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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL Curso Superior de Tecnologia em Design de Jóias
Projeto de Jóias IV
COLEÇÃO DE JÓIAS
CAMINHOS DE PEDRA
ELIANA COLOGNESE
Canoas
2008
RELATÒRIO Este relatório apresenta o desenvolvimento de um projeto de design de jóias,
tendo por finalidade a execução de uma pequena coleção inspirada na imigração italiana no Rio Grande do Sul. Iniciou-se por uma pesquisa teórica quanto ao referencial temático e aos dados histórico-culturais da região de Bento Gonçalves, onde se procurou saber a relação dos imigrantes italianos com as casas do roteiro turístico Caminhos de Pedra. Apresenta também, uma breve teoria sobre o interesse humano pelos adornos e jóias. Depois, temos as bases conceituais; - pequena análise de produtos similares existentes no mercado atual; como também, faz-se uma menção sintetizada de iniciativas dos setores, joalheiro e de turismo, para valorização simbólica em outras regiões do Brasil.
De outro lado, para determinar os elementos necessários para o desenvolvimento de bons produtos de caráter sócio-cultural, realizou-se um estudo das tendências de moda para 2009. Foram considerados, além destes estudos, o conceito projetual e o estilo da usuária, para escolha dos materiais, bem como, as relações ergonômicas e de comportamento.
Por conseguinte, temos a representação gráfica, escolha das melhores alternativas projetuais, juntamente com as pranchas técnicas e um apanhado em relação aos quantitativos materiais, custos e cronograma de execução das peças.
Palavras-chave:
design de jóias, imigração italiana, valorização histórico-cultural, basalto vulcânico
INTRODUÇÂO
Desde 1992, o município de Bento Gonçalves, Rio Grande do Sul,
vem atraindo turistas para visitação dos Caminhos de Pedra, que visa resgatar a cultura
que os imigrantes italianos trouxeram à serra gaúcha. Pioneiro no seu segmento, o
roteiro é referência nacional e internacional em termos de turismo cultural e rural,
arquitetura e patrimônio histórico. Atualmente, o roteiro possui treze pontos de visitação
e está em fase de expansão.
Tendo como inspiração os Caminhos de Pedra, este trabalho é uma
tentativa de chamar atenção das pessoas para a preservação do patrimônio histórico-
cultural da imigração italiana e as relações do imigrante com as casas de pedra. Através
da utilização de jóias e acessórios conceituais enfocando esta temática, pretende-se
auxiliar na valorização do potencial turístico regional, inclusive o religioso. Ajudando a
divulgar entre os nativos, visitantes da região e turistas, leigas ou não a esta temática, a
importância do roteiro e das casas para o desenvolvimento regional.
Há exemplos, em diversas regiões do país, de iniciativas do setor
joalheiro, em especial o de design de jóias, no intuito de auxiliar na divulgação turística
e preservação regional, promovendo localidades e culturas conhecidas ou não. As
razões pela escolha desta temática foram motivadas por uma série de visitas aos
casarios, onde se pode observar certo descaso em relação aos bens materiais e culturais.
Sendo a autora de origem italiana, surgiu uma especial vontade de contribuir com o
resgate desta conscientização e homenagear os imigrantes através deste trabalho.
Este estudo propõe o desenvolvimento de uma nova coleção de
jóias artesanais, enfocando a temática “Caminhos de Pedra”. Além do design inovador,
a coleção apresenta uma proposta de auxiliar na valorização cultural e histórica e
pretende ajudar a preservar a memória do local.
1 ESTUDO DE REFERÊNCIAS
1.1 Referencial Temático
A inspiração para este projeto de design surgiu quando da visitação à casa de
pedra construída pelo imigrante italiano e também tataravô da autora Zenone
Colognese. (Figura 1). A casa datada de 1880 despertou a vontade de contar um pouco
da história dos imigrantes italianos e suas relações com tais habitações. Assim, tendo a
oportunidade de homenagear sua própria família, surgiu a inspiração para este trabalho:
Os Caminhos de Pedra!
Figura 1: casa de Zenone Colognese, Bento Gonçalves, RS
Fonte: acervo pessoal.
O projeto do roteiro Caminhos de Pedra surgiu a partir de um levantamento do
acervo arquitetônico do interior do município de Bento Gonçalves, realizado no ano de
1987, pelo engenheiro Tarcísio Vasco Michelon e pelo arquiteto Júlio Pozzenato. O
acervo material da região, casas de pedra, madeira e alvenaria, estavam abandonados e
esquecidos, foi parcialmente restaurado e passou a receber visitação.
Apesar da decadência e abandono, constataram que o Distrito de São Pedro
possuía um grande potencial turístico. Composto pelas comunidades de São Pedro, São
Miguel, Barracão, São José da Busa, Cruzeiro, Santo Antônio e Santo Antoninho, a
localidade possuía o maior número de casas antigas, conservava traços da cultura e da
história dos colonizadores e tinha fácil acesso.
Empreendedores e simpatizantes montaram então um projeto que contemplava
o resgate de todo o patrimônio cultural e não só o arquitetônico, envolvendo língua,
folclore, arte, habilidades manuais, religião e a culinária dos imigrantes italianos.
Atualmente a Associação Caminhos de Pedra possui treze pontos (comerciais)
de visitação e cinqüenta e três pontos de observação externa pertencentes à Linha
Palmeiro - que era a porta de entrada dos imigrantes italianos, mas a idéia é expandir o
projeto até a cidade de Caxias do Sul, passando por Caravaggio abrangendo assim, além
do turismo rural e cultural, o turismo religioso.1
1 Informações baseadas no site: <http://www.caminhosdepedra.org.br>
1.2 Dados Históricos da Imigração Italiana
Ao longo do roteiro Caminhos de Pedra, podemos observar detalhes
característicos da imigração italiana: casas de madeira ou de pedra, artesanato de palha
de trigo, capelas, capitéis, igrejas, cantinas, parreirais, vinho e muita comida típica. O
roteiro leva este nome devido às diversas casas de pedra espalhadas pela região.
Procurou-se saber então, a história envolvida entre os imigrantes e as casas. Como
vieram a habitar esta região? Quais os motivos que os levaram a construir habitações tão
diferenciadas? Para responder a estes questionamentos, passamos aos fatos históricos.
