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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO NA SAÚDE
VALTER LUIZ MOREIRA DE REZENDE
A INSERÇÃO DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE EM UM
CURSO DE MEDICINA ORIENTADA PELAS DIRETRIZES
CURRICULARES NACIONAIS DE 2014
Goiânia 2018
ii
VALTER LUIZ MOREIRA DE REZENDE
A INSERÇÃO DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE EM UM CURSO DE MEDICINA ORIENTADA PELAS DIRETRIZES
CURRICULARES NACIONAIS DE 2014
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino na Saúde – nível Mestrado Profissional da Universidade Federal de Goiás para obtenção do Título de Mestre em Ensino na Saúde.
Orientador: Profa. Dra. Edna Regina Silva Pereira
Coorientação: Profa. Dra. Alessandra Vitorino Naghettini
Goiânia 2018
v
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO NA SAÚDE DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
MESTRADO PROFISSIONAL EM ENSINO NA SAÚDE
BANCA EXAMINADORA
Aluno (a): Valter Luiz Moreira de Rezende
Orientador (a): Dra. Edna Regina Silva Pereira
Coorientador (a): Dra. Alessandra Vitorino Naghettini
Membros:
1. Dra. Edna Regina Silva Pereira
2. Dra. Maria Auxiliadora Carmo Moreira
3. Dra. Maria Goreti Queiroz
Suplentes:
1.Dra. Maria de Fátima Nunes
2. Dra. Vardeli Alves de Moraes
Data: 14/12/2017
vi
Persistam, então, em buscar primeiro o Reino e a justiça de Deus, e todas
essas outras coisas lhes serão acrescentadas. Portanto, nunca fiquem
ansiosos por causa do amanhã, pois o amanhã terá suas próprias
ansiedades. (Mateus 5.33-34)
vii
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos que contribuíram para a realização desta pesquisa
e estiveram ao meu lado.
A Deus, por me dar a vida e a força para desenvolver este trabalho.
Aos meus pais e família, em especial minha mãe, por serem o
suporte e a referência para que eu chegasse até aqui.
À orientadora Edna Regina Silva Pereira, pelos ensinamentos
transmitidos e disponibilidade ofertada
À Bárbara Rocha e Alessandra Naguettini, por terem me coorientado
e auxiliado em etapas importantes desta pesquisa
Às professoras Eliana Goldfarb e Maria Auxiliadora Carmo Moreira.
Por terem participado da banca de qualificação e defesa e contribuído com
suas orientações
À UniEvangélica e a COREME, por terem me apoiado e liberado para
participar do mestrado.
Aos alunos e docentes que participaram da pesquisa, pela
disponibilidade e carinho demonstrado.
Aos professores do mestrado, em especial à professora Ida Helena
Menezes e Maria Goretti Queiroz, por transmitirem seus conhecimentos.
Aos meus colegas do mestrado, por dividirem conhecimentos e
dificuldades no caminhar destes últimos dois anos.
Sumário viii
SUMÁRIO
TABELAS, FIGURAS E ANEXOS ........................................................... x
SÍMBOLOS, SIGLAS E ABREVIATURAS .............................................. xi
RESUMO ........................................................................................... xiii
ABSTRACT ........................................................................................ xiv
1 INTRODUÇÃO ................................................................................. 1
2 REFERENCIAL TEORICO ................................................................. 4
2.1 O curso de medicina e a formação médica ................................ 4
2.2 A Atenção Primária à Saúde e a Medicina de Família e
Comunidade ..................................................................................... 6
2.2.1 Atenção Primária à Saúde .................................................. 6
2.2.2 Medicina de Família e Comunidade .................................... 9
2.3 Sistema de saúde brasileiro .................................................... 10
2.4 DCN e formação para APS na graduação ................................ 12
2.5 O curso de Medicina da UFG e as transformações curriculares
....................................................................................................... 15
3 OBJETIVO(S) ................................................................................ 17
3.1. Objetivo Geral ....................................................................... 17
3.2. Objetivos Específicos ............................................................. 17
4 MÉTODO (S) .................................................................................. 18
4.1 Tipo de pesquisa ..................................................................... 18
Sumário ix
4.2 Local do Estudo ...................................................................... 18
4.3 Participantes da pesquisa ...................................................... 18
4.4 Coleta de dados ...................................................................... 19
4.4.1 Análise documental .......................................................... 19
4.4.2 Grupo focal ....................................................................... 21
4.5 Análise de dados ..................................................................... 23
4.6 Questões éticas ...................................................................... 24
5 ARTIGO (S) ................................................................................... 25
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................. 58
7 REFERÊNCIAS ............................................................................... 60
8 PRODUTOS .................................................................................... 67
9 ANEXOS e APÊNDICES .................................................................. 74
Tabelas, figuras e anexos x
TABELAS, FIGURAS E ANEXOS
Quadro 01. Descrição da análise documental comparativa entre os
documentos referentes ao perfil esperado do egresso............................... 30
Quadro 02. Descrição da análise documental comparativa entre os
documentos referentes à Atenção à Saúde............................................... 31
Quadro 03. Descrição da análise documental comparativa entre os
documentos referentes à Gestão em Saúde ............................................. 33
Quadro 04. Descrição da análise documental comparativa entre os
documentos referentes à Educação em Saúde .......................................... 36
Figura 1- Passos metodológicos da análise documental ............................. 20
Símbolos, siglas e abreviaturas xi
SÍMBOLOS, SIGLAS E ABREVIATURAS
AMB Associação Médica Brasileira
APS Atenção Primária à Saúde
Capes Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior
CEBES Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
CEP Comitê de Ética e Pesquisa
CFM Conselho Federal de Medicina
CINAEM Comissão Interinstitucional de Avaliação Nacional do
Ensino Médico
CNRM Comissão Nacional de Residência Médica
COAPES Contratos Organizativos de Ação Pública Ensino-Saúde
DAB Departamento de Atenção Básica
DCN Diretrizes Curriculares Nacionais
ESF Estratégia de Saúde da Família
EUA Estados Unidos da América
GP General Practitioner
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
MEC Ministério da Educação
MEPES Mestrado Profissional em Ensino na Saúde
MFC Medicina de Família e Comunidade
MGC Medicina Geral Comunitária
MS Ministério da Saúde
NHS Matinal Health System
OMS Organização Mundial da Saúde
ONU Organização das Nações Unidas
OPAS Organização Pan-Americana de Saúde
PET-SAÚDE Programa de Educação pelo Trabalho dos Profissionais
de Saúde
Símbolos, siglas e abreviaturas xii
PROMED Programa de Incentivo às Mudanças Curriculares dos
Cursos de Medicina
PRÓ-SAÚDE Programa de Reorientação da Formação Profissional em
Saúde
SMS Secretaria Municipal de Saúde
SUS Sistema Único de Saúde
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UBS Unidade Básica de Saúde
UFG Universidade Federal de Goiás
Resumo xiii
RESUMO
As novas diretrizes curriculares nacionais (DCN) do curso de medicina preveem uma formação com maior foco na Atenção Primária à Saúde (APS). A Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG), buscando estas mudanças e adaptando-se às DCN de 2014, criou um novo Projeto Pedagógico de Curso (PPC). O objetivo deste estudo é descrever e compreender a implementação e o desenvolvimento do currículo do curso de Medicina da UFG na perspectiva das DCN de 2014 com o enfoque na APS. Pesquisa de abordagem qualitativa do tipo estudo de caso, que busca descrever e compreender os processos de mudanças ocorridos no currículo de medicina da UFG após a implementação do novo projeto pedagógico em 2014. Os dados foram coletados por meio de análise documental e dois grupos focais, um com alunos e outro com docentes. A análise documental consistiu em um processo onde o PPC atual foi avaliado e comparado às DCN de 2014. Para análise dos dados obtidos por meio de grupos focais utilizou-se análise de conteúdo. Os resultados e a discussão foram descritos em dois artigos. No primeiro, que apresenta a análise documental, observou-se que, embora os documentos contemplem a maioria dos aspectos relacionados ao ensino da APS, faltam determinações para o ensino do método clínico centrado na pessoa, do respeito à autonomia do paciente e da tomada de decisão compartilhada. No artigo dois, que apresenta o produto dos grupos focais, a percepção de discentes e docentes foi que o desenvolvimento do novo currículo ainda é frágil. Os discentes apontaram a depreciação do ensino na APS por alguns professores e a falta de longitudinalidade no ensino da APS. Os docentes destacaram a falta de apoio institucional das instâncias governamentais e da Faculdade de Medicina, e de formadores qualificados para esta mudança. Conforme proposto nas DCN, o novo currículo, mesmo desenhado para contemplar o ensino na APS, apresenta algumas lacunas de temas relevantes, enfrenta resistências por parte do corpo docente e carece de professores com formação específica na área.
Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Currículo; Medicina de Família e
Comunidade; Ensino Superior.
Abstract xiv
ABSTRACT
The National Curriculum Guidelines (NCG) of the 2014 medical course provide for a more focused degree in Primary Health Care (PHC). The College of Medicine of the Federal University of Goiás, adapting the new NCG developed a new Pedagogical Course Project (PCP). The aim of this study is to describe and understand the implementation and development of the curriculum of the UFG Medicine course from the perspective of the 2014 NCG with a focus on PHC. A case-study research was carried out with a qualitative approach, which seeks to describe and understand the processes of changes that occurred in the medical curriculum of the UFG after the implementation of the new pedagogical project in 2014. The data were collected through documentary analysis and two focus groups, The first one with students and the second one with teachers. The documentary analysis consisted of a process which the current PPC was evaluated and compared to the NCG of 2014. The method of Content analysis was used to evaluate the focus group. The results and the discussion were described in two articles. In the first one, which presents the documentary analysis, it was observed that, although the PCP covers most of the aspects related to PHC education, was noticed a lack of determinations for teaching the person-centered clinical method, popular education, respect for patient autonomy, and shared decision making. In article two, which presents the product of the focus groups, the perception of students and teachers was that the development of the new curriculum is flawed. The students pointed out the depreciation of the teaching in the PHC by some teachers and the lack of longitudinality in the teaching of the PHC. Teachers highlighted the lack of institutional support from government agencies and medical school, and qualified trainers for this change. As proposed in the NCG, the new curriculum, despite of the new curriculum designed to contemplate teaching in the PHC, presents some gaps in relevant subjects, faces resistance by the faculty and lacks teachers with specific training in the area. Keywords: Primary health care, curriculum, Family Practice, higuer education
Introdução 1
1 INTRODUÇÃO
As discussões em torno do currículo médico ganharam grande
impulso no último século, em especial após o relatório Flexner de 1910, que
avaliou as Faculdades de Medicina nos Estados Unidos e influenciou a
reformulação do ensino médico em boa parte do mundo. As disciplinas dos
cursos passaram a ser estruturadas segundo as especialidades médicas e
agrupadas em departamentos dos ciclos básico e profissionalizante. Esse
modelo serviu de base para a superespecialização que se daria nos cursos de
medicina em detrimento da formação generalista (MARINS, REGO, LAMPERT,
2004). Flexner, no entanto, reconheceu que a educação médica tem de
configurar-se em resposta às mudanças científicas, circunstâncias sociais e
econômicas. A flexibilidade e liberdade de mudar também faziam parte da
mensagem dele (COOKE et al, 2006).
Influenciados por estes fatores a formação e o perfil dos egressos no
Brasil nas últimas décadas foram voltados a um modelo hospitalocêntrico,
curativo, centrado no atendimento individual e que pouco atendia às
necessidades da população. Esta concepção equivocada do modelo de
atenção à saúde estava presente também entre gestores, usuários e parte
significativa do meio acadêmico. A Atenção Primária à Saúde (APS), após
diversas discussões, foi colocada como alternativa e campo preferencial para
o ensino médico e os sistemas de saúde (FERREIRA et al, 2007).
A APS é a principal porta de entrada do sistema de saúde e países
com uma orientação mais forte para este nível de atenção possuem
melhores indicadores de saúde (CAMPOS, GUERREIRO, 2010). No entanto,
para o pleno funcionamento desta, espera-se profissionais que saibam
atender as pessoas ao longo do tempo, com conhecimento das diversas
condições, alta resolutividade e que coordenem as atividades nos diversos
níveis de atenção à saúde (STARFIELD, 2002). O conceito mais conhecido da
APS, construído em 1978, na conferência de Alma Ata, a descreve como um
nível de atenção que presta cuidados essenciais de saúde, baseados em
Introdução 2
métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentadas e
socialmente aceitáveis, colocadas ao alcance universal de indivíduos e
famílias da comunidade (ALMA-ATA,1978).
Neste contexto, o Brasil teve a criação do Sistema Único de Saúde
(SUS) em 1988 como passo fundamental para a tentativa de formação de
um sistema de saúde universal e integral. A partir da sua implementação,
não só foi desencadeado um processo de ampliação da quantidade de
serviços de saúde, como também da qualidade destes. Buscou-se então um
modelo de APS que viabilizasse a concretização da integralidade das ações e
dos serviços de saúde, ocupando uma posição de confronto ao modelo
convencional vigente (MENDES, 2002).
Para atuar na perspectiva dos princípios do SUS foi necessária uma
articulação entre Ministério da Saúde e Ministério da Educação (MEC) nas
discussões da reformulação da formação médica. O MEC construiu no ano
de 1996 a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei 9.394/96- e
esta, além da participação de algumas entidades médicas, como a
Associação Brasileira de Educação Médica (ABEM) e o Conselho Federal de
Medicina (CFM), estimulou a criação de documentos como as Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCN’s) do ano de 2001 (STELLA, 2007).
As DCN do curso de medicina do ano de 2001 foram um passo
fundamental para estabelecer um perfil de egresso mais adequado às
necessidades de saúde da população. No ano de 2014, após as discussões
em torno da ‘Lei do Mais Médicos’, foram divulgadas as novas DCN para o
curso de Medicina. Dentre as mudanças, ressaltou-se a necessidade de uma
formação generalista e com ênfase nos serviços de APS e
Urgência/Emergência. Reforçou também que os conteúdos fundamentais do
curso estejam relacionados com todo o processo saúde-doença do cidadão,
da família e da comunidade (BRASIL, 2014).
Todos estes movimentos influenciaram na formação desenvolvida
pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (FM-UFG). Esta
iniciou suas atividades no ano de 1960. Primeira faculdade de medicina do
estado de Goiás, já graduou mais de 5.000 médicos, a maioria deles
Introdução 3
exercendo suas atividades na própria região (FACULDADE DE MEDICINA,
2014). O curso, buscando adequação às novas DCN do curso de medicina,
publicou no final de 2014 seu novo Projeto Pedagógico de Curso, ainda em
fase de implementação e avaliação curricular.
Conforme descrito nas DCN 2014: “A implementação e
desenvolvimento dos novos currículos deverão ser acompanhados,
monitorados e permanentemente avaliados, a fim de acompanhar os
processos e permitir os ajustes que se fizerem necessários ao
aperfeiçoamento”. Além disso, processos de avaliação são formas de
adequar as práticas educacionais ao propósito do currículo, de garantir que o
programa alcance os resultados esperados e de gerar oportunidades para
desenvolvimento docente e discente (BOLLELA, CASTRO, 2014).
Portanto, diante da necessidade de revisão e adequação curricular de
todas as escolas médicas nacionais, e com base nas DCN de 2014 e do fato
da FM da UFG já ter desenvolvido o PPC e iniciado sua implementação em
2014, propôs-se um estudo para compreensão do processo de mudanças
curriculares do ensino na APS e que possibilite adequações e melhorias
contínuas no processo formativo dos alunos desta instituição.
Referencial Teórico 4
2 REFERENCIAL TEORICO
2.1 O curso de medicina e a formação médica
A medicina começa a se estruturar ainda nos primórdios da história
humana através da troca de informações sobre a prática médica,
transmitidas oralmente de geração em geração, entre Creta, Egito e
civilizações asiáticas. A maioria utilizava métodos de cura religiosos e
empíricos. A Escola de Cós, frequentada por Hipócrates (460-370 a.C.) e
seus discípulos surge na Grécia e é considerada o marco da medicina
científica por sua forte tendência à racionalização, observação,
sistematização do conhecimento das doenças e da semiologia (FOUCAULT,
1977; GROSSEMAN, PATRÍCIO, 2004).
A partir do fim da Idade Média, começa a desenvolver na medicina
uma tendência à estruturação do saber médico que objetivava
principalmente a busca sistemática de identificação e combate de doenças,
em detrimento da subjetividade do doente (LUZ,1988).
Ao passo que o conhecimento biomédico avançava, em especial no
final do século XIX, a visão de medicina mais próxima da sociedade perdia
seu espaço na Europa. No século XX, o foco do cuidado médico passou de
forma mais clara, além da busca de patógenos, pela descoberta e utilização
de drogas (OLIVEIRA, 2007).
