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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇAO – CAMPUS I
CURSO PEDAGOGIA – EDUCAÇÃO INFANTIL
Aline Regina Pinheiro Cruz Leite
A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORAS DA
EDUCAÇÃO INFANTIL: REPENSANDO CONCEITOS, REVENDO
PRÁTICAS
Salvador
2010
ALINE REGINA PINHEIRO CRUZ LEITE
A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORAS DA
EDUCAÇÃO INFANTIL: REPENSANDO CONCEITOS, REVENDO
PRÁTICAS
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção de graduação em Pedagogia com habilitação em Educação Infantil da Universidade do Estado da Bahia, sob orientação da Prof.ª Lucinete Chaves
Salvador
2010
ALINE REGINA PINHEIRO CRUZ LEITE
A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORAS DA
EDUCAÇÃO INFANTIL: REPENSANDO CONCEITOS, REVENDO
PRÁTICAS
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção da graduação em Pedagogia do Departamento de Educação da Universidade do Estado da Bahia, sob orientação da Profª Lucinete Chaves de Oliveira.
Salvador __ de______________de 2010
_______________________________________
Prof.ª Mestre Lucinete Chaves de Oliveira – UNEB
(Orientadora)
_________________________________________
Prof.ª Ana Lucia de Castro Oliveira Guimarães – UNEB
___________________________________________
Prof.ª Mestre Terezinha Zélia Queiroz Oliveira -- UNEB
Dedico este trabalho a minha filha Laura que precisou, mesmo sendo ainda, tão pequenina, vivenciar os meus momentos de ausência. E a minha mãe Rita que me deu o apoio necessário para a concretização desse objetivo, sabendo com suas as palavras e atos, me acalentar e me encorajar nos momentos mais difíceis desta caminhada.
AGRADECIMENTOS
Primordialmente agradeço a Deus por ter me dado forças para conseguir concretizar esse objetivo, aos meus pais pela dedicação que sempre tiveram a mim, em especial a minha mãe que durante todo esse período da monografia, assumiu a “minha vida”, ao meu irmão por acreditar no meu potencial, ao meu esposo, pelo apoio ao longo dessa trajetória, a minha filha por cada dia ressignificar a minha vida, a Josias Sena, amigo de todas as horas, à minha orientadora Lucinete Chaves, pelas contribuições para minha formação enquanto educadora, as minhas amigas de turma: Alinéa, Carla, Diane e Veronice, por tornarem minhas tardes mais felizes, pelo incentivo e encorajamento quando achava que minhas forças já tinham se esvaído.
“Não há ensino de qualidade, nem reforma educativa, nem renovação pedagógica
sem uma adequada formação de professores.”
Antônio Nóvoa
RESUMO
O presente trabalho monográfico objetivou apresentar dados da revisão bibliográfica
e dados da pesquisa exploratória realizada em uma instituição particular/popular,
localizada em um bairro periférico de Salvador e tem como objeto de estudo a
importância da Formação de professoras para a Educação Infantil e as implicações
desta no processo de aprendizagem das crianças. O estudo investigou as práticas
das professoras informantes, bem como a concepção delas acerca da Educação
Infantil, para tanto a pesquisa utilizou da pesquisa qualitativa, e para obter os dados
fez uso da técnica da entrevista e da observação não-participante e de um
questionário como instrumento de coleta. A pesquisa revelou o quanto a formação
especifica dos profissionais que atuam nesse segmento da Educação é fundamental
para se obter êxito no processo de ensino-aprendizagem e que a precariedade na
formação desses profissionais é resultado de um contexto histórico de
desvalorização da educação à criança pequena, o qual apesar dos avanços
conquistados se propaga até os dias atuais.
PALAVRAS- CHAVE: Educação Infantil – Políticas Públicas – Formação de Professores.
ABSTRACT
This article (monography) presents a literature review and research data a private/popular school, located in an suburb of Salvador, and aims to study the importance of teachers training for kindergarten education and its implications in the children learning process. The study investigated the practices of teachers informant, and their conceptions about early childhood education as well. For this, was used qualitative research, and to get the data was made use of the interview, technique and non-participant observation and a questionnaire as collection instrument. The research revealed how the specific training of professionals working in this sector of education is crucial to achieving success in the teaching-learning process and that job insecurity in the training of these professionals is the result of a history of devaluation of education to infants, which despite the advances made spreads to the present day.
KEY WORDS: Early Childhood Education - Public Policies - Teacher Training
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...............................................................................10
2 BREVE PANORAMA HISTÓRICO DO ATENDIMENTO DA
INFÂNCIA NO BRASIL..........................................................................13
2.1 A TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL.............................13
2.1.1 A dicotomia entre o cuidar e o educar.........................................................19
2.2 A EDUCAÇÃO INFANTIL NO PLANO LEGAL...............................................23
2.2.1 A legislação e a Educação Infantil......................................................................23
2.2.2 Educação infantil: da conquista de 1988 aos dias atuais..........................26
2.2.3 A inserção da criança de 6 anos no Ensino Fundamental..........................31
2.3 FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO INFANTIL..........................35
2.3.1 A desvalorização dos profissionais da Educação Infantil..........................35
2.3.2 A nova perspectiva de formação e seus impasses.....................................38
3 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA..................................................41
3.1 TÉCNICAS E INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS UTILIZADOS........42
4 COLETA E ANÁLISE DE DADOS.................................................45
4.1 CONCEPÇÃO DAS PROFESSORAS ACERCA DA EDUCAÇÃO
INFANTIL/ CUIDAR E EDUCAR..............................................................................46
4.1.1 Qual a importância da Educação Infantil.....................................................47
4.1.2 Requisitos que a pessoa precisa ter para ser professora de Educação
Infantil........................................................................................................................48
4.1.3 O elemento mais importante para ser professora de Educação
Infantil.......................................................................................................................49
4.1.4 A condição de mãe favorece para ser boa professora de Educação
Infantil?......................................................................................................................50
4.1.5 O papel e atividades atribuídas às auxilares................................................51
4.1.6 O que a criança precisa aprender na Educação Infantil?...........................52
4.2 ENTRADA NA PROFISSÃO............................................................................53
4.2.1 O ingresso na Educação Infantil..................................................................54
4.2.2 Como começou a trabalhar na Instituição/ Condições de trabalho..........55
4.3 IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA.........................56
4.3.1 Descrever e avaliar a formação....................................................................57
4.3.2 Participação em eventos que visem aperfeiçoamento profissional.........59
4.4 PRÁTICA DOCENTE......................................................................................60
5 CONSIDERAÇÃOES FINAIS........................................................63
REFERÊNCIAS.............................................................................65
APÊNDICE A(QUESTIONÁRIO)................................................................................68
APÊNDICE B(ROTEIRO DA ENTREVISTA)............................................................69
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho é investigativo e resulta de pesquisa bibliográfica e
pesquisa exploratória com observação não-participante, tendo como sujeitos três
professoras de uma escola particular/popular. A proposta do estudo é discorrer
sobre a formação das professoras de Educação Infantil e tornou-se anseio de
pesquisa devido à minha peculiar experiência como professora de Educação Infantil
de uma escola particular/popular, sem ter nenhuma formação específica para tal
função, apenas por ter afinidade e gostar de crianças.
Ao ingressar no curso de Pedagogia e obter conhecimentos acerca das
especificidades e particularidades do atendimento à criança pequena e, com isso, o
reconhecimento da necessidade de formação de um profissional apto a atender as
exigências da infância, decidi estudar sobre a importância da formação para
professoras que atuam na Educação Infantil, pois - apesar dessa necessidade de
uma formação específica estar assegurada na legislação - nas creches e pré-
escolas, sobretudo nas “escolinhas” particulares/ populares de bairros periféricos,
encontramos profissionais que não possuem formação adequada para o trabalho
com crianças pequenas.
Tendo em vista essa necessidade de profissionais devidamente habilitados
para atuarem na Educação Infantil, pois esta é uma etapa fundamental na vida
escolar do indivíduo, o presente trabalho traz como tema norteador: “A importância
da formação de professoras da Educação Infantil: repensando conceitos,
revendo práticas” e busca revelar em que medida o nível e natureza da formação
de professoras que atuam na Educação Infantil compromete a aprendizagem das
crianças que são atendidas por essas profissionais.
O objetivo geral do estudo foi analisar como ocorreu a formação das
professoras da Educação Infantil da escola pesquisada e as implicações desta no
processo de ensino-aprendizagem dos alunos da Educação Infantil. Buscou-se
salientar a necessidade e a importância de uma formação específica e a qualificação
profissional das professoras de Educação Infantil, a fim de propiciar o
desenvolvimento pleno da criança.
Baseando-se nos teóricos estudados, dentre eles Kramer (2002, 2005)
Oliveira(2002) e Chaves(2007), o primeiro capítulo traz um breve panorama histórico
da infância no Brasil, discorrendo sobre a trajetória da mesma no país e discute a
dicotomia existente entre as dimensões cuidar/educar. Em seguida, aborda o
contexto da Educação Infantil no plano legal e as suas principais conquistas,
impasses e retrocessos. Por fim, discorre sobre a formação da educadora infantil,
enfocando o caráter notoriamente feminino que foi ganhando a profissão e,
conseqüentemente, a sua desvalorização, assim como as perspectivas de formação
e seus impasses.
Neste sentido, o quadro teórico visa revelar como a Educação Infantil, em
particular a oferecida às crianças das classes sociais menos favorecidas
economicamente, desde o seu início, é norteada por um atendimento
assistencialista, mostrando que mesmo após o reconhecimento desse segmento de
ensino pela legislação brasileira e a sua inserção nas políticas públicas de Educação
Básica, o atendimento a criança pequena deixa a desejar em muitos aspectos, em
particular, ao que se refere à formação dos seus profissionais.
No segundo capítulo será apresentada a metodologia utilizada neste
trabalho, enfocando o motivo da escolha desse percurso metodológico e quais
técnicas e instrumentos de coleta de dados foram escolhidas.
O terceiro capítulo traz e analisa os dados da pesquisa exploratória realizada
em uma escola particular/popular da Cidade de Salvador, buscando fazer uma
relação entre a importância de uma formação especifica e a aprendizagem das
crianças. Por fim, apresentamos nossas considerações finais acerca da trajetória e
dos resultados obtidos com a pesquisa.
2 BREVE PANORAMA HISTÓRICO DO ATENDIMENTO DA
INFÂNCIA NO BRASIL
2.1 A TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL
Segundo Corsino (2005), a história do atendimento da infância no Brasil
revela que esta se delineou de duas formas distintas: a educação voltada para as
crianças das classes economicamente mais favorecidas, a qual era norteada pelas
idéias de Froebel1 (os jardins de infância) e o atendimento voltado para as crianças
pobres, este gerido pelas creches e de caráter meramente assistencialista.
A educação oferecida nos jardins de infância, de origem e finalidades
essencialmente pedagógicas, implementados no Brasil no final do século XIX
preconizava o desenvolvimento de um trabalho sistemático com as crianças
pequenas, fundamentado em jogos e brincadeiras, seguindo uma minuciosa rotina
de atividades que tinham, sobretudo, um caráter disciplinador, visando promover
uma boa formação moral.
Segundo Carvalho (2003), no Brasil os primeiros jardins de infância foram
fundados em: 1875, no Rio de Janeiro, e em 1877 em São Paulo; eram mantidos por
entidades privadas; posteriormente foram criados os primeiros jardins de infância
públicos, em 1908 em Belo Horizonte e em 1909, no Rio de Janeiro, estes também
atendiam principalmente as crianças de segmentos mais privilegiados
economicamente. De acordo com Corsino (2005, p.207) “[...] os jardins de infância
eram considerados artigos de luxo, supérfluos para os carentes e despossuídos.”
Desta forma, o atendimento à criança no Brasil desde a sua origem foi
marcado pelas desigualdades sociais, que segundo Corsino (2005) é reflexo de uma
sociedade estratificada erigida sob o regime escravocrata por mais de três séculos.
1 Educador alemão, no quadro das novas influências teóricas e ideológicas de seu tempo- liberalismo e
nacionalismo-, criou em 1837 um Kindergarten (jardim-de infância).
Oliveira (2002) explicita que historicamente o cuidado e a educação das
crianças pequenas foram atribuídos exclusivamente à família. Modos de
atendimento extra-domésticos foram se constituindo junto às camadas sociais
desfavorecidas, desde as sociedades primitivas, através de relações de parentesco
e estas perduraram na Idade Média e Moderna com as “rodas dos expostos” ou os
“lares substitutos”, sob a responsabilidade de entidades religiosas ou filantrópicas.
