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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTOCENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
LUCIENE PERINI
A LINGUAGEM DO ALUNO DO CAMPO E A CULTURA ESCOLAR:UM ESTUDO SOBRE A CULTURA E O CAMPESINATO NA ESCOLA
BÁSICA
VITÓRIA2007
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LUCIENE PERINI
A LINGUAGEM DO ALUNO DO CAMPO E A CULTURA ESCOLAR:UM ESTUDO SOBRE A CULTURA E O CAMPESINATO NA ESCOLA
BÁSICA
Dissertação apresentada ao Programa dePós-Graduação em Educação do Centrode Educação da Universidade Federal doEspírito Santo, como requisito parcial paraa obtenção do Grau de Mestre emEducação, na área de concentração emEducação e Linguagens.Orientadora: Profª. Drª. Gerda MargitSchutz Foerste.
VITÓRIA2007
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Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)
Perini, Luciene, 1971-P445l A linguagem do aluno do campo e a cultura escolar: um estudo sobre
a cultura e o campesinato na escola básica / Luciene Perini. – 2007.210 f. : il.
Orientadora: Gerda Margit Schutz Foerste.Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito Santo,
Centro de Educação.
1. Cultura. 2. Educação rural. 3. Linguagem. 4. Língua materna –Estudo e ensino. I. Foerste, Gerda Margit Schutz. II. Universidade Federaldo Espírito Santo. Centro de Educação. III. Título.
CDU: 37
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AGRADECIMENTOS
Na minha roda da vida, muitas são as pessoas que irradiam luz:Luz forte que incentiva e apóia.
Luz quente que conforta e alivia.Luz amiga que inspira e alimenta a alma de sonhos.
Essas tantas luzes:
Deus,Nossa Senhora, mãe de Deus,
Minha família que tanto amo, razão de tudo.
Mestra e orientadora:Gerda Margit Shütz Foerste
Professores:Erineu Foerste
João Wanderley Geraldi
Parceiros e amigos:Da Escola Santa Catarina,
Da Secretaria Municipal de Educação de Santa Teresa-ES.
Sujeitos da Pesquisa:Professora, alunos da 5ª série “D”,
Coordenadora de área de Língua Portuguesa.
Os tantos amigos queridos...
Sintam-se todos abraçados.
Nós nos tornamos cúmplices na arte de sonhar com os olhos abertos!Muito obrigada.
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As coisas que a gente fala,saem da boca da gentee vão voando, voando,
correndo sempre pra frente.Entrando pelos ouvidos
de quem estiver presente.Quando a pessoa presente
é pessoa distraídanão presta muita atenção.Então as palavras entram
e saem pelo outro ladosem fazer complicação.
Mas às vezes as palavrasvão entrando nas cabeças,vão dando voltas e voltas,
fazendo reviravoltase vão dando piruetas.
Quando saem pela bocasaem todas enfeitadas.Engraçadas, diferentes,
com palavras penduradas.Mas depende das pessoas
que repetem as palavras.Algumas enfeitam pouco.Algumas enfeitam muito.Algumas enfeitam tanto,
que as palavras – que engraçado!- nem parecem as palavras
que entraram pelo outro lado.Por isso, quando falamos,temos de tomar cuidado.
Que as coisas que a gente falavão voando, vão voando,
e ficam por todo lado.E até mesmo modificamo que era nosso recado.
E depois que elas se espalham,por mais que a gente procure,por mais que a gente recolha,
sempre fica uma palavra, voando como uma folha,caindo pelos quintais,
pousando pelos telhados,entrando pelas janelas,
penduradas pelos beirais. (...)Ruth Rocha
À minha princesa,Maria Clara.
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RESUMO
Este estudo aborda o processo ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa numespaço onde se encontram alunos (as) provenientes do meio campesino. Insere-sena linha de pesquisa educação e linguagens, do programa de Pós-Graduação emEducação, da Universidade Federal do Espírito Santo. Parte da problemáticaverificada na construção de projetos de ensino em escola que recebe filhos detrabalhadores do campo, especialmente, no que se refere à importância de se levarem conta o contexto produtivo, a cultura e a linguagem. Aborda aspectos da históriada educação, em especial a educação do campo e da cultura, direcionando-se àsquestões relacionadas às diversas linguagens – vozes – que chegam à escola; focaem especial o texto no ensino da língua materna. Recorre ao referencial teórico dePaulo Freire, Vigotsky, Bakhtin, Geraldi, Bagno, entre outro para construir as basesda reflexão e da análise da realidade. Investiga em particular uma classe de alunosda 5ª série, de uma escola de Ensino Fundamental em Santa Teresa/Es. Para tanto,realiza entrevistas, discussões com grupos focais, observação em sala de aula eatividades intervencionistas, junto aos professores de Língua Portuguesa e tambémjunto aos alunos, discutindo idéias e produzindo textos. Constatou que oconhecimento de mundo do (a) aluno (a) e suas circunstâncias históricas constituemo contexto do discurso que ele produzirá. Destaca a necessidade de entender aescola como um lugar de cruzamento de culturas e ter uma nova postura perante asculturas que se entrelaçam no espaço escolar, reconhecendo diferentes sujeitossocioculturais presentes em seu meio. Sobretudo, defende que a escola, que recebeo (a) filho (a) do homem do campo, precisa pensar uma educação que respeite estacultura; que assuma também a identidade do meio campesino; que valorize o saberdo campo; que respeite a linguagem e a história dos sujeitos; e, ainda, quepossibilite a construção de conhecimentos à criança, na resolução de problemas queemergem de seu espaço vivido .
Palavras-chave: Cultura; Educação do campo; Linguagem; Leitura de mundo;Ensino da língua materna.
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ABSTRACT
This study approaches the process of teaching-learning in the Portuguese languagein a place where the students come from rural field. Insert to the research lineseducation and languages, of the post-graduate education program, of the FederalUniversity in state of Espírito Santo. Part of the problem verified in the construction ofteaching projects in the school that receives workers’ field children, especially, whichrefers to the importance of taking into account the productive context, the culture andthe language. This approaches aspects of the education history, in especially thefield and cultural education, being addressed to the subjects related to the severallanguages- voices-that arrive to the school; focus in special text of the teachingmaternal language. The theoretical referential it’s from, Paulo Freire, Vigotsky,Bakhtin, Geraldi, Bagno, and others to help build the reflex ion bases and theanalysis of the reality. In of it investigates a class of students of the matter 5th grade,of a school of Teaching in Fundamental Santa Tereza /Es. For that way, itaccomplishes interviews, discussions within focal groups, observation in theclassroom and activities interventionists, Along with professors and students of thePortuguese language, discuss ideas and producing texts. Information that provesthat the world’s point-of-view from a student and their historical circumstancesconstitute context of the speech that they will produce, highlighting that schools insuch environment need to be understood as a place of crossing cultures and to havea new posture before the cultures that they are interlaced in the school place,Knowing different social cultural student present between them. Above all, it defendsthe school, that embrace children of farm workers, They needs to think an educationto respect this culture; also it assumes the identity of the rural life; that value to knowabout the field; which respect the language and the history of each student; and, still,make possible the construction of knowledge the child, in the resolution of problemsthat emerge your lived place.
Word-key: Culture; Education makes field; Language; World reading; Teaching of thematernal language.
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RIASSUNTO:
Questo studio abborda il processo di insegnamento e di apprendimento della linguaportoghese in uno spazio dove si trovano studenti che provengono della campagna.Si insere nella ricerca Educazione e Linguaggi, del programma di post-laurea ineducazione dell’Università Federale di Espírito Santo. Parte della problematicaverificata nella costruzione di progetti di insegnamento della scuola che riceve figli dilavoratori del campo, especilalmente, sull’importanza del contesto produtivo, lacultura e il linguaggio. Abborda aspetti della storia della educazione, in specialel’educazione della campagna e della cultura, effettuando una riflessione per lequestioni relazionate a vari linguaggi -voci- che arrivanno a scuola; fa un’attenzionespeciale al testo nell’segnamento della madre lingua. Ricorre al riferimento teorico diPaulo Freire, Vigotsky, Bakhtin, Geraldi, Bagno, tra altri per costruire le base dellariflessione e dell’analise della realità. Investiga in particolare una classe di studentidella quinta elementare, di una scuola elementare a Santa Teresa/ES. Per questo,realizza interviste, dibattito in gruppi specifici, osservazione in classe, interventiinsieme ai professori della lingua portoghese e insime anche ai studenti, dibattendoidee e creando testi. Costata che la conoscenza del mondo dello studente e le suecircostanze storiche constituano il contesto del discorso che produrà. Stacca lanecessità di capire la scuola come un luogo di scambio culturale e di avere un nuovomodo di pensare nei confronti delle culture che si mescolano nell’ambito scolastico,riconoscendo i diversi sogetti socio-culturali presenti. Soprattutto, difendere che lascuola, che acoglie il figlio di un contadino bisogna pensare a un’educazione cherispetta questa cultura; che prenda in mano l’identità del loro modo di vivere, chevalorizzi il sapere del campo; che rispetta il linguaggio e la storia dei sogetti; e,ancora che faccia nascere la capacità del bambino di risolvere i suoi problemi dentroal suo spazio.
