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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE AGRONOMIA E MEDICINA VETERINÁRIA
Programa de Pós-Graduação em Agricultura Tropical
VALORAÇÃO CONTINGENTE DE ATIVOS AMBIENTAIS NA
SUINOCULTURA: UM ESTUDO DE CASO NO MUNICÍPIO DE
DIAMANTINO/MT
EDIJEIDE APARECIDA SOUZA FERNANDES FREITAS
16
C U I A B Á - MT
2004
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE AGRONOMIA E MEDICINA VETERINÁRIA
Programa de Pós-Graduação em Agricultura Tropical
VALORAÇÃO CONTINGENTE DE ATIVOS AMBIENTAIS NA
SUINOCULTURA: UM ESTUDO DE CASO NO MUNICÍPIO DE
DIAMANTINO/MT
EDIJEIDE APARECIDA SOUZA FERNANDES FREITAS
Economista
Orientador: Profº Dr. JOÃO CARLOS DE SOUZA MAIA
Co-orientador: Profº Dr. BENEDITO DIAS PEREIRA
Dissertação apresentada à Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade Federal de Mato Grosso, para obtenção do título de Mestre em Agricultura Tropical.
17
C U I A B Á - MT
2004
FICHA CATALOGRÁFICA
F659v Freitas, Edijeide Aparecida Souza Fernandes
Valoração contingente de ativos ambientais na suinocultura:
um estudo de caso no município de Diamantino/MT / Edijeide
Aparecida Souza Fernandes Freitas. – 2004.
168p.
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Mato
Grosso, Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, 2004.
“Orientação: Prof. Dr. João Carlos de Souza Maia”.
CDU – 636.4:504.06(817.2)
Índice para Catálogo Sistemático
1. Suinocultura – Impacto ambiental – Diamantino (MT).
2. Impacto ambiental – Suinocultura – Diamantino (MT).
3. Recursos naturais – Diamantino (MT).
4. Valoração econômica – Suinocultura – Diamantino (MT).
18
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE AGRONOMIA E MEDICINA VETERINÁRIA
Programa de Pós-Graduação em Agricultura Tropical
CERTIFICADO DE APROVAÇÃO
Título: VALORAÇÃO CONTINGENTE DE ATIVOS AMBIENTAIS NA
SUINOCULTURA: UM ESTUDO DE CASO EM DIAMANTINO/MT
Autora: EDIJEIDE APARECIDA SOUZA FERNANDES FREITAS
Orientador: Dr. JOÃO CARLOS DE SOUZA MAIA
Co-orientador: Dr. BENEDITO DIAS PEREIRA
Aprovada em 29 de março de 2.004. Comissão Examinadora:
_________________________________
Profº Dr. João Carlos de Souza Maia
(FAMEV/UFMT) (Orientador)
_________________________________
Profº Dr. Benedito Dias Pereira
(FAECC/UFMT) (Co-orientador)
___________________________________
19
Profº Dr. Rodrigo Aleixo Brito de Azevedo
(FAMEV/UFMT)
___________________________________
Profº Dr. Francisco de Souza Ramos
(PIMES/UFPE)
20
“A natureza tem horror ao vácuo.”
Aristóteles
DEDICO
Aos meus pais adorados e admiráveis
Eliete e Salvador, exemplos de vida, luta e vitória, que sempre me irradiam luz divina.
Aos meus irmãos queridos
Edijan, Edilene e Edinei, pela amizade, união e apoio.
21
Ao meu amado marido
Pedro Paulo, pelo companheirismo, compreensão, colaboração intelectual e apoio na
busca pelo conhecimento.
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu amigo e orientador Profº João Carlos, que sempre demonstrou acreditar em meu trabalho, não poupou esforços para me ajudar e orientar no desenvolvimento desta pesquisa. Agradeço ao meu amigo e orientador Profº Benedito Pereira, sempre junto, encaminhando, apoiando, orientando. Agradeço à amiga, colaboradora e orientadora Profª Janaina Carvalho da Silva, que sem medir esforços, despendeu seu precioso tempo para me orientar, no momento que mais precisei de apóio. Agradeço as bancas de qualificação e defesa, que muito contribuíram para a evolução e engrandecimento desta Dissertação. Agradeço a equipe de pesquisa: Tatiana, Gioconda e Gilberto, que juntos realizamos a pesquisa de campo na Cidade de Diamantino e desenvolvemos o banco de dados. Agradeço a FAPEMAT – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Mato Grosso, pelo apoio financeiro, por acreditar nos cientistas deste Estado, por colaborar com a ciência.
22
Agradeço a Universidade Federal de Mato Grosso, a Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, aos coordenadores do programa de pós-graduação em Agricultura Tropical, pelo conjunto da obra, por abrir portas, por mostrar caminhos. Agradeço a Faculdade de Administração, Economia e Ciências Contábeis – FAECC/UFMT, aos professores do departamento de Economia e Ciências Contábeis que me forneceram livros, dissertações, teses, revistas, artigos na área de valoração econômica. Agradeço aos meus professores do mestrado, pelas orientações, ensinamentos e lições sobre como fazer ciência. Agradeço a todos os técnico-administrativos do programa de pós-graduação, em especial a Maria e Denise. Agradeço a todos os colegas de mestrado pelo companheirismo, em especial a Karine Medeiros, que juntas lutamos para concretizar nossos trabalhos de pesquisa. Agradeço a União de Ensino Superior de Diamantino - UNED, pela colaboração, pelo apoio logístico no desenvolvimento deste trabalho. Agradeço a Cidade de Diamantino, pela recepção, colaboração e acolhida.
23
VALORAÇÃO CONTINGENTE DE ATIVOS AMBIENTAIS NA
SUINOCULTURA: UM ESTUDO DE CASO NO MUNICÍPIO DE
DIAMANTINO/MT
RESUMO - Este trabalho teve por objetivos estimar e buscar a compreensão do
valor de existência dos ativos ambientais, impactados pela criação de suínos da
principal granja produtora do Estado de Mato Grosso, localizada no município
de Diamantino. A criação de suínos, em escala intensiva de produção, traz
como conseqüência uma grande produção de dejetos nas unidades produtivas,
os quais são altamente poluentes e causadores de degradação ambiental,
quando não manejados e tratados devidamente, como a contaminação do solo,
da água e o desenvolvimento de odores. A problematização desta dissertação
encontra-se no estudo das externalidades (conseqüências) que a suinocultura
provoca sobre o meio ambiente. A hipótese é: o valor de existência estimado
dos ativos ambientais caracteriza baixa consciência da população do município
de Diamantino/MT quanto às questões ambientais relacionadas à suinocultura.
Quanto à metodologia, adotou-se o método valoração contingente, pelo qual se
estimou o valor monetário com base nas preferências individuais reveladas da
disposição a pagar da amostra pela preservação dos ativos ambientais no
contexto de um mercado hipotético. O levantamento da valoração contingente
foi realizado nas ruas da cidade de Diamantino, e, a partir dos dados obtidos,
estimou-se o valor monetário de R$ 1,76 mensal por indivíduo, quantia
24
interpretada como valor dos benefícios obtidos pela satisfação que as pessoas
possuem em saber que o ecossistema Cerrado existe e está sendo preservado.
Buscando a compreensão sobre o valor estimado numa perspectiva
fenomenológica existencialista, o valor indica baixa consciência ambiental da
população do município de Diamantino/MT, na relação meio ambiente e
suinocultura.
Palavras-chave: impacto ambiental, recursos naturais, valoração econômica.
CONTINGENT VALUATION OF ENVIRONMENTAL ASSETS IN PIG
FARMING: A STUDY OF CASE IN THE MUNICIPAL DISTRICT OF
DIAMANTINO/MT
ABSTRACT- This work had for objectives esteem and to search the
understanding of the value of existence of the environmental assets, impact for
the swine creation of the main producing farm of the State of Mato Grosso,
located in the municipal district of Diamantino. The swine creation in intensive
scale of production brings as consequence a great production of dejections in
the productive units, which are highly pollutant and causing of environmental
degradation, when no mismanaged and treated duly, as the contamination of the
soil, the water and the development of odors. The problem of this dissertation
meets in the study of the externality (consequences) that the swine production
provokes on the environment. The hypothesis is: the esteem existence value of
the environmental assets characterizes low conscience of the population of the
municipal district of Diamantino/MT as for the environmental subjects related to
swine production. The methodology, the contingent valuation method was
adopted for which if it esteem the monetary value on the basis of the individual
preferences of the disposition to pay of the sample for the preservation of the
environmental assets in the context of a hypothetical market. The survey of the
contingent valuation was accomplished in the streets of the city of Diamantino,
and, from the gotten data, the monetary value was of R$ 1,76 monthly for
25
individual, interpreted amount as value of the benefits obtained by the
satisfaction that the people possess in knowing that the ecosystem Cerrado
exists and it is being preserved. Looking for the understanding on the estimated
value in a perspective existentialist phenomenological, the value indicates low
environmental conscience of the population of the municipal district of
Diamantino/MT, in the relationship environment and swine production.
Word-key: environmental impact, natural resources, economic valuation.
LISTA DE TABELAS
Página
Tabela 1. Produção média diária de esterco (kg), esterco + urina (kg) e
dejetos líquidos (l) por animal por fase................................................
95
Tabela 2. Características de dejetos suínos (fezes + urinas), expressos por
1.000 kg...............................................................................................
97
Tabela 3. Perdas de Nitrogênio (%) em função do sistema de estocagem,
tratamento e utilização........................................................................
102
Tabela 4. Distribuição de freqüência dos entrevistados no município de
Diamantino, por faixa de renda familiar mensal líquida......................
134
Tabela 5. Tipos de impacto ambiental que a suinocultura pode causar sobre
o meio ambiente..................................................................................
135
Tabela 6. Ambientes naturais do município de Diamantino............................. 136
Tabela 7. Mudanças Ambientais percebidas depois da implantação da
suinocultura no município de Diamantino – externalidades positivas..
137
Tabela 8. Mudanças Ambientais percebidas depois da implantação da
suinocultura no município de Diamantino – externalidades
negativas.............................................................................................
138
26
Tabela 9. Mudanças econômicas percebidas depois da implantação da
suinocultura no município de Diamantino............................................
139
Tabela 10. Valores da disposição a pagar da
amostra.....................................
141
Tabela 11. Motivos pelo não disposição a pagar, dos
entrevistado, pelos
ativos
ambientais..................................................................................
142
Tabela 12. Parâmetros estimados do modelo logit para a
disposição a pagar
pela preservação dos ativos ambientais em
Diamantino/MT...............
146
Tabela 13: Valores médios para estimar o valor estimado
dos parâmetros.....
147
LISTA DE FIGURAS
Página
Figura 1. Preço de equilíbrio em concorrência
perfeita.....................................
28
Figura 2. Preço social (Ps) e preço privado
(Pp)...............................................
29
Figura 3. Decomposição do valor econômico de um recurso
ambiental...........
49
Figura 4. Métodos de valoração 51
27
ambiental.......................................................
Figura 5. Excedente do consumidor
.................................................................
65
Figura 6. Variação do excedente do
consumidor..............................................
66
Figura 7. Medidas de ganho de bem-estar para uma redução de
preço..........
68
Figura 8. Medidas de excedente do consumidor para um bem
público............
72
Figura 9. Curvas de
indiferença........................................................................
77
SUMÁRIO
Página
28
1. INTRODUÇÃO........................................................................................................ 15
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA DA VALORAÇÃO ECONÔMICA
AMBIENTAL...............................................................................................................
23
2.1. Bens públicos ......................................................................................................... 23
2.2. Externalidades......................................................................................................... 24
2.3. A importância da valoração econômica ambiental................................................. 30
2.3. Variações de bem-estar........................................................................................... 31
2.4. As teorias econômicas sobre o valor...................................................................... 32
3 QUESTOES METODOLÓGICAS DA VALORAÇÃO ECONÔMCA
AMBIENTAL............................................................................................................
45
3.1. O valor econômico dos ativos ambientais.............................................................. 45
3.2. Métodos diretod de valoração ou métodos da função demanda.............................. 52
3.2.1. Método de mercado de bens complementares .................................................... 52
3.2.1.1. Método de preços hedônicos............................................................................. 53
3.2.1.2. Método de custo viagem................................................................................... 54
3.2.2. Método de valoração contingente........................................................................ 55
3.3. Métodos indiretos de valoração ou métodos da função oferta................................ 57
3.3.1. Método de produtividade marginal...................................................................... 57
3.3.2. Método de mercado de bens substitutos............................................................... 59
3.3.2.1 Custo de reposição............................................................................................. 60
3.2.2.2. Custos evitados................................................................................................. 60
3.3.2..3. Custos de controle............................................................................................ 60
3.3.2.4. Custo de oportunidade...................................................................................... 61
4. MÉTODO DE VALORAÇÃO CONTINGENTE................................................. 63
4.1. Fundamentos microeconômicos.............................................................................. 64
4 4.2. A valoração de contingente através da disposição a pagar (DAP) e da disposição
a aceitar (DAA)........................................................................................................
72
4.2.1. Escolha entre a DAP e a DAA ............................................................................ 74
4.2.2. Causas das disparidades entre a DAP e a DAA ................................................... 74
4.2.3. Técnicas para obtenção da disposição a pagar e a aceitar.................................... 78
29
4.2.3.1. Lances livres ou forma aberta (open-ended)..................................................... 78
4.2.3.2. Referendum ou referendo (escolha dicotômica)............................................... 79
4.2.3.3. Referendum com follow up ou referendo com acompanhante.......................... 81
4.2.4. O instrumento (ou veículo) de pagamento........................................................... 81
4.2.5. A forma de entrevistar.......................................................................................... 81
4.3. Estimação do método de valoração contingente: validade, confiabilidade
vieses........................................................................................................................
82
4.3.1. Validade............................................................................................................... 82
4.3.2. Confiabilidade...................................................................................................... 83
4.3.3. Vieses – os principais problemas do método....................................................... 84
4.3.3.1. Viés estratégico................................................................................................. 84
4.3.3.2. Viés de estrutura ou do desenho do questionário.............................................. 85
4.3.3.3. Viés hipotético................................................................................................... 86
4.3.3.4. Viés operacional................................................................................................ 87
4.3.3.5. Viés de protesto................................................................................................. 87
4.3.3.6. Os vieses potenciais.......................................................................................... 87
5. A SUINOCULTURA E SEUS EFEITOS SOBRE ATIVOS AMBIENTAIS..... 93
5.1. A suinocultura......................................................................................................... 93
5.2. Os dejetos suínos..................................................................................................... 93
5.2.1. Volume produzido dos dejetos............................................................................. 95
5.2.2. Composição física e química................................................................................ 96
5.3. Efeitos da suinocultura sobre os ativos ambientais................................................. 98
5.3.1. No solo................................................................................................................. 99
5.3.2. Na água................................................................................................................. 100
5.3.3. No ar..................................................................................................................... 103
5.3.4. Na fauna e flora.................................................................................................... 105
6. A CONSCIÊNCIA AMBIENTAL NUMA PERSPECTIVA
FENOMENOLÓGICA..........................................................................................
107
6.1. A fenomenologia..................................................................................................... 108
6.2. As diferentes compreensões de consciência na perspectiva de alguns
30
pensadores fenomenólogos....................................................................................... 110
6.2.1. A consciência na fenomenologia essencialista-transcendental............................ 110
6.2.2. A consciência na fenomenologia existencial....................................................... 113
6.3. A compreensão do valor econômico da natureza................................................... 120
7. METODOLOGIA.................................................................................................... 123
7.1. A pesquisa de campo.............................................................................................. 124
7.2. Estimativa do método de valoração contingente.................................................... 126
7.2.1. O modelo logit..................................................................................................... 127
7.2.2. A estimação da DAP............................................................................................ 128
8. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS....................................................................... 132
8.1. Características descritivas da amostra.................................................................... 132
8.2. Cálculo da DAP....................................................................................................... 143
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. 151
10. CONCLUSÕES...................................................................................................... 159
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... 163
ANEXO......................................................................................................................... 168
31
1. INTRODUÇÃO
A suinocultura é uma atividade economia de produção intensiva de
carne, realizada através de confinamento de suínos, engendrando emprego e
renda. O seu produto, a carne suína, é de maior consumo mundial desde 1978,
superando de frango e de bovinos. Seu consumo tem crescido continuamente
em torno de 2% ao ano, desde 1978. Os principais produtores de carne suína
no mundo, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), em 2003, eram a China, a Europa e os Estados Unidos da América. No
Continente Europeu, destacam-se a Alemanha, a Espanha e a França. Os três
principais mercados consumidores também são, em ordem decrescente, a
China, a Europa e os Estados Unidos. O consumo mundial per capita, em 2003,
era estimado em torno de 14 quilogramas/habitante/ano.
No Brasil, de acordo com Gomes et al. (1992), a atividade sofreu franco
crescimento a partir dos anos 70, quando a suinocultura brasileira foi
estimulada pela política agrícola, principalmente de crédito rural, com o intuito
de modernizar o setor agrícola. Foi possível tecnificar a suinocultura,
aumentando a produção e a produtividade com a importação de pacotes
tecnológicos, inclusive genéticos. Subsídios à agroindústria permitiram a
ampliação também deste segmento e a absorção da produção suinícola
crescente.
Ainda segundo Gomes et al. (1992), a partir de meados década de 70, a
carne suína nacional passou a ter importância em mercados externos em
decorrência de sua qualidade e de seus custos de produção competitivos,
comparativamente a outros países exportadores.
A década de 80 foi de estagnação para a produção de carne suína em
nível nacional, decorrente de um quadro de instabilidades macroeconômicas
32
em que a havia inflação, recessão e distorções na distribuição de renda, tudo
isto aliado a uma oferta abundante de produção de suínos, resultado dos
investimentos da década anterior, e de pressões nos custos de produção,
principalmente devido à variação no preço do milho.
O início da década de 90 foi de crescimento modesto do consumo per
capita, do consumo nacional total e da produção nacional de carne suína. A
indústria frigorífica inicia a tipificação de carcaças, pagando de acordo com a
qualidade da carne. Eventuais melhoras do preço do suíno vivo foram
contrabalançadas por altas no preço do milho, competição com a carne de
frango e redução de compras de carne suína pela Argentina, justificada pela
existência de febre aftosa em rebanhos da Região Sul (Rohenkohl, 2003).
A partir da metade de 1994, com uma ligeira recuperação da renda da
população mais pobre, da boa oferta de milho e de suínos para abate, houve
certa estabilização do mercado e melhor rentabilidade para o suinocultor. De
1994 a 2003, a suinocultura nacional viveu rotineiramente envolvida em
oscilações de rentabilidade de amplitude moderada, decorrentes dos ciclos de
oferta de milho, o que o governo federal tentou diminuir com intervenções de
seus estoques, e dos ciclos de oferta de suínos para abate.
Observando a suinocultura em números, de acordo com o IBGE, a
produção de carne suína era de 1.150 milhões de toneladas em 1980, subiu
para 2.556 milhões em 2000, e atingiu a produção de 2,7 milhões de toneladas
em 2003, onde a produção mundial foi de 95.800 milhões de toneladas neste
mesmo ano. A participação mundial do Brasil na produção de carne suína
cresceu acentuadamente a partir de 1990 (1,49%) e alcançando em 2003 o
percentual de 2,8% do total de carne suína produzida no mundo. De 1990 a
2003, a produção cresceu 159%, enquanto a produção mundial cresceu 37,1%.
Nos últimos 23 anos, a produção nacional de carne suína vem
apresentando índices consideráveis de crescimento, em torno de 4,5% ao ano.
De acordo com o IBGE (2003), em 1980, o Brasil possuía 32,5 milhões de
cabeças, formando o seu rebanho suíno. Em 1990, foi reduzido seu rebanho
33
para 30 milhões de cabeças, mas, a partir de 2000, este rebanho brasileiro
voltou a crescer atingindo 37,3 milhões de cabeças; 37,5 milhões, em 2001; 38
milhões, em 2002, mantendo o mesmo rebanho, em 2003.
Esse rebanho estava distribuído, segundo o IBGE, em 13 milhões ou
34,21% na região Sul, maior região produtora do país; 8,75 milhões (23,05%)
na região Nordeste; 7,2 milhões de cabeças ou 18,95% na região Sudeste; a
região Centro-Oeste possuía em 2003: 6,15 milhões de cabeças ou 16,18% do
plantel nacional e a região Norte, com o menor rebanho: 7,635 ou 2,90 milhões
de cabeças.
Quanto ao Estado de Mato Grosso, a atividade suinícola está em franca
expansão no Estado, uma vez que a região apresenta condições competitivas
favoráveis à produção de suínos como: grande produtor de grãos, clima
favorável, Mato Grosso é considerado área livre de aftosa (com vacinação) e
inclusão como área livre de peste suína clássica e, ainda, a criação pelo
governo do Estado do programa “Granja de Qualidade”, a partir de 1995, que
promove incentivo fiscal sobre o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e
Serviços (ICMS) sobre a comercialização de animais para abate.
O rebanho suíno no Estado de Mato Grosso apresentou queda em seu
plantel em 1995, quando possuía 885.505 mil de cabeças para 602 mil
cabeças, em 1996 e 642.310 mil, em 1997; a partir deste último ano o plantel só
aumentou, pois em 2000, possuía 854.521 mil, e em 2001 – 911.521 mil
cabeças, atingindo, em 2002: 932.992 mil cabeças, segundo o IBGE.
O rebanho de matrizes também sofreu retração no Mato Grosso, em
1995 eram 109.308 mil matrizes, reduzindo para 78.180 mil, em 1997, e 78.660
mil, em 1998. Começou sua trajetória de crescimento, em 1999, com 79.825 mil
cabeças, e, em 2002, atingiu um total de 80.086 mil matrizes suínas.
A distribuição do rebanho de matrizes de suíno no Estado de Mato
Grosso, de acordo com a Associação dos Criadores de Suínos de Mato Grosso
(ACRISMAT) apud Alves (2001), apresenta-se com uma concentração em torno
de 63% do total na região Médio-norte, nos municípios de Diamantino, Lucas do
34
Rio Verde, Nova Mutum, Sorriso e Tapurah. A região Sul do Estado detém
cerca de 33% do total de matrizes, nos municípios de Alto Araguaia, Campo
Verde, Dom Aquino, Pedra Preta, Primavera do Leste e Rondonópolis. Na
região Norte, no município de Sinop, concentra-se aproximadamente 5% das
matrizes.
Em Mato Grosso, de acordo com a Acrismat apud Alves (2001), somente
dois frigoríficos estavam habilitados para abaterem os suínos das 64 granjas
inscritas no Programa Granja de Qualidade, sendo um localizado em Nova
Mutum e outro em Rondonópolis. Das 64 granjas que o Estado possuía em
2001, 26 eram unidades de terminação, nas quais o animal recebia os últimos
tratamentos antes de ir para o abate.
Na região Médio-Norte de Mato Grosso, está sendo implantado um
sistema de criação, onde as cooperativas produzem os leitões e os produtores
efetuam as fases de cria e terminação. A região foi escolhida para abrigar a
maioria das 150 famílias de produtores de suínos da Holanda (municípios de
Nova Mutum e Sapezal), bem como deverá receber até 2005 cerca de R$ 50
milhões em investimento na construção de um complexo de suínos, no
município de Sorriso, pelo grupo americano Spectrum Suínos Sistem, que
possui sede em Sterlling, no Estado de Illinois (Estados Unidos da América); a
mesma empresa também estuda a possibilidade de montar um outro complexo
no município de Lucas do Rio Verde/MT.
Nessa mesma região, no primeiro semestre de 2000, a empresa Carroll’s
Foods do Brasil S.A. inaugurou em Diamantino/MT a primeira granja que faz
parte de um projeto da empresa, que até 2005 alojará 51,4 mil matrizes
comerciais, possuindo 1,2 milhões de cabeças de suínos no Município. Essa
empresa, uma joint venture entre a MPE Polato Participações e a Carroll’s
Foods, empresa norte-americana, deverá investir US$ 19 milhões na cadeia do
suíno em Mato Grosso até 2005. O faturamento anual após a conclusão dos
investimentos deverá atingir a faixa de R$ 215 a R$ 225 milhões.
35
Analisando o potencial econômico para a prática suinícola, o município
de Diamantino/MT possui vantagens comparativas excelentes para manejo: o
clima é tropical quente semi-úmido; mão-de-obra barata. Tanto o município
quanto a Região Médio-Norte é grande produtora de grãos como: milho e soja,
base da alimentação atual dos suínos, perfazendo um custo de produção final
da carne competitivo no mercado mundial.
No entanto, desenvolvendo observações do ponto de vista ambiental, a
prática suinícola implica na geração de grande quantidade de dejetos animais
por área, com significativo potencial de impacto ambiental. Estudos recentes da
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) têm demonstrado
um alto nível de contaminação, por dejetos suínos, dos rios e lençóis de água
superficiais que abastecem tanto o meio rural como o urbano, no Brasil
(Miranda et al., 1999; Palhares et al., 2002; Diesel et al., 2002). Desenvolvendo
análise sobre a contaminação de água, o município de Diamantino localiza-se
em uma região de extrema importância do ponto de vista ambiental. É uma
região de nascentes de importantes rios formadores das Bacias Amazônicas e
do Prata, sendo, portanto, um divisor hídrico e uma área de recarga de
aqüíferos, sendo fundamental a preservação e conservação da qualidade e
quantidade das águas que aí nascem para formar grandes rios como o
Paraguai (Bacia do Prata) e o Juruena (Bacia Amazônica).
A capacidade poluente dos dejetos suínos, em termos comparativos, é
muito superior a de outras espécies. Perdomo (1999) exemplifica que um suíno,
em média, equivale a 3,5 homens, de poder poluente. Em outras palavras, uma
granja com 600 animais possui um poder poluente, de acordo com este
comparativo, semelhante ao de um núcleo populacional de aproximadamente
2.100 pessoas.
A causa principal da poluição é o esterco de suínos que, quando entra
em contato com os cursos de água, acarreta desequilíbrios ecológicos e
poluição, em função da redução do teor de oxigênio dissolvido na água,
36
disseminando patógenos e contaminando água potável com amônia, nitratos e
outros elementos tóxicos (Palhares et al., 2002).
A produção de suínos acarreta, também, a poluição do ar, provocando
problemas com odores desagradáveis. Isso ocorre devido à evaporação dos
compostos voláteis, que causam efeitos prejudiciais ao bem-estar humano e
animal. Os contaminantes do ar mais comuns nos dejetos são: amônia, metano,
ácidos graxos voláteis, etanol, propanol, dimetil sulfidro e carbono sulfidro. A
emissão de gases pode causar graves prejuízos nas vias respiratórias do
homem e animais, bem com, a formação de chuva ácida através de descargas
de amônia na atmosfera (Perdomo, 1999).
Estes impactos ambientais, acima expostos, são fenômenos
mensuráveis do ponto de vista da valoração econômica, uma vez que decorre
da alteração da quantidade e qualidade dos recursos naturais, levando a
variação de bem-estar do homem.
Desta maneira, a valoração econômica ambiental possui a finalidade de
atribuir valor econômico aos ativos ambientais através da medição da variação
de bem-estar que a alteração dos recursos ambientais provoca, percebida pelos
agentes econômicos e manifestada nas suas preferências individuais pelos
ativos ambientais. Esta percepção se revela pela consciência que os indivíduos
possuem sobre o meio ambiente, sendo formada a partir do tempo, espaço e
vivencia do homem, expressada pela disposição a pagar ou aceitar pelo ativo
ambiental.
A valoração econômica ambiental utiliza-se de vários métodos e técnicas
para aferir o valor econômico dos ativos ambientais. Um desses é o método de
valoração de contingente, desenvolvido através das medidas de bem-estar:
variação compensatória, variação equivalente, excedente de compensação e
excedente de equivalência, sendo interpretado pela disposição a pagar (DAP)
de um indivíduo por uma melhoria, preservação ou conservação do recurso
ambiental ou através da disposição a aceitar (DAA) por uma piora ou
decréscimo na oferta do ativo.
37
Desta maneira, a problematização desta Dissertação centra-se no estudo
das externalidades (conseqüências) que a suinocultura provoca sobre o meio
ambiente, em outras palavras: qual é o valor econômico dos ativos ambientais
insertos no processo produtivo deste tipo de atividade econômica?
O objetivo se constitui em estimar o valor de existência dos ativos
ambientais decorrentes dos efeitos da criação de suínos da principal granja
produtora do Estado de Mato Grosso, localizada no município de
Diamantino/MT, utilizando o método de valoração contingente, valendo-se da
disposição a pagar da população do município pelos ativos ambientais. O
objetivo específico é buscar compreender o valor de existência dos ativos
ambientais aferido pelo método de valoração contingente atribuído pela
consciência ambiental da população do município de Diamantino/MT, numa
perspectiva fenomenológica.
A hipótese desta dissertação é: o valor de existência estimado dos ativos
ambientais caracteriza baixa consciência da população do município de
Diamantino/MT quanto às questões ambientais relacionadas à suinocultura.
Este trabalho se desenvolve da seguinte maneira: no segundo capítulo é
desenvolvida a fundamentação teórica microeconômica para valoração
econômica de ativos ambientais, focando as discussões sobre bens públicos,
externalidades, variação de bem-estar e teorias econômicas sobre o valor.
O terceiro capítulo trata das questões metodológicas da valoração
econômica ambiental: o valor econômico ambiental e os métodos e técnicas
existentes para se medir o valor da natureza.
No quarto capítulo se desenvolvem discussões teóricas e metodológicas
sobre o método de valoração contingente, método utilizado para mensurar o
valor de existência dos ativos ambientais que sofrem impactos da suinocultura
no município de Diamantino/MT.
A suinocultura e os seus efeitos sobre ativos ambientais são abordados
no quinto capítulo; busca-se com esse capítulo fazer uma descrição sobre a
38
suinocultura e o que esta atividade econômica pode causar de externalidades
sobre o meio ambiente.
E no sexto capítulo que se desenvolvem as concepções sobre
consciência numa perspectiva fenomenológica, buscando compreender o valor
de existência dos ativos ambientais no município de Diamantino que sofrem
efeitos da atividade suinícola.
A metodologia deste trabalho é descrita e desenvolvida no sétimo
capítulo. Apresentando o desenvolvimento da pesquisa de campo para a coleta
dos dados e da estimativa da DAP.
No oitavo capítulo são demonstrados os resultados e discussão.
Inicialmente expõem-se as características descritivas da amostra,
posteriormente apresenta-se o cálculo da DAP e, por fim, é realizada a análise
do modelo de regressão.
No nono e décimo capítulos constam às considerações finais e
conclusões, respectivamente.
39
5. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA DA VALORAÇÃO ECONÔMICA
AMBIENTAL
O processo de produção e consumo de bens econômicos de maneira
intensiva, que se desenvolveu durante o século XX no mundo, provocou o uso
também intensivo dos recursos ambientais, sem preocupação com a
capacidade de suporte e resiliência destes, gerando custos e benefícios que
não são captados no sistema de mercado, mas que são sentidos pela
sociedade uma vez que altera o nível de bem-estar dos indivíduos.
Neste contexto, a ciência econômica através da valoração econômica
ambiental utiliza-se de métodos que buscam estimar o valor dos ativos
ambientais, refletindo os fluxos de bens e serviços oferecidos pela natureza às
atividades econômicas e humanas, no sistema de mercado. O problema
encontrado para estimar os valores desses diz respeito às características
observadas neles: são bens públicos e apresentam externalidades.
A seguir abordam-se essas características dos ativos ambientais, a
importância da valoração econômica ambiental, a variação de bem-estar e as
teorias sobre valor.
2.1. Bens públicos
Um bem é caracterizado como público, quando apresenta a propriedade
de não destruição pelo uso e cujos direitos de propriedade não estão
completamente definidos e assegurados. Dessa maneira, a impossibilidade
legal ou física de excluir alguém de usufruir o benefício, provoca no sistema de
40
mercado ineficiência na formação de seus preços. Um bem ambiental reúne
estas características de bem público.
A teoria econômica fornece varias definições sobre bens públicos (Motta
e May, 1998, p.50):
a) teoria da troca: bens públicos são aqueles cuja utilização não se pode
individualizar porque estão colocados, simultaneamente, à disposição de
todos os indivíduos;
b) teoria Organicista do Estado: bens públicos são aqueles que
satisfazem “necessidades coletivas” e que colocados à disposição pelo
Estado, proporcionam bem-estar aos indivíduos;
c) teoria Institucional: Bens públicos são aqueles que estão sendo
atualmente supridos pelo Estado ou estão sob sua influência direta, que
seja sua essência direta ou natureza sócio-política.
