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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: EDUCAÇÃO ANATOLI VASSILIEVITCH LUNATCHARSKI: A EDUCAÇÃO NA RÚSSIA REVOLUCIONÁRIA (1917-1929) PAULA GONÇALVES FELICIO MARINGÁ 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: EDUCAÇÃO

ANATOLI VASSILIEVITCH LUNATCHARSKI: A EDUCAÇÃO NA RÚSSIA REVOLUCIONÁRIA (1917-1929)

PAULA GONÇALVES FELICIO

MARINGÁ 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: EDUCAÇÃO

ANATOLI VASSILIEVITCH LUNATCHARSKI: A EDUCAÇÃO NA RÚSSIA REVOLUCIONÁRIA (1917-1929)

Dissertação apresentada por PAULA GONÇALVES FELICIO, ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual de Maringá, como um dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação. Área de Concentração: EDUCAÇÃO Orientadora: Profa. Dra. MARTA CHAVES

MARINGÁ 2018

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PAULA GONÇALVES FELICIO

ANATOLI VASSILIEVITCH LUNATCHARSKI: A EDUCAÇÃO NA RÚSSIA REVOLUCIONÁRIA (1917-1929)

BANCA EXAMINADORA

Profa. Dra. Marta Chaves (Orientadora) Universidade Estadual de Maringá – UEM

Prof. Dr. João Carlos da Silva Universidade Estadual do Oeste do Paraná Unioeste – Cascavel

Profa. Dra. Jani Alves da Silva Moreira Universidade Estadual de Maringá – UEM

Profa. Dra. Maria Aparecida Leopoldino Tursi Toledo (Suplente) Universidade Estadual de Maringá – UEM

MARINGÁ, 26 DE OUTUBRO DE 2018.

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DEDICO AOS MEUS QUERIDOS PAIS, NIVALDO E ROSSANA,

EXEMPLOS DE FÉ, AMOR E DEDICAÇÃO.

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AGRADECIMENTOS

Registro minha gratidão a todos os que fizeram parte da minha história e da história

deste trabalho. Agradeço em especial:

A Deus, por conceder-me força, fé e perseverança;

Aos meus queridos e amados pais, Rossana Gonçalves Felicio e Nivaldo Donizeti

Felicio, por me ensinarem a beleza, o sentido e o significado do amor e da fé, por

possibilitarem e apoiarem meus estudos com dedicação, carinho e orações;

À minha querida orientadora, prof. Dra. Marta Chaves, pelo afeto e zelo que tem me

dedicado, sendo um exemplo de profissional pela sua firmeza, rigor, sensibilidade e

competência, e por me ensinar a sonhar e lutar por uma educação de excelência

para todos. Agradeço imensamente por ter me apresentado sua bela família, a qual

me trata com respeito e carinho;

Aos prezados professores Dr. João Carlos da Silva, Dra. Jani Alves da Silva Moreira,

Dra. Maria Aparecida Leopoldino Tursi Toledo e Dra. Rosane Michelli de Castro, por

aceitarem o convite para compor a Banca Examinadora e pelas significativas

contribuições para a elaboração desta dissertação;

Aos meus amados familiares, em especial a meu irmão Fábio Gonçalves e sua

esposa Francieli Medeiros, a minha tia Aparecida Felicio, a minha avó Cenira

Gonçalves, por incentivarem meus estudos e rezarem pelos meus sonhos, e ao meu

avô Lázaro Felicio, em memória, por seus ensinamentos e suas palavras de “fé e

coragem”, que me fortalecem;

Ao querido Jefferson Cirineo Ferreira de Meira, por me apoiar incansavelmente,

compreender minhas limitações e acreditar que posso superá-las. Com quem divido

os sonhos de uma formação humana plena para todos. Agradeço pela contribuição

fundamental na busca de materiais e fontes para a pesquisa, pelos anos de

companheirismo, amor e paciência, especialmente durante a escrita desta

dissertação. Enfim, agradeço por fazer meus dias mais felizes!;

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Às amigas para uma vida toda: Laura Paiva, desde nossa infância me ensina o

verdadeiro sentido da amizade, companheirismo, consideração e respeito; Jéssica

Rigoldi, que esteve ao meu lado durante o curso de graduação e permanece

presente nessa nova trajetória de estudos, torcendo para o êxito de minhas

realizações pessoais e acadêmicas; Patrícia Souza, pela sensibilidade e alegria

incondicional e revigorantes, por estar ao meu lado durante esse processo de lutas e

sonhos; Mariane Silva, pelo silêncio que acalma e traz esperança diante das

adversidades; Heloísa Nunes, pelas palavras sinceras, de incentivo e de afeto ao

longo de nossa trajetória acadêmica; Francieli Javorsky, com quem em meios aos

desafios do cotidiano escolar pensávamos em possibilidades de aprendizagem e

desenvolvimento dos pequenos, por apoiar meus sonhos e ansiar por minhas

conquistas;

Agradeço carinhosamente ao Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação Infantil –

GEEI, cuja contribuição para minha formação é inestimável, por possibilitar estudos

e vivências ricas e enriquecedoras, pelos momentos de afeto, coletividade e,

particularmente, aos colegas Cristiane Aparecida da Silva Pastre, por sua

sensibilidade, delicadeza e ternura; e Vinícius Stein, por me ensinar a cada instante

o apreço à ciência e à arte.

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[...] E se temos, portanto, necessidade de cultura para progredir rumo ao comunismo, a inversa é igualmente verdadeira: o comunismo será absolutamente desprovido de sentido se não servir a cultura. Cultura, instrução, ciência, arte – não são apenas outros tantos meios para atingir os nossos fins. São ao mesmo tempo a nossa mais nobre finalidade (LUNATCHARSKI, 1988, p. 162, grifos nossos).

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FELICIO, Paula Gonçalves. ANATOLI VASSILIEVITCH LUNATCHARSKI: A EDUCAÇÃO NA RÚSSIA REVOLUCIONÁRIA (1917-1929). 173 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Estadual de Maringá. Orientadora: Profa. Dra. Marta Chaves. Maringá, 2018.

RESUMO

Nesta dissertação, objetivamos apresentar a proposta de Educação defendida por Anatoli Vassilievitch Lunatcharski (1875-1933). Para tanto, priorizamos em nossa investigação a obra “Artigos e Discursos sobre a Instrução e a Educação” (LUNATCHARSKI, 1988). Neste estudo, com delineamento bibliográfico, amparamo-nos nos pressupostos da Ciência da História e da Teoria Histórico-Cultural. Organizamos as seções de modo a atender nossos objetivos específicos. Na primeira seção, contextualizamos os acontecimentos econômicos e políticos russos e revolucionários em que foi desenvolvida a proposição de Lunatcharski e pesquisamos os aspectos biográficos desse intelectual. Na segunda seção, realizamos um levantamento da produção acadêmica afeta a este autor de 2007 a 2017. Discorremos sobre os princípios da escola soviética e a estruturação do sistema educacional proposto por Lunatcharski, em especial entre anos de 1917 e 1929, período em que atuou como Comissário do Povo para Instrução Pública, em defesa da formação do novo homem comunista. Refletimos acerca das possíveis contribuições da proposição de Lunatcharski aos desafios educacionais brasileiros na atualidade, em favor de uma Educação humanizadora e emancipadora. Consideramos relevante o estudo dos clássicos para a formação inicial e continuada de professores, assim como as contribuições de Lunatcharski à Educação, em geral pouco conhecidas no âmbito educacional brasileiro. Nossa pesquisa foi consolidada por meio da participação como integrante do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação Infantil (GEEI), por ser um dos objetos de estudos as proposições dos intelectuais soviéticos dos anos 1920 e 1930. Palavras-chave: Lunatcharski. Educação comunista. Teoria Histórico-Cultural. Formação de Professores.

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FELICIO, Paula Gonçalves. ANATOLI VASSILIEVITCH LUNATCHARSKI: EDUCATION IN REVOLUTIONARY RUSSIA (1917-1929). 173 p. Thesis (Master´s in Education) – State University of Maringá. Advisor: PhD. Marta Chaves. Maringá, 2018.

ABSTRACT In this thesis, we aim to present a proposal for education defended by Anatoli Vassilievitch Lunatcharski (1875-1933). Therefore, we prioritize in our research the work "Artigos e Discursos sobre a Instrução e a Educação" (LUNATCHARSKI, 1988). In this study, with a bibliographic delineation, we are based on the assumptions of the Science of History and Cultural-Historic Theory. We have organized the sections with the purpose of meeting our specific goals. In the first section, we contextualize the Russian revolutionary economic and political events in which a proposition of Lunatcharski was developed and we investigate the biographical aspects of this intellectual. In the second section, we perform a survey of academic production in how it affects this author from 2007 to 2017. Discussing the principles of the Soviet school and the structuring of the educational system proposed by Lunatcharski, in particular between 1917 and 1929, period in which he served as People's Commissar for Public Instruction, in defense of the formation of the new communist man. We reflect on the possible contributions of Lunatcharski's proposition to the current Brazilian educational challenges, in favor of a humanizing and emancipatory Education. We consider relevant the study of the classics for an initial and continued journey of teachers, as well as the contributions of Lunatcharski to Education, in general little known in the Brazilian educational system. Our research was consolidated through participation as a member of the Research Group in Child Education (Grupo de Pesquisa em Educação Infantil – GEEI), as one of the objects of study the propositions of Soviet intellectuals from the years 1920 and 1930.

Key-words: Lunatcharski. Communist Education. Cultural-Historic Theory. Teacher Training.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Iliá Riépin. Barqueiros do Volga. Óleo sobre tela. 131,5 x 281 cm. 1870-1873. Museu Estatal Russo, São Petersburgo...............

30

Figura 2 – Nikolai Ivanovich Feshin. Retrato de Anatoli Lunatcharski.

Têmpera sobre tela. 1920............................................................... 45

Figura 3 – Kuzma Petrov-Vódkin. Na linha do Fogo. Óleo sobre tela. 196 x

275 cm. 1916. Legado em 1951 de M. F. e E. K. Petrov-Vódkin... 52

Figura 4 – Victória Belakóvskaia. Cavalo de Aço nos Campos da Ucrânia.

Óleo sobre tela. 127 x 112 cm. 1927.............................................. 54

Figura 5 – Natalia Gontcharova. Inverno. Óleo sobre tela. 118 x 99 cm.

1911. Legado em 1926 ao Museu de Cultura e Arte através do Instituto Estatal de Arte e Cultura, Leningrado...............................

60

Figura 6 – Konstantín Yuón. Primeira aparição de Lenin em uma reunião do

Soviete de Petrogradi em Smolni em 25 de outubro de 1917. Óleo sobre tela. 132 x 191 cm. 1927..............................................

66

Figura 7 – Aleksandr Samokhválov. Setor Tecelagem. Óleo e têmpera

sobre tela. 68 x 98 cm. 1929.......................................................... 78

Figura 8 – Aleksandr Guerásimov. Moscou. Catedral de São Basílio. Óleo

sobre tela. 164 x 184 cm. 1947..................................................... 95

Figura 9 – Samuil Adlivankin. Concurso de jovens modelistas. Óleo sobre

tela. 121 x 58 cm. 1931.................................................................. 103

Figura 10 – Aleksandr Samokhválov. Universitária. Óleo sobre tela. 97 x 66

cm. 1936-1937................................................................................ 106

Figura 11 – Aleksandr Samokhválov. No estádio. Óleo sobre tela. 121 x

140,5 cm. 1934-1935...................................................................... 128

Figura 12 – Alekséi Volter. Trabalhador de choque (construtor do

socialismo). Óleo sobre tela. 107 x 71,5 cm. 1932......................... 131

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Apresentação de pesquisas localizadas nas plataformas Capes e BDTD..............................................................................................

83

Quadro 2 – Análise dos resultados obtidos nas plataformas Capes e BDTD... 84 Quadro 3 – Relação de pesquisas por Instituição de Ensino Superior (IES).... 84

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Anped – Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação

BDTD – Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento

BNCC – Base Nacional Comum Curricular

CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe

DTP – Departamento de Teoria e Prática da Educação

FMI – Fundo Monetário Internacional

GEEI – Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação Infantil

GITIS – Instituto de Arte Teatral

Glavpolitprosvet – Departamento de Educação Política

GOELRO – Plano Estatal de Electrificação da Rússia

IES – Instituição de Ensino Superior

IZO – Departamento de Artes Plásticas

Komsomol – União da Juventude Comunista

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Likbez – Departamento de Luta Contra o Analfabetismo

LITO – Departamento de Literatura

MA – Maranhão

MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

MUZO – Departamento de Música

Narkompros – Comissariado do Povo para Instrução Pública

NEP – Nova Política Econômica

ONU – Organização das Nações Unidas

PIC – Projeto de Iniciação Científica

PNAIC – Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa

POSDR – Partido Operário Social-Democrata Russo

PPE – Programa de Pós-Graduação em Educação

PR – Paraná

PRONERA – Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária

Proletkult – Organização da Cultura Proletária

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RCNEI – Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil

RO – Rondônia

SEED – Secretaria de Estado da Educação do Paraná

SEMED – Secretaria Municipal de Educação

TCC – Trabalho de Conclusão de Curso

TEO – Departamento de Teatro

TIM – Teatro Meierhold

UEM – Universidade Estadual de Maringá

UFF – Universidade Federal Fluminense

UFSCAR – Universidade Federal de São Carlos

UMESP – Universidade Metodista de São Paulo

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e para a Cultura

Unicentro – Universidade Estadual do Centro-Oeste

Unioeste – Universidade Estadual do Oeste do Paraná

URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

USP – Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO............................................................................................... 14

2 LUNATCHARSKI E REVOLUÇÃO: A FORMAÇÃO DO NOVO HOMEM

COMUNISTA..................................................................................................

26

2.1 O IMPÉRIO RUSSO: ELEMENTOS TEÓRICOS PARA COMPREENDER

A CONSTITUIÇÃO DA LUTA REVOLUCIONÁRIA.......................................

28

2.2 ANATOLI VASSILIEVITCH LUNATCHARSKI: A TRAJETÓRIA DO

INTELECTUAL E COMBATENTE..................................................................

40

2.3 1905-1917: TEMPOS DE EMBATES E ENFRENTAMENTOS...................... 46

2.4 A REVOLUÇÃO DE OUTUBRO DE 1917: ENFRENTAMENTOS E

CONQUISTAS................................................................................................

55

3 LUNATCHARSKI E A ORGANIZAÇÃO DA URSS: OS PRINCÍPIOS DA

ESCOLA SOVIÉTICA....................................................................................

81

3.1 A PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE LUNATCHARSKI NO BRASIL.......... 83

3.2 A ORGANIZAÇÃO DO COMISSARIADO DO POVO PARA INSTRUÇÃO

PÚBLICA........................................................................................................

86

3.3 A PROPOSTA PARA A EDUCAÇÃO SOVIÉTICA: A DEFESA PELA

CIÊNCIA E ARTE...........................................................................................

109

3.4 AS CONTRIBUIÇÕES DE LUNATCHARSKI PARA A EDUCAÇÃO

BRASILEIRA NA ATUALIDADE.....................................................................

137

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................... 150

REFERÊNCIAS.............................................................................................. 154

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1 INTRODUÇÃO

A motivação para este estudo se desenvolveu ao longo de nossa trajetória

acadêmica. No primeiro ano da graduação no curso de Pedagogia, em 2012, na

Universidade Estadual de Maringá (UEM), as disciplinas “Formação docente: Prática

para o ensino de Arte na escola” e “Literatura Infantil na escola”, ministradas pela

professora Dra. Marta Chaves, foram significativas para as primeiras aproximações

com nosso tema de investigação. Nelas, tivemos a possibilidade de estudar, ainda

que sucintamente, questões afetas à Arte e à Educação, em especial à Educação

Infantil, amparados nas elaborações de autores clássicos e contemporâneos1,

particularmente os intelectuais russos.

Nesse sentido, se firmou a intenção de aprimorar nossa formação. Para tal, o

ingresso, em fevereiro de 2013, no Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação

Infantil – GEEI2 –, liderado pela Prof. Dra. Marta Chaves, orientadora deste trabalho,

foi essencial. Os estudos iniciais e as vivências no Grupo, o acompanhamento às

palestras, aos cursos de formações continuadas nos municípios, às disciplinas

ministradas pela referida professora em cursos de graduação e pós-graduação

(especialização em Educação Infantil e em Psicopedagogia, mestrado e doutorado

no Programa de Educação) e as participações em eventos nos mobilizaram e nos

sensibilizaram para reafirmar a necessidade de dedicarmos atenção e esforços na

compreensão de subsídios teóricos-metodológicos, amparados na Teoria Histórico-

Cultural, para refletirmos as possibilidades de intervenções pedagógicas,

1 Bakhtin (2004), Blagonadezhina (1969), Brecht (1991; 2006), Hobsbawn (1998; 2011), Kosik (1976),

Krupskaia (19--), Leontiev (1978), Lukács (2016), Lunatcharski (1965; 1975; 1974; 1988), Luria (1986), Makarenko (1960; 1976; 1977; 1981; 1987; 2012), Marx e Engels (1993), Mészáros (2003; 2008), Mukhina (1996), Pistrak (2009; 2011), Vigotski (2001; 2009). A estes somam-se algumas produções contemporâneas, tais como: Arendt (2008), Chaves (2008; 2011a; 2011b; 2014b; 2015a), Duarte (2001; 2008; 2009; 2012), Facci (2004), Franco (2006), Lessa (2007), Lima (2005), Martins (2013), Mello (2000; 2007; 2010), Moraes (2001), Netto (2011), Peixoto (2003), Prestes (2012), Shuare (1990) e Tonet (2013).

2 O GEEI é liderado pela Dra. Marta Chaves e foi constituído como desdobramento do Projeto de Ensino “Natureza e Sociedade: conteúdo apresentado às crianças através da Literatura Infantil”, com duração entre 2003 e 2004, realizado junto ao Departamento de Teoria e Prática da Educação (DTP) da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Formado por discentes e docentes da Universidade Estadual de Maringá, e pesquisadores de outras Instituições de Ensino Superior do Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Rondônia. Os objetivos do GEEI concentram-se em estudos afetos à formação de professores e investigações sobre as práticas pedagógicas realizadas nas instituições de Educação Infantil. Os pressupostos do marxismo e da Teoria Histórico-Cultural norteiam e amparam as pesquisas, ações e intervenções pedagógicas dos integrantes, a fim de instrumentalizar professores e gestores educacionais para a organização de um ensino por excelência, que se caracteriza por ter como prioridade as máximas elaborações humanas (CHAVES, 2011c; CHAVES, 2012; CHAVES, 2015b).

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especificamente na Educação Infantil, em uma perspectiva humanizadora. Isso

significa considerar a essencialidade da educação escolar em favor dos

conhecimentos afetos à ciência e à arte; uma proposta pedagógica que reflita as

potencialidades das crianças e “a necessidade da intencionalidade educativa em

favor da emancipação, em oposição à ideia de assistência e limite para a criança

aprender e ter determinadas ações apresenta-se enquanto condição elementar para

uma educação humanizadora” (CHAVES, 2011a, p. 63). Destacamos que nossos

primeiros estudos com os escritos e elaborações de Anatoli Vassilievitch

Lunatcharski (1875-1933)3 se efetivaram mediante participação no GEEI.

Mencionamos algumas experiências especiais do Grupo que contribuíram

para nossa formação profissional, dentre as quais o acompanhamento, como

ouvintes, nas disciplinas ministradas pela Prof. Dra. Marta Chaves no curso de

Pedagogia – Turma Especial para Educadores do Campo (UEM)4, na Escola Milton

Santos, localizada no município de Paiçandu – PR, e em particular, a participação do

GEEI no Projeto Ciranda Infantil – Sementes da Esperança, juntamente com os

estudantes da Pedagogia do Campo5, desenvolvido durante a XIII Jornada de

3 Utilizamos a grafia Anatoli Vassilievitch Lunatcharski ao longo de todo o texto, mantendo as formas

de transliteração utilizada pelos tradutores de nossas fontes. “Esse mesmo procedimento é realizado com os demais nomes russos, o que justifica as diferentes grafias para o nome de uma mesma pessoa. As divergências se devem à necessidade de transliteração do alfabeto cirílico para o alfabeto latino” (STEIN, 2014, p. 13). Sobre as pesquisas afetas à tradução do russo para o português mencionamos a obra “Quando não é quase a mesma coisa”, de Zoia Ribeiro Prestes (2012), intelectual que tem conhecimento da língua russa, portuguesa e é uma estudiosa da Teoria Histórico-Cultural, no Brasil.

4 “A Universidade Estadual de Maringá (UEM) foi instada pelo MST a pensar e planejar a oferta de um curso, que contou inicialmente com o apoio de grupos de pesquisa, cujos pesquisadores estudavam a Educação do Campo como gestores e professores”. Cabe salientar que “[...] o curso foi proposto em 2001 e autorizado a funcionar em 2012 [...]”, o qual teve como objetivo a formação docente nos níveis e modalidades da educação, “[...] em áreas de assentamentos e acampamentos de comunidades do campo [...]” (MENEZES; FAUSTINO; CHAVES, 2017, p. 157). O Curso Pedagogia – Turma Especial para Educadores do Campo se iniciou no dia 24 de abril de 2013 junto à UEM, os Movimentos Sociais Populares do Campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera). O curso teve duração de quatro anos e foi oferecido em regime de alternância (com períodos de Tempo Escola/Universidade e períodos Tempo Comunidade), coordenado pelas professoras Dra. Maria Christine Berdusco Menezes, Dra. Marta Chaves e Dra. Rosângela Célia Faustino, no período de 2013 a 2016.

5 Cabe ressaltar que as ações desenvolvidas no Projeto Ciranda contemplaram desdobramentos da disciplina ‘Literatura e Linguagens’, ministrada no Curso “a partir de estudos e reflexões de textos dos autores da Teoria Histórico-Cultural e pesquisadores de instituições de ensino superior do Brasil” (MENEZES; FAUSTINO; CHAVES, 2017, p. 160). Nesse evento foram organizados Ateliês de Arte e Literatura Infantil, jogos e brincadeiras, e um espaço com músicas e brinquedos para os bebês. Para Chaves (2016, p. 130), em seu texto “Educação Integral e intervenções pedagógicas: contribuições e proposições da teoria histórico-cultural”, no qual discorre sobre a formação de professores, a definição pela expressão Ateliê, em oposição ao termo “oficina”, se justifica por esse “conceito estar, na atualidade, imediatamente relacionado às práticas artísticas” e ao trabalho manual, artesanal. De acordo com a autora, a arte é “um processo criativo e criador, que necessita ser rico e enriquecedor” (CHAVES, 2016, p. 130), tendo como referência o que há de mais elaborado, avançado e sofisticado em favor do máximo desenvolvimento das habilidades humanas. Conforme Marx (2013b), o artesão conhece todo o processo de composição de um objeto, diferentemente da dinâmica da oficina ou da fábrica, na qual o processo é fragmentado, se especializando apenas em determinada etapa do processo, se perdendo a noção do todo.

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Agroecologia realizada em 2014. foi fundamental para conhecermos sobre a

organização das ações educativas e da rotina na Educação do campo, em especial

com as crianças dos primeiros meses6 aos 13 anos de idade.

Nossa participação com o GEEI no Projeto Ciranda fortaleceu nossa defesa

por pela luta de uma educação pautada na coletividade. Luedemann (2002) afirma

que as orientações pedagógicas soviéticas advindas do Comissariado do Povo para

Instrução Pública, dirigido por Lunatcharski, era para o desenvolvimento, ao máximo,

da vida coletiva. No Relatório, intitulado “Tarefas da Instrução Pública no sistema da

edificação socialista”, escrito por Lunatcharski (1988) para o “I Congresso da

URSS dos docentes”, ocorrido em Moscou no período de 11 a 19 de janeiro de

1925, publicado no “Jornal dos Docentes”, o autor menciona algumas questões

referentes à Escola do Campo. Destaca que os camponeses, ao terem acesso ao

conhecimento, a uma instrução comunista, não seriam mais escravos e

subservientes. Nesse aspecto, considerava significativas as atividades da União da

Juventude Comunista (Komsomol) no âmbito rural, a qual desenvolveu escolas

adaptadas às aldeias que buscavam formar o camponês intelectual, o militante do

poder soviético local. O autor acreditava que por meio do cotidiano coletivo seria

possível aprender e compreender a relevância da edificação de uma nova sociedade.

Ressaltamos outro elemento que contribuiu significativamente para o

desenvolvimento de nosso tema de pesquisa: as vivências de formação continuada,

orientadas pela líder do GEEI junto às Secretarias de Educação em alguns

municípios7 do Estado do Paraná e do Estado de Rondônia. Destacamos,

especialmente, a participação no “I Seminário de Municípios Integrados”8, que

6 Neste texto, não utilizamos a expressão “0 a 6”, comum em textos acadêmicos, ainda que tal

expressão seja reafirmada em textos de ordem legal, como a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB (Lei nº. 9.394/96) e em documentos orientadores do Ministério da Educação, como, por exemplo, o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI). Em relação à expressão “primeiros meses”, justificamos, em consonância com Chaves (2017, p. 1), que “nenhuma criança tem zero ano de idade”, ou a criança está em vida intrauterina ou tem dias, meses ou anos de nascimento, defesa que tem sido reafirmada em diversos textos (CHAVES, 2007; 2015a; 2016; 2017), bem como em palestras e cursos de formação de professores.

7 No Estado do Paraná mencionamos os municípios: Indianópolis (2002); Presidente Castelo Branco (2005 e 2006); Alto Paraná (2006); Telêmaco Borba (2006); Lobato (2009). Planaltina (2009); Terra Rica (2010); Santo Inácio (2010); Flórida (2013); Floresta (2013); Cruzeiro do Iguaçu (2013); Telêmaco Borba (2013); Boa Esperança do Iguaçu (2014); Borrazópolis (2014); Marialva (2014). No Estado de Rondônia citamos os municípios: Monte Negro (2017) e Cerejeiras (2018).

8 O I Seminário de Municípios Integrados, intitulado “Atuação de professores: estudos e formação humanizadora”, ocorreu em julho de 2015, em Cruzeiro de Iguaçu-PR, coordenado pela Dra. Marta Chaves. Contou com a presença de representantes dos municípios de Boa Esperança do Iguaçu, Borrazópolis, Cruzeiro do Iguaçu, Marialva, Paraíso do Norte e Telêmaco Borba e com a participação do GEEI. Os estudos, em geral, discutidos no evento foram afetos à formação continuada de professores na perspectiva da Teoria Histórico-Cultural, em favor de intervenções pedagógicas humanizadores. Ministraram palestra os pesquisadores: Dra. Marta Chaves (UEM) Me. Vinícius Stein (UEM), Dr. Guillermo Arias Beatón, da Universidade de Havana-Cuba, Dra. Laura Marisa Carnielo Calejon (USP) e Dra. Jane de Abreu Drewinski (Unicentro).

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objetivou socializar estudos e reflexões relativas à formação e atuação de

professores realizadas por pesquisadores e militantes da Educação, da Educação

Infantil e da Psicologia de diferentes instituições de ensino nacionais e

internacionais. Para Chaves (2010), a análise sobre o fazer docente e uma possível

recondução das ações desenvolvidas nas instituições educativas assegurariam

possibilidades de êxito quando pautadas em uma proposta de formação amparada

em estudos consequentes e contínuos. Compreendemos que mesmo em condições

adversas um elemento que pode contribuir decisivamente para a organização de

ações e vivências educativas humanizadoras é a formação de professores. “A

possibilidade que se apresenta à organização de uma proposta de capacitação é

estruturar um projeto de trabalho capaz de atender às necessidades e interesses de

professores e crianças” (CHAVES, 2014a, p. 128).

Nossa participação no GEEI oportunizou, além das mencionadas

experiências, nossa presença no Núcleo de Educação em Maringá, PR para a

apresentação do documento orientador para o Estado do Paraná intitulado

“Orientações Pedagógicas da Educação Infantil: estudos e reflexões para

organização do trabalho pedagógico” (PARANÁ, 2015a; 2015b), organizado pela

Profa. Dra. Marta Chaves juntamente com a Secretaria de Estado da Educação do

Paraná (SEED), em dois volumes e 17 textos que os compõem, que em sua grande

maioria assume a vinculação à Teoria Histórico-Cultural.

Mencionamos, também, nossos estudos iniciais afetos à arte, desenvolvidos

durante a graduação, tais como o Projeto de Iniciação Científica – PIC (FELICIO,

2014) e o Trabalho de Conclusão de Curso – TCC (FELICIO, 2016), nos quais

reafirmamos a necessidade de estudos sobre o ensino de arte na Educação Infantil

e verificamos que as intervenções educativas com modelos e referências artísticas

favorecem a aprendizagem e possibilitam o desenvolvimento das capacidades de

imaginação e criação, as quais estão relacionadas diretamente ao ensino em favor

de uma educação humanizadora e emancipadora amparada pela Teoria Histórico-

Cultural. Nessas elaborações, estudamos o contexto russo revolucionário em que as

pesquisas do referido referencial teórico-metodológico foram desenvolvidas, nos

aproximando, ainda que sucintamente, dos escritos políticos da Teoria expressos

nas obras de Lunatcharski (1975; 1988), Lênin (1936; 1987), Krupskaia (19--),

Makarenko (1976; 1981; 2012), Pistrak (2009; 2011), dentre outros.

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Em nossa análise, as considerações referenciadas e a defesa de ações

pedagógicas favoráveis ao conhecimento e à arte foram aprimoradas quando, como

estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPE) da UEM, na

disciplina “Linguagem, pensamento e conteúdo escolar”, ministrada pela líder do

GEEI, foram discutidos essa temática e seus desdobramentos. Refletimos, na

referida disciplina, que não é possível ser um profissional da educação sem nos

atentarmos às questões econômicas e políticas, pois essa concepção de homem,

sociedade e educação se cristaliza nas ações escolares. Nossas ações educativas

são para contestar a atualidade. Para tanto, precisamos estudar um referencial

teórico-metodológico, e ressaltamos as contribuições da Teoria Histórico-Cultural,

desenvolvida na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS)9 por Lev

Semionovith Vigotski (1986-1934), Alexis Nikolaevitch Leontiev (1903-1979) e

Alexander Romanovitch Luria (1902-1977), considerando seus princípios políticos,

que contribuem para orientar subsídios teórico-metodológicos que busquem

sensibilizar, mobilizar, ensinar e desenvolver professores e crianças, e se

apresentam capazes de refletir a dinâmica da sociedade, compreender para além da

aparência.

Kosik (1976) afirma que a realidade se apresenta aos homens, inicialmente,

com aparência superficial, imediata, aspecto independente e natural, a qual constitui

o mundo da “pseudoconcreticidade”. De acordo com o autor, “o mundo da

pseudoconcreticidade é um claro-escuro de verdade e engano. O seu elemento

próprio é o duplo sentido. O fenômeno indica a essência e, ao mesmo tempo, a

esconde” (KOSIK, 1976, p. 15). Para superarmos esse conceito, faz-se necessário

compreender para além da aparência, isto é, a estrutura e sua essência, por meio do

conhecimento.

Em geral, “há a desvalorização dos fundamentos, anúncio do conhecimento e,

de fato, a negação deste” (CHAVES, 2008, p. 5). Duarte (2008) faz a seguinte

indagação “E qual seria a função ideológica desempenhada pela crença na assim

chamada sociedade do conhecimento?”. No entendimento do autor, seria a de

enfraquecer, significativamente, as críticas ao sistema capitalista, gerando a

9 Em 1922, se constituiu oficialmente a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS –

composta por quinze repúblicas socialistas: Armênia, Azerbaijão, Bielorússia, Estônia, Cazaquistão, Geórgia, Letônia, Lituânia, Moldávia, Quirguízia, Rússia, Tadjiquistão, Turcomenistão, Ucrânia, Uzbequistão (VICENTINO, 1995).

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confiança de que essa luta teria sido superada pela preocupação com outros temas

“mais atuais”, como “a ética na política e na vida cotidiana pela defesa do cidadão e

do consumidor, pela consciência ecológica, pelo respeito às diferenças sexuais,

étnicas ou de qualquer outra natureza” (DUARTE, 2008, p. 14).

Sobre essa questão, Moraes (2001) discute o progressivo recuo da teoria em

pesquisas educacionais, e apresenta duas possíveis determinações desse processo:

a necessidade de novos princípios que se adequem às mudanças da sociedade

atual, significando assumir, sempre no limite, as possibilidades históricas; e por outro

lado, o ceticismo epistemológico que banaliza a questão do conhecimento e da

verdade e procede criando um novo vocabulário10 destinado a assegurar a

obediência e a resignação públicas. A autora afirma que, em geral, as discussões

teóricas têm sido aos poucos suprimidas das pesquisas educacionais.

Conforme reafirma Chaves (2008), na atualidade, em geral, a negação das

condições plenas de vida e a necessidade de manutenção do sistema de produção

capitalista buscam impossibilitar o estudo de teorias que se harmonizam com os

pressupostos marxistas. Na acepção da autora, em um período de intencional

negação dos escritos da Ciência da História e da propagada ideia de sociedade do

conhecimento, é fundamental considerarmos que a dinâmica social está relacionada

à forma de organização da produção, que se expressa a partir da materialidade.

Desse modo, é preciso nos atentarmos aos escritos de Marx e Engels11 (1993,

p. 36-37), os quais defendem que:

A produção de idéias, de representações, da consciência, está, de início, diretamente entrelaçada com a atividade material e com o intercâmbio material dos homens, como a linguagem da vida real. O representar, o pensar, o intercâmbio espiritual dos homens, aparecem aqui como emanação direta de seu comportamento material. [...] parte-

10 Ao refletirmos sobre a linguagem compreensão desenvolvida nas aulas da referida disciplina e nas

experiências junto ao GEEI, entendemos que a linguagem é a condição de interpretação, de comunicação e de posicionamento em nosso tempo. O conceito expressa uma ideologia, isto é, uma concepção de sociedade, homem e Educação. Bakhtin (2004, p. 36) defende que “[...] a palavra é o modo mais puro e sensível de relação social”.

11 Karl Marx (1818-1883) nasceu na Alemanha, e Friedrich Engels (1820-1895) em Barmem, Reino da Prússia, que depois comporia a Alemanha unificada. Esses intelectuais e militantes do socialismo científico viveram no século XIX e analisaram histórica e cientificamente a sociedade capitalista em sua configuração e estrutura. Marx e Engels desenvolveram o método político de pesquisa chamado Materialismo Histórico-Dialético, que objetiva um estudo por meio dos determinantes históricos, econômicos, políticos e sociais do objeto, levando em consideração que nenhum fato acontece de maneira isolada e sim por relação do meio social ao qual está inserido (NETTO, 2011).

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se dos homens realmente ativos e, a partir de seu processo de vida real, expõe-se também o desenvolvimento dos reflexos ideológicos e dos ecos desse processo de vida. [...] A moral, a religião, a metafísica e qualquer outra ideologia, assim como as formas de consciência que a elas correspondem, perdem toda a aparência de autonomia. Não têm história, nem desenvolvimento; mas os homens, ao desenvolverem sua produção material e seu intercâmbio material, transformam também, com esta sua realidade, seu pensar e os produtos de seu pensar. Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência (MARX; ENGELS, (1993, p. 36-37, grifos nossos.

Pelos escritos de Marx e Engels (1993) podemos nos aproximar dos

pressupostos da Ciência da História, por meio dos quais analisamos que tomar o

particular (nesse caso, a investigação das elaborações de Lunatcharski (1988) para

a Educação Soviética e suas contribuições para a Educação na atualidade) como

objeto de estudo requer que compreendamos a totalidade expressa e considerada

como História. Nas palavras dos autores, “[...] resultam somente do estudo do

processo de vida real e da ação dos indivíduos em cada época” (MARX; ENGELS,

1993, p. 39). Com isso, entendemos que a Educação não é um fenômeno explicável

por si mesmo; na ação educacional há uma convivência prática que se testemunha,

que se quer, que se defende ou se quer defender, que se expressa a partir da

materialidade e que reflete no trabalho pedagógico.

Nessa perspectiva, assumimos a ideia de que as instituições escolares

podem se apresentar como espaços educativos de excelência, e defendemos a

intencionalidade dos trabalhos pedagógicos realizados com as crianças.

Consideramos que tal preocupação acentua a importância da formação inicial e

continuada de pedagogos e reafirma, de igual modo, a defesa de uma formação

atenta e rigorosa, o que implica a necessidade de estudarmos os clássicos da

educação.

Dermeval Saviani e Duarte (2010, p. 431) defendem o acesso aos clássicos

como condição necessária à formação humana. Asseveram que o clássico “define-

se, pois, pelas noções de permanência e referência”. Desse modo, verificamos que

os escritos dos autores clássicos, em especial os intelectuais soviéticos, oferecem

contribuições para refletirmos a educação na atualidade, uma vez que, mesmo as

obras de Lunatcharski, nosso objeto de estudo, foram escritas em determinadas

condições históricas, compreendem questões centrais que dizem respeito à

humanidade que se desenvolve historicamente.

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No decorrer da trajetória mencionada se efetivaram nossas primeiras leituras

dos escritos de Lunatcharski. Os estudos iniciais desenvolvidos ao longo da

graduação, como pontuamos, motivaram o propósito de pesquisar, de maneira

detalhada, as questões afetas à Educação na Rússia Revolucionária, principalmente

nas elaborações do referido autor. Lunatcharsky (1975, p. 78-79) pondera que

“A revolução traz consigo ideias de notável amplitude e profundidade. [...] A seu

tempo, o Estado tem também outra tarefa contínua na sua atividade cultural: difundir

o gênero revolucionário de ideias, de sentimentos e de ações, por todo o país”.

A partir dessas assertivas, em nossa trajetória de estudos se firmaram

algumas indagações: Qual a proposta de educação defendida por Anatoli

Vassilievitch Lunatcharski? Há uma produção acadêmica, particularmente teses e

dissertações, significativa sobre o autor? Quais as possíveis contribuições da

proposição de Lunatcharski aos desafios educacionais brasileiros na atualidade?

Ao realizarmos o levantamento de fontes e de estudos elaborados sobre a

temática em questão, verificamos a ausência de artigos, livros, dissertações e teses

que tenham como tema principal o autor Lunatcharski e suas elaborações afetas à

Educação no período da Revolução Russa de 1917. Ressaltamos que esse dado foi

significativo e nos motivou a desenvolver este estudo. No processo de busca,

localizamos um artigo sobre o intelectual em questão, de autoria de Zoia Prestes e

Elizabeth Tunes, intitulado “Anatoli Vassilievitch Lunatcharski e os princípios da

escola soviética”, publicado em 2017 na Movimento revista de Educação. E o livro

“Lunacharski y la organización soviética de la educación y de las artes (1917-1921)”,

escrito por Sheila Fitzpatrick12, publicado pela Siglo XXI de España Editores, em

1977, tradução de Antonio J. Desmonts – cujo título original é “The Commissariat of

12 Sheila Fitzpatrick, em seu livro “Lunacharski y la organizacion soviética de la educacion y de las

artes (1917-1921)”, ampara seus estudos em documentos do período (1917-1921), na Rússia, a fim de apresentar, brevemente, os aspectos biográficos de Lunatcharski e a sua atuação como Comissário do Povo para Instrução Pública, por vezes criticada por setores do Partido Comunista, mas apoiada por Krupskaya, que fortaleceu a ideia de que a função da revolução era fazer da cultura e das escolas uma instituição de desenvolvimento e formação de um novo homem comunista, e não apenas uma instituição de controle e preparação profissional. A autora também permite elucidar alguns dos bastidores das decisões afetas à educação que mobilizaram diversas orientações presentes nos primeiros anos da revolução bolchevique (FREITAS, 2017). Em geral, as pesquisas desenvolvidas por Fitzpatrick têm como temática a história social e cultural do período soviético, particularmente nas práticas cotidianas dos camponeses e dos trabalhadores industriais; publicou livros referentes à sua pesquisa (FITZPATRICK, 1970; 1978; 1979; 1992; 1994; 2017).

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Enlightenment-Soviet organization of Education and the Arts under Lunacharsky

october 1917-1921”, publicado em 1970 pela referida autora.

Além das fontes elencadas, realizamos um levantamento de livros, e

localizamos nas obras relativas à história da Educação soviética menção apenas a

Lunatcharski, o qual foi nomeado Comissário do Povo para Instrução Pública

(FOTEEVA, 1986; LUEDEMANN, 2002) na obra “Makarenko: o nascimento da

pedagogia socialista” (CAPRILES, 1989), em que o autor se refere a Lunatcharski

como o “responsável por toda a transformação legislativa da escola russa e o criador

dos sistemas de ensino primário, superior e profissional da futura pedagogia

socialista” (CAPRILES, 1989, p. 29-30). Identificamos ainda obras que, além de

mencionarem a nomeação de Lunatcharski como Comissário do Povo, discutem sua

atuação política e a organização proposta para a Educação soviética (FISCHER,

1967; ORSO; MALANCHEN; CASTANHA, 2017; PRESTES, 2012).

No tocante aos aspetos biográficos de Lunatcharski, sua formação intelectual

e literária e sua atuação como Comissário do Povo, citamos os escritos dos livros de

Mariátegui (2012) e Trotski (2007). Também nas obras de Lênin (1968; 1977; 1981)

encontramos artigos e discursos do autor que versam sobre orientações políticas ao

Comissariado do Povo para Instrução Pública, assim como menção ao seu

presidente. E localizamos obras que têm anexos de textos que o Lunatcharski

redigiu (FREITAS; CALDART, 2017; GOMIDE, 2017; HAUPT; MARIE, 1972; LÊNIN,

1968; REED, 2017).

Consideramos também os periódicos reconhecidos e os anais de eventos na

área de História da Educação, os quais fazem menção à proposição educacional

Lunatcharski, para discutir a Educação soviética (BITTAR; FERREIRA JÚNIOR,

2011; BITTAR; FERREIRA JÚNIOR, 2015; NUCCI, 2010; PIENIAK; GREGOL, 2017;

PRESTES, 2013; SAVIANI, N., 2011a; 2011b).

Cabe mencionarmos que em língua portuguesa tínhamos acesso a duas

obras de Lunatcharski: “Sobre a Instrução e a Educação” (1988), nossa obra de

referência, traduzida pela Edições Progresso, impressa em Moscou, Rússia, e “As

Artes Plásticas e a Política na U.R.S.S.” (1975), publicada em Lisboa, Portugal, pela

Editorial Estampa. Ressaltamos que em julho de 2018 ocorreu a primeira publicação

dos escritos do autor no Brasil, pela Expressão Popular, a edição da obra “Revolução,

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arte e cultura”13 (2018), sendo sua apresentação oficial ao público em 06 de agosto

desse ano.

Realizamos ainda um levantamento da produção acadêmica, dissertações e

teses, nos bancos de dados online da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal

de Nível Superior (Capes) e da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

(BDTD), especialmente no período compreendido entre 2007 a 2017. Dessa forma,

estabelecemos como prioridade os trabalhos que se aproximavam do tema que nos

propusemos a estudar, pois não identificamos trabalhos que versam diretamente

sobre Lunatcharski, conforme o detalhamento dessas buscas apresentado na

segunda seção.

Em nossos primeiros estudos com as elaborações de Lunatcharski,

verificamos que o intelectual escreveu artigos e proferiu discursos afetos à

Educação, em especial à organização e estruturação da Educação Soviética, após a

Revolução de Outubro de 1917, nos quais, em geral, discute sobre a educação

escolar, a educação extraescolar, o ensino politécnico, a instrução como base da

cultura e a arte. Ressalta ainda a relação indissociável entre as questões

educacionais com as tarefas econômicas e políticas do período em questão para

edificação de uma nova sociedade. Em seus termos: “não pode permitir-se que as

dificuldades do momento pisem as flores das primeiras esperanças do proletariado

na possibilidade de um desenvolvimento harmonioso do homem” (LUNATCHARSKI,

1988, p. 4).

Em nossos estudos dos escritos do revolucionário, Comissário do Povo para

Instrução Pública, observamos que suas discussões sobre a Educação, em meio

aos desafios e difíceis condições dos primeiros anos do poder soviético, período de

conflitos econômicos e políticos de um país marcado pela guerra, fome, miséria e

luta, buscavam contribuir para a reestruturação de uma nação e para a organização

e criação dos princípios de uma educação comunista.

