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URBANISMO SUSTENTÁVEL: uma análise das políticas de habitação no Centro Histórico de São Luís-MA
Muranna Silva Lopes1
Renata Caroline Pereira Reis Mendes2 Viviane Freitas Perdigão Lima3
Resumo
Analisa as políticas públicas de habitação no Centro Histórico
de São Luís/MA a partir da ideia de sustentabilidade urbana.
Utiliza a metodologia de análise bibliográfica e da pesquisa
documental, bem como a observação in loco (direta e indireta).
Apresenta uma visão teórica acerca da ideia de
sustentabilidade. Aborda a questão teórica em torno da
sustentabilidade urbana. Caracteriza a situação do Centro
Histórico da capital maranhense e analisa as políticas públicas
habitacionais ali empregadas.
Palavras-chave: Sustentabilidade; Sustentabilidade urbana;
Políticas habitacionais.
Abstract
It analyzes public housing policies in the Historic Center of São
Luís/MA from the idea of urban sustainability. It uses the
methodology of bibliographic analysis and documentary
research, as well as on-site observation (direct and indirect). It
presents a theoretical vision about the idea of sustainability. It
addresses the theoretical question of urban sustainability. It
characterizes the situation of the Historical Center of the capital
of Maranhão and analyzes the public housing policies
employed there.
Keywords: Sustainability; Urban Sustainability; Housing
Policies.
1 Mestranda em Cultura e Sociedade/UFMA. E-mail: [email protected] 2 Advogada. Mestranda em Cultura e Sociedade/UFMA. E-mail: [email protected] 3 Advogada. Mestre em Direito e Instituições de Justiça/UFMA. E-mail: [email protected]
I. INTRODUÇÃO
A intervenção do homem no meio natural, em consequência das necessidades
de abrigo, geração de alimentos, produção de bens e serviços, comunicação e interação
social tem transformado os recursos ambientais em condições precárias, que resultam em
catástrofes que podem provocar a falência da humanidade.
No intuito de modificar tal cenário, o homem tem realizado transformações
tecnológicas, econômicas e sociais que, embora tragam benefícios à humanidade, geram
um processo de urbanização acentuado gerando problemas relacionados à ocupação do
espaço físico e à manutenção da qualidade de vida das pessoas. Por isso, surgem
inquietações na busca por um desenvolvimento que seja harmonioso com o meio ambiente.
Nesse contexto, emerge uma demanda por políticas públicas necessárias à
promoção de um modelo de desenvolvimento qualitativo - o sustentável (socialmente mais
justo, ecologicamente prudente e economicamente eficiente), sobretudo baseado na
participação da sociedade civil.
A necessidade de reflexão em torno do processo de preservação e das políticas
públicas destinadas à área do Centro Histórico, levando-se em conta as ideias de urbanismo
sustentável e da teoria da tábula rasa, suscitou inquietação e levou à realização dessa
pesquisa. E partindo desse pressuposto, este trabalho pretende analisar as habitações
residenciais no Centro Histórico da cidade de São Luís/Maranhão, com base nas políticas
habitacionais que regem o município.
Utilizou-se da pesquisa bibliográfica e documental, em busca de referências
teóricas e maior aprofundamento nas teorias que regem o tema abordado, realizando-se
ainda a observação in loco (direta e indireta), além de visitas aos órgãos públicos, como o
Instituto Nacional das Cidades-INCID, o Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Cultural-
IPHAN e o Departamento Estadual do Patrimônio Histórico-DPHP de São Luís, para a coleta
de dados, no período de maio a julho de 2016.
A relevância desta investigação está no fato de que é praticamente consenso
entre os estudiosos que a conservação dos sítios históricos se desenvolverá,
principalmente, através da permanência do uso residencial ao qual devem ser atrelados
usos complementares que garantam a sua permanência e que sejam compatíveis com a
função de moradia, ou seja, que promovam uma diversidade de usos (JACOBS, 1973, p.
