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Vigilância Sanitária
Marcos Vilela Ribeiro (1)
; Fernanda Junges (2)
.
(1) Autor. Farmacêutico Clínico Industrial. Universidade de Brasília – UnB.
(2) Orientadora: Farmacêutica graduada pela UFRGS, Especialista em Gestão de Assistência Farmacêutica
Pública pela UNB, Mestre em Ciências Farmacêuticas na área de Gestão de Assistência Farmacêutica pelo
Programa de Pós Graduação em Ciências Farmacêuticas da UFRGS.
RESUMO As ações de vigilância sanitária fazem parte de nossa sociedade desde as populações primitivas, sendo que
desde tempos remotos as populações promovem tentativas de se controlar o meio em que vivem. No Brasil a
implantação da vigilância sanitária se deu precipuamente com a vinda da família real ao país, porém foi só no final dos
anos 1980 que a vigilância sanitária ganha seu corpo jurídico e conceitual, devido à edição da Constituição da
República que dispõe ao Estado o dever de provedor da saúde, e em 1990 é criada a Lei Orgânica da Saúde (LOS)
conceituando suas ações. O campo de atuação da vigilância é muito vasto e isso gera uma grande complexidade em
realizar suas ações, demandando, dessa forma, um grupo de profissionais capacitados em promover a saúde e que
tenham, principalmente, características de trabalhos multidisciplinares. Com a caracterização jurídica da Vigilância
Sanitária passa-se a fazer tentativas de promover uma melhor efetividade das ações, não se resumindo a atividades
fiscalizatórias, e com isso são editadas algumas normas operacionais para promover a vigilância sanitária, chegando ao
modelo de descentralização das atividades de saúde, o que designa aos municípios a responsabilidade de realizar as
ações de vigilância sanitária. O objetivo deste trabalho é realizar uma revisão bibliográfica que trace o perfil histórico,
conceitos, atuação da Vigilância Sanitária no Brasil. Conclui-se neste trabalho que a atuação da Vigilância Sanitária
não deve focar apenas na ideia de simples recuperadora da saúde versus doença, mas sim focar sua atuação na
prevenção e promoção da saúde.
Palavras chaves: Vigilância Sanitária; Sistema Nacional de Vigilância Sanitária; Descentralização.
ABSTRACT The actions of health surveillance is part of our society from primitive people, and that since ancient times
people were advancing attempts to control the environment in which they live. In Brazil, one the first representation of
the Health Surveillance was made with the arrival of the Portuguese royal family to the country, but only at the end of
the 1980s that was the sanitary won its conceptual and legal body, because the edition of the Constitution of the
Republic that the state has the duty of the health provider, and in 1990 created the Organic Law of Health (LOS)
defining their actions. The field of action of monitoring is very wide and that creates a great complexity in performing
its actions, demands, thus, a group of trained professionals to promote health and have, above all, characteristics of
multidisciplinary work. With the legal characterization of health monitoring it is going to make attempts to promote
better effectiveness of actions, not to resuming the activities of surveillance, and with it some operational standards are
published to promote health surveillance, reaching the model of decentralization of activities of health, which refers to
municipalities the responsibility to carry out actions for health monitoring. The aim of this paper is to review literature
that trace the historical profile, concepts, performance of Health Surveillance in Brazil. We conclude this paper that the
performance of Health Surveillance should not just focus on the simple idea of recovering health versus disease, but
focus on its role in prevention and health promotion.
Keywords: Health Surveillance; National System of Health Surveillance; Decentralization.
1. INTRODUÇÃO
As ações de Vigilância Sanitária constituem a mais antiga atividade de Saúde Pública.
Desde tempos remotos as organizações sociais fazem tentativas de realizar o controle sobre os
pontos chaves da vida em coletividade e sobre as ameaças geradas à saúde e à própria vida
(COSTA, 2000).
Para Costa (2001) as ações de Vigilância Sanitária sempre existiram no Brasil, porém
com pouca expressão para a população, para os profissionais e gestores de saúde, ficando
marcada apenas as atuações policiais e burocrático-cartoriais. A ausência de políticas de
Vigilância Sanitária correlacionada às políticas públicas, a pouca vontade governamental para
a área da saúde coletiva, ao incipiente desenvolvimento científico e tecnológico aprofundaram
os problemas estruturais dos serviços de vigilância sanitária no Brasil.
A Vigilância Sanitária no Brasil teve seu marco fundamental no final dos anos 1980 e
início dos anos de 1990, visto que foi em 1988 que ocorreu a promulgação da nova
Constituição da República Federativa do Brasil, o que no campo da saúde tratou de introduzir
um novo conceito e uma nova amplitude de relações, atestando, desde sua promulgação, que a
saúde é direito de todos e dever do Estado provê-la (SOUZA E STEIN, 2007).
A vigilância sanitária, tal como foi introduzida no Brasil a partir do ano de 1988
engloba em suas atividades a regulação de uma variedade de produtos e serviços, de natureza
diversa. Esses produtos e serviços podem ser agrupados em grandes ramos como cita
Lucchese (2001):
“dos alimentos; dos medicamentos; dos produtos biológicos, tais como vacinas e
derivados de sangue; dos produtos médicos, odontológicos, hospitalares e
laboratoriais; dos saneantes e desinfestantes; dos produtos de higiene pessoal,
perfumes e cosméticos, além do controle sanitário dos portos, aeroportos e estações
de fronteiras e da ampla gama de serviços de interesse à saúde.”
A grande diversidade de produtos e serviços, listados acima, expressa os mais variados
tipos e graus de complexidade das tecnologias envolvidas na promoção da vigilância sanitária,
conferindo diretamente às ações de vigilância um alto grau de especialização, visto que essas
ações podem ser defrontadas com demandas simples ou muito complexas, exigindo da
vigilância sanitária conhecimentos variados e em diferentes disciplinas, demonstrando o seu
caráter transdiciplinar e multiprofissional (LUCCHESE, 2001; IVAMA e MELCHIOR,
2007).
A abrangente e complexa atividade de vigilância sanitária adquiriu em 1990 seu corpo
conceitual e jurídico com a edição da Lei 8.080, a qual ficou conhecida como a Lei Orgânica
da Saúde (LOS), muito embora as questões relacionadas à qualidade e à segurança de
produtos e serviços estejam correlacionadas ao período colonial, instalada com a chegada da
Corte Portuguesa ao Brasil (Brasil, 2001). A Lei 8.080/90 conceitua as ações de vigilância
sanitária como:
Um conjunto de ações capazes de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e
de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e
circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde, abrangendo o
controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se relacionam com a
saúde da população. (grifos nossos)
Uma questão a se enfatizar é que as ações de vigilância sanitária promovem a defesa e
a proteção da saúde coletiva o que diversas vezes faz oposição à classe hegemônica e
detentora do poder na sociedade, por exemplo, a burguesia dominante dos meios mercantis
que se relacionam com a saúde da população (SOUZA e STEIN, 2007).
Com o papel definido e escopo visando à eliminação, diminuição e prevenção de
riscos à saúde, a área de abrangência da vigilância sanitária age sobre os problemas sanitários
derivados do meio ambiente, da produção e circulação de bens e consumo e da prestação de
serviço que está ligada direta ou indiretamente com a saúde (Brasil, 2001).
