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TÓPI
CO
Licenciatura em ciências · USP/ Univesp
12 Quím
ica
Guilherme A. MarsonAna Cláudia Kasseboehmer
ENERGIA NAS REAÇÕES QUÍMICAS
12.1 Introdução12.2 Energia de ativação12.3 Termoquímica no dia-a-dia: transformações químicas para utilização de energia
12.3.1 Reações de Combustão12.3.1.1 Combustão no organismo humano: processo exotérmico
12.3.2 Fotossíntese: processo endotérmico 12.4 Espontaneidade das reações
12.4.1 Entalpia12.4.2 Entropia12.4.3 Energia Livre de Gibbs
12.5 Cálculo da variação de entalpia em uma reação química12.5.1 Pela entalpia padrão de formação12.5.2 Pela Lei de Hess
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Química AMBIENTE NA TERRA
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Objetivos• Compreender os tipos de transformações químicas endo e exo do dia a dia.• Prever a espontaneidade de uma reação.• Calcular a quantidade de energia liberada ou absorvida em uma transformação química.
12.1 IntroduçãoVimos no Tópico “Transformações químicas: definição e aspectos macroscópicos” que para
uma transformação ocorrer é necessária energia. Com transformações químicas, por envolver
rompimento e formação de novas ligações químicas, há inicialmente absorção de energia pelo
sistema e, concluída a reação química, o saldo energético pode resultar em absorção ou liberação
de energia quando elas são classificadas em endotérmicas ou exotérmicas, respectivamente.
Neste tópico, veremos alguns tipos de reação química comuns em nosso dia-a-dia e conhe-
ceremos algumas variáveis úteis para determinar teoricamente se uma reação é favorável para
ocorrer espontaneamente ou não. Com uma dessas variáveis, podemos calcular quanto de energia
uma determinada transformação pode liberar ou absorver. O estudo das questões energéticas
relacionadas às reações químicas é chamado de Termoquímica.
12.2 Energia de ativaçãoPara qualquer reação química ocorrer é necessário fornecer uma quantidade mínima de
energia. Essa energia é necessária, por exemplo, para romper as ligações químicas dos reagentes.
Observe a Figura 12.1:
Figura 12.1: Gráficos de energia × progresso da reação para transformações endotérmicas e exotérmicas. Entalpia pode ser definida como a energia em uma reação química e será discutida a seguir. / Fonte: modificado do banco de imagens LENAQ/UFSCar.
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TÓPICO 12 Energia nas reações químicas
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Como vimos anteriormente, as transformações podem ser endotérmicas ou exotérmicas,
pela absorção ou liberação de energia, respectivamente. Observe nos gráficos da Figura 12.1
que em ambos os casos é necessário inicialmente fornecer determinada quantidade de energia
aos reagentes para que a reação química ocorra. Após alcançar o chamado Estado de Transição
ocorre liberação de energia também em ambos os casos.
Esta energia inicial necessária para uma reação química ocorrer é chamada de energia
de ativação (Ea).
Se a quantidade de energia dos reagentes for maior que a quantidade de energia dos produtos, a transformação é classificada como exotérmica. Se a quantidade de energia liberada for menor que a absorvida para a reação química inicial, a transformação é classificada como endotérmica.
12.3 Termoquímica no dia-a-dia: transformações químicas para utilização de energia
12.3.1 Reações de Combustão
Uma transformação química pode produzir energia térmica, elétrica e luminosa. Em nosso
cotidiano, é comum nos depararmos com uma transformação química que produza energia
térmica. Um importante tipo de reação que gera energia térmica é a combustão.
Desde que o homem primitivo aprendeu a utilizar o fogo para o seu beneficio (aquecer-se,
defender-se, cozinhar alimentos), a obtenção de energia a partir de transformações químicas,
em especial as combustões, tem exercido papel fundamental nas sociedades.
Nesse tipo de transformação, a queima das substâncias químicas produz novas substâncias e
libera calor. Para ocorrer a combustão são necessários: um combustível (substância que sofre
a queima), um comburente (substância que alimenta a queima) e uma energia para iniciar a
combustão, por exemplo, uma fonte de chama.
