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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ ISMAILDA DE OLIVEIRA VESCOW OS CONTOS QUE EU CONTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: ERA UMA VEZ... CURITIBA 2014

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ ISMAILDA DE OLIVEIRA …tcconline.utp.br/media/tcc/2016/09/OS-CONTOS-QUE-EU-CONTO-NA-EDU... · FIGURA 14 - CHAPEUZINHO VERMELHO CHEGOU NA CASA DA VOVÓ.....60

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

ISMAILDA DE OLIVEIRA VESCOW

OS CONTOS QUE EU CONTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: ERA UMA

VEZ...

CURITIBA

2014

ISMAILDA DE OLIVEIRA VESCOW

OS CONTOS QUE EU CONTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: ERA UMA

VEZ...

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de pedagogo. Orientadora: ProfªMa. Maria Francisca Vilas Boas Leffer

CURITIBA

2014

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha amada família, que em todos os momentos estiveram

presentes, aos meus queridos alunos, por compartilhar o grande mundo da

imaginação e fantasia.

AGRADECIMENTOS

A Deus, pela vida, por trilhar comigo este caminho.

A minha família, minha mãe (Izabel) pelas orações, Minhas irmãs (Nilda e Nice) que

me alegraram nos momentos de angustia, meus cunhados (Fabio, Osmair) por

estarem sempre do meu lado, ao meu sobrinho (Luan) que muitas vezes me permitiu

viver a sua infância, ao meu marido (Luiz) por me auxiliar nos momentos de

dificuldades, a todos pelo incentivo e colaboração durante estes quatro anos.

Em especial, agradeço do fundo do coração, à professora Maria Francisca, por

caminhar comigo durante este ano, me ajudando e tirando minhas dúvidas, por

todas as orientações que valem para minha vida.

Muito obrigada!!!

EPÍGRAFE

DE VIGOTSKI PARA PIAGET

“A TEORIA DE PIAGET SOBRE A LINGUAGEM E O PENSAMENTO DAS CRIANÇAS”

(Trecho da versão abreviada do prefácio escrito por Vigotski para a edição russa dos dois primeiros livros de Piaget (Gosizdat, Moscou, 1932)

A psicologia deve muito a Jean Piaget. Não é exagero afirmar que ele revolucionou o estudo da linguagem e do pensamento das crianças. Piaget desenvolveu o método clínico de investigação das idéias infantis, que vem sendo amplamente utilizado desde a sua criação. Foi o primeiro pesquisador a estudar sistematicamente a percepção e a lógica infantis; além do mais, trouxe para o seu objeto de estudo uma nova abordagem, de amplitude e ousadia incomuns. Em vez de enumerar as deficiências do raciocínio infantil, em comparação com o dos adultos, Piaget concentrou-se nas características distintivas do pensamento das crianças, naquilo que elas têm, e não naquilo que lhes falta. Por meio dessa abordagem positiva, demonstrou que a diferença entre o pensamento infantil e o pensamento adulto era mais qualitativa do que quantitativa. Como muitas outras grandes descobertas, a idéia de Piaget é tão simples que parece óbvia. Já havia sido expressa nas palavras de Rousseau, citadas pelo próprio Piaget, no sentido de que uma criança não é um adulto em miniatura, assim como a sua mente não é a mente de um adulto em escala menor. Por trás dessa verdade, para a qual Piaget forneceu provas experimentais, encontram-se outra idéia, também simples – a idéia de evolução, que projeta um brilho incomum sobre todos os estudos de Piaget.(VIGOTSKI, 2005, p.11).

RESUMO

O presente trabalho teve como tema de estudo os contos infantis no desenvolvimento das capacidades cognitivas da criança do berçário na faixa etária de 2 a 3 anos, pela narrativa da contação e recontação de história. O estudo trouxe como questionamento: Que capacidades cognitivas são identificadas no momento da contação e recontação de histórias com crianças de 2 a 3 anos de idade? Tendo como objetivo principal: Identificar as capacidades cognitivas estimuladas na criança, pelos momentos da contação e recontação de histórias. Para tanto, desenvolveu-se a pesquisa bibliográfica e a pesquisa de campo. A pesquisa de campo aconteceu nas turmas da própria pesquisadora; com duas turmas de berçário na faixa etária de 2 a 3 a nos, em momentos distintos. Pelas teorias discutiu-se: a literatura infantil no seu percurso histórico; o contexto das leis vigentes da educação infantil; os fazedores e os contadores de histórias; um jeito de contar histórias; dialogando com Vigotski para entender as teorias cognitivas. A análise dos resultados permitiu a identificação das capacidades cognitivas estimuladas e identificadas na expressão da criança nos momentos da contação e recontação de histórias. Pode-se perceber que o conto trouxe em suas narrações, situações com as quais muitas crianças se identificavam, pois para elas os contos possuem um grande valor, facilitando a sua convivência com seus medos e fantasias. Estas contribuem para a formação de cada criança, pois quando elas entram em contato com as histórias, não desperta somente a imaginação, como também exercita a memória, a percepção e a fantasia; ampliam o vocabulário, na vivência das relações com o outro; no auxilio dos estímulos no desenvolvimento do pensamento e da linguagem. Palavras chave: capacidades cognitivas; contação de histórias; educação infantil.

LISTAS DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1- BÁRBARA VASCONCELOS DE CARVALHO......................................45

FIGURA 2 - CLÉO BUSATTO...................................................................................45

FIGURA 3 - FANNY ABRAMOVICH..........................................................................46

FIGURA 4 - LEV SEMIONOVITCH VIGOTSKI COM SUA FILHA GITA....................47

FIGURA 5 – MARIA ANTONIETA ANTUNES CUNHA.............................................47

FIGURA 6 – MARIA BETTY COELHO SILVA...........................................................48

FIGURA 7 – REGINA ZILBERMAN...........................................................................48

FIGURA 8 – CHAPEUZINHO VERMELHO COM O SEU CAPUZ.............................58

FIGURA 9 -MICHELE RECONTANDO A HISTÓRIA PARA AS CRIANÇAS.........59

FIGURA 10 - A MÃE DE CHAPEUZINHO COM VESTIDO ROSA............................59

FIGURA 11- A TENDA AZUL.....................................................................................59

FIGURA12-MICHELE RECONTANDO A HISTÓRIA E MOSTRANDO A FIGURA DO LOBO...........................................................................59

FIGURA 13 - O LOBO MAU PEGOU A VOVÓ..........................................................60

FIGURA 14 - CHAPEUZINHO VERMELHO CHEGOU NA CASA DA VOVÓ..........60

FIGURA 15 -CHAPEUZINHO FUGINDO..................................................................61

FIGURA 16 - MICHELE MOSTRANDO OS PÉS DA CHAPEUZINHO......................61

FIGURA 17 - O LOBO MAU COMENDO A MÔNICA................................................61

FIGURA 18-ONDE O LOBO CORRE E A VOVÓ FEZ DOCE PARA O DRAGÃO..........................................................................................61

FIGURA 19: MICHELE MOSTRANDO O LOBO FUGINDO......................................61

FIGURA 20 - A CHAPEUZINHO CORRENDO PELA FLORESTA............................62

FIGURA 21: O LOBO NA CASA DA VOVÓ...............................................................62

FIGURA 22- O LOBO DEITADO NA CAMA DA VOVÓ............................................63

FIGURA 23- QUANDO O LOBO MORDE O CHÃO DA VOVÓ E O GRANDE

FINAL DO “FELIZES PARA SEMPRE”................................................63

FIGURA 24 - A TURMA FELIZ ESCOLHENDO A HISTÓRIA...................................65

FIGURA 25 - AS CRIANÇAS BUSCANDO AS IMAGENS DO LIVRO......................65

FIGURA 26 - ANSIEDADE POR OUVIR O DESENROLAR DO CONTO..................66

FIGURA 27 - A TRISTEZA PELA SOLIDÃO DA BRANCA DE NEVE.......................67

FIGURA 28- A ALEGRIA DO ENCONTRO DOS SETE ANÕES COM BRANCA DE NEVE..............................................................................67

FIGURA 29- APREENSÃO ESPERANDO A VIRADA DA PROXIMA PÁGINA......67

FIGURA 30- APONTANDO O BONITO CAVALO DO PRÍNCIPE............................68

FIGURA 31– E... “FELIZES PARA SEMPRE”..........................................................69

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................9

2 A CRIANÇA NA TRILHA DA LITERATURA E DOS CONTOS .....................11

3 DO MUNDO DA FANTASIA AO CONTEXTO DAS LEIS VIGENTES DA EDUCAÇÃO INFANTIL ........................................................17 4 OS CONTADORES DAS HISTÓRIAS INFANTIS – OS CONTOS COMO EU CONTO .....................................................................................................22 4.1 UM JEITO DE CONTAR HISTÓRIAS... ERA UMA VEZ ............................... 27

5 DIALOGANDO COM VIGOTSKI PARA ENTENDER AS TEORIAS NO MUNDO DOS CONTOS...........................................................................32 5.1 IMAGINAÇÃO E CRIAÇÃO ............................................................................32

5.2 IMAGINAÇÃO E REALIDADE ........................................................................34

5.3 O MECANISMO DA IMAGINAÇÃO CRIATIVA ..............................................38

5.4 VIGOTSKI E A DISCUSSÃO DA IMAGINAÇÃO DA CRIANÇA .....................39

5.5 A FORMAÇÃO SOCIAL DA MENTE - O DESENVOLVIMENTO

DA PERCEPÇÃO E DA ATENÇÃO................................................................42

6 E AGORA... CONTANDO UM POUCO DA VIDA DE QUEM FAZ OS CONTOS E AS TEORIAS........................................................................45

7 METODOLOGIA............................................................................................50

7.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS - LEVANTAMENTO DOS DADOS E ANÁLISE DOS RESULTADOS ....................................................52 7.2 DINÂMICA DA PROFESSORA COM AS CRIANÇAS – REVELANDO UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA: OS CONTOS QUE EU CONTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: ERA UMA VEZ.......................................................52 7.3 SEGUNDO MOMENTO: MOMENTO DA RECONTAÇÃO DA HISTÓRIA......................................................................................................57 7.3.1 Chapeuzinho Vermelho de Mauricio de Souza: Como amostragem, a recontação da história é apresentada por duas crianças.........................................................................................58 7.4 TERCEIRO MOMENTO DA PESQUISA– CONTAÇÃO DA HISTÓRIA DE BRANCA DE NEVE .............................................................64 7.5 ANÁLISE DOS RESULTADOS.....................................................................69

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................71

REFERÊNCIAS..........................................................................................................73

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1 INTRODUÇÃO

Esta pesquisa teve como tema de estudo os contos infantis no

desenvolvimento das capacidades cognitivas da criança do berçáriona faixa etária

de 2 a 3 anos, pela narrativa da contação e recontação de história.

Há dois anos venho trabalhandona educação infantil, com crianças de nível

três do berçário na faixa etária entre dois a três anos de idade. A minha experiência

com elas na contação de histórias tem me mostrado que existe uma enorme

satisfação e alegria nesses momentos,dá a impressão de que sempre estão à

procura de novas emoções e surpresas. Pela pouca idade, elas ainda estão

desenvolvendo a arte de ouvir, de vivenciar a realidade que uma história pode

proporcionar ao se viajar pelo mundo da imaginação e da fantasia.Ao contar uma

história percebo o brilho nosolhos, o sorriso iluminado no rosto, e muitas vezes

pedindo para que eu conte de novo, mais uma vez... outra vez...Contar históriasé ver

aqueles olhinhos brilhantes esperando pelo próximo acontecimento, ou mesmo pelo

final:“Felizes para sempre‖.

As crianças se expressam, interessam-se pela contação, fazem da história

uma realidade vivida no momento em que a ouvem e querem recontá-la. Isso tem

me chamado a atenção para a questão do desenvolvimento das capacidades

cognitivas nessa faixa de idade.

Dessas experiências originou-seentão, este trabalho que tragocomo objeto

de estudo,os contos infantisno desenvolvimento das capacidades cognitivas,

afetivas e emocionaisda criança.A literatura é um dos caminhos para a criança

desenvolver a percepção, a imaginação, a fantasia, a atenção, memória, o

pensamento e linguagem, emoções e sentimentos de forma prazerosa e

significativa. É através das histórias que as crianças aprendem nomes, sons,

músicas e se inserem na cultura por meio do mundo da imaginação e da linguagem.

Assim, esta pesquisa traz o seguinte questionamento:Que capacidades cognitivas

são identificadas no momento da contação e recontação de histórias com crianças

de 2 a 3 anos de idade?Para responder a esse questionamento buscou-se alcançar

o seguinte objetivo geral: Identificaras capacidades cognitivas estimuladas na

criança, pelos momentos da contaçãoe recontação de histórias.Seguido das ações

dos objetivos específicos, tais como:construir um referencial teórico e metodológico

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que subsidie a pesquisa;analisarpor meio dos teóricos as capacidades

cognitivasidentificadasnaexpressão da criança nos momentos da contação e

recontação de histórias.

Os principais teóricos que subsidiaram a pesquisa foram: Lev Vigotski, nas

discussões da imaginação e a criação na infância, e a construção do pensamento e

da linguagem;Fanny Abramovichtraz a literatura infantil com seus prazeres e

magias; Bárbara Vasconcelos de Carvalhocolaborou com as discussões em torno da

importância da literatura e seu comprometimento com a experiência cognitiva; Betty

Coelhodiscute a importância da contação e recontação de histórias; Maria Antonieta

Antunes Cunha, na apresentação da literatura infantil: teoria e prática; Regina

Zilberman analisa a literatura infantil na escola e Cléo Busatto a arte de contar

histórias.

A metodologia da pesquisa se deu pela pesquisa bibliográfica e pesquisa de

campo. A pesquisa de campo aconteceu em três momentos, com duas turmas

diferentes, de nível três da educação infantil na faixa etária de 2 a 3 anos de idade,

de uma instituição particular de Curitiba.

O trabalho ficou dividido em oito partes. Na primeira, encontra-se a

Introdução. Na segunda está título:A criança na trilha da literatura e dos contos; na

terceira parte é apresentado: Do mundo das fantasias ao contexto das leis vigentes

da educação infantil; na quarta parte está: Os fazedores e contadores das histórias

infantis - como devo contar o meu conto; na quinta parte: Dialogando com Vigotski

para entender as teorias cognitivas no mundo dos contos; Na sexta encontra-se o

título: E agora...contando um pouco da vida de quem faz os contos e as teorias;

como sétima parte temos a metodologia, e oitava e última parte, as considerações

finais.

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2 A CRIANÇA NA TRILHADA LITERATURA E DOS CONTOS

A literatura infantil começou a se delinear em meados do século XVIII, no

momento em que a criança passa a ser vista como um ser diferente do adulto, com

necessidades e características próprias.Antes, a criança acompanhava a vida social

do adultoe da sua literatura.Diante disso, Carvalho (1989) esclarece:

A infânciaconstitui uma fase especial de evolução e formação, com as suas implicações específicas e suas complexidades, em nada comparável com o adulto. E todas as potencialidades da criança devem ser cuidadosamente cultivadas, com seriedade e amor. (p. 18).

Com todas essas potencialidades como relata a autora,os contos infantis

são uma chave mágica para o mundo da fantasia, abrindo as portas da inteligência e

sensibilidade da criança, contribuindo assim, para a sua formação.

Os livros de contos infantis devem ser lidos e conhecidos pelas pessoas

próximas às crianças, pela importância da leitura em família e em casa e não

somente no ambiente escolar. A criança vive num mundo rodeado por sonhos e

fantasias, criados apartir de sua vivência e de sua imaginação fértil.Por isso, não se

deve privar as crianças desse encantamento. (CARVALHO, 1989).

Esta autora acrescenta que:

Tirar da criança o encanto da fantasia pela arte, particularmente a arte do desenho, da forma, das cores e da Literatura (que representa todas), é sufocar e suprimir toda a riqueza de seu mundo interior. O problema está em saber escolher o que se oferece a essas criaturinhas. E então sentimos a grande e imprescindível necessidade de se conhecer a Literatura que se identifica com a criança. (CARVALHO, 1989 p. 19)

Confirmando o que esta autora apresenta, a experiência nos mostra que a

criança no seu processo de desenvolvimento cognitivo vai aprendendo a selecionar

suas leituras, desenvolvendo suas imaginações e fantasias, discernindo o que gosta

do que não gosta. Por isso, cabe ao adulto ou ao professor, orientar e ser o

mediador nessa escolha. Pois que, na infância, a criança encontra-se na fase

das“grandes descobertas”, seja de sons, palavras, tudo mais que a envolve em seu

mundo de maravilhas.

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Para Carvalho (1989, p. 21) “A literatura infantil, enriquecendo a imaginação

da criança, vai oferecer-lhe condições de liberação sadia, ensinando-lhe a libertar-se

pelo espirito: levando-a a usar o raciocínio e a cultivar a liberdade”.

A autora (1989), nos chama a atenção para a questão da importância da

leitura:

A leitura é o meio mais eficiente de enriquecimento e desenvolvimento da personalidade: é um passaporte para a vida e para a sociedade. Literatura é evasão, prazer estético, porém comprometida, de certo modo, com toda expressão de arte, com a educação, logo, com o real, com a experiência cognitiva. (CARVALHO, 1989 p.194).

