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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
Instituto de Geociências
ALTAIR APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO
MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA
CANA-DE-AÇÚCAR: O CASO DO ETANOL CELULÓSICO
CAMPINAS
2017
ALTAIR APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO
MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA
CANA-DE-AÇÚCAR: O CASO DO ETANOL CELULÓSICO
TESE APRESENTADA AO INSTITUTO DE
GEOCIÊNCIAS DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE
CAMPINAS PARA OBTENÇÃO DO TÍTULO DE DOUTOR
EM POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
ORIENTADORA: PROFA. DRA. FLÁVIA LUCIANE CONSONI DE MELLO
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL
DA TESE DEFENDIDA PELO ALUNO ALTAIR
APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO E ORIENTADO PELA
PROFA. DRA. FLÁVIA LUCIANE CONSONI DE MELLO
CAMPINAS
2017
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CAPES, 1407023
Ficha catalográficaUniversidade Estadual de CampinasBiblioteca do Instituto de Geociências
Marta dos Santos - CRB 8/5892
Oliveira Filho, Altair Aparecido de, 1986- OL4m OliMudanças e permanências no Sistema Setorial de Inovação da cana-de-
açúcar : o caso do etanol celulósico / Altair Aparecido de Oliveira Filho. –Campinas, SP : [s.n.], 2017.
OliOrientador: Flávia Luciane Consoni de Mello. OliTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de
Geociências.
Oli1. Sistema de Inovação. 2. Etanol - Política governamental - Brasil. 3. Etanol
- Indústria. 4. Etanol 2G. I. Consoni, Flávia Luciane, 1973-. II. UniversidadeEstadual de Campinas. Instituto de Geociências. III. Título.
Informações para Biblioteca Digital
Título em outro idioma: Changes and permanence in the Sugarcane Sectorial System ofInnovation : the case for cellulosic ethanolPalavras-chave em inglês:System of InnovationEthanol - Government policy - BrazilEthanol - IndustryEthanol 2GÁrea de concentração: Tecnologia e InovaçãoTitulação: Doutor em Política Científica e TecnológicaBanca examinadora:Flávia Luciane Consoni de Mello [Orientador]José Vitor Bomtempo MartinsAndré Tosi FurtadoJosé Maria Ferreira Jardim da SilveiraCarlos Eduardo Vaz RossellData de defesa: 31-08-2017Programa de Pós-Graduação: Política Científica e Tecnológica
Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
AUTOR: ALTAIR APARECIDO DE OLIVEIRA FILHO
MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA
CANA-DE-AÇÚCAR: O CASO DO ETANOL CELULÓSICO
ORIENTADORA: PROFA. DRA FLÁVIA LUCIANE CONSONI DE MELLO
Aprovado em: 31 / 08 / 2017
EXAMINADORES:
Profa. Dra. Flávia Luciane Consoni de Mello - Presidente
Prof. Dr. José Vitor Bomtempo Martins
Prof. Dr. André Tosi Furtado
Prof. Dr. José Maria Ferreira Jardim da Silveira
Prof. Dr. Carlos Eduardo Vaz Rossell
A Ata de Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora,
consta no processo de vida acadêmica do aluno.
Campinas, 31 de agosto de 2017.
Aos meus pais!
AGRADECIMENTOS
Este é o momento de reconhecer e recordar que nunca caminhei só. Ao longo dessa
jornada contei com a ajuda preciosa de muitas pessoas, as quais cederam um pouco do seu
tempo e da sua paciência para me ensinar, aconselhar e incentivar. Tenho muita gratidão por
todos com quem me relacionei nessa trajetória, todos contribuíram com o meu
desenvolvimento e com a construção deste trabalho. O período de doutoramento foi um
grande processo de transformação, onde os questionamentos transformaram-se em esforços de
pesquisa e as minhas aspirações passaram a ser trabalho, tudo isso me fez amadurecer e
crescer como indivíduo.
Quero agradecer especialmente a professora Flávia Consoni, que participou
ativamente de todas as etapas da pesquisa, orientando, corrigindo e ensinando. Soube cobrar e
dar liberdade, ao mesmo tempo em que me passava segurança para realizar a pesquisa – muito
obrigado.
Em especial, agradeço aos professores André Furtado, Maria Beatriz Bonacelli, José
Maria da Silveira, José Vitor Bomtempo e o Dr. Carlos Vaz Rossell pelas suas contribuições
valiosas no exame de qualificação e na avaliação final do trabalho (defesa). Apontaram
caminhos para o trabalho e deram insights preciosos para pesquisas futuras.
Também agradeço a todos os professores do DPCT com o quais cursei as disciplinas
ou fui PED. Agradeço a todos os funcionários do IG pela dedicação e suporte na realização
das atividades diárias, em particular, às servidoras Valdirene Pinotti, Maria Gorete Sousa,
Sonia Tilkian e Adriana Garutti.
Gostaria de reconhecer a importância da CAPES pelo apoio oferecido, concedendo
bolsa de estudos no período entre 2013 e 2017.
Meus agradecimentos se estendem aos companheiros de turma e de sala(s) de estudo.
Muito obrigado pelos debates e pelos “gorós” tão profícuos. Por ordem alfabética, assim
ninguém fica chateado: Adela; Ana; Carol; Diego; Dani; Edgar; Felipe; Fernando; Fernando
Mesquita; Irineu; Jeny; Lucas; Luis; Marco; Marcos Marques; Marcos Silbermann; Marina;
Nanci; Rodrigo; Sebá; Victo (obrigado pela leitura); Vinicius; Tati; Tildo. Uma lembrança e
um “salve” aos camaradas que nem sempre estão por perto, mas sempre que possível, nos
encontramos (molecada de Piracicaba/SP; República Zona da Mata; galera da
UNESP/Ourinhos).
Sou muito grato por ter a Bianca como minha companheira, sempre esteve comigo e
sempre me nutre de carinho, humanidade e amor. Obrigado San!
Agradeço aos meus familiares pelo cuidado, apoio e compreensão nas minhas
ausências. Valeu Everton, obrigado pai e obrigado mãe – Leila, você sempre me transmite
força para seguir em frente.
RESUMO
O setor sucroenergético brasileiro figura como a principal alternativa nacional frente às
energias fósseis. Ademais, ao se utilizar da cana-de-açúcar para obtenção do etanol, matéria-
prima que não integra sua base alimentar, o Brasil passa a ocupar posição de destaque no
debate energético. Não obstante, tal trajetória tem sido confrontada com novos desafios
tecnológicos, especificamente com o desenvolvimento da tecnologia do etanol de segunda
geração. Trata-se de uma tecnologia em desenvolvimento que, ao aproveitar integralmente
toda a biomassa de uma diversidade de matérias-primas, mostra-se bastante promissora. A
presente pesquisa de doutorado expõe e analisa as características do setor sucroenergético
frente ao desafio tecnológico do etanol de segunda geração. Busca-se compreender como o
Brasil se posiciona em relação ao desenvolvimento desta rota tecnológica, e em que medida o
Brasil apresenta (ou não) protagonismo nessa corrida tecnológica. Pautando-se na abordagem
de Sistemas Setoriais de Inovação e utilizando-se de procedimentos metodológicos
específicos para compreender o processo de inovação (mapeamento de políticas publicas;
mapeamento de atores e suas funções; busca e análise de famílias de patentes e artigos
científicos; entrevistas com representantes das firmas), percebe-se que a reconfiguração do
Sistema Setorial de Inovação Brasileiro da cana-de-açúcar presenciada na última década
reafirma a sua condição histórica. Observou-se que o avanço tecnológico tem ocorrido de
maneira particularizada em poucas firmas e condicionado por um novo elemento de
dependência externa, o qual permite a alguns atores atuar na nova rota tecnológica e realizar
incrementos técnicos, ao passo que estabelece parcerias estratégicas com atores estrangeiros.
Palavras-chave: Sistemas Setoriais de Inovação; Políticas Públicas; Etanol Celulósico; Cana-
de-açúcar; Setor Sucroalcooleiro;
ABSTRACT
The Brazilian sugarcane industry has been the main national alternative to fossil fuels . The
ethanol, produced from sugarcane, a kind of feedstock that is not essentially food, occupies an
important position in energy generation debate. However, this trajectory has been faced with
new technological challenges, specifically the development of the 2nd generation biofuel, the
ethanol 2G. The ethanol 2nd generation is a developing technology exploit from a variety of
materials, especially non-food biomass. This PhD research exposes and analyzes the
characteristics of the sugarcane industry in the face of the technological challenge for the
second generation ethanol. We try to understand how Brazil stands in relation to the
development of this technological route, to what extent Brazil has played a leading role in this
technological route. Based on the approach of Sectoral Systems of Innovation and using
specific methodological procedures to understand the innovation process (mapping of public
policy, mapping of actors and their functions, analysis of patent families and scientific
articles, interviews with representatives of firms), we recognized that sugarcane Sectoral
System of Innovation reconfiguration, specially in the last decade, reaffirms its historical
condition. Therefore, the technological advance have occurred in a few firms conditioned by a
new element of external dependence, that allows some actors to act in the new technological
route and to make technical increases, establishing strategic partnerships with foreign actors.
Keywords: Innovation; Public policy; Ethanol; Sugarcane; Sugar and alcohol industry;
Second Generation Ethanol
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Encadeamento entre as questões de pesquisa e os objetivos da tese................................. 29
Figura 1.1. Configurações tecnológicas do etanol celulósico – rota enzimática............................... 58
Figura 1.2. Estratégias de busca de patentes para etanol celulósico – Questel Orbit....................... 77
Figura 2.1. Evolução do arcabouço institucional do Sistema Setorial de Inovação da cana-de-
açúcar do Brasil, entre 1875 a 2016................................................................................................... 86
Figura 2.2. Produção de cana-de-açúcar, etanol e açúcar no Brasil entre as safras de 1948/49 -
2015/2016.............................................................................................................................. .. 89
Figura 2.3. Evolução dos valores disponibilizados pelo BNDES ao setor sucroenergético, entre
2002 - 2016 (em reais - R$)...................................................................................................... 117
Figura 2.4. Evolução dos valores disponibilizados ao setor sucroenergético, entre 2002 - 2016
(em reais - R$) .................................................................................................................................... 118
Figura 2.5. Participação dos Estados na produção do etanol nas safras de 2000/01 e 2015/16 ........ 123
Figura 2.6. Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil ........................................... 131
Figura 3.1. Número de projetos de pesquisas financiados com recursos dos Fundos Setoriais, pela
CNPq (1997 a 2015) e FINEP (1999 a 2015) – Diretamente relacionados ao setor
sucroenergético.................................................................................................................................... 146
Figura 3.2. Projetos de pesquisas contratados pela FAPESP no período de 1997 a 2016
relacionados ao setor sucroenergético................................................................................................. 153
Figura 4.1. Áreas do conhecimento que se dedicam a temática do etanol celulósico....................... 184
Figura 4.2. Campos tecnológicos do etanol celulósico - 2.937 famílias de patentes......................... 185
Figura 4.3. Evolução dos artigos científicos publicados em periódicos internacionais e os
principais países em publicação na temática do etanol celulósico. .................................................... 190
Figura 4.4. Evolução dos depósitos de patentes e os principais países/regiões de proteção das
invenções em etanol celulósico........................................................................................................... 193
Figura 4.5. Evolução dos depósitos de famílias de patentes no Brasil e a origem do P&D das
invenções protegidas no Brasil............................................................................................................ 198
Figura 4.6. Os principais assigners em etanol celulósico, no mundo e no Brasil............................. 200
Figura 4.7. As principais instituições em publicações vinculadas ao Brasil e os principais
conceitos abordados nas publicações. ................................................................................................ 206
Figura 4.8. Principais conjuntos tecnológicos do etanol celulósico - Landscape by technology
clusters – Brasil (564 famílias de patentes)....................................................................................... 209
Figura 4.9. Conceitos tecnológicos das invenções brasileiras (depósitos prioritários - 47 famílias
de patentes)......................................................................................................................................... 214
Figura 5.1. Iniciativas de desenvolvimento de projetos industriais de etanol celulósico no Brasil,
entre o período de 1980 a 2016. ......................................................................................................... 222
LISTA DE TABELAS
Tabela 1.1. Capacidade instalada de produção de etanol celulósico................................................. 51
Tabela 1.2. Resultados da evolução tecnológica - tecnologia disponível no setor industrial – 2011 53
Tabela 2.1. Origem da Cana-de-açúcar moída na usina, por Estados e safras selecionadas............. 106
Tabela 3.1. Detalhamento do aporte realizado pela FINEP em relação ao SSI da cana-de-açúcar
entre 1999-2015.............................................................................................................................. .... 147
Tabela 3.2. Carteira detalhada do PAISS em milhões de reais (2011 a 2014).................................. 162
Tabela 3.3. Projetos de PD&I integrantes do PAISS (2011-2014)................................................... 164
Tabela 3.4. Atores e valores aprovados por projeto no âmbito do PAISS Industrial (2011-2014)... 168
Tabela 3.5. Empresas e valor dos projetos contratados no âmbito do PAISS Agrícola (2014-
2018)............................................................................................................................. ...................... 177
Tabela 5.1. Projetos indústrias de etanol celulósico no Brasil (Iniciativas Estruturadas), aspectos
gerais (2016). ................................................................................................................................... 255
Tabela 5.2. Características técnicas dos projetos industriais de etanol celulósico no mundo e
custo de produção estimado no ano de 2016 (projetos em operação). ............................................. 282
LISTA DE BOXES
Box 1.1. Bases da abordagem de Sistemas Setoriais de Inovação..................................................... 36
Box 3.1. Embrapa Agroenergia.......................................................................................................... 142
Box 3.2. O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE)........................... 145
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 2.1. Licenciamento de veículos novos a etanol no Brasil entre os anos 1975 – 2015 ......... 90
Gráfico 2.2. Participação de fornecedores e produtores próprios na
produção brasileira de cana-de-açúcar, 1948/49 -2014/15 ................................................................ 94
Gráfico 2.3. Distribuição do ATR por produto final (açúcar e etanol), entre as safras de 1948/49-
2015/16 ............................................................................................................................................ 101
Gráfico 2.4. Importação e exportação brasileira de etanol em metros cúbicos, entre 1989 a 2015. 107
Gráfico 2.5. Preço médio do petróleo importado - 2000-2015 (US$/b FOB) .................................. 110
Gráfico 2.6. Implantação e fechamentos de usinas no Brasil entre 2005 a 2015.............................. 119
Gráfico 2.7. Consumo de combustível no Brasil entre 2001 – 2015 (m³)......................................... 121
Gráfico 2.8. Histórico de licenciamentos de veículos por combustível (2004-2016) ...................... 122
Gráfico 2.9. Distribuição por Estado das usinas de cana-de-açúcar em 2016. ............................... 124
Gráfico 2.10. Número de fusões e aquisições ocorridas no setor sucroalcooleiro entre 1995 a
2009. ............................................................................................................................. ..................... 125
LISTA DE QUADROS Quadro 1.1. Modos de inovação e padrões de inovação................................................................... 46
Quadro 1.2 Dificuldades tecnológicas ainda não superadas no etanol celulósico............................ 57
Quadro 1.3. Categoria e tipologia da abordagem de SSI.................................................................. 62
Quadro 1.4. Entrevistas e códigos................................................................................................... 64
Quadro 1.5. Eventos setoriais, visita técnica e códigos................................................................... 64
Quadro 1.6. Bases de dados mais relevantes utilizadas na pesquisa até out./ 2016. 65
Quadro 1.7. Equação de busca para Base da legislação Federal ............................................ 67
Quadro 1.8. Equação de busca para artigos científicos – Scopus ......................................... 74
Quadro 2.1. Medidas Federais que promovem o fortalecimento da capacidade produtiva e a
ampliação do consumo do etanol (2000-2016) ....................................................................... 111
Quadro 2.2. Presença estrangeira na produção de açúcar, etanol e bioeletricidade no Brasil 128
Quadro 3.1. Políticas Federais que promovem o fortalecimento das ações em Ciência e
Tecnologia no SSI da cana-de-açúcar................................................................................................ 139
Quadro 3.2. Projetos relacionados diretamente com o etanol celulósico financiados pela FINEP
anteriores ao PAISS Industrial........................................................................................................... 148
Quadro 3.3. Medidas no âmbito do Estado de São Paulo que fortalecem a Ciência e a Tecnologia
ligadas ao SSI da cana-de-açúcar....................................................................................................... 152
Quadro 3.4. Detalhes dos projetos desenvolvidos nos programas: PITE e PIPE relacionados ao
setor sucroenergético no período de 1997 a 2016.............................................................................. 153
Quadro 3.5. Linhas temáticas do PAISS Industrial.......................................................................... 160
Quadro 3.6. Empresas com planos de negócio selecionados no PAISS Industrial - 2011.............. 165
Quadro 3.7. Ações internacionais de estímulo ao desenvolvimento do etanol celulósico............ 173
Quadro 5.1. Os principais atores na trajetória do etanol celulósico – quem é quem? ..................... 223
Quadro 5.2. Ações de destaque do CTC em P&D ........................................................................... 257
Quadro 5.3. Parcerias estratégicas e cooperação do CTC por etapas da tecnologia de etanol
celulósico, entre 2007 - 2017. ............................................................................................................ 261
Quadro 5.4. Estrutura e áreas de atuação da GranBio. ..................................................................... 264
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ANP Agência Nacional de Petróleo Gás Natural e Biocombustíveis
ABDI Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial
ABIMAQ Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos
ANFAVEA Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores
APL Arranjo Produtivo Local
APTA Agência Paulista de Tecnologia do Agronegócio
BEM Balanço Energético Nacional
BIOEN Programa de Pesquisa em Bioenergia da FAPESP
BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
BP British Petroleum
BTL Biomass To Liquid
C&T Ciência & Tecnologia
C5 Açúcar de 5 carbonos
C6 Açúcar de 6 carbonos
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CBP Consolidated Bioprocessing
CENAL Comissão Executiva Nacional do Álcool
CEPAL Comissão Econômica para América Latina e Caribe
CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos
CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos
CIDE Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico
CIDE Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico
CIMA Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool
CNAE Classificação Nacional de Atividades Econômicas
CNAL Conselho Nacional do Álcool
CNDI Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial
CNPE Conselho Nacional de Política Energética
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
COP21 Conferência das Partes de Paris
CT&I Ciência, Tecnologia & Inovação
CTBE Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol
CTC Centro de Tecnologia Canavieira
CTNBIO Comissão Técnica Nacional de Biossegurança
CTS Ciência, Tecnologia e Sociedade.
DHR Dedini Hidrólise Rápida
DUI Learning by Doing, Learning by Using e Learning by Interacting
E1G Etanol de primeira geração
E2G Etanol de segunda geração
EECC Estação Experimental de Cana de Campos
EECP Estação Experimental da Cana de Piracicaba
EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
ENCTI Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação
EP European Patent Office
EPA Agência de Proteção Ambiental dos EUA
EPE Empresa de Planejamento Energético
ETECs Escola Técnica Estadual de São Paulo
F&A Fusões & Aquisições
FAPEMIG Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais
FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
FAPESPA Fundação Amazônia Paraense de Amparo à Pesquisa
FATEC Faculdade de Tecnologia de São Paulo
FINEP Financiadora de Estudos e Projetos
IAA Instituto do Açúcar e Álcool
IAC Instituto Agronômico de Campinas
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICTs Instituições de Ciência e Tecnologia
IDE Investimento Direto Estrangeiro
IEA International Energy Agency
INOVAs Programas de Apoio a Inovação em Cooperação BNDES-FINEP
INPI Instituto Nacional de Propriedade Industrial
IPCC Intergovernmental Panel on Climate Change
IPCs Classificação Internacional de Patentes
IPI Imposto sobre Produtos Industrializados
IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo
MAPA Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
MCTI Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação
MDCI Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
MDIC Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio Exterior
MTE Ministério do Trabalho e Emprego
OECD Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OGM Organismos Geneticamente Modificados
P&D Pesquisa e Desenvolvimento
PACTI Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação
PAISS Plano BNDES-FINEP de Apoio à Inovação dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico
PCT Cooperação em Matéria de Patentes
PD&I. Pesqueisa, Desenvolvimento e Inovação
PDP Política de Desenvolvimento Produtivo
PED Plano Decenal de Expansão de Energia
PIB Produto Interno Bruto
PINTEC Pesquisa de Inovação Tecnológica
PINTEC Pesquisa de Inovação
PIPE Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas da FAPESP
PITCE Política industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior
PITE Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica
PLANALSUCAR Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar
PNA Plano Nacional de Agroenergia
PPA O Plano Plurianual
PROALCOOL Programa Nacional do Álcool
PRORENOVA Programa Apoio à Renovação e Implantação de Novos Canaviais
RAIS Relação Anual de Informações Sociais
RIDESA Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do setor Sucroenergético
SECEX Secretaria de Comércio Exterior
SHCF Separate Hydrolysis and Co-Fermentation
SHF Separate Hydrolysis and Fermentation
SNI Sistema Nacional de Inovação
SSCF Simultaneous Saccharification and CoFermentation
SSF Simultaneous Saccharification and Fermentation
SSI Sistema Setorial de Inovação
STI Learning by Science, Technology and Innovation
TCD Toneladas de Cana por Dia
TICs Tecnologias de Informação e Comunicação
TPDP Technology-Push-Demand-Pull
TRL Technology readiness levels
UFAL Universidade Federal de Alagoas
UFPR Universidade Federal do Paraná
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFRPE Universidade Federal Rural de Pernambuco
UFRRJ Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
UFSC Universidade Federal de Santa Catarina
UFSCAR Universidade Federal de São Carlos
UNB Universidade Federal de Brasília
UNCTAD United Nations Conference on Trade and Development
UNESP Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"
UNICA União da Indústria de Cana-de-Açúcar
UNICAMP Universidade Estadual de Campinas
USP Universidade de São Paulo
VTI Valor de Transformação Industrial
WO World Intellectual Property Organization
1G Primeira Geração
2G Segunda Geração
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................... 19
CAPÍTULO 1. Abordagem teórica e metodológica para alinhamento da
tese: Sistema Setorial de Inovação e Modos de Inovação................................... 34
1.1. Sistema Setorial de Inovação e a heterogeneidade da estrutura econômica..... 35
1.1.1. O desenvolvimento setorial e o processo de inovação................................... 43
1.2. Definições do “desafio tecnológico”: o etanol celulósico ............................... 50
1.2.1. A tecnologia de produção do etanol (E1G) ................................................... 52
1.2.2. A tecnologia de produção do etanol (E2G) .................................................. 54
1.3. A abordagem metodológica subjacente à análise de Sistemas de Inovação..... 59
1.3.1. Procedimentos metodológicos e ações para estruturação da pesquisa .......... 63
1.3.1.1. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 2 ............... 66
1.3.1.2. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 3................ 71
1.3.1.3. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 4................. 72
1.3.1.4. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 5................. 79
1.4. Considerações finais do capítulo 1........................................................... 81
CAPÍTULO 2. Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil:
evolução e transformações recentes ........................................................... 83
2.1. Gênese e evolução do Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar no
Brasil .......................................................................................................... 84
2.1.1. Gênese e estruturação dos modos de inovação do SSI da cana-de-açúcar no
Brasil ........................................................................................................... 92
2.1.2. Expansão e estabelecimento da produção sucroalcooleira (1930-1990)...... 99
2.2. Mudanças no ambiente de seleção e busca do etanol brasileiro (2000-
2016) ........................................................................................................................ 108
2.2.1. Dimensões econômica e territorial do SSI da cana-de-açúcar .................... 122
2.2.2. Reconfiguração do capital no SSI da cana-de-açúcar: novos atores ........... 125
2.3. Considerações finais do capítulo 2 ............................................................. 129
CAPÍTULO 3. Políticas públicas e o desenvolvimento do etanol celulósico no
Brasil ...................................................................................................................... 132
3.1. Políticas públicas para o setor sucroenergético brasileiro: adensamento da
ciência e da tecnologia ligada ao etanol................................................................... 134
3.1.1. Instrumentos que estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou do
aprendizado tecnológico........................................................................................... 141
3.1.2. Ações do Estado de São Paulo em relação ao estímulo à C&T e ao
aprendizado tecnológico do SSI da cana-de-açúcar (2000 – 2016)......................... 150
3.2. Políticas públicas para o etanol celulósico no Brasil: PAISS Industrial e
PAISS Agrícola........................................................................................................ 156
3.2.1. PAISS Industrial e o start do etanol celulósico no Brasil............................... 158
3.2.2. PAISS Agrícola adensamento das atividades voltadas à C&T e ao
aprendizado tecnológico do SSI da cana-de-açúcar................................................. 176
3.3. Considerações finais do capítulo 3.................................................................... 178
CAPÍTULO 4. A dinâmica do conhecimento e da base tecnológica do etanol
celulósico: considerações a partir dos artigos científicos e das famílias de
patentes ................................................................................................................... 180
4.1. Domínio tecnológico do etanol celulósico...................................................... 182
4.2. A dinâmica do conhecimento e da tecnologia do etanol celulósico: evolução
e distribuição geográfica do esforço de desenvolvimento........................................
188
4.3. Os principais atores do etanol celulósico: firmas e instituições de ensino e
pesquisa.................................................................................................................... 199
4.3.1. Competências tecnológicas no Brasil e dos atores nacionais: um olhar
sobre os Clusters tecnológicos em formação (etanol celulósico)............................ 207
4.4. Considerações finais do capítulo 4.................................................................. 215
CAPÍTULO 5: Tecnologia do etanol celulósico no Brasil: as ações dos atores
e suas interações...................................................................................................... 218
5.1. Os principais atores do SSI da cana-de-açúcar na trajetória do etanol
celulósico: visão geral ............................................................................................ 221
5.2. A dinâmica dos projetos industriais de etanol celulósico no Brasil................. 228
5.2.1. Iniciativas Pioneiras na trajetória do etanol celulósico: anos 1980 ............... 228
5.2.2. Iniciativas Incipientes .................................................................................... 233
5.2.3. Iniciativas Exploratórias................................................................................ 238
5.2.3.1. A Iniciativa da Petrobras/Cenpes .............................................................. 249
5.2.4. Iniciativas Estruturadas: desenvolvimento e adoção da tecnologia de etanol
celulósico no Brasil ....................................................................................... 255
5.2.4.1. Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) ................................................... 255
5.2.4.2. GranBio ...................................................................................................... 262
5.2.4.3. Raízen ........................................................................................................ 274
5.3. Considerações finais do capítulo 5 ......................................................... 281
CONCLUSÕES .................................................................................................... 285
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................. 286
APÊNDICE 1 ....................................................................................................... 312
19
INTRODUÇÃO
O setor sucroenergético1 brasileiro é um importante segmento econômico no plano
nacional, com alta capilaridade no território, presente em 1.040 municípios2 e responsável
pela geração de 567.690 vínculos formais de emprego direto em 20143. Desenvolveu-se ao
longo dos anos a partir de sistemáticas iniciativas dos produtores e, principalmente, por meio
da ação coordenadora do Estado brasileiro, configurando-se como uma importante fonte de
energia renovável alternativa para a dependência externa dos derivados dos combustíveis
fósseis e, na sequência, contribui com a redução das emissões dos gases de efeito estufa.
A produção sucroalcooleira do Brasil, além da sua evidente função econômica, figura
como opção técnica dentro do quadro analítico das Novas Fontes Renováveis (NFRs)4. Ou
melhor, a produção de combustível líquido e energia elétrica renovável por meio dos
potenciais da biomassa, proporciona ao setor um caráter mais amplo e estratégico, sendo
relevante para o setor agrícola e para o setor energético. A contribuição do setor
sucroalcooleiro para a matriz energética do Brasil foi de 49.232 10³ (tonelada equivalente de
petróleo) em 2014, o que representou 18,1 % da Produção de Energia Primária do país (EPE,
2015).
O advento da tecnologia de produção do etanol celulósico (etanol de segunda geração
ou E2G) maximiza o uso energético e econômico da cana-de-açúcar e inaugura uma nova fase
do desenvolvimento técnico da usina de cana-de-açúcar no Brasil. A tecnologia do etanol
celulósico proporciona a utilização quase completa da biomassa por intermédio de processos
físico-químicos que visam ter acesso aos açúcares contidos na celulose.
A técnica consiste em aproveitar os açúcares nas moléculas da sacarose que estão
protegidas por uma “espessa” camada de fibras. Para que este processo se complete, a técnica
1 Ao longo do trabalho utilizam-se os termos: açucareiro, sucroalcooleiro e sucroenergético como sinônimos para
agroindústria processadora de cana-de-açúcar do Brasil. Tais termos são ligados aos produtos provenientes desse
segmento econômico (açúcar, etanol e eletricidade). A denominação do setor se altera ao longo da história,
condizente com o papel que este assume no cenário nacional - exportador de commodities; oferta de
biocombustíveis e substituição da gasolina importada e; segmento constituinte da matriz energética nacional. 2 LEMOS et al., 2014
3 O número de vínculos formais de emprego formal atribuídos ao setor sucroalcooleiro foi obtido a partir de a
Relação Anual de Informações Sociais (RAIS/ MTE), a partir da soma da CNAE 2.0 Classes (Classificação
Nacional de Atividades Econômicas), a saber: (1130) Cultivo de cana-de-açúcar; (10.71-6) Fabricação de açúcar
em bruto; (10.72-4) Fabricação de açúcar refinado; e (19.31-4) Fabricação de álcool. 4 FORAY & GRUBLER (1996); ELLIOT (2000); UNRUH (2006); GOLDEMBERG (2006) WALZ et al
(2008); entre outros.
20
baseada na hidrólise5 ou na gaseificação
6 deve quebrar as cadeias de polissacarídeos que
unem as moléculas da parede celular das plantas (LEITE & LEAL, 2007).
Ademais, os desdobramentos dessa tecnologia abrem espaço para o desenvolvimento
da química verde, visto que as unidades processadoras de biomassa podem ampliar suas
economias de escopo indo além da produção de açúcar, etanol e energia elétrica, podendo
também atuar na produção de outros compostos químicos substitutos dos hidrocarbonetos de
origem fóssil. O desenvolvimento da tecnologia de etanol de segunda geração se faz
necessário diante das limitações impostas pela produção de etanol de primeira geração, a qual
não é capaz de avançar na exploração completa de toda a biomassa, incluindo a palha e o
bagaço da cana-de-açúcar.
O etanol celulósico é puxado tanto pela oferta de tecnologia como pelas demandas do
século XXI, ou seja, o progresso técnico no beneficiamento dos materiais lignocelulósicos –
tecnologias oriundas da Engenharia Química, Bioquímica, Genética ou da Biologia Molecular
- possibilita explorar de maneira integral os potenciais da biomassa, dando origem a novos
processos, novos produtos e a criação de novos nichos econômicos. Do outro lado,
sustentando os esforços nessa nova trajetória tecnológica, está a “urgência” da construção de
uma nova economia, amigável ao meio ambiente e com maior racionalidade econômico-
ambiental, estruturas econômicas adaptadas às condições naturais e sociais dos territórios
(VASCONCELLOS & BAUTISTA VIDAL, 1998; MAYERHOFF et al. 2006; CARDONA
et al., 2010; DANTAS et al., 2013; MAZZUCATO, 2013; GUSTAFSSON et al., 2014).
Somam-se a isso, três outros motivadores que instam o desenvolvimento dessa
tecnologia no Brasil: 1) ampliar a produtividade e a produção da cadeia produtiva do etanol;
2) diminuir o exclusivismo dos derivados de petróleo no abastecimento da frota rodoviária e
ampliar a diversificação dos insumos para a cadeia produtiva da indústria química; e 3) criar
um destino rentável para parte dos “resíduos” da produção do etanol de primeira geração.
Na cultura da cana, a energia está distribuída da seguinte forma: 31,4% em sacarose,
34,7% no bagaço e 33,8% nas pontas e nas folhas (SAFATLE, 2011; GOLDEMBERG,
2006). Logo, o desenvolvimento de tecnologias que convertam materiais lignocelulósicos em
5 Hidrólise é uma reação orgânica e inorgânica em que água efetua uma dupla troca com outros compostos. A
palavra hidrólise significa decomposição pela água, mas geralmente a água por si só não atinge uma hidrólise
completa, para isso é necessário imprimir altas temperaturas e pressões elevadas e/ou a adição de agentes
aceleradores, tais como os ácidos e as enzimas (HIJAZIN et al., 2010). 6 O processo de gaseificação consiste em uma série de reações físico-químicas, transformando os sólidos em uma
mistura de gases, o gás de síntese (CORAL, 2009).
21
biocombustíveis ou em outros produtos é de grande importância para a continuidade do
programa bioenergético brasileiro. Destaca-se que esta tecnologia tem o potencial de elevar a
produção do biocombustível sem aumentar a área plantada de cana-de-açúcar utilizando-se do
bagaço e folhas da planta. Com isso, possibilita diminuir a pressão para a expansão da área
plantada, amenizando em última instância os conflitos por terra.
O etanol de segunda geração prenuncia um novo desenvolvimento estrutural da
indústria sucroalcooleira, potencializando a sua relevância setorial. Esta nova realidade é
impulsionada pela mudança técnica da exploração do material lignocelulósico que compõe a
estrutura vegetal da cana-de-açúcar. Como desdobramento, o setor passa a ser ainda mais
decisivo no plano nacional, sobretudo, para o avanço das opções técnicas-econômicas-
ambientais alternativas às fontes tradicionais (fóssil e nuclear), posicionando-o justamente na
difícil tarefa de propor soluções aos desafios impostos pelo lock-in do carbono7 (UNRUH,
2000).
Em conformidade com este cenário, o setor sucroalcooleiro brasileiro vivencia, em
especial a partir dos anos 2000, um intenso processo de reestruturação técnico-econômica,
caracterizado por: 1) acelerada expansão geográfica para novas áreas de cultivo e
processamento da cana-de-açúcar; 2) concentração e centralização do capital no setor e; 3)
entrada de novos atores, principalmente do capital estrangeiro; 4) retomada da implementação
de medidas institucionais relacionadas ao setor; 5) esforço de aprendizagem em novas bases
de conhecimento atreladas ao E2G. Esses aspectos prenunciam alterações nas características
históricas na produção de etanol de primeira geração e do açúcar.
Destaca-se que ao longo da pesquisa que originou esta tese, foram mobilizados
esforços em caracterizar estes cinco aspectos da reestruturação técnico-econômica. Entretanto,
os três primeiros pontos aparecem apenas como sustentação da problemática central da
pesquisa, sendo que o processo de mudanças que converge para a consolidação da rota
tecnológica do etanol de segunda geração, assim como o processo social que é então
desvelado, constitui o recorte analítico da pesquisa.
7 Carbon lock-in refere-se à inércia criada e perpetuada pelo sistema sócio-técnico de energia baseada nos
hidrocarbonetos fósseis, o qual inibe esforços públicos e privados para introduzir tecnologias de energia
alternativa. Tal perspectiva é muito empregada para compreender as barreiras da mudança de infraestrutura e de
arcabouço institucional relacionadas ao setor energético..
22
Diante deste quadro, a pergunta central da tese é: Quais são os atores/elementos do
Sistema Setorial de Inovação (SSI) da cana-de-açúcar do Brasil que promovem o progresso
técnico do setor em direção ao domínio da tecnologia do etanol celulósico?
A partir desta indagação, desdobram-se diversos outros questionamentos tais como:
Quais são os drives que impulsionam a busca pelo etanol celulósico? Quais são as barreiras
que ainda devem ser superadas para o avanço deste mercado? Como o arcabouço
institucional contribui (ou não) para o desenvolvimento da rota do etanol celulósico? Quais
foram as adequações no campo de política pública para suportar/apoiar/impulsionar esta
nova tecnologia? Como interagem os diversos atores do SSI no que tange o etanol
celulósico? Quais são as diferenças entre os projetos industriais de etanol celulósico no
Brasil? Existe desenvolvimento endógeno de tecnologia para a produção de etanol
celulósico? Quais capacidades o SSI da cana-de-açúcar brasileiro desenvolve neste
processo?
Tais questões orientam a investigação feita nesta tese, a qual expõe e analisa as
características do avanço tecnológico do setor sucroalcooleiro do Brasil, dando ênfase ao
processo inovativo do etanol de segunda geração. Procura-se traçar um panorama atual do
setor, identificando sua configuração, seus principais atores e os processos de ruptura
advindos desta nova rota tecnológica. Com isso, busca-se compreender como o Brasil se
posiciona em relação ao desenvolvimento da rota tecnológica do etanol celulósico e em que
medida o Brasil apresenta (ou não) protagonismo nessa corrida tecnológica.
O argumento desenvolvido nesta tese indica que neste processo de introdução da
tecnologia do etanol celulósico, reside uma ruptura de rota tecnológica, exigindo alterações
nos padrões de aprendizagem das firmas, que tradicionalmente caracterizavam-se por
inovações incrementais (learning by doing, learning by using e learning by interacting)8. Esta
pesquisa argumenta que o setor sucroalcooleiro caminha rumo a uma descontinuidade que
implica um modelo de inovação mais forte e completo de learning by Science, Technology
and Innovation.
Entretanto, esse caminho não é fluido e exige esforços internos das organizações
ligados à transformação da biomassa, bem como, do arranjo institucional. É justamente esse
movimento que é investigado por esta pesquisa, pontuando as características deste processo
que é marcado por avanços e manutenção das suas contradições, pois ao passo que o SSI da
8 Trabalhos que identificam essas características: Varricho (2012); Andersen (2011), Furtado et al, (2011) Harari
(2010) e CGEE ( 2009).
23
cana-de-açúcar adentra a rota tecnológica do etanol celulósico, este o faz incorporando
tecnologia estrangeira e de maneira pontual. Tal situação reflete sua fragilidade em relação às
inovações baseadas no conhecimento científico, mas, por outro lado, é um esboço de uma
reação, visto que a reboque destes esforços iniciais cria-se um conjunto de elementos, de
atores e de infraestrutura propícia ao desenvolvimento futuro. A tese analisa e evidencia essa
condição, tão própria de nações periféricas.
Como indicam os trabalhos de Joseph (2009), Furtado (2014), Ribeiro & Albuquerque
(2015), entre tantos outros, o principal desafio para o setor e para as nações periféricas
consiste em aproveitar as “janelas de oportunidades” a partir da produção endógena de
tecnologia. Assim, supera-se a condição estrutural de importadores e dependentes de
tecnologia estrangeira, com capacidade para promover o desenvolvimento tecnológico, social
e econômico.
Objetivos da pesquisa
É na transição da primeira geração para a segunda geração que se encontra o escopo
da pesquisa. O objetivo central deste estudo é identificar, caracterizar e analisar esse
processo, pois ao passo que o Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar evolui, este se
altera em termos de sua forma e do seu conteúdo. Com isso, o foco recai na compreensão da
reconfiguração do regime tecnológico, analisando a introdução da tecnologia de segunda
geração, de forma a compreender como esse esforço de desenvolvimento tecnológico rebate
na estrutura da indústria e reconfigura o Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar.
Os objetivos específicos relacionados abaixo foram estabelecidos com a intenção de
dar sustentação e esclarecimento à questão principal da pesquisa e conduzem a estruturação
dos capítulos da tese, a saber:
1. Apresentar a abordagem de Sistema Setorial de Inovação (focusing device),
atrelando-a com a compreensão da heterogeneidade estrutural dos países periféricos,
possibilitando a construção de uma base teórica e metodológica para o desenvolvimento da
tese (articulação entre o conceito de SSI e objeto de estudo);
2. Caracterizar o processo histórico de formação do SSI da cana-de-açúcar do
Brasil, pontuando as especificidades da atividade inovativa, proporcionando uma base
comparativa para a identificação das mudanças trazidas no bojo da introdução da tecnologia
do etanol celulósico;
24
3. Identificar qual é o papel desempenhado pelas políticas públicas de promoção
da inovação no setor, e como estas ampliam (ou não) a possibilidade do desenvolvimento
tecnológico voltado ao aproveitamento total da biomassa da cana-de-açúcar;
4. Expor a dinâmica tecnológica do etanol celulósico, trabalhando as bases do
conhecimento e da tecnologia que sustentam o novo processo produtivo, bem como
identificando os atores que conduzem o processo de inovação (exercício de vigilância
tecnológica);
5. Compreender as ações das firmas envolvidas com o desenvolvimento e
adaptação da tecnologia do etanol celulósico no Brasil, evidenciando as relações que estas
estabelecem com outros atores do SSI da cana-de-açúcar;
Hipótese e relevância da pesquisa
A característica disruptiva do etanol celulósico induz de maneira imperativa uma
mudança no modo de inovação do setor sucroalcooleiro, principalmente na fase industrial9. O
etanol celulósico altera a base de conhecimento requerida para a inovação, ou seja, novas
informações e competências devem ser arregimentadas pelas firmas para transformar os seus
recursos internos, tornando-os capazes de ampliar a exploração da biomassa da cana-de-
açúcar.
A hipótese de pesquisa é que as mudanças exigidas pela tecnologia do etanol
celulósico alteram a base de conhecimento na fase industrial do setor sucroalcooleiro,
forçando um deslocamento do exclusivismo DUI-mode (learning by doing, learning by using
e learning by interacting) para um padrão intermediário, visando o STI-mode (learning by
Science, Technology and Innovation). Concomitantemente, este movimento resulta: HI) na
ampliação da dependência tecnológica do SSI da cana-de-açúcar e; HII) na redefinição dos
atores do SSI da cana-de-açúcar na fase industrial10
.
Os elementos necessários para estruturação da produção de etanol de segunda geração
estão em outro nível, diferenciando-se da trajetória traçada pelo etanol de primeira geração.
Portanto, as hipóteses são confirmadas ou refutadas por meio da análise das ações dos
9 Os Trabalhos do CGEE (2009), Varricho (2012), Valente et al. (2012) e Furtado (2014) fazem referência à
existência de duas grandes “etapas” no processo produtivo dos derivados da cana-de-açúcar. 10
A tese apresenta uma hipótese principal, a qual é auto-referenciada pela dinâmica tecnológica, assim, se
desdobra em duas sub afirmações, as quais são confirmadas/refutadas à medida que se responde a questão
principal da pesquisa: “Quais são os atores/elementos do SSI da cana-de-açúcar que promovem o progresso
técnico em direção ao domínio da tecnologia do etanol celulósico”. Acrescenta-se que as hipóteses (HI e HII) não
são concorrentes, estas são consequência da dinâmica imposta pela tecnologia de conversão da biomassa.
25
principais atores do SSI da cana-de-açúcar, os quais figuram como agentes catalisadores deste
processo em curso – o desenvolvimento e a introdução da tecnologia industrial do etanol
celulósico.
Esta nova realidade deriva da “necessidade” de superar o desafio tecnológico do
aproveitamento integral da biomassa da cana-de-açúcar11
, ou seja, desenvolver meios para
ampliar a exploração dos potenciais energéticos da biomassa. Segundo Ericsson et al. (2004);
Negro et al. (2007); Vieira (2008); Suurs & Hekkert (2009); CGEE (2009); Nyko et al.
(2010), Rosa et al. (2010) e Hellsmark & Jacobsson (2012) e, também, pautando-se nas
experiências de sucesso de alguns países europeus (Finlândia e Suécia12
), pode-se afirmar que
o desafio para o setor é o desenvolvimento de tecnologias e de processos que ampliem a
exploração do potencial existente nessa matéria-prima. E, ao fazer isso, reorienta a rota
tecnológica do setor, pois o conhecimento e as tecnologias que são a base da nova trajetória,
são de natureza distinta e mais complexas13
.
A direção do desenvolvimento da rota tecnológica aponta para a ampliação da
eficiência da transformação dos açúcares contidos na biomassa, tanto do caldo como do
material lignocelulósico. Para isso, novos conhecimentos e novas competências devem ser
empregados, tais como a engenharia genética, a biotecnologia, a química orgânica fina, a
química macromolecular e polímeros, a automação e outras. Estas se traduzem em novas
variedades de cana-de-açúcar e melhores práticas agrícolas e, principalmente, em novos e
melhorados processos de pré-tratamento, hidrólise e de fermentação, onde micro-organismos
são empregados como meios de produção.
O deslocamento do DUI-mode para o STI-mode se coloca como uma condição para o
desenvolvimento endógeno do etanol celulósico, pois as competências requeridas estão em
outro patamar, fora da rota normal construída pelo SSI da cana-de-açúcar ao longo dos
últimos 100 anos. Isso fica evidente com a contribuição de trabalhos recentes que,
especificamente, abordaram o papel das empresas de bens de capital do setor sucroalcooleiro
e da própria capacidade inovadora das usinas, a saber: Negri (2010); Liboni & Toneto Jr.
(2008); Valente (2012); Varricho (2012); Oliveira Filho (2013). Tais estudos indicam que as
11
Tal objetivo não é novo; essa pretensão sempre esteve no horizonte do setor, entretanto, só agora com o
avanço tecnológico proeminente dos combustíveis de segunda geração que essa fronteira fica mais próxima. 12
Finlândia e Suécia representam casos de sucesso de exploração energética da biomassa, com indústrias de base
florestal bem desenvolvidas, tanto no setor de papel e celulose como madeireira em geral. 13
O capítulo 4 e 5 demonstram este movimento de maneira mais clara pautando-se em dados de patentes e nas
informações obtidas nos trabalhos de campo.
26
capacidades construídas por meio do DUI-mode estão aquém das necessárias para conduzir o
processo de desenvolvimento tecnológico desta nova fase de desenvolvimento da
agroindústria canavieira e da consolidação da biorrefinaria de cana-de-açúcar.
Historicamente, as alterações técnicas e a difusão de tecnologias na fase industrial da
produção sucroalcooleira foram dadas pela ação produtiva das empresas de bens de capital
ligadas ao setor. Mas, diante dos novos desafios tecnológicos, tem-se a impressão de que este
importante setor não apresenta as condições necessárias para imprimir esforços de
aprendizagem fora da sua base de conhecimento tradicional (VARRICHO, 2012; FURTADO,
2013), sendo necessário ampliar a escala de análise, para identificar os principais responsáveis
pelo progresso técnico do setor14
.
Nessas condições, se justifica a abordagem de Sistema Setoriais de Inovação, a qual
permite compreender as relações das firmas com outros atores (tradicionais e novos), relações
dadas tanto pela cooperação como pela concorrência, de mercado ou extra-mercado e,
principalmente, compreender qual é o papel do poder público nessa nova condição de
desenvolvimento setorial.
A forte alteração nos padrões da atividade inovativa reposiciona as dimensões de
busca e seleção do Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil. Porque a base
de conhecimento é díspar da até então estabelecida. Esta requer mais intensidade em ciência e
tecnologia, por sua vez, demanda e estabelece como condição para o seu desenvolvimento
futuro maiores dispêndios em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), criação de projetos de
cooperação entre firmas e entre firmas e instituições pesquisa. Essa dinâmica já é percebida
no corolário do desenvolvimento inicial do etanol celulósico no Brasil.
Portanto, os esforços empreendidos nesta tese concentram-se em estudar a emergência
de um novo regime tecnológico, analisando essa transição, da tecnologia de primeira geração
14 Tal questão pode ser controvérsa e merece maior cuidado, pois há estudos sobre a indústria de bens de capital
do setor sucroalcooleiro que apontam que seu desenvolvimento tecnológico viria a reboque das
inovações/invenções do CTC e do IAC, os quais estavam à frente dos projetos mais significativos nos anos 1980,
projetos como do reaproveitamento da vinhaça (MARIOTONI, 2004). Outros estudos afirmam que estas
indústrias são conservadoras e apresentam baixo dinamismo (VARRICHO, 2012). Mas a controvérsia reside na
abordagem histórica; se observarmos em um período maior de tempo, no qual tais empresas foram de
fundamental importância para elevar o nível tecnológico do setor, precisamente na passagem dos engenhos de
“fogo morno” para as usinas (na primeira metade do século XX) certamente esse caráter dinâmico pode ser
redimensionado (NEGRI, 2010). E, ainda, se observamos um conjunto de inovações incrementais feitas nos
períodos de expansão da produção do etanol podemos chegar a outras conclusões. A introdução constante de
melhoramentos foi de fundamental importância para redimensionar o tamanho e a escala de processamento das
usinas, por exemplo, saindo das antigas e “minúsculas” destilarias de cobre de 5 mil litros/dia para as destilarias
com potencial de produção de 30 mil litros/dia de aço carbono, depois para as de 60 mil litros/dia, feitas de aço
inox, chegando até os dias de hoje, nas destilarias de 1.200 mil litros/dia de aço inox (OLIVEIRA FILHO, 2013).
27
para a de segunda geração (ou, de uma nova rota tecnológica), fato que permite observar uma
mudança da estrutura da indústria da cana-de-açúcar em relação ao processo inovativo.
Esse esforço pode proporcionar uma contribuição à discussão da natureza
multissetorial da atividade econômica, ao passo que o desenvolvimento da nova tecnologia –
etanol 2G – busca desenvolver uma nova rota tecnológica a partir de conhecimentos e
competências que estão à margem dessa indústria. Identifica-se (pelo menos de início) uma
interação intersetorial e entre firmas de diferentes segmentos, logo, compreender a
reconfiguração tecnológica do setor sucroalcooleiro brasileiro pode mostrar pelo menos em
alguns aspectos essa dinâmica setorial. Tal perspectiva é colocada por Nelson (2007, p. 38)
como uma das áreas que se deve avançar na perspectiva dos estudos da economia
evolucionária. Malerba (2002, p. 248) coloca que a interação entre os setores constitui um
campo de interesse da perspectiva dos estudos da economia industrial, que pouco se tem feito
nessa direção; segundo este autor, é necessário discutir as interações entre os setores e os seus
limites, saindo da armadilha dos estudos estáticos da estrutura industrial15
.
Nesta perspectiva, a pesquisa desenvolveu-se na direção de caracterizar esse processo
e identificar como o processo de inovação nesses termos altera as condições históricas desse
setor e, a partir dessa situação, extrair informações e elementos para compreender a dinâmica
do progresso técnico nos países periféricos, ou identificar elementos que contribuam com a
compreensão do desenvolvimento de tecnologias na periferia do sistema.
A figura 1 ilustra esquematicamente o encadeamento das questões de pesquisa, dos
objetivos, da hipótese e a construção da própria pesquisa, já que cada objetivo específico dá
origem a um capítulo da tese, os quais trazem informações e análises capazes de responder às
questões levantadas nesta investigação.
Desta forma, a figura 1 pontua qual é o escopo do trabalho e posiciona-o em relação
ao amplo quadro da temática dos biocombustíveis de segunda geração, o qual envolve
diversas opções tecnológicas e feedstocks para a obtenção de energia e outros produtos16
.
Ademais, a figura 1 deixa claro que o recorte analítico é um alvo em movimento, pois foca
15
Malerba (2002; 2007) indica que é possível realizar estudos dinâmicos abordando apenas um setor. Para tal
considera fundamental abordar as reverberações intersetoriais, ou seja, as relações resultantes das interações
entre os atores e dos elementos que permeiam as fronteiras setoriais. Para o autor, são estas ações que promovem
a própria mudança setorial. 16
Cherubini et al. (2009) demonstra a existência concomitante de múltiplas configurações de biorrefinaria, desta
forma, é possível produzir uma variedade expressiva de produtos provenientes da exploração integral da
biomassa. Os principais produtos da biorrefinaria são: biodiesel, bioetanol, biometano, biocombustíveis
sintéticos, alimentos, alimentos animais, fertilizantes, glicerina, biomateriais, químicos (os building blocks),
polímeros e resinas, biohidrogênio. Esta característica fica evidente no capítulo 4.
28
nas ações dos atores em relação à mudança de rota tecnológica para obtenção do bioetanol a
partir da cana-de-açúcar, sendo esta situação uma fração do conjunto maior do
desenvolvimento da bioenergia. De tal maneira, a pesquisa promove a identificação das
características recentes do desenvolvimento do SSI da cana-de-açúcar do Brasil e, ao mesmo
tempo, contribui com a discussão sobre o avanço da bioenergia no país a partir de uma base
agroindustrial já estabelecida. Tal base apresenta possibilidades de reconfiguração técnica e
estrutural, passando a ser mais decisiva no conjunto econômico do país, pois fortalece a
tendência sustentável da matriz energética nacional e abre novos mercados (química verde e
biocombustíveis avançados).
29
Figura 1. Encadeamento entre as questões de pesquisa e os objetivos da tese.
Fonte: Elaboração própria.
30
A importância de um estudo acerca do desenvolvimento tecnológico do setor
sucroenergético é de fundamental importância para a compreensão da estrutura energética do
país, diversificada e mais interiorizada - menos dependente dos combustíveis fósseis - e no
seu sucessivo desenvolvimento, possibilita elaborar novas pesquisas e planos políticos deste
setor. Ademais, compreende-se que o setor em questão proporciona desenvolvimento
econômico a algumas regiões do país, sendo que o seu crescimento e a modernização da sua
produção induz transformações na sociedade, já que fomenta no seu conjunto uma ampla
quantidade e variedade de atividades econômicas correlatas através das suas inter-relações
(MORAES et al., 2016).
Abordagem metodológica
O ferramental analítico se apoia na análise do Sistema Setorial de Inovação, pois
possibilita trabalhar a inovação como um processo interativo entre uma grande variedade de
atores, enfatizando que as empresas não inovam isoladamente. Em outros termos, trabalha a
inovação como um processo coletivo. Portanto, buscou compreender como as empresas
interagem com outras empresas, bem como, com organizações não-empresariais para fazer
avançar a tecnologia, tendo como norte a exploração integral da biomassa (GUENNIFA &
RAMANI, 2012; JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009; OYELERAN-OYEYINKA &
RASIIAH, 2009; FREEMAN, 2008; MALERBA, 2007; MALERBA, 2002; LUNDVALL et
al., 2002; CARLSSON et al., 2002; MALERBA, 2003).
Nesta perspectiva, o ferramental analítico do SSI vai além do agregado e foca nas
particularidades que compõem a estrutura produtiva de uma nação, a partir das características
que compõem o setor, da identificação e compreensão dos agentes e das suas relações. O
conceito de SSI é útil para pensar as especializações econômicas dentro da heterogeneidade
estrutural que compõe a estrutura produtiva das nações (MALERBA, 2002), organizar as
evidências históricas e estudar os processos de catching-up17
dos países retardatários no que
diz respeito à acumulação de capacidades industriais (JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009;
OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH, 2009).
Metodologicamente, a abordagem de Sistema de Inovação - nacional/regional/setorial
- é compreendida como focusing device, tendo como objetivo analisar e compreender o
17
Este conceito é compreendido como efetivação e continuidade do esforço para superação do atraso econômico,
social ou tecnológico que um dado país/região/setor possa apresentar em relação aos países líderes ou em relação
à fronteira do conhecimento (FARIA, 2014).
31
processo de inovação, para além da dinâmica de alocação dos recursos (LUNDVALL et al.,
2009). Desta forma, explica a relação entre os agentes de diferentes origens, os quais em
conjunto desenvolvem e transmitem conhecimento economicamente útil. É uma alternativa
para compreender como as firmas e outras organizações adquirem novas habilidades e
competências (IIZUKA, 2013; ALBUQUERQUE et al., 2012).
A revisão conceitual dos Sistemas Setoriais de Inovação indica ser possível trabalhar
com a dimensão real do objeto, por intermédio da análise do concreto, priorizando o trabalho
empírico para caracterizar e compreender o setor em questão. Com isso, a construção da tese
adotou três procedimentos metodológicos, os quais caminham pari passu ao longo de todo o
trabalho, sendo utilizados à medida que se faz necessário confirmar suposições ou apresentar
argumentos válidos para sustentar as afirmações da pesquisa. Estes foram:
1) pesquisa bibliográfica;
2) trabalho de campo e entrevistas;
3) coleta e tratamento dos dados secundários.
Um detalhamento destas três estratégias investigativas está presente no primeiro
capítulo, o qual consiste em um capítulo teórico-metodológico, apresentando as bases
fundamentais da pesquisa.
Estrutura da tese
A pesquisa está organizada em cinco capítulos, além da presente introdução e da
conclusão final do trabalho. O primeiro capítulo coloca em evidência a discussão sobre
Sistemas Setoriais de Inovação (SSI) e inter-relaciona os principais conceitos e os processos
metodológicos utilizados pela pesquisa em cada momento do processo investigativo,
buscando compor uma visão integrada entre o conceito de SSI e o objeto de estudo. Esta
discussão busca dar base e contexto teórico para os próximos capítulos da pesquisa e, com
isso, proporciona a integração do trabalho com discussões mais gerais do campo de estudos da
Ciência, Tecnologia e Sociedade18
.
18
O estudo sobre o desenvolvimento do etanol celulósico no Brasil pode contribuir com discussões sobre: 1)
desenvolvimento e características dos Sistemas Setoriais de Inovação de países em desenvolvimento; 2) novas
tecnologias em países periféricos; 3) inovação em setores baseados em recursos naturais; 4) desenvolvimento da
economia de baixo carbono; 5) desenvolvimento da bioeconomia; 6) diversificação e adensamento de setores
tradicionais; entre outros temas.
32
O segundo capítulo tem a função de expor a gênese e a evolução da realidade
produtiva e inovativa do segmento sucroalcooleiro do Brasil. Isto se dá por meio da
reconstrução da trajetória de formação do Sistema Setorial em questão, apontando suas
características históricas e, principalmente, indicando o start da mudança em análise, ou seja,
o esforço da passagem da produção do etanol de primeira geração para o de segunda geração.
Assim, introduz o arcabouço institucional ligado ao segmento, bem como demonstra a sua
evolução ao longo do tempo, possibilitando uma noção geral e expondo os pontos de inflexão
que influenciam o redesenho do setor, os quais criaram condições para a estruturação da
produção do etanol no Brasil.
O terceiro capítulo tem por objetivo demonstrar a relevância das políticas públicas
para o fomento e o progresso das tecnologias disruptivas e/ou energias renováveis, pois
aponta a correlação das iniciativas nacionais de desenvolvimento tecnológico do etanol
celulósico com as políticas públicas implementadas na década de 2000, sendo estas medidas
institucionais decisivas para o start da produção do etanol de segunda geração. Desta forma, o
capítulo três apresenta quais são os designs destas políticas voltadas para o etanol 2G e indica
como estas ações institucionalizadas movimentaram e influenciaram o conjunto diferenciado
e importante de atores do SSI da cana-de-açúcar.
O quarto capítulo apresenta a dinâmica tecnológica do etanol celulósico, trabalhando
as bases do conhecimento e da tecnologia que sustentam o “novo” processo produtivo do
bioetanol, dando ênfase ao domínio tecnológico e aos atores que conduzem o processo de
inovação. A estruturação do capítulo quatro se dá especialmente pela análise de famílias de
patentes e de artigos científicos publicados internacionalmente. Por meio destes dados é
possível captar a dinâmica da tecnologia e do conhecimento ligada à exploração do material
lignocelulósico, dando contornos materiais e numéricos aos esforços de desenvolvimento ao
longo do tempo.
O quinto capítulo objetiva compreender as ações desempenhadas pelas firmas
envolvidas no processo de adoção e desenvolvimento da tecnologia do etanol celulósico no
Brasil. Para tanto, descreve e analisa a dinâmica dos mais importante atores que estiveram
e/ou ainda estão diretamente envolvidos com o processo de desenvolvimento, disseminação e
adaptação da tecnologia de etanol celulósico no Brasil. Portanto, é o capítulo responsável por
apresentar as ações e as interrelações das firmas responsáveis pelos primeiros projetos de
etanol celulósico no Brasil, com destaque para Petrobrás, CTC, GranBio e Raízen. Assim,
33
confrontam-se as principais variáveis do conceito de SSI (instituições, nova base de
conhecimento, atores e etc.) com os casos concretos existentes no setor sucroenergético.
.
34
CAPÍTULO 1. ABORDAGEM TEÓRICA E METODOLÓGICA PARA
ALINHAMENTO DA TESE: SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO E MODOS DE
INOVAÇÃO
O estudo setorial realizado por esta pesquisa se apoia na base teórica e conceitual da
abordagem de Sistemas de Inovação (FRERRMAN, 1985; LUNDVALL, 1985; FREEMAN,
1988; LUNDVALL, 1992; NELSON, 1993; MALERBA, 1999; MALERBA, 2002). Os
principais pontos dessa abordagem são aqui indicados, entretanto, outros elementos e
conceitos são trabalhados ao longo da tese, à medida que a análise sobre o setor
sucroenergético avança e se faz necessário dialogar com o plano teórico.
Nesta perspectiva, o primeiro capítulo apresenta função dupla: introduz a discussão
sobre Sistemas Setoriais de Inovação (SSI) e apresenta os conceitos e os processos
metodológicos utilizados por esta pesquisa. Esta discussão busca dar base e contexto teórico
para as próximas etapas da pesquisa. Portanto, coloca o SSI como focusing device19
,
atrelando-o como instrumento para a compreensão da heterogeneidade estrutural dos países
periféricos, possibilitando uma articulação entre o conceito de SSI e objeto de estudo, com
vista a responder a pergunta central da pesquisa, ou seja, quais são os atores/elementos do
Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar que promovem o progresso técnico do setor
em direção ao etanol celulósico?
Para isso, o capítulo 1 encontra-se dividido em quatro seções. A primeira (1.1.) busca
expor o arcabouço teórico e os principais conceitos na discussão de SSI e criar uma base
comum para apoiar os outros conceitos que aparecem no decorrer do trabalho. A segunda
seção (1.2.) apresenta as definições e as diferenças entre as tecnologias de produção do etanol
de primeira geração e de segunda geração, demarcando as particularidades das rotas e das
sub-rotas tecnológicas do etanol celulósico20
. A terceira seção (1.3.) versa sobre a abordagem
metodológica subjacente à análise de Sistemas de Inovação, ou seja, articula as categorias da
abordagem de SSI com os procedimentos metodológicos e ações para a estruturação da
pesquisa, assim, destina-se a mostrar como se deram as ações de pesquisa. A quarta e última
seção (1.4.) apresenta as considerações finais do capítulo, estabelecendo um link com o
segundo capítulo.
19
ROSENBERG (1969). 20
A intenção é demarcar a temática do etanol celulósico, dando um panorama da corrida tecnológica em curso –
“ambiente” tecnológico no qual os atores do SSI da cana-de-açúcar visam participar.
35
1.1. SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO E A HETEROGENEIDADE DA
ESTRUTURA ECONÔMICA
Os estudos setoriais são realizados há muito tempo, principalmente, na Economia
Industrial21
e na Geografia Industrial22
. Estas abordagens evoluíram de uma ênfase exclusiva
na identificação das diferenças entre os setores, considerando os limites setoriais estáticos,
para uma perspectiva mais complexa, buscando compreender as relações e a interdependência
setorial e, como estes segmentos se transformam alterando a sua própria forma e o seu
conteúdo, dando origem a novos estágios do desenvolvimento.
Nesta direção, a concepção de setor empregada por esta pesquisa é diferente da noção
de setor industrial, no qual as firmas são homogêneas e os produtos são indiferenciados,
distintos somente pelo preço. Parte-se da abordagem de Sistemas de Inovação (SI), onde
firmas e outras organizações são, em essência, agentes socioeconômicos com racionalidade
limitada, os quais buscam constantemente a interação e a complementaridade por processos
de comunicação, intercâmbio, cooperação, concorrência e comando (FREEMAN, 1982;
LUNDVALL, 1992; OYELERAN-OYEYINKA & RASIAH, 2009).
Adotar essa abordagem implica excluir os preceitos do mainstream, portanto,
compreende-se que os agentes econômicos não apresentam racionalidade perfeita, suas ações
não são sempre conduzidas para a maximização da sua posição ou dos seus lucros, pois os
comportamentos dos agentes dependem diretamente do contexto no qual estão inseridos, visto
que estes apresentam experiências acumuladas, motivações, crenças, objetivos e
oportunidades distintas (LUNDVALL, 1992; MALERBA & MANI, 2009). Todas estas
características estão diretamente relacionadas à cultura e a história do “local” de origem.
Ademais, no seu desenvolvimento, estes criam rotinas23
, ou seja, padrões de
comportamento que passam a conduzir as ações das firmas e das organizações, assim
estabelecendo trajetórias (NELSON & WINTER, 1982; DOSI, 1984).
A tendência geral ao equilíbrio, dada pela ideia de que as transações ocorrem sempre
em mercados puros e as relações são anônimas entre compradores e vendedores são
21
Diversas referências podem ser apontadas como bases indiretas do conceito de Sistemas Setoriais de Inovação,
entre elas têm-se os trabalhos de Alfred Marshall (1892) com o estudo da economia industrial, conceito de firma
e de clusters; Joe S. Bain (1956) com o desenvolvimento do Modelo de Estrutura-Conduta-Desempenho; Josef
Steindl (1952) com trabalhos sobre o funcionamento dos oligopólios. 22
Pierre George (1947); R. Guglielmo (1950). 23
São características persistentes dos organismos (as firmas). Estas rotinas determinam seu comportamento
possível frente à produção, à comercialização, às estratégias de gastos em P&D e muito mais. Embora o
comportamento real também seja influenciado pelo meio ambiente, o modo como a firma interage com o
ambiente/estrutura são aproximadamente coordenados pelas rotinas da firma (NELSON & WINTER, 1982).
36
suplantadas pela interpretação de Sistemas de Inovação. Estes princípios são relegados, visto
que a própria singularidade e comportamento particular dos agentes econômicos impede esta
situação no mundo real. Todos estes princípios são reposicionados pela Teoria Evolucionária
e abordagem de Sistemas de Inovações. Os elementos teóricos e conceituais expostos no box
1.1. compõem a base analítica desta pesquisa.
Box 1.1. Bases da abordagem de Sistemas Setoriais de Inovação. A concepção de Sistemas Setoriais de Inovação tem origem nos estudos sobre o desenvolvimento
econômico e a organização industrial, sendo influenciada concomitantemente por um conjunto amplo de
vertentes interpretativas, as quais podem ser agrupadas da seguinte forma: 1) estudos que buscam compreender o
processo de desenvolvimento, entendidos aqui como aqueles que abrangem a dinâmica da destruição criativa,
elemento que impõem uma transformação constante aos setores econômicos e a sociedade em geral, fato já
percebido e analisado pelos economistas clássicos, Smith (1776) e Marx (1867), posteriormente, é revisitada e
aprofundada por Schumpeter (1912), Dosi (1982) e outros; 2) pesquisas sobre a dinâmica industrial e distritos
industriais, os quais compreendem a importância das externalidades derivadas da trindade marshalliana (mão de
obra especializada, presença de fornecedores especializados e transbordamentos locais de conhecimento); 3)
Concepção que considera relevante a interação, a interdependência, o processo de aprendizado e a construção de
competências desempenhadas pelas firmas como fatores centrais da relação entre progresso técnico e
desenvolvimento econômico; principalmente, os trabalhos alinhados à abordagem da Teoria Evolucionaria; 4) a
abordagem de Sistemas Nacionais de Inovações, a qual remete aos trabalhos de Friedrich List (1841) e são
reposicionados pelas pesquisas de Christopher Freeman (1982) e Bengt-Åke Lundvall (1985); nesta linha de
interpretação, a inovação é resultado de um processo interativo entre uma grande variedade de atores, a firma
não inova sozinha, pois a inovação é um processo coletivo, um fenômeno que ocorre a partir da interações. Com
isso, a atenção passa a ser dada também para elementos que estão “fora” da firma (as instituições, as políticas
públicas, institutos de pesquisa, universidade etc.). (MALERBA, 2002, KIN, 2006, LUNDVALL, 2007;
MALERBA & MANI, 2009; MALERBA & NELSON, 2011).
Com isso, a concepção de Sistemas Setoriais de Inovação surge como uma alternativa para os modelos
de interpretações neoclássicas e, especificamente, no campo dos estudos da Ciência, Tecnologia e Sociedade
(CT&S), mostra-se como uma evolução à ideia de chain-linked model de Kline & Rosenberg (1986),
contribuindo com uma perspectiva histórica e interdisciplinar, integrando os processos de aprendizado e a
construção de competência como elementos analíticos na análise da dinâmica setorial (IIZUKA, 2013).
Em decorrência destes posicionamentos, utiliza-se o conceito/abordagem de Sistema
Setorial de Inovação (SSI), definido em linhas gerais como um conjunto de agentes
heterogênios que realizam interações intermediadas pelo mercado ou fora dele24
, com o
objetivo de gerar, adotar ou fazer uso de novas ou estabelecidas tecnologias visando à criação,
a produção e a utilização de novos ou já existentes produtos e processos pertencentes ao
segmento produtivo em questão (LUNDVALL, 1992; MALERBA, 1999; MALERBA, 2002;
MALERBA, 2003; JOSEPH, 2009). Com isso, o SSI apresenta uma base de conhecimento, de
insumos e uma demanda particular, própria da sua existência.
Os agentes são indivíduos e organizações, dispostos em vários níveis de agregação,
com processos de aprendizagem, competências e estrutura organizacional específica. Estes
24
Relações essencialmente não determinadas pelo preço, as quais podem ser observadas em diversas formas, por
exemplo, a cooperação na atividade de pesquisa ou o network pessoal dos trabalhadores e pesquisadores.
37
agentes são: 1) firmas; 2) institutos de pesquisa; 3) universidades; 4) agências e órgãos
governamentais; 5) associações de classe e patronais; 6) segmentos da sociedade civil
(stakeholders). Por conseguinte, estes agentes apresentam crenças, objetivos e
comportamentos próprios, suas relações são permeadas pela história e pela cultura do local,
assim, os processos desempenhados por estes agentes são enraizados no local. A união destas
características confere singularidade e especificidades aos setores econômicos (MALERBA,
2002; IIZUKA, 2013; ALBUQUERQUE et al, 2012).
Setores específicos demandam o desenvolvimento e a difusão do conhecimento
especializado, pois a estrutura das relações e o network criado pelos atores que compõem o
SSI é particular ao setor, por causa da multiplicidade da base de conhecimento e dos
processos de aprendizado que conformam as tecnologias e as demandas setoriais (JOSEPH,
2009). Essa realidade complexa é resultado da ampliação e diversificação das forças
produtivas, ou seja, da base material da organização social (COHEN, 2013).
Os SSI são abertos e evoluem, tornando-se sistemas complexos que englobam relações
internas às organizações e entre as organizações, instituições e a estrutura socioeconômica, as
quais determinam a taxa e a direção da inovação e da construção de capacidades
(LUNDVALL et al, 2009). Na abordagem do SSI foca-se nas relações entre os atores e as
fronteiras dos setores que se alteram ao longo do tempo, justamente, pela ação destes atores. É
uma visão multidimensional, integrada e dinâmica dos setores, buscando acompanhar a
evolução dos setores.
Desta forma, a abordagem permite interpretar, analisar e propor intervenções no nível
meso, fazendo necessariamente uma ponte entre o macro - formação social e econômica do
país25
– e o nível micro - dinâmica das firmas (JOSEPH, 2009; OYELERAN-OYEYINKA &
RASIIAH, 2009). Assim, supera o agregado e foca-se nas particularidades que compõem a
estrutura produtiva de uma nação, a partir das características que compõem o setor, da
identificação e compreensão dos agentes e das suas relações (MALERBA, 2002; JOSEPH,
2009; LUNDVALL, 2009; OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH, 2009).
O conceito de SSI é útil para pensar as especializações econômicas dentro da
heterogeneidade estrutural que compõe a estrutura produtiva das nações, organizar as
evidências históricas e estudar os processos de catch-up dos países retardatários no que diz
25
Quando nos referimos ao nível macro pensamos nas condições gerais que dizem respeito ao processo de
desenvolvimento das nações, com isso, o recorte está sobre a dinâmica do progresso técnico, ou seja,
incorporamos e identificamos características gerais do Sistema Nacional de Inovação.
38
respeito à acumulação de capacidades produtivas (JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009;
OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH, 2009). O setor sucroenergético brasileiro (mesmo
com todas as suas limitações26
) é um exemplo de construção de trajetória virtuosa, segmento
que além de produzir alimento e energia para o mercado interno, participa da pauta de
exportações do Brasil (commodities).
Este corolário interpretativo é utilizado para se aproximar da realidade produtiva e
inovativa do setor sucroalcooleiro do Brasil, buscando compreender sua organização, a
alteração da sua base de conhecimento em curso e os processos de construção de
competências desempenhadas pelos seus agentes, os quais procuram introduzir e desenvolver
novas tecnologias de exploração da biomassa da cana. Estas ações resultam na ampliação das
suas fronteiras setoriais e reposiciona as suas firmas em relação a novas demandas, como por
exemplo, o mercado de biocombustível de maior valor energético e menos impactos
ambientais (etanol celulósico, butanol, biodiesel etc.).
Ao sair do plano teórico e buscar a realidade material, percebe-se que o
desenvolvimento da base de técnica e de conhecimento dos setores são próprias das suas
funções e das suas características produtivas27
. Assim, mesmo com os seus agentes,
tecnologias e produtos se sobrepondo/justapondo a outras indústrias, as suas
questões/problemas são idiossincráticas, porque a natureza do mercado, o caminho da
inovação e a transformação do seu conteúdo e da sua função diferenciam-se
consideravelmente dependendo da composição das instituições e dos agentes que lhe
sustentam (OYELERAN-OYEYINK & RASHAH, 2009).
Com isso, a dinâmica setorial é própria do setor; mesmo com semelhanças aparentes,
os reveses e as benesses promovidas pelo setor são resultantes dos elementos particulares que
se aglutinaram em torno de um conjunto de fatores que não se repetem e não podem ser
encontrados em outros lugares ou indústrias. Deste modo, faz-se necessário os estudos
setoriais e os estudos de caso, pois para compreender as particularidades e o que há de geral
26
Dentro dessa visão mais positiva em relação ao setor sucroenergético é notório algumas debilidades, as quais
derivam da sua base técnica e outras que fazem presentes no SNI do Brasil. Tais como: 1) a cultura da cana-de-
açúcar e o etanol são altamente concentradas no Brasil, assim, não é um setor que apresenta inserção
internacional como outras culturas (milho e soja); 2) o setor mesmo tendo desenvolvido capacidade tecnológica
realiza a importação de pacotes tecnológicos (maquinário agrícola e insumos ); 3) impacto ambiental e
precariedade dos trabalhos na fase agrícola. 27
Tal discussão é sumarizada em relação ao setor sucroalcooleiro no capítulo 3 e capítulo 4, pois nota-se
claramente que a partir da década de 2000 firmas de outros setores (petróleo, química, biotecnologia) passam
atuar juntamente com atores tradicionais da indústria sucroalcooleira, isto é comprovado pelos dados disponíveis
nas bases de projetos de pesquisas aprovados pela FINEP e na titularidade das patentes depositadas nos diversos
escritórios de propriedade industrial.
39
nessas organizações socioespaciais, são necessários recortes analíticos que se aproximem da
dinâmica histórica e econômica das diversas “partes” que compõem o todo – o território
nacional/economia nacional.
Os setores não só variam em termos de natureza da inovação, de dinâmica e de
transformação setorial, mas também de contexto em que tais mudanças ocorrem. Desta
maneira, o SSI em países em desenvolvimento pode amplamente aderir/apresentar diferentes
dimensões (JOSEPH, 2009). Diferentes entre si e entre seus “pares” do exterior, a
heterogeneidade da estrutura produtiva das nações periféricas promove uma singularidade em
relação aos países centrais (FURTADO, 1969), conferindo características particulares ao SSI
destes países.
A heterogeneidade estrutural dos países periféricos modela as características do
processo de inovação, que por sua vez, determina certos predicados da forma e do conteúdo
do desenvolvimento, a saber: 1) forte heterogeneidade entre as firmas; 2) predomínio de
inovações incrementais; 3) processo de difusão tecnológica se sobressai à introdução de
inovações; 4) grande importância dos setores baseados em recursos naturais; 5) setor
produtivo fortemente orientado ao mercado interno; 6) interação entre os atores do SNI são
débeis; 7) empresas multinacionais figuram como atores relevantes na atividade de P&D; 8)
historicamente as firmas nacionais são importadoras de tecnologia; 9) existe um descompasso
entre a produção de conhecimento e a estrutura produtiva; 10) baixa coordenação entre os
atores e as ações para o desenvolvimento (LALL & TEUBAL, 1998; CHAMINADE et al.
2009; MALERBA & MANI, 2009; IISUKA, 2009; LUNDVALL; 2009; PACHECO &
CORDER, 2010).
Estes elementos são comuns aos países em desenvolvimento e inegavelmente
presentes no Brasil, mesmo desenvolvendo um SNI complexo, com a presença de diversos
atores28
, não escapa aos problemas supracitados, pois existe um desequilíbrio interno
estrutural, que resulta em falhas sistêmicas29
que se mostram nos gargalos da circulação do
conhecimento e na ausência de elos ou atores que devem promovem o progresso da ciência e
da tecnologia.
28
Os trabalhos de Morel (1979), Pacheco & Corder (2010) e Brito Cruz (2010) reconstroem a história de
formação do SNI brasileiro e promovem uma noção de suas dimensões básicas. Ficando evidente a existência de
esforços internos em desenvolver uma estrutura de C&T no país, a qual temporalmente acompanha as nações
desenvolvidas, mas que apresenta resultados aquém de seus pares internacionais. 29
É a inabilidade do Sistema de Inovação em suportar a criação, absorção, retenção, uso e a disseminação de um
conhecimento economicamente útil por meio de aprendizado interativo ou investimentos internos de P&D
(CHAMINADE et al., 2009).
40
Com isso, o Estado exerce um papel determinante na etapa de formação ou na
mudança dos SSI, principalmente, por meio de ações sistematizadas que visem o
direcionamento de uma rota tecnológica e o estabelecimento de um ambiente para o seu
contínuo desenvolvimento. Estas ações passam pela criação de organizações e instituições
“orientadas para a missão”, as quais promovem uma coordenação no sistema e constituem
materialmente na infraestrutura e no fornecimento de recursos e execução de atividades de
PD&I.
Ao se aproximar do objeto de estudo - etanol celulósico no Brasil30
– é possível
identificar os traços latentes da heterogeneidade estrutural e ao mesmo tempo perceber a
importância do Estado na/para a “superação” dessas características, as quais em última
instância são entraves para o processo de catching up. O caso estudado mostra que o SSI da
cana-de-açúcar avança em uma nova rota tecnológica e adquire novas competências
(tecnológicas e institucionais), mas carrega indubitavelmente problemas históricos e
estruturais semelhantes a outros setores econômicos do país.
Realizar este tipo de estudo contribui para identificar pontos fortes e fracos dos
segmentos econômicos e de suas instituições, contribuído para a compreensão da realidade e
para a tomada de decisão futura – planejamento e políticas públicas.
Assim, ao assumir o caráter particular dos SSI compreende-se que os caminhos para o
desenvolvimento não são únicos, mas sim maleáveis, promovidos a partir de como e do
quanto os países e os seus setores realizam investimentos em aquisição de capacidades
tecnológicas, fator central da moderna economia (OYELERAN-OYEYINKA & RASIAH,
2009). Pois os processos de desenvolvimento não se limitam à compra de máquinas e
aumento das taxas de investimento em P&D, mas se dão por meio da criação de capacidades e
competências31
para influir nas rotas tecnológicas e influenciar as cadeias globais de valor.
Os Sistemas de Inovação são resultados das instituições e da estrutura socioeconômica
existente no território nacional – em permanente coevolução. Assim, “o que você faz vai
refletir no que você sabe e será refletido em que você aprende, e por sua vez, é refletido na
estrutura econômica, principalmente, no tecido industrial” 32
(LUNDVALL et al, 2009, p.
30
O capitulo 3 e 5 trazem elementos concretos para demonstrar essa ação. 31
O recurso mais importante na moderna economia é o conhecimento e o mais importante processo é o
aprendizado, assim, os setores econômicos devem desenvolver no interior das suas firmas e organizações os
micro-fundamentos do aprendizado, os quais Lundvall (2007) denomina de Know-What, Know-Why, Know-How
e Know-Who. 32
Tradução própria.
41
12). É por isso que a inovação é enraizada tanto nos processos de aprendizagem baseados na
ciência como nos processos baseados na experiência tácita dos indivíduos (JENSEN et al.;
2007; LUNDVALL, 2007; FREEMAN & SOETE, 2008).
Isso abre a possibilidade de manipular o padrão de especialização, a taxa de
aprendizado e a construção de competências. Em outras palavras, possibilita influenciar as
trajetórias de desenvolvimento dos países, principalmente, por intermédio da estruturação dos
setores econômicos.
Os elementos trazidos pela pesquisa, em especial os capítulos 2, 3 e 5, referenciam
esta dinâmica no SSI da cana, pois evidenciam as ações feitas ao longo do tempo pelo Estado
e pelos principais atores do sistema na direção do estabelecimento da produção e da
exportação do açúcar e, na sequência, ações deliberadas em estruturar a função energética ao
setor (etanol e energia elétrica). Na última década, ocorre um movimento coordenado
objetivando seguir a tendência mundial do desenvolvimento do etanol celulósico e da
exploração da biomassa visando um conjunto amplo de outros produtos.
Estes esforços impõem mudanças ao setor e, consequentemente, contribuem com o
progresso de diversas localidades33
, criando condições para aumento das arrecadações, novos
postos de trabalho, encadeamentos produtivo ao longo da cadeia de valor e o desenvolvimento
de atividades correlatas. Além destes efeitos econômicos e produtivos, o SSI da cana-de-
açúcar introduz ações na direção da bioeconomia, como será pontuado ao longo desta tese, já
que faz esforços em desenvolver tecnologias de exploração integral dos potenciais energéticos
da biomassa canavieira.
E, nessa direção, o que se percebe é que a condição do subdesenvolvimento ou de
retardo tecnológico pode ser superada, considerando que as condições sociais e econômicas
não são imutáveis. É nessa construção teórica que se vislumbra o processo de catch-up dos
setores econômicos e, por sua vez, das nações. Portanto, a construção da capacidade para
inovar e a própria inovação são os drivers para o catch-up (OYELERAN-OYEYINK &
RASHAH, 2009; RIBEIRO & ALBUQUERQUE, 2015).
33
Para uma melhor compreensão das dimensões territoriais do setor vide gráfico 2.9. Acrescenta-se, que a
produção em larga escala de etanol no Brasil tem efeitos socioeconômicos positivos na região Centro-Sul,
principalmente, nos municípios menos industrializados, de forma que a atividade sucroalcooleira aumenta o PIB
municipal per capita, estas são conclusões do trabalho desenvolvido por MORAES et al. (2016). O trabalho de
Martinez et al. (2013) indica que a expansão da indústria canavieira pode trazer impactos econômicos positivos
para o Brasil, principalmente para a região nordeste. A pesquisa de Varricho (2012) destaca a importância
econômica da indústria da cana, em 2006, a cadeia sucroalcooleira apresentou R$18,18 bilhões de Valor de
Transformação Industrial (VTI), sendo que a petroquímica apresentou R$ 12,32 bilhões e a indústria aeronáutica
R$ 3,43 bilhões no mesmo ano.
42
A abordagem de SSI propicia a aproximação com os fatores condicionantes do catch-
up dos setores econômicos dos países periféricos, à medida que trabalha a singularidade
setorial de maneira concomitante com os processos externos ao setor34
e, os processos
internos ao setor, direcionando parte do esforço investigativo para a compreensão da dinâmica
das firmas e das organizações. Nesse intento, vários pontos são considerados, os quais se
alteram de país para país e de setor para setor. Existem evidências que indicam que dentro do
mesmo país, os fatores para catch-up dos setores são/podem der distintos35
.
Isso é resultado das condições sui generis do Sistema Nacional de Inovação (SNI), ou
seja, os níveis e os diferentes graus de especialização produtiva ou a posição que as firmas
locais ocupam na cadeia global de valor, influenciam diretamente na natureza dos elementos
que devem ser estimulados para gerar o desenvolvimento setorial/regional. As condições
estruturais, no nível de país, condicionam, pelo menos no momento inicial, as características
produtivas e inovativas do setor (LUNDVALL et al, 2009; JOSEPH, 2009).
Portanto, a noção de path-dependent36
é crucial para a compreensão da realidade atual,
pois as decisões e ações de agora são correlacionadas com as trajetórias assumidas no
passado; tanto para mudança como para a continuidade, o processo histórico de formação dos
setores é relevante. Com isso, o capítulo 2 apresenta os contornos históricos que estruturaram
e conduziram o SSI da cana-de-açúcar.
As premissas conceituais e teóricas indicadas aqui serão confrontadas e identificadas
no setor sucroalcooleiro, visando traçar um panorama atual do segmento, além de contribuir
com a compreensão dos problemas característicos do desenvolvimento tecnológico das nações
periféricas. Isso por que o setor mostra-se representativo das contradições e dos acertos do
país, apresentando elementos contraditórios e articulados que faz conviver com certa
“estabilidade” elementos modernos e atrasados.
34
Aborda e/ou relaciona as características do setor estudado com as condições da economia nacional e
internacional, observa as relações existentes entre as políticas de nível nacional com as setoriais, dependendo do
enfoque da pesquisa. Relaciona os elementos históricos de grande envergadura que corroboram para mudanças
estruturais na economia (exemplo: choques do petróleo, fato histórico que inaugura o desenvolvimento de
energias renováveis). 35
Os elementos que fazem avançar o setor sucroalcooleiro certamente são distintos da indústria de óleo e gás no
Brasil, que fatalmente, diferencia-se da indústria farmacêutica. As categorias e os conceitos que propiciam a
observação e análise destes são pontuados no subtópico 1.1.1. 36
Path-dependent nos trabalhos de David (1985) e Arthur (1989) foi usado para explicar trajetórias tecnológicas,
mas esse conceito pode ser estendido para as trajetórias institucionais, como indicam os trabalhos de North (1990
e 1994). De maneira geral, o conceito estabelece a importância da trajetória histórica, sendo as escolhas no
presente influenciadas pela base material herdada e pela matriz institucional do passado, portanto, a
compreensão das escolhas atuais passa pelo entendimento do processo de evolução e desenvolvimento do objeto
de estudo.
43
Um exemplo deste fato é que algumas firmas apresentam o desenvolvimento do etanol
celulósico e colheita mecanizada enquanto outras firmas/fazendas presencia-se trabalhos
análogos à escravidão37
. Trata-se de mais uma prova da singularidade setorial e da
heterogeneidade estrutural das sociedades periféricas. Castillo (2013, p. 75) afirma que
“nenhuma atividade agrícola é mais representativa das contradições entre o interno e o
externo, isto é, entre as necessidades internas ao território nacional e a origem externa das
formas mais ativas de seu dinamismo”. Compreende-se com o seu trabalho, que o setor
comunga características próprias da modernização (transformações na base técnica e
organizacional próximas ao standard internacional) ao mesmo tempo, em que conserva
estruturas de poder e de exploração do trabalho e dos recursos naturais análogas ao latifúndio
definido por Celso Furtado em “Formação Econômica do Brasil” em 1959.
1.1.1. O desenvolvimento setorial e o processo de inovação
Compreender o processo de inovação requer compreender como as ideias, as
habilidades e o conhecimento são transferidos, difundidos e adquiridos. A concretização de
uma nova ideia requer a priori o processo de aprendizagem e, isso é estimulado pela pesquisa
científica ou pela experiência daqueles que cotidianamente colocam o conhecimento em
prática. Portanto, a identificação das características do processo de aprendizagem é a chave
para entender como os setores mudam e reposicionam as suas firmas. Assim, parte desta
pesquisa destina-se a identificar quais são as ações desempenhadas pelos principais atores do
SSI da cana-de-açúcar na busca da efetivação da produção do etanol celulósico no Brasil (vide
os capítulos 4 e 5).
Com isso, deve-se ter claro que o conhecimento não é automaticamente transferido e
utilizado. Sua utilização na produção exige esforços na articulação das diferentes capacidades,
dadas por processos anteriores (já acumuladas) ou por meio da absorção de conhecimento
externo (fora do setor ou fora do país) (COHEN & LEVINTHAL, 1990).
No atual estágio de desenvolvimento do sistema capitalista, o conhecimento é ao
mesmo tempo localizado e globalizado, assim, os avanços no conhecimento geram impactos
nos países em desenvolvimento (IIZUKA, 2013). Desta forma, a infraestrutura para inovação
37
20 empresas ligadas ao setor apareceram em 2014 na “lista suja do trabalho escravo”, cadastro feito pelo
Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), contando com todos os empregadores que tenham submetido
funcionários a condições análogas a escravidão (NOVACANA, 04/02/2014).
44
deve ser desenhada para melhorar o acesso ao conhecimento e estimular o processo de
aprendizagem.
Os esforços locais devem buscar a criação de estruturas de ensino e pesquisa, a
criação de canais de comunicação com a comunidade internacional e a implementação de
instituições que ampliem e consolidem o conhecimento no interior das firmas e de outras
organizações, tais como: consórcios de P&D, fomento a inovação; aquisição de tecnologia;
treinamentos. Os esforços do SSI da cana-de-açúcar nessa direção são discutidos e analisados
nos capítulos 3 e 5.
