VEJA 16.3.16

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    0# CAPA 16.3.16

    VEJAwww.veja.vomEditora ABRILEdição 2469 ± ano 49 ± nº 1116 de março de 2016

    [descrição da imagem: Imagem do rosto de Lula, tendo uma expressão de grande raiva. Na cabeça, várias cobras, jararacas, tomando todo o topo e caindo pelos lados. As cobras representam estar vivas, pois estão em diferentes posições, como se mexendo, e algumas com a boca aberta. Também no título da reportagem e nas páginas com as reportagens, aparecem pequenos desenhos de cobras.]O DESESPERO DA JARARACACom o governo Dilma derretendo sob a ameaça do impeachment, Lula sai atrás de apoioem Brasília, recorre ao Supremo Tribunal e termina acuado por um pedido de prisão preventiva.

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    1# SEÇÕES2# PANORAMA3# BRASIL

    4# INTERNACIONAL5# GERAL6# CULTURA _____________________________ 

    1# SEÇÕES 16.3.16

      1#1 VEJA.COM  1#2 CARTA AO LEITOR ± INVESTIGAÇÕES SÉRIAS  1#3 ENTREVISTA ± KATHERINE MERSETH ± A ESCOLA QUE FUNCIONA  1#4 LYA LUFT ± SEREMOS TODOS TROUXAS?  1#5 VILMA GRYZINSKI ± ÍDOLOS DECAÍDOS

      1#6 LEITOR

    1#1 VEJA.COM

    A ERA DAS TERAPIAS 100% INDIVIDUAISO ALEMÃO JOERG REINHARDT, de 60 anos, é presidente do conselho administrativo da multinacional suíça Novartis, uma das maiores empresas farmacêuticas do mundo. Com mais de três décadas de atuação na área, ele conhece como poucos o mercado de medicamentos. Entrevista exclusiva a VEJA, durante recente visita ao Brasil, Reinhardt disse que estamos vivendo o início de uma nova era, com o avanço dos tratamentos genéticos. Aexpectativa é que, em dez anos, devam ser criadas mais de cinquenta terapias com esse mecanismo, capaz de modificar os genes defeituosos dos pacientes e transformá-los em saudáveis novamente. Reinhardt critica a burocracia do governo brasileiro

    em relação ao desenvolvimento de pesquisas e à aprovação de novos remédios e defende o e genéricos.

    O PODER DO SKATEAinda que não seja expressamente proibido, o uso de bicicleta por mulheres é nulo no Afeganistão. Uma mulher que anda de bicicleta é vista como imoral e vulgar. Muitasmeninas, no entanto, encontraram uma alternativa: o skate. Em 2007, a organização Skateistan se instalou no país e desde então vem ensinando a técnica do esporte a jovens e crianças como uma opção de lazer, atividade física e até de autoafirmação feminina. gem no site de VEJA mostra como o skate está fazendo diferença num país onde as mulher

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    es são privadas de direitos básicos como o acesso à educação.

    SIMULADO DA OABEm menos de um mês, dezenas de milhares de brasileiros formados em direito enfrentarão o temido exame da OAB. A taxa de insucesso é superior a 50% e impede o trabalho como advogado. A ajuda está a um clique de distância. Em parceria com a startup deeducação AppProva, VEJA realiza um simulado on-line gratuito com oitenta questões, exatamente como ocorre na primeira fase do exame da Ordem. Reportagem no site dá outras pistas sobre as disciplinas que mais desafiam os candidatos.

    1#2 CARTA AO LEITOR ± INVESTIGAÇÕES SÉRIAS  A CONDENAÇÃO de Marcelo Odebrecht por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e assocação criminosa, divulgada na semana passada, é uma crônica de superlativos. Príncipe dompreiteiros, herdeiro de um enorme conglomerado com milhares de funcionários em dezenas de países, Marcelo Odebrecht foi defendido por uma equipe formada por 22 advogados. Mesmo assim, pegou dezenove anos e quatro meses de prisão. Na sentença, o juiz Sérgio Moro, que cuida da Lava-Jato, ocupa 234 páginas para fundamentar sua decisão, na qual descreve a teia de contas secretas da empresa e o fluxo de muitos milhões de dólares em propinas. O dado superlativo mais relevante, porém, não está nessas quatidades portentosas. Está na qualidade do trabalho de investigação da Lava-Jato.

    O juiz Moro só pôde condenar Marcelo Odebrecht em razão de uma apuração paciente, orosa e séria. Nada em sua sentença traz imprecisões, piruetas retóricas ou conclusões  não estejam fundamentadas em fatos, documentos, depoimentos. Talvez essa seja uma

     das grandes lições que a Lava-Jato está prestando ao Brasil: investigações não podem svidas pela incandescência das paixões, pelo amadorismo, pela precipitação. Numa repúblisob o império da lei, todos os cidadãos são igualmente merecedores de respeito por parte de policiais, juízes, procuradores, promotores.

    A própria Lava-Jato, em que pese o trabalho minucioso que tem feito, já recebeu acusações de cometer excessos, como aconteceu diante da condução coercitiva do ex-presdente Lula para depor na Polícia Federal, em São Paulo. Pode-se concordar com essascríticas ou discordar delas, e há boas razões de ambos os lados, mas talvez nenhum brasileiro, com honestidade, possa acusar os operadores da Lava-Jato de usar qualquer prova, de qualquer jeito.

    É altamente desejável que se possa dizer o mesmo sobre as demais investigações em urso no país. É fundamental que o vasto apoio popular às investigações e condenações detos não seja interpretado como salvo-conduto para medidas intempestivas e irrespon

    sáveis. Até aqui, a Lava-Jato tem percorrido esse caminho prudente. Que seu exemplose dissemine.

    1#3 ENTREVISTA ± KATHERINE MERSETH ± A ESCOLA QUE FUNCIONAÀ frente de um dos cursos mais concorridos de Harvard, a prestigiada educadora diz que treinar gente talentosa para dar aulas é a fórmula para qualquer país trilhar o caminho do crescimento.MONICA WEINBERG

    A MATEMÁTICA americana Katherine Merseth, 70 anos, tornou-se preeminente na área daeducação com uma dezena de livros que não se furtam a tocar em temas espinhosos. Na Universidade Harvard, Katherine, diretora do Programa de Formação de Professores, ganh

    ou projeção por um feito raro: faz todo mundo querer dar aulas. A fórmula se baseia na atração de jovens recém-formados, das engenharias às ciências biológicas, que ali aprea ensinar crianças de escolas públicas, onde vão trabalhar depois. O curso de Katherine entrou na lista dos mais concorridos no câmpus. Na quinta-feira 17, ela estará emSão Paulo, a convite do Instituto Península, para debater a valorização do professor. Sa fórmula: "Para atrairmos os melhores, precisamos de mais meritocracia e menos corporativismo".

    Por que incentivar jovens engenheiros, advogados e economistas a ensinar em escolas?

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    Bem treinado, esse contingente vindo de áreas tão variadas pode elevar o nível nas escolas, promovendo um salto de qualidade desde as primeiras séries. As evidências mostram que um bom ensino já na largada dá ao aluno um horizonte infinitamente mais promissor do que o daqueles que ficam travados por maus professores. Com o tempo, oabismo entre os dois grupos vai se agravando exponencialmente. Quem caminha sobre uma base mais sólida na infância consegue assimilar conhecimentos de maior complexidade na juventude. Daí meu esforço para levar à docência pessoas aptas a tornar a salade aula um lugar menos maçante e mais eficiente. Qualquer país deve dispor de suas melhores cabeças para formar gerações capazes de refletir, produzir e inovar.

    No Brasil, apenas 2% dos estudantes almejam a docência, e mesmo nos Estados Unidos não é muito diferente. Como a senhora conseguiu criar um curso de formação de professoes tão disputado?Acho que a regra para atrair gente boa é universal: o retorno precisa ser claro epalpável. No caso de Harvard, o aluno ganha bolsa, diploma de mestrado e prestígio por ter dedicado tempo a uma atividade de alto valor para a sociedade. Ainda queambicione a advocacia ou a medicina, o jovem recém-formado também entende que ensinar em uma escola pode ser decisivo para lapidar capacidades hoje tão exigidas no mundo do trabalho, como liderança, resiliência e colaboração. É um investimento de todas partes, mas acredito ser de largo alcance e, sim, replicável em outros países, guardadas as especificidades locais.

    O salário não conta na hora de despertar o interesse de jovens talentos pela sala de aula?

    À exceção de alguns países, o professor é historicamente desvalorizado, mas essa não é em a principal razão para que os melhores não sigam a carreira. Quem é bom de verdadequer ter uma profissão em que esforço, resultado e talento sejam reconhecidos e recompensados em grau máximo. Não se trata exclusivamente de mais dinheiro, portanto, mas de poder abrir novas trilhas na profissão e encarar desafios intelectuais cada vez mais complexos e estimulantes.

    Por que há tamanha resistência à meritocracia no mundo da educação?Ao longo de décadas, os sindicatos têm brigado para que todos permaneçam no mesmo patamar, regidos pela lógica da isonomia salarial, à revelia do desempenho, e assim contribuem para afastar gente talentosa da docência. Eles advogam em causa própria, porseus direitos e benefícios, e agitam bandeiras que se sobrepõem à batalha pela qualidade. É uma posição que não condiz em nada com a natureza das escolas, que devem levar o

    ito às últimas consequências, nem com sociedades que buscam se diferenciar e crescer.

    Há muito debate e controvérsia sobre o papel do professor no século XXI. Qual é a sua psição?O papel do professor continua essencial, sem dúvida, mas agora deve ser outro, e esse é um grande desafio. Não podemos ignorar que o ensino não se restringe mais única eexclusivamente a uma sala de aula, mas ocorre em um ecossistema maior, amplificado pelo universo on-line e pelo computador, que está na vida de todos. Professor e aluno são agora parte de uma rede que os conecta a informações, especialistas e pessoas em geral que se situam muito além das quatro paredes convencionais. Diante de toda essa revolução tecnológica que ecoa nas escolas, a questão que se coloca é quais, ee as tradicionais atividades do velho mestre, serão desempenhadas por máquinas inteligentes de modo a otimizar o aprendizado.

    A senhora tem a resposta?Diversas pesquisas vêm sendo conduzidas sobre o uso da tecnologia em sala de aula, separando as soluções inócuas e os modismos do que verdadeiramente funciona. Ainda resta muito a explorar, mas já há alguns indícios do que dá certo. Uma experiência aparenente simples, como a antiga folha de exercícios passada do papel ao formato digital, pode abrir várias frentes para a absorção do saber: o computador é capaz de dar um rtorno sobre a performance do aluno em tempo real, armazenar essas informações para avaliar o seu progresso, ajustar o nível de dificuldade das perguntas de acordo com o desempenho de cada estudante e ainda, ao menor sinal de tropeço, indicar caminh

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    os na rede para que ele obtenha ajuda rumo à solução que busca. Esse é um exemplo de coo a tecnologia pode ceder espaço a um ensino mais individualizado e, quem sabe, mais atraente.

