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Como Avaliar a Pregação do Seu Pastor Keith Collier 04 de Janeiro de 2016 - Igreja e Ministério Imagine isto: dois homens estão diante de uma plateia, ao vivo, competindo por votos. Cada um espera fazer a sua melhor apresentação e impressionar a multidão de tal modo que, quando as cédulas forem contadas, ele seja eleito o vencedor. Não, esse não é o mais novo show de talentos de Simon Cowell ou Mark Burnett.[1] Na verdade, foi uma cena imaginada por um bem-intencionado membro de nossa igreja ao iniciarmos a busca por um pastor titular. Pouco familiarizada com o processo de busca, essa querida irmã perguntou se, depois de examinarmos todos os currículos, nós reduziríamos o número de candidatos a dois e os chamaríamos para participarem de uma espécie de concurso de pregação. Então, e somente então, os membros votariam naquele de quem mais gostassem. A pergunta dela foi inocente, mas tenho certeza de que um processo semelhante a esse infelizmente já aconteceu em mais de uma igreja, deixando para trás um rastro de confusão, sentimentos feridos e divisão. A razão para tanto é que esse processo trata a pregação da Palavra de Deus como uma espécie de apresentação para a qual devemos dar nossa aprovação ou desaprovação. Obviamente, nós vivemos em uma cultura de criticismo com avaliações movidas pelo entretenimento e comentários instantâneos: As celebridades que atuam como jurados nos programas de televisão avaliam os talentos das pessoas para o canto, a dança, a culinária etc., oferecendo comentários ácidos e fazendo julgamentos sarcásticos.

Homilética Ministério Fiel

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artigos do ministério fiel sobre pregação e preparação sde sermões

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Como Avaliar a Pregação do Seu PastorKeith Collier04 de Janeiro de 2016 - Igreja e Ministério

Imagine isto: dois homens estão diante de uma plateia, ao vivo, competindo por votos. Cada um espera fazer a sua melhor apresentação e impressionar a multidão de tal modo que, quando as cédulas forem contadas, ele seja eleito o vencedor.

Não, esse não é o mais novo show de talentos de Simon Cowell ou Mark Burnett.[1] Na verdade, foi uma cena imaginada por um bem-intencionado membro de nossa igreja ao iniciarmos a busca por um pastor titular.

Pouco familiarizada com o processo de busca, essa querida irmã perguntou se, depois de examinarmos todos os currículos, nós reduziríamos o número de candidatos a dois e os chamaríamos para participarem de uma espécie de concurso de pregação. Então, e somente então, os membros votariam naquele de quem mais gostassem.

A pergunta dela foi inocente, mas tenho certeza de que um processo semelhante a esse infelizmente já aconteceu em mais de uma igreja, deixando para trás um rastro de confusão, sentimentos feridos e divisão. A razão para tanto é que esse processo trata a pregação da Palavra de Deus como uma espécie de apresentação para a qual devemos dar nossa aprovação ou desaprovação.

Obviamente, nós vivemos em uma cultura de criticismo com avaliações movidas pelo entretenimento e comentários instantâneos:

As celebridades que atuam como jurados nos programas de televisão avaliam os talentos das

pessoas para o canto, a dança, a culinária etc., oferecendo comentários ácidos e fazendo julgamentos

sarcásticos.

Os comentaristas em programas esportivos e políticos discutem uns com os outros, escrutinando

cada decisão e analisando o desempenho dos outros.

As mídias sociais oferecem comentários instantâneos de artigos, fotos, vídeos e tudo o mais.

Muitos egos têm sido atingidos e muitos corações, feridos pelos comentários (ou pela falta deles) que

correm pelos seus feeds de notícias.

Isso nos leva àquela pergunta que muitas vezes é levantada nas conversas com amigos e familiares durante o almoço de domingo: “O

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que você achou do sermão?”. Se não formos cuidadosos, nossas respostas podem parecer muito com os cenários acima, mais preocupadas com o estalar do fogo do que com a carne sobre ele.

A avaliação do sermão na BíbliaNa Bíblia, nós encontramos maneiras erradas e maneiras certas de avaliar a pregação:

Erradas – Na segunda carta de Paulo a Timóteo, seu filho no ministério, ele adverte: “Pois

haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo

as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à

verdade, entregando-se às fábulas” (2 Timóteo 4.3-4). A congregação que Paulo descreve não avalia

os sermões senão de acordo com o seu próprio termômetro de prazer. Eles só querem ouvir sermões

que os façam sentir-se bem.

Certas – Durante uma das jornadas missionárias de Paulo, ele e Silas entraram na cidade de

Bereia e começaram a pregar nas sinagogas. Acerca dos bereanos nos é dito que eles “eram mais

nobres que os de Tessalônica; pois receberam a palavra com toda a avidez, examinando as Escrituras

todos os dias para ver se as coisas eram, de fato, assim”. Em vez de simplesmente darem ouvidos ao

que lhes fazia sentir-se bem, os bereanos avaliavam se os sermões de Paulo e Silas estavam

alinhados com as Escrituras.

