PRODUO DE CONHECIMENTO REGIONAL E
INFORMAO TCNICO-CIENTFICA EM SADE
SUPLEMENTAR PARA A REGIO SUL DO BRASIL
REDE DE CENTROS COLABORADORES EM SADE SUPLEMENTAR
NCLEO SUL
AGOSTO, 2007
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REDE CIENTFICA SUL: 14 Instituies de Ensino Superior
04 pblico-federais :
UFPR, UFSC, UCS e UFRGS
10 comunitrias :
UEM, Uniplac, UPF, Uniju, Univates, Unisc, IPA, Urcamp, UFPel e UCpel
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CONDUO GERAL E
ARTICULAO NUCLEAR:
UFRGS EducaSade
Ncleo de Educao,
Avaliao e Produo
Pedaggica em Sade
UCS Nepesc
Ncleo de Educao e
Pesquisas em Sade Coletiva
reas Envolvidas:
Educao em Sade Coletiva
Estudos sobre a Formao e Desenvolvimento de Profissionais de Sade
Pesquisa Avaliativa em Sade
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EDITOR
Ricardo Burg Ceccim
COMISSO EDITORIAL
Lcia Ins Schaedler
Luiz Fernando Silva Bilibio
Maurcio Moraes
Raphael Maciel da Silva Caballero
Teresa Borgert Armani
REDE CIENTFICA SUL
Centro Universitrio Metodista Instituto Porto Alegre IPA
Centro Universitrio Vale do Taquari de Educao Superior Univates
Universidade Catlica de Pelotas UCPel
Universidade de Caxias do Sul UCS
Universidade de Passo Fundo UPF
Universidade de Santa Cruz do Sul Unisc
Universidade do Planalto Catarinense Uniplac
Universidade Estadual de Maring UEM
Universidade Federal de Pelotas UFPel
Universidade Federal de Santa Catarina Ufsc
Universidade Federal do Paran UFPR
Universidade Federal do Rio Grande do Sul Ufrgs
Universidade Regional da Campanha Urcamp
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul Uniju
AUTORES
Aida Maris Peres enfermeira, especialista em didtica no ensino superior e em
enfermagem de urgncias, mestre em administrao, doutora em enfermagem pela
USP, professora da Universidade Federal do Paran.
Alcindo Antnio Ferla mdico sanitarista, doutor em educao pela Ufrgs,
4
professor da Universidade de Caxias do Sul.
lvaro Fraga Moreira Benevenuto Jr. jornalista, mestre em comunicao social,
doutor em cincias da comunicao pela Unisinos, professor da Universidade de
Caxias do Sul.
Ana Jlia Poersch estudante de pedagogia na Ufrgs, bolsista de iniciao cientfica
junto ao EducaSade/Ufrgs.
Ana Lusa Poersch estudante de psicologia na Ufrgs, bolsista de iniciao cientfica
junto ao EducaSade/Ufrgs.
Ananyr Porto Fajardo odontloga, mestre em odontologia, doutoranda em educao
na Ufrgs, preceptora de residncia multiprofissional no Grupo Hospitalar Conceio.
Antnio Fernando Boing odontlogo, mestre em epidemiologia, doutorando em
odontologia na USP, professor da Universidade Federal de Santa Catarina.
Arlete Regina Roman enfermeira, mestre em enfermagem, professora da
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.
Bruna Ballarotti estudante de medicina na Ufsc, bolsista de iniciao cientfica
junto ao EducaSade/Ufrgs.
Carla Daiane Silva Rodrigues estudante de enfermagem na Ufrgs, bolsista de
iniciao cientfica junto ao EducaSade/Ufrgs.
Cssia Regina Gotler Medeiros enfermeira, mestre em enfermagem pela Ufrgs,
professora do Centro Universitrio Vale do Taquari de Ensino Superior.
Cntia Galdmez estudante de psicologia na UFPR, bolsista de iniciao cientfica
junto ao EducaSade/Ufrgs.
Denise Elvira Pires de Pires enfermeira, mestre em sociologia poltica, doutora em
cincias sociais, ps-doutora em cincias da sade pela University of Amsterdam,
professora da Universidade Federal de Santa Catarina.
Dora Lcia Leidens Corra de Oliveira enfermeira, mestre em educao, doutora
em educao em sade pela University of London, professora da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, coordenadora do Grupo de Estudos em Promoo da
Sade PPGEnf/Ufrgs.
Douglas Deckert enfermeiro, msico, especialista em enfermagem de terapia
intensiva.
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Eleonor Minho Conill mdica, mestre em sade comunitria e doutora em
desenvolvimento econmico e social pela Universit de Paris (Sorbonne), professora
da Universidade Federal de Santa Catarina.
Ellen Regina Pedroso enfermeira, pesquisadora do Nepesc/UCS.
Fernanda de Oliveira Florentino dos Santos estudante de enfermagem na UFPR,
bolsista de iniciao cientfica junto ao EducaSade/Ufrgs.
Fernanda Erlo Ribeiro estudante de medicina na UCS
Fernanda Hampe (Pires) psicloga, mestranda em educao na Ufrgs.
Fernanda Peixoto Crdova enfermeira, mestranda em enfermagem na Ufrgs.
Fernando Jos Medeiros Fossati odontlogo, especialista em periodontia pela
Ufrgs, especialista em gesto em sade pela Ufrgs, odontlogo judicirio no Tribunal
de Justia do Estado do Rio Grande do Sul.
Fernando Schuster Battaglin estudante de medicina na UFPR, bolsista de iniciao
cientfica junto ao EducaSade/Ufrgs.
Flvia Raquel Rossi enfermeira, mestre em enfermagem, professora da
Universidade de Caxias do Sul.
Francielle Limberger Lenz estudante de psicologia na Unisc, bolsista de iniciao
cientfica junto ao EducaSade/Ufrgs.
Francyne Werner estudante de psicologia na Ufsc, bolsista de iniciao cientfica
junto ao EducaSade/Ufrgs.
Gabriel Trevizan Corra estudante de odontologia na Ufrgs, bolsista de iniciao
cientfica junto ao EducaSade/Ufrgs.
Gilnara da Costa Corra de Oliveira fisioterapeuta, doutoranda em educao na
Ufrgs, professora da Universidade Regional da Campanha.
Hosanna Pattrig Fertonani enfermeira, mestre em enfermagem, doutoranda em
enfermagem na Ufsc, professora da Universidade Estadual de Maring.
Janice Dornelles de Castro economista, mestre em economia da sade pela London
School of Economics, doutora em sade coletiva pela Unicamp, professora visitante
da Fundao Oswaldo Cruz/Braslia.
Joo Paulo Mello da Silveira estudante de medicina na Ufsc, bolsista de iniciao
cientfica junto ao EducaSade/Ufrgs.
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Karin Noga estudante de odontologia na UFPR, bolsista de iniciao cientfica
junto ao EducaSade/Ufrgs.
Liane Beatriz Righi enfermeira, doutora em sade coletiva pela Unicamp,
professora da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.
Lillian Daisy Gonalves Wolff enfermeira, mestre em enfermagem, doutora em
polticas, planejamento e gesto em sade pela Ufsc, professora da Universidade
Federal do Paran.
Lcia Ins Schaedler pedagoga, mestre em educao na sade, doutoranda em
educao na Ufrgs.
Luiz Fernando Silva Bilibio educador fsico, mestre em educao, doutorando em
educao na Ufrgs.
Lutiane de Lara psicloga, mestranda em psicologia na PUC/RS.
Marcos Breunig estudante de medicina na Ufrgs, bolsista de iniciao cientfica
junto ao EducaSade/Ufrgs.
Marcus Vincius Bianchi estudante de medicina na UCS.
Margareth Lcia Paese Capra assistente social, especialista em sade coletiva,
mestranda em educao na Ufrgs.
Maria Conceio de Oliveira mdica, mestre em antropologia, doutora em cincias
humanas pela Ufsc e Universit Provence (Aix-Marseille I), professora da
Universidade do Planalto Catarinense.
Maria Cristina Carvalho da Silva psicloga, mestranda em educao na Ufrgs.
Maria Lecticia Machry de Pelegrini enfermeira, mestre em sade coletiva,
professora do Centro Universitrio Metodista Instituto Porto Alegre.
Mariana Bertol Leal administradora de sistemas e servios de sade, mestranda em
sade coletiva na Uerj.
Marina Helena Capra estudante de medicina na UCS.
Maristela Chitto Sisson mdica, mestre em sade pblica e administrao sanitria
pela Escuela Andaluza de Salud Pblica/Universidade de Granada/Espanha; doutora
em cincias pela USP, preceptora e pesquisadora no Hospital Universitrio da Ufsc.
Marta Vaccari Batista enfermeira, mestre em epidemiologia pela Ufrgs, professora
da Universidade de Caxias do Sul.
7
Maurcio Moraes Mdico, especialista em medicina preventiva e social, mestrando
em educao na Ufrgs, professor da Universidade Catlica de Pelotas e preceptor de
Residncia Mdica da Universidade Federal de Pelotas.
Naiane Melissa Dartora Santos mdica, especialista em medicina de famlia e
comunidade, mestranda em educao na Ufrgs, professora da Universidade de Caxias
do Sul, preceptora de Residncia Mdica da UCS.
Olinda Maria de Ftima Lechmann Saldanha psicloga, mestre em psicologia pela
Ufrgs, professora do Centro Universitrio Vale do Taquari de Ensino Superior.
Raphael Maciel da Silva Caballero fisioterapeuta, mestrando em educao na
Ufrgs, orientador de residncia multiprofissional no Grupo Hospitalar Conceio.
Ricardo Burg Ceccim enfermeiro sanitarista, mestre em educao, doutor em
psicologia clnica pela PUC/SP, professor da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul, coordenador do EducaSade/Ufrgs.
Rita Maria Heck enfermeira, mestre em extenso rural, doutora em enfermagem
pela Ufsc, professora da Universidade Federal de Pelotas.
Roger dos Santos Rosa mdico, mestre em administrao, doutor em epidemiologia
pela Ufrgs, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, coordenador do
curso de especializao em sade pblica da Ufrgs.