Nesse sentido, objetivamos apresentar a proposta de Educação defendida por

Anatoli Vassilievitch Lunatcharski (1875-1933). Para tal, amparamo-nos nas 13 Obra organizada pelos pesquisadores Douglas Estevam e Iná Camargo reúne artigos ou

transcrições de conferências, estudos ou documentos de debates, orientações para trabalhos em organizações culturais ou grupos artísticos de Lunatcharski, que elucidam os princípios soviéticos que orientaram a elaboração da política cultural dos primeiros anos após a Revolução Russa, em outubro de 1917, aos primeiros movimentos do realismo socialista, no tocante à arte, em especial. Sendo assim, os textos foram organizados em quatro temáticas: Proletkult, sua constituição e debates afetos à cultura proletária; Teatro; Cinema; Literatura e crítica literária (LUNATCHÁRSKI, 2018).

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elaborações de Lunatcharski sobre a Educação na Rússia Revolucionária

organizadas em coletânea de artigos e discursos, particularmente na obra “Artigos e

Discursos sobre a Instrução e a Educação” (1988), composta por quatorze textos,

escritos entre 1918 a 1928.

Em termos metodológicos, priorizamos uma investigação bibliográfica. Ruiz

(1982) afirma que a pesquisa bibliográfica constitui uma investigação de um acervo

de livros para o levantamento e análise do que se tem elaborado sobre determinada

temática a ser estudada. Desse modo, descreve as fases desse tipo de pesquisa:

critérios para a escolha do assunto, isto é, trajetória pessoal e relevância acadêmica;

busca cuidadosa por fontes; especificação do assunto e determinação dos objetivos;

elaboração de um projeto de pesquisa; documentação, acervo de textos e obras que

versam sobre o tema; organização da biografia e composição de fichamentos; e

redação final.

Gil (2002, p. 44) compreende a pesquisa bibliográfica como aquela desenvolvida

com o amparo de materiais anteriormente elaborados, compostos principalmente de

livros, os quais “constituem as fontes por excelência. [...] A pesquisa bibliográfica

também é indispensável nos estudos históricos. Em muitas situações, não há outra

maneira de conhecer os fatos passados se não com base em dados bibliográficos”.

Desse modo, fundamentamos nosso estudo nas pesquisas dos Clássicos da

Ciência da História e da Teoria Histórico-Cultural, em que vigora a premissa de que

os homens e suas ideias são resultado de sua existência material. Os pressupostos

desse referencial defendem que a educação não se explica por si mesma, o que

significa asseverar que os fenômenos são explicados pela organização econômica e

política da sociedade. Assim, nenhum fenômeno é compreendido isoladamente; os

homens e suas ideias são resultados de sua existência material (MARX; ENGELS,

1971; 1993).

Considerar o contexto de uma dada época contribui para a compreensão das

proposições de dado autor e de determinada obra. Estudar os aspectos históricos e

a organização econômica e política da URSS se faz necessário para conhecermos

as elaborações e a proposição educacional de Lunatcharski (1988) e sua atuação

política naquele período. Nessa perspectiva, atentarmo-nos à especificidade

Educação na Rússia Revolucionária e aos escritos de Lunatcharski (1988) não

exclui, ao contrário, estabelece como necessidade considerar a dinâmica da

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sociedade capitalista na atualidade. Esses elementos basilares contribuirão para a

compreensão da temática em questão.

Diante do exposto, organizamos nosso trabalho em duas seções. Na primeira,

contextualizamos os principais acontecimentos econômicos e políticos da Rússia no

período czarista e revolucionário em que foi desenvolvida a proposição de Anatoli

Vassilievitch Lunatcharski. Para tanto, discorremos acerca da origem do Império

russo, dos aspectos biográficos do autor em questão e do cenário soviético

revolucionário.

Na segunda seção, realizamos um levantamento da produção acadêmica

afeta ao autor em investigação no período compreendido entre 2007 a 2017. Em

seguida, descrevemos a organização do Comissariado do Povo para Instrução

Pública (Narkompros), o qual Lunatcharski presidia e discorremos sobre os

princípios da escola soviética e a estruturação do sistema educacional proposto por

Lunatcharski (1988), em especial entre anos de 1917 e 1929, período em que atuou

como Comissário do Povo para Instrução Pública, em defesa da formação do novo

homem comunista amparado na ciência e na arte. Refletimos sobre as possíveis

contribuições da proposição do intelectual aos desafios educacionais brasileiros na

atualidade, em favor de uma educação humanizadora e emancipadora. Nas

considerações finais, apresentamos a síntese dos estudos e reafirmamos os

posicionamentos defendidos ao longo do texto.

Para subsidiarmos nossa argumentação, compomos nossos escritos, no

decorrer desta dissertação, particularmente na primeira seção e nos itens 3.2 e 3.3

da segunda seção, com poemas e imagens da arte, realizados com diferentes

técnicas, que retratam o contexto em questão. Em nossa análise, os relatos da

época, as reflexões dos intelectuais referidos e as diferentes expressões artísticas

contribuem, de forma significativa, no esforço por compreendermos aquele período.

Cabe ressaltar que essa forma de composição, das dissertações e teses, está

vinculada ao GEEI por defendermos que os modelos e referências artísticas são

fundamentais para a formação e desenvolvimento humano.

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2 LUNATCHARSKI E REVOLUÇÃO: A FORMAÇÃO DO NOVO HOMEM

COMUNISTA

Nesta seção, discorremos sobre a origem do Império russo, os aspectos

biográficos de Anatoli Vassilievitch Lunatcharski (1875-1933) e o cenário soviético

revolucionário, de modo a atender um dos nossos objetivos específicos:

contextualizar os principais acontecimentos econômicos e políticos do país no

período czarista e revolucionário em que foi desenvolvida a proposição do autor.

Nosso estudo busca explicar que Lunatcharski foi um intelectual que participou

significativamente da luta pela construção de uma consciência revolucionária, a

edificação de uma nova sociedade e a formação do novo homem comunista.

Prestes (2012, p. 9) afirma que “a ciência é uma atividade estritamente

humana. Suas criações refletem a busca por respostas a questões apresentadas

num determinado período de tempo. Existe uma relação íntima entre o contexto

histórico e a elaboração de teorias”. As pesquisas do autor estão diretamente

relacionadas aos acontecimentos do período, isto é, se configuram em uma síntese

das temáticas fundamentais da vida intelectual do contexto da época.

Amparamo-nos, para o desenvolvimento deste estudo, no método Materialista

Histórico-Dialético, consideramos os escritos de Marx e Engels relativos à análise

científica da sociedade capitalista, sua configuração e estrutura no período em que

viviam, século XIX, em meio às transformações sociais oriundas da Revolução

Francesa e da Revolução Industrial. As pesquisas desses intelectuais investigaram

as implicações dessas revoluções, evidenciando que, concomitantemente à intensa

produção de riquezas, contraditoriamente promoveram a exploração, a miséria e o

embrutecimento dos trabalhadores (NETTO, 2015). Em geral, em suas obras,

conforme Duarte (2015, p. 152) “está presente a ideia de que a superação da

alienação produzida pela sociedade capitalista é a elevação do trabalho a um nível

no qual o ser humano possa desenvolver-se de forma omnilateral”, isto é, o

desenvolvimento pleno e integral.

Netto (2011), em seu livro “Introdução ao método de Marx”, discute a

complexidade do estudo dessa concepção teórico-metodológica, tanto por sua

própria complexidade quanto aos tratamentos equivocados aos quais foi submetida,

como as adulterações em sua obra; a alteração na “concepção teórica-metodológica,

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por influência positivista – que substitui os árduos esforços investigativos pela

simples “aplicação” do método de Marx; e sua concepção reducionista, por

considerar somente o aspecto econômico como a principal ou única causa.

Os estudos desenvolvidos pelos intelectuais tinham como fundamento a

análise teórica da produção das condições materiais da vida social, isto é, a

compreensão da essência do objeto, a sua estrutura e a sua dinâmica, econômica,

política e social, para além da aparência imediata e empírica. Dessa forma, a teoria

elaborada está imediatamente associada a um projeto revolucionário em favor dos

trabalhadores e de uma sociedade comunista (NETTO, 2011).

Desse modo, nos estudos do GEEI afetos aos intelectuais russos soviéticos,

em especial nesta elaboração sobre o revolucionário Lunatcharski, faz-se necessário

evidenciarmos o contexto histórico de sua época. Assim, tratamos dos principais

acontecimentos que compuseram o processo de desenvolvimento da Revolução de

Outubro de 1917, para evidenciarmos as relações entre esses fatos com vistas à

compreensão de suas elaborações e sua defesa de educação, a qual,

fundamentada nos escritos marxistas, sustentava que a “[...] a instrução consiste

precisamente em tornar acessível a cada um tudo o que a Humanidade cria, a sua

história e a sua cultura” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 45).

Em seu relatório apresentado no I Congresso de Toda a Rússia para a

Instrução Pública, em 1922, Lunatcharski (2002, p. 1) destaca: “[...] pode ser

considerado vitoriosos e senhor do seu destino um povo que possua, além dos

meios de produção, o conhecimento. Uma só destas condições, sem a outra, não é

suficiente”. Nessa assertiva, o revolucionário defende que o principal objetivo é que

os trabalhadores tenham acesso a todas as riquezas humanas, em especial ao

conhecimento.

Lunatcharski, em seus artigos e discursos, afirmava que as questões

educacionais tinham relação indissociável com as tarefas econômicas e políticas dos

primeiros anos do governo soviético. Considerava que a organização do sistema de

educação era uma das tarefas mais relevantes para que o novo regime se firmasse.

Na busca por superar com o modelo escolar monárquico elitista, defendia uma

escola única do trabalho, cuja função é o pleno desenvolvimento das capacidades e

potencialidades humanas. Para tal, destacava a relevância do ensino politécnico, a

instrução como base da cultura e a arte.

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Os escritos de Lunatcharski discutem a situação na Rússia, assim como a

organização de uma educação revolucionária. O intelectual afirmava que a luta pela

escola é uma das questões fundamentais para instruir o povo e formar um novo

homem comunista. Em suas palavras: “[...] de modo nenhum o povo pode organizar

uma vida estatal e pública justa, nem verdadeiramente gerir a economia, se não for

instruído, se não possuir todos os conhecimentos indispensáveis” (LUNATCHARSKI,

2002, p. 2).

2.1 O IMPÉRIO RUSSO: ELEMENTOS TEÓRICOS PARA COMPREENDER A

CONSTITUIÇÃO DA LUTA REVOLUCIONÁRIA

Neste subitem, temos o intuito discorrer sobre o contexto russo. Para tanto,

tratamos, ainda que sucintamente, da origem do Império Russo, dos aspectos

econômicos e políticos afetos ao governo czarista, das condições de miséria dos

trabalhadores, assim como das aproximações dos intelectuais do período com os

estudos marxistas a fim de retratar o processo em que se desenvolveu a luta

revolucionária descrita posteriormente.

No tocante à origem da Rússia, Bertonha (2011b) pontua que tribos eslavas

habitavam a região, atualmente a Rússia central, por volta de 800 anos a.C.,

disputando territórios por muitos anos. Por volta do século 9 d.C., os vikings,

guerreiros e mercadores escandinavos, se aproximaram desse território e criaram

um Estado, conhecido como da Rússia de Kiev, o qual, sob liderança de vários reis,

por volta de 1030 se tornou o maior em área territorial da Europa, submetendo a

maioria dos povos eslavos e algumas tribos de outras origens. Por volta do século

XIV, iniciou-se o fortalecimento do Estado de Moscou ou Moscóvia (denominação

dada ao Estado russo em documentos estrangeiros do século XVI e XVII), que seria,

de fato, a constituição da origem do Império Russo, expandindo significativamente

seu território e seu domínio sobre os povos da região.

O Império Russo, que após a Revolução de 1917 se constituiria na conhecida

União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), era formado por um amplo

território, o qual se constituiu há muitos séculos a partir de reinos coligados que se

estendiam desde o leste da Europa até o Oceano Pacífico. Um desses Estados, o

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Principado de Moscou, no século XIV, impôs seu poder sobre os outros. Em 1547,

Ivã, conhecido como “o Terrível”, foi o primeiro governante a assumir o título de czar

(uma derivação de “César”), o qual reinou até 1584 (CLARK, 1991; VICENTINO,

1995).

No início do século XVII, conforme Vicentino (1995), iniciou-se uma nova

dinastia no poder, a Romanov (1613-1917). Mikhail III (1613-1645) foi o primeiro czar

coroado, manteve a estrutura política e econômica com a defesa dos privilégios

sociais por meio da ampliação da tributação, isentando os nobres. Os sucessores

foram Alieksiéi Mikailovitch (1645-1676), o qual estabeleceu um novo código de leis

(“Ulozhenie”) que retinha os camponeses na terra, estabelecia as obrigações em

tributos e trabalhos aos seus senhores sob severas penas caso abandonassem os

feudos, período marcado por revoltas camponesas e rebeliões populares; Fiódor III

(1676-1682); e, com a morte deste, foi coroado sucessor Pedro I, intitulado “o

Grande” (1682-1725).

Pedro I, por meio da guerra, continuou a expandir o território russo.

Modernizou o exército, construiu uma nova capital em São Petersburgo14, no golfo

da Finlândia, criou a Escola de Navegação, o primeiro jornal e as bases da

Academia Russa. Seu governo realizou diversas reformas, dentre as quais buscou

aproximar o Império Russo aos padrões dos Estados europeus, impôs à nobreza

latifundiária (dvoryanstvo) adotar hábitos, modos, educação e atitudes ocidentais.

Estabeleceu-se, assim, uma divisão social: a nobreza e o povo russo (narod) –

camponeses submetidos a servos, que continuavam a ser rigorosamente

explorados, sem acesso à educação escolar, vivendo, em geral, em condições de

miséria e fome (CLARK, 1991; VICENTINO, 1995; WOOD, 1991).

Após a morte do czar Pedro, foram coroados vários de seus descendentes, os

quais, em geral, conseguiram amplas conquistas territoriais. Em 1762, Catarina

Anhalt-Zerbst, proclamada imperatriz pelos soldados, assumiu o trono com o título

de Catarina II15. Durante seu governo, que perdurou até 1796, foram criados a

14 Pedro transferiu a capital de Moscou para São Petersburgo, em 1721. Ao longo dos anos, a

cidade teve diferentes nomes: Petersburgo (séculos XVIII-XIX), Petrogrado (1914-1924) e Leningrado (1924-1992). Após a Revolução de Outubro de 1917, a cidade deixa de ser a capital do país, sendo substituída por Moscou. Posterior a reestruturação econômica e política do país, voltou a adotar o nome original: São Petersburgo (PRESTES, 2012; VICENTINO, 1995).

15 No tocante à biografia de Catarina, destacamos duas elaborações que a retratam, sendo o livro intitulado “Catarina, a grande – retrato de uma mulher”, escrito por Robert K. Massie e traduzido por Angela Lobo de Andrade, publicado em 2012, no Brasil (SILVA, 2015).

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Universidade de Moscou, diversas escolas elementares e colégios para professores.

Vicentino (1995, p. 35-36) afirma que enquanto o país buscava se integrar ao

progressismo capitalista, em seu interior mantinham-se estruturas arcaicas do Antigo

Regime.

[...] o império czarista continuava envolto num ideal progressista tímido comparado ao Ocidente. A Rússia, como já apontamos, não conhecera a afirmação de uma sociedade burguesa individualista e leiga (não viveu uma revolução cultural, como o Renascimento, nem religiosa, como a Reforma Protestante) e continuava com suas peculiares estruturas orientais (fortes elementos de uma ordem produtiva asiática) sob supremacia do Estado e fidelidade cristão. [...] A concentração das propriedades fazia do Estado, dos seus nobres e da Igreja os poderosos do Império.

Nesse período, também ocorreu um aumento significativo de escravos e

servos. De acordo com Clark (1991), na Rússia era evidente a diferença entre as

condições sociais: a riqueza das classes dominantes e a miséria dos camponeses.

Com a economia em geral agrária, predominava a servidão no campo, estabelecida

no país oficialmente desde 1649. Para elucidar esse contexto áspero e bruto em que

a população russa era submetida, citamos a pintura “Barqueiros do Volga”

(Figura 1), de Iliá Riépin.

Figura 1 – Iliá Riépin. Barqueiros do Volga. Óleo sobre tela. 131,5 x 281 cm. 1870-1873. Museu Estatal Russo, São Petersburgo

Fonte: 500 ANOS de Arte Russa (2002, p. 51).

A obra em questão (Figura 1) revela a pintura social e histórica desenvolvida

naquele período, a qual motivava o protesto da jovem geração artística (PETROVA,

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2002). A tela retrata 11 trabalhadores a rebocar, com os próprios corpos, a barca. O

semblante é de exaustão e tristeza, submissos às condições desumanas de

trabalho; destaca apenas um deles, no centro da fila, um jovem que parece lutar

contra sua amarra. A situação, em geral, dos trabalhadores russos descrita motivou

o crescimento de revoltas.

Neste mesmo período, o Ocidente, que há muito era fonte exemplar do progressismo capitalista e da modernidade, vivia a efervescência intelectual do Iluminismo – ou Ilustração –, o movimento ideológico contra o Antigo Regime e defensor do estabelecimento de um Estado burguês. O desenvolvimento burguês ocidental já não podia mais conviver pacificamente com o Estado absoluto e mercantilista, exigindo liberdades públicas, o fim dos privilégios tradicionais e a racionalidade política e econômica capitalista (VICENTINO, 1995, p. 36-37).

Nesse sentido se desenvolveram inúmeras organizações secretas que

pretendiam superar o czarismo, bem como as condições de miséria popular. A

história da Rússia no século XIX configurou-se pelas revoltas ocorridas em períodos

anteriores, reafirmando os limites e as dificuldades do governo vigente e suas

estruturas sociais, oriundas do Antigo Regime oriental. No que se referem às políticas

desenvolvidas pelos Romanov, destacamos o envolvimento em consideráveis

conflitos internacionais, como as Guerras Napoleônicas (1803-1815)16, e a

instabilidade econômica do país, a qual se enfraqueceria, severamente, no início do

século XX, em meio à Primeira Guerra Mundial (VICENTINO, 1995).

Durante o século XIX, enquanto as outras potências europeias construíam

enormes impérios na África, na Índia e no Oriente Médio, a Rússia continuava a se

expandir rumo ao leste da Europa e da Ásia. A derrota para os franceses, ingleses e

italianos do Piemonte na Guerra da Criméia (1853-1856)17 foi um fato implacável

contra o expansionismo dos czares; além disso, ocasionou perdas territoriais e meio

16 As Guerras Napoleônicas foram conflitos oriundos da Revolução Francesa e por Napoleão

Bonaparte entre 1789-1815 contra alguns países europeus, por exemplo a Rússia, em busca de conquistas territoriais (BERTONHA, 2011b). No tocante à a referida Guerra, destacamos uma elaboração literária que a retrata, sendo o livro intitulado “Guerra e Paz” de Tolstói, a qual descreve dezenas de personagens durante a invasão napoleônica à Rússia, de 1812.

17 A Guerra da Criméia foi um conflito ocorrido entre o Império Russo e o Império Turco-Otomano Grã-Bretanha, França, pela disputa territorial e o reino da Sardenha, pelas disputas por territórios do Império Turco-Otomano, no qual a Rússia pretendia uma saída para o mar aberto e uma significativa influencia na bacia do Mediterrâneo. A maioria das batalhas se realizaram na península da Criméia (CLARK, 1991; BERTONHA, 2011b).

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milhões de mortes. Sendo assim, a instabilidade econômica e política se acentuou

(CLARK, 1991; BERTONHA, 2011b).

Após a derrota na Guerra da Criméia, houve diversas reformas militares com

o intuito de reorganizar as forças armadas do país conforme as modernas técnicas

bélicas. Seria difícil constituir um exército sem uma população livre para compô-lo;

dessa forma, o czar Alexandre II aboliu a escravidão na Rússia em 1861, porém a

liberdade dos camponeses continuou limitada, “[...] ainda estavam sujeitos ao

castigo corporal, ao recrutamento militar, ao pagamento de impostos individuais e a

certas outras obrigações de que outras classes sociais eram isentas” (WOOD, 1991,

p. 25). Engels (2013, p. 36), em seus escritos sobre as questões sociais da Rússia

nesse período, analisa:

[...] O fato é que a massa do povo russo, os camponeses, há séculos vegeta, de geração em geração, numa espécie de pântano a-histórico; e a única variação que talvez tenha interrompido esse estado letárgico foram algumas revoltas infrutíferas, que só levaram a novas opressões por parte da nobreza e do governo. O próprio governo russo pôs um fim a essa a-historicidade (1861) mediante a inevitável abolição da servidão e a dispensa dos trabalhos forçados – medida que foi implementada com tanta esperteza que certamente levará à ruina a maioria tanto dos camponeses quanto dos nobres. Portanto, as próprias condições em que o camponês russo foi posto agora empurram-no para dentro do movimento, o qual embora se encontre ainda na fase mais incipiente de seu surgimento, avança de modo inexorável graças à situação econômica da massa dos camponeses, a cada dia pior.

O artigo de Engels (2013), escrito em maio de 1875 em Leipzig (Alemanha),

discute o desenvolvimento social da Rússia, sobretudo desde 1861, amparando-se

na literatura russa e afirma, por meio uma análise crítica das referidas reformas, a

situação de empobrecimento crescente dos trabalhadores e o aumento dos

antagonismos de classe no país.

Fitzpatrick (2017) reafirma essa questão ao considerar que mesmo após as

reformas, os camponeses continuavam submissos à aldeia, isto é, não mais

submissos pelas condições de servos, mas pelas dívidas e responsabilidades

coletivas da comunidade. A emancipação tinha o intuito de reforçar o velho sistema

comunal da terra e evitar que os camponeses efetivassem a propriedade de suas

faixas, expandissem ou aprimorassem suas terras e impedir a transição para uma

pequena produção agrícola independente.

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De acordo com os escritos de Engels (2013), com a emancipação a nobreza

russa alcançou privilégios econômicos à custa dos trabalhadores e,

concomitantemente as condições dos camponeses, em geral, era de extrema

miséria. O autor elucida:

[...] Os camponeses pagam sobre a sua metade anualmente o valor de 195 milhões de rublos de imposto territorial, enquanto os nobres pagam...13 milhões! As terras dos nobres são em média duas vezes mais férteis que as dos camponeses, porque, na disputa pela dispensa dos trabalhadores forçados, o Estado tirou dos camponeses e deu à nobreza não só a maior, mas também a melhor parte das terras, e os camponeses tiveram de pagar à nobreza pelas piores terras o preço das melhores [...] (ENGELS, 2013, p. 39).

Engels (2013) reafirma a situação de miséria, absolutamente insustentável,

dos camponeses, os quais foram privados das melhores (regiões férteis) e maiores

pedaços de terra. Esse fato propiciou o descontentamento da classe trabalhadora:

“[...] A rancorosa insatisfação dos camponeses já é um fato que tem de ser levado

em conta tanto pelo governo como por todos os insatisfeitos, incluindo os partidos de

oposição” (ENGELS, 2013, p. 36).

Engels (2013) analisa que havia elementos no interior do Império Russo que o

levariam, em tese, à sua própria ruína. Em sua análise, as condições descritas

acabariam por conduzir a uma Revolução, e “[...] desde a emancipação da servidão,

a situação dos camponeses russos se tornou insuportável e, no longo prazo,

insustentável e que, já por essa razão, está se encaminhando uma revolução na

Rússia” (ENGELS, 2013, p. 43), isto é, estava em questão o desenvolvimento do

movimento revolucionário no país. A esse respeito, Vicentino (1995, p. 49, grifos do

autor) explica:

Era uma época em que os movimentos revolucionários se multiplicavam, produzindo inúmeras organizações, com várias delas já incorporando os novos ideais socialistas, especialmente os da I Internacional, realizada em Londres, em 1864, na qual tiveram participação de destaque Karl Marx e o anarquista Mikhail Bakunin. O descontentamento russo mesclava-se com os novos princípios das avançadas economias industrializadas ocidentais, adaptando-os contra o czarismo, cabendo a Georgi Plekhanov a introdução do marxismo nos meios intelectuais russos, traduzindo a Manifesto do Partido Comunista, de Marx e Engels.

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As obras de Karl Marx e Friedrich Engels18, sobretudo os escritos relativos à

Rússia, como o intitulado “Literatura dos refugiados” (ENGELS, 2013), rapidamente

se tornaram conhecidos nos grupos dos emigrantes revolucionários russos e na

própria Rússia.

Nesse período, conforme Wood (1991), também se desenvolveu na Rússia o

populismo revolucionário (1861-1881) – narodnichestvo, expressão que descrevia as

ações da intelligentsia (intelectuais radicais) militante da Rússia das décadas de

1860 e 1870. Os populistas – narodniki – buscavam motivar mudanças políticas e

sociais no país, evidenciando a necessidade da ruptura com o czarismo e sua

“substituição por uma sociedade agrário-socialista baseada nas tradições do

coletivismo e na instituição da comuna camponesa russa” (WOOD, 1991, p. 29). Em

1874, os narodniki se dirigiram às aldeias com o propósito de suscitar a revolta

nacional contra o czarismo. Assim, se desenvolveram diversos grupos de jovens

revolucionários (VICENTINO, 1995).

Prestes (2012) pondera que no final do século XIX se constituíra no país uma

intelectualidade amparada pelos escritos marxistas. Em 1872, ocorreu a primeira

edição russa de “O Capital”. De acordo com Löwy (2013), em seus escritos que

organizou na obra “Luta de classes na Rússia” (MARX; ENGELS, 2013), a segunda

edição do “Manifesto Comunista” no país também foi relevante para o movimento

revolucionário, que se firmaria, de maneira significativa, a partir de 1881.

No dia 1º de março de 1881, o assassinato do czar Alexandre II não efetivou

as possibilidades de revolução conforme os narodniki esperavam. Em vez disso, o

sucessor coroado, Alexandre III (1881-1894), ampliou a repressão e autoridade

política. Com efeito, o movimento populista não se sustentou (FITZPATRICK, 2017).

18 Destacamos que em 1848 ocorreu a “Associação Internacional dos Trabalhadores, ou Primeira

Internacional, uma tentativa de organizar os revolucionários de todo o mundo. Seus principais líderes eram os filósofos alemães Karl Marx e Friedrich Engels, que publicaram no mesmo ano o Manifesto Comunista” (CLARK, 1991, p. 6, grifos do autor). No que se refere à Associação, em questão, cabe destacar que foram instituídas quatro internacionais. A Primeira Internacional foi fundada no dia 28 de setembro de 1864, durante uma reunião pública internacional de operários no St. Martin’s Hall, em Londres. Marx fez parte dessa associação e escreveu sua mensagem inaugural. A primeira Internacional deixou de existir em 1876. No ano de 1889, foi instituída a Internacional Operária e Socialista, conhecida como Segunda Internacional, esta era uma associação livre de partidos, integrada tanto por elementos revolucionários quanto reformistas. O caráter progressista chegou ao fim em 1914. Durante a Primeira Guerra Mundial se desintegrou e em 1923 voltou a atuar como reformista. Em 1921, foi constituída em Viena a União Internacional de Partidos Socialistas, conhecida como Segunda Internacional e Meia. A Terceira Internacional, chamada Internacional Comunista, foi implantada em 1919 até 1943. Trotsky fundou a Quarta Internacional, no ano de 1938 (MARXISTS, 2018).

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Revolucionários fundamentaram uma análise crítica dos limites do referido

movimento. Em especial um grupo, que fora populista, obrigado a emigrar, iniciou

intensos estudos sobre o comunismo científico, assim como buscou conhecer

as experiências do movimento dos trabalhadores europeus. Desse modo, em

setembro de 1883, foi criado o primeiro grupo revolucionário russo marxista,

intitulado “Emancipação do Trabalho”, composto pelos membros Geoge Plekhanov

(1856-1918), Pavel Borisovitch Axelrod (1850-1928), Lev Grigorievitch Deutsch

(1855-1941) e Vera Ivanovna Zasulitch (1851-1919) (WOOD, 1991).

A segunda edição russa do Manifesto teve significativa relevância na

formação das concepções marxistas do grupo “Emancipação do Trabalho”, para o

qual Marx e Engels redigiram o prefácio. Além disso, havia troca de correspondência

entre o referido grupo e Marx, realizada por Vera Zasulitch, sobre a comuna

camponesa russa, escrita em 16 de fevereiro de 1881, em Genebra. Segue um

trecho da carta:

[...] Vós não ignorais que vosso O Capital desfruta de grande popularidade na Rússia. Apesar do confisco da edição, os poucos exemplares que restam são lidos e relidos pela massa de pessoas mais ou menos instruídas de nosso país – há homens sérios que o estudam. Mas o que vós provavelmente ignorais é o papel que desempenha vosso O Capital nas discussões sobre a questão agrária na Rússia e sobre a nossa comuna rural. Vós sabeis melhor do que ninguém o quanto essa questão é urgente na Rússia (ZASULITCH, 2013, p. 78-79).

Zasulitch, que participou em 1878 de um atentado contra o coronel Trepov,

governador czarista de São Petersburgo, era membro, ao lado de George Plekhanov

e Pavel Axelrod, de um grupo de revolucionários russos exilados em Genebra.

Dissidentes do movimento narosnik – os chamados “populistas” da organização

Narodnaia Volia (A Vontade do Povo), formam o grupo Tchorny Péredel (Partilha

Negra), motivados pelas ideias de Marx e cujo nome se refere a um programa

radical de reforma agrária. Alguns anos depois, os três figurariam entre os principais

fundadores do Partido Operário Social-Democrata Russo, e um pouco mais tarde, de

sua fração menchevique (LÖWY, 2013).

Marx (2013a), após quatro esboços, encaminhou a versão final da carta em

resposta à revolucionária russa, redigida em Londres, no dia 08 de março de 1881.

O intelectual, conforme Löwy (2013), argumenta que as análises históricas de sua

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obra “O Capital” se aplicam tão somente à Europa Ocidental e que, por conseguinte,

não se poderia desconsiderar a hipótese de que a comuna russa fosse capaz de se

tornar o ponto de partida da “regeneração social” da Rússia, uma expressão que se

refere, implicitamente, ao comunismo (LÖWY, 2013). Escreve:

Uma doença nervosa que me acomete periodicamente há dez anos impossibilitou-me de responder mais cedo a vossa carta de 16 de fevereiro. [...] há menos prometi um escrito sobre o mesmo assunto ao Comitê de São Petersburgo. [...] Desse modo, a analise apresentada n’O Capital não oferece razões nem a favor nem contra a vitalidade da comuna rural, mas o estudo especial que fiz dessa questão, para o qual busquei os materiais em suas fontes originais, convenceu-me de que essa comuna é a alavanca [point d’appui] da regeneração social da Rússia; mas, para que ela possa funcionar como tal, seria necessário, primeiramente, eliminar as influencias deletérias que a assaltam de todos os lados e então assegurar-lhe as condições normais de um desenvolvimento espontâneo (MARX, 2013a, p. 114-115, grifos do autor).

A correspondência elucida os estudos de Marx entre os intelectuais e

revolucionários russos do período. A partir disso, o grupo em questão iniciou a

publicação de uma série de obras de Marx e Engels em língua russa. As discussões

e publicações foram significativas, anos depois, para os estudos dos jovens

militantes russos; em nosso caso, tratamos da trajetória de Lunatcharski e de sua

formação intelectual e combatente, conforme expomos no próximo subitem.

Nesse período, os acontecimentos históricos evidenciavam a instabilidade

política da Rússia:

Artística e intelectualmente, o reinado de Alexandre III não se distinguiu por nenhuma realização particularmente notável e, na verdade, o governo exerceu uma censura mais estrita, cerceou a imprensa e provocou o fechamento de muitos periódicos. Nas escolas e universidades, a reintrodução do princípio hierárquico assegurou que as classes inferiores da sociedade não tivessem acesso a uma educação adequada. [...] Se a atmosfera predominante na década de 1880 era de estagnação, mediocridade e repressão, havia uma área em que um modesto progresso estava sendo obtido, abrindo caminho para realizações mais espetaculares na década seguinte: a indústria (WOOD, 1991, p. 38-39).

Desse modo, na década de 1880, o governo iniciou um projeto de

industrialização e a construção de um sistema de ferrovias, a maior era a Ferrovia

Transiberiana, possibilitando acesso da Rússia europeia aos territórios da Ásia, que

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quase foi finalizada na década de 1890. O governo nomeou para o Ministério das

Finanças, em 1892, Serguei Yulevitch Witte, o qual buscou o investimento

estrangeiro, assim como aumentou consideravelmente os impostos (CLARK, 1991;

FITZPATRICK, 2017).

Com a industrialização, que resultou no enriquecimento dos capitalistas

(proprietários das fábricas), se desenvolveu uma nova classe social: os operários

das cidades (proletariado). Estes, em sua maioria, eram camponeses que haviam

deixado o trabalho no campo motivados pelas dívidas ou pequena produção,

contudo parte significativa retornava ao campo no período de colheita. Nas cidades,

a maioria dos operários vivia na miséria, expostos às doenças por trabalharem em

locais sem o mínimo de salubridade.

Clark (1991) afirma que apesar do desenvolvimento econômico, por meio da

industrialização, o país era predominantemente agrário, dominado pela aristocracia

rural, que vivia em meio à riqueza à medida que o povo passava fome. O autor

elucida que nos dias que precederam a Revolução de 1917 “[...] a ópera, os balés e

os teatros de São Petersburgo apresentavam grandes espetáculos para a classe

dominante, que, é lógico não estava disposta a contribuir para melhorar a vida da

população” (CLARK, 1991, p. 5). Marx e Engels (2008), na obra “Manifesto

Comunista”, que teria relevância significativa na Revolução Russa de 1917, explicam

as condições do proletariado:]

Com o desenvolvimento da burguesia, isto é, do capital, desenvolve-se também o proletariado, a classe dos trabalhadores modernos, que só sobrevivem se encontra trabalho, e só encontram trabalho se este incrementa o capital. Esses trabalhadores que são forçados a se vencer diariamente, constituem uma mercadoria como outra qualquer, por isso exposta a todas as vicissitudes da concorrência, a todas as turbulências do mercado (MARX; ENGELS, 2008, p. 19).

Marx e Engels (2008, p. 25) afirmam que apenas o proletariado, de todas as

classes que se contrapõem à burguesia, representa uma classe revolucionária,

“todas as demais se arruínam e desaparecem com a grande indústria; o proletariado,

ao contrário, é seu produto mais autêntico”. Sendo assim, de igual forma na Rússia,

no processo de industrialização, se intensificaram as desigualdades sociais; em

consequência, as condições de trabalho e de vida dos operários se agravavam, os

quais mobilizaram revoltas sociais que expressavam sua insatisfação com o regime

vigente. Elucida o poeta Maiakovski (2012):

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[...] Olhe para a Rússia de lado – e para qualquer lado que o seu olhar lançar, montanhas, trabalhos forçados e minas cravam no céu em batida. Mas a servidão nas máquinas fábris doía mais que os trabalhos forçados. [...] uma terra com maior dor jamais eu conheci. É, nem todo tapa Pode ser apagado da face. O grito se fortalecia: - Levanta-se Por toda a terra e pela liberdade! (MAIAKOVSKI, 2012, p. 84-86).

Esse excerto, escrito por Vladimir Maiakovski (1893-1930)19 em 1924,

compõe seu livro-poema intitulado “Vladimir Ilitch Lênin”, o qual narra o processo

histórico da Revolução de Outubro de 1917, homenageia a trajetória e o legado de

Lênin como líder revolucionário soviético, e foi publicado no Brasil em 2012. Com

sua sensibilidade e firmeza, o poeta descreve a característica autocrata e repressiva

do estado russo naquele período, e que, de acordo com Vicentino (1995), continuou

assim após a morte de Alexandre III, ocorrida em 1894.

Wood (1991) descreve que as precárias e insalubres condições de trabalho

do proletariado industrial levaram à disseminação do descontentamento entre as

massas, que logo se consolidou nos movimentos grevistas e em uma crescente

receptividade com relação à propaganda e agitação dos revolucionários. Entre

esses, os amparados pelas teorias marxistas começaram a observar na classe

operária maior possibilidade de mudança revolucionária no país. É nesse contexto

das relações econômicas e políticas que devem ser buscadas o desenvolvimento do

marxismo russo; nas palavras do poeta:

19 Vladimir Maiakovski nasceu no dia 19 de julho de 1893, em Baghdati, Geórgia. Além de poeta e

um dos fundadores da poesia moderna, também foi dramaturgo, publicitário, ator de teatro e cinema, artista plástico e um dos expoentes da vanguarda estética soviética. Aos 15 anos de idade, em 1908, aderiu ao Partido Socialdemocrata (bolchevique). Aos 16 anos, foi preso pela segunda vez e passou 11 meses na prisão do czar (MAIAKOVSKI, 2012). Cabe mencionar que Lunatcharski incentivava as elaborações de vanguarda do poeta e sua atuação na Proletkult (Organização da Cultura Proletária), grupo fundado em agosto de 1917 por Bogdanov, embora defendesse que a arte do passado deveria ser preservada e a partir dela ser desenvolvida uma cultura proletária (MARIÁTEGUI, 2012).

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Marx! surge aos olhos das molduras do retrato grisalho. Como sua vida está distante das imagens! As pessoas veem emparedado no mármore, com gesso, um velho gélido. Mas quando pela trilha revolucionária os operários davam seu primeiro passinho, oh, com que incrível fornalha Marx ascendeu seu coração e sua ideia! Parecia que ele próprio estava em cada fábrica de pé, como se cada trabalho, pessoalmente enganado os que roubavam a mais-valia, pegou pela mão em flagrante (MAIAKOVSKI, 2012, p. 69-71).

A partir do excerto de Maiakovski (2012) podemos ressaltar que os escritos

de Marx eram significativos na luta para que os operários pudessem ter a

possibilidade de compreender como a sociedade, naquele período, estava

composta, assim como se davam as relações entre as classes, fato que permitia se

organizarem em prol de uma nova sociedade. Em 1888, de acordo com Clark

(1991), cinco anos após a morte de Karl Marx, uma cópia da obra “O Capital” chegou

às mãos de um jovem russo estudante de Direito, chamado Vladimir Ilitch Ulianov20

(1870-1924), conhecido pelo pseudônimo de Lênin, que antes havia sido expulso da

Universidade de Kazan em consequência de sua atividade revolucionária.

20 Vladimir Ilitch Ulianov nasceu em Simbírsk (atual Uliánovsk), no dia 10 (22) de abril de 1870. Foi

um dos mais proeminentes revolucionários comunistas e relevante teórico político. Mudou-se para São Peterburgo em 1893, integrando o Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR). Foi preso em 1897 e exilado. No exílio, suas publicações o fizeram um importante teórico político. Em 1903, com a divisão do Partido, integrou a facção bolchevique. Após a Revolução de Fevereiro de 1917 retornou à Rússia e liderou os bolcheviques para a tomada do poder, em outubro. Foi o primeiro presidente do Soviete dos Comissários do Povo, de 1917 a 1924. Em 1922, fundou, juntamente com os sovietes, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Em 21 de janeiro de 1924 faleceu. Defensor da imprensa comunista, escreveu diversos artigos e livros. Mencionamos algumas obras do revolucionário, dentre elas: Lenin (2010; 2007; 1987; 1979); Lênin (1968); Lenine (1977) e Lénine (1981).

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À época, o processo de industrialização se intensificava, assim como o

aumento das dificuldades da estrutura czarista e as manifestações políticas, as

greves e os movimentos revolucionários se acentuavam. Lunatcharski crescia em

meio às lutas sociais desenvolvidas na Rússia, conforme descrevemos alguns de

seus aspectos biográficos a seguir.

2.2 ANATOLI VASSILIEVITCH LUNATCHARSKI: A TRAJETÓRIA DO INTELECTUAL

E COMBATENTE

Anatoli Vassilievitch Lunatcharski nasceu em 23 de novembro 1875, na

cidade de Poltava, Ucrânia. Em 1978, aos três anos, mudou-se para Nijni Novgorod,

aos cuidados do pai Aleksandr Ivanovitch Antonov (1829-1885), primeiro marido de

sua mãe Aleksandra Iakovlevna Rostovtseva (1842-1914). Retratava seu pai,

funcionário público, como “um homem com ideias revolucionárias e democráticas e

foi quem impulsionou seu espírito ateísta” (PRESTES; TUNES, 2017, p. 256).

Lunatcharski adotou o sobrenome e patronímico do padrasto, Vassili Fiodorovitch

Lunatcharski (FITZPATRICK, 1977; PRESTES; TUNES, 2017).

Em suas recordações, conforme descrevem Prestes e Tunes (2017),

Lunatcharski retrata seus pais como ativos e corajosos. Também lembra como era

habitual, nas famílias nobres da intelectualidade que ainda pequeno apreciava,

sentado no sofá até tarde da noite, Aleksandr Ivanovitch lendo para sua mãe obras

de autores clássicos russos e estrangeiros, atento aos comentários de seu pai afetos

à leitura. Durante sua infância, o Império Russo vivenciou as primeiras iniciativas de

um processo revolucionário da classe trabalhadora. Desde o século XVI, segundo

Wood (1991), o país enfrentava dificuldades econômicas e políticas, conforme

discorremos.

Naquele período, particularmente em 1885, Lunatcharski tinha

aproximadamente dez anos de idade. Após o falecimento de seu pai devido a uma

cirurgia malsucedida, a convivência com sua mãe mudou de maneira significativa.

Aleksandra Iakovlevna vivenciou a perda de maneira acentuada, “de uma mulher

alegre, feliz e amável, transformou-se numa pessoa triste, fechada e rígida”

(PRESTES; TUNES, 2017, p. 257). Desse modo Lunatcharski recebia severas críticas

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e reclamações da mãe, a qual se irritava, por exemplo, devido ao fato de o filho

preferir ficar em casa lendo ao invés de realizar atividades físicas. Mesmo com as

discordâncias, que o fazia passar mais tempo fora de casa com os amigos, buscava

manter uma boa relação com sua mãe e a respeitava (PRESTES; TUNES, 2017).

Seu irmão mais velho, Mikhail Vassilievitch, era musicista e cantor, e de acordo com

Estevam (2018), possibilitou, de certa forma, a aproximação com a música no

ambiente familiar; nos anos que Anatoli frequentava o colégio, iniciou seus estudos

de piano e de teoria musical.

Lunatcharski (2017b) considerava que o ensino escolar, em sua época, era

constituído por matérias pouco relevantes, ensinadas de maneira inadequada; a

escola não lhe agradava. Se formou apenas com 20 anos. Embora considerado um

aluno mediano, tanto em notas como comportamento, em sua casa, aos quatorze

anos, já tinha lido o teórico alemão Marx e estudado Mill (1806-1873), filósofo

britânico e economista. Em sua autobiografia, Lunatcharski (2017b) escreveu que

leu o primeiro volume da obra “O Capital”, de Marx, com quinze anos, mesmo

período em que ingressou no Partido Social-Democrático Russo, considerando-se

um “social democrata”, mas marxista. Trotski (2017, p. 207) reafirma:

Lunatcharski entrou na vida política quando estava no liceu em Kiev. Naquele momento, estava ainda sob influência das últimas explosões da luta terrorista dirigidas pelos populistas contra o czarismo. Para os meus contemporâneos mais próximos, a luta dos “populistas” já mergulhava na lenda.

Conforme Estevam (2018), Lunatcharski foi líder de organização de

estudantes em todas as escolas secundárias de Kiev, as quais reuniam mais de

duzentos estudantes. Nesses grupos, se realizavam estudos sobre as obras dos

democratas revolucionários como Herzen (1812-1870); Tchernichevski (1828-1889);

Dobroliubov (1836-1861); Pissarev (1840-1868); assim como populistas russos, a

exemplo Lavrov. “[...] As referências desses pensadores e escritores do século XIX

foram de grande importância na formação de Lunatcharski e ele se lembrará desse

período de militância como importante espaço de educação política” (ESTEVAM,

2018, p. 12).

