UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
DANIEL BARBOSA CASSOL
A DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO BRASIL
Anotações Teóricas e História do Movimento
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Porto Alegre, RS, Brasil
2003
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DANIEL BARBOSA CASSOL
A DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO BRASIL
ANOTAÇÕES TEÓRICAS E HISTÓRIA DO MOVIMENTO
Monografia de Graduação em Comunicação Social/Jornalismo Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Departamento de Comunicação
Orientador: Wladymir Ungaretti
Porto Alegre
2003
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO
DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO
A Banca Examinadora, abaixo assinada, aprova a Monografia de Graduação
A DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO BRASIL Anotações Teóricas e História do Movimento
elaborada por Daniel Barbosa Cassol
Como requisito parcial para a obtenção do grau de
Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo
BANCA EXAMINADORA:
__________________________________________________
Wladymir Ungaretti (orientador)
__________________________________________________
Geraldo Canali
__________________________________________________
Venício Artur de Lima
Porto Alegre, agosto de 2003
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AGRADECIMENTOS
A Ernesto Che Guevara, Sepé Tiarayu, Luiz Sérgio Metz, Garrincha, Atahualpa Yupanqui e Apparício Torelly, pela inspiração.
A Ana Basso, Gustavo Gindre, James Goergen, João Brant, Jonas Valente, Pedrinho
Guareschi, Sandra de Deus, Renata Charão e Rogério Tomaz Jr., por terem conversado, lido meu trabalho, opinado, cedido entrevistas, respondido às minhas mensagens.
Ao meu orientador, Wladymir Ungaretti; aos professores Venício Artur de Lima e Geraldo Canali; à colega Micheline Michaelsen e à relações públicas e minha mãe, Glória Barbosa Cassol, pela colaboração fundamental para a realização deste trabalho.
À Tia Vilma, por me oferecer refeições e cerveja por preço honesto.
Aos meus colegas do movimento estudantil e da Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos), por terem feito com que minha vida na Fabico não fosse uma mera passagem rumo ao deus-mercado. O resultado final deste trabalho pode ter ficado aquém das expectativas, mas o tema segue de fundamental importância. Só cheguei até ele por causa da Enecos e do combatido e combativo movimento estudantil de comunicação. Este trabalho é de todos nós. E à Nanda, pela companhia nesta reta final.
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“atirados em passeatas ou em casos solitários
como batuques diferentes numa mesma pulsação
que não vão mudar o mundo mas fazem a diferença fazem nossa diferença
ao fascismo que cresce com a crise fazem nossa diferença na maneira de encarar
cidadania, ruas e microfones”
Marcelo Yuka
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À memória de Amélio Antônio Cassol
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RESUMO
A democratização dos meios de comunicação é reivindicação de diversos setores da sociedade civil brasileira. No entanto, o entendimento do que é uma comunicação democrática e de como estabelecer a democratização da comunicação ainda é vago e diverso. Este trabalho procura entender qual é a base histórica e teórica da luta pela democratização da comunicação. No plano internacional, a principal referência está nos debates promovidos pela UNESCO, que vieram alertar o mundo para a necessidade de uma Nova Ordem Mundial da Informação e da Comunicação. A reivindicação da NOMIC se baseia na idéia de que a comunicação constitui-se num dos direitos humanos fundamentais. Como proposta, apontava uma ampla gama de ações que até hoje servem de referência àqueles que se dedicam ao tema. No Brasil, o debate da NOMIC se coadunou, no início da década da 1980, com o crescente interesse que o tema da comunicação vinha adquirindo no país e com o fortalecimento das entidades da sociedade civil, que passaram a encarar a democratização da comunicação como fundamental para a própria redemocratização do Brasil. Este trabalho constitui-se numa pesquisa exploratória, com base em bibliografia, entrevistas com especialistas e documentos das entidades ligadas à trajetória da Frente Nacional de Lutas por Políticas Democráticas de Comunicação (FNPDC) e do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). No primeiro capítulo, procuramos discutir introdutoriamente “o que é uma comunicação democrática” e “como democratizar a comunicação”. No segundo capítulo, traçamos o histórico do movimento pela democratização da comunicação no Brasil, resgatando também as origens do debate internacional promovido pela UNESCO. Esperamos que, com base neste estudo preliminar que ora empreendemos, sejam feitas discussões mais aprofundadas daqui para frente, uma vez que nas bases de discussão da democratização da comunicação está o debate sobre que sociedade queremos.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 11
ABORDAGEM METODOLÓGICA .................................................................................. 21
1 ANOTAÇÕES TEÓRICAS ........................................................................................ 30 1.1 O que é uma comunicação democrática? ............................................................ 30 1.2 Como democratizar a comunicação? .................................................................. 36 1.3 As propostas da sociedade civil brasileira .......................................................... 40 2 HISTÓRICO DO MOVIMENTO ............................................................................... 50 2.1 O Debate Internacional ....................................................................................... 50 2.1 A Democratização da Comunicação no Brasil .................................................... 57 CONCLUSÃO .................................................................................................................... 76 OBRAS CONSULTADAS ................................................................................................. 83 ANEXOS ............................................................................................................................. 87 SITES RECOMENDADOS ................................................................................................ 95
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LISTA DE ANEXOS
ANEXO 1 – PRINCIPAIS SIGLAS ................................................................................... 87
ANEXO 2 – DATAS SIGNFICATIVAS ........................................................................... 89
ANEXO 3 – RESOLUÇÃO DE BELGRADO ................................................................... 93
ANEXO 4 – PLANO DA UNESCO PARA 1990-1995 ..................................................... 94
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INTRODUÇÃO
Desde que Bertold Brecht imaginou, em sua “Teoria de Rádio” de 1932, que cada
cidadão poderia ter um aparelho emissor-receptor em sua residência e assim participar de
uma assembléia popular permanente (DANTAS, 1996), até os dias de hoje, quando o
desenvolvimento da Internet reacende ânimos para uma nova utopia, o que aconteceu de
concreto foi a consolidação dos grandes conglomerados de comunicação. No entanto, à
medida que os sistemas de comunicação se desenvolviam e a propriedade dos meios de
radiodifusão se concentrava cada vez mais na mão de poucas empresas, surgiam
movimentos de resistência isoladamente em várias partes do mundo.
Assumindo características variadas, esses movimentos atuaram em diversas frentes
no combate ao monopólio dos meios de comunicação. Do enfrentamento direto à
formulação teórica, o sentimento geral de que os sistemas de comunicação deveriam e
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devem ser transformados foi, ao longo dos tempos, assumindo o caráter de luta pelo que se
convencionou chamar “democratização da comunicação”.
A democratização da comunicação constitui-se em bandeira de diversos
movimentos sociais, entidades e intelectuais que se dedicam ao tema. Das rádios
comunitárias aos meios acadêmicos, da formulação de políticas públicas ao ativismo dos
movimentos populares, a sociedade civil tem se organizado – ou atuado de forma isolada –
para levar adiante essa luta.
Todavia, ainda não se realizou nenhuma pesquisa especificamente sobre os discursos da sociedade civil, principalmente relativos à sua participação nas lutas pela democratização, embora ela venha ocorrendo, mesmo com diferentes níveis de intensidade, desde o período do regime autoritário (SANTOS, 1995).
Num momento em que as iniciativas se fragmentam e o próprio Fórum Nacional
pela Democratização da Comunicação (FNDC), criado justamente com o objetivo de
unificar os esforços do movimento social, se desarticula novamente, é importante pararmos
um pouco para refletir sobre de onde vem e o que é a democratização da comunicação.
Quais são as origens desta luta? O que as entidades da sociedade civil brasileira, através de
seus documentos, entendem por uma comunicação democrática? Quais são as propostas
historicamente apresentadas para se estabelecer a democratização da comunicação? Situar
histórica e conceitualmente a questão da democratização da comunicação, a partir dessas
perguntas, é o objetivo central deste trabalho.
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O debate internacional sobre a democratização da comunicação tem como referência
a UNESCO, Órgão das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura. Foi nos fóruns da
UNESCO que, a partir principalmente da década de 1960, os sistemas de comunicação
passaram a ser tema de interesse, fruto da pressão das chamadas nações não alinhadas, que
reivindicavam maior equilíbrio no fluxo de informações entre os países do primeiro e do
terceiro mundo (PUNTEL, 1994).
As primeiras propostas de ação, que de certa maneira poderiam ser consideradas
“ingênuas”, foram perdendo espaço à medida que eram levantadas questões como a
concentração da propriedade dos meios, a intervenção dos Estados autoritários e os
conteúdos dos sistemas de comunicação. O movimento, numa UNESCO hegemonizada por
países do bloco socialista, passa a ser pela implementação de políticas nacionais que
garantissem o acesso e o direito do povo à comunicação.
Devido ao grande espalhafato gerado pelo debate das Políticas Nacionais de
Comunicação, alardeadas pelos países liberais como um ataque à liberdade de imprensa,
além das diversas outras polêmicas geradas nos debates, a Conferência Geral da UNESCO
de 1976 solicitou ao diretor-geral que os problemas da comunicação na sociedade fossem
estudados. Decidiu-se, assim, criar a Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas
da Comunicação, presidida pelo irlandês Sean MacBride e amplamente representativa dos
países membros da UNESCO (UNESCO, 1983).
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Dos trabalhos da Comissão é que nasce um dos documentos de maior referência no
debate sobre a democratização da comunicação: “Um Mundo e Muitas Vozes –
Comunicação e Informação na nossa Época”, de 1980, conhecido mundialmente como
Relatório MacBride. A importância do documento reside na defesa de uma Nova Ordem
Mundial da Informação e da Comunicação (NOMIC), segundo a qual o processo de
democratização da comunicação compreenderia medidas como a implementação de
políticas de aumento do acesso aos meios, incentivo à comunicação alternativa e – o mais
importante – uma mudança de perspectiva em relação à comunicação.
Essa mudança de perspectiva viria a partir do momento em que a comunicação fosse
entendida como um direito humano fundamental. Um dos primeiros promotores do direito
de comunicar foi Jean D’Arcy, em artigo de 1969, ao defender que as Nações Unidas
avançassem em relação à mera defesa da liberdade de expressão. O direito à comunicação,
conceito mais amplo que o direito à informação, significa que a todas as pessoas deve ser
garantido o direito de informar, ser informado, trocar idéias e opiniões, por quaisquer meios
de comunicação, sem qualquer restrição (Id., 1983).
Mesmo que os planos da UNESCO tenham sido boicotados pelos países liberais,
como Estados Unidos e Inglaterra, a idéia central da NOMIC continuou viva e espalhou-se
pelo mundo, interpretada e adaptada de diversas formas. No Brasil, o debate da NOMIC
chega principalmente pela mão de alguns pesquisadores da comunicação e, a partir de um
certo momento, se coaduna com o movimento da sociedade civil pela redemocratização do
país, na década de 1980.
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Não há como determinar uma data exata para o surgimento de um movimento pela
democratização da comunicação no Brasil. Antes do golpe militar de 1964 a comunicação
ainda não era uma questão política relevante, até mesmo porque não havia, no país, um
sistema de comunicação de massa estruturado. São os militares que dão início ao processo
de desenvolvimento das telecomunicações, dentro do projeto de integração nacional
(SANTOS, 1995). À Rede Globo de Televisão é delegada a missão de irmanar o país em
torno do futebol, das novelas, do Jornal Nacional. Ao lado disso, o recrudescimento da
repressão e da censura fez com que surgissem movimentos de resistência.
Nesse período, é fundamental o papel da imprensa alternativa e dos movimentos
populares, como aqueles ligados aos setores progressistas da Igreja Católica, pela
capacidade de mobilização das comunidades e pelas iniciativas de comunicação popular. A
Igreja também assume posição importante, seja pela atuação das Comunidades Eclesiais de
Base e do Movimento de Educação de Base e suas “escolas radiofônicas”, como também
das entidades ligadas à comunicação na América Latina, que formularam conceitos de
comunicação alternativa e horizontal, interpretando os preceitos da NOMIC a partir de
experiências entre as classes populares (PUNTEL, 1994). No Brasil, a União Cristã
Brasileira de Comunicação é outra entidade que merece destaque.
No ambiente acadêmico, o debate sobre as Políticas Nacionais de Comunicação
ganha uma nova conotação a partir de questões levantadas em congressos da Associação
Brasileira de Ensino e Pesquisa em Comunicação (ABEPEC). Como defender a
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implementação de políticas de comunicação, que pressupunham a interferência direta do
Estado, se o Brasil ainda vivia sob um regime autoritário? (RAMOS, 1991)
Paralelo ao movimento de chegada do debate da NOMIC, o movimento social vai
aos poucos desenvolvendo suas próprias ferramentas de comunicação e as entidades da
sociedade civil, por sua vez, passam a ganhar importância com o processo de
redemocratização do Brasil. É nesse cenário, de crescimento das preocupações do
movimento social com a comunicação, fortalecimento da sociedade civil e questionamento
das PNC, que os debates se misturam e há uma mudança no eixo de lutas, uma vez que a
reivindicação passa a ser pelo estabelecimento de Políticas Democráticas de Comunicação.
Era o momento em que a sociedade brasileira se mobilizava para elaborar uma nova
Constituição para o país. A articulação de algumas entidades ligadas à área da comunicação
culmina com a fundação, em 1984, da Frente Nacional de Lutas por Políticas Democráticas
de Comunicação (FNPDC), que chegou a contar com 45 entidades e 27 parlamentares
(SOUZA, 1996). Nesse ano, dois documentos podem nos ajudar a entender o conceito de
comunicação democrática e quais as propostas destas entidades para a democratização da
comunicação.
O manifesto de fundação da Frente assumia como compromisso a luta para que uma
comunicação democrática significasse acesso igualitário aos meios, participação de
profissionais na decisão sobre a linha editorial dos veículos e participação da sociedade na
definição das políticas de comunicação do país (FNPDC, 1984). Desde o princípio, a
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principal reivindicação das entidades era a constituição de um sistema público de
comunicação. O Centro de Estudos em Comunicação de Brasília, em seu documento
também de 1984, formula um conceito de Sistema Público, entendido como aquele
financiado por contribuição direta, pelo Estado ou pela iniciativa privada, cuja programação
é controlada por setores organizados da sociedade civil (CEC, 1984).
Pilar mestre deste Sistema Público seria o Conselho Nacional de Comunicação, que,
composto por ampla representação da sociedade civil, teria como função decidir sobre as
políticas de comunicação, além de fiscalizar a programação das emissoras. Esse Conselho,
previsto na Constituição de 1988, só foi instalado em 2001, com a denominação de
Conselho de Comunicação Social, com atribuições extremamente restritas em relação ao
que reivindicavam as entidades no processo constituinte. Essa é apenas uma mostra das
diversas derrotas sofridas pelo movimento, que foi retrocedendo em suas reivindicações ao
longo do tempo.
