1
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
TÍTULO: MOVIMENTO NEGRO: IMPLICAÇÕES POLÍTICAS E SOCIAIS
AUTORA: GRAZIELE DE JESUS PESTANA CONTATO: [email protected]
OBJETIVO GERAL: Apresentar aos alunos, a partir de uma perspectiva histórica e
sociológica, o surgimento do Movimento Negro e suas implicações políticas e sociais. O
objetivo é permitir que os alunos tenham contato com os principais debates acerca da
condição do negro na sociedade brasileira. Ao final da aula espera-se que os alunos
estejam familiarizados com o surgimento do Movimento Negro, assim como as suas
principais demandas.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
Retomar o conceito de Movimentos Sociais;
Situar o Movimento Negro dentro da perspectiva dos Movimentos Sociais;
Apresentar as principais pautas de reivindicação do Movimento Negro; sustentadas por
dados e estatísticas referentes à população negra.
1. PRÁTICA SOCIAL INICIAL DO CONTEÚDO:
1.2 VIVÊNCIAS COTIDIANAS DOS ALUNOS: a) O que os alunos já sabem sobre o
conteúdo?
Os alunos já sabem a definição de Movimentos Sociais, isto é, que o termo
configura um espaço de lutas e ações políticas coletivas cujo objetivo é reivindicar diante
do Estado de direitos ou interesses e/ou preservar a ordem já estabelecida. Os alunos
também sabem que os Movimentos Sociais se dividem em locais, regionais, nacionais e
internacionais. Os elementos que constituem os Movimentos Sociais são os seus
objetivos e/ou metas; estratégias; ideologia e organização. Quanto aos objetivos/metas,
2
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
devem ser bem claros, possibilitando aos interessados possam saber a quem ou a que o
movimento está se opondo/apoiando. As estratégias são as ações pautadas em um
raciocínio lógico, que seguem um método específico que o movimento usa para atingir a
sua finalidade. A ideologia é a visão de mundo/ideias que orienta o Movimento Social.
Quanto à organização, existem duas formas: hierárquica, isto é, quando existem diversos
níveis de influência para a tomada de decisão dentro do movimento, ou a horizontal, onde
todos os membros têm o mesmo peso na hora de deliberar. A organização também
envolve a aplicação dos recursos financeiros que irão subsidiar as ações do movimento.
Os alunos sabem que, para que haja um Movimento Social, três elementos são
indispensáveis: situação de opressão, consciência da opressão e ação. A junção desses
três elementos resulta em um Movimento Social.
b) O que os alunos gostariam de saber a mais?
Os alunos gostariam de saber mais sobre os Movimentos Sociais no contexto na
sociedade brasileira. Nesse sentido, será discutido o surgimento do Movimento Negro a
partir de uma perspectiva histórica baseada no texto “Movimento Negro Brasileiro: alguns
apontamentos históricos”, de Petrônio Domingues, e de uma perspectiva sociológica a
partir de estatísticas retiradas dos bancos de dados do IBGE e um relatório da ONG
Todos pela Educação a respeito das desigualdades sociais que afetam, sobretudo, a
população negra. Posteriormente suscitaremos discussões acerca das dificuldades
enfrentadas pela população negra no Brasil assim como sua luta histórica para reverter a
situação.
Portanto, apresentarei como atividade de introdução, para relacionar teoria e
prática, a música original (depois censurada pela ditadura militar) “Almirante Negro” – (O
mestre sala dos mares), cantada por João Bosco, que conta um pouco sobre a Revolta
das Chibatas (no Rio de Janeiro em 1910) e sobre a história do líder negro João Cândido.
Antes de iniciar a música, perguntarei aos alunos:
Vocês acham que após a chamada "Abolição da escravatura", em 1888, mudou a
maneira como os negros eram tratados pelos brancos no Brasil?
Vocês acham que em 1910, ou seja, 22 anos depois, algum negro continuou
apanhando de chibata ou sendo castigado fisicamente no Brasil?
Por que vocês acham que as histórias dos heróis negros brasileiros (Como de
João Candido) foram escondidas pela Ditadura Militar? Por que isso acontece até hoje?
3
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
Quem de vocês já ouviu falar de João Candido e da Revolta das Chibatas no Rio
de Janeiro?
