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Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito, apresentada pela Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas – FADE, da Universidade Vale do Rio Doce – UNIVALE.
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UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE – UNIVALEFACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÕMICAS-FADE
CURSO DE DIREITO
Bruno Henrique Almeida Nolasco
A CONSTITUCIONALIDADE DA VIDEOCONFERÊNCIA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO
Governador Valadares/MG2010
BRUNO HENRIQUE ALMEIDA NOLASCO
A CONSTITUCIONALIDADE DA VIDEOCONFERÊNCIA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO
Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito, apresentada pela Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas – FADE, da Universidade Vale do Rio Doce – UNIVALE.
Orientadora: Profª. Rosimeire Pereira da Silva
Governador Valadares/MG2010
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BRUNO HENRIQUE ALMEIDA NOLASCO
A CONSTITUCIONALIDADE DA VIDEOCONFERÊNCIA NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO
Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito, apresentada pela Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas – FADE, da Universidade Vale do Rio Doce – UNIVALE
Governador Valadares, _____ de __________ de _______.
Banca Examinadora:
_____________________________________Rosimeire Pereira da Silva
Universidade Vale do Rio Doce - UNIVALE
_____________________________________Prof. _________________________
_____________________________________Prof. _________________________
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Dedico a minha querida mãe, que há 12 anos defendeu esse mesmo tema em sua monografia de conclusão do curso de Direito.
4
AGRADECIMENTO(S)
Agradeço à Deus pela realização e a conquista desta vitória.
Agradeço à minha orientadora Profª. Rosimeire Pereira da Silva (“fessora”), pela
atenção, incentivo e motivação em mim depositada.
Aos meus pais pela atenção e compromisso apoiado, em especial a minha mãe pelo
desafio lançado; aos meus irmãos, Marcus e Wesley, pelos momentos de
cooperação em períodos de crises; a minha “tia Nice” pelo incentivo durante a
caminhada, mesmo em outro continente; e ao meu padrinho Luciano, quem me deu
o pontapé inicial nessa caminhada.
Aos meus amigos de faculdade (Anne, Dan, Nacif e Sara), por esses cinco anos de
caminhada, por todas as barreiras enfrentadas e conquistas realizadas.
Por fim, agradeço a todos os meus amigos que de alguma forma contribuíram para a
conclusão desse trabalho e que puderam entender minhas ausências, minhas
ansiedades, minhas preocupações e meus desesperos.
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“Os anais da ciência jurídica ensinam que a adoção de novas tecnologias sempre é marcada e precedida de períodos traumáticos, repletos de acalorados debates, que, em um primeiro momento podem encontrar eco na doutrina, mas logo se tornam superados pelo bom senso e pelo predomínio de uma nova e irresistível realidade social”.
Leonardo Pereira Martins
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RESUMO
A presente pesquisa tem o objetivo de fazer uma análise sobre o uso da videoconferência no processo penal, principalmente no interrogatório do acusado, defendendo a constitucionalidade do ato. Primeiramente, foi abordado o conceito de videoconferência, sua evolução histórica e a estrutura necessária para a realização do ato. Em seguida passou-se para a definição de interrogatório, o uso do interrogatório on-line e as características oriundas da lei 11.900/09 sancionada pelo Presidente da República. Posteriormente, foi realizado um paralelo entre os doutrinadores que apóiam e que são contra ao uso da videoconferência, fazendo uma defesa do uso do sistema dentro do ordenamento jurídico brasileiro. No próximo tópico, uma analise sobre os princípios constitucionais e uma defesa de forma sucinta, enquadrando o uso do sistema de acordo com os princípios, tais como: do devido processo legal, do contraditório e ampla defesa, da proporcionalidade, da imediação e da identidade física do juiz, do juiz natural, da publicidade, da dignidade humana e do acesso à justiça. Mais adiante é feito uma análise sobre a aplicação do sistema em outros países e um breve relato das experiências já realizadas no Brasil. A conclusão da presente pesquisa demonstra a legalidade, constitucionalidade e viabilidade da realização do interrogatório do réu à distância, proporcionando celeridade e economia à jurisdição, sem ferir os princípios constitucionais. A elaboração do trabalho foi embasada em pesquisas teóricas, envolvendo artigos, textos e notícias extraídos na Internet, em entrevistas, revistas jurídicas, jurisprudência e obras clássicas. Utilizou-se o método dialético dedutivo, partindo-se de um conhecimento geral, para atingir a especificação do tema.
Palavras-chave: Videoconferência. Lei 11.900/09. Interrogatório on-line. Constitucionalidade. Princípios constitucionais. Viabilidade. Legalidade.
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ABSTRACT
The goal of this research is to make an analysis on the use of videoconferencing in criminal process, especially in the interrogation of the accused, defending the constitutionality of the act. First, it was discussed the concept of videoconferencing, its historical evolution and structure required to implement the act. Then it passed to the definition of interrogation, the use of online interrogation and its characteristics derived from the law 11.900/09 sanctioned by the President. Later, it was performed a parallel between the scholars who support and oppose to the use of video conferencing, making a defense of the use of the system within the Brazilian law. In the next section, it analysis about the constitutional principles and a succinct defense, adjusting the use of the system in accordance with the principles, such as: give legal process, the contradictory and full defense, proportionality, and immediacy of the physical identity of the judge, the natural judge, the advertising, the human dignity and the access to justice. Further it is done an analysis about the implementation of the system in other countries and a brief report of the experiments already conducted in Brazil. The conclusion of this research demonstrates the legality, constitutionality and feasibility of conducting the interrogation of the defendant at a distance, providing speed and economy of jurisdiction, without hurting the constitutional principles. The preparation of this work was based on theoretical research involving articles, papers and news taken from the Internet, interviews, legal journals, jurisprudence and work of masters. It was used the dialectical method deductive, starting from a general knowledge, to achieve the specification of the subject.
Key-words: Videoconferencing. Law 11.900/09. Online interrogation. Constitutionality,.Constitutional principles. Viability. Legality.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 102 VIDEOCONFERÊNCIA 122.1 CONCEITO 122.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA 142.3 TECNOLOGIA E A ESTRUTURA DAS SALAS DE
VIDEOCONFERÊNCIAS
15
2.3.1 Equipamentos, softwares e segurança no uso da
videoconferência
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3 O INTERROGATÓRIO 203.1 CONCEITO 203.2 O INTERROGATÓRIO ON-LINE 223.2.1 Lei 11.900/09 254 POSICIONAMENTOS DOUTRINÁRIOS 274.1 POSIÇÃO CONTRÁRIA 284.2 POSIÇÃO FAVORÁVEL 305 A CONSTITUCIONALIDADE DA VIDEOCONFERÊNCIA 365.1 A HARMONIA COM OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS 365.1.1 Princípio do devido processo legal 375.1.2 Princípio do contraditório e ampla defesa 385.1.3 Princípio da proporcionalidade 395.1.4 Princípio da imediação e da identidade física do juiz 405.1.5 Princípio do juiz natural 425.1.6 Princípio da publicidade 435.1.7 Princípio da dignidade humana 435.1.8 Princípio do acesso à justiça 446 USO DA VIDEOCONFERÊNCIA EM OUTROS PAÍSES 46
CONCLUSÃO 48REFERÊNCIAS 50ANEXO 53
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1 INTRODUÇÃO
Este trabalho tem como objetivo realizar um aprofundamento sobre o uso da
Videoconferência no Processo Penal Brasileiro, de acordo com a lei 11.900 que
entrou em vigor no dia 09 de janeiro de 2009. Tal lei sancionou as novas regras do
interrogatório presente no nosso ordenamento jurídico, permitindo assim, o uso da
videoconferência na esfera criminal.
A alteração do Decreto-Lei 3.689/41 – Código de Processo Penal Brasileiro –
representa um grande avanço no intuito de agilizar o andamento da Justiça Criminal,
tendo como fatores notáveis a diminuição de gastos públicos e o risco
desnecessário gerado no transporte de presos pertencentes a facções criminosas.
Apesar de existirem diversos pontos favoráveis na utilização da
videoconferência, ainda possuem correntes contrárias a sua aplicação. É de se
considerar que um tema novo gere barreiras, mas tais divergências não podem
impedir que a justiça brasileira evolua e acompanhe a modernidade global.
Nesse contexto, a questão problema que orienta a pesquisa é a
constitucionalidade do uso da videoconferência no Processo Penal Brasileiro. Ora,
se além de inúmeras vantagens existentes na utilização do interrogatório on-line e
de todos os princípios constitucionais serem garantidos, por que deveríamos nos
privar de tal evolução tecnológica?
Dessa forma, o estudo trabalha com a hipótese de que, com a aprovação da
Lei 11.900/09, com todos os princípios constitucionais referentes ao interrogatório
sendo seguidos e respeitados, doutrinas e direito comparado favoráveis e a real
legalidade na utilização da tecnologia no nosso judiciário.
Sendo assim, o objetivo geral do trabalho é identificar os pontos favoráveis do
uso da videoconferência na Justiça Criminal, discutindo os princípios constitucionais
e defendendo-os dentro do ordenamento jurídico.
A aprovação do dispositivo legal, Lei 11.900/09 veio para alterar o Código de
Processo Penal Brasileiro, legalizando o uso da videoconferência no interrogatório.
Como técnicas de pesquisa, utilizou-se pesquisa bibliográfica, como livros,
artigos científicos impressos e de meios eletrônicos, legislação e jurisprudência com
a finalidade de proporcionar melhores e mais precisas informações sobre o tema.
O texto está dividido em seis partes, além da introdução:
10
No primeiro capítulo é abordado o conceito e a evolução da videoconferência.
Em seguida, o interrogatório on-line e suas características, de acordo com a
Lei de Videoconferência.
No terceiro capítulo, são apresentadas as posições dos doutrinadores sobre o
presente assunto.
No capítulo quatro, são expostos os princípios fundamentais da constituição,
em harmonia com a Lei 11.900/09.
No capítulo seguinte, os tratados internacionais que permitem a utilização da
tecnologia.
No penúltimo tópico, traz relatos das experiências de teleaudiências
realizadas no Brasil.
E, por fim, a conclusão sobre o trabalho de pesquisa.
11
2 VIDEOCONFERÊNCIA
2.1 CONCEITO
Videoconferência nada mais é que um sistema que permite uma discussão
em grupo ou pessoa-a-pessoa, situadas em locais diferentes, que através da
tecnologia podem ver e ouvir uns aos outros como se estivessem todos no mesmo
local.