Assumindo que o seu pastor prega sermões sólidos e bíblicos, aqui estão seis maneiras práticas de avaliar tais sermões que ajudarão no seu próprio crescimento espiritual, fortalecerão o ministério de pregação do seu pastor e edificarão a sua igreja.

Seis maneiras de avaliar o sermão do seu pastorAvalie em oraçãoEm antecipação ao domingo, gaste tempo de joelhos. Ore pelo seu pastor enquanto ele prepara o sermão e peça para que ele pregue o evangelho com clareza e urgência. Um bom pastor conhece bem o fardo de compartilhar corretamente a palavra da verdade e estima as orações do seu povo. Além disso, ore por si mesmo e peça para ter ouvidos para ouvir e para que o Espírito Santo o ajude a avaliar o sermão. Ore também para que a congregação responda em fé e obediência.

Avalie em busca de entendimentoA avaliação do sermão envolve mais do que gostar ou não gostar do sermão; ela deve levá-lo a indagar se você entendeu o(s) ponto(s)

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principal(is) da passagem pregada. Não importa o quão eloquente ou cativante ou bem-humorado seja o seu pastor, você perdeu completamente o ponto se não se concentrou em entender a mensagem. Ao ouvir, identifique os pontos principais e considere a aplicação deles à sua vida.

Avalie criticamente, mas não criticamenteSim, você leu direito. A diferença entre os dois é a sutil diferença entre crítica e criticismo.

No sentido positivo, nós devemos avaliar um sermão criticamente, como os bereanos avaliavam os sermões de Paulo – pondo-os sob o crivo da Escritura e considerando as suas aplicações.

No sentido negativo, devemos evitar avaliar sermões com um espírito de criticismo. Em nossos esforços para examinar o conteúdo da mensagem, devemos ter o cuidado de não cair no erro de trucidar o mensageiro. Todo pastor tem fraquezas e falhas. Não há necessidade de escrutinar sua gramática ou seus hábitos nervosos. Você não precisa manter um registro de suas pronúncias erradas ou das frases que ele sempre repete. Dissecar as fraquezas do seu pastor o distrai da mensagem e produz desdém para com o mensageiro, o que não é saudável. Confie em mim: provavelmente seu pastor é mais duro consigo mesmo nessas áreas do que você.

Avalie em termos de “nós”, e não de “mim”Vivemos numa era de um individualismo cristão desenfreado, na qual a natureza da vida cristã é primariamente vista pelas lentes do crescimento e da descoberta pessoais. Como resultado, com frequência nós apenas consideramos como um sermão ou uma passagem da Escritura se aplicam a nós, pessoalmente. Contudo, há outras lentes as quais nunca deveríamos menosprezar – a natureza corporativa ou congregacional da vida cristã. Ao considerar a aplicação do sermão, não pense apenas em como ele se aplica a você individualmente. Considere também como seria se sua congregação vivesse aquelas verdades coletivamente.

Avalie sem ter outra pessoa em mente.Graças aos podcasts, você agora pode ouvir horas e horas de sermões, a cada semana, proferidos por uma variedade de

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pregadores talentosos do mundo inteiro. Certamente, há benefícios espirituais individuais em ouvir os sermões de outros pastores. Ao mesmo tempo, tome o cuidado para que esse acesso não encoraje comparações nada saudáveis entre os sermões do seu pastor e aqueles de pregadores proeminentes. Deus deu ao seu pastor um rebanho particular para pastorear, o qual ele não deu a esses outros pastores. Ainda que seu sermão não seja tão refinado ou preciso, ele conhece as forças e fraquezas, as tentações e as inclinações da sua congregação particular melhor do que qualquer pregador de podcast. Por exemplo: a sua congregação está cheia de legalistas ou hedonistas? Seu pastor saberá a resposta e, portanto, saberá para que lado se inclinar na pregação. Deus o posicionou de modo singular para aplicar a Escritura à vida da sua igreja.Avalie para encorajarAo ouvir o sermão, observe aspectos positivos e verdades que Deus tenha lhe ensinado por meio dele e, então, lembre-se de dizê-lo ao seu pastor. Ao fazê-lo, seja específico. Não apenas aperte a sua mão e diga: “Bom sermão”. Diga algo como: “O Senhor realmente me desafiou quando o senhor explicou aquela segunda parte da passagem, que falava sobre generosidade”. A longo prazo, comentários úteis e bons o tornarão um pregador ainda melhor, o que contribuirá para o seu próprio crescimento espiritual e para a edificação da igreja para a glória de Cristo.

Notas:

[1] N.T.: Dois jurados do programa norte-americano American Idol.

Esperança para o Pregador AbatidoMatt McCullough18 de Janeiro de 2016 - Igreja e Ministério

Pedro pensou que seria um pregador melhor. E você?