Em sua autobiografia, relata que “[...] aos 15 anos, sob a influência de alguns

camaradas poloneses, comecei a estudar o marxismo seriamente e, desde então,

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me considerei marxista”21 (LUNACHARSKY, 1972, p. 269, tradução nossa).

Participou e liderou uma significativa organização de alunos que compreendia todo o

ensino secundário de Kiev. Aos dezessete anos, começou a atuar por meio da

propaganda.

A partir disso, Lunatcharski (2017d) assumiu uma postura política e ideológica

revolucionária. Realizava propaganda entre os ferroviários na cidade onde morava, e

vivenciava o processo revolucionário que se desenvolvia no final do século XIX e

início do século XX. “A agitação e a propaganda foi um dos campos da atuação

política ao qual Lunatcharski deu maior atenção durante toda sua vida e militância,

conjugando sua formulação teórica e prática política” (ESTEVAM, 2018, p. 12).

Aos 20 anos, conforme Trotski (2017), realizava admiráveis conferências nas

reuniões estudantis, escrevia versos e discutia filosofia e defendia a teoria do valor

em Marx. Nesse mesmo período, Estevam (2018) afirma que o jovem combatente

iniciou seus primeiros artigos para jornais clandestinos, além de estudar diferentes

línguas como: alemão, francês, italiano, inglês e espanhol.

Devido ao seu ingresso em um grupo revolucionário marxista no ginásio,

como mencionamos, havia impedimentos para que o jovem combatente ingressasse

na universidade russa. Desse modo, convenceu sua mãe a lhe enviar à

Universidade de Zurique, na Suíça, para estudar com o filósofo francês Avenarius

(1843-1896). Na Universidade, foi aluno de Pavel Akselrod (1850-1928), filósofo

russo marxista que praticamente o adotou, sendo um dos filósofos significativos em

sua formação (FITZPATRICK, 1977; PRESTES; TUNES, 2017).

A Universidade de Zurique era conhecida por sua abertura e os educandos tinham a possibilidade de organizarem eles mesmos seus programas de estudos. Lunatcharski estabeleceu um programa contendo disciplinas de Filosofia, Psicologia, História, Sociologia, Economia Política, Direito, História das religiões, Crítica Literária, Crítica de Arte e Anatomia. Na universidade ele teve condições de aprofundar seus estudos sobre as obras de Marx e Engels e também de filosofia, estudando as obras de Shopenhauer, Fichte, Schelling, Feuerbach, Nietzche, Spencer, Diderot, Helvétius. Ali, ele ampliou e aprofundou suas relações com os marxistas e sociais-democratas russos como Plekhánov, Axerold e Vera Zassoulitch. Ele conheceu também Rosa Luxemburgo, que estudava na mesma universidade e com quem teve aulas em conjunto, além do genro e da filha de Marx, Laura Marx e Paul Lafargue (ESTEVAM, 2018, p. 13).

21 “[...] A los 15 años, bajo la influencia de algunos camaradas polacos, comencé a estudiar

seriamente el marxismo y desde entonces me tuve por marxista” (LUNACHARSKY, 1972, p. 269).

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Em Zurique, Lunatcharski estudou obras de autores alemães que, em geral,

foram relevantes para o desenvolvimento de sua concepção. Desde os anos

universitários, “Lunatcharski se interessou pelas relações entre arte, cultura e

história, iniciando, por orientação de Plekhánov, aproximação marxista do estudo

acerca da história da arte” (ESTEVAM, 2018, p. 14). O intelectual, por questões de

saúde de seu irmão mais velho, precisou se mudar de Zurique para a França,

passando Nice, Reims e se instalou em Paris entre 1896 a 1898.

É curioso que, pelo visto, sem desconfiar disso, Anatoli Vassilievitch seguiu os passos do avô, tornando-se estudante ouvinte da Universidade de Munique, participando, de acordo com sua escolha, de aulas nas Universidades de Nice, Reims, Paris e da Universidade de Moscou, por ocasião de seu retorno à Rússia em 1898. Em suas memórias Recordações de um passado revolucionário, Anatoli Vassilievitch escreveu: “Minhas aulas na Universidade de Munique, que duraram menos de um ano, foram muito férteis [...] Eu afundei em livros de filosofia, história, sociologia e elaborei para mim mesmo um programa, combinando o departamento de filosofia da faculdade de ciências naturais, seu departamento naturalístico, e algumas aulas da faculdade de direito e, até mesmo, com aulas do Politécnico de Munique [...] (LUNATCHARSKAIA, 1979, p. 482 apud PRESTES; TUNES, 2017, p. 260).

No tocante à sua formação na Alemanha, na Universidade de Munique,

mesmo que compreendeu um breve período, destacamos que os estudos marxistas

desenvolvidos foram significativos para sua formação filosófica e para a constituição

de sua defesa afeta à Educação no que se refere ao ensino politécnico.

Sua militância no Partido, desde jovem, e sua significativa participação no

processo revolucionário o levaram à prisão russa por diversas vezes. Para evitar

algumas, optou por permanecer no exterior, representando a elite intelectual russa

do final do século XIX, a exemplo dos intelectuais que o país formou, “que

participaram ativamente do movimento revolucionário de organização do novo

regime e que entraram na luta conscientemente, com ideais, esperança e muita

determinação. Abdicou também do seu título de nobreza” (PRESTES; TUNES, 2017,

p. 260). Trotski (2017, p. 208) afirma que Lunatcharski:

[...] ligou-se à Revolução e ao socialismo durante 40 anos, isto é, durante toda sua vida consciente. Passou por prisões, deportação, emigração, e permaneceu inquebrantavelmente marxista. No decurso desses longos anos, milhares e milhares de seus antigos companheiros saídos do mesmo círculo intelligentsia aristocrática e

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burguesa passaram para o campo do nacionalismo ucraniano, do liberalismo burguês ou da reação monarquista. As ideias revolucionárias, para Lunatcharski, não constituíam um entusiasmo de juventude: elas o penetraram o mais profundo dos nervos e dos vasos sanguíneos (TROTSKI, 2017, p. 208).

Em 1894, ano que Lunatcharski estava em estudos na Suíça, um novo czar

estava sendo coroado na Rússia: Nicolau II (1894-1917), o qual governava com o

apoio de um pequeno grupo de ministros e de um Conselho de Estado, composto

por representantes da aristocracia. No período em questão, era rigorosamente

proibida a existência de partidos políticos, no entanto existiam partidos clandestinos,

como, por exemplo: o Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR) e o

Socialista Revolucionário (CLARK, 1991).

Lunatcharski retornou à Rússia em 1898 e se uniu a um grupo social

democrata de Moscou, organizado por Anna, irmã de Lênin, e em seguida foi preso.

Após um breve período de detenção foi exilado, primeiramente em Kalunga e,

posteriormente, em Vologda. No exílio, conheceu os marxistas A. Basárov e Nikolai

Berdiaev e A. A. Bogdánov; e estudou sobre filosofia e o mito e história da religião.

Em suas memórias o intelectual relembra, que nesse período de prisões, lia quase

uma biblioteca inteira e também escrevia diversos contos, poemas e tratados, a partir

disso que sua concepção filosófica se firmou (ESTEVAM, 2018; FITZPATRICK, 1977).

Em 1902 segue para Vologda, juntamente com Bogdánov, que cumpria na

referida cidade seu período de prisão, onde desenvolveu sua produção literária com

a publicação de artigos no Pravda e em outros jornais sobre filosofia e psicologia.

Em maio, foi condenado pelo czar, o qual decretou um mandato de dois anos de

deportação e prisão na região de Viatka, contudo, consegue autorização para

permanecer em Vologda, alegando problemas de saúde. Nessa cidade, conheceu

Anna Alexandrovna Malinovskaia, irmã de Bogdánov, com a qual se casou em

setembro daquele ano (ESTEVAM, 2018).

Lunatcharski seguiu dedicando-se à atuação como militante e aos estudos,

sobretudo afetos ao marxismo, desenvolvendo escritos fundamentais para

compreendemos, em especial, a relação entre a luta dos trabalhadores na Rússia,

cultura e formação humana. A tela de Nikolai Ivanovich Feshin (Figura 2) nos revela

o retrato do intelectual e combatente:

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Figura 2 – Nikolai Ivanovich Feshin. Retrato de Anatoli Lunatcharski. Têmpera sobre tela. 1920

Fonte: http://art16.ru/gallery2/v/artgal/feshin_001/DSC03523.jpg.html.

O retrato de Anatoli Lunatcharski (Figura 2), pintado nos anos 1920, é

composto pelo intelectual em condição de estudo, expressa seu apreço ao

conhecimento e, concomitantemente, sua dedicação nas ações políticas. Nesse

contexto, a instabilidade econômica e política da Rússia aumentava

significativamente, assim como a situação de miséria da classe trabalhadora. Na

sequência, discorremos sobre os embates e enfretamentos que levaram à primeira

tentativa de revolução, em 1905, dos quais Lunatcharski participara direta ou

indiretamente dessa luta, por meio de discussões teóricas, seguindo com conferências

por diversos países na Europa, e atuação política, que mesmo nos períodos de exílio

se manteve firme com a agitação e propaganda entre os trabalhadores, operários e

camponeses, e posteriormente ao desenvolvimento da Revolução de Outubro de

1917.

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2.3 1905-1917: TEMPOS DE EMBATES E ENFRENTAMENTOS

No início do século XX, durante o governo de Nicolau II, conforme pontuamos,

as dificuldades econômicas e políticas se intensificaram, assim como as discussões

dos militantes para a superação do poder vigente. Lênin, em seu artigo “Por onde

começar?”, publicado em maio de 1901, no jornal Iskra (A Centelha), e

posteriormente em sua obra “Que Fazer?”, escrita como continuação do referido

artigo, em outubro de 1901, publicada após sua conclusão, em março de 1902, na

Alemanha, pela Editora Dietz, discute as ideias sobre a organização do partido

proletário.

Lênin (1979) afirmava que a tarefa do partido implica em possibilitar aos

operários os conhecimentos políticos, isto é, desenvolver uma consciência política.

Para tal, faz-se necessário “ir a todas as classes da população” como teóricos,

agitadores, propagandistas e organizadores para o alcance da luta emancipadora do

proletariado. Contudo, o Partido não deveria negar em sua prática suas convicções

socialistas em busca de um movimento revolucionário, contra o governo vigente.

Em 1903, no II Congresso da Social Democracia dos Trabalhadores Russos,

realizado em Londres, houve desacordos afetos a questões estratégicas e sobretudo

em relação às tarefas do Partido, conforme discutido por Lênin (1979). Dessa forma,

o POSDR se dividiu em dois grupos: os Mencheviques22, liderados por George

Plekhanov e Iulii Martov, e os Bolcheviques23, por Lênin. Após ser libertado do exílio,

Lunatcharski24 voltou ao estrangeiro e se encontrou pela primeira vez com Lênin. Em

22 Mencheviques – significa minoria “[...] defensores da tese de que a sociedade deve atingir o

socialismo num processo de evolução natural, devendo a classe operária conquistar previamente o poder político. [...] de orientação nacionalista, congregava os intelectuais socialistas, os quais, formados num sistema de ensino dominado pelas classes proprietárias, tendem a identificar-se com os interesses delas (REED, 2017, p. 37).

23 Bolcheviques – significa maioria “adotam a denominação de ‘Partido Comunista’, para enfatizar sua completa ruptura com a tradição do socialismo moderado ou parlamentar, predominante entre os mencheviques na Rússia e nas tendências assemelhadas. Os bolcheviques propuseram a imediata insurreição proletária e a tomada das rédeas do governo como meios de apressar a passagem para o socialismo, assenhoreando-se, à força, da indústria, da terra, dos recursos naturais e das instituições financeiras. Esse expressa notadamente os interesses do operariado das fábricas e também de uma grande parcela dos camponeses pobres (REED, 2017, p. 37).

24 Nesse período, Lunatcharski centrou sua atenção na arte e na religião, em uma perspectiva de estudos marxistas. Destacamos sua obra “Religião e socialismo” (1975), organizada em dois volumes, publicadas em 1908 e 1911, nas quais escreve sobre as relações entre religião e marxismo.

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1904, Lunatcharski e Bogdánov se uniram aos bolcheviques; consideravam-nos

“seguidores” de Marx, pois não somente pretendiam compreender o mundo, mas

também revolucioná-lo.

Em outubro de 1904, Lunatcharski chega a Paris, onde se encontra pela

primeira vez com Lênin e ingressa no órgão central dos bolcheviques. Em dezembro

do mesmo ano, segue viagem para Genebra, onde se tornou um dos líderes da

fração. Lunatcharski escreveu para vários jornais bolcheviques, como Vperiod e

Proletari, juntamente com Lênin e outros companheiros. Também realizou várias

conferências afetas ao movimento revolucionário pela Suíça, França, Bélgica e

Alemanha, em colônias de exilados russos (ESTEVAM, 2018).

No período em questão, o czar Nicolau II, apesar das questões econômicas

se agravarem, dedicava atenção à expansão dos territórios do Império. Em 1904

iniciou uma guerra contra o Japão, a Guerra Russo-Japonesa (1904-1905), pela

disputa da Manchúria e pela Coréia, em sua busca pela expansão no Extremo

Oriente. Os russos foram derrotados pelo Japão, o que motivou a intensificação das

manifestações contra o governo czarista (FITZPATRICK, 2017; VICENTINO, 1995).

Em janeiro de 1905, os trabalhadores de São Petersburgo, juntamente com

os revolucionários, organizaram uma greve geral, na qual exigiam melhores salários

e protestavam contra as demissões. Clark (1991) assinala que até então havia

ocorrido algumas greves isoladas na maioria das cidades do país, mas nada com

tais dimensões. As tropas do czar permaneciam nos principais pontos da capital,

como as estações de trem e centrais telefônicas. A greve continuava sem perspectiva

de êxito.

No dia 09 de janeiro de 1905, os trabalhadores, com o apoio do padre Gapon,

organizaram uma manifestação desarmada. Aproximadamente 200.000 pessoas

seguiram pelas ruas cobertas de neve de São Petersburgo até o Palácio de Inverno,

a fim de entregar ao czar uma petição, com mais de cem mil assinaturas,

reivindicando melhores condições de trabalho, direito de greve, reforma agrária e

instituição de uma Assembleia Nacional. Os manifestantes foram reprimidos

violentamente pelas tropas do czar, massacre que se denominou “Domingo

Sangrento” (CLARK, 1991; REIS FILHO, 1983).

A sensibilidade dos escritos de Maiakovski elucida o sofrimento e a luta da

classe trabalhadora. De acordo com Lunatcharski (2018) em seu texto “Vladímir

Maiakóvski, inovador”, o poeta se relacionou firmemente às questões da luta política

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daquele período, por considerar que as batalhas que se travavam eram a base do

futuro, no qual se poderia enfim respirar a plenos pulmões.

[...] Ainda são montanhas de cabeças coroadas, e os burgueses negrejam como gralhas no inverno, mas já o ardor da lava trabalhadora pela cratera do partido irrompe a terra. Nove de janeiro. Fim de Gapon. Caímos, ceifados pelo chumbo tzarista. [...] O delírio sobre o perdão tzarista acabou com a batalha de Mukden com o estalido de Tsushima. Basta! (MAIAKOVSKI, 2012, p. 109-111).

Maiakovski (2012) versa sobre a manifestação da classe trabalhadora em

busca de melhores condições de vida. Wood (1991, p. 16) reafirma esse aspecto ao

escrever que a relação “entre uma sociedade moderna e industrial e um imenso

campesinato ávido por terras, cujos interesses econômicos há muito eram

negligenciados pelo governo, constitui-se em fator-chave para um entendimento da

natureza da Revolução de 1917”.

Leon Trotski (1879-1940)25, militante revolucionário, teve uma atribuição

relevante na Revolução de 1905 como presidente do Soviete de Petrogrado.

Em 1906, já na prisão, analisou o período por meio de seus escritos, em especial na

brochura “Balanços e perspectivas” (2012), publicada originalmente na Rússia em

1906. No texto, ao discutir as revoluções internacionais, particularmente a Revolução

Francesa (1789), afirma que a Revolução Russa não será uma repetição desta. Com

isso, ao registrar que “o século XIX não foi em vão” (TROTSKI, 2012, p. 196),

defende uma revolução proletária e socialista.

25 Trotski nasceu em Liev Davidovitch Bronstein, na Ucrânia, em 1879. Tornou-se político, militante,

escritor e filósofo. Vivenciou e participou fundamentalmente da Revolução Russa de 1917. Foi presidente do Soviete de Petrogrado em 1905. Após a revolução bolchevique, outubro de 1917, foi comissário do povo para Negócios Estrangeiros e um dos principais organizadores do exército vermelho. Posteriormente à morte de Lenin, com Josef Stalin (1924-1953) à frente do governo, foi expulso do Partido em 1927 e da União Soviética em 1929. Foi assassinado no México, em agosto de 1940, onde estava exilado, dois anos depois de ter fundado a IV Internacional (JINKINGS; SADER, 2012). Dentre suas obras, destacamos: Trotski (2011; 2007; 1980) e Trótski (2017).

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De acordo com Reis Filho (1983) a tentativa de revolução, no início do

século, motivou ações posteriores, os protestos e greves aumentaram de forma

significativa, assim como os conflitos internos. Citamos a Revolta dos Marinheiros,

em 1905, no Mar Negro, que atiraram ao mar oficiais que haviam ordenado o

fuzilamento de seus líderes no encouraçado Potemkin, o mais moderno navio de

guerra da frota russa.

O movimento revolucionário motivava, em várias regiões, a formação dos

sovietes, conselhos de trabalhadores que ampliaram a participação popular.

Concomitantemente, o czar Nicolau II, após resistência, anunciou a instalação da

Duma Estatal (Parlamento), em 1906, com deputados originários das elites

nacionais. A Duma era formada por “500 deputados eleitos, representando todas as

classes sociais rurais, e o Conselho de Estado continha igual proporção de membros

eleitos e indicados, representando as principais instituições sociais, religiosas,

educacionais e financeiras” (WOOD, 1991, p. 51).

No tocante à educação, as escolas primárias russas eram instituições

isoladas, dirigidas com base em critérios feudais. Isso refletia, em geral, no nível da

instrução de maneira separatista, tanto em termos de clãs como de classes,

limitando a continuação dos estudos superiores. A grande maioria das instituições de

ensino eram propriedade, nas áreas urbanas, de alguns setores da burguesia, no

campo, dos latifundiários, e uma pequena parte era do Estado. A Igreja Ortodoxa,

além de controlar a instrução popular, também era proprietária de um significativo

número de escolas, nas quais o ensino se limitava à transmissão do dogma

religioso, noções de leitura e escrita, elementos básicos de aritmética e,

predominantemente, canto religioso (CAPRILES, 1989).

As crianças que tinham a possibilidade de frequentar as escolas, nos meios

operários e camponeses, recebiam uma instrução respaldada em textos

eclesiásticos e conhecimentos básicos aritméticos, ou seja, o ensino não se

amparava nos conhecimentos científicos (CAPRILES, 1989). Após o “Domingo

Sangrento”, em 1905, o czar Nicolau II, dentre suas reformas pouco significativas

estava a educação, cuja organização ficou sob responsabilidade das entidades:

Santo Sínodo, Ministério da Educação e Conselhos Municipais (GILES, 1987).

As duas primeiras Dumas, em pouco tempo, foram dissolvidas, seguiram-se a

terceira e quarta, todavia, os conflitos “entre a autoridade do czar e a Duma

cresceram tão rapidamente que logo desembocaram em impasses, culminando no

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fechamento do Legislativo [...]. Era o retorno à autocracia czarista, acompanhado do

desprestígio de Nicolau II e de tensão política” (VICENTINO, 1995, p. 56).

Cabe mencionar que nesse período Lunatcharski estava exilado, e após

percorrer por alguns países, estabeleceu estadia na Itália, a convite de Gorki26, onde

formulou suas primeiras elaborações sobre cultura proletária, concepção

fundamental para o desenvolvimento posterior de sua proposta cultural. Foi um dos

formadores das escolas de Capri e Bolonha27, nas quais assumiu as disciplinas de

“história do movimento sindical, história da internacional, história da social-

democracia alemã, história do movimento operário na França, na Inglaterra e na

Alemanha, história da literatura russa” (ESTEVAM, 2018, p. 22). Organizou cursos

sobre história da arte e visitas a museus de Nápoles, assim como coordenou

módulos de práticas de propaganda e agitação. Com o término das escolas, o

intelectual se mudou para Paris, de onde partiu para Suíça, em 1915, por conta do

avanço da Primeira Guerra Mundial.

Ao considerar esses acontecimentos históricos, Hobsbawn (2011) afirma que

a queda do governo czarista na Rússia estava prestes a ocorrer. “Após 1905-6,

quando o czarismo foi de fato posto de joelhos pela revolução, ninguém duvidava

seriamente disso” (HOBSBAWN, 2011, p. 63). Fato que posteriormente ocorreria,

em consequência do ingresso do país na Primeira Guerra Mundial (1914-1918)28. O

historiador explica:

26 Máximo Gorki (1868-1936), pseudônimo de Aleksei Maksimovitch Peshkov, nasceu em Moscou,

era de origem camponesa e autodidata. Foi escritor, romancista, dramaturgo. Seus primeiros contos foram publicados na década de 1890, mesmo período em que iniciou sua convivência nos círculos revolucionários e sua militância política. Gorki foi exilado do país e retornou à Rússia somente em 1928. Cabe ressaltar que Gorki é um dos autores que estudamos no GEEI, em especial a peça “A mãe”, também adaptada por Bertolt Brecht (CHAVES, 2000; LANDSBER, 2007). Mencionamos as seguintes obras: Gorki (1973; 1979).

27 Com intuito de desenvolver agitação e propaganda proletária foram constituídas as escolas de Capri, que funcionou entre agosto e dezembro de 1909, e a de Bolonha, entre os meses de novembro de 1910 e março de 1911, ambas coordenados pelo Vperiod – grupo criado em 1909. A discussão foi composta por um conjunto do partido e adquiriu uma dimensão internacional, sendo que Rosa Luxemburgo e Kautski foram convidados para lecionarem. Com uma perspectiva diferente do grupo Vperiod, Lênin também organizou uma escola de formação política, na França, na cidade de Longjumaeu, entre maio a agosto de 1911, na qual Lunatcharski também participou.

28 A tragédia e a relevância histórica da Primeira Guerra Mundial só podem ser avaliadas quando consideramos suas dimensões humanas, políticas e econômicas. Nos campos de combate morreram entre 8 e 9 milhões de pessoas. Se a essas perdas forem somadas as mortes por privações e enfermidades, haveria mais cerca de 5 milhões de óbitos na Europa, sem contar a Rússia. Nesse caso, a devastação foi desmedida, pois incluiu a guerra civil que se prolongou até 1921, com aproximadamente 16 milhões de mortos. A guerra deixou 7 milhões de incapacitados permanentes e 15 milhões de feridos (BERTONHA, 2011a; HOBSBAWN, 2011; MAZZUCCHELLI, 2007).

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[...] Na verdade, o regime czarista mal se recuperava da revolução de 1905 quando, indeciso e incompetente como sempre, se viu mais uma vez acoitado por uma onda de descontentamento social em rápido crescimento. Tirando a firme lealdade do exército, polícia e serviço público nos últimos meses antes da eclosão da guerra, o país parecia mais uma vez à beira de uma erupção. Na verdade, como em tantos dos países beligerantes, o entusiasmo e patriotismo das massas após a eclosão da guerra desarmaram a situação política – embora, no caso da Rússia, não por muito tempo. Em 1915, os problemas de governo do czar pareciam mais uma vez insuperáveis. Nada pareceu menos surpreendente e inesperado que a revolução de março de 1917, que derrubou a monarquia russa [...] (HOBSBAWN, 2011, p. 63-64).

Bertonha (2011b) explica que apesar do desenvolvimento russo em

determinados aspectos econômicos industriais, ainda em 1914 era uma sociedade

essencialmente agrícola, com uma agricultura atrasada e pouco produtiva. Além

disso, os soldados do exército sofriam com a ausência de recursos, disciplina brutal

e métodos antiquados de instrução.

A disputa entre as nações, a exacerbação do nacionalismo e a rigidez do

sistema de alianças revelavam a instabilidade internacional. A perspectiva de um

confronto de maiores proporções lançou os países envolvidos em uma disputa militar

em 1912-1914. A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) envolveu todas as grandes

potências e todos os Estados europeus, com exceção da Espanha, dos Países

Baixos, dos três países da Escandinávia e da Suíça. Os países envolvidos criaram

uma política de alianças, a qual foi dividida em dois blocos: do lado das Potências

Centrais estavam a Alemanha, a Áustria-Hungria, o império Turco-Otomano e a

Bulgária; do lado dos Aliados a França, a Inglaterra, a Rússia e, posteriormente, a

Itália e os Estados Unidos, além de uma série de pequenos países, como a Sérvia,

Portugal, Bélgica e outros (BERTONHA, 2011a; HOBSBAWN, 2011;

MAZZUCCHELLI, 2007).

A Rússia, por exemplo, oscilou por algum tempo entre os dois blocos: por um lado essa nação tinha rivalidades ideológicas com a França (preferindo o conservadorismo de alemães e austro-húngaros) e imperialistas com a Inglaterra na Ásia e no Mediterrâneo; por outro, austro-húngaros e russos disputavam áreas de influência nos Bálcãs e os franceses eram grandes investidos na economia russa. Assim, havia potencial para a Rússia se aliar a qualquer um dos lados, mas o risco de ter territórios na Europa perdidos para a nova potência germânica acabou por levar o Império à Aliança com a Inglaterra e a França (BERTONHA, 2011a, p. 28-29).

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A Rússia, após ter declarado guerra à Alemanha e à Áustria-Hungria, em

agosto de 1914, começou a mobilizar recursos para o conflito. A ausência de

infraestrutura ferroviária e a distância faziam, inevitavelmente, a mobilização russa

mais lenta em comparação aos outros países. O analfabetismo também

comprometia os planos de guerra, a maioria dos recrutas não sabia ler os bilhetes

ferroviários, as ordens de movimento ou os manuais de manutenção do escasso

equipamento mecanizado disponível. Em geral, as instruções e ordens precisavam

ser decoradas (BERTONHA, 2011a; 2011b). O cenário de guerra e as condições dos

soldados podemos ser elucidados por meio da obra “Na linha do Fogo” (Figura 3).

Figura 3 – Kuzma Petrov-Vódkin. Na linha do Fogo. Óleo sobre tela. 196 x 275 cm. 1916. Legado em 1951 de M. F. e E. K. Petrov-Vódkin

Fonte: VIRADA Russa... (2009, p. 119).

Essa obra (Figura 3) o pintor Kuzma Petrov-Vódkin (1878-1939) retrata os

acontecimentos da Primeira Guerra Mundial e o serviço militar, que expressa seu

caráter antimilitarista, composta por muitas figuras construídas em diagonal, enfatiza

a ação dos oficiais que se movem em uma direção qualquer. Destacamos um dos

jovens oficiais, ao centro, que ainda sente, mas já está morto. Ressaltamos também

alguns detalhes, o chão verde coberto por estilhaços no primeiro plano e as nuvens

formadas por fumaças de explosões de canhão.

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Em meio às condições referidas, o exército czarista obteve algumas vitórias,

particularmente sobre os austro-húngaros. Contudo, não obtiveram êxitos em

significativas ofensivas e as perdas de homens eram consideráveis,

aproximadamente 1,5 milhão de soldados. No final de 1916, os soldados mortos ou

seriamente feridos somavam aproximadamente 3,6 milhões e os capturados eram

mais 2,1 milhões (KENNEDY, 1989). Nesse ano, o czar convocou novos recrutas,

em geral despreparados para a Guerra. Bertonha (2011a, p. 56) assinala que

O moral dos soldados estava abatido pela disciplina brutal, escassez de comida, roupas e equipamentos, perdas imensas de vidas e um crescente sentimento de que as batalhas sem fim, e a própria guerra, não tinham sentido. Também dentro da Rússia, as condições de vida deterioravam-se rapidamente, com desabastecimento generalizado de alimentos, remédios e combustíveis, e o descontentamento crescia.

Wood (1991) afirma que, durante o período da guerra, as indústrias que

produziam material bélico se fortaleceram. Porém quando se compreendeu que a

guerra não terminaria em breve, mais empreendimentos foram desviados para a

produção militar. Por outro lado, a produção de bens de consumo decaiu,

provocando dificuldades para a população. Seguiu-se o racionamento, com os

trabalhadores passando fome; as filas por pão, em meio àquela brutalidade,

tornaram-se comuns no cotidiano dos russos. A falta de matéria-prima essencial

também provocou uma crise e greves na indústria (1915-1916). Löwy (2009, p. 113,

grifo do autor) elucida:

[...] Sob um olhar mais atento e distanciado, esses registros que forjam nossa memória do século XX revelam a aspereza do contexto social, político e mesmo geográfico dessa revolução: o frio, a miséria, a guerra, a repressão. Em primeiro lugar, o frio, porque o clima tem uma importância particular nessas regiões, dá o ritmo da vida cotidiana russa, envolve as multidões de soldados e operários que se vestem com casacos pesados, cobrem a cabeça com uma chapa, calçam com botas os pés que afundam na neve meses a fio [...].

Cabe ressaltar que nesse contexto, com a guerra em curso, Lunatcharski adotou

uma postura internacionalista e atuou com Trotski e outros na publicação da Revista

internacionalista Nashe slovo “Nossa Palavra”, na França. Mudou-se para a Suíça, em

1915, onde escreve em suas memórias a Lenin e Zinóviev com uma proposta de

união, a partir do programa internacionalista. Esse fato firmou a reconciliação, pois em

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anos anteriores o intelectual, devido às críticas, havia se afastado da facção, ainda

que não regressasse aos bolcheviques (FITZPATRICK, 1977).

No dia 23 de fevereiro de 1917, no habitual “Dia da Mulher” do movimento

socialista, ocorreu “a jornada das operárias”. Às mulheres que se manifestavam

somaram-se os trabalhadores, em especial os da metalúrgica Putilov, que

organizaram uma greve geral e ocuparam o centro da capital basicamente para

exigir pão. “A fragilidade do regime se revelou quando as tropas do czar, mesmo os

leais cossacos de sempre, hesitaram e depois se recusaram a atacar a multidão, e

passaram a confraternizar com ela” (HOBSBAWM, 2011, p. 66-67). Após quatro dias

de lutas, o czar abdicou, seu irmão Grão-Duque Miguel recusou-se a assumir o trono

e foi substituído por um Governo Provisório.

No tocante à luta e à atuação das mulheres trabalhadoras russas nesse

contexto revolucionário citamos a tela “Cavalo de Aço nos Campos da Ucrânia”

(Figura 4), de Victória Belakóvskaia.

Figura 4 – Victória Belakóvskaia. Cavalo de Aço nos Campos da Ucrânia. Óleo sobre tela. 127 x 112 cm. 1927

Fonte: 500 ANOS de Arte Russa (2002, p. 490).

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A figura principal, da obra em questão (Figura 4), é uma robusta camponesa,

com lenço e óculos na cabeça, cabelos curtos e pele iluminada que, em primeiro

plano, segura firmemente o volante de um trator. Ao fundo, vemos uma extensão de

terra, colorida em tons de amarelo, indicando haver grãos maduros a serem

colhidos, e como analisa Alissa Liubímova, representa uma pintura figurativa e

temática (500 ANOS DE ARTE RUSSA, 2002). Conforme Prestes (2012, p. 12), era

“uma questão latente era mudar o papel da mulher na sociedade. Em inúmeros

trabalhados, Lenin trata o assunto como um dos mais importantes para a construção

de uma sociedade igualitária”.

A tela (Figura 4), composta principalmente por tons de terra, trata-se de

trabalho de graduação, em 1927, da pintora Belakóvskaia, no Instituto Superior

Artístico-Técnico (500 ANOS DE ARTE RUSSA, 2002). Retrata a trabalhadora russa

no período inicial do governo soviético, o qual foi oriundo do processo iniciado no

início do século XX, particularmente com a Revolução de 1905 e a queda do

governo czarista em fevereiro de 1917, fato que estabeleceu o Governo Provisório.

O Governo Provisório, representado pelo Príncipe George Lvov (1861-1925),

de orientação liberal, desenvolveu um programa de reformas, dentre as quais a

diminuição da jornada de trabalho para os operários e a liberdade de imprensa e de

organização política. No que se refere à educação, praticamente não foi

desenvolvido nenhum plano para criar um sistema educacional, sobretudo para a

classe trabalhadora. Os bolcheviques exigiam mais pão, paz e terra para todo o

povo. “Os agitadores revolucionários explicavam aos soldados que o governo do

czar os enviara sem objetivo ou razão clara para o matadouro; e que os sucessores

do czar não conseguiam mudar o caráter da guerra nem empreender a luta pela paz

(TRÓTSKI, 2017, p. 27). Isto é, o Governo Provisório não resolvia os problemas

mais urgentes, como a guerra, a fome e a miséria, conforme tratamos a seguir.

2.4 A REVOLUÇÃO DE OUTUBRO DE 1917: ENFRENTAMENTOS E CONQUISTAS

A situação de guerra, fome e miséria somava-se à revolta no campo, à

falência da indústria e ao enfraquecimento militar. À medida que a imposição da

antiga burocracia e soberania do czarismo ruíam por todo país, eram suprimidas por

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um considerado número de conselhos populares, sovietes, comitês. O Governo

Provisório, em busca de defender seus interesses conflitantes, não provocara

mudanças significativas, especialmente no que tange às questões essenciais: a paz

e a terra.

No dia 3 de abril de 1917, Lênin, que estava exilado na Suíça, retornou à

Rússia com outros emigrantes, após acordos com o governo alemão, o qual permitiu

que cruzassem seu território em um trem fechado, pois esperava que os

revolucionários possibilitassem a retirada russa da guerra. Ainda na estação,

realizou um discurso apresentando as propostas dos bolcheviques, tratava-se das

“Teses de Abril”, publicadas no jornal Pravda, nº 26, no dia 7 de abril. Maiakovski

(2012, p. 134-135), referindo-se ao retorno de Lênin, descreve em seu livro-poema a

esperança que se firmava da revolução que estava por vir:

[...] de repente de lá, de lá do Neva, da estação Finlândia pela Viborgskaia rugiu a metralhadora. E novamente o vento fresco, forte as ondas da revolução levantou em espuma. A fundição foi alagada Por blusa e bonés. “Lenin está conosco! Viva Lenin!”

Lênin, sobre as tarefas do proletariado na presente Revolução, explicitava as

propostas dos bolcheviques nas “Teses de Abril” e propunha a retirada imediata do

país da guerra. Nas palavras do revolucionário sobre a atitude a ser considerada

diante a guerra, a Rússia “continua a ser indiscutivelmente uma guerra imperialista,

de rapina, mesmo sob o novo governo de Lvov e cia., em virtude do caráter

capitalista deste governo, é intolerável a menor concessão ao ‘defensismo

revolucionário’” (LENIN, 2005, p. 63).

Além disso, Lênin defendia a nacionalização das terras do país e a formação

de um novo governo comunista com os sovietes e sem os liberais e a burguesia, que

implicaria uma ruptura com o Governo Provisório eleito pela Duma, mesmo que,

naquele período, os bolcheviques estavam em minoria na maior parte dos sovietes.

Nos termos do autor:

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[...] A peculiaridade do momento atual na Rússia consiste na transição da primeira etapa da revolução, que deu poder à burguesia por faltar ao proletariado o grau necessário de consciência e organização, para sua segunda etapa, que deve colocar o poder nas mãos do proletariado e das camadas pobres do campesinato. [...] Nenhum apoio ao governo provisório, explicar a completa falsidade de todas suas promessas, sobretudo a da renuncia às anexações. Desmascaramento, em vez da ‘exigência’ inadmissível e semeadora de ilusões de que este governo, governo de capitalistas, deixe de ser imperialista (LENIN, 2005, p. 64, grifos do autor).

Dessa forma, Lênin destacava a necessidade de explicar à classe

trabalhadora, de modo paciente e sistemático, e desenvolver sua compreensão

sobre as questões econômicas e políticas que a Rússia vivenciava. Os

pronunciamentos do revolucionário, evidenciando os princípios políticos dos

bolcheviques “paz, terra e pão”, aumentaram significativamente a sua popularidade

entre as massas, “[...] que passaram de um pequeno grupo de uns poucos milhares

em março de 1917 para um quarto de milhão de membros no início do verão

daquele ano (HOBSBAWN, 2011, p. 68).

Hobsbawn (2011) pontua que as reivindicações básicas da população era

pão; dentre os operários melhores condições de trabalho; dos camponeses, em

geral, terra. A classe trabalhadora desejava o fim da guerra. O Governo Provisório e

seus integrantes não atendiam tais necessidades.

Em maio de 1917, Lunatcharski também regressa à Rússia, com um grande

número de refugiados políticos. Em Petrogrado, se uniu à Revista social democrática

internacionalista de Gorki Nóvaia Zhizn “A nova vida”. Até julho, dirigiu a seção

cultural-educativa da Duma de Petrogrado durante as “Jornadas de Julho” descritas

a seguir, e foi preso.

De acordo com Trotski (2017), na época do Primeiro Congresso dos Sovietes

(3 a 24 de junho) de toda a Rússia, os bolcheviques, ainda minoria, organizaram

para o dia 10 de junho uma manifestação armada em Petrogrado, com o intuito de

agir diretamente sobre o Congresso para que rompesse com a burguesia. Uma

campanha contra a manifestação foi efetivada e o Congresso votou por realizar uma

outra manifestação geral desarmada no dia 18 de junho.

[...] Mas esse acabou se tornando justamente o dia do triunfo do nosso partido. As massas percorreram as ruas em imponentes colunas e, apesar de convocadas não por nós – como para a nossa manifestação do dia 10 de junho, que acabou não ocorrendo –, mas

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sim pela autoridade oficial dos sovietes, os operários levantaram bandeiras e estandartes com as consignas do nosso partido: “Abaixo os tratados secretos!”, “Abaixo a política de ofensiva militar!”, “Viva a paz digna!”, “Abaixo os dez ministros capitalistas!”, “Todo poder aos sovietes!” (TRÓTSKI, 2017, p. 31).

Continua o autor,

Após a manifestação das massas revolucionárias, uma crise do governo parecia totalmente inevitável. Mas a notícia vinda do front de que o exército revolucionário havia partido para a ofensiva diluiu os efeitos da manifestação. No mesmo dia em que o proletariado e a guarnição de Petrogrado exigiam a publicação dos documentos e uma proposta aberta de paz, Keriénski lançava o exército revolucionário na ofensiva (TRÓTSKI, 2017, p. 32).

Em junho de 2017, Alexandre Kerenski (1881-1917), ministro da Guerra,

ordenou uma nova ofensiva militar contra a Áustria e a Galícia. O avanço inicial foi

contido, mas teve resultados desastrosos. Isso se somou às novas manifestações

em Petrogrado. No mês seguinte, os bolcheviques organizaram uma revolta armada

contra o Governo Provisório, conhecida como as “Jornadas de Julho”, entretanto não

obtiveram êxito, os regimentos foram dispersos e os jornais bolcheviques banidos.

Lênin conseguiu evitar a prisão, fugindo para a Finlândia (CLARK, 1991; WOOD,

1991).

Diante dos acontecimentos, o Príncipe Lvov renunciou e Kerenski foi

nomeado primeiro-ministro e o general Kornilov comandante-chefe do exército. No

período, foi organizada uma campanha contra os bolcheviques, diversos órgãos de

imprensas divulgavam artigos que buscavam tornar impossível sua existência.

“A tensão concentrada e todo o dramatismo da campanha da imprensa lançada

contra os bolcheviques antecipava a guerra civil que iria desenvolver-se na fase

seguinte da revolução” (TRÓTSKI, 2017, p. 29).

Os acontecimentos militares se complicavam ainda mais com as crescentes dificuldades da vida interna do país. No plano da questão da terra, da indústria, das relações nacionais, o governo de coalizão não conseguia dar nenhum passo decisivo adiante. O abastecimento e os transportes eram cada vez mais difíceis; os conflitos locais se faziam cada vez mais frequentes (TRÓTSKI, 2017, p. 34).

Após as “Jornadas de Julho”, em 1917, Kerenski tomou explicitamente o

caminho da repressão. No mesmo mês, Lunatcharski e Trotski são presos e unem-

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se aos bolcheviques. “O ministério restabeleceu a pena de morte para os soldados.

Nossos jornais foram fechados e nossos agitadores foram presos, mas isso só fez

aumentar nossa influência [...]” (TRÓTSKI, 2017, p. 42). A situação interna do país

se agravava. A guerra era prolongada sem objetivos e sem perspectivas de saída

favorável.

No front a situação piorava a cada dia. O frio outono se aproximava com suas chuvas e lamaçais. Um quarto inverno em guerra era iminente. A comida dos soldados se tornava cada dia pior. A retaguarda havia esquecido o front; os regimentos não tinham nem substituições, nem reforços, nem as roupas quentes que seriam necessárias. As deserções se multiplicavam dia após dia (TRÓTSKI, 2017, p. 54, grifos do autor).

O Soviete de Petrogrado reivindicava “a passagem imediata de todo o poder

central e local para as mãos dos sovietes, a divisão imediata da terra entre os

camponeses, o controle da produção pelos operários e a abertura imediata de

negociações de paz” (TRÓTSKI, 2017, p. 55). Os intelectuais e trabalhadores

estavam cada vez mais impacientes, e em consequência, tomavam as terras por

conta própria e pediam proteção aos bolcheviques. As mazelas da classe

trabalhadora não eram mais suportáveis; o poeta descreve sua súplica:

Poder aos Sovietes! Terra aos camponeses! Paz aos povos! Pão aos famintos! (MAIAKOVSKI, 2012, p. 156-157).

A política do Governo Provisório continuava, oscilava entre as reformas

inócuas e firmes medidas repressivas. Reed29 (2017, p. 56) afirma que os meses de

setembro e outubro de 1917 são os piores do ano russo, particularmente em

Petrogrado, no céu cinza, nos dias cada vez mais curtos, a chuva caía contínua: “A

camada de lama era profunda, escorregadia e pegajosa, marcada por pegadas de

botas pesadas, e ela estava pior que nunca devido ao completo desmantelamento

da administração municipal”. Fortes ventos úmidos sopravam do golfo da Finlândia e

um nevoeiro gelado caía sobre as ruas. Inverno russo foi retratado na tela (Figura 5)

a seguir.

29 John Reed (1887-1920), jornalista e historiador estadunidense, em seu livro “Dez dias que

abalaram o mundo: a história da Revolução Russa” (2017), retrata o início de um dos acontecimentos mais relevantes do século XX, em uma narrativa jornalística afeta à Revolução Russa de Outubro de 1917, que vivenciou (REED, 2017).

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Figura 5 – Natalia Gontcharova. Inverno. Óleo sobre tela. 118 x 99 cm. 1911. Legado em 1926 ao Museu de Cultura e Arte, Leningrado

Fonte: VIRADA Russa... (2009, p. 66).

A pintora Natalia Gontcharova (1881-1962) retratou no quadro (Figura 5) o

intenso e rigoroso inverno russo. Sua cor é constituída pela combinação de preto e

branco, levemente colorida com ocres. Apresenta silhuetas escuras das árvores e de

figuras humanas, em contraste com o céu e a neve esbranquiçados.

O inverno russo se aproximava; os soldados morriam no front, não

conseguiam combater devido à fome, ao frio e à exaustão, os transportes

ferroviários cessavam por falta de combustível, as fábricas fechavam, as massas

conclamavam que a burguesia era responsável pelos sofrimentos do povo e pelas

derrotas na guerra. Reed (2017, p. 56-57) descreve o árduo contexto durante a

Primeira Guerra Mundial:

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Semana a semana os alimentos tornavam-se cada vez mais escassos. A ração diária de pão reduziu-se de 750 para 500 gramas, para 250 gramas, para 150. Em certas semanas não houve pão. A ração de açúcar era de 1 quilo ao mês – e era raro encontra-lo. Uma barra de chocolate, ou meio quilo de caramelos de má qualidade, custava de 7 a 10 rublos, aproximadamente 1 dólar, ao câmbio da época. Havia apenas metade do leite necessário para alimentar as crianças pequenas da cidade; a maioria dos hotéis e das residências ficou sem leite durante meses. Na época de abundância de frutas, maçãs e peras eram vendidas a quase 1 rublo cada [...] Para conseguir leite, pão, açúcar e tabaco era necessário aguardar em longas filas por horas, sob uma chuva gélida. Voltando para casa de reuniões que se prolongavam a noite inteira, vi as filas formando-se antes do amanhecer, compostas, em sua maioria, por mulheres, muitas com crianças nos braços (REED, 2017, p. 56-57).