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Química AMBIENTE NA TERRA
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Os combustíveis podem ser classificados de acordo com diferentes cri-térios. Um deles é a classificação amplamente divulgada na mídia: reno-váveis e não renováveis. Os combustíveis derivados do petróleo, como a gasolina e o óleo diesel, e do gás natural são exemplos de não reno-váveis. Também denominados combustíveis fósseis, eles têm origem na transformação de restos de seres vivos no decorrer de milhões de anos. Para ser considerado renovável, um combustível deve ser produzido em um intervalo de tempo compatível com a vida do ser humano. É o que acontece, por exemplo, com o álcool etílico. O álcool etílico (etanol) é obtido a partir da fermentação do caldo de cana-de-açúcar ou, ainda, da beterraba, entre outros vegetais. Outros exemplos são o biodiesel e o bio-óleo, conhecido como H-Bio. Estes são fabricados a partir de diferentes tipos de óleos vegetais ou de gorduras animais. A utilização de combustíveis renováveis ou não renováveis nos automóveis libera diferentes quantidades de gás carbônico. Esse gás é um dos principais responsáveis pela intensificação do efeito estufa. A vantagem dos com-bustíveis renováveis é o fato de que o carbono emitido resultante da sua queima é o mesmo utilizado pelas plantas originais (cana-de-açúcar ou beterraba) no processo de fotossíntese, sendo, portanto, proveniente da atmosfera. De modo contrário, a queima de combustíveis fósseis libera carbono que estava no subsolo há milhões de anos, o que implica um aumento da quantidade de gás carbônico na atmosfera.
Figura 12.2: Os combustíveis podem ser sólidos (por exem-plo, o carvão), líquidos (como a gasolina), ou mesmo gasosos (o gás de cozinha, por exemplo). / Fonte: Thinkstock.
Durante muitos séculos, a combustão da madeira e de outros materiais, como óleos e
gorduras, foi utilizada como fonte de energia. Álcool, gasolina, óleo diesel, lenha, carvão
mineral, gás liquefeito de petróleo e querosene são exemplos de combustíveis atualmente
utilizados em diferentes setores de atividades do homem.
Deve-se tomar muito cuidado no manuseio de certos combustíveis que têm a característica
de queimarem com muita facilidade; esses combustíveis são denominados inflamáveis.
A definição de líquido inflamável e de líquido combustível depende do aspecto legal em questão. Sob o ponto de vista legal da periculosidade, vale somente a definição dada pela NR 20, onde o ponto de fulgor (PF) é a referência principal para caracterizar um determinado líquido como inflamável ou combustível.
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TÓPICO 12 Energia nas reações químicas
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• Ponto de fulgor: A menor temperatura em que um líquido fornece vapor suficiente para formar uma mistura inflamável quando uma fonte de ignição (faísca, chamas abertas etc.) está presente. Segundo a NR 20 do Ministério do Trabalho, líquidos combustíveis e inflamáveis são definidos da seguinte forma:
• Líquido inflamável: todo produto que possua ponto de fulgor inferior a 70 °C e pressão de vapor absoluta que não exceda a 2,8 kgf/cm2, a 37,7 °C;
• Líquido combustível: todo produto que possua ponto de fulgor igual ou superior a 70 °C e inferior a 93,3 °C.
A norma ABNT NBR 7.505, por exemplo, considera como líquido inflamável todo aquele que possuir ponto de fulgor inferior a 37,8 °C e a pressão de vapor absoluta igual ou inferior a 2,8 kgf/cm2. O Decreto-Lei 96.044, que regulamenta o transporte de produtos perigosos, considera líquido inflamável toda substância que possui ponto de fulgor acima de 60,5 °C (teste em vaso fechado) ou 65,5 °C (teste em vaso aberto).Para entender o comportamento dos líquidos no ambiente, é preciso conhecer as seguintes propriedades: • a velocidade de evaporação do líquido depende de sua constituição, da temperatura (do líquido
e do ambiente), da pressão na superfície exposta e da movimentação do ar (ventilação); • a pressão de vapor depende do líquido e da temperatura de referência; quanto maior a pressão
de vapor, maior a capacidade do líquido em liberar vapores (mais volátil é o líquido).