Silvana Rodrigues dos Santos enfermeira, pesquisadora na Univates.
Suely Grosseman mdica, mestre em sade materno- infantil pelo Institute of Child
Health (London University), doutora em ergonomia pela Ufsc, professora da
Universidade Federal de Santa Catarina.
Suzete Marchetto Claus enfermeira, mestre em educao, doutora em sade
coletiva pela Unicamp, professora da Universidade de Caxias do Sul.
Teresa Borgert Armani pedagoga, mestre em educao, doutora em educao pela
Ufrgs, pesquisadora do EducaSade/Ufrgs.
Teresinha Eduardes Klafke psicloga, mestre em psicologia pela PUCCamp,
professora da Universidade de Santa Cruz do Sul.
Zuleica Maria Patrcio (Karnopp) enferme ira, mestre em enfermagem, doutora em
enfermagem pela Ufsc, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
8
SUMRIO
1. APRESENTAO Ricardo Burg Ceccim
2. CONCEITUALIZAO DA EDUCAO EM SADE SUPLEMENTAR E O SUPORTE DA ANLISE ECONMICA EM SADE
2.1. Educao em sade suplementar: abertura de eixo reflexivo na Educao em Cincias da Sade
Ricardo Burg Ceccim Alcindo Antnio Ferla
2.2. Economia da sade: reflexes acerca de suas contribuies para o ensino e formao em sade
Janice Dornelles de Castro Maria Lecticia Machry de Pelegrini Ricardo Burg Ceccim
2.2.1. Literatura tcnico-cientfica em Economia da Sade: seleo indicativa para estudo, com resumos
Janice Dornelles de Castro Maria Lecticia Machry de Pelegrini
3. CONCEITOS OPERADORES DE APOIO A UMA EDUCAO EM SADE SUPLEMENTAR: ensaio para um dicionrio de especialidade
Ricardo Burg Ceccim (Coordenador) Fernanda Hampe Fernanda Peixoto Cordova Gilnara da Costa Correa de Oliveira Margareth Lcia Paese Capra Maria Conceio de Oliveira Naiane Melissa Dartora Santos Olinda Maria de Ftima Lechmann Saldanha Raphael Maciel da Silva Caballero
9
Rita Maria Heck Teresinha Eduardes Klafke
4. PERSPECTIVAS ANLISE DO PBLICO E DO PRIVADO NA SADE
4. 1. Imaginrios sobre a perspectiva pblica e privada do exerccio profissional e a educao da sade
Ricardo Burg Ceccim Luiz Fernando Silva Bilibio
4.2. Itinerrios teraputicos e o mix pblico-privado na utilizao dos servios de sade
Denise Elvira Pires de Pires Eleonor Minho Conill Maristela Chitto Sisson Maria Conceio de Oliveira Antnio Fernando Boing Hosanna Pattrig Fertonani Ricardo Burg Ceccim
4.3. Cenrios da realidade: atores sociais da sade suplementar e observaes da mdia
Alcindo Antnio Ferla lvaro Benevenuto Jr. Flvia Raquel Rossi Marta Vaccari Batista Suzete Marchetto Claus
5. PRODUES DA EDUCAO EM SADE SUPLEMENTAR NA EDUCAO EM CINCIAS DA SADE
5.1. Conhecimento dos responsveis pela contratao de planos/seguros de assistncia privada sade relativamente regulamentao do setor (Ufrgs)
Fernando Jos Ferrari Fossati Roger Santos Rosa
5.2. Itinerrios teraputicos da mulher com cncer de mama na regio noroeste do Rio Grande do Sul: percursos pblico-privados e a busca por integralidade na
10
ateno sade (Uniju)
Douglas Deckert Liane Beatriz Righi Arlete Regina Roman
5.3. O itinerrio teraputico da mulher em busca da assistncia no ciclo gravdico-puerperal (Univates)
Silvana Rodrigues dos Santos Cssia Regina Gotler Medeiros Ricardo Burg Ceccim
5.4. A opo e utilizao de planos privados de sade por profissionais de sade atuantes com o paradigma da integralidade na ateno bsica sade (UCS)
Ellen Regina Pedroso Alcindo Antnio Ferla Marta Vaccari Batista
5.5. Formao de trabalhadores para o SUS: da realidade aos desafios da mudana na graduao (Uergs)
Mariana Bertol Leal Ricardo Burg Ceccim
6. CONHECIMENTO, FORMAO E TRABALHO EM SADE: resenhas crticas sobre sistema de sade no Brasil, trabalho e exerccio profissional
Ricardo Burg Ceccim (Coordenador)
6.1. Compreendendo as relaes pblico e privadas, individuais e coletivas a partir de uma histria das polticas de sade no Brasil
Alcindo Antnio Ferla Fernanda Erlo Ribeiro Marcus Vincius Bianchi
6.2. A categorizao da universalizao excludente: uma formulao desde a economia da sade
Ananyr Porto Fajardo Gabriel Trevizan Corra Ricardo Burg Ceccim
11
6.3. Educao e a prtica mdica: os imaginrios e a vida real
Bruna Ballarotti Joo Paulo Mello da Silveira Suely Grosseman Zuleica Maria Patrcio
6.4. Mercado de trabalho e formao: construindo perspectivas de atuao profissional com o estudante de medicina
Alcindo Antnio Ferla Marina Helena Capra
7. CONFORMAO DO SETOR DA SADE NO BRASIL: literatura contextual de base - resenhas
Ricardo Burg Ceccim (Coordenador) Aida Maris Peres Ananyr Porto Fajardo Dora Lcia Leidens Corra de Oliveira Fernanda Hampe Fernanda Peixoto Crdova Lillian Daisy Gonalves Wolff Lcia Ins Schaedler Luiz Fernando Silva Bilibio Lutiane de Lara Marcos Breunig Maria Cristina Carvalho da Silva Mariana Bertol Leal
7.1. O dilema preventivista: contribuio para a compreenso e crtica da medicina preventiva Srgio Arouca. (1975)
7.2. As instituies mdicas no Brasil: instituio e estratgia de hegemonia Madel Luz. (1979)
7.3. O capitalismo e a sade pblica: a emergncia das prticas sanitrias no Estado de So Paulo Emerson Elias Merhy. (1985)
7.4. Os mdicos e a poltica de sade : entre a estatizao e o empresariamento a defesa da prtica liberal da medicina Gasto Wagner de Sousa Campos. (1988)
7.5. Planejamento sem normas Everardo Duarte Nunes; Gasto Wagner de Souza Campos e Emerson Elias Merhy. (1989)
12
7.6. Inventando a mudana na sade Luiz Carlos de Oliveira Ceclio. (1994)
7.7. Sade: a cartografia do trabalho vivo Emerson Elias Merhy. (2002)
7.8. Biomedicina, saber e cincia: uma abordagem crtica Kenneth Rochel de Camargo Jr. (2003)
7.9. Planos de sade no Brasil: origens e trajetrias Ligia Bahia, Ludmila Rodrigues Antunes, Thereza Cristina Alves da Cunha e William de Souza Nunes Martins . (2005)
7.10. Duas faces da mesma moeda: microrregulao e modelos assistenciais na sade suplementar ANS. (2005)
7.11. A sade no Brasil: cartografias do pblico e do privado Giovanni Gurgel Aciole. (2006)
7.12. Ensinar sade: a integralidade e o SUS nos cursos de graduao da rea da sade Roseni Pinheiro, Ricardo Burg Ceccim e Ruben Araujo de Mattos. (2006)
8. INFORMAO BIBLIOGRFICA PARA O ENSINO E FORMAO EM SADE SUPLEMENTAR
Maurcio Moraes (Coordenador) Ana Jlia Poersch Ana Lusa Poersch Carla Rodrigues Cntia Galdmez Fernanda de Oliveira Florentino dos Santos Fernando Schuster Battaglin Francielle Limberger Lenz Francyne Werner Karin Noga Ricardo Burg Ceccim Teresa Borgert Armani
8.1. Literatura tcnico-cientfica com resumos
8.1.1. Artigos em peridicos
8.1.2. Dissertaes e Teses
8.1.3. Livros e Captulos de Livro
8.1.4. Trabalhos e Relatrios Tcnicos
13
8.2. Lista de endereos e bibliotecas virtuais
EXPEDIENTE
Produo Visual: AbreuDesign
Reviso: xxx
Grfica: xxx
CD Rom e Software: Midiatag
Editora da Universidade/Ufrgs
7
1. APRESENTAO
Ricardo Burg Ceccim
Este livro nasceu do objetivo de oferecer informao bibliogrfica (seleo de
literatura temtica com carter tcnico-cientfico, indicao de bib liografia focada ou
configuradora do campo analtico, comentrio especializado da bibliografia especfica e
indicao do acesso informao com eixo em descritores delimitados, entre outros
aspectos da busca e uso de informao tcnico-cientfica relativa a um tema, foco ou
especialidade do conhecimento) que desse subsdio formao acadmica e pesquisa
integrada ao ensino e extenso universitria no mbito da Sade Suplementar.
Inicialmente designado como Bibliografia Comentada, o trabalho desencadeado por
docentes e estudantes ligados ao Ncleo de Educao, Avaliao e Produo Pedaggica
em Sade (EducaSade), da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, levou
identificao de uma subrea na Educao dos Profissionais de Sade, uma especificidade a
descoberto no ensino e formao em sade: Educao em Sade Suplementar. A
especificidade somente ganhava evidncia no interior da pesquisa de stricto sensu em
Sade Coletiva ou projetos de anlise e investigao em Poltica, Administrao, Direito e
Economia da Sade. O levantamento que os docentes e estudantes de graduao e de ps-
graduao faziam decorria de desejo de legitimar a regulao pblica do subsetor
suplementar no setor da sade no Brasil. Surgiu, ento uma importante interrogao: como
sustentar critrios pblicos de regulao de um setor cuja operao e legitimao social no
est presente na formao bsica dos atores profissionais que nele exercero a atividade- fim
que lhe d existncia? Se o subsetor existe com base no trabalho de atores profissionais no
exerccio de sua ocupao nuclear, ou seja, com base no atendimento profissional sade
de indivduos e suas famlias, como estes profissionais no percorrem uma formao que
inclua dimensionar esse subsetor, constituir referncias sobre o trabalho no mesmo? Outra
questo detectada foi de que vigente um imaginrio idealizado sobre o trabalho no
subsetor suplementar e h ausncia de um ensino consistente sobre o mesmo.
