SOBRE “A FÍSICA NO ESPIRITISMO” – A CRÍTICA DE UMA CRÍTICA
José Edmar Arantes Ribeiro
PREÂMBULO
Neste artigo comentaremos os vários erros de “A Física no Espiritismo”, trabalho de
Érika de Carvalho Bastone apresentado no VIII Simpósio Brasileiro do Pensamento
Espírita, ocorrido de 17 a 19.10.2003 em Santos-SP. Os simpósios brasileiros do
pensamento espírita, eventos bienais, são organizados pelo Instituto Cultural Kardecista de
Santos (ICKS).
O primeiro contato que tivemos com o artigo da Srta. Érika ocorreu em maio de
2007, através do grupo do Google “Estudos Científicos Avançados de Espiritismo”
(ECAE). Ainda naquele mês daquele ano, levados por três motivos principais, resolvemos
escrever um texto crítico a respeito. Os motivos foram:
a) O fato da Srta. Érika ter concluído um doutorado em Física (UFMG - 2000) e,
apesar disso, ter cometido vários erros relacionados a esta ciência (raramente temos visto
trabalhos tão descuidados provenientes de pessoas com o título de “doutor”);
b) Por ela ter cometido tais erros em um artigo em boa parte focado em críticas, o
que torna a situação um pouco mais séria; e
c) Pelo fato do objeto da crítica da Srta. Érika ser livros tidos como mediúnicos, ou
seja, em que os autores (Espíritos) não podem se defender diretamente.
Infelizmente, não pudemos dar continuidade ao trabalho iniciado naquela ocasião,
mas neste atual mês (maio de 2010) voltamos a trabalhar nele, e aqui estamos a
apresentá-lo por completo.
O texto da Srta. Érika de Carvalho Bastone é divido em quatro partes principais –
INTRODUÇÃO (pp. 1-2), A FÍSICA NOS SÉCULOS XIX E XX (pp. 2-7), ANÁLISE
DOS LIVROS (pp. 7-12) e CIÊNCIA ESPÍRITA (pp. 13-16) – e este nosso artigo irá
comentá-lo parte a parte. Dada a vasta quantidade de erros encontrados (em praticamente
todas as páginas do texto encontramo-los!), utilizamos as páginas do artigo original cujos
trechos serão comentados como títulos das subseções.
COMENTANDO A ‘INTRODUÇÃO’
Pág. 1 01- “(...) Neste trabalho vamos falar um pouco do espiritismo como ciência, em particular,
na Física, uma ciência exata.”
Acreditamos que a autora tenha querido dizer algo como: “Neste trabalho vamos
falar um pouco do espiritismo como ciência, em particular, nas relações do espiritismo
com a Física”.
02- “Desde o advento do espiritismo a física tem sido empregada na explicação de
fenômenos (...)”
Acreditamos que a autora tenha querido dizer algo como: “Desde o advento do
espiritismo a física tem sido empregada como coadjuvante na explicação de seus
fenômenos (...)”.
03- “Muitos cientistas, espíritas ou não, nos primeiros anos da história do espiritismo,
dedicaram parte de seu tempo estudando os ditos fenômenos espíritas. Podemos citar, como
exemplo, William Crookes, Alexandre Aksakof, Friedrich Zöllner, Camille Flammarion e
Ernesto Bozzano, entre outros”.
Não nos parece adequado alocar W. Crookes, J. K. F. Zöllner e E. Bozzano dentre
pesquisadores dos “primeiros anos da história do espiritismo”. Em nossa opinião, este
período vai de meados de 1848 (episódio das Irmãs Fox) a janeiro de 1869 (quando a
London Dialectical Society formara um comitê para investigar e elaborar um relatório sobre
os fenômenos ditos espiritualistas). Ao que tudo indica, Crookes iniciara suas pesquisas
sobre tais fenômenos somente em meados de 1869 [Medhurst & Barrington, 1972: 232-34],
Zöllner em 1877 [Zöllner, 1880: 2], e Bozzano em... 1891 [Bozzano, 1940: 11].
04- “(...) Nesta época o átomo ainda era uma partícula fundamental (indivisível), Maxwell
estava formulando suas equações que dariam origem à teoria eletromagnética e a mecânica
newtoniana ainda reinava absoluta”.
Na época das primeiras pesquisas espíritas de Aksakof, Flammarion, Crookes e
Zöllner – e até mesmo em 1891, quando Bozzano iniciou suas pesquisas neste ramo – a
existência de átomos não era nem mesmo aceita em geral, de modo que é impróprio dizer
que os átomos eram considerados indivisíveis, uma vez que eles nem mesmo eram
considerados em geral. Sobre a ideia de “átomo” à época, vejam o trecho abaixo:
Por mais de um século após a morte de Dalton, muitos cientistas eminentes declararam ilegítimo êsse
seu filho espiritual – um erro especulativo. Ainda em 1904, o Prof. Wilhelm Ostwald, um dos
maiores químicos contemporâneos, tentou persuadir a ciência a que abandonasse toda a idéia de uma
estrutura atômica da matéria. [Trattner 1967: 82]
O capítulo sobre Dalton do livro De Arquimedes a Einstein (trad.), de Pierre
Thuillier, também fornece boas informações sobre a evolução da idéia daltoniana de átomo.
Além disso, deve ser notado que em 1865 Maxwell já havia terminado de formular
suas equações. Portanto, antes do início das pesquisas de Crookes, Zöllner e Bozzano (este
último com apenas três anos nesta data!).
05- “Na década de 50, André Luiz, sob o intermédio dos médiuns Francisco Cândido
Xavier e Valdo Vieira (...)”
É Waldo Vieira, não Valdo Vieira.