158), haja vista que os centros históricos possuem uma infinidade de recursos, renováveis e
não renováveis, e a esse patrimônio se deve ter e manter o respeito em favor da História.
História de todos nós.
II. SUSTENTABILIDADE: uma visão teórica
Sabe-se que as primeiras discussões sobre sustentabilidade tiveram início em
1972, com intelectuais que participavam do Clube de Roma, reforçando a necessidade do
mundo de atentar-se para uma nova perspectiva global e de longo prazo de preservação
dos recursos naturais. Os pesquisadores envolvidos nesta discussão concluíram que
Se as atuais tendências de crescimento da população mundial - industrialização, poluição, produção de alimentos e diminuição de recursos naturais - continuarem imutáveis, os limites de crescimento neste planeta serão alcançados algum dia dentro dos próximos cem anos (MEADOWS, 1973, p.34).
Discute-se neste estudo, sobre o avanço negativo do crescimento desenfreado
da população mundial e a tentativa de se atingir estabilidade econômica e ecológica, indo de
encontro à filosofia do crescimento contínuo da sociedade industrial que indiretamente
estabelece a crítica às teorias de desenvolvimento (VARGAS, 2002).
Outras discussões a respeito da preservação ambiental começaram a surgir. De
modo que em 1974 surgiu a Declaração de Cocoyok, como resultado da reunião da
UNCTAD (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) e do UNEP
(Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas).
Assim, após inúmeras discussões do cenário meio ambiente-desenvolvimento,
concluiu-se que “não existe somente um mínimo de recursos necessários para o bem-estar
do indivíduo; existe também um máximo. Os países industrializados têm que baixar seu
consumo e sua participação desproporcional na poluição da biosfera” (BRUSEKE, 1995, p.
32). Portanto, a declaração demonstra o excesso de poluição dos países desenvolvidos e
industrializados em relação aos outros países não-desenvolvidos e ainda aponta para a
necessidade de diminuição dessas parcelas de consumo.
Em 1987, foi publicado o Relatório de Brundtland, com o título Nosso Futuro
Comum, tornando o conceito de desenvolvimento sustentável mais popular e mostrando os
problemas mundiais e algumas possíveis soluções a serem adotadas. Foi introduzida,
portanto, uma nova visão no cenário internacional e apontou-se a necessidade de revisão
do modelo de desenvolvimento vigente no planeta, considerando-se uma previsão de
esgotamento de recursos naturais.
Neste relatório foram abordadas várias diretrizes, entre as quais podemos
destacar a limitação do crescimento populacional, o controle da urbanização desenfreada e
melhor adequação da relação cidade-campo e a satisfação das necessidades básicas das
populações mais carentes (VARGAS, 2002, p. 225) e demonstra que algumas estratégias
estabeleceram metas que serviram de modelo em nível internacional, impulsionando as
organizações seguirem padrões de desenvolvimento sustentável para a proteção dos
ecossistemas supranacionais.
No Brasil, a discussão se intensificou depois da Conferência das Nações Unidas
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUCED), no Rio de Janeiro, em junho de 1992,
que ficou conhecida como RIO-92 ou ECO-92. Nela, participaram pesquisadores, chefes de
Estado e representantes da sociedade organizada de 179 países, ocasião em que foram
discutidas questões em relação ao meio ambiente e ao desenvolvimento mais sustentável
para o mundo do século XXI.
O termo sustentabilidade, discutido há diversos anos, apresenta várias
abordagens. No que diz respeito às dimensões política e social SILVA (2000) e ACSERALD
(1999), apontam a participação da tomada de decisão da sociedade em mecanismos que
possibilitem uma democratização dos processos, respeitando as diferenças individuais,
modificando as práticas e políticas atuais de exclusão e discriminação.
Na dimensão ambiental, a garantia do ecossistema, respeitando sua capacidade
de renovação e prevenindo as várias formas de poluição é abordada. Para a dimensão
econômica ressalta-se a equidade de distribuição de riquezas e renda, reduzindo as
diferenças sociais. E, para a dimensão cultural, a garantia de preservação de patrimônios
históricos, urbanísticos, paisagísticos e ambientais, considerando a diversidade das culturas
dos povos em suas formas expressão e representação.