2.2. Externalidades
O uso dos ativos ambientais assemelha-se muito ao uso dos bens
públicos, por isso, existe a necessidade de se abordar o conceito de
externalidade. As externalidades estão presentes sempre que terceiros ganham
sem pagar por seus benéficos marginais ou percam sem ser compensados por
suportarem o malefício adicional. Assim, na presença de externalidades, os
cálculos privados de custos ou benefícios diferem dos custos ou benefícios da
sociedade. Com isso, a externalidade existe quando o bem-estar de um
indivíduo é afetado, não só pelas suas atividades de consumo como também
pelas atividades de outros indivíduos (Motta, 1998, p. 206).
Pindyck e Rubenfeld conceituam a externalidade:
Uma externalidade surge sempre que a produção ou o consumo de um bem tem efeitos paralelos sobre os consumidores ou produtores envolvidos, efeitos estes que não são plenamente refletidos nos preços de mercado (2002, p. 631).
Nesta conceituação estão presentes três elementos fundamentais:
41
a) O comportamento de uma empresa (ou indivíduo) pode modificar o
lucro (ou utilidade) do(s) outro(s);
b) Os efeitos do comportamento de uma empresa (ou indivíduo) sobre
os outros não deve ser objeto de transação no mercado;
c) Estes efeitos devem constituir subprodutos involuntários e acidentais
das outras atividades.
Para Varian (2000), a característica fundamental da externalidade é:
A existência de bens com os quais as pessoas se importam e que não são vendidos nos mercados, portanto, não tem preço. Por exemplo, não há mercado para a fumaça produzida por charutos ou, ainda, para um vizinho que mantém um bonito jardim de flores. É a falta desses mercados para externalidades que causa problemas (Varian, 2000, p. 612).
É fácil notar a presença de externalidades, o mesmo não pode ser dito
no que diz respeito à correção das mesmas. Existem dificuldades de natureza
técnica, relativas ao conhecimento dos elementos prejudiciais da poluição, por
exemplo. Mesmo quando conhecidos os elementos maléficos das substâncias
poluentes, existem problemas em se identificar o quanto às pessoas foram de
fato afetadas por uma determinada fonte de poluição, ou seja, de como repartir
o ônus entre os poluidores; e ainda as dificuldades de compensar os afetados
pela poluição, ou seja, como evitar o comportamento oportunista quando se
oferece dinheiro para quem foi afetado por determinado tipo de poluição (Motta,
1998).
Outrossim, às dificuldades técnicas e informacionais decorrentes das
externalidades sobrepõe-se à dificuldade de se identificar corretamente os
direitos de propriedade em questão. Como repartir a responsabilidade pela
poluição atmosférica numa grande cidade? Quanto caberá aos proprietários de
veículos, aos industriais? Como e quanto se cobrará das granjas de suínos que
poluíram as águas e o solo, que causam contaminação dos rios, morte dos
peixes e, também, reduzem a fertilidade do solo? Dessa maneira os problemas
42
econômicos provocados pelas externalidades geralmente surgem devido à má
definição dos direitos de propriedade.
Os casos em que os direitos de propriedade estão mal definidos podem
levar a uma produção ineficiente de externalidades - o que significa que haveria
um meio de fazer com que ambas as partes (consumidores e produtores)
melhorasse, modificando-se a produção de externalidades. Se os direitos de
propriedade estiverem bem definidos e se houver mecanismos que permitam a
negociação entre as pessoas, elas poderão negociar seus direitos de produzir
externalidades da mesma forma que trocam direitos de produzir e consumir
bens comuns (Varian, 2000, p. 617).
Por oportuno, o Teorema de Coase, encaminha a solução para esse
assunto: desde que os direitos de emissão de externalidades sejam
adequadamente definidos e que não haja custos de transação entre as partes,
a livre negociação entre as mesmas deve levar ao nível ótimo de emissão
dessas externalidades (Varian, 2000, p. 618).
Segundo Pindyck e Rubenfeld (2002), o Teorema de Coase aplica-se a
todas as situações em que o direito de propriedade é bem especificado, o
Teorema de Coase:
Quando as partes puderem negociar sem custo e com possibilidade de obter benefícios mútuos, o resultado das transações será eficiente, independente de como estejam especificados os direitos de propriedade (Coase, 1960, p. 44, apud Pindyck e Rubinfeld, 2002, p. 650).
Para Varian (2000), a questão central das externalidades é derivada de
Coase, quando este autor estabelece que a externalidade é um problema de
propriedade mal definida, observação essa que, está enfocada no teorema
“coaseano”.
Quando a livre negociação entre as partes não é capaz de garantir que o
nível de emissão de poluentes seja eficiente, algumas políticas podem ser
justificáveis. As duas formas mais tradicionais de políticas públicas contra a
poluição são a regulamentação direta e o estabelecimento de uma taxa sobre a
emissão de poluentes, taxa essa conhecida como taxa pigouviana.
43
A taxa pigouviana, nome dado em homenagem ao economista Arthur
Pigou (1877-1959) da Universidade de Cambridge, é um imposto sobre unidade
de poluição emitida que deve igualar-se ao custo marginal social dessa poluição
no nível ótimo de emissão. O problema é que se precisa conhecer o nível ótimo
de poluição para se estabelecer o imposto.
Um ponto a favor da taxa pigouviana, de acordo com Marta (1999) é:
O estímulo que esta gera para que as firmas busquem desenvolver tecnologias menos poluidoras. Isso porque, com a taxa pigouviana, a emissão de poluição passa a ter um custo e, com isso, toda firma gostaria de possuir tecnologia que reduzissem seus custos (Marta, 1999, p. 21).
Sendo assim, nas análises econômicas, os bens públicos e as
externalidades são constituintes das fontes de ineficiências do mercado. Este é
justamente o ponto central da teoria econômica do meio ambiente: a maneira
de tratar as ineficiências do mercado para atingir o ponto ótimo de eficiência
alocativa da economia define as bases das políticas do meio ambiente. Sendo
um bem público e apresentando externalidade, os bens ambientais não são
eficientemente alocados.
A alocação ótima de recursos privados numa estrutura de mercado de
concorrência perfeita exige que:
a) os consumidores e os produtores sejam suficientemente numerosos,
de tal modo que mudanças nas qualidades individuais transacionadas
não afetem o preço;
b) os produtos transacionados sejam homogêneos;
c) exista a mobilidade de fatores;
d) todos os consumidores e produtores tenham informações perfeitas; e
e) não existem barreiras à entrada de novos agentes.
Garantindo-se o cumprimento destas exigências, o mercado estaria em
equilíbrio, como mostra a Figura 1, havendo um único preço vigente no
mercado, no qual todos agentes maximizam o seu bem-estar, maximizando-se
conseqüentemente, o bem-estar social.
44
Numa economia de concorrência perfeita, o equilíbrio da alocação de
recursos corresponde a uma situação onde ninguém pode melhorar sua
posição sem que outro se sinta lesado (ótimo de Pareto). Em tal economia, o
ótimo de Pareto coincide com a posição de equilíbrio de mercado: ponto que
iguala preços e custos marginais, se não se verificar a presença de nenhum
efeito externo. Contudo, se uma das exigências do modelo concorrencial não
for cumprida, o ótimo social não é estabelecido.
Preço
O
Pe
D
0 Qe Quantidade
Figura 1. Preço de equilíbrio em concorrência perfeita.
Nesse contexto, a literatura econômica ressalta que as quatro principais
fontes de falhas de mercado são: o monopólio natural, as assimetrias de
informação, os bens públicos e as externalidades conforme enunciado por
Margulis:
Quando alguma das imperfeições de mercado não permite que os preços de equilíbrio sejam os preços ótimos, o benefício social marginal de uma unidade extra de um bem não é igual ao seu custo social marginal. (Margulis, 1990, p.114 apud Pessôa, 1996, p. 14).
Na presença de imperfeições ou falhas de mercado, como por exemplo,
dos ativos ambientais não pode se verificá-las, a não ser que sejam utilizados
certos mecanismos de internalização de efeitos externos, uma vez que o
D = Demanda
O = Oferta
Qe = Quantidade de
equilíbrio
Pe = Preço de equilíbrio
45
sistema de preços não é capaz de captá-los. No caso dos ativos ambientais, a
curva de custo (benefício) marginal social difere da curva de custo (benefício)
marginal privado, devido à imperfeição ou falha de mercado.
Ilustra-se essa situação na Figura 2, onde o nível de produção
considerado ótimo é Qs, dado pelo intercepto da curva de benefício social
marginal (BSMg). Ps é o preço de equilíbrio. Devido a alguma falha de
mercado, o preço que vigora para os consumidores e produtores é Pp, o qual é
determinado pelo intercepto da curva de custo marginal privado (CPMg).
Observa-se que a quantidade ótima Qs deve ser menor do que a quantidade Qp.
Preço
CSMg
CPMg
Ps
Pp
BSMg
0 Qs Qp Quantidade
Figura 2. Preço social (Ps) e preço privado (Pp)
Falhas ou imperfeições de mercado como as externalidades desviam o
preço social de equilíbrio. No caso de uma externalidade ambiental, não existe
um mercado específico no qual a poluição de uma fábrica, que afeta as
populações vizinhas, possa ser negociada de forma a compensar os
prejudicados ou tornar possível o uso de equipamentos de controle. Portanto,
faz-se necessária a avaliação monetária desses efeitos, ou seja, é preciso se
quantificar monetariamente o custo de degradação, de exaustão, ou de
46
preservação, e a valoração econômica exerce esta tarefa, seus métodos serão
apresentados no capitulo 3.
2.3. A importância da valoração econômica ambiental
Um bem ambiental qualquer tem grande importância para o suporte às
funções que garantem a sobrevivência das espécies. De uma forma geral,
todas as espécies de animais e vegetais dependem dos serviços
ecossistêmicos dos recursos naturais para sua existência. Essa importância
traduz-se em valores associados aos bens ou recursos ambientais, objetivando
a contribuição do ativo ambiental para o bem-estar social, existindo, assim, a
necessidade do conhecimento e entendimento das funções ecossistêmicas da
biodiversidade para a valoração dos ativos ambientais.
A valoração econômica busca avaliar o valor econômico de um recurso
ambiental através da determinação do que é equivalente, em termos de outros
recursos disponíveis na economia, que estaria o homem disposto a abdicar de
maneira a obter uma melhoria de qualidade ou quantidade do recurso
ambiental. Em suma, a valoração de ativos ambientais é uma análise de trade-
offs, ou seja, escolha entre opções. (May et al, 2003).
A estimação dos valores monetários reflete valores econômicos
baseados nas preferências dos consumidores, utilizando mercados de bens
privados complementares e substitutos para serviços ambientais ou mesmo
mercados hipotéticos para esses serviços, assim, é possível estimar a
disposição a pagar ou a receber das pessoas por mudanças na provisão
ambiental.
Desenvolvem-se, agora, questionamentos sobre a variação de bem-
estar.
47
2.4. Variações de bem-estar
Quando a disponibilidade de um bem ambiental ou serviço ambiental
derivado de um ativo ambiental é alterado, a valoração deve mensurar as
variações de bem-estar que a alteração de disponibilidade do ativo provocou.
Mensurar variações de bem-estar requer valorar variações de utilidade, uma
variável não diretamente observada (Motta, 1998, p. 207).
Se uma variação da quantidade disponível de um bem (insumo ou
produto) é suficientemente pequena em relação à quantidade total utilizada na
economia, pode-se supor que a variação na sua demanda ou oferta pode ser
considerada marginal ou infinitesimal (isto é, quando a variação da função
demanda ou de oferta tende a zero). Conseqüentemente, a variação da
quantidade não altera o preço de equilíbrio e, portanto, não haverá variação de
bem-estar devido à variação da disponibilidade do bem.
Assim posto, segundo Dubeux (1998), a valoração econômica é um
procedimento de cálculo onde: os ganhos e as perdas de bem-estar para os
indivíduos são mensurados com o uso de valores monetários como padrão
comum e os valores monetários dos ganhos e das perdas dos indivíduos são
agregados como expressões dos ganhos líquidos ou das perdas líquidas da
sociedade.
A valoração tem por fundamento teórico (neoclássico) que os indivíduos
tomam decisões racionais e que a agregação das escolhas racionais dos
indivíduos resulta em uma decisão social racional. Assim, consiste em
identificar qual seria esta racionalidade frente à opção de execução, ou não de
uma tomada de decisão.
Conforme Motta (1998) e Dubeux (1998), na valoração, quantificar os
benefícios significa mensurar todos os ganhos de bem-estar incorridos pela
sociedade com o empreendimento, enquanto que quantificar os custos significa
mensurar todas as perdas de bem-estar advindas com o empreendimento
empresarial.
48
Mensurar variações de bem-estar corresponde, então, a valorar
variações de utilidade no consumo de bens e serviços ambientais que geram ou
diminuem satisfação. Satisfação e preferências são representadas pelo
conceito de utilidade, onde para um indivíduo, seu nível de utilidade é função
das quantidades consumidas de bens e serviços, de modo que:
U = (X1, X2, ..., Xn - 1) (1)
Onde:
U = função de utilidade,
X1, X2, ..., Xn - 1 = quantidades consumidas
Assim, quando a disponibilidade de um bem ou serviço ambiental deriva
de um ativo ambiental, ocorrem variações de bem-estar sociais cuja valoração
indica a dimensão destas variações resultantes das alterações de
disponibilidade.
A seguir, é desenvolvida a discussão teórica sobre valor para a teoria
econômica.
2.5. As teorias econômicas sobre o valor
Existem duas teorias predominantes sobre o valor na teoria econômica:
teoria do valor-trabalho e a teoria do valor-utilidade ou teoria marginalista. A
primeira sustenta que o valor não é mais do que uma manifestação do único
custo real de produção, que é o trabalho humano, sendo o trabalho o elemento
fundante de todos os preços. Já a teoria do valor-utilidade baseia-se no
princípio de que cada consumidor sabe quanto vale a mercadoria para ele; o
valor é, então, o preço relativo, sendo assim, o preço relativo reflete, em última
análise, a utilidade relativa para o consumidor de grande variedade de
mercadorias que estão à disposição dele.
Apresentam-se, na seqüência, as idéias dos economistas clássicos e
neoclássicos sobre valor, como o objetivo de compreender a fundamentação
teórica do valor dos recursos naturais.
49
Para os economistas da escola clássica, o valor advém da quantidade de
trabalho humano necessário para produzir uma mercadoria vendável. Nas
concepções de Adam Smith (1723-1790), todas as atividades que produzem
mercadorias geram valor; o valor (valor de troca) se fundamenta no trabalho, no
tempo necessário para a produção de uma mercadoria vendável. Geralmente
os seres humanos não conseguem sobreviver sem se esforçar para transformar
o ambiente natural de uma forma que lhes seja mais conveniente. O ponto de
partida da teoria de Smith foi enfatizado da seguinte maneira: o trabalho era o
primeiro preço, o dinheiro (padrão de troca relativo e nominal) da compra inicial
que era pago por todas as coisas. Assim, Smith afirmou que o pré-requisito
para qualquer mercadoria ter valor era que ela fosse produto do trabalho
humano.
Nas definições do valor dos bens, Adam Smith assim expressa: O preço real de cada coisa – ou seja, o que ela custa à pessoa que deseja adquiri-la – é o trabalho e o incômodo que custa a sua aquisição [...]. Importa observar que o valor real dos diversos componentes do preço é medido pela quantidade de trabalho que cada um deles pode comprar ou comandar. O trabalho mede o valor não somente daquela parte do preço que se desdobra em trabalho efetivo, mas também daquela representada pela renda da terra, e daquela que se desdobra no lucro devido ao empresário. (Smith, 1985, p. 87).
Sobre o valor de uso e de troca Smith explica que:
Importa observar que a palavra valor tem dois significados [...]. O primeiro pode chamar-se “valor de uso”, e o segundo, “valor de troca”. (...) nada é mais útil do que a água, e, no entanto dificilmente se comprará alguma coisa com ela, ou seja, dificilmente se conseguirá trocar água por alguma outra coisa. (Smith, 1985, p.61).
Na sua afirmação sobre o valor ambiental, ele diz:
A terra constitui de longe a parte maior, a mais importante e a mais durável da riqueza de todo país extenso. Pode certamente ser de alguma utilidade, ou ao menos, pode dar alguma satisfação ao público dispor de uma prova tão decisiva do crescente valor da parte maior, mais importante e mais durável de sua riqueza. (Smith, 1985, p. 222).
Para David Ricardo (1772-1823), inglês e discípulo de Smith, tem-se o
aperfeiçoamento da idéia do valor, e melhoramento do valor-trabalho. Ele
50
afirma que o valor de uma mercadoria depende da quantidade de trabalho
necessário a sua produção e não da maior ou menor remuneração que é paga
por esse trabalho, como Smith argumentava. Ricardo afirmava que a água e o
ar são úteis, indispensáveis à existência humana, mas que em circunstâncias
normais, não se obtêm nada em troca deles. Ele já comentava o esgotamento
dos recursos minerais e dizia que os efeitos da acumulação seriam diferentes
em países diferentes, pois dependeria basicamente da fertilidade e da
capacidade produtiva da terra.
O economista clássico Jean-Baptiste Say (1767-832) admite a utilidade
como o princípio do valor, ele abre precedentes para a valoração de bens
realmente úteis como a água, solo, alimentos, etc., mas também de coisas
antes consideradas rejeitos e até mesmo de produtos da moda, que possuem
utilidade artificial. Assim ele afirma:
O valor de cada coisa é arbitrário e vago enquanto não for reconhecido. A produção é em absoluto uma criação de matéria, mas uma criação de utilidade. A produção não se mede, de maneira alguma, pelo comprimento, volume ou peso do produto, mas pela utilidade que lhe foi dada. O preço é a medida do valor das coisas. O valor é a medida da utilidade. (Say, 1986, p. 54).
Para Thomas Robert Malthus (1766-1834) existia um problema
demográfico no mundo, no início do século XIX., que influenciava a quantidade
disponível de terra fértil e dos alimentos, por conseguinte, o valor de mercado
destes recursos. Segundo ele a população crescia em progressão geométrica e
os meios de subsistência em progressão aritmética, argumentando assim que
ocorreria num curto espaço de tempo escassez de recursos naturais para a
alocação de alimentos para toda população. Nesta concepção Malthus
enxergava problemas ambientais, a população estava crescendo rapidamente e
migrando do campo para a cidade. Ao crescerem as cidades, desenvolveram-
se também, em larga escala, subúrbios miseráveis, sistemas de esgotos e de
distribuição de água insuficientes e outras mazelas urbanas. Inúmeros
problemas econômicos e sociais gerados por essas mudanças nesse século
seguiam sem solução (Fusfeld, 2001, p. 55).
51
John Stuart Mill (1806-1873), também inglês e reconhecido por cristalizar
o pensamento liberal inglês do século XIX e econômico clássico, a ideologia do
livre-mercado, faz afirmações que tocam na questão ambiental. Segundo este
autor:
[...] enquanto a quantidade de um agente natural for praticamente ilimitada, ele não pode, a não ser que seja passível de monopólio artificial, ter valor algum no mercado, já que ninguém pagará por aquilo que se pode conseguir gratuitamente. Mas tão logo comece a existir na prática a limitação, tão logo a quantidade disponível da coisa se torne inferior àquela de que as pessoas se apoderariam e utilizariam se a conseguissem gratuitamente, a propriedade ou uso do agente natural adquire um valor de troca. (Mill, 1986, p. 87).
Mill, mesmo que implicitamente, já menciona uma tímida tentativa de
cálculo do capital natural, embora a teoria da utilidade (base teórica para os
métodos de valoração econômica dos ativos ambientais) só tenha aparecido
mais de cem anos após a elaboração: “todos os recursos dos quais o
proprietário aufere uma renda, renda essa que pode usar sem comprometer e
dissipa o próprio recurso, equivale para ele a capital” (Mill, 1986, p. 89).
Mill reconhece a limitação da produção agrícola devido à limitação de
terras disponíveis e da produtividade agrícola. Ele difere a terra dos demais
elementos de produção, como o trabalho e o capital, por ela não ser suscetível
a aumentos indefinidos, a sua extensão é limitada. Mill, ainda, reconhece que a
tecnologia pode suspender temporariamente, mas não impedir a limitação da
produção, seja ela extrativa, agropecuária ou industrial, pois aquela deriva dos
recursos naturais que ele chamou de agentes naturais limitados. À medida que
o limite de produção estiver se findando, investimentos cada vez maiores em
tecnologia (que implicam aumento considerável de capital) trarão ganhos cada
vez menores de produtividade.
52
Mill, em seu livro Princípios da Tributação, ainda, diz: Em resumo, todos os agentes naturais cuja quantidade é limitada, não somente são limitados em sua força produtiva última, como, muito antes de essa força ser solicitada ao máximo, respondem a todas as solicitações adicionais sob condições cada vez mais rigorosas. Todavia, essa lei pode ser suspensa ou temporariamente mantida sob controle por tudo aquilo que aumentar o poder geral da humanidade sobre a natureza, e, de modo especial, por qualquer enriquecimento do poder humano e do conseqüente domínio dos homens sobre as propriedades e as forças dos agentes naturais. (Mill, 1986, p. 88).
Analisando as idéias sobre valor de Karl Marx (1818-1883), sua teoria se
assemelha a de Say quanto diz que:
O que nos pertence como nosso atributo material, é nosso valor (...), o solo é um dos atributos materiais que nos é essencial à vida e os outros: a água e o ar são os que possibilitam os alimentos à nossa existência. Em relação aos valores de uso e de troca, ele ainda afirma que: [...] o valor de uso se realiza para as pessoas em troca, por meio de relação direta entre a coisa e a pessoa, enquanto o valor só se realiza através da troca, isto é, por meio de um processo social. (Marx, 1980, p.93).
Marx afirma que a agricultura e a indústria obtêm seus produtos com
base na destruição da força do trabalhador e do ambiente de onde vêm os
insumos para tais atividades:
Na agricultura moderna, como na indústria urbana, o aumento da força produtiva e a maior mobilização do trabalho obtêm-se com a devastação e a ruína física da força de trabalho. E todo progresso da agricultura capitalista significa progresso na arte de despojar não só o trabalhador, mas também o solo; e todo aumento de fertilidade da terra num tempo dado significa esgotamento mais rápido das fontes duradouras dessa fertilidade. (Marx, 1980, p. 92).
Marx argumenta ainda que a produção capitalista só desenvolve a
técnica e a combinação do processo social de produção esgotando as fontes
originais de toda a riqueza: a terra e o trabalhador. Para a espoliação da
segunda fonte de riqueza (trabalhadores) ele criou a teoria da mais-valia.
Essas abordagens sobre o valor ficaram conhecidas na teoria econômica
como teoria objetiva do valor ou teoria do valor-trabalho.
No início da década de 1870, Willian Stanley Jevons (1835-1882), Léon
Walras (1837-1910) e Carl Menger (1840-1921), desenvolveram uma nova
53
teoria do valor para substituir a teoria do valor-trabalho. O novo princípio era
simples: o valor de um produto ou serviço não decorre do trabalho incorporado
nele, mas da utilidade da última unidade adquirida. Para esses economistas
(neoclássicos), o valor de cada bem é representado pela utilidade que os
agentes econômicos possuem sobre o bem, fundamentado principalmente na
relação existente entre a utilidade e a quantidade do bem econômico no
mercado; essa é a visão da teoria subjetiva do valor ou teoria do valor-utilidade.
(Fusfeld, 2001, p. 113).
A economia neoclássica parte do pressuposto de que o preço de uma
mercadoria é igual ao seu valor. Para fundamentar essa igualdade, os
neoclássicos edificaram a economia do bem-estar e o conceito da eficiência
alocativa de recursos nos mercados. Assim, a função de bem-estar da
sociedade tem conexão direta com as preferências das pessoas, renda
disponível e utilidade de uma cesta de bens/serviços. Dessa maneira, os
mercados funcionam eficientemente, pois os recursos da sociedade estão
sendo alocados de acordo com a preferência revelada de seus agentes. É
nesse suporte teórico que a economia neoclássica fornece subsídio para o
cálculo do valor da natureza (May et al., 2003).
Fazem-se as apresentações dos pressupostos dos principais representes
da teoria neoclássica, para a compreensão do valor nesta abordagem.
Carl Menger, 1871, em seu livro Princípios de Economia Política,
apresenta que a estrutura econômica é naturalmente constituída como efeito
das escolhas individuais objetivando o atendimento de necessidades. O
pressuposto da análise de Menger é o indivíduo com sua escala de
necessidade e de desejos que requerem permanentemente o seu atendimento.
A causa da satisfação das necessidades é o consumo de bens.
54
Quanto ao valor econômico de um bem, Menger assim se expressa:
Para que um bem tenha valor econômico é preciso que exista uma hierarquia previa de desejos não inteiramente satisfeitos, a disponibilidade de bens escassos que devem ser economizados no atendimento deles, priorizando-se os desejos mais importantes, e o conhecimento do agente de que determinado bem pode ser colocado em nexo causal com a satisfação de necessidades. (Menger, 1983, p. 246).
Os bens não são desejados em si mesmos, mas porque somente eles
permitem preencher necessidades. A aptidão ou capacidade do bem que lhe
possibilita ser colocado em “nexo causal” com a satisfação de necessidades é a
sua utilidade. Somente os bens econômicos possuem valor. O valor é a
propriedade que eles adquirem, dada a existência de escassez ante o conjunto
de necessidades a serem atendidas.
O processo econômico elementar, na visão de Menger, depende do
conhecimento humano individual, os fenômenos econômicos configuram uma
estrutura básica permanente e é tarefa da teoria econômica pura estudar de
modo exato os mecanismos que os descrevem (fenômenos) bem como as leis
que os comandam; o agente econômico deve saber quais são as suas
necessidades e quais bens devem ser economizados no atendimento delas. É
sempre possível o erro, o indivíduo pode desconhecer suas necessidades
objetivas, pode não saber que certo bem possuía a propriedade objetiva de
atender a uma dada necessidade. Mas onde quer que conhecimento individual
do agente seja disponível na quantidade adequada o processo econômico
segue-se em obediência estrita às regularidades descrita na teoria exata (Feijó,
2000, p. 60).
Observando as concepções de Carl Menger, este economista indicou
que o consumidor racional, colocado diante de um grande número de
alternativas para despender sua renda, vai procurar maximizar sua satisfação.
Isso será alcançado quando o consumidor tiver alocado seus dispêndios de
forma que o último montante (o valor marginal) gasto em uma mercadoria não
proporcione nem mais nem menos satisfação ou bem-estar ou utilidade do que
o último montante gasto em qualquer outra coisa. O que confere valor a um
55
bem (água, terra, pão, vinho) é a importância do fim a ele associado. Menger
define o valor não como algo inerente aos bem, mas:
[...] é simplesmente a importância que determinados bens concretos – ou quantidades concretas de bens – adquirem para nós, pelo fato de estarmos conscientes de que só podemos atender às nossas necessidades à medida que dispusermos deles. [...] o valor é um juízo que as pessoas envolvidas em atividades econômicas fazem sobre a importância dos bens de que dispõem para a conservação de sua vida e de seu bem-estar, e, portanto, só existe na consciência das pessoas em questão. (Menger, 1983, p.353).
Menger caracterizou o consumidor como uma pessoa que pesava
continuamente as vantagens desta ou daquela ação e sempre escolhia a que
trouxesse o maior incremento da satisfação.
Willian Jevons salientou outro aspecto do princípio da utilidade, ao
mostrar que a utilidade marginal diminui: quanto mais uma pessoa possuir de
uma mercadoria, menor será a satisfação obtida pelo consumidor por outra
mercadoria e menor será a disposição a pagar por ela. Isso significa que
mercadorias abundantes serão baratas, porque uma quantidade adicional não
valerá muito para o comprador, mesmo que a mercadoria seja essencial para
garantir a vida, como a água. Mercadorias escassas, por outro lado, serão
caras, porque ninguém as possuirá em grande quantidade, e uma unidade
adicional trará uma grande dose de satisfação ao comprador como o diamante,
por exemplo. Então, se os recursos ambientais se tornam escassos, os seus
preços majoram. (Jevons, 1983)
A teoria da utilidade, desenvolvida por Jevons, parte dos princípios do
prazer e do sofrimento, o indivíduo busca satisfazer ao máximo as suas
necessidades com o mínimo de esforço – obter o máximo do desejável é custo
do mínimo indesejável; maximizar o prazer é, de acordo com Jevons, o
problema de economia. Com isso Jevons, dirige suas análises para as ações ou
objetos físicos que são para o homem forte de prazer e sofrimento, por meio
dos quais o sentimento de prazer é aumentado, ou afastando o sofrimento.
Para Jevons, influenciado por Courcelle-Senuil, Senior, Bentham, um
objeto é útil se afeta agradavelmente o sentido no momento presente, ou
56
quando por antecipação, espera-se que ele o faça em algum tempo futuro.
Assim deve-se distinguir cuidadosamente entre utilidade real, no uso presente,
e utilidade futura estimado, que, todavia, descontando-se a força imperfeita da
antecipação e a incerteza dos acontecimentos futuros, proporciona certa
utilidade presente. Têm-se, então, a noção do uso presente e futuro de
quaisquer bens, inclusive recursos naturais. “A utilidade, apesar de ser uma
qualidade das coisas, não é uma qualidade inerente. Define-se melhor como
uma circunstância das coisas que surge da relação destas com as exigências
do homem”. (Jevons, 1983, p. 50)
Para Jevons explicar que a utilidade não é uma qualidade intrínseca,
exemplificou sua idéia com o bem água:
[...] a água é indispensável até certa quantidade; e quantidades adicionais terão diversos graus de utilidade, a utilidade diminui gradativamente até zero, podendo mesmo torna-se negativa, ou seja, quantidade adicional das mesmas substâncias pode tornar-se inconvenientes e danosas. (Jevons, 1983, p. 50).
A variação da utilidade é medida pelos acréscimos feitos ao
contentamento de uma pessoa. O montante de utilidade corresponde ao
montante de prazer produzido. Mas a aplicação continua uniforme de um objeto
útil aos sentidos ou desejos não ira comumente produzir montantes uniformes
de prazer.
Uma vez recebida certa quantidade de um objeto, uma quantidade
adicional é indiferente, ou mesmo provoca desgosto. Cada aplicação sucessiva
em geral excitará os sentidos menos intensamente do que a aplicação anterior.
Portanto, de acordo com Jevons, a utilidade do ultimo fornecimento de um
objeto diminui geralmente em certa função da quantidade total recebida.
Utilidade pode ser tratada com uma quantidade de duas dimensões,
sendo que uma dimensão consiste na qualidade do bem, e a outra é a
intensidade do efeito produzido sobre o consumidor. Existindo teoricamente a
variação nas quantidades, devem-se retroceder as quantidades infinitesimais, e
o que Jevons chamou de coeficiente de utilidade, que é a relação entre o ultimo
acréscimo ou fornecimento infinitamente pequeno de um objeto e o aumento de
57
prazer que ele provoca, sendo ambos, naturalmente, estimado em suas
unidades apropriadas. “Raramente precisamos considerar o grau de utilidade
exceto com relação ao ultimo acréscimo que foi consumido ou, o que dá no
mesmo, ao próximo acréscimo que esta preste a ser consumido” (Jevons, 1983,
p. 53).
O coeficiente de utilidade é, portanto, certa função geralmente
decrescente da quantidade total do objeto consumido. Essa é a lei mais
importante de toda a teoria, onde a variação da função expressa o grau final da
utilidade que é o ponto principal nos problemas econômicos, segundo jevons.
“Podemos estabelecer como lei geral que o grau de utilidade varia com a
quantidade de um bem e finalmente diminui na medida em que a quantidade
aumente”. (Jevons, 1983, p. 54)
Essa função de utilidade é caracterizada de cada tipo de objeto e mais
ou menos de cada individuo. Desse modo, a vontade por água se satisfaz muito
mais rapidamente do que por vinho, por exemplo. E cada pessoa tem seus
próprios gostos (singularidade) característicos nos quais ele é praticamente
insaciável.
