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  • 333A incluso do surdo na universidade...

    A INCLUSO DO SURDO NA UNIVERSIDADE MITO OU REALIDADE?

    Maria Cecilia de Moura Pontifcia Universidade Catlica-SP

    alce55@uol.com.br

    Kathryn M. Pacheco HarrisonPontifcia Universidade Catlica-SP

    kathy_harrison@terra.com.br

    Resumo: Este artigo tem como objetivo discutir se o que colocado pelo Decreto de Lei nmero 5.626 (22/12/2005), que regulamenta a lei sobre a lngua brasileira de sinais (Lei Federal n10436, de 24/04/2002) e a Lei de Acessibilidade (n. 10.098 de 19/12/2000), que dita que as Universida-des devero estar aptas a receberem alunos Surdos, est sendo obedecida. A questo que se coloca no panorama atual : a incluso dos Surdos na Universidade ocorre de forma efetiva? Aps trabalho de um ano numa Universidade, junto a professores, alunos Surdos e intrpretes, verificou-se que se est muito longe ainda de se conseguir uma real incluso e que muitas decises devem ser tomadas e aes realizadas para que se possa verdadeiramente conseguir que essa incluso seja verdadeira. Conclui-se que a simples presena do intrprete na sala de aula condio necessria, mas no suficiente para que o Surdo possa ter seus direitos respeitados.Palavras-chave: incluso na universidade, surdos, intrpretes de lngua de sinais, lei de libras.

    Abstract: This article discusses whether Decree 5626 (12/22/2005) refer-ring to Brazilian Sign Language (Federal Law 10436 04/23/2002) and Accessibility Law 10098 (12/19/2000) that requires Universities to be equipped to receive deaf students is being followed. The question is whe-ther deaf inclusion in universities actually occurs. After a year working

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    with teachers, deaf students and interpreters at a university, we have con-cluded that the university is far from achieving real inclusion and that many more decisions must be taken and actions made in order to meet genuine inclusion. It concludes by confirming that the presence of the interpreter in the classroom is necessary, however, it is not sufficient for the Deaf to have their rights fully respected.Keywords: university inclusion, deaf people, sign language interpreters, libras law.

    1. Introduo

    A utilizao da lngua de sinais na educao e habilitao do Surdo foi alvo de muitos estudos nos ltimos anos, principalmente aps a constatao por Stokoe (1960/1978), em 1960, de que, tanto em relao a sua estruturao interna como de sua gramtica, ela ti-nha valor lingstico semelhante s lnguas orais e cumpria as mes-mas funes, com possibilidades de expresso em qualquer nvel de abstrao. Em pases como a Sucia, a Dinamarca e a Finlndia ela vem sendo usada na educao com Surdos h aproximadamente vinte anos. No Brasil, os estudos sobre a lngua de sinais so ainda mais recentes (QUADROS, 1997, 2006, 2007, 2008, 2009; LODI, 2004; LACERDA; NAKAMURA; LIMA, 2000) e o uso da ln-gua de sinais na educao do Surdo iniciou-se com a introduo da Comunicao Total na dcada de setenta (YOSHIOKA, M.C.; SPINELLI, M.; TEIXEIRA, V.; MOURA, M. C., 1981).

    Na verdade, foi o movimento multicultural na dcada de oitenta que trouxe em seu bojo a luta dos Surdos para que sua lngua fosse respeitada, assim como a sua cultura (MOURA, 2000).

    Como resultado deste movimento foi que se verificou, no Bra-sil, desde o mesmo perodo, o fortalecimento da comunidade Surda que, por meio de suas associaes e principalmente de sua federa-o FENEIS1 -, passou a requisitar que a lngua de sinais passasse a ser usada na educao com os Surdos como parte de uma filosofia

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    que prega a compreenso do Surdo no como deficiente, mas como diferente e pertencente a um grupo lingstico minoritrio (An-dersson, 1994). Esse movimento teve o respaldo da comunidade cientfica que, por meio de pesquisas e artigos cientficos, validou o desejo, transformando-o em necessidade a ser atendida.

    O conjunto dessas aes resultou na elaborao e na votao das leis n 10.436, que dispe sobre a Lngua Brasileira de Si-nais - Libras, e o art. 18 da Lei n 10.098 que, aprovadas, foram regulamentadas pelo decreto 5.626/05. Essa regulamentao exige agora que novas bases tericas e formas prticas de atuao sejam revistas para que a ao exigida pela lei possa ser cumprida.

    Sabe-se que apenas uma mudana total dos paradigmas possi-bilitar que uma modificao real tome corpo e possa tornar a lei efetiva. As Universidades devero se adaptar a essa nova realidade desde que a lei estabelece vrias normas a serem seguidas.

    O decreto 5626/05, por exemplo, no captulo II Da Incluso da LIBRAS como Disciplina curricular - coloca que:

    Art. 3 - A Libras deve ser inserida como disciplina cur-ricular obrigatria nos cursos de formao de professores para o exerccio do magistrio, em nvel mdio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituies de ensino, pblicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios.

