7
  Cobrança pelos serviços religiosos no Candomblé Publicado por Gill Sampaio Ominirò em 26/04/2015 às 00h23 Por que se c obram os Direitos Religiosos? Por Oluwo Ifáadé Odùgbèmi Aworeni Tradução: Mário Filho  Diferentemente da crença que existe, as atividades exercidas pelos sacerdotes e sacerdotisas de Òrìà e Ifá devem ser remuneradas, pois isso é uma determinação divina. Ao longo do texto veremos que se os sacerdotes não cobrarem, mesmo que seja um valor simbólico por seus serviços, perderão o Àṣẹ que lhes foi transmitido quando de suas iniciações. Verão, também, que   rúnmìlà, o Òrìà da sabedoria, esclarece que a s pessoas não dão valor àquilo que lhes vêm fácil, ou seja, elas só passam a valorizar algo que recebem quando pagam por ele.

Cobrança Pelos Serviços Religiosos No Candomblé

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Religião Afro brasileira

Citation preview

  • Cobrana pelos servios religiosos no Candombl

    Publicado por Gill Sampaio Ominir em 26/04/2015 s 00h23

    Por que se cobram os Direitos Religiosos?

    Por Oluwo Ifad Odgbmi Aworeni

    Traduo: Mrio Filho

    Diferentemente da crena que existe, as atividades exercidas pelos sacerdotes e sacerdotisas de r e If devem ser remuneradas, pois isso uma determinao divina. Ao longo do texto veremos que se os sacerdotes no cobrarem, mesmo que seja um valor simblico por seus servios, perdero o que lhes foi transmitido quando de suas iniciaes. Vero, tambm, que rnml, o r da sabedoria, esclarece que as pessoas no do valor quilo que lhes vm fcil, ou seja, elas s passam a valorizar algo que recebem quando pagam por ele.

  • O pagamento de honorrios, denominado Pagamento de Direitos Religiosos, por qualquer ato litrgico levado a cabo por sacerdote ou sacerdotisa de r e If representa o sacrifcio individual que a pessoa beneficiria de tal ao litrgica faz para o r, Ancestral ou Entidade aos quais deseja demonstrar sua boa vontade; representa, tambm, a remunerao do trabalho do sacerdote ou sacerdotisa que emprega seu tempo, conhecimento e recursos para realizar os atos litrgicos; isto, como qualquer outra atividade profissional, indubitavelmente, tem um custo monetrio, o qual deve ser pago por quem se beneficia dos servios desses sacerdotes e sacerdotisas de r e If. Por outro lado, esses esto obrigados a cobrar tais honorrios porque suas carreiras sacerdotais e iniciaes religiosas lhes custaram anos de esforos, sacrifcios e, principalmente, muito dinheiro. Portanto, tal qual o faz qualquer egresso de uma universidade, os sacerdotes de r ou If tm todo o direito em receber por seus trabalhos ao qual, supe-se, dedicaram muitos anos de suas vidas.

    Na Religio Tradicional Yorub, como tudo na vida, as coisas tm seu preo, porque assim foi determinado pelos wn r. Em uma oportunidade, rnml disse aos seus filhos, os Bblwo: Vs tendes que ensinar as pessoas que pagar pelo bem que recebem no retribuir, ao p da letra;

  • agradecer, apreciar, respeitar e corresponder em alguma medida aos wn r e a vs, seus sacerdotes e sacerdotisas.

    Antes que rnml houvesse declarado a mensagem citada, os Bblwo predicavam e praticavam o bem humanidade gratuitamente, vivendo na mais absoluta pobreza e despossudos totalmente de bens materiais.

    Sustentavam-se, ou melhor, tentavam sobreviver, por meio da caridade das pessoas e se conformavam com o que elas, cada vez mais miseravelmente, lhes concediam em reciprocidade ao bem incalculvel que recebiam. No entanto, chegou um momento no qual os Bblwo comearam a padecer de misria, fome, frio e morte prematura, enquanto que para a maioria das pessoas o sofrimento dos sacerdotes lhes foi indiferente. Ainda assim, os Bblwo prosseguiam no cumprimento de sua nobre e sagrada misso, at quase chegarem a desfalecer por inanio. Suas foras haviam se exaurido. Enquanto isso acontecia a maioria das pessoas se esquecia rapidamente do benefcio recebido das mos daqueles religiosos. Muitos haviam sido curados de graves enfermidades, outros se haviam salvado de acidentes mortais, outros haviam recuperado a felicidade e a paz em suas vidas e famlias, outros haviam feito grandes fortunas, outros foram salvos da morte e da desgraa e, assim, a lista de benefcios obtidos pelas pessoas, das mos daqueles dedicados sacerdotes, se fazia interminvel. Ainda assim, os seres humanos manifestavam seu febril egosmo, ao desconhecer, de maneira inescrupulosa, as necessidades vitais daqueles, por cuja intermediao, haviam recebido as bnos dos wn r e Ancestrais.

