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 V A L E T UD O : HOMO SS E X U A L ID A D E N A A N T I G U I D AD E Na An t i gu idade, n i n gu ém saí a d i z en d o p or qu e f u l an o er a gay , mes m o qu e fosse. Por m i l h ar es de an os, o a m or en t r e i gu ai s er a t ão com u m qu e n ão exi s t ia n em o con ceito d e h omossexual i d ad e H umbert oR odri gueseC láudi ad eC astroLi m a|01 /0 3/ 20 08 00 h0 0  A u n ião c i v il e n t re p essoasd o m e smose x op o deparece r al g o b as t a nte r ec ente, coisadegentem oder na. A pen ase m 19 89aD i namarcaabr açou a cau sa–f oi o p r i mei r op saf azeri sso. H oj e, o casa m en t ogayest á am par ado n a l ei de2 1n açõe s. E ssa m archa, por ém, den ov a n ãot em n ada. S u ah is t óriaretom au m t em po em qu enã oh av i anecessi dad ede dist i n gu i ro r elaci on amentoentre pess oas d o mes mose xo –p ar a os povos ant i gos ,o co n ce i to de h om oss e xu al i dade si m pl es ment e n ão existia.  As t r i b o s das i l h asdeNovaGui n é , F i j i eSalo m ã o , nooceano P ací co, ce r ca de 10 mi l anos at r ás j á e x e r ci t avam al g u mas f or m as de homosse xual idade r i t u al. Os m elanésios acreditavam que o conheci m en to sagr ado só pod eria sertr an smi t ido por meio do coi t o entre duplas do m e s m o s e x o. N o r i to , u m hom em tr a v est i do r ep r esen t ava u m esp í ri t o d ot a d o d e gran d e a l egri a – e seu s tr ej eit os n ã o er am m u it od i ferentes dosd eu m sh ow ded r agqu ee n sat u al. U m dos m ais anti go s e i m por tan t es c onj untos de l e i s do mu nd o, elaboradopel oi m per adorH amm ur abi n aan t i gaM esopot âmi aem ce r ca de1750 a. C .,contém al gu n sprivilégiosquedeveri am serd ad os aos p r osti t utose às p r ost i t u t a sque p a rt i ci p ava m dos cu l tosrel i gi os os. E l es eram sagradoset i nham relaçõ e scom osh ome n sd evotosde n trodos t em p los d a Mesop ot âmi a,F en í cia,E gi t o,S icí l i a e Í ndi a,en t r e ou tr os lugares. H erdeiras d oC ód igod eH ammu r ab i, asl ei sh iti t aschegam a r ec on h ece r u n iõesent r ep ess oasd omes m osexo. E ol h a qu ei ssof oi h á m ai sde3mi l an os. Na G r é ciaena R om a da A n t i gu idade, e r aabsol u t ame n t en or mal u m h om em m ai svel h oter relaçõessexuai sco m u m maisjov em . O lóso f o gr egoS ócrat es( 4 6 9 - 3 9 9 ) , ad ept od oa m orhomosse xual, p r eg avaq ueo coi t o an al eraa m el horforma d ei n spi r açã o –e o sexoh eter ossexu al , p orsu a ve z, se rv i a ap en as p ara p r ocr i ar. Pa raa edu cação d os j ove n s aten i en ses, esper ava- sequ eos ad olescen t esa ceit assem a ami zad eeos l açosdeamor com homensmaisvel h os, pa r aa bsorv er suasvirtudese se u scon heciment osd e loso a. A pós os12 an os, d es d equ eo gar ot o concor d asse, t r ansf orm ava- seem u m p ar cei r op assi voa t ép orv ol t ados 18 an os, com aap r ovaçãod es u af amí l ia. Nor m al m en te, aos2 5t or n ava- se u m h omem –e aí es per ava-se qu eass u m iss eopa pel at ivo.

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 VALE TUDO: HOMOSSEXUALIDADE NA ANTIGUIDADE

Na Antiguidade, ninguém saía dizendo por aí que fulano era gay, mesmoque fosse. Por milhares de anos, o amor entre iguais era tão comum que

não existia nem o conceito de homossexualidade

Humberto Rodrigues e Cláudia de Castro Lima | 01/03/2008 00h00

 A união civil entre pessoas do mesmo sexo pode parecer algo bastanterecente, coisa de gente moderna. Apenas em 1989 a Dinamarca abraçoua causa – foi o primeiro país a fazer isso. Hoje, o casamento gay estáamparado na lei de 21 nações. Essa marcha, porém, de nova não temnada. Sua história retoma um tempo em que não havia necessidade dedistinguir o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo – para os