ALMIRANTE NEGRO (Título original) 1973 (Letra original) Há muito tempo nas águas da Guanabara O dragão do mar reapareceu Na figura de um bravo marinheiro A quem a história não esqueceu Conhecido como Almirante Negro Tinha a dignidade de um mestre-sala E ao acenar pelo mar, na alegria das fragatas Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas Jovens polacas e por batalhões de mulatas Rubras cascatas jorravam das costas dos negros pelas pontas das chibatas Inundando o coração do pessoal do porão Que a exemplo do marinheiro gritava – não! Glória aos piratas, às mulatas, às sereias Glória à farofa, à cachaça, às baleias Glória a todas as lutas inglórias Que através da nossa história Não esquecemos jamais Salve o Almirante Negro Que tem por monumento as pedras pisadas do cais Mas faz muito tempo…
“O MESTRE SALA DOS MARES” (Título Censurado) Há muito tempo nas águas da Guanabara O dragão do mar reapareceu Na figura de um bravo feiticeiro A quem a história não esqueceu Conhecido como navegante negro Tinha a dignidade de um mestre-sala E ao acenar pelo mar, na alegria das regatas Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas Jovens polacas e por batalhões de mulatas Rubras cascatas jorravam nas costas dos santos Entre cantos e chibatas Inundando o coração do pessoal do porão Que a exemplo do feiticeiro gritava, então! Glória aos piratas, às mulatas, às baleias! Glória à farofa, à cachaça, às baleias! Glória a todas as lutas inglórias Que através da nossa história Não esquecemos jamais Salve o navegante negro Que tem por monumento as pedras pisadas do cais (Mas, salve ...) Autores: JOÃO BOSCO E ALDIR BLANC
2. PROBLEMATIZAÇÃO
2.1 DISCUSSÃO SOBRE OS PROBLEMAS MAIS SIGNIFICATIVOS:
4
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
Nesse ponto, discutiremos os problemas sociais que engendraram a necessidade
do Surgimento do Movimento Negro no Brasil através da teoria aliada a perguntas
problematizadoras.
Domingues (2007) traz alguns apontamentos (etapas; atores e propostas) sobre a
trajetória do Movimento Negro desde a primeira República (1889) até os anos 2000,
divididas em três etapas, e uma quarta etapa que consiste em uma hipótese sugerida pelo
autor sobre uma possível mudança de paradigma dentro do movimento.
A proposta do autor é demonstrar que desde a República Velha o movimento vem
desenvolvendo estratégias de luta pela inclusão social do negro e contra o racismo. Seu
ponto de partida é a produção intelectual da liderança negra, como por exemplo, José
Correia Leite, Francisco Lucrécio, Abdias do Nascimento, Hamilton Cardoso, Lélia
Gonzalez, dentre outras.
Ao inserir o movimento negro dentro da perspectiva dos movimentos sociais, Domingues
(2007) considera que
Movimento negro é a luta dos negros na perspectiva de resolver seus problemas na sociedade abrangente, em particular os provenientes dos preconceitos e das discriminações raciais, que os marginalizam no mercado de trabalho, no sistema educacional, político, social e cultural. Para o movimento negro, a “raça”, e, por conseguinte, a identidade racial, é utilizada não só como elemento de mobilização, mas também de mediação das reivindicações políticas. Em outras palavras, para o movimento negro, a “raça” é o fator determinante de organização dos negros em torno de um projeto comum de ação (DOMINGUES, 2007, p. 101-102)
Questão problematizadora: Como os negros eram vistos pelo restante da sociedade
naquela época?
PRIMEIRA FASE DO MOVIMENTO NEGRO – REPÚBLICA (1889-1937)
Em 1888 ocorre à abolição da escravatura, em 1889 é proclamado a República no
Brasil. No entanto a população negra foi marginalizada. Isso porque, apesar de a
escravidão ter sido abolida, a população negra ficou limitada política (haviam
impedimentos que limitavam o direito ao voto), social (foram “empurrados” para os morros
e periferias) e psicologicamente (Racismo pautado na doutrina do racismo científico
somado a uma política de branqueamento que trouxe imigrantes europeus para o Brasil).
