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105 ANAIS • Ano I • Volume 1 é surpreendente, porque ela nasce em diversos setores, e tam- bém em instituições privadas, como os hospitais assistenciais, que dão contribuições importantíssimas para a cultura médica. Não tive mais do que poucas conversas com Ricardo, e ele me disse que esse é um trabalho exaustivo. O que ele conseguiu fazer foi pegar um apanhado geral do que existe nas bibliote- cas e em bancos de dados que têm acesso direto pela internet. A notícia boa é que a gente pode ir navegando até 1990, mas a quantidade de dados armazenados é tão grande que, para hoje, foi possível revisar dois anos. Eu achei isso muito bom, porque todos vão compreender o tamanho da empreitada que representa a cultura médica do Distrito Federal, de forma que o verdadeiro ator dessa sessão especial é o Ricardo. Ricardo Afonso Teixeira N a verdade, todo o esqueleto da ideia partiu de uma discussão conjunta, que seria buscar esses dados para saber o que tinha acontecido nos últimos anos. Quando zemos uma primeira pesquisa médica digitando a palavra “Brasília”, surgiram 1.990 artigos, e ainda tínhamos que buscar pelo Distri- to Federal. Então, chegamos a um acordo de tentar apresentar um projeto que possa ser desenvolvido ao longo do tempo. Re- almente, é um trabalho artesanal, artigo por artigo, buscando a liação de cada instituição e assunto.

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discussão conjunta, que seria buscar esses dados para saber o que tinha acontecido nos últimos anos. Quando fi zemos uma primeira pesquisa médica digitando a palavra “Brasília”, surgiram 1.990 artigos, e ainda tínhamos que buscar pelo Distri- to Federal. Então, chegamos a um acordo de tentar apresentar um projeto que possa ser desenvolvido ao longo do tempo. Re- almente, é um trabalho artesanal, artigo por artigo, buscando a fi liação de cada instituição e assunto. 105

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ANAIS • Ano I • Volume 1

é surpreendente, porque ela nasce em diversos setores, e tam-

bém em instituições privadas, como os hospitais assistenciais,

que dão contribuições importantíssimas para a cultura médica.

Não tive mais do que poucas conversas com Ricardo, e ele me

disse que esse é um trabalho exaustivo. O que ele conseguiu

fazer foi pegar um apanhado geral do que existe nas bibliote-

cas e em bancos de dados que têm acesso direto pela internet.

A notícia boa é que a gente pode ir navegando até 1990, mas

a quantidade de dados armazenados é tão grande que, para

hoje, foi possível revisar dois anos. Eu achei isso muito bom,

porque todos vão compreender o tamanho da empreitada que

representa a cultura médica do Distrito Federal, de forma que o

verdadeiro ator dessa sessão especial é o Ricardo.

Ricardo Afonso Teixeira

Na verdade, todo o esqueleto da ideia partiu de uma

discussão conjunta, que seria buscar esses dados para

saber o que tinha acontecido nos últimos anos. Quando fi zemos

uma primeira pesquisa médica digitando a palavra “Brasília”,

surgiram 1.990 artigos, e ainda tínhamos que buscar pelo Distri-

to Federal. Então, chegamos a um acordo de tentar apresentar

um projeto que possa ser desenvolvido ao longo do tempo. Re-

almente, é um trabalho artesanal, artigo por artigo, buscando a

fi liação de cada instituição e assunto.

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ACADEMIA DE MEDICINA DE BRASÍLIA

Isso permanece até hoje no meu dia a dia: “Brasília pre-

cisa estar estruturada para controlar o forte ritmo da ciência e

da tecnologia nas áreas de saúde. É claro que estar preparado

para isso não se resume em ter capital para a aquisição de equi-

pamentos de última geração. Estamos falando de cultura, e é

nesse ponto que a assistência de saúde não pode estar distan-

te da educação. Essas duas dimensões devem andar de mãos

dadas, pois são interdependentes. Uma forte cultura científi ca

forma novos talentos, atrai grandes talentos vindos de outras

regiões e evita a fuga de cérebros da nossa região”.

No mundo contemporâneo iniciam-se grandes transforma-

ções, que têm como fator propulsor a concentração e a disse-

minação de conhecimento. A atual reprodução científi ca tec-

nológica aponta para a crescente participação de novos atores

nesse processo, com forte necessidade de estratégias que es-

timulem interações interinstitucionais. Vamos ver um mapea-

mento das diferentes instituições do Distrito Federal. Acho que

temos muito a refl etir sobre isso.