O emaranhado destas ações na realidade concreta é analisado e interpretado por meio
do conceito de modos de inovação, indicados por Lundvall (2007, 2009) e Jense et al. (2007),
os quais nesta pesquisa são complementados pelo conceito de padrões de inovação
trabalhados por Malerba & Orsenigo (1996) e Malerba (2002; 2003). Os modos de inovação
compreendem processos distintos de aprendizagem, os quais podem ser agrupados pelas
categorias de STI-mode (Science-Technology-Innovation) e de DUI-mode (Doing-Using-
Interacting). Estas categorias analíticas possibilitam aproximar-se da realidade inovativa dos
setores econômicos, principalmente, dos países periféricos, uma vez que, estes modelos de
inovação aparecem de maneira incompleta e desarticulada nessas realidades.
Assim, a busca pelo desenvolvimento econômico, social e tecnológico passa pela
efetivação destes modos de inovação. Portanto, a compreensão do processo de inovação do
setor sucroalcooleiro - na passagem da produção de etanol de primeira geração para o etanol
de segunda geração - é construída pela efetivação destes dois modos de inovação.
Esta pesquisa não só constrói a narrativa a partir destes conceitos, bem como,
demonstra que estes modos se desenvolvem no interior do SSI da cana-de-açúcar, como
elementos reais, os quais conduzem a transformação do setor e ampliam seu escopo,
realizando uma aproximação da agroindústria sucroalcooleira com a biorrefinaria e a
bioeconomia. Tal aproximação ocorre à medida que direciona os seus esforços para a
exploração da celulose, por meio do desenvolvimento de processo de aprendizagem ligados à
ciência e à tecnologias disruptivas (capítulos 3, 4 e 5).
Com isso, definem-se os modos de inovação como regimes de aprendizagem do setor,
caracterizados por um conjunto de atividades que se aglutinam em torno do processo de
aprendizado. A base do STI-mode, o qual por definição está em sintonia estreita com
definição de Sistema de Inovação, centra-se na inovação promovida pelos esforços em P&D.
45
Este modo de inovação sugere que tal processo é dado pela experimentação tipicamente em
laboratórios, a formalização e a codificação do conhecimento identificado (JENSEN et al.,
2007; LUNDVALL et al., 2009).
O modo de inovação DUI-mode, dado especificamente pelo conhecimento tácito e
localizado, refere-se ao aprendizado proveniente dos trabalhadores, quando estes enfrentam
mudanças no curso da efetivação da sua função (produção, comercialização), sobretudo,
vindo das interações externas. Foca assim no aprendizado interativo por meio das estruturas e
das relações (JENSEN et al., 2007; LUNDVALL et al., 2009).
A intensidade da utilização dos modos de inovação ocorre segundo a natureza dos
setores, do contexto e das estratégias das firmas e/ou dos países. O ponto fulcral está na
capacidade de conciliar e combinar os dois modos de inovação. Jensen et al. (2007)
demonstra que as firmas que se utilizam concomitantemente destes modos são mais
inovadoras e apresentam melhor desempenho econômico, superando as empresas que
realizam maiores gastos em P&D38
.
O quadro 1.1. sintetiza e define a interconexão entre os modos de inovação e os
padrões de inovação (Schumpeter Mark I e Schumpeter Mark II)39
. Os padrões de inovação se
referem à estrutura setorial e suas mudanças. Os modos de inovação relacionam-se com a
dinâmica e com o desempenho dos atores que compõem o Sistema Setorial de Inovação,
assim, o modo de inovação é dado pela estratégia de produção e comercialização dos bens e
serviços, tanto quanto pelo tipo e a intensidade das interações e dos feedbacks estabelecidos
na atividade inovativa entre as firmas e entre os atores não-firmas.
38
Jensen et al. (2007) trabalha com a realidade dinamarquesa, que se diferencia grandemente da brasileira,
entretanto, o modelo analítico e conceitual pode ser utilizado, objetivando a aproximação do objeto de estudo,
uma vez que, a trajetória de desenvolvimento do setor sucroalcooleiro é baseada em tecnologia de domino
público e em inovações incrementais. A ruptura tecnológica proposta pelo etanol celulósico pressupõe não
apenas aproveitar as competências acumuladas, como também, aprender em nova base de conhecimento,
sobretudo, com novas fontes de informação e novas áreas do conhecimento. 39
Estes conceitos derivam da interpretação schumpeteriana da relação entre o crescimento econômico e o
progresso técnico, pautando sobretudo na natureza da inovação introduzida em cada padrão (Mark I inovações
radicais e Mark II inovações incrementais) (SCHUMPETER, 1982; MALERBA, 2002).
46
Quadro 1.1. Modos de inovação e padrões de inovação. Schumpeter Mark I Schumpeter Mark II
STI-mode
- Destruição criativa;
- Inovações radicais;
- Novos entrantes;
- Papel importante das novas
firmas inovadoras,
- O regime tecnológico é
caracterizado por:
a) alta oportunidade;
b) baixa apropriabilidade;
c) baixa cumulatividade.
- Pesquisa realizada na fronteira
do conhecimento e/ou “fora” da
rota tecnológica dominante;
-predomínio do conhecimento
codificado;
- Cumulatividade criativa;
- Inovações incrementais com adições técnicas e/ou
funcionais (inovações intermediarias);
- Prevalência das firmas já estabelecidas;
- Fortes barreiras à entrada;
- Presença de poucas grandes firmas;
- O regime tecnológico é caracterizado por:
a) alta apropriabilidade; b) alta cumulatividade;
- Uma evolução para o design dominante;
- Forte controle dos ativos complementares;
- Relações constantes com o sistema de fomento a
P&D;
- A busca de estratégias equilibradas entre exploitation
e exploration;
- A busca pelo controle do conhecimento tácito e
codificado (retroalimentação);
-Combinação do conhecimento local e global;
DUI-mode -
- Cumulatividade criativa;
- Inovações incrementais;
- Prevalência das firmas já estabelecidas;
- Fortes barreiras à entrada;
- Presença de poucas grandes firmas;
- O regime tecnológico é caracterizado por:
a) alta apropriabilidade; b) alta cumulatividade;
- Sistema de proteção intelectual fraco ou
desnecessário;
- Forte controle dos ativos complementares;
-Forte tendência ao lock-in tecnológico e
organizacional;
- Predomínio do conhecimento tácito;
- Conhecimento local;
Fonte: Elaboração própria.
Na intersecção entre STI-mode e Schumpeter Mark I tem-se uma realidade produtiva
instável, onde o padrão tecnológico ainda não foi estabelecido, situação característica de
períodos pré-paradigmáticos. Este momento é marcado pela introdução de inovações radicais,
assim, oferece janelas de oportunidades e, consequentemente, a entrada nas novas rotas
tecnológicas é “facilitada”, tanto para os velhos como para os novos atores.
Neste contexto se recria ou se substitui o padrão ora estabelecido, criando novos
negócios ou novos setores, portanto, representa uma mudança drástica, na qual novas
competências são requeridas para inovar, o que torna o domínio do conhecimento de fronteira
um preditivo óbvio, já que o desenvolvimento dos novos produtos ou processo – desde a
segunda revolução industrial – passam necessariamente pela intensificação do uso da ciência
como uma força produtiva (BRAVERMAN, 1974; HOBSBAWN, 1995; CASTELL, 1999;
STOKES, 2005; FREEMAN & SOETE, 2008).
47
No ponto de contato entre STI-mode e Schumpeter Mark II tem-se um momento de
relativa estabilidade, no qual as firmas já pertencentes ao setor promovem o desenvolvimento
da rota tecnológica por meio de inovações incrementais, consolidando o standard do setor.
Não é um período de pouca inovação ou de baixo uso da ciência e da tecnologia, pelo
contrário, as diversas dimensões do processo de aprendizagem são colocadas em
funcionamento pelos atores estabelecidos, mecanismos de aprendizado provenientes dos dois
modos de inovação são utilizados.
Na Intersecção entre DUI-mode e Schumpeter Mark II prevalece a estabilidade, a
partir da introdução apenas de inovações incrementais com pouca diferenciação em relação à
tecnologia anterior, tanto no que se refere ao design ou a natureza do artefato ou do processo.
Existe o predomínio das grandes firmas, o setor tende a ser fortemente concentrado, assim,
apresenta fortes barreiras à entrada. O controle dos ativos complementares não só são
estratégicos para a manutenção da posição no mercado (TEECE, 1986), como são a principal
estratégia econômica das firmas líderes, assim, a concorrência pelo domínio do conhecimento
de fronteira é pouco relevante.
O duplo par de conceitos definidos no quadro 1.1. indica os elementos e as
características centrais que um SSI deve reunir para desempenhar a sua mudança estrutural ou
de conteúdo, sempre dependendo do estágio de partida40
. A alteração dos seus limites
setoriais, a sua base tecnológica e a sua demanda alteram-se segundo a presença e o
desenvolvimento destes elementos, assim, o processo de inovação olhado a partir dessa
perspectiva possibilita identificar os micro fundamentos que compõem o processo de
aprendizagem - Know-what, Know-why, Know-how e Know-who -, estes desempenhados
pelos atores ao longo do tempo, fazem evoluir a indústria ou transformam-na radicalmente
(LUNDVALL, 2007; LUNDVALL, 2009).
Ao trabalhar com as características particulares do desenvolvimento do SSI da cana-
de-açúcar à luz destes conceitos, tem-se uma compreensão do processo de evolução da
economia setorial e do desenvolvimento da rota tecnológica do etanol celulósico, pois a
assimilação destes elementos na realidade proporciona um retrato da dinâmica do progresso
técnico do setor sucroalcooleiro brasileiro.
40
De um regime tecnológico de alta oportunidade, baixa apropriabilidade e baixa cumulatividade para um
regime tecnológico de alta apropriabilidade e alta cumulatividade ou vice-versa. Situação pode-se inverter ao
longo do tempo.
48
Ademais, este exercício se relaciona com os aspectos gerais, ou seja, o progresso
técnico de setores baseados em recursos naturais com baixa emissão de carbono, circunscrito
em países periféricos, característica que apresenta rebatimentos tanto na interpretação setorial
como na construção contínua da abordagem teórica de SSI (LUNDVALL et al., 2009).
Vale destacar que o trabalho de Jensen et al. (2007), bem como os casos apresentados
no livro “Handbook of Innovation Systems and Developing Countries” comprovam a
importância do DUI-mode para o desenvolvimento econômico, chamando atenção para a
realidade dos países nórdicos e de alguns países periféricos que lograram desempenho
internacional por intermédio deste modelo, assim, suplantando a noção de exclusivismo das
inovações baseadas em ciência. No caso do SSI da cana-de-açúcar este aspecto é amplamente
considerado por Furtado et al. (2011;2014) e Varricho (2012) ao analisar a trajetória de
desenvolvimento do setor no etanol de primeira geração.
O diferencial desta pesquisa é justamente se apropriar desta interpretação observando
o caminho inverso, acrescentando um novo olhar a esta dinâmica. Busca-se compreender a
mudança setorial e a inovação em curso, o setor baseado no DUI-mode que realiza esforços
sistemáticos na última década para emular o STI-mode, visando entre outros avanços à rota
tecnológica do etanol celulósico, assim, amplia as fronteiras do sistema e introduz novos
conhecimentos a base tradicional. Compreender esse caminho é importante, pois ele não é
fluído e apresenta contradições e limitações, que impõem desafios novos ao segmento41
.
A articulação do DUI-mode e STI-mode no interior do SSI da cana-de-açúcar contribui
para a promoção do Sistema de Inovação, e as ações do Estado brasileiro pró-cana/etanol
confirmam este fato, que segundo Lundvall (2007) e Andersen (2011) consiste em um
elemento característico de Sistemas de Inovações em países periféricos, os quais necessitam
de estímulos e ações complementares para suprir o fraco desenvolvimento espontâneo. Este
olhar, por sua vez, remete à tradição inaugurada por List (1841) e delimitada por Freeman
(1982), a ação ativa das políticas públicas visando à proteção e/ou desenvolvimento futuro da
indústria nacional.
Aproximação do SSI da cana-de-açúcar com estes elementos conceituais são
realizadas ao longo da tese, em que se pretende evidenciar a passagem de um modo de
inovação calcado no fluxo DUI para uma “organização” da atividade inovativa mais próxima
41
A identificação e a compreensão destes novos desafios é um dos resultados dessa pesquisa, que complementa
o objetivo central.
49
de STI-mode. A passagem do etanol de primeira geração para o de segunda geração força esse
deslocamento, sendo um vetor para a reestruturação do processo de inovação setorial42
.
A passagem para o etanol de segunda geração é um caminho na direção do STI-mode,
esforço este que contribui com a ampliação dos processos de densificação e diversificação43
,
necessidades inerentes das trajetórias de desenvolvimento de setores baseados em recurso
naturais (ERICSSON et al., 2004; HELLSMARK & JACOBSSON, 2012; VARRICHO,
2012; FURTADO, 2013; ANDERSEN et al., 2015). Os dados organizados e analisados nos
próximos capítulos evidenciam esta dinâmica, que sozinha não proporciona o catching up do
país, mas pode contribuir decisivamente para o desenvolvimento regional, para a
sustentabilidade da matriz energética, para o equilíbrio da balança comercial e proporcionar
ao Brasil a oportunidade de desenvolvimento de novos setores ligados à bioeconomia.
Considera-se que o conhecimento é o recurso mais importante da economia moderna.
Assim, o processo mais relevante para o crescimento econômico e para a mudança técnica é o
processo de aprendizagem, a maneira pela qual as pessoas e as organizações aprendem a fazer
algo, este processo é social, localizado e ativo, exigindo esforços dos envolvidos. Este
processo consiste na interação e na troca consciente de conhecimentos e de capacidades entre
indivíduos e organizações (LUNDVALL, 1992; NELSON, 1993; NELSON, 2005;
LUNDVALL, 2007). Para tal, compreende-se que a inovação reflete o processo de
aprendizado tanto quanto dele deriva (aprendizagem/inovação e inovação/aprendizagem).
Os modos de inovação (DUI x STI) caracterizam o processo de aprendizagem do
setor, portanto, a estrutura das relações com as fontes de informações, conhecimento,
tecnologias, práticas, recursos humanos e financeiros são partes integrantes da conjuntura
setorial, e por isso, figuram como foco da análise desta pesquisa, tanto quanto a própria
inovação em curso no setor, o etanol celulósico. Porque a “maneira de fazer” é tão relevante
quanto o que se faz para compreender as transformações setoriais, porque é na produção que
reside às relações sociais que desempenham a condução da realidade social e econômica.
42
Os elementos mobilizados para identificação da passagem do exclusivismo DUI-mode para uma formação
intermediaria de STI-mode no SSI da cana-de-açúcar estão sumarizados na conclusão deste capítulo e são
trabalhados ao longo da tese, com mais detalhes no capítulo 5. . 43
A densificação e a diversificação do SSI requer ampliar as capacidades internas de inovação, transformando a
exploração tradicional dos recursos naturais em cadeias produtivas mais complexas e integradas à base de
conhecimento científico e tecnológico produzida internacionalmente, visando explorar a economia de escopo, ou
seja, com a mesma matéria-prima produzir uma ampla variedade de produtos e serviços. Tal dinâmica é
espelhada nas experiências de países como Noruega, Finlândia e Suécia (VARRICHO, 2012; FURTADO, 2014;
ANDERSEN et al, 2015).
50
O SSI da cana-de-açúcar mesmo apresentando baixa atividade inovativa
historicamente (VARRICHO, 2012; BIN et al., 2015; SALES-FILHO; 2016), mostra-se como
um caso nacional relevante de desenvolvimento regional e técnico, pois demonstra
competência acumulada, criação de infraestrutura produtiva e de pesquisa ao longo de mais de
cem anos, construindo uma trajetória de aprendizado ascendente, baseadas fortemente no
DUI-mode (FURTADO et al, 2011; ANDERSEN, 2011). Situação que se tornam mais
complexas com as tentativas de densificação e diversificação cunhadas ao longo da década de
2000, vislumbrando desenvolver novas tecnologias para a exploração da biomassa.
Por conseguinte, sua análise contribui com a compreensão de problemas relacionados
à inovação e ao desenvolvimento industrial no nível do país, não se limitando apenas ao
enfoque da cana-de-açúcar. A dinâmica identificada neste setor pode em grande medida ser
estendida para outros segmentos, pelo menos como modelo explicativo, já que apresenta
contradições representativas da dinâmica e da formação territorial brasileira (CASTILLO,
2013). Como, por exemplo, a baixa capacidade de coordenação dos agentes e a ausência de
instituições de pesquisa especializadas, situação que recebeu forte atenção no período por
parte do Governo Federal e do Estado de São Paulo, assim, tal problemática no setor
sucroenergético conta com uma nova dinâmica, a qual pode ser comparada com segmentos
que não receberam a mesma atenção44
.
1.2. DEFINIÇÕES DO “DESAFIO TECNOLÓGICO”: O ETANOL CELULÓSICO
O empenho em substituir o carbono de origem fóssil pelo carbono renovável, a partir
da biomassa, estimula um conjunto amplo de firmas a desenvolverem estruturas produtivas
cada vez mais próximas da biorrefinaria. Este esforço tende a inaugurar um novo paradigma
tecnológico, em que os biocombustíveis, a bioenergia, os bioquímicos, os biomateriais, e a
alimentação humana e animal podem ser eficientemente co-produzidos.
Desta maneira, Cherubini et al. (2009) aponta que a produção dos biocombustíveis
avançados é vista como a força motriz do desenvolvimento futuro da biorrefinaria, uma vez
que incide diretamente no setor que mais emite CO2, o setor de transporte, sendo responsável
44
O capítulo 3 e 5 demonstram alguns dos efeitos proporcionados pela criação do CTBE e da Embrapa
Agroenergia, bem como das ações da FAPESP e do programa de apoio conjunto à inovação do BNDES-FINEP,
medidas que adicionam novas características ao SSI da cana-de-açúcar.
51
por 23% da emissão de CO2 relacionadas as atividades energéticas, correspondendo a 6,7
GtCO2 (IPCC, 2014).
A produção do etanol celulósico encontra-se em fase pré-paradigmática, permeada por
incertezas, em que as rotas tecnológicas concorrem para estabelecer o standard da produção.
Ademais, os problemas tecnológicos e relacionados à logística da biomassa impõem barreiras
difíceis de serem superadas.
O que se observa de forma geral são iniciativas pontuais com plantas demonstrativas e
plantas comerciais ainda em fase de comissionamento45
. Entretanto, estas iniciativas estão
inseridas em um conjunto de ações de grandes empresas e de governos nacionais, os quais
buscam conformar um novo estágio de desenvolvimento do setor de biocombustíveis,
ampliando as possibilidades de evolução do segmento, com novas áreas de exploração de
matéria-prima e novos mercados consumidores46
.
As iniciativas em curso resultam em expectativas de desenvolvimento futuro e
inflexão das curvas de aprendizagens. Em 2005 a capacidade de produção instalada no mundo
era de 0,05 bilhões de litros de etanol celulósico, passando para 1,51 bilhões de litros em 2016
(GUNDRY, 2016). A tabela 1.1. indica a capacidade produtiva instalada por regiões do
planeta.
Tabela 1.1. Capacidade instalada de produção de etanol celulósico. Região Capacidade instalada
(milhões de litros)
Total no mundo
(em %)
EUA 490.37 34%
China 340.19 24%
Canadá 303.45 21%
Brasil 177.34 12%
EU 130.83 9%
Total 1 442.18 100%
Fonte: UNCTAD, 2016.
Segundo o relatório da UNCTAD (2016), é previsto um crescimento de 50% no
mercado de biocombustíveis de segunda geração entre 2014-2020 e o seu valor em 2020 será
de US$ 23,9 bilhões. Desta forma, a busca por figurar como um dos países postulante a
produtor e desenvolvedor da tecnologia do etanol celulósico é fator preponderante para
estabelecer posição de destaque no próximo estágio de desenvolvimento, da difusão
45
Comissionamento é o processo de assegurar que os sistemas e componentes de uma unidade industrial
estejam projetados, instalados, testados, operados e mantidos de acordo com as necessidades e requisitos
operacionais do proprietário. Na prática, o processo de comissionamento consiste na aplicação integrada de um
conjunto de técnicas e procedimentos de engenharia para verificar e testar cada componente físico do
empreendimento. 46
Os esforços do SSI da cana-de-açúcar são representativos desta dinâmica, vide capítulo 3 e capítulo 5.
52
tecnológica. Em 2016 as barreiras à entrada ainda são permeáveis, sendo possível identificar
“janelas de oportunidades” a serem exploradas pelo setor sucroalcooleiro47
.
Em adição ao contexto internacional, existem outros motivadores para o
desenvolvimento da tecnologia de segunda geração, como a indispensável tarefa de resgatar a
atratividade econômica do etanol, cuja competitividade se reduziu nos últimos anos, entre
outros motivos, pelo amadurecimento de seu atual paradigma tecnológico (vide tabela 1.2.).
Ademais, o etanol celulósico pode significar um aumento na produtividade do setor de até
50% em relação ao nível atual (MILANEZ et al. 2015; CTBE, 2016).
1.2.1. A tecnologia de produção do etanol (E1G)
O conjunto tecnológico que sustenta a produção sucroalcooleira no Brasil é a
tecnologia de primeira geração, tecnologia já madura e de domínio público (vide tabela 1.2.).
Com isso, seus ganhos foram incrementais, dados a partir da ampliação da escala dos
equipamentos e do melhoramento da eficiência dos mesmos, conseguida, principalmente, pela
prática do seu uso e da sua produção – DUI-mode (LIBONI & TONETO JR, 2008; NEGRI,
2010; ONOYAMA, 2011; VALENTE et al., 2012; VARRICHO, 2012; OLIVEIRA FILHO
& SILVEIRA, 2013). A tabela 1.2. indica a maturidade dos principais processos
desempenhados na fase industrial.
47
Esta afirmação pode ser feita levando em consideração que o Brasil tem acompanhado o movimento em
relação ao etanol celulósico, entretanto, como será discutido nos capítulos 4 e 5, o domínio da tecnologia parece
figurar sobre o domínio de empresas estrangeiras e os projetos instalados em solo nacional são baseados em
aquisição de pacotes tecnológicos. Desta forma, o protagonismo do Brasil deve ser observado com certo
cuidado, em um cenário onde as oportunidades existem, mas as dificuldades impostas no momento ainda não são
enfrentadas pelas empresas brasileiras e nem pelo Estado nacional na proporção que estas demandam. A
observação dos dados de patentes e a não diversificação das políticas públicas pró etanol celulósico indicam essa
situação retardatária.
53
Tabela 1.2. Resultados da evolução tecnológica - tecnologia disponível no setor industrial – 2011.
Processo e equipamentos
Início do
PROÁLCOOL
(1975)
2011
Capacidade de moagem (TCD)-6x78” 5.500 15.000
Tempo de fermentação (h) 24 6 - 8
Teor alcoólico do vinho (oGL) 6,5 até 16
48
Rendimento extração (% aç. cana)-6 ternos 93 Moenda=97;
Difusor = 98
Rendimento fermentativo (%) 80 92
Rendimento da destilação (%) 98 99.5
Rendimento Total (l bioetanol.hidr./t cana) 66 87
Consumo total de vapor (kg/t cana) 600 320
Consumo vapor-anidro (kg/l) 4,5 2,0
Caldeira-Eficiência (% PCI)
Pressão (bar) / Temperatura (ºC)
66 89
21 / 300 120/ 540
Bagaço excedente (%)-usina de bioetanol Até 8 até 78
Bioeletricidade excedente exportável p/ 12.000 TCD – Us. bioetanol
(só bagaço) (MW) - 50,7
Biometano a partir de vinhaça (Nm3/lbioet). - 0,1
Produção de vinhaça (l vinhaça/l bioetanol) 13 5.0/0,8
Consumo água captação (l água/l bioetanol) 262,5 (-) 3,7
Fonte: DEDINI, 2012; OLIVEIRA FILHO, 2013.
Antes do Proálcool, a produção de etanol no Brasil era obtida, essencialmente, do
chamado álcool residual, que tinha como matéria-prima o melaço, ou mel final, subproduto da
fabricação do açúcar. A partir de 1976, começaram a surgir as chamadas destilarias
autônomas, que produziam somente etanol a partir do caldo de cana. Em paralelo, foram
sendo instaladas destilarias anexas às fábricas de açúcar existentes. Com o crescimento das
exportações de açúcar, as destilarias autônomas foram, na sua maioria, convertidas em usinas
de açúcar e etanol.
Atualmente o processo de fabricação do etanol consiste na fermentação em batelada
alimentada com reciclo de fermento, que representa 80% do total (CGEE, 2009). Trata-se de
um processo que teve início no período do Proálcool, nos anos 1970, e que envolve: 1) a
recepção da matéria-prima na usina; 2) o preparo da cana (corta e retirada dos resíduos vindos
do campo); 3) a moagem da cana com o objetivo de extrair o caldo; 4) tratamento e
processamento do caldo, em que parte se destina a fábrica do açúcar (Evaporação, Cozimento,
Centrifugação e Secagem49
) e uma fração destinam-se à fabricação do etanol (fermentação e
destilação); 5) disposição de efluentes; 6) a estocagem dos produtos finais.
48
Segundo entrevista ENTREVISTA VI a media das destilarias conforme Registro do Controle do CTC o teor
alcoólico do vinho é de aproximadamente 8,5ºGL. 49
Evaporação - após o tratamento, obtemos um caldo de cana transparente, de cor levemente amarelada que
contem basicamente água, sais minerais e açúcares. A finalidade da evaporação é a retirada de pelo menos 75%
54
No interior da usina, o processo ocorre da seguinte maneira: o caldo após estar
completamente puro, é levado a domas (tanques) no qual é misturado juntamente com um
fermento de leveduras (fungos, sendo mais comum a levedura de Saccharomyces cerevisia).
Esses micro-organismos se alimentam dos açúcares presentes no caldo. Nesse processo, as
leveduras quebram as moléculas de açúcar (C6 - Sacarose), transformando elas em duas
moléculas de etanol (2 C2H5OH) e mais duas moléculas de gás carbônico (2 CO2)50
(CGEE,
2009; CHAGAS, 2012).
Estando o etanol misturado ao vinho fermentado, o próximo passo é separá-lo da
mistura por meio da destilação. Nesse processo, o líquido é colocado em colunas de
destilação, nas quais é aquecido até se evaporar. Na evaporação, seguida da condensação
(transformação em líquido), é separado o vinho do etanol. Com isso, fica pronto o álcool
hidratado, usado como etanol combustível, com grau alcoólico em cerca de 96%. Para a
obtenção do álcool anidro têm-se a desidratação. Este processo consiste em retirar o restante
de água contido no álcool hidratado (CHAGAS, 2012).
1.2.2. A tecnologia de produção do etanol (E2G)
O objetivo da tecnologia de segunda geração é realizar a produção do etanol a partir da
biomassa, material vegetal que é formado pela celulose, pela hemicelulose e pela lignina. Esta
matéria-prima pode ser originada dos resíduos agroflorestais ou por cultivos energéticos, as
quais são especialmente cultivadas para este fim, como o caso da cana-de-açúcar, do sorgo
sacarídeo, do milho entre outros (LEITE & LEAL, 2007; DEMIRBAS, 2008; TAYLOR,
2008; MATHEWS et al., 2011). Ademais, esta tecnologia elevaria a produção do
biocombustível sem aumentar a área plantada de biomassa, já que utilizaria o material
lignocelulósico.
da água presente nesse caldo clarificado para transformá-lo em um xarope concentrado, com aproximadamente
65° brix (% de sólidos solúveis).
Cozimento – esta etapa visa a cristalização e recuperação de 80% a 85% da sacarose presente no xarope. O
sistema utilizado transforma o xarope em massa que posteriormente será centrifugada.
Centrifugação - após o cozimento, a massa passa por um processo de separação física (centrifugação). O açúcar é
centrifugado e lavado com água quente e vapor, tendo como subproduto o mel que poderá ser utilizado no
processo de fabricação de etanol.
Secagem – após a centrifugação, o açúcar é encaminhado aos secadores para a secagem e, posteriormente
peneirado. Na sequencia, é envasado em big-bags de 1200Kg e armazenado para comercialização. 50
O processo de fermentação dura diversas horas e como resultado produz o vinho, chamado também de vinho
fermentado, que possui leveduras, açúcar não fermentado e cerca de 10% de etanol.
55
De maneira geral, a tecnologia de segunda geração visa ter acesso aos açúcares
contidos na celulose e na hemicelulose, ou seja, a técnica consiste em aproveitar os açúcares
nas moléculas da sacarose que estão protegidos por uma “espessa” camada de fibras. Para
isso, as técnicas de pré-tratamento da biomassa devem quebrar as cadeias de polissacarídeos,
que unem as moléculas da parede celular das plantas.
Esta tecnologia realiza o desmonte da parede celular, pois a estrutura dos vegetais
envolve a celulose em camadas compostas de uma combinação da lignina e da hemicelulose
(estrutura protetora da célula), que se desenvolveu ao longo de centenas de milhões de anos
exatamente para protegê-la de agentes externos (PERRONE et al., 2011; MAIO;
HENNESSY; BABCOCK, 2012; SCHUTZ, 2012; ZILBERMAN et al., 2013;
GUSTAFSSON et al., 2014; MURAKAMI, 2015);
A produção do etanol celulósico apresenta duas rotas tecnológicas distintas que
mostram-se em melhores condições para se estabelecerem como dominantes: a termoquímica
e a bioquímica. A rota termoquímica consiste em transformar a biomassa em biogás através
do processo de gaseificação, que posteriormente são transformados em etanol e/ou em outros
líquidos (Gás de Síntese). O processo denomina-se conversão, ou seja, passar a matéria do
estado sólido para o estado gasoso. O resultado desse processo são os gases CO2, H2, CO e o
vapor d’água51
.
A rota bioquímica se subdivide em duas alternativas tecnológicas distintas, pois
utilizam catalisadores de natureza diferente: a rota química ocorre através da hidrólise ácida,
já a rota biológica se dá pela hidrólise enzimática, a qual ocorre através da ação dos micro-
organismos (fungos e bactérias). A hidrólise é uma reação química que tem por objetivo
quebrar as cadeias de carbono. Ela ocorre a partir da ação dos micro-organismos (fungos e
bactérias) e possibilita a quebra das moléculas devido à adição de água; nesse caso a água tem
acesso às moléculas pela dissolução das fibras que compõem a hemicelulose e a lignina.
O processo de hidrólise ácida consiste em utilizar um ácido forte para atacar as
ligações glicosídicas entre os monossacarídeos de um polissacarídeo. Esse processo, de
desmonte das células, é feito de maneira rápida, por meio da adição de ácidos ao composto de
51 A gaseificação pode ser definida como o processo de conversão termoquímica de um material sólido ou líquido (que
contém carbono na sua composição) em um produto gasoso combustível (gás de síntese), através da oxidação parcial à
temperaturas elevadas (reações termoquímicas numa faixa de temperaturas de 800°C a 1100°C) e em pressões atmosféricas
ou maiores, até 33 bar. (CORAL, 2009, p. 32). Toda essa reação ocorre através da queima da biomassa. Enfim, os processos
da rota termoquímica que são conhecidos como processos BTL (Biomass To Liquid) são na verdade sistemas de gaseificação
que operam de forma a limitar a oxidação completa do hidrogênio pela água, e do monóxido de carbono para dióxido de
carbono, assim, obtêm o gás de síntese, gás que será sintetizado por uma reação catalítica, o que torna possível a obtenção de
hidrocarbonetos, dos álcoois, do hidrogênio, da amônia, e do gás natural sintético. (LORA et al., 2008).
56
biomassa e, ao mesmo tempo, do controle da temperatura desta mistura, primeiramente
elevando a temperatura e na sequência (em poucos minutos) forçando a queda da temperatura.
Preservam-se assim intactos os monossacarídeos que serão usados para fermentação. De certa
forma, o composto recebe um “choque térmico” para que os ácidos não agridam os açucares.
A hidrólise enzimática é o processo tecnológico mais promissor como apontam os
trabalhos de Leal & Leite (2007); Nyko et al. (2010); Zilberman et al. (2013); Raele et al.
(2014); FAPESP (2015); Silveira et al. (2016); UNCTAD (2016) . As maiores expectativas
para a difusão da tecnologia de etanol celulósico ao longo prazo estão depositadas na
possibilidade de utilizar a “maquinaria bioquímica” de micro-organismos (fungos e bactérias)
para “desmontar” a parede celular. O problema é que, assim como os fungos desenvolveram
estratégias para invadir a parede celular, as plantas também co-evoluiram para sofisticar seus
mecanismos de defesa. Assim, embora haja fungos capazes de degradar a parede celular
vegetal, ela é bastante recalcitrante à degradação (BUCKERIDGE et al., 2010).
O desafio está em quebrar a estrutura da celulose que está organizada em grandes
estruturas chamadas polissacarídeos, que as leveduras não conseguem fermentar diretamente
para converter em etanol, mesmo após o processo de pré-tratamento. Com isso, a tecnologia
enzimática consiste em realizar a conversão bioquímica da celulose em açucares (glicose e
xilose) por intermédio das enzimas, proteínas produzidas por fungos, bactérias e plantas
capazes de causar reações químicas específicas, sem sofrer alteração em sua composição,
dessa maneira, sendo capazes de extrair açúcares da celulose para a produção de etanol
(FAPESP, 2010).
O quadro 1.2. pontua alguns problemas ainda não superados pelo arcabouço científico
e tecnológico do etanol de segunda geração, reforçando que se configura neste caso uma
corrida tecnológica a nível internacional em aberto. A produção do etanol celulósico ainda
encontra-se em uma fase pré-paradigmática permeada por incertezas, na qual as rotas
tecnológicas concorrem para estabelecer o standard da produção.
57
Quadro 1.2 Dificuldades tecnológicas ainda não superadas no etanol celulósico. Rota ácida Rota enzimática Rota termoquímica
* Alto custo de
investimento,
principalmente em
maquinário (devido à
natureza do material
dos equipamentos);
* Material resistente a
reações químicas que
sejam compatíveis com
os preços praticados no
setor.
* Desenvolvimento de sistemas de pré-
tratamento adequados para diferentes tipos de
biomassas;
* Desenvolvimento de processos de
destoxificações do produto da hidrólise;
* Desenvolvimento de novos tipos de enzimas
(selecionar micro-organismos ou desenvolver
geneticamente);
* Desenvolvimento de novas cepas de leveduras
capazes de fermentar os compostos hidrolisados
(C5).
* Os mecanismos/reações relacionados à
hidrólise enzimática não são bem conhecidos,
necessitando de investimentos em pesquisa
básica.
* São requeridas plantas
de grande capacidade para
alcançar viabilidade
econômica (alto custo de
investimento inicial);
* São requeridas grandes
quantidades de matéria
primas (planta
termoquímica = 500 t/h de
biomassa seca).
Fonte: elaboração própria.
- Hidrólise enzimática
A evolução da tecnologia enzimática requer o desenvolvimento ou a seleção de
microrganismos capazes de hidrolisar52
a celulose, tendo como subproduto açúcares (Hexoses
e Pentose) que devem ser fermentados e posteriormente destilados. A direção do
desenvolvimento desta tecnologia é a junção de todas as etapas em apenas um reator, ou seja,
realizar o pré-tratamento, a hidrólise, a fermentação e a produção de enzimas no mesmo
equipamento, utilizando-se do mesmo “conjunto” de micro-organismos, os quais devem ser
tolerantes as altas concentrações de etanol e produzir exclusivamente o etanol.
Este processo produtivo integrado é denominado de Consolidated Bioprocessing
(CBP), considerado como o ponto final na evolução da tecnologia de conversão da biomassa
(HARUN et al.; 2011; DAL POZ et al., 2015).
Portanto, o que se apresenta em 2016 são esforços em melhorar e desenvolver os
processos, tornando-os mais eficientes e integrados. Estas ações traduzem-se em um variável
grupo de modelos tecnológicos, a saber:
Separate Hydrolysis and Fermentation (SHF),
Separate Hydrolysis and Co-Fermentation (SHCF),
Simultaneous Saccharification and Fermentation (SSF),
Simultaneous Saccharification and CoFermentation (SSCF),
Consolidated Bioprocessing (CBP)
52
Processo químico de decomposição ou alteração de uma substância que envolve a divisão de uma molécula
pela água. (MICHAELIS, 2016)
58
De maneira geral, a tecnologia do etanol celulósico baseada na rota enzimática
apresenta as seguintes etapas53
: 1) pré-tratamento, 2) hidrólise; 3) fermentação e 4) destilação.
O nível de integração das etapas determina as características do modelo tecnológico do etanol
celulósico. Destaca-se, que a destilação ocorre igualmente ao etanol de primeira geração. A
figura 1.1. representa as diversas configurações que a tecnologia do etanol celulósico pode
assumir.
O pré-tratamento da biomassa consiste em uma degradação parcial da sua estrutura, no
qual o material lignocelulósico passa por um processo facilitador para a ação posterior dos
microrganismos. Os mais “comuns” são a explosão a vapor54
, a utilização de ácidos com
temperatura e pressão controladas55
, o hidrotérmico e o processo Organosolv; estas ações
abrem os caminhos para os agentes biológicos hidrolisarem as cadeias de polissacarídeos na
etapa seguinte, assim, o resultado do pré-tratamento é a separação da biomassa em celulose,
hemicelulose e lignina. As duas primeiras estruturas celulares serão hidrolisadas e a lignina56
será aproveitada para geração de energia elétrica, por meio da sua queima nas caldeiras
visando à geração de vapor.
Figura 1.1. Configurações tecnológicas do etanol celulósico – rota enzimática.
Fonte: elaboração a partir de BEVILAQUA, 2009.
53
Estas etapas ocorrem após o recolhimento, limpeza e secagem da matéria-prima. 54
A Iogen Corporation detém tecnologia baseada nesse processo, vale destacar que está presente na cooperação
tecnológica com a Raízen. 55
Uma das opções mais difundidas baseada nesse princípio é o Organosolv, pré-tratamento do material e
hidrólise são realizados simultaneamente num reator contínuo. A tecnologia desenvolvida pela Dedini Indústria
de Base é baseada nesse conceito 56
A lignina não é um hidrato de carbono e não pode ser hidrolisado e fermentado.
59
O segundo processo é a hidrólise enzimática. Como foi dito anteriormente, visa à
quebra da estrutura celular da celulose para obtenção da glicose (C6) e da xilose (C5). Esta
ação não é trivial, visto que os compostos enzimáticos apresentam rendimentos heterogêneos,
dependendo do tipo da biomassa e do pré-tratamento desempenhado. Assim, é necessário
ampliar os desenvolvimentos em engenharia genética para desenvolver fungos ou bactérias
adequadas para cada tipo de material ou um conjunto biotecnológico capaz de atuar
igualmente independente das condições da biomassa.
O terceiro processo é a fermentação da glicose e da xilose. Esta etapa é complicada,
pois as leveduras tradicionais, tais como a Saccharomyces cerevisiae, não conseguem
fermentar estruturas compostas por cinco carbonos (a xilose), assim, é necessário separar esta
etapa em duas, com isso, aumentam-se os custos e desperdiça-se uma quantidade expressiva
de açucares para a produção de etanol. A outra opção é a utilização de Organismos
Geneticamente Modificados (OGM) para realizar este processo de maneira completa, de tal
modo, a busca do setor nessa etapa produtiva é por novas variedades de leveduras.
A configuração mais madura para a produção do etanol celulósico, que está agora na
fase de demonstração e comissionamento, é a realização de todas as etapas de hidrólise e
fermentação em reatores separados; este conjunto tecnológico é denominado de Separate
Hydrolysis and Fermentation (SHF). Portanto, os esforços de desenvolvimento caminham na
direção da superação dos pontos de estrangulamento do pré-tratamento, que é relativamente
caro e ineficiente. E, na busca por micro-organismos geneticamente modificados, com a
remoção e adição de características genéticas que permitam a redução do número de etapas do
processo de conversão. A evolução tecnológica caminha para a combinação e realização
conjunta desses processos em um mesmo reator (HARUN et al.; 2011; MAIO; HENNESSY;
BABCOCK, 2012; DAL POZ et al., 2015).
1.3. A ABORDAGEM METODOLÓGICA SUBJACENTE À ANÁLISE DE SISTEMAS
DE INOVAÇÃO
O ferramental analítico se apoia na análise do Sistema Setorial de Inovação, pois
possibilita trabalhar a inovação como um processo interativo entre uma grande variedade de
atores, enfatizando que as empresas não inovam isoladamente. Em outros termos, trabalha a
inovação como um processo coletivo. Portanto, buscou compreender como as empresas
interagem com outras empresas, bem como, com organizações não-empresas para fazer
60
avançar a tecnologia, tendo como norte a exploração integral da biomassa (GUENNIFA &
RAMANI, 2012; JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009; OYELERAN-OYEYINKA &
RASIIAH, 2009; FREEMAN, 2008; MALERBA, 2007; MALERBA, 2002; LUNDVALL et
al., 2002; CARLSSON et al., 2002; MALERBA, 2003)57
.
A abordagem escolhida pela pesquisa deriva da condição histórica do setor58
e também
de premissas teóricas e conceituais ligadas ao conceito de Sistema Setorial de Inovação (SSI),
o qual permite interpretar, analisar e propor intervenções no nível meso, fazendo
necessariamente uma ponte entre o macro - formação social e econômica do país59
– e o nível
micro - dinâmica das firmas (JOSEPH, 2009; OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH,
2009).
Nesta perspectiva, o ferramental analítico do SSI vai além do agregado e foca nas
particularidades que compõem a estrutura produtiva de uma nação, a partir das características
que compõem o setor, da identificação e compreensão dos agentes e das suas relações. O
conceito de SSI é útil para pensar as especializações econômicas dentro da heterogeneidade
estrutural que compõe a estrutura produtiva das nações (MALERBA, 2002), organizar as
evidências históricas e estudar os processos de catching-up60
dos países retardatários no que
diz respeito à acumulação de capacidades industriais (JOSEPH, 2009; LUNDVALL, 2009;
OYELERAN-OYEYINKA & RASIIAH, 2009).
Metodologicamente, a abordagem de Sistema de Inovação - nacional/regional/setorial
- é compreendido como focusing device, tendo como objetivo analisar e compreender o
processo de inovação, para além da dinâmica de alocação recursos (LUNDVALL et al.,
2009). Desta forma, explica a relação entre os agentes de diferentes origens, os quais em
conjunto desenvolvem e transmitem conhecimento economicamente útil. É uma alternativa
57
A revisão conceitual dos Sistemas de Inovação nos permite trabalhar com a dimensão real do objeto, através
da análise do concreto, priorizando o trabalho empírico para caracterizar e compreender o setor sucroalcooleiro. 58
Seguindo de maneira aproximada as categorias de Pavitt (1984) o setor sucroalcooleiro pode ser caracterizado
como Supplier Dominated por apresentar tradicionalmente baixa capacidade em P&D e sua trajetória tecnológica
ser basicamente conduzida pela redução dos custos. Desta forma, trabalhar com outros agentes além das firmas
processadoras de cana-de-açúcar se faz imprescindível para compreender o processo de inovação. Elementos
mais precisos dessa dinâmica são demonstrados nos capítulos 2 e 4. 59
Quando nos referimos ao nível macro pensamos nas condições gerais que dizem respeito ao processo de
desenvolvimento das nações, com isso, o recorte está sobre a dinâmica do progresso técnico, ou seja,
incorporamos e identificamos características gerais do Sistema Nacional de Inovação. 60
Este conceito é compreendido como efetivação e continuidade do esforço para superação do atraso econômico,
social ou tecnológico que um dado país/região/setor possa apresentar em relação aos países líderes ou em relação
à fronteira do conhecimento (FARIA, 2014).
61
para compreender como as firmas e outras organizações adquirirem novas habilidades e
competências (IIZUKA, 2013; ALBUQUERQUE et al., 2012).
Compreende-se que os agentes interagem e aprendem, em vez de fazerem simples
escolhas racionais61
. O SI descreve as interações entre as várias instituições, organizações e
firmas, que na maioria das vezes, funcionam sem depender uma das outras, abordando tanto
as relações daqueles que cooperam como daqueles que competem. O objetivo de se apropriar
deste constructo teórico é a possibilidade de identificar e caracterizar o driving force da
inovação do setor estudado, ou seja, realizar um contorno analítico das ações dos agentes que
circundam e influenciam o comportamento inovativo das firmas. Tal pretensão é fortemente
balizada por estudos anteriores que utilizaram esta abordagem para o segmento
sucroalcooleiro brasileiro, tais como: Andersen (2011); Furtado et al. (2011); Albuquerque et
al. (2012); Campos et al. (2015); SOUZA et al. (2016).
As categorias formadoras do conceito de SSI são referenciadas por Malerba (2002,
p.250) e estão expostas de maneira sumarizada no quadro 1.3. Ao longo desta pesquisa, estes
elementos conceituais são utilizados e relacionados com a realidade do SSI da cana-de-açúcar,
buscando compreender as características pertinentes às atividades inovativas do setor. Ao
trabalhar com estas categorias assume-se o formato metodológico da análise de Sistemas de
Inovação, visto que a identificação destas categorias na realidade produtiva proporciona o
entendimento das características atuais do setor sucroenergético do Brasil.
61
Nelson & Winter (2005).
62
Quadro 1.3. Categoria e tipologia da abordagem de SSI. Categorias Definição
Produto Setorial Bens ou serviços comercializados pelas firmas em dado mercado.
Agentes/Atores
Dois “tipos” de agentes/atores: 1) as Firmas (produtores, fornecedores, consumidores),
juntamente, com as organizações que delas descendem, como os departamentos de
P&D ou consórcio de empresas; 2) as organizações não-empresa, tais como
universidades, institutos de pesquisa, instituições de fomento, agências e órgãos
governamentais.
Conhecimento e o
processo de
aprendizagem
Cada setor é caracterizado por uma base de conhecimento específica em relação aos
seus produtos, portanto, é a lucidez e o entendimento sobre o universo da produção que
se insere. O conhecimento exerce um papel central na inovação, afetando a forma de
aprendizagem e as capacidades requeridas para as firmas. O conhecimento é altamente
idiossincrático no nível da firma, não é difundido automaticamente e
proporcionalmente entre as firmas. A fonte do conhecimento afeta a forma, tamanho e
a desempenho da firma. Estes elementos são à base dos micros fundamentos do
processo de aprendizagem: know-how e know-who e know-what e know-why.
Base tecnológica
Base tecnológica ou tecnologias básicas são componentes técnicos ou conjuntos de
saberes que definem os setores e os subsetores produtivos. A matriz tecnológica é uma
fração das forças produtivas necessárias para o estabelecimento da produção em si.
Esta base técnica difere de setor para setor, podendo apresentar complementaridades ou
contradições.
Mecanismos de
interação dentro
das firmas e fora
delas
A interação é compreendida como formas de comunicação formais e informais
voltadas à inovação, assim, são associadas ao processo de aprendizagem, adoção de
ideias e de projetos específicos ou práticas coletivas de relevância econômica. Estas
interações podem ser intermediadas por transações de mercado ou extramercado. Suas
formas traduzem-se em redes de inovação; projetos de pesquisa com cooperação
interinstitucional; participação em eventos técnicos e científicos; mobilidade entre
trabalhadores e pesquisadores; estabelecimento de canais de comunicação entre
fornecedor-usuário e etc.
Processos de
competição e
seleção
São os processos concorrenciais desempenhados pelas firmas, com objetivo de
“sobreviver” ao longo prazo. O ambiente de mercado oferece uma definição de sucesso
para as firmas de dado setor, as quais segundo as suas habilidades, competências e
recursos buscam se posicionar em relação às demais, na liderança ou sendo seguidora.
Instituições
As instituições são/incluem: normas, rotinas, hábitos comuns, práticas estabelecidas,
regras, leis, padrões. Em suma, é um conjunto de regras que permeiam o setor e
estabelecem a “normalidade” do ambiente de interação e competição das firmas e dos
outros agentes. Essa realidade forma a cognição dos agentes e a ação dos mesmos, bem
como, direciona e interfere na interação entre eles, vincula e impõe aos agentes
dimensões das interações.
Fonte: elaboração a partir de MALERBA, 2002; MALERBA, 2003; NELSON & WINTER, 2005;
LUNDVALL, 2007; JOSEPH, 2009; MALERBA & MAIN, 2009; ALBUQUERQUE et al., 2012.
As análises e os conteúdos contidos nos capítulos da presente tese buscam dar
representatividade concreta às definições expostas pelo quadro 1.3, com isso, evidencia as
categorias de maneira articulada com a realidade do SSI da cana-de-açúcar. O constructo
teórico e metodológico é utilizado de maneira a aproximar o presente trabalho à abordagem
dos Sistemas Setoriais de Inovação, com isso, o objetivo dos capítulos é identificar e
relacionar as particularidades do setor com os elementos gerais que são fornecidos pela teoria.
63
Assim, buscou compreender a dinâmica do setor sucroenergético brasileiro na transição do
etanol de primeira geração para a o etanol celulósico.
Nesse contexto, o SSI é considerado como um quadro analítico que facilita o
monitoramento e a compreensão da dinâmica econômica, capturando a estrutura do setor, pois
estabelece uma abordagem que foca nos links entre os artefatos e os agentes. Nessa dinâmica,
o processo de aprendizagem ganha importância central, pois a maneira como os atores
aprendem, determina a forma e a intensidade das relações entre as partes do sistema, e, é
nessa situação que se define as características do setor, seus limites e sua interdependência
setorial. Estes elementos são próprios para compreender as transformações estruturais do
setor, fato que evidência relação entre mudança tecnológica e o desenvolvimento econômico
setorial.
1.3.1. Procedimentos metodológicos e ações para estruturação da pesquisa
De maneira geral, a realização da pesquisa ocorreu por meio de três procedimentos
metodológicos: 1) pesquisa bibliográfica; 2) trabalho de campo e entrevistas, 3) coleta e
tratamento dos dados secundários. A revisão da literatura ocorreu por intermédio de buscas
coordenadas e planejadas nas bases de artigos científicos, tais como Scopus, Web of Science e
Jstor. As leituras versavam sobre: 1) o setor sucroalcooleiro; 2) desenvolvimento das energias
renováveis; 3) progresso técnico e desenvolvimento; 4) Teoria Evolucionaria; 5) Sistemas de
Inovação; 6) políticas públicas e inovação; 7) tecnologia do etanol celulósico; 8) biorrefinaria
e bioeconomia; 9) Catching up e os países periféricos; 10) inovação na agricultura.
As entrevistas foram realizadas junto a indivíduos que tinham relação significativa
com o objeto de estudo62
. A identificação destes “personagens” ocorreu por meio de buscas
nos site das empresas, instituições ligadas ao desenvolvimento do etanol celulósico no Brasil
e pela participação em eventos ligados ao setor sucroenergético. Os quadros 1.4. e 1.5
destacam os atores entrevistados e a participação em eventos setoriais, bem como a visita
técnica feita na planta de etanol celulósico da Raízen, estas ações tiveram a função de
aproximar o pesquisador do objeto de estudo - trabalho de campo.
62
As entrevistas seguiram um questionário semiestruturado.
64
Quadro 1.4. Entrevistas e códigos Entrevistas Presenciais
Instituição/Firma Posição Data Código
CTBE Gestor de Negócios abril/2015 Entrevista I
UNICA Diretor Executivo junho/2015 Entrevista II
UNICA Consultor de Emissões e Tecnologia junho/2015 Entrevista III
BioCelere Gerente de Inovação setembro/2015 Entrevista IV
FINEP Ex-Presidente fevereiro/2017 Entrevista V
CTC Gerente de Desenvolvimento Industrial fevereiro/2017 Entrevista VI
CTBE Diretor maio/2017 Entrevista VII
Raízen Diretor Executivo de Tecnologias e Projetos maio/2017 Entrevista
VIII
Cenpes/Petrobras Gerente de Biotecnologia maio/2017 Entrevista IX
BNDES Gerente do Departamento de Biocombustíveis junho/2017 Entrevista X
Fonte: elaboração própria.
Quadro 1.5. Eventos setoriais, visita técnica e códigos.
Trabalho de campo /Eventos Evento Cidade Data Código
Ethanol Summit São Paulo/SP junho/2015 Campo I
Vista técnica a planta de E2G da Raízen (promovido
pelo Programa Integrado de Doutorado em
Bioenergia, prof. Carlos Alberto Labate, Dep.
Genética da ESALQ/USP)
Piracicaba/SP Junho/2016 Campo II
III Seminário Internacional sobre Uso Eficiente do
Etanol Campinas/SP setembro/2016 Campo III
UNICA Fórum São Paulo/SP novembro/2016 Campo IV
Proálcool, universidades e empresas: 40 anos de
ciência e tecnologia para o etanol brasileiro São Paulo/SP novembro/2016 Campo V
Simpósio Inovações no Setor Sucroenergético
(PECEGE/ESALQ) Piracicaba/SP dezembro/2016 Campo VI
Ethanol Summit São Paulo/SP Junho/2017 Campo VII
Fonte: elaboração própria.
A coleta e o tratamento dos dados secundários foram feitos a partir de bases de dados
de instituições governamentais e privadas segundo as necessidades da construção da narrativa
da tese, assim, estas informações buscaram consolidar os argumentos da tese, demonstrando
os efeitos da reorganização dos modos de inovação do Sistema Setorial de Inovação da cana-
de-açúcar e, principalmente, fornecendo uma dimensão espacial e econômica do setor,
objetivo da análise destes dados. As bases mais importantes e os tipos de informações obtidas
em cada uma delas estão expostos no quadro 1.6.
65
Quadro 1.6. Bases de dados mais relevantes utilizadas na pesquisa até out./ 2016. Instituição Tipo da informação
Ministério da
Agricultura, Pecuária
e Abastecimento
(MAPA)
Estatísticas e informações sobre agroenergia. Utilizando as séries históricas do setor
sucroalcooleiro e os dados atualizados das exportações, preços e produção do setor.
Com isso, a principal fonte foi o Anuário Estatístico da Agroenergia (2009, 2010 e
2012). Portanto, importante para caracterizar a dinâmica econômica do setor.
Instituto Brasileiro de
Geografia e
Estatística (IBGE)
Duas bases de dados, a saber: 1) Sistema IBGE de Recuperação Automática
(SIDRA), os dados coletados fornecem uma visão geral da produção de cana-de-
açúcar no Brasil, fornecendo área plantada, rendimento, produção, valor da produção
e outras variáveis ligadas a fase agrícola do setor. O importante é abrangência
temporal e espacial desta base, já que traz informações por municípios e desde 1940;
2) Pesquisa de Inovação (PINTEC), dados sobre atividade inovativa da indústria
processadora de cana-de-açúcar. Os dados ainda não foram processados. Importante
para caracterizar a dinâmica econômica do setor.
Empresa Brasileira
Energética (EPE)
Utiliza-se as informações provenientes dos Planos e Balanços realizados pela
instituição, que são: 1) Balanço Energético Nacional (BEM); 2) Plano Decenal de
Expansão de Energia; 3) Estudos da Demanda de Energia. Estas informações
apresentam um quadro geral da produção do etanol no Brasil e, principalmente, uma
visão de futuro do Estado em relação ao segmento. Ademais, estes relatórios são
fontes de orientação para os atores do SSI da cana-de-açúcar sobre o futuro da matriz
energética e qual o papel tem/terá o etanol em relação às outras fontes de energia. ,
importante para caracterizar a dinâmica econômica do setor e posiciona-lo no
conjunto da matriz energética nacional.
Revista Nova Cana
Empresa privada ligada a divulgação e a informações especializadas no setor
sucroenergético. O NOVACANA DATA reúne dados sobre o setor tais como:
exportações, importações, produção, consumo, dados internacionais, dados sobre a
indústria automobilística, dados sobre os desembolsos do BNDES, dados de produção
por usina entre outros. Os dados são provenientes das próprias usinas e de instituições
públicas; a grande vantagem é que estas encontram-se organizadas e de fácil acesso,
por tratar-se de uma plataforma digital. Importante para caracterizar a dinâmica
econômica do setor e detalhar informações por firma.
Questel Orbit
É uma plataforma que reúne dados de 96 escritórios de propriedade intelectual,
abrangendo os países mais relevantes no desenvolvimento tecnológico. Possui um
sistema de busca e análise de informações contidas em patentes e desenhos
industriais. Por meio dos dados de patentes foi possível identificar a base do
conhecimento da tecnologia de segunda geração, os principais atores que buscam
desenvolver a rota tecnológica, a evolução da tecnologia e os principais países onde
esta tecnologia é desenvolvida.
Scopus
A Scopus é a base referencial da Editora Elsevier, a qual indexa títulos acadêmicos
revisados por pares, títulos de acesso livre, anais de conferências, publicações
comerciais, séries de livros, páginas web de conteúdo científico e patentes de
escritórios. Cobre as áreas de Ciências Biológicas, Ciências da Saúde, Ciências
Físicas e Ciências Sociais. Sua base abrange acessos desde 1823 até o presente
RAIS/MTE
Informações sobre vínculos formais de trabalho elaboradas pelo MTE (Ministério do
Trabalho e Emprego), especificamente sobre o setor sucroalcooleiro. Com estas
informações pode-se perceber a evolução dos empregos formais no setor e qual a sua
relevância para o mercado nacional de trabalho. Informações relevantes para
complementar a caracterização do SSI da cana-de-açúcar.
Ministério de Ciência,
Tecnologia e Inovação
(MCTI)
- Foram utilizados os dados e informações disponíveis no site do ministério e,
principalmente, as informações trazidas nos planos nacionais (PACTI e ENCTI) e dos
relatórios de projetos contratados pela FINEP e pelo CNPq, estes relatórios remetam à
carteira de projetos financiados com recursos dos Fundos Setoriais. Em relação ao
FINEP os dados são de 1999 a 2015, totalizando 9.617 projetos contratados pela
instituição, no caso da CNPq, o banco de dados remete ao período entre 1997 a 2015,
com 33.057 projetos contratados (estes números referem-se ao total dos projetos, os
dados especificamente do SSI da cana-de-açúcar estão expostos no capítulo 3).
- Tais informações revelam o esforço nacional sistematizado para fazer avançar a
66
C&T relacionada ao setor, com isso, identificam-se os atores, as áreas de pesquisa, os
temas mais relevantes para o progresso técnico do setor, as interações nas atividades
de pesquisa e apresenta-se uma noção do montante aportado para desenvolvimento de
novas tecnologias.
Portal da Legislação
Disponibiliza todas as leis, decretos, medidas provisórias, atos constitucionais e
outras ações do poder executivo. Com as informações disponíveis no repositório de
legislação é possível ter uma visão abrangente das ações do Estado brasileiro ao longo
do tempo em relação ao setor sucroalcooleiro. Portanto, identifica-se a criação do
arcabouço institucional relaciona a produção de açúcar e etanol no Brasil. Os dados
retirados dessa busca mostram ações do Estado nacional desde 1809 visando
estabelecer e desenvolver o segmento da cana-de-açúcar no território nacional.
Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado
de São Paulo
(FAPESP)
Por meio de buscas no site e nos principais programas de apoio a pesquisa e a
inovação implementado pela instituição ao longo dos anos 2000, foi possível
encontrar um grande volume de iniciativas com relação ao setor sucroenergético. As
principais fontes foram: 1) Projeto Sucest-FUN; 2) Programa para a Pesquisa em
Bioenergia (BIOEN); Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação
Tecnológica (PITE); Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE).
Fonte: elaboração própria.
Os resultados destas estratégias de pesquisa aparecem em todos os capítulos da tese,
obviamente com “pesos” distintos. A seguir expõem-se por capítulos63
os procedimentos
metodológicos e as categorias de SSI que foram mobilizadas por meio dos dados obtidos e
das relações estabelecidas.
1.3.1.1. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 2
O capítulo 2 expõe o processo de formação do SSI da cana-de-açúcar, que se dá por
meio da reconstrução da trajetória de desenvolvimento do setor, apontando as características
históricas e, principalmente, indica o start da mudança atual, ou seja, o esforço da passagem
da produção do etanol de primeira geração para o de segunda geração. Para tal, se baseia na
revisão bibliográfica e na consulta da legislação federal, nos planos, nos programas e projetos
estabelecidos pelo Estado brasileiro em relação ao setor sucroalcooleiro (vide quadros 3 e 4,
apêndice A e capítulo 2).
Realiza-se o levantamento da construção do arcabouço institucional e a identificação
dos principais agentes/atores que compõem o SSI da cana-de-açúcar (vide figura 2.1. no
capítulo 2). A institucionalidade reconstruída ao longo do capítulo 2 é dada pela exposição e
análise das leis, planos e projetos implementados pelo governo federal ao longo do tempo.
Para isso utilizou-se do Portal da Legislação do Governo Federal, um banco de “dados”
63
Faz-se uma exceção para o presente capítulo, pois este tem objetivo de apresentar as bases teóricas e
conceituais da tese, além dos procedimentos metodológicos, facilitando a leitura dos próximos capítulos,
dedicados a expor os resultados e os rebatimentos destes para a abordagem de Sistemas de Inovação e para o
setor sucroalcooleiro brasileiro.
67
público que disponibiliza todas as medidas emitidas pelos governos federais, do período do
império até o presente momento (vide quadro 1.7.).
Quadro 1.7. Equação de busca para Base da legislação Federal Data Termos da busca Número de documentos
recuperados
Documentos
efetivamente
trabalhados na tese
26/05/2016 cana-de-açúcar or açúcar or
álcool or álcool-motor or etanol
445 81
Fonte: Elaboração própria.
Deste modo, foi possível criar um banco de dados com todas as medidas institucionais
relacionadas ao setor, possibilitando o mapeamento das políticas públicas e evidenciando a
evolução do arcabouço institucional ao longo dos anos e dos diferentes governos, indicando
uma permanência das questões relacionadas à indústria canavieira na pauta nacional. A busca
ocorreu a partir da inserção de palavras-chaves no campo de pesquisa avançada da base; o
quadro 1.7. expõe a quantidade de documentos recuperados e a própria equação de busca.
Os documentos efetivamente trabalhados compõem a figura 2.1., ou seja, são as
medidas que foram analisadas e inseridas na construção da interpretação da formação do
arcabouço institucional do SSI da cana-de-açúcar. Estas foram consideradas mais relevantes,
pois versam diretamente sobre o setor ou por desencadear ações no setor ou ainda, por criar
instituições que interagem com o segmento (exemplos o IAA, EPE, CNPE e etc.). A escolha é
arbitrária, entretanto, foi tomada a partir da leitura da descrição de cada uma das 445 medidas
e com atinência à história do setor (revisão bibliográfica64
).
A partir do levantamento das ações implementadas pelo Estado brasileiro, foi possível
construir um “retrato” do arcabouço institucional, não apenas das suas dimensões atuais, mas
também da sua evolução. Essa perspectiva buscou uma visão holística da realidade
abrangendo diversos tipos de instrumentos, ações que vão além da ótica da criação do
mercado ou correção deles. As informações levantadas possibilitam compreender como o país
desenvolveu o mercado e competências tecnológicas ligadas ao setor do açúcar/etanol,
fazendo o setor avançar no interior das suas fronteiras, bem como criam um ambiente para o
desenvolvimento do capital nacional neste segmento.
64
SAMPAIO, 1973; MELO & FONSECA, 1981; LEITE, 1990; OLIVER & SZMRECSÁNYI, 2003; LEÃO,
2005; VIEIRA; 2007; CGEE, 2009; NEGRI, 2010; NEME, 2010; ANDERSEN, 2011; SAFATLE, 2011.
68
Outro ponto que diferencia o trabalho é a noção de continuidade e evolução do
arcabouço institucional. O trabalho mostra que o desempenho atual é fruto da construção de
uma trajetória em políticas públicas focalizadas no segmento sucroenergético, que
acompanhou a trajetória do açúcar e do etanol de primeira geração - mostra-se a coevolução
do SSI da cana-de-açúcar, o desenvolvimento de capacidades tecnológicas e produtivas não é
fruto de ações isoladas, mas sim, uma ação coletiva repleta de interações entre os atores do
SSI.
A análise e o mapeamento das medidas e ações institucionalizadas do Estado brasileiro
em relação ao SSI da cana-de-açúcar abrangem o período de 1875 a 2016, realiza-se por meio
de uma estrutura de categorias de políticas públicas derivadas dos conceitos de technology-
push65 e demand-pull66 (TPDP), par conceitual próprio da literatura destinada à relação entre
inovação e políticas públicas. Os tópicos a seguir delimitam os três grandes grupos de
políticas públicas:
1) Instrumentos que estimulam a criação, manutenção e expansão da
capacidade produtiva local (produção): consideram-se nesta categoria aqueles incentivos
que estão dirigidos às indústrias localizadas no país. Isto abarca desde incentivos monetários –
na forma de incentivos fiscais, subsídios ou subvenções para expandir a capacidade produtiva,
até a criação de condições favoráveis para as firmas se inserirem ou se desenvolverem numa
determinada região. Como exemplos, temos: metas de produção, controle dos preços do
açúcar ou da cana-de-açúcar; taxas diferenciadas para importação de equipamentos; linhas de
crédito para expansão/modernização da estrutura produtiva; criação de organizações que
regulamentam ou orientam o setor e etc.
2) Instrumentos que estimulam o consumo do etanol (Consumo): nesta
categoria são incluídos os instrumentos que favorecem o consumo do etanol, ou seja, aqueles
que criam ou mantém o mercado. Estes instrumentos se dão na forma de: i) mandados de
mistura do etanol à gasolina; ii) incentivos que criam condições para que o etanol torne-se
atrativo ao consumidor (controle do preço, taxas sobre o combustível concorrente, etc.); iii)
65
As políticas voltadas para o technology-push incluem ações conduzidas pelo governo que ampliam a oferta de
novos conhecimentos e/ou reduzem os custos para as empresas desenvolverem inovações. Com isso, incluem-se
nesta perspectiva os investimentos em educação e formação de mão de obra especializada, a concepção e
disponibilidade de subsídios e de créditos para o fomento das atividades de P&D e de projetos de demonstração. 66
As políticas de demand-pull são ações governamentais que aumentam as recompensas para investimentos em
inovações por meio de uma variedade de medidas, tais como a expansão do mercado. Assim, os instrumentos
que se encaixam nesse conceito são: subsídios ao consumidor final, mandatos de mistura entre etanol e gasolina;
a proteção da propriedade intelectual, isenção e reduções de taxas, contratos/compras públicas, estabelecimento
de padrões técnicos e outros.
69
expansão da frota de veículos a etanol ou Flex Fuel (renovação da frota de veículos públicos,
redução do IPI, expansão do crédito etc.)
3) Instrumentos que estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou aprendizado
tecnológico: congrega os instrumentos que promovem o desenvolvimento e aprimoramento
dos distintos conhecimentos e/ou tecnologias que compõem a produção de cana-de-açúcar e
de etanol. Esse tipo de política é majoritariamente monetário, caracterizando-se pela criação
de programas de P&D e de infraestruturas voltadas à pesquisa e/ou ensino, portanto, são os
financiamentos de projetos executados por instituições de pesquisa, empresas, ou por
parcerias entre elas. Concentram-se nas ações da CNPq, FINEP, BNDES e FAPESP. Outro
exemplo destas ações são os projetos demonstrativos, os quais se caracterizam por serem um
teste “controlado” e serem fonte de informações para novas ações, tanto para a indústria como
para o Estado, como são os casos das plantas de etanol celulósico do Brasil. Estas medidas
serão analisadas com maior profundidade nos capítulos 3 e 5.
A definição das categorias para a análise de políticas foi inspirada nos trabalhos de
Mowery & Rosenberg (1979); Chindamber & Kon (1993); Waltz et al. (2008); Nemet (2009);
Camillo (2014); Zhang et al. (2014); Pereira et al. (2015) e Xu & Su (2016). O ponto de
contato entre estes trabalhos é a influência dos conceitos de Technology-push e Demand-pull
(TPDP) como guia teórico para a compreensão e/ou análise do processo de inovação em um
determinado setor/área. Este par conceitual revela uma visão geral da racionalidade das
políticas públicas, as quais contribuem com o processo de desenvolvimento, difusão e adoção
das novas tecnologias.
Tais conceitos são inspirados nas discussões neoshumpeterianas, tendo como foco a
relação entre inovação, progresso técnico e desenvolvimento. Portanto, o par conceitual
Technology-push e Demand-pull (TPDP) inter-relaciona-se com a busca pela compreensão da
dinâmica econômica e social que cerca uma nova tecnologia. Ao se utilizar deste conceito
cria-se um canal de comunicação entre a teoria e a pesquisa sobre a passagem do etanol de
primeira geração para o etanol celulósico.
Este par conceitual é utilizado para complementar e aprofundar a categoria de
instituição da abordagem de SSI, pois as mudanças institucionais influenciam a mudança
70
técnica, uma vez que fornecem novos estímulos aos atores do Sistema de Inovação, podendo
desencadear novos processo de aprendizagem e/ou novas competências para inovar67
.
Os conceitos de Technology-push e Demand-pull (TPDP) trazem luz sobre a dinâmica
do setor, mas, a conformação do seu arcabouço institucional passa por um aprofundamento
desta realidade e, é justamente este diálogo que é construído por esta pesquisa,
principalmente, por meio do detalhamento das políticas públicas pró cana-de-açúcar (vide
capítulos 2, 3 e 5). Com isso, a pesquisa avança na compreensão da dinâmica do progresso
técnico, identificando elementos da introdução do etanol celulósico, situação que é em grande
medida forjada pelas políticas públicas proporcionando os primeiros impulsos para essa
mudança.
Por meio destes grupos ou subcategorias de políticas públicas – Produção, Consumo e
C&T - percebe-se a existência de vários tipos de instrumentos, os quais se destinam a
áreas/dimensões específicas do SSI, mostrando que a variedade faz parte da construção do
arcabouço institucional de uma indústria, já que para cada dimensão existe um conjunto de
medidas institucionais assumidas pelo Governo.
Portanto, para melhor compreender a racionalidade das políticas/medidas encontradas,
bem como trabalhar com as informações e com os desdobramentos destas ações, trabalha-se
em duas frentes de análise68
. No capítulo 2, juntamente com o processo histórico de formação
do SSI da cana-de-açúcar, aborda-se de maneira concomitante, os instrumentos que estimulam
a criação, manutenção e expansão da capacidade produtiva local e os instrumentos que
estimulam o consumo do etanol, pois entende-se que estas ações contribuíram decisivamente
para a formação e expansão do setor sucroalcooleiro. Esta opção metodológica articula-se
com elementos da abordagem de SSI, visto que trabalha com parte das instituições
desenvolvidas pelo sistema e com a evolução destas, fator primordial para o progresso técnico
(NELSON & WINTER, 2005; KIN, 2006; MALERBA & MAIN, 2009).
A segunda frente dedica-se exclusivamente aos instrumentos que estimulam o
desenvolvimento da C&T e/ou aprendizado tecnológico que é trabalhada apenas no capítulo
67
Esta dinâmica é aprofundada nos capítulos 3 e 5, momento que se utiliza desta estrutura conceitual para
analisar especificamente as políticas voltadas à C&T e ao aprendizado tecnológico do setor, identificando
esforços na direção do STI-mode. 68
Segundo Camillo (2014), uma análise deste tipo permite uma maior organização, mas não implica que essas
políticas devam ser estudadas de forma isolada, pois parte-se do princípio de que os instrumentos de incentivo
devem agir de forma coordenada e que a atuação numa esfera pode ter implicações em outras. Por exemplo, os
incentivos diretos ao consumo podem estimular, por consequência, a expansão da capacidade produtiva local e
também o desenvolvimento científico e tecnológico
71
3. Tais medidas recebem maior atenção pelo fato de carregarem elementos importantes da
mudança de trajetória tecnológica, como por exemplo, o financiamento de pesquisas sobre
etanol celulósico, fator novo no segmento e crucial para a trajetória de aprendizado em nova
rota tecnológica.
Por fim, como coloca Nemet (2009), compreender a função e o propósito dos
instrumentos institucionais é fundamental para entender as transformações setoriais, pois o
mix de políticas públicas é capaz de estimular o desenvolvimento de setores, rotas
tecnológicas ou dar origem a um novo segmento. Assim, o capítulo 2 vai além de uma
simples retomada histórica por meio de revisão bibliográfica, retomando elementos da sua
própria formação e as ações institucionalizadas do Estado brasileiro para a formação da
indústria da cana-de-açúcar.
1.3.1.2. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 3
O terceiro capítulo é um desdobramento direto do capítulo anterior, pois centra
esforços em demonstrar como as políticas públicas implementadas pelo Governo Federal e
pelo Estado de São Paulo, na década de 2000, foram decisivas para a criação das primeiras
iniciativas do etanol celulósico em escala industrial. Desta forma, o capítulo 3 evidencia as
características e o conteúdo das ações relacionadas à C&T e ao aprendizado tecnológico do
setor sucroenergético, passando pelas ações da CNPq, FINEP, BNDES e FAPESP, dando
maior destaque aos planos PAISS Industrial e PAISS Agrícola.
Para isso, vale-se dos seguintes procedimentos metodológicos: a) revisão bibliográfica
específica de políticas públicas para energias renováveis; b) revisão bibliográfica sobre
políticas públicas e etanol celulósico; c) coleta de dados e informações relacionadas às
políticas públicas implementadas pelo Brasil na esfera do etanol celulósico (jornais, revistas e
sites); d) entrevistas com atores do SSI da cana-de-açúcar.
Para mobilizar estes elementos da abordagem de SSI trabalhou-se com o resultado do
mapeamento das ações institucionalizadas do Governo do Estado de São Paulo e do Governo
Federal, em relação à C&T e ao aprendizado tecnológico, para isso, foram realizadas buscas
nos sites, relatórios e editais lançados pelo BNDES, CNPq, FINEP, FAPESP objetivando
encontrar programas e projetos de pesquisa financiados ou coordenados por estas
organizações; as fontes aparecem descritas no quadro 3.
72
A busca ocorreu por meio de palavras-chaves (cana-de-açúcar; sucroalcooleiro,
sucroenergético; etanol; bioetanol; álcool; biocombustíveis; biomassa; enzimas, enzimática;
etanol celulósico; etanol de segunda geração; material lignocelulósico). Foi encontrado um
conjunto amplo de ações, as quais compõem o banco de dados dessa pesquisa, algumas ações
mais relevantes estão expostas nominalmente no capítulo 3 e capítulo 5, sendo trabalhadas
qualitativamente ao longo da tese.
As informações provenientes do mapeamento das políticas públicas (C&T),
juntamente com as ações metodológicas já citadas, fornecem as seguintes informações: 1) o
período de maior esforço em pesquisa no setor; 2) o volume de projetos contratados; 3) o
valor aportado de cada projeto; 4) uma visão aproximada do montante gasto em P&D no setor
sucroenergético; 5) o tipo de tecnologia que mais recebeu atenção e aportes no período; 6)
detalhes “técnicos” das iniciativas; 7) identifica-se atores, percebendo quais firmas e quais
ICTs detém competências na área e quais são as responsáveis por conduzir os projetos de
pesquisa; 8) é possível identificar as parcerias estabelecidas dentro de cada projeto de
pesquisa; 9) identifica quais áreas do conhecimento formam as bases das novas tecnologias.
As informações organizadas possibilitam identificar elementos das categorias da
abordagem de SSI no plano real (atores, mecanismos de interação, instituições) Acrescenta-se
que esta dinâmica mostra-se distinta das características do período anterior, pois estas ações
se articulam ao processo de reestruturação do setor dos anos 2000, onde o esforço em
desenvolver o STI-mode se mostra mais palpável, uma vez que as ações em desenvolver novas
tecnologias e processo produtivos ligam-se a conhecimentos substanciados pela ciência ou por
capacidades obtidas de maneira sistematizada (universidades, empresas de
consultoria/engenharia, relação com empresas estrangeiras).
1.3.1.3. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 4
O quarto capítulo busca identificar quais são os atores envolvidos no processo de
desenvolvimento da tecnologia do etanol celulósico incluindo empresas, instituições e/ou
países que se destacam nessa trajetória. Faz isso a partir da análise das bases do conhecimento
e da tecnologia que sustentam esta “nova” forma de se produzir o bioetanol.
Ao posicionar o Brasil e os seus agentes neste segmento, obtêm-se informações
indispensáveis para a compreensão do desempenho do SSI da cana-de-açúcar no processo de
efetivação da produção do etanol de segunda geração em território nacional, explicitando suas
73
qualidades e suas limitações na difícil tarefa de dominar a tecnologia de transformação da
biomassa em biocombustíveis avançados.
O capítulo quatro estrutura-se a partir da revisão de bibliografia (CHERUBINI, 2010;
CHERUBINI et al., 2012; MAIO; HENNESSY; BABCOCK, 2012; ZILBERMAN et al.,
2013; GUSTAFSSON et al., 2014; LIMA, 2013; MAYERHOFF et al., 2006; MURAKAMI,
2015; PERRONE et al., 2011; SCHULTZ, 2012; SILVEIRA et al., 2016) e, especialmente, da
análise de patentes e de artigos científicos publicados internacionalmente. Por meio destes
dados é possível captar a dinâmica da tecnologia e do conhecimento do setor estudado, dando
contornos materiais e numéricos ao esforço de desenvolvimento desta nova tecnologia ao
longo do tempo. Esta abordagem permite quantificar a “evolução” das bases do conhecimento
e da tecnologia do SSI da cana-de-açúcar ao longo do tempo e em relação a outras realidades
(EUA, China ou Europa).
A análise dos artigos científicos publicados internacionalmente fornece uma visão do
desenvolvimento da ciência e do conhecimento sistematizado ligado ao etanol celulósico; já a
análise das patentes fornece uma visão objetiva do desenvolvimento potencial da tecnologia
na medida em que sinaliza o progresso atingido pelos processos, equipamentos e técnicas
atreladas à produção do etanol celulósico.
Para a busca de artigos científicos, trabalha-se com a base Scopus, a qual abrange um
conjunto amplo de revistas científicas internacionais; para a análise de famílias de patentes69
,
trabalha-se com a plataforma Questel Orbit, a qual é capaz de recuperar patentes depositadas
em diversos escritórios de propriedade intelectual ao redor do mundo. Desta maneira, realiza-
se um exercício de vigilância tecnológica70
, entendido como ação organizada e seletiva de
captar informações relacionadas à dinâmica tecnológica e que é capaz de recuperar dados
importantes para compreender aspectos gerais da corrida tecnológica em curso.
A pesquisa reconhece as limitações e os problemas existentes nesses tipos de dados71
,
entretanto, como aponta Barré (2001) ou Malerba (2007), as informações trazidas pelos
69
De um modo geral, uma família de patentes é um grupo de invenções que estão todas relacionadas entre si,
neste caso através da prioridade, ou prioridades, de um documento de patente específico. Na espacenet define-se
uma família de patentes como compreendendo todos os documentos possuindo exatamente a mesma prioridade
ou combinação de prioridades (ESPACENET, 2014). 70
Tal prática é comum no meio coorporativo, sendo utilizada para o planejamento estratégico e para a tomada de
decisões em relação a novos investimentos ou em P&D. Nesta pesquisa será incorporada por meio de um
exercício para compreender a disposição dos esforços em desenvolver a tecnologia do etanol celulósico no Brasil
e no mundo, ação que ocorre por meio da busca e análise de famílias de patentes e artigos científicos. 71
As limitações dos artigos científicos como indicadores de output reside no fato que a quantidade dos artigos
produzidos não se refere integralmente ao nível de impacto, pois a quantidade de citações do artigo por terceiros,
74
documentos patentarios ou por artigos científicos remetem a uma medida aceitável dos
resultados obtidos pelos Sistemas de Inovação, ou seja, são úteis para demonstrar como os
Sistemas Setoriais ou Nacionais agem sobre determinada rota tecnológica - pelo menos no
campo do conhecimento sistematizado, foco da análise nesta etapa do trabalho (evidenciar a
construção do STI-mode no segmento bioenergético).
Quanto à análise dos artigos científicos disponíveis pela Scopus, a busca ocorreu por
intermédio do uso de palavras-chave fortemente relacionadas à temática do etanol celulósico,
organizadas por meio dos operadores booleanos e inseridas no sistema de recuperação de
dados disponibilizado pela plataforma, o Advanced Search, sistema que possibilita cruzar
diversos termos e delinear uma equação de busca que recupere dados pertinentes ao objeto de
estudo. A equação de busca elaborada para esta pesquisa encontra-se exposta no quadro 1.8.
Quadro 1.8. Equação de busca para artigos científicos – Scopus. Data da
busca Equação (Keywords) Resultado
26/04/2017
TITLE-ABS-KEY (ethanol OR bioethanol OR "cellulosic ethanol" OR
"second generation ethanol" OR "second generation bioethanol" ) AND
TITLE-ABS-KEY ("enzymatic hydrolysis" OR "Acid hydrolysis" OR
pyrolysis OR "Biomass to Liquid" OR saccharification OR enzym* OR
hydrol* OR "organosolv process" OR syngas OR "separate hydrolysis
and fermentation" OR "simultaneous saccharification and fermentation"
OR "consolidated bioprocessing") AND TITLE-ABS-KEY ( biomass OR
lignocellulosic OR cellulose OR hemicellulose OR "energy crops" OR
"sugar cane" OR sugarcane OR "corn starch" OR wood OR "sugar
cane bagasse" OR "sugar beet" OR "corn stover" ) AND PUBYEAR >
1926 AND PUBYEAR < 2018 AND ( EXCLUDE ( SUBJAREA ,
"MEDI " ) ) AND ( LIMIT-TO ( DOCTYPE , "ar" ) )
7.056
Fonte: elaboração própria.
pode ser dada não apenas pela qualidade inegável do trabalho, e, sim, pela suas redes de contatos. Outro aspecto,
é que a quantificação não demonstra o “peso” dos artigos, ou seja, não apontam quais são as pesquisas que
resultam em alterações do campo científico, não diferenciando a qualidade dos trabalhos; os trabalhos que
contribuem para a reorganização teórico-metodológica do pensamento de uma disciplina são computados
igualmente. As patentes caracterizam-se por ser um importante indicador de output na sociedade capitalista,
entretanto, deve-se fazer uma primeira ressalva, que a mesma se trata a priori de uma invenção, ou seja, é uma
ideia, um esboço de produto ou de processo, o qual ainda não se realizou comercialmente. Assim, a patente por
definição é um indicador parcial e impreciso enquanto ao desenvolvimento econômico e social, mas, não
desprezível. Um dos grandes problemas contido nas patentes são as enormes disparidades existentes entre as
instituições de patenteamento pelo mundo, pois cada formação social apresenta seu conjunto de regras e normas
para a concepção de patentes. Alguns países são conhecidos por serem mais flexíveis (China); outros, por
apresentar uma alta carga burocrática, são mais lentos e custosos, assim, emperrando o número de registro de
patentes concedidas (Brasil). Outros países apresentam grandes registros porque são importantes mercados
consumidores e produtores de produtos industrializados, atrativos para patenteadores externos, como é o caso
dos EUA (FREEMAM, 1969; BARRÉ, 2001).
75
A equação é formada por termos que se relacionam com o produto (ethanol;
bioethanol; "cellulosic ethanol"; "second generation ethanol"; "second generation
bioethanol"), os quais foram condicionados a termos que remetem aos processos produtivos
do etanol celulósico ("enzymatic hydrolysis"; "Acid hydrolysis"; pyrolysis; "Biomass to
Liquid"; saccharification; enzym*; hydrol*; "organosolv process"; syngas; "separate
hydrolysis and fermentation"; "simultaneous saccharification and fermentation";
"consolidated bioprocessing"). Com isso, garante-se que os artigos encontrados tenham
relação com a temática do etanol celulósico. Outra medida para garantir consistência aos
dados foi aplicar os filtros que excluem outros documentos (livros; trabalhos apresentados em
congressos; etc.) e, ainda, excluíram-se artigos da área de medicina e ciências médicas, os
quais eram apenas 7,9% da amostra original.
Os dados provenientes da amostra de artigos científicos foram tratados e
sistematizados com o software VantagePoint72
, o qual permite criar gráficos e redes de
colaboração entre os países e as instituições. Com isso, foi possível traduzir a dinâmica da
atividade científica ligada ao segmento do etanol celulósico, podendo perceber como o Brasil
e suas instituições voltadas ao ensino e a pesquisa se posicionam no cenário global do etanol
de segunda geração.
Por sua vez, a análise de famílias de patentes traz um olhar sobre a base tecnológica do
etanol celulósico. Com isso, a determinação da amostra de patentes ocorreu por meio do
estabelecimento de duas estratégias de busca de patentes distintas, as quais ao final foram
somadas, resultando no conjunto de dados trabalhados no capítulo 4. Toda estratégia
encontra-se sistematizada na figura 1.2.
A grande diferença entre a primeira estratégia e a segunda estratégia de busca de
patentes é o fato que a primeira remete à um universo conhecido e a segunda não. Na primeira
investida sobre a base de patentes do Questel Orbit trabalha-se com a adição de códigos IPCs
(Classificação Internacional de Patentes) conhecidos e tradicionalmente atrelados ao etanol
celulósico; na segunda iniciativa, trabalha-se com a exclusão de códigos IPCs e de palavras-
chaves que são fortemente as associadas a outros setores (distantes do segmento
bioenergético).
72
É uma ferramenta de mineração e análise de dados, a qual auxilia o rápido entendimento e a navegação em
resultados de busca extensas, fornecendo uma melhor perspectiva a respeito das informações encontradas. A
perspectiva fornecida pelo Vantage Point permite investigar QUEM, O QUE, QUANDO e ONDE, esclarecendo
os relacionamentos e os padrões dentro de um todo – transformando informação textuais (ou numéricas) em
gráficos e tabelas compreensíveis.
76
A primeira busca está balizada na revisão bibliográfica (GUSTAFSSON et al., 2014;
LIMA, 2013; MAYERHOFF et. al., 2006; MURAKAMI, 2015; PERRONE et al., 2011;
SCHULTZ, 2012) e, é considerada focalizada, ou seja, seu objetivo era mapear o conhecido,
visto que a partir das referências foram selecionados os códigos IPCs fortemente relacionados
à tecnologia do etanol celulósico e estes foram vinculados à palavras-chaves que remetem
diretamente ao produto (cellulosic ethanol; second generation ethanol; second generation
bioethanol). Estes termos foram organizados com os operadores booleanos e com símbolos de
trucagem no sistema de busca advanced search, recuperando famílias de patentes que
apresentavam concomitantemente os códigos “IPCs bons” (vide figura 1.1.) e as palavras-
chaves nos campos Title; Abstract; Claims; Description; Object of invention; Advantages
over prior art drawbacks; Independent Claims; Concepts.
77
Figura 1.2. Estratégias de busca de patentes para etanol celulósico – Questel Orbit.
Fonte: elaboração própria.
78
A segunda estratégia ocorreu por meio da elaboração de diversas equações de busca,
formadas a partir de palavras-chaves que remetem aos processos produtivos, às rotas
tecnológicas e às matérias-primas utilizadas na produção do etanol celulósico. Assim, foram
estabelecidas 18 equações de busca, abarcando diversos momentos e estágios da tecnologia,
sendo que as buscas orientaram-se para recuperar invenções ligadas ao etanol celulósico que
por ventura não estavam classificadas com os códigos estabelecidos na primeira estratégia.
Tal situação ocorreu já que apenas 320 famílias de patentes se sobrepuseram nas duas
estratégias.
Esta segunda estratégia de busca explorou um ambiente ainda não mapeado pela
primeira iniciativa, pois recuperou patentes por palavras-chaves relacionadas a diversos
“momentos” do universo tecnológico do etanol celulósico. Para diminuir a distorção dessas
buscas foram estabelecidos três níveis de controle, a saber:
i) Um filtro que delimita a busca no interior do campo dos combustíveis, com
isso, as patentes recuperadas deveriam apresentar no título, ou no resumo, ou na
reivindicação, as palavras: (Biofuel or Fuel) AND (Ethanol or Bioethanol);
ii) A segunda condição era dada pela exclusão de famílias de patentes que
apresentassem termos relacionados a outras áreas tecnológicas ou que após análise do
texto das patentes recuperadas nos primeiros testes mostrassem ligação com outras
tecnologias, fora do escopo do segmento bioenergético. As palavras excluídas (NOT)
estão expostas na figura 1.1..
iii) A terceira condição foi a exclusão de códigos IPCs não relacionados ao setor
do etanol celulósico, ou seja, os códigos “IPCs ruins” são aqueles que
tradicionalmente são utilizados pela indústria de cosméticos, saúde humana e animal,
alimentação e tantas outras áreas que foram recuperadas nos primeiros testes. Os
“códigos ruins” estão expostos na figura 1.2.