Nessa época o termo raça é utilizado como uma forma de diferenciação biológica,
isto é, acreditava-se que a humanidade estaria dividida em raças e que essa
diferenciação determinava o comportamento de diferentes grupos sociais. Nessa
5
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
perspectiva havia uma “hierarquia racial”, ou seja, algumas raças eram tidas como
superiores umas às outras, umas seriam mais “evoluídas” do que outras, o que
“justificaria” a dominação de um grupo sobre o outro. O racismo científico se apoiava em
técnicas ou hipóteses que “sustentavam” essa ideia. É uma prática pseudo-científica, mas
na época recebeu crédito da comunidade científica.
Questão problematizadora: O que aconteceu com a população negra após a
abolição da escravatura?
Por conta disso, a população negra passou a viver à margem da sociedade, isto é,
excluída da sociedade, sem direito à moradia, ao emprego e à dignidade.
Hoje essa ideia foi superada, não existem diferentes raças humanas. Biologicamente
existe apenas uma raça: a humana. Contudo, o termo raça ainda é muito presente na
sociedade como uma realidade simbólica, e apesar da ciência ter reconhecido essa
lastimável passagem de sua história, seus efeitos perduram até hoje:
Dessa maneira, a noção de raça ainda permeia o conjunto de relações sociais, atravessa práticas e crenças e determina o lugar e o status de indivíduos e grupos na sociedade. Nesse sentido, a pessoa pode ser identificada, classificada, hierarquizada, priorizada ou subalternizada a partir de uma cor/raça/etnia ou origem a ela atribuída por quem a observa. (PETRUCCELLI, SABOIA, 2013, p. XXX)
Questão problematizadora: Como a população negra reagiu diante da situação que
estava imposta?
Diante disso, os negros passaram a instituir movimentos de mobilização racial
negra, como por exemplo, o Club 13 de Maio dos Homens Pretos (1902); o Centro
Literário dos Homens de Cor (1903); a Associação Brasileira dos Homens Pretos (1917),
entre diversos outros. Tais movimentos tinham um cunho assistencial, recreativo e/ou
cultural. Sua base de formação era a classe de trabalhadores negros: portuários;
ferroviários e ensacadores. Isso contribuiu, sobremodo, para a formação de uma
identidade sindical.
Associações negras no Brasil:
Entre 1907 e 1937: 123 associações negras em São Paulo;
Entre 1889 e 1920: 72 associações em Porto Alegre;
Entre 1888 e 1929: 53 no Rio Grande do Sul.
6
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
Questão problematizadora: qual foi a importância das mulheres para o movimento
negro?
As mulheres possuíam uma importância não apenas simbólica no movimento.
Eram a maior parte das associadas e frequentavam com maior assiduidade. A Cruzada
feminina mobilizava negras para trabalhos assistenciais, ao passo que as Rosas Negras
organizavam bailes e festivais artísticos.
Haviam também associações formadas apenas por mulheres negras: Sociedade
Brinco das Princesas – São Paulo (1925); Sociedade de Socorros Mútuos Princesa do Sul
– Rio Grande do Sul (1908).
Questão problematizadora: qual foi a importância da imprensa negra para o
Movimento Negro?
Um elemento importante nesse período foi a Imprensa Negra, que consistia em
jornais elaborados por negros para tratar de suas próprias questões, pois “a comunidade
negra tinha necessidade de uma imprensa alternativa”, que transmitisse “informações que
não se obtinha em outra parte” (LEITE, 1992, apud DOMINGUES, 2007, p. 104).
Os jornais que mais se destacaram em São Paulo foram: A Pátria (1889); O
Combate (1912); O Menelick (1915); O Bandeirante (1918); O alfinete (1918); A Liberdade
(1918); A Sentinela (1920); Clarim da Alvorada (1924), dentre outros. O principal objetivo
desses jornais era combater o “preconceito de cor” como se costumava dizer. O enfoque
eram as mazelas que afetavam a população negra no trabalho, em relação à moradia,
educação e saúde. Denunciavam a segregação racial, que impediam negros de
frequentar determinados lugares, como hotéis, clubes, cinema, teatro, restaurantes,
estabelecimentos comerciais e religiosos, inclusive escolas, ruas e praças públicas.
Apesar disso, de acordo com Domingues (2007), nesse período não havia um caráter
eminentemente político no movimento negro, pautado em um programa e projeto
ideológico definido.