COMENTANDO A SEÇÃO ‘A FÍSICA NOS SÉCULOS XIX E XX’, MISTO DE PSEUDO-HISTÓRIA E IRREFLEXÃO
Pág. 2 06- “Durante o século XIX, a física avançou a uma velocidade cada vez mais acelerada,
embora a necessidade de um meio mecânico, o éter, com propriedades essencialmente
diferentes das dos meios elásticos comuns, como repositório de energia no espaço, só tenha
sido definitivamente abandonada na passagem do século XIX para o século XX”.
A autora considera que as ideias de “éter’ e “meio mecânico” eram indissociáveis, o
que está errado. Existiram (e existem!) modelos de éteres não-mecânicos. Além disso,
mesmo a hipótese de um éter mecânico não foi “definitivamente abandonada na passagem
do século XIX para o século XX”. O físico alemão Arthur Korn, por exemplo, publicou
vários artigos nos anos de 1917 e 1918 na revista Physikalische Zeitschrift considerando tal
modelo para o éter, e ainda hoje encontramos pesquisadores que adotam esta hipótese,
como o francês Gabriel LaFreniere (vide http://www.glafreniere.com/ matter.htm).
Pág. 3 07- “Ao mesmo tempo Oersted e Ampère conseguiram provar experimentalmente, em
1829, que, quando uma corrente elétrica passava ao longo de um fio, havia um campo
magnético associado a ela”.
A demonstração da existência de influências magnéticas devidas a correntes
elétricas não foi provada ao mesmo tempo por Oersted e Ampère, e nem ocorreu em 1829.
O mérito desta demonstração, segundo os anais históricos, cabe unicamente a Oersted, e
tornou-se pública em um trabalho datado de 21 de Julho de 1820: Experimenta circa
effectum conflictus electrici in acum magneticam [Maxwell, 1891: 138].
08- “A eletrodinâmica de Ampère, posteriormente mais desenvolvida por Weber, era uma
teoria que imitava o modelo newtoniano, isto é, tudo deveria seguir um modelo
desenvolvido por Newton (1687) na sua mecânica, baseando-se nas interações entre pontos
materiais. Assim, sua teoria se revelou inadequada para explicar os fenômenos
eletromagnéticos, sendo logo substituída pelo novo conceito de campo”.
As informações encerradas no último período estão erradas:
a) Não existe uma prova de que a “inadequação” da teoria de Ampère-Weber em
explicar toda a gama de fenômenos eletromagnéticos (“insuficiência” seria um termo
melhor) derive do fato dela assumir apenas interações entre pontos materiais. É possível
que a referida insuficiência deva-se, principalmente, à falta de um ferramental matemático
mais avançado;
b) É uma impossibilidade lógica uma teoria ser substituída por um conceito,
conforme afirmado;
c) Ainda que no lugar de “conceito de campo” leiamos “teoria de campos”, não é
verdade que a teoria de Ampère-Weber foi logo substituída pela teoria de campos. O
próprio James C. Maxwell (1831-1879), físico que deu grande solidez a esta teoria, diz o
seguinte sobre Weber e seus adeptos: “(...) o grande sucesso que estes eminentes homens
têm alcançado na aplicação da matemática aos fenômenos elétricos dá, como é natural, um
peso a mais a suas especulações teóricas” [Maxwell, 1891: xii]. E, comparando seu próprio
método àquele de Weber, Maxwell afirma que “ambos têm conseguido explanar a
propagação da luz como um fenômeno eletromagnético, e têm realmente calculado sua
velocidade (...)” [Maxwell, 1891: xii].
09- “Faraday propôs a útil e produtiva idéia de um campo. Imaginou que existiam linhas de
força magnética e que estas ficavam tanto próximas quanto mais forte fosse o campo
magnético”.
A autora não explicou o que seria a “útil e produtiva idéia de um campo”. O que
segue – “linhas de força magnética (...) tanto próximas quanto mais forte fosse o campo
magnético” –, não encerra significado algum se não tivermos em mente bem claro o que
deve ser entendido por campo.
10- “(...) linhas de força que circundavam um imã, isto é, o campo magnético de Faraday”.
Não era este o conceito de campo magnético que Faraday utilizava. Para ele, tal
expressão estava associada à noção de espaço. Maiores detalhes em [Assis, Ribeiro and
Vannucci, 2008: 34-35].
11- “(...) Maxwell fez o relacionamento do campo com o éter (...)”.
O correto seria: “(...) Maxwell fez o relacionamento dos vetores dos campos com o
éter (...)”.
12- “(...) ondas eletromagnéticas são provocadas por cargas elétricas aceleradas. Foram
produzidas pela primeira vez em laboratório por Hertz” (nota de rodapé 2).
Isto está parcialmente incorreto. As ondas eletromagnéticas estavam sendo
produzidas em laboratórios de vários locais do mundo à época das pesquisas de Hertz; a
diferença era que ninguém percebia isto. O mérito do físico alemão foi o de ter notado que,
ao fazer saltar faíscas entre as duas esferas de cobre de seu aparelho oscilador, faíscas
surgiam em seu ressonador – duas pontas de um arco de metal –, que se encontrava a certa
distância do oscilador. Foi considerado, então, que a intermediação entre estes fenômenos
dava-se através de ondas eletromagnéticas.
13- “Mas na realidade o éter estava atrapalhando o desenvolvimento da teoria do campo.
Pensava-se que o éter era necessário porque se achava que a energia só podia ser contida na
matéria. Se havia uma energia no campo eletromagnético, então deveria haver uma certa
matéria que contivesse essa energia”.
O éter atrapalhando o desenvolvimento da “teoria do campo”? Onde será que a
autora encontrou essa “pérola”? E o que dizer das construções “se achava que a energia só
podia ser contida na matéria” e “deveria haver uma certa matéria que contivesse essa
energia”? Sem comentários...
Pág. 4
14- “Em 1887, Michelson e Morley inventaram um aparelho, o interferômetro, com o
objetivo de se confirmar a existência do éter. Mas o resultado do experimento foi
justamente o contrário, a não existência do mesmo”.
