WALSH, Froma. Morte na famlia: sobrevivendo as perdas. Porto Alegre: Artmed,
1998.
Morte na famlia: Sobrevivendo s perdas
W223m WalshMorte na famlia: sobrevivendo s perdas / Froma Walsh e Monica
McGoldrick: trad. Cludia Oliveira Dornelles. Porto Alegre: ArtMed. 1998.
1. Psicoterapia Perdas. I. McGoldrick, Monica. II.
Ttulo.
CDU 615.851
Catalogao na publicao: Mnica Bailejo Canto - CRB 10/1023
ISBN 85-7307-402-7
Froma Walsh, Ph.D.
Professor. School of Social Service Administration & Department ofPsychiatry.
Co-Director. Center for Family Health, University of Chicago, Chicago, Illnois.
Monica McGoldrick, A.C.S.W., Ph.D.
Director, Family Institute ofNew Jersey, Metuchen, New Jersey.
Associate Professor of Clinical Psychiatr, Robert Wood Johnson Medical School,
New Brunswick, New Jersey.
Morte na Famlia: Sobrevivendo s Perdas
Traduo: Cludia Oliveira Dornelles Consultoria, superviso e reviso tcnica desta
edio: Helena Centeno Hintz Psicolga clnica e psicoterapeuta de casais e famlia.
Membro fundador e integrante da Equipe de Coordenao do DOMUS (Centro de
Terapia de Casal e Famlia). Profssora e supervisora do CEAPIA (Centro de Estudos.
Atendimentoe Pesquisa da Infncia e Adolescncia), Porto Alegre. RS.
Artmed
Porto Alegre, 1998
Obra originalmente publicada sob o titulo : Living beyond Loss
Froma Walsh and Monica McGoldrick,1991.
Primeira publicao em paperback, pela Norton, 1995.
ISNB 0- 393- 70203-O
Capa:
Joaquim da Fonseca
Preparao do Original:
Maria Rita Quintella
Sandro W. Andretta
Superviso Editorial
Letcia Bispo de Lima
Composio e arte:
Com Texto Editorao Eletrnica.
Este livro dedicado memria daqueles que mais nos ensinaram a respeito da morte
Por Monica
Joseph D. McGoldrick
Margaret R. Phiffer Bush
Mary Gertrude Cahalane
John Michael Zamborsky
Don Mc Cook
Hughie Mc Goldrick
Por Froma
Mary Jo Bourassa Weisberg
George L. Weisberg
E ao brilhante professor que nos indicou o caminho
Murray Bowen
1913-1990
Colaboradores
BETTY CARTER, M.S.W.
Director, Family Institute of Westcester Mount Vernon, New York.
DAVID EPSTON
Co-Director, Family Therapy Centre, Auckland, New Zealand.
ELLIOT ROSEN, Ed.D
Faculty, Family Institute Westchester, Mount Vernon, NewYork.
Consulting Psychologist Jansen Memorial Hospice, Tuekahoe, New York.
EVAN IMBER-BLACK, Ph.D.
Director, Family & Group Studies.
Professor, Department of Psychiatry, Albert Einstein College of Medicine, Bronx, New
York.
EVELYN LEE, Ed.D.
Associate Clinical Professor, Department of Psychiatry, University of California, San
Francisco, California.
GEORGE H. GROSSER, Ph.D.
Former Instructor, Department of Psychiatry, Harvard Medical School, Cambridge,
Massachusetts.
JOHN BYNG-HALL, F. R. C. PSYCH.
Tavistock Clinic, London, England.
JOHN S. ROLLAND, M.D.
Associate Professor of Clinical Psychiatry, Pritzker School of Medicine.
Co-Director, Center for Family Health, University of Chicago, Chicago, Illinois.
MURRAY BOWEN, M.D.
Clinical Professor, Georgetown University Medical Center.
Director, Georgetown University Family Center.
NYDIA GARCIA PRETO A.C.S.W.
Clinical Director.
Faculty, Family Institute of New Jersey, Metuchen, New Jersey.
NORMAN PAUL, M.D.
Lecturer, Department of Psychiatry havard medical Scholl, Cambridge, Massachusetts.
PAULETTE MOORE HINES, Ph. D.
Director, Prevention Services, university of Medicine e Dentistry of New Jersey.
University of Mental Health Services, Piscataway, New Jersey.
Faculty, Family Institute of New Jersey, Metuchen, New York.
RHEA ALMEIDA, M.S.W.
Director, Institute for family Services, Somerset, New Jersey.
Adjunct Instructor, Rutgers Graduate School of Social Work, New Brunswick, New
Jersey.
SANDRA B. COLEMAN, PHD.
Director, Behaviorial Medicine Family Practice Residency Program, Eastern Maine
Medical Center,
Bangor, Maine.
STEVEN E. GUTSTEIN, Ph.D.
Private Practice, Houston, Texas.
Agradecimentos
Muitas pessoas merecem um agradecimento especial por suas sugestes, diretas
e indiretas, a este livro: Peter Sterling Mueller, um generoso e complacente mentor e
colega de muitos anos, cujo entendimento profundo do impacto da perda nas famlias
influenciou profundamente meu prprio trabalho; Norman Paul, cuja disposio
corajosa de enfrentar a perda com as famlias e cujo pensamento original e generosidade
como professor foram extremamente teis para mim ao longo de muitos anos; Murray
Bowen, cujas brilhantes idias vo iluminar nossos caminhos futuros e cuja
generosidade pessoal com seu tempo e com seus pensamentos sempre que o procurei
nos ltimos 17 anos foi profundamente apreciada. Ele influenciou muito meu trabalho,
e sua morte, no momento em que este livro estava no prelo, trouxe-me muita dor.
Espero que meus esforos neste trabalho reflitam bem minha dvida com ele (embora,
sem dvida nenhuma, nunca tivesse desejado este agradecimento).
Agradeo a minha me, Helen McGoldrick, minhas irms, Neale e Morna,
minha tia, Mildred McGoldrick Cook, juntamente com meus amigos, Betty Carter,
Joyce Richardson, Carol Anderson, Meyer Rothberg, Michael Rohrbaugh, Rich Simon,
Imelda McCarthy, Nollaig Byrne, Sandy Leiblum, Jane Sufian, Charlotte Fremon
Danielson, Nydia Preto, Paulette Hines e Evan Imber-Black, seu apoio de tantas formas
ao longo de tantos anos, e especificamente por me ajudarem a compreender o sentido da
vida e o sentido da morte. Tambm agradeo a Jcannine Stone e Gary Lamson, do
UMDNJ-CMHC, de Piscataway; Henry Murphree, M.D., Diretor do Departamento de
Psiquiatria da Robert Wood Johnson Medical School UMDNJ; e Mary Scanlon,
Diretora de Biblio- tecas da UMI)NJ Biblioteca RWJ de Cincias da Sade, por sua
ajuda generosa. Minha irm Neale no ofereceu somente um enorme apoio emocional,
mas um auxlio incansvel com os aspectos tcnicos deste livro genogramas e
trabalhos em informtica.
Agradeo tambm a meu marido, Sophocles, e a meu filho, John, a pacincia
pelas horas que este livro lhes roubou. Vicky Varra e a equipe da Yellow
IX
Brick Road proporcionaram a meu filho dois lares carinhosos e enriquecedores
fora de casa, que foram uma grande fonte de tranqilidade para mim em meu trabalho,
enquanto Cherie Allen, Aimee Copp e Halia Yevtushenko propiciaram o to necessrio
apoio domstico.
Monica McGoldrick
difcil destacar somente alguns dos muitos colegas, amigos e membros da
famlia que contriburam de tantas formas para minhas idias a respeito da morte e da
perda e para o desenvolvimento deste livro. Gostaria especialmente de agradecer a
diversos colegas da Universidade de Chicago. Margareth Waller, minha assistente de
ensino, ofereceu um feedback valioso, e Young Chang, meu assistente de pesquisa,
prestou uma assistncia editorial muito qualificada. Devo muito a Bertram Cohler,
mentor, colega e amigo de longa data, que recentemente perdeu sua esposa, Ann. Jeanne
Marsh, reitora da Escola de Administrao em Servio Social, e Bennett Leventhal,
Chefe da Psiquiatria Infantil e da Adolescncia, apoiaram entusiasticamente a criao
do Centro para a Sade da Famlia, que dirijo juntamente com John Rolland, para a
pesquisa e a formao clnica na abordagem dos desafios da vida familiar. John, meu
marido e colega, enriqueceu enormemente minha perspectiva sobre a perda atravs de
nossas muitas discusses, compartilhando seu prprio trabalho e suas reflexes a
respeito de suas experincias crticas de vida.
Nunca esquecerei daqueles amigos que me apoiaram nos momentos de perda e
em situaes de ameaa vida. Elza Bergeron Gross, minha ex-colega de quarto nos
Peace Corps, ficou ao meu lado nas doenas e funerais de meus pais. George Walsh ps
seu trabalho de lado para cuidar de mim aps um acidente de carro quase fatal, lendo
para mim toda a trilogia de Tolkien. Mary Zaglifa, compartilhando generosamente sua
experincia, ensinou-me mais do que qualquer mdico sobre a recuperao da meningite
e me deu coragem e humor nas horas difceis. Carol Anderson, Celia Falicov, Michele
Scheinkman, Janet Murphy, Karen Countryman e Katherine Goldberg sempre estiveram
ao meu lado, como, espero, estarei ao lado delas FromaWalsh
Este livro reflete para ns duas nosso interesse comum e colaborao por mais
de duas dcadas. Enriquecemos com nossa amizade extraordinria, que continua a
crescer e a se aprofundar com a passagem de nosso ciclo de vida. Juntas, queremos
agradecer a Susan Barrows seu apoio e eficincia em todos os aspectos da produo
deste livro. Ela foi uma colega soberba. Finalmente, queremos expressar nossa
apreciao s famlias que atendemos, aos colegas, amigos e a nossas prprias familias,
cujas experincias de vida serviram para ilustrar os casos de adaptao familiar perda.
Frorna Walsh e Monica McGoldrick
X
Prefcio
H dois anos, um amigo meu faleceu abruptamente. Ele morreu na Argentina e,
na verdade, eu sequer fora informado de sua breve enfermidade antes de sua morte. Ele
era, cronologicamente falando, meu amigo mais antigo fora da famlia: tnhamos sido
co1egas de jardim de infncia. Os labirintos de nossas respectivas trajetrias de vida
permaneceram distanciados por trs dcadas, mas, h mais ou menos vinte anos,
recuperamos a velha intimidade. Trocvamos cartas ocasionais; entretanto, como
vivamos a 6000 milhas um outro, somente nos vamos umas duas vezes por ano,
sempre que nossas vidas nmades nos colocavam a uma distncia razovel. Em cada
ocasio, levvamos mais do alguns minutos para reacender o vnculo, para nos
sentirmos novamente em casa na velha, confortvel, confiante e calorosa amizade.
