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– Parte 1 –
DEZENOVE MIL CRECHES
(Fonte: ‘O Estado de São Paulo’, fevereiro de 2013)
Adriana de Queiroz Brasil, e filhos.
entre as dezenas de milhares vitimadas pelo
descaso das autoridades para com a educação.
Uma família brasileira
Os primeiros anos são fundamentais para a formação
de uma criança.Um dia ainda haveremos de entender que negar uma instrução adequada na tenra idade configura
um crime atroz.
Déficit atual de creches para
atender as crianças brasileiras que aguardam uma
vaga:19 mil crechesQuantidade de
creches que seriam construídas,
conforme promessas da campanha presidencial:6 mil crechesQuantidade de
creches entregues após dois anos de
governo:Sete
Desta forma, como haveremos de constituir algum dia
uma Nação?
Por ser a primeira mulher,
a primeira mãe, a primeira avó a
assumira Presidência da
República,havia expectativas de
que finalmente teríamos um olhar
mais amorosopara com a Educação
e a Infância no nosso
país.
Mas, infelizmente, os fatos demonstram
a continuidade do cruel desprezo e da
visão miseravelmente míope para com
a Educação;O mesmo descaso e
tratamento vergonhoso que governantes homens já
vinham destinando ao tema.
Analistas políticos observam
que os dois anos iniciais de governo são
onde as prioridades são elencadas
e as obras de maior alcance realizadas,
e que daqui até o final do mandato não devemos esperar grandes coisas,
já que, inclusive, os esforços maiores vêm sendo feitos doravante para a campanha pela
eleição de 2014.
Quem leva dois anos pra entregar
sete creches,
será que tem a mínima vontade ou condiçãode inaugurar cinco creches por dia no período restante de seu mandato,para, ao menos, honrar a sua
palavra?
Já seria preocupante,num país com um
déficit de 19 mil creches,
num país que ocupa um lugar de destaque na economia mundial,que um chefe de Estado viesse a ser eleito
prometendo construir, em quatro anos de governo,
apenas 6 mil unidades.
Beira o absurdo, o insano,
num país com tão graves deficiências
sociais,e onde a criminalidade e a violência assolam cada dia com maior
severidade,
que após dois longos anos
apenas sete creches tenham sido entregues.
Que futuro pode almejar
um país, uma sociedade
que vira o rosto para os seus filhos mais
necessitados?
Num país com uma dívida de 19 mil creches para com seus filhos, como podem recursos
públicos ser torrados em estádios destinados a virar
elefantes-brancos após meia dúzia de jogos?
Estádios como o ‘Estádio Nacional
da Vergonha’ em Brasília, obra orçada e licitada
inicialmente em 700 milhões, e que acabou drenando dos cofres públicosum bilhão e 600 milhões de
reais.
E pensar que os times de maior destaque do Distrito
Federal jogam na Terceira Divisão do
campeonato brasileiro.Havia mesmo necessidade
de tamanho gasto?
Se os anseios da população fossem levados em
consideração, será que não optaríamos por
investir tal astronômica quantia em melhorias nas
áreas de Educação, Saúde e Segurança Pública?
E o absurdo do absurdo:
Não satisfeitos em estourar o
orçamento inicial, sabe-se lá como, em 900 milhões
de reais,...
...ainda retiraram 100 milhões dos
já parcos recursos da Saúde
e da Educação para destinar ao Estádio Nacional
da Vergonha.
Aproveitando-se da apatia e alheamento
político de uma sociedade
paralisada, quanto estrago
políticos totalmente
descompromissados com o bem comum vêm provocando.
Segundo o Tribunal de Contas do DF, a quantia gasta com
o desnecessário estádio poderia garantir
a construção de 473 creches
(orçado em R$ 3,3 milhões cada).
Se na capital federal há um déficit de 320 mil vagas
de creche, imagine a situação nos rincões mais afastados e
esquecidos do país.
A corja política matricula seus filhos, netos e sobrinhos
em creches e escolinhas infantis de primeiro mundo
– que contam com pedagogos, nutricionistas, psicólogos, aulas de inglês, música e natação –,
cujas mensalidades giram em torno de R$ 4.000,00.