8
O livro, ento, de uma Bibliografia Comentada, Informao Bibliogr fica para o
Ensino e a Pesquisa em Sade Suplementar no mbito do Sistema nico de Sade, passou
a literatura de apoio Educao em Sade Suplementar. De certo modo, alm das reas ou
subreas de conhecimento antes referidas Sade Coletiva, Poltica, Administrao,
Direito e Economia da Sade surga-nos uma nova rea ou subrea, a Educao. Nesta,
podemos indicar a Educao dos Profissionais de Sade, mais pontualmente a Educao em
Sade Suplementar, um tpico especial na Educao ou tema especfico em Sade
Coletiva, contribuindo para o entendimento da regulao como capacidade de interao nos
processos de prestao de servios, orientando a sua execuo, e de integrao s polticas
pblicas de construo de um sistema nacional para o setor da sade no pas.
O estudo se apoiou inicialmente em uma reviso sobre o tema, discutindo em rede
cientfica os aspectos conceituais e as ferramentas utilizadas no processo regulatrio em
sade, seus alcances e limites, at a construo de um referencial de sugestes para a leitura
aprofundada, pesquisa individual em linhas de investigao, construo de bibliografia em
disciplinas acadmicas ou cursos da rea da sade, formao de professores e renovao
das abordagens entabuladas nos planos de ensino da rea de Sade Coletiva e de Educao
em Sade.
O estudo se seguiu por meio de rede cientifica, uma espcie de comunidade
ampliada de pesquisa ou relaes em rede para a troca de informaes acadmicas,
envolvendo docentes e estudantes de 13 Instituies de Educao Superior dos trs estados
da regio sul do Brasil, elevando-se o debate sobre as conexes com o ensinar e o pesquisar
em Sade Suplementar. O trabalho em Rede Cientfica permitiu detectar lacunas e escolher
caminhos por maior qualidade. Foi necessrio um enorme redimensionamento no projeto
original, resultando na formulao da Educao em Sade Suplementar.
O produto em livro ganhou, ento, 8 blocos de abordagem. Alm da apresentao
(bloco 1), a conceitualizao da Educao em Sade Suplementar e o suporte da Anlise
Econmica em Sade (bloco 2). Em seguida (bloco 3), conceitos operadores de apoio a
uma Educao em Sade Suplementar, numa espcie de ensaio para um dicionrio para
uma especialidade do conhecimento. Na seqncia (bloco 4), a ampliao das perspectivas
9
de anlise sobre o pblico e o privado na sade, com a abordagem de 03 eixos: imaginrios
presentes na formao universitria em sade, itinerrios teraputicos na utilizao dos
servios de sade e cenrios onde atuam os atores na sade suplementar, inclusive a mdia
da sade suplementar. De certo modo, apresentamos a evidncia de um mix entre o pblico
e o privado na sade que nos exigiriam perceber a emergncia do conceito de pblico para
alm do conceito de estatal. Neste bloco, escolhemos trs eixos com a pretenso de colocar
s claras que o subsetor suplementar no tem lugar irrelevante formao, interfere na
produo de sentidos profissionalizao, est presente nos percursos que usurios das
aes e servios de sade estabelecem em busca da integralidade da ateno, sejam ou no
beneficirios de planos e seguros privados de sade, e ao trabalho em suas vrias inseres
e relaes de produo. A seguir (bloco 5), reunimos um conjunto de produes originais e
inditas entre docentes e estudantes das instituies componentes da Rede Cientfica Sul. A
escolha desses trabalhos se deu pela busca da defesa recente de monografias que
atendessem aos descritores da Educao em Sade Suplementar e no se enquadrassem no
mbito do stricto sensu, a inteno foi demonstrar a possibilidade de ensinar com essa
temtica. O bloco seguinte (bloco 6) foi a escolha de resenhas crticas relativas aos mesmos
descritores e que pudessem enriquecer o ensino com o foco em estudo, novamente,
entretanto, a demonstrao do ensino da sade e suas potncias temticas. No esforo de
uma reviso de sentidos, foi montado um bloco de estudos (bloco 7) apresentando uma
literatura contextual de base compreenso do sistema de sade do Brasil, no em seus
aspectos formais ou legais, mas de sentido: questes epistemolgicas, organizacionais,
sociopolticas, de modelo assistencial e de educao dos profissionais de sade.
Caminhando para o fechamento (bloco 8), apresentamos um consolidado de informao
bibliogrfica e uma lista de endereos e bibliotecas virtuais de interesse ao tema para seu
prolongamento entre docentes, estudantes e pesquisadores. Este ltimo bloco foi composto
pela literatura de artigos em peridicos, pelas dissertaes e teses brasileiras originrias da
ps-graduao stricto sensu e pelos livros e captulos de livros publicados no Brasil,
pertencentes ou fortemente aproximadas da temtica. Todas estas referncias esto
apresentadas com resumos. O perodo abrangido para a reviso da literatura foi de abril de
2000 (ano de criao da Agncia Nacional de Sade Suplementar ANS) a abril de 2007
10
(ms em que foi apresentado ANS, pela Rede Cientfica Sul, o referencial para a
nomeao da Educao em Sade Suplementar como temtica de conhecimento).
O componente Bibliografia Comentada, integrante do bloco 8 desta obra, se insere
no Programa de Qualificao da Sade Suplementar: Nova Perspectiva no Processo de
Regulao, da Agncia Nacional de Sade Suplementar, lanado originalmente pelo senhor
ministro da sade em 12 de dezembro de 2004 e editado como parte da Poltica de
Qualificao da Sade Suplementar por meio da Resoluo Normativa n 139, 24 de
novembro de 2006, que instituiu, na ANS, o Programa de Qualificao da Sade
Suplementar. Resultou de atividade desencadeada por Carta Acordo relativa ao
Conhecimento Regional e Produo de Informao Tcnico-Cientfica em Sade
Suplementar para a Regio Sul do Brasil no interior do projeto de Rede de Centros
Colaboradores em Sade Suplementar, lanado pela ANS em cooperao e com a
assistncia tcnica da Organizao Mundial da Sade, por meio do Escritrio Regional
Pan-Americano, a Organizao Pan-Americana da Sade, em 2005.
No formato em CD Rom deste livro, ensaiamos a produo de um livro eletrnico
onde fosse possvel a pesquisa da reviso de literatura por descritores, ttulos e autores.
11
2. CONCEITUALIZAO DA EDUCAO EM SADE SUPLEMENTAR E O
SUPORTE DA ANLISE ECONMICA EM SADE
2.1. Educao em sade suplementar: abertura de um eixo reflexivo na Educao em
Cincias da Sade
Ricardo Burg Ceccim
Alcindo Antnio Ferla
A potncia de indicar a existncia de um segmento na Educao em Cincias da
Sade que se organiza com os aspectos de relevncia sade suplementar, designado como
Educao em Sade Suplementar, est na oportunidade de organizar uma reflexo que
envolva a formao para o trabalho em sade, segundo as implicaes que o trabalho
educativo com o conhecimento da sade suplementar possa aportar qualificao desse
subsetor no mbito do Sistema nico de Sade.
Para entender: existe uma Educao em Cincias da Sade?
A Educao em Cincias da Sade uma designao ampla que remete tanto aos
processos educativos que visam formao e ao desenvolvimento para o trabalho em sade
como educao nas profisses da sade, configurando ncleo temtico de saberes e de
prticas s grandes reas de conhecimento da Educao e da Sade. Como ncleo temtico,
surgiu com a reforma do ensino mdico nos Estados Unidos da Amrica no incio do sculo
XX. Essa reforma foi resultado de um processo de avaliao do ensino e da poltica
educacional coordenado por Abraham Flexner. O rigor disciplinar de Flexner representou
um eficiente trabalho de consolidao das opinies veiculadas pelos estudos sob sua
liderana, nos anos de 1910 e 1920, terminando por sustentar que haveria um ideal
cientfico de educao a ser perseguido pelas instituies de educao mdica e, por
12
extenso, por todo o ensino nas reas identificadas com o estatuto de conhecimento
cientfico-profissional da sade (cincias biomdicas). Por todo o mundo, a modernidade
impunha os hospitais como o lugar da doena e da cura (biopoltica) e lugar melhor
indicado para a formao em medicina e em enfermagem, o que corroborou as teses
educacionais de Flexner e despotencializou outras recomendaes (Feuerwerker, 2002;
Luz, 2004; Ceccim e Capozollo, 2004; Ceccim e Carvalho, 2006).
interessante registrar que em 1920, na Inglaterra, o mdico real Lorde Bertrand
Dawson, por meio do Relatrio Dawson, documento histrico para a gesto e planejamento
de sistemas de sade, propunha uma educao da sade em crescente e ntima integrao
com o sistema de sade e a no-exclusividade dos hospitais para o ensino e como campo de
habilitao profissional. O que caracterizava esse relatrio, ao contrrio do Relatrio
Flexner, era a nfase na incorporao das prticas de ateno bsica e no a centralidade na
ateno especializada, usando a rede regular de servios como escola e no hospitais
universitrios. O Relatrio Dawson justificava e defendia o Estado como gestor e regulador
das polticas pblicas de sade, mediante uma organizao regionalizada e hierarquizada
dos servios, com nfase na integrao entre atividades preventivas e curativas, na
utilizao do mdico generalista e um mbito considerado como primeiro nvel de ateno.
Suas recomendaes se depararam com a farta contrariedade dos mdicos pela
restrio/limitao prtica liberal-privatista e pela regulao das prticas profissionais.
Em virtude das fortes resistncia s apresentadas, as recomendaes no foram adotadas, mas
influenciaram a constituio do sistema nacional de sade da Inglaterra no final dos anos
1940, com a universalizao da ateno primria sade e com a construo do conceito de
mdico generalista (Marsiglia, 1995; Ceccim e Carvalho, 2006).