Moraes Filho (2003, p. 19-20), com base na União Internacional de
Telecomunicações (International Telecommunication Union/Telecommunication
Standardization Sector – ITU), define a videoconferência como:
Um serviço de teleconferência audiovisual de conversação interativa que prevê uma troca bidirecional e em tempo real, de sinais de áudio (voz) e vídeo (imagem), entre grupos de usuários em dois ou mais locais distintos.
Os sistemas de videoconferência permitem a comunicação em tempo real
entre grupos de pessoas, em locais distintos, simultaneamente, possibilitando o
compartilhamento de informações e dados sem que haja um contato físico entre os
participantes.
Devido à confusão existente na distinção de teleconferência, audioconferência
e videoconferência, faz-se necessário uma breve conceituação de cada um dos
termos. Segundo Fioreze (2009, p. 55):
A teleconferência é uma comunicação a distância de uma maneira combinada, compreendendo a telefonia e a televisão, através de uma comunicação via satélite. É o que ocorre na maioria dos ensinos ministrados a distância. A audioconferência é a realização de uma conferência através de áudio (telefone ou celular). A videoconferência é a comunicação interativa nos dois sentidos, utilizando áudio e vídeo.
A estrutura para a realização de uma videoconferência se baseia na
existência de uma sala, sendo cada uma em localidade distinta, equipada de uma
câmera de vídeo (para captação de imagem); microfones (para a captação de
áudio); TV ou telão (para acompanhar sons e imagens vindas do outro ponto); um
codec (aparelho encarregado de codificação/descodificação dos sinais de som e
12
imagem para serem transmitidos a um outro ponto); um modem (que recebe os
sinais digitais, transforma em sinais analógicos e os transmite para outro modem;
uma conexão ISDN (ou outro meio de transmissão); uma interfase usuária (controles
automáticos, teclados, aparelho de fax, etc.); e câmera de documentos (para
scannear documentos e transmiti-los ao receptor).
Devido à modernização tecnológica, tem se tornado viável o uso da
videoconferência através de desktop, sem que tenha a necessidade de utilizar o
sistema de conferência em salas especiais, com equipamentos específicos, sendo
necessária a adaptação dos desktops com a inclusão de software e hardware nos
computadores pessoais.
Defendendo o quesito da segurança das informações e transferências de
dados no sistema de videoconferência, para Amorim (2009):
[...] a segurança das informações é caracterizada pela preservação da confidencialidade, para garantir que as informações sejam acessíveis apenas àqueles usuários, autorizados a terem acessos, através de métodos de autenticação, autorização e responsabilização[...].
Esclarecido o conceito de videoconferência, é mister e notório um breve relato
sobre a aplicação da tecnologia dentro do ordenamento jurídico. Aras (2005) expõe
as seguintes formas de intervenções processuais:
a) teleinterrogatório, para tomada de declarações do indiciado ou suspeito, na fase policial, ou do acusado ou réu, na fase judicial;b) teledepoimento, para a tomada de declarações de vítimas, testemunhas e peritos;c) telerreconhecimento, para a realização de reconhecimento do suspeito ou do acusado, a distância, ato que hoje já se faz com o uso de meras fotografias;d) telessustentação, ou sustentação oral a distância, perante tribunais, por advogado, defensores e membros do Ministério Público;e) telecomparecimento, mediante o qual as partes ou seus advogados e os membros do Ministério Público acompanham os atos processuais a distância, neles intervindo quando necessário;f) telessessão, ou reunião virtual de juízes integrantes de tribunais, Turmas Recursais ou Turmas de Uniformização de Jurisprudência;g) telejustificação, em atos nos quais seja necessário o comparecimento do réu perante o juízo, como em casos de sursis processual e penal, fiança, liberdade provisória, etc.
Os demais requisitos, tecnologias, segurança das transmissões e estruturas
necessárias para a utilização das salas de teleaudiências serão abordadas
posteriormente.
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2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
Os seres humanos sempre tiveram a necessidade de se comunicar. Desde os
primórdios da humanidade existe essa busca pela comunicação através de sons,
imagens e escrita.
Com o decorrer dos anos e com a evolução da raça humana, os meios de
comunicações deixaram de ser somente através do contato físico entre pessoa-a-
pessoa e começou a conquistar mecanismos que permitiam a interação entre
pessoas em localidades geográficas distintas.
Paiva Rodrigues (2007), diz:
A comunicação é um marco histórico que revolucionou o mundo. Desde os primatas, até os dias atuais. A tecnologia avançou a passos largos. A comunicação teve seu contributo na medida em que o tempo passava, ela estava sempre presente. Foi e continua sendo o viés mais importante da evolução humana, fez o grande diferencial entre o ontem e o hoje. Será a mola propulsora entre o hoje e o amanhã. Será uma grande força contributiva de um futuro bem próximo.
Em 1960, surge a videoconferência utilizando conexão ponto-a-ponto,
permitindo o uso de áudio e vídeo. Entretanto, tal tecnologia possuía um valor de
elevado custo, sendo possível a sua utilização em salas especiais. Já em 1964,
surge em Nova York, o primeiro telefone com imagem, porém, naquela época não
despertou muita curiosidade pelo fato de ser algo inovador.
Vale ressaltar que é da natureza humana a existência de rejeição de novas
tecnologias ao primeiro momento. Isso pode ser observado no surgimento do
telefone, da máquina de escrever, do fax, do computador, da internet, da
videoconferência etc. Rejeições essas notórias no ordenamento jurídico.
Leal apud Fioreze (2009, p. 73) que cita o professor Jorge Americano, ao
fazer uma crítica referente à possibilidade da sentença ser datilografada pelo Juiz:
A sentença deve ser escrita do próprio punho, datada e assinada por seu prolator. São considerados essenciais estes requisitos, porque servem para fiscalizar a autenticidade da sentença e, ao mesmo tempo, assegurar o sigilo que sobre ela se deve manter até a respectiva publicação. É essencial, para a dignidade da magistratura, que o juiz mantenha sigilo quanto à sua opinião sobre a demanda, até o momento de lavrar a sentença. Qualquer conversação sobre ela travada conduzirá à discussão com as partes, com grave prejuízo da austeridade a até da honra do
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magistrado [...] Ora, permitir que a sentença seja datilografada é tolerar o seu conhecimento pelo datilógrafo, antes de publicada. É certo que a sentença, enquanto em estado de rascunho, pode ser modificada, e só adquire força depois de publicada. Basta uma hesitação por parte do juiz, em presença do datilógrafo, um erro que corrija, uma modificação que introduza, para criar no espírito desse auxiliar uma suspeita sobre a integridade do juiz ou, quando tal não se dê, trazer a público incidentes curiosos ou anedóticos quanto à maneira de lavrar a sentença. [...] Eis porque parece mais sábio manter a tradição, segundo o qual o juiz lavra, data e assina a sentença do próprio punho.
O sistema de videoconferência surgiu com objetivo de permitir a comunicação
em tempo real, entre pessoas em pontos distantes uma das outras, sendo assim,
permitido a troca de imagem e áudio entre os participantes.
No Brasil, o judiciário tem se rendido a implantação da tecnologia da
videoconferência, sendo que em 1996 foi realizada a primeira videoconferência de
um interrogatório, presidido pelo juiz de direito, Doutor Edison Aparecido Brandão,
titular da primeira Vara Criminal da cidade de Campinas/SP. Posteriormente, em
2002, o Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba foi o primeiro a adotar,
oficialmente, a videoconferência.
Sábias são as palavras de Pinto (2006) ao defender as evoluções alcançadas
na espera judicial:
Quem sabe se ao final deste século, a resistência quanto à implantação de modelos modernos, capazes de agilizar a justiça (como a experiência do interrogatório a distância), não servirá, apenas, como um capítulo pitoresco de nossa história (...).
Com a aprovação da Lei 11.900/09, espera-se que o sistema de
videoconferência evolua cada vez mais, possibilitando novos recursos e qualidades
superiores aos existente no momento e, com isso, os contrários à utilização de tal
recurso plausível, se rendam e passem a aceitar a tecnologia ao seu favor e a favor
da justiça.
2.3 TECNOLOGIA E A ESTRUTURA DAS SALAS DE VIDEOCONFERÊNCIAS
Um dos primeiros depoimentos tomados de um acusado no Brasil ocorreu em
1996, na comarca de Campinas/SP, pelo juiz de Direito Dr. Edison Aparecido
15
Brandão. A audiência foi realizada através de e-mail, através da digitação de
perguntas e das respostas no comunicador, sem a possibilidade de áudio e vídeo.
Obviamente, esta forma de interrogatório desrespeitava princípios
constitucionais, como contraditório e da ampla defesa, tendo em vista que o réu não
podia se defender simultaneamente, já que não existia a transmissão da imagem e
áudio do magistrado. Mesmo assim, as decisões tomadas pela comarca do interior
de São Paulo foram aceitas como válidas.
Atualmente, a videoconferência tem sido utilizada na esfera Jurídica e, para
isso, é necessário que haja uma estrutura nas instalações físicas do fórum e de uma
sala específica dentro do presídio, contendo os equipamentos que possibilitem o uso
do sistema e as demais exigências para a realização de um interrogatório à
distância.
A videoconferência já está funcionando em várias regiões do país, e com a
aprovação da Lei 11.900/09, a tendência é que haja uma expansão ainda maior em
todos os tribunais e prédios penitenciários.
A seguir serão abordados os equipamentos, softwares e a segurança
existente no uso da videoconferência. Tal tópico se faz necessário para que haja
uma melhor compreensão do trabalho de pesquisa, mas as questões técnicas não
serão aprofundadas e discutidas, pois se trata de méritos de especialistas da área
de tecnologia.
2.3.1 Equipamentos, softwares e segurança no uso da videoconferência
O uso da videoconferência pode ser considerado um meio seguro de sistema
de transmissão à distância, já que é possível a codificação das mensagens,
assegurando assim o sigilo das comunicações realizadas em audiências.
É necessária a existência de canais reservados e seguros para a
comunicação entre o réu e o seu advogado, protegendo as confidências e o sigilo
profissional dos dois.
Além da segurança, outros requisitos para a realização da videoconferência
são equipamentos e softwares de alta tecnologia, a fim de que se tenha uma boa
transmissão durante as audiências.