povos antigos, o conceito de homossexualidade simplesmente nãoexistia. As tribos das ilhas de Nova Guiné, Fiji e Salomão, no oceano Pacífico,cerca de 10 mil anos atrás já exercitavam algumas formas dehomossexualidade ritual. Os melanésios acreditavam que oconhecimento sagrado só poderia ser transmitido por meio do coitoentre duplas do mesmo sexo. No rito, um homem travestidorepresentava um espírito dotado de grande alegria – e seus trejeitos nãoeram muito diferentes dos de um show de drag queens atual.Um dos mais antigos e importantes conjuntos de leis do mundo,

elaborado pelo imperador Hammurabi na antiga Mesopotâmia em cercade 1750 a.C., contém alguns privilégios que deveriam ser dados aosprostitutos e às prostitutas que participavam dos cultos religiosos. Eleseram sagrados e tinham relações com os homens devotos dentro dostemplos da Mesopotâmia, Fenícia, Egito, Sicília e Índia, entre outroslugares. Herdeiras do Código de Hammurabi, as leis hititas chegam areconhecer uniões entre pessoas do mesmo sexo. E olha que isso foi hámais de 3 mil anos.Na Grécia e na Roma da Antiguidade, era absolutamente normal um

homem mais velho ter relações sexuais com um mais jovem. O filósofogrego Sócrates (469-399), adepto do amor homossexual, pregava que ocoito anal era a melhor forma de inspiração – e o sexo heterossexual,por sua vez, servia apenas para procriar. Para a educação dos jovensatenienses, esperava-se que os adolescentes aceitassem a amizade e oslaços de amor com homens mais velhos, para absorver suas virtudes eseus conhecimentos de filosofia. Após os 12 anos, desde que o garotoconcordasse, transformava-se em um parceiro passivo até por volta dos18 anos, com a aprovação de sua família. Normalmente, aos 25 tornava-

se um homem – e aí esperava-se que assumisse o papel ativo.

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Entre os romanos, os ideais amorosos eram equivalentes aos dosgregos. A pederastia (relação entre um homem adulto e um rapaz mais

 jovem) era encarada como um sentimento puro. No entanto, se a ordemfosse subvertida e um homem mais velho mantivesse relações sexuais

com outro, estava estabelecida sua desgraça – os adultos passivos eramencarados com desprezo por toda a sociedade, a ponto de o sujeito serimpedido de exercer cargos públicos.Boa parte do modo como os povos da Antiguidade encaravam o amorentre pessoas do mesmo sexo pode ser explicada – ou, ao menos,entendida – se levarmos em conta suas crenças. Na mitologia grega,romana ou entre os deuses hindus e babilônios, por exemplo, ahomossexualidade existia. Muitos deuses antigos não têm sexo definido.

 Alguns, como o popularíssimo hindu Ganesh, da fortuna, teriam atémesmo nascido de uma relação entre duas divindades femininas. Não énada difícil perceber que, na Antiguidade, o sexo não tinha comoobjetivo exclusivo a procriação. Isso começou a mudar, porém, com oadvento do cristianismo.

Sexo para procriar

O judaísmo já pregava que as relações sexuais tinham como único fim amáxima exigida por Deus: “Crescei e multiplicai-vos”. Até o início doséculo 4, essa idéia, porém, ficou restrita à comunidade judaica e aospoucos cristãos que existiam. Nessa época, o imperador romanoConstantino converteu-se à fé cristã – e, na seqüência, o cristianismotornou-se obrigatório no maior império do mundo. Como o sexo passoua ser encarado apenas como forma de gerar filhos, a homossexualidade

 virou algo antinatural. Data de 390, do reinado de Teodósio, o Grande, oprimeiro registro de um castigo corporal aplicado em gays.O primeiro texto de lei proibindo sem reservas a homossexualidade foipromulgado mais tarde, em 533, pelo imperador cristão Justiniano. Ele

 vinculou todas as relações homossexuais ao adultério – para o qual se

previa a pena de morte. Mais tarde, em 538 e 544, outras leisobrigavam os homossexuais a arrepender-se de seus pecados e fazerpenitência. O nascimento e a expansão do islamismo, a partir do século7, junto com a força cristã, reforçaram a teoria do sexo para procriação.Durante muito tempo, até meados do século 14, no entanto, embora afé condenasse os prazeres da carne, na prática os costumespermaneciam os mesmos. A Igreja viu-se, a partir daí, diante de umasérie de crises. Os católicos assistiram horrorizados à conversão aoprotestantismo de diversas pessoas após a Reforma de Lutero. E, com o

humanismo renascentista, os valores clássicos – e, assim, o gosto dosantigos pela forma masculina – voltaram à tona. Pintores, escritores,

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dramaturgos e poetas celebravam o amor entre homens. Além disso,entre a nobreza, que costumava ditar moda, a homossexualidadesempre correu solta. E, o mais importante, sem censura alguma –ficaram notórios os casos homossexuais de monarcas como o inglês