Sua morte me privou de muitas coisas valiosas: ele era um repositrio de minha
identidade (Oi, Carlos!) e de minha histria (Voc se lembra quando...), alm de
uma fonte valiosa de estmulo emocional (Que bom te ver), de feedback social
(Quando voc fez X, eu me senti ...) e de preocupao com minha sade (Voc
parece cansado. Voc est cuidando bem de sua sade?). A relao era recproca e,
assim, ofereceu-me a experincia tranqilizadora de ser tambm o repositrio de sua
identidade e histria, bem como um recurso para sua estimulao emocional, feedback
e preocupao. Foi uma amizade duradoura com um rico fundo de lembranas comuns
que podiam ser despertados por qualquer um de ns; algumas reminiscncias talvez
um cenrio trivial compartilhado somente por ns dois vo permanecer adormecidas
em mim a partir de sua morte, pois no haver ningum para ativ-las. Ele era amigo de
muitos de meus amigos, e sua ausncia implicar a inevitvel perda da conexo que eu
mantinha com eles por meio dele e que se demonstrava a cada vez que falvamos sobre
os amigos, combinvamos encontr-los e assim por diante. A dor de uma perda torna
mais evidente a felicidade que possuamos.Estendo-me nesta experincia complexa
porque, por mais insubstituvel que esta relao possa ser, a maioria de seus atributos
no era peculiar a ela;
XI
certo que ningum pode compartilhar comigo aquelas lembranas de Herr Sultzberger,
nosso aterrorizante professor de Msica do jardim de infncia, mas posso listar algumas
amizades gratificantes, duradouras e ntimas alm dessa, todas nicas, todas lembradas
com carinho, todas intrnseca e individualmente no-essenciais para minha
sobrevivncia. A tempestade causada pela morte de meu amigo paradigmtica do
efeito de algumas das muitas perdas que sofremos ao longo de nossas vidas, e das quais
geralmente emergimos inteiros, embora de alguma forma modificados.
O vcuo de identidade, de histria e continuidade, de estimulao emocional,
de feedback social, de preocupao com a sade, de validao, de responsabilidade
produzido pela perda de um dos elos que constituem nosso self-em-contexto uma
experincia universal. Para alguns, a perda de uma relao preciosa a morte de um
dos pais, de um velho amigo, de um mascote fiel; para outros pode ser um atributo
fsico ou uma parte do corpo uma pele jovem e lisa que comea a enrugar, ou um
membro perdido em um acidente; pode ser o desaparecimento de uma projeo feita no
futuro a sbita conscincia de que um sonho jamais ser realizado ou no passado
quando descobrimos que uma figura idealizada de nossa infncia era corrupta.
Outros so destitudos de um objeto querido ou propriedade valiosa nosso primeiro
carro foi roubado, um incndio queimou todos os nossos lbuns de fotografias; ou vem
valores que lhes so caros desaparecerem o exrcito de nosso pas invade um pas
estrangeiro, ou Kennedy assassinado. E tantos entre ns passam por mudanas de
contexto emigramos, deixando para trs cones, marcadores e amigos. As perdas so
o fantasma de todas as propriedades, materiais ou imateriais.
Qual o processo pelo qual nos curamos desta experincia de sofrimento, pelo
qual esta intolervel ausncia se torna tolervel, pelo qual este vazio existencial
preenchido? E mesmo se despirmos essas perguntas de toda a sua carga de drama e nos
detivermos no destino de uma perda menor, a pergunta ainda permanece intrigante.
Qual o papel das introjees e das outras pessoas familiares, amigos, conhecidos
no processo de luto? E onde acontece a cura? No territrio ntimo do imaginrio
individual? Na arena consensualmente validada do modo como as coisas so contadas e
a realidade construda? Na complexa galeria de espelhos do mundo interpessoal? E,
dentro deste mundo, o processo est na trama interativa ntima e intensa de nossa
famlia imediata ou no tecido mais amplo de nossa rede social?
Ela ocorre em todos esses lugares, ou, mais precisamente, a experincia
totalmente singular para cada indivduo-em-contexto, e a conceitualizao do processo
uma funo dos construtos do narrador/observador: os modelos so as redes ideolgicas
que apreendem, organizam e atribuem sentido ao que est l fora. As experincias, por
mais quentes que possam ser quando so sentidas, so esfriadas pelo efeito mediador da
linguagem, o qual, por sua vez, organizado por modelos conceituais implcitos ou
explcitos.
O quente e o frio exaltam um ao outro neste livro. Enquanto estive imerso nestas
pginas, descobri-me vivenciando emoes intensas evocadas pelos temas e
personagens que habitam seus captulos, alm de um rico prazer esttico ao visitar os
multiplos modelos pelos quais os processos so discutidos pelas organizadoras, Froma
Walsh e Monica McGoldrick, e pelos diversos colaboradores desta obra. Por vezes, eu
gravitava em direo a uma poltrona aconchegante, onde, aninhado em uma colcha
quase pesada demais, e com Mahler propiciando a ambientao adequada, lia partes
deste livro como um romance.
XII
Houve captulos, no tenho dvidas, nos quais EU era o personagem principal
pelo menos essa era minha impresso , enquanto outros aludiam a um ou outro de
meus pacientes provavelmente intrigados agora com por que tantas lgrimas, por que
tantos rituais.
Este livro foi para mim tanto uma aventura de autodescoberta quanto uma
experincia profissional enriquecedora e desafiante. Ele expandiu minha capacidade de
pensar e, assim, de falar e, ento, de observar e, ento, de agir e, portanto, de refletir a
respeito de um dos temas universais da experincia humana. Eu no poderia desejar
uma melhor jornada para o leitor.
Carlos E.
Sluzki, M.D.
Chairman,Department of Psychiatry
Berkshire Medical Center
XIII
Algumas Reflexes Pessoais sobre a Perda
Ano passado foi o vigsimo aniversrio da morte de minha me. Seu
falecimento, claro, no encerrou nosso relacionamento, e eu nunca deixei de sentir sua
falta. Eu queria encontrar uma maneira significativa de comemorar sua perda. Seus dons
de pianista e organista e o amor pela msica que tnhamos em comum me fizeram
recordar os sinos do carrilho da Capela Rockefeller do meu campus na Universidade
de Chicago. Marquei um concerto simples de sinos para a noite do aniversrio. Meu
marido, John, minha filha, Claire, e eu subimos at o topo da torre dos sinos, onde est
o rgo do carrilho, e observamos a vista da cidade enquanto os sinos dobravam
harmoniosamente no ar revgorante da noite.
Eu no estava em absoluto preparada para a prolongada doena de minha me,
que aconteceu em meados de meus 20 anos. Perfeitamente enquadrada na descrio de
Erikson do adulto jovem normal, eu tinha sado de casa, estava desenvolvendo com
sucesso minha prpria carreira e prestes a assumir o compromisso do casamento. Como
muitos de meus pares, eu estava em um intenso programa de estudos de graduao, a
2000 milhas da casa de meus pais. Somente mais tarde minha formao em
desenvolvimento humano veio me proporcionar uma perspectiva normativa til dos
imperativos inerentemente incompatveis do ciclo de vida (os quais descrevi em meu
captulo sobre a vida adulta na obra As mudanas no ciclo de vida familiar. Porto
Alegre: ArtMed, 1995). Naquela poca, meu conflito foi intensificado por minha
conscincia e pelo comentrio de minha me de que eu estava muito ocupada como
profissional ajudando famlias no setting clnico, mas sequer estava por perto quando
minha prpria famlia precisava de apoio, conflito este agravado por minha posio de
filha nica. Antes e depois da morte de minha me, fui elogiada por meus colegas de
profisso e supervisores por minha fora, resilincia e bom funcionamento, pois
no deixei de cumprir nenhuma das exigncias de meu prosso de formao. Meus
novos sogros, impossibilitados de irem ao funeral e desejosos de nos poupar de uma
interao dolorosa, nunca mencionaram a morte de minha me em nossos encontros.
XV
A negao de nossa cultura do impacto da perda, combinada com o mito de que
os adultos jovens so desapegados de seus pais, contribuiu para a minimizao da
importncia de minha ligao e minha perda. As questes no-resolvidas ficaram
ocultas, emergindo em meus outros relacionamentos, at que resolvi ir em busca de meu
prprio trabalho de famlia de origem, facilitado em parte por Jeanette Kranier e por
muitas conversas com Monica sobre nossas famlias. A partir dessa experincia aprendi
a aconselhar meus alunos e outros a reservarem um tempo em suas vidas frenticas e
compromissos excessivos para o que pode ser a ltima oportunidade de passar algum
tempo com um ente querido que est morrendo, ou, aps uma morte, a acharem tempo e
espao para o apoio familiar mtuo e a ateno pa suas prprias questes relativas
perda.
Minha experincia com a morte de minha me me ensinou a agir de forma
diferente com relao a meu pai. Com o mpeto adicional do filme I Never Sang for
my Father , mostrado em um Simpsio do Instituto da Famlia de Georgetow parei de
adiar os esforos que sempre tinha querido fazer para melhorar nos relacionamento e
conhec-lo melhor. A orientao valiosa de Murray Bowen uma viagem de uma ponta
outra do pas com Monica prepararam o caminho. Meu relacionamento com ele tinha se
aprofundado muito quando, alguns anos antes, ele tinha recebido um diagnstico de
cncer e uma previso de apenas alguns meses de vida. Meu comprometimento no era
menor a 1000 milhas de distncia, com um novo cargo de reitora, um casamento e um
beb de 10 meses. Ironicamente, eu estava enfrentando a mesma situao de morte de
um dos avs, coincidindo com o nascimento de um filho que Monica e eu tnhamos
investigado em projetos de pesquisa clnica. Tnhamos observado o estresse inerente s
tarefas conflitantes do ciclo de vida: cuidar de um pai que est morrendo e fazer seu luto
justaposto s exigncias da maternidade e ao apego a um filho nascido na mesma poca.