16
As salas de videoconferências deverão ser equipadas com:
• uma câmera de vídeo (para captação de imagem);
• microfones (para a captação de áudio);
• TV ou telão (para acompanhar sons e imagens vindas do outro ponto);
• um codec (aparelho encarregado de codificação/descodificação dos sinais
de som e imagem para serem transmitidos a um outro ponto);
• um modem (que recebe os sinais digitais, transforma em sinais analógicos
e os transmite para outro modem;
• uma conexão ISDN (ou outro meio de transmissão); uma interfase usuária
(controles automáticos, teclados, aparelho de fax, etc.);
• e câmera de documentos (para scannear documentos e transmiti-los ao
receptor).
Todos os equipamentos deverão ser classificados de acordo com a normas
ITU-T H323, seguindo especificações e medidas de codificações de vídeo, áudio e
sistemas de transferência de dados e controle de conexões em redes. (livro, página
55)
Meneses apud Fioreza (2010, p. 58), ao especificar as marcas mais utilizadas
no mercado para a realização de videoconferência que são:
• PictureTel: É uma das maiores empresas do mercado de videoconferência. Foi adquirida pela PolyCom em 2001 e possui:- Sistemas Compactos – Incluem câmera, microfone e vídeo, adequados para escritório ou pequena sala de conferência. Requer conexão PPP65 ou Lan66 e um monitor de TV normal;- Sistemas Desktops – possibilitam videoconferências em redes Windows67, compatíveis com H.230 e H.232. O sistema opera a 30frames68 por segundo e numa velocidade em média de 600kbps (mínima);- Sistemas de Grupo – Permitem a realização de videoconferência em grandes corporações.
• Intel: Oferece uma linha de produtos variada que suporta tanto a comunicação individual quanto a conferência em grupo (em associação com a PictureTel). Segundo o fabricante, os seus sistemas oferecem as facilidades de comunicação com alta qualidade de vídeo.
• VTEL: Foi uma das primeiras empresas em videoconferência. Fornece uma plataforma multimídia interativa e cooperativa, permitindo a realização de videoconferência associadas a compartilhamento de documentos, apresentações, planilhas eletrônicas ou outros arquivos eletrônicos. Sua linha de produtos vai desde aplicações desktop até sistemas para grandes grupos.
• VCON: É uma empresa norte-americana e foi adquirida pela VTEL. Oferece sistemas aptos para operação tanto em redes IP, quanto PPP, sendo que permite a muulticasting interativo em protocolo H323
17
(videoconferência em IP), além de dispor também do protocolo H320 (videoconferência em ISDN). Esta tecnologia permite que um único estúdio de geração faça streaming de multicasting para até 90 salas, com a mesma qualidade, permitindo também a interação.
Para completar a lista das ferramentas necessárias para a realização da
videoconferência, temos os softwares que, nada mais são, os aplicativos usados em
computadores, possibilitando assim a ligação entre dois ou mais computadores. Os
mais utilizados são:
• Microsoft NetMeeting: O NetMeeting permite que o usuário troque
informações utilizando recursos de áudio e vídeo. Foi desenvolvido pela
Microsoft e utiliza o padrão H.323. A comunicação pode ser ponto a ponto ou
multiponto. Permite utilizar recursos de quadro branco (whiteboard) eletrônico;
possui serviço de chat, compartilhamento de recursos e envio de arquivos
durante uma videoconferência;
• CuSeeMe: A CuSeeMe Networks desenvolve e comercializa softwares
multiplataformas para comunicação remota em redes de curta e longa
distância que utilizam o Internet Protocol (IP). Essa comunicação se efetiva
através do tráfico de multimídia (áudio, vídeo e texto), viabilizando sessões de
videoconferência multiponto, ou seja: diversos participantes interagindo
mutuamente. A principal solução da empresa implementou uma estrutura
cliente-servidor, onde os usuários estabelecem sessões de videoconferência,
sendo que a ferramenta de videoconferência CuSeeMe é um dos mais
populares aplicativos, e um dos pioneiros a oferecer solução para
videoconferência;
• MeetingPoint: O MeetingPoint foi desenvolvido pela First Virtual
Communication e utiliza o padrão H.323, mas funciona somente em conexão
multiponto. Esse software permite uma interoperacionalização com outros
fabricantes como Microsoft, PictureTel, Polycon, Vtel, ou qualquer outro
cliente H.323 e também cliente VoiP. Uma vez conectado, é possível receber
e enviar vídeo e áudio, utilizar chat para conversar e ainda compartilhar
documentos e gráficos em um quadro de comunicações eletrônico e
interativo, permitindo visualizar simultaneamente vários usuários conectados.
18
De uma forma simplificada, não entrando em mais detalhes no quesito
informática e tecnologia, a videoconferência se dá através da utilização desses
recursos básicos abordados. Obviamente, cabe aos especialistas da área de
informática dos tribunais solucionar e aperfeiçoar as questões técnicas, não cabendo
ao operador de Direito se prender em discussões técnicas de informática.
19
3 O INTERROGATÓRIO
3.1 CONCEITO
Segundo Romero (1942, p. 44):
O interrogatório é um ato judicial, presidido pelo juiz, em que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele, advindo de uma queixa ou denúncia, dando-lhe ciência, ao tempo em que oferece oportunidades de defesa.
Tem como características: pessoalidade, judicialidade, oralidade e a
publicidade.
O interrogatório é considerado personalíssimo porque somente o acusado
poderá ser interrogado, não podendo ser representado por outra pessoa;
judicialidade, pois cabe somente ao juiz interrogar o acusado; o interrogatório além
de ser pessoal, deve ser oral, daí a oralidade. O juiz faz as perguntas e o acusado
responde, sendo as respostas ditadas ao escrivão pelo magistrado, sendo
registradas na ata; e o ato deve ser público, respeitando a publicidade, exceto
quando as circunstâncias determinarem o sigilo processual.
No entendimento de Mirabete (2008, p. 272):
A audiência de interrogatório constitui ato solene, formal, de instrução, sob a presidência do juiz, em que este indaga do acusado sobre os fatos articulados na denúncia ou queixa, deles lhe dando ciência, ao tempo em que lhe abre oportunidade de defesa.
O interrogatório é considerado como meio de prova e, também pode ser
atribuído como meio de defesa, onde poderá ser ouvido pelo juiz sobre o assunto
que lhe é indiciado e ao mesmo tempo, o magistrado colhe dados para o seu
convencimento.
Os doutrinadores que defendem o interrogatório como meio de prova
baseiam-se no fato do ato estar disposto no capítulo referente a Provas no Código
de Processo Penal (capítulo III do título VII do Livro I, artigos 185 a 196). Já os que
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defendem como meio de defesa, levam em consideração o direito constitucional de
o réu permanecer em silêncio.
Conforme artigo 186, § único do Código de Processo Penal “O silêncio, que
não importa em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa”.
O interrogatório é dividido em duas fases. No primeiro momento, o magistrado
fará as perguntas relacionadas à qualificação e a personalidade do acusado, sendo
que posteriormente, serão feitas perguntas sobre o mérito.
Essa primeira fase é importante para um melhor conhecimento sobre a
personalidade do acusado, e de grande relevância para a fixação da pena, sendo
decidido o tipo de pena a ser aplicada.
Durante o interrogatório, o juiz deverá seguir um rol exemplificativo de
perguntas estabelecidas pelo Código de Processo Penal, após a sua qualificação.
Neste momento, o réu poderá exercer sua autodefesa.
Artigo 187, §2º do CPP. in verbis:
§ 2º Na segunda parte será perguntado sobre: I - ser verdadeira a acusação que lhe é feita; II - não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela;III - onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta;IV - as provas já apuradas;V - se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e se tem o que alegar contra elas;VI - se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido;VII - todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;VIII - se tem algo mais a alegar em sua defesa.
Importante considerar ainda, que o acusado não está obrigado a dizer a
verdade acerca dos fatos. A mentira não lhe acarreta sanção alguma.
O momento da realização dependerá do rito estabelecido para o julgamento
do ato ilícito.
No antigo rito ordinário o interrogatório era o primeiro ato processual
realizado, sendo feito logo após a denúncia do réu. Com as alterações da lei
11.719/08, o interrogatório passou a ser realizado na instrução, depois da oitiva do
ofendido, das testemunhas e dos peritos.
21
Essa alteração acabou por confirmar o interrogatório como forma de defesa
do réu, já que após todos os atos processuais ele poderá se defender das
acusações.
O interrogatório deverá ser realizado na sede do juízo, de acordo com o artigo
792, “caput”, do Código de Processo Penal. Em casos excepcionais, poderá ser
realizado no presídio onde o réu encontrar-se preso.
Consagrando o princípio da ampla defesa, a lei processual penal garante ao
acusado entrevista reservada com seu defensor antes da realização do
interrogatório.
O art. 185, § 2º, do CPP, prevê que “Antes da realização do interrogatório, o
juiz assegurará o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor”.
Concluindo, o interrogatório é um ato processual estritamente necessário. A
necessidade vem da importância da verificação pelo juiz da personalidade do
interrogado e dos motivos e circunstâncias do crime.
Após esta breve demonstração do que vem a ser o interrogatório
propriamente dito e de suas características, passa-se agora as explicações do que
chamamos de espécie do interrogatório, o Interrogatório por videoconferência.
3.2 O INTERROGATÓRIO ON-LINE
O interrogatório on-line teve seu surgimento devido à dificuldade de
movimentar os presos a serem ouvidos nos fóruns.
Segundo Fioreze (2009, p. 114):
O interrogatório on-line é um ato judicial, presidido pelo juiz, em que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele, advindo de uma queixa ou denúncia, dando-lhe ciência, ao tempo em que oferece oportunidade de defesa, realizado através de um sistema que funciona com equipamentos e softwares específicos.
E continua:
Trata-se de um interrogatório realizado a distância, ficando o juiz em seu gabinete no fórum e o acusado em uma sala especial dentro do próprio presídio, onde há uma interligação entre ambos, por meio de câmeras de
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vídeo, com total imagem e som, de modo que um pode ver e ouvir perfeitamente o outro.
A realização de interrogatórios por meio de videoconferência representa
importante instrumento de agilidade e desburocratização da Justiça, amparada pela
Convenção de Palermo. Para Brandão apud Cardoso Neto (2009):
Essa modalidade de interrogatório consiste na oitiva de do réu, preso ou solto, no local onde se encontra, diverso do local do distrito da culpa (comarca onde está sendo processado), na fase policial ou judicial.
O juiz, em seu gabinete ou em uma sala preparada dentro do fórum de sua
comarca, realiza o interrogatório, fazendo perguntas ao acusado. Nesse momento,
os dois, presentes em locais distintos, podem realizar um diálogo através de som e
imagem, em tempo real.