Parole chiave: cultura, educazione del campo, linguaggio, lettura del mondo, insegnodella madre lingua.
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
ILUSTRAÇÃO 1- Esquema representativo sobre o ato deproduzir uma mensagem ............................... 71
ILUSTRAÇÃO 2 - Esquema representativo sobre o aluno comolocutor efetivo na produção de textos............. 102
ILUSTRAÇÃO 3 - Foto das crianças do primário da ESC em1946................................................................. 108
ILUSTRAÇÃO 4 - Foto do novo prédio da ESC na época desua fundação................................................... 108
ILUSTRAÇÃO 5 - Foto da fachada atual da ESC........................ 109
ILUSTRAÇÃO 6 - Foto do Jardim de entrada da ESC................. 110
ILUSTRAÇÃO 7 - Foto da Biblioteca da ESC.............................. 111
ILUSTRAÇÃO 8 - Foto do laboratório de informática da ESC..... 112
ILUSTRAÇÃO 9 – Foto do pátio da ESC...................................... 112
ILUSTRAÇÃO 10 - Foto de uma das 12 salas de aula da ESC..... 114
ILUSTRAÇÃO 11 - Foto do refeitório da ESC................................ 114
ILUSTRAÇÃO 12 – Mapa do Espírito Santo................................... 117
ILUSTRAÇÃO 13 – Mapa de Santa Teresa.................................... 118
ILUSTRAÇÃO 14 - Foto do Vale do Canaã, em SantaTeresa............................................................. 119
ILUSTRAÇÃO 15 - O Vale do Canaã por Celina Rodrigues.......... 120
ILUSTRAÇÃO 16 - Foto do jardim localizado no centro de SantaTeresa............................................................. 120
ILUSTRAÇÃO 17 - Foto de Beija-flores do Museu de BiologiaMello Leitão..................................................... 121
ILUSTRAÇÃO 18 - Foto de orquídea cultivada em SantaTeresa............................................................. 121
ILUSTRAÇÃO 19 - Texto “Vida de Passarinho”, de Caulos,utilizado pela professora de Português........... 142
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ILUSTRAÇÃO 20 - Produção de texto das alunas “T” e “R” da 5ªsérie “D” com o tema “Trânsito”. 1ª parte........ 152
ILUSTRAÇÃO 21 - Produção de texto das alunas “T”e “R”, da 5ªsérie “D”, com o tema “Trânsito”. 2ª parte...... 152
ILUSTRAÇÃO 22 - Produção de texto das alunas “P” e “C” da 5ªsérie “D”, com o tema “Trânsito”. 1ª parte..... 155
ILUSTRAÇÃO 23 - Produção de texto das alunas “P” e “C” da 5ªsérie “D”, com o tema “Trânsito”. 2ª parte.... 155
ILUSTRAÇÃO 24 - Produção de texto das alunas “P” e “C” da 5ªsérie “D”, com o tema “Trânsito”. 3ª parte..... 155
ILUSTRAÇÃO 25 - Chico Bento tratando de galinhas................... 170
ILUSTRAÇÃO 26 - Homem da roça cuidando de galinhas............ 170
ILUSTRAÇÃO 27 - Foto das crianças da 5ª série “D” produzindotexto no encontro com a pesquisadora........... 177
ILUSTRAÇÃO 28 - Foto das crianças da 5ª série “D” produzindotexto no encontro com a pesquisadora........... 178
ILUSTRAÇÃO 29 - Foto das crianças da 5ª série “D” produzindotexto no encontro com a pesquisadora........... 178
ILUSTRAÇÃO 30 – Foto das crianças da 5ª série “D” produzindotexto no encontro com a pesquisadora........... 179
ILUSTRAÇÃO 31 - Produção de texto de uma dupla de alunosda 5ª série “D” – Parte 1.................................. 179
ILUSTRAÇÃO 32 - Produção de texto de uma dupla de alunosda 5ª série “D” – Parte 2.................................. 180
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LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 - Idade dos alunos matriculados nas 5ª sériesda Escola Santa Catarina – 2005...................... 113
QUADRO 2 - Número de alunos que utilizam o transporteescolar............................................................... 115
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LISTA DE SIGLAS
ABCAR - Associação Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural
ACAR - Associação de Crédito e Assistência Rural
AEB – Associação Brasileira de Educação
AIA - American International Association for Economic and Social Development
ANCA – Associação Nacional de Cooperação Agrícola
ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação
CBAR – Comissão Brasileiro-Americana de Educação das Populações Rurais
CEDES – Centro de Estudos, Educação e Sociedade
CIER’s - Centros integrados de Educação Rural
CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNER - Campanha Nacional de Educação Rural
CNPQ – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
COLE – Congresso de Leitura do Brasil
DETRAN – Departamento de Trânsito
EMATER – Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
EDURURAL – Programa de Extensão e Melhoria para o Meio Rural
ENERA – Encontro Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária
EUA – Estados Unidos da América
FIDENE – Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste
Estado do RS
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IEL/UNICAMP – Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de
Campinas
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira
LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC – Ministério da Educação e Cultura
MEPES – Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo
MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização
MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra
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PCN’S – Parâmetros Curriculares Nacionais
PPGE – Programa de Pós-Graduação em Educação
PRONASEC - Programa Nacional de Ações Sócio-educativas e Culturais para o
meio rural
PRONERA – Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária
PSECD – Plano Setorial de Educação, Cultura e Desportos
SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SSR - Serviço Social Rural
UDEP’s - Unidades de Demonstração, Experimentação e Produção
UERJ – Universidade Estadual do Rio de Janeiro
UFES – Universidade Federal do Espírito Santo
UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UNB – Universidade Federal de Brasília
UNESCO - Organização Educacional, Científica e Cultural das Nações Unidas
UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância
UNIOESTE – Universidade Estadual do Oeste do Paraná
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SUMÁRIORESUMO
ABSTRAT
1 INTRODUÇÃO........................................................................................ 16
1. 1 REVISÃO DA LITERATURA.............................................................. 19
2 CAPÍTULO INOSSOS OLHOS PERCORRENDO A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO:ENTRELAÇANDO IDÉIAS........................................................................ 33
2. 2 A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO E A EDUCAÇÃO DO CAMPO NAHISTÓRIA: DOS JESUÍTAS À NOVA DEMOCRACIA............................. 36
2. 3 OS OLHOS NA REALIDADE: O LUGAR DO CAMPO NASOCIEDADE MODERNA ......................................................................... 55
2. 4 UM OLHAR DE LUTA E ESPERANÇA.............................................. 57
3 CAPÍTULO II3. 1 ESTENDENDO NOSSO OLHAR: CAMINHOS PELA CULTURA,PELA LINGUAGEM E O ENSINO DA LÍNGUA MATERNA................. 62
3. 1 OLHOS DE PASSAGEM PELAS CULTURAS.................................... 62
3. 3 A LINGUAGEM EM FOCO: OLHOS NOS OLHOS............................ 70
3. 4 O ENSINO DA LÍNGUA: A GRAMÁTICA NA CONTRAMÃO.............79
3. 5 O PRECONCEITO LINGÜÍSTICO: COM QUANTOS MITOS SEDESFAZ UMA ‘CANOA’?......................................................................... 85
3. 6 O TEXTO: ‘MENINA DOS OLHOS’.................................................. 93
3. 7 GÊNEROS TEXTUAIS: PONTOS DE VISTA..................................... 98
3. 8 PRODUÇÃO DE TEXTO: PONTO DE PARTIDA E DE CHEGADA... 101
4 CAPÍTULO III4. 1 MÃOS À OBRA: A METODOLOGIA................................................. 104
4. 2 BLOCO 1............................................................................................
4. 2. 1 O CONTEXTO ESCOLAR: HISTÓRICO, LOCALIZAÇÃO,ESTRUTURA FÍSICA, CORPO DOSCENTE E CORPODISCENTE..........................................................................................
107
107
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4. 2. 2 CARACTERIZAÇÃO DA CIDADE DE SANTATERESA..............................................................................................
4. 2. 3 O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO...................................
4. 2. 4 SOBRE AS PROPOSTAS CURRICULARES............................
4. 2. 5 ENTREVISTAS.........................................................................
4. 2. 5. 1 Entrevista com a coordenadora de área de LínguaPortuguesa ........................................................................................
4. 2. 5. 2 Entrevista com a aluna do campo..................................
4. 2. 5. 3 Entrevista com a professora de Língua Portuguesa da5ª série“D”.............................................................................................
4. 2. 6 OBSERVAÇÕES........................................................................
4. 2. 6. 1 Aula do dia 25/10/2005 – 5ª série “D” – 1ª aula – 50minutos – História em Quadrinhos..................................................
4. 2. 6. 2 Aula do dia 25/10/2005 – 5ª série “D” – 2ª aula – 50minutos – Continuação da aula ......................................................
4. 2. 6. 3 Aula do dia 26/10/2005 – 5ª série “D” – 1ª aula – 50minutos – Produção de Texto..........................................................
4. 2. 6. 4 Aula do dia 26/10/2005 – 5ª série “D” – 2ª aula – 50minutos – Produção de Texto .........................................................
4. 2. 6. 5 O que os olhos descortinam...............................................