    Como evitar que o computador se torne apenas um brinquedo que desvie a criança dopropósito de aprender?Enfatizo aqui a relevância do professor, que precisa, evidentemente, ser treinadopara lidar com os novos tempos. A ele cabe monitorar e guiar a criança para que ela se mantenha focada em seu objetivo e extraia o melhor da máquina. O professor deve ser o mentor nessa navegação que o estudante faz pelos vários caminhos virtuais, etambém uma espécie de tradutor do retorno que o aluno recebe do computador ao executar ali parte de seus estudos. Ele é como o maestro de uma orquestra.

    Na imensa maioria das escolas, ainda não funciona assim, certo?É verdade. No meio da educação, há uma clara resistência a mudanças. Os professores ensda mesma forma que aprenderam, e assim velhos hábitos vão se perpetuando, ainda queo mundo seja outro. Isso resulta em uma séria desconexão entre mestres e alunos. Adaptar-se aos dias de hoje não significa abrir mão de metas acadêmicas elevadas. Significa, isso sim, que o percurso escolar pode se tornar menos maçante. Se os educadores prestassem mais atenção ao que a ciência informa sobre como o cérebro retém conhecime, poderiam fazer uma escola mais sincronizada com os estudantes.

    A senhora tem um exemplo?Os neurocientistas já sabem que a atenção de um aluno não resiste a mais do que dez min

    tos durante uma aula expositiva tradicional, à base de lousa e giz. Só que as escolas continuam a oferecer o mesmo modelo de sempre: o professor palestrando por cinquenta minutos, uma hora, à frente da classe.

    Em seus artigos, a senhora tem enfatizado que falta amadurecer o debate sobre overdadeiro papel da educação. Onde está a lacuna?Escolas são, de um modo geral, como empresas mal geridas. Não há ali um acordo básico sbre sua missão primordial. Uns defendem a ideia de que o propósito número 1 da escola éprover conteúdo. Outros acham que ela deve funcionar como um motor para o avanço social e econômico dos indivíduos. Um terceiro grupo acredita ainda que seja um espaço de socialização e exercício da cidadania. A falta de uma visão minimamente comum entre goernos, diretores, professores e as famílias dos alunos é um entrave importante parao sistema educacional. Não faria mal às escolas que respondessem a três questões consid

    radas básicas pelo pai da administração moderna, Peter Drucker (1909-2005): Em qual negócio estamos? Quem são os nossos clientes? E o que afinal consideram valioso?

    O Brasil está discutindo as bases do currículo nacional, assim como os Estados Unidos e tantos outros países já fizeram em décadas passadas. Em sua opinião, o que o curríc de uma escola deve oferecer hoje?Vivemos numa era em que o saber enciclopédico perdeu o sentido diante de tanta informação disponível a um clique na internet. Isso não significa abandonar objetivos acadcos ambiciosos; ao contrário, eles precisam estar à altura de um momento em que o saber evolui a passos largos e ninguém sabe dizer quais serão os problemas de amanhã. Alé de assimilar conceitos e conhecimentos essenciais, portanto, é preciso ter o raciocínio lógico afiado para juntar peças novas e conseguir chegar a conclusões. É precisor curiosidade e persistência para ir fundo em um problema, conseguir avançar de modo

     colaborativo. É preciso, por fim, desenvolver a criatividade necessária para inovar.

    Sua disciplina, a matemática, é justamente a mais odiada nas escolas. Como reverteressa situação?O primeiro passo é tentar demolir uma ideia incrustada nas sociedades e passada de uma geração a outra segundo a qual pouca gente tem capacidade para aprender a matéria. Predomina a visão de que ou você é um privilegiado com dom para os números ou é melhosquecer. Ninguém fala do papel do esforço, tão fundamental para avançar na matemática. a romper com essa cultura, é preciso encarar a tarefa espinhosa de repensar para v

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    aler o conteúdo apresentado hoje às crianças.

    O que há de errado com o conteúdo?Os estudantes aprendem uma matemática congelada no tempo e desconectada dos expressivos avanços recentes na área. A imensa maioria das escolas ensina a geometria desenvolvida, basicamente, no século III a.C., a álgebra do século XVII e a aritmética do slo XVIII. Até o cálculo que chega às salas de aula tem 300 anos de idade. Mais descobertas foram feitas nas últimas décadas do que em toda a história da matemática, e pouca ente sabe disso. Os currículos estão à margem dessas evoluções, estão ultrapassados. Elvam ao aluno conhecimentos que um comerciante demandava para tocar seus negócios nos anos 1940. Não há como ser atraente assim.

    E o que as crianças deveriam estar aprendendo?Elas precisam saber como resolver problemas, e não como memorizar fórmulas em aulasem que pouco põem o raciocínio lógico em ação. Um desincentivo comum à exploração dos nescolas é o desprezo pela intuição matemática do aluno. Quando ele trilha o próprio camo para solucionar uma questão, e não o caminho esperado pelo professor, frequentemente se considera que errou, mesmo tendo chegado à resposta certa. Como ocorre em outras disciplinas, os educadores ainda demonstram estar aferrados a um tempo em que o estudante ficava passivo e calado diante de uma lousa. Não entenderam que estámais do que na hora de colocá-lo no banco do motorista.

    1#4 LYA LUFT ± SEREMOS TODOS TROUXAS?

      TENHO ESCOLHIDO muito cuidadosamente minhas palavras nas tantas dezenas, já centenas, de artigos aqui publicados, para não ser diretamente ofensiva e jamais incorrer em alguma injustiça que poderia ter sido prevenida, pois pobre de quem quiser ser juiz do outro. Mas aos poucos as palavras começam a fugir dos arreios que a prudência lhes tem imposto, e reclamam, e se agitam, e se queixam, exigindo que as deixe brotar naturalmente. Por isso tenho me perguntado, e a algumas pessoas mais chegadas, diante dos absurdos que acontecem: somos mesmo um país de trouxas, para nos tratarem assim? Que falta de noção, de ridículo, que falta de respeito, tantaempulhação feita e dita com cara séria e até frases de retórica, como se fôssemos uma m de imbecis. Por exemplo, a cantilena cansativa e já patética de que as confusões e desgraceiras no país ocorrem "porque a oposição não aceita ter perdido as eleições" lá node 2014!

    Ou dar a entender que um ex-mandatário brasileiro, embora vivendo com luxo, n

    ada possui de seu, é um pobre, mora, vive, diverte-se "de favor". Amigos cuidam dele e de sua família, até pagando fortunas para armazenar contêineres com ditos presentes que teria recebido em seus importantíssimos mandatos. Momentinho! Nenhuma pessoa em cargo público pode aceitar presentes no valor de mais de 100 reais, e se aceitar terá de deixar TUDO, ao sair, em lugares públicos, como benefício para o público, pis a ele não pertencem, e sim ao cargo ocupado.

    Mandantes do mais alto posto desprezam a Justiça, censuram ações legais como se neste país tão esfacelado a Justiça não fosse mais importante do que o mais importante crgo. Nada contra pessoas, partidos, seitas, seja o que for. Sou, sim, contrária à injustiça, à exploração que submete, à hipocrisia que mente e destrói, ao cinismo que aba credulidade dos bons e esforçados. Sou totalmente contrária à mentira com que se enfraquece a força de vontade e se desvia a capacidade de protesto dos bons e inocentes que acreditam quando deveriam há muito desconfiar, e que ainda lutam quando dev

    eriam voltar-se para outro lado.Sem rancor, sem maus desejos, apenas expresso meu estarrecimento diante doque vem sucedendo nas altas cúpulas, agora de novo tentando incendiar as classes mais simples, como se o país já não tivesse desabado num poço, enfiando o pé naquele malado alçapão que para mal de nossos pecados ainda se abriu no fundo. Não quero o mal de ninguém, mas quero o bem deste meu pobre país, objeto de tanta exploração e destruição corruptos, gananciosos, dementes, inqualificáveis ou desqualificados seres humanos em posições de poder. É preciso fazer uma rearrumação em todos os cantos e recantos, todos os níveis sociais, intelectuais, morais, não importa: quero homenagear a Justiça, que agora bafeja o coração dos que ainda por aqui pensam Ð que continue, e floresça,

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     progrida, e quem sabe faça uma limpeza geral e essencial, para que, das ruínas em que moral e economicamente já vagamos, possamos juntar cacos e construir um país respeitado e decente.

    Não é possível que nós, o povo brasileiro Ð que, repito, não é constituído só dos ndicalistas, despossuídos, explorados, mas de cada um dos que, como eu, trabalhampara pagar suas contas e seus impostos, labutam, se desgastam, correm, criam sua família, cuidam de seus amigos, e à noite perdem o sono pensando no que será de nós Ð,eitemos o que está ocorrendo.

    Todos, velhos, doentes, mulheres grávidas, garis, professores, enfermeiras, bancários, empregados do comércio ou indústria, agricultores, estudantes, não somos trouas: cada um de nós é uma peça do povo brasileiro, e todos (a não ser os idiotizados pel neurose de uma crendice ou ideologia cega) vêem, sentem, sofrem o que nos acontece Ð e podem, devem, clamar e reclamar: "Assim não dá mais. Assim não quero mais".

    É hora, urgente, de refazer, limpar, desinfetar, arejar, para podermos começara pensar em arrumar de novo esta casa, esta pátria, este Brasil.

    1#5 VILMA GRYZINSKI ± ÍDOLOS DECAÍDOS  QUAL A PESSOA que você mais admira no mundo todo? Tirando figuras religiosase os próprios pais, muita gente vai ficar sem resposta. E, quanto mais velho, mais é provável que isso aconteça. Com a idade, vem, se não o ceticismo, pelo menos o entenimento de que o escritor fenomenal era um canalha, o pintor de talento sublime maltratava as mulheres e o gênio atual da ciência já se meteu em aventuras sexuais duvidosas. Talvez muitos brasileiros digam Ayrton Senna, morto há quase 22 anos, ainda

     e fervorosamente admirado por ser um vencedor à época incomparável e manter a imagemde homem que não muda por causa da fama e da fortuna. Muitos brasileiros diriam, até pouco tempo atrás, um outro nome, coberto com o precioso manto de defensor dos pobres, ao qual voltaremos no final.

    Vencer, não se deixar consumir pela arrogância, preocupar-se com os desvalidose ser fiel às origens são qualidades nas quais nos espelhamos, mesmo quando não as temos. Constituem modelos a ser mostrados a nossos filhos como exemplo de comportamento louvável. A morte os consagra, como aconteceu com Senna no Brasil, a princesa Diana na Inglaterra e o papa João Paulo II onde quer que houvesse católicos. A vida pode arrastá-los para o buraco. Dois casos da semana passada consumiram a imageme a carreira de esportistas de elite. Maria Sharapova, a tenista impossivelmente bonita e talentosa, foi flagrada e forçada a admitir que tomou durante dez anos um remédio destinado a pacientes de isquemia Ð e atletas ambiciosos. O remédio só entrou

    neste ano na lista dos proibidões, mas Sharapova, a esportista financeiramente mais bem-sucedida do mundo, desmoronou assim mesmo. Também se espatifou a carreira de Adam Johnson, um jogador de futebol conhecido na Inglaterra. Johnson, que tambémfaturava com o estilo bonitão, é a versão inglesa do estereótipo do jogador brasileirofamília pobre, riqueza súbita e casos incessantes. O envolvimento com uma menina de15 anos deverá levá-lo à cadeia.

