Arthur Moura - Pensar a Greve Das Universidades No RJ

Embed Size (px)

DESCRIPTION

http://passapalavra.info/2015/05/104134

Citation preview

Pensar a greve das universidades no RJ7 de maio de 2015Categoria:Ideias & DebatesComentar|ImprimirNo se constri mobilizaes populares sem um balano poltico do carter das mobilizaes passadas.PorArthur MouraA possibilidade de greve que a se coloca j existe como mobilizao prtica, com direito a represso em Estados e municpios que no o Rio de Janeiro neste ano de 2015. No entanto, muito combatidaa priori, no s pelos meios de comunicao burgueses mas tambm pela inoperncia dos diversos setores que compem o corpo universitrio atravs do silenciamento das questes, a greve no Estado ainda se mostra como uma possibilidade distante. Sorrateiramente, a greve vai se impondo como necessria, mas essa necessidade raramente reflete o conjunto das foras que compem a universidade e a sociedade.E que necessidade essa que se coloca a ponto de pensarmos sobre o assunto?Para alm de necessidades especficas e justas de cada setor (como reajustes salariais, por exemplo), a greve deve ter um carter popular e classista se de fato quiser ser perene e atingir outros setores da sociedade, fortalecendo, portanto, questionamentos de ordem estrutural das relaes entre capital e trabalho. A greve para resolver pequenos ajustes no fere em nada questes de ordem estrutural. Mantm, ao contrrio, o seu carter reformista, servindo to-somente como um mecanismo ttico para se angariar determinados direitos j previstos como necessrio ao bom funcionamento do Estado burgus, que por sua vez organiza de um modo particular a dominao de classe. Diz Dcio Saes sobre a especificidade do Estado burgus: um tipo particular de Estado (o burgus) corresponde a um tipo particular de relaes de produo (capitalistas) na medida em que s uma estrutura jurdico-poltica especfica torna possvel a reproduo das relaes de produo capitalistas. Essa a verdadeira relao entre o Estado burgus e as relaes de produo capitalistas: s o Estado burgus torna possvel a reproduo das relaes de produo capitalistas.A necessidade da paralisao, portanto, est para alm de pautas reivindicatrias do professorado, dos trabalhadores terceirizados, tcnicos e estudantes. Parar a universidade significa, na prtica capitalista, interromper o processo de produo de mo-de-obra para o mercado. A partir dessa lgica, nenhuma paralisao legtima, sendo portanto combatida e criminalizada pelo Estado (atravs do seu aparato jurdico) e empresas que concentram o capital privado.Por outro lado, o carter popular da greve universitria tem o desafio de incorporar s paralisaes gerais o pblico que por conta de polticas de Estado so sistematicamente excludos das universidades federais e estaduais dando espao prioritariamente a setores de classe mdia e alta. Primeiro, para se pensar uma greve hoje obrigatrio construir um debate crtico sobre as experincias anteriores, a saber, a greve geral das universidades pblicas no ano de 2012. Ou seja, no se constri mobilizaes populares sem um balano poltico do carter das mobilizaes passadas. Qualquer pretenso de suprimir este debate denuncia claramente o carter fetichista da greve, colocando os segmentos de comando como instncias-limite contra o avano da luta social.E o que nos mostra a greve anterior?A indicao de greve surgiu em 2012 primeiramente a partir de uma determinao do sindicato nacional de docentes de universidades a nvel nacional (ANDES), acatado pela ADUFF a partir de orientao de enfrentamento apenas com o governo e no com a REItoria e garantido, na prtica, por uma parcela muito reduzida daqueles que compem a universidade, neste caso, principalmente pelos estudantes. Em documento produzido em 26 de junho de 2012 por um dos estudantes acampados no Acampamento Libertrio de Gestes Autnomas (ALGA) da Universidade Federal Fluminense, possvel detectar algumas questes centrais do processo.Nossas primeiras movimentaes foram no sentido de pautar um incio de greve que, para alm de pressionar governos pelas pautas inicialmente puxadas pelos professores (reajuste, plano de carreiras e gratificaes), colocasse questionamentos na base da comunidade acadmica sobre diversas questes da universidade como: A QUEM EST SERVINDO ESSE CONHECIMENTO PRODUZIDO? POR QUE NO EXISTE UMA REAL DEMOCRACIA NOS ESPAOS DECISRIOS DA UNIVERSIDADE? QUE RELAO DE PRODUO DE CONHECIMENTO ENTRE DOCENTES AUTORITRIA ESSA QUE VEM SENDO CONSTRUDA? QUE TIPO DE CONHECIMENTO VEM SENDO PRIORIZADO NA PRTICA UNIVERSITRIA? Etc. () Vejo que as pautas estudantis tendem a ser enxugadas pelos comandos estudantis de greve local e