Enquanto centenas de milhares de crianças
brasileiras, como as duas filhas
pequenas de Adriana, aguardam
numa
infrutífera espera por uma vaga numa creche pública.
Quem despreza a Educação, está negando
o mínimo, do mínimo, do mínimo...
Que futuro é este que hoje estamos
construindo?
Um dia ainda haveremos de
aprender que a rua não é
uma boa escola.
E como fazem as mães que precisam trabalhar fora para garantir o sustento,onde deixam seus filhos pequenos?
Diante da criminosa omissão do Estado, estas mães muitas
vezes acabam
tendo que largar os
filhos pequenos em creches
clandestinas.
O frio retrato do abandono.
Que sociedade desalmada é esta
em que nos tornamos?
Como pode um país continental
abandonar um bem tão
precioso que é a primeira infância?
Diferentemente das creches destinadas a uma minoria abastada,
as creches clandestinas não contam com pedagogos, nutricionistas, psicólogos,
e muito menos com aulas de
inglês, música ou natação.
Não passam de depósitos de crianças, sem nenhum
tipo de fiscalizaçãoou controle.
A vivência numa creche e escolinha infantil é uma fase crucial na socialização
do ser humano.
O déficit de 19 mil
creches,e a
deplorável qualidade do
ensino infantil
oferecido pelo poder
público, condenam milhões de vidas a um
futuro nebuloso.
Até quando haveremos de condenar as crianças que tiveram o azar de
nascer na família e na classe social errada
à miséria e à humilhação?
Sem Educação, Cultura, Cidadaniaou Justiça Social,
de que adianta PIB elevado,
Copa do Mundo, caxirola, circo ou carnaval?
Um país rico é um
país
que não abandona seus
filhos mais necessitados.
– Parte 2 –
O PREÇO
DO DESCASO E DA
OMISSÃO
Dentre as principais causas da criminalidade
e da violência no país encontram-se:
– O descaso político com a Educação formal;– Falhas na chamada educação em valores ou comportamento ético;– Desestruturação familiar;– Desigualdade social.
A infância,uma vida que se
inicia,
é muito frágil para ser abandonada.
Diante do frio abandono pelo Estado e pela
sociedade, qual o futuro das
crianças em situação de risco e vulnerabilidade social?
Qual o futuro de uma sociedade que abandona seus filhos mais necessitados?
A epidemia de crack, que assola praticamente todas as cidades e
municípios brasileiros, não é fruto senão do nosso descaso
com a Educação.
Quanto sofrimento, dor e morte poderia ser evitado se, ao invés
de prometer 6 mil creches e entregar sete,
os nossos governantes finalmente levassem a promoção da
Educação a sério.
Somente superaremos a epidemia de crack no dia em que
zerarmos o déficit de 19 mil creches, e garantirmos ensino
público de qualidade às crianças brasileiras.
Até lá, todas as campanhas e esforços
para fazer frente ao flagelo do crack
não passarão de jogadas de marketing político-eleitoral, destinadas a enxugar gelo.
A cura da chaga do crack tem um nome simples :
Educação.
Como fazem falta
19 mil creches.
Como faz falta um ensino público de qualidade.
Como faz falta a valorização do
professor.
Se ao menos houvesse uma
lei que obrigasse os políticos a se empenhar por cumprir aquilo
que em campanha prometem.
Tivesse este garoto recebido
atenção, cuidado, e uma educação digna
desde a primeira
infância, estaria ele hoje
acendendo um cachimbo de
crack?
Pode até ser que sim; mas as
possibilidades certamente
seriam infinitamente
menores.
Um dia ainda haveremos de aprender que é melhor prevenir
do que remediar.
No caso do crack,
infelizmente muitas vezesas sequelas
deixadas são irreversíveis.
A prevenção atende por um nome simples:
Educação.
A mesma Pátria amada que
ontem lhe negou uma vaga numa
creche
ignora-o novamente hoje,
recusando-lhe uma vaga numa
clínica de reabilitação.
– Parte 3 –
CIDADANIA
& COMPAIXÃO
SOCIAL
Nestes dias de desolação e
degradação de valores em que
vivemos,
de violência e criminalidade exacerbadas,
onde a vida humana vale tão
pouco – como verificamos todo
dia nos noticiários,
onde pessoas são mortas por causa
de um aparelho de celular ou de uns
míseros trocados,...