Assim, para uma análise da sustentabilidade deve-se garantir uma inter-relação
entre as dimensões, levando-se em consideração a comparação com o desejável no futuro
e a realidade do presente, sempre respeitando o local em que se está inserido.
A sustentabilidade, geralmente, é associada às preocupações ecológicas,
principalmente quanto à escassez dos recursos naturais. Porém, esse conceito integra
outras áreas como a economia, a sociedade, a política. Ela deve basear-se no princípio de
desenvolvimento sem a privação das gerações futuras dos recursos hoje disponíveis
(MIRANDA, 2003). Afinal, o que se busca realmente para obter a sustentabilidade são ações
que garantam o futuro das localidades e das pessoas, por meio da qualidade de vida, com
respeito aos seres humanos e à natureza.
O debate da sustentabilidade está em constante construção e sofre
modificações continuamente, razão pela qual este estudo propõe-se a discutir a importância
das dimensões ambiental, cultural, social, econômica e política em concomitância à ideia de
sustentabilidade urbana.
III. SUSTENTABILIDADE URBANA: Aporte teórico
O termo sustentabilidade urbana é recorrente nas discussões acerca da
ausência de moradia, infraestrutura, saneamento básico, transporte público e, sobretudo
questões sobre a degradação ambiental que implica na escassez dos recursos naturais, na
poluição, entre outras inseridas no contexto urbano.
Na década de 70 o debate do termo sustentabilidade emergiu relacionado à
diversas preocupações relacionadas ao meio ambiente, sobretudo aos à poluição,
exploração dos recursos naturais, aquecimento global e baixa qualidade de vida da
população. Afinal, a urbanização rápida, a concentração de indústrias, a acumulação de
riquezas sem a distribuição igualitária de benefícios sociais, o crescimento acelerado e a
degradação ambiental, por exemplo, fizeram com que houvesse a busca do
desenvolvimento sustentável nas cidades, conforme as discussões elaboradas por Acserald
(2001), que apresentou três matrizes discursivas enfatizando as diferentes representações
de cidade, resultando em propostas de ações para a questão ambiental urbana.
Essas matrizes perpassam pela representação técnico-material da cidade, pela
ideia em torno da associação desta enquanto espaço de qualidade de vida e pela
restauração da legitimidade das políticas urbanas, modelo da eficiência e modelo da
equidade. De modo que estão interligadas e devem ser consideradas agindo em conjunto
para se conseguir uma cidade sustentável, já que para se obter a racionalidade eco-
energética é preciso buscar uma maior eficiência no uso dos recursos naturais, equidade no
acesso aos serviços urbanos, incentivando o uso de meios de transporte menos poluentes,
aproximando-se do modelo da pureza.
A construção de cidades sustentáveis busca uma série de proposições de
aplicações de boas práticas, devendo considerar a preocupação da situação ambiental local
e do planeta nos tempos presente, passado e futuro. Razão pela qual Roger-Machart, citado
por Magalhães (2006), afirma que: “uma cidade sustentável é a que preenche as
necessidades de seus atuais cidadãos, sem esgotar os recursos das futuras gerações de
todo o mundo”.
Esse conceito se refere apenas à questão dos recursos naturais, propondo
técnicas de reuso, reciclagem, redução, aumentando a eficiência dos recursos naturais para
não privar às gerações futuras o acesso ao mesmo.
A dificuldade que se tem é de como tratar a sustentabilidade no meio urbano,
uma vez que a existência de grandes cidades, grandes aglomerações urbanas e seu
constante crescimento vão contra a proposição de uma cidade ambientalmente sustentável,
vez que se observa a concentração de atividades de negócios nas áreas centrais,
recebendo investimentos imobiliários e de infraestrutura enquanto as periferias se tornam
cada vez mais sem recursos.