No Brasil, mantido o modelo curativo individual no ensino da sade e uma
formao orientada pela cincia das doenas, na qual o corpo deveria ser entendido apenas
como o territrio onde evoluem adoecimentos e a clnica como o mtodo experimental de
restaurao de uma normalidade suposta na sade dos rgos, um esforo de ascenso da
educao superior brasileira identificou o ensino da sade com a pesquisa experimental
emergente e aprofundou o paradigma biologicista. Na dcada de 1940, foi a flexnerizao
que marcou a presena da cincia na qualificao e expanso da educao superior nas
13
profisses de sade, justificando a construo, a reforma e a ampliao de laboratrios;
definindo a construo, reforma e ampliao dos hospitais universitrios (hospitais prprios
como hospitais-escola), registrando um movimento que grassou isolado at o final dos anos
1960 com eixo na prtica individual, no modelo curativista das doenas, hegemonia da
ateno hospitalar e segundo as especialidades e a mais alta tecnicalidade possvel (Ceccim
e Carvalho, 2006a e 2006b).
Nas dcadas de 1950 e 1960, uma corrente terica orientada pelos sistemas de sade
se organiza no mundo como movimento de pensamento, o Movimento Preventivista. A
ruptura com a prtica liberal clssica em sade anunciada em nome da sade como
projeto de populao. Sade qualidade de vida! Ao final dos anos 1940, a Organizao
Mundial da Sade cunhou a definio de sade como qualidade de vida do ponto de vista
fsico, psquico e social (bem-estar biopsicossocial). O Movimento Preventivista apontou a
formao como estratgia para a transformao das prticas de sade e destacou a
necessidade de repensar quais seriam os objetivos finais de um curso de graduao na rea
da sade (qual trabalho deve ser esperado dos profissionais ao obterem uma habilitao
profissional e no qua is diplomas de graduao devem ser expedidos). Para o Movimento
Preventivista, as necessidades de sade da populao (o impacto das profisses de sade no
padro epidemiolgico e a qualidade da resposta dos servios de sade busca por
assistncia e proteo individual e coletiva) so apresentadas como o mote para a
transformao da educao dos profissionais de sade.
O movimento preventivista ampliou a visibilidade para os problemas da sade da
populao e nos anos 1960 houve um boom, nos cursos da rea da sade, notadamente, nos
cursos de medicina, enfermagem e odontologia, dos departamentos de sade pblica ou
sade preventiva, seguido, nos anos 1970, por projetos de aprendizagem em sade
comunitria. Entretanto, como bem demonstrado por Srgio Arouca, no Brasil, com a tese
O Dilema Preventivista (1975), o iderio preventivista no superaria a necessidade de
assistncia nos termos conhecidos para o tratamento das doenas, uma vez que o processo
sade-doena resulta de determinaes e condicionamentos sobre os quais no se justifica
absoluto controle, alm de expressar os modos de andar a vida com fortes componentes
sociais, polticos e de expresso da subjetividade. Surge a noo de processo sade-doena
14
em lugar da oposio sade e doena. Na Organizao Mundial da Sade, por exemplo,
traduziu-se na consigna Sade no ausncia de doena.
Nos anos 1980, experincias para a integrao ensino-servio que extrapolassem a
aprendizagem em hospitais foram desencadeadas pela rea de ensino da sade pblica
(sade preventiva e social, sade comunitria, sade coletiva) seguida das reas de pediatria
e puericultura e de ginecologia, planejamento familiar e pr-natal. Nos anos 1990, a
representao popular incorporada aos projetos de integrao ensino-servio como nova
iniciativa na formao de profissionais de sade: a integrao com a comunidade, mas
tambm nos anos de 1990 que surgem os desafios de uma formao coerente com o
processo de mudanas ocorrido no sistema brasileiro de sade. Entre 1986 (VIII
Conferncia Nacional de Sade) e 1992 (IX Conferncia Nacional de Sade) ocorre a
construo do Sistema nico de Sade, sua aprovao constitucional, a definio de seus
princpios e diretrizes, sua regulamentao em lei e o incio dos processos de
municipalizao.
Na medicina, a Avaliao do Ensino Mdico (Comisso Interinstitucional Nacional
de Avaliao do Ensino Mdico - Cinaem) e, na enfermagem, o Movimento pela Educao
em Enfermagem (Seminrio Nacional de Diretrizes para Educao em Enfermagem)
propem, na medicina, que preciso desflexnerizar a profisso mdica, orientando o
trabalho mdico pelo trabalho em sade (equipe) e pelas necessidades em sade (no pelas
doenas) e, na enfermagem, que preciso a substituio do paradigma da assistncia pelo
paradigma do cuidado humano e que as prticas deveriam estar voltadas para as demandas
de sade da populao e no das instituies hospitalares. Ocorrem a incluso dos
estudantes e dos gestores das polticas setoriais na avaliao do ensino e na construo das
metas curriculares. Surge, em 1992, o conceito de Sade como Defesa da Vida: somente a
integralidade poderia desfazer a polaridade assistencialismopreventivismo; formao e
sistema de sade deveriam caminhar juntos renovando e reinventado as prticas em sade e
a participao da populao deveria justificar a construo do sistema, das prticas e da
formao (Ceccim e Feuerwerker, 2004).
Pode-se falar, portanto, de uma histria dos movimentos de mudana na Educao
15
em Cincias da Sade, reafirmando-se a existncia desse segmento entre as cincias da
Educao ou no interior da rea da Sade Coletiva, uma vez que pode ser estudado como
desafio construo da formao e desenvolvimento dos profissionais e do prprio trabalho
no setor da sade, como afirmao do maior acolhimento aos problemas de sade vividos
pela populao e como maior engajamento na construo de um sistema de sade orientado
pela integralidade no cuidado individual ou coletivo e na gesto de sistemas poltico-
sanitrios e servios assistenciais.
Nos ltimos anos, ampliaram-se significativamente as formulaes, debates e
reunies cientficas em torno da Educao em Cincias da Sade devido formulao das
Diretrizes Curriculares Nacionais pelo Conselho Nacional de Educao, que gerou uma
ampla mobilizao das carreiras, notadamente, as de medicina, enfermagem, nutrio,
farmcia, odontologia, fisioterapia, terapia ocupacional e fonoaudiologia em substituio ao
conceito de currculo mnimo, entre 1997 e 2004, e pela aprovao, pelo Conselho Nacional
de Sade, da Poltica Nacional de Gesto do Trabalho e da Educao na Sade, proposta
pelo Ministrio da Sade em 2003. O Conselho Nacional de Sade aprovou, como poltica
pblica, o documento Poltica de Formao e Desenvolvimento para o SUS: Caminhos para
a Educao Permanente em Sade (Resoluo CNS n 335, de 25 de novembro de 2003).
Esse documento foi o marco para a definio do campo de saberes e prticas da Educao e
Ensino da Sade, envolvendo 11 aes estratgicas (Ceccim, 2007), entre elas a Educao
Permanente em Sade (Plos interinstitucionais e locorregionais); a mudana na formao
de graduao (AprenderSUS); o projeto de Vivncias e Estgios na Realidade do SUS para
estudantes de graduao (VER-SUS); a reviso da poltica de especializaes em servio e
residncias mdicas (Residncias Integradas em Sade), a Educao Popular em Sade
(que gerou a Articulao Naciona l de Movimentos e Prticas de Educao Popular em
Sade Aneps) e a Pesquisa sobre o ensino da integralidade em sade (EnsinaSUS).
Tambm h um aumento recente nas publicaes de livros e principalmente
coletneas sobre ensino em sade (Batista e Batista, 2004; Batista; Batista e Abdala, 2005;
Pinheiro, Ceccim e Mattos, 2006). Os programas de ps-graduao em educao, em sade
coletiva e de desenvolvimento do ensino superior, no Brasil, tm sido os espaos
privilegiados de produo de conhecimento da Educao em Cincias da Sade.
16
Porque a Educao em Sade Suplementar
A Educao em Cincias da Sade multifacetada e abarca vrios subtemas e
objetos de produo de conhecimento: gesto da educao na sade ; formao docente;
currculos e reformas curriculares; diretrizes curriculares nacionais; educao dos
profissionais e insero no mercado de trabalho ; integrao ensino-servio/docente-
assistencial; integrao formao-ateno-gesto-participao ; currculos integrados;
metodologias de ensino e de avaliao; polticas de desenvolvimento de pessoal da sade;
coletivos organizados de produo da sade; educao permanente em sade, residncia
mdica e em rea profissional da sade; residncia integrada em sade; escuta pedaggica
da clnica e dos servios; educao a distncia e a educao nas reas especializadas das
polticas pblicas de sade, donde se faz possvel falar de uma educao em sade coletiva
e, por que no, de uma educao em sade suplementar, entre outras.
A existncia de uma Educao em Sade Suplementar como segmento da Educao
em Cincias da Sade configura uma construo/formulao (saberes) e um perfil de
execuo/implementao (prticas) para o ensino e a pesquisa- interveno em educao. A
relevncia de depararmo-nos com esse segmento est na oportunidade de organizar uma
reflexo que envolva a formao e suas implicaes para o trabalho em sade, uma vez que
ocorre o privilgio da dade gesto-ateno (presente em qualquer debate setorial) e ocorre
a secundarizao dos efeitos de subjetivao que a educao produz, aceitando-se (por falta
de priorizao) que a educao seja igual a transferir informao e treinar habilidades. Nada
mais comum que supor a educao como secundria e decorrente dos processos de gesto
do trabalho e da poltica social, quando a educao , ela prpria, a montagem de
sociabilidades e subjetividades, o disparo de devires, a apreenso e compreenso de saberes
e a construo do conhecimento e de sentidos. A educao no conseqncia, ela
inveno, convocao, seduo.
Entendemos que um objeto subjacente ao assinalamento de uma Educao em
Sade Suplementar apreenso de legitimidade a um processo de regulao pblica que
extrapole o controle de Estado sobre o mercado de prestao de servios de sade
17
(observao e normatizao entre demanda e oferta + vigilncia da capacidade de honrar
compromissos com o cliente) e inclua a interferncia ativa na produo da sade que ocorre
no subsetor (a capacidade de promover sade e autonomia dos usurios no andar da sua
sade nos modos de operar modelos assistenciais e linhas de cuidado). Malta et al. (2004, p.