    rnml prosseguiu com seu discurso: Porque, at hoje, tenho visto, com grande tristeza, como muitos seres humanos to rapidamente esquecem o bem que recebem. mister, ento, ante to abusivo egosmo, que vs no vivais a expensas da boa vontade, da iniciativa humanitria e da caridade daqueles que, cada vez mais, demonstram, com suas atitudes, a indiferena e o desprezo que sentem por tudo aquilo que conseguem facilmente. A maioria dos seres humanos aprendeu de forma equivocada a dar valor material a tudo o que lhe concerne. A mercadoria que vs ofereceis no tem valor material, porque ela, em si mesma, no material; porm, posso-vos assegurar que a sade, o amor, a paz, o equilbrio e a harmonia da vida e a salvao que, por meio de vs eles recebem, no pode ser valorada materialmente, porque ningum pode pagar o verdadeiro valor que estes aspectos tm em suas vidas. Por tudo o que vos disse at aqui, a partir deste momento toda ao vossa, a ttulo pessoal ou a favor de terceiros, que implique a participao direta ou indireta de algum r ou Ancestral, seja qual for esta, dever ser recompensada materialmente sempre, mediante oferta de animais ou objetos valiosos em troca, que obriguem ao beneficirio de vossos favores a demonstrar, em todos os momentos, uma ao recproca que aponte sua disposio ao sacrifcio, qualquer que seja este, em troca dos benefcios incalculveis que recebe.

  • rnml, continuando com suas assertivas, se coloca, ento, como um dos wn r e ordena que os atos litrgicos sejam recompensados materialmente, como forma de sacrifcio, alertando que os fins pretendidos s sero alcanados se a pessoa que os requereu merea ajuda: O ser humano recebeu de ns, os wn r, a vida e a natureza pra que cresa, desenvolva-se e se engrandea mediante o sacrifcio, a honestidade, a justia e o amor aos seus semelhantes. Grandes coisas fizemos previamente para eles, a fim de lhes facilitar o caminho, entretanto, uma vez mais, se fazem de desentendidos e se auto consideram com o direito de receber de forma gratuita vosso sacrifcio unido aos vossos favores. Isso inconcebvel!. Assim, ante tais atitudes, a partir de agora nossos favores e vosso trabalho ter que ser recompensado materialmente por tudo aquilo que vos requererem. Cada Sacerdote dever exigir, sempre, a contrapartida material, previa ou posteriormente consumao de seu trabalho, deixando claro que o pagamento desses direitos, em nenhum momento, significar que se comprou o favor dos wn r ou Ancestrais. O abono dos mencionados direitos sempre ser uma representao simblica do esprito de sacrifcio da pessoa que solicitar vossos servios, mas a ns corresponder sempre a ltima palavra com relao a se concedemos ou no o favor solicitado, somente depois de haver valorado se essa pessoa fez o suficiente para merecer nossa ajuda. Os seres humanos devem dedicar suas vidas a lavrar a madeira, cultivar os campos, caar, pescar, curar os enfermos, ensinar boas coisas aos filhos, cuidar dos animais, labores artsticos, extrair riquezas naturais etc., porm h aqueles que tm a sagrada misso de servir de intermedirios entre os homens e as divindades, dedicando seu tempo e sua vida a to nobre e louvvel labor e, por isso, tm tanto direito a receber o mesmo que os demais! O vosso trabalho to importante como qualquer outro e, por isso, deveis receber o necessrio para viver

  • com dignidade entre seus semelhantes. rnml afirma: Portanto, se as pessoas no so capazes de reconhecer, em toda sua magnitude, o valor de vosso trabalho, ento que, a partir de agora, aprendam que a caridade ter que ser merecida, que esta requer ao e trabalho e, por isso, ter um preo; assim, aqueles que so aptos para receberem suas consagraes e o que lhes sero transmitidos por vs, tambm tero que vos pagar, na justa medida, por seu trabalho.

