COLEÇÃO
p r a z e r e s p o é t i c o s
Chiado Editorawww.chiadoeditora.com
Um livro vai para além de um objeto. É um encontro entre duas pessoas através da palavra escrita. É esse encontro entre autores e leitores que a Chiado Editora procura todos os dias, trabalhando cada livro com a dedi-cação de uma obra única e derradeira, seguindo a máxima pessoana “põe quanto és no mínimo que fazes”. Queremos que este livro seja um desafio para si. O nosso desafio é merecer que este livro faça parte da sua vida.
© 2015, Marcello Silva e Chiado EditoraE-mail: [email protected]
Título: O PescadorEditor: Vitória Scritori
Composição gráfica: Vera Sousa – Departamento GráficoCapa: José Serrano
Ilustrações: Frank CarneiroRevisão: Marcello Silva
Impressão e acabamento: Chiado Print1.ª edição:Outubro, 2015
ISBN: 978-989-51-4930-8Depósito Legal n.º395693/15
Chiado EditorialEspanhaPaseo de la Castellana, 95, Planta 1628046 MadridPasseig de Gràcia, 12, 1.ª planta08007 Barcelona
Chiado Publishing U.K | U.S.A | Irlanda Kemp House 152 City Road London EC1CV 2NX
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Avenida da Liberdade, N.º 166, 1.º Andar1250-166 Lisboa, Portugal
Marcello Silva
Chiado EditoraPortugal | Brasil | Angola | Cabo Verde
o PeScador
PoeSiaS e crónicaS
AgrAdecimento
À Edna Carneiro, pelos ensinamentos e incentivos lite- rários.
À Carmem Silvia Presotto, pelo apoio e companhia poética.
À Welligton Magalhães, Frank Carneiro e Navegantes Sales, pelo suporte na realização desta obra.
À Fátima Oliveira, por entender e compartilhar os devaneios do O Pescador.
dedicAtóriA
Às ‘Marias’ da minha vida, pela simplicidade de me mostrar a santidade do amor: minha mãe Maria de Lourdes V. Silva; minha avó Maria da Conceição Silva e minha filha Maria Cecília N. Silva.
À José Henrique que estar por vir e já o amo desde sempre.
À Francisco Vitório de Oliveira (in memoriam), por ter feito parte da minha vida.
À Cleonice, Jean, Iranildo, Geraldina, Otalício, Alessandra e Maria das Dores, pela compreensão.
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Prefácio
A apresentação deste trabalho seria muito melhor repre- sentada através de uma imagem só. Teria de ser em um alpendre com peitoris servindo como base para colunas que, consequentemente, sustentam um telhado e uma biqueira. Do lado de dentro, seria necessário um tucum, um banco de madeira e um batente na porta, para que a avó se equilibre nos degraus quando trouxer o café quente e a tapioca de goma fresca.
No decorrer da leitura deste, existirão mil maneiras de se imaginar o cenário. Uma avó em um tucum tomando café enquanto um neto observa o mundo, seria o mais óbvio, ou um neto que toma um café trazido por uma avó que se lamenta das desventuras da idade, seria o mais comum, no entanto o mais insignificante de todos, seria um cenário onde um neto vive só, sonhando com um alpendre de infância que tem cheiro de avó, cor de tapioca e gosto de café.
Pois é esta insignificância que seduz esta fotografia escrita, este é o livro onde conhecer do autor dar graça e sentido ao contexto, e a cada metáfora das “palavras pescadas”, pois, se trata de confidências metafóricas, onde há uma realidade de quem soube fazer escolhas certas, ainda que fundamentadas por pensamentos contraditórios, já que, se trata da filosofia de um poeta contador, e não se trata de um contador de causos, mas de números. É um paradoxo cheio de sensibilidades e grosserias; a grosseria vinda do mundo das civilizações urbanas e a sensibilidade advinda da roça.
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Por tanto, a ousadia presente em cada poema, estimula também, o pensamento e o desejo juvenil de quem o ler, são desejos de amar, de se apaixonar, proporciona sentimentos exagerados a ponto de excitar a vida e suas aventuras, sobretudo a vontade de vivê-la. Ler Marcello Silva é como extasiasse de amor, é um manual simples para o sentido poético da felicidade.
Fátima Oliveira - Professora
eu PescAdor
“Eu sou um doido que estranha sua própria alma...”.
- Fernando Pessoa - Escritor
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O PescadOr
eu, somente
Eu tão diferente de mim, Continuo sendo eu Milhares de personalidades e sensações Embutidas sob uma única face.
Quem sou eu em repouso sobre meu corpo?Eu sou a tênue chuva que desce devagar Como uma grinalda florida sobre a terra. Eu sou a tarde gris em um eloquente crepuscular Hipnotizando as pupilas alheias.
Apego-me ao abstrato das coisas E renego o concreto frio que me insulta. Sou ideia imaginada de alguém que pensou em existir? Ou existo e penso em ideias que virão?No entanto, um dia me encontrarei comigo. No aconchegante ninho de uma fênix Sobre afagos de Vênus. Pronto para recomeçar. Para renascer!
E então eu, tão diferente de mim, continuarei Sendo eu, somente.
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Marcello Silva
sicrAno
Vasculho-meReviro-me Reinvento filosofias Me anexo ao subtendido dos silêncios uivantes
Peregrino sem rima Deserto afora Com sede de metáfora Saara do Silva De carona com as miragens eloquentes Me invado... Evado-me
Cadê a lâmpada mágica? Eu serei o meu gênio? Brincarei de criador Profano. Mera criatura reinventada Reinventando...
080111
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O PescadOr
AlegoriA
(à Edna Carneiro)
Sou homem das cavernas Temendo ás sombras Que o fogo projetaPintura rupestre Autorretrato De um doido se reinventandoNoite de vidro (embaçado) Que ateia medo e “transfigura lágrimas”
071111
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Marcello Silva
silvestre
Ando sob vigília dos olhos alheios Invejam-me por razões que desconheço Mil pupilas seguem meus passos
HipócritasSou falcão liberto em fuga Felino em disparada
Segui-me? Tentarão.Inútil... Sou silvestre. Sou Silva.
050711
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O PescadOr
Quem me inventou?
Quem deu a mim o poder de ser eu? Ser o exterminador das minhas angústias E o carrasco do sossego meu?
Quem me inventou assim então Este fragmento humano, máquina enguiçada. De súbito, temido bicho papão. Vez outra menino assustado
Por muitos infindáveis caminhos andei Sem saber quem eu era Se com o desconhecido monstro lutei Hoje ainda luto com a incerteza fera.
Quem é este transeunte louco Que caminha sobre meu corpo? Cambaleante anda aos poucos No triunfal caminho a mim posto.
150409
18
Marcello Silva
do Pó Ao Pó
Sob a densa face fria do dia Transmigram coisas aleatórias Coisas que desconheço Inexatos alaridos de cães Soam estridentes e invasivos Estraçalhando a ordem outrora estabelecidaO que somos alem de fantasma errantes? Somos estatueta de argilas Átomos de pó degenerando-se na ventania Com grito horrorizado de náufrago Almejando sobre nossas estátuas, Um sopro divino nas narinas...
020709
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O PescadOr
ÊxtAse
De tudo que tive ao longo das horas Coisas poucas e passageiras Daquelas que por nós passam voando Amei a pedra, no meio do caminho encontrada Por se ela quase eterna Feita de cal e melancolia
Edifiquei meu templo de silêncio Com pedras sobre pedras E nele aprendi a domar os leões Das horas pacatas de minha dor.
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Marcello Silva
negro, sim senhor!
Chamam-me de moreno... Pardo... Mulato. Não, eu sou é negro. Preto sim senhor! Faço parte dos 97 milhões de brasileiro (aproximadamente) que se autodeclaram negros (ou afrodescendentes para os políticos-corretos)
Carrego no corpo as cicatrizes dos meus ascendentes e na alma à bravura do meu povo. Sobrevivi a 386 anos de escravidão, fiquei enjaulado ao som dos chicotes, reprimindo minha dança e calando meu canto...
Nas mãos dos meus bisavós e tataravós plantei cafezais, cortei canaviais, extrai ouros, construir pontes e estradas... Carreguei nos ombros o desenvolvimento de uma nação.
Negro sim senhor! Desdobro as esquinas com a leveza na alma e nos pés a ginga: não sei se é de Mestre Besouro dançando capoeira ou se é de Mané Garrincha bailando com a bola. Tenho a coragem de Zumbi dos Palmares que adentrou as matas a procura duma liberdade alada.
Negro sim senhor!Todo dia reescrevendo a história da minha gente, alheio
as opiniões formadas sem reflexão, preconceituosas. Mostro a festividade da raça que é tão alegre quanto uma anedota do Grande Otelo ou enigmática quanto um poema de Machado de Assis...
Negro, sim senhor!
151112
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O PescadOr
cAvAleiro medievAl
Eu, cavaleiro medieval. Vindo de terras distantes Além das matas que se findam ao alcance dos olhos meus
Perdi-me nos templos antigos Em meios a esculturas esbeltas Dos deuses, ninfas e anjos solitários.
Procuro-me todo dia Reviro-me ao avesso Não me encontro Estou repousado na sombra da historia Ainda não estudada... Nos braços de Vênus me apaziguo e vivo...