436) acentuam que h um dficit de conhecimento e de ferramentas que possibilitem essa
nova perspectiva de interveno e que uma regulao de Estado nesse mbito dever ser
precedida por um processo de apreenso dessa dimenso, o que incluiria compreender
como os mecanismos assistenciais ocorrem no cotidiano e como linhas de cuidado se
tornam analisadores do modelo assistencial (Ceccim e Ferla, 2006).
Surgem, ento, como relevantes a apreenso e compreenso da cultura dos usurios,
os itinerrios teraputicos que selecionam, respeitam, valorizam ou esto constrangidos a
percorrer; a apreenso e compreenso dos sistemas profissionais de cuidado e cura, as
racionalidades e as lgicas que os profissionais selecionam, respeitam, valorizam ou a que
esto coagidos por protocolos, glosas e auditorias e ainda a apreenso e compreenso dos
interesses dos usurios (segmentos sociais de idade, gnero, vivncia ou convivncia com
patologias etc), expressos como patrimnio do consumidor (cidado portador de direitos)
ou como direito consumerista (proteo legal). Alm das duas grandes sesses,
reconhecidas na dade gestoateno de que falam variados analistas de sistemas de sade
(a formulao de polticas, conduo gerencial, sistemas de informao e avaliao de
resultados e impactos + a integralidade segundo redes relacionais, prticas cuidadoras,
desfragmantao da clnica e superao das diretrizes biologicistas), reconhecemos uma
terceira, introduzida pelo debate na esfera do direito com a presena dos rgos de defesa
do consumidor1, mas queremos introduzir uma quarta relevncia: a apreenso e
compreenso da educao que empreendemos junto aos trabalhadores em formao ou em
servio, os imaginrios presentes no ensino e subjetivao educacional, os cenrios de
vivncia e experimentao, os fatores de exposio pedaggica ao saberes da sade e ao
saber-se em atos de sade. 1 Para a professora Cludia Lima Marques, da Faculdade de Direito, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a situao de vulnerabilidade dos consumidores diante do sistema econmico capitalista indica a necessidade de o direito reequilibrar as relaes de consumo, reforando, quando possvel, a posio do consumidor ou proibindo e limitando certas prticas do mercado. A relao entre consumidor e prestador no comercial ou civil, consumerista. O consumidor o ente mais vulnervel nas relaes capitalistas e a ele que o direito deve se voltar (Marques, 1999).
18
Por exemplo, o questionamento sobre a cobertura de todas as patologias, a
autonomia na solicitao de exames e procedimentos, a garantia de medicamentos ou
planos de assistncia farmacutica, a complementaridade de abordagens, a necessidade de
uma ao educativa continuada etc. feita desde o reconhecimento da ampliao de
autonomia dos usurios no andar da sua sade ou segundo os valores de centralidade na
abordagem mdica, de padro biomdico e de autonomia liberal (as doenas, mas no os
adoecimentos como objeto de ateno sade; os procedimentos tcnicos, mas no as
prticas cuidadoras como objeto de interveno nos adoecimentos)? Por que se desejaria
uma integralidade da ateno: pelo mximo acesso ao mximo de recursos e tecnologias
ou pela maior escuta e melhor correspondncia s necessidades em sade? Precisaramos,
ao longo da formao, alm de uma suficiente exposio s aprendizagens por
sensibilidade, um suficiente debate (apreenso e compreenso) quanto s distines
pblico-privadas nos modelos de ateno, nas linhas de cuidado, nas ofertas de equipe de
sade, na constituio de redes sociais, na medicalizao-desmedicalizao, na promoo
de sade conectada com processos do viver, na conexo de prticas teraputicas com
vivncias singulares e na responsabilizao com os usurios. necessrio apreender e
compreender que a desconexo e desarticulao de atos assistenciais correspondem
inefetividade dos mesmos e induzem a um oneroso consumo de procedimentos e
medicamentos de baixa resolubilidade ao evento realmente vivido. O que se idealiza como
promessa no privado ou se denuncia como ausncia no pblico dificilmente resulta de uma
adequada apreenso e compreenso sobre eficcia e efetividade das interpretaes
diagnsticas e condutas prescritas, tendo em vista as pessoas, com seus componentes
afetivos, sociais e culturais.
O percurso que os usurios empreendem pelos vrios sistemas de ateno
(profissionais, informais e populares) no podem ser contidos por planos, programas e
protocolos; o baixo vnculo e responsabilizao dos profissionais (inclusive por falta do
conceito/prtica em equipe), entretanto, incentivam percursos acrticos e aleatrios (pela
baixa confiana, no pela construo das conjugaes profissional- informal-popular); a
ausncia de linhas de cuidado induz ao consumo de exames, procedimentos e
medicamentos em condutas paliativas de baixa resolubilidade presentes em diversos pontos
dos sistemas profissionais, informais e populares, ou seja a ausncia de regulao do
19
modelo assistencial se mostra temerria sade pblica e irresponsvel com o direito
integralidade da ateno sade na existncia constitucional do Sistema nico de Sade.
Malta et al. (2004, p. 435) mostram-nos o quanto o processo de regulao ainda
incipiente, argindo que isto expe necessidade do enfrentamento de temas mais
complexos e estruturantes pela presena da desafiadora necessidade de entender a
natureza dessa regulao (...), a dimenso da organizao do subsetor, o financiamento da
oferta de servios, as modalidades assistenciais, suas redes e a complexidade dessas
relaes.
Com bastante tranqilidade afirmamos que no exerccio da sade , mesmo que o
trabalho vivo seja capturado pela ao programtica, pela protocolizao da assistncia ou
pela gesto autoritria ou restritiva, no possvel a supresso da margem de liberdade
existente nas relaes cuidadoras propriamente ditas, isto , na interao profissional-
usurio, uma vez que sempre instituinte (aqui-e-agora, in actu, criativa). Entretanto,
justamente essa autoria e liberdade que esto suprimidas quando um processo educativo
orientado pela fragmentao, desconexo e tecnicalidade biologicista preencheu a
subjetividade (modos de pensar-sentir-querer) do trabalhador em formao. Um pensar-
sentir-querer fala de uma vontade de realidade, de um movimento ativo e inconsciente de
montar mundos, pessoas e entornos. Portanto, ao falarmos do enfrentamento de temas
complexos, da instituio de processos inovadores e da transformao de sistemas de
pensamento ou da legitimao de transformaes, a educao no pode de maneira
nenhuma ser preterida.
Distino da Educao em relao dade GestoAteno e ao analisador
Participao
A Sade Suplementar um campo novo, no qual a produo do conhecimento
ainda incipiente. Para muitos militantes do Sistema nico de Sade soa como traio
estudar e compreender a sade suplementar, uma vez que entendem a regulao como a
defesa das relaes de mercado e como aceitao da sade como mercadoria. H uma
20
trajetria paradoxal no amadurecimento do Sistema nico de Sade no que se refere ao
princpio da universalizao, diretriz da integralidade e ao objetivo da eqidade. Soa
confuso e contraditrio qualificar a Sade Suplementar e defender o Sistema nico de
Sade, donde apreender e compreender com propriedade o campo regulatrio
contribuiria, tanto ao maior rigor no cumprimento do objetivo de eqidade do SUS para o
conjunto da populao (em um sistema econmico que no temos o poder de mudar sem
um processo histrico), quanto ao maior rigor no cumprimento da finalidade institucional
da Agncia Nacional de Sade Suplementar (criada no interior do Sistema nico de Sade
para promover a defesa do interesse pblico na assistncia suplementar sade). Agncia
Nacional de Sade Suplementar compete a fiscalizao dos aspectos concernentes s
coberturas, mas tambm o cumprimento da legislao em sade no tocante aos aspectos
sanitrios e epidemiolgicos e o zelo para com a qualidade dos servios de assistncia
sade.
A Agncia foi criada apenas em janeiro de 2000 e a inveno de uma Educao em
Sade Suplementar poder produzir na base da educao dos profissionais de sade
mais que importante subsdio sua misso regulatria, a apreenso e compreenso dos
sentidos (o para qu) da regulao. A Cmara de Sade Suplementar integrada pelos
Conselhos Federais de Medicina, Odontologia e Enfermagem, a maior cobertura dos planos
e seguros privados de sade a da assistncia mdica e odontolgica, alm de hospitais,
laboratrios e servios de apo io diagnstico e teraputico. Deve haver atendimento aos
portadores de transtornos mentais e acesso fisioterapia sempre que recomendada pelo
mdico. Incluem-se nas coberturas de terapias e atendimentos ambulatoriais os
atendimentos de psicologia, fisioterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional. Pelo menos
sete carreiras curriculares de educao superior na sade, portanto, esto envolvidas com o
trabalho e as normatizaes em sade suplementar. Estudam alguma coisa a esse respeito?
Uma Educao em Sade Suplementar subsidia a misso regulatria da ANS no
tocante compreenso dos elementos que constituem a regula o e, no interior da
formao, problematiza o perfil dos trabalhadores da sade, introduzindo a regulao na
composio do ser trabalhador da sade. De maneira imbricada, fortalece as bases para o
exerccio da microrregulao na sade suplementar como desdobramento da defesa de uma
21
cidadania de interesse social.
Num processo de educao, o que ocorre o disparo de subjetivaes. Pode-se
entender a subjetivao como a construo do sujeito identitrio , a transformao de um
indivduo em uma identidade de ser, comportar-se e intervir ou como a construo de um
sujeito em processo de criao, assumindo para si e tambm publicamente quadros de
valores em mutao. A educao menos um processo onde as verdades so apresentadas e
mais uma vivncia-experimentao de ser e estar em coletivos de produo, aceitando a
ativao de mudanas, acolhendo devires, no necessariamente de maneira consciente, mas
de maneira viva. A educao opera produes de cotidiano, aposta em novas relaes (por
interao), tentando construir a aceitao da mudana, a inveno, como ato criativo do
estar junto, do encontrar-se com o outro, do desapegar-se de regras que no implicam
aprender a cuidar e, assim, cuidar do aprender.