O processo de construção da medicina contemporânea é descrito por
Luz (1993) como:
[...] um reflexo da convivência contraditória de uma tripla cisão: a cisão entre ciência das doenças e arte de curar (epistémé),
desenvolvida no pensamento médico ao longo dos últimos três séculos; a cisão na prática médica de combate às doenças (práxis) entre diagnose e terapêutica, desenvolvida sobretudo a partir do
fim do século XIX, e a cisão no agir clínico (tékné), da unidade relacional terapêutica médico-paciente, através do progressivo
desaparecimento do contato com o corpo do doente, pela interposição de tecnologias ‘frias’, verificadas a partir da segunda
metade do século XX (LUZ, 1993, p. 37)
Referencial Teórico 5
A educação médica vive em constante inquietação e transformação.
Desde o século XVIII, com destaque para segunda metade do século XX, o
ensino da medicina tem sido contestado por médicos e a sociedade em geral
(COOKE et al, 2006; MARTINS, SILVA, 2013). Segundo Martins e Silva
(2013), estas transformações levam a um contínuo desequilíbrio entre quatro
vetores: 1) As inovações biomédicas e tecnológicas, 2) As necessidades dos
doentes e exigências da sociedade em meios e cuidados de saúde, 3) As
sucessivas adaptações na política e gestão dos cuidados de saúde e 4) Os
modelos educacionais vigentes para a formação médica desenvolvidos e/ou
adaptados em função das variáveis anteriores.
Na primeira metade do século XX, alguns anos após a publicação de
seu relatório, Flexner percebeu que os aspectos científicos ganharam grande
representatividade nos currículos médicos com redução dos aspectos
humanistas e sociais (COOKE et al., 2006). Outro ponto levantado pelos
autores, foi a excessiva valorização da pesquisa em detrimento do ensino e
dos cuidados clínicos. A cultura acadêmica que praticamente obriga a
publicação nos meios universitários, especialmente na segunda metade do
século XX, levou a um desequilíbrio entre o ensino, os cuidados clínicos e a
pesquisa, colocando esta última em um patamar superior às demais.
Neste contexto, ocorreu a primeira Conferência Mundial de Educação
Médica em Edimburgo, no ano de 1988. Deste evento saíram apontamentos
sobre a necessidade de uma mudança radical na formação médica e que
esta acompanhasse as transformações em nível mundial dos modelos de
assistência à saúde. Em especial, sugeriu-se que as instituições formadoras
descentralizassem as ações e serviços de saúde dos hospitais e
compartilhassem a responsabilidade pela atenção e formação em saúde nos
serviços de APS (ALMEIDA, 2011).
Este discurso de mudança da educação médica pregava também a
adoção da integralidade e o encarar do processo saúde-doença em toda sua
complexidade biopsicossociocultural. No entanto, os médicos mantiveram o
ideal profissional do trabalho em consultório privado, como especialistas
Referencial Teórico 6
focais, preferência pelo setor privado e pouco considerando a atuação no
SUS (FEUERWERKER, 1998).
Pelos diversos fatores citados, a medicina ocidental passa neste início
de século por uma grande crise. A visão biomédica predominante, a
fragmentação do saber médico, o distanciamento na relação médico-paciente
e o alto custo dos serviços de saúde têm acarretado na perda da
terminalidade do ato médico e pouca consideração à subjetividade e cultura
do doente. Este cenário catalisou os movimentos de mudanças e a busca por
uma prática e ensino que abordem mais a integralidade e complexidade dos
pacientes. (GROSSEMAN, PATRÍCIO, 2004).
Frenk et al. descrevem essa conjuntura e afirmam que a última das
três grandes reformas do ensino médico no século XX vem em resposta a
esta crise. Segundo os autores, a primeira reforma ocorreu após a publicação
de Flexner, já aqui descrita anteriormente, a segunda, ocorrida após a
segunda guerra mundial, tratou da inserção da aprendizagem baseada em
problemas no currículo médico e este passou a estruturar-se na integração
das disciplinas e na vivência de simulações como instrumento de
aprendizagem. A terceira e último ciclo de reformas, busca uma educação
baseada em competências e articulada com a realidade dos serviços de
saúde e da população (FRENK et al., 2010).
No Brasil, as últimas grandes mudanças na formação médica
ocorreram com a publicação das DCN de 2001, Lei do Mais médicos de 2013
e DCN de 2014. Estas serão detalhadas adiante neste trabalho.
2.2 A Atenção Primária à Saúde e a Medicina de Família e
Comunidade
2.2.1 Atenção Primária à Saúde
O ano de 1920 marca a construção de um dos primeiros documentos
a utilizar o conceito de APS, o Relatório Dawson. Construído pelo Ministério
da Saúde do Reino Unido, tinha por objetivo reorganizar o sistema de saúde
Referencial Teórico 7
local. Apresentou, entre outros, os conceitos de níveis de complexidade,
território, porta de entrada ao sistema, hierarquia de serviços, vínculo,
acolhimento e atenção primária como coordenadora do cuidado. As
orientações deste documento foram fundamentais para a criação do sistema
nacional de saúde britânico (NHS), em 1948. Este serviu como inspiração
para diversos outros sistemas de saúde no mundo (LAVRAS,2011).
Bertrand Dawson defendia que o serviço de saúde se organizasse a
partir de profissionais (médicos e enfermeiros) generalistas e com atuação
nas áreas curativas e preventivas. Estes atuariam em um centro primário de
saúde, que seria o centro organizador do sistema. A organização incluía
também serviços domiciliares, centros de saúde secundários, serviços
suplementares e hospitais de ensino. A maioria dos problemas deveriam ser
resolvidos nos centros primários e nos serviços domiciliares, que seriam
divididos por região. Situações que não pudessem ser resolvidas ali, seriam
encaminhadas para os centros de atenção secundária, onde há especialistas
focais, ou para os hospitais (CAMPOS et al, 2011; OLIVEIRA, 2007).
Na Conferência Internacional de Cuidados Primários à Saúde, em
1978, em Alma Ata no Cazaquistão, a Organização Mundial da Saúde (OMS)
convocou seus membros a rediscutirem o modelo de atenção ideal à saúde
do mundo (ALMA-ATA, 1978). O grande desenvolvimento científico e
tecnológico da medicina até então não estava acarretando melhoria nos
indicadores de saúde da maior parte da população mundial (ANDRADE et al,
2012). A conferência teve como encaminhamento uma declaração que
apontava a APS como estratégia prioritária para melhoria dos indicadores da
saúde global (ALMA-ATA, 1978).
A Conferência Internacional de Cuidados Primários à Saúde (ALMA-
ATA, 1978), publicou um dos conceitos mais clássicos sobre cuidados
primários à saúde, descritos da seguinte forma:
Cuidados essenciais de saúde baseados em métodos e tecnologias práticas, cientificamente bem fundamentadas e socialmente
aceitáveis, colocadas ao alcance universal de indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a um custo que
a comunidade e o país possam manter em cada fase de seu desenvolvimento, no espírito de autoconfiança e
Referencial Teórico 8
autodeterminação. Fazem parte integrante tanto do sistema de
saúde do país, do qual constituem a função central e o foco
principal, quanto do desenvolvimento social e econômico global da comunidade. Representam o primeiro nível de contato dos
indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de saúde, pelo qual os cuidados de saúde são levados o mais
proximamente possível aos lugares onde pessoas vivem e
trabalham, e constituem o primeiro elemento de um continuado processo de assistência à saúde (ALMA-ATA, 1978, p.04).
No documento “Atenção primária: equilíbrio entre necessidades de
saúde, serviços e tecnologia “, de 2002, Barbara Starfield (2002) elencou e
descreveu os principais atributos da APS:
1) Acessibilidade: o primeiro contato implica a acessibilidade e o
uso do serviço para cada novo problema ou novo episódio de um problema para os quais se procura o cuidado;
2) Integralidade: prestação, pela equipe de saúde, de um conjunto de serviços que atendam às necessidades mais comuns da
população adscrita, a responsabilização pela oferta de serviços em outros pontos de atenção à saúde e o reconhecimento adequado
dos problemas biológicos, psicológicos e sociais que causam as
doenças; 3) Longitudinalidade: assistência contínua, requer a existência do
aporte regular de cuidados pela equipe de saúde e seu uso consistente ao logo do tempo, num ambiente de relação
colaborativa e humanizada entre equipe, pessoa usuária e família;
4) Coordenação do Cuidado: implica na capacidade de garantir a continuidade da atenção, através da equipe de saúde, com o
reconhecimento dos problemas que requerem seguimento constante, ainda que seja em outras unidades de saúde
(STARFIELD, 2002, p.61,62).
No Brasil, as primeiras experiências em APS, em especial na década
de 1970, se estruturaram a partir de centros e postos de saúde. Estes
possuíam enfermeiros e médicos clínicos, pediatras e ginecologistas que
atuavam de forma curativa e preventiva com destaque para ações
programáticas de saúde com a atenção a doenças infectocontagiosas, saúde
da mulher, da criança, do adulto, do idoso e doenças sexualmente
transmissíveis (COELHO,2006).
A APS ganhou impulso e cresceu de forma mais sistematizada a partir
do ano de 1994, com a implementação do Programa de Saúde da Família
(PSF). Diversas políticas sedimentaram e ampliaram o programa e em 2006,
por meio da Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), este passou a ser o
Referencial Teórico 9
modelo de atenção prioritário no país sob o nome de Estratégia de Saúde da
Família (ESF). A PNAB, revisada em 2017, reforça a ESF como estratégia
prioritária de atenção à saúde no SUS e coloca a medicina de família e
comunidade como a especialidade médica preferencial para atuar na ESF
(BRASIL, 2017).
A APS, também chamada de Atenção Básica, é definida na PNAB de
2017 da seguinte forma:
A Atenção Básica é o conjunto de ações de saúde individuais,
familiares e coletivas que envolvem promoção, prevenção,
proteção, diagnóstico, tratamento, reabilitação, redução de danos, cuidados paliativos e vigilância em saúde, desenvolvida por meio
de práticas de cuidado integrado e gestão qualificada, realizada com equipe multiprofissional e dirigida à população em território
definido, sobre as quais as equipes assumem responsabilidade sanitária (BRASIL, 2017, p. 68).
Para a formação de um sistema de saúde resolutivo e que atenda às
necessidades da população é preciso qualificar a atenção prestada na APS
(STARFIELD, 2002). As DCN de 2014 orientam que as atividades em APS no
internato do curso de medicina devem ser coordenadas e voltadas para área
de Medicina de Família e Comunidade (BRASIL,2017).
2.2.2 Medicina de Família e Comunidade
A Medicina de Família e Comunidade surge como especialidade
médica no Brasil na década de 1970 e no Canadá e Estados Unidos (EUA) na
de 1960. Estes dois países e a Espanha utilizam termo (Family Medicine)
semelhante ao brasileiro, já na Inglaterra, Alemanha e Austrália utiliza-se o
termo General Pracctitioners (GP) (LOPES, 2012).
Esta especialidade tem como principal campo de atuação a APS.
Exerce também o papel de médico do primeiro contato na saúde
suplementar e privada. O MFC acompanha pessoas de todos os gêneros e
faixas etárias, coordenando o cuidado e atendendo a qualquer agravo de
forma preventiva e curativa e com resolutividade esperada de 80 a 90%. Em
países com sistema de saúde universal, efetua o papel de primeiro contato e
regulador dos egressos ao sistema (gatekeeper), mediando o fluxo de
Referencial Teórico 10
encaminhamentos aos níveis secundários e terciários (CHAN, 2013). Países
como Inglaterra, Canadá e Austrália apresentam, respectivamente, 30%,
47% e 49% dos seus médicos com esta especialidade e campo de atuação
(VALCÁRCEL, PEREZ, VEGA, 2011).
O autor canadense Mc. Whinney (1995), descreve quatro habilidades
fundamentais ao MFC: 1) solução de problemas indiferenciados, 2)
habilidades preventivas, 3) habilidades terapêuticas e 4) habilidades para
gestão de recursos comunitários e dos sistemas de atenção no âmbito do
exercício da profissão. Cita também quatro pilares desta especialidade:
Atenção Primária, Educação Médica, Humanismo e Formação de Lideranças.
São estas, ao mesmo tempo apoio e norte de ação. São também as bases
teóricas que garantem a identidade de valores e as estratégias de atuação
(JANAUDIS,2010).
Lopes (2012), resume as principais características do Médico de
Família ao afirmar que este deve ser um clínico qualificado, influenciado pela
comunidade, sendo recurso de uma população definida e que tenha a ação
médico-pessoa como peça fundamental para o seu desempenho.
Os primeiros programas de residência de MFC no Brasil surgiram na
década de 1970, no Rio Grande do Sul. No entanto, o reconhecimento pela
Comissão Nacional de Residência Médica só ocorreu no ano de 1981 e pelo
Conselho Federal de Medicina (CFM) no ano de 1986 (RAWAF, 2012).
Diferentemente do que ocorreu em países como Portugal, Canadá, Espanha,
Cuba, Inglaterra e Alemanha, no Brasil a Medicina de Família e Comunidade
recebeu pouco apoio por parte de gestores e comunidade acadêmica. Tal
fato culminou na escassez de profissionais capacitados para a APS e para o
ensino desta nas universidades (TRINDADE, BATISTA, 2016).
2.3 Sistema de saúde brasileiro
Até o ano de 1960, o Brasil não tinha um sistema de saúde definido
e estruturado. O modelo era completamente desarticulado, insuficiente e
pouco financiado pelo estado. As opções em saúde nesta época eram as
Referencial Teórico 11
Santas Casas ou o atendimento curativo individual particular (PAIM et al,
2011).
Em meados das décadas de 50 e 60, começam a formação de
serviços e grandes hospitais financiados pelos sindicatos e pela previdência.
Neste período temos a criação do Ministério da Saúde (1953) e a construção
de leis que unificaram os direitos de previdência social dos trabalhadores
urbanos (1960). Observa-se também um repasse de dinheiro do Estado para
iniciativa privada gerir certos segmentos do sistema, a expansão da
assistência hospitalar e o surgimento de empresas de saúde (PAIM et al,
2011).
Na década de 1970, começa a ganhar força no país o movimento da
reforma sanitária. Organizações como o Centro Brasileiro de Estudo em
Saúde (CEBES), a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) e o
Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) são criados nos anos
de 1976,1979 e 1980, respectivamente. Estes ampliam o debate sobre a
saúde no Brasil e, em 1986, na Oitava Conferência de Saúde, sistematizam
as ideias que serviriam de base para a criação do SUS. A saúde passa a ser
vista não só como uma questão exclusivamente biológica, mas também uma
questão social e política a ser abordada pelo serviço público (ALMEIDA,
2008; MAIO, LIMA 2009).
Os princípios norteadores do SUS: Universalidade, Integralidade,
Equidade e Controle Social, foram formulados na constituição de 1988 e um
novo conceito de saúde, assim expresso em seu artigo 196:
A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doenças e de agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação
(BRASIL, 1988, p.39).
A oitava Conferência de Saúde, a Constituição Federal de 1988 e a
criação do SUS colocam a saúde como um direito da população e um dever
do Estado. Isto foi fundamental para o desenvolvimento das políticas de
saúde apesar da forte oposição por parte de um setor privado poderoso e
mobilizado (MAIO, LIMA, 2009).
Referencial Teórico 12
A implementação do SUS começa a ocorrer em 1990, ano que foi
aprovada a lei nº 8080/90 (Lei orgânica do SUS). Nesta década aumenta a
descentralização da gestão dos estabelecimentos de saúde e, em 1994, é
criado o PSF, primeiro modelo organizado e sistematizado para o
desenvolvimento da atenção primária no país. Este avançou e, no ano de
2006, após a publicação da Política Nacional de Atenção Básica, passou a ser
estratégia de Estado para o desenvolvimento da APS no país (BRASIL, 2011).
A construção do SUS representou uma grande vitória da população
brasileira e é responsável pela melhora de diversos indicadores de saúde. No
entanto, na prática, o processo de construção tem transcorrido com grandes
gargalos e em condições muito adversas, tanto no campo político-ideológico,
quanto no campo econômico-estrutural. As principais dificuldades referem-se
ao subfinanciamento, acesso limitado, recursos humanos insuficientes e uma
baixa cobertura (RAWAF, 2012; TRINDADE, 2017).
2.4 DCN e formação para APS na graduação
No início dos anos 1990, a Comissão Interinstitucional de Avaliação
Nacional do Ensino Médico (CINAEM), avaliou os cursos médicos em todo
país com a participação de entidades médicas e acadêmicas (CFM, AMB,
ABEM) preocupadas com a formação médica brasileira (CFM, 1998).
Concluiu-se após os estudos que era necessário mais incentivo para a
profissionalização de professores e introdução de uma cultura de educação
transformadora. Percebeu-se também que o ensino estava desvinculado da
realidade da saúde da população e que havia uma falta de integração das
escolas com os serviços públicos de saúde. O resultado desse movimento
provocou várias discussões que deram origem e fundamentaram a
proposição das DCN para os cursos de medicina (CFM, 1998).