Questão problematizadora: lembram de como eram distribuídos os postos de
trabalho? Como essa distribuição impactou nas pautas do Movimento Negro?
Na década de 1930, essa situação começa a mudar através da fundação, em 1931,
da Frente Negra Brasileira (FNB), uma das primeiras organizações negras com
7
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
reivindicações políticas deliberadas. Uma das mais importantes entidades negras do país,
operada através de filiais em diversos estados (RJ, MG, ES, PE, RS e BA) que
transformou o movimento negro em movimento de massa após ter arregimentado ao
menos 20 mil associados.
A entidade desenvolveu um considerável nível de organização, mantendo escola, grupo musical e teatral, time de futebol, departamento jurídico, além de oferecer serviço médico e odontológico, cursos de formação política, de artes e ofícios, assim como publicar um jornal, o A Voz da Raça. (DOMINGUES, 2007, p. 106)
Em 1936 a FNB torna-se um partido político pretendendo participar das próximas
eleições. Foi influenciado pela conjuntura internacional do nazifascismo, defendia um
programa político e ideológico ultraconservador. Arlindo Veiga dos Santos elogiava
abertamente Benito Mussolini na Itália e Adolf Hitler na Alemanha.
O jornal A Voz da Raça: Deus, Pátria, Raça e Família era alinhado à ideologia integralista,
uma doutrina política ultraconservadora inspirada nos regimes nazifascistas da Europa. O
jornal era um mecanismo de divulgação do programa ideológico patrianovista (ideologia
que apoia a Monarquia).
Resposta a um boletim lançado pela canalha anarquista-comunista-socialista, que obedece aos patrões judeus e estrangeiros. Frentenegrinos! Negros em geral! A postos contra a onda estrangeira, que, além de vir tomar o nosso trabalho, ainda quer dominar, por um regime iníquo e bandalho, o Brasil dos nossos avós. Que nos importa que Hitler não queira, na sua terra, o sangue negro? Isso mostra unicamente que a Alemanha Nova se orgulha da sua raça. Nós também, nós brasileiros, temos raça. Não queremos saber de ariano. queremos o brasileiro negro e mestiço que nunca traiu nem trairá a Nação. Nós somos contra a importação do sangue estrangeiro que vem somente atrapalhar a vida do Brasil, a unidade da nossa Pátria, da nossa raça da nossa Língua. Hitler afirma a raça alemã. Nós afirmamos a Raça Brasileira, sobretudo no seu elemento mais forte: o negro brasileiro. (SANTOS, 1933 apud DOMINGUES, 2006, p. 528)
Domingues (2007) considera a hostilidade de parte do movimento negro pelos
estrangeiros uma reação às condições do negro na sociedade brasileira, que era preterido
em favor dos imigrantes que monopolizavam o mercado de trabalho no período pós-
abolição.
Questão problematizadora: Qual foi a importância do Movimento Negro, frente aos
problemas que se colocavam naquele momento?
O partido conseguiu que uma de suas demandas fosse concedida pelo então
presidente da República Getúlio Vargas, que era a não proibição de negros na Guarda
8
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
Civil em São Paulo. No entanto o partido foi extinto, assim como as demais organizações
políticas com a ditadura do Estado Novo em 1937.
SEGUNDA FASE DO MOVIMENTO NEGRO – SEGUNDA REPÚBLICA À DITADURA
MILITAR (1945-1964)
Com a instauração do Estado Novo, a repressão política em vistas de evitar
movimentos contestatórios foi inevitável (como em qualquer ditadura). No entanto, com
sua queda há o ressurgimento do movimento negro, só que dessa vez com uma atuação
maior.
Primeiro, porque a discriminação racial, à medida que se ampliavam os mercados e a competição, também se tornava mais problemática; segundo, porque os preconceitos e os estereótipos continuavam a perseguir os negros; terceiro, porque grande parte da população “de cor” continuava marginalizada em favelas, mucambos, alagados e na agricultura de subsistência”. (GUIMARÃES, 2002, apud DOMINGUES, 2007, p. 108)
Surge nesse período a União dos Homens Negros (UHC), um movimento social de
caráter hierárquico que tinha por finalidade elevar o nível econômico e intelectual das
pessoas negras em todo o Brasil, para que elas pudessem ingressar na vida social e
administrativa do Estado. Na década de 1940 já possuía representação em 10 estados.