A educao no ocorre sobre o nada, por isso fala-se tanto da correspondncia entre
educao e mudana. Mecanismos de sujeio e subjetivao das pessoas esto presentes
no funcionamento histrico dos va lores e das instituies (razo moral) e vrias tcnicas
que se aplicam sobre os sujeitos na construo de sua moral (o que cada um vai
aceitar/tolerar e o que no vai). Uma iluso de liberdade cerca os mecanismos de sujeio.
Uma vez que um indivduo no possa estar em autopoiese, ele refm da moral (Varela e
Maturana, 1995).
Os mecanismos de regulao normativa se aplicam muito facilmente sobre a gesto,
que deles no pode prescindir, uma vez que a partir deles constri sua natureza, e sobre a
ateno, uma vez que pode ser protocolizada, pactuada, avaliada e mesmo auditada (sobre a
qual se aplicam treinamentos e capacitaes). A abertura aos usurios, mediante mltiplas
formas convencionais de escuta (pesquisa de opinio e satisfao, ouvidoria, valorizao de
denncias e respeito aos valores informados pelos mecanismos de defesa do consumidor)
deveria ser elevada, entretanto, ao entendimento da escuta como analisador de processos
cuidadores (pesquisa de itinerrios teraputicos, ampliao e valorizao dos rudos em
linhas de cuidado, traduo das necessidades em sade em demandas de ateno). A
distino da educao vai surgir ao perguntarmos qual seu papel na transmisso de saberes?
22
Nas relaes de poder? Na constituio de um sujeito? Sob quais regras embasa seu
funcionamento? Podemos compreender a formao como um eficiente instrumento capaz
de articular poderes e subjetividades, distingui- la serve para que sua introduo se preste
aos mecanismos de enfrentamento daquilo que nos afasta da produo de sade centrada
nos usurios e suas necessidades, estabelecendo um contraponto s formas esgotadas para
produzir sade que seguem arraigadas nos sistemas de pensamento profissional e
institucional (Ceccim, 2005). Uma formao no disciplinar (mecanismo de operar uma
modulao identitria), mas que no a exclui e sim a integra, prope, aponta, faz surgir
coisas novas. A experincia coletiva, quando de educao no disciplinar, gera motivao e
responsabilidade para indivduos e instituies.
A educao no o que centraliza a informao; a informao est em inmeros
bancos de dados, nos peridicos, em livros, trocada em eventos e acessada em endereos
eletrnicos por todo o mundo. Interessa educao que os indivduos sejam levados a falar
sobre si mesmos, a educao est diretamente relacionada s experincias que um sujeito
faz de si mesmo. Prticas como as de auto-avaliao e da escrita sobre questes-poblema
para si, aportam reflexes sobre si prprio e formulao da subjetividade individual. A
educao trata de um conjunto vivo de significaes, no qual tudo est em contato com
tudo. Uma pedagogia por fatores de exposio que traz tona a intimidade, corporificando
e impondo relaes sociais.
Conhecimentos e prticas para uma Educao em Sade Supleme ntar
O imaginrio liberal-privatista atravessa o que se ensina sobre sade desde a
educao infantil at a ps-graduao das reas clnicas em sade, uma concepo marcada
pela prtica de consultrio, pelo atendimento individual embasado na dade diagnstico-
prescrio, tendo a doena como referncia e o curativismo biologicista como paradigma.
Esse imaginrio no tem sido colocado em questo mediante aproximaes concretas ao
mercado de trabalho em sade, regulao do subsetor privado-suplementar e aos
itinerrios teraputicos efetuados por usurios e profissionais em busca da resolutividade
dos problemas de sade identificados, alm de suas implicaes cidadania e promoo
23
da sade como responsabilidade setorial e profissional.
Ao preservarmos, como sociedade do conhecimento, um ensino de sade, em todos
os nveis de escolarizao, que privilegia a perspectiva liberal-privatista e no coloca em
anlise as relaes entre pblico e privado no ordenamento do Sistema nico de Sade, no
contribumos para a real compreenso e apropriao da cidadania, para a eqidade e
solidariedade entre as classes sociais no direito sade como dever do Estado para com
toda a populao e para uma cincia com relevncia pblica associada ao mrito
acadmico.
A construo de referncias e sentidos educao e pesquisa configuram o
primeiro passo na identificao do que e como ensinar e pesquisar na academia
relativamente sade suplementar, escapando do iderio liberal-privatista para uma anlise
de sociedade e sade, trabalho e mercado em sade, educao em sade para a cidadania
plena de todas as classes sociais, problemas e dificuldades na implementao do SUS e
regulao pblica no interesse da coletividade.
Um campo de interesse educao em sade suplementar rene a familiarizao
com os cenrios da sade suplementar no Brasil: inventrio e anlise de situao da
regulao, cobertura assistencial e dinmica de atores com atuao subsetorial; a relao
pblico-privado e os arranjos tecnoassistenciais na utilizao de servios de sade como
estudo de itinerrios teraputicos e rudos em linhas de cuidado e os imaginrios sobre a
perspectiva pblica e privada do trabalho em sade, estudando os cursos de graduao das
profisses representadas no campo.
A realidade do ensino apresenta-se como um cenrio onde carente a identificao
de referncias e sentidos ao ensino e pesquisa da sade suplementar na conduo regular
dos cursos de graduao em sade, no se compondo currculos que minimamente dem
conta do conhecimento relativo regulao do subsetor privado-suplementar de sade
como um fator de cidadania coletiva ou de base populacional que perpasse trabalhadores de
sade autnomos ou empregados, gestores pblicos dos sistemas de sade e gestores
privados das aes e servios de sade, usurios individuais e coletivos de servios
pblicos e de servios privados de sade e docentes e estudantes dos diversos cursos da
24
rea da sade, em seus diversos nveis educacionais.
A perspectiva de um ensino que, com naturalidade, aborde a operao de um
sistema de sade que seja nico quanto aos interesses da populao, ainda que executado
por um subsetor estatal e outro privado-suplementar, tornar nico o debate da qualidade e
dos acessos s aes e servios de sade, no mais se podendo conviver, diante da
educao e da produo de conhecimento acadmico, com a dicotomia, tal como hoje
existente, no pensamento, na gesto, na avaliao e nas perspectivas de trabalho entre um
subsetor muitas vezes designado como desqualificado e destinado aos pobres (uma oferta
pobre para uma populao pobre no imaginrio profissional) e um subsistema designado
como qualificado e destinado aos que podem pagar (uma oferta nobre para uma populao
nobre no imaginrio profissional). De qualquer modo, desde um ponto de vista da cincia
na profisso, h um imaginrio da autonomia profissional e privativizao da teraputica
que suprime de subjetividade, de alteridade e de singularidades nos modos de andar a
vida o outro da clnica, constrangendo-o pura natureza (biologia, anatomia,
fisiopatologia) ou poder econmico (que plano/seguro pode pagar), onde sade-doena
sinnimo de sinistralidade. O subsetor estatal e o subsetor suplementar no so os
segmentos pblico e privado do setor da sade, co-existem no interior do Sistema nico de
Sade, ambos preenchem o espao pblico representado pelo cuidado e proteo sade. O
setor da sade de relevncia pblica e sua natureza estatal ou da iniciativa privada no so
garantia da presena ou ausncia de razes pblicas. J o contole da sociedade na
deliberao ou regulao so garantias de novos espaos pblicos.
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PINHEIRO, Roseni; CECCIM, Ricardo Burg e MATTOS, Ruben Araujo de (org.). Ensinar sade : a integralidade e o SUS nos cursos de graduao na rea da sade. Rio de Janeiro: IMS/Uerj: Abrasco, 2006, 333p.
27
2.2. Economia da sade: reflexes acerca de suas contribuies para o ensino e
formao em sade
Janice Dornelles de Castro
Maria Lectcia Machry Pelegrini
Ricardo Burg Ceccim
Introduo: o que a Economia da Sade
Uma das principais caractersticas da cincia econmica a diversidade de
possibilidades de explicao sobre os fatos da realidade, sendo sempre possvel o
questionamento. No se trata de uma cincia feita de verdades absolutas. Santos (2005) diz
que sob a denominao de economia poltica no apenas encontramos diferentes
abordagens, como no raras vezes abordagens incompatveis das questes econmicas.
Ainda assim, existem algumas unanimidades como, por exemplo, a definio de seu objeto
de estudo: a economia a cincia que se ocupa de estudar o melhor uso dos escassos
recursos disponveis na sociedade. J sobre qual o melhor uso ou como fazer a distribuio
destes recursos o que existe so divergncias e no a unanimidade. A Economia se
desenvolve com base em muitas polmicas, no havendo uma linha reta na cincia
econmica. Se os recursos so escassos, por que o so? H escassez ou concentrao? H
m distribuio ou h apropriao por parcelas ou segmentos de cidados?
Considerando a unanimidade, qual o melhor uso para os escassos recursos
disponveis na sociedade? Desta questo, decorrem todos os estudos relacionados com a
produo, distribuio e consumo de mercadorias. a sade uma mercadoria? Se no fo r,
existiria uma Economia da Sade? possvel comprar ou vender sade? A sade possui
valor de uso, mas no valor de troca. Sabemos que existe um processo de trabalho,
concretizado e explicitado pelo conjunto das aes de sade que afetam positiva ou
negativamente a condio de sade das pessoas. So essas aes de sade que podem ser
compradas e vendidas no mercado. Essas aes so uma mercadoria e afetam diretamente a
condio de sade das pessoas, no entanto, o estado de sade das pessoas sempre uma
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incgnita, no possvel prever quando ou quanto ou qual a ao que deve ser consumida.
Esta condio imprevisibilidade uma caracterstica prpria da prestao de servios de
sade. Foi a partir desta discusso que Kenneth Arrow, em 1963, tornou-se o precursor de
uma nova rea da economia, a Economia da Sade, discutindo a incerteza e o acesso aos
cuidados mdicos.
Esta rea tem assumido importncia crescente nas discusses econmicas desde
ento, tambm pela dinamicidade e capacidade produtiva do setor. O diagrama de Williams
(abaixo), apresentado pela primeira vez em 1987, procura mostrar como se estabelecem as
relaes que existem no setor da sade e quais as reas de influncia da Economia da
Sade.