ProdutoFaixa de
inflamabilidade (%) (ar = 21%)
Pressão Vapor à 37,8°C (kgf/cm²)
Ponto de Fulgor
(°C)
Ponto de Auto Ignição
(°C)Gasolina 1,5 - 7,6 0,70 -40 400
Hexano 1,1 - 7,5 0,30 -21 230
Tolueno 1,2 - 7,1 0,06 4 480
Metanol 6,0 - 3,6 11 385
Etanol 3,3 - 19,0 0,15 13 380
Querosene 0,7 - 5,0 0,17 40 210
Tabela 12.1: Propriedades físicas de alguns combustíveis.
A combustão libera a energia química que está armazenada no combustível. Essa energia
aparece sob a forma de calor e luz. Com a energia da combustão, o ser humano movimenta
veículos a gasolina, a gás, a óleo diesel ou a álcool, e cozinha alimentos no fogão. Essa energia
pode ser liberada também em usinas termoelétricas, que transformam a energia de combustíveis,
como o carvão e o petróleo, em eletricidade.
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A combustão é uma reação química. Como tal, necessita que as substâncias reagentes sejam
um combustível e um comburente. O gás oxigênio geralmente é o comburente. O combustível
e o comburente, após reagirem, formam novas substâncias: os óxidos.
Os óxidos formados nos produtos dependem da composição elementar do combustível; por
exemplo, na combustão do carvão que contém carbono, o óxido que se forma é o dióxido de
carbono, conhecido como gás carbônico.
A combustão do etanol e a oxidação do metal magnésio são exemplos de transformações
exotérmicas, pois se realizam com liberação de energia, em forma de luz e calor.
Por outro lado, a obtenção de metais como o ferro e a fotossíntese são exemplos de transfor-
mações endotérmicas, pois se realizam com fornecimento contínuo de energia.
O calor associado a uma transformação química é chamado calor de reação e recebe o nome
da transformação ao qual corresponde. Se a transformação envolve a formação de uma substância,
ele é chamado calor de formação. Se envolver a combustão, é chamado calor de combustão etc.
O gás carbônico liberado na combustão desses combustíveis é um dos responsáveis
pelo efeito estufa.
12.3.1.1 Combustão no organismo humano: processo exotérmico
Nossa própria vida depende da energia proveniente da combustão da glicose em nossas
células. As células precisam de combustível para a produção dessa energia. O combustível
das células são os nutrientes obtidos através dos alimentos no aparelho digestivo. Através do
sangue, os nutrientes chegam até as células juntamente com o oxigênio. Nas células, ocorrem
combustões lentas com produção de energia.
Para a combustão, é necessário o combustível, que nesse caso são os alimentos, e também o
comburente, que é sempre o oxigênio. O oxigênio necessário à combustão em nível celular é
coletado do ar atmosférico através da respiração. O ar atmosférico entra pelas vias respiratórias
e chega aos alvéolos pulmonares. Os alvéolos pulmonares são percorridos por uma rede de
vasos sanguíneos. Através das paredes desses alvéolos, o sangue recebe o oxigênio necessário à
combustão da glicose e elimina o gás carbônico produzido na combustão.
A energia fornecida pelos alimentos é medida pela quantidade de calor liberada nas combustões
que ocorrem nas células e é expressa em calorias. A quantidade de energia em quilocalorias (kcal)
por dia, necessária para os seres humanos, depende da idade, do peso, da altura e do trabalho físico
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TÓPICO 12 Energia nas reações químicas
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que exercem. Uma criança em fase de crescimento precisa de mais energia do que uma pessoa idosa.
O homem precisa de mais calorias que a mulher, porque possui uma porcentagem maior de tecido
muscular, e uma pessoa de estatura elevada precisa de mais calorias que uma de estatura menor.
A necessidade energética de um indivíduo é composta de uma parte constante, que atende
aos gastos inevitáveis (metabolismo basal) e uma parte variável. A taxa metabólica basal é a
quantidade de energia necessária para a manutenção dos processos vitais básicos: atividade
metabólica das células, trabalho osmótico, bombeamento do sangue, respiração, atividade renal,
do sistema nervoso etc.