A mais importante articulação da sociedade civil na história do movimento é, sem
dúvida, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, criado em 1991, que
chegou a contar, em seu auge, com 32 entidades em nível nacional, além de 44 comitês
regionais e comissões pró-comitês. O FNDC é responsável por algumas das principais
conquistas do movimento pela democratização no âmbito institucional, como a própria
instalação do CCS, malgrado seu caráter restritivo e o próprio processo de negociação. A
atuação do FNDC é baseada em quatro eixos estratégicos: a constituição do controle
público dos meios de comunicação, a reestruturação do mercado, a capacitação da
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sociedade para o conhecimento e a ação sobre a mídia e a implementação de uma política
de desenvolvimento da cultura do país (FNDC, 1994).
Assim como não podemos definir dia e hora exatos do surgimento do movimento, é
igualmente impossível definir quem, nos dias de hoje, está na luta pela democratização da
comunicação. Não existe um movimento global, mas iniciativas diversas – algumas
pontuais, outras dentro de um projeto estratégico – quase a totalidade delas levantando a
mesma bandeira. São poucos, no entanto, os avanços conquistados pelo movimento,
principalmente na sua atuação institucional. Portanto, é importante recuperarmos conceitos
e a história do movimento, a fim de nortearmos a nossa atuação, ainda mais agora com a
nova realidade a partir da convergência tecnológica dos meios de comunicação.
O primeiro capítulo desta monografia é dedicado à tentativa de entendermos o
conceito de democratização da comunicação. A partir do debate da NOMIC e de
documentos históricos das entidades da sociedade civil brasileira, buscamos respostas a
algumas questões. O que se entende por uma comunicação democrática? E quais são as
propostas para a democratização da comunicação? Nesse capítulo, as referências principais
são o Relatório MacBride e os documentos das entidades ligadas à FNPDC e ao FNDC.
Entendidos os conceitos preliminares, passamos para o segundo capítulo, no qual traçamos
um histórico do movimento pela democratização da comunicação, desde o debate
internacional da NOMIC e suas diversas origens e frentes de atuação no Brasil. Aqui,
tivemos que recorrer a diversas fontes, justamente para compor um histórico o mais amplo
possível. Algumas questões mencionadas no primeiro capítulo só serão aprofundadas no
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segundo. Escolhemos dispor os capítulos dessa maneira para que o leitor possa primeiro
entender os conceitos principais e o que as entidades pensam sobre a democratização da
comunicação para depois acompanhar a história do movimento.
Por fim, é importante fazermos algumas considerações sobre as limitações deste
trabalho. Nosso objetivo não é discutir os monopólios de mídia, a influência da
comunicação na sociedade ou se a reivindicação da democratização da comunicação é justa
ou não. Nosso objetivo aqui, simplesmente, é tentar sistematizar a história do movimento,
além de suas principais propostas e ações. É de fundamental importância que se faça uma
discussão aprofundada sobre o conceito de democratização da comunicação e sobre as
diferentes concepções de sociedade refletidas nas maneiras de entendê-lo.
No entanto, esta monografia se limitará a fazer apenas um breve introdução ao tema.
Esperamos, assim, que este trabalho possa servir de base para futuras discussões, realmente
aprofundadas, que poderão ir dos discursos da sociedade civil brasileira sobre a
democratização da comunicação até sobre o próprio conceito de democracia. Ele pode,
também, ser utilizado por aqueles que, pela primeira vez, pretendam se dedicar ao tema,
procurando entender as origens do movimento e as propostas centrais. Falamos
especialmente dos estudantes de Comunicação Social que militam no movimento
estudantil.
Aliás, a primeira motivação deste trabalho vem da necessidade de sanar as
inquietações do autor, surgidas com a vivência no movimento estudantil do curso de
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Comunicação Social. Foram – e são – muitas dúvidas e reflexões durante essa vivência, que
recebem, agora, uma primeira sistematização teórica. Decorre que esta é uma visão parcial
da questão da democratização da comunicação, baseada nas reflexões e nas práticas
vivenciadas pelo autor e que, por ter essa natureza, está sujeita a erros, discordâncias e
deslizes às normas acadêmicas. Ainda assim, vamos a ele.
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ABORDAGEM METODOLÓGICA
Antonio Carlos Gil (1995) define o método como o “caminho para se chegar
a determinado fim. E método científico como o conjunto de procedimentos intelectuais e
técnicos adotados para se atingir o conhecimento”. É importante que um trabalho
acadêmico que se pretenda sério exponha claramente seus objetivos e os meios pelos quais
se chegou até eles, a fim de diferenciar o conhecimento cientifico do senso comum. No
entanto, é importante considerar que, na pesquisa científica hoje, há diversos tipos de
métodos utilizáveis, a depender do objeto de estudo e do seu objetivo, principalmente em
relação às ciências sociais, como nos diz o autor.
Muitos pensadores do passado manifestaram a aspiração de definir um método universal aplicável a todos os ramos do conhecimento. Hoje, porém, os cientistas e os filósofos da ciência preferem falar numa diversidade de métodos, que são determinados pelo tipo de objeto a investigar e pela classe de proposições a descobrir (GIL, 1995).
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Para Lucia Santaella (2001), a ciência é uma coisa viva, em permanente
metabolismo e crescimento, produzida por pesquisadores vivos que buscam descobrir
aquilo que ainda não se conhece. A pesquisa científica nasce, portanto, da necessidade de
se encontrar uma resposta a um questionamento. Exige, mesmo assim, que o pesquisador
cumpra certos procedimentos, a fim de que o conhecimento produzido possa ser
considerado verdadeiro e justificado. A questão, que Santaella levanta a exemplo de Gil, dá
conta de que a ciência, por possuir essas características, desenvolve esses procedimentos à
sua maneira, de acordo com as necessidades que surgem a partir da própria ciência.
Quanto mais a prática científica se aproxima desse ideal, mais científica ela é, não se confundindo com meras encomendas burocráticas, administrativas, comerciais ou ideológicas que são muitas vezes equivocadamente chamadas de pesquisa cientifica (SANTAELLA, 2001).
A pesquisa científica possui diversas divisões. A primeira grande divisão,
segundo Santaella, ocorre entre pesquisa fundamental (cuja função é criar quadros teóricos
de referência) e a aplicada (cuja principal atribuição é resolver algum problema). Quanto
aos seus objetivos, a pesquisa social pode ser dividida em pesquisa exploratória, descritiva
e explicativa. As pesquisas exploratórias são aquelas que exigem menor rigor no
planejamento, uma vez que objetivam dar uma visão geral sobre um assunto pouco
abordado e, geralmente, são apenas o primeiro passo para uma investigação posterior mais
ampla. O levantamento bibliográfico e documental, as entrevistas não padronizadas e os
estudos de caso são procedimentos normalmente utilizados. As pesquisas bibliográficas têm
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“como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idéias, com
vistas na formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos
posteriores” (GIL, 1995).
As pesquisas descritivas, como o próprio nome diz, têm como objetivo
descrever as características de um determinado grupo, fenômeno ou uma situação
(condições de moradia em determinado município, por exemplo). As pesquisas
explicativas, por sua vez, procuram encontrar as razões de determinado fenômeno ou
situação. Mesmo que as três pesquisas tenham o mesmo valor, normalmente os estudos
exploratórios e descritivos costumam fazer parte de uma etapa anterior dos estudos
explicativos.
Nos estudos exploratórios, são muito utilizadas as pesquisas bibliográfica e
documental. Para o autor, a pesquisa bibliográfica tem a vantagem de oferecer ao
pesquisador a cobertura ampla de um tema, principalmente quando os dados estão
dispersos. Nos estudos históricos, por exemplo, a pesquisa bibliográfica se faz fundamental.
No entanto, o autor levanta uma desvantagem deste tipo de pesquisa: muitas vezes as fontes
apresentam dados equivocados. A pesquisa documental diferencia-se da pesquisa
bibliográfica unicamente na natureza das fontes.
Outra divisão que pode ser feita, de acordo com Santaella, é entre pesquisa
qualitativa e quantitativa. A pesquisa quantitativa, grosso modo, é aquela que usa o recurso
das estatísticas. A pesquisa qualitativa, por seu turno, abriga várias subdivisões, e pressupõe
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“uma relação dinâmica, uma interdependência entre o mundo real, o objeto da pesquisa e a
subjetividade do sujeito” (SANTAELLA, 2001). Esse caráter “aberto” da pesquisa
qualitativa não significa, para a autora, que o pesquisador possa abrir mão de critérios
prévios para a realização do trabalho, rejeitando o uso de métodos. A autora também faz a
ressalva que a divisão entre pesquisa qualitativa e quantitativa não encontra consenso no
meio acadêmico, devido aos vários sentidos que se pode dar principalmente à pesquisa
qualitativa.
Na área da Comunicação Social, Santaella afirma que DeVito (1997) dividiu
as pesquisas em descritiva, histórico-crítica e experimental. A pesquisa descritiva tem,
como pode se perceber, o objetivo de descrever comportamentos, atitudes, valores, etc. Já a
histórico-crítica é aquela pesquisa que parte da reconstituição do passado a fim de melhor
compreender os fenômenos. Por fim, temos a pesquisa experimental, baseada
fundamentalmente na observação empírica de fenômenos.
Procedimentos metodológicos adotados neste trabalho
Gil recomenda que, na redação final do texto, sejam descritos os
procedimentos adotados na pesquisa, principalmente, no nosso caso, se a pesquisa é
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exploratória, descritiva ou explicativa e, ainda, qual o delineamento que foi seguido. É o
que faremos.
Antes de relatarmos os procedimentos metodológicos adotados neste estudo,
é importante ressaltar que a monografia é, para muitos estudantes de graduação, a primeira
experiência de fôlego na pesquisa acadêmica. Daí a dificuldade no trato com a metodologia
a ser adotada. É fundamental que um curso de Comunicação Social estimule a produção
científica também na graduação mas, para isso, é preciso que, durante o decorrer do curso,
seja estimulado o contato do estudante com a pesquisa acadêmica e suas particularidades.
O tema da democratização da comunicação no Brasil tem sido bastante
explorado. No entanto, isso tem acontecido de maneira fragmentada, pontual ou limitada a
um certo período de tempo. Normalmente, os trabalhos existentes abordam acontecimentos
específicos em uma determinada época (o debate sobre PNC na década de 1970), ou então a
atuação de um determinado grupo ou entidade (a participação da Igreja na luta pela
democratização da comunicação). Apesar de existirem textos sobre a história do
movimento pela democratização no país, muitos deles reproduzem a visão de determinado
grupo que esteve diretamente ligado ao movimento. Sentimos a falta de um estudo mais
amplo em termos de período de tempo e de visões. Além disso, desejávamos sistematizar
preliminarmente a questão da democratização da comunicação, em seus aspectos históricos
e conceituais, a fim de servir de base para uma discussão teórica mais aprofundada que
possa futuramente ser feita.
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Nosso trabalho assume, portanto, o caráter de pesquisa exploratória, uma
vez que pretende servir de ponto de partida para uma discussão mais ampla e se utilizou
principalmente de fontes bibliográficas e documentais para a sua realização. Também
podemos enquadrá-lo dentro da pesquisa qualitativa, haja vista os procedimentos adotados
(pesquisa bibliográfica, documental, entrevistas, etc), além da flexibilidade – e, com
sinceridade, imprecisão – na escolha de um método. Mas a principal característica que
colocou desde o início este trabalho dentro do quadro das pesquisas qualitativas é a certeza
de que nos depararíamos com diversas questões no decorrer da pesquisa, que poderiam
mudar seus rumos.
A bibliografia utilizada, aparentemente, pode ser considerada um tanto
extensa. Isso se deve a dois motivos: o primeiro deles, porque não havia um estudo
sistematizado sobre o nosso tema, onde pudéssemos encontrar uma bibliografia básica.
Além disso, desejávamos fazer um amplo resgate da história do movimento, além de
contemplar as diversas visões sobre o conceito de democratização da comunicação. A
existência de diferentes visões sobre a história do movimento e sobre como deve se dar a
luta pela democratização da comunicação nos levou a constituir uma bibliografia extensa, a
partir dos textos já conhecidos, que levaram ao conhecimento de outros. Acreditamos que
esse procedimento possa facilitar o trabalho àqueles que desejarem se dedicar ao tema com
maior profundidade.
Elaboramos uma espécie de roteiro que norteou nossa pesquisa por livros e
artigos que tratassem do assunto objeto de nosso estudo. Assim, procuramos encontrar
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textos que abordassem: a) as origens da discussão sobre a democratização da comunicação
nos planos internacional e nacional; b) a história do movimento pela democratização da
comunicação no Brasil e a atuação das entidades da sociedade civil; c) reflexões teóricas
em torno do conceito de direito à comunicação e democratização da comunicação.
Os documentos utilizados são aqueles ligados à história da FNPDC e do
FNDC e já eram, em sua maioria, de nosso conhecimento. À época da Constituinte,
diversos partidos também formularam questões sobre a comunicação, no entanto, não os
analisamos por não fazerem parte direta da história desses dois movimentos formados
essencialmente por entidades da sociedade civil, embora alguns partidos de esquerda
tenham participado dessa articulação. Os autores dos documentos utilizados neste trabalho
são entidades e grupos que estiveram à frente do movimento pela democratização da
comunicação nas décadas de 1980 e 1990. A partir de sua análise, buscamos entender quais
eram e quais são as propostas para a democratização da comunicação e o que estas
entidades entendiam por uma comunicação democrática. Utilizamos os documentos por
economia de tempo e por acreditarmos que um questionário enviado às entidades da
sociedade civil não traria resultados satisfatórios. Como nos diz Gil:
As fontes de ‘papel’ muitas vezes são capazes de proporcionar ao pesquisador dados suficientemente ricos para evitar a perda de tempo com levantamento de campo, sem contar que em muitos casos só se torna possível a investigação social a partir de documentos (GIL, 1995).
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No início de nossa pesquisa, pensamos na possibilidade de enviar um
questionário às entidades ligadas ao FNDC, às entidades patronais do empresariado de
comunicação, além de movimentos populares e de mídia alternativa, a fim de
identificarmos as diferentes visões sobre a democratização da comunicação. Não
concretizamos a idéia porque, além de haver a possibilidade de não recebermos respostas,
estas poderiam vir vagas, difusas ou alheias às práticas das entidades, não colaborando com
a discussão que pretendíamos propor. No entanto, acreditamos ser importante, algum dia,
realizar uma espécie de mapeamento das visões sobre democracia na comunicação, a fim de
questionarmos a atuação da sociedade civil e fazer com que ela própria se questione.