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Não quero dizer que ele tinha, necessariamente, anseios por glória. Porém, daquilo que sabia que teria que fazer quando estivesse no ministério, ele imaginava que pregação seria a mais fácil. Afinal de contas, foi o que o atraiu primeiramente ao ministério. Ele ama estudar, organizar e se comunicar. Ele ouve Keller e Piper quando corre. Possui as biografias de Spurgeon e Whitefield no seu criado-mudo.

Ao sair do seminário, ele sabia que aconselhamento seria um desafio, que administração seria algo a ser aprendido na prática do dia a dia, que pouco conhecia a respeito de marketing efetivo e que gerenciamento de equipe e voluntários não seria natural no princípio. Entretanto, imaginou que se existia uma coisa que faria bem feito, seria compreender e explicar a Bíblia de uma maneira que engajasse a sua audiência.

E isso é algo bom, pensou, pois a pregação centrada na Bíblia é definitivamente o sangue da igreja. Ele acreditava que valia a pena, se necessário, sacrificar tudo para que a pregação fosse bem. Esse é um custo que Pedro está pagando. Pedro está deixando tudo à sua volta ao léo só para que consiga ter as suas 20 horas de preparação de sermão.

Tudo isso se acumulou em um enorme fardo existencial que cada sermão carrega. Pedro se sente no dever de apresentar algo incrivelmente espetacular a cada pregação para justificar a mediocridade em outras áreas do seu trabalho. Todavia o seus sermões raramente saem espetaculares como ele esperava.

E ainda tem mais. Com base no seu contato pastoral com as pessoas, Pedro está bem ciente do quanto o seu contexto atual é distante de uma sala de aula cheia de seminaristas onde pregou os seus primeiros sermões. Ele já não está mais operando em uma situação teórica. Ele está falando diretamente para vidas em situações reais – pessoas que conhece e ama e que desesperadamente precisam de ajuda. Ele sabe que elas precisam de mais perspectiva em situações difíceis em suas vidas, mais confiança em sua fé de que Jesus é verdadeiro. Elas têm mais urgência sobre seus problemas matrimoniais. Ele sabe que as carências relacionadas às

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circunstâncias de cada vida são tão grandes e tão específicas que não consegue imaginar como conseguirá dar conta em apenas um sermão. Contudo Pedro está dando tudo de si. Ele leva esse fardo toda a semana em seus estudos e está sobre os seus ombros cada vez que sobe ao púlpito.

Parece familiar?

Independente da extensão que essa descrição descreve como você vê a sua experiência, ela reflete a minha. Mais do que gostaria de admitir, eu tenho sido, de diversas formas, como o Pedro. A tarefa semanal da pregação é um tremendo fardo emocional, intelectual e psicológico que carregamos conosco durante todo o tempo. Uma porção desse fardo se deve a própria natureza da fera. Outra porção advém da fábriva de ídolos que cultivamos dentro de nós. É um fardo complicado e pode ser fatal para a longevidade do nosso ministério.

Onde podemos encontrar a perspectiva necessária para continuar seguindo em frente? Como aprendemos a lidar com o fato de que nenhum sermão jamais vai se equiparar com a profundeza do texto bíblico, com as necessidades do nosso público ou com o ideal que imaginamos para nós mesmos? Como é que entendemos o que significa sucesso quando sabemos que nossa pregação nunca será boa o bastante?

Seguindo João Batista rumo à liberdade

Algum tempo atrás eu passava por uma fase frustrante em relação às minhas pregações concomitantemente à preparação de uma nova séria baseada no Evangelho segundo João. A maneira com a qual o evangelista descreve o ministério de João Batista foi-me incrivelmente útil naquele momento – e é a perspectiva na qual tenho buscando progredir desde então. Existem três locais onde o ministério de João Batista aparece e, em cada situação, há uma mensagem que precisamos caso queiramos pregar com confiança, liberdade e alegria.

1. “Eu não sou o Cristo” (João 1.19-28)

A primeira vez que ouvimos a voz de João Batista foi quando os sacerdotes e levitas vêm de Jerusalém para testemunhar bem de

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perto o seu ministério. O evangelista não se preocupa em tomar muito espaço com diversos detalhes a respeito do estilo de João Batista e de sua popularidade, porém considerando a forma que os demais autores bíblicos o descreveram não é difícil de imaginar o que esses líderes judeus esperavam encontrar.

Em essência, eles vem perguntando: Quem você pensa que é? Eles certamente ouviram a respeito do seu modo despojado de se vestir, sua dieta estranha e suas chocantes declarações. Eles certamente esperavam um cara cheio de si. Contudo as respostas de João falavam somente sobre quem ele não era: “Eu não sou o Cristo” (João 1.20).

João Batista não está tentando proteger a si mesmo e assim desviar a atenção. Ele não é um Obi Wan em um gesto evasivo, dizendo “esses não são os androides que vocês procuram”. Ele logo, logo entregará a sua própria vida. Porém, aqui, não quer falar de si mesmo porque sabe e tem amor pelo fato de que ele não é o ponto importante. Ele não é a solução. Ele não é o herói. Ele não pode salvar ninguém. Ele não é quem você estava procurando. E ele não apenas aceita essa realidade, mas a incorpora.

