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Formas dramatúrgicas e cênicas do Teatro de Agitprop
Christine HAMON
Sem dúvida é difícil efetuar esta análise sem esquematizar e empobrecer uma
realidade teatral complexa, que tomou rumos bastante diversos nos últimos dez anos de sua
existência. Quando muito pode-se tentar captar um certo número de elementos constantes
na elaboração dos textos e montagem dos espetáculos. Trata-se, sobretudo – confrontando o
que sabemos do agitprop com as realizações teatrais profissionais –, de marcar as oposições
mas também as influências, sublinhando as mudanças formais de uma fase histórica a outra,
de perceber de que maneira específica o agitprop se insere no campo das atividades teatrais.
AS FORMAS DRAMATÚRGICAS
Profundamente enraizado na corrente do autoativismo, o teatro de agitprop aparece
de início como uma nova prática social da arte: não mais grandes autores/as – mesmo que
muitas vezes alguém assuma a responsabilidade literária assinando o texto – mas sim um
coletivo de autoria na maior parte dos casos; não mais atores e atrizes conhecidos, mas um
grupo anônimo de intérpretes. Por isso, não há mais texto a servir e respeitar, mas uma
colcha de retalhos transformável de acordo com as circunstâncias políticas e necessidades
locais. O texto da peça de agitprop, maleável, seguidamente readaptado, torna-se assim um
instrumento, não um fim em si mesmo.
Esta recusa do texto fechado é também a recusa do “grande texto”. Pode-se muito
bem encenar Tolstoi ou Romain Rolland, mas somente num período de transição. O modelo
do teatro psicológico, que ao longo de algumas horas desenvolve uma ação central
construída sobre clímax e episódios novos, não é mais necessário. A grande dramaturgia de
estrutura linear cede espaço a um espetáculo de forma fragmentada. Isto é o que mais
chama atenção num espetáculo de agitprop: a sucessão de pequenas cenas breves, variadas,
eficazes, renovando a todo instante o interesse e a combatividade política da espectadora e
do espectador por meio desta diversidade. Esta estrutura formal não é única e as influências
que marcaram o agitprop no seu início certamente o explicam.
– Influência do teatro de cabaré literário diretamente ligado ao desenvolvimento
inicial do teatro de agitprop.
– Influência do teatro popular e particularmente do balagan (teatro de feira) ou do
Petruchka (marionete russa), tradicionalmente fundado no uso de formas breves.
– Influência também de ideias futuristas difundidas pela vanguarda teatral russa. O
trabalho de Radlov em Leningrado, bem como o de Eisenstein no teatro do Proletkult de
Moscou, não poderiam deixar indiferentes os integrantes dos grupos autoativos mais
avançados no plano artístico. O uso de atrações de circo era frequente entre os Camisas
Azuis, por exemplo, ao mesmo tempo que inúmeros grupos recorriam à sala de espetáculos
e a seus recursos inesgotáveis para reativar o interesse do público.
Há aqui uma gama de influências contrárias à arte das “grandes formas” praticada
no teatro profissional em geral e que o agitprop reformula e abandona, orientando-as para
um objetivo central: o da eficácia política; uma vez que o recurso a “pequenas formas”
variadas, conjugando canto, dança, declamações em grupo ou individuais e a mescla de
diversos temas tratados rapidamente sob um ângulo incisivo (política interna, política
externa, cenas da vida cotidiana etc.) parece particularmente propício para manter o
interesse do público sobre questões frequentemente áridas e captar sua atenção.
Se a eficácia política devia contemplar concisão e variedade, esta escolha implicava,
no entanto, um certo número de exigências: a concisão não deveria excluir a justeza da
análise política, e a variedade não deveria conduzir ao ecletismo político ou à dispersão do
interesse.
A necessidade de inserir no arcabouço estreito de um esquete de agitação uma
análise política precisa sugeriu que se recorresse a certos procedimentos, primeiramente o
do atalho simbólico como meio de expressão privilegiada de relações sociais e políticas.