Reed (2017) afirma que enquanto as massas do povo não conseguiam

sequer pães suficientes, em condições de racionamento, nos depósitos das grandes

cidades havia toneladas de alimentos e roupas, acessíveis apenas aos ricos.

Estoques de combustível e mantimentos eram escondidos e remetidos a outras

localidades, como a Suécia. O jornalista escreve que conheceu, em uma pequena

cidade do interior russo, uma família de comerciantes, cujos três filhos tinham

recorrido ao suborno para serem dispensados do serviço militar, e um deles traficava

alimentos.

O sofrimento, a penúria e a miséria da classe trabalhadora se davam em

todos os aspectos econômicos e políticos da Rússia, sobretudo no que se referem à

Educação e à Arte. Ao mesmo tempo que a população, pobremente vestida,

esperava nas filas de pão o dia inteiro nas ruas cobertas de gelo, a classe

dominante se organizava para frequentar os teatros, que abriam todas as noites,

inclusive aos domingos, onde se apresentavam espetáculos de ballet e produções

de obras de Tolstói. Da mesma forma as galerias, nas quais os intelectuais

compareciam a palestras relativas à arte e literatura (REED, 2017).

Como costuma ocorrer em tais momentos, a vida convencional e frívola da cidade seguia seu curso, ignorando a revolução tanto quanto podia. Os poetas faziam versos – mas não sobre a revolução. Os pintores realistas pintavam cenas da Rússia medieval – tudo, menos a revolução. Mocinhas bem-nascidas das províncias chegavam à capital para aprender francês e estudar canto [...]. Mulheres da pequena burguesia visitavam-se para o chá, cada qual com seu pequeno açucareiro, em ouro, prata ou cravejado, e um pedaço de pão oculto no regalo, desejando a volta do czar, a chegada dos alemães ou qualquer coisa que resolvesse o problema

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da criadagem [...] A filha de um amigo meu chegou em casa histérica de tanta indignação, porque a mulher condutora do bonde tratou-a por “camarada!” (REED, 2017, p. 57-58).

No país, os trabalhadores viviam em severas condições de vida, como falta

de moradia, doenças infecciosas, mínima assistência médica, o que acentuava a

mortalidade infantil. As contradições sociais determinaram um desenvolvimento na

consciência política do proletariado, levando a classe operária e o campesinato a

aliarem-se na luta contra a autocracia. O movimento revolucionário era uma

realidade concreta, e a luta pela instrução pública uma parte relevante e integrante

em um país marcado pelo atraso econômico, miséria, ausência de direitos e o

analfabetismo (CAPRILES, 1989; FOTEEVA, 1986).

Nesse período, particularmente em setembro e início de novembro de 1917,

os bolcheviques eram maioria entre os sovietes, além de terem o apoio dos

trabalhadores, soldados e camponeses. Também havia as organizações de

operários, os chamados “Fabrichno-Zavodskiye Komitieti” – comitês de Fábricas – e

as organizações rebeldes do Exército e da Marinha (REED, 2017).

Reed (2017, p. 72) afirma que os militantes bolcheviques, diariamente,

visitavam os quartéis e fábricas, criticando rigorosamente o Governo Provisório, o

qual estava deliberadamente arruinando o país e o Exército. Certa vez em que os

acompanhava, descreve Lunatcharski como “um tipo miúdo, com jeito de estudante

e uma expressão sensível de artista, explicava por que os sovietes devem tomar o

poder”.

Os bolcheviques, em geral, tinham o apoio popular. Na ocasião referida, em

que Lunatcharski proferia, um soldado revolto exclamava: “Camaradas! Estamos

morrendo de fome e de frio nas trincheiras. Não estamos morrendo por nenhuma

causa. Peço aos camaradas americanos que levem para a América a notícia de que

os russos nunca trairão a revolução, eles irão até a morte [...]” (REED, 2017, p. 73).

Isto é, os soldados estavam dispostos a lutar por uma revolução social.

Com as tropas exaustas, se acentuava a consciência de que a única solução

possível era as propostas dos bolcheviques. Os soldados afirmavam aos sovietes:

“[...] A grande massa de soldados, com uma formidável maioria, está do lado de

vocês!” (TRÓTSKI, 2017, p. 68). O slogan “Paz, Terra e Pão” era ainda mais

imponente, reiterando o sentido e o significado da expressão “Todo poder aos

sovietes!”.

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[...] Mas, agora, em outubro de 1917, essa mesma consigna significava a tomada de todo o poder pelo proletariado revolucionário, à frente do qual nessa época estava o Partido Bolchevique. Tratava-se então da ditadura da classe operária que arrastava, ou mais exatamente, que estava prestes a arrastar atrás dela os milhões e milhões de homens que constituíam as massas de camponeses pobres. Está aí todo o significado histórico da Revolução de Outubro (TRÓTSKI, 2017, p. 57).

O abrangente e extenso país de Dostoiévski30 (1821-1881) e Tolstói31 (1828-

1910), com seus escritos “sensíveis e competentes”, e a “firmeza e leveza das

melodias” de Tchaikovsky32 (1840-1893) vivenciavam a fome, a miséria e o intenso

frio, contudo as adversidades não impediram os trabalhadores, soldados e

revolucionários de desenvolver o Estado Soviético, após a Revolução, em uma

potência na indústria, ciência e cultura (CHAVES, 2018, p. 2).

Desse modo, os Bolcheviques definiram o dia 25 de outubro para a reunião

do Segundo Congresso dos Sovietes de toda a Rússia. No dia 10 de outubro, o

Partido bolchevique realizou, com a presença de Lênin, uma sessão secreta do

Comitê Executivo, na qual foi discutida uma insurreição revolucionária.

As massas populares vinham incessantemente ao nosso encontro, a efervescência aumentava a cada hora que passava. Das trincheiras chagaram constantemente delegas: “Quanto tempo essa situação intolerável ainda durará?” – exclamavam nas sessões do Soviete de Petrogrado –, “Os soldados lhe dizem pela nossa boca: se de agora até o dia 1º de novembro nenhum passo decisivo for tomado no sentido das negociações de paz, as trincheiras serão esvaziadas e todo o Exército virá para a retaguarda (TRÓTSKI, 2017, p. 68).

30 Fiódor Mikhaílovitch Dostoiévski, romancista russo, nasceu em Moscou no dia 30 de outubro de

1821. Envolvido com um grupo de militantes utópicos radicais na década de 1940, cumpriu quatro anos de trabalhos forçados em uma colônia penal da Sibéria. Faleceu em São Petersburgo, no dia 28 de janeiro de 1881 (LANDSBER, 2007). Mencionamos algumas obras do autor, como Dostoiévski (2017; 2016; 2012; 2009).

31 Lev Tolstói, descendente de nobre, nasceu no dia 28 de agosto de 1828, em Iasnáia Poliana, província de Tula, em território russo. Romancista e filósofo, desenvolveu uma significativa compreensão afeta às contradições da sociedade russa naquele período. Em fins da década de 1850 preocupado com a situação precária da educação do meio rural, sente a inquietude de realizar um trabalho junto ao campesinato de alfabetização (LANDSBER, 2007). Dentre suas obras, destacamos Tolstói (2017; 2015).

32 Peter Tchaikovsky (1840-1893) nasceu na cidade russa de Votkinsk. Aos cinco anos, com o apoio de sua mãe, aprendeu a tocar piano. Em 1866, foi convidado para ser professor do Conservatório de Moscou. Nesse período, compôs suas primeiras obras, em especial sua primeira sinfonia – “Sonhos de Inverno". Com trinta e sete anos, já havia escrito três óperas, três sinfonias, um balé e muitas outras peças musicais. “O lago dos cisnes”, “A Bela Adormecida” e “O quebra-nozes” são três grandes balés do compositor e estão baseados em histórias populares (VENEZIA, 2005).

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Os bolcheviques decidiram organizar a “Jornada do Soviete de Petrogrado”,

em 22 de outubro. Tiveram apoio dos membros do Partido, delegados dos Sovietes,

representantes do front, operários, soldados, marinheiros, socialistas de esquerda e

anarquistas. “A atmosfera estava repleta dessa tensão eletrizante que caracteriza

todos os momentos críticos da Revolução: “Abaixo o governo de Keriénski!”, “Abaixo

a Guerra!”, “Todo o poder aos sovietes!” (TRÓTSKI, 2017, p. 75). As massas

camponesas e operárias estavam, em geral, ao lado dos bolcheviques.

Kerenski, na noite de 24 de outubro, dirigiu-se ao Parlamento Provisório e

solicitou medidas repressivas contra os bolcheviques, os quais haviam concluído os

preparativos para a insurreição. Os bolcheviques tinham todas as vias de acesso a

Petrogrado sob controle, assim como todos os principais pontos da cidade (CLARK,

1991; REED, 2017). Trotski, no dia 25 de outubro, anunciou os decretos que

colocavam a Revolução em movimento. No poema a Outubro “Muito Bem!”

Maiakovski, descreve a tomada do Palácio de Inverno:

Sopravam, como sempre, Os ventos de outubro, Como sopram Durante o capitalismo. Sob a ponte o rio Neva. Pelo Neva os de Kronstad... Com a fala dos fuzis Começa logo a tremer O Palácio de Inverno. [...] Sem olhar as estrelas Nossos guardas cercam o Palácio de Inverno Subindo pelas ruas do bairro dos quartéis. [...] Colunas de operários E marinheiros E muitos androjoso Chegaram fazendo brilhar os fuzis Como se juntassem as mãos na garganta No pescoço perfumado Do Palácio de Inverno. [...] Ao ataque! Passaram! Por alfombras, Dintéis rosados. Cada escadaria, Cada recanto

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Tomavam-no [...] Enchiam os aposentos como se entrassem neles A fúria das águas. [...] Ao amanhecer não faltava mais que um metro. [...] Calaram-se as metralhadoras Empalideciam as estrelas do céu Fazendo o turno da guarda. Sopravam como sempre Os ventos de Outubro – Os trilhos serpeavam na ponte Aguçando seus silvos – Já no socialismo (MAIACOVSKI, 1987, p. 22-23).

Como o poema elucida, o dia 25 de outubro de 1917 foi decisivo. Aos poucos,

o Palácio de Inverno foi cercado pelas tropas bolcheviques. Trótski (2017, p. 83)

anunciou na sessão do Soviete de Petrogrado, representando o Comitê

Revolucionário, “[...] que o governo de Keriénski já não existia e que, na expectativa

da decisão do Congresso dos Sovietes de toda a Rússia, o poder passava para as

mãos do Comitê Militar Revolucionário”.

Alguns dias antes, Lênin, que deixara a Finlândia e estava escondido em um

bairro operário dos arredores, se dirigiu, em segredo, ao Instituto Smólni, no dia 25

de outubro de 1917 à noite. Os soldados, marinheiros e guardas vermelhos tomaram

todos os órgãos do poder, sem derramamento de sangue. Naquela noite, ocorreu

uma sessão provisória do Segundo Congresso dos Sovietes de toda Rússia.

Concomitantemente, o Palácio de Inverno estava cercado, a energia elétrica foi

cortada. Após um tempo de espera, o local havia sido tomado em plena escuridão,

Kerenski estava foragido e outros ministros foram presos. Foi realizada a Revolução

Russa de Outubro33. A obra “Primeira aparição de Lenin em uma reunião do Soviete

de Petrogrado em Smolni” (Figura 6), nesse mesmo dia, elucida a conquista

bolchevique:

33 “Revolução Russa de Outubro: até a Revolução o antigo calendário russo (calendário juliano,

instituído por Júlio Cesar no ano 46 a.C.) era diferente do usado no Ocidente (calendário gregoriano, promulgado pelo papa Gregório XIII em 1582). Entre ambos havia uma diferença de doze dias no século XIX e de treze dias no século XX. O 7 de novembro determina, no calendário ocidental, a data correspondente ao 25 de outubro do calendário russo, no qual triunfou a insurreição que ficou internacionalmente conhecida como a Revolução de Outubro ou ‘Outubro russo’” (TRÓTSKI, 2017, p. 19).

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Figura 6 – Konstantín Yuón. Primeira aparição de Lenin em uma reunião do Soviete de Petrogrado em Smolni em 25 de outubro de 1917. Óleo sobre tela. 132 x 191 cm. 1927.

Fonte: Radiante Porvenir (2018, p. 67).

O artista Konstantín Yuón pintou a obra (Figura 6) com motivo da

comemoração do décimo aniversário da Revolução de Outubro e em homenagem a

Lênin após sua morte. Na tela, retrata a primeira apresentação pública do líder

revolucionário, no dia 25 de outubro de 1917, tomada do poder bolchevique.

A organização da sociedade foi fundamentada nos princípios socialistas. Nos

primeiros dias após a Revolução, foram decretados o fim da propriedade sobre a

terra, a expropriação da propriedade privada, fim dos títulos de nobreza, foram

proferidas a liberdade de crença, a separação da Igreja do Estado e da Escola,

assim como foi declarada a igualdade entre homens e mulheres. Também foram

extintos os poderes do Governo Provisório (PRESTES, 2012, FREITAS, L., 2017).

No dia 26 de outubro de 1917, ocorreu a sessão do Soviete de Petrogrado. O

Governo Soviético formulou os Decretos de Paz e Terra, apresentados por Lênin, os

quais, após uma breve discussão, foram aprovados por unanimidade. “Na mesma

sessão foi constituído um novo governo central sob a forma de Conselho dos

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Comissários do Povo”34 (TRÓTSKI, 2017, p. 87). A lista pronunciada era composta,

integralmente, pelos bolcheviques, tendo Lênin na presidência, Trotsky no comando

dos Negócios Externos e Stálin (1878-1953) nos Negócios Internos (CLARK, 1991;

WOOD; 1991; VICENTINO, 1995).

No mesmo dia, foi criado o Comissariado do Povo para a Instrução Pública,

Anatoli Lunatcharski foi nomeado por Lênin presidente e responsável, juntamente

com o apoio essencial de Krupskaia, pelo sistema educacional da Rússia. No dia 9

de novembro, conforme Prestes (2012, p. 13), “é instituída a Comissão

Governamental de Educação e, em 30 de maio de 1918, decreta-se a transferência

das instituições de ensino e formação para a gestão do Comissariado do Povo para

Instrução.

Já antes de outubro de 1917 criara-se a Comissão Estatal para a Educação, cujos membros – Krupskaya (1875-1944), Lepshinsky (1868-1944) e Pokrovsky (1868-1932) – foram responsáveis pela elaboração do documento “Princípios Fundamentais da Escola Única do Trabalho”, que resultou na “Declaração sobre a Escola Única do Trabalho”, aprovada pelo Comitê Central do Partido Comunista Bolchevique, em 30/09/1918. Com a criação do Comissariado, eles e outros educadores entraram na sua composição, dentre os quais: Blonski (1884-1941) e Pistrak (1888-1937) [...] (SAVIANI, N., 2011a, p. 29).

Algumas décadas após estudos e argumentações dos intelectuais que se

dedicaram às obras de Marx e Engels, no final do século XIX e início do século XX, o

fizeram a partir da experiência da Revolução, quando se tratava da luta pela

construção de uma proposta de sociedade socialista e pela sua edificação em uma

prática revolucionária, que implicava uma nova economia, uma nova política e uma

nova educação (ARANHA, 1989).

De acordo com Chaves (2011a), dentre as prioridades do novo modelo

econômico e político, o investimento em áreas capazes de retirar a Rússia do atraso

econômico, tecnológico, científico, social e acadêmico, dentre essas prioridades a

educação. Os meios acadêmicos tinham a tarefa de buscar consolidar uma relação

entre a ciência e o regime social estabelecido, com base em princípios socialistas

para a formação do novo homem, o homem comunista. “Durante os primeiros anos

da Revolução, foram formulados os objetivos da educação que deveriam

corresponder aos princípios da revolução proletária” (PRESTES, 2012, p. 11). 34 Os Comissariados do Povo, substituíam os antigos ministérios; alguns exemplos: Abastecimento;

Agricultura; Assistência Social; Assuntos Estrangeiros; Assuntos Internos; Comércio; Comércio Exterior; Controle do Estado; Defesa; Finanças; Indústria; Instrução Pública; Interior; Justiça; Saúde Pública; Segurança do Estado; Trabalho; Vias de Comunicação (SAVIANI, N., 2011a).

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Com a instalação do poder dos sovietes, o primeiro país socialista estava diante de muitos desafios políticos, econômicos, culturais e sociais. A prioridade era a educação, que deveria deixar de ser um privilégio de poucos para se transformar em um dos direitos de qualquer cidadão, criando-se, para isso, um novo sistema de instrução. [...] a Rússia socialista apresentou a tarefa de criar os fundamentos da psicologia e da pedagogia soviéticas, que tinham por objetivo a formação do homem novo, o que criava a demanda de novos modos de pensar a ciência (PRESTES, 2012, p. 11).

Lunatcharski, conforme descrito por Capriles (1989, p. 29) “homem de vastos

conhecimentos enciclopédicos, destacado crítico, historiador da arte e da literatura

universal, cronista e prolífico orador”, foi responsável pela edificação da base da

educação na URSS, que se firmou, acordo com Chaves (2008, p. 8), com o essencial

apoio de Krupskaya, e sobretudo, se constitui na essência a principal defesa da

Revolução Bolchevique, “[...] de um lado fez estremecer os defensores do capitalismo

e, de outro, pela primeira vez na história da humanidade, se anunciou, com a

Revolução Bolchevique, a possibilidade de máximo desenvolvimento humano e social”.

Nesse sentido, em concordância com Chaves (2018), consideramos

Lunatcharski, assim como Krupskaya35 e Makarenko36, os responsáveis e

idealizadores dos princípios políticos para a educação, psicologia e arte na URSS. A

pedagoga defendia a formação humana escolar na condução da ordem socialista, o

desenvolvimento do espírito coletivo e da auto-organização (disciplina), amparados

nos princípios marxistas. Para Krupskaya37, de acordo com Nereide Saviani (2011a),

35 Citamos, dentre os textos que podem favorecer a compreensão das proposições dessa pedagoga

revolucionária, Krupskaia (19--) e Krupskaya (1979; 2017). Citamos a dissertação de Aline Aparecida da Silva, orientada pela Prof. Dra. Marta Chaves, intitulada “Nadezhda Krupskaia: contribuições para a Educação Infantil na atualidade” (2015). Esse trabalho integra os estudos Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação Infantil (GEEI), e se dedica a pesquisar os intelectuais russos do período revolucionário. Mencionamos o texto redigido pela pesquisadora Prof. Marta Chaves, intitulado “Krupskaya: uma pedagoga revolucionária” (CHAVES, 2018), ressaltamos que o mesmo até o presente momento não foi publicado em meios acadêmicos: livros, capítulos, revista, anais de eventos, entre outros, no entanto, iniciamos os estudos do referido artigo nas discussões coletivas desenvolvidas no Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação Infantil (GEEI).

36 Ressaltamos as significativas contribuições de Makarenko (1960; 1976; 1977; 1981; 1987; 2012), que, a exemplo dos intelectuais revolucionários, orientava professores e familiares dos escolares.

37 Nos 55 volumes das obras completas de Krupskaia, as questões educacionais aparecem sob as seguintes abordagens: crítica à educação burguesa; denúncia à precária situação da educação dos trabalhadores (na Rússia e em outros países); exame de desafios a enfrentar o analfabetismo / alfabetização; ensino e trabalho produtivo; organização de bibliotecas; a imprensa a serviço da educação; os manuais escolares; tarefas da juventude; formação do magistério; as escolas por nacionalidades / questões de idioma...); discussão de princípios, diretrizes e propostas para a educação comunista; análise das experiências pedagógicas, dos movimentos estudantil e docente, da relação da educação com outras esferas da vida social (o trabalho produtivo, a comunicação, a política, o papel do Estado, do Partido...). Para citar os temas mais recorrentes: Questão Nacional (nacionalismo / internacionalismo); Emancipação dos Trabalhadores; Estado e Luta de Classes; Estado e Religião / Igreja; Desenvolvimento Social e Cultural; Desenvolvimento Científico e Tecnológico; Cultura, Cultura Nacional, Cultura Proletária (SAVIANI, N., 2011a, p. 37).

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os principais desafios dos primeiros anos seriam superar a herança da escola antiga;

estabelecer um novo conteúdo e novos métodos; relacionar a escola com a vida; e o

desenvolvimento do espírito coletivo, em favor da formação do novo homem, isto é,

do novo homem comunista.

Pistrak (2011) pondera que tocante à análise das relações sociais, sobretudo

na organização educacional, o método de Marx não somente possibilita a

compreensão dos fenômenos sociais em sua relação dialética, mas também

favorece a transformação da ordem vigente, a consolidação de uma nova ordem, a

sociedade comunista. Desse modo, a escola deve se fundamentar nos princípios

marxistas, pois “a organização da escola nesta base oferece às crianças um meio

sólido e são no qual se desenvolverá um espírito social forte, alegre e capaz de criar

a nova geração (PISTRAK, 2011, p. 34).

Foteeva (1986) assinala que a organização revolucionária econômica e

política do sistema de instrução pública iniciou-se integralmente desde os primeiros

dias da Revolução. Sendo assim, Lunatcharski em seu escrito “Proclamação do

Comissário do Povo para a Educação”, do dia 29 de outubro de 1917, quatro dias

após a Revolução de Outubro, apresentou os princípios e as tarefas principais do

Comissariado do Povo para a Educação, as proposições essenciais em que a

Comissão Estatal se apoiaria. A referida Proclamação, estava articulada com o

Decreto n. 43 de novembro de 1917 do Comitê Executivo Central e do Comitê de

Comissários do Povo sob a direção de Lenin: “Decreto sobre a criação da Comissão

Estatal para a Educação”38 (publicado no Pravda n. 188 em 13 de novembro). Em

linhas gerais da atividade educacional, Lunatcharski (2017, p. 268) afirmava que o

primeiro objetivo era a superação do analfabetismo.

Ele deve alcançar, tão logo possível, a universalização da alfabetização através da organização de uma rede de escolas para atender as demandas da pedagogia moderna, introduzir o ensino universal obrigatório e gratuito e, ao mesmo tempo, organizar uma série de institutos e seminários para professores que, o mais rapidamente possível, irá produzir um poderoso exército de professores do povo, tão necessário para o ensino de toda a população desta imensa Rússia.

38 No decreto, se estabelece a composição da Comissão e fixa suas seções de trabalho (15), bem

como as atribuições mais imediatas e sua mesa diretiva. Em 20 de novembro de 1917 outro Decreto, n. 79, redefiniu a composição da Comissão (Instituto de Marxismo-Leninismo e Instituto de História da Academia de Ciências. Decretos do Poder Soviético, tomo 1 – 25 de outubro de 1917 até 16 de março de 1918. Moscou: 1957, p. 59 e 111). Publica-se a Nota da Comissão pelo texto do portal da biblioteca eletrônica: <http://intellect-invest.org.ua/content/userfiles/files/social_history_pedagogic/ma terial_zagalni/Obrastchenie_Lunatscharskogo_1917.pdf> (FREITAS; CALDART, 2017).

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O autor trata da necessidade de estabelecer o ensino laico, obrigatório e

gratuito, uma escola única, para todos e em todos os níveis. Krupskaya (2017)

reafirmava essa questão em seus escritos sobre educação, com a defesa que no

governo soviético não pode haver possibilidades “para dois sistemas de educação:

um direcionado para educar os que dominam e outro dirigido para educar

escravizados”, mas sim uma “escola única” (KRUPSKAYA, 2017, p. 83).

Em relação ao analfabetismo, Lênin (1981), referindo-se aos dados

estatísticos oficiais do período, particularmente ao “Anuário da Rússia de 1910,

publicação oficial, governamental, editada pelo Ministério do Interior (São

Petersburgo, 1911), afirma a situação de “embrutecimento” no tocante à Instrução

russa. No documento, constava que na Rússia havia 46,7 escolares e estudantes

por cada 1000 habitantes em 1908 (em 1904 eram 44,33 por 1000). O número de

crianças em idade escolar era 22% do total de habitantes, e destas apenas 4,7%

eram alunos.

Em geral, quatro quintas partes de crianças e adolescentes da Rússia eram

analfabetos, e somente 27% dos adultos sabiam ler e escrever. Nas palavras de

Lênin (1981, p. 33): “À excepção da Rússia, na Europa já não há nenhum país tão

bárbaro, onde as massas populares tenham sido tão espoliadas no sentido do

ensino, da instrução e do saber”. A autocracia e a Igreja privavam-nos, da

possibilidade de acesso à escola. O autor reafirma:

Quatro quintas partes da jovem geração estão condenadas a viver no analfabetismo pelo regime estatal feudal da Rússia. O analfabetismo na Rússia corresponde a este embrutecimento do povo pelo poder latifundiário. Esse mesmo Anuário da Rússia calcula (na pág. 88) que na Rússia só 21% da população sabe ler e escrever, ou 27%, se exceptuarmos as crianças em idade pré-escolar, ou seja, os menores de nove anos (LÉNINE, 1981, p. 33, grifo do autor).

Em comparação com os dados do mesmo período, Lênin relata que na

Suécia e Dinamarca não havia analfabetismo, ou o número de analfabetos oscilava

entre 1% e 2%, a exemplo de Suíça e Alemanha. A Áustria-Hungria criou condições

culturais mais significativas que a Rússia para a Instrução Pública, sendo 39% de

analfabetos na Áustria e 50% na Hungria. A América do Norte possuía cerca de 11%

de analfabetos e, entre os negros, 44%, isto é, em 1908 havia 17 milhões de

escolares, 192 por cada 1000 habitantes, mais do quádruplo que na Rússia.

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No tocante às escolas russas, o referido recenseamento escolar da Rússia, de

18 de janeiro de 1911, revela que nas cidades havia 329 escolas urbanas unitárias,

139 escolas privadas de III classe e 177 unitárias paroquiais. Os professores com

instrução geral laica média e superior constituíam 76% nas escolas urbanas, 67% nas

escolas privadas e 18% nas paroquiais. Esses dados, mesmo limitados pelo

Ministério, o qual se esforçou maximamente para que não se recolhessem dados

detalhados, representam a mísera situação das escolas russas (LÉNINE, 1981).

Compreendemos que a tarefa principal era a “liquidação do analfabetismo” da

população, em especial adulta. O elemento mais relevante para realização da

revolução cultural era a escola, a qual deveria estar intimamente relacionada à vida,

proporcionar uma rica instrução geral amparada na ciência, formar uma juventude

com elevado nível cultural e ideológico, capaz de se apropriar dos conhecimentos

desenvolvidos historicamente pela humanidade para edificar o comunismo. O

intelectual argumenta que “As tarefas poderiam definir-se com uma só palavra:

aprender” (LÉNIN, 1981, p. 80).

Assim, a formação dos professores também é uma questão essencial para

essa organização proposta. Além disso, faz-se fundamental a melhoria das

condições de atuação dos pedagogos, saudados pelo comissário como “os donos do

país”, o governo soviético deverá mobilizar os esforços para atender às suas

reivindicações, o mais breve possível.

Como primeira tarefa, a comissão indica a melhoria da situação dos professores e, antes de tudo, daqueles que são os mais desfavorecidos e, no entanto, são os mais importantes [...] para o trabalho da cultura: os professores da escola primária (LUNACHARSKY, 2017a, p. 272).

Desse modo, o Comissário definiu a função da educação para a nova

sociedade, para o novo homem que pretendia se formar, o homem comunista: “[...] o

povo trabalhador, tendo tomado o poder, não pode esquecer que o conhecimento

servirá para ele como sua maior arma na sua luta por uma vida melhor e pelo seu

crescimento espiritual” (LUNACHARSKY, 2017a, p. 269).

Diante de tal função da educação, o revolucionário reafirma que a superação

do analfabetismo não deveria limitar-se somente à organização escolar para as

crianças, adolescentes e jovens, mas também era fundamental a organização de

escolas para os adultos, para se apropriarem da leitura e escrita, que deveriam se

configurar em uma das prioridades no plano geral de educação nacional.

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O Comissário destaca outra questão relevante, o orçamento para a educação,

o qual seria significativo, mesmo com a necessidade de reduzir as despesas com

outros itens do orçamento nacional. Foteeva (1986) pontua que os orçamentos

governamentais para a educação, antes da Revolução de Outubro, principalmente

para a pré-escola, eram insignificantes.

Lunatcharski enfatizou a diferença entre instrução – transmissão por meio

professor do conhecimento – e educação – processo criador, no qual o indivíduo

aprimora ao longo da vida, amplia e enriquece. Reiterava que “as massas populares

que labutam – operários, camponeses e soldados – estão sedentes de alfabetização

e de todas as ciências. Mas também estão sedentas de educação”

(LUNACHARSKY, 2017a, p. 269). E isto, a educação e a instrução do povo, se

configuram como a tarefa principal.

Em toda a Rússia, sobretudo entre os trabalhadores da cidade, mas também entre os camponeses, surgiu uma poderosa onde de movimento cultural educacional e as organizações desse tipo estão se multiplicando rapidamente entre operários e soldados; ir ao encontro delas para apoiá-las em todas as formas possíveis, abrir-lhes o caminho, é a principal tarefa do governo revolucionário e popular no campo da educação pública (LUNACHARSKY, 2017a, p. 270).

Dentre os desafios, estava fazer com que as elaborações e manifestações de

dirigentes, educadores e artistas propagassem uma ideia complexa e valiosa de

maneira simples, sem perder a riqueza da arte. A educação e a cultura, estratégicas

para o processo de construção da sociedade comunista, deveriam ser refletidas com

o intuito do bem comum de trabalhadores, operários e camponeses. Dessa maneira,

“os livros, as escolas, os teatros e os museus deveriam favorecer a educação, não

apenas em seu aspecto formal de aprendizagem da escrita e de conteúdos técnicos,

mas o contexto daquele período histórico clamava por uma educação cultural”

(CHAVES, 2011a, p. 14-15). Reed (2017, p. 58-59) retrata que a população russa,

com a Revolução, estava ávida por conhecimento:

[...] a sede por instrução, durante tanto tempo insatisfeita, provocou um frenesi de formas de expressão. Apenas do Instituto Smolni, durante os seis primeiros meses, saiam caminhões e trens com toneladas de material de divulgação e propaganda, inundando o país. A Rússia absorvia todo tipo de literatura impressa como a areia quente absorve a água, de forma insaciável. E não se tratava de

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fábulas, história falsificada, religião morna ou ficção barata e corrupta, mas de teoria econômica e social, filosofia, obras de Tolstói, Gógol, Gorki [...] (REED, 2017, p. 58-59).

Lênin reafirmava que as tarefas mais relevantes da revolução cultural eram,

em geral, a alfabetização, o desenvolvimento cultural, a igualdade de direitos das

mulheres, povos e nações e a introdução do ensino geral obrigatório (FOTEEVA,

1986). A Educação e a Arte deveriam se expandir para as províncias e alcançar

todos os trabalhadores.

Para os trabalhadores da educação e para o Partido Comunista, como vanguarda da luta, a tarefa fundamental deve consistir em ajudar a educação e a instrução das massas trabalhadoras, para que superem velhos costumes e hábitos, herdados no antigo regime, hábitos e costumes de proprietários que impregnaram profundamente as massas. Esta tarefa fundamental de toda a revolução socialista nunca deve ser confiada apenas a um Centro de Ensino Político, antes deve ligar-se a outras instituições, vinculando-se não só ao Centro, mas também a instituições paralelas, por forma a poderem examinar-se os problemas particulares que durante tanto tempo ocuparam a atenção do C.C. do Partido e do Conselho de Comissários do Povo (LENINE, 1977, p. 142).

Lênin mantinha uma relação de confiança com Lunatcharski; há inúmeros

escritos, conforme Prestes e Tunes (2017), que a expressam. Algumas delas afetas

à Revolução Cultural que se pretendia constituir com parte integrante da Revolução

Socialista, juntamente com a educação, uma das tarefas fundamentais da

Revolução. Lênin declarava ser necessário educar sujeitos altivos, formados por

uma perspectiva dialético-materialista para a consolidação de uma sociedade

socialista. “Para isso não bastava liquidar o analfabetismo, decretar a educação

pública gratuita, reforçar a escola, oferecer uma educação dentro dos princípios

comunistas, mas também defender a arte” (PRESTES; TUNES, 2017, p. 261).

Os princípios que deveriam orientar a organização da nova sociedade que se

intencionava desenvolver, conforme ressalta Giles (1987), tinham sido refletidos

pelos bolcheviques antes da Revolução de Outubro de 1917. “Acreditamos que a

união dos esforços do povo trabalhador e dos intelectuais educados e honestos

conduzirá o país da crise dolorosa, através de uma democracia plena, para o reino

do socialismo e da fraternidade dos povos” (LUNACHARSKY, 2017a, p. 273).

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Essa defesa era expressa tanto nos discursos de Lunatcharski (1988) quanto

nas orientações propostas pelo Governo. Sendo assim, toda a tarefa da educação

escolar seria transferida aos órgãos de auto direção local, isto é, fora instituída a

descentralização, exceto as universidades. Foi suprimido o processo educativo do

controle particular e da Igreja, eliminando o ensino de religião do programa de estudos.

Cabe destacar que na Rússia antes de 1917 as condições para o

desenvolvimento científico eram extremamente difíceis e limitadas. O czarismo

reprimia o pensamento progressista, receando a propagação da instrução popular.

“Os homens de ciência de vanguarda tinham de lutar encarniçadamente contra as

teorias reaccionárias, bater-se contra enormes dificuldades materiais, sofrer

perseguição da autocracia e da Igreja” (U.R.S.S, 1976, p. 13). Os cientistas de

vanguarda, por exemplo, eram expulsos das universidades czaristas pela autocracia.

O trabalho dos cientistas estava paralisado por falta das indispensáveis infra-estruturas material e técnica; muitos deles trabalhavam financiados pelo seu próprio dinheiro. A Rússia tinha poucas instituições cientificas antes da revolução, os trabalhos de investigação eram geralmente realizados pelos catedráticos e, em primeiro lugar, nos pequenos laboratórios das escolas superiores e das universidades. Em 1914 só havia no total 11 600 investigadores nas escolas superiores e nas instituições científicas. A Academia das Ciências, o maior centro científico do país, não contava, antes da revolução, senão com um único instituto, sete museus, cinco laboratórios e três estações experimentais. Trabalhavam aí apenas 109 investigadores científicos e 179 colaboradores auxiliares (U.R.S.S, 1976, p. 14).

Com a Revolução de Outubro de 1917, desde dos primeiros anos do poder

dos sovietes, a ciência era uma das prioridades do Estado, o qual fundou

significativos institutos de investigação cientifica: em 1918, o Instituto de Óptica e o

Instituto de Física Aplicada, em Petrogrado; o Instituto de Aero-hidrodinâmico

Central e o Instituto de Física e Química, em Moscovo; também um laboratório de

rádio em Nijni-Novgorod. Em 1922, havia no país centenas de institutos científicos,

um significativo número de institutos de investigação e de escolas superiores

(U.R.S.S, 1976).

Lênin (1981), ao tratar das principais tarefas da Academia das Ciência na

elaboração do plano de reorganização da indústria e do desenvolvimento econômico

da Rússia, afirmava que a economia nacional, a produção, a eletrificação da

indústria, da agricultura e dos transportes constituíam a base do desenvolvimento da

ciência. “[...] O plano estatal de electrificação da Rússia (G.O.E.L.R.O.), adoptado

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em 1920, era um programa detalhado de reorganização técnica da economia

nacional. Nele era primordial o papel reservado à ciência” (U.R.S.S, 1976, p. 15).

Lunatcharski (1988), em seus artigos e discursos, defendia que a educação

estava intimamente relacionada com as tarefas econômicas e políticas. Desse modo,

o desenvolvimento científico contribuía para o desenvolvimento da economia

nacional e na edificação da sociedade comunista. No tocante às Ciências Humanas,

amparadas no método da Ciência da História, ressaltamos os esforços dos cientistas

para o estudo e pesquisas da dialética marxista e a análise da sociedade, bem como

a formação do indivíduo soviético.

Diante do exposto, reafirmamos que as primeiras medidas do governo

soviético buscavam o desenvolvimento econômico e político do país.

Concomitantemente às tarefas educacionais a serem desenvolvidas, os

bolcheviques buscavam efetivar a nacionalização das indústrias e bancos, a reforma

agrária e um acordo de paz com a Alemanha – em 1918 assinou o Tratado de Brest-

Litovsk39, saindo da Primeira Guerra Mundial. Naquele mesmo ano, outra medida foi

a execução da família imperial. “As decisões revolucionárias ativaram a oposição,

levando mencheviques e czaristas a se aliarem, iniciando a resistência militar ao

novo governo, compondo o que chamavam de russos brancos” (VICENTINO, 1995,

p. 58). Esse fato mergulhou a Rússia em uma sangrenta guerra civil (1917-1922).

A guerra civil russa foi vencida pelo Exército Vermelho40, contudo o país

encontrava-se em situação de esgotamento, sob uma economia arruinada; fábricas,

ferrovias e campos agrícolas, em geral, estavam destruídos; além disso, ocorriam

contestações de camponeses e de setores militares, dentre os que apoiaram a

Revolução de Outubro. Para enfrentar a situação, Lênin estabeleceu a Nova Política

39 Com o Tratado de Brest-Litovsk, assinado com a Alemanha, a Rússia foi obrigada a pagar uma

indenização, além de perder um quarto de seu território, a saber: Finlândia, a Estônia, a Letônia, a Lituânia, parte da Polônia e a Bessarábia. Mas não foi apenas o mapa territorial que sofreu uma radical transformação. Sem a exaustão a que o Império Russo foi submetido durante a guerra – e os terríveis sofrimentos impostos a seu povo –, torna-se difícil compreender a velocidade e a profundidade dos acontecimentos vividos em 1917. Em fevereiro o regime czarista ruiu e em outubro os bolcheviques assumiram o poder. A paz firmada em Brest-Litovsk deu fôlego a Lênin e permitiu que o Exército Vermelho, comandado por Trotsky, se organizasse para conter os enfrentamentos a que o novo regime foi submetido (MAZZUCCHELLI, 2007).

40 Exército Vermelho era o nome dado às forças armadas da extinta União Soviética, criado em 1918. Sua origem remonta à Guerra Civil Russa, ocorrida entre 1918 e 1921, na qual era necessária a criação de um exército que representasse o lado bolchevique no conflito e que, por conseguinte, pudesse levar as forças de esquerda a derrotar seus oponentes conservadores, conhecidos como Exército Branco. O Exército Vermelho seria organizado e fundado pelo dirigente bolchevique Leon Trotsky. Vencida a Guerra Civil, o Exército Vermelho tornou-se o contingente armado oficial do governo soviético (SILVA, 2015). Sobre a referida guerra cabe destacar a obra, intitulada “História da guerra civil russa: 1917-1922” (2017), do historiador Jean-Jacques Marie, composta por uma narrativa histórica e por documentos do período.

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Econômica (NEP), em 1921-1928, um conjunto de medidas que envolvia

planejamento estatal comunista e práticas capitalistas de mercado, buscando

estabilizar a situação financeira do país. “Os camponeses foram autorizados a

vender novamente seus produtos nos mercados (e não ao governo) e os comunistas

passaram a tolerar a empresa privada, em pequena escala” (CLARK, 1991, p. 24).

No que se refere à produção industrial, com a constituição da NEP, foi

autorizada a organização do setor privado, “embora o Estado mantivesse o controle

do ‘alto-comando’ da economia, incluindo a indústria de larga escala e a atividade

bancária. Investidores estrangeiros foram convidados a assumir concessões para

empreendimentos industriais e de mineração” (FITZPATRICK, 2017, p. 117).

Naquele período, Lênin não estava bem de saúde: em maio de 1922 sofreu o

primeiro de uma série de derrames. Lênin acreditava que Trotski deveria assumir o

poder soviético em seu lugar. Enquanto Trotski comandava o Exército Vermelho, o

qual defendia que a Revolução deveria ser internacional, Stálin conquistava espaço

no Partido Comunista, defendendo a instauração do comunismo apenas na Rússia.

Lênin, atento às ações de Stálin, busca afastá-lo do cargo de Secretário-Geral do

Partido Comunista, entretanto, após a morte de Lênin, em janeiro de 1924, Stálin41

assumiu o poder (CLARK, 1991; VICENTINO, 1995).

Maiakovski (2012, p. 197-213), em seu livro-poema em homenagem ao

legado de Lênin, após o falecimento do líder revolucionário, escreve:

[...] A rua parece uma ferida vazada – doí tanto e geme forte. Aqui cada pedra conhece Lenin pelo tropel dos primeiros ataques de outubro. Aqui tudo que cada bandeira bordou foi pensado por ele e ordenado por ele. Aqui cada torre

41 Sobre Josef Stálin (1879-1953) mencionamos o livro intitulado “O que é stalinismo”, escrito por

José Paulo Netto, que discute acerca do regime político instaurado na URSS após Stálin assumir o poder (NETTO, 1985). Cabe ressaltar, que com a ascensão de Stálin ao poder, Lunatcharski é destituído do cargo de Comissário e sua atuação passa a ser no âmbito cultural, viajando pelo país com palestras, em 1932, viajou para tratamento de saúde na Alemanha. No ano, seguinte foi nomeado Embaixador da URSS na Espanha, porém falece sem assumir o posto (PRESTES; TUNES, 2017).

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ouviu Lenin, e por ele iria para o fogo e a fumaça. Aqui cada trabalhador conhece Lenin, o coração dele com ramos de pinheiros forraram. Ele levava para a batalha, e a vitória profetizava, e eis que o proletariado – é dono de tudo. Aqui cada camponês o nome de Lenin no coração inscreveu com mais paixão, do que os dos santos. Ele mandou as terras chamar de suas, um sonho dos avós, açoitados, que estão em caixões. [...] A seda das bandeiras que fluem Inclina-se com a última honra dada: “Então, adeus, camarada, você passou com honestidade seu caminho glorioso, honroso.

De acordo com Lunatcharski (2018) o homem é, essencialmente, determinado

por sua época e circunstâncias. Maiakovski vivenciou a revolução proletária, se fez

revolucionário particularmente após a Revolução bolchevique, participando

intensamente desse processo. Avançou ao encontro desse movimento; decidiu

tornar-se o “[...] poeta proletário mais completo possível. E tudo que havia de melhor

nele, de grandioso, de social, tudo o que engendrava três quartos de sua poesia e

constituía a essência do poeta, tudo isso se encaminhava efetivamente até o

proletário [...]” (LUNATCHÁRSKI, 2018, p. 189).

Os versos do poeta enaltecem a relevância, a dedicação e a luta de

Lenin em defesa dos trabalhadores, e sintetizam as ações desenvolvidas pelo

governo soviético após a Revolução de Outubro de 1917, as quais buscaram

consolidar uma sociedade comunista, um novo regime econômico, político e social,

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amparado no princípio de produzir e distribuir as riquezas elaboradoras socialmente

a todos.

Ressaltamos que a Nova Política Econômica (NEP) aumentou

significativamente a produção agrícola, superando a fome no país. Apesar das

limitações, as mudanças econômicas e políticas instituídas logo nos primeiros anos

do poder soviético, em especial no que se refere à organização de um sistema

educacional acessível a toda a população, transformaram o imenso país, com uma

economia ainda semifeudal, agrícola, e 70% da sua população analfabeta, em uma

potência econômica, industrializada, militar, científica e cultural (SAVIANI, D., 2017).

Nesse sentido, a obra “Setor de Tecelagem” (1929), composta pelo pintor Aleksandr

Samokhválov, versa sobre o desenvolvimento econômico da Rússia soviética

(Figura 7).