Há um grande senso de liberdade para nós, pregadores, à medida que também incorporamos tal realidade. Não há dúvida de que os nossos sermões nunca serão capazes de dar ao nosso público o que ele realmente precisa. Graças a Deus, eu não sou o Cristo.

Obviamente, é essencial que suportemos junstamente os fardos do nosso povo. É inevitável que carreguemos tais fardos até nossos púlpitos. Porém não cabe a nós e aos nossos sermões aliviarem as pessoas dos seus fardos. Somente o Cristo pode fazer isso, e é precisamente isso o que ele veio fazer.

Considere fazer esta oração à medida em que você se prepara para dirigir-se ao seu povo nesta semana:

Obrigado Pai por ter lhes dado – e também a mim – um Salvador maior do que eu poderia ser. Obrigado por Jesus, o qual concluiu a sua obra, e pelo seu Espírito, o qual sabe como aplicá-la a nós.

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2. “Que ele cresça e que eu diminua” (João 3.22-30)

A próxima vez que ouvimos a respeito de João, o cenário é em algum lugar afastado da Judéia, um lugar onde há abundância de água. Jesus e os seus discípulos estão nessa área realizando batismos, e João estava próximo fazendo a mesma coisa.

O diálogo começa com os seguidores de João aproximando-se com preocupações deveras humanas. Eles se preocupam com o fato de que o ministério de João está sendo ofuscado por Jesus. Jesus era totalmente desconhecido até que João falasse abertamente quem ele era, eles insinuam, mas olha o que está acontecendo agora. O discurso exagerado deles demonstra claramente a sua frustração: “...todos lhe saem ao encontro” (João 3.26).

A resposta de João oferece uma explicação esclarecedora sobre nosso alvo como pregadores. Ela flui diretamente do fato que nós não somos o Cristo de ninguém. A nossa tarefa é apontar as pessoas para aquele que salva e então sair da jogada.

A metáfora que João usa com os seus amigos ainda hoje fala poderosamente.  Ele fala sobre o noivo (que é Jesus), a noiva (que é o seu povo) e o amigo do noivo (esse é João Batista). “O que tem a noiva é o noivo”, diz João. Todavia o amigo do noivo não é invejoso. Ele buscava apresentar o noivo, e não por uma noiva para si. Ele buscava elevar a imagem do seu amigo, e ele se enche de alegria quando a sua obra é concluída (João 3.29).

Por um lado, o ministério de João – a obra da sua vida – está se esvaindo. Em questão de meses, ele terá a sua cabeça servida numa bandeja. E ele certamente consegue perceber os sinais disso. Porém, longe de cair em desespero, ele afirma: “esta alegria já se cumpriu em mim” (João 3.29). Ele encara anonimato e morte com alegria, pois o seu alvo de vida e ministério tinha um foco e estava cumprido: “...que ele cresça e que eu diminua” (João 3.30).

Não é libertador para o ministério de um pregador um manifesto como esse? Por um tempo mantive essa frase em uma nota adesiva no computador em que preparo os meus sermões – justamente onde sofro com desapontamentos sobre sermões que não são o que eu

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desejava que fossem, onde sou tentado a escrever aquilo que me enaltecerá. É bom ser criativo, perceptivo, intenso e engajante. Todavia no fim de tudo, há uma questão que devemos perguntar sobre os nossos sermões, uma forma de medir a sua eficácia: “a beleza de Jesus está acessível?”

Senhor, ajude-me a crer que a coisa mais importante sobre mim é o Jesus ao qual proclamo. A minha única glória é dele, compartilhada comigo como um presente, porque sou um com ele.

3. “Tudo quanto disse a respeito deste era verdade” (João 10:40-42)

A última referência a João Batista no Evangelho de João aparece no capítulo 10. Ele já havia sido executado naquele momento, e Jesus veio a uma localização onde João havia realizado boa parte de seu ministério. Muitos que ouviram João pregando agora encontravam Jesus por si mesmos. Aqui está a conclusão deles: “Realmente, João não fez nenhum sinal, porém tudo quanto disse a respeito deste era verdade” (João 10.41).

Que tal isso como epitáfio? Você gostaria?

Imaginemos que isso fosse dito de Pedro, o nosso pregador abatido:

“Sabe, eu ouvi vários pregadores muito mais cativantes. Alguns outros eram mais engraçados, mais provocativos e memoráveis. Pedro não fez nenhum sinal. No entanto, tudo o que ele disse em relação a Jesus era verdade. Nós o vimos por nós mesmos.”

Esse é o epitáfio que queremos, irmãos. E pela graça de Deus, enquanto formos fiéis à sua Palavra, isso está ao alcance de todos nós. Sendo assim, lancemos fora os nossos medos, as nossas inseguranças, os nossos desapontamentos – e sigamos adiante.