116
122
124
127
128
130
133
139
140
145
147
150
157
4. 3 BLOCO 2 ...........................................................................................
4. 3. 1 O ENCONTRO COM OS PROFESSORES DE LÍNGUAPORTUGUESA DA ESCOLA SANTA CATARINA.............................
160
160
4. 4 BLOCO 3............................................................................................
4. 4. 1 ENCONTRO COM OS (AS) ALUNOS (AS) DA 5ª SÉRIE “D”DA ESCOLA SANTA CATARINA........................................................
168
168
5 CONCLUSÃO........................................................................................ 181
6 REFERÊNCIAS...................................................................................... 188
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32
ANEXOS.....................................................................................................
ANEXO A – TEXTO: FUMAÇA DE TODO LADO – MAURÍCIO DESOUSA....................................................................................
ANEXO B - TEXTO: VOU VORTÁ – PATATIVA DOASSARÉ....................................................................
ANEXO C – TEXTO: PROBLEMA DE ACENTO – MAURÍCIO DESOUSA...................................................................................
193
193
194
195
APÊNDICES.............................................................................................
APÊNDICE A – PROTOCOLO DE PESQUISA........................................
APÊNDICE B – PROTOCOLO DE PESQUISA.........................................
APÊNDICE C – CATEGORIAS DE ANÁLISE............................................
APÊNDICE D - PERGUNTAS DA ENTREVISTA COM ACOORDENADORA DE ÁREA DE LÍNGUAPORTUGUESA...............................................................
APÊNDICE E - ENTREVISTA COM A ALUNA DO CAMPO DA ESC.....
APÊNDICE F – PERGUNTAS DA ENTREVISTA COM APROFESSORA DE LÍNGUA PORTUGUESA DA 5ªSÉRIE D................................................................
APÊNDICE G – PLANEJAMENTO DO ENCONTRO COM OS ALUNOSDA ESC...........................................................................
APÊNDICE H – PLANEJAMENTO DO ENCONTRO COM OSPROFESSORES DA ESC...............................................
196
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197
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204
208
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1 INTRODUÇÃO:
Para contextualizar esta pesquisa, é necessário que eu esboce, primeiramente, o
lugar de onde falo. Trago, para a tecitura deste trabalho, o processo ainda
inacabado da junção entre minha experiência profissional e minhas reflexões de
pesquisadora em condição de incompletude, afinal, somos seres inacabados, como
bem nos diz Paulo Freire.
Nesse emaranhado de idéias, permito-me situar num horizonte um tanto curioso de
pensamentos, pois, “pensar é voar sobre o que não se sabe”. (ALVES, 2004, p. 58).
E, em meio a momentos vividos; a tantos autores e a inúmeros livros; a tantas
informações e perguntas - às vezes com respostas ou não, é que me propus a
ingressar no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do
Espírito Santo, com o intuito de refletir sobre o ensino da Língua Portuguesa,
considerando, em especial, as diversas culturas que se encontram num mesmo
espaço escolar.
Desde 1998, atuo na Escola Santa Catarina, em Santa Teresa – ES, como
professora de Língua Portuguesa, e, é no interior de minha história profissional que
se instaurou e se desenvolveu a problemática que ora apresento: Como se dá o
ensino de língua portuguesa, numa sala de aula de 5ª série, do ensino fundamental,
considerando-se que há, neste espaço, um cruzamento de culturas, destacando ,
em especial, culturas provenientes do meio campesino?
Registro que minha escolha pela categoria teórica “campo – campesino”, vem refletir
sobre o sentido atual do (a) aluno (a) que reside no campo e estuda na sede do
município, também sobre as questões culturais e sobre o respeito à linguagem
destes grupos que hoje tentam garantir sua sobrevivência na terra. Emprego essa
expressão em substituição a outros possíveis termos: meio rural, roça, rurícola, etc.
A categoria “campo”, no dicionário Aurélio significa: 1. Extensão de terra sem mata e
que tem ou não árvores esparsas. 2. Grande terreno plantado. 3. Zona fora do
perímetro urbano das grandes cidades, na qual predominam as atividades agrícolas.
Este último, me permite a utilização da expressão “do campo” para os (as) alunos
(as) da qual me refiro na pesquisa. Enfim, minha preocupação especial é
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17
conscientizar para a valorização daquele (a) que habita no campo, que tem sua
cultura, seus valores e sua linguagem; que se preocupa com a sua sobrevivência,
mas também com a da sua terra.
O alunado desta escola, da qual faço parte e também é cenário de minhas
inquietudes, tem características bem heterogêneas, com aluno/as residentes na
sede do município e também alunos provenientes do meio campesino1. Estes
últimos tornaram-se protagonistas de minha pesquisa, visto que suas vivências, suas
culturas e, principalmente suas linguagens me inspiraram a reflexões e quiçá
mudanças da minha prática.
Quando tive a oportunidade de me encontrar com o livro A importância do ato de ler,
de Paulo Freire, minha mente “engravidou” ainda mais de questionamentos
incontroláveis que me levaram a refletir: como estamos vendo, ouvindo e sentindo
nosso (a) aluno (a) que vem do campo? Se a leitura de mundo precede a leitura da
palavra, estamos, enquanto professores (as) de língua portuguesa, considerando a
curiosidade, a experiência de vida, a cultura e a linguagem deste (a) aluno (a)?
Nesta perspectiva, escolhi o espaço da sala de aula da 5ª série “D” , onde realizei
observações diretas do cotidiano dessa turma, nas aulas de Língua Portuguesa,
procurando compreender o processo de ensino da língua materna e refletir sobre a
ação pedagógica desenvolvida neste contexto, no que se refere às relações
interculturais e interativas entre os sujeitos, mediada pelo ensino da língua
portuguesa; também analisei o projeto político-pedagógico da escola, observando
se, através dele, a escola atende às diferenças históricas e culturais, proporcionando
assim, o diálogo entre a criança e a sua cultura.
Buscando observar as expectativas dos sujeitos da pesquisa, ou seja, a maneira
como estes encaram as questões que foram sendo focalizadas, realizei entrevistas
com os profissionais que atuam diretamente com a disciplina de Língua Portuguesa:
1 Isto porque, em 1996, a lei 9.394/96 definiu responsabilidades ao Estado e aos municípios quantoao atendimento à Educação Básica, iniciando o processo de municipalização. A partir daí, as escolaslocalizadas no meio campesino ficaram na responsabilidade dos municípios que, para racionalizarcustos, passaram a deslocar suas crianças campesinas para as sedes dos municípios com aproposta de proporcionar-lhes um ensino de “maior qualidade”.
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professora e coordenadora de área; também realizei intervenções com os (as)
alunos (as) através de produções de textos; e, por meio de um bate-papo com o
grupo de (as) professores (as) de Língua Portuguesa da escola, no planejamento
coletivo, procurei saber como estes pensam o ensino da língua materna,
principalmente, no que diz respeito ao contexto campesino.
Busquei, também, identificar, junto aos (às) alunos (as), quais as dificuldades que
vêm enfrentando no que se referem à linguagem utilizada na escola e as que trazem
consigo, e o que estas dificuldades acarretam para a sua aprendizagem. Neste
contato, enquanto pesquisadora, procurei ainda, identificar, nos conteúdos
trabalhados pelos (as) professores (as) de Língua Portuguesa, a existência de
criticidade, de realidade concreta, de reflexão e comprometimento com a igualdade e
a diferença. E, analisar as propostas curriculares da escola, observando se sua
organização respeita também a necessidade do (a) aluno (a) do campo e se estas
propõem a produção de conhecimentos a partir das experiências dele (a).
Dessa forma, busquei articular discussões sobre a educação em contexto
campesino, sobre a cultura, sobre a linguagem e sobre o ensino da língua,
enfatizando o texto como suporte central no ensino-aprendizagem da língua
portuguesa; distribuindo estes temas em três capítulos: Num primeiro momento, o
primeiro capítulo, trago algumas questões relacionadas à educação e à educação do
campo2: uma breve passagem pelo percurso histórico desta modalidade de ensino,
trazendo à tona o contínuo descaso/esquecimento referente à cultura campesina na
história da educação do Brasil. Apresento, também, Algumas iniciativas da
população, através de organizações e movimentos sociais que vêm surgindo,
forçando as políticas públicas a colocarem a educação campesina na agenda
política do país.
Em seguida, no segundo capítulo, discorro sobre as relações entre a escola e a
cultura: a diversidade cultural, o multiculturalismo e os estudos culturais, fazendo um
recorte para questões relacionadas às diversas linguagens que chegam à escola.
2 Entendo como educação do campo a educação que trabalha a cultura, a economia, a política, alinguagem e os interesses da criança do campo, nas suas diversas formas de organização,produzindo valores, conhecimentos e tecnologias voltadas para o desenvolvimento social eeconômico desta população.
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Neste recorte, busco analisar, à luz dos estudiosos, o ensino da língua materna, as
variantes lingüísticas, os preconceitos lingüísticos possivelmente existentes (ou não),
delineando uma breve abordagem histórica e conceitual do ensino da língua
portuguesa.
Por esse caminho, apresento, no terceiro capítulo, as estratégias metodológicas
adotadas para a realização da pesquisa e os resultados de minhas análises,
tentando articular a teoria estudada com as experiências observadas.