nacional, que incorporam pautas generalistas e sem norte poltico com materialidade especfica, ou seja, sem relao com as demandas por assistncia estudantil e discusso da estrutura de produo do conhecimento na universidade como um todo. O que quero dizer com isso? Aliado a isso se utiliza de uma ttica de greve que priorizam as cpulas de negociaes e no a alimentao das bases reais de resistncia. Quero colocar tambm que nossos motes materiais mais objetivos como equiparao das bolsas ao salrio mnimo, moradia sob autogesto dos estudantes, durao por todo o ano dos pagamentos das bolsas e diversos outros questionamentos acerca da construo do conhecimento no sero incorporados as ditas lutas nacionais dos comandos de greve, sejam os comandos dos docentes que no entendem essas questes como centrais na sua luta, sejam nos prprios comandos estudantis, formados por poucas lideranas burocratizadas e sem relao com uma base social humana e viva politicamente. () Outra questo importante a ser colocada a falta de comprometimento da universidade com as escolas da comunidade ao entorno. A relao que se tm muito pouca e na maioria das vezes burocratizada. Na maioria das vezes a relao que se estabelece atravs dos estudantes graduandos em licenciatura se d no comparecimento a algumas aulas em escolas para cumprir uma carga horria e na maioria das vezes se encerra a relao nessa questo frequencial, obrigatria, burocrtica e sem vida. Na maior parte do tempo a universidade contribui para que as relaes que hoje existem nas escolas pblicas continuem sendo das piores possveis e que no apontam para a produo de um conhecimento escolar que sirva de fato queles que esto submetidos cotidianamente ao convvio escolar. A escola tem sido garantida para controlar, disciplinar aqueles corpos que ali esto e a doideira que a universidade, alm de reproduzir muitas dessas prticas em suas salas de aula, contribui cada vez mais para que o abismo entre universidade e as escolas seja cada vez maior.(Carta aos acampados, ex-acampados, afastados momentaneamente e a meus amigos; Acampamento de Gestes Autnomas; Universidade Federal Fluminense; 26/06/2012)A experincia anterior mostrou, portanto, um claro desinteresse em se debater e questionar a nvel estrutural todos os limites impostos pelo prprio sistema capitalista, tendo no Estado burgus o seu regulador essencial. As mobilizaes de base tambm praticamente inexistiram, tendo por isso surtido efeito reverso no que diz respeito ao avano na luta popular. Os interesses do professorado, que no interior das universidades se impe como uma elite de comando s principais diretrizes a ser traadas no mbito poltico, mostrou-se tambm como fator de impedimento de maior lastro da greve, assim como as instncias burocrticas representativas estudantis partidrias (PSOL, PT, PSTU, PCdoB, etc). Por fim, as REItorias cumpriram suas funes burocrticas de afastar qualquer possibilidade de democratizar e popularizar os rumos das universidades, agindo formalmente atravs da criminalizao de aes antagnicas ao seu funcionamento, se concretizando na forma de violncia policial contra estudantes, tcnicos e professores. Para construir a greve preciso construir a memria poltica dos movimentos sociais, assim como seus aspectos contraditrios.Etiquetas:Greves,Trabalho_e_sindicatosComentrios5 Comentrios on "Pensar a greve das universidades no RJ"Lucas em 8 de maio de 2015 11:20considerando que um dos motivos pelo desinteresse do estudantado nas mobilizaes massivas tambm passa pela construo de pautas irreais e demasiado avanadas, em contraponto s pautas economicistas e burocrticas, pergunto: uma moradia estudantil requer verba, seja para manuteno, seja para novos investimentos em infraestrutura. Reivindicaes como autogesto dos estudantes de um espao necessariamente vinculado a rgos que gestionam verba pblica, ser que isso realmente possvel dentro de uma sociedade controlada pelas relaes capitalistas?Ser que esse tipo de fetiche pela autogesto em qualquer contexto no tambm algo que afasta a possibilidade de uma construo popular e massiva?Me faz pensar um pouco nas consignas que certos movimentos autonomistas parecem copiar de um programa trotskista de transio: Transporte pblico sob controle de trabalhadores e usurios! ok, soa lindo. Mas sejamos francos, tanto entre ns mesmos quanto com as massas que queremos agitar: qual o sentido de propor isso num cenrio de sistema capitalista? Algum realmente acredita que de pouco em pouco vamos corroendo por dentro, como se o capitalismo estivesse j na UTI apenas esperando o novo chegar para entreg-lhe as chaves?Manoloem 9 de maio de 2015 11:51E