http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
A TERRITORIALIDADE DOS MOVIMENTOSSOCIAIS NA AMAZÔNIA: A REALIDADE DO
MUNICÍPIO DE MARABÁ, NO SUDESTEPARAENSE
Rogério Rego Miranda
USP/UNIFESSPA
INTRODUÇÃO
O espaço agrário amazônico é marcado pela concentração de terras, visualizada
por meio dos latifúndios, dos quais muitos são produtos de grilagem, expropriação de
indígenas, camponeses e da apropriação de terras devolutas de propriedade do Estado. Este
fato ocorreu no Sudeste Paraense (ver figura 01), realidade em que os investimentos
capitalistas se efetivaram com grande intensidade, culminando na abertura de estradas e
em uma forte imigração, contribuindo para o aparecimento de uma grande massa de
trabalhadores sem terra.
Essa desigualdade sócioespacial é contestada por diversos movimentos sociais,
com destaque ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Assim, torna-se
importante a discussão da construção do território do MST, com destaque a sua
configuração no Município de Marabá, processo que advém desde o final da década de
1990. A pesquisa apresenta uma grande relevância visto que analisa as formas de
organização do MST, porém pelo prisma do território, entendido aqui, como produto da
interação sociedade-espaço, a qual é mediada e delimitada por e a partir de relações de
poder, em suas múltiplas dimensões. Nesse contexto, a nossa pesquisa visa analisar a ação
desse movimento social no Município de Marabá, especialmente no que concerne as suas
ações na construção e reprodução da luta territorial no assentamento 26 de Março. Para
alcançarmos os resultados da pesquisa em andamento utilizamos como procedimentos
metodológicos o levantamento de material bibliográfico e documental; observação
sistemática; registros fotográficos; entrevistas semiestruturadas; questionários e produção
cartográfica.
4002
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
Figura 1: Mesorregião do Sudeste Paraense.
Fonte: www.bicopapagaioam.hpg.ig.com.br/mapas
Assim, entendemos que na relação entre o Estado e movimentos sociais, o
primeiro apresenta um papel ambíguo em suas intervenções, visto que por meio da
Constituição Federal de 1988, assegura que as terras devolutas deveriam ser para a reforma
agraria, reconhecendo a reivindicação histórica dos movimentos sociais. Por outro lado,
deve prezar pela propriedade privada da terra e, para esse fim, estabelece duas frentes de
atuação em relação a esses movimentos, ou seja, uma visando o processo de criminalização
deles; e outra, proporcionando políticas públicas, a exemplo do Pronaf (Programa de
4003
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
Fortalecimento da Agricultura Familiar), que em certa medida busca controlar/disciplinar e
diminuir o papel político desses movimentos. Como consequência, observamos o aumento
de desapropriações de terra por parte do Estado e a expansão do capital sobre o Sudeste
Paraense e, especificamente Marabá, materializado no agronegócio, realizando a pecuária
de corte e a produção de leite, com alto grau de cientificização do território (uso de
inseminação artificial, clonagem de gado de alto valor comercial etc.), além da plantação de
eucalipto (uso na produção de carvão para as siderúrgicas e para o setor de construção
civil). Muitas dessas empresas se associam com assentados, que, por sua vez, utilizam de
financiamentos provenientes do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar) para viabilizar a criação e a manutenção de rebanho bovino, que
posteriormente é vendido aos frigoríficos das empresas do agronegócio. Entretanto esse
processo não se desenvolve sem resistências e contra-projetos de territorialização
existentes nos assentamentos do MST, buscando a sua territorialidade mediante a uma
organização política (luta pela reforma agrária e, consequentemente, pela socialização dos
recursos naturais, ou seja, a terra de trabalho), econômica (economia camponesa, baseada
na economia de excedentes) e cultural própria (construção de uma identidade particular).
Com efeito, evidencia-se uma maior territorialização do capital em Marabá, mas, por outro
lado, as ocupações, os acampamentos e assentamentos representam e propõem, de
maneira aberta e conflituosa, projetos territoriais diversos e contra hegemônicos.
Conflitos territoriais no espaço agrário do sudeste paraense
O território do sudeste paraense, na Amazônia brasileira, é disputado por
décadas entre indígenas, castanheiros, fazendeiros, grileiros, garimpeiros, posseiros,
empresas mineradoras, dentre outros, conferindo a subregião a condição de uma das áreas
mais conflituosas do Brasil, devido à alta concentração de terras na região.
