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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A RESPONSABILIDADE CIVIL NOS CONTRATOS DE
TRANSPORTE DE PESSOAS
VITOR AUGUSTO COMANDOLLI
Itajaí (SC), outubro de 2006
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
A RESPONSABILIDADE CIVIL NOS CONTRATOS DE
TRANSPORTE DE PESSOAS
VITOR AUGUSTO COMANDOLLI
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor MSc. Eduardo Erivelton Campos
Itajaí (SC), outubro de 2006
AGRADECIMENTOS
À Deus pela concessão do dom da vida e da liberdade;
Aos meus pais, Noviral e Zelani Comandolli, pela educação, formação e dedicação proporcionados;
Ao Professor MSc Eduardo Erivelton Campos, companheiro nestes momentos de anseio e
sacrifício;
Aos meus irmãos Jeferson e Jesana Comandolli, pessoas de valores inestimável com quem tenho
a honra de contar em todos os momentos;
À minha namorada Magali Zen, que considero uma pessoa muito especial;
Aos meus amigos, pela graça da amizade, do companheirismo e do afeto.
3
DEDICATÓRIA
A Deus;
À minha Família;
À minha namorada;
Aos meus amigos.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí (SC), março de 2006
Vitor Augusto Comandolli Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Vitor Augusto Comandolli, sob o
título A Responsabilidade Civil nos Contratos de Transporte de Pessoas, foi
submetida em 09 de novembro de 2.006 à banca examinadora composta pelos
seguintes professores: Professor Presidente Eduardo Erivelton Campos,
Professor Wanderley Godoy Junior e Professora Débora Ferreira de Souza, e
aprovada com a nota 10 (dez) .
Itajaí (SC), outubro de 2006
Mestre Eduardo Erivelton Campos Orientador e Presidente da Banca
Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art. Artigo
CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1916
CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002
CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil
DJU Diário da Justiça da União
p. Página
Rel. Relator
RT Revista dos Tribunais
STF Supremo Tribunal Federal
TJ Tribunal de Justiça dos Estados
TRF Tribunal Regional Federal
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Contrato
“Contrato é o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem
jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as
partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de
natureza patrimonial”. 1
Contrato de adesão
“Tratando-se de contrato de adesão, um das partes apenas adere às condições
preestabelecidas pela outra parte, sem nenhuma alternativa. Vale dizer, uma das
partes, qual seja, o vendedor, dotado de uma posição dominante na relação
contratual, impõe determinadas cláusulas, nas quais geralmente inexiste poder de
negociação por parte do adquirente”. 2
Contrato de transporte de pessoas
“É aquele em que o transportador se obriga a remover uma pessoa e sua
bagagem de um local para o outro, mediante remuneração”. 3
Dano
“É o prejuízo ressarcível experimentado pelo lesado, traduzindo-se, se
patrimonial, pela diminuição patrimonial sofrida por alguém em razão de ação
1 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais. Vol. III. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 24. 2 DOWER, Nelson Godoy Bassil. Curso moderno de direito civil: contratos e responsabilidade
civil. São Paulo: Nelpa, 2005, p. 24. 3 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2005, p. 442.
deflagrada pelo agente, mas pode atingir elementos de cunho pecuniário e
moral”.4
Direito
“É o elemento valorizador, qualificador e atribuidor de efeitos a um
comportamento, com o objetivo de que seja asseguradas adequadamente a
organização das relações humanas e justa convivência em Sociedade”.5
Nexo causal
“O vínculo entre o prejuízo e a ação, designa-se nexo causal, de modo que o fato
lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente ou como sua conseqüência
previsível”.6
Passageiro
“Pessoa que se propõe a ser transportado, pagando um certo preço”.7
Passagem
“Bilhete de passagem, ou simplesmente passagem, emitido pelo transportador ou
seu mandatário, é a prova do contrato de transporte de pessoas”.8
Responsabilidade
O conceito de responsabilidade, “como gênero, implica sempre exame de conduta
voluntária violadora de um dever jurídico. Sob tal premissa, a responsabilidade
pode ser de várias naturezas, embora ontologicamente o conceito seja o
mesmo”.9
4 BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil nas atividades nucleares. Tese apresentada
ao curso de livre-docência para o Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP, 1982, p. 64.
5 PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica. 2000, p. 71. 6 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 81. 7 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, 1993, p. 251. 8 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil – contratos em espécie, 2004, p. 508. 9 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. 2. ed. ver. e amp.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 48.
Responsabilidade civil
“É a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a
outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam”.10
Transportador
“É a pessoa que se compromete a fazer o transporte”.11
10 SAVATIER. Traité de la Responsabilité Civile. Paris: 1939, Vol. I, nº. 1. Apud RODRIGUES,
Silvio. Direito civil – responsabilidade civil. Vol. IV. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 06. 11 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, 1993, p. 251.
SUMÁRIO
RESUMO ......................................................................................... XV
INTRODUÇÃO.................................................................................... 1
CAPÍTULO 1..................................................................................... 04
RESPONSABILIDADE CIVIL . ..........................................................04 1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS E EVOLUTIVOS ................................................. 04 1.2 DEFINIÇÕES CONCEITUAIS.........................................................................11 1.3 FINALIDADE ..................................................................................................13 1.4 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL.................................................13 1.4.1 RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E
EXTRACONTRATUAL....................................14 1.4.2 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA OU TEORIA DA CULPA........................................14 1.4.3 RESPONSABILIDADE OBJETIVA OU TEORIA DO
RISCO...........................................18 1.4.4 RESPONSABILIDADE DIRETA E INDIRETA.............................................................21 1.5 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL.....................................21 1.5.1 AÇÃO OU OMISSÃO DO AGENTE.........................................................................22 1.5.2 CULPA DO AGENTE...........................................................................................23 1.5.3 DANO..............................................................................................................23 1.5.4 NEXO CAUSAL..................................................................................................25 1.6 MEIOS DE EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL............................25
CAPÍTULO 2.......................................................................................27
DOS CONTRATOS EM GERAL ....................................................... 27 2.1 DEFINIÇÕES DE CONTRATO...... ............................................................. ...27 2.2 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO CONTRATUAL.......................28 2.3 CONDIÇÕES DE VALIDADE..........................................................................30 2.3.1 DA CAPACIDADE DAS PARTES...........................................................................30 2.3.2 OBJETO LÍCITO, POSSÍVEL, DETERMINADO OU DETERMINÁVEL.............................31 2.3.3 FORMA PRESCRITA OU NÃO DEFESA EM LEI........................................................32 2.3.4 CONSENTIMENTO RECÍPROCO...........................................................................32 2.4 DA CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS.....................................................33
2.4.1 CONTRATOS UNILATERIAS OU
BILATERAIS..........................................................34 2.4.2 CONTRATOS ONEROSOS OU
GRATUITOS.............................................................34 2.4.3 CONTRATOS ALEATÓRIOS
OU COMUTATIVOS......................................................35 2.4.4 CONTRATOS REAIS OU
CONSENSUAIS................................................................36 2.4.5 CONTRATOS SOLENES OU NÃO SOLENES...........................................................36
2.4.6 CONTRATOS PRINCIPAIS OU ACESSÓRIOS..........................................................37
2.4.7 CONTRATOS PARTIDÁRIOS OU DE ADESÂO.........................................................38
2.4.8 CONTRATOS DE EXECUÇÃO IMEDIATA, DIFERIDA OU
SUCESSIVA...........................38 2.4.9 CONTRATOS TÍPICOS E ATÍPICOS.......................................................................39 2.5 DA FORMAÇÃO E LUGAR DOS CONTRATOS............................................40 2.6 DA INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS...................................................43 2.7 DA EXTINÇÃO CONTRATUAL......................................................................44
CAPÍTULO 3..................................................................................... 48
RESPONSABILIDADE CIVIL NOS CONTRATOS DE TRANSPORTE DE PESSOAS................................................................................... 48 3.1 NOÇÃO GERAL DO CONTRATO DE TRANSPORTE...................................48 3.2 DO CONTRATO DE TRANSPORTE DE PESSOAS......................................50 3.3 MODALIDADES DE TRANSPORTE ..............................................................55 3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL NO TRANSPORTE DE PASSAGEIROS........57 3.4.1 TRANSPORTADOR – OBRIGAÇÕES E RESPONSABILIDADE....................................59 3.4.2 PASSAGEIRO – OBRIGAÇÕES E DIREITOS...........................................................63 3.5 ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS......................................................65
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 73
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 76
RESUMO
Esta Monografia trata da Responsabilidade Civil nos
Contratos de Transporte de Pessoas. O trabalho foi dividido em três capítulos,
sendo que no primeiro estudou-se o instituto da Responsabilidade Civil, onde se
demonstrou seus aspectos históricos e evolutivos, bem como as diversas
definições conceituais, finalidade, espécies, pressupostos e por fim, os meios de
exclusão da Responsabilidade Civil. O segundo capítulo foi destinado ao estudo
dos Contratos em Geral, onde se buscou a evolução histórica, os princípios
fundamentais do direito contratual, além das condições de validade, classificação,
formação e lugar dos contratos, finalizando com a extinção contratual. No terceiro
e último capítulo, investigou-se a Responsabilidade Civil nos Contratos de
Transporte de Pessoas, analisando tanto os direitos e responsabilidade do
transportador, quanto às obrigações e direitos dos passageiros. Como fonte de
pesquisa buscou-se o entendimento de vários doutrinadores citados, bem como,
de jurisprudências selecionadas.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto a Responsabilidade
Civil nos Contratos de Transporte de Pessoas.
O seu objetivo é fazer um estudo em torno de um tema de
grande relevância no Direito Civil, uma vez que ultimamente tem-se roubado
espaço em jornais e revistas, face a polêmica e atualidade.
A justificativa para o desenvolvimento desta pesquisa
encontra-se na importância do tema para a vida social, tendo em vista ser o
transporte de pessoas uma atividade econômica de tamanha expressão que
acaba gerando inúmeros conflitos de interesses, pois são inúmeras pessoas
embarcando, desembarcando dos ônibus, aviões, trens, navios, portando malas,
enviando mercadorias e documentos para todos os locais do Brasil e do Mundo.
Para tanto, principiar-se-á, no Capítulo 1, tratando do
instituto da Responsabilidade Civil, onde se demonstrou seus aspectos históricos
e evolutivos, bem como as diversas definições conceituais, finalidade, espécies,
pressupostos e por fim, os meios de exclusão da Responsabilidade Civil.
No Capítulo 2, tratar-se-á dos Contratos em Geral, onde se
buscou a evolução histórica, os princípios fundamentais do direito contratual, além
das condições de validade, classificação, formação e lugar dos contratos, bem
como a sua interpretação e a extinção contratual.
Finalmente, no Capítulo 3, se estudará a Responsabilidade
Civil nos Contratos de Transporte de Pessoas, analisando as obrigações e
responsabilidade do transportador e obrigações e direitos dos passageiros.
O presente Relatório de Pesquisa encerrar-se-á com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre a Responsabilidade Civil nos Contratos de Transporte de Pessoas.
2
Para impulsionar a pesquisa, formulou-se os seguintes
problemas:
a) Em relação ao passageiro, quais as obrigações do
transportador?
b) Que tipo de obrigação vinculada ao transportador deverá
ser observada pelo passageiro?
c) Em caso de atraso no transcurso da viagem, obriga-se o
transportador a efetuar algum reparo?
d) Havendo dano ao passageiro, no transcurso ocasionado
por terceiros, de quem será a responsabilidade?
e) Havendo transporte não oneroso, o transportador terá
responsabilidade sobre o passageiro transportado?
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
9�O transportador é obrigado a transportar o passageiro no tempo e meio convencionados e a zelar pela segurança do viajante e sua respectiva bagagem.
9�O passageiro ficará vinculado às obrigações constantes do bilhete de passagem emitido pelo transportador ou por ele afixado em local visível.
9�Se o tempo do transporte não for respeitado e o passageiro sofrer danos, não havendo excludentes de responsabilidade – caso fortuito ou força maior – a empresa de transporte responderá pelos danos.
3
9�A responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.
9� O transporte feito clandestinamente ou gratuitamente, por amizade ou cortesia, não se subordina às normas do contrato de transporte e gera responsabilidade subjetiva.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados
o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
Nas considerações finais serão apresentadas as sínteses de
cada capítulo e a confirmação ou não das hipóteses citadas.
CAPÍTULO 1
RESPONSABILIDADE CIVIL
1.1 ASPECTOS HISTÓRICOS E EVOLUTIVOS
O estudo da Responsabilidade Civil nos Contratos de
Transporte de Pessoas passa, primeiramente, pela análise de todo o instituto da
Responsabilidade Civil e seus princípios, com a finalidade de buscar uma melhor
compreensão no decorrer da presente pesquisa.
“Historicamente, nos primórdios da civilização humana,
dominava a vingança coletiva, que se caracterizava pela reação conjunta do
grupo contra o agressor pela ofensa a um de seus componentes”. 12
O comportamento social evoluiu para uma reação individual,
ou seja, a vingança privada, em que os homens faziam justiça pelas próprias
mãos, sob a égide da Lei de Talião13, da reparação do mal pelo mal. 14
O poder público, neste caso, intervinha apenas para ditar
como e quando a vítima poderia ter o direito de retaliação, ensejando no lesante
dano idêntico ao que foi produzido.
Como bem esclarece Arnaldo Rizzardo15:
12 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, Vol. VII. 16. ed.
Atual. De acordo com o novo Código Civil (Lei n. 10.406, de 10-01-2002). São Paulo: Saraiva, 2002, p. 09.
13 Segundo Diniz, “Na lei das XII Tábuas, aparece significativa expressão desse critério na tábua VII, lei 11ª: “si membrum rupsit, ni cume o pacit, talio esto” (se alguém fere a outrem, que sofra a pena de Talião, salvo se existiu acordo)”. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 10.
14 Cf. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 10. 15 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: lei n. 10.406, de 10.01.2002. Rio de Janeiro:
Forense, 2005, p. 33.
5
Nos primórdios das civilizações, tinha-se em conta apenas o mal praticado, pouco relevando o caráter da voluntariedade, ou de culpa, das ações prejudiciais ou ofensivas. A reação era imediata, sem maiores indagações na equivalência entre o mal e a penalização.
Seguindo o mesmo entendimento, Maria Helena Diniz16
conclui que nesta etapa “a responsabilidade era objetiva, não dependia da culpa,
apresentando-se apenas como uma reação do lesado contra a causa aparente do
dano”.
Depois deste período, passa-se para a fase de composição
dos danos. “Aquele que se prejudicou passou a obter vantagens econômicas em
vez da vingança privada, no entanto sem ainda cogitar-se a culpa do ofensor”.17
Em um primeiro momento, surgiu a idéia da composição
voluntária, prevalecendo o entendimento de que seria mais racional a reparação
do dano por meio da prestação da poena (pagamento de certa quantia em
dinheiro) e outros bens. 18
Numa etapa mais avançada, onde há uma autoridade estatal
soberana, o legislador passou a regulamentar a composição, denominada
“composição legal”, vedando a vingança privada e passou a compelir o ofensor a
ressarcir o dano causado. 19
Ao comentar sobre a fase da compensação, Arnaldo
Rizzardo20 ensina que:
Introduz-se uma tarifação aos danos. Aparece um quadro de compensações. Para cada ofensa vinha convencionada uma pena, ou uma retribuição. Responsabiliza-se o ofensor pelos seus atos.