A determinação de filtros, a exclusão de palavras-chaves e de códigos IPC não
relacionados ao setor auxiliaram na formatação das buscas feitas no âmbito da segunda
estratégia. Assim, as famílias de patentes recuperadas nas buscas são atreladas ao universo da
bioenergia e estas somadas aos resultados da primeira estratégia de busca, a presente pesquisa
conta com uma amostra de patentes sobre o etanol celulósico de 2.890 famílias de patentes.
Esta amostra se mostra consistente, visto que o domínio tecnológico do conjunto de dados
79
está atinente ao apontado pela bibliografia especializada (vide Perrone et al. (2011) e
Gustafsson et. al. (2015)).
A articulação entre os elementos conceituais e as informações provenientes da
vigilância tecnológica (patentes e artigos científicos) amplia e fortalece os argumentos que
respondem à pergunta de pesquisa, ou seja, quais são os atores/elementos que promovem o
progresso técnico no setor em direção ao etanol celulósico? O resultado ratifica e encontra
novas firmas e organizações que atuam nessa rota tecnológica, principalmente, no plano
internacional, portanto, complementa os resultados obtidos pelo mapeamento de políticas
públicas nos capítulos 2 e 3.
Outro ponto forte dessa estratégia metodológica é que levanta informações sobre a
tecnologia, demonstrando que a rota tecnológica do etanol celulósico diferencia-se
grandemente do etanol de primeira geração, assim, impondo a necessidade do deslocamento
do DUI-mode para o STI-mode, já que a base de conhecimento dessa tecnologia é fortemente
ligada à ciência (biotecnologia, engenharia genética, biologia, fisioquímica).
Acrescenta-se que a partir desta estratégia de pesquisa, cujos resultados encontram-se
dispostos no capítulo 4, torna-se possível ver a evolução da tecnologia e a sua direção73
, além
de fornecer uma noção de espacialização deste processo por meio do número de depósitos
prioritários por país. Tem-se assim uma noção geral dos esforços de P&D feitos pelas
diversas nações na rota tecnológica do etanol celulósico.
1.3.1.4. Procedimentos metodológicos para estruturação do Capítulo 5
O quinto capítulo tem como objetivo compreender as ações desempenhadas pelas
firmas envolvidas no processo de adoção e desenvolvimento da tecnologia do etanol
celulósico no Brasil. De tal modo, descreve e analisa os projetos industriais de etanol de
segunda geração em curso no país.
Diante do objetivo estabelecido busca compreender 1) quais são as iniciativas no país;
2) quais as características das tecnologias “propostas”; 3) como se dá o processo de adoção e
desenvolvimento da tecnologia celulósica no Brasil; 4) quais relações são estabelecidas pelas
73
Uma análise mais precisa da evolução da rota tecnológica demanda maiores esforços de pesquisa, uma
equação de busca mais completa e a utilização de ferramentas de mineração de dados. Por outro lado, algumas
informações retiradas desse exercício podem ser relacionados com os achados de Perrone et al. (2011);
Gustafsson et al. (2014) Murakami et al. (2015), Silveira et a. (2016), ao indicar que as principais firmas e a
dinâmica da evolução do patenteamento, ou seja, a intensificação dos esforços em desenvolver a tecnologia
ocorre na segunda metade da década de 2000.
80
firmas na tarefa de desenvolver essa tecnologia; 5) quais são os desafios para a efetivação da
tecnologia de etanol celulósico no Brasil.
Para tal, parte-se dos achados reunidos nos capítulos anteriores, bem como das
informações e dados obtidos pela revisão bibliográfica e, principalmente, pelas entrevistas
feitas junto às empresas que apresentam projetos industriais no etanol celulósico no Brasil.
Acrescentam-se as informações conseguidas em jornais, sites e revistas especializadas.
A intenção é mostrar as ações das firmas em torno da tecnologia de transformação da
biomassa de cana-de-açúcar em etanol. As firmas analisadas com maior destaque são: CTC;
Petrobras/Cenpes; GranBio e Raízen. Este recorte implica trabalhar com os principais atores
do SSI da cana-de-açúcar em termos de esforços de desenvolvimento do etanol celulósico,
pois são as empresas que figuram como signatárias de projetos de pesquisa apoiados pelas
políticas públicas na dimensão de estímulo a C&T (PAISS Industrial). Ademais, aparecem
como detentoras de depósitos de patentes e/ou parceiras de empresas estrangeiras que detém
competências na tecnologia do etanol celulósico. Tais informações encontram-se expostas nos
capítulo 3 e 4, dando base para as análises estruturadas no capítulo 5.
Opta-se por estas firmas porque todos os fatores mencionados acima são encontrados
conjuntamente. Outro ponto que fortalece a escolha é o destaque dado a elas pela mídia74
e
pela literatura especializada75
. Assim, justifica-se o recorte analítico76
, considerando estas
firmas como catalisadores desse processo, representativas da mudança em curso (etanol de
primeira geração para o etanol de segunda geração).
74
Disponível em: < http://www.valor.com.br/agro/4753339/solucoes-caseiras-destravam-etanol-celulosico>
Acesso em 24 Outubro 2016; Disponível em: <http://www.valor.com.br/agro/4055282/areia-na-biomassa-da-
cana-e-desafio-para-producao-de-etanol-celulosico> Acesso em 23 Junho 2016; Disponível em: <
http://www.valor.com.br/agro/4055284/bioflex-consegue-aval-da-ctnbio-para-sua-nova-levedura-geneticamente-
modificada> Acesso em 23 Junho 2016; Disponível em: < https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-
celulose/odebrecht-agro-usina-etanol-celulosico-2016-231014/> Acesso em 23 Junho 2016; Disponível em
<http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2014/09/1521775-brasil-comeca-a-produzir-etanol-de-segunda-
geracao.shtml> Acesso em 23 Junho 2016; Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2013/12/1381674-autorizada-producao-de-etanol-de-celulose-no-
pais.shtml> Acesso em 23 Junho 2016. Estas são só algumas das referencias sobre estas firmas na mídia em
geral, a buscas na internet sempre remete a estes atores. 75
O trabalho de Correa (2014) e os relatórios produzidos pelo Projeto de Apoio aos Diálogos Setoriais UE-Brasil
(2012; 2013) e UNCTAD (2016) e mostram certo protagonismo destes atores, indicando que estas iniciativas
estão mais ativas do que outras. 76
Este recorte analítico pode ser alterado dependendo das sugestões da banca de qualificação, pois a presente
determinação visa dar um norte para as ações futuras.
81
1.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 1
O presente capítulo expôs as bases teóricas e conceituais da pesquisa, bem como
estabeleceu definições preliminares da corrida tecnológica do etanol celulósico. De maneira
interligada revelou os procedimentos metodológicos implementados pela pesquisa, indicando
as ações, as ferramentas de análises, as bases de dados e as fontes das informações (primárias
e secundárias).
Reitera-se que a utilização de procedimentos metodológicos distintos77
é uma
condição para abarcar as dimensões do SSI da cana-de-açúcar, operacionalizando e
identificando na realidade os elementos teóricos que compõem a abordagem de SSI (vide
quando 1.3.). Com isso, estabelece um diálogo entre a teoria e a realidade, pois os resultados
destas “estratégias metodológicas” fornecem informações e fatos que corroboram com o
entendimento do processo de inovação desempenhado pelo setor sucroenergético brasileiro –
busca-se compreender as características do esforço nacional em desenvolver a tecnologia de
etanol celulósico.
As informações e as análises sistematizadas em cada capítulo da tese fornece conteúdo
real para as categorias básicas da abordagem de SSI. Com isso, o conjunto resultante formado
pelo conceito-metodologia-realidade responde à pergunta de pesquisa e possibilita validar a
hipótese do trabalho, ou seja, identifica quais são os atores/elementos do SSI da cana-de-
açúcar que promovem o progresso técnico do setor em direção ao domínio da tecnologia de
segunda geração e examina se neste processo ocorre um deslocamento do exclusivismo DUI-
mode para um padrão intermediário, visando o STI-mode, na fase industrial do SSI da cana-
de-açúcar.
Neste capítulo foi definido o que se endente por modos de inovação e apresentou as
estratégias metodológicas para identificar esse processo. Em resumo, isso se dá por meio da
estruturação dos capítulos da tese, já que em cada capítulo analisam-se as particularidades do
processo de inovação do SSI da cana-de-açúcar na rota tecnológica do etanol celulósico,
identificando como as ideias, as habilidades e os conhecimentos economicamente úteis são
transferidos e adquiridos pelos atores do SSI da cana-de-açúcar.
77
Ao longo da pesquisa trabalhou com a identificação dos atores do SSI; com o mapeamento e análise das
políticas públicas e seus instrumentos; busca e análise de patentes e de artigos científicos; entrevistas com os
atores/agentes do processo de desenvolvimento da tecnologia de E2G no Brasil
82
Portanto, para verificar quem/quais são os responsáveis pelo processo e,
principalmente, se nessa ação influenciou a mudança dos modos de inovação na fase
industrial do SSI da cana-de-açúcar (DUI-mode – STI-mode) foi necessário mobilizar um
conjunto de elementos para identificar esta passagem, tais como:
Setor Firma
*Criação de novas instituições de pesquisa (cap.2,
cap.3);
*A entrada de novos atores com bases tecnológicas
distintas (cap. 2 e cap.5)
*Políticas públicas voltadas à Ciência &
Tecnologia e o aprendizado tecnológico do setor
(cap. 3);
*Criação de programas e instrumentos específicos
de apoia a P&D do setor (cap. 3.);
*Deposito de patentes (cap. 4);
*Publicações de artigos científicos em periódicos
internacionais (cap.4)
*Busca por conhecimento formalizado (cap. 5);
*Interação com universidades e institutos de
pesquisa (cap. 4 e cap. 5);
*Estabelecimento de parcerias estratégicas visando
a inovação (cap.5);
*Aquisição de ativos ligados à tecnologia (cap.5);
*Experimentos em laboratórios e escala piloto
(cap.5);
*Cooperação em projetos de pesquisa (cap. 5)
Cada um destes pontos é trabalhado no desenrolar da pesquisa e justamente por isso,
opta-se pela abordagem de SSI e a utilização de uma ampla estratégia metodológica, visando
dar conta de identificar as características da mudança setorial e/ou da introdução de novos
produtos/processos no setor sucroalcooleiro brasileiro.
83
CAPÍTULO 2. SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA CANA-DE-AÇÚCAR DO
BRASIL: EVOLUÇÃO E TRANSFORMAÇÕES RECENTES
O presente capítulo contribui com a compreensão da gênese e da evolução da
realidade produtiva e inovativa do segmento sucroenergético do Brasil. Isto se dá por meio da
reconstrução da trajetória de formação do Sistema Setorial em questão, apontando suas
características históricas e, principalmente, indicando o start da mudança em análise, ou seja,
o esforço da passagem da produção do etanol de primeira geração para o de segunda geração.
Argumenta-se que tal fato reorienta grande parte da atividade inovadora do setor, abrindo
espaço para exploração de novas rotas tecnológicas e a entrada de novos atores.
Assim, introduz o contexto histórico dos anos 2000 – 2016, no que se refere à
produção de etanol no Brasil, possibilitando uma noção geral e expondo os pontos de inflexão
que influenciam o redesenho do setor, criando condições para a estruturação da produção do
etanol celulósico no Brasil.
A proposta deste capítulo é obter uma compreensão geral da dinâmica de
transformação setorial que está no pano de fundo da mudança tecnológica (1G para 2G), com
vista a responder às seguintes questões: 1) Como foi o processo de formação do SSI da cana-
de-açúcar? 2) Quais categorias de atores compõem o SSI? 3) Qual a sua dimensão econômica
e territorial? 4) Quais são os fatores que compõem o contexto da mudança de rota
tecnológica?
O primeiro tópico (2.1.) realiza um preâmbulo histórico que antecede as mudanças da
década de 2000, assim, apresenta o processo de gênese do setor e da sua estruturação. O
segundo tópico (2.2.) descreve e analisa o contexto histórico dos anos 2000-2016,
apresentando as situações que influenciam a reestruturação do setor, igualmente, identifica as
categorias de atores que compõem o SSI da cana-de-açúcar. Já o último tópico (2.3.) realiza o
fechamento do capítulo, expondo os principais achados dessa primeira fase da pesquisa,
indicando o encadeamento das ideias e das análises para os próximos capítulos.
Do mesmo modo, estuda-se o setor sucroalcooleiro pela sua importância histórica e
atual, o qual passa a partir dos anos 2000 por um processo de reestruturação, caracterizado
pela: 1) retomada das políticas públicas relacionadas ao setor; 2) acelerada expansão
geográfica para novas áreas de cultivo e processamento da cana-de-açúcar; 3) concentração e
centralização do capital no setor; 4) entrada de novos atores, principalmente do capital
84
estrangeiro e; 5) esforço de aprendizagem em novas bases de conhecimento, como na
bioquímica, na engenharia genética e outras áreas do conhecimento.
Esses aspectos prenunciam alterações nas características históricas na produção de
etanol de 1ª geração. Deste modo, o modelo explicativo de SSI contribui para o debate do
processo de catch-up e da construção de trajetórias de desenvolvimento dos
setores/regiões/países atrasados que buscam o emparelhamento com o padrão de excelência
ou internacional. Nesta abordagem, ao introduzir o processo de formação do SSI da cana-de-
açúcar busca-se contribuir com essa perspectiva, não somente como um estudo de caso, mas
sim em perceber características gerais e particulares que apresentam indicações para a
compreensão da dinâmica do progresso técnico na periferia do sistema capitalista.
2.1. GÊNESE E EVOLUÇÃO DO SISTEMA SETORIAL DE INOVAÇÃO DA CANA-
DE-AÇÚCAR NO BRASIL
O cultivo da cana-de-açúcar no Brasil teve início no século XVI78
, passando por
intensas transformações quantitativas e qualitativas ao longo tempo. Alguns pontos de
inflexão impulsionaram o desenvolvimento desta atividade (vide figura 2.1.)79
. O quadro
histórico e normativo do setor sucroenergético é a porta de entrada da compreensão desta
realidade, bem como, a identificação das suas características e sua dimensão.
O SSI da cana-de-açúcar se configura como um elemento importante da conformação
territorial, política e social do país, com decisiva influência na formação de importantes
regiões, como do interior de São Paulo e da Zona da Mata nordestina. A figura 2.1. sintetiza a
construção contínua do arcabouço institucional do SSI da cana-de-açúcar, fato que orienta as
respostas do setor em relação ao contexto nacional e internacional, igualmente, indica
referências para serem aprofundadas na compreensão desta realidade. A partir deste quadro
institucional, identifica-se a formação do SSI e reproduz-se a trajetória de evolução do setor
no Brasil.
A figura 2.1., ao classificar as políticas por categorias como Produção, Consumo e
C&T, demonstra a evolução das medidas institucionais promovidas pelo governo nacional ao
longo dos anos (142 anos). Estas ações foram coordenadas pelo Estado e pelos agentes
econômicos ligados ao segmento sucroalcooleiro. Assim, as medidas em conjunto buscam
78
A cana-de-açúcar é uma espécie de gramínea (Saccharum), seu centro de origem é a região Sul da Ásia,
portanto, se adapta com facilidade às regiões tropicais. 79
As informações de cada uma das medidas representadas pela figura 2.1. encontram-se dispostas nos apêndices
A, B, C e nas análises feitas ao longo dos capítulos 2 e 3.
85
promover a expansão e o desenvolvimento contínuo do setor. Em alguns momentos
específicos as ações apresentam maior grau de controle do Estado, ou seja, indicação de
tecnologias, orientação à produção para o mercado externo ou a criação de um novo mercado
– o etanol hidratado. Mas, boa parte das ações são conduzidas na direção de estabilizar e
promover saídas para as crises de superprodução do setor, uma realidade persistente e
estrutural (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991; OLIVER & SZMRECSÁNYI, 2003;
KAHNNA; NUÑEZ; ZILBERMAN, 2016).
As políticas setoriais são ações do Estado buscando direcionar a economia
setorial/nacional e, ao mesmo tempo, ações que visam dar conta das demandas dos agentes
econômicos. Por exemplo, a criação de incentivos à exportação do açúcar no início da década
de 1960 era uma demanda do segmento, que passava novamente por uma crise de
superprodução de açúcar80
e, por outro lado, desejava adentrar ao mercado dos EUA que
estava temporariamente desabastecido, pois rompia suas relações comerciais com Cuba81
.
Ações semelhantes a esta são implementadas ao longo da história, portanto, criando uma
trajetória institucional e tecnológica para o SSI da cana-de-açúcar (ANDERSEN, 2011;
SHIKIDA & PEROSA, 2012; KAHNNA; NUÑEZ; ZILBERMAN, 2016).
80
A intensificação da tendência à superprodução de açúcar é promovida pela expansão da capacidade produtiva
do Estado de São Paulo no período entre guerras (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 199). 81
A revolução cubana de 1959 resultou em um conjunto de sanções econômicas ao país. Os EUA vivendo
intensamente o período da Guerra Fria cortam relações e impõem embargo econômico à ilha, uma tradicional
exportadora de açúcar. Tal situação abriu possibilidade para outros produtores ocuparem essa lacuna de
fornecimento.
86
Fonte: Elaboração própria com base na Legislação Federal, 2016.
Figura 2.1. Evolução do arcabouço institucional do Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil, entre 1875 a 2016.
87
A figura 2.1. representa a evolução do arcabouço institucional brasileiro voltado ao
setor sucroenergético. As medidas institucionais mapeadas foram organizadas segundo três
categorias, a saber: 1) Instrumentos que estimulam a criação, manutenção e expansão da
capacidade produtiva local; 2) Instrumentos que estimulam o consumo; 3) Instrumentos que
estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou aprendizado tecnológico82
.
As categorias separam-se apenas de maneira arquetípica, sendo identificadas
individualmente por meio da racionalidade apresentada na sua composição, ou seja, nos
objetivos que devem ser buscados por ela. Na realidade, percebe-se uma interconexão entre
elas, nem sempre planejada, os efeitos promovidos por elas ocorrem à revelia da sua
formulação original dependendo do contexto e da resistência oferecida pelos atores do SSI,
portanto, a divisão apresentada na figura 2.1. é um quadro estanque, embora representativo
sobre as dimensões e as características básicas da institucionalidade do setor.
Deve-se observar que esta categorização envolve somente instrumentos de promoção
direta, ou seja, instrumentos que estimulam diretamente o setor sucroalcooleiro. A correlação
entre instrumentos é intensa e é difícil demarcar seus limites, visto que os incentivos diretos
ao consumo podem estimular, por consequência, a expansão da capacidade produtiva local e
também o desenvolvimento científico e tecnológico. Um exemplo notável de transbordamento
por intermédio da política pública setorial é a determinação do consumo de etanol hidratado
em 1979, pela segunda fase do Proálcool, que resultou em inovações no setor automobilístico
e na estrutura de produção do etanol (destilarias autônomas). Essas relações serão
consideradas à medida que se reconstrói a trajetória setorial nos próximos subtópicos.
É importante notar, mesmo com as contradições econômicas e sociais inerentes ao
desenvolvimento da cultura canavieira no Brasil, o arcabouço institucional setorial mostra-se
robusto e variado, com medidas de longa duração e ações que visam dar conta das diversas
dimensões do setor. De tal modo, as ações institucionais atacam os problemas ligados à
capacidade produtiva, o processo de aprendizagem e o consumo final concomitantemente por
um longo período de tempo. Característica importante para o desenvolvimento de novas
tecnologias e de produtos concorrentes a opções dominantes, caso da “disputa” entre
biocombustíveis e os derivados de petróleo.
(UNRUH, 2000; MOWERY et al., 2010).
82
A definição e o link com a teoria encontra-se no capítulo 1 deste trabalho.
88
A categoria que congrega os estímulos à criação, manutenção e expansão da
capacidade produtiva pressupõem nas ações de caráter regulador e planejador do Estado sobre
o setor, assim, os programas, planos e nas leis vigentes visam garantir ou expandir a produção
por intermédio da coordenação das ações dos atores do SSI. Isso ocorre com o
estabelecimento dos preços dos produtos e da matéria-prima; estabelecimento de instrumentos
financeiros pró setor (aquisição de máquinas, equipamentos, expansão da lavoura ou da
produção).
Um ponto alto na criação do arcabouço institucional do SSI da cana-de-açúcar é a
criação do Instituto do Açúcar e Álcool (IAA) em 1933, órgão governamental que era
responsável por regular, organizar e planejar a capacidade produtiva e os preços do setor.
Suas ações ocorriam por meio do planejamento regional da oferta de açúcar e do álcool,
assim, a principal atribuição do IAA era manter um equilíbrio entre as regiões produtoras
(Nordeste e Centro-Sul).
A política de preço praticada pelo IAA se baseava nos custos de produção e de
transporte dos usineiros do Nordeste, os quais segundo Szmrecsányi & Moreira (1991) eram,
mais do que satisfatórios para produtos localizados em outras áreas do território nacional.
Essa é a origem da distorção regional e da heterogeneidade estrutural da indústria canavieira,
pois a partir daí perpetua-se a tendência de superprodução e a coexistências de firmas maiores
e mais modernas e firmas menos produtivas, as quais são mantidas por meio de concessões
financeiras, com subsídios e tributação variada, prática fortemente utilizada até 1990.
Destaca-se, nessa dimensão, os estímulos e ações realizadas pelas organizações
púbicas e empresas estatais, nessa direção ocorreram a compra compulsória dos produtos do
açúcar excedente pelo IAA, objetivando regular os preços internos e, o etanol produzido na
época do Proálcool, era totalmente adquirido e distribuído pela Petrobras.
Tais ações coincidem com os momentos de expansão do setor; este “edifício”
institucional, mesmo sofrendo alterações de um período para o outro, é responsável pelo
desempenho do setor, uma vez que as medidas de estímulo à produção são mais frequentes e
ocorrem por todo o período estudado. A única exceção é a década de 1990, pois as políticas
de estímulo ao setor são diminuídas grandemente e transformadas em liberalização do
segmento. Este período é justamente a exceção que confirma a regra, pois é neste momento
histórico que o mercado de etanol hidratado se retrai e a produção de cana-de-açúcar passa a
89
crescer em ritmo mais lento. E ainda, é um momento de instabilidade no setor. A análise da
figura 2.1. juntamente com a figura 2.2. e o gráfico 2.1. confirmam esse panorama.
Figura 2.2. Produção de cana-de-açúcar, etanol e açúcar no Brasil entre as safras de 1948/49 -
2015/2016.
Fonte: elaboração própria a partir de MAPA, 2013; 2016.
90
As políticas públicas voltadas para o consumo congregam as ações do governo que
objetivam garantir ou melhorar as condições de comercialização dos produtos do setor, ou
seja, são medidas que fortalecem o mercado. Estas se alternam enquanto a forma e a
intensidade, mas se mantém ao longo do tempo, principalmente aquelas voltadas ao consumo
do etanol, as quais permanecem vigentes desde 1933. Dentre as ações voltadas ao consumo
tem-se: 1) o estabelecimento da mistura do etanol à gasolina; 2) em alguns momentos
específicos, realiza-se a isenção ou a diminuição de impostos sobre os produtos ligados à
demanda do setor, como o próprio etanol e os veículos com motores flex; 3) a criação da
obrigatoriedade do estoque de etanol. Estas ações promovem segurança ao consumidor e
previsibilidade às firmas, condição sine qua non para a estruturação do SSI durador.
Gráfico 2.1. Licenciamento de veículos novos a etanol no Brasil entre os anos 1975 – 2015.
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
600.000
700.000
800.000
19
79
19
80
19
81
19
82
19
83
19
84
19
85
19
86
19
87
19
88
19
89
19
90
19
91
19
92
19
93
19
94
19
95
19
96
19
97
19
98
19
99
20
00
20
01
20
02
20
03
20
04
20
05
20
06
20
07
20
08
20
09
20
10
20
11
20
12
20
13
20
14
20
15
14
698.563
Fonte: elaboração própria a partir de ANFAVEA, 2016.
A terceira categoria de políticas agrupa as medidas que criam ou ampliam as
condições para o aprendizado tecnológico; são ações que abordam o desenvolvimento do
conhecimento relacionado à produção da cana-de-açúcar, do açúcar e do etanol. Observa-se
que as ações em relação a essa categoria são constantes no tempo, apresentando, mesmo que
de maneira pontual, atos em diversos períodos, com a criação de instituições e programas de
pesquisa. Uma característica evidente deste SSI é que a maior parte das ações foi voltada para
o desenvolvimento técnico ligado a fase agrícola, situação que reforça o protagonismo do
setor agrícola nacional (uma característica do SNI do Brasil).
Entretanto, a fase industrial foi parcialmente deixada de lado, a cargo das ações
pontuais conduzidas pela indústria de bens de capital ligadas ao setor, fazendo aquisições e
cópias de tecnologias estrangeiras e pelos esforços de desenvolvimento do Centro de
Tecnologia Canavieira (CTC). Tal situação começa a se alterar, tornando-se mais complexa e
91
completa a partir da década de 2000, com a criação de novas organizações públicas de
pesquisa, o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) e a Embrapa
Agroenergia e, ainda, com o estabelecimento de programas de apoio à P&D industrial do
setor, visando principalmente o desenvolvimento e comercialização de novas tecnologias (o
PAISS em 2011).
O setor estabeleceu e foi hábil em manter uma relação estreita com o Estado,
ampliando sua capacidade de articulação; de tal modo, as firmas atuam em concordância com
os interesses do Estado e de outras organizações privadas em prol de políticas públicas que
convirjam para a alavancagem de seus principais produtos (açúcar e etanol) no mercado
nacional e internacional (BAUTISTA VIDAL, 2003; CGEE, 2009; SAFATLE, 2011;
SHIKIDA & PEROSA, 2012). Os dados expostos na figura 2.2. exemplificam essa relação,
demonstrando uma produção sempre crescente, independentemente dos momentos de crise no
Brasil ou no setor.
Para melhor compreender a evolução do SSI da cana-de-açúcar e detalhar o processo
descrito na figura 2.1., é estabelecida uma divisão temporal (cinco períodos), que busca
aglutinar as medidas institucionais, o contexto histórico e as características persistentes do
sistema. Assim, é possível observar o processo de estruturação do SSI da cana-de-açúcar, bem
como, identificar elementos originários no passado que explicam as dimensões e as
competências atuais do setor. Portanto, os períodos compreendem os seguintes elementos:
1) Entre as décadas de 1870 e 1920 têm-se a “gênese” do SSI da cana-de-açúcar;
2) Entre as décadas de 1930 e 1960 mostra-se o período de estabelecimento do setor
sucroalcooleiro no Brasil e momento histórico de consolidação do núcleo dinâmico
do SSI da cana-de-açúcar, o interior do Estado de São Paulo;
3) Entre as décadas de 1970 e 1980 o setor passa por rápida e intensa expansão
produtiva, prescindida pela produção de etanol, assim, consolidando o
biocombustível como parte integrante da matriz energética nacional;
4) A década de 1990 é marcada pela desregulamentação do setor e crise da oferta de
etanol;
5) No último turno temporal (2000 – 2016), têm-se a retomada do consumo de etanol
e um novo ciclo de expansão do setor sucroalcooleiro acompanhado por forte
reestruturação do setor (capital, territorial e da base do conhecimento). Neste
92
momento se multiplicam os projetos de cogeração e “exportação” de
bioeletricidade pelas usinas à rede de distribuição.
A orquestração dos interesses e das necessidades dos diversos atores do segmento
sucroalcooleiro ao longo do tempo conforma a trajetória tecnológica e institucional do setor.
As atitudes e as escolhas dos atores realizadas no passado influenciam fortemente as
possibilidades do futuro, condicionando as dimensões das relações atuais e suas
características, sendo que a junção destes elementos históricos configura o mecanismo de path
dependence. Com isso, a trajetória impõe certa rigidez tecnológica e institucional, a qual
limita a diversificação do setor, mas, por outro lado, é responsável pela manutenção do
próprio setor, ou seja, mantém o desenvolvimento da produção do açúcar e do etanol no
Brasil, fazendo-os “sobreviver” diante das transformações do ambiente de seleção. A figura
2.1 e figura 2.2. sustentam essa dinâmica, que se molda pelo estabelecimento de processos de
aprendizagem e de rotinas.
2.1.1. Gênese e estruturação dos modos de inovação do SSI da cana-de-açúcar no Brasil
O marco histórico da fundação do SSI da cana-de-açúcar é dado pelo decreto imperial
de 1875 (DIM 2.687/1875)83
, o qual visava estimular a modernização dos engenhos de açúcar,
transformando-os em engenhos centrais, uma estrutura produtiva mais moderna para a
produção de açúcar em relação aos engenhos de fogo morto84
. Na esteira desse processo têm-
se os decretos 10.393/1889 e o 819/1890, medidas estas que buscavam aprofundar o processo
de adoção de novas tecnologias, no caso, o método de difusão para a obtenção do caldo da
cana. Em um primeiro momento, condicionava os incentivos financeiros à adoção da nova
tecnologia.
Entretanto, como mostra Dunham et al. (2011), esta iniciativa não foi bem sucedida,
pois o governo enfrentou resistência, os donos de engenhos optaram pelo processo de
extração do caldo, por meio das moendas, padrão tecnológico dominante no setor até os dias
de hoje85
. Este esforço institucional é representativo não apenas por ser pioneiro, mas porque
indica a formação de uma tendência ao imobilismo em relação à alteração do padrão
83
Esta medida institucional garantia financiamento com juros de até 7% ao ano e prazos de 5 a 30 anos para os
“empresários” que desejassem estabelecer engenhos centrais (CARREADORE, 2001; DUNHAM et al., 2011). 84
Referência aos engenhos do fim do século XIX e início do século XX. Um relato literário que corrobora com a
identificação das dimensões econômicas e culturais dos engenhos de açúcar é a obra de José Lins do Rego em
“Fogo Morto” de 1943. 85
Na safra de 2004/2005, das 347 usinas em funcionamento no Brasil, apenas seis apresentava em
funcionamento o sistema de extração de caldo por difusão como mostra Oliveira Filho (2013).
93
tecnológico na fase industrial e, também, dos próprios instrumentos de incentivos a “novas”
tecnologias.
A partir desse momento o setor só irá contar com instrumentos de incentivos
financeiros com missão dupla na década de 2000 (financiamento da expansão produtiva
juntamente com a exigência da evolução tecnológica). A criação de linhas de financiamento
do BNDES para o setor sucroalcooleiro exemplifica esta racionalidade dupla das políticas
públicas; os instrumentos estabeleciam vantagens para as firmas que adotassem certos padrões
técnicos, o financiamento de novas caldeiras de geração de vapor era condicionado ao
aumento da potência dos equipamentos e o Programa de renovação do canavial
(PRORENOVA) possibilitava melhores condições se os produtores adotasse novos
cultivares86
.
Mesmo as iniciativas do século XIX tendo pouca efetividade87
, estas ações
institucionais conduziram as diretrizes da estrutura produtiva da agroindústria canavieira, pois
os engenhos centrais tornaram-se a base técnica das usinas de açúcar e álcool. O mote dessa
passagem é dada pela ampliação da composição orgânica do capital das unidades
processadoras de cana, proporcionando a intensificação da força de trabalho e ampliação da
divisão do trabalho na firma e no setor.
A introdução de novos e maiores equipamentos para o processamento da cana-de-
açúcar ocorreu pela importação de equipamentos (França e Inglaterra); com o passar dos anos,
se tornou o padrão técnico e organizacional da indústria do açúcar no Brasil. Esta nova
realidade resultou no aumento do tamanho das unidades produtivas, e, como consequência
direta, criou uma nova categoria de ator no SSI, o fornecedor de cana-de-açúcar (VIAN et al.,
2008; NEGRI, 2010; VALENTE et al., 2012).
A característica fundamental na constituição dos engenhos centrais era a separação da
fase agrícola (a produção de cana) e a fase industrial (a produção do açúcar e, posteriormente,
etanol e energia elétrica). Os donos de engenhos que não se modernizaram tornaram-se
fornecedores de matéria prima ou saíram do setor. O modelo de modernização do século XIX
é um exemplo de como a adoção de uma inovação (o engenho central) é acompanhada de um
86
Uma discussão mais aprofundada da relação entre políticas públicas e inovação na fase industrial consta nos
capítulos 3 e 5. 87
Entre 1875 a 1892 foram autorizados 101 concessões de financiamento para a construção de engenhos
centrais, entretanto, apenas 37 foram construídos (DUNHAM et al. 2011).
94
novo regime; no caso não se trata de um regime tecnológico, mas sim de um novo regime
sócio organizacional, envolvendo a divisão de poder e trabalho (DUNHAM et al., 2011).
A separação entre a fase agrícola e fase industrial é uma realidade atual do setor,
moldada na sua gênese. Pois nesta separação está na natureza do conhecimento e da
tecnologia que sustenta cada momento produtivo dos SSI de cana-de-açúcar, na natureza do
capital que controla os insumos básicos para cada momento produtivo. Essas dicotomias
latentes vem sendo diminuídas, no que se refere ao controle dos recursos e da produção em si,
visto que as firmas sucroalcooleiras buscam - pelo menos desde implementação do Proálcool -
a integração e a verticalização da produção como estratégia de crescimento. Os dados de
processamento de cana própria em comparação com o processamento de cana de terceiros
demonstra essa tendência, principalmente nas novas áreas de expansão da cultura canavieira
(ver gráfico 2.2. e tabela 2.1.).
Gráfico 2.2. Participação de fornecedores e produtores próprios na
produção brasileira de cana-de-açúcar, 1948/49 -2014/15.
0
50.000.000
100.000.000
150.000.000
200.000.000
250.000.000
300.000.000
350.000.000
400.000.000
Própria
Fornecedores
Fonte: elaboração própria a partir de MAPA, 2012; MAPA, 2013.
Durante toda década de 1920 ocorrem diversos eventos que estruturam as bases do SSI
da cana-de-açúcar, sendo os mais importantes: 1) os primeiros esforços na produção de álcool
combustível; 2) a criação da Dedini, a primeira empresa de bens de capital ligada ao setor
sucroalcooleiro e; 3) o estabelecimento da pesquisa agrícola (OLIVER & SZMRECSÁNYI,
2003; NEGRI, 2010; DUNHAM et al. 2011). Estes elementos não só contribuem para a
formação do SSI, mas proporcionam características que perduram ao logo do tempo e,
sobretudo, dão origem a um novo conjunto de atores, os quais se relacionam intensamente
com as firmas responsáveis por processar a cana-de-açúcar (vide figura 2.1.). Assim, a cadeia
açucareira passa por um processo de “qualificação”, sendo sua produção e sua expansão
influenciada pelo desempenho de outras organizações e da intensidade das relações entre os
atores.
95
Já neste primeiro período têm-se os primeiros esforços de diversificação do setor
açucareiro, principalmente na direção de desenvolver o etanol de cana-de-açúcar. Como
demonstra Szmrecsányi & Moreira (1991), a formação do mercado do álcool combustível
(etanol) é motivada pelas crises de superprodução de açúcar do final do século XIX e início
do século XX, que deprimiu os preços e as margens de lucro. Ao projecturar o
desenvolvimento do etanol carburante, busca-se absorver o excedente da produção de cana
(DUNHAM et al., 2011).
Essa característica é uma constante no setor, se alterando nos anos do Proálcool e a
partir de 2003 com a introdução dos veículos flex e com o estabelecimento de medidas
institucionais que recolocam o etanol como uma das opções técnicas para o enfrentamento dos
problemas ambientais e das mudanças climáticas (os acordos de controle de emissões é uma
representação disso).
Outro elemento importante da formação do SSI da cana-de-açúcar no Brasil é a
criação em 1920 da Dedini S/A Indústrias de Base88
, uma das principais empresas de bens de
capital ligada ao setor sucroalcooleiro. Seu desenvolvimento acompanha os ciclos de
expansão do setor canavieiro do interior paulista. O crescimento da produção do açúcar e do
álcool promoveu condições para o desenvolvimento da firma, assim, passou a realizar as
substituições de importações que os engenhos e usinas demandavam.
Atuava na realização de consertos e reparos de peças para a reposição, passando
posteriormente a fabricar e a desenvolver máquinas e equipamentos específicos para as
unidades processadoras da cana-de-açúcar89
(OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013). O
estabelecimento das firmas de bens de capital fora fundamentais para o estabelecimento do
processo de aprendizado do setor e a formação do modo de inovação na fase industrial,
caracteristicamente, baseado no DUI-mode (VALENTE et al., 2012; VARRICHO, 2012;
FURTADO, 2013; OLIVEIRA FILHO, 2013).
88
No cadastro da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ) constam 123
firmas relacionadas à produção de bens de capital ao setor sucroalcooleiro. Estas firmas são concentradas
geograficamente, principalmente no eixo Piracicaba-Sertãozinho-Ribeirão Preto. A Dedini é a empresas mais
antiga de setor, com capacidade para produzir e projetar uma usina de açúcar e álcool completa (turnkey). 89
Iniciativa era considerada de grande importância pelos proprietários de engenhos/usinas, uma vez que
propiciava a continuidade do processo produtivo; nesse caso, a substituição de peças era feitas rapidamente,
porque a alternativa era importar tais componentes mecânicos, por conseguinte, interrompendo a produção por
grande período de tempo (OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013; VARRICHO, 2012; NEGRI, 2010).
96
A Dedini juntamente com outras empresas, constituíram e, ainda são, um importante
elo na difusão de novas tecnologias no setor sucroalcooleiro, principalmente no que se refere
à rota tecnológica do etanol de primeira geração. No entanto, sua função na estruturação do
SSI da cana-de-açúcar não se limitou apenas às atividades de produção e de desenvolvimento
de novos equipamentos. Estas empresas imprimiram entre 1920 a 1980, uma estratégia
inovadora na comercialização e no financiamento dos novos equipamentos. Desta forma,
facilitavam e estimulavam a adoção de novas tecnologias por parte dos engenhos/usinas. A
inovação na comercialização ocorria de duas maneiras. A primeira por meio de acordos
comerciais especiais, no qual se aceitava como parte do abatimento dos custos de produção os
velhos equipamentos, os quais passavam por uma reforma para serem revendidos às unidades
menores.
A segunda vertente dessa estratégia era mais agressiva e proporcionavam-lhe maiores
ganhos, pois acabava por participar da cadeia produtiva do açúcar e do álcool de maneira
completa. Adotava-se a prática de “(...) participação como sócio dos novos empreendimentos,
quer seja na ampliação e modernização das instalações produtoras ou na instalação de
novas unidades” (NEGRI, p.45, 2012). De tal modo, amarrava-se por meio de relações
financeiras e jurídicas fontes de demandas futuras para sua metalúrgica. E, consequentemente,
acelerava-se a modernização do setor em cascata, à medida que se ampliava a capacidade
produtiva, até mesmo das grandes usinas - através de novos equipamentos, mais eficientes e
mais produtivos, que eram produzidos por meio de assimilação de tecnologia estrangeira
(cópias ou licenças). E na base deste processo também se possibilitava uma modernização
proporcional para os engenhos e para as pequenas usinas, por disponibilizar no mercado
equipamentos retificados e recondicionados (OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013).
Este elemento histórico é particularmente importante para a compreensão do objeto de
estudo desta tese, pois a passagem da rota tecnológica do etanol de primeira geração para a
rota celulósica implica na intensificação das inovações na fase industrial do SSI da cana-de-
açúcar, o que levaria consequentemente à ampliação das relações e da importância das
empresas de bens de capital tradicionais do setor. Entretanto, como pode ser vistos nos
capítulo 4 e 5, este ator perde importância no desenvolvimento desta rota tecnológica,
alterando uma característica histórica do segmento, pois grande parte do desenvolvimento
tecnológico e do desempenho produtivo da produção do etanol de primeira geração advém de
inovações introduzidas via fornecedores de máquinas e equipamentos. O setor continua
97
dependente de fornecedores, respeitando as características delineadas pela tipologia de setores
de Pavitt (1984). Informações dispostas nos próximos capítulos demonstram que os
fornecedores são outros, principalmente, por que referem-se a firmas ligadas às indústrias de
biotecnologia e bioquímica.
A base do modo de inovação na fase agrícola do SSI da cana-de-açúcar ocorre por
meio do estabelecimento da pesquisa agrícola ligada ao enfrentamento da crise do Mosaico90
na década de 1920. O mosaico afetou principalmente o Estado de São Paulo, que teve a sua
produção reduzida a menos de ¼ entre 1922 a 1925. A praga alterou a conduta dos agentes
econômicos que passaram a buscar soluções técnicas para este problema específico (OLIVER
& SZMRECSÁNYI, 2003; ANDERSEN, 2011; DUNHAM et al. 2011).
Assim, a pesquisa agrícola conduzida principalmente pela Estação Experimental da
Cana de Piracicaba (EECP) procurou resolver o problema fitossanitário por intermédio da
técnica de seleção de novas variedades de cana-de-açúcar (nacionais ou estrangeiras). Em
paralelo a essa iniciativa, têm-se os esforços da Estação Experimental de Cana de Campos
(EECC), a qual se dedicava à técnica de desenvolvimento de novas variedades, entretanto, a
primeira opção se mostrou mais eficaz no curto prazo e acabou por conformar a trajetória da
pesquisa agrícola, pois o seu “modelo” foi adotado pelo Instituto Agronômico de Campinas
(IAC) e, posteriormente, pelo Centro de Tecnologia Canavieira (CTC).
A partir do programa de seleção de variedades da EECP, as canas suscetíveis ao
mosaico (canas pretas e rosas) foram substituídas pela cana javanesa, principalmente pelas
variedades POJ-36, POJ-213 e POJ-228. A substituição das variedades ocorreu rapidamente;
em 1929 estas representavam 85% da lavoura de cana no estado, chegando a alcançar 99% em
1932. Esse fato recuperou a competitividade do Estado de São Paulo, e iniciou a polarização
do interior paulista em relação ao setor, não somente na produção de açúcar, mas no
desenvolvimento de capacidades e competências técnicas, situação que se intensifica
continuamente.
Além da substituição das canas suscetíveis, a grande novidade para o setor foi o
próprio arranjo do programa de seleção desempenhado pela EECP. Tal programa trouxe
consigo relações de cooperação entre a estação experimental e as usinas. As atividades de
cooperação foram estabelecidas com oito usinas do Estado de São Paulo91
. Essa interação
90
O Mosaico é um vírus que causa o mosqueado ou necrose das folhas, raquitismo e esterilidade na planta,
resultando assim na redução da produção de sacarose (EMBRAPA, 2016). 91
Que representavam 55% da produção paulista de açúcar (OLIVER & SZMRECSÁNYI, 2003).
98
ampliava os campos de experimentação da EECP, fato que dava uma grande vantagem para
usinas participantes e para a própria estação experimental, uma vez que podia trabalhar com
situações mais próximas da real. Com isso, ocorria a participação de técnicos e agrônomos
das/nas usinas, permitindo a rápida difusão de conhecimentos, visto que além de adotar novas
variedades de cana-de-açúcar, essa relação proporcionava a propagação de técnicas de manejo
agrícola.
Em 1935, a EECP foi incorporada pelo IAC e com isso, o modelo de rede de
cooperação entre usina–instituição de pesquisa foi incorporado, expandido e aperfeiçoado.
Nessa nova instituição, as técnicas e tecnologias provenientes do desenvolvimento e da
seleção de variedade de cana se intensificaram, entretanto, com outro objetivo, de aumentar a
produtividade agroindustrial por meio da maximização do rendimento agrícola, representando
um maior conteúdo de sacarose por hectares de cana e variedades com maior resistência a
pragas e a doenças.
Com o IAC, a usinas passaram a conhecer mais sobre o solo, clima, e técnicas de
manejo (melhores condições para o plantio, adubação, irrigação e controle de pragas). O IAC
desempenhou o papel de coordenador da rede de difusão do conhecimento. Em 1946 as usinas
parceiras do IAC eram 73% da produção paulista. Desde março de 2005 o IAC passou a
abrigar o Centro Avançado da Pesquisa Tecnológica do Agronegócio de Cana, por meio do
Centro Cana (IAC), organização que conta com pesquisadores localizados nas cidades de
Ribeirão Preto e Campinas e nos Pólos Regionais da Agência Paulista de Tecnologia do
Agronegócio (APTA), nas cidades de Assis, Adamantina, Jaú, Jundiaí, Mococa, Pindorama e
Piracicaba.
O Centro Avançado da Pesquisa Tecnológica do Agronegócio de Cana conduz
pesquisas nas áreas de melhoramento, biologia molecular, fitopatologia, entomologia,
pedologia, fertilidade, adubação, climatologia, matologia, mecanização e automação,
geoestatística e economia agrícola. Com isso, estabelece redes de cooperação, principalmente
com outras Estações Experimentais do IAC, empresas conveniadas (160 firmas), cooperativas
de fornecedores de cana, com a Copersucar, com Centro de Tecnologia Canavieira (CTC),
com a EMBRAPA e Universidades (UNESP, UNICAMP, USP).
Outro marco no estabelecimento da pesquisa agrícola ligada ao setor sucroalcooleiro
foi a criação do Programa Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar (Planalsucar) em
1971, política pública que se caracteriza como um Instrumento de estímulo ao
99
desenvolvimento da C&T e aprendizado tecnológico do setor. Esta medida tinha como
objetivo principal o desenvolvimento em larga escala de novas variedades de cana-de-açúcar
por meio da experimentação e da manipulação genética. Um diferencial deste programa era
que desde seu design inicial considerava as diferenciações geográficas do território brasileiro,
assim, uma das metas era desenvolver variáveis adaptáveis às condições particulares das
regiões brasileiras. Este programa, juntamente com o IAC e o CTC, caracterizam os principais
traços do modo de inovação na fase agrícola do SSI da cana de açúcar.
O Planalsucar, que estava sediado no IAA, com o processo de desregulamentação do
setor, foi destituído. Entretanto, sua estrutura e corpo técnico foram incorporados pela Rede
Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroenergético (RIDESA) formada em
1991. Sua estrutura é menos concisa do que a formação anterior, entretanto, sua área de
atuação se expandiu e seu corpo técnico é constantemente alimentado pela interação com as
universidades federais que a compõe. Seu caráter multi-regional foi expandido, passando a
contar com estações experimentais nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais,
Goiás, Mato Grosso, Paraná, Alagoas, Sergipe, Pernambuco e Piauí.
Esta organização da pesquisa agrícola proporciona o desenvolvimento do
conhecimento tecnológico “soft”, que deriva do conhecimento formal (ciência básica), mas, é
traduzido em informações correlacionadas ao setor, que dá origem a boas práticas de
produção, compreensão dos problemas práticos e planos de ações específicos aos entraves do
mundo da produção. Segundo Hendry & Harbone (2011), este tipo de conhecimento
retroalimenta a base de conhecimento do SSI, proporcionando competitividade, ação não
intensiva em ciência, mas se mostram inovadores, inovações incrementais que fortalece a
trajetória tecnológica dominante, possibilitando a expansão do setor e a melhora no
desempenho da tecnologia.
2.1.2. Expansão e estabelecimento da produção sucroalcooleira (1930-1990)
Utilizando a figura 2.1. como referência, percebe-se que o período entre as décadas de
1930 – 1980 é caracterizado por forte ação do Estado na coordenação das atividades do setor,
visando, principalmente, estabilizar a oferta e a demanda do açúcar (SZMRECSÁNYI &
MOREIRA, 1991). As ações tinham por objetivo reverter a tendência de superprodução do
açúcar e, ainda, amenizar os efeitos de pelo menos três crises externas, sendo a primeira delas
100
a crise de 1929 que provocou queda nos preços internacionais do açúcar, resultando nas
primeiras iniciativas em produção/consumo do etanol no Brasil.
A segunda situação externa que passa a influenciar o contexto do setor sucroalcooleiro
é a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que provoca a interrupção do transporte por
cabotagem no Brasil, assim, “corta” o país em duas partes: o Nordeste vendo-se
repentinamente à frente de uma grande superprodução de açúcar, e o Sudeste sofrendo com
uma escassez do mesmo produto92
. Tal fato possibilitou o deslocamento definitivo do eixo
produtivo sucroalcooleiro para o interior do Estado de São Paulo.
O terceiro drive externo foi a confluência das crises do petróleo de 1973 e 197993
, que
se somaram a mais uma manifestação da crise de superprodução da agroindústria canavieira,
fortemente alimentada durante as décadas de 1960/1970 pelos programas de estimulo
realizados pelo governo federal (vide figura 2.1.). Esta situação proporcionou um ambiente
favorável à intensificação da utilização do álcool, primeiro como aditivo à gasolina e,
posteriormente, como substituto integral.
Diante dos efeitos da superprodução e das crises externas, o etanol passa a ser
utilizado como regulador da balança comercial, haja vista que a maior parte da gasolina era
importada e, principalmente, como diversificação do escopo da agroindústria canavieira,
proporcionando um novo destino para a cana-de-açúcar, assim, aliviando a pressão sobre os
preços do açúcar que, estruturalmente, são empurrados para baixo (SZMRECSÁNYI &
MOREIRA, 1991; LEITE 1990). O gráfico 2.3. demonstra o manejo da cana-de-açúcar entre
os dois produtos coincidindo com os momentos de crise.
92
Os problemas de abastecimento dos mercados do Centro-Sul dados pelas dificuldades no transporte marítimo
por cabotagem são agravados, pois esse período é marcado pela forte expansão do processo de urbanização e
industrialização do Brasil, ponto de inflexão da transição da população rural para as cidades. Assim, o Centro-sul
“fica” temporariamente com falta de açúcar, uma vez que a produção era fortemente concentrada no Nordeste. 93
De acordo com Raele et al. (2014) em 1972 os gastos com importação eram US$469 milhões para em 1974
2.8 bilhões de dólares. Já a segunda crise do petróleo o barril passa de 24-26 dólares o barril para 40 dólares o
barril em 1981 Essa instabilidade no preço do barril de petróleo impacta diretamente na balança comercial
brasileira. Segundo Shikida & Bacha (1999) a importação do petróleo correspondeu ao dispêndio de US$8,6
bilhões no triênio 1974-1976, muito superior ao triênio anterior, no qual o dispêndio com a importação de
petróleo chegou a US$1,4 bilhão
101
Gráfico 2.3. Distribuição do ATR por produto final (açúcar e etanol), entre as safras de
1948/49-2015/16.
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
% ATR açúcar % ATR etanol
Fonte: elaboração própria a partir de MAPA, 2013; MAPA, 2016.
O gargalo imposto pela tendência à superprodução e à variação “cíclica” dos preços
internacionais do petróleo gera duas ações do setor, as quais ainda persistem: 1) o aumento
das exportações do açúcar e/ou; 2) o aumento da produção e consumo do etanol. Estas
respostas são constantemente estimuladas pelo Estado.
As ações institucionais são direcionadas para dar base à expansão destas atividades,
assim, são formuladas políticas/planos que controlavam os preços, ampliava o
armazenamento dos produtos, realizava isenção de taxas para a exportação, subsídios à
produção de cana-de-açúcar, facilidade de créditos para ampliação da produção e aquisição de
novas máquinas e equipamentos. A figura 2.1. expõem estes instrumentos, sendo que a maior
parte deles estão contidos nas ações do IAA ou conjuntamente aos grandes planos de
expansão do setor, como o Plano de Expansão da Indústria Açucareira (1963) ou Programa
Nacional do Álcool (1975). Estas ações promovem fortes alterações na agroindústria no que
se refere à escala da produção e a territorialização da produção, como demonstra a figura 2.2.
A trajetória do etanol inicia-se em meio a esse contexto de restrição estrutural do
açúcar; já na década de 1930 o governo federal com o Decreto 19.717/1931 estabeleceu a
mistura compulsória de 5% de álcool anidro há gasolina importada. Esta ação tinha como
objetivo criar um novo mercado para o setor sucroalcooleiro, ao mesmo tempo, que visava
diminuir os impactos da importação de gasolina. Junto com essa medida também estabelece
incentivos para importação de equipamentos para a armazenagem e produção de etanol, dando
redução de impostos e taxas diferenciadas em relação ao frete (SZMRECSÁNYI &
MOREIRA, 1991; SAFLATE, 2011; SHIKIDA & PEROSA, 2012).
Em 1938 o etanol definitivamente se insere na composição da oferta de combustíveis
no Brasil; por meio do decreto lei 7.37/1938, torna-se obrigatório a sua adição à gasolina e,
desde então, mesmo em porcentagens variáveis, nunca mais foi retirado da composição da
102
gasolina C e da legislação brasileira. Este fato corrobora com o desenvolvimento do setor,
pois estimula o consumo de etanol de maneira compulsória e possibilita uma previsibilidade
para as firmas atuarem, uma vez que, a previsibilidade é garantida por intermédio da análise
da demanda por combustível. Esta é uma característica muito importante para o
desenvolvimento do biocombustível e fator que diferencia a iniciativa brasileira das demais,
ou seja, a continuidade do “programa” do etanol ao longo dos anos, mesmo passando por
mudanças no cenário político nacional e por contextos internacionais que afetam diretamente
os preços do petróleo, este mercado foi preservado.
A institucionalidade desenvolvida entre as décadas de 1930 e 1940 demonstra uma
relação positiva entre regulação-produção-inovação (vide figura 2.1.), pois em 1933 existia
uma destilaria no Brasil, com produção de etanol aproximadamente de 100.000 litros/dia, já
em 1940 o país contava com 38 destilarias com produção de 53.473.533 litros/dia (DUNHAM
et al. 2011).
As décadas de 1950 e 1960 transcorreram sob o signo de uma forte expansão da
indústria açucareira do Brasil, levadas pela expansão do mercado interno (urbanização e
industrialização) e externo (pós-revolução cubana). Com a produção organizada por meio da
divisão entre regiões e seus mercados, o Estado de São Paulo cobrindo o mercado interno e o
Nordeste dedicava-se às exportações. Entretanto, em 1963 o Brasil implementa o Plano de
Expansão da Indústria Açucareira94
, o qual visava assumir a exportação não mais como
residual, mas, sim como parte da estratégia setorial de desenvolvimento. Com isso, detinha a
queda dos preços internos e, principalmente, ampliava a acumulação de capital por intermédio
das exportações. A estratégia de exportação de açúcar se mantém e é constantemente
estimulada, com uma breve amenização entre 1975-1985, período de grande desempenho do
Proálcool (vide figura 2.3.).
Na década de 1970, a sustentação das condições produtivas foram dadas por novos
incentivos e pelo estabelecimento de novos programas setoriais, a saber: o Programa
Nacional de Melhoramento da Cana-de-açúcar (Planalsucar) em 1971; o Programa de
Racionalização da Indústria Açucareira (1971); e o Programa de Apoio à Indústria
Açucareira (1973) e o Programa Nacional do Álcool (Proálcool). O propósito destas ações
94
Entre as safras de 1961/62 -1971/72 o volume de exportações de açúcar do Brasil aumentou aproximadamente
106%, contra um crescimento de aproximadamente 50% na produção de açúcar, e de apenas 38% no consumo
interno de produto, isso comprova o redirecionamento do setor para a exportação (SZMRECSÁNYI &
MOREIRA, 1991).
103
institucionais residia na tentativa de promover o crescimento do setor, preferencialmente, nas
regiões e das unidades produtivas mais eficientes (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991;
VEIGA FILHO & RAMOS, 2006).
No início de 1974, os preços do açúcar alcançaram seu preço máximo nas bolsas
internacionais, de US$ 1.388,56 por tonelada; já em meados de 1975, os preços despencam
para US$ 336,12 por tonelada. O resultado é uma nova e forte crise de superprodução.
Somado a isso, tem-se a crise do petróleo de 1973, em que o setor se reorienta fortemente para
o mercado interno, visando agora o aumento da produção de etanol, como pode ser visto nos
gráficos 2.4. e 2.6. As racionalidades das políticas se alteram e o comportamento dos atores
também, buscando ampliar a produção do etanol e expandindo suas áreas em outras regiões.
Este novo tipo de dirigismo estatal jogava por terra todo o esforço anterior do IAA
para equilibrar os desempenhos das regiões e de promover a sobrevivência de firmas menos
modernas; na verdade o IAA abandonava parte das preocupações protecionistas em relação ao
Nordeste (VEIGA FILHO & RAMOS, 2006). Com exceção do Planalsucar os outros planos
apresentavam de maneira explícita o fortalecimento do setor por meio da concentração das
unidades industriais e das terras agrícolas, objetivando formar grandes estabelecimentos.
Assim, a capacidade produtiva do setor canavieiro foi aumentada e a modernização foi
seguida de concentração no setor (vide gráfico 2.2. e a tabela 2.1.).
No entanto, o divisor de águas na realidade do sistema setorial é o estabelecimento do
Proálcool, instituído pelo Decreto n° 76.593 de 14 de Novembro de 1975, o qual teve a
finalidade de expandir a produção do álcool anidro, viabilizando seu uso como matéria-prima
para a indústria química e como combustível adicionado à gasolina. Por meio desse programa,
o país pode substituir parte do combustível derivado do petróleo e, além disso, ampliar as
possibilidades do setor sucroalcooleiro explorar a economia de escopo, deslocando parte da
produção de cana-de-açúcar para a produção de etanol, utilizando parte da capacidade
produtiva ociosa das usinas e destilarias anexas (LEMOS et al., 2015; CGEE, 2009; HIRA &
OLIVEIRA, 2009).
A justificativa oficial para o aumento da produção de álcool era a necessidade da
substituição da gasolina automotiva, com o objetivo de aliviar as pressões sobre a balança
comercial ocasionadas pela elevação dos preços internacionais do petróleo, que era até então,
preponderantemente importado (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991; LEITE, 1990).
104
O programa foi pesadamente financiado pelo estado, tendo sido gastos
aproximadamente 7 bilhões de dólares entre 1975 a 1989 (RAELE et al., 2014). No plano
institucional, o governo criou a Comissão Nacional do Álcool, formada por representantes de
vários ministérios envolvidos na execução do programa. A Petrobrás era responsável por
absorver e distribuir a produção de etanol. Conjuntamente, foram criadas linhas de crédito
especiais95
para a instalação e ampliação de destilarias vinculadas a usinas de açúcar, as
chamadas destilarias anexas96
, da mesma maneira, para a construção de novas unidades
produtivas independentes e especializadas na produção de álcool, as destilarias autônomas
(SHIKIDA & PEROSA, 2012; SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991; LEITE, 1990).
Com a segunda fase do Proálcool (1979) têm-se a criação de fato de um novo
mercado, o etanol hidratado. Com isso, um novo conjunto de relações foi estabelecido,
principalmente entre a agroindústria canavieira e a indústria automobilística. A indústria de
automóveis participa do programa em troca de incentivos fiscais para aquisição dos seus
produtos novos, os carros movidos a álcool. Dados da efetividade deste novo arranjo são
mostrados por Stattman et al., (2013): em 1979 o Brasil apresentava 0,46% das vendas de
automóveis movidos somente a etanol, em 1980, eram 26,8% das vendas e no ano de 1986 era
76,1%. O rápido crescimento das vendas de veículos a álcool é considerado como resultado
dos estímulos do governo, que implementou políticas públicas que favoreceram a expansão do
mercado, não só incentivos fiscais, mas também, campanhas de divulgação e conscientização
dos consumidores.
No bojo das mudanças institucionais promovidas pelo Proálcool teve-se a criação de
novas instituições, necessárias para fazer avançar o programa como exemplos dessa têm-se: o
Conselho Nacional do Álcool (CNAL) e a Comissão Executiva Nacional do Álcool
(CENAL), cujo papel era, respectivamente, de formular os instrumentos de ação política e
fixar as diretrizes do Proálcool e de propiciar apoio técnico/administrativo ao CNAL,
portanto, órgãos para ampliar a ação coordenadora do Estado (ANDERSEN, 2011; SOUSA et
al. 2016).
Em adição, outros incentivos ligados ao consumidor final foram estabelecidos, por
exemplo, os preços do etanol hidratado foram fixados num nível equivalente a 65% dos da
95
Segundo Saflate (2011) as condições para a concessão desses financiamentos, parcialmente custeados por
empréstimos externos, eram extremamente favoráveis para os usineiros, com taxas de juros subsidiadas e com
correção monetária, cujos níveis eram muito inferiores aos da inflação da época. 96
Detalhes sobre a tecnologia de destilarias serão abordados no capitulo 4.
105
gasolina, apesar das diferenças de custos de produção. Ao mesmo tempo, no lado da própria
produção, a taxa de conversão do açúcar em álcool foi tornada ainda mais favorável (38 litros
por saco de açúcar de 60 quilos), enquanto que as linhas de crédito subsidiado continuaram a
ser mantidas, apesar da intensificação do processo inflacionário (SHIKIDA & PEROSA,
2012; SHIKIDA & BACHA, 1999).
Os efeitos do Proálcool são muitos, dentre os quais se pode destacar os que formaram
as características básicas do SSI da cana-de-açúcar. O Estado de São Paulo consolida-se
definitivamente como centro dinâmico do SSI e se distanciou em muito do resto do país em
relação à produção e produtividade97
. É no período do Proálcool que ocorre a expansão da
produção canavieira em outros estados da mesma região (Centro-Sul), estados até então sem
grande tradição na produção açucareira - como Paraná, Goiás e Mato Grosso — e que
expandem as plantações de cana-de-açúcar, principalmente, voltadas para produzir álcool,
contribuindo desta maneira para reduzir ainda mais a participação no mercado interno dos
produtores do Nordeste (SHIKIDA & PEROSA, 2012; SAFATLE, 2011).
A tendência de concentração da produção iniciada em 1960 se amplia com as novas
unidades processadoras de cana. Segundo Veiga Filho & Ramos (2006), as destilarias
autônomas instaladas entre 1975 e 1980 tiveram como fundamento a integração vertical (cana
própria), que chegou a 71,2% nesse último ano. Os autores ainda indicam que no caso das
usinas com destilarias anexas, o percentual de cana própria caiu 9,7%, o que se explica pela
intensidade com que foi estimulada a ampliação da cultura canavieira no Estado de São Paulo.
Nos primeiros cinco anos do Proálcool tiveram as suas áreas colhidas elevadas em 62,4%,
elevação quase totalmente acompanhada pelo incremento da área própria cortada pelas usinas
(52,1%). Este fato evidência da existência de reservas de terras dos “latifúndios dos usineiros”
e/ou de aquisições de imóveis rurais.
A integração vertical do setor ocorre como característica histórica, pois em momentos
de expansão acelerada (Proálcool e pós introdução do veículos flex) o processo
concentracionista se manifesta com maior intensidade. Um exemplo disto é o aumento do
processamento de cana proveniente de propriedades dos próprios usineiros (vide gráfico 2.2. e
tabela 2.1.); outro fato é o aumento da capacidade de processamento das usinas, a moagem no
97
Segundo SHIKIDA & PEROSA (2012) às vésperas do Proálcool o Estado de São Paulo já era responsável por
metade da produção brasileira de açúcar, sendo que após o início do programa passou a concentrar também dois
terços da produção de álcool.
106
início do Proálcool era de 5.500 TCD98
, em 2016 a capacidade gira em torno de 15.000 TCD99
(OLIVEIRA FILHO, 2013).
Tabela 2.1. Origem da Cana-de-açúcar moída na usina, por Estados e safras selecionadas.
1975/1976 1983/1984 1999/2000 2009/2010
Própria Fornecedor Própria Fornecedor Própria Fornecedor Própria Fornecedor
GO 241.623 8.532 94.992 1.525 6.760.630 391.466 27.129.534 12.962.895
MT 49.071 16.855 203.798 68.719 7.546.401 2.584.491 11.575.615 2.470.017
PR 1.260.501 645.033 1.788.114 1.252.295 21.529.302 2.781.879 37.595.589 7.907.292
AL 4.518.765 5.219.326 7.298.570 7.604.530 - - 15.477.992 8.791.767
PE 3.988.530 8.761.344 6.031.445 11.862.076 - - 10.453.300 7.806.033
SP 20.016.297 10.401.155 27.229.981 23.215.569 127.689.253 69.316.781 191.654.761 170.989.994
Fonte: elaboração própria de MAPA, 2013; MAPA, 2016.
Nos primeiros dez anos de existência do Proálcool, a produção brasileira de álcool
aumentou a uma taxa média de 35% ao ano, sem que o setor deixasse de produzir volumosas
quantidades de açúcar, tanto para a exportação como para o mercado interno
(SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991). A figura 3 demonstra a evolução da produção do
etanol no Brasil.
Esta rápida expansão foi possível à custa de grandes e graves distorções, as quais
ficaram aparentes com a queda dos preços do petróleo e com o aumento da autossuficiência
brasileira em petróleo, reduzindo as suas importações para menos que 40% dos seus níveis de
consumo corrente em 1990 (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991). Soma-se a esse quadro a
crise fiscal do Estado brasileiro, que fez diminuir sobremaneira os financiamentos e os
subsídios aos antigos e novos empresários do setor Com isso, o Proálcool foi se tornando cada
vez mais caro e “menos” necessário para o país.
A política e a estrutura de preços arquitetada para o estabelecimento do programa
começaram a ruir no início dos anos 1980. Segundo SZMRECSÁNYI & MOREIRA (1991),
à medida que o álcool hidratado foi se apropriando de crescentes parcelas do mercado da
gasolina, aumentava o volume excedente da gasolina, que deveria ser exportado pela
98
TCD = Toneladas de cana-de-açúcar dia 99
Entretanto, o setor é muito heterogêneo, as grandes usinas apresentam capacidade de moagem muito superior,
por exemplo, a Usina São Martinho, no município de Pradópolis/SP apresenta a capacidade de 10.500.000 t
cana/safra, se considera a safra de Abril a Novembro (244 dias) tem-se 43.032 TCD.
107
Petrobrás a preços muito inferiores aos do mercado interno. Estas exportações forçadas (ou,
em outros termos, prejuízo) foram uma das causas do encerramento do Proálcool.
De tal modo, a década de 1990 é caracterizada pelos preços favoráveis do açúcar no
mercado internacional100
, fim dos subsídios ao setor, desregulamentação; o aumento da
importação do etanol (vide gráfico 2.4.); baixa credibilidade do etanol hidratado como
substituto da gasolina101
. Estas expressões são reflexos da mudança da trajetória do setor, via
alteração da postura política e econômica do governo, que deixa de atuar como um
interventor, para passar a ser apenas um agente fiscalizador, sendo o protagonismo do Estado
fortemente diminuído. Com isso, o programa de diversificação da matriz energética via
biocombustível (etanol) é parcialmente abandonado (STATTMAN et al., 2013).
Gráfico 2.4. Importação e exportação brasileira de etanol em metros cúbicos, entre 1989 a
2015.
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
Exportação Importação
Fonte: elaboração própria a partir de MAPA, 2013; MAPA, 2016.
Obviamente que o contexto externo, no que se refere às possibilidades de ampliar as
exportações do açúcar e queda/estabilização dos preços do petróleo, também impactam na
conduta das firmas, as quais reorientaram novamente seus esforços para produção do açúcar,
mais uma vez, demonstrando a capacidade do segmento trabalhar com a economia de escopo.
100
O preço médio da tonelada de açúcar na safra de 1989/90 US$319,00 por tonelada e na safra de 1995/96 de
US$ 305,62 por tonelada (MAPA, 2013). Situação muito semelhante de 1975, entretanto, os preços do etanol
sem subsídios e sem o apoio logístico/financeiro da Petrobras tornava o programa do etanol muito oneroso. 101
A escassez de etanol é resultado do desmanche institucional em torno do Proálcool e da própria
“racionalidade” dos agentes produtores, os quais passaram a direcionar suas produções para o açúcar ou para o
mercado clandestino de etanol (SZMRECSÁNYI & MOREIRA, 1991). A baixa da oferta de etanol atingiu as
vendas de veículos novos a etanol, 1986 apresentou 698.563 licenciamentos de veículos novos movidos a etanol,
já em 1990 os licenciamentos despencaram para 82.001, mais dados dessa situação vide gráfico 2.1.
108
O início do desmonte do arcabouço institucional, responsável por sustentar a expansão
da produção sucroalcooleira, se inicia com a promulgação do Art. 174 da Constituição Federal
de 1988, abrindo espaço para a destituição dos aparatos de controle do Estado sobre os setores
econômicos. Segundo SHIKIDA & PEROSA (2012), a roupagem neoliberal do governo
Collor promoveu a desregulamentação da maioria das cadeias agroindustriais brasileiras,
sendo que a principal alteração no SSI da cana-de-açúcar foi à extinção do IAA e de todos os
programas e medidas conduzidas por esta organização. Observa-se uma ruptura parcial da
orquestração dos interesses que havia se estabelecido em torno do Proálcool, encerrando o
paradigma subvencionista outrora existente na agroindústria canavieira.
A desregulamentação econômica forçou um ajuste setorial de mudanças
organizacionais e produtivas. A questão da relação unidade industrial e agrícola
aparentemente não mudou, fazendo com que se tenha mantida a integração vertical lavoura-
processamento de cana, reforçando o processo de concentração técnica/produtiva, reinterada
pela concentração fundiária do complexo, marcada pelo predomínio do esmagamento de cana
própria (VEIGA FILHO & RAMOS, 2006).
2.2. MUDANÇAS NO AMBIENTE DE SELEÇÃO E BUSCA DO ETANOL
BRASILEIRO (2000- 2016)
Os fatos, os acontecimentos e os processos pontuados no tópico anterior evoluíram de
maneira atrelada às condições históricas do setor agrícola nacional. À medida que o processo
de modernização da agricultura avançava no território nacional, ao longo da segunda metade
do século XX, o setor sucroalcooleiro também se modernizava e empregava ações no sentido
de fortalecer suas bases produtivas, conformando-se em um Complexo Agroindustrial102
. Isto
pressupõe a articulação entre os agentes produtivos e o sistema regulador e financeiro,
situação que fica demonstrada na análise da figura 2.1. e na narrativa do processo de
construção do SSI da cana-de-açúcar.
102
A modernização da agricultura brasileira é um processo de escala nacional, ocorre nas diversas culturas e na
maior parte das regiões do país. Compreende-se como Complexos Agroindustriais a articulação entre os agentes
produtivos e o sistema financeiro (regulação financeira através dos investimentos e das linhas de créditos
dispostas pelos bancos públicos), com isso, esta organização é composta pela indústria de insumos químicos
(fertilizantes, agrotóxicos, corretivos); produtor agrícola; agroindústria; indústria de máquinas agrícolas; e o
Estado (regulação, financiamento, investimento e custeio e Pesquisa científica e biotecnológica). Os trabalhos de
Elias (2007); Heredia et al. (2010) e Castillo (2013) detalham esse processo.
109
O período mais recente é caracterizado pela intensificação desse modelo de
desenvolvimento, a produção é fortemente expandida e, conjuntamente, observa-se a
intensificação dos esforços em adicionar mais conhecimento e ampliar a composição orgânica
do capital nas atividades produtivas. Este padrão de desenvolvimento é uma realidade na
agroindústria brasileira e internacional, sendo que o setor sucroalcooleiro com suas
particularidades também busca seguir essa condição (BUAINAIN & GARCIA, 2015;
BONACELLI et al., 2015; KAHNNA; NUÑEZ; ZILBERMAN, 2016)
Essa dinâmica é permeada por um conjunto de fatores que caracterizam essa nova fase
de expansão da indústria canavieira, podendo ser sintetizados por meio da: 1) acelerada
expansão geográfica para novas áreas de cultivo e processamento da cana-de-açúcar; 2)
concentração e centralização do capital no setor; 3) entrada de novos atores, principalmente,
do capital estrangeiro; 4) retomada da implementação de medidas institucionais relacionadas
ao setor, tendo destaque a inovação setorial; 5) esforço de aprendizagem em novas bases de
conhecimento, como na bioquímica, na engenharia genética e outras áreas do conhecimento.
Os dois últimos elementos serão analisados nos capítulos 3, 4 e 5, à luz do desenvolvimento
da rota tecnológica do etanol de segunda geração.
A forte expansão da produção de açúcar, do etanol e da geração de energia elétrica
para a composição da oferta nacional de energia103
, é resultado de mudanças no cenário
internacional e na conjuntura nacional. O gráfico 2.5. identifica um dos principais drivers
desse período, ou seja, o aumento dos preços internacionais do petróleo, situação que
estimulou o Brasil a estimular o consumo do etanol. Outros elementos compõem este
contexto, o qual incide no Brasil e no mundo, proporcionando uma abertura às tecnologias de
baixo carbono: 1) segurança energética, dada pela dependência do petróleo e/ou por sua
instabilidade (preço e geopolítica); 2) o de fortalecimento das preocupações com o meio
ambiente; 3) discussões, ações e novas medidas institucionais calcadas na mitigação dos
efeitos das mudanças climáticas; 4) o desenvolvimento acelerado das tecnologias e projetos
de exploração das energias renováveis, que se correlacionam com os demais drives. No que se
refere ao açúcar104
, este se beneficia da evolução dos preços das commodities, que é puxada
pelo crescimento econômico dos países em desenvolvimento, em especial à China.
103
A figura 2.2. indica essa situação. Para se ter uma base dessa evolução basta dizer que a produção de etanol
parte de 10.517.535 m3 na safra 2000/01 para 30.478.607 m
3 na safra de 2015/16.
104 Os preços do açúcar passam de 157,91 US$/t em 1999 para 589,20 US$/t em 2011 (MAPA, 2016).
110
Gráfico 2.5. Preço médio do petróleo importado - 2000-2015 (US$/b FOB)
29,72 26,07
24,48
30,38 39,98
55,85 68,57
74,72
108,68
63,88
81,98
116,51 117,80
112,83
110,40
62,40
41,98
-
20,00
40,00
60,00
80,00
100,00
120,00
140,00
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Média do Ano
Fonte: elaboração própria a partir de SECEX, 2016.
A alteração do cenário internacional é complementada por mudanças internas, tanto no
nível de comportamento do setor como na esfera de Governo Federal. Tem-se um período de
relativa estabilidade institucional, o Estado volta a dedicar ações e medidas no nível
setorial105
, sendo que algumas destas ações alcançaram o SSI da cana-de-açúcar, assim,
contrapondo-se a década anterior (vide figura 2.1. e quadro 2.1.). Estas medidas versam sobre
fortalecimento da capacidade produtiva, a ampliação do consumo do etanol, e a intensificação
dos esforços em ciência e tecnologia ligada ao segmento. Paralelo aos estímulos tinha-se a
política de preços praticada pela Petrobras, a qual gerava uma pressão artificial sobre os
preços do etanol, agravando problemas de produção - tais como a baixa produtividade do
canavial -, situação que gerou um descompasso entre as políticas, reduzindo os efeitos das
ações verticais106
.
Estas ações não tiveram efeitos homogêneos e nem sempre foram efetivas, mas é
inegável que estas medidas trouxeram avanços e reposicionaram o segmento em outro
patamar recuperando a confiança do consumidor no etanol e ampliando as possibilidades de
desenvolvimento futuro dos produtos derivados da biomassa de cana-de-açúcar107
.
Os instrumentos que estimulam a criação, manutenção e a expansão da capacidade
produtiva local na década de 2000, mesmo não sendo expressamente coercitivos como na
105
Suzigan & Furtado (2010) e Kupfer (2013) indicam a alteração das políticas industriais a partir de 2003 com a
criação de ações que visavam o desenvolvimento econômico, tais como a PITCE, PDP e o Brasil Maior; a
criação da CNDI e ABDI, estas e outras movimentações ao longo da última década ajudaram a inserir a inovação
no centro da agenda de desenvolvimento, mas estiveram longe do satisfatório e, sobretudo, do necessário, pois
não tiveram forças e nem recursos para se impor, por carência de suporte e legitimidade política para sua
execução. Destaca-se, que estas ações também ficam aprisionadas pela política macroeconômica, sugerindo a
necessidade de reforma das instituições e a urgente articulação entre os diversos tipos e níveis de políticas. 106
Este elemento deve ser mais bem estudado, buscando compreender como a incongruência entre as ações do
Governo podem ter afetado o desenvolvimento recente do setor. 107
As medidas implementadas referentes ao desenvolvimento da C&T são abordadas nos próximos capítulos de
maneira correlacionada ao desenvolvimento do etanol celulósico no Brasil e complementa a discussão realizada
neste subtópico.
111
década de 1960/70/80, são importantes impulsos ao segmento. Estes apresentam racionalidade
e objetivos distintos, mas de maneira geral visaram dar uma nova roupagem institucional para
o setor sucroalcooleiro, buscando sua expansão e conferindo-lhe importância como uma das
opções nacionais para a “superação” dos problemas ambientais e de balança de pagamentos
relacionados à importação de petróleo. Assim, o Governo Federal reafirma a relevância da
indústria canavieira no cenário nacional e lhe proporciona novos caminhos para o seu
desenvolvimento (janelas de oportunidades) como a cogeração, etanol celulósico,
biocombustíveis avançados, bioquímica e a exportação do etanol, além da ampliação da
exportação do açúcar.
Dentre as ações implementadas pelo Governo Federal na direção de ampliar a
capacidade produtiva do setor, tem-se as medidas que são gerais, ou seja, os planos nacionais.
Estes apresentam linhas gerais para serem seguidas pelos diversos atores, assim, estas
medidas impõem metas de produção, previsões da demanda e da oferta e apresentam
objetivos que devem ser perseguidos pelo governo e, também, pelas firmas e outras
instituições que atuam diretamente com a cultura da cana-de-açúcar. Estas ações podem ser
observadas no quadro 2.1. e na figura 2.1.
Quadro 2.1. Medidas Federais que promovem o fortalecimento da capacidade produtiva e a
ampliação do consumo do etanol (2000-2016) Ministérios Políticas
públicas
Objetivos/pontos relevantes
Ministério de
Minas e Energias
MME
Plano Nacional
de Energia 2030
(2007-2013);
Plano Nacional
de Energia 2050
(2014 - )
Fornecer os subsídios para a formulação de uma estratégia de expansão da
oferta de energia econômica e sustentável com vistas ao atendimento da
evolução da demanda, segundo uma perspectiva de longo prazo.
É o primeiro estudo de planejamento integrado dos recursos energéticos
realizado no âmbito do Governo Federal brasileiro;
Contribui de forma decisiva para a recuperação do processo de
planejamento energético nacional de longo prazo (incluindo o etanol).
Plano Decenal
de Expansão de
Energia - PED
2022 (2013) e
as versões
subsequentes
Têm a função de produzir e divulgar os dados sobre a produção/demanda
atual e futura do setor de energia;
Auxilia no planejamento energético em nível de Estado e no nível de
empresas, pois os Planos Decenais são publicados anualmente pela
Empresa de Pesquisa Energética (EPE) desde 2007.
Fornecem informações confiáveis os atores do SSI;
Um elemento institucionalizado que substância as decisões políticas e
econômicas dos atores do SSI da cana-de-açúcar.
Conselho
Nacional de
Política
Energética
(CNPE)
Regulação da
mistura
etanol/gasolina
Determina a % de mistura de etanol anidro a gasolina.
Tal ação visa não só manter uma demanda mínima estável para os
produtores de etanol como também controlar o mercado em momentos de
crise de produtividade do setor;
A mistura apresenta o mínimo de 18% e o máximo de 25% até 2014,
quando a mistura passa atingir 27% de etanol anidro na gasolina C (Lei nº
13.033/2014).
Medida Tem como meta estabelecer um novo padrão de concorrência entre o etanol
112
Provisória no
613/2013 (DOU
08/05/2013)
e a gasolina, através da desoneração fiscal sobre o produto.
Os mecanismos adotados são: 1) o crédito presumido de PIS/Cofins ao
produtor de etanol, assim, zerando a alíquota de R$ 0,12 por litro; 2) novas
condições para o financiamento da estocagem do etanol. Com recursos de
R$ 2 bilhões, com juros de 7,7% a.a. (Resolução Banco Central no 4.216,
de 30 de abril de 2013).
Medida
Provisória no
615/2013 (DOU
20/5/2013)
Estabelecem incentivos e desonera a carga de impostos dos produtores
localizados na Região Nordeste, uma maneira de promover minimamente
condições mais favoráveis à produção regionalizada do etanol.
Os mecanismos adotados foram: 1) a subvenção aos fornecedores
independentes de cana-de-açúcar da região Nordeste, referente à safra
2011/2012, no valor de R$ 12,00 por tonelada de cana; 2) a subvenção às
unidades produtoras de etanol combustível da região Nordeste, referente à
safra 2011/2012, destinada ao mercado interno, no valor de R$ 0,20 por
litro de etanol efetivamente produzido e comercializado na safra
2011/2012.
Congresso
Nacional
Marco
regulatório do
etanol Lei
Federal
12.490/2011
Reduzir as incertezas e permitir melhor regulação do mercado, atuando no
sentido de aumentar a estabilidade do setor no que se refere aos níveis de:
preços, oferta e relação risco-retorno;
Estabelece definições legais aos termos referentes aos biocombustíveis,
bem como, de suas unidades produtivas.
Outro ponto de destaque é a ampliação das competências da Agência
Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para regular e
fiscalizar toda a cadeia de produção, movimentação e abastecimento do
etanol;
Criação da obrigatoriedade de estoques de etanol anidro no período
entresafra, medida valendo tanto para as empresas produtoras como para as
empresas distribuidoras do etanol anidro no Brasil.
Ministério do
Desenvolvimento,
Indústria e
Comércio
Exterior
MDIC
BNDES
Prorenova
Aumentar a produção de cana de açúcar no país, por meio do
financiamento à renovação e implantação de novos canaviais. Visando
ampliar a oferta de matéria prima para a produção de etanol.
Os recursos são destinados a pessoas jurídicas que exerçam atividade
produtiva relacionada ao plantio de cana-de-açúcar, inclusive usinas e
destilarias, cooperativas de produção, cooperativas de produtores e
entidades societárias.
No ano de 2012, 393.000 hectares de cana-de-açúcar foram financiados
pelo programa. Deste valor, 22% foram de novos canaviais e 78% foram de
renovação das áreas já plantadas.
Até Agosto de 2013 a segunda versão do programa teve um total de
projetos aprovados que somados equivalem a 1,3 bilhão de reais, o que já
supera o desempenho de 2012, que teve o desembolso final na casa de 1,2
bilhão de reais.
Programa de
Apoio ao Setor
Sucroalcooleiro
(2010)
Uma linha de crédito do BNDES destinada especificamente ao
financiamento da estocagem de etanol carburante. Objetivo disponibilizar
recursos de capital de giro destinados à estocagem de etanol pelas
empresas, usinas e cooperativas, em um total de R$2,4 bilhões de recursos
disponíveis.
FINAMEs e
outras linhas de
financiamento
Produto financeiro do BNDES, o qual faz parte dos desembolsos da Área
de Operações Indiretas (AOI), com foco no financiamento da produção e a
aquisição de máquinas e equipamentos novos de fabricação nacional
através do intermédio de instituições financeiras credenciadas ao banco
Com relação aos equipamentos para a produção de açúcar e álcool o
crescimento do desembolso foi muito significativo até a crise de 2008,
apresentando taxa de crescimento do volume desembolsado de 481 %,
entre o primeiro semestre de 2003 ao primeiro semestre de 2007;
O valor do desembolso em 2003 na linha de equipamentos industriais para
o setor era de 36,1 milhões de reais, chegando em 2007 ao valor de 209,5
milhões de reais;
113
Projetos novos aprovados/financiados de novos Greenfields em 2004 (1),
em 2005 (3), em 2006 (6), em 2007 (16) e em 2008 (17)..
Ministério da
Agricultura,
Pecuária e
Abastecimento
MAPA
O Plano
Plurianual
(PPA) 2012-
2015
Fortalecer o processo de comoditização do etanol por meio da atuação
brasileira junto a foros e parceiros internacionais;
Promover projetos de cooperação técnica para estimular a implantação de
usinas produtoras de bioenergia e de frotas piloto de veículos flexfuel em
outros países.
Iniciativa com atuação limitada e pontual, destinada a complementar o
conjunto de ações de outros ministérios, como o Ministério de Minas e
Energia e o Ministério das Relações Exteriores.
Fonte: elaboração própria.
Os planos nacionais apresentam tópicos específicos para o etanol (mesmo abordando
outras fontes/setores como o biodiesel). Estes são de grande envergadura, pois consolidam as
bases de dados e reposicionam os alvos a serem “atingidos” pelo setor (pelo menos no plano
ideal). Portanto, funcionam como guias e fornecem uma unidade para os agentes econômicos,
visando dar coesão para as ações do SSI da cana-de-açúcar. Os principais exemplos são: O
Plano Nacional de Agroenergia (2006-2010); Plano Nacional de Energia 2030 (2007-2013);
Plano Nacional de Energia 2050 (2014).
O Plano Nacional de Agroenergia apresentava um conjunto de objetivos para o setor,
dentre estes se têm: 1) o estabelecimento de metas para o desenvolvimento do mercado dos
biocombustíveis, visando garantir a participação dessa fonte alternativa no Balanço
Energético Nacional (BEN); 2) a organização e desenvolvimento de propostas de P&D e de
transferência de tecnologia para garantir a sustentabilidade e a competitividade das cadeias de
agroenergia (dentre elas o etanol); 3) estabelecimento de arranjos institucionais para
estruturação da pesquisa nacional; 4) criar fóruns e instituições para a comoditização do
etanol.
Além das bases para expansão da produção do etanol e da ampliação das discussões
internacionais sobre a comoditização do etanol, os grandes avanços deste plano foram a
ampliação da infraestrutura de pesquisa científica e tecnológica voltada ao setor. Em 2007
ocorre à criação da Embrapa Agroenergia, a qual por meio dos seus laboratórios (4 em
operação) desenvolve um conjunto de pesquisas ligadas a produção de matéria-prima para o
etanol108
. Esta estrutura de pesquisa amplia de maneira considerável o potencial investigativo
108
As linhas de pesquisa da Embrapa agroenergia voltadas para o etanol são: a) cana-de–açúcar tolerante à seca;
b) novas variedades de cana adequadas à produção de etanol lignocelulósico; c) novos híbridos de mandioca; d)
114
ligado ao setor, pois esta instituição soma-se a organizações já estabelecidas, bem como além
de cria novas redes de pesquisa e cooperação. Mais informações e análises sobre este novo
ator do SSI da cana-de-açúcar serão apontados nos capítulos 3 e 5.
O objetivo do Plano Nacional de Energia 2030 e o Plano Nacional de Energia 2050 é
subsidiar a formulação da estratégia de expansão da oferta de energia do Brasil, com vistas ao
atendimento da evolução da demanda, segundo uma perspectiva de longo prazo. O Plano
Nacional de Energia 2030 foi o primeiro estudo de planejamento integrado dos recursos
energéticos realizado no âmbito do Governo Federal, desta forma, contribui de forma decisiva
para a recuperação do processo de planejamento energético nacional de longo prazo, e nesse
conjunto, o etanol figura como uma opção relevante na composição da matriz energética
nacional.
Estes planos de longo prazo são acompanhados dos planos decenais que abordam a
dinâmica da expansão do setor de energia, assim, monitorando e projetando as variações de
curto e médio prazo. Assim, todos têm a função de produzir e divulgar os dados sobre a
produção/demanda atual e futura do setor de energia, auxilia o planejamento energético em
nível de Estado e no nível de empresas, pois os planos decenais são publicados/revisados
anualmente pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) desde 2007. Portanto, sua principal
função para o SSI da cana-de-açúcar é fornecer informações confiáveis aos atores, sendo um
elemento institucionalizado que substância as decisões políticas e econômicas destes atores.
No interior desta categoria, ainda existem as medidas institucionais de caráter
regulador, que visam normatizar, organizar e tributar a produção ou os processos produtivos,
como exemplos tem-se: a CIDE (LEI 10.336/2001); as ações da EPE (Lei 10.847/200); o
Zoneamento Agroecológico da Cana-de-açúcar (6.961/2009); o Marco regulatório do etanol
(lei Federal 12.490/2011) e as diversas Medidas Provisórias que atuam em questões pontuais
e temporárias.
O zoneamento agroecológico regula e organiza a produção, indicando áreas que
podem receber a cultura da cana, assim, determina os limites territoriais, e por sua vez,
restringe a produção futura baseada apenas na ampliação extensiva da cana-de-açúcar. A
expansão baseada na ampliação da área plantada é incompatível com a preservação dos
variedades e cultivares de sorgo sacarino; e) capins e resíduos florestais para etanol lignocelulósico; f)
prospecção (metagenômica) de microrganismos e enzimas para etanol lignocelulósico.
115
biomas (um dos objetivos do zoneamento) e da sustentabilidade ambiental requerida para o
avanço futuro do setor, visando aproximar-se da economia de baixo carbono.
