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Farid Eid Maria José de Souza Barbosa Rodrigo Erdmann Oliveira (Organização) Encontro Regional de Engenharia e Desenvolvimento Social EM DEBATE: Formação em Engenharia, Tecnologia Social Aplicada e Desenvolvimento da Amazônia ICSA Instituto de Ciências Sociais Aplicadas UFPA INSTITUTO FEDERAL PARÁ Campus Castanhal Apoio: Realização: Ministério do Trabalho e Emprego ICSA Instituto de Ciências Sociais Aplicadas UFPA EM DEBATE: Formação em Engenharia, Tecnologia Social Aplicada e Desenvolvimento da Amazônia Farid Eid (organizador)

Livro IEREDS-N

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Farid Eid

Maria José de Souza Barbosa

Rodrigo Erdmann Oliveira

(Organização)

Encontro Regionalde Engenharia e

Desenvolvimento Social

EM DEBATE:Formação em Engenharia, Tecnologia Social Aplicada eDesenvolvimento da Amazônia

ICSAInstituto de Ciências Sociais Aplicadas

UFPA

INSTITUTO FEDERALPARÁCampus Castanhal

Apoio:Realização:

Ministério do

Trabalho e Emprego

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Eid

(organizador)

Farid EidMaria José de Souza Barbosa Rodrigo Erdmann Oliveira

(Organizadores)

EM DEBATE: Formação em Engenharia, Tecnologia Social Aplicada e

Desenvolvimento da Amazônia

Belém2012

EM DEBATE: Formação em Engenharia, Tecnologia Social Aplicada e

Desenvolvimento da Amazônia

© Instituto de Ciências Sociais Aplicadas - ICSA 2012

Projeto Editorial

Instituto de Ciências Sociais Aplicadas

Capa e Editoração Eletrônica

Suzana Rodrigues Wanzeler

Revisão

Bárbara Santos Macêdo Espínola

Ficha CatalográicaAuricléia Barra de Souza Figueiredo

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

E53e Em debate: Formação em Engenharia, Tecnologia Social Alicada e Desenvolvimento da Amazônia / Organização: Farid Eid; Maria José de Souza Barbosa; Rodrigo Erdmann Oliveira-Belém: ICSA, 2012. 131 p.; il.; 22,7x15,5cm.

ISBN: 978-85-61214-13-5

1. Engenharia Ambiental. 2. Tecnologia-civilização. 3. Desenvolvimento Sustentável - Amazônia. I. Eid, Farid; Barbosa, Maria José de Souza; Oliveira, Rodrigo Erdmann, orgs. II. Título.

CDD: 22. ed. 363.7

CURRÍCULO DOS AUTORES

Farid Eid: Professor Associado IV da UFPA. Possui graduação em Economia e Administração de Empresas (FMU, 1978), Mestrado em Engenharia de Produção (UFPB, 1986) e Doutorado em Économie et Gestion (UPJV, França, 1994), com DEA – Diplôme d’Études Approfondies en Économie et Gestion (UPJV, França, 1991). Bolsista Extensão no País pelo CNPq (2010-2013). Participou de pesquisas no Laboratório de Análise do Trabalho no Departamento de Engenharia de Produção na Universidade Federal da Paraíba (UFPB, 1985-1989). Líder do Grupo de Extensão e Pesquisa em Economia Solidária, GEPES, credenciado pela UFSCar/CNPq, mantendo relação de cooperação, desde 2001, com o Programa de Ensino, Pesquisa e Extensão Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários – ITCPES da Universidade Federal do Pará, onde desde 2010 é membro efetivo. Participa do Grupo de Estudo e Pesquisa Trabalho e Desenvolvimento da Amazônia. E, desde 2011 integra o Grupo de Pesquisa da União Européia Cooperativismo, Desarollo Rural y Empreendimentos Solidários, em Cooperação Internacional entre a Universidade de Alicante – Espanha e a Universidade Federal do Pará. Orienta atualmente alunos no PPG de Economia da UFPA (Belém), PPG Dinâmicas Territoriais e Sociedade na Amazônia (Marabá), ambos na UFPA e no IFPA Castanhal no Mestrado Proissional Desenvolvimento Rural e Gestão de Empreendimentos Agroalimentares.

Fernando Michelotti: Possui graduação em Engenharia Agronômica pela Universidade de São Paulo (1993) e mestrado em Planejamento do Desenvolvimento - com ênfase em Economia do Desenvolvimento - pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (2001). Atualmente é professor Adjunto I da Universidade Federal do Pará - Campus de Marabá. Tem experiência na área de Planejamento Urbano e Regional, com ênfase em Desenvolvimento Rural.

Maria José de Souza Barbosa: Possui graduação em Serviço Social pela Universidade Federal do Pará (1984), mestrado e doutorado em Serviço Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1998-2003). Desde 1994 atua como professora da UFPA. Trabalhou no Governo do Estado como Secretária da Secretaria Especial de Proteção Social – SEPS e depois como Secretária Adjunta da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social – SEDES. Desde 2008 voltou à UFPA e atualmente exerce a função de Diretora Adjunta do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas – ICSA. Coordena o Grupo de Estudos e Pesquisa Trabalho e Desenvolvimento da Amazônia. Integra o Programa Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários e o Grupo de Pesquisa Cooperativismo, Desarrollo Rural y Empreendimentos Solidários en La Unión Europeia y Latinoamérica, em cooperação com a Universidade de Alicante – Espanha. Suas temáticas de estudo são em Desenvolvimento Regional, Local e Rural, com ênfase em economia solidária, cooperativismo e incubação de

cooperativas e empreendimentos solidários; políticas sociais e sustentabilidade. É professora do programa de pós-graduação em Serviço Social e Mestrado proissional em Desenvolvimento Rural e Gestão de Empreendimentos Agroalimentares.

Rodrigo Erdmann Oliveira: Possui graduação em Engenharia Ambiental pela Universidade do Estado do Pará – UEPA (2011). Possui experiência em Engenharia Sanitária, com ênfase em Engenharia Ambiental, tendo atuado principalmente em projetos temáticos de gestão ambiental de pequenos empreendimentos; Gestão de Resíduos Sólidos com catadores de materiais recicláveis; incubação de empreendimentos de Economia Solidária; Educação Ambiental comunitária de base popular. Atualmente é mestrando no Programa de Planejamento Energético – PPE, COPPE/UFRJ.

Romier da Paixão Sousa: Possui graduação em Agronomia pela Universidade Federal Rural da Amazônia (1999), mestrado em Agriculturas Amazônicas pela Universidade Federal do Pará (2002) Maestría en Agroecología: un enfoque para el Desarrollo Rural pela Universidade Internacional de Andalucia (2011). É doutorando em Estudios Medioambientales pela Universidad Pablo de Olavide – Sevilla. Atualmente é professor de ensino básico, técnico e tecnológico do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará. Coordenou o Curso Técnico em Agropecuária com ênfase em Agroecologia apoiado pelo Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária. Coordenou o Programa Saberes da Terra na Amazônia Paraense. Participou da equipe de elaboração dos Cadernos Pedagógicos do Programa Projovem Campo Saberes da Terra em nível nacional. Tem experiência na área de Agronomia, com ênfase em Desenvolvimento Rural, atuando principalmente nos seguintes temas: agricultura familiar, agroecologia, educação, Amazônia e educação do campo.

Sandra Ruino: Possui graduação pela Faculdade de Tecnologia de São Paulo (1994), mestrado (1999) e doutorado (2005) em Engenharia de Produção pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e pós-doutorado em Tecnologias Sociais pela Université Catholique de Louvain – UCL (2009). Foi professora colaboradora no Departamento de Engenharia de Produção na EPUSP (2005-2008), professora efetiva no Departamento de Engenharia de Produção da UFRN (2009-2010), atualmente professora do Departamento de Engenharia de Produção da UFOP, coordenadora da Incubadora de Empreendimentos Sociais (INCOP), vice-coordenadora do Núcleo Multidisciplinar de Estudo, Pesquisa e Extensão em Projetos de Engenharia e Gestão Aplicados ao Desenvolvimento Ambiental e Social (PEGADAS-UFRN), é membro fundadora do Núcleo de Economia Solidária da Universidade de São Paulo (NESOL-USP). Tem experiência em Desenvolvimento Social e Sustentável, Tecnologia e Inovação Social, Planejamento e Gestão Estratégica, Gestão e Produção Projetos, Economia Solidária, e Processos Autogestionários.

Sidney Lianza: Possui graduação em Engenharia Civil pelo Instituto Mauá de Tecnologia (1975), mestrado (1991) e doutorado (1998) em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ. É professor adjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro. No desenvolvimento de suas atividades de ensino, pesquisa e extensão focaliza o mundo do trabalho, desenvolve projetos abarcando as seguintes áreas: relações de trabalho; metodologias participativas e de ação; educação e formação proissional; economia social e solidária, autogestão; engenharia de empreendimentos sociais e solidários; gestão de projetos solidários, gestão compartilhada de recursos naturais, sustentabilidade da cadeia produtiva da pesca; redes solidárias; estudos de viabilidade técnica, econômica, ambiental e social. Coordenador de Extensão do Centro de Tecnologia da UFRJ. Líder do grupo de pesquisa “Núcleo de Solidariedade Técnica” – SOLTEC/UFRJ.

Ulisses Manaças: Estudou Filosoia na UFRJ em curso do PRONERA é militante e membro da coordenação estadual do MST no estado do Pará.

Walter Bazzo: Possui graduação em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal de Santa Catarina (1978), mestrado em Engenharia Mecânica (1980) e doutorado em Educação (1998) também pela UFSC. Atualmente é professor Associado III na UFSC no curso de graduação em Engenharia Mecânica e no Programa de Pós Graduação em Educação Cientíica e Tecnológica (PPGECT). Fundador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação Cientíica e Tecnológica (NEPET), onde é hoje coordenador. Autor de vários livros, possui experiência na área de Educação, com ênfase em Métodos e Técnicas de Ensino, atuando principalmente nos seguintes temas: Educação Tecnológica; Ciência, Tecnologia e Sociedade; Educação em Engenharia; Aspectos Didáticos e Aprendizado Tecnológico.

SUMÁRIO

ABERTURA 08

MESA 1

Formação do engenheiro: projetos pedagógicos em questão

Fernando Michelotti 26

Walter Antônio Bazzo 36

Romier Souza 45

MESA 2

Tecnologia social aplicada ao desenvolvimento da Amazônia

Sandra Ruino 54

Maria José de Souza Barbosa 69

MESA 3Engenharia, gestão de empreendimentos solidários e movimento social

Sidney Lianza 82

Farid Eid 90

Ulisses Manaças 102

BALANÇO SOBRE O I EREDS DA REGIÃO NORTE DO BRASIL

Avaliação da coordenação 122

Depoimentos de participantes discentes e da comissão do evento 122

Ilustração de alguns momentos do EREDS-Norte 125

APÊNDICES 129

ABERTURA

Este livro é resultado do apoio do Projeto Centro de Formação em

Economia Solidária da Região Norte / CFES Amazônia executado nos anos 2010

a 2012, nos sete estados nesta região do país, sob a coordenação do Programa

Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos

Solidários da Universidade Federal do Pará – PITCPES/UFPA, que tem como

prioridade a construção e implantação de tecnologias sociais aplicadas no

desenvolvimento territorial da Amazônia, em que os sujeitos beneiciados são protagonistas de um complexo processo de formação e assessoramento em

que interagem movimentos sociais rurais e urbanos, coletivos de trabalhadores

associados, entidades de apoio, gestores públicos, professores/pesquisadores,

alunos de graduação e pós-graduação.

Nesta perspectiva o apoio ao I EREDS – Norte foi importante por se

tratar de temas da maior relevância, pois diz respeito inicialmente à formação

universitária de estudantes de Engenharia na Amazônia, hoje, fortemente

inluenciada pelos grandes projetos empresariais implantados na região, não obstante a presença histórica e marcante de movimentos sociais, notadamente,

na agricultura familiar e camponesa expressa pela organização de associações

e cooperativas, em volumes de produção de alimentos, diversiicada e agroecológica.

Na atualidade, observa-se que estão conigurados dois modelos de desenvolvimento territorial na Amazônia, um fundamentado na política pública

neodesenvolvimentista com a persistência na construção de grandes obras de

infraestrutura de suporte em apoio a projetos de grupos empresariais nacionais

e transnacionais, nas cadeias produtivas ligadas à mineração, na penetração da

monocultura do agronegócio em grande escala da soja, do dendê, da pecuária,

entre outras.

E, outro modelo de desenvolvimento, oposto a este, historicamente

vinculado à produção da população indígena, comunidades remanescentes

de quilombos, trabalhadores sem terra, populações ribeirinhas, pescadores

artesanais, trabalhadores extrativistas, trabalhadores atingidos por barragens,

entre outras classes de trabalhadores que em sua grande maioria coniguram a

agricultura familiar e camponesa, produzem para autoconsumo e um excedente

pequeno para venda, principalmente no comércio local. Atuam notadamente nas

atividades da fruticultura, da mandiocultura, das oleaginosas, do artesanato, da

pesca artesanal e aquicultura, do mel e da cera de abelha.

A presença da universidade nesse quadro em movimento é fundamental

seja pela oferta de cursos, pelas atividades de grupos de pesquisa e extensão

interagindo com as demandas das pessoas interessadas, visando contribuir para a

inserção desses sujeitos sociais nos projetos pedagógicos e não como iniciativas

de alguns professores e alunos de graduação e pós-graduação, comprometidos

com a perspectiva do desenvolvimento sob a diretriz das tecnologias sociais.

Nesse contexto foi organizado o I Encontro Regional de Engenharia e

Desenvolvimento Social – EREDS Norte, a partir da experiência das oito edições

do Encontro Nacional ENEDS e com apoio da Coordenação Nacional do IX

ENEDS, através da Profª. Sandra Ruino. Ressalta-se o apoio da Pró-Reitoria de Extensão, do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas e do Instituto Federal de

Educação e Tecnologia do Pará, IFPA Campus Castanhal, importantes instituições

na organização do I EREDS Norte, a PROEX no inanciamento do evento, o ICSA com o suporte físico e de pessoa e o IFPA que disponibilizou cozinha,

auditório e alojamento aos participantes e o apoio do CFES na organização e

sistematização do evento.

No evento ocorreram três mesas com docentes das Universidades

Federais do Rio de Janeiro, de Santa Catarina, de Ouro Preto, do Pará dos campi

de Belém e de Marabá, e do Instituto Federal de Educação e Tecnologia do Pará

do Campus Castanhal.

Destaca-se que a grande maioria das 375 pessoas inscritas eram estudantes

de diversos cursos de Engenharia da UFPA Campus de Belém e de Castanhal,

estudantes dos diversos cursos do IFPA Campus Castanhal, empreendedores

solidários, movimentos sociais, entidades de apoio e gestores públicos.

O debate possibilitou o aprofundamento de temas sobre as mudanças

nos processos de formação do engenheiro, passando pela emergência de

demandas por construção participativa de tecnologia social a ser aplicada ao

desenvolvimento social; construção essa, vinculada à gestão estratégica de redes

de produtores, consumidores e gestores públicos na organização de pequenas

cadeias produtivas voltadas ao desenvolvimento territorial local e endógeno, na

perspectiva da sustentabilidade.

O evento priorizou o circuito de experiências concretas as quais foram

distribuídas e apresentadas em quatro salas: Recursos Hídricos e Desenvolvimento

Social; Segurança Alimentar e Desenvolvimento Social; Cadeia Produtiva e

Desenvolvimento Social; Desenvolvimento Rural e Desenvolvimento Social.

Três experiências foram selecionadas e serão publicadas no livro da série,

“CIRCUITO DE EXPERIÊNCIAS: Tecnologias, Metodologias e Avanços

na Extensão Universitária para o Desenvolvimento Social”, volume 2, com

experiências apresentadas também nos EREDS das Regiões Nordeste e Sudeste

do país, a ser lançado em 2013.

Assim, apresenta-se o debate sob a dinâmica de novas constituídas de

modo a dar conta de uma temática que inova em termos das discussões sobre

a formação de engenheiros em sinergia com os sujeitos protagonistas do

desenvolvimento social. A aplicação de tecnologias sociais ao desenvolvimento

a Amazônia.

Na Mesa de abertura dos trabalhos do I EREDS NORTE, realizado no

Instituto Federal de Educação e Tecnologia do Pará, IFPA Campus Castanhal,

a coordenação do evento destacou inicialmente os agradecimentos ao então

estudante de Engenharia Ambiental, Rodrigo Erdmann, entre as pessoas

fundamentais na organização do evento, assim como, à professora Maria José

Barbosa e a equipe do ICSA e da Pró-Reitoria de Extensão pela UFPA e os

professores Francisco Edinaldo Feitosa, Cícero e Adebaro Reis pelo IFPA.

Nossos agradecimentos especiais também a toda a equipe das duas

Incubadoras de Cooperativas Populares, a ITCPES da UFPA Belém e a

INCUBITEC do IFPA Campus Castanhal, em mais uma ação de cooperação;

aos estudantes das diversas áreas das engenharias que formaram uma comissão

atuante e comprometida na organização do evento com o binômio Engenharia e

Desenvolvimento Social; e aos autores(as) dos relatos das experiências enviados

e que continuem sempre participando dos ENEDS e EREDS.

Mas porque EREDS Norte, com experiências apresentadas somente do

estado do Pará? Dois trabalhos do estado do Tocantins foram aprovados e estão

na programação. Mas os pesados custos e os cortes nas verbas de custeio das

universidades impossibilitam a presença dos mesmos. Trata-se de uma região

com sete estados do tamanho de um grande país. Como contornar isto para os

próximos EREDS? Um desaio a ser trabalhado na organização dos próximos EREDS nesta região do país.

Como tratar a Engenharia e o Desenvolvimento Social na Amazônia?

Em uma região onde historicamente prevalece uma formação direcionada para

um vínculo do proissional Engenheiro com a grande empresa agroindustrial, mineradora do alumínio, do biodiesel, fazendeiros sojicultores, do gado, do

etanol entre outros ramos do agronegócio. Mas parece que essa realidade não

é só aqui. Como os Engenheiros deste e de outros encontros similares podem

contribuir sobre a questão da formação do Engenheiro no Brasil Contemporâneo

e, em particular, na Amazônia? Que bom que estamos aqui reunidos para tratar

destas e de tantas outras questões.

Bom Ereds a todos e a todas!

Histórico dos ENEDS e do I EREDS Norte

Entender como a Engenharia encontrou a categoria do Desenvolvimento

Social que deu nome ao ENEDS, é entender o contexto pelo qual passa o Brasil,

notadamente, a partir da década de 1990. De início, com a ascensão de Collor

de Mello à presidência quando ocorreu intensa abertura do mercado nacional

à competição internacional, sob o Consenso de Washington; conhecido pelo

conjunto de medidas de ajustes políticos e macroeconômicos impostos a países,

principalmente, da América Latina. Visava promover o suposto crescimento

econômico, induzido por elevados excedentes econômicos na Balança Comercial

para arcar com uma dívida externa questionada. Este conjunto foi formulado por

economistas de instituições inanceiras como o FMI, Clube de Paris e Banco Mundial que passaram a monitorar o país desde 1982 por mais de duas décadas.

Somente na década seguinte, nos oito anos de governo Lula e, mais

recentemente com o governo Dilma, o Estado volta a investir em áreas

estratégicas; se o país reduz a pobreza com distribuição de renda, ao mesmo

tempo, as grandes corporações econômicas nacionais e transnacionais batem

recordes anuais em seus lucros e com aumento na participação do agronegócio

na economia brasileira em detrimento da participação da agricultura familiar e

camponesa.

OS ENEDS

Nesse contexto, os conceitos relacionados à economia solidária passam

por aprofundamento com participação e atuação das Incubadoras Tecnológicas

de Cooperativas Populares, a primeira fundada na UFRJ e depois em outras

universidades do país. Esta iniciativa representa uma das grandes atuações da

Universidade na diminuição das desigualdades brasileiras, formação de quadros

acadêmicos e incubação de iniciativas de trabalho e renda para populações

desfavorecidas, realizando um importante papel de apoio técnico e administrativo

na construção da sustentabilidade desses empreendimentos.

Especiicamente nas Engenharias a iniciativa tarda um pouco a chegar e tomar corpo, uma vez que num primeiro momento é dominada pelas Ciências

Sociais Aplicadas - Economia, Administração, Contabilidade etc. Em 2003,

na UFRJ, professores, entre eles o Doutor Sidney Lianza, alunos da graduação

recém-formados e da pós-graduação da Engenharia de Produção, e o ainda

mestrando, à época, Felipe Addor, sentindo essa necessidade, se propõem a criar

um grupo, o SOLTEC, Núcleo de Solidariedade Técnica, para articular práticas

de ciência e tecnologias interdisciplinares aplicadas ao Desenvolvimento Social.

Essa decisão visou dar vazão a críticas e criar um espaço na formação

em Engenharia sob a perspectiva do Desenvolvimento Social, além de debater

o papel das Engenharias na UFRJ, num primeiro momento, e mostrar as

experiências potenciais de sucesso. O evento teve caráter de I Encontro de

Engenharia e Desenvolvimento Social, EEDS, em 2004, abordando como

temática: “Elaboração, monitoramento e avaliação de projetos solidários”.

Desse evento, muitos outros surgiram até os dias de hoje, na mesma

linha, e o debate continua se estendendo. Este primeiro, contou com doze artigos

escritos e treze painéis apresentados, entre a COPPE/UFRJ e a UFF evidenciando

uma demanda interna ao Rio de Janeiro, que propôs duas mesas redondas, em

formato de debate, adotado ainda nos dias atuais; atuando 20 pessoas na Comissão

Organizadora, bem marcado pela participação de treze estudantes de graduação.

Com o sucesso do evento entre os estudantes e professores/pesquisadores à

época, inclusive com a publicação de um livro com as palestras transcritas do

I EEDS, intitulado “Tecnologia e Desenvolvimento Social e Solidário” 1 pelo

SOLTEC.

É importante ressaltar que, desde o início, a Comissão Organizadora tem

se constituído com grande participação de estudantes voluntários e em ainidades com a temática do evento, principalmente, das Engenharias, com participação de

Diretórios Acadêmicos, Empresas Júniores etc.

A segunda edição do evento passou a ser nacional para aglutinar mais

interessados entre os movimentos sociais, ONG’s, governos e principalmente

acadêmicos que trouxessem novas experiências de outras universidades do

Brasil, com maior contribuição à temática. O II Encontro Nacional de Engenharia

e Desenvolvimento Social, ENEDS, em 2005, consolidou o caráter nacional. A

divulgação foi maior ao atingir outros estados da região, contando com o apoio da

Pró-Reitoria de Extensão e da Escola Politécnica da UFRJ, sendo a realização na

própria UFRJ, no Centro de Tecnologia, sem temática deinida, mas se propondo a discutir o papel do engenheiro no desenvolvimento nacional.

Entre o público, muitos estudantes das engenharias e áreas ains, bem como, pesquisadores e professores nas Mesas Redondas, no intuito de ampliar o

debate entre as engenharias em interlocução com outras áreas de conhecimento,

na medida em que a engenharia não é a única protagonista do desenvolvimento.

Apesar de cerca de 90% dos estudantes serem do Rio de Janeiro, houve a

participação de outras universidades na apresentação dos trabalhos2.

A Comissão Organizadora contou com estudantes do ano anterior,

bolsistas do SOLTEC e através da utilização do livro, lançado no ano anterior,

pode fortalecer a concepção do Encontro da Engenharia com o Desenvolvimento

Social (DS). Os alunos se dividiram em cinco grupos de trabalho para estruturar

o evento.

1 Este livro é importante referência para estudantes e professores da área tecnológica no debate e sensibilização na temática de Engenharia e Desenvolvimento Social. Como dizem os autores, em determinada passagem ao inal, “os artigos presentes no livro coniguram-se em fonte de esperança e de utopia (arte de realizar sonhos), posto latejarem vida, assentados no cidadão deliberativo, no lugar e no local, na esfera pública articulada pela sociedade civil. (...) Valoriza-se a cultura técnica local, o território, os povos” (LIANZA & ADDOR, 2005). 2 UFF, UERJ, UNIRIO, PUC-RJ, UNITAU, UFC, PUC-RS, FSJT, UFSC, UFPB e UFPE.

Neste terceiro ENEDS o esforço foi no intuito de criticar as abordagens

tecnicistas das Engenharias na formação proissional, ao mesmo tempo que mostra projetos participativos de desenvolvimento solidário, demandas de

movimentos sociais, desenvolvimento de projetos de extensão e proposições

para uma nova Engenharia.

As mesas redondas, assim como as oicinas de trabalho, mostraram as discussões em DS, os projetos em DS e os proissionais que atuavam nessas áreas, buscando compreender, implicitamente, o mercado de trabalho para os

Engenheiros(as). As temáticas das mesas e oicinas contaram com metodologias participativas nas escolhas dos palestrantes do evento. A utilização desses

recursos e as discussões, bem como, as apresentações trouxeram efeitos para os

estudantes, que perceberam a existência de proissionais das Engenharias e áreas ains que entendiam a relação entre as engenharias e o desenvolvimento social e, ainda, que existe mercado de trabalho nesta perspectiva, quebrando, desta forma,

o ceticismo das formações das escolas de engenharia, de que há mercado de

trabalho somente nas empresas privadas e escritórios de consultorias e de que

não existem projetos bem sucedidos de DS.

A programação foi ampliada para quatro Mesas Redondas realizadas

em dois dias de evento, contando ainda com duas oicinas de trabalho: uma sobre Economia Solidária e outra sobre Extensão. A Comissão Avaliadora3 dos

trabalhos inscritos foi composta por dezesseis professores da UFRJ que aprovou

treze trabalhos orais e treze painéis de apresentação.

O III e IV ENEDS realizados respectivamente em 2006 e 2007,

ocorreram ainda na UFRJ e seguiram a mesma formatação. O III contou com duas

programações culturais, com apresentações musicais de crianças em situação de

risco social, as quais faziam parte de projetos sociais, bem sucedidos, do Rio

de Janeiro. A temática desta edição foi “A tecnologia na geração de trabalho

e renda no Brasil”. Pela primeira vez se adotou seis linhas temáticas, as quais

direcionaram os artigos e, em consequência, as publicações, de acordo com o

interesse da organização do evento. O eixo abordado era voltado à tecnologia e

sua relação homem e natureza; políticas públicas para geração de trabalho e renda;

engenharia em empreendimentos sociais e solidários; extensão universitária e

inclusão social; formação do engenheiro e lexibilização curricular; experiências 3 A Comissão Organizadora totalizou vinte e duas pessoas, com vários discentes.

de projetos sociais e solidários.

O IV ENEDS adotou a mesma formatação e teve como temática “Uma

outra Universidade, por uma outra Economia”, com a presença do professor Paul

Singer e apoio inanceiro do Banco do Brasil. Em 2008 o ENEDS conquistou outros locais quando houve a decisão

compartilhada de professores e estudantes presentes ao inal do IV ENEDS, de que a organização do V ENEDS seria na Escola Politécnica da Universidade

de São Paulo, sob a temática “Os impactos da Engenharia e os limites da

sustentabilidade”. Neste evento houve o apoio da ITCP/USP, Fundação

Vanzolini, Departamento de Engenharia de Produção, Programa de Extensão da

Poli Cidadã da USP, além dos Engenheiros Sem Fronteiras, ITCP/UNICAMP e

SOLTEC/UFRJ.

Apesar da migração para outra universidade, o SOLTEC permaneceu

com alguns membros na Comissão Organizadora. O evento manteve o caráter

crítico, dos quatro primeiros anos, tendo como eixo central a temática do

Desenvolvimento Social nas Engenharias, com duas palestras e duas mesas

redondas, ao invés de quatro mesas, nos dois dias habituais de duração.

Novamente em 2009 o evento continuou no estado de São Paulo, agora

sob a coordenação da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, onde

ocorreu o VI ENEDS sob a temática “O que a Engenharia tem a ver com o

Desenvolvimento Social?”, realizado pela ITCP/UNICAMP. Vale mencionar

que neste ano já se coniguravam três programas de extensão com experiência de atuação de engenheiros no atendimento a demandas populares (UFRJ, USP e

UNICAMP).

Merece destaque as atividades organizadas por grupos de pesquisa e de

extensão vinculados às Engenharias, da UFSCar, Campi de São Carlos, Araras

e Sorocaba. Em São Carlos, o GEPES – Grupo de Extensão e Pesquisa em

Economia Solidária, vinculado ao Departamento de Engenharia de Produção;

o Núcleo de Extensão UFSCar-Sindicato, sob coordenação de docente deste

departamento, o NAPRA – Núcleo de Apoio à População Ribeirinha da

Amazônia, com forte participação de estudantes, e de grupos de pesquisa das

Engenharias Agronômicas e Florestal nos demais campi.

À organização da UFRJ, da USP e da UNICAMP se agregaram diversas

entidades estudantis e de pesquisas, como o Centro Acadêmico de Engenharia

Elétrica, Empresa Júnior de Engenharia Química, SOLTEC/UFRJ, e o Núcleo

de Apoio às Atividades de Cultura e Extensão em Economia Solidária NACE/

NESOL. O evento voltou ao formato de quatro mesas redondas em dois dias de

duração e mudou algumas linhas temáticas com destaque as temáticas de Gênero

e Diversidade, Meio ambiente e Sustentabilidade, não adotadas anteriormente e

importantíssimas para as Engenharias. Neste evento houve trinta e três artigos

aprovados.

Fora do eixo Rio-São Paulo, o VII ENEDS foi organizado na região

norte de Minas Gerais, em 2010, mas especiicamente no Vale do Mucuri, na Universidade Federal do Vale do Jequitinhonha e Mucuri - UFVJM, em Teóilo Otoni, com a participação de estudantes que estiveram na UNICAMP e que

deiniram uma Comissão Organizadora juntamente com seus professores. O evento foi organizado pelo Instituto de Ciência e Tecnologia do Mucuri ITCM,

UFVJM, juntamente com o SOLTEC/UFRJ, ITCP/UNICAMP, UFMG, UFRN

e muitos estudantes com pouca experiência e muita vontade da recém criada

UFVJM. O tema selecionado foi “Troca de saberes entre os Vales e o Brasil”,

o qual continuou no formato de mesas redondas, apresentações culturais e

apresentação de trabalhos.4No ano de 2010 começou a discutir a possibilidade

da realização de eventos de caráter Regional.

O VIII ENEDS continuou em Minas Gerais, na Universidade Federal de

Ouro Preto, UFOP, vinculado ao Departamento de Engenharia de Produção, sob a

coordenação da professora Sandra Ruino e de Fernanda Araújo; uma articulação que começou no ano anterior, com alunos voluntários para a empreitada em

2011. Neste evento a programação foi realizada em três dias, como já vinha

ocorrendo em todos os demais encontros. Houve a permanência das quatro

mesas redondas, quarenta e oito artigos aprovados, sete linhas temáticas, eventos

culturais e acréscimo de oicinas, minicursos e ilmes com debate. Ou seja, o ENEDS teve sua programação ampliada em acordo com o interesse de estudantes

e professores.

Ao inal do ENEDS de Ouro Preto, a continuidade do evento, pela

4 A partir do VII ENEDS não houve sistematização das demais experiências, sendo que as anteriores foram feitas por um grupo de estudantes na disciplina de Gestão de Projetos Solidários, GPS, Curso de Verão ofertado pela Engenharia de Produção em janeiro de 2010.

primeira vez, foi decidida em grupo, numa plenária inal lotada de estudantes e professores. Houve diiculdades em deinir quem recepcionaria o ENEDS e os EREDS.

A última edição do evento, ou seja, o IX ENEDS, realizado em 2012,

foi realizado no Nordeste, na UFRN, em Natal, organizado pelo Grupo

Multidisciplinar de Estudo, Pesquisa e Extensão PEGADAS – Projetos de

Engenharia e Gestão Aplicados ao Desenvolvimento Ambiental e Social –

organizadores do I Encontro Regional de Engenharia e Desenvolvimento

Social, EREDS/NE em 2011. A temática selecionada foi “O Brasil que se

quer e os caminhos que se trilham”, houve setenta artigos aprovados, mas só

compareceram trinta e sete para apresentações orais, com dois eventos culturais

e nove minicursos.

A organização do X ENEDS, em comemoração aos dez anos de realização

mostrou a pela consolidação nacional do debate sobre engenharia na perspectiva

do desenvolvimento social, que será realizado na UFRJ com a organização do

SOLTEC, quando se espera um grande evento no ano de 2013.

Assim, entende-se que o ENEDES e o EREDS têm se constituído como

referência em termos do debate sobre a formação e exercício proissional dos engenheiros com ênfase no desenvolvimento social, consolidando uma temática

importante na interlocução com outras áreas de conhecimento e na troca de

experiências entre estudantes das Engenharias de modo geral, abrindo um

espaço importante para discussões mais aprofundadas sobre uma nova visão

das engenharias em universidades brasileiras, avançando sobre as fronteiras

delimitadas entre os campos das ciências exatas e das ciências humanas, pois tanto

Engenheiros quanto Cientistas Sociais têm diiculdades em trocar informações e conhecimentos. Uma parte em razão da “reserva de mercado”, pragmático, em

que a Engenharia é contratada para dar respostas eicientes a menores custos e com altos lucros; de outro modo, as ilosoias adotadas pelas Ciências Sociais debatem a realidade deslocada dos projetos infraestruturais urbanístico e rurais,

importantes como exercício de utopia, mas difíceis de serem apreendidos e

aplicados sem o encontro dessas diferentes áreas voltadas ao Desenvolvimento

Social.

A participação deste tipo de evento para estudantes e professores

é, portanto, uma forma de potencializar as trocas de experiências, através de

demandas da sociedade legitimadas por movimentos sociais excluídos dos

processos de decisão do mercado, e fomentar um terreno de desenvolvimento

intelectual e acadêmico para aqueles que não se encaixam nos peris criados pelas ciências exatas distantes das humanidades. Celso Alexandre do SOLTEC,

no VIII ENEDS em Ouro Preto, airmou: “Acredito que esse tipo de evento é uma terapia para todos nós quando conseguimos nos encontrar uma vez ao ano e

falarmos a mesma linguagem” seja nas mesas redondas ou nas confraternizações.

OS EREDS e o I EREDS Norte

Para obter maior divulgação dos eventos de Engenharia e Desenvolvimento

Social em nível nacional, optou-se por fazer Encontros Regionais de Engenharia

e Desenvolvimento Social / EREDS, com objetivos semelhantes ao ENEDS, em

âmbito regional, com duração de dois dias, como preparação e sensibilização

para que estudantes participassem das Comissões Organizadoras.

Desde 2010, aventava-se a possibilidade de fazer eventos de caráter

regionais e, em 2011, dois encontros regionais foram realizados o I EREDS-SE

que aconteceu na UFOP de João Monlevade, em Minas Gerais, no mesmo ano do

VIII ENEDS ocorrido em Ouro Preto. O I EREDS-NE de Natal foi organizado

pelo Núcleo PEGADAS da UFRN ainda em 2011. Ambos aconteceram no

primeiro semestre, ou seja, no mês de maio, dando tempo para inscrições de

trabalhos para o VIII ENEDS de Ouro Preto, que aconteceu em setembro.