Aqui, uma prova cabal da ignorância da autora sobre tópicos importantes da história
do Eletromagnetismo. Vejamos:
a) “Interferômetro” é um nome comum a vários instrumentos que permitem o
estudo da interferência entre duas ou mais ondas, utilizados especialmente em Óptica.
Muito anterior às pesquisas de Michelson e Morley, podemos mencionar, por exemplo, o
“interferômetro de Young”, utilizado por Thomas Young (1773-1829) em seus estudos de
interferometria;
b) O interferômetro utilizado na famigerada “experiência de Michelson-Morley” foi
criado apenas por Albert A. Michelson, e em 1881;
c) O resultado da experiência de Michelson-Morley não provou a inexistência do
éter, algo que, aliás, não foi provado até hoje. Uma teoria adequada para explicar os
resultados da referida experiência foi elaborada pelo físico holandês Hendrik A. Lorentz
(1853-1928), que considerava a hipótese de contração real dos braços do interferômetro.
15- “(...) uma concepção mais moderna do campo só foi atingida por Lorentz em 1892
depois da teoria dos elétrons, que admitia uma localização direta da energia
eletromagnética no espaço, sem qualquer meio mecânico de suporte”.
Isto não poderia ser classificado como “uma concepção mais moderna do campo”,
mesmo porque tal colocação não tem sentido. Em lugar dela, deveria ter aparecido algo
como “uma concepção não-mecânica do éter”.
16- “(...) Depois da teoria da relatividade restrita de Eisntein, em 1905, foi então
definitivamente abandonada a idéia de um éter”.
Houve um pequeno descuido da autora na digitação do nome do físico alemão. Mas
o pior foi a lenda que ela tomou como verdade: que a ideia de um éter fora definitivamente
abandonada após 1905, com o surgimento da Teoria da Relatividade Restrita.
Mostrando-nos uma vez mais seu desconhecimento de tópicos importantes da história do
Eletromagnetismo, a autora não sabia (e é bem possível que ainda não saiba) que somente
por volta de 1910 é que a Teoria da Relatividade Restrita passara a ser melhor aceita
[McCormach, 1970: 491] e que, a partir de 1916, o próprio Einstein voltaria a considerar o
éter em suas elucubrações, após um período de cerca de dez anos negando o conceito
[Kostro, 2000]...
17- “A teoria de Newton sobre a luz, que a considerava como um fluxo de corpúsculos,
manteve-se inalterada até o princípio do século XIX, quando uma nova concepção foi
adotada por Thomas Young”, que “supôs que o espaço estava cheio de um éter luminoso e
que a luz era um distúrbio de onda em tal éter, conseguindo explicar todos os efeitos usuais
de reflexão e refração. Foi dele também o princípio da interferência da luz”.
Na verdade, a ideia adotada por Young não era nova. Mais de um século antes de
seu pronunciamento sobre a Teoria da Luz e das Cores perante a Sociedade Real de
Londres, ocorrido em 1801, um cientista holandês, Christiaan Huygens (1629-1695), já
havia proposto a ideia de que o espaço seria preenchido por um éter luminoso e que a luz
seria um distúrbio em tal éter, tendo explicado os fenômenos de reflexão e refração da luz
com base nessa hipótese [Whittaker, 1951: 22-27].
18- “(...) Em 1793 Young declarou que a difração era causada pela interferência das bordas
de um corpo (...)”.
A data correta é 1803, não 1793 [Whittaker 1951: 108].
19- “A Academie ofereceu outro prêmio, essa vez para uma explicação da difração, que foi
ganho por Fresnel em 1815, que apresentou resultados que conduziram à derrubada da
teoria corpuscular”.
A data correta é 1818, não 1815 [Whittaker 1951: 113]. 20- “Nos anos que se seguiram, novos experimentos foram realizados, agora com Young e
Fresnel trabalhando juntos. A teoria corpuscular foi se tornando insustentável, embora a
polarização continuasse a ser um problema. Em 1817 Young resolveu a questão,
imaginando que as ondas de luz no éter eram realmente transversas, como as ondas do mar,
e não longitudinais. A partir daí qualquer resultado experimental podia ser explicado”.
Este parágrafo deveria ter aparecido antes daquele comentado no item anterior, e
seu primeiro período deveria ser modificado para algo como “Nos anos que se seguiram,
principalmente a partir de 1815, novos experimentos foram realizados, com destaque
àqueles realizados por Fresnel, que, através de Arago, em 1816 obteria também a
colaboração de Young” (ver [Whittaker 1951: 114, 121]).
Pág. 5 21- “O próximo passo para um entendimento mais profundo da natureza dos próprios
átomos resultou na prática de se fazer passar eletricidade através de gases rarefeitos (...)”
O assunto tratado anteriormente não foi a natureza dos átomos, que nem mesmo
eram aceitos em geral à época (década de 1860), e a prática de se fazer passar eletricidade
através de gases rarefeitos foi utilizada para o estudo da própria condução de eletricidade
pelos referidos gases [Whittaker 1951: 390-410].
Pág. 6 22- “(...) Planck, estudando a radiação do corpo negro (radiação emitida por um pequeno
orifício em uma caixa fechada), chegou à conclusão de que a radiação não se dava de uma
forma contínua, mas em pacotes de energia (quanta de energia)”.
Lenda muito comum disseminada por aí. Em seu artigo de dezembro de 1900,
Planck utilizou a hipótese da quantização da energia para os ressoadores da parede do
corpo negro, não para a radiação em si. Além disso, para o físico alemão tudo não passara
de um truque matemático [Jammer, 1966: 22].