Corsino (2005) descreve a roda dos expostos, como
[...] dispositivo giratório de madeira e em forma de cilindro com uma abertura, inserido em uma parede, de modo que, como uma janela, desse acesso à parte interna da instituição ao ser acionado. A criança era depositada no compartimento, e o depositante rodava o cilindro para que a abertura se voltasse para dentro, preservando a identidade do depositante. (Corsino, 2005, p.207).
Para Corsino (2005), a roda dos expostos é caracterizada como a primeira
creche brasileira e esta nasce no início do século XX, com o caráter de assistência e
amparo aos necessitados, descomprometida do ponto de vista pedagógico, atrelada
a entidades de cunho religioso- filantrópico.
Carvalho (2003) corrobora com essa idéia da creche com o objetivo
meramente assistencialista, ao afirmar que as primeiras creches criadas no final do
século XIX e início do século XX tinham como finalidades primordiais retirar as
crianças abandonadas da rua, diminuir a mortalidade infantil, combater a desnutrição
e formar hábitos higiênicos e morais nas famílias. Originando-se, portanto, com um
forte caráter filantrópico-assistencialista e uma tônica médico-sanitária.
Segundo Corsino (2005), as características de doação, caridade, filantropia,
amparo e favor das creches, favoreciam e deixavam evidente o barateamento do
atendimento dispensado às crianças pobres que permaneciam nessas instituições.
Esse atendimento reduzia-se apenas aos cuidados à saúde, higiene e alimentação,
em detrimento dos aspectos cognitivos, emocionais, afetivos e culturais.
É neste contexto, norteado por uma noção puramente caritativa, que foi se
delineando no País o atendimento das crianças menos favorecidas, cabendo este
atendimento às áreas da saúde e da assistência social e não da educação,
desprovida, portanto, de um caráter pedagógico e de um atendimento de qualidade.
Carvalho (2003) salienta que durante as décadas de 30 e 40 do século XX,
sob influência do ideário da Escola Nova e com a finalidade de atender os filhos da
classe operária, surgiu o atendimento em praças públicas – os parques infantis, que
atendiam às crianças de 3 a 6 anos e, também, às de 7 a 12 anos, sendo que essas
últimas freqüentavam a instituição em período oposto àquele em que freqüentavam
a escola regular.
Assim, a intervenção do Estado no que se refere à educação da criança
pequena só se efetiva a partir da década de 40 do século XX, quando segundo
Carvalho (2003), foi criado o Departamento Nacional da Criança, ligado ao Ministério
da Saúde, de caráter predominantemente normativo, reconhecendo a creche como
mal necessário no combate às criadeiras, mulheres do povo que assumiam, em seus
domicílios, a guarda das crianças de mulheres pobres.
Esse cenário de uma educação voltada à primeira infância meramente
assistencialista, sem atender as particularidades e especificidades da criança
perdura no nosso país até a década de 70, do século XX. De acordo com Kramer
(1993)
[...] é só a partir da década de 70 que a importância da educação da criança pequena é reconhecida e as políticas governamentais começam a, incipientemente, ampliar o atendimento, em especial das crianças de 4 a 6 anos. No entanto, essa educação não está segurada na legislação, o que, evidentemente, dificulta a expansão com qualidade da educação para esse nível. (p.18).
É necessário ressaltar que a autora ao afirmar que a Educação Infantil não
está assegurada pela Lei, reporta-se ao período em que ela escreve seu texto, início
dos anos 90, quando de fato a educação da criança pequena não era vista como
direito e assegurada na Legislação, o que vai ocorrer com a promulgação da
Constituição Brasileira de 1988; mais especificamente com a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB) 1996 e que será abordado mais adiante, no
tópico que se refere à Legislação.
Essa expansão do atendimento à criança pequena se configura a partir de
vários fatores ocorridos no século XX, dentre eles: a participação da mulher no
mercado de trabalho, a intensificação da urbanização, as transformações na
estrutura familiar e a influência de políticas sociais de órgãos como a Organização
para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) e Fundo das Nações Unidas para a
Infância (UNICEF) para países de terceiro mundo.
Desta forma, tomando como pressupostos as transformações ocorridas no
século XX, Rosemberg (1999), citada por Carvalho (2003), informa que houve uma
crescente demanda por atendimento às crianças menores de 7 anos. Assim, são
desencadeadas políticas de cunho compensatório e emergencial que articulavam a
ampliação quantitativa do atendimento e baixo investimento público.
Apesar da ampliação no atendimento e o reconhecimento da Educação
Infantil por políticas governamentais, esta - até meados dos anos 80 do século XX -
ainda não se estabelece no plano da lei, dificultando um atendimento de qualidade,
continuando a difundir assim uma educação de cunho assistencial e filantrópico.
Corsino (2005) define os anos 80 e 90 do século XX como de extrema
importância e de significativas mudanças no cenário da Educação Infantil. No
entanto, devido ao histórico de caráter puramente assistencialista conferido a
educação das crianças pequenas, esta carrega até os dias atuais resquícios de uma
educação voltada apenas para a guarda de crianças.
Oliveira (2002 p. 59) corrobora ao explicitar que “[...] as idéias de abandono,
pobreza, culpa, favor e caridade impregnam, assim, as formas precárias de
atendimento a menores nesse período e por muito tempo vão permear determinadas
concepções acerca do que é uma instituição que cuida da Educação infantil,
acentuando o lado negativo do atendimento fora da família‟‟.
Segundo documento da UNICEF(2008) a Educação Infantil é vista por muitas
famílias apenas como local para deixar seus filhos enquanto estão trabalhando,
limitando-se assim a um caráter assistencialista, sendo desvalorizada do ponto de
vista pedagógico, embora seja reconhecida como fundamental para o
desenvolvimento pleno da criança de até 6 anos de idade.
Desta forma, pode-se inferir que o senso-comum estabelece a concepção de
que não existe associação entre desenvolvimento e Educação Infantil, reforçando
assim o caráter puramente assistencialista ao qual atendimento à criança pequena
está subjugado.
Ainda, de acordo com o documento da UNICEF (2008), o acesso a Educação
Infantil está abaixo da necessidade do País; pesquisas evidenciam que existe um
grande percentual de crianças de 0 a 6 anos que ainda não tem acesso à Educação
Infantil
Atualmente, 15,5% das crianças (1,7milhão) de até 3 anos freqüentam creches, sendo que, na Região Norte,esse número cai para apenas 8%- são mais de 2 milhões de crianças que não freqüentam creches na Região Norte. Os números de freqüência a pré- escola são relativamente melhores, mas ainda demandam avanços. Em todo o Brasil, 76%das meninas e meninos (7 milhões) entre 4 e 6 anos estão matriculados na educação infantil. Por outro lado, ainda há muito que se avançar para incluir os 9,5 milhões de crianças de até 3 anos que não freqüentam creches, e os 2,2 milhões entre 4 e 6 anos que não estão na pré- escola.(Situação Mundial da Infância – Caderno Brasil 2008 p.37.)
Nesta perspectiva, segundo dados da UNICEF, o Brasil vem tomando
medidas para garantir o acesso das crianças às creches e pré-escolas. De acordo
com o mesmo documento, “[...] o plano nacional de educação determina que, em
2011, 50% das crianças de até 3 anos e 80% das de 4 e 5 anos estejam
matriculados em instituições de Educação Infantil”(2008,p.37).
A esse respeito, Cabral (2005) salienta que o Mistério da Educação e Cultura
(MEC) vem se posicionando a fim de alcançar essa meta determinada pelo plano
nacional de educação.
O Ministério de Educação vem empreendendo ações incisivas com relação à Educação Infantil, tais como, a expansão do acesso a ela, para tentar atender à expressiva demanda de matrículas, numa perspectiva, notoriamente, quantitativa, sem privilegiar a qualidade do ensino (p.58).
Apesar da expansão do atendimento em creches e pré-escolas, este ainda
está aquém da necessidade e da demanda das famílias das classes sociais menos
favorecidas. De acordo com Corsino (2005 p. 208), para preencher essa lacuna, as
próprias classes populares se organizam para oferecer esse serviço. O atendimento
a essas crianças é feito em “[...] espaços inadequados, por vezes superlotados,
desprovidos de propostas pedagógicas, recursos e materiais, brinquedos ou áreas
ao ar livre.”
Nesse sentido, é notório o crescimento de instituições formais e informais que
atendem à educação da infância. Assim, faz-se necessário um mapeamento e
organização desses sistemas educacionais para regulamentar, coordenar e avaliar
estas instituições, sobretudo as de cunho popular, seja ela lucrativa ou filantrópica,
para que estejam em consonância com padrões de qualidade à infância, conquistas
legais dos movimentos sociais, a fim de alcançarmos um atendimento à infância
digno e integral. (CHAVES, 2007).
2.1.1 A Dicotomia entre o cuidar e o educar.
Educar e cuidar são termos intrínsecos da Educação Infantil e permeia todas
as atividades relacionadas ao atendimento das crianças, sendo um processo único,
cujas ações estão articuladas e interligadas. No entanto, seja na prática ou no plano
teórico, essas ações muitas vezes são tratadas como pólos distintos e
independentes.
Tiriba (2005) diz que embora educar e cuidar sejam ações que estão
profundamente imbricadas “[...] nos textos acadêmicos, nas propostas pedagógicas,
nas práticas, assim como nas falas das profissionais de creches, muitas vezes, mais
que integração, o binômio expressa dicotomia.‟‟ (p.66)
Para esse mesmo autor, essa dicotomia entre educar e cuidar sugere a
existência de duas dimensões, uma que se refere ao corpo - o cuidar, e outra que se
refere aos processos cognitivos - o educar, alimentando assim práticas distintas
entre as profissionais que atuam nas instituições de Educação Infantil, cabendo às
auxiliares de sala o papel do cuidar e às professoras o de educar.
A dicotomia entre o cuidar e o educar resulta nessa “divisão de tarefas” e
traduz uma conotação hierárquica entre os papeis de professora e auxiliar da
Educação Infantil. À professora cabe realizar as atividades pedagógicas, voltadas ao
desenvolvimento cognitivo, de “maior importância” para o desenvolvimento da
criança, enquanto que às auxiliares cabem os cuidados com o corpo, sendo a
higiene vista como uma tarefa menor, sem prestígio.
Segundo Kramer (2005) essa divisão resultante do divórcio entre o cuidar e o
educar é reflexo do contexto de servidão e escravidão presente na história do nosso
país, que durante séculos fluiu sob regime escravocrata. Para ela,
(...) na história da sociedade brasileira, que tem a servidão e a escravidão como marcas fortes, o cuidado quase sempre foi delegado- e relagado- àquelas pessoas com menor grau de instrução. Ou seja: cuida quem não aprendeu a fazer outra coisa ou não teve escolha (quem é servo ou escravo). (p.57).
Nesse sentido, Tiriba (2005) compreende que a cisão entre educar e cuidar
corresponde a fatores socioculturais presentes na nossa sociedade, cujo cuidar está
historicamente vinculado à assistência ao corpo e, portanto, a uma função social
desprivilegiada, visto que no passado essa era atribuída às escravas. Em
consonância com a afirmação de Tiriba (2005), Kramer (2005), destaca que essa
cisão entre o educar e o cuidar está de fato vinculada ao contexto histórico
escravocrata vivido no País
Só uma sociedade que teve escravos poderia imaginar que as tarefas ligadas ao corpo e as atividades básicas para a conservação da vida seriam feitas por pessoas diferentes daquelas que lidam com a cognição! Só uma sociedade que teve essa expressão máxima de desigualdade, que teve seu espaço social dividido entre a casa-grande e a senzala, poderia separar essas duas instâncias da educação e entender que cuidar se refere apenas à higiene – e não ao processo integrado, envolvendo a saúde, os afetos e valores morais. (p.64).
Ainda, segundo Tiriba (2005), a divisão entre o cuidar e o educar, ao menos
no plano teórico-conceitual, foi revista. No entanto, acredita que na prática ainda há
muitas questões a serem superadas. A este respeito informa:
Nos anos 1990, com a perspectiva de as creches e pré-escolas serem incorporadas aos sistemas de ensino e passarem a ser considerada a primeira etapa da Educação Básica, era preciso integrar as atividades de cuidado realizadas nas creches com as atividades de cunho mais pedagógico, desenvolvidas nas pré-escolas. A solução conceitual encontrada foi o binômio educar e cuidar. Mas, se teve o mérito de assumir o corpo como objeto da educação, não resolveu as questões colocadas pela prática: ao contrário, tem provocado muita confusão!(p.68).