De acordo com dados da CPT (Comissão Pastoral da Terra) de 2011, os conflitos
por terra – compreendidos como despejos, expulsões, ameaças de despejos e expulsões,
bens destruídos e pistolagem – apresentam o seguinte número de ocorrências, por região:
Centro-Oeste com 37 casos, envolvendo 3.597 famílias; Nordeste com 279 casos,
envolvendo 21.923 famílias; Norte com 234 casos; envolvendo 18.026 famílias; Sudeste com
61 casos, envolvendo 5.638 famílias; e Sul com 27 casos, envolvendo 766 famílias,
totalizando 638 casos e envolvendo 49.950 famílias em todo o Brasil. Com base nesses
dados percebemos que o Nordeste e o Norte ainda permanecem como as áreas de maiores
4004
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
conflitos no campo.
O Pará registrou no ano de 2011 a marca de 103 conflitos, com um total de
12.197 famílias. A mesorregião do sudeste paraense apresentou 47 conflitos, envolvendo
6.226 famílias. Marabá correspondeu ao município com maior ocorrência de conflitos com
um total de 8, abarcando 416 famílias (CPT, 2011).
Nesses conflitos participam diversos movimentos sociais, com destaque ao
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), cujos sujeitos uma vez
desterritorializados, devido à expropriação de suas terras, almejam uma reterritorialização
mais inclusiva, ou seja, a reforma agrária, visto que eles não possuem no presente momento
o direito de dispor de um pedaço de chão para se reproduzirem em suas mais variadas
formas.
O movimento em relevo e sua territorialidade se expressa por meio, por
exemplo, das ocupações de terras, acampamentos e assentamentos, apresentando
articulações com outros segmentos de luta social, como a Comissão Pastoral da Terra (CPT),
a Via Campesina, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR), a Federação dos
Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará (Fetagri -PA), dentre outros. Assim, torna-se
importante a discussão da construção do território do MST, com destaque a sua
configuração no Município de Marabá, processo que advém desde o início da década de
1990.
O Sudeste Paraense, de acordo com Souza (2002), apresenta três importantes
períodos de reordenação espacial. O primeiro na década de 1970, mediante a política de
distribuição de lotes, provocando um forte movimento migratório para a região. E nesse
contexto, algumas famílias permaneceram; outras foram obrigadas a abandonarem seus
estabelecimentos e se dedicarem a atividades não agrícolas; e muitas procuraram diferentes
frentes de trabalho. O segundo momento, refere-se à ocupação da área pela atividade
agropecuária com fortes incentivos estatais ao capital privado nacional e internacional; além
da exploração mineral, estimulando uma nova leva de força de trabalho, para atuar nas
obras de infraestrutura, acirrando os conflitos sociais, especialmente aqueles ligados a
posse da terra. Também se evidencia o garimpo, a exemplo de Serra Pelada. Por fim, no
terceiro momento, observa-se uma redução do incremento populacional; o fechamento de
garimpos; e a ausência de uma política pública que realizasse de fato a reforma agrária,
favorecendo o aparecimento de uma grande massa de sujeitos desterritorializados, que
passam a lutar pela permanência no território e a pressionar o Estado para atingir esse fim.
4005
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
A Amazônia no contexto supracitado recebe inúmeros incentivos ficais e
creditícios, porém esses foram direcionados aos empresários nacionais e estrangeiros e aos
grandes projetos, que concorreram para o aumento da concentração de terras,
especialmente no sudeste paraense, provocando, ao contrário do que o governo militar
propagandeava, um desenvolvimento da miséria e da pobreza, principalmente em função
da diminuição dos postos de trabalho oferecidos inicialmente; da expulsão dos índios de
suas reservas; do remanejamento de ribeirinhos, em decorrência do represamento do rio,
proporcionado pela construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí (UHT); da retirada violenta
dos posseiros existentes na área pela ação de grileiros e empresários.
Com a desterritorialização desses diversos grupos sociais e a entrada de muitos
migrantes que vão para o Sudeste Paraense e lá se territorializam precariamente,
trabalhando como agricultores, peões, rendeiros e garimpeiros, embora igualmente
destituídos da terra, entraram igualmente para movimentos sociais como uma alternativa
de realizar o desejo de acesso à terra (SOUZA, 2002).