23- “A solução da equação proposta por Schrödinger em sua mecânica ondulatória é
conhecida como função de onda. Inicialmente, ele pensou que ela era uma expressão
matemática que descrevia a onda associada ao próprio elétron. Isso estava de acordo com as
noções clássicas de como as ondas evoluem no tempo; se conhecermos sua posição e
velocidade iniciais, podemos usar suas equações de movimento para prever seu
comportamento futuro. No entanto, rapidamente ficou claro que essa interpretação da
função de onda não podia estar correta. Em 1927 Heisenberg havia mostrado que a física
quântica obedece a um principio fundamental que expõe claramente as diferenças entre o
mundo clássico e o mundo quântico. O princípio da incerteza diz que alguns pares de
variáveis que constantemente afetam uma à outra, tais como tempo e energia ou posição e
velocidade, não podem ser determinadas com precisão absoluta. (...)”
Outra lenda. Heisenberg não mostrou que, no mundo quântico, tempo e energia ou
posição e velocidade não podem ser determinados com precisão absoluta. Isto foi a
interpretação dele à relação matemática obtida, mas há outras formas de considerá-la. Na
proposta de Bohm, por exemplo, teoricamente poderíamos obter com precisão absoluta as
grandezas correlacionadas, e o “princípio da incerteza” seria apenas uma limitação prática
na precisão das medidas. Maiores detalhes em [Bohm 1952a, Bohm 1952b].
Pág. 7 24- “A interpretação de Born demoliu por completo a noção clássica de uma descrição da
natureza. A certeza é substituída pela incerteza, o determinismo, pela probabilidade, os
processos contínuos, pelo salto quântico”.
Há controvérsias... Conquanto modelos puramente clássicos para o “mundo do
muito pequeno” têm-se mostrado insuficientes para descrevê-lo, análises semiclássicas
baseadas principalmente em [Bohm 1952a, Bohm 1952b] têm obtido bons resultados.
COMENTANDO A SEÇÃO ‘ANÁLISE DOS LIVROS’ A maioria das críticas que seguem abaixo foram enviadas em 06/05/07 ao já
referido grupo ECAE (vide “Preâmbulo”). Alguns poucos pontos que na ocasião
passaram-nos desapercebidos foram acrescidos à nossa crítica.
Pág. 7 Antes de iniciar sua “análise dos livros” Evolução em Dois Mundos e Mecanismos
da Mediunidade, ambos de André Luiz e psicografados por Francisco C. Xavier, a autora
explica-nos o seguinte:
A apresentação destas afirmações [afirmações dos livros supracitados que não estariam de acordo
com os conceitos físicos vigentes] está organizada da seguinte maneira: para cada livro, encontram-se
listados, em separado, indicados pelo número da página em que foram encontrados na edição
indicada [20ª. (2000) para EVD e 21ª. (2002) para MM], os trechos que não estão de acordo com a
física e os trechos em que aparecem novas definições e conceitos. Nos primeiros, em cada item
relacionado apresento a justificativa de porque não estão de acordo com a física. Nos segundos, ao
invés de analisá-los item a item, faço uma síntese e, no final, apresento meus comentários de forma
geral.
Em continuidade, referindo-se ao livro EVOLUÇÃO EM DOIS MUNDOS (1958),
e sob o título de “Trechos retirados do livro que não estão de acordo com a física”, a
autora segue com seus apontamentos. Continuaremos, abaixo, enumerando os erros
cometidos por ela e comentando-os.
25- “Página 22: Cada galáxia quanto cada constelação guardam no cerne a força
centrífuga própria, controlando a força gravítica, com determinado teor energético,
apropriado a certos fins.
- Força centrífuga: uma das chamadas forças fictícias, sendo apenas uma técnica que nos
permite aplicar a mecânica clássica da maneira habitual, se quisermos descrever os eventos
de um referencial não-inercial. Se escolhermos um referencial inercial, consideramos
apenas as forças reais, isto é, forças que podemos associar com corpos determinados da
vizinhança, que não é o caso da força centrífuga.
- Força gravitacional: por si só mantém os corpos celestes em equilíbrio”.
Esta análise foi puramente baseada na física clássica newtoniana. Neste ponto
de vista, é correto dizer que as forças centrífugas são forças *fictícias*. Porém, se
analisarmos o trecho de Evolução em Dois Mundos utilizando a mecânica de Mach,
não encontramos problema algum! Neste contexto, as forças centrífugas são forças
reais, decorrendo do giro relativo de todo o universo em relação ao sistema material
de referência adotado. Que eu saiba, não existe ainda nenhuma prova de que a física
newtoniana é melhor do que a física machiana. Ver, por exemplo, os artigos
[Schrödinger, 1925] e [Barbour & Bertotti, 1977] e o livro [Barbour, 1989].
26- “Página 22: A engenharia celeste equilibra rotação e massa, harmonizando energia e
movimento, e mantêm-se, desse modo, na vastidão sideral, magnificentes florestas de
estrelas, cada qual transportando consigo os planetas constituídos e em formação, que se
lhes vinculam magneticamente ao fulcro central, como os eletrões (elétrons) se conjugam
ao núcleo atômico, em trajetos perfeitamente ordenados na órbita que se lhes assinala de
início.
- O modelo atômico acima descrito remonta ao modelo proposto por Rutherford (1911)
ou ao modelo de Bohr (1913), em que os elétrons têm trajetórias definidas em torno do
núcleo, assemelhando-se ao movimento planetário. Desde 1927, através da mecânica
quântica, não se fala em trajetórias para os elétrons nos átomos, mas sim que estão
distribuídos em nuvens de probabilidades”.
O status quo não fala, é verdade, mas há pesquisas recentes, baseadas
principalmente em trabalhos de Timothy Boyer, iniciador da Eletrodinâmica
Estocástica, que continuam mantendo a ideia de trajetória para os elétrons nos
átomos. Ver, por exemplo, o livro [la Pena & Cetto, 1996] e o artigo [França, Franco,
and Malta, 1997].