Léon Walras enunciou a doutrina da utilidade marginal em sua primeira e
principal obra, Elementos de Economia Política Pura, publicado em duas partes,
a primeira em 1874, em que analisa a teoria da troca, e a segunda em 1877, no
qual trata de teoria da produção. Walras fundamenta o valor da troca na
utilidade e nas limitações de quantidade. O desejo de que as utilidades
marginais sejam iguais conduzirá à troca. E esse desejo junto com as
quantidades de mercadorias que cada indivíduo possui e que determinaria uma
oferta e uma demanda representada por uma equação funcional (Fusfeld, 2001,
p. 116).
Léon Walras explicou como o sistema econômico inteiro, incluindo a
produção de bens e capital e matérias-primas, estava ligado às decisões de
dispêndio do consumidor. A economia era uma rede bem costurada de relações
entre preços e quantidades adquiridas, e qualquer mudança na alocação dos
58
gastos do consumidor era propagada por todo o sistema na forma de pequenos
ajustes de produção e preços. Especialmente numa economia competitiva, todo
o sistema ajustava-se automaticamente para adequar a produção à demanda.
Essas idéias levavam ao conceito de equilíbrio geral, no qual a produção
adequava-se às preferências do consumidor, e o maior nível possível de
satisfação do consumidor era alcançado, dados os recursos naturais e a
tecnologia existente.
O economista neoclássico Alfred Marshall (1842-1924), desenvolveu
uma nova visão sobre valor; argumenta que o preço de mercado, ou seja, o
valor econômico era determinado tanto pela oferta como pela demanda, que
interagiam basicamente da mesma forma com que Adam Smith havia descrito a
operação de mercados competitivos. Marshall demonstrou que, no longo prazo,
os preços, em mercados competitivos, tenderiam para o menor nível possível
de custos de produção no qual os montantes demandados pelos consumidores
fossem atendidos. Mas, embora Marshall tenha trazido os custos de produção
de volta, ele, também, abordava de maneira mais ampla as concepções de
Menger e Walras: o patamar de produção era determinado pelas inúmeras
decisões independentes de milhões de consumidores individuais (Fusfeld,
2001, 116).
Observa Marshall que uma pessoa prudente se esforçará para distribuir
os seus recursos para uso presente e futuro, estando disposta a renunciar a um
prazer atual por um igual prazer no futuro (1996, p. 195). A questão do prazer é
exposta como uma medida de utilidade marginal do consumidor de bens.
Marshall reforça esta idéia incluindo na análise o problema da incerteza. Então,
a medida de valor seria alcançada por meio da soma dos prazeres (das
satisfações) que um bem pode proporcionar a uma pessoa.
Com base nessa argumentação, Marshall afirma que:
é preciso notar, porém, que os preços da procura de cada mercadoria, sobre os quais avaliamos a utilidade total e o excedente do consumidor, pressupõem que as outras condições permanecem inalteradas, enquanto o preço sobe até o valor de escassez. (Marshall, 1996, p. 195).
59
Fundamenta assim o conceito de excedente do consumidor como
medida de valor da satisfação de uma pessoa, ou seja, uma medida que
possibilitaria mensurar o seu bem-estar, como princípio metodológico da
valoração econômica. (May et al., 2003)
O enfoque ambiental neoclássico parte do princípio de que um mercado
eficiente é capaz de internalizar os custos ambientais oriundos de
externalidades, referentes ao uso dos recursos naturais, e de assegurar que a
degradação de um recurso natural se reflita em seus preços.
Dos postulados neoclássicos, ora apresentados, aos pensadores
econômicos atuais, desenvolvem-se as idéias de valoração dos recursos
naturais, Sachs (1986) apud Motta (1998), que é um dos fundadores da
valoração ambiental, assim expressa:
[...] Poder-se-ia estabelecer um conjunto de indicadores ecológicos que nos dessem a conhecer a taxa de exploração da natureza que acompanha as diferentes atividades humanas, a evolução da qualidade do meio e o grau de normalidade dos ciclos ecológicos de renovação de recurso. (Motta, 1998, p. 184).
Com o suporte teórico da economia neoclássica o cálculo do valor da
natureza é representado pelo somatório do valor de uso direto, valor de uso
indireto, valor de opção e valor de existência. Qualquer parcela do valor pode
ser mensurada por meio de pesquisa, em que entre as variáveis
socioeconômicas inseridas na pesquisa, se pergunta qual é a disposição dos
indivíduos de pagar ou aceitar pelo recurso natural.
A disposição a pagar (ou aceitar) é o preço que o indivíduo está disposto
a pagar (ou aceitar) pelo uso, opção ou existência do ativo ambiental, e está
relacionada com os princípios da economia neoclássica, a decisão e a alocação
dos recursos estão baseadas na função utilidade das pessoas e na sua
concepção subjetiva sobre o bem ambiental. (Mota, 2001a)
Muitos problemas ambientais tiveram que acontecer em paralelo com o
crescimento econômico ocorrido após a revolução industrial, e principalmente
no século XX, para que fosse incluído o meio ambiente numa perspectiva
econômica, preocupando-se com a disponibilidade dos recursos naturais e a
60
manifestação das funções ecossistêmicas, tendo em vista que o consumo dos
recursos naturais faz parte da função utilidade e função produção do homo
economicus e que possuem valor no mercado, de maneira inadequada, ainda.
Diante do exposto, apresenta-se com isso uma evolução da consciência
ambiental.
A seguir, no próximo capítulo, são abordadas discussões metodológicas
sobre a valoração econômica ambiental.
61
3. QUESTÕES METODOLÓGICAS DA VALORAÇÃO ECONÔMICA
AMBIENTAL
A valoração econômica ambiental resume-se em um conjunto de
métodos úteis para mensurar os benefícios proporcionados pelos ativos
naturais, os quais se referem aos fluxos de bens e serviços oferecidos pela
natureza às atividades econômicas e humanas. E que, mesmo com a escassez
desses recursos, tais atividades continuam degradando os recursos da
natureza em escala acelerada. A valoração busca mitigar tais problemas, tendo
como meio os métodos de valoração, entre os quais: valoração contingente,
custo viagem, preços hedônicos, cujo valor é freqüentemente estimado em
função de variáveis socioeconômicas e da variação de bem-estar.
Faz-se a apresentação da composição do valor econômico dos ativos
ambientais e dos métodos de valoração econômica. Esclarece-se que o método
de valoração contingente será retomado no capítulo 4, onde será mais bem
desenvolvido, uma vez que é o método utilizado para a estimativa do valor de
existência, nesta dissertação.
3.1. O valor econômico dos ativos ambientais
O valor de um ativo ambiental é definido pela função de seus atributos.
Os fluxos de bens e serviços ambientais gerados pelo consumo definem os
atributos relacionados ao seu uso. Os valores de uso, por sua vez, podem ainda
ser classificados em valores de uso direto, valor de uso indireto e valor de
62
opção. E existem também os atributos relacionados à própria existência do
recurso, sem associação ao seu uso apenas a preservação, configura o valor
de não-uso, ou valor de existência do recurso natural. (Mota, 2001a).
Assim, o valor econômico do recurso ambiental (VERA), baseado na
teoria neoclássica ora já exposta no capítulo 2, é obtido pelo somatório do valor
de uso (VU) e valor de não-uso (VNU). Sendo o valor de uso dividido em valor
de uso direto, indireto e de opção, e o valor de não-uso composto pelo valor de
existência.
O valor de uso direto caracteriza-se pelo uso direto do recurso ambiental
como fonte primária de matéria-prima em geral, de produtos medicinais e
científicos, de lazer, de recreação e de satisfação hedônica. (Mota, 2001b)
O valor de uso indireto está relacionado com a função ecológica do ativo
ambiental, pois determinados recursos armazenam muitas contribuições para a
manutenção da biodiversidade. (Mota, 2001b).
Valor de opção relaciona-se com a disposição a pagar declarada pelas
pessoas, com a finalidade de conservar o recurso ambiental e, também, com a
tendência humana de evitar o risco, isto é, a possibilidade de que os recursos
não estejam mais disponíveis para seu uso futuro. Esse valor resulta de uma
série de incertezas no que tange à oferta do bem/serviço será realmente
consumido, ou seja, se as preferências do consumidor e as disponibilidades
futuras de recursos são certas, o valor de opção será zero; mas se essas
hipóteses são improváveis, o consumidor se declara disposto a pagar no
presente algum valor, a fim de ter a opção de uso futuro do recurso ambiental.
(Motta, 1998).
Por fim, apresenta-se de maneira mais sistêmica o valor de existência
(valor mensurado nesta dissertação) que se baseia na parcela do valor
econômico do recurso ambiental somente pela sua existência, que independe
de seu uso presente ou futuro.
63
Para Randall (1997) apud Mota (2001a):
Se algumas pessoas conseguem satisfação somente por saberem que algum ecossistema particular existe em condições relativamente intocadas, o valor resultante de sua existência é tão real como qualquer outro valor econômico. (p. 144).
Na realidade, as pessoas avaliam um recurso natural, mesmo se não o
consomem, porque são altruístas para com amigos, familiares, futuras
gerações, fauna, flora, e por entenderem que a natureza possui direitos.
Desse ponto de vista, os indivíduos quanto expressam suas opiniões
com relação à disposição a pagar, também estão expressando suas
preferências subjetivas com base em um orçamento previamente definido;
portanto, estão conscientes da melhor combinação de bens/serviços que geram
a sua função utilidade máxima. Assim, os mesmo fatores que produzem valores
de existência para bens/serviços conhecidos podem produzir valores para
recursos ambientais não conhecidos (Mota, 2001a, p. 144).
De acordo com Mota (2001b), o valor de existência é motivado por cinco
tipos de comportamentos altruístas:
a) motivo legado: constitui-se em uma das preocupações da geração
presente em legar bens/serviços ambientais para os seus sucessores. A
idéia é que as gerações futuras possam ter acesso aos recursos naturais
em condições ótimas de preservação, como herança de gerações do
presente;
b) benevolência para com parentes e amigos: refere-se à causa mais
nobre do ponto de vista ambiental, pois presentear parentes, amigos ou
instituições ligadas à natureza não é legado e sim complacência e
responsabilidade altruísta em doar bens/serviços ambientais preservados
a outrem;
c) simpatia por pessoas e animais: refere-se ao consenso do bem
comum, isto é, mesmo que o recurso ambiental não seja usado por uma
determinada comunidade, pode estar causando externalidades a outras
comunidades, afetando as suas condições ambientais. O mesmo
64
acontece com relação à biota, quanto às pessoas se predispõem a pagar
para manter ecossistemas preservados;
d) vínculo ambiental: enfatiza as funções ambientais globais. Por
exemplo, a poluição dos recursos hídricos, bem ambiental extremante
importante para a vida na Terra; e
e) responsabilidade ambiental: qualquer causador de degradação
ambiental tem a responsabilidade de reparar o dano ambiental por meio
de pagamento, não somente para mitigar a degradação do recurso
ambiental, mas, também, para reconstituí-lo, de forma a permitir sua
sustentabilidade.
O valor de existência não é somente econômico, mas representa
também a concepção da filosofia ecológica de que o recurso ambiental faz
parte do ecossistema Terra e, portanto, deve viver em processo de simbiose, de
interação com o homem.
É necessário argumentar que nessa visão de valor o homem sofre uma
evolução na sua consciência ambiental, para que se possam compreender suas
atitudes ao dispor-se a pagar pelo ativo ambiental. Esta evolução possui como
etapas: primeiramente, o homem adquire habilidades para viabilizar as
atividades econômicas levando ao crescimento econômico e passa a utilizar os
recursos naturais como elementos geradores de riqueza, degradando-os e
espoliando-os; então, começa sentir variação de seu bem-estar. Depois, num
segundo momento, o homem se educa, adquirindo informações para
reconhecer o ambiente natural como ente sistêmico. E, por fim, o homem passa
a respeitar os direitos dos recursos naturais, atribuindo-lhes valores, valor de
cunho econômico e ecológico: a cifra que representa o patrimônio do capital
natural e analisando as relações de contingência sistêmicas. Desenvolvendo-se
assim, a sua consciência ambiental.
Faz-se uma síntese dos valores ambientais, na Figura 3:
65
Figura 3. Decomposição do valor econômico de um recurso
ambiental
Fonte: Maia, 2002, p. 8.
E necessário argumentar também que, o importante no desafio da
valoração é admitir que indivíduos possam assinalar valores
independentemente do uso que eles fazem hoje ou pretendam fazer amanhã
Valor econômico do recurso
ambiental
Valor de uso
Valor de não-uso
Valor de Uso Direto –
Apropriação direta de
recursos ambientais, via
extração, visitação ou
outra atividade de
produção ou consumo
direto.
Valor de uso indireto –
Benefícios indiretos
gerados pelas funções
ecossistêmicas.
Valor de Opção –
Intenção de consumo
direto ou indireto do
bem ambiental no
futuro.
Valor de Existência –
Valores não associados
ao consumo, e que se
refere a questões
morais, culturais, éticas
ou altruístas em relação
à existência dos bens
ambientais.
66
dos recursos naturais a partir de suas percepções sobre o meio ambiente.
Assim:
VERA = (VUD + VUI + VO) + VE (2)
A tarefa de valorar economicamente um recurso ambiental consiste em
determinar quanto melhor ou pior estará o bem-estar das pessoas devido às
mudanças na quantidade de bens e serviços ambientais, seja na apropriação
por uso ou não (Motta e May, 1998, p. 27).
Dessa forma, os métodos de valoração ambiental correspondem à
capacidade de estimar as distintas parcelas de valor econômico do ativo
ambiental. Todavia, cada método apresenta limitações na cobertura de valores,
a adoção de cada método dependerá do objetivo da valoração, das hipóteses
assumidas, da disponibilidade de dados e conhecimentos da dinâmica
ecológica do objeto que está sendo valorado.
Os métodos de valoração econômica do meio ambiente fazem parte do
arcabouço teórico da microeconomia do bem-estar são necessários na
determinação dos custos e benefícios sociais quando as decisões de
investimento afetam o consumo da população e, portanto, seu nível de bem-
estar.
Não há um padrão universalmente aceito para classificação dos métodos
de valoração existente. Alguns procuram obter o valor do recurso diretamente
sobre as preferências das pessoas, utilizando-se de mercados hipotéticos ou de
bens complementares para obter a disposição a pagar (DAP) ou disposição a
receber (DAR) dos indivíduos, e podem ser classificados como métodos diretos
(função demanda). Por sua vez, os denominados métodos indiretos procuram
obter o valor do recurso através de uma função de produção relacionando o
impacto das alterações ambientais a produtos com preços no mercado
(Dubeux, 1998, p. 19). Na Figura 4 faz-se a síntese dos métodos.
67
Os resultados de todos esses métodos são expressos em valores
monetários, por ser a medida padrão da economia e a forma como os
indivíduos expressam suas preferências no mercado.
Figura 4. Métodos de valoração ambiental.
Fonte: Maia, 2002, p.7.
Cada método de valoração apresenta limitações na captação dos
diferentes tipos de valores do recurso ambiental. No processo de escolha do
método devem estar claras as limitações metodológicas e as conclusões
restritas às informações disponíveis.
Métodos diretos de valoração ou de função demanda – Obtêm as preferências dos consumidores através da disposição a pagar (DAP) ou a aceitar (DAA) para bens e serviços ambientais
Métodos indiretos de valoração ou de função produção – Recuperam o valor dos bens e serviços ambientais através das alterações nos preços de produtos do mercado resultantes das mudanças ambientais.
- Valoração contingente
Mercado de bens complementares
- Preços
hedônicos - Custo de
viagem
- Produtividade marginal
Mercado de bens substitutos - Custos evitados - Custos de controle - Custo de reposição - Custo de
oportunidade
68
3.2. Métodos diretos de valoração ou métodos da função demanda
De acordo com Motta (1998), Dubeux (1998) e Maia (2002), os métodos
diretos de valoração estimam o valor econômico do recurso ambiental a partir
da própria disposição a pagar da população para bens e serviços ambientais.
Estes métodos partem do pressuposto que a variação da quantidade ou da
qualidade do recurso ambiental irá afetar os padrões de bem-estar das
pessoas. Com a variação de bem-estar pode-se estimar a disposição a pagar
das pessoas para evitar ou a disposição a receber para aceitar as alterações do
ambiente.
A maneira de captação da DAP ou DAA, direta ou indiretamente sobre as
preferências das pessoas, será o determinante para classificar os métodos
diretos de valoração.
3.2.1. Método de mercado de bens complementares
Neste grupo os métodos obtêm indiretamente a disposição a pagar das
pessoas para bens e serviços ambientais recorrendo a um mercado de bens
complementares. Os métodos de mercado para bens complementares estimam
o valor dos recursos naturais por intermédio do valor de outros bens e serviços
com preço no mercado. Para tanto utilizam o valor dos bens complementares
que são aqueles consumidos em proporções constantes entre si. Neste sentido,
dada uma função de utilidade U = f(Q, Xi), onde Q corresponde ao recurso
natural, complementar a Xi que são vetores de quantidades de bens que estão
no mercado, poderá ser calculado a partir da estimativa da demanda de Xi para
vários níveis de Q. (Dubeux,1998, p.10).
É esperado que o comportamento destes bens privados complementares
possa trazer as informações necessárias para estudo da demanda pelo bem ou
serviço ambiental (Motta, 1998). Com base nestes fundamentos teóricos, dois
métodos podem ser utilizados, quais sejam Métodos dos Preços Hedônicos e
Método do Custo de Viagem.
69
3.2.1.1. Método de preços hedônicos
De acordo com Maia (2002), o método de preços hedônicos estabelece
uma relação entre os atributos de um produto e seu preço de mercado. Pode
ser aplicado a qualquer tipo de mercadoria, embora seu uso seja mais
freqüente em preços de propriedades.
Conforme Dubeux (1998), este método baseia-se no pressuposto de que
há bens privados A cujo valor varia em função do valor de outros bens ou
serviços B, complementares a A. identificando-se a variação de valor de um
bem privado A em função dos atributos de outro bem ou serviço B, fica
identificado assim o valor deste outro bem ou serviço B.
Assim, um bem privado A que tenha uma oferta perfeitamente inelástica
(a quantidade ofertada não varia quando o preço varia), se a demanda por esse
bem ou serviço complementar B aumenta quantidade ofertada, então a
demanda por A também aumenta. Dada a inelasticidade da oferta de A, o
aumento da quantidade ofertada é devido a B e o valor adicional
correspondente ao valor de B. variações de B alteram preços do bem A e não
quantidades.
No caso da valoração ambiental, o exemplo mais freqüentemente
encontrado na literatura esta relacionado aos preços de propriedades. Distintas
propriedades de mesmas características apresentam diferentes preços de
mercado em função de seus atributos ambientais. Como exemplo pode-se citar
a proximidade da praia ou o nível de ruído do local como diferenciais de preço
de uma propriedade em relação à outra de mesmas características. A
quantificação deste diferencial indica a disposição a pagar dos indivíduos pelo
valor dos atributos ambientais.
Por intermédio de uma denominada função hedônica de preço pode-se
estimar o valor dos atributos de um ou vários bens e serviços ambientais
implícitos no valor de um bem privado. Se P é preço de uma propriedade, a
função hedônica de seus atributos ambientais será dada por.
70
Pi = (ai,Ri) (3)
onde:
ai = atributos da propriedade i
Ri = nível do bem ou serviço ambiental R da propriedade i.
O preço de R será então dado por d/dR sendo a disposição a pagar por
uma variação de R.
3.2.1.2. Método de custo viagem
O método de custo de viagem estima a demanda por um sítio natural R
com base nos custos incorridos pelos usuários de R para acessar R.
Representa, portanto, o custo de visitação a um sítio natural específico que
pode ser considerado a máxima disposição a pagar do usuário pelos serviços
ambientais de R. (Dubeux, 1998, p.24).
Para calcular o valor recreativo do sítio em questão, utilizam-se
procedimentos econométricos. Por intermédio de uma pesquisa de campo
realizada no próprio sítio natural são identificados, por amostragem, seus
visitantes, freqüência e custo de viagem das visitas, idade, zona residencial,
renda, escolaridade, etc. (Dubeux, 1998, p. 24).
A partir destes dados, estima-se a taxa de visitação Vi (visitantes por mil
habitantes por ano, por exemplo) de cada zona residencial da amostra para
correlacioná-la em termos estatísticos com os dados de custo médio de viagem
de cada zona residencial CV da amostra e as outras variáveis sócio-
econômicas (usadas como proxis para indicar preferências) da zona em
questão Si, conforme abaixo:
Vi = (CV, Si) (4)
onde
Vi = taxa de visitação
CV = custo de viagem
Si , i = 1...,n = variáveis sócio-econômicas.
71
Derivando-se em relação à variação de CV para cada zona, estima-se
a curva de demanda ’ pelas atividades recreacionais do sítio natural, medindo-
se a redução (ou aumento) do número de visitantes quando se aumenta (ou
diminui) CV. É ’, portanto, a disposição a pagar pelos serviços ambientais de
R, onde a ’ é a medida do excedente do consumidor.
3.2.2. Método de valoração contingente
O método de valoração contingente (MVC) procura mensurar
monetariamente o impacto no nível de bem-estar dos indivíduos decorrente de
uma variação quantitativa ou qualitativa dos bens ambientais.
Utiliza dois indicadores de valor, quais sejam: Disposição a Pagar (DAP)
e Disposição a Aceitar (DAA); que vem a ser, respectivamente, o quanto os
indivíduos estariam dispostos a pagar para obter uma melhora de bem-estar ou
quanto estariam dispostos a aceitar como compensação para uma perda de
bem-estar. Ou seja, segundo Motta:
o MVC pretende de alguma maneira quantificar a mudança no nível de bem estar percebida pelos indivíduos, resultantes de uma alteração no suprimento de um determinado bem ou serviço ambiental. (Motta, 1998, p. 43).
O MVC estima os valores da DAP e da DAA com base em mercados
hipotéticos que são simulados por intermédio de pesquisa de campo que
pergunta ao entrevistado sua DAP ou sua DAA por alterações na
disponibilidade quantitativa ou qualitativa dos ativos ambiente. Simulam-se
cenários ambientais os mais próximos possíveis das características da
realidade e, ainda, de acordo com Motta (1998), de modo que as preferências
reveladas nas pesquisas reflitam decisões que os agentes tomariam de fato,
caso existisse um mercado para o bem ambiental descrito no cenário hipotético.
O cálculo e a estimação da variação de bem-estar obedecem a
diferentes modalidades em razão da forma de obtenção do valor, por exemplo,
para lances livres (open-ended) que produzem uma variável continua de lance,
72
o valor da DAP ou da DAA pode ser estimado diretamente por técnicas
econométricas. Agora, para as escolhas dicotômicas ou com mais de um valor
(técnica referendum) que produz um indicador de lances, a DAP ou DAA é
estimada por uma função de distribuição das respostas afirmativas e
correlacionada com uma função de utilidade indireta, geralmente logística. Pela
função:
DAPi (ou DAAi) = f (Qij,Yi,Si,Ej) (5)
onde,
Qij = visita
Yi = renda
Si = fatores sociais (ou outras variáveis explicativas)
Ej = parâmetro de qualidade ambiental do bem a ser valorado,
De acordo com Dubeux (1998) pode-se verificar os determinantes das
respostas de DAP o DAA. A curva permite estimar mudanças no lance DAPi ou
DAAi em função de variações em Ei se as demais variáveis permanecerem
estáveis.
A partir da média ou mediana dos valores DAP ou DAA obtidos
multiplicada pelo total da população (indivíduos ou famílias, etc.), obtém-se o
valor econômico total do bem ambiental ou, mais precisamente, da alteração de
sua disponibilidade.
Esta técnica é de extrema valia para a análise econômica do meio
ambiente, principalmente porque é a única que tem potencialmente a
capacidade de captar o valor de existência do bem ambiental. De acordo com
Motta (1998) requer procedimentos muito rigorosos na formulação das
pesquisas para produzir resultados confiáveis.
É desenvolvida uma revisão de literatura mais minuciosa sobre este
método, no próximo capítulo.
73
3.3. Métodos indiretos de valoração ou métodos da função oferta
Os métodos indiretos de valoração estimam o valor de um recurso
ambiental indiretamente através de uma função de produção. O objetivo é
calcular o impacto de uma alteração marginal do ativo ambiental na atividade
econômica, utilizando como referência produtos no mercado que sejam
afetados pela modificação na provisão do recurso ambiental. O impacto
econômico sofrido na produção deste produto será uma estimação dos
benefícios embutidos no recurso ambiental (Maia, 2002, p. 17)
Estes métodos exigem o conhecimento da relação entre a alteração
ambiental e o impacto econômico na produção, que pode ser calculado
diretamente no preço de mercado do produto afetado ou num mercado de bens
substitutos. Os métodos permitem se observar o valor do recurso ambiental R
em razão de sua contribuição como insumo ou fator de produção de um produto
P qualquer, ou seja, permite o cálculo do valor de sua contribuição em
determinada atividade econômica (Dubeux, 1998, p. 25).
Neste sentido, em uma função de produção P = ƒ(Y,R), onde Y
corresponde aos insumos privados e R a recursos ambientais com preço zero,
calcula-se a variação do produto de P em razão da variação da quantidade dos
recursos ambientais R utilizada para produzir P. A adoção destes métodos
depende da possibilidade de obterem-se os preços de mercado para variações
na quantidade do produto P ou de seus produtos substituídos S. Com base
nessa disposição, a seguir, apresenta-se os métodos indiretos de valoração,
que são divididos em dois outros subgrupos: o método de produtividade
marginal e o método de mercado de bens substitutos.
3.3.1. Método de produtividade marginal
De acordo com Maia (2002), o método de produtividade marginal atribui
um valor ao uso da biodiversidade relacionado à quantidade ou à qualidade de
um recurso ambiental diretamente à produção de outro produto com preço
definido no mercado. O papel do recurso ambiental no processo produtivo será
74
representado por uma função dose-resposta, que relaciona o nível de provisão
do recurso ambiental ao nível de produção respectivo do produto no mercado.
Esta função mensura o impacto no sistema produtivo dado uma variação
marginal na provisão do bem ou serviço ambiental, e a partir desta variação,
estimar o valor econômico de uso do recurso ambiental.
Sendo assim, classificado como um dos métodos de função de produção,
o método da produtividade marginal assume que dada a função de produção P
= ƒ(Y,R), o valor econômico de R é um valor de uso dos bens e serviços
ambientais e que para o seu cálculo é necessário conhecer a correlação de R
em f e, ainda, a variação do nível de estoque e de qualidade de R em razão da
produção do próprio P ou de outra função de produção, por exemplo de T. Para
tanto, estimam-se as funções de dano ambiental (funções dose-resposta – DR),
onde:
R = DR (x1,x2,..xn.,Q) (6) Sendo x1,x2,..xn as variáveis que junto com nível de estoque ou qualidade
Q do recurso natural afetam a disponibilidade de R. Assim:
DR = DR/Q (7)
As funções DRs relacionam a variação do nível de estoque ou qualidade
de R, com o nível de danos físicos ambientais provocados com a produção de P
ou T para identificar o decréscimo da disponibilidade de R para a produção de
P.
Dubeux (1998) ressalta que as funções de dano nem sempre são de fácil
utilização tendo em vista que a complexidade da dinâmica dos ecossistemas
ainda não é suficientemente conhecida para que se possam estabelecer
relações precisas de causa e efeito, tornando complexa a estimação da função
do dano.
75
3.3.2. Método de mercado de bens substitutos
Segundo Maia (2002), muitas vezes não se consegue obter diretamente
o preço de um produto afetado por uma alteração ambiental, mas pode-se
estimá-lo por algum substituto existente no mercado. A metodologia de
mercado de bens substitutos parte do princípio de que a perda de qualidade ou
escassez do bem ou serviço ambiental irá aumentar a procura por substitutos
na tentativa de manter o mesmo nível de bem-estar da população.
Entretanto, é muito difícil encontrar na natureza um recurso que substitua
com perfeição os benefícios gerados por outro recurso natural (Varian, 2000, p.
50). As propriedades ambientais são demasiadamente complexas e suas
funções no ambiente são pouco reconhecidas para acreditar que possam ser
substituídas eficientemente.
Considerando-se, de acordo com Dubeux (1998), ainda variações de
quantidade de P devido a variações de quantidade ou qualidade de R, pode se
empregar métodos de mercados de bens substitutos, tanto de P quanto de R
para valorar R. Assim, frente à eventual impossibilidade de se calcular
diretamente as perdas com P ou R, por inexistência de respectivos preços de
mercado, calculam-se as perdas com bens substitutos perfeitos S.
Se em uma função de produção P = F(Y,R), R tem em S seu substituto
perfeito, então a função de produção pode ser expressa em P = F(Y,R + S),
onde a perda de uma unidade de R pode ser compensada por uma quantidade
constante de S. Para manter P constante, uma unidade a menos de R será
compensada por uma quantidade a mais de S e a variação de R será valorada
pelo preço de S observável no mercado. O próprio P sendo um bem ou serviço
ambiental sem serviço ambiental sem preço de mercado, poderia ser
substituído por S caso não houvesse função de produção ou dose-resposta
disponível.
Quatro métodos, com base em mercado de bens substitutos podem ser
considerados de fácil aplicação, a seguir abordados.
76
3.3.2.1. Custos de reposição
Quando o custo de S representa os gastos incorridos pelo consumidor ou
usuário para garantir o nível desejado de P ou R.
Segundo Pearce (1993) apud Maia (2002), este método é
freqüentemente utilizado como medida do dano causado. Isto porque, quando o
prejuízo já foi feito, normalmente é possível estimar o custo de restauração do
ambiente danificado. Ou seja, a estimativa dos benefícios gerados por um
recurso ambiental será calculada pelos gastos necessários para reposição ou
reparação após o mesmo ser danificado.
3.3.2.2. Custos evitados
O método de custos evitados estima o valor de um recurso ambiental
através dos gastos com atividades defensivas substitutas ou complementares,
que podem ser consideradas uma aproximação monetária sobre as mudanças
destes atributos ambientais (Maia, 2002, p. 19)
Quando o custo S representa os gastos incorridos pelo consumidor ou
usuário para não alterar o produto P que depende de R.
3.3.2.3. Custos de controle
O custo de controle representa os gastos necessários para evitar a
variação do bem ambiental e manter a qualidade dos benefícios gerados à
população. É o caso do tratamento de esgoto para evitar a poluição dos rios,
por exemplo (Maia, 2002, p. 20)
Quando o dano ambiental pode ser também valorado pelos custos de
controle que empresas ou consumidores incorrem para evitar a perda de
qualidade ou quantidade de R.
Embora o controle da degradação limite o consumo presente do capital
natural, ele mantém um nível de exploração e aumenta os benefícios da
população a longo prazo, possibilitando o aproveitamento futuro dos recursos
naturais (Maia, 2002, p.20).
77
As maiores dificuldades deste método estão relacionadas à estimação
dos custos marginais de controle ambiental e dos benefícios gerados pela
preservação. Os investimentos de controle ambiental tendem a gerar diversos
benefícios, sendo necessários um estudo muito rigoroso para identificação de
todos eles. Como também não há um consenso sobre o nível adequado de
sustentabilidade, as pessoas encontram sérias dificuldades para ajustar os
custos aos benefícios marginais e determinar o nível ótimo de provisão do
recurso natural.
Segundo Dubeux (1998) há que se ressaltar que o uso dos métodos de
mercados de bens substitutos pode levar a uma subvaloração dos recursos
natural pela dificuldade de encontrarem-se bens substitutos perfeitos, quando
se trata de bens naturais.
3.3.2.4. Custo de oportunidade
O método do custo de oportunidade não valora diretamente o recurso
natural. Pelo contrário, estima o custo de preservá-lo pela não realização de
uma atividade econômica concorrente. Ou seja, é o custo de oportunidade da
renda sacrificada em prol da preservação do recurso ambiental (Dubeux, 1998,
p. 22).
Embora seja desejável do ponto de vista social, a preservação implica
num custo que deve ser mensurado para permitir a divisão entre os diversos
agentes que usufruem os benefícios da conservação. Toda conservação traz
consigo um custo de oportunidade das atividades econômicas que poderiam
estar sendo desenvolvidas na área de proteção. O custo de oportunidade
representa as perdas econômicas da população em virtude das restrições de
uso dos recursos ambientais. O benefício da conservação seria o valor de usos
direto dos recursos ambiental, estimado pela receita perdida em virtude do não
aproveitamento e outras atividades econômicas (Maia, 2002, p. 22).