E o MST nasce em meio ao enfrentamento e a resistência contra a esse modelo
desenvolvimentista e agropecuário instaurado durante o regime militar, e tem como
fundamento a luta contra a expropriação e exploração existente no processo de reprodução
do capitalismo. E a sua construção está assentada no bojo das discussões sobre democracia,
em que a classe trabalhadora conquista novos espaços no campo e na cidade. Momento em
que surgem diversos movimentos sociais. Logo, o MST inicia sua gestação em meio a uma
série de experiências de lutas populares enquanto estratégia político-cultural estabelecida
no seio destes sujeitos sociais, que iniciam ocupações de terra em vários estados. Essas
lutas mais localizadas ganham repercussão no país por meio da igreja e em menor parte
pela mídia, mas foi pela troca de experiências que a articulação em nível nacional desses
movimentos se estruturou, objetivando a superação do isolamento e a autonomia política.
Nesse contexto foram realizados encontros maiores reunindo lideranças estaduais por
intermédio da CPT, especialmente no Centro-Sul, e dessas iniciativas se fundou e organizou
um movimento dos camponeses sem-terra nacional, que lutaria por reforma agrária,
originando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (FERNANDES, 1999)
No Sudeste Paraense, o MST surge com o intento de organizar os camponeses,
em sua grande maioria migrantes oriundos de outras regiões, que haviam sido expulsos ou
mesmo expropriados de suas terras. Mas igualmente resulta de movimentos locais que se
formam, por exemplo, a partir de organizações sociais impulsionadas pela igreja, mediante
4006
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
as Comunidades Eclesiais de Base (CEB`s) em Marabá, que fomentaram a criação de
Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STR`s). Além de partidos políticos ditos de esquerda
(Partido Comunista do Brasil – PC do B – e Partido dos Trabalhadores – PT) e clandestinos
que vão incitar tal processo (ALMEIDA, 2006).
Com o intuito de combater a estrutura fundiária concentrada os movimentos
sociais, em especial o MST, instauram uma dinâmica de luta e uso de estratégias que
venham a questionar e colocar em xeque essa realidade, concorrendo para a ocorrência de
diversos conflitos por terra.
Entre os anos de 2006 a 2011, o Pará apresentou 606 áreas em conflito,
envolvendo 77.028 famílias, ocupando uma área de 6.982.002 hectares. Quase metade
desse número de conflitos está localizada no sudeste paraense, o qual concentra 284 casos
de conflitos (46,86% de todo o estado do Pará), envolvendo 43.933 famílias (57,03%) e
ocupando uma área de 2.743.867 hectares (39,29%). Em Marabá foram identificadas 42
áreas em conflito (6,93%), envolvendo 5.299 famílias (6,87%) e ocupando 96.285 hectares
(1,37%), entre os anos de 2006 a 2011. De acordo com o gráfico 1 abaixo, observamos que o
número de conflitos anuais são relativamente altos no município em relevo, apresentando 4
conflitos no ano de 2007; 6 conflitos nos anos de 2006, 2008, 2011; 7 conflitos no ano de
2010; e 13 conflitos em 2009.
Desse modo, para pressionar o governo pela reforma agrária e reivindicar o
direito de acesso a terra-território, os movimentos sociais realizam as chamadas ocupações,
que correspondem a “ações coletivas das famílias sem ter¬ra que, por meio da entrada em
imóveis rurais, rei¬vindicam terras que não cumprem a função social” (CPT, 2009, p.11).
Nesse sentido, a partir de dados da CPT (2011) observou-se que no Pará houve cerca de 342
ocupações registradas entre os anos de 1999 e 2009, com aproximadamente 47.178 famílias
envolvidas. Desse total o Sudeste Paraense apresentou 270 ocupações computadas
(78,94%), com 31.852 famílias (67,51%). O Município de Marabá no período de 1999 a 2011
teve registrado 60 ocupações (17,54% de todo o estado do Pará) e 7.033famílias
discriminadas (14,90%).
Uma outra estratégia desenvolvida são os acampamentos; que, segundo a CPT
(2009, p.11), são “espaços de luta e formação, fruto de ações coletivas, localizados no campo
ou na cidade, onde as famílias sem terra organizadas, reivindicam assentamentos”.