    1. Todos os cursos de licenciatura, nas diferentes reas do conhecimento, o curso normal de nvel mdio, o curso normal superior, o curso de Pedagogia e o curso de Educa-o Especial so considerados cursos de formao de pro-fessores e profissionais da educao para o exerccio do magistrio.

    2. A Libras constituir-se- em disciplina curricular opta-tiva nos demais cursos de educao superior e na educao

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    profissional, a partir de um ano da publicao deste De-creto.

    A introduo da LIBRAS como disciplina curricular na Uni-versidade traz mais do que apenas o ensino de uma lngua, pois h a necessidade de que todos os envolvidos nessa aprendizagem compreendam a especificidade do Surdo, no apenas com relao sua lngua, mas tambm com relao sua cultura e forma de estar na sociedade. Apenas a compreenso desses aspectos possibilitar uma atuao que contemple a singularidade dos sujeitos Surdos.

    Temos que ressaltar que o universo de Surdos que freqentam a Universidade pautado por particularidades que devem ser con-templadas por todos aqueles envolvidos no trabalho educacional: professores e intrpretes. Muitos Surdos no tm fluncia em LI-BRAS, mas conseguem compreender o que lhes dito se condies optimais de leitura-oro-facial lhes forem oferecidas. Este um tra-balho que os intrpretes devem propiciar aos Surdos que freqen-tam a Universidade, assim como o conhecimento pelo professor da particularidade de funcionamento desses alunos.

    Portanto, necessrio que todas as facetas dos Surdos que fre-qentam a Universidade sejam compreendidas para que a incluso seja real.

    Com relao aos intrpretes, sabemos que a sua presena na sala de aula assunto complexo que necessita ser muito bem estru-turado dentro da Universidade, mas consideramos que os intrpre-tes necessitam de uma base de apoio bem estabelecida onde possam colocar suas dvidas, seus problemas e onde se possam buscar solues que faam com que as necessidades dos Surdos sejam am-plamente contempladas. Alm disso, h a necessidade de uma ao integrada entre os intrpretes e os professores dos diferentes cursos para que a educao possa ocorrer de forma plena.

    necessrio que se torne claro para todos os elementos envol-vidos no processo de incluso de alunos Surdos na Universidade que, com relao ao Surdo, estamos lidando com a linguagem em

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    suas diferentes formas de expresso, sejam elas a comunicao ou a expresso escrita. Saber como lidar com o intrprete na sala de aula condio necessria e imprescindvel para que uma proposta de incluso como esta se d de forma integrada e possvel de ser realizada. Compreender a forma particular que o aluno Surdo tem para se expressar na linguagem escrita outra prioridade nesse trabalho. Alm disso, deve-se discutir com o professor quais as formas mais efetivas para que o aprendizado se d de forma real.

    2. Objetivo

    O objetivo desse trabalho foi verificar se a incluso do Surdo na Universidade exigida pelo governo por meio do decreto nmero 5.626 (22.12.05), que regulamenta a lei sobre a lngua de sinais (Lei Federal n10436, de 24/04/2002) e a Lei de Acessibilidade (n. 10.098 de 19.12.00) est sendo cumprida, realizando uma reflexo sobre o que foi observado aps um ano de atuao numa Universidade com alunos Surdos inclusos e propondo aes que possam ajudar para que essa incluso ocorra de forma real.

    3. Metodologia

    Foram elaborados questionrios que foram respondidos por Surdos, intrpretes e professores envolvidos com os alunos Surdos includos numa Universidade em So Paulo. Posteriormente esses dados foram avaliados, procurando-se compreender, por meio da anlise de suas respostas, baseando-se na Anlise de Discurso de Bardin (1977), o que ocorre na Universidade com relao incluso dos Surdos que a freqentam. As respostas de todos os entrevistados foram transcritas e analisadas, sendo que as expresses recorrentes que levavam possibilidade de se compreender o que os diversos

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    segmentos desejavam expressar com relao incluso dos Surdos na Universidade foram colocadas como unidades de anlise.

    4. Resultados

    4.1. Com relao aos professores

    Os professores entrevistados pertenciam a cinco cursos/Facul-dades: Artes do Corpo, Pedagogia, Matemtica, Administrao e Direito, e foram em nmero de dezenove.

    Num primeiro momento tnhamos como forma de obteno de dados o desejo de agendarmos reunies com os professores. En-tretanto, percebemos que era muito difcil conseguir-se agendar reunies com os mesmos para a discusso dos aspectos relaciona-dos incluso dos alunos Surdos. Isso parece se dar por falta de conscientizao dos mesmos com relao ao seu papel na incluso desses indivduos, falta de tempo para reunies e principalmente falta de conhecimento sobre um servio que esteja verdadeiramente voltado para apoiar tanto os surdos como os professores. Entretan-to, por meio de outras estratgias, como por e-mail, foi possvel conseguir-se informaes que nos levaram a analisar a situao do Surdo e do professor na Universidade. Dessa forma conseguimos dados dos 19 professores de diferentes cursos.

    O questionrio aplicado constou das seguintes questes:

    O aluno Surdo que voc tem na sala de aula est integrado com os outros alunos?