A taxa metabólica basal é medida pela produção de calor ou pelo oxigênio consumido por
um indivíduo em repouso e acordado, 12 horas após a última refeição. É proporcional à área de
superfície corpórea, mais diretamente à massa magra – músculos, ossos e vísceras, ou seja, o peso
corpóreo menos o peso da massa adiposa –, e é também relacionada à idade e ao sexo.
Taxa de metabolismo basal e Energia
Para as mulheres, a taxa corresponde em média a 1.400 kcal/dia (5.850 KJ) e para os homens, a 1.800 kcal/dia (7.530 KJ). O consumo de energia por minuto gira em torno de 1 kcal, o que corresponde aproximadamente ao calor liberado por uma vela ou por uma lâmpada de 75 watts acesa.A variável que mais interfere no consumo energético é a intensidade de atividade física: entre o repouso e o exercício intenso, o dispêndio de energia pode aumentar até dez vezes. O gasto total é a soma da taxa metabólica basal e da energia gasta em diferentes atividades físicas.
Consumo de Energia por um homem adulto durante diferentes atividadesTipo de atividade kcal/h KJ/h
Muito leves: ler, escrever, assistir TV 110 460
Leves: dirigir, andar devagar, lavar louça 220 920
Moderadas: andar depressa, dançar, andar de bicicleta 370 1.550
Intensas: nadar, correr, jogar futebol ou basquetebol 580 2.430
Tabela 12.2: Consumo de energia por um homem adulto durante diferentes atividades.
Os alimentos ingeridos, após digestão e absorção, originam uma grande diversidade de substâncias, que são distribuídas às células, fornecendo os substratos das vias metabólicas oxidativas e biossinté-ticas, além de vitaminas e sais minerais. O funcionamento global do organismo depende da quanti-dade e da qualidade dos nutrientes ingeridos.A produção calórica por oxidação de carboidratos, proteínas e lipídios está indicada na tabela a seguir. Quaisquer destes três tipos de compostos podem suprir a demanda energética alimentar. A recomendação atual é a de que o suprimento energético seja fornecido por uma dieta que contenha cerca de 60% de carboidratos, 25 - 30% de lipídios e 10 - 15% de proteínas.
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Energia
Compostos kcal/g kj/g
Carboidratos 4 17
Proteínas 4 17
Lipídio 9 38
Tabela 12.3: Quantidade de energia por grama liberada por diferentes grupos de compostos orgânicos. / Fonte: Fotografia:Thinkstock.
12.3.2 Fotossíntese: processo endotérmico
Figura 12.3: Apesar de as reações de fotossíntese e a respiração celular serem consideradas quimicamente inversas, elas são consideradas biologicamente complementares, pois o produto de uma é o reagente da outra.
A fotossíntese (do grego photos, luz, e syntithenai, juntar, produzir) é um dos fenômenos
biológicos de maior importância para os seres vivos. Produz substâncias orgânicas a partir de
substâncias inorgânicas; transforma a energia luminosa em energia química, que fica armazenada
na glicose (que é o principal combustível das células); e produz o oxigênio, que será utilizado na
respiração celular a fim de produzir energia para as células.
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TÓPICO 12 Energia nas reações químicas
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A fotossíntese realizada pelas plantas, pelas algas e por certas bactérias (cianobactérias e pro-
clorófitas) é um processo endotérmico. A energia necessária ao processo provém da absorção
da luz e fica armazenada nas moléculas de glicídios, em forma de energia potencial química.
Utiliza como reagentes o gás carbônico e a água, e gera como produtos glicídios (cujos tipos
variam) e gás oxigênio.
Consiste de dezenas de reações químicas, que podem ser reunidas em duas etapas básicas: a
etapa fotoquímica (reações de claro) e a etapa puramente química (reações de escuro).
A etapa fotoquímica compõe-se de fotofosforilação e da fotólise da água; a etapa puramente
química é constituída pelos ciclos das pentoses.
