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1
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A EFICÁCIA DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE
NA RECUPERAÇÃO DO APENADO
Por: Jorge Roberto Lelaché Cardoso
Orientador
Prof. Francis Hajzman
Rio de janeiro
2011
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A EFICÁCIA DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE
NA RECUPERAÇÃO DO APENADO
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito e Processo Penal.
Por: Jorge Roberto lelaché Cardoso.
3
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer a Deus, o “Todo
Poderoso”, por me ter mostrado o
caminho e guiado todos os meus
passos até aqui, pois sem Ele nada é
possível. Toda glória e toda honra ao
Senhor Jesus. Amém.
4
DEDICATÓRIA
Para Rosane, Vini, Nanashara e Miguel
(meu neto) dedico este capítulo da minha
vida; uma demonstração de que nunca é
tarde para se adquirir conhecimento.
Aos meus familiares (pai, mãe, irmãos,
sobrinhos, etc.), o meu agradecimento
pelo apoio nas horas difíceis e um pedido:
que a nossa família se mantenha unida
cada dia mais.
5
RESUMO
O presente trabalho consiste em uma pesquisa bibliográfica e
documental, visando demonstrar que as penas privativas de liberdade, pouco
ou quase nada, têm adiantado na recuperação do apenado ou reduzido a
violência nos grandes centros, assim como o estigmatiza com a alcunha de ex-
presidiário. As penas privativas de liberdade foram criadas com o intuito não só
de punir, mas, primordialmente, com o objetivo de ressocializar o indivíduo
delinqüente, fazendo com que o tempo no cárcere o ensine a valorar a
liberdade e o respeito às normas que regulam o convívio em sociedade e,
posteriormente trazê-los de volta ao convívio social. Na atualidade, muito se
fala em reintegração do ex-apenado na sociedade, o que na verdade raro
acontece, haja vista que no Brasil o sistema penitenciário demonstra grande
deficiência na recuperação dos presos, em virtude de pouco investimento por
parte dos governantes nesta área, o que faz com que a pena de prisão se
transforme, muito ao contrário do seu objetivo, na completa exclusão do
egresso ao seio da sociedade. Procuraremos entender o porquê de alguns
especialistas declararem-na ultrapassadas, reivindicando o seu fim ao passo
em que outros a tentam aprimorar.
6
METODOLOGIA
A metodologia a ser adotada neste trabalho constará de pesquisa
exploratória, por meio de bibliografia pertinente ao tema, além de pesquisa na
internet. Buscar-se-ão respostas plausíveis às indagações norteadoras, através
de pesquisa explicativa tendo como base legislativa a Constituição Federal em
seus artigos 1º, 5º e seguintes e, como base constitucional, os princípios da
dignidade da pessoa humana, da integridade física do preso, entre outros de
extrema relevância para exploração do tema.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇAO ....................................................................................................... 8
CAPÍTULO I- DO DESENVOLVIMENTO ................................................... 10
Breve Histórico da Evolução das Penas Privativas de Liberdade .... 10
CAPÍTULO II- DO PAPEL DO ESTADO NA RESSOCIALIZAÇÃO . 18
CAPÍTULO III – DOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS DO APENADO ........................................................................................................... 23
CAPÍTULO IV – DA EFICÁCIA DAS PENAS PRIVATIVAS DE
LIBERDADE DIANTE DA FALENCIA DO SISTEMA PENAL .......... 32
CAPÍTULO V – DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................... 39
CONCLUSÃO ............................................................................................... 42
BIBLIOGRAFIA ............................................................................................ 44
INDICE ........................................................................................................... 46
FOLHA DE AVALIAÇÃO ............................................................................ 47
8
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objeto trazer ao debate um
questionamento necessário e atual ligado à imperiosa necessidade de se
reavaliar as penas privativas de liberdade, enfatizando o fato de sua
aplicabilidade satisfazer ou não os anseios da sociedade.
O problema que se apresenta é a visível distância entre a proposta
estatal de propiciar a reintegração do apenado via educação e trabalho e a
robusta realidade da recidiva criminal verificada em nosso país, causada pela
discriminação ao ser humano que carrega o estigma de ex-presidiário.
A problemática da obrigação estatal de reinserir o apenado na vida
produtiva - e as ferramentas disponibilizadas para tal - fazem parte de uma
realidade extremamente complexa, na qual uma das primeiras percepções que
se deve ter é a da inversão da principal relação causa-efeito do problema: não
é o egresso reincidente que afeta o meio social, cometendo novos crimes que
perturbam as pessoas de bem, causando injusta comoção que deve ser
repelida com todas as forças, mas sim a própria sociedade, composta pelas
mesmas pessoas de bem aqui mencionadas e aprisionada em seus defeitos,
imperfeições e carências, que pode propiciar – e até estimular – a reincidência
criminal.
9
A reincidência criminal brasileira, nos patamares atuais, deixa de ser
problema localizado – restrito às áreas penal e penitenciária - e passa a
merecer uma análise mais profunda, à medida em que o sistema prisional não
consegue atender as duas funções básicas da execução penal: defender a
sociedade daqueles que praticam crimes e propiciar a auto-reflexão do
apenado, sua recuperação e sua reinserção, de forma produtiva, no convívio
normal dos cidadãos.
10
CAPÍTULO I
DO DESENVOLVIMENTO
BREVE HISTÓRICO DA EVOLUÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE
LIBERDADE
A pena como forma de sanção pode ser observada desde os mais
remotos tempos, aflorada no desejo de vingança, nesta fase, quando um delito
era cometido, a reação do vitimado, dos familiares e até mesmo do clã ou tribo
eram desproporcionais, pois era voltada não só para o ofensor, mas também
contra todo o grupo ao qual pertencia.
Dentro da evolução da sanção penal, a prisão somente surgiu como
pena em meados do século XVIII, pois embora se encontrem registros desde a
Antigüidade da existência do encarceramento, esse sempre foi adotado com
um sentido custodial. Até fins do século XVIII a prisão serviu somente aos
objetivos de contenção e guarda dos réus, para preservá-los fisicamente até o
momento de serem julgados ou executados.
Na Idade Média também não se viu a prisão com o caráter de pena.
Nesse momento histórico, perpetuou-se a prisão custodial como forma de
guardar os condenados até o momento da ostentação da sua punição,
normalmente amputações, mutilações e queimaduras, ocorridas a céu aberto,
como forma de espetáculo para um público fiel.