O acusado, localizado dentro da penitenciária, em sala preparada e equipada
com monitores de vídeo, câmeras, microfones e demais equipamento necessários
para a realização da videoconferência, acompanhado de agentes penitenciários,
oficial de justiça e advogado.
Durante a realização do interrogatório on-line, o magistrado terá em seu poder
todo o controle do sistema, podendo monitorar a direção das câmeras instaladas na
sala de transmissão dentro do presídio, enquadrando o preso, seu advogado, ou
outra pessoa presente no momento do ato. Do outro lado, o acusado terá uma visão
nítida e perfeita do magistrado.
Ao final da audiência, o termo da audiência é enviado direto para a
impressora localizada dentro do presídio, possibilitando assim a leitura de tudo o
ocorrido durante o interrogatório, sendo lida e assinada o documento. Em sequência,
esse termo é encaminhado para a câmara de documentos, que o digitaliza e envia
para o Fórum da Comarca, onde o juiz e as partes firmam o termo, sendo anexado
ao processo em seguida. Também existe a possibilidade do termo ser encaminhado
através de malote, para o Fórum da Comarca, onde será juntado aos autos.
Para que haja uma maior segurança e garantia no momento da assinatura do
termo, uma câmera captara esse momento em que os presentes no Fórum da
Comarca e os presente na penitenciária assinem o documento com segurança.
Esse sistema de videoconferência também permite que o interrogatório seja
registrado em Cd-Room ou outra ferramenta que possibilite a armazenagem de
23
dados, podendo ser juntado aos autos, ficando a disposição das partes e do
magistrado à qualquer tempo no decorrer do processo.
O acusado será acompanhado de um advogado ou um defensor público,
sendo que a presença deste é exigida nos dois ambientes, ou seja, tanto na sala do
Fórum, na presença do juiz, quanto na sala de videoconferência instalada dentro do
complexo penitenciário.
Todo o diálogo entre o acusado e seu defensor será sigiloso através de uma
linha telefônica direta, onde poderão manter contato sempre que for necessário.
Na Palavras de Ana Cláudia da Silva Bezerra (2005), o interrogatório on-line
funciona da seguinte forma:
O interrogatório on line é um ato judicial, presidido pelo juiz, em que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele advindo de uma queixa ou denúncia, dando-lhe ciência ao tempo em que oferece oportunidade de defesa, realizado através de um sistema que funciona com equipamentos e software específicos.
E continua:
No interrogatório on line, câmeras e recepção de áudio podem ser monitorados por controle remoto, identificando os presentes em cada sala. A conexão é via linha telefônica, com Redes ISDN (Integrated Services Digital Network) que formam uma conexão de 512 Kbps (quilobit por segundo).
O uso da videoconferência no interrogatório on-line proporciona uma maior
celeridade e economia no Processo Penal Brasileiro, possibilitando a solução e a
justiça com a maior rapidez e eficiência.
Salienta a posição de Vargas (1989, p. 46):
É importante garantir o início e o fim do processo em tempo satisfatório, razoável, de tal maneira que a demora não sufoque o direito ou a expectativa do direito. (...) Não se deve, pois, entender o acesso à Justiça como o mero ingresso em Juízo, mas, também, como garantia de uma Justiça rápida e eficiente, com uma ordem jurídica justa. Se o Estado se comprometeu a dar a resposta, deverá dá-la efetivamente.
E é isso que o sistema da videoconferência vem proporcionar, uma maior
agilidade e rapidez na Justiça Brasileira, principalmente na esfera criminal, onde os
processos se arrastam por longos anos.
24
Pensando nisso, primeiro interrogatório por videoconferência realizado no
Brasil foi em 27 de agosto de 1996, em Campinas, interior de São Paulo, realizada
pelo Juiz de Direito Edison Aparecido Brandão.
3.2.1 Lei 11.900/09
A lei 11.900/09, sancionada pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da
Silva é resultado da aprovação do Projeto de Lei 4361/08, de autoria do senador
Aloizio Mercadante, projeto que surgiu da união de outros dois Projetos de Lei:
Projeto 139/06 e Projeto de Lei 679/07.
O texto da nova lei autoriza o uso da videoconferência no processo penal ou
outro recurso de transmissão de sons e imagens em tempo real. Tal procedimento
só deverá ser usado em caso excepcionais e autorizado pelo juiz, como: para
prevenir risco à segurança pública; quando o réu estiver com dificuldade de
locomoção; para impedir a influência do réu sobre a testemunha ou vítima; e
responder à gravíssima questão de ordem pública.
Segundo Damásio (2009, p. 29):
A lei federal que autoriza esse sistema – Lei nº 11.900, de 8 de janeiro de 2009, em vigor desde o dia 9 daquele mês – representou, a meu ver, notável avanço no sentido de modernizar e agilizar a prática da Justiça Criminal, evitando gastos e riscos desnecessários, com deslocamento de presos de alta periculosidade.
A respeito da aprovação da lei, Guilherme de Souza Nucci (2009, p. 20), Juiz
de Direito diz:
Não há duvida de que, após vários anos de lacuna legislativa, provocando inúmeras decisões judiciárias contraditórias – ora aceitando, ora rejeitando esse método de inquirição – estamos diante de um sistema inédito no direito brasileiro, ao menos na esfera criminal. Inexiste dúvida, igualmente, que a questão ora tratada na novel lei conduzirá os tribunais pátrios a debater a constitucionalidade do procedimento.
Para a realização da videoconferência, o réu deverá ser intimado com dez
dias de antecedência. Antes do ato do interrogatório, é permitido ao acusado que
acompanhe todos os outros atos processuais através do novo sistema. A sala da
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videoconferência será fiscalizada pelo juiz da causa, pelo Ministério Público e pela
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). A lei ainda autoriza que o réu e seu
defensor tenham um telefone reservado para poderem conversar de forma sigilosa.
De forma suscita, essas foram às alterações trazidas pela Lei 11.900/09 ao
Código de Processo Penal brasileiro.
26
4 POSICIONAMENTOS DOUTRINÁRIOS
A adoção da videoconferência no ordenamento jurídico brasileiro ainda é
motivo de muitas discussões entre os operadores de direito. Anterior a janeiro de
2009, o tema era atacado devido ao fato de não existir uma legislação específica
sobre o assunto, sendo, posteriormente, sancionada a Lei 11.900/09 permitindo o
uso da videoconferência, contrariando assim, os que não concordavam com o uso
do sistema.
Outros encontravam nos Princípios Constitucionais lacunas para atacar o uso
da videoconferência, afirmando que a mesma não estaria respeitando tais
fundamentos constitucionais.
Conforme Martins apud Cardoso Neto (2009):
Os anais da ciência jurídica ensinam que a adoção de novas tecnologias sempre é marcada e precedida de períodos traumáticos, repletos de acalorados debates, que, em um primeiro momento podem encontrar eco na doutrina, mas logo se tornam superados pelo bom senso e pelo predomínio de uma nova e irresistível realidade social.
Como é notório no histórico da evolução tecnológica que atingiu o meio
judiciário no decorrer dos anos, tudo que revolucionava e trazia novidades era
encarado como prejudicial para a Justiça, como foi na implantação de fac-símile,
máquina de datilografar, computador e outros recursos adotados.
Em pronunciamento sobre a videoconferência, Damásio (2009, p. 29) diz:
Pronuncio-me, e já o fiz várias vezes nos últimos anos, em favor da utilização do moderno sistema de videoconferência para interrogatórios e outros atos judiciais em ações penais, sem a presença física do juiz e do réu na mesma sala. Os interrogatórios são realizados mediantes “teleaudiências”. Nestas, os réus, sem sair do local em que estão detidos, podem, em tempo real, comunicar-se livremente com o juiz, o promotor e com seus advogados. Cada um vê e é visto pelos demais em telas com suficiente nitidez para que até expressões faciais fiquem perceptíveis. Os acusados dispõem, ademais, de canal de comunicação exclusivo e sigiloso com seus advogados, tudo de moldes a lhes garantir plenamente os direitos individuais fixado pela Constituição Federal.
Assunto polêmico, tema recente! Posições favoráveis e contrárias sobre o uso
da videoconferência são extensas. É necessário que haja uma maior aceitação a
27
respeito do assunto, fazendo uma crítica no intuído de aperfeiçoar, não
possibilitando assim a existência de falhas no sistema.
Destacaremos agora os principais argumentos geradores das posições
contrárias e favoráveis a respeito do uso da videoconferência na Justiça brasileira.
4.1 POSIÇÃO CONTRÁRIA
São muitos os juristas contrários a utilização da videoconferência no
interrogatório, sendo que alguns até aceitam o uso do sistema em outros
procedimentos judiciais. Na lista dos órgãos que mais se opõem ao uso do
interrogatório on-line temos: A Ordem dos Advogados do Brasil – São Paulo, OAB
Nacional, Associação dos Juízes para a Democracia e o Instituto Brasileiro de
Ciências Criminais, que já encaminharam um requerimento ao Desembargador
Sérgio Augusto Nigro Conceição, Presidente do Conselho de Magistratura de São
Paulo, pedindo que o sistema não fosse aceito nos interrogatórios e audiências de
instruções naquele estado.
Baseados no “Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos” e pela
“Convenção Americana Sobre Direitos Humanos”, ambos adotados e aceitos no
Brasil, o réu têm o direito de ser conduzido à presença do juiz, não sendo aceito por
eles a comparação da condução do acusado em juízo à condução da imagem do
mesmo através da videoconferência.
Para Juliana Fioreze (2009, p. 126):
Os contrários ao interrogatório on-line entendem que o sistema ofende os princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa, e do devido processo legal, violando, ainda, pactos internacionais que impõem a apresentação do acusado ao juiz. Preceituam que o interrogatório do réu no processo penal, como expressão maior da garantia constitucional, pressupõe o exercício do direito de presença e do direito de audiência. Deve ser realizado com a garantia da meio liberdade possível, para que o acusado possa se dirigir diretamente ao juiz e dizer tudo quanto queira sobre as imputações que lhe são feitas.
Muitos acreditam que a falta de contato físico entre o juiz e o réu torna o
interrogatório um momento frio, sem o contato ‘olho a olho’ e a posição firme na
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entonação da voz do magistrado ao realizar as perguntas e do réu ao respondê-las.
D’Urso (2004) diz:
A ausência da voz, do corpo e do ‘olho no olho’, redunda em prejuízo irreparável para a defesa e para a própria Justiça, que terá de confiar no Diretor do presídio ou n’outro funcionário, que fará a ponte tecnológica com o julgador.