No Pará, de um total de 83 acampamentos desencadeados entre os anos de
4007
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
2002 e 2011, envolvendo 16.632 famílias, 68 localizaram-se no Sudeste Paraense (76,92%),
compreendendo 11.672 famílias nessa situação. Marabá no período mencionado acima
apresentou 14 acampamentos (16,86% de todos os acampamentos do estado do Pará), com
1.518 famílias no total (9,12%), cujos números podem ser observados ao longo dos anos no
gráfico 3, que identifica um aumento de acampamentos no ano de 2003, início do governo
do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, porém com uma redução nos anos subsequentes, e
uma retomada desses acampamentos a partir de 2010, começo da presidência de Dilma
Vana Rousseff, em decorrência dos impasses existentes entre os movimentos sociais a
política de reforma agrária estatal.
Essas ações dos movimentos sociais buscam a implementação dos Projetos de
Assentamentos (PA`s) que no Sudeste Paraense, segundo Magalhães (2009), não seguem o
modelo recorrente de implantação, a saber: acampamento-desapropriação-assentamento;
isso porque essa mesorregião apresenta uma situação particular. Aliás ela concentra grande
parte dos PA`s existentes no país, ou seja, o sudeste do Pará possui sozinho um total de
495 assentamentos, com uma área de 4.486.461,766 hectares, contendo 69.876 famílias
assentadas (SIPRA/INCRA-SR/27, 2011).
Para Magalhaes (2009) esses assentamentos são produto de ocupações
desenvolvidas desde o final da década de 1970 e ao longo de 1980, momento de diversos
conflitos fundiários. Entretanto, os PA`s representam uma ação tardia do Estado em
reconhecer uma situação de reforma agrária proporcionada pelos próprios camponeses,
visto que o assentamento não lhes proporcionou o acesso à terra. Pelo contrário, esse fato
só ocorreu pela organização e luta coletiva travada pelos mesmos. Desse modo, os PA`s
compreendem a um direito adquirido pelos pequenos produtores, mediante a posse e o
trabalho na terra desenvolvido há anos, independente e muitas vezes contra o Estado. Logo,
o direito à terra pouco tem haver com as regras formais de propriedade, ao passo que o
projeto de assentamento é consequência de várias iniciativas sociais que venham a lhes
garantir melhorias, e é resultado de um processo jurídico-político, cuja elaboração é
efetuada por instituições ou organizações externas ao mundo camponês.
Em Marabá essa condição não é diferente, apenas por meio de diversas
ocupações realizadas no passado, é que hoje existem 77 assentamentos, com uma área
total de 398.486,2306 hectares e 6.793 famílias (SIPRA/INCRA-SR/27, 2011). Projetos esses
que são oriundos de ações de posseiros em castanhais e do próprio MST, fato que
contribuiu para que em 1998 e 1999 houvesse a criação de 38 PA`s e mais 21 de 2000 a
4008
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
2003. Entretanto, os dados indicam uma diminuição expressiva no número de PA`s, tendo
ocorrido 3 em 2004, 2 em 2005 e apenas 1 em cada ano de 2006 a 2009 e nenhum
assentamento foi criado nos anos de 2010 e 2011, denotando uma redução drástica da
política de reforma agraria do governo federal, o que explica o aumento de ocupações e
acampamento nos últimos anos conforme foi indicado acima.
Com relação a esses assentamentos e acampamentos, o MST é responsável
diretamente no Pará por 13 assentamentos e 12 acampamentos; no sudeste paraense por 7
assentamentos e 8 acampamentos; e em Marabá por 1 assentamento (26 de Março) e 1
acampamento (Helenira Rezende), de acordo com os dados do próprio movimento social no
ano de 2009 (ver quadro 01).