Consideramos importante, também, realizar entrevistas com pesquisadores
interessados no assunto, ligados de alguma maneira aos debates e ao movimento pela
democratização da comunicação. Pedrinho Guareschi é professor do curso de pós-
graduação em Psicologia da PUC-RS e ligado ao movimento das pastorais. É autor de
livros como “Comunicação e Poder”, “Comunicação e Controle Social” e “Os Construtores
da Informação”, todos pela Editora Vozes. Recentemente, organizou uma coletânea de
artigos para o livro “Uma Nova Comunicação é Possível”, pela Evangraf. Venício Artur de
Lima é professor titular aposentado de Ciência Política e Comunicação da Universidade de
Brasília. Autor do recente “Mídia: Teoria e Política”, pela Fundação Perseu Abramo, foi o
primeiro coordenador do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da UnB e fez parte do
Centro de Estudos de Comunicação e Cultura. João Brant foi coordenador geral da
Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social, tendo elaborado a monografia
“Políticas Nacionais de Radiodifusão (1985-2001) e Espaço Público” como trabalho de
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conclusão do curso de Comunicação Social/Radialismo da Universidade de São Paulo
(USP). São pessoas diretamente envolvidas com a questão da democratização da
comunicação, tanto pelo trabalho acadêmico quanto pela militância que desenvolvem. As
entrevistas tiveram o objetivo de complementar as informações sobre a história do
movimento no Brasil e do debate da NOMIC, além de – o mais importante – possibilitar
que realizássemos apontamentos teóricos sobre a questão, que podem, futuramente, servir
de base para novas e mais profundas discussões. É preciso destacar a importância de termos
ouvido outras pessoas que fazem parte da história do movimento no Brasil, algo que não
conseguimos fazer por não termos encontrado algumas e não termos recebido resposta de
outras.
Na redação final do trabalho, utilizamos como base o livro “Normas
Técnicas para o Trabalho Científico”, do professor Pedro Augusto Furaste, que fez uma
explicitação das normas mais recentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT). Apenas como base, pois nos surpreendeu a inacreditável gama de interpretações
que recebem as referidas normas.
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1 Anotações Teóricas sobre a Questão da Democratização da Comunicação
Neste capítulo, propomos uma discussão introdutória sobre os conceitos da
democratização e os caminhos que a ela levariam. O direito à comunicação é a base da
reivindicação e seu debate tem origens nas discussões promovidas pela UNESCO. O
Relatório MacBride é a principal referência na primeira parte deste capítulo, que pretende
responder à questão: “o que é uma comunicação democrática?”. Na segunda parte, na qual
o Relatório MacBride também tem importância ao lado de entrevistas realizadas para este
trabalho e da obra de Joana Puntel (1994), pretendemos discutir os caminhos que levam à
democratização da comunicação. Na terceira e última parte, analisamos alguns dos
principais documentos produzidos pelas entidades da sociedade civil, para que possamos
identificar suas principais propostas e reflexões sobre a questão.
1.1 O que é uma comunicação democrática?
Um dos conceitos fundamentais para o entendimento da questão da democratização
da comunicação dá conta de que a comunicação precisa ser vista como um aspecto dos
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direitos humanos. Trata-se de um conceito mais amplo que o direito de receber
comunicação ou de ser informado. Com essa perspectiva, a comunicação passa a ser
entendida como um diálogo e tem participação fundamental para o desenvolvimento da
sociedade.
Em todas as épocas históricas, o homem lutou para se libertar dos poderes que o dominavam [...]. Graças apenas a alguns esforços fervorosos e infatigáveis, os povos conseguiram a liberdade de palavra, de imprensa e de informação. Hoje em dia, prossegue a luta por estender os direitos humanos e conseguir com que o mundo das comunicações seja mais democrático que agora (UNESCO, 1983).
O “direito de comunicar” foi enunciado pela primeira vez em 1969, por Jean
D’Arcy, num artigo em que afirmava que a Declaração Universal dos Direitos Humanos
precisava avançar na discussão e defender um direito mais amplo que o direito à
informação (FISHER, 1982). A linha do tempo proposta por D’Arcy era de que, na época
da ágora grega, onde se estabelecia uma comunicação direta entre as pessoas, surgiu
primeiramente o conceito de liberdade de opinião. O surgimento da imprensa e as
possibilidades que dela advieram abriram espaço para um conceito semelhante, o de
liberdade de expressão. A tese de D’Arcy era de que o controle de uma sociedade sempre
esteve nas mãos de quem controlava os meios de comunicação. Quando estes eram
limitados, sua posse normalmente ficava por conta de líderes religiosos, políticos ou
pessoas em particular. A “pessoa comum” aceitava essa condição.
Em 1969, no entanto, época em que os instrumentos de comunicação eletrônica e
seu uso se popularizavam, D’Arcy entendia que o avanço das tecnologias permitiria que
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mais pessoas pudessem ter o direito de comunicar, e para isso as estruturas sociais teriam
de se modificar.
Hoje em dia parece possível um novo passo adiante: o direito do homem à comunicação, derivado de nossas últimas vitórias sobre o tempo e o espaço, da mesma forma que da nossa mais clara percepção do fenômeno da comunicação (D’ARCY, 1969 apud UNESCO, 1983).
Segundo Fisher, a idéia foi recebida com indiferença na UNESCO. Acreditava-se
que a introdução deste novo conceito poderia confundir os estudos e retardar os resultados.
No entanto, em sua essência o direito à comunicação é defendido, mencionando-se
inclusive Jean D’Arcy como “um dos primeiros promotores do direito à comunicação”
(UNESCO, 1983). Segundo Fisher, ao passo que as nações “ocidentais” consideravam o
direito à comunicação mais um ataque à liberdade de imprensa, as nações do bloco
socialista temiam que esse direito fosse usado para justificar a continuação do desequilíbrio
de informações entre as nações de ambos os blocos. Por isso, ele alertava para a
necessidade de uma discussão filosófica sobre o conceito, entendendo, porém, a ânsia de
alguns intelectuais em saber quais seriam as implicações práticas da implementação desse
direito.
O direito de comunicar não significa que um determinado país precise aceitar a submersão de sua própria cultura por valores importados. Neste caso, o direito de comunicar significa o direito de uma sociedade de se comunicar em termos de suas próprias necessidades e de se proteger contra os sistemas de valores
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importados, que solapariam suas próprias formas culturais de expressão (FISHER, 1982).
No Relatório MacBride, uma nota aponta que o russo Sergei Losev, integrante da
comissão, temia abordar o conceito de forma tão ampla, já que ainda não se tratava de um
direito reconhecido. Mesmo assim, o texto final da comissão elabora uma formulação do
direito de comunicar.
Todo mundo tem o direito de comunicar. Os elementos que integram esse
direito fundamental do homem são os seguintes, sem que sejam de modo algum limitativos: a) direito de reunião, de discussão, de participação e outros direitos de associação; b) o direito de fazer perguntas, de ser informado, de informar e outros direitos de informação; c) o direito à cultura, o direito de escolher, o direito à proteção da vida privada e outros direitos relativos ao desenvolvimento do indivíduo. Para garantir o direito de comunicar seria preciso dedicar todos os recursos tecnológicos de comunicação a atender às necessidades da humanidade a esse respeito (UNESCO, 1983).
A comunicação é encarada como parte dos direitos humanos. Um direito que não se
resume ao direito de receber informação de qualidade, mas como um processo de mão
dupla do qual pessoas e grupos devem participar, a fim de estabelecer um “diálogo
democrático e equilibrado” (Id., 1983). Essa visão implica tratar a comunicação como “um
processo social fundamental, permitindo que os indivíduos e as comunidades troquem
informações e opiniões” (PUNTEL, 1994).
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A idéia de que a comunicação é um direito forma a base da defesa da
democratização da comunicação. Mas o que seria essa situação? Em que condições
poderíamos dizer que a comunicação está democratizada? No texto final do Relatório
MacBride, a democratização da comunicação é encarada não como um conjunto de
condições estabelecidas, mas como um processo a partir do qual:
a) o indivíduo passa a ser um elemento ativo, e não um simples objeto da comunicação; b) aumenta constantemente a variedade de mensagens intercambiadas; c) aumentam também o grau e a qualidade da representação social na comunicação ou na participação (UNESCO, 1983).
Para Joana Puntel (1994), a questão da democratização da comunicação implica a
consideração de dois fatores: o acesso e a participação. Resumidamente, essa condição
significa que qualquer pessoa deve ter acesso aos meios de comunicação para informar, ser
informado e expressar suas opiniões e, além disso, deve poder participar da elaboração das
políticas de comunicação, bem como das decisões sobre o conteúdo e organização dos
veículos. Segundo a autora, este processo “promove um fluxo horizontal de comunicação,
de representação do público na elaboração das políticas, de acesso às fontes de informações
e de participação nas decisões sobre difusão de conteúdos ou distribuição de informações”.
Em entrevista a Joana Puntel, Luiz Ramiro Beltran, à época consultor da UNESCO
para comunicação na América Latina, também definiu a democratização da comunicação
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como um processo. Ele partia de um ponto de vista latino-americano, definindo a questão
no sentido de aumentar a base popular na utilização e na gerência da mídia.
A nível nacional, Beltran vê a democratização da comunicação como um processo de implantação do acesso e da participação popular nos meios de comunicação. A nível internacional, ele a entende como um processo “de busca de equilíbrio nas liberdades das relações de comunicação entre as nações desenvolvidas e em desenvolvimento” (PUNTEL, 1994).
Tomando como base a Constituição Brasileira, Pedrinho Guareschi entende a
comunicação como um serviço público, assim como os correios, a telefonia e as estradas.
Assim sendo, a comunicação deveria prestar um serviço público à toda a população. Para o
estabelecimento de uma comunicação democrática, “este serviço público tem de cumprir
sua tarefa fundamental: ser porta-voz de toda a sociedade civil para que ela possa dizer sua
palavra, expressar sua opinião, manifestar seu pensamento” (GUARESCHI, 2003).
Por sua vez, João Brant considera perigoso entender a comunicação como um
serviço, oferecido por entes privados ou estatais ao público. O direito à comunicação
entraria em oposição à idéia de comunicação como serviço, uma vez que, como direito, o
Estado deveria garantir à toda a população o acesso e participação na comunicação.
“Precisamos romper a idéia da comunicação como serviço e estabelecê-la como direito.
Não basta permitir o acesso democrático, deve-se trabalhar para garanti-lo.” (BRANT,
2003)
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1.2 Como democratizar a comunicação?
Feitos esses breves apontamentos sobre o que seria uma comunicação democrática,
precisamos identificar quais são as propostas de atuação para o a promoção da
democratização da comunicação. O Relatório MacBride observava uma série de obstáculos
que impedem a democratização da comunicação.
Sociedades não-democráticas seriam o primeiro entrave. Não apenas pelo fato de
que um Estado autoritário tende a moldar um sistema de comunicação centralizado e
burocrático, de acordo com seus interesses. A falta de democracia também se reflete nas
discrepâncias existentes entre as minorias culturais e a massa de analfabetos. Outra questão
que o Relatório apontava era que o público ainda não estava efetivamente representado na
definição das políticas de comunicação. Em muitos países, igualmente, predominava a
chamada “comunicação vertical”, representada pelos monopólios, além de os meios serem
insuficientes para que a população pudesse ter acesso a eles. Faltaria, também,
conhecimento dos indivíduos para compreender as mensagens dos meios de comunicação.
O Relatório também atentava que as novas tecnologias, embora aumentassem as
possibilidades de democratização, poderiam aumentar ainda mais a concentração da posse
dos meios.
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Para superar essas barreiras, o Relatório definia quatro tipos de métodos: o aumento
do acesso da população aos órgãos de informação e ao sistema global de comunicação, a
participação de leigos na produção e emissão dos programas, o estabelecimento de
comunicação alternativa e o estímulo à participação da sociedade na gestão dos meios e na
adoção de decisões. Além disso, o Relatório considerava fundamental também estimular o
espírito crítico dos indivíduos.
Mas o mais importante é que o Relatório ressaltava que eram muitos os caminhos
para democratizar a comunicação, sendo que não eram excludentes entre si. No entanto,
não poderiam ficar restritos apenas a medidas quantitativas, como ampliação dos meios
físicos ou aumento do acesso do público. Era preciso entender a importância de uma troca
de informações em pé de igualdade, seja no plano internacional ou no local, no qual não
houvesse qualquer forma de dominação ou discriminação.
Em outras palavras, implica uma mudança de perspectiva. Sem dúvida se requer uma informação mais abundante, procedente de uma pluralidade de fontes, mas se não houver possibilidades de reciprocidade, a comunicação não será realmente democrática. Sem uma circulação de duplo sentido entre os participantes, sem a existência de várias fontes de informação que permitam uma seleção maior, sem o desenvolvimento das oportunidades de cada indivíduo para tomar certas decisões baseadas no conhecimento completo de fatos heteróclitos e de alguns pontos de vista divergentes, sem uma maior participação dos leitores, dos espectadores e dos ouvintes na adoção de decisões e na constituição dos programas dos meios de comunicação social, a verdadeira democratização não chegará a ser uma realidade (UNESCO, 1983).
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Essa “mudança de postura” serve de gancho para uma outra discussão sobre os
caminhos a serem seguidos. Como veremos, muitas entidades da sociedade civil que se
dedicaram à luta pela democratização da comunicação acabaram por se concentrar na
chamada “luta institucional”, ou seja, a pressão junto ao Estado para a mudança na
legislação de comunicação. Um dos debates mais acirrados dentro do próprio movimento
pela democratização da comunicação tange a aparente dicotomia entre a atuação
institucional e a “ação direta”, esta última relacionada principalmente às experiências de
comunicação popular e alternativa.
Se as práticas de comunicação popular ou alternativa são consideradas, de um lado, como determinantes para a democratização da comunicação, elas podem também, por outro, serem vistas com ceticismo pelos teóricos que acreditam que a democratização da comunicação deve começar do alto, onde reside o poder e onde se travam as discussões (PUNTEL, 1994).
Para entendermos a importância da comunicação alternativa e popular1, torna-se
importante um breve retorno à reflexão sobre o direito de comunicar.
Para Brant, o direito à comunicação opõe-se à liberdade de expressão, uma vez que
esta expressa a idéia de que às pessoas é permitido se expressar, enquanto o primeiro
significa que deva existir uma garantia para que as pessoas possam comunicar. Por
conseqüência, deve haver um garantidor: o Estado. Ao Estado caberia não apenas permitir
1 A expressão “comunicação alternativa e popular” é usada aqui de forma genérica, de modo a identificar iniciativas como rádios comunitárias, jornais de bairro, movimentos de contra-informação, comunicação sindical, formação de redes pela Internet, etc.
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às pessoas comunicarem, mas garantir que toda a sociedade possa ter acesso e participação
nos meios de comunicação e na definição das políticas. Por isso, ele acredita na importância
da disputa por mudanças na legislação, mas ressalva que essa frente de atuação não pode
ser tomada como fim em si mesmo. “A luta é muito mais cultural. Mudança de legislação é
um instrumento da disputa cultural para o estabelecimento de uma comunicação
democrática” (BRANT, 2003).