É possível encontrar na literatura dois tipos de tratamento para questão da
sustentabilidade urbana,
um tratamento normativo, empenhado em delinear o perfil da “cidade sustentável” a partir de princípios do que se entende por um urbanismo ambientalizado; e um tratamento analítico, que parte da problematização das condições sociopolíticas em que emerge o discurso sobre sustentabilidade aplicado às cidades (ACSERALD, 2001, p. 26).
Ambos tratam da busca de um ambiente mais sustentável para ser aplicado nas
cidades, partindo de argumentos diferentes para enunciar essa justificativa. Uma parte da
questão ambiental e outro da questão social e política. Porém, é com a união desses dois
argumentos que se pode alcançar a sustentabilidade urbana.
Pode-se definir que as cidades com desenvolvimento sustentável representam
um local mais igualitário a todos, com preocupação com o meio ambiente e a população que
nela vive, considerando a sustentabilidade urbana como um conceito interdisciplinar e de
difícil caracterização, de maneira que para atingir a sua aplicabilidade no meio urbano, seja
necessária a aplicação de ações políticas, sociais e ambientais.
Ao tratar-se sobre a sustentabilidade urbana brasileira, algumas questões
precisam ser consideradas, sobretudo porque países como o Brasil, enfrentam um enorme
passivo ambiental urbano causado por um modelo de crescimento econômico baseado em
múltiplas desigualdades, que ao longo de décadas privilegiou a concentração da renda e
soluções urbanas individualistas, ao mesmo tempo em que não atendeu à demanda básica
por habitação para o conjunto de suas populações.
Olha-se para a questão ambiental urbana tendo que enfrentar a necessidade de
responder às demandas de seu crescimento econômico, produzindo milhões de unidades
habitacionais, simultaneamente respondendo ao déficit acumulado por décadas em
decorrência do subdesenvolvimento.
A solução desse duplo desafio precisa ser capaz de alterar significativamente
um padrão de urbanização que até hoje gerou impactos ambientais importantes. Por isso,
uma reflexão crítica sobre o que seja cidade sustentável faz-se necessária. Já que, ao
mesmo tempo, como o urbano não se compõe de segmentos divididos, tais ações não serão
estruturalmente eficazes para termos um cenário mais harmônico para as pessoas e a
natureza, se não se promover concomitantemente uma radical revisão dos parâmetros de
urbanização também nas regiões formais e economicamente privilegiadas de nossas
cidades.
No entanto, o modelo urbano brasileiro em geral, mesmo nas áreas ricas das
nossas cidades, se baseia em práticas ambientalmente destrutivas, e por isso não pode
servir de modelo para o futuro. Essa é uma realidade em todas as grandes metrópoles dos
países em desenvolvimento. Afinal, para responder ao crescimento econômico e às
demandas de novas classes médias, os países em desenvolvimento vêm optando por
produzir maciçamente habitações, esquecendo que deveriam, antes de tudo, construir
cidades, e enfrentam, como consequência, graves problemas urbanos que são também
ambientais.
O Brasil, com o Programa Minha Casa, Minha Vida, tende a seguir o mesmo
caminho. Entretanto, a solução de provisão maciça teve um preço significativo: o resultado
urbanístico é sofrível e o impacto ambiental enorme. Em algumas décadas, o saldo dessa
urbanização sem controle cobrará um alto preço em todos esses países, inclusive porque já
se verificam altas taxas de abandono de habitações, como ocorreu no México e no Chile,
onde o déficit habitacional foi quase resolvido, vez que este modelo gerou o que hoje se
chama a questão dos “con techo4”.
Há evidentemente avanços no enfrentamento da injustiça socioespacial, que no
Brasil se expressam na aprovação do Estatuto da Cidade 5 , em 2001, na criação do
Ministério das Cidades e em políticas e ações subsequentes, nos diversos níveis de
Governo. Porém, os entraves políticos, as dificuldades de gestão, os descompassos entre
esferas de Governo, a variedade de porte e capacidade institucional dos municípios
brasileiros, o relativo empenho na promoção de políticas de democratização da cidade,
mostram que, apesar de tais avanços, o desafio ainda é enorme.