Quadro 1 – Relação dos assentamentos e acampamentos assessorados pelo MST no estado do Pará– 2009
Mesorregião Nº SituaçãoFundiária
Nome Município Área (ha)
N° deFamílias
Sudeste Paraense 1 Assentamento 26 de Março Marabá 9.774 206
2 Assentamento Palmares I e II Parauapebas 14.921 517
3 Assentamento Onalicio Barros Parauapebas 1.770 68
4 Assentamento 17 de Abril Eldorado do Carajás 18.000 690
5 Assentamento Cabanos Eldor do Carajás 3.426 85
6 Assentamento Canudos Eldorado do Carajás 2.836 62
7 Assentamento 1° de Março São João do Araguaia 10.960 338
Sudoeste Paraense
8 Assentamento Chico Mendes II Pacajá 5.250 66
9 Assentamento 08 de Março Pacajá 1.500 30
Nordeste Paraense
10 Assentamento Chico Mendes I Baião 3.050 42
Metropolitana de Belém
11 Assentamento João Batista Castanhal ----- 157
12 Assentamento Mártires de Abril Mosqueiro/Belém ----- 87
13 Assentamento Paulo Fontelles Mosqueiro/Belém ----- 68
Sudeste Paraense 14 Acampamento Helenira Resende Marabá ----- 300
15 Acampamento Lourival Santana Eldorado do Carajás ----- 383
16 Acampamento Dalcídio Jurandir Eldorado do Carajás ----- 350
17 Acampamento Dina Teixeira Canaã dos Carajás ----- 700
18 Acampamento João Canuto Xinguara ----- 130
19 Acampamento Wladimir Maiakóvisk
Xinguara ----- 380
20 Acampamento Negra Madalena Tucumã ----- 70
21 Acampamento Bom Jesus Tucumã ----- 20
4009
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
Confluência do Nordeste paraense, Sudoeste paraense e Baixo Amazonas.
22 Acampamento Salvador Allende Baião/Pacajá/Portel ----- 160
Nordeste Paraense
23 Acampamento Luis Carlos Prestes Irituia ----- 70
24 Acampamento Carlos Lamarca Capitão Poço ----- 60
25 Acampamento Olga Benário Acará ----- 55
Total de famílias
8.094
Fonte: Secretaria Estadual do MST-PA/2009
Embora numericamente a ação do MST pareça não ser significativamente
expressiva, especialmente em Marabá, segundo Ondetti et all (2010), esse movimento foi o
principal responsável por mobilizar e organizar as ações de ocupação de terras no sudeste
paraense, inovando em termos de táticas de ocupação e auxiliando inclusive os STR`s locais,
apesar de muitas divergências e conflitos.
O MST inicia a sua atuação junto ao sudeste paraense por volta de 1991 e se
articula com outras entidades locais, especialmente os STR`s, com o intuito de começar os
trabalhos de base, os quais começaram em Marabá, mediante ao cadastramento de três mil
famílias. A primeira decisão foi a ocupação da Fazenda Ponta de Pedras em São João do
Araguaia, a qual não pode ocorrer devido a intervenção da Polícia Militar (P.M.), da Polícia
Federal (P.F) e Polícia Civil (P.C.) de Marabá que fechou a sede do MST, sem ao menos um
mandato judicial, fato esse que culminou na prisão de sete dirigentes do referido
movimento social. Nesse mesmo contexto os fazendeiros resolvem agir de maneira
antecipada as ações do MST, pois antes atuavam com intensa violência contra os posseiros
de maneira individual e fragmentada, mas no caso do movimento sem-terra, esse se
organizava nacionalmente e avançava em todos os estados e com uma estratégia de luta
desconhecida para os fazendeiros (GOMES, 2009).
Com a desmobilização da primeira ocupação o movimento em relevo recebe
ajuda de pessoas do maranhão ligadas a ele e a partir de um novo trabalho de base se
ocupa uma área denominada de “cinturão verde” em Parauapebas no dia 26 de Junho de
1994, com cerca de 1.500 famílias. A área em questão havia sido cedida pelo governo federal
a Companhia Vale do Rio Doce, e para provocar pressão sobre o governo, as famílias
4010
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
acamparam em frente ao INCRA, em Marabá, durante cinco meses, e embora não tenham
conseguido a terra no local supracitado a luta dos militantes possibilitou a criação de um
projeto de assentamento com a desapropriação da fazenda Rio Branco, a partir desse
momento outras ocupações foram sendo realizadas e outros assentamentos são
organizados com base na logica do MST (GOMES, 2009).