Para a autora, é na infância que adquirimos o habito de ler. É nas crianças

que estão todas as potencialidades e disponibilidades para que se possa adquirir o

prazer da leitura. Nós precisamos abrir essa janela de possibilidades para que a

criança possa vir a ter contato com esse mundo maravilhoso que as histórias nos

proporcionam. Mas é preciso saber fazê-lo. Esta autora adverte que:

A fantasia não é gratuita, é um instrumento de compreensão de carências que a pobreza da realidade e a insatisfação do cotidiano provocam na sensibilidade da criança. [...] os livros ajudam as crianças e os jovens a crescer, a encontrar caminhos e soluções para suas proposições, suas inquietações, seus problemas de ordem intelectual, psicológica, ética, moral e social. (CARVALHO, 1989 p. 195).

Como relata Carvalho (1989), a criança precisa de matéria-prima sadia e

com beleza para organizar seu mundo mágico, onde ela é dona absoluta do

“constrói e destrói” tudo aquilo que desejar. É uma ótima forma de ela conquistar a

liberdade, de ouvir e de encantar.Para estaautora, o que mais atrai uma criança de

dois anos de idade, numa história, éa sonoridade das palavras,por isso, ela tem

satisfação em ouvi-las. As palavras nesse momento, vale pelo som que produzem;

distraindo ou mesmo embalando-a. É nesta fase que a criança descobre o som

articulado, num puro estágio auditivo.

A literatura enriquece a imaginação da criança, oferecendo-lhe condições de

sonhar, e de criar possibilidades para seu desenvolvimento cognitivo e afetivo.Para

Carvalho (1989), “a fantasia na criança possui certa atividade interior reprodutiva

que é a capacidadede combinar imagens e refundi-las. Por essa capacidade intuitiva

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e subjetiva, a criança, como os primitivos, é um criador de símbolos, é um poeta”.

(p.47).

Carvalho(1989)chama a atenção pelo que segue: dentro de cada criança

existe um poeta, assim como, em cada poeta existe uma criança. Não somente no

poeta, mas em cada um de nós, adultos, existe uma criança, muitas vezes sufocada

pelavigilância da censura.A criança explora a sua capacidade de imaginar, de criar e

de combinar imagens e movimentos.Essas se manifestam ao ouvir ou ao contar uma

história.Sabe-se que a imaginação é uma das habilidades mais férteis na

criança.Esta autora a conceitua como: “A imaginação é a formade desenvolvimento

intelectual, e o melhor meio de torná-la fecunda é atravésda literatura para criança.

Lendo, ela estará iniciando e desenvolvendo sua crítica, e elegendo o acervo da

Literatura Infantil”. (p. 48).

Através da literatura infantil, a criança, tem contato com valores estéticos e

humanos, provocando estímulos de sensibilidades, além de oferecer um repertório

cheio de recreação e aprendizagem. O importante na literatura é interessar a

criança, sob todos os aspectos: intelectual, emocional, social ou ambiental,

psicológico,dentre outros. (CARVALHO, 1989).

A criança, ao ouvir uma história, explora sua realidade universal, usa a sua

imaginação para explorar um universo maravilhoso povoado por pura fantasia e

criatividade. “O conto de fadas é uma narrativa simples, direta, acessível à criança: é

uma estória familiar, do cotidiano, que faz parte do dia a dia da criança”.

(CARVALHO, 1989, p. 49).

O conto de fadas é a mais antiga forma de narração, em seu sentido mítico,

natural, de narrativa tradicional, de “contar e ouvir”. É a forma primitiva da arte de

dizer, que é a Literatura. O conto para Carvalho (1989) é uma arte constante.

O ambiente da Educação Infantil prioriza a importância do contato das

crianças com narrativas e contações de histórias. Afirma Carvalho (1989) que a

partir da leitura de histórias infantis que um adulto faz para as crianças, seus

objetivos, são bem claros, tais como:

...socializar, recrear, formar, informar, educar a atenção, enriquecer a linguagem, estimular a imaginação e a inteligência, despertar emoções, desenvolver o sentimento de compreensão e a simpatia humana e despertar o senso estético e artístico-literário, formar o hábito da leitura, sobretudo ensinar a “ouvir”. (p. 57).

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Assim, os objetivos das histórias, contos ou mesmo o contato com a

literatura desde pequeno, visam a três aspectos: “o literário-recreativo, o psicológico

e o educativo. No aspecto psicológico apresenta implicações específicas como a

ajuda a resolver conflitos emocionais e as diferenças individuais, determina a origem

inconsciente ou desconhecida do comportamento”. (CARVALHO, 1989, p. 57)

Para as crianças os mistérios existentes nos contos as fazem imaginar o

sobrenatural e mesmo o inexplicável. A magia implica no fantástico, onde elas têm a

oportunidade de ouvir e imaginar, criar um mundo cheio de realidade, podendo ter

contato com as fadas e mesmo com as bruxas, que muito povoam seus contos.

Carvalho (1989) apresenta explicações sobre essas duas personagens, a

fada e a bruxa no imaginário infantil:

Essas duas personagens (Fada e Bruxa) são as representações simbólicas do Bem e do Mal. Veículos da bondade e da maldade, do certo e do errado, da felicidade e da desgraça, elas vão tecendo a trama dos destinos, comentando e questionando valores, dramatizando a própria vida, para concluir a mensagem, pela qual elas também são responsáveis. As estórias e dramatizações, onde essas forças antagônicas medem suas possibilidades, terminam sempre, logicamente, com o triunfo do Bem. (p. 61).

Muitos destes elementos, citados nas contações de histórias, contos da

Literatura Infantil, mágicos, simbólicos, alegóricos, são carregados de significados,

porque nada é gratuito na Literatura. “O sobrenatural, o maravilhoso, o fantástico

são meramente aspetos de nossa realidade; a finalidade real da viagem maravilhosa

nada mais é do que a exploração mais total da nossa realidade universal”.

(CARVALHO, 1989 p. 64).

Para a autora o próprio conto maravilhoso não é senão a separação da

imaturidade infantil à faixa da vida adulta. Assim, é sempre, “a Literatura, a

imaginação criadora, descobrindo, inspirando-se e antecipando-se a Ciência, à

realidade, porque nada se realiza sem a força criadora da imaginação”.

(CARVALHO, 1989 p. 64).

Zilberman (1985),corroborando as afirmações de Carvalho (1989), cita a

importância da literatura e a sua comunicação:

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Ela sintetiza, por meio dos recursos da ficção, uma realidade, que tem amplos pontos de contato com o que o leitor vive cotidianamente. Assim, por mais exacerbada que seja a fantasia do escritor, ou mais distanciadas e diferentes, as circunstâncias de espaço e de tempo dentro das quais uma obra é concebida, o sintoma de sua sobrevivência é o fato de que ela continua a se comunicar com o destinatário atual, porque ainda fala de seu mundo, com suas dificuldades e soluções, ajudando-o, pois, a conhecê-lo melhor. (p. 22).

É desta relação da criança pela obracomo leitor, pelo seu interesse em ouvir

histórias, que a Literatura vai além do desenvolvimento emocional, da socialização.

Para esta autora, esse contato abre portas para um possível leitor; facilita a

gramática, abrindo caminhos para uma visão original da realidade. É deste contexto

do qual participa seu destinatário que emerge a relação entre a obra e o leitor.

(ZILBERMAN, 1985 p.23)

Para esta autora, a maior carência da criança é o conhecimento de si

mesma,e do ambiente no qual vive, que é primordialmente o da família, depois o

espaço circundante e, a história e a vida social. O que a ficção lhe sugere é uma

visão de mundo que ocupa as lacunas de sua experiência existencial, através da

linguagem simbólica. (1985 p.23).

Zilberman (1985) explica:

Logo, não se trata neste momento de privilegiar um gênero ou uma espécie em detrimento de outras, uma vez que seus problemas peculiares necessitam ser examinados à luz dos resultados alcançados por cada escritor; e sim de admitir que, seja através do conto de fadas, da reapropriação de mitos, fabulas e lendasfolclóricas, ou relato de aventuras, o leitor reconhece o contorno dentro do qual está inserido e com o qual compartilha sucessos e dificuldades. (p. 24).

Assim, a criança, a partir do contato com a literatura, se reconhece como

leitor e também reconhece o contorno do ambiente em que está inserida,

compartilhando seus sucessos e também suas dificuldades. A obra da arte literária

não se reduz a um conteúdo reificado, mas depende da assimilação individual da

realidade que recria um mundo criado a partir do imaginário.

Zilberman (1985) acrescenta que:

A literatura infantil [...] é levada a realizar sua função formadora, que não se confunde com uma missão pedagógica. Com efeito, ela dá conta de uma tarefa a que está voltada toda a cultura – a de „conhecimento do mundo e do ser‟ [...] , o que representa um acesso a circunstância individual por intermédio da realidade criada pela fantasia do escritor. E vai mais além –

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propicia os elementos para a emancipação pessoal, o que é a finalidade implícita do saber. (p.25).

É esta possibilidade de superação de um estreitamento de origem que a

literatura infantil oferece à educação. A literatura, tão importante na escola, nasce da

relação que se estabelece com o leitor, com o ouvinte, convertendo-o num ser

crítico, transformador da realidade.

A literatura infantil faz parte, com certeza, da infância de nossas crianças.

Podendo vir a contribuir para seu desenvolvimento intelectual, emocional,

sentimental, social e também cultural. Precisamos pensar em uma educação onde

as histórias da literatura infantil, façam parte da vida integral das crianças, abrindo

novas possibilidades de contato com o mundo mágico, fantástico e irreal para o

mundo real da criatividade.

No próximo capítulo abordaremos o tema: do mundo da fantasia ao contexto

das leis vigentes da educação infantil

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3 DO MUNDO DA FANTASIA AO CONTEXTO DAS LEIS VIGENTES DA EDUCAÇÃO INFANTIL

A educação infantil é vista, segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais,

como a primeira etapa da educação básica. É um dever do Estado, garantir esta

etapa da educação para crianças de 0 a 5 anos. Uma educação pública gratuita e de

qualidade, sem requisito de seleção.

Como apontam essas Diretrizes, a criança é um sujeito histórico e de direitos

que, nas interações, relações e práticas cotidianas que vivencia, constrói sua

identidade pessoal e coletiva, através das brincadeiras, dos jogos e das histórias

ouvidas. A criançaimagina, fantasia, deseja, aprende, observa, experimenta, narra,

questiona e constrói sentidos sobre a natureza e a sociedade, produzindo assim,

cultura.

O Currículo da Educação Infantil apresenta um conjunto de práticas que

buscam articular as experiências e os saberes da criança com os conhecimentos

que fazem parte do patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico,

promovendo o desenvolvimento integral desta criança. Sendo assim, a literatura

infantil, pode auxiliar de forma imprescindível no desenvolvimento da criança.

Nessas Diretrizes Curriculares para Educação Infantil (2010), encontram os

princípios estéticos, na qual se trabalha “a sensibilidade, a criatividade, a ludicidade

e a liberdade de expressões nas diferentes manifestações artísticas ou mesmo

culturais”.

As práticas pedagógicas que compõem a proposta curricular na Educação

Infantil devem ter como eixos norteadores as brincadeiras e a interação que

“possibilitem às crianças experiências de narrativas, de apreciação e interação com

a linguagem oral e escrita, e convívio com diferentes suportes e gêneros textuais

orais e escritos.” (BRASIL, 2010 p. 25).

As Diretrizes Municipais de Curitiba apontam a Educação Infantil como uma

permanente construção da ação educativa, considerando o direito da criança à

infância e a educação.

Para essas Diretrizes:

A infância tem adquirido significados diferenciados em decorrência das transformações sociais, políticas, econômicas e culturais que marcam cada sociedade em diferentes tempos e espaços. Isso significa que a ideia de

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infância não é estática, ela se constrói e se modifica na prática social e está relacionada às formas de se olhar a criança. (CURITIBA, 2006, p.16).

Nesse sentido, a aprendizagem infantil é um processo de apropriação ativa

do conteúdo das experiências humanas. A criança insere-se em múltiplos sistemas

simbólicos, imaginários, constituindo sistemas básicos de apoio a outras

aprendizagens.

Ainda segundo as Diretrizes Municipais para a Educação Infantil (2006),

escutar uma história é o início da aprendizagem para ser um leitor. E apresenta em

suas páginas dentro do capitulo Desenvolvimento e Aprendizagem, o tema literatura

na Educação Infantil da seguinte forma:

Assim como no brincar, a literatura proporciona à criança, num plano simbólico, espaço para: elaborar sentimentos e emoções que vive, como alegria, inveja, amizade, ciúmes, amor, raiva, solidariedade, medo, cooperação; compreender fatos sociais, internalizar valores éticos e morais, oportunizando a ampliação das experiências infantis, na medida em que leva a criança a conhecer outros mundos, culturas, tempos e espaços sociais. (CURITIBA, 2006, p.30).

Sabe-se que nesse período da vida, há o predomínio do pensamento

mágico, em que a criança dá vida às histórias ouvidas, a animais e a objetos

inanimados, dotando-os de comportamentos humanos. O real e o imaginário

acabam por confundir-senesta fase, e é pelo imaginário que ela passa a

compreender o mundo. A criança, ao imaginar, afasta-se de si mesma pela ficção, a

experimentar sentimentos e características de outra pessoa, animais e objetos.

Assim, a literatura passa a ser um recurso adequado a este mundo

imaginário, trazendo sentimentos que vivem de maneira simbólica e lúdica,

contribuindo para a sua elaboração e compreensão, promovendo a identidade

infantil. As Diretrizes Curriculares (2010) indicam que:

Os contos de fadas contribuem [...], auxiliando a criança a lidar com as ambiguidades existentes, como o fato de uma pessoa ser boa ou má, feia ou bonita, tola ou esperta, trabalhadora ou preguiçosa, dando base para ela compreender as diferenças entre as pessoas e escolher como quer ser. Também levam a criança a entender que enfrentar dificuldades e desafios na vida é inevitável, mas que sendo forte e perseverante consegue superá-los. (CURITIBA, 2006, p.31).

19

E assim, ouvindo muitas histórias contada, dramatizada, brincando com as

rimas e as parlendas, e torcendo pelos “felizes para sempre‖ nos contos de fadas,

que as crianças vão ficando fascinada pela leitura, e então desperta o seu interesse

em saber ler. A leitura na Educação Infantil é determinante para que se desenvolva

este interesse e prazer em ler.

A função da literatura infantil é alegrar, divertir e emocionar as crianças, e de

maneira lúdica levá-las a perceber e a interrogar a si mesmas e ao mundo que as

cerca, promovendo nelas o desenvolvimento do senso crítico e a ampliação das

experiências já adquiridas.(CURITIBA, 2006, p. 32),

Não podemos deixar de lado as representações feitas pelas crianças ao

ouvirem uma história infantil contada por um adulto; às vezes deixando transparecer,

como queremos que esta criança veja o mundo. De certa forma, podemos ver como

as crianças integram o mundo dos adultos, aprendendo com suas múltiplas

representações.

Sabe-se que a criança vive um desenvolvimento continuo, eas histórias

infantis quando bem contadas, contribuem na construção da linguagem, e não

deixam de cumprir um papel fundamental na sua formação, sobretudo enquanto

elemento de expressão e de trocas simbólicas.

As Diretrizes Curriculares (2006) apontam que, o contar, o recontar, o ouvir,

o discutir uma história torna-se importante para se entender a ação do meio social,

num processo construtivo da formação humana. Ao ouvir uma história a criança

passa a relacionar suas experiências de vida com o que está no livro. Pensando

assim, a história de um livro, permiteà criança se comunicar, expressar suas

experiências, seus sentimentos, seus saberes, assim como conhecer e interpretar

tudo à sua volta.

As Diretrizes Curriculares (2006) mostramque a história pode ser contada

várias vezes para uma mesma criança, permitindo-a recontar a história. Por

intermédio das histórias, as crianças desenvolvem sua capacidade de pensamento

passando as representações e ligações com sua vida cotidiana. Neste momento a

criança se entende como um ator de suas próprias criações, num mundo imaginário

maravilhoso, de forma que a coisa das quais não gosta, não fazem parte deste

mundo.

As Diretrizes Curriculares (2006) analisam que:

20

Quando escuta histórias lidas pelo adulto, é como se a criança estivesse lendo com os olhos dele e, desta maneira, percebe aos poucos a escrita convencional e seu funcionamento. Outra é com a leitura própria, em que a criança tenha possibilidade de pegar livros de sua escolha, folheá-los e dar sentido às imagens que vê, lendo para si ou para os colegas da turma. Outra ainda quando a criança reconta histórias que memorizou. (CURITIBA, 2006 p.31).

O encanto das crianças pela leitura está relacionado com a escrita que fixa

língua, com as palavras que não se perdem, não desaparecem, nem se substituem

umas às outras. Quando usamos a voz alta para lermos, a criança começa a se

testar e organizar suas ideias, a informação recebida é transformada, descobre-se,

inventa-se. O drama de muitas crianças é exatamente não poderem contar com um

interpretante em casa. Às vezes a família quase não lê, e se comporta, muitas

vezes, como simples decodificadoras. Precisamas crianças, desde a infância, o

contato com livros e também com leitores.(CURITIBA, 2006).

Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação

Infantil(2013), “as crianças, nesse momento de suas vidas, vivenciam o

mundo,constroem conhecimentos, expressam-se, interagem e manifestam desejos e

curiosidades de modo bastante peculiares”. (BRASIL, 2013,p. 85)

Para as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (2013), a

criança se constitui integralmente a partir da convivência, da socialização e contato,

principalmente com os adultos. Assim:

a motricidade, a linguagem, o pensamento, a afetividade e a sociabilidade são aspectosintegrados e se desenvolvem a partir das interações que, desde o nascimento, a criança estabelece com diferentes parceiros, a depender da maneira como sua capacidade para construir conhecimento é possibilitada e trabalhada nas situações em que ela participa. Isso por que, na realização de tarefas diversas, na companhia de adultos e de outras crianças, no confronto dos gestos, das falas, enfim, das ações desses parceiros, cada criança modifica sua forma de agir, sentir e pensar. (BRASIL, 2013 p.86).

Sabe-se que todos esses processos, linguagem, afetividade, pensamento e

sociabilidade, são integrados desenvolvem-se a partir da interação. Cada criança

apresenta sua própria forma de agir e interagir, de expressar suas emoções, seus

sentimentos, buscando novas formas de compreender o mundo e a si mesma.

As referendas Diretrizes, os princípios estéticos contemplam, na infância,a

valorização da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da diversidadede

manifestações artísticas e culturais.

21

Dessa forma, a Educação Infantil deve voltar-se para uma sensibilidade que

valoriza o ato criador na criança, pela construção de respostas singulares,

garantindo-lhes a participação em diversificadas experiências, inclusive no mundo

da fantasia e da imaginação. (BRASIL, 2013, p.88).

Devido a esses princípios, discute-se que:

Na explicitação do ambiente de aprendizagem, é necessário pensar um currículo sustentado nas relações, nas interações e em práticas educativas intencionalmente voltadas para as experiências concretas da vida cotidiana, para a aprendizagem da cultura, pelo convívio no espaço da vida coletiva e para a produção de narrativas, individuais e coletivas, através de diferentes linguagens (BRASIL, 2013 p.93).

Nessas Diretrizes Curriculares observa-se que o contato dos pequenos com

as histórias é de suma importância, visto que:

...dentre os bens culturais que crianças têm o direito a ter acesso está a linguagem verbal, que inclui a linguagem oral e a escrita, instrumentos básicos de expressão de ideias, sentimentos e imaginação. A aquisição da linguagem oral depende das possibilidades das crianças observarem e participarem cotidianamente de situações comunicativas diversas onde podem comunicar-se, conversar, ouvir histórias, narrar, contar um fato, brincar com palavras, refletir e expressar seus próprios pontos de vista, diferenciar conceitos, ver interconexões e descobrir novos caminhos de entender o mundo. É um processo que precisa ser planejado e continuamente trabalhado. (BRASIL, 2013 p.94).

Assim, a criança precisa, desde muito cedo, deste contato com a Literatura

Infantil e a com a contação de histórias. Precisamos explorar esse momento,

ampliando as possibilidades dese autoconhecer, através da participação destas

histórias no repertorio infantil.

No próximo capítulo trazemos e apresentamos aqueles que contam e

constroem as histórias infantis.

22

4OS FAZEDORES E CONTADORES DAS HISTÓRIAS INFANTIS – COMO DEVO CONTAR O MEU CONTO

Vimos que a contação de história proporciona à criança espaço para

elaborar emoções,conhecer outros mundos com sua imaginação fantástica, podendo

através desta, expressar e ter contato com a alegria, amor, solidariedade, medo,

ansiedade e aflições.

Essas histórias têm como objetivo, ensinar, divertir, ampliar as experiências

a respeito do mundo ao seu redor, por fim, educar as crianças. O contador deve

oportunizar esses objetivos. A história alimenta a imaginação e, sendo contada de

uma forma que venha prender essa atenção, desperta nos pequenos o prazer em

ouvir e também o do ser um possível leitor. (COELHO, 1999).

Para Coelho (1999), a importância na contação de histórias está no modo de

como as contamos para os pequenos. Como a história alimenta a imaginação, a

gente grande que conta uma história, volta a ser criança.

Deve ser despertado muito cedo na criança, o estímulo da fantasia, da

imaginação eda criação. É na infância que se compreende este mundo mágico das

histórias, abrindo espaço para dar vida a animais, seres sobrenaturais, fadas,

bruxas, e tudo o que a imaginação possa recriar.(COELHO, 1989).

A importância da contação de histórias alegres, divertidas e prazerosas,

desperta nas crianças o interesse pela leitura, pelo estético, facilitando sua vida

adulta, tanto na escrita quanto na leitura.

Segundo a contadora de histórias Cléo Busatto:

A arte de contar histórias traz o contorno, a forma. Reatualiza a memória e nos conecta com algo que se perdeu nas brumas do tempo. A arte de contar histórias nos liga ao indizível e traz respostas às nossas inquietações. Contar histórias é uma arte, porque traz significações ao propor um diálogo entre as diferentes dimensões do ser. Contar histórias expressa e corporifica o simbólico, tornando-se a mais pura expressão do ser.(2008, p. 9-10).

Para essa autora de histórias,contar histórias é uma arte, podendo nos

conectar com outros mundos, passados ou mesmo com nosso futuro, é uma forma

de incorporar arte à vida.

23

Já para Carvalho (1989), a história contada liberta-se do autor, e adquire um

transautor que é o transfigurador do conto: mas é indispensável o conhecimento do

tema e da estrutura da história a ser contada.

Na leitura com a criança o mais importante não é o que se faz, mas sim,

como se faz. Ler é aventurar-se a crescer. Os contos de fadas na Educação Infantil

oportuniza a criança a dramatização, a emoção, a motivação, ao realismo mágico.

Carvalho (1989) sustenta que:

O Conto de Fadas é forma modelar primária, da narrativa, imprescindível ao crescimento afetivo da criança. Ele utiliza símbolos universais que permitem à criança escolher, desprezar ou interpretar o conto, segundo o estágio de desenvolvimento intelectual e psicológico, que ela tenha atingido. (p.199).

Assim em cada fase de seu desenvolvimento a criança absorve aquilo que

para ela a afetou. Nessa fase, os contos, a literatura e as histórias em geral, são

indispensáveis à criança. Proporcionam prazer como a fantasia, a recriação, e como

fator de ajuste e crescimento afetivo. Este é um período na vida da criança muito

significativo, pois nele se realiza o fenômeno mais importante da vida humana: a

linguagem: nele a criança vive o realismo, o artificialismo, o egocentrismo, cria um

universo próprio, recria seu mundo na literatura. (CARVALHO, 1989, p.199).

Para esta autora

É de importância capital, no livro da criança, a linguagem e o estilo, que identificam o conteúdo, a estrutura e a técnica da leitura. Contudo, é preciso não esquecer que, em se tratando de Literatura Infantil, esses fatos não podem ser considerados em seus valores absolutos, mas em função das diferentes faixas etárias e interesses da criança, obedecendo a uma adequação que, não raro, especifica muitos dos requisitos da forma, do conteúdo, da estrutura e da técnica da leitura. (CARVALHO, 1989 p.202).

Desta forma, para cada faixa etária existe uma forma apropriada de se

contar uma história; a técnica da leitura muda tudo quando falamos em infância.

Para os pequenos, a contação e a narração são mais agradáveis. Elas ficam

impressionadas, às falas e aos pensamentos dos personagens. (CARVALHO,1989).

Já para Cunha (1997) o leitor fará mais sucesso ao contar uma história

evitando discrições longas.Imaginando que os movimentos físicos, a ação dos

personagens, criam certo dinamismo na história, este deve ser a preocupação de

um narrador ao contar sua história.

24

Assim, para Cunha (1997):

A narração é a mais agradável ao espirito infantil. Com relação às falas e aos pensamentos das personagens, a melhor apresentação é através do discurso direto. O diálogo, predominantemente no conto em geral, torna-se mais necessário ainda para crianças: ele atualiza a cena, presentifica os fatos, envolve mais facilmente o leitor, que o discurso indireto, que fica a cargo do narrador. Por tudo isso, se bem feito, numa linguagem realmente oral e adequada às características da personagem e à situação, o diálogo dá um grande realismo à cena. (p.98).

A narrativa feita para as crianças deve ter a sua participação direta da

história, dando opiniões ou mesmo demonstrando suas emoções. Cunha (1997) fala

da importância do desfecho do final feliz, sendo um requisito essencial, sobretudo

para crianças mais novas. Isso porque a criança vive a história ouvida, ela identifica-

se com os personagens, e um final desagradável causaria uma decepção nos

pequenos.

A escolha do que contar para uma criança faz uma enorme diferença, pois,

sabemos que as crianças encontram-se numa série de transformações que

estabelecem fases de sua evolução. Mais do que conhecer as fases de

desenvolvimento de uma criança é conhecer a criança, sua história, suas

experiências e suas ligações com o livro.

Cunha (1997) apresenta algumas fases, pontos de referências, com algumas

características e limites para cada idade, para nós interessa a fase da infância, em

que ela enfatiza:

Na fase do mito se encontram as crianças de 3/4 a 7/8 anos. Predomina nelas a fantasia, o animismo: tanto quanto as pessoas, os objetos têm para criança alma, reações. Não existe para ela diferença entre realidade e fantasia, e a leitura a ser feita para criança desta época é a que também não faz essa distinção: a literatura de maravilhas. Os contos de fadas, as lendas, os mitos e as fábulas são especialmente adequados a essa idade. (CUNHA, 1997 p.100).

Para esta autora a importância é que as crianças tenham acesso às

histórias, muito importante para ajudar a constituir a infância.

A história deve ser contada emocionalmente e não somente apresentada em

seu enredo. Uma boa história nos permite o contar e o recontar várias vezes. O

contador de histórias nos faz parar no tempo, reviver aquele enredo, sentir as

angústias, os medos, a superação, e nos faz sentir a felicidade, do―para sempre...‖.

25

Já para Abramovich (1989), a partir do momento em que uma história é

contada, as crianças sentem emoções importantes, como tristeza, a raiva, a

irritação, o bem-estar, o medo, a alegria, o pavor, a insegurança, a tranquilidade e

outras mais. As crianças passam a viver profundamente tudo aquilo narrado em sua

amplitude, pois é ouvir, sentir e enxergar com os olhos do imaginário.

Abramovich acrescenta que:

É através de uma história que se podem descobrir outros lugares, outros

tempos, outros jeitos de agir e de ser, outra ética, outra ótica, e ficar

sabendo História, Geografia, Filosofia, Política, Sociologia, sem precisar

saber o nome disso tudo e muito menos achar que tem cara de aula. O

primeiro contato da criança com um texto é feito oralmente através da voz

da mãe, do pai, dos avós, contando contos de fada, trechos da Bíblia,

histórias inventadas, tendo a criança ou os pais como personagem das

histórias. (1989, p. 17).

Isso nos mostra que é na infância que a criança compreende que há o

predomínio do pensamento mágico, ela, a partir dos enredos narrados, dá vida aos

objetos e aos animais, dotando-os de comportamento humano. Pela fantasia a

criança conhece o mundo e seus fatos sociais.

As crianças precisam aprender a ter domínio próprio, enfrentar as

dificuldades do dia a dia. A contação de histórias é importante para a formação de

qualquer criança, ser um bom leitor, contar uma boa história abre caminhos infinitos

de descoberta e compreensão de mundo, diz Abramovich (1989), acrescentando

que:

Ler histórias para crianças, sempre, sempre... é poder sorrir, rir,

gargalhar com situações vividas pelo personagens. É suscitar o

imaginário, é ter a curiosidade respondida em relação a tantas

perguntas, é encontrar outras ideias para solucionar questões (como as

personagens fizeram...), é uma possibilidade de descobrir o mundo

imenso dos conflitos, dos impasses, das soluções que todos vivemos e

atravessamos dum jeito ou de outro.(1989, p. 17).

O contador de histórias deve nos fazer viajar por um mundo fascinante

habitado por nossa imaginação. As histórias encantam os ouvintes, deixando-os

entretidos por horas. O contar histórias favorece, e muito, a aprendizagem das

crianças na educação infantil. E ouvir histórias é viver um momento de prazer, de

26

gostosura, de divertimento dos melhores. É encantamento, maravilhamento e

sedução. Abramovich ainda chama a atenção para o que segue:

O livro da criança que ainda não lê é a história contada. E ela é (ou pode ser) ampliadora de referenciais, poetura colocada, inquietude provocada, emoção deflagrada, suspense a ser resolvido, torcida desenfreada, saudades sentidas, lembranças ressuscitadas, caminhos novos apontados, sorriso gargalhado, belezuras desfrutadas e as mil maravilhas que uma boa história provoca... (1989, p. 24).

Uma das atividades mais importantes e significativas, abrangentes e

suscitadoras, dentre tantas outras atividades da educação infantil, é a contação de

uma boa história. Quando a criança ouve uma boa história ela conserva a

significação que esta lhe proporcionou. (ABRAMOVICH, 1989).

As crianças precisam percorrer o caminho do desenvolvimento para a vida,

pois são fracas, frágeis, pequenas, e para enfrentar estes desafios que encontrarão

ao crescer, só imaginando que outras forças como, super heróis e fadas, estarão do

seu lado. Podemos presenciar isso em vários contos, facilitando este confronto e

protegendo a criança. (ABRAMOVICH, 1989, p.130)

A história pode ser narrada, lida, filmada ou mesmo dramatizada. Não existe

lugar, onde as pessoas não tenham orgulho de suas histórias, suas lendas, seus

mitos. Todos, revivemos ao ouvir uma boa história contada ou narrada, este mundo

fantástico, viajamos pelas estradas da nossa imaginação.

Nos dias atuais as crianças não tem oportunidade, dentro do ambiente

familiar, de ouvir histórias. Cabe à educação infantil proporcionar este contato com a

literatura, uma aprendizagem de grande importância, pois a mesma ajudará a

criança em seu desenvolvimento, facilitando inclusive sua leitura.

[....] a história é importante alimento da imaginação. Permite a auto-

identificação, favorecendo a aceitação de situações desagradáveis, ajuda a

resolver conflitos, acenando com a esperança. Agrada a todos, de modo

geral, sem distinção de idade, de classe social, de circunstancias de vida.

(COELHO,1999, p.12).

A história nos permite a resolução de conflitos, a partir da vivência com este

mundo mágico, vemos a vida com mais esperança, ela nos faz sonhar e viajar para

um mundo mágico, onde tudo é possível.

27

A contação de histórias deve fazer parte da vida de todas as crianças,

partindo de sua família e esta prática deve se fortalecer ainda na educação infantil.

A partir destas contribuições para se contar uma boa história podemos

perceber o quanto este mundo da imaginação faz parte da vida das crianças,

ajudando a formar um ser crítico social e intelectualmente. As histórias nos

possibilitam viver a magia, a fascinação, caminhar e percorrer o desconhecido, se

animar e logo se entristecer, mas, ao final uma surpreendente e imensa felicidade.

As histórias quando bem escolhidas, preparadas, e contadas de forma agradável,

nos ajudam inclusive a educar.

Ouvir e contar histórias passa de geração para geração, é vista como

veículo de uma verdade eterna, é um meio de conservação de nossas histórias. Os

contos de fadas têm sido aplicados com resultados felizes no ensino da leitura.

Assim, para se contar uma boa história devemos ter uma boa preparação,

facilitando a narração diante do público. O “ler” para os pequenos é poder sorrir, rir,

gargalhar com os personagens, participando literalmente neste mundo de

divertimento. (COELHO, 1999).

4.1 UM JEITO DE CONTAR HISTÓRIAS... ERA UMA VEZ...

Para Coelho (1999), gente grande volta a ser criança ao contar uma história.

Pois esta alimenta a imaginação. Todos nós temos jeito para contar, é só começar.

A autora, em seu livro “Contar histórias uma arte sem idade” nos apresenta várias

formas, começando pela escolha certa:

Constatada a importância da história como fonte de prazer para a criança e a contribuição que oferece ao seu desenvolvimento, não se pode correr o risco de improvisar. O sucesso da narrativa depende de vários fatores que se interligam, sendo fundamental a elaboração de um plano, um roteiro, no sentido de organizar o desempenho do narrador, garantindo-lhe segurança e assegurando-lhe naturalidade. O roteiro possibilita transformar o improviso em técnica, fundir a teoria à prática. O primeiro passo consiste em escolher o que contar. (COELHO, 1999 p. 13).

Esta autora mostra que escolher uma história para ser contada, por mais

simples que seja ainda requer adaptação verbal que facilite sua compreensão e a

torne mais comunicativa. É preciso fazer uma seleção inicial, visando ao ponto

28

literário, o interesse dos ouvintes e a faixa etária. Esta seleção requer um bom

tempo dedicado à escolha, pesquisando livros e revistas até encontrar a história

adequada à faixa etária, atendendo os interesse do ouvinte, considerando o estilo e

o gosto pessoal do narrador.