Maia (2002) questiona, ainda, que a estimação da oportunidade de
exploração deve sempre considerar uma possível diminuição do capital natural
78
ao longo do tempo, que também é uma oportunidade futura de geração de
renda. Danos irreversíveis sobre espécies de plantas e animais acabarão
reduzindo a longo prazo a renda gerada pela exploração.
Após o exposto, faz-se necessário abordar com maiores detalhes o
método de valoração contingente, uma vez que é este o utilizado para se
estimar o valor dos ativos ambientais no município de Diamantino. Essa
abordagem está no Capítulo seguinte.
79
4. MÉTODO DE VALORAÇÃO CONTINGENTE
O método de valoração contingente consiste na utilização de pesquisas
amostrais para identificar, em termos monetários, as preferências individuais
em relação a bens que não são comercializados em mercado. Especificamente
a valoração contingente, pergunta-se às pessoas o quanto elas avaliam
situações hipotéticas envolvendo uma mudança em quantidade ou qualidade de
um recurso ambiental. São criados mercados hipotéticos do recurso ambiental
ou cenários envolvendo mudanças do recurso, e as pessoas expressam suas
preferências através da disposição a pagar (DAP) para evitar a alteração na
qualidade ou quantidade do recurso natural ou os indivíduos expressão sua
disposição a aceitar (DAA) pelas alterações no recurso ambiental.
O motivo da escolha do método de valoração contingente para este
trabalho é que este é o único que permite a estimação do valor de existência do
recurso ambiental - objetivo desta pesquisa. É necessário argumentar que o
valor de existência não é somente econômico, mas representa também a
filosofia ecológica de que o recurso natural faz parte do ecossistema da terra e,
portanto, deve viver em processo de interação; é assumir, então, no presente
que os recursos naturais têm direitos à preservação, para que as futuras
gerações possam tê-los como legado.
Esse método está alicerçado na teoria neoclássica do bem-estar e parte
do princípio de que o indivíduo é racional no processo de escolha, maximizando
sua satisfação, dados o preço do recurso natural e a sua restrição
80
orçamentária. O objetivo do pesquisador com a aplicação do método é obter
dos indivíduos o excedente do consumidor.
4.1. Fundamentos microeconômicos
Os consumidores adquirem mercadorias porque elas lhes proporcionam
uma satisfação melhor. A microeconomia, ao desenvolver análise da demanda
individual, utiliza-se do Excedente do Consumidor (EC) como uma medida de
bem-estar. O excedente do consumidor mede quão melhor será a satisfação
das pessoas, em conjunto, por poderem adquirir um produto no mercado. Pelo
fato de diferentes consumidores atribuírem valores diferenciados ao consumo
de cada mercadoria, o valor máximo que estariam dispostos a pagar por tais
mercadorias também seria diferenciado. Segundo Pindyck e Rubinfeld: “O
excedente do consumidor é a diferença entre o preço que um consumidor
estaria disposto a pagar por uma mercadoria e o preço que realmente paga”
(2002, p. 123).
O conceito pressupõe que o consumidor avalia os bens, atribuindo o
montante r, pela i-ésima unidade consumida, mas pagando somente o preço p
por cada uma. Assim, obtém-se um “excedente” igual a r1 – p, associado à
primeira unidade em r2 – p à segunda unidade consumida do bem, e assim por
diante. Somando este excedente para n unidades, tem-se o excedente total do
consumidor (Varian, 2000, p. 264)
EC = r1 – p + r2 – p1 + ... + rn – p = r1 + ... + rn – np = ri – np (8)
Onde i = 1, ..., n
Pode-se observar, na Figura 5, abaixo, utilizando uma função de utilidade
quase-linear, que o EC é a área abaixo da curva de demanda, uma vez que a
demanda pelo bem xi independe do montante que o consumidor possui para
gastar no bem xi.
81
Figura 5. Excedente do consumidor.
Fonte: Varian, 2000, p. 266.
Todavia, o que interessa para esta Dissertação, é a variação desse
excedente, figura 6, ou seja, o foco é: qual a variação da satisfação do
consumidor quando ocorre uma modificação no nível de preços (p’ para p”).
Para formas mais genéricas da função de utilidade, e desde que o efeito renda
não seja muito grande: a área sob a função demanda é uma boa aproximação
entre a variação do excedente do consumidor e a variação da utilidade do
consumidor.
De acordo com Varian (2000):
a variação no excedente do consumidor relacionada a uma variação no preço é a diferença entre duas regiões meio triangulares e, portanto, terá a forma aproximada de um trapézio. Além disso, o trapézio é formado por duas sub-regiões indicado por R e a região um tanto triangular indicada por T (Varian, 2000, p. 267)
O retângulo mede a perda de excedente resultante do fato de que o
consumidor agora paga mais por todas as unidades que continua a consumir.
Depois que o preço aumenta o consumidor continua a consumir x” unidades de
82
bem e cada unidade do bem é agora (p” – p’) mais cara. Isso significa que para
consumir x” unidades do bem, o consumidor tem de gastar (p” – p’)x” mais
dinheiro do que pagava antes.
Isso, porém, segundo Varian, não constitui a perda total do bem-estar. O
aumento do preço do bem x faz com que o consumidor decida consumir menos
desse bem. O triângulo T mede o valor do consumo perdido do bem x. A perda
total do consumidor corresponde à soma desses dois efeitos: R mede a perda
de ter de pagar mais pelas unidades que ele continua a consumir e T mede a
perda devida à redução do consumo (2000, p. 267).
Figura 6. Variação do excedente do consumidor.
Fonte: Varian, 2000, p. 267
Se tiver a expressão da demanda pelo bem x (i) como função de seu
preço, pode-se utilizar o cálculo integral a fim de mensurar a variação do
excedente, quando os preços variam de p’ para p”. (Pessôa, 1996, p. 21):
p”
EC = x(i) di (9) p’
A abordagem de Excedente do Consumidor, foi proposta por Dupuit no
século XIX e popularizada por A. Marshall (1842-1924), que utiliza a área
83
abaixo da curva de demanda e acima da linha de preços de um bem como uma
aproximação da utilidade do consumidor pelo bem, dado o critério da
ordinalidade, ocorre a impossibilita da mensuração monetária na variação de
EC. Esse conceito tem sido definido como problemático, enquanto medida dos
benefícios resultantes das mudanças de preços ou de quantidades (Mitchell e
Carson, 1989, p. 23). “Estes problemas são devidos ao fato de que a curva de
demanda ordinária não mantém o nível de utilidade ou satisfação constante,
mas mantém a renda constante” (Varian, 2000, p. 268).
Na década de 40, Hicks sugeriu duas medidas de ganho ou perda que
mantêm a utilidade constante no nível alternativo específico e duas medidas de
excedente, ficando estas medidas conhecidas como medidas hicksianas:
variação equivalente, variação compensatória, excedente de equivalência e
excedente de compensação, são “refinamentos teóricos” da medida
marshalliana de excedente ordinário do consumidor. Calculadas pelas curvas
de demanda, em que a utilidade total é mantida constante, a diferentes níveis
específicos. Dependendo da posição do direito de propriedade do consumidor,
diante do bem em questão, cada uma das quatro medidas pode envolver
pagamento ou compensação a fim de manter a utilidade no nível específico.
(Mitchell e Carson, 1989, p. 23).
A utilidade não pode ser mensurada diretamente e o mecanismo básico
para medir mudança do bem-estar é o uso de uma medida monetária. Ocorre-
se alteração no bem-estar, provocada por mudanças em um preço ou nos
preços, ou ainda por outros fatores, um mecanismo deve ser determinado para
verificar as alternativas que tem o consumidor para, a partir da situação inicial,
obter incremento ou decréscimo de bem-estar ou permanecer indiferente entre
a mudança de preço(s) e a compensação na renda. (Bacon, 1995 apud Ribeiro,
1998, p. 15).
Para exemplificar o exposto, tem-se a figura 7, são apresentadas duas
curvas de indiferença para um indivíduo considerando dois bens dados, um
com preço P’1, que se altera para P”1, e o outro bem com preço P’2 (confere
84
uma cesta composta de outros bens, isto é, são os outros usos da renda), o
qual permanecerá inalterado. Admite-se que os consumidores sejam capazes
de ordenar todas as combinações de bens e outras despesas, de acordo com
uma função utilidade. Admite-se também que as curvas de indiferenças sejam
estritamente convexas implicando que, ao longo de cada linha de restrição
orçamentária, exista uma combinação única de bens que maximiza a utilidade
do consumidor. Considerando-se, ainda, uma redução no preço do bem X1, o
consumidor altera sua cesta de consumo inicial, dado pelo ponto A na utilidade
U1, para o consumo dado pelo ponto B, na utilidade U2. Qual é o benefício de
bem-estar que esses indivíduos obtêm com a redução no preço de X1? A
medida de bem-estar é definida em termos do bem X2, chamado bem
numerário.
X2
VE E
VC D
A B U2
C F P1”
U1 P1’
P1’ P 1” O X1’ X1” Xi
Figura 7. Medidas de ganho de bem-estar para uma redução de
preço.
Fonte: Ribeiro, 1996, p. 17
Partindo da análise da Figura 7, têm-se as medidas hickisianas, de
acordo com a variação de bem-estar:
85
1- Variação Compensatória (VC): mede qual a variação da renda
necessária para compensar o consumidor caso ocorra uma mudança no
nível de preço, passando o nível de P1’ para P1”, de forma que mantenha o
consumidor no mesmo nível de utilidade inicial. Conforme Ribeiro, essa
medida indica que pagamento compensatório ou equiparação da mudança
da renda é necessário para fazer o indivíduo indiferente entre a situação
original (A) e o novo conjunto de preço. Dado o novo conjunto com o
consumo no ponto B, o indivíduo pode ter sua renda reduzida pelo
montante VC e ainda estar tão bem no ponto C, como estava no ponto. A
medida de VC estima a quantidade máxima que o indivíduo estaria
disposto a pagar pela oportunidade de consumo ao novo conjunto de
preço. Para um aumento de preço Xi, a medida VC seria o montante a ser
pago a esse indivíduo de maneira a torná-lo indiferente à mudança de
preço. Então, a variação compensatória é utilizada para encontrar uma
medida padrão que compense os indivíduos que sofreram uma redução do
seu nível de bem-estar causada por uma degradação ambiental.
2- Variação Equivalente (VE): Mensura qual seria o impacto na renda do
consumidor se este, em substituição a uma mudança nos preços de P1’
para P1”, aceita uma variação de igual magnitude, deixando o nível de
utilidade desse consumidor ao mesmo nível que em P1”. De acordo com
Freeman (1979), no trabalho de Ribeiro, define a medida de VE como a
variação na renda, dados os preços originais, a qual poderia levar à
mesma alteração na utilidade, tal como a alteração no preço de Xi. Na
figura 7, dados os preços originais, o indivíduo alcança o nível de utilidade
U2, no ponto D, com um aumento na renda igual à VE, que é a variação
equivalente na renda pelo ganho de bem-estar devido à alteração no
preço. Em outras palavras, quanto o consumidor estaria disposto a aceitar
uma variação na renda que evita uma modificação no nível de preço em
termos da variação na utilidade? Graficamente isto é mostrado pelo
deslocamento da reta orçamentária original, até tangenciar a curva de
86
indiferença representada pela nova cesta de mercadorias. Então a medida
VE é descrita como o montante mínimo que o indivíduo aceita receber,
para, voluntariamente, privar-se da oportunidade de comprar, ao novo
conjunto de preços. Para um aumento de preço, a medida VE é a
quantidade máxima que o indivíduo pode estar disposto a pagar para
evitar mudança nos preços.
Verifica-se que ambas as medidas, variação compensatória e variação
equivalente, permitem que o indivíduo ajuste as quantidades consumidas de
ambos os bens, em resposta às mudanças nos preços relativos e no nível de
renda.
As medidas apresentadas a seguir são definidas para estabelecer
restrições ao ajustamento que o indivíduo faz em sua cesta de mercadorias:
3- Excedente de Compensação (EC): Apresenta o pagamento
compensatório ou equiparação da mudança na renda que pode tornar o
indivíduo indiferente entre a situação original e a oportunidade de adquirir
nova quantidade de X1” do bem cujo preço foi alterado. A medida EC é
dada pela distância vertical entre as curvas de indiferença U1 e U2
referentes a quantidade X1”, ou seja, ela é equivalente ao segmento BF,
na figura 7. Essa medida é rigorosamente relativa a variação
compensatória, e a única diferença entre essas medidas é a restrição ao
julgamento da aquisição de Xi, em resposta à compensação ou
equiparação da variação na renda.
4- Excedente de Equivalência (EE): Indica a mudança na renda que é
requerida, dados os preços originais e o nível de consumo de Xi, a fim de
deixar o indivíduo também como ele poderia estar com o novo conjunto de
preços e consumo no ponto B. Na figura 7 EE, é a distância vertical entre
U1 e U2, dado o consumo do bem Xi no nível original, representada pelo
segmento AE. A medida EE é rigorosamente relativa à medida VE e é a
única diferença que está na restrição do consumo de Xi.
87
Apresentadas as definições das quatro medidas hicksianas, com relação
ao método de valoração contingente, observa-se na literatura que alguns
autores referem-se às medidas de variação compensatória e equivalente,
enquanto outros, às medidas de excedente de compensação e de equivalência,
para mensurar a variação de bem-estar. De acordo com Mitchell e Carson
(1989) as medidas hicksianas de variação devem ser usadas quando o
consumidor tem toda a liberdade para variar a quantidade do bem considerado,
e as medidas hicksianas de excedente, quando o consumidor está constrangido
a comprar apenas quantidades fixas do bem particular. Para o caso especial de
ativos ambientais, as medidas de excedente seriam, segundo esses autores, as
mais indicadas.
Objetivando o entendimento sobre a relação dos bens ambientais (bens
públicos) e as medidas de excedente para Mitchell e Carson (1989), tem-se a
figura 8, que apresenta a curva de demanda ordinária que é a linha marcada D,
e o preço que é considerado como zero, o que é tipicamente o caso de bens
públicos puros. A mudança no excedente do consumidor resultante de um
aumento na provisão do bem público de Q1 a Q2, é a área (a+b); o excedente
de compensação é a área sob a curva de demanda compensada hicksiana
H1(ou seja, a); e o excedente de equivalência é a área sob a curva de demanda
hicksiana H2(ou seja, a+b+c). Observa-se que para aumentar a quantidade, o
excedente de compensação é menor ou igual ao excedente Marshalliano, que
por sua vez é menor ou igual ao excedente de equivalência.
88
Preço
c
a b
H2 H1 D
Q1 Q2 Quantidade
Figura 8. Medidas de excedente do consumidor para um bem
público.
Fonte: Mitchell e Carson, 1989, p. 24
4.2. A valoração contingente através da Disposição a Pagar (DAP) e da
Disposição a Aceitar (DAA)
A variação econômica de ativos ambientais como o ar, a água, o solo etc,
não é de fácil alcance, uma vez que, conforme anteriormente apresentado,
esses bens possuem características de bens públicos e externalidades, logo,
não existe mercado que tenha o preço como a variável indicadora dos agentes
econômicos.
Como a maioria desses bens não se encontra transacionados no
mercado tornou-se necessário se fazer uso de “mercados alternativos”:
contingentes ou de recorrência. No método de valoração contingente, MVC,
utiliza-se destes mercados hipotéticos (contingentes).
Como na prática, o bem ambiental não possui mercado para ser
transacionado, então se supõe que o mesmo exista e a partir daí pergunta-se
às pessoas o quanto elas estariam dispostas a pagar ou a receber pelo bem.
89
Sendo assim, considere as medidas de disposição a pagar (DAP) e a
aceitar (DAA), relativas às alterações da disponibilidade de um ativo ambiental
(Q), que mantém um nível de utilidade inicial do consumidor. Nesse caso, tem-
se:
U(Q, Y), = U(Q, Y + DAR) = U(Q, Y – DAP) (10)
A expressão acima apresenta diferentes pontos, onde distintas
combinações de renda e de provisão de ativos ambientais se encontram na
mesma curva de indiferença em determinado nível de utilidade. Como a função
de utilidade (U), não é observada diretamente, um método de valoração
contingente estima os valores de DAA e DAP com base em mercados
hipotéticos.
Neste sentido, busca-se simular cenários, cujas características estejam
mais próximas do mundo real, de modo que as preferências reveladas nas
perguntas empreendidas aos agentes econômicos nas pesquisas reflitam
decisões que tomariam de fato caso existisse um mercado para um ativo
ambiental descrito no cenário hipotético. Essas referências, utilizando a teoria
econômica, podem ser expressas em valores monetários. Esses valores são
obtidos através das informações adquiridas nas respostas sobre quanto os
indivíduos estariam dispostos a pagar para garantir a melhoria de bem-estar ou
quanto estariam dispostos a aceitar em compensação para suportar uma perda
de bem-estar.
A grande vantagem do MVC, em relação a qualquer outro método de
valoração, é que ele pode ser aplicado em espectro de bens ambientais mais
amplos. A grande critica, entretanto, é a sua limitação em captar valores
ambientais que indivíduos não entendam ou mesmo desconhecem o bem
questionado. (Motta e May, 1998, p. 43).
Todavia, considerando a concepções fenomenológicas existencialistas,
mais especificamente as proposições de Merleau-Ponty, estas concepções são
apresentadas no capítulo 6 deste trabalho, os agentes econômicos são capazes
90
de perceber variações de bem-estar provocadas por alterações ambientais, e
ocorrendo esta percepção, eles podem revelam suas verdadeiras DAP ou DAR
pelos ativos ambientais, considerando as devidas influências das variáveis
sócio-econômicas do modelo de valoração contingente como a renda do
consumidor. Portanto, este método é considerado o ideal para aferir o valor de
existência dos ativos ambientais.
4.2.1. Escolha entre a DAP e a DAA
Na escolha entre a formulação de uma questão de DAP ou DAA, num
levantamento de valoração contingente é analisada em termos de direitos de
propriedade uma vez que se trata de bens públicos em que os direitos são
mantidos coletivamente, esta questão, freqüentemente, não é fácil. O
pesquisador tem de tomar uma decisão sobre o apropriado direito de
propriedade para o bem, ou seja, o pesquisador é obrigado a decidir a medida
hicksiana de excedente do consumidor a ser usada, para cada mudança de
bem-estar (Ribeiro, 1998, p. 21).
Na década de 80 vários pesquisadores obtiveram de seus entrevistados
valores de DAA consideravelmente maiores do que valores de DAP, para o
mesmo bem. Esses resultados geraram várias hipóteses explicativas da
diferença entre a DAP e a DAA; em algumas focalizaram os levantamentos de
valoração contingente enquanto outras consideraram uma classe mais geral de
comportamento de escolha contingente e observada. A seguir consta resumo
das causas das discrepâncias entre os valores da DAP e da DAA, investigado
por Ribemboin (1997).
4.2.2. Causas das disparidades entre a DAP e a DAA
Quando se está buscando valorar uma mudança de qualidade ambiental,
duas são as perguntas comumente realizadas nos questionários de pesquisa
utilizando–se método de valoração contingente (MVC):
91
1. Qual é a máxima quantia que o respondente estaria disposto a pagar
por uma melhoria ou para evitar uma degradação (DAP)?
2. Qual é a mínima quantia que o respondente estaria disposto a
receber para ser compensado por uma degradação ou para desistir de
uma melhoria (DAA)?
A escolha entre a DAP e DAA deve ser criteriosa, pois cada alternativa
pode resultar em valores bastante diferentes. A divergência entre DAP e DAA
não se deve somente em termo teóricos no que diz respeito à utilidade marginal
decrescente das curvas de demanda - DAA. Esta pode ser muitas vezes
superior a DAP quando o indivíduo, perante a uma possível redução da
disponibilidade do recurso ambiental, percebe que são reduzidas às
possibilidades de substituição entre um ativo ambiental altamente valorado e
outros bens e serviços a sua disposição. Dessa maneira, com possibilidades
reduzidas de substituição do ativo, os indivíduos tendem a exigir compensações
mais elevadas. Neste sentido, a literatura tem considerado a DAP uma
mensuração conservadora.
Diversas são as hipóteses explicativas para os resultados de DAP e DAA
serem diferentes:
a) vieses diversos: os vieses que interferem nos resultados de uma
pesquisa de MVC podem ser resultantes de um comportamento
inesperado do respondente, de formulários mal desenvolvidos, de falhas
operacionais etc. Entretanto a maioria dos vieses pode ser tanto para
mais quanto para menos e não se constitui em explicação convincente
para o fato de ser a DAA sempre maior do que a DAP;
b) comportamento estratégico: quando se compreende a pergunta sobre
DAP e DAA, os respondentes tendem a agir estrategicamente de modo a
captar o máximo benefício ao mínimo de custo. Isto não deixa de ser
uma forma de viés. Os indivíduos adotam o comportamento de: em não
92
dizendo a verdade, podem capturar um benefício extra. Isto é
particularmente freqüente entre consumidores e bens públicos;
c) ignorância do mercado, falta de treinamento ou informação imperfeita:
em se tratando de mercados hipotéticos, os indivíduos se ressentem da
falta de prática para citar os valores que lhes são solicitados. As
discrepâncias de preços de compra e venda são sempre maiores em
mercados onde os freqüentadores não estão familiarizados com os
presos. Em contra partidas nos mercados maduros o preço de compra e
venda trabalhado é bastante próximo, posto que compradores e
vendedores possuam largas experiências nos negócios;
d) a aversão à perda ou “prospect theory”: no texto escrito por
Ribemboin, é manifestada a preposição de Kahneman e Tversky em
célebre artigo de 1979, que se constituem uma nova teoria segundo a
qual os indivíduos costumavam dar maior peso a uma perda do que a um
ganho equivalente. Não se trata da hipótese da utilidade marginal
decrescente da renda mais sim de uma espécie de aversão à perda.
A prospect theory ao alicerçar-se sobre base intuicionista lança uma
sombra na rigidez da lógica clássica que permeia a teoria econômica
tradicional. Essa nova “escola psicológica” põe em questionamento muito dos
sustentáculos da teoria neoclássica. As curvas de indiferença deixariam de ser
reversíveis e cada indivíduo teria na verdade dois mapas de preferência, um
para aumento e outro para diminuição na quantidade possuída de determinado
bem, como se encontra sugerido na figura 9 (1997, p. 8).
93
Figura 9. Curvas de Indiferença.
Fonte: Ribemboin, 1997, p. 8
e) formas de comportamento irracional: preguiça mental, sentimento de
perda ou medo de arrependimento, ou ainda a falta de inteligência, têm
sido citados por alguns autores para explicar as diferenças entre DAP e
DAA.
- Preguiça mental: como os mercados são hipotéticos, os indivíduos ao
serem questionados, dizem a oferta que primeiro lhes vem à cabeça.
- Sentimento de Perda ou medo de arrependimento: é uma possível
explicação para teoria psicológica – prospect theory, baseada numa
iminente aversão ao risco por parte das pessoas;
- Falta de Inteligência: os indivíduos não agem de forma racional e
conseqüentemente acabam numa situação de sub-otimização.
Neste contexto, analisando as figuras 7 e 8, DAP e DAA captam os
valores de VE e VC da seguinte forma, dado o aumento de preço (mudança
para pior):
94
DAP capta o valor de VE, pois é a quantia que o indivíduo está
disposto a pagar para evitar a mudança, num cenário de pré-
mudança.
DAA capta o valor de VC, pois é a quantia que o indivíduo está
disposto a aceitar para ser compensado pela mudança, num cenário
de pós-mudança.
4.2.3. Técnicas para obtenção da disposição a pagar e a aceitar
O uso de mercados contingentes para valoração inclui uma larga
variedade de mecanismos ou técnicas, na ausência de preços de mercado. E
esses têm sido estabelecidos para prover uma base razoável de mensuração
do valor de bens públicos, que estão extra-mercado como os ativos ambientais.
Seguem comentários de cada técnica com os respectivos mecanismos
de obtenção dos valores da DAP e DAA.
As principais opções de se obter o valor do ativo ambiental são: lances
livres ou formas abertas (open-ended), referendum ou referendo (dicotômica) e
referendum com follow up ou referendo com acompanhante.
4.2.3.1. Lances livres ou forma aberta (open-ended)
Nesta forma é utilizado o questionário, apresentando as seguintes
questões: quanto você está disposto a pagar? Ou quanto você está disposto a
receber?
Estas formas de pergunta, segundo Motta e May (1998), produzem uma
variável contínua de lances e o valor esperado da DAA ou DAP pode ser
estimado pela sua média, sendo utilizados dois tipos de mecanismos para a
obtenção dos valores: os cartões de pagamento ou os jogos de leilão,
mecanismos pioneiras na valoração contingente. Para verificação dos
resultados obtidos em relação às variáveis explicativas que influenciam a
resposta da amostra, utilizam-se, geralmente, técnicas econométricas de
regressão. Apresentam-se os mecanismos:
95
a) cartões de pagamentos: este mecanismo busca identificar a
verdadeira disposição dos indivíduos; cartões com diferentes valores, ou
representando bens de consumo de valor equivalente, são apresentados
e o entrevistado escolhe o valor que reflete a sua disposição a pagar, por
exemplo. Esta forma é mais recomendável quando se trata de
populações com baixo grau de monetização.
Ribeiro (1998) demonstra um exemplo da técnica: nesse mecanismo o
entrevistador apresenta todos os valores transcritos num cartão, para que o
entrevistado aponte o valor que está disposto a pagar; assim, a técnica pode
prover um único ponto de partida.
b) Jogos de Leilões (bidding games): este mecanismo se baseia em
sucessivas perguntas que vão sendo feitas conforme a resposta dada.
Se o entrevistado aceitar como quantia inicial, o valor perguntado vai
aumentando. Caso rejeite a quantia inicial, os valores vão diminuindo.
Esta técnica busca a verdadeira disposição a pagar dos indivíduos,
tomando um conjunto de valores que, a partir de um valor médio, são
sucessivamente apresentados aos entrevistados. Caso o valor médio seja
aceito pelo indivíduo, valores superiores a este serão apresentados; caso
contrário, valores inferiores serão apresentados. (Ribeiro, 1998, p. 26)
4.2.3.2. Referendum ou Referendo (escolha dicotômica)
Neste o questionário apresenta a seguinte indagação: você está disposto
a pagar R$ X? - A quantia X é sistematicamente modificada ao longo da
amostra para avaliar a freqüência das respostas dadas diante de diferentes
níveis de lances.
Esta forma de obtenção do valor possui dois fatores apreciáveis em sua
técnica: primeiramente, permite menor ocorrência de lances estratégicos dos
entrevistados que procuram defender seus interesses ou beneficiar-se da
96
provisão gratuita do bem (carona), e, segundo, aproxima-se da verdadeira
experiência de mercado que geralmente define suas ações de consumo frente a
um preço previamente definido.
Esta aproximação produz um indicador discreto de lances e o valor
esperado da medida monetária (DAA ou DAP) tem que ser estimado de forma
bastante complexa com base numa função de distribuição das respostas “sim” e
sua correlação com uma função de utilidade indireta, geralmente assumida
como logística.
Isto ocorre devido ao fato da técnica de Referendo envolver,
basicamente, uma pergunta à qual o consumidor responde “sim” ou “não”, caso
esteja disposto, ou não, a aceitar ou pagar um valor a ele apresentado. Esse
valor seria atribuído a determinado bem ou serviço extra-mercado. A decisão do
consumidor envolve uma mudança dicotômica que pode ser analisada pelo
ordenamento de probabilidades de respostas positivas (sim), para valores
monetários específicos.
Sendo assim, a técnica apresenta três problemas, segundo Ribeiro
(1998):
1- Exige amostras maiores que as exigidas por outras técnicas para os
mesmos níveis de significância;
2- A determinação do intervalo de valores a serem apresentados na
pesquisa pode introduzir vieses nesta, influenciando as estimativas de
DAA e DAP;
3- O referendum está sujeito a alto nível de resposta “zero”, o que se
traduz em um problema análogo ao viés do ponto de partida.
4.2.3.3. Referendum com follow up ou Referendo com acompanhante
Esta técnica utiliza-se de uma outra forma mais sofisticada de escolha
dicotômica. Conforme a resposta dada à pergunta inicial, é acrescida uma
segunda pergunta iterativa. Tomado do intervalo de valores que constituem a
pesquisa, um valor é apresentado ao entrevistado; caso seja rejeitado, será
97
substituído por um valor inferior; caso seja aceito, será substituído por um valor
superior. Ao ser oferecido um segundo valor às questões de referendum, as
estimativas obtêm ganhos de eficiência, mas os problemas supram delineados
e inerente à técnica referendum permanece.
4.2.4. O instrumento (ou veículo) de pagamento
Sobre este assunto Motta (1998) argumenta que podem ser, assim,
definidos os instrumentos (ou veículos) de pagamento ou compensação, após a
medição da DAP ou DAA:
DAP – novos impostos, tarifas ou taxas, ou maiores alíquotas nos
existentes; cobrança direta pelo uso; ou doação para um fundo de
caridade ou uma organização não-governamental.
DAA – novos subsídios ou aumento no nível dos existentes;
compensações financeiras diretas; ou aumento de patrimônio via obras
ou reposição.
Observando que cada caso de valoração deve ser analisado
criteriosamente para identificar qual é o instrumento mais neutro, que tenha
maior credibilidade de ocorrer e ser respeitado.
4.2.5. A forma de entrevistar
A pesquisa de valoração de contingente possui algumas peculiaridades
que só a presença de um entrevistador pode atendê-las. Normalmente as
questões exigem cenários complexos, tornando essencial o auxílio visual
através de imagens, gráficos ou tabelas. As entrevistas podem se tornar
relativamente longas, e manter a atenção do entrevistado é essencial para que
nenhuma informação importante passe despercebida.
As entrevistas pessoais são as que produzem os resultados mais
confiáveis. As informações são passadas verbalmente e permitem a utilização
de cenários gráficos. Isso atrai a atenção do entrevistado e aumenta sua
motivação para responder adequadamente à questão de valoração. Estas
98
entrevistas são complexas e usualmente longas, exigindo entrevistadores bem
treinados para aplicá-las. Pode-se usar telefone, mas o seu uso diminui a
qualidade das informações, as entrevistas devem ser mais curtas para não
perder a atenção das pessoas e a amostragem fica restrita às residências
cadastradas na lista telefônica. Por sua vez as entrevistas por correspondência
permitem auxílio visual para especificação dos cenários, mas apresenta sérias
limitações, como a incerteza na compreensão e interpretação feita pelo
entrevistado; ela é recomendada somente nos casos onde os cenários são
simples, curtos, e a população possui certo grau mínimo de instrução e
conhecimento sobre o bem avaliado (Maia, 2002, p. 40).
É de fundamental importância determinar qual o conteúdo das
informações que devem ser prestadas no questionário de forma a transferir,
realisticamente, a magnitude das alterações de disponibilidade do ativo
ambiental em valoração, para se ter uma redução da subjetividade do método.
4.3. Estimação do método de valoração contingente – validade,
confiabilidade e vieses.
A avaliação de aceitabilidade das estimativas de DAP e DAA estão
concentradas nas questões teóricas e metodológicas de valoração contingente.
Estas questões podem ser divididas, segundo Motta (1998), nas categorias:
validade, confiabilidade e vieses.
4.3.1. Validade
A validade refere-se ao grau em que os resultados estimados no MVC
indicam o “verdadeiro” valor do bem. Todavia, como é impossível precisar o real
valor de um recurso ambiental, o que usualmente se faz é a detecção de vieses
a partir de possíveis comportamentos das pessoas e da interferência de
componentes do cenário. É importante argumentar que viabilidade e
confiabilidade não são sinônimas. Existem casos em que o MVC alcança
estimativa consistente, mas sujeitas à presença de vieses. Nesta hipótese, os
99
resultados são julgados não válidos. Considerando um modelo linear geral,
validade e confiança poderiam ser expressas da seguinte forma (Motta, 1998, p.
48):
Y = aX + b + (11)
Y = valor observado da variável
X = valor verdadeiro da variável
a e b = constantes
= erro residual
Enquanto a e b refletem a validade do método, determina a
confiabilidade. Valores de a = 1, b = 0 e sendo o erro aleatório que indica
absoluta validade. Quando não se revela aleatório, então indica a existência
de vieses.
4.3.2. Confiabilidade
A confiabilidade mensura a variabilidade entre as respostas. É
equivalente à medida de precisão estatística, ou seja, a capacidade de
reproduzir o mesmo valor em medidas consecutivas.