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Marcello Silva
PArtes (metáfrAse gullAniAnA)
(a Ferreira Gullar)
Uma parte de mim sou eu “A outra parte é todo mundo” Dividido entre dois hemisférios Antítese, oposto do que sou. Perfeita simetria Paradoxo.Uma parte de mim sou eu A outra parte é ninguém Vazio calabouço Abismo, receio de existência Fuga repentina Medo.Uma parte de mim é amor, melancolia. A outra parte é ódio, dor. Uma parte é poesia, prosa. A outra desconhece a literatura. Uma parte é razão A outra é emoção desgovernada...“Quem me roubou de mim?” Quem me devolverá? Quem me completará? Indago curioso...
010111
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O PescadOr
instAnte exAto
Dentre sete bilhões de transeuntes (aproximadamente) Perambulantes neste mundo habitável (ainda).Não sou nada. Não posso ser nada... Ainda que, alimento da rotina e Aprendiz da sabedoria.Reconheço minha importância: Um grão de areia na ventania da existência, mas, um grão De areia sou e serei, e a ventania não será igual se não Conter essa minúscula parte.
Enquanto casas longínquas me espiam Tento ingerir o sumo vital do dia; Fazer parte da fotossíntese do verde Ou ainda me recolher ao casulo e ser uma “metamorfose Ambulante”.
Porque há pessoas que não evoluem? Não buscam alternativas e se aprisionam em si? Apegados à teoria da inércia Acovardam- se em seus medos: Medo da descoberta; Medo da mudança; Medo do triunfo ou medo do amor. Amor. Ah amor! Como diz Goethe: “Só por ele eu falo”.
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Marcello Silva
Entre muitos, sou mais um a vagar No silêncio do dia Pés descalços, pegando carona com o vento. E amando essa tal liberdade posta em meus braços como Uma criança a ser mimada...
Enquanto...
O que estará fazendo agora meus amigos? Minhas musas Inspiradoras? Todos o que fazem o que pensam? Indago curioso...
Enquanto me debruço sobre filosofias esquecida e teorias Evolutivas, o que faz neste instante o mundo, onde Bilhões de individuo são reféns de bombas atômicas e Nucleares (cogumelos da morte)?
Qual a nova tecnologia inventada que desconheço? Qual o próximo passo da evolução? Invadir Marte, Pandora ou a Terra do nunca? Aprisionar os ETs, Pequeno Príncipe ou Peter Pan?
Não. Não. Não Como sete bilhões de pessoas não sei de nada Não posso saber de nada E mesmo se soubesse minha modéstia não diria.
Deixe-me ser, ainda, um só grão de areia levado e Moldurado pelo sopro divino de DEUS.
100410
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O PescadOr
enQuAnto resPiro
Tempo posto em minhas mãos Esmagado entre os dedos. E ainda me foge como pássaro cego em revoada ao crepúsculo
Não sei se levo a vida sobre meus ombros Ou se em suas asas de veludo sou levado; Não sei se a ganho a cada aurora para perdê-la ao ocaso Ou se ela, me ganha todo dia. Sem que eu possa notar.
Tempo, tempo, tempo... Essa navalha afiada que me retalha o corpo Deixando escoriações e marcas, Pelas quais, um rubro sangue escorre... Intenso como a insana vontade de superação.
Fica aos ares o meu apelo, o meu alento. Que me esqueçam por alguns séculos e me deixe aqui, Imortalizado em pensamentos, moldurado por emoções Passageiras e tendo á frente às horas paralisada como um Quadro velho, sujo e mal pintado.
140510
PAixões
“Se resistimos às nossas paixões, é mais pela fraqueza delas que pela nossa força.”
- François La Rochefoucauld - Escritor
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O PescadOr
Aconchego
“Beija-me com o beijo de tua boca; Porque melhor é o teu amor do que o vinho”Embriaga-me fazendo-me adormecer Sob teu hálito quente; sentindo a maciez de teus lábios e a Texturas de teus gemidos
Entre a intensidade de nosso olhar E o palpitar de nossos corações inquietos Sussurra-me teu nome infinitas vezes Pedindo-me, desesperadamente, um beijo ainda.
Que desça eternamente essa noite Posta misteriosa e única Entre o crepúsculo e a aurora E onde, como água límpida de um chafariz, o amor jorra Naturalmente, manifestado entre carinhos, Regozijos e beijos quentes.
030110
30
Marcello Silva
PAráfrAse
Não sei quando comecei a te querer Quando te vi eu já te amava Te amei antes de te conhecer Reconheci-te em mim Me reencontrei em você.
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O PescadOr
esvAi-se
Alguma coisa se perdeuNão sei o quêNão sei ondeNão sei comoE nem o porquê.
A mancha de vinho no lençol secouMurcharam o jasmim e as rosas na varandaAs chuvas de março esfriou nosso amorE o teu cheiro o vento levou.Cadê você? Onde estamos?
De quem é a culpa?Das estrelas, talvez.
Entre mim e vocêUm labirinto agora há... IntransponívelSaudades eternas da eternidade que já existiu.
050914
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Marcello Silva
teu cheiro
(à Helena de Troia)
Sinuosa meninaNesse dançar de pernas, bailo.No compasso dos teus passosMinhas ideias vacilam.
Esmaeço nesse teu cheiro de fêmea- de pele... Água-de-colônia -Em teus braços sou pecadorHereges...Renasço... Revivo em teus beijos.
PHB - 041013
33
O PescadOr
lunáticA
Mulher de fases. Lua... De cujas lágrimas vertem marés Bebo tua luz – atmosfera vazia – Sendo andarilho em tua órbita Redescubro-me
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Marcello Silva
Quero-te Assim
Por vez quero-te mulher Com tua fúria indomável de fera; Com tua fome de fêmea; Teu hálito suave de herege; Teu riso impiedoso de soberana...
Por outra, quero-te menina. Com tua pureza de “santa”; Com tua ingenuidade de criança; Teu medo de presa indefesa; Teu soluçar de domada... Quero ingerir o néctar do teu contraste A antítese do teu silencio... Quero o mistério do teu riso Subtendido no teu olhar... Quero-te Sim. Menina ou mulher. Quero-te... Assim.
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O PescadOr
teu olhAr
(à Camila)
Como é negro teu olhar Radiante, inusitado... Como uma flecha perdida Atravessa minha alma Cada vez que me olha.
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Marcello Silva
JulieAne
Tão pura menina entre a impureza de mulherPosta linda, afável e angelical. Anjo cruel, tua beleza estrangula. Meus recessos virgens de fantasias. Nas noites de insônias me agito, me agridoProcurando teus olhos transparente, doces amêndoas Mensageiros do indizível; Procurando teu corpo quenteTeu beijo caliente para me acalmarAcalentar-me em teus braços E sob teus afagos sucumbir no silêncio do amor... Na paixão turbulenta.Mais uma vez Outra vez aqui, na reviravolta das horas. O teu vai e vem Se fica ou vai embora Se permitires que de amor adormeça em teus braçosOu se em febre ardo em solidão, Tua indecisão, de mulher menina me devora.Devora...
060310
37
O PescadOr
o don JuAn
O Don Juan nasceu antes mesmo de vir ao mundo, quando no sexto mês de gestação de sua progenitora, foi identificado seu sexo. O Pai logo fez maior algazarra: “Esse vai ser macho igual ao pai”. Dalí em diante todo tratamento e considerações de “macho” se dava a prole por vir: quarto pintado de azul; carros de combate e tanques de guerras; bolas de futebol; espadas... Coleção de Star War.
Quando foi para escola arranjou “namoradinha”. Era o orgulho do pai: “esse é meu garoto”, “cuidado com suas cabritas que meu bode está solto”, “é isso ai filhão”. Na telenovela ele via o galã “pegando” várias garotas... Garotas. Garotas por todo canto, desde os comerciais de cervejas às amantes de seu pai.
Seu pai podia ter várias mulheres. Sua mãe só podia ter seu pai. Ficou confuso... Leu a bíblia: “... a paixão vai arrastar você para o marido, e ele a dominará” (Gn 3,16); mesmo casado com Rebeca Abraão tomou outra mulher chamada Cetura; por quatorze anos de serviços Labão deu suas duas filhas, Raquel e Lia, a Jacó. (...)
Aos 13 anos, seu pai o levou a boate da esquina e pagou a mais experiente prostituta. Afogaram sua inocência. Ele gostou, voltou outras vezes. Adiante, conquistar era seu ofício. Ele sentia necessidades de galantear, de provocar sorrisos, gracejos e arrepios na alma feminina. Seu lema era “pegar e não se apegar”. Seu ego suplicava olhares feminis, bocas entreabertas implorando beijos... Cheiro de pele.
38
Marcello Silva
Na arte da conquista, com seu olhar roubava inocências e incendiava corações; com sua lábia eloquente persuadia meninas, mulheres e
senhoras. Era apenas mais uma para alimentar seu instinto de macho. Macho Alfa.
Prossegui sua busca tentando provar para si mesmo que era possível conquistar mais. Ele destruiu namoros, casamentos e causou intrigas. Conquistou mais... Mais.