Pág. 8
Sob o título “Trechos em que surgem novas definições e conceitos”, a autora passa a
transcrever alguns trechos de Evolução em Dois Mundos. Dentre outros, estes:
Página 33: A matéria elementar, de que o elétron é um dos corpúsculos-base (na esfera espiritual em
que estagiamos, o elétron é também partícula atômica dissociável) ...
(...)
Página 96: ...encontra a matéria conhecida no mundo, em nova escala vibratória. Elementos
atômicos mais complicados e sutis, aquém do hidrogênio e além do urânio, em forma diversa
daquela em que se caracterizam na gleba planetária, engrandecem-lhe a série estequiogenética.
Página 99: ...esse fluido ou matéria mental tem a sua ponderabilidade e suas propriedades
quimioeletromagnéticas específicas, definindo-se em unidades perfeitamente mensuráveis.
27- “Sintetizando os trechos acima, vemos que André Luiz prediz a existência de novos
elementos químicos, aquém do hidrogênio e além do urânio. (...)”
André Luiz não “prediz a existência de novos elementos químicos, aquém do
hidrogênio e além do urânio”, mas apenas comunica que, “na nova esfera de ação, a
que se vê arrebatado pela morte” (é isto o que deveria aparecer em lugar dos “três
pontinhos” usados pela autora na transcrição do trecho da pág. 96), o ser humano
encontra elementos atômicos aquém do hidrogênio e além do urânio.
28- “Temos também a predição de que o elétron não seja uma partícula fundamental, isto
é, que seja dissociável em outras. (...)”
Não é isto o que André Luiz fala. Ele faz questão de ressaltar que “na Esfera
Espiritual, em que estagiamos, o elétron é também partícula atômica dissociável”
Trata-se do elétron espiritual, não do elétron material.
29- “Por último, a existência de uma matéria mental, com uma estrutura eletromagnética,
com carga elétrica, é apontada”.
O que é dito não é bem isto. André Luiz fala em uma “matéria mental” com
“propriedades quimioeletromagnéticas específicas”. Ele não foi claro, é certo, mas
também não falou que a matéria mental possuía uma “estrutura eletromagnética”
com carga elétrica.
Pág. 9 Passando a tratar do livro MECANISMOS DA MEDIUNIDADE (1959), sob o
título “Trechos retirados do livro que não estão de acordo com a física”, a autora
transcreve alguns trechos da obra e tece comentários. Vejamos os vários erros que ela
comete:
30- “Página 22: Façamos funcionar o receptor radiofônico e encontraremos ondas
elétricas.
- Em todo o livro vemos uma confusão entre os conceitos de corrente elétrica (cargas
elétricas em movimento) e onda eletromagnética. O correto, acima, seria onda
eletromagnética”.
Aqui a autora demonstra ignorância de uma sinonímia de ondas
eletromagnéticas. Hertz, o primeiro a detectar ondas eletromagnéticas de frequências
menores que as da luz visível em laboratório, utilizava a expressão "ausbreitung der
elektrischen kraft" (propagação da ação elétrica) para referir-se ao fenômenos em
foco. Em 1892 compilou seus artigos no livro Untersuchungen über die Ausbreitung
der Elektrischen Kraft (Investigações sobre a Propagação da Ação Elétrica). Em 1893,
o livro foi traduzido para o inglês como Electric Waves (Ondas Elétricas). Em 1962
(portanto, depois de Mecanismos da Mediunidade) o livro foi republicado pela editora
Dover, de New York, com o mesmo título: Electric Waves. Então, André Luiz não
confundiu nada! Aliás, a confusão é toda da autora, que interpretou onda elétrica
como sinônimo de corrente elétrica. A expressão "ondas elétricas" era comumente
usada para designar-se as ondas eletromagnéticas de baixas freqüências na época da
redação de Mecanismos da Mediunidade. Como exemplo, vide [Skilling, 1948], onde a
expressão "electric waves" é utilizada como sinônima de "electromagnetic waves" em
todo o livro, e [Whittaker, 1951], abalizada obra sobre a história do
Eletromagnetismo, especialmente sua pág. 328.
31- “[Página 22:] As ondas ou oscilações eletromagnéticas são sempre da mesma
substância, ...
- A onda eletromagnética se propaga no vácuo. Não é necessário um meio material para
a sua propagação”.
Mas não há problema algum em dizer que as ondas eletromagnéticas são
sempre da mesma substância!...
32- “[Página 22:] À falta de terminologia mais clara, diremos que uma onda é determinada
forma de ressurreição da energia, por intermédio do elemento particular que a veicula ou
estabelece”.
- Uma onda apenas transporta energia de um ponto a outro. No caso da onda
eletromagnética, não temos um veículo de transmissão para a onda”.
Há controvérsias. Ver, por exemplo, [Einstein, 1924]. Neste artigo, Einstein diz
que as ondas eletromagnéticas são "qualidades físicas do éter". Ele utiliza o termo
éter para designar uma entidade física, que seria o veículo de transmissão para a onda
eletromagnética. Ver, também, [Fokker, 1963], em que o autor considera os vetores
*E* e *B*, que descrevem a onda eletromagnética, como perturbações em um meio
imaterial (p. 127).
33- “Página 23: Assim é que entre as ondas da corrente alternada, as ondas de rádio, as
da luz e dos raios X, ..., não existe qualquer diferença de natureza, mas sim de freqüência,
considerado o modo em que se exprimem.
Página 28/29: ... até que Hertz consegue positivar a existência das ondas elétricas,
descobrindo-as e colocando-as a serviço da humanidade.
- Novamente, a confusão entre corrente elétrica e onda eletromagnética.
Novamente uma interpretação errônea das palavras de André Luiz e uma
demonstração de desconhecimento por parte da autora (vide item 30).