Em conseqüência da revolução industrial os países da Europa apresentavam
numerosa população no campo e nas cidades. De outro lado, na América, devido às
restrições ao tráfico de escravos africanos, havia mercado para mão-de-obra barata. Na
Itália os camponeses despejados de suas terras, artesãos superados pelas máquinas,
pobres e suas proles numerosas, passavam por grandes dificuldades e não tinham
nenhuma expectativa de sair do impasse imposto pelo capitalismo. Às portas da fome,
parecia não haver lugar para eles naquele mundo em transformação. Em razão de
guerras, secas, esgotamento de terras, miséria, morte, entre outras causas, os italianos
tinham razões para acreditar que encontrariam “o paraíso” na América. Iniciaram o
processo de imigração, atraídos pela promessa de transporte gratuito e crédito e na
esperança de fartura, assistência e terra abundante.
Encarando muitas dificuldades, desde suas habitações, até os portos de
embarque em navios, e após enfrentarem um mês nos precários alojamentos da travessia
atlântica, chegaram finalmente ao Brasil. As áreas que restavam para colonização
ficavam na acidentada encosta da Serra Gaúcha, região selvagem e de difícil acesso, que
a partir de 1875, foi desbravada e colonizada pelos italianos. Abrindo clareiras mato
adentro, seguiam dois ou três dias a pé, em lombo de burro ou em carretas, pelas
picadas de mata densa e fechada, enfrentando animais selvagens e doenças. (Figura 2).
Figura 2: chegada dos imigrantes
Fonte: site O Imigrante
Até limparem seus lotes de terra, ficavam alojados em barracões de madeira.
Não conheciam limites, trabalhavam desde o amanhecer e à noite retornavam para os
barracões. As primeiras moradias foram erguidas de maneira improvisada -
praticamente tendas-, onde tinham de guardar suas roupas e mantimentos nos “ocos”
das árvores para proteger da umidade. Com coragem, tratavam de sobreviver como
podiam. (Figura 3)
Foi às margens do arroio Barracão que, a partir de 1870, a
Comissão de Colonização e Terras do Governo Imperial do Brasil instalou-se para demarcar os lotes de terras da Linha Palmeiro (a maior de todas as linhas da colonização italiana com 200 lotes de 48,4 ha cada). No final de 1875 o barracão, “uma alta construção de um só plano, mal vedada, com longas taquaras pregadas na parede horizontalmente e cobertas de barro e folhas” (DALL’ACQUA apud BATTISTEL; COSTA, 1983, p. 1172).
Figura 3: reconstituição do barracão dos imigrantes
Fonte: Arquivo do Museu do Imigrante de Bento Gonçalves
Desenho de Fábio Valle.
Poderia levar meses para assentarem-se “precariamente” nos lotes. Após,
recebiam ferramentas e sementes que lhes eram lançados como dívida com o Governo
Imperial. Lotes e utensílios deveriam ser quitados no prazo de dez anos. Quando o
colono pagasse um terço desta dívida, recebia um documento de propriedade provisória
do terreno. Só depois de habitar, cultivar e pagar integralmente o lote, é que recebia o
título definitivo. Conseguiriam os imigrantes, vencer todos os obstáculos, inclusive o
isolamento? A surpreendente garra e a tenacidade dos italianos nos mostram que a
resposta é afirmativa, a ponto de implantarem na região da colônia Dona Isabel (hoje
Bento Gonçalves), “uma nova civilização, materializada na difusão cultural, no
comércio, na indústria, na agricultura e nos serviços”. 2
O processo de demarcação das colônias foi planejado para que às margens do
Arroio Barracão fosse o núcleo principal da colônia Dona Isabel, mas em 1876, a
Comissão de Terras mudou-se para um morro elevado, onde hoje é o centro de Bento
Gonçalves. Em informações disponíveis no portal Caminhos de Pedra, conforme relato
de um agente consular italiano em 1905, consta:
‘A sede da nova Colônia Dona Isabel, (hoje Bento Gonçalves), foi traçada em 1875, em um vale entre dois cursos d’água, num local baixo, próximo ao barracão dos imigrantes, e chamada então de cidade branca, devido às tendas feitas de lençóis’. O local foi porta de entrada dos colonos assentados na Linha, que inicialmente não passava de uma picada tortuosa no meio da mata tentando acompanhar uma linha imaginária reta. [...] Como os lotes eram grandes, normalmente eram assentadas duas famílias por lote, uma em cada extremidade (meio eletrônico3).
Por questões de emergência (frio e animais selvagens), as primeiras casas eram
muito precárias e de um ou dois tipos: de bambu, ranchos de pau a pique cobertos de
palha ou folhas; ou construídas com varas e pranchas de pinheiro rachadas a machado,
consistindo em casinhas de quatro paredes, com coberturas de tabuas lascadas ou telhas.
As moradias definitivas eram mais espaçosas com tábuas de madeira aparelhadas em
serrarias, com a base subterrânea de pedra lavrada (basalto) para o uso como cantina;
eram cobertas em geral com madeira, mas também com placas de zinco.
As casas eram mais elegantes nos pequenos povoados e nas cidades
predominavam as casas de madeira desde o início da colonização. As casas de pedra
lavrada eram amplas, compostas de paredes grossas, com janelas finas e altas e o piso
de terra batida. O lambrequin, detalhe de madeira na borda dos telhados, tornou-se
marca decorativa registrada das casas dos italianos. A cozinha (casa de comer) ficava
geralmente separada, se mantinha o fogo sempre aceso e qualquer vento poderia
2 Informações baseadas no site: <http:www.epopeiaitaliana.com.br/historia.htm> 3 FORESTI, Nestor José. Disponível em: <http://caminhosdepedra.org.br/historico.php> Acessado em: 10 out. 2008.
ocasionar incêndios. Por isso, se preservava a casa onde se guardavam os bens (casa de
dormir). Cobria-se o fogo da cozinha com cinzas durante a noite, conservando as brasas
e facilitando o re-acendimento no dia seguinte. Era um hábito religioso, traçar uma cruz
sobre as cinzas para pedir proteção contra incêndios. (Figura 4).
