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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO UNIVERSITÁRIO NORTE DO ESPÍRITO SANTO
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS NATURAIS
Síntese de nanopartículas de magnetita e incorporação em matriz de
acetato de celulose para preparação de nanocompósitos poliméricos
Eupídio Scopel
Monografia de Conclusão de Curso
São Mateus-ES
2016
Eupídio Scopel
Síntese de nanopartículas de magnetita e incorporação em matriz de
acetato de celulose para preparação de nanocompósitos poliméricos
Monografia apresentada ao Departamento de
Ciências Naturais – DCN-CEUNES,
Universidade Federal do Espírito Santo, como
parte dos requisitos para obtenção do título de
Licenciado em Química
Orientador: Prof. Dr. Cleocir José Dalmaschio
São Mateus-ES
2016
Eupídio Scopel
Síntese de nanopartículas de magnetita e incorporação em matriz de
acetato de celulose para preparação de nanocompósitos poliméricos
Monografia apresentada ao Departamento de
Ciências Naturais – DCN-CEUNES,
Universidade Federal do Espírito Santo, como
parte dos requisitos para obtenção do título de
Licenciado em Química
São Mateus, 16 de novembro de 2016
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________
Prof. Dr. Cleocir José Dalmaschio (Orientador)
UFES/CEUNES/DCN
_______________________________________
Prof.ª. Dr.ª Carla da Silva Meireles
UFES/CEUNES/DCN
_______________________________________
Prof.ª Dr.ª Vivian Chagas da Silveira
UFES/CEUNES/DCN
São Mateus-ES
2016
À minha mãe, Adriana, minha irmã, Gabriela,
minha avó, Maria José, e meu pai, Sebastião (in
memoriam)
Agradecimentos
Apesar desse trabalho de conclusão de curso não ser realmente o fim do meu curso, esse é o
momento oficial que tenho para agradecer aos que contribuíram para a minha trajetória até aqui
e, de modo particular, na elaboração deste trabalho.
Agradeço à minha mãe, Adriana, minha irmã, Gabriela, e minha avó, Maria José, por todo o
apoio me dado, pelo incentivo e pela confiança que sempre recebi de todos eles. Sem vocês,
nada teria acontecido. Muito obrigado!
Ao Professor Cleocir José Dalmaschio, meu orientador, por toda a ajuda, não somente no
desenvolvimento deste trabalho, mas durante toda a iniciação científica, pelos conselhos, pela
amizade e por ser o maior responsável por me ajudar a expandir meus horizontes enquanto
estudante. Meu muito obrigado!
Ao meu amigo de longas datas, Patrick, pelo apoio, paciência, pelos momentos de diversão,
além das horas e horas de estudo e pesquisa, que desde a época do IFES passamos juntos. Sem
você, com certeza teria sido muito mais difícil. Por isso, meu muito obrigado.
À professora Carla da Silva Meireles, que abriu as portas da química na graduação para mim,
em Química Geral I e tornou-se referência para mim como professora e pesquisadora. Muito
obrigado pelas conversas e conselhos.
À professora Christiane Mapheu Nogueira, com quem muito pude aprender e que, por meio das
suas dicas nas apresentações de outras monografias das quais fez parte da banca, me ajudou de
maneira indireta a melhorar o meu trabalho.
Agradeço também aos demais professores do CEUNES, em especial com os quais tive aula,
que contribuíram para a minha formação acadêmica.
Aos meus amigos da graduação, especialmente Júlia e Guilherme, pelos momentos de diversão
vivenciados, além dos amigos do grupo de pesquisa, em especial Pâmela, Gesiane e Welber
pela ajuda no laboratório, com as imagens do TCC e pelas dicas preciosas.
Aos órgãos de fomento à pesquisa CNPq e Fapes, pelo auxílio financeiro aos projetos de
pesquisa dos quais faço parte, especialmente à Fapes, fundação da qual fui bolsista.
À UFES pela estrutura física proporcionada para a realização deste trabalho e pela bolsa de
iniciação científica.
E por fim, agradeço a Deus, pelo dom da vida e por ter me sustentado até aqui.
“Eu, um universo de átomos, um átomo no universo”
Richard Feynman
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO................................................................................................................... 14
1.1 ÓXIDOS DE FERRO ................................................................................................ 15
1.2 SÍNTESE DE NANOPARTÍCULAS ........................................................................ 17
1.2.1 Síntese de nanopartículas de magnetita ......................................................... 18
1.2.2 Rota solvotérmica ............................................................................................. 20
1.3 ACETATO DE CELULOSE ..................................................................................... 24
1.4 NANOCOMPÓSITOS POLIMÉRICOS ................................................................... 27
1.4.1 Métodos de preparação de nanocompósitos ................................................... 28
2. OBJETIVOS ....................................................................................................................... 30
3. METODOLOGIA ............................................................................................................... 31
3.1 SÍNTESE DO PRECURSOR ACETILACETONATO DE FERRO (III) ...................... 31
3.2 SÍNTESE DE NANOPARTÍCULAS DE MAGNETITA .............................................. 32
3.3 PREPARAÇÃO DOS NANOCOMPÓSITOS ............................................................... 33
3.4 TÉCNICAS DE CARACTERIZAÇÃO ......................................................................... 35
3.4.1 Ponto de Fusão ....................................................................................................... 35
3.4.2 Difração de Raios-X ............................................................................................... 35
3.4.3 Espectroscopia no Infravermelho ........................................................................ 35
3.4.4 Espectroscopia Raman .......................................................................................... 36
3.4.5 Microscopias Eletrônicas ...................................................................................... 36
3.4.6 Deteterminação da permeabilidade ao vapor de água ....................................... 36
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................................................ 39
4.1 SÍNTESE DO PRECURSOR ACETILACETONATO DE FERRO (III) ...................... 39
4.2 SÍNTESE DE NANOPARTÍCULAS DE MAGNETITA .............................................. 43
4.3 PREPARAÇÃO DOS NANOCOMPÓSITOS ............................................................... 49
5. CONCLUSÃO ..................................................................................................................... 54
6. SUGESTÕES DE TRABALHOS FUTUROS .................................................................. 55
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................. 56
APÊNDICE ............................................................................................................................. 60
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Estrutura cristalina da magnetita na forma espinélio invertido ............................... 17
Figura 2 - Esquema de estabilização estérica promovida por ligantes de cadeira longa .......... 21
Figura 3 - Fórmula estrutural do ácido oléico (Nomenclatura IUPAC: Ácido 9-octadecenóico)
.................................................................................................................................................. 21
Figura 4 - Equilíbrio tautomérico da acetilacetona ................................................................... 23
Figura 5 - Estruturas de ressonância do ligante acetilacetonato ............................................... 23
Figura 6 - Fórmula estrutural do composto [Fe(acac)3] ............................................................ 24
Figura 7 - Fórmula estrutural da celulose ................................................................................. 25
Figura 8 - Fórmula estrutural do monômero acetato de celulose ............................................. 25
Figura 9 - Esquema do processo de separação por membranas ................................................ 26
Figura 10 - Esquema para a síntese do composto [Fe(acac)3] .................................................. 32
Figura 11 - Reator utilizado para a síntese das nanopartículas de magnetita ........................... 32
Figura 12 - Esquema de preparo das membranas de acetato de celulose ................................. 34
Figura 13 - Esquema de montagem do copo de Payne ............................................................. 37
Figura 14 - Aspecto visual das etapas reacionais para a síntese do composto [Fe(acac)3]: a)
Solução de íons Fe3+; b) Adição da solução alcoólica de Hacac; c) Adição da solução aquosa
de CH3COONa ......................................................................................................................... 39
Figura 15 - Aspecto visual do composto sintetizado ................................................................ 41
Figura 16 - Mecanismo proposto para a reação de coordenação e formação do composto
[Fe(acac)3]. ................................................................................................................................ 41
Figura 17 - Caracterização estrutural do composto [Fe(acac)3] por Difração de Raios-X ....... 42
Figura 18 - Caracterização do composto [Fe(acac)3]: (a) Espectroscopia no infravermelho e (b)
Espectroscopia Raman. ............................................................................................................. 43
Figura 19 - Solução coloidal de nanopartículas de magnetita sintetizadas pela rota solvotérmica
.................................................................................................................................................. 43
Figura 20 - Caracterização das nanopartículas sintetizadas por DRX. ..................................... 44
Figura 21 - Imagens de Microscopia Eletrônica de Transmissão da amostra: (a) Escala de 200
nm e (b) Escala de 50 nm. ........................................................................................................ 45
Figura 22 - Gráfico de distribuição de tamanho das partículas a partir de análises de Microscopia
Eletrônica de Transmissão ........................................................................................................ 45
Figura 23 - Estágios de formação de cristais em solução ......................................................... 46
Figura 24 - Análises de espectroscopia no infravermelho das nanopartículas sintetizadas ..... 48
Figura 25 - Aspecto visual das soluções preparadas para a produção das membranas (a) puras e
(b) nanocompósito .................................................................................................................... 49
Figura 26 - Procedimento para preparação das membranas: (a) Placa de espalhamento; (b)
Deposição da solução na placa; (c) Espalhamento para produção das membranas; (d)
Evaporação do solvente; (e) Destacamento da membrana da placa; (f) Membrana obtida ..... 50
Figura 27 - Imagens de MEV: a) Superfície da membrana de acetato de celulose pura; b) Fratura
da membrana de acetato de celulose pura; c) Superfície da membrana de nanocompósito; d)
Fratura da superfície de nanocompósito. .................................................................................. 51
Figura 28 - Gráficos das análises do fluxo de vapor de água: (a) Membrana pura; (b)
Nanocompósito Acetato de celulose/Fe3O4 .............................................................................. 52
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Métodos de preparação de nanocompósitos poliméricos ........................................ 28
Tabela 2 - Fluxo, espessura e permeabilidade das membranas preparadas .............................. 52
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS
acac- Ligante acetilacetonato
CH3COO- Íon acetato
CH3COONa Acetato de sódio
CH3OH Metanol
DRX Difração de raios-X
Fe Símbolo do elemento ferro
Fe2+ Íon ferro (II) ou íon ferroso
Fe3+ Íon ferro (III) ou íon férrico
[Fe(acac)3] Acetilacetonato de ferro (III)
FeCl3 Cloreto de ferro (III) ou cloreto férrico
FeO Óxido de ferro (II) ou óxido ferroso
Fe2O3 Óxido de ferro (III) ou óxido férrico ou hematita
Fe3O4 Magnetita
FTIR Espectroscopia no Infravermelho com Transformada de Fourier
FT-Raman Espectroscopia Raman com Transformada de Fourier
Hacac Acetilacetona
MET Microscopia Eletrônica de Transmissão
MEV Microscopia Eletrônica de Varredura
nm Nanômetro
NP Nanopartículas
OH- Íon hidróxido
PF Ponto de Fusão
rpm Rotações por minuto
u.a. Unidade arbitrária
RESUMO
Dentre os compostos utilizados em escala nanométrica, a magnetita merece destaque, devido
ao seu caráter magnético, para a produção de novos materiais. A síntese desse óxido apresenta
inúmeros inconvenientes quando realizada em meio aquoso, sendo a rota solvotérmica uma
alternativa para sua preparação. Tal rota utiliza um solvente orgânico e um precursor metálico
solúvel nesse solvente, que é decomposto com o aumento da temperatura, formando as
nanopartículas. O solvente age também como ligante e surfactante, estabilizando o tamanho,
além de transferir a solubilidade orgânica para a nanopartícula, o que permite a solubilização
em solventes orgânicos de baixa polaridade para o preparo de soluções coloidais, facilitando a
incorporação em matrizes poliméricas, por exemplo. Sendo assim, o trabalho destinou-se a
sintetizar o composto de coordenação [Fe(acac)3] a partir do sal FeCl3 e do composto
acetilacetona, para utilizá-lo na síntese do óxido Fe3O4 a partir da rota solvotérmica, utilizando
ácido oléico como solvente/ligante. As nanopartículas foram incorporadas em membranas de
acetato de celulose obtidas a partir de resíduos lignocelulósicos para a produção de
nanocompósitos poliméricos. O percursor [Fe(acac)3] sintetizado apresentou características
estruturais e químicas idênticas ao produto comercial e foi utilizado na preparação de
nanopartículas de magnetita com diâmetro médio de 15,0 nm, apresentando uniformidade de
tamanho e superfície funcionalizada, devido à utilização do ácido oléico como solvente. Devido
à funcionalização, foi possível a dispersão das nanopartículas em clorofórmio para a preparação
de soluções coloidais e a incorporação nas membranas, percebendo-se uma alteração na
estrutura das mesmas com uma diminuição na permeabilidade em cerca de 20%, fato atribuído
à compatibilidade entre a fase inorgânica e a fase orgânica.