Até que um dia se descuidou... Apaixonou-se. Foi seu fim. Sentiu na pele a dor causada outrora. Chorou, implorou e pediu amor. Recebeu migalhas...
Hoje é casado, pai de quatro filhos e o mais fiel dos maridos.
Chaval/CE - 2014
39
O PescadOr
PAssos
(à Dulcinéia)
Não. Não andas assim Teu requebrado traiçoeiro É loucura sem fim.
Teus passos rápidos e ousados Levam com eles minha imaginação, Louco fico, fico louco Coeso... Sem ação
Desfilas saltitante e linda, Cabelos a deslizar no ombro teu Enrolam-se neles, medrosos. Os sonhos meus...
40
Marcello Silva
corAção de PedrA
‘Beleza incerta’ Disseram-me os anjosAté tuas lágrimas São poesias em movimento Deveras... Possui o encanto das fadas E a indiferença das pedras.
160112
41
O PescadOr
enQuAnto vivo
Em devaneios vivo mergulhado inteiro Sedento lançado na louca vertigem Em que me vejo num beijo derradeiro Emanado de tua linda boca virgem
Insana euforia por um beijo Ainda me invade fugazmente Como se cá, esse louco desejo. Consumisse-me a inocência lentamente.
Tua face de anjo me persegue Ainda que eu em fuga me esquive A ti, pois, já estou entregue. De uma forma que nunca estive.
Se por medo fujo sem pensar É por não saber que me apreendo Que se afastar de ti é se aprisionar De tanto fugir, é os teus braços ir correndo.
071009
42
Marcello Silva
imPostorA
Atrevidamente me possuiu Seduziu-me sem permissão Chegou devagar sem alarde E agora meu coração arde Transbordante de paixão
Tua alegria me invadiu Iludiu-me o pensamento Apazigua-me a alma Emana a doce calma De teus olhos atentos.
Mesmo assim a tristeza vem. Vem quando não te vejo O coração insiste em doer Triste não sei por quê Se te amo e te desejo.
Você diferente e ousada Assustada surge todo dia Me abraça, me afaga Teus braços duas adagas Retalhando-me em fatias.
310310
43
O PescadOr
lábios
(à Luziane)
Ao surgir tua adejante boca Lábios meus pairam no ar Invade-me uma vontade louca Dum beijo teu ir roubarEsplêndida fica a noite em luar Se teus carnudos lábios vejo Quem me dera repousar Constantemente em teu beijo.
111111
44
Marcello Silva
vigíliA
Perturba meu sono Como um vulto na noite Sem vigíliaFace a face Teu hálito herege Que me ata o discernir Entorpece-meSenão teu brinquedo Adiante sou nada.
45
O PescadOr
mirAgem
Por pensar em ti o mundo foge As horas voam no tempo entre lágrimas e poeiras Tudo é vendaval onde a ventania aflora o amorNão conheço o mundo que habito Ou se de fato existo neste instante, Intervalo de tempo entre o sono e o tédio.Vejo tua face cravada na pele Adaga afiada de dois gumes Fazendo pulsar em veias minhas teu sangueMiragem dos sete desertos, O silencio repousa na tranquilidade de teus olhos E a tentação na tua boca entreaberta e molhada.
200110
46
Marcello Silva
refém
(à Liliane)
Cristalinas águas Teus olhos me afogam Sacia minha sedePedaços de mim Voam ao teu encontro Teus olhos sugam-me os passos E a paz de outrora...Duas pupilas apenas... Fazem-me refém
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O PescadOr
essA mulher
Essa mulher que me incendeia, louca. Com insinuações e afagos de amante Joga-se sobre mim, livre e solta. Embriagada por um prazer delirante.
Essa mulher feita de verso e poesia De um olhar frio que me enlaça Numa lúbrica excitante melancolia Que ao meu coração logo abraça
Essa menina afável, embebida de amor. Que ao sussurro me diz quem sou E sem ela o viver é triste
Menina a essência do que é belo Aquilo que desejo, o que mais quero. A grandeza de tudo que existe.
48
Marcello Silva
PecAdo
Minhas mãos atrevidasAnte a tua calmariaDuas almas embebidasDois corpos em heresia
49
O PescadOr
meninA
Chegou devagar, sem alarde. Sem me dizer o porquê dos leves passos, Enlaçou-me o corpo com carinhos e afagos calientes... Beijou-me a nuca e acariciou-me os cabelos, Com um cruel sussurro elevou-me a alma aos céus E fez dormentes minhas pernas, Com palavras angelicais laçou-me o coração E o pôs saltitante nas mãos
Sob o luar que se fazia Na dita data eternizada Dois corpos e uma alma Desvendaram mistérios já tantas vezes vividos...
061009
50
Marcello Silva
deseJo AlAdo
Viva carne crua Desejo alado Teu corpo em becos Escura rua Trafego em ti Vestido em pele Volúpia nua...
51
O PescadOr
são teus olhos
(à Dulcinéia)
São teus olhos...São teus olhos que me cegaQue me despe página por página.
Medusa... Meu mitoReescreva-me em tua peleCongela-me em teu encanto
Meus olhos são teus olhosSe não for para vê-los, cega-me.
070115
52
Marcello Silva
10 culPAs
Queria pedir desculpasPor tanto me desculparDe tanto insistir que não há culpa algumaAlguma culpa háSerá?Desculpas.
300115
53
O PescadOr
rAzões desconhecidAs
Entre pedregulho de uma tarde cinzenta, pacata e igual a tantas outras, ouvi o sussurro de Pascal: “O coração tem razões que a própria razão desconhece”. Mas o ser humano é tolo por querer que as histórias tenham sempre uma explicação ou uma razão de ser.
Mas quem é o destino para juntar duas pessoas total-mente oposta? Este acaso que une dois corpos, duas almas e dois corações em um só ser, na mesma proporção que separa?
A história começa sem começo, quando ele, menino incerto desses que, como a maioria dos adolescentes tem a incerteza como companheira e o futuro parecendo infindo, com estudos a serem concluídos e tanta coisa ainda para ser vivida. Ela, mulher feita do tipo “cabeça no lugar“, pós- -graduada, sabendo o que quer da vida e o que a vida quer dela.
Ela tinha opinião formada sobre tudo, ele queria ser uma metamorfose ambulante.
Encontraram-se por acaso numa manhã ensolarada de domingo, conversaram, dialogaram e se entenderam. Marca-ram outros muitos encontros naquele mesmo lugar.
Adiante alguns meses, sem nenhuma explicação, noivaram e casaram-se em seguida. Foram morar no apartamento dela. Levavam uma vida normal apesar das declarações de amor que se via rabiscadas nos muros da cidade ou se ouvia na rádio em um programa romântico que remexia com os corações
54
Marcello Silva
apaixonados. Pareciam inebriados e inundados de amor, por todo canto se viam aos beijos e carinhos... Transbordavam felicidade eterna.
Meses passaram... Ontem a vi na janela de seu quarto, cabisbaixa, parecia chorar silenciosamente... Fiquei sa-bendo, depois, que ele foi embora, simplesmente indo e que ninguém sabe dizer o porquê ou para onde. E na cidade todos comentam tentando, inutilmente, entender o que não é para ser entendido, porque “o coração tem razões que a própria razão desconhece”.
Chaval/CE, 2010
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O PescadOr
doce veneno
(à Anali)
Perdi-me no instante em que ti viMe desgracei em tua graciosidadeMalévola princesa
Que isto de insano em tiQue, ao passo que me sustente, Também me devora?
Querer teu amorÉ mesmo que desejar cicutaÉ morrer por uma razão que só eu conheço.
220315
56
Marcello Silva
suPerficiAl
Ao vento palavras Supérfluas indagações Parlatório em vão... Cúmplices de um talvez.Quem dera a eternidade de teu riso Paralisado entre flores em minha janela Quem dera segredar teu silêncio Entender teus sussurros Teu movimento leve de adeus...Vivemos um futuro que não virá Um amor que não nasceu.Supérfluas indagações.
57
O PescadOr
orvAlho
Ao relento, sonâmbulos... DesatentosCorpos nus, dilacerados... SugadosDe outrora a grande euforia Agora a calmaria...Ao silencio submissos Na clemência de um beijo Que não se finde ainda A eloquência desse desejo...
080109
58
Marcello Silva
rAscunho
O que diz a paixão? Esse sentimento louco Que nos torna forte e frágeis Na mesma proporção Aterroriza com duvidas e certezas fracas.
Boa loucura insana Motiva na medida em que desanima. Tanto liberta quanto aprisiona Quem és tu Senhora de um negro véu?
sAudAdes
“O tempo não para! Só a saudade é que faz as coisas pararem no tempo”.
- Mário Quintana - Poeta
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O PescadOr
velho relógio
“O mais feroz dos animais domésticos é o relógio de parede: conheço um que já devorou três gerações da minha família.”
(Mário Quintana).
Relógio velho estático Posto imóvel na parede Marca as horas O passar lento dos ponteiros pontiagudosVelho relógio Companheiros das horas tristes Domador do tédio das manhãs chuvosas E quando felizes foram as horas, Rápidas passaram Que nem se percebeu o velho amigo Triste contínuo na parede.
Sob a insistência do tempo O tic- tac monótono continua Marcando o compasso; Marcando o tédio; Marcando as horas; Marcando a chegada de alguém; Marcando alguma coisa que agora, Pouco importa.