Assim, em Comment l’esprit leur est venu (Como lhes veio a ideia), as relações entre
operárias/os da cidade e camponeses/as são simbolizadas pelas trocas comerciais (venda de
foices, venda de trigo) entre duas personagens-tipo representando os dois grupos sociais.
Em Debut pour lutter Esclaves colonisés (De pé para lutar, Escrav@s colonizad@s), a
exploração colonial é evocada simbolicamente por uma cena de dominação na qual os
capitalistas ocidentais reprimem com chicote um grupo de escravos revoltados. O uso do
atalho simbólico não diz respeito somente às situações dramáticas e imagens cênicas, mas à
própria linguagem das cenas breves.
Além disso, a questão de evitar a dispersão que pode nascer da diversidade de
formas levou à busca de uma organização significativa dos espetáculos e também de peças
separadas. As análises políticas eram construídas em torno de um tema central e os relatos
vivos seguiam, no desenvolvimento das sequências, o plano estabelecido no roteiro escrito.
Esta necessidade engajou igualmente autores e autoras a encontrar no arcabouço estreito de
cada peça de agitação a estrutura dramatúrgica mais adequada para reforçar a clareza
política da proposta, na qual a substituição da antiga dramaturgia linear por um tipo de
encenação didática, ainda bastante ingênua, pode aparecer como a transposição direta do
enredo imagético dos cartazes da ROSTA – o da mulher com o pão, legendado por
Maiakovski, por exemplo, ou o processo de montagem realizado em Petite Pièce sur les
Popes (Pequena peça sobre os padres) de Maiakovski, onde a justaposição de sequências
sublinha de maneira interessante o interrogatório do padre Cochonu. Esta estrutura
dramática concisa, que concentra três atos em cinco minutos de maneira futurista, acentua
os contrastes ao invés de apagá-los e estimula a reflexão crítica da audiência.
Por outro lado, em Comment l’Esprit leur est venu, a ação se desenvolve pela
justaposição de cenas, mostrando as relações conflituosas de pessoas camponesas e
operárias ao longo de diferentes fases econômicas. A lição política aparece pouco a pouco,
impulsionada por uma pessoa camponesa e uma operária, atores/atrizes que saem do
público, que incitam o conjunto de espectadores/as a julgar a situação e a agir para
transformá-la.
Este é um outro aspecto importante do teatro de agitação: fazer espectadores/as se
implicarem diretamente na ação. Do mesmo modo que o cartaz político é dirigido a “você”
e muitas vezes com o dedo apontado para a pessoa designada, o teatro de agitprop recorre à
implicação direta, seja incitando o público a participar fisicamente do espetáculo, por
exemplo no processo de agitação, onde as pessoas da audiência frequentemente entram em
cena; seja sublinhando de maneira explícita que a mensagem política é diretamente
direcionada a elas pela intervenção de uma pessoa com função de narrar ou conduzir a peça
(mestre/a de cerimônia), trazendo à tona o seu significado.
A elaboração das personagens, bem como a estrutura da ação, obedece às mesmas
regras de expressividade. O aspecto mais marcante é sem dúvida o confronto político e
moral das personagens que representam as classes em luta: de um lado a classe operária, o
exército vermelho, correspondentes de fábricas e de vilarejos, com coragem, generosidade,
prudência, e do outro os representantes do capitalismo ou do imperialismo, que possuem
muitas vezes os traços de algum personagem conhecido: Lloyd George, Clemenceau etc.,
ou que sintetizam as características de um grupo hostil: menchevique, kulak, o padre etc.