Palavras-chave: Química de Materiais. Nanotecnologia. Óxido de Ferro. Rota Solvotérmica.
Membranas Poliméricas.
ABSTRACT
Among the compounds used in nanoscale, the magnetite noteworthy due its magnetic character
for the production of new materials. The synthesis of oxide has many disadvantages when
carried out in water, and a solvothermal route is an alternative way for its synthesis. The
solvothermal route uses an organic solvente and a soluble metal precursor, wich is decomposed
with increasing temperature, forming the nanoparticles. The solvent is a binder and a surfactant,
wich stabilizes the size of particles. The organic solubility is transfer to the nanoparticles,
allowing the solubilization in organic solvents of a low polarity for the preparation of colloidal
solutions, making possible the incorporation in polymer matrices. The objective of this work
was the synthesis of [Fe(acac)3] from FeCl3 and acetylacetone for the utilization in Fe3O4
synthesis by solvothermal route, using oleic acid as solvent. The nanoparticles were
incorporated in cellulose acetate membranes obtained from lignocellulosic waste for the
polymer nanocomposites production. The precursor [Fe(acac)3] showed identical structural and
chemical characteristics to comercial product and was used for the synthesis of magnetite
nanoparticles, presenting size of 15,0 nm, uniformity of size and functionalized surface due the
use of oleic acid as solvent. Due the functionalization, it was possible the dispersion in
chloroform for the preparation of colloidal solution and the incorporation in membranes,
changing the structures with a decrease in permeability in 20% approximately, due the
compatibility between the inorganic and organic phases.
Keywords: Materials Chemistry. Nanotechnology. Iron Oxide. Solvothermal Route. Polymer
Membranes.
TRABALHOS ORIUNDOS DA PRODUÇÃO DESTA MONOGRAFIA
Trabalhos apresentados na forma de pôster:
Síntese de nanocristais de óxido de ferro por rota solvotérmica – Trabalho apresentado
na II Semana de Química do Norte do Espírito Santo (II SEQUINES), São Mateus, 2015.
Nanocristais de óxido de ferro obtidos por decomposição solvotérmica de
acetilacetonato de ferro – Trabalho apresentado no V Encontro Capixaba de Química (V
ENCAQUI), Vitória, 2015.
Avaliação da utilização da rota solvotérmica para obtenção de soluções coloidais de
nanopartículas de magnetita – Trabalho apresentado no V Workshop de Engenharia
Química, (V WEQ), São Mateus, 2016.
Incorporation of ZrO2 nanoparticles in cellulose acetate matrices – Trabalho
apresentado na XV Brazil Materials Research Society Meeting, Campinas, 2016.
Publicações em periódicos:
Avaliação da utilização da rota solvotérmica para obtenção de soluções coloidais de
nanopartículas de magnetita – Artigo publicado no periódico Brazilian Journal of
Production Engineering (v. 2, n.2), 2016.
Premiações:
Menção honrosa em reconhecimento ao trabalho “Síntese de nanocristais de óxido de ferro
por rota solvotérmica”, na II Semana de Química do Norte do Espírito Santo, realizada em
São Mateus, 2015.
Student award from E-MRS at XV Brazil MRS Meeting – Prêmio em reconhecimento às
melhores contribuições de cada simpósio para os trabalhos apresentados no encontro anual
da SBPMat, realizado em Campinas, 2016.
14
1. INTRODUÇÃO
O desenvolvimento das sociedades sempre esteve ligado à utilização e desenvolvimento
de novos materiais. Desde os primórdios da humanidade, o homem manipula os materiais
existentes para fornecer-lhes novas características, buscando melhores condições de
sobrevivência. O modo de viver da sociedade moderna é fruto, sobretudo, desses processos. A
produção de metais, plásticos, vidros e fibras, por exemplo, possibilitou melhores condições de
transporte, habitação, vestuário, comunicações, recreação, entre outros (CALLISTER;
RETHWISCH, 2007).
Em colaboração com as pesquisas de desenvolvimento de novos materiais, trabalhos
com nanotecnologia ganharam destaque nos últimos 25 anos, sendo uma das áreas que mais se
expandiu nesse período. É considerada por muitos como uma nova revolução, comparada com
a Revolução Industrial (MARTINS; TRINDADE, 2012).
“Nano” é um prefixo grego que significa “um bilionésimo”. Sendo assim, “nanômetro”
representa um “bilionésimo de metro” (10-9 metros). A nanotecnologia e a nanociência estudam
processos que ocorrem em escala nanométrica de modo reprodutível e controlado,
especialmente os fenômenos que não ocorreriam com materiais em outras escalas, pelo fato dos
nanomateriais possuírem propriedades físicas e químicas diferenciadas (EFFENBERGER,
2012; SCHULZ, 2005).
A diferença de propriedades dos nanomateriais se dá, principalmente, devido à alta área
superficial por volume que apresentam. A superfície de um material ou de uma partícula possui
reatividade diferente do seu interior, o que modifica as suas propriedades. Um exemplo disso é
o efeito da tensão superficial em líquidos, fruto de ligações incompletas das moléculas da
superfície. Na faixa de 1 a 100 nm, faixa intermediária entre moléculas e partículas
submicrométricas, se tornam evidentes as propriedades dos materiais em relação às moléculas
e sólidos cristalinos típicos (MARTINS; TRINDADE, 2012).
Apesar das pesquisas com nanotecnologia terem ganhado destaque mais recentemente,
Michael Faraday já havia observado influências do tamanho das nanopartículas nas
propriedades dos materiais ao realizar estudos com dispersões coloidais de nanopartículas de
ouro, percebendo que o tamanho influenciava na coloração da dispersão (FARADAY, 1857).
15
O desenvolvimento de nanopartículas não tem apenas interesse científico, mas também
busca aplicações tecnológicas (SCHMID, 2004). Sendo assim, uma aplicação da utilização das
nanopartículas é na formação de nanocompósitos poliméricos.
Os compósitos são resultantes da combinação de dois ou mais materiais em fases
distintas, que, quando combinados, apresentam propriedades únicas, não obtidas a partir dos
componentes individuais (AJAYAN et al., 1994; CALLISTER; RETHWISCH, 2007). Se uma
das fases do compósito é um material em escala nanométrica, o compósito recebe o nome de
nanocompósito, que pode ser formado pela combinação de materiais orgânicos e inorgânicos
(PAIVA; MORALES; GUIMARÃES, 2006).
Os nanocompósitos foram propostos inicialmente há 20 anos, tendo recebido maior
atenção na última década, e, dentre eles, os nanocompósitos poliméricos (SÁNCHEZ, 2013).
Esses materiais receberam destaque por possuírem propriedades mecânicas e térmicas
diferenciadas, se comparadas aos polímeros puros ou aos compósitos tradicionais (ARANTES,
2012).
Muitas espécies nanométricas podem ser utilizadas em nanocompósitos, das quais pode-
se destacar os óxidos de zinco, estanho, silício e titânio, que são utilizados para melhoria do
desempenho mecânico, além dos óxidos de ferro (especialmente hematita e magnetita), que
melhoram também as propriedades magnéticas (NOVAKOVA et al., 2003).
Nas seções seguintes serão apresentadas algumas características dos óxidos de ferro,
especialmente da magnetita, que pode utilizada como fase inorgânica na preparação de
nanocompósitos, além das rotas de preparação do material, que influenciam nas suas
propriedades. Também serão apresentadas características do acetato de celulose, polímero onde
as nanopartículas podem ser incorporadas, representando a fase orgânica do nanocompósito, e
características dos nanocompósitos poliméricos.
1.1 ÓXIDOS DE FERRO
O ferro é um elemento químico que pertence ao bloco d da tabela periódica, sendo o
quarto elemento mais abundante na crosta terrestre. Na forma iônica, os estados de oxidação
mais frequentes são Fe2+ (íons ferrosos) e Fe3+ (íons férricos) (LEE et al., 1999). Compostos de
ferro com estados de oxidação 4+, 5+ e 6+ também são conhecidos, porém são menos comuns.
16
Na maioria das vezes, o ferro é encontrado na natureza na forma de óxidos, mais
comumente como FeO (óxido de ferro II), Fe2O3, (óxido de ferro III, também conhecido como
hematita) e Fe3O4 (magnetita). Além desses, outros compostos contendo óxido de ferro são as
ferritas, de fórmula geral MFe2O4, onde o ferro apresenta-se no estado de oxidação 3+ e M
representa um cátion metálico no estado de oxidação 2+ (ARAÚJO, 2011).
Os óxidos de ferro estão presentes em solos, rochas, na água e nos seres vivos,
participando de várias interações. A humanidade utiliza-os há milênios, como corantes nas
pinturas rupestres, pigmentos em materiais artísticos, em materiais de uso doméstico e em
cosméticos (OSPITALI; SMITH; LORBLANCHET, 2007). Entre 4000 a.C. e 2000 a.C.
descobriu-se como utilizar os óxidos para a obtenção de ferro metálico, que era utilizado na
produção de utensílios, ferramentas, armas e na construção civil, tendo papel fundamental no
desenvolvimento da sociedade, da cultura e da indústria modernas (CORNELL;
SCHWERTMANN, 2003; SILVA, 2010).
Atualmente, os óxidos de ferro possuem também outras aplicações em vários setores da
indústria e da pesquisa, como na purificação e descontaminação de águas, separação e
purificação de minerais, produção de ferrofluidos, em baterias, entre outros (SILVA, 2010).
Dentre os óxidos de ferro, a magnetita merece destaque pelo fato de ser o óxido mais
magnético. Os materiais magnéticos têm despertado interesse e são estudados desde o século
VI a.C. na Grécia Antiga, com o início da mineração da magnetita (PAPAEFTHYMIOU,
2009), na região da Magnésia, conhecida como “local das pedras mágicas”, justamente devido
ao fato das rochas do local se atraírem “misteriosamente”. É um óxido duplo (FeO.Fe2O3),
contendo íons ferro nos seus dois estados de oxidação mais comuns (Fe2+ e Fe3+). A magnetita
está presente em diversos processos industriais, como na purificação de carvão mineral e como
catalisador no processo de obtenção da amônia (SILVA, 2010).
A magnetita pode ser encontrada em grande quantidade na areia da praia ou em
depósitos espalhados pelo mundo, estando presente também em seres vivos como ferramenta
de orientação, funcionando como uma bússola (CORNELL; SCHWERTMANN, 2003).
Possui estrutura de espinélio invertido, sendo sua célula unitária cúbica de face centrada.
Na estrutura da magnetita existem dois tipos de coordenação: a tetraédrica, composta por 4 íons
oxigênio e a octaédrica, composta por 6 íons oxigênio. Nos interstícios tetraédricos posicionam-
se os íons férricos e nos interstícios octaédricos posicionam-se os ferrosos, resultando em um
17
total de 24 cátions (16 férricos e 8 ferrosos), conforme ilustrado na Figura 1. Uma magnetita
perfeita possui o dobro de átomos férricos em relação aos íons ferrosos (COSTA, 2013).
Figura 1 - Estrutura cristalina da magnetita na forma espinélio invertido
Fonte: COSTA, 2013
Nanopartículas de magnetita possuem propriedades diferenciadas pela alta razão área
superficial-volume, tais como reatividade, ponto de fusão, cor, além de apresentarem o
fenômeno do superparamagnetismo, que ocorre especialmente em nanomateriais (ARAÚJO,
2011).