Para Joana Puntel, são três as características básicas da comunicação alternativa.
Primeiro, trata-se de um processo que implica participação dirigida à uma determinada
mudança social. Nesse processo, o que existem são trocas de mensagens entre pessoas,
inexistindo as figuras do emissor e do receptor. Em segundo lugar, a comunicação
alternativa é um processo latino-americano, de oposição à comunicação vertical
estabelecida pelos monopólios, que exerce diversas funções: contra-informação, educação
não-formal, conscientização, mobilização e fortalecimento. Por fim, ela acredita que
processos de comunicação alternativa podem ser estabelecidos de diversas maneiras, seja
pela diversidade de meios como a forma como eles podem ser usados. Entende a autora que
essas estratégias de comunicação alternativa normalmente são voltadas para a resolução de
algum problema imediato de um determinado grupo ou comunidade, mas seu objetivo final
é a organização, a ação política e a elaboração de conceitos sobre a comunicação.
Estas formas alternativas de comunicação têm metas claras para desenvolver valores de comunicação participativa e uma infra-estrutura de formas de mídia participativas e inovadoras (PUNTEL, 1994).
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Puntel diz que, como o movimento pela implementação de políticas nacionais de
comunicação na América Latina não foi levado adiante na década de 1970 principalmente
porque a maioria das nações vivia sob ditaduras, os movimentos de comunicação popular e
alternativa surgiram à margem da sociedade, desempenhando papel fundamental na luta
pela democratização da comunicação. Estes movimentos, “enquanto elaboravam conceitos
de comunicação, formas de utilização da mídia e práticas inovadoras de formação cultural,
incorporaram conceitos de comunicação democrática, tais como o acesso e a participação”
(Id., 1994).
1.3 As propostas da sociedade civil brasileira
Na trajetória do movimento pela democratização da comunicação no Brasil, alguns
documentos, produzidos principalmente na época da Assembléia Nacional Constituinte, são
peças-chave para visualizarmos quais as propostas da sociedade civil para democratizar os
meios de comunicação. O primeiro documento é “A Transição Política e a Democratização
da Comunicação Social”, produzido pelo Centro de Estudos de Comunicação e Cultura, de
Brasília, em outubro de 1984, a pedido do Senador Affonso Camargo, chefe do escritório
do então candidato à presidência, Tancredo Neves. Os demais documentos estão mais
41
ligados ao movimento que culminou com a criação do FNDC, embora o CEC tenha
participado deste processo. São eles: o manifesto de fundação da Frente Nacional de Luta
por Políticas Democráticas de Comunicação (FNLPDC), de 1984; a “Carta de Brasília” do
Encontro Nacional dos Jornalistas e a “Carta de Brasília” do Encontro Nacional dos
Estudantes de Comunicação Social, ambos realizados em 1986; a “Proposta dos Jornalistas
à Sociedade Civil”, de 1991; e o documento “Bases de um Programa para a
Democratização da Comunicação”, de 1994.
O Centro de Estudos em Comunicação e Cultura era composto por Luiz Gonzaga
Motta, Venício Artur de Lima, José Salomão Amorim, Ubirajara da Silva, Carlos Setti e
Murilo Ramos. O documento produzido pelo grupo para o candidato Tancredo Neves veio
a público um ano depois de sua formulação, às vésperas da Constituinte. No diagnóstico da
Comunicação Social no Brasil, o documento apontava a existência de um sistema
autoritário, de caráter excludente, privilegiando minorias, tendendo à crescente
concentração de propriedade. Além disso, identificava uma acentuada dependência externa,
tanto em relação à programação quanto às tecnologias. Predominava o sistema comercial,
não havendo participação dos profissionais e do público na decisão sobre as políticas de
comunicação, regulamentadas por uma legislação considerada obsoleta.
A principal proposta do documento era a constituição de um Sistema Público de
Radiodifusão.
Entendemos como sistema público aquele que sendo financiado tanto por contribuições diretas do público como pelo Estado e/ou pela iniciativa privada tem,
42
todavia, sua programação sob o controle de segmentos organizados da sociedade civil (CEC, 1984).
O CEC defendia que o Conselho Nacional de Comunicação, criado em 1972 em
substituição ao Conselho Nacional de Telecomunicações, deveria cumprir suas finalidades
de assessoramento ao Ministério das Comunicações na formulação e execução das políticas
de radiodifusão, além de elaboração de estudos sobre a programação das emissoras. O CNC
deveria ser composto por representantes de ministérios mais diretamente ligados à questão
da radiodifusão, por entidades de profissionais da área, Universidades, representantes dos
empresários, do poder legislativo, garantindo-se paridade entre os representantes do Estado
e da sociedade civil. A vinculação do CNC ao Ministério das Comunicações era
considerada um erro, uma vez que, de acordo com o documento, “qualquer política de
radiodifusão deve ser implementada a partir do seu interesse sócio-cultural e não da sua
viabilidade técnica” (Id.,1984).
Ao Conselho caberia deliberar sobre os assuntos da radiodifusão, até que uma
alteração na Constituição pudesse reverter a situação em que se encontrava o sistema de
comunicação no Brasil. O caráter precário das concessões de rádio e TV deveria ser
mantido, prevendo-se uma série de condições para a renovação dos contratos. O CEC
também propunha o aumento na programação jornalística e na execução de músicas
brasileiras, restrições à publicidade, em especial ao merchandising, entre outras medidas.
43
O manifesto de fundação da FNPDC é fruto de um primeiro esforço de um conjunto
de entidades para a organização de um movimento nacional, cuja missão principal, à época,
era a disputa na Constituinte. No documento, a comunicação é entendida como um direito
do cidadão. Uma comunicação democrática, segundo o texto, significaria
a) o acesso igualitário de todas as camadas da população à produção, difusão e consumo do bem cultural; b) a participação dos profissionais na decisão das linhas editoriais dos veículos de comunicação; c) a participação de todos os setores da sociedade na definição de políticas de comunicação (FNPDC, 1984).
Embora a democratização da comunicação esteja quase sempre ligada à questão da
radiodifusão, o manifesto também apresenta medidas referentes a outras áreas: imprensa
escrita, publicidade, artes, censura, tecnologia, liberdade de informação, educação e
comunicação popular. As medidas propunham o controle da sociedade sobre as políticas
das diversas áreas, incentivo às produções regionais e capacitação da sociedade para a
reflexão crítica em relação à comunicação e também para a ação prática. De certa maneira,
essa visão mais ampla da questão da comunicação no país é que vai permear o ideário de
criação do FNDC, na década seguinte.
Em relação à radiodifusão, o documento da Frente defendia que nas concessões de
rádio e TV deveriam ser priorizadas entidades sem fins lucrativos e socialmente
representativas. Além disso, defendia-se que uma mesma entidade não poderia acumular
mais de uma concessão de serviço de radiodifusão. Previa-se a criação de um Conselho
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Federal de Radiodifusão, órgão que forneceria pareceres sobre as concessões. Conselhos
municipais e federais seriam responsáveis pela fiscalização da programação das emissoras,
que deveriam fixar limites mínimos de produção regional, garantir espaços para o horário
político gratuito e para programas informativos e de entretenimento gerados por uma
entidade pública nacional. A radiodifusão de baixa potência, a produção independente e o
caráter público das emissoras educativas também eram contemplados no texto.
Menos detalhadas, as respectivas cartas dos jornalistas e dos estudantes de
comunicação não deixam de aprofundar a defesa de um sistema público de comunicação
social, reforçando a idéia de que os veículos deveriam ser explorados apenas por fundações
e entidades públicas sem fins lucrativos. A carta dos jornalistas divulgada após o encontro
em Brasília defendia
a instituição de um novo modelo de comunicação social, com a participação de todos os setores da sociedade na definição de políticas de comunicação. Deve ser garantido, também, o pleno e livre acesso de todos os setores aos meios de comunicação para informar, serem informados e se auto-expressarem (FENAJ, 1986).
Ambos os documentos defendiam que os meios de comunicação deveriam ser
explorados por entidades públicas sem fins lucrativos. O agora denominado Conselho
Nacional de Comunicação seria o órgão responsável por “decidir sobre todas as questões
que dizem respeito à política de comunicação, acompanhar as diretrizes aprovadas e
fiscalizar a respectiva legislação” (Id., 1986).
45
Para os estudantes de Comunicação Social, igualmente, caberia ao Conselho a
definição de políticas para a constituição de um Sistema Público de Comunicação com
vistas à democratização dos meios de comunicação. Os estudantes defendiam a pluralidade
de fontes e a expressão das culturas regionais e da opinião das minorias.
Esta nova política promoveria a revisão das concessões hoje existentes e estabeleceria critérios para as novas concessões que refreassem o poder dos monopólios e garantissem a diversificação cultural e de informações, com limites mínimos de programação regional estabelecidos em lei (ENECOM, 1986).
O documento alertava para o fato de que “a luta pela democratização da
comunicação não começou na Constituinte, não podendo, portanto, limitar-se a seus
resultados” (Id., 1986), sinalizando, em última análise, o debate sobre a limitação da luta
pela democratização à disputa pela mudança nas leis. Assim, fazia a defesa das rádios livres
e dos movimentos que desafiavam à censura.
Esses documentos refletem as idéias do movimento que criou a Frente e, após a sua
desarticulação, bancou, através da FENAJ, uma emenda popular à Constituição. Como
veremos, a derrota sofrida com a criação de uma Assembléia Constituinte restritiva arrefece
a articulação das entidades. Os resultados obtidos na Constituição são limitados, às vezes
considerados como uma derrota do movimento.
46
Apesar da falta de recursos, das dificuldades de mobilização e da avaliação inicial negativa da direção da Frente que considerou a luta na Constituinte com uma derrota sua, pela primeira vez o tema da comunicação social foi tratado em um capítulo especial da Constituição, contendo cinco artigos sobre a temática (SOUZA, 1996).
A Constituição, teoricamente, proibiu a formação de oligopólios mas, na visão dos
jornalistas, no documento de 1991, “consolidou o privilégio dos grande grupos de
comunicação instalados no país” (FENAJ, 1991). O Conselho Nacional de Comunicação
foi regulamentado como Conselho de Comunicação Social e teve suas atribuições
drasticamente reduzidas, limitando-se a ser um órgão consultivo do Congresso Nacional.
Vale dizer que ele só foi instalado efetivamente em 2002, mais de dez anos depois do que
estava previsto em lei.
Para a FENAJ, porém, havia lacunas na Constituição, que dependiam de legislação
ordinária, nas quais as entidades deveriam interferir para a transformação do sistema de
comunicação brasileiro. Por isso, convocava a sociedade civil para a criação de um
Movimento Nacional pela Democratização da Comunicação. O documento retrocede em
algumas reivindicações, se comparadas com as propostas contidas nos documentos escritos
no período pré-constituinte. Como exemplo, a questão do Conselho de Comunicação
Social, visto não mais como um órgão a decidir, mas assessorar e opinar sobre as
concessões, além de democratizar as informações sobre as empresas de radiodifusão. Sua
composição deveria ser, de acordo com o texto, amplamente representativa da sociedade
civil.
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Em seu documento, os jornalistas faziam um diagnóstico do sistema de
comunicação brasileiro e apontavam algumas necessidades prementes à época. Nota-se, já,
que não se fala mais em um amplo Sistema Público, mas em garantir que as emissoras
existentes privilegiassem o interesse público e que houvesse abertura para novos
protagonistas, de preferência, entidades públicas. No seu diagnóstico, os jornalistas
observavam
a) Ilegitimidade do predomínio exclusivo, sem mandato e sem representação, de interesses minoritários, sobre os atuais sistemas de rádio e televisão que se constituíram, em larga medida, amparados em ilegalidades, imoralidades, favorecimentos, compadrio e corrupção. b) Necessidade da existência de princípios claros e de regulamentação para a assegurar efetiva compatibilização da particularidade dos interesses que operam as emissoras como interesse público que, em última instância, deve prevalecer. Isto é, a reafirmação e a consolidação de um estatuto de serviço público para a radiodifusão e a definição de princípios éticos que devem orientar sua atuação. c) Necessidade de se assegurar a abertura do sistema de radiodifusão para novos protagonistas, de modo a tornar efetivamente pluralista sua atuação, privilegiando o ingresso de entidades públicas, não estatais e representativas da sociedade civil (Id., 1991).
O documento dos jornalistas serviu como estímulo para rearticulação das entidades,
para a criação do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. Em sua quinta
plenária, o FNDC lança as bases para seu programa que, pelo menos até a plenária de 2003
mantinha-se como o principal documento da entidade. O documento defende um conjunto
abrangente de propostas, dentro de um projeto estratégico definido, além de entender, como
o Relatório MacBride, que a democratização da comunicação não possuiu um fim em si
mesmo.
48
O alcançável é um determinado grau de democratização que será, permanentemente, recorrente ao estágio de desenvolvimento tecnológico, e ao conflito entre as distintas vontades. Sendo assim, percebe-se a necessidade de avanços, sobretudo, na capacidade da sociedade elaborar o próprio conflito humano (FNDC, 1994).
O FNDC se baseia em quatro eixos estratégicos de atuação. O primeiro, e o mais
importante deles, seria a construção do controle público dos meios de comunicação de
massa.
A construção do controle público deverá corresponder ao advento de práticas democráticas na elaboração de políticas públicas para a área das comunicações, gerando critérios para a concessão, posse e uso dos veículos e, sobretudo, a possibilidade de incidência democrática da sociedade sobre o conteúdo dos veículos de comunicação (Id., 1994).
Os outros três eixos são: a reestruturação do mercado na área de comunicações, a
capacitação da sociedade para o conhecimento e a ação sobre os meios de comunicação e,
por fim, a definição de uma política cultural para o país. No entanto, o documento traz mais
uma vez marca das sucessivas derrotas sofridas pelo movimento. O Conselho de
Comunicação Social, por exemplo, ainda não instalado, é admitido apenas como órgão
consultivo.
A grande maioria das propostas de atuação vai na linha da disputa pela mudança na
legislação, fato que se comprovou na prática. A própria direção executiva do FNDC, em
49
documento de avaliação do movimento, de 2003, admite que alguns eixos de atuação do
Fórum foram hipertrofiados em detrimento de outros.
50
2 Histórico do Movimento pela Democratização da Comunicação no Brasil
Neste capítulo, pretendemos traçar um histórico do movimento pela
democratização da comunicação no Brasil, principalmente no que tange a atuação das
entidades da sociedade civil.
2.1 O Debate Internacional
O debate internacional sobre a importância da democratização da comunicação se
concentrou fundamentalmente nos fóruns da Unesco (Organização das Nações Unidas para
Educação, Ciência e Cultura), e culminou com a publicação do livro “Um Mundo e Muitas
Vozes – Comunicação e Informação na nossa Época”, conhecido como Relatório
MacBride, em 19802. Esse debate tem grande influência no Brasil, principalmente entre os
meios acadêmicos e nas organizações da Igreja Católica, como veremos adiante, e em
certos aspectos orientou a trajetória do movimento pela democratização da comunicação no
Brasil.