Figura 4: casa de madeira (Residência de descendentes de italianos de
propriedade de Humberto Colognese) Fonte: acervo pessoal
Os colonos adaptaram sua arquitetura à realidade local. A casa puramente de
madeira seria característica de áreas desmatadas recentemente e onde a parreira não
desenvolveu. A produção da uva foi um fator responsável pela edificação de madeira
sobre um compartimento de pedra basáltica, servindo de cantina para produção e
conservação do vinho, como é feito das exigências, quanto às condições de sua
fabricação. (Figura 5).
Figura 5: cantina
Fonte: Portal da Cidade de Bento Gonçalves
Devido às condições regionais, o basalto era (e é), material abundante na
região. Adaptando-se aos recursos naturais disponíveis, o imigrante passou a utilizar a
rocha na construção das casas de pedra. Além de ser resistente contra tempestades e
erosão, ou seja, uma melhor alternativa de segurança, também foi uma maneira de
iniciar a agricultura. A partir da construção das casas com porão de basalto os
imigrantes conseguiram adequar a plantação da uva. O basalto, mesmo contendo pouca
água em suas partes subterrâneas, fornecia a umidade necessária para manter as videiras
e passou a ter papel importante na produção do vinho, conservando-o em temperaturas
amenas.
Antes do cultivo da uva, nos lotes onde o solo era mais fértil e provido de água,
iniciaram as lavouras – geralmente pelo plantio do milho e do trigo. Garantindo a
produção de alimentos como a polenta, pão e a massa. As palhas de milho e de trigo
eram usadas na confecção de colchões, chapéus e cestos. Isolados, os colonos tinham
que produzir tudo o que precisavam! Plantavam árvores frutíferas e a partir das frutas
produziam os doces e as compotas. Em pouco tempo, havia vinho, graspa – aguardente
feito da casca da uva, salame e queijo. A culinária passou a ser mais diversificada
influenciando, inclusive, os hábitos dos nativos de regiões próximas, que passaram a
consumir uma variedade de massas e pães, como por exemplo, o tortéi e o grôstoli. Isso
se deu depois que começaram a surgir carroceiros e mascates – elo de comércio entre as
colônias.4
Os imigrantes italianos plantaram as primeiras mudas de uva junto às casas de
pedra, nas áreas de encosta. A produção de vinho artesanal logo se difundiu e passou a
ser a principal fonte de renda, dando origem às primeiras cantinas. Mais tarde, o vinho
passou a ser comercializado fora da colônia e forneceu os primeiros capitais a serem
investidos nas pequenas oficinas que, mais tarde se tornaram indústrias.5
As mulheres dividiam-se entre a educação dos filhos, lida na roça e afazeres
domésticos. E os homens, além da atividade agrícola, trabalhavam durante a metade do
mês na abertura de estradas da região, em pagamento dos lotes que recebiam. A casa e a
igreja eram onde se reuniam, sendo locais de aglutinação, também entre famílias.
(Figura 6).
A vida associativa começa a um nível da família nuclear, na casa
rural onde decorre grande parte da existência entre a morada e a cozinha: a dormida, a preparação da comida diária e das conservas, as refeições principais, o encontro depois do trabalho, as orações da noite, os nascimentos e as mortes, a recepção dos filhos e filhas que vem do seminário e do convento. O culto aos santos e dos mortos e o próprio culto da família são ali
4 Informações baseadas na História Ilustrada do Rio Grande do Sul, RBS Publicações, 2004. 5 Informações baseadas na História Ilustrada do Rio Grande do Sul, RBS Publicações, 2004.
simbolizados nas estampas e fotografias que se expõem nas paredes do salão. (AZEVEDO, 1975, p.180).
Figura 6: reunião da família de Ângelo Colognese (descendente de italianos)
Fonte: acervo pessoal
O calendário social e religioso derivava do ritmo do trabalho. Os casamentos
eram realizados em dois ou três períodos anuais, desde que não coincidissem com as
tarefas agrícolas. O casamento é uma das grandes oportunidades para integração social,
de encontros de dezenas de parentes, amigos, vizinhos, compadres.
O camponês e os sacerdotes católicos italianos trouxeram para o
Rio Grande do Sul o costume que os acompanhou na imigração e se incorporou à sua sociedade, da benção das culturas, das primícias e do sustento da cura rural, ao menos em parte com os frutos da terra. Os italianos fizeram da atividade religiosa o foco de sua vida comunitária. Em cada núcleo colonial, a igreja ocupava o ponto principal, e a construção de igrejas e capelas mobilizava sempre a participação coletiva, com doação de material e trabalho voluntário. Os estilos e materiais eram variados, desde simples casinhas de madeira até imponentes obras de pedra talhada ou tijolos artesanais, transportados para o local pelos fiéis enfileirados. Freqüentemente separado do corpo principal das capelas, o campanário concentrava as atenções em todos os templos católicos da região. (AZEVEDO, 1975, p.180).
A religiosidade dos imigrantes é testemunhada pela construção de pequenas
capelinhas e capitéis (Figura 7)., ao longo de estradas, muitas vezes para testemunhar
uma graça ou em homenagem ao santo de devoção. O fervor religioso era cultivado com
rigor nas famílias, que realizavam semanalmente cultos e novenas em suas
comunidades.6
Figura 7: capitel Nossa Senhora do Carmo
Fonte: site Caminhos de Pedra
Por motivos políticos e de sobrevivência, os descendentes de italianos foram
escondendo suas origens, conforme enfatiza Zaninini (2004, p. 54) :
As relações ‘tranqüilas’ entre imigrantes e seus descendentes e a
sociedade local dar-se-iam até as primeiras décadas do século XX e os acontecimentos relativos à II Guerra Mundial quando, a partir das posições políticas adotadas pelo governo brasileiro, os italianos e seus descendentes se transformam em inimigos e ‘perigos’ nacionais.