E, assim, apresento minhas conclusões acerca da temática em questão,
problematizando os aspectos mais relevantes e, - ciente de que sempre nos faltarão
peças para compreender o ensino da nossa língua materna, pois cada final nos
remete a infindáveis recomeços - procuro elencar os aspectos que por ventura não
se resolverem.
1. 1 REVISÃO DA LITERATURA
Este estudo realiza-se a partir do olhar atento às questões referentes à educação do
campo, à interculturalidade e ao ensino da língua materna, com especial atenção ao
processo educativo que se realiza no espaço escolar. Dessa forma, procedo um
breve levantamento das pesquisas desenvolvidas sobre estas temáticas no
Programa de Pós-Graduação em Educação-UFES; nos anais do Seminário de
Educação no Meio Rural de 1982; nos anais do 14º COLE – Congresso de Leitura
do Brasil, de 2003; no banco de dados do site do Instituto de Estudos da Linguagem
da UNICAMP; e, nos periódicos: Educação e Sociedade, Revista Brasileira de
Educação e Educação e Pesquisa.
Minha primeira aproximação, permite-me perceber que os estudos sobre educação
no contexto campesino tiveram significativo incremento nessas duas últimas
décadas com a produção de pesquisas que destacam a necessidade de uma política
voltada à educação do campo.
Dialoguei, inicialmente, com as produções acadêmicas deste Programa de Pós-
graduação em Educação – PPGE – UFES, onde encontrei a produção de Gerlinde
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Merklein Weber (1998), “A Escolarização entre descendentes pomeranos em
Domingos Martins”, que, através de um estudo de caso etnográfico, observou uma
comunidade campesina em torno de uma escola unidocente em Domingos Martins –
ES, cujos membros, em sua maioria, são descendentes de pomeranos.
Weber (1998) constatou que a Igreja Luterana desta comunidade é que assumia,
além das funções religiosas, as sociais – em destaque a educação. Observou que a
escolarização pouco levava em conta o contexto marcado por uma cultura
específica, cuja produção econômica se baseia na agricultura de subsistência.
Percebeu também que as crianças daquela comunidade freqüentavam apenas as
séries iniciais do ensino fundamental, apresentando resistência à obrigatoriedade de
escolarização nas séries finais, e que o Conselho Tutelar do município procurava
intervir para que as crianças cumprissem pelo menos até a 8ª série do ensino
fundamental. Em suma, Weber (1998) procurou verificar no grupo pomerano do
campo sua cultura e sua vivência, para depois discutir sua escolarização.
Outra pesquisa bastante relevante do Programa de Pós-graduação em Educação-
UFES é a de Pizetta (1999), “Formação e Práxis dos Professores de Escolas de
Assentamentos: A experiência do MST no Espírito Santo”, que trata da formação e
práxis político-pedagógica dos professores que atuavam em escolas de
assentamentos, no Estado do Espírito santo, no período de 1984 a 1997. Evidenciou
a coerência entre o discurso e a prática, destacando a influência e a importância do
processo de formação e da organicidade na implementação da práxis. Pizetta
observou que o Movimento Sem Terra desenvolvia um amplo processo de formação
de professores e articulava distintas formas e momentos capazes de preparar
professores para implementar sua proposta educativa. Ainda, o autor sugeriu ao
MST que ampliasse seu processo de formação de professores e qualificasse seus
aspectos organizativos, envolvendo desde a base até o conjunto da Organização,
para superar os desafios que o momento histórico lhe impunha.
Também, dentre as pesquisas que foram recentemente defendidas neste Programa,
situo a pesquisa concluída em 2004, por Nelbi Alves da Cruz, “Pedagogia da
Alternância: (re) significando a relação pais-monitores no cotidiano da Escola
Comunitária Rural Municipal de Jaguaré-ES”, que analisa o papel sociopolítico e
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pedagógico dos pequenos agricultores, pais e mães de alunos, na formação
continuada e práxis dos monitores da Escola Comunitária Rural Municipal de
Jaguaré-ES, focalizando seus saberes e fazeres, as suas relações sociais, a
orientação e acompanhamento do filho na família, as formas de envolvimento na
escola em nível individual e coletivo. As conclusões de Cruz são a de que existem
lacunas entre as famílias e os monitores, no que se refere a pouca participação dos
pais e mães na vida escolar; à incompreensão tanto pelos pais como pelos
monitores dos instrumentos pedagógicos; à perda da capacidade de gestão política
das famílias, devido à influência dos monitores e dos órgãos ligados à administração
e manutenção da escola. Porém, a escola provocou mudanças positivas nos alunos,
no que se refere à relação familiar e comunitária, no interesse pelas atividades do
campo numa alternativa de realizar práticas alternativas à agricultura moderna.
Enfim, a autora considera relevante a formação das famílias e dos monitores para a
organização da associação e o resgate dos princípios e dos objetivos da alternância
real, com uma política que evite a rotatividade dos monitores e dê mais autonomia
administrativa aos pais e mães de alunos.
Ainda, destaco a pesquisa de Marinely Santos Magalhães, “Escola Família-Agrícola:
uma escola movimento”, defendida neste Programa de Pós-graduação, em 2004,
que trata de uma análise da educação oferecida às populações do campo, no
Espírito Santo, pelas escolas família-agrícolas e de como esta proposta educacional
produz o interesse e a valorização da educação e do espaço campesino. Como
resultado de seu trabalho, Magalhães afirma que a forma de organização das
escolas-família, de estruturação do seu trabalho político-pedagógico e a metodologia
utilizada são fatores determinantes na construção de um outro modelo educacional
no campo e de diferenciação do modo de educar predominante no meio campesino
brasileiro.
Outro estudo que focalizei foi o de Jocilene Marquesini Mongim, cujo título é
“Ocupando a escola: uma cartografia das práticas educativas escolares do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra”, defendido também em 2004,
neste Programa. Trata dos processos de subjetivação engendrados nas práticas
educativas escolares do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Através de sua pesquisa, Mongim afirma que as práticas educativas escolares do
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MST se constituem como processos inventivos3, uma vez que problematizam modos
instituídos de fazer educação.
Também, a pesquisa de Eliézer Toretta Zen, defendida neste Programa de Pós
Graduação, em março de 2006, cujo título é “Pedagogia da Terra: A formação do
professor sem terra”, onde teve como objetivo analisar o Curso Pedagogia da Terra
da Universidade Federal do Espírito Santo em seus diferentes espaços-tempos-
saberes e sua relação com os princípios da educação no e do campo. O problema
que a pesquisa buscou compreender foi perceber como os espaços-tempos-saberes
mobilizados no Curso Pedagogia da Terra (segunda turma), contribuem para a
construção da educação do campo. Os resultados revelaram, que o Curso
Pedagogia da Terra por meio de seus diferentes espaços-tempos-saberes tem
contribuído de forma peculiar para a formação do professor sem-terra e para o
fortalecimento de políticas públicas que respeitem e valorizem os saberes, a cultura
e a identidade dos sujeitos que vivem e trabalham no e do campo.
Situo também a pesquisa de Marinete Sousa Marques Martins, cujo título é “A
criança do Movimento em movimento: linguagem, mística e desenho.” defendida em
dezembro de 2006, neste Programa de Pós-Graduação, cujo tema encontra-se na
interface das discussões sobre educação e infância. Esse percurso conduz à
investigação da infância/criança no Movimento Sem Terra (MST). Busca, nas
múltiplas linguagens, expressões de identidade sem-terrinha, privilegiando a mística
e o desenho, procurando pistas sobre o infante do MST. A pesquisa aborda
aspectos da história da educação do campo, em especial no MST, buscando
indicadores para a discussão da Educação Infantil no Movimento. Dimensiona,
fundamentada em Vigotski, o campo da linguagem na expressão da mística e do
desenho, o que possibilita percebê-los como espaço de expressão da identidade
sem-terrinha. Marinete constatou que a criança do MST se constrói no coletivo. Nas
múltiplas linguagens, a criança expressa um devir humano, engajada na construção
e reconstrução de sua história, dando cor, vida, movimento a cada “capítulo” vivido.
Se, antes, era considerada sem-teto, sem-terra, sem-alimento, sem-escola; hoje, ela
3 O conceito de invenção utilizado pela autora porta a idéia de imprevisibilidade, ou seja, a invençãoé, necessariamente, imprevisível, uma vez que se engendra na imanência de redes de forças em luta.(Informação da própria autora)
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luta pela realização de seus sonhos. É ator/atriz e não figurante, é protagonista de
sua história. A criança, nos diferentes espaços do movimento, manifesta-se gráfica e
plasticamente, com voz, com vez, com sonhos, com sofrimento, com brincadeira e
produz cultura, ao mesmo tempo em que se produz, construindo sua identidade
sem-terrinha.
Também, merecem destaque os trabalhos relacionados às questões pedagógicas
que apresentam o histórico da educação no contexto campesino e sinalizam para a
necessidade de construção de um projeto que respeite as especificidades do campo.