Desde sua fundação, a ONU já afirmava que uma sociedade só seria justa e
democrática se garantisse a liberdade de expressão de seus cidadãos. Fisher aponta que na
“Resolução 59 da Assembléia Geral de 1946 declarou-se que ‘a liberdade de informação é
2 Utilizamos, neste trabalho, a edição publicada no Brasil, em 1983.
51
um direito humano fundamental e é a pedra de toque de todas as liberdades às quais à ONU
se consagra’” (FISHER, 1982). Famoso tornou-se o artigo XIX da Declaração Universal
dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral em 10 de dezembro de 1948, no
qual está escrito que:
Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão (Declaração Universal dos Direitos Humanos, ONU)3.
Entre as décadas de 1950 e 1970 as atividades da ONU na área da comunicação
passaram a se concentrar na UNESCO, fruto da pressão das chamadas não-alinhadas pelo
estabelecimento de um fluxo equilibrado de informações entre as nações desenvolvidas e
em desenvolvimento. Em 1972, autorizou-se o diretor geral do órgão a promover estudos
sobre os problemas relativos à comunicação na sociedade. O principal debate relacionava a
comunicação com o processo de desenvolvimento dos países. Era o momento em que a
televisão se expandia, principalmente com o desenvolvimento dos satélites. As distâncias
iam sendo estreitadas. Assim, defendia-se que os meios de comunicação fossem
empregados com o objetivo de “acelerar o desenvolvimento, fazendo deles meios também,
e principalmente, de educação, inclusive de educação à distância” (RAMOS, 2000).
3 A versão em português foi retirada diretamente do site oficial da ONU (http://www.unhchr.ch/udhr/lang/por.htm). Existem diferentes versões, embora todas possuam o mesmo conteúdo.
52
Grosso modo, pensava-se que as desigualdades entre as nações desenvolvidas e em
desenvolvimento poderiam ser suprimidas se houvesse equilíbrio no fluxo de informações.
Chegou a ser proposto que os países deveriam observar padrões mínimos de meios de
comunicação para servir a população. A idéia aos poucos foi perdendo força, porque
“percebeu-se que havia coisas mais importantes em jogo – o conteúdo dos sistemas de
comunicação e o direito do povo de usá-los” (FISHER, 1982)
A idéia de “liberdade de informação e expressão”, muito mais aplicável aos tempos
exclusivos da imprensa escrita, foi aos poucos dando lugar à de um “livre fluxo de
informação”, esta também superada pela defesa de um ”fluxo de informação livre e
equilibrado”, conceito incorporado ao programa da 18a sessão da Conferência Geral da
UNESCO, em 1974. Mas essas expressões ainda se centravam na questão do conteúdo da
comunicação, deixando de lado questões como o acesso aos meios.
À medida que o debate avançava começou a se solidificar a idéia de que, para que
se estabelecesse um fluxo equilibrado de informações, deveriam ser implementadas
Políticas Nacionais de Comunicação (PNC). A idéia aparece pela primeira vez na
Conferência Geral da UNESCO, em 1970 (RAMOS, 1991). A implementação dessas
políticas seria “o melhor caminho para a democratização do acesso das populações à
informação e à educação, logo, ao exercício da política e da cidadania” (RAMOS, 2000).
Numa Unesco hegemonizada por países do bloco socialista, a idéia de uma ação estatal
nesse sentido ganhou força.
53
Em linhas gerais, as políticas nacionais de comunicação previam [...] uma intervenção explícita do Estado, direta e indireta, fosse pela ação dos meios estatais de comunicação, fosse por regulamentos e normas diversas que ajustassem os eventuais meios privados aos programas, objetivos e metas que compunham o planejamento governamental para toda a sociedade (RAMOS, 1991).
Conforme aponta MacBride no prólogo ao relatório final, a década de 1970 foi um
momento em que “o debate internacional sobre os problemas da comunicação tinha
chegado, depois de muito espalhafato, à fase de enfrentar um bom número de questões”
(UNESCO, 1983). O “espalhafato” girava principalmente em torno das PNC. Os países
liberais, minoritários na UNESCO, sustentavam que a existência de PNC representaria a
interferência do Estado na liberdade de imprensa, considerada um dos pilares da
democracia liberal. A reação centrou-se inicialmente na Sociedade Interamericana de
Imprensa (RAMOS, 2000).
Para equacionar a série de polêmicas levantadas, em 1976 a Conferência Geral da
UNESCO solicitou que fossem estudados os problemas da comunicação na sociedade, a
partir de uma comissão formada por membros “amplamente representativos da diversidade
ideológica, política, econômica e geográfica do mundo” (UNESCO, 1981). O resultado foi
a criação da Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas da Comunicação4,
presidida por Sean MacBride. A Comissão iniciou seus trabalhos em dezembro do ano
4 Membros da Comissão: Elie Abel (Estados Unidos), Hubert Beuve-Méry (França), Elebe Ma Ekonzo (Zaire), Gabriel García Márquez (Colômbia), Sergei Losev (URSS), Mochtar Lubis (Indonésia), Mustapha Masmoudi (Tunísia), Michio Nagai (Japão), Fred Isaac Akporuaro Omu (Nigéria), Bogdan Osolnik (Iugoslávia), Gamal el-Oteifi (Egito), Johannes Pieter Pronk (Holanda), Juan Somavia (Chile), Boobli George Verghese (Índia), Betty Zimmerman (Canadá)
54
seguinte e concluiu o relatório em novembro de 1979. De acordo com MacBride, no
prólogo do livro, foram realizadas neste período oito reuniões, cuja duração total foi de dois
meses.
O Relatório MacBride, publicado em maio de 1980, veio enunciar a necessidade de
se estabelecer uma “nova ordem mundial mais justa e eficaz da informação e da
comunicação” (que a partir deste ponto vamos denominar NOMIC, sigla pela qual a
expressão ficou conhecida). O relatório é considerado o mais abrangente documento sobre
a importância da democratização da comunicação, tendo se constituído no “ápice de um
precursor movimento internacional” (SOUZA, 1996).
Nos estertores da Guerra Fria, uma comissão formada majoritariamente por países
do bloco socialista trazia para o debate internacional a necessidade de se constituir uma
NOMIC, opondo-se aos monopólios internacionais da comunicação, aos fluxos de
informação em “sentido descendente” e propondo a implementação de Políticas Nacionais
de Comunicação que visassem à democratização do acesso aos meios. A própria
formulação do direito de comunicar dava a idéia da necessidade de algum tipo de
interferência direta para a garantia desse direito e o estabelecimento da democratização da
comunicação.
Cabe ressaltar que, devido ao grau de polêmica dos debates que antecederam a
formação da comissão e a origem dos membros que a compuseram, o texto final do
Relatório carece de uniformidade e apresenta contradições de ordem teórica e política. No
55
entanto, não se resume a discutir caminhos para a construção de uma NOMIC, embora
apenas isso já explicasse sua relevância. Tampouco se trata de um relatório sobre a
influência dos meios de comunicação na política. A comissão se propôs a se situar “numa
perspectiva histórica, política e sociologicamente mais ampla” (UNESCO, 1983).
Para tanto, elaborou um traçado histórico sobre o ato de comunicar, desde os tempos
em que a comunicação se dava entre indivíduos, sem mediação, apontando a importância
da comunicação para o desenvolvimento da humanidade. Um preâmbulo que, segundo o
Relatório, não é gratuito, uma vez que “perceber melhor os canais graças aos quais se
desenvolveu a comunicação, as formas de que se revestiu no passado, os objetivos que
persegue e os meios de que dispõe, pode abrir perspectivas para o futuro” (Id., 1983). Fiel a
seu objetivo de estudar os problemas da comunicação, não deixou de abordar a questão da
concentração dos meios pela iniciativa privada nem o uso que os governos autoritários
fazem da comunicação. Já naquela época, atentou para o surgimento das novas tecnologias,
que poderiam tanto aumentar o acesso da população aos meios como restringi-lo, caso
concentradas nas mãos de poucos.
Embora o texto considere que a democratização da comunicação não acaba em si
mesma, se constituindo num processo, são apontados alguns caminhos que tornariam mais
democrática a comunicação. Entre eles, ampliação do acesso popular aos meios de
informação, participação de leigos na produção e emissão de programas, estabelecimento
de comunicações alternativas ou de contra-informação, gestão coletiva dos meios de
comunicação, políticas nacionais de comunicação, cooperação internacional para suprir a
56
falta de recursos os países em desenvolvimento e fortalecimento do espírito crítico dos
cidadãos.
A parte mais inovadora do relatório MacBride retoma a premissa fundamental da NOMIC, ou seja, a pretensão de democratizar a comunicação. O relatório MacBride reconhece a necessidade de ultrapassar as barreiras que impedem uma democrática comunicação, baseando seu pedido no ‘direito de comunicar’. Com esta finalidade, o relatório recomenda que se estabeleçam novas políticas de comunicação social e apresenta também uma outra concepção de comunicação alternativa e horizontal, que prevê o efetivo acesso e a participação de todas as pessoas que passam a ser agentes ativos e não apenas sujeitos passivos da comunicação (PUNTEL, 1994).
As propostas que levariam à NOMIC foram sintetizadas na Resolução de Belgrado,
aprovada em outubro de 1980 pela 21a reunião da Conferência Geral da UNESCO. Os onze
princípios apontavam claramente para a necessidade de se pôr fim aos monopólios da
comunicação, respeitando a pluralidade de fontes e as identidades culturais dos países (ver
anexo 3).
A polêmica que acompanhou o debate sobre a NOMIC e as políticas nacionais de
comunicação desde sua origem acabou por decretar a derrocada do Relatório MacBride. O
presidente Ronald Reagan, dos Estados Unidos, respaldado por Japão e Inglaterra, liderou
um movimento de esvaziamento da UNESCO, por meio principalmente da redução dos
recursos destinados ao órgão da ONU.
57
O plano da UNESCO para a primeira metade da década de 1990 representou um
retrocesso em relação às propostas do Relatório MacBride. As quatro principais metas
definidas voltavam a mencionar a modernização dos meios de comunicação nos países em
desenvolvimento e o privilégio à produção educativa (MELO, 1991). As metas abordavam
apenas as questões de conteúdo, ignorando o debate sobre a posse dos meios de
comunicação (ver anexo 4). Segundo Puntel, nos planos da UNESCO do final da década de
1990 foram ignorados os “princípios políticos” da NOMIC: o direito de comunicar, as
políticas nacionais de comunicação e a Nova Ordem Econômica Internacional (PUNTEL,
1994).
Nos dias de hoje, a UNESCO segue promovendo debates teóricos sobre a
comunicação, muito mais centrados nos conteúdos e na questão cultural. A União
Internacional de Telecomunicações, órgão também ligado à ONU, convocou para dezembro
de 2003 a Conferência Mundial sobre a Sociedade da Informação.
2.2 A Democratização da Comunicação no Brasil
Costuma-se afirmar que o movimento pela democratização no Brasil surge, de
forma organizada e institucional, com a criação da Frente Nacional por Políticas
58
Democráticas de Comunicação, organizada por jornalistas, professores, estudantes de
comunicação, apoiados por várias entidades da sociedade civil, durante a redemocratização
do país em 1983/1984 (SOUZA, 1996). O programa do FNDC aponta que as primeiras
propostas de organização de um movimento nacional pela democratização no final da
década de 1970 eram imbuídas de um espírito “oposicionista e ‘negativo’”, e que as
iniciativas surgidas no final dos anos 1980 e início dos 1990 tinham uma perspectiva
imediatista e particularizada. Constituíam-se numa capitulação à “falta de um projeto
político abrangente em troca da satisfação produzida por um ativismo pretensamente ‘mais
concreto’” (FNDC, 1994). Embora admita que as propostas da Frente também não
constituíam um “projeto global”, o documento afirma que:
Em quase vinte anos de luta pela democratização da comunicação transcorrida no Brasil, uma exceção surgiu durante a transição do regime militar, com as propostas apresentadas por alguns setores para o governo Tancredo Neves e que acabaram olimpicamente desconsideradas pela Frente que sustentou Sarney no governo (Id., 1994).
De fato, a atuação institucional e organizada de um conjunto de entidades da
sociedade civil brasileira em prol da implementação de leis que limitassem o poderio das
grandes empresas de comunicação se dá em 1983/1984. No entanto, não é razoável assumir
que o debate e a luta pela democratização da comunicação no Brasil nascem, como que do
nada, no início da década de 1980, a partir do estímulo provocado pela “manipulação do
processo político durante a campanha das ‘Diretas Já’” (SOUZA, 1996), sob pena de se
59
descontextualizar as origens do movimento e reduzir sua atuação à disputa por mudanças
na legislação do setor.
É preciso considerar alguns fatores que, se não tiveram influência direta no
chamado movimento pela democratização da comunicação, perfazem o contexto histórico
do seu surgimento no Brasil. Um deles diz respeito às iniciativas ligadas à comunicação
popular e alternativa a partir da década de 1960. Além disso, é de se destacar o papel de
algumas entidades cuja fundação é anterior ao surgimento da FNPDC, tendo inclusive
participado da sua criação, como a FENAJ, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB). É importante considerar que o debate sobre as Políticas Nacionais de
Comunicação chega ao Brasil já na década de 1970, principalmente através de artigos e
publicações da UNESCO e de pesquisadores ligados ao órgão da ONU. Desempenham
papel fundamental também a Associação Brasileira de Pesquisa e Ensino em Comunicação
(ABEPEC) e os setores progressistas da Igreja Católica na América Latina.
Para José Milton Santos, antes do golpe militar de 1964, “a comunicação mediática
não se colocava com uma questão política relevante no Brasil, haja vista que nada consta
sobre ela no elenco das reformas de base defendidas pelos setores progressistas e
capitalizadas pelo governo João Goulart” (SANTOS, 1995). Isso acontecia porque o Brasil
ainda não possuía um sistema de comunicação de massa estruturado e a população do país
ainda era predominantemente rural. Só a partir da instalação da ditadura, quando os
militares passam a encarar a comunicação como um meio de alcançar a meta de integração
60
nacional, que o sistema se consolida. Surgem a Embratel (1965), o Ministério das
Comunicações e o Conselho Nacional de Telecomunicações (1967), a rede nacional de
microondas e o sistema de transmissão via satélite, a Empresa Pública de Correios e
Telégrafos (1969), a Telebrás e a TV a cores (1972). O próprio regime estimulou o
desenvolvimento dos meios de comunicação, especialmente jornais, concedendo
“empréstimos subsidiados para a construção de novas sedes e modernos parques gráficos,
além de lhes destinarem vultosas verbas publicitárias” (Id., 1995).