Coelho (1999) nos apresenta faixa etária de interesses: até três anos: fase

pré-mágica, histórias de bichinhos, brinquedos, objetos, seres da natureza

(humanizados); histórias de crianças; histórias de repetição e acumulativas; histórias

de fadas. (COELHO, 1999 p. 14).

Nesta fase pré-mágica, as histórias devem ter enredo simples, vivo e

atraente, contendo situações que se aproximem o mais possível da vida da criança,

de sua vivência afetiva e doméstica, de seu meio social, de brinquedos e animais

que a rodeiam. A criança integra-se com estes personagens, conseguindo “viver” os

enredos sentindo-se no lugar em que a história acontece.

Nesta fase sua imaginação torna-se criadora. Podemos observar isso a

partir da interação da criança com seus brinquedos, quando conversa ao telefone,

conversa sozinha ou mesmo com pessoas invisíveis, inventando até nomes. Cada

criança cresce com seu ritmo próprio.

Uma vez escolhida essa história a ser contada, passamos ao seu estudo.

Para estudar esta história é, em primeiro lugar, divertir-se com ela, captar a

mensagem que nela está implícita e, em seguida, após algumas leituras, identificar

os seus elementos essenciais, isto é, que constituem sua estrutura. (COELHO, 1999

p. 21)

Para Coelho (1999), a introdução é a parte inicial, preparatória. Pois tem por

objetivo localizar o entrecho da história no tempo e no espaço, apresentar os

principais personagens caracterizando-os. Deve ser curta, apenas passando

informações necessárias facilitando a compreensão daqueles que vão escutar. A

introdução pode ser quando: “Era uma vez...”, “Há muitos e muitos anos...”, onde:

“Numa floresta distante...”, tem os “Três porquinhos”.

A introdução estabelece este contato inicial com quem conta a história e

quem a ouve, devendo ser contada com uma voz clara, pausada e uniforme.

Coelho (1999) chama a atenção para o seguinte:

Nem todos os livros trazem introduções precisas, completas. Se a história é lida, a criança pode suprir a falta. Mas, se é para ser ouvida, cabe ao narrador completar, adaptar, pois fica difícil começar a narração sem a fase

29

preparatória inicial. Quase sempre basta acrescentar o “Era uma vez”, “Um dia”, e colocar as frases em ordem direta. (p. 22).

Depois da escolha, do estudo da história, de fazer adaptações, se

necessárias, é preciso, ainda, escolher a melhor forma de apresentá-las aos

pequenos. Os recursos mais utilizados são: a narrativa com o auxílio do livro, o uso

de gravuras, de flanelógrafo, de desenhos e a narrativa com interferências do

narrador e dos ouvintes. Para cada recurso existem vantagens especificas,

requerendo uma técnica especial. (COELHO, 1999).

Vamos falar um pouco da simples narrativa com livro. Para Coelho (1999),

esta é sem dúvida, a mais fascinante de todas as formas de contação de histórias, a

mais antiga, tradicional e autêntica expressão. Não requer nenhum acessório e se

processa por meio da voz do narrador, de sua postura. Concentrando sua força na

expressão corporal.

Coelho (1999) dá a sua sugestão:

Contos de fadas, eu sempre conto sobre a forma de simples narrativa. Que gravura mostraria o esplendor do baile da Cinderela, ou a emoção da fuga ao soar as badaladas da meia noite? Mesmo lidando com crianças pequenas, prefiro aplicar esse recurso em histórias de brinquedos. (p. 31).

Quando contamos uma história precisamos também dramatizá-la. A partir

delas as crianças captam integralmente o enredo. Para a autora, lendas, fábulas,

histórias recolhidas da tradição oral e histórias similares aos exemplos citados, ela

recomenda que sejam transmitidas aos pequenos sob a forma da simples narrativa,

pois contribui para a estimulação da criatividade. (COELHO, 1999).

Mas, há textos que necessitam exclusivamente da apresentação do livro,

pois a ilustração vem complementar a história. “Existem livros onde se destaca a

apresentação gráfica e a imagem é tão rica quanto o texto (às vezes mais rica)

verifica-se a propriedade do recurso”. (COELHO, 1999 p. 32)

Narrar com o livro, não é propriamente ler a história. O narrador a escolheu e

a estudou e vai, assim, contando com suas próprias palavras, sem vacilações ou

mesmo consultas ao texto, isso viria a prejudicar a integridade da narração. As

crianças, ao ouvirem a história, certamente interferirão com perguntas ou

questionamentos a respeito.

30

Para Coelho (1999), este momento é ideal para atribuir as palavras um

significado concreto, real, dirimir preconceitos, ideias falsas, mas claro que essa

intenção ela não revela às crianças, simplesmente aproveita para instigar os

pequenos a pensar.

Porém, antes de se iniciar uma narração é importante uma conversa

introdutória no assunto, facilitando assim, o entendimento do enredo. “Contar

histórias é uma arte, por conseguinte requer certa tendência inata, uma

predisposição, latente, aliás, em todo educador, em toda pessoa que se propõe a

lidar com crianças”. (COELHO, 1999 p. 50).

A naturalidade precisa estar presente no momento da contação, sendo

simples, sem artificialismos. Um bom contador de histórias precisa estar presente no

espaço, parado narrando a história escolhida e estudada. Se o narrador agir como

se estivesse representando, andando de um lado para o outro, dispersaria as

crianças, deixando-as sem saber quem acompanhar, se quem narra ou aos

personagens apresentados na história. As emoções são transmitidas pela voz,

principal instrumento do narrador. (COELHO, 1999).

Crianças pedem que lhes contem histórias em diferentes momentos como:

para vir almoçar, antes de dormir, na escola. Mas, o mais importante é contar

histórias no momento em que a criança está bastante esperta, pois, facilita a

identificação e dar-lhe o prazer fantástico da criação e imaginação que a história

proporciona, divertindo-lhe, fazendo-lhe pensar e assimilar.

Assim,

Só escutando repetidamente um conto de fadas e sendo dado tempo e oportunidade para demorar-se nele, uma criança é capaz de aproveitar integralmente o que a história tem a lhe oferecer com respeito à compreensão de si mesma e de sua experiência de mundo. [...] Redirecionar os pensamentos da criança prematuramente para uma segunda história pode matar o impacto da primeira, enquanto fazê-lo numa época posterior, pode aumentá-lo. (COELHO, 1999, p.55).

Para Coelho (1999) a repetição deve ser feita mesmo após alguns dias. As

crianças o exigem por uma forte razão: da primeira vez desconhecem o que vai

acontecer, a expectativa é forte. Nas seguintes, conhecendo o enredo, já

identificadas com alguns personagens, apreciam melhor a trama, podem antecipara

as emoções e torná-las mais ricas, mais duradouras, um renovado prazer. (1999, p.

55).

31

A história não acaba quando termina a narração. Ela permanece na vida da

criança, incorporando-a como um alimento de sua imaginação criadora. As crianças

precisam de tempo para refletir a partir da história ouvida. Elas mergulham num

mundo cheio de imaginação, sua percepção auditiva cria possibilidades de irem

além daquilo que foi ouvido. Assim, as crianças são encorajadas a falar sobre a

história, depois disso, a recontagem desta história revela muito mais

emocionalmente e intelectualmente do que imaginamos que a história passaria a

essas crianças.

Para coelho (1999), é de grande importância, depois que estas histórias são

contadas, propor atividades, pois ajudam os pequenos a digerir essas informações

num processo de associação a outras práticas artísticas, educativas, e mesmo de

sua vida cotidiana.

Esta autora nos propõe vários tipos de atividades que podemos desenvolver

baseadas nas sugestões que o enredo nos oferece, a dramatização, desenhos,

recortes, dobraduras, criação de textos (para crianças em idade de alfabetização),

brincadeiras e também a construção de maquete. (p. 59) a imaginação continua

presente mesmo depois de a história acabar.

E Carvalho dá a sua contribuição dizendo que:

E mais uma vez a fantasia faz a história da realidade, [...] Assim é, sempre: a Literatura, a imaginação criadora, descobrindo, inspirando e antecipando-se à Ciência, à realidade, porque nada se realiza sem a força criadora da imaginação. (CARVALHO,1989, p. 65).

Contar histórias é também saber narrá-las. O narrador deve estar consciente

de que importante é a história, ele apenas conta o que aconteceu, empresta sua

vivacidade à história. Ele cuida ao escolher a história, estuda-o e recria na

linguagem oral todo enredo desta história, passando para os pequenos, toda magia

que uma grande história pode nos proporcionar. Fazem-nos viajar para outro mundo,

onde tudo, aos nossos olhos, é belo, é fantástico, é surreal.

No próximo capitulo são apresentadasas teorias cognitivas de Vigotski para

entender o mundo dos contos.

32

5DIALOGANDO COM VIGOTSKI PARA ENTENDER AS TEORIAS COGNITIVAS DO MUNDO DOS CONTOS

5.1 IMAGINAÇÃO E CRIAÇÃO

Nesse começo de diálogo com Vigotski (2009) é ressaltada as funções e as

características da atividade criadora para a existência humana. Para este autor é

chamada de atividade1 criadora do homem aquela em que se cria algo novo. Não

importando “se o que se cria é algum objeto do mundo externo ou uma construção

da mente ou mesmo um sentimento, conhecida apenas pela pessoa em que esta

construção habita e se manifesta”. (p.11).

Vigotski (2009) chama a atenção para o seguinte:

Se olharmos para o comportamento humano, para a sua atividade, de um modo geral, é fácil verificar a possibilidade de diferenciar dois tipos principais. Um tipo de atividade pode ser chamado de reconstituidor ou reprodutivo. Está ligado de modo íntimo à memória; sua essência consiste em reproduzir ou repetir meios de conduta anteriormente criados e elaborados ou ressuscitar marcas de impressões precedentes. Quando me lembro da casa onde passei a infância ou de países distantes que visitei, reproduzo as marcas daquelas impressões que tive na primeira infância ou à época das viagens. Da mesma forma, quando elaboro desenhos de observação, quando escrevo ou faço algo seguindo determinado modelo, reproduzo somente o que existe diante de mim ou que assimilei antes. O comum em todos esses casos é que a minha atividade nada se cria de novo e a sua base é a repetição mais ou menos precisa daquilo que já existia. [...] Ao lado da conservação da experiência anterior, o cérebro possui ainda outra função não menos importante. Além da atividade reprodutiva, é fácil notar no comportamento humano outro gênero de atividade, mais precisamente a combinatória ou criadora. (p.11-13).

Este autor acrescenta que se a atividade do homem restringisse apenas do

anterior, ele seria somente voltado para o passado, adaptando-se ao futuro

conforme suas necessidades. No entanto, é a atividade criadora que faz do homem

um ser voltado para o futuro, buscando modificações no seu presente, e que toda a

atividade humana que tenha como resultado a criação de novas imagens e não a

reprodução, pertence ao comportamento criador.

Vigotski (2009) reforça que:

1 O conceito de atividade tem raízes no materialismo histórico-dialético de Karl Marx e está relacionado às

bases materiais da existência.

33

O cérebro não é apenas o órgão que conserva e reproduz nossa experiência anterior, mas também que combina e reelabora, de forma criadora, elementos da experiência anterior, erigindo novas situações e novo comportamento. [...] É exatamente a atividade criadora que faz do homem um ser que se volta para o futuro, erigindo-o modificando o seu presente. (VIGOTSKI, 2009 p.14).

Nessa discussão, Vigotski (2009) chama a atenção para a questão de que a

psicologia denomina de imaginação ou fantasia essa atividade criadora. Porém, se

entende por imaginação ou fantasia em nosso cotidiano, como sendo tudo o que não

é real, que não corresponde á realidade. Em vista disso, explicando que:

Na verdade, a imaginação, base de toda atividade criadora, manifesta-se, sem dúvida, em todos os campos da vida cultural, tornando também possível a criação artística, a científica e a técnica. Nesse sentido, necessariamente, tudo o que nos cerca e foi feito pelas mãos do homem, todo o mundo da cultura, diferentemente do mundo da natureza, tudo isso é produto da imaginação e da criação humana que nela se baseia. (VIGOTSKI, 2009, p. 14).

Nessa linha de reflexão, Vigotski (2009) ressalta que os processos de

criação são revelados com toda a sua força já na infância. Dizendo que:

Uma das questões mais importantes da psicologia e da pedagogia infantil é a da criação na infância, do desenvolvimento e do significado do trabalho de criação para desenvolvimento geral e o amadurecimento da criança. Já na infância, identificamos nas crianças processos de criação que se expressam melhor em suas brincadeiras. (VIGOTSKI, 2009, p.16).

Este autor dá exemplos de criações nas brincadeiras das crianças, como: o

cabo de vassoura que se transforma num cavalo; brincando de boneca, a menina

imagina-se a mãe; ou numa brincadeira o menino transforma-se em bandido ou

soldado do exército. Para Vigotski (2009), tudo isso são representações da mais

autêntica e verdadeira criação, pois que, são apresentados elementos novos, e a

combinação desses, representa uma coisa, criada pela própria criança, mesmo

sendo conhecidos por ela de experiências anteriores, caso contrário, não teria como

criar.

No entanto, esses elementos do real nunca se reproduzem na brincadeira

como realmente aconteceu, a brincadeira é uma simples recordação do que ela

possivelmente vivenciou, numa reelaboração criativa.

34

5. 2 IMAGINAÇÃO E REALIDADE

Para essa discussão Vigotski (2009) chama a atenção para o seguinte:

“...cada período da infância possui sua forma característica de criação. [...] mas

depende diretamente de outras formas de atividade, em particular do acúmulo de

experiência”.(p.19).

Iniciando a explicação do mecanismo psicológico da imaginação e da

atividade de criação a ela ligada, há um esclarecimento da relação entre fantasia e

realidade no comportamento humano. Para Vigotski (2009), fantasia e realidade não

se separam. Ele ainda apresenta quatro formas principais de relação entre atividade

de imaginação e realidade. Isso ajuda-nos a compreender que a imaginação não é

um divertimento ocioso da mente, mas uma função vital necessária.

Assim, a primeira forma que o autor nos apresenta desta relação entre

imaginação e realidade, consiste no fato de que toda obra de imaginação constrói-se

de elementos tomados da realidade ou mesmo presentes numa experiência anterior.

De acordo com essa visão, a análise científica das construções mais fantasiosas e

distantes da realidade, como nos contos de fadas, nos convence de que as criações

mais fantásticas foram uma reelaboração da realidade, submetidos a uma

modificação da nossa imaginação. Desta forma, entende-se que a imaginação não é

uma invenção do nada. Pode-se perceber que nossa imaginação sempre constrói,

ela pode criar novos níveis de combinações, inserindo elementos da nossa

realidade. “Quanto mais rica a experiência da pessoa, mais material está disponível

para a imaginação dela. Eis por que a imaginação da criança é mais pobre2 que do

adulto, o que se explica pela maior pobreza de sua experiência.” (VIGOTSKY, 2009,

p. 22).

A conclusão pedagógica que se pode chegar a partir de tudo isso consiste

na afirmação da necessidade de ampliar a experiência da criança, criando bases

suficientemente sólidas pra sua atividade de criação.

Para que isso seja possível, salienta Vigotski (2009):

Quanto mais a criança viu, ouviu e vivenciou mais ela sabe e assimilou; quanto maior a quantidade de elementos da realidade de que ela dispõe em sua experiência - sendo as demais circunstâncias as mesmas - mais significativa e produtiva será a atividade de sua imaginação. [...] A fantasia

2 Vigotski fala em riqueza e pobreza de experiência relacionada ao acúmulo ou quantidade. O problema é como

quantificar e qualificar a experiência.

35

não se opõe à memória, mas apoia-se nela e dispõe de seus dados em combinações cada vez mais novas. (p. 23).

Na segunda forma, esse autor vai discutir a relação entre fantasia e

realidade, que é diferente e mais complexa: “...e não diz respeito à articulação entre

os elementos da construção fantástica e a realidade, mas sim àquela entre o produto

final da fantasia e um fenômeno complexo da realidade”. (VIGOTSKI, 2009, p. 23).

Afirma ainda Vigotski (2009) que a partir do momento em que se baseia em

relatos ou narrativas e se compõe um quadro disso tudo, há o resultado da atividade

de criação e de imaginação3. A nossa mente cria novas combinações dessa

experiência. Isto é, não se cria do que foi percebido, mas do que foi narrado. A

imaginação adquire uma função muito importante no desenvolvimento, pois se

transforma em meio de ampliação de experiência, a partir de narrações ou mesmo

uma descrição. O individuo imagina o que não viu e o que não vivenciou.

Acrescentando que:

A pessoa não se restringe ao circulo e a limites estreitos de sua própria experiência, mas pode aventurar-se para além deles, assimilando, com a ajuda da imaginação, a experiência histórica ou social alheias. Assim configurada, a imaginação é uma condição totalmente necessária para quase toda a atividade mental humana. (VIGOTSKI, 2009, p. 25).

Para esse autor, nossa imaginação serve à nossa experiência. Existe uma

dependência dupla e mutua entre a imaginação e a experiência, a imaginação apoia-

se na experiência e a experiência apoia-se na imaginação.