Há nesse período um novo impulso na imprensa negra e destacam-se os jornais
São Paulo: Alvorada (1945); Novo Horizonte (1946); Notícias de Ébano (1957), etc.
apesar disso o Movimento Negro ficou isolado politicamente, não tendo apoio da direita
ou da esquerda. Um caso que evidencia isso é que em 1946 o senador Hamilton
Nogueira (UDN) apresentou um projeto de lei antidiscriminatória, que foi rejeitado pelo
PCB (Partido Comunista Brasileiro), sob a afirmação de que tal projeto restringiria o amplo
conceito de democracia, ademais, dividiria a luta dos trabalhadores impedindo a marcha
da revolução socialista. A primeira Lei antidiscriminatória (Lei Afonso Arinos) só foi
aprovada em 1951 após um escândalo, no qual uma bailarina norte-americana, Katherine
Dunham, foi proibida de se hospedar em um hotel em São Paulo.
TERCEIRA FASE DO MOVIMENTO NEGRO – DA REDEMOCRATIZAÇÃO (1978-2000)
O Golpe de 1964 desarticulou a luta política dos negros. Os militares acusavam os
militantes negros de “criarem um problema que não existia: o racismo no Brasil”. A
discussão racial pública foi banida nesse período:
9
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
tínhamos três tipos de problemas, o isolamento político, ditadura militar e o esvaziamento dos movimentos passados. Posso dizer que em 1970 era difícil reunir mais que meia dúzia de militantes do movimento negro. (CUNHA JR, 1992 apud DOMINGUES, 2007, p. 111)
No entanto não quer dizer que não houve algumas ações, como por exemplo,
Centro de Cultura e Arte Negra (1972), assim como alguns movimentos da imprensa
negra: Árvore das Palavras (1974); O Quadro (1974); entre outros.
O retorno do movimento negro organizado à cena política se com o surgimento do
Movimento Negro Unificado, em 1978. No plano externo se inspirava na luta pelos direitos
civis dos negros norte-americanos, em lideranças como Martin Luther King e Malcon X e
em organizações negras marxistas como os Panteras Negras. Também se inspiravam
nos movimentos de libertação dos países africanos, sobretudo de língua portuguesa:
Guiné Bissau, Moçambique e Angola (países nos quais havia um discurso radicalizado
contra a discriminação racial).
No plano interno se inspirava na organização marxista Convergência Socialista,
que combinava a luta contra o racismo com a luta contra o capitalismo. “Na concepção
desses militantes, o capitalismo era o sistema que alimentava e se beneficiava do
racismo; assim, só com a derrubada desse sistema e a consequente construção de uma
sociedade igualitária era possível superar o racismo” (DOMINGUES, 2007, p. 112-113).
Alguns ativistas importantes desse movimento foram Flávio Carrança, Hamilton Cardoso,
Vanderlei José Maria, Milton Barbosa, Rafael Pinto, JamuMinka e Neuza Pereira.
A rearticulação do movimento negro também se deu pelacriação do Movimento
Unificado Contra a Discriminação Racial, com atos públicos contra casos de
discriminação racial.