A partir do início deste século, os Ministérios da Saúde e da
Educação têm formulado políticas destinadas a promover mudanças na
formação dos profissionais de saúde. As principais medidas foram: Diretrizes
Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação da Área de Saúde; Promed-
Programa de Incentivo às Mudanças Curriculares nos Cursos de Medicina;
VER-SUS, Polos de Educação Permanente do SUS; o Programa Nacional de
Referencial Teórico 13
Reorientação da Formação Profissional em Saúde - Pró-Saúde e o Programa
de Educação Para o Trabalho em Saúde – Pet-Saúde (BRASIL, 2006a;
FERREIRA, SILVA, AGUERA 2015).
As DCN de 2001 foram um importante passo na reorientação da
formação profissional e fundamentaram as novas mudanças do currículo. As
DCN previam a formação de um médico generalista, humanista, crítico e
reflexivo com capacidade de atuar nos diferentes níveis de atenção, com
ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde (BRASIL,
2001).
Apesar da publicação destas DCN e das políticas indutoras de
reorientação da formação profissional da saúde, como o Pró-Saúde e Pet-
Saúde, as universidades pouco avançaram na mudança curricular na primeira
década do século XXI. Importante salientar também que, frente à grande
necessidade de expansão e qualificação da APS no país, estas mudanças
ainda se mostraram insuficientes (PAIM et al, 2011).
Uma etapa fundamental para esta transformação é o ensino da MFC
na graduação. Em artigo de 2007, Anderson e colaboradores, embasados na
publicação de Byrne, 1977, descreveram as principais razões para incluir o
ensino da MFC na graduação de medicina:
1. Os estudantes de Medicina devem vivenciar e entender o cenário
e as maneiras pelas quais a grande maioria da população é cuidada pelos
serviços de saúde.
2. Os estudantes de Medicina devem vivenciá-la na sua forma mais
integrada e integradora, o que é mais bem evidenciado no cenário de prática
do MFC.
3. Os estudantes de Medicina devem vivenciá-la centrada na pessoa,
invertendo a tendência de enfoque na doença e na tecnologia dura.
4. Os estudantes de Medicina devem ter a chance de vivenciar a
prática da MFC, a fim de poderem incluir essa especialidade na lista de
opções para a futura carreira profissional. Os estudantes de Medicina que
têm perfil e podem se tornar futuros MFC´s necessitam ter contato com esta
Referencial Teórico 14
especialidade, a exemplo do que ocorre em relação às outras especialidades
no curso de graduação.
5. Estudantes de Medicina que seguirem outras especialidades, que
não a MFC, necessitam conhecer as bases de atuação desta especialidade.
Isso é particularmente importante se considerarmos que a maioria das
especialidades atuará no sistema de saúde como referência para o
encaminhamento e/ou parecer de casos provenientes dos MFC, e/ou os
utilizarão como referência para o acompanhamento clínico geral dos
pacientes atendidos por eles.
6. A participação de MFC´s como professores no ensino médico de
graduação abre novas possibilidades de ensino, pesquisa e extensão na
escola médica, ampliando o envolvimento e a responsabilidade da mesma
com as necessidades e demandas de saúde das pessoas e das comunidades.
7. A MFC, como também as outras especialidades da profissão
médica, necessita da vivência no ensino de graduação, possibilitando assim
espaço e estímulo para o seu desenvolvimento acadêmico no sentido mais
amplo.
A APS tem como modelo prioritário no Brasil a ESF e o graduando de
medicina deve desenvolver competências para atuação neste campo de
prática. A ABEM e a Sociedade Brasileira de Medicina de Família e
Comunidade (SBMFC) elaboraram no ano de 2011 o documento: ‘Diretrizes
para o ensino na Atenção Primária à Saúde na graduação em medicina’. É
previsto neste documento que o graduando adquira competência em três
dimensões: abordagem individual, abordagem familiar e abordagem
comunitária (Demarzo et al, 2012).
Em 2013, lançou-se a lei nº 12.871 - ‘Lei do Mais Médicos’. Esta
buscou fortalecer a APS brasileira com melhorias na formação médica e
ampliando a cobertura à saúde no país, especialmente em áreas mais
remotas. A lei é dividida em três eixos: o primeiro refere-se ao aumento da
quantidade de vagas para a graduação de medicina, o segundo, ao aumento
da carga horária das disciplinas voltadas à formação na APS, dos estágios de
estudantes em Unidade Básicas de Saúde (UBS) e de vagas em programas
Referencial Teórico 15
de residência em MFC, e o último ao provimento de médicos para
atendimento na APS em todo país (BRASIL, 2013).
Após o sancionamento da Lei do Mais Médicos, determinou-se que o
Conselho Nacional de Educação (CNE) discutisse e aprovasse novas DCN
para o curso de medicina em até um ano. Com debates que envolveram
também o Conselho Nacional de Saúde, publicou-se as novas DCN do curso
de medicina, em 2014. Esta destaca o ensino da APS na formação médica e,
com percentual maior de participação na graduação e no internato, propicia
uma prática crescente em serviços de APS, em consonância com as diretrizes
da ABEM e da SBMFC. No entanto, para que ocorram mudanças reais e
efetivas, são necessários cenários de prática de APS de alta qualidade, sob
supervisão de professores/preceptores MFC e integração ensino-serviço
consolidada (TRINDADE, BATISTA, 2016).
2.5 O curso de Medicina da UFG e as transformações
curriculares
O curso de Medicina da UFG iniciou suas atividades no ano de 1960 e
já na década de 1970, em um processo de interiorização da Universidade
estimulado pelo Governo Federal, implementou um estágio rural para o
ensino de uma medicina comunitária: CRUTAC (Centro Rural Universitário de
Treinamento e Ação Comunitária) em Firminópolis, cidade do interior de
Goiás. Este projeto, em funcionamento até hoje, criou o internato rural do
curso de medicina. Com a proposta inicial de levar assistência médica às
populações mais vulneráveis e desenvolver oportunidades de aprendizagem
para os estudantes de medicina, o estágio se expandiu para outras cidades
do interior goiano (MENDONÇA, 2010).
A partir dos anos 2000, com a publicação das DCN dos cursos de
saúde e da reformulação do Projeto Pedagógico da Faculdade de Medicina
em 2003, a instituição procurou refazer o seu ensino na comunidade, com
mudanças do eixo teórico-prático e a valorização de práticas fora do
ambiente hospitalar (MENDONÇA, 2010).
Referencial Teórico 16
Além da reforma curricular, a FM-UFG aderiu aos programas de
incentivo às mudanças curriculares desenvolvidos pelos Ministérios da Saúde
e da Educação. Em 2002 ao Programa de Incentivos às Mudanças
Curriculares dos Cursos de Medicina (Promed), em 2005 integrou-se ao
Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde
(Pró-Saúde I e II), e em 2008 ao Programa de Educação pelo Trabalho para
a Saúde, o PET-Saúde. Com a adesão a estes projetos, a instituição passou a
ter um enfoque maior em atividades de ensino da saúde na comunidade
(NAGHETTINI, 2014).
Por fim, no ano de 2014, influenciada pela publicação da Lei dos
Mais Médicos em 2013 e das discussões para construção das DCN do curso
de medicina de 2014, a FM iniciou um novo ciclo de transformação curricular
e construção do seu novo Projeto Pedagógico de Curso. Criou-se um eixo
transversal, denominado Saúde, Família e Comunidade, em todos os anos do
curso e que propicia ao estudante uma formação mais longitudinal e ligada à
comunidade (NAGHETTINI, 2014).
Objetivos 17
3 OBJETIVO(S)
3.1. Objetivo Geral
Descrever e compreender o papel da APS no currículo do
curso de medicina da UFG a partir das orientações das Diretrizes
Curriculares Nacionais de 2014.
3.2. Objetivos Específicos
• Identificar no Projeto Pedagógico do curso de medicina da UFG
as determinações das Diretrizes Curriculares Nacionais de 2014
quanto ao ensino na Atenção Primária.
• Verificar as percepções de docentes quanto à formação para
atenção primária à saúde.
• Verificar as percepções de discentes quanto à formação para
atenção primária à saúde
Métodos 18
4 MÉTODO (S)
4.1 Tipo de pesquisa
Pesquisa do tipo estudo de caso, de abordagem qualitativa, que
busca descrever e compreender os processos de mudanças ocorridos no
currículo de medicina da Universidade Federal de Goiás após a
implementação do novo projeto pedagógico em 2014.
4.2 Local do Estudo
O estudo foi desenvolvido na Faculdade de Medicina da Universidade
Federal de Goiás (UFG), no município de Goiânia-GO, no período de agosto
de 2015 a setembro de 2017.
4.3 Participantes da pesquisa
Foram convidados a participar todos os alunos do curso de Medicina
da UFG matriculados nas turmas de 2014, 2015 e 2016, que ingressaram no
currículo novo e todos os professores do módulo Saúde, Família e
Comunidade, do mesmo curso e instituição. Cada turma possui 110 alunos e
o número total de professores do módulo é catorze.
Alunos e docentes foram convidados a participar do estudo por meio
de redes sociais e grupos de um software de mensagem instantânea. Foram
selecionados todos aqueles que responderam ao convite e aceitaram
participar da pesquisa.
Como critérios de inclusão para participar do estudo foram
considerados ser discente da FM/UFG e ter ingressado nos anos de 2014,
2015 e 2016, e ser docente do módulo Saúde, Família e Comunidade, que
aceitaram voluntariamente participar da pesquisa. Foram excluídos os
Métodos 19
discentes matriculados nas turmas 2014 a 2016 oriundos do projeto
pedagógico anterior (reprovados) e os professores de férias ou de licença
temporária.
4.4 Coleta de dados
Os dados foram obtidos por meio de análise documental e
entrevistas utilizando a técnica de grupo focal com alunos e docentes.
4.4.1 Análise documental
O Projeto Pedagógico Curricular atual foi avaliado e comparado por
meio de Análise Documental às DCN de 2014. Esta etapa só ocorreu após a
aprovação do Comitê de Ética e liberação da Coordenação da Faculdade de
Medicina. Foi realizada uma primeira leitura exploratória, estabelecendo-se,
assim, contato com os documentos a serem analisados e um conhecimento
do texto (LUDKE, ANDRÉ, 1986). Em um segundo momento foram
identificados os tópicos relacionados à APS e à concordância ou não com as
determinações das DCN.
O documento “Diretrizes para o Ensino na Atenção Primária à Saúde
na Graduação em Medicina” de 2011 também foi analisado para subsidiar e
estabelecer o “padrão-ouro” sobre as especificações do ensino da APS na
graduação. Este documento foi produzido pela Associação Brasileira de
Educação Médica (ABEM) em conjunto com a Sociedade Brasileira de
Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) (DEMARZO et al, 2012). Após a
leitura deste, levantou-se doze descritores relacionados ao “O que ensinar”
sobre APS na graduação:
• Competência para trabalhar em equipe
• Capacidade para atuar na atenção primária e conhecer os
diversos níveis de atenção à saúde
• Conhecimento de ações de gestão e dos serviços de saúde
Métodos 20
• Competência para trabalhar com educação popular e
permanente da equipe
• Respeito à autonomia
• Capacidade de tomar decisão compartilhada
• Utilização de evidências científicas
• Decisão baseada em prevalência e incidência
• Perfil Generalista
• Liderança no trabalho multidisciplinar
• Responsabilidade Social
• Integralidade
Com os descritores organizados, buscou-se nas DCN e no PPC
direcionamentos semelhantes que refletiam o ensino na APS. As DCN de
2014 são divididas em três capítulos: 1. Diretrizes; 2. Áreas de competência
da prática médica; 3. Conteúdos curriculares e do projeto pedagógico do
curso de graduação em medicina. Os dois primeiros capítulos são
subdivididos em três seções: Atenção à saúde; Gestão em saúde; Educação
em Saúde. No PPC encontram-se os princípios e estratégias de avaliação de
aprendizagem, duração do curso e a estrutura curricular, incluindo a matriz
curricular, o elenco dos módulos e os conteúdos de aprendizagem, com as
respectivas ementas e cargas horárias. Todos estes tópicos foram avaliados
nesta pesquisa.
Figura 1. Passos metodológicos da análise documental
Descrição dos termos encontrados e comparação entre o equivalente descrito nas DCN e
no PPC
Leitura e exploração das DCN de 2014 e do PPC buscando os descritores levantados.
Leitura do documento “Diretrizes para o Ensino na Atenção Primária à Saúde na
Graduação em Medicina” e extração dos 12 descritores relacionados ao “O que
ensinar” sobre APS na graduação
Métodos 21
4.4.2 Grupo focal
A escolha em avaliar por meio de grupos focais deve-se ao fato
destes serem ambientes propícios para interação entre pesquisador e
participantes e para colher dados a partir da discussão focada em tópicos
específicos e diretivos (IERVOLINO, PELICIONI, 2001).
O grupo focal é uma técnica de pesquisa que extrai dados através da
discussão do grupo em relação aos tópicos sugeridos pelo pesquisador e,
como técnica, ocupa uma posição intermediária entre a observação
participante e as entrevistas em profundidade. É importante também para
compreensão das percepções, atitudes e representações sociais de grupos
humanos (GONDIM, 2002).
Nesta pesquisa realizou-se dois grupos focais, um com docentes e
outro com discentes em salas da FM/UFG. Os mesmos ocorreram após
concordância dos participantes com os propósitos da pesquisa, da gravação
em áudio, da garantia de sigilo, e da assinatura do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE). Foram utilizados dois gravadores com o intuito de
garantir a segurança e qualidade das gravações para posterior transcrição.
Cada encontro foi gravado e teve uma duração média de 60 minutos.
Participaram do Grupo Focal 1, sete alunos do curso de medicina. Um
ingressou no ano de 2014, três em 2015 e três no ano de 2016. Enquanto
cinco docentes do módulo Saúde, Família e Comunidade, atenderam ao
Grupo Focal 02.
Importante pontuar que somente os que responderam ao convite e
aceitaram participar estiveram presentes, logo estes podem ter uma
identificação maior com o tema.
Um especialista em coordenação de grupo focal atuou como
moderador e levantou as questões a serem debatidas e o outro pesquisador
participou como observador e fez as anotações de algum detalhe da
discussão ou expressão não verbal. As perguntas norteadoras do grupo
foram:
Métodos 22
Grupo Focal 1 (discente):
1. O que você entende por “Atenção Primária e Medicina de Família
e Comunidade (MFC)?
2. Vocês têm aprendido e utilizado ferramentas de atuação comuns
à atenção primária (Ex: abordagem familiar e comunitária,
método clínico centrado na pessoa, ecomapa, coordenação do
cuidado, prevenção quaternária, gerenciamento de equipe e
condições mais comuns na APS)?
3. Você observa concordância entre os assuntos teóricos e o que é
visto nas atividades práticas na UBS?
4. Como você avalia o novo Projeto Pedagógico de Curso com
relação à formação na atenção primária?
5. Quais as sugestões para melhoria da formação de vocês na
atenção primária?
6. Quais as principais dificuldades enfrentadas nos estágios e
módulos voltados para a APS?
7. Como vocês avaliam o redirecionamento da formação médica
(desospitalização) e aumento da carga horária na APS?
Grupo Focal 2 (docente):
1. Como você avalia o novo Projeto Pedagógico de Curso com
relação à formação na atenção primária?
2. Como tem sido a implementação do novo currículo em relação a
APS?
3. Quais as principais dificuldades enfrentadas no ensino teórico e
prático do conteúdo voltado para APS?
4. Vocês acreditam que o currículo atual é adequado para formação
de um profissional generalista e que saiba atuar na APS?
5. Quais as sugestões para melhoria da formação dos alunos na
atenção primária?
6. Você percebe/conhece apoio institucional (universidade e
município) para a mudança do currículo?
Métodos 23
Após a realização dos grupos, ocorreu a transcrição do material
gravado pelo primeiro autor deste trabalho. Os alunos foram representados
pelas siglas de A1 a A7 e os professores de P1 a P5.
4.5 Análise de dados
Realizada por meio de análise documental e análise de conteúdo.
Para análise dos dados oriundos dos documentos utilizamos a técnica de
análise documental. A análise documental, conforme Bardin, 2011, é uma
operação ou conjunto de operações que visam representar o conteúdo de
um documento em uma forma diferente do original, a fim de facilitar em um
período posterior, a sua consulta e referenciação. Embora guarde
semelhanças com a análise de conteúdo, diferencia-se desta por trabalhar
com documentos e ter por objetivo a representação condensada da
informação. Enquanto na análise dos dados obtidos por meio dos grupos
focais, utilizou-se a análise de conteúdo que trabalha com a mensagem e
tem por objetivo a manipulação desta (BARDIN, 2011).
Além disso, a análise de conteúdo buscou sistematizar as questões
respondidas pelos participantes, facilitando sua interpretação. Quanto à
modalidade, foi escolhida a análise temática fundamentada em Bardin
(BARDIN, 2011), que é colocada como efetiva para investigações qualitativas
em saúde (IERVOLINO, PELICIONI 2001).