A terceira forma de relação entre atividade de imaginação e realidade é a de

caráter emocional. Para Vigotski, (2009), ela se manifesta de dois modos. Por um

lado, qualquer sentimento, qualquer emoção tende a se encarnar em imagens

conhecidas correspondentes a esse sentimento. Assim, a emoção parece possuir a

capacidade de selecionar impressões, ideias e imagens consonantes com o ânimo

que nos domina num determinado instante. Sabemos que vemos as coisas com

diferentes olhares4 conforme nosso estado de alegria ou de tristeza.

Vigotski (2009) esclarece que:

3 Podemos formar imagens, criar mentalmente cenas e encarnar isso, imaginar, tomando por base a experiência

dos outros. Isso se torna possível pela linguagem. 4 Em Psicologia da Arte, Vigotski faz referencia à contribuição especifica de Zienkovski, que mostra como as

emoções se articulam a imagens, que por sua vez, transformam as emoções.

36

Há muito os psicólogos notaram o fato de que qualquer sentimento não tem apenas uma expressão externa, corporal, mas também interna, que se reflete na seleção de ideias, imagens, impressões. Esse fenômeno foi denominado por eles de lei da dupla expressão dos sentimentos. (VIGOTSKI, 2009, p. 26).

O medo, por exemplo, se expressa não somente palidez, tremores ou

mesmo secura da garganta, mas mostra-se no fato de que todas as impressões

recebidas e as ideias que vêm à cabeça de uma pessoa, naquele momento, estão

cercadas de sentimentos que a domina. Os sentimentos influem na imaginação. As

imagens a as fantasias propiciam uma linguagem interior para o nosso sentimento.

O sentimento seleciona elementos isolados da realidade, combinando-os numa

relação que se determina internamente pelo nosso ânimo, e não externamente,

conforme a lógica das imagens. (VIGOTSKI, p.26).

Para Vigotski (2009), existe também uma relação inversa entre imaginação e

emoção:

Enquanto, no primeiro, os sentimentos influem na imaginação, nesse outro, inverso, a imaginação influi no sentimento. Esse fenômeno poderia ser chamado de lei da realidade emocional da imaginação. A essência dessa lei é formulada por Ribot do seguinte modo: „Todas as formas de imaginação criativa contêm em si elementos afetivos‟. Isso significa que qualquer construção da fantasia influi inversamente sobre nossos sentimentos e, a despeito de essa construção por si só não corresponder à realidade, todo sentimento que provoca é verdadeiro, realmente vivenciado pela pessoa, e dela se apossa. (p. 28).

Isso pode ser explicado trazendo o exemplo citado por este autor:

Entrando num quarto, ao entardecer, uma criança, ilusoriamente, percebe um vestido pendurado como se fosse alguém estranho ou um bandido que entrou na casa. A imagem do bandido, criada pela fantasia da criança, é irreal, mas o medo e o susto que vivencia são verdadeiros. (VIGOTSKI, 2009, p. 28).

Assim, o autor esclarece que o medo, as paixões, os finais felizes, a corrida

pela sobrevivência, perturbam-nos, inquietam-nos, apesar de serem acontecimentos

irreais, invenções da fantasia. Tudo ocorre porque as emoções provocadas pelas

imagens fantásticas de um livro são completamente reais e vividas profundamente

por nós de verdade.

37

A quarta e última forma de relação entre fantasia e realidade, liga-se

intimamente com essa descrita acima, mas, diferencia-se dela de maneira

substancial.

Para Vigotski (2009):

A sua essência consiste em que a construção da fantasia pode ser algo completamente novo, que nunca aconteceu na experiência de uma pessoa e sem nenhuma correspondência com algum objeto de fato existente, no entanto, ao ser externamente encarnada, ao adquirir uma concretude material, essa imaginação „cristalizada‟ que se fez objeto, começa a existir realmente no mundo e a influir sobre outras coisas. (p. 29).

Desta forma, essa imaginação vai tornar-se realidade, mesmo sendo algo

que nunca tenha acontecido em experiências anteriores.

Como forma de esclarecimento para explicar essa questão que envolve o

intelectual e o emocional, Vigotski (2009), cita Ribot:

Qualquer pensamento preponderante, diz Ribot, „é sustentado por alguma necessidade, ímpeto ou desejo, ou seja, por um elemento afetivo, pois seria um absurdo completo crer na constância de qualquer pensamento que, supostamente, se encontraria num estado puramente intelectual, em toda a sua aridez e frieza. Qualquer sentimento (ou emoção) preponderante deve concentrar-se numa ideia ou numa imagem que o encarne, sistematize-o, sem o que ele permanecerá num estado vago. [...] dessa forma, podemos ver que esses dois termos – pensamento preponderante e emoção preponderante - são quase equivalentes porque tanto um quanto o outro envolvem os dois elementos inseparáveis e indicam apenas a preponderância de um ou de outro‟. (p. 30).

Este autor refere-se à dimensão intrínseca, própria de uma esfera de

atividade, aquilo que constitui uma especificidade, um modo característico de operar,

aquilo que sustenta uma consistência interna e a prevalência de alguns sentimentos

historicamente construídos. Nesse contexto Vigotski (2009, p. 32), deixa a seguinte

explicação: “O conto ajuda a esclarecer uma relação cotidiana complexa; suas

imagens iluminam um problema vital, e o que não pode ser feito de um modo frio,

em prosa, realiza-se na história pela linguagem figurativa e emocional”.

38

5.3 O MECANISMO DA IMAGINAÇÃO CRIATIVA

Até aqui se pode perceber como a imaginação é um processo extremamente

complexo. Para Vigotski (2009), essa complexidade é justamente a principal

dificuldade no estudo do processo de criação. Desta forma, diz ele:

Bem no início desse processo, como já sabemos, estão sempre as percepções externas e internas, que compõem a base de toda experiência. O que a criança vê e ouve, dessa forma, são os primeiros pontos de apoio para a sua futura criação. Ela acumula material com base no qual, posteriormente, será construída a sua fantasia. Segue-se, então, um processo complexo de reelaboração desse material. (p.36).

Assim, a criança passa a cumular material, no qual, mas adiante, será de

grande uso na construção de sua fantasia. A dissociação e a associação de partes

percebidas fazem parte deste processo. A dissociação consiste em fragmentar esse

todo complexo em partes, algumas delas se destacam das demais, umas

conservam-se, enquanto outras são esquecidas. Dessa forma, a dissociação é uma

condição necessária para a atividade posterior da fantasia. (VIGOTSKI, p. 36).

Vigotski (2009), ainda esclarece que:

A paixão das crianças pelo exagero, do mesmo modo que a dos adultos, tem fundamentos internos muito profundos, que em parte, consistem na influência que o nosso sentimento interno tem sobre impressões externas. Exageramos porque queremos ver as coisas de forma exacerbada, porque isso corresponde à nossa necessidade, ao nosso estado interno. A paixão das crianças pelo exagero é maravilhosamente registrada em imagens de contos. (p.37).

Nesse momento Vigotski (2009) chama a atenção para as discussões em

torno das ciências e suas complexidades. Diz que estas, não reprimem a

imaginação, mas abre áreas mais amplas para a sua criação. Citando astronomia,

geologia, física, química, mostrando que os exageros tanto são importantes e

necessários para a arte quanto para as ciências. Discute-se então, a questão da

dissociação, pois que, o que compõe os processos de imaginação é a associação,

que é a união dos elementos dissociados e modificados. Que tanto podem ser a

união subjetiva de imagens, quanto à cientificamente objetiva.

39

O último princípio da imaginação é a combinação de imagens individuais,

sua organização num sistema, a construção complexa. “Mas a atividade da

imaginação criadora não para aqui. Como já destacamos, o seu circulo completo é

concluído quando se encarna ou se cristaliza em imagens externas”. (VIGOTSKI, p.

39).

Para explicar melhor este processo de cristalização e imaginação,

precisamos entender a necessidade do homem de se adaptar ao meio em que vive.

Ele precisa de desafios para que sua criação entre em ação. Portanto, na base da

criação há sempre uma inadaptação da qual surgem necessidades, anseios e

desejos. (VIGOTSKI, 2009).

Todo esse movimento aflora o processo de imaginação. Para o autor, a

criação é um processo de herança histórica em que cada forma que sucede é

determinada pelas anteriores. Por mais fantasiosa que sejam as imaginações, no

fundo elas tem um coeficiente social. Porque qualquer inventor é sempre um fruto do

seu tempo e de seu meio. “Nenhuma invenção ou descoberta científica pode emergir

antes que aconteçam as condições materiais e psicológicas necessárias para seu

surgimento”. (VIGOTSKI, 2009, p. 42).

Para Vigotski (2009), as classes sociais privilegiadas detêm um percentual

bem maior de ”inventores na área da ciência, da técnica e das artes porque são

nessas classes que estão presentes todas as condições necessárias para a

criação.” (p.42).

5.4 VIGOTSKI E A DISCUSSÃO DA IMAGINAÇÃO DA CRIANÇA

Para esse teórico a atividade da imaginação é muito complexa, dependendo

de uma série de fatores. Devido a isso, essa atividade é diferente na criança e no

adulto. Em cada período do desenvolvimento infantil a imaginação criadora funciona

de modo peculiar, caracterizando pelo momento de infância vivido pela criança.

Anteriormente vimos que a imaginação depende da experiência; e na

criança essa experiência constrói e cresce de forma gradual, diferenciando-se da do

adulto. Os interessesdos adultos são distintos dos interesses das crianças, por isso,

compreende-se por que a imaginação delas funcione diferente, uma vez que os

40

estímulos recebidos do meio podem influenciar de forma diversa no processo de

criação.

Em relação à questão da diferença da imaginação da criança e a do adulto,

Vigotski (2009), ainda traz a seguinte consideração:

Até hoje, ainda existe a opinião de que a imaginação na criança é mais rica do que no adulto. A infância é considerada a época em que a fantasia é mais desenvolvida e, de acordo com essa visão, à medida que a criança se desenvolve, sua imaginação e a força de sua fantasia diminuem. Formou-se essa visão porque uma série de observações da atividade da fantasia apresenta razões para essa conclusão. [...] a obra da imaginação infantil diverge forte e nitidamente da experiência do adulto, o que permitia chegar à conclusão de que a criança vive mais tempo num mundo fantasioso do que no mundo real. Ainda, são conhecidas as imprecisões, as alterações da experiência real, o exagero e, finalmente, o gosto pelos contos e histórias fantásticas, características da criança. (p. 44).

No entanto, essas afirmações sobre a fantasia na idade infantil, ao ser

analisadas pelo prisma cientifico, esse ponto de vistanão encontra confirmação,

segundo Vigotski (2009), uma vez que:

Sabemos que a experiência da criança é bem mais pobre do que do adulto. Sabemos, ainda, que seus interesses são mais simples, mais elementares, mais pobres; finalmente, suas relações com o meio também não possuem a complexidade, a sutileza e a multiplicidade que distinguem o comportamento do homem adulto e que são fatores importantíssimos na definição da atividade da imaginação. A imaginação da criança, como está claro, não é mais rica, e sim mais pobre que a do homem adulto; ao longo do processo de desenvolvimento da criança, desenvolve-se também a sua imaginação, que atinge a sua maturidade somente na idade adulta. Eis por que os produtos da verdadeira imaginação criadora em todas as áreas pertencem somente à fantasia amadurecida. (VIGOTSKI, 2009, p.44).

Ribot, citado por Vigotski (2009) em seu estudo sobre a imaginação criadora,

apresenta a curva do desenvolvimento da imaginação, permitindo-nos compreender

“a peculiaridade da imaginação infantil5, da do homem adulto e da que acontece no

período de transição”. (p.45).

Nesse processo de discussão, Vigotski (2009) afirma que o desenvolvimento

do intelecto começa mais tarde e ascende devagar, porque exige um maior acúmulo

de experiência e uma reelaboração mais complexa. No entanto, há um momento em

que o desenvolvimento da imaginação e do desenvolvimento da razão coincide.

5 Se a imaginação vai sendo afetada pelas formas racionais de pensar, historicamente construídas, ela continua

intimamente articulada à realidade e impregnada pela emoção.

41

Porém, o desenvolvimento da imaginação e o desenvolvimento da razão divergem

bastante na infância.

Vigotski acrescenta que:

A criança é capaz de imaginar bem menos do que um adulto, mas ela confia mais nos produtos de sua imaginação e os controla menos. Por isso, a imaginação na criança, no sentido comum e vulgar dessa palavra, ou seja, de algo que é irreal e inventado, é evidentemente maior do que no adulto. (2009 p. 46).

Assim, nesse processo, a imaginação passa a se adaptar às condições

racionais, passando a ser uma imaginação mista.De fato, onde quer que se

conserve uma vida criativa podemos dizer que aí existe lugar para a imaginação.

Vigotski (2009) faz a seguinte observação:

A atividade de imaginação, na forma como se manifestava na infância, retrai-se na adolescência. É muito fácil perceber isso quando, numa criança dessa idade, como regra geral ou na maioria dos casos, desaparece a paixão pelos desenhos. Apenas algumas, de maneira isolada, continuam a desenhar e, em sua maioria, são as mais talentosas ou estimuladas pelas condições externas com aulas especiais de desenho etc. (p.48-49).

Nessa questão dos talentos, o próprio Vigotski (2009, p. 51), faz a seguinte

pergunta: “a atividade da imaginação não depende do talento?” No que ele vai

opinar:

Existe uma opinião muito difundida de que a criação é o destino de eleitos e apenas quem tem o dom de um talento especial vai desenvolvê-la, podendo considerar-se convocado para a criação. Esse postulado não é correto, como já tentamos explicar. Se compreendermos a criação, em seu sentido psicológico verdadeiro, como a criação do novo, será fácil chegar à conclusão de que a criação é o destino de todos, em maior ou menor grau; ela também é uma companheira normal e constante do desenvolvimento infantil. (VIGOTSKI, 2009, p. 51).

Vigotski (2009) cita adiante, na infância, as crianças prodígio6,que bem cedo

revelam um rápido amadurecimento de algum dom especial. Para ele à medida que

elas amadurecem perdem seu dom, as especificidades comuns da criação infantil

são esclarecidas de um modo melhor com as crianças comuns e normais. Para ele,

a verdadeira criação grandiosa ainda está distante desses sinais de genialidade

6 Outro tema polêmico e pouco desenvolvido no texto. A questão do dom, do amadurecimento precoce e da

genialidade relacionados à patologia demanda estudos mais profundos.

42

futura, são apenas relâmpagos, que com muita antecedência, anunciam

tempestades, são indicações para o futuro desabrochar dessa atividade.

Na sequência Vigotski traz uma breve discussão sobre o desenvolvimento

da percepção e da atenção pela abordagem da formação social da mente, e

dasfunções psicológicas humanas.

5.5 A FORMAÇÃO SOCIAL DA MENTE - O DESENVOLVIMENTO DA PERCEPÇÃO E DA ATENÇÃO

Segundo Vigotski (1989)a criança percebe as coisas do mundo não apenas

pelos olhos, mas também pela fala, tornando-se esta, a parte essencial do

desenvolvimento cognitivo. Com isso os mecanismos intelectuais que tem relação

com a fala, vão adquirindo as suas funções. Para esse autor:

O papel da linguagem na percepção é surpreendente, dadas as tendências opostas implícitas na natureza dos processos de percepção visual e da linguagem. Elementos independentes num campo visual são percebidos simultaneamente; nesse sentido, a percepção visual é integral. A fala, por outro lado, requer um processamento sequencial. Os elementos, separadamente, são rotulados e, então, conectados numa estrutura de sentença, tornando a fala essencialmente analítica. (VIGOTSKI, 1989, p. 37).

Na sequência dessa explicação, sobre o papel da linguagem na percepção

como componente do desenvolvimento cognitivo da criança, esse autor ainda

discute a questão da percepção humana que surge desde muito cedo, que é a

percepção de objetos reais. Para isso, Vigotski (1989) dá a seguinte conotação:

Por esse termo eu entendo que o mundo não é visto simplesmente em cor e forma, mas também como um mundo com sentido e significado. Não vemos simplesmente algo redondo e preto com dois ponteiros; vemos um relógio e podemos distinguir um ponteiro do outro. (p.37).

Desta forma é possível entender quando Vigotski faz a seguinte abordagem:

...a maneira pela qual, crianças pequenas descrevem uma figura, difere em estágios sucessivos de seu desenvolvimento. Uma criança com dois anos de idade, comumente limita sua descrição a objetos isolados dentro do conjunto da figura. Crianças mais velhas descrevam ações e indicam as relações complexas entre os diferentes objetos de uma figura. (1989, p. 36).