Uma medida de confiabilidade é a variância do estimador, que mensura a
dispersão dos dados em torno da média estimada. Uma distribuição aleatória
da variância do estimador indica consistência entre as respostas e a existência
de alguns componentes não aleatórios na distribuição poderem enviesar a
estimação para alguma direção. Assim, quanto menos aleatória for a amostra,
menor será o grau de confiabilidade.
A variância depende basicamente de três elementos:
1. Da verdadeira natureza do erro aleatório;
2. Do próprio processo de amostragem; e
3. Da forma como foram elaborados os questionários.
100
Para melhorar a confiabilidade, Maia (2002) sugere amostras
relativamente grande e técnicas estatísticas mais vigorosas para detecção de
outliers (valores extremos, considerados irreais para o escopo da pesquisa de
valoração de recursos ambientais).
4.3.3. Vieses - os principais problemas do método
Podem ser identificados vários vieses que afetam a confiabilidade do
método e que devem ser minimizados com o desenho do questionário e da
amostra. A valoração de bens públicos apresenta dificuldades devido ao
problema da revelação de preferências para essa categoria de bens (públicos)
e o método de valoração contingente é um dos métodos de mercado hipotético
mais conhecido, visto que constrói um mercado, ele está sujeito a vários vieses:
viés estratégico, viés de estrutura ou do desenho do questionário, viés
hipotético, viés operacional, viés de protesto e vieses potenciais. A seguir, é
feita uma descrição de cada um, de acordo com os trabalhos de Pessôa (1996),
Motta (1998) e Ribeiro (1998).
4.3.3.1. Viés Estratégico
O viés estratégico já é bastante antigo na literatura e originou-se da
suposição ou evidência de que, no contexto de mercados hipotéticos, os
indivíduos não revelem suas verdadeiras preferências, porque adotam um
comportamento estratégico com o objetivo de garantir um benefício maior que o
custo que desejam assumir.
Este viés descreve a possibilidade que os respondentes subestimem sua
verdadeira disposição a pagar por um bem, pois acreditam que agindo assim,
podem ser capazes de usufruir os benefícios da provisão do bem a um preço
menor que se tiver que pagar um preço mais alto pelo mesmo bem. Os
respondentes percebem que mesmo não podendo cumprir com sua disposição
a pagar não são compelidos a fazerem “revelando” sua disposição, influencia
na avaliação monetária da DAP estimada. Além disso, se a soma agregada das
101
DAPs exceder os custos de provisão do bem ambiental em questão, este será
ofertado, tornando-se difícil excluir qualquer pessoa de usufruí-lo. Isto se deve à
característica de bem público. Este é o clássico problema do free rider
(passageiro clandestino ou pegar carona).
Com vistas a minimizar a ocorrência do comportamento estratégico,
Motta e May (1998) recomendam atenção com a estrutura das perguntas para
que estas não sejam indutoras desse tipo de comportamento. Uma maneira
usada para diminuir o viés estratégico é fazer as perguntas utilizando três
cenários distintos: somente os n entrevistados que apresentarem os maiores
lances terá acesso ao bem; todos têm acesso ao bem se a DAP for acima de
um determinado nível; e todos com uma DAP positiva terão acesso.
O primeiro cenário parece revelar a “verdadeira” DAP, o segundo, um
fraco comportamento estratégico e o último um forte. Evidências empíricas
sugerem que, nos resultados obtidos nas pergunta com formato dicotômico,
observa-se uma incidência do comportamento caronista menor que nas
perguntas do tipo aberto (continua). Em se tratando dos bens públicos
ambientais, o valor de existência e o sentimento de altruísmo atuam como um
desincentivo para o carona.
4.3.3.2. Viés de estrutura ou do desenho do questionário
Está relacionado com todo tipo de problema que envolva o planejamento
de uma pesquisa utilizando uma avaliação hipotética, já que este pode induzir
os entrevistados a dar respostas que não traduzam suas reais preferências.
O viés do ponto de partida pode ocorrer devido a uma possível influência
que o valor inicial apresentado na questão de valoração, com o uso da técnica
jogos de leilão ou referendum com follow up, possa exercer no entrevistado, já
que este pode ser induzido a considerar que esse valor inicial seja o mais
correto.
O viés do veículo é definido pelo instrumento de pagamento usado na
pesquisa. A mudança em taxas locais e conhecidas pelos entrevistados, tais
102
como taxas de acesso, sobretaxas de contas específicas, elevação dos preços
dos bens determinados, faz com que os entrevistados sejam mais sensíveis ao
tipo de veículo adotado como pagamento. O viés informativo pode decorrer
devido à forma pela qual o pesquisador/entrevistador informa ao entrevistado
sobre dado valor inicial. A seqüência das perguntas e as informações contidas
nestas ou apresentadas no texto para valoração contingente podem influenciar
os entrevistados.
4.3.3.3. Viés hipotético
É decorrente da própria natureza do MVC e está relacionado com a
própria capacidade do pesquisador em construir, idealmente, o mercado
hipotético. Além de estar relacionado com a compreensão que os entrevistados
têm do processo. Dada à natureza hipotética do método, os entrevistados
podem não levar a sério o processo e, conseqüentemente, não realizar boa
reflexão acerca de suas respostas. Para reduzir o efeito desse viés, os
economistas têm buscado apoio no campo da psicologia sobre processo de
informação e tomada de decisão, conhecimento sobre as relações entre atitude,
intenções e comportamento. Motta (1998) coloca que o viés hipotético induz a
um aumento da variância e, conseqüentemente, a uma baixa confiabilidade do
modelo.
Ainda, segundo Motta, as pesquisas elaboradas sobre o viés hipotético
mostram que este tipo de problema é bastante significativo em estudos
baseados na DAA e que pode se tornar insignificante nos estudos baseados na
DAP. Normalmente, o teste é realizado através da comparação entre os lances
hipotéticos e os lances obtidos em simulações de mercado onde se utilizam
transações reais de dinheiro. A divergência entre a verdadeira DAP e DAP
hipotética é muito menor que na referente a DAA. Uma razão para este
fenômeno deve-se ao fato de que os entrevistados estão muito mais
familiarizados na vida real com o ato de fazer pagamentos de que o de receber
103
compensações. Para minimizar o viés hipotético, a credibilidade dos cenários e
proximidade destes com a realidade são fundamentais.
4.3.3.4. Viés operacional
Ocorre pela dimensão em que as condições operacionais apresentadas
no mercado hipotético se aproximam das condições de mercados reais. Muitos
pesquisadores indicam que a pesquisa de valoração contingente deve
apresentar, claramente, as possíveis formas de se operacionalizarem
alterações relativas ao bem com o qual os entrevistados devem ter alguma
familiaridade ou conhecimento. A presença de incertezas a respeito de como o
bem pode ser provida é a principal fonte desse tipo de viés.
4.3.3.5. Viés de protesto
Este tipo de viés tem sido considerado como muito importante pela
literatura recente. O viés expressa uma “forma de comportamento político”, pois
o entrevistado utiliza suas respostas como instrumentos que expresse seu
protesto contra algo relacionado com a pesquisa. Para a identificação desse
viés, os questionários podem incluir uma questão que investigue os motivos
pelos quais os entrevistados deram resposta negativa à valoração contingente.
(Hanemann, 1994 apud Ribeiro, 1998, p. 38)
4.3.3.6. Os vieses potenciais
Os vieses potenciais sobre o método de valoração contingente podem
ser agrupados em três tipos: incentivo a falsificar o valor da DAP, implicação
dos valores sugeridos (indicados) e cenário (contexto) incorretamente
especificado. (Pessôa, 1996, p. 47).
O primeiro tipo de erro potencialmente sistemático é resultado dos
incentivos aos respondentes falsearem o valor da DAP. Estes incentivos são
causados pelas características do cenário do bem que está sendo avaliado ou
104
instrumento, que pode induzir comportamento estratégico, comportamento de
concordância ou comportamento de resposta.
Sendo assim, três vieses potenciais são incluídos:
a) O primeiro deles é chamado de viés estratégico: os respondentes
declaram um montante falso para influenciar o resultado do estudo de
forma que sirva aos seus próprios interesses (caso do carona, free rider,
ou dos respondentes que pertencem a instituições ambientalistas que, na
oportunidade de responder um questionário, superestimam sua avaliação
ambiental – DAP).
Para reduzir os efeitos do viés estratégico, existem três formas:
1. recomenda-se a utilização de um método de licitação com
compatibilidade de incentivos, no caso, o método TIOLI (take-it-or-leave-
it);
2. evitar alguma opinião (sugestão) que leve os respondentes a
compreenderem que uma mudança ambiental que está sendo avaliada
será fornecida impreterivelmente ou que os respondentes apenas
pagarão um montante fixado;
3. análise cuidadosa da distribuição dos valores declarados. Licitantes
estratégicos geralmente fazem lances altos demais ou bastantes baixos,
sem uma razão apropriada. No caso de lances altos, a renda (familiar ou
individual) seria uma restrição ou no caso de lances baixos, os
respondentes consideram a provisão do bem analisado uma questão
sem importância.
b) viés do entrevistador – este viés está relacionado com os
respondentes que declaram um montante falso de forma a agradar o
entrevistador ou o patrocinador da pesquisa. Para reduzir o efeito desse
viés, recomenda-se um treinamento especifico para os entrevistadores e
que a operacionalidade da pesquisa seja feita por uma organização
neutra.
105
c) o terceiro tipo, o viés da conveniência social, tem relação com aqueles
respondentes que atestam um montante falso para representarem a si
mesmo como se fosse um procedimento elegante, por exemplo, quando
se está respondendo alguma questão, é preferível dizer sim a não. Uma
forma de reduzir a influência é perguntar aos respondentes qual o
pensamento da família com relação à disposição a pagar que seria
compatível com a renda.
O segundo grupo de erros diz respeito à implicação dos valores
sugeridos (indicados), que são resultantes dos elementos do cenário (contexto).
Esses elementos que compõe a avaliação são percebidos pelos respondentes,
implicando em informações sobre o valor da mudança ambiental. Se o cenário
contém algum valor monetário indicado (algumas pesquisas informam, ao longo
do questionário, algum montante associado a outro ativo ambiental similar ou
não), os respondentes estarão propensos a usá-lo como referência quando
avaliar sua disposição individual.
Três vieses potenciais são incluídos neste segundo grupo:
a) viés do ponto de partida: está relacionado com a suposição de que o
respondente faz sua avaliação com base no valor DAP inicial, que é o
indicado no início do jogo de oferta (lances), quando se utiliza o método
de licitação interativo entre o entrevistado e o entrevistador;
b) viés de ordenamento: diz respeito ao respondente que baseia sua
DAP analisando a ordem da disposição dos diversos montantes (valores)
apresentados no carnê de pagamento;
c) viés referencial: refere-se aos respondentes que avaliam sua
disposição a pagar tomando como base algum bem público, o qual é
enfatizado por elementos de cenários, como o veículo de pagamento, ou
opção de valores indicados no carnê de pagamento.
106
Os dois primeiros tipos de vieses podem ser evitados fornecendo alguma
sugestão não monetária no cenário (ou contexto) a ser avaliado, utilizando o
método de licitação direta ou formulando questões que tenham como resposta
uma escolha dicotômica. Uma estratégia que pode ser adotada para reduzir o
efeito dos vieses é permitir que o respondente obtenha alguma experiência em
avaliação de bens ambientais antes que ele proceda à avaliação do bem em
questão.
O efeito do terceiro viés pode ser reduzido através de cuidado na
elaboração do desenho da pesquisa, por exemplo, do questionário, do veículo
de pagamento e outros.
O último grupo de viés a ser analisado, de acordo com Pessôa, é
denominado viés de cenário incorretamente especificado. Esse viés é resultante
de elementos de cenários (contexto) os quais são corretos do ponto de vista
teórico ou do conhecimento dos fatos da situação, mas são percebidas as
maneiras como as pessoas percebem a informação. É subdividido em dois
grupos:
a) vieses relacionados à má especificação do bem, sendo os potenciais
vieses:
1) viés simbólico, os respondentes reagem preferencialmente aos bens
com maior significado simbólico do que as descrições apresentadas do
bem;
2) viés parcial, os respondentes reagem preferencialmente a uma maior
compreensão do bem ambiental do que a descrição especificada no
questionário;
3) viés de probabilidade, os respondentes reagem de forma diferente a
uma probabilidade de provisão de uma mudança ambiental do que a
uma probabilidade descrita na pesquisa.
107
b) vieses relacionados a má especificação dos aspectos do contexto no
qual o bem é avaliado. Cinco vieses potenciais são incluídos no segundo
subgrupo:
1) viés de veículo de pagamento: os indivíduos respondem
diferentemente em relação às características do veículo de pagamento
do que a um veículo pretendido, mesmo supondo que a forma de
pagamento fosse neutra;
2) viés do método de provisão: os entrevistados respondem
diferentemente devido às qualidades da organização que está
fornecendo o bem ambiental em questão do que alguma organização
pretendida, mesmo sendo neutra a forma de provisão;
3) viés de restrição de orçamento: os entrevistados respondem a
diferentes restrições orçamentárias do que em relação a renda líquida.
4) viés de licitação: os respondentes não percebem que o processo de
licitação final, conduz ao máximo montante solicitado;
5) viés de contexto: o entrevistado reage com maior relevância às
questões precedentes do cenário, de modo não intencional. Por
exemplo, se uma série de questões é perguntada sobre a necessidade
de melhoria da qualidade ambiental sem colocar algumas das questões
na forma de trade-offs econômico, o potencial de ocorrer viés de
contexto seria induzido, sem intencionalidade, mas enfatizando a idéia
de melhoria ambiental.
O impacto desses vieses pode ser reduzido através: de treinamento aos
respondentes na avaliação de bens ambientais, no cuidado na elaboração do
“design” da pesquisa, uso de grupos de discussão tendo como foco o objeto de
análise e precauções prévias na pesquisa, além da utilização de técnicas que
auxiliem na montagem do mercado hipotético como figuras, fotos, discussões
com o entrevistado sobre o tema.
108
Contudo, viés de especificação incorreta pode ser uma série ameaça
para a validade do método de valoração contingente. Dados que pessoas não
fazem a articulação de valores para avaliação de bens ambientais dentro de um
estudo de valoração contingente, existe um considerável potencial para as
pessoas ignorarem ou interpretarem mal alguns dos detalhes em um cenário.
O método de valoração contingente é classificado como Metodologia de
Provisão Local, metodologia que soluciona um problema peculiar, de certo
campo de interesse. A simples estimação da máxima disposição a pagar (DAP)
ou a mínima disposição a aceitar (DAA), ou a revelação de escolhas
contingentes, como por exemplo, comprar ou não comprar a um preço dado, ou
ainda, votar sim ou não para decidir sobre alguma política pública, fez com que
economistas e cientistas sociais desacreditassem na eficiência da MVC.
Contudo, ao longo dos anos 70 e 80 vários estudos empíricos utilizando MVC
foram sendo publicados, teorias, modelos e técnicas proliferaram, aumentando,
portanto, as contribuições para a aceitabilidade do método. As leis federais e
regulamentações passaram a conceder compensação monetária por danos
ambientais sofridos por indivíduos que reivindicaram a perda de um ativo
ambiental que tinha um valor de uso passivo, utilizando MVC como um método
de avaliação (Ribeiro, 1996, p.52).
A seguir, no próximo capítulo é caracterizada e descrita a suinocultura e
o que esta pode causar aos ativos ambientais.
109
5. A SUINOCULTURA E SEUS EFEITOS SOBRE ATIVOS AMBIENTAIS
5.1. A Suinocultura
A suinocultura é o manejo realizado para criação de suínos em escala
intensiva de produção. A carne suína por ser a carne mais consumida no
mundo, tem um papel fundamental com relação ao crescimento da produção de
alimentos para a população mundial. Sendo assim, ela é uma atividade
importante do ponto de vista econômico e social (gera emprego, renda e
alimento), no entanto, sua exploração é considerada como uma atividade de
grande potencial poluidor.
É realizada, agora, uma discussão sobre dejetos suínos: composição
química e física, manejo e tratamento e seus efeitos sobre os ativos ambientais
(solo, água, ar, fauna e flora).
5.2. Os dejetos suínos
A criação de suínos em escala industrial traz como conseqüências a
intensa produção de dejetos nas propriedades rurais, os quais são altamente
poluentes e causadores de degradação ambiental, como a contaminação dos
corpos receptores e desenvolvimento de odores. Os resíduos orgânicos dos
suínos possuem um potencial poluidor em torno de 50 vezes a mais do que o
esgoto doméstico, pois, enquanto o esgoto doméstico apresenta uma Demanda
Bioquímica de Oxigênio – DBO per capita de 45 g/hab/dia, Perdomo (1999),
aponta uma DBO per capita de 189g/suíno/dia, com peso de 61 kg.
110
De acordo com Diesel et al. (2002) a causa principal da poluição é o
lançamento direto do esterco de suínos sem o devido tratamento nos cursos de
água, que acarreta desequilíbrios ecológicos e poluição em função da redução
do teor de oxigênio dissolvido na água, disseminação de patógenos e
contaminação das águas potáveis com amônia, nitratos e outros elementos
tóxicos.
Os principais constituintes dos dejetos suínos que afetam as águas
superficiais são: matéria orgânica, nutrientes, bactérias fecais e sedimentos.
Nitratos e bactérias são os componentes que afetam a qualidade da água
subterrânea. A produção de suínos acarreta, também, um outro tipo de poluição
que é aquela associada ao problema do odor desagradável dos dejetos. Isto
ocorre devido à evaporação dos compostos voláteis, que causam efeitos
prejudiciais ao bem-estar humano e animal. Os contaminantes do ar mais
comuns nos dejetos são: amônia, metano, ácidos graxos voláteis, etanol,
propanol, dimetil sulfidro e carbono sulfidro. A emissão de gases pode causar
graves prejuízos nas vias respiratórias do homem e animais, bem como, a
formação de chuva ácida através de descargas de amônia na atmosfera, além
de contribuírem para o aquecimento global da terra (Perdomo, 1999).
Segundo Oliveira e Lima (1998) o processo de manejo e tratamento de
dejetos, inicia-se na separação de fases, sendo este um processo que consiste
em separar as partículas maiores contidas nos dejetos da fração líquida,
conduzindo à obtenção de dois produtos: uma fração líquida mais fluida, mas
que conserva a mesma concentração em nutrientes fertilizantes solúveis que os
dejetos brutos; e uma fração sólida, resíduo da decantação ou da peneira, com
unidade alta e mantendo-se agregada, podendo evoluir para um composto,
sendo que o programa de manejo dos dejetos deve atender às exigências e as
características específicas de cada criador. Para Oliveira (1993) devem-se levar
em conta, no planejamento do manejo dos dejetos, cinco etapas: a produção, a
coleta, o tratamento, a armazenagem e a utilização dos dejetos na forma sólida,
pastosa ou líquida. O perfeito conhecimento de cada uma destas etapas é
111
fundamental para o sucesso e a sustentabilidade do sistema de manejo
suinícola.
5.2.1. Volume produzido de dejetos
De forma geral, Oliveira (1993) e Perdomo et al. (2001), estimam que um
suíno (na faixa de 16 a 100 kg de peso vivo) produz de 8,5 a 4,9% de seu peso
corporal em urina + fezes diariamente. O manejo, o tipo de bebedouro e o
sistema de higienização adotados, bem como, o número e categoria de animais
também influenciam o volume de dejetos (tabela 1). Estima-se a produção de
efluentes das unidades de ciclo completo (cria, recria e abate), em condições
normais, em 100/matriz/dia., 60 l/matriz/dia para as unidades de produção de
leitões e 7,5 l/terminado/dia. Portanto, uma granja em ciclo completo com 80
matrizes e dejetos “pouco diluídos”, geram 8 000 l/dia, cerca de 12 000 l/dia
com “diluição média” e 16 000 l/dia no caso de “muito diluído”.
TABELA 1. Produção média diária de esterco (kg), esterco + urina (kg) e
dejetos líquidos (l) por animal por fase.
Categoria de Suínos Esterco Esterco + urina Dejetos líquidos
25-100 kg 2,30 4,90 7,00
Porcas em Gestação 3,60 11,00 16,00
Porcas em Lactação 6,40 18,00 27,00
Machos 3,00 6,00 9,00
Leitão desmamado 0,35 0,95 1,40
Média 2,35 5,80 8,60
Fonte: Oliveira (1993)
112
5.2.2. Composição física e química
Os dejetos suínos são constituídos por fezes, urina, água desperdiçada
pelos bebedouros e de higienização, resíduos de ração, pêlos, poeiras e outros
materiais decorrentes do processo criatório (Konzen,1993 apud Diesel et al.,
2002). O esterco, por sua vez, é constituído pelas fezes dos animais que,
normalmente, se apresentam na forma pastosa ou sólida. O esterco líquido dos
suínos contém matéria orgânica, nitrogênio, fósforo, potássio, cálcio, sódio,
magnésio, manganês, ferro, zinco, cobre e outros elementos incluídos nas
dietas dos animais (Diesel et al., 2002, p. 7).
As características dos dejetos (Tabela 2) estão associadas ao sistema de
manejo adotado e aos aspectos nutricionais, apresentando grandes variações
na concentração dos seus elementos entre produtores e dentro da própria
granja (Perdomo et al. 2001, p. 10).
113
TABELA 2. Características de dejetos suínos (fezes + urinas), expressos por
10 kg de peso vivo.
Parâmetros Unidade Valor
Volume – urina Kg 39
fezes kg 45
densidade Kg/m³ 990
Sólidos – totais kg 11
voláteis kg 8,5
DBO5 kg 3,1
DQO kg 8,4
Ph - 7,5
Nitrogênio – total kg 0,52
amoniacal kg 0,29
Fósforo total kg 0,18
Potássio total kg 0,29
Minerais – Cálcio kg 0,33
Magnésio kg 0,070
Enxofre kg 0,076
Sódio kg 0,067
Cloro kg 0,26
Ferro Mg 16
Manganês Mg 1,9
Zinco Mg 5,0
Cobre Mg 1,2
Coliforme – total Colônia 45x1010
fecal Colônia 18x1010
Fonte: ASSAE (1993) apud Perdomo et al. (2001)
114
A degradação de fibras vegetais e de proteínas provoca a formação de
compostos voláteis. Os ácidoaminados submetidos aos processos de
desaminação, transaminação, descarbolixação oxidativa dão origem ao CO2,
NH3 e ácidos graxos voláteis (AGV). Segundo Pain e Bonazzi (1991) apud
Perdomo et al. (2001), a concentração de AGV varia de 4 a 27 g/l de dejetos.
Sob condições aeróbias o CO2 é o principal gás produzido, mas em processos
anaeróbios predomina o CH4 (60 a 70%) e o CO2 (30%). Dentre os mais de 40
compostos gasosos identificados como resultante da degradação de dejetos
animais, cabe destaque ainda para a família dos mercaptanos, sulfides, esteres,
carbonilas e aminas. A produção de CH4 é pequena na produção de suínos,
representando menos de 1% da energia consumida e, comparada à produção
de ruminantes resulta insignificante, sendo levemente superior a 1 kg de CH4
por cabeça/ano (Tamminga e Verstegen, 1992 apud Perdomo e Lima 1998)
Agora, são analisadas as conseqüências dos dejetos sobre ativos
ambientais.
5.3. Efeitos da suinocultura sobre os ativos ambientais
A suinocultura é atividade de grande potencial poluidor, ora já
argumentado, face ao elevado número de contaminantes gerados pelos seus
efluentes, cuja ação individual ou combinada, pode representar importante fonte
de degradação do ar, dos recursos hídricos, do solo e, por conseguinte dos
animais. De acordo com Perdomo et al. (2001), a degradação biológica dos
dejetos produz gases tóxicos, cuja exposição constante a níveis elevados, pode
reduzir o desempenho zootécnico dos suínos e incapacitar precocemente os
tratamentos para o trabalho, mas o lançamento dos dejetos na natureza pode
causar desequilíbrios ambientais, a exemplo da proliferação de moscas e
borrachudos, além do aumento das doenças vinculadas à água e ao solo.
Esses problemas ocorrem devido à falta de informações precisas sobre a
concentração química dos dejetos, da aptidão dos diferentes tipos de solos e
culturas para o recebimento de fertilizantes existentes nos dejetos suínos e da
115
compreensão dos efeitos da aplicação dos resíduos sobre o meio ambiente, a
curto e longo prazo. Eles têm provocado muitos danos econômicos e
ambientais.
Oliveira e Lima (1998) argumentam que a prática de lançar os dejetos de
suínos de forma indiscriminada na natureza, com riscos de contaminação do
solo, dos mananciais naturais de água, do ar e da saúde das comunidades
rurais e urbanas, constitui-se numa agressão condenável.
Buscando a caracterização da produção de dejetos suínos, através dos
sistemas de manejo dos animais, os sistemas confinados constituem a base da
expansão suícola, correspondem a 61%, em 2000, do total de sistemas
adotados de produção de suínos no Brasil, de acordo com Perdomo et al.
(2001), e induzem a adoção do manejo de dejetos na forma líquida. O elevado
nível de diluição constitui um agravante para os problemas de captação,
armazenamento, tratamento, transporte e distribuição dos dejetos.
Todos os sistemas, confinado, semiconfinado, extensivo ou ar livre,
resultam poluidores potenciais, mas com níveis de impacto ambiental
diferenciados, por exemplo: o sistema confinado, de uma forma geral, coleta e
armazena os dejetos suínos para posterior tratamento e utilização. A
intensificação no sistema acarreta aumento da pressão sobre os recursos
naturais, uma vez que gera e distribui os efluentes no próprio local. O impacto é
especialmente na integridade do solo (dificuldade para manter a cobertura
natural, compactação, erosão) e na contaminação das águas superficiais e
subterrâneas (Perdomo et al., 2001, p. 9).
5.3.1. No solo
Na exploração da suinocultura, é importante estar atento ao processo de
contaminação do solo, em função da quantidade de esterco líquido que
porventura venha a ser depositado, assim como da capacidade de filtração do
solo e retenção dos nutrientes do esterco. O impacto ambiental sobre o solo
ocorre devido aos componentes poluentes dos dejetos suínos -
116
macronutrientes: o nitrogênio, o fósforo, o potássio alguns microminerais como
o zinco e o cobre.
O problema do nitrogênio no solo é provocado pela sua transformação
em nitrato, que sofre lixiviação e atinge os lençóis freáticos. O fósforo em
excesso fica acumulado no solo e só é dissolvido na água dos rios quando a
capacidade de retenção dele pelo solo fica prejudicada.
Seganfredo (2000), ao estudar o efeito acumulativo da aplicação de
dejetos suínos no solo (três anos), concluiu que doses para suprir até 150 kg/ha
de N na cultura do milho, aumentaram os teores de N total, N-NH4 e N-NO3 na
camada de 0 a 20 cm do solo e de N-NO3 na de 40 a 60 cm. A concentração de
N-NO3 na profundidade de 40 a 60cm foi 172% superior a testemunha
(adubação mineral) e os teores de NO3 excederam de 50 a 121% o limite
estabelecido pela legislação ambiental (10 mg/l). Um outro estudo do autor com
dosagens de 100 a 150 kg/ha de N revelou que a aplicação de dejetos de
suínos diminui a microporosidade e a densidade do solo, mas, aumentou a
macroporosidade e a porosidade total do solo.
Além dos macronutrientes essenciais, os dejetos de suínos, devido à
suplementação mineral oferecida aos animais, contêm micronutrientes como o
Zn, Mn, Cu e Fe que, em doses elevadas, também, podem ser tóxicos às
plantas (Perdomo et al., 2001, p. 15).
A disposição direta e indiscriminada do dejeto no solo pode causar
contaminação de águas superficiais e subterrâneas por nitrato, elevação da
concentração de metais pesados no solo e nas plantas, salinização,
depreciação das características físicas e químicas do solo, além do aumento da
concentração de agentes patogênicos no meio ambiente (Couto e Maia, 1999,
p.9)
5.3.2. Na água
O problema da adição de dejetos aos recursos hídricos resulta do rápido
aumento populacional das bactérias e na extração do oxigênio dissolvido na
117
água para o seu crescimento. As bactérias são as principais responsáveis pela
decomposição da matéria orgânica. Se o corpo de água contém oxigênio
dissolvido (OD), os organismos envolvidos na decomposição da matéria
orgânica são as bactérias aeróbias ou facultativas, sendo o CO2 e a H20 os
subprodutos finais da digestão aeróbia (Perdomo et al., 2001, p. 13). Os
macronutrientes como nitrogênio (N), fósforo (P) encontrados nos dejetos
provocam, também, contaminação dos recursos hídricos.
Quando se adiciona uma grande quantidade de dejetos num corpo
d’água, teoricamente, a população de bactérias pode dobrar a cada divisão
simultânea, ou seja, uma bactéria com tempo de multiplicação de 30 minutos
pode gerar uma população de 16 777 216 novas bactérias em apenas 12 horas
de vida (Krueger et al.,1995 apud Perdomo et al., 2001).
Os nutrientes, o nitrogênio (N) e o fósforo (P) são considerados como os
principais problemas de poluição dos recursos hídricos. Dietas ricas em
proteína, e conseqüentemente nitrogênio, exigem maior consumo de água, uma
vez que o metabolismo das proteínas gera menor produção de água
metabólica, quando comparada ao de carboidratos e lipídeos. A excreta na
urina é tanto maior quanto mais elevado for o nível de N da dieta (Perdomo, et
al., 2001, p.13).
O N é o nutriente que exige maiores cuidados, pois além de limitar o
desenvolvimento da maioria das culturas, é o mais sujeito às transformações
biológicas e perdas, seja na armazenagem ou no solo. A Tabela 3 apresenta as
perdas de N em função do sistema de estocagem e utilização.
118
TABELA 3. Perdas de Nitrogênio (%) em função do sistema de estocangem,
tratamento e utilização.
Sistema Perda de N
Lagoa anaeróbia 70 a 85
Esterqueira 20 a 40
Aspersão 15 a 40
Distribuição
Líquida 10 a 25
Sólida 15 a 30
Injeção ou incorporação imediata 1 a 5
Fonte: USDA (1994) apud Perdomo et al. 2001
Em estudos empreendidos por Perdomo (1998, 2001) os teores de
nitratos detectados no lençol freático de solos tratados com altas quantidades
de dejetos líquidos (160 m³/ha) são 10 vezes maiores que os de solos não
tratados. Com isso, o impacto da suinocultura se dá nos recursos hídricos
superficiais e subterrâneos, o efeito sobre a água é provocado inicialmente pelo
nitrogênio, que se transforma em nitrato (NO3-) e nitrito (NO2
-). Segundo Alves
(2001), no caso do nitrato (NO3-), sendo um ânion normalmente repelido pela
superfície negativa das partículas do solo, será facilmente lixiviado, por
movimentar-se no solo, praticamente acompanhado as águas de percolação. O
nitrogênio pode também poluir o ambiente na forma de amônio, que pode
causar a chamada chuva ácida.
O Excesso de fósforo, assim como o nitrogênio favorece o
desenvolvimento desordenado de algas. A decomposição destas algas
consome o oxigênio dissolvido na água. A este crescimento das algas e o
consumo de oxigênio dissolvido é dado o nome de eutrofixação. Ela
compromete o crescimento de espécies aquáticas, como peixes, crustáceos,
etc.
119
Os microminerais que chegam aos rios em níveis relativamente baixos
de cobre podem causar a morte de peixes, algas e fungos. O zinco também
pode comprometer o desenvolvimento de peixes e algas. Ocorrem, ainda,
alterações nas características naturais da água como cor, odor, viscosidade etc.
(Palhares, 2002, p. 49).
A disposição dos dejetos, camas, iodos de tratamento e produtos da
compostagem de forma inadequada no solo também poderá causar poluição
das águas superficiais e subterrâneas, os impactos estão correlacionados
(Palhares, 2002, p. 50)
5.3.3. No ar
O impacto da suinocultura na qualidade do ar é devido à emissão de
gases tóxicos e poluentes e os odores desagradáveis ao conforto humano,
como exemplo, uma simples aplicação superficial do dejeto suíno no solo é um
potencial fonte de impacto no ar.
A emissão de gases ocorre dentro das instalações dos animais, a partir
de sistemas de tratamento mal manejados e devido à aplicação de resíduos no
solo de forma errônea. Os gases emitidos no interior das instalações são
prejudiciais à saúde dos animais e produtores, sendo que em altas
concentrações podem até causar morte. A amônia é a principal substância
presente nas instalações. As lagoas de tratamento, principalmente, as
anaeróbias também emitem gases de impacto na atmosfera como o metano,
gás carbônico e gás sulfídrico. A maior emissão deste está relacionada ao
manejo destas lagoas e ao seu correto dimensionamento (Dartora et al., 2002).