Contudo, após a caracterização jurídica e conceitual das atividades de vigilância
sanitária, era preciso romper com o estigma da polícia sanitária e das ações cartoriais de
vigilância, que designava aspectos plenamente burocráticos e autoritários da vigilância
sanitária, impedindo a promoção das ações educativas em vigilância (Brasil, 2001).
O processo de descentralização das atividades de saúde se tornou um ponto chave para
a efetivação da saúde com um direito de todos os cidadãos e dever do Estado. Tal fato se
justifica por ser o município a instância apropriada para realizar as ações de saúde, já que é
esse ente que se insere com maior proximidade do cidadão e dos seus problemas. Desta feita,
a municipalização promove o conhecimento da responsabilidade do município pela saúde,
para com a saúde de seus munícipes (Rio Grande do Norte, 2007).
Com os processos de descentralização e municipalização das atividades de saúde,
diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), foram construídos novos meios para efetivar a
democratização da gestão e para a concretização das ações de vigilância sanitária, que tem
objeto o ambiente, a organização social e, principalmente, as ações centradas nas pessoas
(Brasil, 2001). As definições de competências são distribuídas para as três esferas do poder,
onde a gestão municipal deve executar suas ações segundo as Normas Operacionais Básicas
(NOB), visto que nessas normas estão elencadas as condições para realizar as
responsabilidades e prerrogativas que o gestor deverá assumir para as atividades que visam à
vigilância sanitária (SOUZA e STEIN, 2007).
Na atualidade o desafio para o setor saúde é acompanhar a ampliação das necessidades
da população, o que provém de interações de vários processos, como os de natureza
econômica, social, cultural, política e científico-tecnológica (COSTA, 2001).
2. OBJETIVO
O objetivo deste estudo foi traçar o perfil histórico e a atuação da Vigilância Sanitária
junto à sociedade na República Federativa do Brasil. Além de conceituar a Vigilância
Sanitária e definir suas funções e objetivos, seu campo de abrangência, verificar a sua
importância para a saúde da população, do consumidor e do meio ambiente e definir os
instrumentos para a efetividade das ações de Vigilância Sanitária.
3. MÉTODO
Para o desenvolvimento do presente projeto de pesquisa foram implantadas estratégias
de investigação, sendo que o método utilizado foi a revisão de material bibliográfico e a
análise crítica do mesmo.
Inicialmente foi feito o levantamento bibliográfico em banco de dados com o uso das
seguintes palavras-chaves: Vigilância Sanitária, Sistema Nacional de Vigilância Sanitária,
Financiamento da Vigilância Sanitária e Processo de Descentralização das Ações de
Vigilância Sanitária.
No segundo momento foram analisadas as informações relativas aos artigos obtidos e
feita uma revisão sistemática e analítica das caracterizações da Vigilância Sanitária.
Por fim foram compiladas as informações obtidas da revisão bibliográfica na forma de
redação, formulando assim uma linha temporal da estruturação, conformação e ação da
Vigilância Sanitária na República Federativa do Brasil.
4. HISTÓRICO
Existem relatos de casos nos quais indicam que as sociedades de eras remotas
demonstravam preocupações com o exercício médico, e não apenas com o estado de
conservação dos alimentos e medicamentos, mas também com a possibilidade de existência
de adulterações e falsificações dos mesmos. Como exemplo, relata-se que 16 séculos antes de
Cristo havia homens que tinham o domínio de técnicas para compor drogas, porém eles não
apenas produziam-nas, mas também tinham a atribuição de ensinar como empregar essas
drogas, como conservar e qual deveria ser seu prazo de validade [MCKREY (apud COSTA,
2000)]1.
Com o advento da Revolução Industrial foi constituída uma nova configuração social,
tornando as relações sociais mais complexas devido, principalmente, ao crescimento da
produção, do mercado e do consumo de produtos. Houve também a partir desse marco a
afirmação do individualismo, da liberdade e dos direitos, onde os trabalhadores, ditos “livres”,
deveriam tomar para si novas posições e consequentemente novos deveres no universo do
trabalho. Como contrapartida a esses processos foram implementadas também estratégias de
coletivização e ampliação do espaço público. O que se nota com todo esse arcabouço de
inovações é que as funções sociais vão se tornando mais diferenciadas e especializadas
[BODSTEIN (apud COSTA 2001)]2.
O Processo de “mercantilização” do setor saúde introduziu novos elementos ao
imbricado meio de ação da vigilância sanitária devido ao aumento da produção de itens
relacionados à saúde, com serviços e informações das mais variadas fontes, direcionados a
prevenção de doenças, promoção, preservação e recuperação da saúde (COSTA, 2000).
A experiência adquirida com fatos históricos afirma que o mercado não tem a eficácia
de se autorregular, tendo em vista que o modo de produção, centrado na mercadoria, suplanta
os direitos à saúde e com isso à vida. Então o reconhecimento da vulnerabilidade do
consumidor, no mercado de consumo, leva a obrigatoriedade de regulação das práticas
mercantis que gerem interesse à saúde humana (COSTA, 2000).
4.1. Vigilância Sanitária no Brasil
Segundo Bueno (2005) a história da Vigilância Sanitária brasileira se confunde com a
história de nosso país, história do medo da doença e da morte, um relato de tragédias e figuras
heroicas, de conquistas, desafios e perdas, uma espécie de creditação de resistência às
atrocidades geradas pela via do poder, à ignorância dos governantes, ao descaso das
autoridades sanitárias que em épocas remotas faziam o isolamento dos doentes o seu método
de cura, ou purificação. Além da inércia dos gestores a população estava sujeita às ações
1 MCKRAY, G. Consumer protection: The Federal Food, Drug and Cosmetic Act. In: ROEMER, R. &
MCKRAY, G. Legal aspects of health policy. Issues and trends. Conecticut, Greenwood Press, 1980. p. 173-
211.
2 BODSTEIN, R.C. de A. Complexidade da ordem social contemporânea e redefinição da responsabilidade
pública. In: Rozenfeld, S. (Org.). Fundamentos da Vigilância Sanitária. Rio de Janeiro, Editora Fiocruz, 2000, p.
63-97.
truculentas e com uso da violência para conter as comunidades revoltadas com a situação da
saúde pública.
As ações destinadas ao controle sanitário apresentam no Brasil um caminho ligado à
formação dos serviços sanitários iniciados no início do século XIX devido, principalmente, à
instalação da Família Real portuguesa em nosso território (PIMENTA, 2004).
Para Costa (apud COSTA; FERNANDES e PIMENTA, 2008) foi com a estadia da
Família Real portuguesa no Brasil que se deu inicio à fundação e criação de vários meios
normativos e diversos órgãos públicos os quais tinham a finalidade de exercer os serviços
sanitários. A singularidade desses serviços somente se consolidou como um saber específico
na área da Saúde Coletiva no final do século XX.