Figura 7 – Aleksandr Samokhválov. Setor de Tecelagem. Óleo e têmpera sobre tela. 68 x 98 cm. 1929

Fonte: 500 ANOS de Arte Russa (2002, p. 51).

A partir da década de 1920, em geral, muitos pintores soviéticos, inclusive

Aleksandr Samokhválov, tornaram recorrente o tema industrial. Os artistas se

propuseram a vários empreendimentos para a aquisição do conhecimento da vida e

para sua relação representativa na arte. O quadro (Figura 7) apresenta a produção

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têxtil, destacada no período, em duas perspectivas. O primeiro plano retrata duas

operárias trabalhando, mas as divisórias das máquinas apresentam a profundidade

da fábrica, onde, por meio de um corredor comprido, uma operária com camiseta

listrada movimenta-se ao encontro do observador. A obra expressa o avanço da

maquinaria.

No governo de Stálin, as medidas afetas à economia foram propostas por

meio da instituição de uma nova política, chamada “O Plano Quinquenal”, que

objetivava intensificar a industrialização na URSS, criar novas indústrias, e priorizar

os setores básicos da indústria pesada e da produção de energia, que constituíam o

fundamento de qualquer grande economia industrial. Assim, o governo buscava

aumentar a produção agrícola (HOBSBAWN, 2011).

Buscamos pontuar que as discussões e os conflitos estabelecidos nos

primeiros anos do poder dos bolcheviques motivaram medidas para o

desenvolvimento econômico, político e social, sobretudo as pesquisas em um país

que antes da Revolução as condições de desenvolvimento científico eram

extremamente difíceis e limitadas (U.R.S.S, 1976) afetas à Educação, à Psicologia e

à Arte, as quais visavam contribuir com a formação do homem comunista. Conforme

escreve Maiakovski (2012, p. 14), a esperança e o sonho se faziam presentes na

luta revolucionária:

No verão da comuna os anos se aquecerão, e a felicidade com o doce de frutas enormes amadurecerá nas flores vermelhas de Outubro.

Em síntese, após a Revolução de Outubro de 1917, para o desenvolvimento

do país, uma das principais tarefas defendida por Lunatcharski era possibilitar o

acesso ao conhecimento à classe trabalhadora, assim como a luta contra o

analfabetismo, a construção de escolas, formação dos docentes, a educação pré-

escolar e organização do ensino politécnico. Na próxima seção, realizamos um

levantamento da produção acadêmica afeta ao autor em investigação no período

compreendido entre 2007 a 2017.

Descrevemos, em seguida, a organização do Comissariado do Povo para

Instrução Pública (Narkompros), presidido por Lunatcharski, e os princípios da

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escola soviética e a estruturação do sistema educacional proposto por ele em defesa

da formação do novo homem comunista, amparados na ciência e na arte. Refletimos

acerca das possíveis contribuições da proposição do intelectual aos desafios

educacionais na atualidade em favor de uma educação humanizadora e

emancipadora.

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3 LUNATCHARSKI E A ORGANIZAÇÃO DA URSS: OS PRINCÍPIOS DA ESCOLA

SOVIÉTICA

Na primeira seção, discorremos sobre a origem do Império Russo, os

aspectos biográficos de Anatoli Vassilievitch Lunatcharski (1875-1933) e o cenário

soviético revolucionário, intencionando explicar que Lunatcharski foi um intelectual

que participou significativamente da luta pela construção de uma consciência

revolucionária, pela edificação de uma nova sociedade e a formação do novo

homem comunista.

Cabe ressaltar que a Revolução de Outubro de 1917, de acordo com o

historiador italiano Manacorda (2006, p. 313), “[...] levou pela primeira vez ao poder,

num vasto império, a classe operária e seu partido político, rompendo a unidade

burguesa do mundo moderno: um fato que, seja qual for o julgamento sobre ele e o

êxito atual, marca uma virada na história”.

A Revolução Soviética significou historicamente a busca por consolidar uma

sociedade comunista, um novo regime econômico e político, amparado no princípio

de produzir e distribuir as riquezas elaboradoras socialmente a todos. A Educação

era umas das fundamentais tarefas consideradas pelos dirigentes bolcheviques, o

que significava constituir uma ampla Educação da classe trabalhadora e superar o

analfabetismo (LOMBARDI, 2017).

Em síntese, “a história do Breve Século XX não pode ser entendida sem a

Revolução Russa e seus efeitos diretos e indiretos [...]” (HOBSBAWN, 2011, p. 89).

Em concordância com Chaves (2018, p. 6), “[...] nem as baixas temperaturas, nem a

fome quase absoluta impediram os soldados, trabalhadores e militantes

revolucionários, de tornar a República Socialista Soviética uma potência na indústria,

na ciência e na cultura”.

Desse modo, buscamos demonstrar que a Educação foi priorizada desde os

primeiros momentos da instauração do regime soviético. Havia a necessidade de

criar uma nova sociedade, e para tanto era fundamental uma proposta educacional

em favor da formação do novo homem comunista. Nesta seção, de modo a atender

nosso objetivo geral, apresentamos a proposta de Educação defendida por Anatoli

Vassilievitch Lunatcharski.

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Para tanto, realizamos um levantamento da produção acadêmica, teses e

dissertações, referentes ao revolucionário Lunatcharski com o intuito de responder a

uma de nossas indagações: “Há uma produção acadêmica, particularmente, teses e

dissertações, significativa sobre o autor?”, conforme anunciamos na introdução.

Na sequência, nos propomos a descrever, ainda que sucintamente, a

organização do Comissariado do Povo para Instrução Pública (Narkompros),

presidido por Lunatcharski, assim como discorremos sobre os princípios da escola

soviética e a estruturação do sistema educacional proposto por Lunatcharski (1988)

em defesa da formação do novo homem comunista, amparado na ciência e na arte.

Priorizamos neste estudo a obra “Artigos e Discursos sobre a Instrução e a

Educação” (LUNATCHARSKI, 1988), composta por quatorze trabalhos, entre artigos

e discursos, escritos entre 1918 a 1928. Os textos elucidam a relação entre a

Revolução de Outubro de 1917 e a instrução pública, seus aspectos econômicos e

políticos, e o seu conteúdo pedagógico. Em meio aos desafios e difíceis condições

dos primeiros anos do poder soviético, com o país ainda em condições de guerra

civil e fome, Lunatcharski (1988) propagou as bases do novo sistema de Educação,

elaborou os princípios para a edificação da escola comunista. Criou uma ampla rede

de Educação pré-escolar, de instrução profissional secundária e de ensino superior,

assim como instituições de ensino e de cultura. Fundamentado no método marxista,

discutiu a Educação escolar, a Educação extraescolar, o ensino politécnico, a

instrução como base da cultura e a arte. Lunatcharski (1988) enfatiza relação

indissociável entre as questões educacionais com as tarefas econômicas e políticas

do período para edificação de uma nova sociedade.

Finalizamos a seção com a reflexão sobre as possíveis contribuições da

proposição de Lunatcharski (1988) aos desafios educacionais na atualidade, em

favor de uma Educação humanizadora e emancipadora. Destacamos que a Teoria

Histórico-Cultural nos apresenta subsídios teóricos-metodológicos para refletirmos

sobre isso. Chaves (2018, p. 3) afirma que “o princípio e o conteúdo político da

educação soviética são compreendidos quando atribuímos atenção ao contexto

soviético e às defesas de sociedade que se firmavam com a Revolução Russa de

1917”. Dessa maneira, em nossa análise, os princípios políticos da Teoria Histórico-

Cultural fundamentam-se por meio da proposição educacional de Lunatcharski,

assim como de Makarenko e Krupskaia.

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Nessa perspectiva, retomamos nossa reflexão inicial acerca da necessidade

do profissional da educação se atentar às questões econômicas e políticas, pois

essa concepção de homem, sociedade e Educação se cristaliza nas ações

escolares. Desse modo, consideramos a relevância do estudo dos clássicos para a

formação de professores, inicial ou continuada, bem como as contribuições de

Lunatcharski (1988) à educação, em geral, pouco conhecidas no âmbito educacional

brasileiro, conforme tratamos a seguir.

3.1 A PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE LUNATCHARSKI NO BRASIL

Realizamos um levantamento da produção acadêmica, teses e dissertações,

relativas ao revolucionário Lunatcharski. Nessa busca, consideramos a base de

dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e

da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD), no período

delimitado de 2007 a 2017.

Localizamos um total de dois trabalhos entre dissertações e teses na BDTD.

Para refinar as buscas, inserimos na plataforma dois termos: “Lunatcharski e

Educação Soviética”. No banco de dados da Capes, realizamos as buscas de igual

forma, e encontramos 14 títulos entre teses e dissertações no referido período

(Quadro 1).

Quadro 1 – Apresentação de pesquisas localizadas nas plataformas Capes e BDTD

Plataforma de busca

Pesquisas localizadas (teses e dissertações)

Dissertações selecionadas

Teses selecionadas

CAPES 12 09 03

BDTD 02 01 01

TOTAL 14 10 04

Fonte: Elaborado pela autora e pelo GEEI (2018).

Dentre os dados localizados nessas duas plataformas, selecionamos os

trabalhos que se relacionavam com a temática a que nos propusemos estudar, pois

não encontramos trabalhos que apresentassem no título “Lunatcharski” e versassem

diretamente sobre o autor. Observamos que o número de teses que faziam menção

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aos termos da nossa pesquisa inicial era menor se comparado com as dissertações.

Assim, as temáticas que se apresentam versam sobre a Educação soviética, sendo

duas dissertações e uma tese, e o ensino politécnica, uma dissertação e uma tese

selecionadas (Quadro 2).

Quadro 2 – Análise dos resultados obtidos nas plataformas Capes e BDTD

Temática principal das pesquisas Quantidade

de Dissertações

Quantidade de

Teses 1. Educação politécnica 01 01 2. Educação soviética 02 01

TOTAL DE PESQUISAS 03 02 Fonte: Elaborado pela autora e pelo GEEI (2018).

Nos dados apresentados no Quadro 2, é possível perceber que há estudos

afetos dois temas principais, sendo a temática “Educação soviética” a de maior

número. A partir disso, foi possível perceber que as referidas pesquisas apenas

citam as elaborações de Lunatcharski no decorrer do texto, mas não apresentam

suas elaborações como objeto de estudo, como o caso de nossa pesquisa.

Verificamos, conforme o Quadro 3, que os trabalhos selecionados foram publicados

por quatro Instituições de Ensino Superior (IES).

Quadro 3 – Relação de pesquisas por Instituição de Ensino Superior (IES)

Instituição de Ensino Superior

(IES)

Autor Pesquisador e dissertações / teses orientadas

Total de pesquisas

por IES

Nara Tatiana Costa Dr. Clesio Acilino Antonio 1. Unioeste Cezar Ricardo de Freitas Dra. Ireni Marilene Zago

Figueiredo 2

2. UFF Edison Riuitiro Oyama Dr. José dos Santos Rodrigues 1

3. UFSCAR Vagno Emygdio Machado Dias Dr. Paolo Nosella 1

4. UMESP Caroline de Melo Ferreira Dr. Decio Azevedo Marques de Saes 1

Fonte: Elaborado pela autora e pelo GEEI (2018).

No Quadro 3, demonstramos que as pesquisas selecionadas foram

publicadas por quatro universidades brasileiras. Fazemos menção à Universidade

Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), a qual publicou o maior número de

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trabalhos, sendo duas dissertações orientadas pelos professores Dra. Ireni Marilene

Zago Figueiredo, em 2009, e Dr. Clesio Acilino Antonio, em 2016.

Diante dos dados sistematizados, detalhamos mais elementos dos trabalhos

selecionados. Iniciamos pelas pesquisas da Unioeste, na dissertação intitulada “O

Escolanovismo e a Pedagogia Socialista Na União Soviética no início do século XX e

as concepções de Educação Integral e Integrada” (FREITAS, C., 2009), cujo objetivo

é apresentar as propostas de Educação Integral e Integrada nos teóricos da União

Soviética e em John Dewey. No que se refere aos intelectuais russos, priorizou os

escritos de Lênin (1976; 1977), Krupskaia (19--), Pistrak (1977) e Makarenko (1977;

1981). No texto, menciona apenas Lunatcharski como Comissário do Povo para

Instrução Pública e não discute sua defesa educacional para a organização do país.

A dissertação “O Colégio Agrícola de Francisco Beltrão e os desafios da

Educação Politécnica” (COSTA, 2016) tem como objetivo geral analisar os desafios

da educação politécnica no contexto do Colégio Agrícola Francisco Beltrão, PR.

Para tal, fundamenta-se nas pesquisas de Marx e Engels (1993; 2004); intelectuais

soviéticos, como Lunatcharski, Pistrak e Shulgin e autores contemporâneos, a

exemplo Dermeval Saviani, Nosella, Manacorda, entre outros. Ao tratar da

especificidade da Educação Politécnica, a autora atribui especial atenção aos

escritos de Lunatcharski (1988) sobre essa temática, e discute, particularmente na

segunda seção, o conceito de politecnia defendido pelo revolucionário.

No que se referem aos trabalhos da Universidade Federal de São Carlos

(UFSCAR), citamos a tese intitulada “A Educação Integrada e a profissionalização

no Ensino Médio” (DIAS, 2015) cujo objetivo é analisar a Educação Integral no

Brasil, amparada nas elaborações de Marx (1996; 2010; 2011), Gramsci (1982;

2004; 2005; 2011), Lênin (1977; 1981), Krupskaia (1978) e Lunatcharski (2002). O

autor também discute o ensino politécnico na concepção dos intelectuais soviéticos,

em especial, na primeira seção. Desse modo, explica o posicionamento de

Lunatcharski, o qual defende a escola única do trabalho e os princípios do ensino

soviético.

A dissertação “As contribuições dos Educadores Bolcheviques na

concretização de Políticas Educacionais na Educação Soviética” (FERREIRA, 2014),

publicada pela Universidade Metodista de São Paulo, examina a Educação soviética

e seus educadores que contribuíram para a edificação de uma sociedade comunista

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no período compreendido entre 1917 a 1930. Estuda, particularmente, a proposição

educacional defendida por Pistrak (2011), Krupskaia (19--) e Lunatcharski (1988).

A tese “Lenin, educação e revolução na construção da república dos sovietes”

(OYAMA, 2010), desenvolvida na Universidade Federal Fluminense, também faz

referência a Lunatcharski ao investigar a temática educação escolar e revolução

social na Rússia, após a Revolução de 1917, examinando os objetivos e ações de

Lênin no âmbito educacional, o que constitui o objetivo da pesquisa.

Verificamos, nesse levantamento, que apesar da menção a Lunatcharski, os

trabalhos selecionados não versam sobre os aspectos biográficos do revolucionário,

a proposição educacional defendida pelo autor para a organização soviética e suas

contribuições para refletirmos a Educação na atualidade. Da mesma forma, vale

enunciar, conforme Chaves (2018), no tocante aos escritos da História da Educação

ou da Pedagogia, a elaboração de Lunatcharski é praticamente anulada. São raras

as referências aos estudiosos russos, incluindo Krupskaia e Makarenko, por

exemplo.

Sendo assim, constatamos que o fato de não haver produção acadêmica,

dissertações e teses, que versam detidamente sobre a vida e obra de Lunatcharski,

no Brasil, sobretudo em relação ao período desta pesquisa, reafirma a pertinência

do estudo ora desenvolvido.

3.2 A ORGANIZAÇÃO DO COMISSARIADO DO POVO PARA INSTRUÇÃO

PÚBLICA

Nesta subseção, descrevemos, ainda que sucintamente, a organização do

Comissariado do Povo para Instrução Pública, cuja abreviatura é Narkompros

(Narodnyi Komissariat Prosveshcheniya). Buscamos discutir elementos que

contribuam para a compreensão do desenvolvimento da política cultural e artística, a

educação defendida no contexto soviético, o projeto educacional em curso e a

concepção de sociedade e homem que se intencionava formar.

O Narkompros, substituindo a antiga estrutura ministerial, conforme

assinalamos, sob a presidência de Anatoli Lunatcharski, que atuou nessa posição

até 1929, substituído por A. S. Bubnov (1884-1938) durante o governo de Stálin,

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tinha como tarefa organizar as questões relativas à cultura e à instrução, o sistema

educacional do país e as bases da nova escola soviética. As primeiras atribuições de

Lunatcharski consistiram em reunir os membros que comporiam o Comissariado e

ocupar o espaço físico do antigo Ministério de Educação Pública, fato que ocorreu

no dia 18 de novembro de 1917 (FITZPATRICK, 1977; FREITAS, 2009).

Eram membros Krupskaia, Pokrovski (1868-1932) nomeado adjunto do

presidente, Lepshinskiy (1868-1944). Posteriormente, participaram intensamente das

primeiras medidas, juntos aos educadores mencionados: P. P. Blonskiy (1884-1941);

L. Menzhínskaia (ano) S. T. Shatskiy (1878-1934); A. P. Pinkevich (1883-1937); A.

G. Kalashinikov (1893-1962) e M. M. Pistrak (1888-1937). Após 1931, figura a

participação de A. S. Makarenko (1888-1939), embora, desde o início da revolução,

trabalhasse com as questões educacionais na Ucrânia (FREITAS, 2009).

Krupskaia, como pontuamos, era a essência do Comissariado, e segundo

Lunatcharski, teve atuação fundamental em sua organização. Pokrovski, que fora

membro do grupo Vperiod e tinha contribuído na organização das escolas de Capri e

Bolonha, se tornou vice-comissário em maio de 1919. Além dos seus referidos

companheiros de militância, contribuíram significativamente os artistas e escritores

como Maiakovski, Meierhold42 (1874-1940) e Blok43 (1880-1921), assim como o

movimento de cultura proletária, representado pela Proletkult44 (ESTEVAM, 2018).

42 Vsevolod Meierhold “foi diretor e produtor teatral russo cujo trabalho experimental no Teatro de

Arte de Moscou teve importância duradoura. Membro do Partido Bolchevique, corajosamente se se recusou a equiparar cultura revolucionária aos limitados conceitos de naturalismo e realismo. Foi um dos precursores do ‘teatro do absurdo’, usando cenários construtivistas e insistindo para que os atores minimizassem o próprio envolvimento subjetivo” (LANDSBER, 2007, p. 233).

43 Aleksándr Blok foi “filólogo, ensaísta, dramaturgo e o maior dos poetas simbolistas russos. No fim da vida, adotou procedimentos do cubismo e do futurismo em seus escritos” (LANDSBER, 2007, p. 219).

44 Lunatcharski (2018) em seu ensaio intitulado “O proletkult e o trabalho cultural soviético”, publicado pela primeira vez no jornal Izvestia, n. 80, em 13 de abril de 1919 e reeditado na revista Proletarskaja kultura (Cultura Proletária), n. 7/8, trata sobre o significado e a função desta da referida organização, temática discutida na I Conferência das Organizações Proletárias Culturais e de Educação que ocorreu sob presidência de Lunatcharski, em 16 a 19 de Outubro de 1917, em Petrogrado, dias antes da Revolução. O intelectual afirmava que o Proletkult tinha suas tarefas definidas e delimitadas, o qual não deveria substituir ou romper com os valores culturais das épocas anteriores, “[...] o proletariado deve ter plena propriedade da cultura universal; é uma classe histórica, precisa progredir em relação a todas as passadas. Menosprezar a ciência e a arte do passado sob pretexto de que elas são burguesas é tão absurdo quanto, sob o mesmo pretexto, jogar fora as máquinas das fábricas ou as estradas de ferro” (LUNATCHARSKI, 2018, p. 58); assim como não cabe ao Proletkult se preocupar com os órgãos da “formação humana”, mas sim, de acordo com autor (2018, p. 59) “[...] precisa concentrar sua total atenção no trabalho dos estúdios, encontrar e fomentar novos talentos entre o proletariado, na formação de círculos de escritos, pintores e artistas gráficos, jovens cientistas de todo tipo da classe trabalhadora, [...] na tarefa indispensável de desenvolver, sem arrogância e pretensão, uma semente livre e descontraída, que esteja na alma proletária”.

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Em 30 de novembro de 1917, em uma reunião presidida por Lunatcharski, em

que convoca os artistas, Maiakovski foi o primeiro a declarar, conforme consta na

ata: “Devemos saudar o novo governo e entrar em estreito contato com ele”

(MAIACOVSKI, 1987, p. 21). O poeta, que participou intensamente das ações

revolucionárias, escreveu:

Quando eu, Resumindo o passado, Remexo nos dias de ontem Procurando o mais vivo, Recordo sempre O vinte e cinco de outubro, O primeiro dia (MAIACOVSKI, 1987, p. 21-22).

Lênin acompanhava atentamente a organização do Comissariado,

interessava-se pelas as questões afetas à instrução pública, assistindo, em geral, a

todas as conferências sobre educação, até 1922. Tinha frequentes contatos com

Lunatcharski sobre os assuntos educativos e, em 1921, recebia informes telefônicos

diários de Litkens (1888-1922), encarregado da reorganização do Narkompros

(FITZPATRICK, 1977). O líder revolucionário ressaltava:

Há, no Comissariado de Instrução, dois camaradas [...] com tarefas de características especiais. São o comissário camarada Lunacharski, que exerce a direcção geral, e o seu suplente, o camarada Pokrovski, que faz parte da direcção primeiro como vice-comissário e depois como conselheiro obrigatório (e dirigente) sobre questões científicas e problemas do marxismo em geral. Todo o Partido, que conhece bem os camaradas Lunacharski e Pokrovski, está naturalmente convencido de que se trata, de certo modo, de ‘especialistas’ do Comissariado do Povo para a Instrução Pública (LENINE, 1977, p. 67).

A tarefa organizacional central do Narkompros era a administração do sistema

escolar, e durante a guerra civil, enfrentou constantes limitações, mas também

obteve significativos êxitos. O Comissariado elaborou os princípios da educação

soviética e criou uma significativa quantidade de jardins de infância e uma rede de

escolas experimentais e colônias infantis. Subsidiou as artes com critérios liberais,

que favoreceram o desenvolvimento da arte experimental e vanguarda, e

concomitantemente impediram a perseguição aos conservadores (FITZPATRICK,

1977).

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Nos primeiros anos de atuação do Comissariado, de acordo com Lombardi

(2017), dentre os desafios enfrentados se destacavam: o combate ao analfabetismo;

a organização cultural, como de museus e bibliotecas populares; a formação dos

professores e da juventude soviética; a criação de uma imprensa a serviço da

educação; a relação entre o ensino e o trabalho, entre outros. Para tal, as ações

deveriam ser amparadas no marxismo, o que, consequentemente, implicava na

necessidade de romper com a herança da antiga escola czarista, com a moral

burguesa e a resistência dos professores conservadores, formados sob o velho

regime.

A partir disso, Lunatcharski, segundo Fitzpatrick (1977), considerava algumas

questões fundamentais para a organização do Narkompros, como, por exemplo,

definir os fundamentos educativos para o ensino. Os aspectos que se destacavam

eram o desenvolvimento infantil, especialmente do processo de criação, suas

relações sociais e a ampliação do plano de estudos, com a educação física e

estética, assim como a preparação de habilidades e ofícios manuais; a cultura e a

ciência; e o princípio de igualdade de oportunidades educativas.

O Comissariado defendia que o sistema educativo deveria oferecer

possibilidades ao filho de um operário industrial ser operário em uma fábrica ou

diretor de uma indústria ou membro da Academia de Ciências, sem que a escolha

profissional fosse limitada desde a tenra idade. Desse modo, deveria ser

desenvolvida a Escola Única do Trabalho, a qual, de acordo com o programa do

Narkompros, era baseada no ensino politécnico, e discutia sobre o ensino Extra-

Escolar, conforme tratamos em detalhes adiante.

As Universidades, a Academia de Ciências, os institutos de investigação científica e os teatros se mantiveram abertos com a supervisão estatal e sem excessivas interferências do Narkompros [...]. As bibliotecas públicas, os museus e as coleções de arte foram protegidas e se abriram ao público45 (FITZPATRICK, 1977, p. 11, tradução nossa).

Os princípios educativos elaborados pelo Narkompros em 1918 foram

aprovados pelo governo soviético. O período da guerra civil para o Narkompros foi

45 “Las Universidades, la Academia de Ciencias, los institutos de investigación científica y los teatros

se mantuvieron abiertos con subvención estatal y sin excesivas interferencias del Narkomprós [...]. Las bibliotecas públicas, los museos y las colecciones de arte se protegieron y abrieron al público” (FITZPATRICK, 1977, p. 11).

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um momento de implicações práticas limitadas, no entanto de intensas esperanças.

Para o Comissariado, em especial para Lunatcharski, os novos jardins de infâncias

eram “espaços cheios de alegria, da luz da manhã que anuncia o futuro socialismo,

pontos luminosos do futuro pelo qual lutamos, contra o cenário de fundo cruelmente

coloreado pela guerra”46 (FITZPATRICK, 1977, p. 14-15, tradução nossa).

As atividades principais desenvolvidas pelo Comissariado, como

asseveramos, eram afetas à educação, propaganda e artes. De acordo com

Mariátegui (2012), Lunatcharski assumiu a árdua tarefa de Comissário, o qual, além

das questões educacionais, se preocupava em preservar todas as relíquias da Arte

russa. Logo após a tomada do poder bolchevique, divulgou-se a notícia, em

Petrogrado, que as igrejas do Kremlin e a Catedral de São Basílio haviam sido

bombardeadas e destruídas pelas tropas da revolução. Diante disso, o intelectual

renunciou a seu cargo. Lunatcharski, em 03 de novembro de 1917, declarou:

Camaradas: Vocês são jovens mestres do país e, embora tenham muito o que fazer e pensar, devem saber como defender seus tesouros artísticos e científicos. [...] É particularmente terrível, nestes dias de luta violenta, de guerra destruidora, ser o Comissário do Povo para a Educação Pública. Apenas a esperança na vitória do socialismo, fonte de uma nova e superior cultura, traz algum conforto. Sobre mim pesa a responsabilidade de proteger a riqueza artística do povo [...] não podendo permanecer em meu posto, onde eu não tinha influencia, eu me demiti. Meus camaradas, os demais comissários, consideraram minha demissão inadmissível. Permanecerei portanto em meu posto [...] além disso, compreendo que o dano infligido ao Kremlin não é tão sério como se pensou a princípio [...] Mas, camaradas, peço seu apoio [...] Preservem para vocês e seus descendentes a beleza de nossa terra; sejam os guardiões da propriedade do povo. Em pouquíssimo tempo [...] os que têm sido mantidos na ignorância por tanto tempo, despertarão e compreenderão que magnífica fonte de prazer, força e sabedoria é a arte [...] (LUNATCHARSKI, 2017b, p. 383-384).

Lunatcharski recebeu a informação que a notícia era falsa, fato que lhe

fortaleceu para permanecer em seu posto. A igreja de São Basílio nada sofrera nas

jornadas da Revolução em Moscou. Trotski (2007, p. 210) afirmou que nenhum outro

intelectual poderia substituir Lunatcharski em sua função, o qual “[...] Mostrou a todo

o mundo fechado, com entusiasmo e sem dificuldade, que os bolcheviques não só

46 “rincones llenos de alegría, llenos de la luz de la mañana que anuncia el futuro, socialismo; puntos

luminosos del futuro por el que luchamos, visibles contra el crepúsculo, contra el telón de fondo cruelmente coloreado por la guerra de nuestra atormentada pátria” (FITZPATRICK, 1977, p. 14-15).

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respeitavam a cultura, mas procuravam conhecê-la”. O comissário, segundo Lênin

(1968) e Trotski (2007), defendia que a arte do passado deveria ser preservada e a

partir dela desenvolver uma cultura proletária. Desse modo, movia todos os esforços

para possibilitar o acesso da população à arte.

No que se refere à estruturação do Narkompros, houve diversas

configurações ao longo do período da Guerra Civil na Rússia até a NEP (1917-

1922). A organização que se constituiu a princípio foi a criação de alguns

departamentos sob coordenação de Lunatcharski. No tocante às questões artísticas,

foram criados os seguintes departamentos: Literatura (LITO), Música (MUZO),

Teatro (TEO) e Artes Plásticas (IZO).

O Departamento de Teatros (TEO) foi instituído em janeiro de 1918.

Meierhold foi nomeado por Lunatcharski para assumir as tarefas na seção de

repertório, história do teatro e pedagogia do departamento. Com a divisão do TEO –

Moscou e Petrogrado, no outono de 1918, o encenador Meierhold dirigiu o de

Petrogrado. “Em 1922, há uma nova reestruturação, fundindo vários ateliês, que

resulta no Instituto de Arte Teatral (GITIS), também conduzido por Meierhold”

(ESTEVAM, 2018, p. 32), o qual, em 1923, forma o Teatro Meierhold (TIM).

Lunatcharski (2018, p. 108) reafirmava a necessidade de conservar, melhorar

e disponibilizar para os trabalhadores os teatros do passado, assim como mobilizar

esforços para aprimorar e aumentar significativamente os estúdios de formação para

um novo ator revolucionário. “[...] Faremos de tudo para que esses estúdios,

aproximando-se o mais possível do ambiente amador, acolham em suas fileiras os

melhores elementos de diversos meios, entre proletários e camponeses”. O

comissário asseverava:

Eis a política que perseguimos, seja no teatro, seja em todo o campo artístico, não sem algumas dificuldades, visto que o número dos personagens capazes de compreender essa política e de realizá-la não é assim muito grande, mas é a política à qual, repito, não posso em sã consciência renunciar, nem por um instante (LUNATCHARSKI, 2018, p. 109).

A política mencionada por Lunatcharski (2018) reafirmava, no que diz respeito

às questões artísticas, seja no teatro ou na música (MUZO), por exemplo, sua

preocupação com o processo de apropriação do proletariado ao conjunto da cultura

humana historicamente elaborada. O Comissário afirmava que não permitiria abolir

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as universidades ou silenciar nas salas de concerto expoentes como Beethoven

(1770-1827), Schubert (1797-1828), Tchaikovsky, dando ordem apenas para que

tocassem um repertório oriundo da arte proletária.

O LITO objetivava atuar, em geral, estabelecendo relações entre o governo e

a literatura, apoiar os grupos literários e organizar as publicações. Lunatcharski

presidia o departamento, o vice-presidente era o poeta Valeri Brisusov, os membros

da direção Serafimóvich, Ivanov, Gorki, Blok, Baltrushaitis e Gerasimov ou Kirilov,

em representação a Proletkult.

Em 1918, foi organizado o Departamento de Artes Plásticas (IZO), criada a

revista Arte da comuna, publicada em Petersburgo entre dezembro de 1918 e abril

de 1919. O IZO organizou debates, formações em ateliês47, exposições, como a

Primeira Exposição Livre do Estado, em abril de 1919, reunindo 299 artistas. Suas

ações incluíam a criação de museus e institutos de pesquisa artística, compra de

obras, publicações de livros sobre a História da Arte, organização de conferências

destinadas aos trabalhadores, decoração de espaços públicos, ilustrações de livros,

o financiamento de produções cinematrográficas, entre outras (ESTEVAM, 2018;

NUCCI, 2010).

Entre as diferentes tendências artísticas que compunham o departamento

havia relações de contradições, particularmente por parte dos futuristas, que, por

vezes, se opunham às políticas de Lunatcharski afetas à preservação da herança

cultural e patrimônios do passado (ESTEVAM, 2018).

A arte, de acordo com Lunatcharski (1975, p. 97) reflete, por meio da

subjetividade, a vida social da humanidade. Nas palavras do intelectual, “a arte é a

gigantesca canção da humanidade sobre si mesma e sobre a sua circunstância. É,

cabalmente, uma lírica e fantástica autobiografia da nossa espécie”. Assim, a cultura

do passado deve pertencer à classe trabalhadora. Nesse aspecto, o comissário se

posiciona:

[...] Como é natural, as massas socialistas ascenderão os seus próprios faróis, ascenderão o seu próprio sol; mas, a herança do passado representa – especialmente agora – um tesouro tão gigantesco que ninguém pode deixar de se indagar quando se observa que qualquer demagogo, consciente ou inconsciente, sem

47 No tocante aos estudos sobre os ateliês artísticas criados após a Revolução de Outubro de 1917

mencionamos a tese intitulada “Arte, Ensino, Utopia e Revolução: os ateliês artísticos Vkhutemas/Vkhutein (Rússia/URSS, 1920-1930)” (MIGUEL, 2006).

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reflectir a fundo sobre o assunto, quer ocultar esta grande herança dos olhos do operário e do camponês e convencê-los da necessidade de desviar os olhos unicamente para a mísera tocha que se ascendeu recentemente no campo da arte (LUNATCHARSKI, 1975, p. 99).

Lunatcharski (1975) afirmava que a sua preferência artística, dos membros do

comissariado ou dos representantes do regime soviético, não deveria ser tomada em

consideração, haveria de se permitir o desenvolvimento de diferentes orientações e

grupos artísticos, assim como não se deveria permitir que uma perspectiva

eliminasse a outra. Sendo assim, não há nenhum impedimento que o regime dos

operários e camponeses apoiasse os inovadores excluídos pelos antigos poderes.

Ressaltou que os futuristas foram os primeiros a apoiar a revolução, reconhece suas

capacidades organizativas, a atuação em ateliês e os processos de formação,

contudo faz ressalvas sobre as pretensões do referido grupo e, em concordância

com Lênin no que diz respeito à defesa da arte do passado, declarou que:

Partindo destes princípios, o Comissariado Popular de Educação dedica muitos cuidados e trabalhos à conservação intacta de objectos de tradições, nos quais palpita o passado e através dos quais a arte das grandes épocas artísticas pode influir na grande época em que estamos a entrar (LUNATCHARSKI, 1975, p. 99).

Lênin (1968, p. 47) reafirmava ser necessário se apropriar da cultura antiga,

herança do capitalismo e, a sua base, desenvolver o comunismo. “[...] É preciso

apossar-se de tôda a ciência, de tôda técnica, de todos os conhecimentos, de tôda a

arte. Sem isso não podemos edificar a vida da sociedade comunista”. Isto é, tornar

do novo homem, em especial, da classe trabalhadora a ciência e a arte oriundas do

capitalismo, que eram acessíveis somente aos ricos, à minoria. Ressaltava em seus

diálogos com Lunatcharski que, sendo Comissário do Povo, e autoridade no que se

refere à arte, deveria procurar expor os princípios soviéticos por meio de seus

artigos e intervenções públicas.

Lunatcharski (1968, p. 189), em suas recordações sobre Lênin a respeito da

cultura e da arte, escreveu que em determinada ocasião, em um diálogo reservado

pediu a Lênin recursos para a manutenção dos tetros experimentais. Sua resposta

foi: “Que os teatros experimentais se mantenham durante êstes tempos de fome à

base de determinado entusiasmo. É necessário aplicar todos os esforços para que

não afundem os alicerces básicos de nossa cultura [...]”. De acordo com

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Lunatcharski, as principais preocupações de Lênin eram que não deixassem de

existir os museus que conversavam valores colossais e que os especialistas da arte

não passassem fome ou emigrassem. Era preciso defender o que havia de mais

eficiente, particularmente no que diz respeito à técnica da arte velha.

Ao tratar do poder soviético e dos monumentos do passado, Lunatcharski

(2017d), em seu texto jornalístico resultante de uma conferência pronunciada em

1919, afirma a preocupação do Comissariado na conservação dos museus, palácios,

grandes propriedades senhoriais e igrejas, obras de arte e monumentos antigos do

país. Menciona que mesmo no período de guerra e combates revolucionários alguns

bens artísticos tenham perecido, não se pode compará-los à destruição dos bens

culturais de alguns países burgueses, que ocorreu em maior proporção.

O comissário afirmou que o Departamento de Conservação de Monumentos

Históricos e Obras de Arte possui agentes que, com o auxílio dos camponeses e

trabalhadores da intelligentsia, velam por todo o patrimônio popular, isto é, pelos

bens artísticos não apenas em São Petersburgo, Moscou e redondezas, mas

também nas províncias, por vezes nas mais remotas (LUNATCHÁRSKI, 2017c). No

que se refere aos museus, explica:

[...] eles se encontram na mais exemplar ordem e funcionam sob chefia dos melhores museólogos; eles foram extremamente enriquecidos graças à transferência para lá de todo tipo de obras de arte e monumentos históricos oriundos de palacetes rurais e mansões senhoriais (LUNATCHÁRSKI, 2017c, p. 275).

Os palácios, museus, galerias de artes, antes não disponíveis ao público,

após a revolução bolchevique foram abertos para a apreciação das massas

populares e dos estudantes. De acordo com Lunatcharski (2017c, p. 276), os

palácios serviam para os mais variados objetivos. Como exemplo, o Palácio de

Inverno foi transformado em um palácio das artes. “Em suas gigantescas e luxuosas

salas [...] vocês sempre encontrarão uma multidão que escuta excelente música,

concerto do coro estatal e da orquestra estatal ou que assiste a uma sessão de

cinematógrafo ou espetáculos especiais” (LUNATCHÁRSKI, 2017c, p. 276). Outro

exemplo é a Catedral de São Basílio, em Moscou, conforme a obra do pintor

Aleksandr Guerásimov elucida (Figura 8):

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Figura 8 – Aleksandr Guerásimov. Moscou. Catedral de São Basílio. Óleo sobre tela. 164 x 184 cm. 1947

Fonte: RADIANTE PORVENIR (2018, p. 72).

A Catedral de São Basílio, monumento da arquitetura russa do século XVI,

localizada na Praça Vermelha de Moscou, após a Revolução de Outubro de 1917,

conforme retratada na Figura 8, se configurou em museu, sendo um dos principais

locais para as homenagens, manifestações festivas e outros eventos soviéticos do

período em questão.

Outros palácios foram transformados em museus, como Palácio de Tsárskoie

Seló de Catarina e, ao lado dele, o de Alexandre, nos quais a história do período

czarista é acessível aos trabalhadores e aos estudantes que chegavam à

Petersburgo em multidões. “Estamos fazendo o possível para transformar as

exposições e os museus em verdadeiras fontes de conhecimento, acompanhando-

os com aulas, dando a todo grupo de visitantes um instrutor-guia especial”

(LUNATCHÁRSKI, 2017c, p. 276).

De acordo com Mariátegui (2012, p. 103), os museus públicos se

enriqueceram com as obras, quadros, esculturas e relíquias de coleções

particulares, as quais eram, em geral, “[...] monopolizadas pela aristocracia e

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burguesia russas, em seus palácios e em suas mansões, são exibidas agora nas

galerias do Estado. Antes, eram um luxo egoísta de casta dominante; agora, são um

elemento de educação artística do povo”. O poema intitulado “Maravilhoso”, escrito

em 1927 por Maiakovski, representa as atividades culturais realizadas nos museus:

[...] Nos muros do palácio, fixava um cartaz: “Terça-feira próxima Uma palestra Do camarada Maiacovski” Aqui mesmo, ali ao lado, O czar em pessoa Corria de sala em sala, De bilhar em bilhar. Aqui onde o Romanov Tapeando os jogadores Suas bolas alojava, Sob aplausos do seu séquito, Aqui falo eu aos camponeses Sobre a forma dos versos E sobre seu conteúdo. [...] Aquele que dos Sovietes duvida, Que venha comigo E ficará ébrio de felicidade. Onde já se viu isso: Num palácio [...] ler O que? Versos! Para quem? Para mujiques! (MAIACOVSKI, 1987, p. 182-183).

O Palácio de Livadia, na Criméia, foi a casa de verão do último czar russo,

Nicolau II. Após a Revolução de Outubro, foi transformado em museu e aberto ao

público para apreciação das atividades culturais em curso. No poema em questão, a

expressão “mujiques” utilizada pelo autor era a denominação dada aos camponeses.

Dessa forma, o Narkompros defendia que as exposições e museus fossem um meio

de conhecimento, isto é, educação para a classe trabalhadora.

No que se refere à educação, o intuito era possibilitar o acesso ao

conhecimento à classe trabalhadora. Desse modo, no dia 09 de novembro de 1917

foi criada no Narkompros a Comissão Governamental de Educação, a qual

compreendia os departamentos de Luta Contra o Analfabetismo (Likbez);

Construção de Escolas; Formação de Professores; Educação Pré-Escolar;

Assistência Técnica; Escola Única do Trabalho, organização do ensino politécnico,

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medicina e higiene escolar; Educação Política (Glavpolitprosvet); Científico-

Pedagógica. “Em muitos campos foi preciso começar do zero” (U.R.S.S., 1976, p.

85). Isto é, as bases educacionais não foram reformadas, mas sim criadas.

A prioridade do Narkompros era desenvolver e estruturar uma significativa

campanha de alfabetização (Likbez). Em 1918, foi assinado o decreto “Sobre a

mobilização dos que sabem ler e escrever”, no qual a população culta era

responsável com o trabalho de instrução geral. E em dezembro de 1919, Lênin

assinou o decreto “Sobre a liquidação do analfabetismo entre a população da

R.S.F.S.R.”, o qual estabelecia que toda a população, entre 8 a 50 anos, que não

eram alfabetizada seria obrigada a aprender ler e escrever ou na língua russa ou em

sua língua materna, conforme optasse (U.R.S.S., 1976).

O governo não somente determinou que a população estudasse, mas

possibilitou as condições necessárias para tal. Capriles (1989, p. 30) declara que “a

jornada de trabalho foi reduzida em duas horas diárias, com a completa conservação

do salário [...]”. Dessa forma, nas fábricas, salas de leitura se criam escolas e

círculos de estudos, aos jovens e adultos, assim como um número significativo de

instituições noturnas de ensino (U.R.S.S., 1976).

Cabe ressaltar que o país estava em um período de luta em busca de suprimir

a miséria e a fome. Krupskaia escrevia ser preciso talhar os lápis à faca, estudar

sem manuais, sem papel nem tinta e, por vezes, à luz de vela. O governo dos

Sovietes tinha de economizar em tudo para conseguir superar as ruínas de forma

breve; as fábricas, as minas, os caminhos de ferro foram destruídos durante os anos

de guerra. Apesar disso, o governo conseguia aumentar os recursos destinadas à

educação, em especial à alfabetização.

No final da guerra civil na Rússia, reduziram-se as despesas com a

manutenção dos navios, economias atribuídas ao Narkompros. Além dos recursos

financeiros, em 1921, o Conselho dos Comissários do Povo efetivou um decreto

“Sobre as medidas a tomar para melhor o estado material das escolas e de outros

estabelecimentos de ensino”, o qual foi significativo para desenvolver a infra-

estrutura escolar (U.R.S.S., 1976).

Lênin (1981) considerava a instrução pública parte integrante da luta por uma

sociedade comunista. No discurso pronunciado no I Congresso de Instrução Pública

de Toda a Rússia, em 28 de agosto de 1918, o revolucionário expôs sua defesa:

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Os trabalhadores aspiram ao saber porque este é necessário para a vitória. Nove décimas partes das massas trabalhadoras compreenderam que o saber é uma arma na sua luta pela emancipação, que os seus reveses se devem à falta de instrução e que agora depende deles torná-la efetivamente acessível a todos. A nossa causa triunfará porque as próprias massas se entregaram à construção da nova Rússia, da Rússia socialista. Aprendem por experiência própria, aprendem com os seus reveses e enganos e vêem como é necessária a instrução para o desenlace vitorioso da luta que travam. Apesar da aparente desordenação de muitas instituições e do júbilo dos intelectuais sabotadores, vemos que a experiência da luta ensinou as massas a decidirem por si mesmas o seu destino. Todos os que simpatizam com o povo não em palavras, mas em actos, os melhores homens do magistério virão em nosso auxílio, e nisso vemos uma garantia segura de que a causa do socialismo vencerá (LÉNINE, 1981, p. 61, grifos nossos).

A tarefa principal era a “liquidação do analfabetismo” da população, sobretudo

a adulta. O elemento mais relevante para realização da revolução cultural,

corroborando Lênin, era a escola, a qual deveria estar intimamente relacionada à

vida, proporcionar uma rica instrução geral amparada na ciência, formar uma

juventude com elevado nível cultural e ideológico, capaz de se apropriar dos

conhecimentos desenvolvidos historicamente pela humanidade para edificar o

comunismo. O intelectual pondera que “As tarefas poderiam definir-se com uma só

palavra: aprender” (LÉNIN, 1981, p. 80).