Em 2011 a Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e

Empreendimentos Solidários, ITCPES/UFPA, teve um artigo aprovado no VIII

ENEDS de Ouro Preto, intitulado “A relação entre UFPA e CONCAVES no

cumprimento ao Decreto Federal Nº 5.940/2006: Contribuição ao debate”, cujos

autores foram Rodrigo Erdmann e Farid Eid que se desenvolveu através de uma

experiência com os catadores de resíduos na UFPA.

De modo muito pessoal, esta foi a primeira vez que se teve oportunidade

de conhecer o ENEDS em Minas Gerais, com a apresentação do trabalho, “Desde

o tempo que era do movimento estudantil na Engenharia Ambiental, quando

mantive contato com pesquisadores do SOLTEC/UFRJ, na ocasião de uma

disciplina oferecida como Curso de Verão, em janeiro de 2010, na Engenharia de

Produção da UFRJ, onde participei como graduando”5.

Em Ouro Preto, ao inal do VIII evento nacional, em meio às discussões em plenária aberta para continuação dos encontros, o IX ENEDS de 2012

decidiu-se que os organizadores do I EREDS / NE o II EREDS / NE, 2012,

icaria a cargo dos estudantes presentes da IFCE de Juazeiro do Norte – CE; o II EREDS SE, 2012, para o grupo do Centro Federal de Educação Tecnológica

Celso Suckow da Fonseca, em Nova Iguaçu, RJ e o Norte, representado por

mim em Ouro Preto, com o aval e apoio do Professor Farid Eid, em Belém,

quando nos colocamos a responsabilidade de organizar o I EREDS Norte, para

o qual obtivemos o apoio da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares

e Empreendimentos Solidários – ITCPES/UFPA e da INCUBITEC do IFPA –

Campus Castanhal.

Já em 2012, a coordenação do I EREDS N, a partir de março tinha quatro

meses para organização de um evento sem recursos inanceiros deinidos para a divulgação e mobilização do público estudantil para o evento e nem Comissão

Organizadora, assim a Incubadora da UFPA, com apoio decisivo, na coordenação,

da Professora Maria José de Souza Barbosa, Diretora, Adjunta do Instituto de

Ciências Sociais Aplicadas e Coordenadora do CFES Norte, juntamente com

o Professor Farid Eid, este último, à época, vinculado ao Curso de Engenharia

Industrial do Campus de Abaetetuba, ambos da UFPA, conseguiu-se acessar

recursos da PROEX/UFPA.6,7

A partir de então iniciou-se um rico processo de mobilização e reuniões,

via skype, quando ajudarmos mutuamente a manter informações de divulgação

do evento e inscrições de trabalho via site. Finalmente, acordamos em fazer o

EREDS Norte em 22 e 23 de junho de 2012, com uma Comissão Cientíica para a formatação do EREDS NO.

O evento icou deinido desde o início que seria realizado no IFPA – Campus Castanhal, a 60 km de Belém, com o qual a ITCPES/UFPA possui

5 Histórico dos ENEDS, de I a VI. Trabalho apresentado no Curso de Verão da disciplina Gestão de Projetos Sociais ofertada pelo Núcleo de Solidariedade Técnica, SOLTEC/UFRJ, 2010.6 A elaboração do projeto de captação de recursos foi submetido ao edital de eventos estudantis, promovido pela PROEX-UFPA, com inanciamento em até quinze mil reais. Toda a arte gráica do evento foi realizada pela bolsista em design da ITCPES/UFPA Maria Gabriella Vilhena Monteiro. 7 Projeto de evento “I EREDS NORTE: Tecnologia Social Aplicada ao Desenvolvimento Territorial da Amazônia” submetido à PROEX/UFPA com aprovação e inanciamento, 2012.

relações acadêmicas e de cooperação estreitas e solidárias com a INCUBITEC,

Incubadora Tecnológica de Desenvolvimento e Inovação de Cooperativas e

Empreendimentos Solidários, quando se obteve apoio em relaçãoà infraestrutura,

o que reduziu os custos e garantiu a mobilização do movimento estudantil, que

poderia participar das discussões e da Comissão Organizadora.

A coordenação do evento realizou reuniões no IFPA Castanhal com

a participação de professores da ITCPES e da INCUBITEC para planejar a

temática do evento e das três mesas redondas, decidindoainda quais professores

seriam convidados. A INCUBITEC coube ainda a mobilização dos estudantes

do Centro Acadêmico de Agronomia – CEAGRO. Após este processo árduo de

discussões e debates construiu-se a temática do I EREDS como “Tecnologia

Social Aplicada ao Desenvolvimento Territorial da Amazônia”.

Com o projeto já aprovado pela PROEX-UFPA e a liberação de verbas,

garantiu-se a participação de professores de referência no debate. Ao mesmo

tempo, houve a mobilização entre os estudantes de Engenharia da UFPA, com

divulgações nos Centros Acadêmicos, Empresas Juniores e Secretarias de cursos

em Belém. Dessas mobilizações obteve-se a adesão de estudantes de Engenharia

Naval, de Alimentos, de Elétrica, Sanitária8, Ambiental e Computação, além dos

estudantes bolsistas da Incubadora das áreas de Turismo, Ciências Contábeis,

Serviço Social e Estatística. Uma outra Comissão foi criada em Castanhal sob

a coordenação geral da INCUBITEC, responsáveis pela divulgação do evento

entre os estudantes.

Assim o trabalho foi dividido entre Belém que icou responsável pela parte de planejamento do evento com uma Comissão subdividida em cinco

grupos: Divulgação e inscrição; Transporte e deslocamento até Castanhal;

Alimentaçãono IFPA Bandejão para os dois dias do evento; Alojamento aos

participantes; e Cultural. Durante o último mês as atividades começaram a icar mais intensas e a Comissão de estudantes de Belém e de Castanhal estreitaram

as relações a im de dar conta das tarefas. O site de divulgação do evento contou com o apoio do site do IX ENEDS

da UFRN, visto que nos foi oferecido em uma das reuniões para que izéssemos

8 Por exemplo, o estudante de Engenharia Sanitária e Ambiental, Ygor Silva de Souza contribuiu com a ilmagem de todo o evento. Nossos agradecimentos ao excelente trabalho, que nos possibilitou a sistematização e em consequência, a elaboração deste livro.

as inscrições e divulgação de informações na mesma plataforma. Fez-se a

divulgação para a maioria das Universidades Federais e Estaduais da Região

Norte, através de e-mails de todos os Pró-Reitores de Extensão, encontrados no

sítio da Rede Nacional de Extensão, RENEX.

Vale ressaltar que ao mesmo tempo em que se planejava e executava o

evento no Norte, eram intensos os contatos com a Comissão Cientíica Nacional quando as Comissões Regionais,as vezes, contribuía na divulgação para Pró-

Reitores de Universidades de outras regiões, bem como, enviava e-mail com

convite a professores doutores pelo Brasil, para participação da Comissão

Avaliadora de trabalhos do IX ENEDS, em Natal; alimentando banco de dados

nacionais, nos envolvendo da dinâmica nacional do evento.

O trabalho em grupo entre Norte, Nordeste e Sudeste foi intenso e

dirigido em determinados momentos por pessoas mais experientes, como Sandra

Ruino (executora do ENEDS USP e UFOP), com estabelecimentos de prazos e metas a cada semana. Assim, o I EREDS Norte fomentou a inscrição de artigos

no Circuito de Experiências, turno do evento onde se fariam as apresentações de

experiências de Grupos de Trabalho em salas temáticas.

Nos dias 22 e 23 de Junho, coincidiu com o aniversário de quarenta anos

do IFPA Castanhal9, antiga Escola Agrotécnica de Castanhal; portanto, o campus

encontrava-se em festas. O evento contou com a abertura no ginásio de esportes

juntamente com as comemorações do dia e uma mística, organizada pelos

estudantes, que abordou os alimentos fornecidos pela agricultura familiar, e após

isso foi anunciado a abertura da primeira mesa redonda do EREDS, no Auditório

do Campus, intitulada “Formação em Engenharia: Projetos pedagógicos em

questão”, a qual começou levantando questões para os cerca de 200 estudantes

que ocupavam o auditório pela manhã, colocando em polêmica os currículos

dos cursos de Engenharia e as limitações da formação tecnicista. Trouxe ainda

o debate que por mais que se tenham disciplinas voltadas ao desenvolvimento

social e para uma formação mais sistêmica e holística do engenheiro (e também

das outras áreas), sejam elas curriculares ou não, se forem tratadas de forma

isolada não conseguem uma transformação, e, portanto, não adiantam novos

9Ressalte-se que o IFPA Castanhal é um campus com predominância de concepções Agroecológicas, ao invés de predominâncias guiadas pelo Agronegócio, e vem sendo disputados paulatinamente em todos esses anos de acordo com os interesses dos atores sociais mobilizados, entre docentes, discentes e sociedade organizada através de Movimentos Sociais.

projetos pedagógicos, se, na verdade, for uma discussão ilosóica e política do curso e da universidade, o projeto pedagógico, as disciplinas, as ações serão

decorrentes disso. Participaram desta mesa os professores Romier Souza, do

IFPA Castanhal e da Associação Brasileira de Agroecologia – ABA; Walter

Bazzo, engenheiro mecânico formado e atuando na UFSC, e no NEPET – Núcleo

de Estudos e Pesquisas em Educação Tecnológica; além de Fernando Michelotti,

UFPA, Campus Marabá, da Agronomia, Coordenação Nacional do PRONERA.

A segunda mesa redonda, pela parte da tarde, sob a temática “Tecnologia

Social Aplicada ao Desenvolvimento Territorial da Amazônia” trouxe a relexão que apesar da tecnologia existir para a melhoria e facilitar a vida das pessoas,

seu desenvolvimento é majoritariamente para as empresas ou ins militares, e por isso adjetivá-la com o social (assim como para o ecológico, assistência etc)

é uma reivindicação para toda a Sociedade.

As tecnologias sociais são artefatos, metodologias ou processos

construídos coletivamente e democraticamente (unindo os saberes popular e

acadêmico) que promovem a transformação social da localidade e que possa ser

multiplicados. A Amazônia tem um grande potencial para o desenvolvimento

de tecnologias sociais, e a ITCPES/UFPA tem incentivado e desenvolvido em

conjunto com várias comunidades. Essa segunda mesafoi constituída pelas

professoras Sandra Ruino, da UFOP, INCOP, Núcleo PEGADAS – UFRN, e NESOL USP e Maria José de Souza Barbosa, da UFPA, GTDA/UFPA, ITCPES/

UFPA.

À noite, a programação cultural do evento icou por conta do IFPA Castanhal que planejou um Arraial de 40 anos. A festa foi uma celebração entre

alunos e professores que se conheceram nesse momento de descontração ao

ritmo do Carimbó e Forró, concurso de quadrilhas, miss caipira, etc..

No segundo dia, no período matutino, houve apresentação de trabalhos

no Circuito de Experiências do EREDS, momento destinado a troca de

experiências de Grupos de Trabalho, entre projetos e iniciativas voltadas para o

desenvolvimento da Região Norte, quando foram apresentados nove trabalhos de

doze inscritos. Os estudantes dirigiram-se para as salas temáticas. Segue abaixo

tabela com artigos aprovados e salas temáticas.

Tabela 1: Salas temáticas, trabalhos aprovados e autores do Circuito de

ExperiênciasSALA TRABALHO RESPONSÁVEIS

Sala 1 – Recursos Hídricos

Problemas técnicos e sociais no sistema de abastecimento de água do bairro do coqueiro.

Gabriela Fragoso; Fábio Paiva; Fernanda Moreira. (UFPA Belém)

Obras de melhoria urbana VS qualidade de vida: relexões sobre o caso da macrodrenagem dos canais da Quintino e Generalíssimo, Belém-PA.

Jessyca I. N. dos Santos; Paulo Rodrigo da C. Pacheco; Leandro Barbosa Mergulhão. (UFPA Belém)

Sala 2 – Segurança Alimentar

Estudo da viabilidade da aceitação de peixes na merenda escolar entre alunos de 2ª a 6ª série no município de Castanhal.

Félix L. da Silva; Janaína de S. Souza; Hugo Luiz Cordovil; Suzane Fonseca; Melquisede Ribeiro. (IFPA Castanhal)

Elaboração e caracterização de leite pastoso com Castanhal do Brasil.

Dayala da A. da Silva; Juliana do Carmo; Lauana Pantoja; José Renato Mourão. (UFPA Belém)

Sala 3 – Cadeia

Produtiva

Incubadora Tecnológica de Desenvolvimento e Inovação de Cooperativas e Empreendimentos Solidários.

Adebaro Reis e Wagner Nascimento (IFPA, Castanhal)

Fonte: Relatório I EREDS Norte, 2012.

Pela parte da tarde, já no último turno do evento, houve a inalização com a terceira mesa redonda intitulada “Engenharia, Gestão de Empreendimentos

Solidários e Movimentos Sociais”. Esta mesa contou com as exposições do

professor Sidney Lianza, PPG Engenheiro de Produção/UFRJ, SOLTEC/UFRJ;

professor Farid Eid, PPG Economia/UFPA, GEPES/UFSCar e GTDA/UFPA e

Ulisses Manaças, representante da Coordenação Estadual do MST.

A primeira exposição chamou atenção para a importância da realização de

um bom diagnóstico participativo e apresentou a pesquisa-ação como uma grande

possibilidade e estratégia de desenvolvimento aplicado na relação direta com, os

sujeitos protagonistas do desenvolvimento. A segunda trouxe experiências de

cooperação entre um grupo de extensão e pesquisa da UFSCar com o MST /

Setor de Produção e o Complexo Cooperativo de Mondragon, na execução de

um Curso em Tecnólogo em Gestão de Cooperativas, com ênfase na gestão de

empreendimentos solidários, já existentes no Sul do país, como forma de motivar

e mostrar que outra economia e mundo é possível, e como pode ser adaptado

à realidade da Amazônia, na organização de pequenas cadeias produtivas sob

controle dos coletivos de trabalhadores associados. E, por im, o representante do MST resgatou o histórico sobre o processo de luta dos trabalhadores rurais,

sejam eles expulsos ou incentivados a sair de suas terras desde a década de 30,

até a atualidade, a criação, história e a luta do MST.

Todas as mesas redondas tiveram um potencial de sensibilização dos

estudantes e o Circuito de Experiências foi bem sucedido deixando os acadêmicos

como protagonistas dos espaços, sendo que em todas as salas havia professores

facilitando os debates sobre Engenharia e Desenvolvimento Social, de acordo

com as temáticas.

A plenária inal contou com vários depoimentos da Comissão Organizadora10 e participantes que airmavam a importância do evento. Cerca de 200 participantes obtiveram 75% de presença durante os dois dias do evento.

Uma carta memória do evento foi elaborada no intuito dos estudantes levarem

para seus cursos e divulgarem para os que não compareceram.

A Comissão Organizadora teve à satisfação de ver os estudantes

compreendendo que não estavam sozinhos na compreensão da necessidade

de maior articulação entre conhecimento técnico e a realidade social em

busca do desenvolvimento social. Existe um nicho de mercado, um nicho de

atuação proissional com lacunas, espaços para se atuar por uma Engenharia mais humana, mais problematizadora do desenvolvimento, voltando-se para as

demandas sociais de fato. Existem espaços a se disputar e vazios a se preencher,

assim, e os Encontros de Engenharia e Desenvolvimento Social são mais que

simples encontros acadêmicos, torna-se um movimento em busca da construção

de uma nova concepção de engenharia.

Farid Eid Rodrigo Erdmann Oliveira

10Ana Paula Marins dos Santos, discente do Curso de Engenharia de Alimentos – UFPA; Rodrigo Pinheiro, discente do Curso de Engenharia de Produção, UEPA Castanhal; Bruno da Silva Duarte, discente do Curso de Engenharia Naval, UFPA; Fábio Paiva da Silva, discente do Curso de Engenharia Sanitária e Ambiental, UFPA; Wagner Luiz N. do Nascimento, discente do Curso de Engenharia Agronômica, IFPA – Campus Castanhal, Bolsista da INCUBITEC/ IFPA – Campus Castanhal.

Maria José de Souza Barbosa

MESA 1Formação do Engenheiro: projetos pedagógicos em questão

Fernando Michelotti11

O cenário mostra um grande terreno, desmatado e nivelado por

terraplanagem. A terra nua levanta poeira ao menor movimento. Não fosse o

rio Tocantins, ao fundo, poderia ser confundido com um deserto. Duas cenas

quebram a aridez inicial. Primeiro, a visão de uma placa indicando tratar-se ali

das obras das futuras instalações da empresa Aços Laminados do Pará – ALPA12,

um empreendimento da mineradora Vale com apoio inanceiro do Governo Federal através do BNDES. Segundo, centenas de ‘sem terras’ marchando para

dentro do ‘deserto’ e se preparando para um ato de protesto.

O protesto, realizado no dia 20 de junho de 2012, na cidade de Marabá,

estado do Pará, faz parte das manifestações referentes ao evento Rio+20. O

principal objetivo do movimento dos sem terra, com esse ato, foi denunciar

os impactos dos projetos do grande capital na Amazônia, negando uma tese

recorrente na Rio+20 de que o próprio capitalismo pode solucionar a crise

ecológica atual, através do chamado ‘capitalismo verde’.

O protesto foi gravado em vídeo e disponibilizado na internet através do

youtube13 para que, junto com outros protestos realizados ao redor do mundo e

com as manifestações realizadas na cidade do Rio de Janeiro, sede da Conferência

Rio+20, chamassem a atenção dos limites ecológicos e sociais do atual modelo

de desenvolvimento.

Com esse vídeo, inicio minha exposição no I Encontro Regional de

Engenharia e Desenvolvimento Social da Região Norte – EREDS Norte, que

ocorre em Castanhal – PA nos dias 22 e 23 de junho de 2012. Minha exposição

faz parte de uma mesa denominada “Formação do Engenheiro: projetos

pedagógicos em questão”, responsável por abordar a questão educacional neste

evento voltado para engenheiros e estudantes de engenharias.11 Formação de Engenheiros: relexões sobre a experiência do Curso de Agronomia da Universidade Federal do Pará, Campus de Marabá12 Este terreno tem uma área total de 1.035 ha, com previsão de utilização de 253,71 ha de área a ser construída. 13 Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=HklXmbFLqG8

No vídeo, o diálogo com o espectador não se resume a mostrar a enorme

área ‘deslorestada’ para a implantação da fábrica siderúrgica. Os centenas de trabalhadores sem terra marcham sobre o terreno e, com seus corpos, realizam

desenhos que são tomados de uma vista aérea. Primeiro, desenham uma árvore –

igura emblemática em se tratando de uma região amazônica, onde antes existiu uma densa loresta tropical. O desenho procura reproduzir uma castanheira, mais emblemática ainda para a região de Marabá, que outrora foi conhecida como o

polígono dos castanhais.

Numa segunda cena, a árvore se desmancha e dá lugar a um cifrão, com

os dizeres“... o que VALE é a riqueza de poucos, sobre a miséria e a morte

de muitos!” faz uma alusão direta à mineradora VALE, responsável pelo

empreendimento. Completa-se ainda com a informação de que os lucros obtidos

pela empresa em 2011 foram de 37 bilhões de reais, e com a acusação de que os

lucros são diretamente proporcionais aos seus impactos sócio-ambientais.

Nas décadas de 1970 e 1980, conlitos entre projetos do grande capital – os chamados ‘grandes projetos’ – e populações locais foram comuns na

Amazônia. Ao longo dos anos 1990, com a ascensão da questão ambiental e de

novos movimentos sociais14 que aliaram certas preocupações especíicas, como as ecológicas, a uma pauta mais geral, por outro modelo societário, multiplicaram-

se críticas e mobilizações contra essa perspectiva de que, para ter-se o suposto

desenvolvimento na Amazônia precisa, necessariamente, causar a destruição da

loresta e das formas de viver e produzir ali existentes. Em meados dos anos 2000, contraditoriamente, iniciou-se uma retomada

do estímulo do governo brasileiro ao modelo dos projetos do grande capital na

Amazônia, tendo as atividades da mineração e a expansão do agronegócio, como

principais indutores.

Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio

Exterior mostram que, em 2011, os minérios de ferro e seus concentrados, foram

responsáveis por 16,3% do valor das exportações brasileiras. Os oito principais

produtos da exportação, neste mesmo ano, foram responsáveis por 45,7% do

valor total. Além do minério de ferro, que encabeça a lista, aparecem: óleos brutos

de petróleo, soja mesmo triturada, açúcar de cana - em bruto, café cru em grão,

14 O conceito de novos movimentos sociais foi trabalhado por Scherer-Warren, I. Scherer-Warren, I. (1996) Redes de Movimentos Sociais. São Paulo: Ed. Loyola. 143p.

carnes de frango, farelo e resíduos da extração de óleo de soja e pasta química de

madeira15; todos, oriundos das atividades da mineração e do agronegócio.

Essa expansão dos projetos do grande capital na Amazônia, inanciados pelo Estado, está associada à ideia de que há um mercado de trabalho crescente

para engenheiros. Um exemplo ilustrativo vem do próprio CNPq, que publicou

em 18 de junho de 2012 no seu portal de notícias na internet, o anúncio de um

edital para estimular a formação de engenheiros16. Esse edital, lançado pelo CNPq

em parceria com a empresa Vale, através de seu Instituto Tecnológico Vale (ITV),

no âmbito do programa Forma-Engenharia, oferta bolsas para pesquisadores,

estudantes de graduação, ensino médio e técnico visando estimular a formação de

engenheiros, com a justiicativa apoiada nos resultados de uma pesquisa do IPEA de que, se a economia brasileira continuar com o atual ritmo de crescimento, o

país sofrerá um “apagão de engenheiros” em 2020. A notícia cita uma frase do

diretor-presidente do ITV, “... não há futuro sem mineração, e não há mineração

sem planejarmos os engenheiros para o nosso futuro”, demonstrando a força da

ideia de vinculação entre essa demanda de novos engenheiros e os projetos do

grande capital, sobretudo vinculados à mineração.

Dois riscos emergem desse quadro apresentado. Primeiro, que os projetos

do grande capital, na sua versão mínero-industrial ou da agropecuária são a única

alternativa para o suposto desenvolvimento da região amazônica. Segundo, de

que os engenheiros, portadores de um domínio técnico, não devem estabelecer

uma relação crítica a esses empreendimentos.

Almeida (2009)17 deine como agroestratégias, um conjunto de iniciativas adotadas pelos interesses empresariais para garantir a incorporação de novas

terras face à elevação do preço das commodities agrícola e metálicas. Baseadas

em estratagemas de comunicação e com forte apoio midiático, procura fortalecer

uma visão triunfalista do agronegócio, associando interesses empresariais,

15 BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Secretaria do Desenvolvimento da Produção. Anuário Estatístico 2011. Brasília: SDP, 2011. 16 CNPq (2012) Edital para Estimular a Formação de Engenheiros tem Inscrição até Julho. Disponível em: http://www.cnpq.br/web/guest/noticiasviews/-/journal_content/56_INSTANCE_a6MO/10157/290124.Acesso em: 05 nov. 2012.17 ALMEIDA, A. W. B. de, 2009. Agroestratégias e Desterritorialização: os direitos territoriais e étnicos na mira dos estrategistas dos agronegócios. In: ALMEIDA, A. W. B. de; CARVALHO, G. (orgs.) O Plano IIRSA na Visão da Sociedade Civil Pan-Amazônica. Belém: ActionAid, Fundação Heinrich Böll, Fase Amazônia, Universidade Federal do Pará, Observatório Comova, Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais e Fórum da Amazônia Oriental.

de agências multilateriais e inanceiras inluindo decisivamente nas políticas governamentais e reforça uma associação entre agronegócio e a modernidade,

o progresso.

As universidades não estão dissociadas dessa hegemonia e os cursos

de engenharia têm sido fortemente inluenciados por estas questões. Temos, portanto, que nos perguntar em que medida as universidades estão formandos

engenheiros capazes de pensar criticamente sobre os impactos socioambientais

dos empreendimentos nos quais estão sendo chamados a trabalhar? Em que

medida os projetos pedagógicos dos cursos de engenharia estão voltados para

uma formação crítica?

Em minha exposição, trouxe para a relexão a experiência do curso de agronomia da Faculdade de Ciências Agrárias do Campus de Marabá da UFPA.

Diferentemente de grande parte dos cursos de ciências agrárias no país, que

são construídos a partir de uma visão apologética do agronegócio e baseados

nas premissas de que a grande propriedade, a monocultura e o uso intensivo de

insumos industriais representam a modernização da agricultura; este curso,ao

contrário, foi construído fazendo a opção pela agroecologia e trata a agricultura

familiar como principal força motriz do desenvolvimento rural.

Nessa nossa experiência, uma questão recorrente é como o projeto

pedagógico do cursopode contribuir para inverter a perspectiva de formação dos

engenheiros agrônomos sob a hegemonia do agronegócio? Como podemos tratar

a formação do engenheiro agrônomo numa outra perspectiva, que dialogue com

o que tem de mais moderno, mais avançado, em termos de ciência e tecnologia,

sem abrir mão de outra perspectiva social e ambiental?

Ao longo dos dez anos no curso de agronomia em Marabá, três elementos

têm sido cruciais para uma formação em engenharia agronômica mais crítica e

mais problematizadora: a interdisciplinaridade, a pesquisa e o trabalho como

princípios educativos. A seguir e de forma breve, trago algum detalhamento

sobre cada um desses três elementos. Por im, mostro como estes elementos pedagógicos têm sido implementados através do estágio de vivência em

assentamentos rurais.Interdisciplinaridade

Um currículo convencional de engenharia agronômica, em geral, traz

disciplinas que colocam os conteúdos de forma fragmentada. Além disso,

prioriza apenas aquelas disciplinas que trazem os chamados conteúdos técnicos.

As tentativas de mudar esse quadro muitas vezes cria embates não só entre os

professores, herdeiros desse tipo de formação, mas também entre os alunos, que

sentem que a inclusão de uma disciplina da área social ou ambiental, fragiliza

sua formação, pois representa uma perda no aprofundamento do conhecimento

técnico exigido pelo mercado de trabalho.

Um elemento crucial para uma renovação no nosso currículo de agronomia

tem sido insistir no debate da multidisciplinaridade, da interdisciplinaridade e

até da transdisciplinaridade. Mesmo sendo o currículo do curso de agronomia

de Marabá construído por disciplinas, como se pode trabalhá-lo de forma mais

interdisciplinar para uma formação mais ampla?

Um primeiro esforço foi de garantir disciplinas que tratassem das temáticas

da Sociedade. Disciplinas como epistemologia, antropologia, sociologia,

economia e desenvolvimento regional, associativismo e cooperativismo têm

sido muito importante porque acabam alavancando um tipo de discussão que só

as disciplinas que tratam as tecnologias de uma forma mais dura não dão conta.

Em outra dimensão, mais comum considerando-se o objeto da engenharia

agronômica, foi a inclusão de disciplinas da área ambiental. Como exemplo tem-

se as disciplinas da ecologia e gestão de recursos naturais que tratam a questão

ambiental de forma mais complexa.

A inclusão dessas disciplinas que trazem conteúdos do ponto de vista

social e ambiental tem sido muito importante, porém não pela disciplina em si,

que continua tendendo à fragmentação. A experiência tem mostrado que não

basta ter essas disciplinas isoladamente, mas sim planejar como elas interagem

entre si e com o conjunto da formação. Caso contrário, corre-se o risco delas

se tornarem peças marginais no currículo, quando deveriam estar no centro das

preocupações, uma vez que um projeto de produção agropecuária tem impactos

na sociedade e na natureza, que não podem estar dissociados dos seus resultados

produtivos.

Nessa perspectiva, o Projeto Político Pedagógico do curso de agronomia

de Marabá se propõe a:[...] formar Engenheiros Agrônomos com uma sólida base técnico-cientíica, com capacidade de analisar e agir de maneira

crítica sobre a realidade na qual trabalha, e comprometido com o desenvolvimento sustentável da região amazônica nas suas dimensões sociais, econômicas, ambientais e culturais. (UFPA, 2003, p. 08)18

Formação Apoiada na Pesquisa

Um segundo elemento, é a questão da pesquisa. Uma das coisas que o

curso tem nos ensinado é a importância da pesquisa como indutora do processo

de formação. Apesar de a universidade reconhecer ensino, pesquisa e extensão

como um tripé indissociável, muitas vezes a pesquisa aparece como uma forma

separada do conjunto das outras ações. E o estudante que faz pesquisa é só aquele

contemplado com uma bolsa para atuar no projeto de iniciação cientíica, junto a uma equipe de pesquisadores.

Um movimento que tem sido buscado é o de pensar como a pesquisa

permeia o conjunto do processo de ensino-aprendizado dos estudantes durante

o curso de graduação como um todo. É bom que alguns estudantes possam

participar de uma equipe de iniciação cientiica ou de projetos de pesquisa, mas esse não pode ser um privilegio só desses alunos. O conjunto dos estudantes tem

que ter o contato com a pesquisa, no sentido da problematização da realidade,

da produção do conhecimento novo, de se desaiar a pensar a realidade e buscar construir respostas para esses problemas no cerne do nosso processo de formação.

O projeto pedagógico do curso de agronomia da UFPA em Marabá

indica, como um item constituinte da ilosoia do curso, a formação apoiada na pesquisa. Considerando a realidade amazônica, em especial a produção

rural, como parte de uma realidade complexa que integra recursos biofísicos,

econômicos e sociais muitas vezes pouco conhecidos, o esforço dos docentes

de produzirem conhecimentos agrega um dinamismo ao conteúdo trabalhado no

curso. Por outro lado, o projeto pedagógico reconhece que a aproximação com a

pesquisa, para além da atualidade dos conteúdos, traz um estímulo aos estudantes

para a criatividade e para o exercício da dúvida, que são fundamentais para o seu

futuro exercício proissional no complexo contexto amazônico (UFPA, 2003, p.

18 UFPA. Formação de Recursos Humanos em Ciências Agrárias: curso de agronomia. Mimeo, 2003, p. 135.

08) 19.

Essa perspectiva adotada merece ainda uma última consideração sobre a

relação entre o tipo de pesquisa realizada pelas ciências agrárias, num sentido mais

estrito, e pelas ciências sociais. A temática da pesquisa nos cursos de engenharia

agronômica não é novidade, se considerarmos a ideia da experimentação agrícola

convencional, como testes de produtividade de diferentes variedades de uma

planta, respostas de culturas agrícolas a diferentes quantidades de insumos, etc.

Sem negar a importância deste tipo de pesquisa, a perspectiva colocada pelo curso

de agronomia em Marabá é reconhecer que, mesmo num curso de engenharia, há

uma necessidade de aproximação com a pesquisa social.

Minayo (2002) 20 airma que dentre as contradições e conlitos existentes no campo cientíico há um grande embate sobre a cientiicidade das ciências sociais em comparação com as ciências da natureza. O reconhecimento de que

o objeto das ciências sociais é histórico e, portanto, carregado de dinamismo e

especiicidades, que o objeto de estudo das ciências sociais possui consciência histórica, que existe uma identidade entre sujeito e objeto, tornando-a intrínseca e

extrinsecamente ideológica e, por im, que seu objeto é essencialmente qualitativo faz com que certos segmentos questionem sua cientiicidade. Segundo a própria autora, no entanto, as descobertas da física quântica e da teoria da relatividade

desautorizam essas perspectivas de objetivação absoluta das ciências da natureza

e fortalecem a ideia de que a cientiicidade não pode ser reduzida a uma forma determinada de conhecer, contendo diversas maneiras concretas e potenciais de

realização.

Compreender que a ação de um engenheiro agrônomo tem um conteúdo

social e consequências para a Sociedade, exigindo assim que a pesquisa em

agronomia extrapole a experimentação de técnicas e tecnologias e inclua uma

compreensão sobre a dinâmica da própria sociedade é uma perspectiva inovadora

dessa experiência educacional.

Trabalho como Princípio Educativo

19 Idem, p. 08. 20 MINAYO, M. C. de S. (2002) Ciência, Técnica e Arte: o desaio da pesquisa social. In: Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Minayo, M. C. de S. (org.) Petrópolis: Ed. Vozes.

Um terceiro elemento fundamental para os currículos de engenharia é o

trabalho. Frigotto; Ciavatta21 airmam que:

O trabalho como princípio educativo ganha nas escolas a feição de princípio pedagógico, que se realiza em uma dupla direção. Sob as necessidades do capital de formação de mão de obra para as empresas, o trabalho educa para a disciplina, para a adaptação às suas formas de exploração ou, simplesmente, para o adestramento nas funções úteis à produção. Sob a contingência dos trabalhadores, o trabalho deve não somente preparar para o exercício das atividades laborais – para a educação proissional nos termos da lei em vigor – mas também para a compreensão dos processos técnicos, cientíicos e histórico-sociais que lhe são subjacentes e que sustentam a introdução das tecnologias e da organização do trabalho.

Um currículo de curso superior em engenharia tende a reairmar a separação do trabalho manual do trabalho intelectual. O engenheiro é formado

para ser o gerente, o representante do capital. Diicilmente o engenheiro é formado para se ver como parte do conjunto da classe trabalhadora, para enfrentar as

diiculdades do mundo do trabalho. Por isso, não se trata apenas de incorporar trabalhos e aulas práticas no currículo, mas introduzir:[...] nos currículos a crítica

histórico-social do trabalho no sistema capitalista, os direitos do trabalho, o

conhecimento da história e o sentido das lutas históricas dos trabalhadores no

trabalho e na educação.22

No caso da agronomia, é comum a utilização de campo experimental em

áreas na própria universidade ou fora dela. Esse tipo de espaço de aprendizagem,

embora traga possibilidades dos estudantes desenvolverem atividades práticas e

até pesquisas experimentais, tende a ser fortemente artiicializado e insuiciente para uma percepção da realidade concreta dos processos produtivos. Ainal, não se trata apenas de desenvolver um trabalho prático, mas permitir ao estudante se

confrontar com o mundo do trabalho na perspectiva de quem faz o trabalho, de

quem é explorado a partir desse trabalho, de quem vive as contradições reais do

mundo do trabalho.

21 FRIGOTTO, G. & Ciavatta, M. (2012) Trabalho como Princípio Educativo. In: Dicionário da Educação do Campo. CALDART, R. et al. (orgs.). Rio de Janeiro / São Paulo: Escola Politécnica Joaquim Venâncio / Expressão Popular, 2012, p. 750.22 Idem, p. 753.

Estágios de Vivência em Assentamentos da Reforma Agrária

Em nossa experiência na agronomia de Marabá, o principal instrumento

para garantir os três elementos citados, a interdisciplinaridade, a formação apoiada

na pesquisa e o trabalho como um princípio educativo é o estágio de campo. O

currículo em questão tem cinco estágios supervisionados, realizados ao longo

dos cinco anos de formação. Esses estágios ocorrem em áreas de assentamentos

de reforma agrária ou comunidades de pequenos agricultores familiares, onde

todo estudante do curso passa de uma semana a dez dias, em cada um dos cinco

estágios, com a supervisão de um professor, estudando e observando o cotidiano

dessas áreas. Cada dupla de estudantes ica hospedada, durante esses dias, na casa de uma família de agricultores, vivenciando seu modo de vida.