Entretanto a ocupação que mais ganhou repercussão nacionalmente foi a do
Complexo Macaxeira que resultou no Massacre de Eldorado de Carajás (área em questão
fazia parte do polígono dos castanhais, que sediava o processo produtivo da
castanha-do-pará, baseado principalmente na mão de obra escrava. No local, após o
referido período, houve o investimento na criação de animais de grande porte e na venda
ilegal de madeira) que resultou na criação do P.A. 17 de Abril, fazendo referencia a data de
17/ 4/1996, em que houve o conflito com a Policia Militar e que gerou 19 mortes de sem
terras (GOMES, 2009).
Um dessas ações pode ser visualizada no caso específico do assentamento P.A.
26 de Março, que teve sua origem com a ocupação da fazenda Cabaceira de propriedade da
família Mutran, que foi ocupada a partir de uma estratégia estabelecida pelo MST, a qual
previa uma manifestação pública por emprego, no dia 26/03/1999, mas que em verdade
tinha por intuito desvirtuar o verdadeiro objetivo do ato, que era ocupar a área citada
anteriormente e para essa ação o MST organizou os trabalhos de base três meses antes e
com aproximadamente 50 militantes e outros assentados que se prontificaram em ajudar
(GOMES, 2009).
A ocupação da fazenda em destaque começou com 950 famílias e findou com
400, cuja quantidade de pessoas ultrapassava a área destinada ao assentamento, desta
forma ficaram apenas 206 famílias e as demais foram remanejadas para outras áreas de
acampamento. Com efeito o assentamento hoje apresenta 206 lotes com 50 hectares cada,
organizados em seis núcleos de moradia, que comportam cada um entre vinte e cinquenta
famílias (ver figura 2) e uma área de 174 hectares para cedida para a Escola Agrotécnica
Federal de Marabá (GOMES, 2009).
4011
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
Figura 2: Assentamento 26 de Março – Identificação dos Núcleos de Moradia.
O P.A. 26 de Março recebeu em 2009 políticas públicas que correspondem
aquelas que estão em forma de lei (norma de execução/ nº79/DD de 26 de dezembro de
2008) e são obrigatórias, devendo ser executadas pela seção regional do INCRA (SR-27) no
momento de implantação do assentamento, logo ficou ao seu encargo a demarcação da
área total e dos lotes de cada agricultor, da construção das casas, das estradas e de fomento
a agricultura, muito embora tenha sido identificado uma associação na aplicação de políticas
públicas entre o INCRA, governo estadual e municipal.
CONCLUSÕES
De uma maneira geral, no sudeste paraense existiu uma forte territorialização
de agentes econômicos, a exemplo dos castanheiros, comerciantes no inicio do século XX e,
mais recentemente, de empresas mineradoras e/ou agropecuárias e fazendeiros, que
viabilizaram expropriação, ou seja, introduziram formas de apropriação dos recursos, que
desterritorializam populações tradicionais, como os indígenas e camponeses. Embora, em
determinadas condições desenvolvam a territorialização do capital (Oliveira, 2002), entrando
em consórcio com os pequenos produtores e/ou assentados, subjugando-lhes a sua renda
4012
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
da terra.
Esse processo, no entanto, não deve obscurecer a ação concreta dos
movimentos sociais que se territorializam e apresentam formas outras de (re)produção,
irredutíveis a uma dimensão econômica. Além de construírem no seio das suas lutas
coletivas projetos alternativos, flexíveis e em estruturação constante, ambicionando uma
certa emancipação. Desse ponto de vista, concordamos com Gonçalves (2006), ao
compreender que os movimentos sociais apresentam uma expressão territorial, cuja análise
deve, metodologicamente, considerar alguns pressupostos, a saber: 1. Os conflitos
apresentam uma feição dialética e aberta dos processos instituintes; 2. O conflito territorial
deve ser analisado em suas diferentes escalas geográficas; 3. Por fim, os movimentos sociais
possuem a capacidade de trazer a tona as contradições marcadas no território, não apenas
mostrando a sua realidade atual, mas sugerindo outras possibilidades inscritas no real,
sendo portador de uma outra ordem, que implica em novas posições e reações socialmente
produzidas.