7
A partir do período do Estado Novo (1937-1945), os imigrantes passam a ser
alvo de ressentimentos, tendo seus descendentes, motivos para manifestarem-se de
forma repressiva. Muitos sofriam humilhações públicas e perseguições, sem ao menos
saberem o que estava acontecendo na Itália. O idioma e os dialetos italianos foram
proibidos, as famílias temiam usá-lo, até mesmo em casa. Com receio, muitos destruíam
livros, objetos, fotos, documentos, ou seja, qualquer coisa que pudesse identificá-los
como italianos, suprimindo desta forma, que novas gerações conhecessem suas raízes.
Zanini (2004, p. 55), denominou esse processo de
varredura cultural, o qual fez com que muitas famílias, que
ainda tinham em suas memórias informações acerca do processo migratório e das histórias dos antepassados, preferissem o silêncio e a omissão dessas informações às gerações sucessivas.
Somente a partir da década de 70 os descendentes, já inseridos em destacadas
posições sociais e econômicas, começam a retomar o resgate por suas origens com a
6 Fonte: ROXO: SILVA, 2007. 7 ZANINI, Maria Catarina Chitolina. A família como Patrimônio: a construção de memórias entre
descendentes de imigrantes italianos. UFSM, Santa Maria, RS, Campos 5(1):53-67, 2004.
finalidade de traçar o trajeto familiar do imigrante até a atualidade. Muitas famílias
sabiam de sua descendência italiana, porém possuíam pouca informação sobre seus
antepassados. Então, começaram a reunir-se e promover festas familiares para troca de
informações e pesquisa, assumindo um caráter de tributo aos antigos. Atualmente,
algumas famílias conseguem traçar o trajeto de seu antepassado e descobrir de qual
cidade italiana emigraram, passando a estudar e a adotar, inclusive, hábitos e
comportamentos típicos da região de seu ascendente. A construção das memórias do
italiano imigrante passa a fazer parte da história familiar, retira-se do passado o que é
positivo, passando a ser exemplo para as gerações atuais, e agregam para si, a trajetória
de sucesso dos imigrantes pioneiros, considerados heróis. Outras famílias, não
conseguem refazer este trajeto, já que muitas informações perderam-se com o passar
dos anos ou por ocasião da II Guerra Mundial. Visando somente cultuar os
antepassados, compartilham os sentimentos de pertencimento a uma descendência
italiana, seguindo costumes que julgam ser parte de sua origem. Preferem acreditar nas
concepções de que os emigrados eram pessoas trabalhadoras, honestas, religiosas,
apegadas à família e tais características, somam-se às suas próprias pessoas,
influenciando em sua auto-estima e sucesso.
A religiosidade dos descendentes italianos continua se manifestando através
dos rituais e consagrações. As bênçãos à colheita, caminhadas e procissões em
homenagem a determinados santos ainda fazem parte de seu cotidiano. Como
centralizadora da paisagem, até agora há uma praça onde se localiza a igreja, foco dos
encontros sociais. Ir a missa é uma tradição, um costume entre as famílias. Continuam a
manifestar fortemente o significado de sua fé, nas grutas, cemitérios e mausoléus,
espalhando vasos de flores em homenagem aos mortos. A religiosidade do povo
também se faz presente nas festividades, onde grupos sociais realizam celebrações em
homenagem as divindades, envolvendo música, dança e gastronomia. Comemoram as
datas relevantes para sua cultura, que são reconhecidas pela animação característica do
ítalo-descendente.8
Os detalhes característicos da imigração italiana, presentes nos Caminhos de
Pedra apresentam uma forte ligação com as casas, sendo parte de uma história que está
8 NETO, Helena Brum, Regiões Culturais: A construção de Imagens Culturais no Rio Grande do Sul e
suas Manifestações nas Paisagens Gaúchas, Dissertação de Mestrado em Geografia e Geociências, UFSM, 2007, p.163 a 271.
intimamente ligada às condições encontradas pelos colonizadores e ao sucesso regional
gerado pela sua adaptação a tais condições.
Há poucas informações em relação ao uso de adornos nesta região. Sabe-se
apenas, que a mulher imigrante costumava ser simples na maneira de vestir.
Apresentava as seguintes características, conforme estudos elaborados pela organização
da Festa da Uva:
As mulheres imigrantes usavam pouca pintura e o mínimo de jóias
– broche, brincos, cordão de ouro e relógios com correntes. Para as roupas de trabalho as mulheres imigrantes usavam algodão, riscado e pelúcia. Já para as roupas de domingo, vestiam linho e seda, com pequenos detalhes em lã e veludo, já que naquela época esses dois tipos de tecidos eram muito caros. (meio eletrônico9).
Atualmente, Bento Gonçalves além de cidade turística, é um pólo de design de
móveis freqüentado por pessoas de diversos níveis culturais, incluindo os descendentes
italianos. Na região central, há circulação de mulheres de estilos distintos, o que foi
percebido informalmente10 nas visitas para elaboração deste trabalho. A composição do
visual é importante para a mulher do centro da cidade, visto que, são extremamente
detalhistas no uso das roupas e acessórios. Já na região das linhas e distritos dos
Caminhos de Pedra, as mulheres são mais simples, não deixam de ser vaidosas, porém,
primam pelo conforto e praticidade. Quando da aplicação da pesquisa de opinião,
descreveram suas preferências por peças clássicas e em suas afirmações verbais,
demonstraram apreciar principalmente as jóias religiosas.
1.3 Jóia: Objeto Perene
A jóia, remota aos tempos mais antigos, desde a Pré História, quando o homem
sentiu necessidade de se diferenciar ou simplesmente facilitar seu modo de viver. Há
segundo Eliana Gola, “achados arqueológicos datados de 4000 a. C que revelam jóias
confeccionadas em elementos naturais como: conchas, ossos, presas de animais,
pedaços de rochas, minerais e cascalho, supostamente amarrados com tiras de couro ou
alguma fibra vegetal”.