A análise de conteúdo organizou-se em torno de três polos
cronológicos (BARDIN, 2011):
1. Pré-análise: leitura flutuante de cujas impressões e orientações
emergiram as hipóteses, escolha dos documentos com demarcação do
universo a ser analisado, formulação das hipóteses.
2. Exploração do material: fase de codificação, decomposição ou
enumeração, em função de regras previamente formuladas.
3. Tratamento dos resultados obtidos e interpretação: os resultados
brutos são tratados de modo a serem significativos e válidos. Nessa fase,
podem ser obtidos quadros de resultados que condensem as informações
Métodos 24
fornecidas pela análise, além de inferências e interpretações que respondam
aos objetivos propostos.
As categorias extraídas da transcrição dos grupos com discentes e
docentes e descritas adiante, foram construídas de duas formas:
1) Predeterminadas: a partir dos objetivos do estudo e perguntas
norteadoras do grupo focal. Bardin (2011), coloca que esta
modalidade é aplicável nos casos de a organização do material
decorrer diretamente dos funcionamentos teóricos hipotéticos.
2) Acervo: incorporação de questões que emergiram
espontaneamente pelos participantes do grupo. Essas categorias
foram escolhidas a posteriori, conforme indicação de Bardin
(2011), que cita como possibilidade de categorização temática os
“valores” revelados pelo material pesquisado, através das forças
de inferências que nascem do diálogo com o contexto da
pesquisa e a literatura já existente.
4.6 Questões éticas
Cada aluno e professor convidados a participar tiveram ciência do
estudo por meio do TCLE, do qual constava a apresentação do pesquisador,
o objetivo da pesquisa, a garantia do anonimato e a possibilidade de recusa.
O estudo iniciou após apresentação à Coordenação do Curso para
aprovação da pesquisa e, posteriormente, ao envio e aprovação pelo Comitê
de Ética e Pesquisa do Hospital das Clínicas da UFG, parecer 1.523.208,
conforme resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 466 de 12 de
dezembro de 2012.
Artigos 25
5 ARTIGO (S)
Artigo 1 – Análise documental do projeto pedagógico de um curso de
medicina segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais de 2014
Autores: Valter Luiz Moreira de Rezende, Edna Regina Silva Pereira, Bárbara Souza Rocha, Alessandra Vitorino Naghettini
Revista Interface
Artigo 2 – Percepções docentes e discentes do ensino médico na atenção
primária após Diretrizes Curriculares de 2014
Autores: Valter Luiz Moreira de Rezende, Bárbara Souza Rocha, Alessandra Vitorino Naghettini, Edna Regina Silva Pereira
Revista Interface
Artigos 26
Artigo1
Análise documental do projeto pedagógico de um curso de medicina segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais de 2014
Documentary analysis of the pedagogical project of a medical course according to the NCG of 2014
Análisis documental del proyecto pedagógico de un curso de medicina según las DCN de 2014
Resumo As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) do curso de medicina de 2014 preveem uma formação com maior foco na Atenção Primária à Saúde (APS). A Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás, adaptando-se às novas DCN elaborou um novo Projeto Pedagógico de Curso (PPC). O objetivo deste estudo foi analisar e comparar, por meio de análise documental, o novo PPC nas perspectivas das DCN de 2014, tendo por base o documento “Diretrizes para o Ensino na Atenção Primária à Saúde na Graduação em Medicina”. Embora o PPC contemple a maioria dos aspectos relacionados ao ensino da APS, observou-se a ausência de determinações para o ensino do método clínico centrado na pessoa, na educação popular, no respeito a autonomia do paciente e na tomada de decisão compartilhada. Espera-se, assim, subsidiar mudanças no PPC atual e estimular outras universidades a abordar estes temas. Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Currículo; Medicina da família e comunidade; Ensino. Abstract The National Curriculum Guidelines (NCG) of the 2014 medical course provide for a more focused degree in Primary Health Care (PHC). The College of Medicine of the Federal University of Goiás, adapting the new NCG developed a new Pedagogical Course Project (PCP). The objective of this study was to analyze and compare, through documentary analysis, the new PCP in the perspectives of the 2014 NCG, based on the document “Guidelines for Primary Health Care Teaching in Undergraduate Medical Education”; Although the PCP covers most of the aspects related to PHC education, was noticed a lack of determinations for teaching the person-centered clinical method, popular education, respect for patient autonomy, and shared decision making. It is hoped, therefore, to subsidize changes in the current PCP and to stimulate other universities to approach these issues. Keywords: Primary Health Care, curriculum, family practice, education. Resumen Las Directrices Curriculares Nacionales (DCN) del curso de medicina de 2014 prevén una formación con mayor foco en la Atención Primaria a la Salud (APS). La Facultad de Medicina de la Universidad Federal de NN, adaptándose a las nuevas DCN elaboró un nuevo Proyecto Pedagógico de Curso (PPC). El objetivo de este estudio fue analizar y comparar, por medio
Artigos 27
de análisis documental, el nuevo PPC en las perspectivas de las DCN de 2014, teniendo como base el documento "Directrices para la Enseñanza en la Atención Primaria a la Salud en la Graduación en Medicina". Aunque el PPC contempla la mayoría de los aspectos relacionados con la enseñanza de la APS, se observó la ausencia de determinaciones para la enseñanza del método clínico centrado en la persona, en la educación popular, en el respeto a la autonomía del paciente y en la toma de decisión compartida. Se espera, así, subsidiar cambios en el PPC actual y estimular a otras universidades a abordar estos temas. Palabras clave: Atención Primaria a la Salud; Currículo; Medicina de la familia y comunidad; Enseñanza.
Introdução
As discussões em torno do currículo médico ganharam grande impulso no
último século, em especial após o relatório Flexner, de 1910, que influenciou a
reformulação do ensino médico em boa parte do mundo. Esse modelo serviu de base
para a superespecialização que se daria nos cursos de medicina em detrimento da
formação generalista1. Flexner, no entanto, reconheceu que a educação médica tem
de configurar-se em resposta às mudanças científicas, circunstâncias sociais e
econômicas. A flexibilidade e liberdade de mudar também faziam parte da
mensagem dele2.
A formação e o perfil dos egressos no Brasil, nas últimas décadas, seguiram
esta mesma tendência e foram voltados a um modelo hospitalocêntrico, curativo,
centrado no atendimento individual e que pouco atendia às necessidades da
população3. Esta concepção equivocada do modelo de atenção à saúde estava
presente também entre gestores, usuários e parte significativa do meio acadêmico3. A
Atenção Primária à Saúde (APS), após diversas discussões, foi colocada como
alternativa e campo preferencial para o ensino médico e os sistemas de saúde3,4.
A APS é a principal porta de entrada do sistema de saúde e países com uma
orientação mais forte para este nível de atenção possuem melhores indicadores de
saúde5. No entanto, para o pleno funcionamento desta, espera-se profissionais que
saibam atender às pessoas ao longo do tempo, com conhecimento das diversas
condições, alta resolutividade e que coordenem as atenções sofridas nos diversos
níveis6.
A articulação entre Ministério da Saúde e Ministério da Educação, nas
discussões da reformulação da formação médica, além da participação de algumas
entidades médicas, levaram à criação de documentos como as Diretrizes Curriculares
Nacionais (DCN)7.
Artigos 28
As DCN do curso de medicina do ano de 20017 foram um passo
fundamental para estabelecer um perfil de egresso mais adequado às necessidades da
população. No ano de 2014, após as discussões em torno da ‘Lei do Mais Médicos’8,
foram divulgadas as novas DCN para o curso de Medicina9. Dentre as mudanças,
ressaltou-se a necessidade de uma formação generalista e com ênfase nos serviços de
APS e Urgência/Emergência. Reforçou também que os conteúdos fundamentais do
curso estejam relacionados com todo o processo saúde-doença do cidadão, da família
e da comunidade9.
A Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG) iniciou
suas atividades no ano de 1960 e já graduou mais de 5.000 médicos, a maioria deles
exercendo suas atividades na própria região, inclusive nas áreas de gestão pública e
privada10. Realizou diversos esforços para adequar o ensino à população e, já na
década de 70, implementou um estágio rural para o ensino de uma medicina
comunitária. No ano de 2002, a FM-UFG realizou uma reforma curricular para se
adequar às DCN do ano de 2001 e, além desta, em 2002, aderiu ao Programa de
Incentivos às Mudanças Curriculares dos Cursos de Medicina (Promed), em 2005 ao
Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró- Saúde
I e II), e em 2008 ao Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde, o PET-
Saúde. Com a adesão a estes projetos, a instituição passou a ter um enfoque maior
em atividades de ensino da saúde na comunidade11.
No ano de 2014, buscando nova adequação às DCN do curso de medicina,
publicou seu novo Projeto Pedagógico de Curso (PPC), ainda em fase de
implementação e avaliação. Este determina os princípios norteadores e as
expectativas em torno da formação médica na instituição10.
Considerando a necessidade de revisão e adequações curriculares de todas
as escolas médicas nacionais com base nas DCN de 2014, o objetivo deste estudo foi,
então, analisar e comparar o PPC do curso de medicina da UFG segundo as
determinações das DCN de 2014 quanto ao ensino na Atenção Primária.
Métodos
Trata-se de uma pesquisa do tipo estudo de caso, de abordagem qualitativa,
com dados produzidos por meio de análise documental. Esta, conforme Bardin12,
2011, é uma operação ou conjunto de operações que visam representar o conteúdo de
Artigos 29
um documento em uma forma diferente do original, a fim de facilitar em um período
posterior, a sua consulta e referenciação.
Conforme ilustrado na Figura 1, três documentos foram analisados e dois
comparados: O “Projeto pedagógico do curso de medicina da UFG” publicado no
final de 2014 foi comparado as “Diretrizes curriculares do curso de Medicina”
publicada em 2014.
O documento “Diretrizes para o Ensino na Atenção Primária à Saúde na
Graduação em Medicina”13 também foi analisado para subsidiar e estabelecer as
especificações do ensino da APS na graduação. Após esta etapa, selecionou-se os
doze descritores que tinham correspondência nas DCN de 2014:
• Competência para trabalhar em equipe
• Capacidade para atuar na atenção primária e conhecer os diversos níveis
de atenção à saúde
• Conhecimento de ações de gestão e dos serviços de saúde
• Competência para trabalhar com educação popular e permanente da
equipe
• Respeito à autonomia
• Capacidade de tomar decisão compartilhada
• Utilização de evidências científicas
• Decisão baseada em prevalência e incidência
• Perfil Generalista
• Liderança no trabalho multidisciplinar
• Responsabilidade Social
• Integralidade
Realizou-se, então, uma primeira leitura exploratória, estabelecendo-se,
assim, contato com o PPC e conhecimento do texto12. Neste documento, encontram-
se os princípios e estratégias de avaliação de aprendizagem, duração do curso e a
estrutura curricular, incluindo a matriz curricular, o elenco dos módulos e os
conteúdos de aprendizagem, com as respectivas ementas e cargas horárias10. Todos
estes tópicos foram avaliados nesta pesquisa.
Após esta etapa, buscou-se no PPC as passagens que abordavam o ensino
dos temas ilustrados nos descritores para posterior descrição e correlação,
apresentados nos quadros em resultados (figura 1).
Artigos 30
O estudo foi submetido ao Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital de
Clínicas da UFG e iniciado após a sua aprovação - Parecer 1.523.208 em 2016
conforme resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 466 de 12 de
dezembro de 2012.
Resultado e discussão
Os quatro temas que resultaram da análise documental são apresentados em
quadros, com a descrição e a comparação entre os documentos. O primeiro quadro
(Quadro 1) compara os documentos segundo o perfil do egresso, o segundo quadro
(Quadro 2) trata da área de atenção à saúde, o terceiro (Quadro 3) refere-se a
aspectos da Gestão em Saúde e o último sobre a Educação em Saúde (Quadro 4).
Perfil esperado do egresso
O perfil do profissional descrito no PPC, um médico generalista e adequado
às necessidades da sociedade, está em acordo com as DCN. A formação na atenção
primária e a responsabilidade social são destacadas em ambos (Quadro 1).
A formação de um estudante de medicina com perfil generalista,
conhecimento dos diferentes níveis de atenção à saúde e com responsabilidade social
se alinha às mais recentes diretrizes do curso de medicina em países como Canadá,
Inglaterra e Espanha, e dos princípios do SUS14,15. Estes defendem que o egresso de
medicina deve estar em uma consonância maior com a realidade local, ter maior
conhecimento e resolutividade dos problemas mais prevalentes e com o atendimento
ambulatorial primário como prioridade na formação2,5, 6,16,17.
Artigos 31
Quadro 1: Descrição da análise documental comparativa entre os documentos referentes ao perfil esperado do
egresso do curso de medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG). Goiânia, 2017.
Diretrizes do ensino na
Atenção Primária à Saúde
Diretrizes Curriculares
Nacionais do curso de
medicina de 2014
Projeto pedagógico curricular de 2014 –
Faculdade de Medicina – UFG
Perfil generalista
“O graduado em Medicina
terá formação geral,
humanista, ...” (p. 01)
“A proposta curricular visa à formação de um
profissional generalista e mais adequado aos
desafios da sociedade moderna.” (p. 12)
“O Curso de Medicina da UFG tem como
objetivo geral a formação de um profissional
generalista[...].” (p. 12)
Capacidade para atuar na
atenção primária e conhecer
os diversos níveis de atenção
à saúde.
“[...] com capacidade para
atuar nos diferentes níveis de
atenção à saúde, com ações
de promoção, prevenção,
recuperação e reabilitação da
saúde, nos âmbitos individual
e coletivo[...]” (p. 01)
“Valorização da vida, com a
abordagem dos problemas de
saúde recorrentes na atenção
básica[...]” (p. 03)
“Estabelecer a inserção do estudante, desde o
primeiro ano do curso, em atividades de
campo oportunas à formação das habilidades
e competências, nos diferentes níveis de
atendimento, bem como no gerenciamento
administrativo, nos diversos cenários de
ensino-aprendizagem necessários ao
exercício da prática médica.” (p. 13)
“Atuar nos diferentes níveis de atendimento à
saúde, com ênfase nos atendimentos primário
e secundário[...]” (p. 16)
Responsabilidade social
“O graduado em Medicina
terá formação geral [...] com
responsabilidade social e
compromisso com a defesa da
cidadania, da dignidade
humana, da saúde integral do
ser humano [...].” (p.01)
“o eixo do desenvolvimento curricular foi
construído de acordo com as necessidades de
saúde dos indivíduos e das populações,
identificadas[...]” (p. 16)
“objetivo é tornar a educação do egresso,
relevante em relação às necessidades da
sociedade[...]” (p. 16)
Embora as DCN do curso de medicina de 20017 já contemplassem estas
orientações, as escolas médicas pouco avançaram nesse sentido18. O ensino médico
no país permaneceu centrado, predominantemente, em cenários hospitalares e
terciários, e com pouca interface com as principais necessidades da população15,18.
Com a publicação da Lei do Mais Médicos, 2013, instituiu-se a obrigatoriedade de os
cursos de medicina acompanharem as DCN8. Em função disto, espera-se agora
maiores transformações no ensino médico brasileiro e na universidade analisada.
Para corroborar com estas orientações, importante citar também que a
Organização Mundial de Saúde recomenda que cerca de oitenta por cento das
demandas em saúde sejam resolvidas na APS20 e, no clássico estudo Ecologia dos
Serviços de Saúde, de White,196116, replicado e confirmado em 2001 por Green17,
observou-se que menos de cinco por cento das pessoas que procuram atendimento
médico necessitam de cuidados hospitalares. Estes dados reforçam a necessidade de
uma formação com maior enfoque em serviços ambulatoriais, e, em especial, na
APS.
Artigos 32
Atenção à Saúde
No Quadro 2, foram abordados temas relacionadas à área Atenção à Saúde,
como o cuidado centrado na pessoa, família e comunidade, prevenção e promoção de
saúde, utilização de evidências científicas e as competências para trabalhar em
equipe, desenvolver atividades de educação popular e tomar decisões
compartilhadas.
A necessidade de se considerar a pessoa em sua totalidade, incluindo a
família e comunidade, é citada nos dois documentos. No entanto, não se observa no
PPC menção ao método clínico centrado na pessoa. Esta técnica de abordagem
apresenta diversas vantagens sobre o modelo biomédico tradicional, centrado no
médico. Incluem maior satisfação do paciente, maior adesão ao tratamento e melhor
resposta à terapêutica, maior satisfação do médico, menor número de processos por
erro médico, cuidado mais eficiente, menor número de exames complementares e de
encaminhamentos a especialistas focais, com redução dos custos para o sistema de
saúde e para o paciente15;16;17.