A concentração de bactérias (estafilococos, estreptococos e outras) no ar
das edificações nas granjas, varia de 17.650 durante o verão e 353.000 no
inverno por m3 de volume de ar, mas em edifícios que possuem uma das
laterais abertas, as concentrações reduzem-se a 3.530 e 175.500 por m3 de
volume de ar durante o verão e inverno, respectivamente. Estas concentrações
internas de bactérias podem ser consideradas elevadas quando comparadas à
120
externa que é da ordem de 353 por m3 de volume do ar. Um bom sistema de
ventilação possibilita manter a concentração de partículas suspensas no ar em
níveis adequados (Perdomo et al., 2001, p. 12).
Os gases de maiores interesses para a suinocultura são: a amônia,
dióxido de carbono e hidrogênio sulfídrico. Duas de suas dimensões
apresentam grande significância, qual seja: o nível da concentração incidente e
o tempo de permanência.
O amônio (NH3) é facilmente detectado através do odor na concentração
de 5 ppm ou mais. A partir de 50 ppm passa a afetar o crescimento e a saúde
dos animais. Sendo mais leve que o ar, tende a concentrar-se junto ao forro.
Sua concentração depende muito mais da higiene do que da ventilação e não é
um bom indicador da qualidade da ventilação. Drumond et al. (1980) apud
Perdomo et al. (2001) encontraram reduções de 12,0; 30,0 e 29,9% do ganho
de peso de suínos (8,5 kg de peso vivo) quando expostos à concentrações de
50; 100 e 150 ppm de NH3 durante quatro semanas. Para o maior conforto e
segurança dos criadores e animais, recomenda-se que os níveis de NH3 não
ultrapassem os 10 ppm.
Já o dióxido de carbono (CO2) é mais pesado do que o ar, inodoro e
asfixiante. A concentração máxima admissível na edificação das granjas é de
3.500 ppm sendo que valores superiores a 20.000 ppm provocam aumento dos
batimentos cardíacos, sonolência e dor de cabeça. Permanece na camada mais
baixa das edificações e das estruturas de armazenagem, deslocando
gradualmente os gases mais leves. Perdomo (1999) encontrou em estudo
realizado em Concórdia (SC) concentrações de 0,030% em edifícios
climatizados naturalmente e de 0,038% em climatizados artificialmente, muito
abaixo daqueles referidos como tóxicos. Um suíno de 50 kg pode produzir cerca
de 450 kg/ano de CO2, o qual contribui para o efeito estufa, também (Tamminga
e Verstegen, 1992 apud Perdomo et al., 2001).
O hidrogênio sulfídrico (H2S) é detectado na concentração de 0,01 ppm
ou mais, e entre 50–200 ppm pode acarretar sintomas, tais como: perda de
121
apetite, fotofobia, vômitos e diarréias nos animais. Recomenda-se que os níveis
de H2S nas edificações não ultrapassem os 20 ppm (Tamminga e Verstegen,
1992 apud Perdomo et al., 2001).
No manejo de dejetos suínos usando biodigestores, que têm como um
dos produtos do processo o biogás, também poderão ser fonte de poluição
atmosférica, se este for liberado.
5.3.4. Na fauna e flora
A suinocultura pode impactar a biodiversidade da fauna e flora devido
aos danos provocados na qualidade do solo, água e ar. Dependendo do grau
de poluição dos corpos de água com dejetos suínos, poucas, ou nenhuma
espécie de peixe pode sobreviver; assim, onde antes havia uma diversidade de
animais aquáticos, torna-se um ambiente estéril. O excesso de dejetos no solo
provoca mudanças nas características microbiológicas, incentivando uma
seleção de organismos adaptados a estas condições adversas em detrimento
de outras espécies.
Um exemplo típico de impacto na fauna é o caso da elevação da
população de borrachudos em regiões de concentração suína onde os dejetos
são despejados nos rios, pois os microrganismos presentes nos dejetos são
alimentos para as larvas dos borrachudos. O mau cheiro afugenta a fauna do
local onde se localiza o empreendimento, todavia, atraí outras muitas vezes
indesejáveis (Perdomo et al., 2001).
Outro exemplo ocorre na poluição do ar que provoca incidência de
doenças relacionadas à perda da qualidade do ar nas granjas. Cerca de 50%
dos suínos criados em sistemas confinados, apresentam problemas de saúde e
muitos criadores tornam-se precocemente incapacitados para o trabalho, face
aos danos causados em seu sistema respiratório pela exposição constante a
ambientes com elevadas concentrações de poeiras e gases (Perdomo, et al.,
2001, p.12).
122
Isso exposto, no próximo capítulo faz-se a abordagem sobre a
consciência ambiental.
123
6. A CONSCIÊNCIA AMBIENTAL NUMA PERSPECTIVA
FENOMENOLÓGICA
Este capítulo busca a compreensão da consciência a partir da
fenomenológica, com o objetivo de verificar o significado atribuído pelos
indivíduos entrevistados por esta pesquisa com relação à questão ambiental. A
prática de valorar revela-se da consciência que o homem tem a respeito da sua
realidade sobre os ativos ambientais no mundo, quantitativamente; todavia a
valoração econômica não se dispõe a trabalhar a compreensão da
subjetividade do valor num mercado contingente, e a abordagem sobre o valor
de existência dos ativos ambientais aferido neste trabalho requer o olhar
subjetivo, fazendo-se necessário buscar na perspectiva fenomenológica.
Sendo assim, é desenvolvida primeiramente neste capítulo uma
abordagem etimológica da fenomenologia, em seguida, são apresentadas duas
direções fundamentais da fenomenologia: o essencialismo e o existencialismo;
e, então, apresentada de maneira sucinta a fenomenologia essencialista,
buscando a compreensão da consciência, no pensamento de Edmund Husserl,
que é considerado por muitos estudiosos o pai da fenomenologia
transcendental; posteriormente é trabalhada a fenomenologia numa perspectiva
existencial, sendo mostradas as considerações da consciência para Martin
Heidegger, Jean-Paul Sartre e para Maurice Merleau-Ponty. Por fim é
desenvolvida uma correlação do pensamento sobre consciência de Merleau-
124
Ponty com o entendimento da teoria neoclássica sobre o valor e o bem-estar,
sendo estas concepções neoclássicas a base teórica na valoração econômica.
É necessário deixar claro que nas idéias dos economistas neoclássicos
(como: Walras, Jevons e Menger) percebem-se concepções fenomenológicas,
sendo por este motivo que se utiliza a filosofia da fenomenologia para se
compreender a consciência. E a escolha do fenomenólogo existencialista
Merlau-Ponty para abordar a questão da consciência ambiental neste trabalho,
se deve ao fato de que suas concepções sobre a percepção do fenômeno
(impacto ambiental) se fazem através de uma consciência entendida na origem
de toda a experiência histórica, fundada no tempo, no espaço, na liberdade do
homem, sendo estes aspectos observáveis e presentes no método de
valoração de contingente, no que tange à subjetividade (utilidade, satisfação do
agente econômico de maneira singular), utilizado para mensurar o valor de
existência dos ativos ambientais em Diamantino/MT.
6.1. A fenomenologia
Etimologicamente, a fenomenologia é o estudo ou a ciência do
fenômeno. Fenômeno é tudo o que se mostra ou aparece, o que se torna
visível. Em sentido amplo Fragata (1959) define fenômeno como “tudo aquilo de
que podemos ter consciência, de qualquer modo que seja” (p. 82). São
considerados fenômenos não só os objetos da consciência, mas os atos da
consciência sejam eles: intelectivos, volitivos ou afetivos. Numa visão
transcendental o fenômeno se mostra ou aparece para uma consciência; numa
abordagem existencial o fenômeno mostra-se na consciência engajada, inserida
numa cultura, numa sociedade, num momento concreto.
A fenomenologia procura deter-se na análise do puramente vivido ou
experimentado. Isso supõe que todo fenômeno tem uma essência e não se
pode reduzi-lo a uma única dimensão de fato. A fenomenologia, assim, é o
estudo do que surge à consciência como fenômeno, no sentido de explorar e
descrever a essência desse fenômeno. Ele é apresentado e revelado à
125
consciência, e no qual se pensa e do qual se fala, evitando suposições, tanto
sobre a relação que o liga ao ser do qual ele é fenômeno, como sobre a relação
que o liga à consciência para quem ele é fenômeno (DARTIGUES, 1992, p. 17).
Na História da Filosofia, a fenomenologia possui três significados
especiais. Primeiramente, em meados do século XVIII, era sinônima de “teoria
das aparências”, expressão cunhada pelo filósofo Jean-Henri Lambert para
distinguir a aparência das coisas do que elas são em si mesmas. Com Hegel,
tem-se o segundo significado, em “Fenomenologia do Espírito” (1807), é uma
espécie de lógica do conteúdo e uma introdução à filosofia, história das fases
sucessivas, das aproximações e das oposições pelas quais o espírito se eleva
da sensação individual à razão universal, ou, para usar sua formulação: “é a
ciência da experiência que faz a consciência”. Por fim, foi com Husserl que a
palavra ganhou, nas primeiras décadas do século XX, o significado de que hoje
se reveste de estudo dos fenômenos em si mesmos, que visa à evidência
primordial, e de denominação de um movimento que influenciou de modo
significativo no pensamento filosófico dessa época (Martinelli, 1987).
Herbert Spiegelberg apud Martinelli (1987), em sua obra, de 1960, “The
Phenomenological Mouvement: a historical introduction”, considera que a
Fenomenologia, na história de seu movimento, contém pelo menos três grandes
linhas ou tendências: a transcendental, a existencial e a genética. A
fenomenologia husserliana fica conhecida como transcendental caracterizada
por se preocupar com a essência do vivido, que é uma meditação sobre o
conhecimento. Considera que aquilo que é dado à consciência é o fenômeno
(objeto do conhecimento imediato). Esse fenômeno só aparece numa
consciência; portanto, é a essa consciência que é preciso interrogar, deixando
de lado tudo o que lhe é exterior. Tem-se a Fenomenologia Existencial que se
faz da influência de Husserl de maneira profunda sobre Martin Heidegger, a
fenomenologia existencial busca compreender o homem em sua estrutura
universal, e, concomitantemente, na sua experiência concreta do vivido, tendo
como expoentes além de Heidegger, Jean-Paul Sartre e Maurice Merleau-
126
Ponty. Por fim, tem-se a fenomenologia genética que procura as razões
passivas e ativas no homem, para explicar a origem de seus conhecimentos e
os processos pelos quais toma consciência dos fatos. Nesta concepção tem-se
Karl Jaspers, médico alemão que procurou aplicar os princípios da
fenomenologia à Psiquiatria.
Tem-se, no próximo item, a apresentação de apenas duas correntes de
pensamento da fenomenologia: essencialista e existencialista, buscando
somente compreender a categoria consciência para alguns filósofos
fenomenólogos.
6.2. As diferentes compreensões de consciência na perspectiva de alguns
pensadores fenomenólogos.
6.2.1. A consciência na fenomenologia essencialista-transcendental
A fenomenologia foi assim apresentada nas filosofias de Hegel e Husserl:
estudo dos fenômenos considerados em si, livres dos condicionamentos
exteriores a eles, com o objetivo de apreender sua essência, havendo uma
essência para cada fenômeno, ou cada fenômeno é caracterizado pela sua
essência. Sendo o conhecimento da realidade essencial dos fenômenos e a
possibilidade desse conhecimento foi preocupação constante da filosofia até
princípios do século XX (Oliveira, 1985, p. 131).
Objetivando a compreensão sobre a consciência, na fenomenologia de
Edmund Husserl (1859-1938), a noção de intencionalidade propõe uma análise
acurada da estrutura da consciência e da descrição dos objetos como se lhes
apresentam. A intencionalidade da consciência torna-se postulado fundamental
da fenomenologia husserliana. Seu ponto de partida são as experiências do ser
humano consciente que vive e age em um mundo, que ele percebe e interpreta
e que faz sentido para ele. Portanto, os atos perceptivos do sujeito consciente
de alguma coisa têm caráter direcional, que implicam movimentos ativos da
127
consciência para além de si mesmo e na direção do objeto intencionado
(Pavão, 1988, p. 18).
Dessa forma, a consciência está sempre dirigida para um objeto que
pode ser real, imaginário, material ou ideal, e que, por sua vez, só tem sentido
para uma consciência; esta correlação mostra a intencionalidade da
consciência, que busca o objeto e o objeto em função da consciência. Sendo
assim, a significação da consciência se faz na essência do objeto, que não será
nunca objeto em si, mas sempre objeto percebido, pensado, imaginado etc.
Para Fragata (1959), França (1966) e Costa (1980), a fenomenológica de
Husserl interpreta os fenômenos vividos e experimentados da consciência.
Descreve, assim, os fenômenos como eles mesmos são. Não busca o
fenômeno em si, mas a consciência indo ao fenômeno, vivendo-o,
experimentando-o, descrevendo-o. Com isso, a consciência, para Husserl, só
pode ser entendida como intencional, isto é, não está fechada em si mesma,
mas define-se como uma certa maneira de perceber o mundo e seus objetos.
Mostrar os diversos aspectos pelos quais a consciência percebe esses objetos
e sob os quais eles lhe aparecem, o que a sua presença supõe, constitui o
estudo e o objetivo essencial da fenomenologia.“A fenomenologia trata o
conhecimento humano, o sujeito-como-cogito, como intencionalidade: a
propriedade fundamental dos modos de consciência em que vivo como eu”
(Husserl, 1973, p. 98 apud Costa, 1980, p. 12).
A idéia da intencionalidade de Husserl, segundo Costa:
faz-se na relação da consciência de algo, do caráter da consciência pelo qual a cada ato da consciência corresponde um conteúdo de consciência, ou seja, toda consciência é consciência de si e nunca uma relação entre duas entidades de relacionamento existente, por outras palavras, o ato de consciência e o objeto (fenômeno) da consciência.[...] Husserl define consciência fazendo a intenção voltar-se para o objeto (fenômeno). Não existe fenômeno que não tenda para a consciência e não há consciência que não vise o mundo dos objetos (Costa, 1980, p. 13).
Assim, o campo de análise fenomenológica, em que a consciência é
sempre consciência de alguma coisa, e o objeto é sempre objeto para a
128
consciência, supõe que “para a modalidade de consciência intencional temos
uma correspondência, ou seja, o modo como o objeto se apresenta à
consciência” (Capalbo, 1984, p. 15). A esta análise dos atos da consciência
intencional, na concepção de Husserl, supõe uma estrutura noética-noemática,
dentro da qual o ser aparece na sua essencialidade. A intencionalidade,
segundo Pavão (1988), considera como ato de conhecer, a noesis, nome
aplicado para designar atividade de consciência a partir da vivência orientada
subjetivamente, que inclui dados matérias enquanto informados. Todo conteúdo
visado, relativo ao ato do conhecimento, Husserl chama de noema, que se pode
definir como vivência orientada objetivamente, então, a consciência se faz a
partir de uma subjetividade para uma objetividade sobre o fenômeno.
Segundo Martinelli (1987):
O conhecimento para Husserl é o relato objetivo do sujeito, atribuindo à subjetividade a condição de ser a única fonte transcendental de todo conhecimento, absoluto e objetivamente valido, pois é na subjetividade da consciência, e tão somente lá que encontramos a objetividade absoluta. (MartinelliI, 1987, p. 4).
Para Husserl, o fenômeno é tudo aquilo que se oferece ao olhar, à
observação pura, descrito dos fatos vivenciados do pensamento e do
conhecimento originário dessa observação.
Neste ponto a reflexão fenomenológica exige um esforço constante para
compreender o real, o significado essencial da estrutura do vivido que se fez
fenômeno, cuja compreensão nunca é fechada, é sempre vir-a-ser.
Buscando a compreensão da objetividade e subjetividade, nas
concepções de Husserl, a objetividade é uma construção subjetiva ou
intersubjetiva, e a subjetividade fenomenologicamente supõe uma
intencionalidade, ou seja, atribuição de um significado dirigido à consciência de
alguma coisa. Pela intencionalidade, o mundo se apresenta à consciência que
por sua vez lhe dá sentido, através da experiência vivida (Pavão, 1988).
Por conseguinte, para Husserl, toda a consciência “esta no mundo”, para
conhecê-lo, compreendê-lo e transformá-lo e só quando assim age cumpre o
homem sua vocação de ser dono e sujeito de sua situação. O “estar no mundo”
129
e “com o mundo”, permanece todo o alcance da consciência. E é nesta
significação que centraliza a conscientização como um processo de homem-
mundo.
A perspectiva da fenomenologia essencialista/transcedental, proposta
por Husserl, não obteve muitos seguidores, porém, muitos estudiosos de
diferentes áreas do conhecimento (sociólogos, filósofos etc.) partiram da teoria
de Husserl sobre a fenomenologia transcendental para a genética e existencial,
como já foi supra mencionado.
Sendo a fenomenologia existencial, na sua concepção sobre
consciência, que faz suporte à compreensão do valor de existência mensurado
a partir da subjetividade do agente econômico numa fundamentação
neoclássica sobre o valor dos ativos ambientais, a seguir revisão.
6.2.2. A consciência na fenomenologia existencial
Existencialismo, na filosofia, embora represente uma corrente específica
do pensamento moderno, não deixa de ser uma tendência que se faz sentir ao
longo de toda a história da filosofia. Assim sucede, por exemplo, com o
imperativo socrático “conhece-te a ti mesmo”; com a angustiada exclamação de
Pascal, situando o homem entre o ser e o nada. Denomina-se existencialismo
uma série de doutrinas filosóficas que, mesmo diferindo radicalmente em muitos
pontos, coincidem na idéia de que é a existência do ser humano, como ser livre,
que define sua essência, e não a essência ou natureza humana que determina
sua existência. (Martins, 1983).
Representantes deste pensamento, como Hegel, abraça o conceito da
necessidade incoercível, afirmando que a liberdade é a consciência da
necessidade, a consciência eleva-se da imediatidade da relação com o objeto,
que é o puro visar algo como isto aqui e agora na sensação até o nível do
conhecimento entrelaçando sensações e percepções, a consciência constrói
objetos estáveis e codifica pontos de referência fora de si; e o dinamarquês
130
Soren Kierkgaard, considerado o pai do existencialismo, interpreta a existência
em termos de possibilidade. A existência humana é, para todas as formas de
existencialismo, a projeção do futuro sobre a base das possibilidades que o
constituem (Silva, 1985, p. 109 - 110).
A fenomenologia existencial se interessa pela explicitação, descrição,
compreensão, interpretação e ação sobre o fenômeno em sua natureza material
e não em sua natureza meramente formal, a partir desta compreensão busca-
se a entendimento nesta teoria sobre consciência.
De maneira abrangente, na fenomenologia existencial a consciência é
sempre consciência de alguma coisa, o dado básico do “eu” é a
intencionalidade da consciência. A consciência é do mundo, mas não se acha
no mundo como as coisas. Se a consciência é consciência de algo, ela própria
não pode ser esse algo. É inerente à consciência a negação da identidade entre
consciência e algo. A consciência se aproxima do ser, pois é consciência dele,
mas se reconhece ao mesmo tempo distanciada do ser (Pavão, 1988).
Em suma, a fenomenologia é uma análise da noção mais profunda, e
última, do fenômeno. Assim, o existencialismo é a descrição mais profunda e
definitiva dos nossos dados relativos à existência.
A fenomenologia existencial possui inúmeros seguidores, porém neste
trabalho faz-se uma descrição sucinta das idéias dos fenomenologos
existencialistas Heidegger e Sartre, por fim Merleau-Ponty, de maneira mais
elaborada, buscando a compreensão da consciência. Explica-se que, este
último autor é o escolhido para se fazer a compreensão sobre consciência
ambiental, uma vez que nas suas concepções, consegue-se a interpretação do
valor de existência de maneira qualitativa, uma vez que a compreensão e
interpretação dos fenômenos para o filósofo se faz a partir da percepção total
do indivíduo envolvendo aspectos como: ver e observar situado no tempo, no
espaço e no corpo (gesto, expressões, linguagem etc.).
Primeiramente, apresentam-se as discussões sobre a consciência para
Martin Heidegger (1889-1976), filósofo alemão que conduziu a fenomenologia
131
para o existencialismo, foi um dos fundadores do existencialismo alemão,
reestruturou radicalmente os postulados metafísicos tradicionais, a partir de
uma conceituação do ser compreendido necessariamente em sua relação com
o tempo e suas circunstâncias reais.
Em 1927 publicou “Ser e Tempo”, sua obra principal, que constituiu um
delineamento filosófico inesperado por parte de quem parecia seguidor da
fenomenologia de Edmund Husserl, pois Heidegger era seu discípulo. Este
pensador em seus escritos assinala que o ser é existência. Considera que
“estar-no-mundo”, é uma temporalidade. Essa abordagem representa uma
mudança total em relação à idéia metafísica clássica de "essência" (Husserl). O
homem, segundo Heidegger, é “existência lançada ao mundo, obrigado a
construir sua própria essência”. Este homem, para Heidegger, é definido como
pré-compreensão do sentido (sentido é qualquer coisa que excede o próprio
homem), o que constitui a sua essência é a exigência do sentido, a esperança,
o desejo de ser na falta do próprio ser. Então, buscando compreender a
estrutura dos atos vividos, Heidegger, define a consciência como os objetos
vividos nos atos de consciência, do ponto de vista de sua objetividade
determinada pela própria consciência (objetividade transcendental, determinada
pelo sujeito do conhecimento, ou, pela fenomenologia, pela consciência). Mas
Heidegger avança em seus fundamentos sobre a consciência defendidos por
Husserl, e passa da consciência transcendental para o “Dasein” (o ser se dá,
em seu retraimento e em seu não retraimento, para a, na, presença do ser do
homem) um ser que inclui o individuo e as coisas e possibilita o próprio
conhecimento (Fleig, 2003).
É necessário argumentar, diante do que foi exposto, a expressiva
contribuição deste filósofo a partir da proposta husserliana, avança em suas
reflexões para uma fenomenologia vinculada à ontologia da existência, para ele
o problema fundamental da filosofia é o ontológico, isto é, o problema do “ser”
e, assim, o problema do homem ficar subordinado a esse problema.
132
Agora, buscando a compreensão de consciência para Jean-Paul Sartre
(1905-1980), este filósofo francês, é conhecido como um dos principais
representantes da doutrina existencialista. Em 1933, Sartre teve contato com a
fenomenologia de Edmund Husserl, as teorias existencialistas de Kierkgaard,
bem como o pensamento de Heidegger. Igual a todos os outros fenomenólogos,
Sartre tem como ponto de partida o caráter intencional da consciência. Todo
modo de consciência, para o filósofo, representa algo, revela algo, apresenta
algo, está voltado e direcionado para algo fora dela mesma, daí dizer que a
consciência é intencional. Ela não existe sem estar voltada, sem estar
representada, criando a presença de um objeto. Os objetos da consciência são
reais, ainda que alguns sejam ideais, eles existem como fenômenos, como
imagens, são porque existem, que Sartre os considera “seres em si”,
completos, acabados, de fato existentes. Porém, há também um conhecimento
ou consciência de que se é consciente, isto é, uma consciência da consciência.
Então, diz Sartre: “a consciência é um ser para si”. Sem seu objeto, a
consciência é um nada, um não-ser, pois somente existe na relação de si
mesma com o “ser em si”. Ela procura o “ser em si” para fundar a si mesma, o
que significa que ela destrói o “ser em si”, transformando-o no seu próprio nada.
“O Ser e o Nada”, título de seu livro publicado em 1943, refere-se a esses dois
tipos de ser: o “ser em si” (fenômeno) e o “ser para si” (consciência) (Cobra,
2001).
Esta concepção do nada como algo que existe que é a consciência
segundo Sartre. É preciso notar a constante separação daquilo que o homem,
que Sartre chama o “nada”, que obriga a realidade humana a se fazer ao invés
de ser. A realidade humana é nada precisamente no que ela não é, mas está a
se fazer incessantemente: o “nada”, em Sartre, não é uma constatação niilista
(redução a nada). Portanto, percebe-se que a contribuição deste filósofo para a
fenomenologia existencialista e para a compreensão da consciência ocorre
quando o autor expressa que o homem tem a capacidade de conceber do
“nada” a constituição de liberdade de imaginar outras possibilidades, ou melhor,
133
o poder de negar é a possibilidade de escolher, é o princípio da liberdade do
pensamento (de imaginar possibilidades) e da liberdade de ação (o tentar
realizá-las).
Objetivando a interpretação fenomenológica sobre a consciência, faz-se,
agora, a busca da compreensão das idéias de Maurice Merleau-Ponty (1908-
1961), filósofo francês, principal representante da fenomenologia, que baseou
sua epistemologia na relação entre a consciência e o mundo, tomando a
percepção como base do conhecimento.
Em 1942, Merleau-Ponty publicou “A Estrutura do Comportamento” e,
três anos depois, “Fenomenologia da Percepção”; desenvolvendo nessas obras
a tese segundo a qual o organismo humano deve ser considerado como um
todo, para se descobrir o que decorre com cada conjunto de estímulos (no
tempo e espaço). Seu método, para isso, é essencialmente fenomenológico e
pressupõe que a percepção é a fonte maior de todo o conhecimento.
Para Maurice Merleau-Ponty a fenomenologia é o estudo das essências,
e todos os problemas, segundo ele, tornam a definir essências, a essência da
percepção, a essência da consciência; mas a fenomenologia é também uma
filosofia que substitui as essências na existência e não pensa que se possa
compreender o homem e o mundo de outra forma senão e a partir de sua
facticidade. A consciência humana em sua existência concreta é finita e
temporal, inserida numa cultura, numa sociedade, num dado momento histórico,
é a consciência engajada (Capalbo, 1984, p. 26).
Para Merleau-Ponty, a consciência: “[...] não é apenas inserida no
mundo, pois o seu ser-no-mundo é o poder de ter consciência desta inserção e
de tomar posição fase a esta inserção – é isto que define a noção de
engajamento” (Merleau-Ponty, 1971, p. 65). Essa inserção no mundo, para o
filosofo não é apenas um estar, mas é participar efetivamente com consciência
de si, do outro e da sociedade.
O ser humano, para Merleau-Ponty, não é um ser que “repousa em si”,
mas é um ser cuja essência é a de “fazer ver”. O homem, enquanto consciência
134
define-se essencialmente por um movimento centrífugo que lança para fora
uma “maneira de existir”. É a partir desta perspectiva sobre o homem como
“mostração” que o filósofo visualiza temas humanos fundamentais: do tempo,
do espaço, do corpo, da liberdade, do social para compreender o indivíduo.
Dessa maneira, considera-se fundamental a apresentação da
subjetividade para Merleau-Ponty:
A subjetividade não é identidade consigo mesmo, mas é um sair de si, é um “se fazer ver” a si mesmo. Este “se fazer a si mesmo” configura o “se fazer presente”, isto é, “o engajamento”. A essência do ser humano é ser consciente (esta consciência entendida com origem de toda a experiência), ou seja, um “devenir” puro que se manifesta necessariamente a si mesmo (...), para se constitui intrinsecamente de um movimento de intencionalidade ao ser (toda consciência é sempre consciência de algo), o que significa dizer que consiste em um movimento de consciência de si mesmo ou revelação de si próprio, resultando no aparecimento de uma ipseidade, interioridade ou subjetividade, configurando em uma série de presentes. (Merleau-Ponty, 1971, p. 89).
Então, a subjetividade e o “se fazer presente” se identificam, o que
equivale dizer que subjetividade e tempo se identificam. Uma vez que encontrar
o tempo do sujeito é conseqüentemente apreender este “se fazer presente”, ou
seja, é captar o engajamento no mundo do homem.
Para Merleau-Ponty, é o corpo que efetua a síntese dos engajamentos
no mundo. No desdobramento do tempo, funda-se uma síntese espacial e do
objeto e o corpo não expressa a fixação do passado, porém, “projetam em torno
do presente um duplo horizonte do passado e do futuro e recebem uma
orientação histórica” (Merleau-Ponty, 1971, p. 275). Portanto, para o autor o
corpo é o lugar da “intenção de significar” e do “fazer ver”, não enquanto
conjunto anatômico, mas enquanto significações vivas. Sendo assim,
A intencionalidade do corpo é a possibilidade de instituição do espaço, pois buscar o espaço do sujeito é buscar um espaço habitado, o espaço de sua existência, isto é, este meio que meu corpo projeta em torno de “si” Enquanto tomada das intencionalidades, o corpo efetua todas as tomadas de percepção no mundo. (Merleau-Ponty, 1971, p. 162).
O mundo para Merleau-Ponty, ocorre enquanto o individuo efetua a
síntese dos engajamentos no mundo, ao nível de uma espacialidade que não é
135
física, mas de um conjunto significativo que tende a um equilíbrio, vividos pelo
sujeito, o corpo é, enfim, a estrutura estabilizada de uma existência.
Continuando as analises através da percepção do corpo, para o filosofo
francês, a linguagem esta inserida no corpo. A palavra não está separada do
gesto, mas ela é, na verdade, “um verdadeiro gesto”. O gesto designa, por si
mesmo, o seu sentido, contendo um modo de estar no mundo e se oferece a
uma compreensão, portanto, o corpo quanto à fala são lugares de fazer ver,
para Merleau-Ponty.
Definindo-se como um “fazer ver”, o homem é um ser cuja existência
consiste, fundamentalmente, na retomada de certa estrutura de significação
sempre aberta a mais de uma consciência. Em outras palavras, o homem é um
ser que é dado a si mesmo, que recebe com a existência uma maneira de
existir. Todas as ações e pensamentos dos homens estão em relação com esta
estrutura e é somente sendo sem restrições e sem reservas esta significação
da natureza e da história que o homem tem a chance de progredir.
Quanto ao mundo social, ele é situado por Merleau-Ponty como “fundo
de mundo” onde toda liberdade se particulariza.
Situa-se depois do mundo cultural como campo permanente e dimensão de existência, mais profundo que toda experiência e todo julgamento, estando já lá quanto tomamos consciência, inesgotavelmente lá. (Merleau-Ponty, 1971, p.23).
Este “fundo de mundo” não é a explicação de um Ser ou Natureza, mas é
o sentido do mundo que o mundo apresenta ao homem e que o homem
desvela. Um sentido que se dá na intersecção das experiências do homem e na
intersecção das experiências esse homem com das dos outros.
No pensamento de Merleau-Ponty a consciência está inserida no mundo,
pois é a consciência de um sujeito existente no mundo, ela é a consciência de
um mundo “ser-no-mundo”, trata-se de descrever o fenômeno tal como é
percebido (Capalbo, 1984, p. 28).
Por conseguinte, é a consciência de si (homem) há que ser a consciência
que o homem tem de sua maneira de estar no mundo e de se posicionar face
136
às situações, a consciência que deverá poder emergir da fenomenologia é uma
compreensão profunda que capta a forma de vivenciar o mundo pelo homem na
sua singularidade. Então, numa conjectura traçada no pensamento de Merleau-
Ponty sobre a consciência, é que se busca compreender e interpretar esta
categoria numa perspectiva ambiental medida através do valor dos bens
ambientais, onde este é aferido de maneira subjetiva num mercado contingente,
através do método de valoração de contingente.
6.3. A compreensão do valor econômico da natureza
A economia ambiental procura uma abordagem preventiva contra os
problemas ambientais, pregando a conservação dos recursos naturais por meio
de uma ótica que adequadamente considere as necessidades potenciais das
gerações futuras. Por seu turno, os economistas neoclássicos, propõem
técnicas de valoração que visem mitigar os efeitos da degradação ambiental
dos recursos naturais.
Os recursos naturais desempenham funções ecossistêmicas e
econômicas, entendidas estas como quaisquer serviços que contribua para a
melhoria do bem-estar, do padrão de vida e para o desenvolvimento econômico
e social do ser humano. Estes recursos naturais podem ser valorados
economicamente por meio do fluxo de serviços que oferece à economia e aos
anseios humanos. A valoração econômica é composta por muitos métodos e
técnicas, ora já apresentados no capítulo 3, deste trabalho. Para esta pesquisa,
a mensuração do valor econômico dos ativos ambientais foi desenvolvida pelo
método de valoração de contingente através da disposição a pagar de um
conjunto de pessoas, em decorrência do usufruto do ativo ambiental que reflete
as preferências individuais das pessoas no consumo de bens naturais.