Esta oposição é nítida sobretudo nos primeiros anos do agitprop; mais tarde, quando os
objetivos de luta evoluem, as personagens são mais nuançadas. Vemos aparecer tipos
soviéticos negativos que não são inteiramente irrecuperáveis: burocratas, biscateiros,
beberrões, delinquentes. Mas serão sobretudo as “grandes formas” dramatúrgicas do
período seguinte que facultarão o itinerário dessas personagens à redenção social. As
formas breves mal permitem mostrar este tipo de evolução, contentando-se em denunciar os
abusos mais gritantes. A partir dos anos de 1920, aparecem também esboços de tipos
psicológicos. Assim, em Desenchan...thés (Desencan...tchados) a personagem idealista,
herdeira direta dos heróis de Tchekhov, se opõe ao cético taciturno. Estas ressalvas não
passam, no entanto, de esboços, pois um dos aspectos mais marcantes do agitprop reside na
ausência de análise psicológica. São as exigências técnicas das formas breves, mas
principalmente as escolhas estéticas e políticas que explicam esta característica. Pouco
importa o estado de alma de criaturas ficcionais, já que as personagens são essencialmente
representantes de uma classe. De Baldwin e Chamberlain, o agitprop retém apenas o ímpeto
imperialista. Esses esboços de comportamento são inclusive traduzidos por atalhos
compreensíveis por todos: burgueses empanturram-se em cena, a classe proletária,
oprimida, sofre sob correntes e chicote. Somente o indispensável à clareza didática da
proposta é mantido para compor as personagens, que são apenas um suporte do diálogo
político. Com procedimentos artísticos muitas vezes julgados ingênuos e esquemáticos,
cuja eficácia é, no entanto, indiscutível, o teatro de agitprop consegue persuadir o
espectador e a espectadora, pois a eficácia do espetáculo não reside tanto na criação de
personagens ou de intrigas verossímeis, mas em colocar em cena situações dramáticas
politicamente expressivas.
Rejeitando a arte da representação, objetivo último do teatro tradicional, o teatro de
agitprop visa, ao contrário, uma arte de desvendamento. Ainda que as relações sociais
estejam desnudadas, o inimigo é nitidamente apontado. Alguns procedimentos são
utilizados para se alcançar esta exposição das relações políticas. Primeiramente, o inimigo
mesmo dá seu testemunho ingênuo e se apresenta simplesmente como tal. Rejeitando o uso
do duplo sentido, próprio dos vilões no teatro tradicional, os imperialistas expõem
livremente suas intrigas, o papa declara que quer encher os bolsos, os vírus cantam
grotescamente seu projeto de destruir a humanidade. Posto no papel de réu, o inimigo
responde com sinceridade inteiramente cordial às questões do tribunal de agitação. A
ingenuidade fabricada aparece mesmo como uma arma essencial de denúncia política, mas
esta ingenuidade não é, porém, um procedimento pueril (destinado às crianças e ao público
dito simples), é muito mais uma maneira de estilização didática do real, na qual ninguém é
tolo, e que se apoia sobre representações mentais bem conhecidas pelo grupo (charuto e
cartola representando o capitalista etc.).
Alguns outros procedimentos dramáticos, mais próximos da verossimilhança teatral,
permitem ainda desmascarar o inimigo. Assim, o velho truque da conversa surpreendida às
escondidas é bastante utilizado, ilustrado frequentemente pelo uso do telefone. Em Herriot
et MacDonald (Herriot e MacDonald), por exemplo, os proletários e proletárias
surpreendem ao telefone o diálogo sem maquiagens de dois políticos. O uso de cenas
simultâneas intervém de maneira análoga: também em Comment l’Esprit leur est venu, a
justaposição de cenas que se desenvolvem entre pessoas camponesas e pessoas operárias
permite trazer à tona as contradições. Não se trata mais de desmascarar o inimigo, mas de
revelar o nó do conflito por meio das aproximações que a audiência opera. Além disso, é
preciso sublinhar que a estrutura dramática da produção didática em si funciona como uma
forma essencial de exposição política.