Nos anais do 14º COLE – Congresso de Leitura do Brasil, Campinas –SP, de 2003,
três trabalhos que tratam da Educação do Campo me chamaram a atenção. O
primeiro, apresentado no Seminário sobre leituras do professor, desse evento, é a
pesquisa de Benedita de Almeida (UNIOESTE – Francisco Beltrão), cujo título é
“Concepções e ações de leitura de professores alfabetizadores em escolas do
campo”, que identifica concepções de leitura e de saber escolar que norteiam o
trabalho de professores alfabetizadores do campo na organização de situações de
leitura desenvolvidas em sala de aula; as relações entre essas concepções e suas
articulações nos espaços e tempos de aprendizagem.
Outra pesquisa que considerei bastante interessante citar é a que foi apresentada no
Seminário de letramento e alfabetização do COLE, “A heterogeneidade
oralidade/escrita nas produções textuais de alunos em comunidade rural”, cuja
autoria pertence a Antônio Carlos Pastre, Jaqueline Valim e Karin Cristina Pereira
Bigote (IEL/UNICAMP - Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual
de Campinas), onde, embasados na idéia de que a oralidade também constitui a
escrita, discutem a respeito de que a oralidade de pessoas de classes dominantes é
muita próxima da escrita padrão e a de pessoas de classes menos privilegiadas é
bem distante da escrita padronizada. Diante disto, consideram a correção da
oralidade presente em textos escritos por alunos de comunidade rural como uma
forma de preconceito.
Ainda, nesse mesmo seminário, quero citar os estudos de Iracema Gabler, cujo título
é “A aquisição e o desenvolvimento da oralidade e da escrita pelo aluno”, onde
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propõe que o papel do educador é problematizar a realidade concreta do aluno,
buscando não falar somente de sua própria visão de mundo, mas dialogando com o
aluno sobre a sua visão e a dele. Neste sentido, à luz de Paulo Freire, afirma que
educador/educando estão sempre a se fazer, a se construir num processo de
inacabamento, de incompletude em que o diálogo é mediador dessa reconstrução.
Dessa forma, observei que há bastante preocupação por parte dos estudiosos em
analisar e/ou reconstruir experiências pedagógicas que questionam mudanças
sociais, buscando o respeito e o comprometimento com os sujeitos do campo, sua
cultura, seus saberes, sua linguagem, sua valorização e o reconhecimento de sua
inegável contribuição à sociedade brasileira.
Os pesquisadores voltados para a questão da educação do campo reconhecem que
há ainda muita limitação e precariedade nestas escolas, principalmente no que
concerne ao atendimento dos reais interesses dos grupos sociais em que estão
inseridos. Porém, muito já se conquistou significativamente, pois a produção
científica referente a esta temática vem confirmando que a educação deve refletir a
dinâmica das relações entre a escola e a prática, o saber acadêmico e o saber
historicamente elaborado pelo campesinato nas suas práticas culturais, políticas,
sociais e produtivas.
Convém sublinhar também que estas pesquisas vêm dar suporte científico para a
formulação de políticas educacionais comprometidas com o meio campesino,
procurando analisar entre outros, o significado da escola para os sujeitos do campo;
as dificuldades existentes no envolvimento da comunidade com a escola; a
integração entre trabalho-escola; o comportamento desses sujeitos com seu meio
ambiente; o papel das igrejas, pastorais da terra, dos sindicatos rurais e instituições
envolvidas nas questões agrárias; e, as práticas educativas de projetos
desenvolvidos em diferentes contextos campesinos. Isto significa que há um grande
empenho por parte de estudiosos em garantir o direito a uma educação digna para o
homem do campo, que lhe proporcione o desenvolvimento não só cognitivo, mas
principalmente, de pessoa humana, pensante, produtora de conhecimentos e de
cultura, sujeito ativo de sua história.
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Caldart, Cerioli & Fernandes4 (1998), deixam-nos clara esta questão de que a
educação do campo deve ser peculiar e específica.
Diferenciada, isto é, alternativa. Mas, sobretudo, deve ser educação, nosentido amplo de processo de formação humana, que constrói referênciasculturais e políticas para a intervenção das pessoas e dos sujeitos sociaisna realidade, visando a uma humanidade plena e feliz. (p. 80)
Esta preocupação já se fez presente no Seminário de Educação no Meio Rural 5 ,
que aconteceu em junho de 1982, em Ijuí- RS, onde houve intercâmbios de idéias e
questionamentos profundos da pesquisa sobre Educação no meio campesino. As
preocupações centrais do Seminário consistiam em fazer um balanço dos estudos e
pesquisas que analisavam os problemas da educação no meio campesino, bem
como entrar em contato com experiências carregadas de propostas alternativas de
educação a partir das populações campesinas. Além disso, buscou ampliar o quadro
das informações sobre a pesquisa nessa área e contribuir para a definição de linhas
mais precisas, respeitando a diversidade de enfoques teóricos e metodológicos.
Arroyo (1982), pronunciou-se, neste Seminário, apresentando as linhas gerais de
uma pesquisa que estava em desenvolvimento sobre a educação e o trabalho,
analisando o estudo da introdução elementar e do ensino médio técnico e agrícola.
Segundo ele, a relação entre trabalho e educação estava presente nas políticas
educacionais e, “para uma economia e uma sociedade moderna, supunha-se que
eram necessários cidadãos modernos e sobretudo trabalhadores eficientes.”
(ARROYO, 1982, p.16)
Reservava-se para a educação do campo um papel central que era o de fixar o
homem do campo no campo e aumentar a produtividade através do ensino de
habilidades às novas técnicas de produção e trabalho. Propunha-se, também, a
“reformulação de programas curriculares na escola, a implementação de programas
de educação não-formal e um melhor aproveitamento das escolas técnicas e
agrícolas.” (ARROYO, 1982, p. 16).
4 Texto básico da Conferência Nacional Por uma Educação Básica do Campo, por Roseli SaleteCaldart, Paulo Ricardo Cerioli e Bernardo Mançano Fernandes, promovida em Lusitânia, Goiás, entre27 e 31 de julho de 1998.5 Promovido e patrocinado pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, eapoiado pela FIDENE - Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste doEstado do RS.
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Sendo assim, este autor concluiu que
A classe subalterna não é apenas vítima de um projeto de ideologizaçãotentado pelas classes dominantes, ela é agente histórico, constrói a própriahistória e se faz a si mesma, muito mais do é feita fora. [...] o homem docampo tem seus próprios valores sobre o tempo, o lazer e o trabalho, o quecondiciona qualquer projeto de reeducação para os novos valoresrequeridos pelas novas relações de trabalho. Neste sentido, trata-se de umprocesso conflitivo, que traspassa a política de instrução elementar e doensino técnico e agrícola. (p. 20)
Em suma, as pesquisas apresentadas no Seminário de Educação no Meio Rural 6 ,
procuraram investigar a relação histórica entre educação e trabalho, questionando e
analisando os êxitos e as dificuldades de implementar uma política que aproximasse
a escolaridade e a profissionalização, formando trabalhadores, não prioritariamente
na sua dimensão técnica, mas na dimensão social.
Já Calazans7 (1993), desenvolveu uma pesquisa que retrata a trajetória da escola
pública no meio campesino e a produção de projetos e programas especiais,
integrados neste meio, com propostas educacionais explícitas. Constatou que a
escola surgiu no meio campesino brasileiro, tardia e descontínua e que só a partir de
1930 ocorreram programas de escolarização considerados relevantes para as
populações do campo.
Calazans (1993), realizou esta pesquisa com a intenção de oferecer-nos um
mapeamento dos programas e projetos governamentais de ações educativas que
perpassavam momentos históricos da realidade brasileira e neles deixaram suas
marcas, tornando acessível um material de difícil consulta, nem sempre disponíveis
em todos os centros de estudos e pesquisas do país.
6 Promovido e patrocinado pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, eapoiado pela FIDENE - Fundação de Integração, Desenvolvimento e Educação do Noroeste doEstado do RS.7 “Para compreender a Educação do Estado no Meio Rural (Traços de uma trajetória)”, de MariaJulieta Costa Calazans, professora do Instituto de Estudos Avançados em Educação - Iesae/ FVG eno mestrado em Educação da Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ. Este trabalho foielaborado com base em informações armazenadas principalmente nos relatórios do EstudoRetrospectivo da Educação Rural no Brasil 1975-1983, coordenado pela autora, com a participaçãode outros docentes do Iesae, dentre os quais se destacam: Hélio Raimundo S. Silva, Manoel deJesus Soares Luiz Felipe Meira de Castro. Este artigo encontra-se no livro Educação e Escola nocampo. Campinas, SP: Papirus, 1993.
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Outra pesquisa relevante é a de Therrien8 (1993), que analisou, na esfera do
cotidiano, as relações entre o saber da prática social das professoras e sua prática
pedagógica escolar no processo de construção social da escola no campo e
observou que, como cidadã, a professora do campo elabora sua experiência de vida
e sua visão de mundo no contexto da classe camponesa marcada por luta pela terra.
Segundo este autor, a professora do campo vivencia uma experiência pedagógica
cujo saber produzido se orienta nas relações de produção e nas práticas políticas do
meio campesino.