221009
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Marcello Silva
é o Que é
(a Frank Carneiro)
Sento no poema como numa cadeira de balanço, Degusto o aroma da tarde E as revoadas dos pássaros cegos.
Longe do que vejo Coisas acontecem Porem, o que importa, pois, o acontecer das coisas?
Como o estreito e apressado córrego que passa, a vida passa Sem me dizer quem sou ou o porquê de se indagar tudo Isso.
O que é o poema? O que é a tarde? A coisa... O que é a vida?
100709
63
O PescadOr
entre coisAs
Do que vale o passado Se o verão o levou para além dos oceanos, E as nuvens em tempestade louca o Destruiu pelos ares?
Passou o ocorrido e lá ficou Sorrindo, exato na história vivida. O passado apagou-se como se apaga uma vela; Uma fogueira despedaçada na chuva insana...
Com o tempo bilhões de coisas certas e Incertas deixaram de existir, E o tempo, arquiteto mentiroso, construiu. Outras tantas iguais...
Do que vale relembrar o passado, Se ele foi uma mentira incerta e mal Contada?
64
Marcello Silva
noite negrA
Noite tranquila e negra Na quietação desta, Murmúrio se ouve Da chuva melancólica e sombria Consolas o coração Transbordante de ilusão Amargurado pela saudade fria...
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O PescadOr
sAudAde
De repente, Um suspiro profundo Saudade distante não sei de quê... De pessoas esquecidas, Coisas outras pelo tempo, ingeridas. Tudo findo... Saudades apenas Esse mar revolto me direciona a uma ilha distante Sou flutuante sem rumo Beirando um naufrágio inevitável Serei a pouco, um náufrago, afogado. Em minhas loucas saudades... Apenas.
080808
66
Marcello Silva
nostAlgiA
A saudade bateu a minha porta Entrou devagarzinho Sem pedir licença algumaTrouxe-me teus sussurros E a suavidade daquele último beijo.Expulsou-me de mim E na minha alma fez morada
300712
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O PescadOr
AurorA
Vou devagar me desalinhando Da penumbra lerda do sono. Acordo alheio a tudo
A aurora desponta Com raios vagos de sol dorminhocoPor entre as casas tímidas Sonoros galos orquestram a sinfonia monótona Do dia que nasce.Pássaros beliscam o dia Numa harmonia melancólica de cantos. Pessoas com passos apressados passam Indo a qualquer lugar fazer algo que desconheço.
Enquanto o dia ainda desponta Acovardo-me ao frio; Recolho-me aos lençóis, Me apego ás pútridas lembranças Que viram e reviram minha mente...
281009
68
Marcello Silva
AnJo dA morte
In memoriam Francisco V. Oliveira
Foi amor à primeira vista. Reluzente como um anjo, ela sorriu ao vê-lo. Tinha um brilho rubro como os lábios das mulheres do Bairro da Luz Vermelha. Seu movimento ludibriante imitava o dançar das meninas do Moulin Rouge. Entretanto, possuía a frieza típica de um serial killer.
Juntou dinheiro, deu entrada e parcelou o restante em vinte vezes. Comprou sua assassina em uma manhã fria de janeiro. Mal sabia ele que esta seria sua última amante, seu amor derradeiro e o mais profano.
Enamoraram-se durante meses numa paixão efervescida, comum em recém-casados. Desbravaram a rotina e ingeriram estradas, rodovias, ruas... Onde um estava o outro se fazia presente. Galoparam mundo afora, era um Dom Quixote em seu Rocinante. De tanta convivência, um era complemento do outro, apesar da apatia dela.
Era uma tarde quente de julho quando saíram para seu último passeio. Ele feliz, ela fria. Ela o excitou e ele concordou com a provocação e ambos voaram sobre o asfalto... No segundo semáforo de uma avenida qualquer, ela inexplicavelmente, o lançou a um poste. Foi seu último contato... Seu último adeus.
Ela a vinte metros dele permanecia fria, indiferente como um psicopata a observar o último suspiro de sua vítima. Assassina!
69
O PescadOr
indescritível
Outrora, de tanto amor. O que restou? Esconderam-se onde tuas fácies promessas, Tuas declarações molduradas em lágrimas? Onde se esconderam teus abraços duradouros? Teus beijos ousados... Teus sussurros... Teu sorriso... Onde?Meu coração transpassado por tua fria rejeição, Agora chora fragmentando-se em lágrimas...O que se fará senhorita? Se meu mundo se esquiva e foge na inocência de teus Olhos; Na sensualidade de teus passos E na ousadia de teus lábios rubros... O que faço alem de, lentamente, me afundar Em tuas lembranças?
70
Marcello Silva
JAneiro 2011
2011 é um menino assustado Bate à porta do futuro violentamente Têm no rosto as incertezas do infinito E nas mãos a espada da esperança Que como um raio fugidio transpassa o medo. Esperneia, cospe fogo. Quer entrar pelo teto do tempo, Correr casa adentra revirando tudo, Beliscar concretos e comer cotidiano...
71
O PescadOr
inúteis coisAs
Insólito gosto invade-me a saliva Exalando o temor das coisas funestas...
O tempo confuso em procissão Desfila torto pelo concreto da eterna novidade, Expande-se por caminhos escuros e desconhecidos. O grito rouco da rotina (monstro invisível) Ecoa sobre os muros sujos e mal rebocados. Monotonias chatas percorrem veredas já Trilhadas, seguem rotinas já previstas.
Pessoas perdidas passam Levadas pela neblina da manhã E apegadas ao estranho medo e afazeres que ignoro.
O que de necessário me falta nesta manhã Cinzenta e melancólica?
020409
72
Marcello Silva
morto
Nesta cova tão escuraNeste instante, dormes eternamente.É o fim da vida tão duraDo destino o ultimo presenteTalvez, andou muito sozinho.Errante seguindo a estrada em frentePercorreu diversos caminhosNo entanto, agora deitado nada sente.
O que te espera, além da sepultura.Nesta jornada seguida?Será outra lastimosa vidaCom raízes fincadas em amarguraOu porventura, terá diferente sina.Descanso de outrora vidaCom paz reinando em fartura?
050509
sociAl Político
“O Homem é um animal político”
- Aristóteles - Filósofo
75
O PescadOr
brAzucAs...
Somos eternos e frágeis Milhões de faces diferentes No entanto algo nos iguala
Somos iguais na luta Desbravadores das matas virgens Sonhadores inertes ao medo Juntos poderemos modificar o amanhã Romper o silêncio dos dias Desvendar os mistérios da noite. Poderemos construir pontes... Destruir muros Com nossos braços, pernas, sonhos e ideologias...
Somos iguais filhos de uma mesma mãe Fragmentos de um mesmo pó Sangue ‘verde – amarelo’ nos percorre as veias Único... Sagaz.
300908
76
Marcello Silva
A revolução dAs mulAs em chAvAl
E um dia revoltaram-se a mulas em Chaval. Cansadas da lida e da vida oprimida que levavam na pacata cidade interiorana. Elas estavam farta de sobrecargas de pesos; de sucumbir o dia inteiro sob o sol quente sem direito a uma comida digna ou água fresca, sem falar nas chicotadas que sofriam rua a fora, aquilo era humilhante à ‘classe muleira’. Dali em diante estava decretado a revolução das mulas.
Chaval acordou diferente, ao invés dos cantos dos pardais, ouviam-se zurros pelas ruas. A concentração foi iniciada na Ponte do Lima seguindo a Rua Monsenhor Carneiro sentido Centro. Velhos slogans eram adaptados: “As mulas unidas jamais serão vencidas” e “uma por todas e todas por uma” alem de alguns exclusivos: “por uma vida sem cabrestos”, “queremos milhos e água fresca” etc.
Deu-se a algazarra revolucionária, gritos (zurros) de protesto. Dentre as reivindicações estava: trabalhar oito horas diárias com direito a vinte minutos de descanso a cada hora trabalhada; transportar, no máximo, 400 kg incluindo o peso do condutor; não receber chicotadas (uma boa conversa resolveria); não trabalhar aos domingos...
O líder das mulas, de ofício nas mãos – melhor dizer nas patas – foi impedido de entrar nos prédios dos três poderes (Prefeitura, Fórum e Câmara) por motivos estruturais e óbvios, pois esses edifícios não foram construídos para deleite de quadrúpedes.
77
O PescadOr
A cidade amedrontada ficou refém da revolução. O co- mércio não funcionou, uma vez que não se poderiam entregar mercadorias em domicílio. A construção civil parou, pois faltava transporte para transpor areia, cal, cimento... Tijolos e telhas não foram entregues. Chaval padeceu este dia, era uma ‘Tróia traída por seu cavalo’. Se a Segunda Guerra Mundial teve seu dia D, as mulas chavalenses também tiveram seu dia. Deixaram de lado a vida fatigosa e foram, por um dia, pégasos saltitantes pela cidade.
P.S.: Dizem que até o chefe do poder executivo municipal decretou estado de emergência na cidade por causa desta revolução.
Chaval/CE – 2014
78
Marcello Silva
loucos
Não vos cantarei coisas belas Melodias harmoniosas E canções singelas Não falarei palavras divinas Não declamarei poesias e nem poemas...