    Muitos pais se arrepiam com os maus exemplos dados por pessoas famosas, especialmente quando as filhas começam a usar calças rasgadas, tingir o cabelo de azule, horror dos horrores, ouvir Miley Cyrus. Sobram péssimos exemplos, também, para os meninos. Ser mãe, ou pai, é acima de tudo preocupar-se. Nesse caso, vale lembrar que muitas mulheres que hoje são avós entraram na juventude ouvindo Madonna e não perderam nada, a não ser a paciência com o mesmo show de sempre. Na questão dos modelos de comportamento, a melhor, ou talvez única, solução possível é garantir que os filhos tenh

    uma multiplicidade de escolhas em quem se espelhar Ð e rezar para que Harry Potter seja mais poderoso do que Kim Kardashian. A americana com curvas de funkeira carioca também enfiou as unhas de 3 centímetros na questão dos modelos de comportamento. Ela divulgou uma foto mostrando o corpo que tinha no ano passado, antes da segunda gravidez. Nua, claro. Foi criticada, entre outros, pela jovem atriz Chloë Grace Moretz (a Carrie refilmada). A rainha dos vídeos escandalosos e da promoção da própri nudez deveria, disse a atriz, entender a importância de mostrar às jovens "que temos muito mais a oferecer do que apenas nosso corpo". Se pedisse a um vampiro para parar de beber sangue, poderia ser mais bem-sucedida. Chloë é de família evangélica e em uma queda por Neymar, enrolado na Espanha num processo por evasão fiscal.

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      Erros de esportistas e outros famosos são condenáveis, mas não deveríamos lhes atrbuir importância excessiva. Mais prejudiciais são os desvios dos eleitos e admirados pelo povo. Em 1º de janeiro de 2003, o brasileiro mencionado no primeiro parágrafofez um dos mais emocionantes discursos da política nacional. Disse ele: "Não permitiremos que a corrupção, a sonegação e o desperdício continuem privando a população de reque são seus e que tanto poderiam ajudar na sua dura luta pela sobrevivência. Ser honesto é mais do que apenas não roubar e não deixar roubar. É também aplicar com eficiên transparência, sem desperdícios, os recursos públicos focados em resultados sociais concretos". Deu no que deu.

    1#6 LEITORLULA E A LEIO dia 4 de março não foi apenas uma sexta-feira de 2016. Foi o antes e o depois, e a luz do dia em que a "alma mais honesta deste país" conheceu sabores já provados por seus "amigos" ('"O legal versus o ilegal'", 9 de março).Sidnei Júnior RamosTrês Lagoas, MS

    Lula está moralmente morto; e o PT, seu partido, continua apoiando o membro mais "ilustre" da nomenklatura tupiniquim, indiferente às evidências de enriquecimento ilícito e corrupção desse farsante. Enquanto o ex-presidente não é definitivamente encarcerao, seus crimes são expostos detalhadamente por uma imprensa livre e corajosa. Livramo-nos, assim, da criação de mais um mito populista.

    Álvaro Paz GrazianiJoinville, SC

    Com certeza, Lula é o pai da Facção...Zehev Schwartz BenzakenManaus, AM

    Cidadão Luiz Inácio Lula da Silva, em seu lugar eu agradeceria aos procuradores e à Polícia Federal pela oportunidade de fornecer explicações sobre fatos que envolvem seu nome. Em vez disso, entre tantos destemperos, comparou a si próprio a uma cobra!Regina TauloisRio de Janeiro, RJ

    Além de expor todas as mentiras nas quais acredita piamente, inclusive na sua honestidade, Lula, sendo traiçoeiro como uma cobra, autointitulou-se uma jararaca. Seu coração estava tão cheio de ódio que a cobra veio à tona.Marcia Acatauassu LedoBelém, PA

    Rui Falcão, Dilma, Lula e companhia estão fazendo um grande serviço à oposição e contra mesmos ao despertar a atenção dos seus partidários desiludidos. O episódio da conduçãocitiva está redirecionando novamente para o PT e cia. os olhares desses partidáriosdesiludidos, desacreditados, cabisbaixos etc., como a cúpula e cia. tanto desejavam. Parece a reviravolta de que eles precisavam. Porém, quando as provas condenatórias forem reveladas e as prisões acontecerem, esses mesmos olhares verão os crimes revelados daquilo que antes eram apenas notícias, fortes rumores e que tanto os desil

    udiram. Agora, a frustração e a vergonha serão irreversíveis, e graças a essa movimenta a própria cúpula e cia. do PT estão fazendo. Dessa vez, a paulada será na cabeça. Ou s, o PT agarrou apenas uma boia furada nesse naufrágio no alto-mar de lama em que navega. É só um pouco mais de fôlego antes de morrer afogado.Fausto DamasRio de Janeiro, RJ

    VEJAA agilidade e a magnitude da reportagem especial "Lula e a lei" são um exemplo daeficiência jornalística brasileira, com isenção e clareza, dando notoriedade a VEJA e f

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    zendo valer o direito à informação. É lastimável que nem todos os brasileiros façam usoe grande instrumento informativo, que traz em tempo real o Brasil cotidiano.Fernando Guerra JúniorBelo Horizonte (MG), via tablet

    MAÍLSON DA NÓBREGANo artigo "Sem espaço para guinada" (9 de março), o economista Maílson da Nóbrega fez óa leitura da recessão pela qual passamos. De fato, o populismo na América Latina criou bolhas de consumo, aumentou a popularidade dos autores e quebrou países; e a solução petista é aumentar gastos públicos.Hedelcio RodriguesSão Vicente, SP

    Maílson da Nóbrega demonstrou com clareza a catástrofe em que se transformou a políticaeconômica do governo petista. O país encolheu, e o povo está pagando caro pela inconsequência da turma que se alojou no Planalto há mais de treze anos. Se vivo fosse, Itamar Franco, que abriu caminho para a estabilidade econômica com o Plano Real, estaria de topete em pé!João Bosco MarinhoBrasília, DF

    ªLula e a lei, ou Lula é a lei? É incrível como esse cidadão, com o dedo em riste, desa o Judiciário."Wagner Rodrigues de Oliveira

    Araxá, MGUM DIA DIFÍCIL Logo depois de ter sido conduzido coercitivamente para depor durante três horas à Polícia Federal em São Paulo, na sexta-feira (4), o ex-presidente Lula dbochou da Justiça em um pronunciamento mais parecido com um comício. Disse Lula: "Se quiseram matar a jararaca, não bateram na cabeça, bateram no rabo. A jararaca tá viva"

    DOSSIÊ CONTRA SÉRGIO MOROO dossiê fajuto que tenta atingir o juiz Sérgio Moro é obra de um mentecapto ("Operaçãooprada", 9 de março).Marlon JustusCuritiba, PR

    O ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, nega ter recebido um dossiê com denúncias contra o juiz Sérgio Moro, conforme matéria publicada em VEJA. "Desconheço e não me inteessa conhecer", diz Wagner. O ministro informa ter recebido o governador Tião Viana acompanhado de dois representantes da Associação dos Policiais Federais que abordaram a questão do plano de cargos e salários da categoria.Sônia CarneiroAssessora de comunicação social da Casa Civil da Presidência da RepúblicaBrasília, DF

    CLÁUDIO DE MOURA CASTROO artigo "Do Magnum .357 para Harvard" (9 de março), de Cláudio de Moura Castro, reflete tudo o que penso sobre educação. Como diretor de escola e pesquisador do tema,

    quando se toca no assunto da importância dos traços socioemocionais para a formação dascrianças, volto a acreditar que resta alguma esperança para nossos jovens se os professores entenderem que essa nova geração mudou Ð e seus desafios idem.Almir VicentiniSão Paulo, SP

    O excelente texto do articulista é uma obra-prima que deveria ser seguida pelas autoridades educativas do nosso país. A tão sonhada "pátria educadora" poderia finalmente se tornar uma realidade quando pusesse em prática esse programa de concepção extraordinária.

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    Renato SenaFortaleza, CE

    PETER DIAMANDIS"Brilhandis" deveria ser o sobrenome de Peter Diamandis ("O mundo sempre melhora", Entrevista, 9 de março). Instruído, culto, multiprofissional e empreendedor, elejá está devidamente lapidado. Somos o que nossa mente projeta. Em seus planos futuristas, não se esqueceu da educação. Fundou um instituto para remodelar o sistema de ensino. Com pessoas assim, o mundo sempre melhora, com certeza.Francisco de Almeida Franco JúniorUberaba, MG

    PARA SE CORRESPONDER COM A REDAÇÃO DE VEJAAs cartas para VEJA devem trazer a assinatura, o endereço, o número da cédula de identidade e o telefone do autor. Enviar para: Diretor de Redação, VEJA - Caixa Postal 11079 - CEP 05422-970 - São Paulo - SP;fax: (11) 3037-5638; e-mail: [email protected] motivos de espaço ou clareza, as cartas poderão ser publicadas resumidamente.Só poderão ser publicadas na edição imediatamente seguinte as cartas que chegarem à reda quarta-feira de cada semana. ___________________________________________ 

    2# PANORAMA 16.3.16

      2#1 IMAGEM DA SEMANA ± OS INSTINTOS E OS SMARTPHONES  2#2 DATAS  2#3 CONVERSA ± LENNY NIEMEYER ± ªAS MULHERES USARÃO SAIAº  2#4 SOBEDESCE  2#5 NÚMEROS  2#6 RADAR  2#7 VEJA ESSA

    2#1 IMAGEM DA SEMANA ± OS INSTINTOS E OS SMARTPHONESDURANTE um amistoso de beisebol em Orlando, na Flórida, nos Estados Unidos, o taco escapou das mãos de um jogador e voou na direção da torcida. Um fotógrafo registrou o xato instante em que Shaun Cunningham, de 37 anos, impediu com o braço que o objet

    o atingisse o rosto do filho de 8 anos, Landon, enquanto as pessoas em volta seabaixavam, se contorciam e simulavam movimentos defensivos de artes marciais para escapar da paulada. O gesto de Cunningham pode ser atribuído tanto ao instinto paterno quanto à sua habilidade em salvamentos (ele é bombeiro). Sorte de Landon queo pai também tem bom reflexo. O fato de o garoto ser o único da cena que não percebe o taco se aproximando por estar absorto no celular motivou, nas redes sociais, os clichês de sempre sobre os malefícios do mundo virtual para as crianças. Mais grave e menos debatido é o dano psicológico e físico que pais viciados em smartphones causamaos filhos. Um estudo do governo britânico mostrou que o número de crianças pequenas com dificuldade de fala aumentou porque os pais interagem mais com os smartphones do que com elas. Nos Estados Unidos, uma em cada três crianças acha que seus pais gastam muito tempo com o celular. Além disso, os acidentes domésticos que poderiam ter sido evitados se os cuidadores não estivessem de olho numa telinha aumentaram 22

    %. Como ilustra a imagem ao lado, mais importante que um pai com instinto é um pai desconectado.DIOGO SCHELP

    2#2 DATASMORRERAMNancy Reagan, ex-atriz americana, notabilizada como uma das mais influentes primeiras-damas dos Estados Unidos, era viúva do republicano Ronald Reagan (1911-2004). Sua relevância era reconhecida até mesmo entre os democratas. "Ela redefiniu o pap

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    el de primeira-dama", disse Barack Obama ao saber de sua morte. Nascida em NovaYork, Nancy chegou a Hollywood quando tinha 28 anos. Lá conheceu Reagan, também ator, divorciado havia um ano. Casaram-se em 1952. Mas claro que a notoriedade de ambos iria se firmar bem longe dos sets de filmagem: nos palcos da política. Tudo começou em 1966, quando Ronald Reagan foi eleito, e depois reeleito, governador da Califórnia. Nancy teria um desempenho de destaque na campanha que o levou a derrotar, em 1980, um combalido presidente que almejava a reeleição, o democrata Jimmy Cárter. Uma vez instalada na Casa Branca, a ex-atriz tornou-se uma personalidade controversa. Com o país em plena crise econômica, torrava milhares de dólares em decoração eins. Durante os oito anos de governo Reagan (1981-89), ela ajudou a contratar ea demitir os assistentes do marido. Consta que também foi figura-chave no episódio Irã-Contras, a mais séria crise política atravessada por ele. Nancy convenceu Reagan, a quem chamava de Ronnie Ð e ela era, para o companheiro de toda a vida, a sua Mommy Ð, a se desculpar publicamente, recuperando com isso a imagem do presidente. Apelidada de Rainha Nancy, por causa do pendor autoritário, fez campanha de combate ao álcool e às drogas, cujo slogan ficou famoso: "Apenas diga não". Quando seu marido foi diagnosticado com Alzheimer, tornou-se uma ativista nessa área. Dia 6, aos 94 anos, de insuficiência cardíaca, na Califórnia.