Para usos práticos - utilizadas como broches, tinham originalmente finalidades
9 Portal Festa da Uva. Disponível em: <http://www.festuva.com.br/2008/?ir=salaimprensa&id_noticia=13> 10 Informações baseadas na percepção e avaliação visual da autora
funcionais, porém, sempre esteve ligada ao simbólico, muitas vezes representando fé,
virilidade ou status. No livro As jóias falam – Uma Tese Romanceada, Richard Klein
afirma:
Desde os tempos romanos, há exemplos de anéis de noivado ou amizade decorados com o entalhe de um par de mãos dadas, mãos direitas – a que sempre se dá para um aperto de mãos. [...] O motivo das mãos dadas era geralmente usado em cordões de casamento no século XVI e em anéis de casamento. [...] O anel no dedo é um sinal de mão na mão, do modo como sinalizamos paz e união (2004, p. 112),
sinal este que ainda perdura entre casais do mundo intero. A jóia sempre foi entornada
por significados! Em épocas antigas, acreditava-se que tinha o poder de defender as
pessoas do mal e ainda hoje é carregada de misticismo acerca de seu uso. Com o passar
do tempo, seu valor ou significado é cada vez mais considerado.
Mas afinal, o que representam as jóias e por que as desejamos? Conforme a
consultora de estilo, Regina Machado (2002)11 afirmou as jóias:
São veículos de significados, objetos mágicos que lidam com um
universo ambíguo que flutua entre a proteção, o prestígio e a sedução. Objetos desejados, sobretudo, por suas auras de relíquias leigas do mundo social, as jóias têm sido competentes operadores da evasão do tempo real do cotidiano para o tempo simbólico da memória. Tal qual um Proust contemporâneo, a arte do design de jóias tenta salvar o presente, o instante que se vive, e gerenciar as analogias entre o futuro-passado que o presente se tornará. [...] O momento de criação de uma jóia pretende realizar essa ponte entre o passado - a tradição da joalheria é estreitamente ligada à história dos homens e mulheres - e o futuro, representado pela expectativa de durabilidade dos materiais com os quais são executadas as jóias.
Hoje em dia são utilizadas não só como adorno ou símbolo de status, têm valor
conceitual além do valor material, informa a singularidade dos indivíduos e sua
autenticidade. As questões relativas à memória têm sido objeto de interesse da maioria
dos designers contemporâneos, impregnando as jóias de significados em relação ao
mundo e ao homem. Em harmonia com a estética e a história, o designer vem tentando
desenvolver papel social difundindo culturas e resgatando memórias através dos
produtos de joalheria, evitando assim, que as formas das jóias atuais percam o sentido
com o passar dos anos.
A joalheria de hoje tem uma riquíssima contribuição das culturas, filosofias e
artes em geral. É uma ligação entre a arte e a moda de todos os tempos. Materiais
11 MACHADO, Maria Regina Soares. Jóia: a vocação da permanência no tempo das efemeridades. Rio de Janeiro: ECO/UFRJ. Dissertação (Mestrado em Comunicação dos Sistemas Simbólicos), Faculdade de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2002.
preciosos que nos trazem informações a respeito de povos ancestrais! É um elo de
comunicação entre os indivíduos e suas culturas, capaz de levar mensagens através das
formas, despertando a curiosidade em relação a sua simbologia, seja ela qual for. Regina
Machado afirma: “por meio das jóias ficamos sabendo de muitas informações
importantes das épocas em que foram criadas. A vocação da jóia é materializar o
tempo”.
Os imigrantes italianos foram fundamentais para o crescimento econômico da
serra do Estado do Rio Grande do Sul, daí a importância e necessidade de retratar sua
cultura através de jóias conceituais e tentar exercer um papel social de conscientização e
resgate de suas memórias. Não foram encontradas jóias com a temática imigração
italiana ou que fizessem referência aos Caminhos de Pedra, ou ainda, que utilizassem o
basalto como material (nacional).
2 JUSTIFICATIVAS
Observou-se que o roteiro Caminhos de Pedra é pouco valorizado pelos
moradores da localidade de Bento Gonçalves. Muitas casas de pedra estão abandonadas,
esquecidas pelos proprietários, algumas talvez até sujeitas à ruína. Embora o projeto de
preservação, hoje reconhecido pela Unesco, tenha tombado prédios representativos e
restaurado muitos deles, algumas pessoas, ainda relutam em aceitar o roteiro e
acreditam se tratar de um estímulo a desordem. Um pré-julgamento descabido! Visto
que, outros habitantes e empreendedores tiveram apoio do Sebrae e da Lei Nacional de
Incentivo a Cultura para transformar o patrimônio dos Caminhos em ponto turístico,
preservando a memória de seus antepassados através dos ambientes domésticos e de
trabalho da época da imigração, muitas casas transformaram-se em museus e pontos
comerciais típicos, contribuindo para economia e renda regional. 12
Há uma necessidade de valorização do patrimônio histórico e de despertar a
consciência social em relação à preservação do acervo material e resgate da cultura dos
colonizadores no roteiro Caminhos de Pedra, visto que muitos ítalos-descendentes, por
falta de divulgação ou interesse, simplesmente desconhecem sua existência. Quanto às
casas, devido a perda de informações (resultantes da II Guerra Mundial), muitos dos
descendentes ignoram os reais “porquês” das casas terem sido construídas de maneira
12 Informações baseadas no site: <http://www.caminhosdepedra.org.br/>
tão diferente e com o material basalto.
Uma coleção de jóias que desperte o interesse para a história da imigração
italiana conseguiria levar esta abordagem para um número mais efetivo de pessoas e
atingir públicos de diversas regiões. Valorizando não só o local, mas enriquecendo a
cultura de pessoas leigas ao roteiro, e também estimulando o conhecimento, espírito de
resguardo pela cultura dos nativos.
2.1 Objetivos
Confeccionar uma coleção de jóias conceituais que ajude a divulgar o roteiro
turístico Caminhos de Pedra. Tendo como foco principal difundir os fatos históricos das
relações dos imigrantes com as casas de pedra, demonstrando a importância das
habitações para o desenvolvimento da cidade. O conceito do projeto é de caráter sócio-
cultural e visa auxiliar na democratização do conhecimento da história da colonização
italiana incentivando a preservação do patrimônio e da cultura dos imigrantes italianos
entre os descendentes e leigos.
Pretende-se aplicar nas jóias, alguns elementos regionais que simbolize as
casas de pedra e que ao mesmo consigam demonstrar as principais características
culturais da imigração italiana dos Caminhos de Pedra. O design das jóias é
fundamental para possibilitar que esta divulgação seja atrativa aos visitantes e
interessante para os nativos da região.