Nesse mesmo aspecto, Carvalho (2005), corrobora com Tiriba (2005) ao
afirmar que
Na atualidade, a dicotomização entre “cuidar e educar” começa a ser revista, devido à necessidade de se promover um trabalho conjunto entre as creches (que se caracterizavam mais pelo cuidar) e as pré-escolas (que se caracterizavam mais pelo ensinar), pois, em síntese, ambas devem “cuidar e educar” (p.72).
Kramer (2005) afirma que o tema educar e cuidar tem gerado muita polêmica
no cenário da Educação Infantil, fazendo emergir conceitos marcados por dicotomias
e ambigüidades. Ademais, sustenta que ora se menciona educar/cuidar, supondo -
com o uso da barra - que são ações intrínsecas, que se trata de um só processo;
ora mencionam educar e cuidar, sugerindo -com a conjunção - a idéia de duas
dimensões.
No entanto, ainda segundo Kramer (2005, p.62) “[...] não é possível educar
sem cuidar”, pois todo ato educativo requer o cuidar seja ele em qualquer nível
educacional. Assim, embora existam atividades relacionadas ao cuidado que são
especificas da Educação Infantil, o cuidar não é uma especificidade da mesma, pois
“[...] no processo de educação, em qualquer nível de ensino, cuidamos do outro”
(p.63).
Assim, apesar da dicotomia que permeia a natureza do binômio educar e
cuidar, estes sempre foram indissociáveis. Craidy (2002) afirma que “[...] é
equivocado afirmar que, só agora, as creches e pré-escolas se transformaram em
instituições educativas. Elas sempre foram instituições educativas, já que é
impossível cuidar de crianças sem educá-las” (p.61). De acordo com essa autora, o
que mudou foi o novo ordenamento legal, que buscou garantir uma formação de
qualidade através do uso de propostas pedagógicas adequadas e do trabalho dos
professores.
Ao conceituar o termo educar, o Referencial Curricular para a Educação
Infantil (RCNEI) diz que educar é
[...] propiciar situações de cuidado, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade social e cultural. (RCNEI, 1998, p.23).
É neste sentido, a fim de terminar com essa cisão, que Tiriba (2005) propõe -
no debate sobre Educação Infantil - dispensar o binômio educar e cuidar e utilizar
simplesmente educar, já que o próprio termo educar engloba também o cuidar.
As concepções abordadas neste tópico, à luz dos teóricos estudados, no que
corresponde ao histórico da Educação Infantil no Brasil e à discussão acerca do
binômio educar/cuidar, serviram de suporte para nortear as observações realizadas,
a fim de compreender a concepção das professoras pesquisadas sobre a temática.
A seguir será discutido o cenário da Educação Infantil no plano das leis.
Busca-se fazer uma retrospectiva de Educação Infantil e da Legislação, abordando
os avanços e retrocessos que vêem delineando o atendimento da criança pequena
no Brasil.
2.2 A EDUCAÇÃO INFANTIL NO PLANO LEGAL
2.2.1 A legislação e a Educação Infantil.
Segundo Bittar et all (2003), historicamente a educação da criança pequena
no Brasil, no que se refere a políticas públicas, por muito tempo esteve relegada das
políticas educacionais, não sendo assegurada pela legislação, ficando à margem do
sistema educacional.
Ainda de acordo com Bittar et all (2003), a primeira preocupação com a
Educação Infantil, no plano da lei, só se efetiva nos anos 70, do século XX quando
a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 5.692/71, no seu artigo 19,
menciona de que forma e que instituições deverão receber e educar as crianças com
idade menor de sete anos. No seu texto a LDB de 71 salienta que “[...] os sistemas
de ensino velarão para que as crianças de idade inferior a sete anos recebam
conveniente educação em escolas maternais, jardins de infância e instituições
equivalentes”. (Cap.II, art 19).
No entanto, apesar de dedicar um artigo para tratar da educação da criança
pequena, a referida lei não explícita que instância do governo ficará responsável por
essa educação. Além disso, ao utilizar o termo “velarão” para expressar o papel dos
sistemas de ensino para com a educação da criança pequena, e instituição
equivalente, sem conceituar o que seria essa equivalência, dissemina a concepção
de uma educação assistencialista, a qual deverá apenas se preocupar com a guarda
das crianças.
Tendo como pressuposto a LDB que contempla, ainda que superficialmente, a
educação da criança pequena, em 1974 o governo federal, através do Ministério da
Educação e Cultura (MEC), cria a Coordenação de Educação Pré- Escolar-
(COEPRE) o qual, embora tivesse caráter e propostas baseadas em uma educação
compensatória, teve um papel importante no que se refere a políticas públicas para a
Educação Infantil na década de 70, pois “[...] impulsionou o debate sobre funções e
ações pedagógicas da pré-escola, legitimando-a e vinculando pré-escola e escola de
1º grau‟‟. (NUNES et all, 2005, p.17).
Segundo Bittar et all (2003), no ano de 1981, o Ministério da Educação
publicou o Programa de Educação Pré-Escolar, o qual “[...] estabelecia as metas,
diretrizes, prioridades e planos de ação da política pré-escolar”(p.36). Sendo que o
programa priorizava a ampliação do atendimento da pré- escola às crianças de
classe social menos favorecida, com o propósito de difundir e na defesa de “[...] uma
educação pré-escolar com vagos objetivos em si mesma, desvinculada da escola
de1º grau.” (NUNES et all ,2005, p.17).
Assim, de acordo com Bittar et all (2003), apesar dos avanços ocorridos na
década de 70 e no início dos anos 80, o atendimento pré- escolar ainda era norteado
por programas vinculados a uma perspectiva compensatória, ficando o Estado
ausente e livre de qualquer responsabilidade com a educação da criança pequena.
Nunes et all (2003 p. 18) informam que o Programa de Educação Pré- Escolar
foi utilizado como estratégia para ampliar e expandir o atendimento de baixo custo
à criança pequena, sendo que este foi recebido com reprovação por vários
segmentos da sociedade, tais como: universidades, sistemas de ensino e
movimentos sociais, que denunciavam a precariedade das alternativas de baixo
custo e reivindicavam a educação das crianças de 0 a 6 anos como direito social e
político da infância.
Bittar et all (2003), salientam que diante da insatisfação e da luta dos
movimentos sociais por uma educação pré-escolar de qualidade e com a iminência
de uma nova Constituição, nos anos 80 desencadearam-se mobilizações em prol do
reconhecimento da educação infantil como direito. Segundo esses autores
Na segunda metade da década de1980, movimentos sociais vinculados aos diferentes setores das políticas sociais organizaram-se, visando à inserção de direitos na nova Carta Constitucional que seria elaborada. Com a educação infantil não foi diferente: vários segmentos uniram forças com o objetivo de sensibilizar a sociedade sobre a importância de se compreender a infância como um período distinto no desenvolvimento da criança, o qual apresenta certas peculiaridades e particularidades fundamentais, especialmente no período de zero a seis anos. Os movimentos reivindicavam um tratamento diferenciado às crianças, portanto, a Constituição Brasileira, que estava sendo construída, deveria reservar um espaço a elas no capítulo que trataria da educação (Bittar et all, 2003 p.37).
Para os mesmos autores, neste contexto a participação da Organização
Mundial para a Educação Pré-Escolar (OMEP), nos movimentos sociais em favor do
direito da educação da criança de 0 a 6 anos foi de extrema importância para o
reconhecimento e inserção desse direito na Constituição. O presidente do
movimento, Vital Didonet, representando a sociedade civil, por meio de um artigo
publicado em jornal, mobilizou a sociedade e pressionou o Estado a reconhecer a
criança de 0 a 6 anos como cidadã de direitos e garantir a sua educação na
legislação.
Denominando o artigo “A Criança e a Constituinte”, Didonet (1986), citado por
Bittar et all (2003), exprime seu pensamento em benefício da inserção do direito da
educação da criança de 0 a 6 anos na lei
Esse ano deve ser, para nós, um ano de intenso trabalho em torno do tema criança e constituinte. É um momento histórico importantíssimo que não devemos perder por omissão. Não se fazem constituições todos os anos! E nós não queremos mais ouvir os argumentos dos „adversários‟ da criança de que a educação pré-escolar não é obrigatória, não está na constituição [...] Vamos fazer uma programação intensa neste ano. Peço que todas as associações se articulem com todas as instituições( Públicas e Privadas – Secretarias de Governo, Fundações, Institutos de Assistência, Associações de Pais e Mestres, Associações de Bairro, etc.), que estabeleçam um plano de ação conjunta em torno de um objetivo
comum, por exemplo: trabalhar pela conscientização da sociedade e pela expressão dessa consciência, sob a forma de movimento, pressão,[...], para estabelecer, na Nova Constituição, os princípios e as obrigações do Estado com as crianças.( Bittar et all, 2003, p. 37 apud Didonet, 1986, p.1).
Ainda segundo Bittar et all (2003), um dos resultados dessa mobilização
nacional, a qual reivindicava o direito constitucional da educação da criança
pequena, foi a criação da Comissão Nacional Criança e Constituinte que
desencadeou no movimento intitulado de Constituinte: Lute por Mim – a criança e o
adolescente: propostas para a Assembléia Nacional Constituinte. Os autores, ao
mencionarem esse movimento afirmam que o mesmo
[...] envolveu vários segmentos da sociedade civil em torno da organização de estratégias políticas cujos objetivos consistiam na articulação com deputados e senadores, com vistas à obtenção de compromisso por parte dos constituintes com as reivindicações do movimento; na discussão e aprovação nas comissões de propostas sobre legislação complementar e políticas de ação; entrega de abaixo- assinado ao presidente da Assembléia Nacional Constituinte contendo as exigências do movimento e continuidade do processo de mobilização Criança e Constituinte (p.38).
Desta forma, de acordo com Nunes et all (2005 p. 18) como resultado da luta
dos movimentos sociais, a população brasileira conquistou a Constituição de 1988 a
qual reconhece o direito de todas as crianças de 0 a 6 anos à educação e determina
como dever do Estado oferecer creches e pré-escolas para tornar fato esse direito.
2.2.2 Educação Infantil: da conquista de 1988 aos dias atuais
De acordo com Cabral (2005), nas últimas décadas do século XX o cenário da
Educação Infantil está sendo caracterizado por avanços no que corresponde a
legislação, que, a partir de muitos esforços e conquistas dos movimentos sociais
começa a assegurar o direito a Educação Infantil de qualidade. Essa concepção se
expressa na Constituição de 1988, no Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990
e na Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 que reconhecem a Educação
Infantil como direito da criança.
Oliveira (2002 p. 36) sintetiza as principais contribuições da legislação no final
dos anos 80 e no decorrer dos anos 90 no que se refere à Educação Infantil nos
seguintes aspectos
[...] a criança é sujeito de direitos e sua educação deve ser assegurada a partir do seu nascimento, cabendo ao Estado fazê-lo, em complementação á ação da família; a relação entre União, Estados, Distrito Federal e municípios realiza-se a partir da instituição de um regime de colaboração mútua; os municípios têm a responsabilidade pela oferta da educação infantil; a educação infantil é considerada a primeira etapa da educação básica, e tem por finalidade o desenvolvimento integral da criança até 6 anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social; a habilitação exigida para se trabalhar com a criança de 0 a 6 anos é em nível superior, aceitando-se que seja , no mínimo, em nível médio; a formação continuada dos profissionais de educação deve ser assegurada pelos sistemas de ensino, em uma constante associação entre teoria e prática”.
Segundo Cabral (2005), a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do
Adolescente e a LDB determinam que
[...]a criança deve ser vista como sujeito de direitos e, assim, ela passa a ser reconhecida como cidadã em desenvolvimento, requerendo, então, uma atenção individualizada. Segundo esse preceito constitucional, lhe é assegurado, o acesso a uma Educação Infantil de qualidade que contribua para seu desenvolvimento efetivo. (p.61).
Nesta perspectiva, a legislação traz a concepção da criança pequena como
cidadã de plenos direitos, em particular o acesso a uma Educação Infantil de
qualidade, sobretudo quando a insere na Educação Básica, dando-lhe a
possibilidade de adquirir conhecimentos básicos para dar continuidade aos seus
estudos.
Oliveira (2002 p. 38), ao comentar sobre a legislação e as políticas públicas
para a Educação Infantil, afirma que
[...] podemos identificar os avanços obtidos na Política Nacional de Educação Infantil a partir da legislação vigente em quatro áreas principais: Desenvolvimento de projetos curriculares; Formação do profissional de Educação Infantil; Organização político-pedagógica das redes de ensino e levantamento e caracterização das instituições que atuam com a criança de 0 a 6 anos.