Pai, quando eu pregar, guia-me na verdade. Proteja-me do erro. Mostra-lhes que Jesus é verdadeiro. Que eles provem da beleza dele...

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Conhecer seu Rebanho é Fundamental para uma Pregação SignificativaJared C. Wilson01 de Outubro de 2015 - Igreja e Ministério

O pregador andou pela plataforma, olhando fixamente para a congregação. Era o momento de seu apelo semanal. Ele pediu para que respondessem levantando a mão. Nem uma única mão foi levantada. Mas ele não tinha como saber disso porque estava numa tela de projeção.

Eu me encontrava no campus mais próximo de uma igreja multilocal[1] a serviço do próprio pastor, um homem que havia recentemente me contratado para fazer um serviço de pesquisa freelance para ele. Visitar um dos seus muitos cultos a distância deveria me ajudar a “sentir” como andava seu ministério. Com certeza ajudou.  Mas eu não conseguia evitar sentir que este formato de ministério não poderia ajudar o pregador a “sentir” sua congregação.Eu não sei o que você pensa sobre transmissões por vídeo ou o crescimento do modelo de igreja com múltiplos locais de culto, mas esta experiência e outras tem somente confirmado algumas das preocupações que eu tenho sobre a desconexão entre pregador e rebanho, um dilema crescente em todos os tipos de igrejas, grandes e pequenas.

Na verdade, este dilema não está somente limitado a igrejas de múltiplos locais, com transmissões de vídeo. Pastores de igrejas de todos os tamanhos que estão crescendo continuarão a lutar para estarem familiarizados com suas congregações. E a tentação de se tornar mais e mais isolado fica maior a medida que mais complexidade é adicionada a uma igreja em crescimento.

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E é claro que é possível para um pregador de uma igreja pequena ser o melhor amigo de todos em sua igreja, e é possível para pregadores de igrejas maiores conhecerem todos bem. Mas o pregador cujo ministério está se tornando cada vez mais focado na pregação e cada vez menos no pastoreio, o pregador que está se tonando cada vez menos envolvido com sua congregação está na verdade minando a tarefa para a qual está tentando devotar mais do seu tempo! Boa pregação requer pastoreio próximo.

O ministério da pregação não pode ser divorciado do ministério de cuidado da alma; na verdade, a pregação é de fato uma extensão do cuidado com a alma. Existe uma série de razões que mostram porque é importante para pastores que querem pregar de forma significativa conhecerem seu rebanho tão bem quanto podem, mas aqui destaco três das mais importantes.

1. Uma pregação significativa tem os ídolos das pessoas em menteQuando viajo para pregar em cultos de igrejas e conferências, uma das primeiras perguntas que normalmente faço ao pastor que me convidou é “Quais são os ídolos do seu povo?”. Eu quero ser capaz não somente de chegar e “fazer meu trabalho”, mas servir este pastor e sua congregação ao falar da melhor forma que puder sobre suas esperanças e sonhos que não estão devocionalmente conectadas a Cristo como a maior satisfação deles. Infelizmente, alguns pastores não sabem como responder a pergunta.

Quando Paulo entrou em Atenas, ele viu que a cidade estava cheia de ídolos (Atos 17.16). Dito isto, ele não considerou este como um problema filosófico, mas como um problema espiritual que o entristeceu pessoalmente. Quando ele trata o assunto, faz tão especificamente, se referindo à devoção deles “ao deus desconhecido” (17.23). E sempre que Paulo se dirigiu a igrejas específicas em suas cartas, você verá que os tipos de pecados e falsidades os quais ele trata eram bem específicos. Ele não falou de modo generalizado. Ele sabia o que estava acontecendo naquelas igrejas.

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Isto não significa, é claro, que você começará a constranger ou expor pessoas a partir do púlpito. Mas significa que você está tão imerso na vida congregacional para falar em termos familiares.

Até que um pastor tenha passado tempo de qualidade com as pessoas em sua congregação, os ídolos que sua pregação combaterá serão somente teóricos. Todos os seres humanos têm alguns ídolos em comum. Mas as comunidades onde as igrejas estão localizadas, a própria subcultura da congregação e os mesmo gostos e características demográficas especificas na congregação tendem a resultar em ídolos e padrões de pecado mais específicos.

Conhecer em primeira mão as esperanças mal orientadas nas finanças, carreira e família do seu rebanho o ajudará a saber como pregar. Isto o ajudará a escolher os textos certos e a ênfase certa para explicar tais textos. Isto é o que torna a pregação um ministério e não simplesmente um exercício.

2. Uma pregação significativa tem o sofrimento das pessoas no coraçãoEu posso lhe dizer, em primeira mão, que minha pregação mudou depois que eu comecei a segurar a mão das pessoas enquanto elas morriam e a ouvir o coração das pessoas enquanto choravam. Até que você tenha ouvido pessoas compartilhando seus pecados, medos, preocupações e feridas o suficiente, sua pregação pode ser excelente e apaixonada, mas não será tudo o que pode ser – ressonante.