As instituições educacionais buscavam possibilitar a todos o acesso ao

conhecimento, não mais como um privilégio ou restrição à admissão no que se

refere à nacionalidade e por ser homem ou mulher. O ensino laico foi estabelecido

imediatamente após a Revolução de Outubro de 1917. A essência das instituições

educativas, desde a escola primária ao ensino superior, era a formação do novo

homem comunista. Sendo assim, a escola e o trabalho estavam intimamente

relacionados.

Conforme Chaves (2018) Krupskaia, com seus estudos criteriosos relativos ao

fundamento teórico-metodológico e ao propósito educacional de diferentes países,

posicionou-se em relação a uma das proposições de maior evidência no século XX:

a Escola Nova. A partir da análise dos estudos de Dewey (1959; 1971; 1978), a

pedagoga afirmou que se estivesse em discussão a escola convencional, a Escola

Nova poderia ser considerada “um passo adiante”, afirmação que não a torna

defensora de tal perspectiva, ao contrário, pontua que “essa escola absolutamente

não é escola que a classe operária quer” (KRUPSKAIA, 2017, p. 55), isto é, o

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fundamento e o princípio político não se adequavam com a sociedade comunista

que se buscava consolidar, estavam em defesa a Escola do Trabalho. Sobre essa

questão, Chaves (2018, p. 13) afirma:

A utilidade do ensino formal, isto é, a utilidade da escola, para ser devidamente compreendida, é necessário relembrar que devemos considerar o princípio político em constituição e que deveria ser o principal elemento da Educação das Repúblicas Soviéticas. Devemos levar em conta que o mais relevante intento da Revolução após 1917 era a instituição da Escola do Trabalho.

O Narkompros defendia o desenvolvimento da Escola do Trabalho em busca

de contribuir com a edificação do comunismo, a qual não seria esvaziada de Arte, por

exemplo, e que a ciência não se desvinculasse do cotidiano, isto é, que o ensino

tivesse sentido e significado na formação de crianças, jovens e adultos, trabalhadores,

amparada no princípio, em especial, de coletividade (CHAVES, 2018).

O sistema de Instrução Pública organizado pelo Narkompros compreendia as

instituições pré-escolares; as escolas primárias e secundárias; e os

estabelecimentos de ensino superior (universidades e institutos). Também era

composto pelas diferentes instituições extraescolares para crianças e adolescentes,

e organizações culturais para jovens e adultos. Dessa forma, permitiu que os “[...]

filhos de operários e camponeses estudassem, reforça sistematicamente o potencial

intelectual do país através de uma contribuição de novas forças saídas do povo e dar

aos trabalhadores a possibilidade real de se desenvolverem” (U.R.S.S., 1976, p. 96).

Nesse período, primeiros anos do socialismo, o país ainda em condições de

guerra civil e fome, foram realizadas providências para a garantia de vida e cuidados

com a saúde, particularmente das crianças48. A primeira iniciativa foi ampliar a rede

de educação infantil, sendo considerada parte do sistema de educação, como

primeiro estágio de formação do novo homem comunista, e a formação de quadros

para atender as crianças. “A experiência de Anton Semionovitch Makarenko em uma

colônia para crianças abandonadas na Ucrânia tornou-se referência para os

profissionais da educação” (PRESTES, 2012, p. 13).

48 “[...] Até a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), havia na Rússia tsarista mais de 2 milhões e

meio de crianças abandonadas. A situação agravou-se ainda mais durante a guerra, nos anos de intervenção e da guerra civil. Para abrigar as crianças e protege-las de degradação física e moral, começaram a ser criadas as casas da criança, que até o início de 1921 já somavam 5 mil unidades que atendiam a 260 mil crianças órfãs ou abandonadas. No ano seguinte, o número cresceu para 7.815 casa, com 415 mil crianças abrigadas” (PRESTES, 2012, p. 13).

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Em 7 de novembro de 1917, criou-se o departamento Pré-Escolar, conforme

mencionamos, que passou a integrar o sistema de educação, cientificamente

organizado, como o primeiro período de formação do novo homem. Os dados

estatísticos, segundo Prestes (2012, p. 13), revelavam em seus registros o

atendimento às crianças e seu imediato crescimento, em 1923: “havia 913

instituições que atendiam a 44.164 crianças; em 1927, já eram 1.373 instituições

atendendo a 70.930 crianças”. A partir do final de 1920 250.000 crianças

frequentavam os jardins de infância, creches e os infantários (U.R.S.S., 1976).

Foteeva (1986) expõe que, mesmo em condições de miséria e fome nos

primeiros anos soviéticos, a luta se efetivou com a criação de uma ampla rede de

creches e jardins infantis à medida que se estabelecia relação com o

desenvolvimento da economia e o processo de emancipação da mulher, a sua

atuação econômica e política. As instituições infantis se configuravam como estatais,

laicas e acessível a todos. O número de instituições pré-escolares aumentou

significativamente nos anos posteriores:

Por volta de 1969, a U.R.S.S. tinha mais de 75 000 jardins de infância e creches permanentes onde mais de 500 000 educadoras se ocupavam de 9 milhões de crianças. além disso, mais de cinco milhes de crianças iam passar férias às creches e jardins de infância no Verão. Em 1971, o número de crianças que frequentavam regularmente estes estabelecimentos era de 14,5 milhões e o de educadoras elevou-se para 600 000 (U. R. S. S., 1976, p. 99).

No I Congresso sobre a Educação de toda a Rússia, em 1919, foi definido

que as creches atenderiam as crianças desde os primeiros meses aos três anos e os

jardins infantis de três a sete anos de idade. Além dos jardins infantis permanentes,

isto é, em funcionamento todos os dias, foram criados os temporários, abertos

principalmente na zona rural no período do verão (FOTEEVA, 1986).

Em 1919, foi elaborado o documento intitulado “Instrução para a

administração de parques e jardins infantis”, no qual, orientava em relação a

organização, manutenção e metodologia. Em consonância com Foteeva (1986),

recomendava-se não apenas trabalhar com brinquedos, mas também materiais

variados, como argila, areia, madeira, tecidos, conjuntos de instrumentos, entre

outros; criar terrários, viveiros, etc. A atenção às aulas de desenho, pintura,

moldagem, construções de cubos e areia, recorte, tratamento de plantas e animais,

canto, música, atividades físicas, assim como a narração de histórias, para o

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desenvolvimento da linguagem eram fundamentais. As atividades deveriam

possibilitar o desenvolvimento do espírito coletivo e solidário, como argumentava

Lunatcharski (1988):

Faz parte da autêntica escola socialista a maior individualização, mas quanto mais a criança se vá desenvolvendo (vemo-lo em todos os jardins de infância, em todas as escolas para crianças), mais importante se torna que, desde a mais tenra idade, se lhe ensine a respeitar o carácter social de outrem, sejam organizados para as crianças jogos e passatempos comuns, sejam obrigadas a cooperar. Uma coisa como o teatro na escola, como o trabalho no jardim escolar, numa quinta, numa biblioteca, num laboratório, obrigará as crianças a trabalhar em conjunto (LUNATCHARSKI, 1988, p. 37).

Nesse processo de instituição de pré-escolas, os congressos educacionais

afetos à temática se faziam necessários e recorrentes, os quais eram organizados,

em geral, por Lunatcharski e Krupskaia. No III Congresso sobre a Educação Pré-

Escolar, em 1924, foram discutidas, com atenção especial, as questões afetas à

formação de professores e a educação que se deveria ofertar às crianças, e uma

das questões discutidas foi a educação musical, e foi sistematizada uma coletânea

de canções infantis (FOOTEVA, 1986).

Os principais documentos referentes à organização Pré-Escolar tiveram

participação significativa de Krupskaia e são fundamentais para o trabalho

pedagógico nas instituições infantis. Ao tratar do desenvolvimento das crianças,

afirmava ser necessário, desde a mais tenra idade, brincar, trabalhar e vivenciar

atividades coletivas, em favor do desenvolvimento multilateral e pleno (KRUPSKAIA,

19--; 1973).

Na escola primária, a atenção especial estava no estudo da língua materna,

assim como no ensino de matemática, desenho e música. Nos anos mais

avançados, a ênfase recaía nos estudos dos fundamentos das ciências da natureza

e da sociedade, período inicial do ensino politécnico. Os fundamentos da concepção

científico-materialistas, desenvolvem-se habilidades para o trabalho e possibilita aos

alunos uma formação física e estética (U.R.S.S., 1976).

De acordo com Krupskaia (2017), inicialmente a escola deveria desenvolver

na criança a curiosidade, a investigação no campo das ciências naturais e sociais.

Para tal, era necessária uma intima relação da escola com a vida, isto é, com a

população, seu trabalho. Era preciso ensinar a criança nos livros, na ciência, na

busca pela compreensão das questões que se fazem presentes. Outra questão

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relevante é a tarefa de desenvolver nos estudantes o espírito coletivo e a auto-

organização. Citamos a contribuição ímpar de Makarenko (1976; 1981), que a

exemplo de outros intelectuais revolucionários, orientava professores e familiares

dos escolares.

As instituições secundárias eram caracterizadas pelo ensino politécnico

defendido pelo Narkompros, o qual buscava o desenvolvimento multilateral dos

estudantes e princípios científicos mais gerais da organização do trabalho. A

especialização deveria ocorrer após os 17 anos. Contudo, no final de 1920, em uma

reunião do Partido afeta ao ensino politécnico, a profissionalização passou a ser

aceita provisoriamente aos 15 anos, decisão que desagradou Krupskaia e

Lunatcharski. A pedagoga, por exemplo, defendia que a escola politécnica se

diferenciava da profissional por considerar a capacidade de compreender o trabalho

a partir da interdependência dos fenômenos, enquanto a segunda tem ênfase

apenas nas habilidades de trabalho (KRUPSKAYA, 2017).

O Narkompros, em 1918, na I Seção dos Professores Internacionalistas,

anunciou a criação das Escolas Experimentais-Demonstrativas, entre elas as

Escolas-Comunas, “[...] instituições de ensino de tipo internato que, entre 1918 e

1925, voltaram-se para a tarefa de resolver a questão prática de elaborar a nova

pedagogia e a escola do trabalho” (FREITAS, 2009, p, 12-13). Dentre as Escolas-

Comunas, destacava-se a conduzida por Pistrak, nomeada com o nome do seu

fundador por encargo do Comissariado, no outono de 1918, P. N. Lepeshinskiy. Por

vezes, era chamada por sua vinculação ao órgão que a instituiu, Escola-Comuna do

Narkompros (FREITAS, 2017).

Em 30 de setembro de 1918, o Comitê Central do Partido Comunista (bolchevique) publica a Deliberação sobre a escola única do trabalho e em 16 de outubro de 1918 o Narkompros publica o documento Princípios fundamentais da escola única do trabalho [...]. Estes documentos foram escritos pela Comissão Estatal para a Educação, composta por A. V. Lunacharskiy; N. C. Krupskaya; M. N. Pokrovskiy; P. N. Lepeshinskiy; L. R. Menzhinskaya e V. M. Pozner, entre outros, existente antes da revolução, a qual se juntou depois ao Narkompros (FREITAS, 2009, p. 12).

Nas referidas escolas, a organização do trabalho pedagógico, em geral,

considerava a temática dos complexos de estudo, a auto-organização escolar e o

trabalho socialmente necessário para a formação do novo homem comunista,

aspectos fundamentais na política educacional do período (FREITAS, 2017). Pistrak

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(2011), ao tratar dos fundamentos da escola do trabalho, pontua sobre a necessidade

do conhecimento científico no ensino soviético:

[...] importamo-nos não com a quantidade, mas, sim, com a qualidade dos conhecimentos que ofereceremos com a intenção de ajudar os alunos a se apropriarem solidamente dos métodos científicos fundamentais para analisar as manifestações da vida. A se apropriarem dos conhecimentos indispensáveis para conquistar a vida moderna! (PISTRAK, 2011, p. 97, grifos do autor).

O programa escolar analisa a vida no método marxista. Para tal, o programa

oficial prossegue nas relações entre as disciplinas, submetendo-as à finalidade

social proposta pela escola. “A cultura física, a organização científica do trabalho, o

trabalho de grupos de estudo, as excursões para lugares próximos e distantes, a

escola de verão – tudo deve ser integrado nos programas” (PISTRAK, 2011, p. 103).

Sobre as atividades físicas mencionamos a obra “Concurso de jovens modelistas”

(Figura 9).

Figura 9 – Samuil Adlivankin. Concurso de jovens modelistas. Óleo sobre tela. 121 x 58 cm. 1931

Fonte: RADIANTE PORVENIR (2018, p. 56).

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Conforme ilustra a referida tela (Figura 9) de Samuil Adlivankin (1897-1966),

esse esporte, com significativo componente ideológico e educacional, conquistou

relevância, pois estava com o treinamento físico segundo o programa de preparação

para o trabalho e luta pela sociedade comunista. o artista em questão elaborou

diversas obras clássicas do realismo socialista, assim como ilustrou revistas

populares e realizou desenhos juntamente com Maiakovski. Vale lembrar que nas

décadas de 1920 e 1930, a ideia da conquista do espaço e do tempo, isto é, da

ciência, base para outros gêneros e modalidades da arte soviética, era essencial

para a prática do aeromodelismo, assim como outras modalidades.

Pistrak (2011) ressaltava outro aspecto relevante no processo escolar, a

“organização do programa de ensino segundo os complexos”, o qual tem o intuito de

compreender a ciência em uma perspectiva marxista, pelo conhecimento dos

fenômenos e suas relações, isto é, pelo método dialético. A referida organização

implica algumas questões, como a escolha do objeto do complexo – o critério de

seleção deve ser o social, por exemplo: “o homem”, é inadmissível que se defina por

meio do interesse dos alunos; a forma de estudar cada tema; a organização do

ensino e do trabalho com as crianças. Com isto, “[...] nossa tarefa fundamental é

tornar o ensino escolar plenamente efetivo, renunciando ao antigo método

puramente intelectual” (PISTRAK, 2011, p. 126, grifos do autor).

Nessa perspectiva, o desenvolvimento da coletividade era uma das tarefas

fundamentais da escola. Pistrak (2009, p. 121) afirmava que “[...] a habilidade de

trabalhar coletivamente significa também a habilidade de, quando necessário, dirigir

e, quando necessário, subordinar-se. A realização deste objetivo deve refletir-se nas

formas de autodireção [...]”, isto é, a coletividade e a disciplina, as quais deveriam

ser ensinadas aos estudantes. O autor ressalta:

O objetivo da escola não é apenas conhecer a atualidade, mas dominá-la. [...] É preciso tomar os fenômenos em suas mútuas ligações e interações; é preciso mostrar que os fenômenos em sua atualidade são parte de um processo histórico único e geral de desenvolvimento; é preciso esclarecer a essência dialética do que nos cerca (PISTRAK, 2009, p. 116, grifos do autor).

Nessa assertiva, a escola daquele período deveria formar o homem

comunista, lutadores e construtores do novo regime. Era necessário que a futura

geração desenvolvesse a consciência que cada estudante, cada jovem, era um

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“soldado na frente de luta, que sua tarefa é instrumentalizar-se detalhadamente para

esta luta pelo conhecimento” (PISTRAK, 2009, p. 117). Essa formação também

deveria partir da própria constituição docente.

No tocante à formação de professores, Krupskaia (2017) apresentava os

aspectos que o docente deveria dominar para ser um bom educador soviético,

dentre os quais destacamos: conhecer a ciência que ensina e sua fundamentação,

sua relação com as outras e suas relações sociais, isto é, “dominar o fundamento

dialético da ciência” (KRUPSKAIA, 2017, p. 207); capacidade de transmitir seus

conhecimentos aos estudantes; e dominar uma pedagogia, nas palavras da autora

significa o “conhecimento das peculiaridades da idade, da percepção e do

pensamento da criança, de suas condições de desenvolvimento em cada idade, o

volume de sua experiência de vida [...]” (KRUPSKAIA, 2017, p. 208).

Lênin, de acordo com Krupskaya (2017), defendia ser necessário e essencial

na Rússia soviética o desenvolvimento da indústria, da produção, mas também a

elevação do nível da educação e cultura como elemento que se relaciona

diretamente com a economia e o aumento da produtividade do trabalho. Para a

formação de professores, por exemplo, era necessário ampliar o acesso da

juventude proletária às instituições de ensino superior.

Em relação ao ensino superior, uma das principais questões era a

organização do processo de ensino, de uma orientação teórica que se harmonizasse

com a nova sociedade que se buscava consolidar. Em 1921, em decorrência de

alguns decretos assinados por Lênin, foram criadas as universidades de Tachkent

(Ásia Central), de Minsk (Bielorrússia), a Universidade Comunista das minorias

nacionais do Ocidente e a Universidade Comunista dos trabalhadores do Oriente.

Em 1923, a classe trabalhadora, operários e camponeses, formavam 50% dos

estudantes admitidos no ensino superior. No final de 1925, o Estado dispunha de

“[...] 145 estabelecimentos de ensino superior frequentados por 167 000 estudantes.

A título de comparação, lembremos que na Rússia czarista de antes da Primeira

Guerra Mundial havia 91 escolas superiores e 112 000 estudantes” (U.R.S.S., 1976,

p. 91).

Algumas faculdades deram origem a diversas instituições de ensino superior

técnico, médico, pedagógico, das ciências econômicas e outros. As universidades

tiveram uma função relevante na formação dos estudantes com vistas ao

doutoramento e dos doutorados. As universidades de Moscou, Kiev, Leningrado,

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Ural, Tachkent, Kazan e outras tornaram-se locais para o desenvolvimento científico

e pedagógico da escola superior soviética, contribuiu essencialmente para a

formação dos especialistas em ciências sociais; em geral, 39% dos estudantes se

especializavam neste domínio.

O ensino superior para todos seguiu em defesa da classe trabalhadora. A tela

“Universitária” (Figura 10), de Aleksandr Samokhválov, expressa a luta, ideais e

conquistas após a Revolução de Outubro de 1917, em especial, em relação às

questões educacionais, assim como a atuação política e social das mulheres

soviéticas no contexto em questão.

Figura 10 – Aleksandr Samokhválov. Universitária. Óleo sobre tela. 97 x 66 cm. 1936-1937

Fonte: RADIANTE PORVENIR (2018, p. 24).

Em síntese, Lunatcharski (2018) reafirma que o trabalho do Narkompros

assumiu a tarefa de tomar posse dos bens culturais do país e disponibilizar a todos,

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assim como necessitou criar órgãos para fazer das escolas, museus, teatros,

concertos, exposições, bibliotecas, revistas, entre outros, instrumentos do sistema

educacional proletário. Desse modo, o comissário (2018, p. 56) questionou: “O que

significa isso: sistema educacional proletário?”, e em seguida explica:

[...] isso significa a propagação dos valores universais da ciência e da arte sem os quais não se pode ser uma pessoa mais consciente, sem os quais o proletariado permanece bárbaro, cuja falta de aquisição não permite que se explore nem o poder, nem os meios de produção conquistados. Isso é uma tarefa gigante (LUNATCHARSKI, 2018, p. 56).

Lunatcharski (1988), intelectual do campo da filosofia, literatura era

comprometido politicamente com a formação intelectual da juventude. No III

Congresso da Juventude Comunista, em outubro de 1920, Lênin (1981, p. 88)

realizou um discurso que destacou a tarefa essencial da juventude: estudar. “Toda a

educação, toda a instrução e todo o ensino da juventude [...] devem inculcar-lhe o

espírito da moral comunista”, aos interesses da luta de classe do proletariado, isto é,

reside em uma “disciplina solidária e unida nesta luta consciente das massas contra

os exploradores” (LÊNINI, 1981, p. 91-92). Nesse período, houve uma atenção

especial às Organizações Infantis – Jovens Pioneiros, a partir dos 11 anos; e às

Organizações Juvenis – Komsomol, dos 14 aos 28 anos.

O poema “Desatai o Futuro!” de Maiakovski elucida a tarefa da juventude na

edificação de uma sociedade comunista:

O futuro não virá por si só Se não tomarmos medidas. Pega-o pelas orelhas, komsomol! Pega-o pela cauda, pioneiro! A comuna Não é uma princesa fantástica Com que de noite se sonha. Calcula, reflete, mira bem e avança! O comunismo Não reside apenas na terra, No suor das usinas. Senão também no lar, À mesa, nas relações de família, Nos costumes. [...] Quem não aguentou a tarefa doméstica E dorme no bem-bom das rosas de papel,

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Esse não atingiu o talhe Da poderosa vida do porvir. Qual uma peliça o tempo é também roído Por vermos quotidianos. Às vestes poeirentas de nossos dias Cabe a ti, komsomol, saculi-las! (MAIACOVSKI, 1987, p. 161-162).

No poema, Maikovski refere-se a Komsomol – União da Juventude

Comunista, que contava com o apoio do governo e do Narkompros. Lênin (1981)

afirmava que a Komsomol necessitava ser o grupo que vinculasse a educação à luta

dos trabalhadores, e deveria dedicar seus momentos de ócio, por exemplo, para

melhorar o cultivo das hortas ou organizar em uma fábrica a instrução da juventude.

“Queremos transformar a Rússia pobre e miserável num país rico. E é preciso que a

União das Juventudes Comunistas uma a sua formação, instrução e educação ao

trabalho dos operários e camponeses” (LÊNIN, 1981, p. 95).

O Comissariado para a Instrução Pública, além das questões relacionadas à

instituição formal de ensino, organizou a secção extraescolar – científica e artística.

“O aparelho de Estado recentemente criado esforça-se por, na medida do possível, ir

ao encontro das necessidades do povo, sem nada destruir da velha cultura.

Sabemos que ao estudar a antiga, o proletariado edificará uma nova cultura”

(LUNATCHARSKI, 1988, p. 25). Dessa maneira, era fundamental a defesa dos

palácios e museus, os quais foram abertos ao público para que pudessem admirá-

los. Quanto à secção de belas-artes, o autor considerava a ideia de Lenin – usar os

monumentos como meio de propaganda. “A educação por meio de estátuas e

pinturas é uma marca de grande cultura” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 26).

Estamos a viver agora um momento difícil, somo obrigados a caminhar enterrados até ao pescoço no sangue e na lama, mas a nossa revolução, como toda a grande revolução, será seguida de uma vaga de criatividade e uma arte nova, bela, esplêndida se propagará. [...] Nos dias que correm, tudo entre nós é marcado por um carácter de guerra e o nosso desejo de criação também é um elemento de luta (LUNATCHARSKI, 1988, p. 26).

Continua o autor,

Agora que já não lutamos contra os destacamentos alemães, mas contra o regime burguês do mundo inteiro, os nossos nomes já são pronunciados no Ocidente com consideração, olham-nos como pessoas de cultura que constroem o seu futuro na base dos

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princípios bem assimilados da instrução pública. Quando recebemos representantes de Estados estrangeiros, eles vêem que possuímos agora uma força nova, fundada na vontade de elevar o povo ao mais alto grau da cultura; vêem que a nossa força reside na nossa ardente aspiração a formar uma geração nova, magnífica, e são obrigados a reconhecer que venceremos (LUNATCHARSKI, 1988, p. 26-27).

Nesse sentido, o poder soviético e o Narkompros iniciaram seus trabalhados

buscando romper com a lógica da velha estrutura russa, a orientação geral da

atividade educativa era superar o analfabetismo e a ideologia burguesa ensinada

nas escolas. A premissa defendida era possibilitar o acesso a toda a população, em

especial aos operários e aos camponeses, todos os conhecimentos acumulados

pela humanidade.

3.3 A PROPOSTA PARA A EDUCAÇÃO SOVIÉTICA: A DEFESA PELA CIÊNCIA E

ARTE

O Comissariado do Povo para Instrução Pública (Narkompros), conforme

descrevemos, era liderado por Lunatcharski. De acordo com Prestes (2013), ao

assumir a responsabilidade pela definição das bases ideológicas e teóricas da

pedagogia soviética, expôs os desafios e as possibilidades para a educação do novo

homem comunista.

Nesta subseção, de modo a atender nosso objetivo geral, apresentamos a

proposta de Educação defendida por Lunatcharski. Para tal, priorizamos o estudo da

obra “Artigos e Discursos sobre a Instrução e a Educação” (LUNATCHARSKI, 1988),

composta por quatorze trabalhos, entre artigos e discursos do autor, escritos entre

1918 a 1928, após assumir o cargo de Comissário da Instrução Pública, na Rússia.

Os textos da referida obra estabelecem relação entre a Revolução de Outubro

de 1917 e a instrução pública, seus aspectos econômicos e políticos e seu conteúdo

pedagógico. Lunatcharski firmou-se como combatente, dedicou sua vida à

Revolução e elaborou uma proposta educacional em favor da formação do novo

homem comunista. Nesse sentido, organizamos nossos escritos de forma a salientar

três aspectos fundamentais defendidos pelo intelectual: a luta pela superação da

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escola de classe; a defesa pela ciência, ensino politécnico; e a formação humana

por meio da arte.

No discurso proferido no I Congresso de toda a Rússia para a Instrução

Pública, em 26 de agosto de 1918, Lunatcharski (1988) afirma que a luta do povo

pela sua liberdade toma três direções. “Pode ser considerado vitorioso e senhor do

seu destino um povo que possua, além dos meios de produção, o conhecimento”

(LUNATCHARSKI, 1988, p. 8). De acordo com o intelectual, apenas considerar uma

dessas referidas condições não é o suficiente, se fazem necessários os seguintes

elementos: o poder governamental, econômico e o conhecimento, “[...] isto é, na

condição de se efetuar um amplo trabalho de instrução, levando as massas a uma

tomada de consciência elevada ao máximo” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 9).

O autor menciona que em termos políticos na Rússia, nos meses de fevereiro

e março de 1917, o povo derrubou o antigo regime, no entanto, o aparelho de

funcionamento se manteve, e o Governo Provisório, conforme discorremos na seção

anterior, se propôs a realizar reformas. Após a Revolução havia a tentativa do

governo de manter reformado o velho sistema educacional. Dessa maneira, os

bolcheviques desenvolveram a luta para transformar a revolução democrático-

burguesa em uma revolução socialista a partir de Outubro de 1917.

Lunatcharski (1988), ao proferir seu discurso, afirmou que o Estado, depois de

dez meses da Revolução socialista, confronta-se com novos desafios e está em

pleno trabalho de organização, como, por exemplo, a sua Constituição49,

considerada provisória. O objetivo firmado foi possibilitar ao povo todas as riquezas.

Para tanto, “esta via necessita de uma grande cultura, de um enorme saber, de uma

excepcional firmeza” (LUNATCHARSKI,1988, p. 10). Desse modo, de acordo com o

autor, a terceira condição que se impõe, não menos importante, é a luta pela escola.

Quando fui nomeado Comissário para a Instrução Pública, não podia deixar de me aperceber desta enorme responsabilidade de que o povo me investiu. Trata-se de transmitir o mais rápida e amplamente possível o saber ao povo, de destruir o privilégio do conhecimento de que só uma ínfima parcela da sociedade

49 “A primeira Constituição soviética foi a Constituição da RSFSR, adoptada pelo V Congresso dos

Sovietes de Toda a Rússia em 1918. A Constituição consagrou o poder soviético como forma da ditatura do proletariado, suprimiu a propriedade privada capitalista e fundiária, proclamou a igualdade de todos os povos da Rússia, etc. A Constituição assegurava a todos os trabalhadores da Rússia a participação na gestão do Estado, e privava os exploradores do direito de voto. Em 1924, o II Congresso dos Sovietes da URSS aprovou a primeira Constituição da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas” (DNEPROV, 1988, p. 249).

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gozava. Também aqui, salta igualmente aos olhos que não se tratava de nos apoderarmos da escola: a escola é tão caduca e inútil como o aparelho de Estado. Não podíamos racionar como o Governo Provisório, dizendo que íamos prescrever algumas modificações aos inspetores de distrito; tínhamos de desmantelar tudo; era perfeitamente claro que a escola deve ser objeto de uma transformação revolucionária (LUNATCHARSKI, 1988, p. 11, grifos nossos).

A partir da assertiva, compreendemos que a nova organização educacional

em favor do novo homem comunista, proposta pelo comissário, necessitava romper

com a escola de classes, isto é, o conhecimento apenas para as classes

privilegiadas. Sendo assim, um dos desafios elencados pelo autor era em “como dar

ao povo, o mais rapidamente possível, um máximo de conhecimentos em prol da

enorme tarefa que a revolução lhe confiou” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 11-12).

Não foi em vão que vários milhares de pessoas saíram do seio da classe operária e do campesinato russos e assumiram as funções do poder soviético. Essas pessoas representam uma força criadora. Não tememos as dificuldades. Nenhuma dificuldade será intransponível para a Rússia Soviética. Mas existe um outro tipo de perigo: é a luta, a luta contra o inimigo que acaba de ser vencido e ainda está disposto a reagrupar-se e a reiniciar o combate [...] Esta atmosfera de guerra e a necessidade de mobilizarmos todas as nossas forças – é essa a nossa maior dificuldade (LUNATCHARSKI, 1988, p. 13).

Lunatcharski (1988) reafirma a necessidade de criar uma nova organização

escolar que atendesse os princípios da revolução proletária. Os dados históricos da

educação soviética destacavam a relevância da educação para formar a nova

geração, e a escola deveria se ocupar na preparação para a vida comunista, e sua

essência, os princípios e fins da educação encaminhariam para o sentido social da

existência, sem classes sociais antagônicas, valorizando o coletivo (BARROCO,

2007; PRESTES, 2012).

Foram promulgados alguns decretos nesse período: foi suprimida a função de

procuradores dos distritos, de diretores e inspetores das escolas; foi proibido o

ensino do catecismo, eliminando o latim dos programas; foram revogados os

certificados de maturidade, substituindo-os por certificados de fim de curso; foi

eliminada a avaliação dos estudantes com a atribuição de notas, pois se

permanecesse não seria possível, em geral, o ingresso e a permanência dos filhos

dos trabalhadores, os quais não poderiam atender ao padrão de conhecimento

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exigido pela velha escola; e introduzido o ensino misto. Em síntese, “mais não

fizemos do que varrer da escola o velho pó, do que desembaraçá-la de certas taras

que saltam aos olhos” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 16).

Segundo o Comissário, feito isto, é tempo de a escola superar as velhas

condições impostas pelo czarismo. Para tal, apenas o proletário tem a coragem e

firmeza, enquanto a burguesia “não aceita a ciência senão na medida em que dela

tira proveito” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 16). Isto é, a burguesia não pode aceitar

uma escola que daria acesso ao povo trabalhador, a qual possibilitasse a formação

de um novo homem comunista.

Lunatcharski (1988), ao criticar a educação burguesa, constata que nos

países em que há a existência de patrões e de escravos, concomitantemente, há

uma ausência de direitos econômicos e culturais. Sendo assim, por um lado, a

escola formará senhores que poderão dominar os outros com segurança e

arrogância, “[...] sem se interrogarem se tem o direito de fazer isso e sabendo

manter-se nessa posição dominante com todas as presas e garras em riste; e, por

outro lado, a escola formará escravos, ou seja, indivíduos dóceis [...]”

(LUNATCHARSKI, 1988, p. 33).

Sobre essa questão, ao discutir a importância da consciência histórica, citamos

os escritos de Brecht (2006), que amparado pelos clássicos marxistas, faz inúmeras

referências críticas ao conteúdo da escola burguesa, como na obra “As histórias do

Senhor Keuner”50, especificamente no conto “Se os tubarões fossem homens”, no qual

busca desvelar os mecanismos da sociedade capitalista:

Como é natural, nessas grandes caixas também haveria escolas. E nessas escolas os peixinhos aprenderiam como se nada na goela

50 A obra “As histórias do Senhor Keuner” é composta por 87 crônicas, pequenos textos escritos no

início da década de 1930, trazem reflexões pertinentes ao comportamento humano. Para tratar temas como nacionalismo, princípio religioso, perseguição aos opositores do regime nazista, Brecht (2006) cria o Senhor Keuner, que se posiciona criticamente contra estas e outras questões na luta pela vida. Em uma das curtas histórias e utilizando-se do conto “Se os Tubarões fossem Homens”, o autor destaca algumas instituições sociais entre as quais a escola. Para tal, põe um diálogo entre o Senhor Keuner e uma menina filha de uma hospedeira, que simboliza no conto a ingenuidade, o caráter de naturalidade que os homens dão às questões da sociedade capitalista. Quando a menina indaga o Senhor Keuner sobre como seria o mundo se os tubarões fossem homens, a resposta, dada com muita astúcia, é um exemplo do comportamento desse autor, diante da dificuldade de sobreviver nos anos 1930, em função da perseguição política que sofriam aqueles que se opunham à ordem vigente na Alemanha, mas em todo mundo. Eis como, em linguagem figurada e irônica, o Senhor Keuner a desmistifica, tratando da forma oficial de se educar o homem na referida sociedade (CHAVES, 2000). Ressaltamos que a obra do autor são objetos de estudos do Grupo de Pesquisa e Estudos em Educação Infantil (GEEI).

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dos tubarões. [...] É claro que a formação moral dos peixinhos seria o mais importante. Ensinar-lhes-iam que nada é mais sublime nem formoso do que um peixinho que se sacrifica alegremente, e todos deveriam ter fé nos tubarões, sobretudo quando prometem zelar pela felicidade futura. Far-se-ia os peixinhos compreender que um tal futuro só estaria assegurado se aprendessem a obedecer [...] (BRECHT, 2006, p. 57).

Nessa citação, em nossa análise, Brecht (2006) denuncia a escola, instituição

social cuja rotina diária e conteúdo preparavam os estudantes, “os peixinhos”, para

internalizar valores morais caros à sociedade capitalista. As atividades

aparentemente realizadas de forma integrada, a relação mediada pela falsa ideia de

bondade e alegria são práticas constantes. A ideia de sacrifício é fundamental e

permanentemente exaltada (CHAVES, 2000). Reafirma a condição da educação

para subserviência, em geral, oferecida à classe trabalhadora nas instituições

educativas. O dramaturgo alemão escreve:

Se os tubarões fossem homens, por certo fariam guerra uns aos outros para conquistar caixas e peixinhos estrangeiros. Mandariam os seus próprios peixinhos para a guerra, e ensinar-lhes-iam que há enorme diferença entre eles e os peixinhos dos outros tubarões. Como toda gente sabe, proclamariam, os peixinhos são mudos mas calam-se em línguas muito diferentes e por isso é impossível entenderem-se. A cada peixinho que matasse na guerra uns quantos peixinhos inimigos, dos que se calam noutra língua, seriam dadas uma condecoração de algas marinhas e o título de herói (BRECHT, 2006, p. 58).

Brecht (2006) afirma que a educação pode ser um instrumento legitimador da

sociedade vigente, que, em geral, tem servido de respaldo ou para naturalizar,

demonstrar como curso natural da história, o modo de ser da sociedade capitalista, e

não revela a contradição social existente, pois traz em muitas de suas ilustrações e

textos a defesa de valores patrióticos expressos na exaltação ao herói (CHAVES,

2000). A menção ao dramaturgo se faz por compreendermos que figura de forma

exímia ao denunciar a sociedade capitalista, e o faz apresentando a organização

escolar e seu cotidiano cristalizando as contradições dessa dinâmica social.

Nessa perspectiva, Lunatcharski (1988) afirma que a educação burguesa se

configura pela necessidade de preparar o homem para lutar em defesa da pátria,

formar grandes exércitos, motivar o patriotismo, prepará-lo para morrer pela pátria,

assim como o individualismo se preconiza. Isto é, “toda a orientação consiste em

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ludibriar o homem de modo a que ele volte o seu amor a um Estado que, como é

evidente, se baseia na injustiça e de modo a que esteja pronto a sacrificar por esse

Estado a sua vida” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 34). E essa fidelidade para com o

regime vigente deve ser orientada desde a mais tenra idade. Nesse entendimento,

continuamos reflexão com a menção a outro escrito de Brecht (2006) “O amor à

pátria, o ódio às pátrias”, em que elucida:

O sr. K. não achava necessário viver num determinado país. Ele dizia: “Posso passar fome em todo lugar”. Mas um dia passou por uma cidade que era ocupada pelo inimigo do país no qual vivia. Então cruzou com um oficial do inimigo, que o obrigou a descer da calçada. O sr. K. desceu, e notou que estava aborrecido com esse homem, e não apenas com ele, mas sobretudo com o país ao qual ele pertencia, de modo que desejo que esse país desaparecesse da face da Terra. “Por que me tornei um nacionalista por um minuto?”, perguntou o sr. K. “Por ter cruzado com um nacionalista. É por isso que se deve eliminar a estupidez, porque ela torna estúpido aquele com quem cruza” (BRECHT, 2006, p. 19).

O autor, ao tratar da temática do nacionalismo na composição de mais um de

seus escritos, intitulado “Passar fome” explica a expressão “Posso passar fome em

todo lugar”. Por meio do personagem do Sr. K., que viver em um determinado local

onde reina a fome é tão ruim quanto passar fome, afirma que o essencial é sermos

contra o fato de haver fome, isto é, independente da nacionalidade em questão,

sermos sensíveis aos princípios que expressam o coletivo, essencial para o

desenvolvimento de uma sociedade comunista.

Lunatcharski (1988) em seu artigo51 escrito para o jornal russo Izvestia, em 26

de março de 1919, reafirma que a instrução pública em uma sociedade capitalista

comporta um caráter de classe, sendo um meio para a adaptação dos indivíduos aos

objetivos do governo vigente. Sendo assim, o ensino não impõe os mesmos

objetivos para a educação das classes dominantes, as camadas médias e para as

camadas inferiores, as quais são objeto e mão de obra.

51 “Este artigo foi motivado pelo debate sobre a organização da instrução política no Estado

soviético, que decorria na imprensa e que culminou na reconversão, em 1920, de Departamento Extra-Escolar do Narkompros em Comité Principal da República para a Instrução Política, sendo a direção confiada a Krupskaia, eminente pedagoga marxista. O pretexto concreto do artigo em questão de modo algum lhe esgota toda a problemática. Para além das questões de organização, Lunatcharski entrevê um amplo problema político Comunista, e é isso o que o título expressa: A Propaganda Comunista e a Instrução Pública” (DNEPROV, 1988, p. 259).

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Na sociedade burguesa, a classe dominante é uma minoria que explora a

maioria. “Lembrai-vos do modo como o soldado estava convencido de que dar a vida

pelo czar era a maior das façanhas. Estais a ver como as pessoas tinham sido

amansadas!” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 79). Há de se considerar a significativa

força que possui a burguesia, a qual, dentre outras instituições, também faz uso da

escola como instrumento de corrupção da consciência das massas. Nos países em

que a população é amplamente alfabetizada, pode ter um bom soldado, um bom

agricultor, um bom operário, e quando a Europa Ocidental se convenceu desse fato,

deu prioridade à escola pública.

Não queria contudo que essa escola desse ao povo a plenitude do saber. Para quê fazer isso? Ao povo é preciso adestrá-lo, ensinar-lhe a ler e escrever, mas também que o pope imediatamente o sature do seu veneno cristão. Há que dar às pessoas simples aptidões técnicas até um certo limite, mas sem uma séria formação científica, e o essencial é excluir toda a possibilidade de o homem do povo ultrapassar esta esfera restrita da escola dita do povo (LUNATCHARSKI, 1988, p. 84).

No que se refere à educação na Rússia czarista, Lênin (1981) pontuava que a

autocracia russa impossibilitava à classe trabalhadora o conhecimento, desvelando o

caráter classista da educação da política do governo em questão. No artigo “Em que

pensam os nossos ministros?”, escrito no final de 1895 para o jornal “Rabótcheie

Dielo”, Lênin denunciava que os ministros russos geralmente receavam as teorias de

Marx e Engels, assim como defendiam que a escola deveria estar longe da classe

trabalhadora. O revolucionário, no final do século XX, analisava:

Operários! Já vedes o medo enorme que têm os nossos ministros à união dos conhecimentos como o povo trabalhador! Mostrai a todos que não há força capaz de arrancar a consciência aos operários! Sem conhecimentos, os operários estão indefesos; com conhecimentos, são uma força! (LÉNINE, 1981, p. 23).

Lênin (1981) reafirmava ser um equívoco considerarmos que a escola

burguesa intencionava criar homens instruídos em todos os domínios e que lhes

ensinava a ciência em geral. Em uma sociedade pautada pela divisão de classes, a

antiga escola, em geral, possibilitava o acesso aos conhecimentos somente aos

filhos da burguesia. Dessa maneira, na busca de superá-la, propuseram se apropriar

dela unicamente o que era necessário para criar as bases da educação comunista.

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A escola czarista era livresca, obrigava os estudantes a memorizar conhecimentos

inúteis, supérfluos, mortos, os quais formavam a geração jovem em sujeitos

adequados ao próprio modelo.

Krupskaya (2017), em seus escritos de 191852, declarava que o objetivo da

escola no Estado burguês é determinado pelos interesses da classe dominante e

sua organização difere dependendo de qual classe social a educação se destina.

Por exemplo: se a escola se destina à classe dominante, terá o intuito de formar os

estudantes capazes de deleitar-se com a vida e governar; se é destinada à pequena

burguesia, “sua finalidade é criar nelas um corpo burocrático, um quadro de

‘inteligência’ que, por direito a uma certa parte do bolo público, vai ajudar a classe

dominante a governar a população” (p. 67); e se destinada a classe trabalhadora

“[...] a tarefa da escola pública é manter os estudantes com a moral burguesa,

diminuir a sua consciência de classe, fazer deles um rebanho obediente, fácil de

controlar” (p. 68). Isto é, o conhecimento era um privilégio de classe.

No tocante à instrução dos camponeses e da pequena burguesia na Rússia

czarista, Lênin (1981) apresenta dados significativos. Em 1912, dos 119.000

estudantes nos liceus, apenas 18.000 eram camponeses. Nos seminários

conciliares, de 20.500 seminaristas, somente 1.300 eram camponeses. Diante dos

dados, reitera que o campesinato e a pequena burguesia constituíam na Rússia 88%

da população, isto é, quase nove décimas partes, enquanto os nobres somavam um

e meio por cento.

[...] o Governo obstrui o caminho do ensino a nove décimas partes da população da Rússia. Sim, o nosso Ministério da Instrução Pública é um ministério de buscas policiais de escárnio da juventude, de ultraje à ânsia de saber do povo. Porém, nem todos os camponeses russos, e em particular os operários russos, nem todos nem muitíssimo menos, senhores membros da IV Duma, se parecem com as lebres. A classe operária soube demonstrar isto no ano cinco e saberá demonstrar outra vez, de modo muito mais seriamente, a sua capacidade para a luta revolucionária pela autêntica liberdade e por uma instrução não a Kassó bem para os nobres, mas verdadeiramente popular! (LÉNINE, 1981, p. 40, grifos do autor).

Sendo assim, superar as velhas condições escolares impostas pelo czarismo,

isto é, superar a escola de classes se configura em um dos aspectos defendidos por

52 Educação pública, 1918, n. 1-2. Publica-se pelo texto do Instituto de Marxismo-Leninismo, N. K.

Krupskaya: obras escolhidas. Moscou: Politizdat, 1988.

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Lunatcharski. A Revolução de Outubro de 1917 pôs fim ao privilégio da instrução

para a minoria que detinha o poder e possibilitou que todo o desenvolvimento da

ciência, cultura e arte fosse patrimônio das massas populares em favor da formação

do novo homem comunista. Lênin (1981) asseverava que todas as conquistas da

cultural tornarão patrimônio do povo e jamais a ciência e as elaborações humanas

serão convertidas em meio de exploração. Nesse sentido, Lunatcharski (1988, p. 52,

grifos nossos) reafirma:

Toda a diferença entre o Estado da violência da burguesia e o Estado da ditadura do proletariado reside no facto de os esforços do primeiro visarem consolidar e perpetuar o Estado em si e, desse modo, a sujeição do homem pelo homem, ao passo que os esforços do segundo tendem, por assim dizer, para a autodestruição, isto é, para a criação de condições nas quais o Estado deixe de ser uma necessidade, e tendem também para a completa emancipação de cada indivíduo.

Lunatcharski (1988) defende que a instrução e o Estado devem ser

instrumentos de propaganda comunista. Isso não significa limitar a liberdade da

investigação científica; pelo contrário, o ideal proferido é pelo conhecimento da

língua, da matemática, das ciências da natureza, da Arte e das técnicas.