que pauta voc prope, ento?Lucas em 9 de maio de 2015 21:14tanto com relao moradia estudantil quanto com relao ao transporte pblico creio que as pautas concretas so o principal, seja a reforma disso ou daquilo, seja o remanejo de linhas e a tarifa zero (mais vagas para estudantes, mais veculos, melhor comida, mais segurana, etc)Tenho sim muitas dvidas com relao soluo por meio de uma mudana de gesto quando estes servios dependem quase exclusivamente de verbas pblicas. Se hoje esta verba j precria e insuficiente, o dia em que forem destinadas a um rgo sob controle autnomo, e portanto altamente subversivo em relao ao sistema econmico vigente, muito rpido se aproximar do zero. E o grave aqui no a simples derrota, mas sim iludir os indivduos que esto sendo convocados luta com promessas de algo que irrealizvel sem mudanas estruturais mais profundas.Creio que ambas construes baseadas em pautas concretas tem potencial de vitria e so a base para a organizao popular e de massas citada no texto. Creio que a impossibilidade de se criar ilhas de auto-gesto baseadas em verbas pblicas se constitui como contedo ideal para os debates e formaes que permitiro a estes movimentos ultrapassarem estas pautas especficas e fomentaro massa crtica para lutas estruturais de fundo, sem as quais estas pautas especficas nunca tero uma soluo plena.Minha descrena no relativa auto-gesto, apenas penso que ela no deve ser encarada como um horizonte quando ela incapaz de auto-sustentar-se. Auto-gesto de uma fbrica, auto-gesto de um transporte popular em certos bairros, auto-gesto de um centro cultural; so espaos que podem obter uma autonomia econmica que outros no podem, especialmente aqueles que foram criados nas sociedades de massas atravs das intervenes estatistas nos processos econmicos, tal como o transporte pblico e as universidades pblicas.Para resumir, dando seguimento s reflexes propostas pelo PassaPalavra, creio que necessrio que o autonomismo pense a auto-gesto como um processo inserido na dinmica econmica da sociedade, no como um voluntarismo que tenta entufar contedos comunistas-libertrios em supostas fissuras do capitalismo.Eugnio Varlino em 10 de maio de 2015 11:38Lucas,Acho que a reduo das verbas para prximo de zero em situao de controle popular uma suposio apressada sua. S aconteceria isso se as lutas esfriassem e o fato de ter controle popular do transporte no servisse de estmulo a mais exigncias, a uma maior ofensiva das lutas visando o transporte de qualidade, novos nibus e metrs, novas relaes laborais nesses veculos autogeridos etc. tal como a receita do Marx de exigir sempre mais, at chegar no impossvel de ser concedido (na Mensagem Liga dos Comunistas em 1850). Alis foi com essa msg que o Passa Palavra concluiu a srie sobre autonomia. Voc fala que seria iludir as pessoas com algo que irrealizvel sem mudanas estruturais profundas, mas as mudanas estruturais profundas viro assim, passo a passo, com momentos de avano das conquistas e momentos de recuo, momentos de acelerao da histria. Esse semestre brasileiro, por exemplo, est sendo um momento de mudanas estruturais profundas, com todas essas conquistas da direita que estamos assistindo atnitos, em especial a da terceirizao e a retomada de direitos trabalhistas histricos. O outro lado da moeda, que sei que vc no defenderia, seria iludir as pessoas dizendo que basta uma tomada do poder de Estado para que todas as mudanas substantivas nas questes cotidianas venham depois. Essa sua questao, portanto, a meu ver toca no central do debate sobre ttica e estratgia hoje em dia, j que o que mobiliza e leva as pessoas a lutas so as pautas especficas e menores, que muitas vezes so irrealizveis sem as mudanas estruturais profundas, sendo que uma bandeira de mudana estrutural profunda no mobiliza ningum a no ser bolcheviques convictos etc.Na sequncia do primeiro pargrafo vem uma boa reflexo sua, com a qual concordo, com exceo de que voc no est ponderando o contedo pedaggico dessas lutas que porventura no se sustentem economicamente. a questo de ganharmos uma derrota. Nas lutas os trabalhadores experimentaro novas prticas, e s de ver que so possveis j temos uma vitria, para alm de por exemplo a experincia de autogesto do transporte fracassar e tudo voltar aos gestores privados. pouco, mas isso que temos, e assim que tem que ser: a questo no acertar ou errar nas escolhas que fizermos durante a luta, sobre a maior ou menor proximidade com o Estado, a forma de financiamento da iniciativa, ou coisa assim. O central de onde vem essa escolha: se vem dos trabalhadores autonomamente organizados, errar j um ganho. Claro que