Muitos pregadores carregam o peso da Palavra de Deus para o púlpito e isto é algo bom. Receber a difícil tarefa de pregar com fervor da glória de Cristo, sentir o peso de proclamar o favor do Senhor no evangelho é uma obra nobre, digna e maravilhosa. Mas o pregador deve também sentir o peso de seu povo naquele púlpito. Ele deve subir para pregar tendo estado no vale com eles. Seu esboço deve estar borrado pelas lágrimas de seu povo.

Saber quais sofrimentos que afligem seu povo regularmente impedirá o pregador de se tornar surdo em relação a sua congregação. Ele não será descuidado em áreas sensíveis. Isto irá afetar os tipos de ilustrações que ele usa, os tipos de histórias que conta e, mais importante, a maneira como maneja a Palavra. Eu já vi pregadores

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fazendo piadas sobre coisas com as quais pessoas em sua congregação estão tendo que lutar. E eu já fui este pregador. Nós viemos para aliviar jugos, mas com nossas palavras descuidadas nós terminamos por adicionar peso sobre eles.

Pregador, você tem um coração genuinamente inclinado para o seu povo? Eu não quero dizer, “Você é bom com pessoas?” Eu quero dizer, você sabe o que está acontecendo na vida das pessoas de sua congregação e isso mexe com você, o aflige? Você tem chorado com os que choram? Se não, sua pregação com o tempo mostrará isso.

Pense na aflição de Moisés por causa do pecado de seu povo (Êxodo 32.32) ou nas lágrimas abundantes de Paulo (Atos 20.31, 2 Coríntios 2.4, Filipenses 3.18, 2 Timóteo 1.4). Pense, também, na compaixão de Cristo, contemplando o coração do povo (Mateus 9.36). Você pode acreditar que conseguirá trabalhar tais sentimentos sem realmente conhecer sua congregação, mas não é a mesma coisa, especialmente para eles. Não é o mesmo para eles, assim como ouvir palavras encorajadoras de um alguém exemplar não é a mesma coisa que ouvir palavras encorajadoras do seu pai. Pregador, não exponha o seu texto sem carregar verdadeiramente as cargas do seu povo em seu coração.

3. Uma pregação significativa tem o nome das pessoas em oração.Todo pregador fiel ora sobre seu sermão. Eles oram para que a Palavra de Deus não retorne vazia (Isaías 55.11). Eles oram para que as pessoas sejam receptivas. Oram para que almas sejam salvas e vidas, transformadas. Estas são boas orações. Melhor ainda são sermões preparados e compostos com orações por João Silva e Julia Torres e pela família Carneiro nos lábios do pregador. Melhor ainda é o sermão sobre o qual se ora clamando pela salvação do Antônio Santos e pelo arrependimento do William Lira e pela cura da Maria Alice.

Paulo repetidamente fala para as pessoas sob seus cuidados que ele se lembra deles em suas orações (Efésios 1.6, 2 Timóteo 1.3, Filemon 1.4). E como ele está frequentemente mencionando nomes, sabemos que não quer dizer só de forma geral. Apesar de Paulo não ter uma

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congregação para pastorear de perto, mas servia na maior parte do tempo como missionário plantador de igreja, ele mesmo assim se esforçou para conhecer as pessoas para as quais ministrava a distância e procurava visitá-los o maior número de vezes que pudesse. Quanto mais deveria o pastor da igreja local desenvolver relacionamentos com seu povo! Ele deve saber seus nomes e deve levar seus nomes aos céus em oração.

É importante saber para quem você está pregando. É importante saber que a aquela irmãzinha não gosta da sua pregação. É importante saber que o aquele irmão adulador gosta demais. É importante saber que o homem na parte de trás com os braços cruzados e as sobrancelhas franzidas não está com raiva de você; esta é a maneira como ele ouve com atenção. É importante saber que a senhora que sorri e concorda com a cabeça na primeira fila tem a tendência de não lembrar nada do que você fala. Quando você sabe estas coisas, você pode orar pelo seu povo de forma mais profunda, pessoal e pastoral. E sua pregação ficará melhor. Ela será mais real. Ela virá não somente de sua mente e boca, mas de seu coração, sua alma e suas entranhas.

Eu assumo, é claro, que você está interessado neste tipo de pregação. Se você entende a pregação como simplesmente prover “recursos espirituais” para as mentes interessadas ou uma conversa para motivar os religiosamente inclinados e não como sendo levar o testemunho profético da Palavra de Deus revelada aos corações das pessoas, então você pode seguramente ignorar todos os pontos acima.

Notas:

[1] Uma igreja multilocal é uma igreja que tem os seus sermões transmitidos para vários locais diferentes ao mesmo tempo, através de transmissão via satélite, ou seja, é uma igreja única, na qual a membresia se reúne em lugares diferentes, ao mesmo tempo. Esse tipo de igreja é um fenômeno crescente nos Estados Unidos.