A história da Saúde Pública no Brasil foi impactada por vários conluios
administrativos e produção de muitas normas legais, porém tiveram pouca execução, ou seja,
pouca utilidade prática. Da instalação da família real portuguesa até a década de 1920,
República Velha, as ações de vigilância sanitária eram tidas como parte integrante da Saúde
Pública, sem distinção do que era cada uma [MACHADO et al, 1978; LUZ, 1982 (apud
COSTA, 2000)]3.
Em 1923 com o advento da primeira Constituição Republicana, foi estabelecido o
Regulamento Sanitário Federal como se fora um Código Sanitário que regulamentava os
diversos objetos de interesse da saúde, visto que essa primeira Constituição republicana em
nada abordou o tema da saúde em seu arcabouço legal (COSTA, 2000).
4.2. Da década de 1930 a 1960
As décadas de 1930 e 40 estabeleceram marcos importantes para a vigilância sanitária
no Brasil e para a saúde em geral. Com o Estado Novo (1930-45) foi apresentado um novo
projeto para promover o desenvolvimento econômico do Brasil, com isso a economia urbano-
industrial cresceu, representando uma pequena parcela da população, ampliando dessa forma
a segregação social [BRAGA e PAULA (apud COSTA, 2000)]4. Em 1934 e 1937
promulgam-se duas novas Constituições, porém essas reconheceram a saúde apenas como um
3 MACHADO, R.; LOUREIRO, A.; LUZ, R. e MURICY, K. Danação da norma: medicina social e
constituição da Psiquiatria no Brasil. Rio de Janeiro, Graal, 1978.
LUZ, MT. Medicina e ordem política brasileira: políticas e instituições de Saúde (1850-1930). Rio de Janeiro,
Graal, 1982.
4 BRAGA, JCS. e PAULA, SG. Saúde e previdência: estudos de política social. 2ª ed. São Paulo, Hucitec, 1986.
direito do trabalhador que possuía um emprego formal, ou seja, a saúde era direito apenas da
classe trabalhadora (COSTA, 2000).
No início da década de 1940 foi instituído o Serviço Nacional de Fiscalização da
Medicina, e nos anos 50 cria-se também o da Farmácia. Em 1945 houve a expansão das
indústrias farmacêuticas nacionais, devido à quebra das patentes de produtos farmacêuticos,
transformando assim a farmácia em um estabelecimento comercial (COSTA, 2000).
Em meados dos anos 50 foi criado um laboratório específico para a realização de
análises de drogas, medicamentos e posteriormente de alimentos, o Laboratórios Central de
Controle de Drogas e Medicamentos. No final do governo de Juscelino Kubitschek foi
promulgado o Código Nacional de Saúde, esse código designou uma grande abrangência às
ações de saúde (COSTA, 2000).
4.3. Dos anos de 1970 a 1988
Até os anos 1970 a Vigilância Sanitária não se apresentava de maneira visível ao setor
saúde, tendo suas ações desenvolvidas pelo Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e
Farmácia. As ações de vigilância sanitária eram desenvolvidas a nível estadual sob a
responsabilidade de órgãos congêneres ao Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina e
Farmácia, apesar de que suas atribuições não se limitavam apenas fiscalizar o exercício
profissional, como pode transparecer. Na esfera federal as atividades desenvolvidas com
maior primazia eram a regulamentação e registro de medicamentos, controle de importações e
circulação de produtos farmacêuticos e correlatos (COSTA; FERNANDES e PIMENTA,
2008).
O desenvolvimento econômico impulsionado pelo “milagre econômico” gerado no
pós-1968 gerou novas necessidades do Estado, tal qual, regulamentação para adaptação da
produção brasileira às exigências internacionais de qualidade de produtos. Soma-se a tal fato,
as questões sociais que havia mister de reestruturação nas políticas de saúde, e isso
impulsionou as reformas do setor saúde, levando consigo a vigilância sanitária (COSTA;
FERNANDES e PIMENTA, 2008).
Em 1975 foi implantada a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Consumidor,
que tinha o objetivo de averiguar as questões comerciais abusivas das indústrias farmacêuticas
e suas políticas de introdução de novos produtos no mercado. A notoriedade dos feitos
realizados por essa CPI foi de grande valia e, provavelmente, com a estratégia de diminuir as
suas conseqüências, o governo federal então propôs uma nova legislação que veio a constituir
a chamada Lei de Vigilância Sanitária, Lei 6.360, que fora promulgada em 1976 [COSTA
(apud COSTA; FERNANDES e PIMENTA, 2008)]5.
Conforme mencionam Costa, Fernandes e Pimenta (2008) a Lei 6.360 significou um
avanço na conformação da vigilância sanitária, pois se insere como parte central de
modernização da legislação voltada para a área da saúde no nível de federação, e obteve forte
influencia de organismos internacionais na sua implementação, tais como Organização
Mundial de Saúde (OMS) e Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS). Essa lei “dispõe
sobre vigilância sanitária a que ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos
farmacêuticos e correlatos, cosméticos, saneantes e outros produtos”, desta forma, ela se
apresenta como ação permanente e rotineira dos órgãos de saúde de modo integrado com as
várias outras esferas de gestão.
Durante os anos de 1970 foram introduzidas várias outras legislações no sistema legal
brasileiro tais como a Lei 5.991/73, que “dispõe sobre o controle sanitário do comércio de
drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos”, a Lei 6.368/76 que “dispõe
sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias
entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica”, a Lei 6.437/77 que
“configura infrações à legislação sanitária federal, estabelece as sanções respectivas”
(COSTA; FERNANDES e PIMENTA, 2008).
Segundo Costa, Fernandes e Pimenta (2008) uma outra questão importante na década
70, foi a modificação da terminologia “fiscalização” para “vigilância”, o que demonstra um
novo conceito, visto que o termo “vigilância” remete às ações destinadas a precaução, cuidado
e prevenção, constituindo assim uma noção mais abrangente do que as ações demandadas
pelo termo “fiscalização” que é apenas de controle e punição. Tal modificação foi devido à
criação da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS/MS) em 1976, que foi gerada
em conseqüência à reformulação do Ministério da Saúde (MS).
Conforme relata Costa (apud COSTA; FERNANDES e PIMENTA, 2008), a
instituição dessa nova Secretaria e a compilação de suas competências deu nova visão à
vigilância sanitária, tornando-a mais importante, no âmbito da Saúde Pública, porém com essa
nova secretaria foi promovida a separação entre a Vigilância Sanitária e a Vigilância
Epidemiológica, visto que se localizaram em espaços institucionais distintos no MS.
Apesar das grandes mudanças ocorridas com a promulgação das novas legislações e
com a nova instituição ministerial, a Vigilância Sanitária, conforme afirma Costa (apud
5 Costa, E.A. Vigilância Sanitária: proteção e defesa da saúde. 2ª ed. São Paulo: Sobravime; 2004.
COSTA; FERNANDES e PIMENTA, 2008), ainda se apresentava de forma isolada das
demais ações de saúde, distante da população e marcada pela centralização de suas ações e
forte autoritarismo para com as instâncias estaduais.
Em meio às idéias de Reforma Sanitária, que permeou a década de 80, surgiram
algumas preocupações, tais como fazer a integração das ações entre os níveis hierárquicos das
esferas federal, estaduais e municipais, como também resolver os problemas de capacitar seus
trabalhadores (COSTA; FERNANDES e PIMENTA, 2008).