Ainda de acordo com Oliveira (2002 p.38), o desenvolvimento de projetos
curriculares é de suma importância para garantir o caráter educativo das instituições
de Educação Infantil. Nesse contexto, Bittar et all (2003 ) informam que em 1994 foi
formulada e publicada pelo MEC a Política Nacional de Educação Infantil, a qual,
segundo as autoras
[...] traçou diretrizes pedagógicas e de recursos humanos com o objetivo de: expandir a oferta de vagas para crianças de 0 a 6 anos; fortalecer nas instâncias competentes , a concepção de Educação Infantil; promover melhoria da qualidade do atendimento em creches e pré-escolas.( p. 39).
Assim, ainda segundo Oliveira (2002), no ano de 1997-98 foi elaborado e
divulgado o documento Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil-
(RCNEI), com o objetivo de nortear o projeto curricular da Educação Infantil,
subsidiando o trabalho docente.
Segundo Cabral (2005), embora o RCNEI seja uma referência para as
instituições e os profissionais da Educação Infantil, é importante salientar que o
referencial não contempla a pluralidade e diversidade cultural do Brasil,
padronizando desta maneira as diversas realidades existentes nas escolas.
Desta forma, em 1999 o MEC instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil que, de acordo com o próprio documento
[...] constituem-se na doutrina sobre Princípios, Fundamentos e Procedimentos da Educação Básica, definidos pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, que orientarão as Instituições de Educação Infantil dos Sistemas Brasileiros de Ensino, na organização, articulação, desenvolvimento e avaliação de suas propostas pedagógicas. (art 2º p.4).
Segundo Oliveira (2002 p.39), “[...] a nova dimensão da Educação Infantil,
como primeira etapa da Educação Básica, gerou uma valorização do papel do
profissional que se dedica à criança de 0 a 6 anos” , a qual exige uma formação
específica, reconhecendo a necessidade de formar e capacitar o profissional que
atua na Educação Infantil‟‟.
NUNES et all (2005 p.19), salientam que muitas instituições têm estabelecido
a formação específica, contudo, trata-se de iniciativas isoladas, desarticuladas de
uma política que alcance a todos e que seja reconhecida oficialmente.
No que se refere à organização político pedagógica e administrativa das
redes de ensino, devido a reorganização do sistema escolar determinada pela LDB,
Kramer (2005 p.9) explicita que é dever do Estado na figura da instância municipal,
assegurar a educação para todas as crianças de 0 a 6 anos. Desta forma cabe às
prefeituras das cidades organizar e oferecer Educação Infantil às crianças cujas as
famílias desejem matricular seus filhos.
Ainda, de acordo com Kramer (2005 p 21), essa transferência das creches e
pré- escolas do plano da assistência social para a educação “[...] não se faz por
simples determinação legal; é um processo gradativo e exige reestruturações e
reorganizações.” Estas reorganizações correspondem desde os recursos físicos até
a construção de propostas pedagógicas.
Nesta perspectiva, Oliveira (2002 p.41) salienta que a questão dos recursos
financeiros destinados à Educação Infantil é um impasse, pois até pouco tempo a
Educação Infantil não contava com dotação orçamentária já que o Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento de Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério-(FUNDEF) não contempla o nível infantil e, este, não contava com
recursos próprios de financiamento.
Segundo Chaves (2007), é apenas muito recentemente, no ano de 2007, que
a Educação Infantil com a instituição do Fundo Nacional de Desenvolvimento da
Educação Básica-(FUNDEB), o qual determina financiamento para toda a Educação
Básica, inclusive a Educação Infantil, que esta é contemplada com recursos
financeiros.
Oliveira (2002p. 42) explicita que a ausência de dados consistentes que
caracterizem o atendimento dispensado às crianças de 0 a 6 anos que freqüentam
instituições de ensino, levou o Ministério da Educação e Cultura, por meio do
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), a organizar o
Censo da Educação Infantil; este tinha como objetivo obter informações relativas a
todos os aspectos que norteiam o atendimento oferecido às crianças de 0 a 6 anos,
seja da rede pública e privada, seja filantrópica, comunitária ou confessional.
Segundo Chaves (2007), é difícil obter dados concretos no que se refere a
escolas comunitárias e filantrópicas, pois muitas dessas “[...] funcionam com
recursos próprios e com doações por parte de organismos internacionais, incluindo
as não regularizadas junto aos Conselhos Municipais de Educação” (p.4).
Apesar de termos alcançado conquistas significativas no que se refere ao
atendimento e a qualidade da educação infantil, principalmente após a Constituição
de 1988, há uma enorme distância entre a legislação e a realidade que circunda as
nossas creches e pré-escolas, evidenciando assim dois mundos paralelos: o ideal e
o real, constatando, o que diz Campos (2002), ao afirmar que
[...]o divórcio entre a legislação e a realidade, no Brasil, não é de hoje. Nossa tradição cultural e política sempre foi marcada por essa distância e, até mesmo, pela oposição entre aquilo que gostamos de colocar no papel e o que de fato fazemos na realidade (p27)”.
Desta maneira, mesmo com os avanços conquistados, a realidade da
Educação Infantil, ainda está aquém do idealizado pela lei, sendo que muito ainda
deve ser realizado a fim de superarmos a concepção de uma Educação Infantil
assistencialista e homogênea, que desconsidera as singularidades e
particularidades de cada criança e obter, como diz Chaves (2007, p.2):
[...] uma Educação Infantil que através dos princípios de educar e cuidar possibilitará as crianças a construção de sua identidade, a socialização com seus pares, a interação com o ambiente circundante, a aquisição de habilidades nas dimensões: afetiva e emocional, sócio-cultural, étnica, cognitiva e lingüística, lúdica, artística e imaginária.
Neste contexto em prol de uma Educação Infantil de qualidade, vale destacar
o papel do Movimento Interfóruns de Educação Infantil no Brasil (MEIB), descrito por
Bittar et all como
[...] entidade suprapartidária cuja finalidade se concentra em
mobilizar os diferentes setores da sociedade civil em torno dos direitos da criança e pressionar os órgãos públicos no que se refere à alocação de recursos financeiros destinados à política pública de
Educação Infantil” (BITTAR et all 2003 p.45).
2.2.3 A inserção da criança de 6 anos no Ensino Fundamental
De acordo com documento do MEC, Ensino Fundamental de nove anos-
Orientações Gerais (2004), historicamente no Brasil, sempre houve interesse em
ampliar os anos de escolaridade obrigatória.
[...] a Lei n 4.024, de 1961, estabelecia quatro anos; pelo Acordo de Punta Del Este e Santiago, o governo brasileiro assumiu a obrigação de estabelecer a duração de seis anos de ensino primário para todos os brasileiros, prevendo cumpri-la até 1970. Em 1971, a Lei n 5.692 estendeu a obrigatoriedade para oito anos. (MEC/2004 p.14)
Segundo Cabral (2005), essa determinação da obrigatoriedade escolar de oito
anos é explicitada na primeira versão da atual LDB lei nº 9394/96, no seu artigo 32.
No entanto, no Artigo 87, a referida lei já sinaliza uma possível ampliação do Ensino
Fundamental para nove anos, inserindo assim a criança de seis anos de idade neste
segmento da Educação. Assim reza o referido artigo
[...]cada Município e, supletivamente, o Estado e a União, deverá
matricular todos os educandos, a partir de sete anos de idade e, facultativamente, a partir dos seis anos, no Ensino Fundamental”. (LDB artigo87, Inciso I, § 3º)
Desta forma, tomando como pressuposto esta sinalização da lei que permite,
ainda que facultativamente, o ingresso da criança de seis anos no Ensino
Fundamental, segundo o Censo Escolar de 2006, as redes de 15 estados, do Distrito
Federal e de mais de dois mil municípios já oferecem a matrícula obrigatória a todas
as crianças com seis anos de idade.
Segundo o documento do MEC Ensino Fundamental de nove anos, a
ampliação deste segmento de ensino, inserindo mais um ano, torna-se meta da
educação nacional pela Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que aprovou o Plano
Nacional de Educação, o qual visa implementar progressivamente o Ensino
Fundamental de nove anos.
Assim, em fevereiro de 2006, foi sancionada a lei nº 11. 274 que de fato
alterou a duração do Ensino Fundamental de oito para nove anos, transformando a
último ano da Educação Infantil no primeiro ano do Ensino Fundamental, sendo que
esta determinação deve ser atendida pelas escolas até o ano de 2010.
Desta forma, essa determinação alterou a redação da LDB, 9394/96 no seu
artigo 32 que passa a rezar que “[...] o ensino fundamental obrigatório, com duração
de nove anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos seis anos de idade [...]”
(p.42), e no seu artigo 87, o qual determina a matrícula de todos os educandos de
seis anos no ensino fundamental, não mais como facultativa, mas obrigatória. (LDB,
lei 9394/96 p. 61).
Segundo ainda o documento do MEC- Ensino Fundamental de nove anos
(2004 p.14), a inclusão da criança de seis anos no Ensino Fundamental tem duas
intenções, oferecer maiores oportunidades de aprendizagem no período da
escolarização obrigatória e assegurar que, ingressando mais cedo no sistema de
ensino, as crianças prossigam nos estudos, alcançando maior nível de escolaridade.
Desta forma, o mesmo documento enfatiza que esta ampliação do Ensino
Fundamental, além de aumentar o número de crianças no sistema educacional,
favorece prioritariamente as crianças oriundas dos setores populares, uma vez que
as crianças da classe média e alta já se encontram na Educação Infantil ou na
primeira série do Ensino Fundamental.
Ainda de acordo com o documento supracitado, medidas vêm sendo tomadas
a fim de atender as necessidades advindas dessa mudança no sistema de ensino,
pois a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos
[...] não se trata de transferir para as crianças de seis anos os conteúdos e atividades da tradicional primeira série, mas de conceber uma nova estrutura de organização de conteúdos em um Ensino Fundamental de nove anos, considerando o perfil de seus alunos.” ( MEC/ 2004 p.17).
Assim, o documento contempla a necessidade de uma atenção particular as
situações envolvidas no ingresso da criança de 6 anos no Ensino Fundamental, a
fim de possibilitar continuidade e ampliação da aprendizagem , não havendo uma
ruptura e negação dos conhecimentos adquiridos na Educação Infantil.
O documento explicita que é necessária também uma nova organização nas
escolas que receberam as crianças de seis anos no Ensino Fundamental, seja na
estrutura, na forma de gestão, definição e organização de ambientes, espaços,
tempos e materiais; na definição e escolhas de conteúdos, metodologias, objetivos,
planejamento e avaliação, afim de que essa mudança ocorra de forma natural, sem
rupturas e conseqüências que prejudiquem o desenvolvimento da criança.
Desta maneira, diante do exposto e de acordo ainda com o referido
documento, o qual norteia as orientações gerais para a ampliação do Ensino
Fundamental de nove anos, o objetivo de um maior número de anos de ensino
obrigatório é assegurar a todas as crianças um tempo mais longo de convívio
escolar, maiores oportunidades de aprender e, com isso, uma aprendizagem mais
ampla.
Nesta perspectiva, tomando como pressuposto que a Educação Infantil é
reconhecida como fundamental para o desenvolvimento pleno da criança
(UNICEF/2008), a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos e
conseqüentemente, a redução de um ano da Educação Infantil, traz um
questionamento: porque não tornar a Educação Infantil obrigatória, ao invés de
ampliar o Ensino Fundamental?
Segundo Cabral (2005), esse contexto reforça a condição histórica do
atendimento a infância que, por muito tempo, não foi assegurada pela legislação,
tendo como conseqüência a desvalorização do atendimento à criança pequena.
As abordagens aqui discutidas pelos autores contribuíram para a
compreensão da concepção de Educação Infantil que é propagada na atualidade
norteando as categorias de análise e observação que serão abordadas
posteriormente.
.
2.3 FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO INFANTIL
2.3.1 A desvalorização das profissionais da Educação Infantil
Segundo Oliveira (2002 p. 23), a descaracterização da identidade e
profissionalização do educador infantil está relacionada à desvalorização que
historicamente delineou o atendimento oferecido nas creches e pré escolas, o que,
como já foi mencionado anteriormente, durante muito tempo foi norteado por uma
concepção puramente assistencialista.
É nessa perspectiva de uma educação voltada para a filantropia e ao
assistencialismo, que foi delineando-se o perfil e a identidade do profissional de
Educação Infantil, pautado por idéias simplórias, restringindo sua função apenas a
aspectos da higiene e do cuidado de crianças, perdurando desta forma a concepção
de que para ser professora de Educação Infantil basta ter habilidades físicas e
maternais. Como explicita Chaves (2007),
[...] para ser professora de educação infantil ---- raramente se admite a possibilidade de que seja um homem ---, basta ser jovem (menina), portanto mulher, com paciência, vitalidade física e saúde suficiente para acompanhar o “pique” das crianças, às quais deve garantir a satisfação de necessidades básicas de alimentação e higiene. (p.2).
