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Entrevista a Stefano Riva

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Entrevista para a revista Traço ao arquitecto italiano Stefano Riva sobre o seu percurso profissional em Portugal.

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Stefano Riva é um italiano em Lisboa. A postura descon-traída de quem vive a vida de uma forma tranquila é a

mesma com que diz que a crise para ele não é novidade, anovidade está no facto de agora toda a gente falar dela

Texto: Ana Rita Sevilha | Fotos: João Reis e D.R.

StefanoRiva

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veria vender a arquitectura como vende ovinho e o azeite. “A primeira coisa que ospolíticos deveriam fazer em Portugal eracriar um imaginário português porque nãoexiste”. Comparando os dois países Stefanodiz que a arquitectura portuguesa tem ac-tualmente um impacto na Europa muitomaior que a Italiana. Com isto, refere o ar-quitecto, não quer dizer que Itália não tenhabons arquitectos, a diferença é que “ aqui aarquitectura é sentida como um fenómenoenquanto na Itália é um fenómeno muitodisperso e quase não há presença na socie-dade, na comunicação, por exemplo. Os ar-quitectos em Itália não têm um papel tãoactivo como em Portugal”.

“A crise existe, é um facto”Mas para Stefano Riva, não é propriamenteuma novidade: “sempre vivi uma espécie deprecariedade que não é novidade. A novi-dade para mim é que agora todos falamnisso”. Com isto não quer dizer que tam-bém não o sinta ao nível da encomenda.“Até há dois anos atrás eu tinha muita obra– principalmente dos trabalhos que fiz comos ARX, sempre com muito ritmo. Entre-tanto acabaram e em Setembro dei-meconta de que não tinha trabalho nenhummesmo. E de alguma forma fiquei mais as-sustado porque depois toda a gente falavano mesmo, na falta de trabalho, na crise.Estava generalizado”. Ao deparar-se comesse facto, começou a organizar-se paraparticipar em concursos, “estava a prepa-rar-me para accionar o Plano B”. Contudo,Stefano vive a profissão da forma como aescolheu viver: “A precariedade é intrinsecana profissão do arquitecto. Sempre tenteialigeirar o mais possível as despesas, comuma estrutura muito pequena, que sócresce pontualmente quando é necessáriopara determinados projectos. Nunca tivecolaboradores fixos. Fico contente pelofacto que desde que comecei a trabalhar so-zinho, nunca tive de o fazer a um Sábadoou a um Domingo”. Neste momento Ste-fano, entre outros trabalhos, diz estar a rea-lizar uma das suas quimeras: emcolaboração com colegas italianos realizouduas moradias no seu país Natal.

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Stefano Riva é um italiano por Lis-boa. A postura descontraída de

quem vive a vida de uma forma tranquila éa mesma com que diz que a crise para elenão é novidade, a novidade está no facto deagora toda a gente falar dela. Chegou a Lis-boa há 18 anos, de uma forma um poucocasual e “deixando o quarto por arrumar”por pensar que só ficaria seis meses, mas avida trocou-lhe as voltas. Da arquitecturaportuguesa conhecia relativamente pouco,tinha-a estudado, feito o “Siza Tour” eEduardo Souto Moura era um arquitectoque acompanhava com alguma atenção.Mas pouco mais. “Nunca vim para ficar!”revela à Traço. “Tinha uma tese final parafazer, e a minha ideia era fazê-la cá e depoisvoltar...mas entretanto, de uma forma es-pontânea, começaram a acontecer milhõesde coisas e fui ficando”. “Acabei a minhatese e comecei a trabalhar nos ARX”, corriao ano de 1997. Stefano Riva ficou no gabi-nete de José e Nuno Mateus durante seisanos.