Essa experiência tem sido muito rica porque permite vários

direcionamentos. Quando o estudante sai do laboratório e da sala de aula, onde

tem um único professor dando a direção do que está sendo estudado, normalmente

centrado nos conteúdos de sua especialidade, e faz uma imersão numa unidade

de produção rural, ele começa a ter contato com o conjunto das dimensões e dos

desaios enfrentados pelos agricultores e suas famílias. Essa vivência tende a uma valorização do conhecimento interdisciplinar, pois a busca de meios para

compreender a situação exige o diálogo com várias disciplinas.

Quando o estudante sai da universidade para passar uma semana na

casa de um assentado, de um agricultor, precisa buscar entender como a família

organiza-se, como é a relação daquela família com o meio ambiente e com

os recursos naturais, como aquela família se relaciona com a economia e a

sociedade local, quais são as técnicas e as ferramentas de produção utilizadas?

Esse conjunto de questões está todo interligado, o que leva o estudante a estar

atento a múltiplas dimensões da realidade e a mobilizar conteúdos trabalhados

em diferentes disciplinas, tanto das ciências agrárias, como das ciências sociais

e ciências ambientais.

Por isso, essa vivência de campo é tão importante no curso para tentar

interligar essas diferentes dimensões da formação. No entanto, é mais do que

uma simples vivência, pois, nesse esforço de compreender essa realidade

multidimensional, o estudante deve hierarquizar questões para análise, construir

perguntas e respostas, problematizar a realidade e, eventualmente, buscar formas

criativas de usar tecnologias. Dessa forma, o estudante está fazendo pesquisa

social no sentido de compreender o funcionamento de uma parte da sociedade:

a realidade rural da região sudeste paraense. Com a vantagem de que o estágio

supervisionado mostra-se como um momento de pesquisa que todos os estudantes

passam por ele, independente de serem bolsistas de iniciação cientíica ou estagiários de um determinado grupo de pesquisa.

A pesquisa, tratada desde a perspectiva apresentada, traz duas questões

políticas de fundo. Primeiramente, o estágio não se resume a ser mão de obra

numa determinada empresa, para treinamento em uma tarefa. Ao contrário, trata-

se de ir à unidade de produção com o olhar de pesquisador, de problematizador da

realidade e extrair dali questões para aprofundamento ao longo do seu percurso

formativo.

Em segundo lugar, ao optar pelo estágio em assentamentos de reforma

agrária, busca-se dar visibilidade ao camponês como produtor rural, desmitiicar a dicotomia modernidade/agronegócio versus atraso/campesinato, tão

ideologicamente airmada pelos agroestrategistas. Estimular que os estudantes, e os professores que os acompanham, procurem entender o estabelecimento

familiar camponês como uma unidade produtiva, com suas potencialidades e

seus desaios, alguns dos quais podem ser superados com o apoio da academia, redeinindo assim prioridades de pesquisa e extensão.

Através dessa opção política pedagógica, muito diferente de se realizar o

estágio no escritório de gerenciamento de uma grande empresa agropecuária de

gado, soja ou dendê, nós estamos levando o estudante para uma imersão na casa

do agricultor familiar. Ao acompanhar o cotidiano dessa família, desses que, ao

mesmo tempo em que gerenciam a sua unidade de produção, executam os trabalhos,

enfrentam as diiculdades de trabalhar com pouco recurso inanceiro e com equipamentos muitas vezes precários, que são explorados na hora de comercializar

seu produto, o estudante confronta-se com as contradições do trabalho camponês

na sociedade capitalista enquanto forma de subordinação, mas também como força

de emancipação e possibilidade de conquista de maior autonomia relativa.

Walter Antônio Bazzo

Após cumprimentar o Professor Michelotti, o Prof. Walter considerou

que a discussão da formação de engenheiro, não pode-se, em hipótese

alguma, desconsiderar os três eixos que o Fernando enumerou e que me deixa

extremamente feliz de estar aqui neste local, no Pará.

Considera-se também importante o fato do professor não só fazer esse

tipo de trabalho, mas estar difundindo esse tipo de trabalho. Eu gostaria que

muitos professores de engenharia estivessem aqui para poder discutir isso,

porque são poucos professores que nesse mundo tecnológico que tem essa

postura, de trabalhar a engenharia com essa questão que nós vemos hoje em dia

de desenvolvimento sustentável.

Se nós não mudarmos a concepção do que estamos fazendo na qualidade

de futuros engenheiros, de professores, de futuros médicos, a sociedade tem

sérios problemas a serem enfrentados.

Então, temos esse título “Formação de engenheiro” e temos uma

interrogação; projetos pedagógicos em questão. Será que são os projetos

pedagógicos em questão, ou será que são as ilosoias dos cursos colocadas em questão? O que queremos com a formação dos nossos engenheiros?

Eu sou Walter, sou engenheiro mecânico, sou professor, sou de

Florianópolis, Santa Catarina, tenho doutorado em educação e um pouquinho de

ilosoia, ou seja, uma mescla, que as vezes parece que minha cabeça ica meio pirada.

Mas, é por isso que eu tenho muita satisfação de estar aqui conversando

com vocês. Que esses eventos como o EREDS comecem a chamar a atenção,

de que temos que pensar em projetos pedagógicos, mas se esses projetos

pedagógicos são deinidos em função de uma lógica de formação que queremos para os nossos engenheiros.

Eu falo com muita propriedade que disciplinas isoladas podem até

ajudar, mas não dão conta do processo. Eu queria agora, sim, conversar com

os professores da engenharia, através de vocês: (...) a nossa formação tem que

ser muito mais holística que apenas técnica. Eu não estou dizendo que não se

tem que ser um conhecimento aprofundado de uma disciplina técnica, agora ele

tem que ter um conhecimento um pouco mais expandido em termos da pergunta

chave: para que? Porque? E para quem queremos formar engenheiros? Então, são

essas questões que podemos discutir e que eu gostaria de recomendar fortemente

para vocês, inclusive, os professores, o site www.nepet.ufsc.br, associado com

outros professores da área de literatura, sociologia, da área de psicologia, que

estão tentando entender o que é educação tecnológica nos dias que vivemos

hoje. Nesse grupo, os alunos inclusive poderão encontrar um material novo

e relexivo. É um site que, inclusive, traz resenhas de livros atuais, porque o

mundo está girando numa velocidade que estamos sendo atropelados por esse

tipo de conhecimento, infelizmente, as escolas de engenharia não trazem para a

discussão em sala de aula.

O professor Fernando vai ser o meu passamento para o que eu vou falar

aqui. Eu também Fernando não acredito em interdisciplinaridade se o professor

de engenharia não tiver uma visão um pouco maior sobre isso. Talvez possa ser

uma questão secundária, desde que o professor de engenharia, e daí estou de novo

conversando com os professores de engenharia, tenha uma atuação ilosóica um pouco mais expandida na área que está atuando. E não é por uma questão mais

aprofundada. Não estou pregando aqui que todo professor de engenharia vá fazer

doutorado na área de educação.

Nós somos os primeiros na qualidade de professores de engenharia

que dizemos para os nossos alunos “olha, você para resolver um problema de

engenharia, a primeira coisa que você tem que fazer é identiicar o problema.”Não existe problema tecnológico sem avaliarmos a condição social

colocada em questão. Tudo que Fernando trouxe aqui e vocês, naquele site

vão encontrar N ilmes com esse tipo de relexão, porque a ideia é exatamente produzir, não produzir material apenas, mas selecionar materiais que sirvam

junto com essa parafernália de materiais que nós temos na internet. Que possa

fazer os alunos de engenharia e os professores reletirem sobre essa questão (aspas). Essa questão pedagógica que volto a insistir é decorrente de uma lógica,

de uma questão ideológica, como se dizia antigamente, politicamente correta.

Por isso, devemos pensar nesse tipo de coisa, de pensar no social, de

pensar no trabalhador, de pensar em quem quer que seja, mas que não seja o

eminentemente técnico. É por uma questão de sobrevivência.

Não adianta querermos fechar os olhos e achar que essa derrubada de

mata, essas reuniões que estão sendo feitas no Rio de Janeiro, aquecimento

global, sejam palavras remotas. O fato é o seguinte; o desenvolvimento

sustentável é simplesmente uma tentativa de dizer: olha tá tudo certinho. Não

existe desenvolvimento sustentável. Talvez exista desenvolvimento prorrogável,

possível etc.

Agora é uma questão física. Queremos que os alunos entendam das

engenharias. Que a entropia interna está aumentando e consequentemente

o bagunçamento de moléculas em função do despreparo humano para lidar

com sua própria inteligência para desenvolver tecnologia está começando a

apresentar confusões. A Rio+20; vamos estar na Rio +90, com um pouco mais

de poluição, discutindo as mesmas coisas que estamos discutindo atualmente, se

essas variáveis não entrarem no problema.

Eu iquei emocionado hoje ao assistir aquela dança, naquela apresentação, e ver que as pessoas que estão produzindo; as pessoas que estão fazendo a

comida; as pessoas que estão no campo trazendo a possibilidade do homem se

desenvolver tecnologicamente.

E ica todo mundo abismado com os novos celulares, com os novos computadores. Isso é importante? Claro que é. Mas, isso isolado do processo

social vai nos trazer grandes problemas. E isso, tem que ser discutido nas

escolas de engenharia, por mais que alguns professores de engenharia, às vezes

não concordem comigo, dizendo que: “não, nós não podemos desmotivar os

nossos alunos”.

Temos que trabalhar com nossos alunos as questões de desenvolvimento

tecnológico etc. Temos, sim, que trazer esses problemas, porque se não,

estaremos sendo incoerentes com o nosso próprio processo de ser engenheiro.

Ser engenheiro é resolver problemas humanos.

Então, são essas questões que eu venho vinte, trinta anos discutindo em

fori de formação de professores de engenharia no Brasil e confesso para vocês

sem muita vergonha, não sou muito ouvido. “Ah, aquele cara pensando nessas

‘frescuras de educação, frescuras’ de sociologia, negócio hoje é produzir.” Para

que? Por que? E para quem? Com o que o ser humano está tão preocupado?Com

essa velocidade exacerbada para chegar onde?

Então, o que eu quero trazer para vocês é:o que é educar em engenharia?

E eu estou usando vocês para conversar com os professores de vocês. Perdão!É

que raramente os professores de engenharia estão preocupados com esses fori,

para discutir esse tipo de coisa. Tem coisa muito mais nobre para ser feita, como

projetos. Por favor, não vão sair daqui dizendo que o Walter não é engenheiro. O

que quero mostrar para vocês é que isso é uma questão complexa e conjunta. Não

dá para pensar em engenharia no meu modo de ver, sem pensar em sociedade.

Esse aqui é um dos livros que eu escrevi exatamente trazendo Ciência,

Tecnologia e Sociedade, no contexto da educação tecnológica. Aqui tem mais ou

menos o meu sonho do que deveria ser um Curso de Engenharia. Obviamente,

ele é utópico, mas conto para vocês que é um pouco menos utópico do que há

vinte e cinco anos atrás.

Porque, de repente, pelo Brasil a fora, nos EREDS, nos ENEDS, os

COBENGEs (Congresso Brasileiro de Educação em Engenharia), outros

professores da engenharia, até por uma questão de necessidade, estão trazendo a

tona esse tipo de discussão.

Por isso Fernando a minha alegria em ver esse tipo de questão que

vocês estão tratando e que me parece ser muito mais própria nos interiores do

Brasil do que nas capitais. Isso é uma questão constatada, quando falo da minha

experiência e viajo pelo Brasil todo e ico feliz em estar aqui e ver esse tipo de evento acontecendo.

Pena que todos os professores não estejam para discutir esse tipo de coisa,

porque não dá tempo. Tem o projeto x, o projeto y. Eu estou querendo atraí-los

o tempo inteiro para discutir isso. E dá para discutir! Por isso, trato da formação

de professor de engenharia, de novo volto à questão. Basta termos um pouco

mais de “tesão” para discutir isso nos fori da própria engenharia. Isso é uma das

questões que me dá muito prazer em estar em Castanhal, no Pará, discutindo esse

tipo de problema, em um evento como esse.

Bom, então, o que é educar em engenharia, na minha modesta forma de

ver? Motivar a gostar de tecnologias? Não! Não, precisamos mais de motivação

para dizer aos nossos alunos que a tecnologia é importante. Isso está posto.

Ninguém mais vive hoje sem o seu computador, sem o seu celular. Aliás, às

vezes muito dependente desse tipo de coisa.

Parece que uma das motivações maior do educar em engenharia não é

essa questão de motivar a gostar de tecnologia, de ensinar a desenvolver aparatos

técnicos? Sim. Paralelo a outras coisas. Entender as repercussões da ciência

dentro da tecnologia? Sim, e muito. Volto ao ilme que vimos sobre a Vale. Não adianta colocarmos a cabeça dentro do buraco e achar que o mundo

vai andar de acordo com que a gente desejaria que acontecesse. Ou somos

relexivos e tentamos mudar um comportamento que, volto a insistir, é perigoso para a sociedade humana. Hoje em dia ou então daqui a pouco, quando a água

estiver no limite, vou dizer, a gente devia ter pensado nisso antes. Poucas escolas

de engenharia pensam nisso. Culpa de quem? Dos professores, dos alunos? Isso

é um processo hegemônico colocado, que diz o seguinte: quanto menos você

pensar, melhor. Quer dizer, é tudo igual.

Chamo a atenção de vocês para a leitura. Deixem, às vezes, os professores

falarem uma porção de coisas, mas vão pensar se especializar no campo de vocês.

E não existe coisa melhor do que a leitura.

Vocês sabiam que alunos de engenharia ou alunos de qualquer outro

curso, que o Brasil é o pais do mundo onde menos se lê. A média de leitura por

ano é de 0,96 livros.

Dá para acreditar em um desenvolvimento sustentável, prorrogável,

seja lá o que for, se não tivermos conhecimento do que acontece no mundo

contemporâneo? Ninguém resolve problema sem ter matéria-prima. Como vou

resolver problemas se não conheço os problemas. Então, um conselho para vocês

que vão ser proissionais daqui a pouco. Leiam!Leiam! E leiam!É a fonte mais importante para que vocês possam identiicar essas questões.

Será que um curso de engenharia serve para entender um aparato

técnico? Sim. É a resposta. Vocês vão produzir aparatos técnicos, mas sempre

tem que ter uma conexão, de veriicar se isso tem uma conexão humana. Na sociedade contemporânea estão confundindo desenvolvimento tecnológico com

desenvolvimento humano e não é a mesma coisa.

Por mais paradoxal que possa parecer, nós estamos com tecnologia de

ponta em tudo quanto é setor e a disparidade social é cada vez maior. Mas, que

coisa é essa? Para que adianta tecnologia então?

Para o ser humano é simples. Agora estamos com televisão de plasma.

Estou com o telefone não sei o que, e mais, não se pensa na questão da mobilidade

humana, na questão energética que é o grande problema do ser humano hoje

em dia. Vai chegar uma hora em que acabará essa história de estarmos por ai

de carro, de avião, etc. Ou começamos a pensar nisso, ou essa coisa de dizer

desenvolvimento sustentável é modismo. Como já teve aquelas palavras:

reengenharia, inovação tecnológica, empreendedorismo, que são palavras-chave

para dizer o seguinte: vamos resolvendo o problema da forma que dá e vamos

levando o barco.

Existe uma necessidade hoje de uma quebra de paradigma na escola de

engenharia. Ou se repensa em engenharia associada à sociedade ou estamos

fazendo um faz de conta junto com o poder hegemônico.O aparato técnico e o ser

humano, entender a sociedade moderna, consumo, posse, felicidade, desvendar o

desenvolvimento tecnológico do desenvolvimento humano. Essas são questões

que chamo para a discussão de educação em engenharia. Senão começarmos a

pensar com muito mais profundidade, daqui a pouco isso ica muito longe das possíveis soluções.

Algumas coisas estão sendo feitas em disciplinas isoladas. A questão da

extensão, a própria pesquisa que hoje só desenvolvida para aparatos técnicos e

não para essa relação entre aparatos técnicos e felicidade humana.

Falar em felicidade humana parece, assim, uma coisa de mito. Felicidade

humana é ter o melhor celular, melhor televisão, melhor carro, o resto é bobagem.

É a sociedade que está trocando o ser pelo tempo. Assim, temos que ter um

cuidadocom esse tipo de coisa.

Na qualidade de alunos, deem um passo à frente!Comecem a pensar na

formação paralela. E essa formação paralela, pode ser o que? O que vocês estão

fazendo aqui. Participar de discussões como essas, com professores que tem essa

intenção de trazer a questão para dentro da sala de aula. A leitura para que vocês

comecem a entender “Eu não consigo resolver um problema tecnológico sem o

aspecto humano envolvido nessa questão. Se não, é um trabalho de burro”.

Para que vou resolver um problema tecnológico, se o alcance social é tão

minimizado? Essas questões todas; temos que trazer de novo para a engenharia.

Porquecolocar projetos pedagógicos de engenharia, em questão? Volto a insistir,

isso é uma postura do curso de engenharia, dos professores de engenharia. O que

queremos com essa formação?

Muita gente pensa ser engenheiro é produzir e isso ica por conta dos

políticos. Essa loucura política não acontece no Brasil, mas em qualquer país

no mundo. Quando os políticos chegam lá despreparados, mal intencionados,

corruptos.” Não adiante só chegar dizendo o seguinte: “Mas, esses políticos,

quem vota somos nós.” Quem vão ser os políticos de amanhã, vão ser vocês, mas

são os oriundos das escolas atuais. Temos que tomar conta do timão. No sentido

de dirigir. E, para isso, precisamos ter uma construção de conhecimento mais

relexiva, mais analítica. As variáveis do problema envolvido na educação tecnológica são muito

mais extensas do que atualmente utilizamos nas escolas de engenharia, ou seja,

que o técnico pelo técnico vai dar solução para essas questões.

Na educação em engenharia é importante alfabetizar cientíica e tecnologicamente o aluno? Claro!

O cara que não sabe ler, ele terá que estudar para se formar. E saber ler hoje

em dia, em uma sociedade extremamente tecnológica é entender esses processos

cientíicos e tecnológicos. A minha tese é de que aprender a ler cientíica e tecnologicamente passa por entender o social, o ilosóico, o técnico e questionar onde é que vou ter tempo para tudo isso? Tenham certeza que essas coisas vão

nascendo de acordo com o interesse interdisciplinar desses conhecimentos. A

história de acreditar que a formação pedagógica para o professor, agora falando

do professor, passa por essa interdisciplinaridade epistemológica, que devem

ter. E independente da questão técnica, na minha visão, qualquer professor de

engenharia tem que estar constantemente antenado.

Como é que vou resolver uma questão técnica sem entender o processo

econômico que esse mundo passa? Como é que vou entender uma questão

técnica sem entender as questões do plantio, que cada vez tem tornando-se

monoculturas? Para que saber disso quando se é engenheiro mecânico? Claro,

tenho que saber, pois além de engenheiro, hoje sou um formador, um educador,

independente da minha área de atuação. Trabalho, por exemplo, com mecânica

dos luidos, termodinâmica; não deixei de saber disso. Aliás, me facilitou muito o conhecimento dessas coisas em função de saber que a termodinâmica não é

empreendimento químico, ou seja, a hora que for entender como é que funciona,

chego lá e ligo o interruptor e produzo essa luz. É um processo termodinâmico?

É. Então, entra e vê por que o operário está morrendo de câncer na mina de

carvão?

Isso é um processo de educação interdisciplinar. E a formação dos

professores de engenharia não precisaria ser tão complexa, se houvesse o que

se chama “tesão” por ser um educador. Mas, esse processo não é uma via só.

Se vocês não colaborarem com isso e não começarem a ser críticos, relexivos, perguntadores, querer aprender, então essa coisa passiva: acabou a aula vai

embora, não funciona!

Para qualquer coisa que queira fazer na vida, alunos, qualquer coisa

precisa paixão, precisa vontade, precisa “tesão”, precisa motivação. E por que

estudar seria diferente? Se vocês pensam que vão fazer um curso sem construir o

conhecimento de vocês, vão se dar bem na vida? Cuidado! Pode até dar e ganhar

dinheiro. Mas não confundam essa questão de ter com o ser! Isso está deixando

essa nossa civilização hoje em dia tão estressada.

Então, é preciso alfabetizar cientíica e tecnologicamente, o que implica necessariamente na formação de um proissional capaz de criar situações de aprendizagens signiicativas, que possam ajudar o aprendiz a usar, de forma crítica-relexiva, a ciência e tecnologia, além de trabalhar conscientemente as informações tecnológicas.

Temos que entender a relação ciência, tecnologia e sociedade. Mais ou

menos, o que, isso que aquele nosso grupo de pesquisa, está trabalhando. Deem

uma visitadazinha no site, vocês vão gostar. Como é que acontece a relação

ciência, tecnologia e sociedade? Esse livro que acabei de mostrar para vocês, é

um dos produtos do nosso grupo. Ou será apenas mais um modo para grupos de

pesquisa? Professores, agora chamo vocês de novo. Esse negócio de icar criando grupo de pesquisa aqui, grupo de pesquisa ali, conseguir projeto no CNPQ,

na CAPES, se isso não se repetir na educação, esses resultados de pesquisas

raramente entram em sala de aula, porque os professores não tem tempo para

esse tipo de coisa.

Então,o tripé –pesquisa, extensão e ensino– começa a icar capenga. O ensino é um pouco abandonado, a extensão muito mais e é a pesquisa que nos

dá autoridade, nos dá currículo, possibilidade de viajar por aí, etc. É isso que é

mais levado em consideração. Estou fazendo uma autoavaliação. Está na hora de

pararmos de escamotear certas questões, porque se a gente não mexer na ferida,

pouco se resolve. Agora, para isso, vocês tem uma contribuição fantástica. Sair

dessa passividade, de acreditar que o conhecimento se processa com o professor

passando uma informação e vocês copiando, fazendo uma prova e ser aprovado.

Cuidado com esse tipo de equívoco!Depois é complicado de resolver.

Quando vocês começarem a dizer: quem tem que construir meu próprio

conhecimento sou eu. A escola pode ser boa, os professores podem ser fantásticos,

mas se vocês não abrirem a janelinha do cérebro para construir conhecimento

isso não acontece. Nada acontece por osmose. Não adianta esfregar um livro

debaixo do braço e achar que vai aprender, ou vocês estão pensando que agora a

solução para nossa vida e aprendizado está no Google?

É uma concepção equivocada, achar que a informação é a mesma coisa

que a formação. São essas questões que se discute aqui. É um posicionamento

epistemológico? E, certamente, 98% de vocês não ouviram falar da palavra

epistemologia, né? Para terem uma ideia, epistemologia é o estudo do

conhecimento cientíico. E, falamos aqui nas escolas de engenharia: olha! Temos que entender a ciência, a tecnologia, etc. Então, esses resgates, os professores

de engenharia tem que fazer, para que seus alunos tenham a possibilidade de

construir seus conhecimentos. Repassar informações.Tem que ser processada

no sistema de ensino.Isso chama formação. Pesquisa ou educação: a excessiva

academização do assunto, ausência do processo escolar, excessivas derivações

de objetivos, etc. Então, as atitudes urgentes que teremos que tomar, no meu

modo de entender, formação dos engenheiros e, consequentemente,na formação

dos professores é exteriorizar, com mais clareza, os objetivos e a relação entre

ciência e sociedade.

Essa exteriorização, da forma como o Fernando colocou, é o conhecimento

dos problemas. É ir além, é entender os dados que estão disponíveis sobre

esses problemas, para poder depois, na qualidade de engenheiros, cogitar uma

solução para a questão posta. Quantos aos dados cientíicos e tecnológicos, para os estudantes, que ciência e tecnologia são constructos sociais. A ciência e a

tecnologia não são neutras. Elas têm objetivos ininitos e infelizmente sempre em função dos poderosos, como foi visto naquele vídeo visto anteriormente.

Aliás, se vocês tiverem um pouquinho de curiosidade assistam o ilme chamado Thecorporation, encontrado no Google. É um ilme extremamente

relexivo sobre as questões que acabamos de colocar. Poderia falar mais, mas respeitando o espaço para a fala do outro professor, reforço o endereço do site

onde encontrarão leituras boas para subsidiar os trabalhos de vocês e para que

entendam os trabalhos que vêm sendo desenvolvidos na Universidade Federal

de Santa Catarina.

Romier Souza

Queria inicialmente me apresentar: sou Técnico em agropecuária

formado pela Escola Agrotécnica Federal de Castanhal (EAFC), Engenheiro

Agrônomo formado pela antiga Faculdade de Ciências Agrárias do Pará (FCAP)

e atualmente professor do Instituto Federal do Pará – Campus Castanhal, onde

ajudei a construir nosso Curso de Agronomia, do qual também contribuo como

docente-pesquisador.

Esta breve caminhada me credencia a realizar, aqui, uma relexão crítica sobre a formação proissional em engenharia, especialmente, no campo das Ciências Agrárias, na qual vou me deter com mais intensidade.

A contribuição que queria trazer, para não ser repetitivo, pelas questões

que foram colocadas pelos colegas que me antecederam, vai ser na perspectiva

socioambiental e pedagógica que passa fundamentalmente por pensar quais

são as questões que nos mobilizam, hoje nestes campos de conhecimentos para

reletir a formação proissional. Penso que o professor Fernando Michelotti trouxe, com o vídeo da

manifestação realizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

(MST), no canteiro de obras da Empresa Vale, relexões importantes sobre a (des)territorialização de milhares de famílias e os impactos socioambientais

ocasionados pelos grandes empreendimentos na Amazônia.O professor Walter,

trouxe alguns elementos fundamentais sobre esse debate da ciência e da

tecnologia e, queria, talvez, abordar em uma outra perspectiva. Pensando que

grandes temas da conjuntura nos mobilizam hoje?

Tenho feito um grande esforço de dialogar nas diversas atividades que

temos participado aqui no Instituto, com os colegas professores e engenheiros

e também com nossos estudantes, no sentido de trazer alguns elementos que

possam ajudar a reletir a partir da realidade concreta. Penso que há um problema

quanto à questão da formação acadêmica dentro dos cursos de engenharia, quando

começamos a fazer um discurso que talvez esteja numa direção diferente do que

historicamente essas formações vêm se dando. Em geral, há uma reação por

alguns, de que somos muito teóricos e que isso é muita ilosoia, e os estudantes preferem a prática.

Neste sentido, vamos discutir a realidade para poder pontuar, a partir

de uma contextualização real, os grandes problemas vivenciados atualmente.

Vamos abordar dois temas fundamentais, como contribuição à discussão: uma

breve discussão sobre a ciência que temos construído e uma relexão sobre a apropriação da natureza pelos seres humanos com ênfase nas ciências agrárias.

O Bidu23, sua calda e a ciência

Gostaria de iniciar este tópico com uma metáfora. Outro dia estava na

casa de minha mãe e comecei a observar um cachorro que ela possui, chamado

Bidu. Ele [o cachorro] é da raça Pinche, inquieto e barulhento por natureza.

Aqueles cachorros do tipo especial para seus donos. Porém, me parece que ele

tem algum problema mental, pois de uma hora para outra ele começa a correr

atrás do rabo até cansar. De tanto morder seu rabo, começou a se automutilar.

Normalmente estes cachorros são levados a amputar o rabo. No entanto, minha

mãe é contra qualquer tipo de mau trato e não cortou a calda do animal. Mas,

quando levamos ao médico veterinário, ele disse que deveríamos cortar o rabo

do Bidu, porque estava bastante daniicado pelas mordidas. O veterinário relatou que o Bidu é especial, pois nunca havia visto um

cachorro que corria tanto atrás do rabo. Nós optamos em realizar a cirurgia

no Bidu, cortando sua calda. Ocorreu tudo bem e ele se recuperou de forma

tranquila. Porém, a surpresa foi que ele continuou correndo atrás da calda, de vez

em quando, até cair de cansado.

Olhando esta cena, comecei a reletir sobre a ciência hegemônica construída, em especial, nas engenharias e, infelizmente, na Agronomia isso se

reproduz bastante, inclusive aqui no nosso Instituto. Uma ciência que corre atrás

do rabo o tempo todo, reletindo a partir de velhas questões ou com perguntas que em princípio parecem novas, no entanto, reletem sobre algo que muitas vezes foi responsável pelo problema que está querendo responder. 23 Personagem de História em Quadrinhos do Cartunista Maurício de Sousa

Penso que temos dado voltas em problemas antigos exatamente por não

buscar olhar de forma diferente. O que é pior, nesta lógica, percebe-se que não há

um rabo a ser perseguido. Muitos cientistas estão correndo atrás de um não-rabo,

sem um problema concreto a ser resolvido.

Seguindo nossa metáfora canina, parece-me que em alguns casos muitos

pesquisadores estão a anos correndo atrás do rabo e esquentando pesquisas e

trazendo problemas já a muito respondidos, em geral, por não saírem de seus

laboratórios ou muros que os pendem a uma episteme convencional e inadequada

para a época em que estamos vivenciando [Aquecimento Global24, redução dos

recursos naturais, aumento do número de famintos no mundo25, contaminação

dos solos, água, atmosfera etc.]. Muitas vezes melhoram alguma coisinha, mas

em geral, são pesquisas existentes e que já não contribuem com a evolução do

pensamento cientíico efetivamente. Para exempliicar o que estou dizendo, outro dia vi um projeto aqui em

nosso Campus, de exclusão do fósforo para ver o comportamento do açaizeiro.

Aí, ico me perguntando: será que alguém já não estudou esta situação? Devemos ter algumas dezenas de artigos publicados sobre a mesma questão e continuam

reproduzindo estas pesquisas. Por quê? Na minha avaliação, além de ser um

problema cientíico, também é um problema pedagógico. Pois, é parte de um movimento de adestramento dos estudantes. Essa ciência reprodutivista vem

para a sala de aula e ensina os educandos a simplesmente reproduzirem o que já

está pronto.

Além do problema efetivo de método, temos um problema ideológico,

pois estas pesquisas são aceitas como verdades absolutas, inquestionáveis,

exatamente porque foram realizadas a partir de uma ciência hegemonizada na

sociedade e na academia.

Quer dizer ela [a ciência] justiica os atos e garante o poder hegemônico e uma perspectiva de reprodução econômica do capital, como foi mostrado aqui,

24 Segundo estudo publicado na revista Nature – A safe operatingspace for humanity - em 2009, a degradação ambiental já ultrapassou o ponto de não retorno em três paramentos: mudança climática, perda de biodiversidade e ciclo do nitrogênio. LE MONDE DIPLOMATIQUE Brasil. Por consumo e produção sustentáveis. Le Monde Diplomatique Brasil: suplemento especial. Vol. 5, nº 59, julho de 2012. 25 Dados da FAO (2009) ressaltam que atualmente existem cerca de 1020 milhões de pessoas subnutridas no mundo. FAO. El estado mundial de la agricultura y la alimentación: La ganadería, a examen. Roma, Itália: FAO, 2009.

muito bem, pelo Fernando, no vídeo apresentado. Esse é o elemento forte de

como a ciência vem justiicando esse adestramento que recebemos nas Escolas de formação. Outro exemplo que gostaria de compartilhar é de um artigo chamado

“A construção de uma ciência a serviço do campesinato”, que são de autores da

Associação Brasileira de Agroecologia (ABA).E, de como essa ciência chega até,

de certa forma, a ser cínica. Diz assim, com base em um parecer do Ministério

de Ciência e Tecnologia sobre os transgênicos: recente documento do Ministério

da Ciência e Tecnologia (MCT), elaborado por cinco cientistas que integram

a Comissão Nacional de Biossegurança (CTNBio), expõe o artifício de forma

límpida:

Em nome da verdade cientíica, seus autores airmam que seria uma temeridade para o país, no século XXI, (...) que a diversidade de qualquer planta de grande interesse econômico estivesse na dependência de agricultores que não têm a mais vaga ideia de genética e que a preservação in situ é inviável. Seguem assegurando que é um desserviço que prestam ao país os que estimulam um pequeno agricultor brasileiro a continuar usando grãos de milho crioulo como semente, ao invés de utilizar sementes de uma cultivar melhorada pela Embrapa. Isso porque o pequeno agricultor, incentivado a plantar grãos dos chamados milhos crioulos como semente, produz menos de uma tonelada por hectare e assim estaria condenado à pobreza e a enfrentar todos os problemas advindos de uma má prática agrícola. Para inalizar, a pérola maior: o plantio de grãos no lugar de sementes pode ser antigo como defecar nos rios, mas não é compatível com o convívio entre cidadãos de uma sociedade moderna (ANDRADE et. al., 2009 apud PETERSEN, 2009)26.

O Brasil possui uma Comissão Técnica Nacional de Biossegurança

(CTNBio)27, composta por “expertos” na área, com alto conhecimento cientíico sobre o tema e que decidem, por exemplo, a liberação do milho transgênico, do

26PETERSEN, PAULO; DAL SOGLIO, F. K; CAPORAL, F. R. A construção da ciência a serviço do campesinato. In: PETERSEN, Paulo (org.). Agricultura Familiar camponesa na construção do futuro. Rio de Janeiro: ASPTA, 2009.27 Lei 11.105 de 24 de março de 2005, regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de iscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modiicados – OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o, 10 e 16 da Lei no 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências.

feijão transgênico, do arroz transgênico, d soja transgênica. Como eles fazem

isso e quais os argumentos cientíicos que utilizam? Dizem o seguinte, expõem o argumento da forma mais “límpida”, conforme vimos no trecho do parecer

dos cientistas acima, um parecer de cinco cientistas sobre o uso das sementes

crioulas, sendo extremamente conservadores e preconceituosos com relação ao

papel estratégico da diversidade agro biológica28.

Para contrastar esta realidade, recentemente foi publicada uma pesquisa

realizada por pesquisadores da EMBRAPA, reletindo um estudo realizado em cinco regiões da Paraíba com mais de quatro anos de trabalhos de campo,

mostrando a diferença da produção de milho crioulo e a produção do milho

melhorado da EMBRAPA. O resultado da pesquisa cientíica mostrou que onde o milho crioulo não empatou com as variedades melhoradas, ganhou (SANTOS

et al, 2012)29. E o milho crioulo se mostrou muito mais resiliente porque tem a

capacidade de suportar determinadas variações, por exemplo, de clima, falta de

chuva, de luminosidade, enim. E aí os cientistas dos transgênicos nos vêm com essa pérola, exatamente para justiicar a necessidade dos agricultores deixarem de utilizar as sementes crioulas. Por quê?

Isso tem a ver com o interesse das grandes empresas produtoras de

sementes no mundo. Atualmente, a maior parte da produção de sementes está

nas mãos de quatro grandes empresas produtoras de milho no mundo. E aí, qual

é a estratégia? Eliminar a diversidade das sementes e deixar os agricultores

dependentes dessas empresas.