O interesse na utilização de nanopartículas de magnetita geralmente envolve suas
propriedades magnéticas, como em gravação e armazenamento de informações, fluidos
magnéticos, agentes de contraste em imagem por ressonância magnética, catálise, liberação
controlada de fármacos e incorporação em substratos para a formação de nanocompósitos
(ARAÚJO, 2011; KODAMA, 1999; LU; SALABAS; SCHÜTH, 2007). Especialmente em
aplicações biomédicas e em catálise, onde o fenômeno do superparamagnetismo torna-se ainda
mais importante, as partículas devem ser menores do que 100 nm e estarem em uma estreita
faixa de distribuição de tamanho (LAURENT et al., 2008).
1.2 SÍNTESE DE NANOPARTÍCULAS
Com o avanço da nanotecnologia, tornou-se necessário o desenvolvimento de novas
rotas para a obtenção dos nanomateriais, que buscassem controle de tamanho, forma e
proporcionassem novas propriedades aos materiais já existentes (DALMASCHIO et al., 2010;
LEE et al., 2012).
18
Independente da rota adotada para a síntese, as propriedades buscadas para materiais de
alta qualidade são alta cristalinidade, controle da morfologia e boa dispersão do material em
substratos e soluções (EFFENBERGER, 2012).
Os métodos de síntese de nanopartículas podem ser divididos em dois grandes grupos:
os métodos físicos, conhecidos como top down (em tradução livre, “de cima para baixo”), e os
métodos químicos, conhecidos como bottom up (“de baixo para cima”, em tradução livre). Os
métodos top down partem de materiais com dimensões macroscópicas para a obtenção de
nanopartículas por meio de métodos físicos, como o nome sugere, como por exemplo, com a
utilização de moagem. Já os métodos bottom up partem de átomos ou moléculas para dar
origens aos nanomateriais (EFFENBERGER, 2012).
Os métodos químicos são mais utilizados por apresentarem melhor eficiência e menor
custo no processo de síntese. Tais métodos partem de precursores moleculares ou atômicos que,
por meio de reações químicas, geram os nanomateriais, apresentando maior controle de
tamanho, comparados aos métodos físicos, além de possibilidade da dispersão em sólidos e
líquidos (EFFENBERGER, 2012; ZARBIN, 1997).
Muitas rotas químicas foram desenvolvidas utilizando água como solvente (MURRAY;
KAGAN; BAWENDI, 2000; PINNA; NIEDERBERGER, 2008). Para a síntese de alguns
materiais, como o óxido de estanho, a rota aquosa apresenta bons resultados. No entanto, para
muitos outros, ocorria agregação e baixo controle sobre a morfologia. Tal fato restringia a
utilização dos materiais apenas na forma de pó, além de resultar em uma diminuição das
potencialidades das propriedades físico-químicas. Outro fator do processo de redução das
potencialidades é a ampla faixa de distribuição de tamanho das nanopartículas sintetizadas por
rotas aquosas, já que um refino dessas propriedades depende da uniformidade em relação ao
tamanho e forma. Deste modo, foi necessário o desenvolvimento de novas rotas de síntese.
1.2.1 Síntese de nanopartículas de magnetita
Diversos precursores podem ser utilizados para a síntese de nanopartículas de magnetita,
como cloretos férricos e ferrosos, acetato de ferro e hidróxidos de ferro. Em meio aquoso, as
partículas formam agregados, sendo difícil definir o tamanho das mesmas e até mesmo obter
partículas em dimensão nanométricas. Para estabilização em meio aquoso é necessário um
19
processo de funcionalização das nanopartículas para formar estruturas core-shell (em tradução
livre, caroço-casca), onde as partículas são o “caroço”, ao passo que algum ligante atua como
a “casca”, impedindo a agregação das mesmas (ARAÚJO, 2011).
A maioria das rotas para a síntese de magnetita possui algum inconveniente, geralmente
associado ao meio aquoso (MORAIS et al., 2001). Entre os inconvenientes estão a dificuldade
no controle da relação entre íons Fe2+ e Fe3+ e o alto índice de aglomerados (COSTA, 2013).
Devido à alta razão área superficial-volume, as partículas tendem a agregar-se por atrações de
van der Waals, sendo necessária a utilização de agentes estabilizantes para impedir a agregação
(SI et al., 2004).
Dentre os métodos mais utilizados para a síntese de nanopartículas, está a co-
precipitação, que mesmo sendo realizada em meio aquoso, ainda é um método muito utilizado,
por ser uma maneira prática para a obtenção de magnetita. Tal método consiste na precipitação
de cátions de uma solução onde suas concentrações devem ser superiores ao produto de
solubilidade do material que se deseja sintetizar. Também é importante que os cátions não
precipitem antes da adição do agente precipitante, que pode ser algum reagente que altere o pH
do meio, por exemplo. Para a síntese de magnetita, a co-precipitação acontece a partir de uma
solução aquosa de uma mistura de sais ferrosos e férricos, seguido do aumento do pH do meio
pela adição de hidróxido de sódio ou amônio (EFFENBERGER, 2012). É um método simples,
mas em que é necessário o controle de vários parâmetros reacionais, pois, caso contrário, serão
sintetizadas partículas grandes e não estequiométricas, devido à polidispersividade de tamanhos
(ZHU; WU, 1999).
A rota sol-gel é um outro método de síntese de nanopartículas, que consiste na conversão
de uma solução precursora a um sólido por meio de reações de polimerização inorgânica
induzidas pela água, sendo que o precursor pode ser um sal metálico inorgânico ou um alcóxido
(EFFENBERGER, 2012). No entanto, o processo é complexo, devido a vários fatores que
devem ser controlados para garantir a reprodutibilidade do procedimento, como a taxa de
hidrólise e condensação, pH, mistura, oxidação, natureza dos ânions, entre outros (LIVAGE;
HENRY; SANCHEZ, 1988; NIEDERBERGER; PINNA, 2009). A rota não se destaca das
demais para a síntese de magnetita, pois não forma nanopartículas com diâmetros pequenos e
controlados, nem com morfologia uniforme.
20
1.2.2 Rota solvotérmica
A rota solvotérmica é uma alternativa às rotas aquosas, por utilizar um solvente orgânico
no lugar da água. O solvente orgânico e o precursor metálico, além de algum outro reagente
adicional que seja necessário para a síntese, são mantidos selados em autoclave em
superaquecimento. O bom funcionamento do sistema evita a volatização do solvente, ajudando
na dispersão e prevenindo a oxidação indesejada (EFFENBERGER, 2012).
Neste método de síntese, o solvente age também como ligante e surfactante,
estabilizando o tamanho das nanopartículas. Geralmente são utilizadas moléculas de éter,
alcoóis ou ácidos de cadeias entre 8 e 18 carbonos, como por exemplo éter dioctílico, álcool
benzílico ou ácido oléico, que permitem que a reação ocorra em temperatura de refluxo elevada.
Os precursores metálicos podem ser acetilacetonatos ou carbonilas metálicas, além de acetatos
e oleatos (EFFENBERGER, 2012). Devido à menor toxicidade, comparados aos precursores
carbonílicos, acetilacetonatos e acetatos são mais utilizados atualmente (COSTA, 2013).
O fato do solvente agir também como ligante influencia diretamente no controle do
tamanho da partícula, estabilizando-a. Além disso, por permanecer ligado ao nanocristal ao
término da síntese, ocorre uma funcionalização da nanopartícula, devido ao fato de ocorrer a
transferência da solubilidade orgânica do ligante para a estrutura inorgânica, possibilitando o
preparo de soluções coloidais em solventes orgânicos (DALMASCHIO; RIBEIRO; LEITE,
2010; NIEDERBERGER; PINNA, 2009).
Os ligantes são classificados quanto à natureza da estabilização que promovem,
podendo ser do tipo eletrostática ou estérica. Na estabilização eletrostática, algum composto
com carga é adsorvido sobre a superfície das nanopartículas, impedindo a agregação, podendo
ser utilizados sais de tetrametilamônio e polímeros catiônicos. Já na estérica, os ligantes de
cadeia longa criam uma barreira mecânica que impede a aproximação de outras nanopartículas,
podendo tais ligantes serem proteínas ou ácidos carboxílicos (EFFENBERGER, 2012),
conforme representado na Figura 2.
21
Figura 2 - Esquema de estabilização estérica promovida por ligantes de cadeira longa
Fonte: DALMASCHIO, 2012
O ácido oléico, um solvente muito utilizado, que age também como ligante, se coordena
à superfície dos óxidos por grupos carboxilato, realizando estabilização do tipo estérica. A
fórmula estrutural do composto está representada na Figura 3.
Figura 3 - Fórmula estrutural do ácido oléico (Nomenclatura IUPAC: Ácido 9-octadecenóico)
A cadeia hidrocarbônica realiza a estabilização estérica, por meio da qual ocorre o
impedimento da aproximação de outras partículas, resultando em partículas de tamanho
uniforme, hidrofóbicas, que formam dispersões estáveis em meios pouco polares, como
tolueno, cicloexano, hexano e clorofórmio (EFFENBERGER, 2012). Soluções coloidais de
materiais magnéticos são denominados ferrofluidos ou fluidos magnéticos (MAMANI, 2009).
Na rota solvotérmica, as nanopartículas são obtidas por meio da decomposição térmica,
onde o precursor metálico é decomposto em duas ou mais espécies de composição mais simples
quando aquecido (SILVA, 2010). Com o aquecimento do precursor metálico na presença de
um solvente com alto ponto de ebulição, suficiente para a degradação da parte orgânica do
precursor, formam-se nanopartículas, ocorrendo de modo simples e reprodutível na síntese de
partículas com excelente cristalinidade, controle de tamanho e de formas (ALVES, 2007).
22
A decomposição térmica do precursor induz um aumento na concentração de
monômeros das futuras nanopartículas, o que leva ao crescimento de cristais pela agregação
destes monômeros. O material obtido possui baixa polidispersão de tamanhos pela atuação do
solvente e pela utilização de altas temperaturas, o que favorece a remoção de defeitos
cristalinos, fornecendo partículas com alta qualidade (ALVES, 2007).
A rota solvotérmica permite uma série de aspectos controláveis, como a escolha do
precursor metálico, os tipos de ligantes, a temperatura e o tempo. Além disso, as partículas já
são sintetizadas funcionalizadas e ainda é possível, após a síntese, realizar uma substituição de
ligantes, como por exemplo para tornar as partículas hidrofílicas, caso o solvente inicial seja
apolar e as partículas sejam hidrofóbicas após a síntese.
O processo de crescimento dos cristais pode ser dividido em duas etapas: a nucleação e
o crescimento. Para a síntese de nanomateriais de tamanho uniforme e controlado, um dos
fatores críticos na síntese é o processo de controle e separação entre as fases de nucleação e
crescimento (COSTA, 2013). Esse processo pode ser dividido em estágios (DALMASCHIO,
2012): no primeiro estágio, os reagentes estão disponíveis no meio reacional, evoluindo para
um segundo estágio, onde o meio recebe condições necessárias para a reação, como a variação
de pH ou mudança de temperatura, ocorrendo a formação de agregados atômicos, denominados
clusters; no terceiro estágio, ocorre a agregação dos clusters para obtenção de estruturas
termodinamicamente estáveis; no quarto estágio, ocorre o crescimento das nanopartículas,
sendo nessa etapa que podem se formar estruturas com tamanhos polidispersos, por meio da
aglomeração de partículas, ou podem se formar estruturas com forma e tamanhos controlados,
estabilizadas por ligantes, que controlam as interações partícula-partícula e partícula-solvente.
Quando a etapa de nucleação e de crescimento são separadas no tempo, pode haver a formação
de partículas de tamanho monodisperso, devido ao mesmo histórico de crescimento dos
núcleos, o que resulta em um material de maior qualidade. O controle de tamanho é feito tendo
em vista a razão dos reagentes iniciais, a temperatura e o tempo de reação (LU; SALABAS;
SCHÜTH, 2007).