    Ao terminar, rnml emite seu decreto: Por fim eu decreto que: No haver ao vossa, nem nossa, que esteja livre do pagamento, exceto quando previamente ns apontemos o contrrio. Isso significa que a caridade e sua justa administrao ser uma questo exclusiva de ns, os wn r, e em nenhum momento de vs. Se uma pessoa, por suas atitudes em vidas passadas ou na atual, merece ser premiada com uma caridade, livrando-a do pagamento, isso ser determinado por ns, vossos wn r e Ancestrais.

    A partir do momento em que a mensagem de rnml foi recebida pelos sacerdotes as coisas mudaram muito para eles. As pessoas aceitaram e se adaptaram muito rapidamente a essa nova sistemtica. Por isso, qualquer Bblr ou Bblwo, onde quer que se encontre, est obrigado a cobrar, de forma a que suas oraes e trabalhos tenham bnos e suficiente; do contrrio e, sobretudo, se a situao se repete, pode chegar a perder o e o privilgio que lhe foi outorgado por nossas divindades. Ao lermos as declaraes e decreto de rnml, passamos a compreender perfeitamente porque se deve pagar para se iniciar a r ou Ancestral; receber as diversas consagraes e fundamentos religiosos; para se assentar nossos wn r e Ancestrais; para se iniciar em If, realizar um pedido, orao, b etc. Da mesma forma, cada etapa de formao religiosa requer um longo e duro caminho a percorrer, bem como grande esforo e tempo da vida til de uma pessoa, pelo qual est no s limitada a receber recompensas e reconhecimento por parte dos wn r, seno, tambm, por seus semelhantes. No h motivos lgicos e racionais para pensar que um Sacerdote ou Sacerdotisa, pelo simples fato de ser um religioso, esteja obrigado ao altrusmo. Se assim o fosse, quem daria o sustento a essa pessoa? Como ele se calaria ou se vestiria? Como cobriria seus gastos mais elementares? Como e onde viveria? Como poderia recorrer sade pblica, aos hospitais e assistncia mdica em geral? Apesar de que o prprio rnml j reconheceu: Creem vs, que nossos sacerdotes e sacerdotisas, de verdade, poderiam viver custa da vontade e da caridade das pessoas? Claro que isso impossvel!. A qualquer mdico, o qual, logicamente, comprometeu sua vida sob o juramento hipocrtico de no negar jamais auxlio a um ser humano, cujo labor social eminentemente humanitrio e importante para preservar a sade da sociedade em que vivemos, se no lhe d a retribuio por seus servios, logicamente no trabalhar, pois ainda que o queira, humanamente no o pode fazer. Tampouco a ningum ocorreria que eles vivem da caridade pblica ou da boa vontade das pessoas; se assim o fosse no existiriam mdicos em nossa sociedade, pois ningum estaria disposto a passar anos estudando para, ao final, ficar a custa da boa vontade alheia.

  • No entanto, apesar de que a profisso de mdico implica um alto sentido humanitrio e de sacrifcio pelos demais, grande parte de nossos mdicos lucram e se enriquecem com sua profisso humanitria, exigindo preos, s vezes, elevadssimos s vezes impagveis pelos menos favorecidos financeiramente , por qualquer interveno cirrgica ou por um simples tratamento para emagrecer. As pessoas parecem aceitar isso como algo inexorvel, que tem que ser assim e nada mais. Enquanto tudo isso uma realidade, s pessoas no ocorre pensar que um sacerdote ou sacerdotisa tambm dedica toda sua vida a estudar e a preparar-se para ajud-las de vrias maneiras. como a lei do funil: o mais largo para alguns e o mais estreito para outros. E por qu? Pensem vocs mesmos e vero que uma total injustia social. Talvez alguns pensem que sacerdotes e sacerdotisas podem ser qualquer um e que por trs dessas ocupaes se encobrem inmeras formas de fraude e engano; isso existe tambm, mas acaso no h outros profissionais ruins e inescrupulosos em nossa sociedade? s pessoas muito fcil pensar que por um bem recebido pela mediao de um sacerdote ou sacerdotisa, o pagamento pelos servios desses ocorre nica e exclusivamente pelas divindades. Aqui se aplica a estpida e egosta relao patro-empregado: imaginam que, como sacerdotes, estes sejam empregados das divindades e so elas que devem recompens-los por seu trabalho; nada mais absurdo!

    O sacerdote de r tambm um ser humano: nasce, vive e morre como todos os demais seres humanos; basicamente tem as mesmas necessidades materiais de vida que os demais e o servio social que prestam humanidade o realizam na Terra, entre os seres humanos, portanto, tambm tem que viver como seres humanos.