Prevenção, promoção de saúde e competência para trabalhar com educação
popular e da equipe são colocadas como ações esperadas do estudante. A expressão
‘promoção da saúde’ foi utilizada pela primeira vez na década de 1970, pelo ministro
da saúde canadense, Mark Lalonde, num documento chamado The New Perspectives
on the Health of Canadians. A influência de fatores ambientais, comportamentos
individuais e modos de vida na ocorrência de doenças e na morte foram bastante
destacadas neste documento. A Carta de Otawa, publicada pela Organização Mundial
de Saúde na primeira conferência internacional de promoção à saúde, reforça essa
tese e acrescenta que os indivíduos deverão ser orientados para ter melhor controle
sobre a própria saúde20,24.
Embora o PPC aborde o conceito de educação permanente e envolva a
população neste sentido, não consta menção ao aprendizado sobre Educação Popular
em Saúde (EPS) de forma clara e específica. A EPS reconhece e enfrenta os
problemas de saúde dialogando com as classes populares e respeitando a cultura e os
saberes trazidos por estes. A atual concepção da EPS, influenciada principalmente
pela publicação de Paulo Freire, rompe com as práticas hegemônicas de educação em
saúde anteriores. Estas eram instituídas de forma unilateral pelos profissionais de
saúde, pouco dialógicas e com caráter exclusivamente biomédico. Torna-se, portanto,
Artigos 33
de fundamental relevância a inclusão e ensino destes conceitos no curso de
medicina20.
Quadro 2: Descrição da análise documental comparativa entre os documentos referentes à área de Atenção à
Saúde do curso de medicina da Universidade Federal de Goías (UFG). Goiânia, 2017.
Diretrizes do ensino
na Atenção
Primária à Saúde
Diretrizes Curriculares Nacionais do
curso de medicina de 2014
Projeto pedagógico curricular de 2014 –
Faculdade de Medicina – UFG
Abordagem
centrada na pessoa,
família e
comunidade
“integralidade e humanização do cuidado
por meio de prática médica contínua e
integrada com as demais ações e
instâncias de saúde, [...], estimulando o
autocuidado e a autonomia das pessoas,
famílias, grupos e comunidades” (p. 02)
“Cuidado centrado na pessoa sob
cuidado, na família e na comunidade [...]”
(p. 02)
“incluir a perspectiva dos usuários,
família e comunidade, favorecendo sua
maior autonomia na decisão do plano
terapêutico.” (p. 08)
“A primeira aproximação deve se dar entre
o estudante e o indivíduo inserido em seu
contexto social mais próximo (a família,
seu grupo de vizinhança e os focos sociais
em que se desenvolvem suas relações
sociais).” (p. 15)
“Eixo Individuo Família, Comunidade,
Sociedade: visa o desenvolvimento de uma
prática de ação comunitária, integrada [...],
onde o estudante entra em estreita relação
com o indivíduo, a família, a comunidade e
a sociedade ou em ambientes e estruturas a
elas pertencentes” (p. 46)
Atuação na
prevenção e
promoção de saúde
“participação na discussão e construção
de projetos de intervenção em grupos
sociais, orientando-se para melhoria dos
indicadores de saúde, considerando
sempre sua autonomia e aspectos
culturais” (p. 07)
“estímulo à inserção de ações de
promoção e educação em saúde em todos
os níveis de atenção, com ênfase na
atenção básica” (p. 07)
“atuar na proteção e na promoção da saúde
e na prevenção de doenças, bem como no
tratamento e reabilitação dos problemas de
saúde” (p. 24)
Competência para
trabalhar com
educação popular e
permanente da
equipe
“estímulo à inserção de ações de
promoção e educação em saúde em todos
os níveis de atenção, com ênfase na
atenção básica” (p. 07)
NÃO CONSTA EDUCAÇÃO POPULAR
“veiculação do conhecimento da área da
saúde, cujo alcance envolve a formação do
acadêmico, e a troca contínua entre os
profissionais integrantes dos órgãos
prestadores de serviços, principalmente nas
Unidades Básicas de Saúde, alcançando,
ainda, a própria comunidade, em um
processo de educação e conscientização
permanente.” (p. 16)
Respeito a
autonomia do
paciente
“estimulando o autocuidado e a
autonomia das pessoas, famílias, grupos e
comunidades” (p. 02)
NÃO CONSTA
Capacidade de
tomar decisão
compartilhada
“incluir a perspectiva dos usuários,
família e comunidade, favorecendo sua
maior autonomia na decisão do plano
terapêutico” (p. 08)
NÃO CONSTA
Utilização de
evidências
científicas
“Tomada de decisões, com base na
análise crítica e contextualizada das
evidências científicas”( p. 03)
“capacidade de tomar decisões [...]
baseadas em evidências científicas; (p. 22)
Decisão baseada em
prevalência e
incidência
“Análise das necessidades de Saúde de
Grupos de Pessoas e as Condições de
Vida e de Saúde de Comunidades, a partir
de dados demográficos, epidemiológicos,
sanitários e ambientais, considerando
dimensões de risco, vulnerabilidade,
incidência e prevalência das condições de
saúde[...]” (p. 07)
“diagnosticar e tratar corretamente as
principais doenças do ser humano em todas
as fases do ciclo biológico, tendo como
critérios a prevalência e o potencial
mórbido das doenças” (p. 24)
As DCN colocam a necessidade do estímulo ao autocuidado pelos pacientes,
respeito a autonomia destes e capacidade de tomar decisão compartilhada. No
Artigos 34
entanto, merece destaque, a ausência no PPC de qualquer termo que remeta ao
respeito da autonomia ou decisão compartilhada. Conforme mostrado a seguir,
diversas publicações reforçam a orientação das DCN sobre estes assuntos. O código
de ética médica, de 200926, em seu artigo XXI, diz que no processo de tomada de
decisões profissionais, de acordo com seus ditames de consciência e as previsões
legais, o médico aceitará as escolhas de seus pacientes, relativas aos procedimentos
diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e
cientificamente reconhecidas.
A mudança de predomínio de doenças agudas para doenças crônico-
degenerativas tornará obrigatória a reincorporação da arte da medicina, segundo
Sullivan, 200327. O objetivo exclusivo de cura e de evitar a morte, dá lugar para o
objetivo de cuidado das pessoas, considerando a perspectiva dessas. O respeito a
autonomia do paciente e a valorização de seu ponto de vista em relação à saúde e ao
cuidado com a mesma, é peça fundamental do agir médico. O paciente-sujeito está
sendo reintroduzido na medicina23,27.
A tomada de decisões baseada em evidências e considerando a prevalência e
incidência dos diversos agravos aparece nos dois documentos. Essa forma de atuação
garante maior resolutividade e efetividade aos tratamentos, atenção a prevenção
quaternária, uso racional de recursos e medicamentos e diminuição dos casos de
iatrogenia28,29.
Gestão em Saúde
Este tópico trata de assuntos como o trabalho em equipe, liderança no
trabalho multidisciplinar e o conhecimento de ações de gestão. Todas estas
competências são recomendadas pelas DCN e pelo PPC (Quadro 3).
Com o envelhecimento da população e o aumento de condições crônicas,
expandiu significativamente a complexidade do cuidado4,30. Portanto, torna-se
fundamental a formação de profissionais que tenham competência para enfrentar este
novo perfil epidemiológico. Trabalho em equipe e liderança, de forma colaborativa,
não hierárquica e coordenada, são competências imprescindíveis neste processo4,31,32.
A liderança, apesar do seu caráter subjetivo, é uma competência que pode
ser ensinada. Envolve boa comunicação, saber trabalhar em equipe, planejamento
estratégico e tomada de decisões. Espera-se também, que o estudante seja capaz de
Artigos 35
identificar necessidades, traçar objetivos e atuar em equipe, buscando envolver e
partilhar o cuidado com outros profissionais33.
Quadro 3: Descrição da análise documental comparativa entre os documentos referentes à área de Gestão em
Saúde do curso de medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG). Goiânia, 2017.
Diretrizes do ensino na
Atenção Primária à
Saúde
Diretrizes Curriculares
Nacionais do curso de medicina
de 2014
Projeto pedagógico curricular de 2014 –
Faculdade de Medicina – UFG
Competência para
trabalhar em equipe
“Trabalho em Equipe, de modo a
desenvolver parcerias e
constituição de redes, estimulando
e ampliando a aproximação entre
instituições, serviços e outros
setores envolvidos na atenção
integral e promoção da saúde. (p.
03)
“Inserção do estudante desde o primeiro
ano do curso em atividades práticas, em
trabalho em equipe, com interação e
atuação multiprofissional, tendo como
beneficiários os indivíduos e a
comunidade.” (p. 12)
“Promover a formação das competências
necessárias para trabalho em equipes
multiprofissionais bem como o
relacionamento interpessoal e ético em
todos os níveis da atuação profissional,
[...]” (p. 14)
Liderança no trabalho
multidisciplinar
“Liderança exercitada na
horizontalidade das relações
interpessoais [...], tendo em vista o
bem-estar da comunidade [...]” (p.
03)
“[...] no trabalho em equipe
multiprofissional, deverão estar aptos a
assumir posições de liderança, sempre
tendo em vista o bem-estar da
comunidade.” (p. 22)
Conhecimento de ações
de gestão e dos serviços
de saúde
“[...]participar de ações de
gerenciamento e administração
para promover o bem-estar da
comunidade, [...]” (p. 02)
“Participação social e articulada
nos campos de ensino e
aprendizagem das redes de atenção
à saúde, colaborando para
promover a integração de ações e
serviços de saúde, provendo
atenção contínua, integral, de
qualidade...” (p. 03)
“[...]ter visão do papel social do médico e
disposição para atuar em atividades de
política e de planejamento em saúde.” (p.
24)
“[...] deve estar apto a tomar iniciativas,
fazer o gerenciamento e administração
tanto da força de trabalho quanto dos
recursos físicos e materiais e de
informação” (p. 22)
Integralidade
“[...]promoção da integralidade da
atenção à saúde individual e
coletiva[...]” (p. 08)
“[...] reconhecer a saúde como direito e
atuar de forma a garantir a integralidade da
assistência [...]” (p. 24)
Outra competência desejada, o desenvolvimento e conhecimento de ações
de gestão, envolve a organização de sistemas de saúde e atenção em saúde pública.
Qualificar o estudante para gerir e conhecer tanto a macroestrutura, quanto os
serviços e políticas públicas, são medidas que trarão profissionais e gestores mais
capacitados e envolvidos com a melhoria dos dispositivos da rede de atenção à
saúde34.
Uma atuação que busque a integralidade é etapa fundamental do
atendimento médico na APS. Ao utilizar a abordagem clínica centrada na pessoa
integral, complexa, garante-se que o indivíduo seja visto em sua totalidade e é uma
estratégia para a concretização de uma assistência voltada para as reais necessidades
da população35.
Artigos 36
Educação em Saúde
Na parte das DCN referente à área Educação em Saúde, um ponto com
interface na APS é destacado, a interdisciplinaridade. Esta encontra-se contemplada
no PPC (Quadro 4).
A interdisciplinaridade, que significa a interação entre diferentes teorias e
saberes nos processos de ensino-aprendizagem31, é peça essencial para a formação de
um profissional que trabalhe de forma integrada, interprofissional e resolutiva32.
Quadro 4: Descrição da análise documental comparativa entre os documentos referentes à área de Educação em
Saúde do curso de medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG). Goiânia, 2017.
Diretrizes do ensino na
Atenção Primária à Saúde
Diretrizes Curriculares
Nacionais do curso de medicina
de 2014
Projeto pedagógico curricular de 2014
– Faculdade de Medicina – UFG
Interdisciplinaridade
“Promover a integração e a
interdisciplinaridade em coerência
com o eixo de desenvolvimento
curricular, buscando integrar as
dimensões biológicas,
psicológicas, étnico-raciais,
socioeconômicas, culturais,
ambientais e educacionais” (p. 12)
“Aspectos éticos, morais, sociais e
fisiopatológicos na prática médica com
ênfase na interdisciplinaridade. ” (P.97)
Conforme Frenk et al4, a interdisciplinaridade e a interprofissionalidade são
pilares da última grande geração de reformas no ensino médico que tratam da
aquisição de competências para formação de um profissional mais alinhado com as
necessidades da população.
Considerações finais
O novo projeto pedagógico curricular foi construído em um contexto de
transformações na formação médica e no modelo assistencial (pós “Lei do Mais
Médicos”) e acompanhou as DCN de 2014 na maioria dos pontos relacionados ao
ensino da APS na graduação. Ambos determinam a formação de um profissional
generalista, que atenda às necessidades de saúde da população e que possua grande
conhecimento da APS. Também é descrita a necessidade de se buscar um egresso
que tenha abordagem integral, habilidades para trabalhar em equipe e conhecimentos
dos processos de gestão.
Merece destaque, no entanto, a ausência no PPC de referências ao ensino do
método clínico centrado na pessoa, da educação popular em saúde, do respeito à
autonomia do paciente e da tomada de decisão compartilhada. Espera-se que os
gestores do curso em um processo de avaliação e atualização continuada do currículo
Artigos 37
possam incluir essas recomendações, que são previstas nas DCN e são peças
fundamentais para o exercício da medicina e, em especial, da atenção primária.
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Artigo 2
Percepções docentes e discentes do ensino médico na atenção primária após Diretrizes Curriculares de 2014
Perceptions of teachers and students of the medical education at primary
care for 2014 Curricular Guidelines Percepciones docentes y discentes de la enseñanza médica en la atención
primaria después de las Diretrices Curriculares de 2014 Resumo Este estudo verificou as percepções de discentes e docentes sobre o desenvolvimento do novo currículo do curso de medicina de uma Universidade Federal da região centro-oeste, pós Lei dos Mais Médicos e das novas Diretrizes Curriculares Nacionais de 2014, quanto ao ensino na Atenção Primária à Saúde (APS). Realizou-se uma pesquisa do tipo estudo de caso, de abordagem qualitativa, cuja coleta de dados ocorreu por meio de dois grupos focais: um com docentes e outro com discentes. Na percepção dos discentes, falta longitudinalidade no ensino da APS e há depreciação desta área por alguns professores. Os docentes destacaram a falta de apoio da gestão municipal, escassez de campos de estágio e de formadores qualificados para esta mudança. O novo currículo, embora desenhado para contemplar o ensino na APS, enfrenta resistências e carece de professores com formação específica na área. Palavras-chave: Atenção Primária à Saúde; Currículo; Medicina; Ensino. Abstract This study verified the perceptions of students and teachers about the development of the new curriculum of the medical course of a Federal University of the midwest region, post More Doctors Law and the new National Curricular Guidelines of 2014 regarding teaching in Primary Health Care (PHC). A case study was carried out, with a qualitative approach, whose data collection took place through two focus groups: one with teachers and the other with students. In the perception of the students, there is a lack of longitudinality in the teaching of PHC and there is a depreciation of this area by some teachers. Teachers highlighted the lack of support from municipal management, shortage of internships field and qualified trainers for this change. The new curriculum, although designed to contemplate teaching in the PHC, faces resistance and lacks teachers with specific training in the area. Keywords: Primary Health Care, curriculum, medicine, education.
Resumen Este estudio verificó las percepciones de discentes y docentes sobre el desarrollo del nuevo currículo del curso de medicina de una Universidad Federal de la región centro-oeste, post Lei de los Más Médicos y de las nuevas Directrices Curriculares Nacionales de 2014, en cuanto a la enseñanza en la Atención Primaria a la Salud (APS). Se realizó una investigación del tipo estudio de caso, de abordaje cualitativo, cuya recolección de datos ocurrió por medio de dos grupos focales: uno con docentes y otro con discentes. En la percepción de los discentes, falta
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longitudinalidad en la enseñanza de la APS y hay depreciación de esta área por algunos profesores. Los docentes destacaron la falta de apoyo de la gestión municipal, escasez de campos de prácticas y de formadores calificados para este cambio. El nuevo currículo, aunque diseñado para contemplar la enseñanza en la APS, enfrenta resistencias y carece de profesores con formación específica en el área. Palabras clave: Atención Primaria a la Salud; Currículo; Medicina; Enseñanza.
Introdução
A formação médica no Brasil, influenciada ainda pelo modelo
Flexneriano, possui predominância de um modelo curativo, especializado e
hospitalocêntrico. As discussões sobre mudanças neste ensino ocorreram
nas últimas décadas, em especial após o surgimento da Comissão
Interinstitucional de Avaliação do Ensino Médico (CINAEM) em 1991. Neste
contexto, a Atenção Primária à Saúde (APS) foi colocada como alternativa e
campo preferencial para o ensino médico e os sistemas de saúde1-4.
Os sistemas de saúde com melhores indicadores ao redor do mundo
possuem a APS como a principal porta de entrada 5. No entanto, para o
pleno funcionamento desta, espera-se profissionais altamente qualificados e
serviços com infraestrutura adequada3,6.
As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) de 2001, foram um
importante passo na reorientação da formação profissional7. Construídas a
partir da sociedade organizada de médicos e educadores, de pressões
populares e do Conselho Nacional de Saúde, fundamentaram mudanças no
currículo médico em direção a um egresso com perfil mais generalista. No
entanto, apesar da publicação destas DCN, as universidades avançaram
pouco na mudança curricular na primeira década do século XXI8.