Vós estais cegos... Surdos Prisioneiros de vossas razões Conformados e mudos...
Não me apegarei em descrever-vos Não sugarei meu tempo tentando entender vossos Pensamentos Vós estais loucos!
Estão apegados á matéria, ou concreto. Não conhecem sentimentos São feitos de aço e cobiça.Vós estais loucos!
010507
79
O PescadOr
fome fogo fome
Fome, fogo devorando as vertigens. Num alarido de cães e ventanias. Nas tardes inquietas e noites infindáveis Ainda ao amanhecer insana devastação
Infelizes criaturas Bichos da selva de concreto, Mortos na penumbra entre o pão dormido e a falta do Dinheiro para compra-lo.
Homens asfixiados pelo capitalismo Esquecidos nos lixões onde se arrastam lerdos Em disputa com os abutres pela ração suja e necessária
Fogo, fome intenso e oculto. Queimando do homem a carne desamparada, No entanto ainda como uma gota última Reside uma esperança... Inquieta.
020409
80
Marcello Silva
Que sistemA é esse?
Que sistema é esse? Cavalo pardo em silêncio sangrando Relinchos mudos, nos mesmos cascos. Em caminhos foscos cavalgando.
Que sistema é esse? A estampar desigualdade em revistas Televisões e jornais... Violência e miséria a nossa vista Tão próximas e fatais
Que sistema é esse? Que nos torna reféns do consumismo E filhos da burocracia Estamos no mesmo barco furado Sistema errado Naufragando numa deserta ilha.
Que sistema é esse?
080908
81
O PescadOr
diA novo?
“Hoje é um novo dia, de um novo tempo que começou...”. Mas, que tempo outro? Que dia, alem desse aqui, surgirá?A vida para muitos não seria um pavoroso grito adentrando um dia infindável?
O que dirão os libaneses em seus dias infinitos de Horrores? Haverá sonhos no sono Sem endereço dos meninos de rua? O que importa um dia novo Se vivê-lo é decadência igual de outrora Será apenas mais um dia apático Complemento de um tédio sonâmbulo.
O que será um dia novo para os famintos da África? Para os prisioneiros perdidos no Guantánamo da Ignorância? Haverá um dia novo para os homens bombas? “kamikazes” mulçumanos E para os feridos do Japão? Um dia novo haverá para as crianças esquecidas, Repudiadas, exploradas...?Deus meu! Deus meu!Há em nós otimismo profundo e intenso Igual pensar ainda que, “nesses novos dias as alegrias. Serão de todos... É só querer!”
130112
82
Marcello Silva
hino dos oPrimidos
Ouviram o grito oprimido e sem graça Deste povo heroico e delirante Com o sol da liberdade fulgido Para o além do horizonte O teor dessa desigualdade Leva os homens a sua própria sorte Em seus meios a crueldade Exalando dor, medo e morte. “Ó pátria amada” Teus filhos Salve! Salve! Brasil, um sonho velho, sonho. De desamor, miséria e corrupção. Em teu famoso céu uma cinza De lixo, gás, poluição. Tão rico de pura natureza És lindo e verde, mas, porém, Teu futuro espelha só pobreza Terra abandonada E cheias de glórias mil “És tu Brasil Pátria amada” Tuas crias em sujo ovil Clamam atadas Ó Brasil “Pátria amada”
070908
83
O PescadOr
gothAm city A beirA do cAos
Onde estão teus heróis Gotham City? Em qual dessas pedras teu Batman se esconde? O comissário Gordon se vendeu por uma secretaria em cargo comissionado e os vilões se multiplicam por teus logradouros. Emanam de tuas vias sanguessugas com grandes poderes sobrenaturais que sugam tuas veias.
O Coringa, com seu sorriso pérfido, agora persegue teu povo. Ele rir da ignorância (inocência ou medo) de tua gente. Mentirosas criaturas plantaram esperança e agora engendram medo. Enigmático final da charada que ninguém sabe. Quem vai rir por último? Porém, para responder essa indagação é necessário admitir que exista um fim. Será que haverá fim para tua angústia, Gotham City?
Tuas noites são mais longas e temerárias e teus dias mais exauridos e incertos. Trilhamos a beira do caos. Quem irá nos salvar? O Chapolin Colorado? Não, ele não faz parte do catálogo da DC Comics.
Enquanto Bruce Wayne se acovarda, os morcegos sanguinários (criaturas da noite) devoram teus sonhos e tuas esperanças, Gotham City. Para saber o que será de ti e de tua gente é necessário esperar o próximo capítulo deste filme insano e interminável.
Chaval/CE, 2014
rAízes
“... troque suas folhas, mantenha suas raízes.”
- Victor Hugo - Escritor
87
O PescadOr
dnA
Tenho o sangue de gente guerreira E a paixão obcecada pela vida Mas me encontro parado na porteira Do caminho que me guiará na ida Na busca frenética do que quero No sonho louco que me espera Em paisagem perdida e derradeira Pinto a bravura de meu povo Na busca incessante pela vida inteira.
080908
88
Marcello Silva
felicidAde
Verde tem cheiro de chuvaChuva calma, chuvisco.Chuvisco são lágrimas dos anjos...
Trovões. É São Pedro mexendo nas panelasAbrindo as portas do céuPra mandar chuva boa
Quanta felicidade, meu Deus!
Poção - 060314
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O PescadOr
mundo meu
(à Cleonice Silva)
Cresci de mãos dadas com a natureza, entre o rio Ubatuba que passava no meu quintal e as carnaubeiras, incontáveis, no meu terreiro.
Sou bicho do mato: jaguatirica que foge caatinga adentra; sou caipora assoviante que assusta os caçadores em noites escuras; sou tatu-bola adentrando a mãe terra.
Sou parte da caatinga que sofre com a estiagem. Quando passa nosso período de inverno chega agosto com suas venta-nias fazendo redemoinhos nos pés de Imburana, arrastando folhas e levantando poeira. Entretanto, basta chegar janeiro com suas chuvas torrenciais para essa ‘mata branca’ virar uma festa: o verde ressurge com uma soberania inenarrável e os sabiás, nas moitas de mofumbo, orquestram a sinfonia de cantos da passarinhada.
Cresci vivenciando esses ciclos, tomando banho de chuva, pulando no barreiro d’água e soltando ‘barquinhos’ na grota que desaguava no rio. Cresci escalando os cajueiros, comendo pitombas e ouvindo o cantar gótico da mãe da lua no alto do pau-d’arco se contrapondo aos cantares festivos dos xexéus nas ateiras.
Esse é meu recanto. Pedaço do paraíso. Aqui a felicidade descansa na sombra de um juazeiro e de onde ouve o sussurro do vento trazendo recados das terras distantes. Esse é meu Éden.
Poção - 130812
90
Marcello Silva
dAnçA A iemAnJá
Uma prece a Iemanjá. Que Ogum abra os caminhos desse criolo
Batuque. Berimbau, pandeiro. Um coração que dança... Capoeira
Joga daqui. Esquiva de láEu sou de Palmares. Eu fugi da senzala. Eu quero feijoada da preta Chica.Mestre Besouro continue o batuque Porque meu corpo ginga... Capoeira
040912
91
O PescadOr
chAvAl...
Em tuas vias (veias) trafegoNavego em teu burburinho acanhado
Sou cria do teu âmagoVômito do teu útero
Bebo tuas pedrasMastigo tuas marés‘Sal’dades
92
Marcello Silva
mãe, bicho estrAnho
(à Mª de Lourdes V. Silva)
Mãe...Que bicho estranho é este,Que sangra lágrimas nas madrugadas?Que morre todo dia para dá vida à sua prole?Suicida?Deveras...
De que matéria é constituída?Parece concreto.Irredutível rocha
Doce engano...
É maleávelFrágil cristalFlor das serranias.
E, dizem, que seu colo possui a sinfonia dos anjos e querubinsE seus afagos, o cânticos dos deuses.
Poção – 100514
93
O PescadOr
bAtuQue
Enamorando o crepúsculo da tarde Ouço o batuque dos meus antepassados Minha alma grita no sussurro de Solano Trindade: “Sou negro Meus avós foram queimados Pelo sol da África Minha alma recebeu o batismo dos tambores atabaques, Gongues e agogôs”.
E alem dos anos passados Ainda se ouve seus cantos, Se ver suas gingas no terreiro de terra batida, Que como uma ave negra adentrando á noite Fez-se infinita em um voo rasante e eterno.
Minha alma herdou O samba; A crença; A capoeira e a insana vontade de liberdade.
010409
94
Marcello Silva
historinhAs eternAs
(a Otalício e Antonio Santil)
Boas historinhas mal contadasInvadiram minha infância Povoaram de imaginação minhas noites estreladasAdormeceram na rede debaixo da varanda insoneOs mistérios contidos e emergidos dessas históriasFizeram-se serelepes criaturas a brincarem no meu Terreiro,Porque o Saci-Pererê nada mais era do que o negrinho Sorridente e prezepeiro que Escondia meus carrinhos de Papelão;O Lobisomem, viajante das serranias, era um ponto negro Que se movia ao meu Comando;A onça, o leão e o bravo índio eram brinquedos Esquecidos debaixo da Minha rede.