16 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 10. 17 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Saraiva 1993, p. 04. 18 GANDINI, João Agnaldo Donizete. A responsabilidade civil do estado por conduta
omissiva. Disponível em: www.ufsm.br/direito/artigos. Acesso em: 20 Fev. 2006. 19 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.05. 20 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2005, p. 33.
6
Nesse diapasão, Orlando Soares21 ressalta que o princípio
da responsabilização do autor da injúria, injustiça, lesão, ofensa ou dano, aparece
nos mais antigos textos legais, dentre os babilônios, gregos, romanos e astecas.
Vinha a previsão da reparação.
Segue o mesmo autor, exemplificando com o Código de
Hamurabi:
Se seu escravo roubasse um boi, uma ovelha, um asno, um porco ou uma barca, caso pertencesse a um deus ou palácio, deveria pagar até trinta vezes mais; se pertencesse a um cidadão livre, dentre as classes dos proprietários, soldados pastores e outros,
restituiria até dez vezes mais. Se o ladrão não tivesse com que restituir, seria morto. 22
Ainda em relação ao período da compensação, Yussef Said
Cahali23 menciona que, nesta fase surgiram vários ordenamentos jurídicos, dentre
os quais:
(...) o Código de Manu, que datou do século XIII a.C., e tratou da indenização por defeito oculto da noiva e dano causado a animais; como também, no o Código de Ur-Nammur e a Lei das XII Tábuas.
No período seguinte, a Lex Aquilia de damno24 veio
estabelecer as bases da responsabilidade, criando uma forma pecuniária de
indenização dos prejuízos, com base no estabelecimento do seu valor. 25
21 SOARES, Orlando. Responsabilidade civil no direito brasileiro. 1. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1999, p. 01. 22 SOARES, Orlando. Responsabilidade civil no direito brasileiro. 1. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1999, p. 01. 23 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 2. ed. São Paulo:
Saraiva, 1988, p. 245. 24 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil, p. 248: “Foi com a promulgação da Lex Aquilia,
durante a República Romana, aproximadamente ao longo do século III a.C., que se começou a traçar os fundamentos da responsabilidade civil”.
25 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 10.
7
Neste sentido, Carlos Roberto Gonçalves26 ensina que:
É na Lei Aquília que se esboça, afinal, um princípio geral regulador da reparação do dano. Embora se reconheça que não continha ainda uma regra de conjunto, nos moldes do direito moderno, era, sem nenhuma dúvida, o germe da jurisprudência clássica com relação á injúria, e fonte direta da moderna concepção da culpa aquiliana, que tomou da Lei Aquilia o seu
nome característico.
Igualmente pertinentes são os apontamentos de Maria
Helena Diniz27 :
A Lex Aquilia de damno veio a cristalizar a idéia de reparação pecuniária do dano, impondo que o patrimônio do lesante suportasse o ônus da reparação, em razão do valor da res, esboçando-se a noção de culpa como fundamento da responsabilidade, de tal sorte que o agente se isentaria de qualquer responsabilidade se tivesse procedido sem culpa. Passou-se a atribuir o dano à conduta culposa do agente.
Na Idade Média, com a estruturação da idéia de dolo e de
culpa stricto sensu, responsabilidade civil passou a ser diferenciada da
responsabilidade penal e surge a indenização, sendo que ocorre a partir do
momento em que o Estado passou exclusivamente para si a ação repressiva de
velar e punir a composição. 28
Nota-se a menção que Carlos Roberto Gonçalves29 traz
sobre o assunto:
A diferenciação entre a “pena” e a “reparação”, entretanto, somente começou a ser esboçada ao tempo dos romanos, com a distinção entre os delitos públicos (ofensas mais graves, de caráter perturbador da ordem) e os delitos privados. Nos delitos públicos, a pena econômica imposta ao réu deveria ser recolhida
26 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, 2003, p. 05. 27 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 10. 28 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, 2003 p. 05. 29 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, 2003, p. 05.
8
aos cofres públicos, e, nos delitos privados, a pena em dinheiro cabia à vítima.
Com o acontecimento da Revolução Industrial, grande foi à
necessidade de uma inovação no campo legislativo, haja vista o grande vazio
deixado na era medieval.
Segundo José de Aguiar Dias 30:
Nesse período, ficou estabelecido nitidamente o princípio geral da responsabilidade civil, afastando-se dos inúmeros casos em que foi instituída a composição obrigatória. Tais princípios estabeleceram algumas linhas de raciocínio, criando as seguintes categorias básicas: a que acarrete a responsabilidade penal do
agente perante o Estado, e a responsabilidade civil perante a vítima; a das pessoas que descumprem obrigações, que é culpa contratual; a que se origina da imprudência e negligência, não se ligando a crime ou delito.
Arnaldo Rizzardo31 segue o mesmo entendimento,
sustentando sua posição da seguinte forma:
No curso da revolução Industrial, as injustiças sociais e a exploração do homem pelo homem levaram à inspiração de idéias de cunho social, favorecendo o aprofundamento e a expressão da teoria da responsabilidade objetiva, com vistas a atenuar os males decorrentes do trabalho e a dar maior proteção às vítimas de doenças e da soberania do capital.
A teoria da responsabilidade se concretizou por intermédio
da doutrina, desenvolvendo-se, sobretudo na França, principalmente pelos
juristas franceses Domat e Pothier, responsáveis pelo Princípio da
Responsabilidade Civil e que influenciou quase todas as legislações que se
basearam na culpa.
30 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil, Vol. I. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997,
p. 20. 31 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2005, p. 34.
9
Foram surgindo certos princípios gerais e a responsabilidade
civil evoluiu sob o prisma de seu fundamento, baseando-se o dever de reparar o
dano não somente quando houvesse culpa, hipótese em que será subjetiva, como
também pela no risco, caso em que passará a ser objetiva, ampliando-se a
indenização de danos sem a existência de culpa. 32
A expansão da responsabilidade civil operou-se também no
que diz respeito à sua “extensão ou área de incidência, aumentando-se o número
de pessoas responsáveis pelos danos, de beneficiários da indenização e de fatos
que ensejam a responsabilidade civil”. 33
Quanto à densidade ou a profundidade da indenização, o
princípio é o da responsabilidade patrimonial, segundo o qual a pessoa deverá
responder com o seu patrimônio pelos prejuízos causados a terceiros, não
havendo limitação de valor para a reparação do dano, salvo nos casos de
estipulação contratual em que haja previsão de cláusula penal, vinculação de
certos bens, delimitação por valor de seguro, dentre outros. 34
A responsabilidade objetiva vai evoluindo e subdividi-se em
Teoria do Risco e Teoria do Dano Objetivo, sendo que a primeira, advém dano na
prática de atividade de risco, desencadeando o dever de reparar ou indenizar. Já
pela segunda, o ressarcimento decorre automaticamente pela verificação do
dano. 35
Tanto a responsabilidade objetiva quanto a responsabilidade
subjetiva serão estudadas em tópicos separados com mais propriedade.
Em nossa legislação pátria, existiram três fases distintas.
Na primeira, as Ordenações do Reino sustentavam-se no
direito romano, aplicando-o como subsidiário do direito brasileiro, devido à
32 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 12. 33 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 13. 34 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 13. 35 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2005, p. 35.
10
chamada lei da Boa Razão, de 18 de Agosto de 1769. Nesta fase, havia uma
grande confusão entre a reparação, a pena e a multa.36
A segunda fase concentrou-se no Código Criminal do
Império de 1830, em seus arts. 21 e 22, procedeu com a idéia de satisfação, isto
é, o ressarcimento do dano, que é usado até nos dias atuais.37
Por fim, a terceira fase distinguiu a responsabilidade civil da
penal, concentrando a satisfação do prejuízo decorrente do delito na legislação
civil.38
No Código Civil de 1916, esta regra foi proposta no art. 159,
consagrando a Teoria da Culpa, que assim aduz:
Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imperícia, violar direito e causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.
O atual Código Civil, Lei 10.406 de 10 de Janeiro de 2002,
consagra a Teoria do Risco e admite, juntamente com a responsabilidade
subjetiva, a responsabilidade objetiva, conforme se pode perceber com a leitura
dos artigos 186 e 927 ipsis litteris:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imperícia, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele, que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Como se pode verificar, o instituto da responsabilidade civil é
quase tão antigo quanto à história da humanidade, pois sempre houve ações ou
36 WILLEMANN, Carolina. A responsabilidade civil do cirurgião dentista não autônomo nas
situações de emergência. Disponível em: www.direitonet.com.br. Acesso em: 15 Fev. 2006. 37 WILLEMANN, Carolina. A responsabilidade civil do cirurgião dentista não autônomo nas
situações de emergência. Disponível em: www.direitonet.com.br. Acesso em: 15 Fev. 2006. 38 WILLEMANN, Carolina. A responsabilidade civil do cirurgião dentista não autônomo nas
situações de emergência. Disponível em: www.direitonet.com.br. Acesso em: 15 Fev. 2006.
11
omissões por parte dos homens, que de alguma forma vieram a ocasionar dano a
outrem, surgindo, por conseguinte, a subseqüente necessidade de ressarcimento.
Logo, a evolução da responsabilidade civil tem que ser
analisada sob o prisma pluridimensional, pois sua expansão se deu quanto à sua
história, aos seus fundamentos, a sua extensão ou área de incidência e a sua
profundidade ou densidade.
1.2 DEFINIÇÕES CONCEITUAIS
A doutrina, tanto pátria quanto estrangeira, tem enfrentado
grandes dificuldades para conceituar um dos mais importantes institutos do Direito
Civil, qual seja, a Responsabilidade Civil.
Para Rui Stoco39, o entendimento de Responsabilidade pode
ser “extraído da própria origem da palavra que vem do latim respondere,
responder alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar
alguém por seus atos danosos”.
Silvio Rodrigues40 cita a definição de Savatier que
Responsabilidade Civil é “a obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o
prejuízo causado a outra, por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que
dela dependam”.
Diante das etimologias das duas palavras que compõem o
termo, bem como das tendências atuais a respeito da responsabilidade civil,
Maria Helena Diniz 41 entende que:
(...) Responsabilidade Civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado,
39 STOCO, Rui. Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2001, p. 675. 40 SAVATIER. Traité de la Responsabilité Civile. Paris: 1939, Vol. I, nº. 1. Apud RODRIGUES,
Silvio. Direito civil – responsabilidade civil. Vol. IV. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 06. 41 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro – responsabilidade civil, 2002, p. 05.
12
por pessoa por quem ela responde, por coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.
Caio Mário Pereira da Silva42, entende que
“Responsabilidade Civil consiste na efetivação da reparabilidade abstrata do dano
em relação a um sujeito passivo da relação jurídica que se forma”.
Segundo Cléber Lúcio Almeida43, ela “pode ser conceituada
como a obrigação de reparar o dano – lesão a um bem ou interesse jurídico
protegido por uma norma – causado a outrem”.
É o que restou estampado no atual Código Civil brasileiro,
em seu artigo 927, caput:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Faz-se necessário ressaltar que a responsabilidade não se
confunde com obrigação, esta é um dever originário e não sucessivo. Assim, a
responsabilidade civil é o dever jurídico secundário que obriga o violador de um
dever jurídico primário a indenizar o ofendido. 44
Como se pode notar, a responsabilidade civil consiste na
aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou
patrimonial causado a outrem, em razão de ato por ela mesma praticado, ou pelo
fato de pessoas ou coisas que dela dependam ou por simples imposição legal;
visando em sua estrutura, a idéia da culpa quando se cogita da existência de um
ilícito, e a idéia da responsabilidade sem culpa, quando cogitar um risco
determinado legalmente.
42 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p.11. 43 ALMEIDA, Cleber Lúcio. Responsabilidade civil do empregador e o acidente de trabalho.
Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 18. 44 AVELAR, Ednara Pontes de. Responsabilidade civil - contratos de turismo. Disponível em:
www.direitonet.com.br. Acesso em 05 Jan. 2006.
13
1.3 FINALIDADE
Grande é a importância da responsabilidade civil, nos
tempos atuais, “por se dirigir à restauração de um equilíbrio moral e patrimonial
desfeito e à redistribuição da riqueza de conformidade com os ditames da justiça,
tutelando a pertinência de um bem, com todas as suas utilidades, presentes e
futuras, a um sujeito determinado”.45
Por isso, há em nosso ordenamento jurídico a
responsabilidade civil não só abrangida pela idéia do ato ilícito, mas também o
ressarcimento de prejuízos em que não se cogita da ilicitude da ação do agente
ou até da ocorrência do ato ilícito, o que se garante pela Teoria do Risco, haja
vista a idéia de reparação ser mais ampla do que meramente ato ilícito.46
1.4 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL
A Responsabilidade Civil pode apresentar-se sob diferentes
espécies, conforme a perspectiva em que se a analisa.
Neste sentido, Maria Helena Diniz47 oferece a seguinte
classificação:
1) Quanto ao fato gerador, hipótese em que se terá: a) responsabilidade contratual, se oriunda de inexecução de negócio jurídico bilateral ou unilateral (...); b) responsabilidade extracontratual ou aquiliana, se resultante do inadimplemento normativo, ou melhor, da prática de um ato ilícito por pessoa capaz ou incapaz ( CC, art. 927), visto que não há vínculo anterior entre as partes, por não estarem ligadas por uma relação obrigacional ou contratual.(...).
2) Em relação ao seu fundamento, caso em que se apresentará como: a) responsabilidade subjetiva, se encontrar sua justificativa na culpa ou dolo por ação ou omissão, lesiva a determinada pessoa (...); b) responsabilidade objetiva, se fundada no risco, que
45 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro – responsabilidade civil, 2002, p. 06. 46 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro – responsabilidade civil, 2002, p. 06. 47 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro – responsabilidade civil, 2002, p. 115.
14
explica essa responsabilidade no fato de ter o agente causado prejuízo à vítima ou a seus bens. (...).
3) Relativamente ao agente, isto é, a pessoa que pratica a ação. Assim a responsabilidade será: a) responsabilidade direta, se proveniente da própria pessoa imputada (...); b) responsabilidade indireta, se promanada de ato de terceiro, vinculado ao agente, de fato animal ou de coisa inanimada sob sua guarda.
Passa-se a estudar cada classificação separadamente com
mais propriedade.
1.4.1 Responsabilidade contratual e extracontratual
É comum fazer-se na doutrina a distinção entre
responsabilidade contratual que é aquela que deriva da relação contratual, e
responsabilidade delitual ou extracontratual, que é aquela que não deriva de
contrato, mas de infração ao dever de conduta, um dever legal, imposto
genericamente.