    Como foi feita a incluso desses alunos na sala de aula? Vo-cs receberam algum tipo de orientao?

    Quais as maiores dificuldades encontradas com relao ao aluno Surdo includo?

    Como est sendo o aproveitamento acadmico do aluno Sur-do includo?

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    Qual o contato dos professores com os alunos Surdos fora do horrio de aula?

    Qual o contato dos professores com os intrpretes? O que voc gostaria de sugerir com relao aos alunos Sur-

    dos includos?

    A partir das respostas dos professores e para melhor anlise dos dados, reunimos os mesmos sob a forma de expresses-chave que sero apresentadas a seguir.

    5. Integrao e Orientao

    Com relao integrao vrias colocaes foram feitas: o alu-no participa da mesma forma dos colegas desde que a disciplina ministrada no utilize como ferramenta o debate em sala de aula. A integrao vista em alguns casos como algo presente na relao de amizade com os colegas, mas no existindo participao na aula, o que corrobora o que os intrpretes colocam em suas respostas. Para um dos professores, o lugar ocupado pelo aluno Surdo em sala de aula, na frente e em contato direto com o intrprete, poderia restringir o contato do aluno com o resto da classe. Consideramos que se a incluso for bem feita e os alunos ouvintes conscientizados do que ter um colega Surdo em sala de aula, isso no impediria a integrao do aluno Surdo com o resto da turma.

    No caso de alunos Surdos na mesma sala o que acontece a integrao maior entre eles do que com os alunos ouvintes o que perfeitamente natural se pensarmos no compartilhamento de uma mesma lngua e a falta de orientao e sensibilizao com os cole-gas ouvintes.

    H um relato de nenhuma integrao do aluno Surdo com seus colegas, seja dentro ou fora de aula (pelo menos que o professor tenha observado).

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    Nenhum professor relata ter sido orientado com relao a como agir com o aluno Surdo e todos relatam contar com o intrprete para lidar com o aluno Surdo, apesar de no ter nenhum contato formal ou fora da aula com o mesmo. Os professores mostram preocupao com relao a esse aspecto e desejo de ter maiores in-formaes. O aluno Surdo foi visto uma vez como exigente demais consigo mesmo e com os outros, o que para um dos professores exprime a sua maior dificuldade.

    Alguns professores chegam a relatar o estranhamento que tive-ram quando entraram na sala no primeiro dia de aulas e encontra-ram um aluno que se sentava de costas para o professor. S aps pedir para esse aluno se virar que descobriram que ele era um intrprete e que havia um aluno Surdo em sala.

    Os professores no sabem se tm que falar mais lentamente por conta do intrprete e relatam dificuldade no incio, pois tentam falar mais devagar, mas depois de um tempo esquecem e falam mais rpido. Eles colocam que alguns dos intrpretes pedem para falarem normalmente. Em nenhum momento foi pedido aos pro-fessores para esperarem os alunos anotarem o que estava escrito na lousa antes de continuarem a sua explanao. Isso ajudaria os alunos Surdos que no podem se dedicar a duas atividades visuais ao mesmo tempo (olhar o intrprete e copiar da lousa).

    5.1 Incluso

    Para todos os professores, o fato do aluno Surdo estar em sala de aula foi uma surpresa, no houve nenhuma preparao ou conscien-tizao com relao presena desse aluno. O intrprete considera-do parte importante do processo de incluso. Ele tido at como um profissional muito paciente, dadas as condies de trabalho.

    Alguns professores elogiam a atuao do intrprete que, em alguns casos, buscam realmente levar ao aluno Surdo todas as in-formaes do que acontece em sala de aula.

    Existe no discurso de todos os professores uma preocupao muito grande com a incluso real desses alunos e a reclamao

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    constante de no saberem o que fazer e como agir. Existe uma demanda que deve ser tomada como algo a ser resolvido pela Uni-versidade.

    5.2 Dificuldades

    Como explicitado anteriormente, os professores relatam que a dificuldade maior se relaciona a no saber como agir em relao ao aluno Surdo. Eles no sabem se tratar o aluno Surdo da mesma forma que os outros no uma forma de discriminao, pois no lidam com as dificuldades, at por no saberem como fazer. Para um dos professores, o aluno Surdo parece no se esforar para compreender o que se passa, parecendo no estar feliz em estar l. Para o professor s vezes difcil compreender o que acontece com o aluno Surdo pela falta de informaes. Para um dos profes-sores o tempo do aluno diferente dos demais e esse professor em particular se preocupa em sentar com o aluno para explicar melhor o contedo, mas isso s possvel porque esse professor ministra aula terico-prtica, o que facilita esse tipo de abordagem. Claro que a disponibilidade do professor tambm ajuda muito.

    Um professor relata que: No tenho como saber se o que est sendo interpretado corresponde ao que est sendo passado clas-se, principalmente porque o intrprete no tem conhecimento da matria (e nem teria obrigao de ter). Isso aparece em outras palavras no discurso de outros professores que no entendem como o intrprete pode estar interpretando assuntos desconhecidos para ele. Percebe-se aqui a necessidade de um contato maior entre intr-pretes e professores, para que ambos possam trocar informaes e talvez, pensar em estratgias conjuntas que poderiam favorecer o aprendizado do aluno Surdo.