11
Com a afirmação do catolicismo, seus preceitos se estenderam a
religiosos e leigos e gradativamente formaram o corpo jurídico da Igreja
Católica, cominando com o surgimento do direito canônico, cuja contribuição se
deu pela adoção dos princípios humanitaristas na aplicação da pena, à qual era
dado o sentido de correção e reabilitação do delinqüente.
A idéia de confinamento para purgação dos pecados, precursionada pela
Igreja Católica, é o gérmen da pena de prisão.
Para "purificar a alma da chaga dos pecados" exigia-se a penitência em
ambientes de reclusão, onde o pecador ou penitente pudesse refletir sobre o
mal causado, através do remorso e do sentimento de culpa que se exaltariam
em uma situação de isolamento.
Durante a Idade Moderna, em face do desenvolvimento das cidades, a
crescente criminalidade e ante a impossibilidade de se dizimar toda uma
população de delinqüentes, a autoridade do direito penal viu-se obrigada a
limitar os casos de adoção da pena de morte.
Essa conjuntura social permitiu o surgimento das casas de correção [02],
nas quais se pretendiam "reformar" o infrator, notadamente, através de um
regime de disciplina e trabalho. Outro antecedente na Modernidade da pena de
prisão foi a pena das galés, na qual os criminosos eram condenados a cumprir
a pena de trabalhos forçados em embarcações de velas, remando sob a
coerção de castigos corporais.
12
Ademais, outra raiz do surgimento da privação da liberdade como pena
se encontra no contratualismo do século XVIII (cf. 2.3). O contrato social, se
violado, mereceria uma sanção, entretanto, como a sociedade daquele tempo
não dispunha de grandes riquezas, decidiu-se privar o indivíduo daquilo que lhe
era mais precioso, sobretudo no Iluminismo: a liberdade.
O homem moderno utiliza a pena privativa de liberdade como forma de
punir os delitos cometidos, contudo, como já comentado, nem sempre foi
assim. Na realidade, esta pena marcou uma verdadeira “evolução” humanista
na forma de punição, como pode-se notar a privação de liberdade já
representou algum freio do comportamento humano, sendo vista com respeito
ou, pelo menos, conseguindo, em uma determinada época da história, fazer
surtirem os efeitos da política criminal.
Enfim, olhando-se para o passado, verificar-se-á que as penas privativas
de liberdade, mesmo cumpridas em regime fechado, representaram um
progresso no sistema penitenciário vigente até então. O que pode depreender
é que, ainda que insatisfatória atualmente, a pena privativa de liberdade
representou em certa medida, um avanço na forma de punir, em face das
penas corporais cruéis que antes eram aplicadas. Foucault em sua obra “Vigiar
e Puni r 1” nos remonta a alguns exemplos dos castigos corporais impostos
àqueles que infringiam as leis.
No final do século XVIII e início do século XIX, contudo, vai-se
extinguindo aos poucos o próprio corpo como alvo principal da repressão
13
penal. Para o citado mestre, as execuções públicas, a utilização de suplícios e
castigos corporais, passam a ser vistos de maneira ruim pela sociedade, posto
que instigava ainda mais a violência, transformando os próprios carrascos em
também criminosos, posto que eles utilizavam a violência “ legal ” do sistema
na execução dos condenados.
A justiça moderna passou a ter vergonha de punir, a execução da pena
distanciando dos juízes da época, tanto que nos rituais modernos de execução
capital (ou pena de morte), não mais se impõe dor e sofrimento aos
executados, como bem atesta Foucault “Desaparece, destarte, em princípios
do século XIX, o grande espetáculo da punição física: o corpo supliciado é
escamoteado; exclui-se do castigo a encenação da dor. Penetramos na época
da sobriedade punitiva”.
No Brasil a pena tem o seu marco histórico na colonização portuguesa,
quando o sistema penal se baseava nas ordenações Afonsinas, Manuelinas e
Filipinas, cujos mandamentos pregavam a desigualdade das classes sociais
em relação ao delito praticado, cabendo ao julgador avaliar a gravidade da
conduta e a casta do criminoso, valorando a condenação, não pelo delito, mas
sim por quem o cometia.
Os delinqüentes de classe nobre eram punidos com multa e ao plebeu restava
as masmorras, os castigos e as humilhações.
14
As Ordenações Afonsinas, lei promulgada por Dom Afonso V, em 1446.
Vigorou até 1521. Serviu de modelo para as ordenações posteriores, mas
nenhuma aplicação teve no Brasil1.
As Ordenações Manuelinas continham as disposições do Direito
Medieval, elaborado pelos práticos e confundiam religião, moral e direito.
Vigoraram no Brasil entre 1521 e 1603, ou seja, somente após o início da
exploração Portuguesa, não chegando a ser verdadeiramente aplicadas porque
a justiça era realizada pelos donatários.
As Ordenações Filipinas vieram a ser aplicadas efetivamente no Brasil,
sob a administração direta do Reino. Tiveram vigência a partir de 1603,
findando em 1830 com o advento do Código do Império. A matéria penal
estava contida no Livro V, denominado o Famigerado. As penas fundavam-se
na crueldade e no terror. Distinguiam-se pela dureza das punições. A pena de
morte era aplicada com freqüência e sua execução realizava-se com peculiares
características, como a morte pelo fogo até ser reduzido a pó e a morte cruel
marcada por tormentos, mutilações, marca de fogo, açoites, penas infamantes,
degredos e confiscações.
Com o advento da independência, a Assembléia Constituinte de 1823
decretou a aplicação provisória da Legislação do Reino; continuaram, assim, a
vigorar as Ordenações Filipinas, até que com a Constituição de 1824, foram
revogadas parcialmente.
1 TELES, NEY MOURA. Direito Penal; Parte geral. São Paulo: Editora de Direito, 1999. p 59
15
No ano de 1823 foram encarregados de elaborar um Código Penal
os parlamentares José Clemente Pereira e Bernardo Pereira de Vasconcelos.
Tendo cada um apresentado seu projeto, preferiu-se o de Bernardo, que sofreu
alterações e veio a constituir o Código de 1830. Nele manteve-se, ainda, a
pena de morte, que acabou sendo tacitamente revogada por D. Pedro II
quando do episódio da execução de Mota Coqueiro, no Estado do Rio, que,
acusado injustamente, depois de morto teve provada sua inocência.