Costa (2000) diz que:
“No movimento pela redemocratização do país cresceram os ideais pela reforma da
sociedade brasileira envolvendo diversos atores sociais, sujeitos coletivos e pessoas
de destaque. Os consumidores “apareceram” no cenário político e sanitaristas
ocuparam postos importantes no aparelho de Estado. A democratização na saúde
fortaleceu-se no movimento pela Reforma Sanitária, avançando e organizando suas
propostas na VIII Conferência Nacional de Saúde de 1986 que deu as bases para a
criação do Sistema Único de Saúde.”
A maioria dos pontos discutidos durante a VIII Conferência Nacional de Saúde foi
admitida no processo Constituinte de 1988, o qual foi pressionado pelos movimentos sociais
tentando a afirmação dos direitos sociais no período pós-ditadura, que por fim teve
proclamado no artigo 196 da Constituição que “a saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e
de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção,
proteção e recuperação” [LIMA et al; e GERSCHMAN (apud COSTA; FERNANDES e
PIMENTA, 2008)]6.
Na mesma Constituição é criado o SUS, que outorga maior visibilidade às ações de
vigilância sanitária, tornando-a integrante da normatização jurídica da saúde, proibindo a
comercialização de sangue, reconhecendo o direito à informação, determinando a defesa do
consumidor, e deferindo ao Poder Público algumas atribuições para controlar os riscos
sanitários. A sociedade brasileira obteve um imenso avanço em relação à cidadania, porém é
6 Lima N, Fonseca C, Hochman G. A saúde na construção do Estado Nacional no Brasil. In: Lima N, Gerschman
S, Edler FC, Suarez JM, organizadores. Saúde e democracia – história e perspectivas do SUS. Rio de Janeiro:
Fiocruz; 2005.
Gerschman S. A democracia inconclusa: um estudo da Reforma Sanitária brasileira. Rio de Janeiro: Fiocruz;
2004.
necessário apontar que a proteção e promoção da saúde são de responsabilidade pública o que
implica dizer que é competência de todos os cidadãos do país (COSTA, 2000).
4.4. Anos de 1990
A década de 90 é institucionalizada pela contrariedade da saúde ao projeto neoliberal7.
Segundo Mendes (apud COSTA, 2000)8 a cultura desenvolvida no Brasil é a paternalista-
autoritária o que gera uma diminuição do ímpeto social na participação do desenvolvimento
de uma política de saúde pública, o que promove crises no SUS, e desta forma o setor privado
de saúde começa a obter uma maior parcela da população e por conseguinte desenvolve uma
maior capacidade de pressão política.
Com a fragilidade na área da saúde insurge-se a crise sanitária que é derivada de várias
circunstâncias, tais como desumanização do atendimento nos serviços públicos, filas e falta de
atendimentos, desta forma o cenário se torna insustentável quando ocorrem episódios de
mortes evitáveis, de falsificações e de comércio ilegal de medicamentos, todos esses fatores
incitam às modificações e à reforma institucional (COSTA, 2000).
A reforma institucional então ocorreu em 1999 culminando com a criação da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) sob a Lei 9.782, sendo essa uma entidade que
funcionaria sob a forma de uma agência reguladora, conferindo-lhe uma administração
pública gerencial orientada por resultados. Seu modelo institucional se baseia em três
“pilares” que são independência financeira, autonomia administrativa e estabilidade dos
dirigentes (COSTA, 2000). Na Lei de criação da ANVISA fica clara em seu artigo 6º qual é
sua finalidade institucional:
“A Agência terá por finalidade institucional promover a proteção da saúde da
população, por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de
produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos
processos, dos insumos e das tecnologias a eles relacionados, bem como o controle
dos portos, aeroportos e fronteiras.” (grifos nossos)
Além disso fica a cargo da ANVISA a coordenação do Sistema Nacional de Vigilância
Sanitária (SNVS) e também as ações de vigilância sanitária realizada por laboratórios da Rede
7 Neoliberal é a absoluta liberdade de mercado e uma restrição a intervenção estatal na economia, só devendo
esta ocorrer em setores imprescindíveis e ainda assim em um grau mínimo (Hauaiss). 8 MENDES, E.V. As políticas de saúde no Brasil nos anos 80: a conformação da reforma sanitária e a construção
da hegemonia do projeto neoliberal. In: MENDES, EV., Org. Distrito Sanitário: o processo social de mudanças
das práticas sanitárias do Sistema Único de Saúde. São Paulo, Hucitec/Abrasco, 1993. P. 19-91
Oficial de Laboratórios de Controle de Qualidade em Saúde Integrante do SUS (COSTA,
2000).
5. CONCEITO DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA
Com a assunção pela Constituição brasileira de 1988 de tornar a saúde um direito de
todos os seres humanos, independentemente de condição social e se possui ou não uma
relação empregatícia, e apregoar ao Estado o dever de ser o provedor da saúde, a conceituação
de vigilância sanitária, constante na Lei 8.080 de setembro de 1990, está conforme o artigo 6º,
parágrafo 1º que diz que (EDUARDO e MIRANDA, 1998):
“Entende-se por vigilância sanitária um conjunto de ações capazes de eliminar,
diminuir ou prevenir riscos à saúde e de intervir nos problemas sanitários
decorrentes do meio ambiente, da produção e circulação de bens e da prestação de
serviços de interesse da saúde, abrangendo:
I - o controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se relacionem com a
saúde, compreendidas todas as etapas e processos, da produção ao consumo;
II - o controle da prestação de serviços que se relacionam direta ou indiretamente
com a saúde.”
Desta forma, a ação de vigilância sanitária pode ser identificada sob a ótica de
intervenção do Estado, com a função de trabalho no sentido de amoldar o sistema produtivo
de bens e serviços relacionados à saúde, assim como os espaços ambientais às exigências
sociais e às necessidades do sistema de saúde (LUCCHESI, 2001).
As práticas de Vigilância Sanitária são baseadas nas concepções de risco, perigo
virtual ou ameaça de agravos. Desta forma, os problemas vivenciados pela vigilância sanitária
demandam tratamentos interdisciplinares, principalmente, sobre a ótica da epidemiologia, e
tratamentos interinstitucionais, demandando a interação entre vários setores como
saneamento, abastecimento de água, agricultura, Ministério Público (COSTA, 2000).
Necessita ainda da mediação das diferentes instâncias dos poderes, envolvendo o pode
Executivo, o Legislativo, o Judiciário além de outros setores do Estado e da sociedade, que
devem ter sua participação constituída (LUCCHESI, 2001).
Na prática, as ações de vigilância sanitária ainda conservam suas atribuições mais
antigas e estão estabelecidas nas atividades de fiscalização, observação do fato, na concessão
de licenças a estabelecimentos, no julgamento de procedimentos irregulares e nas sanções
penais, funções estas derivadas de seu poder de polícia. Características essas mais conhecidas
pela população, porém ainda possuem as demandas de normatização e educacional
(EDUARDO e MIRANDA, 1998). De acordo com Costa (2000, 2003), Eduardo e Miranda
(1988), e Cunha e Freitas (2001), apesar dos avanços em termos de ordenamento jurídico, a
Vigilância Sanitária no Brasil tem apresentado, na prática, uma atuação frágil, isolada e
marcadamente cartorial.