IV. TÁBULA RASA E PRESERVAÇÃO NO CONTEXTO DO CENTRO HISTÓRICO
Tendo como base a análise de Clarissa Moreira (2004) sobre os conceitos de
tábula rasa e preservação, o presente trabalho propôs-se a refletir acerca das questões
4 De acordo com Rodríguez et al (2004), essa expressão diz respeito à política de habitação social no Chile que é considerada um sucesso. Nos últimos quinze anos, a produção habitacional enorme reduziu o déficit habitacional, e muitos governos latino-americanos estão imitando seu modelo de financiamento. No entanto, esta política bem sucedida acabou criando novos problemas urbanos e sociais: a segregação, a fragmentação, a insegurança, a superlotação. Por isso, surge uma política de habitação social sensível agora deve incorporar novos critérios, principalmente relacionados com a qualidade da habitação, a localização dos conjuntos construídos e mobilidade residencial de beneficiários. Disponível em: <http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0250-71612004009100004>. Acesso em: 21/ 07/ 2016. 5 O Estatuto da Cidade é a denominação oficial da lei 10.257 de 10 de julho de 2001, que regulamenta o capítulo "Política urbana" da Constituição brasileira. Seus princípios básicos são o planejamento participativo e a função social da propriedade.
patrimoniais pertinentes ao Centro Histórico de São Luís, no intuito de se compreender a
dinâmica da preservação, através da análise dos processos pelos quais a sociedade passa
em sua evolução histórica e que evidentemente, tem implicações sociais igualmente
relevantes para este estudo.
A abordagem da questão urbana por este prisma é complexa e exige não só a observação dos efeitos da intervenção da materialidade da cidade sobre a cultura urbana, mas a observação crucial das demandas, por vezes invisíveis, desta mesma cultura sobre o espaço urbano. E implica em avaliação de dados em grande parte subjetivos, justamente por tratar de “qualidade” e, portanto, de opiniões e de sentimentos. (Moreira, 2004)
É preciso, portanto, compreender que além dos movimentos de expansão
econômica que levam à valorização de determinadas áreas em detrimento de outras, as
cidades possuem suas peculiaridades socioculturais.
Estas peculiaridades e diversidade de percepções se evidenciam em muitos
momentos, uma vez que a sociedade está em constante diálogo tanto com o discurso de
preservação, quanto com a tendência de tábula rasa, que se apresenta forte no momento
histórico que a cidade vive. Tábula rasa é, portanto,
a intenção de transformar a cidade e de criar algo ‘novo’, de decidir sobre seu presente e futuro (e também sobre o seu passado) e, para tal, por vezes, destruir partes ou, em seu auge, destruí-la completamente ou abandoná-la, e fazer um a nova cidade ou novas partes dela (MOREIRA, 2004, p. 18).
Assim, verifica-se que esta é uma tendência das sociedades humanas, algo
intrínseco aos movimentos históricos da humanidade e que, dependendo de cada sociedade
e do momento histórico, pode se apresentar de forma mais ou menos intensa.
Já a preservação
se refere ao ato de livrar de perigos e de danos. Refere-se a resguardar, a manter, a não se desfazer, a continuar a ter. Em relação à questão urbana, refere-se ao desejo de perpetuar elementos e objetos – a materialidade da cidade – ou princípios, modos de fazer, tradições e costumes – a cultura urbana” (ibidem, p. 18).
Em São Luís, pode-se observar o dilema da convivência entre os processos de
preservação e tábula rasa, uma vez que a cidade também passou por um surto de
expansão, modernização e renovação urbanística e arquitetônica nas últimas décadas.
Processo este que levou a um abandono por parte da população de classe média que vivia
em seu centro histórico, resultando, na degradação dos espaços públicos e do próprio
conjunto arquitetônico.