    Raymond Tomlinson, engenheiro eletrônico americano que, em 1971, criou o formato de e-mail tal como o conhecemos hoje e acrescentou o sinal @ aos endereços. A primeira mensagem de e-mail foi enviada quando Tomlinson trabalhava para a empresa de pesquisas Bolt Beranek and Newman, em Boston. A companhia tornou-se conhecida como uma das responsáveis pela criação da Arpanet, a rede de computadores instalada em

    1969 para uso militar. Como o símbolo @, em inglês, refere-se à preposição aí (em, na),inson decidiu usá-lo com o propósito de indicar a instituição do usuário que enviava o ail. Nasceu em uma pequena cidade do Estado de Nova York, chamada Amsterdam, e formou-se pelo MIT, onde também fez seu mestrado. Dia 5, aos 74 anos, de causa não especificada, em Massachusetts.

    Nikolaus Harnoncourt, maestro alemão, conhecido por suas performances com instrumentos de época. Nascido em Berlim, mas criado na Áustria, era filho de aristocratas,descendente de imperadores romanos e outros nobres da Europa. Sua mãe, por exemplo, era neta de um arquiduque Habsburgo. Harnoncourt tocou violoncelo na Orquestra Sinfônica de Viena entre 1952 e 1969. Tinha um interesse enciclopédico por músicas antigas, especialmente dos períodos barroco e clássico. Entre 1971 e 1990, regravou as quase 200 cantatas de Bach com o grupo Concentus Musicus Wien, formado na dedad

    a de 1950 por ele e por sua mulher, Alice. Em dezembro passado, anunciou sua aposentadoria por problemas de saúde. Dia 5, aos 86 anos, de causa não especificada, na Áustria.

    2#3 CONVERSA ± LENNY NIEMEYER ± ªAS MULHERES USARÃO SAIAºA estilista responsável pelos uniformes do Brasil para a abertura e o encerramento da Olimpíada diz que o risco de picadas do Aedes aegypti não a fez mudar os modelos.

    Qual foi o maior desafio para desenhar os uniformes?Estou acostumada a analisar uma roupa em uma mulher, em uma foto ou na passarela. Mas imaginar o conjunto da delegação foi um desafio enorme e fascinante. É como uma

    escola de samba. Às vezes, uma roupa parece exagerada, mas, no contexto, tem uma harmonia incrível. Deu um frio na barriga delicioso.

    O mosquito Aedes aegypti é atraído por cores escuras e também pelo suor. Isso foi umapreocupação na hora de pensar nas roupas?Não, porque, quando começamos, não estávamos nesse pé, não se falava em zika. As mulherarão saia, mas acredito que não teremos problema.

    Qual foi sua inspiração para a estamparia?Tentei usar uma estampa que fosse bastante abrangente, de norte a sul. Há elemento

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    s da fauna e da botânica nela. O que parece uma asa de arara-azul para uma pessoapode remeter a um papagaio para outra. Você olha para a estampa e identifica o Brasil ali.

    A senhora é conhecida como uma das ativas anfitriãs do Rio de Janeiro. Pretende daralguma festa durante a Olimpíada?Ainda não tenho nada planejado, mas adoraria! É um momento muito especial.

    Qual o erro que o promotor de uma festa não pode cometer?Não cumprimentar ou deixar de falar com algum convidado. Mesmo não sendo conhecida,a pessoa deve ser recebida como se já tivesse estado lá.

    A senhora tem muitos biquínis, por ser expert em roupa de praia?Não, a casa é de ferreiro e o espeto é de pau mesmo! Acabo não tendo muito tempo de ir raia. Quando saio de férias, o pessoal da minha equipe fala para eu levar umas coisinhas novas. Tenho uns cinco biquínis de que gosto muito e acabo usando sempre os mesmos.

    FERNANDA ALLEGRETTI

    2#4 SOBEDESCESOBEPAULO MALUF - Alvo da Justiça há duas décadas, já condenado na França, o deputado cont

    a leve, solto e à vontade até para "lançar" a candidatura de Geraldo Alckmin à Presidên em 2018. É um guerreiro imbatível.MORTOS NO FACEBOOK - 2098 será o ano em que o número de contas no Facebook em nomede pessoas mortas vai ultrapassar o de usuários vivos - se a rede social estiver bem de saúde até lá, claro.ROBÔS - Depois das vitórias sobre humanos no xadrez, uma máquina ganhou uma partida contra um campeão mundial de Go, o complexo jogo oriental de tabuleiro.

    DESCELUIZ ESTEVÃO - Dez anos e mais de trinta recursos protelatórios depois, o ex-senador finalmente começou a cumprir seus 26 anos de prisão pelos desvios na obra do prédiodo TRT de São Paulo. É um guerreiro em fim de batalha.NASCIMENTOS NO MUNDO - A duplicação do uso de contraceptivos nos últimos 46 anos impe

    dirá 1 bilhão de nascimentos nos próximos quinze anos, segundo a ONU.ESTADO ISLÂMICO - Mais de 20.000 fichas de inscrição de integrantes e aspirantes ao grupo, de 51 nacionalidades, caíram nas mãos das agências de inteligência europeias.

    2#5 NÚMEROS67 - pessoas já foram condenadas pelo juiz Sérgio Moro desde o início da Operação Lava-o, em março de 2014.2,9 - bilhões de reais foram retomados pela Justiça - 659 milhões vieram da repatriaçãe recursos em contas no exterior e outros 2,4 bilhões de bens bloqueados dos réus.49 - acordos de delação premiada foram firmados até agora - o do senador Delcídio do Aaral, uma vez homologado pelo STF, será o quinquagésimo.100 - réus da Lava-Jato ainda esperam por julgamento - dos 179 acusados nas 24 fas

    es da operação, apenas doze foram absolvidos de todas as suspeitas.

    2#6 RADARVERA MAGALHÃ[email protected]

    LAVA-JATOO QUE DELCÍDIO FALOUHá duas menções a Aécio Neves na delação premiada de Delcídio do Amaral (PT-MS). Na mai

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    hada delas, o senador aponta intervenção do tucano, então governador de Minas, para ocultar dados da quebra de sigilo do Banco Rural, que demoraram a ser enviados à CPI dos Correios, em 2005. A outra diz respeito a um suposto esquema do tucano em Furnas.

    AGORA VAI?Quem viu os depoimentos não tem dúvida de que o Ministério Público Federal pedirá abert de inquérito contra Aécio. Citações anteriores a ele foram arquivadas por Rodrigo Jant.

    O QUE DIZ AÉCIOO tucano diz desconhecer tais citações e "a que interesses elas servem". Afirma quejamais tratou com Delcídio sobre questões referentes à CPI. Em nota, sua assessoria afirmou: "Em relação a Furnas, é uma requentada tentativa de envolver o nome do senadore de diversos outros políticos em falsas acusações".

    ASSIM NÃO DÁTeori Zavascki voltou a se irritar com Janot, como já ocorrera quando ele "jogou no colo" do Supremo o pedido de afastamento de Eduardo Cunha às vésperas do recesso.O ministro ficou chocado com o fato de o procurador-geral ter concordado com a quarentena de seis meses para a delação de Delcídio.

    RETIRE SUA SENHAAdvogados que antes eram peremptórios em garantir que seus clientes não partiriam pa

    ra a delação premiada agora demonstram nervosismo com a "fila para delatar". Temem ficar por último e, quando chegar a vez, não ter nada de interesse da força-tarefa a acrescentar Ð e perder o benefício.

    DO MENSALÃO ÀS LETRASApós o indulto que obteve na última semana para sua condenação no mensalão, o ex-deputaJoão Paulo Cunha se prepara para lançar o segundo livro. A publicação, que sairá em maiela TopBooks, terá resenhas de cerca de vinte obras lidas por ele na prisão, como OHomem que Amava os Cachorros, de Leonardo Padura, e O Tempo entre Costuras, de Maria Dueñas. O petista, que já publicou um volume de poesias, também trabalha em outro projeto: suas memórias do cárcere.

    O OCASO DO GOVERNO

    ENTRE A CRUZ E A CALDEIRINHAPara ministros do Supremo, a avaliação de que é melhor para Lula virar ministro para ter foro privilegiado é falha. Com as investigações concentradas na corte, os processos andariam mais rápido. Além disso, caso condenado, Lula não teria mais instâncias às qu recorrer, sem contar que perderia o discurso de vítima de perseguição política.

    PACTO SILENCIOSONa hipótese de avançar a orquestração em curso entre PSDB e PMDB pelo impeachment, o Trbunal Superior Eleitoral tende a deixar morrer a ação de cassação de mandato contra a capa Dilma-Temer. A justificativa será que o alvo é a presidente e, se ela for impedida, o processo perderá a razão de ser. O acordo tácito é vital para que o PMDB de Temerembarque no impeachment.

    PRIMEIRO TESTEA votação no Senado da PEC que acaba com a reeleição será um piloto da aproximação de pistas e tucanos. Se passar, evidenciará o acordo para que Temer assuma o governo sem a possibilidade de disputar em 2018.

    "OLHEM PARA A MINHA CARA"Dilma pode não ter cara de quem vá renunciar ou de que esteja resignada, como disseno peculiar pronunciamento de sexta-feira. Mas, nas últimas aparições, chamou atenção ps olheiras profundas. Não são resultado só das noites maldormidas: ela se submeteu à blfaroplastia, procedimento para levantar as pálpebras e retirar as bolsas de gordur

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    a sob os olhos.

    LIVROSQUALQUER SEMELHANÇA...Um dos autores brasileiros mais vendidos nos anos 2000, Augusto Cury lança neste mês, pela editora Planeta, um romance com título concernente aos dias atuais: O Médicoda Humanidade e a Cura da Corrupção. Embora não situe explicitamente a história no Brasl, Cury trata de temas para lá de atuais.