“Sou um emigrante de Samsonite”Stefano estudou em Milão e fez Erasmusem Madrid. “Foi nessa altura que percebique a arquitectura podia ter piada”. Con-tando à Traço o seu percurso, Stefano Rivacomenta que saiu da Faculdade de Milãocom a sensação de que tinha aprendidopouco. “Frequentei um Instituto de Arte deque gostei bastante, onde tive bons profes-sores e onde aprendi muito. Mas depois, noPolitécnico de Milão, parecia que estavanuma fábrica, onde cada turma tinha de-masiados alunos, o que levava a que nuncahouvesse uma abordagem muito 'intima'.Em Madrid, deparei-me com o contrário,com uma abordagem muito diferente, porisso digo que foi lá que percebi que a ar-quitectura podia ter piada”. De regresso àsua terra Natal, depois da passagem porMadrid, percebeu que não queria ficar porlá. Não equacionou voltar a Madrid porquenão sentiu a necessária empatia com a ci-dade para viver, e Barcelona foi o destinoque escolheu. Contudo, não foi a cidade queo acabou por receber. “A determinada al-tura decidi ir para Barcelona, já estava tudo

“Vim para ficar seis meses,já passaram 18 anos”

organizado, mas à última da hora acaboupor se alterar tudo e vim parar a Portugal”.No fundo, “sou um emigrante de Samso-nite”, explica. “Eu venho de uma zona deItália que talvez seja das mais ricas da Eu-ropa, e embora exista quem diga que emItália não se faz arquitectura, recentementevi um programa sobre a Lombardia que fa-lava que em oito anos tinha sido construídoo equivalente a oito novas cidades comoCoimbra. Sempre que vou a Itália, maisconcretamente a Milão, vejo coisas novas.Há dinheiro. Com isto quero dizer que aminha escolha em sair de Itália não foi feitano sentido de 'ter de me safar'. Foi mais opoder dar-me ao luxo de fazer uma escolhasem que o dinheiro fosse um factor muitoimportante”. “Hoje, o mais engraçado é quevivo uma série de contradições, entre elas ofacto de ser um arquitecto português, por-que nunca trabalhei num gabinete em Itá-lia, o que eu conheço do mercado é o queme contam”, refere.

Volto, não voltoStefano Riva diz que houve alturas em quepensou em regressar, mas mais porquecomo saiu de Itália com a ideia de passarseis meses, “sempre vivi com uma espéciede drama do volto, não volto, o que é quefaço!”. Mas curiosamente, relata à Traço,assim que deixou de se preocupar com issocomeçaram a acontecer coisas ao nível pes-soal e profissional que fizeram com quecriasse raízes muito fortes aqui. “De algumaforma o voltar acabou por passar para se-gundo plano”. Contudo, sublinha, ao níveldos honorários estaria bem melhor em Itá-lia, onde os arquitectos são mais bem pagos.Questionado sobre o que o fascina então naarquitectura portuguesa que o levou a ficartanto tempo, Stefano explica à luz da expe-riência que teve enquanto trabalhou nosARX e com quem tem vindo a desenvolveralguns projectos que, relativamente aosseus colegas de Itália, “fez e faz uma arqui-tectutura muito mais profissional, menosespeculativa”, e sublinha que: “tive a possi-bilidade de fazer uma série de projectos quenão sei se em Itália teria tido”. Em jeito deconselho, Stefano Riva diz que Portugal de-

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Construir num bosque preservando o ambiente natural.Construir sobre um plano oblíquo mantendo a morfologia do terreno.Construir duas moradias separadas com o mesmo acesso.O programa previa a construção de duas moradias.O envolvente apresenta uma forte expressividade espacial, um lugar peculiar, as árvores de alto portefiltram e variam a intensidade da luz.As duas casas projectam-se no terreno em direcção ao bosque a partir de uma cota plana, conquis-tando um espaço habitável, suspendido no envolvente, valorizando a preexistência natural.A " casa sopesa", a Norte do lote nasce em volta de um páteo suspenso, que une num único gesto oespaço exterior e interior.A " casa pilar " tem um volume apoiados em pilares,que determina um espaço inferior de onde atravésde uma rampa ligamos o terreno às copas das árvores.As duas habitações apresentam um alçado que normalmente não existe, "o plano inferior", que resultaparticularmente sugestivo, evidenciando a relação entre o costruído e o elemento natural.O sistema construtivo é um misto entre betão armado e estrutura de aço, com forro em painéis de fi-brocimento e madeira de larice.Apesar de tudo isso, as folhas continuam a cair no outono e a renascer na Primavera.

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Ficha Técnica:Nome: "2 ville nel bosco"Autores: Marco Bigozzi, Massimo Bigozzi, Stefano RivaLocalidade: ItaliaÁrea: 460 m2Custo obra: 1.200.000,00 eurosInício e Conclusão: 2006-2012

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