    Desde que o aluno Surdo no conta com a presena do intrpre-te fora de sala de aula alguns professores relatam problemas de co-municao com os alunos Surdos fora de sala de aula para orientar trabalhos e atividades. Talvez devssemos contar com o intrprete para esses momentos tambm, apesar dos intrpretes perceberem

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    que os professores no procuram os alunos. A partir desses dados, tentamos orientar os alunos no sentido deles procurarem os profes-sores, pois consideramos que um movimento desse tipo por parte dos alunos Surdos poderia comear a modificar o quadro geral da incluso dos Surdos na Universidade.

    Os professores se mostram desorientados quanto efetividade da didtica utilizada em sala de aula para a aprendizagem do aluno Surdo, bem como em relao aos critrios de avaliao.

    O uso de filmes no legendados isola o aluno e o professor, a princpio, no percebe a inadequao do material, por no ter sido alertado quanto a esse fato. Isso leva, na palavra dos professores, a uma situao de extremo desconforto e percepo de inadequao que muito constrangedora para ele.

    No discurso de um professor aconteceu exatamente isso:

    Tivemos uma aula onde assistimos a um vdeo sobre o tema que estava sendo discutido. Como o udio era em portu-gus, no havia legenda, o que dificultou o trabalho da tradutora e a compreenso do aluno. Foi um evento isolado, mas demonstra o quanto alguns recursos no so adequados para a incluso.

    O prprio professor passa a perceber as situaes inadequadas, mas isso poderia ser evitado com um trabalho de conscientizao.

    5.3 Aproveitamento Acadmico

    Com relao participao dos alunos fica clara a no participa-o dos alunos Surdos na sala de aula, o que j foi relatado no dis-curso dos professores. O aproveitamento acadmico dos alunos foi considerado ruim pela maioria dos professores, ainda que alguns (poucos) relatem aproveitamento dentro da mdia. O rendimento ruim se deve, em parte, questo pouco ventilada relacionada escrita dos alunos Surdos. A populao Surda, em grande parte,

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    tem uma escrita ruim e isso no se refere apenas populao bra-sileira, mas aos Surdos do mundo inteiro. Muitas so as razes apontadas para justificar esse fato, mas a realidade que a leitura e a escrita dessa populao, muitas vezes, no seguem as regras do portugus. Isso gera enormes controvrsias, sendo que parte da liderana Surda pede que a sua forma de escrita, conhecida como portugus Surdo seja reconhecida e aceita. Por conta disso, soa politicamente incorreto no aceitar a forma que eles tm de se expressar por escrito em portugus. O que acontece de forma pr-tica que os professores no sabem o que fazer com esse portugus que no segue as regras estabelecidas. Essa uma das razes dos professores considerarem que o rendimento acadmico dos alunos ruim. A pergunta que se deve fazer : o portugus ruim que torna seu rendimento acadmico fraco ou o aluno Surdo realmente no est conseguindo se sair bem na Universidade? Se ele fosse avaliado por meio da lngua de sinais ele se sairia melhor? Esse tipo de avaliao pode ser aceito pela Universidade? Retornare-mos a essa questo posteriormente.

    5.4 Contato do Professor com o Aluno

    A maioria dos professores relata no haver nenhum contato dos professores com os alunos fora do horrio de aula. Parece que o aluno no se sente confortvel em procurar o professor e muitas vezes ele no conta com a ajuda do intrprete nesse horrio para intermediar a conversa que poderia esclarecer dvidas ou ampliar o conhecimento do aluno. Alguns professores relatam atender ao aluno Surdo sempre que solicitado.

    5.5 Contato do Professor com o Intrprete

    Os professores relatam no haver contato algum com os intr-pretes. Eles dizem nem ao mesmo saber qual a funo do intrpre-te, que s percebida como uma traduo quando se iniciam as aulas. Os professore no sabem dizer se o intrprete ajuda ou no

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    o aluno Surdo com relao s dvidas. Um dos professores relata ter um timo contato com o intrprete dizendo at que o intrprete parece ter mais interesse do que o aluno, o que mostra que muitas vezes o intrprete que tenta resolver os problemas vividos pelos alunos Surdos. Para outro professor, o contato com o intrprete grande, mas logo aps a aula e de forma rpida. Esses encontros tiveram como objetivo esclarecer atividades a serem desenvolvidas extra-classe. Seria importante se houvesse um tempo maior para que esse tipo de orientao pudesse ser mais bem aproveitada.

    Um dos professores, porque assim o quis, procurou o intrprete logo aps a aula quando discutia situaes extra-sala. Esse profes-sor chegou a aprender alguns Sinais de Libras. Isso demonstra que o interesse do professor e do intrprete pode modificar as relaes e enriquecer o prprio professor.

    5.6 Sugestes

    Os professores sugerem que algum tipo de orientao deveria ser dada com relao a como lidar com o aluno Surdo. Alguns sugerem a elaborao de algum material escrito que favorecesse a compreenso e a tomada de atitudes com relao ao aluno Surdo includo. H tambm demanda de explicaes mais aprofundadas sobre o papel do intrprete, a relao dele com o aluno e com os outros alunos.