pro trabalhador essa perspectiva de longo prazo importa menos, ele quer resultados, e resultados imediatos, mas em todo caso no d pra saber se os resultados sero efmeros ou no, se a mudana ser pontual ou abrangente e estrutural, antes da prpria luta acontecer, por isso discordo da sua colocao sobre esse tipo de fomento desse tipo de lutas ser uma forma de iludir os trabalhadores e entufar contedos comunistas-libertrios em supostas fissuras do capitalismo. Esses contedos brotam ali porque a realidade objetiva impe eles ali, quando o arcabouo poltico menos radical se mostra insuficiente pra explicar e pra fundamentar a prtica social no sentido que ela precisa andar se quiser resultar nos ganhos almejados imediatamente, e tambm no longo prazo.Enfim, no bsico concordei com quase todos os seus apontamentos, em especial o conclusivo: que o autonomismo pense a autogesto como um processo inserido na dinmica econmica da sociedade, mas toda transio se d a partir de dentro, e o aspecto pedaggico das lutas no pode ser diminudo, pois ali na prtica que se inventa a janela.Lucas em 11 de maio de 2015 23:36Eugnio,no entendo como auto-gesto entra necessariamente como pauta especfica. Da mesma forma, no entendo porque questionar a autogesto como horizonte de luta seria diminuir o aspecto pedaggico da luta. Seria essa consigna a nica capaz de gerar luta e aprendizagem?Entendo que gratuidade, melhores servios e tudo o mais que signifique para o trabalhador ou para o estudante uma melhor qualidade de vida, tudo isso so pautas especficas, concretas e que mobilizam inclusive espontaneamente.Exatamente como j ouvi/li black blocs pedindo a auto-gesto na Sabesp como proposta frente crise hdrica em So Paulo, me parece que muitos militantes autonomistas veem na auto-gesto uma frmula para superar a dicotomia reforma-revoluo atravs das bases. A auto-gesto de qualquer espao seria uma autntica mini-revoluo, j que esperar ou se organizar apenas para a grande revoluo seria um projeto falido.Me parece se tratar de uma falsa resposta, e especialmente nestes casos de rgos e empresas pblicas, um erro estratgico e principalmente de compreenso a respeito do capitalismo (partindo do principio que para sermos anti-capitalistas consequentes temos que entend-lo). O erro de leitura no ver que se tratam justamente de espaos sociais que NO deveriam produzir valor (como dizem as faixas contra a mercantilizao da educao, do transporte, da gua, etc), e que ento s podem se sustentar a partir dos recursos extrados de outras reas da economia produtiva. Me interessaria conhecer casos concretos de servios pblicos estatais sob controle de trabalhadores, pois eu nunca ouvi falar disso nos regimes capitalistas em situao estvel (estou pensando nas possveis excees da espanha em plena guerra civil ou no chile de allende).No acho que reivindicar a revoluo socialista seja incompatvel com a construo de base por pautas concretas, tambm me parece que reivindicar a auto-gesto no garante nenhum contedo anti-capitalista, especialmente quando se trata de auto-gestes financiadas pelo circuito capitalista da economia.E definitivamente os trabalhadores autonomamente organizados o que importa. Mas so eles que levantam o tema da auto-gesto como soluo para estes servios (afinal, quem garante que trar melhorias para o transporte, para a moradia estudantil, se a fonte de dinheiro lhes alheio)? Ou so os militantes autonomistas que trazem essa consigna devido sua linha poltica? Os militantes e os trabalhadores autonomamente organizados no podem tambm pensar a revoluo sem serem bolchivistas ou partirem para a luta armada?Sinto que auto-gesto serve para muitos como resposta pronta e acaba bloqueando a vista para horizontes mais importantes, tendo sempre em mente que o horizonte algo que contemplamos distncia, mas sem o qual no temos como guiar-nos.E para voltar ao texto, penso que se trata de um exemplo de pauta que afasta estudantes que no esto inseridos no movimento estudantil, muito menos nas ideias e estilos de vida dos setores que costumam propor a auto-gesto estudantil em servios dos quais estes outros estudantes dependem. A confiana vir de onde, da proposta mais libertria? Ao invs de fortalecer o movimento estudantil frente massa de estudantes, construindo um movimento forte e de referncia, um problema inclusive relatado em outro texto recentemente postado aqui no PP (http://passapalavra.info/2015/04/103717), comum ver setores autonomistas/anarquistas que preferem criar espaos livres de agrupaes polticas opositoras na inteno de fazer surgir do nada espaos de auto-gesto. De volta ao gueto-anarco/autonomista.