Para a síntese de magnetita, os precursores mais utilizados são o oleato de ferro,
pentacarbonilferro (Fe(CO)5) e acetilacetonato de ferro (III), sendo este um composto de
coordenação, utilizado no trabalho, sintetizado a partir de um sal de ferro solúvel em meio
23
aquoso e da acetilacetona (nomenclatura IUPAC: 2,4-pentadiona), um composto orgânico que
existe em equilíbrio tautomérico com a forma enólica, conforme representado na Figura 4.
Figura 4 - Equilíbrio tautomérico da acetilacetona
O ligante acetilacetonato (acac-), formado pela desprotonação da acetilacetona, é um
ligante tipicamente bidentado, sendo um famoso ligante na química de coordenação, sendo
utilizado desde 1890, tendo seus estudos aprimorados principalmente pelo fato de se coordenar
a qualquer metal, além de seus compostos serem excelentes precursores metálicos
(GLIDEWELL, 2003). A melhor forma que o ligante acetilacetonato se apresenta é como um
híbrido de ressonância, conforme representado na Figura 5.
Figura 5 - Estruturas de ressonância do ligante acetilacetonato
Os metais, de modo geral, são coordenados pelos dois oxigênios, formando um anel
estável de 6 membros. O composto [Fe(acac)3] segue essa tendência, sendo um composto de
coordenação octaédrico, coordenado por 3 ligantes acac-, conforme representado na Figura 6.
24
Figura 6 - Fórmula estrutural do composto [Fe(acac)3]
1.3 ACETATO DE CELULOSE
Na produção da agroindústria, diversos resíduos são gerados, como cascas, caroços e
bagaços. Na produção de coco, por exemplo, as fibras da casca são muitas vezes descartadas
inadequadamente ou utilizadas apenas para alimentação bovina, por exemplo. Esse resíduo,
chamado de lignocelulósico, pode servir como matéria-prima para a produção de acetato de
celulose. Do ponto de vista ambiental, a utilização do acetato de celulose provenientes de
resíduos lignocelulósicos, promove uma redução da poluição, pela remoção do resíduo do meio
ambiente. Do ponto de vista econômico, a utilização dos resíduos gera uma agregação de valor
ao resíduo.
O resíduo lignocelulósico é constituído de três componentes principais: celulose, lignina
e hemicelulose. A celulose, cuja estrutura está apresentada na Figura 7, é um dos mais
importantes polímeros naturais existentes, sendo o maior constituinte de plantas. É um polímero
linear, composto por unidades de glicose unidas por ligações glicosídicas β (1,4), possuindo
ligações de hidrogênio que fornecem ao polímero propriedades físicas e químicas
características (MEIRELES, 2007). É um biopolímero que pode ser extraído para ser reutilizado
ou utilizado para a produção de derivados celulósicos, como o acetato de celulose (KLEMM et
al., 2005).
25
Figura 7 - Fórmula estrutural da celulose
A fração mais abundante dos resíduos lignocelulósicos é a celulose, que representa cerca
de 30 a 50% da composição, podendo ser reaproveitado para a produção de derivados, que
possuem propriedades distintas da celulose, além de diversas outras formas de aplicação.
O acetato de celulose, um dos possíveis derivados celulósicos, possui aplicações em
fibras, plásticos, adesivos e em membranas para processos de separação (JALAJERDI et al.,
2012). É sintetizado pela acetilação dos grupos hidroxila das unidades de glicose por grupos
acetila, em graus que podem variar de 0 unidades acetiladas (celulose) a 3 unidades (triacetato
de celulose). A fórmula estrutural do monômero do triacetato de celulose, comumente
referenciado simplesmente como acetato de celulose, está representada na Figura 8.
Figura 8 - Fórmula estrutural do monômero acetato de celulose
A reação de acetilação da celulose é o meio pelo qual se obtém o acetato de celulose. O
agente acetilante é o anidrido acético, na presença de um catalisador, que pode ser ácido
sulfúrico. O produto é solúvel em ácido acético, que pode ser utilizado como solvente da reação.
Dentre as aplicações do acetato de celulose, uma que merece destaque é a produção de
membranas para processos de separação, que podem ser utilizadas em osmose inversa,
hemodiálise e liberação controlada de fármacos, além de processos de purificação de água e
efluentes.
26
As membranas para processos de separação são barreiras que restringem total ou
parcialmente o transporte de gases ou soluções. Podem ser preparadas com materiais orgânicos
ou inorgânicos, sendo que comumente são preparadas com materiais poliméricos das mais
diversas composições (HABERT; BORGES; NOBREGA, 2006).
As membranas podem ser classificadas como densas ou porosas, devido às
características da superfície. A seletividade das membranas porosas se baseia no tamanho dos
poros, sendo que os componentes maiores que o tamanho do poro da membrana ficam retidos,
ao passo que a os menores passam pela membrana. O processo de separação em membranas
densas depende da afinidade que o material a ser separado tem com a membrana, pois a
separação ocorre por processos de difusão, como por exemplo em processos de osmose inversa
e permeação de gases (HABERT; BORGES; NOBREGA, 2006). Os processos de separação
podem ser ilustrados conforme esquematizado na Figura 9.
Figura 9 - Esquema do processo de separação por membranas
Fonte: HABERT; BORGES; NOBREGA, 2006.
Processos de separação possuem vantagens sobre os processos de evaporação e
destilação pela maior facilidade de operação e baixa energia utilizada (MEIRELES, 2007). Por
tais motivos são utilizados na indústria química, na área médica, indústrias alimentícias e em
tratamento de água (HABERT; BORGES; NOBREGA, 2006).
27
1.4 NANOCOMPÓSITOS POLIMÉRICOS
O termo nanocompósito foi introduzido por Roy na década de 80, designando materiais
compósitos com pelo menos uma das fases dispersas em escala nanométrica. Mesmo em
pequenas quantidades, a presença das nanopartículas melhora propriedades mecânicas,
térmicas e físico-químicas dos polímeros. A incorporação de uma nova fase (inorgânica) a um
polímero puro para melhorar as propriedades ou reduzir custos tornou-se procedimento
amplamente utilizado pela indústria (ARANTES, 2012).
A utilização dos nanocompósitos foi uma alternativa aos compósitos convencionais,
devido à alta qualidade e às propriedades diferenciadas dos materiais nanométricos, como maior
leveza e resistência mecânica (NAM et al., 2001). Os nanocompósitos inorgânico-orgânicos
são de grande importância, devido às propriedades extraordinárias que apresentam pela sinergia
entre às propriedades dos componentes (KICKELBICK, 2015).
Os nanocompósitos, de forma geral, mantêm a processabilidade e a densidade do
polímero puro, devido à baixa quantidade de nanopartículas adicionadas, diferentemente dos
compósitos tradicionais, que empregam muitos reforços inorgânicos para alcançar as
propriedades mecânicas desejadas, que pode levar a algumas desvantagens, como o aumento
da densidade, perda da tenacidade, diminuindo a processabilidade do material (ARANTES,
2012). Devido à alta área superficial das nanopartículas, há uma grande área de contato entre o
polímero e a fase inorgânica, melhorando a compatibilidade entre eles (ALEXANDRE;
DUBOIS, 2000).
Compósitos magnéticos são utilizados em células magnéticas de separação de proteínas,
agentes de contrastes em ressonância magnética, filtros magnéticos, sensores magnéticos, além
das aplicações biológicas (MUNAWEERA; ALIEV; BALKUS, 2014).
Devido à aplicação de um campo magnético externo, a adição de nanopartículas
magnéticas pode modificar as propriedades físicas do compósito (LIU; LUO; ZHOU, 2013).
Os nanocompósitos podem ser processados, por exemplo, na forma de filmes, fibras,
microesferas, hidrogéis e aerogéis.
28
1.4.1 Métodos de preparação de nanocompósitos
Os métodos de preparação dos nanocompósitos influenciam nas propriedades finais do
material sintetizado, sendo de grande importância o método escolhido. É difícil o controle da
dispersão ou do tamanho das nanopartículas na maioria dos métodos utilizados. As estratégias
de síntese mais utilizadas para a preparação de nanocompósitos estão apresentadas na Tabela
1.
Tabela 1 - Métodos de preparação de nanocompósitos poliméricos
Método de preparação Forma dos reagentes
Síntese de nanopartículas in situ Polímero + precursores das nanopartículas
Polimerização in situ Nanopartículas + Monômeros do polímero
Simples mistura Nanopartículas + Polímero
O método da síntese das nanopartículas in situ requer processos mais sofisticados e alta
compatibilidade entre a nanopartícula sintetizada e o polímero. Caso contrário, não haverá
interação entre as duas fases do nanocompósito. Por exemplo, para a síntese de nanocompósitos
de magnetita por tal método, a matriz polimérica é posta em contato com a solução de íons Fe2+
e Fe3+, que se incorporam aos poros por interações eletrostáticas. Com a adição de NaOH, se
obtêm partículas de magnetita. No entanto, tais partículas são irregulares e o tamanho final das
mesmas possui dependência com o tamanho do poro, não sendo possível o controle refinado
(LIU; LUO; ZHOU, 2013).
A polimerização in situ mostra rigoroso controle das propriedades físico-químicas do
material, além de uma distribuição mais uniforme das nanopartículas, que recebem um
tratamento prévio nas suas superfícies, quando necessário, para que possam ser incorporadas
(BOURGEAT-LAMI; LANG, 1998). Para melhor eficácia, é necessário um total conhecimento
das condições e do mecanismo de polimerização, além de uma seleção criteriosa dos
monômeros (ARANTES, 2012).
O método da simples mistura de componentes é amplamente utilizado na indústria e é
baseado na mistura de nanopartículas em uma solução do polímero. Após a retirada do solvente,
29
se obtêm o nanocompósito. O maior problema relatado para tal rota é a necessidade de
compatibilizar as fases distintas. Uma alternativa para tanto, é manter ambos – polímero e
nanopartícula – em forma líquida, seja como emulsões ou soluções coloidais (HWANG; WEI;
WU, 2004). É necessário funcionalizar a partícula para que seja compatível com a matriz
polimérica e ocorra a dispersão (SINHA RAY; OKAMOTO, 2003).
30
2. OBJETIVOS
Sintetizar nanopartículas de magnetita para obtenção de nanocompósitos poliméricos, a
partir da incorporação em acetato de celulose, para a produção de membranas poliméricas. Para
tanto, os seguintes objetivos específicos foram alcançados:
Sintetizar o precursor [Fe(acac)3] a partir do sal solúvel em meio aquoso FeCl3;
Sintetizar o óxido de ferro na fase magnetita pela rota solvotérmica, tendo como
solvente ácido oléico, buscando uniformidade de tamanho e forma do material
sintetizado;
Incorporar a magnetita sintetizada à matriz polimérica de acetato de celulose e preparar
nanocompósitos acetato de celulose/Fe3O4;
Processar o nanocompósito na forma de membranas poliméricas;
Avaliar a permeabilidade das membranas de nanocompósitos comparados a membranas
de acetato de celulose.
31
3. METODOLOGIA
A metodologia para a realização do trabalho pode ser dividida em 3 partes. A primeira
parte diz respeito à síntese do composto de coordenação [Fe(acac)3], que foi utilizado para a
síntese de nanopartículas de magnetita, descrita na segunda parte. A terceira parte descreve a
preparação dos nanocompósitos a partir da incorporação das nanopartículas sintetizadas à
matriz polimérica de acetato de celulose.
3.1 SÍNTESE DO PRECURSOR ACETILACETONATO DE FERRO (III)
A síntese do complexo [Fe(acac)3], precursor para a síntese do óxido de ferro, se baseia
em uma reação de complexação entre íons Fe3+ e o ligante acac-. Para isso, preparou-se 5 mL
de uma solução aquosa 0,5 mol/L de FeCl3 (Solução 1) e uma solução alcoólica contendo 0,8
mL de acetilacetona e 5 mL de CH3OH (Solução 2). Gotejou-se a Solução 2 à Solução 1 por
15 minutos, sob agitação magnética, obtendo-se a Solução 3.
Preparou-se uma solução aquosa 8,7 mol/L de CH3COONa (Solução 4), que foi gotejada
por 5 minutos à Solução 3, observando-se a formação de precipitado vermelho. Aqueceu-se o
sistema em banho-maria a 80ºC por 15 minutos, sob agitação magnética e resfriou-se à
temperatura ambiente em banho de gelo.