Com a instauração do AI-5, em 1968, a repressão recrudesceu e aumentou a censura
aos meios de comunicação de massa. A Rede Globo consolidava-se como “porta-voz” do
regime (o Jornal Nacional vai ao ar em setembro de 1969). Nesse contexto, surgiam
espaços de resistência social.
De um lado, a repressão direta e a censura aos meios de comunicação de massa tentavam bloquear as manifestações e as reivindicações populares, com o objetivo de impor um isolamento ao movimento de base e à sociedade civil como um todo. De outro lado, as próprias condições de marginalidade social e política, acrescidas à crescente pauperização das classes subalternas, construíam pólos de conflitos e resistência (FESTA, 1986).
Nesse período é importante o papel das Comunidades Eclesiais de Base, grupos
originários das periferias das cidades e do campo, apoiados pela Igreja Católica, que
buscavam mobilização social e política a partir dos ensinamentos do Evangelho. É nessa
fase também que surgem alguns das mais importantes publicações alternativas, como
61
Pasquim, Opinião, Coojornal, Movimento, Em Tempo, entre outros que, “apesar do
bombardeio da censura, travaram uma luta contra o autoritarismo através da
conscientização, mobilização e organização popular” (SANTOS, 1995).
Conforme Santos, no final desse período de resistência e de início do processo de
redemocratização do país, cresce a importância da chamada sociedade civil. Entidades
como a FENAJ, a OAB, a ABI, a CNBB, entre outras, “passam a liderar o processo, dando-
lhe, inclusive, maior legitimidade” (Id., 1995).
Os meios acadêmicos assimilam o debate da UNESCO sobre as políticas nacionais
de comunicação, principalmente nos recém-criados cursos de pós-graduação em
Comunicação e nos meios profissionais ligados ao jornalismo (RAMOS, 2000). Para
Venício Artur de Lima, existiram dois movimentos paralelos, a partir da década de 1970,
responsáveis pelas origens do debate sobre a democratização da comunicação no Brasil. De
um lado, os debates da UNESCO que chegavam de maneira bastante restrita em algumas
universidades. Do outro, a luta das entidades da sociedade civil pela redemocratização do
país, algumas delas ligadas à comunicação, que passaram a colocar na pauta a necessidade
de democratizar também a comunicação. “A discussão da NOMIC chegou de forma
independente ao movimento da sociedade civil pela democratização da comunicação. Num
determinado momento, essas duas coisas acabam se interpenetrando” (LIMA, 2003).
Uma entidade que possui destaque nesta discussão é a ABEPEC, oficialmente
fundada em julho de 1972. O debate mais polêmico envolvia a aplicação da NOMIC nos
62
países da América Latina. Temia-se com os resultados que as PNC poderiam causar se
aplicados pelos regimes autoritários da época, ainda mais no Brasil, que vivia sob uma
ditadura desde 1964.
Vivia-se aqui o dilema de lutar por políticas nacionais de comunicação, com o risco de que elas de fato fortalecessem o regime autoritário e não o processo de democratização, ou permanecer intocado o sistema de comunicação que favorecia a perpetuação de nossa “dependência cultural” (SANTOS, 1995).
Este debate é feito pelos professores e pesquisadores da Universidade de Brasília,
Luiz Gonzaga Mota e Ubirajara da Silva, intitulada “Crítica das Políticas de Comunicação:
entre o Estado, a empresa e o povo”, que foi apresentada durante o III Congresso da
ABEPEC, em Caxias do Sul (RS), em julho de 1976. A conferência é um diálogo com um
artigo do também professor da UnB, Marco Antônio Rodrigues Dias, que questionava o
conceito de PNC5.
Segundo Ramos (1991), Mota e Silva admitiam que a proposta de implementação
de Políticas Nacionais no Terceiro Mundo tinha um caráter de reação ao liberalismo e, por
isso, havia sido apropriada por grande parte dos setores progressistas nos países
desenvolvidos. Alertavam, no entanto, que por trás de qualquer política há um Estado, cuja
5 A referência desse documento é: DIAS, Marco Antônio Rodrigues. A Responsabilidade Cultural da Radiodifusão. In: Revista da ABT. Ano VI, n.9.
63
ideologia se reflete nesta política. Entre a “estatização autoritária” e a “comunicação
liberal”, os professores se perguntavam: “com quem ficar?”.
Mota e da Silva, na tentativa de resolver o impasse decorrente da questão do Estado, colocam-se na posição de buscar, teoricamente, uma saída diversa daquela posta pelo debate entre ‘estatização autoritária’ e ‘democracia liberal’. Eles sugerem a participação independente de setores e interesses populares no debate entre estatização e privatização dos meios e mensagens de comunicação e propõem um retorno à cultura brasileira6 como uma terceira opção para os profissionais e teóricos da comunicação (RAMOS , 1991).
O debate da NOMIC também foi assimilado pela Igreja Católica na América Latina,
que se posicionou em um outro segmento da luta pela democratização da comunicação:
“Enquanto vários pesquisadores de renome reivindicavam o estabelecimento de Políticas
Nacionais de Comunicação, outras organizações, destacando-se entre elas a Igreja Católica,
passaram a apoiar a criação de uma comunicação alternativa ou popular” (PUNTEL, 1994).
Neste aspecto, a Igreja Católica pode ser considerada pioneira, principalmente no
uso dos instrumentos de radiodifusão eletrônica. Já em 1947, nasciam as chamadas “escolas
radiofônicas”, a partir da experiência colocada em prática na Colômbia, com a Acción
Cultural Popular (ACPO) – Radio Sutatenza. No Brasil, as escolas radiofônicas
começaram com a experiência de Dom Eugênio Sales, em Natal (RN), no ano de 1958.
6 O retorno à cultura brasileira, para os pesquisadores, representava que “o compromisso de profissionais e teóricos da comunicação deve ser com a cultura brasileira que emana de baixo para cima, aquela que corresponde às classes que historicamente sempre estiveram subjugadas” (MOTA e SILVA, 1976 apud RAMOS, 1991).
64
Desta iniciativa nasce o Movimento de Educação de Base que, em 1963, contava com 59
sistemas em operação, atingindo 7.353 escolas de 15 estados, tendo sido financiados pelo
governo federal por cinco anos, sob a direção da CNBB (Id., 1994).
A tarefa de organização dos comunicadores cristãos ficou a cargo de entidades
como a Conferência Episcopal Latino-Americana (CELAM), a Associação Católica Latino-
Americana para Rádio e Televisão (UNDA-AL), o Secretariado para América Latina da
Organização Católica Internacional de Comunicação (SAL-OCIC) e a União Católica
Latino Americana de Imprensa (UCLAP). Segundo Puntel, no contexto latino-americano
quatro tipos de prática pastoral foram desenvolvidos: o estabelecimento de organizações de
mídia, a presença maior da Igreja na mídia, a criação de meios de comunicação de grupo e,
por fim, as alternativas à NOMIC.
Segundo a autora, a Igreja Católica nunca fez referência oficial à NOMIC. Isso
ocorreu de forma indireta, de três modos distintos. O primeiro, nos documentos das
Conferências de Medellín (1968) e Puebla (1979). Em segundo lugar, por meio da teologia
da libertação. Por fim, a forma mais expressiva, a partir dos congressos e seminários das
entidades citadas acima, além da União Católica Internacional de Imprensa (UCIP), a partir
do final da década de 1970. Considerado “um marco para a América Latina no terreno da
Comunicação” (PUNTEL, 1994), o documento produzido no encontro de Embu (SP), em
1982, convocava os membros da Igreja a “participar ativamente da implantação da
NOMIC” (EMBU, 1982 apud PUNTEL, 1994).
65
No Brasil, é importante destacar a atuação da União Cristã Brasileira de
Comunicação, formada por profissionais, escolas, empresas, professores e pesquisadores.
Fundada em 18 de julho de 1969, em São Paulo, a UCBC nasce num contexto em que
aumentava a participação de leigos na Igreja Católica, além de ser esse o período de
surgimento das CEBs e da Teologia da Libertação (GOMES, 1991).
A questão da comunicação passou a ser tema de interesse, em maior ou menor grau,
em diversos setores dos movimentos sociais. No início da década de 1980, “a partir do
acesso a essas novas tecnologias (vídeo, fax, correio eletrônico, computadores etc.), o
movimento popular cria novo fôlego para sua atuação na comunicação” (SOUZA, 1996).
Entre os exemplos dessa nova conjuntura que se desenhava está a criação da Associação
Brasileira de Vídeo Popular, criada em dezembro de 1984 a partir de experiências na
documentação das edições do Congresso Nacional das Classes Trabalhadoras
(CONCLAT). Em 1985 é criado o Movimento Nacional de Rádios Livres e a Associação
de Rádios Livres do Estado de São Paulo (ARLESP), a partir principalmente de uma
experiência na cidade de Sorocaba (SP), onde estudantes colocaram no ar cerca de 56
pequenas emissoras de rádio.
Paralelamente começam a ser desenhadas as primeiras articulações que vão levar à
criação da Frente Nacional de Lutas por Políticas Democráticas de Comunicação (FNPDC),
a partir do episódio de manipulação da campanha das Diretas pela Rede Globo.
66
Esse movimento é paralelo e não está articulado aos projetos e trabalhos desenvolvidos com as novas tecnologias de comunicação. São dois lados de uma mesma moeda que inicialmente são gerados de forma espontânea e independente (SOUZA, 1996).
É o momento de abertura política do país e fortalecimento da sociedade civil,
quando algumas entidades ligadas à comunicação passam a se articular em torno de uma
luta estratégica pela democratização da comunicação. O embrião desse movimento vem da
tese apresentada pela delegação do curso de Comunicação Social da UFSC durante o IV
Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação (ENECOM), em setembro de 1980, em
Curitiba. Intitulado “Os estudantes de Comunicação e a Radiodifusão Brasileira”, o
documento questionava o sistema de comunicação no Brasil mas ainda não falava na
necessidade de uma articulação nacional.
Em 7 de outubro de 1983, durante o IV Encontro Latino-Americano de Faculdades
de Comunicação e o VII Congresso da ABEPEC, em Florianópolis, acontece uma reunião
com entidades representativas e acadêmicas da comunicação, além de outras entidades da
sociedade civil, como a FENAJ, a ABI, a ABEPEC e o CEC de Brasília. A FNPDC é
lançada oficialmente em 24 de setembro de 1984, na Câmara dos Deputados em Brasília.
“O lugar escolhido estrategicamente já demonstrava que o movimento daria uma
importância fundamental às lutas legais, de mudança da legislação, como o Código
Brasileiro de Telecomunicações, Lei de Imprensa, entre outros” (SOUZA, 1996). Para
Santos, é uma mudança substantiva no eixo da luta pela democratização da comunicação
67
que faz com que o termo PNC dê lugar à expressão Políticas Democráticas de
Comunicação.
Essa proposta estava em sintonia com o salto qualitativo dos setores organizados da sociedade que, sem abandonar os meios de resistência criados até então, vislumbram a possibilidade de transformações institucionais e constitucionais de maior envergadura (SANTOS, 1995).
A Frente conseguiu reunir 45 entidades e 27 parlamentares até que, com a derrota da
emenda Dante Oliveira, no início de 1985, o movimento se desarticula. Entidades de peso
que compunham a frente centram forças na luta por uma Assembléia Nacional Constituinte
Exclusiva, “livre, soberana e democrática”. O presidente José Sarney opta pela alternativa
conservadora, de delegar poderes constituintes aos congressistas eleitos em 1986 (SOUZA,
1996). Apesar das derrotas seguidas, neste período vários setores da sociedade civil e dos
partidos políticos lançam documentos sobre a questão da democratização da comunicação
na constituinte, analisados no capítulo anterior.
Todos estes documentos, com diferentes enfoques, propõem a constituição de um sistema democrático de comunicação no Brasil, o fim dos monopólios, a criação de um Conselho de Comunicação Social, com a participação da sociedade civil, o reconhecimento do direito à comunicação como um novo direito humano, e a liberdade irrestrita de expressão (SANTOS, 1995).
68
Ante à constituinte, as entidades buscam a rearticulação da Frente. De acordo com
Santos, a partir de 1986, “a ênfase nas políticas democráticas de comunicação é substituída
por democratização da comunicação” (SANTOS, 1995). No entanto, devido à pouca
mobilização do conjunto das entidades da Frente, fica decidido que a FENAJ bancaria uma
proposta de emenda popular, apoiada também pelo Movimento Nacional pela
Democratização da Comunicação (MNDC), criado em São Paulo, em 1987, por jornalistas,
radialistas, professores da USP, rádios livres, etc (SOUZA, 1996).
A exemplo dos debates sobre as Políticas Nacionais de Comunicação na UNESCO,
as propostas da Frente também foram encaradas como ataque à liberdade de imprensa pelas
entidades empresariais da comunicação. Apesar disso, algumas propostas foram aprovadas
na Constituição de 1988, principalmente a proibição de monopólios e oligopólios, a
regionalização da produção e a criação do Conselho de Comunicação Social.
A Frente não consegue se articular após a constituinte. “Depois dos limitados
resultados obtidos na Assembléia Nacional Constituinte, a luta pela Democratização da
Comunicação prosseguiu com iniciativas regionais” (SOUZA, 1996). O processo de
rearticulação das entidades se dá somente após a polêmica edição do debate entre Collor e
Lula, na Rede Globo, nas eleições presidenciais de 1989, quando “deflagrou-se um
movimento de indignação por todo o país, o que fez com que vários setores da sociedade
civil se articulassem para lutar pela democratização da comunicação” (Id., 1996). No ano
seguinte, começam a surgir comitês pela democratização da comunicação em alguns
69
estados brasileiros. O primeiro é criado em maio, no Rio de Janeiro, com a adesão de 67
sindicatos e entidades da sociedade civil. Em novembro, é fundado o comitê paulista.
No XXIV Congresso Nacional dos Jornalistas, realizado de 31 de outubro a 4 de
novembro de 1991, em Florianópolis, a FENAJ:
(...) tomou uma série de posições que têm a seguinte síntese: é imprescindível a criação, no Brasil, de um movimento de caráter nacional, capaz de aglutinar os setores já mobilizados e ampliar o conjunto das categorias, partidos políticos e entidades preocupadas com a democratização da comunicação (FENAJ, 1991).
Nesse ano, surge o terceiro comitê pela democratização da comunicação, em Minas
Gerais. No momento em que sete Estados (SC, RJ, SP, GO, MG, DF, MT) já contavam
com seus comitês, é realizada uma reunião em Brasília, nos dias 5 e 6 de junho de 1991, na
qual se decide retomar a idéia de um movimento nacional, denominado a partir daquele
momento Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (SOUZA, 1996). Desde
seu início, o movimento demonstra seu caráter “institucional”. Suas principais frentes de
atuação foram a regulamentação e a implantação do Conselho de Comunicação Social, a
disputa da regulamentação da TV a Cabo e a elaboração de uma nova Lei de Imprensa que
o Fórum respondeu, posteriormente, com o projeto da Lei da Informação Democrática,
além ainda da campanha de reestruturação da Rede Manchete (FENAJ, 1994).