Apesar de não haver a destruição do patrimônio arquitetônico da cidade, o que
se nota é a tendência da vida econômica e social deslocar-se para sua área nova e nobre
em detrimento do centro, que fica ocupado pelo comércio popular, pelos escritórios públicos,
pelos poucos empreendimentos turísticos e, mais importante, pelas atividades culturais que,
via de regra, são realizadas pelos órgãos oficiais. No entanto, boa parte deste conjunto de
construções está abandonado, em uma clara prova da tendência a tábula rasa da sociedade
ludovicense.
Por outro lado, desde os anos de 1940 (com o Programa de Preservação e
Conservação de Bens Culturais) com as primeiras ações voltadas a discutir a questão do
patrimônio histórico-cultural de São Luís, o poder público, através de seus órgãos oficiais,
inicia os esforços de preservação, fundamentados na questão da preservação da memória e
do próprio patrimônio em si e justificado do ponto de vista econômico por seu interesse
turístico.
Entre estas ações, destacamos o Tombamento Federal do Conjunto
Arquitetônico e paisagístico da Cidade de São Luís; a criação do Projeto Praia Grande em
1979, que após revisão, origina o Programa de Preservação e revitalização do Centro
Histórico de São Luís, em 1986.
De 1987 a 1990 acontece a primeira grande intervenção com resultados práticos
na restauração e revitalização do patrimônio histórico da cidade, foi o Projeto Reviver, que
restaurou ruas, praças, ruas, sistema de iluminação e prédios na área do antigo bairro
comercial, a Praia Grande, transformando-o em local por excelência, de atividades turísticas
e também culturais.
No final da década de 1990 através do PRODETUR (Programa de
Desenvolvimento do Turismo) dá-se a segunda etapa do Projeto Reviver, que restaurou
ruas e praças das áreas circundantes à Praia Grande (Praças Pedro II e João Lisboa e
Largo do Carmo e Bairro do Desterro).
No final da década de 1990 através do PRODETUR (Programa de
Desenvolvimento do Turismo) dá-se a segunda etapa do Projeto Reviver, que restaurou
ruas e praças das áreas circundantes à Praia Grande (Praças Pedro II e João Lisboa e
Largo do Carmo e Bairro do Desterro).
Estes esforços culminaram no reconhecimento por parte da UNESCO, que em
1997 classifica significativa parte do Centro Histórico da cidade como Patrimônio Histórico e
Cultural da Humanidade, o que deu à cidade, além de status e meio de financiamento para a
melhoria da infraestrutura de preservação, a visibilidade que proporciona o aumento do fluxo
de turistas e, portanto, de possibilidades de desenvolvimento econômico para a região.
Assim, que, se por um lado a cidade de São Luís tenha, devido a uma política
oficial, mantido seu patrimônio de pedra e cal em razoável estado de conservação, por outro
lado este patrimônio deixou de ser vivo e relevante para a sociedade em si, uma vez que ali
já não acontecem as vidas social, vez que esta se dá de forma consideravelmente
marginalizada ou sob forma de resistência cultural por parte de determinados segmentos, e
econômica, sendo realizado pelo comércio popular e algumas instituições financeiras.
Graças às políticas oficiais, entretanto, a área apresenta diversificada atividade
cultural, o que é em parte explicado pelo interesse em desenvolver a atividade turística na
região. Mas estas atividades são sazonais e localizadas e não resultam em efetivas ações
para a reabilitação da área.
O que pode ser observado é que, com a expansão urbana para a área do litoral
norte da cidade, houve um desvio das zonas de moradia das classes média e alta, que
antes ocupavam o centro, com suas atividades sociais e culturais acontecendo na área de
preservação histórica.
Este esvaziamento causou em boa parte do centro um processo de “guetização”,
onde famílias de baixa renda vieram a ocupar os casarões, agora abandonados pelos
antigos moradores. Porém, incapazes de fazer uma adequada manutenção destas
construções, levantadas com materiais nobres, tendo que seguir rígidas normas de
construção estabelecidas pelos órgãos de defesa do patrimônio e, geralmente, sem auxílio
do poder público para fazê-lo, estes imóveis acabam se deteriorando e se transformando em
moradias de baixa qualidade para seus ocupantes.