A primeira encontra seu fundamento no artigo 389 do Código
Civil ipsis litteris:
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por
perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
A segunda, no artigo 186 do mesmo diploma legal:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligencia ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Como se vê, a responsabilidade contratual é a que decorre
do descumprimento ou inadimplemento contratual, causando prejuízo aos outros
contratantes, estabelecendo o artigo 399 do Código Civil:
15
Art. 399. Não cumprindo a obrigação ou deixando de cumpri-la pelo modo e tempo devido, responde o devedor por perdas e danos.
Já, a responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana,
refere aquele que por ação ou omissão voluntária, negligencia ou imprudência
violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano. Pois o
artigo 186 do Código Civil, supra citado, disciplina, genericamente as
conseqüências derivadas da responsabilidade aquiliana.
Portanto, a responsabilidade nasce quando surge o
descumprimento, que pode ser de um dever legal (violação da lei ou principio
geral do direito) ou de um vínculo contratual.
Compreende-se na responsabilidade contratual, antes de
existir a obrigação de indenizar, o que existe é um vinculo jurídico entre o
inadimplente e o seu contratante, vinculo este derivado da convenção.
Na responsabilidade aquiliana antes da indenização,
nenhum liame jurídico existe entre o agente causador do dano e a vitima, só
existirá a partir do momento que o ato for praticado, gerando uma ação que a
principio gera obrigação de indenizar.
A responsabilidade civil que se constata na presente
pesquisa é a contratual, oriunda do Contrato de Transporte, porém a mesma será
estudada com mais propriedade no Capítulo 03 do presente trabalho monográfico.
1.4.2 Responsabilidade subjetiva ou teoria da culpa
Inicialmente, é de suma importância tecer algumas
considerações sobre a “culpa”.
Diz Arnaldo Rizzardo 48 em sua mais recente obra que:
A culpa no sentido estrito equivale à ação ou omissão involuntária que causa danos, e que se dá por negligência ou imprudência, no
48 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2005, p. 28.
16
que se expande em sentidos equivalentes, como descuido, imperícia, distração, indolência, desatenção e leviandade. No sentido lato, abrange o dolo, isto é, a ação ou omissão voluntária, pretendida, procurada, almejada, que também traz danos em ambas as dimensões, desrespeita-se a ordem legal estabelecida pelo direito positivo.
A culpa pode ser dividida em três graus: grave, leve e
levíssima. Sobre estes três graus da culpa estabelece Carlos Roberto
Gonçalves49:
A teoria subjetiva desce várias distinções sobre a natureza e a extensão da culpa. Culpa lata ou grave é a falta imprópria ao comum dos homens, é a modalidade que mais avizinha do dolo. Culpa leve é a falta evitável com atenção ordinária. Culpa levíssima é a falta evitável com atenção extraordinária, com especial habilidade ou conhecimento singular.
Para Sílvio Salvo Venosa50 a culpa grave, por quase se
aproximar do dolo pode ser entendida como consciente, pois “(...) o agente
assume o risco de que o evento danoso e previsível não ocorrerá”. Isto é, a culpa
grave é a culpa com previsão do resultado que se assemelha ao dolo eventual.
Já a culpa leve é a decorrente de infração a um dever de
conduta cabível a todos nós, é a culpa que pode ser evitada, enquanto que a
culpa levíssima é a que provém da falta de atenção que somente uma pessoa
muito atenta ou muito perita, dotada de conhecimento especial para o caso
concreto poderia ter. 51
Passa-se então a estudar a responsabilidade subjetiva.
Segundo a teoria da responsabilidade subjetiva, para que
haja a obrigação de indenizar é necessário que seja demonstrada a culpa do
49 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, 2003, p. 31. 50 VENOSA, Sílvio Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. Vol. IV, 2. ed. São Paulo: Atlas,
2002, p.22. 51 VENOSA, Sílvio Salvo. Direito civil: responsabilidade civil, 2002, p.22.
17
suposto violador do direito da vítima, sendo desta última a incumbência de provar
tal situação para que tenha direito à indenização.
Essa teoria, também chamada teoria da culpa, pressupõe a
culpa como fundamento da responsabilidade civil. Em não havendo culpa, não há
responsabilidade.
Desta forma, Sérgio Cavalieri Filho52 explica ser a culpa, de
acordo com a teoria clássica, o principal pressuposto da responsabilidade civil
subjetiva.
Logo, pode-se concluir sem sobra de dúvidas de que na
responsabilidade subjetiva, a vítima apenas terá o direito à indenização, nos
casos em que conseguir comprovar a culpa do agente.
Conforme se observa nas explicações de Roberto Senise
Lisboa53:
Na responsabilidade Subjetiva, via de regra cabe á vítima, provar a existência de todos os pressupostos da responsabilidade civil, inclusive a culpa, exceção feita à presunção de culpa, na qual a vítima irá provar apenas o dano e o nexo causal ficando ao agente provar que não agiu com culpa, sendo que não haverá responsabilidade caso não consiga provar isso ou verifique- se a ausência de nexo de causalidade, ou haja alguma excludente de culpabilidade.
Como se pode verificar pela exposição supra citada, a
responsabilidade que se baseia na culpa do autor do ilícito denomina-se subjetiva.
52 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 3. ed. São Paulo: Malheiros,
2003, p. 41. 53 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: obrigações e responsabilidade civil. Vol.
II. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 566.
18
1.4.3 Responsabilidade objetiva ou teoria do risco
A responsabilidade objetiva, também chamada de teoria do
risco, postula que todo dano deve ser indenizável independente do nexo de
causalidade entre dano e culpa. O elemento culpa não será analisado.
Logo, a teoria do risco que requer tão somente o nexo
causal e o efetivo dano, foi adotada no direito brasileiro apenas nas circunstâncias
expressas em lei, sendo a exceção da teoria da culpa, que é regra.
Com toda razão Carlos Roberto Gonçalves54 observa que:
Para esta teoria, toda pessoa que exerce alguma atividade cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. A responsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a idéia de risco, ora encarada como ‘risco-proveito’, que se funda no princípio segundo o qual é reparável o dano causado a outrem em conseqüência de uma atividade realizada em benefício do responsável (ubi
emolumentum, ibi onus)".
Segundo essa teoria, o dever de indenizar não mais
encontra amparo no caráter da conduta do agente causador do dano, mas sim no
risco que o exercício de sua atividade causa para terceiros, em função do proveito
econômico daí resultante.
O parágrafo único do art. 927 do Código Civil estabelece
que:
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos para o direito de outrem.
Da leitura deste dispositivo legal verifica-se que a
responsabilidade deixa de resultar da culpabilidade, para derivar da causalidade
material.
54 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, 2003, p. 29.
19
O Código Civil também previu outros casos em que o agente
responde independentemente de ser demonstrada a sua culpa como no art. 931
que estabelece:
Art. 931. Ressalvados outros casos previstos em lei especial, os empresários individuais e as empresas respondem independentemente de culpa pelos danos causados pelos produtos postos em circulação.
Também no art. 932, I a V c/c o 933 do mesmo diploma
legal, há previsão de responsabilidade objetiva em diversos casos, como
exemplo, os pais pelos seus filhos que estiverem sob a sua guarda, ipsis literis:
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;
III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;
V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia.
Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
No que tange a responsabilidade pelo fato da coisa previsto
nos arts. 937 e 938 do Código Civil e a responsabilidade por fato de animais do
art. 936 do mesmo diploma legal as mesmas são objetivas.
20
E, ainda, os arts. 929 e 930 que trata da responsabilidade
civil por ato lícito e os arts. 939 e 940 que prevêem a responsabilidade do credor
que demanda o devedor antes de vencida a dívida ou por dívidas já pagas, tratam
de responsabilidade civil objetiva, como segue:
Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.
Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.
Art. 939. O credor que demandar o devedor antes de vencida a
dívida, fora dos casos em que a lei o permita, ficará obrigado a esperar o tempo que faltava para o vencimento, a descontar os juros correspondentes, embora estipulados, e a pagar as custas em dobro.
Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.
Faz-se necessário ressaltar que a responsabilidade objetiva
não se confunde com aquela em que a culpa é presumida, neste caso a
responsabilidade também é subjetiva, ou seja, fundada na culpa, no entanto há
uma presunção da existência da culpa, conforme verificado no item anterior.
Destarte, verifica-se que o Código Civil adotou como regra a
responsabilidade civil subjetiva, ou seja, aquela fundada na culpa. No entanto, em
vários dos seus artigos previu a responsabilidade objetiva, na qual não se faz
necessário à presença do elemento culpa.
A Responsabilidade Civil do Transportador em relação ao
seu fundamento é objetiva, como será visto no capítulo 03 do presente estudo.
21
1.4.4 Responsabilidade direta e indireta
A responsabilidade relativa ao agente será direta, se
proveniente da própria pessoa imputada, onde o agente responderá, então, por
fato próprio, e será indireta, se promana de ato de terceiro, vinculado ao agente,
de fato animal ou de coisa inanimada sob sua guarda.
A responsabilidade direta é, pois a obrigação de indenizar
resultante de ação ou omissão culposa do agente, provado o nexo de causalidade
e o dano, tendo por fundamento legal os arts. 186 e 927 do Código Civil.
A responsabilidade indireta, por sua vez, é aquela que só
poderá ser vinculada indiretamente ao responsável, e só poderá ser encarada
dentro dos termos legais, não admitindo interpretação extensiva ou amplitiva.
Compreende duas modalidades: a) responsabilidade por fato
de terceiro, desde que o causador do dano esteja sob a direção de outrem, que
então responderá pelo evento lesivo, por disposição legal do art. 932 do Código
Civil; b) responsabilidade pelo fato das coisas animadas ou inanimadas, que
estiverem sob guarda de alguém, que se responsabilizará pelos prejuízos
causados por disposição legal dos arts. 936, 937 e 938 do Código Civil, mas
também há outros, como por exemplo os transporte que será estudado com mais
ênfase no Capítulo 03.
1.5 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Para que surja a obrigação de indenizar, faz-se necessária a
existência de determinados fatores, denominados pressupostos ou elementos da
responsabilidade civil.
Entretanto, como bem afirma Maria Helena Diniz55, “bastante
difícil é a caracterização dos pressupostos necessários à configuração da
responsabilidade civil, ante a grande imprecisão doutrinária a respeito”.
55 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro – responsabilidade civil, 2002, p. 35.
22
Diante dessa grande indeterminação doutrinária, optar-se-á
pela classificação de que são pressupostos da responsabilidade civil: a) ação ou
omissão do agente; b) culpa do agente; c) dano experimentado pela vítima; d)
nexo de causalidade.
Passa-se a fazer um breve estudo acerca de cada um
desses pressupostos.
1.5.1 Ação ou omissão do agente
No entendimento de Maria Helena Diniz56:
Ação é o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.
“A comissão vem a ser a prática de um ato que não se
deveria efetivar e a omissão, a não observância de um dever de agir ou da prática
de certo ato que deveria realizar-se”. 57
E, como bem salientado por Silvio Rodrigues58, diante da
ação e omissão: “A indenização pode derivar de uma ação ou omissão individual
do agente, sempre que, agindo ou se omitindo, infringe um dever legal, contratual,
ou social, isto é, se praticado com abuso de direito”.
Como se pode notar, a ação ou omissão do agente, para
constituir ato ilícito e consequentemente gerar direito à indenização, envolve a
infração de um dever legal, contratual ou social.
Faz-se necessário salientar que, a determinação de
indenizar dano causado a outrem pode advir de determinação legal, sem que a
pessoa obrigada a repará-lo tenha cometido qualquer ato ilícito. A
responsabilidade neste caso, se funda no risco, conforme visto anteriormente.
56 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 35. 57 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 35. 58 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Vol. IV. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1983, p. 04.
23
1.5.2 Culpa do agente
No nosso ordenamento jurídico vigora a regra geral da culpa
como fundamento da responsabilidade civil, apesar de existirem alguns casos de
responsabilidade sem culpa.
Faz-se necessário ressaltar que a culpa, para a
responsabilidade civil, é tomada pelo seu vocábulo latu sensu, abrangendo,
assim, também o dolo, isto é, todas as espécies de comportamento contrários ao
direito, sejam intencionais ou não, mas sempre imputáveis ao causador do dano.
Ao referir-se ação ou omissão voluntária a luz do artigo 186
do Código Civil, o legislador apresenta a questão do dolo na Responsabilidade
Civil e logo em seguida o mesmo faz referência também à culpa ao mencionar
negligência ou imprudência.
Neste sentido, Carlos Roberto Gonçalves59 ensina que “para
obter a reparação do dano, a vítima geralmente tem de provar dolo ou culpa
strictu sensu60 do agente”.
Entretanto, prevendo o legislador que em muitas ocasiões
torna-se impossível a produção da prova do dolo ou da culpa por parte da vítima,
elaborou as hipóteses específicas em que poderia haver a responsabilidade sem
culpa, a responsabilidade objetiva, com base na teoria do risco, abrangendo
também os casos de culpa presumida.
1.5.3 Dano
Como fora anteriormente mencionado, o dano é um
pressuposto da responsabilidade civil, contratual ou extracontratual, visto que não
poderá haver ação de indenização sem a existência de um prejuízo.
59 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, 1993, p.32. 60 Strictu Sensu do latim significa: “no sentido estrito. Indica que deve ser tomado em sentido
preciso, sem nenhuma extensão analógica”. ROSA, Patrícia Fornella. Dicionário técnico jurídico e latim forense. Florianópolis: Habitus, 2002, p. 188.
24
Segundo os ensinamentos de Carlos Alberto Bittar61:
(...) o dano é o prejuízo ressarcível experimentado pelo lesado, traduzindo-se, se patrimonial, pela diminuição patrimonial sofrida por alguém em razão de ação deflagrada pelo agente, mas pode atingir elementos de cunho pecuniário e moral. O dano pode referir-se a pessoa ou aos bens de terceiro (inclusive direitos), nos dois sentidos enunciados, patrimonial e moral – e em ambos –
mas, especialmente nessa última hipótese, deve ser determinado consoante critério objetivo, como pondera Barassi, e provado em concreto.
Verifica-se, assim, que há o dano moral (lesão a um bem
extrapatrimonial) e o material (lesão a um bem patrimonial).
O Código Civil em seu art. 402 menciona os danos
emergentes (o que a vítima efetivamente perdeu) e os lucros cessantes (o que a
vítima razoavelmente deixou de ganhar),
Art. 402. Salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar.
Para que haja dano indenizável, será imprescindível a
ocorrência dos seguintes requisitos: a) diminuição ou destruição de um bem
jurídico, patrimonial ou moral pertencente a uma pessoa; b) efetividade ou certeza
do dano; c) causalidade; d) subsistência do dano no momento da reclamação do
lesado; e) legitimidade; f) ausência de causas excludentes de responsabilidade.62
Destarte, percebe-se que o elemento dano é essencial a
configuração de qualquer tipo de responsabilidade, seja ela subjetiva ou objetiva.
E para que o dano seja caracterizado, é preciso à observância de alguns
requisitos, acima estudados.
61 BITTAR, Carlos Alberto. Responsabilidade civil nas atividades nucleares. Tese apresentada
ao curso de livre-docência para o Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP, 1982, p. 64.
62 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 53.