Dois casos importantes resultaram em mobilizações públicas de protesto com o
racismo, o primeiro foi o caso de discriminação racial sofrida por 4 jovens no Clube de
Regatas Tietê e o segundo foi o assassinato de Robson Silveira da Luz. Os protesto
ocorreram em 7 de julho de 1978 e mobilizou cerca de 2 mil pessoas. Uma carta aberta
convocava os negros a formarem Centros de Luta
[...] a fim de organizar a peleja contra a opressão racial, a violência policial, o desemprego, o subemprego e a marginalização da população negra. [...]No Programa de Ação, de 1982, o MNU defendia as seguintes reivindicações “mínimas”: desmistificação da democracia racial brasileira; organização política da população negra; transformação do Movimento Negro em movimento de massas; formação de um amplo leque de alianças na luta contra o racismo e a exploração do trabalhador; organização para enfrentar a violência policial; organização nos sindicatos e partidos políticos; luta pela introdução da História da África e do Negro no Brasil nos currículos escolares, bem como a busca pelo apoio internacional contra o racismo no país. (DOMINGUES, 2007, p. 114)
10
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
O Culto da Mãe Preta, um símbolo de passividade do negro também passou a ser
execrado:
Em meados dos anos 1920 alguns militantes negros, dentre os quais vários jornalistas e intelectuais, tiveram a ideia de fazer uma escultura representando a Mãe Preta. O objetivo era chamar a atenção para a importância dos negros na formação do país. Tratava-se de justa homenagem à imagem da mulher negra que conheceu e geriu como ninguém o mundo doméstico, que deu a vida por bebê alheio, que ensinou as primeiras palavras, cantou para dormir as moças apaixonadas, tirou piolhos e deixou dengoso os futuros donos do poder. Essas mulheres seriam a representação do trabalho, do amor e da negação de si próprias e, estavam eternizadas na memória de muitos brasileiros negros e brancos naquele início de século. Embora não faltassem, desde a ideia inicial, os contrários a esse elogio a um passado que para alguns devia ser esquecido. (BISPO, 2011, PAG)
O 13 de Maio data de Comemoração da Abolição da Escravatura, passa a ser o
Dia Nacional de Denúncia Contra o Racismo. O Movimento Negro Unificado (MNU)
passou a incentivar os negros a assumirem sua condição social adotando oficialmente o
termo “negro” para designar todos os descendentes de africanos escravizados no Brasil,
retirando assim a sua conotação pejorativa. Nesse sentido “negro” passa a ser uma forma
de os negros resistirem à opressão que caracteriza a condição de “ser” negro como algo
ruim. Os negros passam a se identificar, a se reconhecerem como negros. A palavra de
ordem do movimento passa a ser “NEGRO NO PODER!”
Questão problematizadora: qual foi a importância do Movimento Negro para a
educação?
No âmbito educacional o Movimento Negro propôs uma revisão de conteúdos
preconceituosos em livros didáticos, capacitação interétnica para professores, reavaliação
do papel do negro no Brasil e inclusão do ensino de história da África nos currículos
escolares, passaram a reivindicar uma literatura negra ao invés da eurocêntrica. Houve
nesse sentido um resgate às raízes ancestrais e o movimento negro passou a
“africanizar-se”.
Houve também nesse período uma campanha política contra a mestiçagem, que
era tida como uma armadilha ideológica alienadora:
A avaliação era de que a mestiçagem sempre teria cumprido um papel negativo de diluição da identidade do negro no Brasil. O mestiço seria um entrave para a mobilização política daquele segmento da população. Segundo essa geração de ativistas, a mestiçagem historicamente esteve a serviço do branqueamento, e o mestiço seria o primeiro passo desse processo. Por isso, condenavam o discurso oficial pró-mestiçagem. Como contrapartida, defendiam os casamentos endogâmicos e a constituição da família negra. O homem negro teria que, inexoravelmente, casar-se com a mulher do mesmo grupo racial e vice-versa. Por
11
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
essa concepção, os casamentos inter-raciais produziam o fenômeno da mestiçagem que, por sua vez, redundariam, a longo prazo, em etnocídio. O discurso nacional pró-mestiçagem era, assim, concebido como uma estratégia da classe dominante para provocar o “genocídio” do negro no país”. (DOMINGUES, 2007, p. 116-117)
QUARTA FASE DO MOVIMENTO NEGRO (2000-??) HIPÓTESE INTERPRETATIVA
Domingues (2007) propõe uma hipótese interpretativa que vê no Hip-hop,
movimento cultural inovador, uma possível nova fase do movimento negro. Isso porque
esse movimento de característica popular fala a linguagem da periferia, nesse sentido
haveria um rompimento com o discurso vanguardista das entidades negras tradicionais
para um discurso mais acessível aos jovens negros não intelectuais. O Hip-hop expressa
a rebeldia da juventude negra, há uma mudança no perfil dos ativistas, uma espécie de
resgate da autoestima: “Negro 100%”.
Há também a substituição do termo “negro” por “preto” como uma forma de se
diferenciar do movimento negro tradicional.
No entanto, afirma Domingues (2007), é cedo para dizer que esses movimentos
sinalizam uma ruptura na plataforma do movimento negro, pois ainda é desprovido de um
programa político e ideológico mais geral de combate ao racismo, além disso não possui
um recorte estritamente racial. O discurso é contra o sistema, mas não há um eixo central.
