PREVALÊNCIA DE EFEITOS COLATERAIS EM PACIENTES
SUBMETIDOS À QUIMIOTERAPIA
BORGES, Lúcia Rota1; HELBIG, Elizabete
1; BENDER, Letícia
1; GOMES, Aline
Brauner1; CASARETTO, Luciane Paiva
1
1Faculdade de Nutrição/Universidade Federal de Pelotas – Rua Gomes Carneiro, n
o 1 -
CEP 96010-610 - Pelotas - RS. E-mail: [email protected]
Resumo: O câncer é considerado um importante problema de saúde pública, sendo a
segunda maior causa de morte no mundo. A quimioterapia constitui uma das
modalidades de tratamento com a função de eliminar as células que formam o tumor. No
entanto, por ser um tratamento sistêmico todos os tecidos podem ser afetados, causando
efeitos colaterais. O objetivo deste trabalho foi avaliar a prevalência de efeitos colaterais
em pacientes submetidos à quimioterapia. Para avaliar a prevalência de efeitos
colaterais foram utilizadas as variáveis da Avaliação Subjetiva Global Produzida Pelo
Paciente (ASG-PPP). Foram avaliados 20 pacientes, com média de idade de 59,95 anos.
A maioria dos pacientes (55,0%) apresentou diagnóstico de câncer gastrointestinal e
cabeça e pescoço. Quanto à presença de efeitos colaterais, 90,0% dos pacientes
relataram ter apresentado algum tipo de sintoma. Foi encontrada associação
significativa entre os dados de perfomance status e presença de efeitos colaterais
(p=0,02). Conclui-se neste estudo a elevada prevalência de efeitos colaterais nos
pacientes submetidos à quimioterapia, principalmente entre aqueles indivíduos
considerados com pior prognóstico. A identificação precoce dos sintomas, durante o
tratamento é de suma importância uma vez que, colabora para a diminuição do impacto
no estado nutricional do paciente e permite uma assistência nutricional adequada
prevenindo assim, maiores complicações decorrentes do tratamento.
Palavras chaves: câncer, quimioterapia, efeitos colaterais.
Introdução
O câncer é considerado um importante problema de saúde pública, sendo hoje a
segunda maior causa de morte no mundo¹. É uma enfermidade crônica e multicausal
caracterizada pelo crescimento desordenado e descontrolado de células, que invadem
tecidos e órgãos. Estas células dividem-se rapidamente, determinando a formação de
tumores malignos, que podem espalhar-se para outras regiões do corpo2,3
.
Tendo em vista, que existem muitas pesquisas a procura de uma cura, os
métodos mais eficazes no combate às células cancerígenas ainda se encontram na
utilização da quimioterapia, radioterapia e cirurgia¹. A quimioterapia consiste na
administração de compostos químicos com a principal função de eliminar as células
malignas que formam o tumor. Os principais objetivos são a sua erradicação, ou na sua
impossibilidade, a redução do volume tumoral de forma a aliviar os sintomas
relacionados com a doença e prolongar a vida do paciente¹.
Por ser um tratamento sistêmico, todos os tecidos podem ser afetados, uma vez
que, os quimioterápicos não atuam exclusivamente sobre as células tumorais, agredindo
também células sadias que se renovam constantemente, como as células da medula
óssea, pêlos e a mucosa do trato digestivo1. Além disso, a quimioterapia pode ter
importante consequência no estado nutricional do paciente em função dos efeitos
colaterais produzidos, contribuindo diretamente para a desnutrição, com repercussões
negativas na sua qualidade de vida¹. A desnutrição afeta entre 20% e 60% dos pacientes,
isto colabora diretamente para uma maior incidência de complicações durante o
tratamento, repercutindo na recuperação do paciente e aumento da mortalidade4,5
.
A avaliação dos efeitos colaterais durante o tratamento quimioterápico é de suma
importância, uma vez que, a identificação precoce e o seu manejo adequado poderão
contribuir para a diminuição do impacto no estado nutricional, subsidiando a assistência
nutricional adequada a esses pacientes e prevenindo complicações posteriores
decorrentes do tratamento.
Diante do exposto, o objetivo deste trabalho foi avaliar a prevalência de efeitos
colaterais em pacientes submetidos à quimioterapia.