Estes fatos elucidam bem o papel que a ciência hegemônica vem

cumprindo em benefício de um punhado de empresas, justiicando o modelo de reprodução econômica do capital30. Nessa linha, vejo uma necessidade de repensar

28 De acordo com Fernandes; Almeida (2007) com a liberação dos transgênicos para plantio em larga escala, como o milho, que é uma planta de fecundação cruzada, a contaminação de uma variedade crioula por transgenes irá fatalmente ocorrer. Nesse cenário, a erosão genética é proporcional à quantidade de variedades contaminadas. Ainda que um agricultor obtenha sementes de outras variedades crioulas, a contaminação poderá ocorrer novamente. Assim, a cada ano, ocorrendo o processo de contaminação, a perda da variedade será inevitável. Na verdade, não só a crioula, mas qualquer semente não-transgênica de uma mesma espécie pode ser contaminada. FERNANDES, G. B.; ALMEIDA, P. A ameaça dos Transgênicos. Entrevista. Agriculturas - v. 4, nº 3, out. 2007.29 SANTOS, Amaury et al. Avaliação participativa com variedades de milho crioulo no município de Casserengue-PB. In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE SISTEMAS DE PRODUÇÃO, 9., 2012, Luziânia. Ciência, tecnologia e inovação para o desenvolvimento rural sustentável: anais. Brasília, DF: Embrapa; Planaltina, DF: Embrapa Cerrados, 2012. 1 CD-ROM.30Petersen et al, 2009 ressaltam que : “De fato, ao assumir o papel de caucionador ideológico dos modernos impérios agroalimentares, se valendo da retórica da necessidade de superação do atraso,

os projetos pedagógicos nesse debate, ao menos trazendo estas contradições para

serem debatidas no âmbito da formação proissional.Talvez a nossa maior inquietação, com as estruturas pedagógicas, desses

cursos de engenharia, é que fazemos adestramento nos educandos. A maioria

dos professores só nos ensina a reproduzir técnicas que já existem, sem realizar a

crítica sobre estas técnicas ou mesmos reletir a quem estas técnicas e tecnologias estão beneiciando efetivamente.

Pensar novas possibilidades, ver oportunidades a partir de problemas

novos ou demandas reais da maioria da sociedade é um grande desaio na mudança de concepção política-pedagógica na formação dos engenheiros. Não

discutem com base naproblemática da realidade. Não querem debater sobre isso,

reproduzem as técnicas já produzidas por uma ciência que não está adequada à

atual realidade em que vivemos.

A ciência deveria evoluir na medida em que é capaz de responder aos

principais desaios de cada época (FUNTOWICZ e RAVETZ, 2000)31. Para

estes autores a complexidade dos problemas existentes, atualmente, não pode

ser tratada na mesma forma que a ciência atual vem fazendo.

A apropriação da natureza e as relações de trabalho

Outro elemento importante nessa discussão da realidade é a relação de

apropriação da natureza e as relações de trabalho estabelecidas. Como temos

nossos celulares? Nossos laptops? Os móveis onde estamos sentados? O que

vestimos ou nos alimentamos? Quer dizer, como isso acontece? O que transforma

tudo que temos e utilizamos? O que nos transforma em seres humanos? Penso

em um conceito central para entender estes processos é o conceito de trabalho,

do ponto de vista ontológico, conforme nos revela Saviani32:

O ato de agir sobre a natureza transformando-a em função das necessidades humanas é o que conhecemos com o nome de trabalho. Podemos, pois, dizer que a essência do homem é

a Ciência exerce nos dias de hoje função análoga à que cumpriu a Igreja ao abençoar os projetos de expansão imperial de Portugal e da Espanha nos séculos XIV e XV, fechando os olhos para as consequências atrozes da modernidade que implantou”.31FUNTOWICZ, S.; RAVETZ, J. R. La cienciaposnormal: cienciaconlagente. Barcelona: Icaria editorial, 2000.32 SAVIANI, D. Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e históricos. Revista Brasileira de Educação. v. 12, n. 34. Jan/abr, 2007.

o trabalho. A essência humana não é, então, dada ao homem; não é uma dádiva divina ou natural; não é algo que precede a existência do homem. Ao contrário, a essência humana é produzida pelos próprios homens. O que o homem é, é-o pelo trabalho. A essência do homem é um feito humano. É um trabalho que se desenvolve, se aprofunda e se complexiica ao longo do tempo: é um processo histórico.

Não estou tratando aqui do trabalho como emprego, mas do trabalho no

sentido das transformações dos recursos naturais e de bens materiais e imateriais

que garantem a nossa existência humana.

Desmitiica-se muita coisa com uma leitura do papel do trabalho, porque se a gente parte dessa ideia e consegue reletir o seguinte: nada, absolutamente nada-tratando das engenharias que tem a prerrogativa de transformar os recursos

naturais, como mecânica, agronômica, civil, etc, nada é feito sem ação humana,

a partir do trabalho.

E, esse trabalho, necessariamente, é algo construído historicamente,

culturalmente. Se, partirmos dessa ideia, pensar a formação de engenheiro, é

necessariamente pensar a transformação dos recursos naturais e bens materiais

para existência humana. Ou seja, é pensar as relações humanas, é pensar as

relações sociais de trabalho historicamente constituídas. Nesta condição é

fundamental pensar o trabalho como princípio educativo, conforme (FRIGOTTO

et al 2005, p. 2)33.

Somos parte da natureza e dependemos dela para reproduzir a nossa vida. E é pela ação vital do trabalho que os seres humanos transformam a natureza em meios de vida. Se essa é uma condição imperativa, socializar o princípio do trabalho como produtor de valores de uso, para manter e reproduzir a vida, é crucial e “educativo”. Trata-se, como enfatiza Gramsci, de não socializar seres humanos como “mamíferos de luxo”. É dentro desta perspectiva que Marx sinaliza a dimensão educativa do trabalho, mesmo quando o trabalho se dá sob a negatividade das relações de classe existentes no capitalismo. A própria forma de trabalho capitalista não é natural, mas produzida pelos seres humanos. A luta histórica é para superá-la.

33 FRIGOTTO, G; CIAVATTA, M.; RAMOS, M. O trabalho como princípio educativo no projeto de educação integral de trabalhadores In: COSTA, Hélio da e CONCEIÇÃO, Martinho. Educação Integral e Sistema de Reconhecimento e certiicação educacional e proissional. São Paulo: Secretaria Nacional de Formação – CUT, 2005.

Desnudam-se assim, os pré-conceitos que se estabelecem, muitas vezes

nos nossos cursos, reforçando uma lógica de que a tecnologia hegemônica é

neutra. No entanto, quem faz a tecnologia? Quem produz a existência humana,

se não os próprios humanos.

Fritjof Capra34, ilósofo do campo da Física, tem airmado que vivemos uma “crise de percepção”. O que é essa crise de percepção? É exatamente como

conseguimos enxergar a realidade na qual estamos inseridos? Segundo este

autor, “nossas grandes instituições sociais concordam com os conceitos de uma

visão de mundo obsoleta, uma percepção da realidade inadequada, para lidarmos

com nosso mundo superpovoado e globalmente interligado”. Haesbaert e Porto-

Gonçalves35revelam como nossos principais problemas foram criados pelas

tecnologias que construímos:

Ainal, vivemos um mundo em que os maiores perigos já não mais advém da peste ou da fome, mas, sim, das próprias intervenções feitas por meio do sistema técnico-cientíico. O efeito estufa, a ampliação da camada de ozônio, a erosão genética e de solos, a doença da vaca louca, a gripe asiática (Sars), o vírus ebola, a doença do frango, o DDT, o ascarel, o amianto, o césio, o pentaclorefenato de sódio (o pó da China), o agente laranja (Tordon 45), entre tantos riscos que nos apresentam, não são obras da natureza e, sim, efeitos de nossa ação por intermédio de poderosos meios técnicos e cientíicos.

Segundo estes mesmos autores:

A revolução tecnológica não é externa às relações sociais e de poder, é parte delas, e por isto temos esta revolução tecnológica que aí está e não outra, entre as muitas revoluções técnicas possíveis. É preciso desnaturalizar a técnica, e libertá-la dessa visão que fala de uma revolução tecnológica em curso sem se perguntar quem a põe em curso. Ainal, as técnicas não caminham por si mesmas. (Idem, p. 106)

Mais uma vez ica clara a importância do debate sobre a produção da

34 CAPRA, F. A teia da vida: uma nova compreensão cientíica dos sistemas vivos. São Paulo: Cultrix, 2006.35HAESBAERT, R.; PORTO-GONÇALVES, C. W. A nova desordem mundial. São Paulo: Editora UNESP, 2006, p. 122-3.

ciência e tecnologia nas engenharias e não simplesmente a reprodução de técnicas

prontas e acabadas, sem o devido questionamento das mesmas. Precisamos

romper com a concepção “bancária” de formação, em que nossos estudantes

são “vasilhas vazias” que, pacientemente, memorizam e repetem o que lhes é

repassado (FREIRE, 2005)36. Precisamos trazer as contradições dos modos de

produção existentes na atualidade e a quem estes modos estão beneiciando. Realizar a crítica quanto ao tipo de impacto sócio-ambiental que estas técnicas e

tecnologias vêm causando aos seres humanos.

36 FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2005.

MESA 2Tecnologia social aplicada ao desenvolvimento da Amazônia

Sandra Ruino (Professora UFOP)

Agradeço o convite e a oportunidade de vivenciar o evento, como

primeira experiência do EREDS NORTE. Espero que tenha o segundo, terceiro,

pois sou viciada nesses eventos da engenharia, relacionados ao desenvolvimento

social, para a formação do aluno e não só necessariamente, das engenharias, mas

para todos os cursos que aqui possam ter oportunidades de visualizar e de ter

acesso a outras informações que tradicionalmente em sala de aula vocês não têm.

O EREDS é um espaço livre para um debate de ideias e de conhecer

temáticas novas que mobiliza muitos alunos, proissionais e docentes vinculados a essa área (desenvolvimento social). Para mim, é muito gratiicante ver o depoimento, na primeira mesa, do Rodrigo Erdmann, das incertezas que ele tinha

em relação às engenharias e dizer que não é o primeiro que faz esse tipo de

depoimento de que é possível trabalhar e permanecer na sua área acreditando e

trabalhando para um mundo melhor.

Perdemos muitos engenheiros e muitos alunos que eram das ditas

“ciências duras”, justamente, porque não conseguiram perceber ou conciliar a

questão do desenvolvimento social e a questão ambiental, junto a sua área e

optou em sair do curso e migrar para outra área. E isso não precisa acontecer. A

ideia de sensibilização e problematização das questões sociais, com a engenharia

e tecnologia é justamente dizer que você (aluno, professor, proissional) pode fazer essas opções, sim, dentro da sua área. Aliás, precisamos muito de

proissionais que sejam da área das chamadas “ciências duras” (engenharias, física, matemática, química etc) para trabalhar porque somos muito poucos e

queremos aumentar esse número.

O EREDS não é um processo de “lavagem cerebral”, como fazem por

aí, aonde todo mundo sai igualzinho. Aqui, não! Vocês são livres para optar se

vocês querem sair, por esse caminho, como muitos de nós estamos seguindo, ou

se vocês vão seguir por outras áreas. A grande questão é a oportunidade dada que

muitas vezes não temos. Nós que lecionamos em cursos de engenharia ou mesmo

em outras áreas também técnicas, como: administração, economia, psicologia,

pedagogia dentre outros cursos, como os que estão aqui presentes no evento:

ciências contábeis, agronomia, turismo, serviço social, engenharia ambiental,

engenharia civil, engenharia sanitária, os tecnólogos de agricultura, agroecologia

e assim por diante [desculpem-me, se esqueci de algum curso, é porque faltou o

papel com a cola dos cursos presentes], o objetivo é trazer (ampliar) um leque de

opções para atuação no mercado de trabalho.

Os proissionais, muitas vezes, quando vão para o mercado seguem um determinado caminho porque não conheceram outro. Na verdade, não foi uma

escolha, e sim um direcionado (condicionado). É esse debate que o EREDS

(regional) e o ENEDS (nacional) vêm suscitar para os alunos. Então, todos sejam

muito bem vindos! E estou muito feliz por essa oportunidade.

Falarei sobre tecnologia social, apesar da mesa estar colocada como

tecnologia social voltada para Amazônia. Sou da região Sudeste, e seria muita

petulância de minha parte apresentar tecnologias sociais da região de vocês.

Tentarei tratar sobre tecnologia em termos gerais; as tecnologias sociais que

existem e que podem ser de qualquer região brasileira e deixo a para professora

Maria José, de uma forma muito mais apropriada, tratar do que existe aqui.

Considerando que estamos pós-almoço, a ideia é tentar acordá-los.

Proponho a seguinte dinâmica: no começo da manhã se trabalhou muito com

a questão da formação. Quero que vocês peguem o bloco de nota e a caneta

que receberam. Na parte da manhãtrataremos de formação o tempo todo e da

necessidade de mudança. Trago um desaio para vocês [mostra o slide]: existem ali nove círculos equidistantes e vocês terão que traçar quatro traços consecutivos

por cima dos nove círculos.

Por que esse desaio? Primeiro, é para todo mundo acordar, depois do almoço; segundo é para ter um processo de provocação. A grade apresentada na

palestra da manhã nos prende e nos deixam em caixinhas. As disciplinas que são

dadas uma a uma e fazem com que nossa percepção do mundo ique presa a uma caixa. O objetivo é sensibilizar, para sairmos da caixa e poder responder a essa

questão. (dinâmica dos 9 círculos).

Darei um minuto para que respondam a esse desaio. Quem for resolvendo vai me mostrando e como estamos em um processo de competição teremos um

prêmio: um “parabéns” (risos). Espero que ninguém deixe de fazer, porque

não tem um prêmio à altura para se sentirem motivados. Vocês têm um minuto

para fazer quatro traços consecutivos por cima dos nove círculos. Como estava

dizendo, vocês devem (precisam) sair da caixa. O mundo hoje pede proissionais cada vez mais generalistas, que tenham uma percepção e uma interligação com

diversas áreas do saber. Isso inclusive foi dito pela manhã o que precisamos

ser multidisciplinares. “preciso entender de economia, sociologia, psicologia;

preciso entender das diversas áreas do saber, porque a minha área não está

isolada no mundo; não vivo em uma caixinha. Vivo em uma sociedade que ela é

multidisciplinar, transdisciplinar”.

Considerando que estão em uma Universidade e têm oportunidades.

Isso sempre digo para os meus alunos, procurem os professores e os instiguem

também para que se aprofundem [O professor Walter consegue fazer os quatro

traços consecutivos; apresenta à professora Sandra]. Dez, nove, oito, sete, seis,

cinco, quatro, três, dois, um. Acabou [tempo esgotado da dinâmica]. Estamos

na universidade e não no mercado de trabalho, caso contrário, já teriam sido

reprovados, teriam sido demitidos, seriam excluídos do processo. Por estarmos

na Universidade, podemos ter um debate democrático. Disse para vocês que

tínhamos que olhar para fora. Temos que sair da caixa para encontrar essa

solução. [fase 2 da dinâmica].

Darei vinte e cinco por cento da resposta para vocês. Portanto, quero

participação nos lucros. Para vocês terminarem a resolução do problema. Vocês

terão mais trinta segundos para terminar de fazer os 75%, correto? Muito bem,

aqui já conseguiram resolver. [Outro grupo de alunos conseguiram responder].

Vocês já têm mais 25%. Tenho participação nos lucros, 25% dos parabéns vai

para mim. [tempo correndo] Vocês precisam ser capazes num processo que

é de pressão o tempo todo, não tem tempo para executar, nunca consegue se

concentrar e não consegue dar resposta. Cinco, quatro, três, dois, um. Acabou

o tempo novamente. Agora, temos pelo menos uns três a mais com a resposta.

Isso é muito bom. Faz com que vocês sejam cada vez mais dinâmicos. Mais um

tempo, por favor! Para os que não conseguiram ainda. Os 50% na participação

são meus. Vocês precisam resolver em dez segundos.

Finaliza, parece uma coisa fácil, alguns de vocês considerarão isso óbvio

(ou não). Uma coisa que achei interessante, na parte da manhã, quando um dos

professores expôs o seguinte: “nós queríamos fazer a patente, mas soubemos que

alguém já tinha inventado”. Isso acontece porque as técnicas ou adestramentos

que vocês recebem, e que também recebemos, fornecem instrumentos para

que pensemos da mesma forma e cheguemos aos mesmos resultados. Não é

impossível imaginar que várias coisas, em lugares distintos, sejam produzidas de

maneira semelhante (quando não iguais), porque fomos condicionados à pensar

e à fazer da mesma forma.

É a questão da “forma” (FORMAção). Enquanto estivermos presos ao

quadrado, estivermos presos a uma caixa, não teremos soluções diferentes. A

proposição é que precisamos sair da caixa. Temos que inovar, sermos ousados,

fazermos diferentee, para isso, temos que estar dispostos. Considerando que

vocês estejam motivados com esse desaio, darei outro desaio semelhante. Já que vocês aprenderam com quatro traços, agora vocês devem fazer

com três traços consecutivos, que passem por cima dos nove círculos. A lógica é

a mesma, tenho que olhar para fora. Às vezes eu preciso ver o problema de forma

mais distante, para conseguir um resultado. Tenho que interagir com outras áreas

para conseguir chegar a uma solução. Vocês têm trinta segundos para resolver

esse próximo desaio. São três traços consecutivos. Portanto, será muito mais fácil do que fazer com quatro, são menos traços para vocês utilizarem. [professor

Walter responde novamente primeiro].

Qual a dica que você dá para esses meninos [perguntando ao Walter que

responde]? “Tem duas dicas: uma delas é o seguinte, duas retas se encontram

no ininito, outra coisa, ela [Sandra] nunca disse que se chega a hipóteses signiicativas, que às vezes a gente acha que existe e não existem, por exemplo, quem disse a grossura da linha?” Muito bem, mas, essa última dica ica para próxima dinâmica.

Darei outra dica. Vocês assistem séries de TV? Filme de bangbang.

Assistiram ao Zorro? Esta é a dica. Aproveitando a dica também do Walter sobre

o traço no ininito. Uma coisa muito engraçada com relação aos problemas, não avaliamos

(de fato) o problema, icamos inventando ou aumentado o problema. Não resolvemos o problema e complicamos as coisas. O que não disse não é regra.

Vocês automaticamente já colocaram isso

[imposição de limites]. Como sei que alguns

já resolveram e outros não e para não icar aqui, muito tempo, sobre isso passarei a

resposta. [resolvendo no quadro]. Por isso

[mostrando o resultado] falei sobre Zorro,

lembra? Um pouquinho a marca [z] três traços

consecutivos por cima dos nove.Acabou o

desaio? Não! Próximo desaio e último. Essa sim é uma das dicas que o professor Walter

apresentou. O tempo todo estou dizendo para vocês que é traço, quatro traços,

três traços, e assim como vocês precisam ser generalistas, precisam interagir com

outras áreas, precisam aprofundar nas áreas técnicas também. De que adianta

um médico cirurgião se este não souber utilizar um bisturi? De que adianta um

engenheiro que não sabe utilizar as suas técnicas? Então, temos que conhecê-las

muito bem para saber, inclusive, como modiicá-las (aprimorá-las ou adequá-las). Se tenho esse domínio [técnico] saberei fazer um único traço, passando

por cima dos nove círculos. Qual que é sua opção?[perguntando para alguém

da plateia]. Como é que faço, para um único traço passar por cima dos noves

círculos? Modiico a largura (espessura) e aí passo por cima de todos os círculos. Todo mundo acertou? Então vamos lá.

Quando tratamos de tecnologia,

quase sempre pensamos em tecnologia

high tech, tecnologia de ponta. Vem à

cabeça o astronauta, mais recentemente a

chinesa que voou, saiu tanta propaganda

sobre isso e iquei impressionada porque ela foi escolhida por conta do cheiro (e

não somente pela competência), que foi

o indicador determinante para escolha

dela.

A tecnologia tem sido apresentada como algo inalcançável e, na

maioria das vezes, apenas os artefatos (objetos) [apresenta várias imagens de

concepções e artefatos tecnológicos], até o

momento em que esse tipo de tecnologia

se torna comum (padrão). Mas chega um

ponto [apresenta a imagem dos efeitos da

bomba atômica] que começamos a avaliar

as consequências dessa tecnologia, que

tipo de tecnologia estamosutilizando para

quem?

Qual é a forma de vocês? [outro

momento de sensibilização: apresentação

de vários slides de modelos de formas

de bolo e doces]. É a quadradinha, a mais redondinha, mais moderna, é uma

mais contemporânea? A tecnologia historicamente é a técnica formada por um

conjunto de saberes. É uma ciência do conjunto de técnicas. O dicionário Aurélio

apresenta à tecnologia como um conjunto de conhecimentos cientíicos que se aplica a um determinado ramo de atividade a totalidade desses conhecimentos

numa metodologia técnica.

Quem pode desenvolver tecnologia? Os engenheiros? Ou, então, é da

universidade (e de seus diversos técnicos e proissionais) o desenvolvimento da técnica, da tecnologia? Não!A técnica em seus primórdios começou é ao acaso.

E nesse descobrimento, assim como o homem descobriu o fogo, como aprendeu

a conservar alguns alimentos (com o sal), a descoberta da tecnologia era sem

querer (ao acaso). Era do direito de qualquer um. Não se pensava a tecnologia

como algo pensado, pesquisado, sistematizado. Era, de fato, uma descoberta e

acabava sendo apropriada (dominada) e reproduzida por todos.

Da fase do acaso, a tecnologia evoluiu e passou para a técnica do artesão.

Apenas alguns homens dominavam certo ofício e tinham seus aprendizes. Eram

os chamados mestres. Eles confeccionavam sapatos, roupas e esse processo foi

evoluindo e, com a revolução, passamos a uma terceira fase (momento) que é

a técnica da técnica. Passa a ser uma técnica cientíica. Momento em que foi retirada da sociedade e passou a ser de domínio da universidade. Passando a

existir o conlito do saber popular com o saber cientíico. A sociedade não deixou de desenvolver a técnica, a tecnologia, ao acaso, ela ainda existe. Até mesmo

o descobrimento do post-it foi um acaso, para quem não sabe sua criação foi

erro de uma fórmula de cola que deveria ser forte (cola resistente), e podemos

citar outros exemplos, como o da penicilina. Mesmo a técnica do acaso continua

existindo na universidade, em um ambiente de metodologias, ciência, regras e

leis e procedimentos rigorosos.

A grande questão é, como vamos dimensionar esses saberes? Um

saber não é mais importante do que o outro. Eles são apenas diferentes. E para

pensarmos em tecnologia social teremos que saber conciliar os dois saberes.

A tecnologia é apresentada, normalmente, em uma visão mais

convencional desenvolvida e encontrada na área de produção, muitas vezes

industrial. O que se faz na agricultura, desenvolvimento de plantas ou técnicas

para agroecologia, na visão tradicional, pode não ser considerado tecnologia.

Até hoje háa discussão sobre o rural e o urbano. Olha-se o rural como

atrasado, como caipira, como se, de fato, no ambiente rural não pudesse haver

desenvolvimento e tecnologia. A tecnologia convencional é associada aos

artefatos, sempre, a objetos. Para ser considerada tecnologia na maioria das

vezes, precisa ser alta tecnologia. Tem que estar ligada a internet, informática,

telecomunicações. Uma receita de bolo, um que consiga erradicar a desnutrição,

não é vista como tecnologia. O soro caseiro não é visto como uma tecnologia.

A tecnologia está associada à ciência aplicada e na maioria das vezes, como as

imagens apresentadas no começo, são tecnologias vistas como neutras.

A ciência e a tecnologia são tratadas, muitas vezes, como neutras para

a sociedade. O professor Walter [que estuda CTS] pode trazer muito mais

elementos para esse debate. Onde a tecnologia é construída pela tecnologia e que

não gerará nenhuma consequência, não implicará em algo negativo para nossas

vidas ou sociedade.

Pergunto: tecnologia para quem? Noventa por cento dos proissionais de engenharia e de designer desenvolvem suas atividades, apenas para dez por cento

da população, e que é a mais rica. Esquecendo (ou ignorando) as necessidades

das pessoas que representam os noventa por cento da sociedade. Quando o

desenvolvimento da tecnologia é voltado para um determinado grupo, ica difícil dizer queé neutra. Uma vez o resultado de uma pesquisa realizada em uma

universidade, portanto, com respaldo cientíico e metodológico, foi divulgado

por um jornal de grande porte, que informou os telespectadores que o chuveiro

elétrico era melhor do que qualquer alternativa para se tomar banho aquecido,

comparado com o uso de energia solar ou a gás. Comprovaram cientiicamente, entretanto, se formos analisar os parâmetros de comparação abre margem para

dúvidas. A pesquisa não considerou a vazão de água, tempo debaixo do chuveiro,

custo no longo prazo e tantas outras variáveis. Mas, mesmo assim, conseguiram

comprovar que o chuveiro elétrico era a melhor opção. Você se pergunta: quem

encomendou a pesquisa? [pergunta ao professor Farid] Pois é, foi o fabricante,

professor Farid. Lógico.

Em outras universidades que são inluenciadas por empresas, não sei como é a realidade aqui, mas, a UFOP sofre inluência e recebe demandas das empresas mineradoras da região.Muitaspesquisas são direcionadas a esse

segmento, como trazem riqueza e desenvolvimento para região, mesmo que

essas mineradoras acabem com a montanha por inteiro, façam um revestimento

de grama e depois divulgue que isso é ser sustentável. Não é professor? Eu

não sei o que eles consideram sustentável, porque uma montanha em troca de

uma grama e alguns royalties que não chegam à comunidade local. Ou não sei

que equilíbrio é esse. Em São Paulo, era outra questão. Lá há a inluência das montadoras. Os estudos são direcionados para essas empresas. No Rio de Janeiro

e no Rio Grande do Norte para as empresas de petróleo, e, em cada localidade,

há uma inluência de empresas de grande porte.Vimos que uma grande parte dos recursos humanos, no desenvolvimento

da tecnologia é voltada para os mais ricos. A outra parte é voltada para estudos

militares. Nos EUA, 70% do gasto público, especíico do desenvolvimento, estão orientados para interesses militares, outros 15% para área nuclear e aeroespacial

e somente outros 15% que é para o restante. Um absurdo! Temos ainda, 70%de

gastos com pesquisa empresarial e, destes, 70% são transnacionais. Os 30%

são gastos com serviço empresarial. Signiica que não sobra quase nada para a sociedade.

Entretanto, temos uma demanda enorme para desenvolvimento de

tecnologias, para podermos melhorar a nossa condição de vida, para melhorar

o nosso bem estar. Não precisamos correr atrás de mais um novo artefato.

Não temos que trocar o iphone por um iphone II, iphone III a cada seis meses.

Precisamos saber, de fato, o que é importante para nós e para a sociedade. Por

que preciso de um celular a cada seis meses, se posso utilizar um por cinco anos?

Fizessa fala no ano passado, em um seminário de economia: tenho maior orgulho

de dizer que meu celular tem cinco anos de existência. Tinha, porque logo depois

da fala o celular pifou, mas herdei esse aqui de minha ilha e já tem 2,5 anos de uso [mostra o aparelho celular]. Por que esse consumismo exacerbado? No

comportamento sobre o consumo, a responsabilidade não é somente nossa, mas

é também nossa.

Vieira Pinto (2005) faz uma discussão de quatro signiicados da tecnologia: o primeiro que é o etimológico. A tecnologia tende a ser a teoria,

ciência, estudo e a discussão da técnica. O segundo, a tecnologia equivale pura

e simplesmente a técnica e esse é o sentido mais frequente e popular. O terceiro,

ligado à deinição anterior, o conceito de tecnologia pode ser entendido como o conjunto de todas as técnicas de que dispõe uma determinada sociedade, em

qualquer fase histórica de seu desenvolvimento. O quarto, e para mim, mais

interessante, o signiicado do capital: a ideologia da técnica. E isso é importante porque tratamos da política, da ilosoia, dos princípios que essa tecnologia traz, o nosso comportamento.

Em síntese, podemos dizer que a tecnologia é o conjunto de saberes

(conhecimento) que permitem fabricar objetos e modiicar o meio ambiente, incluindo, plantas e animais, para satisfazer as necessidades e desejos humanos.

Compreende a descrição de um saber organizado (sistematizado) e a explicação

das técnicas, pode ser tanto um produto/artefato, como pode ser uma técnica/

método e, ainda, poder ser um processo/metodologia, utilizada para resolver ou

facilitar nossos problemas ou necessidades da sociedade.

Pergunto: se a tecnologia é isso, por que temos que adjetiva-la? Por que

tenho que dizer tecnologia social, se ela, por si só, na sua essência, já é voltada

para a sociedade? A resposta é: como o domínio dessa tecnologia é de poucos

e para poucos ela não está conseguindo atender a demanda da maioria. Temos

que reivindicar o direito de desenvolvimento da tecnologia para a sociedade.

Por isso, temos que adjetivar: tecnologia social, para lembrar seu papel. O que

faz a tecnologia convencional? Pega a natureza e o trabalho e na exploração

desses dois, gera o lucro para os que a dominam. O desenvolvimento desse tipo

de tecnologia gera destruição da natureza, exploração, alienação e exclusão. A

tecnologia hoje não relete o interesse da sociedade.Outros tipos de tecnologias que podemos citar [apresenta vários slides

de tecnologias] são tecnologias apropriadas ao processo de estabelecimento

dos efeitos sociais e ambientais, de uma tecnologia proposta antes que ela seja

desenvolvida, e a tentativa de incorporar elementos benéicos, nas várias fases de seu desenvolvimento e utilização.

A tecnologia assistiva está relacionada ao desenvolvimento de

tecnologias para deicientes de qualquer natureza: visuais, físicos, mentais. É qualquer tecnologia que ajude na inserção de uma pessoa com deiciência na sociedade.

As ecotecnologias que, em alguns casos, são também tecnologias

sociais que geram menor impacto ecológico aproveitamento de materiais para

construção de móveis e de construção civil, sistema de captação de chuva que

pode servir para regar o jardim e para agricultura também, como são as cisternas,

sistema de irrigação como gotejamento, etc.

Uma polêmica que soube, recentemente, é de tecnologias para energias

alternativas, no caso da energia eólica. Soube a dois meses, que um grupo de

pescadores no Rio Grande do Norte manifestou-se contra essa tecnologia. O

Estado comprou essa tecnologia para geração de energia e instalou próximoà

margem do litoral, mas está prejudicando os pescadores, pois está afugentando

os peixes, por causa da vibração que causa no solo, com o movimento das

hélices. Mesmo as tecnologias limpas também geram impacto. Toda tecnologia

gera impacto. Temos que avaliar sempre. Por isso, alguns defendem que a

energia nuclear, enquanto energia limpa, talvez, seja a mais viável, apesar dos

riscos que conhecemos.

Recentemente passou na TV como ecotecnologia a lâmpada de PET,

que existe há muito tempo, mas que a emissora deu mérito e autoria da invenção

para a pessoa que foi entrevistada. Apresenta imagem do sistema PAIS. O

sistema PAIS, pela Fundação do Banco do Brasil e pelo MDS é considerado

uma tecnologia social, uma maneira que você tem de plantio para quem tem

pequena produção rural. [Apresenta a imagem da tecnologia por gotejamento

com garrafa PET]. Para manter a umidade do solo e um sistema equilibrado

na produção de alimentos; [Apresenta a imagem de bomba de água manual], a

utilização de bombas e sistemas simples para que não precise de energia para

retirar a água; [apresenta imagem de vassoura feita de garrafa PET], vassoura

de pet; [apresenta imagem biodigestor] e os biodigestores na Índia, chegamos

a desenvolver um projeto com a equipe do projeto Rondon do Ministério da

Defesa e construído na comunidade de Nossa Senhora de Lourdes em Sergipe.

Os biodigestores utilizam as fezes humanas ou de animais para

geração de gás, em substituição ao gás de cozinha. Em Mariana, Minas

Gerais, o biodigestor instalado em uma escola capta, das residências ao redor

e da própria escola para uso do gás na preparação da merenda dos alunos.

[Apresenta imagem de um aparelho leitor de notas] Esse é um exemplo de

uma tecnologia assistida. AAuire Prisma é uma empresa que seu proprietário

foi aluno de um grupo chamado Poli Cidadã na Escola Politécnica da USP, e

que se preocupava muito com as questões sociais e de tecnologia assistida e

inventou um produto mais barato do que era vendido no exterior. Tecnologia

brasileira, para leitura de notas de dinheiro, para deicientes visuais, para que eles não tenham que depender de alguma pessoa para contagem de notas, pois

o equipamento identiica notas de dois reais, de cinco, de dez, de cinquenta, de cem, inclusive as notas novas.

As tecnologias sociais compreendem produtos, técnicas e/ou

metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e

que representem efetivas soluções de transformação social (RTS, 2004). As

tecnologias sociais trabalham com o princípio da construção do conhecimento

de forma democrática e coletiva, e busca compartilhá-los com outras

comunidades com necessidades semelhantes.

Podemos dizer que tecnologia social é mais ambiciosa que a tecnologia

apropriada. A tecnologia apropriada é o conhecimento pronto e adaptado voltado

para a sociedade, enquanto que a tecnologia social é o desenvolvimento de

tecnologias, a partir da integração e sinergias entre o saber popular e cientíico, com participação efetiva na concepção dessa tecnologia, pela sociedade

envolvida. Tive informações de grupos vinculados a tecnologia apropriada que

aplicaram uma solução que deu muito certo na Índia para a mesma necessidade,

porém em uma outra realidade na África não obteve o nosso resultado. Como

se o fato daquela solução ter dado certo em um lugar obrigatoriamente, vai dar

certo em qualquer lugar.

A solução adequada a um problema depende também do contexto

e meio em que inserida. Nem sempre uma tecnologia para uma região e uma

determinada realidade consegue ser reaplicada de forma indistinta em outra.

Mas, não signiica que não possa ser aproveitada enquanto conhecimento esperado. Quando você vai para a localidade e, de fato, debate o problema com

a comunidade, o mundo dos saberes empírico e o cientiico, é que se consegue fazer grandes transformações.

Precisamos parar, principalmente para ouvir. Saber o que já existe de

soluções com os saberes locais para podermos potencializá-los. Porque da

mesma forma que muitas vezes a universidade chegando a um local e ignora o

saber local, também as pessoas dessa localidade - oprimida pela universidade,

porque já chega com status, de salto alto - acaba não valorizando seu próprio

conhecimento e aceitando como sendo único e verdadeiro, o conhecimento da

universidade. Precisamos dialogar, cada vez mais, e aproveitar e potencializar

esses saberes.

A tecnologia social, então, trabalha com o princípio da construção do

conhecimento, de forma democrática e coletiva, na busca compartilhada com

outras comunidades de necessidades semelhantes. O compartilhar não signiica impor, signiica trazer para aquela localidade outros saberes e analisar o que pode ser aproveitado. Mesmo sendo útil; se não pode ser implementada com

as características e peculiaridades locais, com o passar do tempo, ela pode ser

aprimorada e retornando para outras localidades.