Em contraste com as famlias com bom funcionamento que vivenciavam uma perda e
um nascimento coincidentes, as famlias mais disfuncionais no conseguiam fazer o
luto. Quando me vi subitamente envolvida no mesmo dilema, a pesquisa reforou
minha percepo da importncia crucial de dedicar ateno questes da perda,
equilibrando os dois conjuntos de exigncias. Coloquei o trabalho de lado e mobilizei
recursos em casa para poder ficar com meu pai, acompanhar suas hospitalizaes,
desocupar seu apartamento e organizar seus pertences, coloc-lo em uma residncia
com cuidados especializados e organizar seu funeral um conjunto exaustivo de
desafios para uma filha nica sem parentes vvendo prximos. A certeza de que meu
filho estava sendo bem cuidado em minha ausncia aliviou as dificuldades inerentes.
Embora sofrendo com a perda de meu pai, e estava em paz com nosso relacionamento e
grata por aqueles longos dias que passava sentada em silncio ao lado de sua cama.
Fiquei triste, e at mesmo com raiva por algum tempo, porque o irmo de meu
pai no veio v-lo em seus ltimos dias, nem me deu seu apoio. Mas depois me dei
conta de que as sbitas palpitaes cardacas que o fizeram cancelar sua viagem (e
desapareceram logo depois do funeral) devem ter expressado a dor em seu corao pela
perda iminente do ltimo irmo que lhe restava, uma vez que o terceiro havia sido
assassinado a tiros, alguns anos antes, em um assalto empresa que ambos
administravam juntos. Ainda mais insuportvel havia sido a recente doena e morte de
sua jovem nora, com um impacto devastador sobre seu filho (um veterano do Vietn) e
trs netos pequenos, que ele amava muito. Superamos tais problemas e renovamos
nossa intimidade.
XVI
Minha filha aprendeu pela primeira vez sobre a morte e a perda na maravilhosa
histria Cliarlottes Web, em uma fita de vdeo que ganhou de Monica, que sua
madrinha, em seu quarto aniversrio. A histria, a que assistimos muitas, muitas vezes,
motivou belas conversas a respeito da relao especial entre a aranha e o porco, a
normalidade da morte no ciclo da vida, a tristeza da perda e a importncia de conservar
as lembranas e formar novos laos.
Tambem aprendi muito com todas as vezes em que eu mesma estive prxima da
morte, forando-me a confrontar o terror de minha prpria mortalidade e me
surpreendendo com uma maior (e, por vezes, desconfortvel) clareza de viso. Tais
experincias, juntamente com a perda dos seres amados, fizeram-me mais consciente de
quo precioso o tempo, aguaram meu sentido de prioridade, diminuram minha
tolerncia a bobagens e catalisaram mudanas no curso de minha vida, afirmando
valores e ligaes humanas mais profundas.
Froma Walsh
Embora fssemos irlandeses, minha famlia cresceu tentando ser WASP*(1) e,
talvez por esta razo, parecia ter uma atitude sem frescuras, de evitao quanto
morte. Quando eu estava no segundo grau, meu professor predileto morreu de
melanoma. A famlia dele e a minha eram amigas ntimas, mas tnhamos recm nos
mudado e por isso no fomos ao funeral. Eu no tive chance de elaborar essa
experincia com a famlia dele, seus amigos e os meus. Em 1961, logo aps ter
retornado de meu primeiro ano na faculdade, minha bab morreu, aps um derrame.
Ningum tinha me contado que ela estava morrendo, e eu no cheguei a v-la antes de
morrer. Ela tinha me criado desde o nascimento, tranado meu cabelo todos os dias,
conhecido os segredos de minha infncia e me ensinado tudo o que sabia por 17 anos,
mas eu fui protegida de v-la antes de morrer. Seu funeral foi presidido por um padre
que no a conhecia, e ns no fomos ao enterro. Por meses eu ficava imaginando que a
via na rua. Somente visitei sua sepultura 27 anos depois, quando pedi que sua sobrnha
me levasse at l e finalmente soube qual era seu nome do meio.
Em abril de 1964, meu namorado da faculdade morreu em um acidente de carro.
Seu melhor amigo e eu, ambos devastados pela experincia, decidimos no ir ao funeral
ele foi sepultado muito longe, ns no conhecamos sua famifia e ningum nos
estimulou a ir. Eu levei dois anos para ir. at sua cidade natal, de Allentown, na
Pennsylvania, e visitar seu tmulo. Minha fantasia era de que eu ia encontrar um
pequeno cemitrio rural e caminhar entre as lpdes at encontrar a dele. Mas eu no
teria tanta sorte, o que descobri ao chegar l e me deparar com uma grossa lista
telefnica com numerosas igrejas listadas.
*(1) N.de T. . White Anglo Saxon Protestant: protestantes brancos e anglosaxes, a
classe dominante nos Estados Unidos.
XVII
Telefonei para a me dele, que agiu como se estivesse me esperando o tempo
todo e soubesse exatamente do que eu precisava. Ela veio ao meu encontro
imediatamente e me mostrou o local do acidente no caminho at o cemitrio. Ela me
contou a histria da morte dele e me deixou a ss por algum tempo em frente ao tmulo,
antes de me levar para sua casa, onde conheci outros membros da famlia. Ela at
mesmo se desculpou depois por no ter me preparado para o choque dc conhecer o
irmo de meu namorado morto, que era extremamente parecido com ele. Essa
experincia serviu para que eu elaborasse algo que tinha sido uma obsesso por dois
anos. Dei-me conta da diferena crtica que faz sentir-se enlutado e compartilhar o luto.
Quando minha av morreu, em 1966, s fui informada de seu falecimento duas
semanas depois e, por isso, no fui ao funeral, apesar de morar muito prxima. Em
maro de 1971, Mamie, minha tia favorita, morreu de velhice em uma clnica geritrica
em Staten lsland. Ela tinha sido o Papai Noel da minha infncia, chegando para nos
visitar com sacolas de livros e balas. Ela, mais do que ningum, era a historiadora da
famlia. Ela nos falava de seus irmos Din, Tim, Tom, Dan e Jack, e principalmente de
meu av Neil. E ela nos contava a respeito de nossos muitos primos, que amava como a
seus filhos, e sobre o que eles andavam fazendo. Ela tambm falava com freqncia de
sua prpria morte, e sempre dizia: Quero que meu cortejo saia da Casey, e quero estar
de culos, para poder ver quem vai estar l. Eu fui a primeira a chegar na casa
funerria de Casey* (1) para o velrio. Ela no estava de culos, e pedi ao responsvel
que os buscasse. Ela sabia como era importante que as pessoas viessem para
compartilhar e fazer parte do luto. Era um pedido essencial, que devia ser honrado.
Minha famlia parece ter mudado muito sua atitude em relao morte desde
aqueles primeiros anos. Quando meu pai morreu, em 1978, compartilhei sua morte com
minha me. Eu fiquei sozinha com ele durante as horas anteriores ao seu falecimento e,
no momento de sua morte, quis certificar-me de que a janela estava aberta para que seu
esprito pudesse sair, de acordo com a antiga superstio irlandesa. Minha me, minhas
irms e os amigos da famlia estavam envolvidos em planejar uma despedida que
refletisse o que ele significava para todos ns. As idias deste livro se desenvolveram
em mim por 30 anos a partir dessas experincias formativas.
Monica McGoldrick
*(1) N. de T. Nos pases anglo-saxes, os el rios, so realizados em casas funerrias
especializadas, e de l o fretro levado em cortejo para o cemitrio, diferentemente da
tradio brasileira de velar o corpo nas capelas dos cemitrios.
XVIII
Sumrio
1 A PERDA E A FAMILIA: UMA PERSPECTIVA SISTEMICA........................27
Froma Walsh e Monica McGoldrick
2 UM TEMPO PARA CHORAR: A MORTE E O CICLO DE VIDA
FAMILIAR.....................................................................................................................56
Monica McGoidrick e Frorna Walsh
3 ECOS DO PASSADO: AJUDANDO AS FAMLIAS A FAZEREM O LUTO DE
SUAS PERDAS............................................................................................................. 76
4. A REAO DA FAMLIA MORTE ...............................................................105
Murray Bowen
5. O LUTO OPERACIONAL E SEU PAPEL NA TERAPIA FAMILIAR CONJUNTA
................................................................................................................118
Norman L. Paul e George H. Grosser
6. O LEGADO DA PERDA .......................................................................................129
Monica McGoldrick
7. OS ROTEIROS FAMILIARES E A PERDA ........................................................153
John Byng-Hall
8. AJUDANDO FAMLIAS COM PERDAS ANTECIPADAS............................. 166
John S. Rolland
9. A PERDA AMBGUA ...........................................................................................187
Pauline Boss
10. O LUTO EM DIFERENTES CULTURAS.........................................................199
Monica McGoldrick, Rhea Almeida, Paulette Moore Hines, Elliott Rosen, Nydia Garcia
Preto e Evellyn Lee
11. OS RITUAIS E O PROCESSO DE ELABORAO.......................................229
Evan Imber-Black
12. NOVAS E ESTRANHAS FORMAS DE ABORDAR A CULPA.....................246
David Epston
13. SUICDIO DE ADOLESCENTES: A PERDA DA RECONCILIAO........263
Steven E . Gutstein
14. PADRES INTERGERACIONAIS DE PERDA TRAUMTICA:
MORTE E DESESPERO EM FAMLIAS DE DROGADICTOS........................ 282
Sandra B. Coleman
15. A MORTE NA FAMLIA DO TERAPEUTA ...................................................295
Betty Carter
NDICE REMISSIVO ................................................................................................307
Introduo
O tema da morte o ltimo tabu no campo da terapia de famlia. Nossa teoria,
pesquisa e prtica confrontararn problemas intimidantes como a esquizofrenia, o abuso
de substncias, a violncia familiar e o incesto, e, ainda assim, raramente abordamos o
tpico da perda. De todas as experincias da vida, a morte impe os desafios adaptativos
mais dolorosos para a famlia como sistema e para cada um de seus membros
individualmente, com ressonncias em todos os seus outros relacionamentos. A negao
da morte em nossa sociedade aumenta esta dificuldade. A sociedade americana lida
muito mal com a morte, negando seu impacto, removendo os moribundos de seus lares
e comunidades e no sendo capaz de ofercer suportes culturais para ajudar as famlias
em seu processo de adaptao perda. Ao mesmo tempo, os avanos da Medicina cada
vez mais colocam as famlias frente a decises sem precedentes relativas vida e
morte. Apesar disso, o campo da terapia familiar, assim como o da sade mental e a
sociedade mais ampla na qual esto inseridos, tm dedicado escassa ateno perda.