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Assim, as crianças menores têm a percepção dos objetos isoladamente,

para depois mais tarde, ter a percepção da figura como um todo. Para Vigotski

(1989, p. 52) “Cada uma dessas transformações cria as condições para o próximo

estágio e é, em si mesma, condicionada pelo estágio precedente; dessa forma, as

transformações estão ligadas como estágios de um mesmo processo e são, quanto

à sua natureza, históricas.” Nessa mesma linha de pensamento, há uma reflexão de

Vigotski, relacionada ao processo geral do desenvolvimento, quando diz:

Podem-se distinguir, dentrode um processo geral de desenvolvimento, duas linhas qualitativamente diferentes de desenvolvimento, diferindo quanto à sua origem: de um lado, os processos elementares, que são de origem biológica; de outro, as funções psicológicas superiores, de origem sócio-cultutal. A história do comportamento da criança nasce do entrelaçamento dessas duas linhas. (VIGOTSKI, 1989, p. 52).

Vigotski dá essa explicação para o entendimento de que seria impossível o

estudo das funções psicológicas sem as suas raízes biológicas, em que ele as

chama de pré-história. Acrescentando que: “As raízes do desenvolvimento de duas

formas fundamentais, culturais, de comportamento, surge durante a infância: o uso

de instrumentos e a fala humana. Isso, por si só, coloca a infância no centro da pré-

história do desenvolvimento cultural”. (VIGOTSKI, 19889, p. 52).

Nessa progressão de análise e discussão Vigotski vai apresentar seu estudo

sobre a zona de desenvolvimento proximal. Explicando que esta acontece no

intervalo entre o conhecimento real e o conhecimento potencial. Isto é, a zona de

desenvolvimento proximal é a distância entre aquilo que a pessoa já sabe

(conhecimento real), já tem a independência para a solução de problemas, com

aquilo que ela tem de potencial para aprender, com a mediação de um adulto, ou

colegas mais capazes. Tudo isso via educação, nada mais é, do que partir do

conhecimento prévio da criança e ir estimulando-a para a aquisição do seu

potencial. (VIGOTSKI, 1989).

Para este autor o desenvolvimento é impulsionado pela linguagem. É o

processo de aprendizagem que gera e promove o desenvolvimento das estruturas

mentais superiores.

Vigotski (1989) cita a pesquisadora americana Dorothea McCarthey, em que

esta, mostra a criança entre as idades de três e cinco anos em dois grupos de

funções:

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Aquelas que as crianças já dominam, e aquelas que elas só podem pôr em açãosob a orientação, em grupos, e em colaboração umas com as outras, ou seja, que elas não dominaram de forma independente. O estudo de McCarthy demonstrou que esse segundo grupo de funções situa-se no nível de desenvolvimento real de crianças de cinco a sete anos de idade. Aquilo que as crianças só conseguiriam fazer somente sob orientação, em colaboração, e em grupos entre as idades de três e cinco anos, conseguiriam fazer de forma independente quando atingissem as idades de cinco a sete anos. (VIGOTSKI, 1989, p.98).

Essas inserções de Vigotski sobre a questão do desenvolvimento mental da

criança nos faz refletir sobre a necessidade então, de um aprendizado

adequadamente organizado em que resulta em desenvolvimento mental. Vigotski

(1989, p. 101) ainda acrescenta o seguinte: “Assim, o aprendizado é um aspecto

necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas

culturalmente humanas”. Portanto, para esse autor: ...”o aspecto mais essencial de

nossa hipótese é a noção de que os processos de desenvolvimentos não coincidem

com os processos de aprendizado. [...] desta sequenciação resultam, então, as

zonas de desenvolvimento proximal.” (p. 102).

Na próxima parte será apresentada um pouco da vida de quem faz os contos

e as teorias.

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6 E AGORA... CONTANDOUM POUCO DA VIDA DE QUEM FAZ OS CONTOS E AS TEORIAS

6.1 BÁRBARA VASCONCELOS DE CARVALHO (1915-2007)

Figura 1 – Bárbara Vasconcelos de Carvalho

Fonte: http://focusantologiapoetica.blogspot.com.br

A Focus — Antologia poética rende este ano (2008) merecida homenagem póstuma a Bárbara Vasconcelos de Carvalho por tudo que realizou na educação e na literatura infantil brasileira. Falecida ano passado, ela revolucionou seu tempo. Licenciada em Letras Neolatinas, pela Faculdade de Filosofia da Ufba, Bárbara pontificou mais a sua magnífica performance nos vários setores de ensino no panorama educacional de Salvador. Na década de 50, já em São Paulo, reestruturou o programa de Língua Portuguesa e Literatura a convite da Secretaria de Educação, e se debruçou por vocação sobre o estudo da literatura infanto-juvenil, tornando-se pioneira deste segmento da literatura. Neste período viajou pelo Brasil e países da América Latina e publicou o seu primeiro Compêndio sobre a Literatura Infantil. Membro Fundadora da Academia Brasileira de Literatura Infantil e Juvenil, além de pertencer à Academia Baiana de Educação, ocupou, na Academia Brasileira de Educação, a vaga do amigo Adroaldo Ribeiro Costa. Bárbara tem seus versos no coração das crianças do Brasil e a sua imagem na mente de todos que a admiraram e a amaram. http://focusantologiapoetica.blogspot.com.br/2010/03/barbara-vasconcelos-de-carvalho-focus.html: Acessado em 10 de maio de 2014.

6.2 CLÉO BUSATTO Figura 2: Cléo Busatto

Fonte: http://www.editorabiruta.com.br/autor/cleo-busatto

É escritora e contadora de histórias. Em 2001 publicou o primeiro livro infantil com o título de Dorminhoco. E daí, tomou gosto pela literatura infantil. Escrever e contar histórias são a forma que Cléo encontrou para conversar mais de perto com os pequenos leitores. Cléo é atriz, já trabalhou com

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diretores de teatro e autores muito conhecidos pela qualidade de trabalho que realizam. Adora viajar e das viagens traz histórias para os livros e contações. Ela sabe que contar história é uma arte que exige pesquisa e estudo. Em suas oficinas já capacitou mais de 40.000 professores, pais e atores. E contou histórias para mais de 60.000 pessoas. Cléo nasceu em Santa Catarina e vive em Curitiba onde desenvolve seu trabalho. Fez mestrado em Teoria Literária na Univesidade Federal de Santa Catarina. Já publicou 7 livros infantis. Dentre eles estão: Contar e Recontar: pequenos segredos da narrativa - 2003; Pedro e o Cruzeiro do Sul - 2006; A arte de contar histórias no século XXI - 2006. O livro Pedro e o Cruzeiro do Sul ganhou o Prêmio do Salão Internacional do desenho em 2007 pelas ilustrações de Renato Alarcão. Se você quiser conhecer melhor o trabalho dessa autora, visite o site:www.cleobusatto.com.br http://www.editorabiruta.com.br/autor/cleo-busatto/: Acessado em 10/05/2014.

6.3 FANNY ABRAMICH

Figura 3: Fanny Abramovich

Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa

Mais de 40 títulos para crianças e adolescentes estão no currículo da escritora Fanny Abramovich, que também já esteve "do lado de cá" da sala de aula: ela foi professora de Educação Infantil e arte-educadora por mais de 30 anos. Seus primeiros livros instigavam professores a repensar seu papel, como em Que Raio de Professora Sou Eu (Ed. Scipione). Hoje, no entanto, é ficção o que ela mais gosta de escrever.

Fanny Abramovich é bacharel e licenciada em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP. Foi professora de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Magistério, além de dar aulas em diversas faculdades (Belas Artes, Anhembi, FAAP), também na pós-graduação. Como orientadora pedagógica, trabalhou no GIBSA, CEA, Escola Experimental Vera Cruz, Teatro Infantil do Teatro de Arena, entre outros centros de aprendizagem. Deu mais de cem cursos e proferiu cerca de 350 palestras, em todo o país, centrados prioritariamente nos temas: arte e educação, teatro e educação, teatro infantil, criatividade na educação e literatura infanto-juvenil. Colaborou em projetos voltados para crianças e jovens, propostos por entidades como SESC, ARTE GLOBAL, FUNARTE, FUNDACEN, UNESCO e Secretarias de Educação e Cultura de vários Municípios e Estados do Brasil. http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/pratica-pedagogica/livro-precisa-ser-vicio-423573.shtml: Acessado em 10/05/2014.

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6.4 LEV VIGOTSKI Figura 4 – 1933-Lev Semionovitch Vigotski com sua filha Gita.

Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/formacao/lev-vygotsky-teorico

O psicólogo bielo-russo Lev Vygotsky (1896-1934) morreu há mais de 70 anos, mas sua obra ainda está em pleno processo de descoberta e debate em vários pontos do mundo, incluindo o Brasil. "Ele foi um pensador complexo e tocou em muitos pontos nevrálgicos da pedagogia contemporânea", diz Teresa Rego, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Ela ressalta, como exemplo, os pontos de contato entre os estudos de Vygotsky sobre a linguagem escrita e o trabalho da argentina Emília Ferreiro, a mais influente dos educadores vivos.

A parte mais conhecida da extensa obra produzida por Vygotsky em seu curto tempo de vida converge para o tema da criação da cultura. Aos educadores interessa em particular os estudos sobre desenvolvimento intelectual. Vygotsky atribuía um papel preponderante às relações sociais nesse processo, tanto que a corrente pedagógica que se originou de seu pensamento é chamada de socioconstrutivismo ou sociointeracionismo. http://revistaescola.abril.com.br/formacao/lev-vygotsky-teorico-423354.shtml Acessado dia 13/05/2014. http://geografiadainfancia.blogspot.com.br/2011/08/notas-biograficas-e-bibliograficas.html: Acessado dia 13/05/2014

6.5 MARIA ANTONIETA ANTUNES CUNHA

Figura 5 – Maria Antonieta Antunes Cunha

Fonte: http://www.prolivro.org.br/ipl/publier4.0/dados/anexos

Maria Antonieta Antunes Cunha é professora aposentada da Universidade Federal deMinas Gerais (UFMG), com mestrado em Educação e Doutorado em Letras. Lecionou nos Cursos de Graduação de Letras, Biblioteconomia, Educação e Comunicação da UFMG. Coordena os cursos de Especialização da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais em Literatura Infantil e Arte-Educação. Além de diversos projetos culturais e de fomento à leitura, criou e dirigiu a Biblioteca Pública Infantil e Juvenil de Belo Horizonte os projetos Cantinhos de Leitura e Organização de

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Bibliotecas Escolas. Foi Secretária Municipal de Cultura de Belo Horizonte, coordenadora do Centro de Extensão da Faculdade de Letras da UFMG,curadora do I Salão do Livro de Minas Gerais, do Encontro Internacional de Literatura Latino Americana, do II Salão do Livro de Minas Gerais e do Encontro Internacional de Literaturas em Língua Portuguesa. Foi integrante do Conselho Curador e do Conselho Diretor da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil e presidente da Câmara Mineira do Livro. Foipresidente da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte. Atualmente é Diretora do Livro Leitura e Literatura no MINC. http://www.prolivro.org.br/ipl/publier4.0/dados/anexos/3182_3.pdf: Acessado em 10/05/2014.

6.6 MARIA BETTY COELHO SILVA Figura 6– Maria Betty Coelho Silva

Fonte: www.fpc.ba.gov.br/contadora-de-historia-mais-antiga-da-bahia

Maria Betty Coelho Silva nasceu em Alagoinhas, na Bahia, em 24 de abril de 1923 e graduou-se em Pedagogia. Seu amor pelos livros e histórias lhe rendeu a homenagem de ter uma biblioteca com seu nome: a Biblioteca Betty Coelho, inaugurada no Bairro Boca do Rio, em Salvador, Bahia, no dia 12 de março de 2005, data em que é comemorado o Dia do Bibliotecário.

Sua trajetória de vida é cheia de histórias que atraem e encantam crianças, adolescentes e adultos, que juntos com ela percorrem lindos caminhos. Falam com animais, entram em castelos encantados, vivem maravilhosas aventuras, vencem obstáculos e encontram exemplos e soluções para as suas realidades.

Essas são algumas das principais características da professora Maria Betty Coelho Silva, conhecida como Betty Coelho, que durante mais de 50 anos formou gerações e gerações de contadoras e contadores de histórias. Na próxima sexta-feira, dia 26 (abril), ela recebe uma homenagem na Biblioteca Juracy Magalhães Júnior (Rio Vermelho) pelo aniversário de 90 anos (2013). Segundo alunos, amigos e admiradores, Betty Coelho tem uma grande preocupação: ―fazer a

criança feliz por meio das histórias narradas‖. www.fpc.ba.gov.br/contadora-de-historia-mais-antiga-da-bahia: Acessado dia 10/05/2014

6.7REGINA ZILBERMAN Figura 7 – Regina Zilberman

Fonte: www.ube.org.br/biografias

Nascida em Porto Alegre, em 1948, Regina Zilberman licenciou-se em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (RGS), doutorou-se em Romanística na Universidade de Heidelberg e realizou pós-doutoramento no Center for Portuguese & Brazilian Studies da Brown University. Foi professora de Teoria da Literatura e Literatura Brasileira na Pontifícia Universidade

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Católica de RGS (PUCRS) e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Pertenceu ao Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia do Estado do RGS,dirigiu o Instituto Estadual do Livro do RGS e a Faculdade de Letras da PUCRS (2002 e 2004).

Recebeu, em 2000, na Universidade Federal de Santa Maria, o título de Doutor Honoris Causa. Acaba de ser eleita presidente da Associação Internacional de Lusitanistas pela segunda vez consecutiva. Regina Zilberman é hoje uma das maiores especialistas em literatura infanto-juvenil. Possui mais de 20 livros publicados e premiados na área pedagógica e educacional. Algumas de suas obras: As Pedras e o Arco: Fontes Primárias, Teoria e História da Literatura;Estética da Recepção; Como e por que Ler a Literatura Infantil Brasileira; A literatura infantil na escola; Fim do Livro, fim dos leitores?; Leitura em crise na escola: as alternativas do professor.

Na sequência, é apresentadaa metodologia, como sétima parte deste

trabalho.

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7METODOLOGIA

Este trabalho tem suas características em uma pesquisa descritiva de

natureza qualitativa, envolvendo levantamentos bibliográficos e pesquisa de

campo,com observação assistemática e observação direta intensiva e participante

da própria pesquisadora, como docente de educação infantil, de uma escola

particular de Curitiba, no Bairro Champagnat.

A pesquisa evidenciou-se em três momentos distintos: o primeiro aconteceu

no início do segundo semestre do ano de 2013, com a minha turma de 15 crianças

do maternal, na faixa etária entre 2 a 3 anos de idade, em um dos momentos diários

danossa contação de histórias,de forma assistemática não estruturada, que será

apresentada por mim, na metodologia deste trabalho, pelas narrativas das histórias:

A HISTÓRIA DE LINO; CHAPEUZINHO AMARELO e a HISTÓRIA DOS TRÊS

PORQUINHOS. O segundo momento, com a mesma turma, já no final do semestre

de 2013, coma contação da história de CHAPEUZINHO VERMELHO, feita por mim

– a pesquisadora - e o recontar dessa mesma história, pelas crianças, de

formasistemática quanto à observação, que será apresentada pela narrativa de

recontação da história feita por duas crianças; e o terceiro momento, aconteceu nos

meados do primeiro semestre de 2014, com12 crianças, de outra turma de maternal,

na mesma faixa de idadeentre 2 a 3 anos,pela contação da história de BRANCA DE

NEVEfeita por mim, professora e pesquisadora. Justifico a continuidade da pesquisa

com outra turma, devido ao novo semestre. Dei continuidade ao processo da

pesquisa quando percebi pelas práticas, que essas crianças já estavam prontas para

contar e recontar uma história, com características semelhantes à turma de 2013.

E assim aconteceu: Para essas observações, começo então, a buscar os

teóricos e a elaborarquestões envolvendo as capacidades cognitivas, tais

como:percepção, memória, pensamento e linguagem, criação, fantasia, atenção,

raciocínio etc.

Tratando-se de uma observação atenta e sistemática se fizeram

acompanhar de anotações e fichamentos, gravações de áudio, como também de

vídeo para o desenvolvimento do estudo em questão.

A pesquisa de campo, segundo Marconi e Lakatos (1982):

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...é aquela utilizada com o objetivo de conseguir informações e/ou conhecimento acerca de um problema [...] O interesse da pesquisa de campo está voltado para o estudo de indivíduos, grupos, comunidades, instituições e outros campos, visando à compreensão de vários aspectos da sociedade. (1982, p. 64).

Quanto à pesquisa de observação, para Marconi e Lakatos:

A observação é uma técnica de coleta de dados para conseguir informações e utiliza os sentidos na obtenção de determinados aspectos da realidade. Não consiste apenas em ver e ouvir, mas também em examinar fatos ou fenômenos que se desejam estudar. É um elemento básico de investigação científica, utilizado na pesquisa de campo e se constitui na técnica fundamental da Antropologia.A observação ajuda o pesquisador a identificar e a obter provas a respeito de objetivos sobre os quais os indivíduos não têm consciência, mas que orientam seu comportamento. Desempenha papel importante nos processos observacionais, no contexto da descoberta, e obriga o investigador a um contato mais direto com a realidade. É o ponto de partida da investigação social. (2003, p. 191).

Para Andrade (1999),

A observação direta intensiva: baseia-se nas técnicas de observação propriamente dita e nas entrevistas. Modalidades de observação direta intensiva: sistemática – quando planejada; assistemática – não estruturada; participante – quando o pesquisador participa dos fatos a serem observados. (p.118).