Em 2011, a crise do setor sucroalcooleiro atinge seu ponto mais crítico109
, sobretudo
para os atores ligados diretamente à produção do etanol. O setor enfrenta problemas no
abastecimento interno de etanol: o mercado de açúcar continua sendo mais atraente e a
oscilação do preço do etanol na safra e na entresafra passa ser mais significativa (nível baixo
de estoque do combustível), resultando no aumento da importação do etanol (vide gráfico
2.4.). Como resposta a esse cenário, o Governo Federal estabelece o Marco regulatório do
etanol, ação legal que veio em resposta à crise para estabilizar a oferta do produto na escala
nacional.
Do ponto de vista legal, a grande implicação é que todas as etapas de produção e
distribuição do etanol estão agora sob o regime legal da Lei do Petróleo. Os requisitos
legais criados são os mesmos exigidos dos outros agentes do segmento dos combustíveis.
A ANP passa a exigir maior segurança na oferta dos combustíveis110
, e, desta forma, busca
estabilizar a oferta do produto no mercado.
O que se nota é que o Governo Federal buscou explicitar as definições técnicas e
comerciais dos agentes ligados a cadeia do etanol, pois neste marco regulatório ocorre a
determinação de definições pontuais para as etapas mais importantes do processo produtivo
do etanol. Além disso, passando a regulação para a ANP, o setor passa a contar com normas
mais claras e com um arcabouço de ações regulatórias mais exigentes, pois emprega padrões
de segurança, produção e de estoque semelhantes ao da gasolina, assim, forçando uma
adequação das unidades produtoras de etanol. Ainda, passa a concentrar toda a tarefa de
regulação e vigilância sobre uma única entidade, tarefa antes “dividida” com o MAPA. O
setor de etanol passa ser de incumbência do MME, de tal modo, diminuindo a sobreposição
de esforços e aumentando a eficiência do planejamento energético nacional.
Essa medida é uma ação que busca diminuir a distorção do mercado de etanol, uma
vez que cria definições para as etapas de produção e distribuição do produto, instituindo
instrumentos para garantir o fornecimento contínuo do produto no mercado nacional,
109
A produtividade dos canaviais brasileiros que em 2009 era de 84 toneladas por hectare reduz para 69
toneladas por hectare em 2011(MAPA, 2012). 110
Determinando que o distribuidor de combustíveis automotivos tenha em 1.º de março de cada ano, estoque de
etanol anidro em volume compatível com, no mínimo, 15 dias de sua comercialização média de gasolina C, no
período anterior de novembro a janeiro. E, que o produtor de etanol anidro tenha em 1.º de março de cada ano,
estoque em volume compatível com no mínimo 8% de sua produção de etanol anidro no período de abril, do ano
anterior, a fevereiro do ano corrente (ANP, 2013).
116
amenizando a sazonalidade intrínseca do setor. E, nesta direção, percebe-se a interconexão
inerente entre as medidas institucionais, ao passo que esta atua sobre os padrões da produção
que incide também na dimensão do consumo, pois visa garantir a continuidade da oferta de
etanol na entre safra.
As ações dadas a partir da ANP e da EPE objetivam regulamentar aspectos
particulares do setor, por exemplo: normas de segurança, padrões técnicos das usinas, as cotas
de armazenamento da produção de etanol por safra, a distribuição, a definição de termos
técnicos e correlacionados ao segmento. Estes são instrumentos institucionais que buscam
homogeneizar os padrões de produção e uma regularidade da oferta do produto no mercado
nacional. Com isso, reduzem as incertezas e permitem melhor regulação do mercado, atuando
no sentido de aumentar a estabilidade do setor no que se refere aos níveis de: preços, oferta e
relação risco-retorno.
No interior da mesma dimensão - estímulo à capacidade produtiva local – apresentam-
se as medidas de tipo pontual ou focalizadas, as quais versam sobre elementos particulares do
ambiente da produção sucroalcooleira. Dentre estas têm-se a criação de linhas especiais de
financiamento e crédito para o setor sucroalcooleiro realizadas pelo BNDES, principalmente,
visando a cogeração, ampliação da capacidade produtiva e a estocagem do biocombustível
(vide figura 2.1. e as figuras 2.3. e 2.4.).
As figuras 2.3 e 2.4. apresentam uma visão geral da atuação do BNDES no setor
sucroalcooleiro; por meio das ações focalizadas o banco passa a contribuir decisivamente para
o processo de expansão do setor. Os dados demonstram a evolução do montante contratado
pelo setor e a distribuição deste dinheiro no interior do setor, ou seja, para quais etapas da
produção estes recursos foram destinados; estas informações refletem o caráter expansivo do
setor na última década.
117
Figura 2.3. Evolução dos valores disponibilizados pelo BNDES ao setor sucroenergético,
entre 2002 - 2016 (em reais - R$).
Fonte: elaboração própria a partir de NOVACANA, 2016; BNDES, 2016.
A figura 2.3. confirma a evolução do dispêndio feito pelo BNDES para o setor ao
longo da década de 2000. É possível observar que existe uma oscilação entre os anos, mas
parece inegável uma tendência de evolução no montante contratado, onde o banco passa cada
ano a ser mais participativo no SSI da cana-de-açúcar. Em 2002, o valor total contratado era
superior a 105 milhões de reais, passando em 2005 para aproximadamente 543 milhões de
reais e chegando a atingir em 2010 mais de 4,5 bilhões de reais. Nesta mesma figura pode-se
perceber a existência de “três ciclos” de expansão do setor: o montante de recursos evoluiu de
maneira significativa entre um período e outro, de 2003-2006, depois entre 2007-2010 e
finalmente entre 2011-2014.
A distribuição destes recursos está exposta nas figuras 2.3. e 2.4., sendo possível
identificar quais atividades receberam os maiores investimentos entre 2002-2016. A
implantação de novas unidades capitaneou 37% dos recursos (R$ 10.966.593.756), seguida
pela atividade de expansão e modernização industrial que representou 25% dos recursos (R$
7.366.442.381). Em terceira posição tem-se o plantio de cana-de-açúcar com 13% dos
118
recursos contratados (R$ 3.991.023.041). Estas atividades confirmam que o período é de
expansão e ainda, evidenciam a atuação do BNDES neste processo, uma vez que o maior
volume de recursos foi destinado para áreas/segmentos que ampliam a capacidade produtiva
local. A observação conjunta das figuras 2.2., 2.3. e 2.4. e do gráfico 2.6. possibilita
claramente perceber o momento de expansão da capacidade produtiva, pois de 2005 a 2013
tem-se registro de instalação de novas unidades processadoras de cana de açúcar.
Figura 2.4. Evolução dos valores disponibilizados ao setor sucroenergético, entre 2002 -
2016 (em reais - R$).
Fonte: elaboração própria a partir de NOVACANA, 2016; BNDES, 2016.
119
Gráfico 2.6. Implantação e fechamentos de usinas no Brasil entre 2005 a 2015.
-20
-10
0
10
20
30
40
2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015
8
2426
34
21
13
52 32 2 2
7
-4 -5 -5
-19 -20-17
-15
-11
Implantação Reativação Fechamento
Fonte: elaboração própria a partir de EPE, 2016.
O BNDES passa nesse contexto ser o principal articulador das ações do Governo
Federal, não só por sustentar financeiramente a expansão e a modernização do setor, mas por
ter desenvolvido capacidade mínima de orientar as ações dos agentes do SSI da cana-de-
açúcar. Isso fica claro nos planos de financiamento da cogeração, onde o financiamento era
condicionado a um padrão mínimo da nova caldeira e/ou do sistema de geração de energia.
Nessa direção, tem-se a criação do Programa de apoio à renovação e implantação de
novos canaviais PRORENOVA (2011 - 2016), com o objetivo de aumentar a produção de
cana-de-açúcar no país, visando ampliar a oferta de matéria-prima para a produção de etanol.
Os recursos são destinados a pessoas jurídicas que exerçam atividade produtiva relacionada
ao plantio de cana-de-açúcar, inclusive usinas e destilarias, cooperativas de produção,
cooperativas de produtores e entidades societárias. No ano de 2012, 393.000 hectares de cana-
de-açúcar foram financiados pelo programa. Deste valor, 22% foram de novos canaviais e
78% foram de renovação das áreas já plantadas. Em Agosto de 2013, a segunda versão do
programa teve um total de projetos aprovados que somados equivaleram a 1,3 bilhão de reais,
o que superou o desempenho de 2012, que teve o desembolso final na casa de 1,2 bilhão de
reais.
120
No caso do PRORENOVA, os valores financiados variam segundo o tamanho das
empresas participante e segundo a variedade de cana-de-açúcar que é escolhida para compor o
novo/renovado canavial, podendo o financiamento chegar a 90% se as empresas
comprovarem o uso de variedades protegidas ou de clones potenciais de cana-de-açúcar. Com
esse adendo, a respeito da utilização de novas variedades de cana-de-açúcar, o Governo busca
por meio de uma política pública fortalecer o mercado de insumos para o etanol em um novo
patamar, buscando estimular os principais produtores de cana-de-açúcar a elevar o padrão
tecnológico dos canaviais.
Muitas relações podem ser feitas a partir das informações trazidas nas figuras 2.3. e
2.4., como o caráter reativo das políticas públicas brasileira, os anos de 2011 e 2012 marcam
o momento mais agudo da crise de produtividade da cana-de-açúcar, assim, também é o
momento da implementação do PRORENOVA e do aumento dos desembolsos do banco na
área de plantio de cana-de-açúcar (vide figura 2.4.).
Essas ações, mesmo apresentando problemas, se mostram relevantes, principalmente
no caso dos planos de inovação. Isto por que toda a configuração do PAISS Industrial e do
PAISS Agrícola foi feita por meio do trabalho de pesquisa e coordenação conjunta entre o
BNDES e a FINEP, indicando desenvolvimento de capacidades de planejamento estratégico,
sendo possível direcionar o desenvolvimento de rotas tecnológicas especificas, caso da
hidrólise enzimática, processo industrial que compõe a produção do etanol celulósico111
. Os
contratos envolvendo inovação agrícola, projetos de etanol de segunda geração e bioquímicos
da cana representaram um pouco mais 970 milhões de reais, sendo apenas 3% do total
investido com recursos do BNDES no período de 2002-2016.
A respeito dos instrumentos desenhados especificamente para estimular o consumo do
etanol na década de 2000, o grande destaque é a permanência da mistura de etanol à gasolina,
ação inalterada mesmo no período de desregulamentação do setor (década de 1990). Com
isso, sua permanência assegura a continuidade do projeto de substituição parcial do consumo
de combustíveis fósseis no Brasil e mantém uma demanda mínima estável para os produtores
de etanol, permitindo a criação de reserva de mercado para o produto. Assegura a oferta ao
consumidor nos períodos de instabilidade, como por exemplo, problemas climáticos que
atingem a produção, alta dos preços internacionais do açúcar e queda nos preços nacionais da
gasolina.
111
Estas ações e outros aspectos do período relacionados à C&T do setor serão trabalhados no capítulo 3.
121
A mistura ocorre entre o mínimo de 18% e o máximo de 27,5%, a adição de etanol
anidro é regulamentada por lei pelo Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool (CIMA),
as alterações são feitas por meio de resoluções. Esta medida é muito importante, pois cria uma
situação mínima para a existência da produção do etanol no Brasil, fator que diferencia o
Brasil de outras nações onde a mistura é facultativa, fator que eleva as incertezas e fragilidade
do projeto de substituição dos combustíveis com alta emissão.
Esta medida garante a existência do etanol nos períodos de crise, principalmente do
etanol anidro, mas a inovação do motor flex fuel em 2003 é a grande responsável pela
retomada do consumo do etanol hidratado. Assim, em 2002, o consumo de hidratado que era
de 3,7 milhões de m3 passou para 17,8 milhões de m
3 em 2015, claramente acompanhando o
crescimento da frota de veículos flex.
Gráfico 2.7. Consumo de combustível no Brasil entre 2001 – 2015 (m³).
0,00
5.000.000,00
10.000.000,00
15.000.000,00
20.000.000,00
25.000.000,00
30.000.000,00
35.000.000,00
40.000.000,00
45.000.000,00
50.000.000,00
2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015
Etanol Hidratado Etanol Anidro Etanol Total Gasolina C
Fonte: elaboração própria a partir de NOVACANA, 2016.
O arcabouço institucional formulado nos anos 2000 se sobrepõe às medidas
estabelecidas nos períodos anteriores (vide figura 2.1.), assim, esse conjunto passa a orientar e
ampliar as possibilidades de progresso da produção do etanol, açúcar, bioeletricidade e de
novos produtos a base da biomassa da cana, portanto, são produtos e tecnologias que por suas
características elementares, concorrem com o standard estabelecido (produtos de base fóssil).
A expressão desta oposição ao standard é observada no consumo do etanol versus o da
gasolina e dos veículos movidos à gasolina e os movidos a partir da tecnologia flex fuel. O
desempenho destas opções “alternativas” marca esse novo período de expansão do setor
sucroalcooleiro, sendo os gráficos 2.7 e 2.8. expressão dessa realidade.
122
Gráfico 2.8. Histórico de licenciamentos de veículos por combustível (2004-2016)112
.
0
500.000
1.000.000
1.500.000
2.000.000
2.500.000
3.000.000
3.500.000
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016
Flex Gasolina Diesel Etanol Elétrico
Fonte: elaboração própria a partir de ANFAVEA, 2016.
2.2.1. Dimensões econômica e territorial do SSI da cana-de-açúcar
O resultado dessa articulação entre o contexto externo e ações internas pró SSI da
cana-de-açúcar possibilitou ao Brasil ser o maior produtor de cana-de-açúcar do mundo com
666.011.859 ton., o primeiro em produção de açúcar (33.497.668 ton.) e o segundo maior
produtor de etanol do mundo com 30.478.607.000 bilhões de litros na safra 2015/2016
(MAPA, 2016; EPE, 2016). Na safra de 2014/2015 o setor sucroalcooleiro movimentou cerca
de R$ 70 bilhões, com a produção de cana, açúcar, etanol e bioeletricidade, o que
correspondeu a 1,3% do PIB do Brasil. Em 2016, o setor é composto por 422 unidades113
processadoras de cana-de-açúcar e a área plantada de cana-de-açúcar representa cerca de 10
milhões de hectares, o que equivale a 4,5% da área agricultável do Brasil (ANUARIO DA
CANA, 2015).
As figuras 2.2., 2.3. e 2.4. mais os gráficos 2.3., 2.4., 2.6., 2.7. e 2.8. confirmam o
crescimento do setor, demonstrando que ao longo da última década o setor se fortaleceu. Uma
das características desse processo é o crescimento sustentado pelo aumento da área plantada,
saltando de 4,3 milhões de hectares, em 1990, para 10 milhões de hectares em 2015, um
aumento de mais de 132%114
.
A evolução da produção do etanol no Brasil entre as safras 1975/76 até a 1985/86,
evidencia uma taxa de crescimento médio de 34,7% ao ano, concomitante à implementação
112
Os dados do ano de 2016 foram atualizados em 06/07/2016. 113
Em 2016, 51 unidades encontram-se paradas vide gráfico 2.9. 114
No mesmo período, a Índia, segundo maior produtor mundial de cana, expandiu sua área em cerca de 50%,
passando de 3,4 milhões de hectares, em 1990, para 5,1 milhões, em 2008, tendo retrocedido desde então,
alcançando 4,2 milhões, em 2010. Com isso, a área de cana que no Brasil era pouco mais de 25% maior que a
área do segundo maior produtor, em 1990, passou para quase 120% a mais, em 2010 (CHAGAS, 2012).
123
do Proálcool. Da safra 1986/87 até a 2002/03 houve uma fase de desaceleração e instabilidade
da produção sucroalcooleira, assim, o crescimento médio foi de 0,72% ao ano. Entretanto, a
partir das safras 2000/01, constata-se um segundo ciclo expansivo de com crescimento médio
de 7,9% ao ano. Para todo o período considerado (1975/76 a 2015/16), a taxa de crescimento
médio anual da produção de etanol do Brasil foi de 12,3%.
A territorialização da estrutura produtiva do SSI da cana-de-açúcar pode ser observada
na figura 2.5. e gráfico 2.9. Os dados definem os aspectos elementares das dimensões
produtivas do setor, que se concentra na região Centro-Sul e na região Nordeste.
Figura 2.5. Participação dos Estados na produção do etanol nas safras de 2000/01 e 2015/16.
Fonte:elaboração própria a partir de NOVACANA, 2016.
124
Gráfico 2.9. Distribuição por Estado das usinas de cana-de-açúcar em 2016.
Acre
Amazonas
Ceará
Pará
Piauí
Rio Grande do Sul
Rondônia
Tocantins
Rio Grande do Norte
Espírito Santo
Maranhão
Bahia
Sergipe
Rio de Janeiro
Paraíba
Mato Grosso
Pernambuco
Alagoas
Mato Grosso do Sul
Paraná
Goiás
Minas Gerais
São Paulo
1
1
1
1
1
1
1
1
3
4
4
5
6
7
8
12
22
24
25
32
39
42
181
5
5
10
17
20
22
30
36
37
157
Ativas em 2016 Total de Usinas
Fonte: elaboração própria a partir de NOVACANADATA, 2016.
125
2.2.2. Reconfiguração do capital no SSI da cana-de-açúcar: novos atores
A forte expansão produtiva da indústria canavieira ocorreu concomitantemente à com
uma mudança na composição do capital do setor. Intensificou-se um processo iniciado nos
anos 1990, em que as aquisições e as joint ventures entre as empresas pertencentes ao setor e
novos entrantes, passaram a controlar ativos, movimento este observado no gráfico 2.10. e no
quadro 2.2. É sabido que o segmento era composto majoritariamente pelo capital nacional
com a presença de famílias tradicionais no controle das agroindústrias; tal padrão se altera
significativamente, com a entrada de empresas estrangeiras ou de grandes grupos nacionais
originários de outros setores.
Gráfico 2.10. Número de fusões e aquisições ocorridas no setor sucroalcooleiro entre 1995 a
2009.
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009
21 1
32
7
119
5 5
89
25
14
4
Fonte: : elaboração própria a partir de KPMG, 2009.
As fusões e aquisições (F&A) tornaram-se uma alternativa para a adequação do
tamanho e da estrutura organizacional das empresas frente às novas condições do mercado,
caracterizado por uma regulamentação parcial (pós anos 1990) e pela conjuntura econômica
mundial, distinta pela intensificação do processo de globalização, expansão das energias
renováveis e do boom dos preços das commodities. Este movimento é próprio da dinâmica de
crescimento das firmas115
; as pertencentes ao setor crescem por aquisição e reforçam sua core
competence, ampliando suas possibilidades de desenvolvimento na mesma rota tecnológica.
Por sua vez, as novas entrantes crescem pelo processo de diversificação. Assim,
multiplicam suas competências, sendo capazes de acompanhar novas tendências,
possibilitando a realização de novos negócios “fora” da rota tecnológica que sustenta a sua
atividade principal, tornam-se ou ampliam sua característica de empresas multi-produto e
muti-setorial (CHANDLER, 1998). O caso das empresas ligadas ao setor de petróleo (Shell,
115
Penrose (2006).
126
BP e Petrobras) é ilustrativo deste movimento, as quais adquiriram ou construíram parcerias
com firmas produtoras de etanol, um combustível concorrente aos derivados do petróleo.
Este processo é proveniente de pessoas físicas, fundos de pensão, fundos private
equity, mas, principalmente de grandes firmas ligadas ao setor energético e alimentício (vide
quadro 2.2.). Tal situação promoveu uma reestruturação acionária no setor sucroalcooleiro do
Brasil e fortaleceu a tendência à concentração produtiva.
Em relação às novas entrantes, sobretudo as multinacionais, a opção pelas fusões,
aquisições ou formação de joint ventures foram preferidas com o objetivo de diminuir os
custos operacionais e os custos de aprendizagem. Tal estratégia implica adentrar no setor já
com participação de mercado e com ativos em pleno funcionamento (usinas). Assim,
adquirem informações e conhecimentos relevantes economicamente, os quais só poderiam ser
atingidos com a participação no cotidiano da produção, portanto, perpassa por
particularidades culturais e tecnológicas de maneira mais fluída, queimando etapas no
processo de aprendizagem, inclinando a curva de aprendizagem e adaptações. Com essa
dinâmica, as entrantes encurtam a distância relativa entre das empresas líderes,concorrendo de
maneira mais equitativa com as empresas já estabelecidas em um curto período de tempo.
A opção dos novos investidores pela aquisição ou joint venture também se explica
pela redução dos custos de expansão dos seus grupos empresariais, pois opera em um novo
setor desde o início a economia de escala. Outro fator importante é a remoção das barreiras à
entrada, visto que aquisição garante o domínio de ativos complementares, como as bases e os
canais de distribuição e comercialização já instalados. Especificamente no caso do açúcar e do
etanol, tratam-se de fatores muito importantes, uma vez que boa parte do açúcar é exportada e
o etanol é consumido por todo o território nacional.
Nesta seara é perfeitamente possível supor que haja aumento da concentração
econômica, com a junção de diferentes plantas sob a direção de uma mesma empresa ou
grupo econômico. Isso resulta, em última instância, na diminuição dos custos administrativos
e no aumento no poder de negociação de preços dos insumos e dos produtos e, portanto,
amplia a rentabilidade e a competitividade das grandes firmas sucroalcooleiras.
No primeiro momento, as aquisições se deram entre as firmas pertencentes ao setor,
intensificando o movimento de concentração, já estimulado pela política pública116
. Em
116
Programa de Racionalização da Indústria Açucareira (1971-1975); Estímulos à fusão/incorporação de
unidades industriais (DEL 1.186/1971 ); PROÁLCOOL (DEC 76.593/1975). A observação do gráfico 5 e da
127
meados dos anos 1980, o Grupo Cosan incorporou três usinas (Usinas Santa Helena, Usina
São Francisco e Usina Ipaussu), todas no Estado de São Paulo; esta ação é o início de um
processo maior, o qual se torna sistemático a partir de meados dos anos 1990. Em 1995, a
trading Balli Group realizou um joint venture e incorporou parte das ações da Usina Santa
Elisa (Grupo Zanini), localizada em Sertãozinho/SP. Neste mesmo ano, um consórcio paulista
adquiriu a Usina Santa Lydia, no município de Ribeirão Preto/SP (BENI, 2012).
Entre 1995 a 2000, pelo menos nove processos de F&A ocorreram na agroindústria
canavieira. Entre 2000 a 2009 foram identificados 97 ações envolvendo fusões, aquisições e
joint ventures, as quais proporcionaram incorporações de unidades de processamento,
verticalização à montante da cadeia, ou seja, compras de terras para autofornecimento e,
também, resultou em verticalização a jusante, com a posse de usinas pelas tradings atacadistas
de açúcar. Por exemplo, a aquisição da Santelisa pela multinacional Louis Dreyfus, deu
origem a Louis Dreyfus Commodities Bioenergia, a qual opera 13 usinas e tem uma
capacidade de moagem de 40 milhões de toneladas (VARRICHO, 2012).
A verticalização dos elos de produção é uma das características do processo de
concentração em curso. Desta maneira, chega-se em 2011 com 20% da agroindústria
concentrada nas mãos de 12 grupos empresariais. Consequentemente, a territorialização
destes grupos conforma o próprio circuito espacial de produção canavieiro, materializando-se
enquanto sistemas de objetos e ações, assim, hegemonizam áreas regionais na hinterlândia de
suas unidades agroindustriais (BENI, 2012; SHIKIDA & PEROSA, 2012; CASTILLO,
2013).
Estes novos atores visam participar da cadeia produtiva sucroalcooleira, ação
impulsionada pelas estratégias das commodities trading firms. O interessante é que estas
novas firmas passam a participar diretamente da produção e do controle dos ativos, o qual
altera a característica histórica do setor. O quadro 2.2. identifica alguns destes novos atores:
tabela 1 indicam esse fenômeno no cultivo da cana-de-açúcar e no controle da matéria-prima, já que nas áreas
tradicionais e nas novas áreas de expansão a cana própria é superior a cana de fornecedores.
128
Quadro 2.2. Presença estrangeira na produção de açúcar, etanol e bioeletricidade no Brasil.
Entrantes Origem de
Capital
Entrantes
Origem de
Capital
DOW Chemical EUA Epuron (grupo Conergy) França
Shell Anglo-holandesa Eridania Beghin Say França
Glencore Intl A.G. Angla-suíça Eridania Beghin Say (EBS) França
Adecoagro Argentina Evergreen França
Alcotra Bioenergy Bélgica FDA - Franco Bras. A.A. França
Global Energy Espanha Tereos França
ADM (Archier Daniels
Midland) EUA
Trading Sucden França
Amyris EUA Trading Noble Group Hong Kong
Bunge e Born EUA Sheree RenuKa Sugars Ltd. Índia
Cargill EUA Mitsubishi Corporation Japão
Coinbra/Dreyfus EUA Mitsui Japão
Globex EUA Sojitz Corporation Japão
Grupo Stanley Morgan EUA Toyota Tshusho Japão
RanchCapital Investment EUA Ventoria Limited Reino Unido
Truenergy EUA Biofuel AS Reino Unido
Wellington Management EUA BP (British Petroleum) Reino Unido
Infinity Bio-Energy EUA Balli Group Reino Unido
Monsanto EUA
Clean Energy Brazil Investidores
diferentes
Cluster França
Brazilian Renewable Energy Company Investidores
diferentes
Fonte: : elaboração própria a partir de BENETTI, 2009; KPMG, 2009; BORGES & COSTA, 2009; SIQUEIRA
& CASTRO JUNIOR, 2011; GARCIA et al., 2015.
Desde o início dos anos 2000 este setor vem recebendo investimentos de empresas
estrangeiras e advindas de outros setores econômicos, como: do agronegócio, da energia, da
biotecnologia, da química e da petroquímica. Como exemplo, destes novos atores pode-se
citar as empresas: Bunge, Cargill, Infinity Bioenergy, Abengoa, Louis Dreyfous, a Shell, BP,
Dow, Dupont, Amyris, Novozymes, Mascoma, Odebrecht, Petrobras, Noble Group, Sojitz e
outras que seguem expostas no quadro 2.2. (CORRÊA, 2014; BASTOS, 2012; BENETTI,
2009; GUEDES, 2009). Com isso, o IDE (Investimento Direto Estrangeiro) na indústria
canavieira em 2002, que era cerca de US$ 4 milhões, passa para mais de US$ 1 bilhão em
2007 (SHIKIDA & PEROSA, 2012).
A emergência de novas firmas, novas espécies de firmas, inicia novos sub-setores ou
requalifica o conteúdo e a forma dos setores tradicionais (OYELERAN-OYEYINK &
RASHAH, 2009). Este processo é percebido no SSI da cana-de-açúcar. Esta mudança
estrutural, juntamente com o crescimento e a expansão do setor para novas áreas, estimulou a
diversificação das atividades econômicas e a reorientação das atividades inovativas, por
exemplo: a difusão da cogeração com objetivo da venda da eletricidade, adaptação das
129
variedades de cana para novos tipos de solo; novos sistemas operacionais, difusão da
automação nas plantas industriais e etc.
Este processo desencadeia o alargamento das fronteiras setoriais e nessa ação residem
os elementos da mudança setorial, pois as fronteiras setoriais são importantes “espaços” para
o processo de aprendizado, visto que são nessas áreas que localizam-se importantes fontes de
novos conhecimentos. Ou seja, a interação entre firmas de diferentes naturezas possibilita o
processo de aprendizagem, a aquisição de novas competências e/ou de novas tecnologias, as
quais são refuncionalizadas e utilizadas sob uma nova perspectiva, agregando ou
redirecionando a rota tecnológica anteriormente estabelecida (MALERBA, 2002;
MALERBA, 2007).
A apropriação de novos conhecimentos e as novas oportunidades derivadas dessa nova
dinâmica de crescimento impele os atores a buscarem novas tecnologias, conformando novas
rotas tecnológias, por exemplo, todos os projetos de etanol celulósico ou de química verde no
interior do SSI surgem nesse contexto, e apresentam relações ou são conduzidas por estas
“novas” empresas117
. Tal afirmação toma forma nos capítulos 3 e 5.
2.3. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 2
O presente capítulo teve como objetivo demonstrar e compreender a gênese e o
processo de evolução da realidade produtiva do SSI da cana-de-açúcar do Brasil. Desta forma,
foi reconstruída a trajetória de formação do SSI e destacada suas características históricas, os
elementos e momentos que lhe conferem unidade e o posiciona no plano nacional. Assim, é
possível perceber sua forma híbrida, de um setor que integra concomitantemente os
segmentos agrícola, energético e alimentício.
Tais dimensões aparecem de maneira atrelada às peculiaridades dos momentos
históricos, como foi demonstrado, tendo sido cada uma destas dimensões estimuladas de
acordo com contexto e com as ações promovidas pelo arcabouço institucional. Ou seja, em
alguns períodos amplia-se a produção do açúcar e em outro a do etanol e, assim, diante dos
117
Vale reiterar que os novos entrantes não são necessariamente os únicos a realizar esforços em desenvolver ou
implementar novas tecnologias (o caso CTC comprova isso) e muito menos todos os entrantes mostram-se pré
dispostos a realizar tal movimento. O fato é que alguns destes aparecem com grande relevância no mapeamento
das políticas para C&T, na busca de patentes e na execução de projetos industriais de etanol celulósico (Raízen,
Abengoa, Odebrecht Agroindustrial etc.).
130
impulsos, as firmas manejam a economia de escopo. Esta dinâmica fica clara na releitura do
processo histórico de formação do SSI da cana feita até aqui.
A proposta deste capítulo é obter uma compreensão geral da dinâmica de
transformação do SSI da cana-de-açúcar, visando dar um panorama da base material que gesta
as inovações de segunda geração. Como isso, revela-se o contexto histórico com a intenção de
demarcar as dimensões, as fronteiras e as particularidades do setor que sofre mudanças
recentes, e pode ser fortemente reconfigurado com o desenvolvimento futuro do etanol
celulósico. Então, a construção deste plano visa dar lastro para as discussões futuras, pois
assim sabe-se que as projeções e a resolução das barreiras ao desenvolvimento do etanol 2G
passa por compreender o ponto de partida.
Como foi demonstrado, trata de um setor em constante transformação. As últimas duas
décadas, em especial, têm promovido novos impulsos para a reconfiguração da indústria
canavieira, desregulamentação, criação de um arcabouço institucional novo, a entrada de
novos atores, e um novo ciclo de expansão da cana-de-açúcar, elementos estes apontados ao
longo deste capítulo. Tal dinâmica deu origem a um SSI completo, com a presença de todas as
categorias de atores no segmento, conforme ilustra a figura 2.6.
A figura 2.6. esboça a dinâmica complexa do SSI, com os principais elementos que
compõem o SSI da cana-de-açúcar do Brasil e a direção dos fluxos de relações existentes
nesse ambiente. A principal categoria de atores deste sistema é a indústria de transformação
da cana-de-açúcar (usinas/destilarias), as quais apresentam o maior nível de interação por
concentrarem a atividade core deste segmento, ou seja, a produção do açúcar, do etanol e da
bioeletricidade. Vale destacar que os fluxos de conhecimento sempre apresentam uma via de
“mão dupla”, ao passo que, quando os atores interagem, ambos aprendem.
131
Figura 2.6. Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil
Fonte: elaboração própria.
132
CAPÍTULO 3. POLÍTICAS PÚBLICAS E O DESENVOLVIMENTO DO ETANOL
CELULÓSICO NO BRASIL
O presente capítulo visa identificar qual é o papel desempenhado pelas políticas
públicas de promoção à inovação no setor e como estas ampliam (ou não) a possibilidade do
desenvolvimento tecnológico voltado ao aproveitamento total da biomassa da cana-de-açúcar.
Com isso, destaca-se a necessidade das medidas institucionalizadas para o fomento e a
condução do progresso das tecnologias disruptivas e/ou amigáveis ao meio ambiente, ou seja,
tecnologias que concorrem com padrões técnicos e econômicos já estabelecidos, como é o
caso do etanol celulósico. Soma-se a esta temática, disputas na dimensão de superação do
Carbon lock-in. Nessa direção, o esforço particular desta pesquisa também contribui com uma
problemática global e atual.
Neste estágio do trabalho é possível apontar a correlação das iniciativas nacionais de
desenvolvimento tecnológico do etanol de segunda geração com as políticas públicas
implementadas pelo Governo Federal e pelo Governo Estadual de São Paulo. Cada ação
resultou em um conjunto de desdobramentos - os quais conformam a realidade do setor em
relação a essa tecnologia-, delineados pelas limitações e pelas vantagens existentes nas
próprias políticas públicas. O capítulo expõe a relação entre implementação de políticas e o
start das atividades voltadas à CT&I ligadas ao etanol celulósico no Brasil.
Os achados/resultados deste capítulo estão organizados de maneira a responder três
questões, estas são: 1) Qual é o design das políticas públicas voltadas especificamente para o
etanol celulósico? 2) Como o conjunto de medidas institucionais voltadas ao etanol celulósico
influenciou os atores do SSI da cana-de-açúcar? 3) Quais foram as adequações no campo de
políticas públicas para suportar/apoiar/implementar esta nova tecnologia no Brasil?
Tais perguntas estão fundamentadas na premissa de que as políticas públicas devem
articular o mercado118
e o desenvolvimento tecnológico/científico (MOWERY et al, 2010),
ação que possibilita emular o processo social da inovação e amplia a possibilidade da
tecnologia ser difundida no interior do SSI. Este pressuposto é embasado constantemente por
118
O capítulo 2 demonstrou a existência e a continuidade de medidas institucionais, as quais criaram um
ambiente “estável” para o etanol de primeira geração, possibilitando sua sobrevivência mesmo em períodos de
crise econômica ou crises relacionadas a condições internas ao setor. Portanto, o Brasil foi hábil em desenvolver
um mercado nacional para o biocombustível. A discussão deste capítulo visa complementar a análise do
arcabouço institucional relacionado ao setor sucroenergético, sobretudo, visando demonstrar as medidas que
promovem o aumento da oferta de tecnologia e de conhecimento no setor, assim, abrindo um espaço para
inovações, tal como o etanol celulósico.
133
intermédio de estudos de casos que mostram uma relação positiva entre políticas específicas
para o desenvolvimento das energias renováveis e o avanço do setor (LEWIS & WISER,
2007; BUEN, 2006; HENDRY & HARBORNE, 2011; e RU et al, 2012 sobre energia eólica,
e ERICSSON et al 2004; NEGRO et al, 2007; SUURS & HEKKERT, 2009; e HELLSMARK
& JACOBSSON, 2012, sobre o aproveitamento da biomassa na Europa)119
.
Ademais, uma diversidade de autores dedicados ao problema do desenvolvimento
tecnológico das energias renováveis [KEMP & SOETE (1992); JACOBSSON et al. (2000);
CARLSSON et al. (2002); WALZ (2008); CGEE, 2009; NEMET (2009); MOWERY et al
(2010); NYKO et al. (2010); CAMILO (2013); MAZZUCATO et al. (2015)] têm
argumentado que estas novas tecnologias necessitam de um conjunto amplo de medidas
regulatórias e instrumentos de incentivos para que avancem na trajetória de desenvolvimento
técnico e econômico; assim, identificar as características básicas das políticas implementadas
correlacionadas à produção e ao desenvolvimento do etanol no Brasil se torna relevante.
Por outro lado, ao responder a estas questões, aproxima-se da compreensão do papel
das políticas públicas120
no âmbito do Sistema Setorial de Inovação, de maneira conceitual e
concreta, pois avança no entendimento do setor sucroalcooleiro e retoma um elemento
importante do conceito desenvolvido por Malerba (2002, 2003) e Nelson & WINTER (1982).
Desta forma, as informações contidas nas subseções a seguir somam-se ao conteúdo
exposto no capítulo 2, complementando o quadro evolutivo da institucionalidade ligada ao
setor e evidencia o caráter singular dos anos 2000, momento em que ocorreu uma mudança
qualitativa do padrão de intervenção do Estado no setor sucroenergético – a inovação foi
posta na pauta de ações dos agentes públicos e privados.
O capítulo foca exclusivamente nas medidas de estímulo à C&T e de aprendizado
tecnológico, sendo possível evidenciar três características importantes: 1) a retomada das
ações do Governo Federal na direção de orientar (minimamente) os atores do setor
sucroenergético (depois de um hiato nos anos 1990); 2) a realização de esforços
sistematizados de aprendizagem tecnológica em uma nova base de conhecimento e; 3) a
119
Em comum, tais estudos abordam as problemáticas do desenvolvimento tecnológico de produtos e processos
novos, os quais necessariamente concorrem com sistemas técnicos já consolidados, dotados de uma
infraestrutura produtiva e institucional já estabelecida, as quais se contrapõem ao progresso da nova rota
tecnológica (renovável). 120
Endente-se por políticas públicas o conjunto de ações do governo que irão produzir efeitos específicos na
sociedade, na cultura, na economia e no território nacional. Estas ações partem diretamente dos órgãos
governamentais ou podem ser delegadas a outras organizações, públicas ou privadas (SOUZA, 2006). Logo, faz
uso do termo políticas públicas para referir à soma das atividades do governo que influenciam a vida dos atores
sociais, partindo sempre do que o governo escolhe fazer ou não fazer.
134
entrada de novos atores, principalmente os estrangeiros, os quais passam a agir em território
nacional correlacionado ao setor sucroenergético por meio destas medidas de apoio à
inovação, e com o estabelecimento de parcerias estratégicas tais como Amirys, Novozaymes,
VTT do Brasil e outras.
As políticas de estímulo à C&T do setor sucroalcooleiro são aqui interpretadas como
de cunho agrícola-industrial-tecnológico, visto que buscam atender demandas específicas da
produção, ao passo que buscam agregar valor à cadeia produtiva e, ainda, fazem avançar a
fronteira do conhecimento por intermédio da busca por uma ruptura tecnológica (etanol de
segunda geração e novos produtos químicos a partir da biomassa da cana-de-açúcar).
No interior das medidas de estímulo à C&T (vide figura 2.1. e quadro 3.1.) foi
analisado o desenho das principais medidas, leis e programas ligados ao setor no período de
2000 a 2016. O recorte temporal justifica-se pelo fato que se objetivou traçar um quadro atual
do setor e, além do mais, este é o momento em que o Governo Federal intensifica suas
medidas e estratégias para o desenvolvimento dos combustíveis renováveis, pontuando sua
importância nos objetivos dos planos e projetos de ação do Estado; um exemplo é o Plano
Nacional de Agroenergia (PNA) em 2006.
Por fim, este capítulo apresenta três seções além desta introdução. A primeira seção
(3.1) aborda as políticas públicas voltadas ao estímulo da C&T e do aprendizado tecnológico
ligado ao setor sucroalcooleiro em geral, expõem as medidas/instrumentos encontrados no
processo de mapeamentos das iniciativas do Governo Federal e do Governo do Estado de São
Paulo no período de 2000 a 2016, em que destacam-se as principais características e os seus
efeitos mais perceptíveis no SSI da cana-de-açúcar. A segunda seção (3.2) dedica-se
exclusivamente ao Plano Conjunto BNDES-FINEP de Apoio à Inovação Tecnológica
Industrial dos Setores Sucroenergético e Sucroquímico (PAISS Industrial e PAISS Agrícola).
A terceira seção (3.3.) é dedicada a expor as considerações finais do capítulo.
3.1. POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O SETOR SUCROENERGÉTICO BRASILEIRO:
ADENSAMENTO DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA LIGADA AO ETANOL
O conjunto de ações e medidas que estimulam a C&T e/ou aprendizagem tecnológico
do setor sucroenergético são caracterizadas por proporcionar condições para os investimentos
em PD&I e, sobretudo, são ações diretas do Governo para o desenvolvimento da tecnologia;
na maioria dos casos o Governo é o financiador e, em outros é o responsável por executar os
135
projetos de pesquisa por meio de instituições de ensino ou pesquisa. Destaca-se que cada
instrumento apresenta uma característica específica e efeitos variados.
As ações mapeadas no período entre 2000 a 2016 são formuladas e conduzidas pelo
Governo Federal por meio dos seus ministérios (MAPA, MDCI e MCTI) e órgãos de fomento
à inovação, como a FINEP e o BNDES. Nesse ínterim encontram-se ações na esfera estadual,
com destaque para o Estado de São Paulo121
. As discussões sobre estas ações se somam aos
destaques do capítulo anterior, desta forma, pode-se perceber que mesmo com as contradições
e deficiências existentes na realidade brasileira, o SSI da cana-de-açúcar foi hábil em
construir um arcabouço institucional completo para o seu desenvolvimento da trajetória do
açúcar e do etanol de primeira geração122
.
As medidas institucionais mapeadas ao longo da tese (vide figura 2.1. no capítulo 2 e
quadro 3.1.) apresentam certo sincronismo, pois agem em vários momentos da cadeia
produtiva do etanol e buscam co-evoluir com a tecnologia. Portanto, as ações institucionais,
no contexto dos anos 2000, buscam acompanhar e estimular as mudanças tecnológicas
vivenciadas no setor bioenergético123
. O esforço do arcabouço institucional no período recente
é de coevoluir com a base produtiva e, ao fazê-lo, conduzir e suportar as condições para a
inovação.
Inegavelmente este processo ocorre, entretanto, seu alcance e efetividade são limitados
como é demonstrado nos trabalhos de Varricho (2012); Bin et al. (2015) e Souza et al. (2016)
e, também, suportados pelos dados da PINTEC (2008 e 2011). Essa “baixa” atividade
inovativa é uma característica estrutural do segmento – heterogeneidade das firmas.
Medidas institucionais voltadas ao estímulo da CT&I buscam alterar este quadro e, tal
movimento/esforço é o objeto de análise deste capítulo, pois mesmo que estas ações não
tenham revolucionado a técnica e a organização do setor, estas são responsáveis por inaugurar
121
As medidas realizadas pelo Governo Estadual serão abordadas ao final desta seção, com um subtópico em
particular. 122
Como mostrado na figura 2.1. (capítulo 2), o arcabouço institucional do setor sucroenergético é completo
enquanto a forma, ou seja, apresenta temporalmente políticas e instrumentos de apoio ao setor que versão sobre
as três categorias de políticas públicas definidas por esta pesquisa: Instrumentos que estimulam a criação,
manutenção e expansão da capacidade produtiva local (produção); Instrumentos que estimulam o consumo do
etanol (Consumo); Instrumentos que estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou aprendizado tecnológico –
(vide subseção 1.3.1.1.). 123
Os trabalhos Nyko et al. (2010); Bastos (2012); Bacovsky et al. (2013); Pereira et al. (2015); Pereira (2015) a
;
UNCTAD (2016) entre outros, demonstram que os esforços em desenvolver o etanol celulósico e outros
produtos por meio da biomassa é uma disputa global, com ações em diversos países, cada qual apostando em um
tipo de matéria-prima e em um processo produtivo, com certa ligeira predominância dos esforços na rota
bioquímica (o capítulo 4 apresenta elementos para suportar tal afirmação).
136
novas estruturas de pesquisa (CTBE, Embrapa Agroenergia, Ph.D. Program in Bioenergy124
),
criar ou atrair “novas” empresas no setor (Alellyx; CanaVialis; GranBio; Amyris, Iogen
Energy; Abengoa, VTT, Novozymes, DSM; Butamax; LS9; Metso e outras) e promover avanço
tecnológicos verdadeiramente relevantes (novas variedades de cana, leveduras geneticamente
modificadas, ampliação da agricultura de precisão, plantas industriais de etanol celulósico).
Os atores estrangeiros atraídos pela nova política de inovação do setor são diferentes
das empresas estrangeiras e nacionais entrantes ao longo da primeira década de 2000 (vide
capítulo 2). Estas firmas e instituições visam explorar as oportunidades tecnológicas,
apresentam bases de conhecimento e técnicas ligadas à biotecnologia e a química fina,
portanto, almejam ser fornecedoras e desenvolvedoras de tecnologias e de insumos
tecnológicos para as unidades processadoras de biomassa. Por outro lado, os atores da
primeira década são grandes firmas ou grupos de investidores que objetivam participar ou
ampliar sua participação na produção mundial de commodities (açúcar) e aproveitar o boom
de consumo de etanol no mercado interno (carro flex – que durou até 2010 aproximadamente).
Estes novos fatores ampliam a dimensão do SSI da cana-de-açúcar, alterando suas
fronteiras setoriais, promovendo alterações nos padrões históricos da produção, forçando um
deslocamento em direção ao STI-mode, haja vista que o contínuo progresso técnico do setor
depende de uma articulação mais constante entre o conhecimento sistematizado e as
competências acumuladas ao longo da sua trajetória de desenvolvimento - calcada no DUI-
mode.
O esforço de aprendizagem em nova base de conhecimento e a entrada de novos atores
com competências distintas ampliam a quantidade e alteram a natureza das relações entre as
firmas e entre os atores não-firmas, assim, resultando em novos links, alterando as
interdependências e a complementaridade entre os indivíduos e as organizações. Esta
dinâmica é própria da transformação industrial, dada na sua essência pela contínua relação
entre tecnologia e sociedade ao longo do tempo, processo que ao final, manifesta-se como
mecanismo de desenvolvimento econômico e inovação (BRESCHI et al., 2003; MALERBA,
2003; MALERBA, 2007).
124
Programa de pós-graduação voltado à geração de conhecimento e à formação de recursos humanos de
excelência na temática da bioenergia. Este foi formado a partir de acordo de cooperação entre as três
universidades estaduais de São Paulo (USP, UNICAMP e UNESP).
137
As medidas institucionais que ampliam a chance do progresso técnico do setor
consolidam o arcabouço institucional, tornando-o atuante nas diversas etapas da cadeia
produtiva. Nesse processo, fica evidente que nos anos 2000 o esforço em desenvolver novas
tecnologias, principalmente, o etanol celulósico, passa a ser foco de ações sistematizadas do
Estado (criação de planos de desenvolvimento, editais de pesquisa e linhas de financiamento à
inovação – vide quadro 3.1 e figura 3.1.), contrastando com a década anterior marcada pelo
encerramento das atividades “coordenativas” do Estado e ausência de iniciativas no campo da
C&T especificamente com etanol125
.
A corrida pelo etanol celulósico ainda está em curso como demonstram os trabalhos de
Nyko et al. (2010); Souza et al. (2015), Silveira et al. (2015); UNCTAD (2016), Silveira et
al. (2016). Portanto, o Brasil como um dos principais players em energias renováveis126
e o
segundo maior produtor de etanol do mundo, deve buscar assumir o desenvolvimento desta
tecnologia como parte da sua estratégia de desenvolvimento, pois a tecnologia do etanol
celulósico e os seus desdobramentos apresentam o potencial de revolucionar o segmento
bioenergético, assim, a continuidade da cadeia produtiva da cana-de-açúcar no Brasil
(completa e integrada) depende da reação dos atores e do Estado em relação à trajetória de
segunda geração.
Os saltos na produção do etanol e a participação na bioeconomia não se dão de
maneira automática, compreende-se que tais mudanças não se desenvolvem de maneira
espontânea, apenas com o setor privado ou mesmo com ações que visam corrigir distorções
do mercado, é necessário ir além de medidas que se caracterizam como um “empurrão” do
poder público (isenções fiscais e créditos). O progresso em áreas de fronteira e de tecnologias
que fazem frente ao Carbon lock-in necessita de políticas ativas, nas quais órgãos públicos
assumam os riscos e conduzam o processo (ou parte dele), dividindo responsabilidades e
competências, já que se tratam de soluções de enfrentamento a desafios socioambientais
abrangentes (MOWERY et al., 2010; FORAY et al. 2012; MAZZUCATO, 2013;
MAZZUCATO et al. 2015).
Os exemplos concretos nas tecnologias ligadas à fotovoltaica (SHUM &
WATANABE, 2009; WISER et al. 2011; PETERS et al., 2012), ao veículo elétrico
125
Deve-se fazer uma ressalva, pois nos anos 1990 o setor apresenta um importante programa de mapeamento do
genoma da cana-de-açúcar conduzido no âmbito da FAPESP (elementos dessa iniciativa aparecem no subtópico
destinado às ações no nível estadual). Mas na esfera federal não foi encontrada nenhuma iniciativa. 126
A Produção de Energia Primária no Brasil no ano de 2014 provenientes de fontes renováveis atingiu 43,5%,
sendo que produtos da cana-de-açúcar representaram 18,1% do total da energia primária.
138
(AHMAN, 2006; ZHANG et al., 2013; MOCK & YANG, 2014; MAZUR et al, 2015;
LUTSEY, 2015; XU & SU; 2016) e, mesmo em relação ao etanol celulósico (NYKO et al.,
2010; NYKO et al., 2013; MILANEZ et al., 2015; PEREIRA et al., 2015; UNCTAD; 2016)
indicam que o caminho da superação passa pela ação do Estado, não apenas corrigindo as
distorções do mercado, mas imputando ao poder público a função de indutor e orientador do
desenvolvimento tecno-econômico do novo setor.
As experiências internacionais revelam que as ações são coordenadas e focalizadas em
trajetórias tecnológicas “portadoras de futuro”, assim, estas ações se traduzem em misson-
oriented R&D programs. Este tipo de ação, segundo Foray et al. (2012), é necessária para
induzir e desenvolver tecnologias relevantes na atualidade, sendo que as ações apresentadas
nos quadros 3.1.; 3.3. e 3.6. substanciam essa situação.
Este caminho é percorrido pelo SSI da cana-de-açúcar e os pontos fracos e fortes que
derivam deste esforço conformam as características atuais do sistema de inovação da cana,
sustentando uma das vertentes da reestruturação setorial, o aprendizado em uma nova base
tecnológica. As políticas destacadas a seguir tangenciam as características básicas de misson-
oriented programs, principalmente, os planos de cooperação entre FINEP-BNDES (PAISS
Industrial e PAISS Agrícola) e o programa BIOEN/FAPESP.
A execução do PAISS (Industrial e Agrícola) demonstra um encadeamento das
políticas federais realizadas para o SSI da cana-de-açúcar ao longo da última década, pois no
período entre 2000-2010 as políticas focaram-se mais no desenvolvimento da pesquisa básica
(linhas de pesquisa do PACTI e ENCTI) e na construção e ampliação da estrutura de pesquisa
(criação do CTBE e da Embrapa Agroenergia). Já no período posterior, entre 2011-2014, as
políticas apresentam financiamento a projetos de demonstração e financiamento de projetos
de pesquisa ligados aos problemas produtivos. Com isso, ocorre uma passagem qualitativa no
interior das novas rotas tecnológicas ligadas à transformação da biomassa da cana-de-açúcar.
Este movimento mostra como o arranjo institucional ligado ao setor se adaptou para induzir e
apoiar o start do desenvolvimento do etanol celulósico no Brasil.
139
Quadro 3.1. Políticas Federais que promovem o fortalecimento das ações em Ciência e Tecnologia no SSI da cana-de-açúcar. Ministérios Políticas públicas Objetivos (relacionados ao SSI da cana-de-açúcar) Resultados/pontos relevantes
Ministério da
Agricultura, Pecuária
e Abastecimento
MAPA
Plano Nacional de
Agroenergia
2006-2011 (PNA)
*Organizar e desenvolver propostas de P&D e de transferência
de tecnologia para garantir a sustentabilidade e a
competitividade das cadeias de agroenergia;
*Estabelecer metas para o desenvolvimento do mercado dos
bicombustíveis, visando garantir a participação dessas fontes
alternativas no Balanço Energético Nacional (BEN);
*Estabeleceu arranjos institucionais para estruturar a pesquisa
nacional;
*Comoditização do etanol;
*Criação da Embrapa Agroenergia em 2007, a qual através dos seus
laboratórios (4 em operação) desenvolve um conjunto de pesquisas
ligadas a produção de etanol como:
– Cana-de–açúcar tolerante à seca;
– Novas variedades de cana adequadas à produção de etanol
lignocelulósico (ELC);
– Novos híbridos de mandioca;
– Variedades e cultivares de sorgo sacarino;
– Capins e resíduos florestais para ELC;
– Prospecção (metagenômica) de microrganismos e enzimas para
ELC;
- Cooperação em projetos de P&D de firmas e outras instituições –
Ex:. Com o CTC e CTBE (vide capítulo 5).
Ministério de Ciência,
Tecnologia e Inovação
MCTI
Plano de Ação em
Ciência, Tecnologia e
Inovação 2007-2010
(PACTI)
*Fomentar a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação
aplicada ao setor sucroalcooleiro, visando tornar mais eficiente
a produção, o processamento e o uso de co-produtos da cana-
de-açúcar, em especial, o álcool combustível, por isso foca no
desenvolvimento de novas tecnologias e rotas para produção
de etanol;
*Direcionamento das linhas de pesquisa através do
estabelecimento de metas e objetivos dentro do setor;
*Recursos pré-determinados ao longo do período do plano de
ação em C,T&I
*A criação do Centro de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE),
com investimento inicial de 69 milhões de reais. Instituição de
pesquisa que além de desenvolver suas próprias pesquisas tem a
função de auxiliar as pesquisas feitas nas empresas, bem como,
abrigar espaços de comunicação entre os pesquisadores e os
produtores desta tecnologia;
*Investimento de 21 milhões de reais alocados na Rede
Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro
(Ridesa) para o desenvolvimento e para a identificação de variedades
de cana-de-açúcar.
*Gasto de 21,5 milhões de reais através de editais do CNPq para a
formação de recursos humanos – projetos de pesquisa.
Estratégia Nacional de
Ciência, Tecnologia e
Inovação 2011 – 2015
*Elege alguns programas prioritários, que envolvem as cadeias
importantes para impulsionar a economia brasileira, dentre os
vários segmentos apresenta um conjunto pontual de ações para
o etanol, visando ampliar os efeitos iniciados do PACTI, ou
seja, continuar o apoio a pesquisas na área de produção de
etanol.
*Fomento a pesquisa e inovação voltadas para a produção do etanol
de nova geração;
*Consolidação do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do
Bioetanol (CTBE) como centro de excelência na pesquisa
desenvolvimento e inovação em etanol de 2ª geração;
Ministério do
Desenvolvimento,
Indústria e Comércio
Exterior
MDIC
PAISS (BNDES e
FINEP)
*Fomentar projetos que visem o desenvolvimento, a produção
e a comercialização de novas tecnologias industriais destinadas
ao processamento da biomassa a partir da cana-de-açúcar;
*Busca a obtenção de produtos de maior valor agregado, que
podem ser obtidos a partir da biomassa da cana.
*O programa permitiu atração de novos atores para o setor, como as
empresas estrangeiras de biotecnologia;
*A criação de empresas brasileiras subsidiárias de grupos
internacionais com tecnologia de ponta;
*Promoveu a cooperação empresarial através de consócios: 7
140
+
Ministério de Ciência,
Tecnologia e Inovação
MCTI
consórcios entre empresas e 10 parcerias entre ICTs e empresas,
* Construção e operação de 3 plantas industriais dedicadas ao etanol
2G, sendo 2 em escala comercial e 1 demonstrativa.
PAISS Agrícola
(BNDES e FINEP)
*Elevar a quantidade de investimento e de apoio a projetos de
risco tecnológico e fortalecer as relações entre empresas, ICTs
e o setor público;
*Os esforços de PD&I destinam-se a parte agrícola do
processo de produção de etanol.
*Os recursos do PAISS Agrícola são de R$ 1.480.000 bilhões (2014
a 2018);
*A FINEP com a modalidade de Financiamento Reembolsável e
Instrumentos de Renda Variável no montante de R$ 700.000 milhões,
e no instrumento de Subvenção Econômica no valor de R$ 40.000
milhões. O BNDES apresenta os mesmo R$ 700.000 milhões na
modalidade Financiamento Reembolsáveis e Instrumentos de Renda
Variável e no FUNTEC 40.000 milhões de reais.
Fonte: elaboração própria.
141
3.1.1. Instrumentos que estimulam o desenvolvimento da C&T e/ou do aprendizado
tecnológico
O contexto de expansão da cultura canavieira127
, o aumento dos investimentos em
energias renováveis128
e, mais o aumento dos preços do petróleo129
na década de 2000,
abriram espaço para ações do Estado no direcionamento do setor. Instrumentos do tipo
tecnology-push (estímulo a CT&I) multiplicaram-se neste contexto, ampliaram a oferta de
recursos à tecnologia e ao conhecimento ligado a cana-de-açúcar, aproveitando uma
competência forjada ao longo dos anos, a qual não se dissipou completamente nos momentos
recessivos130
.
Na década de 2000 as principais ações federais ligadas ao estímulo a CT&I pró-cana-
de-açúcar foram: a manutenção e a expansão da RIDESA (2007 - 2010)131
; financiamento de
projetos de pesquisa pelo CNPq (1997 - 2015) e pela FINEP (1999 - 2015)132
; o Plano
Nacional de Agroenergia (2006-2010); o estabelecimento de Cooperação Tecnológica em
motores flex entre Brasil e Índia (2006 - ); o Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e
Inovação (PACTI – 2007-2010); a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação
(ENCTI - 2012-2015); o PAISS Industrial (2011-2014) e o PAISS Agrícola (2014-2018).
O Plano Nacional de Agroenergia (2006-2011), concebido pelo Ministério da
Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), visava organizar e desenvolver propostas de
P&D e de transferência de tecnologia para garantir a sustentabilidade e a competitividade das
cadeias de agroenergia. O plano buscou através do MAPA e da Embrapa estabelecer arranjos
institucionais para estruturar a pesquisa. Para isso, cria a Unidade Embrapa Agroenergia133
, o
principal instrumento na organização da pesquisa do setor de bicombustível. Outra função era
127
A produção de cana-de-açúcar na safra de 2000/01 era de 254.921.721 ton passando para 666.011.859 ton na
safra de 2015/16, com isso, apresentou um crescimento acumulado de 161%. A produção de etanol na safra de
2000/01 era de 10.517.535 m3 passando para 30.478.607 m
3 na safra 2015/16, tendo um crescimento acumulado
de 190% no período. 128
Segundo Mazzucato et. al. (2015) em 2014 foram gastos cerca de US$ 29 bilhões em P&D em tecnologias
verdes em nível mundial, destes, US$ 12 bilhões foram empregados na geração de energias renováveis e US$ 17
bilhões gastos em eficiência energética. 129
Vide gráfico 5 no capítulo 2. 130
Fator atribuído pela continuidade do consumo do etanol anidro, o qual mesmo com a desregulamentação do
setor nos anos 1990 e com fim do Proálcool, permaneceu sendo continuamente misturado à gasolina (ação
suportada por Lei Federal desde 1938 - DEL 737/1938). Tal situação não só manteve a estrutura produtiva e de
distribuição funcionando, como também, manteve atenção e esforços da atividade acadêmica e de pesquisa
ligada ao setor (HIRA & OLIVEIRA, 2009; LEITE et al., 2009). 131
A RIDESA é composta por uma rede de universidade federias e pela cooperação com diversas usina, não é
uma iniciativa puramente pública. 132
Projetos financiados pela carteira de recursos dos Fundos Setoriais, pela Finep e CNPq – vide figura 3.1. 133
Vide Box 3.1.
142
indicar ações através das estruturas já dadas do Governo Federal para fomentar o mercado
internacional de biocombustíveis, buscando contribuir com a comoditização do etanol.
O plano apresenta um eixo específico para o aperfeiçoamento e o desenvolvimento do
PD&I da Agroenergia, o qual estava subdividido em quatro grandes áreas: o etanol, a co-
geração de energia provenientes da cana-de-açúcar, o biodiesel de fontes animais e vegetais, e
a biomassa (florestal, resíduos e dejetos). O direcionamento do PD&I da agroenergia esteve
focado no desenvolvimento de tecnologia para a matéria-prima e o desenvolvimento ou o
aprimoramento de processos de produção da matéria-prima, portanto, o esforço de pesquisa
desse plano é mais voltado para a área agrícola do processo de produção de biocombustíveis.
Assim, a grande função deste plano no que tange a questão de PD&I é direcionar os esforços
dos diversos atores “espalhados” no território nacional, no sentido de dar suporte à pesquisa
da agroenergia, principalmente, pesquisa de base e de processos de produção agrícola
(conhecimento soft)134
.
BOX 3.1. Embrapa Agroenergia. A Embrapa é uma empresa pública, criada em 1973, com o objetivo de gerar e difundir conhecimento
especializado e novas tecnologias para a agropecuária brasileira. A unidade de Agroenergia foi fundada em
2007, com determinação do Plano Nacional de Agroenergia (2006), sendo sua função principal a pesquisa, o
desenvolvimento e a inovação em biocombustíveis e em produtos que agregam valor às cadeias produtivas,
principalmente, do biodiesel e do etanol. A unidade também visa desenvolver estudos de genética e
biotecnologia com culturas agrícolas com potencial energético, culturas não estabelecidas atualmente no cenário
bioenergético nacional (sorgo, pinhão-manso, caroço de algodão, algas e outras).
A unidade originalmente foi concebida para: a) Coordenar as ações de pesquisa em agroenergia; b) Ser
um órgão de aglutinação de conhecimentos e competência específica (que estavam espalhadas nas diversas
Unidades da Embrapa); c) Captar especialistas com competência ainda não incorporada; d) Centro de referência
na Embrapa, a partir do qual a empresa se integrará a redes e consórcios multiinstitucionais que se formam para
a PD&I no assunto.
Em 2016, a unidade conta com quatro laboratórios (Química de Biomassa e Biocombustíveis; Genética
e Biotecnologia; Processo Bioquímicos; Processos Químicos), uma área de planta-piloto e um núcleo de apoio a
culturas energéticas.
Em pesquisa feita na base de projetos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) da Embrapa, foram
recuperados 85 projetos relacionados diretamente com a cultura da cana-de-açúcar; apenas seis estão sobre a
liderança da Embrapa Agroenergia. Buscando por projetos estritamente sobre cana-de-açúcar e etanol celulósico
encontram-se sete projetos no total, dos quais apenas dois estão sob a condução da Embrapa Agroenergia. Por
outro lado, em busca mais abrangente, sobre etanol celulósico, encontram-se 15 projetos na Embrapa, dentre
estes oito são liderados pela Embrapa Agroenergia.
Uma das ações mais importante ligadas ao etanol celulósico ocorre no Laboratório de Processo
Bioquímicos, no qual desenvolve-se ações de P&D com foco na prospecção, seleção, caracterização e cultivo de
microrganismos para obtenção de produtos úteis ou correlacionados aos combustíveis de primeira geração
(fermentação de amiláceos) e de segunda geração (etanol lignocelulósico). Esta estratégia é abrangente e pode
dar base a diversos tipos de processo industriais e novos produtos, dentre essa miríade de caminhos, apresenta-se
o desenvolvimento de coquetéis de microrganismos ou de enzimas para utilização na desconstrução de biomassa,
ação primordial para o acesso ao açúcar (xylose) base do etanol celulósico.
134
Hendry & Harborne (2011), com base no caso dinamarquês, identificam que um importante fator para o
desenvolvimento das fontes de energia renováveis é o conhecimento tecnológico “soft”, que deriva do
conhecimento formal (da ciência básica). Estes estudos visam balizar práticas cotidianas da produção, como a
modelagem micrometeorológica, estudos de melhoramento das práticas agrícolas e etc.
143
O Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI) elaborado
pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), constituiu um importante
instrumento de orientação das ações do Estado para as atividades de PD&I, na medida em que
delineou programas e direcionou aportes de recursos, por meio de uma estratégia pré-
determinada, indicando os setores econômicos mais relevantes para o desenvolvimento
nacional.
O PACTI destinou de maneira pontual um programa de CT&I para o etanol, contendo
objetivos, metas e recursos específicos para o setor (prioridade III do plano), ação que
repercute no aumento de projetos de pesquisas financiados pela CNPq e FINEP, os quais
estão expostos na figura 3.1.
Assim, o objetivo desse eixo em CT&I do etanol é fomentar a pesquisa, o
desenvolvimento e a inovação aplicada ao setor sucroalcooleiro, visando tornar mais eficiente
a produção, o processamento e o uso de co-produtos da cana-de-açúcar, em especial, o álcool
combustível. Por isso foca no desenvolvimento de novas tecnologias e rotas para produção de
etanol; esta ação soma-se às “tradicionais” ações do SSI - ações privadas de P&D vide
Furtado et al. (2011).
O design do PACTI cumpre com diversos pontos expostos pela teoria. Atende os
amplos argumentos das políticas de technology-push, visto que realiza gastos em P&D e
reforça a capacidade de troca de conhecimento entre os atores do SSI, pois os editais
pressupõem na sua maioria a integração entre as empresas que irão desenvolver a pesquisa
com as universidades ou/e instituições de pesquisa.
Nota-se grande convergência entre as metas do PACTI com os objetivos específicos
de PD&I para o etanol do Plano Nacional de Agroenergia. Esse fato é importante para
direcionar os outros atores do SSI da cana-de-açúcar, pois explicita as prioridades a serem
resolvidas, além de concentrar esforços e recursos sobre questões chaves. Destaca-se ainda, a
regularidade de um recurso específico destinado ao setor do etanol, fator importante para o
planejamento de projetos de pesquisa e de desenvolvimento tecnológico, visto que amplia a
capacidade dos atores de prever situações futuras, o que diminui o paradoxo entre custos,
riscos e benefícios tão evidenciado por Kemp & Soete (1992).
Esta política aproxima-se do “receituário” teórico e empírico trazido por Nemet
(2009), sendo que os principais resultados do PACTI 2007/2010 para o segmento do etanol
demonstram essa relação. A criação do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do
144
Bioetanol (CTBE) representa uma nova realidade para o SSI da cana-de-açúcar, ao cobrir uma
lacuna no SSI da cana.
O CTBE tem a função de congregar pesquisadores e iniciativas para o
desenvolvimento de tecnologias ainda não consolidadas no setor, as quais ainda se mostram
como oportunidades de novos negócios, com o estabelecimento de rotas tecnológicas ainda
não exploradas, com potencial para reposicionar as empresas brasileiras e o próprio Brasil na
concorrência pelo mercado de bioenergia, com possibilidades de não só figurar como um
produtor de combustíveis, mas, também, como produtor e exportador de tecnologia.
A criação do CTBE teve aporte inicial de 69 milhões de reais (em 2010) e figura como
importante instituição de pesquisa, que além de desenvolver suas próprias pesquisas tem a
função de auxiliar as pesquisas feitas nas empresas, bem como abrigar espaços de
comunicação entre os pesquisadores e os produtores desta tecnologia, por meio de workshops,
palestras, congressos e reuniões específicas para a troca de informações sobre rotas
tecnológicas em fase de desenvolvimento, como é o caso da produção do etanol de segunda
geração pela rota enzimática.
Um resultado expressivo atingido pelo PACTI é o investimento de 21 milhões de reais
alocados na Ridesa (Rede Interuniversitária para o Desenvolvimento do Setor
Sucroalcooleiro) para o desenvolvimento e para a identificação de variedades de cana-de-
açúcar. Outro fato importante é o investimento de 21,5 milhões de reais através de editais do
CNPq para a formação de recursos humanos.
Esta ação junto a RIDESA é um fato novo, pois desde a sua criação o seu
financiamento é prioritariamente privado e os programas de melhoramentos são executados
em parcerias entre as universidades federais (que herdaram as estruturas e o corpo técnico do
PLANALSUCAR) e as usinas. As ações derivadas do PACTI foram as primeiras a realizar
aportes específicos à essa rede de melhoramento de cana-de-açúcar.
145
Box 3.2. O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) inaugurado em 2010 faz parte do
Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), tal organização é suportada pelo Ministério da
Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e encontra-se localizada em Campinas/SP. O CTBE coloca à disposição
da comunidade científica e empresarial as suas instalações e serviços, tanto para brasileiros como para
estrangeiros, atuando na área de produção, caracterização e processamento da biomassa e seus derivados,
relacionando-se fortemente com a biofísica, fisiologia vegetal e biotecnologia. O CTBE também apresenta uma
agenda de pesquisa interna, abrangendo áreas relacionadas à cadeia produtiva do etanol (fase agrícola, fase
industrial, avaliação tecnológica, sustentabilidade, avaliação técnica/econômica/ambiental e pesquisas
exploratórias relacionadas à biomassa/bioprodutos).
O CTBE conta com duas estruturas principais de pesquisa, a Planta Piloto para Desenvolvimento de
Processos (PPDP) e o Laboratórios de Desenvolvimento de Processos (LDP). A planta-piloto construída em
2012 torna-se uma estrutura de pesquisa muito importante para o SSI da cana-de-açúcar permitindo e ampliando
as possibilidades de compreensão de processos industriais relacionados à conversão de biomassa em etanol
celulósico e em outros produtos derivados da biomassa; sua escala é semi-industrial com capacidade de 300
litros. Esta estrutura possibilita validar indicadores técnico-econômicos dos processos, minimizando os riscos e
otimizando as estimativas de investimento futuros na indústria. Já o PDL executa diversas caracterizações de
matérias-primas, bioprocessos e produtos, hospeda reatores capazes de transformar a biomassa lignocelulósica
em etanol, chemical building blocks e outros produtos, sendo uma organização de pesquisa complexa, aportando
diversos tipos de projetos de pesquisa.
O CTBE apresenta três eixos principais de pesquisa, os quais se dividem em diversos projetos de
pesquisa, próprios ou em parcerias. Estes eixos são: 1) Produção de Biomassa dedica-se a compreender a
evolução dos aspectos econômicos e ambientais da mecanização agrícola da cultura da cana-de-açúcar, com
ênfase nos custos de produção, conservação do solo e qualidade das matérias-primas. O principal projeto deste
eixo de pesquisa, a Estrutura de Tráfego Controlado (ETC), traz um novo conceito que visa reduzir em 80% a
incidência de tráfego no canavial. Esta nova máquina deve preservar os nutrientes do solo e economizar
combustível. Além disso, um processo de colheita alternativa promete reduzir o custo de operação por 50%; 2)
Processamento de biomassa é dedicada a atividades de pesquisas prospectivas e orientadas a um projeto
específico (demanda da empresa), atuando na área de conversão de cana-de-açúcar em bioprodutos. Estes
estudos envolvem os principais processos de produção de biocombustíveis, como os tratamentos físico-químicos,
obtenção de complexos enzimáticos, hidrólise enzimática e fermentação; 3) Avaliação Integrada das
biorrefinarias, desenvolvimento de uma ferramenta de simulação computacional, a Biorrefinaria Virtual de
Cana-de-açúcar (BVC), a qual avalia novas tecnologias e estratégias agrícolas no setor sucroalcooleiro por meio
da avaliação de três critérios da sustentabilidade (social, econômico e ambiental).
O CTBE em suas diversas ações de pesquisa estabelece parcerias com diversos atores do Sistema
Setorial da Inovação da cana-de-açúcar, com empresas (Zilor; Braskem; Lilly; São Martinho; ETH Bioenergia;
DSM; Petrobras; Raízen; DOW; Jacto; Rhodia; BP; Embrapa), universidades e institutos de pesquisa (Unicamp;
USP; UFG; IFGO; UFSCar; UFPE; USC; University of British Columbia; Max Planck Institutes; Jülich
Institutes), órgãos de fomento (BNDES; FINEP; FAPESP) e outras organizações tais como a UNICA e PNDU.
As ações desencadeadas pelos grandes programas/planos de C&T listados acima
ampliam as ações de pesquisas no SSI da cana-de-açúcar. Tal afirmação é confirmada com a
observação da figura 3.1, a qual ilustra os esforços de pesquisas realizadas por meio de
financiamento público. É possível perceber que a quantidade de eventos passa a aumentar no
decorrer da década, tendo o maior número de projetos de pesquisa contratados entre 2007 –
2013, coincidindo com a implementação do PACTI, do ENCTI e com as ações conjuntas do
BNDES-Finep por meio do PAISS Industrial.
146
Figura 3.1. Número de projetos de pesquisas financiados com recursos dos Fundos Setoriais,
pela CNPq (1997 a 2015) e FINEP (1999 a 2015) – Diretamente relacionados ao setor
sucroenergético.
FONTE: elaboração própria a partir de MCTI, 2016.
As iniciativas no âmbito federal relacionadas ao SSI da cana-de-açúcar respondem aos
estímulos dos planos supracitados. É possível observar uma relação dos temas dos projetos de
pesquisa financiados por estas instituições com as linhas de prioridades do PACTI, ENCTI e
do PAISS Industrial, demonstrando uma convergência/coordenação entre as diversas
iniciativas do Estado brasileiro (vide figura 2, quadro 3.1.). Por exemplo, o PACTI
estabeleceu metas e objetivos relacionados à produção da cana-de-açúcar e sobre novas
tecnologias na produção do etanol. A partir deste período, não só houve um aumento das
iniciativas como um direcionamento dos temas de pesquisa, pois só no período do programa
(2007-2010) o CNPq contou com 242 projetos voltados ao setor, destes 49 eram sobre etanol
celulósico, ligando-se ao segundo objetivo do plano para o setor (PACTI, 2007). Situação
semelhante se dá na FINEP, no período do PAISS Industrial (2011-2014), em que encontram-
se financiados pela agência 21 projetos ligados ao SSI da cana, destes apenas quatro não eram
vinculados ao PAISS Industrial.
Estas ações são importantes, pois aumentam a quantidade de pesquisas focadas nos
problemas cotidianos do setor (uso do solo, controle de pragas, seleção de variedades
genéticas, irrigação e etc.) e nos desafios “futuros” do setor (aproveitamento da biomassa,
novos produtos a partir da cana, composto enzimático etc.). Assim, ampliam o conhecimento
e as competências do setor, não só pelas pesquisas realizadas no interior de cada projeto, mas
pelas interações que derivam destas iniciativas, pois existem projetos desenvolvidos em
parcerias entre o setor produtivo e instituições de ensino e pesquisa. Tal realidade amplia os
canais de comunicação entre os atores, facilitando a difusão de conhecimento, condição de
existência do Sistema Setorial de Inovação (MALERBA, 2002; LUNDVALL, 2009).
147
Com isso, cabe aprofundar-se em alguns detalhes fornecidos pelos dados expostos na
figura 3.1.. No que se refere às iniciativas do CNPq, entre os anos de 1997 a 2015, encontra-
se 398 projetos financiados com relação direta ao SSI da cana-de-açúcar, sendo que o
primeiro evento ocorre apenas em 2001. Dentre estes, 73 são explicitamente relacionados ao
etanol celulósico, estando à evolução destas ações expostas na figura 3.1.
Sobre a competência da FINEP (1999 – 2015) foram encontrados 97 projetos
diretamente ligados ao SSI da cana-de-açúcar, 25 explicitamente voltados ao etanol
celulósico. A tabela 3.1. detalha a categoria dos recursos aportados pela FINEP ao SSI da
cana-de-açúcar, indicando que as ações em termos de recursos alocados concentram-se
majoritariamente nas operações de créditos (88%), tendo início somente em 2010, com o
projeto da Amyris Brasil S.A135
. A categoria que mais financiou projetos foi a subvenção com
28 projetos, tendo início no ano de 2007 com o projeto da Usina Cerradinho Açúcar e Álcool
S.A. Todas as ações de subvenção somadas representam apenas 4 % do montante alocado.
Tabela 3.1. Detalhamento do aporte realizado pela FINEP em relação ao SSI da cana-de-
açúcar entre 1999-2015.
Categoria Número de projetos Valor Contratado
Eventos 1 30.000,00
P&D agropecuário e agroindustrial para inserção social 2 5.364.128,00
Tecnologia Industrial Básica – TIB 3 8.180.560,00
Apoio a projetos de Interação Universidade-Empresa e apoio à
inovação 16 19.931.156,46
Tecnologias Sociais 5 20.806.284,08
Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação em Áreas Estratégicas 14 53.651.361,33
Infraestrutura de Pesquisa Científica e Tecnológica 8 56.579.095,19
Subvenção 28 81.321.890,91
Crédito 20 1.818.748.722,30
Total 97 2.064.613.198,27
FONTE: elaboração própria a partir de MCTI, 2016.
135
O projeto tinha como mote a pesquisa e o desenvolvimento de processo de fermentação para a produção em
escala piloto de biocombustível diesel a partir da cana-de-açúcar, o valor contratado foi de 6.435.000 reais.
148
Os projetos ou as iniciativas especificamente relacionadas ao etanol celulósico
anteriores ao PAISS Industrial (2011-2014) no âmbito da FINEP são apontadas no quadro
3.2.:
Quadro 3.2. Projetos relacionados diretamente com o etanol celulósicos financiados pela
FINEP - anteriores ao PAISS Industrial. Projetos Instituições / Empresas
2004 - ENZITEC 2004 6º seminário brasileiro de
tecnologia enzimática
Fundação Universitária José Bonifácio
2006 - implementação da Embrapa Agroenergia Embrapa / Fundação Arthur Bernardes / UFRJ
2006 - Produção de etanol por hidrólise enzimática
da biomassa da cana-de-açúcar
CTC / Faculdade de Engenharia Química de Lorena /
UNICAMP / UNB / UFCS / UEM / IPT / Instituto
Nacional de Tecnologia / Toyobo do Brasil LTDA. /
USP )
2008 - Cana-de-açúcar geneticamente modificada
para a produção de etanol celulósico
Alellyx S.A
2008 - Infraestrutura para o estudo de
biocombustíveis
UFRS / INMETRO
2009 - Consolidação do centro de ciência e
tecnologia do bioetanol
Laboratório Nacional de Luz Sincroton
2009 - Desenvolvimento de normalização, de
avaliação da conformidade e de métodos analíticos
aplicados ao setor sucroalcooleiro
Fundação Educacional Charles Darwin / INMETRO
2009 - Escalonamento da produção de enzimas
celulolíticas e acessórias e sua utilização na hidrólise
da biomassa da cana e outras biomassas pré-tratadas
BIOMM S/A / COPPETEC /UFRRJ / Instituto
Nacional de Tecnologia / UFSC / UFRJ
2009 - infraestrutura para a área de biotecnologia
estrutural voltada para o estudo de biocombustíveis
UFRGS / INMETRO
2009 - Obtenção de etanol via hidrólise ácida
assistida por microondas em injeção de fluxo
(haamif) de material celulósico e produção de
fertilizante via mineralização de vinhoto por
microondas
Quadex Technology Comércio E Desenvolvimento
De Equipamentos Científicos LTDA.
2009 - Pirolise para produção de etanol e energia
elétrica a partir do bagaço e da palha da cana-de-
açúcar
GASES E EQUIPAMENTOS SILTON LTDA. –
GASIL
2010 - Desenvolvimento de processo para a
obtenção industrial de misturas enzimáticas
celuloliticas destinadas a produção de
biocombustíveis a partir de biomassa
BIOMM S/A
FONTE: elaboração própria a partir de MCTI, 2016.
Estes projetos apresentam características variadas, versando principalmente sobre a
rota tecnológica enzimática, sendo que alguns projetos se destacam por apresentar integração
entre empresa e outras instituições; o projeto liderado pelo CTC em 2006 e o projeto liderado
pela BIOMM em 2009 são exemplos dessa situação. A pesquisa do CTC teve aporte de R$
3.629.932,8, tendo como objetivo o desenvolvimento de tecnologia baseada na utilização da
149
hidrólise enzimática para a transformação da biomassa (bagaço e palha) em álcool
combustível. O pano de fundo do projeto visava à intensificação da produção de álcool por
hectare, em contraste com a simples expansão da lavoura de cana, permitindo o aumento da
produção, a redução dos riscos econômicos e ambientais, a diminuição dos investimentos em
infraestrutura e em logística. Outras informações sobre as ações do CTC no E2G aparecem no
capítulo 5.
A BIOMM é uma empresa de biotecnologia sediada em Belo Horizonte/MG criada em
2001136
. O projeto de 2009 com parceria com outras instituições recebeu R$9.143.850,80 de
aporte, com o objetivo de desenvolver tecnologia para a produção de enzimas celulolíticas e
acessórias visando o seu uso para a produção de etanol celulósico. A pesquisa visava realizar
os experimentos em escala pré-piloto, atuando nos processos de pré-tratamento da biomassa,
sua hidrólise enzimática e fermentação alcoólica dos xaropes de biomassa, considerando a sua
interdependência.
Outro destaque é o projeto da Alellyx S.A de 2008, que recebeu R$ 9.451.328,39 na
categoria de subvenção. O projeto visava desenvolver uma variedade de cana-de-açúcar
geneticamente modificada para a produção de etanol celulósico, em que a cana deveria
apresentar menor conteúdo de lignina e/ou modificação na composição da lignina facilitando
o pré-tratamento do bagaço e aumentando a eficiência da conversão da celulose em
monossacarídeos pelo processo enzimático. Ademais, o projeto previa a introdução de
construções gênicas contendo enzimas celulolíticas, necessárias para a hidrólise da celulose.
O resultado esperado era obter uma tecnologia de expressão segura de celulases em plantas e,
em caráter experimental, uma cana que produza as enzimas celulolíticas em quantidade
suficiente para hidrolisar a celulose presente no bagaço.
Nota-se que no conjunto das ações apontadas no quadro 3.2. apresentam-se também
aportes para a efetivação de infraestruturas de pesquisa científica específicas ao etanol. Em
2006 a FINEP aportou R$9.832.000 para a Embrapa Agroenergia, na categoria de
Infraestrutura de Pesquisa Científica e Tecnológica e, em 2008 o aporte foi de R$325.591
para a Universidade Federal do Rio Grande Sul (UFRGS) e para o Inmetro para a
consolidação do Programa de Biotecnologia do Inmetro. Em 2009 o aporte foi de
R$36.230.000 para o estabelecimento do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do
136
A BIOMM surge com a reestruturação da Biobrás, que em 2002 foi comprada pela empresa dinamarquesa
Novo Nordisk. A Biobrás foi criada em 1975 com objetivo de produzir enzimas extraídas de matérias-primas
animais e vegetais, atuando na indústria farmacêutica e alimentícia.
150
Bioetanol (CTBE) por meio da categoria de Infraestrutura de Pesquisa Científica e
Tecnológica.
As ações que visam ampliar a infraestrutura da C&T são importantes e tratando-se do
SSI da cana-de-açúcar são inéditas, pois no atual estágio de desenvolvimento do sistema
capitalista, o conhecimento é ao mesmo tempo localizado e globalizado, assim, os avanços no
conhecimento geram impactos nos países em desenvolvimento. A dimensão e a qualidade
destes impactos dependem diretamente da estrutura local ser capaz de absorver e influenciar
essa dinâmica, assim, participando da difusão do conhecimento tanto na escala nacional como
internacional (IIZUKA, 2013). O CTBE e a Embrapa Agroenergia apresentam na origem essa
função.
Desta forma, a infraestrutura para inovação deve ser desenhada para melhorar o
acesso ao conhecimento e estimular o processo de aprendizagem. Os esforços locais devem
buscar a criação de estruturas de ensino e pesquisa, a criação de canais de comunicação com a
comunidade internacional e a implementação de instituições que ampliem e consolidem o
conhecimento no interior das firmas e de outras organizações, tais como: consórcios de P&D,
fomento à inovação; aquisição de tecnologia; treinamentos.
3.1.2. Ações do Estado de São Paulo em relação ao estímulo à C&T e ao aprendizado
tecnológico do SSI da cana-de-açúcar (2000 – 2016)
De modo paralelo, apresenta-se um conjunto de ações voltadas ao estímulo à C&T e
ao aprendizado tecnológico no setor proveniente do nível estadual. O Estado de São Paulo
imprime um conjunto de ações nessa direção, as quais se encontram sumarizadas no quadro
3.3.. Importante frisar que, nesta sessão, destacam-se apenas os grandes programas de
pesquisas e as ações ocorridas no interior do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para
Inovação Tecnológica (PITE) e a Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE).
Entretanto, como apontam Oliver & Szmrecsányi (2003), Furtado et al. (2011), e
Andersen (2011), muitas outras ações são desempenhadas pelo governo estadual para a
consolidação do SSI da cana-de-açúcar, por exemplo, a criação do programa de erradicação
da queimada da cana-de-açúcar (Lei 11.241/2002), a APL do álcool em 2005, o programa de
doutorado e pós-doutorado em Bioenergia (USP/UNICAMP/UNESP) e tantas outras ações
específicas ao SSI da cana-de-açúcar.
151
As ações do Estado de São Paulo confundem-se com a própria formação do setor
sucroenergético e de sua infraestrutura de pesquisa e de desenvolvimento técnico. Primeiro,
pela sua condição histórica de região mais desenvolvida do país (dotada de material humano,
infraestrutura produtiva e de serviços) e, em segundo, por ser a região tradicional do cultivo
da cana, a qual ao longo do último século construiu instituições e organizações que se
relacionam fortemente com o setor, como as universidades (USP, UNICAMP, UNESP,
UFSCar), institutos de pesquisa agronômicos (IAC e APTA) e cursos técnicos e tecnólogos
(FATECs e ETECs).
O quadro 3.3. expõe as principais medidas realizadas pelo Estado de São de Paulo pró
C&T do SSI da cana-de-açúcar; estas ocorrem por meio das ações de fomento à pesquisas da
FAPESP. A primeira ação relacionada ao SSI da cana é de 1968, iniciativa voltada à
consolidação de infraestrutura de pesquisa, a qual abre espaço ao desenvolvimento de
iniciativas no campo da biotecnologia; entretanto, as ações vão se intensificando ao longo dos
anos, ocupando espaço definitivo na agenda de pesquisa da Fundação nos anos 2000, com o
sucesso do programa FAPESP Sucest (1999-2002), desde então, sempre conta com projetos
ligados ao setor, ganhando ainda mais relevância com o programa BIOEN (2008-2012).
152
Quadro 3.3. Medidas no âmbito do Estado de São Paulo que fortalecem a Ciência e a
Tecnologia ligadas ao SSI da cana-de-açúcar.
FAPESP
Apoio ao Laboratório de Biotecnologia Industrial da Escola Politécnica (1968) – os recursos
da Fapesp foram utilizados para a consolidação da infraestrutura e das atividades do laboratório.
Programa Bioq-FAPESP (1972) – Tinha como objetivo formar recursos humanos no campo da
biotecnologia, tal iniciativa abriu caminho para o sequenciamento genômico de vários
organismos, dentre eles o da cana-de-açúcar.
FAPESP Sucest (1999-2002) – Financiava atividades de pesquisa ligadas ao genoma da cana-de-
açúcar, com o objetivo de sequenciar o DNA da cana-de-açúcar e identificar genes com interesse
econômico (cerca de 50 mil), identificando características que favorecessem a resistência a
doenças e o metabolismo da sacarose. Uma das suas características era a forte interação entre o
setor privado e as instituições públicas de pesquisa e ensino. Ao final, o projeto mapeou 250 mil
fragmentos de genes funcionais da cana, reuniu 240 pesquisadores e teve financiamento da ordem
de US$ 4 milhões da FAPESP e outros US$ 400 mil da Copersucar. Este programa marca o
início das pesquisas relacionadas ao DNA e ao sequenciamento genético da cana-de-açúcar no
Brasil.
Projeto Sucest-FUN (2003) – Surge na sequência e relacionado ao Sucest, dedicando-se à análise
dos genes da cana. Apresentava a característica de cooperação entre setor privado e instituições
públicas de ensino e pesquisa (CTC, Usina Central de Álcool Lucélia, USP e Unicamp). Realizou
a identificação de 348 genes associados ao teor de sacarose e a identificação de marcadores
moleculares, processo este que acelera o melhoramento das variedades de cana-de-açúcar.
Programa para a Pesquisa em Bioenergia (BIOEN) (2008-2012) – o objetivo do programa é
articular a P&D privada e pública, utilizando-se dos laboratórios industriais e acadêmicos para a
realização de pesquisas nas áreas relacionadas à produção de etanol. O orçamento previsto era de
US$ 130 milhões nos cinco primeiros anos do programa. A iniciativa conduzida pela FAPESP foi
organizada em cinco grandes áreas: 1) Pesquisa em biomassa, com o foco em cana-de-açúcar,
incluindo genômica, bioquímica, biologia celular, fisiologia e plantação de cana; 2) Pesquisa em
tecnologias de etanol, enfatizando o processamento e a engenharia para produção de etanol; 3)
Alcoolquímica e biorrefinarias, objetivando a integração na química do açúcar, alcoolquímica e
bioprodutos; 4) Engenharia, ênfase nos desenvolvimento de motores de veículos a etanol; 5)
Impactos: estudos sociais, econômicos e ambientais, como uso da terra e propriedade intelectual
associado à indústria sucroalcooleira.
Um desdobramento do Bioen foi a criação em 2010 do Centro Paulista de Pesquisa em
Bioenergia. Trata-se de um esforço para estimular a pesquisa interdisciplinar e ampliar o
contingente de pesquisadores envolvidos com o tema, mantido pela FAPESP, o Governo do
Estado de São Paulo e as três universidades estaduais paulistas (USP, UNICAMP, UNESP).
Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) (1994 -):
Objetiva financiar projetos de pesquisa em instituições acadêmicas ou institutos de pesquisa,
desenvolvidos em cooperação com pesquisadores de empresas localizadas no Brasil ou no
exterior. O financiamento se dá de maneira compartilhada, portanto, os projetos necessariamente
contam com recursos da agência de fomento e das empresas. Assim, o programa intensifica o
relacionamento entre universidades/institutos de pesquisa e empresas, por meio da realização de
pesquisas cooperativas. Os projetos PITE, na grande maioria envolvem grandes empresas e as
instituições públicas de ensino e pesquisa. Os projetos que se relacionam com o SSI da cana-de-
açúcar concentram-se nas áreas da microbiologia e engenharia química, destinando-se ao
desenvolvimento de processo de conversão energética dos materiais celulósicos.
Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) (1997 - ) – Apoia a execução de pesquisa
científica e/ou tecnológica em micro, pequenas e médias empresas no Estado de São Paulo, busca
aumentar a competitividade das pequenas empresas e induz o aumento do investimento privado
em pesquisa tecnológica. Outra característica importante é a criação de uma “ponte” entre estas
empresas e o ambiente cientifico/acadêmico, visando criar condições a inovação tecnológica. Os
projetos PIPE que se relacionam ao SSI da cana-de-açúcar concentram-se em áreas das ciências
agrárias, engenharia química e agrícola. Esses projetos produzem melhoramentos e inovações
tecnológicas incrementais em processos produtivos existentes para a produção do etanol de 1ª
geração.
Fonte: elaboração própria a partir de FAPESP, 2012; VARRICHO, 2012; FAPESP, 2016.
153
A figura 3.2. e o quadro 3.4. apresentam detalhes da evolução dos esforços em
financiar pesquisas de inovação no segmento, estão detalhadas informações dos programas
PITE e PIPE da FAPESP. É possível perceber que ações junto às empresas ganham força na
década de 2000. Os programas anteriores e o BIOEN apresentam o foco mais nas
universidades e na pesquisa básica, situação que se desloca nos projetos do PITE e PIPE, pois
estão direcionados na sua formulação ao desenvolvimento de novos produtos ou processos
pela empresa demandante.
Figura 3.2. Projetos de pesquisas contratados pela FAPESP no período de 1997 a 2016
relacionados ao setor sucroenergético.
Fonte: elaboração própria a partir de FAPESP, 2016.
Quadro 3.4. Detalhes dos projetos desenvolvidos nos programas: PITE e PIPE relacionados
ao setor sucroenergético no período de 1997 a 2016.
PITE PIPE
ICTs USP, Unicamp, UFSCAR, UNESP,
CNPEM, IPT, APTA -
Firmas com
projetos 1G
ETH Energia (8); Vale(5);
COPERSUCAR (3); Braskem S/A (3);
Microsoft (1); SAMA (1); TORO (1);
EMBRAER (1); AgroBio (1); Peugeot
Citroën (1); Mahle Metal Leve (1).
Ao todo são 70 projetos destinados ao SSI da
cana-de-açúcar, abordando aspectos diversos
do sistema produtivo. As firmas demandantes
estão listadas no apêndice E.
Firmas com
projetos 2G
ETH Energia (1); Vale (1); Oxiteno
(2); Dedini (1);
Biocelere (1); RMT Tage Biaggio (1);
Fermentec (1); Algae Biotecnologia (1);
Verdartis Desenvolvimento Biotecnológico (1).
Áreas do
conhecimento
Engenharia Química (6); Bioquímica
(5); Química (3); Genética (3);
Engenharia Agrícola (3) e outras.
Agronomia (10); Química (10); Engenharia
Agrícola (9); Engenharia de Materiais e
Metalúrgica (5); Genética (5); Ciência da
Computação (5) e outras.
FONTE: elaboração própria a partir de FAPESP, 2016.
154
Como demonstrado na figura 3.2. os projetos relacionados ao SSI da cana iniciam em
1997 (PITE e PIPE), sendo contratados 2 projetos por ano na média, ocorrendo um aumento
sensível em 2013 quando observa-se a contar com 10 projetos no PITE e 14 projetos no PIPE.
A quantidade total de iniciativas no PITE é de 35 projetos no período de 1994 a 2016, o que
equivale a 15,2% do total de projetos contratados pelo programa. Já no PIPE o total de
iniciativas chega a 75 projetos contratados no período de 1997 a 2016, sendo assim, o SSI da
cana é responsável por 4% do total de projetos nesse programa. Tais dados mostram a
relevância do segmento na agenda de pesquisa paulista.
Os projetos do PITE destinados ao SSI da cana-de-açúcar concentram-se nas áreas de
Engenharia Química e Bioquímica. Seus esforços são voltados para o desenvolvimento de
tecnologia e/ou conhecimento para a conversão energética do material celulósico (etanol de 2ª
ou bioeletricidade). Estes projetos funcionam por meio de um convênio, no qual cada uma das
partes concede 50% dos recursos (empresa – FAPESP), a partir daí consolida-se uma
chamada única de projetos relacionados às linhas de pesquisas determinadas pelas partes.
Os projetos no âmbito do PIPE são orientados por motivações diversas, mas na
maioria dos casos são ligados a serviços ou processo auxiliares da produção do açúcar e do
etanol, geralmente voltados para a fase agrícola do SSI da cana-de-açúcar, por exemplo:
controle da produção, sistemas de mapeamento, controle automatizado, controle biológico e
técnicas de manejo e planejamento da lavoura. Assim as áreas do conhecimento que são mais
relevantes nessas iniciativas são a Agronomia, a Química e a Engenharia Agrícola.
Os projetos com relação direta com o etanol celulósico no programa PITE são
liderados pelas empresas: Dedini S/A (2002-2007); Oxiteno S/A (2008-2012); Oxiteno S/A
(2009 – 2012); Vale S/A (2011-2014); Vale S/A (2012-2016); ETH Energia S/A (2013-2015).
E no âmbito do PIPE, entre os 6 projetos ligados diretamente ao etanol celulósico, sendo o
mais relevante o projeto desenvolvido junto a Biocelere Agroindustrial Ltda. (2015-2016)137
.
Detalhes sobre os projetos do PITE – Dedini; Oxiteno e ETH Bioenergia – serão
abordados no capítulo 5, uma vez que estas ações somam-se a outros esforços sistematizados
137
A princípio este projeto sobre etanol celulósico, no âmbito do PIPE, é considerado mais relevante que os
outros da mesma categoria porque está sendo conduzido no interior de um projeto estratégico, ou seja, a
Biocelere é uma das empresas da GranBio, empresas que realiza esforços em diversas dimensões da tecnologia
do etanol celulósico, na parte industrial (Bioflex 1); desenvolvimento de leveduras geneticamente modificada e
na parte agrícola, com o desenvolvimento da cana-energia. Assim, este projeto soma-se ao conjunto de ações da
empresa que diversifica o desenvolvimento tecnológico, bem como as fontes de financiamento.
155
de desenvolvimento da tecnologia do etanol celulósico no Brasil. Estes atores figuram como
agentes representativos do esforço nacional na trajetória tecnológica do E2G.
O projeto da Vale-FAPESP (2012) conta com a cooperação da FAPEMIG138
e da
FAPESPA139
, e visa articular o potencial da biodiversidade brasileira e a produção de etanol
de segunda geração. Portanto, versa sobre a produção de etanol de segunda geração a partir de
biomassa lignocelulósica, com o aproveitamento dos açúcares provenientes da hidrólise do
bagaço e da palha. Foca-se nos processos de hidrólise da biomassa por meio da rota
tecnológica constituída pelo pré-tratamento físico-químico seguido da hidrólise enzimática
para liberação de açúcares fermentecíveis140
. Para a constituição do composto enzimático e
para a obtenção de microrganismos, visa selecionar organismos provenientes do bioma
Amazônico.
O Projeto Vale – FAPESP (de 2011) também conta com a cooperação da FAPEMIG e
da FAPESPA, e visa a descoberta e/ou identificação de genes da via metabólica da xilose que
possam ser “extraídos” de leveduras selvagens fermentadoras de xilose, criando a
oportunidade de melhoramento genético da assimilação de xilose em Saccharomyces
cerevisiae141
. Assim, os principais objetivos deste projeto são: 1) Isolamento, caracterização e
identificação genética de leveduras xilolíticas que colonizam o trato intestinal de insetos que
parasitam a cana-de-açúcar; 2) Identificação genética de fungos presentes no trato intestinal
destes insetos a partir da confecção e sequenciamento do DNA de uma biblioteca de ITSs
("internal transcribed spacers"); 3) Clonagem e caracterização molecular dos genes
envolvidos no metabolismo de xilose a partir das leveduras isoladas; e 4) Introdução destes
genes em S. cerevisiae e verificação da eficiência de fermentação da xilose nestas cepas
recombinantes.
Em relação aos programas PIPE , vale mencionar o projeto da Biocelere que tem como
base os cruzamentos entre híbridos de cana-de-açúcar e Saccharum spontaneum142
para a
produção da cana-energia. Desta forma, o projeto dedicou-se à avaliação das respostas de
clones de cana-energia aos protocolos de transformação genética e prospecta genes para
138
Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Minas Gerais. 139
Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisa do Pará. 140
Este conjunto tecnológico é preferível, pois tem sido apontado como o mais promissor por operar em
condições brandas de hidrólise, minimizando a geração de resíduos, os gastos em energia e o desgaste de
equipamentos e maximizando os rendimentos de recuperação de carboidratos livres. 141
Este projeto visa à identificação de leveduras capazes de fermentar mais eficientemente a xilose a partir do
trato intestinal de insetos que interagem com a cana-de-açúcar. 142
É uma espécie de gramínea originária do continente asiático, encontrada com certa facilidade na índia.
156
aumento e qualidade de biomassa lignocelulósica. Este projeto espera estabelecer as primeiras
ferramentas moleculares e biotecnológicas para auxiliar o programa de melhoramento
genético da cana-energia (da GranBio) e, em uma próxima fase vislumbrar a possibilidade da
obtenção de plantas geneticamente modificadas143
.
No conjunto dos projetos financiados pela FAPESP em relação à C&T do SSI da cana-
de-açúcar percebe-se que as ações são dedicadas ao melhoramento dos processos agrícolas e
às novas áreas do conhecimento e da tecnologia de produção da biomassa e do etanol. Com
isso, é possível vislumbrar novos processos produtivos e a geração de novos produtos no bojo
do desenvolvimento do etanol celulósico, apoiando a utilização da cana para novos produtos
em nichos específicos. Outra característica é que as empresas apoiadas pela FAPESP, nesse
caso, são majoritariamente nacionais e buscam implementar projetos com elevado conteúdo
tecnológico, uma característica de destaque tratando-se de um setor baseado em recursos
naturais.
3.2. POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ETANOL CELULÓSICO NO BRASIL: PAISS
INDUSTRIAL E PAISS AGRÍCOLA
Entre os principais instrumentos de políticas públicas que podem induzir o progresso
técnico no segmento do etanol celulósico, figuram os mandatos de mistura obrigatória,
incentivos fiscais e tributários, subvenções para P&D, créditos para pesquisas e para a
construção de projetos demonstrativos ou em escala comercial. A junção completa ou parcial
destes instrumentos pode dar origem a programas temáticos. A grande vantagem destas ações
é o foco tecnológico dado já na origem do programa, os quais devem abarcar aspectos
setoriais, regionais e tecnológicos; quanto maior o equilíbrio entre estas dimensões, maiores
as chances de sucesso (STEINMUELLER, 2010).
Os trabalhos de Mowery et al. (2010); Foray et al. (2012); Mazzucato (2013); e
Mazzucato et al. (2015) colocam em evidência a ação do Estado como indutor do processo de
desenvolvimento e difusão de novas tecnologias, em uma perspectiva que vai além da Market
Failure Theory (MFT).
A estruturação destes programas temáticos introduz ações que o mercado sozinho não
é capaz de induzir. Os investimentos em P&D nestes termos buscam promover soluções para
143
O caso da GranBio será novamente abordado no capítulo 5 – detalhando o conjunto de ações desse ator na
rota tecnológica do E2G.
157
problemas sociais, ambientais, populacionais ou ampliar as possibilidades de
desenvolvimento econômico de uma determinada região/setor (FORAY et al., 2012;
MAZZUCATO, 2013). Assim, estes programas governamentais devem atuar no
desenvolvimento de tecnologias relevantes ou disruptivas, que são necessárias à superação de
problemas complexos.
Os desafios impostos pelas mudanças climáticas acionaram um conjunto recente de
propostas de apoio público a projetos de P&D deste tipo; estas ações são diversas e atuam
sobre um conjunto múltiplo de opções tecnológicas calcadas na sustentabilidade, das quais o
etanol celulósico é uma das opções. Estas ações consideram as características específicas do
desafio e o contexto em que serão desenvolvidas e implantadas, assim, devem ir além do
desenvolvimento de capacidade tecnológicas particulares144
, onde o sucesso está sujeito à
articulação de diversos tipos de competências e conhecimentos (KEMP & SOETE, 1992;
MOWERY et al., 2010; FORAY et al., 2012).
Em termos gerais, as ações conjuntas do BNDES-FINEP carregam algumas dessas
características, pois não só oferecem créditos subsidiados e subvenção econômica às
empresas, como também induzem o desenvolvimento dos projetos rota tecnológicas pré-
determinadas, direcionando assim o progresso técnico145
. Como indicam Milanez et al. (2015,
p. 246) “a característica principal desse tipo de política é a predefinição de temas, para os
quais os candidatos elegíveis são convidados a submeter propostas de programas de P&D”.
O fomento à tecnologia do etanol celulósico no Brasil se conecta a estas ações mais
gerais, por contribuir com o avanço das fontes alternativas de energia146
e, por movimentar
diversos tipos de competências no interior do SSI da cana-de-açúcar, inclusive forçando o
alargamento das fronteiras setoriais na medida em que os novos conhecimentos são
incorporados pela compra de tecnologia ou adquiridos por meio de processo de aprendizagem.
144
Postura típica dos projetos de desenvolvimento científico e tecnológico baseados no modelo linear de
inovação. Para Foray et al. (2012), característica dos grandes projetos de C&T, tais como o Projeto Manhattan e
o Programa Apollo. 145
Em uma comparação feita entre as ações brasileiras e as feitas nos EUA por Pereira (2013) e Pereira et al.
(2015) nota-se que as ações estadunidenses apresentam um nível de coordenação maior e os projetos são
conduzidos com um nível de detalhamento mais aprofundado. Por outro lado, essa não deixa de ser uma ação
inovadora, uma vez que esse tipo de ação é justamente inaugurada pelo SSI da cana-de-açúcar, um novo tipo de
esforço institucional no Brasil. 146
Este fato pode ser encarado dessa forma, pois tanto o Governo Federal quanto as empresas encaram essa ação
como a principal iniciativa do Brasil nesse contexto, um exemplo dessa constatação é que os estudos do CTBE
sobre etanol celulósico e, mais os projetos da Raízen e da GranBio, foram apresentados na COP21
(ENTREVISTA X). Esta ação motivou a criação da Biofuture Platform, organização compostas por 20 países
(Argentina; Brasil; Canadá; China; Dinamarca; Egito; Finlândia; França; Índia; Indonésia; Itália; Marrocos;
Moçambique; Holanda; Paraguai; Filipinas; Suécia; Reino Unido; Estados Unidos; Uruguai).
158
Vale o destaque que ao longo dos anos 2000 o BNDES recuperou sua função de
indutor do desenvolvimento econômico (financiando atividades econômicas147
) e passou a
atuar, também, como agente coordenador, por meio da ação de uma equipe técnica148
,
influenciando a condução das atividades econômicas (ENTREVISTA V).
Neste contexto, o BNDES juntamente com a FINEP, colocou em prática uma “nova”
maneira de propor, conduzir e financiar projetos de inovação no Brasil. Os programas PAISS
Industrial (2011-2014), PAISS Agrícola (2014-2018), bem como, os planos INOVAs149
, são
exemplos dessa atitude, medidas institucionais que visaram desenvolver novos setores ou
modernizar elementos de cadeias produtivas já consolidadas no país.
A grande novidade foi à cooperação e o compartilhamento das competências técnicas
e dos recursos financeiros já existentes para conduzir a política, possibilitando uma melhor
coordenação dos esforços (firmas e governo) e aumentar os aportes financeiros por projetos
(dispêndios de recursos maiores em relação ao que vinha sendo feito).
3.2.1. PAISS Industrial e o start do etanol celulósico no Brasil
O Plano Conjunto de Apoio à Inovação Tecnológica Industrial dos Setores
Sucroenergético e Sucroquímico (PAISS Industrial) deve ser compreendido como uma
resposta nacional frente aos desafios tecnológicos impostos pela necessidade de exploração
integral da biomassa. Tal esforço, mesmo que marginal, abriu espaço para o desenvolvimento
da trajetória tecnológica do E2G no país.
A origem da ação é resultado dos diagnósticos realizados pela equipe de analistas do
BNDES e da FINEP, ao longo dos anos 2000. Resumidamente estes identificaram que: i) os
programas de apoio destinados ao setor sucroenergético caracterizavam-se pela baixa
coordenação das agências públicas nas atividades de fomento a P&D e os projetos
apresentavam pequeno volume de recursos alocados (NYKO et al. 2013; NYKO et al. 2010;
BASTOS, 2007); ii) o Brasil estava muito “atrás” em relação a fronteira tecnológica, uma vez
147
Vide capítulo 2, mostra-se a evolução do desembolso do BNDES para o setor sucroalcooleiro. 148
Nota-se que BNDES nesse período não só aumentou a quantidade de funcionários como passou a realizar
“pesquisas” no âmbito do agência, de maneira correlacionada, grande parte do corpo técnico desenvolve
pesquisas junto a Universidades, por meio de programas de mestrados e doutorados. Essa afirmação merece
maiores esclarecimentos, mas é inegável que as publicações do BNDES Setorial sejam feitas por alunos ou
recém-mestres e doutores com temas relacionados ou explicitamente interligados aos programas de apoio
desenvolvidos pelo próprio banco. 149
Como afirmam Nyko et al. (2013) e Pereira et al. (2015) o PAISS mostrou-se como base para outros panos de
fomento, ampliando a cooperação entre BNDES e Finep, dando origem ao Inova Petro, Inova Energia, Inova
Saúde, Inova Aerodefesa e Inova Agro.
159
que outras nações já realizavam esforços sistematizados na rota tecnológica do etanol
celulósico, apresentando diversas plantas industrias na escala piloto ou demonstrativas
(ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).
Acrescenta-se que o diagnóstico, bem como a própria criação do PAISS Industrial,
descende da experiência nacional pela comoditização do etanol. Como já mencionado no
capítulo 2, a partir de 2006, o Governo Federal por meio do Itamaraty e de outras instâncias
da burocracia nacional buscaram o diálogo com a comunidade internacional para estabelecer a
comercialização e a produção do etanol em escala global, mas enfrentaram desconfianças e
resistências em relação ao etanol de primeira geração (desmatamento da Amazônia; relações
de trabalho nas lavouras; Food Vs. Fuel) (ENTREVISTAS V; ENTREVISTA X).
Neste processo identificou-se que havia grandes oportunidades para o Brasil e para o
diálogo internacional por intermédio do desenvolvimento do E2G. A nova tecnologia de
conversão da biomassa tornava o biocombustível “mais democrático” e possibilitava ao Brasil
realizar incrementos técnicos ao seu setor agroindustrial já estabelecido e, ainda, abria-se uma
janela de oportunidade para as firmas brasileiras figurarem como atores relevantes na nova
rota tecnológica (ENTREVISTA X). O plano ficou sob a supervisão e condução do MCTI
juntamente com o MDIC, por meio da FINEP e do BNDES, lançado em 2011.
O objetivo do PAISS Industrial consistiu em fomentar projetos direcionados ao
desenvolvimento, produção e comercialização de novas tecnologias industriais destinadas ao
processamento da biomassa a partir da cana-de-açúcar. O PAISS buscou a obtenção de
produtos de maior valor agregado, que podem ser obtidos a partir da biomassa da cana, como,
por exemplo, os combustíveis líquidos de maior conteúdo energético (diesel, gasolina, butanol
e querosene de aviação) ou mesmo intermediários químicos com aplicações industriais
diversas.
O programa estabeleceu três linhas temáticas, as quais orientaram os programas de
pesquisa das firmas e das instituições selecionadas. As linhas são: (1) Bioetanol de segunda
geração, (2) Novos produtos de cana-de-açúcar e (3) Gaseificação: tecnologias, equipamentos,
processos e catalisadores. Estas três linhas se dividiram em um conjunto de sublinhas de
pesquisa – vide quadro 3.5.
160
Quadro 3.5. Linhas temáticas do PAISS Industrial Linhas de pesquisa Sub itens das linhas de pesquisa
(1) Bioetanol de 2ª geração
(1.1) Desenvolvimento de tecnologias de coleta e transporte de palha de
cana-de-açúcar
(1.2) Otimização de processos de pré-tratamento de biomassa de cana para
hidrólise
(1.3) Desenvolvimento dos processos de produção de enzimas e/ou de
processos de hidrólise de material lignocelulósico oriundo da biomassa da
cana-de-açúcar
(1.4) Desenvolvimento de microrganismos e/ou de processos de
fermentação de pentoses
(1.5) Integração e escalonamento de processos para produção de etanol
celulósico.
(2) Novos produtos de cana-de-
açúcar
(2.1) Desenvolvimento de novos produtos diretamente obtidos a partir da
biomassa da cana-de-açúcar por meio de processos biotecnológicos
(2.2) Integração e escalonamento de processos para produção de novos
produtos diretamente obtidos a partir da biomassa da cana-de-açúcar.
(3) Gaseificação
(3.1) Desenvolvimento de tecnologias de pré-tratamento de biomassas de
cana-de-açúcar para gaseificação
(3.2) Desenvolvimento de tecnologias de gaseificação de biomassas de
cana-de-açúcar, especialmente quanto à otimização dos parâmetros de
processos e/ou redução nos custos de capital dos equipamentos;
(3.3) Desenvolvimento de sistemas de purificação de gases
(3.4) Desenvolvimento de catalisadores associados à conversão de gás de
síntese em produtos
Fonte: FINEP, 2011.
Algumas características do PAISS Industrial em relação ao seu design devem ser
destacadas: i) escolhe previamente a biomassa – cana-de-açúcar; ii) coloca ênfase em um
produto, o etanol, mas abre possibilidade para os intermediários químicos; iii) não escolhe
uma rota tecnológica a priori, mas enfatiza as tecnologias ligadas a biotecnologia. O destaque
nos processos industriais envolvendo a biotecnologia foi dado deliberadamente pelos
formuladores da política, estes consideravam “a biotec como o negócio do futuro”
(ENTREVISTA X).
Esta interpretação deriva da observação da dinâmica do conhecimento científico
ligado a biotecnologia, a qual apresentou na última década um ritmo de crescimento acelerado
(os dados expostos no capítulo 4, artigos científicos e famílias de patentes cofirmam essa
suposição). Ademais, consideraram que mesmo estando concentradas nas mãos de empresas
estrangeiras as técnicas e os insumos tecnológicos necessários à conversão da biomassa
(enzimas e leveduras) são “janelas de oportunidades entreabertas”, visto que estas sempre
sofrerão atualizações, melhores micro-organismos podem surgir por meio de adaptações
genéticas ou por meio de seleção de organismos nativos. Estas possibilidades podem
161
viabilizar a participação de atores nacionais no futuro (ENTREVISTA V; ENTREVISTA
X)150
.
Estas determinações são elementos novos na política de inovação ligada ao setor
sucroenergético, pois direcionam minimamente os esforços de P&D. Reforça a biomassa já
vencedora e elege tecnologias portadoras de futuro, as quais podem (a depender de novos
investimentos) fomentar a estruturação de novos mercados, por exemplo, os bioquímicos ou
outros biocombustíveis (butanol, querosene de avião, etc.).
Os projetos selecionados tiveram apoio das instituições, com base nas linhas de
financiamento, programas e fundos já existentes (vide tabela 3.2.). Desta forma, os
proponentes puderam obter financiamento dentro das diversas linhas e programas da FINEP e
do BNDES, de acordo com as características dos seus projetos. Isso caracteriza o PAISS
como um plano de fomento estruturado (financiamento temático), no qual as instituições
públicas de apoio à inovação determinam a direção central dos projetos e o tipo de
financiamento segundo o estágio e a necessidade do programa de PD&I (PEREIRA, 2013;
PEREIRA et al. 2015).
Com isso, o Estado, passa a ser um agente importante do SSI, dá um importante passo
na tentativa de direcionar a rota tecnológica do etanol. O pioneirismo deste plano de apoio à
inovação está no fato de mesclar e combinar tipos diferentes de mecanismos de financiamento
- crédito; subvenção; participação acionaria e financiamento a ICTs – segundo o risco
tecnológico e as dimensões do projeto (bancada, piloto, demonstração ou comercial)
(ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).
É importante destacar que as propostas que foram aprovadas estavam vinculadas aos
planos de negócios das empresas; portanto, os projetos aprovados apresentaram “programas
de execução” detalhados, prevendo a efetiva introdução das tecnologias e dos produtos no
mercado. Isso caracteriza a política como um esforço declarado de inovação, visando o
estabelecimento de novos produtos ou processos de produção.
Essa nova política de financiamento do Governo Federal mostra-se como um
importante passo à frente na corrida tecnológica, pois une instrumentos de financiamento do
BNDES e da FINEP, permitindo que a política de inovação atue em níveis distintos do
150
Na ENTREVISTA X os formuladores da política fizeram uma analogia com a dinâmica da indústria de
softwares, que passam constantemente por atualizações e acaba gerando oportunidades para novos entrantes,
mesmo que em nichos específicos, imaginava-se que algumas empresas brasileiras pudessem participar nesse
segmento – talvez o único caso próximo disso seja a GranBio, com o desenvolvimento de levedura própria.
162
processo de inovação, facilitando inclusive as inovações radicais. Antes, apenas utilizava-se
das linhas de subvenção, um estágio muito preliminar do processo (pesquisa básica e plantas
de demonstração). Mas, com a disponibilização de uma variedade maior de instrumentos de
financiamento, como o crédito subsidiado e participação acionária, o PAISS passa para um
nível mais maduro do processo, o nível de planta de demonstração e das plantas industriais
em escalas comerciais.
Neste sentido, a política de inovação do governo federal aprendeu com os erros do
passado (FURTADO, 2014; PEREIRA et al., 2015), e posiciona-se na busca de melhorar sua
eficácia a partir de uma maior coordenação dos investimentos e de uma maior aproximação
das firmas e de suas necessidades.
O PAISS teve o orçamento inicial de 1 bilhão de reais, que seriam aplicados no
decorrer de 2011 a 2014. Entretanto, segundo Nyko et al. (2013), depois do processo de
seleção dos projetos de PD&I das empresas, o PAISS passou a contar com uma carteira de
negócios de 3,3 bilhões de reais, dos quais 2,4 bilhões foram aprovados151
(vide tabelas 3.2 e
3.3.). As atividades de inovação fomentadas foram prioritariamente aquelas com foco
comercial, desenvolvidas por empresas ou em cooperação com empresas.
Tabela 3.2. Carteira detalhada do PAISS em milhões de reais (2011 a 2014). Instrumentos Carteira Estimativa Total Contratado
Abril de 2010 Março de 2011 Fevereiro de 2014
FINEP 209.423 500.000 1.205.708
Crédito 63.399 200.000 1.120.155
Subvenção 88.898 200.000 75.286
Cooperação ICT-Empresa 57.126 100.000 10.267
BNDES 206.236 500.000 1.270.847
Crédito 110.405 300.000 645.373
Participação Acionária 45.000 100.000 600.000
FUNTEC 50.831 100.000 25.474
Total 415.659 1.000.000 2.476.555
Fonte: FINEP, 2014.
O plano apresentou um reforço no volume de verbas, visto que a carteira conjunta de
projetos de inovação ligados à cadeia de produção de etanol e derivados da FINEP e do
BNDES somavam 413,5 milhões de reais antes do PAISS, dos quais a FINEP era responsável
por 244,4 milhões de reais e o BNDES por 169,1 milhões de reais. Desse modo, a aprovação
151
No mapeamento das ações sobre o PAISS Industrial foi encontrado um total de 34 projetos, tento como
somatória dos valores contratados o montante de R$ 2.164.879.298. Ambos os números diferem dos divulgados
no trabalho de NYKO et al. (2013).
163
do PAISS dota o setor sucroenergético com mais do que o dobro de recursos até então
disponibilizados (vide tabela 3.2.).
Outra mudança no design da política pública para a inovação envolve a centralização
da administração desses recursos, permitindo aos beneficiários negociar em um só guichê a
combinação de diferentes modalidades de financiamento, como por exemplo, verbas a fundo
perdido e a modalidade de participação acionária dos bancos em projetos relevantes de alto
risco (como foi o caso da primeira fábrica de etanol 2G do Brasil, a BioFlex 1).
- Resultados e destaques do PAISS Industrial
Há dois fatos importantes na constituição e na execução do PAISS. Primeiramente, ao
contrário do Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI) e da
Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2012–2015 (ENCTI), este programa é
voltado diretamente para o etanol (política direta). Outro elemento destoante é o fato de ser
voltado para o desenvolvimento de tecnologias através de projetos de demonstração, plantas-
pilotos e de projetos de escalonamento (vide tabela 3.3.). Assim, mostra-se um avanço
qualitativo no desenvolvimento da rota tecnológica do etanol, pois a grande quantidade de
conhecimento de base até agora gerado passa a ser materializado em projetos de
desenvolvimento, com o financiamento dos projetos de demonstração, significando uma
evolução em relação às políticas anteriores destinadas ao setor.
E, ainda, o PAISS possibilitou ao Brasil figurar como um dos atores desse processo
de desenvolvimento da tecnologia industrial, pois as empresas e instituições envolvidas
aprendem com informações/situações reais da exploração da biomassa e com problemas
impossíveis de serem detectados em laboratório. Trata-se de tecnologias que estão na
antessala do mercado e do processo de difusão. Portanto, o PAISS cumpre uma das
características elencada por Nemet (2009) com relação às políticas de technology-push,
contemplando o financiamento de projetos de demonstração.
O quadro 3.6. e a tabela 3.3. permite realizar um balanço geral das ações e dos efeitos
que PAISS Industrial promoveu no SSI da cana-de-açúcar. O programa selecionou 25
empresas lideres de projetos, estas proporcionaram 60 projetos de pesquisa/inovação. A área
que recebeu maior número de iniciativas foi a linha 2, novos produtos a partir da cana-de-
açúcar, com 22 projetos totalizando um investimento de R$ 1.605 bilhões. Os projetos
referentes a etanol de segunda geração (Linha 1 - rota biotecnológica) somou 16 iniciativas,
164
gerando um investimento na ordem de R$ 1.446 bilhões. Por sua vez, a linha 3 (gaseificação)
contou com aprovação de apenas um projeto, entretanto, os recurso não foram contratados
pela Petrobras (empresa selecionada).
Tabela 3.3. Projetos de PD&I integrantes do PAISS (2011-2014) N
0
projetos
Etanol
2G
R$
milhões
N0 projetos
Bioquímicos
R$
milhões
N0 Projetos
Gaseificação
R$
milhões
N0
total
R$
milhões
(total)
Perspectiva 1 202 6 621 0 0 7 823
Análise 3 74 2 6 0 0 5 80
Aprovado 4 90 7 306 1 255 12 651
Contratado 8 1.080 7 672 0 0 15 1.752
Total 16 1.446 22 1.605 1 255 39 3.306
Fonte: NYKO et al, 2013.
165
Quadro 3.6. Empresas com planos de negócio selecionados no PAISS Industrial - 2011.
Razão Social Capital Setor 2 G BioQ. Gaseif.
Famílias de
patentes no
Brasil152
Agacê Sucroquímica Brasil Bioenergia X 0
Barauna Comércio e Indústria Brasil Biotecnologia X 0
BioFlex / GranBio Brasil Bioenergia X 5
BIOMM Brasil Biotecnologia X 0
Centro de Tecnologia Canavieira Brasil Bioenergia X X 4
Odebrecht Agroindustrial Brasil Bioenergia X X 2
Ideom Tecnologia Ltda Brasil Química X 0
Methanum Engenharia Brasil Engenharia X 0
Petrobras Brasil Petróleo X X 5
PHB Industrial Brasil Bioquímica X 3
Novozymes Dinamarca Biotecnologia X 68
Abengoa Bioenergia Espanha Bioenergia X 2
Kemira Chemicals Brasil Finlândia Química X 1
Metso Paper South America Finlândia Bens de Capital X 3
VTT Finlândia Biotecnologia X X 0
DSM Holanda Biotecnologia X X 12
Amyris EUA Biotecnologia X 2
Bunge EUA Alimentos X 0
Butamax Biocombustíveis
Avançadados
EUA Bioenergia X 10
Dow EUA Química X X 6
Dupont EUA Química X 30
Eli Lilly do Brasil EUA Farmacêutica X 0
LS9 Brasil Biotecnologia EUA Biotecnologia X 0
Mascoma EUA Biotecnologia X 2
Solazyme Brasil Óleos Renovavéis
e Bioprodutos
EUA Bioenergia X 0
Fonte: elaboração própria a partir de BNDES, 2013; QUESTEL ORBIT, 2013.
Outras características desse programa temático podem ser levantadas, tais como153
:
1) Permitiu a atração de novos atores para o setor, como as empresas estrangeiras de
biotecnologia (Novozymes; DSM; Beta Renewables); do setor de papel e celulose (Metso
Paper; Pöyry); da industria química (Chemtex; Dow e DuPont);
2) Salienta-se a capacidade do PAISS em movimentar e integrar diversos tipos de firmas
em projetos de P&D, ligadas a setores industriais distintos (biotecnologia; química; start up
de base tecnológica; petróleo; bioenergia; papel e celulose);
3) Possibilitou a criação de empresas brasileiras subsidiárias de grupos internacionais
com fico em explorar novas tecnoogias ou comercializar novos produtos, tais como: a
152
Número de famílias de patentes referentes à tecnologia de produção de etanol celulósico. Os resultados e a
análise detalhada destas informações estão expostos no capítulo 4. 153
Informações disponíveis em Nyko et al. (2013) e Milanez et al. (2015). Complementos e ajustes são
provenientes da entrevista V e entrevista X.
166
Butamax; VTT do Brasil; Solazyme Brasil Óleos Renovavéis e Bioprodutos; Mascoma Brasil
P&D; LS9 Brasil Biotecnologia; Eli Lilly do Brasi;.
4) Promoveu a cooperação empresarial através de consórcios (foram formados sete
consórcios entre empresas e 10 parcerias entre ICTs e empresas). Os principais projetos de
E2G em curso no Brasil apresentam esse tipo de relação, mas esse formato de parceria se
estende para os bioquímicos. Como exemplo desse formado de parceria tem-se as relações
entre: a) VTT, Metso e Odebrecht; b) CTBE, Dow e DSM; c) CTC e Novozymes; d) Raízen
e Novozymes; e) Biocelere e Rodhia; f) Solazyme e Bunge;
Um dos consórcios de P&D formados no âmbito do PAISS que merece destaque é a
cooperação entre a VTT Brasil, a Odebrecht e a Metso. O seu objetivo é desenvolver uma
solução tecnológica que viabilize a produção de etanol 2G integrada à produção de etanol de
primeira geração e de energia elétrica nas usinas brasileiras. A VTT possui experiência no
desenvolvimento de tecnologia para exploração de biomassa na Finlândia, visto que no país
de origem apresenta o formato original de instituto de pesquisa, atuando em diversos setores
industriais, entre estes, a indústria de papel e celulose e madeireira. O seu objetivo no Brasil é
adaptar sua tecnologia e seus processos produtivos para a biomassa da cana-de-açúcar.
5) O programa aprovou a implantação de 8 plantas industriais dedicadas ao E2G,
sendo três em escala comercial. Mas efetivou-se apenas 3 plantas, duas em escala comercial
(GranBio e Raízen) e uma em escala de demonstração (CTC). Ainda em curso, existe a
iniciativa conduzida pelo CTBE, a qual prevê a instalação da sua tecnologia em nível
comercial (o projeto se encerra no final de 2017).
Mesmo não atingindo a construção de 8 plantas industriais pode-se considerar que o
programa trouxe avanços para o SSI da cana-de-açúcar na rota tecnológica do etanol
celulósico, pois antes da sua implantação só havia no país uma única empresa em condições
de conduzir projetos relevantes na trajetória do E2G, a Petrobras, a qual conduzia pesquisas
no seu centro de P&D desde 2004 e em 2010 já tinha fechado uma parceria estratégica com
uma empresa americana (KL Energy) (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X). Assim, em 2017
além dos diversos projetos correlacionados a conversão da biomassa o programa logrou a
construção e a operação de 2 plantas comerciais.
É verdade que ambas as iniciativas sofrem com problemas tecnológicos, mas estas
novas estruturas estabeleceram em território nacional processos de aprendizagem que não
167
eram possíveis de serem alcançados na escala laboratorial ou piloto. Estes casos serão
abordados com mais detalhes no capítulo 5.
O PAISS Industrial abriu “janelas de oportunidades” tanto para empresas estrangeiras
como para empresas nacionais (vide quadro 3.5.). As estrangeiras enxergaram no PAISS a
possibilidade de explorar um novo mercado (tecnologias e insumos tecnológicos para as
usinas de cana) e, principalmente, objetivaram utilizar o Brasil para escalonar os seus
processos industriais. O setor sucroenergético passou a ser uma plataforma de escalonamento,
melhoramento e adaptação das suas tecnologias de E2G e de intermediários bioquímicos
(ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).
A ideia geral foi aproveitar a biomassa brasileira e a escala de produção da mesma, ao
mesmo tempo, em que se aproveitavam os recursos financeiros disponíveis. Estes novos
atores entraram na fase industrial do SSI da cana-de-açúcar em substituição aos tradicionais
produtores/fornecedores de tecnologia de produção do etanol de primeira geração (Dedini,
Sermatec, TGM; Mausa; NG; etc.). Pois a conversão da biomassa em E2G e ou bioquímicos
exige outro “tipo/nível” de competência e de conhecimento, estes atores tradicionais não
atuam e nem apresentam capacidades para empreender processos de aprendizagem na
biotecnologia, química fina, engenharia genética, ou até mesmo, na parte metal-mecânica
ligada ao pré-tratamento da biomassa (ENTREVISTA V; ENTREVISTA VIII;
ENTREVISTA X).
No momento da formulação e da seleção dos projetos de pesquisa para o PAISS
Industrial os policy makers tinham a intenção de inserir estes atores tradicionais no programa,
mas, a estrutura tecnológica e, principalmente as condições financeiras desses atores os
impediu de participar, esta situação ocorreu com a Dedini Indústria de Base, que teve seu
projeto aprovado e na primeira fase da seleção (ENTREVISTA X).
Tal fato mostra-se sintomático, pois no atual estágio de desenvolvimento dos projetos
em funcionamento - 2017, é justamente na etapa do pré-tratamento que existe os maiores
desafios, processo industrial onde estes atores tradicionais poderiam agir, porque as
competências acumuladas na produção de equipamentos e máquinas para 1G, somadas aos
conhecimentos sobre a biomassa de cana-de-açúcar os colocam em uma posição privilegiada,
visto que os equipamentos importados da indústria de papel e celulose não apresentaram
desempenho satisfatório – precisamente por desconsiderarem as particularidades da
composição da cana-de-açúcar.
168
Por outro lado, o PAISS também foi uma janela de oportunidade aproveitada pelos
atores nacionais, no sentido em que possibilitou de maneira direta (algumas firmas) a
participação na corrida tecnológica internacional e, como tal, imprime processos de
aprendizagem inéditos, tanto de maneira tácita como sistematizada. Esta situação resulta em
criação de novos produtos e a participação em novos segmentos econômicos, por exemplo, a
exportação de E2G para a Europa ou Califórnia /EUA154
.
O desempenho financeiro do PAISS Industrial pode ser observado pela tabela 3.4., a
qual mostra os valores dos desembolsos e a tipologia dos recursos (categorias de
financiamento). Percebe-se que a maior parte dos projetos contratados está na categoria de
crédito (15 projetos) ou de subvenção econômica (13 projetos). Mas, em relação ao montante
alocado, a equidade desaparece, pois os valores concentram-se na categoria de crédito,
aproximadamente 95% dos recursos, sendo que a subvenção econômica abarca apenas 3% dos
recursos.
Tabela 3.4. Atores e valores aprovados por projeto no âmbito do PAISS Industrial (2011-
2014)155
.
PAISS Industrial
Ano ICTs/Empresa Valor
Contratado Categoria Instituição
2011 BIO4 Soluções Biotecnológicas* 890.888,60 Subvenção FINEP
2011 DOW Agrosciences Industrial 34.587.179,54 Crédito FINEP
2013
Centro Nacional De Pesquisas em Energia e Materiais
(CNPEM – CTBE) -
Eli Lilly do Brasil 8.719.540,00
Interação
Universidade-
Empresa e
apoio à
inovação FINEP
2013 Methanum Engenharia Ambiental 4.872.000,03 Subvenção FINEP
2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 9.993.024,00 Subvenção FINEP
2013 Odebrecht Agroindustrial 8.309.076,00 Subvenção FINEP
2013 Braskem* 8.000.000,00 Subvenção FINEP
2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 3.277.000,00 Subvenção FINEP
2013
Baraúna Indústria e Comércio - UFSCAR
- USP/ESALQ 1.546.979,00
Tecnologias
Sociais FINEP
2013 VTT Brasil 9.985.657,08 Subvenção FINEP
2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 1.799.000,00 Subvenção FINEP
2013 Braskem* 8.000.000,00 Subvenção FINEP
154
O volume das exportações é baixo, mas todo o etanol celulósico já produzido pela Raízen foi exportado
(ENTREVISTA VIII; ENTREVISTA X). 155
Esta tabela encontra-se incompleta, pois nem todos os projetos contratados no âmbito do PAISS Industrial
estão disponíveis na base de dados do MCTI ou do BNDES, assim, mais esforços de pesquisa devem ser
empregados.
169
2013 Braskem* 4.000.000,00
Tecnologias
Sociais FINEP
2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 9.701.136,00
Tecnologias
Sociais FINEP
2013 Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) 4.374.200,00 Subvenção FINEP
2013 Braskem* 2.000.000,00
Tecnologias
Sociais FINEP
2013 Geo Energética Participações* 161.709.300,00 Crédito FINEP
2013 GranBio Investimentos 126.063.128,96 Crédito FINEP
2013 Máquinas Agrícolas Jacto* 85.990.000,00 Crédito FINEP
2013 Braskem* 10.888.984,76 Crédito FINEP
2013 Raízen 207.762.000 Crédito BNDES
2013 Rhodia Poliamida e Especialidades 4.827.000 Crédito BNDES
2013 Centro De Tecnologia Canavieira (CTC) 71.100.000 Crédito BNDES
2013 Bioflex / GranBio 300.295.000 Crédito BNDES
2014
DOW Brasil Indústria E Comércio de Produtos
Químicos 2.877.571,62 Subvenção FINEP
2014 GranBio Investimentos 186.877.254,60 Crédito FINEP
2014 SJC bioenergia* 112.000.000,00 Crédito FINEP
2014
Edeniq Brasil Importação e Comércio de Produtos e
Serviços Ltda* 89.382.647,20 Crédito FINEP
2014 Abengoa Bioenergia 76.680.000,00 Crédito FINEP
2014 DSM south america 272.650.000,00 Crédito FINEP
2014 Abengoa Bioenergia / Unidade São Luiz 309.556.000 Crédito BNDES
2014
Fundação de Apoio a Pesquisa Cientifica e
Tecnológica 23.759.978 -
BNDES
2014
Fundação de Apoio a Pesquisa Cientifica e
Tecnológica 7.554.104
BNDES
FUNTEC BNDES
2014
Centro Nacional De Pesquisas em Energia e Materiais
(CNPEM /CTBE) 21.874.790
BNDES
FUNTEC BNDES
Fonte: elaboração própria a partir de MCTI, 2016; BNDES, 2016. * As firmas e as instituições marcadas com asterisco são atores que não constavam na lista divulgada pelo BNDES/FINEP de empresas aprovadas (vide
quadro 3.5.). Mas estes atores receberam aportes no período de vigência do programa (2011-2014) e os temas
dos seus projetos se relacionam fortemente com as linhas temáticas do PAISS Industrial.
Em relação aos projetos de subvenção econômica aprovados no âmbito do PAISS,
destacam-se os conduzidos pelas empresas VTT Brasil, a Dow, a Braskem, a Methanum e a
Baraúna/USP. A VTT Brasil recebeu cerca de R$10 milhões para o desenvolvimento de
diferentes tecnologias e etapas do processo de produção de etanol 2G. A Dow teve projeto
financiado em R$2,9 milhões para criar uma rota tecnológica para a obtenção do propanol e
do ácido propiônico a partir da cana. A Braskem teve três projetos aprovados, num total de
R$20 milhões, para rotas tecnológicas de produção de químicos "verdes". A Methanum
trabalha na metanização de vinhaça, com R$4,9 milhões financiados. Por fim, a Baraúna/USP
teve cerca de R$1,7 milhões para financiar um projeto de biofertilizantes.
170
O resultado mais sensível destes encadeamentos são as duas plantas industriais de
etanol celulósico, da GranBio e da Raízen, ambas financiadas pelo PAISS, tendo produção
iniciada respectivamente em 2014 e 2015. Estes empreendimentos utilizam pacote
tecnológico estrangeiro, das empresas Beta Renewables e Iogen Energy (os casos serão
abordados no capítulo 5).
Um desdobramento do PAISS para a esfera da política pública para a inovação é que
sua experiência passa a consubstanciar a elaboração de novos programas de apoio à indústria
brasileira, os quais se espelham na sua estrutura regulatória, por exemplo, o Inova Petro,
Inova Energia, Inova Saúde, Inova Aerodefesa, Inova Agro e o PAISS Agrícola156
, todos
apoiados de maneira simultânea pela FINEP e pelo BNDES, e com grandes semelhanças ao
PAISS no que diz respeito às modalidades de financiamentos aos projetos de PD&I
(FURTADO, 2014; NYKO et al., 2013).
A implementação do PAISS também demonstra um encadeamento das políticas
federais realizadas para o SSI da cana-de-açúcar, pois no Governo Lula (2006-2010) as
políticas focaram-se mais no desenvolvimento da pesquisa básica e na construção e ampliação
da estrutura de pesquisa (criação do CTBE e da Embrapa Agroenergia). Já no primeiro
mandato do Governo Dilma (2011-2014), as políticas apresentaram uma forte tendência de
financiar o desenvolvimento de projetos “mais próximos do mercado, como plantas de
demonstração. Com isso, aparentemente, ocorre uma passagem qualitativa no interior das
novas rotas tecnológicas ligadas à transformação da biomassa da cana-de-açúcar.
Tais dados evidenciam que este instrumento regulatório permite a movimentação do
SSI, pois induz um conjunto de indústrias distintas a atuarem sobre o “mesmo” regime
tecnológico, ou seja, a atuação de diversos segmentos industriais sobre a rota tecnológica do
etanol de segunda geração, com objetivo de produzi-lo diretamente ou com objetivo de
complementar sua cadeia.
Esta iniciativa impõe um novo regime de aprendizagem para o setor, forçando o seu
deslocamento do fluxo exclusivo baseado no DUI-mode, como foi detalhado na seção
anterior, para um modelo de inovação mais próximo do STI-mode ilustrado por Jensen et al.
156
O PAISS Agrícola (2014-2018) dá continuidade em outro nível ao desenvolvimento de competências para a
inovação no setor sucroenergético brasileiro. O programa tem como objetivo elevar a quantidade de investimento
e de apoio a projetos de risco tecnológico e fortalecer as relações entre empresas, ICTs e o setor público. Esta
iniciativa é fruto do diagnóstico setorial feito durante o PAISS, o qual indicou a necessidade de aumentar a
produtividade da cana-de-açúcar. o PAISS Agrícola contou inicialmente com cinco linhas de pesquisa, já
predeterminadas pelas agências governamentais. Os recursos são de 1.480.000 bilhões de reais, e devem ser
liberados entre 2014 a 2018.
171
(2007)157
. Com isso, as firmas não só buscam aprender em bases de conhecimentos científicos
como a Química Orgânica, a Genética e de outras áreas do conhecimento de fronteira. As
empresas também são levadas a estabelecer interações e cooperações com diversas
universidades e institutos de pesquisa nacionais e internacionais, bem como, com outras
firmas com capacidades complementares.
Portanto, a janela de oportunidade contínua aberta para as nações periféricas ou não.
E, em se tratando de um setor em que o Brasil apresenta não somente grandes potenciais
naturais como também uma rota de aprendizagem ascendente com mais de trinta anos (desde
o Proálcool), passa a ser um segmento estratégico para o desenvolvimento da nação,
merecendo atenção (políticas de estímulo) e investimentos em novas tecnologias. Trata-se de
uma oportunidade para que o Brasil possa romper com a condição histórica de produtor de
insumos e possa figurar como líder na produção de tecnologias para os biocombustíveis e seus
derivados.
- Limitações do PAISS Industrial
Dentre as limitações do PAISS Industrial e pontos que devem ser buscados pelas
novas políticas públicas ligadas ao avanço do etanol celulósico no Brasil, deve-se destacar
quatro elementos:
i) Induzir ou criar empresas de base tecnológica para participar da cadeia produtiva do
E2G. Condição para o Brasil reduzir o controle quase absoluto das empresas estrangeiras
sobre os processos mais complexos da conversão da biomassa - a hidrólise enzimática e a
fermentação da C5.
Para ilustrar essa situação tem-se o caso da Biomn S.A.. A empresa foi selecionada
pelo PAISS e seu projeto de desenvolvimento e produção de enzimas foi contemplado com
recursos na modalidade de subvenção econômica. Mas a empresa antes mesmo de iniciar o
157
A definição dos modos de aprendizagem e inovação podem ser vistos em Jensen et al. (2007) e Lundvall
(2009). De maneira sintética, o DUI-mode (learning by doing, learning by using e learning by interacting ) é
baseado em experiência dos trabalhadores no nível da firma, refere-se ao Know-how, é um conhecimento tácito
e localizado, e o processo de aprendizado pode ocorre de maneira não intencional. O STI-mode (learning by
science, learning by innovation) é baseado em produção e uso de códigos científicos e conhecimento
tecnológicos , e por mais que parta de um problema local, faz uso do conhecimento global e de conhecimento
científico sistematizado.
172
cronograma da pesquisa acabou desistindo de participar do PAISS158
. Este caso é interessante,
porque os formuladores da política buscaram agregar esse tipo de ator ao programa
(realizaram visitas e apresentações com estas firmas), mas não atingiram aderência qualitativa
suficiente. Atores que poderiam ser financiados e tinham competências não aderiram (caso da
Biomn) e outros que apareceram não tinham envergadura financeira ou conhecimento
tecnológico suficiente (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X). Tal situação mostrou uma
debilidade da política, bem como da própria estrutura produtiva brasileira.
ii) A necessidade de aprimorar a estratégia de cooperação com outros órgãos e
instâncias do governo. Este problema resume-se no fato que o BNDES e a FINEP não
conseguiram ampliar as cooperações com outros atores na mesma qualidade e intensidade que
o fez entre si (ENTREVISTA V). O engajamento de outros entes públicos foi quase nula no
PAISS Industrial.
Nos planos INOVAs ocorreram cooperações com outros atores governamentais, por
exemplo, no Inova Energia com ANEEL, no InovaPetro com a Petrobras, mas as sinergias
não foram as mesmas. A ENTREVISTA V relata problemas causados pela mudança de
estratégia da Petrobras com o programa em andamento, essa situação alterou a política interna
da empresa de aquisição de equipamentos (política de fornecedores locais), com isso
inviabilizou a iniciativa em curso de desenvolvimento e produção de equipamentos
específicos para a extração de petróleo feita por uma empresa nacional (o equipamento é
popularmente chamado de “arvore de natal”).
Portanto, é necessário criar canais de engajamento entre outras instituições do
governo, já na fase do diagnostico. Assim, consegue-se arregimentar maior volume de
recursos e ampliar a coordenação das ações, podendo atrair mais de um tipo de instrumento de
política pública, ampliando as chances do Governo trabalhar com as diversas dimensões de
políticas públicas (Produção; C&T e Consumo);
iii) Criar e implementar uma política pública voltada à demanda do E2G. Até o ano de
2016 as ações do Estado brasileiro se limitaram a ações na esfera do estímulo a C&T e do
aprendizado tecnológico, ações importantes, mas insuficientes para difusão da tecnologia.
Pois como indicam os trabalhos de Suurs & Hekkert (2009) e MAZZUCATO (2013), o
avanço de novas fontes renováveis demandam medidas em múltiplas dimensões.
158
A empresa atua no seguimento de produção de insulinas. Na época alegou que conduzir um grande projeto
em uma área diferente poderia tirar o foco e o fôlego das suas ações no core competece da firma (ENTREVISTA
X).
173
A condição atual do arcabouço institucional apenas suporta o mercado do etanol de
primeira geração, sendo que o etanol celulósico, dado o seu estágio atual de desenvolvimento
tecnológico, demandaria ações em outras esferas, tais como: medidas de criação de um
mercado de nicho ou medidas que impulsionassem as exportações159
, ou ainda, a criação de
um arranjo regulatório suficientemente forte para este produto somar-se ao mercado de
biocombustível de primeira geração, proporcionando recompensa ao produtor (compensação
pelos benefícios ambientais)160
.
Tal situação é característica do atual estágio da tecnologia (2G), não se limitando à
realidade brasileira, pois o standard tecnológico não está estabelecido, assim, ações que visem
o desenvolvimento e a melhora da tecnologia são imprescindíveis para a tomada de posição
no setor; todos os países que desejam figurar como atores proeminentes nessa trajetória
estabelecem medidas nessa direção. Os EUA são uma exceção, pois além de estabelecer
medidas de estímulo a C&T e à aprendizagem tecnológica introduzem ações que incentivam a
produção e o desenvolvimento de capacidade produtiva local, tais como o estabelecimento de
metas de produção e mistura de etanol celulósico aos combustíveis fósseis, caso da Energy
Independence and Security Act. (MAIO; HENNESSY; BABCOCK, 2012). Nos demais países
– como mostra o quadro 3.7. - as ações são apenas na dimensão da C&T, e mesmo no caso
americano, as mais relevantes encontram-se voltadas à C&T.
Quadro 3.7. Ações internacionais de estímulo ao desenvolvimento do etanol celulósico.
EUA
Biomass Research and Development Initiative (2000) – Por meio da parceria entre o
Department of Energy (DOE) e o United States Department of Agriculture (USDA) forma-se um
programa que oferece subvenções para projetos de PD&D em biocombustíveis. Esta iniciativa
apresenta três eixos principais: 1) desenvolvimento de matérias-primas; 2) desenvolvimento de
biocombustíveis e bioprodutos; e 3) análise do desenvolvimento dos biocombustíveis. O
programa conta com duas revisões, em 2008 e em 2014, a participação máxima do governo é de
80% do custo total do projeto.
Energy Independence and Security Act (2007) – No que tange os combustíveis renováveis
determina cotas progressivas de mistura entre biocombustíveis e combustíveis fósseis, com o
objetivo de atingir 36 bilhões de galões de biocombustíveis em 2022 (136 bilhões de litros).
Existe uma meta específica para combustíveis celulósicos, em 2022 deverão ser consumidos 16
bilhões de galões nos EUA (60 bilhões de litros).
Ações da Receita Federal Americana - concedeu crédito tributário para a produção de
biocombustíveis celulósicos, crédito de até US$ 1,01 por galão, produzidos nos EUA depois de
31 de dezembro de 2008. Soma-se a essa ação subsídio especial de 50% para as deduções com
159
Representantes da Raízen afirmam que o etanol de segunda geração tem nicho muito forte no mercado
exportador. Os principais destinos seriam EUA, Europa e Ásia (REUTERS BRASIL, 2015). Em entrevista
realizada na GranBio (09/09/2015) as exportações aparecem como um destino importante para a produção do
etanol celulósico, devido ao desenvolvimento do arcabouço regulatório dos países desenvolvidos, os quais
compreendem metas para emissões e indicativos de mistura de biocombustível aos derivados de petróleo.
174
depreciação das plantas de biocombustíveis celulósicos que utilizassem a hidrólise enzimática
em seu processo produtivo. Ambas as ações se estenderam até 2013.
Biorefinery Assistance Program (2008) - O programa encontra-se no escopo da Farm Bill de
2008, seu objetivo era oferecer subvenções econômicas e garantias de empréstimos para a
construção de biorrefinarias de escala comercial e/ou modernização de biorrefinarias
demonstrativas transformando-as em comercial. Visava demonstrar a viabilidade comercial dos
processos de conversão de biomassa em biocombustíveis avançados.
Biorefinery, Renewable Chemical and Biobased Product Manufacturing Assistance
Program (2014) O programa encontra-se no escopo da Farm Bill de 2014, amplia a ação e o
escopo da versão anterior (Biorefinery Assistance Program), assim, adiciona as funções o apoio
aos produtos químicos provenentes da biomassa. Outra grande mudança foi o abandono do
apoio por meio de subvenção econômica.
Biomass Program (2008) – O programa apresenta orçamento acumulado de 3,3 bilhões de
dólares, suporta projetos de P&D em diferentes fases (bancada, piloto e demonstração). Seu
principal objetivo é o desenvolvimento de novas tecnologias indústrias no segmento de
biocombustíveis. Esta ação se dá no âmbito do Department of Energy (DOE) e é conduzida pelo
Office of Energy Efficiency and Renewable Energy (EERE). No seu desenvolvimento estabelece
parcerias público-privadas.
Demonstration and Market Transformation - O programa congrega todas as ações de
Pesquisa, Desenvolvimento e Demonstração (PD&D) do U.S. Department of Energy’s
Bioenergy Technologies Office (BETO) que envolve a conversão da biomassa, abrangendo toda
a sua cadeia produtiva. Com isso, o programa fomenta projetos tecnológicos de alto risco, nos
níveis de planta-piloto, demonstração e escalas industrial, buscado remover os obstáculos à
comercialização. As ações do BETO ocorrem por meio do estabelecimento de parcerias público-
privadas que atuam nas seguintes linhas/sub programas: 1) Biorrefinarias integradas; 2)
Biocombustível para aviação; 3) Infraestrutura para distribuição e uso final do Biocombustível;
4) Uso da biomassa para energia elétrica (Biopower); 5) Co-otimização do biocombustível e do
Motor a combustão.
Conversion Research and Development (R&D) – Conduzido pelo BETO, tem como objetivo
desenvolver tecnologias para a conversão da biomassa em combustíveis líquidos
comercialmente viáveis, bem como bioprodutos e bioenergia. As linhas de pesquisa são: 1)
Bioquímica e 2) termoquímica. Este programa é voltado à pesquisa básica e desenvolvimento
em escala laboratorial, agindo como complemento aos programas já existentes (pré-
competitivos).
Algae Program – É realizado no âmbito do BETO, apresenta uma visão de longo prazo,
objetivando aumentar os rendimentos e reduzir os custos de biocombustíveis de algas. Trabalha
com parceiros (públicos e privados) buscando integrar competências para o desenvolvimento de
tecnologias nos diversos estágios da à cadeia produtiva do biocombustível celulósico da alga.
União
Europeia
NER300 – Programa de financiamento de projetos demonstrativos ou em escala comercial em
energias de baixo carbono, com isso, estimula novas tecnologias em energias renováveis e
captura e armazenamento de carbono. Funciona com apoio direto aos projetos via subvenção
econômica, com o orçamento estimado de 2 bilhão de euros. Esta ação ocorre no âmbito do
Climate Energy Package da União Europeia, as articulações das duas medidas visam cumprir
com os mandatos de uso de biocombustíveis, como medida para redução das emissões de GEEs.
China
12th Five Year Plan (2011-2015) – A bioenergia é vista na China como uma indústria
emergente, sendo estratégica ao país. No interior do plano quinquenal de desenvolvimento
define metas para o aumento da biomassa e dos biocombustíveis, visando o desenvolvimento de
etanol celulósico e do biodiesel. O National Energy Administration (NEA), é a instituição
responsável pela condução da matriz energética, com isso, é a responsável pela elaboração de
leis, regulamentação, regulamentos e padrões tecnológicos e fornece orientações para a atividade
de investigação científica e tecnológica.
Fonte: elaboração própria a partir de PEREIRA, 2013; USDA, 2014; PEREIRA et al., 2015; MILANEZ et al.,
2015; EERE, 2016.
175
O BNDES/FINEP formulará uma proposta de ação do lado da demanda, mas esta não
foi levada a diante justamente pelo problema indicado no ponto anterior, o engajamento de
outras dimensões do Estado.
A proposta para estimular a demanda do etanol celulósico no Brasil consistia em
determinar uma mistura mínima de etanol anidro 2G a gasolina, seria destinado 1% da mistura
atual do anidro ao etanol celulósico. A ideia é que dos 10 bilhões de litros de anidro
misturados a gasolina, seria destinado 1 bilhão de litros de E2G, o que daria um volume 10
vezes maior do que as usinas de E2G no Brasil estão produzindo (ENTREVISTA X).
Segundo os cálculos da equipe técnica do BNDES, isso deveria ser complementado com um
instrumento que garantisse o pagamento de um premio de R$ 1 por litro de E2G ao produtor,
que ao final não daria mais que 0,5 centavos ao consumidor que enchesse um tanque de 40
litros de gasolina (ENTREVISTA X).
Um mandato de mistura específico ao E2G e uma política de bonificação ao produtor
possibilitaria a expansão da produção do etanol celulósico, o que aceleraria o processo de
aprendizagem e de adensamento da cadeia produtiva no território nacional. Estima-se que a
instalação de mais 3 plantas industriais de E2G com capacidade 40 milhões de litro/ano
(iguais da Raízen), a Novozymes instalaria uma planta de enzimas no Brasil para suprir a
demanda por insumos tecnológicos (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).
iv) Por fim, a continuidade das iniciativas de fomento a tecnologias disruptivas é
condição necessária para o Brasil continuar perseguindo o desenvolvimento tecnológico, pois
momentos de hiato (iguais da década de 1990) ampliam o gap tecnológico entre o Brasil e as
nações que atuam na fronteira do conhecimento. Segundo o que foi levantado nas entrevistas,
o etanol e a inovação ainda estão no radar do BNDES e da FINEP, mas não há previsão para o
lançamento de um novo programa que abarque o etanol celulósico. A continuidade e a
correção de esforços ampliam as chances de evolução da tecnologia, bem como das próprias
instituições.
176
3.2.2. PAISS Agrícola adensamento das atividades voltadas à C&T e ao aprendizado
tecnológico do SSI da cana-de-açúcar
O PAISS Agrícola foi lançado em 2014 dando continuidade em outro nível ao
desenvolvimento de competências para a inovação no setor sucroenergético brasileiro. Esta
iniciativa é fruto do diagnóstico setorial feito durante o PAISS, que indicava a necessidade de
aumentar a produtividade da cana-de-açúcar, ou seja, ampliar a produtividade dos canaviais,
fato que ficou latente com a crise de 2011 e 2012 no setor.
Ademais, percebeu-se que o setor necessitava desenvolver variedades de cana-de-
açúcar mais adaptadas às condições geográficas atuais do setor e, ainda, procurar desenvolver
variedades com maior capacidade energética.
O diagnóstico também pontuou a urgência em desenvolver equipamentos adequados
para plantio e colheita, já que o maquinário agrícola atual são adaptações de outras culturas,
os quais têm provocado alguns problemas na produção, como a compactação do solo e a
perda de material no transporte (palha da cana). Por último, busca através de novos
investimentos em PD&I alongar a produção do etanol para além do período da safra de cana,
para diminuir os efeitos do fluxo de caixa das unidades processadoras de cana-de-açúcar na
entre safra (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).
Com isso, o PAISS Agrícola conta com cinco linhas de pesquisa, já predeterminadas
pelas agências governamentais, a saber: 1) Desenvolvimento de novas Variedades; 2)
Máquinas e Implementos; 3) Sistemas integrados de manejo e planejamento da produção; 4)
Novas técnicas de propagação de mudas; 5) Adaptação de sistemas industriais para outras
culturas (sorgo e o milho).
177
Tabela 3.5. Empresas e valor dos projetos contratados no âmbito do PAISS Agrícola (2014-
2018)161
.
PAISS Agrícola
ANO Instituições/Empresa Valor
Contratado Categoria Instituição
2014 Tracan Máquinas e Sistemas para Agricultura LTDA 11.133.900,00 Crédito FINEP
2014 AGN Agroindustrial e Biocombustiveis LTDA 37.198.047,20 Crédito FINEP
2014 Raizen Energia S/A 4.473.000,00 Crédito BNDES
2015 Cerradinho Bioenergia S.A. 36.529.808,00 Crédito FINEP
2015 Biocelere Agroindustrial LTDA 2.509.090,40 Crédito FINEP
2015 Biocelere Agroindustrial LTDA 1.090.909,09 Crédito FINEP
2015 Grupo Zilor (Copersucar) 12.678.000 Crédito BNDES
Fonte: elaboração própria a partir de MCTI, 2016; BNDES, 2016.
No interior desse novo programa estruturado apresentam-se dois importantes break
thru tecnológicos ligados à fase agrícola do SSI da cana-de-açúcar, que diferentemente das
inovações mais complexas e disruptivas da fase industrial emuladas pelo PAISS Industrial são
conduzidas por atores nacionais, os quais empregam elementos fortes do STI-mode. Assim,
intensificando os processos de aprendizagem já presentes nessa fase da produção do etanol e
do açúcar (CORTEZ et al., 2016). Os destaques são:
i) Cana-energia: nova variedade de cana-de-açúcar que em 2017 apresenta cerca de
30 mil hectares plantados, não estando mais em uma escala experimental. Esse novo canavial
é composto por variedades das empresas GranBio e, principalmente, da Vignis. Esta segunda
firma apresenta mais de 10 anos de experiência neste tipo de melhoramento, pois os
proprietários e pesquisadores da empresa são os mesmos que fundaram a Allelixy e
Canavialis. Destaca-se, que ambas participam do PAISS Agrícola.
Existe uma dinâmica interessante dessa nova variedade, que além de ser um trunfo
futuro para o etanol celulósico (MILANEZ et al. 2015; ENTREVISTA VII), hoje está se
mostrando independente do E2G, tendo vida própria. A cana-energia esta sendo testada e já
usada por algumas usinas para estender a safra da cana-de-açúcar (período de funcionamento
da usina), sendo processada no início e no fim da safra. Essa variedade tem dificuldade para
cristalizar o açúcar, mas com o seu caldo é possível fazer etanol e como o início da safra
brasileira é basicamente produção de etanol, então o seu uso cabe. Ademias, seu bagaço esta
sendo utilizado para ampliar o estoque de biomassa para a cogeração de energia, ampliando a
161
Os projetos referidos foram encontrados na carteira de projetos financiados com recursos dos Fundos
Setoriais e no repositório do BNDES. Mas estas bases não foram atualizadas depois do início de 2015, assim,
não foi possível encontrar informações sobre outros projetos ou até mesmo do andamento destes.
178
disponibilidade de energia elétrica a ser exportada a rede elétrica (ENTREVISTA VII;
ENTREVISTA X).
ii) Cana-de-açúcar transgênica: as pesquisas e o desenvolvimento conduzido pelo
CTC ao longo da última década resultou no registro da primeira cana transgênica do mundo
(em junho de 2017), saindo à frente das grandes sementeiras transnacionais (Monsanto e
Syngenta). A nova variedade de cana foi desenvolvida pelo CTC, mas uma parte considerável
dos recursos advêm do BNDES e da FINEP, tanto por meio de projetos de pesquisa, como por
meio dos aportes feitos pelo BNDESPar que é acionista da empresa.
Esta nova variedade de cana foi criada a partir da introdução do gene BT, assim, se
aproveitou de um gene de domínio público – estratégia da empresa para não pagar royalties e
se apropriar da maior parte dos rendimentos da inovação (ENTREVISTA VI; ENTREVISTA
X). Com esse gene a nova variedade da cana fica imune a pragas, tais como a broca de cana-
de-açúcar. Esta nova situação permite os produtores reduzirem custos de operação, como uso
de pesticidas e manejos preventivos.
3.3. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 3
O presente capítulo preocupou-se em expor o quadro evolutivo da institucionalidade
ligada ao setor sucroalcooleiro, destacando as ações ligadas a C&T e ao aprendizado
tecnológico. Assim, conseguiu evidenciar o caráter singular dos anos 2000, momento em que
ocorre uma mudança qualitativa do padrão de intervenção do Estado no setor sucroenergético.
A inovação foi posta na pauta de ações dos agentes públicos e privados.
Esta nova política pública é distinta do padrão de intervenção estabelecido pelo
Proálcool (1975-1990), que se preocupava com a expansão do setor e a regulação dos
mercados regionais. Sua implementação desencadeou o crescimento extensivo do setor
(ampliação da área plantada, aumento da capacidade instalada – ampliação dos equipamentos
– vide capítulo 2). Basicamente, a política da década de 1970/1980 se preocupava com o
crescimento do setor, buscando dar conta da demanda interna por combustível e, também,
criar uma forma de contornar as crises de superprodução ligadas à produção do açúcar
(variações nos mercados internacionais).
As novas ações do Estado em relação ao setor sucroenergético nos anos 2000
mostram-se diferentes; existe uma mudança qualitativa, onde o componente inovativo é
valorizado já no desenho da política. Se a inovação realmente ocorre na realidade econômica,
179
esta depende de outros fatores (vide capítulo 5), embora o design da política considera esse
elemento como central.
O PAISS Industrial possibilitou pela primeira vez ao SSI da cana-de-açúcar
vislumbrar a possibilidade de realizar incrementos técnicos na fase industrial (financiamento e
direção) e, ainda, a possibilidade de explorar outros nichos de mercado: bioquímicos, energia
elétrica; biofertilizantes; pellets; biocombustíveis avançados. Então, a nova política buscou
ampliação do setor sucroenergético não apenas pela expansão, como as ações da década de
1970/80, mas também pela via de intensificar a economia de escopo e a diversificação de
produtos das usinas.
A nova política implementada pelo Estado brasileiro consegue (mesmo com as
limitações) introduzir a consciência que o Brasil podia ser inovador, pois até então a
estratégia/pensamento dominante é de continuidade na primeira geração (na rota tecnológica
conhecida); assim, o Brasil apostou na formação de uma nova dinâmica para a produção de
biocombustíveis.
Com esta perspectiva, no período de 2006 a 2015 o Brasil apresentou um conjunto
amplo de políticas, do tipo technology-push e de demand-pull, voltadas para o etanol. Em
destaque temos o PAISS (de 2011) e o PAISS Agrícola (de 2014). Tais iniciativas estimulam
os atores inseridos no SSI a agirem sobre a tecnologia, com o intuito de desenvolvê-la. Estes
são programas de fomento estruturados, com linhas mais definidas possibilitando um
direcionamento das pesquisas e dos atores. Trata-se de ações que visam um estágio diferente
do PD&I, objetivando tecnologias industriais e tecnologias agrícolas em um estágio mais
maduro do conhecimento, já na antessala da inovação tecnológica, com linhas de
financiamento para projetos de demonstração e em escala industrial.
O PAISS Industrial colocou o SSI da cana-de-açúcar na rota tecnológica do etanol
celulósico de fato, figurando como uma das principais regiões desenvolvedoras/produtoras do
etanol 2G no mundo, com 12% da capacidade industrial mundial instalada (vide tabela 1.1. no
capítulo 1).
180
CAPÍTULO 4. A DINÂMICA DO CONHECIMENTO E DA BASE TECNOLÓGICA
DO ETANOL CELULÓSICO: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DOS ARTIGOS
CIENTÍFICOS E DAS FAMÍLIAS DE PATENTES
O presente capítulo tem como objetivo evidenciar a dinâmica tecnológica do etanol
celulósico, trabalhando as bases do conhecimento e da tecnologia que sustentam o “novo”
processo produtivo do bioetanol, dando ênfase à base tecnológica e aos atores que conduzem
o processo de inovação. Tal esforço torna-se relevante diante da composição variada dos
projetos de etanol celulósico no mundo162
, evidenciando o caráter pré-paradigmático que
sustenta essa nova tecnologia (LIMA, 2013; ZILBERMAN et al., 2013; FAPESP, 2015;
MURAKAMI, 2015; GUSTAFSSON et al., 2014; MURAKAMI et al. 2015; SILVEIRA et al.
2015; SILVEIRA et al. 2016).
Destaca-se que esta investigação possibilita compreender as características do
conjunto tecnológico e, principalmente, identificar os atores envolvidos no processo de
desenvolvimento desta tecnologia, percebendo quais são as empresas, as instituições e/ou os
países que se destacam nessa trajetória.
De maneira exploratória, realiza-se um exercício de vigilância tecnológica para
demonstrar a evolução dos esforços em desenvolver o etanol celulósico no Brasil e no mundo
sendo que os detalhes metodológicos e as informações sobre as escolhas realizadas
encontram-se justificadas no capítulo 1 (subtópico 1.3.1.3.). Por meio dos dados de patentes e
de artigos científicos publicados internacionalmente, identificam-se os principais detentores
da tecnologia no Brasil e no mundo, a base de conhecimento que sustenta estas iniciativas e,
ainda, pode-se ter uma clara noção do papel desempenhado pelo SSI da cana-de-açúcar do
Brasil na tecnologia de etanol 2G.
Este olhar exploratório sobre a tecnologia do etanol celulósico serve para identificar a
dinâmica da produção de conhecimento sistematizado e das novas técnicas e processos
relacionados à temática no Brasil e no mundo. Assim, dando contornos concretos aos esforços
das instituições de ensino e pesquisa, das firmas e de outros atores que se dispõem a
desenvolver o etanol celulósico.
162
O relatório apresentado pela UNCTAD (2016) indica a existência de muitos projetos de etanol celulósico no
mundo. Os EUA lideram, com 27 plantas instaladas e 13 em processo de instalação ou planejadas, a União
Europeia conta com 18 plantas instaladas e mais 10 planejadas, o Canadá possui 9 plantas instaladas, e a China
apresenta 12 plantas instaladas. Estas unidades apresentam níveis distintos de integração entre o processo de pré-
tratamento e a hidrólise, diferenciam-se em relação ao tipo de projeto (piloto, demonstrativo, comercial). As
iniciativas em território Brasileiro serão analisadas no capítulo 5.
181
A discussão conduzida neste Capítulo é norteada por três questões: 1) quais são os
conjuntos técnicos e de saberes sistematizados que compõem as invenções em etanol de
segunda geração?; 2) quais são os atores mais relevantes no desenvolvimento da tecnologia do
etanol celulósico a partir dos depósitos de patentes e da publicação de artigos científicos?; 3)
por meio da análise dos dados de patentes e de artigos científicos, quais são as capacidades
desenvolvidas pelo SSI da cana-de-açúcar? As respostas a tais questionamentos se interligam
com o quarto objetivo específico da tese, “expor a dinâmica tecnológica do etanol celulósico,
trabalhando as bases do conhecimento e da tecnologia”, por conseguinte, suportando
elementos da resposta da Pergunta de Pesquisa, “quais são os atores/elementos do SSI da
cana-de-açúcar que promovem o progresso técnico do setor na direção do etanol celulósico”
(vide figura 1).
O capítulo encontra-se estruturado em quatro tópicos além da presente introdução. O
primeiro tópico (4.1.) traz as definições a respeito da tecnologia do etanol celulósico,
portanto, trabalha-se com o domínio tecnológico, delimitando as bases do conhecimento e da
tecnologia que compõe o universo do etanol de segunda geração, oferecendo contornos
concretos aos saberes que sustentam as invenções nessa trajetória.
O segundo tópico (4.2.) expõe a dinâmica evolutiva do esforço de desenvolvimento do
etanol celulósico, identificando os períodos de maior atividade no setor e as localidades que se
colocam como lócus da inovação no segmento, determinando quais países e regiões tem se
dedicado ao setor de segunda geração.
O terceiro tópico (4.3.) identifica os principais atores que sustentam este processo,
pontuando quais são as firmas e as instituições de ensino e pesquisa que figuram como
proeminentes nessa atividade. Desta forma, comprova a presença de novos atores no processo
de inovação do setor sucroenergético, os quais demonstram esforço de aprendizado em novas
bases de conhecimento, distinta da trajetória do etanol 1G. Já o quarto tópico (4.4.) sumariza
os principais achados dessa parte da pesquisa, posicionando o Brasil neste debate, além de
construir um link com a discussão teórica que permeia a estruturação da pesquisa, ou seja, a
abordagem de SSI.
182
4.1. DOMÍNIO TECNOLÓGICO DO ETANOL CELULÓSICO
Os setores econômicos se diferenciam grandemente em termos de conhecimento e
processos de aprendizagem, formando distintos domínios tecnológicos, ou seja, conjuntos de
saberes técnico-científicos específicos às atividades de inovação de cada setor (MALEBA &
ORSENIGO, 1996; NELSON & WINTER, 2005; DOSI, 2006; MALERBA, 2007). Desta
maneira, a agregação destes saberes/conhecimentos economicamente úteis resulta na
estruturação da produção, bem como delimita as fronteiras dos setores e os regimes de
acessibilidade e apropriabilidade da indústria.
Portanto, torna-se imperativo compreender quais são as características do domínio
tecnológico do etanol celulósico, pois este universo é ponto de partida das instituições e das
firmas para atuarem na trajetória tecnológica. A base de conhecimento e a base técnica “dá o
tom” do processo inovativo; igualmente, dita o ritmo das sucessivas interações entre os atores
sociais durante e após a introdução da nova tecnologia (MALERBA, 2002; JENSEN et al.,
2007; LUNDVALL, 2007; GONZALEZ-PERNÍA et al. 2014). Este movimento traz ao
cotidiano da produção novas firmas, novos fornecedores de insumos e de tecnologias e,
principalmente, novos arranjos tecnológicos, baseados em novos conhecimentos e processos
de aprendizagem (MALERBA, 2002; DOSI, 2006).
Essa dinâmica é um reflexo eminente do esforço inovativo, tendo como implicação a
transformação estrutural dos setores econômicos. E, quanto mais radical é a nova tecnologia,
maior será a mudança setorial, podendo este se modernizar ou desaparecer163
(MALERBA,
2002; ROSENBERG, 2006; FREEMAN & SOETE, 2008).
A tecnologia de produção do etanol celulósico tem por definição a capacidade de
extrair os açúcares contidos na estrutura celular das plantas, logo, realiza a “quebra” das
ligações glicosídicas que em suma formam a parede celular (celulose-hemecelulose-lignina).
Este desmonte da estrutura microcelular, libera os açucares, tais como a glicose e a xilose.
Estes açúcares são utilizados como insumos para diversos processos industriais, dando origem
aos biocombustíveis de segunda geração e os bioquímicos.
Como já sumarizado no capítulo 1 (seção 1.2.) esse processo de conversão da
biomassa só é possível pela introdução de um novo arranjo técnico-científico, que apresenta
um caráter disruptivo em relação à tecnologia estabelecida (1G). Este fato alterar toda a
163
Toda a discussão teórica e estudos de caso que descendem do conceito de “destruição criadora” cunhado
por Schumpeter (1912) dão base para refletir sobre essa dinâmica.
183
dinâmica de produção do etanol ora estabelecida, pois introduz conhecimentos científicos e
técnicos que estão à margem das competências tradicionais do setor sucroalcooleiro (vide
figura 4.1. e 4.2.).
A apreciação dessa dinâmica - desenvolvimento da tecnologia do etanol celulósico –
alimenta o entendimento sobre as mudanças exigidas pela própria tecnologia, a qual só pode
se efetivar com a alteração da base de conhecimento na fase industrial do setor
sucroalcooleiro, pois se supõem que a tecnologia força um deslocamento do exclusivismo
DUI-mode para um padrão intermediário, visando o STI-mode, pois os elementos necessários
para estruturação da produção de segunda geração estão em outro nível, diferenciando-se da
trajetória traçada pelo etanol de primeira geração.
Ao trabalhar as bases do domínio tecnológico do etanol celulósico percebe-se as
diferenças e o que realmente muda entre as trajetórias de 1G para a de 2G. Além disso,
caracterizar as bases da nova tecnologia e toda a sua dinâmica (evolução, distribuição
geográfica e os principais atores164
), possibilita identificar o que há de novo nessa fase do
processamento da biomassa. Essa postura justifica-se como parte integrante do objetivo
central da pesquisa “identificar, caracterizar e analisar o desenvolvimento e a introdução da
tecnologia de segunda geração no SSI da cana-de-açúcar”. Desta forma, operacionaliza-se
elementos do real com as categorias analíticas da abordagem de Sistemas Setoriais de
Inovação (building blocks), tais como o knowledge base / basic Technologies indicadas por
Malerba (2002).
Para identificar as características básicas do domínio tecnológico do etanol celulósico
recorre-se à análise dos artigos científicos publicados internacionalmente, utilizados como
proxy dos conhecimentos científicos ligados a esta tecnologia. Por outro lado, trabalha-se
conjuntamente com os depósitos de famílias de patentes, visando dar contornos reais as
invenções tecnológicas já “disponíveis”, expondo os principais conceitos que circundam essa
tecnologia e, ainda, quais são os grupos de tecnologias mais relevantes (clusters), os micro-
organismos e os feedstocks que recebem maior atenção e, os processos produtivos que
angariaram maiores investimentos ao longo da última década165
.
164
Todos estes elementos são trabalhados em detalhes nos próximos subtópicos, respectivamente 4.2 e 4.3. 165
O material levantado e o conjunto de dados reunidos nesta etapa de pesquisa são apenas parcialmente
explorados nesse capítulo, buscando utilizar somente as informações relevantes para dar conta do que foi
proposto na tese, mas, destaca-se que o banco de dados formado por esta pesquisa possibilita outras tantas
análises sobre a dinâmica do conhecimento e da tecnologia ligada ao etanol celulósico, assim, aventa-se
desenvolver novas pesquisas com base nesta sistematização inicial.
184
A figura 4.1. indica as áreas do conhecimento científico que ao longo do tempo
dedicaram maior atenção aos problemas e potenciais do etanol celulósico. Observando tanto a
amostra como um todo (7.056 artigos) ou somente os artigos publicados por instituições e
firmas brasileiras (509 artigos) percebe-se um grande peso da Bioquímica, da Genética, da
Biologia Molecular, da Imunologia e da Microbiologia, áreas do conhecimento que juntas
representaram 33% do total dos artigos científicos publicados no plano internacional.
Figura 4.1. Áreas do conhecimento que se dedicam a temática do etanol celulósico.
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Scopus, 2017.
É importante notar na figura 4.1. que existe uma coincidência entre as áreas de
pesquisas no mundo e no Brasil, mostrando uma sintonia entre as temáticas que estão
relacionadas ao SSI da cana-de-açúcar e as conduzidas por instituições internacionais. Esse
quadro também indica um esforço da estrutura nacional em acompanhar a dinâmica mundial,
dado que proporções de importância entre as áreas se mantém na escala nacional semelhante a
internacional.
Nota-se que os campos de estudo são ligados às pesquisas desenvolvidas na fronteira
do conhecimento, disciplinas que cresceram impressionantemente a partir da segunda metade
do século XX e continuam em franca expansão (ZILBERMAN et al, 2013). Estas quando se
ligam ao mundo da produção, sempre demandam altos dispêndios em P&D e mão-de-obra
altamente qualificada, fato que desenvolve segmentos econômicos e/ou firmas intensivas em
conhecimento.
185
Ainda observando a figura 4.1. percebe-se outras áreas do conhecimento que se não
estão na dianteira do conhecimento, são áreas tradicionais do desenvolvimento técnico e
apresentam historicamente igual importância, demandando esforços significativos em P&D
(adaptação, escalonamento e etc.), estas são: engenharia química (18%); química (6%) e
engenharias (4%) e ciências dos materiais (3%).
A figura 4.2. identifica os campos tecnológicos do etanol celulósico, obtidos por meio
da análise das famílias de patentes (2.937); logo de início é possível perceber forte relação
com as áreas do conhecimento expostas pela figura 4.1. (artigos científicos). A Biotecnologia
abarca 69,1% das tecnologias protegidas, mostrando que os conhecimentos provenientes desta
área, que incluem Bioquímica, Genética, Biologia Molecular e Microbiologia, estão presentes
na sustentação dos esforços de desenvolvimento do etanol celulósico.
Figura 4.2. Campos tecnológicos do etanol celulósico - 2.937 famílias de patentes.
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.
186
As Figuras 4.1. e 4.2. indicam que as tecnologias dominantes estão correlacionadas
aos setores de intensa atividade em P&D e com forte relação com a ciência. Isso sugere que a
base de conhecimento vem se alterando, estabelecendo relações com áreas do conhecimento e
setores econômicos que dialogam diretamente com a Genética e a Biologia Molecular,
ocupando os lugares da Metalurgia e da Mecânica, então conhecimentos chaves no processo
de expansão da produção de etanol de primeira geração ao longo de todo o século XX. Este
fator é totalmente novo se levarmos em consideração o histórico de desenvolvimento do setor
sucroenergético, o qual introduz suas inovações na fase industrial do processo produtivo por
meio do DUI-mode166
, principalmente a partir de melhorias incrementais dos equipamentos
industriais (OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013).
Percebe-se que a biotecnologia tem sido a base da tecnologia do etanol celulósico e
este arcabouço de conhecimento amplia consideravelmente a variabilidade disponível de
métodos para a produção do etanol, não em relação à destilação que continua basicamente a
mesma, mas na forma e na quantidade de obtenção de açúcares provenientes da biomassa que
são colocados à disposição da fermentação, bem como a própria fermentação que pode contar
com leveduras geneticamente modificadas.
Assim, a fase industrial do setor sucroalcooleiro passa por uma reestruturação na sua
base de conhecimento, que possibilita, em última instância, ampliar sua capacidade produtiva
por intermédio da utilização de novos métodos de pré-tratamento, hidrólise e fermentação,
dados pela engenharia genética, pela química orgânica fina e por outras subáreas do
conhecimento das ciências naturais.
Com isso, adverte-se que a proeminência no setor, pelo menos no que diz respeito à
tecnologia, depende da apropriação destes conhecimentos e precisamente nesse quesito que os
países periféricos apresentam maiores dificuldades (vide figura 4.4 e 4.5.). As firmas
brasileiras envolvidas no setor sucroenergético, tanto de bens de capital como as
processadoras de cana, não figuram como players globais nesses segmentos, nem ao menos
apresentam estruturas técnicas para conduzir P&D nessas áreas do conhecimento.
Isso em parte é dado pelo processo de desenvolvimento do setor, baseado em
tecnologias de domínio público e processos de aprendizagem calcados no DUI-mode, mas,
166
Os trabalhos já citados de Negri (1981); Liboni & Toledo Jr (2008); Negri (2010); Valente (2012); Varricho
(2012); Oliveira Filho (2013) e Salles-Filho (2015) ilustram o processo de aprendizagem das firmas de bens de
capital do setor sucroenergético e apresentam contornos ao processo de introdução de inovações no SSI da cana-
de-açúcar na fase industrial, fortemente ligadas ao DUI-mode.
187
por outro lado, evidencia o caráter atrasado da indústria nacional, que não acompanha o
desenvolvimento tecnológico próximo à fronteira. Assim, as firmas nacionais posicionam-se
como incorporadoras de tecnologias estrangeiras e, ao adquirir pacotes tecnológicos
“fechados”, acabam por vivenciar diversos problemas167
(CEPAL, 2002; CGEE, 2006).
A crítica também deve abrir espaços para as exceções, pois o Brasil apresenta esforços
nesse campo tecnológico, tanto no que diz respeito às firmas, como das instituições de ensino
e pesquisa (vide figuras 4.3, 4.4 e 4.5.). O grande problema é a envergadura e a profundidade
dessas iniciativas, que geralmente seguem trajetórias já iniciadas pelos atores estrangeiros ou
ações adaptativas, ocorrência perfeitamente compreensível e importante para os países
periféricos, mas insuficiente para engendrar processos de desenvolvimento de longo prazo e
autônomos.
Pensando na liderança tecnológica e nos desdobramentos positivos que existem no
desenvolvimento das tecnologias endógenas, as iniciativas que se configuram como exceções
deveriam ser intensificadas e multiplicadas, visto que:
i) O desenvolvimento externo não se preocupa com as questões específicas do setor,
assim, não possibilita expansões e modernizações adequadas às realidades geográficas e
sociais dos países periféricos (Brasil);
ii) A geração de tecnologias domésticas adensa os setores econômicos, pois gera
empregos de maior qualidade, novos negócios e aumenta o processo de acumulação
capitalista, o qual bem alinhavado com um sistema justo de redistribuição e
“retroalimentação” dos novos ciclos virtuosos pode gerar desenvolvimento econômico e
social de proporções regionais e nacionais (MAZZUCATO, 2013).