25
1.5.4 Nexo causal
Para que se pretenda responsabilizar alguém por ato
danoso, faz-se necessário provar a relação de causalidade, isto é, demonstrar
que devido à atitude culposa ou dolosa do agente resultou em um dano a vítima.
“O vínculo entre o prejuízo e a ação, designa-se nexo
causal, de modo que o fato lesivo deverá ser oriundo da ação, diretamente ou
como sua conseqüência previsível”.63
Orlando Gomes64 leciona que "para o ilícito ser fonte da
obrigação de indenizar, é preciso uma relação de causa e efeito entre o fato e o
dano. A essa relação chama-se nexo causal".
Entretanto, há fatos que rompem o nexo causal, são eles: o
estado de necessidade, a legítima defesa, a culpa da vítima, o fato de terceiro, a
cláusula de não indenizar e o caso fortuito ou força maior. Estes fatos são
denominados excludentes da responsabilidade civil, os mais importantes para o
presente trabalho serão melhor estudados ao ser analisados os a exoneração da
responsabilidade do transportador, sejam elas: caso fortuito ou força maior, a
culpa exclusiva da vítima e ainda o fato de terceiro.
Como se pode verificar, não pode-se falar em
responsabilidade civil sem que esteja presente o nexo causal, pressuposto
indispensável para a caracterização da responsabilidade civil.
1.6 MEIOS DE EXCLUSÃO DA RESPONSABILIDAE CIVIL
Existem algumas causas que excluem a responsabilidade
civil, porque a presença de uma delas atenua ou extingue o dever de ressarcir,
por atenuar ou extinguir a relação de causalidade.
63 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 81. 64 GOMES, Orlando. Obrigações. 10. Ed. rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 273.
26
Silvio de Salvo Venosa65 ensina que “excludentes de
responsabilidade, são aquelas que venham a impedir que se concretize o nexo
causal”.
Neste sentido, Maria Helena Diniz66 conclui que:
Para que o dano seja indenizável, isto é, para que haja reparação do dano por parte de seu agente causador, torna-se imprescindível os seguintes requisitos: diminuição ou destruição de um bem jurídico, patrimonial ou moral, pertencente a uma pessoa, a efetividade ou certeza de um dano, a causalidade, a subsistência de um dano, a legitimidade da vítima em pleitear o dano e a ausência das excludentes de responsabilidade.
As excludentes de Responsabilidade Civil nos Contratos de
Transporte de Pessoas serão estudadas de maneira mais profunda no Capítulo
03 deste trabalho.
O próximo capítulo fará uma abordagem acerca do instituto
dos contratos, passando pelas definições conceituais, seus princípios
fundamentais, sua classificação, formação, interpretação e extinção contratual,
com o objetivo de identificar o contrato de transporte.
65 VENOSA, Silvio Salvo. Direito civil – contratos em espécie e responsabilidade civil. São
Paulo: Atlas, Vol. III. 2001, p. 519. 66 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil, 2002, p. 61.
27
CAPÍTULO 2
DOS CONTRATOS EM GERAL
2.1 DEFINIÇÕES DE CONTRATO
Para um perfeito entendimento da Responsabilidade Civil
nos Contratos de Transporte de Pessoas, é extremamente importante que se
conheça as regras gerais dos contratos.
Etimologicamente o contrato vem do latim "contractu",
significando "trato com". Representa a combinação de interesses de pessoas
sobre determinada coisa. 67
A conceituação dos Contratos é diversa na doutrina pátria,
entretanto, “tradicionalmente, a tecnologia jurídica constrói o conceito de contrato
em torno da noção de acordo de vontades”.68
Segundo Maria Helena Diniz69:
Contrato é o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.
67 MARTINS, Francisco Serrano. A teoria da imprevisão e a revisão contratual no código civil
e no código de defesa do consumidor. Disponível em: www.jusnavegandi.com.br. Acesso em 01 de Jun. 2006.
68 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 18. 69 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais. Vol. III. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 24.
28
Para Orlando Gomes70, um contrato pode ser definido como
uma espécie de negócio jurídico71, de natureza bilateral ou plurilateral,
dependente, para sua formação, do encontro da vontade de pelo menos duas
partes, que criam, entre si, uma norma jurídica individual reguladora de interesses
privados. Nesse contexto, o contrato tem por fundamento o concurso da vontade
humana, limitada pela ordem jurídica, capaz de estabelecer direitos e obrigações,
em regra, entre as partes contratantes.
Seguindo esse mesmo entendimento, Jônatas Milhomens72
conclui que: “Através do contrato, em que duas ou mais pessoas manifestam sua
vontade sobre determinado objeto, o homem cuida dos seus interesses, satisfaz
suas necessidades, no constante movimento de atos que é a vida social”.
Diante do exposto, chega-se a definição de contrato como
um ato bilateral, pois depende de no mínimo duas declarações de vontade,
visando criar, modificar ou extinguir obrigações.
2.2 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO CONTRATUAL
Não há uniformidade na doutrina, mas em regra, como bem
explica Maria Helena Diniz73, regem as obrigações contratuais os princípios74 da
autonomia da vontade, do consensualismo, da obrigatoriedade da convenção, da
relatividade dos efeitos do contrato e o da boa fé.
70 GOMES, Orlando. Contratos. 17. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 11. 71 “Em direito civil, negócio jurídico é todo ato jurídico feito com manifestação da vontade do
agente. Ao contrário do ato jurídico, depende da vontade expressa do agente, geralmente por que quer atingir um objetivo previsto em lei”. WIKIPEDIA, A enciclopédia livre. Disponível em: http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%89tica. Acesso em: 01 Jun. 2006.
72 MILHOMENS, Jônatas. Manual prático dos contratos. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 06.
73 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, 2005, p. 44.
74 Como bem ensina Coelho: “Os princípios do direito contratual trata-se de normas de grande generalidade, expressas em dispositivos de direito positivo ou deles extraídas por via argumentativa, as quais ajudam a nortear os juízes na apreciação de demandas que versam sobre a existência, validade e cumprimento de contratos”. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, 2005, p. 23.
29
Passa-se a fazer uma breve abordagem acerca de cada um
dos princípios acima mencionados.
Na esfera contratual, o princípio da autonomia da vontade
corporifica-se na liberdade de contratar. “As partes, de forma livre, podem
convergir vontades com o objetivo de criar, modificar ou extinguir direitos
reconhecidos e tutelados pela ordem jurídica”. 75
Segundo o princípio do consensualismo, o simples acordo
de duas ou mais vontades basta para gerar o contrato válido, pois “a maioria dos
negócios jurídicos bilatérias é consensual, embora alguns, por serem solenes,
tenham sua validade condicionada à observância de certas formalidades legais”.76
Pelo princípio da obrigatoriedade da convenção, “as
estipulações feitas no contrato deverão ser fielmente cumpridas, sob pena de
execução patrimonial contra o inadimplente”. 77
Segundo o princípio da relatividade dos efeitos do contrato,
“a avença apenas vincula as partes que nela intervieram, não aproveitando nem
prejudicando terceiros, salvo raras exceções”. 78
Por fim, pelo princípio da boa fé “deve-se entender que as
partes contratantes, embora defendam interesses economicamente opostos,
prevalece o espírito da confiança e lealdade”. 79
Importante se faz ressaltar que, todos os princípios
contratuais estão ligados ao do respeito e proteção à dignidade da pessoa
humana (art. 1º, CF), dando tutela jurídica aos contratantes, para que efetivem a
75 SAMAPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: contratos. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002,
p. 18. 76 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 44. 77 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 45. 78 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 45. 79 SAMAPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil contratos, 2002, p. 23.
30
função social da propriedade (art. 1.118, § 1º CC), a do contrato (art. 421 CC) e a
justiça social (art. 170 CF). 80
2.3 CONDIÇÕES DE VALIDADE
Conforme já mencionado, os contratos são negócios
jurídicos e, como tal, devem atender a alguns requisitos sem os quais não
poderão ser juridicamente considerados como válidos.
Dessa forma, para que um contrato tenha plena validade
não basta à vontade das partes, é indispensável que estejam presentes duas
espécies de requisitos: de ordem geral e de ordem especial.
De ordem geral, que são comuns a todos os atos e
negócios jurídicos (CC, art. 104) ipsis litteris:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.
De ordem especial – específico dos contratos: o
consentimento recíproco ou acordo de vontades.
Far-se-á uma breve abordagem acerca de cada um dos
requisitos.
2.3.1 Da capacidade das partes
Cada uma das partes envolvidas na contratação deve ter
capacidade para praticar os atos da vida civil.
Sendo assim, as pessoas relacionadas nos artigos 3º e 4º do
Código Civil Brasileiro – os chamados absolutamente incapazes e relativamente
incapazes – não podem figurar como parte contratante, sob pena de o contrato
80 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 44.
31
ser considerado nulo ou anulável, como bem dispõe os seguintes artigos do
Código Civil:
Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz; (...).
Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico: I - por incapacidade relativa do agente; (...).
Outro requisito de fundamental importância referente à parte
é o da legitimação, ou seja, a aptidão para atuar em negócio jurídico.
Importada do Direito Processual, a legitimação é uma
qualidade circunstancial que não diz respeito à qualidade intrínseca da pessoa,
mas à posição dessa face ao objeto do contrato. 81
Logo, além de ser agente capaz, a parte contratante há de
ter legitimidade, ou seja, possuir uma relação de legítimo interesse com o objeto
do contrato.
2.3.2 Objeto lícito, possível, determinado ou determinável
A fim de o contrato ser considerado válido, seu objeto deve
ser lícito, possível, determinável e idôneo.
Conforme já enunciado, “o objeto sobre o qual versa a
contratação não pode ser contrário à lei, à moral, aos princípios da ordem pública
e nem aos bons costumes”. 82
Todo o objeto deve ser sempre lícito, consoante às
disposições legais e morais, os princípios da ordem pública e os bons costumes.
81 GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Da validade jurídica dos contratos eletrônicos.
Disponível em: www.jusnavegandi.com.br. Acesso em 01 Jun. 2006. 82 GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Da validade jurídica dos contratos eletrônicos.
Disponível em: www.jusnavegandi.com.br. Acesso em 01 Jun. 2006.
32
É mister que haja a possibilidade física e jurídica do objeto e que este seja
determinado, ou ao menos determinável, além de suscetível de valoração
econômica.83
2.3.3 Forma prescrita ou não defesa em lei.
Conforme será visto no decorrer do presente trabalho, o
Código Civil estabelece a liberdade de forma como regra e o formalismo como
exceção, apenas sendo relevante o elemento formal quando a lei o exigir.
Para Sílvio Rodrigues, “a exigência de forma especial tem
muitas finalidades, dentre elas, facilitar a prova, garantir a autenticidade do ato e
dificultar o vício de vontade por dolo ou coação” 84.
Destarte, a forma só é requisito para os atos formais e
solenes, assim definidos pela legislação.
2.3.4 Consentimento recíproco
De acordo com o já mencionado, o contrato consiste na
união de duas ou mais declarações de vontade que, embora distintas, convergem
para determinado objeto.
Torna-se importante observar que não basta à mera troca de
declarações para a formação do contrato, “é imprescindível que estas se integrem
e sejam coincidentes em relação aos direitos e deveres criados, modificados ou
extinguidos pelo instrumento contratual” 85.
Ao comentar sobre o requisito de ordem especial próprio dos
contratos, Carlos Roberto Gonçalves86 ensina que:
83 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2002, p. 05. 84 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Vol. III. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 16. 85 GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Da validade jurídica dos contratos eletrônicos.
Disponível em: www.jusnavegandi.com.br. Acesso em 01 Jun. 2006. 86 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2002, p. 07.
33
O consentimento recíproco ou acordo de vontades deve ser livre e espontâneo, sob pena de ter a sua validade afetada pelos vícios ou defeitos do negócio jurídico: erro, dolo, coação, simulação, fraude e lesão.
Maria Helena Diniz87 argumenta ainda que:
Deve haver coincidência de vontades, porque cada contraente tem determinado interesse e porque o acordo volitivo é força
propulsora do contrato: é ele que cria a relação jurídica que vincula os contraentes sobre determinado objeto.
Ressalta-se ainda que, a declaração de vontade não
prescinde de um formalismo rigoroso para ser feita. A regra é a informalidade.
Basta que o consentimento seja expresso por quaisquer meios inequívocos,
capazes de assegurar à outra parte o intuito de contratar.
2.4 DA CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS
“Os contratos classificam-se em diversas modalidades,
subordinando-se a regras próprias ou afins, conforme as categorias em que se
agrupam”. 88
Como bem ensina Silvio Rodrigues89:
A classificação é um procedimento lógico, por meio do qual, estabelecido um ângulo de observação, o analista encara um fenômeno determinado, grupando suas várias espécies conforme se aproximem ou se afastem umas das outras. Sua finalidade é acentuar as semelhanças e dessemelhanças entre as múltiplas espécies, de maneira a facilitar a inteligência do problema em estudo. Predomina na doutrina a classificação dos contratos em
unilaterais ou bilaterais; onerosos ou gratuitos; aleatórios ou comutativos; reais ou
87 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 29. 88 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2002, p. 22. 89 RODRIGUES, Silvio. Direito civil. Vol. III. 27 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 25.
34
consensuais; solenes ou não solenes; principais ou acessórios; paritários ou de
adesão; de execução imediata, diferida ou sucessiva; típicos ou atípicos.
Passa-se a estudar cada um deles com mais propriedade.
2.4.1 Contratos unilaterais ou bilaterais
Unilaterais são os contratos que criam obrigações
unicamente para uma das partes, como a doação pura, por exemplo. Bilaterais
são os que geram obrigações para ambos os contratantes, como a compra e
venda, a locação, o contrato de transporte, etc. 90
Silvio Rodrigues91 ensina que:
A distinção entre estas duas espécies de contrato é de enorme relevância, porque variam os efeitos do ato conforme o ajuste seja unilateral ou bilateral. Assim, a ‘expectio non adimpleti contratus’, ou seja, a “exceção do contrato não-cumprido” é peculiar às
convenções sinalagmáticas; também, a cláusula resolutiva tácita é inerente ao contrato bilateral e estranha ao unilateral, pois, como naquele, as prestações são recíprocas;(...).
Nota-se dessa forma, que nos contratos bilaterais há
obrigações para ambas as partes, e já nos unilaterais, apenas uma das partes
assume obrigações.
2.4.2 Contratos onerosos ou gratuitos
Gratuitos ou benéficos são os contratos em que apenas uma
das partes aufere benefício ou vantagem. Para a outra há só obrigação, como por
exemplo, nas doações puras. Nos onerosos, ambas as partes têm obrigações
patrimoniais, ambos buscam um proveito, ao qual corresponde um sacrifício. Na
compra e venda, por exemplo, a vantagem do comprador é representada pelo
recebimento da coisa, e o sacrifício, pelo pagamento do preço. 92
90 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2000, p. 23. 91 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, 2002, p. 28. 92 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2000, p. 23.