O precipitado foi filtrado em funil de Büchner, lavado com água destilada gelada, e
mantido na filtração à vácuo por 15 minutos. Após isso, foi mantido em dessecador para as
caracterizações quanto ao seu ponto de fusão, difração de raios-X, espectroscopia no
infravermelho, espectroscopia Raman e para a utilização na síntese das nanopartículas de
magnetita. O esquema de síntese pode ser exemplificado na Figura 10.
32
Figura 10 - Esquema para a síntese do composto [Fe(acac)3]
3.2 SÍNTESE DE NANOPARTÍCULAS DE MAGNETITA
Para a síntese da magnetita, utilizou-se a rota solvotérmica. Preparou-se uma solução
0,3 mol/L de [Fe(acac)3], tendo como solvente ácido oléico e inseriu-se em reator fechado, sem
pressão, sob aquecimento até 300ºC, permanecendo nesta temperatura por 24 horas. O
aquecimento foi feito por meio de resistência elétrica controlada por sistema PID. Durante o
tempo de reação, o sistema manteve-se sob agitação magnética. Foram testados previamente
tempos de síntese e temperaturas menores, no entanto, sem sucesso. O reator utilizado para a
síntese das nanopartículas está representado na Figura 11.
Figura 11 - Reator utilizado para a síntese das nanopartículas de magnetita
33
Após o tempo de reação, deixou-se o sistema atingir a temperatura ambiente e separou-
se o material obtido em 4 tubos de centrífuga, adicionando-se acetona para agir como agente
floculante. O material foi centrifugado por 30 minutos a 3500 rpm. Desprezou-se o líquido
sobrenadante e dispersou-se o precipitado em tolueno, realizando-se novamente o processo de
precipitação com acetona e centrifugação por mais 30 minutos a 3500 rpm. Após desprezar o
líquido sobrenadante, dispersou-se o material em clorofórmio, observando-se a formação de
uma solução estável e magnética. O material foi analisado por difração de raios-X,
espectroscopia no infravermelho e microscopia eletrônica de transmissão para ser utilizado na
preparação dos nanocompósitos.
Tendo como base o gráfico de difração de raios-X, foi possível estimar o tamanho de
coerência cristalográfica das nanopartículas sintetizadas, utilizando a Equação de Scherrer
(Equação 1):
𝐷 = 𝑘𝜆
𝛽𝑐𝑜𝑠𝜃
Onde: D = diâmetro médio das nanopartículas; k = constante dependente do formato da
partícula; λ = comprimento da radiação utilizada; θ = ângulo central do pico de difração; β =
largura na metade da altura do pico analisado.
3.3 PREPARAÇÃO DOS NANOCOMPÓSITOS
O método utilizado para a preparação dos nanocompósitos foi o de simples mistura. O
acetato de celulose, material onde foram incorporadas as nanopartículas de magnetita, foi
obtido na forma sólida, como pó, a partir da celulose obtida das fibras da casca do coco.
Considerando que o acetato de celulose é solúvel em solventes de baixa polaridade, para a
produção de membranas puras do material foi preparada uma solução na concentração de 6%
m/m de acetato de celulose em clorofórmio, homogeneizando-se por 12 horas.
Após esse tempo, a emulsão foi espalhada em placa de vidro previamente limpa com o
solvente da solução de acetato de celulose, no caso, clorofórmio. Deixou-se o solvente evaporar
(1)
34
por 2,5 minutos e se induziu o destaque da membrana da placa de vidro, mergulhando-a em
banho de água à temperatura de aproximadamente 4ºC. O esquema de preparação das
membranas está relacionado na Figura 12.
Figura 12 - Esquema de preparo das membranas de acetato de celulose
Fonte: CARVALHO; CRISTIANO, 2001 (adaptada)
Para a produção de membranas do nanocompósito, preparou-se uma solução, do mesmo
modo e parâmetros utilizados para a produção das membranas puras, homogeneizando-se por
12 horas. Após esse tempo, adicionou-se a solução coloidal do óxido de ferro sintetizado, com
concentração definida, de modo que após a evaporação do solvente, houvesse 10% de Fe3O4
em relação ao acetato de celulose, em uma relação massa-massa. O processo posterior segue o
mesmo procedimento adotado para a preparação das membranas puras, com o mesmo tempo
de evaporação do solvente, conforme representado na Figura 10. Ambas as membranas, pura e
o nanocompósito, foram caracterizadas quanto a testes de fluxo de vapor e espessura para a
determinação da permeabilidade ao vapor de água das membranas.
35
3.4 TÉCNICAS DE CARACTERIZAÇÃO
3.4.1 Ponto de Fusão
A análise do PF do composto de coordenação [Fe(acac)3] sintetizado foi realizada para
determinar a pureza do produto da síntese, comparando-o com o valor reportado do PF do
composto [Fe(acac)3] na literatura. De tal modo, era possível inferir se o material sintetizado
era o composto [Fe(acac)3]. A análise foi realizada em aparelho de Ponto de Fusão a Seco da
Marca SP Labor, Modelo Q340S.
3.4.2 Difração de Raios-X
As análises de DRX foram utilizadas para determinação da estrutura cristalina do
composto de coordenação e das nanopartículas sintetizadas. A partir dos dados obtidos, foi
possível a determinação do tamanho de coerência cristalográfica das nanopartículas obtidas. Os
difratogramas foram obtidos em aparelho modelo MiniFlex 600, da fabricante Rigaku, equipado
com anodo de Cu para emissão de raios-X, com predominância dos comprimentos 0,154 nm.
Para as análises, foram empregadas as condições de emissão de radiação 40 kV e corrente de
15 mA no anodo e passo de 0,02º no detector de radiação.
3.4.3 Espectroscopia no Infravermelho
As análises de FTIR possibilitaram a caracterização do precursor [Fe(acac)3] sintetizado
quanto às suas ligações e a avaliação da presença dos ligantes orgânicos coordenados à
superfície dos nanocristais, o que é esperado pela utilização da rota solvotérmica. As análises
foram realizadas na região de 4000 a 400 cm-1, sendo utilizado um aparelho FTIR Agilent
Technologies Modelo Cary 360 FTIR com acessório de reflexão total atenuada (ATR).
36
3.4.4 Espectroscopia Raman
A Espectroscopia Raman foi utilizada para a caracterização das ligações do composto
[Fe(acac)3], como uma complementação à Espectroscopia no Infravermelho. Para as análises,
foi utilizado um espectroscópio Horiba Jobin Yvon modelo IHR550, com detector CCD
(Charge Coupled Device) resfriado por sistema Peltier a uma temperatura de -70ºC,
equipamento alocado na Universidade Federal de São Carlos.
3.4.5 Microscopias Eletrônicas
As análises por MET foram utilizadas para a verificação da morfologia dos nanocristais
após sintetizados. Para análise das membranas foi empregada as análises de MEV para análise
da superfície e das fraturas das membranas. As análises de MET foram realizadas em aparelho
FEI Titan Cubed Themis, com dupla correção e aceleração de voltagem de 200 kV, alocado no
International Iberian Nanotechnology Laboratory, em Braga (Portugal), e as análises de MEV
foram realizadas em equipamento Shimadzu modelo SSX-550 equipado com filamento de
tungstênio, alocado no Departamento de Física da Universidade Federal do Espírito Santo,
Campus Goiabeiras.
3.4.6 Deteterminação da permeabilidade ao vapor de água
Para os testes de permeabilidade ao vapor de água, utilizou-se o copo de Payne, cujo
esquema de montagem encontra-se representado na Figura 13. O copo é preenchido com água
até metade da sua capacidade e acopla-se a membrana no suporte. O sistema é colocado em
dessecador, sendo utilizado pentóxido de fósforo como agente dessecante, por 8 horas,
pesando-se o sistema em intervalos de uma hora (RODRIGUES FILHO et al., 2008).
37
Figura 13 - Esquema de montagem do copo de Payne
Após as pesagens, obteve-se um gráfico de variação de massa por variação de tempo
(∆m x ∆t). A partir do gráfico, é possível determinar o de vapor de água, conforme a Equação
2, onde o valor de ∆m/∆t é obtido a partir do gráfico, por meio de um ajuste linear da curva
obtida.
𝐽𝑤 =∆𝑚
∆𝑡. 𝐴
Onde: Jw = fluxo de vapor de água; ∆m = variação de massa, em gramas; ∆t = variação
de tempo, em horas; A = área permeante da membrana, em cm2.
Outro parâmetro medido para a determinação da permeabilidade é a espessura das
membranas, que foi medida com um micrômetro Mitutoyo, de resolução 0,001 mm.
Com base na 1ª Lei de Fick, o coeficiente de permeabilidade ao vapor de água (Pw) pode
ser determinado conhecendo-se o gradiente de pressão de vapor de água (∆Pv) e a espessura da
membrana (L), conforme apresentado na Equação 3 (MORELLI; RUVOLO FILHO, 2010)
𝐽𝑤 =𝑃𝑤. ∆𝑃𝑣
𝐿
Onde: Jv = fluxo de vapor de água; Pw = Permeabilidade ao vapor de água; ∆Pv =
Variação na pressão de vapor de água, na temperatura de 25ºC (23,76 mmHg); L = Espessura
da membrana
(2)
(3)
38
A variação na pressão de vapor de água foi estimada considerando-se que a umidade no
interior do copo de Payne representa o valor da pressão de água em uma dada temperatura, no
caso, 23,76 mmHg, à temperatura de 25ºC, e no exterior não havia umidade, devido à ação do
agente dessecante, o que leva ao valor de ∆Pw igual ao valor de pressão do vapor de água.
Para a obtenção do resultado de permeabilidade na unidade de cm2/s, é necessária a
correção do termo ∆Pv, utilizando a equação dos gases ideais e a utilização do valor da massa
molar da água. Assim, a Equação 3 torna-se:
𝐽𝑤 =𝑀𝑤𝑃𝑤. ∆𝑃𝑣
𝑅𝑇𝐿
Onde: Mw = Massa molar da água; R = Constante dos gases ideais; T = Temperatura da
análise
Reajustando a fórmula, de modo a isolar o termo Pw, que é o desejado após as análises,
a Equação 4 pode ser reescrita:
𝑃𝑤 =𝐽𝑣𝑅𝑇𝐿
𝑀∆𝑃𝑣
(4)
(5)
39
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Como apresentado na seção de Metodologia, os resultados serão apresentados
obedecendo a ordem da seção anterior.
4.1 SÍNTESE DO PRECURSOR ACETILACETONATO DE FERRO (III)
Para que o composto [Fe(acac)3] fosse sintetizado, o processo reacional foi dividido em
3 etapas. A Etapa 1 corresponde à solução 1 (solução aquosa de FeCl3); a Etapa 2 corresponde
ao processo de adição da solução 2 (Hacac em CH3OH) à solução 1, formando a solução 3; a
Etapa 3 corresponde à adição da solução 4 (solução aquosa de CH3COONa) à solução 3, onde
formou-se o precipitado [Fe(acac)3]. O aspecto visual de cada etapa da reação está apresentado
na Figura 14.
Figura 14 - Aspecto visual das etapas reacionais para a síntese do composto [Fe(acac)3]: a)
Solução de íons Fe3+; b) Adição da solução alcoólica de Hacac; c) Adição da solução aquosa
de CH3COONa
Na Etapa 1, estão presentes em solução apenas os íons Fe3+ e Cl-, provenientes da
dissolução do sal FeCl3. A mudança de coloração percebida na Figura 14.b (Etapa 2) ocorre
devido à reação entre os íons Fe3+ e a o ligante acac-. As reações que governam esta etapa são
a reação de desprotonação da acetilacetona (Equação 6) e a reação de formação do complexo
[Fe(acac)3] (Equação 7).
