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CAPíTULO 1 Os pilares daestratégia enxadrística
nos peões são a alma do xadrez."(Philidor)
Pode-se afirmar que a era moderna do xadrez começa com Philidor. Seus antecessores foram,dentre outros, o espanhol Ruy López e os italianos Paolo Boi (1528-1598) e Leonardo da Cutri, quepossuíam uma concepção rudimentar do jogo. Philidor foi o primeiro a introduzir, em seu livroAnáZisisdeZjuegodel ajedrez, uma visão científica da estratégia enxadrística e mais particularmentea importância da estrutura de peões na evolução da partida.
FRANÇOIS ANDRÉ PHILIDORNacionalidade: Francês
Nascimento: Dreux, 7 de setembro de 1726.Morte: Londres, 31 de agosto de 1795.Títulos: Melhor jogador do mundo do século XVIII.Melhores torneios: Venceu todos os melhores jogadores da época.
Façanhas: Foi um grande especialista em partidas às cegas, que realizava com fre-qüência no Café de Ia Regence. Esse local foi um dos mais famosos centros enxadrísticos dahistória, onde, posteriormente, outro enxadrista, La Bourdonnais (1795-1840), se tornariao mais destacado jogador da primeira metade do século XIX.
Vida privada: Compartilhava sua paixão pelo xadrez com a profissão de músico, carreira naqual também se destacou, em especial como compositor de óperas.
Legado: Sua obra AnáZisis deZjuego deZajedrez causou uma revolução a respeito dasidéias enxadrísticas da época. Destacou a importância dos peões como elemento essencial deestratégia; assentou as bases das futuras escolas posicionais; antecipou-se a Nimzowitsch nosconceitos de bloqueios, prevenção, sacrifício posicional e importância da estrutura de peões.Também foi o primeiro a analisar em profundidade o final de torre e bispo contra torre. Legoupara a posteridade a importante Defesa Philidor, muito utilizada por enxadristas de todo omundo.
Consideração final: Foi considerado campeão (oficioso) do mundo por cinqüentaanos.
22 ANTONIO LÓPEZMANZANO EJOS~ MONEDERO GONZÁlEZ
Partida 1 - A importânciados peões
Conde Brüh1 - PhilidorLondres, 1783
Abertura do Bispo do Rei
Esta partida foi realizada em uma simultâ-nea que Philidor disputou, às cegas, contratrês enxadristas em 1783.
1. e4 e5 2. ~c4 c6Lance um tanto estranho, mas deve-se con-
vir que na época não existia a teoria das aber-turas.
3. 'iVe2 d6 4. c3 f5 5. d3?Sem dúvida, uma perda de tempo, já que a
idéia das brancas, como veremos depois, erafazer d4.
5. ... ll:\f66. exf5 ~xf5 7. d4 e4Philidor prepara a formação de uma forte
cadeia de peões.
8. ~g5 d5 9. ~b3 ~d6 10. ll:\d2 ll:\bd711. h3 h6 12. ~e3 'iVe7 13. f4
As pretas têm um peão passado, mas nomomento este está bloqueado pelo bispo bran-co situado em e3.
13 h5Essa jogada impede a expansão das bran-
cas no flanco do rei mediante gS e g4.
14. c4 a6
..iriA .i A
88 i/3i.
~..C;P,
8llJ. :19 h
IA
ti
a b c d e
Para impedir uma possível entrada da damapor bS após a troca de peões centrais.
15. cxd5 cxd5 16. 'iVf2 o-o 17. ll:\e2b5
Para se apoderar do espaço das brancas noflanco da dama.
18. O-Oll:\b6 19.1l:\g3 g6 20. :tac1ll:\c421. ll:\xf5 gxf5 22. 'iVg3+ 1i'g7
As pretas têm interesse na troca de damaspara entrar com vantagem no final.
23. 1i'xg7+ 'it>xg7 24. ~xc4 bxc4 25.g3 :tab8 26. b3 ~a3 27. :tc2 cxb3 28.axb3 :tbc8 29. :Xc8 :Xc8 30. :tal .i.b431.:txa6
Aparentemente, as pretas perderam umpeão, mas Philidor preparou uma maneirade recuperá-Io e melhorar sua posição.
31. ... :tc3 32. 'it>f2:td3 33. :ta2 .i.xd234. hd2 1Ixb3 35. :tc2 h4
O sacrifício posicional do peão foi feitopara debilitar a estrutura dos peões brancos noflanco do rei.
36. 1Ic7+ 'it>g637. gxh4ll:\h5O cavalo preto é muito superior ao bispo
branco, que atua como simples pivô.
38. :td7 ll:\xf4!Um belo recurso tático.