Curiosamente, at a publicao deste livro, no havia um nico livro sobre o
impacto da morte na famlia em toda a literatura especializada, ou, de forma mais
ampla, no campo da sade mental.*(1) Os poucos artigos de orientao sistmica que
contribuem para nosso entendimento da perda esto espalhados em jornais e textos com
mltiplos tpicos, no sendo vistos nem integrados pela maior parte dos estudantes e
profissionais de terapia familiar. Nas disciplinas de sade mental e cincias sociais, a
ateno morte e ao luto carece de uma perspectiva sistmica, e a famlia vista como
um pano de fundo que estimula ou dificulta a recuperao dos indivduos frente perda.
Devido a este foco to estreito no indivduo que sofre e em sua relao direta com o
membro da famlia falecido, o impacto familiar da perda deixa de ser investigado,
incluindo os efeitos imediatos e de longo prazo sobre os pais, os filhos,os irmos, a
famlia extensa e outros que podem at mesmo no ter conhecido o morto, mas que so
tocados por suas relaes com os sobreviventes.
*(1) Enquanto este livro eslava sendo impresso, foi publicado excelente texto de Elliott
Rosen sobre famlias que enfrentam doenas terminais, intitulado families facing death:
family dynamics of terminal illness.
XXI
Alm disso, a teoria e a prtica tm se fundamentado em premissas suposies
no comprovadas a respeito do luto normal, em contraste com o anormal,
patologizando as experincias que no se encaixam nos padres do primeiro.
necessrio que reconheamos a importncia dos processos familiares na mediao do
impacto da perda, na promoo do controle e do crescimento ou na contribuio para a
disfuno. Este entendimento requer a valorizao da diversidade nas respostas
individuais, familiares e culturais perda.
Alm disso, a teoria e a pesquisa sobre o desenvolvimento tm se concentrado
predominantemente nas conseqncias da perda dos pais na infncia (principalmente a
da me, havendo uma tendncia a ignorar a perda do pai). A perda de um dos pais ou de
um irmo na vida de um adulto jovem permanece particularmente inexplorada.
Precisamos examinar o impacto diferencial da perda nos vrios estgios do ciclo de vida
da famlia, para membros em diversos papis e relacionamentos e para a famlia como
unidade funcional.
Embora a teoria dos sstemas familiares tenha introduzido um novo paradigma
para o entendimento da rede de relaes na famlia, o impacto sistmico da perda
permaneceu em grande parte inexplorado. Com a ascendncia dos modelos estruturais e
estratgicos de terapia familiar, a ateno passou a concentrar-se nos processos
transacionais do aqui e agora, e nas co-construes da realidade. O fato inescapvel
da morte, as relaes com os membros mortos ou moribundos e suas ressonncias
atravs do sistema como um todo ficaram de fora do quadro das investigaes e
observaes. Jay Haley expressou-se sucintamente: Eu no acredito em fantasmas.
Mesmo quando a importncia de uma morte especfica notada, nossa teoria carece de
um referencial para compreender o impacto devastador que certas perdas podem ter nos
processos familiares, e confere pouco sentido aos problemas que podem surgir pela
incapacidade de uma famlia de fazer o luto de suas perdas.
Somente uns poucos pioneiros da terapia familiar abordaram o impacto familiar
da perda. H 25 anos, Norman Paul descreveu pela primeira vez os efeitos do luto nao
resolvido sobre os outros relacionamentos, especialmente na disfiino conjugal.
Murray Bowen, aproximadamente na mesma poca, chamou a ateno para o impacto
perturbador da morte ou da ameaa de perda no equilbrio funcional de uma famlia,
descrevendo a onda de choque emocional que reverbera por todo o sistema familiar por
muito tempo aps a perda de um membro importante.
Nosso interesse no tema da perda e o desenvolvimento deste livro caminham
paralelamente ao crescimento de nossa relao como amigas e colegas por mais de 20
anos. No incio dos anos 70, envolvidas em projetos separados de pesquisa familiar em
diferentes partes do pas, compartilhvamos nossos insights e hipteses a respeito dos
padres intergeracionais de luto no resolvido que observvamos no trabalho com
famlias de pacientes esquizofrnicos, com outros distrbios graves e com famlias de
filhos normais. Ao longo dos anos, influenciadas pelas idias seminais de Paul e Bowen
sobre a perda e pelos trabalhos de muitos dos que contriburam para este livro,
continuamos a discutir nossos casos clnicos e de pesquisa, assim como a avanar
nossas prprias formulaes e intervenes sistmicas.
XXII
Recentemente, tem ocorrido um grande nmero de progressos na teoria, na
pesquisa e na prtica clnica em torno da perda nas famlias, mas com pouco contato
entre os inovadores. Para reunir os lderes de nosso campo para uma troca frutfera, ns,
juntamente com Norman Paul, organizamos um Colquio Internacional sobre a Perda e
a Famlia em julho de 1988, em Ballymaloe, na Irlanda. Foi uma reunio
excepcionalmente estimulante. Entre muitas apresentaes de especialistas, ns (Monica
e Froma) decidimos trazer nosso dilogo para um nvel mais pessoal. Em vez de
apresentarmos nossos trabalhos, decidimos usar nosso tempo para explorarmos nossa
prpria mortalidade. Pedimos aos participantes, organizados em pequenos grupos, para
se concentrarem no seguinte: explorem suas fantasias e temores a respeito de suas
prprias mortes. Considerem as seguintes perguntas: Quanto tempo voc espera viver?
Como voc imagina sua morte? Que tipo de ritos funerrios voc gostaria que fossem
realizados quando voc morrer? Que heranas voc deixaria? A experincia foi
extraordinariamente significativa. Ao confrontarmos as questes universais da
mortalidade e da perda, a hierarquia e as fronteiras comumente construdas entre o
especialista e o cliente/paciente/ famlia se apagaram. Mais do que isso, fomos
todos tocados pelo poder dos legados de perda em nossas prprias famlias e ambientes
culturais, e pela relevncia de diferentes questes, dependendo de nossos estgios no
ciclo de vida familiar.
A Conferncia internacional sobre a Perda galvanizou nosso interesse comum no
desenvolvimento de um livro a respeito da perda desde uma perspectiva sistmica.
Como a conferncia, a idia deste livro foi gerada por um mpeto de reunir os melhores
trabalhos na rea da perda e famlias, incluindo artigos clssicos de Paul e Bowen
publicados h muito tempo, e trabalhos novos que representam o que h de mais
inovador no desenvolvimento da teoria, na pesquisa e na prtica clnica. Embora quase
todos os autores deste livro tenham apresentado seus textos na Conferncia
Internacional da Irlanda, ele no uma compilao dos trabalhos do congresso ou de
seus desdobramentos, os quais teriam produzido um tomo volumoso. Tentamos
selecionar as idias sistmicas mais importantes e os esforos de pesquisa mais
relevantes para a prtica clnica.
Este livro o primeiro a examinar o impacto da perda sobre o sistema familiar e
a considerar tanto os processos normativos como os disfuncionais em relao a cada
passagem no ciclo da vida das famlias e a seu contexto cultural. Embora muito j tenha
sido escrito sobre a perda com um foco individual ou dual, os textos desta obra
examinam a perda enquanto um fenmeno familiar multifacetado propagando-se por
todo o mbito familiar e transmitindo-se para a prxima gerao.
Os captulos deste livro, embora abordem aspectos diferentes da perda, tem em
comum uma perspectiva sistmica, com certas premissas bsicas. A famlia vivencia e
reage perda como um sistema de relaes, no qual todos os membros participam de
interaes mutuamente reforadoras. A perda tem
XXII
implicaes para como a famlia vai se adaptar a experincias posteriores e para
indivduos no diretamente relacionados ao membro que morreu. Os padres postos em
ao quando da morte de um membro da famlia tm tanto um impacto imediato como
ramificaes a longo prazo no desenvolvimento familiar, no curso do ciclo de vida e por
muitas geraes.
Nosso interesse no impacto familiar da perda reflete uma perspectiva evolutiva
multigeracional. Mais do que entender os eventos que cercam uma morte como causas
patolgicas de distrbios, ns os vemos como transies normativas no ciclo de vida
familiar, que carregam um potencial de crescimento e desenvolvimento, bem como de
perturbaes momentneas ou disfunes a longo prazo. Entendemos que a resposta
familiar perda to crtica na adaptao quanto morte. As famlias influenciam o
modo como o evento vivenciado e seus reflexos a longo prazo. Concentrando-se nos
processos familiares, os clnicos podem promover uma adaptao saudvel perda e
fortalecer a unidade familiar para enfrentar os outros desafios da vida. Tendo em
comum uma perspectiva multigeracional da perda, tomamos o cuidado de dedicar
ateno aos legados das perdas passadas no sistema familiar em todas as avaliaes e
intervenes clnicas. Igualmente importante o fato de nossa considerao da perda
levar em conta a diversidade cultural nos processos de luto.
Neste livro, os autores trazem reas especiais de conhecimento e uma variedade
de abordagens de interveno para lidar com diversas questes relevantes para os
profissionais, tais como o suicdio de adolescentes, as heranas intergeracionais e a
morte na famlia do terapeuta. A perda de um filho, de um dos pais, de um cnjuge e de
um irmo explorada. Diretrizes e tcnicas clnicas teis so oferecidas para a avaliao
e interveno com famlias que antecipam uma perda, para aquelas recentemente
enlutadas e para membros de famlias que vivenciam complicaes de longo prazo.
Nos captulos 1 e 2, Froma Walsh e Monica McGoldrick apresentam uma
orientao sistmica e uma perspectiva do ciclo de vida sobre a perda. No captulo 3,
Monica McGoldrick elabora diretrizes para a avaliao e a interveno clnicas
produzidas a partir deste referencial em seu trabalho com a perda. Os captulos 4 e 5
apresentam as idias fundamentais de Murray Bowen e Norman Paul em seus agora
clssicos artigos iniciais. No texto seguinte, Monica McGoldrick oferece uma
explicao fascinante dos legados multigeracionais da perda em diversas famlias
proeminentes. A seguir, John Byng-Hall, cujo persistente trabalho sobre os processos de
transmisso intergeracional foi de grande interesse para ns duas, propicia um rico
exemplo de seu trabalho clnico sobre os roteiros familiares e a perda. Tambm
influenciado pelo conceito de roteiros em seu trabalho a respeito dos sistemas de
crenas das famlias, John Rolland contribui com um texto sobre o tpico negligenciado
da perda antecipatria, baseado em seu modelo evolutivo dos sistemas familiares com
doenas crnicas e fatais. Intimamente relacionada a isto est a situao de perda
ambgua, descrita no artigo seguinte por Pauline Boss, cujas pesquisas representam um
marco no delineamento dos efeitos prejudiciais da ambigidade que cerca a perda no
funcionamento familiar e o controle das experincias de perda.