No entanto, se o desvendamento está sempre no centro dos recursos empregados
pelo agitprop, nem sempre é suficiente. Assim, não é raro que seja reforçado por formas de
redundância, de acúmulo, que permitem acentuar com força ainda mais persuasiva a ideia
política antes colocada. Em Comment l’Europe s’est desarmée (Como a Europa se
desarmou) por exemplo, vemos todos os Estados entregarem simbolicamente até as suas
últimas armas e então, com o anúncio de uma manifestação operária, depositam um a um as
suas armas de última geração sobre a mesa. Um processo semelhante de acúmulo dá o tom
em Procès de La Deuxième Internationale (Processo da Segunda Internacional), no qual a
acusação repetida – “ele pegou” – se espalha, demonstrando nitidamente os compromissos
da socialdemocracia. De maneira que o inimigo se encontra desmascarado, mostrado tal
qual é: um imperialista, um vendido, um traidor, e sua força é esvaziada a ponto de não
mais se aproveitar da linguagem ambígua e ceder muitas vezes ao ridículo.
O uso do cômico tem um papel determinante nessa desmistificação do inimigo.
Situações cômicas antes de mais nada: o padre em Petite pièce sur les popes, de
Maiakovski, quer introduzir seus cartazes no desfile do Primeiro de Maio; cômico verbal
com inúmeros jogos de palavras, subentendidos, pancadaria etc.; cômico gestual também na
tradição do teatro de bonecos, com a aparição ridícula de MacDonald e Herriot em um
elefante, ou pelas cacetadas com as quais são agraciados os inimigos do proletariado. Todos
esses processos culminam na elaboração de uma ironia grotesca que ainda é acentuada pelo
jogo cênico, ironia que é exercida em detrimento dos inimigos de classe e contribui para
fazer deles não mais personagens no sentido tradicional, e sim “máscaras sociais”. Esta arte
do grotesco, fundada no exagero e sarcasmo, não implica subestimar as capacidades de luta
do inimigo. Muitas vezes, pelo contrário, o grotesco aparece como uma vitória momentânea
sobre o medo. Assim, quando o inimigo se encontra, como é o caso na frente de guerra, a
poucos quilômetros de distância, sua representação grotesca se torna um mecanismo de
controle momentâneo do medo do perigo. Em todo caso, essa desmistificação do inimigo, a
facilidade das vitórias imaginárias trazidas à cena, parecem agir sobre o público como um
elemento gerador de euforia, podendo esboçar uma ação imediata sem que ninguém venha
a aderir conscientemente à representação simplificadora do inimigo. É, em parte, por haver
ignorado esta função simbólica da arte de agitação que, nas críticas do período posterior, o
teatro de agitprop foi acusado de triunfalismo político.
O problema da linguagem do agitprop é mais difícil de elucidar, pois não existe
propriamente uma linguagem, mas registros que diferem segundo a forma ou, por vezes,
conforme as personagens escolhidas: nos esquetes de Petruchka ou nas pequenas peças
inspiradas no teatro de bonecos, a linguagem é simples e popular, colorida de expressões de
baixo calão, rica em detalhes concretos; o prazer do verbo é manifestado nela, prazer de
brincar com as sonoridades, prazer dos diminutivos, de ritmos engraçados, seja nas peças
de Maiakóvski ou em textos anônimos. Aqui, onde, às avessas, a influência do cabaré
literário se faz mais nítida, as citações paródicas, o sentido escorregadio, as apresentações
burlescas ou os discursos cômico-grotescos são encontrados em abundância: a peça dos
Camisa Azul, Herriot et MacDonald, é particularmente significativa neste aspecto.