Ainda segundo Chaves (2007 p.3), esse modelo materno e feminino atribuído às
professoras da Educação Infantil, contribui para a negação de uma formação
específica e da exigência de profissionalização docente.
Nesse sentido, a concepção de professora que atua com crianças pequenas
sobre a profissão é norteada pelo conceito de vocação nata da mulher para cuidar
de crianças, a qual basta apenas ter competências maternais para exercer a função
não havendo a necessidade de qualificação profissional, descaracterizando assim a
identidade docente, desvalorizando o trabalho dessas profissionais e promovendo
uma Educação Infantil precária que não atende às especificidades da criança.
Corroborando com Chaves, (2007) Oliveira (2002), ao tratar dos requisitos
exigidos das professoras que atuam na Educação Infantil, explicita que as
qualidades maternais são valorizadas, em detrimento da formação pedagógica
específica.
Desse profissional se requer paciência, capacidade para expressar afeto e firmeza na coordenação do grupo infantil. Pouco se exige em termos de conhecimento mais elaborado acerca das funções da
educação infantil e das características sócio- históricas do desenvolvimento das crianças, bem como em termos do domínio do saber historicamente elaborado a respeito das diversas dimensões
pelas quais o homem e o mundo podem ser conhecidos. (OLIVEIRA,2002,p.24).
Kramer (2002) aponta essa questão do gênero como um impasse para uma
política de formação mais contundente para as professoras de Educação Infantil. A
autora ressalta que a construção do caráter histórico do profissional da Educação
Infantil que foi “[...] orientado por modelo de papéis sexuais dicotomizados e
diferenciados, em que a socialização feminina tem como eixos o trabalho doméstico
e a maternagem [...]” (p.125), servem de pressuposto para a desvalorização e a
pouca ou não qualificação do profissional que atua com crianças pequenas.
Desta forma, ainda segundo a mesma autora, o cenário da Educação Infantil é
caracterizado por “avanços, retrocessos e impasses”, sendo que o caráter
notoriamente feminino dessa profissão descaracteriza a construção de uma
identidade profissional para as professoras que trabalham com a Educação Infantil,
visto que a docência na Educação Infantil é vista como uma extensão das atividades
domésticas. A esse respeito adverte:
A educação infantil, marcada por um quadro de desigualdades, não só nas possibilidades de acesso, mas também na qualidade do atendimento e no imaginário, tem na questão do gênero mais uma variável para a desvalorização do trabalho dos profissionais que se dedicam ao atendimento das crianças de 0 a 6 anos. Ao ser enfatizado o jeito, acaba-se por aceitar pessoas com pouca ou nenhuma formação, o que leva a uma baixa remuneração e uma alta rotatividade, pois não há perspectiva em torno de carreira. (p.126).
De acordo com Chaves (2007), essa visão que inferioriza a Educação Infantil e
conseqüentemente as profissionais que desenvolvem seu trabalho nesse segmento
de ensino, serve de estratégia para a precarização e o não reconhecimento das
professoras que atuam na Educação Infantil como profissionais, negando-lhes
direitos legais trabalhistas. Sobre a precariedade e desvalorização na área explicita
Assim, não há necessidade de planos de cargos e salários, e compreende-se a falta de um piso nacional para os profissionais da área e concursos públicos específicos para professores para a educação infantil nas instituições públicas, e na maioria das instituições comunitárias, particulares e filantrópicas do país. (CHAVES, 2007,p.3)
Nesse mesmo sentindo, corroborando com Chaves (2007), Kramer (2002), salienta
A ideologia aí presente camufla as precárias condições de trabalho, esvazia o conteúdo profissional da carreira, desmobiliza os profissionais quanto às reivindicações salariais e não os leva a perceber o poder da profissão. (KRAMER, 2002, p.125)
2.3.2 A nova perspectiva de formação e seus impasses.
Segundo Oliveira (2002), com a Constituição de 1988, o Estatuto da Criança e do
Adolescente de 1990, que prescrevem a Educação Infantil como direito e, sobretudo
com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação 1996, que estabelece a necessidade
de formação específica para lecionar em classes de Educação Infantil, seja ela em
nível médio ou superior, delineou-se uma nova perspectiva de formação para o
educador da infância, o qual segundo Chaves (2007 p.3) „„[...] necessita de formação
específica, interdisciplinar, multirreferenciada, histórica e socialmente situada. ‟‟
Ainda segundo Oliveira (2002), a situação real do nível de formação das
professoras que atuam na Educação Infantil não está em consonância com o que
determina a LDB. Ao discutir a legislação e as políticas nacionais para a educação
infantil e a formação dos seus profissionais explicita
[...] embora o nível de formação dos profissionais que atuam nas pré-escolas venha aumentando, ainda temos um percentual significativo de professores que não tem o 2º grau completo e, mesmo não existindo levantamentos abrangentes sobre o assunto, a formação daqueles que atuam nas creches- podemos afirmar- é bastante precária (OLIVEIRA, 2002, p.39).
Dados do MEC/INEP/2002 revelam que a condição da formação dos
educadores da infância no Brasil, está aquém daquela exigida pela LDB, pois
apenas cerca de 68% dos professores concluiu o ensino médio e 27% o nível
superior, sendo que no Nordeste este quadro ainda é pior, pois apenas 1% dos
professores concluiu o ensino superior e 81% o ensino médio.
Nesta mesma perspectiva, o Referencial Curricular Nacional para a Educação
Infantil (RCNei) no que se refere à formação dos profissionais de Educação Infantil,
enfatiza a precariedade na formação das professoras da Educação Infantil afirmando
que “[...] vários estudos têm mostrado que muitos destes profissionais ainda não têm
formação adequada, recebem remuneração baixa e trabalham sob condições
precárias.” (vol1 p.39).
Corrobora ainda com essa concepção os estudos de Kramer, ao informar
sobre o grande percentual de professoras que não possuem formação específica e
estão atuando na Educação Infantil “[...] essa realidade se impõe de forma
contundente, pois profissionais não habilitados legalmente se dedicam ao
atendimento de uma parcela significativa da população de 0 a 6 anos
[...]”(KRAMER,2002 p.120).
Sendo assim, faz-se necessário romper com a divergência existente entre a
realidade de grande parte dos profissionais da Educação Infantil que não tem
formação adequada para atuar neste segmento de ensino e o que propõe a LDB a
qual defende uma formação específica para os profissionais da Educação Infantil
para alcançarmos um atendimento de qualidade à infância.
Desta forma, tendo em vista a complexidade da Educação Infantil e as
especificidades da infância, é necessário que o profissional que atua neste
segmento de ensino seja polivalente, ou seja, que ele consiga “[...] trabalhar com
conteúdos de naturezas diversas que abrangem desde cuidados básicos essenciais
até conhecimentos específicos provenientes das diversas áreas do conhecimento”.
(RCNei vol1. p.41).
Nesta perspectiva, de que o educador infantil precisa operar conhecimento
em rede, a formação desse profissional deve ser ampla não se restringindo apenas a
um tempo e a um espaço, mas como afirma Kramer (2002)
[...] formação ocorre em diferentes espaços e tempos (I) formação prévia no ensino médio ou superior [...]; (II) formação no movimento social,fóruns,associações,partidos,sindicatos[...]; (III) formação em cada escola, creche e pré-escola que garanta estudo, leitura, debate[...];(IV) formação cultural que pode favorecer experiências com a arte em geral[...](p127).
Assim, a formação do profissional de Educação Infantil não se dá em um
momento único, o professor que atua neste segmento de ensino deve estar sempre
em formação, buscando sempre uma reflexão constante da sua prática pedagógica,
a fim de saber lidar com a imprevisibilidade, a heterogeneidade, a incerteza e os
conflitos que perpassam o trabalho docente para assim responder às demandas
exigidas pela Educação Infantil, colaborar para a desconstrução da idéia de que
para atuar nessa etapa da educação não há a necessidade de formação especifica,
difundindo assim uma concepção e práticas de Educação Infantil precárias.
3 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA
Este estudo se desdobra numa pesquisa qualitativa, que de acordo com
Ludke e André (1986), é caracterizada pelo trabalho de campo, supondo o contato
direto do pesquisador com o ambiente e a situação que está sendo investigada.
Sendo assim, este tipo de pesquisa considera o ambiente natural, como sua fonte de
dados e o pesquisador como seu principal instrumento.
A pesquisa exploratória aqui proposta, acerca da importância da formação
das professoras da Educação Infantil é direcionada por princípios do estudo de caso,
alicerçado na concepção de Ludke e André (1986),
O estudo de caso é o estudo de um caso, seja ele simples e especifico, como o de uma professora competente de uma escola pública, ou complexo e abstrato, como o das classes de alfabetização (CA) ou do ensino noturno. O caso é sempre bem delimitado, devendo ter seus contornos claramente definidos no desenrolar do estudo. O caso pode ser similar a outros, mas é ao mesmo tempo distinto, pois tem um interesse próprio, singular. (p.17).
Devido à incompatibilidade semestral do calendário acadêmico da
Universidade do Estado da Bahia (UNEB), com o calendário regular e
conseqüentemente, com o calendário escolar, optou-se por denominar a pesquisa
como de cunho exploratório, o qual permite um conhecimento pouco aprofundado da
realidade pesquisada, e não um estudo de caso em si, visto que este para ser
realizado, com rigor científico, é necessário que o pesquisador esteja imerso na
realidade por um considerável espaço de tempo, o que é inviável com a organização
atual de semestralidade da UNEB e o tempo disponível para o estudo monográfico.
Desta forma, esse estudo se abre para desdobramentos mais profundos
posteriormente.
3.1 TÉCNICAS E INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS UTILIZADOS.
Para a realização da pesquisa, foi escolhida como técnica a observação não-
participante e entrevista individual, semi-estruturada, e ainda foi aplicado como
instrumento de coleta de dados um questionário composto de perguntas que tratam
da caracterização dos sujeitos e 10 questões que tratam do objeto da pesquisa, ou
seja, a formação de professoras da Educação Infantil.
A pesquisa foi realizada em uma escola particular/popular, situada no bairro
de Tancredo Neves, comunidade periférica, com grande presença da população
afro-descendente, de baixo nível econômico. A escola supracitada atende ao público
da Educação Infantil ao nono ano do Ensino Fundamental e foi escolhida como lócus
deste trabalho por conhecer e ter a experiência de anteriormente ter lecionado na
Instituição.
Os sujeitos desta pesquisa são três professoras que atua na Educação Infantil
da referida escola, tendo em vista que o problema a ser pesquisado abrange a
formação dessas profissionais. Essas que compõem o universo pesquisado
.trabalham na instituição nos dois turnos, sendo que apenas uma atua na Educação
Infantil nos dois turnos, lecionando no grupo 5; a segunda pela manhã atua no grupo
4 e a tarde leciona em uma turma do segundo ano do Ensino Fundamental; a
terceira leciona no grupo 5 pela manhã e a tarde dá aulas de Libras no Ensino
Fundamental.
As três professoras investigadas iniciaram a carreira como educadora da
infância, sem formação específica, começaram a lecionar apenas por terem
“afinidade” com crianças. Quando se iniciaram na profissão uma delas tinha apenas
o Ensino Fundamental e as outras duas haviam concluído o Ensino Médio, na
modalidade formação geral.
A primeira professora será denominada como professora A, concluiu no ano
de 2007 o curso técnico de nível médio de Magistério; a segunda e a terceira
professoras, que serão denominadas como professoras B e C estão cursando
Pedagogia, uma na Faculdade Visconde de Cairú e a outra na Faculdade de
Tecnologias e Ciências (FTC), sendo que estão cursando o terceiro e o primeiro
semestre, respectivamente. Desta forma, com exceção da professora A que tem o
curso técnico concluído, pode-se afirmar que as professoras B e C não têm
formação específica para atuar na Educação Infantil, visto que ainda estão no início
do curso.
É importante ressaltar que, no momento da entrevista, fiquei intrigada quando
a professora C afirmou estar cursando o primeiro semestre, visto que estávamos no
mês de dezembro, assim não seria possível ela estar no semestre que dizia, já que
as Instituições particulares de Ensino Superior seguem o calendário regular. Desta
forma, a fim de sanar a dúvida que inquietava meus pensamentos, decidi pesquisar
no site da Instituição se havia alguma turma no respectivo semestre. Para minha
surpresa, não só não existe nenhuma turma neste semestre, como a Instituição não
oferece o curso de Pedagogia, o que me fez concluir que a professora C, faltou com
a verdade em relação ao seu nível de formação profissional. Esse fato indica que a
professora reconhece a necessidade da profissionalização docente, e tem o desejo
de se qualificar.