No ano de 2013, foi sancionada a Lei nº 12.871 - ‘Lei do Mais
Médicos’, que tratou da reordenação da formação médica no país e de
estratégias para fixação de médicos na APS e em áreas com déficit de
profissionais9. Um dos pilares do programa é o aumento da carga horária
das disciplinas voltadas à formação na APS e dos estágios de estudantes
em Unidade Básicas de Saúde (UBS), tal como ocorre em outros países
com sistemas públicos de saúde9,10.
Artigos 42
Após a promulgação da Lei do Mais Médicos, publicou-se as novas
DCN do curso de medicina10, em 2014. Estas destacam a APS na formação
médica e, com percentual maior de participação na graduação e no
internato, esperam propiciar uma prática crescente na atenção básica. No
entanto, discute-se que para mudanças reais e efetivas, são necessários
cenários de prática de APS de alta qualidade, sob supervisão de
professores/preceptores com formação na área e integração ensino-serviço
consolidada11,12.
A Faculdade de Medicina (FM) da Universidade Federal analisada
buscando se adaptar a essas determinações, reformulou no ano de 2014
seu Projeto Pedagógico de Curso (PPC). Desde então o novo currículo tem
sofrido profundas transformações.
Os esforços para construção de um curso voltado também para uma
saúde comunitária nesta instituição começaram já na década de 1970 com a
formação de um estágio rural. Nos anos 2000, realizou uma reforma
curricular para se adequar às DCN do ano 2001 e aderiu a diversos
programas de incentivo ao ensino na APS. Destaque para o Programa de
Incentivos às Mudanças Curriculares dos Cursos de Medicina (Promed), o
Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde
(Pró- Saúde I e II), e em 2008 ao Programa de Educação pelo Trabalho para
a Saúde, o PET-Saúde13.
Considerando a necessidade de revisão e adequações curriculares
de todas as escolas médicas nacionais com base nas DCN de 2014, faz-se
necessário uma avaliação contínua do currículo, que monitore e possa
propor adequações ao longo do processo de mudanças. Logo, o objetivo
deste estudo foi verificar as percepções de discentes e docentes sobre a
implementação e o desenvolvimento do novo currículo segundo as
determinações das DCN de 2014 quanto ao ensino na APS em uma escola
médica federal.
Metodologia
Pesquisa do tipo estudo de caso, de abordagem qualitativa,
realizada na FM de uma Universidade Federal da região Centro-Oeste, após
a implementação do novo projeto pedagógico em 2014.
Artigos 43
Foram convidados a participar, por meio de redes sociais e grupos
de um software de mensagem instantânea, todos os alunos do curso de
medicina das turmas de 2014, 2015 e 2016, e todos os professores do
módulo saúde, família e comunidade, que possui a maior carga horária
destinada a assuntos de APS no PPC, do mesmo curso e instituição.
Com o intuito de verificar as percepções sobre as mudanças
ocorridas no currículo de medicina foram realizados dois grupos focais, um
com docentes e outro com discentes. Todos os participantes que
concordaram com os propósitos da pesquisa e com os procedimentos de
coleta de dados por meio de gravação em áudio, assinaram o TCLE antes
do início dos grupos. Participaram do Grupo Focal 01 (GF1), sete alunos do
curso de medicina das turmas selecionadas. Enquanto cinco docentes do
módulo “Saúde, Família e Comunidade”, atenderam ao Grupo Focal 02
(GF2).
A escolha em avaliar por meio de grupos focais deveu-se ao fato
destes serem ambientes propícios para interação entre pesquisador e
participantes e para colher dados a partir da discussão focada em tópicos
específicos e diretivos14.
Uma especialista em coordenação de grupo focal atuou como
moderadora e levantou as questões a serem debatidas e o pesquisador
participou como observador. As perguntas norteadoras do GF1 foram
relacionadas ao entendimento dos discentes sobre a APS e a Medicina de
Família e Comunidade, a concordância entre os assuntos teóricos e o que é
visto nas atividades práticas, a avaliação do novo PPC e as críticas e
sugestões ao novo currículo e a desospitalização.
Já no GF2, com docentes, as perguntas-guia questionaram sobre a
implementação do novo currículo, a avaliação do novo PPC, a percepção de
apoio institucional e as críticas à formação na APS.
Para análise dos dados oriundos da transcrição dos grupos focais
utilizamos a técnica de análise de conteúdo que buscou sistematizar as
questões respondidas pelos participantes, facilitando sua interpretação.
Quanto à modalidade, foi escolhida a análise temática fundamentada em
Bardin15, considerada efetiva para investigações qualitativas em saúde14.
Artigos 44
A análise de conteúdo organizou-se em torno de três polos
cronológicos15: Pré-análise, exploração da matéria e tratamento dos
resultados obtidos e interpretação.
As categorias extraídas da transcrição dos grupos com discentes e
docentes foram construídas de duas formas: 1) Predeterminadas: a partir
dos objetivos do estudo e perguntas norteadoras do grupo focal, e 2) Acervo:
incorporação de aspectos que emergiram espontaneamente pelos
participantes do grupo. As falas de discentes e docentes se uniram para
subsidiar cada categoria.
O estudo foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa
do Hospital de Clínicas da UFG, parecer 1.523.208 em 2016 conforme
resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) nº 466 de 12 de dezembro
de 2012.
Resultado e Discussão
O processo de análise de conteúdo dos dados permitiu construir
quatro categorias entres discentes e docentes. Os alunos foram
representados pelas siglas de A1 a A7 e os professores de P1 a P5.
Foram formadas quatro categorias mistas: 1) Saberes, resistências e
(des) conhecimentos acerca de um novo paradigma; 2) O ensino na APS:
inadequações, insuficiências e pouca integração do currículo; 3) Falta de
preceptores e professores com formação na área: Onde estão os exemplos?
4) Desafios nas relações interprofissionais e na integração ensino-serviço.
Saberes, resistências e (des) conhecimentos acerca de um novo
paradigma
Essa categoria discorre a respeito do conhecimento discente sobre a
APS, a Medicina de Família e Comunidade (MFC) e as resistências do corpo
docente no ensino da APS. Quando questionados sobre o que entendem por
APS, as falas dos alunos trazem o conceito de um modelo de saúde voltado
às necessidades da população, descentralizado, com maior proximidade dos
usuários e que serve como primeiro contato com o sistema de saúde. Os
participantes entenderam também que ações como busca ativa, prevenção e
promoção de saúde são características deste nível de atenção.
Artigos 45
Vejo como algo mais descentralizado e que provê uma maior proximidade entre o profissional, meio de trabalho, tanto meio de trabalho que vai ser o mesmo meio de vida do paciente e com o paciente também, então, além dessa descentralização, algo com uma maior proximidade. (A2)
O entendimento dos alunos a respeito da MFC foi de uma área da
medicina atrelada a estratégia de saúde da família, semelhante a um clínico
geral, que acompanha famílias e comunidades ao longo do tempo, atuando
de modo multidisciplinar, levando em consideração as necessidades
populacionais, contexto social e cultural, e com foco na pessoa, não só na
doença. Não foi sinalizado pelos participantes que esta é uma especialidade
médica.
Seria a medicina que poderia ser capaz de atuar em todos os segmentos da clínica geral, da comunidade. Então ela deveria ser capaz de estar em uma região que tem crianças, idosos. Ela deveria ser capaz de promover a saúde de todas demandas populacionais e das necessidades específicas de saúde daquele grupo. (A1)
A APS é o primeiro nível de atenção à saúde e, como descrito por
Starfield6., possui valores como a universalidade, equidade, integralidade,
participação e controle social; princípios como respostas às necessidades de
saúde, intersetorialidade, orientação para qualidade, justiça social; e
atributos específicos: primeiro contato, longitudinalidade, integralidade,
coordenação, orientação familiar e comunitária, enfoque na pessoa e
competência cultural6,16. A MFC é uma especialidade médica com a APS
como principal campo de atuação e que dispõe de uma série de ferramentas
para atuação individual e coletiva17.
Os alunos mencionam algumas destas características, mas não
consideraram aspectos importantes como a equidade, controle social e
coordenação do cuidado. A não citação da MFC como especialidade médica
e de ferramentas como o método clínico centrado na pessoa e abordagem
familiar, leva-nos a inferir que os alunos desconhecem a MFC em sua
totalidade, associando-a apenas com uma área que atua na ESF e sem
grandes especificidades. Esse desconhecimento, associado aos fatores
descritos a seguir, podem explicar o desinteresse dos alunos pelo
aprendizado na APS.
Artigos 46
Percebe-se também pelas falas dos alunos, que parte do corpo
docente da FM desconhece a importância de uma formação generalista.
Estes também adotam posturas de pouca integração.
Tem muito professor que trata a atenção primária de forma pejorativa até hoje, então a gente vê muito isso. Então essa mudança de eixo saindo do hospital não é total no curso. (A2)
Embora sejam reconhecidos alguns avanços e mudanças desde o
início do novo currículo, os participantes do GF1 e GF2 descrevem falhas na
inserção do ensino na APS por consequência da grande resistência e falta
de capacitação dos docentes para executá-lo.
[...] o problema do novo currículo é que ele foi pensado de uma maneira muito bonita, mas ele tá sendo executado por algumas pessoas que têm a mentalidade do velho currículo. Eu acho que a principal dificuldade é essa. (A3) [...] a gente via assim uma participação massiva na construção do novo currículo de professores da área de saúde coletiva, alguns outros professores da pediatria, da gineco tiveram uma participação grande. Agora, no geral, os professores da universidade tiveram uma participação muito pequena, uma resistência. (P1)
Alguns formadores têm também dificuldade de deixar hábitos e
crenças antigas e usar os instrumentos de qualificação que existem.
Aumentar estas medidas de educação permanente ou criar instrumentos que
motivem os docentes a se qualificar são colocadas pelos participantes como
opções para transformar este cenário.
Então, além de ter essa organização, é capacitar os professores. Eu acho que muitos deles não falam por mal, eles cresceram ouvindo isto... Quarenta anos dando aula. (A2)
Os relatos remetem a uma grande dificuldade por parte dos
docentes do curso em mudar velhas práticas e saberes. Conforme descrito
por Costa18, as mudanças no ensino médico são difíceis de acontecer.
Algumas explicações para isso são a desvalorização das atividades de
ensino e supremacia da pesquisa, a falta de profissionalização docente,
desvalorização da docência na medicina e o individualismo e resistência
docente a transformações18.
A APS no Brasil ganhou visibilidade, principalmente, nas duas
últimas décadas, por conta disso o conhecimento dos especialistas focais
que atuam em serviços especializados sobre o processo de trabalho na APS
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e a valorização de seus profissionais ainda é insuficiente. Este cenário
interfere na criação de uma cultura colaborativa e de respeito entre pares19.
Embora haja um redirecionamento da formação para a APS a partir
do novo currículo, vários professores e departamentos ainda não aderiram
às novas mudanças.
O ensino na APS: inadequações, insuficiências e pouca
integração no novo currículo
O módulo de Saúde, Família e Comunidade, chamado também de
saúde coletiva pelos alunos, foi colocado como o único que trata do ensino
de conteúdos relacionados a APS. Na visão deles a FM como um todo não
assumiu a responsabilidade pelo ensino da APS e alguns módulos a
negligenciam, considerando como papel exclusivo dos professores do
instituto que concentra os professores da saúde coletiva.
Assim, pensando no curso como um todo... acho que a responsabilidade do ensino da atenção primária tem que ser assumida pelo curso. [...] a partir do momento que a gente entra nos ambulatórios de clínica médica e clínica cirúrgica eu vejo que tem uma falta gigante disto. Os professores não valorizam isso. Eu não sinto o compromisso tão grande dos outros departamentos em ter esta mudança... porque eles querem manter rotinas antigas deles [...] (A2)
A fala dos professores reforça este cenário. A responsabilidade
sobre o ensino da APS tem sido delegada, quase que exclusivamente, ao
departamento de Saúde Coletiva, o que, segundo as falas no GF2, é
inadequado e insuficiente. Dois pontos reforçam essa opinião, o primeiro é
que a saúde coletiva não é sinônimo de MFC e não tem um corpo de
médicos docentes que atuem neste nível de atenção, o segundo é que as
outras especialidades deveriam se deslocar também para a APS, visto que
existe um grande número de casos e pacientes com perfil abordado por elas.
Fortalecer a Atenção Primária na formação médica não é tarefa da Saúde Coletiva, é tarefa da Faculdade de Medicina. Ou seja, é a Faculdade de Medicina que deve ir para a Atenção Primária, encontrar um desenho aonde atuar na Atenção Primária, que é absolutamente natural, os pacientes que são daqui do Hospital das Clínicas são originários da Atenção Primária. (P4)
A MFC e a Saúde Coletiva, embora tenham muitas interfaces,
possuem uma série de especificidades cada uma10,11. Portanto, o ensino
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destas necessita de corpo docente com conhecimento e atuação nas
diferentes áreas.
O redirecionamento da formação para APS e a mudança no PPC
são vistos como positivos pelos participantes do GF1. Esta ação leva ao
desenvolvimento de uma abordagem mais integral e mais habilidades em
ações como prevenção e promoção de saúde.
Eu percebo que se não tivesse esse redirecionamento pra fora do hospital, a gente nunca ia começar a fazer promoção de saúde. A gente não faz prevenção de saúde se não sair do hospital. Se a gente ficar só no hospital vai ficar querendo medicar todo mundo, [...]. (A2)
Um ponto destacado pelos docentes é a falta de longitudinalidade no
ensino da APS na graduação. Os alunos passam pontualmente nas UBS
durante o semestre letivo, não criando vínculo com o serviço e pacientes. É
também mencionado que os conteúdos que são trabalhados no começo do
curso, em especial pelo módulo “Saúde, Família e Comunidade”, não
recebem atenção das outras áreas e módulos, e o contato com a atenção
primária vai diminuindo progressivamente.
[...] eu fico muito satisfeito quando dez por cento da turma sai com a cabeça diferente, alguns que conseguem enxergar que se eles dessem atenção a aquilo que a saúde coletiva aponta, eles serão melhores profissionais, mas infelizmente nem todos pensam assim, e por que não pensam? Porque não há professores em número suficiente pra gerar esse tipo de influência e o meu receio... por exemplo, saúde coletiva a gente faz essa abordagem no primeiro ano, né? Tem outras abordagens, mas daqui pra frente, no terceiro em diante ele é bombardeado por outras coisas...então isto fica de lado. (P5)
Esta falta de transversalidade e longitudinalidade reforçam, segundo
os participantes do grupo focal, uma formação voltada para as
especialidades. Portanto, o aluno ainda sai sem um perfil generalista.
O contato pontual e centrado no começo do curso mostra-se
insuficiente para que o egresso tenha uma formação satisfatória na APS.
Segundo Demarzo et al17, esta inserção deve ser longitudinal e com
continuidade ao longo do curso, num modelo em espiral crescente de
complexidade e, de preferência, com atividades na APS em todos os
períodos do curso.
Outro ponto relatado por discentes foi a não homogeneidade entre
os professores no ensino da APS. As diferenças entre o que é ministrado em
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cada subgrupo e a falta de uniformidade e de objetivos de aprendizagem
claros são exemplificados na transcrição abaixo:
Eu acho que na faculdade o grande problema é que os professores são muito diferentes. Falta uniformidade. Os alunos são divididos em vários grupos e cada professor ensina da forma que ele acredita que é a melhor.” (A2)
Os problemas organizacionais e metodológicos citados podem ser
fatores de desestímulo em relação aos módulos que passam pela APS. A
falta de uniformidade leva a que alunos de um mesmo período tenham
impressões variadas sobre o assunto ministrado. Conforme descrito no
documento de Demarzo et al17, a formação na APS deve ter objetivos claros
de ensino-aprendizagem e cronograma de trabalho, evitando-se apenas
estágios de observação.
Por fim, os discentes relataram pouca integração entre o conteúdo
exposto nas aulas teóricas e sua utilização nas atividades de campo. A falta
de aplicação do conteúdo teórico na prática dos estágios é ilustrada nos
depoimentos:
Alguns não aprendem nem no começo. Alguns mandam a teoria, mas você não vê na prática. Mandam textos, você não entende direito. Você precisa de um contexto e eu não tive esse contexto. (A7)
Por exemplo, as vezes eu estudava, lia, lia, lia o texto, chegava lá e o professor não aplicava o texto, entendeu? [...]. Aí esse tipo de coisa desmotivava. (A4)
Os estágios e atividades práticas são elementos fundamentais para
que os alunos busquem novos conhecimentos (cognitivos, afetivos e
psicomotores). A concepção tradicional, que os conteúdos teóricos devem
ser dados de forma profunda antes dos alunos irem à prática, é bastante
questionável, visto que as situações vivenciadas garantem maior
aprendizado significativo, motivação e a exposição a novos saberes2.