3 BRIEFING
Cabe lembrar que a elaboração deste trabalho foi baseada na metodologia de
Bruno Munari e nas adequações desta metodologia com o material didático das
disciplinas estudadas neste curso. Para obter-se um resultado satisfatório deste projeto
de design, procurou-se acrescentar aqui,
o aspecto dos valores objetivos – tais como a funcionalidade, a manuseabilidade, a cor, a forma, o material de que são feitos e assim por diante, [...] (MUNARI, Bruno. Das Coisas Nascem Coisas. 1998, p. 97).
além de outros aspectos que devem ser observados pelo profissional designer, como
complementação destes estudos, adiciona-se a partir deste briefing.
Definição do Problema: criar uma coleção de jóias artesanais com conceito
sócio-cultural, com utilização de material regional que caracterize o roteiro Caminhos
de Pedra, que ajude a divulgar a região e aumentar o nível cultural e de conhecimento
histórico dos nativos e visitantes da região.
Temática: a inspiração é o roteiro turístico Caminhos de Pedra.
Idéia: contar um pouco da história dos imigrantes através de produtos de
joalheria. Tentar contribuir para o resguardo da memória dos Caminhos de Pedra,
conscientizando os visitantes e habitantes locais sobre a importância histórica das casas
no desenvolvimento regional e também fazendo com que os usuários levem consigo, um
pouco da cultura local, divulgando-a, inclusive, para outras regiões.
Função: as jóias têm função de adorno e servem para complementar o visual da
usuária. As peças desta coleção, além da função decorativa, também apresentam a
função simbólica.
Necessidade: em vista da necessidade feminina em combinar acessórios e
roupas e no intuito de auxiliar no dia-a-dia da usuária, procurou-se desenvolver
alternativas versáteis, que possibilitem mais de uma configuração de uso. Segundo
Fernando Cortés (informação verbal13), consultor do IBGM
quando alguém compra uma jóia, as necessidades são de origem superior e podem ser divididas entre: necessidades sociais, necessidades de ego e necessidades de auto-atualização.
Pode-se afirmar que, a abordagem desta coleção tem a capacidade de sanar
quaisquer destas necessidades, já que apresenta um papel social importante em sua
temática, tem design exclusivo e utiliza materiais nobres e diferenciados que podem
satisfazer os mais variados clientes. Sendo assim, uma solução definitiva.
Proposta de coleção: a coleção é composta de seis peças: dois broches-
pingente, dois anéis, um bracelete e um par de brincos; todas confeccionadas em ouro
18K, diamantes e basalto polido, atende as necessidades do mercado em relação ao que
se encontra ou se espera encontrar nos materiais que compõem uma jóia.
Tecnologias de confecção: produção artesanal executada pelos profissionais:
ourives, lapidário e cravador.
Inovação tecnológica: a utilização de basalto polido, considerando-se que, não
foram encontradas no Brasil jóias executadas com esta rocha vulcânica e trata-se de um
diferencial conceitual que caracteriza a região.
Inovação funcional: broches que podem ser utilizados como complementos de
13 FERNANDO, Cortés. Mais Varejo Básico. Porto Alegre, AJORSUL, 20 a 22 out. 2008.
colares e pulseiras.
Conceito: as peças têm design orgânico e exprimem a força e união entre os
imigrantes e a terra que os acolheu. Os modelos apresentam um basalto polido
“abraçado” pelo metal, simbolizando as rochas das casas e das encostas. Representando
o modo como o povo italiano “literalmente”, lapidou esta terra serrana levando-a ao
progresso, segregando sua persistência e fazendo das adversidades encontradas nas
encostas e leitos de rios, materiais de construção para suas moradias.
Onde ficava o mundo? Só pinhais, matos, charnecas e milho para a
fome dos olhos. Para lá da serra, o azul de outra serra e outra serra ainda. E o mar? E a cidade? E os Rios? Caminhos de pedra, sulcados, curtos e estreitos, onde chiam carros de bois e há poças de chuva. Onde ficava o mundo? Nem a alma sabia julgar. Mas vieram engenheiros e máquinas estranhas. Em cada dia o povo abraçava outro povo. E hoje a terra é livre e fácil como o céu das aves: a estrada branca e menina é uma serpente ondulada e dela nasce a sede da fuga como as águas dum rio. (NAMORA, Fernando. [S.I.]:[S.ed.]).
Interações das usuárias com as jóias: as mulheres na faixa etária dos 20 aos 60
anos, oferecem maior desempenho e eficácia operacional no manuseio das jóias. A
freqüência de uso poderá ser diária, dependendo, exclusivamente, da vaidade e vida
social da usuária. Os produtos apresentam ações de manejo básicas e fáceis de aprender.
Sendo os broches, os produtos que mais demandam tempo na hora da colocação. As
operações são consideradas simples, sem exigir movimentos repetitivos, de freqüência
ou tempo, sendo compatíveis, ou seja, não contrariam os estereótipos populares,
influenciando apenas a capacidade cognitiva – as crianças e idosos, por exemplo, podem
apresentar dificuldades motoras ao colocar um brinco. As ações de manejo e controle
são: fino e preciso (para todas as peças) sendo suas exigências consideradas de nível
médio para os broches e brincos, e de nível básico para as demais jóias. As partes do
corpo ou membros envolvidos são: as orelhas, colo (pescoço), dedos e pulsos (braços).
No caso dos broches, apresentam uma inovação funcional, podendo ser fixado em
roupas, utilizado como pingente ou como complemento de pulseiras. Para
desenvolvimento projetual, foram observados, as dimensões, o peso e a superfície
material de cada peça para que se obtivesse uma melhor ergonomia, garantindo, o
conforto da usuária. Este breve estudo microergonômico, teve como base as anotações
dos conteúdos ministrados em aula, na disciplina de Fundamentos da Ergonomia
(GOMES, p. 29-102).