Citemos, por exemplo, os versos pronunciados por Herriot que parodiam versos
românticos:
“Por acaso hoje tendo minhas dívidas contado
E a dor já toma conta do meu coração gelado”
Poderíamos, enfim, lembrar certas peças breves mais diretamente inspiradas das
muitas cenificações do período da guerra civil, que podem nos parecer como peças-slogan
tratadas no registro patético-heroico e nas quais a linguagem é ao mesmo tempo mais pobre
e mais metafórica: é o caso, em Debout pour lutter Esclaves colonisés, contra o domínio,
contra a teia de aranha do capital, etc. Aqui a linguagem lembra, por sua concisão e sintaxe,
tanto os slogans políticos como as legendas de cartazes. São muitas as frases que não
passam de um verbo e seu complemento e aquelas em que o verbo, para dar maior
dinamismo, está oculto: “Colunas operárias – às armas!”. Se a concisão é um elemento de
expressividade essencial da linguagem do agitprop, a escolha das formas verbais é também
significativa. O recurso à primeira pessoa do plural do imperativo suscita uma implicação
profunda do espectador e da espectadora: “Tomemos o poder”, “Não baixemos a cabeça”,
fórmulas como estas, frequentes nas peças-slogan, mas também presentes em conclusões de
numerosas outras peças de agitação sobre costumes ou política, marteladas nas
declamações em grupo de maneira repetitiva: “Nós queremos a igualdade por inteiro, nós
queremos edificar a vida comunal, nós chamamos a todos/as etc.” permitem esta
implicação afetiva profunda dos/as interlocutores/as chamando à adesão à vontade comum
do grupo proclamada com insistência.
O uso de ritmos e rimas, uma vez que a maioria das peças de agitprop é escrita em
versos rimados e ritmados, sublinha ainda este martelar persuasivo da frase-slogan. Este
efeito é particularmente nítido nas passagens de declamação em grupo nas quais ritmo e
rima criam uma repetição assombrosa. O recurso aos câmbios de ritmo aparece
frequentemente como um procedimento de grande expressividade: assim, em Debout pour
lutter Esclaves colonisés, por exemplo, o cinismo dos exploradores, que se exprimem em
versos iâmbicos muito breves em ritmo insolentemente desenvolto, cede lugar aos longos
versos datílicos dos/as oprimidos/as, evocando dolorosamente seu sofrimento. Por vezes
elementos de memorização, por vezes objetos de uma elaboração rica e complexa, ritmos e
rimas contribuem largamente para reforçar o impacto dos textos de agitprop.
Clareza didática da proposta, cômico de situação, expressividade da língua. Deve-se
notar, no entanto, que apesar destas qualidades, a dramaturgia do agitprop perdeu seu brilho
depois de alguns anos. Sem dúvida, isto se deve em parte às críticas políticas lançadas
contra o gênero, mas é certo, além disso, que uma certa fadiga com respeito a estas formas
dramáticas ocorria desde a metade dos anos vinte, mesmo entre idealizadores de peças de
agitprop: fadiga provocada pela repetição demasiada de trivialidades, pela impossibilidade
de tratar de maneira aprofundada certas questões em formas demasiado curtas, ainda que
assistamos, a partir de 1925 aproximadamente, ao desenvolvimento de duas tendências:
uma buscando vivificar as formas tradicionais do agitprop enriquecendo-as com novos
elementos expressivos (é o caso das peças de agitação criadas para serem usadas no
campo), a outra se esforçando em tirar partido dos aspectos dramatúrgicos mais férteis do
agitprop para criar peças longas mais próprias para tratar dos problemas complexos da nova
sociedade socialista (desenvolvimento da burocracia, ressurgimento de hábitos burgueses
etc.). E assim se desenvolve uma nova dramaturgia, seja com a obra de autores menores
como Zadikhine ou mesmo pelas de Tretiakov ou Maiakóvski, que colocam em cena novas
máscaras sociais mais elaboradas, mais complexas, e sobretudo retomam, aprofundando, o
princípio da montagem didática. A oposição entre formas breves e formas longas,
pertinente durante o primeiro período do agitprop, se nuança, portanto, no segundo período
até o momento em que o teatro de agitprop, assim como as peças longas, que parcialmente
beberam de sua fonte, são igualmente rejeitados pelo realismo socialista.