35
Nota-se a menção que Caio Mário da Silva Pereira93 traz
sobre o assunto:
É preciso não confundir a classificação dos contratos em bilaterais e unilaterais com a dos onerosos e gratuitos, embora haja coincidência de algumas espécies. Os contratos onerosos comumente são bilaterais, e os gratuitos da mesma forma unilaterais. Mas é apenas coincidência. O fundamento das classificações difere: uma tem em vista o conteúdo das obrigações, e outra, o objetivo colimado. Não há uma correspectividade necessária, pois que existem contratos unilaterais que não são gratuitos (e. g., o mútuo), e outros que são bilaterais e podem ser gratuitos (o mandato, por exemplo).
Assim, nos onerosos ambas as partes têm obrigações
patrimoniais, e nos gratuitos apenas uma das partes se compromete
economicamente.
2.4.3 Contratos aleatórios ou comutativos
Nos contratos comutativos cada uma das partes recebe, ou
entende que recebe uma contraprestação mais ou menos equivalente, como por
exemplo, na compra e venda. Nos aleatórios, porém, as partes se arriscam a uma
contraprestação inexistente ou desproporcional, como nos contratos de seguro,
de risco ou de aposta. 94
De acordo com Silvio Rodrigues95:
Na idéia de comutatividade se insere, de um certo modo, a de equivalência das prestações. Porque é normal que, nas convenções de intuito lucrativo, cada parte, só consinta num sacrifício, se aquilo que obtém em troca lhe for equivalente.
93 PEREIRA, Caio Mário da Silva, atualizado por Fichtener, Regis. Instituições de direito civil,
Vol. III. 11. ed. São Paulo: Forense, 2003, p. 67. 94 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2000, p. 28. 95 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, 2002, p. 31.
36
Como se pode verificar, os contratos comutativos são os de
prestações certas e determinadas. Já os contratos aleatórios, ao contrário,
caracterizam-se pela incerteza para ambas as partes.
2.4.4 Contratos reais ou consensuais
“Seguindo o princípio do consensualismo, em geral, os
contratos tornam-se perfeitos com o consenso das partes (acordo de vontades).
Isto é, a partir de então tem-se por geradas as obrigações” 96. Esses contratos
são chamados de consensuais.
Reais são os contratos que só se formam com a entrega
efetiva da coisa, como por exemplo, no mútuo, no depósito ou no penhor. A
entrega, aí, não é cumprimento do contrato, mais detalhe anterior, da própria
celebração do contrato. 97
Ressalta-se, desde já, que o contrato de transporte é
consensual, uma vez que se forma apenas com a aquiescência das partes.
2.4.5 Contratos solenes ou não solenes
Contratos solenes são os que devem obedecer à forma
prescrita em lei para a sua constituição, sob pena de nulidade. Não solenes são
os contratos de forma livre, basta o consentimento para a sua formação. 98
Para Fábio Ulhoa Coelho99:
Formais (ou solenes) são os contratos para cuja constituição exige a lei, além do consentimento das partes, a forma escrita. Não admitem, por isso, a contratação oral; tampouco a eletrônica: os contratos formais devem ser celebrados necessariamente por escrito lançado em suporte papel. Antes de confeccionado e assinado o instrumento, o contrato não se aperfeiçoa, não existe.
96 SAMAPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: contratos, 2002, p. 39. 97 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2000, p. 34. 98 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2000, p. 34. 99 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 48.
37
O mesmo autor segue argumentando que “para ser formal o
contrato é indispensável expressa previsão na lei, já que, em regra, qualquer
forma é admissível para os negócios jurídicos (CC, art. 107)” 100.
Assim reza o art. 107 do código Civil:
Art. 107. A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.
Dessa forma, conclui-se que, em regra, os contratos têm
forma livre, salvo expressas exceções.
2.4.6 Contratos principais ou acessórios
Principal é o contrato autônomo, isso é, cuja existência não
depende de outro. Já o acessório é o contrato que existe em função do principal,
desse modo, extinguindo-se o principal, o contrato acessório deixa de existir no
mundo jurídico. 101
Segundo Silvio Rodrigues102:
Se o contrato principal é nulo, ineficaz, igualmente será o acessório; assim, se um contrato de fiança estiver adjeto a um contrato de locação e este for declarado nulo por incapacidade absoluta de uma das partes, nula será a fiança. Todavia, a recíproca não é verdadeira. Se a fiança for ineficaz, por um defeito qualquer, a nulidade do acessório não contamina o principal, que sobreviverá intocado. A fiança não produz efeito; a locação; sim.
Assim, principais são os que subsistem de forma
independente, e acessórios são os que só existem em função de um outro
contrato.
100 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 48. 101 FÜHER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de obrigações e contratos. 25. ed. São
Paulo: Malheiros, 2005, p. 39. 102 RODRIGUES, Silvio. Direito civil, 2002, p. 36.
38
2.4.7 Contratos partidários ou de adesão
Partidários são os contratos em que as partes estão em pé
de igualdades, escolhendo o contratante e debatendo livremente as cláusulas. De
adesão, os contratos em que uma das partes detém um monopólio de direito ou
de fato, e impõe todas as cláusulas, em bloco, cabendo à outra apenas aderir ou
não ao estipulado. 103
O Código do Consumidor (Lei nº. 8.078/90) em seu artigo 54
estabeleceu que:
Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente o seu conteúdo.
Considerando que o contrato de adesão é elaborado apenas
pelo proponente, caso haja dúvida no sentido de alguma das cláusulas, a
interpretação deverá ser em benefício do aderente, que como regra é a parte
mais fraca. 104
O contrato de transporte de pessoas, como será visto no
próximo capítulo, é um contrato de adesão, pois uma das partes impõe os termos
do pacto, sendo que a outra simplesmente adere ao contrato pré-estabelecido,
concordando com as suas condições.
2.4.8 Contrato de execução imediata, diferida ou sucessiva
Contrato de execução imediata é aquele onde as partes
cumprem seus deveres e auferem seus direitos em um único momento, como, por
exemplo, a venda e compra a vista, posto que nesse contrato, o vendedor,
mediante o recebimento integral do preço, transfere a propriedade do bem ao
comprador. De execução diferida é o contrato no qual, pelo menos uma das
103 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2000, p. 39. 104 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 53.
39
partes, deverá cumprir a sua obrigação em época diversa da celebração do pacto,
exemplificando, a venda e compra cujo pagamento se dará em uma futura
parcela. 105
Nesse sentido, Caio Mário da Silva Pereira106 ensina que:
De execução sucessiva ou de trato sucessivo, ou execução continuada, é o contrato que sobrevive, com a persistência da obrigação, muito embora ocorram soluções periódicas, até que, pelo implemento de uma condição, ou decurso de um prazo, cessa o próprio contrato. O que caracteriza é o fato de que os pagamentos não geram a extinção da obrigação, que renasce. A duração ou continuidade da obrigação não é simplesmente
suportada pelo credor, mas é querida pelas partes contratantes. Caso típico é a locação, em que a prestação do aluguel não tem efeito liberatório, senão do débito correspondente a período determinado, decorrido ou por decorrer, porque o contrato continua até a ocorrência de uma causa extintiva.
Como bem se pode notar, os contratos de execução
imediata são cumpridos no ato, por ambas as partes e já os contratos de
execução diferida são os contratos de prazo único e, os contratos de execução
sucessiva, são cumpridos em etapas periódicas.
2.4.9 Contratos típicos e atípicos
Típicos são os contratos previstos em nosso ordenamento
jurídico, ou seja, aqueles que já possuem suas características estabelecidas na
legislação, como, por exemplo, o contrato de locação imobiliária (Lei nº. 8.245/91),
o contrato de compra e venda (CC artigos 481 e seguintes), o contrato de seguro
(CC artigos 757 e seguintes), o contrato de corretagem (CC artigos 722 e
seguintes). 107
105 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2000, p. 32. 106 PEREIRA, Caio Mário da Silva, atualizado por Fichtener, Regis. Instituições de direito civil,
2003, p. 70. 107 FÜHER, Maximilianus Cláudio Américo. Resumo de obrigações e contratos, 2005, p. 39.
40
Por sua vez, atípicos são os contratos criados pelas partes e
que não foram previstos pelo legislador, como um contrato de compra e venda de
matéria prima cumulado com fornecimento de mão de obra. 108
Para Caio Mário da Silva Pereira109:
A celebração de um contrato atípico exige-lhes o cuidado de
descerem a minúcias extremas, porque na sua disciplina legal falta a sua regulamentação específica. Na solução das controvérsias que surgirem, o julgador ou interprete terá de invocar em suprimento do conteúdo das cláusulas próprias os princípios legais relativos ao contrato típico mais próximo, e isto nem sempre é fácil, porque a ocupação de zona grísea, entre mais de um, sugere às vezes aproximações várias, nenhuma das quais dotada de pura nitidez.
Nos termos do art. 425 do Código Civil: “é lícito às partes
estipularem contratos atípicos, desde que sejam observadas as normas gerais
fixadas neste Código”.
2.5 DA FORMAÇÃO E LUGAR DOS CONTRATOS
O momento da formação do contrato é de vital importância
para o estudo do contrato. A partir do seu nascimento, surgem direitos e
obrigações decorrentes do vínculo obrigacional.
Conforme fora visto anteriormente, o contrato é o acordo de
vontades das partes contratantes, tácito ou expresso, que se manifesta de um
lado pela oferta e de outro pela aceitação. 110
Logo, como bem ensina Maria Helena Diniz111 :
108 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito das obrigações: parte especial, 2000, p. 32. 109 PEREIRA, Caio Mário da Silva, atualizado por Fichtener, Regis. Instituições de direito civil,
2003, p. 61. 110 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 74. 111 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 74.
41
A proposta e a aceitação são elementos indispensáveis à formação do contrato, e entre elas gira toda a controvérsia sobre a força obrigatória do contrato, sobre o momento exato em que ambas se fundem para produzir a relação contratual, e sobre o lugar em que se reputará celebrado o negócio jurídico.
A oferta ou proposta é uma declaração receptícia de
vontade, dirigida por uma pessoa à outra (com quem pretende celebrar um
contrato), por força da qual a primeira manifesta sua intenção de se considerar
vinculada, se a outra parte aceitar. 112
A aceitação é a manifestação de vontade, expressa ou
tácita, da parte do destinatário de uma proposta, feita dentro do prazo, aderindo a
esta em todos os seus termos, tornando o contrato definitivamente concluído,
desde que chegue, oportunamente, ao conhecimento do ofertante. 113
Ao comentar sobre o assunto, Fábio Ulhoa Coelho114
argumenta que “em todos os contratos, mesmo nos instantaneamente
constituídos e executados, podem divisar a proposta e o aceite”.
O mesmo autor segue exemplificando que quando adquiro o
jornal do dia a dias na banca, realizo contrato de consumo, pelo qual o fornecedor
manifesta sua proposta ao expor a mercadoria à venda, e eu, minha aceitação, ao
colher o exemplar e entregar o dinheiro.115
Portanto, “o contrato nasce da convergência da proposta e
aceitação. É, portanto, negócio jurídico bilateral resultante do encontro de
negócios jurídicos unilaterais” 116.
112 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 75. 113 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 75. 114 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, 2005, p. 18. 115 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, 2005, p. 18. 116 ULHOA, Fábio. Curso de direito civil, 2005, p. 18.
42
Há de ser observado ainda que o contrato possa ser
concluído entre pessoas que estão na mesma localidade (entre presentes) ou
entre pessoas que estão em lugares diversos (entre ausentes).
Nota-se a menção que Maria Helena Diniz117 traz sobre o
assunto:
Se o negócio jurídico contratual for entre presentes, a proposta
(ou policitação) poderá estipular ou não prazo para a aceitação. Se a proposta não contiver prazo para a aceitação, esta deverá ser manifestamente imediatamente, senão deixará de ter força vinculativa. Se a proposta estipulou prazo, a aceitação deverá ser pronunciada no termo concedido, sob pena de desvincular-se o policitante. Se o contrato for entre ausentes, existindo prazo, este
deverá ser obedecido, mas se a aceitação atrasar – por falha do correio, p. ex. – o proponente deverá dar ciência do fato ao aceitante, sob pena de responder por perdas e danos (CC, art. 430). Se o ofertante não estipulou qualquer prazo, a aceitação
deverá ser manifestada dentro de tempo suficiente para chegar à resposta ao conhecimento do proponente.
Em relação ao tempo da constituição do contrato, como bem
esclarece Fabio Ulhoa Coelho118, “é, em princípio, o do recebimento da aceitação
pelo proponente, se ainda estiver obrigado pela proposta”.
O mesmo autor119 segue esclarecendo que:
A proposta só começa a vincular o proponente quando dela toma conhecimento o destinatário; por sua vez, a aceitação só importa
a conclusão do contrato no momento de sua ciência pelo proponente. Há uma exceção, contudo. Os contratos entre ausentes consideram-se celebrados quando do envio tempestivo,
pelo aceitante, de sua aceitação (CC, art. 434). Se o encontro de vontades dá-se por correspondência epistolar – fato raríssimo hoje em dia -, será a data da postagem desta a do contrato, desde que não vencido o prazo da oferta.
117 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 68. 118 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 83. 119 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 83.
43
Por sua vez, o lugar do contrato, nos termos do art. 435 do
Código Civil, será o da proposta, salvo se as partes contratarem por modo
diverso, como segue:
Art. 435. Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto.
Faz-se necessário salientar que, pela Lei de Introdução do
Código Civil (art. 9º, § 2º), aplicável no direito internacional privado, a obrigação
resultante do contrato considerar-se-á constituída no lugar em que residir o
proponente, ipsis literis:
Art. 9º - Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que constituírem.
§ 1º (...)
§ 2º - A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente.
2.6 DA INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS
“O contrato, por ser originário de declaração de vontade,
requer, como a lei, uma interpretação, dada a possibilidade de conter cláusula
duvidosa ou qualquer ponto obscuro ou controvertido”. 120
“A lei regula uma determinada conduta social, enquanto o
contrato limita os interesses do pactuante”. 121
Por ser a interpretação do contrato indiscutivelmente similar
à lei, (uma vez que até se pode afirmar uma certa coincidência entre as duas),
120 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 78. 121 LOPES, Miguel Maria de Serpa. Curso de direito civil - fontes das obrigações: contratos.
vol. III. 6. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1996, p. 45.
44
“aplicam-se a hermenêutica do contrato princípios concernentes à interpretação
da lei”. 122
O legislador pátrio, atento a essa dificuldade da linguagem,
estabeleceu no art. 112 do CC que “Nas declarações de vontade se atenderá
mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”.
Procurou, dessa forma, afastar o apego excessivo à letra,
que mata, dando valor ao pensamento, que vivifica; determinando ao intérprete
que reconstruísse, da maneira mais aproximada possível, a vontade real dos
contratantes, no momento da formação dos contratos.
Para isso, poderia observar o que costumeiramente é
acordado em contratos do mesmo tipo; o que normalmente as pessoas se
obrigam; o que o bom senso e a boa-fé determinam para a sua melhor
interpretação.
2.7 DA EXTINÇÂO CONTRATUAL
A partir da formação do contrato, as partes aguardam o
cumprimento das obrigações pactuadas, como decorrência natural do vínculo
jurídico criado pelas declarações de vontades.
Segundo Fábio Ulhoa Coelho123: “Trata-se a extinção do fato
jurídico em razão da qual o contrato termina, chega ao fim, deixa de existir”.