Em análise aos dados de 1998, indicados por Marques (2002) mas que, em
função da falta de políticas públicas para aquela área, se mantêm consideravelmente atuais,
observou-se que a quantidade de imóveis sem uso (250, correspondem a 28,25% do total
de imóveis) supera a quantia daqueles usados para moradia (217, ou 24,52% do total de
imóveis). Ou seja, o centro se transformou em uma zona de uso comercial, de serviços e
institucional (395 dos imóveis ou 44,64% da área construída).
Diante deste quadro, percebe-se que, parte da sociedade de São Luís
estabeleceu uma tábula rasa neste final de século XX, ao voltar suas atividades urbanas e
de moradia para uma cidade nova, para além da Ponte Governador José Sarney,
deslocando, assim, a vida social e econômica do centro histórico.
Pelo que se vê, determinados patrimônios se mantém engendrados na
atualidade, em abrangência ao discurso oficial, baseado em princípios academicistas de
preservação e na justificativa econômica do interesse turístico, constituindo, assim, um
grande desafio para a cidade preservá-lo e reabilitá-lo.
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo buscou sistematizar a ideia de sustentabilidade urbana a partir
do ponto de vista de autores que abordam a temática na perspectiva das dimensões
ambientais, sociais, políticas, econômica, cultural e social. Considerando-se que a
sustentabilidade não é uma coisa a ser atingida, mas sim um processo contínuo.
Nesse contexto, a sustentabilidade deve ser vista como um forte aporte para a
atividade de preservação e conservação das habitações na região do Centro Histórico de
São Luís, a fim de obter-se melhores formas de benefícios à região e à sociedade em geral.
Embora se deva considerar que as políticas públicas do Estado e do Município necessitem
de mais compromisso e conformidade com as políticas sustentáveis já existentes.
Foi possível perceber que há um processo de conservação sendo arquitetado há
quase sessenta anos na Cidade de São Luís e que, nos últimos vinte anos, tem havido
intervenções significativas para tentar reverter o quadro de abandono, degradação e
marginalização do patrimônio histórico, na busca pelo tão almejado desenvolvimento
sustentável, que poderá deixar para as gerações futuras um pouco dessa história que foi e
que está sendo construída.
As intervenções no Centro Histórico, portanto, têm tido êxito em possibilitar a
permanência do uso residencial, com a reabilitação de casarões e sobrados que estão
recebendo como principal função o uso residencial multifamiliar. No entanto, é válido frisar
que não se pode aumentar essa população residente na área sem dar a ela condições
adequadas de habitabilidade.
Embora se reconheça a existência da luta por um resgate do tempo perdido,
com o objetivo de conseguir reverter um quadro criado pelo processo acelerado de
degradação do centro, que vem ameaçando a sustentabilidade desse sítio, verificou-se que,
dentre os imóveis pesquisados, 250 encontram-se na situação de inutilização, o que
caracteriza um processo de abandono e degradação, em função da ação do tempo e da
negligência.
Resta então incentivar os usos existentes, buscando a consolidação do Centro
Histórico, além de assegurar que as intervenções tragam novas atividades para este Centro
Histórico com uma perspectiva de dar condições favoráveis de habitabilidade à população.
E, para que isso se concretize, é necessário que se respeitem todas as características
existentes.
Não se pode pensar na conservação do Centro Histórico considerando somente
as suas características e qualidades estéticas, paisagísticas e ambientais, já que se deve
privilegiar um elemento que é parte fundamental desse processo, a população. Espera-se
que este trabalho represente o início de uma pesquisa que poderá abrir caminho para vários
estudos sobre a questão colocada e que poderá contribuir de forma significativa para o
conhecimento de práticas de incentivo ao incremento da atividade urbana sustentável na
cidade de São Luís.
REFERÊNCIAS
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