Devido à incompatibilidade do calendário acadêmico da UNEB com o
calendário escolar, como já foi explicitado, a coleta de dados foi realizada em dois
momentos distintos: durante o mês de dezembro do ano de 2009, quando foram
feitas as entrevistas e aplicado o questionário, sendo que para tanto fui a escola
durante cinco dias. No primeiro, dia conversei com a diretora e as professoras
selecionadas explicando o objetivo do trabalho, no segundo dia foram realizadas
duas entrevistas, no terceiro a última professora foi entrevistada, no quarto dia
retornei para aplicar os questionários. No entanto, devido a sobrecarga de atividades
decorrentes do fechamento do ano letivo, não foi possível proceder à aplicação
deste, sendo assim, precisei retornar a escola por mais um dia para a aplicação
desse instrumento.
O segundo momento foi norteado pela observação não participante que
aconteceu no mês de fevereiro de 2010. Esta técnica de pesquisa foi escolhida no
intuito de acompanhar o trabalho em sala de aula e verificar se o exercício e a
prática docente das professoras investigadas favorecem o desenvolvimento da
criança em seu aspecto cognitivo, emocional, afetivo e cultural. De acordo com
Ludke e Andre (1986, p.26), essa técnica de pesquisa tem grande validade nas
pesquisas educacionais.
[...] a observação ocupa um lugar privilegiado nas novas abordagens de pesquisa educacional. Usada como o principal método de investigação ou associada a outras técnicas de coleta, a observação possibilita um contato pessoal e estreito do pesquisador com o fenômeno pesquisado, o que representa uma série de vantagens. [...] a experiência direta é sem dúvida o melhor teste de verificação da ocorrência de um determinado fenômeno.
Os dados obtidos na pesquisa de campo foram organizados e divididos em
quatro categorias: concepção acerca da Educação Infantil/educar e cuidar; entrada
na profissão; importância da formação inicial e continuada e prática docente. Serão
apresentados e analisados no próximo capítulo.
4 COLETA E ANÁLISE DE DADOS
O Campo de estudo foi uma escola particular/popular, situada em bairro da
periferia de Salvador que atualmente atende o público da Educação Infantil ao
Ensino Fundamental. A escola foi fundada no ano de 2000 por uma jovem de 18
anos, após ter vivido a experiência de lecionar na escola comunitária do bairro onde
residia, a qual era mantida por populares e funcionava na Associação de Moradores
do mesmo bairro, sua formação era de nível médio completo, no curso de formação
geral.
A escola foi fundada com o objetivo de atender as crianças de 0 a 6 anos da
localidade, oferecendo educação com mensalidades com baixo valor(atualmente na
ordem de cinqüenta reais), que pudessem encaixar na renda mensal das famílias
que tinham crianças que estudavam na Instituição. Desta forma, pode-se afirmar que
a escola foi fundada com princípios de um atendimento que se preocupava mais
com o aspecto assistencial em detrimento ao pedagógico, corroborando assim, com
os estudos descritos no quadro teórico, já explicitado nesta pesquisa.
Nesta perspectiva, oferecendo ensino particular a preços populares, a escola
nestes dez anos ampliou a estrutura e o quadro de funcionários e passou a oferecer
não só a Educação Infantil, mas também o Ensino Fundamental, passando de uma
escola de pequeno para médio porte, tornando-se referência no bairro.
A pesquisa revelou que a Escola Nossa Senhora do Cenáculo, apesar de ter
ampliado a estrutura, não investe na formação docente, em especial das professoras
da Educação Infantil, que é o objeto dessa pesquisa, pois as professoras que atuam
neste segmento de ensino não possuem formação especifica para tal profissão.
A observação permitiu verificar a prática das professoras, a organização da
sala, de que maneira as atividades são aplicadas e desenvolvidas, de que forma se
dá a relação professora-aluno e a influência desta na construção do conhecimento.
Os dados obtidos com a aplicação dos questionários e a realização das
entrevistas junto às professoras foram organizados e agrupados em quatro
categorias: concepção acerca da Educação Infantil/ cuidar e educar; entrada na
profissão; importância da formação inicial e continuada e prática docente. A seguir,
apresentamos nossa análise dos dados coletados.
4.1 CONCEPÇÃO DAS PROFESSORAS ACERCA DA EDUCAÇÃO INFANTIL/
CUIDAR E EDUCAR
Esta categoria foi demarcada a partir das respostas obtidas às seguintes
perguntas: Qual a importância da Educação Infantil? Quais requisitos a pessoa
precisa ter para ser professora da Educação Infantil? O que é mais importante para
ser professora de Educação Infantil? A condição de mãe contribui para ser uma boa
professora de Educação Infantil? Por quê? Você dispõe de auxiliar em sala? Quais
atividades ela exerce? O que a criança precisa aprender na Educação Infantil?
Essas questões e as respostas dadas pelas docentes serão discutidas, de modo a
verificar que concepção de Educação Infantil, norteia as práticas das professoras
investigadas. ( Quadro 1)
PERGUNTA
PROFESSORA A PROFESSORA B PROFESSORA C
1.Qual a importância
- É a base de tudo. - A criança chega como
- É fundamental para a vida
- É a base da vida - Não deve ser
da Educação Infantil?
uma folha de papel em branco. - A escola ajuda a desenvolver; socialização.
- è o começo do conhecimento - Início a partir dos 2 ano
banalizada; - O que a criança aprende [na Educação infantil] leva para a vida toda.
2. Quais os requisitos para ser professor da Educação infantil?
- Boa formação. -paciência - gostar do que faz
- Tranquilidade - paciência - amor, acima de tudo
-Paciência é fundamental - equilíbrio - e amor
3.O que é mais importante para ser professor da Ed. Infantil?
- Formação - Conhecimento
- Respeitar a Criança - A Capacitação, tem que estudar sempre
4. A condição de mãe favorece para ser uma boa professora da Ed. Infantil?
- Não - Vem da pessoa - Qualquer uma pode ser mãe, mas professor não.
- Sim. Influencia muito - Principalmente na troca de fralda. Alimentação e durante o choro da criança
- Sim. - Ajuda no saber lidar com a criança. - A mãe tem mais sensibilidade,a percepção é direta
5. Você dispõe Auxiliar em Sala de Aula?Quais atividades ela exerce?
- Sim. - Geralmente as tarefas ligadas ao cuidar da criança. -Mas essas tarefas [cuidar] podem ser exercidas pela professora
- Sim. - ela ajuda a levar as crianças ao banheiro, a colocar a merenda e a organizar a sala.
- Sim - A Auxiliar ajuda em tudo em conjunto, até mesmo a levar ao banheiro, limpar o bumbum. Essas atividades ligadas ao cuidar.
6.O que a criança precisa aprender?
- se socializar - coordenação motora - reconhecer as letras, número e as cores
- coordenação [motora] - letras, números, nome próprio e formas geométrica
- Respeitar os colegas. - Coordenação motora. - Percepção visual, alfabeto e números
Quadro 1- Concepção da Educação Infantil: Educar / cuidar
4.1.1 Qual a importância da Educação Infantil
Os dados coletados indicam que as três professoras questionadas
consideram a Educação Infantil como de extrema importância no desenvolvimento
do indivíduo. As respostas obtidas evidenciam que todas concordam com o que
está explicitado no artigo 29 da LDB 9394/96, o qual caracteriza a Educação Infantil
como de fundamental importância para o desenvolvimento pleno da criança. “A
Educação Infantil é a base de tudo, onde começa todo o nosso desenvolvimento” (
Professora A), “ É fundamental na vida de uma pessoa, é a partir daí que a pessoa
começa a adquirir conhecimento e é onde começa seu processo educacional, por
volta dos dois anos”. (Professora B), “É de fundamental importância na vida da
criança, é a base da pessoa e não deve ser banalizada, é na Educação Infantil que a
criança vai se desenvolver” (Professora C).
Assim, diante das respostas obtidas, pode-se afirmar que elas conceituam a
Educação Infantil como uma etapa primordial para a formação da criança. Todavia,
ao considerar que a criança ao ingressar na Educação Infantil “é uma folha de papel
em branco” (Professora A), e afirmar que a criança só começa a adquirir
conhecimento quando ingressa na Educação Infantil (Professora B), indicam que a
ausência de uma formação específica, restringe a capacidade intelectual das
crianças á entrada na escola afastando-se das atuais tendências de pesquisadores
de Educação Infantil, que destacam a relevância de uma escola em que se leve em
conta a experiência e o legado cultural que a criança já traz do contato com a família
e outros grupos sociais.
4.1.2 Requisitos que a pessoa precisa ter para ser professora de Educação
Infantil.
As respostas obtidas revelam que, apesar de apontar outros requisitos, as
três informantes ressaltam o sentimento do amor e a paciência como elementos
fundamentais para ser professora de Educação Infantil. “Três coisas: boa formação
(eu não tenho), paciência que é muito importante e amor pelo que faz” (Professora
A), “Tranqüilidade, paciência, amor e acima de tudo dom para trabalhar com as
crianças” (Professora B), “Paciência que é primordial, equilíbrio para saber ser firme,
mas também moderada e o amor que é fundamental” (Professora C).
Para Kramer e colaboradores (2005), essa ênfase no amor pelo que faz,
mencionado pelas professoras é justificativa para suprir as dificuldades que
permeiam a realidade da Educação Infantil, e também para “mascarar” a
precariedade na formação, visto que “[...] quando a professora não sabe o que faz
ela ama.”(p.49).
É notório na fala da professora B, a concepção de vocação como requisito
para ser professora de Educação Infantil “acima de tudo dom para trabalhar com as
crianças”, em detrimento da formação, evidenciando os estudos de Chaves (2007), a
qual atribui a essa concepção de vocação um impasse para a formação especifica,
pois dentro dessa perspectiva qualquer pessoa que saiba “lidar” com criança pode
ser professora de Educação Infantil.
4.1.3 O elemento mais importante para ser professora de Educação Infantil.
Para este questionamento as respostas das informantes foram bastante
objetivas. A professora A responde que a formação, o conhecimento é o item mais
importante para ser educadora da infância, concordando a professora C, ao informar
que a capacitação é o item mais importante. “A capacitação, tem que estudar
sempre”. Esta mesma professora disse estar cursando Pedagogia em uma
faculdade particular que não oferece o curso. Nesse sentido, podemos inferir que a
professora C reconhece a necessidade de profissionalização e tem o desejo de se
especializar. Ressalta-se que no questionamento anterior a professora A considera
que formação é requisito importante e revela que não possui “boa formação ( eu não
tenho)”.
Assim, os dados indicam que mesmo sem possuírem formação específica
para atuarem na Educação Infantil, nas suas falas as professoras informantes
reconhecem a importância da mesma para que se possa desenvolver um trabalho
de qualidade com as crianças. Kramer (2005) considera essa realidade paradoxal,
pois ao mesmo tempo em que essas professoras reconhecem que é necessária a
formação, não se percebem como responsáveis para implementar essa formação.
Desta forma, acabam por se acomodar e não buscam formação acadêmica ou
técnica para sua qualificação profissional, é o caso da professora C que já está oito
anos atuando na Educação Infantil e tem apenas o Nível Médio em formação geral.
4.1.4 A condição de mãe favorece para ser boa professora de Educação
Infantil?
A professora B diz: “Acho que sim, influencia muito principalmente nas
questões como trocar de fraldas, alimentação e quando a criança chora”, em
consonância cabe trazer a afirmação da professora C: “Sim, o fato de ser mãe ajuda
a professora saber lidar com as crianças, pois mãe já tem sensibilidade, a percepção
é direta”
As respostas a este questionamento indicam que a relação que as
professoras informantes estabelecem entre maternidade e docência, confirmam os
estudos de Chaves (2007), que explicita que a função de educadora da infância está
atrelada a função de maternagem a qual descaracteriza a profissão, negando uma
identidade docente, desvalorizando o trabalho dessas profissionais e
conseqüentemente a Educação Infantil.
Na fala da professora B fica implícita a divisão que ela faz entre as tarefas
correspondentes ao cuidado e às voltadas ao pedagógico, confirmando a dicotomia
citada por Tiriba (2005), o qual afirma que apesar das dimensões cuidado e
educação serem processos que devem ser articulados, na prática são tratados como
processos distintos e separados.