Fui rei sim!
Dono da minha infânciaConstruir meus castelos, reinos e impérios.Destruir os gigantes e os vilões com minhas pequeninas Mãos
95
O PescadOr
Historinhas contadas e vividas na essência Fizeram-se eternasNa janela da minha existência até então.
Poção - 220509
96
Marcello Silva
o homem e o cão
(à Nelím e seu cão Stheban)
Leal fera oculta escondida No negror dos olhos deste cão Do homem companheiro da vida A seguirem junto na mesma direção
Quando noite, seu olfato nos ares. A cumprir a lei natural Guardador dos setes mares Ladra, recua protetor matinal.
Na escuridão um soldado vigília Olhos atentos vendo longe á milhas Lobo dormindo acordado sono
Dormirá amanhã, o sol a espera. Com leal humildade de fera Aos olhos extasiados de seu dono.
220508
97
O PescadOr
A morte de José AdoniAs
In memoriam José Adonias Rodrigues
Morreu no último dia 23 (fevereiro, 2014) aos 72 anos, José Adonias Rodrigues, residia em Oiticica, zona rural de Granja/CE. Morava com sua esposa Francisca, a qual debilitada de saúde, não pode socorrê-lo, quando ele teve um ataque cardíaco na noite de sábado. Adonias foi encontrado na manhã seguinte agonizando no quarto.
A morte de José Adonias não renderá capa na Revista Veja; não será matéria no Jornal Nacional, tampouco será documentário da CNN. Adonias não foi presidente, ditador, rei nem jogador de futebol; não escreveu livros; não foi inventor, ator... Não ganhou Nobel. José Adonias Rodrigues foi muleiro e sua vida não será contada nos livros de história
Quando as estradas eram, apenas veredas, ele surgia com seu lote de mulas, levantando poeira na terra batida. Trazia da Serra de tudo um pouco: rapadura, cachaça, coco, utensílio de couro e palha, etc. E levava daqui outros mantimentos: feijão, farinha, milho, etc.
Sua robustez era visível quando carregava ou descarre-gava suas mulas. Tinha um porte atlético invejável, barba feito, bigode aparado, chapéu country e sempre com sua afiada faca peixeira no cós da calça jeans. No entanto, também era perceptível seu lado cômico e hilário, quando ele narrava as histórias de suas andanças sertão adentro.
98
Marcello Silva
As histórias de José Adonias não serão reproduzidas e a vida dele não será tema de filme algum. Não deixou descendentes e em breve pouquíssimas pessoas lembrar-se-ão dele, não saberão da sua coragem, da sua força ou que fazia... Quem era. Ao ponto chegará a que seu túmulo cinzento nada representará.
Idas e vindas. Chegadas e partidas. A vida, em sua significância, cessará ao riso da morte. Paradoxo? Simetria? ‘Eis do pó e ao pó retornarás’
Fazenda Poção - Chaval/CE, 06 de março de 2014.
99
O PescadOr
fAzendA Poção
Moro nos seios da caatinga. Embalado pelos redemoinhos de agosto. Aqui saboreio o jatobá maduro. Com o vento livre no rosto.
Essa minha ‘mata branca’. Que sofre com a estiagem. A mãe da lua chorosa canta. O lirismo da triste imagem.
Quando chega o inverno. O verde renasce em esplendor. Canhens e xexéus nas ateiras. Nos cajueiros um sabiá cantador.
Moro entre as carnaubeiras. Tendo um rio no meu quintal No terreiro brinca a caipora. Numa felicidade sem igual.
050912
100
Marcello Silva
PrincesinhA
Princesinha do litoral, escondida no desemborcar de dois rios. No passar dos dias vai beijando as marés com seus lábios de sal. Selva de pedra Surgida no acaso dos anos se faz menina miscigenada Mistura de tudo: cor, raça, religião... Eis Chaval simplesmente Chaval. Por tuas ruas quentes desfilam os filhos teus, alheios ao teu Valor. Apegados a rotina não percebem quão belo eis o Porto em Noite de lua cheia, Assim como o Itaúna sendo beijado pelos primeiros raios de sol Duma manhã de verão.Ou quão indescritível a paz que emana da Pedra da Gruta Ou ainda, a hipnose ao obsevar o último crepúsculo de cima da Pedra da Carnaúba. Teus filhos!Teus filhos! Desconhecem tua face.Desconhecem teus cantos.Tuas danças... Lendas.Asfixiam tua cultura pouco a pouco Vão lentamente esquecendo (esmagando) teus costumes Teu grito de socorro entristece-me à alma a jorrarem Sólidas lágrimas de sal.
101
O PescadOr
donA biricA
(à Vó Birica)
“Ah meu filho, estou muito cansada...” é a frase dela mais usual, ultimamente, depois de ter “criado” doze filhos, além de cinco outros que morreram antes de completar um ano de idade. E ainda ajudou a matriarca dos Araújos a ‘criar’ o seus.
Seu nome é Maria, igual a tantas outras ‘Marias da Conceição’. O Silva é o detalhe que a torna de aço. Ela casou aos quinze anos, ficou viúva aos sessenta e em sua vida, incorporou uma heroína digna dos melhores roteiros hollywoodianos.
Hoje, aos 93 anos, 12 filhos, 37 netos e 48 bisnetos, ela contempla o silencio enquanto espera a água ferver para seu café mágico. Cansada e dolorida, mas, inquieta. Levanta ás cinco horas da manhã para seus afazeres domésticos. Por vez, desconfio que não seja humana: como pode tal bravura? Seu corpo, de que matéria é constituído?
Cada cabelo branco e cada ruga em seu rosto é uma página da vida, uma lição aprendida, cuja experiência foi preciso cravar na pele para que outrem, ao observar, também aprenda que a vida, para ter sentido, é preciso ser construída de desafios, batalhas e obstáculos quase intransponíveis.
De tudo, o que mais admiro é seu silencio que me cortam as metáforas... Aquele olhar para o vazio que esconde
102
Marcello Silva
mistérios que jamais decifrarei. Não sei o que pensa. Se sente saudades de ontem ou se sonha com o amanhã.
Enquanto isso, o café já está pronto e ele tem gosto de flores e cheiro de fadas. Acho que, um pouco da sua essência, escapa em tudo que ela faz.
Poção – 2015
devAneios
“Eu não sou uma sonhadora. Só devaneio para alcançar a realidade.”
- Clarice Lispector - Escritora
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O PescadOr
esconderiJo
Meu universo mede 16 m2 (metros quadrados) Algumas mobilhas e livros Desfilam anjos, elfos. Princesas andarilhas...
Enquanto escrevo transmigro em mim Monto castelo de palhas Recrio asas de ceras...
Mamutes na escrivaninha Na cama, uma amazona ferida. Implorando um gole de cicuta.
Recolho-me Ao meu esconderijo milenar.
080912
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Marcello Silva
AulA dominicAl
Sonâmbulo entre letras. Soletro... Releio o silêncio dos dígrafos. Prosopopeia - caneta mergulha no chão.
107
O PescadOr
mil fAces (As mulheres Que não vi)
(à Carmen Presotto; Fátima Oliveira; Simone Cardozo).
Quantas mulheres se escondem em uma só? Quantos gritos resumidos, em um único gemido? Mulheres que não vi Escondidas sob uma única pele Detrás de dois olhos apenas. Quantas personalidades, jeitos, andares, Olhares... Num único corpo. Quantas faces! Amar sob a pressão do ódio, Odiar por tanto amar tanto No entanto Nunca amar. Dentro de uma bela reside uma fera Uma cinderela, branca de neve. Pequena sereia... Ainda que astutas também adormecidas. Quantas personagens sem nome! Quantas vozes caladas! Quantos caminhos não percorridos, Roteiros incertos! Quantas faces! Quantas utopias esquecidas,
108
Marcello Silva
Amores roubados. Quantas mulheres morrem Dentro de uma única, sem terem sido, sequer notadas?
231108
109
O PescadOr
nAs AsAs dA liberdAde
Se, nas asas de noite, passa o tempo. Tenho sob meus pés, a vida. Consumida e vivida na sua essência.
Tenho a brisa do amanhecer, submissa. Convidando-me a passear pelo mundo; Tenho o sol: menino brincalhão e amigo último A vida é tudo aquilo que passa Enquanto respiro; enquanto durmo; Enquanto desfilo pelas estradas alegres e retas da Existência.
Já não temo ao horizonte desconhecido Quero o futuro como uma fruta a ser ingerida... Quero a vida em estado bruto Assim como o tempo paralisado na janela enquanto Escrevo.
311209
110
Marcello Silva
delírio
Molduraram-lhe os deuses, sua face tão bela. Em cuja, os olhos me ateiam devaneios. E de tudo que mais admiro nela Delírios tenho ao ver os brancos seios
111
O PescadOr
e lá forA?
(à Neyci Sotero)
Quero sair de mimVer o mundo que não cabe nos olhos (essas estreitas janelas da alma)
O que há lá fora?Há luz? Há serras?Há dia?Há vida?
Quero pular do euJogar-me monólito abaixoSer molécula de arPedra cinzentaFotossíntese...
Dessa minha armadura esculpida a mãoCarapaça de papel (egocêntrica)Quero sairQuero pular...