Segundo Maria Helena Diniz124: “Extingue-se normalmente o
contrato pela sua execução e o credor atestará o pagamento por meio de
quitação regular (CC, arts. 319, 320, 322 e 323)”.
Assim rezam os arts. Acima mencionados:
122 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 78. 123 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 109. 124 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 175.
45
Art. 319. O devedor que paga tem direito a quitação regular, e pode reter o pagamento, enquanto não lhe seja dada.
Art. 320. A quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular, designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu representante.
Art. 322. Quando o pagamento for em quotas periódicas, a quitação da última estabelece, até prova em contrário, a presunção de estarem solvidas as anteriores.
Art. 323. Sendo a quitação do capital sem reserva dos juros, estes presumem-se pagos.
“A quitação é o ato pela qual se atesta o pagamento,
provando-o, exonerando-se, então, o devedor da obrigação cumprida”.125
A execução pode ocorrer no próprio momento da formação
(execução instantânea); num momento previamente determinado (execução
diferida) ou durante todo o tempo de vigência do contrato (execução continuada).
“No entanto, nem sempre o contrato atinge o seu fim por
meio do cumprimento das obrigações geradas. Situações há em que o vínculo
contratual se extingue antes das partes atingirem os fins almejados” 126.
Diante disso, como bem ensina Rogério Sampaio127, há as
seguintes situações:
Causas anteriores ou contemporâneas à formação do contrato. Hipóteses que levam à invalidação do contrato, quer por nulidade relativa (anulação) ou por nulidade absoluta (declaração de nulidade). Causas superveniente à formação dos contratos. Hipóteses que levam a dissolução do vínculo. Elas se classificam em: resolução, resilição e rescisão.
125 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 161. 126 SAMAPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: contratos, 2002, p. 57. 127 SAMAPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito civil: contratos, 2002, p. 57.
46
Segundo Orlando Gomes128, o contrato padece de nulidade
absoluta quando:
(...) praticado por agente absolutamente incapaz; quando seu objeto for ilícito ou impossível; se não revestir a forma prevista em lei ou for preterida alguma solenidade essencial exigida pela norma para a sua validade; a lei taxativamente o declarar nulo ou lhe negar efeito.
O mesmo autor segue argumentando que o contrato sofre
de nulidade relativa “quando celebrado por pessoas relativamente incapaz com
vício resultante de erro, dolo, coação, simulação ou fraude” 129.
Em relação às causas supervenientes, a extinção nesses
casos verifica-se sobre o tríplice aspecto:
A Resolução é forma de extinção contratual que ocorre em
virtude do inadimplemento de uma das partes contratantes. A inexecução pode
ser culposa ou não. 130
Resilição: resilir significa extinguir o contrato por vontade de
uma ou de ambas as partes. Etimologicamente, advém do latim resilire, que
significa ‘voltar atrás’. A resilição pode ser bilateral ou unilateral. A bilateral
realiza-se por mútuo consenso dos contratantes em extinguir o vínculo contratual
e, a unilateral pode ocorrer nos contratos por tempo indeterminado, nos de
execução continuada e nos contratos em geral, cuja execução não tenha
começado. Produz efeitos para o futuro. 131
Rescisão é a ruptura do vínculo contratual em que houve
lesão. A lesão determina a dissolução do contrato e pode ser obtida mediante
ação judicial. Os vícios rebiditórios132 autorizam a rescisão contratual em virtude
128 GOMES, Orlando. Contratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 172. 129 GOMES, Orlando. Contratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 173. 130 GOMES, Orlando. Contratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 175. 131 GOMES, Orlando. Contratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 175. 132 Segundo Diniz: “Denominam-se vícios rebiditórios ou defeitos ocultos os que tornam a coisa
imprópria ao uso a que é destinada ou lhe diminuam o valor, podendo o adquirente enjeita-la,
47
do desequilíbrio entre as prestações do contrato comutativo. Requer a conjunção
de dois elementos: lesão grave, capaz de ocasionar desbalanceamento das
prestações do contrato, como manifesta desvantagem para uma das partes;
exercício do direito dentro do prazo legal. 133
O assunto é carecedor de exames mais profundos. No
entanto, por não ser o tema principal do presente estudo, fez-se um comentário
sintético a respeito dos contratos em geral, passando o capítulo seguinte a se
abordar assuntos mais atrelados ao tema principal.
rescindindo o contrato. Essa responsabilidade subsiste para o alienante em todos os contratos comutativos, em razão da garantia que neles impera”. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, 2005, p. 185.
133 GOMES, Orlando. Contratos. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 173.
48
CAPÍTULO 3
A RESPONSABILIDADE CIVIL NOS CONTRATOS DE TRANSPORTE DE PESSOAS
3.1 NOÇÃO GERAL DO CONTRATO DE TRANSPORTE
O estudo da Responsabilidade Civil nos Contratos de
Transporte de Pessoas passa, inicialmente, pela análise, a guisa de introdução,
da noção geral do contrato de transporte.
O contrato de transporte tem sua origem numa época em
que o ser humano atinge determinado grau de relacionamento, fazendo nascer a
necessidade de intercâmbio entre os povos, seja para fins comerciais, seja para
fins políticos, tornando-se necessário o translado de pessoas e objetos. 134
Num primeiro momento, o transporte foi de suma
importância para as cidades gregas, principalmente os transportes marítimos, ao
passo que regulou as normas de dano e avarias nos navios, bem como de
descarto de objetos ao mar, no caso de perigo de naufrágio. 135
Com toda razão, Sílvio de Salvo Venosa136 observa que: “o
surgimento de melhores meios de comunicação exigiu o estabelecimento de
regras para diferenciar o transporte de coisas e de pessoas em suas várias
modalidades”.
134 ROSADAS, Rafael Rodrigues. Contrato de transportes – breves comentários. Disponível
em: www.direitoacademico.com.br. Acesso em: 20 Fev. 2006. 135 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil – contratos em espécie. Vol. III. 4. ed. São Paulo:
Atlas, 2004, p. 492. 136 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil – contratos em espécie, 2004, p. 492.
49
Tratando-se de legislação pátria, o nosso Código Comercial
(1850), foi o primeiro do mundo a regular o transporte de pessoas, embora se
ativesse mais ao transporte de coisas e ao transporte marítimo.
O Código Civil de 1916 não trazia qualquer dispositivo sobre
o contrato de transporte. A sua regulamentação era feita por leis esparsas e pelo
Código Comercial.
Surgiram, então, algumas normas sobre o transporte
ferroviário, algo regulando o transporte terrestre, mas uma legislação
condensada, que contivesse os princípios norteadores do contrato, não havia. 137
E, como bem salientado por Ruy Rosado de Aguiar138: “(...)
devido a essa legislação condensada decorria muitas dificuldade, seja para as
empresas transportadoras, seja para os aplicadores do Direito”.
Assim, somente o atual Código Civil, Lei nº. 10.406, de 10 de
Janeiro de 2002, veio suprir essa deficiência e regular o contrato de transporte,
num Capítulo com três seções: Seção I, Parte Geral; Seção II, Transporte de
Pessoas; Seção III, Transporte de Coisas.
Pontes de Miranda139, discorrendo sobre o assunto, define
que “contrato de transporte é o contrato pelo qual alguém se vincula, mediante
retribuição, a transferir de um lugar para o outro pessoas ou bens”.
O Código Civil, com base nesta definição, define essa
espécie de contrato em seu art. 730, que assim aduz:
Art. 730. Pelo contrato de transporte alguém se obriga, mediante retribuição, a transportar, de um lugar para o outro, pessoas ou coisas.
137 AGUIAR, Ruy Rosado de. Contrato de transporte de pessoas e o novo código civil, 2003,
p. 617. 138 AGUIAR, Ruy Rosado de. Contrato de transporte de pessoas e o novo código civil, 2003,
p. 617. 139 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972, p. 08.
50
Portanto, o transporte ou é de pessoas, ou de coisas.
O contrato de transporte é tipicamente um contrato de
adesão, isto é, as cláusulas gerais referentes ao contrato, às condições do
negócio, estão explicitadas em um documento que genericamente contém todas
as disposições a respeito do contrato, mas que não é apresentado para aquele
que vai utilizar o serviço.
Sobre contrato de adesão, Nelson Dower140 traz a seguinte
definição:
Tratando-se de contrato de adesão, um das partes apenas adere às condições preestabelecidas pela outra parte, sem nenhuma alternativa. Vale dizer, uma das partes, qual seja, o vendedor, dotado de uma posição dominante na relação contratual, impõe determinadas cláusulas, nas quais geralmente inexiste poder de negociação por parte do adquirente.
O mesmo autor segue acrescentando que o contrato de
transporte é ainda bilateral por envolver duas partes que possuem obrigações
contratuais; é comutativo por serem equivalentes as obrigações para ambas as
partes; é oneroso por pressupor o pagamento ou contraprestação.141
Tendo em vista o tema do presente trabalho, dar-se-á
ênfase ao Contrato de Transporte de Pessoas.
3.2 DO CONTRATO DE TRANSPORTE DE PESSOAS
O contrato de transporte de pessoas, como bem sintetiza
Maria Helena Diniz, “É aquele em que o transportador se obriga a remover uma
pessoa e sua bagagem de um local para o outro, mediante remuneração”. 142
140 DOWER, Nelson Godoy Bassil. Curso moderno de direito civil: contratos e
responsabilidade civil. São Paulo: Nelpa, 2005, p. 24. 141 DOWER, Nelson Godoy Bassil. Curso moderno de direito civil: contratos e
responsabilidade civil, 2005, p. 25. 142 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2005, p. 442.
51
Segue a referida autora143, ao citar Orlando Gomes,
complementando que o contrato de transporte apresenta os caracteres jurídicos
de:
1º) Bilateralidade, por originar obrigações tanto para o
transportador como para o passageiro ou expedidor. O transportador deverá remover a coisa ou pessoa de lugar para o outro, e o passageiro ou expedidor terá o dever de pagar o preço ajustado, que é a passagem ou frete.
2º) Onerosidade, por haver vantagens para ambos os contraentes.
Tal onerosidade lhe é essencial, pois o serviço de transporte é atividade econômica de fim lucrativo. Se porventura for gratuito, ter-se-á contrato, mas a responsabilidade do transportador obedecerá a norma diversa, entendendo-se que, havendo dano, a presunção de culpa será tão somente juris tantum.
3º) Comutatividade, porque as prestações de ambas as partes contratantes já estão certas, não ficando na dependência de algum evento futuro e incerto. (...)
4º) Consensualidade, visto que se aperfeiçoa pelo mútuo
consentimento dos contraentes, admitindo qualquer meio de prova permitido em direito. No transporte de pessoas, o bilhete de
passagem, expedido pelo transportador, provará o pagamento do
preço, dando ao passageiro o direito de exigir daquele execução do contrato, isto é, sua remoção de um local para o outro.
Segundo Fábio Ulhoa Coelho144: “No transporte de pessoas,
se o próprio contratante do serviço tem o interesse voltado ao deslocamento de
sua pessoa, ele é chamado de passageiro”.
“Nessa modalidade de contrato há dois contraentes: o
transportador, que é a pessoa que se compromete a fazer o transporte, e o
passageiro, que se propõe a ser transportado, pagando um certo preço”.145
143 DINIZ, Maria Helena. Teoria das obrigações contratuais e extracontratuais. 2005, p. 467. 144 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 395. 145 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, 1993, p. 251.
52
Importante se faz ressaltar que “o transporte feito
clandestinamente ou gratuitamente, por amizade ou cortesia, não se subordina às
normas do contrato de transporte e gera responsabilidade subjetiva”. 146 Nessa
hipótese o transportador terá responsabilidade extracontratual (CC, art. 736).
Assim reza o art. 736 do Código Civil:
Art. 736. Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia.
Parágrafo único. Não se considera gratuito o transporte quando, embora feito sem remuneração, o transportador auferir vantagens indiretas.
Maria Helena Diniz147 esclarece que:
Se o passageiro, conduzido gratuitamente, vier a sofrer uma lesão, só poderá acionar o transportador, provando a sua negligência, imprudência ou imperícia, para haver reparação do dano. Mas é preciso lembrar que não será gratuito o que, feito sem remuneração, trouxer ao transportador vantagens indiretas (CC, art. 736, parágrafo único). É o que se dá, por exemplo, com o hoteleiro que transporta gratuitamente seus hóspedes de seu hotel até o aeroporto ou a locais de turismo, com o intuito de ampliar seus serviços, angariando mais clientes.
Conforme visto anteriormente, por sua natureza, o contrato
de transporte de pessoas é um Contrato de Adesão, uma vez que suas cláusulas
são previamente estipuladas pelo transportador, às quais o passageiro
simplesmente adere no momento da celebração.
A partir do momento em que o passageiro dá a sua adesão
às condições preestabelecidas pelo transportador, está celebrado o contrato.
146 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 487. 147 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e
extracontratuais, 2005, p. 487.
53
É ainda um contrato consensual, bilateral, oneroso e
comutativo, posto que para a sua celebração basta o simples encontro de
vontades; criam direitos e obrigações para ambas as partes e há um equilíbrio
entre as respectivas prestações.
De todas as características mencionadas, a mais importante
é a cláusula de incolumidade, que no próprio contrato de transporte está implícita.
E, como bem salientado por Antônio Márcio Cossich148
diante da cláusula de incolumidade:
A obrigação do transportador é de fim, de resultado, e não apenas de meio. Não se obriga ele a tomar providências e cautelas necessárias para o bom sucesso de transporte; obriga-se pelo fim, isto é, garante o bom êxito. Tem o transportador o dever de zelar pela incolumidade do passageiro na extensão necessária a lhe evitar qualquer acontecimento funesto.
Em suma, entende-se por cláusula de incolumidade a
obrigação que tem o transportador de conduzir o passageiro são e salvo ao lugar
de destino.
Maria Helena Diniz149 afirma ainda que o contrato de
transporte de pessoas é um título de legitimação, pois:
O passageiro adquire um bilhete de passagem, que poderá ser nominativo ou ao portador, e dará direito a quem se apresentar
com ele de ser transportado; é, portanto, um título de legitimação, que atesta a vontade do adquirente de ser transportado de um lugar para o outro, e a do transportador de realizar o transporte.
Prossegue ainda a citada autora dizendo que o bilhete de
passagem “constitui a prova do contrato de transporte. A falta, irregularidade ou
148 COSSICH, Antônio Márcio Figueira. Responsabilidade civil do transportador. Disponível em:
www.passosuemg.br/faculdade/fadipa. Acesso em: 20 Fev. 2006. 149 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, 1993, p. 253.
54
perda do bilhete não prejudica a existência e eficácia do contrato, dentro do seu
prazo de validade”. 150
Neste mesmo sentido, Sílvio de Salvo Venosa151 esclarece
que “o bilhete de passagem, ou simplesmente passagem, emitido pelo
transportador ou seu mandatário, é a prova do contrato de transporte de
pessoas”.
Porém, como bem ensina Arnaldo Rizzardo152, “em certos
tipos de transporte é dispensada a passagem, o que acontece, em geral, nos
trens, nas barcas, em coletivos de circuito urbano e em bondes”.