Nesse sentido, Dotti apud Fioreze (2009, p. 135) também se posiciona:
É necessário usar a reflexão como contraponto da massificação. É preciso ler nos lábios as palavras que estão sendo ditas, ver a alma do acusado através dos seus olhos, descobrir a face humana que se escondera por trás da máscara do delinqüente. É preciso, enfim, a aproximação física entre o Senhor da Justiça e o Homem do Crime, num gesto de alegoria que imita o toque dos dedos, o afresco pintado pelo Gênio Michelangelo na Capela Sistina da criação de Adão.
O fato do acusado não sair do presídio e ir até o fórum para a realização do
interrogatório e não ter um contato físico com o juiz, acaba ressaltando outro ponto
negativo à respeito da coação que ele poderia sofrer dentro do próprio complexo
penitenciário. Essa coação poderia partir de companheiros de cela e até mesmo de
agentes penitenciários ou outro funcionário presente naquela instituição.
O medo de que o réu esteja sofrendo agressões e torturas e até mesmo
ameaça e, por este fato fique coagido de realizar um interrogatório em perfeito
estado psicológico, estando emocionalmente comprometido para se defender das
acusações que esteja sofrendo é um outro ponto preocupante para os que são
contra ao uso da videoconferência.
Ora, imagine que o réu, em meio ao interrogatório on-line precise indicar um
comparsa, ou até mesmo que se isente da prática de um crime, denunciando
alguém que tenha realmente cometido o crime pelo qual está sendo acusado. Esse
réu conseguiria chegar vivo na sua cela de origem? Suponha-se também que o
interrogado esteja sendo vítima de maus tratos no cárcere, sendo violentado por
funcionários públicos responsáveis pela sua integridade? Quais garantias ele teria
para informar essas agressões ao magistrado da causa?
Além de desrespeitar os princípios constitucionais do contraditório, da ampla
defesa, e do devido processo legal, fere o princípio da publicidade, já que o
interrogatório aconteceria dentro de uma sala, na própria penitenciária onde se
encontra o acusado.
29
Nesse quesito, Sérgio Marcos de Moraes Pitombo conforme o Ministro do
STF, Cézar Peluso (HC 88.914, Boletim IBCCRIM nº. 178 - Setembro / 2007):
A prática do interrogatório por meio de videoconferência viola, ademais, a publicidade que deve impregnar todos os atos do processo.“Ao devido processo penal importa a ampla publicidade dos atos, exibindo-se a restrição qual excepcionalidade (arts. 5º, inc. LX e 93, inc. IX, da Constituição da República, e, ainda, art. 792, caput, do Código de Processo Penal). As exceções, agora apontadas na Lei Maior, são: defesa da intimidade, interesse social e interesse público. O interesse público limita-se ao ‘escândalo, inconveniente grave, ou perigo de perturbação da ordem’ (art. 792, § 1º, do Código de Processo Penal).A publicidade ativa, imediata, externa, ou direta permite que qualquer do povo presencie o ato processual, ou dele tome conhecimento. Às pessoas que assistem, a lei do processo denominou espectadores (art. 793, 1ª parte e 795, do Código de Processo Penal). À evidência, não se dará acesso à carceragem, para tais pessoas. Reduz-se a publicidade e sem amparo constitucional”. (grifo do autor).
Portanto, pelos argumentos observados acima, alguns juristas não concordam
com o uso da videoconferência no interrogatório, já que o mesmo violaria os
princípios fundamentais da Constituição Federal, tais como: princípio da publicidade,
do contraditório e da ampla defesa e do devido processo legal; a possível coação
sofrida pelo acusado dentro do estabelecimento prisional; a falta do contato físico
entre o juiz e o réu.
4.2 POSIÇÃO FAVORÁVEL
Com o decorrer dos anos e a evolução da sociedade, com o surgimento de
novas tecnologias e suportes avançados, proporcionando a todos um melhor
conforto de vida e mais facilidade no dia-a-dia, não seria admissível que sistema
judiciário brasileiro ficasse para trás, não aproveitando tudo que a globalização pode
oferecer.
É notório no transcorrer dos anos, como a evolução tecnológica atingiu a
Justiça brasileira, causando grandes alvoroços aos serem implantados
equipamentos eletrônicos, tais como: máquina de datilografia, fax, computador e
agora o sistema de videoconferência.
30
A respeito dessa visão, Brandão (2008), com brilhantismo, defende a
videoconferência:
O conservadorismo de alguns juristas e o apego aos velhos formalismos são males da própria ciência do direito. Tanto é, que anularam as primeiras sentenças datilografadas – uma verdadeira inovação para época – e, mais recentemente, as digitadas em computador (desta eu não escapei; também tive sentenças anuladas por tal motivo no final dos anos 80). Pergunta simples: muitos dos desembargadores e ministros que anularam sentenças digitadas em computadores e que ainda judicam anulariam hoje uma sentença ou todas as sentenças só porque digitadas? Todos perderam o medo do novo e tiveram que reconhecer as benesses advindas com os avanços tecnológicos, que engoliu medos e preconceitos, que dominou o apego aos formalismos. Acredito que o mesmo ocorrerá com a videoconferência judicial, embora com mais de uma década de atraso. Não importa, contanto que sejam debelados os sistemas do conservadorismo no direito.
Para Luiz Flávio Gomes (2003, p. 40), não se pode aceitar que a justiça fique
de fora da informatização e digitalização e diz:
Desde que tomadas às devidas cautelas e preservados os direitos e garantias fundamentais de todas as pessoas, não há como evitar que os recursos tecnológicos e informáticos sejam ampla e eticamente utilizados no âmbito do Judiciário. Eficiência e garantismo, esse é o binômio da Justiça do terceiro milênio.
Existe também a segurança que a videoconferência trás para a sociedade e
para o próprio acusado, já que não existindo a necessidade do deslocamento do
detento até o fórum para a realização do interrogatório, evita a exposição da
sociedade, pois grande parte desses réus são considerados perigosos e fazem parte
de crimes organizados.
E não só falando da segurança da sociedade, mas também do próprio
acusado que evita um contato com outras pessoas que podem ter uma reação de
protesto e acabar gerando qualquer tipo de violência contra esse detento.
Outro grande fator é a economia que isso gera para os cofres públicos. O
transporte de um detento para a realização de uma videoconferência, saindo da
penitenciária e indo para o fórum, que geralmente costuma ser em outra cidade,
longe do estabelecimento prisional, gera gastos com o transporte, alimentação,
suporte militar e, algumas vezes, até com alojamentos.
Segundo o Desembargador Rossi, do Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo apud Fioreze (2009, p. 167):
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[...] no período de 1 a 15.06.2003, foram realizadas 27.186 escoltas, 73.744 policias militares e 23.240 viaturas policias foram mobilizadas, gerando um gasto de R$ 4.572.961,94, dinheiro este que, com o uso da videoconferência na oitiva de delinqüentes, poderia estar sendo bem mais aplicado em outras áreas da Administração Pública.
Ainda por Fioreze (2009, p 168), em sua obra, cita trecho de matéria
publicada no jornal Estadão:
[...] em 2008, de acordo com a SSP, as polícias paulistanas fizeram 78.583 escoltas, com 186.437 presos para destinos diferentes, sendo que os policiais foram mobilizados 1000.859 vezes. Para isso, foram utilizadas 63.980 viaturas. O custo desse serviço foi orçado em exatos R$ 6.637.868.
Uma maior celeridade no processo também pouparia dinheiro dos cofres
públicos e uma resposta mais rápida e eficiente, tanto para a sociedade, quanto para
o próprio réu que fica na espera da sua liberdade.
Os gastos e o tempo que se perde com o uso de uma carta precatória ou até
mesmo de uma carta rogatória torna os processos da esfera criminal mais
demorados, pois até que as cartas sejam expedidas e, ao recebê-las, sejam
cumpridas e enviadas de volta a comarca de origem, gera um grande transtorno,
sendo que o mesmo poderia ser realizado ao vivo, através da videoconferência e, o
mais importante, sendo ministrada pelo juiz da causa, ou seja, aquele que irá julgar
e dar a sentença.
Tatiana Viggiani Bicudo (2007) manifesta o seguinte:
Neste ponto, falar em interrogatório na presença do juiz é entender que o interrogatório será feito por carta precatória e, portanto, não será realizado pelo magistrado responsável por julgar o processo. Além disso, dada à crise que vive o Judiciário no País, muitas vezes, o interrogatório por carta precatória demora meses, quando então o acusado será entrevistado por um juiz diferente daquele que julgará o seu caso.
Nesse sentido, é possível afirmar que o uso da videoconferência irá aplicar o
princípio da identidade física do juiz, juntamente com o princípio da celeridade. Sem
contar os outros princípios constitucionais, como: devido processo legal, publicidade,
ampla defesa e contraditório que não são afetados com o uso da videoconferência e
muito pelo contrário, são respeitados, possibilitando assim um interrogatório justo e
confiável, resguardando os princípios fundamentais.
32
Defendendo a proteção da garantia dos princípios constitucionais, o
Procurador de Justiça Vladimir Aras (2005) defende o princípio da publicidade ao
dizer:
A própria idéia processual de publicidade especial (aquela assegurada às partes e aos seus defensores) é privilegiada com o sistema de videoconferência, levando-se em consideração que o réu, preso ou solto, poderá acompanhar as sessões de julgamento perante tribunais e toda e qualquer audiência judicial, mesmo aquelas em que sua presença for recusada, por conduta inconveniente ou para assegurar o bem-estar de testemunhas e vítimas.
Na defesa do princípio do contraditório, Bezerra (2005) argumenta:
No momento da realização do interrogatório on line, todas as determinações legais são cumpridas, senão vejamos: existe a presença das partes (Defensores, Ministério Público ou Querelante) no referido ato; o magistrado fala que o réu não está obrigado a responder a nenhuma pergunta, mas que é o interrogatório o momento próprio para que o acusado exponha a sua verdade sobre a acusação; é feita a leitura da denúncia; são realizadas as perguntas em sua duas fases (sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos); as partes participam do interrogatório realizando perguntas, entre outros procedimentos.