12.4 Espontaneidade das reaçõesCom a utilização de três , que são elas: Entalpia, Entropia e Energia
Livre, é possível prever se uma reação química pode ocorrer. É importante ressaltar que a
previsão determinada com esses parâmetros termodinâmicos é verificada na prática somente se
houver tempo suficiente para que a reação química ocorra. No próximo tópico estudaremos
a cinética das reações, ou seja, a velocidade com que as mesmas podem ocorrer. Veremos que
existem estratégias para acelerar ou retardar as reações químicas e, quando se altera a cinética da
reação, as indicações termodinâmicas do processo podem não ser obedecidas.
A seguir conheceremos as três funções de estado termodinâmicas e quais indicações cada
uma oferecem para analisar se uma reação química é favorável. A Entropia e a Energia Livre
serão abordadas prioritariamente de forma qualitativa, porém, na Leitura Complementar você
poderá aprofundar seus conhecimentos e estudar algumas questões matemáticas dessas funções.
12.4.1 Entalpia
Retomemos os conceitos de sistema e vizinhança do Tópico “Propriedades das substâncias”.
Denominamos sistema a pequena porção do universo em que estamos interessados em observar
enquanto que aquilo que o circunda é chamado de ambiente ou vizinhança.
A variação de Entalpia, ou ΔH, pode ser definida como o calor transferido para o sistema ou do
sistema a pressão constante durante uma transformação desse sistema, que pode ser física ou química.
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Primeira Lei da TermodinâmicaA Primeira Lei da Termodinâmica enuncia que “a energia total do Universo é constante”. Portanto, temos que a quantidade de energia que um sistema transfere para a vizinha seja na forma de calor ou trabalho é a mesma que a vizinhança absorve e vice-versa.
Quando a transformação do sistema resulta em liberação de energia para a vizinhança a pressão
constante, como vimos, a transformação é classificada como exotérmica. Nesse caso, atribui-se
valor negativo a ΔH. Do mesmo modo, quandoocorre absorção de energia da vizinhança a pressão
constante tem-se então uma transformação endotérmica e o valor do ΔH é positivo.
Outro ponto importante em relação ao valor de ΔH é que o mesmo varia com a quantidade
de massa do sistema que sofre a mudança. Assim, se na evaporação de 1 mol de água líquida há
absorção de 44,0 KJ, quando 2 mol de água líquida evaporam são absorvidos 88,0 KJ de ener-
gia. Portanto, atente-se quando calcular a entalpia de uma reação química, para que a equação
química esteja corretamente balanceada!
O valor de ΔH também varia de acordo com a temperatura. No exemplo, anterior, na evaporação
de 1 mol de água líquida há absorção de 44,0 KJ quando a temperatura é 25 °C ou 298 K.
Observe os gráficos da Figura 12.4.
Figura 12.4: Diagrama de entalpia das transformações do vapor de água H2O(g), da água líquida H2O(l) e das substâncias simples que originam a substância água. / Fonte: Kotz, p. 180.
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TÓPICO 12 Energia nas reações químicas
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No gráfico da Figura 12.4 estão relacionadas as entalpias para as mudanças de estado da
substância química água. Observe que processos inversos possuem o mesmo valor de entalpia
alterando-se somente o valor de ΔH. Por exemplo, enquanto que ΔH = + 44,0 KJ/mol para a
evaporação da água, o valor de ΔH é - 44,0 KJ/mol para a condensação da substância.
Espontaneidade das reações químicasEm relação à utilização dessa função de estado para verificar a espontaneidade de uma reação, temos que:
Reações exotérmicas são mais favoráveis do que as endotérmicas. Isso pode ser explicado pelo fato de a vizinhança, por ser maior que o
sistema, contém maior quantidade de átomos o que facilita a dispersão randômica – em número maior de átomos – da energia potencial química
dos átomos e moléculas dos reagentes, estabilizando melhor o sistema.
12.4.2 Entropia
A Entropia, S, é uma função termodinâmica relacionada ao grau de dispersão ou de desordem
de um sistema. Teoricamente, um cristal altamente organizado na temperatura de zero absoluto
(0 K) teria entropia zero, pois as moléculas não se movimentariam e não haveria desordem.