40
Hacac(aq) H+(aq) + acac-
(aq)
Fe3+(aq) + 3acac-
(aq) [Fe(acac)3](s)
No entanto, em condições ácidas ou neutras, o equilíbrio da reação 6, de desprotonação
da acetilacetona, está majoritariamente deslocado para a forma protonada do composto, sendo
necessário o aumento do pH para que a reação se desloque de modo a formar íon acetilacetonato
suficiente para a precipitação do complexo [Fe(acac)3]. Tais condições foram alcançadas com
a adição do sal CH3COONa. O íon CH3COO-, por ser hidrolisado, libera íons OH-, conforme a
Equação 8.
CH3COO-(aq) + H2O(l) CH3COOH(aq) + OH-
(aq)
A liberação dos íons OH- faz com que haja maior desprotonação do composto
acetilacetona e ocorra a formação do ligante acetilacetonato, que está apto a ligar-se em maior
proporção ao íon Fe3+, conforme a Equação 9.
Hacac(aq) + OH-(aq) acac-
(aq) + H2O(l)
Com a adição do sal CH3COONa, observou-se a formação de um precipitado e mudança
na coloração da solução, conforme representado na Figura 14.c. Após o aquecimento em banho-
maria e o resfriamento em banho de gelo até a temperatura ambiente, para o processo de
purificação, filtrou-se o precipitado obtido e obteve-se o produto desejado, conforme ilustrado
na Figura 15. No procedimento adotado o rendimento da síntese foi de 87%.
(6)
(7)
(8)
(9)
41
Figura 15 - Aspecto visual do composto sintetizado
O mecanismo proposto para a formação do composto de coordenação pode ser
representado conforme proposto por Glidewell (2003) e esquematizado na Figura 16.
Figura 16 - Mecanismo proposto para a reação de coordenação e formação do composto
[Fe(acac)3].
De acordo com a proposta do mecanismo, na primeira etapa ocorre a desprotonação da
acetilacetona, favorecida em pH básico. A partir de então, forma-se o ligante acetilacetonato,
que possui três estruturas de ressonância, sendo melhor representado pelo híbrido de
ressonância, que está propício a coordenar-se ao íon Fe3+ (GLIDEWELL, 2003).
Para avaliar a formação e pureza do composto sintetizado, verificou-se o ponto de fusão
do produto obtido, sendo a temperatura de fusão observada de 179ºC, idêntico ao valor
42
reportado para o composto [Fe(acac)3] (LIDE; BAYSINGER; BERGER, 2007), indicando o
sucesso da síntese.
A avaliação estrutural do composto sintetizado, realizada por DRX, que avalia a
estruruta cristalina do composto sintetizado, está apresentada na Figura 17, onde foi comparada
a estrutura do [Fe(acac)3] sintetizado com o produto comercial comercializado pela Sigma-
Aldrich com 97% de pureza, indicando que o composto sintetizado apresenta forma e estrutura
cristalina idênticas ao produto comparado. Os picos de maior intensidade foram indexados
conforme o arquivo de difração PDF #11-864, associado ao acetilacetonato de ferro (III).
Figura 17 - Caracterização estrutural do composto [Fe(acac)3] por Difração de Raios-X
10 20 30 40 50 60
Fe(acac)3 sintetizado
Inte
nsid
ad
e / u
.a.
(24
3)
(04
1)
(34
1)
(04
2)
(00
2)
2 / ângulo
(04
0)
Fe(acac)3 comercial
As caracterizações por espectroscopia no infravermelho e por espectroscopia Raman,
apresentadas na Figura 18, também foram realizadas comparando-se o composto sintetizado ao
produto comercial, indicando as ligações e grupos funcionais presentes no composto sintetizado
idênticas ao composto comercial, com ênfase na ligação Fe-O (região de 450 cm-1 nos
espectros) e nas ligações características do ligante acetilacetonato, conforme indexados no
gráfico.
43
Figura 18 - Caracterização do composto [Fe(acac)3]: (a) Espectroscopia no infravermelho e (b)
Espectroscopia Raman.
3750 3000 2250 1500 750
Fe(acac)3 sintetizado
C-H
C-H
CH
Inte
nsid
ad
e / u
.a.
Comprimento de onda / cm-1
Fe-O C-O
(a)
Fe(acac)3 comercial
300 600 900 1200 1500
Fe(acac)3 sintetizado
Espalhamento Raman / cm-1
Fe-O(b)
Fe(acac)3 comercial
4.2 SÍNTESE DE NANOPARTÍCULAS DE MAGNETITA
A partir do composto [Fe(acac)3] sintetizado e caracterizado, realizou-se a síntese da
magnetita. A utilização do tempo e temperatura mencionados no procedimento tornou possível
a separação do óxido de ferro após a síntese. A literatura aponta que nanopartículas de
magnetita são sintetizadas utilizando-se menor temperatura ou menor tempo de síntese, mas é
apontada a necessidade de uma maior velocidade de centrifugação para melhor separação das
nanopartículas, superior a 5000 rpm (COSTA, 2013). O aspecto da solução coloidal preparada
após a dispersão em solvente clorofórmio está representado na Figura 19.
Figura 19 - Solução coloidal de nanopartículas de magnetita sintetizadas pela rota solvotérmica
44
A caracterização das nanopartículas por DRX está apresentada na Figura 20. Os picos
foram indexados tendo como base o arquivo de difração PDF #19-629, indicando que o
composto sintetizado tratava-se de óxido de ferro na fase magnetita.
Figura 20 - Caracterização das nanopartículas sintetizadas por DRX.
10 20 30 40 50 60
(51
1)
(42
2)(4
00
)
(22
2)
(31
1)
(22
0)
In
ten
sid
ade
/ u
.a.
2ângulo
(11
1)
Utilizando a Equação de Scherer (Equação X) com os parâmetros k = 0,9, considerando
partículas esféricas, λ = 0,154 nm, de acordo com a radiação emitida pelo aparelho, e os valores
de θ e β ajustados conforme função pseudo-voight a partir da Figura 20, o tamanho médio das
nanopartículas encontrado foi de 17 nm, em relação ao pico mais intenso (311).
As análises por Microscopia Eletrônica de Transmissão, apresentadas na Figura 21,
indicam a uniformidade nas partículas sintetizadas quanto à distribuição de tamanho e forma.
45
Figura 21 - Imagens de Microscopia Eletrônica de Transmissão da amostra: (a) Escala de 200
nm e (b) Escala de 50 nm.
A uniformidade visualizada qualitativamente por meio da Figura 21 pode ser
comprovada pelo gráfico de distribuição de tamanho das partículas, apresentado na Figura 22.
Em uma contagem de 100 partículas, o tamanho médio estimado foi de 15,1 nm. Além disso, é
possível observar que o tamanho de 96% das nanopartículas contadas está na faixa de 11 a 19
nm, o que reforça a uniformidade do material sintetizado.
Figura 22 - Gráfico de distribuição de tamanho das partículas a partir de análises de
Microscopia Eletrônica de Transmissão
10 12 14 16 18 20 22 24
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
Qu
an
tid
ad
e d
e p
art
icu
las
Tamanho das particulas / nm
Média: 15,1 nm
Desvio: 2,2 nm
Total de contagens: 100
46
Em ambos os métodos de estimativa de tamanho das nanopartículas, o tamanho obtido
está na faixa de potencialização das propriedades do material (LAURENT et al., 2008). A
uniformidade das nanopartículas sintetizadas pode ser atribuída à utilização da rota
solvotérmica. A Figura 23 apresenta o processo de formação de cristais proposta por
Dalmaschio (2012).
Figura 23 - Estágios de formação de cristais em solução
Fonte: DALMASCHIO, 2012
Adaptando-se para o processo de síntese da magnetita, conforme proposto por
Effenberger (2012), no Estágio I tem-se os reagentes prontos para a reação, ao passo que ocorre
uma evolução no Estágio II, onde, pela mudança de temperatura, ocorre a troca do ligante
acetilacetonato pelos ligantes oleato, provenientes do solvente ácido oléico, formando o
intermediário reacional oleato de ferro. Nesta etapa ocorre também a redução parcial dos íons
47
Fe3+ para Fe2+. Após tal processo, os intermediários oleato de ferro (II) e oleato de ferro (III)
foram decompostos, devido à alta temperatura, formando os monômeros (clusters) de
magnetita.
No Estágio III, ocorre a supersaturação de monômeros de magnetita, no ponto mais alto
da curva, onde ocorre a combinação dos clusters, iniciando o processo de nucleação. Os núcleos
formados devem ser mais estáveis do que os clusters e os que são menos estáveis se combinam
para formar núcleos mais estáveis, vencendo a barreira de energia. Caso não consigam vencer
a barreira de energia, são novamente dissolvidos. O ligante oleato impede cineticamente o
crescimento das partículas, evitando a ampla distribuição de tamanho, devido ao impedimento
estérico. Por esse motivo, foram geradas nanopartículas de tamanhos similares (ALVES, 2007).
Quando não se utilizam ligantes para o controle do tamanho, mesmo a temperaturas elevadas,
onde a nucleação é instantânea, formam-se partículas sem forma e tamanhos definidos, devido
à alta agregação no estágio de crescimento, não sendo consideradas partículas nanométricas
(EFFENBERGER, 2012). Os estabilizantes agem no Estágio IV, na superfície das
nanopartículas, e impedem a agregação das mesmas. O Estágio V corresponde ao processo de
crescimento de agregação das partículas e formação das partículas mais estáveis (menor valor
de Energia Livre de Gibbs).
Corroborando com os resultados alcançados na análise de Microscopia Eletrônica de
Transmissão, as análises de Espectroscopia no Infravermelho (Figura 24) evidenciam a
presença dos ligantes oleato na superfície das nanopartículas sintetizadas. Logo, pode-se
atribuir à utilização do ácido oléico como solvente o motivo da uniformidade no tamanho das
nanopartículas visualizada nas análises por Microscopia Eletrônica de Transmissão.
48
Figura 24 - Análises de espectroscopia no infravermelho das nanopartículas sintetizadas
4000 3500 3000 2500 2000 1500 1000 500
NPs
OH
Fe-O
C-H
C=OC-H
Ab
so
rbâ
ncia
/ u
.a.
Numero de onda / cm-1
C=C
Acido
oleico
Na Figura 24, comparando-se com o espectro do ácido oléico, pode-se perceber a
presença das ligações de grupos carboxílicos na superfície das nanopartículas em 1727 cm-1,
banda que encontra-se deslocada em relação ao ácido oléico, que apresenta a vibração em 1710
cm-1, o que é um indício de que houve a coordenação do ligante oleato à superfície das
nanopartículas, além da vibração Fe-O na região de 580 cm-1, referente à ligação entre os
compostos no interior do cristal de magnetita (ATTA et al, 2014). A presença destas e das
demais vibrações, indicam sua presença na superfície das nanopartículas sintetizadas. No
método de síntese utilizado, foram formadas estruturas funcionalizadas, do tipo core-shell, que
puderam ser dispersas em meio orgânico devido à interação entre o ligante orgânico presente
na superfície e as moléculas do solvente.
As nanopartículas obtidas atenderam aos critérios de qualidade indicados na literatura,
como uniformidade de tamanho, reprodutibilidade, alta cristalinidade, além de controle de
morfologia e boa dispersão em solvente orgânico (EFFENBERGER, 2012).
49
4.3 PREPARAÇÃO DOS NANOCOMPÓSITOS
O aspecto visual das soluções para preparação das membranas de acetato de celulose
puras e dos nanocompósitos está apresentado na Figura 25.
Figura 25 - Aspecto visual das soluções preparadas para a produção das membranas (a) puras
e (b) nanocompósito
O processo de preparação das membranas, conforme descrito na metodologia, foi
realizado conforme apresentado na Figura 26.
50
Figura 26 - Procedimento para preparação das membranas: (a) Placa de espalhamento; (b)
Deposição da solução na placa; (c) Espalhamento para produção das membranas; (d)
Evaporação do solvente; (e) Destacamento da membrana da placa; (f) Membrana obtida
As análises de Microscopia Eletrônica de Varredura das membranas puras e dos
nanocompósitos, apresentadas na Figura 27, indicam uniformidade da superfície e da fraturas
das membranas antes e após a incorporação das nanopartículas. Também é possível a
visualização de que tratam-se de membranas densas, visto que tal conclusão pode ser levada
pela observação da ausência de poros na superfície das membranas (HABERT; BORGES;
NOBREGA, 2006). Além disso, outro indício é o aspecto visual da membrana, que apresenta-
se transparente, indicando também tratar-se uma membrana densa.