AS FORMAS CÊNICAS
Assim como as formas dramatúrgicas, as formas cênicas do teatro de agitprop são
igualmente originais. Originais pelo arranjo da cena ou pelas pesquisas que caracterizam o
jogo da atuação, mas igualmente pelas condições materiais de desenvolvimento deste
teatro, que pesaram bastante sobre sua estética.
Espetáculos itinerantes apresentados no interior de fábricas, em praças públicas, em
regiões rurais isoladas ou nas frentes da guerra civil, em condições precárias e muitas vezes
perigosas; espetáculos rapidamente montados e desmontados diante de um público sempre
diferente, com preocupações bastante variadas. Como meio de transporte, caminhões,
barcos, trem ou a pé, de malas nas mãos. Nenhum ou pouco dinheiro. Também as
associações precisaram aprender a fazer economias prodigiosas: uma cenógrafa do grupo
Camisas Azuis explicou que se podia montar um espetáculo com um orçamento de cinco a
cinquenta rublos, utilizando-se de telas recicladas e cadeiras, únicos elementos que
certamente são encontrados em qualquer lugar e que, complementados com pedaços de
tecido e compensados, se tornam mesa, cama, poltrona etc. Mobilidade, economia, são as
condições que determinam o desenvolvimento material dos espetáculos; às suas
necessidades soma-se uma outra essencial, a de ser acessível a um grande público, o que
implica tanto simplicidade quanto expressividade de formas.
No que diz respeito ao cenário, o agitprop se confronta, apesar da permanência das
exigências técnicas (necessidade de se curvar a reduzidas dimensões de palco, por
exemplo), com mudanças profundas que em poucos anos transformam sua concepção. No
início da guerra civil, é evidente que o teatro de agitação se inspira no teatro profissional
ambulante. Para encenar Romain Rolland ou Tolstoi, o cenário é composto por telas
pintadas segundo a técnica da perspectiva ilusionista e acessórios naturalistas. Depois,
pouco a pouco, a necessidade impõe o abandono destas maquiagens artísticas, mantendo-se
somente alguns acessórios significativos, como uma simples tela ao fundo, capaz de evocar
de maneira sintética e realista o contexto da ação. Assim nascem dispositivos simples como
as pinturas de Chagall na cidade de Vitebsk para o Terevsat (Teatro da Sátira
Revolucionára). Para complementar essas telas de fundo, adereços por vezes autênticos
(baionetas, tambores, cadeiras, pequenos objetos diversos), por vezes ilustrados em
papelão, ou mesmo simplesmente esboçados sobre a tela. No entanto, sob a influência dos
teatros profissionais de vanguarda, e particularmente do construtivismo e do urbanismo,
uma evolução bastante nítida se faz sentir em direção ao que poderíamos chamar abstração
funcional: o contexto da ação não é mais sugerido de maneira realista – um círculo
colorido, uma tela de fundo pintada com formas geométricas simples, um amontoado de
cadeiras fazendo a base do palco e a cena está pronta para a atuação: esta evolução do
cenário para a abstração caracteriza particularmente o grupo Camisas Azuis. Para
complementar estes diferentes dispositivos, sejam eles realistas ou não, as trupes recorrem
igualmente aos materiais escritos: cartazes-slogan, diagramas, crachás, sinalizações
indicando o local de ação permitem criar pontos de referência e fixar visualmente algumas
ideias centrais.