    Os professores mostram descontentamento com o rendimento e o background acadmico dos alunos. Para alguns professores, tratar o Surdo de forma diferenciada, pela singularidade pode at mesmo atrapalhar o processo educacional dos alunos. Percebe-se em alguns professores que eles no tm certeza de que o aluno sabe a razo de estarem no curso escolhido. Isso parece refletir as dificuldades que os alunos esto experimentando na Universidade.

    Para alguns professores seria importante a organizao de uma reunio junto aos intrpretes no comeo do semestre e que as orien-taes abordassem questes especficas sobre as aulas ministradas. Essa ltima demanda parece estar presente em decorrncia da difi-

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    culdade de compreenso dos alunos quanto ao contedo ministrado.Um dos professores faz uma sugesto que nos parece bastante

    importante:

    No sei se h disponibilidade de tempo dos intrpretes ou do aluno, mas um perodo maior de contato entre ambos, fora da sala de aula, poderia levar o aluno a ter maior aproxi-mao com seus colegas a partir da sua introduo junto ao grupo por intermdio do intrprete.

    Sabemos das dificuldades de tempo e de tipo de contrato do intrprete, mas se desejamos uma incluso real do Surdo, aspectos como esse deveriam ser considerados.

    Um dos professore pede suporte sobre tcnicas educacionais especficas para os alunos e nos conta que seria importante ter um feedback do aluno quanto a didtica usada, mas para tanto o pro-fessor precisaria da ajuda do intrprete.

    Alguns professores se mostraram interessados em aprender Li-bras, o que seria muito proveitoso para os alunos Surdos includos. Mesmo que o aprendizado de Libras no possa ser obrigatrio, se-ria importante que a Universidade pudesse incentivar os professo-res a faz-lo, desde que a DERDIC2 organiza o processo de ensino de Lngua de Sinais. Talvez a formao de grupos de professores na prpria Universidade em dias de reunio das Faculdades pudes-se facilitar a formao de grupos.

    6. Com relao aos intrpretes

    Da mesma forma como relatado anteriormente, desejvamos, num primeiro momento, realizar entrevistas com os intrpretes. Isso tambm se mostrou invivel, razo pela qual, da mesma forma descrita com os professores elaboramos um questionrio que foi respondido por e-mail.

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    O questionrio dirigido aos intrpretes realizava as seguintes indagaes:

    O aluno Surdo que voc tem na sala de aula est integrado com os outros alunos?

    Como foi feita a incluso desses alunos na sala de aula? Vo-cs receberam algum tipo de orientao?

    Quais as maiores dificuldades encontradas com relao ao aluno Surdo includo?

    Como est sendo o aproveitamento acadmico do aluno Sur-do includo?

    Qual o contato dos professores com os alunos Surdos fora do horrio de aula?

    Qual o contato dos professores com os intrpretes? O que voc gostaria de sugerir com relao aos alunos Sur-

    dos includos?

    Conseguimos contato com 3 intrpretes.As respostas dos intrpretes mostram que, segundo a opinio

    desses profissionais, os alunos Surdos no esto integrados, no tendo havido nenhum tipo de orientao em relao incluso dos mesmos dentro da sala de aula. Alm disso, os intrpretes rela-tam que as atividades desenvolvidas em sala de aula no foram adaptadas para os Surdos, como por exemplo: apresentao de filmes sem legendas, atividades de msica, dana e relaxamen-to que dependiam inteiramente da audio. Os intrpretes relatam que no existe agendamento de horrios extras com os professores para discusso das dificuldades encontradas. As sugestes dos in-trpretes revelam a importncia de sensibilizao dos professores conscientizando-os das peculiaridades dos alunos Surdos e das ne-cessidades especficas desse tipo de populao. Para os intrpretes, necessrio que os professores tenham conscincia da necessidade de usar filmes legendados e de que os materiais usados em sala de aula sejam adaptados. Os exemplos dados vo desde o fato de que

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    o aluno Surdo no tem como anotar da lousa, pois deve olhar o in-trprete e o professor no d tempo para o aluno copiar, falando ao mesmo tempo at contedos que esto verdadeiramente fugindo da compreenso do aluno e que pode ser percebido pela sua expresso facial e que deveriam ser retomados pelo professor.

    Os intrpretes relatam que so raras as ocasies em que foram procurados para interpretarem fora do horrio de aula ou logo aps a aula em que o professor poderia desejar esclarecer algo para o aluno Surdo ou que o aluno Surdo poderia desejar fazer uma per-gunta sobre algo que no havia entendido.