4.1.5 O papel e as atividades atribuídas às auxiliares.
Os dados obtidos revelam que as funções atribuídas às auxiliares, quase
sempre são as atividades ligadas ao cuidado, ratificando os estudos de Tiriba
(2005), que afirma a existência de uma divisão de tarefas entre as auxiliares e as
professoras, cabendo à professora apenas às atividades pedagógicas e as auxiliares
as atividades ligadas a higiene, que são tratada como de menor valor, reforçando a
falsa dicotomia que existe entre a educação e o cuidado.
Quando questionada se dispõe de auxiliar e as atividades que ela exerce, a
professora A afirma “Sim, geralmente por questão de tempo a auxiliar fica com as
tarefas que estão ligadas ao cuidado” , em consonância cabe trazer a resposta da
professora B “ Sim, a auxiliar me ajuda a levar as crianças ao banheiro, colocar a
merenda, organizar a sala”
A resposta da professora C em parte se distancia da posição das outras
informantes, para ela as dimensões cuidado e educação devem estar articuladas,
cabendo a professora e a auxiliar realizarem as atividades que correspondem a
higiene “ Sim, a auxiliar me ajuda em tudo que preciso, fazemos tudo em conjunto,
até mesmo levar ao banheiro”, no entanto no decorrer da sua fala fica implícito,
mesmo não expressando claramente que as atividades relacionadas a higiene,
portanto, ao cuidado são classificadas como de menor valor , continuando a fala diz“
... até mesmo levar ao banheiro, limpar bumbum...”, pois o até mesmo denota que
não coloca essa tarefa como a principal, mas como de menor valor que deve ser
exercida pela auxiliar.
Desta forma, concordando com Tiriba (2005) implícita ou explicitamente os
discursos das informantes revelam que embora no plano teórico as dimensões
cuidar e educar sejam vistas como processos que estão intimamente interligadas, na
prática estas são trabalhadas de forma diferenciada e hierarquizada.
4.1.6 O que a criança precisa aprender na Educação Infantil?
Em relação a este questionamento as respostas foram semelhantes, a
professora A diz que na Educação Infantil a criança precisa aprender “a se socializar
com os outros, coordenação motora, reconhecer as letras/vogais, números e cores‟‟,
a professora B, menciona esses aspectos e acrescenta formas geométricas e a
professora C coloca além dos itens já citados a percepção visual.
Todas as informantes mencionam a coordenação motora como “conteúdo”
que a criança precisa aprender na Educação Infantil. Vale ressaltar que durante as
observações pude perceber que as atividades que visam desenvolver a
coordenação se limitam apenas a atividades mimeografadas nas quais as crianças
cobriam tracejados, ora em linha reta, ora com ondulações que segundo a
professora A serviam para “treinar a coordenação grossa e fina”, respectivamente. A
prática das professoras indica que elas desconhecem as demais possibilidades que
colaboram para o desenvolvimento da coordenação motora, seja a fina ou a grossa,
além disso, no discurso das informantes a coordenação motora é uma habilidade
que deve ser treinada.
As práticas e os discursos das professoras informantes apontam para a
ausência de uma formação específica, a qual abarca a polivalência de conhecimento
proposta pelo RCNEi (1998) e que o profissional que atua na Educação Infantil
precisa ter, a fim de atender as especificidades e particularidades da infância.
4.2 ENTRADA NA PROFISSÃO
Essa categoria foi definida a partir de duas perguntas que nortearam a
entrevista realizada com as informantes: Como ingressou na Educação Infantil;
Como começou a trabalhar nesta escola/Condições de trabalho. Serão discutidas de
modo a evidenciar quais as fatores permearam o ingresso das professoras
investigadas na Educação Infantil. (Quadro 2).
PERGUNTA
PROFESSORA A PROFESSORA B PROFESSORA C
1.Como se deu a entrada na profissão?
- Na minha cidade praticamente todo mundo faz magistério e eu também fiz. - Quando vim para Salvador abandonei o curso, mas o retomei depois de três anos.
- Ajudava minha mãe que é professora e levava atividades para casa, então fui tomando gosto pela profissão.
- Entrei por um acaso. Sendo ajudante aí foi despertando o amor pela profissão e comecei a ensinar.
2.Como começou a trabalhar na escola e as condições de trabalho?
- Era mãe de aluno e a diretora sabia que eu tinha abandonado o magistério, então ela me chamou para ensinar e me incentivou a terminar o curso. - Gosto muito de trabalhar aqui, já estou aqui a três anos; um ambiente acolhedor. - Ganho um salário e acho que o salário de professor poderia ser melhor, mas para mim, que só tenho o Ensino Médio, está ótimo.
- Minha mãe conhece a dona da escola e pediu para me dar uma oportunidade . É o meu primeiro ano aqui. - Acho que o salário de Professor poderia ser maior, mas o salário mínimo é compatível.
- Meus filhos estudam aqui, sou mãe de aluno e... [a diretora] sabendo que eu tinha experiência me chamou . ´ É o meu primeiro ano nesta escola. - Recebo um salário e acho muito pouco, pouquíssimo até mesmo para quem só tem o Ensino Médio. - É muita coisa pra fazer e o salário é baixo.
Quadro 2- Entrada na profissão
4.2.1 O ingresso na Educação Infantil
Os dados coletados indicam que as professoras informantes ingressaram na
Educação Infantil por acaso. A Professora B diz “Comecei auxi liando minha mãe
que é professora e levava as atividades para casa, aí ajudando ela, fui tomando
gosto”, a resposta da professora C é semelhante “Entrei por um acaso, sendo
ajudante (auxiliar), aí foi despertando um amor pela Educação Infantil e estou até
hoje”. Estes dados corroboram com Kramer (2005), quando afirma que a entrada na
Educação Infantil, muitas vezes se dá pela situação que circunda a vida dessas
professoras.
Podemos inferir que esse é mais um fator que contribui para descaracterizar a
identidade da professora que atua com criança pequena, pois se “abre as portas” da
Educação Infantil para qualquer pessoa que queira trabalhar com crianças, sem a
necessidade de formação adequada e específica.
O discurso da professora A evidencia que ela entrou para a carreira docente
não por escolha, mas por falta de opção: “fui ser professora, porque na minha cidade
praticamente todo mundo faz magistério e eu também fiz...”. A fala da professora
explicita o que Kramer (2005, p. 41) denominada como “[...] a escolha dentro da não
escolha [...]
Apesar da entrada na Educação Infantil das informantes não ter sido por
opção, todas continuam na área, sem buscar qualificação profissional, ou seja,
apesar de se engajarem na Educação Infantil e admitirem gostar do que fazem,
continuam, mesmo depois de anos, sem formação específica, apesar de
reconhecerem a sua importância.
4.2.2 Como começou a trabalhar na Instituição/Condições de trabalho
As falas das professoras informantes revelam que todas começaram a
trabalhar na escola por terem uma relação com a diretora, (proprietária) da escola,
duas por serem mães de alunos. Professora A, ao ser questionada revela: “Era mãe
de aluno...então ela me chamou para ensinar; a resposta da professora C é parecida
“Meus filhos estudam aqui, sou mãe de aluno e a diretora sabendo que tenho
experiência me chamou...” A professora B, começou a trabalhar na Instituição
através da mãe, que conhece a proprietária da escola “Minha mãe conhece a dona e
pediu para me dar uma oportunidade...”
Em todos os casos podemos observar que o ingresso das professoras se deu
por relações de convívio, ou seja, relações amigáveis de empregabilidade. Em
nenhum momento as professoras informantes mencionaram que houve análise de
currículo, entrevista ou algum tipo de seleção comum a um processo de admissão.
Esses dados confirmam os estudos de Oliveira (2002), que denomina essa situação
de “currículo oculto”, informando que a formação das professoras de Educação
Infantil das creches e escolas populares é baseada na experiência que tem com os
filhos, não exigindo uma qualificação profissional, fato que descaracteriza a profissão
como carreira.
O outro aspecto que a pergunta contempla é sobre as condições de trabalho.
As três entrevistadas garantem que as condições de trabalho são favoráveis para
desenvolvimento das suas atividades, dizem que o ambiente é acolhedor e que
gostam de trabalhar na Instituição. Quando questionadas a respeito do piso salarial,
notei que duas professoras ficaram constrangidas para responder. A professora A
diz: “Ganho um salário mínimo e acho que o salário do professor deveria ser melhor,
mas para mim que só tenho o Ensino Médio tá bom”; em consonância a professora
B responde: “Acho que o salário do professor deveria ser melhor, mas o salário que
ganho é compatível”. É importante enaltecer que ambas recebem um salário mínimo
para trabalhar os dois turnos, ou seja, 40 horas semanais. Desta forma, dentre
outros aspectos, as condições salariais é um dos fatores que impede que as
professoras se profissionalizem.
Os relatos dessa professoras demonstram o que explicita Chaves (2007), ao
afirmar que essa condição de precariedade na formação docente, acaba por refletir
na condição salarial das professoras que na maioria das vezes ganham valores
irrisórios que não alcançam nem o salário mínimo, configurando-se em um círculo
vicioso que implica na descaracterização da natureza da Educação Infantil e na
perpetuação da crença de que é preciso muito pouco para ser educador da infância.
É notório na fala das professoras que, apesar de considerarem o valor do
salário que recebem baixo, internalizam as representações sociais que
desqualificam a função e estão conformadas com este, com exceção da professora
C que em sua fala evidencia a sua insatisfação com o valor do seu ordenado:
“Recebo um salário e acho muito pouco, pouquíssimo, até mesmo pra quem só tem
o Ensino Médio, é muita coisa pra fazer e o salário é baixo”.
4.3 IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA
Essa categoria analisa a percepção das professoras investigadas acerca da
importância da formação, seja ela inicial ou continuada. Foi composta a partir do eixo
da entrevista que solicitava descrever e avaliar a formação recebida, e a partir das
perguntas que questionavam sobre a participação das professoras em cursos que
visem a qualificação profissional. A escola já promoveu oportunidades ou incentivou
a participar de algum evento (curso, palestra, oficina...), que vise o aperfeiçoamento
profissional? Você por iniciativa própria já participou de algum evento dessa
espécie? (Quadro3).
PERGUNTA
PROFESSORA A PROFESSORA B PROFESSORA C
1. Descrever a avaliar sua profissão
- Me formei no ICEIA*, depois de ter parado por três anos. - O curso não foi totalmente o que eu esperava. - O estágio foi o que mais gostei. Mas o curso mesmo deixa muito a desejar,
- Fiz formação geral e agora estou fazendo Pedagogia na Fundação Visconde de Cairu.Já estou no terceiro semestre - Acho que tudo que aprendi até hoje contribui para a minha formação e para passar
- Já Estou há muito tempo na educação, mas só agra estou fazendo curso de pedagogia na FTC – Faculdade de Tecnologia e Ciências, onde estou no 2ª semestre. - Tudo que sei toda
principalmente nas metodologias. – Também [o curso] deveria enfatizar mais o papel do lúdico, pois quando chegamos na prática ficamos atordoadas, sem saber o que fazer.
para as crianças. minha formação, vem da minha experiência. Com o tempo, apreendi muito a entender como trabalhar com as crianças, mas acho que a gente tem que procurar sempre aprimorar.
2. A Escola incentiva a participação em eventos de educação infantil
- Sim. Sempre, mas deixa por nossa conta
- Sim. Cursos das editoras.
- Sim. Sempre tem avisos no mural. Às vezes combinamos e vamos.
3. Já participou de eventos educacionais
- Sim fiz curso no ICEIA, promovido pela Universidade Católica do Salvador
- Sim, na Faculdade - Sim, com certeza! Todos que sei e sempre participo.
Quadro 3- Importância da formação inicial / continuada
4.3.1 Descrever e avaliar a formação
As respostas das três professoras a este questionamento foram sucintas e
diversificadas, em breves palavras descreveram e avaliaram a sua formação. A
professora A considera que a sua formação como parcialmente boa, explicitando
que o curso de Magistério deixou muita coisa a desejar: “O curso não foi totalmente
o que eu esperava, o estágio foi o que eu mais gostei, mas o curso mesmo deixa
muita coisa a desejar, principalmente nas metodologias quando chegamos na
prática ficamos atordoadas sem saber o que fazer” .
Desta forma, na resposta da professora A, fica evidente uma fragilidade no
seu processo de formação, justamente nos aspectos que incidem diretamente na
sua ação junto às crianças: as metodologias.