A evolução dos figurinos é paralela à dos cenários: dos figurinos naturalistas ao uso
generalizado de camisas camponesas e prozodejdas (roupa de trabalho de tecido grosso),
ornadas de acessórios diversos, eles trazem de uma forma cada vez mais simbólica os
elementos necessários à compreensão da ação. Assim, atores e atrizes figurando capitalistas
acrescentam simplesmente uma cartola ao prozodejda, ao passo que quem interpreta papeis
operários se mune de uma ferramenta ou um capacete. A popularização da camisa
camponesa, difundida com a trupe Camisas Azuis, torna-se tão expressiva que diversos
outros grupos a adotam, apelidando-se de Camisas Vermelhas, Amarelas etc. Mais
frequentemente, no entanto, prozodejdas e trajes camponeses evoluem para figurinos
funcionais, com formas geométricas, compostos por retalhos de cor viva, como os
utilizados na opereta La Reine s’est trompée (A rainha se enganou) em encenação do grupo
Camisas Azuis. Se a alguns grupos faltavam meios ou se pessoas colaboradoras
competentes apelavam para alguma facilidade formal, a atividade dos melhores grupos se
distinguiu por uma grande busca de novas modalidades de expressão emprestadas do teatro
profissional de vanguarda bem como das salas de concerto e do cinema: danças ritmadas,
agrupamentos geométricos, introdução de verdadeiras sequências cinematográficas, todas
as inovações técnicas são adotadas por alguns grupos de agitprop.
Contudo, no plano plástico, o caminho permanecia estreito para o teatro de agitação:
entre a repetição incessante de formas específicas e a imitação sem grandes recursos do
teatro profissional. É a esta última tentação que sucumbiram muitas trupes, já que a partir
dos anos de 1926-1927 elas se consagraram cada vez mais às grandes montagens. Portanto,
a especificidade das formas cênicas de agitprop muitas vezes embaçava, assim, a evolução
das formas dramatúrgicas.
É sempre difícil retratar o trabalho de atuação por falta de documentos iconográficos
ou testemunhos precisos. No entanto podemos sublinhar um determinado número de
constantes. Se a situação de atores e atrizes parece difícil – a formação é bastante
diversificada e normalmente insuficiente, o tempo de ensaio limitado – é possível, no
entanto, retirar algumas linhas de força desta prática caótica. Sem dúvida, normalmente
suas atuações são definidas, por meio de artigos de crítica e pequenas notas, de maneira
negativa: a atuação de agitprop não deve ser uma paródia fortemente teatralizada, nem de
inspiração no realismo psicológico praticado no Teatro de Arte [de Moscou]; ao contrário, é
especificado que a atuação deve ser “demonstrativa, primitiva e absolutamente real,
buscando mostrar e demonstrar o essencial, evitando detalhes e permanecendo apenas os
traços significativos”. É uma definição vaga, mas permite esclarecer algumas notas de
atores e atrizes e de diretores e diretoras e principalmente as indicações dadas por Danilov
sobre a encenação no Teatro de Agitação de Leningrado: “As personagens das encenações
são figuras de cartazes e, como tal, exigem um olhar bastante original para serem
interpretadas. Representá-las na maneira realista do velho teatro destruiria completamente o
caráter de cartaz de agitação que é o fundamento de toda encenação. É por isso que o
objetivo do ator ou da atriz que interpreta estas personagens não pode ser o de encarná-las,
mas de dar a ela um julgamento ativo. Tendo deixado de ‘reencarnar’, a atriz e o ator
começam a trabalhar unicamente sua relação com o tipo, com a personagem representada:
analisam sem cessar, objetivamente, e julgam, por assim dizer, a personagem que
representam. Daí resulta, por vezes, essa relação característica das encenações, de ironia
direcionada às personagens negativas, que conduz seguramente ao estilo do grotesco
cênico. Tal técnica de encenação, que corresponde a mostrar totalmente a relação entre
intérprete e personagem, corresponde aos princípios de trabalho do teatro autoativo e tem
sua origem no jogo de cena do teatro de clube. Sem dominar perfeitamente a técnica de
atuação, amadores/as dos clubes expõem a natureza da situação de classe da personagem
em função de sua determinação social, sem fazerem representações realistas de personagens
estranhas à sua classe, como são os ‘capitalistas’, os ‘burgueses’ ou mesmo ‘Kerenski’.