O valor econômico dos recursos naturais é composto de quatro partes:
valor de uso direto, valor de uso indireto, valor de opção e valor de existência;
nesta Dissertação é aferido o valor de existência, que é aquele expresso pelos
indivíduos que mesmo não consumindo os serviços e bens ambientais, podem
137
manter-se preocupados com sua qualidade ou existência, derivando daí
satisfação (concepção da teoria neoclássica). Diante disso, a partir dos
conhecimentos sobre a prática suinícola, e as observações quanto às questões
ambientais decorrentes dos impactos sobre o meio ambiente que esta prática
provoca, abordada no capítulo 5 deste trabalho, e tendo como objeto de análise
unidade de produção de suínos no município de Diamantino/MT, existe a
necessidade de buscar compreender a consciência dos habitantes do
município, quanto à questão ambiental.
Partindo para a compreensão de consciência ambiental parafraseou-se
importantes filósofos da perspectiva fenomenológica como: Husserl
(transcendental), Heidegger (ontologia), Sartre (o nada), os quais deixam
importantes contribuições sobre compreender o vivido. Mas foi a concepção
sobre consciência trabalhada por Merleau-Ponty, que é construída a partir da
existência concreta, finita e temporal, inserida numa dada sociedade e num
mundo histórico, que se busca compreender o valor de existência, obtido pela
variação do bem-estar sentida pelo homem e manifestada na disposição a
pagar pelos ativos ambientais e revelada na consciência que a população de
Diamantino/MT possui da relação entre o meio ambiente e a prática suinícola.
Desenvolvendo análise das concepções do fenomenólogo Merleau-Ponty
e as proposições da teoria neoclássica do valor-utilidade e do bem-estar,
observa-se que o valor de cada bem é representado pela utilidade que os
agentes econômicos possuem sobre o bem, fundamentado principalmente na
relação existente entre a utilidade e a quantidade do bem econômico no
mercado, e que os bens não são desejados em si mesmos, mas porque
somente eles permitem preencher necessidades do homem, em seu mundo
vivido, e que o nível de satisfação do individuo é alcançado através da
disponibilidade do bem, dos recursos e da tecnologia existentes, medida pela
utilidade marginal, onde uma variação na quantidade de um bem é suficiente
para variar o nível de bem-estar do individuo, sendo que a medição desta
variação indica perda ou ganho de bem-estar que é a fundamentação para o
138
calculo da valoração dos ativos ambientais, quando o bem é um recurso
natural. Com vistas nisso, observam-se concepções fenomenológicas na
valoração ambiental como: existência, individualidade (singuralidade),
subjetividade, engajamento, tempo, espaço, do ser no mundo, descrevendo o
fenômeno tal como é percebido, numa consciência engajada do bem ambiental
no mundo vivido.
Por fim, a compreensão da formação do valor dos recursos naturais pelo
homem se traduz no papel que o valor exerce no processo de escolha para o
individuo no pensamento neoclássico, sendo que a base para a atribuição do
valor para o meio ambiente tem dimensão filosófica, pois é pela análise
filosófica que se compreende a natureza do valor de existência do recurso
ambiental que é subjetiva, e é nesta visão que se faz a conexão entre a razão e
a ação de dispor a pagar ou não pelo ativo ambiental, obtendo-se a correlação
da categoria consciência da fenomenologia existencial de Merleau-Ponty com o
pensamento neoclássico.
No próximo capítulo, é abordada a metodologia.
139
7. METODOLOGIA
Para a viabilização da valoração dos ativos ambientais que sofrem
efeitos da atividade suinícola no município de Diamantino/MT, é usado o
método de valoração de contingente para obter o valor de existência dos
recursos naturais. Na elaboração da pesquisa de campo para a aplicação do
método foram tomadas como base algumas pesquisas empíricas realizadas no
Brasil como os trabalhos de dissertação de Pessôa (1996), Ribeiro (1998),
Dubeux (1998) e Maia (2002), e do exterior: Dixon e Sherman na Tailândia, em
1990; Carson e Imbel na Austrália, em 1994; Bickmore e Willians, em 1998,
trabalhos de valoração que constam em Motta (1998).
Utilizando o método de valoração de contingente e desenvolvendo
modelo econométrico baseado na medida hickisiana (excedente de
compensação) de variação de bem-estar obtida pela disposição a pagar da
amostra da população do município de Diamantino/MT estimou-se o valor de
existência dos ativos ambientais. Mediante a aplicação da técnica lance livre
com cartões, era oferecida aos entrevistados uma escolha entre duas
alternativas (sim ou não), para que estes revelassem a sua preferência. Como a
resposta é uma variável binária e descontínua, o modelo econométrico foi
obtido pela equação logit, para estimar, primeiro, a probabilidade de um
indivíduo se dispor a pagar e, em seguida, o preço, em que a probabilidade de
obtenção de uma resposta “sim” seja de 50%, que é considerado o valor
140
máximo que o indivíduo estaria disposto a pagar. Para a obtenção da equação
Logit foi utilizado o programa estatístico SPSS 10.0 for windows.
7.1. A pesquisa de campo
Na pesquisa de campo foram realizadas entrevistas utilizando
questionário no município de Diamantino, sendo aplicada pesquisa piloto em 20
pessoas para determinar o valor mínimo e o máximo que estas estariam
dispostas a pagar pela preservação dos ativos ambientais e também identificar
se estava compreensível as 28 perguntas constantes no questionário. O
mecanismo aplicado foi o de cartões, onde nestes estavam escritos valores
monetários de R$ 1,00 (mínimo) e R$ 240,00 (máximo) para serem pagos
mensalmente para uma instituição brasileira proteger e manter os recursos
naturais do município.
Esses valores a pagar foram baseados na renda mensal média domiciliar
do município, que consta no Relatório do Fórum de Desenvolvimento do
Município de Diamantino realizado pelo Sebrae/MT (2001), que é de até 3 (três)
salários mínimos para 64% dos domicílios. Como esse nível de renda pode ser
considerado baixo, foi estipulado o teto máximo do valor a pagar de 1 (um)
salário mínimo ora vigente no país. Foram identificadas várias escolhas de
valores sendo o mínimo de R$ 1,00 e o máximo de R$ 100,00. Então, foram
deixados para fazer parte da pesquisa de campo os valores monetários: R$
1,00, R$ 5,00, R$ 10,00, R$ 20,00, R$ 30,00, R$ 40,00, R$ 50,00, R$ 60,00, R$
70,00, R$ 80,00, R$ 90,00 e R$ 100,00. A pesquisa piloto serviu ainda para a
identificação dos recursos naturais conhecidos e visitados pela população do
local e a devida compreensão pelos entrevistados das perguntas sobre a
suinocultura.
Entre os dias 01 a 04 de outubro de 2003 foi realizado o trabalho de
campo, participando 4 pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso:
uma mestranda em Agricultura Tropical, uma pós-graduanda em Economia
Agroindustrial, uma pós-graduanda em Gestão Ambiental e um acadêmico do
141
último ano do curso de Economia. Foram abordadas 338 pessoas na cidade de
Diamantino, das quais 330 se dispuseram a responder o questionário. Esse,
conforme já afirmado, continha 28 questões. Inicialmente foram solicitadas
informações socioeconômicas: idade, sexo, grau de instrução, setor que
trabalha renda mensal líquida individual e familiar, quantas pessoas residem na
casa do entrevistado, se participava de alguma organização não governamental
e se era nascido em Diamantino; em seguida, o questionário contemplou o
conhecimento do entrevistado sobre suinocultura: o que era, o que já havia
ouvido falar, se tinha conhecimento que a maior produtora de carne suína da
América possuía unidade de produção no local, se tinha conhecimento dos
impactos ambientais que a suinocultura poderia causar ao meio ambiente e, em
seguida, identificavam os impactos que eram de seu conhecimento;
posteriormente, se possuíam noção do manejo do dejeto suíno como adubo
orgânico, fonte de energia e fertirrigação. Adiante era perguntado sobre os
recursos naturais do município. Nesta parte da entrevista o objetivo era
diagnosticar o interesse do entrevistado pelos ativos ambientais: então era
perguntado se ele se preocupava com problemas ambientais que a suinocultura
poderia causar aos ativos (solo, água, ar, fauna e flora), se havia percebido
alguma mudança ambiental na região após a instalação da unidade produtiva e
quais eram as mudanças positivas e negativas que constavam no questionário.
Em seguida era interrogado sobre mudanças econômicas, constantes no
questionário. Por fim era perguntado ao entrevistado como ele classificava seu
interesse pela preservação ambiental: alto ou baixo e, então, se estaria disposto
a contribuir financeiramente com uma quantia mensal para a preservação dos
ativos ambientais de Diamantino, com resposta dicotômica “sim” ou “não”; caso
“sim” então eram entregues cartões aos entrevistados, contendo valores de R$
1,00 a R$ 100,00, para escolha de um cartão identificando o valor que ele
estaria disposto a pagar. Em caso da resposta “não”, era solicitado ao
entrevistado identificar o motivo de sua resposta negativa, pela preservação dos
ativos ambientais.
142
7.2. Estimativa do método de valoração contingente
O questionário aplicado para captar as disposições individuais a pagar
apresentado aos entrevistados continha duas alternativas para escolha: aceita
ou não pagar pela preservação dos recursos naturais. Após a decisão do
entrevistado, se aceita ou não a DAP, dada certas características ou atributos,
têm-se a necessidade de um modelo que faça estimação das respostas dos
entrevistados. Isto é possível através do modelo de probabilidade linear (linear
probability model), do modelo probabilístico (probit model) e do modelo logístico
(logist model), sendo os resultados compreendidos no intervalo entre 0 e 1.
O modelo de probabilidade linear é usado para o modelo de regressão
onde a variável dependente y é dicotômica, com valores 1 e 0. A variável y é
um indicador da ocorrência ou não do evento:
y = 1 – ocorrência
0 – não ocorrência.
O modelo de probabilidade linear analisa a variável dicotômica como elas
são (demonstram ser). Os modelos probit e logit consideram a existência
implícita da variável latente para a qual se observa à relação dicotômica
(Maddala, 1992).
Os modelos probit e logit podem ser descritos pelo modelo de regressão:
k
yi* = 0 j Xij + (12) j=1 O modelo probit e o modelo logit diferenciam-se pela especificação da
distribuição do termo aleatório (Maddala, 1992, p 327).
Para este trabalho utiliza-se o modelo logístico na estimação da DAP.
Ele é mais aplicável para a forma de entrevista, usada nesta Dissertação, e
também porque a função de distribuição logística é próxima à distribuição
normal e algebricamente mais simples. Esse modelo é sintetizado a seguir.
143
7.2.1. O modelo logit
No modelo, define-se Pi como a probabilidade de um individuo concordar
em pagar. Essa probabilidade é determinada por vários fatores representados
por Zi, tais como nível de renda, idade, sexo, nível de escolaridade, entre
outros. Como a probabilidade é uma variável que se encontra no intervalo [0, 1],
a relação entre essa probabilidade e determinado atributo pode ser
representado por uma função densidade de probabilidade. No caso do modelo
Logit, essa função é representada pela seguinte função densidade de
probabilidade acumulada logística (Maddala, 1992):
Pi = F(Zi), (13)
em que F é a função densidade.
No caso da função logística, F tem-se a seguinte forma:
1 Pi = (14)
1 + -Zi ou seja, 1 Pi = (15)
1 + -( + 1X
1i +
2X
2i)
Partindo-se de (14), tem-se:
Zi Pi = (16)
Zi + 1 1
1 – Pi = (17)
Zi + 1 Dividindo a probabilidade de ocorrência pela não-ocorrência, tem-se:
Pi
Zi = (18) 1 – Pi
Tomando-se o logaritmo neperiano, tem-se:
144
Pi Zi = ln (19)
1 - Pi e considerando que Zi seja uma função linear das variáveis explicativas, resulta:
Pi
ln = Zi = + 1X1i + 2X2i. (20) 1 - Pi
A variável dependente nessa regressão é o logaritmo das chances de
uma escolha particular. O lado esquerdo da equação (19) é denominado logito,
e é uma função linear dos parâmetros e das variáveis explicativas. A
probabilidade Pi não é observável; observa-se y = 1, caso a escolha seja feita e
y = 0, caso contrário. Por isso, a equação (20) deve ser ajustada pelo método
de Máxima Verossimilhança (Gujarati, 1995).
7.2.2. A estimação da DAP
Para estimar mudanças no bem-estar dos indivíduos, os coeficientes
obtidos da regressão Logit devem ser interpretados com base na teoria da
utilidade (Aguire e Faria, 1996 apud Ribeiro, 1998). As respostas “sim” ou “não”
são tomadas como resultado de um processo de maximização da utilidade.
Como o objetivo desta dissertação é a estimação do valor de existência
dos ativos ambientais do município de Diamantino, para um individuo,
questiona-se a sua disposição a pagar (DAP). Considerando-se a pergunta:
“Você estaria disposto a contribuir financeiramente com uma quantia mensal
para a preservação dos ativos ambientais de Diamantino?” - admite-se que o
indivíduo deriva sua utilidade do consumo dos recursos ambientais e da sua
renda monetária. Esse tipo de pergunta leva a uma medida de excedente de
compensação (medida hicksiana), estimada pela seguinte função utilidade:
u (j, y; s) (21)
145
em que j = variável binária; j = 1 significa – ativos ambientais preservados; j = 0
significa – ativos ambientais sofrendo impacto ambiental; y = renda e s = vetor
que representa outros atributos do indivíduo que possam afetar sua preferência.
Portanto, para u1 = u (1, y; s): os indivíduos optam em preservados os
recursos naturais, e, para u0 = u (0, y; s) : os indivíduos não se importam com
os recursos naturais.
Tem-se que u1 e u0 são variáveis aleatórias com certa distribuição de
probabilidade e com média v (j, y; s) e v (1, y; s). Portanto, as utilidades são
escritas como:
u (j, y; s) = v (j, y; s) + j = 0, 1 (22)
Em que 0 e 1 são variáveis aleatórias independentes e identicamente
distribuídas, com média zero e variância finita.
Os indivíduos dão uma resposta “sim” a questão apresentada, apenas se:
v (1, y – p; s) – v (0, y; s) 0 - 1, (23)
em que p é a quantia que o indivíduo pagaria, mensalmente, para ter o bem
“ativo ambiental” e mede sua disposição a pagar (DAP).
Enquanto o individuo tem certeza da escolha que maximiza sua utilidade
à resposta do individuo é uma variável aleatória cuja distribuição de
probabilidade é dada por:
Pi = Pr [o individuo aceita pagar]; (24)
Pi = Pr [v (1, y – p; s) + 1 v (0, y; s) + 0] (25)
Pi = Pr [ v ], (26)
Em que:
v = v (1, y – p; s) – v (0, y; s) (27)
Sendo: v (1, y – p; s) – o indivíduo aceita pagar pelos ativos ambientais e
v (0, y; s) – o indivíduo não aceita pagar pelos ativos ambientais. Como:
= 0 - 1. (28)
146
Conseqüentemente,
P0 = Pr [o indivíduo não aceita pagar] (29)
P0 = 1 – Pr. (30)
Como o caráter aleatório é dado por , torna-se a função densidade
acumulada de , de modo que a probabilidade de que o indivíduo esteja
disposto a pagar R$ p possa ser escrito por:
Pi = F (v). (31)
Assim, no modelo Logit, F é a distribuição acumulada da função logística
padrão; v é a Função Diferença de Utilidade, tal como dada na equação (27):
o modelo estatístico das respostas binárias pode ser interpretado como
resultado de uma escolha que maximiza utilidade. Logo, a forma funcional
relevante a ser especificada é a de v.
Para calcular uma medida, com base na utilidade, do valor monetário dos
benefícios atribuídos à disponibilidade do bem, estima-se uma quantia R$ p que
satisfaça a igualdade:
v (1, y – p*; s) – v (0, y; s) = (32)
O valor que faria um indivíduo permanecer indiferente na escolha entre
perda de ativos ambientais (impacto ambiental) e renda total y, ou preservação
de ativos ambientais (ativos protegidos) e renda menor (y – p*), é R$ p, sendo
p* a quantia mensal a ser paga pela obtenção desse benefício. Se tem
distribuição logística padronizada, a mediana é igual à média e igual a zero.
Então, o valor = 0 está associado ao ponto de indiferença, sendo a função
Logit F (0) = 0,5. Para v = = 0, o indivíduo estaria indiferente em proteger,
ou não, o bem ambiental, e o valor médio (e mediano) de p é considerado como
valor que o indivíduo estaria disposto a pagar pelo mesmo (p*). Assim, tem-se:
147
Pr [v = = 0] = F (v = 0) = 0,5. (33) Portanto, o modelo Logit, p* satisfaz a condição:
v (p*) = 0. (34)
Após se ter abordado o modelo Logit, a seguir, resultados e discussão.
148
8. RESULTADOS E DISCUSSÃO
8.1. Características descritivas da amostra
A pesquisa de campo realizada na cidade de Diamantino/MT, para
obtenção do valor de existência dos ativos ambientais que sofrem ação da
suinocultura, é constituída de amostra com 330 observações. A coleta de dados
foi realizada através de entrevistas ao acaso nas ruas da cidade, atingindo os
bairros: Centro, Nossa Senhora da Conceição, São Benedito, Ponte e Novo
Diamantino.
Do total dos entrevistados 145 foram do sexo masculino e 185 do
feminino; 43,9% e 53,1% respectivamente. A idade dos entrevistados assim
ficou distribuída: na faixa de 16 a 25 anos, a maior porcentagem: 46,7%; entre
26 a 35 anos: 29,7%; na faixa de 36 a 45 anos: 14,5% e entre 46 a 55 anos:
6,7%, dos 56 a 65 anos: 2,1% e 0,3% acima de 65 anos.
Quanto ao grau de instrução, a amostra apresentou apenas 0,6% dos
entrevistados sem instrução; 10,6% com ensino fundamental incompleto; 7,3%
com ensino fundamental completo; 9,1% com ensino médio incompleto, 27,8%
com ensino médio completo; a grande maioria dos entrevistados: 104 (31,5%)
possuem o nível superior incompleto; 8,4% nível superior completo e 4,7%, com
pós-graduação. É observado que 147 entrevistados 44,6% da amostra já
fizeram ou fazem graduação; e 55,4% (183 indivíduos da amostra) não tiveram
acesso ao nível superior. Desta maneira, constata-se um elevado grau de
escolaridade na amostra investigada.
149
Com relação ao setor de trabalho, 70,3% dos entrevistados são do setor
privado; 20,3% trabalham no setor público e 9,4% da amostra não trabalham.
Quanto à renda pessoal mensal líquida, 9,1% dos entrevistados não
possuem renda pessoal; 15,5% recebem até um salário mínimo (R$ 240,00);
26,4% recebem entre R$ 240,00 a R$ 500,00; 31,2% (a maior porcentagem)
possuem renda pessoal mensal líquida entre R$ 501,00 a R $1.500,00; 12,1%
da amostra recebem de R$ 1.501,00 a R$ 2.500,00; 3% de R$ 2.501,00 a R$
3.500,00; 0,9% de R$ 3.500,00 a R$ 5.000,00 e acima de R$ 5.000,00
(mensalmente) 1,8% dos entrevistados. Estes dados mostram que 241
entrevistados ou 73% possuem renda pessoal mensal líquida entre um a seis
salários mínimos.
A renda familiar mensal líquida fica assim distribuída: não houve a
ocorrência de falta de renda familiar; 1,3% declararam possuir renda familiar de
até R$ 240,00; 12,1% entre R$ 240,00 a R$ 500,00; 40,9%, a maioria,
responderam que a renda familiar fica entre R$ 501,00 a R$ 1.500,00; 21,8%
entre R$ 1.501,00 a R$ 2.500,00; 13,3% possuem renda familiar mensal líquida
entre R$ 2.501,00 a R$ 3.500,00, na faixa entre R$ 3.501,00 a R$ 5.000,00,
7,3% dos entrevistados e 3,3% acima de R$ 5.000,00. A tabela de resultados
da renda familiar está anotada a seguir:
150
TABELA 4. Distribuição de freqüência dos entrevistados no município de
Diamantino, por faixa de renda familiar mensal líquida.
Renda familiar mensal liquida Entrevistados (%)
Sem renda -
Até 240,00 1,3
Entre 240,00 a 500,00 12,1
Entre 501,00 a 1.500,00 40,9
Entre 1.501,00 a 2.500,00 21,8
Entre 2.501,00 a 3.500,00 13,3
Entre 3.501,00 a 5.000,00 7,3
Acima de 5.000,00 3,3
Total 100
Fonte: pesquisa de campo (2003)
Com relação à quantidade de pessoas que residem na casa do
entrevistado, 23,3% da amostra possui 4 pessoas; 22,3%, 5 pessoas; 20,9%, 3
pessoas; com 2 pessoas, 14,5%; sozinha, 4,3% e 14,7% da amostra possuem 6
indivíduos ou acima morando na residência.
Quanto à participação do entrevistado em organizações não
governamentais (ONGs) que cuidam ou protegem o meio ambiente, 88,5%
declaram não participar, e 11,5% participam de ONG que protege e cuida do
meio ambiente.
Em relação à naturalidade dos entrevistados, 70,9% dos entrevistados
não nasceram em Diamantino e apenas 29,1% são nascidos na cidade.
Ao serem questionados se sabiam o que era suinocultura, 308 (93,3%)
dos entrevistados disseram que “sim”, então a estes foram perguntados sobre o
que já ouviram falar sobre a atividade suinícola: que a suinocultura é criação de
suinos, 286 (93%) entrevistados; que a suinocultura provoca impacto ambiental,
184 (60%); que a suinocultura gera emprego e renda: 269 pessoas ou 87%; que
151
a carne suína não é saudável, 113 (37%); que a carne suína é saudável nos
dias de hoje, 135 (44%) dos entrevistados; outros 0,01%.
Observa-se nestes dados da pesquisa que quase a totalidade dos
entrevistados (93%) que responderam saber o que é suinocultura, 87% dos
entrevistados manifestaram ter consciência da relação entre aspectos
econômicos positivos e atividade suinícola mais do que com os impactos
ambientais (60%).
De acordo com a amostra, 266 (80,6%) dos entrevistados sabem que a
maior produtora de carne suína da América possui unidade de produção em
Diamantino.
Sobre a pergunta: você sabe que tipo de impacto ambiental a
suinocultura pode causar sobre o meio ambiente, sendo múltiplas as escolhas.
Na tabela seguinte constam os resultados:
TABELA 5. Tipos de impacto ambiental que a suinocultura pode causar sobre o
meio ambiente
Impactos ambientais Freqüência porcentagem
Degradação do solo (erosão, compactação) 108 33
Degradação dos recursos hídricos (água) 186 56
Morte de peixes nos rios 118 36
Proliferação de insetos 229 69
Prejudica a qualidade do ar 198 60
Doenças nas pessoas (alergia, hepatite, câncer) 102 31
Pragas em lavouras próximas unidade produtiva 48 15
Fonte: pesquisa de campo (2003)
Responderam que a suinocultura causa impacto na fauna, aumenta a
presença de insetos (moscas e borrachudos) e no ar (qualidade) 69% e 60%,
respectivamente; 56% degradação dos recursos hídricos; 33% degradação do
152
solo; 31% doenças nas pessoas e 15% pragas em lavouras próximas à região
produtora. Ficou constatado na pesquisa de campo sobre este item do
questionário que: dos entrevistados que declaram conhecimento sobre impacto
ambiental da suinocultura, principalmente sobre a fauna e o ar, que estes
conhecimentos devem-se as experiências pessoais, percebidas pela maioria
dos entrevistados na própria região pesquisada.
Quanto à utilização dos dejetos suínos como insumo de produção, na
forma de adubo orgânico 166 (50,3%) dos entrevistados desconhecem essa
utilização e 164 (49,7%) tinham conhecimento; como fonte de energia 208
(63%) declara não conhecer esta utilização do dejeto e 122 (37%) da amostra
conhece; com relação a fertirrigação, 194 (58,8%) dos entrevistados não tinham
conhecimento e 136 (41,2%) conhece a utilização da parte líquida do dejeto
suíno como fonte de nutrientes através da irrigação do solo.
Com relação aos recursos naturais, foi perguntado aos entrevistados se
conheciam alguns lugares na região. O objetivo era investigar as percepções
dos entrevistados quanto aos recursos naturais. Segue tabela com os
resultados.
TABELA 6. Ambientes naturais do município de Diamantino.
Ambientes Naturais Freqüência Porcentagem
Nascente do Rio Paraguai 132 40
Ponte de Pedra 75 23
Cidade de Pedra 38 12
Rio Subterrâneo do Sumidouro 37 11
Rio Salto 27 8
Cachoeira do Frei Manoel 207 63
Chapadão da Serra Pary 30 9
Fonte: Pesquisa de campo (2003)
153
Observa-se na Tabela 6 que os entrevistados não têm muito
conhecimento das paisagens naturais da região. O ambiente natural mais
conhecido e visitado pela amostragem é a Cachoeira do Frei Manoel, com 63%,
e 40% declararam conhecer a nascente do rio Paraguai, principal rio da Bacia
Hidrográfica Platina, que banha o ecossistema Pantanal.
Dos 330 entrevistados, 282 (85,5%) informaram que se preocupa com
problemas ambientais que a suinocultura pode causar aos ativos ambientais
(água, solo, ar, fauna e flora), e 48 (14,5%) dos entrevistados não se
preocupam com os ativos.
Foram, então, perguntados aos entrevistados se perceberam alguma
mudança ambiental após a implantação da maior produtora de suínos na
região, 171 (51,8%) responderam que “sim”, e em seguida foi investigado que
tipos de mudanças. Seguem as Tabelas com os resultados, das mudanças
positivas (externalidades positivas) e das negativas (externalidade negativa).
TABELA 7. Mudanças ambientais percebidas depois da implantação da
suinocultura no município de Diamantino – externalidades positivas.
Mudanças Ambientais Freqüência (%)
Aparecimento de animais (pássaros, jacaré etc) 4 2,3
Melhoria no clima 3 1,8
Melhoramento na qualidade água 1 0,6
Paisagismo, beleza cênica. 2 1,2
Melhoramento na qualidade do solo - -
Outros 2 1,2
Fonte: Pesquisa de campo (2003)
154
TABELA 8. Mudanças ambientais percebidas depois da implantação da
suinocultura no município de Diamantino– externalidades negativas.
Mudanças Ambientais Freqüência (%)
Mau cheiro 128 75
Aparecimento de insetos(moscas, borrachudos etc) 108 63,2
Aparecimento de ratos 20 11,7
Aumento de problemas de saúde 17 10
Erosão do solo 9 5,3
Cheiro e gosto na água 12 8,2
Redução de fertilidade do solo 5 2,9
Outros 15 18,8
Fonte: Pesquisa de campo (2003)
Constata-se que dos 171 entrevistados que declararam perceber
mudanças ambientais, as conseqüências (externalidades) negativas da
suinocultura que foram mais observadas: 75%: mau cheiro, 63%:
aparecimentos de insetos, e 12% de ratos.
Existem observações a serem feitas sobre este item, dos 5 bairros
pesquisados o bairro: Novo Diamantino, região urbana mais próxima da granja
suinícola, aproximadamente 15 km de distância da unidade produtiva e 8 km do
centro da Cidade de Diamantino, ocorreu a maior freqüência de respostas
quanto ao impacto ambiental negativo. Nas entrevistas efetuadas neste bairro,
as pessoas sentiam a necessidade de manifestar declarações. Fizeram
menções sobre os horários que o mau cheiro era mais intenso, os tipos de
insetos, principalmente moscas, e animais como ratos, que apareceram nos
últimos tempos. Também é interessante argumentar que a amostra deste bairro
apresentou uma maior disposição a pagar pelos ativos ambientais, do que nos
outros bairros visitados e pesquisados. As externalidades negativas provocam
variações no bem-estar deste universo da amostra, sendo fato vivido no tempo
155
da pesquisa, no espaço do município de Diamantino, manifestado em suas
expressões e argumentações do corpo e da fala, num engajamento com o
mundo exposto, neste momento.
Os itens: aparecimento de problemas de saúde e outros foram indicados
por 10 e 18,8% da amostra, respectivamente, os entrevistados de maneira geral
relataram o surgimento de doenças como: dermatológicas nas pessoas que
trabalharam ou trabalhavam na granja, e que também sofriam de mal-estar
(dores de cabeça, enjôos) principalmente aqueles moradores e pessoas que
trabalham mais próximos à unidade produtiva.
Quanto às mudanças econômicas, 87,9% (290) da amostra perceberam
alterações econômicas depois que a suinocultura foi implantada na região,
conforme dados da Tabela 9.
TABELA 9. Mudanças econômicas percebidas depois da implantação da
suinocultura no município de Diamantino
Mudanças econômicas Freqüência Percentagem
Geração de emprego 276 95,2
Aumento da circulação de dinheiro no comércio 169 57,9
Crescimento econômico da Região 144 49,7
Chegada de novas pessoas (migração) 158 54,5
Melhoramento em infra-estrutura na região 77 26,6
Outros 1 0,03
Fonte: Pesquisa de campo (2003)
Observa-se na tabela 9 que as mudanças econômicas foram bastante
percebidas pela amostra. A geração de emprego foi indicada por 95,2% dos
entrevistados e aumento da circulação de dinheiro no comércio por 57,9% da
amostra. A empresa suinícola (Carroll’s Food) demanda mão-de-obra da
cidade, e existe um enxergar bastante positivo pelos entrevistados sobre a
156
empresa. Foram realizadas varias audiências públicas na cidade de Diamantino
sobre a suinocultura e o manejo que a empresa desenvolve na unidade de
produção suinícola instalada na região. Em 2002, a granja obteve destaque
nacional devido a uma reportagem realizada no local e apresentada para todo o
país, como um marco do desenvolvimento de atividade da produção de suinos
no Centro-oeste do Brasil. Ficou constatado pela equipe de pesquisadores que
o empreendimento é o orgulho da região, manifestadas nas percepções das
pessoas quanto à prática suinícola, no engajamento delas com o vivido
apresentado.
Por fim, foi solicitada uma escolha dicotômica sobre a sua disposição a
pagar pelos ativos ambientais aos entrevistados. Pedia-se ao respondente que
imaginasse que a prática suinícola tivesse provocado contaminação no solo,
nos rios da região, no ar, desaparecimento de algumas espécies de animais, e
que uma instituição ambiental brasileira tinha sido escolhida para proteger e
manter os ativos ou recursos ambientais do município; então eram perguntados:
“Você estaria disposto a contribuir financeiramente com uma quantia mensal
para a preservação dos ativos ambientais de Diamantino?” - a resposta “não” foi
proferida por 158 (47,9%) dos entrevistados, e a “sim” por 172 (52,1%) da
amostra.
Para as pessoas que responderam “sim” foram entregues cartões que
continham valores em reais e, então, era solicitado aos respondentes escolher
um valor a ser pago mensalmente pelos ativos ambientais, como meio de
pagamento a cobrança direta a pessoa, a tabela 10 apresenta as respostas.
Para a parcela da amostra que aceita pagar, a seguir tem-se a Tabela de
valores.
157
TABELA 10. Valores da disposição a pagar da amostra
Valores a pagar por mês Freqüência Porcentagem
R$ 1,00 17 10
R$ 5,00 24 14
R$ 10,00 52 30,2
R$ 20,00 34 20
R$ 30,00 13 7,6
R$ 40,00 5 3
R$ 50,00 15 8,7
R$ 60,00 1 0,6
R$ 70,00 - -
R$ 80,00 3 1,2
R$ 90,00 - -
R$ 100,00 8 4,7
Total 172 100
Fonte: Pesquisa de campo (2003)
Os cartões mais aceitos foram: o de valor R$ 10,00, com 30,2%; de R$
20,00, com 20%; e de R$ 5,00 com 14% das escolhas; ou seja, 74,2% do total
das 172 pessoas pagam até R$ 20,00 pelos ativos ambientais, e 25,8% deste
universo pagam valores iguais ou acima de R$ 30,00. É necessário argumentar
que a amostra apresenta-se com 73% dos entrevistados recebendo até 6
salários mínimos por mês, isto traz implicações diretas sobre o valor pago aos
ativos ambientais, sua restrição orçamentária.