Para obter subsídios teóricos sobre os trabalhos em relação ao tema, foram

utilizados autores que discutem a arte de contar histórias, a fantasia e a magia

presentes na imaginação dos pequenos ouvintes, como:Carvalho (1989); Coelho

(1989) e (1999); Abramovich (1989), Busatto (2007); Zilbermann (1985); e Cunha

(1997).Para o teórico Vigotski (2010) coubesustentaçãodas teorias sobre as

questões da imaginação e criação na infância, pensamento e linguagem, dentre

outros autores que foram pesquisadospara o esclarecimento de dúvidas e para obter

informações e conhecimentos a respeito do assunto da pesquisa. Assim,

A pesquisa bibliográfica não é mera repetição do que já foi dito ou escrito sobre certo assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras.(LAKATOS e MARCONI 1991, p.43).

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7.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS - LEVANTAMENTO DOS DADOS E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Assim, a pesquisa aconteceu com os dois grupos de 15 e 12 crianças

consecutivamente. É apresentada inicialmente a dinâmica da professora com as

crianças no seu diaadia de sala de aula na contação de histórias, numa observação

assistemática em forma de narrativa. Para a sequência das duas observações

posteriores, foi utilizado como instrumento para a pesquisa de observação, um

roteiro pré-estabelecido, dentro do que segue:

FICHA ORGANIZADA PARA LEVANTAMENTO DOS DADOS

1 As crianças ouvindo a história- Local da contação: sala de aula, numa formação

de meio circulo. As crianças com liberdade para interromper e fazer perguntas e

questionamentos.

2 Observação das capacidades cognitivas que serão apresentadas pelas

crianças no decorrer da contação e recontação das histórias ao ouvir eao

recontar uma história: participação; expressão facial; expressões corporais;

percepção visual e auditiva; pensamento e linguagem, imaginação, fantasia,

emoção, afetividade, memória visual e auditiva; conteúdos da história; concentração

e criatividade.

3 No sentido da linguagem: vocabulário, sequência lógica, esclarecendo o

pensamento, expressão oral;

7.2 A DINÂMICA DA PROFESSORA COM AS CRIANÇAS- REVELANDO UMA PRÁTICA PEDAGÓGICA: OS CONTOS QUE EU CONTO NA EDUCAÇÃO INFANTIL: ERA UMA VEZ...

No ano de 2013, ao contar histórias infantis, como: Chapeuzinho Vermelho,

Os Três Porquinhos, Cinderela, Rapunzeldentre outras,deparei-me com as

expressões espontâneas das crianças e seus comentários ao ouvir e ao recontar

histórias. Eram quinze crianças, com duas auxiliares que me ajudavam; uma pela

53

manhã e outra no período da tarde. Assim como eu, essas auxiliares também

admiravam, ao ver a reação das criançaspequenas, ouvindo histórias.

Era no meio da tarde que acontecia o momento da leitura. Todos os dias as

crianças pediam para que eu contasse uma história; algumas até traziam seus

livrinhos, pedindo para queeu lesse aquilo que muitas vezes elas mesmas haviam

escolhido. Podiaaté ser a mesma história do dia anterior, parecia que ficavam

esperando para ver se ao contar novamente, iriamapareceralgumas surpresas.

E assim, acontecia: quando começava acontar a história, não ouvia mais

nem sequer um barulhinho, todos ficavam quietos, alguns, até de boquinhas abertas,

olhos atentos, esperando ansiosos pela expressão: Era uma vez... e quando

começava a leitura: ―Era uma vez em uma terra muito, muito distante‖... Ouviam-se

alguns suspiros, ―hããããã‖,o peito de alguns se enchia de ar, quem sabe imaginando

onde possa ficar esta terra tão distante!

A curiosidade palpitava na sala por saber o desfecho da história. E também

a minha curiosidade aumentava para saber o que se passava naquelas cabecinhas

ao ouvir uma história cheia de magia; um vilão tão malvado como o lobo mau! Será

que essa história podia somar algo em suas vidas? O que representava toda essa

magia e esse medo? Minha curiosidade ia aumentando a cada recontar dessas

histórias; a magia e a fantasia que se expressavam em seus olhinhos, despertavam

cada dia mais e minha curiosidade. Por que tanta vontade em ouvir repetidas vezes

a mesma história, e o mesmo: “Era uma vez...‖ Os teóricos poderão me responder!

E agora, Coelho (1999) traz sua ajuda, citando Alícia Prieto (1984. p. 57):

O „Era uma vez‟ levanta a cortina de um mundo novo que, se escapa à realidade imediata, suscita em troca uma realidade simbólica dotada de uma intensidade tal que as reações que nela se dão podem tomar um matiz à vezes fascinante. [...] Todos os elementos são sugeridos pela voz e pela mímica do narrador, que esquece „seu‟ rosto, dissimula „seu‟ corpo, esquece „sua‟ voz, para converter-se, todo ele, em pincel e paleta, cor e som, forma e emoção. E a emoção chega aos pequenos.

E Vigotski acrescenta:

O conto ajuda a esclarecer uma relação cotidiana complexa; suas imagens iluminam um problema vital, e o que não pode ser feito de um modo frio, em prosa, realiza-se na história pela linguagem figurativa e emocional. (2009, p. 32).

E vem a primeira história... Era uma vez...

54

A) A HISTÓRIA DE LINO

Todos os finais de tarde nos reuníamos para mais uma leitura e mais uma

aventura;e essa, era uma história cheia de imagens, e como sempre, todos ficavam

atentos olhando para a primeira imagem do livro, um pequeno brinquedinho com sua

amiguinha coelha, de nome “Lua”, também um brinquedo, que tinha uma enorme luz

na barriga, e quando ficava feliz, aquela luz acendia! Essa história se passava numa

loja de brinquedos. Todos a ouvem atentamente, quando... na metade da história,

Lino perde sua amiga; nem desconfiou que ela fora vendida. A aluna Helena com o

olhar triste, fala com a voz quase que melancólica, e exclama: “coitadinho!” Os olhos

dessa menina meiga e carinhosa se entristecem. Mas logo o personagem Lino é

comprado por uma menininha chamada Estrela, este é o momento quando ele

encontra uma nova amiga, que brinca, dá risadas e o faz feliz por um curto período

de tempo. Pois ele não consegue esquecer sua amiga Lua.

O que se via nas crianças, nesse momento, era uma expressão, quase que

geral, de alivio. A Helena achava-a linda! E logo esboça: “Nossa! Hummmm!” Todos

queriam ver de perto as imagens da Estrela,quando esta convida Lino para ver a

adorável noite, e ele se depara com uma grande lua rodeada de estrelas. Estrela diz

a Lino: “Esta é a Lua!” Lino fica muito feliz ao avistar sua amiga, deduzindo o quanto

ela deveria estar feliz, pois sua barriga brilhava incandescente.

As crianças admiram a imagem da lua e das estrelas. E no final desta

história Lino vai à janela todas as noites para admirar lua, e hoje, noite de lua

crescente, parece que ela está sorrindo para Lino!

E a história chega ao fim, mas os pequenos acrescentam:e viveram felizes

para sempre...

A impressão que se temdessas experiências é a de que, cada criança está

revivendo, do seu jeito, a história, viajando com aquelas imagens, e com a doce voz

que faz a magia fluir dentro da sala.

Observa-se que nesses momentos as crianças expressam: afetividade,

capacidade de percepção auditiva e visual, concentração, imaginação, criatividade,

fantasia, emoçãoe tantas outras capacidades cognitivas e tantas outras capacidades

estimuladas pela contação da história.

Carvalho traz uma explicação:

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E mais uma vez a fantasia faz a história da realidade, [...] Assim é, sempre: a literatura, a imaginação criadora, descobrindo, inspirando e antecipando-se à Ciência, à realidade, porque nada se realiza sem a força criadora da imaginação. (1989, p. 65).

E depois, vem a segunda historinha que as crianças já a ouviram muitas e

muitas vezes...

B) CHAPEUZINHO AMARELO

Antes pergunto: porque vocês querem ouvir de novo a história de

Chapeuzinho Amarelo? Ouço a resposta: - por causa do lobo mau, ela tinha medo

de trovão e do lobo! É isto que ouço quando questiono o motivo de ter que recontar

a história que eles já conhecem, sabem alguns trechos de cor, mas ficam ouvindo-a

com se fosse pela primeira vez.

E Coelho (1999), responde ao meu questionamento:

Só escutando repetidamente um conto de fadas e sendo dado tempo e oportunidade para demorar-se nele, uma criança é capaz de aproveitar integralmente o que a história tem a lhe oferecer com respeito à compreensão de si mesma e de sua experiência de mundo. [...] Redirecionar os pensamentos da criança prematuramente para uma segunda história pode matar o impacto da primeira, enquanto fazê-lo numa época posterior, pode aumentá-lo. (p.55).

E Coelho (1999) tem mais uma resposta para esses pequenos de 3 anos:

Para os pré-escolares, as histórias devem ter enredo simples, vivo e atraente, contendo situações que se aproximam o mais possível da vida da criança, de sua vivência afetiva e doméstica, de seu meio social, de brinquedos e animais que a rodeiam, humanizados. Assim, ela pode integrar-se com os personagens, consegue „viver‟ os enredos e sentir-se no „lugar‟ em que os episódios narrados ocorrem. Até os três anos, quando as crianças se encontram na fase pré-mágica, as histórias devem conter, de preferência, muito ritmo e repetição. (p. 16)

E começando a história... A Chapeuzinho Amarelo é uma menininha que

tinha medo de tudo até da própria sombra. Mas o que mais a amedrontava era o tal

do lobo mau. A aluna Manu fica paralisada ouvindo a história; ela tem medo de

trovão e também do lobo mau. Quando na história a personagem se depara com o

lobo mau, Manu dá um pulo, faz uma carinha de espanto fazendo com a boca o som

do lobo, gruuuuuuu! Olhando firmemente para a enorme imagem do lobo mau.

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Quando no meio da história, o lobo mau vira um bolo, a felicidade é geral.

Os olhares se encontram, indicandoum sinal de alivio, então era um lobo mau feito

de bolo! E o burburinho que logo se espalha é das lembranças das festas de

aniversários. Mas, dizem também que Chapeuzinho Amarelo nunca poderia comer

aquele bolo, pois era feito do lobo mau.

Manu diz não ter medo do lobo, só um pouquinho. E começa a conversa

quase no fim da história: - onde o lobo mora? – na casa dos três porquinhos.

Parecem um pouco inconformados pelo lobo ter virado bolo, pois eles talvez

quisessem que a história terminasse com um final triste para o lobo. E Chapeuzinho

perde todo o medo que tinha e vive feliz com sua nova vida. Para eles a satisfação

da felicidade de Chapeuzinho Amarelo é evidente, mas e o lobo? Parece que esta

história teve “quase” um final feliz...

Abramovich (1989) nos dá uma resposta para os conflitos existentes nas

contações de histórias:

Ler histórias para crianças, sempre, sempre... é poder sorrir, rir,

gargalhar com situações vividas pelos personagens. É suscitar o

imaginário, é ter a curiosidade respondida em relação a tantas

perguntas, é encontrar outras ideias para solucionar questões (como as

personagens fizeram...), é uma possibilidade de descobrir o mundo

imenso dos conflitos, dos impasses, das soluções que todos vivemos e

atravessamos de um jeito ou de outro.(p. 17).

E depois, vem mais a outra história...

C)A HISTÓRIA DOS TRÊS PORQUINHOS

E todos estão olhando fixamente para mim, esperando o grande momento

do início da história dos Três Porquinhos. E nãopode esquecer-se de começar as

histórias com:―Era uma vez...‖. Seus olhares penetrantes e ansiosos ao ouvir o

começo, ficam parados olhando o desenrolar da história. Depois do início dou um

nome comum aos três porquinhos, e são dois porquinhos e uma porquinha, não

podendo deixar as meninas de fora da história, uma vez que, a imaginação fala tão

alto que ao olhar para eles tenho a sensação de que estão dentro da história.

Pode-se perceber o medo expresso nos rostos das crianças quando aparece

o lobo mau, enchendo seu pulmão para assoprar a casa dos porquinhos. Quando a

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casinha vem ao chão todos fazem a carinha de derrota. Mas, quando os dois

porquinhos encontram a casinha de tijolos, seus olhos voltam a brilhar, talvez num

pensamento de ―Ufa, estamos salvos do lobo mau!”. Não passa muito tempo até o

lobo mal voltar a atacar, e novamente vejo a apreensão em seus rostos, e seguido

de perguntas: O que acontece tia? As histórias infantis têm sempre um final feliz

para todos, nas minhas também. Quando o lobo mal cai na panela e queima o

bumbum, vejo uma satisfação exposta, ―nos livramos do lobo mau!‖. E ao final da

história não posso deixar de falar que o lobo mau foi embora para bem longe, morar

em outra floresta, perto da casa de uma menininha que usava uma capa vermelha.

E seus olhos se enchem novamente de curiosidades. Não podendo esquecer do:

―Felizes para sempre tia!‖. E naquela tarde os três porquinhos ficaram tão felizes!...

Quando a história termina, um ar de descanso invade a sala, passamos por

bons e maus bocados na história, mas tudo acabou bem.

As crianças gostam muito de ouvir histórias, e se estas forem

acompanhadas de expressões, de sons e de coisas que acontecem no nosso

cotidiano,fica a sensação de que entramos juntos na história. Passamos a ver e a

sentir aquilo que as crianças também viram e sentiram.

Acho maravilhoso contar histórias para os pequenos! Eles simplesmente

param e fixam os olhos em nós, esperando a próxima palavra, o próximo parágrafo e

o próximo medo da história. A vivência do conto é tão real para elas, como é real

para mim, estar ali na sala contando os contos que eu conto na educação infantil.

Era uma vez...

7.3SEGUNDO MOMENTO:MOMENTO DA RECONTAÇÃO DA HISTÓRIA

Eis entãoa contação da história de Chapeuzinho Vermelho, feita por mim – a

pesquisadora - e o recontar dessa mesma história, pelas crianças.

Esta segunda parte do levantamento dos dados e análise dos resultados,

feitos por meio das narrativas da contação de histórias, aconteceu no final do ano de

2013. Algumas crianças acabavam de completar três anos e outras estavam

próximas a completar. Durante um ano todo de trabalho com os pequenos,em que

ouviam atentamente as histórias por mim narradas, vieram a desenvolver um grande

prazer em recontar as histórias que muitas vezes foram dramatizadas por eles.

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Assim, contando histórias repetidas vezes e ouvindo-os em diferentes

momentos do dia, quis gravar um áudio com os pequenos, recontando as histórias

ouvidas durante o ano, como um instrumento para levantamento de dados.

Para a gravação do áudio me preparei bastante. Arrumei a sala, fizemos

uma roda de conversa, sobre qual história cada um gostaria de recontar. Fizemos

alguns combinados como: enquanto o amigo reconta a história os outros devem ficar

em silêncio, pois também teriam um momento para recontar a sua história preferida,

ficar na roda, entre outros. Falei para as crianças que levaria um “microfone” para

que sua voz ficasse mais alta (eles adoram microfone).

Feito os combinados e com a roda preparada, liguei o gravador, para eles

terem aquele aparelho perto da boca para dar volume. E a história ficou muito

divertida!A recontaram,cada um do seu jeito, algumas crianças colocaram na história

até situações de seu cotidiano.

7.3.1 Analisando o áudio: Chapeuzinho Vermelho de Mauricio de Souza: Como

amostragem, a recontação da história é apresentada por duas crianças.

Figura 8 – Chapeuzinho Vermelho com o seu capuz

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

Michelle: três anos, reconta a história de “Chapeuzinho Vermelho” (figura 9). Com o

livro em mãos, começa a história com:―Era uma vez um lobo, entrou na floresta e

Chapeuzinho Vermelho tinha uma coberta‖ (na imagem do livro, aparece

Chapeuzinho com o capuz, figura 8).

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Figura 9: Michele recontando a história para as crianças

Fonte: imagem fotográfica da pesquisadora

―E dai a mamãe de Chapeuzinho Vermelho tinha um vestido rosa pink‖ (na figura 10,

aparece a mãe de Chapeuzinho Vermelho com um vestido cor de rosa).

Figura 10: A mãe de Chapeuzinho com vestido rosa.

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

―E daí tinha uma cortina azul blue‖ (ao fundo da floresta havia uma tenda azul, figura

11). ―E o lobo ‗tava‘ aqui‖ (neste momento a pequena aponta no livro a figura do lobo

- figura 12).

Figura 11 - A tenda azul Figura12-Michele recontando a história e mostrando a figura do lobo

Fonte: do livro de Mauricio de Souza Fonte: imagem fotográfica feita pela pesquisadora

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―Dai o lobo apareceu na porta da vovó, o lobo mau pegou a vovó pra jogar dentro do

armário‖. (figura 13).

Figura 13 – O lobo mau pegou a vovó

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

―Chapeuzinho Vermelho chegou na casa da vovó e ―tava‖ dormindo na casa da

vovó‖. (a criança aponta o lobo que estava deitado, figura 14).

