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A ILUSÃO DO MIGRANTE
Carlos Drummond de Andrade
Quando vim da minha terra,se é que vim da minha terra(não estou morto por lá?),
a correnteza do riome sussurrou vagamenteque eu havia de quedarlá donde me despedia.
Os morros, empalidecidosno entrecerrar-se da tarde,pareciam me dizerque não se pode voltar,porque tudo é conseqüênciade um certo nascer ali.
Quando vim, se é que vimde algum para outro lugar,o mundo girava, alheioà minha baça pessoa,e no seu giro entrevique não se vai nem se voltade sítio algum a nenhum.
Novas coisas, sucedendo-se,iludem a nossa fomede primitivo alimento.As descobertas são máscarasdo mais obscuro real,essa ferida alastradana pele de nossas almas.
Quando vim da minha terra,não vim, perdi-me no espaço,na ilusão de ter saído.Ai de mim, nunca saí.Lá estou eu, enterradopor baixo de falas mansas,por baixo de negras sombras,por baixo de lavras de ouro,por baixo de gerações,por baixo, eu sei, de mim mesmo,este vivente enganado,enganoso.
FORMATAÇÃO: Mima (Wilma) Badan
MÚSICA: Coração que sente
Interpretação: Arthur Moreira Lima
(Repasse com os devidos créditos)