Mas nós sabemos que a escola deve, primeiramente, instruir as crianças e os jovens sobre o passado da humanidade, dar a imagem do presente e esclarecer as esperanças do futuro, e que ninguém pode fazê-lo com uma objetividade absoluta, porque esta se esconde de olhares dos homens (LUNATCHARSKI, 1988, p. 59).

Na Rússia, o governo soviético, que considera os interesses da classe

trabalhadora, deve romper com o caráter de classe das instituições escolares e fazê-

la, em todos os níveis, “[...] acessível a todos os segmentos da população, mas fazer

isso não só em palavras, mas em atos. A educação continuará sendo um privilégio

de classe burguesa até que as finalidades da escola sejam alteradas”

(KRUPSKAYA, 2017, p. 70). Dessa forma, faz-se necessário que a educação, desde

a pré-escola à superior, tenha um objetivo comum:

[...] formar pessoas desenvolvidas multilateralmente, com predisposições sociais conscientes e organizadas, que tenham uma visão de mundo reflexiva, integral e que claramente entendam tudo o que está acontecendo ao seu redor na natureza e na vida social; pessoas preparadas na teoria e na prática para todos os

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tipos de trabalho, tanto físico quanto mental; pessoas capazes de construir uma vida social racional, cheia de conteúdo, bonita e alegre. Essas pessoas são necessárias à sociedade socialista, sem elas o socialismo não pode se realizar plenamente (KRUPSKAYA, 2017, p. 70).

De acordo com Lunatcharski (1988, p. 36), na educação socialista, o princípio

instituído é “para que cesse a exploração do homem pelo homem é preciso unir

forças com vistas a um objetivo comum. [...] uma sociedade normal deve ser

concebida e organizada com a finalidade de todos dela tirarem proveito e não alguns

privilegiados”. Para tal, a formação do novo homem comunista deve desenvolver

uma personalidade que saiba viver em coletivo, e concomitantemente, será admitida

a individualidade, a exemplo de uma orquestra, na qual cada um toca o seu próprio

instrumento em harmonia com os demais.

[...] Alguém se ocupará de arte, outro de ciência, um terceiro de técnica, etc. Assim sendo, cada um terá acesso a tudo: não é músico mas ouve música; um músico pode interessar-se por astronomia, saber como é confeccionado o vestuário, etc. Não será um selvagem que vê passar os eléctricos como, segundo a expressão alemã, uma vaca a ver passar os comboios (LUNATCHARSKI, 1988, p. 37).

Desse modo, a educação comunista busca relacionar o máximo de

individualidade com o máximo de unidade, o coletivo. Sobre essa questão,

Krupskaya (2017, p. 83) reafirma que a finalidade da escola é possibilitar o

desenvolvimento pleno do sujeito, considerando sua individualidade e formá-lo para

o coletivo. Dessa forma, na Rússia soviética “não pode haver lugar para dois

sistemas de educação: um direcionado para educar os que dominam e outro dirigido

para educar escravizados”. Por esse motivo, o primeiro ato proclamado pela

Comissariado da Instrução Pública foi a “Declaração do sistema único de educação”.

A pedagoga ressalta que,

A escola que o poder soviético procurar criar atende aos requisitos de uma democracia plena: ela é única para todos. Esta escola atende às exigências do desenvolvimento econômico, contribuindo para a melhor preparação das forças produtivas criativas vivas. Esta escola satisfaz às necessidades mais prementes da classe operária neste momento histórico: ela contribui para a transformação da classe operária que tomou o poder em dona e organizadora da produção coletiva (KRUPSKAYA, 2017, p. 88).

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De acordo com Prestes (2017), Lunatcharski assumiu a tarefa de transformar

a velha escola do regime czarista, reservada apenas para os filhos da nobreza, em

uma escola para toda a população. A esse desafio o comissário dedicou especial

atenção, conclamando os professores para o desenvolvimento da nova escola, a

qual teria função essencial na edificação na nova sociedade comunista.

A formação de professores era considerada um elemento relevante nesse

processo, para que fossem preparados a esse fim pedagógico e político.

Lunatcharski (1988, p. 129) afirmava ser necessário elevar a condição intelectual

dos docentes “[...] não podemos cuidar dos alunos sem cuidar do mestre”. Nesse

sentido, apenas em 1918, no país, foram realizados 164 Congressos locais de

professores e 81 Congressos dos trabalhadores da instrução pública.

O período da ditadura do proletariado consiste na preparação das condições

que tornarão possíveis a plena realização do comunismo. Sendo assim, a escola

deve ser não apenas o meio dos princípios gerais do comunismo, mas também o

meio da influência ideológica, organizativa e educativa do proletariado, com o intuito

de educar uma geração capaz de consolidar uma nova sociedade. Krupskaya (19--,

p. 198, tradução nossa) sinalizava que “[...] todo o regime social, toda esta vida em

reorganização, a escola e o educador, a família, todos juntos, haverão de educar as

crianças e jovens no espirito do leninismo, no espírito do marxismo”53. A educação

comunista precisa ser fundamentada na ciência e o educador necessita saber sobre

o desenvolvimento da criança. O educador, em conformidade com Krupskaya (19--),

deveria considerar as orientações de Lênin de 1920, no Congresso da União da

Juventude Comunista, a qual defendia que todo o objetivo da educação, da

instrução e do ensino são educar a juventude a moral comunista, que consiste

fundamentalmente nos interesses da luta de classe do proletariado, isto é,

desenvolver o espírito coletivo. Sobre essa questão, Lunatcharski (1988, p. 21-22)

pontuava:

Para nós é importante que o pedagogo seja o homem mais universal e perfeito do Estado, porque ele deve ser a fonte da alegre transformação dos pequenos seres que vivem em pleno processo de desenvolvimento progressivo de suas forças. [...] O pedagogo deve realizar na sua pessoa o ideal humano.

53 “[...] todo el régimen social, toda esta vida en reorganización, la escuela y el educador, la familia,

todos juntos, habrán de educar a niños y jóvenes em el espírito del leninismo, em el espírito del marxismo” (KRUPSKAYA, 19--, p. 198).

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Nesse âmbito, a tarefa do professor é possibilitar ao estudante, desde a mais

tenra idade, compreender o trabalho dos Sovietes e participar da organização deste,

assim como aprender a diferenciar as contradições que devem lutar e superar

daquilo que é preciso conservar cuidadosamente e aprimorar, isto é, ensinar à jovem

geração os fundamentos da moral comunista. “Pedagogo, ergue-te! Ergue-te,

pedagogo e, consciente da tua dignidade, toma conta da tua extremamente difícil,

mas tanto mais honrosa, função que te cabe na edificação da nova cultura!”

(LUNATCHARSKI, 1988, p. 180). O intelectual considerava o docente essencial para

a formação de uma geração futura.

Lunatcharski (1988), considerando as orientações de Lênin, convocou os

professores e intelectuais no período para dialogar sobre a participação nessa luta, e

muitos intelectuais decidiram emigrar, contudo outros tantos ficaram e assumiram o

compromisso com o novo regime para a formação de novas gerações de

professores. Lênin (1981) pontuava que apenas criando novas bases para a

educação da juventude conseguiriam que os esforços da jovem geração, no futuro,

criassem uma sociedade que não se parecesse com a antiga, isto é, a sociedade

comunista.

Lênin (1981) pontua que a tarefa da geração precedente consistia em

derrubar o regime czarista. A nova geração, a juventude, tem diante de si uma tarefa

mais complexa, isto é, edificar a sociedade comunista. Para tal, faz-se necessário o

conhecimento. “É esta a vossa missão: por ela nos deveis reger ao instruir, educar e

elevar toda a geração jovem [...] Toda a educação [...] deve inculcar-lhe o espírito da

moral comunista” (LÉNINE, 1981, p. 87-88).

Dessa maneira, a jovem geração soviética só poderá aprender o comunismo

se relacionar sua instrução, educação e formação à luta da classe trabalhadora

contra a velha sociedade czarista. No tocante ao desenvolvimento da moral

comunista, esta se constitui na disciplina solidária e unida, na luta consciente das

massas na superação da exploração, “[...] a nossa escola deve dar aos jovens os

fundamentos da ciência, a arte de forjarem por si mesmos uma mentalidade

comunista, deve fazer deles homens cultos” (LÉNINE, 1981, p. 92).

Conforme apontamos, Lunatcharski (1988) considerava a relevância das

tarefas políticas e culturais no que se referem à instrução extraescolar. Em seu

discurso na abertura dos cursos para instrutores de formação extraescolar,

pronunciado em 20 de dezembro de 1918, o intelectual analisou a discussão para a

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organização do ensino Extraescolar sob os aspectos econômicos, políticos, sociais e

pedagógicos do período em questão.

Lunatcharski (1988) apresentou as seguintes indagações: “o que é a

instrução, a quem se pode chamar um homem instruído?”. De acordo com o autor

(1988, p. 42), “um homem instruído é aquele no qual predomina a imagem humana”,

isto é, um homem intelectualmente desenvolvido, culto, o qual tem a possibilidade de

ter acesso ao conhecimento sistematizado ao longo da história da humanidade, o

que não significa dizer que seja “omnisciente”, mas sim que possa considerar: “nada

do que é humano me é alheio” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 44).

Ninguém deve ser ignorante. Cada um deve conhecer os rudimentos de todas as ciências e de todas as artes. Quer seja sapateira ou professor de química, se a alma se fechou para toda a arte, ser-se-á um ser incompleto, um deficiente, como se nos faltasse um olho ou fôssemos surdos. Por que a instrução consiste precisamente em tornar acessível a cada um tudo o que a Humanidade cria, a sua história e a sua cultura, o que se reflecte nas obras das quais o homem tira proveito, consolação, ou simplesmente, alegria de viver – mas, ao mesmo tempo, cada indivíduo deve possuir uma qualquer especialidade (LUNATCHARSKI, 1988, p. 45).

Ao discutir sobre o desenvolvimento intelectual, técnico e artístico humano, o

autor considera que os homens devem ter suas especificidades e aperfeiçoá-las,

mas não limitar-se somente a determinada área do conhecimento. É preciso ter

acesso ao conhecimento, à ciência e à arte, e nas palavras de Lunatcharski (1988,

p. 45), “de modo algum podemos admitir que a especialidade mate no homem a

cultura geral ou que a cultura geral mate no homem a especialidade”. Acrescenta

que:

E a revolução, a revolução socialista, é uma revolução da instrução tanto na escola como fora dela. Esta revolução é a da revolução da instrução do homem, uma revolução do grande amor não só dos que actualmente estão mutilados, e por isso incultos, mas pelos nossos filhos e netos que amamos por que vemos neles o homem que nós próprios gostaríamos de ser, mas que infelizmente não podemos. Esta consciência de não sermos homens sublimes torna-nos sedentos de ideal e irados contra tudo o que barra à Humanidade o caminho a esse ideal. Deste ponto de vista, a revolução é a revolta do homem que não se forma no âmbito de indivíduos isolados, mas no conjunto da sociedade, porque é impossível dar uma formação ética ao homem se não existir uma verdadeira sociedade (LUNATCHARSKI, 1988, p. 47).

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No discurso pronunciado no I Congresso de Toda Rússia para a Instrução

Extra-Escolar54, em 06 de maio de 1919, Lunatcharski (1988) apresentou as

principais tarefas concretas para a instrução Extraescolar como organização e

conteúdo, formas e meios, assim como os desafios e as possibilidades.

No tocante ao processo de instrução Extraescolar, a qual foi destinada

àqueles que, em geral, não frequentaram a escola formal, uma das fundamentais

preocupação era o analfabetismo55. Na Rússia, existia um número significativo de

analfabetos, e o objetivo era assegurar o direito e a obrigação de saber ler e

escrever. Além disso, a alfabetização do adulto deveria basear-se na leitura de

livros, dos jornais, dos decretos; as principais finalidades desse processo é o acesso

aos conhecimentos científicos, das belas-artes, da propaganda sociopolítica.

[...] todos os cursos, escolas dominicais, escolas nocturnas, escolas suplementares, todas as conferencias, etc., devem ser concebidos de modo a oferecerem um alimento intelectual tanto aos iniciados que não possuem qualquer noção cientifica, nem instrução primária, como aos que têm um grau de instrução mais elevado, indo até, porventura, à satisfação das necessidades dos homens mais cultos. Na nossa Rússia não devemos reduzir a cultura ao primitivo tornando impossível o desenvolvimento contínuo das pessoas instruídas (LUNATCHARSKI, 1988, p. 63).

54 “O supracitado Congresso realizou-se em Moscovo de 06 a 19 de maio de 1919 na presença de

cerca de 800 delegados. Nele tomou a palavra por duas vezes V. I. Lenine. O Congresso abordou questões respeitantes à instrução extra-escolar e adoptou várias resoluções: sobre a erradicação do analfabetismo, sobre a criação de um sistema de estabelecimentos estatais encarregados da instrução extra-escolar, etc. O Congresso se reunia nas difíceis condições de guerra civil, quando na primavera de 1919, as forças conjugadas dos intervencionistas e de contrarrevolução interna tinham encetado uma nova ofensiva, mais vasta que as anteriores. Além dos exércitos brancos, participavam nela tropas dos seguintes países: Inglaterra, França, Polónia, Finlândia, Checoslováquia, Sérvia, Grécia, Roménia e Estados bálticos burgueses. Caracterizando a inquietante situação militar do momento. Além dos exércitos brancos, participavam nela tropas testemunhava <<a potência do nosso movimento>> e mostrava que o desenvolvimento da instrução era uma tarefa não menos importante que a vitória sobre as forças contrarrevolucionárias, dizia Lunatcharski” (DNEPROV, 1988, p. 260).

55 O referido Congresso contribuiu para um amplo movimento público em relação ao analfabetismo no país. Os delegados convidaram o Conselho dos Comissários do Povo promulgar um decreto sobre a liquidação do analfabetismo entre a população adulta (até os 50 anos) e entre os adolescentes que não iam à escola. O projeto de decreto foi elaborado pelo Comissariado do Povo para a Instrução Pública a partir de fins de 1919, e foi Lénine que, a 26 de dezembro, assinou este decreto Sobre a Liquidação do Analfabetismo entre a População da RSFSR. Tratava-se do primeiro ato estatal do poder dos Sovietes respeitante à instrução geral e obrigatória. O decreto desencadeou uma vasta ofensiva contra o analfabetismo, assim como foi significativo para a atividade cultural. Além de que se impunha por tarefa superar o analfabetismo, o poder soviético possibilitou as condições indispensáveis para isso, tomou a seu cargo a instrução em todo o país. O Narkompros ficou responsável para fazer participar, como trabalho obrigatório, todos os cidadãos instruídos na educação dos analfabetos. O decreto prescrevia o amplo recurso às células locais do partido, aos sindicatos, ao Komsomol, às comissões de atividades entre mulheres e outras organizações. A Comissão Extra-ordinária da Rússia para a Abolição do Analfabetismo, criada a 19 de junho de 1920 junto ao Comissariado para a Instrução Pública, estava à frente do movimento nacional pela luta contra o analfabetismo (DNEPROV, 1988).

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Lunatcharski (1988) aponta ser necessário considerar as propostas para a

organização da instrução extraescolar mencionada por Krupskaia em seu discurso

inaugural no congresso, a qual afirma a relevância de relacioná-la à educação política

das massas. Desse modo, o teatro, o museu, a biblioteca, a exposição, a galeria de

pintura, o cinematógrafo devem ser instrumentos de educativos. Em concordância

com o comissário, Lênin (1981) reiterava que uma das tarefas mais imediatas, além

da superação do analfabetismo, era aprimorar a cultura da classe trabalhadora:

[...] não basta liquidar o analfabetismo; por outro lado, é preciso edificar a economia soviética e nisso não se pode ir muito longe só com base no conhecimento das primeiras letras. Necessitamos de uma enorme elevação da cultura. É necessário que o homem exerça a sua capacidade de ler e escrever, que tenha que ler, que tenha jornais e folhetos de propaganda, que estes sejam distribuídos devidamente e cheguem ao povo (LÉNINE, 1981, p. 119).

De acordo com Prestes (2017), a ênfase deveria estar nos estudos sem negar

a herança cultural, se apropriar do conhecimento historicamente elaborado e tornar

acessível a todos. E nesse contexto, não apenas o ensino extraescolar era

relevante, mas as instituições educacionais desempenhariam uma tarefa

fundamental nessa revolução cultural. Assim, Lunatcharski (1988) considerava os

seguintes questionamentos: Se a escola de classes deve ser superada, em favor da

escola comunista, como seria essa escola? Como organizá-la? Qual a função da

ciência e da arte?

A educação socialista, em oposição à de classes, conforme Lunatcharski

(1988), se apresenta como a Escola Única do Trabalho. Por exemplo, no ensino das

crianças em idade pré-escola faz-se necessária a brincadeira; o principal objetivo do

jardim de infância e dos anos iniciais de escolaridade é tornar racionais os jogos das

crianças. O autor elucida:

A dançarem, a cantarem, a recortarem, a modelarem, elas aprendem. Os educadores devem escolher sempre os jogos de maneira a fazer-lhes adquirir todos os dias novos conhecimentos, para que em cada dia aprendam alguma coisa, para que em cada dia elas possam iniciar-se neste ou naquele pequeno trabalho manual. E é preciso que isso seja interessante (LUNATCHARSKI, 1988, p. 92).

Krupskaya (2017), em seus escritos “Materiais para a revisão do programa do

partido” publicados em maio de 1917, apresenta seus argumentos afetos à

organização educacional. Pontua que a educação deve ser gratuita, geral obrigatória

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e politécnica, e o intuito da escola não é formar especialistas estreitos, mas pessoas

capazes de desenvolver todos os tipos de trabalho. Amparada nos estudos de Marx,

argumenta que o conceito de ensino politécnico “[...] inclui também o ensino do

trabalho agrícola, técnico, artístico e de artesanato; o conhecimento prático de todos

os ramos contribui para um desenvolvimento físico multilateral, produzindo hábitos

de trabalho gerais” (KRUPSKAYA, 2017, p. 62).

Lunatcharski (1988), ao tratar da educação soviética, afirma a necessidade de

organizar a Escola Única do Trabalho e considera o ensino politécnico essencial

nesse processo. Krupskaia (19--) reafirma essa questão ao discutir que a edificação

de uma nova sociedade comunista motiva na classe trabalhadora “[...] o interesse

pela técnica, o que cria premissas favoráveis para a realização da educação

politécnica que profundia este interesse e lhe proporciona uma base científica”

(KRUPSKAIA, 19--, p. 331).

Na acepção de Krupskaia (19--), é necessário que as instituições, desde a

pré-escola, desenvolvam o interesse pela técnica por diferentes meios, como:

assimilação e compreensão científica, livros, demonstrações, excursões,

observações, o estudo do processo de trabalho, assim deve aproveitar cada central

elétrica, cada ferrovia, trator, máquinas, fábrica e indústria. Nesse sentido, os

escritos de Maiakovski (2017, p. 1-20) são elucidativos:

Já vou fazer dezessete anos, está na hora de ter planos. Onde vou trabalhar, então, qual vai ser minha profissão? É preciso gente para trabalhar Na marcenaria, Na carpintaria! Fazer móveis é trabalhoso: Primeiro nós pegamos o tronco E serramos as ripas, Finas e compridas. Com essas ripas Zás-trás Encerra-se uma bancada. Soltando faísca a serra trabalha [...] Marcenaria é legal, Mas engenharia é mais ainda, Construir casas eu poderia, Só preciso que me ensinem. [...] Eu desenho primeiro a casa, Do jeito que quero. O principal no projeto de um edifício magnífico

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É que pareça real. [...] Assim cada espaço se destaca: Do banheiro ao jardim. Planta pronta e cerca de cem na obra, Um milhão de mãos à obra. [...] Engenharia é legal, Mas medicina é mais ainda, cuidar de crianças eu poderia, só preciso que me ensinem. Vou à cidade, vou ao campo. Olá, crianças! Tem alguém doente? Como vai a vida? Como anda essa barriga? [...] Medicina é legal, Mas a fábrica é mais ainda, Trabalhar na fábrica eu poderia, Só preciso que me ensinem. [...] Fábrica é legal, [...] Mas ser motorista é mais ainda, Dirigir carros eu poderia, Só preciso que me ensinem. [...] Motorista é legal, [...] Mas aviação é mais ainda, Pilotar aviões eu poderia, Só preciso que me ensinem. [...] Sobrevoo a nuvenzinha, Nuvenzinha-volante. Tal gaivota pelos ares, Voei atrás dos mares, Sem mais delongas, Sobrevoei uma montanha. Leve, motor, nos conduza Às estrelas e até à lua, Ainda que a lua e a massa de estrelas Estejam de nós tão longe. Aviação é legal, Mas a marinha é mais ainda, Navegar eu poderia, Só preciso que me ensinem. [...] O livro vire e revire mais, Depois guarde na cachola: Todos os trabalhos são legais, Escolha o que gosta mais! (MAIAKÓVSKI, 2017, p. 1-20).

Maiakovski (2017) compôs um poema visual-concreto para crianças em 1928,

no qual apresentou as profissões que estavam em evidência no período. Em

consonância com os argumentos de Lunatcharski (1988) afetos ao ensino

politécnico, o poeta descreve que desde que seja ensinado diferentes técnicas e

conhecimentos acerca dos referidos trabalhos, por exemplo, o sujeito terá

possibilidade de escolher sua preferência, sem que lhe seja limitado um

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conhecimento específico, superficial e fragmentado ou estabelecido por sua classe

social.

Nesse sentido, Lunatcharski (1988) defende que a essencialidade da escola

deve ser estreitamente relacionada ao trabalho. A partir disso, o trabalho se

configura como matéria de estudos, como o ensino da técnica em sua totalidade,

sendo um processo coletivo, no qual se faz possível a formação de traços de caráter

e personalidade indispensáveis na sociedade em que se busca constituir.

O homem não vive para trabalhar, mas trabalha para viver humanamente. É nesta vocação da natureza humana que reside a sua dignidade que o distingue do animal, porque o animal não é consciente. O homem é um trabalhador, e a natureza é o seu material. A sua finalidade é transformar a natureza segundo o seu ideal. As palavras de Marx eram ouro quando dizia: a ciência que nos precede tem interpretado o mundo de maneiras diferentes, o nosso objetivo é, porém, o de o transformar56 (LUNATCHARSKI, 1988, p. 19).

No discurso pronunciado na Assembleia Geral dos Sindicatos de Empregados

da Instrução Pública e de Artistas, em 22 de maio de 1923, em Tomsk, Lunatcharski

(1988) apresenta as ideias fundamentais da política pedagógica e os princípios

filosóficos da escola soviética. O autor descreve os objetivos da instrução. “Desde a

sua mais remota idade, desde os primeiros estádios do seu desenvolvimento, desde

que abordamos o homem como objeto de estudos históricos e etnológicos, que

constatamos o grande papel da instrução” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 136). Os

homens, diferentemente dos animais, são produto da instrução. A cultura e o

conhecimento elaborados ao longo da história da humanidade, acumulados de

geração em geração, são transmitidos às novas gerações por meio do ensino. Isto é,

o que determina o desenvolvimento do indivíduo é o acúmulo de experiências,

expresso nas universidades, nos laboratórios, nas bibliotecas.

[...] É esta particularidade da sociedade humana – o facto de reproduzir à sua imagem os seus pequenos concidadãos a partir de um pedaço de homem por via de contágio, inoculando-lhe os seus costumes, os seus conhecimentos, os seus ideais – esta particularidade é a instrução [...] (LUNATCHARSKI, 1988, p. 138).

56 “Lunatcharski parafraseia os escritos de Marx: ‘Os filósofos têm apenas interpretado o mundo de

maneiras diferentes; a questão, porém, é transformá-lo’ (MARX, E.; ENGELS, F. Obras Escolhidas em Seis Tomos. Lisboa: Edições Avante, 1982, t. 1, p. 3)” (DNEPROV, 1988, p. 249).

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Dessa forma, a educação é um processo que compreende dois elementos: “o

do crescimento ininterrupto da organização da experiência humana [...], e o método

que permite dar acesso às crianças a cada etapa desse progresso fazendo-as assimilar

a experiência adquirida ao longo dos milénios” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 138).

O autor afirma que “a escola não pode, pois, ser honesta em um regime

burguês, não pode ser científica, só em certa medida é científica no plano da

educação” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 148). Ao contrário, se configura a escola

soviética, cujos princípios são fundamentados no socialismo científico, uma escola

única para todas as classes sociais, utilizando os mesmos métodos de ensino, todos

os indivíduos têm possibilidades absolutamente iguais. Em segundo lugar, é uma

escola do trabalho. Conforme o autor,

[...] Temos também em vista o ensino do trabalho em si. Esse ensino do trabalho (diferentemente do ensino técnico, em que apenas se trata de fazer de um homem um bom operário) entendemo-lo nós como fazendo parte da instrução geral. Não se trata de formar um bom torneiro ou um bom operário têxtil, mas de ensinar o homem a conhecer o trabalho. O actual trabalho cientificamente orientado na agricultura e na indústria é uma pura e total cristalização da ciência (LUNATCHARSKI, 1988, p. 149).

Sendo assim, consideramos essencial uma escola politécnica, cuja

especificidade é a ciência. “Ora, nós temos também o objetivo da educação: que

pode ser realizado por um ensino justo da história e da ciência social e por uma boa

organização da vida escolar” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 150). Sendo assim, o

intelectual define qual a função da escola:

[...] Queremos formar um homem que seja o mais harmonioso possível no plano moral e espiritual, que tenha uma instrução geral completa e que facilmente possa adquirir uma qualificação num qualquer domínio. Propomo-nos também formar um autêntico colaborador benevolente para com seus concidadãos, queremos formar um camarada para com todas as outras pessoas e, enquanto a luta durar, um combatente pelo ideal socialista (LUNATCHARSKI, 1988, p. 150).

Nessa perspectiva, o autor considera:

E cada pedagogo, se compreender bem a sua missão, ao entrar na aula ou noutro local onde as crianças brinquem, ou ainda ao conduzi-las em excursão ao campo, deve sentir que realiza algo solene que deve fazer vibrar de alegria o seu coração, porque está a viver o

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milagre da transfiguração da Humanidade. Se ele compreender que imensa liberdade de acção e de criatividade lhe é dada neste domínio sagrado, com que paixão a revolução a isso o chama e a que ponto – apesar de toda a sua pobreza – ela está pronta a vir mais depressa em sua ajuda, então, provavelmente, no seu coração maravilhado, apesar de todas as dificuldades, nos seus melhores momentos, ele ficará profundamente reconhecido ao proletariado revolucionário e ao seu guia – o Partido Comunista da Rússia! (LUNATCHARSKI, 1988, p. 156).

Lunatcharski (1988) refirma a relevância do ensino científico a ser ministrado.

Em relação às matérias escolares, propôs que fossem mantidas, mas organizadas

para serem agrupadas ou unificadas. Destaca que a única matéria de estudo é a

cultura humana, a qual compreende as ciências naturais e suas relações com a

natureza humana. Concomitantemente à instrução científica, a educação física

(desenvolvimento do corpo) e a educação estética (desenvolvimento da criação)

devem desempenhar uma significativa função. “É este, para nós, o único método,

segundo a nossa concepção do mundo profundamente humana” (LUNATCHARSKI,

1988, p. 21). A tela “No estádio”, de Aleksandr Samokhválov (Figura 11), elucida a

idealização do novo homem: altivo, forte e determinado.

Figura 11 – Aleksandr Samokhválov. No estádio. Óleo sobre tela. 121 x 140,5 cm. 1934-1935

Fonte: RADIANTE PORVENIR (2018, p. 63).

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No tocante à educação física, o intelectual afirmava que era necessário

desenvolver o corpo a fim de se tornar ágil, são e belo, seguir em sua higiene, que

inclui diversos exercícios especiais que proporcionam ao homem uma boa saúde.

Cabe ressaltar, que a temática afeta às atividades físicas, esportivas, foi uma das

mais destacadas na arte soviética da metade da década de 1920 e 1930.

A referida obra (Figura 10) traduz em imagem a idealização do novo homem.

A luminosidade da tela evidencia a dinamicidade do movimento das figuras humanas

compostas. O artista retratou a cultura física, representada por diferentes

modalidades esportivas, como a “alegria da existência”, que fortalece o homem na

superação das limitações na luta por edificar uma nova vida e desenvolver o espírito

coletivo.

A partir disso, compreendemos que um dos aspectos discutidos pelo

comissário era a superação da escola de classes e o desenvolvimento de uma

escola para todos, a Escola Única de Trabalho, na qual se priorizava o ensino

politécnico, científico e estava intimamente relacionada com as questões

econômicos e políticas do período.

A intervenção pronunciada por Lunatcharski (1988) no debate da Casa dos

Sindicatos, em 4 de dezembro de 1922, refere-se à função da escola para o Estado

proletário, a qual tende a superar as classes. Esse período foi de significativa

discussão da Nova Política Econômica (NEP).

Lembrais-vos desse plano. Era o plano de instalação da escola única politécnica do trabalho. A escola única tal como os comunistas a concebem consiste em suprimir qualquer fosso entre a escola de classe para os trabalhadores das camadas sociais inferiores e a escola de classe privilegiada para as crianças das camadas médias e superiores. A escola deve ser única para toda a população no sentido jurídico, no sentido do nível de instrução ao qual cada criança tem direito (LUNATCHARSKI, 1988, p. 114).

O autor trata três aspectos relevantes afetos à temática em discussão: a

escola deve ser destinada ao Estado proletário; sua defesa deve ser pela Escola

Única do Trabalho; sendo esta a condição necessária para realização do ideal

socialista. Nesse âmbito, o papel educativo do trabalho configura-se no

desenvolvimento intelectual e físico do indivíduo.

O ensino de primeiro grau deve possibilitar o jogo, isto é, a apropriação dos

conhecimentos por meio da brincadeira. Deve ser baseada na horta, no pomar, na

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criação de animais, por exemplo, o gado. No tocante à escola de segundo grau, é

preciso buscar fazer dela a escola do trabalho – politécnica, o objetivo consiste na

ideia de um trabalho cientificamente organizado. Fazem-se necessários esforços

para estabelecer relações com a indústria, utilizar-se delas para excursões e instalar

laboratórios ou oficinas (LUNATCHARSKI, 1988).

No tocante à gestão escolar, o intelectual em questão afirmava que “Não se

pode obrigar as crianças a ficarem sentadas várias horas nas carteiras a respirarem

a poeira e o ar viciado. Aí tratar-se-ia já não de diversidade, mas de estupidez”

(LUNATCHARSKI, 1988, p. 21). Da mesma maneira, além da alfabetização, a

instrução política é de extrema relevância. Devemos formar uma juventude capaz de

prosseguir os seus estudos na Universidade.

Na acepção de Lunatchaski (1988), mesmo com as urgências da sociedade

da época, sobretudo para o desenvolvimento econômico do país, a responsabilidade

escolar não deveria ser baseada essencialmente no controle de ações políticas e

preparação profissional. “Esse ideário custou particularmente ao Comissário e a

Krupskaia incontáveis embates com as lideranças comunistas, sobretudo pela

necessidade urgente de a URSS formar trabalhadores e especialistas”. Cabe

lembrar que nesse período havia um debate significativo em defesa do ensino

profissionalizante (CHAVES, 2018, p. 9).

Diante dos desafios enfrentados para a consolidação de uma sociedade

comunista após a Revolução de Outubro de 1917, os objetivos imediatos se fazem

necessários: a defesa nacional, fortalecimento da economia e a instrução pública, as

quais se configuram nas principais tarefas. Isto é, preparar para a defesa, para o

trabalho, assim como para os cargos de responsabilidade do Estado soviético,

significa educar homens dedicados a esta causa. E é esta também a tarefa da

instrução, formar o novo homem comunista. “A nossa educação consiste em

aproximar da realidade todos os andares do edifício da instrução. A vida instrui, e

não tanto a vida, em si, como a opinião pública que nessa vida ganhou profundas

raízes” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 160).

Nesse sentido, a tela “Trabalhador de choque (construtor do socialismo)”

(Figura 12), do pintor Alekséi Volter, busca retratar as características e sintetizar o

modelo do novo homem soviético.

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Figura 12 – Alekséi Volter. Trabalhador de choque (construtor do socialismo). Óleo sobre tela. 107 x 71,5 cm. 1932

Fonte: RADIANTE PORVENIR (2018, p. 37).

O trabalho, que havia adquirido relevância na União Soviética para o

desenvolvimento econômico do país, assim como estava presente na formação do

novo homem, se representa na referida obra como uma disposição constante de se

apropriar das novas tarefas produtivas. A paisagem industrial, que mostra a vista,

serve como fundo apropriado para a figura monumental, que trata das enormes

dimensões da construção socialista na qual participava o personagem retratado.

No relatório para o I Congresso da URSS dos docentes (que ocorreu em

Moscou, de 11 a 19 de janeiro de 1925), publicado pela primeira vez no “Jornal dos

Docentes”, em 16 de janeiro de 1925, o autor afirma que “sem a ciência, sem a

escola como eixo fundamental de desenvolvimento, não iremos, claro, a parte

nenhuma” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 161). Considera que no desenvolvimento

cultural do povo concomitantemente o meio e o objetivo da edificação socialista.

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Discorremos acerca do segundo aspecto fundamental para compreendermos

a proposta educacional de Lunatcharski, a defesa pela ciência especialmente na

escola, que na sociedade comunista se constituiu como a Escola Única do

Trabalhado, pautada pelo ensino politécnico, isto é, a educação em favor do pleno

desenvolvimento humano, que de acordo com o intelectual, estava intimamente

relacionado com a educação artística, terceiro aspecto que discutimos a seguir.

Lunatcharski (1988), atento às questões afetas à arte e sua função na

educação, assevera que o desenvolvimento humano é inseparável da arte e da

educação estética. Em sua autobiografia, afirmava que enquanto trabalhava como

propagandista bolchevique e como comissário do povo para a educação,

“[...] continuei minhas atividades literárias, em particular as do dramaturgo. Eu

escrevi uma série inteira de peças, uma parte das quais foram montadas e

representadas” (LUNACHARSKY, 1972, p. 273, tradução nossa)57. Foi autor de

diversos trabalhos relativos à música, teatro, pintura, arquitetura, ética, estética,

questões sobre a história do pensamento filosófico e revolucionário, política

internacional, educação, religião e literatura. Destacamos suas peças: “O Barbeiro

do Rei” (1906); “Fausto e a Cidade” (1918); “Oliver Cromwell” (1920); “Tommaso

Campanella” (1922); “Don Quixote Libertado” (1922); “O Veneno” (1926), entre

outras (LUNATCHARSKI, 1988).

Defendeu que a Arte está intimamente relacionada a todo o trabalho afeto à

instrução e à formação humana, a qual não deve apenas formar o homem, sua

personalidade, mas também formar a humanidade, a sociedade (LUNATCHARSKI,

1988).

Se continuarmos a repetir que devemos combater o analfabetismo, vulgarizar o saber científico, as artes, e contribuir para a escolhe de homens de espírito criador, preocuparmo-nos com a educação técnica e física, já vedes que ilimitado campo de acção se abre diante de nós. Entretanto, não devemos deixar de estar conscientes de que a propaganda política deve penetrar tudo isso qual fio condutor vermelho [...] (LUNATCHARSKI, 1988, p. 71-72).

O autor continua,

57 “continué mis actividades literarias, en particular las de dramaturgo. Escribí toda una serie de

piezas, una parte de las cuales se montaron y representaron [...]” (LUNACHARSKY, 1972, p. 273).

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Para já, o marxismo procedeu a uma nova e profunda análise de toda a história da humanidade, a um reexame de todos os fundamentos da sociedade que nos cercam e obteve resultados a tal ponto enormes que podemos dizer: todo o conhecimento, toda a matéria científica pode ser ensinada de modo a fazer parte do edifício da concepção socialista do mundo. Podemos aí abrir um caminho partindo de toda a ciência. A partir de toda a ciência podemos penetrar no coração do edifício social [...] (LUNATCHARSKI, 1988, p. 71-72).

Lunatcharski (1988) destacava a relevância de as escolas oferecer, além dos

conhecimentos científicos, formação cultural dos escolares. Krupskaia (19--)

reafirmava que a educação escolar referente à arte deveria possibilitar os elementos

da história da arte, música, artes plásticas, do teatro e da literatura em favor do

desenvolvimento do seu pensamento e sentimentos.

Há que tentar dar a nova geração a possibilidade de expressar seus pensamentos e sentimentos de forma mais pleno e multifacetada. Penso que sim, já que a expressão da forma aos pensamentos e faz mais profundos os sentimentos. O homem cresce ao expressar-se. Assim como no processo de fala, tanto oral como escrita, o homem torna-se conhecedor dos seus pensamentos, da mesma forma, ao expressar suas emoções em música, dança ou mímica, o homem conhece melhor a si mesmo [...] (KRUPSKAIA, 19--, p. 181, tradução nossa)58.

Krupskaia (19--), ao proferir um discurso sobre a atenção às artes plásticas na

escola, pontua que esta tem um relevante valor educativo para o desenvolvimento,

especifcamete da memória visual e da imaginação, assim como o desenvolvimento

do espírito coletivo e dos sentimentos.

Nesse sentido, “[...] Uma obra de arte é sempre um reflexo original, isto é,

subjetivo, da realidade ou dos fenómenos da consciência humana” (LUNATCHARSKI,

1988, p. 183). Por esse motivo, o autor considera a criação infantil – o desenho e,

sobretudo, a narração oral e escrita – como elemento relevante da educação,

habilidade que se desenvolve e se aprimora à medida que o ensino avança.

No tocante à linguagem literária, Lunatcharski (1988) afirma que, além do

ensino da gramática, sem o estudo dos modelos clássicos não é possível um 58 “Hay que tratar de dar a la nueva generación la posibilidad de expresar sus pensamientos y

sentimientos de la forma más plena y multifacética. Pienso que sí, ya que la expresión da forma a los piensamientos y hace más profundos los sentimientos. El hombre crece al expresarse. Así como en el proceso de habla, tanto oral como en su forma escrita, el hombre se da mejor cuenta de sus pensamientos, de la misma forma, al expresar sus emociones en la canción, el baile o la mímica, el hombre se conoce mejor a sí mismo [...]” (KRUPSKAIA, 19--, p. 181).

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significativo desenvolvimento no domínio da língua como instrumento de criação e

influência artística sobre os indivíduos. Faz-se necessário considerar os clássicos

como principal modelo a ser estudado, mas é um equívoco desconsiderar a literatura

contemporânea. Entretanto, devemos estar atentos à forma e ao conteúdo.

Há que ensinar primeira às crianças, bem entendido, não só o conteúdo, mas também a forma de uma obra (desde que elas tenham atingido a idade que lhes permita semelhante abordagem); chamar a sua atenção para a musicalidade, o colorido e a expressividade desta ou daquela frase, para a plasticidade, o dinamismo desta ou daquela figura e mostrar como e por que meios esse efeito foi obtido – isso faz parte da leitura das obras clássicas que deve ser feita na escola. Ao mesmo tempo, no curso de iniciação aos clássicos, é conveniente salientar de preferência o que eles têm de conjuntural [...] e de permanente, o que continua profundo e importante para o nosso tempo, indicando porquê este ou aquele grande artista-pensador chegou a determinada fórmula pertinente que por vezes não perde a sua pertinência durante milênios (LUNATCHARSKI, 1988, p. 185).

Os escritos de Duarte (2010) analisam a relação entre a riqueza cultural

acumulada historicamente pela humanidade e a subjetividade individual. A arte

expressa as contradições humanas, a unidade entre a essência e a aparência; o

autor considera que a dialética entre subjetividade e a obra de arte “pode ser uma

importante fonte de informações sobre o tema mais amplo da dialética entre a

formação do indivíduo e a objetivação do gênero humano” (DUARTE, 2010, p. 148).

Com base nessa proposição, entendemos que a Arte movimenta e expressa o

desenvolvimento do homem que a cria e, com ela, estabelece alguma relação. Marx

(1844) assinala a capacidade de criação desenvolvida pelo homem; compreende a

Arte como desdobramento do trabalho, e ambas as atividades, o trabalho e a Arte

constituem objetivações materiais e não-materiais capazes de diferenciar o homem

dos animais. Sendo assim, a Arte é uma das formas de revelar o ser social,

representa a ação que vai além das necessidades imediatas, isto é, a atividade,

realização progressiva da essência humana e que auxilia na transformação dos

ouvidos, dos olhos, dos órgãos biológicos em órgãos humanos. A arte como

atividade humana, oriunda de uma realidade social, revelando-a e contendo, em si,

elementos para potencializar a superação dessa mesma realidade, traduz o próprio

processo educativo (BARROCO; CHAVES, 2010).

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No que diz respeito ao processo educativo e ao desenvolvimento humano,

Lunatcharski estabelecia diálogos entre os estudiosos do período de diferentes

áreas, como a psicologia. Como exemplo, o intelectual Vigotski, ao se dirigir a

Londres, no verão de 1925, como representante do Comissariado do Povo para a

Instrução Pública para participar do Congresso Internacional sobre Ensino e

Educação de crianças surdas-mudas. Este recebeu uma carta com instruções de

Lunatcharski, antes de sua partida, datada de 7 de julho daquele ano:

[...] Participar ativamente do trabalho da conferência e suas sessões, com o objetivo de conhecer a experiência e os avanços tecnológicos das escolas europeias e americanas na educação de crianças surdas-mudas. O senhor está encarregado de fazer uma palestra sobre a organização e os princípios da educação social das crianças surdas-mudas na República Federativa Socialista Soviética da Rússia, detendo-se na questão sobre a relação entre o nosso sistema e os princípios gerais da educação social, assim como nos avanços e especificidades metodológicas do nosso sistema, que podem despertar interesse por parte de outros países [...] O resumo da palestra deve ser impresso e distribuído entre os participantes da Conferência. O senhor deve também participar da exposição e fazer todo o possível para satisfazer o interesse dos delegados estrangeiros sobre a situação da educação das crianças surdas-mudas na RFSSR. O relatório sobre o trabalho realizado deve ser apresentado pelo senhor ao Comissariado do Povo para Instrução imediatamente após seu retorno (VIGODSKAIA; LIFANOVA, 1996, p. 84-84, apud PRESTES, 2012, p. 53).

Conforme Prestes (2012), esse documento estava guardado nos arquivos da

família de Vigotski. Retratam as orientações de Lunatcharski sobre a relevância do

processo educativo, assim como a função que o professor tem na “tarefa de

transmitir à nova geração tudo o que os séculos acumularam de válido e não

transmitir os preconceitos, os vícios e as doenças que Vigotski se engaja no trabalho

de instrução e formação das crianças e adolescentes” (PRESTES, 2012, p. 27).

Lunatcharski (1988, p. 209-210) afirmava:

Dai-lhe, então, grandes meios, tomai a consciência de que, por intermédio das suas mãos, fazeis crescer o ramo vivaz em nome do qual lutamos, em nome do qual existimos, e sem o qual não valeria a pena viver nem lutar. É o que de mais importante há na nossa luta.

Prestes (2012) assevera que entre os anos de 1925 e 1930 os estudos do

grupo de Vigotski, denominado troika, sobre a psicologia e a educação, na busca de

superar a “velha psicologia”, desempenharam uma significativa contribuição na

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formação de professores. Nos termos de Lunatcharksi (1988, p. 209), “para a

formação de um homem novo fica perfeitamente claro que, do ponto de vista da

influência consciente sobre o curso do processo educativo, a nova escola surge

como uma das tarefas essenciais”.

A teoria histórico-cultural, desenvolvida por um grupo de cientistas que liderava, foi um marco importante para a psicologia mundial e serviu de base para o desenvolvimento da psicologia como ciência. É preciso lembrar, como já dito anteriormente, que o contexto histórico à época em que Vigotski desenvolveu suas ideias influenciou seu trabalho. O desejo de aprender com o método de Marx guiou seus estudos; para ele o importante era o que o marxismo oferecia para a psicologia se constituir como ciência (PRESTES, 2012, p. 46).