Para Lucchesi (2001) as ações de vigilância sanitária têm a função de levar a cabo as
percepções e os propósitos éticos relacionados à qualidade das relações, dos processos de
produção, do ambiente e dos serviços. Por tal assertiva é que se entende que a área de
vigilância sanitária tem um papel importante e diferencial para a modificação do modelo
assistencial de saúde, quanto para fomentar os processos de construção da cidadania no país, a
qual se deve refletir na saúde e na qualidade de vida dos cidadãos.
6. FUNÇÕES E OBJETIVOS DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA
As ações da Vigilância Sanitária englobam variadas categorias de objetos de cuidado,
dividindo competências com diversos órgãos e instituições de outros setores que da mesma
forma, direta ou indiretamente, realizam e promovem o controle sanitário. Como visto, as
ações de vigilância sanitária possuem um caráter multidisciplinar além de possuir a
capacidade de interferir nas relações sociais de produção-consumo para realizar a prevenção,
diminuição ou eliminação de riscos e/ou danos à saúde. São devidas à Vigilância Sanitária as
funções de desenvolver metodologias e políticas públicas destinadas a englobar o crescente
aumento da qualidade de vida (COSTA, 2003).
Conforme leciona Costa (2003), as ações de vigilância sanitária são principalmente de
caráter preventivo, percorrendo quase todas, senão todas, as atividades médico-sanitárias,
partindo da promoção chegando à proteção/recuperação e reabilitação da saúde, tendo sua
atuação sobre fatores de risco e danos em conexão a produtos, insumos e serviços que
englobam a saúde, com o meio ambiente incluindo nesse o de trabalho, com a circulação
internacional de transportes, cargas e pessoas.
“O mundo em que vivemos e trabalhamos parece cada vez mais cheio de riscos e
perigos que representam ameaças à saúde do homem, do meio ambiente e das futuras
gerações” (FREITAS e GÓMEZ, 1996-1997), o que demonstra diretamente a necessidade da
função de proteção à saúde.
Costa (2003) descreve as seguintes funções da Vigilância Sanitária:
“I- Normatização e controle de bens, da produção, armazenamento, guarda,
circulação, transporte, comercialização e consumo de substâncias e produtos de
interesse da saúde, suas matérias-primas, coadjuvantes de tecnologias, processos e
equipamentos;
II- Normatização e controle de tecnologias médicas, procedimentos e
equipamentos e aspectos da pesquisa em saúde;
III- Normatização e controle de serviços direta ou indiretamente relacionados
com a saúde, prestados pelo Estado e modalidades do setor privado;
IV- Normatização e controle específico de portos, aeroportos e fronteiras,
abrangendo veículos, cargas e pessoas;
V- Normatização e controle de aspectos do ambiente, ambiente e processos de
trabalho, e saúde do trabalhador.”
Para Lucchesi (2001) a Vigilância Sanitária é uma área da saúde coletiva que possui
vínculo direto com as ameaças à saúde pública que são resultantes da maneira de vida
contemporânea, do uso e consumo de novos produtos, novas tecnologias, necessidades novas,
geralmente demandadas pela imposição da sociedade, ou seja, hábitos e formas de
relacionamentos da vida em coletividade.
7. CAMPO DE ABRANGÊNCIA DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA
Com a definição de vigilância sanitária vê-se que o seu campo de atuação é bastante
abrangente, vasto e ilimitado, pois conforme mencionam Eduardo e Miranda (1998) a
vigilância sanitária poderá atuar em todos os aspectos que exercem influência direta ou
indireta sobre a saúde dos cidadãos.
Eduardo e Miranda (1998) dividem o campo abrangente de atuação da vigilância
sanitária em dois subsistemas o de bens e serviços de saúde e o de meio ambiente.
7.1. Bens e serviços de saúde
O controle sanitário dos serviços relacionados, tanto direta quanto indiretamente, com
as questões da saúde deve possuir a capacidade de realizar a proteção da saúde da população
contras as iatrogenias, segundo Costa (2003), são as doenças relacionadas com os serviços de
saúde. Costa (2003) ainda diz que o controle sanitário deve fornecer os meios para proteção
do ambiente de “externalidades negativas” que são devidos do processo de manufatura dos
serviços, como o lixo hospitalar, resíduos de materiais radioativos.
7.2. Meio ambiente
O conceito de meio ambiente neste subsistema segundo Derani9 (apud COSTA, 2003)
não é resumido em conceitos de ar, água, terra, porém ao “conjunto de condições de
existência humana que integram e influenciam o relacionamento entre os homens, sua saúde
e seu desenvolvimento”, portanto, não resumindo, mas expandido esse conceito à qualidade de
vida, que demanda não fatos pontuais e sim fatos complexos e que demandam fatores físicos,
psicológicos e, sobretudo sociais.
De modo geral, a vigilância sanitária tem sob seu escopo de atuação, a promoção do
controle sanitário sobre medicamentos, alimentos, água, bebidas, resíduos em saúde,
agrotóxicos, cosméticos, saneantes, produtos de higiene e perfumes, equipamentos, produtos
hemoterápicos, imunobiológicos, sangue e hemoderivados, órgãos e tecidos humanos usados
em processos de transplantes, radioisótopos, radiofármacos, cigarros, propaganda de produtos
que geram risco sanitário, produtos que envolvem risco à saúde, obtidos por engenharia
genética, exercer o controle sanitário dos serviços relacionados à saúde, suas instalações
físicas, equipamentos, tecnologias, ambientes, processos envolvidos nas fases de produção de
bens e produtos, transporte e a distribuição dos produtos acima referidos (EDUARDO e
MIRANDA, 1998; COSTA 2003).
8. IMPORTÂNCIA DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA
Segundo Baudrillard10
, Giovannni11
e Fanuck12
(apud COSTA, 2003) estratégias dos
mercados produtores induzem, direta ou indiretamente, o aumento do consumo de seus
produtos, devido à ideologia do consumismo que está implantada nos meios sociais. Para
Singer13
(apud COSTA, 2003) é nesse âmbito que os produtores exercem seu papel
manipulador sobre os consumidores, influenciando-os a adquirir cada vez mais mercadorias,
sendo que muitas vezes a necessidade do consumidor é só fictícia e não real, ou seja, o
mercado cria a necessidade. Como não existem diferenças nas indústrias produtoras de bens
para saúde e de indústrias de outras frentes de trabalho, as técnicas mercadológicas também
9 DERANI, C. Direito Ambiental Econômico. São Paulo, Max Limonad, 1997.
10
BAUDRILLARD, J. A Sociedade de Consumo. Lisboa, Edições 70, 1975.
11
GIOVANNI, G. A questão dos remédios no Brasil: produção e consumo. São Paulo, Livraria e Editora
Polis, 1980.
12
FANUCK, L. Justiça na Saúde: Quem Age na Defesa do Povo? Saúde em Debate, 19:12-4, 1987.