Representando-os, ridicularizam-nos inevitavelmente, amplificam os traços e produzem um
avanço considerável nas cores de suas paletas de atuação. Nessas condições, a pessoa que
atua irrompe por detrás da maquiagem da personagem representada. Assim nasce uma
relação de ironia crítica, de rejeção das figuras negativas e uma atitude de adesão heroico-
patética às positivas.”
Danilov acrescenta que esta técnica de encenação desenvolvida e aprofundada pelo
Teatro de Agitação de Leningrado (TRAM) é também praticada por diversas outras trupes
de agitprop, além dos grupos do TRAM. Nota-se no texto citado que a originalidade
essencial da encenação de agitprop repousa sobre a prática de uma forma de distanciamento
utilizada a partir de 1922-1923 no teatro profissional, por exemplo em La Mort de
Tarelkine (A Morte de Tarelkine), dirigida por Meyerhold.
No que concerne à atuação e também às tendências cênicas, as relações são,
portanto, estreitas entre alguns teatros de agitação e os teatros profissionais de vanguarda.
Uma constatação idêntica pode ser feita em relação ao desenvolvimento da biomecânica
nos teatros de agitprop. Muitas são as trupes que, de maneira explícita ou não, fazem
referência à biomecânica, bastando examinar algumas fotografias para se convencer disto:
exercícios de ginástica inseridos na ação, organização de movimentos de grupo,
geometrização dos deslocamentos, transposição de conflitos psicológicos para o plano
corporal, diversos são os elementos de atuação inspirados em uma biomecânica mais ou
menos bem assimilada.
Apesar das desigualdades e das contradições, o trabalho das atrizes e atores de
agitprop pode parecer decididamente novo: orientado para a ação corporal, fundado em
uma crítica política dos papéis, atento a preservar um distanciamento das personagens,
recorrendo incessantemente a piscadas de olhos e a efeitos de ruptura, anuncia e prepara,
ainda que de maneira desigual e pouco teorizada, a encenação épica tal qual será praticada
pouco tempo depois na Alemanha.
Se quisermos enfim, para concluir, nos interrogar sobre a especificidade das
relações entre pessoas atuando e pessoas espectadoras suscetíveis de justificar a dupla
fórmula de agitação e de propaganda, constatamos que esta forma de teatro está fundada
sobre a recusa de produzir uma imitação da vida destinada a ser contemplada passivamente
e visa, ao contrário, a substituir a cena cena-reflexo passiva por uma cena ativa que incite a
pessoa espectadora a participar do espetáculo.
Contudo, os efeitos desta arte processual não parecem dever se exercer sempre na
mesma direção e podemos aqui encontrar os dois modos de relação palco-plateia que
globalmente refletem bastante bem as duas tendências do teatro autoativo na União
Soviética.
A primeira corrente, derivada do teatro de comício, das grandes festas populares,
presente sobretudo, no que concerne ao agitprop, nas declamações coletivas e nas pequenas
peças salpicadas de heroísmo patético, tende para a afirmação da unidade entre os grupos –
pessoas atuando/ pessoas espectadoras –, em direção a uma certa identificação narcísica da
sala com a cena, num movimento de entusiasmo coletivo.
A segunda corrente, ao contrário, muito mais representada no teatro de agitação
soviético, antes visa a dar ao público uma imagem crítica da realidade a fim de que ele a
analise e a transforme. Profundamente preocupado com o “ajamos!” lançado em cena, o
público é convidado a refletir e agir. Neste caso o teatro não hesita mais em suscitar
clivagens na sala: conflitos entre pessoas operárias e camponesas com relação à entrega de
trigo, conflito entre kulaks e camponeses/as pobres sobre cooperativas etc. A sala de
espetáculos não é mais o espelho unânime da cena, ela se divide em função dos interesses
próprios das pessoas espectadoras.
Revelando, assim, a realidade das relações sociais, suscitando clivagens,
provocando a reflexão crítica, incitando à ação, o teatro de agitprop se desliga radicalmente
da prática estética do teatro profissional para se orientar na direção de uma arte produtiva e
processual.