    ...NÃO SERÁ COINCIDÊNCIAO protagonista é Napoleão Alcântara, candidato à Presidência de um grande país que recevisita do misterioso senhor H. Cercado de assessores de índole duvidosa, como o marqueteiro João Gilberto, Napoleão começa a rever seus conceitos quando H o coloca frente a frente com líderes e pensadores como Robespierre e Sócrates.

    ECONOMIA EM CRISEATRASO NO PAGAMENTOApesar da redução da alíquota do Reintegra, que caiu de 3% para 0,1% em 2015, exportadores queixam-se do atraso no pagamento dos créditos tributários do programa. Há quem esteja há quase um ano sem receber. Empresários alegam que o sistema da Receita mudou três vezes nos últimos meses, retardando a análise das informações. Procurado, o Fiscoquis comentar.

    NOTAS DIÁRIAS EM WWW.VEJA.COM

    Com Severino Motta e Natalia Viri

    2#7 VEJA ESSA"NINGUÉM PODE ESTAR TOTALMENTE PREPARADO PARA TORNAR-SE PRESIDENTE DOS ESTADOS UNIDOS. ACHO QUE FOI (JOHN) KENNEDY QUEM DISSE ISSO. TUDO NO FATO DE SER PRESIDENTE É TOTALMENTE IMPREVISÍVEL." - KEVIN SPACEY, ator americano, em conversa, por telefone, com diversos órgãos de imprensa. Spacey é Frank Underwood na série House of Cards, a Netflix, cuja quarta temporada entrou recentemente no ar.

    "Quando você não tem nada para vestir." - KIM KARDASHIAN, socialite e faz-tudo americana, ao postar no Instagram uma foto em que está nua e que recebeu 1,5 milhão de curtidas.

    "É preciso haver uma voz governamental que se oponha à infernal e arcaica injustiça social perpetrada contra os animais no Reino Unido simplesmente porque esses animais não falam inglês." - MORRISSEY, cantor e compositor britânico, ex-vocalista da banda inglesa The Smiths, em entrevista ao site True to You. Ele foi convidado peloAnimal Welfare Party (Partido pelo Bem-Estar dos Animais) a concorrer nas eleições para a prefeitura de Londres.

    "Peça, meu irmão e minha irmã, a graça de pisar a cabeça da serpente. De todas as víbore insistem e persistem em nossa vida. Daquelas que se autodenominam jararacas."- DOM DARCI NICIOLI, bispo auxiliar da Arquidiocese de Aparecida, ao pregar a fiéis no santuário da cidade, no domingo 6. Dois dias antes, após depor na PF, o ex-presidente Lula dissera em seu discurso: "Se quiseram matar a jararaca, não bateram na

     cabeça, bateram no rabo. A jararaca está viva, como sempre esteve".

    "SE OS PENSADORES DE ESQUERDA NÃO TIVEREM A GRANDEZA DE RECONHECER O ERRO QUE COMETERAM COM LULA E COM O PT (...), A ESQUERDA BRASILEIRA VAI AFUNDAR COM ELES." -JOSÉ PADILHA, cineasta, em artigo publicado no jornal O Globo.

    "Pelo menos testemunhem que não tenho cara de quem vai renunciar." - DILMA ROUSSEFF, presidente da República, em coletiva à imprensa no Palácio do Planalto, na sexta-feira 11.

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    EPÍGRAFE DA SEMANAA pretexto do trabalho realizado pela Operação Lava-Jato, que completa seu segundo aniversário"SE RECONHECES QUE ALGO É INJUSTO, TENTA PÔR FIM À INJUSTIÇA O MAIS RÁPIDO POSSÍVEL: PAE ESPERAR O PRÓXIMO ANO?" - MÊNCIO (372-289 a.C.), filósofo chinês. ______________________________________________ 

    3# BRASIL 16.3.16

      3#1 A SERPENTE ACUADA  3#2 PRÍNCIPE CONDENADO  3#3 ÓDIO ALIMENTADO  3#4 MAIS UM LISTÃO  3#5 RESSACA BRAVA

    3#1 A SERPENTE ACUADACom o governo de Dilma Rousseff esfarelando-se a olho nu, Lula busca apoio político do PMDB, e seu ofidiário espalha que ele foi convidado para ser ministro. O ex-presidente encerrou a semana constrangido por um inédito - e espetaculoso - pedidode prisão preventiva.DANIEL PEREIRA

      Embora a jararaca seja uma serpente endêmica na América do Sul, nenhum outro país

     do continente além do Brasil tem uma jararaca como Luiz Inácio Lula da Silva. "A jararaca está viva", disse o ex-presidente há duas semanas, logo depois de depor nas investigações da Lava-Jato, na barulhenta condução coercitiva de que foi alvo. Na semanapassada, a jararaca provou-se realmente muito viva, mas em luta desesperada pela sobrevivência. Jantou por três horas no Palácio da Alvorada com a presidente Dilma Rousseff, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para barrar as investigações sobre seu patrimônio, reuniu-se com líderes do PMDB em busca de uma saída política, recebeuum convite para ser "ministro do foro privilegiado" e terminou a semana ainda pior do que começou: denunciada por lavagem de dinheiro e falsidade ideológica, e comum inédito pedido de prisão preventiva apresentado à Justiça pelo Ministério Público deulo. Sim, a jararaca está viva, mas nunca esteve tão acuada.

    A movimentação de Lula revela quanto sua situação se deteriorou nos últimos dias, de o depoimento que prestou à Polícia Federal, no Aeroporto de Congonhas. Sua imagem

    , logo depois de falar por três horas e meia aos agentes federais, apareceu num vídeo divulgado pela deputada Jandira Feghalli, do PCdoB do Rio de Janeiro, no qualLula vocifera palavrões ao telefone, irritadíssimo com a pressão das investigações. Maspare-se o joio do trigo: o pedido de prisão apresentado pelos procuradores do Ministério Público de São Paulo na semana passada é uma peça amadora, que em nada se comparo trabalho cuidadoso que vem sendo feito pelos investigadores da Lava-Jato. O pedido de prisão produziu o milagre de reunir críticas uníssonas de petistas, tucanos, juristas e palpiteiros em geral. Ele será analisado pela juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga Oliveira, da 4    Vara Criminal de São Paulo, que tem fama de linha-dura.

    São muitos os pecados atribuídos ao ex-presidente. Em diferentes frentes, ele é acusado ou suspeito de corrupção, tráfico de influência, lavagem de dinheiro e falsidadeideológica. Ou, substituindo o Código Penal pelo bom português, é investigado sob a suseita de se beneficiar do dinheiro sujo do petrolão, o maior esquema de corrupção já inv

    stigado na história do país. Diante de tantos e tão variados indícios de crimes, Lula dsembarcou em Brasília para pedir apoio a próceres da República. Seu plano é criar uma rde de proteção capaz de contestar, constranger e intimidar os investigadores. Numa reunião com Dilma Rousseff, exigiu empenho em sua defesa e alegou que protegê-lo significa proteger o governo e o mandato da presidente, que treme à sombra do impeachment em tramitação no Congresso. O recado foi claro: o destino de um está atrelado ao destino do outro. Ou os dois se salvam, ou ninguém. O raciocínio traz embutido um acerto de contas. Há tempos o criador reclama da deslealdade da criatura, que insiste em transferir para Lula a responsabilidade pelos escândalos. O petista tem alegado que Dilma arruinou a economia, desarranjou a política e quer salvar-se da guilho

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    tina com o discurso do combate à corrupção.Em mais de um cenário, Lula insinuou a Dilma que o melhor caminho para ambos

    seria ele, Lula, assumir de vez as rédeas do governo. O ex-presidente reclama para assessores que sua sucessora ouve seus conselhos, finge que concorda, mas não executa o combinado. Daí a necessidade de uma intervenção. Assim Lula tem resumido o balanço da relação com a presidente: "A Dilma é ótima para ser mandada (por mim), mas uma tia para mandar (nos outros)". Numa tentativa de mostrar poder, Lula quer agora os ministérios da Justiça e da Fazenda sob a sua tutela. Ele defende há tempos a nomeaçãara a Justiça de um político ou jurista experiente, como o ex-ministro Nelson Jobim, que seja capaz de controlar a Polícia Federal com pulso firme e manter um diálogo com os ministros dos tribunais superiores, a quem cabe a palavra final sobre os escândalos de corrupção.

    Da Fazenda, Lula espera uma guinada na política econômica, com a adoção de medidasde incentivo ao crédito e ao investimento, a fim de atenuar o mau humor da população.O PT considera a rua um ativo partidário e conta com ela para defender o ex-presidente e sua pupila do risco de impedimento. A pessoas próximas, Lula e seu ofidiário(veja o quadro) espalharam que o ex-presidente foi convidado por Dilma para assumir um ministério. Lula se sentiu comovido com o gesto, mas não aceitou nem recusoua oferta. No ano passado, petistas já haviam defendido sua nomeação para a Casa Civilcomo forma de lhe assegurar o direito a foro privilegiado. Na época, Lula classificou a ideia de coisa de aloprado, uma vez que aceitá-la equivaleria a assinar umaconfissão de culpa. A situação, agora, é outra. O cerco dos investigadores está cada veais próximo, e Lula, cujo instinto de sobrevivência é historicamente aguçado, anda preoupado com sua família, que obviamente não seria beneficiada pelo foro privilegiado.

    O ex-presidente se reuniu também com senadores do PT e do PMDB. No encontro,declarou ser vítima de perseguição e conclamou os parlamentares a lutar contra o que chamou de "arbitrariedades" da Polícia Federal, do Ministério Público e da Justiça. O dicurso soa como uma sinfonia de Bach para uma plateia toda encrencada, também ela,com inquéritos no Supremo Tribunal Federal, acusada de receber propina desviada dos cofres da Petrobras. É o caso do próprio anfitrião da reunião, o presidente do Senado Renan Calheiros (PMDB-AL).

    O quadro geral fica mais grave ainda diante da situação do governo de Dilma Rousseff. Nos últimos dias, a presidente tem aparecido em público com o rosto abatido,olheiras carregadas, cabisbaixa. Em parte, esse semblante decorre de uma cirurgia (veja nota na coluna Radar), mas seu desânimo é consequência de uma revelação: finalme, ao que parece, Dilma deu-se conta de que seu governo pode acabar antes do fim. Até aqui, a presidente vinha confiando cegamente nas garantias que seu marquetei

    ro, João Santana, preso em Curitiba, lhe dera sobre a lisura das contas de sua campanha. Mas as notícias de que as delações premiadas, a começar pela dos executivos da epreiteira Andrade Gutierrez, vão reforçar a silhueta do caixa dois da campanha de 2014 abalaram o estado de espírito de Dilma (veja a reportagem na pág. 52). É tanta delaçque o líder do PDT na Câmara, Weverton Rocha, disse que, no Maranhão, já há prefeito dondo em motel Ð para não ser surpreendido com uma versão local do japonês da Federal.