13
SINGER, P., CAMPOS, O. & OLIVEIRA, E.M. Prevenir e curar: o controle social através dos serviços de
saúde. Rio de Janeiro, Forense-Universitária, 1978.
invadem e se aplicam ao setor saúde. Gerando nos consumidores a busca incessante por
serviços para/de saúde, que acabam se confundindo com a busca pela saúde, exemplo disso
são os medicamentos que se transformaram em objeto de estratégias comerciais, expandindo
as frentes apenas curativas (COSTA 2003).
Nesse contexto, as atividades de vigilância sanitária se enquadram como parte das
ações de controle dos processos econômico e social que se destinam a impedir ou evitar
contradições que interfiram na produção e/ou no processo de consumo de bens e serviços de
saúde [SINGER (apud COSTA, 2003)], interessando a todos esses processos de controle,
tanto a consumidores quanto a produtores [LIMA (apud COSTA, 2003)].
Para Mancuso14
(apud COSTA, 2003) há na atualidade um aumento dos interesses
difusos, que se relacionam para com a vigilância sanitária na noção de qualidade de vida, que
é buscada pelo ser humano, o qual é o titular dos interesses que se relacionam com uma
existência de uma vida digna.
Questões da atualidade - tais como o consumo de produtos transgênicos, uso de
embriões em pesquisas - trazem novas exigências à prática da vigilância sanitária, visto que
além da verificação dos requisitos de qualidade, eficácia e segurança das práticas e produtos
de interesse à saúde, cabe ainda à vigilância sanitária a promoção do princípio bioético do
benefício e o princípio da precaução15
para garantir a segurança e credibilidade da saúde
coletiva (COSTA, 2003). (grifos do autor)
Com os fatos históricos pode-se verificar que o mercado produtor é inábil para exercer
a sua própria função regulatória, ou seja, incapaz de se autorregular para a fixação dos
interesses sanitários da população, pois o mercado está centrado no produto e não na
promoção da saúde da coletividade, que em certos pontos apresentam questões antagônicas
uma com as outras. Existem doutrinadores que reconhecem a vulnerabilidade das populações
frente ao mercado produtor o que justifica a real necessidade de uma prática de regulação do
mercado por meio de controles sanitários que garantam a saúde humana e ambiental (COSTA,
2003).
9. SISTEMA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA
14
MANCUSO, R.C. Interesses difusos: conceito e legitimação para agir. 3.ª ed. São Paulo, Revista dos
Tribunais, 1994. 15
Este princípio foi incorporado nas reformulações promovidas pela França em seu sistema da saúde pública,
que tende a promoção da segurança sanitária [Durand (apud Costa,2003)].
A organização da Vigilância Sanitária no Brasil foi modificada com a edição da Lei
9.782 de 1999, que criou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – que substituiu a antiga
Secretaria de Vigilância Sanitária integrante do Ministério da Saúde – e definiu o Sistema
Nacional de Vigilância Sanitária, entrando em consonância com os ordenamentos jurídicos
que organizam o sistema de saúde brasileiro, e se inserindo nas estratégias para se enfrentar os
problemas da época, como a crise dos medicamentos falsificados no país (DALLARI, 2001;
IVAMA & MELCHIOR, 2007; COSTA, 2003).
Com a edição dessa nova lei nacional passa a ser de responsabilidade da esfera federal
a definição da política e do sistema nacional de vigilância sanitária, as atividades de
características macro, como a normatização, o controle e a fiscalização de produtos,
substâncias e serviços que se relacionam direta ou indiretamente com a saúde da população, a
vigilância de portos, aeroportos e fronteiras. Além de atribuir a todo o sistema federativo a
atividade de manutenção de monitoramento do sistema de vigilância sanitária propriamente
dito e de um sistema de informações em vigilância sanitária [Lei 9.782/99 (apud DALLARI,
2001).
O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária é composto na Esfera Federal pela
ANVISA, agência vinculada ao Ministério da Saúde, o Instituto Nacional de Controle de
Qualidade em Saúde (INCQS), a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), o Conselho Nacional
de Secretários Estaduais de Saúde (CONASS), o Conselho Nacional de Secretários
Municipais de Saúde (CONASEMS), o Conselho Nacional de Saúde (CNS) e a Comissão
Intergestores Tripartite (CIT). As Esferas Estaduais são compostas pelos órgãos de Vigilância
Sanitária das Secretarias Estaduais de Saúde e do Distrito Federal, que contam com os
Laboratórios Centrais (LACENs) de Saúde Publica, pelos Conselhos Estaduais e Distrital de
Saúde e pela Comissão Intergestores Bipartite (CIB). As Esferas Municipais são compostas
pelos órgãos de Vigilância Sanitária das Secretarias Municipais de Saúde, pelos Conselhos
Municipais de Saúde e Colegiados de Gestão Regional (CGR) (Rio Grande do Norte, 2007).
As ações de vigilância sanitária são realizadas na prática pelos três entes federativos
incumbidos de exercer a gestão da saúde, assim as responsabilidades são fracionadas por
áreas de competência, ficando a cargo da ANVISA a coordenação do Sistema Nacional de
Vigilância Sanitária tendo as atribuições de regulamentar e executar as ações com
abrangência nacional. As demais esferas ficam sob coordenação do estado e dos municípios
(IVAMA & MELCHIOR, 2007). Para Eduardo e Miranda (1998) as atribuições de normatizar
e fiscalizar ficam sob a responsabilidade de todos os órgãos, de modo complementar e
harmônico, respeitando os princípios da hierarquização e descentralização das ações de saúde,
estando em conformidade com o que propõe o SUS.
Dentre as atribuições da ANVISA estão a de “assessorar, complementar ou
suplementar as ações estaduais, municipais e do Distrito Federal para o exercício do
controle social” (IVAMA & MELCHIOR, 2007), ou seja, as responsabilidades de cada ente
não são excludentes.
10. A DESCENTRALIZAÇÃO DAS AÇÕES DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA
Segundo Juliano e Assis (2004) a adoção do sistema de descentralização das ações de
vigilância sanitária são devido, principalmente, ao sistema federativo adotado pelo Brasil, o
qual possui sua organização político-administrativa compreendida na União, nos Estados, no
Distrito Federal e nos Municípios, todos autônomos, conforme o texto constitucional em seu
artigo 8º. O Brasil é dividido em 27 Estados e possui 5564 municípios com uma população
aproximada de 170 milhões de habitantes (dados do Censo Demográfico de 2000), com todo
esse tamanho e conseqüente complexidade é que se justificam as ações de descentralização
das atividades de vigilância sanitária. A descentralização, portanto, tende a atender as
variabilidades apresentadas pelas diferenças socioeconômicas, culturais, demográficas e
sanitárias que são encontradas em cada ente federado brasileiro.