A tecnologia social é para pobre e deve ser barata? Não, necessariamente.

O que mais observamos é que há muitas tecnologias sociais que reaproveitam

materiais ou utilizam recursos mais baratos, pois na grande maioria é para

população mais carente. Mas, a tecnologia social, não necessariamente implica

algo que seja apenas para os pobres (assim como a economia solidaria também

não é). É um modo de vida; é um modo de trabalho, de produção diferente. Ela

é válida para todos nós.

Não signiica reinventar a roda, mas não temos que buscar somente a tecnologia de ponta. Não vou comprar uma bazuca para matar uma mosca, não

faz sentido. É desperdício de recurso, de energia. Mas, também, não precisamos

minimizar as coisas para chegar a uma solução no local. Temos que chegar

a um equilíbrio e consenso. Lembro-me de uma discussão, em São Paulo,

com mutirões: trabalhadores que se unem (associação) para construir suas

casas em terrenos cedidos pela prefeitura. Eles faziamo sistema de rodízio na

autoconstrução de suas casas, a partir do projeto desenvolvido por técnicos. Um

desses mutirões tomou a decisão de utilizar estrutura metálica para as residências,

porém os técnicos da prefeitura disseram que eles não poderiam utilizar estruturas

metálicas. Ao indagarem do por que não poderiam utilizar estrutura metálica,

os técnicos responderam que condizia com a realidade deles. Eles haviam feito

um estudo e havia três grandes benefícios: social, tempo de realização e custo

(20% mais barato), mas não contemplariam a variável ecológica. Na verdade,

não era inviável. Pela primeira vez, autorizaram a utilização de estruturas

metálicas para a construção de casas populares. Conversando com moradores

de um assentamento perguntaram: ”olha, por que eu vou utilizar a técnica de

solo-cimento, se o rico não utiliza?” Então não é bom? Tem que ser bom para

todo mundo? Por que utilizar ecotecnologias, tecnologias sociais se outros não

utilizam? É a questão cultural também.

Voltando a questão de a tecnologia ser para pobre, barata e fácil;

encontramos exemplos como Gnu e Linux e que podem ser consideradas

tecnologias sociais. Para quem é programador, é um software livre e aberto.

Todos podem participar colaborar e pode multiplicar (distribuir) quantas vezes

quiser. Não signiica que seja barata ou fácil. Assim como os softwares livres, o

Banco Palmas, que é o primeiro banco comunitário no Brasil, tem mais de dez

anos e está localizado no Ceará, é uma tecnologia social,sendo adotado inclusive

como uma política pública de governo, de desenvolvimento, com a criação de

novos bancos comunitários e uso de moeda social no Brasil. Estão multiplicando

essa experiência em diversos municípios e estados. O banco comunitário é uma

metodologia. O desenvolvimento de uma tecnologia social pode ser muito mais

ousado, desde que seja desenvolvida de uma forma democrática com a sociedade.

Mas, infelizmente, temos distorções. Há casos de proissionais, bem intencionados, que por desenvolverem tecnologias para a sociedade já consideram

que desenvolvem tecnologias sociais, sem respeitar um princípio básico, de

participação da comunidade. Fiz uma pesquisa sobre projetos de tecnologias

sociais em uma universidade. Vários projetos de pesquisa com as palavras

chave: tecnologia social, economia solidária e desenvolvimento sustentável

que, na verdade, era apenas fachada para captar recursos, já que eram temáticas

prioritárias.

A pesquisa consistia em conhecer o projeto e entrevistar os proponentes

e os beneiciários/comunidade. Conheci um professor, que em todos os projetos, tinha o título tecnologia social. Um dos projetos desse professor idealizava uma

fábrica de farinha de banana, porque na cabeça dele, farinha de banana, pensando

em segurança alimentar era muito importante para a comunidade. Captou

recursos da FINEP, escolheu uma comunidade e implementou a fábrica, com

recurso signiicativo e não deu certo. No depoimento dele dizia: “A gente faz esforço e o pessoal não dá valor para o que a gente faz”. Por que não deu certo?

Porque, o professor nem consultou a comunidade para saber se eles queriam ou

não a fábrica naquela comunidade. E nem sequer perguntou se queriam fábrica

de farinha de banana ou outra coisa, sendo que não tem banana na região. O que

é pior ainda.

São esses cuidados que temos que ter em relação ao desenvolvimento

de tecnologia, por mais que tenhamos “boa intenção” de trabalhar com o

desenvolvimento de uma determinada região. Nossa ação tem que ser em

conjunto com a comunidade, porque não vai ter êxito se não for da vontade

daquela comunidade. O que podemos fazer, então, junto com a comunidade?

Podemos fazer novos produtos, novos processos, uma maneira diferente de

produzir. “Eu vou continuar produzindo alface, criando peixe, continuar fazendo

artesanato, mas o processo, a maneira de fazer é diferente”. Novos serviços,

novas inovações sociais e organizacionais [indica um texto do Walter Bazzo

sobre inovação tecnológica x inovação social]. Inovações sociais de gestão, etc.

Analisando o banco Palmas, é exatamente os três últimos: serviço,

organizacional e gestão. Porque está trabalhando com moeda social, atua com

crédito para as pessoas e tem uma metodologia própria de organização das trocas

e empréstimos, que fogem da lógica dos sistemas inanceiros tradicionais. A moeda social tem validade apenas localmente e trouxe grandes melhorias para

região.

A tecnologia convencional é para empresa privada e a tecnologia social

é para inclusão social. A tese para que haja o desenvolvimento, como se falou no

suportável, no durável, tem que ter as dimensões da sustentabilidade, trazida por

Sachs (1998), não somente a ecológica, mas também a social, cultural, política,

espacial/territorial, técnica e econômica. Os franceses não utilizam o termo

desenvolvimento sustentável em termos semânticos. Não acreditamos que seja

possível realmente ser sustentável (onde nada se perde), acreditamos que seja

possível um desenvolvimento durável, porque com qualquer intervenção mesmo

a eólica tem impacto. Sejamos realistas fazendo com que isso seja o mais durável

possível, para as próximas gerações, fazer com que o pulmão que a natureza tem,

tenha tempo de respirar e se oxigenar, caso contrário não iremos conseguir. Nas

relações entre a natureza e a economia, esta precisa ser tolerável (suportável);

já na relação sociedade e natureza é preciso haver um equilíbrio; na relação

sociedade e economia é necessário a equidade. São essas relações que geram a

durabilidade.

Hans Jonas (1968) nos diz “os nossos vindouros tem o direito a que lhes

seja deixado um planeta intacto, não tem o direito a novas curas miraculosas”, isso,

principalmente, para debater com o pessoal da nanotecnologia, biotecnologia.

Até onde vai esse nosso desenvolvimento, até onde queremos alcançar e no que

isso nos impacta? Mas, não temos o controle de todas as inovações e tecnologias,

como fazer? Uma frase que gosto muito é “há coisas que se pode fazer e outras

que se deve fazer, a sabedoria consiste em distinguir uma da outra”. É isso.

Convido a todos para o Encontro Nacional de Engenharia e

Desenvolvimento Social, que acontecerá nos dias 12 a 14 de setembro, em Natal.

A submissão de artigos na temática é até o inal do mês de junho. O Rodrigo poderia icar responsável em auxiliar, caso queiram, na organização de caravanas. Enviem artigos e caso sejam aprovados ica mais fácil para captar recursos e para poderem participar. Obrigada!

Maria José de Souza Barbosa

Inicialmente gostaria de agradecer o convite do Rodrigo Erdmann e

do Farid Eid. A participação na construção e organização do I EREDS Norte

foi um aprendizado. Particularmente, quando se trata da interlocução com as

engenharias, para tratar da tecnologia social aplicada ao desenvolvimento da

Amazônia. Trato do tema a partir de um lugar que não é da engenharia; sou

assistente social e tenho como base o trabalho desenvolvido na Incubadora, de

onde venho problematizando a questão do desenvolvimento da Amazônia.

Na condição de coordenadora do grupo de pesquisa Trabalho e

Desenvolvimento da Amazônia, com ações de pesquisa articulada à extensão,

via a Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos

Solidários, tem-se o compromisso de pensar a realidade amazônica e propor

soluções sob a ótica da incubação de empreendimentos solidários.

Busca-se, assim, problematizar a tecnologia social aplicada ao

desenvolvimento da Amazônia sob dois eixos básicos: o primeiro reproduzindo

o debate introduzido no texto Trabalho e Natureza na Amazônia, escrito em co-

autoria com o professor Giuseppe Cocco, em 2007 e, o segundo, com base na

experiência de incubação de empreendimentos solidários na região.

No texto de 2007 abre-se um debate sobre a difícil tarefa de problematizar

a questão do desenvolvimento da Amazônia sob as temáticas globais e locais, que

dinamizam a realidade nacional e regional. Assim, pensar em tecnologias sociais

aplicadas ao desenvolvimento da Amazônia, no lugar da universidade, torna-se

uma tarefa importante, principalmente, quando se busca travar um diálogo com

a formação de engenheiros, na sociedade do século XXI, ou seja, no capitalismo

de redes, na sociedade do conhecimento e no capitalismo cognitivo, ainda mais,

quando isto acontece na semana da Rio+20.

Isso gera um contexto, uma conjuntura importante para se problematizar

as tecnologias sociais e o desenvolvimento na Amazônia. Trata-se de desaios que precisam ser enfrentados, tanto na Amazônia da globalização, quanto da

Amazônia local, posto que ela não está isolada. E, quando se pensa na questão do

chamado desenvolvimento sustentável, a Amazônia é a primeira, região focada.

É preciso problematizar a Amazônia na encruzilhada da crise da sociedade

industrial e dos seus impactos ambientais. Observá-la sob as experiências dos

povos tradicionais: indígenas, ribeirinhos, quilombolas etc., a partir de seus

saberes, suas práticas e modos de vida relacionados à natureza. No cotidiano

das práticas desses povos é possível identiicar estratégias de vida para além do mercado e das mercadorias. Quando se pensa em desenvolvimento da Amazônia,

se pensa em desenvolvimento do Brasil, como falou a professora Sandra Ruino. Pensa-se em lucro, em como expropriar a riqueza natural da Amazônia, em

como se apropriar dela. E, essa apropriação não se dá com base nos saberes das

populações tradicionais ali residentes. Para as populações tradicionais a natureza

não é exclusivamente produto, mas sujeito em processo de troca e uso coletivo,

em que a relação entre o homem e a natureza estão em sintonia, portanto, não se

trata de um objeto a ser explorado, mas um recurso a ser utilizado para saciar as

necessidades relativas à reprodução do grupo social.

O modo de vida dessas populações nos faz interrogar os próprios

paradigmas de vida e de desenvolvimento. O que se difunde no espaço da

academia? Para dialogar com as discussões, realizadas nas mesas anteriores,

essas populações nos inspiram a criar novos conceitos e novas práticas sociais.

Elas nos inspiram ainda a criar novas ferramentas e criticar os velhos paradigmas

imanentes à racionalidade instrumental.

Na Amazônia os povos tradicionais vivem mais próximos da natureza,

dos rios, das várzeas, da loresta, do campo e isso nos possibilita pensar outras dimensões da realidade social, a partir de uma cosmologia completamente

diferenciada da racionalidade instrumental. Seus conhecimentos sobre a

Amazônia podem aportar novos conhecimentos, justamente para nós, os

chamados civilizados!

As transformações da sociedade do conhecimento, muito bem colocado

pela parte da manhã, e pela professora Sandra Ruino, quando airmam que a sociedade do capitalismo de rede interconecta todos os espaços até mesmo

àqueles dos ribeirinhos, com a realidade dos artefatos de última geração. Essas

transformações nos exigem novos pressupostos e novas alternativas, quando se

quer uma sociedade, digamos, diferente, uma sociedade igualitária, temos que

criar estratégias em face da própria crise da sociedade industrial.

Essa crise abre questões como o esgotamento dos recursos naturais

e, ao mesmo tempo, exige se pensar outras perspectivas, na medida em que a

manutenção,na mesma direção dada pela sociedade industrial e pela racionalidade

instrumental corre o risco de uma hecatombe, se postergarmos as soluções para

os problemas a serem enfrentados no presente.

Pensar, por exemplo, nos problemas da Amazônia, como foi tratado pelo

professor Michelotti, é gerar pobreza onde ela não existia, isto é, nos espaços em

que a relação entre homem e natureza não conhecia o padrão de vida consumista.

É somente quando esse modo de vida é impactado, ocorre o “pecado capital” das

necessidades e, ao mesmo tempo, do individualismo possessivo, sustentado pela

ganância do lucro sobre a extração dos recursos naturais.

E tudo isso em nome do que? Do capital. Das decisões políticas das

chamadas grandes potências, as quais repercutem em nossas vidas de modo

dramático, como a imposição da guerra, da fome, da miséria, da pobreza, do

desemprego, da violência. Em face do fracasso desse modelo de desenvolvimento,

que repassa para as classes trabalhadoras a miséria humana, como condição de

vida, cada vez mais fragmentadas.

No contexto da crise, não se pode negar os saberes das populações

tradicionais, os quais nos levam a pensar em tecnologias sociais a serem aplicadas

sobre um quebra cabeça, de uma região que não conheceu o desenvolvimento

industrial e nem viveu o assalariamento como forma de identidade e de

sociabilidade.

A Amazônia, como totalidade, não foi atingida por esse modelo brutal,

embora esteja subsumido a ele. No ilme mostrado pelo professor Michelotti pôde-se ver o processo de desertiicação produzido pela soja, mas também pela extração de minério, etc. Na Amazônia e no capitalismo de redes – é

possível existir uma correlação entre trabalho e emprego em uma região que

não conheceu o assalariamento industrial? São questões para se pensar. Como

enfrentar os impactos ambientais da exploração mineral, do desmatamento e do

agronegócio, por exemplo? É justiicada a sobrevivência de grandes projetos de infraestrutura (Belo Monte para sustentar a Vale e um modelo ultrapassado,

Hub Porto37em Espardate espaço de desterritorialização) para sustentar a

37 Um mega porto para ancorar navios de grande calado para transportar os minérios, os grãos e o gado. Quando se tem no estado do Pará os maiores índices de falta de saneamento e de habitações precárias.

expansão do gado, da soja e da exploração mineral? Mas também para as demais

instalações que vem se estruturando em todo o território do estado do Pará e da

Amazônia? É esse o modelo de desenvolvimento que se quer para a Amazônia?

Como icam as populações tradicionais? Na sociedade do conhecimento, seus saberes sobre a biodiversidade da Amazônia são destituídos e apropriados por

grandes laboratórios. Essa é a trajetória a ser reairmada com a insistência do neodesenvolvimentismo (REIS; BARBOSA, 2007)38 e do capitalismo de redes e

pós-industrial? (COCCO, BARBOSA, 2007)39.

Para pensar a Amazônia e mesmo o Brasil nas tendências mais avançadas,

isto é, sob a perspectiva do capitalismo de redes é preciso mudar nossos

paradigmas de crescimento e de desenvolvimento. Na realidade, são questões

para serem problematizadas na relação em que se faz entre ensino, pesquisa e

extensão, juntamente com as populações tradicionais. Então, no capitalismo de

redes não há diferenças entre centro e periferia, nenhuma etapa progressista. Os

problemas são locais e globais, não existe o fora e o dentro, as fronteiras estão

abertas (COCCO, BARBOSA, 2007).

Na sociedade global, as relações, os tentáculos do capital, das empresas-

rede sugam toda a possibilidade de distribuição da riqueza e cresce o fosso entre

as classes sociais. Assim, é preciso conhecer as novas contradições para abrir

novos horizontes e novas possibilidades. Neste espaço, a tarefa de professores e

pesquisadores, como nós, precisa ser deinida no campo de estudo, para além da linearidade e da icção do progresso industrial da Amazônia.

No capitalismo contemporâneo existem duas características que estão

associadas: o esgotamento do pleno emprego, porque aí tem a fato real da

reestruturação produtiva e do desemprego estrutural, da aplicação da ciência

e da tecnologia que gerou, em grande medida, a substituição do homem pela

máquina. Certamente, os novos instrumentos do trabalho e da gestão reduzem a

inclusão de trabalhadores e, em consequência, ampliaram a exclusão social.

O esgotamento do pleno emprego, enquanto uma política de

desenvolvimento que foi gerada pela dinâmica da sociedade do desenvolvimento,

38 REIS, Adebaro Alves; BARBOSA, Maria José de S. Desaios na fronteira amazônica entre o desenvolvimentismo e o noedesenvolvimentismo: estratégias de desenvolvimento local no Pará. In: XI ENCONTRO NACIONAL DA ABET, Campinas: UNICAMP, 2008.39 COCCO, Giuseppe; BARBOSA, Maria José de S. Trabalho e Natureza na Amazônia. In: Gestão de Políticas Públicas na Amazônia. Rio de Janeiro: Papers, 2007.

no pós-guerra, com a dinâmica da sociedade do bem-estar, é somente uma

miragem que persiste nas sociedades em desenvolvimento ou emergente.

Há também outra questão que está associada à antiga separação entre

o centro e a periferia, aquela que traçava a linha da divisão internacional do

trabalho, a qual também foi esgarçada. Portanto, há aí um fechamento de

possibilidades que, em tese, era determinado pelo crescimento econômico. Hoje

se pode ver que, quanto mais a economia cresce e se moderniza, menos emprega

trabalho vivo. Nessa perspectiva, o sonho de bem estar como alternativa de um

progresso da sociedade moderna, está profundamente destruído.

A nova questão social é dada, portanto, pelo desemprego estrutural, cujo

resultado, de um lado, é a terceirização, precarização do trabalho, do tempo

parcial, do contrato temporário, por projeto, por peça etc.; então porque re-

airmar essa forma? Ora, a primeira grande fragmentação se deu justamente com a quebra do paradigma da relação do homem com a natureza, quando o homem

se separou da natureza houve a primeira exclusão.

Lojkine (1998)40, no livro Entreprise et Societé, airma que a grande sacada do capitalista foi separar o mundo da vida do mundo do trabalho, como

também observou Habermas quando tratou da razão instrumental e da razão

comunicativa. Essa separação fragmentou o próprio homem, como também

mostrou a professora Sandra Ruino, ao tratar da alienação do trabalho, pelo trabalhador assalariado que não se reconhece como produtor do que produz.

Ele se aliena, porque a propriedade do produto não é mais dele, se encerra no

momento em que o produto é acabado.

Mas, quais são as soluções para essa nova questão social? As políticas de

transferência de renda têm gerado a inclusão social e o consumo sobre padrões

de vida mínimo, um padrão de inclusão que se dá de forma “subordinada”? É

essa forma de inclusão que se quer? Há uma concentração de riqueza e renda que

de certa forma é enfrentada pelas políticas de transferência de renda, ou seja, as

chamadas políticas sociais do século XXI.

Mas, a crise também abre para novas possibilidades! Não existe somente a

inclusão pelo emprego! O crescimento econômico não se traduz automaticamente

em maior nível de integração social. Isso é cada vez mais visível. O Brasil é a

sexta economia do mundo e em que isso se traduz para a sua população? Para 40LOJKINE, Jean. Entreprise et Societé. Paris: Galimar, 1998.

onde essa riqueza é canalizada?

Outra coisa que precisa ser desmistiicada. Nos anos oitenta, a palavra de ordem era: fora daqui o FMI! E isso agregava todos trabalhadores. Mas,

como é que nós estamos hoje? No caso do Brasil, os problemas de crescimento

econômico e da chamada integração social são determinados pelo histórico de

integração nacional, das especiicidades do próprio desenvolvimento do Brasil, isto é, da manutenção das desigualdades regionais. Vejam a guerra iscal, a luta pela distribuição dos ganhos do pré-sal, a lei Kandir etc.

Temos como elemento desse chamado desenvolvimento a alta

concentração de terras e de rendas, a precariedade das conquistas democráticas,

a interiorização racial, a mobilização de mão de obra cada vez mais precária, o

trabalho intermitente, e a insegurança social. Não são problemas de fora, mas

problemas internos ao modelo de desenvolvimento nacional. A informalidade e

a insegurança ameaçam hoje o centro e a periferia. Um autor português tratou

da questão do desemprego e da pobreza nos países ricos como um fenômeno da

brasilianização41. Isso quer dizer que a crise desse modelo atinge a todos, centro

e periferia? Assistimos diariamente no jornal, na televisão, problemas no centro

do capitalismo mais avançado.

O desmatamento para extração de madeira, minério, gado, agronegócio,

monocultivo são problemas colocados por esse modelo de desenvolvimento

convencional. O horizonte da sociedade industrial originária da razão instrumental

está em crise. A sobrevivência é dada pelos governantes do sistema global

(FMI, Banco Mundial, OMC, União Europeia, ONU) entre outros órgãos da

governança global. Nesse sentido, há uma dramática constituição conservadora

sob a hegemonia do capitalismo de rede e das instituições da globalização

(HARDT; NEGRI, 1998)42. No pensamento único e na globalização neoliberal,

tudo é mercadoria!

O compromisso com o desenvolvimento local e com o meio ambiente

é eclipsado pela própria crise. O agronegócio tem esgotado a maior riqueza da

Amazônia, que é sua biodiversidade. A natureza é o recurso produtivo mais

importante para o capitalismo, e sua busca esquizofrênica pelo lucro e pelo

consumo da natureza, enquanto produto, tem destruído as condições de vida no

41 Hoje se vê, na Europa, trabalhadores desempregado nas calçadas pedindo esmola.42HARDT, Michael; NEGRI, Antonio. Império. Rio de Janeiro: Record, 2001

planeta.

A ciência e o conhecimento se tornam joguete nas mãos do capital, mas

é delas que dependem nossas próprias vidas. E é nesse sentido que a questão

da tecnologia social pode operar o “milagre”, pelo aprendizado e pela troca de

conhecimento com as populações tradicionais na Amazônia, na medida em que

essas populações tem uma relação com a natureza de continuidade; uma relação

de respeito, de reverência totalmente diferenciada da nossa relação, que é de

sujeito-objeto.

A natureza para essas populações não é um simples recurso para uso

inescrupuloso, mas condição de vida e de trabalho. Não é somente de produção de

mercadorias, mas produção de vida. É verdade que não podemos ser românticos

e pensar que é possível voltar aos bosques, às cavernas, seria uma mentira! Mas

é possível que os saberes das populações tradicionais possam contribuir para a

redeinição de nossa relação com a natureza, de consumo e de degradação. Do ponto de vista do que se herdou da revolução industrial, a relação do homem com

a natureza foi praticamente abolida. É aí, nesse âmbito, que se precisa voltar e

ancorar a formação proissional.A ontologia do ser social mostra que há uma efetiva transformação do

homem na relação com a natureza, como explicou Marx, mas a ambiguidade

dessa trajetória, da qual somos herdeiros, é entender a natureza somente como

recurso para a produção de artefatos e de coisas voltadas à satisfação de nossas

necessidades (reais e imaginéticas). Quando nós, enquanto sujeitos sociais,

distanciamo-nos da natureza, não nos vemos mais como parte dela. Spinoza,

um ilósofo do século XVII, já chamava atenção para essa questão, quando airmava que o homem ao se sentir um império dentro de outro império, ou seja, do império da natureza, esquece-se que é parte desta própria natureza. É esse

estranhamento que provoca a devastação ambiental e com isso coloca em risco

a própria vida do planeta. Fragiliza-se e não se reconhece mais como natureza,

somente como ser social.

Hoje, se tem que retomar esses ensinamentos, especiicamente, da necessária relação essencial entre homem e natureza, na medida em que este é

em si uma natureza naturada. Uma natureza em constante transformação, cujo

estreitamento e dado pela razão instrumental dos homens com a natureza e entre

si. É preciso mudar urgentemente essas experiências para demonstrar que a

máquina do capitalismo e suas engrenagens apertam a todos nós. Nessa direção

é que as populações tradicionais têm muito a nos ensinar.

Quando se pensa em alteração de paradigmas se vê a necessidade de

olhar, no cotidiano, as práticas sociais vinculadas à natureza e em prol do meio

ambiente, portanto, as formas de vida e de relacionamento das populações

tradicionais com seus familiares, com sua comunidade e com a natureza. Nesse

espaço de convivência, o trabalho rotineiro não é o centro de movimentação da

vida. Não é a busca de excedente e, portanto, de lucro que move sua gente.

Nesse espaço, apreende-se que a vida é constituída sob a negação de

valores impregnados pela cultura do individualismo possessivo, da sociedade

do consumo e do desperdício, construída sob a ruína dos laços de cooperação,

solidariedade, vizinhança e reciprocidade. Portanto, em contraposição a esses

processos brutais de apropriação da natureza com a extração ilegal de madeira,

queimadas e a desertiicação para a introdução de soja, de pastagens e da mineração, de abertura de estradas ilegais em plena loresta, sob um circuito de conivências com os governos locais, estaduais e, muitas vezes, com fomento de

órgãos públicos.

A partir dessa realidade, as dinâmicas locais constituem uma perspectiva

de desenvolvimento mais articulada com as trocas e as experiências do modo

de vida das populações amazônicas, uma realidade que precisa ser apreendida

e decodiicada, como estratégia de fortalecimento de novos valores e novas práticas sociais, pautadas na cooperação e na reciprocidade, para que haja uma

nova codiicação. As tecnologias sociais, nesse sentido, constituem elementos essenciais

para criar mecanismos e ferramentas que possibilitem essa abertura para

novos aprendizados. O fato das populações tradicionais estarem tão próximas

da natureza traz uma possibilidade de novas conectividades em relação ao

reconhecimento da igualdade entre homem e natureza, uma relação de sujeito-

sujeito, como aparece em Spinoza e na cosmologia das populações tradicionais,

principalmente, os indígenas e os quilombolas. Eles apreendem a natureza

como parte da vida comum e coletiva, portanto, uma cultura de todos, sob uma

dinâmica de relação integral.

A Incubadora na Construção de Tecnologias Sociais Aplicadas ao Desenvolvimento da Amazônia43,44,45,46

As demandas por formação, acompanhamento técnico e assessoramento

a empreendimentos solidários, no estado do Pará, têm exigido de nós professores-

pesquisadores, estudos e relexões para a inserção de discentes de graduação, pós-graduação e proissionais recém-formados, em um campo de intervenção cujos requisitos proissionais, competências e habilidades técnicas remetem a questões não resolvidas no âmbito da formação proissional. No entanto, no exercício concreto do trabalho desenvolvido no Programa Incubadora Tecnológica

de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários da Universidade

Federal do Pará - ITCPES, o movimento de ensino, pesquisa e extensão para a

produção e aplicação de conhecimentos se dá na interface com outras áreas de

conhecimentos e no contexto de uma equipe interdisciplinar.

A Incubadora tem se constituído em um espaço de aprendizado em que

o ensino é realizado a partir de um processo de troca intenso, seja no interior

da própria equipe interdisciplinar (engenheiros de alimentos, ambientais,

de produção, economistas, sociólogos, antropólogos, assistentes sociais,

administradores, contadores, advogados, designs, entre outros), onde ocorre um

rico debate, a partir de uma interação entre si que possibilita diferentes olhares

sobre a realidade, e, na relação direta com os empreendimentos solidários,

43 BARBOSA, Maria José de Souza. Desenvolvimento Rural e Economia Solidaria: estratégia de sustentabilidade sob processos de intercooperación Espanha e Brasil na microrregião no Baixo Tocantins - na Amazônia brasileira In: Estrategias y acciones de desarrollo rural

a traves de cooperativas y emprendimientos solidarios. Baixo Tocantins (Para-Brasil). Alicantes: UA, España, 2012.

44______ et al. Formação, Prática e Estágio Proissional em Serviço Social na relação com empreendimentos solidários. In: Anais do XI Encontro Nacional de Pesquisadores em Serviço Social: Juiz de Fora: UFMG, nov. de 2012.

45______. A Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares e Empreendimentos Solidários da UFPA: um campo de articulação entre ensino, pesquisa e extensão. In: Educação e Sócio-Economia. Interação Universidade – Movimentos Sociais. Série Sociedade Solidária. Cáceres-MT: Editora Unemat. Vol. 2, 2006.46SOUZA, Armando Lírio de; BARBOSA, Maria José de S.; REIS, Adebaro, Alves. Incubadoras Universitárias: inovação social e desenvolvimento. XXXXXXXX

quando se busca aprender e contribuir nos processos de gestão e de produção

dos próprios empreendimentos.

Nessa dinâmica, visa-se fortalecer os processos de vida que são cada

vez mais fragilizados e vulnerabilizados pela dinâmica de penetração dos

grandes projetos na Amazônia. Assim, a Incubadora tem trabalhado a partir

de demandas de formação, de acompanhamento técnico e assessoramento a

empreendimentos solidários, realizando estudos e relexões para a inserção de discentes de graduação, pós-graduação e de proissionais recém-formados, sob uma perspectiva de desenvolvimento diferenciada, na medida em que tem como

inalidade potencializar as experiências e as práticas sociais das populações locais, sob a base do aprendizado.

A Incubadora é um espaço que remete à formação compromissada com

a realidade dos empreendimentos e, portanto, com a valorização da cultura e das

experiências locais. Tem como elemento central o exercício concreto de apoio e

de realização de experimentos, sob a troca de conhecimentos aplicados em que

os saberes populares dão sentido às diferentes áreas de conhecimento.

Neste espaço, há um esforço concreto de revisitar no plano teórico e

metodológico, os instrumentais operativos, como foi levantado pelos professores

Walter Bazzo, Fernando Michelotti e Romier. Quer dizer, busca-se estabelecer

uma “prática em comum das habilidades técnicas que fortaleça os elos sociais

[...]: a habilidade técnica se apresenta de duas formas básicas: fazer e consertar

as coisas”47. Na medida em que não há receitas prontas e a própria dinâmica das

sociedades locais nos mobilizam a pensar e a buscar conhecimentos para renovar

nossos instrumentais analíticos e operativos.

Busca-se assim, reconstituir nossas capacidades e habilidades técnicas,

clariicar determinados objetivos, redimensionar ou mesmo ressigniicar nossas próprias concepções e práticas pedagógicas envolvidas nessa dinâmica de

trabalho. Não há desta forma, separação entre o pensar e o fazer; isso porque

se considera que neste espaço são criadas condições para um fazer constante,

seja de construção de conhecimentos, de intercâmbio, de experiência, de troca

de saberes, de aprendizagens, os quais são mediados misturados em um meio,

muitas vezes, a conversas informais e escutas dos dramas e soluções vivenciadas

no cotidiano dos diferentes sujeitos em interação. 47 SENNETT, Richard. Juntos. [tradução de Clóvis Marques]. Rio de Janeiro: Record, 2012, p. 241.

Neste espaço, as tensões e conlitos são percebidos e trabalhados de diferentes perspectivas, pois são imanentes as diferentes corporeidades

e questões, como abordagens e referenciais teórico-metodológicos de áreas

de conhecimento díspares e em interação. Construir um ambiente comum de

formação sob as determinações do trabalho interdisciplinar não é tarefa fácil.

Para que haja o diálogo é preciso uma revisão continuada, na medida em que

a ritmos e rituais de trabalho inscritos pelas diferentes áreas técnicas e de uso

dos instrumentais de análise e técnico-operativos para que estejam ainados ao estreito debate da formação proissional; mas que precisam ser imediatamente postos em teste, na medida em que não há o distanciamento entre o debate teórico

e o exercício da prática.

A relexão teórica é embasada na realidade prática, tornando-se um imperativo, devido às novas competências técnicas e habilidades proissionais que são exigidas, a im de comunicar as ações, tarefas e atividades de cada sujeito no âmbito do planejamento e da formulação de oicinas, cursos, ações e projetos operados organicamente na dinâmica do trabalho coletivo e cooperativo

entre as equipes e os sujeitos envolvidos em ambiente de rede. Os gestos, as

falas, os olhares dão vida à cooperação que se traduz em um exercício especíico e particular uma vez que está inscrito, de modo efetivo, em cada momento de

planejamento e de produção que é peculiar a cada empreendimento.

No trabalho com as populações ribeirinhas se observa seus artefatos,

usos, hábitos, costumes, habitações palaitadas, a produção baseada no cultivo e na extração de frutos naturais (açaí, pupunha, cupuaçu, bacurí, pracaxi e outros

derivados), o cultivo da mandioca para fazer a farinha, a agricultura de quintal,

baseada em plantas medicinais e comestíveis48. Tudo isto é revestido de ritos

de cooperação, sob um diálogo necessário que se reveste de um simbolismo

comunal, de ajuda ao outro, gerando um processo de participação,do agir

coletivo, pleno de signiicados impressos pelas marcas da trajetória dos sujeitos locais, suas histórias de vida, de seus antepassados, na medida em que suas

técnicas e tecnologias imprimem um movimento real de manutenção em espaços

extremamente vinculados à natureza. Nestes casos especíicos, observa-se a

48 O matapi instrumento confeccionado do cipó da árvore para a pesca do camarão; o tipiti também confeccionado de cipó para a extração do tucupi, um líquido da mandioca muito utilizado na culinária paraense; produção da farinha (que extrai o tucupi), a peconha para a extração do açaí.

presteza no uso de instrumentos que em aparência são de simples manejo, mas

que carregam um tempo histórico amarrado nas formas de vida junto à natureza.

A valorização do conjunto dos valores, formas de vida e dos rituais

inscritos em suas culturas podem contribuir para a compreensão e alteração de

valores externalizados do homem-natureza, e repercutir em atos compartilhados

que foram debilitados ou mesmo esquecidos pelos rituais da sociedade moderna.

Como um ser que vive em sociedade, o homem precisa reencontrar esse caminho

que foi obscurecido pela homogeneização dos processos de individualização e,

com o posterior individualismo possessivo.

Considerações Finais

Mostra-se com esse pequeno debate, que há um movimento para se

fazer, em meio ao debate das tecnologias sociais aplicadas ao desenvolvimento,

particularmente, quando se trata da Amazônia. Na realidade, se coloca alguns

problemas de pesquisa, extensão e de vidaque correm sob outras dimensões, que

podem contribuir na perspectiva de um desenvolvimento focado nos sujeitos

protagonistas da relação entre homem e natureza, a im de mostrar que existem outras formas de organização da vida no espaço amazônico.

As vantagens que se têm, nesse contexto, também podem ser vistas como

desvantagens. Pois, se as populações locais embora detenham o conhecimento

da biodiversidade amazônica, ao conhecerem o uso de suas propriedades e

substâncias, por outro lado, não acessamos meios para melhor fazer uso e deter

o direito de propriedade comum.

Nesses espaços, há a relação direta com a natureza e a terra mas, essa não

é potencializada, na medida em que essa população vem, cada vez mais, sendo

desarticulada desse modo de vida, desses laços entre homem e natureza.

Como é que a Universidade pode fortalecer essa dinâmica, a im de manter ou mesmo desenvolver suas tecnologias sociais, imanentes a esse modo

de vida, para além da subordinação à dinâmica do capital? É claro que a sociedade

global, a sociedade do capital busca subsumir todas as formas de vida no planeta.

Mas, como é que se pode, nesse processo, garantir a organização de um campo

de resistência e sistematizar essas experiências, a im de estruturar ou mesmo resgatar as experiências concretas de vida comum com novos aprendizados?