Observa-se então que a falta de integração entre teoria e prática tem
prejudicado o processo de ensino-aprendizagem discente.
Falta de preceptores e professores com formação na área: Onde
estão os exemplos?
As consequências da ausência de Médicos de Família e
Comunidade (MFC´S) nos diversos espaços na formação, é, segundo os
Artigos 50
docentes, um dos grandes entraves para o melhor ensino na APS. Conforme
descrito nas falas a seguir, observamos que existem conteúdos que são
próprios da especialidade de MFC e não são abordados por outros
departamentos.
[...] até porque nossa disciplina tem essa grande vertente na estratégia da saúde de família, mas ela é disciplina de saúde coletiva. Teria de ser a medicina de família, porque teria que ter uma outra abordagem. Estou falando na estratégia, inclusive no seu corpo docente, grande parte dos professores não são médicos... (P1)
Os alunos também pontuaram que professores e preceptores,
muitas vezes, não detêm conhecimento específico da área, realizando
atividades não preferenciais para aquele nível de atenção.
[...] eu chegava na unidade e tinha dia que o professor nem foi... chegava na unidade e ele nem sabia o que tinha que fazer.... falava assim: “Ah... então vamos pegar uma veia aqui...” Não é ali que eu tenho que aprender isso. (A6)
A MFC é a especialidade médica prioritária e mais preparada para
atuar neste nível de atenção. A ausência de profissionais com formação nos
locais de estágio implica uma APS menos resolutiva e mais distante das
questões teóricas levantadas em sala de aula. Outro ponto que merece
destaque é que o corpo docente sem MFC´s não consegue abordar a
totalidade dos assuntos próprios da especialidade 6,17,20,21.
Cabe ressaltar que a influência de professores modelo (role model) é
um fator importante para que os estudantes se interessem pela APS, seja
como referencial positivo ou negativo22. Além disso, outro agravante se deve
ao fato de que muitos dos atuais preceptores do campo não enxergam este
como local definitivo e preferencial de atuação.
E nem quando eles estão nos estágios, porque os profissionais que estão lá nas unidades que eles vão, estão com ideal de saírem de lá daqui a um pouco tempo para poderem fazer uma residência. (P2)
A inexistência de departamentos, professores e módulos específicos
de MFC leva a um redirecionamento frágil da formação. Em instituições de
ensino europeias, os departamentos do curso de medicina incorporaram a
MFC com disciplinas específicas, longitudinais e integradas às outras. O
Ministério da Saúde da Espanha credita a alta resolutividade da APS de seu
país, cerca de 92%, à priorização do ensino desta na graduação. Realidade
Artigos 51
semelhante é vista na Austrália, nos Estados Unidos da América, e no
Canadá23,24. Percebe-se, portanto, que o aluno não adquire referências reais
sobre o papel do médico na APS.
Desafios nas relações interprofissionais e na integração ensino-
serviço.
Nesta categoria a integração com a gestão municipal local é descrita
como insuficiente. Por um lado, não há a construção de acordos e contratos
que trabalhem um olhar diferenciado pela SMS para os profissionais e
equipes que recebem alunos, seja com a redução das exigências de
quantitativo, seja com aumento da remuneração. Por outro, foi citado que a
FM não oferece contrapartidas ao município, ação esta que tem funcionado
em outros locais de ensino.
De uma forma geral também, eu acho que falta um pouco da universidade investir no serviço. Porque as vezes assim, se vai muito pra sugar o que o serviço tem dentro das suas fragilidades a oferecer, mas você contribui muito pouco. [...] Mesmo o próprio COAPES. Ele deve de alguma forma permitir algum tipo de fortalecimento nos campos de estágios... que nem sempre acontece (P3)
[...]. Alguma coisa que engrandecesse aquele momento, porque ali é uma troca de experiência riquíssima. É um momento onde eu aproximo o meu profissional da universidade e isso melhora a qualidade do meu serviço, como também tem toda a devolutiva pra universidade que é o conhecimento ali da prática diária. (P2)
A falta de incentivo financeiro, segundo os participantes, acarreta
problemas estruturais importantes. As UBS de forma geral carecem de
insumos, profissionais e reformas da estrutura física e dentro da
universidade faltam recursos didáticos, o que acaba desestimulando o corpo
discente e docente. Conseguir estágios, materiais e profissionais que
aceitem receber os alunos são pontuados como um grande desafio.
E eu acho também o aluno muitas vezes se desencanta [...]. Quando eles veem equipes de saúde que são incompletas, alta rotatividade de médico, a unidade caindo aos pedaços, faltando o básico do básico.... Quer dizer, isto aí e ele se pergunta: ‘Será que eu vou dedicar minha vida pra fazer isso?’ (P5)
E essa falta de apoio também nas unidades, né? Até no nosso caso por ser uma universidade pública. Que não temos como pagar a preceptoria... [...] Pra você ver, nós tivemos determinadas situações, em determinadas unidades que alguns profissionais se trancavam dentro da sala pra não ter que nos receber [...] (P1)
Artigos 52
Como descrito por Ceccim25, alunos e professores costumam chegar
sem aviso e planejamento prévio nas unidades e desenvolvem atividades
que não são baseadas nas necessidades daquele meio, gestores propõem
capacitações esporádicas e de temas não pactuados, a população não
dialoga com as diversas instâncias e os trabalhadores restringem-se a
executar suas atribuições.
Embora a Lei 8080 de regulamentação do SUS26 coloque-o como
definidor da formação de profissionais de saúde, existe ainda uma grande
dificuldade de inserir alunos nos diversos espaços. Uma alternativa colocada
por Demarzo et al.17 é a criação de concursos e contratos trabalhistas em
saúde que prevejam à docência e a integração serviço-ensino-comunidade
como parte do processo de trabalho, com reconhecimento profissional e
financeiro diferenciados.
Este cenário de pouca integração prejudica a todos, pois as
instituições formadoras e os municípios possuem a capacidade de se apoiar
e reinventar, já que um é o terreno do ensino, e o outro de práticas. Quanto
maior o comprometimento dessas instâncias, maior a imposição ética de
mudarem a si mesmas. As transformações destas articulações não podem
ser consideradas meramente técnicas, pois envolvem mudanças nos
processos, relações e, principalmente, nas pessoas25.
Esse desencontro observado entre ensino e serviço acarreta em
prejuízo para o ensino na APS e a uma relação muitas vezes conflituosa. A
otimização dos espaços de diálogo pode trazer melhorias neste processo.
Outra dificuldade citada é o trabalhar e ensinar de forma
interprofissional, mesmo no ambiente hospitalar.
A gente trabalha na maior parte da nossa graduação em um hospital de nível terciário, um hospital que é extremamente médico centrado, que deveria trabalhar com os outros profissionais da equipe, mas não trabalha. Eu não vejo isto, não vejo nenhum, em nenhum momento. (A5)
O trabalho desarticulado das equipes na maioria dos campos de
estágio e na faculdade, influencia negativamente no aprendizado dos alunos
sobre o trabalho interprofissional. Este cenário é percebido também na fala
dos docentes.
Artigos 53
Sem contar que eles vivenciam muito isso nas equipes que eles vão. Eles veem essa desarticulação. Então só reforça esse pensamento (falta de trabalho interprofissional). (P2)
Além de buscar uma maior integração com outros departamentos e
cursos da saúde na universidade, uma ação para estimular e ensinar de
forma multidisciplinar e interprofissional os alunos é investir mais na APS27.
Como descrito por Feuerwerker27, no processo do trabalho deste nível de
atenção, as atividades em equipe multiprofissional são mais frequentes e
mais estruturadas do que na prática hospitalar.
Para integração entre os módulos e profissionais exige-se a criação
de uma nova cultura institucional por meio de um ensino com mescla de
conteúdos, espaços formais de troca, pesquisas em comum e propostas de
intervenção na realidade a partir de um trabalho mais coletivo28.
A ausência destes aspectos e a falta de interprofissionalismo
visualizada nas falas levam a uma fragmentação do saber e dificuldade em
entender o trabalho em equipe.
Considerações Finais
A instituição conseguiu escrever o novo projeto pedagógico tendo
como base as DCN de 2014, porém os recursos para o desenvolvimento do
novo currículo são escassos. Há falta de recursos humanos capacitados,
como Médicos de Família e Comunidade na universidade e nos estágios e
este é, segundo os docentes, um dos grandes entraves para o melhor
ensino na APS. Quanto a estrutura física, as UBS de forma geral carecem
de insumos e reformas, e dentro da universidade faltam recursos didáticos, o
que acaba desestimulando o corpo discente e docente. Conseguir estágios,
materiais e profissionais que aceitem receber os alunos também são
pontuados como um grande desafio.
O processo de implementação do currículo é visto como falho pelos
discentes, pois, segundo eles, a FM de forma geral não assumiu a
responsabilidade pela mudança da formação. Os conteúdos de APS têm
ficado a cargo, quase que exclusivamente, dos professores do módulo de
Saúde, Família e Comunidade e não há comprometimento de outros
docentes e departamentos na integração e longitudinalidade do ensino
Artigos 54
deste. Há uma resistência à execução do PPC por parte de alguns docentes
e a depreciação do ensino da APS por estes, inclusive com falas pejorativas.
Como a maior parte dos docentes do curso não tem a APS como campo de
atuação, eles resistem em deixar o ensino em ambiente hospitalar. As
especialidades focais também ganhariam ao se fazer mais presentes na
APS, pois teriam o primeiro contato com muitos dos pacientes e veriam mais
as condições de grande prevalência.
A articulação com a gestão municipal não ocorre de forma
satisfatória e por conta disso não há estágios e profissionais adequados para
esta formação. Outro ponto levantado é que a inexistência de
departamentos, professores e módulos específicos de MFC leva a um
redirecionamento frágil da formação. Experiências de outras universidades e
países, que colocam a MFC como eixo norteador do currículo, recebendo o
matriciamento e a integração das outras especialidades, foram colocadas
como alternativas a se espelhar.
Quanto ao produto encontrado até aqui na implementação do novo
PPC, percebe-se pelas falas de discentes e docentes que, embora sejam
reconhecidos alguns avanços e mudanças desde o início do novo currículo,
ocorrem falhas na implementação por consequência da grande resistência e
falta de capacitação dos docentes para executá-lo.
Os alunos têm aprendido atributos, ferramentas e ações próprias da
APS. No entanto, isto ocorre ainda de forma não homogênea e incompleta.
O corpo discente, em função da falta de professores modelo e da
abordagem insuficiente dos temas da área, não consegue compreender a
MFC em sua totalidade e em reconhecê-la como uma especialidade médica
com vários campos de atuação. O interprofissionalismo é outro ponto ainda
pouco estimulado e ensinado na execução do atual currículo.
Portanto, em função dos diversos pontos destacados, observa-se
que a dificuldade do corpo docente em mudar velhas práticas e saberes
somado à falta de incentivo e integração institucional da gestão com a FM
retardam uma mudança real da formação médica voltada à Atenção Primária
no curso de medicina analisado.
Artigos 55
Referências
1. Cooke M. et al. American Medical Education 100 Years after the Flexner
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Considerações finais 58
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O novo projeto pedagógico curricular do curso de medicina da UFG
foi construído em um contexto de transformações na formação médica e no
modelo assistencial (pós “Lei do Mais Médicos”) e acompanhou as DCN de
2014 na maioria dos pontos relacionados ao ensino da APS na graduação.
Ambos determinam a formação de um profissional generalista, que se
enquadre às necessidades da população e que possua grande
conhecimento da APS. Também é descrita a necessidade de se buscar um
egresso que tenha abordagem integral, habilidades para trabalhar em equipe
e conhecimentos dos processos de gestão.
Merece destaque, no entanto, a ausência no PPC de referências ao
ensino do método clínico centrado na pessoa, da prevenção quaternária, do
respeito à autonomia do paciente e da tomada de decisão compartilhada.
Estas, excetuando a prevenção quaternária, são previstas na DCN e todas
são peças fundamentais para o exercício da medicina e, em especial, da
atenção primária.
Os recursos para o desenvolvimento do novo currículo são
escassos. Há falta de recursos humanos capacitados, como Médicos de
Família e Comunidade na FM-UFG e nos estágios e este é, segundo os
docentes, um dos grandes entraves para o melhor ensino na APS. Quanto à
estrutura física, as UBS de forma geral carecem de insumos e reformas, e
dentro da universidade faltam recursos didáticos, o que acaba
desestimulando o corpo discente e docente. Conseguir estágios, materiais e
profissionais que aceitem receber os alunos também são pontuados como
um grande desafio.
O processo de implementação do currículo é visto como falho pelos
discentes, pois, segundo eles, a FM de forma geral não assumiu a
responsabilidade pela mudança da formação. Os conteúdos de APS têm
ficado a cargo, quase que exclusivamente, dos professores do módulo
Saúde, Família e Comunidade e não é descrito grande comprometimento de
outros docentes e departamentos na integração e longitudinalidade do
Considerações finais 59
ensino deste. É mencionado uma resistência à execução do PPC por parte
de alguns docentes e a desqualificação do ensino da APS por estes,
inclusive com falas pejorativas. Como a maior parte dos docentes do curso
não têm a atenção primária como campo de atuação, eles resistem em
deixar o ensino em ambiente hospitalar. As especialidades focais também
ganhariam ao se fazer mais presentes na APS, pois teriam o primeiro
contato com muitos dos pacientes e veriam mais as condições de grande
prevalência.
A articulação com a SMS de Goiânia não ocorre de forma
satisfatória e por conta disso não há estágios e profissionais adequados para
esta formação. Outro ponto levantado é que a inexistência de
departamentos, professores e disciplinas específicas de MFC leva a um
redirecionamento frágil da formação. Experiências de outras universidades e
países, que colocam a MFC como eixo norteador do currículo, recebendo o
matriciamento e a integração das outras especialidades, foram colocadas
como alternativas a se espelhar.
Quanto ao produto encontrado até aqui na implementação do novo
PPC, percebe-se pelas falas de discentes e docentes que, embora sejam
reconhecidos alguns avanços e mudanças desde o início do novo currículo,
ocorrem falhas na implementação por consequência da grande resistência e
falta de capacitação dos docentes para executá-lo.
Os alunos têm aprendido atributos, ferramentas e ações próprias da
APS. No entanto, isto ocorre ainda de forma não homogênea e incompleta.
O corpo discente, em função da falta de professores-modelo e da
abordagem insuficiente dos temas da área, não consegue compreender a
Medicina de Família e Comunidade em sua totalidade e a reconhecê-la
como uma especialidade médica com vários campos de atuação. O
interprofissionalismo é outro ponto ainda pouco estimulado e ensinado na
execução do atual currículo.
Portanto, em função dos diversos pontos destacados, observamos
que a dificuldade do corpo docente em mudar velhas práticas e saberes
somada à falta de incentivo e integração institucional (SMS e FM) retardam
uma mudança real da formação médica no curso de medicina da UFG.
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Produtos 67
8 PRODUTOS
8.1 PRODUTO CIENTÍFICO
Esse trabalho apresentou como produto científico a dissertação e
dois artigos
8.2 PRODUTO TÉCNICO
O produto técnico consistirá em duas etapas:
1) Apresentação deste trabalho ao Conselho Diretor e Núcleo
Docente Estruturante da FM/UFG.
2) Oficina de para desenvovlvimento docente no ensino da APS
Produtos 68
PRODUTO TÉCNICO
Este produto técnico é consequência da dissertação desenvolvida para
o Mestrado Profissional em Ensino na Saúde da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal de Goiás (FM/UFG). A pesquisa desenvolvida, intitulada
“A INSERÇÃO DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE EM UM CURSO DE
MEDICINA ORIENTADA PELAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS DE
2014”, teve por objetivo avaliar a implementação e o desenvolvimento do
currículo desse mesmo curso e instituição.
1. INTRODUÇÃO
No início dos anos 1990, a Comissão Interinstitucional de
Avaliação Nacional do Ensino Médico (CINAEM), avaliou os cursos médicos
em todo país com a participação de entidades médicas e acadêmicas (CFM,
AMB, ABEM) preocupadas com a formação médica brasileira. Concluiu-se
após os estudos que era necessário mais incentivo para a profissionalização
de professores e introdução de uma cultura de educação transformadora.
Percebeu-se também que o ensino estava desvinculado da realidade da
saúde da população e que havia uma falta de integração das escolas com os
serviços públicos de saúde (CFM, 1998). O resultado desse movimento
provocou várias discussões que deram origem e fundamentaram a
proposição das DCN para os cursos de medicina.
As DCN do curso de medicina do ano de 2001 foram um passo
fundamental para estabelecer um perfil de egresso mais adequado às
necessidades de saúde da população. No ano de 2014, após as discussões
em torno da ‘Lei do Mais Médicos’, foram divulgadas as novas DCN para o
curso de Medicina. Dentre as mudanças, ressaltou-se a necessidade de uma
formação generalista e com ênfase nos serviços de APS e
Urgência/Emergência. Reforçou também que os conteúdos fundamentais do
Produtos 69
curso estejam relacionados com todo o processo saúde-doença do cidadão,
da família e da comunidade (BRASIL, 2014).