Assim, forma-se e elabora-se a consciência social da professora campesina,
compondo o processo de organização e sistematização do seu saber e,
conseqüentemente, alimenta sua prática escolar. Evidencia-se, pois o saber social
elaborado para além do espaço escolar. Ainda, Therrien (1993) nos afirma que “esse
saber articulado aos interesses dos trabalhadores é o resgate das suas experiências
de luta e de produção [...].” (p.47).
Damasceno9 (1993) também procurou compreender a forma como se dá a
elaboração do “saber social10” pelo campesinato, na sua prática social produtiva e
política. Para tanto, buscou apreender e explicar o saber social que se forja na luta
diária, resgatando-o a partir das histórias de vida e das histórias de luta. A autora
constatou que os camponeses possuem um saber próprio oriundo de seu cotidiano.
Ainda nos relata que este saber próprio embora seja heterogêneo, “tem um caráter
eminentemente vivo, dinâmico e sobretudo é um instrumento útil mediante o qual o
camponês se situa no mundo e com ele mantém relação [...]”. (p. 71).
A autora nos alerta que este saber social é bastante significativo, mas limitado,
principalmente aquele que é gerado no processo de trabalho, pois se trata de um
8 Universidade Federal do Ceará. Este trabalho encontra-se no livro Educação e Escola no campo.Campinas, SP: Papirus, 1993.9 Universidade Federal do Ceará. Este trabalho encontra-se no livro Educação e Escola no campo.Campinas, SP: Papirus, 1993.10 A autora define “saber social” como um saber gestado no cotidiano do trabalho e da lutacamponesa, é a expressão concreta da consciência desse grupo social; um saber que é útil aotrabalho, aos enfrentamentos vividos cotidianamente pelos camponeses. Ainda, a autora aproxima oconceito de “saber social” ao de “saber cotidiano” de Agnes Heller (1987) onde é entendido como osaber básico que os integrantes de um determinado grupo social necessitam para participar do seuambiente, qualificando-se por ser prático (em termos: técnico, político, religioso, etc.), mediante o qualo sujeito interfere na vida cotidiana. (p. 55)
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saber prático para a realidade na qual ele está inserido. A intenção da autora foi
chamar a atenção para a necessidade de uma efetiva articulação entre o saber
social e o saber científico como caminho para fazer avançar a prática produtiva e
política do campesinato; privilegiar o próprio trabalhador como entidade coletiva, a
sua atividade real, nas lutas, e o seu saber, na qualidade de sujeito do processo
educativo.
Nesse contexto, destaco também os registros de Caldart (1997), onde contêm as
experiências das práticas pedagógicas no Curso de Magistério para Educadoras e
Educadores11 dos Assentamentos e Acampamentos de Reforma Agrária,
mostrando-nos como a Associação Nacional de Cooperação Agrícola - ANCA12, vem
trabalhando na educação de crianças e adolescentes dos assentamentos
espalhados pelo país, baseando-se na convicção de que para garantir uma
educação de qualidade, é preciso investir na formação e capacitação dos
professores que atuam nestas áreas. A autora enfatiza que
Tratar da formação de Educadoras e Educadores do MST significacompreender os processos através dos quais trabalhadores/as que atuamem atividades educacionais nos assentamentos e acampamentos deagricultores sem-terra passam a se constituir como sujeitos sociais daconstrução de uma proposta de educação vinculada com as necessidades eos desafios da luta pela Reforma Agrária e pelas transformações sociaismais amplas em nosso país. (p.15)
No que se refere às questões relativas à cultura, estudos culturais e
multiculturalismo, pesquisas apontam para a necessidade de propor currículos que
respeitem a diversidade cultural e os saberes dos sujeitos. Muitos estudos se
desenvolvem nesta perspectiva.
Na Revista Educação e Sociedade, publicação do Centro de Estudos Educação e
Sociedade – CEDES, agosto de 2002, por exemplo, encontrei o artigo de Vera Maria
11 A expressão Educadoras e Educadores foi cunhada pelo Coletivo Nacional de Educação do MST,quando estava pensando no nome que seria dado ao primeiro Encontro Nacional, em julho de 1987,que passou a se chamar Encontro Nacional de Educadoras e Educadores da Reforma Agrária – IENERA. Este nome provocou/resultou de duas discussões principais: a primeira sobre o fazer ou nãoa chamada da questão de gênero e a segunda discussão foi sobre o final do nome do Encontro: “daReforma Agrária”; chegou-se à conclusão de que ser educadora ou educador da Reforma Agrária émais do que trabalhar num assentamento ou acampamento, é mais que pertencer ao MST: é lutarpela causa da Reforma Agrária, torná-la uma militância de vida. (p. 152)12 ANCA – Associação Nacional de Cooperação Agrícola – é uma entidade jurídica que trabalha comos assentamentos de Reforma Agrária ligados ao MST.
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Ferrão Candau, cujo título é “Sociedade, Cotidiano Escolar e Cultura (s): uma
aproximação”, versão do trabalho “Multiculturalismo, cotidiano escolar e formação de
professores” apresentado no Colóquio sobre Questões Curriculares, realizado na
Universidade do Minho, Portugal, e, que apresenta a problemática da educação
multicultural hoje, do ponto de vista conceitual e prático. Neste contexto, situa e
define a perspectiva da educação intercultural e analisa as relações entre cultura (s)
e educação na sociedade. Como referencial teórico, privilegia três tensões
especialmente significativas para as questões educativas: globalização versus
multiculturalismo, igualdade versus diferença e universalismo versus relativismo
cultural.
A autora conclui, tecendo comentários sobre o que pôde observar no cotidiano
escolar, durante sua pesquisa. Percebeu que a reflexão sobre multiculturalismo tem
sua especificidade e vai penetrando lentamente na vida acadêmica, porém, no dia-a-
dia das escolas, está ainda muito pouco presente. A maioria das escolas em que de
alguma forma o tema penetra, se limita a adicionar alguns conteúdos que têm a ver
com pluralidade cultural, a ressignificar comemorações e outras práticas escolares
esporádicas nesta perspectiva ou a adotar uma perspectiva assimilacionista e/ou
compensatória. Em geral, predomina uma abordagem que não afeta a globalidade
do currículo, não desenvolve processos de construção de identidades culturais em
que se fortaleçam a auto-estima e o autoconceito dos alunos provenientes de grupos
excluídos e discriminados, nem se promove o seu empoderamento.
Após uma busca no banco de dados do site do Instituto de Estudos da Linguagem,
da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, encontrei uma pesquisa, em
nível de doutorado, de 2005, intitulada “Hibridismo cultural e lingüístico no universo
escolar”, de Paulo Roberto Almeida, que tem como proposta uma reflexão sobre a
relação sujeito/linguagem e o processo de constituição/construção de identidades,
num universo escolar heterogêneo, constituído por diferenças culturais e lingüísticas
e marcado por uma situação de hibridismo, ou seja, por uma coexistência de valores
e verdades antagônicos. Esse cenário sociolingüístico, constituído por grupos de
"minorias" lingüísticas (maiorias tratadas como minorias), atravessado por uma
relação de forças desiguais, com forte cunho ideológico, é perpassado por conflitos
no processo de aprendizagem de língua materna, em conseqüência do
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confronto/conflito entre variedades lingüísticas, entre uma variedade padrão
prestigiada socialmente, tomada como "legítima ou legitimada", preconizada pela
instituição escolar como referência para um critério de avaliação de desempenho
individual do aluno e outras variedades tidas como "não-legítimas13",
institucionalmente estigmatizadas, "trazidas" por alunos-trabalhadores de curso
técnico profissionalizante.
No debate sobre o ensino da língua materna, sobretudo nos últimos anos, enfatiza-
se a urgência em mudar a compreensão conceitual da linguagem, tomando-a como
atividade constitutiva, coletiva, histórica e social. Entre os estudos que demonstram
esta preocupação, encontrei a pesquisa de Émerson de Pietri, do Instituto de
Estudos da Linguagem, da UNICAMP, 2003, intitulada: “A constituição do discurso
da mudança do ensino de língua materna no Brasil”, cujo objetivo foi observar as
características de um discurso que se constituiu a partir do final da década de 70, no
Brasil: o discurso da mudança nas concepções de linguagem e no ensino de língua
materna (discurso da mudança).
Pietri (2003) nos diz que o discurso da mudança se caracteriza por argumentar
quanto à necessidade de mudanças nas concepções de linguagem e de ensino, e
por apresentar um componente de divulgação científica: a argumentação se realiza
amparada na divulgação de teorias lingüísticas, sociológicas e/ou sociolingüísticas,
que fornecem subsídios para demonstrar a procedência da concepção de
língua/linguagem apresentada pela lingüística, e os problemas apresentados pela
concepção de língua e de ensino que pretende modificar. Esse discurso se inicia,
assim, afirmando a necessidade de: considerar a diferença entre a língua da escola
a e língua das camadas populares que começam a chegar à escola; considerar a
realidade da variação lingüística e respeitar a variedade do aluno, relacionar ensino
de linguagem e condições socioeconômicas como o objetivo de produzir práticas
pedagógicas democráticas e transformadoras; divulgar informações produzidas pela
Lingüística e outras ciências, a fim de alterar as práticas pedagógicas existentes.
13 Este estudo, embora localizado em contexto profissionalizante/especificidade, permite-nos perceberquestões de poder/hegemonia/legitimação que estão implicadas nas práticas do ensino da línguamaterna.