O Código de 1830 sofreu influências do Código Francês de 1810 e da
Baviera de 1813, tendo, por sua vez, influenciado o Espanhol de 1848, que foi
a base do de 1870 e que, por sua vez, veio a se constituir em modelo para os
demais códigos de língua espanhola. Vê-se, assim, a importância de nosso
Código do Império. Apesar disso recebeu severas críticas, porque foi
considerado liberal, estabeleceu a imprescritibilidade das penas, considerou a
religião com primazia — incriminação dos delitos religiosos como mais
importantes — e manteve a pena de morte2.
Ao Código Penal seguiu-se o Código de Processo Penal, editado em
1832. Desde então, até o advento da República, várias leis foram publicadas.
Com a República foi promulgado novo Código Penal, pelo Decreto 847, de 11
de outubro de 1890, baseado no projeto de Batista Pereira, em que foram
adotados os princípios da escola clássica: 1. Da reserva legal; 2. Divisão
dicotômica da infração penal; 3. Penas: prisão celular, banimento e reclusão.
Mas, continuava a edição de inúmeras leis.
2 TELES, NEY MOURA. Direito Penal; Parte Geral. São Paulo: Editora de Direito, 1999. p 15.
16
Em 1932, Vicente Piragibe faz uma compilação das leis vigentes que,
sob a denominação de Consolidação das Leis Penais, passa a vigorar por força
do Decreto 22.213, de 14 de dezembro de 1932.
Sobreveio a Revolução de 1937. O Presidente Getúlio Vargas,
pretendendo fazer reformas legislativas, mandou que o Ministro da Justiça,
Francisco Campos, designasse Alcântara Machado para elaborar o novo
Código. Foi editado, então, o Decreto n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940, que
começou a vigorar somente em 1º de janeiro de 1942 a fim de que pudesse
tornar-se conhecido.
Ressalta-se que no Código de 1940, proveniente de um projeto
preparado durante um período revolucionário, quando o Estado era a força
maior, deu-se maior importância à figura humana — predomínio dos direitos
individuais —, relegando os crimes contra o Estado ao último lugar da lista.
Tratava-se de um código eclético, pois não se filiou a nenhuma escola.
Principais características: pena e medida de segurança; individualização da
pena; tecnicamente moderno.
A seguir foram editados o Código de Processo Penal (Decreto n. 3.689,
de 3/10/1941), a Lei das Contravenções Penais (Decreto n. 3.688, também de
3/10/1941), a Lei de Introdução ao Código Penal (9/12/1941) e o Código Penal
Militar (Decreto n. 6.227, de 24/1/1944).
17
Em 1962, Nelson Hungria ficou encarregado de elaborar um novo
projeto de Código. Em 1964 foi designada uma comissão para a revisão do
projeto final, composta pelo próprio Nelson Hungria, Aníbal Bruno e Heleno C.
Fragoso. Em 1969 o projeto foi promulgado pelo Decreto-Lei n. 1.004, de 21 de
outubro, mas restou revogado sem ter vigência.
O Código Penal foi instituído pelo Decreto-Lei n. 2.848/40, nos termos do
art. 180 da Constituição de 1937. Daí em diante sofreu várias alterações, como
as de 1977 e 1984, pelas Leis n. 6.416 e 7.209, respectivamente. Esta última,
de 13/07/84, com eficácia a partir de 12/01/85, trata-se do nosso efetivo Código
Penal. O Código Penal de 1984 alterou substancialmente certos aspectos
contidos no ordenamento anterior.
18
CAPÍTULO II
DO PAPEL DO ESTADO NA RESSOCIALIZAÇÃO
A discussão sobre o modelo ressocializador não pode ser considerada
uma polêmica vazia meramente acadêmica. Pelo contrário, deve ser vista
como um apontamento interessante para o Direito e para as outras áreas
(Serviço Social, Psicologia, etc.) que atuem na justiça criminal, obrigando-as a
repensarem a função e as reais condições de efetivação do modelo
ressocializador, porém cabe aos operadores do sistema penitenciário
implementar este modelo, mesmo com suas limitações.
Ressocializar significa tornar o Ser Humano capaz de viver em
sociedade novamente, consoante a maioria dos Homens fazem. A palavra
ressocializar poderia, a princípio, referir-se apenas ao comportamento do
preso, aos elementos externos que pode ser resumido da seguinte forma:
ressocializar é modificar o comportamento do preso, para que seja harmônico
com o comportamento socialmente aceito e não nocivo à sociedade.
Entretanto, como é sabido, antes do comportamento existem os valores; nós
agimos, atuamos em função desses valores. O comportamento é um elemento
externo, dessa forma, é essencial influir nos valores diretamente, tornando-os o
máximo possível sociáveis.
19
Assim é que ressocializar não significa apenas dar um emprego ao
preso na prisão ou quando ele for libertado, ou não ter preconceitos contra os
ex-presidiários. Estas são atitudes positivas é evidente, todavia, o processo da
ressocialização é muito mais complexo e inicia por uma reversão dos valores
nocivos do condenado, para valores benéficos para a sociedade.
Dentro do processo de ressocialização do preso condenado é
fundamental o desenvolvimento de mecanismo que resgate, enquanto ainda o
mesmo está encarcerado, os seus valores de pessoa, de ser humano. Os
valores em comum com a sociedade livre. Isto só pode ser conseguido através
de um ambiente de experiências favorável à assimilação destes valores. Este
ambiente de experiências favorável deve ser o mais amplo possível. O efetivo
cumprimento da Lei de Execuções Penais, a qual tem o status de uma espécie
de Constituição Federal do preso, é crucial neste processo.
O Estado, ao receber o poder-dever de realizar o bem comum, apareceu
como um poder de mando, como governo e dominação, ficando assim
responsável pelo bem estar da sociedade, e dentro dessa responsabilidade, lhe
restou também à incumbência de afastar temporariamente os indivíduos
perturbadores desse convívio, com o compromisso de devolvê-lo
posteriormente, ressocializado.
As teorias sobre os fins da pena reconhecem, mesmo que
implicitamente em alguns casos, que a ressocialização é uma finalidade da
ação punitiva do Estado. Isso fica claro na análise das teorias preventivas e
20
unificadoras da pena, e se encontra de maneira implícita nas teorias
retributivas, onde o castigo e a punição devem servir como retribuição ao mal
feito pelo indivíduo ao praticar uma ação tida como delituosa.