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A Pregação Mudou Desde a Igreja Primitiva?Peter Sanlon23 de Setembro de 2015 - Igreja e Ministério

A pregação expositiva sistemática e regular da Escritura tem um papel central em minha visão para o ministério eclesiástico normal. Quando prego através de cada livro da Bíblia para as minhas congregações, creio que estou continuando um ofício e uma tradição que tem suas raízes no Pentateuco, nos métodos de ensino judaicos e na Igreja Apostólica. O pouco espaço que tenho não me permite elucidar a natureza dessas primeiras florações da pregação expositiva; ao invés disso, foi–me pedido que compartilhasse algumas reflexões sobre a natureza de nossa obrigação para com a pregação da Igreja Primitiva pós-bíblica.

Os pregadores da Igreja Primitiva que eu vejo como mestres de ofício incluem Ambrósio, Jerônimo, Gregório de Nazianzo, Crisóstomo, Atanásio, Agostinho e Pedro Crisólogo. Contudo, quando leio os sermões desses praticantes da pregação expositiva, é impossível não notar que a pregação deles parece estranha àquilo que se pensa hoje como uma exposição. Como a pregação expositiva moderna pode ser dependente da pregação da Igreja Primitiva que parece tão estranha a nós?

Uma convicção comum aos antigos e modernos

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Em primeiro lugar, é vital enfatizar a convicção que nós e os pregadores da patrística temos em comum. Tanto praticantes antigos quanto contemporâneos da pregação expositiva criam que a Escritura é verdadeira em tudo o que ela afirma. Além disso, ambos os grupos defendem que quando a Bíblia é pregada, o próprio Deus fala.

Em muitos lugares os Pais, como Tertuliano, afirmaram que o que quer que a Escritura ensine é a verdade.1 Agostinho também declarou: “Aprendi a render tal respeito e honra apenas aos livros canônicos da Escritura: apenas nesses creio decisivamente que os autores eram completamente livres de erro”.2 Tais afirmações explícitas da confiabilidade bíblica são valiosas na reconstrução da visão patrística da Escritura.Todavia, as implicações que podem ser tiradas de como a Escritura foi usada por toda a vasta obra dos Pais da Igreja são, no mínimo, tão relevantes quanto. A pregação era o principal ponto em que a Bíblia era usada na Igreja Primitiva, e quando menções após menções são empilhadas sobre citações após citações, fica abundantemente claro que os pregadores antigos lidavam com a Escritura daquela maneira porque criam que ela era verdadeira e que através dela Deus falava aos seus ouvintes.

Como Agostinho pregou: “Tratemos a Escritura como Escritura: como Deus falando”.3 Sem tal convicção há pouca motivação para debruçar-se sobre o texto bíblico na preparação do sermão, como os Pais faziam.Por que, então, os sermões da Igreja Primitiva parecem tão diferentes dos pregadores modernos ocidentais que compartilham do mesmo comprometimento para com o papel da Escritura no discurso de Deus? Os sermões da patrística sempre utilizam alegorias obscuras, presumem significado nos números e podem saltar por passagens bíblicas aparentemente aleatoriamente. Os sermões da patrística podem conter reflexões e excursões que aparentemente divergem grandemente do texto sendo considerado. A ideia de que a pregação expositiva moderna é descendente de tais homilias antigas seria, meramente, uma ilusão?

A pregação expositiva se relaciona com a cultura pagã

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Pregação expositiva é um ofício, uma arte e uma disciplina pastoral que interage com a cultura pagã em geral e com a oratória pagã em especial.

Os pregadores da patrística (e os pregadores contemporâneos) comprometidos com a pregação expositiva têm visões radicalmente divergentes da erudição pagã. Alguns pregadores teciam citações de autores pagãos no tecido de suas exposições. Por exemplo, Ambrósio tem mais de cem citações de Virgílio em sermões de sua autoria a que temos acesso hoje, e usava o autor médico Galeno para ajudá-lo a explicar Gênesis. Tertuliano desacreditou o ensino pagão como inimigo da teologia. O fato de seu estilo de discurso se utilizar de técnicas retóricas forjadas nas escolas pagãs nos lembra que ninguém pode escapar completamente do seu contexto.

A frequência das citações de autores pagãos é a única e mais óbvia forma que o aprendizado pagão influenciou os sermões da patrística. Mais profundamente, a cultura pagã do mundo antigo era fascinada pelas palavras — seu sentido, formação e significado. O empilhamento nos sermões de citação bíblica após citação bíblica, assim como o uso de passagens bíblicas mais claras para interpretar passagens mais obscuras, eram técnicas que os pregadores aprenderam nas técnicas escolas pagãs usavam para interpretar Homero.