Ações como as do CTBE; CTC e GranBio apresentam caminhos “alternativos” para a
superação dessa condição subalterna na dinâmica da inovação, pois estes atores buscam saídas
para os problemas locais, com esforços de P&D voltados às especificidades do setor, tanto no
que diz respeito à pesquisa básica, como nos projetos de desenvolvimento tecnológico em
parcerias com as firmas do SSI da cana-de-açúcar168
.
167
Esta discussão é retomada no capítulo 5 por meio do exame dos projetos industriais de etanol celulósico no
Brasil. 168
Estes atores apresentam diversas iniciativas que qualificam as ações do SSI da cana-de-açúcar na trajetória do
etanol celulósico, tais como: pesquisas para desenvolvimento de coquetel enzimático; elaboração de
métodos/processos para a produção de enzimas onsight; desenvolvimento de leveduras transgênicas;
desenvolvimento de cana-energia; construção e operação de plantas industriais de etanol celulósico (escala
piloto, demonstração e comercial); estabelecem diversas parcerias em etanol celulósico e química verde, tanto
com empresas como outras instituições. Estes e outros elementos serão abordados no capítulo 5.
188
4.2. A DINÂMICA DO CONHECIMENTO E DA TECNOLOGIA DO ETANOL
CELULÓSICO: EVOLUÇÃO E DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DO ESFORÇO DE
DESENVOLVIMENTO
O desenvolvimento de um novo conjunto tecnológico demanda múltiplas ações de
diversos atores, os quais realizam iniciativas individuais e ações colaborativas, tanto em
direções convergentes como divergentes. A incerteza e os riscos fazem parte desse processo,
assim, os arranjos entre os atores e a intensidade dos esforços são variados entre os países e as
regiões, sendo que a robusteza das políticas públicas é fundamental para ditar o ritmo dessa
dinâmica - como já mostrado no capítulo 3. Desta forma, nota-se que os picos de “esforços”
dessa trajetória tecnológica coincidem com a implementação de ações institucionalizadas na
temática dos biocombustíveis e com a alta dos preços do barril do petróleo no mercado
internacional (vide figuras 4.3. e 4.4.).
Os dados da dinâmica do conhecimento são traduzidos pela evolução e pela
distribuição espacial dos artigos científicos publicados internacionalmente; a figura 4.3.
apresenta contornos concretos dessa atividade. A outra face do progresso técnico é dada pela
evolução dos depósitos de famílias de patentes, conforme figura 4.4. Tanto do lado do
conhecimento científico como do lado das invenções tecnológicas percebe-se que o progresso
da trajetória tecnológica do etanol celulósico ocorre em escala global e é um fator novo no
cenário das energias renováveis, pois acelerações das publicações e dos depósitos ocorrem na
segunda metade da década de 2000.
A figura 4.3. faz uma síntese da dinâmica dos artigos científicos relacionados à
temática do etanol celulósico. A amostra analisada é de 7.056 artigos, sendo que destes 509
artigos são de origem brasileira, ou seja, provenientes de instituições ou firmas brasileiras. A
distribuição espacial do conhecimento científico do etanol celulósico segue principalmente
três características:
i) A produção científica concentra-se em países que tradicionalmente lideraram a
produção científica mundial, tais como EUA (1.764), China (1.015), Japão (454) e
Coréia do Sul (335);
ii) Existe produção científica expressiva em países que se dedicam a produção de
bioenergia ou em países que apresentam tradição no processamento da biomassa,
mesmo que para outros setores (alimentício, papel e celulose), estes são: Índia (512),
Brasil (509), Suécia (330), Canadá (291), Austrália (100) e Finlândia (95);
189
iii) Países em desenvolvimento figuram como importantes localidades de produção
de conhecimento científico sobre o segmento: China, Índia e Brasil; não obstante,
outros países em desenvolvimento também acompanham essa discussão, mesmo com
certa “distância”, Malásia (93), Tailândia (93), Irã (88), África do Sul (85) e México
(81).
É importante notar que os EUA e o Brasil se encaixam em mais de uma racionalidade,
pois além de apresentarem estruturas científicas desenvolvidas, mesmo que obviamente não
equiparáveis, são os maiores produtores de etanol do planeta. Assim, o interesse de pesquisa
segue uma relação com a base produtiva, neste caso, uma produção de conhecimento que vai
além da base produtiva atual (etanol de primeira geração), conhecimentos desenvolvidos na
fronteira do conhecimento e que de maneira correlacionada abrem espaços para novos
negócios.
Esta relação não é linear e nem sempre verdadeira, mas mesmo no Brasil, encontram-
se alguns casos exitosos, os quais descendem diretamente dessa produção do conhecimento,
por exemplo, a Vignis ou a GranBio, ambas empresas de base tecnológica que atuam no
segmento de etanol celulósico.
Outra característica notável na distribuição espacial do conhecimento científico
relacionado ao etanol celulósico é a grande relevância dos países em desenvolvimento, pois
entre os cinco primeiros países, três são países periféricos (China, Índia e Brasil) e outros
tantos estão muito próximos de países desenvolvidos, com estruturas científicas superiores -
França (178) e Alemanha (157). Esta constatação indica que a temática da bioenergia é uma
oportunidade e uma rota possível para as nações em desenvolvimento não só participarem do
desenvolvimento científico e tecnológico, mas, também desenvolverem tecnologias e setores
econômicos adaptados às suas condições naturais (economias baseadas em recursos naturais).
190
Figura 4.3. Evolução dos artigos científicos publicados em periódicos internacionais e os
principais países em publicação na temática do etanol celulósico.
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Scopus, 2017.
Por outro lado, a expressividade da produção de conhecimento não se reflete
diretamente na produção de novas tecnologias (patentes), que continuam fortemente
concentradas no centro do sistema capitalista169
, como fica nítido nas figuras 4.4. e 4.5. Tais
dados mostram, mais uma vez, que a geração de conhecimento de qualidade não é condição
suficiente para gerar desenvolvimento tecnológico relevante, sendo necessários outros
elementos, tais como as políticas públicas de sustentação dos novos setores e de adensamento
do Sistema Setorial de Inovação, situação que é analisada ao longo desta pesquisa.
O caso brasileiro mostra-se inserido nessa situação; mesmo aparecendo como grande
produtor de biocombustível, o país não figura como um proeminente desenvolvedor de
tecnologia de segunda geração. Entretanto, os dados que se seguem e toda a discussão do
capítulo 5 indicam que nem tudo é terra “arrasada”, pois o Brasil não lidera em artigos
científicos e muito menos em depósitos de patentes, mas apresenta algumas ações
contundentes na trajetória do etanol celulósico, que o colocam em situação de pelo menos
acompanhar a trajetória tecnológica e concorrer no segmento bioenergético.
A figura 4.3. indica que mesmo o Brasil não liderando a produção de artigos
científicos, sua proeminência não deve ser desvalorizada. Os trabalhos de Perrone et al.
169
Com exceção da China.
191
(2011) e Souza et al. (2015) corroboram com essa visão, ao indicar que a produção científica
brasileira ocupa a terceira posição em número de publicações de artigos científicos. Tal
situação torna-se relevante se considerando o desempenho em outros segmentos ou da ciência
brasileira como um todo, como apontam os trabalhos de Brito Cruz & Pacheco (2004) e Brito
Cruz (2010).
A dinâmica temporal da produção de conhecimento científico sobre etanol celulósico
tem seu início em 1950170
, a partir de um artigo sobre a separação da lignina. Entretanto, a
quantidade de artigos até a década de 1970 permanece abaixo de uma dezena por ano, só
passando a figurar na agenda de pesquisa mundial após os choques do petróleo (1973 e 1979).
Mesmo com o aumento absoluto das publicações, o seu crescimento é modesto, só
apresentando um novo salto no ano de 2006, quando as publicações finalmente alcançam as
centenas por ano, a partir daí a curva se eleva de maneira significativa, saindo de 130 artigos
em 2006 para 713 em 2016, uma elevação de quase 6 vezes o valor atingido uma década atrás
(artigos por ano).
O caso brasileiro segue a mesma tendência, apresentando crescimento expressivo em
meados da década de 2000, com a curva se acentuando a partir de 2006; neste ano o Brasil
apresentou 6 artigos publicados contra os 91 artigos publicados no ano de 2016, um número
quase 15 vezes maior que o atingido no início da década (artigos por ano). Esses dados
reforçam o caráter de novidade da temática e sua origem recente na agenda de pesquisa
nacional (última década).
Obviamente iniciativas pontuais já existiam antes de 2006, mas o crescimento do
esforço nacional na última década sugere que a criação dos programas de pesquisa e o planos
nacionais de CT&I imprimiram um novo fôlego às iniciativa já em curso. De positivo,
criaram consensos em relação aos biocombustíveis e determinaram linhas de pesquisas e/ou
chamadas específicas para o segmento, fato que ampliou a produção científica nacional ligada
ao setor sucroalcooleiro, adensando a cooperação entre as instituições nacionais e criando
conexões com instituições estrangeiras.
Uma interpretação possível é analisar conjuntamente os dados de evolução do
financiamento público para projetos de pesquisa (vide figuras 3.1 e 3.2. no capítulo 3) com os
dados de publicações de artigos científicos publicados internacionalmente (vide figura 4.3).
Esta sobreposição analítica corrobora com a identificação da evolução quantitativa e
170
Artigo publicado no Journal of the American Chemical Society, com o título “Experiments on the
fractionation of isolated wood lignins”. Os artigos da amostra iniciam-se em 1950 .
192
qualitativa dos resultados dos projetos de pesquisa na temática do etanol celulósico. É
possível identificar a elevação dos números de artigos acompanhando o número de iniciativas
de fomento, situação apenas presente nos anos 2000, gerando sinergias importantes para o SSI
da cana-de-açúcar. Os exemplos abaixo ilustram este fato:
i) Nei Pereira Junior (UFRJ) aparece como autor/coautor de 18 artigos
publicados internacionalmente (ocupando a primeira posição na amostra). E,
entre 2006 e 2012, foi coordenador de dois projetos financiados pela CNPq, na
temática do etanol celulósico, totalizando R$ 701.860, 73;
ii) Rubens Maciel Filho (Unicamp) apresenta 14 artigos e entre 2002 e 2015
apresentou como coordenador de projetos de pesquisa 10 projetos financiados
pela FINEP e CNPq, dos quais 2 eram voltados a temática do etanol celulósico,
totalizando R$750.000;
iii) Igor Polikarpov (USP) conta com 12 artigos publicados internacionalmente na
temática do etanol celulósico e entre os anos de 2004 e 2015 coordenou 7
projetos financiados pela FINEP e CNPq, no entanto, apenas 4 eram ligados ao
etanol celulósico, o que totaliza R$ 4.355.898.
Estes exemplos poderiam ser desdobrados em mais exemplos, detalhando os efeitos
das políticas públicas em relação ao desenvolvimento de conhecimento e capacidades
tecnológicas para o SSI da cana-de-açúcar, pois existe uma convergência temporal e temática
entre os projetos financiados e os artigos publicados (vide figura 3.1. e 4.3.). É por meio do
estabelecimento de políticas e instrumentos de aporte ao conhecimento científico e ao
desenvolvimento tecnológico que um país pode lograr ganhos de competências, visando dar
conta dos seus problemas específicos.
Quanto à dinâmica da tecnologia, a figura 4.2. evidencia o caráter recente e inovador
contido nos projetos de produção do etanol celulósico, pois comparando os números da
década de 1990 com os anos 2000, vê-se que o esforço sistematizado de desenvolvimento
dessa trajetória acelera-se apenas na última década. Tal situação vale igualmente para o Brasil
(vide figura 4.5.).
193
O interesse pela ciência e pela tecnologia do etanol celulósico é um fenômeno dos
anos 2000, motivado pelas oportunidades do contexto – discussões sobre as mudanças
climáticas; controle das emissões; elevação dos preços internacionais do petróleo; bem como
pela “recente” disponibilidade de novas tecnologias (GUSTAFSSON et al., 2014).
Figura 4.4. Evolução dos depósitos de patentes e os principais países/regiões de proteção das
invenções em etanol celulósico.
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.
A figura 4.4. resume a dinâmica dos esforços tecnológicos voltados ao etanol
celulósico, proporcionando contornos reais ao aumento das tecnologias no mercado. Assim,
destaca a evolução dos depósitos de famílias de patentes, as quais ganham proeminência a
partir da segunda metade dos anos 2000, atingindo o seu pico de depósitos de famílias de
patentes no ano de 2013, com 568 famílias de patentes depositadas no mundo (priority years).
De certa maneira, a realidade do desenvolvimento tecnológico segue uma tendência evolutiva
semelhante aos artigos científicos, pois no ano de 2005 apresentou o depósito de 59 famílias
de patentes e no ano de 2006 apresentou 148, quase triplicando o valor.
194
Os depósitos aumentaram significativamente, ano após ano, até se estabilizar em 2011
com 548 depósitos de famílias de patentes, estabelecendo um crescimento vegetativo até
2013. Já nos anos subsequentes, ocorre um movimento regressivo, atingindo em 2016 apenas
197 famílias de patentes depositadas (vide figura 4.4.). Tal situação mostra-se diferente da
dinâmica dos artigos científicos, os quais sempre são crescentes (vide figura 4.3.).
A dinâmica atual dos depósitos de patentes indica uma estabilização na corrida
tecnológica do etanol celulósico, dados estes que corroboram as informações e impressões
obtidas em campo (ENTREVISTA VII; CAMPO V), pois o presente momento é
caracterizado pela aprendizagem, pela adaptação e pelo melhoramento das tecnologias
recentemente colocadas em uso em escala industrial. Assim, a euforia característica do início
dos anos 2000, deu lugar a um processo de reavaliação das metas de produção, de expansão e
de novos investimentos. Portanto, compreende-se que este momento em compasso lento (de
espera) é resultado dos entraves técnicos171
encontrados nas primeiras iniciativas de produção
do etanol celulósico172
.
Este hiato é característico de momentos subsequentes à introdução de novas
tecnologias ou novos produtos, nos quais as instituições e, principalmente, as firmas
aguardam melhoramentos futuros para realizarem novos investimentos. Rosenberg (2006)
compreende que esta característica é própria da natureza descontínua da inovação tecnológica;
a incerteza não é apenas gerada pelas inovações tecnológicas em outros pontos da economia
ou por situações dos contextos, “mas pelo aperfeiçoamento ulterior da tecnologia cuja
introdução está no momento sendo considerada” (ROSENBERG, p.167, 2006).
Este fato não autoriza dizer que a dinâmica tecnológica cessou, pelo contrário,
encontra-se em um estágio de ajuste e de escalonamento, que pode e deve resultar em novos
processos de aprendizagem. De tal modo, se os novos gargalos práticos e operacionais forem
compreendidos e equacionados novos dados e demandas do cotidiano da produção devem
retroalimentar à dinâmica da pesquisa e do desenvolvimento do setor bioenergético de
segunda geração173
.
171
Os problemas com as tecnologias em uso no Brasil serão explorados com maiores detalhes no capítulo5. 172
Situação que se soma as condições de incertezas dos mercados, provocadas pela crise política brasileira e/ou
pelo efeito Trump nos EUA. 173
Rosenberg (2006) destaca que gargalos na produção podem influenciar e ditar novas agendas de pesquisa, que
inauguram novos campos do conhecimento humano, retroalimentado o desenvolvimento tecnológico. Segundo o
autor, a história da tecnologia – a máquina a vapor ou o processo de fermentação para a produção de vinhos –
percebe-se que nestes “...um conhecimento científico de grande generalidade originou-se de um problema
particular num contexto limitado.” (ROSENBERG, p. 217, 2006).
195
O decréscimo do número de depósitos indica que o avanço na fronteira tecnológica se
estabilizou, pois as expectativas iniciais de domínio tecnológico não se concretizaram e os
problemas encontrados hoje não são os problemas que estavam no planejamento inicial
(ENTREVISTA VII; ENTREVISTA VIII; ENTREVISTA X). Mesmo isso sendo uma
tautologia por definição, os principais problemas que estão ocorrendo não são em áreas mais
sensíveis à ciência (como a hidrolise enzimática ou a fermentação das pentoses), mas estão
nos equipamentos e no processo produtivo, situações tidas como superadas, uma vez que tais
processos eram utilizados na indústria de papel e celulose.
A figura 4.4. indica também a distribuição geográfica do esforço tecnológico na
trajetória do etanol celulósico, os principais locais de patenteamento são: i) os centros que se
relacionam com a produção e/ou consumo do etanol de primeira geração; ii) locais que
apresentam empresas multinacionais fortemente ligadas aos conjuntos tecnológicos que se
destinam a compor a rota tecnológica de segunda geração (biotecnologia e bens de capital
voltados a papel e celulose); iii) centros tradicionais de comercialização de novas tecnologias,
os quais normalmente aparecem nas buscas, independentemente do tipo de tecnologia que se
aborda [World Intellectual Property Organization (WO); Japão (JP); Coréia do Sul (KR) e
EUA (US)].
A análise da figura 4.4. complementada pela figura 4.5. é possível enxergar a
discrepância entre os países no que diz respeito à execução da P&D e a “simples” proteção
intelectual da invenção estrangeira. Na parte inferior da figura 4.4. apresenta-se a distribuição
dos depósitos das famílias de patentes levando em conta o país prioritário, isto é a localidade
que recebeu o primeiro depósito (priority coautry)174
e a expansão geográfica da proteção, ou
seja, novas áreas onde a mesma invenção encontra-se protegida (publication country). Com
isso, constata-se que as atividades de P&D relacionadas à tecnologia do etanol celulósico
concentram-se nos EUA (1.343), China (1.007) e no European Patent Office (173), sendo que
estas três localidades juntas representam 85,9% da “origem” das famílias de patentes do
universo amostral de 2.937 famílias de patentes.
Sem dúvida o caso chinês deve ser olhado com maior atenção, pois se trata de um país
em desenvolvimento e que tradicionalmente não se relaciona ao segmento bioenergético. É
importante tomar nota de algumas particularidades sobre as patentes depositadas
174
A localização da P&D é dada pelo número de depósitos no país prioritário, pois a literatura sugere que este
tipo de informação é uma proxy desta atividade vide OECD Patent Statistics Manual (2009).
196
prioritariamente na China: a) os maiores depositantes são as universidades e as instituições de
pesquisa chinesas; b) existe uma firma chinesa que aparece com grande protagonismo, a
China Petroleum & Chemical (Sinopec), com 113 famílias de patentes175
; quantitativamente
fica atrás apenas da Novozymes que apresenta 165 famílias de patentes. Mas é digno de nota
que destas 113 famílias de patentes da Sinopec apenas duas estão protegidas fora da China,
uma no escritório norte americano e uma no World Intellectual Property Organization – este
fato se repete com outros atores chineses, indicando que estas invenções são novidades apenas
para China, ou são de “baixa” qualidade ou específicas para a realidade chinesa.
Tanto os EUA como a Europa são tradicionais áreas de desenvolvimento tecnológico,
assim, é de se esperar protagonismo destes país/região. Além disso muitas das multinacionais
que passaram a atuar no segmento bioenergético nos anos 2000 têm sua origem ou localizam
os seus centros de P&D nos EUA ou em países europeus176
, como a Novozymes, DSM, e
Dupont exemplificam essa concentração.
Com exceção óbvia da China, os países em desenvolvimento e subdesenvolvidos
apresentam pouca expressividade como localidades de P&D no segmento de etanol
celulósico, mas, já no que se refere à expansão da proteção intelectual das invenções, a
situação se altera, ficando nítida na análise das figuras 4.4 e 4.5.. Estes países são
compreendidos como áreas de interesse, nas quais as multinacionais desejam explorar a
tecnologia comercialmente, tornando-se mercados futuros para as novas tecnologias.
O caso brasileiro encaixa-se perfeitamente nessa dinâmica. O país apresenta 47
depósitos prioritários de famílias de patentes, contra 517 depósitos não prioritários, os quais
em tese têm origem em outras localidades (tecnologia estrangeira). Isso equivale a dizer que
apenas 1,6% das famílias de patentes da amostra foram depositadas prioritariamente no
Brasil, ou seja, menos de 2% de todo o esforço tecnológico sistematizado (P&D) em etanol
celulósico no mundo foi feito no Brasil; o mesmo não ocorre com as publicações científicas,
em que o Brasil responde por 7% da produção de conhecimento sistematizado177
.
Tal situação não ocorre apenas no Brasil; Índia, México e Canadá apresentaram este
mesmo comportamento (vide figura 4.4.). A princípio, era de se esperar que o Brasil, sendo o
segundo maior produtor de etanol do mundo e com mais de 40 anos de experiência na
175
Certamente essa dinâmica merece maior reflexão, a qual foge do escopo dessa pesquisa. 176
No capítulo 2 e no subtópico 4.3 desse capítulo apresentam-se dados e informações sobre a participação
destes novos atores. 177
Em Perrone et al. (2011) o Brasil é responsável por 10% das publicações.
197
produção de biocombustíveis, revelasse um desempenho mais significativo na atividade
inovativa. Estes dados traduzem parte do atraso tecnológico e do baixo protagonismo
brasileiro no cenário mundial.
Analisando as figuras 4.4. e 4.5. percebe-se que o Brasil comporta-se muito mais
como mercado para as novas tecnologias do etanol celulósico do que lócus de
desenvolvimento tecnológico. O país é uma das principais localidades de interesse em
proteger a tecnologia de segunda geração, sendo o 3ª no ranking de patenteamento
(publication country), atrás apenas dos EUA e da China (os maiores desenvolvedores). Esta
posição secundária na dinâmica de desenvolvimento é uma constante na análise do
desempenho do Sistema Nacional de Inovação brasileiro, que nesse caso em particular
descende resumidamente de dois fatores:
a) O SNI brasileiro, bem como, dos países periféricos sofrem com as Falhas
Sistêmicas (KATZ, 1993; LALL & TEUBAL, 1998; CHAMINADE et al., 2009), isso
decorre da carência de organização entre os atores (firmas-ICTs-Universidades); da
ausência de setores dinâmicos ou de pesquisa em rotas tecnológicas inovadoras
(deficiência de competências); baixa interatividade entre os atores e entre o plano
nacional e o internacional e; ausência de atores, situação comum em áreas específicas
e/ou que são intensivas em conhecimento, por exemplo, o Brasil não apresenta um
conjunto de firmas no segmento de biotecnologia – fato já pontuado no capítulo 3, por
meio da dificuldade de encontrar firmas nacionais para desenvolver projetos de
inovação no PAISS Industrial (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X) – situação que
atrapalha a interiorização do desenvolvimento tecnológico na rota do etanol celulósico;
b) Ademais, as competências acumuladas ao longo dos últimos quarenta anos
concentram-se em uma rota tecnologia distinta do etanol celulósico (vide figuras 4.1. e
4.2.). Toda a produção de etanol no Brasil é feita por meio do processo de extração do
caldo da cana-de-açúcar (beneficiamento da sacarose), padrão secular de produção do
açúcar e de seus derivados. O E2G está assentado em uma rota tecnológica
completamente diferente, beneficiamento da glicose e da xilose, açúcares que só podem
ser acessados por meio do desmonte da estrutura celular que evoluiu ao longo de
centenas de milhares de ano justamente para protegê-las.
198
Figura 4.5. Evolução dos depósitos de famílias de patentes no Brasil e a origem do P&D das
invenções protegidas no Brasil.
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbiti, 2017.
A figura 4.5. expõe nominalmente a origem da P&D das tecnologias salvaguardadas
pelo INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial); dentre estas, os EUA concentram
grande parte desta atividade, com 73,9% da origem da P&D. Vale destacar que muitas das
patentes presentes no Brasil vêm por meio do Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes
(PCT), um acordo multilateral que permite requerer a proteção patentária de uma invenção
simultaneamente, em um grande número de países, por intermédio do depósito de um único
pedido internacional de patente; esta forma de proteção representa 90% do total de famílias de
patentes depositadas no Brasil. Assim, abrangendo boa parte das patentes depositadas
prioritariamente nos EUA e nos países europeus.
Analisando a figura 4.5. percebe-se que a dinâmica evolutiva dos depósitos no Brasil
acompanham a tendência geral, se intensificando a partir da segunda metade dos anos 2000,
movimento que ocorre em parte pela forte presença de famílias de patentes via PCT. Por outro
lado, em uma escala mais modesta, têm-se o aumento (proporcional) de depósitos de famílias
de patentes prioritárias no Brasil, as quais se ligam não apenas ao contexto, mas, também ao
estabelecimento das novas políticas públicas pró setor sucroenergético. Tal afirmação não é só
baseada na coincidência temporal do depósito e da execução das políticas, visto que as
199
detentoras das patentes são as mesmas instituições e firmas que foram alvos dessas ações
institucionais.
Como exemplos dessa sinergia, destacam-se os casos da Biocelere Agroindustrial e da
Braskem, as quais foram contempladas em mais de um tipo de iniciativa, recebendo recursos
tanto da FINEP e como da FAPESP/PITE/PIPE e, hoje contam, respectivamente, com 4 e 3
famílias de patentes em etanol celulósico.
Os novos investimentos em tecnologias no setor sucroalcooleiro, principalmente no
que tange a realidade do etanol 2G, tiveram como prelúdio as ações desencadeadas pelas
políticas públicas, tais como o Plano Nacional de Agroenergia; os Programas de Pesquisa da
FAPESP ou PAISS Industrial, sendo verdadeiros enforcement na construção de janelas de
oportunidades para os atores brasileiros, direcionando o desenvolvimento de uma nova
trajetória tecnológica para produção do etanol, bem como ações em bioquímicos a partir da
biomassa de cana-de-açúcar.
Desta forma, o entorno da produção do etanol vêm se transformando, assim como se
transforma a sua base de conhecimento, os agentes envolvidos no processo de
desenvolvimento e introdução da tecnologia, as redes de relacionamentos entre as instituições
e/ou as firmas e, principalmente, o arcabouço institucional setorial, conforme visto nos
capítulos 2 e 3 (coevolução do SSI), em que a temática da inovação e o adensamento do
conhecimento científico passaram a fazer parte da realidade do setor.
Esse cenário sugere, conforme a abordagem desenvolvida por Malerba (2002; 2003),
que as fronteiras do SSI da cana-de-açúcar estão em processo de evolução. Todos os dados e
informações organizados por essa pesquisa buscam demonstrar essa dinâmica, mas em
particular, o presente capítulo oferece contornos reais à nova base de conhecimento e aos
atores que detém competência técnicas e científicas nessa nova trajetória.
4.3. OS PRINCIPAIS ATORES DO ETANOL CELULÓSICO: FIRMAS E
INSTITUIÇÕES DE ENSINO E PESQUISA
Nesta seção identificam-se quais são os atores mais relevantes no desenvolvimento da
tecnologia do etanol celulósico, tomando como base os depósitos de famílias de patentes e as
publicações de artigos científicos internacionais. Com isso, apresentam-se os atores sociais
responsáveis pela estruturação da nova rota(s) tecnológica(s), tanto na escala global como no
200
território nacional, diferenciando as origens e as diferentes nacionalidades destas firmas e
instituições.
É importante notar que este mapeamento de atores complementa e finaliza a
identificação dos novos atores do SSI da cana-de-açúcar iniciada no capítulo 2 (subtópico
2.2.). O segmento da bioenergia aparece com pouca expressão na amostra de atores detentores
de famílias de patentes, os destaques são oriundos de outras indústrias como: petróleo;
química; biotecnologia e pequenas empresas de base tecnológica (start up). A figura
4.6.expõe os principais atores e dá uma noção da relevância de cada ator na corrida
tecnológica do etanol celulósico.
Figura 4.6. Os principais assigners em etanol celulósico, no mundo e no Brasil.
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.
A figura 4.6. permite identificar quais são os principais detentores de competências
tecnológicas no universo do etanol celulósico, os quais podem ser organizadas segundo a
indústria/segmento de origem, levando em consideração os 100 primeiros assigners e os
assigners de patentes depositadas prioritariamente no Brasil, a saber:
i) Bioenergia: há um conjunto “pequeno” de firmas ligadas diretamente ao processamento
da biomassa, ou seja, agroindústrias que beneficiam cana-de-açúcar ou milho com a
intenção de obter etanol. No plano mundial têm-se a POET (EUA); a Greenfield
201
(Canadá) e a Abengoa (Espanha); no Brasil foi encontrado a Odebrecht Agroindustrial e
a Bioenergia do Brasil (a antiga Central de Álcool Lucélia). Outro destaque é a Raízen,
mesmo não apresentando depósitos de patentes, figura como um ator relevante no nível
nacional/internacional, pois apresenta projeto em escala industrial de etanol 2G em
andamento, e ainda é detentora de 50% da Iogen Energy, empresa canadense que
apresenta competência em etanol celulósico (24 famílias de patentes).
ii) Tradings de commodities: a China National Cereals, Oils and Foodstuffs Corporation
(COFCO) foi a única empresa ligada à comercialização de commodities encontrada na
busca de famílias de patentes – levando em conta apenas os 100 maiores assigners.
iii) Sementeras: aparecem duas firmas ligadas ao universo tecnológico do etanol
celulósico, a Syngenta (China) e a Ceres (EUA), com desenvolvimento visando
modificação genética das plantas (milho e sorgo).
iv) Petróleo: firmas oriundas da indústria do petróleo têm figurado como atores de grande
relevância na amostra, com destaque para grandes corporações de atuação global como
a Companhia Petroquímica da China (Sinopec); BP (Reino Unido); Shell (anglo-
holandesa); SK Energy (Coréia do Sul); Neste Oil (Finlândia); Exxon Mobil (EUA) e
Petrobras (Brasil).
v) Químico: a indústria química aparece com grande importância na amostra e no contexto
de aproveitamento dos materiais lignocelulósicos, com destaque para Du pont (EUA);
Veritchem (Canada); Phillips 66 (EUA) e Arkema (França); já no nível de Brasil,
sobressai a Braskem (Brasil).
vi) Biotecnologia: é o segmento industrial com maior destaque na amostra de 2.937
famílias de patentes, apresentando dois “tipos” de firmas: i) Firmas multinacionais e
multi-produtos, como a Novozymes (Dinamarca); a DSM (Holanda) e a Lallemand
(Canada) e; ii) Pequenas firmas de base tecnológica e/ou start up (fortemente ligadas
a universidade), como a Xyleco (EUA); Iogen (Canadá); Inbicon (Dinamarca); Qteros
(EUA); Edniq (EUA); Wisconsin Alumni Research (EUA); Coolplanet (EUA);
TerraVia (EUA); Furanix Technologies (Holanda); Deinove (França); Codexis (EUA);
Joule Unlimited (EUA). Todas estas estão entre os 100 principais assigners no nível
mundial, já no plano nacional destaca-se a Biocelere Agroindustrial (Brasil).
202
vii) Órgãos governamentais / Institutos ou empresas de pesquisa: os principais
representantes desse grupo são a US Department of Agriculture (EUA); IFP Energies
Novelles (França); Purdue Research Foudation (Indiana/EUA); Ut-Battelle (EUA);
Centre National de La Recherche Scientifique (França); Georgia Tech Reserch (EUA).
Na escala Brasil, o Centro de Tecnologia Canavieira – CTC (Brasil) e o Laboratório
Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol – CTBE (Brasil) se destacam.
viii) Universidades: Na amostra existe um grande número de universidades, muitas
figurando como os principais assingners do universo tecnológico mapeado: os
destaques ficam com a TianJin University (China); University of California (EUA);
Chinese Academy Science (China); Michigan State University (EUA); University of
Illinois (EUA); e tantas outras. As universidades chinesas, norte americanas e sul
coreanas aparecem com grande destaque entre os assigners sendo desnecessário nomear
cada uma delas. No plano nacional, as universidades que se destacam são: Universidade
Estadual de Campinas (4); Universidade Federal de Brasília (2); Universidade Federal
do Rio de Janeiro (2); Universidade de São Paulo (1); Universidade Estadual Paulista
(1); Universidade Federal de São Carlos (1); Universidade Federal de Santa Catarina (1)
e Universidade Federal do Espírito Santo (1).
O levantamento dos principais assigners (vide figura 4.6.) sugere que o
estabelecimento do etanol celulósico depende da articulação (ou da apropriação) entre os
atores tradicionais no processamento da biomassa com os “novos” atores, os quais estão
inseridos em bases de conhecimentos e tecnológicas distintas da produção do E1G e é
justamente esse movimento que propicia a mudança setorial (MALERBA & ORSENIGO,
1999; MALERBA, 2002; MALERBA, 2007). A interação ou a entrada destes novos atores no
SSI da cana-de-açúcar pode/deve ampliar a fronteira do setor, visto que novos conhecimentos,
novos processos de produção e novos produtos são somados a base já estabelecida, gerando
novas maneiras de interações entre os atores e, principalmente, alterando o cotidiano da
produção.
Sabe-se que o conhecimento define os limites das firmas e das indústrias (PAVITT,
1984; METCALFE, 1995; NELSON & WINTER, 2005), principalmente porque o
conhecimento difere em termos de fontes (fornecedores, universidades, usuários, etc.); de seus
203
domínios (campos científicos e tecnológicos específicos à base de atividades inovadoras) e
das suas aplicações no mundo da produção (ADAMS et al. 2011).
O conhecimento pode ser mais ou menos cumulativo (o grau em que a geração de
novos conhecimentos se baseia no conhecimento atual) e pode ter diferentes graus de
acessibilidade (oportunidades de conhecimento que são internos/externos às empresas ou
internos/externo ao setor) (ADAMS et al. 2011). Estes elementos somados ao quadro
expostos pelas figuras 4.3., 4.4. e 4.6. deixam claro que a inserção da tecnologia de etanol
celulósico promove mudanças significativas no SSI da cana-de-açúcar, porque as firmas
nacionais não figuram como as maiores detentoras de tecnologias nesse segmento e por outro
lado, os maiores assigners são de outras indústrias. Assim, o conhecimento útil para
consolidar e estabelecer um standard tecnológico em etanol celulósico está externo as firmas
e externo a indústria processadora de cana-de-açúcar.
Ao buscar acessar os conhecimentos e as tecnologias necessárias ao E2G realiza-se a
expansão das fronteiras setoriais - o prelúdio da mudança setorial (MALERBA, 2002). Estes
efeitos são perceptíveis no esforço da introdução da nova tecnologia (E2G), a qual além de
fazer avançar o processo de aprendizagem na nova rota tecnológica geram efeitos nos
processos já estabelecidos, por exemplo: a Raízen ao cooperar com outros atores (Iogen,
Novozymes) para o desenvolvimento do etanol celulósico, “apreende” novas maneiras de
manejar e acompanhar o processo de fermentação de primeira geração178
, resultando em
ganhos de produtividade por meio da redução de custos com leveduras179
.
Portanto, este novo contexto apresenta um quadro de agentes muito mais complexo e
envolvendo empresas multinacionais de várias áreas do conhecimento, com destaque para as
biotecnológicas, mas também pequenas empresas de base tecnológica com competências nas
áreas da química orgânica, nanotecnologia, genética, software, entre outras. Também estão
envolvidas nessa realidade, de forma mais intensiva, as universidades e seus Núcleos de
Inovação Tecnológica (NIT). Há ainda a presença de órgãos públicos (internacionais,
178
Outros exemplos serão dados no capítulo 5. 179
Isso dá base para ver que o DUI-mode não desaparece, pelo contrário, este se reforça a medida que as firmas
produtoras de etanol celulósico incorporam novas tecnologias, mas elevam esse processos de aprendizagem em
outro nível (conhecimentos ligados a biotecnologia), pois continuam apreendendo pelo uso e pela produção, mas
suas ações não se limitam a isso, é necessário paralelamente estabelecer e realizar outras ações, por exemplo,
testes em laboratórios; interação com a universidade; busca de conhecimento formal (caracterização da
composição da biomassa); entre outros (ENTREVISTAS VIII; ENTREVISTA IV).
204
nacionais e estaduais) cujo foco é o desenvolvimento tecnológico (JOÃO et al., 2011; LIMA
et al., 2013).
No que se refere à produção de conhecimento científico tem-se uma dinâmica
interessante (publicações de artigos). Mesmo as universidades e as organizações públicas
norte americanas, chinesas e da União Europeia figurando como os principais “nós” das redes
de pesquisa internacionais, as instituições brasileiras rivalizam numericamente com os
principais atores internacionais (vide figura 4.7). Destacam-se no continente europeu a Lunds
Universitet (Suécia) com 175 artigos; a Chalmers University of Technology (Suécia) com 79;
Danmarks Tekniske Universitet (Dinamarca) com 124 artigos. Estes dados indicam forte
relação entre a produção acadêmica e a base produtiva, pois os países nórdicos apresentam
grandes firmas processadoras de biomassa (papel e celulose e bioenergia).
Nos EUA os destaques são o National Renewable Energy Laboratory (143); USDA
Agricultural Research Service (131); a United States Department of Agriculture (118); a
Michigan State University (92); University of Florida (80); Iowa State University (69). No
continente asiático, a China apresenta a Chinese Academy of Sciences (135); Ministry of
Education China (92); South China University of Technology (87); Beijing Forestry
University (73). Ainda aparecem com destaque o Japão com a Kyoto University (53) e a
Coréia do Sul com a Korea University (57).
Na escala nacional a figura 4.7. indica quais instituições aparecem como lócus do
conhecimento sistematizado do etanol celulósico. O destaque está na Universidade de São
Pulo (144); Universidade Estadual de Campinas (81); o Laboratório Nacional de Ciência e
Tecnologia do Bioetanol (67); a Universidade Federal do Rio de Janeiro (41) e a Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (32). Na amostra ainda aparecem atores que não
são universidades e também contribuem para o avanço do conhecimento na rota tecnológica
do etanol celulósico, estes são: a Embrapa (28); a Petrobras (13); o CTC (9); o IAC (4) e
outros menos expressivos.
Vale o destaque ao CTBE, instituição pública de pesquisa criada em 2010, por meio
do Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI), o qual figura
como a terceira instituição em produção de conhecimento científico ligado ao etanol
celulósico. Sua criação é mais um efeito positivo e sinérgico das ações promovidas pelo
arcabouço institucional a partir dos anos 2000. Um elemento que marca uma nova maneira de
205
desenhar a política de inovação do setor, a criação de instituição capaz de articular atores e
também de conduzir pesquisas ligadas à temática produtiva (vide figura 4.7.).
A figura 4.7. apresenta as principais temáticas de pesquisa dos atores brasileiros. A
produção do etanol e a caracterização da biomassa são as grandes preocupações da pesquisa
nacional. Temas como a hidrólise e a fermentação da C6 também figuram entre os temas de
destaque da agenda de pesquisa do Brasil (ocupando os primeiros lugares). Por outro lado,
conceitos ligados ao pré-tratamento e à fermentação da xilose (C5) ocupam posição
secundária na produção científica nacional, situação que demanda atenção do SSI, pois é
justamente nessas etapas do processo industrial que as firmas pioneiras estão enfrentando
problemas. É importante redirecionar os esforços de pesquisa, atendendo às necessidades
atuais do mundo da produção. Isso não significa que não há produção nessas áreas, mas os
conceitos que se ligam diretamente a estas temáticas aparecem com menos destaque (após os
15 primeiros).
206
Figura 4.7. As principais instituições em publicações vinculadas ao Brasil e os principais conceitos abordados nas publicações.
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Scopus, 2017.
207
4.3.1. Competências tecnológicas no Brasil e dos atores nacionais: um olhar sobre os
Clusters tecnológicos em formação (etanol celulósico)
Esta subseção mostra a tradução do domínio tecnológico do etanol celulósico em
grupos de tecnologias específicas, as quais visam prover respostas particulares a uma miríade
de problemas e potenciais dessa nova trajetória(s) tecnológica(s). As tecnologias são
agrupadas por semelhanças180
, constituindo clusters tecnológicos, os quais se voltam a
momentos particulares do processo produtivo do biocombustível. Alguns destes clusters
dedicam-se a questões ligadas ao pré-tratamento da biomassa, outros à fermentação e, ainda,
há cluster destinados à própria engenharia genética dos micro-organismos ou das plantas.
Estas tecnologias, além de serem voltadas a estágios distintos da produção do etanol,
relacionam-se com os variados tipos de feedstocks. Esta redistribuição e materialização dos
conhecimentos/saberes estão expostas nas figuras 4.8.
O cenário do etanol celulósico é múltiplo, com opções variadas para cada estágio da
produção, portanto, as figuras 4.8. e o apêndice1. apresentam um retrato atual da paisagem
tecnológica oriunda dos esforços sistematizados na temática do etanol de segunda geração.
Igualmente, oferecem uma noção das competências já estabelecidas e das convergências
atingidas pelo segmento de processamento do material lignocelulósico.
Portanto, os dados expostos nessa subseção complementam os tópicos trabalhados
anteriormente, uma vez que, demonstram em quais processos, técnicas ou produtos
específicos às bases do conhecimento e da tecnologia “deságuam”, ou seja, mostram quais são
os consensos gerais em relação à tecnologia do etanol celulósico e quais são atores
proeminentes por tecnologia, dando uma noção das competências tecnológicas das firmas e
instituições.
A figura 4.8. foca nas tecnologias protegidas exclusivamente no Brasil, oferecendo um
olhar mais particularizado da realidade nacional, portanto, o landscape by technology foi
gerado com 564 famílias de patentes que podem ser hoje exploradas em território nacional,
dando uma noção das competências tecnológicas que podem ser apropriadas pelo SSI da
cana-de-açúcar, bem como, apresenta uma análise do ambiente tecnológico do Brasil181
.
180
As figuras 4.8 e o apêndice 1 foram geradas pela plataforma Questel Orbit. 181
Aborda-se especificamente as famílias de patentes depositadas no Brasil para poder dar conta dos objetivos da
tese, entretanto, o apêndice 1 dedica-se ao setor como um todo, olhando o geral, pois a landscape by technology
foi gerada com todas as famílias de patentes da amostra (2.937). Estes dados merecem ser analisados com maior
atenção, pois se configuram como informações importantes para compreensão da dinâmica tecnológica do E2G,
tal esforço investigativo deve ser feito em trabalhos futuros.
208
A figura 4.8. e o apêndice 1 são “mapas” tecnológicos, ou seja, representações das
tendências e uma síntese do processo evolutivo pelo qual passou o conjunto de tecnologias do
universo do etanol celulósico182
. Estas devem ser lidas como “mapas tridimensionais”, onde
suas topografias são formadas por meio das palavra/conceitos presentes nos pedidos de
proteção intelectual das invenções. Estas são agrupadas por similaridade, isto é, a plataforma
Questel Orbit realiza automatizadamente uma análise lexicográfica dos termos tecnológicos
presentes nos documentos integrantes da amostra.
A leitura do “mapa tecnológico” deve ser feita de maneira similar a leitura de mapas
geomorfológicos183
. De tal modo, os “vales” são resultados de termos/conceitos tecnológicos
menos frequentes (representados pelo azul claro) e os “picos” congregam os termos/conceitos
mais frequentes (representados pela variação do verde e por cores quentes, tais como marrom
e vermelho). Os pontos referem-se ás patentes, cada ponto é uma família de patente, as cores
dos pontos são apenas para facilitar a leitura.
A figura 4.8. representa o mapa tecnológico do Brasil, indicando quais competências
estão mais “disponíveis” no território nacional. Com a leitura da figura 4.8. percebe-se a
existência de 8 clusters tecnológicos. Outro detalhe é que não existe uma convergência muito
significativa no interior dos clusters, com exceção do cluster C. Deste modo, o mapa
tecnológico brasileiro é caracterizado pelas “planícies”, áreas menos elevadas, indicando uma
grande variedade de tecnologias semelhantes e um esforço ainda exploratório, sugerindo a
existência de janelas de oportunidades.
182
Exercício semelhante foi feito por Dal poz & Silveira (2015). 183
São utilizados para representar as características do relevo de uma região/área.
209
Figura 4.8. Principais conjuntos tecnológicos do etanol celulósico - Landscape by technology clusters – Brasil (564 famílias de patentes).
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.
210
O cluster A é formado por 99 famílias de patentes, agrupando tecnologias voltadas aos
processos de pré-tratamento da biomassa propriamente dito ou da hidrólise, nesse segundo
caso, as tecnologias visam melhorar as condições para ação dos coquetéis enzimáticos. Assim,
a maior parte das patentes tratam de equipamentos ou métodos novos ou otimizados que
objetivam melhorar a fração do material lignocelulósico ou a remoção de compostos
inibidores, gerando um composto lignocelulósico de melhor qualidade para as etapas
seguintes (hidrólise e fermentação).
Os atores que mais se destacam no cluster A são: o IFP Energies Nouvelles (França)
com 11 famílias de patentes; a Inbicon (Dinamarca) com 8; a Du Pont (EUA) com 4 e a
Greenfield Ethanol (Canadá) com 4 famílias de patentes. No plano nacional as firmas que
demonstram desenvolvimento endógeno de competências tecnológicas nessa fase do processo
produtivo são: a Brazilian Expertise Research Group (BRAERG); o CTC e a Braskem todas
com uma família de patente cada. Neste cluster ainda se encontra a Universidade Estadual de
Campinas, com uma família de patente.
Vale ressaltar que as empresas parceiras da GranBio e da Raízen também estão
presentes nesse cluster, respectivamente, a Beta Renewable (Itália) e Andritz (Áustria) com
uma família de patente cada e a Iogen (Canadá) com 2 famílias de patentes.
O cluster B é formado por 90 famílias de patentes, tendo como escopo a engenharia
genética e a transgenia dos microrganismos para ampliar e maximizar os processos de
hidrólise enzimática e o processo de fermentação – com especial atenção a fermentação da C
5 (xilose). Os principais atores nesse cluster são: a DSM (Holanda com 6 famílias de
patentes; a Deinova (França) com 4; a BP (Reino Unido) 4; a Codexis (EUA) e a Du Pont
(EUA) com 3 família de patentes cada. No que tange os atores brasileiros aparece com
relevância a Biocelere Agroindustrial com 2 famílias de patentes e a Embrapa com 1 família
de patente, este segundo caso é interessante, pois a patente foi desenvolvida em parceria com
a Universidade Federal de Brasília e com a Universidade Católica de Brasília.
Sobre o desenvolvimento da Biocelere pode-se dizer que a tecnologia é baseada na
modificação genética de microrganismos visando possibilitar o consumo eficiente da xilose,
portanto, é uma biotecnologia para a produção de etanol celulósico por meio da fermentação
da C5.
211
O cluster C é constituído por 66 famílias de patentes, apresentando apenas 2
assigners, são estes: Novozymes (Dinamarca) com 62 famílias de patentes e a Du Pont (EUA)
com 4 famílias de patentes. As invenções deste grupo estão inseridas na produção, seleção e
melhoria das enzimas visando a criação de compostos enzimáticos. Com isso, atuam na fase
da hidrólise enzimática.
O cluster D é composto por 28 famílias de patentes. Mesmo sendo organizado por
semelhança dos conceitos tecnológicos, resultou em um pequeno grupo não coeso de
tecnologias, ou seja, apresenta tecnologias tanto da rota bioquímica como da termoquímica. O
que fica claro é que as tecnologias deste grupo estão focadas na conversão da biomassa e, o
ponto de união entre elas é que são “propostas completas” de processos produtivos. Figuram
neste grupo as seguintes firmas: POET (EUA); Iogen (Canáda); Xyleco (EUA); Neste Oil
(Finlândia); Inbicon (Dinamarca). O Brasil apresenta apenas a Petrobras neste cluster, com
um método para produzir açúcares fermentáveis de alta concentração a partir de material
lignocelulósico.
O cluster E é formado a partir de 92 famílias de patentes, dedicando-se principalmente
ao processo de fermentação da C6 (glicose). Para tal, apresentam-se tecnologias focadas no
método de produção (equipamentos ou melhoramentos no processo) e, também,
biotecnologias que atuam principalmente na seleção ou melhoramento genético das enzimas e
de outros micro-organismos visando à inativação da celulase184
. Os principais assigners deste
cluster são: Dupont (EUA) com 9 famílias de patentes; Iogen (Canáda) 9 famílias de patentes;
a POET (EUA) com 6; Xyleco (EUA) 4; a BP (Reino Unido) 3 famílias de patentes. No caso
brasileiro tem-se a Petrobras com 3 famílias de patentes; o CTC com uma família de patente e
a Universidade Federal do Rio e Janeiro com 2 famílias de patentes .
O cluster F estrutura-se a partir de 28 famílias de patentes. O grupo esta inserido na
química verde, principalmente, na produção de subprodutos da biomassa que não o etanol,
tais como: a glicerina purificada; o biodiesel, lubrificantes; plastificantes, solventes e outros
bioprodutos. Assim, as tecnologias envolvem métodos e processo de produção destes novos
produtos. Os principais atores desse cluster são a Novozymes (Dinamarca) com 3 famílias de
patentes; a University of California (EUA) com 3 famílias patentes; a Battelle Memorial
Institute ( EUA) com 2 patentes, a POET (EUA) com 2 e a Solenis Technologies Cayman
184
Esta “melhoria” é fundamental para o processo de hidrólise, que visa desmontar as cadeias de polissacarídeos
sem consumir os açúcares resultantes desse processo (atingir o grau ótimo da digestibilidade da parede celular).
212
(EUA) com 2 famílias de patentes. As empresas nacionais que demonstraram alguma
iniciativa nessa direção foi a Fibria e Brasil Biofuel, ambas com uma família de patente cada.
O cluster G é formado por 73 famílias de patentes e, as tecnologias que lhe dão
contornos se inserem no campo da alcoolquímica. O conjunto não é coeso no que diz respeito
aos produtos gerados pelos métodos e processos produtivos deste cluster, pois as tecnologias
dão origem a produtos distintos, tais como o etileno, isopropanol, etanol e outros bioprodutos.
A diferença deste cluster para o cluster F está no fato de abordar conjuntamente com outros
produtos o etanol e, ainda, boa parte das tecnologias aqui fazem uso da engenharia genética
para adaptar ou melhorar a ação dos microrganismos, ao passo, que o grupo tecnológico
anterior se limitava aos processos industriais “já estabelecidos”, ou seja, não pautavam-se em
novos micro-organismos.
Os assigners mais significantes nesse campo são: a Terravia (EUA) com 6 famílias de
patentes; University of California (EUA) com 4 famílias de patente; a BP (Reino unido) com
3 famílias de patentes; a Lallemand (Canadá) com 3 famílias de patentes e a Colorado State
University (EUA) com 2 famílias de patentes. Na escala nacional tem-se a Braskem e a
Suzano, ambas aparecem com apenas uma família de patente. É interessante notar que a
tecnologia desenvolvida pela Braskem além de ser fruto do seu esforço inovativo é uma
trajetória financiada pelo Estado brasileiro, no levantamento de políticas públicas pró-etanol,
no capítulo 3, foi possível perceber que esta área na firma recebeu aportes da FAPESP e da
Finep ao longo dos anos 2000.
O cluster H é composto por 73 famílias de patentes, as quais se destinam aos
processos de pré-tratamento e preparação do composto lignocelulósico. Uma das
características mais relevantes desse grupo de tecnologia é o fato de estar presente o conceito
de biorrefinaria. Nesta mesma direção, percebe-se que as tecnologias agrupadas neste cluster
exibem também a noção de integração de processos, como pré-tratamento-hidrólise-
fermentação ou as fermentações da C6 e da C5 de maneira combinada. A maioria das
tecnologias tem por objetivo realizar o tratamento e a fragmentação da biomassa; a filtragem e
a separação dos sólidos; a redução da viscosidade do composto que será hidrolisado e o
estabelecimento de processos de hidrólise contínua.
Os atores que mais se sobressaem nesse grupo de tecnologias são: a IPI Intellectual
Property (EUA) com 17 famílias de patentes; a Shell (Anglo-holandesa) com 5 famílias de
patentes; a Iogen (Canadá) com 4 famílias de patentes; a BP (Reino Unido) com 3 famílias de
213
patentes; a DuPont (EUA) com 2 famílias de patentes. A única empresa brasileira encontrada
no levantamento foi a Villares com um processo industrial para obtenção de etanol de
materiais celulósicos por meio da hidrólise ácida contínua.
Para sumarizar a descrição das competências nacionais no universo tecnológico do
etanol celulósico apresenta-se a figura 4.9., a qual complementa o que foi visto na landscape
by technology do Brasil. A Figura 4.9 indica os principais conceitos/temas das tecnologias
prioritariamente depositadas no Brasil, ou seja, mais particularizada das 47 famílias de
patentes depositas primeiramente no Brasil (uma proxy da P&D local). Assim, percebe-se de
maneira mais clara quais foram as ações técnicas e tecnológicas perseguida pelos atores do
SSI da cana-de-açúcar ao longo da última década.
As competências nacionais, bem como os esforços de desenvolvimento dos atores do
SSI da cana-de-açúcar estão assentadas nas seguintes áreas:
i) Hidrólise enzimática – o conceito é autoexplicativo, entretanto, as tecnologias aqui
apresentam processos e sistemas para a produção integrada de E1G e E2G como a
tecnologia desenvolvida pelo CTC, ou processos de fermentação integrados a produção de
E2G a partir das pentoses, um exemplo é a tecnologia proposta pela UNICAMP.
ii) Bioquímicos caracterizados – tecnologias que se baseiam nos processos químicos que
ocorrem dentro ou relacionados aos organismos vivos, assim, ao controlar ou potencializar
estes processos aperfeiçoa-se a hidrólise, a fermentação ou dá origem a building block
verdes que podem ser a base de outros produtos. Um exemplo é a tecnologia desenvolvida
pela Biocelere, ao controlar características de células eucarióticas possibilita produzir
diversos bioprodutos.
iii) Saccharomyces cerevisiae – reúne as tecnologias atreladas a esse micro-organismo,
uma levedura altamente difundida na produção de E1G. Assim, as tecnologias visão
melhorar o processo de fermentação, sobretudo, por meio da melhoria das leveduras ou pela
inserção de novos códigos genéticos na própria Saccharomyces cerevisiae.
iv) Demanda energética das plantas – as tecnologias aqui não estão relacionadas ao
manejo no campo e, sim, com o tratamento da biomassa que será hidrolisada, as tecnologias
versão sobre o pré-tratamento da biomassa.
v) Fermentação – o conceito também é autoexplicativo, mas as tecnologia ligadas a esse
termo visão aperfeiçoar o processo já conhecido na primeira geração ou integra-lo a
realidade dos novos processo de etanol 2G. Igualmente, as invenções objetivam o processo
214
fermentativo da biomassa liginocelulósica; nova/adaptada composição enzimática a partir de
micro-organismos selecionados (Trichoderma Reesei ou Aspergillus Awamori); processo
para desmulsificação e esterificação de ácidos e seus derivados; entre outras técnicas.
Figura 4.9. Conceitos tecnológicos das invenções brasileiras (depósitos prioritários - 47
famílias de patentes).
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.
215
4.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 4
O presente capítulo expôs a dinâmica e as principais características do conhecimento e
da tecnologia que sustentam o universo do etanol celulósico. Identificou os principais atores
envolvidos no processo de desenvolvimento da rota(s) tecnológica(s), tanto no plano
internacional como no nacional, nomeando as firmas e as instituições responsáveis pelos
avanços alcançados na última década. De maneira correlacionada, posicionou os
países/regiões segundo seus desempenhos nas atividades de patenteamento e publicações de
artigos científicos.
É fato que o desenvolvimento do etanol de segunda geração carrega muitas incertezas,
não havendo tecnologias estabelecidas ou trajetória(s) dominante(s). Entretanto, por meio dos
dados de patentes e de artigos científicos observa-se uma convergência na rota enzimática.
O problema é que a rota enzimática carrega no seu interior diversas configurações
industriais e “biotecnológicas”, as quais variam entre a separação das “etapas” de conversão
da biomassa até a junção de todas elas de uma só vez (pré-tratamento, hidrólise, fermentação).
Acrescenta-se que estas opções podem ainda carregar variações nos equipamentos; na
“natureza” dos micro-organismos; e nos métodos e nos processo correlacionados a cada
“momento” do processamento da biomassa185
.
Outro destaque sobre a dinâmica tecnológica é observar que o ritmo de patenteamento
desacelerou nos últimos anos (a partir de 2011). Esta situação pode marcar um estágio
estacionário do ciclo de desenvolvimento do E2G, novos esforços investigativos devem ser
realizados para comprovar esse fato. Mas o que se sabe, é que a euforia pelo etanol celulósico
diminuiu (vide figura 4.4.). Os problemas advindos das primeiras plantas em escala
comercial, o contexto político mundial (questionamento às mudanças climáticas) e,
principalmente, os efeitos que outras inovações exercem sobre a opção pelos biocombustíveis
(gás de xisto, a energia fotovoltaica, a energia eólica, etc.) diminui o apetite dos investidores e
dos órgãos públicos que puxavam os investimentos iniciais.
O capítulo também oferece um retrato sobre a atuação do SSI da cana-de-açúcar no
universo do etanol celulósico. Na dimensão do conhecimento científico, as universidades
brasileiras apresentam desempenho similar aos atingidos pelas unidades dos EUA, da Ásia ou
da Europa. Na somatória, o Brasil ocupa a terceira posição em número de artigos científicos
185
Por ouro lado, não é plausível afirmar que os desenvolvimentos cessaram nas outras rotas tecnológicas (ácida
e termoquímica), haja vista, a existência de depósitos de patentes na última década.
216
publicados internacionalmente, sendo que a Universidade de São Paulo figura entre as cinco
instituições com mais publicações.
Outro elemento relevante nas informações provenientes do levantamento de artigos
científicos é o desempenho do CTBE, o qual figura como a terceira unidade mais importante
do Brasil em relação ao conhecimento científico do E2G e, em uma comparação
internacional, posiciona-se entre as 30 maiores instituições, feito extraordinário se
considerarmos que a instituição tem apenas 7 anos de existência.
Uma análise “fria” dos dados reunidos sobre a dinâmica tecnológica (famílias de
patentes) pode proporcionar uma visão desalentadora do desempenho do SSI da cana-de-
açúcar (o que é verdade), visto que nenhuma das firmas processadoras de cana-de-açúcar
figura entre os principais assigners. Isso é um problema estrutural, o setor historicamente
caracteriza-se por baixa capacidade inovativa.
Por outro lado, como indica a literatura de SSI, as firmas não inovam sozinhas e os
setores econômicos apresentam padrões de inovações bem definidos segundo as bases do
conhecimento. Portanto, tal situação já era esperada, sendo uma confirmação das
particularidades do setor sucroenergético (inovações introduzidas por fornecedores de bens e
de insumos).
Mas o interessante é destacar as exceções. Os mesmos dados (famílias de patentes)
possibilita perceber que outros agentes/atores, igualmente presentes no SSI da cana-de-açúcar,
apresentam competências tecnológicas acumuladas não desprezíveis, fato que não só justifica
a estratégia metodológica, como também abre espaço para compreender o real processo de
desenvolvimento e introdução da nova tecnologia na realidade brasileira. Demonstra também
que a nova trajetória impõe mudanças históricas no padrão estabelecido e traz à cena
produtiva outros tipos de atores e de relações.
Os pontos fortes do Brasil percebidos pela análise da dinâmica da tecnologia do E2G
são: a) As firmas e instituições que receberam aportes advindos da nova política de inovação
para o setor figuram como depositantes de patentes na trajetória do etanol celulósico – CTC;
GranBio; Odebrecht Agroindustrial; CTBE; Brasken; Petrobras; b) A qualidade das invenções
é difícil de avaliar por intermédio da estratégia escolhida, mas as invenções protegidas pelos
atores brasileiros não se limitaram apenas ao INPI, fato que indica uma certa qualidade das
patentes ou pelo menos mostra que seus proprietários acreditam no seu potencial comercial; c)
Mesmo tratando-se de poucas patentes depositadas, estas aparecem em etapas distintas do
217
processo de conversão da biomassa, mostrando que o esforço tecnológico do SSI é variado e
abarca diversos momentos da produção do E2G, tais como: as leveduras geneticamente
modificadas; design industrial visando a integração de unidades produtivas (1G – 2G);
seleção e melhoramento de micro-organismos; melhoramentos no processo de hidrólise
enzimática; propostas de pré-tratamento específicos para a biomassa de cana-de-açúcar; novas
variedades de cana-de-açúcar.
Como foi mostrado nesse capítulo, o esforço do Brasil em estabelecer tecnologia
endógena de maneira sistematizada (patentes) representa pouco no esforço geral, o que mostra
que o deslocamento para o STI-mode não é fluído e ocorre de maneira particularizada. Mas
olhando com mais detalhes os dados de patentes por assigners, percebe-se que a propriedade
das invenções em etanol celulósico encontra-se pulverizadas, o que quer dizer que a maioria
dos atores proprietários de tecnologia tem sobre sua posse poucas patentes. O nível de
concentração é baixo: os 5 maiores assigners representam juntos apenas 12,6% da amostra.
Isso sugere que atores nacionais que apresentam duas ou quatro famílias de patentes não
podem ser sumariamente desconsiderados. O grande desafio é difundir essa prática/esforço
para outros atores do SSI da cana-de-açúcar e ampliar os esforços já em curso, buscando
intensificar as potencialidades já desenvolvidas.
218
CAPÍTULO 5: TECNOLOGIA DO ETANOL CELULÓSICO NO BRASIL: AS
AÇÕES DOS ATORES E SUAS INTERAÇÕES
O presente capítulo tem como objetivo compreender as ações desempenhadas pelos
principais atores envolvidos no processo de adoção e desenvolvimento da tecnologia do
etanol celulósico no Brasil, com especial atenção para as ações das firmas. De tal modo,
descreve e analisa os projetos industriais186
de etanol de segunda geração em curso no país,
destacando as relações estabelecidas por eles para tornar os projetos reais.
Tal esforço investigativo visa fechar o arco analítico da pesquisa, posicionando as
firmas no centro da interpretação, com isso, abarcando o fenômeno da inovação tecnológica
(1G para 2G) no seu conjunto. As informações/análises levantadas neste capítulo completam
as apreciações tecidas nos capítulos anteriores, pois ao longo da tese percorre-se a trajetória
de desenvolvimento do SSI da cana-de-açúcar, da formação até as primeiras iniciativas
sistematizadas de desenvolvimento de uma nova base tecnológica para a produção de etanol.
Este exercício traz uma noção evolutiva do segmento, bem como uma chave interpretativa de
como os setores/indústria mudam e evoluem em países periféricos187
.
Este foco justifica-se em razão da própria natureza das firmas188
, as quais se
comportam como catalisadoras desse processo, não só por introduzirem o etanol celulósico no
mercado de combustíveis, mas por representarem um fenômeno em gestação no país. Ao
passo que constroem plantas industriais baseadas na rota celulósica, estas congregam outros
elementos da estruturação do STI-mode, pois se beneficiam sistematicamente das interelações
promovidas pelo SSI da cana-de-açúcar, ou seja, são alvos de políticas públicas para inovação
(PAISS Industrial e PAISS Agrícola), recebem aportes diretamente voltados ao P&D
186
Projetos Indústrias de etanol celulósico consistem nas iniciativas desempenhadas pelos atores (firmas e
instituições de pesquisa), as quais visam em um dado momento realizar a prova de conceito por meio de
prototipagem em pequena escala e/ou a construção de plantas industriais - escala piloto, demonstrativa e
comercial. Com base na classificação adotada pela metodologia Technology readiness levels (TRL), seleciona-se
os projetos que se encaixam entre as fases TRL5 - TRL7 e TRL8 – TRL9. Adota-se as definições feitas por
Stafford et al. (2017). 187
Os setores econômicos em economias subdesenvolvidas carregam características comuns, tais como: a) a
forte heterogeneidade das firmas - diferentes níveis tecnológicos convivem ao mesmo tempo no mesmo setor; b)
inovações intensivas em conhecimento advêm do exterior; c) os investimentos e a condução do Estado é fator
central para avançar o nível tecnológico das firmas. Estes elementos estão presentes na tentativa de introduzir a
produção do etanol celulósico na realidade do setor sucroalcooleiro. 188
A firma, principal elemento do SSI, é responsável pela transformação dos inputs em outputs. Ela é
caracterizada por processos específicos de aprendizagem, competências e organizações (rotinas) os quais
conduzem suas ações, suas expectativas e os seus objetivos. A partir destes princípios, as firmas interagem com
os demais agentes do SSI, tais como universidades, institutos de pesquisa, agências regulatórias, consumidores,
fornecedores entre outros. Os agentes interagem por meio de processos de comunicação, troca, cooperação,
competição e comando, e assim estabelecem networks (redes de inter-relação) que criam canais e mecanismos de
aprendizado interativo, elemento essencial para o processo de inovação (LUNDVALL, 2009; JOSEPH, 2009).
219
(FAPESP e FINEP), são firmas que estabelecem relações com agentes externos com a
intenção de incorporar novas tecnologias (Joint Venture, cooperação tecnológica e aquisição
de empresas estrangeiras), criam relações com atores não-empresas do SSI (universidades e
ICTs). E, por fim, elaboram rotinas voltadas ao desenvolvimento destas novas tecnologias,
baseadas em processos de aprendizagem não restritos ao DUI-mode.
As firmas que conduzem e conduziram os principais projetos industriais em etanol
celulósico são189
: CTC; GranBio e Raízen. Estes três casos possuem plantas instaladas e em
funcionamento, consolidam-se no cenário nacional à medida que absorvem novos
conhecimentos e aprendem com o próprio uso da nova tecnologia. E, ademais, são os atores
brasileiros que melhor acompanham a corrida tecnológica em curso no plano internacional.
Acrescenta-se que no processo de mapeamento dos atores do SSI da cana-de-açúcar
identificaram-se outras firmas com projetos industriais em etanol celulósico, entretanto, estas
apresentam suas iniciativas descontinuadas ou envoltas em incertezas promovidas tanto pelo
contexto socioeconômico como por novas estratégias empresariais, a saber: Villares Metals
S.A; Dedini Indústria de Base; Jaraguá Equipamentos Industriais; Petrobras; Oxiteno;
Odebrecht Agroindustrial; Bioenergia do Brasil S/A; Abengoa Bioenergia; Clariant;
British Petroleum Biocombustíveis (BP).
Estes casos serão “chamados” à narrativa para demonstrar elementos próprios da
dinâmica da evolução da tecnologia, justamente em um momento pré-paradigmático, onde a
incerteza, a entrada/saída de atores e a disputa de designs tecnológicos distintos compõem o
quadro histórico deste contexto.
De maneira correlacionada e independente, apresentam-se também atores não-firmas
que conduzem ações na trajetória do etanol celulósico na fase industrial do SSI da cana-de-
açúcar, tendo como expoentes: o CTBE, IPT e a Escola de Engenharia de Lorena-USP. Os
atores não-firmas são relevantes no processo de interação e cooperação no interior do SSI da
cana-de-açúcar, mas não apenas, visto que o CTBE apresenta uma planta-piloto de E2G e
projetos industriais completos em fase de testes, os quais devem ser disponibilizados ao
mercado em 2018.
189
Levantamento que ocorreu até 2017, ano de conclusão desta tese de doutoramento.
220
Portanto, os atores não-firma além de colaborar e funcionar como fontes de
conhecimentos sistematizados, conduzem desenvolvimentos tecnológicos particulares que se
somam às iniciativas em curso, dinamizando o processo de aprendizado do SSI (o caso do
CTBE reúne estes elementos e recebe especial atenção neste capítulo).
Destaca-se que os atores “aparecem” como resultado do mapeamento de políticas
públicas e de todo levantamento de dados sobre o setor feito ao longo da pesquisa (artigos
científicos; família de patentes; levantamento bibliográfico; mídia especializada; e pelas
entrevistas realizadas em campo). Estes atores, firmas e não-firmas, são verdadeiros
catalisadores desse processo e representativos da mudança em curso, situação que aprofunda a
heterogeneidade setorial, ao passo que faz avançar a base técnica da indústria da cana-de-
açúcar.
Em tempo, a apresentação e a caracterização dos casos/iniciativas de desenvolvimento
da tecnologia do E2G estão pautadas principalmente nas informações coletadas em trabalho
de campo (eventos setoriais e visitas) e entrevistas semiestruturadas junto aos representantes
das principais instituições e firmas do SSI da cana-de-açúcar, vide quadros 1.3 e 1.4. no
capítulo 1. Informações complementares são provenientes de fontes secundárias
disponibilizadas pela mídia especializada (vide quadro 1.5.).
Este capítulo estrutura-se por meio de questões, as quais orientam a exposição das
informações e das análises construídas por esta etapa da pesquisa, estas são: 1) Quais são e
como estes atores introduzem a tecnologia industrial do etanol celulósico no Brasil? 2) Quais
as diferenças entre os projetos tecnológicos de etanol celulósico em curso no Brasil? 3) Quais
são as relações estabelecidas entre estas firmas e outros atores do SSI da cana-de-açúcar no
que tange o etanol celulósico? 4) Como as políticas públicas incidem sobre estas iniciativas?
Com as respostas pode-se ter uma noção, mesmo que aproximada, do quão perto/longe
está a tecnologia de etanol celulósico de ser uma opção complementar a produção de 1G no
Brasil. E, ainda, identificar o esforço do SSI da cana-de-açúcar em introduzir uma inovação
disruptiva.
221
5.1. OS PRINCIPAIS ATORES DO SSI DA CANA-DE-AÇÚCAR NA TRAJETÓRIA
DO ETANOL CELULÓSICO: VISÃO GERAL
A indústria do etanol celulósico está em construção e como tal encontra-se sem
definições estruturais claras, contando com a presença de diversos “tipos” de firmas, tais
como as grandes firmas processadoras de biomassa, as startups de base tecnológica, firmas
tradicionais de exploração de recursos naturais (agrícolas e petróleo) e grandes firmas do setor
químico.
A figura 5.1. e o quadro 5.1. expõem estas ações de maneira esquemática, indicando
os principais atores, que são de diferentes “naturezas”, deste processo em território nacional.
Vale enfatizar que a identificação dos atores foi o resultado do mapeamento de atores do SSI
da cana-de-açúcar e das políticas públicas de fomento à inovação, bem como aparecem na
amostra de famílias de patentes.
O Brasil conta com diversas iniciativas voltadas ao desenvolvimento da tecnologia
industrial do etanol celulósico, as primeiras ações remontam à década de 1980 (vide figura
5.1.). Atualmente (ano de 2017), o Brasil conta com três plantas de etanol 2G em operação,
sendo duas em escala comercial (GranBio e Raízen) e uma em escala demonstrativa (Centro
de Tecnologia Canavieira – CTC).
A figura 5.1. representa esquematicamente a evolução dos esforços brasileiros em
desenvolver a tecnologia de segunda geração, reforçando o fato das primeiras iniciativas
serem concomitantes com o auge do Proálcool e a retomada das iniciativas só ocorrer nos
anos 2000, principalmente, após 2010. Desta forma, a figura resume a trajetória brasileira no
etanol celulósico e indica os esforços temporalmente, sendo possível perceber a distribuição
dos atores por rota tecnológica e o “grau” deste esforço (pesquisas em laboratório, planta-
piloto, escala de demonstração ou planta comercial).
Estas ações somadas representam o esforço do SSI da cana-de-açúcar em desenvolver
competências internas na nova rota tecnológica. Trata-se de ações que foram fortemente
suportadas pelo poder público e conduzidas a partir de parcerias estratégicas com firmas
estrangeiras, detentoras de tecnologia – estas informações estão expostas no tópico a seguir
(5.2.).
222
Figura 5.1. Iniciativas de desenvolvimento de projetos industriais de etanol celulósico no Brasil, entre o período de 1980 a 2016.
Fonte: elaboração própria.
Legenda
E = Elaboração; preparação ajustes
com os parceiros.
PL = Pesquisa Laboratório.
PsP = Planta Semi-Piloto.
PP = Planta-Piloto.
PD = Planta Demonstração.
PD.e = Planta Demonstração no
exterior.
PC = Planta Comercial.
X = Projeto encerrado.
? = Projeto interrompido/ indefinição.
= Continuidade do projeto.
223
Quadro 5.1. Os principais atores na trajetória do etanol celulósico – quem é quem?
Fundação Ator País Origem Setor Relação / Interesse no setor sucroenergético
1899 IPT Brasil Público Instituição de
Pesquisa
Pesquisa & Desenvolvimento; Prestação de serviços (análise de materiais; análise da
composição da biomassa).
1920 Dedini Brasil Privado Bens de Capital Fabricação de máquinas e equipamentos para a produção de açúcar, etanol e eletricidade a partir
da cana-de-açúcar;
1953 Petrobras Brasil Público Petróleo Distribuição e logística do etanol; Com PBIO produzia açúcar, etanol e eletricidade.
1969 CTC Brasil Privado P&D Pesquisa & Desenvolvimento; Variedades de cana-de-açúcar.
1969 FTI Lorena/SP Brasil Público Instituição de
Pesquisa
Pesquisa & Desenvolvimento; Como integrante da USP exercer a função de desenvolvimento e
disseminação de conhecimento sistematizado e de formação de mão de obra.
1957** Clariant Alemanha- Suíça Privado Química Interesse na produção de bioquímicos a partir da cana-de-açúcar; Pesquisa & Desenvolvimento
– ações exploratórias realizadas na Europa em E2G.
1957 Jaraguá Equip. Brasil Privado Bens de Capital Fabricação de máquinas e equipamentos para setor sucroenergético e de papel e celulose.
1970 Oxiteno Brasil Privado Química Produção de bioquímicos (solventes verdes).
1976 CODETEC Brasil Público Universidade –
empresa
Pesquisa & Desenvolvimento; Prestação de serviços e assessoria a pequenas empresas de base
tecnológica ligada à Unicamp.
1979 Brasil
Bioenergia Brasil Bioenergia
Produção e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar; Produção de
Bioagentes (Biovespa, Biorrizium e Biovéria) - controle de pragas.
1979 COALBRA Brasil Público Bioenergia Produção de etanol, coque e furfural.
2007*** Abengoa
Bioenergia Espanha Privado Bioenergia
Produção e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar; Pesquisa &
Desenvolvimento – ações exploratórias realizadas na Europa e nos EUA em E2G.
2007 Odebrecht
Agro. Brasil Privado Bioenergia Produção e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar;
2008* BP Reino Unido Privado Petróleo Produção e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar; Pesquisa &
Desenvolvimento – ações exploratórias realizadas nos EUA em E2G.
2010 CTBE Brasil Público Instituição de
Pesquisa Pesquisa & Desenvolvimento; Prestação de serviços;
2010 Raízen Brasil –Holanda –
Reino Unido Privado Bioenergia Produção, distribuição e comercialização de etanol, açúcar e energia a partir da cana-de-açúcar;
2011 GranBio Brasil Privado Biotecnologia Pesquisa & Desenvolvimento; Cana-energia; bioquímicos; Produção de E2G.
Fonte: elaboração própria. *Abengoa bioenergy é de 1980, mas chega ao Brasil em 2007. **A criação da BP é de 1909, mas sua atuação no setor sucroenergético é de 2008.
***As atividades da Clariant no Brasil herdaram as estruturas da Hoechst (que chegou ao Brasil 1957), firma alemã que se incorporou a Clariant em 1997. Outro destaque é
que Clariant, Jaraguá Equipamentos e Bioenergia do Brasil não aparecem na figura 5.1., pois estes casos apresentaram apenas interesse em desenvolver projetos de P&D na
rota do E2G - ficando apenas na especulação (submeteram propostas ao PAISS Industrial).
224
As informações dispostas na figura 5.1. e complementadas pelo quadro 5.1. revela a
“posição” de cada firma ou instituição que realizou esforços nessa trajetória e indica a sua
origem e sua relação com o setor sucroenergético. Com isso, coloca em relevo um conjunto de
evidências e informações que substanciam a resposta da pergunta de pesquisa deste trabalho,
isto é, “Quais são os atores/elementos do SSI da cana-de-açúcar que promovem o progresso
técnico em direção ao domínio do etanol celulósico?”, visto que nomeia e identifica cada ator
que liderou iniciativas de desenvolvimento, aquisição ou adaptação da tecnologia de E2G no
Brasil ao longo do tempo.
Observando a figura 5.1. percebe-se a existência de 13 iniciativas concretas em
desenvolver a tecnologia industrial de segunda geração no Brasil, conduzidas por atores
distintos, sendo que há 10 firmas e 3 atores não-firmas (CTBE, IPT e FTI Lorena)
conduzindo/liderando as iniciativas de P&D. Para melhor compreender as características do
esforço nacional no universo da tecnologia do etanol celulósico, bem como, para identificar as
relações estabelecidas pelos atores no SSI da cana-de-açúcar, separa-se e classificam-se as
iniciativas em quadro grandes grupos:
i) Iniciativas Pioneiras - FTI Lorena/SP; COALBRA; CODETEC e Dedini;
ii) Iniciativas Incipientes - Brasil Bioenergia; Jaraguá Equipamentos; Abengoa;
Clariant e BP;
iii) Iniciativas Exploratórias - IPT; CTBE; Petrobras; Oxiteno; Odebrecht
Agroindustrial;
iv) Iniciativas Estruturadas – CTC; GranBio e Raízen (portadoras de futuro).
Esta estrutura tem a intenção de facilitar a exposição dos detalhes sobre o esforço
nacional e ir além do mapeamento de atores, mostrando os avanços, os problemas e as
particularidades do SSI da cana-de-açúcar na(s) rota(s) do etanol celulósico - com particular
atenção aos casos dos anos 2000 (Iniciativas Estruturadas).
As Iniciativas Pioneiras correspondem aos projetos industriais implementados no
Brasil na década de 1980, ações que iniciaram as pesquisas e estabeleceram os primeiros
passos nacionais nesta tecnologia. Distinguem-se das outras iniciativas pelo time e
principalmente, pela opção tecnológica (rota ácida).
225
As Iniciativas Incipientes são os projetos e as ações que não atingiram maturidade, ou
seja, não foram capazes de sair do nível da especulação, da elaboração dos projetos, ou
ainda, não atingiram os objetivos propostos pela própria iniciativa, sendo interrompidos de
maneira abrupta (forças do contexto e/ou reformulação da estratégia da firma).
As Iniciativas Exploratórias são basicamente as ações de pesquisa no nível
laboratorial ou em escalas-reduzidas (bancada e polito). Estas iniciativas caracterizam-se
por não atingirem o estágio de early commercial deployment (STAFFORD et al, 2017), ou
seja, não estabelecerem concretamente unidades de processamento de biomassa, sendo
incapazes de estudar/resolver de maneira direta questões relacionadas à fabricação, manuseio
e processamento da matéria-prima, eficiência energética e resíduos.
Por outro lado, as Iniciativas Estruturadas são aquelas que atingiram “maturidade” e
materializaram-se na realidade do SSI da cana-de-açúcar – estando em um nível à frente das
Iniciativas Exploratórias. São capazes de produzir etanol celulósico, mesmo que por um curto
período de tempo e sem atingir a sua capacidade projetada. Entretanto, são ações que
municiam o SSI com novas informações estratégicas, já que presenciam na execução dos seus
projetos situações e problemas que até então não tinham sido sequer aventados pelo setor
sucroalcooleiro.
Desta forma, as ações estruturadas imprimem um ritmo mais acelerado e
territorializado no processo de aprendizagem do SSI da cana em relação à tecnologia de
conversão da biomassa, visto que os experimentos e os problemas vivenciados por meio das
estruturas em funcionamento promovem conhecimentos impossíveis de serem obtidos em
escala laboratorial ou no nível da teoria científica. Estes projetos/ações serão analisados com
maior atenção no subtópico 5.2.2.
Os destaques expostos a seguir derivam das principais características do conjunto das
iniciativas desempenhadas em território nacional. Os casos presentes na figura 5.1. dão
origem a estes destaques, os quais serão detalhados (na medida da sua relevância) na seção
seguinte (5.2.). Mas os highlights a seguir dão uma noção geral do esforço nacional e
levantam pontos que devem ser levados em consideração no momento da leitura dos casos em
particular. Os destaques são:
No decorrer da trajetória brasileira tem-se uma mudança de rota tecnológica: as
Iniciativas Pioneiras eram calcadas na hidrólise ácida, já as iniciativas realizadas nos anos
2000 pautam-se na sua maioria na hidrólise enzimática e na busca pela exploração da C5
(Xilose e Pentose) por meio de leveduras adaptadas geneticamente (OGMs) - fermentação
226
de alto rendimento. A exceção fica por conta do caso do IPT, que baseia a sua tecnologia
no processo de gaseificação da biomassa;
As iniciativas brasileiras apresentam o mesmo time das ações que ocorreram em outros
países (no primeiro momento final dos anos 1970 e início dos anos 1980 e no segundo
momento início da segunda década de 2000). O Brasil segue a tendência mundial; a
figura 5.1., a tabela 5.2. e os dados de depósitos de patentes e publicações de artigos
científicos trabalhados no capítulo 4 indicam essa condição.
Todas as Iniciativas Pioneiras foram motivadas pelo contexto do Proálcool;
Com exceção do caso da Dedini, as iniciativas pioneiras não permaneceram ativas ao
longo do tempo, encerrando-se ou mudando de função com o fim do Proálcool e início
dos anos 1990;
As Iniciativas Pioneiras (com exceção do caso Dedini) tinham como princípio a
diversificação da biomassa para a produção de etanol, haja vista, realizaram testes com
biomassas distintas da cana-de-açúcar;
A iniciativa da Dedini é a mais duradoura do Brasil (23 anos) e antecipa a estratégia de
estabelecer parcerias. Diferentemente dos casos dos anos 2000, suas relações de
cooperação são estabelecidas com atores nacionais;
Todas as iniciativas dos anos 2000 estabeleceram parcerias estratégicas190
com firmas
estrangeiras. Este fato é o modus operandi para acessar tecnologias ligadas ao processo
de pré-tratamento, hidrólise e fermentação da C5.
O estabelecimento de parcerias com atores estrangeiros visa ter acesso a conhecimentos
específicos, adquirir novas competências, adquirir insumos tecnológicos e utilizar
estruturas de processamento de biomassa já em funcionamento para realização de testes
(plantas-pilotos e plantas de demonstração). As parcerias com atores nacionais visam
adquirir matéria-prima e compartilhar infraestrutura;
Todas as Iniciativas Exploratórias e todas as Iniciativas Estruturadas receberam aportes
diretos das agencias e órgãos de fomento para as atividades de P&D. Com grande
destaque ao programa PAISS Industrial, que sustentou financeiramente a construção das
plantas industriais em escala comercial. O mapeamento de políticas públicas e análise dos
casos demonstram que o esforço nacional foi estimulado e sustentado financeiramente
pela ação do Estado Brasileiro (vide capítulo 3 e a caracterização das iniciativas nos
subtópicos 5.2).
Quando os recursos eram negados ou descontinuados, o projeto não avançava – fato que
fica claro com o projeto de gaseificação do IPT, que não teve aportes do BNDES/FINEP,
assim, não saiu da escala laboratorial/piloto;
190
Segundo os trabalhos Hagedoorn (1993) e Vonortas & Safioleas (1997) define-se as parcerias estratégicas que
visam o desenvolvimento de novas tecnologias ou a obtenção de competências tecnológicas como acordos
cooperativos entre firmas independentes que compartilham objetivos tecnológicos comuns, tal ação afeta o
posicionamento de mercado no longo prazo de pelo menos um dos parceiros. Dependendo do conteúdo
tecnológico ou da base de conhecimento da firma/setor, os parceiros das empresas podem ser institutos de
pesquisa e universidades.
227
As ações da FAPESP aparecem com maior importância na categoria de Iniciativas
Exploratórias. Firmas estabelecem convênios para cooperação em pesquisa (Dedini; BP;
Oxiteno; Odebrecht Agroindustrial) – Programa PITE.
Na categoria de Iniciativas Estruturadas o BNDES e a FINEP são os principais agentes
financiadores dos projetos, tanto das plantas comerciais como de ações em P&D
correlatas à nova unidade;
A ação do governo não se limitou ao financiamento “tradicional” de atividades de P&D,
pois em alguns casos - Petrobras; GranBio; CTC e Odebrecht agroindustrial - existe a
“mão” nada invisível do poder público participando diretamente da composição acionária
das empresas que conduzem os principais projetos em etanol celulósico. As ações do
BNDESPar ilustram esse fato;
As iniciativas dos anos 2000 são conduzidas por atores distintos, principalmente, por
firmas de diferentes “naturezas”. Este fato indica que o SSI da cana-de-açúcar passa por
um movimento de ampliação das suas fronteiras setoriais – atores que agem sobre uma
nova base tecnológica e de conhecimento;
Os casos dos anos 2000 são conduzidos por novos atores do SSI da cana-de-açúcar
(firmas e instituições criadas na última década), com exceção do CTC – vide quadro 5.1.
Alguns projetos apresentam o “pacote” tecnológico próprio como o cerne da iniciativa
(Dedini; CTC; Odebrecht Agroindustrial; Petrobras); outros incorporam tecnologias
estrangeiras e passam a adaptar equipamentos/componentes e “padrões” técnicos segundo
os problemas enfrentados (Raízen e GranBio);
As Iniciativas Incipientes não colocaram em prática seus projetos de P&D sobre etanol
celulósico no Brasil;
As Iniciativas Incipientes advêm de atores ligados ao segmento de bioenergias. Estes
casos podem ser encarados como uma proxy do desenvolvimento futuro/novos entrantes /
demanda por novas políticas para inovação / um potencial a ser explorado;
Na categoria de Iniciativas Exploratória, os institutos de pesquisa pública figuram como
atores relevantes - CTBE, IPT e Cenpes/Petrobras;
O estabelecimento de parcerias com universidades nacionais (relação universidade-
empresa) ocorrem nas Iniciativas Exploratórias e Iniciativas Estruturadas;
Nas Iniciativas Exploratórias e nas Iniciativas Estruturadas é que se tem o
desenvolvimento de competências nacionais na rota de E2G, pois firmas e instituições de
pesquisa destinam recursos para apreender e desenvolver conhecimento economicamente
útil na rota 2G. Ademais, os projetos de P&D são pensados e conduzidos para dar conta
dos problemas do setor sucroenergético. Estas competências surgem como consequência
de pesquisas e melhoramentos tecnológicos ocorrendo em território nacional e por meio
do trabalho de pesquisadores, engenheiros e técnicos “brasileiros”;
Os esforços na rota do etanol celulósico geraram patentes depositadas por atores
nacionais – Petrobras, GranBio, CTC, Odebrecht agroindustrial e CTBE;
As Iniciativas Estruturadas geraram expectativas muito acima da realidade. Hoje
enfrentam problemas não previstos no início do projeto, passando por momentos de
menor credibilidade e de desenvolvimento menos acelerado. Com isso, contingenciam
novos investimentos para novas plantas de E2G.
228
5.2. A DINÂMICA DOS PROJETOS INDUSTRIAIS DE ETANOL CELULÓSICO NO
BRASIL
A análise a seguir complementa o levantamento de dados feitos nas etapas de pesquisa
anteriores, não apenas por identificar e caracterizar as ações dos atores que participaram da
rota tecnológica em território nacional, mas por “passar a limpo” o que foi feito, mostrando as
especificidades desse processo recente, que se não foi suficiente para colocar o Brasil na
dianteira do desenvolvimento tecnológico da conversão da biomassa em bioprodutos, foi
capaz de proporcionar condições de seguir a rota tecnológica, com possibilidades – a
depender das novas ações – de alcançar posição proeminente na atividade produtiva do etanol,
biocombustíveis avançados, bioquímicos e bioeletricidade.
Segue abaixo a caracterização dos esforços realizados ao longo dos últimos 35 anos do
SSI da cana-de-açúcar na(s) rota(s) do etanol celulósico, ademais, aprofunda-se na
identificação dos atores já apresentados na figura 5.1. e no quadro 5.1.. Assim, indica-se a
natureza dos projetos e as relações estabelecidas por estes atores com outros elementos e
agentes do SSI da cana-de-açúcar, para tal, segue a divisão esquemática dos grupos de
iniciativas/projetos em E2G: (1) as Iniciativas Pioneiras; (2) as Iniciativas Incipientes; (3) as
Iniciativas Exploratórias; (4) as Iniciativas Estruturadas.
5.2.1. As Iniciativas Pioneiras na trajetória do etanol celulósico: anos 1980
As primeiras iniciativas declaradas em desenvolver o etanol celulósico no Brasil
ocorreram nos anos 1980, contanto com quatro projetos: FTI Lorena/SP; CODETEC;
COALBRA; e Dedini. Tais projetos lograram resultados importantes, como: a caracterização
da biomassa de cana-de-açúcar; os primeiros testes e caracterização de outras biomassas
(eucalipto; palha de arroz e madeira); experimentos em escala piloto, demonstrativa e
comercial; conceito de integração de plantas industriais (E1G e E2G)191
.