39. ~xf4 :tf3+ 40. 'it>g2:txf4As pretas dispõem de dois peões passados e
unidos.
41. ':xd5 11f3 42. :d8 ':d3As brancas têm um peão de vantagem, mas
sua estrutura está debilitada. Por outro lado,a torre preta apóia o avanço dos peões.
43. d5 f4 44. d6 ':d2+ 45. ~f1 ~f7 46.h5 e3 47. h6 f3
E as brancas abandonam.Philidor demonstrou nessa partida a im-
portância dos peões como elemento básico deestratégia. Por exemplo: 48. ~gl f2+ 49. 'it>g2:td1, e as brancas não podem impedir a coroa-ção do peão preto.
811
n i
6i5
4
3 i.2188
.:1
o XADREZ DOS GRANDESMESTRES23
8
7 .6
5
4
3
2
8.1
abcdefgh
Final- Estudo de Rinck
o final abaixo corresponde a um belofinal no qual um cavalo e uma torre vencemuma dama. A ação de um cavalo num canto dotabuleiro não impede que esta exerça sua forçademolidora com os múltiplos xeques duplosque realiza ao longo de uma combinação.
8
7
6
5
4
~j ];1
8 liJ'
9 h
1. :th8!Começa o cerco à dama.
1. ... 'iVbS!A única das 17 casas de que dispõem as
pretas para não perderem a dama.Naturalmente que, se 1. ... 'i1Vxh82. ttJg6+
e tomaria a dama.
2. ttJfS+ 'ãtff6Novamente é a única casa. O duplo de ca-
valo é um tormento para as pretas.
3. :th6+ 'ãtfeS4. :'e6+Nova entrega da torre para desviar o rei e
permitir a dupla ameaça de cavalo.
4. ... 'ãtff4Se 4. ... ~d5 5. c4+!, e tanto faz se a captura
for realizada com o rei ou a dama, pois o cavaloaplica um duplo, capturando a dama.
5. :te4+ ~xe4Agora já não há mais escolha. Se 5. ... ..t>f3
6. ttJd4+, também se ganharia a dama.
6. ttJd6+E finalmentese ganha a dama e a partida.
Mates típicos
Mate de Phi1idor
8
7
6
5
4 i3
2
1. ttJf7+ ~g8Se 1. ... 1:txf72. 'i1Vxc8+:'f8 3. 'i1Vxf8mate.
2. ttJh6+ 'ãtfh8 3. 'i1Vg8+!!:'xg8 4. ttJf7mate.
Exercício 1
Alekhine - Supico,1945
As brancas jogam e ganham
Na partida entre Alekhine e Supico, em1945, aconteceu a posição retratada no dia-grama a seguir. Você consegue encontrar a es-petacular jogada vencedora?
3
218 81
... ,
a b c d e
"I i ! !
I'i .L=
I_«,."';,"w
a b c d e
24 ANTONIO LÓPEZ MANZANO EJOSÉMONEDERO GONZÁlEZ
81 .1, .tiJ.., i. ,
.
888:~
a b c d e 9 h
ANEDOTAS E CURIOSIDADES
O peão envenenado
Deve-se ter cuidado ao tomar um peãoaparentemente presenteado, já quepode se tratar de uma cilada mortal.
A partida a seguir, que surge de uma va-riante Najdorf da Defesa Siciliana, é um claroexemplo do perigo de se tomar um peão emplena abertura. A dama é uma peça especial-mente delicada e fácil de atacar nos primeirosmovimentos da partida, por isso é mais prudentedesenvolver o resto das peças antes de colocá-Iaem jogo. No entanto, toda regra tem exceção, e ogenial Bobby Fischer demonstrou em algumaspartidas que, em certas situações, é recomen-dável e até proveitoso capturar esse tipo de peão(evidentemente que não na situação a seguir).
Partida 2
J. López - A. LópezBarcelona, 1972
Defesa Siciliana
A seguinte partida foi disputada por um dosautores deste livro num encontro escolar. In-fluenciado por Fischer, o grande mito de todauma geração de enxadristas, dentre os quais meencontro, joguei inocentemente a Defesa Sici-liana. Vejamos como transcorreu a partida:
1. e4 c5 2. lDf3d6 3. d4 cxd44. l2Jxd4l2Jf65.lDc3 a6 6. ~g5lDbd7 7. f4 'iVb68. a3
"Se Fischer pode tomar, por que eu não pos-so?", pensei.
8. ... 'iVxb2??Minhaignorânciafoi duramente castigada.
9. lDa4E perdi a dama e a partida.
.t ..í" i, alil'
I a
2111 8 8811 'ir.~...t :1a b c d e 9 h
Partida 3 - Outro exemplode peão envenenado
Kunin - OxengoitMoscou, 1958
Defesa francesa1. e4 e6 2. d4 d5 3. lDc3 it.b44. it.d2Entregandoum peão central à custa do de-
senvolvimentoe de ameaçasimediatas.