Os anos 1990 para o setor saúde foram marcados pela formulação estratégica da ação
descentralizadora do sistema de saúde, identificado com a criação da Lei Orgânica da Saúde,
a Lei 8080/1990 e os seus desdobramentos, as Normas Operacionais Básicas (NOB´s) e a
Norma Operacional de Assistência à Saúde (NOAS) (JULIANO e ASSIS, 2004). E ao longo
desse período, o processo de descentralização “consolidou a reestruturação da arena
decisória em torno da saúde”, conjugando meios de transferência de responsabilidades e
competências junto à transferência de recursos financeiros para os Estados e municípios
(COHEN, MOURA e TAMAZELLI, 2004). (grifos nossos)
A descentralização, portanto, é a redistribuição de recursos e responsabilidades entre
os entes federados com base no entendimento de que o nível central, a União, só deve
executar aquilo que o nível local, os municípios e estados, não podem ou não conseguem
executar. A gestão do Sistema (SUS) passa a ser de responsabilidade da União, dos estados e
dos municípios, agora entendidos como os gestores do SUS (Brasil, 2004).
Segundo Solla e Costa (2007) o processo de descentralização das ações do setor saúde
aponta diversas vantagens nos âmbitos administrativo, político e econômico, tais como:
“Possibilidade de organizar de forma mais racional o sistema de saúde com base em
áreas administrativas locais, particularmente para atenção básica à saúde; contribui
para facilitar a coordenação intersetorial; permite soluções locais para problemas
relacionados a grandes distâncias, comunicação inadequada e áreas de difícil acesso;
pode permitir maiores oportunidades para inovações e aumentar o universo de
experiências positivas de gestão; promove um contato mais próximo entre governo e
população, melhores condições para formulação de políticas, planos e programas
mais realistas e adequados à realidade local; permite melhores condições para
incrementar a provisão de atenção à saúde em regiões com baixa cobertura;
aquisição local de determinados tipos de insumos estimula a economia na região;
facilita a participação da comunidade, permitindo melhorar o controle sobre os
recursos aplicados, a aceitabilidade, cooperação e sustentabilidade da política de
saúde; possibilita às representações de vários grupos sociais, étnicos, religiosos e
políticos em diferentes regiões do país participar mais diretamente das tomadas de
decisão sobre as políticas de saúde; e permite que as políticas nacionais penetrem
em áreas distantes, onde o suporte para programas nacionais é geralmente mais
frágil.”
Tratar a saúde como direito de todos e dever do Estado tem na descentralização uma
estratégia fundamental para a efetivação desse direito, assim o processo de municipalização
das ações de vigilância sanitária é visto como primordial, tendo em vista que o município é o
nível mais próximo do cidadão e consequentemente dos seus problemas. Desta forma, passa a
ser do município a responsabilidade pela saúde pública de sua população, não cabendo mais a
possibilidade de escolha na execução ou não das ações de Vigilância Sanitária, mas, sim, de
assumir a titularidade do dever constitucional da execução das ações de Vigilância Sanitária
em seu território (Rio Grande do Norte, 2007).
Para Cohen, Lima e Pereira16
(apud COHEN, MOURA e TAMAZELLI, 2004)
“dentre as diretrizes e princípios que orientam o SUS, pode-se afirmar que a
descentralização é aquele cujos processos e resultados têm sido mais estudados e
acompanhados, e vários são os desafios e avanços registrados”.
Dando continuidade à normalização do processo de descentralização, é editada a
NOB-SUS de 1996 o qual ajusta o processo de gestão em modalidades, envolvendo estados e
municípios, sendo criadas as modalidades de gestão plena da atenção básica e gestão plena
do sistema, destinadas aos municípios; e as modalidades de gestão avançada do sistema e
16
Cohen MM, Lima JC, Pereira CRA. Normas Operacionais do SUS e a Vigilância Sanitária. Curso de
atualização em gestão da VISA para dirigentes do RJ-2003. ENSP/FIOCRUZ, 2003.
gestão plena do sistema destinados aos estados, com repasse “fundo a fundo”17
. O que
diferencia essas formas de gestão são os níveis de responsabilidades que cada esfera
governamental passa a exercer, outorgando autonomia ao gestor municipal na gestão plena do
sistema para gerir o sistema como um todo, abrangendo as ações de promoção, proteção e
recuperação da saúde. A gestão plena da atenção básica concede a responsabilização pelas
ações de atenção básica ao gestor municipal, o qual se define pela equalização das
transferências de recursos por base populacional, por meio do Piso de Atenção Básica
(PAB)18
compreendendo uma parte fixa, obtido pela multiplicação de um valor per capita
nacional pela população de cada município e uma parte variável, esta é definida com base
em critérios técnicos específicos [VIANA, LIMA & OLIVEIRA19
(apud JULIANO & ASSIS,
2004); (SOUSA, 2002)] (grifos do autor).
No fim do ano 2000 quase a totalidade dos municípios brasileiros, cerca de 99%, já
faziam parte de alguma das modalidades de gestão implantada pela NOB-SUS 96 (Brasil,
2001).
Com o desenvolvimento da programação integrada, com a criação de centrais de
regulação, com o aprimoramento do controle e avaliação e com a formulação de consórcios
intermunicipais e também pela criação e implementação de planos de regionalização
promovidos pelas secretarias estaduais de saúde em conjunto com os municípios ocorreu um
aumento significativo na articulação da rede de serviços de saúde (Brasil, 2001).
Com a implementação e a transferência das responsabilidades e atribuições dos
serviços de saúde para os entes estaduais e municipais, durante a década de 1990, verificou-se
um grande crescimento das transferências “fundo a fundo”, esse fato demonstra que tais entes
passaram a fazer a substituição da lógica de pagamento por produção, atividades que eram
realizadas anteriormente no país (Brasil, 2001).
Com a Norma Operacional de Assistência à Saúde (NOAS-SUS) 2001 foram
disponibilizadas duas condições de gestão em que os municípios puderam se habilitar, sendo a
Gestão Plena da Atenção Básica Avançada (GPABA) e a Gestão Plena do Sistema Municipal
(GPSM). Sendo que em cada gestão há alguns conjuntos de prerrogativas, responsabilidades,
requisitos e instrumentos que devem ser cumpridos pelos municípios. Como exemplo são as
necessidades de se comprovar as condições para o desenvolvimento das ações básicas de
17
Repasse automático de recursos financeiros do Fundo Nacional de Saúde para os Fundos Estaduais e
Municipais de Saúde [Viana, Lima & Oliveira (apud Juliana & Assis, 2004). 18
Conforme diz Sousa (2002) o Piso de Atenção Básica consiste em um montante de recursos financeiros
destinado exclusivamente ao custeio de procedimentos e ações de atenção básica à saúde. 19
Viana ALD, Lima LD & Oliveira RG 2002. Descentralização e federalismo: a política de saúde em novo
contexto – lições do caso brasileiro. Ciência & Saúde Coletiva 7(3):1-15.
vigilância sanitária e comprovar a execução de ações de maior complexidade nas áreas de
vigilância sanitária para que o município possa se habilitar em GPABA e GPSM,
respectivamente (COHEN, MOURA e TAMAZELLI, 2004).
Cohen, Moura e Tamazelli (2004) informam que:
“Um dos maiores desafios para a ação regulatória do Estado moderno na área
sanitária é a avaliação do risco das novas tecnologias, sejam elas substâncias,
aparelhos ou serviços. Para que se possa atuar nesta lógica é imprescindível que o
município assuma, pelo menos, o conjunto de procedimentos que são básicos, menos
complexos, mas fundamentais para proteção da Saúde da população.