Diagrama de Williams (Adaptado de Barros, 2005)*
* O Diagrama de Williams encontra-se na obra do portugus Pedro Pita Barros, da Faculdade de Economia, da Universidade Nova de Lisboa (Barros, 2005).
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Como podemos observar no diagrama, existe uma teia de relaes que se
estabelecem entre os diferentes blocos analticos. Cada um dos blocos procura sintetizar as
complexas relaes que se do na realidade. No primeiro bloco, o autor coloca a questo
fundamental que definir todas as outras: o que influencia a sade? Esta pergunta est
relacionada com o conceito de sade que cada sociedade assume, entre esses, que sade o
conjunto de condies que levam ao bem estar do indivduo . Assim, praticamente todas as
variveis analisadas numa realidade social poderiam afetar o nvel ou o estado de sade de
um cidado. Como atribuir um valor vida? Quais os ndices que podem medir um estado
de sade? Muitas vezes se estabelecem limites para este conceito por meio da definio de
padres ideais de consumo de aes de sade. Por exemplo, qual a interferncia do
comportamento do mdico no uso dos servios de sade e quais os estudos de demanda
disponveis? Foram consideradas todas as barreiras de acesso? Esses fatores/limites
remetem discusso do conceito de necessidade em sade.
Considera-se tambm nos estudos econmicos a avaliao de custos dos servios e
da efetividade em todas as suas formas; a discusso de planejamento, oramento e
avaliao dos sistemas de sade; as listas de espera e os critrios de eqidade. Todas essas
discusses esto afetas Economia da Sade e, hoje, so fundamentais para a anlise do
setor. Percebe-se, assim, que no existe uma nica abordagem para a questo da Economia
da Sade, esta a razo pela qual procuramos apresentar neste trabalho algumas das
diferentes abordagens que contribuem para a construo dessa rea de conhecimento, tendo
em vista facilitar a familiaridade com seus termos para professores e estudantes da rea da
sade.
Um pequeno passeio pelo pensamento econmico
Um dos principais pensadores da economia foi Adam Smith, que publicou a obra
intitulada A riqueza das Naes, em 1776. O livro foi escrito a partir da experincia da
revoluo industrial inglesa. Para os clssicos, o liberalismo e o individualismo eram
vinculados ao bem comum e, ao maximizar a satisfao com o mnimo de esforo, os
homens estariam contribuindo para alcan- lo. O fator de harmonizao, conforme Adam
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Smith, era feito pela mo invisvel. O pensamento clssico fundamenta-se, segundo Souza
(2001, p.45) no individualismo, na liberdade e no comportamento racional dos agentes
econmicos, com mnima presena do Estado. O Estado teria como funes precpuas,
nesse pensamento, a defesa, a justia e a manuteno de certas obras pblicas.
A obra de Smith, ao discutir as questes das liberdades naturais, da mo invisvel e
dos interesses privados, serve de modelo para diversas teorias posteriores de explicao da
realidade, inclusive as que defendem a no interferncia do Estado nas questes
econmicas, como, por exemplo, os que apiam a privatizao dos servios pblicos em
especial os de sade.
Jean Baptiste Say (1768-1832), que estabeleceu a lei de Say, diz que a oferta cria a
sua prpria demanda, ou seja, o aumento da produo transformar-se-ia em renda dos
trabalhadores e empresrios, que seria gasta na compra de outras mercadorias e servios
(Vasconcelos e Garcia, 2001, p. 17). Esta idia bastante difundida e, com embasamento
nesta premissa, acredita-se que basta criar a oferta e haver demanda para os servios de
sade. Sem dvida uma importante questo a ser respondida no momento de planejar a
necessidade de servios, seu financiamento ou, ainda, o montante de recursos necessrios
para o financiamento dos sistemas de sade ou para a manuteno da higidez da populao.
Qual o nosso objetivo, afinal?
muito difcil resumir em poucas linhas a contribuio e o impacto do pensamento
de Marx para o pensamento econmico. O enfoque marxista apresenta caractersticas
bastante diferentes das teorias econmicas mais conhecidas, mas podemos dizer que a
questo que fundamenta seu pensamento e a mais importante a teoria da explorao ou da
mais-valia. Para Marx, o trabalho humano produz valor, mas o capitalista no paga ao
trabalhador por todo o valor produzido, apropriando-se de parcela deste valor: a maisvalia.
Aqui, aparece a idia da produo de excedente por meio do trabalho humano. Para a
economia expandir-se necessria a transformao de sua estrutura produtiva ou a criao
de novos mtodos de produo que vo aumentar a produtividade do trabalho e,
conseqentemente, da maisvalia. A questo da introduo do progresso tecnolgico se
apresenta como uma sada para as crises do capitalismo. Fica como contribuio do
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pensamento marxista a possibilidade de discutir o setor da sade como produtor de mais-
valia e o papel do desenvolvimento de novas tecnologias.
No pensamento da escola Marginalista, o valor depende da utilidade marginal.
Deste modo, quanto mais raro e til for um produto, tanto mais ele ser demandado e
valorizado, aumentando, assim, o seu preo. Desse modo, os fatores tm o preo definido
por sua utilidade e escassez, enquanto na Escola Clssica o valor era determinado pela
quantidade de trabalho incorporado nos bens (Souza, 2000).
Alfred Marschall (1842-1924), no livro Princpios de economia, de 1890, props
a sntese neoclssica, buscando conciliar o pensamento clssico e marginalista. Para o
autor, o valor, as quantidades demandadas e os preos dos bens so determinados no
mercado pela utilidade marginal de cada um, enquanto o equilbrio parcial de um bem se d
pela interao da oferta e da demanda no mercado.
Uma das principais reaes ao liberalismo econmico foi representada por Vilfredo
Pareto (1884-1923) que criticou a teoria vigente por afirmar que o bem-estar social
alcanado pela maximizao das funes de utilidade e lucro individual. Estabeleceu o
timo de Pareto, onde o ponto de equilbrio alcanado quando possvel aumentar o
bem-estar de um sem diminuir o bem-estar de outro.
Alm de Pareto, Arthur Pigou (1877-1959) em sua obra A economia do bem-estar
criticou a idia liberal de que o bem-estar social resultado da somatria do bem-estar de
cada um, este somatrio pode levar, em economia de livre mercado, a um ponto de
equilbrio geral abaixo do ponto timo potencial. Introduziu, ento, os conceitos de
economia e deseconomia externas: quando o Custo Marginal Social menor que o Custo
Marginal Privado.
A grande depresso dos anos 1930, com a falncia de inmeras empresas e o
aumento do desemprego foi um dos principais fatores que impulsionou as crticas ao
liberalismo e a aceitao com mais facilidade da interveno do Estado na economia. O
Estado deve intervir para garantir o direito de propriedade e tambm a liberdade de
mercado, com um maior nvel de emprego.
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John Maynard Keynes (1883-1946) na sua obra principal, a Teoria geral do
emprego, do juro e da moeda, procurou apontar solues para a crise do mundo capitalista.
Mostrou que a economia pode ser representada pelo fluxo circular de produto e renda, onde
o valor dos bens e servios produzidos (produto) tem como contrapartida os salrios, juros,
aluguis e lucros (renda). Este fluxo no funciona de forma automtica, pois existem
vazamentos, ou seja, parte da renda no volta para a economia, ou para o fluxo circular, em
funo da poupana, das importaes e do pagamento de impostos, estas so rendas
retiradas da economia. Desta forma, cabe ao Estado assegurar o investimento para
compensar os vazamentos, ou ainda, o Maior fluxo de renda estimular a demanda
agregada, retomando o caminho da prosperidade (Souza, 2000, p. 57).
Nesta poca surgiu o que foi chamado por Welfare State ou Estado de BemEstar
Social. Esta uma forma de poltica social, cujo conceito de cidadania considera que alguns
direitos so indissociveis da existncia das pessoas. Esses direitos devem ser garantidos e
fornecidos pelo Estado direta ou indiretamente. Seriam, por exemplo, a sade, a educao,
a renda mnima, os recursos adicionais para a sustentao dos filhos etc.. Muitos dos
sistemas de sade e previdncia, especialmente dos pases europeus, foram criados neste
perodo.
A segunda sntese neoclssica ou dos Neoclssicos liberais aceita alguma
participao do Estado na economia, uma vez que, para os neoclssicos liberais a
concorrncia no existe na sua forma pura e a liberdade irrestrita de mercado gera muita
instabilidade, portanto, so aceitas algumas medidas de polticas monetrias e fiscais.
Paul Samuelson (1887-1975), autor do livro Fundamento da anlise econmica
realizou a sntese do pensamento neoclssico com o pensamento Keynesiano, iniciando-se,
assim, a escola neoclssica liberal, onde
(..) havendo pleno emprego, utiliza-se integralmente as proposies tericas neoclssicas, desde que o mercado funcione segundo os postulados neoclssicos para alocar recursos e distribuir renda. Entretanto, isso s possvel com o governo adotando polticas fiscais e monetrias, regulando oligoplios e atuando na produo de bens pblicos. No caso de desemprego, a recomendao pela adoo das polticas keynesianas. (Souza , 2000, p.58).
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Os Neoclssicos conservadores so representados por Milton Friedman (1912-
2006), da Escola de Chicago, Ludwig Von Mises (1881-1973) e Friedrich Hayek (1899-
1992), da Escola Austraca. Esses autores defendem uma economia emprica, com a
excluso de qualquer juzo de valor. Para esses formuladores, a grande depresso foi
resultado de falhas do governo e no do mercado, foram as polticas econmicas
equivocadas que desviaram a economia do crescimento equilibrado. Acreditam na lei de
Say, ou seja, que o crescimento da produo gera novas rendas e demanda equivalente. No
acreditam na existncia de externalidades, portanto, no justificam a interveno do Estado,
devendo a mesma ser reduzida ao mnimo para que a mo invisvel do mercado funcione.
Sob a influncia destes pensadores foram realizados muitos processos de
privatizao, especialmente na Amrica Latina na dcada de 1990. Desestruturando alguns
sistemas pblicos de sade ou, ainda, impedindo a construo de outros. Os Estruturalistas
surgem como reao s teorias neoclssicas liberais e conservadoras no combate inflao.