Tal interpretação é parcialmente compartilhada por Alentejano (2008), que
critica o conceito de “movimentos socioterritoriais” de Fernandes (2008), para o qual os
movimentos gozariam de uma maior autonomia, já que possuem o próprio território como
trunfo, a exemplo dos acampamentos, considerados espaços de luta, resistência e
socialização política. Todavia, para Alentejano (2008) essa autonomia deveria ser
relativizada, em virtude da atuação de outros mecanismos de subordinação, isto é, o
trabalho e a posse da terra fazem parte das relações de trabalho, mas não se referem a sua
totalidade. Portanto, deve-se inegavelmente avaliar os condicionantes e disciplinamentos
impostos pelo Projeto de Assentamento.
De uma maneira geral, ao se analisar a realidade do espaço agrário e a ação dos
movimentos sociais, especialmente em uma região de fronteira, como é o caso de nosso
locus de pesquisa, pauta-se ainda na ideia de frente pioneira, que exprime um movimento
social cujo resultado imediato é a incorporação de novas regiões pela economia de mercado
(MARTINS, 1975). Havendo a “modernização” das relações e inserindo-as em uma lógica do
mercado capitalista. Não estamos negando esse processo, mas como Martins (1997) nos
chama atenção, a fronteira é marcada pelo encontro e desencontro de temporalidades,
representativas de tempos sociais que embora “nascidas” em momentos históricos
diferentes, coexistem entre si assimetricamente, numa relação de “descompasso e
desencontro”. Essas temporalidades, e porque não dizer territorialidades, reconstroem
4013
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
concepções de sociedade que entram em disputa entre si, criando projetos territoriais que
possuem naturezas diferenciadas, mas articuladas.
4014
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
REFERÊNCIAS
ALENTEJANO, Paulo. Uma análise geográfica dosconflitos no campo brasileiro. . In: MárcioPiñon de Oliveira; Maria Célia Nunes Coelho;Aureanice de Mello Corrêa. (Org.). O Brasil, aAmérica Latina e o Mundo: espacialidadescontemporâneas. Rio de Janeiro: Lamparina:Faperj; ANPEGE, 2008, v. II, p. 238-253.
ALMEIDA, Rogério Henriquez. Territorializaçãocamponesa no Sudeste do Pará. Dissertação(Mestrado em Desenvolvimento Sustentável doTrópico Úmido) - Universidade Federal do Pará,2006.
CPT. Conflitos no campo do Brasil. São Paulo:Expressão Popular, 2009.
______. Conflitos no campo do Brasil. São Paulo:Expressão Popular, 2011.
GOMES, Maria Suely Ferreira. A construção daorganicidade no MST: A experiência doassentamento 26 de Março-PA. Paraíba, 2009.Dissertação (Mestrado em Geografia Humana)– Centro de Humanidades , UniversidadeFederal de Campina Grande, 2009
GONÇALVES, Carlos Walter Porto. A geograficidadedo social: uma contribuição para o debatemetodológico para os estudos de conflitossociais na América Latina. In: Revista Eletrônicada Associação dos Geógrafos Brasileiros –Seção Três Lagoas-MS, V. 1, nº3, 2006, p. 5-25.
FERNANDES, Bernardo Mançano. MST: formação eterritorialização. São Paulo: Hucitec, 1999.
______. Movimentos socioterritoriais do campobrasileiro: contribuição para leitura geográficados movimentos camponeses. . In: Márcio
Piñon de Oliveira; Maria Célia Nunes Coelho;Aureanice de Mello Corrêa. (Org.). O Brasil, aAmérica Latina e o Mundo: espacialidadescontemporâneas. Rio de Janeiro: Lamparina:Faperj; ANPEGE, 2008, v. II, p.385-405.
MARTINS, José de Souza. . Frente pioneira:contribuição para uma caracterizaçãosociológica. In: MARTINS, J.S. Capitalismo etradicionalismo: estudos sobre as contradiçõesda sociedade agrária no Brasil. São Paulo:Pioneira, 1975.
______. Fronteira: a degradação do Outro nosconfins do humano. São Paulo: Hucitec, 1997.
ONDETTI, Gabriel; WAMBERGUE, Emmanuel;AFONSO, José Batista g. De posseiro asem-terra: o impacto da luta pela terra do MSTno Pará. In: CARTER, Miguel (org.).Combatendo a Desigualdade Social: O MST e aReforma Agrária no Brasil. UNESP:SP-Presidente Prudente, 2010, p. 257-284.
OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. A geografiaagrária e as transformações territoriaisrecentes no campo brasileiro. In: CARLOS, A. F.A (org.). Novos caminhos da geografia. SãoPaulo: Contexto, 2002.