Desta forma, a Vigilância Sanitária estadual poderá cumprir seu efetivo papel
coordenador e regulador, mesmo executando os procedimentos de maior
complexidade em Vigilância Sanitária. Não basta fiscalizar burocraticamente; é
necessário usar a técnica apropriada e identificar quais são os pontos críticos naquela
unidade, seja num estabelecimento de saúde ou em qualquer outro sujeito à
Vigilância Sanitária, buscando Boas Práticas na fabricação, comercialização ou
prestação de serviços. Daí a necessidade de divisão solidária de responsabilidades
entre os entes federativos e de capacitação permanente dos profissionais.”
Cohen, Moura e Tamazelli (2004) concluem dizendo que o desfio é fazer a
implementação dos avanços alcançados no SUS quanto ao processo de descentralização das
ações de vigilância sanitária, sem, entretanto, atribuir a este processo de descentralização uma
característica meramente burocrática, percebendo o processo como uma estratégia operacional
em freqüente aprimoramento, e não como algo estático e pontual.
11. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho observou-se que a história da Vigilância Sanitária no Brasil foi
diretamente influenciada pelos movimentos sócio-políticos que ocorreram neste país.
Constatou-se que a caracterização de uma estrutura sanitária começou a ocorrer com a
instalação da Família Real portuguesa em solo brasileiro, estrutura que se limitava a um
controle sanitário do capital imperial português.
Observou-se que com o processo de globalização da produção e da circulação de bens
e produtos sobrevieram pontos interrogativos sobre a atuação da Vigilância Sanitária, pois a
nova ordem econômica mundial não estendeu a distribuição dos benefícios gerados pela
acumulação de riquezas a todos os países do globo terrestres, mas promoveu a ampliação de
distribuição internacional dos riscos difusos à saúde humana. Torna-se claro que os países
mais vulneráveis aos problemas sanitários serão aqueles que possuem sistemas de vigilância
frágeis (COSTA, 2000).
O processo evolutivo da Vigilância Sanitária no Brasil foi também influenciado pela
evolução econômica do país, tal qual o que ocorreu em meados dá década de 70 denominado
de o “milagre econômico brasileiro” que gerou a necessidade de se regular os mercados
produtivos para que os nossos produtos pudessem entrar em competição com o mercado
internacional, demonstrando que o processo evolutivo do sistema de saúde brasileiro sofria
uma determinação do capitalismo internacional.
O processo de construção de uma Vigilância Sanitária no Brasil alcançou seu ápice
nos anos 80 e 90 com o fim do regime militar e consequente redemocratização do país, o que
gerou vários movimentos sociais, sendo que um deles foi na área da saúde, neste período
começam a se discutir as ideias da Reforma Sanitária, que se consolida então em 1986 na VIII
Conferência Nacional de Saúde por lançar as bases para um sistema único de saúde, buscando
desta forma a afirmação da saúde como um direito social, universal, igualitário, sem
privilégios de grupos ou pessoas, o que leva então a criação do SUS na Constituição Federal
de 1988, o que provê juridicamente maior visibilidade ás ações da Vigilância Sanitária.
A Vigilância Sanitária como uma das partes integrantes do Sistema Único de Saúde
enfrenta vários desafios que não se restringem apenas às discórdias entre questões mercantis
versus saúde, mas a várias demandas externas como a qualidade da formação profissional, a
produção e disseminação de conhecimentos e informações atualizadas, a pontos conceituais e
doutrinários que envolvem todo o arcabouço da área da saúde, e até mesmo as tecnologias que
envolvem todo o meio em que se insere a vigilância sanitária (COSTA, 2001). Conforme
afirma Costa (2001) “é preciso romper, sobretudo, a estrutura tradicional do modelo sanitário
fragmentado e anacrônico, centrado no cuidado à doença e agravado pela pulverização de
ações similares descoordenadas em distintos espaços institucionais”, tudo afirmando que o
conceito de Vigilância Sanitária envolve aspectos não apenas de recuperação da saúde, mas
de prevenção também.
Para que a finalidade da Vigilância Sanitária seja realizada e com isso consiga obter a
sua legitimidade social é necessário promover ações integradas entre a sociedade e os
profissionais e trabalhadores de saúde, para que em “equipe” implantem políticas públicas
intra e intersetoriais com a finalidade de integrar as atividades de vigilância sanitária no
conjunto de ações de saúde e demais setores que visem à boa qualidade de vida (COSTA,
2001).
Conforme diz Solla & Costa (2007) as ações de vigilância sanitária, por realizar as
atividades de regulação destinada à proteção da saúde, são integrantes tanto da ação de saúde
quanto meio de organização econômica, cultural e social. A atividade de proteção da saúde
não inclui apenas cidadãos e consumidores de gêneros que interfiram direta ou indiretamente
na saúde, mas engloba também os produtores, que atuarão em ambientes de credibilidade,
visto estarem sujeito a menos efeitos de concorrência desleal e a fraudes. A regulação
sanitária tratada do ponto de vista econômico trata de superar falhas mercadológicas,
caracterizadas pelo simples fato de o mercado não ser capaz de se auto-regular, ou seja, as
forças do mercado não são suficientes para garantir qualidade dos bens essenciais, a
segurança do consumo, ao ambiente limpo (LUCCHESE, 2001).
Na área de saúde ainda há muito por ser feito, perpassando desde fatores relacionados
ao desenvolvimento teórico-conceitual e metodológico até a formação e capacitação do corpo
humano envolvido nas ações de vigilância sanitária, visto que o movimento tecnológico está
em constante manufatura. Nota-se, porém que existe um grande processo de desenvolvimento
das ações de vigilância sanitária, ao passo do Sistema Único de Saúde, da descentralização e
municipalização da saúde, tomando como consideração também e de grande importância o
repasse de recursos do nível federal para os demais entes, propiciando assim as ações de
saúde pelos níveis mais próximos do alvo, ou seja, da população (COSTA, 2000).
Costa (2000) finaliza dizendo que:
“O processo de transformação que a atualidade requer defronta-se com imensos
desafios expressados em temáticas polêmicas, tais como a necessidade de regulação
das práticas mercadológicas de incentivo ao consumo desenfreado de produtos de
risco, medicamentos e tecnologias médicas, a necessidade de depuração do mercado
farmacêutico, de redução e controle das iatrogenias, a saúde dos consumidores, os
desastres com produtos tóxicos e perigosos, a deterioração do meio ambiente e a
extração predatória dos recursos naturais. Estas questões exigem da Saúde
Pública/Vigilância Sanitária, como campo de saberes e práticas sociais, intervenções
de natureza mais complexa que a das práticas usuais nos sistemas de saúde. Esta
exigência recompõe conceitos e noções ainda pouco elaboradas, desde o próprio
conceito de saúde, à regulação, segurança sanitária, promoção, proteção e defesa da
saúde, a serem conjugados com os princípios e diretrizes afirmados para a
constituição da saúde como um valor, um direito humano fundamental, ou seja, os
princípios de universalização, eqüidade, integralidade, ética e responsabilidade
pública, sob as diretrizes de descentralização, participação e controle social no
Sistema Único de Saúde.”
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