34- “Página 29: ... pelo fato de gravitarem os elétrons, ao redor do núcleo, no sistema
atômico, em órbitas seguramente definidas...
... mentalizou o átomo como sendo um núcleo cercado, no máximo, de sete
camadas concêntricas, plenamente isoladas entre si, no seio das quais os elétrons
circulam livremente, em todos os sentidos
- O modelo sugerido se afasta completamente do modelo atômico aceito após o
advento da mecânica quântica. Ele traduz a idéia de elétrons como partículas, com
trajetórias definidas, enquanto que no modelo quântico os elétrons apresentam a
dualidade partícula-onda como já discutido, sendo as órbitas descritas por funções
de probabilidade, que não estão espacialmente isoladas, mas se sobrepõem no
espaço”.
É claro que o modelo mencionado não está completamente de acordo com a
Mecânica Quântica (1924-1926), pois André Luiz tratava de um modelo de 1913 para
o átomo, devido à Bohr! Os “três pontinhos” que seguem após a referência da página
– novamente eles (vide comentário ao trecho 27) – escondem o seguinte trecho: “Foi
então que Niels Bohr deduziu que a descoberta de Planck somente se explicaria ...”.
35- “Página 40: Entretanto, o meio sutil em que sistemas atômicos oscilam não pode ser
equacionado com os nossos conhecimentos. Até agora, temos nomeado esse terreno
indefinível como sendo o éter; contudo, quando Einstein buscou imaginar-lhe as
propriedades indispensáveis,... , não conseguiu acomodar as necessárias grandezas
matemáticas numa fórmula, ..., e concluiu que ela não existe, propondo abolir-se o
conceito de éter, substituindo-o pelo conceito de campo.
Campo, desse modo, passou a designar o espaço dominado pela influência de uma
partícula de massa.
... a indagação quanto à matéria de base para o campo continua desafiando o
raciocínio, ...
- O trabalho de Einstein, que aboliu definitivamente o éter, foi publicado em 1905,
resultado que também pode ser deduzido do experimento de Michelson-Morley em 1887.
André Luiz diz que, até agora, (em 1959) existe um meio sutil denominado éter. (...)”
O trabalho de Einstein de 1905 sobre a eletrodinâmica dos corpos moventes
não aboliu definitivamente o éter (vide comentário ao trecho 16), e a tal “abolição
definitiva do éter”, não tendo ainda ocorrido (ocorrerá?), obviamente não poderia ser
deduzida diretamente do experimento de Michelson-Morley de 1887 (vide item “c” do
comentário ao trecho 14).
Pág. 10 36- “(...) - O conceito de campo não foi um substituto para o éter. Aliás, durante cerca de
cinqüenta anos conviveram em certa harmonia.
- A definição dada para campo não corresponde à definição aceita. Campo pode ser
definido como qualquer quantidade física que dependa do tempo e do espaço. Como já
discutido anteriormente, não é necessária uma matéria base para o campo”.
A noção de campo ainda é problemática nos dias de hoje. Campo como
quantidade física é apenas um dos conceitos utilizados... Na seção 3.1 de minha
dissertação de mestrado [Ribeiro, 2008], aponto nada menos do que 6 definições
distintas utilizadas para “campo”! Inclusive, ainda na década de 80 do século passado
a definição referida por André Luiz era utilizada: “Field in general signifies a region
of space considered in respect to the potential behaviour of test bodies moved about in
it; the electricians of 1780 lacked the word but not the concept, which they called
“sphere of influence”, sphaera activitatis, or wirkungskreis” [Heilbron, 1981: 187].
37- “Página 55: Circuito elétrico: a extensão do condutor em que se movimenta uma
corrente elétrica. ... Circuito mediúnico: a extensão do campo de interação magnética em
que circula uma corrente mental.
- Esta definição de circuito mediúnico é confusa e imprecisa: não podemos falar em
extensão de um campo, e muito menos em uma corrente circulando em um campo”.
Realmente a definição de André Luiz é um tanto confusa. Porém, quanto ao
último ponto da crítica da Srta. Érika, entendendo campo como região (é esta a
concepção de A. L.), não há problema algum em se falar em "corrente circulando em
um campo".
38- “[Página 79:] Informamo-nos, ainda, de que a circulação da corrente elétrica num
condutor é invariavelmente seguida do nascimento de calor, formação de um campo
magnético ao redor do condutor, produção de luz e ação química.
Devemos ter cuidado com a linguagem. Calor é uma forma de energia. Energia não
nasce ou morre. O que ocorre é uma transformação de uma forma de energia em outra”.
A interpretação da autora não nos parece apropriada. Não há problema algum
em dizer-se "nascimento de calor". A energia, antes de outra forma, apareceria depois
como calor. André Luiz não falou em "nascimento da energia". Além disso, os
verdadeiros erros deste trecho não foram percebidos pela Srta. Érika: não há
invariavelmente produção de luz e ação química devidas a correntes elétricas em
condutores, como dito.
Pág. 11
39- “Página 86: ... o pensamento age de cérebro a cérebro, quanto a corrente de elétrons
de transmissor a receptor (tv)...
- Novamente, a confusão entre corrente elétrica e onda eletromagnética. Em um
processo de transmissão de informações como o que ocorre para o funcionamento do
televisor, temos emissão e recepção de ondas eletromagnéticas, e não de partículas, tais
como os elétrons”.
Interpretação errada! André Luiz referia-se aos transmissores e receptores
existentes dentro de um aparelho analógico de TV. Neste caso, há, sim, uma corrente
de elétrons em ação, do transmissor ao receptor.
40- “Página 87: ...o cérebro possui nas células e implementos que o servem aparelhagens
correspondentes às peças empregadas em televisão para a emissão e recepção das
correntes eletrônicas...
- Novamente, a confusão entre corrente elétrica e onda eletromagnética”.