O contrato de transporte de pessoas abrangerá a obrigação
de transportar a bagagem do passageiro ou viajante no próprio compartimento em
que ele viajar ou em depósitos apropriados dos veículos, mediante despacho,
hipótese em que o transportador fornecerá nota de bagagem, que servirá de
documento para a retirada no local de destino.
Nota-se a menção que Maria Helena Diniz153 traz a respeito
do transporte de bagagem:
O transporte de bagagem é assessório do contrato de transporte de pessoa, de modo que o viajante, ao contratar o transporte, pagando bilhete de passagem, adquirirá pó direito de transportar consigo sua bagagem, e o condutor assumirá a obrigação de fazer esse transporte. O passageiro só pagará o transporte de sua bagagem se houver excesso de peso, tamanho ou volume.
Deve-se ressaltar ainda que, a cláusula de não indenizar
não é admitida no contrato de transportes de passageiros, de acordo com
determinação do STF, que dita que em contrato de transporte é inoperante a
cláusula de não indenizar (Súmula 161 de STF).
150 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, 1993, p. 253. 151 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil – contratos em espécie, 2004, p. 508. 152 RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil: lei n. 10.406, de 10.01.2002, 2005, p. 443. 153 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, 1993, p. 255.
55
Faz-se necessária a transcrição da Súmula 161 do STF, in
verbis:
STF Súmula nº. 161. Em contrato de transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar.
Nesta cláusula, o transportador, que naturalmente se obriga
a indenizar os prejuízos resultantes de dano futuro, estipularia no contrato, em
comum acordo com o outro contratante, já que este que adere ao contrato
demostrando sua aceitação, a sua irresponsabilidade pelo inadimplemento
eventual, não provocado por si mesmo, mas por terceiro ou por fortuito. Também
o Decreto 19.473/30 proíbe a cláusula de não indenizar.
Conforme já mencionado, o contrato de transporte de
pessoas é um contrato sinalagmático, gerando, portanto, direitos e obrigações
para ambas as partes, como será viso no decorrer do presente capítulo.
3.3 MODALIDADES DE TRANSPORTE
Segundo Maria Helena Diniz154, as espécies de transportes
podem ser classificadas da seguinte forma:
1º) Quanto ao objeto conduzido: a) transporte de pessoas, em que
o transportador se obriga a transportar pessoas portadoras de passagem, que se titula num bilhete extraído pelo transportador. A passagem é um título de legitimação. b) transporte de coisas,
animadas ou inanimadas, contendo operações como o depósito de mercadorias a serem expedidas, relacionadas em um documento denominado conhecimento, a carga e descarga. O expedidor deverá remunerar o transportador. Essa remuneração designa-se frete.
2º) Em atenção ao meio empregado: a) transporte terrestre, que se subdivide, em função do veículo utilizado, ferroviário,
rodoviário; em função da extensão coberta, em urbano,
intermunicipal, metropolitano, interestadual, interestadual e internacional; b) transporte aquaviário, que poderá ser marítimo,
154 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, 1993, p. 226.
56
se ocorrer no mar, hidroviário ou fluvial, se realizado em rios ou lagos; c) transporte aéreo.
3º) Em relação à forma do transporte de mercadoria, o transporte poderá ser: a) Modal, se se utiliza de um meio de transporte, ou
seja, a mercadoria desde o embarque até o destino foi transportada por via aérea, rodoviária, ferroviária, fluvial ou marítima; b) Segmentado, se a carga for transportada por veículos
diversos, sendo contratados separadamente os vários serviços e os diferentes transportadores; c) Sucessivo, se a mercadoria para
chegar ao seu destino precisar ser transportada em veículos da mesma modalidade de transporte, mas para tanto haverá apenas um contrato de transporte; d) Intermodal, se a mercadoria for
transportada mediante o uso de várias modalidades de transporte,
por via rodoviária e depois por via marítima. O transporte multimodal avançou tecnologicamente com o emprego dos containers, com a especialização de navios porta-containers e dos
terminais portuários, vindo a servir como instrumento de apoio à política ativa do comércio exterior.
Ruy Rosado de Aguiar155 ensina ainda que, além das
espécies acima descritas, o contrato de transporte pode ser ainda coletivo ou
individual.
Prossegue ainda o citado autor ensinando que:
O contrato coletivo de transporte se estabelece quando vão, no mesmo veículo, duas ou mais pessoas, cada uma delas celebrando um contrato com a transportadora. Isto é, são diversos contratos que fazem entre a transportadora e os que são transportados no mesmo veículo. Se por ventura tivermos várias pessoas transportadas no mesmo veículo, mas o contrato é um só, não teremos contrato coletivo. Pode ser que eventualmente apenas uma pessoa seja transportada, mas é contrato coletivo se permitindo o acesso de outras.
Em um táxi, o contrato de transporte será um contrato individual,
se realizado por uma pessoa e só ela paga, embora sejam diversos conduzidos. Mas, será contrato coletivo (para os que
155 AGUIAR, Ruy Rosado de. Contrato de transporte de pessoas e o novo código civil. Rio de
Janeiro: Renovar, 2003, p. 617.
57
admitem esse tipo de contrato coletivo com táxi) se cada um paga a sua parte para o taxista, não obstante viajem todos no mesmo táxi e dirijam-se ao mesmo lugar. 156
Interessa aqui o transporte terrestre, e especificamente de
pessoas.
3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL NO TRANSPORTE DE PASSAGEIROS
Conforme se verificou no primeiro capítulo deste trabalho, a
obrigação de indenizar está calcada em três pressupostos: o dano ou prejuízo, o
ato ilícito e o nexo de causalidade entre estes elementos.
Dessa forma, havendo a reunião destes em um determinado
fato, surge a responsabilidade civil, ou seja, o lesado deverá ser reparado pelo
seu ofensor.
A responsabilidade civil no transporte de passageiros no
Brasil teve início com o Decreto Legislativo n.º 2.681, de 07/12/1912, que regulou
o aludido instituto através do princípio de que a culpa será sempre presumida, ou
seja, se o transportador teve culpa ou não no evento, deverá indenizar o
passageiro transportado, admitindo-se apenas três excludentes desta
responsabilidade : caso fortuito, força maior e culpa da vítima.157
O caso fortuito ou força maior e a culpa exclusiva da vítima
estão explícitos no Decreto 2.681/12 que regula a responsabilidade das estradas
de ferro, onde a jurisprudência estendeu às Empresas de Ônibus, já o fato de
terceiro foi uma novidade implantada pelo Código de Proteção e Defesa do
Consumidor. 158
156 AGUIAR, Ruy Rosado de. Contrato de transporte de pessoas e o novo código civil, 2003,
p. 617. 157 MENTA, Ilso Pedro. Responsabilidade Civil no Transporte Coletivo de Passageiros.
Disponível em: www.ntu.org.br/publicacoes/publicacoes. Acesso em: 20 Jun. 2006. 158 MARTINS, Rodrigo Monteiro. Responsabilidade Civil do Transportador nos casos de
assaltos com morte de passageiros. Disponível em: www.proteus.limeira.com.br. Acesso em: 20 Jun. 2006.
58
O art. 734 do Código Civil traz a seguinte redação:
Art. 734. O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade.
Ao estudar o artigo supra citado, Rafael Rosado159 conclui
que:
(...) o legislador, ao normatizar as regras do contrato de transporte, imputou ao transportador a responsabilidade civil objetiva no caso dos danos causados. Chegamos facilmente a essa conclusão ao analisar a primeira parte do artigo, onde apenas atribui a responsabilidade ao transportador, não se preocupando em avaliar se o nexo causal existente entre a ação/omissão e o dano efetivamente causado foi eivado de culpa ou dolo. Inclusive institui que qualquer cláusula que exclua tal responsabilidade será considerada nula, seguindo orientação transcrita pela sumula 161 do STF, in verbis: “Em contrato de
transporte, é inoperante a cláusula de não indenizar” .
O art. 735, também do Código Civil, vem para reforçar a
atribuição da responsabilidade objetiva ao transportador, ao afirmar que:
Art. 735. A responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.
A este respeito, note o exemplo que Rafael Rosadas160 traz
sobre o assunto:
Um exemplo clássico para essa situação é aquele em que um passageiro sofre danos materiais decorrente de um acidente com o ônibus que o transportava, acidente esse provocado por veículo de um terceiro que avançou o semáforo fechado em seu sentido. Nesse caso, o passageiro recorre judicialmente à empresa de
159 ROSADAS, Rafael. Contrato de transportes - breves comentários. Disponível em:
www.odireito.com. Acesso em: 23 jun. 2006. 160 ROSADAS, Rafael. Contrato de transportes - breves comentários. Disponível em:
www.odireito.com. Acesso em: 23 jun. 2006.
59
transporte, cabendo a ela uma ação regressiva em face do motorista causador do acidente.
Conforme visto nessa relação contratual, tanto o passageiro
quanto o transportador têm direitos e obrigações. Logo, passa-se a estudá-las
com maior propriedade.
3.4.1 Transportador – direitos e obrigações
A responsabilidade civil do transportador poderá ser
examinada sob três aspectos distintos: em relação aos seus empregados, em
relação a terceiros e em relação aos passageiros.
Como bem ensina Fabrini Muniz Galo161:
Com relação a terceiros a responsabilidade do transportador é extracontratual. Não há entre eles nenhuma relação jurídica contratual; são estranhos até o momento em que tem lugar o acidente, dele decorrendo o vínculo jurídico ensejador do dever de indenizar. O art. 37, § 6º, da Constituição Federal dispõe ser esta responsabilidade objetiva, fundada no risco administrativo. Esse dispositivo constitucional só se aplica à responsabilidade extracontratual porque o texto fala em terceiros e terceiro é quem
não tem relação jurídica contratual com o causador do dano.
A mesma autora segue argumentando que a
responsabilidade em relação aos empregados “será fundada no acidente de
trabalho, uma vez que há entre a empresa e o empregado uma relação contratual
trabalhista”. A indenização deverá ser pleiteada junto ao INSS. Mas, havendo
dolo ou culpa do empregador, poderá ser também pleiteada uma indenização de
Direito Comum, com base no art. 7º, XXVIII, da Constituição.
“Apenas em relação ao passageiro a
responsabilidade do transportador será contratual, fundada no contrato de
transporte, aspecto que passaremos a examinar com maior vagar”. 162
161 GALO, Fabrini Muniz. Responsabilidade civil do transportador no transporte de pessoas.
Disponível em: www.jusnavegandi.com. Acesso em 23 Jun. 2006.
60
Passa-se a fazer uma abordagem acerca da
responsabilidade do transportador perante o passageiro.
A responsabilidade civil do transportador em geral,
apresenta-se no mundo jurídico através de um contrato, o contrato de transportes,
que, como foi visto anteriormente, é o meio pelo qual uma parte se obriga a
conduzir, de um lugar para outro, pessoas ou coisas, mediante uma retribuição
previamente estabelecida.
Para Fábio Ulhoa Coelho163:
O transportador, recupero, é necessariamente empresário (pessoa física ou jurídica). Ele deve organizar a atividade econômica de prestação de serviços de transporte para poder cumprir satisfatoriamente suas obrigações contratuais e ter meios para respeitar os direitos do outro contratante. Sem a organização empresarial que dê adequado lastro operacional e econômico ao serviço de transporte, ninguém está em condições de atender às obrigações e responsabilidades impostas por lei ao transportador.
Como bem esclarece Maria Helena Diniz164, uma vez
celebrado o contrato de transporte de pessoas, o transportador será responsável
se:
a) não transportar o passageiro de um local para o outro, no tempo e no modo convencionados (CC, art. 737);
b) não efetuar o transporte com cuidado exatidão e presteza;
c) houver danos causados aos viajantes, oriundos de desastres não provocados por força maior ou caso fortuito (RT, 781:710) ou por culpa exclusiva do passageiro (Dec.n. 2.681/12, art. 17), caso em que deverá pagar uma indenização variável conforme a natureza ou a extensão do prejuízo;
162 GALO, Fabrini Muniz. Responsabilidade civil do transportador no transporte de pessoas.
Disponível em: www.jusnavegandi.com. Acesso em 23 Jun. 2006. 163 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 395. 164 DINIZ, Maria Helena. Tratado teórico e prático dos contratos, 1993, p. 505.
61
d) se atrasar, na saída ou na chegada, caso em que deverá pagar os danos acarretados aos passageiros em virtude desse atraso, desde que ele não tenha sido motivado por força maior (Dec.n. 2.681/12, art. 24);
e) causar dano ao passageiro, sem motivo de força maior, por ter suspendido ou interrompido o tráfico ou não lhe ter oferecido lugar no veículo, causando-lhe graves prejuízos, desde que ele tenha adquirido bilhete para o transporte ser feito em determinada hora (Dec.n. 2.681/12, art. 25);
f) não cumprir o contrato, se o transporte for cumulativo, relativamente ao seu percurso, caso em que deverá responder pelos danos pessoais que nele se derem (CC, art. 733);
Logo, Fábio Ulhoa Coelho165 sintetiza que as obrigações do
transportador no transporte de pessoas são: levar a pessoa ao destino, não
recusar serviço sem base no regulamento ou por motivo de saúde, higiene,
observar horários, itinerários e demais condições de contrato, arcar com os custos
da interrupção da viagem e restituir o valor da passagem ao passageiro
desistente.
Entre os direitos do transportador, destaca-se o direito
procedimental de retenção de bagagem do passageiro, assim definido pelo art.
742 do Código Civil, ipsis litteris:
Art. 742. O transportador, uma vez executado o transporte, tem direito de retenção sobre a bagagem de passageiro e outros objetos pessoais deste, para garantir-se do pagamento do valor
da passagem que não tiver sido feito no início ou durante o percurso.
“A hipótese é de pagamento diferido para o final da viagem.
Não se aplica, por exemplo, se foi contratado o pagamento da passagem a
prazo”. 166
165 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 396. 166 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil – contratos em espécie, 2004, p. 503.
62
Outro direito de suma importância é o direito de reter 5%
(cinco por cento) do valor da passagem no caso de desistência do passageiro
elencados nos § 1º e 2º do art. 740 do Código Civil, in verbis:
Art. 740. O passageiro tem direito a rescindir o contrato de transporte antes de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo de ser renegociada.
§ 1º Ao passageiro é facultado desistir do transporte, mesmo depois de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor correspondente ao trecho não utilizado, desde que provado que outra pessoa haja sido transportada em seu lugar.
§ 2º Não terá direito ao reembolso do valor da passagem o usuário que deixar de embarcar, salvo se provado que outra pessoa foi transportada em seu lugar, caso em que lhe será restituído o valor do bilhete não utilizado.
Essa retenção serve na verdade, para amenizar as
despesas que o transportador tem, como por exemplo, a emissão de bilhete de
passagem, o papel utilizado, a tinta da máquina de imprimir, a hora de trabalho do
funcionário que vendeu a passagem, dentre outros. 167
O art. 738 do Código Civil dispõe que a pessoa transportada
deve sujeitar-se às normas estabelecidas pelo transportador, abstendo-se de
quaisquer atos que causem incomodo ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o
veículo, ou dificultem ou impeçam a execução normal do serviço. Acrescenta o
parágrafo único:
Parágrafo único. Se o prejuízo sofrido pela pessoa transportada for atribuível à transgressão de normas e instruções regulamentares, o juiz reduzirá equitativamente à indenização, na
medida em que a vítima houver concorrido para a ocorrência do dano.