A Fundação de Tecnologia Industrial - FTI de Lorena/SP foi a responsável pela
primeira iniciativa sistematizada de desenvolver a tecnologia de produção do etanol celulósico
no Brasil. Era uma instituição de pesquisa que foi originada a partir da Faculdade Municipal
de Engenharia Química – FAMENQUIL, na cidade de Lorena/SP em 1969. Em 1978 a
faculdade é incorporada pelo órgão Federal, a FTI – Fundação de Tecnologia Industrial e
191
Vale destacar que os processos enzimáticos não estavam maduros, de tal modo, a hidrólise ácida era a única
opção tecnológica disponível.
229
passa a ter seu foco na pesquisa científica. Já como instituição federal conduz dois grandes
projetos tecnológicos da década de 1970, o desenvolvimento da tecnologia de beneficiamento
do nióbio e a tecnologia de produção de álcool combustível192
.
O projeto da FTI-Lorena consistia na construção de uma planta-piloto de etanol
celulósico com capacidade de produzir 500 litros por dia de etanol 2G. Usava como matéria-
prima o eucalyptus panicutata e o processo era a hidrólise ácida, dada por meio da ação do
ácido sulfúrico concentrado. As ações na unidade passaram por estudos em laboratórios e
bancadas até chegar à planta na escala-piloto que começou a funcionar em 1981 (MAIA,
2010; CALDAS, 2011; CORREA, 2014). O projeto se inseria na ideia do Estado brasileiro
em buscar alternativas à biomassa da cana-de-açúcar, por isso, utilizava resíduos agro
florestais.
De maneira concomitante às ações referidas acima, está o Projeto HIDROCON,
conduzido pela CODETEC (Companhia de Desenvolvimento Tecnológico), com parceria da
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e tendo como “cliente” a Firma Aços
Villares (LEITE, 2008). O projeto HIDROCON teve início em 1979, com o objetivo de
desenvolver o processo de hidrólise ácida em território nacional, sendo utilizada como
matéria-prima o bagaço da cana-de-açúcar e a palha de arroz. Os testes na escala de planta-
piloto correram entre 1981 a 1983, atingindo rendimentos de sacarificação na faixa de 57% a
60% em massa (CALDAS, 2011).
O processo compreende diversas etapas193
. Basicamente, o composto lignocelulósico
era aquecido com pressão controlada e na sequência era adicionado ácido concentrado sobre
esse composto, para no momento subsequente, a “pasta” ser exposta a uma queda de pressão
abrupta e um resfriamento. Os açúcares resultantes eram direcionados para a fermentação,
para dar origem ao etanol.
192
Em 1991, a FTI, até então responsável pela FAENQUIL, foi extinta e a Faculdade foi incorporada ao Sistema
Estadual de Ensino Superior do Estado de São Paulo. Com a estadualização a instituição passou apresentar
missão tripla: a pesquisa, o ensino e a extensão, sendo absorvida pela Universidade de São Paulo (USP) em
2006. 193
Tecnologia da Villares: i) formação de uma polpa aquosa homogeneizada de material celulósico com 3 a 30%
em peso de sólidos; ii) bombeamento desta pasta de material celulósico, de forma contínua, ao interior; iii)
aquecimento da pasta de material celulósico pressurizado até a temperatura de cerca de 160 (grau) a 250 (grau)
C. antes da sua introdução no reator; iv) adiciona de forma contínua uma dada dose de um ácido concentrado
“sobre” a pasta de material celulósico pressurizado e aquecido, que será diluída continuamente no reator, para
proporcionar a reação de hidrólise da referida pasta; v) submeter a polpa de material celulósico hidrolisado a
uma queda de pressão abrupta e arrefecer imediatamente após sair do reator; vi) neutralizando e fermentando a
solução aquosa resultante para se obter etanol; viii) e recuperando os subprodutos resultantes que são metanol,
furfural, ácido acético e lignina (BR 8102802).
230
Segundo Leite (2008, p.487) “o sucesso da planta-piloto de hidrólise ácida motivou a
COPERSUCAR a contratar a CODETEC para a produção de equipamentos de hidrólise por
explosão a vapor (Steam Explosion)”. Por meio de um novo contrato tecnológico, foram
produzidos e instalados em várias usinas o sistema Steam Explosion com a finalidade de
melhorar o aproveitamento do bagaço para alimentação animal (gado).
A Codetec era uma companhia privada, com forte ligação com a Unicamp, voltada
para apoiar o estabelecimento de pequenas empresas surgidas na universidade, as quais
deveriam ser capazes de gerar tecnologia apropriada às condições brasileiras. Alguns autores
consideram como a primeira incubadora de empresas do país, criada em 1976. A experiência
resultou em dezenas de pequenas firmas de base tecnológica e voltadas a segmentos distintos,
dentre elas tem-se a Termoquip, que atua na área de fabricação de máquinas e equipamentos
para produção de energia a partir da biomassa194
.
A terceira iniciativa brasileira de desenvolvimento e introdução da tecnologia do
etanol celulósico se dá por meio da criação da Coque e Álcool de Madeira S/A (COALBRA),
foi criada por meio da Lei nº 6.768, de 20 de dezembro de 1979 com a finalidade de
incentivar a produção e a utilização de combustíveis líquidos derivados da madeira e,
também, com a função de produzir e comercializar diretamente os combustíveis e
subprodutos. Outra missão era de prestar assistência técnica às firmas interessadas na pesquisa
e produção de combustíveis líquidos.
Sua fábrica foi implementada em 1981 na cidade de Uberlândia/MG, a tecnologia de
produção do etanol celulósico era baseada em tecnologia estrangeira, o processo Scholler-
Madison, tecnologia que estava em funcionamento na União Soviética em escala industrial.
Com a importação da tecnologia, construiu-se uma fábrica com capacidade de produção de
30.000 l/dia de etanol. Segundo Caldas (2011, p. 20) a planta “não chegou a atingir a sua
plena capacidade operacional, devido a fatores econômicos desfavoráveis, tendo suas
atividades encerradas em meados de 1986”, quando se dedicava à produção de um composto
orgânico heterocíclico aromático – o furfural.
O processo em teste pela COALBRA era baseado em pré-tratamento com ácido
sulfúrico (H2SO4) diluído, devido ao seu menor preço e poucos problemas com a corrosão se
comparado ao ácido clorídrico (HCl). O uso de concentrações baixas de ácido (<1%)
demanda o uso de altas temperaturas (180-230 ºC), com isso, obtêm altos rendimentos de
194
A firma atua também no segmento de saneamento básico e ambiental, peças e acessórios.
231
glicose. Por outro lado, as temperaturas elevadas degradam rapidamente as pentoses e as
hexoses da hemicelulose, com isso, inibe a fermentação, o próprio processo que dá origem ao
etanol. Situação semelhante enfrentado por outros processos baseados na rota ácida.
A COALBRA foi extinta pelo Decreto no
93.603, de 21 de novembro de 1986.
Portanto, sendo o único dos casos que não se desdobrou em novos esforços de aprendizagem,
se reformulando para continuar atuante no setor sucroenergético. A sua experiência se encerra
juntamente com o “início” da crise do Proálcool, situação que indica forte relação entre o
programa (política pública) e as iniciativas em desenvolver a tecnologia do etanol celulósico.
As ações sistematizadas do Estado brasileiro por meio do Proálcool e de todos os
outros instrumentos que o circundavam, sustentavam a demanda e a oferta do biocombustível
na realidade nacional, situação que proporcionava perspectiva de futuro e estimulou as
primeiras ações de desenvolvimento do E2G. Ao ser abandonado e posteriormente desativado,
acaba por eliminar o estímulo à inovação na trajetória do etanol celulósico, bem como,
diminuir a introdução de novos métodos, processo e tecnologias na fase industrial da
produção sucroalcooleira. Tanto que grande parte das usinas em funcionamento nos dias de
hoje (2017) apresentam os mesmos padrões tecnológicos introduzidos na década de 1970195
(um dos elementos da alta heterogeneidade do SSI da cana-de-açúcar).
A quarta iniciativa ocorre em 1982 pelas ações da Dedini Indústria de Base (antes
denominada de Codistil S.A.). A Dedini é uma firma tradicional de bens de capital do setor
sucroalcooleiro, fundada em 1920 no município de Piracicaba/SP, uma das grandes
responsáveis pelo processo de modernização e expansão da capacidade produtiva do setor ao
longo do século XX (NEGRI, 2010; OLIVEIRA FILHO & SILVEIRA, 2013). É a única
firma nacional com capacidade de realizar projetos turnkey para o segmento sucroenergético
(usinas de E1G completas).
A iniciativa da Dedini deve ser considerada como o principal esforço brasileiro de
desenvolvimento do etanol celulósico por meio da rota ácida. Tal projeto remonta um
processo de aprendizagem que se inicia em 1982 com estudos laboratoriais e de bancada,
chegando em 2002 a projetar e construir uma Unidade de Desenvolvimento de Processo
(UDP), a qual funcionou até 2007 (OLIVEIRA FILHO, 2013; SILVA, 2013). No
195
Estes argumentos baseiam-se nos trabalhos de Varricho (2012); Valente et al. (2012); Oliveira Filho (2013) e
Bin et al.(2015). E, principalmente, nos dados apresentados por José Luiz Oliverio (Dedini Indústria de Base
S.A.) no evento “Proálcool, universidades e empresas: 40 anos de ciência e tecnologia para o etanol brasileiro”
realizado na FAPESP no dia 30 de Novembro de 2016.
232
desenvolvimento do projeto, a Dedini estabeleceu relações com outros atores do SSI da cana-
de-açúcar, tais como USP/Esalq; Rhodia; CTC; Coopersucar; FAPESP.
A tecnologia desenvolvida pela Dedini foi o processo Dedini Hidrólise Rápida -
DHR196
que combina o processo organosolv197
com a hidrólise ácida diluída (ácido sulfúrico).
Na tecnologia DHR, o pré-tratamento e a hidrólise ocorrem em estágio único, no mesmo
reator. Segundo Silva (2013, p.55) “o processo organosolv realiza o pré-tratamento, o qual
dissolve a lignina, através da combinação de um solvente em meio aquoso, com
aproximadamente 75% de etanol e 25% de água. O pré-tratamento deixa a celulose e
hemicelulose expostas para a reação da hidrólise”. Essa reação ocorre em um reator com
pressão (25/28 bar) e temperatura (180/200°C) controladas.
Após a hidrólise, o composto passa por um resfriamento através da evaporação flash
para que não haja a degradação dos açúcares obtidos, já que o meio da reação é ácido. Em
seguida, o licor hidrolisado (o composto) é encaminhado à destilação, processo igual ao de
primeira geração (OLIVEIRA FILHO, 2013; SILVA, 2013).
O ponto de inflexão do projeto DHR é a cooperação entre a Dedini, Copersucar e a
FAPESP em 2002. Por intermédio do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para
Inovação Tecnológica (PITE) deu origem a construção de uma planta semi-industrial de
etanol celulósico acoplada à Usina São Luiz, em Pirassununga/SP. A capacidade da planta de
demonstração era de 2 mil quilos de bagaço por hora e produção de 5.000 litros de etanol por
dia.
Esta nova organização do projeto de P&D da Dedini deu condições à firma realizar o
scale up do projeto inicial de 1982198
e compreender de maneira mais aprofundada elementos
importantes do processo de produção de etanol de segunda geração, os quais estavam ausentes
ou mostravam-se superados no nível de bancada e da planta-piloto.
Os trabalhos de Oliveira Filho (2013) e Silva (2013) elencam alguns avanços
tecnológicos e conceituais atingidos nesta fase do projeto: i) a seleção de materiais
compatíveis para ambientes corrosivos; ii) desenvolvimento de sistema de alimentação
contínua do bagaço em reatores, sob pressão elevada; iii) automação e controle dos
equipamentos de pré-tratamento e hidrólise; iv) a identificação da necessidade da limpeza da
196
A base da tecnologia era o processo Organosolv combinado com hidrólise ácida (ácido sulfúrico)
(OLIVEIRA FILHO, 2013; SILVA, 2013). 197
Organosolv é uma técnica que usa solvente orgânico para solubilizar lignina e hemicelulose, muito utilizada
na indústria de papel e celulose. 198
Para acompanhar detalhadamente a evolução histórica do processo DHR vide Silva (2013).
233
biomassa; v) implantação de um sistema de limpeza da biomassa antes do pré-tratamento; vi)
desenvolvimento de um conceito de integração da primeira geração com a segunda geração199
,
ou seja, anexar o processo de hidrólise às usinas existentes - obtendo vantagens econômicas,
tais como o compartilhamento da Infraestrutura; de alguns equipamentos (colunas de
destilação); logística da biomassa e de distribuição do produto final.
Outra ação que descendeu deste projeto foi o estabelecimento de um convênio entre a
FAPESP e a Dedini visando apoiar projetos de pesquisa científica e tecnológica cooperativos,
entre pesquisadores de instituições de pesquisa e de ensino superior no Estado de São Paulo, e
da Dedini (formação de equipes mistas). Os projetos deveriam versar sobre o conhecimento e
a tecnologia na área de processos industriais para a fabricação de etanol de cana-de-açúcar200
.
O acordo foi firmado em 2007 e previa o aporte financeiro de R$100 milhões com
desembolsos ao longo de 5 anos. Mas o convênio ao longo do seu período de vigência
realizou apenas uma chamada com aportes de até R$ 20 milhões. O resultado ficou muito
abaixo do esperado, pois nesta única chamada só foi contratado um projeto de pesquisa,
coordenado por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos, que abordava o
processo de destilação, sob o titulo “aplicações de técnicas de CFD na melhoria e eficiência
de estágio em colunas de destilação para produção de etanol”, portanto, voltado
principalmente ao etanol de primeira geração.
5.2.2. Iniciativas Incipientes
Todas as iniciativas a seguir têm em comum o fato de não ter colocado em prática seus
projetos de P&D relacionados à tecnologia do etanol celulósico no Brasil. Portanto, são ações
que ficaram no plano das especulações e das intenções, os casos que se encaixam nesta
categoria são: Jaraguá Equipamentos; Brasil Bioenergia; BP; Abengoa; Clariant.
Os casos da Jaraguá Equipamentos Industriais e da Bioenergia do Brasil S/A se
enquadram no tipo de ações incipientes especulativas, com poucas informações divulgadas
199
O conceito de integração de plantas da Dedini DHR foi absorvido pelo CTC. 200
O acordo de cooperação entre a Dedini e FAPESP era realizado por meio do Programa de Apoio à Pesquisa
em Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) (vide capítulo 3). Os projetos contratados deveriam ser voltados
à pesquisa básica e ao desenvolvimento de tecnologia e visavam o desenvolvimento de técnicas de conversão do
bagaço de cana em etanol. Os temas do projeto eram: a) Pesquisa científica ou tecnológica aplicada ao
desenvolvimento de tecnologia para o sistema Dedini Hidrólise Rápida (DHR)200
; b) Pesquisa científica sobre
hidrólise utilizando rotas químicas e/ou enzimáticas ou sobre rotas que produzem combustíveis líquidos por
gaseificação, produção de gás de síntese e devidas conversões catalíticas; c) Produção de energia; d) Consumo
de energia; e) Rendimento e eficiência de processos.
234
pelas firmas. O que há de concreto é que ambas participaram da chamada do PAISS
Industrial, tendo projetos aprovados somente na primeira fase do programa. Seus projetos
eram na linha temática 2 (Bioetanol de 2ª Geração) no eixo de Integração e escalonamento de
processos para produção de etanol celulósico. No entanto, na “Lista de empresas com Planos
de Negócio Selecionados” estas duas iniciativas não estão presentes, significando que seus
projetos de pesquisas não fazem parte do PAISS Industrial. Em buscas pela internet e na
revisão da literatura, estas iniciativas não aparecem com grande destaque.
A Bioenergia do Brasil S/A, antes chamada de Central de Álcool Lucéia Ltda., mostra-
se atuante nas atividades de P&D, mas não como empresa líder e sem realizar as atividades de
pesquisa internamente. Sua atuação ocorre por meio da participação em projetos de pesquisa
com outros atores, como no Programa Sugarcane EST Project – Sucest (1999 – 2003) da
FAPESP, em parceria com o CTC, USP e Unicamp. Um dos resultados desse projeto foi a
identificação de 200 genes da cana.
Outro resultado encontrado para esta firma foi o depósito de uma família de patente
“capturada” pelo recorte analítico da pesquisa, que ocorreu no ano de 2010 em pareceria com
pesquisadores da USP. A invenção não é diretamente ligada à tecnologia de produção do
etanol celulósico, mas pode abrir espaço para mudanças de características genéticas da cana,
as quais podem em teoria ser uteis ao E2G. Assim, a invenção provê sequências de ácidos
nucleicos isolados de promotores de genes de cana-de-açúcar; insere-se no campo da
engenharia genética, buscando regulação das expressões genéticas da planta201
.
Dentre as ações que não progrediam até o estabelecimento de plantas industriais
ligadas ao capital estrangeiro, tem-se o projeto da British Petroleum Biocombustíveis (PB), a
qual não passou de uma sondagem, não saindo do plano. Mas as especulações são
fundamentadas, visto que a BP no Brasil opera três usinas, duas em Goiás e uma em Minas
Gerais, em que juntas somam capacidade de moagem de 9,7 milhões de toneladas de cana-de-
açúcar e produção anual de 640 milhões de litros de etanol202
.
Outro elemento que condiz com a especulação é o fato da empresa ter adquirido em
2010 uma planta demonstrativa de etanol celulósico e um centro de tecnologia em
201
O título da patente é “promotores de cana-de-açúcar, cassetes de expressão, vetores e seu uso na expressão
de transgenes” (patente - BRPI1003751). 202
Desde janeiro de 2013, a BP realiza aumentos de capital, resultando na injeção R$ 1,218 bilhão nas usinas.
Em julho de 2016, a unidade Tropical, em Edéia/GO, passou a ter a maior capacidade produtiva de etanol do
Brasil (3,7 milhões de litros por dia de etanol)Disponível em: <
https://www.novacana.com/n/industria/usinas/usina-goiana-maior-pais-capacidade-producao-etanol-220716/>
Acesso em: 05 Novembro 2016.
235
biocombustíveis em Jennings (Louisiana/EUA), da empresa de tecnologia Verenium, que
atuava principalmente no segmento de desenvolvimento de enzimas. Este negócio
movimentou U$ 98,3 milhões.
Estes fatos somam-se à existência de um joint venture entre a BP e Dupont que visam
produzir Bio-butanol, a Butamax203
, a qual no início de 2017 adquiriu uma firma americana,
Nesika Energy, que possui uma planta de etanol nos Estados Unidos. O objetivo dessa
estratégia é transformar a unidade em uma produtora de bio-isobutanol, molécula produzida a
partir de fontes renováveis que pode ser usada na indústria química e em combustíveis
(adicionado à gasolina)204
.
Entretanto, estas condições não foram suficientes para a implantação do projeto no
Brasil. Ademais, em 2015 a BP decidiu descontinuar o projeto de etanol celulósico nos EUA
(Jennings/Louisiana), situação que acentua as incertezas em relação ao seu posicionamento
no segmento de etanol de segunda geração205
.
Mesmo não estabelecendo o projeto de E2G no Brasil, a BP demonstrou ao longo da
década de 2000 outras iniciativas em P&D, tanto por meio da Butamax como pela atuação da
BP Biocombustíveis. A Butamax possui em Paulínia/SP, desde 2010, um laboratório de
fermentação para obtenção de informações preliminares para dar apoio à produção futura de
bioisobutanol a partir da canadeaçúcar. Em 2011 apresentou projeto na chamada do PAISS
Industrial (Linha 2 – Novos produtos de cana-de-açúcar), foi selecionada, mas, não contratou
os recursos.
No que se refere às ações da BP Biocombustíveis na atividade de P&D, tem-se a
criação de uma equipe de pesquisadores para conduzir experimentos e investigações no
universo da produção do etanol a partir da cana-de-açúcar206
(12 ao todo). Em 2012 BP
203
A Butamax foi formada pela BP e pela DuPont em 2009, com 50% de participação cada. A joint venture
possuiu plantas de demonstração de bioisobutanol no Reino Unido e nos Estados Unidos. 204
Disponível em: http://www.valor.com.br/agro/4925434/butamax-de-bp-e-dupont-adquire-empresa-de-etanol-
nos-eua Acesso em: 03 de Julho de 2017. 205
Este movimento parece ser mais uma tentativa de reestruturação da estratégia global da empresa do que um
abandono das tecnologias renováveis baseadas na biomassa, pois o fechamento da estrutura em Louisiana vem
acompanhada do estabelecimento de um centro de pesquisas em biociências em San Diego (Califórnia/EUA), o
qual deve centralizar os recursos e capacidades desenvolvidas nos últimos anos (Disponível em: <
https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/bp-vender-ativos-etanol-celulosico-fecha-usina-centro-
pesquisa-150515/> Acesso em: 20 Outubro de 2016. 206
Segundo a reportagem da Revista PESQUISA FAPESP 202 – dezembro de 2012, a equipe de pesquisadores
no Brasil era composta por engenheiros e biólogos e estabelece interação com os pesquisadores do laboratório da
BP nos Estados Unidos, San Diego. A intenção é trocar informações e experiências no segmento de produção de
biocombustíveis. No mesmo, ano a BP anunciou investimentos de US$ 500 milhões durante 10 anos em
pesquisas feitas pelo Energy Biosciences Institute (EBI) para desenvolvimento de energias renováveis a partir da
236
Biocombustíveis assinou um acordo de cooperação científica e tecnológica com a FAPESP,
visando apoiar um programa de pesquisa colaborativo, que tinha a intenção de promover
projetos de pesquisa entre pesquisadores vinculados a instituições de ensino e pesquisa, do
Estado de São Paulo, e pesquisadores da BP.
O aporte financeiro era de no máximo US$ 25 milhões a serem desembolsados pela
FAPESP e de até US$ 25 milhões a ser desembolsada pela BP, com duração de dez anos. O
acordo ainda está em vigência, entretanto, na busca feita na base de dados da FAPESP não foi
encontrado nenhum projeto financiado no âmbito do acordo BP Biocombustíveis/FAPESP.
Outro caso ligado ao capital estrangeiro que se limitou a especulação foi a Abengoa
Bioenergy, multinacional com sede na cidade de Sevilha, Espanha207
. Possui e opera 16
unidades de produção de etanol localizadas nos Estados Unidos, Europa e Brasil, com uma
capacidade total de produção de 3,187 bilhões de litros por ano. Chegou ao Brasil em 2007 ao
adquirir o controle da Dedini Agro por R$ 1,3 bilhão.
No segmento do etanol celulósico, instalou uma planta-piloto em York (EUA) no ano
de 2007, visando processar a palha de trigo e resíduos de milho, com capacidade de 75.708,2
litros por ano. Para sustentar esse projeto, participou de uma linha de fomento à pesquisa do
U.S. Department of Energy (DoE) americano, a cost share Grant, recebendo US$ 97 milhões.
Em 2009 instala outra planta-piloto na região de Salamanca (Espanha), com capacidade de 1,3
milhões de litros de etanol ano, processando palha de trigo e de cevada. Já em 2011 constrói
uma planta industrial comercial de E2G na cidade de Hugoton (Kansas- EUA), para tal é
beneficiada com o empréstimo de US$ 133 milhões por meio do Energy Policy Act.
O projeto industrial da Abengoa no Brasil vem a reboque das ações realizadas nas
unidades no exterior, com tecnologia desenvolvida pela própria matriz. O objetivo era
construir uma plana de E2G em escala comercial na cidade Pirassununga/SP. O projeto foi
enviado e avaliado pelo PAISS Industrial sendo aprovado e concedido o aporte de R$
309.556.000 pelo BNDES na modalidade crédito. Mas a empresa desistiu de contratar os
recursos, alegando que os problemas financeiros existentes na companhia dificultavam a
tomada de créditos (ENTREVISTA X).
biotecnologia – iniciativa liderada pela Universidade de Berkeley, na Califórnia, em parceria com a
Universidade de Illinois, ambas nos Estados Unidos (FAPESP, 2012). 207
Tal firma pertence à Abengoa S.A., grupo industrial que atua no segmento de energia (biocombustíveis; solar,
eólica e transmissão elétrica) e presta serviços de engenharia nas áreas de energia e meio ambiente.
237
Em 2015 a Abengoa (matriz) iniciou um processo de reestruturação financeira que
abriu a possibilidade de venda de algumas das suas unidades produtoras de biocombustíveis.
Nos Estados Unidos, vendeu 5 plantas de etanol208
, mas até o presente momento, apesar das
especulações, continua atuando no Brasil, embora seu projeto de etanol celulósico continue
parado.
A Clariant é um firma multinacional do setor químico, com atuação no mercado
brasileiro, e planta industrial na cidade de Suzano/SP209
. Como tal, seu interesse no segmento
sucroenergético é o desenvolvimento da química verde, utilizando-se da biomassa de cana-de-
açúcar como matéria-prima para compostos químicos que possam integrar sua cadeia de
insumos ou de produtos finais.
O caso da Clariant até o momento é uma ação de especulação e de espera do deslace
do contexto, pois não apresentou em território nacional nenhuma proposta de P&D. Por outro
lado, vêm sistematicamente participando dos eventos da União da Indústria de Cana-de-
açúcar (UNICA), tanto como patrocinador como colaborador/palestrante210
indicando seu
interesse em explorar os potencias do segmento sucroenergético, haja vista, o
desenvolvimento da tecnologia Sunliquid, processo completo de produção de etanol
celulósico desenvolvido por ela.
A tecnologia de produção de etanol celulósico da Clariant está em testes em uma
planta pré-comercial (demo), localizada em Straubing (Bavieria/Alemanha)211
. Sua
capacidade é de 1 milhão de litros/ano de etanol celulósico, alimentada com 4,5 mil toneladas
de palha de trigo. O processo Sunliquid baseia-se na hidrólise enzimática e processo de
fermentação com micro-organismos geneticamente modificados desenvolvidos pela própria
Clariant. Com isso, projeta-se converter 90% da celulose e hemicelulose presentes no material
208
Disponível em: <http://www.canalbioenergia.com.br/etanol-2g-primeiras-plantas-comerciais-em-plena-
producao/> Acesso em : 10 Outubro 2016. 209
A Clariant no Brasil emprega 1.260 trabalhadores. Na cidade de Suzano/SP, funciona o maior parque fabril da
companhia na América Latina, concentra-se o maior número de pessoas, 823. A sede administrativa e o Centro
Regional de Desenvolvimento e Assistência Técnica, na capital paulista (276). 210
Em 2017 participou do Ethanol Summit como patrocinador e apresentou a tecnologia Sunliquid no painel
“Perspectivas para 2030: O Papel do Etanol Celulósico” (CAMPO VI). 211
Disponível em: < http://www.petroleoenergia.com.br/clariant-investe-no-etanol-celulosico/>. Acessado em:
25 de março de 2017.
238
fibroso em etanol212
. Um diferencial é que a planta integra a produção das enzimas no mesmo
local, o que proporciona a redução dos custos213
.
Até o presente momento (primeiro semestre de 2017) a Clariant não estabeleceu
nenhuma parceria com atores nacionais ou licenciou a sua tecnologia de produção do E2G em
território brasileiro. As únicas ações concretas foram: i) testes de conversão do bagaço de
cana-de-açúcar na sua planta demonstrativa, 40 contêineres de bagaço de cana do Brasil
foram enviados a Europa, a experiência demonstrou um rendimento de 300 litros de etanol
por tonelada de biomassa (bagaço); ii) Em 2016 a Clariant em cooperação com a Scania do
Brasil iniciou um teste/divulgação do etanol de segunda geração produzido pela companhia na
Alemanha, colocou em operação três caminhões Ecotrucks214
movidos a etanol nas operações
cotidianas da sua fábrica em Suzano/SP.
5.2.3. Iniciativas Exploratórias
Dentre as Iniciativas Exploratórias, as quais atingiram status e dimensões de execução
de projetos de P&D e desenvolvimento de competências em território nacional, têm-se os
casos da Oxiteno, Odebrecht Agroindustrial; Petrobras; Instituto de Pesquisas Tecnológicas
(IPT) e o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE). Todos estes
atores se caracterizam por implementar atividades de P&D na temática do etanol celulósico,
sendo realizadas internamente e/ou por meio de parcerias estratégicas.
A Oxiteno é uma multinacional brasileira, pertencente ao segmento petroquímico que
foi fundada em 1970, sendo a primeira firma brasileira a produzir óxido de eteno e derivados
no Brasil. A Oxiteno pertence ao grupo Ultra215
.
É líder nacional em tensoativos e em especialidades químicas, atuando no
desenvolvimento e fornecimento de insumos para indústrias, incluindo cosméticos, cuidados
212
Isso equivale em teoria uma razão de 4,5 toneladas de bagaço de cana para 1.000 litros de etanol celulósico
(CLARIANT, 2017). Estes números são super interessantes uma vez que 1 tonelada de cana-de-açúcar produz
entre 85 - 90 litros de etanol (CGEE, 2009). 213
Este design é semelhante com o modelo em desenvolvimento pelo CTBE – produção de enzimas “on site”. 214
Estes veículos são capazes de reduzir em até 92% a emissão de CO2 em comparação a veículos similares a
diesel. Os caminhões dispõem de uma tecnologia/adaptação do motor a diesel, assim, funcionam com uma
mistura de 95% de etanol e 5% de um aditivo especial – no caso o Master Batch ED 95, produzido pela Clariant
no Brasil. Disponível em: <http://www.unica.com.br/noticia/caminhoes-a-etanol-adquiridos-pela-clariant-
entram-em-operacao/>.Acessado em: 25 de março de 2017. 215
Uma companhia multinegócios que está entre os cinco maiores grupos empresariais do Brasil, teve início no
ano de 1937 com a distribuição de gás domiciliar. Atua nos seguintes segmentos econômicos: a) Distribuição e
varejo especializado, por meio da Ipiranga, no setor de combustíveis; da Ultragaz, no segmento de Gás
Liquefeito de Petróleo (GLP); e Extrafarma, no varejo farmacêutico; b) Indústria de especialidades químicas, por
intermédio da Oxiteno; c) Armazenagem de granéis líquidos, por meio da Ultracargo.
239
pessoais, limpeza doméstica e industrial, agroquímicos, tintas e vernizes. Os dois grandes
nichos de mercado da Oxiteno são os derivados de óxido de eteno e os solventes oxigenados.
Com a possibilidade do desenvolvimento da química verde alguns dos seus produtos podem
ser produzidos a partir do etanol e, é desta possibilidade que nasce seu interesse em
desenvolver a tecnologia e a produção do E2G e de bioquímicos216
.
A iniciativa de pesquisa da Oxiteno começou em 2004 com o estabelecimento de uma
equipe de trabalho da própria firma para realizar o levantamento do “estado da arte” da
tecnologia de conversão da biomassa – basicamente pesquisa bibliográfica.
Em 2006 por meio da cooperação entre Oxiteno, FAPESP e BNDES, abriu-se uma
chamada pública para recebimento de propostas de projetos de pesquisa na área de novas
tecnologias visando à produção de açúcares, álcool e derivados. A chamada pública previa o
investimento de R$ 6 milhões, sendo metade custeada pela Oxiteno e a outra metade pela
FAPESP e BNDES (JOÃO et al., 2012; VARRICHO, 2013). Os projetos que foram
aprovados seguiam as normas e os padrões do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria
para Inovação Tecnológica (PITE/FAPESP).
A chamada pública da Oxiteno apresentava 16 linhas temáticas, que versavam sobre a
metodologia analítica; hidrólise ácida; hidrólise enzimática; caracterização de bioprodutos e
estudos sobre a lignina. A chamada pública da Oxiteno foi uma maneira que a firma
encontrou para perseguir a nova(s) rota(s) tecnológica(s) sem desempenhar as atividades de
P&D internamente217
. Trata-se de uma estratégia da firma, a conversão da biomassa em
bioprodutos era uma área nova para a firma, na qual não apresentava competências internas e,
segundo Pedro Wongstchowski, Presidente do Grupo Ultra “montar uma equipe de pesquisa
nesses assuntos levaria cinco anos para começar a trabalhar eficientemente. Teríamos de
contratar e treinar gente, definir métodos...” 218
.
Outro ponto da ação é que por intermédio da chamada pública foi possível diversificar
os esforços, abarcando elementos das diversas rotas tecnológicas, já que os diferentes grupos
de pesquisa atuam em áreas distintas e complementares.
216
Na linha do óxido de eteno é possível obter o etilenoglicol (líquidos de arrefecimento) por uma rota verde
com etanol e na linha de solventes oxigenados a Oxiteno já comercializa Solventes Verdes obtidos a partir da
cana-de-açúcar, que dão origem a uma série de derivados e substituem os solventes sintéticos. 217
Disponível em: < http://www.bv.fapesp.br/namidia/noticia/7008/pesquisa_desenvolvimento_etanol/>
Acessado em: 10 Fevereiro de 2016. 218
Disponível em: < http://www.bv.fapesp.br/namidia/noticia/7008/pesquisa_desenvolvimento_etanol/>.
Acessado em: 10 Fevereiro de 2016
240
O convênio entre Oxiteno-FAPESP realizou uma chamada, em duas fases: na primeira
fase pré-aprovou 23 projetos, destes aprovou e financiou 4 auxílios à pesquisa e uma bolsas
no país, executados entre 2007-2012. As instituições que participaram e relacionaram-se neste
programa foram: o IPT com projeto sobre hidrólise enzimática; o IQSC/USP com o
desenvolvimento de metodologia analítica e deslignificação com o processo organossolve; o
Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS) com projetos de hidrogenólise e
Catalisadores; e por fim, a ESALQ/USP com a fermentação industrial tendo fungos como
agentes. Todos tangenciam o universo da tecnologia do etanol celulósico.
A Odebrecht Agroindustrial219
atua na produção e comercialização de etanol, açúcar e
energia elétrica a partir da biomassa. Fundada em 2007, a Odebrecht Agroindustrial
(primeiramente chamada de ETH Bioenergia) é uma firma subsidiária do Grupo Odebrecht220
.
A Odebrecht Agro é a segunda maior produtora de etanol do Brasil e o terceiro maior
grupo do setor sucroenergético em termos de capacidade instalada, composta por 9 usinas.
Todas somadas apresenta a capacidade instalada de 36 milhões de toneladas de cana-de-
açúcar, com isso emprega 12 mil trabalhadores e é capaz de produzir 700 mil toneladas de
açúcar, 3,7 mil m3 de etanol e gerar 3,1 GWh de energia elétrica a partir da queima da
biomassa restante (ANUARIO DA CANA, 2015). Na safra 2015/2016, atingiu a moagem de
29,2 milhões de toneladas de cana, o que representa um crescimento de 20% em relação à
safra anterior.
A Odebrecht Agroindustrial passa a realizar esforços na trajetória do etanol celulósico
a partir da implementação do PAISS Industrial. No contexto do programa ela estabelece dois
projetos, o primeiro visa à construção de uma planta em escala comercial de etanol celulósico
a partir do bagaço e da palha de cana-de-açúcar. O segundo projeto objetiva realizar
desenvolvimento proprietário da tecnologia de etanol celulósico. Ambas às ações contam com
parcerias estratégicas e com o financiamento púbico via PAISS Industrial (vide capítulo 3)
219
A composição acionaria da empresa em 2014 era XX do Grupo Odebrecht, 14,4% do BNDESPar, 13,1% do
Ashmore e 2,4% da Tarpon Investimentos.
Disponível em: <http://www.novacana.com/n/industria/financeiro/odebrecht-agroindustrial-injecao-capital-ceo-
060814/> Acessado em: 10 de abril de 2017. 220
A Organização Odebrecht é um conglomerado brasileiro de capital fechado que atua em diversas partes do
mundo (24 países) nas áreas de construção e engenharia, químicos e petroquímicos, energia, indústria,
desenvolvimento e operação de projetos de Infraestrutura e saneamento. Tem sua origem no setor da Construção
Civil em 1923, Salvador/BA.
241
O projeto de construção da planta comercial de E2G conta com o acordo de
licenciamento da tecnologia desenvolvida pela Inbicon (Dinamarca), contrato estabelecido em
2013. O objetivo da parceria é comprovar/validar o potencial da tecnologia da Inbicon – que
só operou em escala demonstrativa. Por outro lado, a execução do projeto possibilita a
Odebrecht Agro entrar na rota tecnológica do etanol celulósico e acompanhar os concorrentes.
A Inbicon é uma subsidiária da DONG Energy, a maior companhia dinamarquesa de
energia, com mais de 6.000 funcionários e receita na ordem de US$ 9,8 bilhões (2011). A
Inbicon apresenta testes com a tecnologia de conversão de biomassa já no fim dos anos 90.
Sua tecnologia baseada na rota enzimática realiza a transformação dos materiais
lignocelulósicos leves (palha de trigo, caules de milho, gramíneas) em etanol celulósico e
melaço de açúcar industrial.
Em 2009 realizou a instalação de uma planta na escala de demonstração na cidade de
Kalundborg (Dinamarca), utilizando como matéria-prima a palha de trigo. A capacidade da
unidade é de 1,5 milhões de galões por ano de etanol celulósico, 11.400 toneladas métricas de
pellets combustíveis de lignina e 13.900 toneladas métricas de melaços de açúcar industriais.
Esta planta se integra a uma estação de energia adjacente, realizando a produção de energia
elétrica.
Desta forma a empresa dinamarquesa oferece um pacote tecnológico com soluções
integradas para a produção do biocombustível, visando realizar as adaptações à realidade
brasileira. Por isso, em julho de 2013, amostras do bagaço de cana das usinas da Odebrecht
foram enviadas para Kalundborg, para serem testadas na planta de demonstração da parceira.
A tecnologia oferecida pela Inbicon engloba um processo de pré-tratamento diferente,
realizado em duas etapas, o pré-tratamento mecânico e o pré-tratamento hidrotérmico. Após
estes dois momentos produtivos, o composto resultante passa pela hidrólise enzimática e a
solução de açucares passa para o processo de fermentação, a qual é feita pelo uso de leveduras
geneticamente modificadas, possibilitando a co-fermentação dos açúcares C5 e C6. Na
sequencia realiza-se a destilação convencional com o objetivo de separar a água do etanol.
A formação deste arranjo para execução de atividade de inovação, mais a tradição
tecnológica da Inbicon, gerou uma expectativa de desenvolvimento bem otimista do projeto,
tais como, o início das operações em escala industrial em 2015. Mas como se sabe até o
primeiro semestre de 2017 a planta não foi sequer construída.
242
O projeto original da Odebrecht-Inbicon apresentavam três fase distintas que deveriam
ser executadas em 3 anos (2013-2016), a saber: a) comprovação de viabilidade tecnológica
(testes na planta de demonstração e aprimoramentos); b) planejamento da planta comercial e;
c) construção e operação da planta comercial. O projeto foi “interrompido” no segundo
momento quando a Odebrecht comprovou a viabilidade da tecnologia escolhida (em 2014).
Esta comprovação pode ser considerada como um dos resultados positivos do projeto
até o momento. Os testes feitos na planta demo, na Dinamarca, obtiveram resultados de custo
de produção do E2G abaixo do patamar estimado pela pesquisa conduzida pelo BNDES-
CTBE (MILANEZ et al. 2015). O custo de produção do biocombustível alcançado pela
Odebrecht-Inbicon foi de aproximadamente R$1/litro, quanto à estimativa da pesquisa era de
proximamente R$ 1,50/litro. Fato que indica a viabilidade técnica do projeto.
O acordo de licenciamento da tecnologia foi além da utilização, pois na busca de
família de patentes sobre E2G no Brasil foi possível encontrar 2 patentes da Odebrecht
Agroindustrial com cotitularidade com a Inbicon, que ao todo realizou 10 depósitos de
famílias de patentes no Brasil. Estas duas patentes foram depositadas na vigência do projeto
(2014) e abordam processo para a produção de um ou mais alcoóis a partir de matérias-primas
lignocelulósicas (BR102014023091; BR102014011796).
Na outra iniciativa de P&D impulsionada pelo PAISS Industrial teve-se o
estabelecimento do acordo de cooperação entre Odebrecht, VTT Brasil e Metso. Esta relação
gerou um consórcio de P&D, para a viabilização do desenvolvimento proprietário da
tecnologia de etanol 2G. Neste caso, a tecnologia é desenvolvida em conjunto entre os
parceiros.
A VTT Brasil221
é uma subsidiaria de um instituto de pesquisa finlandês especializado
em tecnologias de biorrefinaria e a Metso é uma empresa de bens de capital / engenharia com
tradição no segmento de papel e celulose, com origem na Finlândia.
A VTT Brasil também foi contemplada pelo PAISS Industrial de maneira “separada”
ao consórcio com a Odebrecht, assim, fechou um contrato de R$ 13,7 milhões com a FINEP,
sendo que quase R$ 10 milhões deste aporte são na modalidade recursos não-reembolsáveis e
o restante será a contrapartida da empresa.
221
A VTT Brasil era a única subsidiaria fora da Finlândia e foi inaugurada em 2011 na cidade de Barueri/SP, de
maneira concomitante ao estabelecimento do projeto com financiamento do PAISS Industrial. Um ponto
adicional é que esta empresa encerrou suas atividades no fim de 2016, situação que merece novos esforços de
investigação.
243
O objetivo fundamental do consórcio entre Odebrecht-VTT-Metso é o
desenvolvimento de uma solução tecnológica que viabilize a produção de etanol de segunda
geração integrada à produção de etanol de primeira geração e de energia elétrica no Brasil. O
escopo é desenvolver esses processos para a biomassa da cana-de-açúcar. Assim, o acordo
prevê transferência tecnológica e customização dos processos pensando a cana-de-açúcar (já
que as empresas parceiras já realizaram projetos semelhantes na Finlândia com resíduos de
madeiras).
De maneira paralela a Odebrecht Agroindustrial estabeleceu um acordo de cooperação
com a FAPESP em 2011, por meio do Programa de Apoio à Pesquisa em Parceria para
Inovação Tecnológica (PITE). O objetivo da chamada era promover projetos de pesquisa que
almejassem soluções novas e de relevância imediata para a construção de competências
científicas e tecnológicas na área de bioenergia, buscando também as aplicações com valor de
mercado222
. O edital completo da FAPESP-Odebrecht Agroindustrial previa o dispêndio de
R$20 milhões.
Em 2012 a primeira chamada recebeu um total de 29 propostas de pesquisa, das quais
11 foram selecionadas. O aporte financeiro para viabilizar estes projetos aprovados foi de R$
10 milhões, sendo que cada parte participou com 50% dos recursos. Estes projetos tiveram
duração de 60 meses (aproximadamente até 2016/2017 dependendo do início do cronograma).
Os projetos versam sobre a utilização de ferramentas modernas de bioinformática,
genética, expressão heteróloga de alta produtividade e Bioquímica Molecular Estrutural para
identificar, clonar e expressar em larga escala as xilose isomerases (Xls) que sejam novas e
potencialmente patenteáveis. Outros projetos abrangeram o desenvolvimento de pré-
tratamento do bagaço da cana para obter um hidrolisado hemicelulósico e, conduz testes de
isomerização e fermentação simultâneos de C5 usando leveduras comerciais e industriais em
condições reacionais próximas às encontradas nas usinas do país.
Dentre as Iniciativas Exploratórias há ainda os projetos conduzidos por instituições
públicas de pesquisa, que além de avançar o conhecimento do SSI da cana-de-açúcar na(s)
rota(s) do etanol celulósico gera competências locais (pesquisas votadas às características do
setor sucroenergético e conduzidas por pesquisadores brasileiros). Os destaque aqui ficam por
conta do IPT e do CTBE.
222
Disponível em: < http://agencia.fapesp.br/fapesp_e_eth_bioenergia_anunciam_resultado_de_chamada/16218/
> Acessado em 24 de julho de 2017.
244
O Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) tem como
objetivo prover apoio e soluções tecnológicas que visam aumentar a competitividade dos
setores econômicos e promover a qualidade de vida223
, tanto para o setor público como
privado. A ligação com o setor sucroenergético ocorre pela prestação de serviços (análise de
materiais; análise da composição da biomassa e etc.) e pela participação ou condução de
projetos de pesquisas relacionados à cana-de-açúcar ou um dos seus produtos.
Em 2010 iniciou um processo de elaboração e desenvolvimento de competências para
implantação de uma planta-piloto de gaseificação de biomassa da cana-de-açúcar. O objetivo
do projeto era desenvolver um processo completo de gaseificação da biomassa em escala
piloto, visando à produção de gás de síntese. Entre as metas da proposta estava o
estabelecimento de um Centro de Gaseificação224
na cidade de Piracicaba/SP, nas instalações
da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz - USP. Cada módulo tecnológico (pré‐
tratamento, gaseificação e limpeza de gases) seria desenvolvido pelo IPT e por outros
participantes da iniciativa em cooperação 225
.
O projeto do Centro de Gaseificação da biomassa era conduzido pelo IPT com
parcerias da Petrobrás, Oxiteno e Vale/VSE, os quais criaram um consórcio - o Biosyngas. A
ESALQ/USP e a Prefeitura da cidade de Piracicaba/SP participaram com concessões de
terreno e de infraestruturas para a instalação da planta-piloto (que não ocorreu). A iniciativa
contava ainda com o apoio tecnológico do CTC e CTBE. O orçamento total do projeto em
2012 era estimado em R$83 milhões, cada empresa parceira deveria aportar R$ 2 milhões,
durante toda a execução do projeto.
223
O instituto de pesquisas é vinculado a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e
Inovação do Estado de São Paulo, com sede na cidade de São Paulo e com dois centros tecnológicos no interior,
Franca/SP e São José dos Campos/SP. Foi fundado em 1899, como instituição ligada ao Gabinete de Resistência
dos Materiais da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. O instituto possui 37 Laboratórios e Seções
Técnicas, atuando em diversas áreas do conhecimento e segmentos econômicos, as quais se reúnem por meio de
quatro eixos: a) PD&I (Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação); b) Serviços tecnológicos; c) Apoio metrológico;
d) Informação e educação em tecnologia. Apresenta aproximadamente 800 empregados e no ano de 2015 emitiu
22.661 documentos técnicos. 224
O Centro de Gaseificação deveria oferecer suas instalações para projetos de pesquisa em escala laboratorial,
tanto para pesquisadores de universidades como de outras instituições Disponível em: <
http://agencia.fapesp.br/ipt_tera_planta_piloto_para_gaseificacao_de_biomassa_/15944/>. Acessado em 12 de
fevereiro de 2016. 225
O projeto previa a comprovação de conceito de uma planta industrial com capacidade de processar 400 mil
toneladas anuais de bagaço e palha de canadeaçúcar. Isso equivale aproximadamente à metade do bagaço e
palha gerados por uma usina, que faz a moagem de 4 milhões de toneladas de cana. Disponível em:
http://www.usp.br/espacoaberto/?materia=esalq-ipt-e-apla-juntos-no-estudo-do-bagaco-de-cana-de-acucar>.
Acessado em: 12 de fevereiro de 2016.
245
Com se sabe a planta-piloto não foi construída e o Centro de Gaseificação ainda
encontra-se em estágio de preparação226
, pois uma das condições para a efetivação do projeto,
o financiamento da planta-piloto, não aconteceu. O projeto pleiteou financiamento da FINEP
e do BNDES, mas ambas as organizações, após um período de negociação (em 2013)
desistiram de realizar aportes. A justificativa foi devido à conjuntura internacional
desfavorável, os preços do etanol e do petróleo e as perspectivas de desenvolvimento do gás
de xisto. Assim, o projeto da planta de gaseificação em Piracicaba/SP foi interrompido.
Além destes elementos que certamente pesaram contra o financiamento do projeto,
tem-se o fato que a FINEP e o BNDES fizeram escolhas, ou seja, decidiram apostar na rota
biotecnológica para a produção do E2G, mais especificamente, em tecnologias baseadas no
processo de hidrólise enzimática (ENTREVISTA V; ENTREVISTA X).
Mesmo com a não concretização da planta-piloto, a iniciativa promoveu avanços e o
desenvolvimento de competências locais, pois durante este período (2010 – 2017) o IPT
contou com “projetos satélites”, ou seja, pesquisas próprias do IPT que ocorrem paralelas e
relacionadas à temática da gaseificação da biomassa de cana-de-açúcar, fato que manteve a
discussão na agenda de pesquisa e os pesquisadores mobilizados.
Os avanços em pesquisa e o estabelecimento de competências locais ocorreram nas
seguintes áreas da tecnologia da gaseificação: i) análise das cinzas liberadas no processo de
queima da biomassa, ou seja, compreende-se melhor o comportamento das cinzas em relação
à biomassa - a composição química das cinzas, o ponto de fusão, a temperatura de liquefação
da biomassa, quanto de cinza é gerado por tonelada de biomassa processada; ii) Como as
cinzas são afetadas por características agrícolas, se variam com a região em que a cana é
plantada ou com a época do ano em que é colhida (influências da sazonalidade da cultura);
iii) Identificação dos aspectos físico-químicos da biomassa, reconhecimento dos genótipos da
cana que proporcionam um melhor processo de gaseificação (ações conduzidas pela
ESALQ/USP).
Os conhecimentos originados dessa iniciativa podem ajudar no processo de adaptação
e redimensionamento das máquinas e os equipamentos para a gaseificação, visto que a
iniciativa do IPT gerou informações e know-how sobre a biomassa da cana-de-açúcar, fato
226
Em apresentação feita na 3ª International Conferences Industry of the Future – Green Chemistry, em maio de
2017, o pesquisador do IPT Gerhard Ett indica que a ideia geral do projeto continua em andamento, mas ainda
não atingiu o estágio previsto no programa inicial.
246
novo na rota termoquímica, já que a literatura internacional e projetos demonstrativos ao
redor do mundo baseiam-se em outros tipos de biomassas.
Assim, estes avanços são relevantes, não apenas pelo “ineditismo”, mas porque a
interação meio-biomassa-equipamentos é sempre particularizada, dependentes das
especificidades locais, fato que pode condicionar o sucesso ou o malogro da produção dos
bioprodutos.
As pesquisas do IPT na rota termoquímica continuam – não apenas por ser parte da
estrutura de pesquisa do instituto (Laboratório de Engenharia Térmica - LET ), mas também
por que em janeiro de 2017 passou a integrar o projeto “BioValue: Valorizing the
Decentralized Biomass Production Chain for Advanced Biofuel Production: Development
and Evaluation of Thermochemical Routes Integrated with Biomass Production”227
, aprovado
no âmbito do convenio de cooperação entre a União Europeia, a FAPESP, o Ministério de
Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC) e do Conselho Nacional das
Fundações Estaduais Amparo à Pesquisa (CONFAP).
O Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), em função
da sua constituição, tem como objetivo contribuir para o avanço do conhecimento científico e
tecnológico do setor sucroenergético, atuando tanto nas áreas de produção e manejo da
biomassa quanto na conversão de biomassas em energia e materiais. Isso ocorre por meio de
atividades de P,D&I e capacitação de pessoas. Nesse processo visa estabelecer relações de
colaboração com outros atores do SSI da cana-de-açúcar – função já prevista e demandada
desde sua concepção228
.
227
Disponível em:
<http://agencia.fapesp.br/brazil_and_eu_to_conduct_joint_research_on_advanced_biofuels/24602/> Acessado
em: 04 de julho de 2017. Destaca-se que o O projeto atenderá às regras do Programa de Parceria para Inovação
Tecnológica da FAPESP (PITE). 228
Em 2005, o Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (NIPE/Unicamp), por meio de encomenda do
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), inicia um projeto de pesquisa exploratória para
identificar os fatores que limitam a expansão da produção brasileira de etanol, esta ação ficou conhecida como o
“Projeto Etanol”, sob a coordenação de Rogério Cezar de Cerqueira Leite (deu origem a relatório da CGEE –
“Energias renováveis: etanol de cana” de 2009). Dentre as conclusões do projeto tem-se a ideia que o Brasil teria
recursos naturais e financeiros, competência técnica e infraestrutura para substituir 10% da gasolina consumida
no mundo por etanol de cana em 2025. Para isso ser factível seria necessário superar importantes gargalos
tecnológicos, dentre eles a necessidade de aprofundar o conhecimento científico e tecnológico em todo ciclo
cana/etanol. Tais resultados consubstanciaram a criação de um instituição específica para sofisticar o ambiente
de C&T do segmento e, é nesse contexto que se insere o CTBE.
247
Suas atividades iniciaram em 2010 e sua criação é fruto das novas políticas públicas
implementadas a partir de 2006 (vide capítulo 3). É um importante ator do sistema, o qual
figura entre as três maiores instituições em publicações de artigos científicos sobre a temática
do etanol celulósico no Brasil (67 artigos - vide capítulo 4).
O CTBE devido a sua “natureza” e ao seu propósito, conduz e participa de diversas
iniciativas de P&D ligadas ao etanol celulósico. Desta forma, opta-se por expor apenas três
ações, as quais se destacam pela importância estratégica e por estabelecerem relações de
cooperação com outros atores do SSI da cana-de-açúcar. Estas são: i) Planta Piloto para
Desenvolvimento de Processos (PPDP) de etanol celulósico; ii) coquetéis enzimáticos e; iii) o
projeto de produção da tecnologia do etanol celulósico em parceria com a indústria.
A iniciativa de construir, operar e disponibilizar para estudos uma planta-piloto de
etanol celulósico trouxe uma mudança importante na qualidade da infraestrutura de C&T do
SSI da cana. A planta encontra-se disponível a pesquisadores de outras instituições e de
empresas, para realizarem testes e experimentos laboratoriais em escalas mais próxima das
condições operacionais reais da indústria.
Esta nova estrutura amplia as competências do SSI no campo das pesquisas relevantes,
tanto no que diz respeito à fronteira do conhecimento como em projetos antenados às
necessidades do setor produtivo (ENTREVISTA I; ENTREVISTA VII). Portanto, a planta-
piloto é um elemento importante para o desenvolvimento científico e tecnológico, visto que a
estrutura dá condições de realizar a ampliação de escala de processos relacionados ao ciclo
cana-de-açúcar/etanol e da química verde até a escala semi-industrial.
A segunda iniciativa se destaca pelo esforço de desenvolvimento de um coquetel
enzimático nacional para a produção do E2G, visto que em todos os casos existentes de
“produção” do novo biocombustível em território brasileiro, são empregados insumos
tecnológicos (as enzimas) desenvolvidos no exterior e controlados por grandes multinacionais
estrangeiras.
O projeto é conduzido por meio de uma parceria entre CTBE, Embrapa e a
Universidade de Caxias do Sul (UCS). O objetivo central é criar um coquetel enzimático a
partir de micro-organismos presentes nos biomas brasileiros. Para tal, utiliza-se de técnicas de
melhoramento genético clássico ou via engenharia genética e pela suplementação do coquetel
com proteínas auxiliares. Com isso, seleciona-se e isolam-se características desejáveis dos
248
microrganismos capazes de degradar as ligações dos polissacarídeos presentes nas fibras da
biomassa de cana-de-açúcar (ENTREVISTA VII).
O coquetel atualmente (em 2017) em teste foi obtido a partir da seleção e do
isolamento de aproximadamente 5 mil linhagens e clones de microrganismos. As enzimas
produzidas nesse projeto partem dos fungos da espécie Trichoderma harzianum (P49P11) e
Penicillium echinulatum (ENTREVISTA VII).
Os custos das enzimas do coquetel criado pelo CTBE ainda estão em um valor não
competitivo, na casa de US$ 0,10 por litro de etanol, quando o ideal é chegar em US$ 0,05
por litro de etanol, conforme objetivo do projeto (ENTREVISTA VII). Uma das formas de
acelerar a redução dos custos de produção das enzimas é criar um sistema de produção de
enzimas acoplado à unidade de produção do etanol 2G. Este sistema também vem sendo
desenvolvido pelo CTBE e denomina-se produção de enzimas “on site”.
Com este sistema de reprodução das enzimas é possível utilizar a própria matéria-
prima e os insumos disponíveis na usina para sustentar a produção dos micro-organismos,
assim, reduze-se o custo final do etanol, pois suprime os gastos com transporte e
armazenamento e, ainda, dependendo da configuração adotada pela unidade, pode eliminar
completamente os fornecedores de insumos tecnológicos (reduz os custos de transação).
A terceira iniciativa em destaque é o projeto de desenvolvimento da tecnologia de
produção do E2G. O projeto de P&D conjunta é conduzido pelo acordo de cooperação entre
CTBE, Dow, DSM e BNDES. O projeto contempla todas as etapas de produção do etanol 2G,
assim, visa estabelecer uma rota de conversão de biomassa proveniente de cana-de-açúcar em
etanol, para tal parte-se da rota enzimática.
Segundo Di Giorgio (2016), o valor do projeto é de R$24,3 milhões, com duração de 3
anos e 3 meses (abril de 2014 - julho de 2017). O pacote tecnológico desenvolvido nessa
parceria seria/será utilizado pela Dow em conjunto com sua parceira, a trading japonesa
Mitsui & Co. Ltda, para produzir plástico verde (polietileno) a partir do etanol de cana-de-
açúcar, em uma fábrica em Santa Vitória/MG (a unidade provável é a Usina Santa Vitória
Açúcar e Álcool que pertence a Dow).
A DSM responsabiliza-se por comercializar o processo de produção de etanol 2G
resultante desta iniciativa para outros empreendimentos. E, assim, incluiria as suas enzimas e
leveduras de fabricação própria. A participação do CTBE ocorre por meio da disponibilização
249
dos recursos humanos e infraestrutura laboratorial necessários ao projeto229
. O BNDES
participa com o aporte financeiro de 90% do seu valor total, por meio do instrumento Funtec.
A Dow e a DSM aportam apenas 5% cada uma.
5.2.3.1. A Iniciativa da Petrobras/Cenpes230
A Petrobras é uma empresa brasileira de capital aberto, cujo acionista majoritário é o
Governo do Brasil (a União), portanto, uma empresa estatal de economia mista231
. Opera no
segmento de energia, principalmente, nas áreas de exploração, produção, refino,
comercialização e transporte de petróleo, gás natural e seus derivados232
.
Em relação ao setor sucroenergético, além da sua atuação na distribuição e logística do
etanol, que remonta o início do Proálcool (SZMRECSÁNYI, 1979; SZMRECSÁNYI &
MOREIRA, 1991), criou em 2008 a subsidiaria Petrobras Biocombustível S.A. (PBIO), tendo
por finalidade a produção de etanol e biodiesel, bem como quaisquer outros produtos e
atividades correlatas. Esta nova empresa possuía participações societárias na Guarani S.A.;
Nova Fronteira Bioenergia S.A. e Bambuí Bioenergia S.A, somando a capacidade total de
moagem de 31,2 milhões de t/ano de cana-de-açúcar.
A condução do desenvolvimento de competências tecnológicas e de novas tecnologias
ocorre na Petrobras por meio das ações do Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo
Américo Miguez de Mello (CENPES)233
. O Cenpes atua no desenvolvimento de tecnologias
fundamentais para o desenvolvimento da produção de óleo e gás e em outras áreas
estratégicas da companhia, tais como o pré-sal e as energias renováveis.
Em 2015, os gastos em P&D totalizaram R$ 2 bilhões, sendo que R$ 44,4 milhões
foram dedicados à área de Energia Renovável, destes 60% foram empregados somente em
229
Vale destacar que dada à existência da planta-piloto do CTBE, a tecnologia esta sendo desenvolvida no
próprio laboratório (DI GIORGIO, 2016) 230
A Petrobras merece um destaque dentro da categoria de Iniciativas Exploratórias porque é uma ação
sistematizada e de longa duração promovida por um ator nacional, o qual respondeu as motivações nacionais em
desenvolver tecnologia na rota do etanol celulósico (projeto com 12 anos de duração, 2004 – 2016). A iniciativa
também se torna relevante porque apresentou patenteamento de tecnologias (5 famílias de patentes na rota do
etanol celulósico), estabeleceu parcerias estratégicas na rota do E2G antes mesmo da implementação do PAISS
Industrial. 231
A Petrobras foi criada no Governo Vargas em 1953 e deixou de monopolizar a indústria petroleira no Brasil
em 1997. 232
Disponível em: < http://www.petrobras.com.br/pt/quem-somos/>. Acessado em 10 de junho de 2017. 233
Esta unidade foi criada em 1963. É a responsável pela coordenação das atividades de pesquisa,
desenvolvimento e engenharia básica da Petrobras e também pela articulação com instituições e firmas parceiras
em projetos de desenvolvimento tecnológico. o Cenpes contava em 2014 com um efetivo de 1.950 profissionais,
onde 1.336 tem nível superior, sendo 626 bacharéis, 466 mestres e 244 doutores e pós‐doutores. Dentre esses
profissionais, 677, onde 60% são mestres, doutores e pós‐doutores (Petrobras, 2014).
250
biocombustíveis. Estes gastos foram subdivididos entre as seguintes subáreas de pesquisa: a)
Biocombustíveis avançados (R$ 18,5 milhões); b) Biocombustíveis de primeira geração (R$
9,7 milhões); c) Energia de resíduos urbanos e de vinhaça (R$ 6,8 milhões); d) Solar (R$ 6,8
milhões); e) Eólica (R$ 2,6 milhões). Vale destacar que este montante investido representou
uma diminuição de 49,8% em relação a 2014 (no total de gastos em energias renováveis).
O Cenpes conduz um conjunto amplo de projetos de pesquisa ligados ao setor
sucroenergético e aos biocombustíveis em geral. Esta unidade de P&D tem um caráter
estratégico, não apenas para a Petrobras, mas ao Brasil, pois desenvolve competências locais
em segmentos econômicos em que o país apresenta potenciais naturais e tradição produtiva
(petróleo e biocombustíveis).
Ademais, as suas pesquisas subsidiam políticas públicas. Um exemplo importante e ao
mesmo tempo ligado ao SSI da cana-de-açúcar é o estudo conduzido entre os meses de julho a
outubro de 2014, sobre os possíveis impactos no aumento da mistura de etanol à gasolina
(mais 2,5%). Esta pesquisa avaliou as variáveis emissões, consumo e desempenho veicular,
associada a análises físico-químicas da gasolina com diferentes teores de etanol (22%, 25%,
27,5% e 30%) em diferentes veículos e motos, tendo demonstrado ser tecnicamente viável a
mudança do teto para 27,5%. Este estudo foi uma requisição direta do Governo Federal234
,
que alterou em 16 de março de 2015 a mistura entre etanol e gasolina para 27%235
.
No que tange o etanol celulósico, as ações de pesquisa industriais visando os
biocombustíveis avançados tiveram início em 2004, antes mesmo da criação da Petrobras
BIO. O desejo de dominar o processo de produção do etanol celulósico motivou a estatal a
estabelecer ações sistemáticas de P&D nessa perspectiva, pois considerava estratégico liderar
e ter o controle sobre uma inovação que poderia afetar o segmento de combustíveis líquidos
(ENTREVISTA IX).
Assim, optou-se desde o início realizar o desenvolvimento próprio da tecnologia e
buscar parcerias em algumas etapas específicas, as quais não detinha familiaridade ou seria
muito dispendioso desenvolver sozinha – como a seleção, desenvolvimento e produção de
enzimas, que envolveu a parceria com a Novozymes em 2010.
234
Informações disponíveis no Relatório de Tecnologias da Petrobras de 2014. Disponível em:
<http://www.petrobras.com.br/pt/nossas-atividades/tecnologia-e-inovacao/relatorio-de-tecnologia/>. Acessado
em: 25 de março de 2017. 235
Disponível em: < http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2015/03/aumento-do-etanol-na-gasolina-foi-
precedido-por-um-estudo-entenda > Acessado em: 25 de março de 2017. Disponível em: <
http://www.brasil.gov.br/economia-e-emprego/2015/03/adicao-de-27-de-etanol-na-gasolina-e-estabelecida-pelo-
governo> Acessado em: 25 de março de 2017.
251
Ente os anos de 2004 – 2006 Cenpes/Petrobras estabeleceu parcerias com instituições
de ensino e pesquisa nacionais visando aprofundar e adquirir conhecimento sistematizado
sobre a tecnologia de etanol celulósico. Dessa relação, resultaram projetos exploratórios com
a Universidade Federal o Rio de Janeiro (UFRJ), com a Universidade Federal de Brasília
(UNB) e com a Universidade Federal do Amazonas (UFAM) (ENTREVISTA IX).
Neste período inicial realizou o estudo e a seleção das rotas tecnológicas e dos
processos de produção do E2G. Estabeleceu testes em laboratório e o aprofundamento da
pesquisa, tais como o screening de microrganismos produtores de enzimas, ou seja, uma
triagem das características, dos potenciais e das funcionalidades dos micro-organismos no que
se refere à produção de enzimas capazes de quebrar as ligações das moléculas de açúcar
(ENTREVISTA IX).
Outros avanços conseguidos nesta etapa do projeto foi o estabelecimento da produção
de etanol celulósico em laboratório, atingindo os resultados de 220 litros de etanol /t de
bagaço seco, com o depósito de 2 patentes relacionadas ao processo de produção do etanol de
segunda geração (ENTREVISTA IX).
Entre 2006 – 2008 o Cenpes construiu e operou uma planta-piloto de etanol celulósico,
processando bagaço de cana-de-açúcar e a torta da mamona, período em que foram realizados
cerca de 90 ensaios com o bagaço, reproduzindo os mesmos resultados de laboratório (220
litros de etanol/t de bagaço). O design tecnológico da plata-piloto da Petrobras era baseado na
rota enzimática com Sacarificação e Fermentação Simultânea (Glicose - C6) e fermentação da
Xilose (C5) em um reator separado (ENTREVISTA IX).
E é nesta fase do projeto que se inicia o processo de avaliação e escolha de novas
parcerias, visando acelerar o processo de aprendizagem e estabelecer o processo em escala
comercial. Deste modo, no ano de 2010 a Petrobras firmou contrato de desenvolvimento
conjunto com a KL Energy Corporation (KLE)236
visando desenvolver a tecnologia de
produção do E2G237
. Com isso, a Petrobras é a primeira empresa a estabelecer parceria
estratégica com firmas estrangeiras visando a construção de uma planta industrial – antes
mesmo do lançamento do PAISS Industrial.
236
Que em 2011 passa a ser denominada Blue Sugars Corporation (Blue Sugars). Disponível em:
http://www.biofuelsdigest.com/bdigest/2013/05/17/ciao-western-biomass-energy-formerly-blue-sugars-
formerly-kl-energy/. Acessado em 07 de julho de 2016. 237
Disponível em: < http://fatosedados.blogspetrobras.com.br/2010/08/24/petrobras-e-kl-energy-assinam-
contrato-para-desenvolver-tecnologia-de-etanol-celulosico/> Acesso em: 05 Novembro 2016.
252
A KLE é uma firma americana que atua no segmento de produtos energéticos à base
da celulose238
, seus testes para a produção do etanol celulósico a partir dos resíduos de
madeira iniciaram-se em 2008, chegando a construir e a operar uma planta industrial em
escala demonstrativa239
.
Por meio do projeto de P&D em cooperação, a Petrobras investiu US$ 11 milhões para
adaptar as instalações da unidade de demonstração da KLE, para permitir o processamento de
bagaço de cana-de-açúcar como matéria-prima (ENTREVISTA IX). Segundo Correa (2014,
p. 86) este “acordo firmado garantia, inicialmente, a exclusividade mútua por 18 meses
(Acordo de Licenciamento Cruzado) e o desenvolvimento (otimização) conjunto da tecnologia
(Acordo de P&D) para a produção de etanol celulósico da empresa”. Acrescenta-se que o
acordo permitia a Petrobras obter a licença de uso da tecnologia KLE.
De maneira paralela e relacionada à parceria com a KLE, a Petrobras estabeleceu em
2010 um acordo de cooperação com a Novozymes, visando à redução de custos e aumento da
eficiência do processo de fabricação do etanol celulósico a partir da otimização de enzimas
(ENTREVISTA IX). A parceria PetrobrasNovozymes foi vigente entre 2010-2013 e era
baseada em contratos de fornecimento de insumos tecnológicos, sendo que as melhorias de
processo ou métodos novos que viessem a sair dos testes realizados no Cenpes seriam de
propriedade da Petrobras (ENTREVISTA IX).
O objetivo final do projeto Petrobras-KLE era o desenvolvimento de uma usina de
etanol celulósico em escala industrial (capacidade de 40 milhões de litros/ano), que deveria
ser totalmente integrada a uma usina de cana-de-açúcar pertencente ao Grupo Petrobras, no
Brasil. Estava prevista para entrar em funcionamento em 2013, depois se alterou a meta para o
start em 2015.
O projeto não atingiu seu último estágio, a implantação e a produção de etanol
celulósico no Brasil. Segundo a ENTREVISTA IX, isso se deu pelo estabelecimento de uma
“conjuntura desfavorável” em relação aos custos de produção do E2G e da própria condução
238
Os produtos energéticos de segunda geração fabricados pela KLE eram o etanol, a biolignina e produtos
químicos intermediários. No seu portfólio ainda oferece serviços de engenharia, de otimização e técnicos para as
instalações. Disponível em: < http://www.ethanolproducer.com/articles/7485/gearingupforbagasse> Acessado
em 21 de maio de 2017. 239
A planta de demonstração da KLE localiza-se na cidade de Upton, no Estado de Wyoming - EUA. O design
tecnológico da planta é composto por um processo de pré-tratamento termomecânico e um sistema de hidrólise
enzimática, feitos em momentos distintos e em reatores separados.
253
de novos investimentos que deveriam ser feitos pela Petrobras e pelas usinas parceiras. Os
elementos expostos a seguir elencam os motivos da interrupção do projeto:
i) os resultados dos testes feitos no âmbito do projeto Petrobras-KLE indicavam que o
processo desenvolvido funcionava e estava no limiar da economicidade, ou seja, a produção
do E2G era tecnicamente e economicamente viável, entretanto, o valor pago pela venda de
energia elétrica no mercado spot deveria se manter no patamar de 100 R$/MWh, pois a nova
unidade de produção de etanol celulósico iria se utilizar do bagaço restante da produção de
energia elétrica já estabelecida pelas usinas.
As usinas nas quais a Petrobras detinha participação acionária já tinham contratos de
“longo prazo” firmados com a venda do excedente de energia elétrica, portanto, apresentavam
estrutura de cogeração em funcionamento. Como no segundo semestre de 2014 e no primeiro
semestre de 2015 o preço pago pela energia no mercado spot subiu, tendo o seu pico em
novembro de 2014 (804,54 R$/MWh)240
, as usinas parceiras optaram por destinar esse bagaço
“extra” para mais geração de energia elétrica, aproveitando a estrutura produtiva já instalada
ao invés de realizar novos investimentos. As oportunidades de retorno com a venda de energia
elétrica eram melhores que a venda de mais etanol;
ii) Nesse mesmo período a Petrobras passou a sentir os efeitos econômicos e políticos
de duas situações que afetavam diretamente o “caixa” da companhia - a queda dos preços
internacionais do barril de petróleo e a políticas de preços da gasolina praticada no mercado
interno. Tal situação impôs uma restrição dos recursos para a área de biocombustíveis,
limitando os novos investimentos e a tomada de novos empréstimos para a condução do
projeto. É por isso que a Petrobras desistiu de contratar os recursos disponíveis pelo PAISS
Industrial;
iii) A crise institucional também afetou o “animo” da companhia para
empreendimentos de alto risco241
. Mesmo com os testes e a pesquisa comprovando a
viabilidade técnica do conjunto tecnológico desenvolvido pela Petrobras, existia um alto risco
tecnológico que a companhia não estava mais disposta a correr (situação crível diante dos
problemas enfrentados pelas outras unidades em funcionamento).
240
Informações obtidas na ENTREVISTA IX. Mas também podem ser vistas nos dados da Câmara de
Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), disponíveis em: <
https://www.ccee.org.br/portal/faces/pages> Acessado em 16 de julho de 2017. 241
Segundo ENTREVISTA IX “a primeira planta seria para ganhar experiência e não ganhar dinheiro”
acreditava-se que ajustes e a superação de entraves tecnológicos seriam necessários, demandando novos esforços
em pesquisa e, principalmente, melhoramento da tecnologia de processo.
254
Mesmo com a sua interrupção, o projeto conduzido pela Petrobras apresentou alguns
resultados tais como: i) atualizou/adaptação de planta de demonstração em Upton/EUA, sendo
capaz de processar tipos diferentes de biomassa (resíduos de madeira e bagaço de cana),
atingindo a produção de 80 mil litros de etanol celulósico em 2012; ii) desenvolveu
capacidades de produção de leveduras in loco; iii) validações do processo de produção
desenvolvido no Cenpes; iv) em 2012 a Petrobras movimentou 40 minivans durante a Rio+20,
com etanol celulósico da sua planta de E2G em escala-piloto, transportando 8 mil
conferencistas242
; v) a KLE consegui obter créditos do programa Renewable Identification
Numbers (RIN)243
por intermédio da produção do etanol celulósico da sua planta de
demonstração com bagaço de cana-de-açúcar.
A iniciativa do etanol celulósico com bagaço de cana deu origem a outros projetos de
pesquisa “menores”, que ocorriam paralelamente, como de avaliação de outras matérias-
primas. Foram feito testes entre 2014-2015 com o cacho vazio de palma (dendê), resíduo da
extração do óleo do fruto. A solução Cenpes identificou que o cacho possui em sua
composição 40% de celulose e 20% de hemicelulose (indicativos da concentração de
açúcares), teores bem similares ao do bagaço e propícios para produção de etanol.
Para dizer o mínimo, as ações da Petrobras/Cenpes encontram-se descontinuadas e
imersas a grandes incertezas, pois o novo Plano de Negócios e Gestão (2017-2021)244
da
companhia prevê a retirada da estatal dos setores de biocombustíveis, distribuição de GLP
(gás de cozinha), produção de fertilizante e das participações na petroquímica, ação esta que
implicará a venda dos ativos da empresa. O argumento principal dessa nova racionalidade da
empresa é preservar competências tecnológicas em áreas com maior potencial de
desenvolvimento, mais próximas do core competence da firma.
242
Disponível em: < https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/projeto-usina-etanol-celulosico-
pbio-parado-270315/> Acesso em: 05 Novembro 2016. 243
É um número de identificação para os combustíveis renováveis, estes são atribuídos a um “lote” de
biocombustíveis com o objetivo de rastrear sua produção, o uso e a comercialização conforme os padrões
estabelecidos pela U.S. Environmental Protection Agency (EPA), os quais passam a vigorar com a
implementação do programa Renewable Fuel Standard (RFS) – criado a partir da Energy Policy Act of 2005. 244
O plano de negócios da Petrobras foi anunciado em 20/09/2016.
255
5.2.4. As iniciativas Estruturadas: desenvolvimento e adoção da tecnologia de etanol
celulósico no Brasil
As Iniciativas Estruturadas são os projetos que atingiram o status de plantas de
demonstração e plantas comerciais, sendo capazes de trabalhar em condições reais,
explorando o cotidiano e vivenciando os problemas da produção industrial do E2G. Os casos
que se encaixam nessa categoria são: CTC; GranBio e Raízen.
A tabela 5.1. indica os detalhes dos projetos indústrias em curso no Brasil, sinalizando
para a capacidade produtiva instalada, aspectos técnicos das plantas, início das atividades e as
relações estabelecidas no âmbito do projeto. Outros dados serão adicionados a esta “síntese
preliminar”, nas próximas subseções, abarcando outras dimensões que envolvem os esforços
de adoção e de desenvolvimento da tecnologia de segunda geração no Brasil.
Tabela 5.1. Projetos indústrias de etanol celulósico no Brasil (Iniciativas Estruturadas),
aspectos gerais (2016).
Fonte: elaboração própria
5.2.4.1. Centro de Tecnologia Canavieira (CTC)
O CTC é considerado o maior centro de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em cana-
de-açúcar do mundo, com atuação em toda a cadeia produtiva do setor canavieiro (cana-de-
açúcar, etanol, açúcar e bioenergia). Foi criado em 1969, por meio da iniciativa da
Cooperativa de Produtores de Cana-de-Açúcar, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo
(COOPERSUCAR), um grupo de usinas da região de Piracicaba/SP245
.
245
Em 2004, passa por um processo de reestruturação e torna-se uma instituição de pesquisa sem fins lucrativos
“independente” da COOPERSUCAR. As suas receitas eram provenientes, substancialmente, das contribuições
associativas das firmas cooperadas pela COOPERSUCAR e, por outras firmas do setor fora da chancela da
cooperativa (“concorrentes”).
256
Em 2011, torna-se uma Sociedade Anônima (S.A.) por ações de capital fechado,
passando a buscar o lucro e a remuneração de seus acionistas246
. Em junho de 2016 a
composição acionária do CTC era a seguinte: 19,93% da Raízen Energia S.A.; 17,68% da
Copersucar S.A.; 15.03% do BNDES Participações S.A.(BNESPAR) e demais acionista
ficavam com 47,37% das ações247
.
Seu objetivo é a pesquisa, o desenvolvimento e a comercialização de tecnologias para
o setor sucroenergético, com destaque para o desenvolvimento de novas variedades de cana-
de-açúcar, por meio do melhoramento genético. Assim, a atuação do CTC ocorre por
intermédio de 4 linhas de P&D, a saber: i) Melhoramento Genético - envolve o
desenvolvimento de novas variedades de cana-de-açúcar (melhoramento genético tradicional;
uso de marcadores moleculares; engenharia genética); ii) Novos sistemas de plantio - criação
de sementes artificiais de cana-de-açúcar e novos processos de plantio; iii) Biomassa -
processamento e peletização do bagaço e da palha da cana para gerar energia; iv)
Modernização das usinas - redesenho do conceito de usinas, com a adoção de melhores
práticas em engenharia e biotecnologia indústria (etanol celulósico; butanol e upgrade na
produção do E1G).
A sede do CTC está localizada no município de Piracicaba/SP, onde também se
encontram uma planta-piloto de etanol celulósico e um complexo de Laboratórios de
Biotecnologia Agrícola. Somam-se ainda outras estruturas do CTC como os polos de
melhoramento genético em sete cidades diferentes (Maringá/PR; Qurinópolis/GO;
Goianésia/GO; Camamu/BA; Piracicaba/SP; Ribeirão Preto/SP; Araçatuba/SP) e 10
escritórios de vendas (Dourados/MS; Maringá/PR; Goiânia/GO; Uberaba/MG;
Uberlândia/MG; Piracicaba/SP; Ribeirão Preto/SP; São José do Rio Preto/SP; Assis/SP e
Araçatuba/SP).
A relevância do CTC no setor é dada pela abrangência das suas variedades de cana-de-
açúcar, as quais respondem por um de cada três hectares do canavial brasileiro
(aproximadamente 3,33 milhões de hectares) (ENTREVISTA VI). Ademais, o CTC realizou
e realiza um conjunto amplo de ações em P&D voltadas ao setor sucroalcooleiro que vão além
246
Segundo Correia (2014) em 2011 a Copersucar era a maior acionista com 25% da participação, seguida da
Raízen, com 20%; além da Bunge, Tereos International, Grupo São Martinho e Usina Coruripe. 247
No ano de 2016 o CTC enviou um pedido para registro de companhia aberta junto à Comissão de Valores
Mobiliários (CVM), bem como autorizar a adesão da Companhia ao segmento de listagem Bovespa Mais da
BM&FBovespa. O registro como companhia aberta e a listagem no Bovespa Mais integram o acordo feito em
março de 2014 com o BNDES. Disponível em:
<http://ri.ctc.com.br/upload/files/0049_DFs_CTC_30.06.2016.pdf> Acessado em 14 de julho de 2017.
257
do desenvolvimento e introdução de novas variedades de cana-de-açúcar. O quadro 5.2. visa
dar uma visão geral de outras atividades ligadas a inovação do centro de pesquisa, as quais
tangenciam o universo do E2G.
Quadro 5.2. Ações de destaque do CTC em P&D Ação/Estrutura Informação / Destaque
Banco de
germoplasma
# Início em 1969;
# O maior banco de germoplasma do mundo;
# 4.000 variedades;
# Cruzamentos dirigidos para cada uma das regiões canavieiras do País;
CaneBioFuels
# European Union's Research and Innovation funding programme (FP7);
# Início em 2009;
# Financiado de cerca de 1,6 milhões de euros;
# Projeto de pesquisa em cooperação com outras instituições;
# Objetivo criar uma plataforma científica e tecnológica para o desenvolvimento, em
escala comercial, de um processo de conversão da biomassa de cana-de-açúcar em açúcar
fermentáveis;
# Parceiros – Novozymes; USP, Unicamp, UFPR, CTBE, IPT e Embrapa;
Leveduras
# Início em 2013;
# Projeto de pesquisa que visa compreender e desenvolver leveduras com características
especiais para a produção de etanol;
# Parceria - USP/ESALQ.
Projeto
CTC/Embrapa
# Início em 2012;
# Parceria estratégica para atuar em três frentes de pesquisa. 1) Melhoramento Genético; 2)
Biotecnologia Agrícola; 3) Biotecnologia Industrial – desenvolvimento de enzimas;
# Aproximadamente 15 pessoas do CTC estão envolvidas no projeto;
# Investimento na ordem de R$ 7 milhões - 90% do BNDES e 10% do CTC;
Laboratório de
Biotecnologia
Agrícola
# Inaugurado em 2015;
# Investimentos de aproximadamente R$ 40 milhões;
# 75% dos aportes nos laboratórios vieram do PAISS Industrial (BNDES/FINEP);
# Reorganiza e potencializa as linhas de pesquisas já desenvolvidas pelo CTC – nova
infraestrutura e equipamentos;
#Pesquisa em marcadores moleculares tem o objetivo de identificar e selecionar
características desejáveis na cana;
# Pesquisas em novas variedades de cana por meio de melhoramento genético –
objetivo é novas variedades mais produtivas, com maior teor de açúcar, tolerantes à
seca e resistente às pragas;
# Pesquisa em Biotecnologia é basicamente voltada ao desenvolvimento de
microrganismos para produzir enzimas (objetivo hidrolisar material
lignocelulósico);
# Pesquisa em biotecnologia apresenta um grupo de 30 pesquisadores,
aproximadamente 30% são estrangeiros;
# Pesquisa em sementes artificiais visa substituir o processo de plantio de cana com
"toletes" (pedaços de cana);
# O potencial das sementes artificiais - "Para cada hectare de cana é necessário de
15 a 18 toneladas de cana em tolete, mas com as sementes, são necessárias apenas
meia tonelada de sementes” – redução de custos na renovação do canavial.
Cana-de-açúcar
transgênica
# Lançamento 2017;
# Resistente à broca (Diatraea saccharalis);
# A infestação da broca e representa perda estimada de R$ 370 por ha/ano, um valor alto,
considerando os 9,5 milhões de hectares cultivados com cana no país;
Fonte: Elaboração própria.
258
A iniciativa do CTC para obter competências na tecnologia do etanol celulósico inicia
em 2007248
. Entre os anos de 2007 - 2008 ocorreram pesquisas exploratórias e experimentos
em escala laboratorial. De maneira concatenada, em 2007, o CTC estabeleceu uma parceria
com a Novozymes visando testar e desenvolver tecnologia de processo em hidrólise
enzimática – essa parceria ocorreu no âmbito do convênio de pesquisa financiado pela União
Europeia (FP7 2020).
A iniciativa deu origem a uma planta semi-piloto de E2G, ou seja, uma unidade de
desenvolvimento de processo com equipamentos não conectados. Esta estrutura ficava/fica
localizada na sede do CTC, na cidade de Piracicaba/SP. A capacidade da planta era de 1 mil
litros de etanol/dia. Assim, entre 2009 - 2010 foram realizados diversos testes na escala semi-
piloto em Piracicaba/SP (ENTREVISTA VI). Este projeto era conduzido com recursos
próprios e provenientes do convênio com a União Europeia (FP7 2020).
Em 2011 o CTC aluga as instalações da empresa sueca SEKAB, proprietária de uma
planta-piloto de E2G localizada no norte da Suécia, com o objetivo de fazer testes com o
bagaço de cana, buscando validar e observar a viabilidade econômica e técnica da matéria-
prima. Mas segundo ENTREVISTA VI, os testes não foram conclusivos. Ainda que o
entrevistado não estivesse à frente desse processo no período, sua opinião é que a
parametrização da planta-piloto feita para operar com resíduos de madeira influenciou nos
testes com bagaço de cana, devido à fisiologia vegetal ser distinta.
Como desdobramento direto das iniciativas anteriores, o CTC participa do PAISS
Industrial (2011). Seu objetivo é instalar e operar uma planta de produção de E2G em escala
demonstrativa (TRL8 - Early commercial deployment), com isso, demonstrar a eficácia das
tecnologias desenvolvidas pela empresa, comprovando os rendimentos dos processos
industriais atingidos no nível laboratorial e semi-piloto.
Esta iniciativa se diferencia das outras ações em curso no Brasil (GranBio e Raízen),
pois o CTC se preocupa mais com a comprovação do seu “pacote tecnológico”, enquanto as
outras firmas querem em última instância atingir a produção industrial do E2G, almejando se
beneficiar com as vantagens de serem as primeiras a produzir etanol celulósico - aumento da
248
É só no ano de 2006 que o CTC passa a liderar projetos de pesquisa voltados a tecnologia de produção do
etanol celulósico; até então tinha participado de outras iniciativas, cooperando e compartilhando conhecimentos
e instalações, como no caso do projeto Dedini Hidrólise Rápida, que conta com a participação do CTC a partir de
2002. Disponível em <
https://www.jornalcana.com.br/entrevistacomoswaldogodoygerentedeengenhariadoctc/>
Acessado em: 07 de junho de 2016.
259
produtividade por tonelada de cana; créditos de carbonos; exportações para a Califórnia e
Europa, e etc..
Por isso que tanto GranBio como Raízen optaram pelo licenciamento de tecnologia
estrangeira. E o CTC – que é uma empresa de pesquisa – visa aprimorar suas competências
tecnológicas e gerar um conjunto de tecnologias que possa ser vendido em um futuro
próximo249
.
A construção da unidade de produção do etanol celulósico em escala demo inicia-se
em 2013 na cidade de São Manoel/SP - na Usina São Manoel250
. A localização da unidade
está relacionada com a proximidade da sede do CTC (125 km), onde ficam os laboratórios da
empresa (ENTREVISTA VI). O início das operações ocorreu em julho de 2014 e a
expectativa de realizar um scaleup na planta é apenas em 2018 (planta na escala comercial).
Destaca-se que o projeto do CTC apresenta um diferencial em relação aos projetos em
andamento, que é o fato da unidade de produção de E2G ser totalmente integrada à usina de
primeira geração. Este design possibilita um melhor aproveitamento da infraestrutura
existente (ENTREVISTA VI). As outras plantas compartilham apenas as infraestruturas
“externas”, por exemplo, a Bioflex 1 compartilha do sistema de co-geração com a Usina
Caeté e a unidade de 2G da Raízen compartilha apenas o espaço físico da usina Costa Pinto
(terreno).
A planta demonstração possui capacidade de processamento de 100 toneladas de
biomassa por dia, podendo produzir 3 milhões de litros. Segundo entrevista no CTC, o
potencial da tecnologia desenvolvida pelo CTC é de 120 litros de etanol por tonelada de cana,
isso frente aos atuais 85-90 litros de etanol por tonelada, ou seja, a tecnologia pode aumentar
cerca de 40% a produção de etanol de uma usina de primeira geração251
.
A tecnologia utilizada no projeto da usina São Manoel é proprietária do CTC, com
patente depositada em 2008. A unidade do CTC enquadra-se na rota bioquímica, as etapas
produtivas são estabelecidas pelo: i) o design do sistema industrial é o Separate Hydrolysis &
Fermentation (SHF); ii) com pré-tratamento a partir do uso de vapor juntamente com
catalisadores, processo que foi desenvolvido especificamente para a cana-de-açúcar; iii)
249
Discussão e percepções feitas a partir das entrevistas: Entrevista V; Entrevista VI; Entrevista VIII e Entrevista
X. 250
Disponível em: <https://oglobo.globo.com/economia/ctc-coloca-em-operacao-planta-de-demonstracao-de-
etanol-celulosico-13409950 > Acessado em: 24 de julho de 2017. 251
Até o encerramento da pesquisa (julho de 2017) a planta do CTC ainda não havia operado de maneira plena,
enfrentava problemas no sistema de alimentação de bagaço ao pré-tratamento (ENTREVISTA VI).
260
hidrólise enzimática (as enzimas são da Novozymes); iv) o conjunto tecnológico de produção
do E2G é integrado a plantas de 1G, conceito que descende da experiência com o projeto da
Dedini (2002-2007).