Assim como na Reforma, o contexto educacional dos pregadores da patrística moldou seus ministérios profundamente. O primeiro manual para o aprendizado da pregação foi escrito por Agostinho. Ele continua extensas seções refletindo sobre como se apropriar melhor das lições de oratória de Cícero. Agostinho via valor no discernimento pagão de como falar bem: “Por que aqueles que falam a verdade o fariam como se fossem estúpidos, enfadonhos e sonolentos?”.4Apesar de elogiar algumas lições de Cícero, no fim Agostinho considerou que orar e ouvir bons pregadores era mais importante.5

Muito daquilo que faz os sermões da patrística parecerem diferentes dos sermões modernos surge do fato de que, em nossos ministérios de pregação expositiva, nós e nossos antepassados estamos (deliberadamente ou não) usando os melhores conhecimentos pagãos disponíveis sobre hermenêutica e comunicação. Os pregadores

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antigos criam que a Bíblia era uma palavra divina de rica verdade para os ouvintes. Eles buscavam significado em padrões de números porque a cultura pagã via beleza, verdade e significado residindo em mistérios profundos nos números. Se era assim com a matemática, os discursos persuasivos e a filosofia, pensavam, certamente deve ser muito mais com um texto inspirado pelo próprio Deus. O contexto do aprendizado secular moldou as abordagens dos pregadores antigos ao seu ofício.

O mesmo é verdadeiro quando se fala de questões práticas da pregação. Alguns pregadores escreviam seus sermões por completo e depois os liam. Outros, como Agostinho, meditavam na passagem durante a semana e depois falavam extemporaneamente. Muitas escolas de retórica ensinavam seus alunos a falar em público fazendo-lhes ler e memorizar discursos. Quintiliano, o orador pagão, argumentou que essa era uma maneira superficial e imatura de falar em público. Se um pregador concordasse com Quintiliano ou não acabava moldando sua prática com relação a falar a partir de um roteiro.

Seria um erro grave assumir que nossas abordagens modernas ao entendimento e à pregação da Bíblia são automaticamente superiores àqueles dos pregadores antigos. Também seria incorreto não observar o fato de que a pregação expositiva moderna é descendente da homilética da patrística e partilha de suas convicções fundamentais.

A pregação expositiva se desenvolve com a história da igrejaOutra razão pela qual os sermões da patrística parecem tão singulares é porque foram pregados por pessoas de dentro do contexto da história da igreja em que habitavam. No mundo antigo, alguns pregadores se beneficiaram ao fazer referências cruzadas de traduções iniciadas por Orígenes em sua Héxapla. Agostinho teve dúvida se deveria adotar a tradução bíblica mais erudita de Jerônimo ou continuar com a versão com a qual sua congregação estava mais familiarizada. Ele optou por manter a tradução menos precisa para a sua congregação por causa de sua sensibilidade pastoral, enquanto lentamente integrava a tradução de Jerônimo aos seus escritos acadêmicos.

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Conforme a história da igreja progredia, também progrediam as ferramentas, e a forma de pregação expositiva se desenvolvia. Uma das áreas mais óbvias onde isso se aplicava era na história da salvação. Na Igreja Primitiva, os pregadores estavam muito conscientes de que havia um desenvolvimento dentro da história bíblica. Irineu desenvolveu uma teologia de “recapitulação” baseada nas repetições que se percebia dentro da história da salvação como a árvore em Gênesis 2 e o madeiro em que Cristo foi pendurado. A rejeição herética de Marcião do Antigo Testamento e interações com estudiosos judeus levaram muitos pregadores a pregar entre a semelhança e a unidade entre os Testamentos. A ênfase de Agostinho na graça na controvérsia pelagiana o levou a enfatizar a diferença entre a lei e o evangelho. Todas essas — e a aparente presença da prática da alegoria — eram tentativas primitivas dos pregadores de se dedicarem às passagens das Escrituras de maneira a fazer justiça à história da salvação por inteiro.

Dados os muitos desenvolvimentos na história da igreja que nos oferecem novas maneiras de articular a história da salvação e lhe dar nuances, é compreensível que os sermões da patrística possam parecer bem estranhos em suas interpretações teológicas. Na realidade, os grandes pregadores dos primeiros séculos estavam mapeando as possibilidades para configurar unidade e diversidade dentro do cânon — algo com o que nós temos dificuldade e diferimos ainda hoje.

ConclusãoA pregação expositiva mudou desde a igreja primitiva? Na questão de que a pregação expositiva deve se relacionar com a cultura pagã e desenvolver com a história da igreja, a resposta é sim. Se isso nos cegasse quanto às convicções centrais partilhadas a respeito da autoridade da Escritura e a paixão que leva os pregadores a usar o melhor material a que tem acesso na cultura e na teologia para pregar a Bíblia fielmente, nós não só estaríamos desonrando os santos que labutaram antes de nós, mas também deserdaríamos a nós mesmos de um tesouro que pode nos ajudar a aprimorar a nossa pregação — a pregação da Igreja Primitiva.

Notas:

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1 - Tertuliano, A Carne de Cristo, 6.2 - Agostinho, Epístola 82.3.3 - Agostinho, Sermão 162C.15.4 - Agostinho, A Doutrina Cristã, 4.3.5 - Agostinho, A Doutrina Cristã, 4.32.