    Com o esfarelamento do governo Dilma, o Senado até abriu uma discussão típica das crises agudas: a mudança de regime. A ideia seria adotar uma modalidade de semipresidencialismo ou um parlamentarismo-tampão, através do qual a presidente poderia atéficar no cargo, mas como elemento decorativo. No Congresso, forma-se um consenso de que o impeachment só será aprovado se chancelado pelas ruas, onde a defesa do governo também se encontra fragilizada. Em nota, a Conferência Nacional dos Bispos doBrasil cobrou dos políticos responsabilidade na busca de uma solução para a crise: "O

    momento atual não é de acirrar ânimos. A situação exige o exercício do diálogo à exaustntal garantir o Estado democrático de direito. Conclamamos a todos que zelem pelapaz em suas atividades e em seus pronunciamentos". A iniciativa da CNBB, antes tão ligada ao PT, reflete o clima de hostilidade reinante. Movimentos sociais invadiram recentemente a sede de veículos de comunicação, numa tentativa de intimidá-los. Cetrais sindicais, como a CUT, anunciaram faz tempo a intenção de colocar seus soldados em campo para defender o governo. Mas a decantada força do PT, ou de Lula, nas ruas ainda é mais uma promessa do que uma realidade.

    A voz das ruas, na verdade, enfraqueceu-se diante das denúncias sobre o patrimônio de Lula. Ficou difícil, mesmo para os petistas da gema, defender o ex-presiden

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    te. O pedido de prisão preventiva de Lula, ainda que apressado, decorre de uma questão real: a reforma realizada pela OAS num tríplex no Guarujá que, segundo os investigadores, pertence à família do ex-presidente. Além da prisão, os promotores pediram a qebra do sigilo fiscal do petista e a retenção de seu passaporte. VEJA revelou em outubro que a empreiteira gastou cerca de 1 milhão de reais na reforma do tríplex. De lápara cá, só cresceram as evidências de que a família Lula da Silva, se não é dona formaimóvel, era sua indiscutível beneficiária.

    Em nota, o Instituto Lula afirmou que o Ministério Público possui documentos que provam que o petista não é dono do tríplex nem cometeu irregularidade. O pedido do Ministério Público, rascunhado às pressas, facilitou a defesa de Lula e até virou piada iral na internet por uma confusão. Os promotores disseram que as peripécias de Luladeixariam impressionados até mesmo "Marx e Hegel". Queriam dizer Marx e Engels, mas trocaram o parceiro de Marx pelo filósofo alemão, no que poderia ser considerado,digamos assim, um crime epistêmico. E ainda cometeram o deslize de citar Nietzsche, o filósofo do niilismo. O dado desconcertante é que Nietzsche dizia que "não existem fatos, apenas interpretações".

    "Se tentaram matar a jararaca, não bateram na cabeça, bateram no rabo. A jararaca tá viva, como sempre esteve." Essa foi a frase completa de Lula, ao reagir à condução coercitiva para depor, há duas semanas. Dois dias depois, a bazófia recebeu uma insperada reprimenda do então bispo auxiliar da Arquidiocese de Aparecida, dom Darci José Nicioli. "É hora de voltar à casa do Pai. Pisar a cabeça da serpente. De todas asserpentes. Anular a força do mal e vencer o mal pelo bem. Coragem", declarou Nicioli, abençoando o trabalho de combate à corrupção. Lula e o PT perdem o apoio da Igreja,cuja ala mais liberal sempre lhes foi dócil, e também estão perdendo terreno em outra

    seara antiga: os artistas, que, como a atriz Juliana Paes, têm gravado vídeos contra o atual estado de coisas.A fragilidade política de Dilma e os percalços crescentes de Lula reanimaram os

     caciques do PMDB e do PSDB que trabalham pela queda do governo. Eles se reuniram para discutir cenários. O presidente do PSDB, senador Aécio Neves, defendeu como solução mais viável o impeachment da presidente, que, se aprovado, deixaria o comando do país nas mãos do vice-presidente Michel Temer. Os tucanos querem derrubar os petistas, mas não desejam assumir o governo num quadro de recessão econômica, desemprego einflação crescentes. Na sexta-feira passada, em entrevista coletiva, Dilma manteve em aberto a possibilidade de Lula assumir o ministério e aproveitou para negar queesteja pensando em renunciar. Com sua habitual inabilidade política, introduziu no vocabulário de Brasília uma palavra da qual qualquer governante fraco faz tudo para passar longe Ð renúncia.

    A questão central, no entanto, é que o destino pessoal de Lula ou de Dilma é praticamente irrelevante quando confrontado com o destino do Brasil. A crise, que abala o governo e o nome mais popular do PT, está arranhando o país, cuja economia seencontra paralisada e sem perspectivas de melhora a curto prazo, o que resulta em prejuízo para o conjunto dos brasileiros, ricos ou pobres. É desse veneno ofídico que o Brasil precisa escapar para retomar o caminho das nações estáveis, prósperas e ao mnos um pouco otimistas com o próprio futuro.

    O OFIDIÁRIO DE LULAÀs cobras criadas do ex-presidente cabem a defesa incondicional do chefe e o ataque implacável aos seus inimigos

    Paulo Okamotto

    JARARACA-VERDEO presidente do Instituto Lula é também o fiel escudeiro do petista para assuntos financeiros, guardião e administrador das "verdinhas" da família. A força-tarefa da Lava-Jato chegou a pedir sua prisão preventiva pela prática de organização criminosa, mas opedido foi negado na semana retrasada pelo juiz Moro.

    Jaques WagnerJARARACA-DA-PRAIAO sempre bronzeado ex-governador da Bahia, com sua fala mansa e fama de jeitoso, é o negociador de Lula por excelência. Nessa função, faça chuva ou faça sol, o chefe d

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    a Civil do governo Dilma atua tanto em território adversário quanto no campo amigo.

    Renan CalheirosJARARACA-DO-CERRADODesde que Lula o ajudou a livrar-se da cassação de mandato, o (novamente) presidente do Senado está ligado a ele por um pacto de sangue selado em meio ao cerrado da capital federal. Peemedebista e petista compartilham interesses comuns, nem todos confessáveis.

    Gilberto CarvalhoJARARACA-DO-CAMPOO melhor amigo do MST é, para Lula, o perfeito pau para toda obra. Gilbertinho, como é chamado pelo patrão, toma broncas homéricas e públicas de Lula, e no seu governo ea chefe de gabinete. Jamais recusa uma missão dada por ele, mesmo as mais penosas. 

    Ricardo BerzoiniJARARACA-PINTADAO ex-sindicalista, ex-presidente do PT e hoje ministro de Dilma é o ponta de lança da tropa de choque lulista. Especializado em confrontos e aloprações, está sempre pintado para a guerra.

    Rui FalcãoJARARACA-DE-BARRIGA-VERMELHA

    No PT, Lula manda e ele executa. Rui Falcão é o braço-direito do ex-presidente no partido. Sua missão: garantir que a sigla da bandeira vermelha e da estrela branca trabalhe a serviço dos interesses do chefe.

    AS FRENTES CONTRA LULADenunciado na quinta passada no caso Bancoop/tríplex, o ex-presidente ainda é investigado em outros três processos

    Caso: BANCOOP/TRÍPLEXStatus de Lula: DENUNCIADOQuem investiga: Ministério Público de São PauloO órgão ofereceu denúncia contra o ex-presidente pelos crimes de lavagem de dinheiro e falsidade ideológica. Lula é suspeito de tentar ocultar a propriedade de um tríplex n

    o Guarujá (SP), adquirido por meio da Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop)

    Caso: VENDA DE MEDIDAS PROVISÓRIASStatus de Lula: INVESTIGADOQuem investiga: Operação ZelotesA Polícia Federal, no âmbito da Operação Zelotes, apura a participação do petista no ca duas medidas provisórias que beneficiaram a indústria automobilística. Os investigadores suspeitam que elas tenham sido "vendidas" a representantes do setor por agentes do governo

    Caso: PETROLÃOStatus de Lula: INVESTIGADO

    Quem investiga: Lava-JatoA força-tarefa da Lava-Jato apurou que Lula teve despesas pessoais e vantagens patrimoniais pagas pelas empreiteiras beneficiadas no petrolão

    Caso: FAVORECIMENTO À ODEBRECHTStatus de Lula: INVESTIGADOQuem investiga: Ministério Público FederalO órgão apura o pagamento de 7 milhões de reais ao ex-presidente pela Odebrecht. Em troca, ele teria interferido junto ao BNDES para que a empreiteira obtivesse empréstimos para realizar obras no exterior

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    3#2 PRÍNCIPE CONDENADOSentenciado a quase vinte anos de prisão, Marcelo Odebrecht, dono da maior empreiteira do país, negocia com a Justiça contar o que sabe em troca de redução da pena.ULLISSES CAMPBELL

      O EMPRESÁRIO Marcelo Odebrecht sempre imaginou que sua estada na carceragem da Polícia Federal seria curta. Tanto que, desde que foi preso, há nove meses, nuncateve mais do que umas poucas mudas de roupa na cela. Na semana passada, essa perspectiva ruiu. O "príncipe dos empreiteiros" foi condenado pelo juiz Sérgio Moro a dezenove anos e quatro meses de cadeia por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e associação criminosa. Depois da sentença, familiares providenciaram uma mala cheia de roupas, incluindo agasalhos para o inverno.

    Nas 234 páginas de sua sentença, o juiz Moro descreve com base em uma profusão de documentos como a empreiteira de Marcelo transferia dinheiro de propina para contas secretas de dirigentes da Petrobras (veja o quadro) em troca de favorecimento nos contratos com o governo. Entre junho de 2007 e agosto de 2011, a Odebrecht pagou 16,3 milhões de dólares de suborno a Paulo Roberto Costa, Renato Duque e Pedro Barusco, ex-funcionários da estatal que agiam em benefício próprio e no interesse de partidos políticos. No período, a Odebrecht amealhou contratos públicos que somam mais de 17 bilhões de reais. Além dos documentos que embasam a sentença, dois delatores Ðo doleiro Alberto Youssef e o ex-presidente da Camargo Corrêa Dalton Avancini Ð confirmaram a existência do esquema entre a Odebrecht e os dirigentes da Petrobras.

    Para enfrentar o processo no qual acaba de ser condenado, Marcelo Odebrecht cercou-se de uma formidável banca de advogados, composta de 22 profissionais. A tropa protagonizou um dos mais duros embates com o juiz Moro nesses dois anos deLava-Jato, dentro e fora dos autos. Tentou anular provas acolhidas por ele, organizou abaixo-assinados e divulgou comunicados públicos acusando o magistrado de parcialidade. Moro incluiu nos autos a sua resposta: "O questionamento da imparcialidade consiste em uma tentativa de desviar, de modo inapropriado, o foco das provas contra os acusados para uma imaginária perseguição", escreveu.

    Diante da sentença condenatória, Marcelo Odebrecht, que sempre refutou a ideiade colaborar com a Justiça, mudou de planos. Um de seus principais advogados afirmou a VEJA que ele já iniciou as tratativas para um acordo de delação premiada, que pode virar uma devastação generalizada. O acerto talvez signifique a diferença entre voltar para casa em breve e ter de ficar ao menos mais dois anos na cadeia (consider

    ando que cumpra pelo menos um sexto da pena determinada por Moro, como faculta a lei aos presos de bom comportamento e sem antecedentes criminais).Marcelo Odebrecht tem poucas escolhas, ou talvez nenhuma. Ao menos cinco ex

    -funcionários seus já se encontram em conversas com o Ministério Público para se tornarm delatores, como a ex-secretária Maria Lúcia Tavares, responsável pelo transporte dos "acarajés", como os diretores da empreiteira se referiam ao dinheiro de propina.O empreiteiro sabe que está encurralado. E que o inverno está logo aí.