...devemos parar para refletir
se a cegueira e o descaso social
dos políticos e governantes
brasileiros
não são um reflexo da
compaixão social que nós também
perdemos.
Nestes dias de individualismo exacerbado,
a beirar o doentio, quem ainda se preocupa com aquilo
que é coletivo,quem ainda pensa no próximo
necessitado?
“A minha família, os meus filhos.”“A minha renda, o meu salário, o meu
emprego.”
“O meu aparelho de celular da hora.”“O meu carro novo. A reforma da minha casa.”“As minhas fotos no Facebook, a minha viagem
dos sonhos.”
Repare no teor das
conversas do dia-a-
dia:...
“A minha aposentadoria. O meu jazigo no cemitério.”
Imersos no individualismo
umbigóide, nos
apartamos da coletividade.Diante do vergonhoso serviço público de
saúde, corremos para os planos privados.
Diante do degradante ensino público ofertado,
corremos para matricular nossos filhos em escolas particulares.
Mas como ficam as dezenas de milhões de famílias e crianças brasileiras
que não têm condições de contratar um plano privado de saúde, ou de arcar
com as mensalidades de uma creche ou escola particular?
Pagamos tão elevados impostos e tributos,
e não exigimos nada em troca?Como foi que permitimos que tamanha cegueira social
se apoderasse de nossas vistas,ofuscando de nossos corações a compaixão e
seu brilho?
Na rodoviária de Brasília, por entre transeuntes e a fumaça de
automóveis, perambula a pequena menina.
Apesar da tenra idade, de sua presença, de seu gesto,
de seu rosto e olhar, de seu silêncio, emana uma seriedade precoce.
Uma seriedade que
jamais deveria pertencer ao
universo infantil.
Tão ensimesmados nos tornamos que passamos por ela sem perceber que
existe, como se fizesse parte da paisagem.
Ainda no início de sua jornada existencial,
e tão precocemente excluída, segregada,
tornada invisível.
Quem algum dia haverá de lhe sondar o coração,
a fim de mensurar o tamanho do sofrimento que o abandono
é capaz de infligir?
Tão demasiadamente absortos estamos em nossos míseros afazeres que não podemos parar para perguntar-lhe o
nome, verificar se tem sede, se passa fome, e tentar aliviar, um pouco que seja, o seu desconsolo.
Aonde haverá de nos conduzir a atual mentalidade do cada um por si?
E se porventura um de nós se dignar a lhe dirigir
um olhar compassivo por alguns segundos, logo em seguida é tomado
pelo pensamento: “Quem deve se preocupar com as
crianças carentesé o governo, não eu!”
Não muito longe, a uns poucos metros, no Palácio do Planalto,
a Presidenta, no seu gabinete, ocupa-se com os afazeres que considera
relevantes.
Ela tampouco, na condição de chefe de Governo, parece se preocupar com a desolação que o abandono imprime a
tantos corações infantis.
Pra que perder tempo construindo creches e investir em Educação, se o
que rende votos é o populismo e o assistencialismo
barato?
Nos absurdos da realidade,
cada um enxerga o que quer.O olhar da alma dá visibilidade
ao que a palavra esconde.
“Somos a memória que temos e a responsabilidade que assumimos.
Sem memória não existimos,sem responsabilidade talvez não
mereçamos existir.”José Saramago
A cegueira social da Presidenta talvez seja um reflexo
do Amor e da Compaixão que perdemos.
Talvez ainda não seja
demasiado tarde para
acordarmos.
Os transeuntes passam;
a menininha perambula na sua vã procura
por abrigo, proteção, carinho e cuidado;a Presidenta sonha com a reeleição;
o vento frio sopra;
a noite cai;
a vida segue.
Formatação: [email protected]
Tema musical: ‘Schindler’s List Theme’, interpretado por Simina Croitoru
e Angelys Symphonic Wind Orchestra
Um país rico é um país que ama seus filhos,e com especial carinho e atenção aqueles mais
necessitados.
Um país rico é um país que sabe que as suas crianças representam o seu bem mais precioso.
Quem ama acolhe, educa, abriga, protege...