E conclui:
Portanto, se a videoconferência não elimina os direitos e garantias do preso, não há motivos para não realizá-la, ao contrário, segundo alguns juízes que tiveram a oportunidade de realizá-las opinaram por mantê-las, pois sentiram que poderiam levar ao réu, ao acusado uma Justiça mais célere.Isto posto, o interrogatório on line traz para o mundo do processo penal o dinamismo que tanto necessitava, fazendo Justiça a tempo, e quiçá, no futuro, sanando todos os problemas que o sistema prisional tem em conjunto com o Judiciário.
Não se podem aceitar posições contrárias ao uso da videoconferência sob a
argumentação de que tal procedimento traria frieza e impessoalidade do ato. Ora,
como já fora dito, o uso de carta precatória e rogatória trás a mesma coisa, ou então,
pode ser amenizado pelo fato de está sendo realizado por um magistrado, mas vale
ressaltar que o referido juiz não é o juiz da causa, tornando o ato impessoal.
Não se decide um processo através de expressões e demonstrações de
sentimentos do acusado, até porque algumas expressões poderiam causar
interpretação divergente. Ronaldo Batista Pinto, Promotor de Justiça (2006, p 13),
diz:
33
Outro dado um tanto polêmico, ainda no mesmo tópico, é o que se refere à necessidade da presença do réu, no interrogatório, próximo ao juiz (quer dizer, no mesmo ambiente), a fim de que todas as suas reações sejam captadas. Primeiro que não se tem notícia de interrogatório no qual o juiz tenha feito consignar que, ao formular determinada pergunta, viu-se o réu acometido de intenso rubor facial ou de tremor nas mãos. Segundo que essa espécie de constatação viria carregada por tamanho subjetivismo que a tornaria incapaz de conter algum valor probatório ou de prestar-se como elemento de defesa em favor do réu.
Outra vantagem do uso da implantação da videoconferência na esfera
criminal é a possibilidade, além da realização do interrogatório on-line, de outros
atos no decorrer do processo, podendo o réu participar ativamente de todos os
momentos processuais.
Em cidades onde já foram instaladas o sistema de videoconferência nos
complexo penitenciários e nos fóruns, ainda existe a possibilidade do uso do
mecanismo para o contato do detento com familiares, quando os mesmos residirem
em locais distantes das penitenciárias. Essa utilização tem ajudado na
ressocialização de muitos acusados, já que tem possibilitado o contato com seus
entes queridos, o que, por muitas vezes, não teriam condições financeiras de
realizar tais visitas.
Por fim, é defendido que o “comparecer perante a autoridade jurídica”,
conforme diz o CPP em seu art. 185, caput, não refere-se em estar presente na
forma física junto a autoridade jurídica e sim que haja esse contato.
É mister defendermos que existe sim esse comparecimento perante a
autoridade jurídica através da videoconferência, já que juiz e acusado estarão em
contato, ao vivo, com transmissão de voz e áudio, em perfeito estado de
comunicação, tendo todas as garantias constitucionais preservadas.
O jurista Vladmir Aras (2005) entende da seguinte forma:
Na sistemática do CPP, "comparecer" nem sempre significa necessariamente ir à presença física do juiz, ou estar no mesmo ambiente que este. Comparece aos autos ou aos atos do processo quem se dá por ciente da intercorrência processual, ainda que por escrito, ou quem se faz presente por meio de procurador, até mesmo com a oferta de alegações escritas, a exemplo da defesa prévia e das alegações finais. Vide, a propósito, o art. 570 do CPP, que afasta a nulidade do ato, considerando-a sanada, quando o réu "comparecer" para alegar a falta de citação, intimação ou notificação. Evidentemente, aí não se trata de comparecimento físico diante do juiz, mas sim de comunicação processual, por petição endereçada ao magistrado.
34
Conclui-se que se seguidas todas as exigências da lei, respeitando os
princípios fundamentais, o uso da videoconferência só tem a adicionar no nosso
ordenamento jurídico, possibilitando assim uma maior celeridade e economia,
podendo solucionar com mais rapidez e eficiência os processos que lotam as
secretarias dos fóruns aguardando o julgamento.
35
5 A CONSTITUCIONALIDADE DA VIDEOCONFERÊNCIA
A grande discussão em torno do uso da videoconferência no interrogatório on-
line é a sua inconstitucionalidade, sendo alvo de diversos doutrinadores contra a
utilização do sistema. Para tanto, um tópico totalmente dedicado para discutir a
constitucionalidade da videoconferência no interrogatório on-line se fez necessário.
5.1 A HARMONIA COM OS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS
Primeiramente, vale ressaltar que princípios fundamentais são conceituados
como regras de interpretações que os juristas usam para a aplicação de normas
vigentes ao caso concreto. Nossa constituição descreve diversos princípios, dos
quais abordaremos alguns de maior relevância dentro do assunto discutido.
Segundo Tereza Nascimento Rocha Doró (1999, p. 10):
“Os princípios são, então, regras de interpretação que unem a lei ao fato analisado, considerando a posição da pessoa, o ato cometido e a maneira de se resolver o caso, de forma a uniformizar e prestigiar a justiça, pois, se ficasse somente a critério de cada juiz ou das partes a incumbência de ler e aplicar as regras existentes, por certo haveria contradições, erros e verdadeiro caos, já que cada um tem seu próprio entendimento”.
Conclui-se, portanto, que os princípios devem nortear a aplicação da norma
jurídica servindo-lhe de base.
Destaca-se os ensinamentos de Barroso (1996, p. 142-143):
[...] os princípios constitucionais são, precisamente, a síntese dos valores mais relevantes da ordem jurídica. A Constituição [...] não é um simples agrupamento de regras que se justapõem ou que se superpõem. A idéia de sistema funda-se na de harmonia, de partes que convivem sem atritos. Em toda ordem jurídica existem valores superiores e diretrizes fundamentais que ‘costuram’ suas diferentes partes. Os princípios constitucionais consubstanciam as premissas básicas de uma dada ordem jurídica, irradiando-se por todo o sistema. Eles indicam o ponto de partida e os caminhos a serem percorridos.
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O presente tópico aborda a harmonia existente entre os princípios
fundamentais e o uso da videoconferência no interrogatório on-line.
A seguir, far-se-á, de forma sucinta, a defesa da constitucionalidade do uso
do sistema no ordenamento jurídico.
5.1.1 Princípio do devido processo legal
Com a aprovação da Lei 11.900/09 não se tem mais fundamento ao afirmar
que o uso da videoconferência no processo penal brasileiro seria inconstitucional, já
que a previsão legal é válida e está em pleno vigor.
Dessa forma, não existe problema algum com a legislação atual, já que o
CPP trás previsão expressa do novo procedimento. Antes da lei 11.900/09 não havia
previsão legal a respeito do uso da videoconferência, isso se dá ao fato do Código
ser de 1941, e, naquela época, não tinha como conceber a apresentação de outra
forma, a não ser fisicamente perante o magistrado.
Fioreze (2009, p. 197) diz:
No que tange ao interrogatório on-line, verifica-se que em nada afeta o devido processo legal garantista, mas, ao contrário, vem de encontro com este. Todos os princípios básicos do modelo garantista de Ferrajoli continua presente. A jurisprudência se faz presente, pois é o juiz e apenas este quem interroga o réu. Igualmente presente a inderrogabilidade do juízo, pois o magistrado não declina sua função a ninguém. E, quando transfere o interrogatório a outro juiz (em caso de rogatórias e precatórias), com mais razão ainda o interrogatório on-line valoriza a função garantística do processo penal, na medida em que protege e assegura os princípios do juiz natural e da identidade física do juiz, enaltecendo, assim, os direitos fundamentais do acusado. Por sua vez, continua havendo separação entre as atividades de julgar e acusar, pois quem interroga e julga o acusado é sempre o juiz, tendo o órgão ministerial não só o direito, mas também o dever de estar presente ao interrogatório on-line. Igualmente, faz-se presente a presunção da inocência, sendo, inclusive, garantia fundamental. Por fim, mantém-se inviolável a contradição (contraditório e ampla defesa), uma vez que o acusado pode contrariar todas as acusações e provas produzidas contra si, bem como, defender-se plenamente.
O interrogatório on-line pode ser utilizado em harmonia com a os princípios
constitucionais vigentes e em compatibilidade com os demais princípios de proteção
à pessoa humana.
Portanova apud Fioreze (2009, p. 192) diz:
37
O objetivo do devido processo legal não diz respeito apenas com preocupações individualistas e particulares, mas, sobretudo, com preocupações coletivas e difusas, com, enfim, a efetiva igualização das partes no debate judicial.
O objetivo do interrogatório virtual é a agilização, economia e
desburocratização da justiça, bem como uma maior segurança para a sociedade e
para o próprio acuado.
5.1.2 Princípio do contraditório e ampla defesa
O princípio do contraditório e da ampla defesa é previsto no art. 5º, inciso LV,
da CF, segundo o qual “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos
acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios
e recursos a ela inerentes”.
É o princípio que garante o direito de se defender pela acusação sofrida.
Caso não seja observado o presente princípio, o processo será declarado nulo.
Vicente Greco Filho (1997, p. 252) diz:
O contraditório se efetiva assegurando-se os seguintes elementos: a) o conhecimento da demanda por meio de ato formal de citação; b) a oportunidade, em prazo razoável, de se contrariar o pedido inicial; c) a oportunidade de produzir prova e se manifestar sobre a prova produzida pelo adversário; d) a oportunidade de estar presente a todos os atos processuais orais, fazendo consignar as observações que desejar; e) a oportunidade de recorrer da decisão desfavorável.
O fato de o interrogatório ser realizado através de videoconferência não fere
em nada o presente princípio, já que a utilização desse sistema não impede o direito
da ampla defesa e do contraditório, uma vez que todos os atos são observados pelo
magistrado.
A questão de o espaço ser virtual, não traz prejuízo aos procedimentos a
serem adotados e não impossibilita o réu de exercer seus direito, sendo a
autodefesa, a sua ampla defesa ou até mesmo o seu silêncio.
Bezerra (2006) entende que:
Não resta dúvidas que a realização do interrogatório on-line não fere a ampla defesa do acusado, posto que todos os seus direitos são observados e exercidos. Portanto, se a videoconferência não elimina os direitos e
38
garantias do preso, não há motivos para não realizá-la, ao contrário, segundo uns juízes que tiveram a oportunidade de realizá-la, opinaram por mantê-la, pois sentiram que poderiam levar ao réu, ao acusado, uma Justiça mais célere. Isto posto, o interrogatório on-line traz para o mundo do processo penal o dinamismo que tanto necessitava, fazendo justiça a tempo, e quiçá, no futuro, sanando todos os problemas que o sistema prisional tem em conjunto com o Judiciário.