Não há, para as teorias retributivas, nenhum efeito utilitário nas
punições, pelo menos em tese. Uma análise mais detida, porém, revela que
nem mesmo para os teóricos da retribuição pura, de bases kantiana e
hegeliana, a ressocialização é desconsiderada. Nenhuma teoria ignora que o
punir, mesmo que para retribuir o mal, deve evitar a prática de um novo delito
por parte do praticante.
Prevenir o crime, no que diz respeito ao indivíduo, é mudar seu
comportamento de "cometedor de crime" para "não cometedor de crime".
Legalmente, no ordenamento jurídico brasileiro, a ressocialização é
estabelecida como um fim da pena.
A ressocialização é assegurada no art.1° da lei 7.210 de 1984, a Lei de
Execução Penal (LEP), que prevê: “A execução penal tem por objetivo efetivar
as disposições da sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para
a harmônica integração social do condenado e do internado”. Se doutrinária
e legalmente a ressocialização é um fim da pena, ela se apresenta, então,
como um dever do Estado.
Ao ter em suas mãos o monopólio da violência punitiva (fazer justiça
com as próprias mãos não é permitido), o Estado deve arcar com a pena em
21
todas as suas possibilidades, cumprindo todos os seus fins (entre eles o de
ressocializar o indivíduo). Se ressocializar é dever do Estado, é um imperativo
de aplicação para o mesmo, ela é, em contrapartida, um direito subjetivo para o
indivíduo.
Diante da ineficácia das ações perpetradas pelo Estado com a finalidade
de ressocializar o detento, a sociedade vem alimentando, equivocadamente, o
imaginário de que o preso vai para a cadeia fazer um aprazível curso intensivo
de criminalidade, comendo, bebendo e dormindo de graça, enfim, vai para uma
"escola". Contudo, se a afirmação for analisada no contexto em que foi feita
pelo ilustre profissional do direito, outra será a conclusão.
Ninguém ignora que hoje no Brasil a prisão não regenera nem
ressocializa as pessoas que são privadas da liberdade por ter cometido algum
tipo de crime. Ao contrário, é de conhecimento geral que a cadeia perverte,
corrompe, deforma, avilta e embrutece. É uma fábrica de reincidência, é uma
universidade às avessas, onde se diploma o profissional do crime3.
É de conhecimento geral, no entanto, que a ressocialização se afigura
como mera ideologia, mera ilusão. Dois elementos contribuem para seu
fracasso enquanto projeto: a falta de apontamento para o que as sociedades
exigem de seus indivíduos para que os mesmos sejam cidadãos participantes,
e o uso da prisão como meio de excelência para se punir alguém. Ser
cidadão no mundo moderno implica uma série de condições psicossociais de
3 É preciso parar de prender, revista Veja, 22/05/91.
22
participação, tais como a autodisciplina, a responsabilidade e o cálculo
racional.
Restando claro que, o simples cumprimento das determinações contidas
no ordenamento jurídico, de forma relevante mudaria este quadro caótico. É
preciso a reforma do sistema para que a transformação de comportamento do
condenado seja propiciada por instrumentos como a educação e o trabalho, de
modo a dar-lhe condições de levar uma vida digna quando sair do
estabelecimento prisional, e evitar que o cárcere seja mais penoso do que deve
ser. Isto, até mesmo para que a pena de prisão entre em consonância com os
princípios do direito penitenciário, quais sejam: a proteção dos direitos
humanos do preso; o preso como membro da sociedade; a participação ativa
do sentenciado na questão da reeducação e na sua reinserção social; a efetiva
colaboração da comunidade no tratamento penitenciário; e a formação dos
encarcerados de modo que reaprendam o exercício da cidadania.
O projeto ressocializador que observar as condições necessárias para a
participação cidadã, e compreender as verdadeiras funções da prisão, não
resolverá todos os problemas relativos à criminalidade, mas abrirá novas
alternativas para o problema estrutural da criminalidade, evitando que, mais
uma vez, o Direito seja transformado em letra morta.
23
CAPÍTULO III
DOS DIRIETOS CONSTITUCIONAIS GARANTIDOS AO
APENADO PELO ESTADO
A Constituição Federal procura velar pela integridade física e dignidade
dos aprisionados, tendo sido expressa ao assegurar "o respeito à integridade
física dos presos" (art. 5º, XLIX).
As Cartas anteriores já o consignavam, com pouca eficácia, referindo-se
habitualmente a várias formas de agressão física a presos, a fim de extrair-lhes
confissões de crimes. Ademais, a Carta Magna determinou que "ninguém será
submetido a tortura ou a tratamento desumano ou degradante" (art. 5º, III).
Para dotar tais normas de aplicabilidade plena, preordenaram-se as
várias garantias penais adequadas, como o dever de comunicar,
imediatamente, ao juiz competente e à família ou à pessoa indicada, a prisão
de qualquer um e o local onde esteja confinado; e o dever da autoridade
policial de informar ao preso os seus direitos, entre os quais o de permanecer
calado,o direito a ter a assistência de advogado; e o direito do preso à
identificação dos responsáveis por sua prisão e interrogatório.
A realidade fática, no entanto, é bem distinta. Os apenados são lançados
à prisão sem qualquer critério de classificação, sendo abandonados pelo
24
Estado e mantidos na ociosidade e no ódio pela sociedade que ali os flagelou.
Ficam a passar pelas suas mentes uma forma de vingança por tudo a que são
submetidos.
Isso até mesmo para que a pena de prisão entre em consonância com
os princípios do direito penitenciário, quais sejam: a proteção dos direitos
humanos do preso; o preso como membro da sociedade; a participação ativa
do sentenciado na questão da reeducação e na sua reinserção social; a efetiva
colaboração da comunidade no tratamento penitenciário; e a formação dos
encarcerados de modo que reaprendam o exercício da cidadania e o respeito
ao ordenamento legal.
Tendo a pena privativa de liberdade o objetivo não apenas de afastar o
criminoso da sociedade, mas, sobretudo, de excluí-lo com a finalidade de
ressocializá-lo, note-se que a pena de prisão atinge o objetivo exatamente
inverso: ao adentrar no presídio, o apenado assume o seu papel social de um
ser marginalizado, adquirindo as atitudes de um preso habitual e
desenvolvendo cada vez mais a tendência criminosa, ao invés de anulá-la.
É preciso a transformação do sistema para que a reforma do condenado
seja propiciada por instrumentos como a educação e o trabalho, de modo a
dar-lhe condições de levar uma vida digna quando sair do estabelecimento
prisional, e evitar que o cárcere seja mais penoso do que deve ser.