Particularmente tem-se aprendido e apreendido muito nessa relação

estreita com as populações ribeirinhas, com as populações tradicionais. Pensar

como estas populações podem inluenciar na formação de um novo proissional, por exemplo, imerso em compromissos com os sujeitos locais, respeitando seus

valores, suas culturas e vida social é certamente uma possibilidade de alteração

dos projetos pedagógicos de cursos tanto nas ciências sociais, quanto nas

engenharias.

Não se pode esquecer ou mesmo suprimir nossas capacidades de vivermos

juntos. “Como animais sociais, somos capazes de cooperar, mais profundamente

do que imagina a atual ordem social” (SENNETT, 2012)49. Nas populações

tradicionais muito ainda resta deste animal social que traz, geneticamente,

a condição de cooperação como elemento de sobrevivência, seja com a sua

própria espécie, seja com os demais entes da vida natural. Somos natureza. Não

esqueçamos disso. É vital!

49 Idem, p. 336.

MESA 3Engenharia, Gestão de Empreendimentos Solidários e Movimento Social

Sidney Lianza

Boa tarde! Tá todo mundo acordado? Maravilha, maravilha. Vocês são

uns heróis e eu idem. Bom, a temática geral do nosso encontro e essa que está

aí. E, na verdade, o que me pediram seria o terceiro, foram três eixos digamos,

assim, a serem focados.

O primeiro, de ontem, onde foi pela manhã, a discussão muito boa,

interessante sobre a questão da formação do engenheiro ou da engenheira,

projetos pedagógicos em questão que, aliás, foi colocada a questão dos projetos

pedagógicos, aqui, pelo Bazzo. A segunda, desenvolvimento social aplicada ao

desenvolvimento da Amazônia, que coincide com o título do evento, então a

mesa da tarde ganhou essa signiicação, grande, pelo próprio nome. E, hoje, essa grande temática, engenharia e gestão de empreendimentos

econômicos solidários e movimentos sociais. Não consigo e, isso, desde muito

tempo, vamos acordar para essa questão, de falar do terceiro item, sem falar do

segundo ou pelo menos uma parte do segundo e da polêmica do primeiro e do

segundo que é a concepção do evento.

Quer dizer, o evento diz que a tecnologia social é desenvolvimento.

Isso já foi motivo de debate e polemica do que se tem do desenvolvimento

sustentável, não sustentável, paralelo, e assim por diante.Então, é uma questão

que queria colocar, também,com o meu ponto de vista, porque o contexto

dessa mesa, é Empreendimentos Solidários e Movimentos Sociais, visando ao

desenvolvimento territorial da Amazônia.

Da mesma maneira que a Sandra, eu não me sinto muito a vontade para

falar sobre Amazônia, porque não entendo absolutamente nada; já entendo de um

monte de coisa, mas Amazônia, realmente me rendo, já não tenho essa vivência

fundamental, mas pelo menos queria indicar, como questão de desenvolvimento,

para poder explicar meu ponto de vista.

Bom, estamos em tempo de Rio+20, que encerrou ontem. (...) Uma

temática foi a economia verde, no contexto da economia sustentável. Queria

chamar atenção para economia a verde e que já foi colocada aqui e, vou reiterar

essa colocação, para ver se na própria mesa aprofundamos mais essa temática e

a questão. Tenho uma imagem que não é minha, foi capturada, mas a articulação

da economia verde e o tigre vegetariano que achei fantástico; e eu coloco então

para reletir. Estamos dentro da universidade, daqui a pouco vou apresentar, quem é

muito ácido, nessa crítica da universidade, o Milton Santos, tem por obrigação

desenvolver o espírito crítico sobre o que está acontecendo na sociedade seja

brasileira, seja internacional. E na comunidade, particularmente, essa tragédia

socioambiental que toma conta.

Então nós debatemos isso, ou seja, economia verde, está se querendo dar

uma signiicação à economia esverdeando-a. Ou também podemos imaginar o tigre vegetariano. É possível que exista? É possível, mas isso é um palavrão, é

um pseudo que existe, quer dizer são palavras que tem uma diiculdade, é um paradoxo entre uma coisa e outra, economia verde, essa economia capitalista de

gente e o tigre ser vegetariano.

Milton Santos,nesse livro,“Por uma outra globalização”, que foi

citado hoje, que é um documentário maravilhoso e recomendo também vê-lo:

é realmente fantástico, mas o Milton, nessa entrevista e, também, nesse livro,

segue uma máxima, do Gramsci. Ele é extremamente pessimista na análise e

extremamente otimista na ação, na proposta de ação. Aliás, não gosto disso,

porque atualmente estou extremante pessimista na análise da situação e não

quero perder a esperança. Quer dizer, porque o quadro está felino. Se a gente

aprofundar a situação que está no mundo e icarmos nesse estado, a gente vai dar um tiro na cabeça. Porque a situação está muito ruim. E, Milton, comanda

o seguinte, já em 2001, “estamos vivendo um globalitarismo”. “Nós não temos

democracia”. Boaventura da Silva, Saramago “Nós não temos cidadania”. Quer

dizer, quem manda no mundo? Os hiperdecisores, que foi o que tentei falar hoje

na reunião sobre recursos hídricos; alguém decide que alguém vai passar sede.

Não é de graça. Manda a natureza? Natureza tem água. Então, alguém decide.

Quem é? Lá no centro tem os hiperdecisores, tem algum nível de poder que a

sociedade não controla. Por exemplo, a Organização Mundial do Comércio, por

exemplo, Fundo Monetário Internacional, enim tem vários organismos, e,que

parte deles, decidem evidentemente. As grandes transnacionais que globalizaram

o mundo. Elas são mais forte que os estados nacionais. É isso tudo que Milton

nos traz e estou aqui mostrando, que Milton é, sim, motivo de orgulho para nós

e é referência para debater os dias de hoje. Milton também adverte isso: olhar a

nossa situação da linha da esperança com os óculos de quem mora no Brasil e na

América Latina, que é um país de língua portuguesa, quer dizer olharmos com

os nosso olhos e não com os olhos dos outros, que eventualmente nós saímos

da nossa situação, quer dizer, vivemos como iguras deslocadas no tempo e no espaço.

Trago uma temática que passou por várias das mesas, mas é uma temática

que creio é importante discutir.Acho que essa temática, ou seja, o mundo está

sendo privatizado. Uma reserva de uma visão geral, isso foi dito.

Quer dizer quando falamos em bens comuns normalmente, corretamente,

associamos essa anatureza viva. (...) Todos temos direito aos bens comuns. Temos

acesso aos bens comuns. E isso aqui é um conceito, ao meu ver fundamental

para quem está falando de economia solidária. Quem está falando de economia

solidária, está falando da questão de como é que a gente cuida do bem comum.

E, como é que a gente gerencia, e como é que a gente compartilha o poder das

decisões sobre isso, sobre todos esses aspectos. Daí, se alguém tenta falar de

economia verde,ao meu ver, é o que corretamente disseram, é uma tinta sobre o

que acontece no mundo, tentando ludibriar com responsabilidade empresarial,

social, por exemplo, da mesma maneira, os adversários da economia solidária

também falam como que pode a economia ser solidária? Essa economia

capitalista não pode.

Aí, podemos aprofundar mais. A economia é algo a ser disputado

hegemonicamente. E aí cuido rapidamente, coloco o seguinte: quer dizer a

economia entendida por Karl Polanyi, ou seja, relações sociais, a sociedade se

organiza para tratar do bem comum, para gerir as coisas da vida. Isso acontece

desde que a humanidade existe. É cuidar da casa, é cuidar da comunidade, é

cuidar da sociedade. A economia política que estamos falando. Quando estamos

falando de economia solidária, é nessa acepção, e não na condição de escassez

e de sem valores, de maneira associativa e participativa, que é um movimento

que ainda está crescendo, mas ainda é pequeno, mas que tem essa cidade.Ontem

foi falado do Instituto Palmas, da economia solidária, a experiência da moeda

social; e eu vou citar ali Silva Jardim, que ica a 80 km da capital cearense, e que implantou a moeda social pela prefeitura. Simplesmente em dois anos dobrou

a circulação de produtos dentro da cidade. Havia uma cultura de comprar fora,

agora é comprar dentro da própria cidade, enim. E, ao mesmo tempo, uma coisa mais ampla, mais macro.Tive o privilégio

de apresentar,no ano passado, um projeto que vou mostrar para vocês daqui a

pouco;estiveram sessenta e cinco países presentes em Montreal, no Fórum

Internacional de Economia Social e Solidária, e estava presente, inclusive,

alguns desses organismos que eu falei para,vocês, que nós não controlamos.

Estava lá sentadinho, o Banco Mundial, estava a OIT, mas também estavam os

movimentos sociais. Quer dizer, um Fórum interessante.

Outro conceito que foi colocado aqui, essa outra questão, ou seja, hoje

pela manhã nos recursos hídricos icou claro, lembram, quando falava assim “essa questão ambiental é coisa para a classe média e não para burguesia”.

Uma visão praticamente errada, porque quem sofre com a questão ambiental,

normalmente, é o pobre, o negro e o índio. Quer dizer, aquele excluído. Há um

processo, ou seja, inclusive,estou em uma corrente que são dos Estados Unidos

que fala de racismo ambiental comprovado inclusive estatisticamente, dentro

dos Estados Unidos.

E, temos o livro do nosso colega, o Henri Acselrad, que é do Instituto

de Pesquisa e Planejamento Urbano, que é uma pessoa, um ícone, tem uma

experiência; um intelectual que tem um livrinho pequenininho que se chama

O que é justiça ambiental, muito interessante, eu recomendo, muito bom e fala

sobre movimento instrumental. Não é um texto acadêmico. Muito importante, e

acho que é esse conceito que a gente tem que trabalhar, e confesso para vocês

que ainda não trabalho com ele normalmente. Estou querendo trabalhar mais

com esse conceito de justiça ambiental, e rede de justiça ambiental, e ainda a

rede de saúde e justiça ambiental também. Bom, voltando então aos debates, os

três eixos só para lembrar e não perder o rumo. Agora estamos nessa questão,

que é a gestão em engenharia e se tem que falar dos homens, quer dizer do Taylor

e do Ford, da produção em massa. Não é isso? Manda quem pode, obedece quem

tem juízo. Certo? Quer dizer então você tem aqui Tempos Modernos, Charlie

Chaplin quem viu vai entender o que estou falando. Quem não viu, por favor,

é um dever do ofício de estar vivo. Tem que ver esse ilme, que é uma das sínteses mais interessantes sobre a história do cinema, sobre um processo que

aconteceu no século XX. Aí você tem também, na segunda linha capitalista,a

chamada produção enxuta, que foi na década de setenta, oitenta que disputou

com os Estados Unidos e eles sentiram o tranco. Sentiram o tranco com a disputa

capitalista, assim como o Japãoestá sentindo o tranco da Coréia agora, mais

o que é? Produção enxuta, lexível, fazerpor encomenda, não empurra. Uma série de questões desse tipo. Tem também uma experiência que não vingou

que é a sociotécnica, que foi experimentada mais nos países escandinavos,

particularmente, pela Suécia e Dinamarca.

Mas, as três tiveram concepções de trabalho diferenciadas umas das

outras. Uma era com ciclo de tarefas, depois posso mostrar mais detalhes,

minúsculos, e na sociotécnica um ciclo de reprodução da mesma temática,

com muito mais tempo. Então três experiências, e, evidentemente, acho mais

democrática essa última, porque corresponde inclusive, isso que eu queria deixar

mais claro. Cada uma, delas, corresponde a um tempo, um espaço concreto.

Uma foi advinda dos Estados Unidos, outra do Japão, e outra da Suécia,

e tudo de acordo com a mãe. Que os pariu, porque é impossível ter um sistema

japonês nascido na Argentina. Quer dizer, o sistema japonês nasceu daquele jeito

porque nasceu dentro do Japão. E aí vem a questão da autogestão. Há quanto

tempo, e o Farid deve lembrar, muito bem, disso, cadê a concepção teórica para

autogestão? Ora taylorismo, fordismo, sociotécnica são as grandes escolas. Aí

nem político nem padrão, cooperação, solidariedade, alienação, uma cadeia, os

trabalhadores assumiram o controle, fecha uma fábrica, na Argentina, onde os

trabalhadores assumiram para recuperar a fábrica.

E, aí, vem a situação, temos que criar algo novo, mas não podemos fazer

do mesmo jeito. Como dizia o Einstein, você vai fazer do mesmo jeito e quer

a história diferente? Esse que é o problema, nós queremos reinventar o mundo,

vamos ter que criar novas formas de organização; e aí tem que estar atrás dessa

bola do mundo, da vida concreta, e também na relexão e na sistematização. Perdão! Volta um instante por favor, economia solidária, práxis para o um

novo mundo. O que é práxis como entendo? Práxis entendo como uma teoria

por dentro da prática e a prática por dentro da teoria. Quer dizer temos que ser

renovação constante. E como é que fazemos isso? E isso permeou todo o nosso

debate também. Essa questão, ontem, foi dita, não lembro bem, exatamente, o

caso concreto, mas foi você (Sandra Ruino) que falou,acho que sobre um caso

que foi feito algo que não perguntou nada para comunidade. Quem falou essa?

Sandra responde – eu. Você? Qual foi o caso? Sandra – projeto fábrica de

farinha de banana. Farinha de banana, exatamente, então, ou seja, não vamos

poder, ou também, como o Bazzo disse:O novo tem que ser construído por toda a

sociedade, e aqui vamos usar termos que são caros para Paulo Freire – o diálogo.

Daí tem esse palavrão, dialogicidade, não devemos ter medo de palavrão que é

uma forma de olhar o mundo, e temos que ver a metodologia também.

Esse novo mundo, qual a metodologia? No que avançamos? E tem a

alteridade, alteridade pessoal é de uma generosidade esse sentimento. É quase

uma utopia, uma empatia pelo outro, estar no lugar do outro, quase no sentido

religioso da compaixão. E aí tem uma máxima dita por Miguel Simone que é um

querido companheiro, já falecido, que lavrou essa, que eu acho fantástica: “se

quisermos construir um novo mundo”, estou aqui falando para vários estudantes,

para professores, “é preciso ir lá para ver, é preciso ir lá para viver e é preciso ir

lá para ver com os olhos dos outros”. Esse é um lema, digamos assim, dentro da

metodologia de Paulo Freire.

E aí vou apresentar dois casos para vocês, do nosso núcleo, que se

denomina Núcleo de Solidariedade Técnica. Teria outros, mas não tem tempo

para o debate, portanto só posso falar alguns, mas escolhi, porque tanto um,

quanto outro, dizem mais respeito aqui para a gente. Um sobre pesca e o

outro sobre quilombos. Vou falar sobre os dois. No caso o PAPESCA, da

rede solidária da pesca; é uma sigla que quer dizer Pesquisa Ação na Cadeia

Produtiva da Pesca, no litoral luminense. Aí tem um blog que vocês podem acessar papescalitoralluminense.blogspot.com, e tem uma parceria do núcleo

de pesquisa ecológica da UFRJ, em Macaé, com o SOLTEC e que nós estamos

desenvolvendo aalgum tempo. É um programa importante. O objetivo geral é

como surgiu na cidade de Macaé, que tem uma experiência fantástica, de uma

escola municipal de pescadores,em parceria da Universidade Federal do Rio de

Janeiro e com a prefeitura de Macaé, ao lado de onde surgiu a cidade de Macaé,

Macaé é o que? Em 1970, era uma vila de pescador e a vila de pescador, hoje

é uma favela dominada pelo tráico. É isso que o petróleo trouxe para aquela sociedade. Você não entra na favela sem pedir licença. Não tem UPP. Então,

lá, naquela época, começamos, em 2004, não tinha esse problema. E a gente

foi lá, com isso, a sustentabilidade da cadeia produtiva da pesca, dessa escola

municipal de pescadores. Então, aqui vou trazer referências também. A pesquisa-

ação é simples pessoal, sem confusão. Pesquisa, o que é pesquisa? É desenvolver

conhecimento. Visando a transformação. Já disse um outro pensador mexicano o

seguinte: se temos que criar uma nova cosmovisão, Paulo Freire já nos deu a dica

com a pesquisa-ação. Temos que ter grandes programas com a pesquisa-ação

para se construir a nova civilização.

Então, precisa-se antes, desenvolver o conhecimento para a transformação.

Thiollent é a referência do país, um livrinho pequeno, e é uma referência

enquanto método e está vivo é amigo nosso. Podemos contar com ele. Não vai

custar muito a gente tê-lo mais perto. Em frente. Já esse mora um pouco mais

longe, lá de Quebec, Canadá: André Morin que trabalha com essa pesquisa-açao

integral e sistêmica. Mas são amigos, da mesma turma. O André Morintrata a

questão do dialogo, que a Sandra Ruino falou ontem, a metodologia do diálogo exige contrato. Estou falando aqui com vocês, sem contratar o nosso tempo. Não

contratei o tempo e nem falei se vocês estão a im de ouvir a gente até às cinco horas. Não se fez um trato aqui. Vamos mudar isso? Quer dizer o contrato é

fundamental,porque? Por causa das expectativas.

Não existe saber maior que o outro, existem saberes diferentes. Então, é

isso. Isso é uma questão de Paulo Freire e também uma questão de metodologia.

E conjugam-se esses três aspectos, a pesquisa é para explicar, aplicar e é para

implicar. Não é para implicar, no sentido de ser implicante e chato, mas de

implicar o ator social na transformação e no desenvolvimento do conhecimento.

Com esse levantamento junto com os pescadores, nós envolvemos cem

pescadores, com SESC, SEBRAE, prefeitura, ministérios e assim por diante.

Conseguimos, dialogando, ver os entraves da cadeia produtiva da pesca em

Macaé. E isso possibilitou porque a pesquisa-ação prevê isso, levantamento

de informações, assim por diante, como também seminários e negociação em

seminários. No inal concluímos todo um programa de ação, em uma plenária,na

escola municipal de pescadores, com mais de cento e cinquenta pessoas,onde

aprovamos três eixos:a) preservação do meio ambiente para as cadeias

responsáveis, b) comércio solidário e crédito popular,c) educação e gestão

social, com diretrizes, possíveis a projetos e possíveis fontes de inanciamento. Não conseguimos grandes êxitos. Tivemos alguns êxitos, por exemplo. Um

êxito fantástico: a pesca que é uma atividade histórica e tradicional de Macaé,

nunca teve um capítulo numa política do município. Esse trabalho subsidiou uma

audiência pública para o Plano Diretor e hoje existe um capítulo da pesca no

Plano Diretor do município de Macaé, que é inspirado totalmente nesse trabalho

desenvolvido pela comunidade.

A PAPESCA, por esse tipo de ação, por trabalhar com tecnologia de

pesquisa-ação, chamou atenção de outros experimentos no Brasil, que é um

grande laboratório uma coisa fantástica. E, existia um projeto chamado Peixes,

Pessoas e Aves, no Alto e Médio Rio São Francisco, onde você tem como

referência a cidade de Pirapora e outros municípios por ali e que estavam

passando maus pedaços, terminando o crédito canadense,também sairiam e,

assim, fomos e dissemos: olha, nós não estamos aqui para ensinar ninguém.

Nós estamos aqui para trocar. Que tal a gente bolar uma rede e começamos a

dialogar. Essa ideia foi boa e aí nasceu um projeto na Rio 92, na Amazônia, que

era o Pró-várzea, como diz o nome, da várzea do Solimões e do Amazonas, um

projeto fantástico, um programa fantástico de manejo, tanto de animais, loresta, peixes; nos associamos e formamos aí a rede solidária da pesca, que tem um blog

também que é hoje um item da política de economia solidária no país, nas redes.

São estes que deinimos para mensurar a pesca, que está na educação continuada e gestão social.

Tivemos quatro encontros, os dois últimos foram no Norte, em 2008,

em Santarém, Alter do Chão, um paraíso, e em Manaus, em setembro de 2010.

Essas são fotos. Outra coisa importante, trabalhamos com qualidade, técnicos e

comunidade e sempre essa qualidade, é fundamental.

Agora, vamos colocar o projeto no âmbito do projeto Brasil Local

de economia solidária. Esse projeto é uma parceria do Conselho Nacional

dos Quilombos, com o Núcleo de Solidariedade Técnica, em parceria com a

Secretaria Nacional de Economia Solidária. Ele parte do mesmo pressuposto

pessoal, existe um, vamos em frente. Assim, esse é só para mostrar o líder, que é

o Ronaldo, a grande liderança do processo, agora já saiu, mas ele é do quilombo

de Campinhono Rio de Janeiro, um dos poucos,reconhecido como quilombo, já

legalizado. O projeto completamente megalomaníaco, em um ano, quer dizer

visando abranger um conjunto de comunidades, em vários estados. Nós, com

uma pequena,equipe o que izemos. Trabalhamos com a questão da implicação, com a organização da CONAR,através dos seus liderados. Formamos lideres

quilombolas, como pesquisadores que levantaram a informação e izeram o censo, em determinados quilombos. Que informação? Em 40% nós conseguimos

fazer o censo orientados pelo IBGE. Censo?Não, é apenas enquete. Quer dizer

com todos os dados exigidos pelo rigor do IBGE. Foi um salto muito grande e

muito interessante para dar visibilidade. Sem censo isso não existe. Aí foram

vários momentos de reunião, de formação.Também com essa qualidade de

discussão e assim por diante. Eu não sou técnico, mas formo a coordenação

do Centro de Tecnologia lá da UFRJ, junto com outros dois colegas. E a gente

vai ter um Congresso de Tecnologia e Inovação Social, em outubro, estou aqui

anunciando quando vai ter a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia. Estamos

também lançando essa revista virtual, na semana passada, e que já estamos

esperando artigos. Então, ica digamos, assim, esse breve anúncio. É isso para nós debatermos, obrigado!

Farid Eid50

Caio LuisChiariello51, MaicoRoris Severino52, Jose Eduardo Fernandes53

Boa tarde a todos e a todas! Todo mundo está acordado, depois do

almoço. Vou falar sobre a experiência do Grupo de Extensão e Pesquisa em

Economia Solidária – GEPES, da Universidade Federal de São Carlos54,em

50 Embora a palestra durante a Mesa do evento tenha sido realizada pelo primeiro autor, o trabalho é coletivo, com três outros, que merecem o recebimento dos créditos.51 Economista, Mestre e Doutor em Engenharia de Produção52 Bacharel, Mestre e Doutor em Engenharia de Produção53 Publicitário e Especialista em Gestão da Produção54As atividades de ensino, pesquisa e extensão foram desenvolvidas no Programa de Pós Graduação em Engenharia de Produção do Departamento de Engenharia de Produção na Universidade Federal de São Carlos - PPGEP/UFSCar, linha de pesquisa Trabalho, Tecnologia e Organização. Integra um corpo de investigações realizadas por pesquisadores no interior do GEPES/UFSCar/CNPq: Farid Eid (coordenador) e os estudantes de Mestrado (M) e Doutorado (D): Ana Rita Gallo (D), Andréa Eloisa Bueno Pimentel (M e D), Márcia Regina Vazzoler (D), Gilmar Laforga (M e D), Cristiane Betanho

cooperação com a CONCRAB – Confederação das Cooperativas de Reforma

Agrária do Brasil, que faz parte do setor de produção do MST, e com Mondragon

Corporação Cooperativa, localizado no país basco. Esta experiência pedagógica

foi de formação de técnicos em gestão de cooperativas, apresentada como tema

da nossa mesa.

Nesta atividade de cooperação participaram os quatro autores pelo

GEPES; todos com atividades de pesquisa e extensão universitária com as

cooperativas do MST nos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio

Grande do Sul. Começamos as atividades junto com o pessoal da CONCRAB e

MST, a partir de 1996. Essa parceria é muito interessante porque tive o privilégio,

à época, em 1995, de ter o secretário de formação da CONCRAB como aluno em

um curso de especialização. Fomos convidados a participar da realização de um

diagnóstico organizacional das cooperativas do movimento, de caráter interno, e

que tratava de três questões centrais: a gestão do trabalho; a questão do mercado

e; a questão das relações interpessoais.

A partir dessas atividades, desenvolvemos pesquisas conjuntas,

participamos de cursos como: Técnico em Administração de Cooperativas,

realizado em Veranópolis, na Serra Gaúcha, onde está localizada a escola

de formação, ITERRA;o Curso de Especialização em Administração de

Cooperativas, organizado na UNB, em Brasília CEACOOP; um terceiro, o de

graduação em Agronomia do PRONERA, pela UFSCAR, onde fui coordenador

geral, na fase de elaboração e, no primeiro ano do curso; a pesquisa participativa

e a pesquisa-ação, em cooperaçãonos anos de 2003 até 2008. Isso envolveu

diversas cooperativas e associações na Região Sul e no Nordeste brasileiro,

principalmente, em Pernambuco onde desenvolvemos uma pesquisa, com cerca

de quarenta assentamentos de reforma agrária e em uma pequena agroindústria

na zona da mata sul.

Ainda neste processo, o GEPES conduziu dois projetos de pesquisa55

(D), Marcos de Carvalho Dias (D), MaicoRoris Severino (M), Caio LuisChiariello (M e D), Silvio Eduardo Alvarez Cândido (M), Daniela de Moraes (M), Gustavo Pigossi (M), Ana Maria Lima (M) e Jose Eduardo Fernandes.55 a) DINÂMICA ORGANIZACIONAL E PRODUTIVA EM COOPERATIVAS DE REFORMA AGRÁRIA: diagnóstico, implementação de estratégias para o desenvolvimento e perspectivas, desenvolvido nos anos 2002-2004, em parceria entre o GEPES e a CONCRAB, inanciada pelo MCT/CNPq/COAGR; b) IMPLEMENTAÇÃO DE ESTRATÉGIAS DE COMERCIALIZAÇÃO DE PRODUTOS DA REFORMA AGRÁRIA, uma parceria entre GEPES e CONCRAB, inanciado pelo MCT/CNPq, desenvolvido em 2005-2006.

sequenciais em cooperação com a equipe técnica e de assessoria da Confederação

das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (CONCRAB). O primeiro teve

como foco central, a dinâmica organizacional e produtiva em nove cooperativas

de reforma agrária, a Loja da Reforma Agrária e a Cooperativa Central dos

Assentados do MST, em quatro estados: Rio Grande do Sul, Santa Catarina,

Paraná e São Paulo.

O grupo de pesquisa atuou em vários planos. No primeiro, formação

acadêmica, com a produção de teses de doutorado, dissertações de mestrado e

monograia de especialização. No segundo, a pesquisa trabalhou a intervenção social direta, atendendo às demandas dos produtores de algumas cooperativas.

No terceiro, a formação de produtores agrícolas, assessores, técnicos e dirigentes

de cooperativas. E, no quarto as atividades diretamente relacionadas ao grupo de

acompanhamento das cooperativas da CONCRAB, através da cooperação entre

o grupo de pesquisa da UFSCar e a equipe técnica e de assessores da CONCRAB.

E, como foi que surgiu essa demanda do curso de Técnico em Gestão de

Cooperativas? No início de 2010, o coordenador do Centro de Desenvolvimento

Sustentável e Capacitação em Agroecologia (CEAGRO) convidou o GEPES para

participar de uma reunião de trabalho. O MST, através do CEAGRO, desenvolve

uma parceria com o Instituto Federal do Paraná e a Fundação Lanki-Mundukide.

A sede do curso é na cidade de Rio Bonito do Iguaçu-PR, próximo a Laranjeiras

do Sul, estado do Paraná.

A demanda, agora, seria para que a gente assumisse uma atividade

conjunta com o pessoal de Mondragón; o pessoal basco estava investindo na

formação, saindo daquela história de só organizar as cooperativas dentro do país

basco e partindo para uma relação de solidariedade internacional, e como há uma

relação próxima com os bascos, eles resolveram investir na criação do curso de

“Tecnólogo em Gestão de Cooperativas”.

Aí nós fomos de carro até Laranjeiras do Sul e Rio Bonito do Iguaçu,

estado do Paraná que dá uns 1.200 km da cidade de São Carlos, no estado de

São Paulo. Aí você tem o CEAGRO, o Instituto Federal do Paraná e Mondragon

Corporação Cooperativa (MCC). Este, representado por dois membros, que já

foram gerentes de fábricas do MCC.

Esta primeira visita de integrantes do GEPES se deu durante três dias,

em fevereiro de 2010. Na ocasião foi feito o convite formal para contribuição do

GEPES junto à realização do curso TGC. Antes, foi apresentada pelos, técnicos

bascos, a orientação do curso aos membros do grupo presentes à reunião:

a) formar técnicos em gestão de cooperativas populares para atuarem na

implantação e no desenvolvimento de novas linhas de produção; b) aprofundar

a qualiicação dos quadros das cooperativas da Região Sul do Brasil; c) difundir o conhecimento cooperativo; d) oferecer uma visão global do empreendimento

cooperativo, com base na experiência deMondragon Corporação Cooperativa; e)

focar as dimensões econômica e social da cooperação; f) avaliar a implantação

de um novo curso na Região Nordeste do Brasil, a partir dessa experiência.

Em seguida, eles solicitaram do grupo, contribuição com o

desenvolvimento de temáticas sobre gestão da produção; organização do

trabalho e marketing: direcionados para as especiicidades do curso de Técnico em Gestão de Cooperativas – TGC. Nesse sentido, caberia ao GEPES elaborar

as ementas, conteúdos e metodologia das disciplinas a serem ministradas, que

deveriam adequar-se a algumas demandas do curso:

A elaboração de conteúdos que contemplassem as questões referentes à

gestão da produção, direcionadas para as associações e cooperativas populares,

algumas adiantadas no processo de agroindustrialização, mas outras ainda em

projetos de implantação de pequenas agroindústria; A compactação da disciplina

em módulos ministrados, durante duas semanas, com carga de 30 a 36 horas/aula

por semana; A orientação dos trabalhos individuais componentes das disciplinas,

seriam realizados individualmente pelos educandos, nas cooperativas e

empreendimentos objeto de estudo; A leitura e correção dos trabalhos, e aplicação

de avaliação, sob a forma de prova escrita e aferição de nota individual, com

comentário sobre o desempenho particular de cada educando.

O processo de ajuste metodológico das ementas das disciplinas e

módulos do curso desenvolvidos pelo GEPES apresentou certo tensionamento

inicial. Os integrantes da equipe da MCC foram enfáticos acerca da necessidade

de intensa instrumentalização das disciplinas, tendo em vista o viés técnico do

curso, enquanto a equipe do GEPES e os membros do MST argumentaram sobre

a importância do equilíbrio entre o conteúdo instrumental, com as questões mais

abrangentes sobre a gestão dos empreendimentos e o seu caráter de movimento

social. Portanto, sendo imprescindível a introdução de uma abordagem crítica às

teorias da administração da produção, vigentes nas empresas capitalistas. Por im, icou acordado que os educadores teriam autonomia para confeccionar o material didático a ser utilizado nas disciplinas, desde que contemplassem justamente

os elementos técnicos e críticos, tanto no material, quanto na apresentação dos

conteúdos aos educandos. Este procedimento impôs limites à metodologia que

se pretendia introduzir, na medida em que a carga horária reduzida não permitiria

problematizar, em profundidade, a questão do uso das ferramentas de gestão,

da tecnologia e dos processos de trabalho na perspectiva do trabalho associado

politécnico e autogestionário.

Ficou claro, para todos, que não é simplesmente pegar o livro do Slack,de

Administração da Produção, preparar as lâminas e apresentar em sala de aula,

planejamento, controle da produção, controle de estoque, redução de custo, gestão

de pessoal. Interagir esse conhecimento técnico com o debate teórico sobre o

modo de produção capitalista, as contradições, os limites e as possibilidades na

prática do trabalho concreto dos coletivos de trabalhadores associados.

Portanto, a cada módulo que desenvolvemos e trabalhamos em sala de

aula tinha o conteúdo técnico e, ao mesmo tempo, social, econômico, ambiental,

cultural e, essencialmente, político também, no sentido de, por exemplo: como

vamos discutir processo de trabalho, a transmissão dos conhecimentos dos antigos

para os novos, a formação do trabalhador coletivo para si e não reproduzir uma

lógica da alienação do trabalho.

O Sidney foi muito feliz quando colocou, como é que vamos fazer? Do

mesmo jeito que eles fazem? Colocava para eles, muito claramente, o risco

de formar gerentes de fábricas. E, que já tinham vários educandos, que tinham

quatro, cinco anos nas agroindústrias, que existem e funcionam sob o controle

desses coletivos de trabalhadores associados. E as novas, será que elas vão

ser implantadas? Algumas estão em implantação, mas muitas já existiam e o

grande risco era o que? Ter uma separação entre o trabalho manual e o trabalho

intelectual. Como romper com essa falsa dualidade do trabalho intelectual e do

trabalho manual?

As cooperativas do MST são vinculadas aos movimentos sociais para a

transformação social e não um movimento para o empreendedorismo competitivo.

O pragmatismo, implícito no discurso dos companheiros de Mondragón, era de

que as cooperativas tinham que competir num ambiente altamente competitivo.

Seria disputar hegemonia de mercado, com as empresas tradicionais e priorizar

os mercados tradicionais.

Após, o ajuste metodológico aprovado foi muito interessante, porque os

companheiros do MST, inclusive, colocaram que havia, antes deste entendimento,

entre todos, umtensionamento na relação entre as duas instituições, mas era um

tensionamento positivo, na medida em que havia uma tolerância de um lado

e de outro. Porque se não houver tolerância, não se avança na cooperação, na

parceria. Então, esse ajuste foi aceito e o GEPES foi responsável em adequar e

realizar as atividades demandadas.

Trabalhamos três disciplinas e foi interessante porque a primeira

disciplina foi a de Marketing. Iniciava-se o curso pela comercialização, o modelo

que eles aprenderam no país Basco. Não é da produção para comercialização,

mas inverter essa lógica que é a mesma da grande empresa tradicional, ou seja,

primeiro criamos as condições de colocar o produto no mercado, para depois

organizar a produção.

Portanto, a produção é puxada de fora para dentro. Então, partimos para

elaboração da disciplina de marketing, em seguida a disciplina de gestão da

produção e, por im, a disciplina de organização do trabalho, com atividades presenciais e do tempo-comunidade, para cada módulo. Dessa forma, chegou-

se a uma deliberação conjunta sobre as características centrais das disciplinas

ministradas, propondo o debate sobre os seguintes tópicos, entre outros:

a) a existência de pequenas cadeias produtivas internalizadas nos

assentamentos de reforma agrária e organizadas por cooperativas do

MST;

b) a necessidade de debater criticamente e ajustar os conhecimentos

técnicos sobre aplicação das ferramentas de gestão da produção e da

comercialização;

c) interação entre os conhecimentos técnicos com o debate teórico

sobre o modo de produção capitalista, as contradições, os limites e

as possibilidades na prática do trabalho concreto dos coletivos de

trabalhadores associados.

O Apêndice A, ao inal do livro, ilustra um plano de aula elaborado, para o módulo da disciplina Gestão da Produção, contento o programa completo do

módulo desenvolvido pelos educadores do GEPES.