    "CLARAS COMO A LUZ DO DIA"Os registros das transferências de dinheiro da Odebrecht para executivos da Petrobras obtidos pela Lava-Jato constituem, nas palavras de Moro, provas documentais"claras como a luz do dia".

    ODEBRECHTContas offshore controladas pela empreiteira: Smith & Nash, Arcadex Corporatione Havinsur S.A.Contas offshore que receberam depósitos milionários de outras controladas pela Odebrecht: Del Sur, Klienfeld e Ihnovation ResearchDe junho de 2007 a agosto de 2011 - TOTAL: 16,3 milhões de dólares

    Contas offshore beneficiadasSagar Holdings, Quinus Service e Sygnus Assets: 11,4 milhões de dólares. Controladas por Paulo Roberto Costa.

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    Milzart Overseas: 2,7 milhões de dólares. Controladas por Renato Duque.Pexo Corporation: 2,2 milhões de dólares. Controlada por Pedro Barusco.

    3#3 ÓDIO ALIMENTADOSérgio Moro, o juiz da Lava-Jato, tem a segurança pessoal reforçada pela Polícia Federa depois de receber telefonemas e mensagens com ameaças de morte.RODRIGO RANGEL

    El Carmo3.207 TweetsEl Carmo @ElCarmo 1hChega de palhaçada de acreditar na democracia da direita. MATEM O MORO.

    El Carmo @ElCarmo 1hTenhamos coragem MATEMOS MORO e acabemos com esta festa.

    El Carmo @ElCarmo 1hNunca pensei que iria ver três golpes neste país.

      MESMO COM A OPERAÇÃO Lava-Jato já debruçada sobre políticos influentes e empresáriderosos, o juiz Sérgio Moro sempre resistiu a qualquer mudança de rotina. Apesar dos alertas para cuidar da própria segurança, prosseguiu fazendo rigorosamente tudo o que fazia antes de assumir os processos e enfrentar a corrupção. Moro ia trabalhar de

     bicicleta. Frequentava restaurantes e shoppings de Curitiba e corria, sozinho,pelas ruas da cidade. Com o passar do tempo, aceitou fazer algumas concessões. Aposentou a bicicleta, passou a evitar programas familiares em lugares públicos e trocou o cooper ao ar livre pela esteira de uma academia. Mas nunca admitiu andar com escolta, embora estivesse no centro de uma atividade naturalmente fadada a despertar rancores. Por mais de uma vez, a Polícia Federal lhe ofereceu proteção. Sempre que ouvia a sugestão, o magistrado repetia uma pergunta: "Há alguma ameaça concreta?". Não havia, mas aparentemente agora há. Desde a semana passada, Moro está sob a proteçde uma equipe de agentes altamente treinados.

    Fazia tempo que o juiz era alvo de ataques virtuais, a exemplo do que aconteceu com o ex-ministro Joaquim Barbosa durante o julgamento do processo do mensalão. Mas nada que fosse suficiente para fazê-lo mudar de conduta. O ponto de inflexãobrotou com a decisão de mandar a Polícia Federal conduzir o ex-presidente Lula para

    depor sobre suas ligações com o petrolão, na sexta-feira 4. A ordem de Moro, expedidacomo parte da 24    fase da Operação Lava-Jato, atiçou a militância petista mais radical muitos casos, pode ser apenas histeria, dada a facilidade de gritar nas redes sociais. Do ponto de vista policial, contudo, impõem-se cautela e atenção. Ainda no diada condução coercitiva de Lula, à medida que o ex-presidente e outros hierarcas do PTsubiam o tom do discurso, mais agressivas se tornavam as ameaças da tropa cibernética.

    Pelo menos três desses ataques resultaram em abertura de inquérito por um motivo muito simples: incitaram, entre outras barbaridades, ao assassinato do juiz da Lava-Jato. "Chega de palhaçada de acreditar na democracia de direita. Matem o Moro", escreveu no Twitter um agressor já identificado. "Tenhamos coragem. Matemos Moro e acabemos com esta festa", emendou o militante. "Todos de esquerda nas ruasjá e com armas! É guerra civil", postou outro radical no Facebook. "Matar o Moro e t

    odos os fascistas. É guerra", prosseguiu. Mensagens desse quilate puseram a políciae Moro em alerta. A "ameaça concreta" que o juiz paranaense dizia inexistir despontou como uma possibilidade real. Prudência agora é o nome do jogo. Desde aquela sexta-feira em que Lula depôs numa sala do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, agentes da Polícia Federal se revezam num esquema ostensivo ao redor de Moro. Em paralelo, policiais rastreiam a origem das ameaças e de telefonemas que o magistrado tem recebido. "Identificaremos todos eles", disse a VEJA um investigador que trabalha no caso.

    Enquanto resistia à ideia de aceitar proteção, Moro sustentava que, não havendo umrisco real e iminente, não tinha por que se privar Ð e privar sua família Ð da liberdad

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     de antes. Em conversa pouco amistosa em meados do ano passado, um delegado ponderou a Moro que, mesmo sem o risco imediato, era preciso tomar cuidados extras.O juiz nunca acreditou que os investigados da Lava-Jato Ð políticos, empreiteiros, lobistas Ð pudessem algum dia encomendar um atentado contra ele. Não há indício algum dese tipo de postura dos investigados, e ao menos a esse ponto o Brasil não chegou.Em tom grave, o delegado alertou o juiz: "Há sempre o risco de um militante fanático fazer algo por conta própria". A proteção extra que Moro finalmente aceitou na semana passada não é exagerada. Por mais que as ameaças tenham surgido no conflagrado territóio da internet, é sempre bom podar o perigo na raiz.

    Na Itália do início dos anos 1990, na esteira da Operação Mãos Limpas, a versão ita da Lava-Jato que desmontou a máfia, os juízes Giovanni Falcone e Paolo Borsellinocomeçaram recebendo ameaças por cartas e telefonemas, numa era pré-digital. Acabaram,ambos, assassinados. "Não queremos nada semelhante aqui, e por isso insistimos naproteção a Moro", diz um policial envolvido no esquema de segurança.

    A pessoas próximas, o juiz revela seu desconforto com o reforço na segurança Ð o qe ele chama, eufemisticamente, de "restrições à minha liberdade". Mas não é disso que M mais reclama. O juiz se incomoda com o que, na visão dele, está na origem das ameaças: o discurso de ódio difundido na retórica oficial e em sites da internet patrocinados com dinheiro do governo. A ofensiva de um lado resulta, evidentemente, em agressividade do outro, numa guerra que racha o país. Nos últimos dias, imagens montadas e textos foram espalhados na internet para acusar Moro de agir politicamente.Uma dessas colagens mostrava o juiz ao lado do senador tucano Aécio Neves Ð um dos difusores da mensagem é funcionário do Palácio do Planalto. Os ataques não pouparam nem s familiares de Moro. Um texto apócrifo dizia que seu pai, já falecido, foi um dos f

    undadores do PSDB no Paraná. Mentira. A mãe do juiz foi hostilizada em uma solenidade em comemoração ao Dia da Mulher. Sem falar nos falsos dossiês (veja o quadro). Os juíes italianos que conduziram a Mãos Limpas sofreram ataques semelhantes. Não se deve, a bem da correção histórica, igualar sem ressalvas o Brasil de hoje à Itália dos anos 0. Mas pede-se cuidado para que uma investigação legítima não seja alvo de agressões anemocráticas.

    CASO DE POLÍCIA  A Polícia Federal vai abrir um inquérito para investigar os responsáveis pela produção de um dossiê fajuto contra o juiz Sérgio Moro e os principais delegados e procuraores que trabalham na Operação Lava-Jato. Como VEJA mostrou na semana passada, o documento, elaborado por agentes da própria Polícia Federal, foi entregue em novembro do ano passado ao ministro Jaques Wagner, chefe da Casa Civil, durante uma audiênci

    a no Palácio do Planalto. O portador do papelório foi o policial Flávio Werneck, vice-presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) e presidente do Sindicato dos Policiais Federais no DF. O dossiê usa informações distorcidas para apontar ligações do juiz e dos investigadores com o PSDB - e, com boas doses de surrealismo distribuídas em suas seis páginas, conclui que as descobertas dos desvios milionários do petrolão não passam de uma conspiração contra o governo e o PT. Citado nas investiações da Lava-Jato e um dos principais encarregados da estratégia de salvar o governoe o partido das consequências da operação, Jaques Wagner agradeceu o presente e prometeu providências. O dossiê, ao que tudo indica, era a gênese de mais uma operação alopra típica do submundo petista, que tinha como objetivo tumultuar as investigações a partir do constrangimento do juiz, dos delegados e dos procuradores.

    A audiência do policial-sindicalista com o ministro não foi registrada na agenda oficial. A ideia era que tudo ficasse em segredo. Uma vez descoberta a trama,

    coube aos envolvidos negar o encontro e, mais ainda, tentar desmentir qualquerligação com o dossiê. Em carta a VEJA, Jaques Wagner informou desconhecer o papelório. Desconheço e não me interessa conhecer", disse o ministro. Werneck, por sua vez, declarou que se reuniu com o ministro para tratar de interesses corporativos da categoria. A VEJA, porém, ele afirmara outra coisa, bem diferente. Em entrevista gravada, admitiu ter levado o dossiê a Jaques Wagner e ainda fez duras críticas à Lava-Jato, que, segundo ele, "vem pegando pontos-chave de empresas e do governo", o que"afeta diretamente a economia". Em breve, Werneck será chamado a depor no inquéritoque vai apurar o que há por trás do dossiê. De partida, há a certeza de que a intenção nvolvidos, claro, era minar a Lava-Jato.

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    Hugo Marques

    3#4 MAIS UM LISTÃOOtávio Azevedo, ex-presidente da Andrade Gutierrez, acusou Ricardo Berzoini, ministro da coordenação política, de negociar propina em obras federais. E disse que Edinho Silva, da Comunicação Social, pediu dinheiro para a campanha de 2014e foi informado sobre "doações" oriundas do petróleo.ROBSON BONIK

      DAS GRANDES empreiteiras envolvidas no escândalo de corrupção na Petrobras, a Andrade Gutierrez foi a primeira a decidir contar seus segredos. Durante quase umadécada, Otávio Azevedo presidiu o que é hoje um vasto conglomerado, expandiu seus negócos para a área de energia, saneamento, transportes e tecnologia, e passou a atuarem quatro continentes Ð crescimento combinado com as boas relações que sempre mantevecom o poder, especialmente a partir de 2003, quando Lula chegou ao governo. Preso e acusado de pagar propina a políticos envolvidos no escândalo do petrolão, Otávio Azvedo assinou um acordo de delação premiada com a Justiça. Em troca da liberdade, comprometeu-se a contar detalhes da relação simbiótica que, por mais de uma década, transforou políticos em corruptos e empresários em corruptores. As revelações do executivo forncem evidências que não deixam dúvidas sobre a natureza dos governos de Lula e Dilma Rousseff. Ambos tinham na corrupção um pilar de sustentação.