Estes afirmam que a inflao tem causas bsicas (que so as limitaes e a rigidez do
sistema econmico) e causas circunstanciais (como o aumento do preo das importaes e
dos gastos pblicos), assim, o aumento de preos provocado por causas reais exige maiores
volumes de moeda em circulao.
As novas teorias de crescimento acreditam que o capital e o trabalho no so os
nicos fatores relevantes, consideram tambm o capital humano e as novas tecnologias.
Souza (2001, p.61) interpreta que o produto da economia cresce em funo da acumulao
de capital fsico, do emprego de mais trabalhadores e do aumento do estoque de
conhecimentos. Essas teorias tm trazido discusso do desenvolvimento econmico
aspectos fundamentais para a vida em sociedade. No podemos mais apenas crescer,
necessrio que este crescimento tenha reflexo nos indicadores de qualidade de vida das
pessoas.
O uso dos instrumentais da economia para a compreenso e a anlise da sade
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Economia e polticas sociais
Hfling (2001) cita Gobert e Mller, que propem como conceito de polticas
pblicas o Estado em Ao, ou seja, o Estado governo, por meio de programas e aes
voltadas para setores especficos da sociedade. Guareschi et al. (2004, p.180) definem como
o conjunto de aes coletivas voltadas para a garantia dos direitos sociais, configurando
um compromisso pblico. Esse compromisso pblico visaria dar conta de determinadas
necessidades sociais, afetas a diversas reas. Uma poltica pblica expressaria a
transformao daquilo que do mbito privado em aes coletivas no espao pblico.
As polticas sociais tm suas razes nos movimentos populares do sculo XIX, so
criadas para mediar os conflitos surgidos entre capital e trabalho durante a primeira
revoluo industrial. O Estado interfere visando a manuteno das relaes sociais de uma
determinada formao social e, por isso, essas polticas assumem feies diferentes,
gerando diferentes projetos de interveno conforme o projeto poltico da sociedade.
Para Offe (1991), o Estado atua como regulador das relaes sociais a servio da
manuteno das relaes capitalistas em seu conjunto e no especificamente a servio dos
interesses do capital a despeito de reconhecer a dominao deste nas relaes de classe.
Segundo Offe e Lenhardt (1984, p. 15), a poltica social a forma pela qual o Estado tenta
resolver o problema da transformao duradoura de trabalho no assalariado em trabalho
assalariado. O Estado capitalista moderno cuidaria no s de qualificar permanentemente a
mo-de-obra para o mercado, como, tambm, por meio de tal poltica e de programas
sociais procuraria manter sob controle parcelas da populao no inseridas no processo
produtivo.
O Estado capitalista no institui e no concede a propriedade privada, portanto, no
tem poder para interferir nela, apenas tem a funo de arbitrar e no de regular conflitos
que possam surgir na sociedade civil, onde proprietrios e trabalhadores estabelecem
relaes de classe, realizam contratos, disputam interesses etc.. Desta maneira, as polticas
sociais so reduzidas legitimao do poder, tendo um papel compensatrio das misrias
sociais.
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Os neoliberais acreditam que as polticas sociais so um dos maiores entraves ao
desenvolvimento e so responsveis, em grande medida, pela crise econmica que
atravessa a sociedade. A interveno do Estado constituiria uma ameaa aos interesses e
liberdades individuais, inibindo a livre iniciativa, a concorrncia privada, podendo bloquear
os mecanismos que o prprio mercado capaz de gerar para restabelecer o seu equilbrio.
Uma vez mais, o livre mercado apontado pelos neoliberais como o grande harmonizador
das relaes entre os indivduos e das oportunidades na estrutura ocupacional da sociedade.
As polticas pblicas, como responsabilidade de Estado, quanto a sua
implementao e manuteno, por meio dos diferentes rgos pblicos e diferentes
organismos da sociedade, referem-se s aes que determinam o padro de proteo social,
voltadas para a redistribuio dos benefcios e visando reduo das desigualdades
estruturais produzidas pelo modelo de desenvolvimento econmico; no podem ser
reduzidas apenas burocracia pblica ou s polticas estatais. Assim, podemos classificar
estas polticas de diferentes formas:
a) Polticas distributivas: so caracterizadas por um baixo grau de conflito, pois
parecem distribuir apenas vantagens e no acarretar custos, ?pelo menos
diretamente perceptveis, para outros grupos. Essas policy arenas so
caracterizadas por consenso e indiferena amigvel. Em geral, beneficiam um
grande nmero de destinatrios, todavia em escala relativamente pequena. Os
potenciais opositores costumam ser includos na distribuio de servios e
benefcios.
b) Polticas redistributivas: so orientadas pela existncia de conflito social, seu
objetivo o desvio, o deslocamento consciente de recursos financeiros, direitos ou
outros valores entre camadas sociais e grupos da sociedade, portanto o processo
poltico que visa a uma redistribuio costuma ser polarizado e repleto de
conflitos.
c) Polticas regulatrias: pressupe que custos e benefcios podem ser distribudos
de forma igual e equilibrados entre os grupos e setores da sociedade, do mesmo
modo como as polticas tambm podem atender a interesses particulares e restritos.
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Os processos de conflito, de consenso e de coalizo podem se modificar conforme
a configurao especfica das polticas. Baseiam-se em ordens e proibies,
decretos e portarias, mais ou menos negociados com a sociedade, na medida do
processo democrtico e participativo existente.
d) Polticas constitutivas ou polticas estruturadoras: determinam as regras do
jogo, e com isso, a estrutura dos processos e conflitos polticos, isto , as
condies gerais sob as quais vm sendo negociadas as polticas distributivas,
redistributivas e regulatrias. Dizem respeito criao e modelao de novas
instituies, modificao do sistema de governo ou do sistema eleitoral,
determinao e configurao dos processos de negociao, de cooperao e de
consulta entre os atores polticos.
A distino entre poltica estruturadora e scio-regulatria particularmente
importante em relao aos seus efeitos nos processos de conflito e de consenso. Enquanto
polticas scio-regulatrias versam sobre questes morais e vm sendo discutidas de forma
bastante controversa dentro da sociedade, as estruturadoras ou constitutivas so
habitualmente discutidas apenas dentro do sistema poltico-administrativo (Frey, 2000, p.
223-225) e tm conseqncias importantes para o processo poltico.
Desta forma, ressalta Hfling (2001), evidente que o processo de definio de
polticas pblicas reflete o grau de organizao ou desorganizao social, os conflitos de
interesses, os arranjos feitos nas esferas de poder que no perpassam apenas as instituies
do Estado, mas toda a sociedade. necessrio estar atento aos fatores culturais, ou seja,
queles que historicamente vo construindo processos diferenciados de representao, de
aceitao, de rejeio, de incorporao das conquistas sociais, pois onde est a explicao
para o sucesso ou fracasso de uma poltica ou programa ou, ainda, s diferentes solues e
padres adotados para aes pblicas de interveno. A relao entre sociedade e Estado, o
grau de distanciamento, as formas de utilizao de canais de comunicao entre os
diferentes grupos da sociedade e os rgos pblicos, estabelece contornos prprios para as
polticas pensadas para uma sociedade. Indiscutivelmente, as formas de organizao, o
poder de presso e articulao de diferentes grupos sociais no processo de estabelecimento
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e reivindicao de demandas so fatores fundamentais na conquista de novos e mais amplos
direitos sociais, incorporados ao exerccio da cidadania.
No Estado de inspirao neoliberal as aes e estratgias sociais governamentais
incidem essencialmente em polticas compensatrias, em programas focalizados, voltados
queles que, em funo de sua suposta capacidade e supostas escolhas individuais, no
usufruem do progresso social. Tais aes no tm o poder e freqentemente no se
propem a alterar as relaes estabelecidas na sociedade.
Funes econmicas e setor pblico
O objetivo do setor pblico deve ser o de implementar as aes que o mercado no
absorve, seja porque no so rentveis, seja por razes de Estado. As principais funes
econmicas do setor pblico so:
a) Funo alocativa: o governo fornece o que no adequadamente ofertado pelo
mercado. o caso dos bens pblicos cuja principal caracterstica a no excluso
do consumo. Depois de definido o volume de produo, o fato de algum no
utilizar o bem ou servio ofertado no significa que possa haver a reduo fsica da
oferta deste bem para os demais. Um exemplo a segurana pblica. importante
salientar que existe diferena entre os bens de consumo coletivo e os bens pblicos,
os bens de consumo coletivo apenas sero considerados bens pblicos quando o seu
consumo no estiver saturado, como por exemplo, uma praia lotada, quando um
indivduo sai, beneficia os demais, neste caso dizemos que no um bem pblico
puro. Temos ainda os bens semi-pblicos ou meritrios, so aqueles que mesmo
satisfazendo o princpio da excluso, so produzidos pelo Estado. Por exemplo, a
oferta de servios de sade.
b) Funo distributiva: o governo atua, atravs da tributao, como um
redistribuidor de rendas, retirando recursos dos grupos ou regies mais ricas e
transferindo para os menos favorecidos. Esta tarefa deixada nas mos do mercado
teria como resultado, a influncia da dotao inicial do patrimnio de cada um, na
sua produtividade individual. O mercado no consegue fazer uma justa distribuio
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de renda.
c) Funo estabilizadora: o pleno emprego e a estabilidade de preos no ocorrem
de forma automtica, ento o Estado atua por meio de instrumentos de poltica
fiscal, monetria, cambial, comercial e de rendas para garantir a estabilidade. O
mercado no consegue se auto-regular em relao a produo e ao crescimento dos
preos.
d) Funo de crescimento econmico: o Estado atua na implantao de polticas
com o objetivo de aumentar a formao de capital ou os investimentos pblicos
(infra-estrutura) e os financiamentos para os investimentos privados. Para alguns
autores, esta funo se confunde com a funo alocativa.
Tributao
Para o Estado cumprir as suas funes necessita de recursos que so arrecadados na
sociedade e que compem a sua receita fiscal, os chamados tributos. Estes podem incidir
sobre a renda ou sobre os usos (impostos sobre consumo). A tributao segue alguns
princpios:
a)