A escolha do mecanismo de cartões (lance livre) deveu-se ao fato da
população do município de Diamantino apresentar-se com baixa renda
(Relatório do Fórum de Desenvolvimento Municipal de Diamantino, 2001). Para
populações de baixa renda este mecanismo é o recomendado pelo manual de
valoração (1998) e por trabalhos já realizados de valoração como o de Maia
158
(2002). Uma outra observação a ser feita sobre a utilização de cartões é que
este mecanismo apresenta-se com baixo poder de influência do entrevistador
sobre a resposta do entrevistado.
Para os 158 (47,9%) entrevistados que não se dispuseram a pagar pela
preservação dos ativos ambientais. Esses respondentes apresentaram as
seguintes justificativas, identificadas na Tabela 11:
TABELA 11. Motivos pela não disposição a pagar, dos entrevistados, pelos
ativos ambientais
Motivo Freqüência Porcentagem
Desempregado - -
O estado deve conservar o meio ambiente 42 26,6
Contribuo com instituições que cuidam do
meio ambiente
4 2,5
O solo e a água de Diamantino não devem ser
preservados
5 3,2
O agente que provocou o impacto ambiental
deve arcar com o preço a ser pago pela
degradação
88 55,7
Outros motivos: econômicos 19 12
Total 158 100
Fonte: Pesquisa de campo (2003)
A maioria, 88 (55,7%) entrevistados, alegou não pagar pelos ativos
porque, para eles, quem deve arcar com o preço é o agente que provocou o
impacto ambiental; 42 (26,6%) justificaram a recusa pelo pagamento afirmando
que o estado é que deve preservar o meio ambiente; outros motivos de ordem
econômica, principalmente a falta de renda, foram às respostas de 12% da
amostra; já outros justificaram sua resposta afirmando que contribuem com
159
instituições que cuidam do meio ambiente (2,5%); e para 3,2% escolheram o
item: o solo e a água não devem ser preservados.
Esses resultados das respostas dos entrevistados que não se
dispuseram a pagar indicam a presença de viés (protesto); já o conjunto de
respostas que pagam indica que a valoração contém benefícios da existência
dos ativos ambientais.
8.2. Calculo da DAP
Dada a função utilidade proposta por Hanemann (1984) apud Ribeiro
(1998), tem-se:
v (j, y; s) = aj (s) + by j = 0, 1 e b > 0 (35) A função acima é linear em y; portanto, a utilidade marginal da renda é
constante, implicando que a probabilidade associada à variável discreta de
escolha independe da renda do indivíduo; assim, ocorre apenas o efeito-
substituição e não o efeito-renda.
Aplicando em (35) a definição de Função Diferença de utilidade, sobre a
equação (27), tem-se que:
v = a1 (s) + b (y – p) – a0 (s) – by, (36)
v = [a1 (s) – a0 (s)] – bp, (37)
v = (a1 – a0) – bp, (38)
v = a – bp (39)
Substituindo (39) em (31), obtém-se o modelo estatístico de escolha que
é:
Pi = F (a – bp) (40)
Onde : a = a1 – a0 (41)
Porém, a1 e a0 não podem ser identificados a partir dos dados, sendo
que apenas a diferença entre eles é identificável.
160
A função determinada em (40) é estimada pelo Modelo Logit, cuja forma
funcional utilizada é linear, e a equação é ajustada pelo método da Máxima
Verossimilhança definida por:
v = 1 Preço 2 Renda familiar mensal 3 Instrução 4 Protesto 5
Preocupação 6 Suinocultura 7 Origem (42)
As variáveis escolhidas ficaram assim definidas:
- v = variável dependente, com valor 0 para respostas “não” aceita
pagar pelos ativos ambientais e 1 para “sim”, ou seja, aceitam pagar;
- Preço = valores monetários calculados a partir da distribuição de
freqüência: (1) R$ 1,00, (2) R$ 5,00, (3) R$ 10,00, (4) R$ 20,00, (5) R$
30,00, (6) R$ 40,00, (7) R$ 50,00, (8) R$ 60,00, (9) R$ 70,00, (10) R$
80,00, (11) R$ 90,00 e (12) R$ 100,00;
- Renda familiar mensal = valores monetários calculados a partir da
distribuição de freqüência: (1) até R$ 240,00, (2) entre R$ 240,00 a R$
500,00, (3) entre R$ 501,00 a R$ 1.500,00, (4) entre R$ 1.501,00 a R$
2.500,00, (5) entre R$ 2.501,00 a R$ 3.500,00, (6) R$ 3.501,00 a R$
5.000,00, (7) acima de R$ 5.001,00;
- Instrução = escolaridade calculada a partir da distribuição de
freqüência: (0) sem instrução, (1) ensino fundamental incompleto, (2)
ensino fundamental completo, (3) ensino médio incompleto, (4) ensino
médio completo, (5) ensino superior incompleto, (6) ensino superior
completo, (7) pós-graduação;
- Protesto = variável que indica o porquê do respondente não aceita
pagar pela preservação dos ativos ambientais, sendo: (0) aceita pagar,
(1) desempregado, (2) o Estado deve conservar o meio ambiente, (3)
contribuo com instituições que cuidam do meio ambiente, (4) não tem
interesse sobre o assunto, (5) o solo e a água de Diamantino não devem
ser preservados, (6) o agente que provocou impacto ambiental deve
161
arcar com o preço a ser pago pela degradação, (7) outros motivos de
ordem econômica;
- Preocupação = dummy com valores 0 e 1, ou seja, não preocupa-se
com o meio ambiente e preocupa-se com o meio ambiente,
respectivamente;
- Suinocultura = dummy com valores compreendidos entre 0 e 1, não
sabem o que é suinocultura ou sabem o que é, respectivamente, e
- Origem = dummy, 0 não são naturais de Diamantino e 1 são nascidos
na cidade.
Essas variáveis foram escolhidas após a análise do cenário pesquisado e
baseando-se em outras pesquisas que utilizaram o método de valoração
contingente (Maia, 2002; Dubeux, 1998; Ribeiro, 1998; Pessôa, 1996), verificou-
se que essas variáveis poderiam influenciar a resposta da disposição a pagar
dos entrevistados pela preservação dos ativos ambientais. Sendo assim foram
feitas às estimativas dos coeficientes, o resultado:
v = 0,293 – 1,263 Preço – 0,163 Renda familiar mensal + 0,302 Instrução +
0,856 Protesto – 0,507 Preocupação - 0,009 Suinocultura + 0,429 Origem (43)
A seguir, tem-se a Tabela com os resultados encontrados na regressão:
162
TABELA 12. Parâmetros estimados do modelo logit para a disposição a pagar
pela preservação dos ativos ambientais em Diamantino/MT.
Modelo Logit – variável dependente v
Amostra = 330
Convergência após 3 (três) interações
Variável Coeficiente Erro-padrão Teste t
0,293 1,368 0,214
Preço -1,263 0,249 5,072
Renda familiar -0,163 0,231 0,705
Instrução 0,302 0,213 1,417
Protesto 0,856 0,268 3,194
Preocupação -0,507 0,693 0,731
Suinocultura -0,009 1,051 0,008
Origem 0,429 0,568 0,755
Fonte: Dados da pesquisa (2003)
Quanto à avaliação da regressão (43), o pseudo R² (McFadden), modelo
ajustado, é de 90,9%, indicando que as variáveis independentes do modelo
explicam 90,9% a variável dependente v.
A significância dos coeficientes individual foi obtida através do teste t,
que permite testar a hipótese nula, ou seja, não existe relação de cada variável
explicativa com a variável dependente do modelo, ao nível de significância 5%.
Foi observado que as variáveis: Preço, Instrução e Protesto são significativas;
Renda familiar, Preocupação, Suinocultura e Origem não são significativas.
Por fim, faz-se agora o cálculo da DAP: função definida em (35) e (39):
v = a – bp, fazendo v = 0,
a – bp = 0. (44)
Resolvendo para p, obtém-se:
P* = a/b. (45)
163
Sendo a equação (32) definindo a equação (45) obtém-se o valor médio
de p, denotado por P*, calculado em função dos coeficientes do modelo
estatístico. O valor da perda (dano dos bens ambientais) ou benefício
(preservação dos bens ambientais) individual é dado por:
* Perda individual = (46)
*
Sendo * a estimativa dos coeficientes que representam , e *, as
estimativas que representam b na equação 45, têm-se a seguir os valores
médios das distribuições de freqüência das variáveis explicativas:
TABELA 13. Valores médios para estimar o valor estimado dos parâmetros.
Variável Média Total
1,0000
Preço 21,3260
Renda familiar 3,6909
Instrução 4,1242
Protesto 1,8758
Preocupação 0,8545
Suinocultura 0,9333
Origem 0,290
Fonte: Dados da pesquisa (2003)
Obtém o valor da DAP:
_________________ _______ ______
*= 0,293 – 0,163 (Renda familiar mensal) + 0,302 (Instrução) + 0,856(Protesto) __________ __________ _____ – 0,507 (Preocupação) - 0,009 (Suinocultura) + 0,429 (Origem) (47)
* = - 1,263 Preço (48)
164
Substituindo os valores médios dos parâmetros na equação (47) das
variáveis: Renda familiar mensal, Instrução, Protesto, Preocupação,
Suinocultura e Origem, apresentados em (47), (constantes na Tabela 13) e,
usando os valores estimados dos parâmetros e, uma vez conhecidos *e *,
pode-se, finalmente, estimar o valor da DAP por intermédio da razão entre: * =
2,226 e * = - 1,263, ou seja: R$ 1,76.
O valor estimado (R$ 1,76) representa o valor econômico da perda
ambiental mensal por indivíduo, devido à ausência ou deficiência no controle do
impacto ambiental sobre os ativos ambientais que sofrem efeitos da atividade
suinícola no município de Diamantino, valor este que pode servir como
parâmetro para pagamento de indenização por parte da empresa poluidora.
Esse valor também pode expressar o benefício individual mensal a ser mantido
com a conservação dos ativos ambientais.
Existe a necessidade de argumentar que o valor ora mensurado é baixo
quando comparado com outros valores de ativos ambientais estimados pelo
método valoração contingente em trabalhos acadêmicos na mesma linha de
pesquisa desta Dissertação, como por exemplo, o valor estimado no trabalho de
Pessôa (1996) foi de R$ 23,52, por habitante pela preservação dos ativos
ambientais de Roraima/RR, na pesquisa de Ribeiro (1998) o valor foi de
R$14,57 individual pela preservação e conservação do rio da Ponte em
Goiânia/GO; o de Maia (2002) R$ 25,50, valor do conforto provocado pelo meio
ambiente sobre os funcionário e estudante da UNICAMP/São Paulo.
Agora, comparando o valor estimado deste trabalho com o custo para se
recuperar áreas degradadas, observa-se que os valores monetários para a
recuperação e preservação do meio ambiente são muito elevados; por exemplo,
o valor dos custos de reposição do Estuário de Mersey na Grã-Bretanha que
sofreu contaminação: ficaram em US$ 14,04 milhões por ano (Bickmore et al.,
1998); já o programa de despoluição da Baia da Guanabara no Rio de Janeiro,
os gastos totais estimados são de US$ 793 milhões (Dubeux, 1998). Se fosse
considerar hipoteticamente a contaminação do lençol freático, por dejeto suíno,
165
o valor anual estimado dos ativos ambientais do município de Diamantino/MT,
nesta pesquisa, ficou em R$ 389.811,84, considerando a taxa de câmbio em
US$ 1,00 comprando R$ 2,92, em dezembro de 2003 (IPEADATA/2003), tem-
se a quantia anual de US$ 134 mil; portando o valor é baixo; uma vez que a
região estudada é aqüífero e divisora de águas para dois importantes
ecossistemas: o Pantanal ao sul de Diamantino e a Floresta Amazônica ao
norte. Uma contaminação dos lençóis freáticos da região geraria impacto
ambiental nos dois ecossistemas.
Pode ainda ocorrer à contaminação e degradação dos outros ativos
ambientais: o ar, o solo, a fauna e a flora do Cerrado, onde se encontra
localizado o empreendimento suinícola, os valores para a reposição dos ativos
ambientais se elevariam ainda mais.
Diante do exposto, existe, portanto, a necessidade de buscar a
compreensão deste valor de existência mensurado, na subjetividade da
objetividade de valorar, utilizando para isso as concepções fenomenológicas de
Merleau-Ponty e do pensamento dos economistas neoclássicos. Sendo assim,
os motivos do baixo valor caracterizá-se pela baixa renda da população, esta
declarada na amostra, e em tudo aquilo que está situado no mundo fazendo
parte da experiência dos entrevistados; e ao ser construído, pelo entrevistador,
um mercado hipotético (contingente) para os ativos naturais as pessoas foram
provocadas a revelar suas preferências pelos recursos naturais, neste momento
a experiência humana influenciou a ação do respondente em se dispor a pagar
pouco pelos ativos ambientais.
Esta ação realizou-se na unidade do sujeito, no momento da experiência,
no entrecruzamento de todos os motivos e necessidades do sujeito em seu
mundo natural e social, efetuado na totalidade do ser e do existir da relação:
homem, suinocultura e meio ambiente, a disposição a pagar, então, foi obtida
na visão pelo homem de seu mundo, na percepção de compreender a
existência dos recursos naturais nas suas funções ecossistêmicas e
econômicas.
166
Nesse entendimento, como não há o conhecimento (consciência) sobre
impacto ambiental e, também, as externalidades não são sentidas por todos os
entrevistados, somando-se a isso a baixa renda da amostra, e como não houve
a provocação para a reflexão sobre os impactos negativos que a suinocultura
possa causar sobre o meio ambiente antes desta pesquisa, então, as
preferências dos entrevistados foram reveladas e refletiram o valor de R$ 1,76
pelos ativos ambientais, por indivíduo, por mês.
167
9. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A criação de suínos em escala industrial traz como conseqüências a
geração de emprego e renda, crescimento da atividade econômica e, também,
a intensa produção de dejetos nas unidades produtivas, os quais são altamente
poluentes e causadores da degradação ambiental, como a contaminação dos
corpos receptores e desenvolvimento de odores, alterando a disponibilidade de
recursos naturais, por conseguinte o bem-estar da população que vive nas
proximidades deste tipo de atividade econômica.
Sendo assim, a valoração econômica ambiental é um campo da teoria
econômica que emerge das análises neoclássicas a respeito da utilização das
terras agrícolas, da água, da fauna, da flora, enfim de todos os recursos
naturais reprodutíveis ou não-reprodutíveis e a relação destes com o bem-estar
do homem, servindo como um eficiente instrumento para determinar políticas
alocativas dos recursos ambientais escassos de maneira a obter o maior
benéfico social a partir das disponibilidades finitas dos recursos naturais e das
necessidades humanas infinitas. Sua finalidade é obter o valor dos recursos
naturais que não apresentam preços adequados no mercado, mas são
intensamente usados na atividade econômica. Para a obtenção desse valor
existem diversos métodos e técnicas, entre estes: a valoração contingente,
preços hedônicos, custo viagem etc.
Tendo em vista que a suinocultura encontra-se em franca expansão no
Estado de Mato Grosso, em especial na região Médio-Norte, onde no município
168
de Diamantino/MT está instalada unidade de produção que estima até 2005
alojar 51,4 mil matrizes e atingir 1,2 milhões de cabeças. Foi desenvolvida
nesta Dissertação a valoração econômica dos recursos naturais utilizando-se
do método valoração contingente no Município de Diamantino, com o objetivo
de estimar o valor de existência dos ativos ambientais que sofrem efeitos da
prática suícola.
Desenvolvendo críticas sobre o método valoração contingente, esse
estima o valor monetário dos bens e serviços ambientais com base nas
preferências expressas pelos indivíduos relativas à disponibilidade e, ou,
alteração na provisão desses bens, tomada no contexto de um mercado
hipotético estruturado pelo pesquisador; o método valoração contingente é
solidamente fundamentado na teoria econômica, o conceito básico esta
centrado nos benefícios derivados dos ativos ambientais, que são identificadas
nas preferências dos indivíduos em se dispor a pagar por aquilo de desejam. A
mensuração desses benefícios corresponde à medida do nível de bem-estar.
As medidas de bem-estar derivadas da valoração contingente são as
hicksianas, que fundamentam, teoricamente, os modelos analíticos utilizados
para interpretação das respostas de disposição a pagar, obtida por técnicas de
pagamento, neste trabalho a medida hicksiana foi do excedente de
compensação e a técnica lance livre com cartões.
O método utilizado, nesta pesquisa, apresentou alguns vieses: de
protesto, os respondentes utilizam de seu poder de resposta para transferir toda
a responsabilidade do problema ambiental à empresa poluente e ao Estado
como os agentes que deverão cuidar do meio ambiente; outro viés foi o de
gênero, foi entrevistado mais mulheres do que homens, e as mulheres são
consideradas mais sensíveis que os homens quanto a questões de impacto
ambiental; o terceiro viés é com relação ao espaço ou local da amostra, no que
tange o bairro Novo Diamantino, este está localizado mais próximo da granja de
suínos do que os outros bairros pesquisados, logo os respondentes dessa
169
localidade estão mais propenso a pagar pela existência dos ativos ambientais,
pois sentem mais a variação de bem-estar.
Como resultado da pesquisa, um total de 338 pessoas foi abordado nas
ruas da cidade, e 330 pessoas aceitaram ser entrevistadas, das quais: 172
(52,1%) apresentaram disposição a pagar pelos ativos ambientais e 158
(47,9%) não aceitaram pagar pela preservação dos ativos ambientais. Nessa
distribuição obteve-se o preço dos ativos ambientais de: R$ 1,76 por individuo
mensalmente.
Quanto a outras características da amostra, a maioria dos entrevistados
foi do gênero feminino (53,1%); a faixa etária de maior percentual foi de 16 a 25
anos com 46,7%; 27,8% dos entrevistados possuem ensino médio completo e
31,5% o nível superior incompleto; 73% da amostra recebem até 6 salários
mínimos por mês; apenas 29,1% é natural do município de Diamantino/MT;
93,3% responderam que sabiam o que é suinocultura, deste total 60%
declararam saber que a suinocultura provoca impacto ambiental e 87%
responderam que a suinocultura provoca geração de emprego e renda; quanto
aos impactos ambientais a amostra indicou que a suinocultura causa danos na
fauna (69% proliferação de insetos, 36% morte de peixes), no ar (60%), na
água (56%), tabela 5; quanto aos recursos naturais, uma grande parcela da
amostra demonstrou não conhecer as belezas naturais da região, tabela 6;
quanto às mudanças ambientais e econômicas percebidas pela amostra depois
da implantação da unidade produtiva no municípios, destacaram-se quanto ao
meio ambiente: 75% afirmaram que provocou mudança no ar, 63,2%
aparecimento de insetos (moscas e borrachudos), o econômico: geração de
emprego 95,2%, aumento da circulação de dinheiro no comercio local 57,9%
(tabelas 8 e 9).
Quanto à equação (43) de regressão do modelo logit, tem-se a análise
dos efeitos das variáveis independentes sobre a variável dependente.
Em particular, a variável Preço possui sinal negativo, indicando que
quanto maior o preço dos ativos ambientais, menor disposição a pagar do
170
individuo. Isto condiz com a teoria econômica, uma vez que, a coeteris paribus,
aumentos no preço provocam redução na quantidade demandada. A variável
independente Renda familiar mensal apresenta-se negativa, isto significa que
quanto maior a renda familiar menor a disposição a pagar pelos ativos
ambientais do individuo; desenvolvendo análise econômica pode-se argumentar
que os ativos possuem características de bens inferiores para a amostra, uma
vez que aumento da renda reduz a quantidade demandada pelos ativos, isto
pode ser explicada pela baixa consciência ambiental apresentada pelos
entrevistados e verificada no sinal dessa variável. É oportuno lembrar que a
variável Preço é estatisticamente significativa e a Renda familiar não é
significativa (5%).
Quanto à variável Instrução, esta possui sinal positivo indicando que
quanto maior a escolaridade maior a disposição a pagar pelos ativos ambientais
do indivíduo. A variável explicativa Protesto tem haver com o universo da
amostra que não aceita pagar pelos ativos ambientais, uma vez que os
entrevistados não foram os causadores dos problemas ambientais, onde 55,7%
da amostra responderam que “o agente que provocou o impacto ambiental deve
arcar com o preço a ser pago pela degradação” e 26,6% argumentou que o
Estado é que deve preservar o meio ambiente. (tabela 11), estas variáveis são
estatisticamente significativas.
As variáveis Preocupação (preocupação com o meio ambiente) e
Suinocultura (o que é suinocultura) possuem sinais negativos, isto significa que:
na primeira variável - 85,5% afirmaram que possuem preocupação com o
ambiente; na segunda variável verifica-se que 93,3% da amostra sabem o que
é suinocultura, todavia, a disposição a pagar e o valor da disposição a pagar
pelos ativos ambientais é baixo, indicando assim baixa consciência ambiental.
Estatisticamente, essas variáveis não são significativas a 5%.
Por fim, a variável explicativa Origem tem sinal positivo, apenas 29,1%
da amostra são naturais de Diamantino, parcela significativa aceita pagar pelos
171
ativos ambientais; e estatisticamente esta variável explicativa também não é
significativa.
Fazendo considerações sobre a hipótese desta Dissertação, ela foi
aceita, uma vez que o valor de existência estimado dos ativos ambientais é
baixo: esse valor expressa a reduzida consciência da população, quanto à
relação meio ambiente e suinocultura, uma vez que para a recuperação ou a
preservação dos recursos naturais demandam-se valores monetários
extremamente altos, conforme já apresentado no capítulo 8 deste trabalho.
Então, como o método valoração contingente é um procedimento
quantitativo e não apresenta a compreensão do valor estimado, e como este
valor aferido foi apenas de R$ 1,76 por individuo mensalmente, buscou-se a
compreensão do valor na categoria consciência numa perceptiva
fenomenológica.
Dentre os autores que fazem a discussão sobre a consciência, optou-se
pelo fenomenólogo existencialista Merleau-Ponty, devido ao fato deste autor
possibilitar ao entrevistador compreender o sujeito (entrevistado) na sua
percepção do ver e observar sobre o fenômeno (impacto ambiental), a partir do
espaço e do tempo que foi realizada a pesquisa. O espaço do entrevistado é
um espaço habitado que se mede pela amplitude de sua vivência de
possibilidades de alcance e captação de sua compreensão do mundo. É este
espaço (Diamantino) que é a medida de existência e não-existência do
entrevistado quanto a questões ambientais, que se transformam. O tempo do
entrevistado, por sua vez, e seu engajamento e consciência de si. Ver e
observar a partir do tempo dos entrevistados é , portanto, captar as suas
subjetividades, buscando perceber essa subjetividade no seu momento, no
momento, então, da realização desta pesquisa. Buscou-se perceber, através
das respostas, de que forma as pessoas compreendiam as questões
ambientais, na percepção de si mesma para si, na raiz de todas as suas
experiências e de todas as suas reflexões, de seu saber sobre os problemas
ambientais, que se chegou à constatação que não é sentido por todos a
172
variação de seu bem-estar, dada as mudanças dos ativos ambientais pela
prática suinícola no município.
No momento da entrevista observou-se que para um grupo que
responderam as 28 perguntas e que até depoimentos fizeram para a equipe de
pesquisadores, e se dispuseram a pagar pelos ativos, nas suas percepções, no
tempo e no espaço foi sentida a presença de mudanças ambientais. Esse grupo
foi formando principalmente de moradores e trabalhadores do bairro Novo
Diamantino, lugar próximo à granja de suínos. Nos outros bairros (Centro,
Nossa Senhora da Conceição, São Benedito e Ponte) foram observadas
expressões de espanto quanto às questões de impacto ambiental negativo que
a suinocultura possa provocar a disposição a pagar foi mais baixa comparada
ao bairro Novo Diamantino.
As respostas dos entrevistados permitem compreender que o impacto
ambiental (fenômeno) não é vivenciado por todos que foram entrevistados, por
uma questão muitas vezes de espaço (aqueles que moram perto do
empreendimento suinícola - Bairro Novo Diamantino sentem mudanças de bem-
estar provocadas pelas variações dos ativos ambientais: mau cheiro,
aparecimento demasiado de insetos e ratos), e aqueles habitantes que
moravam em outras localidades urbanas do município, que não perceberam
mudanças em seu bem-estar, não sendo, portanto, de suas vivencias o
fenômeno (problema ambiental) possui uma baixa consciência.
Destaca-se, também, que foi percebida a construção de uma identidade
do empreendimento na região utilizando-se de aspectos econômicos bastante
positivos, como a geração de emprego, crescimento da renda na região e status
nacional, somado a isto a falta de vivência de problemas ambientais por uma
parcela da amostra, no período que ocorreram as entrevistas que mais
contribuíram para a falta de consciência ambiental apresentada no baixo valor
da disposição a pagar; ou seja, na formação subjetiva do valor pago no
mercado contingente aos ativos ambientais do município.
173
Desenvolvendo uma análise de correlação entre o pensamento
neoclássica sobre valor-utilidade e as concepções fenomenológicas
existencialista de Merleau-Ponty, o valor é revelado pela consciência que o
homem tem a respeito da sua realidade sobre os ativos ambientais no mundo,
derivando o valor de existência que se manifesta pela satisfação que as
pessoas possuem do simples fato de que uma determinada espécie e
ecossistema existem e estão sendo preservados. Os habitantes do Município
de Diamantino ao se disporem a pagar ficam satisfeitos em saber que o
ecossistema Cerrado existe e desejam que seja conservado. Essa é a
concepção de consciência ambiental, ora buscada, sendo esta consciência
percebida do ambiente numa perspectiva: histórica, temporal espacial, corporal,
liberal do homem que foi entrevistado utilizando o método valoração
contingente, então, constata-se uma baixa consciência ambiental.
Analisando as limitações da valoração econômica do meio ambiente, o
conceito de disposição a pagar, refere-se à máxima propensão a pagar que
uma pessoa revela sobre um ativo ambiental, considerando seu limite
orçamentário, sua preferência, seu altruísmo e outros fatores atitudinais e sócio-
econômicos, encontra-se dificuldades de se estimar o valor total dos ativos
ambientais, que, também devido ao fato do homem ainda não compreender
totalmente as manifestações das funções ecossistêmicas do Cerrado, por
exemplo, prejudica a obtenção do valor da natureza. A subjetividade existente
no método valoração contingente, é uma parte integrante na aferição do valor
de recursos ambientais, e questionada quanto à aceitação deste valor como o
valor real de mercado.
Por conseguinte, surge à necessidade de se reconhecer que o valor de
existência dos recursos naturais, é aferido através da percepção filosófica do
homem, representado por princípios como: a perpetuação das espécies, o
legado, a benevolência para com as pessoas e meio ambiente, a simpatia e o
respeito em relação aos seres vivos, a compreensão das funções ambientais e
174
ecológicas exercidas pelos recursos naturais e a responsabilidade ambiental de
deixar para as gerações futuras um mundo possível de viver.
Estas constatações fazem frente à razão fundamental da valoração
econômica do meio ambiente que é prover investigações de racionalidade
econômica para investir em melhorias (ou preservação) ambientais, buscando o
desenvolvimento sustentável. E esta pesquisa sobre valor dos ativos
ambientais, numa visão fenomenológica, motivou reflexões dos habitantes da
cidade, uma vez que a consciência é uma estrutura aberta, em direção às
coisas, dimensionando-se no tempo e no espaço, numa história, num vivido,
levada a um engajar no mundo, fazendo-se presente, provocando reflexões,
desenvolvendo um novo olhar para os problemas ambientais na relação
suinocultura e meio ambiente em Diamantino/MT.
Indica-se para pesquisa futura o “valor total” dos ativos ambientais do
município de Diamantino, incluindo na estimativa, além do valor de existência,
os valores de uso direto, uso indireto e de opção.
175
10. CONCLUSÕES
O valor de existência dos ativos ambientais que sofrem efeitos da
atividade suinícola no município de Diamantino/MT estimado por esta
pesquisa é de R$ 1,76 por indivíduo mensalmente;
O objetivo desta Dissertação foi atingido, o valor de existência dos ativos
ambientais que sofre efeitos da criação de suínos da principal granja
produtora do Estado de Mato Grosso, localizada no município de
Diamantino/MT foi estimado, utilizando o método de valoração contingente
valendo-se da disposição a pagar da população do município pelos ativos
ambientais.
O valor estimado de R$ 1,76 significa o benefício por habitante mensal a
ser obtido como a conservação dos ativos ambientais do município de
Diamantino/MT; de outra maneira, pode também representar o dano ou a
perda individual mensal decorrente da ausência ou deficiência provocada
pela atividade suinícola sobre os ativos ambientais do município de
Diamantino/MT.
Se extrapolado para o valor estimado mensal o total é R$ 32.484,32 e R$
389.811,32 (anual), considerando a população em 18.457 habitantes
(CENSO/IBGE/2000);
176
O valor estimado dos ativos ambientais em Diamantino/MT, pode ser
usado como parâmetro para determinação de multas por danos
ambientais, como valor de referência para o estabelecimento de tarifas de
uso dos recursos, como também na implementação da cobrança pelo uso
dos recursos naturais na região estudada;
A hipótese deste trabalho é aceita, pois o valor de existência estimado
dos ativos ambientais é baixo, comparando com outras pesquisas sobre
o valor de ativos ambientais que utilizaram o método de valoração
contingente: o valor estimado no trabalho de Pessôa (1996) foi de R$
23,52, por habitante pela preservação dos ativos ambientais de
Roraima/RR, na pesquisa de Ribeiro (1998) o valor foi de R$14,57
individual pela preservação e conservação do rio da Ponte em
Goiânia/GO; o de Maia (2002) R$ 25,50, valor do conforto provocado
pelo meio ambiente sobre os funcionário e estudante da UNICAMP/São
Paulo;
Considerando o valor anual dos ativos ambientais aferidos pelo MVC, em
Diamantino/MT, tem-se a quantia de R$ 389.811,32, se comparado com
valores gastos para a recuperação ambiental, como por exemplo, o valor
dos custos de reposição do Estuário de Mersey na Grã-Bretanha que
sofreu contaminação: o valor é US$ 14,04 milhões por ano, outro
exemplo é o programa de despoluição da Baia da Guanabara no Rio de
Janeiro, os gastos totais estimados são de US$ 793 milhões, portanto, o
valor monetário estimado é baixo;
O método de valoração contingente não oferece resposta à compreensão
do valor aferido, sendo assim recorreu-se a perspectiva fenomenológica
existencialista do filósofo Maurice Merleau-Ponty, para a compreensão do
valor de existência dos ativos ambientais;
177
O valor estimado expressa a reduzida consciência da população quanto à
relação meio ambiente e suinocultura;
O valor de existência dos ativos naturais é aferido através da percepção
filosófica do homem, representado por princípios como: a perpetuação das
espécies, o legado, a benevolência para com as pessoas e meio ambiente,
a simpatia e o respeito em relação aos seres vivos, a compreensão das
funções ambientais e ecológicas exercidas pelos recursos naturais e a
responsabilidade ambiental de deixar para as gerações futuras um mundo
possível de viver.
Os habitantes do Município de Diamantino ao se disporem a pagar ficam
satisfeitos em saber que o ecossistema Cerrado existe e desejam que seja
conservado. Essa é a concepção de consciência ambiental, ora buscada,
sendo esta consciência percebida do ambiente numa perspectiva:
histórica, temporal espacial, corporal, liberal do homem que foi
entrevistado utilizando o método de valoração contingente, então,
constata-se uma baixa consciência ambiental.
Os indivíduos entrevistados no bairro Novo Diamantino, local próximo à
granja de suínos, apresentou uma maior disposição a pagar pelos ativos
ambientais;
Nos bairros: Centro, Nossa Senhora da Conceição, São Benedito e Ponte,
foram observadas expressões de espanto nos entrevistados quanto às
questões de impacto ambiental negativo que a suinocultura possa
provocar, e a disposição a pagar foi mais baixa comparada ao bairro Novo
Diamantino.
178
Foi percebida a construção de uma identidade do empreendimento na
região utilizando-se de aspectos econômicos bastante positivos, como a
geração de emprego, crescimento da renda na região e status nacional;
Esta pesquisa sobre valor dos ativos ambientais provocou a construção de
um novo olhar para os problemas ambientais na relação suinocultura e
meio ambiente em Diamantino/MT, uma vez que a consciência é uma
estrutura aberta, em direção às coisas, dimensionando-se no tempo e no
espaço, numa história, num vivido, levada a um engajar no mundo.
179
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ANEXO