4. ... dxe4 5. 'iVg4 'iVxd4As pretas podem fartar-se com tantos
peões. Mais seguro seria 5. ...lDf6 6. 'iVxg7:'g87. 'irt'h6lDc6, devolvendo o peão e ativando ojogo.
6. 0-0-0 f5As pretas tentam conservar a vantagem
material em detrimento de sua posição.
7. ~g5!? 'iVe5?Na partida Marshall contra Tchigorin,jogada
em Montecarlo, em 1901, as pretas venceramcom: 7. ... 'iVxf28. 'iVh3~e7 9. 'ót'b1~d7 10. g4lDc6 11. gxf5 'ii'xf5 12. be7 'ii'xh3 13. it.xh3<Jo>xe714. l2Jxe4 lDf6, e as pretas ficam com dois .peões de vantagem.
811 ani
61..t ,&5
4
3 82
8 I7
6 i5
4tiJ31'8
o XADREZ DOS GRANDES MESTRES 25
8. l::td8+ <3;f79. lbf3!Acrescentando outra peça ao ataque das
brancas.
9. ... 'fiaS?Um grave erro. Seria melhor ter jogado: 9.
.., exf3! 10.'fixb4 cs 11. 'fih4lbc612. .i.f4 'fif613. .i.gs 'fig6 14. 'fig3! lbxd8 15. 'fic7 + <3;f816. 'fid6+ que resultaria empate.
10. .i.bS!Ameaçando mate.
811 . Ali71111
Ijle1i
6 ii j..'.
i 11tD888
.' '~:
5 rirj.41 A31 tD21888
c;t.>
a b c d e 9 h
10. ...lbc6Não seria válido 10. ... lbf6 11. 'ilVhs+ g6
12. lbes+ çj;e7 13. l::t~8 gxhs 14. l::te8+ <3;d615. lbf7+ <3;cs16. .i.e3 mate.
Ou também 10. ... g6 11. lbes+ <3;g712.'ilVh4.i.xc313. .i.h6+ lbxh6 14. 'iVe7+ lbf71s.'fixf7 + çj;h6 16. l::txh8e mate em poucas joga-das.
11. lbeS+ lbxeS 12. .i.e8+ çj;f8 13..i.g6 mate.
Quantas jogadasvocê pode calcular?
Conta a lenda que, há muitos anos, o todo-poderoso Capablanca jogou contra um espertoenxadrista de Nova York. Esquecendo-se mo-mentaneamente que era invencível, Capablancaperdeu a partida. Ante esse imprevisto, os espec-tadores ficaram assombrados. Como pode umcampeão do mundo perder para um jogadormuito inferior a ele?
Quantos lances à frente o senhor pode pre-ver? - perguntou um aficionado seu.
- Pelo menos dez - respondeu o campeãodo mundo.
- E quantas jogadas você pode pensar ante-cipadamente? - perguntou ao ganhador da par-tida.
Ele respondeu:- Só uma.- Aqui há uma paradoxo: como pode um
jogador que só prevê uma jogada ganhar deoutro que pode antever dez?
Então, o vencedor explicou:- Eu penso um só lance, mas é sempre o
melhor!
CONSELHOS
1. No meio-jogo, estude a possibilidade de che-gar a um final favorável: nem sempre se ga-nha com uma brilhante combinação de mate.
2. Compreender adequadamente a transiçãodo meio-jogo para o final é um dos ele-mentos essenciais do jogo de xadrez.
3. As posições, aparentemente simples emalgumas ocasiões, podem esconder temascombinatórios ou estratégicos ocultos. Re-corde o que disse Anderssen: "Nunca confiedemasiadamente; muitas vezes não é fáciljogar em posições simples".
4. Quando estiver em vantagem, atue semprecom energia e não perca a iniciativa.
s. Surpreenda o adversário com jogadas ines-peradas que possam lhe trazer vantagempsicológica.
6. Tente conhecer a si próprio o melhor quepuder para melhorar seus pontos fracos eevitar um tipo de jogo que não se adapte aoseu estilo.
7. Estude seu adversário tanto quanto pos-sível a fim de saber que tipo de jogo lhecria maiores problemas.
8. A paciência é a virtude básica do enxa-drista: qualquer tipo de precipitação duran-te a partida pode trazer conseqüênciasnegativas.
9. A prepotência é uma má conselheira; tenteser objetivo sobre seu nível de jogo e o deseus adversários.
10. "O peão passado é um criminoso que deveestar na prisão, não o trate com medidassuaves." (Nimzowitsch)