Figura 14 – Chapeuzinho Vermelho chegou na casa da vovó

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

―E daí o lobo caiu aqui‖ (aponta outra vez para a figura representativa do lobo caindo

da cama), ―que o dentão do lobo mau, que grandona. Tá chorando com todos os

pés‖. (neste momento, quando a Chapeuzinho chega ao quarto e vê o lobo mau, ele

levanta da cama e cai no chão, na figura, aparecem vários pés de Chapeuzinho

representando sua fuga, figura 15).

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Figura 15 -Chapeuzinho fugindo Figura 16: Michele mostrando os pés da Chapeuzinho.

.Fonte: do livro de Mauricio de Souza Fonte: Imagem fotográfica tirada pela professora.

―Tava comendo toda Mônica, assim‖, (a criança representa como o lobo iria comer a

Chapeuzinho, abre a boca e mostra como se colocasse algo na boca, (figura 17),

―pegou a Mônica e quase o lobo comeu‖.

Figura 17 - A criança representa o lobo comendo a Mônica, podemos ver que é a Magali (essa foto não tem????)

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

―O lobo correu, correu, correu, e.. e.. e.. comeu e a vovó fez um.. todos um doce po

pa dragão come‖ (Figura 18). Neste momento ao fim da gravação de áudio uma das

crianças grita: - Ai! Como se estivesse com medo do dragão.

Figura 18-Onde o lobo corre e a vovó fez doce para o dragão Figura 19: Michele mostrando o lobo fugindo.

Fonte: Fonte: Imagem fotográfica tirada pela pesquisadora

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Leticia: Também com três anos e reconta a história da Chapeuzinho Vermelho

seguido da amiga. ―Era uma vez uma Chapeuzinho Vermelho, dai a Chapeuzinho foi

correndo na floresta e encontrou um lobo, dai o lobo disse que ele, que ele era, ele

era...ma... lindo!‖ (Figura 20, a criança dá uma pausa).

Figura 20 -A Chapeuzinho correndo pela floresta

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

―Dai o lobo abriu a janela da vovó, dai um dia quase que o lobo colocou no armário

da vovó, dai a Chapeuzinho foi assim: - quem que é? – É o lobo!‖(figura 21).

Figura 21: O lobo na casa da vovó.

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

―Dai a Chapeuzinho Vermelho disse: - Nossa vovó, que, que cabelo grande que

você tem! - são pra pentiá!‖ (figura 22).

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Figura 22 0 - Lobo deitado na cama da vovó

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

―Daí um dia e o lobo ficou mordendo o chão da vovó... e daí o caçador bateu na

bunda mais forte. Daí felizes para sempre‖.(figura 23).

Figura 23: quando o lobo morde o chão da vovó e o grande final do “Felizes para sempre”.

Fonte: do livro de Mauricio de Souza

Nessa pesquisa de observação pode-se perceber como é grandioso o

recontar uma história pela criança, ainda mais quando esta tem apenas três anos e

te chama e pede para você sentar e ouvi-la. Com o livro em mãos Michelle e

Leticia7recontaram a história de Chapeuzinho Vermelho, por elas ouvidas várias

vezes. Percebeu-se que pequenas diferenças são colocadas ao se recontar uma

história. As duascrianças contaram a mesma história, porém cada uma com sua

individualidade, com particularidades e uma grande representação de experiências

vividas e ouvidas.

Para Vigotsky (2009):

O cérebro não é apenas o órgão que conserva e reproduz nossa experiência anterior, mas também que combina e reelabora, de forma criadora, elementos da experiência anterior, erigindo novas situações e novo comportamento. (p.14).

7 Os nomes foram alterados para preservação das crianças.

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As crianças ouviram muitas vezes a história de Chapeuzinho Vermelho, e

muitas vezes a recontaram, cada uma destas vezes com características pessoais,

usando sua memória, sua imaginação, pensamento e linguagem.

A imaginação manifesta-se em todos os campos da vida cultural do ser

humano, pode-se dizer que tudo o que nos cerca foi feito pelo homem, sendo

produto de sua imaginação e criação. A história ouvida faz com que a criança

imagine, faça uso da fantasia, uso da linguagem para levar adiante o mundo

fantástico que existe dentro de si. (VIGOTSKI, 2009).

Para Vigotski (2009)

A linguagem que torna possível o faz de conta, a criação da situação imaginária. A criação não emerge do nada, mas requer um trabalho de construção histórica e participação da criança na cultura. A brincadeirainfantil é, assim, um lugar por excelência de incorporação das práticas e exercício de papeis e posições sociais. (p. 16).

A linguagem, a memória, a imaginação fazem parte de todo este processo

de escuta e de recontagem das histórias. A imaginação e a realidade andam juntas,

a imaginação precisa de algo da realidade para que se sobressaia a partir do que já

se conhece, já vivenciou. (VIGOTSKI, 2009).

7.4TERCEIRO MOMENTO DA PESQUISA – CONTAÇÃO DA HISTÓRIA DE BRANCA DE NEVE

A terceira parte da observação finalizou com a gravação de um vídeo, em

que aparece a contação da história: A BRANCA DE NEVE E OS SETE ANÕES.

Para essa gravação as crianças ficaram sentadas no chão de frente àsua

professora, estapesquisadora. O que objetivou essa gravação foi o de registrar as

várias expressões das crianças numa imagem em movimento.

Escolhida a história,as crianças bateram palmas ardorosamente,

comemorando a escolha. Começa então, o momento de narrar e registrar a

interação dos pequenos com a contadora e com a história.

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Figura 24 - A turma muito feliz escolhendo a história

Fonte: imagem fotográfica da pesquisadora

Para esta contação fiz uso do livro ilustrado, narrando o desenrolar da

história.Os contos de fadas na Educação Infantil oportuniza a criança a

dramatização, a emoção, a motivação, ao realismo mágico.

O Conto de Fadas é forma modelar, primária, da narrativa, imprescindível ao crescimento afetivo da criança. Ele utiliza símbolos universais que permitem à criança escolher, desprezar ou interpretar o conto, segundo o estágio de desenvolvimento intelectual e psicológico, que ela tenha atingido. (CARVALHO, 1989 p.199).

E logo após o ―Era uma vez‖ os pequenos param e muitas vezes se curvam

para enxergar a ilustração do livro, seus olhinhos brilham, a imaginação flutua por

entre as paredes da sala de aula.

Figura 25 - As crianças buscando as imagens do livro

Fonte: imagem fotográfica da pesquisadora

A partir do momento em que uma história é contada, as crianças sentem

emoções importantes, como tristeza, a raiva, a irritação, o bem-estar, o medo, a

alegria, o pavor, a insegurança, a tranquilidade, entre outras mais. As crianças

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passam a viver profundamente tudo aquilo que é narrado. Pois é o ouvir, sentir e

enxergar com os olhos do imaginário. Para Abramovich, (1997):

É através de uma história que se podem descobrir outros lugares, outros tempos, outros jeitos de agir e de ser, outra ética, outra ótica, e ficar sabendo História, Geografia, Filosofia, Política, Sociologia, sem precisar saber o nome disso tudo e muito menos achar que tem cara de aula. O primeiro contato da criança com um texto é feito oralmente através da voz da mãe, do pai, dos avós, contando contos de fada, trechos da Bíblia, histórias inventadas, tendo a criança ou os pais como personagem das histórias. (p. 17).

Podemos ver na expressão dos rostinhos das crianças o pavor quando a

bruxa aparece com seu espelho mágico, e ouve-se vários suspiros “hããããããã”, uma

bruxa, o medo parece pairar entre os pequenos, mas no mesmo momento observo a

ansiedade por ouvir o desenrolar do conto.

Figura 26 – ansiedade por ouvir o desenrolar do conto

Fonte:imagem fotográfica da pesquisadora

Quando a “Branca de Neve” é abandonada pelo caçador no meio da floresta

os suspiros de medo se misturam com os de dó, e ouve-se “coitadinha da Branca de

Neve!”, João está com os olhos vidrados nas ilustrações do livro, revivendo o pavor

da solidão da Branca de Neve, e a tristeza por ser abandonada e estar sozinha. A

solidão parece ser muito triste aos olhos dos pequenos.

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Figura 27- a tristeza pela solidão da Branca de Neves

Fonte: imagem fotográfica da pesquisadora

E a história continua, e o conforto invade a sala no momento em que Branca

de Neve encontra uma casinha bem pequenininha.

Figura 28 – a alegria do encontro dos Sete Anões com a Branca de Neve

Fonte: imagem fotográfica da pesquisadora

O sorriso está estampado nos rostos de algumas crianças quando os sete

anões encontram, em sua humilde casinha, a Branca de Neve. Mas ainda paira o

medo da bruxa, pois descobre que Branca de Neve está viva. O temor dos

pequenos é aparente, ficam apreensivos esperando a virada da próxima página.

Figura 29 – Apreensão esperando a virada da próxima página

Fonte: imagem fotográfica da pesquisadora

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A imaginação se faz presente juntamente com a curiosidade pelo desenrolar

do final deste conto, conhecido e ouvido pelos pequenos outras tantas vezes. Mas

quando eu reconto é sempre como se fosse pela primeira vez.Pois, as crianças têm

a oportunidade de ouvir e imaginar, criar um mundo fantástico cheio de realidade,

podendo ter contato com as fadas e mesmo com as bruxas, que muito povoam

esses contos.

A história segue para o final, o Príncipe aparece com seu cavalo branco para

dar o beijo que salva a vida da Branca de Neve. João, muito esperto, sai do seu

lugar para apontar e enfatiza como é bonito o cavalo do príncipe!

Figura 30 – apontando o bonito cavalo do príncipe

Fonte: imagem fotográfica da pesquisadora

O momento do beijo é demonstrado de várias maneiras pelos pequenos,

alguns fazem gestos, outros mexem a boca como se estivessem beijando a

personagem. E a felicidade é expressa em sorrisos no momento do:―Felizes para

sempre‖, parte da história tão esperada, também depois de tantas tristezas tudo

deveria acabar bem! E ouço um:―de novo tia‖, para eles ouvir a mesma história não

tem problema, o importante é viajar pelo mundo da fantasia e ajudar a princesa a ser

feliz, pois assim também seremos felizes.

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Figura 31 – E...“Felizes para sempre...”

Fonte: imagem fotográfica da pesquisadora

Ao ouvir histórias ou contos, a imaginação, a realidade e fantasia entram em

ação. Para Vigotski (2009), fantasia e realidade não se separam, pois a imaginação

não é um divertimento ocioso da mente, mas uma função vital necessária.

Portanto, as histórias revividas pelas crianças são tão importantes quanto à

realidade que as cerca. Para elas esses contos acontecem em algum lugar distante

daqui, é real, é verdadeiro, é encantador.

Assim, quando o príncipe aparece e salva a Branca de Neve,as emoções

são aparentemente vistas pelas expressões faciais e pelos gestos de cada criança.

Ao ouvirem as histórias os pequenos deixam os sentimentos influírem na

imaginação e a imaginação influir nesses sentimentos, envolvendo todo o lado

afetivo e emocional..

Podemos perceber claramente como a imaginação e realidade caminham

lado a lado na vida dos pequenos. Ao ouvir as histórias eles revivem a trajetória

proposta, passando pelos mesmos apuros que os personagens, e vivendo a mesma

felicidade traduzida em sorrisos que estampam em seus lindos rostinhos, satisfeitos

com o desfecho final da história.

―E FORAM FELIZES PARA SEMPRE‖...

7.5 ANÁLISE DOS RESULTADOS

Por meio das observações e da participação nas dinâmicas junto aos

pequenos, foi possível identificar as capacidades cognitivas estimuladas na criança

pelos momentos da contação e recontação das histórias, visto que estas contribuem

para a formação de cada criança, pois quando elas entram em contato com as

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histórias, não desperta somente a imaginação, como também exercita a memória, a

percepção e a fantasia;ampliam o vocabulário, na vivênciadas relações com o outro;

no auxilio dosestímulosno desenvolvimento do pensamento eda linguagem.

Pode-se perceber que o conto trouxe em suas narrações situações com as

quais muitas crianças se identificavam, pois para as crianças os contos possuem um

grande valor, facilitando a sua convivência com seus medos.

Vigotski (2009) deixou claro que nosso cérebro produz uma grande

plasticidade, modificando-se a cada nova influência recebida, se o estimulo é forte e

frequente produz marcas, que permitem, posteriormente, reproduções, ou seja,

podem ser relembrados. E, além de relembrar os fatos ocorridos, nosso cérebro é

capaz de fazer novas combinações. Somos capazes de criar a partir destas

combinações de nossas experiências, quanto mais experiências tivermos mais

“conteúdo” para combinar e criar, com isso, mais fértil será nossa imaginação,

nossas fantasias, para querer cada vez mais...ERA UMA VEZ!

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8 CONSIDERAÇOES FINAIS

Estas observações e interferências participativas foram de grande valia para

meus conhecimentos sobre a temática da pesquisa, principalmente as estimulações

da contação de histórias na Educação Infantil para o desenvolvimento das

capacidades cognitiva. A relevância que uma criança dá ao ouvir uma história e o

prazer que ela sente quando um adulto pode ouvi-la recontando esta mesma

história, é de extrema importância.

Os objetivos desta pesquisa foram alcançados, pois ficou evidente que os

contos contribuem para o desenvolvimento das capacidades cognitivas da criança.

São crianças que simplesmente param o que estão fazendo para ouvir uma história,

contada pela quinta ou sexta vez. O importante é reviver esta história, é pensar num

novo final, ou então, prestar atenção em detalhes que não foram percebidos outras

vezes.

Encantei-me, e continuo me encantando com todo este mistério que vejo no

rostinho dos pequenos, atentos, quietos, ansiosos, por ouvir o próximo “Era uma

vez”. Neste ano de pesquisa pude observar de perto como é maravilhoso fazer uso

da literatura infantil, o quanto este campo dos contos podem contribuir, seja pela

atenção, ou pela memória, ao recontar a história, ou então pelo simples fato de

poder fugir da realidade da sala de aula e viajar para um mundo muito, muito

distante, aonde a bruxa, o lobo mau vão se dar mal, e a princesa vai viver feliz para

todo o sempre. Desta forma, creio que o problema inicial foi respondido: Que

capacidades cognitivas são identificadas no momento da contação e recontação de

histórias com crianças de 2 a 3 anos de idade?

Deixo aqui minha enorme gratidão por minha querida orientadora que

persistiu comigo neste caminho mágico e fantasioso dos contos. E juntas chegamos

ao final desta pesquisa e, amparada por autores maravilhosos que discutem este

mundo mágico da literatura infantil, chegamos à conclusão que esta literatura vem

contribuir, e muito, para formação do cognitivo e desenvolvimento das crianças na

idade da Educação Infantil.

Precisamos trazer os contos, a literatura infantil para a escola, dividir este

mundo fantástico com as crianças, dando a elas a chance de experimentar o novo.

Um mundo diferente do nosso, um mundo fantástico, que contribui para a sua

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formação, ajudando mais tarde a lidar com sua própria realidade, com suas próprias

escolhas.

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REFERÊNCIAS

ABRAMOVICH, Fanny. Literatura infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione, 1989.

BUSATTO, Cléo.

CARVALHO, Bárbara Vasconcelos de. A Literatura Infantil: visão histórica e crítica. 6° ed. São Paulo: Global. (1989).

COELHO, Betty. Contar Histórias: uma arte sem idade. São Paulo, Editora Ática, 1999.

COELHO, Nielly Novaes. Literatura Infantil: teoria, análise, didática. São Paulo. Moderna, 2000.

CUNHA, Maria Antonieta Antunes. Literatura Infantil teoria e prática. São Paulo. Editora Ática, 1997.

CURITIBA, Secretaria Municipal de Educação. Diretrizes Curriculares para a Educação Municipal de Curitiba. Estabelece as diretrizes para a educação infantil. Curitiba: SME, v. 2, 2006.

FARIA, Ana Lúcia Goulart de. O coletivo infantil em creches e pré-escolas: falares e saberes, (org.). São Paulo: Cortez, 2007.

LA TAILLE, Yves de. Piaget, Vygotsky, Wallon. Teorias psigenéticas em discussão. São Paulo : Summus, 1992.

RATNER, Carl. A psicologia Sócio-histórica de Vygotsky: aplicações contemporâneas/CarlRatner;trad. Lólio Lourenço de Oliveira. – Porto Alegre: Artes Médicas, 1995.

VYGOTSKY, Lev. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo sócio-histórico. São Paulo : Scipione, 2010.

Vygotsky, Lev; LURIA, Alexander Romanovich; LEONTIEV, Alexis. Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. Trad. Maria da Pena Villalobos. São Paulo : Ícone, 2010.

______________. A imagem e a Arte na Infância. Lisboa ,Portugal : Relógio D‟Água Editores, 2009.

______________A imaginação e a criação na infância: ensaio psicológico. Tradução: Zoia Prestes. São Paulo : Ática, 2009.

_____________. A construção do pensamento e da linguagem. Tradução: Paulo Bezerra. 2ª ed. São Paulo : Editora WMF Mrtins Fontes, 2009.

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ZILBERMAN, Regina. A literatura Infantil na escola/ Regina Zilberman. São Paulo: Global Ed. 4° ed. 1985.