Para exemplificar, seguem alguns exemplos das alterações de Entropia em determinados
sistemas:
• para uma mesma substância, a entropia dos gases é maior que a dos líquidos e a entropia
destes é maior do que quando a substância encontra-se no estado sólido;
• moléculas simples têm entropia menor que moléculas mais complexas;
• a dissolução de um líquido ou sólido em um solvente aumenta a entropia do sistema.
Segunda Lei da Termodinâmica e espontaneidade de reação químicaA Segunda Lei da Termodinâmica enuncia que “a entropia total do Universo aumenta continuamente”. Dessa forma, se uma reação química aumentar a entropia do Universo, ela será favorável. Assim como ocorre com a energia que quanto mais dispersa favorece uma transformação química, também a matéria concentrada tende a dispersar-se e quando isso ocorre as reações químicas são mais prováveis de formar os produtos.
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12.4.3 Energia Livre de Gibbs
De acordo com Tiedmam (2009), em Química, é interessante analisar algumas transformações
do ponto de vista da variação de entropia, ou seja, da dissipação de energia.
A reação de combustão do butano é exotérmica:
4 10 (g) 2(g) 2(g) 2 (g)13C H O 4 CO 5 H O calor2
+ → + +
A energia liberada na reação dissipa-se no ambiente, aumentando a entropia deste (ΔSamb
> 0). No sistema também ocorre um aumento de entropia (ΔS
sis > 0), porque 7,5 volumes gasosos nos
reagentes passa-se a 9 volumes gasosos nos produtos, o que corresponde à energia mais dispersa
nos produtos. Logo, a combustão do butano, uma vez iniciada, é espontânea.
A combustão do acetileno também é exotérmica, o que significa que a energia da reação se
dissipa no meio ambiente:
2 2(g) 2 2(g) 2 (g)5C H O 2 CO H O calor2
+ → + +
Porém, no sistema não há dissipação de energia. No sistema, ocorre concentração de energia
devido à redução de volume gasoso, de 3,5 nos reagentes (1 + 2,5) a 3(1 + 2) nos produtos.
Portanto, no caso da combustão do acetileno, olhando apenas para o sistema, poderia se
chegar à conclusão de que a reação não é espontânea. Porem, a experiência nos mostra que esta
reação é espontânea, o que se deve ao fato de que a energia dissipada no ambiente compensa a
energia concentrada no sistema.
O caso da combustão do acetileno nos mostra porque se procurou outra maneira de consi-
derar o balanço entre a dissipação e concentração de energia no sistema e no ambiente.
Este caso também ilustra o problema de se usar a entropia para verificar se um processo é
espontâneo ou na. É preciso olhar tanto para o sistema quanto para o ambiente. Ai a definição
do sistema fica meio sem sentido, já que é preciso levar em conta o todo. Para resolver a questão,
foi definida uma nova grandeza termodinâmica, chamada de Gibbs, representada pela letra G.
A variação da energia de Gibbs (ΔG) é definida, à pressão e temperatura constantes:
G H T SΔ = Δ - Δ
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TÓPICO 12 Energia nas reações químicas
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Energia Livre de Gibbs é uma função de estado que permite cruzar as variáveis entalpia,
entropia e temperatura para analisar, com informações apenas do sistema – e não do Universo
como depende a entropia – se é favorável obter os produtos de uma reação ou não.
Podemos sintetizar a espontaneidade das reações da seguinte maneira:
• Se uma reação for exotérmica (ΔH negativo) e se a entropia do sistema aumenta
(ΔS positiva), a reação será favorável aos produtos, pois ΔG será negativa;
• Se ΔH e ΔS tiverem o mesmo sinal, a espontaneidade da reação dependerá dos valores
de T, ΔH e ΔS;
• Sendo ΔH e ΔS negativa, o valor de ΔG resultante será positiva e a reação química,
nas condições em questão, não será favorável aos produtos.