XXIV
O importante tema da diversidade cultural do luto requer muitas perspectivas.
Monica e suas colegas Nydia Garcia-Preto, Paulette Moore Hines, Evelyn Lee, Rhea
Almeida, juntamente com Elliott Rosen, resumem seu trabalho sobre as diferenas
culturais nas crenas a respeito da perda e nas prticas de luto. A seguir, Evan Imber-
Black aplica suas ricas idias sobre a importncia dos rituais que marcam as transies
familiares para os problemas especficos da perda. Depois. David Epston, que trabalha
em freqente colaborao com Michael White, nos estimula com suas intervenes
inovadoras sobre a perda a partir de sua perspectiva comum de recriao das narrativas
familiares.
Steven Gutstein oferece uma abordagem criativa e efetiva da rede familiar no
suicdio de adolescentes, um tema no qual tem trabalhado por muitos anos. O captulo
de Sandra Coleman apresenta uma perspectiva de suas importantes pesquisas, em
conjunto com vrios colegas ao longo dos anos, que investigam os padres
intergeracionais traumticos de perda em famlias de usurios de substncias e sua
ligao com o comportamento autodestrutivo da adio. Finalmente, guardamos para o
final um maravilhoso texto de Betty Carter, apresentado em um Simpsio de
Georgetown h muitos anos, que relata seus esforos para lidar com questes de sua
famlia de origem em torno da morte iminente de seu pai.
Este livro pretende proporcionar um texto til para profissionais que trabalham
com membros de famlias lidando com a ameaa da perda, com as conseqncias
imediatas de uma morte e com os efeitos a longo prazo de uma perda passada. A
perspectiva e as intervenes familiares sistmicas com a perda devem se mostrar
valiosas na formao e na prtica de uma grande gama de profissionais, incluindo (1)
terapeutas de famlia, assistentes sociais, psiclogos e psiquiatras; (2) mdicos de
famlia, enfermeiras e outros profissionais de sade que trabalham em hospitais, asilos e
ambulatrios; (3) religiosos, conselheiros pastorais e pessoal de casas funerrias. Ele
tambm vai servir apropriadamente como um texto bsico para cursos universitrios que
abordem a morte, o morrer e o impacto da perda.
Existem sinais de que nossa sociedade e nosso campo de atuao esto
comeando a confrontar questes familiares cruciais a respeito da morte e da perda. Este
livro no apenas oportuno; a investigao destas questes j devida h muito tempo.
O medo da morte o nosso terror mais profundo, e a morte de um ente querido nossa
tristeza mais profunda. Devemos desafiar o tabu que silenciou o campo da terapia de
famlia e os outros profissionais em torno do tema da morte, obscurecendo nosso
reconhecimento das questes da perda e bloqueando nossa comunicao com as
famlias e nossa capacidade de ajud-las. Esperamos que este livro sirva para quebrar
este ltimo tabu.
XXV
1. A Perda e a Famlia:Uma Perspectiva Sistmica
FROMA WALSH e MONICA MCGOLDRICK
Por toda a histria e em todas as culturas, os rituais de luto facilitaram no
apenas a integrao da morte, mas tambm as transformaes dos sobreviventes. Cada
cultura, a seu modo, oferece assistncia comunidade dos sobreviventes para que sigam
adiante com suas vidas. Em Hong Kong, quando as pessoas deixam um funeral chins,
elas recebem um envelope contendo trs itens: um pedao de pano branco, para secar as
lgrimas; uma bala, para lembr-las da doura da vida e para ser dividida com outros
sobreviventes; e uma moeda, como smbolo do antigo costume de reembolsar parentes e
amigos pela viagem para o funeral, para que eles no sofressem ainda mais perdas.
A partir de uma perspectiva familiar sistmica, a perda pode ser vista como um
processo transacional que envolve o morto e os sobreviventes em um ciclo de vida
comum, que reconhece tanto a finalidade da morte como a continuidade da vida. Atingir
o equilbrio neste processo a tarefa mais difcil que uma famlia deve enfrentar em sua
vida. Este captulo vai apresentar uma viso sistmica da perda, considerando o impacto
da morte de uma pessoa sobre a famlia enquanto unidade funcional, com ressonncias
imediatas e de longo prazo para cada um de seus membros e para todos os
relacionamentos. Embora reconheamos a diversidade das respostas culturais,
individuais e familiares perda (ver McGoldrick, Almeida, Hines, Preto, Rosen & Lee,
captulo 10), consideramos os processos familiares como determinantes cruciais da
adaptao saudvel ou disfuncional perda. Vamos identificar as principais tarefas
familiares que, em nossa experincia, promovem o processo de elaborao da perda e
retomada da vida. Vamos examinar variveis cruciais que podem tanto facilitar a
adaptao ou complicar o processo e contribuir para disfunes imediatas ou a longo
prazo. Estes fatores dizem respeito forma da morte, famlia e rede social, ao
momento da perda no ciclo da vida familiar e ao contexto sociocultural da perda.
Nas sociedades ocidentais antes do presente sculo, as pessoas morriam em casa
e mesmo as crianas no eram protegidas da viso e dos cheiros da morte.
27
Como ainda prevalece nas comunidades pobres do mundo todo, as famlias
tinham que lidar com a precariedade da vida, com a morte que atingia tanto os jovens
quanto os idosos. Com as altas taxas de mortalidade para bebs, crianas e mulheres
durante o parto, juntamente com uma expectativa de vida muito mais baixa (em mdia
47 anos em 1900, nos EUA), era raro crescer sem vivenciar uma morte na famlia
imediata. A morte de um dos pais muitas vezes desfazia as famlias nucleares e as
reorganizava de outras formas, produzindo redes complexas de relaes completas, de
meio parentesco e de parentesco no-sangneo, alm de vastos sistemas de parentesco
extensos (Scott & Wishy, 1982).
Portanto, a nostlgica imagem americana da famlia normal como intacta um
mito (Walsh, 1983a); nossa negao da morte contribui para sua manuteno. Em nosso
tempo, passamos a esconder a morte, tornando o processo de adaptao perda ainda
mais difcil. Em contraste com as culturas tradicionais, nossa sociedade carece de
suportes culturais para ajudar as famlias a integrarem o fato da morte vida que
continua (Aries, 1974, 1982; Becker, 1973; Mitford, 1978). As distncias geogrficas
separam os membros das famlias nos momentos de morte e de morrer. A prtica e a
tecnologia mdica complicaram o processo, removendo a morte da realidade cotidiana,
ao mesmo tempo em que confrontam as famlias com decises sem precedentes
relativas a prolongar ou terminar a vida. Mais recentemente, as famlias comearam a se
organizar em esforos para resgatar para si o processo do morrer.
A morte, obviamente, no a nica perda. A separao conjugal ou o divrcio, a
troca de emprego ou casa, a diminuio do funcionamento em decorrncia de uma
doena crnica ou o nascimento de um filho deficiente tambm envolvem perdas,
inclusive as de nossos sonhos e expectativas. Qualquer mudana em nossas vidas,
incluindo aquelas desejadas, como o casamento ou a aposentadoria, requer uma perda.
Levemos desistir ou alterar certas relaes, papis, planos e possibilidades para termos
outras. E todas as perdas requerem um luto, que reconhea a desistncia e transforme a
experincia, para que possamos internalizar o que essencial e seguir em frente.
Qualquer que seja a forma e as circunstncias, o luto deve ser experimentado.
Investigaes recentes feitas por Wortman e Silver (1989) e sua anlise de um amplo
campo de pesquisas confirmam que as respostas de luto variam enormemente. Ao
mesmo tempo, estudos epidemiolgicos descobriram que a morte de um membro da
famlia aumenta a vulnerabilidade doena e morte prematura dos membros
sobreviventes da famlia (Osterweis, Solomon & Green, 1984), em especial para
cnjuges vivos ou pais que perderam um filho recentemente (Huygen, van de Hoogen,
van Eijk & Smits, 1989). Alm disso, as crises evolutivas da famlia foram ligadas ao
aparecimento de sintomas em um de seus membros (Hadley, Jacob, Mliones, Caplan &
Spitz, 1974). Em vista das profundas conexes entre OS membros de uma famlia, no
surpreendente que o ajustamento perda por morte seja considerado mais difcil do que
qualquer outra mudana na vida (Holmes & Rahe, 1967).
Contudo, em nossa reviso da vasta literatura clnica e de pesquisa a respeito da
perda, impressionou-nos a negligncia com o foco familiar. Houve
28
contribuies importantes para nosso entendimento do processo de morrer (Kbler-
Ross, 1969; Worden, 1982), e esforos para distinguir entre o luto normal e o
patolgico nos sobreviventes individuais, desde o tratado de Freud sobre o luto e a
melancolia (1917) at os inovadores estudos de I3ecker (1973), Bowlby (1961, 1980),
Engel (1961, 1975), Glick, Weiss e Parkes (1974), Lindemann (1944), Parkes (1972,
1975) e Pollock (1961). Entretanto, particularmente nas contribuies com uma
perspectiva psicanaltica, a considerao da famlia ficou estreitamente limitada
relao dual entre um indivduo sintomtico e o parente morto (por exemplo, Pinkus,
1974; Schiff, 1977; Viorst, 1986). No melhor dos casos, observada a reao de outros,
solidrios ou no, experincia desta pessoa enlutada (por exemplo, Wortman & Silver,
1989). Supe-se que os membros assintomticos da famlia estejam se ajustando
normalmente, sem uma avaliao do sistema de interao. Alm disso, a teoria e a
pesquisa sobre o desenvolvimento, concentradas predominantemente nos efeitos da
perda dos pais na infncia para o desenvolvimento individual (por exemplo, Furman,
1974), negligenciaram o impacto da perda nos diferentes estgios do ciclo de vida
familiar, para vrios membros e para a famlia como uma unidade funcional (ver
McGoldrick & Walsh, captulo 2).
De modo geral, o campo da sade mental falhou em apreciar o impacto da perda
sobre a famlia como um sistema de interao. Uma resposta individual que pude ser
funcional ou disfuncional para uma pessoa tem conseqncias para os outros
membros da famlia e relacionamentos que s podem ser apreciadas atravs de um
exame do sistema. Uma ateno insuficiente tem sido dada aos efeitos imediatos e de
longo prazo para os irmos, pais, filhos e para a famlia extensa. Os legados da perda
encontram expresso em padres continuados de interao e influncia mtuas entre os
sobreviventes e entre as geraes (ver McGoldrick, captulo 6). A dor da morte toca
todas as relaes dos sobreviventes com os outros, alguns dos quais podem nem mesmo
ter conhecido a pessoa que morreu.