Este é um trabalho de busca de artigo por artigo. Consegui-

mos, para esta data, fechar os anos de 2007 e 2008. Selecionei

todo o ano de 2007 e até 31 de julho de 2008. Tivemos um traba-

lho muito grande, também porque tem muita coisa do México e

de Portugal que aparece com a palavra-chave “Distrito Federal”.

O critério de exclusão foram artigos não associados à saúde hu-

mana. Nesse caso, apenas uma pessoa tomou a decisão.

Os trabalhos da UnB na área de física não tinham relação

com a física médica. Áreas básicas foram incluídas, assim como

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ANAIS • Ano I • Volume 1

toda a área de biotecnologia e a parte experimental, desde que

tivesse alguma ligação com o fenômeno da saúde humana. Fo-

ram incluídos também pelo menos quatro artigos desse grupo

de entendimento de novas tecnologias, para se tentar melhorar

a aplicação de alguns testes usados em medicina laboratorial

em termos de exame.

Dentro desse período de 2007 e 2008, temos 293 artigos

na área de saúde com esses critérios. Não tivemos uma linha de

progressão de produção. Desde 1990, quando se coloca a pa-

lavra Brasília, teríamos mais de 10% no último um ano e meio.

Nos últimos cinco ou dez anos, há uma produção muito maior

do que no início da atividade científi ca em Brasília.

Usando algumas categorias nessa ideia-piloto, vimos que a

maioria dos artigos foram publicados em revistas nacionais. São

170, contra 123 em revistas internacionais. Outra categoria bus-

cada nos artigos foi determinar se eram originais, se eram casos

clínicos, revisões ou de outra categoria. Essas outras categorias

foram cartas, normas técnicas – muito frequentes no grupo do

Ministério, trabalhando a área epidemiológica.

Por instituições, optamos por avaliar da seguinte forma:

universidades públicas, universidades privadas, Secretaria de

Estado de Saúde, o Sarah e o Poder Executivo. Tirei o Sarah

da categoria do Executivo, mas incluí todos os ministérios, o

Hospital das Forças Armadas e qualquer outro órgão que este-

ja vinculado. Outras categorias: instituições privadas; público/

público – que signifi ca uma cooperação entre duas instituições

públicas; privado/privado – uma cooperação entre duas insti-

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ACADEMIA DE MEDICINA DE BRASÍLIA

tuições privadas; público/privado; público/nacional e público/

internacional.

No resultado, tivemos 293 artigos, sendo 156 publicados

por universidades públicas (desses, 152 pela UnB), 26 de uni-

versidades privadas (22 da Universidade Católica de Brasília). A

Secretaria de Saúde contribuiu com 13 e o Sarah com 27, quase

todos do Javier. Ele está em todas as revistas mais importantes

e, apesar de não conhecê-lo, faço questão de exaltar a impor-

tância que ele tem para a instituição Sarah. O Poder Executivo

contribuiu com 29, sendo que 20 são do Ministério da Saúde.

Há 14 artigos de instituições privadas, alguns brilhantes. Fiquei

surpreso com a área de Oftalmologia, por exemplo.

A área experimental envolve toda a área de biotecnologia,

de cirurgia experimental. O grupo de cirurgia de Brasília tem

uma grande parcela dessa fatia experimental, e isso não está

refl etido nesses 34 artigos da cirurgia, que são artigos clínicos.

Nas especialidades clínicas tivemos 67 artigos e, no universo ex-

perimental de biotecnologia, 55, sendo 43 vinculados à saúde

pública. O peso da produção do Poder Executivo é muito forte

nesse sentido, pois representa quase metade disso.

Acho muito interessante o que Paulo Melo falou em entre-

vista em 2006: “Acredito que os alunos devem ter sua formação

prática majoritariamente junto a docentes com formação aca-

dêmica, e não junto a profi ssionais com experiência prática”,

ou seja, quem está ensinando a nossos alunos todos esses prin-

cípios ideológicos talvez não tenha como passar esse vírus de

gostar de pesquisa. É muito interessante que ele fala também

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ANAIS • Ano I • Volume 1

que, na época, o Hospital de Base chegou a manter quase 20

profi ssionais no exterior para fazer especialização, ou seja, o jo-

vem precisaria acreditar que ia ter uma chance de ter benefícios

que o ajudasse a seguir aquela carreira.