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Contudo, pesquisas sobre o ensino da Língua Portuguesa que leve em consideração
a dimensão intercultural e o contexto campesino ainda são insipientes. Entre os
estudos que se aproximam desta perspectiva, identifiquei a pesquisa em nível de
mestrado de Maria Emília Almeida da Cruz Torres, defendida no Instituto de Estudos
da Linguagem, da Universidade Estadual de Campinas - SP, em 2003, com o título
“Expectativas de letramento de uma comunidade rural e o letramento sancionado na
escola local: cooperação e conflito”, onde focaliza o conflito entre as necessidades e
expectativas de escrita dos alunos de uma comunidade rural e o letramento
sancionado na escola. Com este trabalho, Torres (2003) procura observar se a
escola atende a essas expectativas, o que revela se ela está realmente promovendo
o letramento de seus alunos, pois a aquisição de práticas letradas que atendam às
expectativas do aluno é um fator que possibilita transformação pessoal e coletiva,
emancipando o cidadão e propiciando sua inserção nos processos sociais por que
passa o mundo atual.
Para tanto, a autora discorre sobre a importância de se formar o cidadão letrado e,
para que tal objetivo seja alcançado, ela nos diz que é necessário que a escola
conheça a orientação de letramento de seus alunos, para que a partir daí outros
usos lhes sejam mostrados, visando atender suas necessidades e expectativas
sobre a escrita e a leitura. Ainda, afirma que é senso comum dizer que as práticas
de escola são centradas na transcrição do código da língua, propiciando o
desenvolvimento de habilidades técnicas especificas do contexto escolar. Então,
essa concepção do processo de alfabetização desprestigia as práticas que o
aprendiz já conhece e aponta para a ideologia da escola ao prestigiar práticas de
escritas características das classes letradas dominantes.
Assim sendo, Torres apresenta sua visão de escola como uma instância
discriminatória, reforçando a exclusão e a estratificação social. Também, cita
pesquisas recentes, como as de Barton (1998) e Terzi (1995), que apontam para a
questão do aluno de meios pouco letrados, que têm suas práticas de escrita
diferentes daquelas da escola e sua dificuldade em leitura e escrita, devido a não-
observação do letramento que o aluno já traz para a escola. Dessa forma, esse
estudo vem dialogar com o que questiono em minha pesquisa.
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Enfim, com esta revisão das produções acadêmicas, pude constatar o quanto se faz
necessário dialogar com outros estudos para podermos, ainda mais, incrementar
nossas discussões sobre o assunto em questão. Todas as pesquisas citadas vêm
contribuir para minha caminhada de reflexões acerca de meu objeto de estudo.
Ainda, se faz necessário buscar um maior aprofundamento nas leituras sobre
Educação e Educação do Campo. Sendo assim, o primeiro capítulo dessa pesquisa ,
que vem a seguir, aborda a História da Educação no Brasil desde os Jesuítas até a
nova democracia e entrelaça idéias com a trajetória da Educação do Campo nessa
mesma história.
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2 CAPÍTULO I
2. 1 NOSSOS OLHOS PERCORRENDO A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO:
ENTRELAÇANDO IDÉIAS.
O fato de me perceber no mundo, com o mundo e com os outros me põenuma posição em face do mundo que não é de quem nada tem a ver comele. Afinal, minha presença no mundo não é a de quem se adapta, mas a dequem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser apenas‘objeto’, mas sujeito também da História.
Paulo Freire
Não somos seres prontos, acabados; estamos sempre sendo, acontecendo. É com o
passar do tempo que o homem faz sua história. Logo, podemos admitir que o
homem é um ser histórico, já que suas ações e pensamentos são mutáveis no
tempo.
O homem não vive só no mundo. O homem é um ser social, pois, durante sua vida,
lida a todo tempo com sujeitos e objetos, produzindo socialmente e desenvolvendo
seu caráter cultural em relações sociais. Daí afirmarmos que o homem também é um
ser social.
A partir das relações sociais, o homem cria padrões de comportamento, instituições
e saberes, cujo aperfeiçoamento é feito pelas gerações sucessivas, o que lhes
permite assimilar e modificar os modelos valorizados em uma determinada cultura.
Logo, podemos concluir que o homem é a um só tempo histórico, social e cultural.
Na verdade, interpretar a ação transformadora do homem no tempo, é escrever a
sua própria história. Para Ghiraldelli Jr. (1994), “a história se refere tanto aos
processos de existência e vida real dos homens no tempo como ao estudo científico,
à pesquisa e ao relato estruturado desses processos humanos”.
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Geraldi (1997), nos afirma que a história da educação recupera avanços e recuos
que só são perceptíveis como tais ao olhar contemporâneo, pois dependendo das
concepções e dos interesses sociais é que as iniciativas educacionais acontecem.
Isto nos remete a afirmar que é de acordo com a compreensão que se tem da
realidade social em que o homem está inserido que se processa a educação.
A palavra educação deriva-se do latim educere ou também educare. A primeira tem
o sentido de ‘conduzir de fora’, ‘dirigir exteriormente’; a segunda, o sentido de
sustentar, alimentar, criar. Segundo Romanelli (1999),
Distinguem-se, no processo educativo, dois aspectos interdependentes: ogesto criador que resulta do fato de o homem “estar no mundo” e com elerelacionar-se, transformando-o e transformando-se – neste caso o gestoeducativo não se distingue do gesto criador de cultura – e o gestocomunicador que o homem executa, transmitindo a outrem os resultados desua experiência. Nesse sentido, a educação é a mediadora entre o gestocultural propriamente dito e a sua continuidade. (p. 23)
Assim, o homem se educa na medida em que se transforma, e ajuda a educar o
outro na medida em que comunica os resultados de sua experiência. Do ponto de
vista de Freire (1987), “a educação modela as almas e recria os corações, ela é a
alavanca das mudanças sociais”. (p. 32)
Para Leite (2002), “a educação é ampla, multifacetada, variável, de conformidade
com o ‘espaço’ humano-racional em que lhe é possível aflorar. Por isso existem tipos
e formas educacionais diferentes, entre elas – a educação rural”. (p.13).
E é para a educação do campo que, no momento, estendo meu olhar de
pesquisadora, lembrando que, os (as) protagonistas de minha pesquisa são crianças
que partem do campo para estudarem na Escola Santa Catarina, localizada na sede
do município de Santa Teresa – ES, trazendo suas vivências, suas culturas e,
principalmente suas linguagens. Logo, acredito ser necessária uma breve passagem
por este processo histórico – da educação e da educação do campo, com o intuito
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de refletir e compreender determinadas situações que no decorrer de minha
pesquisa foram sendo questionadas.
Este processo de deslocamento dos (as) alunos (as) do meio campesino para as
escolas da sede se deu a partir de 1996, quando a lei 9.394/96 veio definir
responsabilidades ao Estado e aos Municípios quanto ao atendimento à Educação
Básica.
Destaco, então, o artigo 1º da LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Brasileira, nº. 9.394, promulgada em 20 de dezembro de 1996, onde nos conceitua a
educação brasileira da seguinte forma:
Aquela que abrange os processos formativos que se desenvolvem na vidafamiliar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino epesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nasmanifestações culturais. (art. 1)
Infelizmente, no cotidiano das nossas escolas isto não se concretiza, afinal, ao
pensarmos no currículo mínimo que os professores precisam cumprir em suas
práticas, poucas são as possibilidades de extrapolar esses conteúdos e trabalhar a
realidade, a vida concreta do aluno, na qual ele está inserido.
A realidade campesina difere-se em muitos aspectos (sócio-cultural, histórico e
econômico) do contexto urbano. Suas peculiaridades reclamam, durante toda a
história, por um atendimento específico, o que até os dias atuais tem-se tornado
difícil, devido ao elitismo acentuado do processo educacional aqui instalado desde
os jesuítas.
Segundo Calazans (1993), “só a partir de 1930 ocorreram programas de
escolarização considerados relevantes para as populações do campo”. (p.17). As
escolas no meio campesino, durante seu percurso histórico, sempre foram
colocadas em segundo plano no sistema educacional brasileiro e,
conseqüentemente, negados os direitos à educação básica à população “esquecida”
do campo. É o que poderemos constatar no breve relato histórico feito a seguir.
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2. 2 A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO E A EDUCAÇÃO DO CAMPO NA HISTÓRIA:
DOS JESUÍTAS À NOVA DEMOCRACIA
Não é no silêncio que os homens se fazem,Mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão.
Paulo Freire
Foi da necessidade de as gerações mais velhas transmitirem às mais novas (e
preservarem) a sua cultura é que nasceram as instituições educativas. A escola
surge com o intuito de fazer comunicados e não de comunicar; a ação escolar, neste
caso, pretende formar o espírito ilustrado e não o espírito criador. Cedo, ela se
transforma numa instituição ritualista, onde o cumprimento de certas formalidades
legais tem valor em si mesmo. Romanelli (1999) nos afirma que, na fase colonial14,
este tipo de ação escolar (ritualista) vai servir de instrumento nas mãos da sociedade
para impor e preservar a cultura transplantada da civilização européia para o Novo
Mundo.