25
Neste sentido, contrapondo os pressupostos da Declaração Universal de
Direitos Humanos e da Lei de Execuções Penais, percebe-se uma falta de
conformidade da última com os princípios dos direitos humanos. A lei brasileira
é obrigada, conforme a Constituição Federal, a assegurar aos indivíduos os
direitos aprovados em documentos internacionais, incorporando-se ao direito
interno brasileiro. Desse modo, passam a ter aplicação imediata, da mesma
forma e no mesmo nível que os direitos constitucionalmente consagrados. A
importância dos direitos humanos, conseqüentemente, passa a permear as leis
dos países signatários que, em sua maioria, adotaram seus pressupostos,
embora isso não seja sinônimo de aplicabilidade.
Assim, ao ratificarem os tratados de direitos humanos, os Estados
Partes contraem, a par das obrigações convencionais atinentes a cada um dos
direitos protegidos, também obrigações gerais da maior importância,
consignadas naqueles tratados.
Dessa maneira, os princípios básicos da DUDH deveriam estar
totalmente outorgados nas leis brasileiras, o que inclui a LEP. O Documento da
ONU garante aos indivíduos igual tratamento humanitário, social, econômico e
político, sem distinção de classe social, raça ou cor. Porém, essa relação não é
vista nas prisões do Brasil, que privilegiam o modelo privativo de liberdade,
embora inúmeras unidades já pratiquem a ressocialização.
É também obrigação do Estado garantir igual remuneração por igual
trabalho, o que não acontece no sistema penal brasileiro. Tendo como exemplo
26
a penitenciária Lemos Brito e em conformidade com a LEP, os internos que
trabalham na Requinte Móveis recebem três quartos do salário mínimo.
Portanto, a LEP contraria a DUDH, ao permitir que empresas paguem salários
inferiores em relação a mesmo trabalho (marcenaria). Desses três quartos,
parte é destinada ao “ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a
manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da
destinação prevista nas letras anteriores”, segundo o item “d” do artigo 29 da
LEP.
Aprovada pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de
dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em cujo
preâmbulo está escrito que devemos todos, indivíduos e comunidades, nos
empenhar para que os direitos nela inscritos se tornem uma realidade,
mediante a adoção de medidas progressivas de caráter nacional e
internacional.
E para reforçar ainda mais a Declaração dos Direitos Humanos, a Lei de
Execuções Penais , Lei n. 7.210, de 11 de julho de 1984 diz,: “Art. 1º - A
execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou
decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social
do condenado e do internado. Um indivíduo que cometeu um crime deve ser
julgado segundo o devido processo legal e, se condenado, sujeito a um
sistema que objetive sua ressocialização.”
27
Segundo Cesare Beccaria “Toda pena, que não derive da absoluta
necessidade, diz o grande Montesquieu, é tirânica, proposição esta que pode
ser assim generalizada: todo ato de autoridade de homem para homem que
não derive da absoluta necessidade é tirânico”4.
Como conseqüências e frutos de políticas sociais injustas, o poder
dominante priva a maioria da população brasileira do alcance aos meios
mínimos de sobrevivência como educação, saúde e moradia, elevando cada
vez mais as diferenças sociais e os índices de criminalidade. A pena deve ser
usada como profilaxia social, não só para intimidar o cidadão, mas também
para recuperar o delinqüente.
Aponta-se como uma das soluções para um melhor resultado das
sanções aplicadas a de colocar em prática o que já está previsto em lei, o
trabalho dos detentos nos sistemas prisionais, como explicita a Lei N.º 7.210
DE 11 DE JULHO DE 1984 (Lei de Execuções Penais) nos artigos:
“Artigo 28 - O trabalho do condenado, como dever social e condição de
dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semi-
aberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena.
Art. 128. O tempo remido será computado para a concessão de
livramento condicional e indulto.”
5 BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos delitos e das penas. São Paulo: CD, 2004. p.28.
28
A Laborterapia trata-se de ocupar o tempo fazendo uma atividade
profissional. Poderão os detentos desenvolver atividades que variam da
manutenção do presídio, panificação, cozinha e faxina, até atividades como a
confecção de bolas, caixões e outras tantas atividades mais que possam ser
desenvolvidas dentro dos presídios.
As prisões devem ser reformuladas com a criação de oficinas de
trabalho, para que a laborterapia possa ser aplicada de fato, dando
oportunidade para que o condenado possa efetivamente ser recuperado para a
vida em sociedade.
Uma outra alternativa para as superlotações e a redução dos custos do
sistema penitenciário, seria as penas alternativas. As penas alternativas são
destinadas aos criminosos não perigosos e às infrações de menor gravidade,
visando substituir as penas detentivas de curta duração. Elas podem substituir
as penas privativas de liberdade quando a pena imposta na sentença
condenatória por crime doloso não for superior a quatro anos. Tratando-se de
crime culposo a substituição é admissível qualquer que seja a pena aplicada.
Entretanto, o crime cometido com violência e grave ameaça não é passível de
substituição, assim como a reincidência em crime doloso impede a concessão
da alternativa penal.
A estigmatização do ex-presidiário é um dos fatores que dificultam sua
reintegração5, o que acaba provando sua nova exclusão e, consequentemente,
5 HULSMAN, Louk, CELIS, Jacqueline Bernat de. Penas perdidas; o sistema penal em questão. Rio de Janeiro : Lumen, 1993. p. 69
29
o retorno à vida do crime e possível e provavelmente à vida no cárcere em
algum momento futuro.
O estigmatizado tem um aspecto simbólico que é o da sua
representação como ex-presidiário e assim como um sinal de periculosidade
para a sociedade como um todo (família, mercado de trabalho, polícia) e tem
também um aspecto material, que é o da personalidade estigmatizada
desenvolvida pelo preso na cadeia e agora reforçada, quando em liberdade.
A maioria dos egressos volta a cometer delitos porque não encontram
condições para se reintegrarem à sociedade com dignidade. “O correspondente
a 81% dos egressos possuem baixa escolaridade e, conseqüentemente, baixa
qualificação profissional. Somando-se isso à discriminação por ser ex-
presidiário, aos abalos dos vínculos familiares e às marcas psíquicas e
emocionais, devido ao longo período de encarceramento, como, por exemplo,
delírios persecutórios, o egresso retorna ao mundo exterior sem rumo e
perspectiva.