Relação das jóias com o meio: jóias são peças que se requer cuidado no
manuseio, exposição, armazenamento e sempre precisam de manutenção. Nas lojas,
quando não estão em expositores ou displays de vitrine, as jóias devem ser armazenadas
em estojos, de material rígido e forrado internamente, para evitar riscos nas superfícies
de gemas e metais, ou até mesmo, que se quebrem. O mesmo vale para o
armazenamento após a compra. As sacolas destinadas ao consumidor final, também têm
de ser de material estruturado pela mesma finalidade. O contato com produtos químicos
é um perigo para as jóias, podem danificar seriamente as peças e, no caso do contato
com o mercúrio, pode corroer o metal. É desaconselhável o uso de jóias nos afazes
domésticos, em trabalhos pesados e na operação de máquinas e equipamentos, evitando
desta forma a ocorrência de acidentes.
Relação das jóias com o meio ambiente: “A jóia é o único produto do luxo que
não vira lixo”, afirmou oralmente Regina Machado, em setembro de 2007, na palestra
da feira da AJORSUL (Associação do Comércio de Jóias, Relógios e Óptica do RS), em
Gramado. O ouro é um metal reciclável, uma vez aplicado na confecção de uma jóia,
poderá ser refinado novamente e ser utilizado para fazer novas peças. Quanto a rocha
basáltica, concluiu-se também se tratar de um material reciclável. Considerando que é
comum sua utilização ornamental, o basalto pode ser reutilizado para este fim, desde
que seja retirado das peças por um profissional capacitado. Além disso, embora não se
tenha realizado um estudo mais efetivo em relação ao seu reaproveitamento, sabe-se que
esta rocha é amplamente utilizada da indústria da construção civil e também em
produções artísticas, o que nos leva a pensar que os descartes oriundos destes segmentos
poderiam ser aplicados na indústria joalheira.
3.1 Definição de Materiais
Cada vez mais, os designers sentem necessidade de inovar e aplicar materiais
inusitados em suas peças. Para aplicar um material efetivamente representativo nesta
coleção de jóias, além da pesquisa, visitou-se a região para coletar dados e materiais
para auxilias na escolha da alternativa mais adequada. O basalto vulcânico – por estar
intimamente ligada a história local é o mais característico dos Caminhos de Pedra.
O basalto tem uma grande contribuição ao desenvolvimento regional da Serra
Gaúcha, onde tem forte influência de colonização italiana. A plantação de uva e
produção de vinho, que é atividade rural principal da região, também tem uma íntima
relação com o basalto. Utilizado há mais de 100 anos nas construções das casas dos
Caminhos de Pedra, apesar de sua contribuição regional, a importância do basalto é
pouco divulgada.
O planalto presente nos Estados de Santa Catarina e Rio Grande do Sul,
denominado Serra Geral, é constituído principalmente por lavas de composição
basáltica. Este conjunto de lavas é originado de erupções vulcânicas efusivas de grande
escala ocorridas há cerca de 135 milhões de anos, sendo a segunda maior ocorrência de
grandes derrames de lava basáltica na região nesta região do mundo. O basalto pode ser
aplicado em forma de: lajes, uso ornamental, construção de paredes, pavimentação de
calçadas e pisos, paralelepípedos, construção de muros, polimento e brita para
construção, dependendo da fratura da rocha. Pode ser encontrado nas cores: preta (black
rock) – a mais escura das rochas ornamentais conhecidas no Brasil, tonalidade cinza
(greyscale rock), cinza escura (dark grey rock) e variar do amarelo-claro, violeta a
vermelho-escuro (slight-colour rocks), dependendo da composição química.14
Sobre o basalto e a produção de vinho na serra gaúcha, transcreve-se aqui,
parcialmente, o estudo - Basalto da Serra Gaúcha e sua Relação com o
Desenvolvimento Regional, apresentado nos Anais do 2º Congresso Brasileiro de
Extensão Universitária, em Belo Horizonte, nos dias 12 a 15 de setembro de 2004
(anexo):
Devido a esta condição regional, os imigrantes foram obrigados a procurar atividades diferentes do plantio, tal como pecuária. Uma opção de agricultura praticável até mesmo neste terreno foi a plantação de uva. A uva resiste bem na condição com pouca água e baixa fertilidade, além disso, pode ser plantada também nas encostas. Apesar de pequena quantidade, o Basalto mantém água subterrânea nas fraturas horizontais desenvolvidas, formando uma massa rochosa permeável. Portanto, o ambiente subterrâneo é mais úmido do que o da superfície. A existência da água subterrânea [...] são favoráveis para fruticultura, sobretudo de uva.
Junto com a plantação de uva, foi iniciada a produção de vinho [...] O basalto é um material-chave, [...] para o amadurecimento de vinho, [já que] é necessário um espaço escuro, úmido e de baixa temperatura durante o ano inteiro. [...] Muitas casas desta região têm porão deste tipo para armazenar vinho caseiro. Isto é, o basalto cria a uva e transforma-a em vinho.
[...] o basalto da Serra Gaúcha é um material essencial e importantíssimo para atividades econômicas desta região, oferecendo uma imensurável contribuição social. [...] Entretanto, a origem do basalto não está bem conhecida pelos habitantes locais. Além disso, apesar da importante contribuição social, o basalto está pouco conhecido no Brasil.
[...] professores universitários devem estender seus esforços para as atividades de extensão, praticando a divulgação científica e inteiração social, juntando braços com os professores e alunos de primeiro e segundo
14 Segundo a medida quantitativa de cores, parâmetro Brightness
graus, produtores do basalto e indústrias regionais de construção. [...] Por meio disso, pode-se realizar a valorização do basalto como o material de construção do orgulho da região da Serra Gaúcha. (MOTOKI, Akihisa. et al., 2004)
Os dados aqui relacionados são de extrema importância na definição de escolha
dos materiais utilizados nesta coleção. Pode-se perceber que a valorização regional
desperta inclusive, o interesse histórico e ambiental por parte de outras áreas do
conhecimento, tamanha sua importância.
Quanto ao conceito atual sobre os materiais no design de jóias, são bem
colocados através das palavras de Regina Machado:
O que vale numa jóia, hoje, é o conceito que ela traduz, mais do
que o valor do peso do metal ou das gemas que a compõem. O que caracteriza o luxo é sempre algo extraordinário, algo que
foge ao comum. Hoje esse novo luxo na joalheria é construído com a mistura do luxo tradicional – ouro, diamante, rubi, esmeralda, safira – com materiais alternativos, como madeira, couro e sementes.