Metodologia
Foi realizado um estudo transversal, onde foram avaliados todos os pacientes
submetidos à quimioterapia em uma clínica de oncologia localizada na cidade de
Pelotas/RS. Foram excluídos do estudo pacientes com menos de 18 anos de idade e
aqueles que estavam no primeiro dia de quimioterapia.
Aplicou-se um questionário com informações relativas às características sócio-
demográficas (sexo, idade, cor da pele, estado civil, escolaridade e profissão). Os dados
referentes ao tipo de tumor, estadiamento da doença, tipo de quimioterapia, ciclo
quimioterápico, performance status e presença de metástases foram obtidos do
prontuário do paciente.
Para avaliar a prevalência de efeitos colaterais foram utilizadas as variáveis da
Avaliação Subjetiva Global Produzida Pelo Paciente (ASG-PPP)6. Ao paciente foram
dirigidas perguntas referentes à sintomatologia apresentada, início da ocorrência de tais
sintomas e tempo de duração dos mesmos. Foram coletados dados de peso e altura. Para
obtenção do peso, foi utilizada uma balança Filizola, com capacidade de 150Kg e
precisão de 100g. Para medição da altura, foi utilizado estadiômetro de metal acoplado à
balança com 200cm e precisão de 1mm.
Os dados coletados foram digitados em planilha do Microsoft Excel e exportados
e analisados no programa Stata, versão 10.0. Foi realizada análise descritiva das
características dos pacientes estudados. Após, foi realizada análise bivariada através do
teste de qui-quadrado. O nível de significância utilizado foi de 5%.
O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de
Medicina da Universidade Federal de Pelotas (OF. 55/2011). Foi realizada uma visita à
clínica, com a finalidade de solicitar autorização para a realização deste trabalho. O
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi entregue ao paciente no início do
estudo.
Resultados e Discussão
Foram avaliados 20 pacientes em tratamento quimioterápico, no período de
agosto a dezembro de 2011. Do total de pacientes, 60,0% (n=12) eram do sexo
masculino, com média de idade de 59,95 anos (DP=14,95 anos). O peso médio dos
avaliados foi de 72,58 Kg e média de IMC de 26,09 Kg/m². Na Tabela 1 estão descritas
as características da amostra estudada.
A Tabela 2 apresenta as características relacionadas à doença. Em relação ao
tipo de tumor, os tumores do sistema gastrointestinal e cabeça e pescoço foram os mais
prevalentes (55,0%), seguidos pelos tumores hematológicos (20,0%).
Quanto ao estadiamento, o estádio IV foi encontrado em 75,0% dos pacientes e
cerca de 60,0% (n=12) apresentavam metástases. Quanto ao tipo de tratamento, a
quimioterapia paliativa foi a mais prevalente (55,0%) e 45% (n=9) dos pacientes
encontravam-se no segundo ciclo de quimioterapia.
Quanto à presença de efeitos adversos relacionados com a quimioterapia (Tabela
3), 90,0% (n=18) dos pacientes relataram ter apresentado algum tipo de sintoma durante
o tratamento. Os mais prevalentes foram náuseas, xerostomia e constipação. No que diz
respeito ao início dos efeitos colaterais, a maioria dos efeitos tiveram seu início na
primeira semana de tratamento.
O tratamento oncológico mediante a administração de agentes quimioterápicos
caracteriza-se pela ocorrência de efeitos adversos derivados das alterações que estes
agentes provocam não apenas nas células tumorais, como também nas células sadias do
organismo. Além disso, a gravidade decorrente destes efeitos depende diretamente das
características tanto do paciente, como da própria doença, como por exemplo, o tipo de
tumor, estadiamento da doença, tipo de agente antineoplásico administrado, estado geral
do indivíduo, presença de enfermidades concomitantes, etc7. Além disso, segundo
Waitzberg (2002)8 e Custen & Arends (2005)
9, a quimioterapia pode desencadear
sintomas clínicos de grande importância comprometendo diretamente o estado
nutricional do paciente oncológico.
A análise da prevalência de efeitos colaterais, considerando o sexo dos
pacientes, evidenciou que todas as pacientes do sexo feminino (100%) relataram
apresentar algum efeito colateral decorrente do tratamento, porém sem diferença
estatística. Enquanto que no sexo masculino, somente dois pacientes apresentaram
ausência de sintomas.