O investido feito no projeto da planta de demonstração foi de R$ 71,1 milhões,
recursos aportados por meio do PAISS Industrial – na modalidade crédito252
. De maneira
articulada, o CTC recebeu em 2014 cerca de R$ 350 milhões através da participação acionária
do BNDESPar (empresa de participações acionárias do BNDES), subscrevendo novas ações
em P&D do CTC em etanol celulósico, mas, principalmente, abarcando outros elementos,
como a aquisição de equipamentos para pesquisa, infraestrutura e implementação de novos
projetos/ações de P&D para a cadeia sucroenergética como um todo.
Em resumo, os aportes feitos pelo BNDESPar estão sendo destinados principalmente
nas ações do Laboratório de Biotecnologia Agrícola (que envolve um conjunto amplo de
projetos – vide quadro 5.2.) e na continuidade e expansão das pesquisas e comercialização da
cana transgênica.
O desenvolvimento e a implementação da planta demo do CTC contou com o
estabelecimento de parcerias estratégicas, principalmente, com atores internacionais. Os
parceiros do projeto de demonstração são: a) a Usina São Manoel, integrante da Copersucar
(Brasil), com o fornecimento da biomassa e compartilhamento da infraestrutura; b) a Pöyry
(Finlândia) realizou o detalhamento da engenharia do projeto; c) Andritz (Áustria) realizou a
seleção, o desenvolvimento e a produção dos principais equipamentos da planta; d)
Novozymes (Dinamarca) faz o fornecimento das enzimas.
Por intermédio das parcerias, o CTC compartilha competências e infraestruturas e
obtém o fornecimento de insumos tecnológicos (enzimas; leveduras). Estas novas
informações agregam-se às competências em processos industriais que não faziam parte do
seu portfólio de negócios ou agenda de pesquisa até os anos 2000.
O quadro 5.3. expõe todas as relações estabelecidas pelo CTC em etanol celulósico
entre os anos 2007-2017, portanto, indica nominalmente com quais atores o CTC se
relacionou no universo das tecnologias do etanol celulósico. Os atores em destaque (negrito)
são aqueles que cooperam efetivamente no projeto da planta demo no âmbito do PAISS
Industrial. Os outros atores são aqueles que apresentaram parcerias em outros projetos de
252
No âmbito do PAISS Industrial o CTC recebeu ainda R$ 15,8 milhões da FINEP para realizar pesquisas sobre
etanol celulósico e novos produtos a partir da cana-de-açúcar (bioquímico; biocombustíveis avançados) – vide
capítulo 3.
261
pesquisa ou apenas se relacionaram por meio de apoio tecnológico (consultoria técnica e
tecnológica) tanto no sentido de suportar as ações do CTC ou quando o CTC é chamado a dar
apoio em projetos de terceiros.
Quadro 5.3. Parcerias estratégicas e cooperação do CTC por etapas da tecnologia de etanol
celulósico, entre 2007 - 2017.
EPC* Suprimento da
Biomassa Pré-tratamento Hidrólise, Fermentação e Processo
Pöyry (Finlândia)
Andritz (Áustria)
Metso (Finlândia)
Abeinsa (Espanha)
Technip (França)
CNH (EUA/Itália)
AGCO (EUA)
Jonh Deere (EUA)
Claaas (Alemanha)
Andritz (Áustria)
Metso (Finlândia)
DSM (Holanda)
Nozymes (Dinamarca)
Beta Renewables (Itália)
DuPont (EUA)
Clariant (Suíça)
Life Technologies (EUA)
Leaf Technologies (EUA)
Dyadic (EUA)
Abengoa (Espanha)
BP (Reino Unido)
Ouro Fino (Brasil)
Petrobras (Brasil)
CTBE (Brasil)
Embrapa (Brasil)
UFRJ (Brasil)
USP (Brasil)
UFSC (Brasil)
UFPR (Brasil)
Fonte: ENTREVISTA VI; CAMPO I; * Engenharia, Suprimentos e Construção
O projeto do CTC apresenta algumas características que se destacam em relação às
outras iniciativas em curso no Brasil, estas são253
:
i) ter sido desenvolvida especificamente para a biomassa da cana-de-açúcar (bagaço e
palha);
ii) ser totalmente integrado com a produção de etanol de primeira geração – resultando
em investimentos iniciais menores e menores custos de produção do E2G por compartilhar
etapas do processo de 1G;
iii) o design do projeto proporciona a redução da taxa de ociosidade da planta de 1G
nas etapas de fermentação e destilação, ampliando e flexibilizando o período de produção do
etanol para além da safra e, também, podendo alterar o mix de produção entre açúcar e etanol;
253
Considerações a partir das entrevistas: Entrevistas III; Entrevistas VI e Entrevistas X.
262
iv) o estabelecimento do conceito da planta e os sucessíveis ajustes técnicos em nível
de projeto industrial foram feitos em território nacional - O projeto contou com 50 pessoas,
formando uma equipe de P&D dedicada para tal fim 254
.
v) A parceria entre CTC e Novozymes teve como um dos resultados a redução das
“doses” enzimáticas no processo de hidrólise (quatro vezes) na escala semi-piloto;
vi) No decorrer das iniciativas do CTC na tecnologia do E2G pode-se afirmar que a
firma adquiriu conhecimentos sobre o desempenho da tecnologia de hidrólise enzimática –
fato novo na trajetória da firma. Essas competências são sobre o processo industrial de
conversão da biomassa e não na produção e desenvolvimento de enzimas;
vi) Outro resultado do esforço do CTC em desenvolver tecnologia proprietária reflete-
se nos quatro depósitos de patentes realizados na área de etanol celulósico entre 2008 a 2012.
Talvez a patente mais relevante seja a WO 2013142934 que protege o processo integrado para
produção de E1G e E2G, o qual pode ser também utilizado para produtos afins (química
verde). Esta mesma invenção prevê a utilização de outras matérias-primas como o milho,
cereal, trigo, sorgo, e beterraba.
Diante da estratégia adotada pelo CTC, a expectativa é estabelecer condições para
fornecer uma planta de E2G “turn key flex” integrada ao E1G, combinando suas
competências em outros estágios da produção de cana-de-açúcar e seus derivados. Com isso,
prevê entregar um pacote tecnológico completo, contando com o recolhimento da palha;
novas variedades de cana (apropriadas ao E2G); engenharia conceitual e de processo e
programa de desenvolvimento contínuo e otimização da Tecnologia E2G255
.
As parcerias estratégicas e o estabelecimento de relações expostas no quadro 5.3. vêm
nesse sentido, ampliando as competências internas e diversificando o portfólio de tecnologias
desenvolvidas pelo CTC, buscando cobrir todas as etapas do ciclo produtivo do etanol
celulósico.
5.2.4.2. GranBio
A GranBio é uma firma de biotecnologia industrial 100% nacional que atua na
transformação da biomassa em produtos renováveis, tais como os biocombustíveis,
bioquímicos e bioeletricidade. A GranBio é controlada pela GranInvestimentos S.A., holding
254
Dado apresentado por José Gustavo Teixeira Leite - Diretor-superintendente do CTC no Ethanol Summit que
ocorreu entre os dias 06 e 07 de julho de 2015 em São Paulo/SP. 255
Entrevista VI.
263
da família Gradin e pela BNDESPar, braço de participações do BNDES (com 15% das ações).
Um diferencial deste ator é a sua atuação em mais de uma fase do processo produtivo do E2G
(vide quadro 5.3.)
A GranBio, criada em 2011, opera a primeira planta industrial em escala comercial de
etanol celulósico do Brasil. A fábrica Bioflex 1, localizada na cidade de São Miguel dos
Campos/AL, iniciou a produção em 2014. Outras instalações da GranBio são: o Centro de
Pesquisas em Biologia Sintética (BioCelere) e a Estação Experimental (BioVertis) para
desenvolvimento de novas fontes de biomassa (vide Quadro 5.4.).
A Estrutura da GranBio e os segmentos de atuação estão representados no quadro 5.4.
Nota-se que as suas ações estão voltadas ou interconectadas com a produção do etanol
celulósico, sendo o único caso no Brasil com dedicação exclusiva à produção do E2G. Todos
os outros atores que empenharam esforços em desenvolver ou adotar a tecnologia do E2G
apresentam ligações históricas com o segmento sucroenergético ou são oriundos de setores
que se relacionam na fronteira do setor, como a indústria química, petróleo, bens de capital e
etc. A GranBio pode ser considerada uma outsider.
264
Quadro 5.4. Estrutura e áreas de atuação da GranBio. Ano Estrutura Atividade Parcerias
2013 BioCelere
# Centro de Pesquisas em Biologia Sintética;
# Localizada no complexo do Techno Park, em Campinas/SP;
# P&D em melhoramento genético de microrganismos,
processamento de biomassa, desenvolvimento de processos de
fermentação e de hidrólise enzimática.
# Seu corpo cientifico/técnico é formado por mais de 20
cientistas, sendo 11 PhDs.
# Além de tecnologias próprias, atua no co-desenvolvimento de
tecnologias de parceiros.
# Desenvolvimento de levedura transgênica – Celere-2L
# Unicamp
#American
Process
2014 Bioflex
# Unidade industrial da GranBio;
# A primeira fábrica de etanol celulósico em escala comercial do
Hemisfério Sul;.
# Matéria-prima é a palha de cana;
# Localizada no município de São Miguel dos Campos/AL;
# Capacidade para produzir 82 milhões de litros de E2G por ano;
# Rota bioquímica – Separate Hydrolysis & Fermentation – SHF
(C5 e C6 no mesmo reator)
# Usina Caeté –
Grupo Carlos
Lyra
# Beta Renewables
#Novozymes
#Chemtex
#DSM
2013 BioVertis
# Estação Experimental localizada no município da Barra de São
Miguel/AL.
# Foco no desenvolvimento de cana-energia (a CanaVertix®).
Esta variedade é desenvolvida por meio de cruzamentos de
espécies ancestrais e híbridos comerciais de cana-de-açúcar;
# A cana-energia é uma cana mais robusta, com maior teor de
fibra e apresenta potencial produtivo para a fabricação de
biocombustíveis e bioquímicos de segunda geração e para ampliar
a geração e/ou cogeração de energia elétrica;
# Vantagens: a) plantada em áreas com baixa aptidão agrícola; b)
aumento da produtividade por hectare (pode chegar a ser 3
vezes); c) a planta exige menos água;.
# Projeto de Colheita de Palha - um sistema de recolhimento,
armazenamento e processamento de palha de cana-de-açúcar.
Com capacidade de 400 mil toneladas por ano.
# P&D conjunto na cana-energia – Biovertis-IAC-Ridesa
# IAC;
# Ridesa;
# West Indies
Cane Breeding
Station (Barbados)
# CNH;
# Valtra;
#Implanor
2014 SGBio
# É uma joint venture (50% - 50%);
# Produção de químicos de fonte renovável;
# Objetivo é construir no Brasil uma planta industrial para o bio
n-butanol - composto químico para a produção de tintas e
solventes;
# Testam tecnologias de parceiros para a conversão de biomassa
em bioquímicos.
# Rhodia – Grupo
Solvay
Fonte: elaboração própria a partir de GRANBIO, 2017.
265
A principal iniciativa da GranBio na rota tecnológica do etanol celulósico consiste em
instalar e operar uma planta industrial em escala comercial de E2G. Conjuntamente com esse
projeto, busca desenvolver produtos e processos correlatos a essa unidade e/ou para novos
nichos de mercado, todos se relacionando com a conversão da biomassa (vide quadro 5.3. – a
criação da SGBio é um exemplo).
A escolha da localização das instalações das unidades de produção de E2G e da
estrutura para o melhoramento da cana-energia ocorreu devido às vantagens comparativas
existentes na região de São Miguel dos Campos/AL, tais como: a proximidade e
disponibilidade da matéria-prima (palha); clima favorável à produção de biomassa (muito sol
e regimes pluviométricos bem definidos); proximidade com o Porto de Maceió, uma distância
de 55 Km, situação que facilita o escoamento da produção (exportações ou cabotagem); e os
incentivos fiscais haja vista os incentivos a empreendimentos industriais oferecidos pela
região nordeste (ENTREVISTA IV).
O design da planta foi definido pelo acordo de licenciamento da tecnologia PROESA
da empresa Beta Renewables. Com isso, adquiriu-se um pacote tecnológico completo, com
todas as etapas e os processos. A planta começou a ser instalada em 2013 e sua operação
ocorreu em 2014 (segundo semestre). A estrutura apresenta a capacidade de produção de 82
milhões de litros de etanol anidro por ano e gerar 61 MW/hora de energia.
O financiamento do projeto e de outras ações de pesquisas da GranBio se deram por
intermédio dos aportes feitos pelo poder público, na figura das suas agências e órgãos de
fomento, informações que encontram-se sistematizadas no capítulo 3. Apenas no Programa
PAISS Industrial, as unidades da GranBio contaram com o aporte de R$ 300,2 milhões do
BNDES (crédito) para a implantação da BioFlex 1 e mais R$ 312,9 milhões vindos da FINEP
(crédito) para outras atividades de P&D. De maneira paralela, mas concatenada, tem-se o
aporte feito pelo BNDESPar256
, disponibilizando recursos na ordem de R$ 600 milhões ao
longo da vigência do Plano de Negócios submetido ao PAISS Industrial.
A constituição material do projeto ocorreu com o estabelecimento de parcerias
estratégicas, ou seja, a GranBio estabeleceu relações para viabilizar a tecnologia e a operação
da planta industrial, buscando competências, tecnologias de processos e insumos tecnológicos
256
Os recursos financeiros feitos pelo BNDESPar proporcionou a participação acionária na empresa (15%) e
adquiriu o direito de indicar um membro do Conselho de Administração. Dessa maneira, o BNDES acompanha o
desenvolvimento da firma e pode exercer alguma influência sobre as direções estratégicas. Ademais, pode se
beneficiar (novas receitas) caso as inovações da GranBio tragam retorno econômico (ENTREVISTA V;
ENTREVISTA X).
266
que já estavam disponíveis no mercado internacional. As parcerias na constituição da BioFlex
1 são257
:
- Usina Caeté (Brasil): usina de cana-de-açúcar produtora de etanol de primeira
geração e açúcar, pertence ao Grupo Carlos Lyra. Sua função no projeto é fornecer o
abastecimento de matéria-prima para a Bioflex 1. O acordo entre as partes baseia-se em um
contrato de fornecimento de palha de cana de longo prazo (10 anos) com benefícios mútuos,
ou seja, caso a retirada da palha afete o desempenho do canavial da usina de 1G o contrato
pode ser readequado ou desfeito.
A relação entre estes dois atores resultou na construção de uma unidade de cogeração
junto a BioFlex 1. O sistema é alimentado com bagaço de cana-de-açúcar e lignina –
subproduto gerado no processo de produção do E2G. Esta solução é inédita no Brasil e o uso
da lignina traz vantagens ao processo de geração de vapor, pois é um material com alto
potencial calorífico e com menor umidade em relação ao bagaço de cana, portanto, em teoria
é uma biomassa mais eficiência (ENTREVISTA IV).
O sistema de cogeração foi projetado para permanecer em operação durante onze
meses ao ano, o equivalente a oito mil horas. Com isso, é capaz de atender às necessidades
das duas fábricas (Bioflex e Caeté) e, ainda, gerar um excedente de energia elétrica da ordem
de 135 mil MWh/ano, energia que deve ser exportada à rede nacional de abastecimento de
energia elétrica. Este excedente é suficiente para abastecer uma cidade de 300 mil habitantes.
Mas como a usina de etanol celulósico ainda não atingiu sua capacidade instalada, o sistema
funciona basicamente com bagaço e abaixo do seu potencial (ENTREVISTA IV).
Tanto os investimentos como a “administração” desse sistema de cogeração é feito em
conjunto entre os parceiros, os quais criaram uma joint venture para operar esta
estrutura/negócio – a Companhia Energética São Miguel dos Campos.
- Beta Renewables (Itália)258
: é o parceiro que detém a propriedade sobre a tecnologia
PROESA. Assim, a relação entre GranBio e Beta no projeto ocorre por meio de um contrato
baseado em licenciamento da tecnologia (firmado em maio de 2012). Destaca-se que nessa
relação não existe acordo/contrato para realizar pesquisa conjunta, co-desenvolvimento ou
comercialização da tecnologia melhorada pelo uso na Bioflex 1.
257
Informações retiradas da ENTREVISTA IV. 258
A Beta Renewables é uma joint venture entre a Biochemtex, uma empresa do Grupo Mossi Ghisolfi, e o fundo
americano TPG (Texas Pacific Group). No final de 2012, a Novozymes tornou-se acionista da empresa, com a
aquisição de 10% das ações, no valor de 90 milhões de euros.
267
O acordo de licenciamento tecnológico prevê a garantia de desempenho. Com isso, a
Beta Renewables deve realizar a manutenção das condições dos processos/etapas que foram
testados no projeto PROESA na planta original na Itália (CORREA, 2014). Ademais, este
acordo gerou relações com outros atores, incluindo os fornecedores de insumos tecnológicos e
de tecnologias complementares, como a tecnologia enzimática e as leveduras transgênicas,
proporcionando novas ramificações contratuais.
- Biochemtex (Itália): é fornecedora de equipamentos e realiza a engenharia e a
assistência técnica para a BioFlex.
- Novozymes (Dinamarca): é a fornecedora de enzimas e dos compostos enzimáticos,
por meio de contratos de fornecimento de insumos tecnológicos para a etapa de hidrólise
enzimática.
- DSM (Holanda): é a fornecedora de leveduras geneticamente modificadas (OGM),
as quais realizam a fermentação da glucose (C6) e da xilose (C5) de maneira simultânea. Estas
leveduras são de propriedade da DSM. Assim, para a etapa de fermentação, firmou-se dois
contratos entre GranBio e DSM, o primeiro de licenciamento para a utilização da levedura
RN1016 para P&D da BioCelere e o outro contrato de fornecimento de insumos tecnológicos,
as leveduras, para serem utilizadas na unidade de produção do E2G.
A levedura da linhagem RN1016 se destaca pela capacidade de fermentar a xilose,
açúcar de cinco carbonos. Esta capacidade foi obtida por meio da “introdução” do gene XylA,
codificador da enzima xilose isômeras.
- Universidade Estadual de Campinas (Brasil): existe um acordo de cooperação entre
a BioCelere e Unicamp, o qual é operacionalizado por meio de projetos de pesquisa. Na
abrangência da relação universidade-empresa, incentiva-se a participação dos estudantes em
projetos de pesquisa da GranBio.
Este convênio prevê que os resultados das pesquisas (teses e dissertações)
desenvolvidas na circunscrição do acordo, estão assegurados pelo convênio, assim, estabelece
uma co-titularidade de uso exclusivo com a repartição de recursos entre as partes, com uma
cláusula que indica que quaisquer desenvolvimentos a partir do acordo estabelecido
pertencem aos parceiros (CORREA, 2014).
Este arranjo institucional permite que estudantes de graduação e pós-graduação sejam
financiados pela empresa e desenvolvam projetos em conjunto. Segundo as ENTREVISTA
IV e ENTREVISTA VII, os ex-alunos da universidade tornam-se pesquisadores da GranBio.
268
Para além dos acordos de cooperação, fornecimento e licenciamento de tecnologias, a
GranBio estabelece outras estratégias para ampliar suas capacidades tecnológicas e atuar em
nicho que não detém competências internas, tais como a formação de joint ventures e a
aquisição de empresa de base tecnológica (ENTREVISTA IV).
Em 2013 adquiriu parte da empresa American Process Inc., que é dedicada à
tecnologias limpas (15% de participação acionária). Em 2014, na área de bioquímicos,
realizou uma joint venture com a Rhodia (grupo Solvay), dando origem a SGBio Renováveis,
com composição acionaria de 50% para cada uma das firmas. O foco dessa nova organização
é a pesquisa e a produção de químicos a partir da celulose contida na biomassa da cana-de-
açúcar (etanol e n-butanol).
Com a compra de ações da American Process, a GranBio passou a ter acesso a uma
plataforma tecnológica proprietária de pré-tratamento de biomassa. Pode ainda adquirir
conhecimentos desenvolvidos por esta empresa, a qual possui uma planta-piloto de E2G
funcionando desde 2013 e mais participação em dois projetos em escala de demonstração em
Thomaston (Geórgia) e Alpena (Michigan) nos EUA.
Por meio da criação da SGBio Renováveis, realizou-se a aquisição dos ativos da
Cobalt Technologies, empresa norte-americana de biotecnologia, que apresentava experiência
no desenvolvimento de tecnologia para a produção de n-butanol, acetona, etanol e buteno, a
partir de biomassa (ENTREVISTA IV). Nesse movimento de compra, a SGBio adquiriu o
banco de micro-organismos e ativos de propriedade intelectual da Colbalt Technologies como
patentes, marcas, processos e métodos.
- A tecnologia PROESA
A tecnologia utilizada na planta de E2G da GranBio em Alagoas é conhecida como
PROESA, que compreende um conjunto tecnológico protegido por quatorze famílias de
patentes (CORREA, 2014; SOUTINHO, 2016). Trata-se de uma tecnologia completa que
abarca todos os componentes de engenharia e etapas do processo de produção - do pré-
tratamento da biomassa que chega à unidade até o produto final. Exige apenas a compra de
insumos: matéria-prima, enzimas e as leveduras.
A tecnologia PROESA é formada basicamente por três etapas distintas que ocorrem
em reatores separados. A primeira etapa é o processo de pré-tratamento, baseia-se na
aplicação de altas temperaturas e pressão sobre a biomassa (Steam Explosion), assim, a
269
estrutura rígida da biomassa (lignina) é quebrada, permitindo que a celulose e a hemicelulose
fiquem acessíveis para a etapa seguinte.
Na segunda etapa, um composto formado pelos polissacarídeos (celulose e
hemicelulose) é tradado por enzimas, com isso ocorre a “quebra” das ligações moleculares e
libera-se os açúcares “menores”, os monossacarídeos C5 e C6. Esse processo é chamado de
hidrólise enzimática.
A terceira etapa é a fermentação dos açucares C5 (xilose) e C6 (glucose), que são
digeridos por micro-organismos geneticamente modificados (as leveduras). Como resultado
desse processo tem-se o etanol, que é destinado à destilação, dando origem ao etanol anidro
(retirar água do etanol). A destilação ocorre igualmente ao processo já utilizado na produção
do 1G.
É importante notar que a hidrólise enzimática e a fermentação são feitas em reatores
distintos, assim, o design da tecnologia é pautada no modelo Separate Hydrolysis &
Fermentation (SHF). Acrescenta-se que o processo de fermentação da C5 e da C6 ocorrem no
mesmo reator, conceito que difere do modelo da Raízen – que faz uma espécie de reciclo de
fermento, separando a etapa de fermentação em dois estágios (VISITA I).
- Expectativas e problemas
Devido a esse novo arranjo (GranBio e parceiras) e aos dados de desempenho
apresentados pela tecnologia em laboratório/piloto, criou-se uma expectativa muito positiva
do desenvolvimento do projeto da Bioflex, “fugindo prá longe” do que realmente está
ocorrendo. Por exemplo, em 2012/2013 acreditava-se que a Bioflex iria operar em plena carga
a partir de 2015, produzindo os 82 milhões de litros de E2G anidro e 50% iria para a
exportação. Assim, a Bioflex deveria atingir o faturamento de R$ 150 milhões em 2015.
Projetava-se que o Grupo GranBio juntamente com os novos parceiros iria construir
mais 10 plantas de etanol celulósico até 2022, movimentando um investimento de R$ 4
bilhões. Com estas novas plantas imaginava-se chegar à produção de 1 bilhão de litros de
E2G em 2022 , para tal, a segunda planta do Grupo GranBio estava pensada para iniciar sua
construção em 2016.
Mas a dinâmica da inovação é incerta e repleta de entraves que derivam das condições
objetivas da realidade, tais como as tecnologias não atingem o desempenho desejado devido
às interações não “imagináveis” no momento do desenho do artefato. Problemas de cunho
270
institucional se acumulam frente às necessidades do processo de produção ou da circulação do
capital e, principalmente, a compreensão e o aprendizado tecnológico leva tempo e necessita
de esforços sistemáticos para atingir maturidade.
Os problemas listados abaixo ilustram os entraves enfrentados pela GranBio que,
ademais, não são específicos desta empresa visto que também estão presentes nos casos da
Raízen e das iniciativas internacionais.
A Bioflex apresentou e apresenta baixa produção, de outubro de 2014 a maio de 2015
produziu um total de 2 milhões de litros de etanol celulósico. Em 2016 a empresa informou
que produziu 4 milhões de litros de etanol celulósico, sendo que o melhor mês de trabalho
gerou 1,5 milhão de litros do combustível. Esses números estão muito aquém da capacidade
produtiva instalada de 82 milhões de litros/ano. Esse baixo desempenho se deve
principalmente aos problemas mecânicos e da dinâmica de sólidos - os problemas no pré-
tratamento forçam a Bioflex 1 interromper sua produção por meses259
.
De maneira oficial, a Bioflex interrompeu sua produção em dois momentos: no final
de 2015, a unidade ficou parada por dois meses e em 2016 suspendeu a produção entre os
meses de abril a outubro. Situação que impediu sequer chegar próximo das expectativas
criadas no momento de elaboração e implementação260
. A causa das interrupções advém de
problemas no processo de pré-tratamento da biomassa, fase que fica sujeita a uma forte
corrosão dos equipamentos de aço261
. A biomassa que chega até o reator onde ocorre a
deslignificação (pré-tratamento) carrega muitas impurezas, ou seja, a terra que entra na
fábrica junto com a palha da cana, quando submetida à pressão e temperatura elevadas, corrói
com agressividade as estruturas de aços da planta (ENTREVISTA VII).
O problema é que os equipamentos não foram testados para um elevado teor de
minerais, isto é, os testes feitos com palha e bagaço de cana na Itália tinham um nível de
“pureza” maior. Ademais, as propriedades fisiológicas da cana são distintas das biomassas
utilizadas nos projetos originais, resultando em dimensões e qualidades de equipamentos
distintos e não adequados à realidade brasileira (ENTREVISTA VII; ENTREVISTA X).
259
Disponível em: < https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/granbio-paralisa-usina-etanol-
celulosico-050416/>. Acessado em 16 de junho de 2017. 260
Disponível em: < https://www.biomassabioenergia.com.br/imprensa/areia-na-biomassa-da-cana-e-desafio-
para-a-producao-de-etanol-celulosico/20150521-094419-H386>. Acessado em 16 de junho de 2017. 261
Com isso, danifica as válvulas, as bombas e as tubulações. Tal situação se mostrou constante na Bioflex 1,
mas não é apenas exclusividade desse projeto. A Raízen e outras iniciativas internacionais têm sofrido com estes
problemas (ENTREVISTA VII; ENTREVISTA).
271
A palha que chega a Bioflex 1 carrega um teor de impureza em média de 8% e estima-
se (pelo fabricante) que os equipamentos deveriam suportar a presença de “areia” por tonelada
de matéria-prima de até aproximadamente 4% (ENTREVISTAS IV; ENTREVISTAS VII).
Esse problema também é sentido no projeto da Raízen, embora esta firma sofra
"menos" com a com corrosão das estruturas metálicas de sua unidade, pois usa apenas o
bagaço da cana, que é uma matéria-prima um pouco mais “limpa” do ponto de vista de
impurezas minerais em relação à palha (ENTREVISTAS VIII).
Outra questão desconsiderada pelos desenvolvedores da tecnologia PROESA é a
interação entre a tecnologia e meio físico, já que a morfologia dos solos afeta de maneira
decisiva o nível de impureza da biomassa. O solo da região de São Miguel/AL é basicamente
arenoso com maior teor de sílica, que é mais abrasiva que os minerais encontrados em outras
regiões canavieiras, por exemplo, o Latossolo Vermelho, um solo mais argiloso característico
da região de Piracicaba/SP onde se localiza a unidade da Raízen.
Outro problema que não é de cunho tecnológico foi o atraso no start da planta devido
à demora e aos entraves burocráticos impostos pelo processo de regularização e aprovação do
uso da levedura geneticamente modificada da DSM (ENTREVISTA IV). O processo todo de
aprovação da levedura demorou ao todo um ano e meio até que a CTNBio concluísse que o
micro-organismo tinha os mesmos efeitos sobre a saúde humana, animal e ao ambiente do que
a levedura convencional já usada no país (Saccharomyces cerevisiae) e, portanto, autorizasse
o seu uso para a produção de etanol celulósico.
Estes problemas acabaram por alterar todo o cronograma de investimentos e de metas
da GranBio em relação à produção do Etanol celulósico. Segundo notícias divulgadas na
mídia262
a GranBio alterou o seu cronograma de investimentos e de metas de produção do
combustível por conta dos problemas “tecnológicos” e pela crise econômica, mas espera ter,
em 2019, um etanol 2G competitivo como o de primeira geração.
- Esforço local e resultados
Um olhar diferente também é possível sobre a experiência da GranBio no Etanol
celulósico, pois a curta trajetória trouxe alguns resultados positivos e a obtenção de
competências importantes para o desenvolvimento da tecnologia em território nacional –
adensando os esforços de inovação do SSI da cana-de-açúcar.
262
Disponível em: < http://istoe.com.br/granbio-admite-atraso-em-usina-mas-espera-alcool-2g-competitivo-em-
2019/> Acessado em 10 de julho de 2017.
272
A Bioflex implementou ajustes e alterações visando solucionar o problema do pré-
tratamento, tais como o revestimento com cerâmica das estruturas danificadas e o
redimensionamento do raio de algumas válvulas (ENTREVISTA VII; ENTREVISTA X).
Mas as ações mais significativas são os avanços na área de biotecnologia da firma – Biocelere
– e na área de produção da biomassa – BioVertis. As conquistas tecnológicas importantes
seguem listadas abaixo:
- O desenvolvimento de uma levedura geneticamente modificada: A nova cepa263
desenvolvido pela GranBio é resultado de engenharia genética sobre a levedura
Saccharomyces cerevisae, micro-organismo amplamente utilizado na indústria de 1G. Por
meio da inserção homóloga do gene xylA, codificador da enzima Xilose isomerase, criou-se
um novo micro-organismo capaz de consumir o monossacarídeo com cinco carbonos (C5)
presente na hemicelulose, ou seja, a Xilose.
Em outras palavras a equipe de pesquisadores da GranBio/Unicamp desenvolveu uma
linhagem geneticamente modificada da Saccharomyces cerevisae com um gene de outro
microrganismo – não revelado – e alguns genes modificados da própria Saccharomyces
tornado esse novo micro-organismo apto a processar a xilose. Esta linha de leveduras foi
denominada de Celere-2L, a qual tem como a “única” característica diferente do seu parental
a capacidade de consumir o açúcar xilose (ENTREVISTA IV; ENTREVISTA VII).
Na produção do etanol 1G, as leveduras industriais da espécie Saccharomyces
cerevisiae consome a sacarose e a frutose existentes na forma solúvel no caldo da cana. O
resultado é a produção do etanol como um subproduto das reações provocadas pela
“alimentação” destes micro-organismos. Na indústria de E2G os açúcares das fibras da palha
e do bagaço da cana são compostos pelos açucares glicose (40%), xilose (25% ) e a pentose
(35%). Os dois últimos são de cinco carbonos e apresentam-se em estado não solúvel,
portanto, as leveduras “normais” não os reconhecem. Mas com a modificação genética
introduzida pelo gene xylA, estes novos micro-organismos passam a reconhecer estes açucares
não solúveis e, assim, ampliam a sua “dieta”, passando a consumir a Xilose tendo como
subproduto mais etanol (ENTREVISTA IV).
O organismo já foi aprovado para uso comercial pela coordenação-geral da Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e seu uso é protegido por uma patente
depositada no Brasil e no acordo PCT.
263
Um grupo de descendentes com um ancestral comum.
273
Em teoria o uso deste novo micro-organismo tem o potencial de ampliar a produção do
E2G e, ainda, reduzir custos de produção da Bioflex. Segundo ENTREVISTA IV e
ENTREVISTA VII esta inovação deve trazer um ganho de cerca de R$ 50 milhões anuais
para a empresa se ela conseguir processar 400 mil toneladas de biomassa por ano (isso com
base no projeto inicial).
A levedura da GranBio se destaca por ser a primeira a ser desenvolvida no Brasil
voltada exclusivamente para o E2G. Outro destaque é que em testes laboratoriais atingiu
desempenho melhor que as leveduras desenvolvidas pela DSM (RN1016), no quesito
agilidade do processo de fermentação que leva em média 72 horas.
- Cana-energia: por meio da cooperação entre GranBio, IAC e Ridesa, a empresa
conseguiu desenvolver uma variedade nova de cana-de-açúcar, não transgênica, criada a partir
de cruzamentos tradicionais entre vários cultivares. O processo de cruzamento envolveu um
exercício de melhoramento ao contrário da rota estabelecida nos últimos 90 anos
(ENTREVISTA IV). Isto significa que os cruzamentos feitos para a cana-energia foram feitos
com espécies “mais antigas”, buscando obter genótipos que favorecessem a robustez e a
ampliação da massa da planta.
Ao longo de todo o projeto de etanol celulósico da GranBio – que se confunde com
própria história e com os propósitos da empresa – pode-se destacar que a atividades de P&D
fazem parte da “rotina” da GranBio, onde os investimento giram em torno de R$ 75 milhões
por ano (CORREA, 2014).
Especificamente no que se refere à absorção da tecnologia e do aprendizado na
produção do E2G tem-se as relações estabelecidas no desdobrar do processo de implantação
da planta industrial, como as atividades de treinamento e transmissão de conhecimentos feitos
no interior da parceria (GranBio – Beta Renewables), tanto de maneira tácita como de
maneira sistemática e consciente.
Os conhecimentos tácitos referentes à tecnologia de produção são transmitidos e
absorvidos pelo convívio sistemático com os novos artefatos e, principalmente, com os
especialistas das empresas estrangeiras que passaram a trabalhar em conjunto com os
engenheiros e trabalhadores da GranBio. Situação que ficou mais constante com os problemas
enfrentados no cotidiano da produção – pré-tratamento e alimentação dos reatores para a
hidrólise enzimática.
274
Mas os conhecimentos também foram transmitidos e adquiridos de maneira
sistematizada, pois o acordo entre a GranBio e a Beta Renewables, contemplou treinamento e
ambientação com um grupo de 16 engenheiros de processos da GranBio na unidade de
Crescentino (Itália). O objetivo dessa ação, ao acompanhar a operação da planta de etanol
celulósico in loco, foi capacitar à equipe acerca dos processos e procedimentos que deveriam
ser gerenciados no Brasil.
5.2.4.3. Raízen
A Raízen foi criada em 2010 a partir da joint venture entre a Shell e a Cosan, com
composição acionária de 50% para cada. A sua atuação ocorre nos seguintes segmentos
econômicos: a) distribuição de combustíveis; b) cogeração de energia; c) produção de açúcar
e, d) produção de etanol. A Raízen detém 24 usinas, localizadas nos Estados de São Paulo,
Goiás e Mato Grosso do Sul, e emprega cerca de 30 mil funcionários.
Na safra 2014/2015 suas unidades somadas processaram 57 milhões de toneladas de
cana-de-açúcar, produziu 4 milhões de toneladas de açúcar e 2 milhões de m3 de etanol, sendo
o maior grupo do setor sucroenergético nestes três critérios. Sua receita líquida no ano fiscal
de 2015 foi de R$ 74 bilhões.
O projeto de etanol celulósico da Raízen, mesmo que não declaradamente, pode ser
considerar como parte e derivação da estratégia mundial da Shell, empresa tradicionalmente
voltada aos combustíveis fósseis que visa diversificar e, principalmente, acompanhar
possíveis trajetórias tecnológicas que interferem diretamente no seu core business - a
tendência imposta pela sustentabilidade, resultante dos problemas ambientais, dos
movimentos socioambientais e das inovações na área de energias renováveis.
A iniciativa da Raízen consistiu na construção e operação de uma planta em escala
comercial de etanol celulósico. O projeto teve início no ano de 2011 e a instalação, em 2014,
ocorreu no município de Piracicaba/SP, ao lado da Usina Costa Pinto, unidade pertence ao
grupo Raízen. A capacidade instalada da planta é de 40 milhões de litros por ano. Vale
destacar que a capacidade instalada da Bioflex 1 é de 80 milhões de litros por ano, mostrando
que mesmo na escala comercial existe diferenças significativas entre as iniciativas (a tabela
5.1. e 5.2. apresentam outros detalhes sobre as diferenças entre os projetos brasileiros e
internacionais).
275
A elaboração, o desenvolvimento e a construção da usina de E2G é fruto das ações da
Raízen junto aos seus parceiros estratégicos (firmas estrangeiras). No entanto, a viabilidade
econômica do projeto é dada por meio dos aportes realizados pelo programa de apoia à
inovação do BNDES-FINEP (PAISS Industrial). A construção da unidade de E2G e a
instalação dos equipamentos necessários demandaram investimentos na ordem de R$ 237
milhões, sendo que 85% deste montante foram realizados pelo BNDES (PAISS Industrial –
crédito).
O projeto submetido ao PAISS Industrial em 2011 previa o estabelecimento de
parcerias para a condução do projeto de P&D e a introdução da inovação (E2G). Assim, em
2012 a Raízen estabeleceu parceria com a Iogen Corporation, empresa canadense de
biotecnologia, que desde 2002 mantinha uma joint venture com a Shell, resultando na criação
da Iogen Energy. Esta por sua vez, passa a ser parcialmente controlada pela Raízen em 2012
reconfigurando a joint venture - Raízen 50% e Iogen Corporation 50%.
A Iogen Corporation é uma empresa criada em 1974 que se utilizava do processo
steam explosion para melhorar a digestibilidade da celulose – alimentação animal. Já em 1982
constrói uma planta-piloto de etanol celulósico e passa também a desenvolver pesquisas com
enzimas. Em 1999 constrói uma planta em escala demonstrativa na cidade de Ottawa com o
objetivo de adquirir a expertise e comprovar o conceito tecnológico. Desta forma, é um ator
com “tradição” na tecnologia do etanol celulósico264
.
Na amostra de famílias de patentes analisadas no capítulo 4, a Iogen Energy detém 16
famílias de patentes na temática do E2G. Vale enfatizar que tais tecnologias podem ser
acessadas pela Raízen, que é um dos acionistas da firma.
A parceria entre Raízen e Iogen Energy é um acordo tecnológico, no qual a Iogen
entrou com a tecnologia de processo, o design da planta e seu start-up, bem como serviços
operacionais. Neste acordo a Raízen tornou-se licenciada com direito de uso exclusivo das
tecnologias. O diferencial é que a Raízen tem a propriedade integral sobre todos os novos
desenvolvimentos tecnológicos resultantes do projeto em conjunto.
Diante das competências e da estrutura já instalada no Canadá, os testes com a
biomassa da cana-de-açúcar foram feitos nas instalações da Iogen, processo este que envolveu
o envio de mais de 1.000 toneladas de bagaço de cana ao Canadá. A intenção era realizar o
aprimoramento das técnicas de produção de etanol celulósico (ENTREVISTA VIII).
264
Disponível em: http://www.iogen.ca/about-iogen/history.html Acessado em: 08 de julho de 2016.
276
Outra parceria estratégica estabelecida no projeto da planta comercial foi com a
Novozymes, um contrato de fornecimento exclusivo de enzimas e micro-organismos
geneticamente modificados (OGM) – leveduras para a fermentação dos açucares de cinco
carbonos (C5 - Xilose). Este contrato de fornecimento de insumos tecnológicos pode ser
resumido em dois objetivos: a) o fornecimento das enzimas para a produção imediata do E2G;
b) a realização do aprimoramento da tecnologia enzimática, “novos” compostos enzimáticos
para melhorar a conversão do material celulósico em açúcares, visando às características da
cana-de-açúcar. E, o desenvolvimento e fornecimento de leveduras para a fermentação da C5
– segunda fase do projeto que se iniciou em 2016 (ENTREVISTA VIII).
A tecnologia desenvolvida pela Iogen Energy caracteriza-se pelo uso da rota
bioquímica: pré-tratamento (processo de explosão a vapor), hidrólise enzimática (conversão
da celulose em glicose), separação do produto da hidrólise em porções sólida e líquida,
fermentação (microrganismos avançados que fermentam os açúcares C5 e C6) e destilação
(CORREA, 2014).
- Expectativas e problemas
A curta trajetória da planta de E2G da Raízen (start em 2015)265
é representativa das
características e das dificuldades em introduzir inovações disruptivas. A estratégia inicial da
empresa era construir 8 plantas de etanol celulósico até 2024. Estas teriam capacidade de
produção de 1 bilhão de litros por ano, com isso, aumentaria em 50% a produção do Grupo
Raízen sem ampliar a área plantada266
.
Entretanto, já em 2015/16, com a planta funcionando, as projeções foram revistas267
-
onde novos investimentos em construções industriais deveriam aguardar novos resultados da
planta já em funcionamento. O prognóstico muito positivo era resquício da euforia desmedida
da primeira fase do etanol celulósico no Brasil – e no mundo (entre 2010 – 2012)
(ENTREVISTA VII; ENTREVISTA VIII).
265
Em novembro de 2014 a Raízen iniciou as operações da planta E2G, mas a inauguração oficial - contando
com a presença da Presidenta da República Dilma Rousseff – se deu no dia 22 de julho de 2015 (ENTREVISTA
VIII). 266
As expectativas eram altas, tanto que ainda em 2014 previa-se que a segunda usina de E2G iria ser construída
em junho de 2016 com uma capacidade três vezes maior que a primeira unidade, alcançando 120 milhões de
litros/ano. 267
Disponível em: <https://www.novacana.com/n/etanol/2geracao>. Acessado em 08 de Julho de 2016.
277
Os desempenhos e os problemas enfrentados no mundo real da produção fez arrefecer
a “pressa” da Raízen e de outros atores envolvidos nesse processo. Os problemas enfrentados
pela iniciativa da Raízen foram em grande medida semelhantes aos enfrentados pela GranBio,
POET/DSM, DuPont e Beta Renewenble. Tais entraves podem ser sumarizados da seguinte
forma:
- Baixo volume de produção: a produção atual da planta está muito abaixo da
capacidade instalada268
. O aumento contínuo da produção de etanol 2G vem ocorrendo (os
números são expostos a seguir), mas não na velocidade imaginada no início da proposta, fato
que impôs um represamento nos novos projetos.
- Dificuldades mecânicas: o grande problema esta relacionado à natureza da matéria-
prima processada, ou seja, desenvolver um regime contínuo de alimentação dos reatores –
material pré-tratado para o reator onde ocorre a hidrólise enzimática.
- “Baixa” eficiência do composto enzimático: os primeiros micro-organismos e as
enzimas liberadas por eles não eram fortes o bastante para "quebrar" as moléculas da
biomassa da cana com alta eficiência, assim, liberando menos açúcares para serem
fermentados (ENTREVIATA VIII). Este problema parece estar superado ou ter melhorado o
desempenho dos novos compostos, introduzidos em 2016, mas não foi revelado detalhes
(ENTREVISTA VIII).
- separação da lignina: os equipamentos utilizados para separar a lignina não
apresentaram bons resultados, o que resultou na alta presença da lignina no estágio da
fermentação, assim, diminuindo a eficácia do processo (as leveduras não degradam a lignina).
Essa situação também atrapalha o uso comercial da lignina, material com alto potencial
calorífico; a ideia é utilizar esse “resíduo” nas caldeiras para gerar vapor e, consequentemente,
energia elétrica para planta ou exportada a rede. O entrave é o desenvolvimento de um filtro
eficiente para separar a lignina (ENTREVISTAVI; ENTREVISTA VIII).
- Logística: um fato que atrasou o start da planta da Raízen foi dificuldade e o
encarecimento do transporte de maquinário específico, os quais eram importados
(ENTREVISTA VIII). Por exemplo, uma máquina de pré-tratamento importada do Canadá
precisou ser trazida por avião, porque não foi possível aproveitar o “frete” marítimo – vindo
pelo Canal do Panamá (essa operação gerou um custo de R$ 1 milhão a mais).
268
<http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,raizen-avanca-no-etanol-de-2-geracao,10000089302>
278
Problemas com a importação e o armazenamento das enzimas também são frequentes.
As enzimas são trazidas de uma planta industrial da Novozymes localizada nos Estados
Unidos (Franklinton – Carolina do Norte) e quando chega pelo porto de Santos/SP é
transportada de caminhão até Piracicaba/SP, permanecendo armazenadas em contêineres
refrigerados.
- Esforço local e resultados
Mesmo frente a estes problemas a parceria Raízen-Iogen-Raízen-Novozymes tem
logrado alguns resultados positivos e, principalmente, a Raízen tem adquirido competências
nesse processo.
Uma das situações que animam os entusiastas do projeto é o fato da produção de E2G
da Raízen não ter sido interrompida, o que igualmente ocorreu com a produção da GranBio
ou da Abengoa (Hugoton – EUA). Estas unidades enfrentaram problemas sérios no pré-
tratamento da biomassa, sendo necessária a manutenção/substituição dos maquinários, com
isso, comprometendo o processo contínuo.
Embora o volume ainda esteja distante do que as instalações permitem (40 milhões de
litros), a perspectiva é de aumento contínuo, visto que na safra de 2015/2016, chamada de
“fase de análise”, a planta produziu 1,4 milhão de litros de E2G, frente à produção que
ocorreu entre os meses de abril a outubro de 2016, produção de 4,5 milhões de litros de
etanol. E se levarmos em consideração a safra 2016/2017 como um todo (abril – abril) a
produção ficou na casa dos 7,1 milhões de litros de E2G. Essa produção equivale a 17,7% da
capacidade instalada.
Na mesma direção, a expectativa para a safra de 2017/18 é alcançar a produção de 15 a
20 milhões de litros. Os mesmos números olhados de maneira relativa (safra-safra) são
possíveis ver que a produção de E2G da Raízen teve um “salto” de 507% entre a safra de
2015/2016 e a safra 2016/2017.
Outra informação importante sobre o desempenho da tecnologia Raízen-Iogen é a
relação de E2G por tonelada de bagaço de cana – a eficiência do processo. O target da planta
industrial é de 289 litros/tonelada, na safra 2015/2016 atingiu 91 litros/tonelada e na safra
seguinte (2016/2017) consegui atingir a relação de 211 litros/tonelada, estabelecendo uma
média de 167 litros de etanol/tonelada (ENTREVISTA VIII). Os valores mais atuais superam
a relação do etanol de primeira geração (85-90 litros/tonelada).
279
Vale destacar que os ganhos de eficiência e o aumento da produção do etanol da safra
2015/16 para a 2016/17 foi resultado da introdução do processo de fermentação dos açúcares
de cinco carbonos (C5 – xiloses). Este fato é muito relevante, pois este processo era tido como
um entrave à expansão da produção de segunda geração (ENTREVISTA VII; ENTREVISTA
X). Este novo estágio do projeto incidiu diretamente no aumento da produção e no aumento
da eficiência do processo produtivo como um todo.
Para a efetivação do processo de fermentação da Xilose, a Raízen passou a empregar
leveduras geneticamente modificadas, as quais foram desenvolvidas e produzidas pela
Novozymes – especificamente para o projeto Raízen-Iogen. A capacidade da planta de etanol
celulósico realizando apenas a fermentação da C6 (glucose) é de 26 milhões de litros por ano,
mas com o novo processo de fermentação passa para os 40 milhões de litros anuais.
Estes destaques de aumento da produção devem ser relativizados, pois os custos de
produção do E2G da planta da Raízen ficam acima do patamar do E1G269
. A empresa projeta
que vai conseguir equiparar os custos em 2018. Em matéria divulgada pelo Valor Econômico
de 24 de outubro de 2016:
“se a planta utilizasse toda a capacidade mantendo o atual nível de eficiência, o
custo de produção seria 50% maior que o etanol de primeira geração. Por mais que
esse número não pareça competitivo, ele é animador na comparação com os
resultados do ano passado, quando a diferença era de 300%” (VALOR
ECONÔMICO, 2016) 270
.
Para ter uma noção mais dos avanços desempenhados pela Raízen, recupera-se os
dados de custos e projeções feitos por Milanez et al. (2015): o custo de produção do litro de
etanol 1G no Brasil é de aproximadamente R$ 1,10, enquanto o de 2G estaria próximo de R$
1,50 por litro. A expectativa, no entanto, é de que esses valores fiquem entre R$ 0,90 e R$
0,70 e entre R$ 0,70 e R$ 0,50, respectivamente, por volta de 2020.
Outro destaque é que parte do etanol produzido na planta da Raízen foi destinada à
exportação. Segundo informe da Reuters Brasil de 22 de julho de 2015, a Raízen fechou tarifa
para exportação de etanol de segunda geração para a Europa, com um prêmio de 300 reais por
metro cúbico sobre o produto convencional271
.
269
Disponível em: < http://br.reuters.com/article/domesticNews/idBRKCN0PW20M20150722> Acessado em:
08 de julho de 2016. 270
Disponível em:
<http://www.valor.com.br/search/apachesolr_search/%22RA%C3%8DZEN%22?page=8&solrsort=created%20d
esc> Acessado em: 01 de julho de 2017. 271
Disponível em: < http://br.reuters.com/article/domesticNews/idBRKCN0PW20M20150722> Acessado em:
08 de julho de 2016.
280
O mais interessante para o SSI da cana-de-açúcar é o desenvolvimento de
competências nacionais na trajetória de E2G e o adensamento do próprio SSI – novos atores;
políticas e instrumentos institucionais voltados à inovação; ampliação dos esforços em
desenvolvimento científico e tecnológico; e o estabelecimento de novas competências na
produção. Estes elementos estão presentes no desenvolvimento da trajetória do etanol
celulósico do Brasil com intensidades distintas.
A iniciativa da Raízen certamente contribui de maneira mais relevante à formação de
competências locais ligadas ao ambiente da produção e organização da fabricação do E2G –
já que a tecnologia de “ponta” é acessada por meio das parcerias e da sua “subsidiaria”, a
Iogen Energy.
As competências desenvolvidas pela Raízen envolvem basicamente as soluções
técnicas encontradas internamente para contornar os problemas do cotidiano da produção. É a
solução de problemas nas diversas etapas do processo de conversão do material
lignocelulósico que estabelece uma “ponte” com processos de aprendizagem mais
sistematizados, a saber272
:
i) Troca e substituição de peças e componentes devido à forte corrosão provocada
pelas impurezas minerais da biomassa e/ou pela ação dos ácidos usados para quebra da
celulose. Devido aos problemas no pré-tratamento, a Raízen tomou a decisão por conduzir
essas ações internamente, visto que os bens importados demorariam em média 6 meses para
chegar e isso poderia interromper o processo produtivo. Com essas ações, desenvolveu novos
materiais e ligas de aços mais resistentes para os novos componentes, “novas” bombas e
válvulas – que estão suportando as condições reais do processo produtivo.
ii) Desenvolvimento de uma nova máquina para auxiliar a limpeza da biomassa, uma
espécie de "lavadora" de impurezas da biomassa. Com este dispositivo a parcela de
impureza na celulose caiu de 11% para 4%.
iii) Construção e operação de um laboratório isolado para a manipulação de
micro-organismos geneticamente modificados (OGM). Nesta estrutura manipula-se as
leveduras capazes de fermentar os açúcares de cinco carbonos. Estes OGM foram
desenvolvidos pela Novozymes, mas como não foi aprovado pela Comissão Técnica Nacional
de Biossegurança (CTNBio) para uso comercial, os micro-organismo devem ser manipulados
em uma área restrita e controlada, a qual foi construída junto à planta de E2G.
272
As informações a seguir foram obtidas junto a representantes da Raízen – ENTREVISTA VIII e CAMPO VI
e VISITA I.
281
Esta três frentes de competências contou com a mobilização dos engenheiros, técnicos
e mecânicos da própria Raízen para resolver os problemas, por meio dos recursos e dos
conhecimentos disponíveis na própria firma. Estas inovações incrementais não deram retorno
financeiro, mas certamente foram responsáveis por destravar os gargalos e passaram a
alimentar projeções mais otimistas sobre o futuro desse mercado273
.
5.3. CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO 5
A dinâmica dos projetos de desenvolvimento da tecnologia industrial no Brasil
refletem elementos da corrida tecnológica internacional, na qual atores heterogêneos buscam
estabelecer um standard para a tecnologia de transformação da biomassa em etanol e em
outros bioprodutos. A tabela 5.2. indica algumas das faces desse contexto, bem como, mostra
o posicionamento das empresas brasileiras ante aos principais players internacionais, sendo os
dois casos mais avançados GranBio e Raízen.
O etanol celulósico no Brasil apresenta algumas vantagens “de partida”, ou seja, uma
situação favorável devido a sua base de recursos naturais e pela trajetória de aprendizagem
desenvolvida no etanol de primeira geração (domínio das técnicas agrícolas, logística e
infraestrutura para o consumo). Concomitante a estas vantagens, tem-se o fato que os novos
processos de produção de etanol (2G) são baseados em resíduos agroindustriais que não
competem com o uso da água ou com a produção de alimentos. Ademais, a cana-de-açúcar
apresenta o melhor custo de matéria-prima, como fica evidente na observação da tabela 5.2.
273
Em 22 março de 2017 o portal NovaCana divulgou que a Raízen pode decidir, ainda no ano de 2017, ampliar
a capacidade instalada de sua unidade de etanol celulósico ou construir uma nova usina voltada para a segunda
geração, a depender da continuidade dos bons resultados atingidos na Usina Costa Pinto – Piracicaba/SP.
Disponível em: https://www.novacana.com/n/etanol/2geracao-celulose/raizen-ampliar-producaoetanol-
celulosicoconstruir-novausina220317/ Acessado em: 08 junho de 2017.
282
Tabela 5.2. Características técnicas dos projetos industriais de etanol celulósico no mundo e
custo de produção estimado no ano de 2016 (projetos em operação).
Características Raízen GranBio Poet-DMS
Beta
Renewables DuPont Abengoa
País Brasil Brasil EUA Itália EUA EUA
Capacidade (milhões de l/ano) 40 83 94 75 113 94
Custo de capital (milhões de dólares) 100 265 275 210 225 500
Matéria-prima
Bagaço de
cana
Palha de
cana
Palha de
milho
Palha de
Trigo
Palha de
Trigo
Palha de
milho
Custo da matéria-prima (US$/ton) 38 40 90 75 52 90
Pré-tratamento
Ácido
diluído
Explosão
a vapor
Ácido
diluído
Explosão a
vapor Alcalino
Ácido
diluído
Potencial de geração de energia (MW) 7 16 17 13 N/A 21
Custos de produção (US$/l) 0,26 0,3 0,52 0,53 0,54 0,63
Preço mínimo de venda do etanol
celulósico (US$/l) 0,57 0,7 0,8 0,87 0,88 1,2
Fonte: elaboração própria a partir de LUX RESEARCH (2016) 274
.
O relatório “Uncovering the Cost of Cellulosic Ethanol Production” da Lux Research
(2016) indica que os custos com a matéria-prima é o fator mais importante para determinar os
custos de produção do etanol celulósico, correspondendo a 40% do total. Assim, a Raízen e a
GranBio apresentam os menores custos de produção de etanol celulósico no mundo em 2016,
vide tabela 5.2.
Os esforços de pesquisa desenvolvidos pelos atores brasileiros e por aqueles que aqui
estão, pelo menos na sua formulação, predispõem-se ao desenvolvimento de competências
para dominar a tecnologia de segunda geração. Visam assim aproveitar as condições
vantajosas da base natural para ir além, com isso, explorar novos mercados por meio de novas
tecnologias de transformação da biomassa em biocombustíveis, bioquímicos e biomateriais
(este direcionamento é visto nos programas de P&D e nas políticas públicas expostas no
capítulo 3, bem como na análise dos casos neste capítulo).
Portanto, o presente capítulo trouxe elementos para compreender essa dinâmica,
identificando quais são as ações nessa direção, ou seja, compreender como ocorre o
movimento pela densificação e diversificação do SSI da cana-de-açúcar, condição sine qua
non para o desenvolvimento de setores econômicos baseados em recursos naturais
(ANDERSEN, 2011; FURTADO, 2014; ANDERSEN et al. 2015).
274
As informações foram obtidas no resumo executivo do relatório e em reportagem especial do portal Nova
Cana, o qual está disponível em: <https://www.novacana.com/n/etanol/2-geracao-celulose/custo-producao-
etanol-celulosico-usinas-mundo-150316/ > Acesso 10 Outubro 2016.
283
Essa discussão liga-se diretamente com a postura teórica e metodológica adotada no
capítulo 1, pois a análise dos projetos industriais de etanol celulósico fornecem elementos
para compreender a mudança setorial e identificar ações na direção do adensamento e
diversificação do SSI da cana-de-açúcar, que ao fazê-lo, desloca as suas fronteiras setoriais,
mediante a busca de novos conhecimentos e novas tecnologias. De maneira correlata, traz
novos atores para o SSI, os quais somados aos já estabelecidos introduzem novos processos
produtivos e novos produtos.
Essa dinâmica é retratada e compreendida na tese, que só se fecha com a conclusão de
todos os capítulos. Pois a chave interpretativa é compreender a direção do desenvolvimento
do setor, mas, principalmente a maneira e a intensidade de como ocorre, já que entender a
dinâmica do desenvolvimento é identificar as características particulares desse processo, que
em essência é permeado por dificuldades (técnicas e institucionais) e de incertezas promovida
pela própria natureza do processo inovativo.
Tais dificuldades residem na própria tecnologia de segunda geração, a qual exige uma
transição qualitativa do modo de inovação do setor (mais ciência e tecnologia), mas, a grande
questão é como se faz isso? Ao passo que o Brasil tem plantas de etanol celulósico em
operação (com custos melhores do que as concorrentes internacionais), estas são baseadas em
tecnologias estrangeiras (equipamento e insumos). Por outro lado, mesmo com tecnologias
incorporadas estabelecem-se processos de adaptação e desenvolvimento endógeno, ações da
GranBio, da Raízen, do CTC e do CTBE indicam essa posição.
As iniciativas levantadas pela pesquisa indicam a ocorrência de ganhos de
experiências e o desenvolvimento de competências locais, as quais foram conduzidas nas
Iniciativas Exploratórias (Oxiteno; Odebrecht Agroindustrial; IPT; CTBE;
Petrobras/Cenpes) e nas Iniciativas Estruturadas (CTC; GranBio e Raízen). Estas são frutos
das novas políticas públicas implementadas ao longo dos anos 2000 e dos esforços e recursos
empregados na rota tecnológica do etanol celulósico advindos de diversos tipos de atores
(firmas; ICTs e agências públicas – BNDES, FINEP, FAPESP).
Como exemplo destes ganhos tem-se: 1) o desenvolvimento de pesquisa junto a
universidades (Oxiteno, Odebrecht, GranBio e CTC); 2) aquisição de competências em
processos industriais não utilizados na produção do 1G, tais como a limpeza da biomassa;
pré-tratamento; hidrólise enzimática e fermentação da C5.
284
Por mais que estes processos não estejam funcionando próximos das definições
conceituais, pode-se afirmar que o SSI da cana-de-açúcar se aproxima muito mais da rota
tecnológica do E2G em 2017 do que anteriormente, pois para cada etapa do processo de
produção os atores (diferentes) têm implementado ações para solucionar ou aperfeiçoar esses
processos: o CTC desenvolveu um “pacote” tecnológico com a possibilidade de integração de
plantas industriais de E1G e E2G; a Raízen (por adaptação) criou um equipamento para
limpar a biomassa; a GranBio criou uma nova cepa de leveduras capazes de fermentar C5; o
CTBE desenvolve um “sistema” de produção de enzimas; a Petrobras/Cenpes também
apresenta a competência tecnológica capaz de implementar uma planta de E2G, igualmente,
Iogen Energy e Beta Renewables (engenharia e projeto), só lhe faltando os insumos
tecnológicos.
Os casos que não atingiram a escala TRL8/TRL9 (Early commercial deployment)
sinalizam as incertezas que pairam sobre esta rota tecnológica, bem como as barreiras que
interferem na concretização de iniciativas inovadoras como um todo. Os esforços resultam em
ganhos de experiência, mas nem sempre avanços de maneira concreta.
As maiores dificuldades encontradas pelas iniciativas brasileiras foram/são: a)
entraves institucionais, os quais vão da demora em regular um OGM até a ausência de
instrumentos de política pública que fortaleçam a demanda do E2G; b) baixo desempenho da
tecnologia importada (muitos problemas técnicos que derivam da interação com a realidade
brasileira – biomassa e solo); c) contexto nacional e internacional permeado por incertezas de
várias naturezas (crise política; questionamento crescente das políticas/ações pró-mudanças
climáticas; “concorrência” com outras alternativas tecnológicas).
O cenário ainda é incerto, mas as vertentes da transição do SSI estão postas e,
aparentemente, não será uma via única, pois até o momento o setor apresenta ações que
fortalecem a transição em uma ótica de dependência (incorporando pacotes tecnológicos e
insumos biotecnológicos) e ora apresenta soluções endógenas que visam contrapor esta
tendência. O que foi exposto até o momento fornece um panorama geral dessa dinâmica, que
certamente moldará o futuro da bioenergia no Brasil.
285
CONCLUSÕES
A pesquisa caracterizou o esforço nacional na trajetória tecnológica do etanol
celulósico, com a identificação dos atores sociais, das particularidades das iniciativas e do
contexto histórico em que se inserem tais ações. A partir deste esforço, a presente tese foi
capaz de mostrar o “quando”, “como” e “quem” são os responsáveis pela participação
brasileira na corrida tecnológica do etanol de segunda geração.
Estes esforços ocorreram por meio e no entorno do SSI da cana-de-açúcar, segmento
agroindustrial que ao longo do tempo sofreu mudanças institucionais e técnicas que
favoreceram ações na direção do desenvolvimento da tecnologia e da produção do etanol
celulósico. As primeiras ações ocorreram no início dos anos de 1980 (Iniciativas Pioneiras),
caracterizadas pela opção da hidrólise ácida.
A segunda “onda” de ações sistematizadas na rota do etanol celulósico no Brasil
ocorre a partir dos anos de 2000 - superando o período de hiato dos anos de 1990. Os atores
pertencentes ao SSI da cana-de-açúcar e aqueles que atuavam próximos às fronteiras setoriais
deste segmento foram os responsáveis por um conjunto de iniciativas que visavam
desenvolver competências e implementar unidades industriais de E2G, as quais tendiam tanto
para a realização de testes como para a produção do etanol de fato. Os eventos e as ações
ocorridas nesse interin foram objeto das análises da pesquisa, configurando o recorte analítico
e temporal da tese.
As ações realizadas nos anos de 2000 compõem o quadro de fatos e indícios que
deram o “tom” das mudanças e das permanências ocorridas no SSI da cana-de-açúcar ao
longo dos últimos 17 anos. As alterações no interior do SSI têm sido promovidas por
intermédio da busca por novas competências e do estabelecimento de processos de
aprendizagem voltados à tarefa de desenvolver as tecnologias de produção do etanol
celulósico em território nacional.
Isso resultou na reconfiguração dos atores, das relações e dos conteúdos do próprio
SSI, sobretudo, no que diz respeito à inovação na Fase Industrial do setor sucroenergético.
Porque até então, a introdução de novos equipamentos, máquinas e métodos de produção
nesta fase visavam apenas à ampliação da eficiência e da capacidade produtiva das usinas na
transformação do caldo de cana-de-açúcar em etanol (Sacarose C12; Glicose C6; Frutose C6).
No novo contexto, a inovação passa a ter outro sentido e direção: busca-se o aproveitamento
286
integral da biomassa, ou seja, a extração e beneficiamento do açucares contidos na estrutura
fibrosa da planta (Glicose C6; Xilose C5 e Pentoses C5).
A inovação para a produção de etanol ou de intermediários bioquímicos neste novo
contexto já não é mais alcançada apenas em função do melhoramento incremental das
estruturas técnicas já estabelecidas. Neste novo contexto, passa a ser imperativo introduzir um
novo conjunto tecnológico capaz de ampliar a exploração da biomassa, aproveitando
economicamente “hoje” o que era resíduo “ontem”.
Este novo direcionamento relegou atores tradicionais (as firmas de bens de capital
nacionais) ao mesmo tempo em que recebeu novos atores, os quais dominam bases de
conhecimento e técnicas distintas. Trata-se de firmas e instituições de pesquisa concatenadas
aos avanços na fronteira do conhecimento científico, pertencentes aos segmentos da
biotecnologia, da química fina, da biologia molecular e da genética.
A identificação, a caracterização e a sistematização desta nova dinâmica no setor
sucroenergético são os produtos desta pesquisa de doutoramento. Cada capítulo da tese
trabalhou com elementos particulares ligados às iniciativas brasileiras em direção ao domínio
do etanol celulósico, operacionalizando as categorias conceituais da abordagem de Sistemas
Setoriais de Inovação com seus correspondentes na realidade. Assim, os achados da tese – que
na verdade são sistematizações dos episódios reais conduzidos pelos atores do SSI da cana-
de-açúcar - podem ser sumarizados a partir das respostas às perguntas de pesquisa (vide figura
1 – Introdução).
O principal questionamento que direcionou toda a pesquisa foi: Quais são os
atores/elementos do Sistema Setorial de Inovação (SSI) da cana-de-açúcar do Brasil que
promovem o progresso técnico do setor em direção ao domínio da tecnologia do etanol
celulósico? Para responder esta questão, foi realizado o mapeamento dos atores e a
identificação das suas ações perante o desafio tecnológico do E2G275
. Essa investigação
permite afirmar que o Estado brasileiro, por meio dos ministérios, agências e órgãos públicos
de diferentes naturezas, foi o principal ator desse processo, não apenas porque destinou
recursos financeiros a todos os projetos de P&D realizados nos anos de 2000, mas porque
introduziu inovações institucionais que possibilitaram implementar projetos industriais de
E2G, colocando o Brasil em pouco tempo no cenário mundial do E2G.
275
Busca, seleção e análise de políticas públicas e seus instrumentos; famílias de patentes; artigos científicos
publicados internacionalmente; entrevistas com representantes das firmas e instituições.
287
Esses acertos do lado da oferta (technology push) infelizmente casou-se com uma total
ausência de instrumentos institucionais do lado da demanda (demand pull) e ainda com
políticas de outras naturezas que foram desencontradas com a estabilidade do setor de
biocombustíveis. A política de controle dos preços da gasolina é um dos exemplos. Mas,
mesmo assim, o Estado foi hábil em estabelecer medidas institucionais que possibilitaram
avançar nessa trajetória tecnológica, onde a FINEP e o BNDES sustentaram os
investimentos, bem como direcionaram as ações pró-inovação do setor – sendo estes os dois
entes públicos mais representativos desse novo papel do Estado brasileiro.
Como não podia deixar de ser, existem outros atores relevantes nessa trajetória, sem os
quais seria impossível e inútil implementar políticas públicas, já que tais atores foram os alvos
dos estímulos e os responsáveis por conduzir de fato os projetos de P&D. Trata-se das firmas
e das ICTs presentes no SSI da cana-de-açúcar. Estes atores são verdadeiros catalisadores dos
estímulos provenientes do Estado brasileiro e do contexto promovido pela corrida
internacional pela tecnologia do E2G. Ademais, são estes os atores que executam as
atividades de P&D, desenvolvem competências e constroem novas relações e estruturas
relacionadas à tecnologia do etanol celulósico em território nacional.
As ações mais significativas foram dadas pelo IPT; CTBE; Petrobras; Oxiteno;
Odebrecht Agroindustrial, denominadas de Iniciativas Exploratórias, e pelo CTC; GranBio
e Raízen, classificadas como Iniciativas Estruturadas. O primeiro grupo apresenta ações de
pesquisa no nível laboratorial ou em escalas reduzidas (bancada e polito). Estas iniciativas
caracterizam-se por não atingirem o estágio de early commercial deployment. Já as ações
estruturadas são aquelas que materializaram plantas industriais na realidade do SSI da cana-
de-açúcar (Demo e Comercial) – estando em um nível à frente das Iniciativas Exploratórias.
São capazes de produzir etanol celulósico e municiar o SSI com novas informações, já que
estão presentes na execução dos projetos, situações e problemas que até então não tinham sido
sequer aventadas pelo setor sucroenergético.
Nas Iniciativas Exploratórias e nas Iniciativas Estruturadas se tem o desenvolvimento
de competências nacionais na rota de E2G, pois firmas e instituições de pesquisa destinam
recursos para apreender e desenvolver conhecimento economicamente útil na rota 2G276
.
Estes atores em conjunto modificaram elementos históricos do SSI da cana-de-açúcar (fase
276
Ademais, os projetos de P&D são pensados e conduzidos para dar conta dos problemas do setor
sucroenergético. Estas competências surgem como consequência de pesquisas e melhoramentos tecnológicos
ocorrendo em território nacional e por meio do trabalho de pesquisadores, engenheiros e técnicos “brasileiros”.
288
industrial), porque imprimiram diferentes tipos de esforços na atividade de P&D, que ao final
convergem na busca pela ampliação da exploração da biomassa.
É interessante notar que a disposição destes atores em empreender ações sistemáticas
na rota do etanol celulósico são provenientes de uma confluência de fatores, tanto internos
como externos ao Brasil. Os drives que influenciaram as ações no etanol 2G foram: a) alta
nos preços do petróleo (em 2012 o preço médio do petróleo importado chegou a US$117,80
por barril); b) desenvolvimento tecnológico no campo da biotecnologia e da engenharia
genética (vide capítulo 4); c) movimentações políticas e sociais em torno das questões
ambientais, principalmente, a partir das ações de mitigação e adaptação às mudanças
climáticas.
Estas situações acionaram um conjunto de investimentos públicos e privados nos
EUA e na Europa, na busca por fontes alternativas de energia. Assim, as Novas Fontes de
Energia Renovável passaram a figurar na pauta de ações dos Estados nacionais e dos atores
econômicos que de alguma maneira se aproximam destas novas tecnologias de baixo carbono.
No plano nacional, o Brasil volta a realizar crescimento econômico nos anos de 2000 e
uma das relações derivadas disso é o aumento expressivo do consumo de etanol, que veio a
reboque da introdução do carro flex em 2003277
. De maneira correlacionada, a outra grande
mudança foi o fato do Estado brasileiro colocar o etanol (novamente) como ativo/setor
estratégico, sendo alvo de ações institucionais: planos, programas e campanhas
internacionais278
foram implementadas. Estas ações geraram discussões e investimentos no
setor sucroenergético e um dos desdobramentos refere-se às iniciativas no E2G279
.
Um dos destaques da tese é mostrar como o arcabouço institucional contribui para o
desenvolvimento da rota do etanol celulósico no Brasil. As contribuições do novo arranjo
institucional foram centrais para o desenvolvimento das atividades na rota do E2G, porque
todas as iniciativas mapeadas na década de 2000 foram financiadas em algum momento pelo
277
Esta situação é intensificada devido a uma política de estímulo ao mercado interno (expansão do crédito,
redução do IPI e etc.). 278
As ações no plano internacional retratam também elementos da coevolução do SSI da cana-de-açúcar. Por
exemplo, no início da década de 2000, a empreitada brasileira por meio do Itamaraty era pelo etanol 1G como
commodity global, mas depois da COP21 e do estabelecimento da plataforma biofuturo, as ações passaram a
visar os estímulo ao E2G. 279
A realidade é que estas novas diretrizes, mesmo com os problemas de coordenação institucional do Brasil,
estimularam os atores do SSI, os quais passaram a movimentar-se em diversas frentes: expansão da área
cultivada; instalação de novas usinas; expansão da cogeração; investimentos em agricultura de precisão;
mecanização da lavoura; ações em P&D (de maneira concentrada, em poucas firmas); e outras. Todas estas
ações fizeram novamente o setor e o consumo dos produtos derivados da cana crescer.
289
poder público e na maioria dos casos sendo contempladas em programas e linhas de
financiamentos distintas. Por exemplo, a Odebrecht Agroindustrial teve projetos financiados
pelo PAISS Industrial e pelo PITE da FAPESP.
O Estado suportou boa parte dos custos para a execução das atividades de P&D, tanto
aquelas realizadas nas estruturas públicas, como aquelas conduzidas internamente nas firmas.
Essa dinâmica é interessante, pois programas como o PAISS Industrial ou o BIOEN/FAPESP,
ao disponibilizar recursos, também conduziram parcialmente a direção dos esforços em P&D,
pois determinaram a priori as rotas (ou sub-rotas) tecnológicas que seriam elegíveis para
receber os recursos.
Esse fato concentrou os esforços nacionais, evitou sobreposições e aumentou a
envergadura dos aportes, ao passo que elegeu “campeões nacionais”, pois os atores
selecionados se beneficiaram de recursos estratégicos não disponíveis anteriormente.
A nova política também criou canais institucionais e canais informais para as trocas de
informações e experiências entre os diversos tipos de atores que visavam desenvolver a
tecnologia do E2G. Destes canais derivaram-se as parcerias estratégicas entre firmas e ICTs
nacionais com os agentes estrangeiros de diferentes naturezas tecnológicas.
Outra ação que derivou desta mudança no arcabouço institucional foi a criação de
novos atores públicos voltados especificamente para conduzir pesquisas e cooperar em
projetos de P&D no SSI da cana-de-açúcar. A criação do CTBE e da Embrapa Agroenergia
contribuem com o adensamento da atividade inovadora no setor.
A partir de 2006, nota-se que o arcabouço institucional ligado ao setor sucroenergético
recebeu adequações no campo de política pública, as quais passaram a suportar e apoiar
ações na nova rota tecnológica. As mudanças foram dadas, principalmente, por trazer à cena
setorial a ideia e o conceito de inovação ao setor. Houve no período de 2006-2016 uma
mudança qualitativa no padrão de intervenção do Estado em relação ao etanol. As ações, que
no passado visavam regular a expansão do setor e os mercados regionais (como no Proálcool),
passaram a ter como meta o adensamento da atividade inovadora, com destaque à fase
industrial – situação inédita.
Com isso, foram criados planos/programas com metas e objetivos para a CT&I do
setor sucroenergético (Plano Nacional de Agroenergia; PACIT; ENCIT; PAISS Industrial;
PAISS Agrícola). Destas ações, descendem os aportes das agências de fomento. Como
exemplo, tem-se a FINEP que entre os anos de 1999 a 2015 financiou 9.617 projetos com
290
recursos dos Fundos Setoriais, dentre os quais 97 eram ligados ao setor sucroenergético280
,
sendo que 25 deles eram declaradamente relacionados à tecnologia do E2G.
Outro avanço foi a criação de um programa específico ao etanol celulósico, o qual
gerou “novas modalidades” de ação do Estado em relação ao SSI da cana-de-açúcar, tais
como: a) as participações acionárias em empresas que buscam realizar inovação (GranBio;
CTC); b) financiamento por meio de recurso não-reembolsáveis; c) créditos para projetos de
inovação (condições especiais); d) recursos para ICTs realizarem projetos de P&D em
cooperação com as firmas na fase industrial do SSI.
Os novos direcionamentos e o contexto histórico possibilitaram ao SSI da cana-de-
açúcar presenciar novas interações entre os distintos atores que compõem o sistema. Estas
novas relações se realizam por meio dos projetos e P&D em etanol celulósico, que por sua
vez, se sustentam operacionalmente a partir das parcerias estratégicas entre firmas ou entre
firmas e ICTs. Todas as iniciativas dos anos 2000 realizam algum tipo de parceria. Estas
ocorrem por meio de joint ventures, cooperação no P&D; consórcios para a realização de
P&D; licenciamento de tecnologia estrangeira; contratos de fornecimento de insumos
tecnológicos específicos; dentre outras.
Este novo tipo de interação ocorre na medida em que os atores visam complementar
suas competências tecnológicas. As empresas líderes dos projetos de P&D adquiriram ou
cooperaram nos “momentos produtivos” do E2G onde não apresentam competências, ou que
seria muito dispendioso realizar investimentos. Por tais razões, uma mesma empresa
estabeleceu relações com vários atores distintos.
Um exemplo característico deste novo contexto é a GranBio. Para a construção e
operação da sua planta de etanol celulósico, estabeleceu a aquisição do pacote tecnológico da
Beta Renewables (Itália); para obter os insumos tecnológicos necessários ao funcionamento
dos processos chaves, realizou acordos com a Novozymes (Dinamarca) e DSM (Holanda),
respectivamente fornecedores de enzimas e de leveduras; para obter a biomassa, realizou
acordo de fornecimento de matéria-prima com a Usina Caeté (Brasil); para acessar
competências em fermentação de alto desempenho de maneira proprietária, realizou parcerias
com a Unicamp (Brasil); para estabelecer alternativas tecnológicas na etapa do pré-
tratamento, adquiriu parte da empresa American process (EUA); para desenvolver cana-
280
O primeiro aporte só foi feito no ano de 2000. Os recursos gastos pela FINEP no setor sucroenergético
somam R$ 2.064.613.198,27, sendo que aproximadamente metade deste valor foi investida no âmbito do PAISS
Industrial.
291
energia estabeleceu parcerias com IAC (Brasil) e RIDESA (Brasil). Por fim, para implementar
e melhorar seu sistema de recolhimento de palha de cana, fechou acordos com CNH (EUA),
Valtra (Finlândia) e Implanor (Brasil).
É imperativo reconhecer que o braço do Estado brasileiro participa ativamente dessas
relações; apenas no Programa PAISS Industrial, as unidades da GranBio contaram com o
aporte de R$ 300,2 milhões do BNDES (crédito) para a implantação da BioFlex 1 e mais R$
312,9 milhões vindos da FINEP (crédito) para outras atividades de P&D. De maneira paralela,
mas concatenada, tem-se o aporte feito pelo BNDESPar, disponibilizando recursos na ordem
de R$ 600 milhões ao longo da vigência do Plano de Negócios submetido ao PAISS Industrial
– situação que permite ao banco público controlar 15% das ações da empresa e o direito de
indicar um membro para o Conselho de Administração.
É importante notar que esta nova dinâmica deu origem a projetos industriais em E2G
distintos. As diferenças são de capacidade instalada, mas, principalmente, de propósitos. Por
exemplo: o CTC, a Odebrecht e o CTBE visaram uma escala reduzida, com plantas industriais
para a realização de testes e comprovação do conceito tecnológico e da viabilidade
econômica, e como tal objetivaram o desenvolvimento proprietário da tecnologia. Já os
projetos da Raízen, da GranBio e o da Petrobras eram voltados para a escala comercial,
buscando explorar as vantagens de serem os pioneiros em produzir etanol celulósico.
Uma ressalva deve ser feita em relação à iniciativa da Petrobras, que além de buscar os
ganhos do pioneirismo, também desenvolvia proprietariamente a tecnologia, com o objetivo
futuro de explorar economicamente a tecnologia. Diferentemente da GranBio e da Raízen,
que importaram tecnologia com o propósito de atuar de fato na produção de biocombustíveis
e bioquímicos.
Na esteira desse processo, foi possível identificar a existência de “focos” de
desenvolvimento endógeno da tecnologia de E2G. Este desenvolvimento local pode ser visto
de duas maneiras:
1) Os depósitos de famílias de patentes, sendo que os principais atores nacionais nessa
trajetória depositaram patentes nos anos 2000. A GranBio (5); a Petrobras (5); o CTC (4); a
Odebrecht (2); o CTBE (2) e as universidades também participaram dessa ação, sendo que a
Unicamp é proprietária de 4 famílias de patentes281
. Estas invenções são furto de esforços em
281
Estes esforços não podem ser desprezados, mas é notória a desproporcionalidade existente entre os atores
nacionais e os estrangeiros, como exemplo: a Novozymes (165); DuPont (40); POET (33); DSM (31); BP (25);
Iogen (24); Inbicon (15) e outras.
292
pesquisa e desenvolvimentos feitos em projetos de pesquisa formalizados, configurando ações
que se aproximam do STI-mode. O caso da GranBio, com a levedura transgênica, ou do
CTBE, com o desenvolvimento de coquetéis enzimáticos, são destaques dessa dinâmica.
2) Existe o desenvolvimento endógeno pela via de aprendizagem baseada na
adaptação e no melhoramento da tecnologia importada, fato este que reorienta o
desenvolvimento pelo DUI-mode. Esta situação se dá nas duas plantas em escala comercial.
Assim, estas firmas realizam a substituição de materiais e de equipamentos, bem como o
desenvolvimento de “novos” equipamentos – como é o caso da máquina de limpar biomassa
da Raízen.
Diante do desafio tecnológico e dos esforços sistemáticos realizados pelos principais
atores do SSI da cana-de-açúcar, a pesquisa formulou a seguinte hipótese: as mudanças
exigidas pela tecnologia do etanol celulósico alteram a base de conhecimento na fase
industrial do setor sucroalcooleiro, forçando um deslocamento do exclusivismo DUI-mode
(learning by doing, learning by using e learning by interacting) para um padrão
intermediário, visando o STI-mode (learning by Science, Technology and Innovation).
Essa situação se daria pela exigência da própria tecnologia, ou seja, as tecnologias que
suportam a produção do E2G pertencem a outro regime tecnológico. Assim, obrigariam os
atores do SSI da cana a buscarem processos de aprendizagem mais próximos da ciência; do
conhecimento formal; dos experimentos em laboratórios; e com o estabelecimento de
cooperações com universidades e/ou ICTs.
Esse movimento aconteceu/acontece de maneira particularizada em poucos atores que
conduzem ou conduziram projetos de P&D nos anos 2000. Alguns destes têm origem
nacional, tais como a GranBio; CTC; Cenpes/Petrobras; CTBE. Estes buscaram competências
ligadas ao conhecimento formalizado, tentando emular o STI-mode. Até por isso, figuram
como depositantes de famílias de patentes.
Vale destacar que estes atores não são firmas processadoras de biomassa (usina). O
único ator que atua no beneficiamento da cana-de-açúcar e que atingiu maturidade no seu
projeto de P&D foi a Raízen. E seus esforços de inovação ocorrem a partir da aquisição da
tecnologia estrangeira e, em seguida, diante dos problemas enfrentados no cotidiano da
produção, passou a imprimir inovações incrementais. Foi a partir do uso, da produção e da
interação com outras experiências que a Raízen realizou melhoramentos e adaptações.
293
Assim, pode-se supor que as usinas/firmas processadoras de biomassa irão se manter
no DUI-mode, atreladas aos fornecedores. As usinas são tradicionalmente supplier dominated
firms e como tal permanecem nessa situação mesmo após a introdução do E2G – pelo menos
nesse primeiro momento.
As inovações na fase industrial do SSI da cana-de-açúcar continuam sendo
introduzidas pelos fornecedores de insumos e desenvolvedores de tecnologias, mas a grande
diferença é que no E2G ocorre uma substituição dos atores nacionais pelos estrangeiros, os
quais apresentam base tecnológica e de conhecimento distintas das principais firmas que
compunham as iniciativas de inovação no setor sucroalcooleiro até então.
Na trajetória tecnológica do etanol de primeira geração, as inovações vivenciadas
pelas usinas foram introduzidas pelas empresas de bens de capital nacional, as quais se
baseiam no DUI-mode. Mas no contexto do E2G, as inovações demandam conhecimentos
sistematizados ligados à ciência, situação que inviabilizou a participação destes atores
tradicionais. Como consequência, atraiu ao setor as empresas de base tecnológicas ligadas à
química e à biotecnologia (na grande maioria estrangeiras).
Portanto, com exceção dos poucos atores nacionais já referenciados, o deslocamento
para o STI-mode no nível de SSI é conduzido por empresas estrangeiras, uma vez que o Brasil
não domina as tecnologias mais relevantes. O desenvolvimento para o STI-mode deve ocorrer
inevitavelmente devido à natureza do desafio tecnológico; mas, como não poderia deixar de
ser, mudam-se os tradicionais fornecedores de insumos e de tecnologias por novos atores.
O que se viu até o ano de 2017 foi uma dinâmica aparentemente paradoxal, em que os
atores brasileiros adentraram a rota tecnológica do E2G em patamares semelhantes aos atores
internacionais (vide tabela 5.2.), mas ao mesmo tempo, o SSI da cana-de-açúcar aumentou sua
dependência tecnológica externa, porque as etapas mais complexas da tecnologia são
controladas por empresas estrangeiras. E, o mais interessante, é que este movimento foi
impulsionado para produzir um produto já de domínio no Brasil, com mecanismos de
aprendizagem já dominados, e uma cadeia produtiva totalmente internalizada no país.
As estratégias até aqui são acertadas - parcerias estratégicas com o capital estrangeiro.
Mas a próxima barreira a ser superada pelo SSI da cana-de-açúcar deve ser a internalização
dessas ações e das competências ligadas ao STI-mode, para desenvolver tecnologias
proprietárias e desencadear sucessivos desdobramentos pelo setor produtivo (produção do
etanol 2G e bioquímicos; máquinas e equipamentos e insumos tecnológicos nacionais).
294
Acrescenta-se a essa dinâmica a existência de outras barreiras a serem superadas
para o avanço do etanol celulósico. A principal delas, sem dúvida, é a barreira tecnológica;
na situação atual, os diversos processos industriais da “usina de 2G” ainda não funcionam
como deveriam e os custos de produção ainda são maiores do que o E1G (vide capítulo 5).
De maneira correlacionada a esta barreira existe a necessidade de continuar
implementando políticas pró-etanol celulósico, mesmo diante de um cenário incerto e
desconfiado em relação aos avanços futuros da tecnologia. A tecnologia não funciona de
maneira satisfatória, mas pode vir a funcionar com novos esforços em P&D, então é
necessário investir. Encontra-se aqui um paradoxo pois, como indica Mazzucato (2013), os
investidores privados só irão investir se a tecnologia funcionar.
Isso indica que o Estado novamente deverá mostrar apetite para inovação e desenhar
novos instrumentos de políticas que sustentem as próximas etapas da evolução da tecnologia
do etanol celulósico. Além da incerteza com a tecnologia, o etanol celulósico sofre uma
pressão a partir de outras opções tecnológicas, as quais visam descarbonizar o setor de
transportes 282
.
Estas inovações, em outros ramos da economia, podem em médio/longo prazo
eliminar as possibilidades da expansão do etanol 2G como combustível para veículos de
passageiros. Então, existe um time que deve ser aproveitado pelos atores do SSI da cana-de-
açúcar, mas para serem aproveitadas, essas soluções no curto e médio prazo devem ser
elaboradas visando resolver os problemas atuais e difundir a tecnologia no setor
sucroenergético.
Estes novos estímulos devem superar as limitações atuais do arcabouço institucional
do SSI da cana-de-açúcar, que conseguiu avançar pelo lado da oferta, mas ficou estagnado no
lado da demanda. Hoje só existem instrumentos voltados à demanda do etanol de primeira
geração e, como a segunda geração origina-se de um domínio tecnológico distinto, deve-se
implantar ações sistemáticas que favoreçam a compra e a produção do E2G, tais como os
mandatos de misturas ou as bonificações aos produtores.
282
O etanol celulósico sofre pressão de outras “tecnologias verdes” na medida em que é utilizado apenas como
substituto direto da gasolina, mas o seu uso e seu potencial devem perseguir o horizonte da alcoolquímica e o
abastecimento de outros modais (veículos pesados, por exemplo). Ainda, a sua tecnologia abre espaço para o
desenvolvimento de outros produtos que podem complementar o segmento de combustíveis e químicos.
295
O desafio para as políticas públicas do setor sucroenergético está na continuidade da
promoção do avanço tecnológico do E2G paralelamente ao avanço do seu mercado,
contornando as incertezas e as pressões existentes no cenário internacional em relação à
continuidade dos biocombustíveis. Com isso, a superação destas barreiras deve resultar na
promoção do crescimento setorial puxado pela inovação (difusão da tecnologia de segunda
geração), realizando o adensamento e a diversificação das atividades do SSI da cana-de-
açúcar.
É nessa difícil tarefa que reside a maior contribuição da tese, pois ao longo do trabalho
mostrou-se os papéis do setor público e do setor privado no processo de inovação do E2G.
Expôs-se as particularidades desse processo, identificando que o setor público não se limitou
apenas a incentivos complementares às ações conduzidas pelo setor privado; pelo contrário, o
Estado brasileiro em certa medida assumiu riscos ao investir recursos financeiros na rota do
etanol celulósico e os complementou com um conjunto de ações.
Com isso, o trabalho evidenciou o caráter coletivo da inovação, mostrando a divisão
do trabalho inovador entre os diferentes atores do SSI da cana-e-açúcar, com especial atenção
ao comprometimento de cada ator frente ao contexto que abarca o etanol celulósico.
296
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312
APÊNDICE 1
Figura. Principais conjuntos tecnológicos do etanol celulósico - Landscape by technology
clusters –Geral ( famílias de patentes).
Fonte: elaboração própria a partir dos dados da Questel Orbit, 2017.