UMA PERSPECTIVA SISTMICA DA PERDA
notvel que em toda a literatura do campo da terapia de famlia no haja um
nico livro sobre a perda. Embora a teoria dos sistemas familiares tenha introduzido um
novo paradigma para o entendimento das relaes familiares, o significado particular da
perda foi abordado por apenas alguns tericos sistmicos, mais notavelmente Murray
Bowen e Norman Paul. Em seu clssico trabalho de 1976 (captulo 4 deste volume),
Bowen afirmou de forma ousada sua posio sobre o papel da morte nas famlias, um
tema sobre o qual ele j pensava h 30 anos:
O pensamento direto a respeito da morte, ou o pensamento indireto a respeito de
manter-se vivo e evitar a morte, ocupa mais do tempo do homem do que qualquer outro
tema O principal entre todos os temas tabus a morte. Uma grande porcentagem das
pessoas morre s, presa em seus prprios pensamentos,
29
que no podem comunicar para os outros. Existem a pelo menos dois processos em
operao. Um o processo intrapsquico do self, o qual sempre envolve alguma
negao da morte. O outro o sistema fechado de relaes: as pessoas no podem
comunicar os pensamentos que tm, para no incomodarem a famlia ou os outros.
Bowen descreveu o impacto perturbador da morte ou da ameaa de perda sobre
o equilbrio funcional de uma famlia, entendendo a intensidade da reao emocional
enquanto governada pelo nvel de integrao emocional da famlia no momento da
perda e pela importncia funcional do membro perdido. Uma famlia mais integrada
pode mostrar mais reaes explcitas no momento, mas se adaptar rapidamente, em
contraste com uma famlia menos integrada, que pode demonstrar pouca reao
imediata mas responder posteriormente com problemas fsicos ou emocionais. Bowen
descreveu a onda de choque emocional que pode reverberar por todo o sistema familiar
muito depois da perda de um membro importante da famlia:
[Uma] rede de tremores secundrios subterrneos pode ocorrer em qualquer
ponto do sistema familiar extenso nos meses ou anos que seguem a eventos emocionais
srios em urna famlia. Ela ocorre mais freqentemente aps a morte ou a ameaa de
morte de um membro significativo da famlia, mas pode ocorrer aps outros tipos de
perda. Ela no est diretamente relacionada s reaes usuais de sofrimento ou luto das
pessoas prximas quela que morreu. Ela opera em uma rede subterrnea de
dependncia emocional entre os membros da famlia. A dependncia emocional
negada, os eventos srios aparentam no ser relacionados, a famlia procura camuflar
qualquer conexo entre os eventos e h uma vigorosa reao de negao emocional, na
qual ningum tenta relacionar os eventos entre si.
Bowen sustentava que o conhecimento da onda de choque oferece informaes
vitais para a terapia, sem as quais a seqncia de eventos pode ser tratada como
desconectada. Da mesma forma, ele considerava essencial avaliar a configurao
familiar total, a posio de funcionamento do membro morto ou prestes a morrer e o
nvel geral de adaptao da famlia vida, para ajudar seus membros antes ou aps uma
morte.
Normal Paul foi o outro pioneiro da terapia de famlia a reconhecer o impacto
profundo da perda nas famlias (Paul, 1967, 1980; Paul & Grosser, 1965; ver captulo
5). Paul descobriu que, independentemente da averso morte e ao sofrimento, sua
fora ser expressa de qualquer maneira. O sofrimento pela perda de um pai, irmo por
outro membro importante da famlia, quando no reconhecido e no recebe a devida
ateno, pode precipitar a rejeio do cnjuge ou de um filho. Isto pode ocorrer logo
aps ou muito tempo depois da perda, como quando uma criana alcana a idade que o
pai tinha no momento em que ela ocorreu. Em alguns casos, o trauma do sofrimento
pode bloquear a intimidade ou interferir no comportamento sexual, sob a forma de
retrao ou disfuno sexual, casos extraconjugais ou mesmo envolvimento
30
incestuoso (Paul & Paul, 1982, 1989). Ele v a tarefa teraputica como a de trazer o
sofrimento abortado tona, para que ele possa ser elaborado como parte da experincia
normal de vida da famlia. Com Betty Paul, sua valiosa colaboradora, Norman Paul
devotou sua carreira clinica ao desenvolvimento de formas de confrontar o luto no
reconhecido e lidar com seus efeitos nos relacionamentos subseqentes. Suas maiores
inovaes foram com as confrontaes e replay com fitas de udio e vdeo, e com
projees justapostas da imagem de um cliente com uma foto de um pai morto. Em
confrontaes cruzadas, gravaes de experincias de terapia com alta carga emocional
de outras famlias proporcionam uma sano para que as famlias considerem e
compartilhem seus prprios sentimentos inacessveis ou inaceitveis de perda. Outros
estmulos estressores, como poemas, cartas, clips de filmes ou literatura, podem ser
usados para trazer os sentimentos dolorosos para a superfcie (Paul, 1976; Paul & Paul,
1982, 1989). Tanto Bowen quanto Paul, em abordagens teraputicas diferentes,
enfatizaram a importncia de aceitar a perda e modificar os padres associados a ela.
A despeito destes avanos inovadores, houve poucas contribuies para a
literatura familiar com uma viso sistmica da perda. Herz (1980, 1989) ampliou as
idias de Bowen, discutindo fatores-chave para a adaptao familiar. Ns mesmas
articulamos uma perspectiva sistmica da histria e da perda (McGoldrick & Walsh,
1983), bem como os padres normativos e as complicaes da morte em diferentes fases
do ciclo da vida (Walsh & McGoldrick, 1987; ver captulo 2). Contudo, poucos
pesquisadores trouxeram uma perspectiva sistmica para o estudo da morte e da perda,
especialmente Coleman e Stanton sobre o luto no resolvido em famlias de usurios de
drogas (Coleman & Stanton, 1978; Stanton, 1977; ver Coleman, captulo 14). Apenas
uns poucos trabalhos clnicos em publicaes sobre a famlia abordaram as ramificaes
sistmicas da perda, notadamente os artigos de Welldon (1971), Howe e Robinson
(1975), Wihiamson (1978), Reily (1978), Hare-Mustin (1979) e Kuhn (1981). Um livro
til para famlias que enfrentam uma morte iminente acaba de ser publicado por Rosen
(1990).
Em nossa viso, a desateno da terapia familiar perda anda de mos dadas
com a negao da morte em nossa cultura (Becker, 1973; McGoldrick & Walsh, [983).
Ambas so problemticas para as famlias que lidam com uma perda. Como nossa
sociedade trata o sofrimento como um assunto particular, os clnicos, assim como os
outros de fora da famlia, tendem a evitar fazer perguntas a respeito do impacto da
perda, reforando a comunidade invisvel dos enlutados (Rosaldo, 1989). Paul
comentou sobre a relutncia dos terapeutas, bem como a dos clientes, em confrontarem
o tpico da perda:
De todos os diferentes tpicos considerados representativos dos processos
familiares normais, aquele que vivenciado como o menos normal e o mais anormal o
processo de luto. O problema aqui que ele geralmente considerado normal na
literatura, mas encontra resistncia consciente e inconsciente quando realmente ocorre
em uma pessoa. O principal paradoxo que, embora exista
31
uma constante sombra de morte na vida de todos, todos esto alimentando a idia de sua
prpria imortalidade. (Paul & Paul, 1982, p. 229)
Paul adverte que a averso de um clnico morte e ao sofrimento pode
prejudicar sua capacidade de diagnosticar e tratar um problema sistmico familiar
corretamente enquanto ligado ao luto, resultando em uma concentrao pouco til em
sintomas secundrios.
A negligncia da perda na terapia de famlia foi aumentada pela ciso que
ocorreu no desenvolvimento do campo a respeito da importncia relativa do indivduo
versus o sistema familiar, do contedo versus o processo, e da histria versus o
aqui-e-agora para o entendimento e o tratamento das disfunes familiares (Madanes &
Haley, [977). Com a mudana paradigmtica para uma orientao sistmica, o foco
sobre o indivduo, as questes de contedo e as influncias do passado passou a ser
considerado por muitos como no-sistmico e associado a modelos tradicionais de
psicoterapia mais reducionistas (Fisch, Weakland & Segel, 1982). A medida que os
terapeutas estratgicos e estruturais deslocaram seu foco para os padres
organizacionais e processos de comunicao da famlia que podiam ser observados na
interao corrente, as questes de perda foram consideradas insignificantes para o
entendimento da manuteno do problema e irrelevantes para a mudana do sistema. A
perda era repudiada Como sendo meramente urra questo de contedo, envolvendo
sentimentos e reaes intrapessoais a eventos, particularmente no passado; por isso, era
relegada ao domnio da psicanlise. Mais recentemente, os tericos construtivistas
desvalorizaram ainda mais o significado dos eventos vitais (presumivelmente incluindo
a morte) argumentando que a realidade nunca pode ser conhecida, que todas as
experincias so co-construdas subjetiva- mente e que, portanto, qualquer tentativa de
descobrir ocorrncias factuais equivocada e irrelevante para as vises atuais (ver
Hoffman, 1990).
Infelizmente, estas falsas polarizaes impediram muitos de apreciar a
importncia crtica da perda para as famlias e para a terapia de famlia. Quando a
avaliao e a interveno clnicas esto limitadas aos padres transacionais existentes
entre os membros presentes em uma entrevista ou que vivem sob o mesmo teto num
dado momento, as relaes que foram perdidas (passado) ou as ameaas de perda
(futuro) permanecem fora de considerao, embora possam ter uma influncia direta nas
perturbaes atuais da famlia. A perda no simplesmente um evento discreto; ao
contrrio, ela envolve um processo transacional ao longo do tempo, com a abordagem
da morte em suas conseqncias. A perturbao individual aps uma perda no se deve
somente ao sofrimento, mas tambm resultado de mudanas no realinhamento do
campo emocional da famlia (Kuhn, 1981). A perda modifica a estrutura familiar e
geralmente requer a reorganizao do sistema como um todo. Talvez o mais importante,
o sentido de uma morte especfica e das respostas individuais a ela sejam moldados pelo
sistema de crenas da famlia, o qual, por sua vez, modificado por todas as
experincias de perda (Reiss & Oliveri, 1980). Se quisermos apreciar a diversidade e a
complexidade dos processos de perda, precisamos atentar para o interjogo dos
indivduos em seus contextos familiar e social;
32
para o processo ( o contedo, para a histria, bem como para o aqui-e-agora e para as
circunstncias factuais de uma morte bem como para seu significado para a famlia.