    Um dos intrpretes nos relata uma situao em que o aluno Surdo obviamente no compreendeu quando o professor fala de Estado laico. O intrprete procura o aluno no intervalo da aula e pergunta se ele havia entendido o que o professor havia dito. O aluno relata que no e pergunta ao intrprete o que seria Estado laico. O intrprete, consciente de seu papel, pede para o aluno perguntar ao professor. O aluno diz que no tem coragem. Na segunda parte da aula o aluno Surdo no pergunta, mas um aluno ouvinte o faz, pois tambm no sabia o que era Estado laico. O professor explica e o aluno surdo mostra que compreendeu o que o professor elucidou. Frente a essa situao, o intrprete procura o aluno Surdo e mostra para eles como as perguntas podem e devem ser feitas e que no s o aluno Surdo que no entende alguns contedos, palavras ou expresses. O aluno Surdo sorri envergo-nhado, mas o intrprete percebe que em outras situaes o aluno passa a perguntar para o professor, mesmo que isso no venha a acontecer sempre.

    Esse mesmo intrprete nos questiona sobre um assunto muito importante: papel do intrprete fazer esse tipo de interveno com o aluno Surdo includo na Universidade? De quem esse pa-pel? O professor no deveria estar atento s dificuldades demons-tradas pelos alunos Surdos e incentivar os alunos a perguntarem? Consideramos que isso deveria ocorrer, mas que s pode acontecer se houver um trabalho integrado com esses professores aonde eles

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    mesmos poderiam esclarecer as suas dvidas e as suas possibilida-des de atuao na sala de aula com o aluno Surdo.

    Pelo tipo de discurso feito pelos intrpretes e pelas dificuldades levantadas junto aos professores e alunos Surdos, fica a questo: qual o papel do intrprete? Ele no poderia ser um facilitador das relaes entre os prprios alunos?

    Fica claro, no discurso dos intrpretes que os papis devem no apenas ser passados como regras a serem seguidas, mas discutidos amplamente para que tanto alunos como professores e intrpretes possam saber o que fazer e como fazer.

    7. Com relao aos alunos surdos

    Os alunos Surdos tiveram maior disponibilidade para agendar reunies, mas, para mantermos a mesma sistemtica adotada com professores e alunos, pedimos a resposta a um questionrio, que foi realizada presencialmente ou enviada por e-mail.

    O nmero de Surdos que freqentaram efetivamente a Univer-sidade nesse perodo foi de 8 (oito) alunos, sendo que conseguimos ter contato com 6 (seis) deles.

    7.1 Questionrio para os alunos Surdos

    Como foi a sua entrada na Universidade? O que poderia ter sido feito e no foi feito? Voc acha que o intrprete ajuda no seu dia-a-dia escolar? Como o intrprete poderia ajudar mais? Voc entende o que o professor explica? Quando voc tem dvidas voc tem a possibilidade de per-

    guntar e ter a sua dvida solucionada? Quais as suas sugestes para uma melhor incluso do Surdo

    na Universidade? O que voc gostaria de falar para seu intrprete? O que voc gostaria de falar para seus professores?

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    7.2 Entrada na universidade

    Os alunos Surdos relatam que no h uma preparao para sua entrada na Universidade. Quando chegam na sala de aula o intr-prete que lhes explica como ir funcionar o esquema de intrprete em sala de aula. Muitos dos Surdos j conhecem o esquema, mas alguns nunca puderam contar com o intrprete em sala de aula e essa uma situao muito nova. Eles percebem que os professores se sentem no confortveis com a presena do intrprete, assim como os demais alunos, que aparentam no entender o que est acontecendo. Eles mesmos, no incio, no sabem se podem ou no interromper o professor e acabam ficando com dvidas, muitas vezes por vergonha.

    Os alunos percebem que os professores no tm informaes sobre como o Surdo se relaciona com o mundo (de forma visual) e que o intrprete ajudou nessa compreenso.

    7.3 Sugestes

    As sugestes dadas so as mesmas dadas no primeiro bloco de respostas e que se encontram anteriormente neste trabalho.

    Alguns alunos consideram importante um contato maior dos professores com os intrpretes para que esses ltimos possam sa-ber mais a respeito do assunto tratado em sala de aula e para que possam estudar os Sinais correspondentes a termos especficos.

    7.4 Intrprete

    Para todos os alunos Surdos o intrprete figura essencial no seu dia a dia acadmico. Eles no podem nem ao menos imaginar como fariam sem o intrprete na sala de aula. Para alguns, seria importante que o intrprete conhecesse melhor o assunto a ser interpretado para que pudesse fazer a interpretao de forma mais fluda.

    H alguns relatos (ainda que no de todos os Surdos) de que s vezes eles tm a sensao de que o intrprete resume o que o pro-

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    fessor falou. Eles percebem isso porque o professor faz um longo discurso e o intrprete faz poucos Sinais. Alm disso, muitas vezes o professor escreve na lousa algo que no foi dito pelo intrprete e que parece ser um conceito importante.

    Um problema bastante relatado diz respeito mudana de intr-pretes no decorrer do Curso. Eles gostariam, na medida do poss-vel, que os intrpretes fossem mantidos, porque se habituam a eles que passam a conhecer seu jeito e a melhor forma deles compre-enderem. Sabemos que isso pode ser impossvel, muitas vezes em razo dos intrpretes pararem de trabalhar na universidade, mas consideramos esse pedido bastante razovel se for exeqvel.