Ricardo Coração de Leão (1157-1199).No curto intervalo entre 1347 e 1351, a peste negra assolou a Europa ematou 25 milhões de pessoas. Como ninguém sabia a causa da doença,a especulação ultrapassava os limites da saúde pública e alcançava oscostumes. O “pecado” em que viviam os homens passou a ser apontadocomo a causa dela e de diversas outras catástrofes, como fomes eguerras. Judeus, hereges e sodomitas tornaram-se a causa dos malesda sociedade. Não havia outra solução a não ser a erradicação dessesgrupos. Medidas enérgicas foram tomadas. Em Florença, por exemplo, asodomia foi proibida em 1432, com a criação dos Ufficiali di Notte(agentes da noite). O resultado? Setenta anos de perseguição aoshomens que mantinham relações com outros. Entre 1432 e 1502, maisde 17 mil foram incriminados e 3 mil condenados por sodomia, numapopulação de 40 mil habitantes.Leis duras foram estabelecidas em vários outros países europeus. NaInglaterra, o século 19 começou com o enforcamento de vários cidadãosacusados de sodomia. E, entre 1800 e 1834, 80 homens foram mortos.

 Apenas em 1861 o país aboliu a pena de morte para os atos desodomia, substituindo-a por uma pena de dez anos de trabalhos

forçados.

Ciência maluca

Outro tratamento nada usual foi destinado tanto à homossexualidadequanto à ninfomania feminina: a lobotomia. Desenvolvida peloneurocirurgião português António Egas Moniz, que chegou a ganhar oprêmio Nobel de Medicina de 1949 por isso, ela consistia em umatécnica cirúrgica que cortava um pedaço do cérebro dos doentes

psiquiátricos, mais precisamente nervos do córtex pré-frontal. NaSuécia, 3 mil gays foram lobotomizados. Na Dinamarca, 3500 – a últimacirurgia foi em 1981. Nos Estados Unidos, cidadãos portadores de“disfunções sexuais” lobotomizados chegaram às dezenas de milhares.O tratamento médico era empregado porque a homossexualidadepassou a ser vista como uma doença, uma espécie de defeito genético.

 A preocupação científica com os gays começou no século 19. Aexpressão “homossexual” foi criada em 1848, pelo psicólogo alemãoKaroly Maria Benkert. Sua definição para o termo: “Além do impulso

sexual normal dos homens e das mulheres, a natureza, do seu modosoberano, dotou à nascença certos indivíduos masculinos e femininos

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do impulso homossexual(...). Esse impulso cria de antemão umaaversão direta ao sexo oposto”. Em 1897, o inglês Havelock Ellispublicou o primeiro livro médico sobre homossexualismo em inglês,Sexual Inversion (“Inversão sexual”, inédito no Brasil). Como muitos da

época, ele defendia a idéia de que a homossexualidade era congênita ehereditária. A opinião científica, médica e psiquiátrica vigente era deque a homossexualidade era uma doença resultante de anormalidadegenética associada a problemas mentais na família. A teoria, junto dasidéias emergentes sobre pureza racial e eugenismo nos anos 1930,torna fácil entender por que a lobotomia foi indicada para oshomossexuais.

 A situação só começou a mudar no fim do século passado, quando adiscussão passou a se libertar de estigmas. Em 1979, a Associação

 Americana de Psiquiatria finalmente tirou a homossexualidade de sualista oficial de doenças mentais. Na mesma época, o advento da aidsteve um resultado ambíguo para os homossexuais. Embora tenharessuscitado o preconceito, já que a doença foi associada aos gays aprincípio, também fez com que muitos deles viessem à tona, sem medode mostrar a cara, para reivindicar seus direitos. Durante os anos 80 e90, a maioria dos países desenvolvidos descriminalizou ahomossexualidade e proibiu a discriminação contra gays e lésbicas. Em2004, o Supremo Tribunal dos Estados Unidos invalidou todas as leisestaduais que ainda proibiam a sodomia.

“Em toda a história e em todo o mundo a homossexualidade tem sidoum componente da vida humana”, escreveu William Naphy, diretor docolégio de Teologia, História e Filosofia da Universidade de Aberdeen,Reino Unido, em Born to Be Gay – História da Homossexualidade.“Nesse sentido, não pode ser considerada antinatural ou anormal. Nãohá dúvida de que a homossexualidade é e sempre foi menos comum doque a heterossexualidade. No entanto, a homossexualidade éclaramente uma característica muito real da espécie humana.” Paramuitos, ainda hoje sair do armário continua sendo uma questão de

tempo. As portas, no entanto, vêm sendo abertas desde a Antiguidade.