As pesquisas de Vigotski, Leontiev e Luria, amparadas no método marxista,

apresentavam a concepção de que as habilidades ou funções psíquicas humanas,

como a memória, atenção, concentração, pensamento lógico, linguagem,

imaginação, criação, entre outras, não são inatas ao indivíduo, mas se desenvolvem

durante a vida em um processo de educação, resultado de apreensão da

experiência social acumulada ao longo da história da humanidade, pelas gerações

precedentes, as quais são elaboradas pela sociedade (PRESTES, 2012).

A formação do novo homem e da nova escola, baseada nos princípios

humanistas, deixando no passado a “velha escola”, se pautava na ciência e na arte

(LUNATCHARSKI, 1998). Chaves (2018) pontua que as referidas questões

associadas ao desenvolvimento intelectual e às condutas sociais necessárias, novos

hábitos, que exigiam à época estavam presentes nos estudos vinculados à

Educação e Psicologia, áreas importantes ao considerarmos o contexto soviético

dos anos 1920 e 1930.

Nesse âmbito, Chaves (2018) ressalta que são significativas as pesquisas

daquele período sobre o desenvolvimento intelectual, sobretudo as afetas à

educação e à arte, as de estudiosos como Vigotski (2009), por exemplo. Segundo a

autora, “Essa atenção à aprendizagem e ao ensino estavam preservados o espírito e

conteúdo político que viriam ou deveriam vir nas elaborações de outros intelectuais e

psicólogos da URSS” (CHAVES, 2018, p. 10). Para exemplificar, mencionamos

Leontiev (1978), Luria (1986), Elkonin (1988), Liublinskaia (1973) e Teplov (1977).

Cabe lembrar que Vigotski (2009), em seus estudos, combatia o entendimento

da “velha psicologia” em favor da formação do novo homem comunista, de que a

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criação, por exemplo, é algo místico ou destino de alguns gênios eleitos e que na vida

de uma pessoa comum não haja criação. Ao contrário, asseverava que toda obra de

criação se constitui a partir de elementos hauridos da experiência anterior do

indivíduo. Dessa forma, o desenvolvimento dessa capacidade e de habilidades

técnicas artísticas configuram-se tarefa da educação.

Vigotski (2009) discorre acerca da importância de criar necessidades que nos

permitam o trabalho com a defesa de disponibilizar às crianças elementos da riqueza

cultural existente. Em consonância com Chaves (2011a), ampliar e enriquecer suas

vivências implica, necessariamente, em não limitá-las às experiências imediatas e

individual, únicas vivências que a sociedade capitalista lhes reservou, argumento

defendido por Lunatcharski.

Lunatcharski, com uma formação filosófica consistente e um conhecimento

significativo pela cultura, apreciador da arte e da literatura, expressa em seus

escritos, particularmente os que compõem nossa obra de referência

(LUNATCHARSKI, 1988), sua concepção de educação, homem e sociedade. O

princípio político que se firma é a edificação de uma sociedade comunista e a

formação do novo homem em favor do seu pleno desenvolvimento, mediante o

conhecimento acumulado historicamente pela humanidade, a ciência e a arte. Nessa

acepção, refletimos a seguir sobre as contribuições do intelectual para a educação

brasileira na atualidade.

3.4 AS CONTRIBUIÇÕES DE LUNATCHARSKI PARA A EDUCAÇÃO BRASILEIRA

NA ATUALIDADE

Assinalamos no decorrer desta seção que Lunatcharski, Comissário do Povo

para Instrução Pública, após a Revolução de Outubro de 1917, na Rússia, foi

responsável pela edificação do princípio educacional soviético. Sua defesa consistia

em transmitir a todos o conhecimento, antes privilégio de uma ínfima parte da

sociedade, “levando as massas a uma tomada de consciência elevada ao máximo”,

por meio da ciência e da arte (LUNATCHARSKI, 1988, p. 9). O objetivo que se

firmou foi possibilitar ao povo todas as riquezas historicamente acumuladas pela

humanidade.

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Chaves (2018, p. 8) afirma que esse argumento, que constitui na essência o

principal fundamento da defesa da Revolução de Outubro de 1917, “[...] de um lado

fez estremecer os defensores do capitalismo e, de outro, pela primeira vez na

história da humanidade, se anunciou, com a Revolução Bolchevique, a possibilidade

de máximo desenvolvimento humano e social”.

Nesta subseção, refletimos sobre as possíveis contribuições da proposição de

Lunatcharski (1988) aos desafios educacionais brasileiros na atualidade em favor de

uma Educação humanizadora e emancipadora. Nosso intuito é responder a uma de

nossas indagações anunciadas na introdução desta dissertação: “Quais as possíveis

contribuições da proposição de Lunatcharski aos desafios educacionais brasileiros

na atualidade?”.

Em nossa análise, consideramos que o contexto da Revolução Russa

contribui para a compreensão da proposição de Lunatcharski e de suas elaborações,

particularmente a obra de referência “Artigos e Discursos sobre a Instrução e a

Educação” (1988). Reafirmamos que estudar os principais aspectos históricos e a

organização econômica e política da URSS foi fundamental para conhecermos a

defesa de educação desse intelectual, assim como sua atuação política. Atentarmo-

nos à especificidade da Educação na Rússia Revolucionária, especificamente no

período compreendido entre 1917 e 1929, e aos escritos de Lunatcharski (1988) não

exclui, ao contrário, estabelece como necessidade considerar a dinâmica da

sociedade capitalista na atualidade.

Lunatcharski (1988), em seu artigo intitulado “Premissas sociológicas da

Pedagogia Soviética”59, afirmava que os escritos marxistas, sobretudo as premissas

sociológicas, são significativos para a análise da sociedade e instrumento

indispensável para mudá-la. Dessa forma, a finalidade da educação relaciona-se

com o regime vigente, “[...] dos processos sociais gerais, e a sociedade marxista pode

demonstrar que existe uma concordância total entre a instrução pública e o fim social

para o qual ela se desenvolve e que ela serve” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 189), isto

é, a educação não se explica por si mesma, o que significa asseverar que os

fenômenos são explicados pela organização econômica e política da sociedade em

determinado período. 59 Artigo publicado pela primeira vez na Enciclopédia Pedagógica, em 1927. A primeira Enciclopédia

Pedagógica Soviética, redigida por ocasião do décimo aniversário da Revolução Russa de Outubro de 1917, foi organizada em três volumes, a fim de analisar e sistematizar, em uma perspectiva marxista, questões da educação e do ensino, na qual se encontravam referencias e estudos afetos à pedagogia, os setores do ensino público e do trabalho educativo, cultural. Lunatcharski, Krupskaia, Blonski, Chatski e outros intelectuais compuseram a redação do material (DNEPROV, 1988).

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Nessa perspectiva, Lunatcharski (1988) defende a Escola Única do Trabalho,

apesar da pobreza da Rússia, ainda nos primeiros anos após a Revolução de

Outubro de 1917, e da desigualdade econômica que em partes se mantivera,

constatou os êxitos significativos na criação de uma escola acessível para todos. “As

normas da escola única, comportando a todos os níveis de ensino direitos iguais

para crianças igualmente dotadas, devem continuar a ser as inabaláveis normas do

nosso edifício” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 192).

O intelectual em pauta, em seus artigos e discursos, postulava que a

Educação tinha uma relação indissociável com as tarefas econômicas e políticas,

especialmente nos primeiros anos do governo soviético, nos quais se buscava a

constituição da sociedade comunista. Para tal, era necessário considerar os

seguintes elementos, conforme pontuamos, o poder governamental, econômico e o

conhecimento; dessa forma, a luta da classe trabalhadora pela liberdade, isto é, uma

tomada de consciência ao máximo, se edificaria (LUNATCHARSKI, 1988).

Na atualidade, há determinados conceitos e valores em constante discussão

em diferentes esferas, nas escolas, mídia ou nos próprios lares. Destacamos como

um desses conceitos em evidência a “liberdade” no que diz respeito à defesa de

Lunatcharski (1988). Pensemos na liberdade anunciada na esfera econômica e

explicada por Antunes (2009b, p. 234):

Entre as distintas formas de flexibilização – em verdade, precarização – podemos destacar, por exemplo, a salarial, de horário, funcional ou organizativa. A flexibilização pode ser entendida como “liberdade da empresa” para desempregar trabalhadores; sem penalidades, que a produção e as vendas diminuem; liberdade, sempre para a empresa, para reduzir o horário de trabalho ou de recorrer a mais horas de trabalho; possibilidades de pagar salários reais mais baixos do que a paridade de trabalho exige; possibilidade de subdividir a jornada de trabalho em dia e semana segundo as conveniências das empresas, mudando os horários e as características do trabalho (por turno, por escala, em tempo parcial, horário flexível etc.); dentre tantas outras formas de precarização da força de trabalho.

Antunes (2009b) revela, no que se refere às questões econômicas, a falsa

ideia de liberdade anunciada pelas empresas como flexibilização, com efeito, é a

precarização do trabalho, que favorece, particularmente, as empresas. De acordo

com o autor, sendo o trabalho uma necessidade humana e desenvolvimento do seu

potencial emancipador, que deve superar o trabalho que aliena, pensemos,

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brevemente, nas contradições presentes nesse processo na sociedade capitalista:

“O que deveria ser fonte de humanidade se converte em desrealização do ser social,

alienação e estranhamento dos homens e mulheres que trabalham” (ANTUNES,

2009b, p. 232).

[...] com a advento do capitalismo, houve uma transformação essencial que alterou e complexificou o labor humano. Essa dupla dimensão presente no processo de trabalho, que ao mesmo tempo cria e subordina, emancipa e aliena, humaniza e degrada, oferece autonomia, mas gera sujeição, libera e escraviza, impede que o estudo do trabalho humano seja unilateralizado ou mesmo tratado de modo binário e dual (ANTUNES, 2009b, p. 233).

Lunatcharski (1988) ressaltava que a economia, o trabalho tem como tarefa

desenvolver e formar o novo homem, pois o homem antigo educado no capitalismo

era insatisfatório. A sociedade de classes, dividida entre “senhores e escravos”, é

considerada pelo autor “anti-humana”, na qual desenvolve-se o espírito

individualista, de desprezo pelas massas. Dessa maneira, encontra-se por fim o

trabalho que se expressa como insatisfação. Naquele período, fato que

consideramos na atualidade, era muito frequente, por exemplo, conseguir um

emprego de escritório, com obrigações técnicas que fazem com que todos os dias se

parecessem uns aos outros, o que significa afirmar que afastava, no plano moral e

cultural, muitos camaradas de cada combate.

Nesse aspecto, de acordo com Saviani e Duarte (2010), amparados nos

estudos de Marx (1985), o que faz o homem um representante do gênero humano é

a atividade vital, a qual assegura a vida de uma espécie. No caso dos seres

humanos, é o trabalho – funções definidas pela prática social. Contudo, ao longo da

história social marcada pela divisão das classes antagônicas, as relações de

produção caracterizaram-se pela divisão social do trabalho. Os autores esclarecem:

Nas sociedades divididas em classes antagônicas, os resultados da produção material realizada pelas classes dominadas beneficiam as classes dominantes. No caso da sociedade capitalista, uma parcela considerável dos produtos da atividade de trabalho é incorporada ao capital, ou seja, a apropriação dos produtos da atividade humana dá-se sob uma forma social que aliena esses produtos da classe que os produz (SAVIANI; DUARTE, 2010, p. 426).

Saviani e Duarte (2010) apontam que na sociedade capitalista, o trabalho

produz riqueza, porém esta não é plenamente apropriada por aqueles que

trabalham. O produto do trabalho é uma mercadoria que pertence ao capital, ou

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seja, o trabalho é entendido como alienação e exteriorização, não expressa a

individualidade do trabalhador, mas é alheio a quem o produziu. Nesse sentido, os

escritos de Marx (1985, p. 108) são elucidativos:

[...] Certamente o trabalho produz maravilhas para os ricos, porém produz privações para o trabalhador. Produz palácios, porém para o trabalhador produz choupanas. Produz beleza, porém deformidades para o trabalhador. Substitui o trabalho por máquinas, porém lança uma parte dos trabalhadores a um trabalho bárbaro, e converte em máquinas a outra parte. Produz espírito, porém gera estupidez e cretinice para o trabalhador.

Antunes (2017), em seu texto “Da educação utilitária fordista à da

multifuncionalidade liofilizada”, escrito para a 38ª Reunião Nacional da Anped, que

ocorreu em São Luís - MA, discorre acerca da relação existente entre a educação e

o modo de produção capitalista, o qual, desde a predominância do sistema taylorista

e fordista de organização do trabalho, é um projeto de educação baseado em

escolas técnicas, ditas profissionalizantes, ao longo do século XX. Analisa o autor

que nas últimas décadas, sobretudo a partir de 1970 aos dias atuais, vem sendo

profundamente alterado.

Ao contrário da rigidez estabelecida nas fábricas do século XX, com a

globalização o mundo do capital informacional-digital vem impondo uma nova divisão

internacional do trabalho, que se configura em trabalhos parciais, precários,

temporários, rebaixamento salarial acentuado, perda dos direitos, ampliação do

desemprego estrutural, desemprego por desalento, terceirização, informalidade,

flexibilidade, isto é, sua precarização, por exemplo, o trabalho on-line que desmantelou,

em geral, a separação entre o tempo de vida no trabalho e fora dele. Assim, se

ampliam as maneiras “modernas” de escravidão digital (ANTUNES, 2008; 2017).

Antunes (2000) reflete acerca da necessidade de se alterar a lógica da

produção societal, a qual, prioritariamente, contrária à lógica do mercado, deve ser

voltada para a produção de “coisas socialmente úteis”, tendo como critério o “tempo

disponível” e não o “tempo excedente”, isto é, possibilitaria ao trabalhador, de fato,

um tempo livre com sentido e significado para além da esfera do trabalho, o que é,

em geral, negado na sociedade regida pela capitalismo. “O tempo livre atualmente

existente é tempo para consumir mercadorias, sejam elas materiais ou imateriais”

(ANTUNES, 2000, p. 173).

De acordo com Antunes (2017), essa nova a organização do trabalho passa a

desenvolver uma empresa “flexível e liofilizada”, que necessita do trabalho

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“multifuncional”. Isso nos permite refletir sobre a questão educacional nessa nova

fase do capital em termos que a formação para o mercado de trabalho, a criatividade

e a adaptação às constantes mudanças de tarefas, objetivos e tecnologias,

passaram a ser exigidas aos trabalhadores, assim como a capacidade do “aprender

a aprender”60. Sobre essa questão, Duarte (2000, p. 55) afirma:

Aqueles que pensam que desenvolvem mecanismos de resistência à mundialização do capitalismo por meio da defesa dos direitos das chamadas minorias e da defesa do multiculturalismo não percebem que a dinâmica da universalização do mercado possui uma plasticidade que lhe permite assimilar os fenômenos culturais locais, transformando-os em mercadorias e utilizando-se deles de forma ideológica, para legitimar do ponto de vista ético a manutenção das desigualdades sociais. [...] em nome do respeito à alteridade e da convivência pacífica entre os povos e entre os grupos culturais são perpetuadas as divisões e exclusões necessárias à reprodução do capital.

Nesse cenário, Moraes (2001) ressalta as decorrentes imposições do sistema

capitalista em todas as esferas os países em desenvolvimento se obrigam a buscar

alternativas que lhes possibilitem a participação no “complexo jogo econômico

mundializado”. Tais ações têm efeito sobre as práticas sociais, e particularmente

sobre a educação – e se apresentam, de modo significativo, nos documentos,

planos, diretrizes e nas políticas públicas educacionais, seguindo as orientações dos

organismos internacionais, as quais, de modo geral, asseguram a centralidade da

educação básica nas atuais circunstâncias políticas e econômicas.

Lunatcharski (1988) declara que a vida em si e o sistema econômico e político

na sua totalidade educam a nova geração. O intelectual, ao estudar o modo como a

instrução pública está organizada na sociedade burguesa, menciona a defesa de

Marx sobre as contradições existentes, assim como a ilusória igualdade dos direitos

políticos e a desigualdade econômica de fato. Essa questão é discutida por Lênin

(1980), o qual escrevia que:

60 A expressão “aprender a aprender” são capacidades expressas em documentos internacionais

para a Educação como no Relatório Jacques Delors (1996), o qual orientou reformas e políticas educacionais no Brasil na década de 1990, seus princípios se apresentam, por exemplo, Parâmetros Curriculares Nacionais das séries iniciais (1997). Sobre esta questão Duarte (2000) explica: “O lema ‘aprender a aprender’ desempenha um importante papel na adequação do discurso pedagógico contemporâneo às necessidades do processo de mundialização do capitalismo, pela sua interna vinculação à categoria de adaptação que ocupa lugar de destaque no discurso político-econômico neoliberal [...]” (DUARTE, 2000, p.56).

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[...] Marx lutou acima de tudo contra as ilusões da democracia pequeno-burguesa e do democratismo burguês. Marx ridicularizou acima de tudo as palavras ocas acerca de liberdade e da igualdade quando elas encobrem a liberdade dos operários de morrer de fome ou a igualdade entre aquele que vende a sua força de trabalho e o burguês, que aparentemente, compra livremente e em condições de igualdade no mercado livre a força do seu trabalho, etc. (LÊNIN, 1980, p. 116).

Dessa forma, reiteramos que o conceito de liberdade amplamente discutido

na atualidade é anunciado de maneira aparente, fato que testemunhamos na esfera

econômica, que fundamenta as políticas educacionais. Conforme pondera Antunes

(2009; 2017), a ideia que as “reformas educacionais” referem-se à sua concepção de

uma escola flexibilizada para atender as exigências e os imperativos empresariais;

uma formação instável, superficial e instituída para atender as necessidades do

mercado de trabalho. O pesquisador pontua que a Educação, em geral,

particularmente do século XXI, não poderá desenvolver um sentido humanista e

crítico, isto é, uma Educação emancipadora.

Moreira (2012, p. 106) expõe que a partir da década de 1970, no Brasil e na

América Latina, o neoliberalismo “doutrina ideológica que resgata os ideais do

liberalismo clássico econômico e que foram retomados para favorecer e legitimar as

novas reorganizações econômicas do capitalismo na sua fase mundializada” se faz

presente nas discussões educacionais. Dessa maneira, uma política mundial de

“ajuda” aos referidos países se desenvolveu por meio de orientações advindas de

algumas agências internacionais61 que compõe a ONU. Dentre essas agências,

destacamos, no tocante às políticas públicas e gestão da educação: o Banco

Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), O Fundo Monetário

Internacional (FMI), a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe

(CEPAL), a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e para a

Cultura (UNESCO)62, entre outras.

61 “A criação de diversos organismos internacionais como: ONU, FMI, OIC e o BID, ao longo do

século XX, foi uma expressão da forma de internacionalização do capital, que prevaleceu neste período que relacionava sistemas econômicos, a partir de poderes políticos nacionais ou plurinacionais. Visava, sobretudo, regulamentar políticas macroeconômicas e programas de reconstrução dos países pobres, visando construir uma estabilidade necessária para a livre circulação de capital. Para além de adotar políticas econômicas aos países pobres, visava controlar governos, enfim a vida de todos os povos. Os mecanismos de controle econômicos tomam formas cada vez mais complexas e eficientes de dominação cultural, e de conservação da sociedade da mercadoria” (SILVA, 2011, p. 153).

62 No que se refere aos estudos no Estado do Paraná afetos às agências internacionais para as orientações das políticas educacionais brasileira mencionamos a tese “O papel dos Estados Unidos e da UNESCO na formulação e implementação da proposta pedagógica no Estado do Paraná na década de 1960: o caso da Educação no Jardim de Infância (CHAVES, 2008).

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Chaves (2008) afirma que a dependência da educação para com a esfera

econômica e política implica compreender que as políticas educacionais não

desconsideram a lógica mundial de organização da economia. Nesse sentido,

Mészáros63 (2008, p. 35), reafirmando os escritos marxistas, pontua:

A educação institucionalizada, especialmente nos últimos 150 anos, serviu – no seu todo – ao propósito de não só fornecer os conhecimentos e o pessoal necessário à máquina produtiva em expansão do sistema do capital, como também gerar e transmitir um quadro de valores que legitima os interesses dominantes, como se não pudesse haver nenhuma alternativa à gestão da sociedade, seja na forma “internalizada” (isto é, pelos individuais devidamente “educados” e aceitos) ou através de uma dominação estrutural e uma subordinação hierárquica e implacavelmente impostas (MÉSZÁROS, 2008, p. 35).

A partir dessa assertiva, observamos que mesmo o autor escrevendo para as

demandas de seu contexto, a educação na atualidade, por diversas vezes, é

colocada em função da manutenção da ordem econômica e política vigente. De

acordo com Chaves (2018), na atualidade presenciamos no Brasil um acentuado

debate afeto à educação, se configuram discursos, proposições e documentos

oficiais ou orientadores que reafirmam a relevância da Educação escolar e sua

relação com as questões econômicas e políticas.

Em nosso entendimento, tais discussões expressam um princípio e um

conteúdo político que necessitam ser compreendidos. Nas últimas décadas do

século XX, a partir da Constituição Federal de 1988, seguiram-se estudos, debates e

legislação (CHAVES, 2018). Mencionamos a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

(LDB) (Lei nº 9.394/96), e os documentos como o Referencial Curricular Nacional

para a Educação Infantil (RCNEI) (BRASIL, 1998), e os elaborados recentemente

para o Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa (PNAIC) (BRASIL, 2015) e a

Base Nacional Comum Curricular (BNCC)64 (BRASIL, 2017a), a qual anuncia

orientações a fim de nortear os currículos dos sistemas e redes de ensino do Brasil,

assim como as propostas pedagógicas das escolas públicas e privadas de Educação 63 István Mészáros nasceu em 1930 em Budapeste, Hungria, onde completou os estudos

fundamentais. Somente após o final da Segunda Guerra Mundial (1945) pode se dedicar aos estudos. Começou a trabalhar com Georg Lukács (1885-1971) no Instituto de Estética da Universidade de Budapeste em 1951 e defendeu sua tese em 1954. As instituições educacionais colocadas em função da manutenção da ordem capitalista tem sido um dos temas enfrentados pelo autor (MÉSZÁROS, 2008).

64 Sobre esta temática, mencionamos algumas referências de artigos para refletirmos sobre o documento em questão: Ferreti e Silva (2017); Gonçalves (2017); Saviani, D. (2016) e Souza (2018).

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Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, amparada no desenvolvimento de

competências.

A fim de refletimos sobre a formação humana na sociedade brasileira, citamos

a reforma do Ensino Médio a partir da Lei n. 13.415, em fevereiro de 2017, que

busca atender as orientações dos organismos internacionais. Gonçalves (2017)

assinala que a proposta que se anuncia é que as únicas disciplinas obrigatórias

durante essa etapa da Educação Básica são Português e Matemática; as demais

disciplinas se configuram em itinerários formativos, currículo composto pela BNCC,

com ênfase nas seguintes áreas do conhecimento ou de atuação profissional:

I – linguagens e suas tecnologias; II – matemática e suas tecnologias; III – ciências

da natureza e suas tecnologias; IV – ciências humanas e sociais aplicadas; V –

formação técnica e profissional (BRASIL, 2017b), sendo estes escolha de cada

estudante, que poderá também optar por uma formação técnica profissional.

Conforme a Lei, a critério dos sistemas de ensino poderá ser composto o itinerário

integrado – componentes curriculares da BNCC e dos itinerários formativos citados.

O modelo de flexibilização se faz presente, por exemplo, na referida reforma,

que anuncia a liberdade de escolha por uma área de conhecimento. Em nosso

entendimento é falsa liberdade, assim como compõe os documentos norteadores da

Educação Nacional como a BNCC, que anuncia o desenvolvimento de competências

capazes de se adaptar aos desafios do mundo contemporâneo. Em nossa análise,

isso pressupõe a preparação para o mercado de trabalho, que se expressa como a

formação da mão de obra para capital. Moraes (2003, p. 152) explica:

[...] O discurso é claro: é preciso, agora elaborar uma pedagogia, um projeto educativo de outra natureza, e assegurar o desenvolvimento de competências, valor agregado a um processo que, todavia, não é o mesmo para todos. Para alguns, exigem-se níveis crescentemente altos de aprendizagem, situados em um domínio teórico-metodológico que a experiência empírica por si só, é incapaz de garantir. Para a maioria, porém, bastam as competências no sentido genérico que o termo adquiriu nos últimos tempos, as quais permitem a sobrevivência nas franjas de um mercado de trabalho com exigências diferenciadas e níveis de exclusão jamais vistos na história [...].

Conforme Moraes (2003), para a maioria é proposto um currículo flexível, que

evidencia a condição imediata do sujeito, em busca de atender às demandas do

mercado de trabalho, marcado pelo esvaziamento do conteúdo científico, na

atualidade, caracterizada pela negação da ciência e pelo recuo da teoria. Arendt

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(2008), ao tratar dos “tempos sombrios”, afirma que a miséria para as condições

básicas de sobrevivência e para as questões afetas à alimentação, saúde soma-se à

miséria para o desenvolvimento da condição intelectual.

Chaves (2014b) pontua que as ações escolares cotidianas estão tomadas de

elementos que podem favorecer uma Educação humanizadora, plena ou

subserviente, desoladora e desencantadora. Uma Educação de excelência, em

harmonia com a defesa de Lunatcharski (1988), contrariando a lógica dominante,

não desconsidera a condição de miséria. Nas instituições educativas, essa

desigualdade econômica se expressa de inúmeras formas: na organização do

espaço, na escassez de materiais didático-pedagógicos, na desvalorização do

conhecimento e da arte, assim como na fragilidade e aligeiramento da formação e

capacitação inicial ou continuada dos profissionais da educação. Tais elementos

expressam o valor que a sociedade capitalista atribui às crianças, sobretudo

oriundas da classe trabalhadora (CHAVES, 2011a).

Ao considerar os enfretamentos para a superação da lógica capitalista,

Lunatcharski (1988) afirma que a escola tem uma dupla tarefa, por um lado,

possibilitar a todos as conquistas do passado no tocante à ciência e à arte, e, por

outro lado, superar a lógica da escola de classes. Dessa forma, amparado nos

estudos marxistas, afirma a necessidade de compreendermos “[...] a incompatibilidade

particularmente profunda que existe entre as formas da instrução pública ditadas

pelos interesses e a vontade das classes dirigentes, e a educação que responderia

aos interesses das massas exploradas” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 189). Assim, a

sociologia pedagógica tem por tarefa essencial analisar “raízes naturais” da instrução

pública e relacionar os princípios pedagógicos aos objetivos do comunismo, opondo-

se às teorias burguesas, isto é, superar o antigo e elaborar o novo, “ser um

combatente e um criador”.

O intelectual em questão realizou a seguinte reflexão: que homem queremos

formar? Em sua concepção, o sujeito que satisfaça suas necessidades e desenvolva

todas as suas capacidades humanas. Para tal, deve receber uma formação geral,

tornar-se um homem para o qual nada do que é humano lhe é alheio, para, assim,

realizar suas escolhas, sejam pessoais ou profissionais, em favor do coletivo. A

escola “deve dar à criança, ao adolescente, conhecimentos politécnicos, isto é, a

assimilação, com a ajuda de exemplos, dos princípios de base, das leis

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fundamentais, dos processos essenciais do trabalho aperfeiçoado, cientificamente

organizados” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 232).

A partir disso, reafirmamos a defesa pelo conhecimento. Lunatcharski (1988)

desenvolvendo as teses de Lênin acerca da função da escola na edificação da

sociedade comunista e na formação do novo homem, que em sua conferência,

realizada no dia 23 de maio de 1928, em Leningrado, analisa as tarefas

educacionais da escola, do conteúdo e das formas de educação moral, física,

estética e de trabalho, historicamente desenvolvidos.

Assim, ao estudarmos o passado e fazê-lo reviver por meio de visitas ao

museu, estudando coleções e no presente abordá-lo implantando-os na vida,

inserindo-os nela mais intimamente. “Isto leva-nos à questão da educação artística”

(LUNATCHARSKI, 1988, p. 236). De acordo com o autor, é necessário organizar a

própria vida, contraditória sobretudo por meio da arte, seja da música, literatura,

teatro, cinema, artes plásticas.

Ao refletirmos sobre as contribuições dos escritos de Lunatcharski para a

atualidade, compreendemos que a organização de procedimentos didático-

pedagógicos, priorizando o conhecimento científico e a arte, pode proporcionar uma

aprendizagem e desenvolvimento que favoreçam a emancipação humana. Assim, os

escritos de Vigotski (2009, p. 23) são elucidativos: “A conclusão pedagógica que se

pode chegar com base nisto consiste na afirmação da necessidade de ampliar a

experiência da criança [...] Quanto mais a criança viu, ouviu e vivenciou mais ela

sabe e assimilou [...]”.

Vigotski (2009) explica a relevância dos estudantes terem vivências ricas e

enriquecedores em seu processo educativo. Quanto maior o acesso às elaborações

humanas, mais possibilidades terão para aprender e desenvolver, em especial, suas

funções psicológicos superiores, como memória, atenção, concentração, linguagem,

imaginação e criação, assim como o desenvolvimento afetivo, coletivo e estético, em

favor de uma educação emancipadora, argumento que se harmoniza com a defesa

de Lunatcharski (1988).

Gramsci (1891-1937), intelectual italiano, em seu texto “Homens ou

Máquinas” (2004, p. 75), afirma que a escola não deve servir para a escravidão e

orientação mecânica, instruir, em suas palavras “[...] para um ofício, sem ideias

gerais, sem cultura geral, sem alma, mas só com o olho certeiro e a mão firme”, mas

conduzir para a liberdade por meio do conhecimento, isto é, “disciplinar-se é tornar-

se independente e livre” (GRAMSCI, 2004, p. 87).

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Nessa perspectiva, Lunatcharski (1988) ressaltava ser necessário

desenvolver nos processos educativos elementos de coletividade e de disciplina; o

coletivo deveria ser a essência da aquisição da disciplina. Em relação ao conceito de

liberdade, Lunatcharski (1988, p. 228), amparado nos escritos de Engels, realizou

uma reflexão relevante sobre o contexto soviético afirmando que o comunista

“durante a luta é a humanidade escravizada que arranca os seus grilhões vivos

constituídos por corpos humanos e pela viva consciência dos seus inimigos de

classe”, isto é, a busca pela liberdade, por meio do conhecimento.

Ao considerarmos essa assertiva, retomamos a epígrafe escolhida para

compor esta dissertação, em que Lunatcharski (1988) afirmava a necessidade da

cultura para constituir uma sociedade comunista e que sem a cultura o comunismo

estaria destituído de sentido. No que diz respeito à edificação de uma sociedade

comunista, podemos considerar a seguinte citação como uma reflexão pertinente

aos dias atuais: “[...] cultura, instrução, ciência, arte – não são apenas outros tantos

meios para atingir os nossos fins. São ao mesmo tempo a nossa mais nobre

finalidade” (LUNATCHARSKI, 1988, p. 162).

Para Lunatcharski (1988), por meio da ciência, arte, cultura e instrução as

novas gerações podem assimilar a experiência das anteriores, ficam em seus

ombros, se apropriam do conhecimento, em busca de resistir, como quer Chasin

(2000), as contradições econômicas e políticas impostas pelo capitalismo, que em

geral se expressam na estrutura da Educação de maneira fragmentada,

reproduzindo a lógica de mercado e a divisão social do trabalho, sendo o acesso ao

conhecimento seletivo e desigual (SAVIANI, D.; DUARTE, 2015).

Reiteramos a discussão que, em uma lógica, na atualidade, de permanente

esforço individual para se adequar às constantes mudanças das condições de

trabalho, no sentido de sua precarização,

[...] Preconiza-se como ambiente próprio a uma escola dinâmica e adequado ao século XXI a reprodução da dispersão em diversas atividades simultâneas que só se podem realizar de forma superficial e imediatista. Concentração, esforço intelectual e abstração para aproximar o aluno aos clássicos do conhecimento são coisas tidas como pertencentes a um passado inapelavelmente superado (SAVIANI, D.; DUARTE, 2015, p. 3).

A luta pela efetivação da especificidade, isto é, pelo conhecimento, da escola

se faz essencial, sobretudo no que tange ao ensino dos clássicos. Lunatcharski

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(1988) pontuava a relevância de priorizar o que os autores clássicos têm de

conjuntural e de permanente, o que continua fundamental para o nosso tempo, a

compreensão porque tal intelectual ou artista não perde sua pertinência durante

milênios.

Em concordância com Saviani D. e Duarte (2015, p. 6), “o acesso ao clássico

é a condição necessária para a formação humana”. Nesse sentido, a formação de

professores se configura como fundamental nesse processo, seja inicial ou

continuada. De acordo com Chaves, Lima e Groth (2012), a discussão inicial com os

profissionais da Educação deve priorizar o referencial teórico-metodológico. Em

nosso entendimento, a Teoria Histórico-Cultural é capaz de favorecer reflexões para

aos desafios da atualidade, e a partir disso “propor e planejar os trabalhos com o

que podemos considerar, neste momento da história, de mais avançado enquanto

recurso, estratégia e conteúdo” (CHAVES; LIMA; GROTH, 2012, p. 13).

Assim, em concordância com Chaves (2011a), a relevância de estudos

consequentes e contínuos, sobretudo dos clássicos da Educação e da Psicologia, e

em nosso entendimento, a proposta de Educação elaborada por Lunatcharski

(1988), podem favorecer a avaliação e recondução do todo da prática educativa.

Isso implica levar à discussão a função da escola em uma perspectiva de

humanização e emancipação.

Nessa lógica, em conformidade com Faustino (2006), a educação só poderá

ser emancipadora e promover a autonomia se associada aos conhecimentos

científicos acumulados historicamente pela humanidade à disposição de todos, como

quer Lunatcharski (1988). Só assim o indivíduo poderá conseguir compreender a

condição de exploração na qual se encontra, fazer escolhas políticas/culturais e

verificar que as mudanças podem e devem ocorrer.

Por meio dos escritos de Lunatcharski (1988), fortalecemos nossa reflexão

sobre sua contribuição à Educação na atualidade, que em meio aos desafios e às

contradições há possibilidades de vislumbramos uma formação humana pautada na

ciência e na arte, conforme os versos sensíveis e contundentes da música “Metal

Contra as Nuvens”, de Renato Russo (1960-1996), ou das letras de resistência e

esperança compostas por Chico Buarque (1944), em especial a canção “Apesar de

Você”. Com base no exposto, e a fim de finalizar nossos escritos, apresentamos na

sequência nossas considerações finais sobre este estudo, reafirmando os

posicionamentos defendidos ao longo deste trabalho.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados sistematizados a partir dos estudos realizados junto ao

Programa de Pós-Graduação em Educação (PPE/UEM) e ao Grupo de Pesquisa e

Estudos em Educação Infantil (GEEI) permitem-nos reafirmar que as instituições

educativas podem se apresentar como espaços de acesso ao conhecimento científico

elaborado historicamente pela humanidade e à arte. Para tal, as intervenções

pedagógicas precisam ser tomadas por intencionalidade, a fim de possibilitar os

escolares a aprendizagem e desenvolvimento.

Nossa argumentação nesta dissertação foi motivada pelas vivências e estudos

realizados no GEEI. Dentre nossas experiências destacamos a participação no

Projeto Ciranda, juntamente com os estudantes da Pedagogia do Campo; o

acompanhamento nas palestras, nos cursos e nas formações continuadas, sob

orientação da prof. Dra. Marta Chaves, em alguns municípios do Paraná e em Monte

Negro, RO; destacamos especialmente a participação no “I Seminário de Municípios

Integrados”, em Cruzeiro do Iguaçu-PR, assim como aprimoramos nossos estudos

como estudante do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPE) da UEM, na

disciplina “Linguagem, pensamento e conteúdo escolar”, ministrada pela líder do

Grupo. Nessas situações de estudos do GEEI, nos aproximamos dos autores

clássicos, particularmente das elaborações de Lunatcharski (1988).

Nesse sentido, nos atentamos à formação de professores, como ressalta

Chaves (2014a), a avaliação e a recondução das intervenções pedagógicas são

possíveis por meio de uma proposta de formação fundamentada em estudos

contínuos, em favor de uma educação humanizadora. Com base nisto, ressaltamos o

objetivo geral de nosso trabalho: apresentar a proposta de Educação defendida por

Anatoli Vassilievitch Lunatcharski (1875-1933). Para tal, amparamo-nos nas

elaborações de Lunatcharski sobre a Educação na Rússia Revolucionária organizadas

em coletânea de artigos e discursos, particularmente na obra “Artigos e Discursos

sobre a Instrução e a Educação” (LUNATCHARSKI, 1988), composta por quatorze

textos, escritos entre 1918 a 1928.

Para a realização deste estudo, nos fundamentamos nas pesquisas dos

Clássicos da Ciência da História e da Teoria Histórico-Cultural, em que vigora a

premissa de que os homens e suas ideias são resultado de sua existência material.

Assim, considerar o contexto e estudar os principais aspectos históricos e a

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organização econômica e política da URSS se fizeram necessários para

compreendermos as elaborações e a proposição educacional de Lunatcharski (1988),

assim como sua atuação política naquele período.

Na primeira seção, contextualizamos os principais acontecimentos econômicos

e políticos da Rússia czarista. Verificamos que em meio às condições de miséria dos

trabalhadores, estudantes e intelectuais do período se aproximaram das elaborações

marxistas, processo fundamental para compreendermos a luta revolucionária que se

efetivaria posteriormente.

Lunatcharski crescia em meio às lutas sociais desenvolvidas na Rússia. Por

volta da década 1890, quando ainda era aluno no liceu de Kiev, se aproximou do

movimento revolucionário, realizou agitação e propaganda em fábricas, oficinas e nos

grupos operários e ingressou no Partido Social-Democrático Russo em favor da luta

por uma sociedade comunista. Estudou na Universidade de Zurique, assim como

viajou e aprimorou sua formação filosófica e política em alguns países da Europa,

como Alemanha, França e Itália.

Lunatcharski seguiu em dedicação à sua atuação como militante e aos seus

estudos, desenvolvendo seus escritos fundamentais para compreendemos a relação

entre arte, cultura e formação humana. O intelectual participou significativamente da

luta pela construção de uma consciência revolucionária, especificamente nas

revoluções de 1905 e outubro de 1917, para a edificação de uma nova sociedade e a

formação do novo homem comunista.

Após a Revolução de Outubro de 1917, uma das principais tarefas era

possibilitar o acesso ao conhecimento à classe trabalhadora. Desse modo, foi criado o

Comissariado do Povo para a Instrução (Narkompros), o qual Lunatcharski presidiu, e

a Comissão de Estado para a instrução pública, que compreendia as sessões de luta

contra o analfabetismo para a construção de escolas, formação dos docentes,

organização do ensino politécnico, da medicina e da higiene escolares, da educação

pré-escolar e da assistência às crianças, assim verificamos que as bases

educacionais não foram reformadas, mas sim criadas, em favor da formação de um

novo homem comunista.

Na segunda seção, a fim de a atender ao objetivo geral, apresentamos a

proposta de Educação defendida por Anatoli Vassilievitch Lunatcharski. Para tal,

inicialmente realizamos um levantamento da produção acadêmica brasileira, teses e

dissertações dos últimos dez anos (2007-2017). Verificamos a ausência de trabalhos

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que versam detidamente sobre os aspectos biográficos e a proposta educacional de

Lunatcharski, fato que reafirmou a pertinência do estudo ora desenvolvido.

O contexto de miséria tomado pela guerra, frio e fome que a Rússia vivenciava

mobilizou a luta e enfrentamentos dos trabalhadores pela conquista de possibilidades

de condições melhores. A partir da Revolução de Outubro de 1917, a educação é uma

das questões priorizadas pelo governo bolchevique com o intuito de consolidar uma

nova sociedade e formar um novo homem comunista. Desse modo, o Narkompros

tinha como tarefa a organização das questões culturais, a estruturação do sistema

educacional do país e elaboração dos princípios da nova escola soviética.

Lunatcharski (1988), em seus artigos e discursos, afirmava que as questões

educacionais tinham relação indissociável com as tarefas econômicas e políticas dos

primeiros anos do governo soviético. Considerava que a organização do sistema de

educação era uma das tarefas mais relevantes para que o novo regime se firmasse.

Nesse sentido, na busca por superar uma escola de classes, defendia a Escola Única

do Trabalho, cuja função é o pleno desenvolvimento das capacidades e

potencialidades humanas desde a pré-escola, que passou a integrar o sistema de

educação, ao ensino superior. Destacava a relevância do ensino politécnico, a

instrução como base da cultura e a arte como imprescindível para a formação

humana.

Chaves (2018, p. 17) afirma “que as condições objetivas da Rússia

determinavam medidas específicas e imediatas, e ao mesmo tempo, convidavam a

edificar uma prática e, portanto, uma concepção de educação revolucionária”. Dessa

forma, os conhecimentos científicos foram, significativamente, considerados,

sobretudo na proposta educacional de Lunatcharski, que consistia em possibilitar a

todos o acesso ao conhecimento, antes privilégio de uma ínfima parte da sociedade,

“levando as massas a uma tomada de consciência elevada ao máximo”, por meio da

ciência e da arte (LUNATCHARSKI, 1988, p. 9). Isto é, o objetivo que se firmou foi

possibilitar ao povo todas as riquezas historicamente acumuladas pela humanidade.

Cabe ressaltar que em meio às condições adversas, o país se consolidou como uma

potência na indústria, na ciência e na cultura.

Verificamos que a atenção atribuída aos desafios e êxitos alcançados na

Rússia, assim como a proposta educacional elaborada por Lunatcharski (1988),

contribuem para refletirmos acerca da Educação brasileira da atualidade, sobretudo

no que se refere às questões econômicas e políticas, estabelecendo a necessidade

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de considerar a dinâmica da sociedade capitalista atual e suas implicações no âmbito

educacional.

Ao considerarmos o poder governamental, econômico e o conhecimento a luta

da classe trabalhadora pela liberdade, isto é, uma tomada de consciência ao máximo,

se edificaria, como pontua Lunatcharski (1988). Destacamos, assim, o conceito de

liberdade, que na esfera econômica se expressa como a precarização do trabalho

(ANTUNES, 2000; 2009a; 2009b; 2017).

Constatamos que a Educação é organizada para atender os objetivos do

sistema capitalista, oferecer o mínimo para a classe trabalhadora visando à formação

para o mercado. Ao compreendermos isso, rompemos com a ideia da ineficácia da

educação atual, conforme os dados oficiais do governo; pelo contrário, ela é eficaz

para atender e manter o capitalismo.

Reafirmamos a necessidade da formação de professores, inicial ou continuada,

amparada no estudo dos clássicos, para compreendermos a dinâmica econômica e

política para além do imediato, da aparência (KOSIK, 1976). Nessa perspectiva, se

firma a possibilidade de superar práticas docentes fragmentadas e esvaziadas de

sentido e significado. Em nossa análise, por meio dos estudos contínuos é possível

planejarmos e reconduzirmos as intervenções pedagógicas, priorizando a ciência e a

arte, com recursos aprimorados, que mobilizem o desenvolvimento intelectual, assim

como o espírito solidário e coletivo dos estudantes, como propôs Lunatcharski (1988).

Ressaltamos a essencialidade da Educação escolar em favor dos

conhecimentos afetos à Ciência e à Arte. Uma proposta pedagógica que reflita as

potencialidades das crianças e “a necessidade da intencionalidade educativa em favor

da emancipação, em oposição à ideia de assistência e limite para a criança aprender

e ter determinadas ações apresenta-se enquanto condição elementar para uma

educação humanizadora” (CHAVES, 2011a, p. 63).

Por fim, citamos Lunatcharski, que dedicou sua vida em favor da edificação de

uma sociedade comunista, elaborou os fundamentos da escola soviética tendo como

base sua defesa por uma Educação que possibilitasse o desenvolvimento intelectual e

humano de todos, superando a ideia dos privilégios da escola de classes, tanto no

que se refere à educação formal quanto ao ensino extraescolar, constituído no

período a partir do conhecimento científico e artístico acumulados historicamente pela

humanidade. Assim como este autor, defendemos que uma formação de professores

coerente pode possibilitar alcançar esse fim, a plena liberdade à classe trabalhadora,

isto é, a humanização e a emancipação.

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REFERÊNCIAS

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