Apesar desse movimento ser vinculado aos negros, também está vinculado aos jovens
brancos marginalizados que vivem nas periferias de todo o Brasil.
Questão problematizadora: vocês acreditam que o Hip-hop e o rap representam
uma ruptura na forma de articulação do Movimento Negro? Para vocês, qual é a
importância desses estilos musicais? Em que sentido essas músicas podem
interferir na realidade?
DADOS ESTATÍSTICOS ACERCA DAS DESIGUALDADES SOCIAIS QUE ATINGEM A
POPULAÇÃO NEGRA
Questão problematizadora: o que esses dados estatísticos tem a dizer sobre a
realidade da população negra?
12
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
Mortalidade:
No gráfico 6.1.1 podemos ver que do período compreendido entre 2002 a 2012 a
taxa de homicídios entre a população negra é muito maior do que a população branca.
Olhando para 2012, a realidade mais próxima da nossa, nós tivemos uma taxa de
homicídio da população negra de 40,4 para grupo de 100 ml habitantes, ao passo que a
população branca teve uma taxa de 16,4 para cada 100 mil habitantes. Equivale dizer que
morrem 24 pessoas negras a mais do que pessoas brancas por grupos de 100 mil
habitantes. Entre os jovens (15-24 anos) – gráfico 6.1.2 – esses números são muito
maiores: população negra jovem no mesmo período teve uma taxa de homicídios de 80,7
para 100 mil habitantes, contra 30,1 da população branca. Quer dizer que morre, ao
menos 50 pessoas a mais na população negra, do que na população branca a cada 100
mil habitantes.
13
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
No gráfico 6.2.1 podemos perceber que de 2002 a 2012 houve um crescimento na
taxa de homicídios, sobretudo da população negra. Mesmo no caso dos estados que
lograram êxito em diminuir essas taxas, as da população branca caíram mais do que as
taxas da população negra.
Questão problematizadora: e quanto à riqueza, sabemos que o Brasil é
caracterizado pela enorme desigualdade social, uma das maiores do mundo, mas
isso se reflete também entre brancos e negros?
Distribuição de riquezas:
De acordo com o IBGE (2015), mais da metade da população do Brasil (54%) é
composta por negros. As estatísticas apontam que entre as pessoas 1% mais ricas da
população, apenas 17% são negras. Já entre os mais pobres esse número sobe para
75%.
Questão problematizadora: esses dados refletem em outros aspectos, como
escolaridade? Ou moradia?
Escolaridade:
Ainda de acordo com o relatório do IBGE – 2015 esse fato (desigualdades sociais)
está relacionado com a escolaridade, que é de difícil acesso à população negra. Somado
a isso, existem altas taxas de evasão escolar ocasionadas por repetência no ensino
fundamental. O percentual de negros nas universidades – impulsionado pelas políticas de
ações afirmativas (cotas) – conseguiu atingir 12,8%, ao passo que o percentual de
brancos nas universidades equivale a 26,5%.
14
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
Mercado de trabalho:
Média salarial dos negros é inferior do que a média do país, que é R$ 1.012,25.A
média salarial dos negros está entre R$ 723,50 e R$ 753,69. Já entre os brancos a renda
média é de R$ 1.334,30.
Questão problematizadora: o que pode explicar essa diferença salarial?
Moradia:
Os lares de negros que contam com saneamento básico (sistema de esgoto, coleta
de lixo, etc.) atualmente equivale a 55,3%. Já os lares de brancos com saneamento
básico, atualmente equivale a 71,9%.
15
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
2.2 DIMENSÕES DO CONTEÚDO A SEREM TRABALHADAS NA AULA:
DIMENSÃO HISTÓRICA: apresentar a cronologia do movimento negro, suas
associações, mobilizações e lutas.
16
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
DIMENSÃO SOCIOLÓGICA: apresentar os problemas sociais (opressão contra o povo
negro) que posteriormente se converteram em problemas sociológicos, foco de análise de
diversos sociólogos brasileiros.