A jóia hoje não tem mais o valor estipulado pelo peso empregado na fabricação. O que vale é o peso da idéia, do desenho, do conceito. O capital material não é mais a única forma de aferir se peça é de luxo ou não. “Antigamente, verificava-se o quanto de ouro era usado, quantos quilates de diamantes. Só que, hoje, a aura da joalheria não é construída mais exclusivamente pelo uso de materiais preciosos. Então, tão importante quanto o material é o design, a cultura e isso não tem como ser pesado, porque o luxo foi para o abstrato”, resume a designer. (MACHADO, Maria. Revista
Indústria de Jóias: lapidando a imagem da jóia brasileira, SEBRAE, 2007, p. 18 e 19).
Com base nestes dados, surgiu a necessidade de efetuar uma busca para
verificação da existência de jóias confeccionadas com basalto. O material foi
encontrado somente nos trabalhos do designer português Paulo do Vale, que se dedica
exclusivamente, à produção de peças de joalheria artesanal com uso da rocha vulcânica.
3.2 Definição do Conceito
Os conceitos de união, resistência, progresso, fé são representados nesta
coleção. Todas as peças fazem referências aos elementos da cultura da imigração
italiana presentes nos Caminhos de Pedra e, denotam as casas de pedra através da
utilização do basalto vulcânico. Estes elementos estão simbolizados nas formas
utilizadas no desenho das jóias. A resistência é representada pelo basalto vulcânico. As
jóias apresentam uma evolução histórica entre si. Em separado, cada peça tem sua
simbologia dentro do contexto histórico cultural da imigração italiana e suas relações
com as casas de pedra.
O broche-pingente Resistenza representa o momento em que os imigrantes
italianos iniciaram as edificações das casas de pedra, fizeram do basalto das encostas,
que inicialmente era uma adversidade para o plantio, além de material de construção,
um aliado no cultivo da uva e produção do vinho – simboliza a resistência dos
imigrantes.
O bracelete e anel Progredire representa a forte ligação dos imigrantes com a
terra firmando raízes na região e espalhando seu espírito empreendedor pela serra
gaúcha, assim como se espalham os parreirais fruto de seu trabalho – simbolizam o
progresso.
O brinco e o pingente Religione representam a religiosidade, a perseverança do
imigrante em sempre acreditar que era possível vencer – simbolizam a fé que perdura
até hoje entre as famílias de descendentes italianos.
O anel Unione representa a culinária italiana – simboliza a união da família,
pois era à mesa que se fortalecia a relação familiar, desde a oração até as festividades.
CONCLUSÃO
O trabalho foi desenvolvido com o objetivo de projetar uma pequena coleção
de jóias com design inovador que fosse capaz de abordar satisfatoriamente a temática da
imigração italiana no Rio Grande do Sul. Em vista da falta de divulgação dos Caminhos
de Pedra ou desinteresse dos habitantes do local em relação ao roteiro, a intenção é
valorizar o patrimônio histórico-cultural e preservar a memória da região. Na tentativa
de ajudar a divulgar o itinerário, tornando inclusive, as informações relativas a cultura
dos imigrantes italianos mais acessíveis aos descendentes, foi elaborado um projeto de
design de jóias conceituais em que o maior desafio foi encontrar um material que
caracterizasse com fidelidade a região e que tivesse uma forte relação com a história dos
imigrantes.
Baseando-se nas exigências estéticas e de mercado foram realizadas visitas e
coleta de dados, bem como pesquisa histórica e de materiais, complementadas pelos
estudos em relação às tendências de moda, concorrência e preferências do cliente, e
estes estudos fundamentaram a geração de seis alternativas projetuais, utilizando um
material característico da região e estreitamente ligado a história da colonização italiana,
o basalto.
Inicialmente, não se tinha idéia do quanto o basalto foi importante na história
dos imigrantes, tanto que, se pensou em abordar tal temática fazendo referência às
esculturas regionais ou as casas de pedra. Porém, após a pesquisa, descobriu-se que o
basalto foi fundamental para que os colonizadores se estabelecessem na serra gaúcha,
sendo auxiliar no cultivo da uva e produção do vinho. Aliando design, história, conceito
e técnica foi possível projetar peças que representam importantes fatos da colonização.
O desafio encontrado aqui foi adequar este material as peças de joalheria projetadas,
mantendo as formas visuais e não comprometendo o conceito de cada peça, nem o
conforto da usuária.
A experimentação nunca deve ser ignorada pelo projetista! Devido às
condições de lapidação do basalto, a idéia de utilizá-lo em formato de esferas teve de ser
adaptada também, para os formatos cabochão e gota. Outra adaptação foi quanto a
fixação do basalto nas jóias. A idéia era perfurar a rocha e utilizar a fixação semelhante
a que é comumente empregada entre as pérolas, ou seja, por pinos. Embora seja
tecnicamente viável esta alternativa foi remanejada por motivos de economia e
substituída pela cravação sob pressão com o auxílio de cola.
Procurando atender as necessidades da usuária, buscou-se inovação funcional
em projetar 2 peças que apresentam mais de uma configuração de uso. A inovação
tecnológica ficou por conta da utilização do basalto, material não convencional inédito
na joalheria brasileira. Para estudos futuros, fica a sugestão de explorar outras cores de
basalto e quem sabe, divulgá-lo como mineral gemológico. Por enquanto, mantém-se a
idéia de buscar apoio regional para exposição da coleção e divulgação do basalto como
patrimônio do orgulho da serra gaúcha e de seus colonizadores.
Entende-se, que o profissional designer exerce seu papel social no
desenvolvimento de produtos que facilitam a resolução de problemas e atendam as
necessidades do usuário. A utilização de temáticas culturais, em especial as regionais,
acrescenta mais valor social aos produtos de design merecendo uma atenção especial
por parte do projetista. Em vista disto, concluiu-se que este trabalho mostrou-se
satisfatório. Deixando uma sensação de primeiro passo de uma longa caminhada na
busca de fortalecer os produtos de joalheria como coadjuvantes na conscientização
cultural entre a sociedade, e não apenas como produtos do luxo.
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