SOUZA, Carlos Henrique Lopes de. A Trajetória daForça de Trabalho no Sudeste Paraense: deagricultores migrantes a garimpeiros, degarimpeiros a posseiros, a excluídos, a SemTerra. In: XIII Encontro da Associação Brasileirade Estudos Populacionais, realizado em OuroPreto, Minas Gerais, Brasil de 4 a 8 denovembro de 2002.
4015
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
A TERRITORIALIDADE DOS MOVIMENTOS SOCIAIS NA AMAZÔNIA: A REALIDADE DO MUNICÍPIO DE MARABÁ, NO SUDESTE PARAENSE
EIXO 2 – Dinâmicas e conflitos territoriais no campo e desenvolvimento rural
RESUMO
O espaço agrário amazônico é marcado pela concentração de terras oriunda da grilagem, da
expropriação de territórios indígenas, camponesas e da apropriação de terras devolutas de
propriedade estatal. No Sudeste Paraense isso ocorre devido aos investimentos capitalistas se
efetivaram com grande intensidade, culminando na abertura de estradas e no investimento de
grandes projetos agropecuários e mineradores, concorrendo para a valorização e apropriação
empresarial da terra, por outro lado, promove também uma forte imigração, contribuindo para o
aparecimento de uma grande massa de trabalhadores sem terra. Essa desigualdade sócioespacial
é contestada por diversos movimentos sociais, com destaque ao Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem-Terra (MST). A sua territorialidade se expressa por meio das ocupações de terras,
acampamentos e assentamentos. Assim, torna-se importante a discussão da construção do
território do MST, com destaque a sua configuração no Município de Marabá, processo que advém
desde o final da década de 1990. Desta feita, a pesquisa apresenta uma grande relevância visto
que analisa as formas de organização do MST, porém pelo prisma do território, entendido aqui,
como produto da interação sociedade-espaço, a qual é mediada e delimitada por e a partir de
relações de poder, em suas múltiplas dimensões. Assim, a pesquisa visa analisar a ação das
políticas públicas sobre o território camponês no espaço agrário do Município de Marabá,
especialmente no que concernem as atuações governamentais junto aos assentamentos
provenientes de lutas do MST, com destaque ao assentamento 26 de Março. Para alcançarmos os
resultados da pesquisa em andamento utilizamos como procedimentos metodológicos o
levantamento de material bibliográfico e documental; observação sistemática; registros
fotográficos; entrevistas semiestruturadas; questionários e produção cartográfica. Assim,
entendemos que nessa relação entre o Estado e movimentos sociais, o primeiro apresenta um
papel ambíguo em suas intervenções, visto que por meio da Constituição de 1988, assegura que
as terras devolutas deveriam ser para a reforma agraria. Por outro lado, deve prezar pela
propriedade privada da terra, estabelecendo duas frentes de atuação em relação aos movimentos:
uma visando o processo de criminalização deles; e outra, proporcionando políticas públicas, a
exemplo Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar, que em certa medida busca
controlar/disciplinar e diminuir o papel político dos movimentos sociais. Consequentemente,
eleva-se as desapropriações de terra e a expansão do capital sobre o Sudeste Paraense e,
especificamente, Marabá, materializado no agronegócio, realizando a pecuária de corte e a
produção de leite, com alto grau de cientificização do território, além da plantação de eucalipto
usado nas siderúrgicas. Muitas dessas empresas do agronegócio se associam aos assentados,
4016
http://6cieta.org São Paulo, 8 a 12 de setembro de 2014.ISBN: 978-85-7506-232-6
que, por sua vez, utilizam de financiamentos provenientes do Pronaf para viabilizar a criação de
gado, que posteriormente é vendido aos frigoríficos dessas empresas. Entretanto, esse processo
não se desenvolve sem resistências, existentes nos assentamentos de atuação do MST, buscando
a sua territorialidade mediante a uma organização política, econômica e cultural própria. Com
efeito, evidencia-se uma maior territorialização do capital em Marabá, mas, por outro lado, as
ocupações, os acampamentos e assentamentos representam e propõem, de maneira aberta e
conflituosa, projetos territoriais diversos e contra hegemônicos.
Palavras-chave: Amazônia; Marabá; MST; Pronaf.
4017