O confronto das representações com a realidade, quando submetida a
uma análise crítica e fundamentada, pode demonstrar esses equívocos.
Quando se discute violência, como fator de ameaça à vida, não se pode omitir
ou dispensar a discussão de conceitos que podem gerá-la. Esse, sem dúvida, é
o caso dos conceitos de estigma, exclusão, ironia, indiferença, preconceito.
A construção, aceitação e divulgação do preconceito e do estigma já
são, em si, processos violentos, que geram violência. Essa construção é
30
realizada por homens, seres pensantes, capazes de raciocínio e de intenções.
É preciso, portanto, compreender melhor o estigma e o preconceito. O estigma
é uma marca, um rótulo que se atribui a pessoas com certos atributos que se
incluem em determinadas classes ou categorias diversas, porém comuns na
perspectiva de desqualificação social.
Os rótulos dos estigmas decorrem de preconceitos, ou seja, de idéias
pré-concebidas, cristalizadas, consolidadas no pensamento, crenças,
expectativas socioindividuais. Assim, percorrendo vários campos das ações e
relações sociais, os estigmas alcançam tanto os pobres e os meninos de rua,
como os portadores de HIV, os que apresentam necessidades especiais
(físicas, mentais, psicológicas) e os homossexuais. E os pré-conceitos
(portanto, os conceitos prévios ou previamente estabelecidos) antecedem os
atributos ou características pessoais a que se referem.
Desse modo, os atributos ou características que justificam o estigma são
previamente avaliados, com pouca ou nenhuma oportunidade de análise crítica
e consciente, que os associe às circunstâncias reais da vida e das relações
humanas, sociais. Conseqüentemente, o preconceito é inflexível, rígido, imóvel,
prejudicial à discussão, ao exame fundamentado e à revisão do que está pré-
concebido6.
Mais uma vez recorrendo à análise crítica e fundamentada, que
aproxima visões e consciências das circunstâncias reais da vida, observa-se
7 A VIOLÊNCIA DO ESTIGMA E DO PRECONCEITO À LUZ DA REPRESENTAÇÃO SOCIAL - Disponível em www.arco-iris.org.br/_prt/dicas/arquivos/052004-02.doc
31
que cada indivíduo é singular, é diferente, é único em suas características;
respeitá-lo, qualificá-lo, acolhê-lo, não é uma concessão, mas sim um direito;
esse direito é social, é político, é de cidadania. Os que constroem ou aceitam
preconceitos, constroem e aceitam estigmas. Ambos - preconceitos e estigmas
- promovem e naturalizam palavras ou ações violentas. Por conseguinte, essa
construção pode ser a origem e o início da violência.
32
CAPÍTULO IV
DA EFICÁCIA DAS PENAS PRIVATIVAS DE
LIBERDADE DIANTE DA FALÊNCIA DO SISTEMA
PENAL
Com o passar do tempo a humanidade observou que os métodos de
repressão até então adotados (de vingança pessoal, Lei de Talião) eram
prejudiciais à sociedade. Estes sistemas consistiam em causar ao criminoso
dano ou mal semelhante ao que ele praticara. “Olho por olho, dente por dente”,
foi a norma utilizada durante grande período da raça humana, que mais se
aproximava da barbárie do que da civilização.
Nesse momento, começa a surgir uma maior interferência social no
controle das punições, colocando fim na vingança privada. Logo, o Estado
assume a titularidade da punição dotado do Direito Penal.
Sendo o Estado o detentor do direito de punir, a sociedade espera que
este proporcione mais segurança e harmonia entre as pessoas e para atingir o
objetivo de estabilidade social, o Estado busca combater à criminalidade
através de estratégias de política criminal. Yure Gagarin Soares de Melo7
ensina que: “Política Criminal é o conjunto dos procedimentos preventivos e
repressivos através dos quais o Estado reage ao crime”. O Estado procura um
modo, uma forma de atuar para prevenir e combater a criminalidade e assim,
7 MELO, Yure Gagarin Soares de. As novas perspectivas do direito penal brasileiro. Rio de Janeiro, 2003, p. 20
33
propiciar a consecução dos fins almejados e que também se adaptem
perfeitamente à realidade da sociedade a ser por ela regulada.
Em razão do crescente aumento da violência, da falência do Estado em
combater à criminalidade, da deslegitimação dos sistemas penais, surgem
grandes correntes com propostas político criminais, preocupadas em solucionar
a crise penal.
Dentre estas, pode-se citar a promulgação da Lei dos Crimes
Hediondos, Lei n° 8072, de 25/07/1990, criada pelo Estado que passou a tratar
com uma forma mais agressiva crimes considerados de maior gravidade social,
crimes estes especificados no texto da lei.
Para os seus partidários as penas têm de ser severas e duradouras,
sem sequer questionar se são justas, adequadas, ou proporcionais. Acreditam
que as pessoas deixariam de cometer crimes devido ao temor imposto pelo
rigor da pena, preconizando assim, pela privação de liberdade por longos
períodos, pela prisão perpétua e pela aplicação da pena de morte.
Os que comungam com essa doutrina entendem que, o Direito Penal
deve ser mais coativo e coercitivo, o criminoso deve ser tratado com todo rigor,
garantindo desta forma a segurança pública. Porém, apresenta-se apenas
como um símbolo de eficiência, pois na prática não mostrou resultado positivo,
tendo em vista que o advento da Lei dos Crimes Hediondos não fez com que
diminuísse o número de crimes.
34
Por outro lado, temos a corrente da teoria abolicionista, tendo em vista o
descrédito do sistema penal, apresenta a proposta de abolir com o direito
penal, pois, para seus defensores a aplicação do direito penal enseja mais
efeitos negativos que positivos. São contrários as leis e a pena de prisão, por
entenderem que não solucionam os problemas da sociedade.
A teoria abolicionista é tida como o meio mais radical de enfrentar o
problema da criminalidade, visto que pretende eliminar por completo o sistema
penal, afastando o Estado e investindo na própria sociedade a incumbência de
solucionar os conflitos através de meios informais como a reparação civil, o
acordo e a arbitragem.
Para os abolicionistas, as pessoas pouco a pouco se acostumariam a
observar as regras de convivência social e passariam a se respeitar,
diminuindo assim a violência. Porém, para os questionadores desta doutrina
seria como voltar ao direito selvagem, vingança individual, lei do mais forte e
prevenção geral da vingança pública, que na ausência do direito penal, seria
atuada por poderes soberanos, entendendo assim, que a lei penal deve existir
para tutelar pelos direitos fundamentais, limitando e organizando a vida em
sociedade.