Segundo Ghiraldelli (2003),
A educação escolar no período político do Brasil Colônia, ou ao menos, aeducação regular e mais ou menos institucional de tal época, passou por trêsfases: a de predomínio dos jesuítas; a das reformas realizadas pelo marquêsde Pombal, principalmente a partir da expulsão dos jesuítas do Brasil e dePortugal em 1759; e aquela em que D. João VI, então rei de Portugal, trouxea corte para o Brasil (1808-21). (p. 5).
A forma como aconteceu a colonização das terras brasileiras e o controle do poder
político, é que vem condicionar a evolução da educação escolar no Brasil. A escola
tinha a função de ajudar a manter privilégios de classes, apresentando-se também
como um privilégio.
14 O período colonial durou de 1500 até a Independência, em 1822. A partir daí iniciou-se a fasepolítica do Império, que durou até 1889.
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Segundo Romanelli (1999), a importação de formas de pensamento e idéias
dominantes na cultura medieval européia foi feita através dos jesuítas; a família
patriarcal favoreceu esta importação, afinal, além de possuir o poder político e
econômico, ela queria possuir também o poder cultural. Apenas aos donos de terra,
minoria da sociedade, cabia o direito à educação, e ainda assim eram excluídos,
dessa minoria, os filhos primogênitos e as mulheres, ou seja, somente os filhos
homens que não os primogênitos podiam freqüentar a escola.
O que os padres jesuítas ensinavam era completamente alheio à realidade da
Colônia, não se preocupavam em qualificar para o trabalho, não contribuíam para
modificações estruturais na vida social e econômica do país. O ensino ficava à
margem, sem utilidade prática visível para uma economia de agricultura rudimentar e
trabalho escravo. Os que estudavam tinham como intuito “cultivar o espírito”, isto é,
uma educação literária, humanista, capaz de dar brilho à inteligência. Além disso, os
jesuítas tinham como objetivos práticos o recrutamento de fiéis e servidores, nos
quais foram atingidos, pois a catequese assegurou a conversão dos índios, donde
surgiram escolas para os curumins, que garantiam a evangelização destes.
Os padres acabaram ministrando, em princípio, educação elementar para a
população índia e branca em geral (salvo as mulheres), educação média para os
homens da classe dominante, parte da qual continuou nos colégios preparando-se
para o ingresso na classe sacerdotal, e educação superior religiosa só para esta
última. A parte da população escolar que não seguia a carreira eclesiástica
encaminhava-se para a Europa, a fim de completar os estudos, principalmente na
Universidade de Coimbra, de onde deviam voltar os letrados.
De acordo com Romanelli (1999), quando os jesuítas foram expulsos, em 1759, eles
tinham aqui no Brasil mais de cem estabelecimentos de ensino. A fim de adaptar seu
país no mundo moderno, o marquês de Pombal, então ministro de Estado em
Portugal, empreendeu uma série de mudanças na economia, na política e na cultura
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de seu país, trazendo idéias mais ou menos iluministas15 para a educação. Ainda
que a mão de obra tenha sido aquela formada pelos jesuítas, o ensino passou a ser
público, ou seja, mantido pelo Estado e voltado para a cidadania e não mais para o
religioso.
Em 1807, a Corte portuguesa se deslocou para o Brasil16. Com isto, inúmeros
cursos, tanto profissionalizantes em nível médio como em nível superior, bem como
militares, foram criados para fazer do Brasil uma verdadeira Corte. Ghiraldelli (2003)
destaca que,
Deram-se a “Abertura de Portos”, o nascimento da Imprensa Régia, acriação do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Em 1808, surgiram o Cursode Cirurgia na Bahia e o Curso de Cirurgia e Anatomia no Rio de Janeiro.Posteriormente, criou-se o Curso de Medicina no Rio de Janeiro e, emseguida, em 1810, a Academia Real Militar (que mais tarde tornou-se aEscola Nacional de Engenharia). (p.10)
O Brasil, então, passou a ter ensino primário, secundário e superior. É interessante
destacar que, em 1812, “o Plano de Educação de D. João VI inclui como um dos
dispositivos que no 2º grau da instituição pública se ensinariam todos os
conhecimentos essenciais aos agricultores, aos artistas e aos comerciantes”.
(CALAZANS, 1993, p. 17).
Logo, a menção à educação voltada para o campo era pouco significativa. Na
verdade, a ênfase um pouco maior para o meio campesino, antes de 1930, deu-se
mais no ensino médio e superior, como veremos a seguir. Até que, em 1822, D.
Pedro lidera a Independência e outorga uma Constituição – a Constituição de 1824 –
15 Iluminismo é o movimento cultural que se desenvolveu na Inglaterra, Holanda e França, nosséculos XVII e XVIII. Nessa época, o desenvolvimento intelectual, que vinha ocorrendo desde oRenascimento, deu origem a idéias de liberdade política e econômica, defendidas pela burguesia. Osfilósofos e economistas que difundiam essas idéias julgavam-se propagadores da luz e doconhecimento, sendo, por isso, chamados de iluministas”. (FILHO, Milton B. B. História Moderna eContemporânea. São Paulo, Scipione, 1993).
16 Nesta época, Portugal foi invadido pelas tropas de Napoleão, então, a Corte portuguesa teve quese mudar para o Brasil.
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que continha um tópico específico em relação à educação, onde inspirava a idéia de
um sistema nacional de educação.
Todavia, por não existir uma política integrada entre o governo central e as
províncias, a educação da época era de caráter heterogêneo, no sentido de que não
havia um sistema de ensino único.
De acordo com Ghiraldelli (2003), “é de se notar que o aparato institucional de
ensino existente era carente de qualquer vínculo com o mundo prático e/ou com a
formação científica. E é claro, mais voltado para os jovens do que para as crianças”.
(p. 11).
Em 1826, segundo Calazans (1993), o Plano Nacional de Educação sofreu uma
reforma e instituiu que no 1º ano do 2º grau abrangeria um pouco sobre a natureza,
insistindo-se, particularmente, no conhecimento dos terrenos e dos produtos naturais
da maior utilidade nos usos da vida. Porém, o povo mais pobre não tinha acesso à
educação, logo, esta reforma não fazia muito sentido. O objetivo da educação
jesuítica, que era a catequese, cedeu lugar à educação de elite, excluindo o povo.
Ghiraldelli (2003) destaca que um ponto marcante do ensino do Império foi a
promulgação do Decreto nº. 7.247, ad referendum da Assembléia, pelo então
ministro do Império e professor da Faculdade de Direito de São Paulo, Leôncio de
Carvalho, que instituiu a liberdade dos ensinos17 primário e secundário no município
da Corte e a liberdade do Ensino Superior em todo país. Ainda, a freqüência aos
cursos secundários e superiores era livre, logo, os alunos poderiam aprender com
quem lhes conviesse e, ao final, deveriam se submeter a exames rigorosos18.
17 Segundo o autor, a nova lei entendia por “liberdade de ensino” que todos os que se achassem, porjulgamento próprio, capacitados a ensinar, poderiam expor suas idéias e adotar os métodos que lhesconviessem.18 Esses exames, segundo o autor, permanecem até hoje nos vestibulares, o que condicionam oEnsino Médio a se moldar por eles.
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Calazans (1993) destaca que, nesse decreto, estabeleceu-se que “o ensino nas
escolas primárias do 2º grau constaria da continuação e desenvolvimento das
disciplinas ensinadas no 1º grau e mais, entre outras disciplinas, noções de lavoura
e horticultura”. (p. 18). Novamente, percebemos o quão insignificante era tratada a
escolarização voltada para o campo, sofrendo um grande desinteresse por parte das
lideranças brasileiras, ficando vinculada às expectativas metropolitanas.
Foi graças a esse Decreto que nosso país se tornou um país da Europa, com a
cultura intelectual alienada e alienante. A educação dada pelos jesuítas atravessou
todo o período colonial e imperial e atingiu o período republicano, não sofrendo, em
suas bases, qualquer modificação estrutural.
Infelizmente, a sociedade brasileira somente despertou para a educação do campo
quando se iniciou o movimento migratório interno dos anos de 1910/20, em que as
pessoas residentes no campo partiam em direção às cidades em busca de emprego.
Daí surgiu o “Ruralismo Pedagógico”, um grupo de pioneiros que buscava uma
escola típica do meio campesino, acomodada aos interesses e necessidades da
região a que fosse destinada, a fim de fixar o homem do campo no campo.
Segundo Leite (2002),
O ruralismo no ensino permaneceu até a década de 1930, uma vez que aescolaridade mantinha-se vinculada à tradição colonial e distanciada dasexigências econômicas do momento. Somente após os primeiros sintomasde uma transformação mais profunda no modelo econômico agroexportadoré que a escolaridade, de maneira geral, tomaria posições mais arrojadas.(p.29)
Profundas transformações na sociedade brasileira fizeram com que o Império não
sobrevivesse e desse lugar a um novo regime político, a República19: a expansão da
lavoura cafeeira, o fim do regime escravocrata e o início do trabalho assalariado,
19 Este regime político costuma ser também designado como República Velha, República Oligárquica,República dos Coronéis ou República do Café. Resultou de um golpe militar, em 15 de novembro de1889, onde participaram do movimento: uma