As aulasministradas oferecidas pelos educadores José Eduardo

Fernandes, Caio LuisChiariello e Maico Roriz Severino, integrantes do GEPES,

sob a supervisão do Prof. Farid Eid e a tutoria de trabalhos dos educandos foi

realizada pelos educadores, segundo a metodologia da alternância, durante o

tempo-cooperativa, ao longo de 2010.

Após a conclusão das atividades didáticasiniciais, tanto nas disciplinas

durante o tempo-escola, quanto na tutoria dos trabalhos, durante o tempo na

cooperativa, foi feito o convite ao GEPES para a realização da atividade de

orientação presencial e à distância, de monograias de conclusão de curso de sete educandos. A orientação da elaboração das monograias teve como objetivo geral, contemplar os conhecimentos adquiridos ao longo do curso pelos educandos e,

como objetivo especíico,analisar a viabilidade econômica da implantação de novas cadeias produtivas dentro. Nas cooperativas ou mudanças na organização

da produção, possibilitando ampliar a diversiicação da produção e incentivar a elaboração de planos de negócios.

Dentre as monograias desenvolvidas, com orientação dos educadores do GEPES, destaca-se a “Ampliação da produção de piscicultura na Cooperativa

de Produção Agropecuária União do Oeste – Cooperunião”, considerada uma

importante referência entre as cooperativas do MST, em termos educacionais,

de formação, de diversiicação e agregação de valor, com pequenas cadeias produtivas, com reairmação da identidade camponesa e que já tem mais de vinte anos de existência.

Esta cooperativa está localizada na cidade de Dionísio Cerqueira que

ica há 1 km da Argentina e 1 km do estado do Paraná. Eles possuem a cadeia produtiva completas do frango, com certiicação de inspeção federal, o SIF. Eles têm desde a produção do milho, seu beneiciamento da produção da ração para os aviários, o abatedouro, a câmara frigoríica, o caminhão e ainda tem pontos de venda.

Portanto, eles conseguem internalizar e controlar todos os elos da cadeia

produtiva, com exceção, do pinto de um dia, a ser criado, cujo fornecimento

está sob controle de algumas grandes empresas oligopolistas. Para os assentados

trata-se de uma cadeia produtiva, em pequena escala, mas que possibilita maior

autonomia relativa em relação às empresas capitalistas, ao gerar uma renda

que atende suas necessidades e uma boa qualidade de vida, ao mesmo tempo,

consegue liberar quadros para desenvolver novos estudos e atuar nas frentes de

luta. Procuram não perder a sua identidade enquanto movimento social, mas ao

mesmo tempo, aperfeiçoam a eiciência e a eicácia dessa experiência. No caso, o estudo da viabilidade de ampliação do setor de piscicultura, já

existente na Cooperunião, atende uma demanda interna, para a dinamização do

setor e aferição de renda por parte dos associados. Portanto, é aquela história de

que sempre partir de uma demanda interna da cooperativa o educando terá como

compromisso a elaboração da monograia e não, de uma forma abstrata o estudo é para atender uma demanda do próprio movimento social, do qual faz parte e

foi liberado para estudar e trazer contribuições para soluções aos problemas do

coletivo.

As atividades didáticas, com aulas durante o tempo escola, com tutoria dos

trabalhos, durante o tempo cooperativa e com a orientação de sete monograias, concluídas e defendidas, sob orientação dos educadores do GEPES, como abaixo

relacionadas, com a indicação dos autores e breve síntese de seus objetivos:

Quadro1: Relação dos Orientandos do Curso de TGC

Nº ORIENTANDOTÍTULO DAS

MONOGRAFIASOBJETIVO

1

Tatiane Aparecida Anzoline

Ampliação da produção de piscicultura – Cooperativa de Produção Agropecuária União do Oeste – Cooperunião, localizada na cidade de Dionísio Cerqueira – estado de Santa Catarina

Estudo de viabilidade de ampliação do setor de piscicultura já existente na COOPERUNIÃO, havendo uma demanda interna para dinamização do setor para aferição de renda por parte dos associados.

2Viviane Balbinotti

Análise da logística e distribuição física da produção de erva-mate – Coopermate – estado do Paraná

Análise da logística de distribuição da produção de erva-mate componente fundamental para o desenvolvimento comercial da cooperativa e elevação da renda dos trabalhadores associados.

3LeodimarAntonio Ferreira

Estudo de implantação de uma mini-usina de extração de óleo comestível de girassol na Escola Nacional Florestan Fernandes - ENFF

Implantação de uma linha de produção na ENFF contribuindocom a produção dos assentamentos do entorno e propiciando maior autonomia inanceira da escola por meio da produção em escala comercial.

4Rodrigo Duarte Casado

Produção e industrialização de café cru na Cooperativa de Comercialização e Reforma Agrária Norte Pioneiro - COANOP – Cidade de São Jerônimo da Serra – estado do Paraná

Analise a elaboração de um projeto submetido ao BNDES e aceito para fomento da produção de café cru, sendo parâmetro para a elaboração de projetos similares por outras cooperativas.

5Carlos Pansera

Perspectiva de implantação da agroindústria de embutidos da Cooperativa Nordestina em Itaporanga d’Ajuda – Sergipe

Aborda o planejamento para a implantação de uma cooperativa de embutidos no estado de Sergipe para dinamizar a produção dos assentamentos da região.

6

Antonio Natalino Gonçalves

Estudo de viabilidade na produção de iogurte orgânico na Copavi – cidade de Paranacity, estado do Paraná

Trata da elaboração de um plano de negócios para a produção de iogurte orgânico no interior do setor de produção de leite e derivados da cooperativa, analisando a viabilidade da implantação desta nova linha de produção

7Airton Rubenich

Industrialização da carne suína na Cooperativa de Produção Agropecuária Nova Santa Rita Ltda – Coopan, estado do Rio Grande do Sul

Elaboração de um plano de negócios para a implantação da produção do embutido ‘salsichão’ a partir da produção de suínos da cooperativa, sendo que este sub-produto permitirá a agregação de valor dentro da cadeia produtiva. Em síntese, as atividades didáticas foram marcadas pelo evidente comprometimento dos educandos para com o cumprimento dos objetivos do curso que, vale ressaltar, contemplou conteúdos abrangentes sobre a gestão da produção, marketing e gestão de pessoas, sintetizados para apresentação ao longo do tempo escola, contando com a mesma carga teórica de cursos tradicionais de formação de tecnólogos. Da mesma maneira a orientação das monograias por integrantes do GEPES apresentou desenvolvimento satisfatório com intensa aplicação dos orientandos. A composição de propostas para implantação de novas cadeias produtivas em cooperativas já atuantes na elaboração das monograias teve como meta possibilitar a confecção de um texto de caráter cientíico reforçando a possibilidade de expansão das atividades produtivas mediante o trabalho associado e autogestionário.

Fonte: GEPES, 2010.

Importância Estratégica da Politecnia na Organização das Pequenas Cadeias Produtivas Autogestionárias

O debate teórico sobre politecnia esteve presente nas experiências

socialistas do século XX, sendo recolocado, em discussão, sobre as perspectivas

da organização democrática do trabalho, a partir do inal do século XX, enquanto importante elemento na construção da autogestão plena.

O conceito de politecnia remonta ao debate teórico sobre a fusão

entre trabalho intelectual e trabalho manual, elementos separados no processo

de trabalho capitalista. A proposta politécnica vislumbra a formação de

trabalhadores omnilaterais, detentores dos conhecimentos técnicos e cientíicos, para a execução das atividades e tendo o domínio das ferramentas de gestão da

produção e do processo de trabalho.

A politecnia diz respeito ao domínio dos fundamentos cientíicos das modalidades de trabalho. Busca a unidade entre as diferentes técnicas que

caracterizam o processo de trabalho humano, fundindo os elementos técnicos

e cientíicos, o trabalho manual e o intelectual.Para isto, o processo de trabalho deve se desenvolver em uma unidade indissolúvel, nos aspectos manuais e

intelectuais. O pressuposto é de que não exista trabalho manual puro, e nem

trabalho intelectual puro. A separação é decorrente do processo histórico, do

modo de produção capitalista, separação esta que não é absoluta. Essas formas se

separam por um processo formal, abstrato, em que os elementos dominantemente

intelectuais se sistematizam como tarefa de determinado grupo da sociedade.

Esta formação, em múltiplas técnicas, seria, em Marx, o ‘fermento’

da transformação social. O ensino politécnico é o único capaz de dar conta do

movimento dialético de continuidade-ruptura, pois não somente está articulado

com a tendência histórica de desenvolvimento da sociedade, como a fortaleceria.

Por um lado, a formação politécnica contribui para aumentar a produção, fortalecer

o desenvolvimento das forças produtivas e intensiicar a contradição principal do capitalismo (entre socialização crescente da produção e mecanismos privados

de apropriação); por outro, contribui para fortalecer o próprio trabalhador, ao

desenvolver suas energias físicas e mentais, potencializando o trabalhador a

assumir o comando da transformação social.

Para efetiva aplicação da politecnia, em abrangência societal, deve-se

ter em conta que a união entre trabalho intelectual e trabalho manual só pode

se realizar, em plenitude, sobre a base da superação da apropriação privada dos

meios de produção e da superação do modo de produção capitalista.

Portanto, a própria autogestão sugere que, pela coletivização dos meios de

produção, todo conhecimento é relativo, tanto em termos de planejamento, quanto

da execução das atividades, seja compartilhada entre o corpo de trabalhadores

politécnicos, combinando múltiplas técnicas, que tenham sua utilização deinida por eles próprios, de maneira a reairmar sua autodeterminação.

Nos últimos anos no Brasil, ocorre um processo embrionário de

formação de sistemas de Redes de Produção e de Consumo Solidários, através de

organizações de crédito, produção, consumo, comércio e serviços que passam a

analisar as melhores estratégias de expansão, chegando a sinalizar a necessidade

da remontagem de cadeias produtivas, com a substituição parcial de fornecedores

de insumos que operam sob a lógica do capital, por fornecedores que operam sob

a lógica da economia solidária.

Ao contrário, se a estratégia da sociedade política e econômica brasileira

for priorizar, desde o início, o mercado externo convencional, signiica, na grande maioria das situações concretas, integrar os empreendimentos solidários

em cadeias produtivas mistas, controladas por grupos econômicos oligopolistas,

geralmente, por empresas transnacionais. Ao coordenarem estas cadeias,

determinam o ritmo da acumulação de capital, subordinam os empreendimentos

solidários ao seu controle, e à dinâmica do processo e o controle social passa a

ser dado pelas primeiras. Pode-se pensar na reprodução dos processos históricos

de integração entre diferentes produtores, muito comum nas relações entre

campesinato e empresário rural.

No estágio atual de desenvolvimento de nossas pesquisas e das

atividades de extensão, observamos que no interior do MST, na prática, há uma

preocupação crescente entre diversos dirigentes de CPA’s localizadas em estados,

principalmente, nos da Região Sul do Brasil, em buscar o equilíbrio crítico entre,

a ampliação dos ganhos sociais e políticos – resgate da dignidade, construção

da cidadania coletiva e apoio às lutas dos trabalhadores – e, por um lado,

melhorar a eicácia e a eiciência na gestão coletiva das cooperativas buscando

a sobrevivência e crescimento, a im de se evitar que haja um descompasso que possa levar à ruptura da coesão social, por outro lado.

Sobre a realidade da Amazônia brasileira, a exemplo do estado do

Pará, identiicam-se algumas cadeias produtivas a serem organizadas de forma autogestionária, por cooperativas e associações de agricultores familiares e

trabalhadores urbanos, a exemplo da fruticultura, mandiocultura, pesca artesanal,

oleaginosas, artesanato e vestuário.

Este é um campo de atividade com grande potencial para se organizar

na Amazônia, articulando ensino, pesquisa-ação e extensão universitária,

em conjunto com trabalhadores associados, interessados e protagonistas na

organização de pequenas cadeias produtivas autogestionárias.

Muito distante em se constituir um novo modo de produção, para além

do atual, elaborar e implementar coletivamente estas estratégias pode signiicar, a construção de uma reserva estratégica para a transformação, mesmo que na

atualidade sirva de aprendizagem para o desenvolvimento organizacional

dos coletivos de trabalhadores associados e, ao mesmo tempo, reairmar o compromisso de parcelas crescentes da universidade e da sociedade brasileira,

comprometida em erradicar uma dívida social histórica, da pobreza e da miséria

no país.

Ulisses Manaças

Boa tarde, companheiras e companheiros. É uma honra, um prazer

muito grande estar aqui com vocês, agradecer o convite desse evento importante

de proissionais da área de engenharia, que trabalham e querem debater essa questão da engenharia social na construção de uma sociedade mais fraterna,

que é o objetivo dessa intervenção. Então, agradecendo aos professores que

se empenharam na construção desse evento, professor Farid, professora Maria

José56, professor Fernando.

O professor Sidney que é lá do Centro de Tecnologia da UFRJ, que foi

onde inclusive estudei e possibilitei meios sociais de produção de conhecimento.

56 Maria José de Souza Barbosa, coordenadora de Grupo de Pesquisa da União Europeia Cooperativismo, Desarollo Rural y Empreendimentos Solidários, em Cooperação Internacional entre a Universidade de Alicante – Espanha e a Universidade Federal do Pará, que contribuiu para a reforma do CEFAC.

Estudei ilosoia no Rio de Janeiro.Aí, não sei por que, mas é o Centro de Tecnologia.E o pessoal foi muito solidário conosco e quem dava aula para gente

não era o pessoal de tecnologia, era o pessoal de Serviço Social, que era mais

avançado nessa temática.

Eu não trouxe minha apresentação, mas vou passar rapidamente sobre

uma experiência que está em construção no MST, Movimento Sem Terra, uma

parceria com a Incubadora de Cooperativas Populares e Empreendimentos

Solidários – ITCPES da UFPA e a universidade de Alicante,da Espanha.

Então, falando dessa ideia de engenharia social, o meu papel seráde

traduzir um pouco da experiência do Movimento Sem Terra, nesse campo

da organização. Então, vou, mas não vai ser suiciente, para exprimir toda a experiência do nosso movimento, do nosso desenvolvimento de massa,

movimento que atua em diversas frentes. Por isso, vou tentar sintetizar o máximo

possível dessa experiência.

Bom, o MST vocês sabem muito bem, é fruto de um processo,isto é, de

desenvolvimento do capitalismo brasileiro.O Brasil experimentou vários modelos

de desenvolvimento na nossa economia, desenvolvimento agroexportador, onde

a matriz portuguesa procurava extrair produtos oriundos da agricultura do nosso

território, aquele desenvolvimento agroextrativista, onde basicamente a economia

brasileira passou por quatro séculos, sendo uma economia eminentemente

agrária, agrícola, extrativista. Tudo aquilo que era produzido no Brasil tinha

como fundamental a exportação para metrópole, para o continente Europeu.

Esse modelo de desenvolvimento gerou uma herança colonial que na

nossa caracterização, é um fundamento dessa forma de organização da estrutura

produtiva brasileira e, por conseguinte, é a base fundamental para a estrutura

fundiária que vem se desenvolvendo no decorrer dos séculos.

Ou seja, esse latifúndio, esse, teoricamente moderno pelos grandes arautos

da modernidade do chamado agronegócio, ele tem o seu fundamento exatamente

na forma de organização da economia brasileira, desde mil e quinhentos. O

Brasil construiu, então, a fundação desse moderno latifúndio, como conhecemos

no nosso território.

Foi o modelo de capitanias hereditárias, onde do litoral se tinha uma

faixa quilométrica, milhares de quilômetros que eram os agraciados da

CoroaPortuguesa administravam a economia daquele território, trabalhando

basicamente com agricultura, com agroextrativismo, onde a matriz portuguesa

era agraciada com essa produção. Nesses quatro séculos, o Brasil, de muitas

lutas pela posse da propriedade. Tivemos um período de escravidão,muito

grande, a importação de mão de obra negra por volta de 1637 no território, mas

a estrutura fundiária se concentra de tal forma que o Brasil não resolveu seu

problema agrário.

Em 1850 conseguimos construir a primeira Lei de Terras. Nessa lei,

teoricamente poderia ser avanço para o território brasileiro. Foi instituído na

verdade um mercado de terras no nosso território. A Lei de Terras trazia o seguinte:

bom agora, não só os agraciados da Coroa Portuguesa tem possibilidade de ter

terra no Brasil, mas todo aquele que tiver dinheiro para comprar terra no Brasil.

Isso excluiu milhões e milhões de camponeses que não podiam e não tinham

acesso a recurso, nem depois da lei tiveram acesso à propriedade da terra.

O Brasil experimentou, na virada do século, retrasado, um modelo de

desenvolvimento fundamentado na industrialização. O Brasil deu os primeiros

passos na incursão de um modelo de industrialização, por volta de 1930, já no

governo Vargas, que fez uma empreitada no território brasileiro, para industrializar

o Brasil, para tirar o país de uma economia que consideravam atrasada, passar de

uma economia agrária para uma economia complexiicada, economia moderna. Então, o Brasil constrói grandes empresas nacionais, constrói o parque

siderúrgico que é a base de qualquer indústria, e a siderurgia está relacionada

ao ferro, aos metais e que constrói toda uma base,de empresas comoCSN,

companhia Vale do Rio Doce e que hoje é a Vale, a Eletrobrás, Telebrás, a

própria Petrobras. Depois de uma incursão no território em busca de petróleo,

concluíram que o Brasil não tinha petróleo; depois,o Brasil construiu a Petrobras

e descobremser um dos maiores produtores de petróleo do mundo. O Brasil

então constrói uma economia, de acordo com um modelo de industrialização

dependente. Esse modelo de industrialização dependente, colocou a agricultura

submetida à indústria e trabalha com a lógica de que os camponeses viriam a se

tornar operários. Então, aquela mudança na demograia brasileira,em que, a partir da década de 40 e 50, 80% da população brasileira morava e residia no campo, e

na virada da década de 50 para 60, 70, o Brasil inverte a tabela a pirâmide para

baixo, mais de 80% da população brasileira vive nos grandes centros urbanos.

Há um processo de êxodo rural em massa. Dizem os geógrafos que é o

maior êxodo interno, na mesma nação, já conhecido em todo o mundo. Quer dizer,

a população era rural e é expulsa para grandes cidades. Expulsou não. Ele vai,

em busca de melhores condições nas grandes cidades porque, esse processo faz

parte do modelo de desenvolvimento teoricamente civilizatório, mais avançado.

Então, o Brasil passa da década de 30 até 80 com aquele modelo de civilização

dependente. Por que é um modelo de civilização dependente? Porque o Brasil

importa tudo aquilo que já é refratário, tudo aquilo que já é secundário, tudo

aquilo que já é refugo dos países centrais. E os países centrais também começam

a migrar suas empresas para os países subdesenvolvidos, que têm taxas, cada vez

mais baratas, e começam a aumentar sua taxa de lucro.

Então, a gente atravessa esse período da década de 30 a 80, do século

passado, e o problema agrário brasileiro, não é resolvido, da mesma forma, mas

não atravessa esse modelo de desenvolvimento sem apresentar lutas sociais,

lutas de massa, construções de grandes organizações no campo.

Estou sintetizando essa história, para dizer o seguinte: o Movimento Sem

Terra, o MST, e outros movimentos sociais do campo são frutos desse modelo

de desenvolvimento da sociedade brasileira, que priva uma população do acesso

à terra e priva também a reprodução da sua própria existência. E os camponeses

estão espremidos num processo de desenvolvimento nacional, de uma forma

brutal, de uma forma violenta. Os exemplos dos massacres, das lutas, pelo

território, da luta camponesa estão recheados na história brasileira.

Então, o MST nasce exatamente dessa miragem, desse processo. Dizemos,

muito, que somos herdeiros dos povos que nos antecederam no território. Os

povos originados, indígenas, que pela posse do território com a escravidão, da

luta do povo, negro, da luta nas senzalas, da disputa pelo território, construir os

quilombos.

O MST é fruto de outras lutas que nos antecederam. Temos experiência,

por exemplo, da ULTAB, que era organização ligada ao Partido Comunista

Brasileiro, que era a União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do

Brasil. Temos experiência das Ligas Camponesas que, nascem na década de 50,

especialmente, no território mais miserável do Brasil, que é o Nordeste brasileiro,

faz uma luta dura contra a ditadura militar, contra o latifúndio no Nordeste. E

nós nascemos, exatamente, na Região Sul do Brasil, onde o capitalismo começa

a dar uma grande virada no seu processo de tecnização no campo. É o período

também da revolução verde, está fundamentada, na grande propriedade, na

utilização intensiva de produtos químicos, de agrotóxicos, ou seja, de veneno. A

implantação desse modelo, chamado de pacote tecnológico da revolução verde,

que vai expelindo do seu sistema do próprio território, milhares e milhares

de camponeses. Então, a partir desse período da ditadura militar, milhares de

camponeses, especialmente, na Região Sul do Brasil são desterritorializados, são

expulsos da terra por conta da implantação dos grandes projetos de monocultivo.

Não se chama monocultura, cultura é um negócio muito diferente, cultura

é a própria construção do trabalho, é a construção da nossa vivência, é a forma

como produzimos. Isso tudo é cultura, não é só música, não é só folclore, cultura

é a própria forma de trabalhar, de produzir, de construir nossa existência. Então,

monocultivo não tem nada a ver com monocultura. Cultura é algo complexo,

algo rico.

É dessa forma que começam as lutas, especialmente, na luta dos

movimentos sociais do campo e da cidade, pela abertura democrática, do inal da década de 70 e começam a eclodir, na verdade milhares de ocupações de terra,

exatamente nessa região do Sul brasileiro, do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa

Catarina. Essas grandes ocupações de terra, organizadas de forma espontânea

são um processo de resistência, de autoairmação. E,com a disputa pelo território, vai surgindo a necessidade de se criar um

movimento social que os representasse, então a partir dessa experiência da luta

espontânea, nasceu o Movimento Sem Terra, formalmente no dia 24 de janeiro

de 1984, no primeiro Encontro Nacional do Movimento Sem Terra, realizado na

cidade de Cascavel, no estado do Paraná. O Movimento Sem Terra surgiu com a

sigla MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – o MST, como é

conhecido ou o Movimento dos Sem Terra, também como é conhecido.

Então, o MST começa sua incursão, a partir desse encontro levantou as

bandeiras de luta do movimento pela reforma agrária e justiça social. O MST

começou a se territorializar nos quadrantes do Brasil e hoje está organizado

em 24 estados. O MST só não está organizado no estado do Amapá, do Acre e

do Amazonas. São três estados onde o MST não está organizado no território

nacional. Então, em todos os outros estados o MST está organizado.

No Pará, tivemos uma das primeiras iniciativas de ocupação já na década

de 80, mas o MST só veio ocupar, de fato, o primeiro território, em 1990a fazenda

Ingá, no município de Conceição do Araguaia. Depois, começou o processo

de territorialização. E nessa trajetória histórica, do Movimento Sem Terra,

fomos percebendo limites que era da própria luta pela terra. E a organização, a

partir desses limites, desses enfrentamentos diferenciados, o MST também foi

moldando, já que a palavra do debate é a engenharia social. Também construímos

a nossa engenharia social, nossa própria organização foi se alterando, conforme

o movimento foi avançando, percebeu os limites impostos pelo Estado, pelo

grande capital, pelos inimigos dos movimentos sociais do campo. Então, a partir

daí, a nossa organização foi se moldando de forma diferenciada, para poder

enfrentar conjunturas que vão também se alterando. Então, o MST construiu

seus grandes objetivos.

O objetivo fundamental pelo qual as famílias entram no Movimento

Sem Terra, em primeiro, é a terra. As pessoas não vão para o MST porque

acham bonito. É bom icar debaixo do barraco de lona preta, ter uma disputa acirrada pela posse da terra, ter sua sobrevivência física ameaçada, enfrentar

jagunço, pistoleiro, polícia, prisão, despejo, viver em condições insalubres de

vida debaixo do barraco de lona preta. As pessoas vão para o MST por uma

necessidade imediata. Qual a necessidade imediata? É comum, é a barriga,

é vontade de produzir, de ter comida, ter terra, ter dignidade. Então essa é a

motivação fundamental por que se entra no Movimento Sem Terra.

O Estado brasileiro já fez políticas de assentamento e de colonização, em

toda a sua história. Aqui, temos, inclusive, na Ditadura Militar a distribuição de

terra a rodo, como se fala na linguagem popular, em vários territórios do Sul e

Sudeste do Pará, na região do Baixo Amazonas, especialmente,de aonde vieram

paranaenses, mineiros, goianos, nordestinos em busca de terra. Só que era uma

política de colonização, uma política de assentamento, e nisso ocorreu um

quadro onde vários conseguiram seu lote, o chamado quadrado burro,porque?

Porque se dava terra, mas não tinha o conjunto de infraestrutura para garantir

sobrevivência naquele território. Então, esse limite das políticas de assentamento

foi colocando para nós também com objetivos superiores. Por quê? Porque só

a terra não bastava. Terra é um primeiro passo. Era preciso uma política mais

global, era preciso mais conquistas. Então, fomos aperfeiçoando a nossa luta por

reforma agrária que é o segundo grande objetivo do Movimento Sem Terra.

Reforma agrária não é só terra. Terra é um dos passos, é o primeiro

passo, mas é preciso então um conjunto de políticas sociais, que visa melhorar

as condições de vida no campo. É preciso uma política de infraestrutura para

os assentamentos de reforma agrária, que signiica energia elétrica para poder iniciar a produção, signiica estrada para o escoamento da produção, signiica incentivos públicos do Estado, cobrindo os assentamentos de reforma agrária,

signiica a universalização do acesso à educação no Brasil. Vocês sabem que o Brasil ainda tem um índice de analfabetismo elevado, acentuado, e no campo

isso é muito mais elevado do que na cidade. Não sei como está hoje a taxa

de analfabetismo no Brasil, mas deve variar entre 16% a 19%. Tem regiões do

Brasil, por exemplo, Alagoas, que chega a 50% o índice de analfabetismo, ou

seja, signiica dizer que a miséria, a falta de serviços públicos nessas regiões, ainda é muito acentuada, a ausência do Estado. Por que? Porque não interessa.

Então, a reforma agrária signiica um conjunto de políticas que visa alterar esse estado de coisas, no campo brasileiro, signiica a universalização do acesso a educação, infraestrutura, serviço público para garantir qualidade,

signiica a ampliação de tudo aquilo que nós já acumulamos no campo da técnica, da ciência, da formação, do avanço no processo educacional, para melhorar

a produção e para conseguir outras esferas em dimensões da vida humana no

campo.

Essa reforma agrária, muito embora seja uma luta dos movimentos

sociais, das organizações camponesas, do campo e da cidade, hoje, digamos,há

uma simpatia da sociedade brasileira. Fizeram várias pesquisas no Brasil sobre

reforma agrária, e se você perguntar para qualquer trabalhador, qualquer cidadão

ou cidadã brasileira, todos e todas vão dizer que são a favor da reforma agrária.

Mas, vão dizer não gosto dos sem terra, não gosto do MST, mas sou a favor da

reforma agrária.

Sou contra essa invasão, como é caracterizada pela imprensa. Para quem

vai analisar o Movimento Sem Terra e taxa o movimento como invasão. Há

diferença muito grande,invasão é um ato de violência. Você chega na casa de

alguém, onde tem uma família, mete o pé na porta expulsa todo mundo e ica com tudo. Isso é uma invasão. O que fazemos, o principal método de luta do MST é

a ocupação de um território que é ocioso, que é público e deve ser utilizado para

as famílias que estão sem terra no país. Então, a mídia usa esse termo invasão

porque, dá a visão de violência, um termo que agride e que é justamente para

criminalizar a luta, e o principal mecanismo de luta do MST, assim como de

outros movimentos sociais do campo.

Então, a reforma agrária tem muitos limites. Por que? Porque no modelo

de desenvolvimento da economia brasileira não cabe mais; a chamada reforma

agrária, especialmente nesse modelo que vivemos, posterior à década de 80,

chamado neoliberalismo. Por que? Porque o Estado brasileiro e o grande capital

têm a sua intervenção no território brasileiro. Já havia um reordenamento

fundiário, uma reforma agrária em território brasileiro. Então, não é verdade que

nunca existiu reforma agrária no Brasil. Ela foi feita e está sendo feita a partir

do modelo daqueles que “dirigem” o nosso destino. Então, os que dirigiam o

Estado e os que dirigiam o grande capital não têm sede no nosso território. É o

capital dos impérios, das grandes nações e incorporações economicamente mais

avançadas no planeta. É o processo de mercantilizarão da própria agricultura que

já havia nessa viagem dos anos 90, quando se consolidou o neoliberalismo, com

aprofundamento.

Com os governos de Fernando Henrique Cardoso, a reforma agrária teve

umgrande avanço. Essa reforma agrária de mercado, teve o seu grande avanço. O

que seria, em síntese, essa reforma agrária de mercado? Mercantilizar toda a vida

no campo, a produção do trabalho, a produção agrícola, e a própria organização

do escoamento da produção, tendo como eixo fundamental as exportações e o

saldo da balança comercial brasileira.

Foi no governo de FHC que, contraditoriamente, tive alguns reluxos nas lutas sociais, um amordaçamento da luta sindical, da luta da esquerda brasileira,

quando o sindicalismo brasileiro foi derrotado, quando o movimento estudantil

também sofreu uma derrota imperiosa. As organizações que vinham em um

num processo de crescimento da luta de massas. E, após a histórica greve dos

petroleiros em 95, houve um grande reluxo, porque o governo através das suas

medidas de desregulamentação da legislação trabalhista, de intervenção nos

sindicatos centrais. Nesse períodode derrota, de reluxo das lutas sociais no Brasil que o movimento social camponês rompeu com uma vanguarda questionadora do

modelo neoliberalista liderado, especialmente, pelo MST. Então, os movimentos

sociais do campo conseguem imprimir não uma derrota aos governos FHC, mas

dando um empate, onde conseguiu expor para sociedade brasileira a ausência de

uma política de reforma agrária do governo FHC. É, exatamente, no ano de 1997

que o MST, junto com outros setores sociais, construiu a chamada marcha dos

cem mil, quando começou uma marcha de todos os estados do Brasil e chegaram

até Brasília, incorporando os movimentos dos professores, dos educadores,

dos sindicatos, com segmentos urbanos e chegaram à cidade e disseram: “aqui

estamos e qual a política de reforma agrária?” e o FHC não tinha.

E a partir daí começou a ser gestada, no Brasil, uma política de reforma

agrária de um novo mundo rural, que nada mais nada menos,é política, com

subpolíticas para implementarna política de mercantilização da reforma agrária.

Com programas como Cédula da Terra, ou seja, um empréstimo que o governo

fazia ao Banco Mundial e emprestava para os estados e municípios, para eles

comprarem terra para distribuir aos camponeses; cadastrar os camponeses

individualmente e os camponeses faziam seu processo de reforma agrária.

Primeiro, endividava o Brasil, com empréstimos externos do Banco Mundial.

Segundo, repassava a pressão do governo federal para os estados e municípios e,

em terceiro, agraciava os aliados do governo nos estados e municípios, ou seja,

latifundiários e prefeitos da, principalmente, da base aliada.

O que existe nos municípios são prefeitos que são latifundiários ou

prefeito apoiado por eles. Essesobjetivam aquelas terras degradadas, mesmo

para vender aos seus agraciados. Então, era uma cadeia que você prendia e, o

quarto, você individualizava a relação com o camponês, porque a principal força

do movimento social é a capacidade de aglutinar gente para fazer o movimento.

Aglutinar a multidão e fazer pressão em massa. Então, ao individualizar a

relação, ao conseguir cadastrar na prefeitura de forma individualizada, quebrava

a espinha dorsal do movimento social camponês. Esse era o objetivo fundamental

dessas políticas.

Outra forma dessa política era a chamada de reforma agrária, pelo

correio. Os mais velhos aqui se lembram, os mais novos não lembram que tinha

um programa na televisão que dizia você quer terra? Vá ao correio e deixe uma

carta. Brincadeira não tinha isso não!Mas dizia vá ao correio e se inscreva e você

vai ser selecionado. Também para que? Para individualizar e, nessa brincadeira

de reforma agrária pelo correio, quase um milhão de famílias se inscreveu,

mais precisamente, 996 mil famílias e não passaram de 60 mil àqueles que

conseguiram terra e isso se virou contra o próprio governo, porque o MST fez a

campanha que dizia o seguinte: “façam o cadastro no correio e agora vamos para

o correio exigir a terra”. E aí o governo não sabia o que fazer, porque não tinha

como fazer, então virou um tiro no pé.

Essa conjunto de políticas para individualizar a relação era uma forma

de calar o movimento no campo; o governo estava construindo um conjunto

de infraestrutura para poder pavimentar e consolidar o terreno do chamado

agronegócio no nosso território. A construção das hidrovias, das ferrovias, a

criação da malha ferroviária brasileira, a ampliação dos portos brasileiros para

aumentar as exportações para abastecer o mercado externo e não o interno. Tanto

é que as pesquisas do próprio IBGE, e não é o MST mostrou isso, apontando o

que? Que a agricultura familiar é responsável por 73% dos alimentos produzidos

pelo povo brasileiro, ou seja, quase tudo que nós comemos aqui vem da pequena

propriedade. Então é uma fraude é dizer que não produz alimento e outra fraude

dizer que o agronegócio produz alimento; quase 8 de cada 10 empregos gerados

no campo brasileiro é a pequena propriedade quem emprega, não é o grande

proprietário. Outra fraude que o agronegócio propagandeia, nos meios de

comunicação, que são pagos por eles é de que são responsáveis pela defesa do

meio ambiente. Outra mentira porque o agronegócio é o grande responsável por

essa tragédia ambiental, na qual nós estamos vivendo. Porque o agronegócio

se fundamenta na grande extensão da propriedade, concentração fundiária, na

utilização intensiva de agrotóxicos, ou seja, veneno.

E o Brasil deu um salto há quatro anos para ser o campeão mundial, não

de futebol, mas para ser o campeão de produção e de consumo de veneno no

mundo. O Brasil é o maior consumidor de veneno, o que levou, nós do MST e

da Via Campesina, a delagrar uma campanha nacional e internacional contra a utilização de veneno. E, ao fazer um ato a dois dias atrás57,em frente à fazenda 57 Dia 21 de junho de 2012.

que despeja veneno, fomos recebidos a bala na fazenda Santa Bárbara, que é do

banqueiro Daniel Dantas. Cada brasileiro consome em média 5kg e 200 ml de

veneno por ano, ou seja, você já tomou sua dose de veneno hoje? Tem gente que

consome mais inclusive, osFastFood. Mas, enim, o Brasil é o maior receptor de veneno do mundo, fruto desse modelo que é o grande responsável peça tragédia

ambiental que nós vivemos.