70
Em 1994 o Fórum chegou a contar com 44 comitês regionais e comissões pró-
Comitês, além de 32 entidades nacionais (FNDC, 1994). É neste ano que o movimento
aprova as “Bases de um Programa para a Democratização da Comunicação no Brasil”, em
sua quinta plenária, realizada em Salvador.
Em 1994/1995, é aprovada a Lei do Cabo, considerada uma das conquistas do
FNDC, uma vez que, entre outras questões, garante a criação dos canais de acesso público
(Câmara, Senado, Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores, Canais
Universitários, Canais Comunitários e Canais Educativo-Culturais). Outro fato importante
na história do FNDC foi a elaboração da lei de radiodifusão comunitária, entre 1996 e
1997, período no qual é criada a Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária
(ABRAÇO).
A sexta plenária, realizada no ano de 1995, em Belo Horizonte, demarca um período
em que o Fórum começa a se desarticular,
(...) exaurido pelas disputas internas e pelas fortes resistências à articulação da sociedade civil geradas pelo governo FHC e a sua decorrente desmobilização, além de renovadas reações contrárias do empresariado de comunicação, atraído pelo governo com a retomada de práticas de barganha e clientelismo (FENAJ, 2001).
Várias tentativas de retomada do FNDC surgiram entre 1998 e 2000, principalmente
como reação a atitudes do Governo Federal, como a Proposta de Emenda Constitucional
71
que acabou permitindo a abertura do capital das empresas de comunicação em 30% a
grupos estrangeiros. Em 2001, o FNDC consegue realizar sua oitava plenária, em Brasília.
É o momento em que o Fórum intensifica seu processo de rearticulação: além da plenária
realizada no Rio de Janeiro, em 2002, comitês voltam a funcionar no Rio Grande do Sul,
São Paulo e Rio de Janeiro. O ano de 2003 é de indefinições. O debate sobre as práticas
internas do FNDC volta à tona, sendo marcada uma reunião de avaliação do movimento em
São Paulo.
São produzidos quatro documentos de avaliação da trajetória do FNDC: “Por que
reconstruir o FNDC?”, pela coordenação executiva do Fórum, composta por FENAJ,
ABRAÇO, Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (ENECOS),
Conselho Federal de Psicologia (CFP), Federação Interestadual dos Trabalhadores em
Empresas de Radiodifusão e Televisão (FITERT); “Avaliação da atuação do FNDC
(nov2001 – jan2003)”, pela ENECOS; “Remontando as bases de um FNDC possível”, por
Álvaro Neiva e Adílson Cabral; e “Carta ao FNDC”, produzido por integrantes do Comitê
carioca, sendo enviado três vezes, por entidades distintas, porém com o mesmo conteúdo. O
teor dos três últimos textos é de crítica ao movimento, no que diz respeito ao modo de sua
atuação, das sucessivas derrotas aceitas como vitórias e também questões relativas a
práticas internas do FNDC.
O Conselho de Comunicação Social só é instalado em 2002, assim mesmo como um
órgão auxiliar do Congresso e com reduzida participação da sociedade civil. Além disso,
também as aprovações da Lei do Cabo e da Lei de Radiodifusão são vistas como “derrotas
72
de fato vendidas como vitórias de direito” (CABRAL e NEIVA, 2003), pelo caráter
restritivo que sofreram. Basicamente, os três textos apontam a falta de sustentação popular
do FNDC, que teria assumido um caráter cupulista e limitado à disputa por mudanças na
legislação.
(...) a pior derrota, de todos nós que fazemos parte do FNDC, é não termos conseguido inserir, na sociedade civil, a importância da luta e do debate sobre a comunicação social e a sua democratização. Esta derrota nos levou muitas vezes a aceitar aquilo que era possível no embate de forças com os oligopólios da comunicação e não o que era desejável para a sociedade (COMITÊ RIO, 2003).
Para Venício Artur de Lima, questões consideradas como conquistas do movimento,
como a Lei do Cabo e o Conselho de Comunicação Social, são passíveis de diversas críticas
não apenas por seus resultados com pelo processo de condução das negociações. Segundo
ele, numa avaliação das conquistas do movimento, os resultados podem ser considerados
muito pequenos. Ele aponta uma outra questão, que pudemos evidenciar com a análise dos
principais documentos: “O movimento e sobretudo o próprio FNDC ficaram mais
acanhados em relação às suas reivindicações originais” (LIMA, 2003).
Em junho de 2003 é marcada a X Plenária do FNDC, para os dias 19, 20 e 21 de
setembro do mesmo ano, na sede do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. O ambiente é
de crise, marcada pela existência de apenas três comitês regionais (SC, RS e RJ), muitas
críticas e algumas tentativas de rearticulação, evidenciadas no documento da executiva da
entidade.
73
Porque as definições sobre a introdução da tecnologia digital na comunicação social eletrônica, a reestruturação do mercado de mídia no Brasil, a política de concessão de outorgas de radiodifusão e a revisão da legislação da área estão em curso, ou prestes a serem deflagradas, ainda sem uma diretriz clara por parte do governo federal. E é justamente neste vácuo de propostas que o acúmulo e a experiência desenvolvidos pelo FNDC poderiam se mostrar necessários (FNDC, 2003).
Na outra frente da luta pela democratização da comunicação, os movimentos de
mídia alternativa e popular têm contribuído de diversas formas. Rádios comunitárias,
veículos sindicais, movimentos de contra-informação, entre outras iniciativas, têm a
capacidade de não só fazer um enfrentamento aos monopólios e oligopólios da
comunicação como também de promover a reflexão entre os movimentos sociais e
populares sobre a importância da mídia na sociedade contemporânea, além de transformar o
“cidadão comum” em sujeito ativo do processo de comunicação.
Alguns casos exemplares podem ser citados, como a própria criação da Associação
Brasileira de Radiodifusão Comunitária, além da Associação Mundial das Rádios
Comunitárias. O movimento de rádios comunitárias tem se apresentado como um dos
principais focos de resistência aos monopólios de mídia, sendo alvo de ataques freqüentes
da Polícia Federal sob determinação da Agência Nacional de Telecomunicações
(ANATEL).
74
Movimentos de cunho anarquista também têm atuado na chamada mídia alternativa
ou de contra-informação: um exemplo é o Centro de Mídia Independente, movimento
mundial criado para fazer a cobertura alternativa das manifestações antiglobalização em
Seattle, e que hoje no Brasil possui grupos trabalhando nas principais capitais brasileiras. A
principal característica desses grupos é o uso da internet para promover uma espécie de
perturbação na ordem comunicacional vigente.
Na esfera institucional, setores do Congresso Nacional, em conjunto com
representantes da sociedade civil, têm se dedicado a campanhas de fiscalização dos
programas e de esclarecimento à população sobre os meios de comunicação social. É o caso
da campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”, iniciativa da Comissão de
Direitos Humanos da Câmara dos Deputados com entidades da sociedade civil, que tem
como objetivo acompanhar a programação da televisão e denunciar ataques ao direitos
humanos.
Além disso, hoje cada vez mais os sindicatos, entidades, movimentos, procuram
desenvolver seus próprios meios de comunicação. O Movimento dos Trabalhadores Rurais
Sem-Terra, por exemplo, possui site na Internet, boletim por correio eletrônico, jornais,
além de estarem participando do projeto “Brasil de Fato”, criado para ser um jornal de
esquerda na imprensa brasileira. O próprio meio Internet tem sido o ambiente de articulação
de redes de pessoas e movimentos sociais.
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Todas essas iniciativas, e muitas outras, embora não façam parte de um movimento
unificado, contribuem à sua maneira pela democratização da comunicação – pelo menos
este é o objetivo de muitos desses movimentos e entidades. Merecem um estudo
aprofundado, principalmente sobre o impacto das novas tecnologias nas concepções e nas
práticas dos movimentos sociais.
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CONCLUSÃO
Com este trabalho, pretendemos fazer uma discussão introdutória sobre o que se
entende por uma comunicação democrática e quais são os caminhos para o estabelecimento
da democratização da comunicação. Além disso, elaboramos um histórico do movimento
pela democratização da comunicação no Brasil, em suas diversas características,
procurando entender de que modo sua concepção de comunicação democrática e suas
reivindicações nesse sentido foram sendo colocadas ao longo da trajetória. Na parte
histórica, nos dedicamos mais às origens do debate, até porque atualmente as iniciativas
estão tão fragmentadas quanto os próprios conceitos que as orientam.
A principal base de defesa da democratização da comunicação é, justamente, a idéia
de que a comunicação hoje se constitui num dos direitos humanos. Isso significa que a
população não tem o direito apenas de receber informação de qualidade, a partir de uma
pluralidade de fontes, mas de ser sujeito da comunicação, trocando informações e opiniões,
sem restrições de qualquer ordem. Embora o direito à informação ainda seja defendido por
77
alguns setores do movimento, é no direito à comunicação que reside a importância de sua
democratização. A própria formulação do direito de comunicar, contida no Relatório
MacBride, dá conta de que são necessárias ações no sentido de garantir o direito à
comunicação.
Considerada a comunicação como um direito de todo o cidadão, o processo de sua
democratização implica amplo acesso e participação de toda a população aos meios e à
definição das políticas de comunicação. A democratização da comunicação é vista então
como um processo a ser constantemente buscado, que tem como base a idéia de que os
indivíduos sociais e coletivos devem estabelecer um diálogo democrático e equilibrado via
meios de comunicação.
Só chegamos a esses conceitos com o retorno às origens do debate, principalmente o
relativo à NOMIC, no qual estão expressas as idéias centrais do que seria a comunicação
democratizada. Bandeira de diversas entidades e movimentos sociais, a democratização da
comunicação, a nosso ver, foi banalizada a ponto de o próprio movimento entrar em
contradição.
Em relação às suas práticas, a sociedade civil brasileira tem atuado, basicamente,
em duas frentes. A primeira delas é o estabelecimento de iniciativas de comunicação
alternativa, nos movimentos sociais e populares, nas comunidades, até mesmo nos meios
profissionais. Embora possamos dizer que a chamada imprensa alternativa exista desde o
surgimento da própria imprensa, é nos meios de radiodifusão eletrônica que os movimentos
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sociais desenvolveram as mais importantes investidas. A começar pelos setores
progressistas da Igreja Católica, com o uso do rádio nos Movimentos de Educação de Base
(MEB), passando pela criação da Associação Brasileira de Vídeo Popular, hoje extinta,
culminando com um crescente número de rádios comunitárias e alternativas pelo País.
Embora muitas vezes desarticuladas entre si e outras vezes reproduzindo a lógica dos
veículos comerciais, as rádios comunitárias, bem como todas as iniciativas de comunicação
horizontal, alternativa ou popular, têm servido não apenas como resistência à censura e ao
monopólio dos meios, mas para gerar o debate sobre a importância do acesso e da
participação de toda a população na comunicação.
É a partir da primeira metade da década de 1980 que o movimento pela
democratização da comunicação tem sua primeira organização institucional, com a Frente
Nacional de Lutas por Políticas Democráticas de Comunicação (FNPDC). É o início de
uma segunda frente de atuação do movimento, de luta pela limitação do poder dos
monopólios e pelo controle público dos meios de comunicação a partir de mudanças na
legislação. Esse movimento culmina na criação do Fórum Nacional pela Democratização da
Comunicação (FNDC), de conquistas e derrotas ao longo de sua trajetória, que tem um
programa estratégico bastante amplo e audacioso, embora tenha retrocedido em diversos
pontos a cada derrota sofrida.
O FNDC mereceu destaque em nosso trabalho porque, em seu auge, congregou uma
vasta gama de entidades e é dele que partiram importantes formulações teóricas e
reivindicações da sociedade civil. Não o consideramos, com isso, o único espaço onde se
79
articula um movimento pela democratização da comunicação que, como dissemos, assume
diversas características, cada uma com sua importância.
Dessa diversidade de características surge uma falsa dicotomia. A de que a “ação
institucional” exclui a “ação direta”, e vice versa. Ora, sabemos que, de um lado, há um
sistema de comunicação no Brasil que precisa ser modificado e, de outro, que essas
mudanças não serão possíveis nem mesmo frutíferas se a sociedade não for capaz de
entender a importância da democratização da comunicação, ainda mais num país em que a
crítica da mídia é quase inexistente. Por isso optamos por entender o movimento pela
democratização da comunicação no Brasil em todas suas frentes de atuação, até porque sua
fragmentação, embora perca o sentido de uma luta conjunta e estratégica, pode servir
também para disseminar o debate sobre a importância da comunicação. Se o próprio
Relatório MacBride aponta diversas alternativas para a democratização da comunicação,
não é razoável apontar apenas uma delas como referência de luta.
Em linhas gerais, pode-se dizer que o movimento mais ligado à disputa de
mudanças na legislação tem como horizonte a construção do controle público dos meios de
comunicação, expresso inclusive como o principal eixo estratégico do FNDC. Nos
primeiros documentos das entidades da sociedade civil na época da constituinte, porém, a
defesa era a de um radical Sistema Público de Comunicação, no qual à sociedade caberia a
tarefa de definir as políticas de comunicação e controlar a programação das emissoras, que
deveriam ser eminentemente públicas. Há, claramente, um retrocesso. No Sistema Público,
todos os meios de comunicação devem ser públicos – nem estatais, nem privados. Ao que
80
nos parece, a idéia de “controle público” dá a entender de que se aceita a existência de
meios de comunicação privados, sobre os quais o público deveria apenas exercer controle,
principalmente no que tange à programação.
O retrocesso na reivindicação evidencia-se no famigerado Conselho de
Comunicação Social. Na década de 1980, reivindica-se a constituição de um Conselho
Nacional de Comunicação, que deveria ser amplamente representativo da sociedade civil e
responsável pela decisão sobre as concessões – somente a fundações públicas – e pela
fiscalização das programações. Instalado dez anos depois de sua regulamentação, com o
nome modificado, o Conselho de Comunicação Social tem hoje, além de funções
meramente consultivas, restrita participação da sociedade civil.
Esse retrocesso representado pelo recuo na reivindicação em relação ao CCS se
evidencia em outras questões do programa do FNDC. Ao propor a reestruturação dos
mercados, por exemplo, o FNDC aceita a apropriação privada dos meios de comunicação e,
assim, dá indícios de defender uma sociedade em que decisões serão tomadas por
improváveis consensos entre setores com interesses tão distintos.