Vale enfatizar que a presença virtual do réu, no interrogatório on-line, é uma
presença réu, pois existe a comunicação simultânea entre o acusado e o
magistrado, com interação e recíproca direta. Dessa forma, não é violado o art. 185
do Código de Processo Penal: “porquanto o ato se realiza entre o réu perante a
autoridade judiciária”, sendo permitido a participação ativa do acusado e de seu
advogado.
Deste modo, sendo respeitado o direito ao contraditório e a ampla defesa, não
há no que se falar em inconstitucionalidade do ato processual através da
videoconferência, sob o irreal pretexto da violação dos princípios fundamentais do
acusado.
5.1.3 Princípio da proporcionalidade
O princípio da proporcionalidade serve para a investigação da
constitucionalidade de leis que possam interferir no âmbito da liberdade humana; se,
essas leis ferirem a esfera dos direitos de maneira mais intensa que a exigida para
sua efetividade, serão declaradas inconstitucionais.
Gomes (2010) expõe que:
O princípio da proporcionalidade (ou da razoabilidade, ou da proibição do excesso) é princípio geral do Direito. É válido para todas as áreas: penal, processo penal, administrativa etc. No nosso país tem fundamento constitucional expresso (CR, art. 5º, LIV), porque nada mais representa que o aspecto substancial do devido processo legal. Logo, é princípio constitucional geral do direito.
Este princípio é muito importante na esfera criminal, proporcionando a justa
atuação do Judiciário na matéria penal. Tem como função orientar o magistrado,
ponderando entre interesses conflitantes. Considera-se o princípio um modo
39
especial de ponderação de bens como forma de solucionar a colisão entre os
direitos fundamentais.
Fioreze (2009, p. 222) defende a aplicação do princípio no uso da
videoconferência como:
O princípio da proporcionalidade estabelece que o Estado deve procurar atingir seus objetivos com o mínimo de prejuízo ao indivíduo. Em relação ao interrogatório virtual, o Estado visa reduzir o perigo no transporte de réus presos e, principalmente, diminuir gastos que tal procedimento acarreta.
O interrogatório continua sendo oral. Ao acusado e o magistrado são
permitidos a visualização da imagem e do áudio em tempo real, em perfeito estado
de transmissão, sendo permitida ainda uma melhor captação nas expressões
corporais, devido aos equipamentos de alta tecnologia. Todo o ato é acompanhado
pelo defensor do réu e tudo é registrado em ata e em cd-rom ou outro meio que
permite o arquivamento de dados. O réu não é obrigado a falar e nem proibido de
ficar calado, sendo assim, não é eliminado nenhum direito constitucional,
respeitando todas as formalidades dos arts. 185 e 196 do CPP.
Portanto, o interrogatório on-line, segundo o princípio da proporcionalidade,
poderá ser realizado de acordo com a ordem constitucional vigente, e em harmonia
com os princípios.
5.1.4 Princípio da imediação e identidade física do juiz
Antes de qualquer coisa, convém analisar o que vem a ser o presente
princípio, destacando-se como o princípio mais importante na fase do interrogatório.
Princípio da imediação é o princípio segundo o qual o juiz que profere a
sentença deve ser o mesmo que ouviu a prova oral. Já o princípio da identidade
física, defende o contato direto do magistrado com as partes, as testemunhas e as
provas em geral produzidas em uma demanda, visando uma maior proximidade
possível no tempo entre as provas e a decisão.
No sistema convencional de interrogatório, tal princípio não pode ser
respeitado em muitos dos casos devido à grande extensão territorial do nosso país,
40
ocorrendo em alguns momentos à ausência da vítima, testemunhas e até mesmo do
acusado nos procedimentos do processo.
Souza Netto (2006, p. 99) comenta à respeito da inaplicabilidade do princípio
nos atos onde exigem o comparecimento das partes, ignorando o uso da
videoconferência:
De qualquer forma, a ausência do princípio da identidade física é lamentável, sendo extremamente necessária ao processo penal, para impedir a individualização da pena sem que o magistrado tenha presente a imagem do acusado.
Ao contrário da distância existente entre o magistrado e a prova oral através
das cartas (rogatória e precatória) que, em muita das vezes não permitem um
contato direto entre as vítimas, testemunhas ou acusado com o juiz, o uso da
videoconferência proporciona esse contato entre as partes envolvidas e o verdadeiro
julgador da causa, através de uma transmissão simultânea e real.
Fioreze (2009, 233-234) expõe as vantagens do uso do interrogatório on-line,
confira:
O princípio da imediação, por sua vez, o princípio da identidade física do juiz, são, sem dúvidas, os dois principais princípios a obterem benefícios com o uso da videoconferência no interrogatório dos réus. Ora, as audiências e os interrogatórios on-line podem ser gravados em meio digital, óptico ou equivalente. Esta facilidade permite ao julgador da causa, o mesmo que realizar o ato ou o que vier a sucedê-lo (em ocasiões excepcionais, por analogia ao art. 132 do CPC), aproximar-se fundamentalmente da prova então produzida, ao ver ou rever as gravações audiovisuais, permitindo, inclusive, a observação repetidas vezes dos mecanismos não-verbais de linguagem que, comumente, ocorrem numa audiência judicial.
E conclui:
Além disso, as audiências de coleta de depoimentos de vítimas, testemunhas e peritos, realizadas em foros distintos, por precatória ou rogatória ou por carta de ordem, poderão se acompanhadas diretamente pelos acusados e seus defensores e pelo membro do Ministério Público encarregado da causa, com intervenção pronta e imediata de qualquer um desses sujeitos processuais, priorizando-se, desta forma, a ampla defesa e o princípio do promotor natural.
Ora, visto que o princípio da imediação e da identidade física do juiz é
respeitada e melhor aplicada com a utilização da videoconferência no processo
41
penal brasileiro, conclui-se que a adoção do sistema acarretará mais vantagens para
o acusado, podendo ser julgado de forma mais justa e tendo suas garantias
fundamentais respeitadas.
5.1.5 Princípio do juiz natural
A grande vantagem do interrogatório on-line é garantir ao réu a aplicação do
princípio do juiz natural, fazendo valer o garantido no art. 5º da CF, em seu inc. LII:
“ninguém será processado nem sentenciado, senão pela autoridade competente”.
Com o uso do sistema, não será mais necessário o desgaste da expedição e
espera do retorno das cartas precatórias, rogatórias ou de ordem para o
interrogatório de denunciados ou a ouvida de vítimas, testemunhas e peritos. O
próprio juiz da causa, se valendo da videoconferência poderá realizar tais atos.
O art. 3º da Lei 11.900/09 altera o art. 22 do CPP da seguinte forma:
Na hipótese prevista no caput deste artigo, a oitiva de testemunha poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, permitindo a presença do defensor e podendo ser realizada, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento.
Vale ressaltar que nem sempre o acusado deixa de comparecer porque quer,
outros fatores podem acarretar isso, como por exemplo, a distância de onde reside a
comarca onde responde pela acusação.
Se a videoconferência for aplicada em todo o território nacional e o réu
comparecer virtualmente, diminuirá os casos de suspensão de processos e o curso
do prazo prescricional. E nem a justificativa da prisão preventiva do acusado, que
não “comparecer”, sendo uma grande vantagem processual e material.
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5.1.6 Princípio da publicidade
Outros atacam a inconstitucionalidade do interrogatório on-line dizendo que o
mesmo fere o Princípio da Publicidade dos atos processuais, previstos nos arts. 5º,
inciso LX e 93, inciso IX, da CF, e 792 do CPP, que, combinados, conclui-se que os
atos processuais serão realizados nas sedes dos tribunais, sendo permitida a
participação dos cidadãos.
Crítica essa totalmente sem fundamento, já que aqueles que comparecerem a
sede dos tribunais, poderão acompanhar todo o procedimento, estando presente o
juiz e demais participantes e a imagem e áudio de alta qualidade do acusado,
através do sistema de videoconferência. Caso queira acompanhar o interrogatório
do complexo penitenciário, estará na companhia do acusado, advogado e demais
participantes, vendo e ouvindo toda a transferência vinda do Fórum, sem nenhum
prejuízo para as partes.
Ora, com o uso da videoconferência será possível ainda mais o cumprimento
do Princípio a Publicidade, haja vista que com esse mecanismo as audiências e
demais atos processuais poderão ser vistas direto dos sites dos tribunais, de
qualquer canto do mundo, a qualquer momento do dia, ou seja, totalmente público e
acessível. Levamos em consideração também que o interrogatório será gravado em
cd-rom, ficando disponível para o juiz e magistrados das instâncias superiores, os
quais poderão assistir inúmeras vezes ao ato.
Conclui-se com o pensamento de Fioreze (2009, p. 238):
A alegada falta de publicidade do ato, por vezes erigida como um dos óbices do interrogatório on-line, não é de ser considerada. Com a moderna tecnologia milhares e milhares de pessoas podem assistir ao ato simultaneamente, como de resto inúmeros atos são assistidos em nível mundial, simultaneamente, via internet, assegurando-se, deste modo, o princípio da publicidade geral e o controle social sobre os atos do Poder Judiciário, ampliando-se o acesso à informação.
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5.1.7 Princípio dignidade humana
O princípio da dignidade humana pode ser entendido como uma expressão da
garantia de respeito às liberdades individuais de toda pessoa.
Segundo Fioreze (2009, p. 242):
O princípio da dignidade humana da pessoa humana constitui a viga mestra de todo o arcabouço jurídico, porque confere unidade de sentido ao conjunto de preceitos relativos aos direito fundamentais e há de ser interpretado como referido a cada pessoa (individual), a todos as pessoas, sem discriminações (universal) e a cada homem como um ser autônomo (livre).
O interrogatório realizado através da videoconferência respeita o princípio da
dignidade humana, pois evita que os acusados sejam transportados até o fórum em
condições precárias.
Com o uso da videoconferência, permite o pronto acesso dos acusados ao
Poder Judiciário, sendo assim, respeitados os direitos fundamentais e garantido o
princípio da dignidade humana.
E continua:
O princípio da dignidade da pessoa humana pressupõe, de certa forma, o princípio do acesso à Justiça, e o interrogatório virtual assegura esse acesso e permite que os acusados exerçam a mais ampla defesa em juízo, tudo de forma rápida e segura, sempre em prol da dignidade dos mesmos.