Então, o agronegócio é uma fraude e o elemento central do nosso

território. Por isso, nesse segundo objetivo do MST um terço de reforma agrária,

não cabe dentro deste modelo porque pode ser o governo que tenha as melhores

condições políticas de fazer, como o governo Lula, em 2003, não a fez. Teve

depositado muita esperança disse, inclusive, em uma frase que se não tivesse

nenhuma política no Brasil, faria a reforma agrária e não a fez. Os movimentos

sociais elaboraram o segundo PNRA – Plano Nacional de Reforma Agrária em

um debate exaustivo, em acampamento, assentamento, comunidades rurais,

enim, e o governo não se comprometeu com as promessas. E, por último, o governo da Dilma não tem a coragem de dizer para

sociedade, mas na prática é o que está fazendo. Vem marginalizando a agricultura

familiar e camponesa e a reforma agrária. Quer dizer, uma ideia foi cortar do

MDA, que é o Ministério responsável pela reforma agrária, 70% dos recursos

destinados à reforma. Signiica dizer que não tem possibilidade de funcionar dessa forma, tanto é que levou os funcionários do órgão à delagrarem uma greve nacional, porque a demanda dos últimos dez anos multiplicou por vinte.

Fruto da luta dos movimentos sociais e com o número de funcionários

do INCRA,com 60% do que tinha a dez anos atrás, sem contar que todo dia

se aposenta gente do órgão. Então, é inviabilizar a própria reforma agrária. A

expressão visível disso é o sucateamento do órgão.

O INCRA, grande responsável pela reforma agrária vem, aos poucos,

sendo desmantelado pelo governo federal. Se não é uma prioridade a política,

não precisa de um órgão no governo inchado, para o desenvolvimento dessa

política. Vou citar dois exemplos.

O primeiro, o INCRA criou, para regularização fundiária na Amazônia um

projeto chamado Terra Legal, que no nosso segmento é um programa chamado

terra ilegal, pois era para legalizar grileiros de terra no nosso território, que tem

a possibilidade de até 1.500 hectares para o latifúndio, ou seja, entrou em terra

pública, grilou terra pública, pode se cadastrar no Terra Legal. Para cadastrar sua

grilagem. Ou seja, legalização do crime. E, do INCRA, 10% dos funcionários

foi deslocados para esse programa. Isso é um desmantelamento, além de tirar a

atribuição do órgão que é uma atuação estratégica a regularização fundiária.

O segundo, virou parte de infraestrutura como a construção de casas,

de responsabilidade do INCRA e passou para a Caixa Econômica Federal. São

processos sinuosos que vai desmantelando, vai amputando as responsabilidades

centrais do INCRA, porque não é prioridade do governo. Para que manter

um órgão estratégico? Porque a reforma agrária não pode ser uma política

compensatória, como tem sido tratada pelo governo.

O último exemplo, desse processo, é o caso da superintendência de

Belém,da área de abrangência do território. Fazendo um levantamento no

INCRA, descobrimos que a última desapropriação de terra feita na região, foi

no ano de 2006. A última desapropriação de terra. Mas, ao contrario disso, o

INCRA de Belém bate todos os recordes e os índices que o governo propõe.

No ano passado foram 3.800 famílias assentadas em Belém. Sabe onde está

essa recriação de assentamentos? O INCRA tem feito o que eles chamam de

regularização fundiária, o que eles chamam de novos atores da reforma agrária.

Na Ilha do Marajó, nas ilhas de Abaetetuba, Igarapé Miri, não sei mais o que

Isso é ruim? Não. Ao regularizar o cidadão que ocupa um território a

décadas, inclusive, gerações e gerações atrás, você dá a ele a possibilidade de

ter acesso a políticas públicas, não é verdade? É. Mas, isso não altera a estrutura

fundiária que é de responsabilidade do órgão. Ou seja, você não compra briga

com o latifundiário, com as empresas capitalistas que estão disputando território

como o programa de biodiesel na região, e você regulariza território para

o cidadão que já mora ali. É um dos possuidores, porque tem posse coletiva

nessas ilhas, dos possuidores daquele território. Você acessa para ele sim, a

possibilidade de política, mas não mexe na estrutura fundiária, porque o governo

tem um comprometimento com esses setores do agronegócio que dão sustentação

no Congresso Nacional e, por conseguinte, no saldo da Balança Comercial

Brasileira. Então, dentro deste modelo a reforma agrária não cabe.

E aí vem o terceiro grande objetivo do MST que é a mudança na estrutura

social e na economia do Brasil. A reforma agrária só vem a ter um novo papel

nesse cenário de derrota, porque passa, se mudarmos a estrutura da economia

brasileira. Signiica mudar a estrutura social, política e econômica do Brasil. Mudança na estrutura, transformação da sociedade, uma sociedade diferente

sobre novos patamares, sobre novas bases de sua organização, que chamamos

de socialismo. Sem medo, uma sociedade socialista, ou seja, alterar a estrutura

social, política e econômica do Brasil, onde a reforma agrária tem um papel

central.

Mas, isso já não é uma tarefa do desenvolvimento social do campo, uma

tarefa dos sem terra, do sindicato de trabalhadores rurais. É uma tarefa para o

conjunto da sociedade brasileira, uma tarefa de ampliar a reforma agrária, ou

seja, estudantes, trabalhadores urbanos, a juventude que está nos grandes centros

urbanos, a intelectualidade da própria academia, e que tem deixado de fazer o

seu papel e tem trabalhado, cada vez mais, para o mercado capitalista, porque

o que determina a forma de organização de uma sociedade é como ela pensa,

trabalha e produz, a forma predominante da estrutura econômica do Brasil é a

estrutura de mercado.

É claro que quem dita as regras no Brasil, e as estruturas jurídicas não

passam ao lado desse processo, e a academia, cada vez mais, vem servindo de

suporte para o mercado capitalista. Lá, no Centro de Tecnologia a gente sabe

que existe uma grande disputa, por exemplo, para formar proissionais do tipo daqueles do ilme “Tempos Modernos” do Charlie Chaplin, apertador de parafuso, ou seja, hoje é programador de programas de computador, para servir

ao mercado, não é bem essa palavra, mas enim, cada vez mais a academia está servindo de suporte para esse modelo hegemônico de sociedade.

Aí está a grande disputa! Ao contrário disso, fazendo uma crítica

não genérica, até porque tem muita gente que respeito aqui; cada vez mais a

universidade se volta para o próprio umbigo, porque o papel de cada intelectual

é produzir suas teses, e dialogar somente com seus pares. E expor esse trabalho

em prol da intervenção da sociedade, em prol do diálogo com os movimentos

sociais do campo e da cidade. Para alterar essa realidade está cada vez mais

ausente, porque a hegemonia política e de pensamento na sociedade, é da forma

de mercado, e aí está a disputa. Nessa disputa, estamos perdendo infelizmente.

É preciso ter proissionais com essa capacidade técnica, política, mas acima de tudo, com a sensibilidade social, para poder ter aqueles que estão

alheios a esse processo de construção. Então, o terceiro grande objetivo do MST

é a justiça social, onde a reforma agrária tem um papel central, por isso, então,

por ter um caráter temático, o MST atua em várias frentes.

Temos a organização de mulheres, juventude, da produção, da formação,

tudo é política que temos, especíicas na construção desse grande movimento de massa. E aí viemos caracterizando o MST como movimento de caráter múltiplo,

porque não pode caracterizar o MST como movimento apenas de caráter

camponês, mas o MST tem um caráter triplo.

O MST tem o movimento sindical porque a reivindicação da luta

econômica, da posse da terra, de ter o seu sustento, a sua economia, caracteriza o

MST como movimento sindical. É uma reivindicação de movimentos sindicais,

a terra, o trabalho, a produção, a economia, o MST pode ser caracterizado como

movimento sindical, mas ao mesmo tempo um movimento popular porque

nós não temos somente terra para reproduzir economicamente; nós queremos

também construir nos assentamentos, um espaço bom para se viver. Para isso

tem que ter escola, ter que ter saneamento básico sim, água de qualidade, um

ecossistema integrado saudável, ter energia elétrica e essas reivindicações que

são características de movimentos populares. E o MST é, ao mesmo tempo, um

movimento de caráter político, porque ao questionar essa questões, a terra, o

trabalho, a economia, a produção, ao questionar a falta de escola, de energia

elétrica, o MST se compara com o Estado. A gente quer militar nessas conquistas.

Então, a gente quer desfazer o modelo excludente da sociedade. Ao questionar

o modelo excludente da sociedade somos um movimento de caráter político

também.

Então, essas são algumas características do nosso movimento. E para

fazer uma intervenção o MST tem um espaçode ação. E onde é digamos o nosso

local de ação, o local de construção da nossa política? É o assentamento que

foi eleito como centro das nossas ações. Para que? Nós não queremos criar

assentamentos para reproduzir em miniatura aquilo que o agronegócio faz no seu

território, ou seja, construir aquilo que a gente chama de quadrado burro, ou seja,

ao ganhar a terra cada um ica com seu quadrado de terra, deixa de participar da

vida social e política do MST e, por conseguinte, deixar de crescer no seu grau

de consciência e organização política.

O assentamento tem sido centro de nossas ações para criar um sistema

digamos embrionário que viria a ser de uma nova sociedade que queremos

construir. Então, o assentamento tem que produzir no seu espaço social novas

formas de organização da vida econômica, social e política. E esse é o maior

desaio do Movimento Sem Terra, porque ao vir pro MST, cada cidadão e cidadã vem com uma herança de formação, uma carga histórica que foi a sociedade

capitalista, individualista que formou. E, portanto, ele quer reproduzir no seu

próprio lote de terra aquilo que o grande mercado fez, ou seja, ao se isolar no lote

de terra ele quer ali construir a sua política, o seu regime, o seu estado e a sua

forma de organização da sua vida social e política. Então, ele constrói também

não só no seu lote de terra, mas na sua família utilizando as mulheres como

cidadãs.Então, tem uma forma de organização que nós queremos justamente

alterar, essa forma de organização nos assentamentos, para ser expressão de uma

nova forma de produzir na agricultura, mas a nossa grande bandeira de luta,

no momento, é fazer a transição para o modelo agroecológico, para confrontar

com o modelo do agronegócio. A agroecologia é entendida, não como uma

forma somente de produzir alimentos saudáveis, mas de reproduzir também uma

sociabilidade no campo, onde o meio ambiente não seja pura e simplesmente

como trata o capital, um suporte para a produção de mercadoria, mas que seja

também um espaço onde o homem relita junto, aquele ecossistema; que construa uma agrobiodiversidade cada vez mais complexa e saudável, onde o homem não

seja o centro do universo, mas um dos agentes importantes daquele território e,

para isso, tem que remodelar toda a forma de nos organizar e isso incide sobre

o território.

Essa forma de assentamento, onde cada um ganha seu lote, cada um vive

isolado não propicia uma nova sociabilidade no campo. Tem que propiciar a

participação e aí vamos gestando mais uma vez a engenharia social, territórios

onde possibilite isso. Já testando raios de sol, onde todo mundo está no seu lote,

mas ao mesmo tempo se encontra na agrovila, testando núcleos de moradia,

formas de organização que propicie a participação política nesses assentamentos.

Mais do que isso, temos que construir novas relações entre os seres

humanos e lutar e combater as formas arcaicas para se trabalhar de forma

culturalmente diferenciada. Lutar pela emancipação das mulheres, trabalhar para

que as crianças tenham seu espaço na sociedade e para que não sejam tratadas

como estorvo, com vem sendo, enim, uma nova engenharia social é um dos objetivos do nosso movimento.

E, por último, a partir desse desaio foi se colocando um conjunto de políticas do nosso movimento. O professor Farid expressou um conjunto de

com proissionais e técnicos, pessoas sensíveis a essa causa e fomos construindo então relação com várias entidades públicas, para construir políticas, para ocupar

o espaço dentro da academia, para alterar e qualiicar a nossa intervenção, porque também somos parte e temos acesso a essas políticas públicasfomos

construindo nossos ciclos de formação, nossas escolas de formação com o

Instituto Josué de Castro, a Escola Nacional Florestan Fernandes que tem uma

academia popular para multiplicar a formação. Nós, do Movimento Sem Terra,

temos construído os Institutos de Agroecologia, a Escola Latino Americana de

Agroecologia no Paraná. A partir dessas experiências construímos, em parceria

com o governo bolivariano do Chavez, na Venezuela, a Escola Latino Americana

de Agroecologia na Venezuela em parceria com o governo cubano, a Escola de

Medicina, que sai de uma experiência vitoriosa em Cuba e vai para Venezuela,

vai para outros territórios aqui na América Latina. A partir da relação com a

ALBA,isto é, a Alternativa Bolivariana para as Américas e Desenvolvimento

Social,são um pouco das experiências que temos na trajetória de lutas no campo.

E, no Pará, e outros estados do Brasil, construímos os Centros de

Construção de Agroecologia, por quê? Porque se queremos mudar e construir

um novo modelo de produção da agricultura, fundamentado na agroecologia,

temos que construir o que? Escolas, cursos que multipliquem essa experiência.

Multipliquem proissionais fundamentados e calçados na experiência da agroecologia para multiplicar essa experiência.

A agroecologia só vai se consolidar se multiplicarmos essa experiência

e para que? Proissionais capacitados com essa visão de cientistas do campo, fundamentado nessa política. Então tem que ter o que? Um suporte técnico,

cientíico e uma estrutura política para poder explicar. E a partir disso, nas escolas que vimos mais recentemente, agora na experiência, acho que o

professor Fernando, a experiência da Escola Latino Americana de Agroecologia

no assentamento Palmares, em conjunto com a Universidade Federal do Pará,

uma experiência importante de curso de pós graduação para reproduzir essas

políticas.

E aqui, por último, no nosso território nós estamos com a experiência

do CEFAC que é o Centro de Estudos e Formação em Agroecologia e Cultura

Cabana, um centro no Assentamento Luís Carlos Prestes, no município de

Irituia, onde,em parceria do MST com a Universidade Federal do Pará através

daIncubadora e com a Universidade de Alicante da Espanha, estamos construindo

uma parceria inédita, importantíssima. Esse Centro vai ser para nós uma baliza,

de multiplicar a experiência de Agroecologia.

O CEFAC não se encerra com a escola, mas ele é uma extensão da

experiência que o MST vem desenvolvendo em agroecologia, para vários

sistemas diferenciados de agroecologia. Aqui, rapidamente, vou passar para

vocês a im de inalizar e, o tempo está quase estourado; temos a experiência do CEFAC.

O CEFAC é um espaço onde já tinha a fazenda São Felipe, que izemos a ocupação em 2007, no município de Irituia. Lá utilizamos a antiga sede da

fazenda, que era muito bonita e hoje está em reforma, através do trabalho

voluntário das famílias que compõe o MST nessa região. Elas estão trabalhando

para construir um Centro de Estudo e Formação emAgroecologia e Cultura

Cabana – CEFAC.

E porque agroecologia? Porque é o modelo que a gente adotou para

multiplicar esse conhecimento, tem que ter formação e não temos, na atualidade.

Ainda não temos suicientemente para poder multiplicar esse conhecimento na nossa região. É um processo rico em construção. Bom, aí tem uma introdução

pode passar, seguindo, isso aí é um pouco da engenharia do CEFAC e essa

proposta está em debateem todas as instâncias do Movimento Sem Terra.

Aqui vou colocar um dos objetivos principais do CEFAC. Os princípios

ilosóicos e pedagógicos do CEFAC: a educação para a transformação social; a educação para o trabalho é a cooperação, a cooperação que é fundamental para a

organização do trabalho, que adotamos no Movimento Sem Terra. A cooperação

como forma de reeducação do trabalho fundamentado na solidariedade e nos

princípios.A educação voltada para várias dimensões da pessoa humana não é só

como já reproduzimos em experiências antigas, só para trabalhar, aquele trabalho.

Isso não forma, isso deforma na verdade, as outras dimensões da vida humana

como educação política, a educação social, a cultural, enim, a educação com e para valores humanistas, socialistas, e agroecológicos, e o quinto a educação

como um processo permanente de formação e transformação humana. São os

grandes princípios ilosóicos dessa Escola que são princípios que o próprio Movimento Sem Terra constitui.

Os princípios pedagógicos então estão aí: primeiro: a relação entre

prática e teoria, a práxis política; dois: a combinação metodológica entre o

processo de ensino e de capacitação; aínão sei explicar direito esse, mas vocês

entenderam; três: a realidade por base da produção do conhecimento, ou seja,

aquele conhecimento que o pessoal gosta de falar dialógico, que dialogue com

a realidade, interprete a realidade, que é uma palavra da moda aqui; quarto:

conteúdos formativos socialmente úteis; quinto: a educação para e pelo trabalho,

a cultura e o bem viver.

O bem viver é um debate que foi incorporado muito recentemente pelos

movimentos camponeses, indígenas, no mundo inteiro que, digamos, tem sido a

ponta de lança desses processos mudancistas na América Latina, a partir dessas

diferenças indígenas, populares e campesinas, na Venezuela, Brasil, Colômbia,

Equador, enim.O bem viver, ou seja, em síntese não é o ter; só o ter mercado, a mercadoria

que importa para os processos de desenvolvimento. É viver bem, qualidade

de vida não é só ter carro, não é só ter bens materiais, é como viver bem no

meio ambiente, se alimentar bem, de forma saudável, enim, uma cultura muito mais além do mercado capitalista. Sexto: o vínculo orgânico entre os processos

educativos, políticos e culturais; sétimo: vínculo orgânico entre processos

educativos e processos econômicos; oitavo: vínculo orgânico entre educação

e cultura, nono: gestão democrática e participativa, que é uma das formas que

falei dentro dos conhecimento que funciona; décimo: auto-organização dos

estudantes e das estudantes; décimo primeiro: é criação de coletivo pedagógico

e formação permanente dos educadores e educadoras; décimo segundo: atitude

e habilidade de pesquisa; e o décimo terceiro: combinação entre processos

pedagógicos, coletivos e individuais.

Finalizando, aqui, os objetivos do CEFAC: 1) construir a estruturado

Centro de Estudos e Formação em Agroecologia e Cultura Cabana, que possibilite

ser uma escola dos movimentos sociais articulados pela Via Campesina na

região amazônica. Então, não é só do MST, mas também articulados pela

Via Campesina. 2) ser escola informal e formal que abrange a escolarização

em níveis médios e proissionalizantes, graduação, pós-graduação, e todos os cursos informais do MST e dos movimentos sociais; 3) formar quadros e

militantes políticos para os movimentos sociais, articulados pela Via Campesina,

no bioma amazônico; 4) formar quadros e militantes políticos que adquiram

conhecimentos teóricos e capazes de semear ideias e práticas agroecológicas;

5) construir alianças políticas, pedagógicas e educativas com as universidade,

escolas, entidades ambientais e organizações; 6) ser lugar de formação formal

e a formação informal, cursos básicos de militantes, seminários, reuniões, curso

de formação para as famílias dos assentamentos e acampamentos, comunidades

campesinas, ribeirinhos, indígenas e afrodescendentes com base na agroecologia;

7) ser ferramenta de luta política e prática de construção da soberania alimentar

na região amazônica; 8) ser ferramenta de luta, formação, mobilização, produção

agroecológica orientando-se pelos princípios políticos, ilosóicos ideológicos e ambientais do MST e dos movimentos da Via Campesina; 9) formar sujeitos

sociais com conhecimentos e práticas agroecológicas; 10) ser ferramenta de

luta contra as transnacionais e a expansão do agronegócio e da biotecnologia

comercial na Amazônia; 11) ser uma ferramenta de formação para a extinção

do machismo, do sexismo e do racismo, e de outros itens prejudiciais a saúde

e a sociedade; 12) ser ferramenta para a auto-organização das mulheres e do

feminismo como fundamento da emancipação da classe trabalhadora; 13) formar

a partir do internacionalismo proletário viabilizando e publicizando as formas

organizativas da classe trabalhadora; 14) ser ferramenta contra a exploração e

opressão humana, promovidas pela burguesia e o capital hegemônico global.

O CEFAC é uma extensão de tudo aquilo que nós do MST, entre outras

coisas, acumulamos com prática política, pedagógica, ou seja, a própria extensão

da luta social do MST que é a luta em si. Ela forma, mas a experiência educativa

também tem dialogado com sua própria forma de luta. Enim, é o acúmulo

daquilo que o MST vem construindo e deve ser, digamos, uma baliza para as

futuras experiências no campo da construção da agroecologia e da sociedade

como um todo. Muchasgracias! Obrigado!

UM BALANÇO DO I EREDS DA REGIÃO NORTE DO BRASIL

Avaliação da Coordenação

Em nosso planejamento não imaginávamos que este evento teria tanta

aceitação por um público com mais de trezentas pessoas inscritas mostrando o

interesse e o compromisso em ouvir e debater temas importantes para a realidade

brasileira, pouco discutido na Região Norte do Brasil. O binômio Engenharia

com Desenvolvimento Social. Nem mesmo com o problema de falta de energia

elétrica, observou-se a saída das pessoas do auditório. Os debates ultrapassavam

o horário previsto para encerramento. E, mesmo assim, as pessoas continuavam

manifestando o interesse pela organização de um segundo EREDS, ou seja, em

2013. Com esses incentivos estamos nos organizando, novamente, para buscar

os recursos necessários. Já temos um estudante bolsista responsável em iniciar

as atividades de mobilização. A experiência valeu e icou um gostinho de quero mais!

Depoimentos de participantes discentes e da Comissão do Evento

O EREDS Norte 2012 foi um evento muito estimulante para os estudantes

de diversos Cursos de Engenharia. A priori, participei da Comissão Organizadora

do evento e tive um crescimento pessoal e proissional muito importante,devido trabalho em equipe, realizado pelos participantes. No decorrer do evento, com

as palestras, mesas-redondas e discussões, os participantes mantinham interação

com os professores palestrantes com outros alunos, sobre o desenvolvimento

social, comecei a ver a dimensão desse tema para a sociedade na atualidade

e para as gerações futuras. O primeiro EREDS Norte foi o ponta pé inicial

para a abordagem dessa temática na região e contribuiu positivamente para

o aprendizado dos participantes por meio das atividades realizadas durante o

encontro. (Ana Paula Martins dos Santos)

É com imenso prazer que escrevo este depoimento sobre o EREDS-Norte.

Um encontro de engenharia diferente dos convencionais, que veio com o objetivo

de quebrar o paradigma da engenharia voltada somente a cálculos, e nos mostrar

uma nova visão, em que o desenvolvimento social e a sustentabilidade estão

atrelados à nossa realidade de futuros engenheiros.O EREDS teve uma grande

importância em minha formação curricular, onde obtive novas experiências, por

meio de apresentações voltadas ao desenvolvimento territorial da Amazônia, das

diversas discussões nas proveitosas mesas-redondas e nas excelentes palestras

com os mais variados temas.Tenho certeza, que como futuro engenheiro de

produção, vou levar e aplicar em minha proissão, toda a experiência que o I EREDS Norte me propiciou. (Rodrigo Pinheiro)

Foi muito bom ter participado de um evento como esse, como parte

da equipe de organização e também como ouvinte; poder ver um mix de

conceituados palestrantes na área de educação, como também aquela palestra

sobre o Movimento Sem Terra, e tudo isso dentro da abordagem nas Engenharias.

Durante o evento, tivemos a oportunidade de conversar com os palestrantes nos

bastidores e sermos bem atendidos.Foram dois dias de muito proveito, nossas

correrias durante o evento, como parte da organização, para que tudo ocorresse

bem, valeram a pena. Foram aprendizados os quais nos trazem a reletir sobre como devemos abordar e voltar o nosso conhecimento de Engenharia valorizando

o meio, com o qual iremos lidar de forma mais consciente, pois pequenas

ações podem gerar grandes mudanças. Tive a oportunidade de falar que, em

minha área, teremos um futuro projeto de extensão que, num primeiro plano,

utilizará alunos de Engenharia Naval, para informarem aos ribeirinhos sobre

a importância de haver uma proteção no eixo do propulsor das embarcações

que eles utilizam, para que se previna contra o Escalpelamento. Então, ver que

podemos ter esse conhecimento e aplica-lo, de forma mais consciente, foi, a

meu ver, algo que levarei para minha vida proissional. Outro ponto,foi quanto a questão do ensino nas engenharias, ressaltar o Prof. Walter Bazzo, que abordou,

de uma forma contundente, sobre as necessidades de haver uma didática e

de uma importância de repassar o conhecimento dentro das salas de aula de

engenharia, o que realmente precisa ser mudado.Posso, dizer que valeu a pena

mesmo! Sou grato pela oportunidade de ter participado com uma equipe que foi

muito legal e que, naqueles dias, também foram uma família, e que os quais,

com certeza saíram de lá com uma outra visão sobre as abordagens na área das

engenharias. (Bruno da Silva Duarte)

Quando me inscrevi no I Encontro Regional de Engenharia e

Desenvolvimento Social/Norte, não imaginei o quão marcante e signiicativa seria essa experiência. O título, em si, já me tinha despertado o interesse por

trazer à tona um tema um tanto quanto incomum: “Tecnologias Sociais Aplicadas

ao Desenvolvimento da Amazônia”. Ora, em primeiro lugar, o que vem a ser

exatamente “Tecnologias Sociais”, e o que eu, futuro engenheiro, tenho a ver

com isso?

O evento me trouxe pontos de vistas extremamente inovadores e, ao

mesmo tempo, verossímeis e aplicáveis. Professores de diversos lugares do país e

de diversas áreas de atuação nos mostraram, claramente, nossa Responsabilidade

Social como futuros Engenheiros; que os modelos pedagógicos adotados

atualmente nas universidades são defasados, ainda trabalham o conhecimento

de forma muito restrita, tecnicista. Distanciando-nos de uma visão mais social,

humana.

Tudo isso me sensibilizou de uma maneira muito positiva, tanto que

meu envolvimento com o evento mostrou-se cada vez maior e, depois dos dois

dias de evento, entre palestras, apresentações de artigos e discussões, saí de

Castanhal com um senso crítico muito mais apurado. A ideia da interação entre

Engenharia e Desenvolvimento Social me pareceu muito tangente e me fez crer

que a disseminação dessa ideia deve ser feita o quanto antes, imediatamente.

O I EREDS/N plantou muitas sementes. Cada um dos participantes,

pouco ou muito, absorveu informações muito valiosas e que serão levadas para

a vida acadêmica e proissional. Quanto a mim, hoje sou um dos responsáveis pela organização do II EREDS/N, que será realizado em Belém-PA, e tenho a

responsabilidade de dar continuidade e expansão a tudo que já foi trabalhado

para disseminar, ainda mais, que nós, futuros Engenheiros, temos um papel

decisivo no que diz respeito ao Desenvolvimento Social. (Fábio Paiva da Silva)

O 1º Encontro Regional de Engenharia e Desenvolvimento Social do

Norte (EREDS Norte) foi realizado no Instituto Federal de Educação, Ciência

e Tecnologia do Pará – Campus Castanhal (IFPA - Campus Castanhal). O

evento ocorreu através da Incubadora da UFPA em parceria com INCUBITEC

/ Incubadora Tecnológica de Desenvolvimento e Inovação de Cooperativas e

Empreendimentos Solidários, no momento em que o IFPA - Campus Castanhal

comemorava 40 anos de sua fundação na cidade de Castanhal.

Diante da complexidade do cenário socioeconômico e ambiental,

apresentado pela região amazônica, é de suma importância que as instituições

relitam sobre seus pontos de vista e suas tecnologias, em função das demandas e particularidades do campo de atuação de seus proissionais.

Em 2010, o IFPA – Campus Castanhal implantou o curso de Engenharia

Agronômica, seguindo os pensamentos empíricos das comunidades agrícolas e os

conhecimentos cientíicos produzidos na Academia, objetivando a permanência do homem no campo, a produção de alimentos e a preservação do meio ambiente.

Neste sentido, o EREDS Norte proporcionou aos graduandos de

Engenharia Agronômica do IFPA – Campus Castanhal, a partir de mesas-

redondas e circuitos de experiências, debates sobre a formação dos Engenheiros;

as tecnologias desenvolvidas para Amazônia; gestão de Empreendimentos

Econômicos e Solidários; e o papel dos Movimentos Sociais para o

desenvolvimento local (Wagner Luiz N. do Nascimento)

Ilustração de Alguns Momentos do EREDS-Norte

Fotograia 1: Ginásio de esportes do IFPA Castanhal onde acontece abertura do 1º EREDS Norte, juntamente com comemoração de 40 anos do campus.

Fonte: Comissão Organizadora do Evento, 2012.

Fotograia 2: Mesa de credenciamento com estudantes da Comissão Organizadora.

Fonte: Comissão Organizadora do Evento, 2012.

Fotograia 3: Caneca distribuída aos participantes inscritos no 1º EREDS Norte.

Fonte: Comissão Organizadora do Evento, 2012. Fotograia 4. Mesa 1 - Formação do Engenheiro e Projetos Pedagógicos em questão, com Prof. Fernando Michelotti; Prof. Walter Bazzo e Prof. Romier Souza e Rodrigo Erdmann mediando o debate.

Fonte: Comissão Organizadora do Evento, 2012.

Fotograia 5: Mesa 2 - Tecnologia Social Aplicada ao Desenvolvimento Territorial da Amazônia, com Profa. Maria José; Profa. Sandra Ruino e com a mediação do Prof. Farid Eid

Fonte: Comissão Organizadora do Evento, 2012.

Fotograia 6: Mesa 3 – Engenharia, Gestão de Empreendimentos Solidários e Movimento Social, com Prof. Sidney Lianza, Prof. Farid Eid, Ulisses Manaças e com a mediação de Edson Matoso

Fonte: Comissão Organizadora do Evento, 2012.

APÊNDICE A

PLANO DE AULA DISCIPLINA GESTÃO DE PRODUÇÃO

Curso de Tecnologia em Gestão de Cooperativas

Plano de Ensino do Módulo: Gestão da Produção

Educadores responsáveis:Farid Eid, MaicoRoris Severino e Caio LuisChiariello. Convidado Pedro Ivan Christoffoli

Objetivo geral: Introdução dos conceitos básicos e ferramentas de gestão sobre organização da produção e do trabalho para melhoria do planejamento de empreendimentos cooperativos do MST.

Ementa: Organização do Trabalho e Processos de Trabalho. Cadeias Produtivas. Engenharia do Produto e Processos Produtivos. Projeto do Trabalho. Engenharia da Qualidade. Planejamento e Controle da Produção. Pesquisa Operacional. Logística e Gestão da Cadeia de Suprimentos. Gestão de Custos da Produção. Engenharia da Sustentabilidade.

Cronograma da Primeira Etapa do Módulo: 31 de maio a 4 de junho com carga horária de 40 horas.

Tópicos e Duração (Primeira Etapa)a) Primeiro dia: Organização do Trabalho e Processos de Trabalho (4 horas);

Cadeias Produtivas (4 horas)b) Segundo dia:Engenharia do Produto e Processos Produtivos (4 horas),

Projeto do Trabalho (4 horas);c) Terceiro dia: Engenharia da Qualidade (4 horas), Planejamento e Controle

da Produção (4 horas);d) Quarto dia: Pesquisa Operacional (4 horas), Logística e Gestão da Cadeia

de Suprimentos (4 horas);e) Quinto dia: Gestão de Custos da Produção (4 horas), Engenharia da

Sustentabilidade (4 horas).

Todos estes tópicos serão retomados e aprofundados na segunda etapa deste módulo.

Objetivos especíicos: Esta disciplina tem como objetivo apresentar os conceitos fundamentais sobre gestão da produção e do trabalho de forma a aprofundar os conhecimentos dos educandos,além de contribuir para elaboração de diagnósticos e implementação de melhoria na gestão de cooperativas do MST.

Estratégias de Ensino: Como esta disciplina apresenta os conceitos fundamentais da Gestão da Produção e do Trabalho, a estratégia utilizada é de articular o aprendizado destes conceitos com a realidade da gestão das cooperativas.

Atividades dos Educandos: Leitura e elaboração de Resenhas dos textos em sala de aula e no tempo-comunidade. Elaboração de trabalhos em grupo sobre Diagnóstico da Gestão da Produção em Cooperativas do MST. Apresentação de Seminários Temáticos. Participação nas discussões em sala de aula. Manter contato com os Educadores/Monitores sobre suas dúvidas e andamento de seus trabalhos, via internet. Elaboração de notas individuais sobre a visita técnica a uma cooperativa.

Recursos a serem utilizados: Lousa, Giz, Pincel Atômico, Computador, Projetor. Durante a segunda etapaplaneja-se uma visita técnica a uma cooperativa de referência perto do local do curso.

Procedimentos de Avaliação do Ensino-Aprendizagem dos Educandos: Prova individual ao inal de cada etapa (peso 2); Resenhas individuais a serem entregues no início da segunda etapa (peso1). Elaboração de Trabalho em Grupo (peso 1). Apresentação de Seminário do trabalho com notas individuais (peso 1)

REFERÊNCIAS:

Autores: Nigel Slack, S. Chambers, R. JohstonTítulo: Administração da ProduçãoPublicação: Editora Atlas, Edição compacta, 2008.

Autores: R.B.Chase, F.R. Jacobs, N.T. AquilanoTítulo: Administração da Produçãopara a vantagem competitivaPublicação: Editora Bookman, 2006.

Autores: Farid Eid, Andréa Eloísa Bueno PimentelTítulo: Contribuição ao debate teórico sobre desenvolvimento local e cadeias produtivasPublicação: Revista do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas, UFPA, v.1, n.1, p.69-90, agosto-dezembro de 2008.

Autor: Farid EidTítulo: Características e conceitos básicos sobre Organização do TrabalhoPublicação: Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal de São carlos, mimeo, 2000.

Autores: Carlos Estevão Leite Cardoso, Augusto Hauber Gameiro,Título: Caracterização da cadeia agroindustrial da mandioca no Estado de São Paulo. Publicação: Anais do Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural, 41. Juiz de Fora, 2003.

Autor: Caio Luis ChiarielloTítulo: Análise da gestão de cooperativas rurais tradicionais e populares: estudo de casos na COCAMAR e COPAVILocal: Universidade Federal de São Carlos, Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção. Dissertação de Mestrado, 2008.

Autor: Maico Roris SeverinoTítulo: Organização e processos de trabalho em uma cooperativa do MST: debate teórico no contexto da empresa capitalista e da economia solidáriaLocal: Universidade Federal de São Carlos, Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção. Dissertação de Mestrado, 2006.

PROGRAMA DE ENSINO RESUMIDO1. Organização do Trabalho e Processos de Trabalho (4 horas)1.1 Conceito de processo de trabalho1.2 Modelos de organização do trabalho: Taylorismo, Fordismo, Modelos lexíveis (Italiano, Sueco, Japonês)1.3 Transição dos peris do trabalhador: do trabalho fragmentado à polivalência

2. Cadeias Produtivas2.1 Conceituação de cadeia produtiva2.2 Tipologia das cadeias produtivas2.3 Integração vertical e horizontal

3. Projeto de trabalho3.1 Conceituação de projeto de trabalho3.2 Análise ergonômica do trabalho, projeto ergonômico3.3 Abordagem comportamental3.4 Equipes de trabalho (workteams)eis (Italiano, Sueco, Japones)ismo

4. Logística e Gestão da Cadeia de Suprimentos4.1 Conceituação de Cadeia de suprimentos4.2 Os relacionamentos no canal de distribuição