Novamente, interpretação errada e desconhecimento dos processos envolvidos
no funcionamento de TV's analógicas.
Págs. 11-12 Sob o título “Trechos em que surgem novas definições e conceitos”, a autora
transcreve algumas passagens de Mecanismos da Mediunidade, das quais discordamos das
seguintes como exemplos de “novas definições e conceitos”:
41- “Página 46: A matéria mental obedece a princípios idênticos àqueles que regem as
associações atômicas na esfera física. ... Página 71: Surpreendemos no ferromagnetismo
um ponto expressivo para o estudo da mediunidade ... Página 76: ... circulam (no cérebro)
as correntes mentais constituídas à base dos átomos de matéria da mesma grandeza, qual
ocorre na matéria física, ..., pelo que depreendemos, sem dificuldade, a existência do
eletromagnetismo tanto nos sistemas interatômicos da matéria física, como naqueles em
que se evidencia a matéria mental. ... Páginas 126/127: E aos encarnados interessa a
existência em plano moral mais alto para que definam, com exatidão e propriedade, a
substância ectoplasmática, analisando-lhe os componentes e protegendo-lhe as
manifestações ...
Não houve nenhuma definição ou conceito novo; apenas informações novas.
Pág. 12 Em conclusão à sua análise de Evolução em Dois Mundos e de Mecanismos da
Mediunidade, a autora nos diz:
42- “Concluindo, vemos que em todos os dois livros há uma discordância clara entre os
conceitos físicos, vigentes na época em que foram escritos, com o conteúdo apresentado,
sendo que a utilização de conceitos e termos desatualizados é uma constante”.
E nós diríamos o seguinte: “Concluindo, vemos que em toda a análise da
autora há um desconhecimento claro de teorias físicas alternativas e de importantes
tópicos históricos e epistemológicos do Eletromagnetismo. Grande parte dos erros
apontados em ambos os livros na realidade não existem, tendo sido simplesmente
embasados na ignorância da autora nos assuntos supracitados. Além disso, a
interpretação falha de textos também foi uma constante na análise da Srta. Érika”.
43- “Até mesmo conceitos de mecânica clássica não são corretamente empregados, como,
por exemplo, na afirmativa da necessidade de uma força centrífuga para equilibrar a força
gravitacional”.
A existência de uma “força centrífuga” para equilibrar a força gravitacional é
verdadeira na mecânica clássica de Mach.
44- “A noção de campo, principalmente, não foi assimilada corretamente pelo autor que,
inúmeras vezes, confunde corrente elétrica e campo eletromagnético”.
Como vimos, a confusão referida foi toda da autora, que, além de desconhecer
a nomenclatura utilizada por Hertz, interpretou erroneamente os textos de André
Luiz.
COMENTANDO A SEÇÃO ‘ CIÊNCIA ESPÍRITA’ Pág. 13 45- “(...) Além disso, vimos que André Luiz se confundiu diversas vezes, principalmente no
que se refere aos conceitos de campo e corrente. (...)”
Quanto a nós, vimos que muitas das “confusões” atribuídas à André Luiz com
relação ao conceito de “campo” residem na verdade na ignorância histórica da autora sobre
o assunto.
46- “(...) Se o espiritismo realmente possui os três aspectos, filosofia, moral e ciência, este
último não deveria ser explorado por pessoas capacitadas, devidamente preparadas para
isso?”
O leitor que responda se a autora enquadra-se na categoria mencionada...
Pág. 16
47- “A minha proposta, ao apresentar este trabalho foi a de dar a minha visão, com base na
minha formação acadêmica, de como anda o aspecto científico no movimento espírita atual
propondo que se comece a pensar em uma ciência espírita tal como formulada por Kardec,
com os critérios e rigores de qualquer ciência, que foram tão bem utilizados por ele na
elaboração da Doutrina Espírita”.
Bem, se o trabalho apresentado pela autora refletiu sua formação acadêmica,
podemos dizer que tal formação foi de mal a pior... Sobre os critérios e rigores científicos
“tão bem utilizados por Kardec”, que seja-me permitido discordar. Mas deixemos este
assunto para uma outra vez...
CONCLUSÃO
Gostaríamos aqui de tratar dos erros cometidos pela autora vistos sob dois diferentes
ângulos: perante simplesmente sua formação, e frente sua formação, à espécie de público
ao qual seu trabalho destinou-se e ao tipo de trabalho no qual os erros apareceram.
Érika de Carvalho Bastone, doutora em Física pela UFMG, especialista em
Mecânica Estatística (deve realmente entender disso!), demonstrou desconhecimento de
importantes tópicos de epistemologia, fundamentos e história do Eletromagnetismo e da
Física Quântica em seu artigo. Isto nos leva a refletir, dentre outras coisas, sobre a cultura
do “telefone sem fio” de grande parte dos cursos de ciências exatas de nosso país,
epistemológica e historicamente baseados no “ouvi dizer” e em livros didáticos que servem,
quando muito, como meros manuais técnicos. A autora, certamente não muito afeita a
estudos autodidatas nas áreas mencionadas, resolveu utilizar-se simplesmente dos
“conhecimentos” obtidos durante sua doutrinação acadêmica tecnicista para a elaboração de
seu texto. Não poderia ser diferente: “deu com os burros n’água”... Pois uma formação
acadêmica em Física (mesmo um doutorado) não basta para poder se falar com propriedade
sobre tudo em Física.
Infelizmente, porém, é bem certo que a maioria das pessoas que tiveram contato
com as ponderações da autora tomaram-nas como seguras, por tratar-se de afirmações feitas
perante um público não especializado (espíritas em geral) por alguém que, em tese, deveria
saber do que está falando. Se os problemas de interpretação apresentados no texto da Srta.