    Em sua confissão, Otávio Azevedo contou que pagar propina por obras no governopetista era regra em qualquer setor Ð e não uma anomalia apenas da Petrobras. Nos de

    poimentos prestados pelo empreiteiro aos investigadores da Procuradoria-Geral da República são descritas transações associadas ao nome de alguns dos políticos mais infntes do país. Combinados a um calhamaço de demonstrativos bancários, minutas de contratos e registros de reuniões secretas, os relatos produzem um acervo sobre o grau de contaminação dos governos petistas. Estão envolvidos ministros, ex-ministros, ex-governadores e parlamentares de múltiplos quilates. Eles negociaram pagamentos milionários de propina com a empreiteira e, com isso, vilipendiaram o mais sagrado dos rituais em uma democracia: o processo eleitoral. A lista de Otávio Azevedo deixa em péssima luz tanto o ex-presidente Lula quanto a presidente Dilma Rousseff. Todosos comprometidos nas maquinações narradas pelo empreiteiro são figuras presentes na intimidade do ex e da atual mandatária do Planalto.

    No governo Lula, segundo ele, cobrava-se propina de 1% a 5% das empreiteiras interessadas em participar dos consórcios que executavam as obras do Programa de

     Aceleração do Crescimento (PAC). O negociador do pacote de corrupção, de acordo com o mpreiteiro, era Ricardo Berzoini, atual ministro da coordenação política. O executivocontou que, certa vez, a cúpula da Andrade Gutierrez foi procurada por Berzoini, que se apresentou como representante do PT para resolver pendengas financeiras. Em outras palavras, o petista era o encarregado de acertar o recebimento de "comissões" por contratos no governo. O ministro, durante bom tempo, foi responsável pela administração da "conta corrente" das obras de Angra 3 e da hidrelétrica de Belo Monte.

    O setor elétrico, como a Lava-Jato já descobriu, era um dos grandes vertedoresde dinheiro sujo para os cofres do PT. As empreiteiras eram achacadas em todas as fases, e por personagens distintos. Berzoini cobrava depois de assinados os contratos. Antes disso, ainda na fase de estudos, apareciam outros figurões do partido para "ajudar" nas negociações. Segundo o empreiteiro, Erenice Guerra, ex-chefe da

     Casa Civil de Lula e braço-direito de Dilma, e Antonio Palocci, ex-chefe da CasaCivil de Dilma e braço-direito de Lula, auxiliavam as empreiteiras na formação dos consórcios que mais tarde executariam as obras. Cobravam 1% de propina pelo serviço. Só depois disso os projetos destravavam, os preços ficavam dentro do que as empreiteiras queriam e todos, exceto os contribuintes, saíam ganhando.

    Em janeiro passado, VEJA revelou que Otávio Azevedo havia sido alvo de uma abordagem nada republicana durante a campanha presidencial de 2014. O executivo contou que foi procurado pelo tesoureiro Edinho Silva, hoje ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, e por Giles Azevedo, ex-chefe de gainete e atual assessor especial de Dilma. Os dois queriam dinheiro, mais dinheir

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    o, 100 milhões a mais do que a quantia que a empreiteira havia combinado "doar" à campanha. Da negociação, sabe-se agora, surge uma evidência mais grave. Para explicar que não podia atender ao pedido, Azevedo explicou que os "acertos" da Petrobras já haviam sido repassados. O tesoureiro e o assessor disseram que isso era outra coisa. Ou seja, Edinho e Giles, ao menos naquele instante, foram informados sobre a existência de repasses oriundos do petrolão. Não se surpreenderam ou não se interessaram Como a pressão continuou, a Andrade "doou" mais 10 milhões à campanha petista.

    A roubalheira não poupou as obras dos estádios para a Copa de 2014. Em sua lista, Azevedo incluiu como beneficiários de propinas cinco ex-governadores de estados que sediaram o Mundial. Todos embolsaram "comissões" para favorecer a empreiteira na construção das arenas e na realização de outras obras relacionadas à Copa. Otávio Ao admite o pagamento de propina aos ex-governadores do Distrito Federal José Roberto Arruda (então no DEM) e Agnelo Queiroz (PT), responsáveis pelas obras do Estádio Nacional Mané Garrincha, um monumento ao superfaturamento que custou quase 2 bilhões de reais. Ele também disse ter pago propina a Sérgio Cabral, ex-governador do Rio deJaneiro, a Eduardo Braga (PMDB), ex-governador do Amazonas e atual ministro de Minas e Energia, e a Omar Aziz (PSD), hoje senador. Otávio Azevedo foi transferidopara prisão domiciliar após entregar a lista de seus "clientes" famosos. A empreiteira também aceitou pagar uma multa de 1 bilhão de reais.

    Criticados no início da Lava-Jato, os acordos de delação foram, sem dúvida, fundamntais para o sucesso das investigações. Através deles, quebraram-se pactos de silêncio,localizaram-se contas secretas no exterior, figurões e figurinhas foram parar na cadeia. Em busca da liberdade ou da redução da pena, outros envolvidos entraram na fila para contar o que sabem. Na semana passada, advogados da Odebrecht e da OAS e

    stiveram em Curitiba conversando com o Ministério Público sobre a possibilidade de seus clientes serem admitidos no programa. Marcelo Odebrecht está condenado a dezenove anos e quatro meses de prisão. Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, a dezesseis anos e quatro meses. Além deles, buscam o acordo o marqueteiro João Santana, que recebeu dinheiro sujo como pagamento de serviços eleitorais a campanhas do PT, o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula e envolvido até o pescoço no petrolão, e o senaor petista Delcídio do Amaral.

    Não será uma negociação fácil: o esquema de corrupção na Petrobras está praticamenesvendado. Falta apenas confirmar quem era o chefe, o mandante. Ou seja, os benefícios serão concedidos a quem ajudar os procuradores a chegar lá. Todos os investigados têm informações que podem levar ao topo da cadeia de comando. A dúvida é saber quem  tomar a iniciativa de falar primeiro. O senador Delcídio está na frente. Preso em novembro do ano passado por atrapalhar as investigações, ele revelou que tanto Dilma

    quanto Lula sabiam e se beneficiaram do petrolão. O petista narrou detalhes de negócios fraudulentos realizados pelo PT na China e em Angola, também citando os ex-ministros Antonio Palocci e Erenice Guerra. Elencou, ainda, dezenas de políticos quereceberam dinheiro de corrupção Ð incluindo, de novo, o presidente do Congresso, Renan Calheiros, e os peemedebistas Romero Jucá, Jader Barbalho e Eunício Oliveira Ð e até u representante da oposição, no caso, o senador tucano Aécio Neves. Por fim, acrescentou uma nova história de extorsão ao currículo do ministro Edinho Silva. O então tesoureio de Dilma, de acordo com o senador petista, repetiu os métodos denunciados pela Andrade para arrancar dinheiro do laboratório EMS na campanha presidencial. Se tudo for verdade, faltará mesmo muito pouco para ser contado.

    A LISTAEm sua delação premiada, o ex-presidente da Andrade Gutierrez envolve ex-governadore

    s, senadores, ministros e ex-ministros dos governos Lula e Dilma em esquemas derecebimento de propinas.Ricardo Berzoini - Durante o governo Lula, o ministro reuniu-se com executivos da Andrade para exigir o pagamento de propinas ao PT. Recebia pixulecos por contratos da Petrobras e nas obras de Angra 3 e Belo Monte. O percentual girava entre 2% e 5%.Edinho Silva - Tesoureiro da campanha da presidente Dilma Rousseff em2014, o ministro reuniu-se com dois executivos da Andrade para cobrar doações durante as eleiçõe. Tinha conhecimento de que o dinheiro que financiou a campanha de Dilma era oriundo do pagamento de propina do petrolão e de outras obras públicas.

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    Giles Azevedo - Assessor especial da presidente Dilma, tinha conhecimento de que o dinheiro que financiou a campanha de 2014 era proveniente do pagamento de propina do petrolão e de outras obras públicas. Estava com Edinho Silva na conversa emque executivos da Andrade trataram abertamente de propina repassada à campanha petista.Sérgio Cabral - O ex-governador do Rio recebeu propina da Andrade Gutierrez por negócios na Petrobras e por contratos das obras da Copa de 2014.Agnelo Queiroz - O ex-governador do Distrito Federal recebeu propina da Andradepor contratos das obras da Copa de 2014 em Brasília.José Roberto Arruda - Também ex-governador do Distrito Federal, recebeu propina da Andrade por contratos das obras da Copa de 2014 em Brasília.Eduardo Braga - O ministro e ex-governador do Amazonas recebeu propina da Andrade Gutierrez por contratos das obras da Copa de 2014 em Manaus.Omar Aziz - Senador e ex-governador do Amazonas, recebeu propina da Andrade Gutierrez por contratos das obras da Copa de 2014 em Manaus.Edison Lobão - Ex-ministro de Minas e Energia e atual senador, recebeu propina em contratos do petrolão e do setor elétrico.Renan Calheiros - O presidente do Congresso recebeu propina em contratos do setor elétrico.Romero Jucá - O senador recebeu propina em contratos do setor elétricoEdison Lobão Filho - O ex-senador recebeu propina em contratos do setor elétrico.Erenice Guerra - Ex-chefe da Casa Civil do governo Lula, participou da operação que resultou no pagamento de 1% de propina ao PT na obra de Belo Monte.Antonio Palocci - Ex-ministro e coordenador da campanha de Dilma, em reunião com

    executivos da Andrade exigiu do consórcio de Belo Monte o pagamento de 1% do valor da obra em propinas ao PT.

    3#5 RESSACA BRAVAPara negar a falsificação de uma assinatura que beneficiou Eduardo Cunha, deputado diz ter problemas psicológicos e tomar drogas controladas, que mistura com bebida.MARIANA BARROS

      FOI UM DESFECHO à altura da novela. Ao longo de cinco meses, o presidente daCâmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e seus aliados perpetraram uma sucessão de chicanas regimentais destinadas a adiar a instauração de um processo contra ele no Conselho de Ética. No início deste mês, por 11 votos a 10, foram finalmente venci

    dos. O estoque de manobras havia chegado ao fim. Cunha, acusado de ter mentido à Casa quando negou ter contas na Suíça, terá agora de submeter-se ao escrutínio de seus pres. Na semana passada, o jornal Folha de S. Paulo revelou aquela que foi a última tentativa de seus apoiadores de adiar o processo Ð e ela não poderia espelhar melhor o clima que dominou os 141 dias que durou a interminável enrolação.

    O deputado Vinícius Gurgel (PR-AP), aliado de Cunha, sabendo que viajaria e não iria à sessão do Conselho de Ética que decidiu pela continuidade do processo, quis evitar que seu suplente, do PT, votasse contra o peemedebista. Para isso, renunciou ao cargo no conselho para que outro colega, esse alinhado a Cunha, assumisse o posto. Laudos feitos a pedido do jornal, no entanto, mostraram que a assinatura de Gurgel no documento de renúncia fora grosseiramente forjada.

    A fim de negar as suspeitas de falsificação, o deputado passou a desfiar um rosário de misérias íntimas. A assinatura seria dele, sim, mas não estaria