12.5 Cálculo da variação de entalpia em uma reação química
Além de poder determinar se os produtos de uma reação química são favoráveis de serem
obtidos em condições experimentais específicas, é também útil poder calcular quanto de
energia é liberada ou absorvida em uma transformação química. Por exemplo, sabemos que
atualmente há diferentes combustíveis disponíveis no mercado como o etanol, a gasolina, gás
natural, etc. Um dos parâmetros de análise que devemos utilizar para uma escolha consciente de
qual combustível é o mais adequado para as nossas necessidades, além de impactos ambientais
e preço é o quanto de energia cada um desses materiais libera. Assim, é possível compará-los e
decidir qual combustível rende mais por quantidade de matéria ou por volume, etc.
A seguir veremos as diferentes estratégias para calcular a variação de entalpia, ΔH,
de uma reação química.
12.5.1 Pela entalpia padrão de formação
A entalpia padrão de formação de uma substância é tabulada e este valor corresponde à
variação de entalpia da reação de formação dessa substância a partir de substâncias simples em
seu estado padrão.
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Química AMBIENTE NA TERRA
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Estado padrãoEstado padrão é a forma mais estável da substância no estado físico em que ela existe em determinadas pressão e temperatura. Por exemplo, nas condições padrão de pressão e temperatura (T = 25 °C ou 298 K e P = 1 atm), a forma mais estável do carbono é a grafita no estado sólido – C
(s, graf ) – mesmo que ele possa ser encontrado em outras formas
alotrópicas. Já o oxigênio apresenta-se na forma mais estável como molécula diatômica e no estado gasoso – O
2(g).
É determinado que a entalpia de uma substância simples nas condições normais de tem-peratura e pressão é zero.
Compostos Nome ΔH0f (KJ/mol)
CaCO3 Carbonato de cálcio -1207.0
CH4(g) Metano -74.8
CH3OH(l) Metanol -238.6
CO(g) Monóxido de carbono -110.5
CO2(g) Dióxido de carbono -393.5
H2O(l) Água líquida -285.8
H2O(g) Água gasosa -241.8
H2SO4(l) Ácido sulfúrico -811.3
NH3(g) Amônia -46.2
C2H4(g) etileno +52.3
C3H8(g) propano -103.8
C2H5OH(l) etanol -277.6
NO(g) Monóxido de nitrogênio +90.4
NO2(g) Dióxido de nitrogênio +33.9
SO2(g) Dióxido de enxofre -296.1
Tabela 12.4: ΔHf0 para alguns compostos de interesse ambiental e energético. / Fonte: Lide, D. R., 2008.
Com os valores de entalpia de formação, podemos calcular a ΔH em uma determinada
reação. Considere, por exemplo, a combustão do metano, cuja equação química é fornecida
abaixo e os valores de entalpia de formação de cada substância:
( )4(g) 2(g) 2(g) 2 gCH 2 O CO 2 H O+ → +
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TÓPICO 12 Energia nas reações químicas
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Substância ΔHf a 298 K (KJ/mol)
CH4(g) - 74,8
O2(g) 0
CO2(g) - 393,5
H2O(g) - 241,8
Tabela 12.5: Valores de entalpia de formação para algumas substâncias.
A variação de entalpia decorre da entalpia dos produtos menos a entalpia dos reagentes:
( ) ( ) ( ) ( )( ) ( ) ( ) ( )
( ) [ ]
produtos reagentes
2 2 2 4
–
CO 2. H O – 2. O CH
393,5 2. 241,8 – 2. 0 74,8
393,5 783,6 – 0 – 74,8
1177,1 74,8 1102,3
f f f f
H H H
H H H H H
H
H
HH
Δ =
Δ = Δ + Δ Δ + Δ Δ = - + - + - Δ = - + - Δ = - +Δ = -
Portanto, na combustão do metano há liberação de 1102,3 KJ/mol do combustível.
12.5.2 Pela Lei de Hess
Se a entalpia é uma função de estado, a variação de entalpia de uma reação independe das
etapas pelas quais a reação passou. O que importa é a reação global, que descreve os reagentes
e os produtos da reação. Isto nos permite assumir que é possível calcular o ΔHde uma reação se
pudermos concebê-la como o resultado de diversas reações. Este princípio é conhecido como
Lei de Hess e tem a seguinte formalização:
0 0 0 0 ...H Ha Hb HcΔ = Δ + Δ + Δ +
onde a, b, c, etc. se referem a equações termoquímicas balanceadas, que podem ser somadas
algebricamente para darem a equação para a reação desejada.