Para ajudar as famlias frente perda, os terapeutas devem reavaliar a histria
familiar, substituindo as premissas deterministas de causalidade por uma perspectiva
evolucionista. Assim como o contexto social, o contexto temporal oferece uma matriz
de sentidos na qual se insere todo o comportamento. Embora uma famlia no possa
mudar seu passado, as mudanas no presente e no futuro ocorrem em relao a ele. De
fato, como comentou Hoffman (1981),
Um problema pode permanecer congelado at que os padres ligados ao seu
estabelecimento original sejam modificados. O uso de Bowen da histria sugere
enfaticamente que no o revisitar do passado, mas o refazer do presente, o que conta.
(p. 249)
Ns propomos que as famlias precisam estar em equilbrio ou em harmonia com
seu passado, no em uma luta para recaptur-lo, escapar dele ou esquec-lo. Vemos a
terapia como um auxlio s famlias para que recuperem seu senso de continuidade e
movimento desde o passado em direo ao futuro.
Elas podem fazer isso modificando as crenas inseridas em suas vises do
passado que as impedem de progredir. Ajud-las a reconstruir sua histria e colocar suas
perdas em uma perspectiva mais funcional uma parte essencial para ajud-las a mudar
suas relaes com o passado e o futuro.
ADAPTAO FAMILIAR PERDA
O modelo do ciclo de vida familiar de Carter e McGoldrick (1989) oferece um
referencial que leva em considerao as influncias recprocas de diversas geraes
medida que elas avanam no tempo e se aproximam e reagem perda (ver McGoldrick
& Walsh, captulo 2). A morte traz desafios adaptativos comuns, exigindo uma
reorganizao imediata e a longo prazo e mudanas nas definies de identidade e
objetivos da famlia. A capacidade de aceitar a perda est no mago de todas as
habilidades dos sistemas familiares saudveis, em contraste com as famlias
severamente disfuncionais, que demonstram padres de m adaptao ao lidarem com
perdas inevitveis, unindo-se na fantasia e na negao para desfocar a realidade e
insistir na atemporalidade e na perpetuao de laos nunca desfeitos (Lewis, Beavers,
Gossett & Phillips, 1976).
Adaptao no significa resoluo, no sentido de uma aceitao completa e
definitiva da perda. Ao contrrio, ela envolve a descoberta de maneiras de colocar a
perda em perspectiva e seguir em frente com a vida. A festejada noo psicanaltica de
elaborar a perda para alcanar uma resoluo completa no se aplica experincia da
maioria dos indivduos e de suas famlias (Wortman & Silver, 1989). A adaptao no
tem uma escala ou seqncia fixa, bem como perdas traumticas ou significativas
podem nunca ser totalmente resolvidas. Os mltiplos sentidos de qualquer morte so
transformados durante todo o
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ciclo de vida, medida que so vivenciados e integrados com as experincias vitais,
incluindo, obviamente, outras perdas.
As Tarefas Adaptativas da Famlia
Embora seja um equvoco impor expectativas ou estgios, seqncias ou escalas
fixas a processos to complexos como o luto, dada a diversidade dos estilos familiares e
individuais de enfrentamento, acreditamos que existem tarefas adaptativas cruciais, as
quais, se no forem realizadas, deixam as famlias vulnerveis disfuno. Baseadas em
pesquisas e experincia clinica, podemos identificar duas tarefas familiares principais
que tendem a promover a adaptao imediata e a longo prazo para os membros das
famlias e a fortalecer a famlia enquanto unidade funcional.
1. O reconhecimento compartilhado da realidade da morte e a experincia
comum de perda. Todos os membros da famlia, a seu prprio modo, devem confrontar
a realidade de uma morte que a atinge. Bowen (captulo 4) chama nossa ateno para a
importncia do contato com a realidade da morte e, em particular, para a incluso das
crianas:
Eu incentivo os membros da famlia a visitarem os que esto morrendo sempre
que possvel, e a encontrarem algum modo de incluir as crianas, se a situao permitir.
Nunca vi uma criana ferida pela exposio morte. Elas so feridas apenas pela
ansiedade dos sobreviventes. As tentativas bem intencionadas de proteger as crianas ou
os membros vulnerveis da perturbao potencial de participar destes eventos as
isolam da experincia e dos riscos comuns, dificultando seu processo de luto.
O reconhecimento da perda facilitado pela informao clara e pela
comunicao aberta sobre os fatos e circunstncias da morte. A incapacidade de aceitar
a realidade da morte pode levar um membro da famlia a evitar o contato com os outros
ou ter raiva daqueles que esto progredindo em seu processo de luto. Antigos conflitos e
rompimentos entre irmos podem freqentemente; ser remontados ao leito de morte de
um dos pais, ou ao seu tmulo.
Os rituais funerrios (Imber-Black, captulo 11) e as visitas ao tmulo (Williamson,
l978) tm uma funo vital ao proporcionarem uma confrontao direta com a realidade
da morte e uma oportunidade de prestar uma ltima homenagem, compartilhar o
sofrimento e receber conforto da rede de apoio; dos sobreviventes. Compartilhar a
experincia da perda, seja de que modo for, crucial para a boa adaptao da famlia. O
seguinte exemplo sublinha o valor que tem para todos a incluso de um membro
vulnervel da famlia no processo de luto:
Sam Marcus, de 74 anos, estava confinado em uma casa geritrica h 5 anos,
aps sofrer danos cerebrais severos ao ser atropelado por um carro. Sua mulher
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e suas filhas tinham se ajustado, com o tempo, perda do marido e pai que tinham
conhecido, e conseguiram gradualmente lidar com suas profundas mudanas de
personalidade, ocasionais exploses violentas e, o mais doloroso para elas, sua recente
incapacidade de reconhec-las. Antecipando sua maior degenerao e morte, as filhas
foram tomadas de surpresa quando a me, embora aparentasse boa sade, morreu
repentinamente. As irms queriam muito que o pai participasse do funeral, embora os
mdicos se recusassem a liber-lo, temendo um comportamento perturbador, e
insistissem que ele no compreendia que a esposa tinha morrido e somente ficaria
confuso com a experincia. Para inclu-lo, as irms decidiram realizar o velrio na casa
geritrica (para o desagrado do agente funerrio, que dobrou o preo pela
inconvenincia). Quando o pai foi trazido na cadeira de rodas, elas sentaram ao seu
lado, embora ele no desse nenhum sinal de reconhec-las. Quando as irms se
levantaram e falaram sobre a morte e a vida de sua me, as lgrimas correram pelo rosto
do pai. Depois, eles ficaram sentados juntos em silncio, de mos dadas.
A comunicao entre a famlia vital no curso do processo de perda. Embora
tendo em mente que os indivduos, as famlias e as culturas variam no grau em que a
expresso aberta dos sentimentos valorizada ou funcional, existem fortes evidncias
de pesquisa sobre o bom funcionamento familiar de que a comunicao clara e direta
facilita a adaptao familiar e fortalece a famlia como uma rede de apoio para seus
membros (Walsh, 1982). Um clima de confiana, resposta emptica e tolerncia a
diversas reaes crucial. O processo de luto tambm envolve tentativas de colocar a
perda em uma perspectiva significativa, que se encaixe coerentemente no resto das
experincias vitais da famlia e em seu sistema de crenas. Isto requer que se lide com
as implicaes negativas da perda, incluindo a perda dos sonhos para o futuro.
As famlias podem vivenciar uma gama de sentimentos, dependendo do sentido
singular do relacionamento e de sua perda para cada membro e das implicaes da
morte para a unidade familiar. Fortes emoes podem vir tona em diferentes
momentos, incluindo sentimentos confusos e ambivalentes de raiva, desapontamento,
desamparo, alvio, culpa e abandono, os quais esto presentes em um certo grau nas
relaes familiares. O antroplogo Rosaldo (1989) escreve sobre suas reaes morte
sbita, acidental, de sua esposa, tambm uma proeminente antroploga, quando ela
escorregou enquanto eles caminhavam em uma trilha de montanha e caiu em um
precipcio ngreme:
Imediatamente aps encontrar seu corpo, fiquei enfurecido. Como ela podia me
abandonar? Como ela podia ler sido to burra de cair? Tentei chorar. Eu soluava, mas a
raiva bloqueava as lgrimas. Mais tarde, poderosos estados emocionais viscerais
tomaram conta de mim. Experimentei a profunda dor cortante da tristeza, quase alm do
suportvel, o frio cadavrico de me dar conta da finalidade da morte, o tremor que
comeava em meu abdmen e se espalhava pelo corpo, o lamento fnebre que comeou
contra minha vontade, e freqentes soluos de pranto.
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Raramente tais emoes so expressas to diretamente em nossa cultura, onde
compartilhar sentimentos negativos intensos tende a produzir desconforto e
distanciamento nos outros. Alm disso, a perda do controle ao vivenciarmos
sentimentos to avassaladores pode assustar os membros da famlia e outros, que podem
bloquear a comunicao da experincia.
Quando levamos em considerao as mltiplas, flutuantes e freqentemente
conflitantes respostas de todos os membros de um sistema familiar, podemos apreciar a
imensa complexidade do processo de luto de qualquer famlia. E necessria a tolerncia
para com as respostas diversas dentro das famlias, e para a possibilidade de que alguns
membros estejam em desacordo com os outros, dadas as diferenas de significado dos
relacionamentos e os estilos de enfrentamento individuais. Quando um cnjuge vivo
tambm o pai de uma criana pequena, a expresso emocional pode ser bloqueada pelas
responsabilidades de ser pai solteiro, com os filhos e os parentes bem intencionados
conspirando para manter o nico pai sobrevivente forte e funcionando.
Quando o luto parental bloqueado, um filho tem mais probabilidade de se
tornar sintomtico.