51
Figura 27 - Imagens de MEV: a) Superfície da membrana de acetato de celulose pura; b) Fratura
da membrana de acetato de celulose pura; c) Superfície da membrana de nanocompósito; d)
Fratura da superfície de nanocompósito.
A primeira etapa para a determinação da permeabilidade ao vapor de água é a construção
dos gráficos de variação da massa em realação à variação do tempo, que estão apresentados na
A análise foi realizada em triplicata. Cada medida foi realizada com membranas de processos
de espalhamento diferentes, o que pode influenciar na medida, devido à variação de espessura.
As membranas puras estão identificadas como MP, enquanto que as membranas dos
nanocompósitos poliméricos estão identificadas como NC.
a) b)
c) d)
52
Figura 28 - Gráficos das análises do fluxo de vapor de água: (a) Membrana pura; (b)
Nanocompósito Acetato de celulose/Fe3O4
0 2 4 6 80,00
0,05
0,10
0,15
0,20
MP1
MP2
MP3
- m
/ g
t / h
a)
0 2 4 6 80,00
0,05
0,10
0,15
NC 1
NC 2
NC 3
- m
/ g
t / h
b)
Por meio do fluxo de vapor de água calculado e da espessura das membranas, é possível
a determinação da permeabilidade, conforme apresentado na Tabela 2.
Tabela 2 - Fluxo, espessura e permeabilidade das membranas preparadas
Membranas Jw (10-7gcm-2 s-1) L / 10-2cm Pw / 10-5cm2s-1 Média / 10-5cm2s-1
MP 1 8,917 2,60 10,1
9,65 ± 0,46 MP 2 5,866 3,60 9,17
MP 3 7,416 3,00 9,68
NC 1 7,162 2,70 8,40
7,64 ± 0,67 NC 2 6,087 2,80 7,40
NC 3 6,573 2,50 7,13
Como a determinação da permeabilidade trata-se um teste preliminar para a
caracterização de membranas, com base nos resultados apresentados na Tabela 2, é possível
perceber que a incorporação das nanopartículas de Fe3O4 às membranas de acetato de celulose
provocou uma diminuição na permeabilidade em cerca de 20% em relação à permeabilidade da
membrana pura. Isso indica que houve alteração na estrutura das membranas, devido à
incorporação das nanopartículas. Há indícios de compatibilidade entre as fases, devido ao
53
revestimento orgânico na superfície das nanopartículas, que promoveu uma melhor interação
entre as fases do nanocompósito preparado. A incorporação das nanopartículas de Fe3O4 na
produção das membranas gerou um impedimento físico de transporte das moléculas de água
pelo processo de difusão, o que gerou uma diminuição da permeabilidade. Por tratar-se apenas
de um teste preliminar, demais testes devem ser realizados para possíveis aplicações das
membranas.
A utilização do método de simples mistura para a preparação do nanocompósito
polimérico apresenta vantagens pela sua simplicidade de preparação. Apesar de uma das
maiores dificuldades apontadas para a utilização desse método seja a funcionalização da
superfície da nanopartícula para promover uma melhor compatibilização entre as fases
inorgânica e orgânica, a utilização da rota solvotérmica na síntese das nanopartículas de
magnetita foi responsável pela síntese de nanopartículas já funcionalizadas, que puderam ser
incorporadas e interagirem sinergicamente com a matriz polimérica, tendo esse problema sido
superado. Caso fosse utilizada outra rota para a síntese das nanopartículas, teria sido necessária
a funcionalização da superfície das mesmas antes da incorporação das nanopartículas à matriz
polimérica.
Com a utilização deste método de preparação do nanocompósito também foi possível
maior controle quanto ao tamanho da nanopartícula adicionada, visto que nos demais métodos
esse parâmetro é de difícil controle. Tais fatores são importantes para a obtenção de materiais
de maior qualidade e com propriedades diferenciadas.
54
5. CONCLUSÃO
A utilização da rota solvotérmica possibilitou a síntese de nanopartículas de magnetita
com revestimento orgânico, possibilitando a preparação de soluções coloidais do óxido
sintetizado em solvente orgânico, o clorofórmio. A utilização do acetilacetonato de ferro (III)
como precursor metálico, sintetizado e purificado no trabalho por meio de uma reação de
complexação entre íons Fe3+ e o ligante acac- em meio básico, juntamente com o ácido oléico
em temperatura elevada propiciaram a formação do óxido de ferro na fase magnetita pura, com
uniformidade de tamanho e forma. A presença do ácido oléico na superfície foi o meio pelo
qual foi possível a dispersão do material em solvente orgânico.
Com a obtenção de nanopartículas com tais características e já funcionalizadas, foi
possível realizar a incorporação do material sintetizado em matriz polimérica de acetato de
celulose e a preparação de membranas. A incorporação das nanopartículas modificou a
estrutura das membranas de acetato de celulose, o que foi observado pela redução na
permeabilidade de vapor de água, provavelmente devido à interação entre as cadeias orgânicas
na superfície das nanopartículas com as redes poliméricas.
55
6. SUGESTÕES DE TRABALHOS FUTUROS
Como sugestões para a continuidade do trabalho, pode-se realizar um melhor estudo
para a compreensão do mecanismo de síntese das nanopartículas, como também inferir sobre o
modo como as nanopartículas estão revestidas por ligantes oleato. Além disso, é possível um
posterior processo de substituição dos ligantes da superfície das nanopartículas, o que pode
influenciar diretamente na dispersão das nanopartículas nos substratos.
Quanto às membranas, testes referentes a propriedades de seletividade em soluções
aquosas e iônicas podem ser realizados para o estudo de possíveis aplicações destas em
processo de separação.
56
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APÊNDICE
Brazilian Journal of Production Engineering, São Mateus, Suplemento Especial 4 Workshop de Engenharia Química, Vol. 2, N.º 2 (Setembro). p. 48-53.
(2016).
Editora CEUNES/DETEC. Disponível em: http://periodicos.ufes.br/BJPE
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Eupídio Scopel1; Patrick Pires Conti2; Cleocir José Dalmaschio3
Recebido em: 30/06/2016 - Aprovado em: 16/08/2016 - Disponibilizado em: 30/09/2016
RESUMO: Com o avanço das pesquisas que envolvessem nanotecnologia, rotas foram desenvolvidas para a obtenção de materiais com dimensões nanométricas, como a rota solvotérmica, que utiliza um solvente orgânico e um precursor metálico solúvel nesse meio. O solvente orgânico atua como ligante, sendo responsável pelo controle de tamanho dos nanopartículas obtidos, além de permitir a formação de soluções coloidais. Para a síntese de magnetita, a maioria dos inconvenientes estão relacionados com a utilização de meio aquoso para a síntese, sendo a rota solvotérmica uma alternativa à resolução de problemas como agregação ou restrição da utilização das nanopartículas na forma de pó, o que não favorece suas propriedades físico-químicas. Assim, o objetivo deste trabalho foi a síntese de nanopartículas de magnetita, utilizando a rota solvotérmica, para a preparação de solução coloidal do óxido, sendo o solvente/ligante para a síntese ácido oléico e o precursor metálico o composto acetilacetonato de ferro (III), obtendo-se partículas com uniformidade de tamanho e morfologia, além de solúveis em meio orgânico, devido à solubilidade proporcionada pela presença de ligantes orgânicos na superfície das nanoestruturas, obtendo-se soluções coloidais estáveis, chamada de ferrofluido. PALAVRAS-CHAVE: Nanotecnologia, Síntese, Química de Materiais
ABSTRACT: Advances in nanotechnology research lead to a development of routes to obtain materials in scale between 1 – 100 nm, such as solvothermal route. This process uses an organic solvent and a soluble metal source. In fact, the organic solvent acts as a ligand, responsible to control the nanoparticles size and growth. In addition, the ligand transfers the solubility allowing the formation of colloidal solutions. For magnetite synthesis, the majority of undesirable are associated with the use of an aqueous medium for synthesis. Solvothermal route is an alternative process to solve problems, such as, aggregation that restrict the use of nanoparticles in powder, which does not shows their physicochemical properties in all potential. The objective of this study was the synthesis of magnetite nanoparticles, using solvothermal route for the preparation of colloidal solution. In the synthesis was used oleic acid (as solvent / ligand) and as the metal precursor iron acetylacetonate (III). Using this route was possible to obtain nanoparticles with uniform size and morphology; in addition, they were soluble in organic medium, due to the solubility provided by the presence of organic ligands on the surface of the nanostructures, resulting in stable sols, called ferrofluid. KEYWORDS: Nanotechnology, Synthesis, Materials Chemistry
____________________________________________________________________________
ISSN: 2447-5580
AVALIAÇÃO DA UTILIZAÇÃO DA ROTA
SOLVOTÉRMICA PARA A OBTENÇÃO DE
SOLUÇÕES COLOIDAIS DE NANOPARTÍCULAS
DE MAGNETITA
EVALUATION OF SOLVOTHERMAL REACTION ROUTE TO OBTAIN
COLLOIDAL SOLUTION OF MAGNETITE NANOPARTICLES
1 Graduando em Química. UFES – Centro Universitário Norte do Espírito Santo (CEUNES). São Mateus, ES. [email protected]
2 Graduando em Química. UFES – Centro Universitário Norte do Espírito Santo (CEUNES). São Mateus, Es. [email protected]
3 Doutor em Ciências. UFSCar, 2012. Professor adjunto – CEUNES/UFES. São Mateus, ES. [email protected]
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1. INTRODUÇÃO
A faixa de estudo da nanotecnologia envolve processos
que ocorrem na escala de 1 a 100 nm, dimensões
pouco superiores a átomos ou moléculas. Esses
materiais possuem propriedades químicas e físicas
diferenciadas de materiais em outras escalas
(EFFENBERGER, 2012). Isso ocorre devido à alta área
superficial que apresentam. Nas últimas décadas,
houve um grande avanço nas pesquisas nessa área de
estudo, fazendo com que a nanotecnologia fosse
considerada por muitos como uma nova revolução,
comparada até mesmo com a Revolução Industrial
(MARTINS; TRINDADE, 2012).
Os materiais magnéticos despertam curiosidade e
interesse desde o século VI a.C. na Grécia Antiga,
quando se iniciou o processo de mineração da
magnetita (PAPAEFTHYMIOU, 2009). A magnetita é
um óxido de ferro de fórmula molecular Fe3O4, sendo
um óxido duplo, constituído pelos óxidos de ferro II e III
(FeO.Fe2O3), possuindo estrutura cristalina de
espinélio invertido (COSTA, 2013).
São vastas as aplicações da magnetita, devido ao seu
caráter magnético. Em escala nanométrica, tem sido
utilizada em processos biológicos, em catálise, além da
ciência dos materiais, onde é incorporara a outros
materiais para a produção de materiais híbridos
(KODAMA, 1999).
Os métodos de síntese de nanopartículas podem ser
divididos amplamente em dois grupos: os métodos
físicos (top down) e os métodos químicos (bottomup).
Os métodos físicos partem de materiais
macroscópicos, particionando-se até a escala
nanométrica, ao passo que as rotas químicas partem
de átomos ou moléculas para dar origem às
nanopartículas (NPs), por reações químicas
(EFFENBERGER, 2012).
A rota de obtenção das NPs influencia fortemente nas
suas propriedades após a síntese, sendo que os
métodos químicos apresentam melhores resultados no
controle de tamanho e propiciam a dispersão em
sólidos e líquidos (ZARBIN, 1997).
Dentre as rotas químicas, muitas foram desenvolvidas
em rotas aquosas, apresentando bons resultados para
alguns materiais (MURRAY; KAGAN; BAWENDI, 2000;
PINNA; NIEDERBERGER, 2008). Entretanto, para
outros, ocorria agregação e baixo controle de tamanho
e morfologia, além de que algumas vezes o material só
podia ser utilizado na forma de pó. O baixo controle de
tamanho e morfologia não potencializa as propriedades
físico-químicas das NPs.