    7.5 O professor

    Para a maioria dos Surdos os professores se esforam muito para passar informaes para os alunos Surdos, mesmo no saben-do Libras. Mas, os alunos percebem total desconhecimento por parte dos professores de como o Surdo aprende, das dificuldades que eles possam ter com relao ao portugus, da necessidade do aluno Surdo ter acesso a material pedaggico anterior aula.

    A questo dos filmes no legendados tambm foi levantada, o que trouxe angstia e desconforto aos alunos.

    Para os alunos Surdos, o professor deveria respeitar as dificul-dades de escrita do Surdo. Esse um assunto muito polmico que j levantamos acima e a que retornaremos ao final desse artigo.

    7.6 Orientaes

    Buscamos, no decorrer da pesquisa, orientar os alunos no sen-tido de que buscassem junto aos professores respostas para suas perguntas e dvidas, assim como requisitassem tudo que consi-deravam importante para realizarem suas atividades acadmicas. Sentimos que para alguns alunos isso possvel, mas muitos se sentem incomodados em ter que tomar essa atitude. Enfatizamos o papel do intrprete como elemento de ligao importante entre

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    eles e o professor. Parece-nos que a relao com o intrprete em geral muito boa e que os intrpretes esto fazendo o possvel para solucionar os problemas enfrentados pelos Surdos.

    Colocamo-nos disposio de professores e intrpretes para solu-cionar problemas e discutir dvidas, mas parece que essa no uma funo que eles pudessem atribuir a ns, desde que a DERDIC que , para eles, o departamento responsvel por esse assunto na Uni-versidade, mesmo que no o realize. Parece-nos que, desde que esse tipo de orientao e acolhimento nunca foi feito na Universidade. Apesar de termos alunos surdos includos h bastante tempo, no se criou a tradio de se contar com esse tipo de servio. Nada impede que ele possa se iniciar agora, desde que quem for realizar esse tipo de atividade seja investido de autoridade e autorizao para faz-lo.

    8. Algumas consideraes

    A unidade acadmica que se mostrou mais mobilizada para compreender e fornecer informaes sobre os alunos Surdos in-cludos foi a de Cincias Contbeis em que os professores se mos-traram preocupados em entender assuntos relacionados ao aluno. Tanto os alunos, como os professores se mostraram mais dispon-veis para prestarem informaes e se disporem a uma interlocuo com a pesquisadora. Os intrpretes no eram dessa unidade. Artes do Corpo tambm se mostrou bastante mobilizada. interessante observar que os alunos e professores desses dois cursos se mostra-ram muito envolvidos com esse projeto.

    Parece-nos importante salientar que a verdadeira incluso s pode se dar se todos estiverem envolvidos no processo e os dados, ainda que de um pequeno nmero de sujeitos pesquisados, demons-tra que quando um dos lados se envolve e se interessa (no caso, os professores) os outros envolvidos (alunos) tambm se sentem mais motivados a procurar ajuda e trabalhar para chegar a solues aos problemas enfrentados.

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    Os alunos Surdos requisitaram alguns itens especficos que elen-co abaixo:

    Necessidade de ter material escrito do contedo das aulas dadas.

    Necessidade de ter apoio visual nas aulas (Power Point Pre-sentation, transparncias, etc.).

    Possibilidade de ter acesso ao material anteriormente aula para poderem seguir melhor o que lhes passado.

    Maior flexibilidade do professor com relao correo das provas em razo da escrita do portugus como segunda ln-gua.

    Sentimento de que os professores no conhecem os Surdos e se sentem incomodados com a sua presena.

    Possibilidade de realizar as provas em LIBRAS com a ajuda do intrprete.

    Falta de conhecimento do intrprete do assunto a ser inter-pretado na aula.

    9. Concluso

    De acordo com os dados coletados conclumos que se as univer-sidades desejam fazer cumprir a lei de forma que uma real incluso venha a acontecer necessrio que exista uma pessoa encarregada da incluso dos Surdos na Universidade em todas as instncias: Surdo Intrprete Professor. Esse profissional deve ter vasto e profundo conhecimento da questo educacional do Surdo, das questes relacionadas lngua e a Libras e escrita do portugus como segunda lngua. Alm disso, recomendvel que esse profis-sional saiba Libras para que possa ter um caminho fcil e fludo de comunicao com os alunos Surdos.

    Dada a necessidade de intercmbio de informaes que se mos-trou crucial para a real incluso do Surdo, vemos como condio

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    imperativa que o Intrprete tenha uma carga horria mais estendida para que possa atender os professores e os alunos em suas ativida-des extra-classe.