Essa lei permite-nos calcular a variação de entalpia de uma reação mesmo que ela não ocorra,
ou o calor de reação não possa ser medido por alguma limitação experimental. Por exemplo,
usando os valores de ΔH 0f da Tabela 12.4, é possível calcular o ΔH 0 para a combustão do etanol:
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Química AMBIENTE NA TERRA
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( )2 5 (l) 2(g) 2(g) 2 gC H OH 3 O 2 CO 3 H O 1234 KJ/molH+ → + Δ = -
Para tanto, podemos empregar o seguinte raciocínio:
1. é necessário formar 3 mols de H2O e 2 mols de CO
2; logo, usamos as equações de formação
destes compostos e multiplicamos os valores ΔH 0f para ajustar as quantidades desejadas:
02(g) 2(g) 2 (g)
0(grafite) 2(g) 2(g)
3 H 1,5 O 3 H O 3 (-241,8 KJ/mol) -725,4 KJ/mol
2C 2O 2CO 2 (-393,5 KJ/mol) -787 KJ/mol
H
H
+ → Δ = × =
+ → Δ = × =
2. é necessário consumir 1 mol de C2H
5OH e 3 mols de O
2; logo, usamos a equação
inversa da reação de formação do etanol e lembramos que, como o O2 é uma
substância simples na forma mais estável, sua entalpia de formação é nula:
02 5 (l) (grafite) 2(g) 2(g)C H OH 2C 3 H 0,5 O 277,6 KJ/molH→ + + Δ =
3. somamos as equações acima e seus respectivos valores de ΔH calculados
2(g)3 H 2(g) 1,5 O+ 02 (g)
(grafite)
3 H O 3 ( 241,8 KJ/mol) -725,4 KJ/mol
2C
H→ Δ = × - =
02(g) 2(g)
2 5 (l) (grafite)
2O 2CO 787 KJ/mol
C H OH 2C
H+ → Δ = -
→ 2(g) 3 H+ 2(g) 0,5 O+ 0
02 5 (l) 2(g) 2(g) 2 (g)
277,6 KJ/mol
C H OH 3 O 2CO 3 H O 1234,8 KJ/mol
H
H
Δ =
+ → + Δ = -
Note que o valor e o sinal de ΔH devem acompanhar as inversões de reagentes e produtos
e a multiplicação ou divisão dos coeficientes estequiométricos. Embora tenhamos usado a
Lei de Hess para calcular valor de ΔH de combustão do etanol, a reação de combustão etanol
nãoenvolve a sua decomposição em Cgrafite, H2(g)
e O2(g)
para em seguida originar CO2(g)
e
3 H2O
(g). As etapas usadas são artifícios para calcular os valores de ΔH explorando o
conceito de função de estado para H.
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TÓPICO 12 Energia nas reações químicas
Licenciatura em Ciências · USP/Univesp
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Referências para a elaboração do tópicoaTkins, P. W.; Jones, L. Princípios de química: questionando a vida moderna e o meioambiente.
3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2006.
Brady, J. e.,russeL, J. W. & HoLum, J. r. Química: a matéria e suas transformações. 3.ed.
Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 2002.
BroWn, T. L.; Lemay, H. e.; BursTen, B. e.; Burdge, J. r. Química: a ciência central. 9. ed.
São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005.
koTz, J. C.; TreiCHeL, P. m.; Weaver, g. C. Química geral e reações químicas. 6. ed.
São Paulo: Cengage Learning, 2010.
maHan, B. m.; myers, J. r. Química: um curso universitário. São Paulo: Edgard Blücher, 1995.
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College Pub., 1997.
Tiedmann, P.W. Química Nova Interativa. Disponível em: <http://qnint.sbq.org.br/qni/
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GlossárioFunção de estado: Grandeza do sistema cuja variação só depende do estado inicial e do estado final do sistema.