Muito embora tenha fracassado nos países onde surgiu (Escandinavos e
Holanda), sua grande contribuição é a humanização defendida em face da
falência do direito de punir do Estado. Assim sendo, o Abolicionismo tem
demonstrado que se fazem necessárias mudanças no sistema penal para
35
combater a criminalidade, ressocializando o infrator e lhe possibilitando um
cumprimento de pena digno a sua qualidade de ser humano.
Por derradeiro, a terceira corrente que defende o direito penal mínimo,
busca solucionar a violência não com um rigor excessivo como no direito penal
máximo e nem abolindo o sistema penal, visto que entendem os minimalistas
que se faz necessário um controle estatal, porém de forma moderada sendo
utilizado quando realmente necessário para que haja a garantia dos direitos
fundamentais. A certeza perseguida pelo direito penal mínimo, está, em que
nenhum inocente seja punido, reduzindo as formas de punições, e garantindo
ao máximo os direitos fundamentais. Por isso o Direito Penal mínimo também é
conhecido como garantismo.
Entendem os minimalistas que o direito penal deve ser aplicado somente
em ultima ratio, ou seja, o direito penal deve ser aplicado em último caso,
quando as outras soluções não forem suficientemente eficazes, lutam por uma
maior utilização de penas alternativas, de solução dos conflitos mediante o
emprego de institutos de outros ramos do direito, a exemplo da reparação do
dano (âmbito civil) e da sanção, advertência, etc. (âmbito administrativo).
Buscam diminuir a utilização do cárcere, pois entendem que a prisão corrompe
ainda mais o condenado. Para exemplificar o Direito Penal Mínimo, menciona-
se a Lei n° 9.099/95, uma vez que, no âmbito dos juizados especiais utiliza-se
o direito penal como última ratio, manuseando anteriormente instrumentos
alternativos de solução de conflito, como transação penal e composição civil. A
Lei n° 9.009/95 apresenta modos alternativos de solução de conflitos para
36
infrações de menor e médio potencial ofensivo, reservando a pena de prisão
para casos de grave potencial ofensivo.
Na luta pelo combate à criminalidade tem se notado a ineficiência do
Estado em controlar e diminuir a violência, por isso as correntes de política
criminal até agora estudadas tentam buscar uma forma para diminuir a
criminalidade e alcançar a paz social.
Atualmente vive-se, em especial no Brasil, uma situação preocupante
no que diz respeito à segurança das pessoas. A cada dia aumenta a violência e
o número de crimes praticados, fazendo com que muitos clamem pela
instituição do Direito Penal máximo, ou seja, de penas mais severas, inclusive
defendendo a pena de morte.
No Brasil a pena de prisão não tem sido eficaz, por não apresentar um
sistema penitenciário adequado. O que torna a pena privativa de liberdade uma
porta para a escola de delinqüência e de recrutamento da criminalidade
organizada.
Os dados estatísticos do ano de 2008, fornecidos pelo MINISTÉRIO DA
JUSTIÇA - DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL - Sistema
Integrado de Informações Penitenciárias – InfoPen, apontam que no país tem
um total geral de presos no sistema e na polícia, de 440.000 presidiários.
37
O sistema penitenciário brasileiro encontra-se à beira da falência e põe
em risco a paz social. Presídios destinados aos que reparam com a pena o
dano causado à sociedade, transformaram-se em verdadeiras masmorras. Sua
função educativa (a ressocialização do condenado e a sua inserção no
mercado de trabalho) cedeu lugar aos motins, levantes e rebeliões, que deram
origem a um poder paralelo (o poder marginal), financiado pelo comércio das
drogas e administrado por comandos e facções, concorrendo com o poder legal
(o estado de direito) debilitado pelos insignificantes orçamentos que deixam à
mercê da sorte a Segurança Púbica nos Estados federados.
A superpopulação carcerária, os maus tratos e torturas, a falta de
assistência odontológica, médica e psicológica aos presos (alguns portadores
de AIDS ou tuberculose e outros portadores de necessidades especiais,
apenados com medidas de segurança), a lentidão da justiça pela ausência de
assistência judiciária nos processos em curso durante a execução das penas, a
falta de classificação dos presídios por critério de qualificação de delito,
quantificação de penas e grau de periculosidade, aliados a falta de
compromisso com a ressocialização do preso e o desrespeito à sua integridade
física e moral, constituem o combustível que alimenta a chama da revolta e
leva os amotinados a enfrentarem o aparato policial ensejando os constantes
massacres.
A quem interessa essa desordem social e a quem atribuir culpa: ao
Poder Judiciário pela sua lentidão? Ao Ministério Público, pela falta de uma
atuação mais presente nos presídios? Ou ao Estado Executivo, responsável
38
pela custódia dos presos, incapaz de oferecer condições à Defensoria Pública
para cumprir suas obrigações constitucionais, mas que privilegia obras e
realizações, em troca de dividendos políticos
Têm razão o jornalista Persival de Souza e o médico Drauzio Varella,
quando retratam o submundo dos presos em suas obras “A Prisão” e “Estação
Carandiru” e, o Padre Gunther Zgubic, coordenador da Pastoral Carcerária do
Brasil ao afirmar: “Tudo que é garantido ao preso não existe”, repudiando os
maus tratos e torturas, que transformam os presídios em verdadeiros
calabouços de expiação.
O Brasil é uma sociedade injusta e desigual e o sistema penitenciário
brasileiro é o maior espelho disso. Repare que o perfil do preso desse país é
jovem, pobre e não-branco. A prisão é um sistema de punição de pobres. Não
há políticas públicas voltadas à estruturação do sistema penitenciário. Já notou
que só se fala no sistema quando há uma rebelião? A imprensa só fala da rede
prisional quando ocorre um motim. A lei de execução penal não é cumprida
nesse país. Há uma distância enorme entre o que diz a lei e a realidade. No
Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, o critério para o local de
encarceramento do preso é a suposta facção a qual ele pertence. Se, de fato,
ele não pertencer a nenhuma facção criminosa, o poder público toma como
base o endereço do detento e o enquadra em alguma facção, obrigando-o a
assinar um termo de compromisso que exime o Estado de qualquer
responsabilidade pela sua vida.