167 ROSADAS, Rafael Rodrigues. Contrato de transportes – breves comentários. Disponível
em: www.direitoacademico.com.br. Acesso em: 20 Fev. 2006.
63
Conforme determina o art. 739 do Código Civil, o
transportador poderá impedir o embarque de passageiro mal trajado ou sob o
efeito de álcool e entorpecentes, ou substância que gere dependência físico-
psíquica, como segue:
Art. 739. O transportador não pode recusar passageiros, salvo os casos previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou de saúde do interessado o justificarem.
A este respeito Sílvio Salvo Venosa168 ensina que:
A regra geral é no sentido de que o transporte de pessoas é um serviço público, um direito constitucional do indivíduo se locomover. Nesse sentido, o transportador não poderá recusar passageiro, salvo os casos previstos nos regulamentos, ou se as condições de higiene ou saúde do interessado o justificarem.
A exoneração da responsabilidade civil do transportador
somente ocorrerá nos casos em que não restar provado o nexo causal entre a
conduta e a lesão, no caso de fato exclusivo do passageiro.
3.4.2 Passageiro – obrigações e direitos
O passageiro somente fará jus ao transporte com o
pagamento da importância determinada para o percurso da viagem, e esta o
passageiro obrigado a demonstrar a aquisição do bilhete quando for requisitado.
Em contrapartida, o passageiro tem o direito de ocupar o
lugar mencionado no bilhete, bem como tem direito a ser transportado com
presteza e exatidão, do lugar do início de sua viagem ao lugar da chegada.
“Passageiro é a pessoa transportada. Mesmo não sendo ele
o contratante do serviço, cumpre-lhe o atendimento a um dever estabelecido em
lei no interesse dos demais usuários do mesmo transporte”. 169
Assim determina o art. 738 do Código Civil:
168 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil – contratos em espécie, 2004, p. 501. 169 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 400.
64
Art. 738. A pessoa transportada deve sujeitar-se as normas estabelecidas pelo transportador, constantes no bilhete ou afixadas à vista dos usuários, abstendo-se de quaisquer atos que causem incômodo ou prejuízo aos passageiros, danifiquem o veículo, ou dificultem ou impeçam a execução normal do serviço.
Dessa forma, os passageiros devem sujeitar-se ao
regulamento170 do transporte baixado unilateralmente pelo transportador (a cujas
condições e termos aderem pelo simples fato de embarcarem no veículo de
transporte).
O parágrafo único do artigo 738 traz ainda, a derradeira
implicação da inobservância do dever imposto ao passageiro é a
proporcionalização da indenização a que ele faria jus por força de acidente de
transporte para o qual sua conduta ilícita tenha contribuído.
Nota-se o exemplo que Fábio Ulhoa Coelho171 traz para o
assunto:
Se o usuário do metrô, sem motivo justificável e por simples brincadeira, aciona o dispositivo de emergência existente no vagão e machuca-se em razão da parada abrupta do trem
subterrâneo, não terá direito de ser indenizado pelo valor integral dos danos que sofreu (sem prejuízo, é claro, da obrigação de indenizar os que tiver causado).
O passageiro também poderá rescindir, unilateralmente, o
contrato de transporte, sendo-lhe devida à restituição, nos termos do art. 740 §§
do CC, ipsis litteris:
Art. 740. O passageiro tem direito de rescindir o contrato de transporte antes de iniciada à viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor da passagem, desde que feita a comunicação ao transportador em tempo de ser renegociada.
170 Cf. Coelho: “O regulamento é que baixado unilateralmente pelo empresário transportador, visa
garantir a segurança e o conforto de todos os passageiros durante a viagem”. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 401.
171 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. III. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 401.
65
§ 1º. Ao passageiro é facultado desistir do transporte, mesmo depois de iniciada a viagem, sendo-lhe devida a restituição do valor correspondente ao trecho não utilizado, desde que provado que outra pessoa haja sido transportada em seu lugar.
§ 2º. Não terá direito ao reembolso do valor da passagem o usuário que deixar de embarcar, salvo se provado que outra pessoa foi transportada em seu lugar, caso em que lhe será restituído o valor do bilhete não utilizado.
Como se pode verificar, o transportado também algumas
obrigações, entre elas a de se sujeitar às normas e regulamentos do transporte,
pagar o preço, apresentar-se no momento da partida, não assumir condutas que
prejudique os demais passageiros e, caso ele descumpra a norma regulamentar
ou da própria lei civil, e com isso causar um dano, responderá por ele, e, nesse
caso, se ele também sofre o dano, terá sua indenização reduzida na medida de
sua culpa.
3.5 ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS
Nos próximos parágrafos serão expostos alguns
entendimentos jurisprudenciais a respeito da Responsabilidade Civil nos
Contratos de Transporte de Pessoas.
O primeiro julgado trazido trata-se da Apelação Cível nº.
2000.001.17471, julgado em 20/02/2004, pela Quinta Câmara Cível, Rel. Des.
Milton Fernandes de Souza, e trata da responsabilidade civil no contrato de
transporte:
RESPONSABILIDADE CIVIL. CONTRATO DE
TRANSPORTE. PROVA INDIRETA. DANOS MATERIAIS E MORAL. 1- As
regras de experiência comum fixam-se diante dos procedimentos ordinários da
sociedade (art. 335 do CPC) e, aliadas à prova indireta, servem à formação
segura do convencimento do Juízo sobre a existência de um fato. 2- Caracteriza-
se o descumprimento da obrigação do transportador, ou o defeito do seu
serviço, e enseja o dever de indenizar os danos material e moral daí decorrentes
quando, em virtude da colisão do ônibus em que era transportado, o passageiro
66
não chega incólume ao seu destino. 3- Se da incapacidade decorrente da tesão
física advinda com o acidente não resultou uma efetiva perda patrimonial, porque
o passageiro estava em férias e não perdeu rendimento do trabalho, bem como
não realizou gastos com médico ou medicamentos, inexiste dano material a ser
indenizado. 4- Mas esse estado físico do passageiro, ferido e total e
temporariamente incapacitado durante o período de suas férias, é motivo de
constrangimento capaz de atentar contra a sua dignidade e caracteriza o dano
moral. (TJRJ. APELACAO CIVEL Nº 2000.001.17471, Reg. em 30/03/2004,
QUINTA CAMARA CIVEL, Rel. DES. MILTON FERNANDES DE SOUZA).
Noutro julgado, Apelação Cível 2003.024090-0, julgado em
31/08/2004, sendo Relator: Des. Jaime Ramos, trata de indenização por acidente
de trânsito no transporte de pessoas:
INDENIZAÇÃO POR ACIDENTE DE TRÂNSITO - IMPUTAÇÃO DE
RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA AO DER/SC POR INSUFICIÊNCIA DE
SINALIZAÇÃO E INEXISTÊNCIA DE RÓTULA NO CRUZAMENTO ENTRE
RODOVIAS - SINALIZAÇÃO EXISTENTE - CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA -
AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DA AUTARQUIA - RECURSO NÃO
PROVIDO. Comprovado nos autos que no trevo de cruzamento entre duas
rodovias estaduais havia sinalização indicando que veículo deveria parar antes de
cruzá-lo, não há que se falar em culpa do DER/SC (atual DEINFRA) por
insuficiência de sinalização, não tendo sido causa do acidente, também, a
inexistência de rótula no local, se a vítima, que conduzia o veículo provocador
tinha ampla visibilidade e deveria ter tomado as cautelas necessárias antes de
cruzá-lo, parando o automóvel em obediência à placa de "PARE" que lhe era
totalmente visível. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - CONDENAÇÃO EM
VALOR EXCESSIVO - REDUÇÃO DE OFÍCIO - POSSIBILIDADE. "Em se
tratando de condenação de grande monta e se revelando desmedidos os
honorários advocatícios fixados em Primeiro Grau, é possível que o Tribunal
proceda à sua adequação de ofício, a fim de se evitar o ônus excessivo a uma
das partes" (Apelação Cível n. 1998.002310-6, de Chapecó. Relª. Desª. Salete
Silva Sommariva). ÔNUS PROCESSUAIS DA DENUNCIANTE, FRENTE À
67
LITISDENUNCIADA - POSSIBILIDADE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS -
MINORAÇÃO - APLICAÇÃO CONFORME O ARTIGO 20, § 4° DO CPC.
Improcedente o pedido inicial e, destarte, prejudicada a denunciação da lide
formulada pela demandada, sujeita-se esta, em relação à lide secundária, aos
efeitos da sucumbência, arcando com os honorários advocatícios do patrono da
denunciada. No entanto, o excessivo o valor aplicado deve ser minorado de ofício,
para conformá-lo aos parâmetros do artigo 20, § 4º do Código de Processo Civil.
Há também que se destacar o seguinte acórdão:
RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR POR ATO CRIMINOSO
DE TERCEIRO. ARREMESSO DE PEDRA QUE FERE PASSAGEIRO DENTRO
DE ÔNIBUS. Inexistência, no caso, de dissídio com a Súmula n. 187, que não é
aplicável quando o terceiro é equiparável, para o transportador, a caso fortuito ou
de força maior, pela inevitabilidade do fato, apesar de observadas as condições
para o transporte decorrente da concessão pública e, por isso mesmo,
compatíveis com a tarifa estabelecida. (STF – 1a T. – RE Rel. Min. Moreira
Alves – j. 15.5.87 – RTJ 122/1181).
A ainda, a Apelação cível 1997.006595-7, sendo Relator
Jorge Schaefer Martins, em 31/03/2005:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO CUMULADA
COM PERDAS E DANOS. PESSOA INSCRITA EM CONCURSO PÚBLICO.
QUEBRA DO ÔNIBUS QUE A CONDUZIA. ATRASO DE ÔNIBUS.
ELIMINAÇÃO DO CONCURSO. ALEGAÇÃO DE CARÊNCIA ECONÔMICA
PELA EXCLUSÃO DO CERTAME. INSCRIÇÃO. MERA EXPECTATIVA DE
DIREITO. AUSÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. RECURSO NÃO PROVIDO. Na
verdade, como bem salientado pela Magistrada de Primeiro Grau, é sabido que a
simples inscrição no concurso público não indica a sua aprovação, existindo
somente uma expectativa de direito quanto à realização das provas. Além disso,
mesmo que realizada a prova prática, poderia não obter êxito; ou, caso aprovada,
não existe a garantia de que fosse nomeada para ocupar o cargo. A propósito, a
68
jurisprudência entende que a aprovação no concurso é mera expectativa de
direito. Ante o exposto, negou-se provimento ao recurso.
Conclui-se, então, que a pretexto do entendimento de alguns
magistrados das Cortes Cíveis, que quando caracterizado o descumprimento da
obrigação do transportador, ou o defeito do seu serviço, logo enseja o dever de
indenizar os danos material e moral daí decorrentes. Logo, é objetiva a
responsabilidade civil do transportador e, portanto, basta ao viajante demonstrar,
objetivamente, que a sua incolumidade não restou assegurada.
Não necessita comprovar a causa do acidente, ou a culpa do transportador, nem
a relação de causa e efeito entre o transporte e o acidente.
Ao transportador cumpre demonstrar que não faltou à sua
obrigação, ou que o acidente se deu por caso fortuito ou motivo de força maior,
ou, ainda, fato exclusivo da vítima.
Em relação ao fato de terceiro, divide-se a doutrina e a
jurisprudência. Uns entendem que este se equipara ao caso fortuito e, portanto,
exime o transportador de responsabilidade civil. Outros, ao revés, entendem que
o fato de terceiro não exime o transportador de responsabilidade, competindo-lhe,
apenas, atuar regressivamente em face do efetivo causador do dano.
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69
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como objetivo investigar, á luz da
legislação e da doutrina pátria, a Responsabilidade Civil no Contrato de
Transporte de Pessoas.
Para o seu desenvolvimento lógico o trabalho foi dividido em
três capítulos.
O primeiro capítulo tratou da responsabilidade civil
apresentada no ordenamento jurídico brasileiro e doutrinas, explanando seus
principais requisitos e pressupostos.
Conforme disposto naquele capítulo, a responsabilidade civil
vem se adaptando através dos tempos às reparações do dano não somente
assitidas através da culpa, mas também para as reparações que não resultam de
atos ilícitos propriamente ditos, e sim, do exercício regular de uma atividade que
representa um risco assumido pelo agente, pois tal atividade proporciona um
benefício.
Juntamente, foi discorrido sobre as espécies da
responsabilidade civil e seus pressupotos, sendo que responsabilidade civil pode
ser Contratual, quando derivada da inexecução de negócio jurídico;
Extracontratual, quanfo fere uma norma prevista num ordenamento jurídico;
Subjetiva, assentando-se na idéia da culpa e Objetiva, fundada na teoria do risco.
É imprescindível citar que a responsabilidade civil tem como
pressupostos a ação ou omissão do agente; o dano; a culpa e o nexo de
causalidade, que interliga o dano e a ação que gerou a responsabilidade.
O segundo capítulo foi destinado ao estudo dos contratos
em geral. Buscou-se caracterizar as regras gerais dos contratos perante o
172 Nota de Rodapé da Citação Longa. 173 Nota de Rodapé da Citação Curta.
70
ordenamento juridico brasileiro. Para tanto, demonstrou-se algumas definições de
contrato, os princípios fundamentais do direito contratual, suas condições de
validade, a classificação contratual, a formação e lugar dos contratos, a sua
interpretação, bem como a sua extinção.
No terceiro e último capítulo estudou-se, especificamente, a
responsabilidade civil no contrato de transporte de pessoas, buscando
caracterizar o contrato de transporte de pessoas baseando-se nos requisitos e
pressupostos antes apreciados, com o objetivo de demonstrar os direitos e
obrigações tanto do transportador quanto do passageiro.
Por fim, retoma-se as hipóteses básicas da pesquisa:
a) no que foi demonstrado, o transportador é obrigado a
transportar o passageiro no tempo e meio convencionados e a zelar pela
segurança do viajante e sua respectiva bagagem.
b) o passageiro ficará vinculado às obrigações constantes do
bilhete de passagem emitido pelo transportador ou por ele afixado em local
visível, confirmando-se esta hipótese.
c) se o tempo do transporte não for respeitado e o
passageiro sofrer danos, não havendo excludentes de responsabilidade – caso
fortuito ou força maior – confirmou-se que a empresa de transporte responderá
pelos danos.
d) Confirmou-se também a hipótese de que a
responsabilidade contratual do transportador por acidente com o passageiro não é
elidida por culpa de terceiro, contra o qual tem ação regressiva.
e) Por fim, restou confirmada também a hipótese de que o
transporte feito clandestinamente ou gratuitamente, por amizade ou cortesia, não
se subordina às normas do contrato de transporte e gera responsabilidade
subjetiva.
71
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