Para a síntese de magnetita, a maior parte dos
inconvenientes está relacionado com a utilização do
meio aquoso (MORAIS et al., 2001). Algumas das
dificuldades se referem à dificuldade no controle da
relação entre íons Fe2+ e Fe3+, alto índice de
aglomerados e dificuldade de estabilização em
soluções.
Uma alternativa para a síntese de NPs é a rota
solvotérmica, que apresenta maior controle na
morfologia e tamanho dos nanocristais. Essa rota utiliza
um solvente orgânico com ponto de ebulição maior do
que a água, geralmente álcoois ou ácidos com cadeias
com 8 a 18 carbonos, e um precursor metálico solúvel
em meio orgânico. As NPs sintetizadas por esse
método apresentam alto grau de cristalinidade e
controle de tamanho e forma (EFFENBERGER, 2012).
Os precursores metálicos mais comumente utilizados
são acetilacetonato, carbonilas metálicas, acetatos e
oleatos, por serem mais baratos, merecendo destaque
os acetilacetonato e acetatos, devido à menor
toxicidade apresentada (COSTA, 2013).
O solvente atua como ligante, controlando o tamanho
da estrutura, sendo uma forma prática de estabilizar as
estruturas em soluções coloidais, além de transferir a
solubilidade para as NPs (NIEDERBERGER; PINNA,
2009).
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Nas reações em solução, o processo de formação dos
cristais é dividido em duas etapas: a nucleação e o
crescimento. Para a síntese de materiais de tamanho
uniforme e controlado, um dos fatores críticos é a
separação entre as fases de nucleação e crescimento
(COSTA, 2013). Dalmaschio (DALMASCHIO, 2012)
apresenta esse processo com uma divisão de estágios.
No primeiro estágio, os reagentes para a síntese estão
no meio reacional, evoluindo para um segundo estágio,
onde o meio recebe condições necessárias para a
reação, seja por variação do pH, mudança de
temperatura ou outra variação, onde ocorre a formação
de agregados atômicos, os clusters. No terceiro
estágio, ocorre a agregação dos clusters para se obter
estruturas termodinamicamente estáveis. O quarto
estágio é o estágio do crescimento das NPs, onde
podem se formar estruturas polidispersas, por meio da
aglomeração de partículas, ou podem se formar
estruturas com forma e tamanho uniformes,
estabilizadas por ligantes, que controlam a interação
partícula-partícula e partícula-solvente. Quando a
etapa de nucleação e crescimento são separadas no
tempo, pode-se formar partículas monodispersas,
devido ao mesmo histórico de crescimento dos núcleos.
A estabilização, no caso da utilização de ligantes desse
tipo, é estérica, onde as cadeias impedem a
aproximação de outras nanopartículas, conforme
representado na Figura 1.
Devido à presença de grupos apolares na superfície
das NPs, é possível formar soluções coloidais estáveis
em solventes pouco polares, como tolueno, hexano,
cicloexano e clorofórmio.
Os ligantes promovem a formação de soluções
coloidais devido à estabilização, que depende das
forças atrativas e repulsivas de Van der Waals, forças
eletrostáticas, da estabilidade da molécula, para que o
Movimento Browniano seja suficientemente grande
para se opor à tendência de precipitação ou
aglomeração (MAMANI, 2009).
Figura 1 – Esquema da estabilização estérica, que impede a agregação de nanopartículas
Fonte - (EFFENBERGER, 2012).
Tendo em vista esse contexto, o objetivo do artigo é a
preparação de soluções coloidais de NPs de magnetita
utilizando a rota solvotérmica para tanto, tendo como
solvente ácido oléico e como precursor metálico o
composto acetilacetonato de ferro (III) (Fe(acac)3),
também sintetizado no trabalho.
2. METODOLOGIA
2.1 SÍNTESE DO FE(ACAC)3
A síntese baseia-se em uma reação de complexação
entre íons Fe3+ e ligante acetilacetonato (acac-). Foi
preparada 5 mL de uma solução aquosa 0,5 mol/L de
cloreto de ferro (III) (FeCl3) e uma segunda solução
alcoólica contendo 0,8 mL de acetilacetona (Hacac) e 5
mL de metanol (CH3OH), gotejando-se a segunda
solução sobre a primeira por 15 minutos, sob agitação
magnética.
Preparou-se também 3 mL de uma solução 8,7 mol/L
de acetato de sódio (CH3COONa), que foi gotejada
sobre a solução anterior por 5 minutos, observando-se
a formação de um precipitado vermelho, levado a
banho-maria por 15 minutos a 80ºC. Após isso, foi
resfriado até temperatura ambiente em banho de gelo,
filtrado em funil de Büchner com papel de filtro e seco
em bomba de vácuo e então mantido em dessecador.
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2.2 SÍNTESE DAS NPS DE MAGNETITA
O composto Fe(acac)3 obtido foi utilizado para a síntese
da magnetita. Preparou-se 40 mL de uma solução 0,3
mol/L de Fe(acac)3, tendo como solvente ácido oléico.
Transferiu-se a solução para o vaso reacional e inseriu-
se em reator fechado, sem pressão, sob aquecimento,
mantendo-se o sistema na temperatura de 300ºC por
24 horas. O aquecimento foi realizado por resistência
elétrica controlada por um sistema PID, mantendo-se
agitação magnética durante todo o tempo de
tratamento.
Após o tempo de reação, esperou-se o sistema atingir
a temperatura ambiente e centrifugou-se o material
obtido por 30 minutos a 3500 rpm, utilizando-se
acetona como agente floculante. As NPs obtidas foram
dispersas em solvente clorofórmio, formando uma
solução estável e magnética.
2.3 CARACTERIZAÇÕES
A análise do ponto de fusão foi realizada para
determinar o a temperatura de fusão do composto
sintetizado e comparar com o valor referenciado. A
determinação foi realizada em equipamento SpLabor
Q340S.
Análises de Difração de Raios-X (DRX) foram utilizadas
para determinar a estrutura cristalina dos compostos
Fe(acac)3 e Fe3O4, além de estimarem o tamanho de
cristalito das NPs de magnetita. Para as análises foi
utilizado um aparelho Rigaku modelo Miniflex 600
equipado com tubo de emissão de cobre operando com
tensão de 40 kV e corrente de 15 mA.
Para a avaliação da presença dos ligantes na superfície
das NPs e para caracterização das ligações do
composto Fe(acac)3, utilizou-se a técnica de
Espectroscopia no Infravermelho com Transformada de
Fourier (FTIR). Para as análises foi utilizado um
aparelho FTIR Agilent Technologies Modelo Cary 630
FTIR com acessório de reflexão total atenuada (ATR).
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 SÍNTESE E CARACTERIZAÇÃO DO COMPOSTO
FE(ACAC)3
A temperatura de fusão do composto sintetizado
verificada foi 179ºC, idêntico ao valor reportado para o
Fe(acac)3 (LIDE; BAYSINGER; BERGER, 2007)
indicando o sucesso da síntese e pureza do composto
obtido. As análises por DRX indicaram a estrutura do
composto sintetizado e sua forma cristalina idênticas ao
composto comercial (Sigma Aldrich), conforme
comprovado na Figura 2. Os picos indexados no
difratograma seguem o arquivo de difração padrão PDF
#11-864.
10 20 30 40 50 60
Inte
nsid
ad
e / u
.a.
Fe(Acac)3 - comercial
Fe(Acac)3 - sintetizado
(243)(0
41)
(341)
(042)
(002)
2 / ângulo
(040)
Figura 2 – Análise de DRX do composto Fe(acac)3 comparando o composto obtido com produto
comercial.
A caracterização por FTIR, conforme apresentado na
Figura 3, indicou as ligações e os grupos funcionais
presentes no composto sintetizado, com ênfase na
ligação Fe-O e nas ligações dos grupos do ligante
acetilacetonato: as vibrações da ligação C-O na região
de 934 cm-1 e as vibrações da ligação C-H nas regiões
de 1535 e 2920 cm-1 são características do ligante
acac-.
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52
3750 3000 2250 1500 750
C-H
C-H
CHInte
nsid
ad
e /
u.a
.
Comprimento de onda / cm-1
Fe(acac)3-comercial
Fe(acac)3-sintetizado
Fe-O C-O
(a)
Figura 3 – Análise por FTIR do composto Fe(acac)3.
3.2 SÍNTESE E CARACTERIZAÇÃO DA MAGNETITA
A partir do composto Fe(acac)3 sintetizado, o passo
posterior foi a síntese da magnetita. A caracterização
por DRX, apresentada na Figura 4, indica que a fase do
composto obtido é magnetita, conforme os picos
indexados no gráfico segundo o PDF #19-629.
10 20 30 40 50 60
(51
1)
(42
2)
(40
0)
(22
2)
(31
1)
(22
0)
Inte
nsid
ad
e /
u.a
.
2ângulo
(11
1)
Figura 4 – Análise de DRX do óxido sintetizado, indicando a fase magnetita.
Por meio do gráfico da Figura 4, é possível estimar o
tamanho médio das NPs, utilizando a Equação de
Scherrer (Eq. 1):
𝑑 =𝑘𝜆
𝛽𝑐𝑜𝑠𝜃
Onde d é o diâmetro médio das NPs, k é uma constante, que depende do formato da partícula
(utilizou-se o valor de 0,9, para partículas esféricas), λ é o comprimento da radiação utilizada (0,154 nm), θ é o ângulo central do pico de difração e β é a largura na
metade do pico analisado
Por meio da Eq. 1 determinou-se o tamanho de
cristalito como sendo de 17 nm.
A partir da utilização da rota solvotérmica, o
ligante/solvente se coordena à superfície das NPs,
transferindo a solubilidade orgânica, sendo possível a
dispersão em meio orgânico, como foi realizado. A
análise de FTIR da superfície das NPs, apresentada na
Figura 5, indica a presença dos ligantes oleato,
provenientes do ácido oléico, que são responsáveis
pela formação da solução coloidal, especialmente do
grupo carboxilato, que se encontra ligado à superfície
das NPs (região de 1750 cm-1) e as ligações Fe-O
(região 750 cm-1).
4000 3500 3000 2500 2000 1500 1000 500
Fe-OC=OC-H
C-H
Absorb
ância
/ u
.a
Numero de onda / cm�-1
C=C
Figura 5 – Análise por FTIR da superfície das NPs de magnetita, indicando a presença do ligante oleato, responsável pela estabilização das nanopartículas no
solvente orgânico formando a solução coloidal.
O ligante/solvente contribuiu para a estabilização do
crescimento das NPs de magnetita, coordenando-se ao
ligante no momento do processo de crescimento das
NPs na síntese, impedindo a agregação e o
crescimento desordenado das NPs, aliado processo de
nucleação quase instantâneo, devido à alta
temperatura (EFFENBERGER, 2012), o que,
juntamente com a presença do ligante na superfície
contribui para a síntese de nanocristais de tamanho
uniforme, recobertas com ligante orgânico, que
puderam contribuir na formação de soluções coloidais.
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4. CONCLUSÕES
Utilizando uma reação de complexação, e como
precursores FeCl3 e acetilacetona, foi obtido o
composto de coordenação Fe(acac)3. O acetilacetonato
de ferro (III), solúvel em meio orgânico, foi utilizado em
reação solvotérmica na presença de ácido oléico para
formação de nanopartículas de magnetita revestidas
com grupos oleato. O revestimento orgânico com
oleato, além de controlar o processo de crescimento, foi
responsável pela dispersão das NPs em clorofórmio e
a formação de soluções coloidais.
Os inconvenientes geralmente relacionados com a
síntese de magnetita, em meio aquoso, foram
superados com a utilização da rota solvotérmica, sem a
necessidade de um posterior tratamento para a
funcionalização das NPs, obtendo soluções coloidais
estáveis e magnéticas em solvente orgânico de baixa
polaridade.
AGRADECIMENTOS
Os agradecimentos pela realização deste trabalho ao
CNPq e à Fapes pelo auxílio financeiro para a
execução, e à UFES pela estrutura física.
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