A professora B acredita que todas as experiências formativas que teve ao
longo da vida contribuem para a sua prática: “Fiz Formação Geral, e agora estou
fazendo Pedagogia... e acho que tudo que aprendi até hoje contribui para minha
formação e para passar o que eu sei para as crianças”. A resposta da professora C
diverge das falas das demais professoras, esta atribui a sua formação aos anos de
experiência que possui na Educação Infantil: “ ... tudo que sei, toda a minha
formação vem da experiência, com o tempo aprendi muito e entender como trabalhar
com crianças” e conclue enfatizando a importância da formação continuada “ ...
mas acho que a gente deve sempre procurar aprimorar.”
Nas falas das professoras B e C fica implícita a idéia de que não há
necessidade de uma formação específica para atuar junto com crianças pequenas,
elas descrevem aspectos relevantes e importantes que constituem a prática
pedagógica, ambas dizem que as experiências vividas e acumuladas ao longo da
vida contribuem para a sua formação e fazer docente. Corroboram com Kramer
(2002), quando salienta que a experiência passada é elemento importante e
essencial na formação do profissional que atua na Educação Infantil, visto que para
essa mesma autora a formação não acontece em um único momento e sim em
diferentes espaços e tempo.
No entanto, se distanciam da proposta de Kramer (2002) quando não
mencionaram a formação específica que para a autora é primordial para uma prática
profissional que atenda as peculiaridades do trabalho com a Educação Infantil.
No discurso da professora A, podemos notar que a qualificação docente seja
ela em nível médio ou superior não encerra a necessidade de aprimorar a ação
profissional, como diz a professora C, devemos “sempre procurar se aprimorar”,
visto que recorrendo novamente a Kramer (2002 p.128)“ [...] nessa profissão,
estamos sempre nos formando e se conseguirmos nos transformando [...]”.
4.3.2 Participação em eventos que visem aperfeiçoamento profissional.
Os dados obtidos com os questionamentos sobre a participação das
professoras informantes em eventos que visem o aperfeiçoamento profissional, seja
ele proposto pela escola, ou por iniciativa própria, indicam que tanto a escola como
as próprias professoras valorizam a importância da formação continuada, pois todas
responderam as perguntas com afirmativas de que a escola incentiva à participação
nesses eventos e que elas por iniciativa própria também participavam. A Professora
A ao ser questionada se a escola incentiva ou promove eventos dessa espécie
responde “ Sim, sempre, mas deixa por nossa conta”, A expressão “por nossa
conta” que esta professora utiliza, sugere que é necessário investimentos para
participar desses eventos, como para deslocamento, pagamento de taxas e outros, e
evidencia que a unidade escolar não toma para si parte da tarefa e responsabilidade
de qualificar seus profissionais. A professora B específica “ Sim, os promovidos pela
editora”, e a professora C, diz “ Sim, sempre tem avisos mural”.
As professoras informantes dão respostas vagas as quais, com exceção da
professora B, não especificam quais foram esses eventos, por quem foi promovida, a
finalidade e as discussões ocorridas e não deixam claro se elas participaram e de
quais dos eventos.
As respostas obtidas ao serem questionadas se por iniciativa própria já
haviam participado de eventos que contribuíssem para qualificação profissional, das
docentes também são bastante superficiais. As professoras A e B informam as
instituições que promoveram o curso que participaram, mas restringem a resposta a
esse dado. A Professora A: “Sim, fiz um curso no Iceia2 que foi promovido pela
UCSAL3”, professora B:“Sim, os que são oferecidos pela minha faculdade”, a
resposta da professora C, ainda é mais vaga, se limita a dizer “ Com certeza, todos
que sei, se der participo”
2 Instituto Educacional Isaías Alves, instituição pública de ensino que oferece o curso de Magistério.
3 Universidade Católica da cidade do Salvador, instituição particular de Ensino Superior, pertencente à Igreja
Católica.
Os dados obtidos revelam que, apesar de no discurso as professoras
informantes reconhecerem a importância de eventos que visem a qualificação
profissional, esta não é tratada como primordial para as professoras, seja pela falta
de tempo, pois tem uma jornada de 40 horas semanais, ou pela falta de verba, já
que recebem apenas um salário mínimo e também para a escola que não investe
na qualificação das suas profissionais, divergindo da proposta de Kramer (2002), ao
afirmar que a formação em serviço deve ser uma prática constate na trajetória
profissional dos educadores.
4.4 PRÁTICA DOCENTE
Essa categoria analisa a prática pedagógica das professoras investigadas, buscando
estabelecer uma relação destas com o nível de formação das professoras. A
categoria foi definida a partir das seguintes perguntas: Qual recurso didático utiliza
para lecionar? Os conteúdos ministrados quem propõe e baseado em quê? As
observações realizadas também serviram de suporte para obtenção de dados que
compõem esta categoria.( Quadro 4).
PERGUNTA
PROFESSORA A PROFESSORA B PROFESSORA C
1.Quais recursos didáticos utiliza?
- Quadro, recortes, gravuras e brinquedos.
- Quadro, giz e cartazes.
-Cartazes, quadro, alfabeto letrado, música.
2.Os conteúdos didáticos, quem propõe e em que se baseia?
- A coordenação da escola. - Não sei em que [se baseia]
- baseia-se no Livro didático, escolhido pela Direção.
- É proposto pela Coordenação, baseado no livro didático.
Quadro IV- Prática Docente
Os dados obtidos indicam que as professoras investigadas, desconhecem, ou
não priorizam a infinidade de recursos didáticos que podem utilizar na prática
docente. Na resposta das professoras podemos verificar que elas restringem os
recursos que utilizam para lecionar a quadro e cartazes. “Professora A: “Quadro,
recortes e gravuras”, professora B“ Quadro, giz, cartazes”, professora C “Cartazes,
quadro, alfabeto ilustrado”. Essa situação é reflexo da formação insuficiente dessas
profissionais para atuarem na Educação Infantil.
Sobre quem propõe os conteúdos e em que eles são baseados todas as
informantes dizem que estes são passados para elas pela direção e são baseados
no livro didático adotado pela escola. Desta forma, as professoras recebem um
planejamento pronto que devem seguir ao longo do ano letivo, portanto não
participam da elaboração. Neste aspecto, podemos notar a inexistência da
autonomia das professoras e da prática de planejamento colaborativa como
alternativa de formação continuada e em serviço.
Durante as observações, percebi que este planejamento existe desde a
fundação da escola e todos os anos é adotado para as turmas da Educação Infantil,
como uma receita que deve ser seguida. As atividades desenvolvidas também são
dos anos anteriores e são reproduzidas através de mimeografo.
Presenciei uma atividade de “artes”, no grupo 4. A professora distribuiu para a
turma um desenho que eles deveriam colorir e enfeitar, era um boneco vestido com
uma fantasia, já que a atividade proposta era sobre o tema Carnaval. As crianças
pintaram o desenho e à medida que cada uma acabava, a professora ia até a mesa
da criança e dava alguns círculos de papel laminado para a criança colar na
fantasia.
Podemos inferir, que essa atividade limita a criança a desenvolver um
desenho padrão inibindo a sua enorme capacidade criadora e criatividade, lançando
mão de seu repertório e representações pessoais sobre o tema.
Os dados recolhidos indicam que o fazer docente das professoras
investigadas em muitos aspectos não condizem com uma prática pedagógica eficaz
e autônoma, que vise o favorecer o desenvolvimento da criança de forma integral.
Como propõe Oliveira (2002 p.24), uma formação que abarque “[...] conhecimentos
mais elaborados acerca das funções da Educação Infantil e das características
sócio- históricas do desenvolvimento das crianças”, o que pode é reflexo da falta de
formação específica para atuar na Educação Infantil.
5 CONSIDERAÇÃOES FINAIS
A Educação Infantil tem como objetivo proporcionar o desenvolvimento
integral da criança de 0 a 5 anos em todos os seus aspectos. Durante a revisão
bibliográfica pude notar que o profissional que atua nesse segmento de ensino é o
principal responsável para que esse objetivo seja alcançado, ou seja, cabe a
professora observar, fazer registro e criar situações que estimulem o
desenvolvimento da criança, mediando para que seu desenvolvimento ocorra de
forma integral.
A formação especifica em nível médio ou superior do profissional que atua
com criança pequena é imprescindível para promover uma Educação Infantil de
qualidade e busquei na pesquisa exploratória, embasada pela fundamentação
teórica adquirida durante revisão bibliográfica, compreender essa relação existente
entre teoria e prática, observando a prática docente na turma de uma das
professoras investigadas.
A pesquisa fundamentada no referencial teórico revelou que embora a
Educação Infantil, tenha conquistado progressos significativos, sobretudo, após a
promulgação da LDB 9394/96, o debate sobre a formação de professores para a
Educação Infantil, ainda, é bastante complexo e multifacetado, com impasses,
retrocessos e avanços que necessitam ser discutidos, para alcançarmos um
atendimento favorável, que respeite as peculiaridades das crianças de 0 a 5 anos.
Constatei assim, que existe um abismo entre as políticas públicas que
reconhecem a formação de docentes para este nível de ensino, o que gera uma
distorção entre o que é proposto na Lei e o que, realmente, se efetiva na prática.
Na análise de dados das entrevistas e questionários que apliquei com as
professoras, e das observações realizadas pude perceber as implicações que a falta
de uma formação especifica traz para a aprendizagem das crianças.
A pesquisa revelou o quanto é importante e necessário a qualificação do
profissional que atua na Educação Infantil, todavia não podemos restringir a
precariedade do atendimento as crianças de 0 a 5 anos apenas a esse fator,
responsabilizando as professoras que não possuem formação especifica, por um
processo de precarização da educação de crianças pequenas que é histórico, pois
uma prática de Educação Infantil de qualidade é resultado de uma série de
elementos que compõem a prática educativa.
No entanto acreditamos que a formação dos profissionais que atuam junto
com a criança pequena deva ser uma dimensão prioritária para alcançamos uma
Educação Infantil de qualidade que respeite e abarque todas as especificidades e
particularidades da infância.
REFERÊNCIAS
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BRASIL, Ministério de Educação e Cultura. SEF/DPE. Política Nacional de Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF/DPE, 1994.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei 9.394/96.
Dezembro, 1996
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília MEC/SEF, 1998.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de nove anos- Orientações Gerais. . Brasília: MEC/SEF/DPE/ COEF, 2004.
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prática docente. Campo Grande: Editora UCDB, 2004.
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CARVALHO, Denise Maria de; CARVALHO, Tânia Câmara Araújo de. Educação Infantil: História, Contemporaneidade e Formação de Professores.Disponívelem<http//sbhe.org.br/novo/congressos/cbhe2/pdfs/Tema3/3117.pdf> Acesso em: 8 nov. 2009.
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CORSINO, Patrícia. Educação Infantil: a necessária institucionalização da infância. In: KRAMER, Sonia. (org.). Profissionais de Educação Infantil: Gestão e Formação. 1. Ed. São Paulo: Editora Ática, 2005.
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KRAMER, Sonia. (org.). Com a Pré- Escola nas Mãos: Uma alternativa curricular para a Educação Infantil. 6. Ed. São Paulo: Editora Ática, 1993.
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LUDKE, Menga; ANDRE, Marli. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas.
São Paulo: Editora EPU, 1986.
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UNICEF. Situação Mundial da Infância. Caderno Brasil. Brasília, DF, 2008.
APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO APLICADO AS PROFESSORAS
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA- UNEB
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
ACADÊMICA: ALINE REGINA PINHEIRO CRUZ LEITE
QUESTIONÁRIO
Professora_____
Grupo_________
Filhos_______ Quant_______
Formação______________________________
1. Qual a importância da Educação Infantil?
2. Quais requisitos que a pessoa precisa ter
para atuar na Educação Infantil?
3. O que é mais importante para ser professora
da Educação Infantil?
4. A condição de mãe contribui para ser uma
boa professora de educação Infantil? Por quê?
5. Você dispõe de auxiliar em sala? Quais
atividades ela exerce?
6. O que a criança precisa aprender na
Educação Infantil?
7. Qual recurso didático utiliza para lecionar?
8. Os conteúdos ministrados quem propõe e
baseado em quê?
9. A escola já promoveu oportunidades ou
incentivou a participar de algum evento (curso, palestra, oficina...) que vise o
aperfeiçoamento profissional?
10. Você por iniciativa própria já participou de
algum evento dessa espécie? Quais?
APÊNDICE B – ROTEIRO DA ENTREVISTA
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA- UNEB
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
ACADÊMICA: ALINE REGINA PINHEIRO CRUZ LEITE
ENTREVISTA
1 - Comentar e avaliar a formação inicial
2 - Entrada na profissão 3 - De que forma começou a trabalhar na escola atual/ Condições de trabalho.