Érika podem ser percebidos por qualquer leigo em Física que tenha espírito crítico, o
mesmo não se pode dizer dos erros epistemológicos e históricos cometidos pela autora. É aí
que reside a gravidade da coisa. O pior é que ela cometeu seus erros em um texto focado
em críticas... E em críticas de textos atribuídos a um Espírito!... Agora, vejamos a grande
ironia do negócio: cotejando este nosso artigo com aquele escrito por Érika de Carvalho
Bastone, doutora em Física, o leitor poderá perceber que os erros por ela cometidos
ultrapassam com larga margem os reais problemas que foram apresentados em EVD e em
MDM, livros atribuídos ao Espírito André Luiz, que fora médico quando encarnado. Se os
equívocos de A. L. não são justificáveis, muito menos ainda o seriam os erros da doutora,
não é verdade?...
Finalizo então com uma curta ressalva. Quando não compreendemos algo, o ideal é
assumirmos nossa ignorância no assunto e, caso realmente estejamos interessados,
procurarmos nós mesmos estudar a respeito. Não havendo possibilidades, que consultemos
especialistas no assunto. Inexiste argumento plausível que justifique a propagação de erros
cometidos por pessoas não especializadas ao tratar de assuntos que exijam especialização.
REFERÊNCIAS
ASSIS, A.K.T., RIBEIRO, J.E.A., and VANNUCCI, A. “The Field Concepts of Faraday
and Maxwell”, pp. 31-38 de Trends in Physics – Festschrift in homage to Prof. José
Maria Filardo Bassalo, S. Paulo: Editora Livraria da Física, 2009.
BARBOUR, J.B. & BERTOTTI, B. "Gravity and Inertia in a Machian framework", Il
Nuovo Cimento B, 38: 1-27, 1977.
BARBOUR, J.B. Absolute or Relative Motion? - A study from a Machian Point of View of
the Discovery and the Structure of Dynamical Theories, 1989.
BOHM, David. “A suggested interpretation of the quantum theory in terms of "hidden"
variables I”, Physical Review 85: 166 - 179, 1952a.
BOHM, David. “A suggested interpretation of the quantum theory in terms of "hidden"
variables II”, Phys. Rev. 85: 180 - 193, 1952b.
BOZZANO, Ernesto. Animismo ou Espiritismo? (trad. do italiano por Guillon Ribeiro),
Rio: FEB, 1940.
EINSTEIN, Albert. "Über den Äther" (Sobre o Éter), Schweizerische naturforschende
Gesellschaft, 105: 85, 1924. [Este artigo aparece em The Philosophy of Vacuum,
Saunders & Brown (eds.), pp. 13-20, "On the Ether", mas a tradução possui
problemas.]
FARADAY, Michael. Experimental Researches in Electricity, vol. III, New York: Dover
Publications, 1965 (unabrigded of the 1st edition, published by London: Taylor and
Francis in 1855).
FOKKER, A.D. Time and Space, Weight and Inertia (trad. do holandês), Oxford:
Pergamon Press, 1963.
FRANÇA, H.M., FRANCO, H. and MALTA, C.P., "A stochastic electrodynamics
interpretation of spontaneous transitions in the hydrogen atom", European Journal of
Physics, 18: 343, 1997.
HEILBRON, J.L. “The Electrical Field before Faraday”. In CANTOR, G.N. & HODGE,
M.J.S. (eds.): Conceptions of Ether. Cambridge: Cambridge University Press, 1981.
JAMMER, Max. The conceptual development of quantum mechanics, New York: McGraw-
Hill, 1966.
KOSTRO, Ludwik. Einstein and the Ether, Montreal: Apeiron, 2000.
LA PENA, L. & CETTO, A.M. An Introduction to Stochastic Electrodynamics, Kluwer
Academic Publishers, 1996.
MAXWELL, James C. A Treatise on Electricity and Magnetism, vol. I, New York: Dover,
1954 (unabridged of the 3rd edition, published by the Clarendon Press in 1891).
MC CORMACH, Russell. “H. A. Lorentz and the Electromagnetic View of Nature”, Isis,
61(4): 459-497, 1970.
MEDHURST, R.G. & BARRINGTON, M.R. (eds.). Crookes and the Spirit World, New
York: Taplinger, 1972.
RIBEIRO, J. E. A. Sobre a força de Lorentz, os conceitos de campo e a “essência” do
Eletromagnetismo Clássico. Dissertação aprovada para a obtenção do título de “Mestre
em Ciências”. IFUSP, Mar/2008.
SCHRÖDINGER, Erwin. "Die Erfüllbarkeit der Relativitätsforderung in der klassischen
Mechanik", Annalen der Physik, 77: 325-336, 1925. Este artigo foi traduzido para o
português por A. L. Xavier Jr.: “O cumprimento do postulado de relatividade na
mecânica clássica” (in Xavier Jr., A.L. & Assis, A.K.T. Revista da Sociedade
Brasileira de História da Ciência, 12: 3-18, 1994). Ele também está discutido em
Assis, A.K.T. & Pessoa Jr., O. "Erwin Schrödinger e o Princípio de Mach", Caderno
de História e Filosofia da Ciência, Série 3, v. 11, n. 2, pp. 131-152, 2001.
SKILLING, Hugh H. Fundamentals of Electric Waves, New York: John Wiley &
Sons, 1948 (2nd edition).
TRATTNER, Ernest R. Arquitetos de Idéias (trad. do inglês por Leonel Vallandro), Porto
Alegre: Globo, 1967 (3ª ed.).
WHITTAKER, Edmund T. A History of the Theories of Aether and Electricity – from the
age of Descartes to the close of the nineteenth century, London: Thomas Nelson &
Sons, 1951 (unabridged republication of the 1st edition, published in 1910).
ZÖLLNER, J. K. Friedrich. Transcendental Physics (trad. do alemão por Charles C.
Massey), London: W.H. Harrison, 1880.