Pedra da Baliza – 060314
112
Marcello Silva
ArogA...
Faz-se nostálgico Entre chegadas e partidas Um coração sangra
Momentos...
O vai e vem de homens No compasso das horas Limita minhas utopias
Momentos...
Raros instantes de poesias Metáforas lúdicas... Momentos.
040912
113
O PescadOr
simone
(à Simone)
Sob a densa noite fria te vi passarIgual leveza de um anjo, desfilando ao vento.Maravilhado fiquei ao te observar... E nasOndas te teus cabelos me perdi em pensamentosNaveguei, por um instante, sem rumo a naufragar.Estático, na angelicalidade de teus olhos atentos.
114
Marcello Silva
vitrines e cAstelos
(à Fátima Oliveira)
A boneca de porcelana Saiu da vitrine Sacudiu a poeira Segredou-me silêncios
A princesa fugiu dos contos Dispensa os sapatos de cristais Quer salto quinze ou uma plataforma Azaléia...
Engole sapos Para não ter que acreditar Que príncipes ainda existem
Reinventa caminho Monta castelo... De areia.
115
O PescadOr
ProcurA-se
Procuro-me anestesiado pela calma, Solitariamente descansando sobre mim. Estou a um passo do meu corpo E, no entanto não me acho; Sou folha seca a deriva; Ventania de agosto; Chuva... Chuvisco... Furacão...
Sou pecado em rubra carne Sou o sagrado posto intocável. Sacrilégio... Sou. Sou metáfora... Frase incompleta. Texto em branco que já diz tudo Sou personagem inexistente da minha história mal contada Autor da tragédia que faz rir... Rir somente
Procuro-me todo dia Entre labaredas e fornalhas No estômago pútrido e escuro da rotina Bicho-papão que me apazigua e me devora Não me encontro ainda. Ainda não...
130710
116
Marcello Silva
300 milhAs
Estou à trezentas milhas de mim Um passo à frente dos meus pés Pensando alem do pensamento imaginado Fico tentando entender o que não é para ser entendidoE isso, às vezes, me escarnecem os neurônios e maltrata-me a alma.Fico farto do perfeitismo imaginado pelas pessoas De como algumas delas se apegam a coisas tão fúteis, Desnecessárias e passageiras... E ainda se julgam o centro Do universo...A tarde em bocejos me pede beijos... Beijos eternos e quentes. No entanto, a noite vem e descubro, felizmente, que não Sou eterno, Que nada sou.. Que JESUS me guia na simplicidade De viver em cada dia a sua essência Ingerir a cada aurora o néctar necessário para a eternidade Entre o nascer e o por- do – sol... SomenteE enquanto me desamarro Do cronômetro eletrônico (que não para) Fico a mercê da monótona rotina. De ser... De ter... De pensar... Necessito ir além do caminho traçado, Pois estou um passo à frente dos meus pés, A trezentas milhas de mim...
080810
117
O PescadOr
beirA mAr
Vem menino mar, descamisado, beijar tua namorada: Areia alvoroçada, molhada querendo a’Ma’r mais... Afogarem-se ambos na fúria do amor primeiro, antigo e Ultimo. Na cúpula desse amor, estendem-se, não muitas luzentes, As estrelas curiosas. Paira sobre o ninho nupcial As lágrimas angelicais dos arcanjos.Que ousa dizer que mar e areia não se amam? É na falha do outro que um completa Visto isso nos beijos inumeráveis Que se sucedem eternos, no decorrer dos séculos...Vem menino mar aguçado, enamorar outra vez tua bela...
118
Marcello Silva
osAcA
(à F. Oliveira)
O acaso aos nossos pés Insulta-nos A tomar um conhaque No bar da esquinaIgnoraremos RepudiaremosQueremos uma prece Orações a Chivas Salmo de Davi...
119
O PescadOr
e dePois dAs seis?
(à Cecília)
Para onde vamos depois das seis, Quando os pássaros voltarem das campinas E o trem rouco passar? Para onde vamos? Aqui não há lugar para onde ir A não ser ir a lugar nenhum Encontrar-se com Bonaparte ou Stálin no quintal de casa
Para onde vamos?
Se ao menos o Everest fosse aqui Escalaríamos agora numa louca carreira, Mas não, fica longe (cem metros talvez)Para onde vamos?
Se Orfeu nos convidasse para um chá com Sócrates Iríamos sem remorsos tomar cicuta Dormir eternamente nos braços de Vênus, Sob carinhos de Afrodite...
120
Marcello Silva
mAtériA
Minha matéria é o dia de hoje... Presente, Convidando-me sorridente, Adentrando o acaso da existência Existindo sem saber por quê.
Minha matéria é onde estou pisando, vendo e ingerindo. É o mar, a moça, a bola, a música... É o poema. È o dia vivido, sucumbido, escalado no pulsar. Frenético de rotina, Medido por fragmentos de tempo Sem espaço restante...
Minha matéria (nervosa) é o que vejo, Gente exalando dor, almejando paz e querendo amor. Minha matéria nefasta e fugidia Gira se estraçalhando nos estilhaço da “bomba de tempo”
121
O PescadOr
e mim
Pulei de mimFraturei a almaGritei silênciosBebi meu pranto até saciar sede
Retornando ao casuloSangrei metáforas...
122
Marcello Silva
breve instAnte
Preciso de um breve instante Entre o gole de conhaque e a vertigem Entre o beijo e a taquicardia
Eu sou o instante Breve... Passageiro Em que anjos desfilam na noite: Chegam sem pedir licença E vão sem dizer adeus...
Eu sou o instante flutuante Em que a lua abraça as águas do Porto E as mãos gélidas denunciam O nervosismo oculto...
Eu preciso de um instante de fuga De encontros Com anjos... Comigo...
041111
123
O PescadOr
PAlAvrAs... PAlAvrAs
Palavras em mim caem Como pesadas gotas de chuva torrencial Adentram-me o cérebro Molham-me os neurônios E inunda meu pensar de frases e versos frios
Palavras caem gota a gota Sobre o concreto do meu poema E de tanto bater até que o fura devagarzinho
Pássaros perdido em bando Num céu sem nuvem Bicando os pés do infinito Palavras, oh palavras... Quantas metáforas te descrevem?
111109
124
Marcello Silva
PerAmbulAnte
Como demente, na noite, perambulo.Consumindo o néctar noturnoDefumo o tempo como um charutoNa magia do desconhecido, enfurno.
Ando sem rumo, fumando a negrura.Ofereço às estrelas poemas e abraçoÀ majestosa lua nas alturasPara ela, ainda, nada faço.
Não vejo homem algum a andarErrante como eu, neste caminho.O que farei neste campo a vagarTriste, roto e sozinho?
Por incontáveis dias aqui já andoSem saber onde a estrada findaSe ao castelo da donzela que amoContinuarei caminhando ainda.
230709
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O PescadOr
misteriosA PedrA
Cinzenta pedra Posta imóvel sobre a face do tempo E onde descansam anjos tortos e malcriadosRabiscam teu pálido corpo Gravam á navalhas anseios e desabafos Letras mortas e esquecidas...Cinzenta pedra Fria imagem opaca Cujo surgimento desde os primórdios do tempo ignoro Perdidas almas lá descansam Sob o luar das noites claras Defumam charutos... Bebem orvalhos...
060709
126
Marcello Silva
vAzio
O silencio grita teu nome Incorporo gênios Com lâmpadas descartáveis Faço meus (próprios) pedidos Não me atendoEncaixo-me na noite Tímpanos apurados Quero teus sussurros Teu respirar... PulsarOuço o vazio a desdenhar Perfurando-me a garganta...
127
O PescadOr
As rosAs
(à Fátima Oliveira)
As rosas não falam Exalam o perfume mais tenro
As rosas não choram Bebem orvalho Sussurram segredos Psicografam poesia
As rosas dançam ao vento Bailam na chuva Valsa... Ventania.
Espinhos... Pra que servem os espinhos? Proteção?
300911
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Marcello Silva
mAr
Anjo de água Cujas claras pupilas me excitam; Cuja bravura de monstro me intimida; Cujo mistério me intriga.
Se, ingere o ocaso todo dia. Agora no seu vai e vem de ondas Vomita espumas aos meus pés Saciado... Pedindo-me carícias.
Na areia branca Sua digestão molhada; Sua lágrima salgada; Seu gemido de gigante, ante a benevolência Da existência.
129
O PescadOr
À sombrA
Aqui à sombra da história, respiro.A tomar com Sócrates um cháNão sei se de hortelã ou cicuta.
É apaziguador está entre amigosVer Newton adentrando suas teorias inacabadas;Ler de Drummond o poema que ele nunca escreveu;Discutir com Aristóteles quanto ás suas opiniões errôneas, Ainda que ao findar da conversa, ele vença;Aplaudir as teorias platônicas do barbudo que descansa ali Em frente;
É apaziguador está entre amigos,Presenciar, numa cadeira de balanço, Patativa declamar Sua poesia popularEm contraste com Bilac sorridente a sua frente;Testemunhar na rede ao lado, Che Guevara descansando. Com sua boina ao peito, ainda Que Alexandre “O grande” saia pelo quintal gritando: “avançar” e ver Napoleão o acompanhar em seu cavalo de Pau.