Uma coisa que também precisa ser bastante trabalhada no

meio é que muitas pesquisas deixam de ser publicadas porque

são feitas e, só depois de serem feitas (na área química princi-

palmente), são submetidas ao comitê de ética. Às vezes, isso

fi ca emperrado. Grande parte das revistas de peso de todo o

planeta não recebem nem mesmo só com a aprovação da co-

missão de ética. Ainda assim é necessária a inscrição no Comitê

Internacional de Ética Médica nesse sentido. Esse é um proble-

ma que está sendo sempre divulgado. A comissão de ética não

é nenhum bicho papão, ela precisa ser desmistifi cada.

A publicação é um novo gargalo importante dessa nossa pro-

dução científi ca. Hoje em dia, as grandes revistas já não aceitam

que você só submeta o seu artigo. Eles leem, dão a negativa e

devolvem, mas cobram para isso. Então, tem que se pensar duas

vezes se é para lá mesmo que o seu artigo tem cacife para ir.

Ainda hoje existe esta nova tendência de que, quando se

publica uma coisa que para você é muito importante, que se en-

tende como um dos pilares da vitrine do seu laboratório, do seu

grupo, você pode pagar à revista para que aquele artigo seja

disponibilizado imediatamente como artigo livre na internet.

Isso é uma colocação do que eu vivo hoje. Acho que é pre-

ciso desmitifi car essa cultura de que a ciência está só dentro da

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ACADEMIA DE MEDICINA DE BRASÍLIA

universidade. A ciência é coisa séria e precisa ser levada como

patente, como marca das grandes empresas e, porque não, das

empresas privadas. Por que se afastar desse caminho se não

estamos mais na universidade? Não temos alunos, mas, além da

realização pessoal e intelectual, é uma responsabilidade cívica

registrar e dividir conhecimento, além de se fazer uma análise

crítica do próprio trabalho. É um controle de qualidade do seu

próprio trabalho e não deixa de ser um marketing natural do

seu produto. A medicina que você faz é mais reconhecida quan-

do escrita. Quem escreveu tem menos medo de mostrar aquilo

do que quem só fala.

Essa é uma provocação. Buscar alguém que já sabe fazer é

um caminho mais fácil. Uma tendência de quase todas as revis-

tas hoje é criar a página do paciente. A Academia Americana de

Neurologia tem a página do paciente. Se sair um artigo impor-

tante de impacto no dia-a-dia das pessoas, seja sobre exercício

físico, ou mesmo que seja uma doença, aquilo é decodifi cado

para o próprio doente entender qual foi o avanço daquilo, onde

estávamos e onde fomos parar. Outro caminho são os “boxes”,

com discussões específi cas com colunistas. É um time peso pe-

sado discutindo sobre diversos assuntos. Eu tenho entendido o

quanto isso é uma coisa séria hoje em todas as dimensões do

conhecimento, seja no “jornalismo New York Times”, seja no

jornalismo científi co formal.

Acho que toda decodifi cação de conhecimento ao leigo

retroalimenta a própria ciência vista como ortodoxa. A divulga-

ção científi ca é uma importante ferramenta para que a socieda-

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ANAIS • Ano I • Volume 1

de passe a entender o quanto a ciência é vital para o desenvol-

vimento da nossa sociedade. Essa conscientização pode fazer

com que a ciência seja aceita e estimulada pela população por

meio de seus representantes, e que as ações que fomentam o

desenvolvimento científi co e tecnológico dos países passem a

ter impacto na geração de votos nas eleições. As pessoas têm

que começar a entender que ciência não é coisa de gringo, que

a ciência também é feita aqui.

Temos que acelerar esse processo. O jornalismo científi co

é muito importante nesse sentido. Também é importante le-

var as crianças, já no ensino fundamental, para essa construção

de cultura. Tive a oportunidade de receber os primeiros cader-

nos da série do GDF com um kit experimental para as crianças.

A gente espera que esse seja um projeto sustentável.

Acadêmico Antônio Raimundo Lima Teixeira: Pesquisador e Professor da Faculdade de Medicina da UnB.

Acadêmico Ricardo Afonso Teixeira: Médico neurofi siologista.