    importante salientar a necessidade de se realizar uma discus-so ampla com relao s dificuldades de portugus apresentadas pelos alunos Surdos (ainda que no todos, mas de qualquer forma, a maioria). Esse um assunto de grande impacto atualmente que muitos profissionais da rea da surdez evitam dar opinio frente questo poltica que se coloca. De maneira bem simples o que se encontra hoje em dia no discurso de muitos profissionais que o Surdo no tem culpa de no ter aprendido a lngua escrita. A culpa do sistema educacional que no soube realizar bem a sua funo. O resultado seria a aceitao do portugus Surdo em que o que seria avaliado seria o contedo e no a forma. Alm disso, se espe-ra que o aluno Surdo possa fazer a avaliao em lngua de sinais. Essas no so questes simples e no devem envolver apenas a opinio de Surdos e/ou de um profissional. uma questo com-plexa que merece reflexo e discusso ampla entra profissionais da rea. A partir dessa discusso, a Universidade dever adotar uma sistemtica de trabalho em que essa forma de expressar o portugus Surdo ser ou no aceita, assim como a possibilidade de realizar as provas em Libras. Essa deciso ser ento passada para todos os envolvidos, inclusive aos alunos antes de prestar vestibular. Todos tm que estar cientes das exigncias: Surdos, Intrpretes e Profes-sores para que mal entendidos sejam evitados e para que o melhor possa ser feito para que uma real incluso acontea. A falta de conhecimento do professor pode levar quilo que no desejamos para nenhuma universidade: a incluso perversa que finge que in-clui para apenas cumprir o papel de dar um certificado que pouca serventia ter para um profissional despreparado.

    Como nos dizem Harrison e Nakasato (2006) num trabalho que analisam as questes ligadas ao Surdo na universidade:

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    A universidade, como um dos centros privilegiados de sa-ber, deveria estar atenta s questes da diversidade e ne-cessidade de se tomar as diferentes prticas sociais como fundamentais para o processo de construo de novas prti-cas educacionais. (p.72)

    Nos Estados Unidos encontramos um respaldo bastante grande para que os alunos Surdos possam ser capazes de ler e escrever na lngua inglesa, sendo que o Departamento de Ingls da Gallaudet University (NICKERSON, J., 2003) desenvolve um trabalho que incentiva os alunos a desenvolverem proficincia em ingls de for-ma a poderem compreender uma grande gama de gneros escritos de forma a poderem ser independentes na sua vida acadmica.

    Para eles, os alunos Surdos que desejam cursar a Universidade devem ter domnio do ingls lido e escrito. Eles acreditam que a leitura de material em ingls essencial para o acmulo de conhe-cimentos e a formao de uma mente crtica. Da mesma forma, a escrita do ingls formal importante para passar informaes e formar opinies.

    Depender do outro para refazer a escrita do ingls perpetuar a dependncia a que o Surdo foi assujeitado no decorrer dos sculos. A independncia passa pelo domnio da lngua majoritariamente usada no pas. Eles esclarecem que isso no retira a importncia da lngua de sinais e da cultura Surda, mas que leva os sujeitos a po-derem ser atuantes de forma significativa no mundo dos ouvintes.

    Na verdade, muitos Surdos chegam s Universidades nos Es-tados Unidos com um domnio incompleto do ingls, da mesma forma que no Brasil, razo pela qual eles tm a possibilidade, den-tro da Universidade, de melhorarem suas habilidades lingsticas por meio de cursos especiais de ingls como segunda lngua por um ano antes de iniciarem os cursos nas Faculdades por eles es-colhidas. O objetivo desses cursos melhorar a leitura e a escrita de textos acadmicos. Ainda enquanto freqentam os cursos, esses alunos podem contar com auxlio em textos em ingls para que

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    possam ter habilidades lingsticas adequadas para seguirem sua carreira, acadmica ou no. Esse sistema tambm adotado na Colmbia, tambm sob a formatao de um ano de curso de lngua escrita antes da entrada formal nas faculdades.

    Esse tipo de sistemtica poderia ser adotado pelas Universida-des brasileiras. Reiteramos que, para uma incluso verdadeira, necessrio o esforo de todos os envolvidos ainda que isso tenha um custo para a Universidade.

    Outro aspecto de grande importncia o aquele relacionado ao intrprete. Encontramos, nessa pesquisa, que se considerava que a simples presena de intrpretes na sala de aula seria suficiente para que os problemas dos Surdos na universidade fossem resolvidos. Demonstramos que isso no verdade. O que necessrio uma atuao muito mais ampla. No apenas uma questo de lngua que est em pauta, mas muitos outros fatores que passam, em pri-meiro lugar, pelo respeito pela diferena.

    Temos certeza de que muitas Universidades no Brasil atual-mente realizam um trabalho consciente de incluso, mas muito h ainda a ser feito e acreditamos que os dados aqui apresentados podero ser teis para uma discusso profunda entre os envolvidos que poder melhoras ainda mais o cenrio da incluso de Surdos na Universidade brasileira.

    Notas

    1. FENEIS Fundada em 1987 - Federao Nacional de Educao e Integrao dos Surdos - entidade filantrpica, sem fins lucrativos, tem finalidade scio-cultu-ral, assistencial e educacional e tem por objetivo a defesa e a luta dos direitos da Comunidade Surda Brasileira. filiada Federao Mundial dos Surdos.

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    2. Derdic: Diviso de Educao e Reabilitao dos Distrbios da Comunicao. Unidade Suplementar da Faculdade de Cincias Humanas e da Sade da PUC-SP, que possui Clnica para atendimento de alteraes de audio, voz e linguagem, e Escola Especial para Surdos.

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