Foi testada a associação entre presença de sintomas e as variáveis estadiamento,
tipo de tratamento, tipo de tumor e performance status. Os resultados evidenciaram que
a prevalência de sintomas foi maior entre os pacientes com estadiamento IV (77,78%),
em quimioterapia paliativa (55,56%) e com tumores de cabeça e pescoço e
gastrointestinal (55,56%), porém não houve significância estatística entre as variáveis.
Houve associação significativa apenas entre os dados de performance status e presença
de efeitos colaterais, evidenciando que dentre aqueles pacientes classificados como 1 na
análise do performance status, somente 11,11% não relataram efeitos colaterais,
enquanto que 88,89% relataram pelo menos um efeito colateral durante a quimioterapia
(p=0,02).
A ASG-PPP é um instrumento utilizado para avaliar pacientes com câncer e
possuí uma alta sensibilidade e especificidade para detectar alterações no estado
nutricional destes indivíduos, além disso, permite a identificação de sintomas
específicos da doença que podem interferir diretamente na ingestão alimentar
provocando um grande impacto na saúde com repercussões negativas na sobrevida
destes pacientes6,10
. A identificação precoce destes efeitos colaterais permite um
adequado plano de intervenção nutricional e é essencial para planejar a terapia
nutricional, contribuindo na diminuição do impacto no estado nutricional do paciente
com câncer.
Conclusões
Observou-se neste estudo uma elevada prevalência de efeitos colaterais relatados
pelos pacientes, principalmente entre aqueles considerados de pior prognóstico. Estes
resultados sugerem a necessidade de identificar precocemente estes sintomas e intervir
de maneira adequada com a finalidade de ações que permitam minimizar estes efeitos
colaterais e que possuem um grande impacto no estado nutricional do paciente
oncológico, prevenindo desta forma a ocorrência da desnutrição e a evolução para a
caquexia.
Em vista aos resultados encontrados, percebe-se a importância de oferecer um
suporte nutricional adequado para pacientes em tratamento quimioterápico, visando
minimizar as perdas nutricionais, decorrentes dos efeitos colaterais do tratamento, e
consequentemente, preservando a qualidade de vida do paciente oncológico. Desta
forma, orientações nutricionais, ajudam a tornar o tratamento menos impactante para os
doentes, sendo de fundamental importância a sua existência dentro do protocolo de
tratamento.
Tabela 1. Características da amostra
Características N %
Sexo
Masculino
Feminino
12
8
60,0
40,0
Estado Civil
Com companheiro
Sem companheiro
17
3
85,0
15,0
Cor da pele
Branca
20
100,0
Escolaridade
Ensino Fundamental incompleto/completo
Ensino Médio incompleto/completo
Ensino superior incompleto/completo
13
2
5
65,0
10,0
25,0
Profissão
Aposentado (a)/Do lar
Funcionário Público/Outros
10
10
50,0
50,0
Tabela 2. Características relacionadas à doença
Características N %
Tipo de tumor
Cabeça/Pescoço/Gastrointestinal
Hematológico
Outros
Mama/Ginecológico
11
4
3
2
55,0
20,0
15,0
10,0
Estadiamento
I
II
III
IV
1
1
3
15
5,0
5,0
15,0
75,0
Ciclo Quimioterápico
1
2
3
4
5
9
1
1
1
8
45,0
5,0
5,0
5,0
40,0
Tipo de Quimioterapia
Paliativa
Adjuvante
Curativa
Neoadjuvante
11
4
3
2
55,0
20,0
15,0
10,0
Presença de metástases
Sim
12
60,0
Tabela 3. Prevalência de efeitos colaterais durante a quimioterapia.
Características N %
Náuseas 12 60,0
Xerostomia 11 55,0
Constipação 11 55,0
Alteração de apetite 11 55,0
Náuseas associadas ao olfato 10 50,0
Saciedade precoce 8 40,0
Vômitos 7 35,0
Diarréia 6 30,0
Alteração no paladar 5 25,0
Feridas na boca 3 15,0
Dificuldade para engolir 1 5,0 *Os valores ultrapassam 18 porque os pacientes podem ter relatado mais de um sintoma
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