3. INSTRUMENTALIZAÇÃO
3.1 AÇÕES DIDÁTICO-PEDAGÓGICAS
PRIMEIRO PASSO: A aula terá início a partir do questionamento aos alunos sobre o
conceito de Movimentos Sociais, discutido na aula anterior.
SEGUNDO PASSO: Posteriormente, através do diálogo estabelecido apresentarei o
contexto histórico do surgimento do Movimento Negro no Brasil, assim como as principais
demandas do povo negro e as lutas travadas desde o período pós-abolição até o início
dos anos 2000.
TERCEIRO PASSO: Ao final, será discutido a importância do Movimento Negro na
sociedade no que diz respeito à luta por igualdade social a partir de estatísticas retiradas
dos bancos de dados do IBGE e relatório da ONG Todos Pela Educação.
3.2 RECURSOS - Quadro de Giz; Slides; vídeo que aborda as questões
problematizadoras.
4. CATARSE: SINTESE E EXPRESSÃO DA SÍNTESE:
4.1 SINTESE: Ao final da aula, espera-se que o aluno compreenda que desde o período
pós-abolição da escravatura, a população negra foi relegada à margem da sociedade.
Essa situação foi possível por ter sido pautada em um discurso que se apresentava como
um saber científico que “justificou” a superioridade de uma raça sobre a outra, o que
engendrou uma política de embranquecimento que trouxe muitos povos europeus que
monopolizaram os empregos, contribuindo ainda mais para com a situação degradante a
qual os negros foram submetidos. Essa situação gerou a necessidade de um movimento
social articulado política e culturalmente para resistir contra as discriminações e o
preconceito, e também para lutar por demandas sociais que possibilitassem superar esse
passado vergonhoso em nossa história. Espera-se que os alunos entendam a importância
do movimento negro, assim como suas pautas e as políticas afirmativas (como as cotas)
para que os negros possam ocupar os lugares (geográficos ou simbólicos), os postos de
17
Edição Nº. 8, Vol. 1, jan./dez. 2018. Inserida em: http://www.uel.br/revistas/lenpes-pibid/
trabalho, as vagas nas universidades que sempre foram negados sob a justificativa de um
discurso preconceituoso e dissimulado.
4.2 EXPRESSÃO DA SÍNTESE: Pretende-se avaliar a aprendizagem do conteúdo pelos
alunos por meio através de texto dissertativo. A atividade procura avaliar a capacidade do
aluno em associar a teoria apresentada com a atualidade e suas próprias vivências.
Nesse sentido, será proposto a seguinte questão: “Elabore um texto dissertando sobre
algum tipo de opressão que você já passou, ou já presenciou alguém passando e que
pode ser contemplado pelas atividades do Movimento Negro. (máximo de 15 linhas, mais
ou menos três parágrafos).
REFERÊNCIAS:
“Almirante Negro” – (O Mestre-Sala dos Mares) – letra sem censura, em 20/agosto/2010; Rio de Janeiro/RJ; Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=I7PW8L_ezlQ Acesso em: 28 de julho 2017. BISPO, Alexandre. Mãe Preta. 2º Ato – O Menelick, 2011. Disponível em: http://omenelick2ato.com/memoria/mae-preta/ Acesso em: 19 de outubro de 2017. DOMINGUES, Petrônio. Movimento negro brasileiro: alguns apontamentos históricos. Tempo, Niterói, v. 12, n. 23, p. 100-122, 2007 . Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-77042007000200007&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 15 de outubro de 2017. ___________________. O "messias" negro? Arlindo Veiga dos Santos (1902-1978): "Viva a nova monarquia brasileira; Viva Dom Pedro III!". Varia hist., Belo Horizonte , v. 22, n. 36, p. 517-536, Dez. 2006. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-87752006000200015&lng=en&nrm=iso Acesso em 15 de outubro de 2017. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA. Síntese de indicadores sociais – uma análise das condições de vida da população brasileira. IBGE, 2016. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv98965.pdf Acesso em: 15 de outubro de 2017. TODOS, PELA EDUCAÇÃO. De olho nas metas 2015-16: sétimo relatório de monitoramento das 5 metas do Todos Pela Educação. Todos Pela Educação, 2017. Disponível em: https://www.todospelaeducacao.org.br/arquivos/biblioteca/olho_metas_2015_16_final.pdf Acesso em: 15 de outubro de 2017.