É apaziguador está entre amigosNotar que alheio ao barulhoShakespeare tenta me dizer que não escreveu que a Filosofia era vã, mas que foi erro de tradução;Deduzir que emana uma infinita paz de Gandhi em sua
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Marcello Silva
Oração a Chivas;Sentir olhares femininos pousando em mimE por entre coqueiros verificar Joana D’arc surgir com Uma lança afiada
Ao passo que Cleópatra brinca com suas serpentes debaixo Da minha rede;Sentir o afago de Dalila acariciando-me os cabelos... é Apaziguador.
É apaziguador verificar que Da Vinci faz-me uma pinturaE se pergunto a ele quanto ao mistério de Monalisa, o Porquê de tanta eloquência,Bem sei que nada me responderá...
É apaziguador está entre amigosMesmo que, de repente, adentrem a noite sem explicação Alguma,Sumam misteriosamente sob a face da existência.
090909
131
O PescadOr
A dor Que une
Sobre o caixão de um ente queridoDuas famílias se reencontramUnidos pela dor...Antigos insultos esquecidosVelhas diferenças amenizadas.
As lágrimas de agoraInundam as mágoas de outroraAbraçam-se como se nunca tivessem se renegado...
A cada aperto de mão;A cada abraço;A cada soluço.O passado se afogava.
Poção – 130714
132
Marcello Silva
fusão
Uma pedra está na tarde Ou é a tarde que está na pedra? No entanto Uma invade a outra A compacta mistura formada Permanece apoiada Na arquitetura da existência
Uma pedra é feita de tarde Assim como a tarde é filha da pedra, Enamoradas desde o surgimento da vida
Ambas penetram-se E um grito rouco e sangrento Cresce no segredo de seus corpos.
270209
133
O PescadOr
crePusculAr
(à Carmen Silvia Presotto)
Cai a tarde aos pésImplorando poesias.Declamo BillacLeio Carmen
Café puro me congela os neurôniosO conhaque falsificado não me alegra…Tenho a tarde e as dobras do tempoEm encaixes com postigos…
Entre poemas invento veredasvestígios de caligrafiasinais de poesias.
Me identifico…me perco entre metáforas na solidão crepuscular…
020511
134
Marcello Silva
trilhA rotineirA
Odeio a rotina na mesma proporção que a amo Pessoas passam como um rio entre pedras Numa ligeira correnteza arrastando tudo Com passos programados indo a lugares já conhecidos.
Feitos cavalos cegos perdidos na noite Transeuntes nervosos e apressados Seguem a trilha do precipício.
Quantas vezes vi e revi a mesma cena Os mesmos atores, interpretando os mesmos papéis; Seguindo o mesmo roteiro; Sob o olhar atento do senhor tempo. Tempo, ‘tempo, estranha força’.
190110
135
O PescadOr
sem rumo
Um dia desses qualquer, amigo. Vou sair por aí, à toa. Sem rumo, comigo. Perdido entre névoas e garoas
Vou sair assim, pensando. Sem objetivos a me atar. Sem lugar, sem hora, sem parar. A tudo me desapegando.
Livre de tudo, livre do medo. Vou sair por aí sem rumo A procura do mundo Salvo dos enganos Liberto do cotidiano Sem angústia, sem segredos.
Vou sair leve, flutuando. Neste interminável caminho Sou menino sozinho Descobrindo-me, me desvendando,
Sem rumo aos passos lentos Seguirei sem saudades Com rosto ao vento Amando a tal liberdade
136
Marcello Silva
Seguirei guiado na fé Sem rumo... Sem rumo Um dia desses qualquer.
137
O PescadOr
somos o hoJe
O presente é nossa eternidade O nosso infinito é o agora vivido, Consumado, sugado, bebido...
A vida que foge entre os dedos É o néctar que escorrega-nos pelos lábios, Doce, afável, benévolo.
A vida sorrir A vida nos quer Acaricia-nos a nuca... Beija-nos os calcanhares Entregamos-nos aos seus braços como criança Ao colo da mãe...
Filhos ingratos...
Somos matérias constituintes do cosmo Parte do dia e o dia é parte de nós... Somos o hoje com suas migalhas E o hoje somos nós em fragmentos...
170710
138
Marcello Silva
exPostA noite
Tenho a brisa das noites macilentas A tremer nas minhas veias Devaneios que logo rebentam Na fria negrura outrora feia
Tenho os monótonos passos dos viajantes Caminhantes perdidos no estradão Pobres corpos sem almas, errantes. Envolto no “véu da escuridão”
Tenho, no alto onde a lua mora Um nebuloso luzir Como ondas que se desenrolam, Na areia vindo a bramir.
Tenho a face dos setes pecados Meu corpo de heresias está cheio Por nefastas mulher ter amado Ter da donzela, beijado os brancos seios.
Inebriado na noite pela dormência Enganado, triste embora. Adormecido tranquilo na existência Para acordar renascido na aurora.
210709
139
O PescadOr
fÊnix
Onde vomita tuas cinzas revividas Teu hálito em fogo de ressurreição? Para renascemos em outrora vida Na mesma fremida encanação.
Adentremos o medo da noite escura Sobre tuas penas afogueadas Por sobre, da noite, a moldura. Teu piar crocita em revoada.
Cavalgando em ti sobre os mares Sob o rubro da nossa fúria ardente, Vejo mortais aprisionados em seus lares.
A liberdade incendeia-nos a mente E submete a fogos os nossos males Assim, passando a vida, já não se sente.
080410
140
Marcello Silva
rAbisco dA noite
Noite de longos braços e pernas curtas Caminha sobre a terra desconforme Teu mistério antigo e uniforme Persiste ligado e estático na negrura
O que possuis teu coração de vento, Enquanto coisas humanas passam alheias a tudo? O palco do espetáculo está montado Debaixo de tua face fria A vida, protagonista inexperiente, declama Poemas no ato primeiro.
Sob a noite hostil Somos meros personagens esquisitos Entramos em cena e desaparecemos Como clandestinos... Somos da noite parte essencial Tentando entender se “ser ou não ser eis” Ainda “a questão” primordial.
190509
141
O PescadOr
fArto
Fujo da rima igual condenado de seu algoz; Igual pássaro da seta noturna, Pelos ares, pelos campos, pelos mares (oh rima indecente). Fujo cavalgando em mim
Não me apegarei a estilos e formas Fórmulas exatas Dizer o previsto para ser ditoEstou farto, Farto da coisa certa e previsível...
Ao absoluto sou devasso Inquieto carrasco da ideia estabelecida Por que seguir o mesmo caminho? Copiar pegadas, quando elas ‘conduzem somente até onde Outros foram’?
Inventarei veredas, Sobrepondo pedras, espinho. Entretanto não me siga Inventem as suas...
250310
índice
Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
Eu Pescador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11Eu, somente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13Sicrano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14Alegoria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15Silvestre . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16Quem me inventou? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17Do pó ao pó . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18Êxtase . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19Negro, sim senhor! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20Cavaleiro medieval . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21Partes (metáfrase gullaniana) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22Instante exato . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23Enquanto respiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
Paixões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27Aconchego . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29Paráfrase . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30Esvai-se . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31Teu cheiro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32Lunática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33Quero-te assim . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34Teu olhar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 Julieane . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36O Don Juan . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
Passos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39Coração de pedra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40Enquanto vivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41Impostora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42Lábios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43Vigília . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44Miragem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45Refém . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46Essa mulher . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47Pecado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48Menina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49Desejo alado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50São teus olhos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5110 culpas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52Razões desconhecidas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53Doce veneno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55Superficial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 56Orvalho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57Rascunho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58
Saudades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59Velho relógio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61É o que é . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62Entre coisas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63Noite negra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64Saudade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65Nostalgia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66Aurora . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67Anjo da morte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68Indescritível . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69Janeiro 2011 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70Inúteis coisas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71Morto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72
Social Político . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73Brazucas... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75A Revolução das Mulas em Chaval . . . . . . . . . . . . . . . 76Loucos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78Fome fogo fome . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79Que sistema é esse? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80Dia novo? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81Hino dos oprimidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82Gotham City a beira do caos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
Raízes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85DNA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87Felicidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88Mundo meu . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89Dança a iemanjá . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90Chaval... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91Mãe, bicho estranho . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92Batuque . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93Historinhas eternas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94O homem e o cão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96A morte de José Adonias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97Fazenda Poção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99Princesinha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100Dona Birica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
Devaneios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103Esconderijo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105Aula dominical . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106Mil faces (as mulheres que não vi) . . . . . . . . . . . . . . 107Nas asas da liberdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109Delírio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110E lá fora? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111Aroga... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112Simone . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113
Vitrines e castelos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114Procura-se . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115300 milhas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 116Beira mar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117Osaca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118E depois das seis? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119Matéria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 120E mim . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121Breve instante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122Palavras... Palavras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123Perambulante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 124Misteriosa pedra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125Vazio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 126As rosas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127Mar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128À sombra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129A dor que une . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131Fusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 132Crepuscular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 133Trilha rotineira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 134Sem rumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135Somos o hoje . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137Exposta noite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 138Fênix . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 139Rabisco da noite . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 140Farto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 141
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