Influenciada por estas publicações, a FM/UFG iniciou um novo ciclo de
transformação curricular e construção do seu novo Projeto Pedagógico de
Curso. Criou-se um eixo transversal, denominado Saúde-Família e
Comunidade, em todos os anos do curso e que propicia ao estudante uma
formação mais longitudinal e ligada à comunidade. (NAGHETTINI, PEREIRA,
MORAES, 2014)
Considerando a necessidade de revisão e adequações curriculares de
todas as escolas médicas nacionais com base nas DCN de 2014 e o fato da
FM da UFG já ter desenvolvido o PPC e iniciado sua implementação em 2014,
faz-se necessário um processo de avaliação curricular que monitore e possa
propor adequações contínuas.
A pesquisa desenvolvida na dissertação encontrou os seguintes
pontos:
a) O novo projeto pedagógico curricular do curso de medicina da
UFG acompanhou as DCN de 2014 na maioria dos pontos relacionados ao
ensino da APS na graduação. Ambos determinam a formação de um
profissional generalista, que se enquadre às necessidades da população e
que possua grande conhecimento da APS
b) Merece destaque, no entanto, a ausência no PPC de referências
ao ensino do método clínico centrado na pessoa, da prevenção quaternária,
do respeito á autonomia do paciente e da tomada de decisão compartilhada.
c) Os recursos para o desenvolvimento do novo currículo são
escassos. Há falta de recursos humanos capacitados, como Médicos de
Família e Comunidade na FM-UFG e nos estágios, e este é, segundo os
docentes, um dos grandes entraves para o melhor ensino na APS.
d) Quanto à estrutura física, as UBS de forma geral carecem de
insumos e reformas, e dentro da universidade faltam recursos didáticos, o
que acaba desestimulando o corpo discente e docente.
e) Conseguir estágios, materiais e profissionais que aceitem
receber os alunos também são pontuados como um grande desafio.
Produtos 70
f) O processo de implementação do currículo é visto como falho
pelos discentes, pois, segundo eles, a FM de forma geral não assumiu a
responsabilidade pela mudança da formação. Os conteúdos de APS têm
ficado a cargo, quase que exclusivamente, dos professores do módulo
Saúde, Família e Comunidade e não há comprometimento de outros
docentes e departamentos na integração e longitudinalidade do ensino da
mesma.
g) Como a maior parte dos docentes do curso não têm a atenção
primária como campo de atuação, eles resistem em deixar o ensino em
ambiente hospitalar.
h) As especialidades focais também ganhariam ao se fazer mais
presentes na APS, pois teriam o primeiro contato com muitos dos pacientes e
veriam mais as condições de grande prevalência.
i) A articulação com a SMS de Goiânia não ocorre de forma
satisfatória e por conta disso não há estágios e profissionais adequados para
esta formação.
j) A inexistência de departamentos, professores e disciplinas
específicas de MFC leva a um redirecionamento frágil da formação.
Experiências de outras universidades e países, que colocam a MFC como eixo
norteador do currículo, recebendo o matriciamento e a integração das outras
especialidades, foram colocadas como alternativas a se espelhar.
l) Quanto ao produto encontrado até aqui na implementação do
novo PPC, percebe-se pelas falas de discentes e docentes que, embora
sejam reconhecidos alguns avanços e mudanças desde o início do novo
currículo, ocorrem falhas na implementação por consequência da grande
resistência e falta de capacitação dos docentes para executá-lo.
m) Os alunos têm aprendido atributos, ferramentas e ações
próprias da APS. No entanto, isto ocorre ainda de forma não homogênea e
incompleta.
n) O corpo discente, em função da falta de professores-modelo e
da abordagem insuficiente dos temas da área, não consegue compreender a
Produtos 71
Medicina de Família e Comunidade em sua totalidade e a reconhecê-la como
uma especialidade médica com vários campos de atuação.
o) A interdisciplinaridade é ainda pouco estimulada e ensinada na
execução do atual currículo.
2. OBJETIVOS
2.1 OBJETIVO GERAL
Aprimorar a implementação e o desenvolvimento do currículo do
Curso de Graduação de Medicina da UFG nas perspectivas das Diretrizes
Curriculares Nacionais de 2014 com o enfoque na Atenção Primária à Saúde.
2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
2.2.1. Apresentar os resultados da avaliação curricular desenvolvida
nesta dissertação ao Núcleo Docente Estruturante (NDE) da FM-UFG.
2.2.2. Debater alternativas para o aprimoramento curricular.
2.2.3. Otimizar o ensino da atenção primária à saúde na FM-UFG.
3. METODOLOGIA
A atividade será dividida em duas etapas: Na primeira, os resultados
da dissertação serão apresentados em uma reunião com o NDE da FM/UFG.
A segunda etapa contará com uma oficina desenvolvida e coordenada por
docente convidado de outra instituição referência em ensino na APS.
No primeiro encontro será realizada uma exposição dialogada dos
resultados desta avaliação curricular e em seguida será proposta uma
discussão sobre o que foi encontrado. A apresentação será estruturada e
mostrada no programa Power Point e depois disponibilizada ao NDE. A
atividade será coordenada e conduzida pelo primeiro autor deste trabalho
(Quadro 1).
Produtos 72
O segundo encontro mostrará experiências exitosas no ensino da APS
no país, com a participação de professor convidado externo, de referência na
área, para desenvolvimento de uma oficina com o NDE. Como produto da
oficina, esperamos propostas de melhoria para o ensino da APS na FM-UFG,
e adequações no currículo (Quadro 2).
4. CARGA HORÁRIA E DURAÇÃO
Realizar-se-á dois encontros. O primeiro com 02 horas de duração
e o segundo com 04 horas.
Quadro 1: CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO DO PRIMEIRO ENCONTRO
ETAPAS/TEMAS CARGA HORÁRIA
Apresentação do autor e dos
participantes da atividade
05 min
Exposição dialogada do resultado da
dissertação
40 min
Esclarecimentos, discussão e
propostas de encaminhamento para a
oficina (segundo encontro)
40 min
Encerramento 20 min
Quadro 2: CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO DO SEGUNDO ENCONTRO
ETAPAS/TEMAS CARGA HORÁRIA
Apresentação do professor convidado
e dos participantes da atividade
15 min
Exposição dialogada da Dissertação
de Mestrado
20 min
Produtos 73
Exposição dialogada sobre aspectos
do ensino na APS
40 min
Esclarecimentos e discussão
Painel Sobe e Desce
30 min
Intervalo 15 min
Discussão em grupos – propostas de
aprimoramento do atual currículo
40 min
Apresentação em plenária das
Discussões
40 min
Fechamento das propostas após
discussão
30 min
Avaliação da oficina 15 min
Encerramento e agradecimentos 5 min
5. RESULTADOS ESPERADOS
Espera-se através da discussão e problematização dos resultados
encontrados, que a oficina tenha como produto propostas de melhoria do
currículo e ensino da APS na FM/UFG, a serem apresentadas como relatório
técnico à Direção da FM/UFG.
9 ANEXOS e APÊNDICE
Anexo 1 – Parecer do Comitê de ÉticA
Anexo 2 – Normas de publicação dos respectivos periódicos
Apêndice 1 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Anexo 2 – Normas para revista Interface INTERFACE — Comunicação, Saúde, Educação, publica artigos analíticos e/ou ensaísticos, resenhas críticas e notas de pesquisa (textos inéditos); edita debates e entrevistas; e veicula resumos de dissertações e teses e notas sobre eventos e assuntos de interesse. Os editores reservam-se o direito de efetuar alterações e/ou cortes nos originais recebidos para adequá-los às normas da revista, mantendo estilo e conteúdo. A submissão de manuscritos é feita apenas online, pelo sistema Scholar One Manuscripts. Toda submissão de manuscrito à Interface está condicionada ao atendimento às normas descritas abaixo. FORMA E PEPARAÇÃO DE MANUSCRITOS SEÇÕES. Dossiê — textos ensaísticos ou analíticos temáticos, a convite dos editores, resultantes de estudos e pesquisas originais (até seis mil palavras). Artigos — textos analíticos ou de revisão resultantes de pesquisas originais teóricas ou de campo referentes a temas de interesse para a revista (até seis mil palavras). Teses — descrição sucinta de dissertações de mestrado, teses de doutorado e/ou de livre docência, constando de resumo com até quinhentas palavras. Título e palavras-chave em português, inglês e espanhol. Informar o endereço de acesso ao texto completo, se disponível na internet. SUBMISSÃO DE MANUSCRITOS Interface - Comunicação, Saúde, Educação Aceita colaborações em português, espanhol e inglês para todas as seções. Apenas trabalhos inéditos serão submetidos à avaliação. Não serão aceitas para submissão traduções de textos publicados em outra língua. A submissão deve ser acompanhada de uma autorização para publicação assinada por todos os autores do manuscrito. O modelo do documento estará disponível no link http://issuu.com/revista.interface/docs/autorizacaoautor_revista_miriam_15_ . Nota: para submeter originais é necessário estar cadastrado no sistema. Os originais devem ser digitados em Word ou RTF, fonte Arial 12, respeitando o número máximo de palavras definido por seção da revista. Todos os originais submetidos à publicação devem dispor de resumo e palavras-chave alusivas à temática (com exceção das seções Livros, Notas breves e Cartas). Da primeira página devem constar (em português, espanhol e inglês): título (até 15 palavras), resumo (até 140 palavras) e no máximo cinco palavras-chave. Nota: na contagem de palavras do resumo, excluem-se título e palavras-chave. 101 Notas de rodapé - identificadas por letras pequenas
sobrescritas, entre parênteses. Devem ser sucintas, usadas somente quando necessário. Citações no texto: As citações devem ser numeradas de forma consecutiva, de acordo com a ordem em que forem sendo apresentadas no texto. Devem ser identificadas por números arábicos sobrescritos. Exemplo: Segundo Teixeira1,4,10-15. Nota importante: as notas de rodapé passam a ser identificadas por letras pequenas sobrescritas, entre parênteses. Devem ser sucintas, usadas somente quando necessário. Casos específicos de citação: a) Referência de mais de dois autores: no corpo do texto deve ser citado apenas o nome do primeiro autor seguido da expressão et al. b) Citação literal: deve ser inserida no parágrafo entre aspas. No caso da citação vir com aspas no texto original, substituí-las pelo apóstrofo ou aspas simples. Exemplo: “Os ‘Requisitos Uniformes’ (estilo Vancouver) baseiam-se, em grande parte, nas normas de estilo da American National Standards Institute (ANSI) adaptado pela NLM.” 1 c) Citação literal de mais de três linhas: em parágrafo destacado do texto (um enter antes e um depois), com 4 cm de recuo à esquerda, em espaço simples, fonte menor que a utilizada no texto, sem aspas, sem itálico, terminando na margem direita do texto. Observação: Para indicar fragmento de citação utilizar colchete: [...] encontramos algumas falhas no sistema [...] quando relemos o manuscrito, mas nada podia ser feito [...]. Exemplo: Observação: Para indicar fragmento de citação utilizar colchete: [...] encontramos algumas falhas no sistema [...] quando relemos o manuscrito, mas nada podia ser feito [...]. Exemplo: 102 Esta reunião que se expandiu e evoluiu para Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas (International Committee of Medical Journal Editors - ICMJE), estabelecendo os Requisitos Uniformes para Manuscritos Apresentados a Periódicos Biomédicos – Estilo Vancouver. REFERÊNCIAS Todos os autores citados no texto devem constar das referências listadas ao final do manuscrito, em ordem numérica, seguindo as normas gerais do International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE) – http://www.icmje.org. Os nomes das revistas devem ser abreviados de acordo com o estilo usado no Index Medicus (http://www.nlm.nih.gov/). As referências são alinhadas somente à margem esquerda e de forma a se identificar o documento, em espaço simples e separadas entre si por espaço duplo. A pontuação segue os padrões internacionais e deve ser uniforme para todas as referências: Dar um espaço após ponto. Dar um espaço após ponto e vírgula. Dar um espaço após dois pontos. Quando a referência ocupar mais de uma linha, reiniciar na primeira posição.
Apêndice 1 - Termo de Consentimento Livre e esclarecido
Título da Pesquisa: AVALIAÇÃO DO CURRÍCULO DO CURSO DE MEDICINA NA
ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NA PERSPECTIVA DAS DIRETRIZES CURRICULARES
DE 2014
Nome do Pesquisador Principal: Valter Luiz Moreira de Rezende
Nome da Orientadora: Dra. Edna Regina Silva Pereira
Nome da Coorientadora: Alessandra Vitorino Naghettini
1. Natureza da pesquisa: O (A) senhor (a) está convidado (a) a participar dessa
pesquisa que tem como finalidade avaliar as mudanças do currículo do curso de
Medicina da UFG frente às Diretrizes Curriculares Nacionais de 2014 com
enfoque na Atenção Primária. Essa pesquisa terá como produto final uma
dissertação de mestrado e será enviado à coordenação do curso de medicina.
2. Participantes da pesquisa: Serão selecionados alunos das turmas de 2014, 2015
e 2016 do curso de medicina e docentes do módulo “Saúde, Família e
Comunidade”.
3. Envolvimento na pesquisa: O (A) senhor (a) tem liberdade de se recusar a
participar e ainda se recusar a continuar participando em qualquer fase da
pesquisa, sem qualquer prejuízo. Sempre que quiser poderá pedir mais
informações sobre a pesquisa através do telefone do (a) pesquisador (a) do
projeto e, se necessário através do telefone do Comitê de Ética em Pesquisa (62
3521-1215) e do pesquisador Valter L M Rezende (62 9489-4503).
4. Sobre as entrevistas: Você participará de um grupo focal (um grupo que
debaterá aspectos da formação dentro da atenção primária pelo curso de
medicina). A discussão ocorrerá em uma sala reservada dentro da sua
instituição de ensino e será mediada pelo pesquisador Valter L M Rezende e um
auxiliar de pesquisa. O tempo de discussão é, aproximadamente, 01 hora.
5. Riscos e desconforto: A participação nesta pesquisa não traz complicações
legais, contudo, há possibilidade do participante ficar constrangido (por
desconhecer/conhecer pouco) o assunto tratado. Para sanar esse possível risco,
será entregue uma cópia do questionário previamente ao participante para
leitura prévia e ele poderá se recusar a participar a qualquer momento. Os
procedimentos adotados nesta pesquisa obedecem aos Critérios da Ética em
Pesquisa com Seres Humanos conforme Resolução nº 196/96 do Conselho
Nacional de Saúde. Nenhum dos procedimentos usados oferece riscos à sua
dignidade.
7. Confidencialidade: Todas as informações coletadas neste estudo são
estritamente confidenciais. Todas as informações que você responder serão
pessoais e sigilosas e de forma alguma aparecerá seu nome ou outra maneira de
identificação dos sujeitos que participarem desta pesquisa. Somente o
pesquisador Valter Luiz Moreira de Rezende, a orientadora Dra. Edna Regina da
Silva e a coorientadora Dra. Alessandra Vitorino Naghettini terão conhecimento
dos dados.
8. Benefícios: Ao participar desta pesquisa o(a) senhor(a) não terá nenhum
benefício direto. Entretanto, esperamos que este estudo traga informações
relevantes para a melhoria do curso de medicina e o aprendizado no contexto
da Atenção Primária à Saúde. Esse pesquisador se compromete a divulgar os
resultados obtidos.
9. Pagamento: O(A) senhor(a) não terá nenhum tipo de despesa para participar
desta pesquisa, bem como nada será pago por sua participação. Contudo, o
participante pode não ter recursos para o transporte e/ou alimentação no local
escolhido para a coleta de dados, em tal dia, tal horário e o pesquisador
custeará essas despesas.
Após estes esclarecimentos, solicitamos o seu consentimento de forma livre
para participar desta pesquisa. Portanto preencha, por favor, os itens que se seguem.
Caso tenha alguma dúvida que não foi esclarecida, não assine esse termo.
Tendo em vista os itens acima apresentados, eu, de forma livre e
esclarecida, manifesto meu consentimento em participar da pesquisa. Declaro que
recebi cópia deste termo de consentimento, e autorizo a realização da pesquisa e a
divulgação dos dados obtidos neste estudo.
______________________________________________
Nome do Participante da Pesquisa
______________________________
Assinatura do Participante da Pesquisa
____________________________
Assinatura do Pesquisador
___________________________________
Assinatura do Orientador
Contatos:
Pesquisador Principal: Valter Luiz Moreira de Rezende (62) 94894503/
Comitê de Ética em Pesquisa: Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação, Universidade
Federal de Goiás, Caixa Postal: 131, Prédio da Reitoria, Piso 1, Campus II
(Samambaia). CEP: 74001-970, Goiânia, Goiás, Brasil.
Telefone: (62)3521-1215 Email: [email protected]