Em famlias nas quais certos sentimentos, pensamentos e lembranas so
proibidos por lealdades familiares ou tabus sociais, o bloqueio da comunicao pode
contribuir para o comportamento sintomtico, ou os sentimentos podem ficar ocultos e
reaparecerem em outros contextos, desconectados de sua origem. Quando os
sentimentos so insuportveis ou inaceitveis, eles podem ser delegados e expressos de
modo fragmentado por diferentes membros (Reilly, 1978). Um membro pode expressar
toda a raiva pela famlia, enquanto outro fica em contato apenas com a tristeza; um
demonstra apenas alivio, o outro fica entorpecido. Quando a famlia incapaz de tolerar
sentimentos, um membro que expresse o indizvel pode virar o bode expiatrio ou ser
excludo. Alm disso, o choque e a dor de uma perda traumtica podem despedaar a
coeso familiar, deixando os membros isolados e sem apoio em seu sofrimento,
arriscando conseqncias disfuncionais, como no seguinte caso:
A Sra. Campbell buscou a ajuda da clnica psiquitrica infantil em decorrncia
de problemas escolares de sua filha de li anos. A terapeuta descobriu que os problemas
tinham sido identificados pela escola um ano antes, mas haviam piorado no ms
anterior, logo aps o filho mais velho, de 18 anos, ter sido a vtima inocente de um
tiroteio entre gangues. O pai comeou a beber muito, distanciando-se da famlia. O
outro filho mais velho, de 17 anos, levou o dio da famlia para as ruas, buscando
vingana peio assassinato. Dois outros filhos do meio no demonstraram nenhuma
reao, ficando fora do caminho e comportando-se como meninos de ouro. A me, em
sua dor, voltou sua ateno para os problemas preexistentes da filha. A terapia familiar
proporcionou um contexto para o trabalho de luto da famlia, ao mesmo tempo em que
reparou sua fragmentao e promoveu uma rede mais coesa de apoio e cura mtuos. Foi
especialmente importante envolver os irmos que estavam bem, os quais estavam
segurando sua dor e confuso para no sobrecarregarem ou perturbarem ainda mais os
pais. Em uma entrevista de acompanhamento, seis meses depois, a filha
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estava indo bem na escola e a famlia relatou que a experincia de se reunirem para
compartilhar o sofrimento tinha fortalecido sua capacidade de lidar com outros
problemas.
2. A reorganizao do sistema familiar e o reinvestimento em outras relaes e
projetos de vida. A morte de um membro da famlia perturba o equilbrio familiar e os
padres estabelecidos de interao. O processo de recuperao envolve um
realinhamento das relaes e a redistribuio dos papis necessrios para compensar a
perda e prosseguir com a vida familiar. Promover a coeso e a flexibilidade no sistema
familiar crucial para sua reestabilizao. A convulso e a desorganizao
experimentadas como conseqncia imediata de uma perda podem levar as famlias a
fazerem movimentos precipitados para novas casas ou casamentos. Este novo
deslocamento pode piorar as coisas. Algumas famlias podem tentar se aferrar
rigidamente a antigos padres, que no so mais funcionais, para minimizar a sensao
de perda e perturbao na vida familiar.
A Sra. Robbins procurou ajuda devido a problemas de comunicao entre ela e sua
filha de 16 anos, Donna, que andava tristonha e distante. A famlia consistia na me e
trs filhas. O Sr. Robbins, morto em um acidente de carro seis anos antes, tinha sido
muito amado por sua famlia. A perda foi agravada quando a filha de 16 anos na poca,
Pam (que tinha sido a mais ligada ao pai), fugiu com o namorado algumas semanas
depois da morte dele, cortando todos os contatos com a famlia. Pouco tempo depois,
Nick, um antigo amigo da famlia, tinha persuadido a Sra. Robbins a se mudar para a
cidade dele para comear urna vida nova. Ele a ajudou a encontrar um emprego e um
apartamento ao lado do dele. A filha mais velha, ento com 18 anos, tornou-se sua
ajudante e arruinou um emprego para ajudar a sustentar a famlia, deixando de lado seus
planos de ir para a faculdade.
A despeito da mudana, a Sra. Robbins se determinou a conduzir a vida familiar corno
se seu marido ainda fosse o chefe da casa, e a criar as filhas dele corno ele mesmo
teria feito. Juntas, elas mantinham a expectativa ilusria de que ela deveria viver como
se fosse os dois pais ao mesmo tempo, e de que elas deviam continuar a vida familiar
corno antes da morte do pai. Embora a me agora trabalhasse em tempo integral para
sustentar a famlia, ela dolorosamente preparava os pratos preferidos do pai, servindo-os
a cada noite na hora determinada pelos horrios dele para a janta. Nick juntava-se a elas
corno um convidado incmodo. Os piqueniques e feriados familiares eram celebrados
exatamente como tinham sido com o Sr. Robbins. Com a explorao do terapeuta, as
meninas admitiram que j estavam crescidas para muitas daquelas atividades, e somente
fingiam se divertir com elas. J adolescentes, elas queriam passar mais lempo com os
amigos, mas sentiam que seria desleal com os dois pais expressar algum
descontentamento. A me reconheceu sua exigncia de tentar manter a famlia como se
estivesse ainda intacta. A terapia ento se concentrou em ajud-las a fazer o luto de sua
perda e a modificarem suas tradies para se
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encaixarem melhor s suas necessidades evolutivas em mutao e sua estrutura como
famlia com somente um dos pais.
O processo de luto bastante varivel, e com freqncia dura muito mais do que
as prprias pessoas esperam (Wortman & Silver, 1989). Cada nova estao, feriado e
aniversrio podem evocar a perda. A idealizao excessiva do morto, a sensao de
deslealdade ou o medo catastrfico de outra perda podem bloquear a formao de outros
relacionamentos e compromissos. Os membros da famlia podem se recusar a aceitar
um novo membro, vendo-o como um substituto do morto, se a perda no estiver bem
integrada, como no caso das Robbins:
medida que a terapia progredia, as meninas comearam a expressar queixas a
respeito de Nick: Aquele homem do apartamento ao lado passa muito tempo l em
casa. Ele um idiota. Ele no chega nem perto do homem que nosso pai foi Aps
ter passado muito rapidamente para uma nova relao, seu status permaneceu ambguo
por quase seis anos. Embora mantivessem apartamentos separados, Nick dormia no
quarto da me, todas as noites colocando um colchonete ao lado de sua cama, e todas as
manhs guardando-o. Este ritual clandestino expressava a ambivalncia persistente em
seu relacionamento. Aps a morte de seu marido, a Sra. Robbins tinha encontrado apoio
e consolo em Nick, e a mudana propiciou urna fuga bem vinda de seu ambiente
cotidiano, que a lembrava constantemente da perda. Contudo, ela nunca se sentiu
perfeitamente bem em relao a um verdadeiro compromisso com ele, e estava
deprimida, acima de seu peso e insatisfeita com o emprego. A terapia passou por uma
fase de sesses de casal, que revelaram a relutncia de Nick em se comprometer
realmente com ela e suas filhas, decorrente de um divrcio e um rompimento amargo
com seus prprios filhos. Ao se dar conta de que a relao deles estava em um beco
sem sada, ela decidiu termin-la.
Com esta perda, a Sra. Robbins viu-se sonhando diariamente com seu falecido
marido, inundada por sentimentos de saudade. Uma srie de sesses individuais revisou
seu casamento e o sentido da perda dele para ela. Utilizando fotografias e urna cadeira
vazia, ela teve duas conversas que desejava ter tido com ele: a primeira para dizer
adeus antes de sua morte e a segunda, no presente, para inform-lo do que havia
acontecido com as filhas e com ela desde a morte dele e de sua necessidade de agora
tocarem a vida adiante, conservando sempre sua memria querida. Ela perguntou
terapeuta se podia ficar com as fitas daquelas sesses, e posteriormente disse que sentia
que uni peso tremendo tinha sido retirado de sua mente: Eu no vou ter mais que
carregar todos aqueles sentimentos na cabea, porque os tenho todos gravados,
A terapia de famlia com a perda requer a mesma engenhosidade e flexibilidade
que a famlia precisa ter para responder aos vrios membros e subsistemas medida que
suas questes vo aparecendo. Quando ocorrem mudanas em uma parte do sistema,
elas geram mudanas para as outras. A
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opo de fazer sesses individuais, de casal ou com a unidade familiar guiada por uma
viso sistmica do processo de perda.
Com a famlia Robbins, a fase final da terapia envolveu uma reunio da me
com as filhas. Elas organizaram caixas velhas no sto e decidiram ficar com certas
recordaes e se desfazer de outras. Para o aniversrio da morte do marido, a sra.
Robbins escreveu um obiturio que havia sido solicitado, mas incapaz que fora, de
escrever na poca da perda dele. Isto estimulou as filhas a escreverem poemas e fazerem
desenhos em memria do pai. Com grande entusiasmo, elas reuniram estes trabalhos em
um livreto, que mandaram para parentes e amigos. A terapeuta orientou a me em seus
esforos para reencontrar a filha distante, Pam, que finalmente veio visit-las. Nos anos
seguintes, a famlia manteve a terapeuta informada de importantes passagens familiares,
como o novo apartamento e o emprego mais satisfatrio da me e a ida das filhas para a
faculdade.
Fatores que Influenciam a Adaptao Familiar Perda
Diversos fatores influenciam o impacto de uma morte e a natureza e a durao
da resposta de uma famlia. A partir dos trabalhos de Bowen (1976) e Herz (1980,
1989), e de pesquisas sobre o funcionamento familiar (Walsh, 1982), podemos
identificar diversos padres que tendem a complicar a adaptao familiar perda e
criam um risco maior de disfuno. Se quisermos entender por que algumas perdas
podem ser devastadoras para certos indivduos e suas famlias, devemos avaliar
cuidadosamente estas variveis e abord-las em qualquer plano de interveno.
A FORMA DE MORTE. Morte repentina ou prolongada. As mortes repentinas
ou aps uma doena prolongada so especialmente estressantes para as famlias e
demandam mecanismos de enfrentamento diferentes (ver Rolland, captulo 8). Quando
uma pessoa morre inesperadamente, os membros da famlia carecem de tempo para
antecipar e se preparar para a perda, para lidar com assuntos inconclusos ou, cm muitos
casos, at para dizer adeus.
Quando o processo do morrer prolongado, os recursos financeiros e de
prestao de cuidados da famlia podem se esgotar, e as necessidades dos outros
membros so colocadas em suspenso. O alvio com o fim do sofrimento do paciente e
da tenso da famlia costuma vir carregado de culpa. Alm disso, as famlias esto cada
vez mais enfrentando o penoso dilema de manter ou no, e por quanto tempo, os
esforos de manuteno da vida, com enormes custos, para manter um membro da
famlia indefinidamente em estado vegetativo ou com dores crnicas, sem virtualmente
nenhuma esperana de recuperao. A controvrsia a respeito da tica mdica, das
crenas religiosas, dos direitos do paciente/famlia e de processos criminais se estende
s perguntas mais fundamentais de quando a vida acaba e quem deve determinar este
fim. Estas perguntas podem ser angustiantes para famlias divididas entre os desejos do
paciente
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do direito de morrer com dignidade e a tica md