39
CAPÍTULO V
DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verificou-se a partir das premissas básicas contidas na primeira parte
em sua abordagem do conjunto de normas utilizadas pelo homem, a busca de
uma forma de punição para quem efetivamente viola a ordem preestabelecida,
desde o Brasil colonial aos dias atuais.
Oportunamente foi observado que desde os primórdios, a legislação
penal escrita ou consuetudinária, esteve atrelada aos princípios religiosos e
com diferenças de aplicabilidade em cada meio social, o que de forma explícita
favorecia aos mais afortunados.
Em período pós-independência, começa uma evolução sistemática de
aplicação de penas, com a criação de institutos que buscavam uma
padronização das penas, sem, contudo, buscar uma igualdade entre os
homens, de forma a punir com um julgamento justo, o criminoso, sem olhar a
sua classe social ou a cor da sua pele.
Posteriormente com o advento do Código Penal, iniciava-se a
sistematização da aplicabilidade das penas em um quanto pré-definido para
cada tipo de delito. Com a evolução dos tempos este digesto normativo, sofre
diversas alterações, ora aprimorando a tipificação do delito, ora asseverando
40
as penas e a suas formas de cumprimento, sem, contudo, alcançar o seu fim, a
paz social.
A partir da segunda fase do presente trabalho buscou-se entender as
formas utilizadas pelo Estado, já soberano, na reintegração do membro à
sociedade, que por ele, Estado, como forma de punição, por violar os estatutos,
foi excluído temporariamente para cumprir a sanção penal e ser reeducado.
Chocantemente, constata-se, que por falta de recursos, por falta de
vontade ou por falta de meios adequados, para cumprir o mando
ressocializador, o indivíduo que foi retirado do convívio social, não tem mais o
seu retorno aceito, pois carrega o estigma de “ex-presidiário, ex-apenado,
egresso do sistema prisional e outros epítetos degenerativos de sua conduta
moral e social”.
1. Na terceira fase, adentrou-se mais detidamente à delimitação do tema
apresentado, ou seja, a avaliação da sociedade, quanto à sanção aplicada ao
seu membro infrator e o retorno deste ao seu seio.
Notou-se claramente, que a sociedade em si, move-se de forma
emotiva, acompanhando o clamor de suas massas, ora querendo o expurgo
definitivo do indivíduo criminoso, ora de forma benevolente aceita a sua
conduta delituosa, analisando, sempre, os fatos de forma passional e
direcionada aos anseios individuais. Contudo, se demonstrando preconceituosa
aos que foram estigmatizados pelo cumprimento de pena restritiva de
liberdade.
41
No retorno para a liberdade, é o momento em que a sociedade se
mostra insatisfeita com a aplicação da lei penal, não se sentindo ressarcida
pelo mal que lhe foi causado. Então se fecham as portas, não se sabe, se
cobrando o que faltou ser pago ou por simples preconceito.
Enfim, na fase final, obteve-se uma análise da necessidade de se
reavaliar o sistema penal e carcerário com fins a se estabelecerem mudanças
que coíbam a reincidência criminal, de forma que se instituam normas mais
eficientes e adequadas ao cumprimento da sanção, bem como na preparação
do apenado ao seu regresso a sociedade.
Consciente de que a vontade humana supera as adversidades impostas
pelo sistema, ao ponto de superar preconceitos, o presente trabalho mesurou-
se na premissa de que dentre as normas adotas para tirar do estado de
falência em que se encontra o sistema prisional, está a utilização de meios
educativos que levem o apenado a valorar a sua autoestima, buscando
também a sua ressocialização. O que comprovadamente é viável e eficaz, pelo
retorno à vida social e a uma melhor qualidade de vida, proporcionando um
bem estar, não só a sociedade em seu todo, mas também de forma individual,
pelas razões e fundamentos expostos no presente trabalho monográfico.
42
CONCLUSÃO
Está pacificado que as penitenciárias brasileiras não reduzem a
criminalidade. E por não cumprirem a primordial finalidade de ressocialização
do apenado, retratam a falência da pena de prisão.
Deixam de cumprir o seu papel ressocializador quando não dão
condições ao preso de se aprimorar e se recuperar visando sua reintegração à
sociedade quando chegar a hora de retornar à liberdade.
É certo que a punição é uma necessária satisfação do Poder Público à
sociedade servindo de exemplo para que outros delitos não venham a
acontecer. Tendo a punição dupla função, qual seja, reparadora e
ressocializadora, visa a reintegração do apenado à sociedade apto a conviver
com seus pares.
A realidade carcerária do país é de superpopulação carcerária,
corrupção, tráfico de drogas, violência, condições insalubre, alimentação de
péssima qualidade, etc. Tudo isso traz uma enorme distância do princípio da
dignidade da pessoa humana, que deveria ser observado em relação ao
apenado.
Relegados às péssimas condições em que vivem não há de se
recuperar qualquer preso.
43
Para que se consiga um controle plenamente eficaz visando a solução
deste problema, acredita-se num aperfeiçoamento do modelo atual
impulsionado pelo investimento na reforma dos complexos penitenciários,
oportunidade de trabalho intra e extra muros para os apenados objetivando o
instituto da detração penal, o implemento de penas alternativas para delitos
não violentos e, até mesmo, a melhoria de salário dos agentes penitenciários.
44
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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2004.
BRASIL. Constituição. Texto Constitucional de 5 de outubro de 1988 com
as alterações adotadas pelas Emendas Constitucionais nº. 1/1992 a 30/2000
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45
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TORRES, Douglas Dias. O Direito Penal na Atualidade. Disponível em:
http://www.direitonet.com.br/artigos/x/33/33/333/p.shtml.
46
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2 AGRADECIMENTO 3 DEDICATÓRIA 4 RESUMO 5 METODOLOGIA 6 SUMÁRIO 7 INTRODUÇÃO 8 CAPITULO I – DO DESENVOLVIMENTO. 10 Breve Histórico da Evolução das penas Privativas de liberdade. CAPITULO II – 18 O PAPELDO ESTADO NA RESSOCIALIZAÇÃO. CAPITULO III - 23 DOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS DO APENADO. CAPITULO IV - 32 DA EFICÁCIA DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE DIANTE DA FALÊNCIA DO SISTEMA PENAL. CAPITULO V – 39
DAS CONSIDERAÇÕES FINAIS.
CONCLUSÃO – 42
BIBLIOGRAFIA - 44
INDICE - 46
FOLHA DE AVALIAÇÃO - 47