5.1.8 Princípio do acesso à justiça
Dinamarco apud Fioreze (2009, 242) sintetiza o Princípio do Acesso à Justiça
como:
Mais do que um princípio, o acesso à Justiça é a síntese de todos os princípios e garantias do processo, seja a nível constitucional ou infraconstitucional, sem em sede legislativa ou doutrinária e jurisprudencial. Chega-se a idéia do acesso à Justiça, que é o pólo metodológico mais importante do sistema processual na atualidade, mediante o exame de todos e de qualquer um dos grandes princípios.
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Esse princípio tem como objetivo inserir o Poder Judiciário como um ambiente
em que os cidadãos possam fazer valer seus direitos, sendo que na área penal, isso
tem grande importância, principalmente, para que possa se defender.
O fato do acusado, pessoalmente (ainda que virtualmente) dirigir-se àquele
que irá julgá-lo é o evidente uso do acesso à Justiça.
O interrogatório criminal é o verdadeiro palco de acesso à Justiça e, com base
nisso, que sobe esse ato processual os cuidados com as garantias fundamentais
são ainda maiores.
Portanto, com o uso da videoconferência, um réu localizado em uma região
distinta de onde está sendo acusado de algum ato, poderá comparecer, mesmo que
virtualmente, para se defender, em contato direto com o juiz da causa. Ou seja, essa
possibilidade do acusado comparecer, mesmo a distância, dá a ele a possibilidade
do acesso à Justiça, fazendo com que o princípio constitucional seja respeitado.
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6 USO DA VIDEOCONFERÊNCIA EM OUTROS PAÍSES
Estados Unidos da América, Canadá, Austrália, Índia, Reino Unido, Espanha,
Chile, Itália, Holanda, França, Portugal, Timor-Leste, são alguns países exemplos
pela adoção do sistema da videoconferência em seu ordenamento jurídico,
principalmente na esfera criminal, possibilitando assim a realização do interrogatório
on-line.
Visando a facilitação, a celeridade e a economia processual, a proteção à
testemunha, a segurança pública e o combate ao crime organizado, muitos países
vem regulamentando e adotando procedimentos processuais com o auxílio de
tecnologias.
Desde 1983, nos Estados Unidos da América, a videoconferência tem
previsão legal, possibilitando assim a realização de depoimentos e interrogatórios
on-line para evitar o contato entre as vítimas e seus agressores, preservando assim,
a integridade de cada um dos envolvidos.
A Espanha e a França também possuem regulamentação sobre o uso da
videoconferência, possibilitando o uso da tecnologia para a oitiva de testemunhas e
interrogatório, além de prever demais meios eletrônicos nos atos processuais.
A Itália, em 1992, no intuito de combater a máfia adotou o uso do mecanismo
em seu ordenamento jurídico. Atualmente só é usado nos casos de presos
perigosos e em hipóteses definidas em lei.
Ana Cláudia da Silva Bezerra (2005), menciona a declaração de Giancarlo
Sandro Caselli, ex-chefe do pool antimáfia italiano, a respeito da utilização da
videoconferência:
Os interrogatórios são feitos por circuito interno de televisão. (...) Para evitar que os mafiosos fossem resgatados ou fizessem ameaças às testemunhas durante os interrogatórios, o Ministério Público passou a utilizar o que eles chamam de videoconferência.
Com a adoção da Lei Geral sobre a Cooperação Internacional, em 2003, no
Reino Unido é possível que testemunhas na Espanha, Inglaterra, Irlanda do Norte e
Escócia realizem os depoimentos através da comunicação eletrônica de áudio e
vídeo.
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Além dos países adotarem o uso da videoconferência em seu ordenamento
jurídico interno, ainda existem os Tratados Internacionais que permitem o uso desse
recurso e que, permitem a outros países que não possuam uma legislação
específica, encontrem nos tratados respaldos para a utilização da videoconferência
em procedimentos internos.
A União Européia ratificou o Tratado de Assistência Judicial, em 2002, criando
a possibilidade do uso da videoconferência nos procedimentos processuais.
Tratados como: Convenção de Mérida, Convenção das Nações Unidas contra
o Crime Organizado Transnacional (Convenção de Palermo), são alguns exemplos
da adoção da videoconferência.
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CONCLUSÃO
Com o avanço dos tempos, o mundo vem passando por transformações
tecnológicas, permitindo ao homem um maior conforto e qualidade de vida.
Junto com toda essa evolução tecnológica, vem o conservadorismo que
impede que alguns recursos sejam utilizados de imediato, sendo marcado sempre
por barreiras que lutam contra o novo e tentam impedir a implantação de novos
recurso. Dessa forma, a justiça não fica de fora, possuindo sempre contrários aos
avanços que o mundo globalizado nos proporcionam.
Anos atrás houveram resistências à máquina de escrever, ao fax símile, ao
computador e agora com a videoconferência.
A videoconferência surgiu para proporcionar encontros e conferência entre
duas ou mais pessoas distantes, possibilitando a transmissão de imagem e áudio
em tempo real, capaz de simular um encontro físico entre os participantes. Esse
sistema, agora implantado no ordenamento jurídico, poderá facilitar na realização de
audiências, interrogatório e demais atos processuais.
O sistema utilizado atualmente é de alta tecnologia, permitindo tanto ao juiz
quanto ao réu uma perfeita percepção de som e imagem, pois o zoom é capaz de
capturar uma visão detalhada das expressões corporais dos presentes. Permite
também, a qualquer momento, entrevista entre o acusado e o seu defensor, através
de linha direta, totalmente confidencial.
Vale lembrar que o uso da videoconferência no interrogatório on-line respeita
todos os princípios constitucionais, não ferindo a nenhum deles. O princípio do
devido processo legal, contraditório e ampla defesa, proporcionalidade, imediação e
identidade física do juiz, juiz natural, publicidade, dignidade humana e acesso à
justiça são garantidos no uso do sistema.
Ademais, para que seja garantida a ampla defesa é necessária a presença
de, no mínimo, dois defensores para a realização do ato: um na companhia do réu,
para assegurar que não ocorra nenhum tipo de coação; e outro na companhia do
juiz e dos demais presentes na sala de audiência do Fórum. E ainda, todo o ato será
gravado em mídia, o que garante, a qualquer momento, nova análise do
interrogatório, inclusive pelos Tribunais Superiores.
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Portanto, não há como dizer que qualquer garantia do réu poderia ser
lesionada, aliás, o que não seria plausível em um Estado Democrático de Direito.
Além da garantia dos princípios constitucionais, há que se falar da economia
e da celeridade que o uso do sistema proporciona para a Justiça brasileira. Como já
foi comprovado, o transporte do réu até o Fórum para a realização do interrogatório
trás número desastrosos para os cofres públicos, sendo evitado a partir do momento
que o réu, dentro do próprio presídio pode “comparecer” ao interrogatório.
A segurança é outro fator de grande relevância, já que não teria necessidade
de colocar a sociedade em risco com o transporte de acusados de grande
periculosidade, pertencentes a facções criminosas.
Ao depois, o interrogatório por videoconferência é utilizado em outros países
com sucesso.
Conclui-se, portanto, que a Lei 11.900/09 é constitucional, uma vez que o
procedimento proporcionado pela videoconferência para a realização do
interrogatório, em nada fere o devido processo legal, uma vez que é realizado
conforme todas as regras estabelecidas pela Lei Processual.
Sendo assim, o interrogatório por videoconferência é viável e está dentro dos
limites da legalidade.
Por fim, o interrogatório por videoconferência deve ser regra no processo
penal. O julgador, em análise ao caso concreto e diante do princípio da verdade real,
procederá ao interrogatório da maneira que entender necessária.
49
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52
ANEXO
53
Anexo A
Presidência da RepúblicaCasa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 11.900, DE 8 DE JANEIRO DE 2009.
Mensagem de veto
Altera dispositivos do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, para prever a possibilidade de realização de interrogatório e outros atos processuais por sistema de videoconferência, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Os arts. 185 e 222 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, passam a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 185. ....................................................................
§ 1o O interrogatório do réu preso será realizado, em sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares bem como a presença do defensor e a publicidade do ato.
§ 2o Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma das seguintes finalidades:
I - prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir durante o deslocamento;
II - viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja relevante dificuldade para seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou outra circunstância pessoal;
III - impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima, desde que não seja possível colher o depoimento destas por videoconferência, nos termos do art. 217 deste Código;
IV - responder à gravíssima questão de ordem pública.
§ 3o Da decisão que determinar a realização de interrogatório por videoconferência, as partes serão intimadas com 10 (dez) dias de antecedência.
§ 4o Antes do interrogatório por videoconferência, o preso poderá acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico, a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que tratam os arts. 400, 411 e 531 deste Código.
§ 5o Em qualquer modalidade de interrogatório, o juiz garantirá ao réu o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor; se realizado por videoconferência, fica também garantido o acesso a
54
canais telefônicos reservados para comunicação entre o defensor que esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre este e o preso.
§ 6o A sala reservada no estabelecimento prisional para a realização de atos processuais por sistema de videoconferência será fiscalizada pelos corregedores e pelo juiz de cada causa, como também pelo Ministério Público e pela Ordem dos Advogados do Brasil.
§ 7o Será requisitada a apresentação do réu preso em juízo nas hipóteses em que o interrogatório não se realizar na forma prevista nos §§ 1o e 2o deste artigo.
§ 8o Aplica-se o disposto nos §§ 2o, 3o, 4o e 5o deste artigo, no que couber, à realização de outros atos processuais que dependam da participação de pessoa que esteja presa, como acareação, reconhecimento de pessoas e coisas, e inquirição de testemunha ou tomada de declarações do ofendido.
§ 9o Na hipótese do § 8o deste artigo, fica garantido o acompanhamento do ato processual pelo acusado e seu defensor.” (NR)
“Art. 222. .................................................................
§ 1o (VETADO)
§ 2o (VETADO)
§ 3o Na hipótese prevista no caput deste artigo, a oitiva de testemunha poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, permitida a presença do defensor e podendo ser realizada, inclusive, durante a realização da audiência de instrução e julgamento.” (NR)
Art. 2o O Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte art. 222-A:
“Art. 222-A. As cartas rogatórias só serão expedidas se demonstrada previamente a sua imprescindibilidade, arcando a parte requerente com os custos de envio.
Parágrafo único. Aplica-se às cartas rogatórias o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 222 deste Código.”
Art. 3o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 8 de janeiro de 2009; 188o da Independência e 121o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVATarso GenroJosé Antonio Dias Toffoli
Este texto não substitui o publicado no DOU de 9.1.2009
55