O primeiro diagnóstico, logicamente, é o da dificuldade de mudanças na legislação
em um Congresso em que boa parte dos deputados já foi agraciada com concessões de
rádio e televisão. Além disso, nota-se que a sociedade em geral e os próprios movimentos
sociais ainda não se deram conta da importância de se combater os monopólios da
comunicação no Brasil. Os movimentos sociais precisam entender que a luta pela
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democratização da comunicação incide sobre suas lutas específicas. De outra parte, deve se
trabalhar constantemente para que a população entenda as razões de se democratizar a
comunicação, como acontece, por exemplo, com a luta pela reforma agrária, hoje
amplamente debatida no Brasil. Não será a mídia, que agenda o debate político no país, que
irá fazer sua autocrítica. A despeito dessas dificuldades, porém, o movimento social deve
ter como meta, para a democratização da comunicação, a democratização do próprio
debate.
De que debate estamos falando? Até aqui, nos limitamos a fazer uma espécie de
mapeamento geral sobre os principais conceitos e reivindicações do movimento pela
democratização da comunicação. Com o decorrer do estudo, porém, fomos nos deparando
com questões que indicaram a existência de um debate de fundo ainda pouco explorado.
Um debate que coloca, dentro do próprio movimento, diferentes concepções de sociedade
em disputa.
A discussão sobre a democratização da comunicação ainda se limita aos
encaminhamentos práticos, ou seja, sobre as mudanças necessárias na legislação e sobre os
meios de enfrentamento aos monopólios. Garantir o acesso e a participação de todos no
processo da comunicação é uma idéia ousada que precisa ser defendida, ainda mais em um
país como o Brasil, no qual a exclusividade de tudo o que é dito e ouvido fica por conta de
um seleto grupo de grandes empresas familiares. No entanto, no seio do próprio
movimento, é um equívoco contentar-se com essa discussão. A pergunta a ser feita é: que
democratização da comunicação queremos?
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Acredita-se que, nesta sociedade que temos, haverá a situação idealizada em que os
diferentes segmentos, com seus interesses conflitantes entre si, conseguirão alcançar
consensos – e que a comunicação será o espaço para que isso aconteça? Ou admite-se que
não existem consensos numa sociedade em que um grupo subjuga outro – e que a
comunicação deve ser justamente o espaço de disputa desses interesses? Como admitir
uma comunicação democrática dentro da sociedade capitalista? Esse debate de fundo, aqui
simploriamente colocado, permeia a atuação do movimento e, se ele não é feito, acaba
tornando a luta pela democratização um processo confuso em que não se sabe que tipo de
sociedade se tem como meta. Discutir a democratização da comunicação é discutir que
sociedade queremos e colocar em cheque o próprio conceito de democracia.
São dúvidas e inquietações que ficam ao final deste trabalho. A única saída é a
recuperação dos conceitos e o aprofundamento do debate. Vivemos um momento em que a
Internet abre uma nova perspectiva e demanda uma nova postura dos movimentos sociais
que, neste campo, sempre tiveram sua atuação voltada à questão da radiodifusão. Brecht,
calejado com as derrotas da sociedade civil e com o avanço do capitalismo, talvez não
sonhasse para a Internet o mesmo que sonhou para o rádio. É por isso que só um debate
sério sobre a democratização da comunicação, que não se limite às práticas do movimento,
mas perfaça as questões acima colocadas, será capaz de fazer com que a sociedade civil
assuma uma postura crítica diante da convergência tecnológica e tenha claro o norte
político de sua atuação. Que ele seja feito daqui pra frente.
83
OBRAS CONSULTADAS
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ANEXO 1 - PRINCIPAIS SIGLAS ABEPEC: Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Comunicação ABI: Associação Brasileira de Imprensa ABRAÇO: Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária ABVP: Associação Brasileira de Vídeo Popular ACPO: Acción Cultural Popular AMARC: Associação Mundial de Rádios Comunitárias ARLESP: Associação de Rádios Livres do Estado de São Paulo CEB: Comunidade Eclesial de Base CEC: Centro de Estudos em Comunicação e Cultura CFP: Conselho Federal de Psicologia CNBB: Confederação Nacional dos Bispos do Brasil CONCLAT: Congresso Nacional das Classes Trabalhadoras CMI: Centro de Mídia Independente ENECOS: Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social ENECOM: Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação Social FENAJ: Federação Nacional dos Jornalistas FITTERT: Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão FNDC: Fórum Nacional pela Democratização das Comunicações FNPDC: Frente Nacional de Luta por Políticas Democráticas de Comunicação MNDC: Movimento Nacional pela Democratização da Comunicação NOMIC: Nova Ordem Mundial da Informação e da Comunicação
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OAB: Ordem dos Advogados do Brasil ONU: Organização das Nações Unidas PNC: Políticas Nacionais de Comunicação SAL-OCIC: Secretariado para América Latina da Organização Católica Internacional de Comunicação UCBC: União Cristã Brasileira de Comunicação UCIP: União Católica Internacional de Imprensa UCLAP: União Católica Latino-Americana de Imprensa UNDA-AL: Associação Católica Latino-Americana para Rádio e Televisão UNESCO: Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
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Anexo 2 – DATAS SIGNIFICATIVAS DO MOVIMENTO PELA DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO
1908 – Fundação da ABI. 1927-1928 – Criação da União Católica Internacional de Imprensa (UCIP), na Bélgica. 1928 – criação da Organização Católica Internacional de Cinema (OCIC). 1928 – Criação da Organização Católica Internacional de Rádio e Televisão (UNDA), na Alemanha. 1945 – Carta das Nações Unidas. 1945 – Constituição da Unesco. 1947 – Surgimento da Rádio Suatenza, com a ACPO. 1948 – Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948 – Resolução 7.22 da Unesco sobre o Livre Fluxo de Informações (Beirute). 1952 – Criação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. 1958 – Início das escolas radiofônicas, lideradas por dom Eugênio Sales, em Natal (RN). 1961 – Começo do Movimento de Educação de Base (MEB) no Brasil. 1964 – Golpe empresarial-militar no Brasil. 1965 – Começo das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) no Brasil. 1965 – Criada a Embratel. 1967 – Surgimento do Ministério das Comunicações e do Conselho Nacional de Telecomunicações. 1968 – Instalação do Ato Institucional número 5. 1968 – Lançamento do documento da Conferência de Medellín. 1969 – Publicação do artigo de Jean D’Arcy, proclamando o direito de comunicar. 1969 – fundação da União Cristã Brasileira de Comunicação
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1969 – Criação da Empresa Pública de Correios e Telégrafos no Brasil. 1970 – 16a reunião da Conferência Geral. Delegações de vários países em desenvolvimento colocaram explicitamente o que caberia qualificar de problemática da distribuição desigual dos meios de informação. Nesta década, começam as discussões sobre a NOMIC, articuladas pelas nações não-alinhadas. 1972 – Declaração dos Princípios-Guia sobre o Uso de Radiodifusão por Satélite para o Livre Fluxo de Informações, a Disseminação da Educação e um Maior Intercâmbio Cultural. 1972 – autorizou-se o diretor geral a promover o desenvolvimento de pesquisas em matérias de comunicação. 1972 – Fundação da ABEPEC. 1972 – Surgem a Telebrás e a TV a cores no Brasil. 1972 – Criação do Conselho Nacional de Comunicação no Brasil. 1974 – aprovação da Nova Ordem Econômica Internacional (NOEI) em sessão especial da Assembléia das Nações Unidas. 1975 – criação de uma Associação de Agências de Notícias Não-alinhadas. 1976 – encontro em Tunis das nações não-alinhadas com enfoque especial em comunicação. 1976 – A 19a reunião da Conferência Geral da ONU encarrega Amadou-Mahtar M’Bow de proceder um exame geral dos problemas da comunicação na sociedade da época. Constitui-se, assim, a Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas da Comunicação. 1976, julho – conferência em San José, Costa Rica. Sugere-se a criação dos Conselhos Nacionais de Comunicação. 1976 – Nairóbi, 19a reunião da Conferência Geral. Tamanhas eram as pressões contrárias que “a única solução realista consistia em prosseguir o debate e adiar qualquer solução” (Sean MacBride, na apresentação do Relatório). 1976, julho – Realização do terceiro Congresso da ABEPEC, em Caxias do Sul (RS). 1977, dezembro – início dos trabalhos da Comissão da UNESCO. 1978, abril – reunião internacional em Estocolmo.
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1977 – primeiro Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação 1978 – 20a reunião da Conferência Geral. Apresentado relatório provisório da Comissão. Aprovada a “Declaração sobre os Meios de Comunicação de Massa”. 1978 – Paris. Publicação do texto da “Declaração dos princípios fundamentais relativos à contribuição dos meios de comunicação de massas para o fortalecimento da paz e a compreensão internacional, para a promoção dos direitos humanos e para a luta contra o racismo, o apartheid e a provocação à guerra”. 1979, novembro – término dos trabalhos da Comissão. 1979 – Lançamento do documento de Puebla. 1980 – Publicação do Relatório MacBride, pela UNESCO. 1982 – encontro da Igreja Católica sobre comunicação, em Embu. Documento lançado é considerado uma “mini-NOMIC” na Igreja. 1983 – Publicação do Relatório MacBride no Brasil. 1983 – reunião de entidades para a criação da FNPDC, durante o sétimo Congresso da ABEPEC, em Florianópolis. 1984 – Publicação do documento “A Transição Política e a Democratização da Comunicação Social”, do CEC. 1984, setembro – Lançamento oficial da FNPDC. 1984 – Criação da ABVP. 1985 – retirada dos EUA da UNESCO. 1985 – Criação do Movimento Nacional de Rádios Livres e da ARLESP. 1985 – Derrota da Emenda Dante Oliveira no Congresso Nacional. 1986 – Retirada da Inglaterra da UNESCO. 1986 – Publicação da “Carta de Brasília”, no Encontro Nacional dos Jornalistas. 1986 – Publicação da “Carta de Brasília”, no Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação Social. 1987 – Fundação do MNDC, em São Paulo.
92
1987 – Instalação da Assembléia Nacional Constituinte. 1989 – UNESCO expõe mudança no foco de atuação no campo da comunicação, no lançamento do Terceiro Plano Intermediário (1990-1995) na XXV Conferência Geral. 1989 – Debate Lula x Collor na Rede Globo. 1991 – Criação da Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social. 1991 – Lançamento do documento “Proposta dos Jornalistas à Sociedade Civil”, pela FENAJ. 1991 – Fundação do FNDC. Em Junho, é realizada a primeira plenária, em Brasília. 1991, Outubro – Segunda plenária do FNDC, em Brasília. 1992 – Terceira Plenária do FNDC, em São Paulo. 1993 – Quarta plenária do FNDC, no Rio de Janeiro. 1994 – Quinta plenária do FNDC, em Salvador. Publicação do documento “Bases de um programa para a Democratização da Comunicação”. 1994-1995 – Aprovação da Lei do Cabo. 1995 – Sexta plenária do FNDC, em Belo Horizonte. 1996 – Criação da ABRAÇO. 1997 – Sétima plenária do FNDC, no Rio de Janeiro. 2001 – Realização do XXV Enecom, em Brasília, com o tema “Democratização da Comunicação: quem está no controle?”. 2001 – Oitava plenária do FNDC, em Brasília. 2002 – Instalação do Conselho de Comunicação Social, depois de 10 anos de sua regulamentação.
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ANEXO 3 – RESOLUÇÃO DE BELGRADO
Trecho retirado do artigo “UNESCO, NOMIC y America Latina. De la Guerra Fria al espíritu de buena voluntad de MacBride”, de José Marques de Melo (1991). La esencia de las propuestas de la Comisión MacBride se encontró consustanciada en la Resolución de Belgrado, aprobada por la vigésima primera sesión de la Conferencia General de la UNESCO, en octubre de 1980 (Shea y Jarret 1984:82-83). Esta resolución contiene once princípios, en los cuales se debería basear el NOMIC (Nuevo Orden Mundial de la Información y de la Comunicación): 1. Eliminación de los desquilibrios y desigualdades que caracterizan la situación vigente. 2. Eliminación de los efectos negativos de determinados monopolios, publicos o privados, y de las excesivas concentraciones. 3. Remoción de los obstáculos internos y externos para un libre flujo de y una más ampla y equilibrada diseminacióm de informaciones e ideas. 4. Pluralidade de fuentes e canales de información. 5. Libertad de prensa y de información. 6. Libertad para los perodistas y para todos los profesionales de los medios de comunicación; una libertad inseparable de la responsabilidad. 7. Habilitación de los países en desarollo para mejorar sus proprias situaciones, sobre todo en lo que respecta a la adquisición de equipo propio, entrenamiento de personal, recuperación de infraestrutuctura, además de capacitación de sus medios informativos y de comunicación, para sintonizarse con sus propias necesidades y aspiraciones. 8. Compromiso sincero de los países desarollados para ayudarlos a lograr tales objetivos. 9. Respeto a la identidad cultural de cada pueblo y al derecho de cada nación para informar al públco internacional sobre sus intereses, aspiracionais y respectivos valores sociales y culturales. 10. Respeto al derecho de todos os pueblos para participar en el intercambio internacional de información, con base en la igualda, la justicia y el beneficio mutuo. 11. Respeto al derecho de la coletividad, de los grupos étnicos y sociales, así como de los individuso para tener acceso a las fuentes de información y participar activamente en los flujos de comunicación.
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ANEXO 4 – PLANO DA UNESCO PARA 1990-1995 Trecho retirado do artigo “UNESCO, NOMIC y America Latina. De la Guerra Fria al espíritu de buena voluntad de MacBride”, de José Marques de Melo (1991). El nuevo plan de la UNESCO para el quinquenio 1990-1995 contiene cuatro metas bien definidas: 1. Inversiones en infraestrutuctura, ampliando y modernizando las redes de comunicaciones de los países en desarollo. 2. Entrenamiento de los recursos humanos, dando prioridad a la producción educativa, la selección de tecnologías apropriadas y la investigación aplicada. 3. realización de estudios sobre el impacto sociocultural de los medios de comunicación de masas y las nuevas tecnologías en la identidad cultural de los pueblos. 4. Desarollo de programas destinados a educar los usuarios de los medios de comunicación, capacitándolos para escoger críticamente las mensajes disponibles, a resisitir las posibles manipulaciones y a defender sus derechos como ciudadanos.
95
SITES RECOMENDADOS Associação Mundial das Rádios Comunitárias www.amarc.org Centro de Mídia Independente brasil.indymedia.org Comunicação, Cultura e Política www.comcult.blogger.com.br Ética na TV www.eticanatv.org.br Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social www.enecos.org.br Federação Nacional dos Jornalistas www.fenaj.org.br Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação www.fndc.org.br Media Democracy Day www.mediademocracyday.org Mídia Tática Brasil www.midiatatica.org Observatório da Imprensa www.observatoriodaimprensa.com.br Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura www.unesco.org Rede Brasil de Comunicação Cidadã www.rbc.org.br União Cristã Brasileira de Comunicação www.ucbc.org.br