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INTRODUÇÃO
tema desta monografia é o estudo do comportamento da sociedade
de consumo influenciada pela Indústria Cultural, através da
propaganda segundo uma análise do filme, 1,99 – Um Supermercado que
vende palavras, de Marcelo Masagão, que propõe uma reflexão acerca dos .
No filme curiosas histórias acontecem no supermercado e segundo o diretor,
há três personagens principais: o desejo, a angústia e compulsão pelo ato da
compra.
Alguns pontos abordados serão a evolução da comunicação, desde a
pré-história até os dias de hoje, com criação dos meios de comunicação. A
Indústria Cultural e na criação da indústria de consumo, falando sobre seus
agentes. O papel da propaganda e da publicidade como agentes atuantes na
criação da subjetividade. Passando por um breve estudo da sociedade do
espetáculo, fruto do trabalho de massificação da comunicação.
A questão central é mostrar a critica que o diretor do filme faz da sociedade e da propaganda traduzida em benefícios e qual o papel da propaganda nas decisões do consumo, através da observação do filme e da crítica a sociedade de consumo feita pelo diretor.
A análise do filme pretende mostrar como somos influenciados por um
mundo de idéias, comportamentos e conceitos criados a nossa revelia e que a
propaganda atua a favor da indústria do consumo.O estudo do filme é reflexão
sobre a sociedade de consumo moderna e mostra como a propaganda atua
nas decisões de cada indivíduo ou do coletivo.
O
9
Capítulo I
A EVOLUÇÃO DA COMUNICAÇÃO HUMANA
“Após a extinção do sujeito, a arte é o que menos se deixa salvar pelo empalhamento do sujeito, é o único sujeito que dela seria digno atualmente , o puro inumano, furta-se ao mesmo tempo a ela por usa enormidade e sua inumanidade.”
Theodor Adorno (1903 -19690)
Segundo registros fósseis, várias formas primatas evoluíram durante
sucessivas eras. Cerca de noventa mil anos atrás surge o Cro-Magnon (Homo
sapiens, sapiens) que acabou ocupando todas as partes da África e da Ásia.
Os Cro-Magnon viviam em cavernas ou em abrigos, faziam roupas adequadas
ao clima e aprenderam a conservar alimentos. Eles foram capazes de se
organizarem socialmente e sobreviveram em ambientes hostis. Ao longo dos
anos, criaram uma tradição artística com pinturas e entalhes nas cavernas.
Sem dúvida os Cro-Magnon, são idênticos ao homem atual, não só pela
aparência, mas também pela necessidade de contarem sua história, mesmo
que de maneira primitiva. As pinturas e entalhes são indícios de que o homem
precisava se comunicar. Quanto mais ele se aperfeiçoava como comunidade,
maior era a necessidade de se fazer entender.
Para compreender a necessidade de comunicação é importante
conhecer a teoria de transições, onde, são explicadas através de etapas
distintas, a comunicação humana. Provavelmente a primeira etapa foi a Era
dos Símbolos e Sinais, feita de maneira instintiva, que foi evoluindo à medida
que a capacidade cerebral do homem foi aumentando. A mudança radical foi
percebida quando o ser humano ingressou na Era da Fala e da Linguagem.
Cerca de cinqüenta mil anos, os Cro-Magnon desenvolviam a linguagem, mas
somente há cinco mil anos, é que o homem passou para a Era da Escrita. A
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mais antiga transição para a escrita ocorreu entre os egípcios e sumérios.
Mas foram os gregos que por volta de 500 a.C. desenvolveram o alfabeto
amplamente utilizado.
1.1 - A Era da Comunicação de Massa
A Era da Comunicação de Massa se iniciou no começo do século XIX,
com a criação da prensa que alavancou a produção de jornais. Além disso,
houve o surgimento da mídia elétrica como telegrafo e telefone que
contribuíram para a irradiação das idéias. Já no século XX, surgiu o cinema, o
rádio, a televisão e a internet. Cada um desses veículos proporcionou
mudanças significativas no pensamento humano, aumentando a
disponibilidade de empregar novas linguagens na sociedade.
“Vivemos em uma sociedade em constante mutação. Às vezes é difícil determinar quais mudanças são importantes... O televisor, entretanto é um recurso tecnológico que exerce impacto imediato e direto... Assim o televisor e os outros veículos são novidades em torno das quais seres humanos organizam suas vidas em modelos diferentes do que jamais ocorreram no decorrer da nossa evolução” (DeFleur, Ball-Rokeach, 1993, p. 42).
Os principais veículos de comunicação de massa foram a televisão e o
rádio, que até hoje influenciam o comportamento da sociedade. O conteúdo da
programação desses veículos é formado por sistemas: entretenimento,
propaganda, agências de notícias, agências reguladoras, produtos e
principalmente o público.
O público é o componente de maior relevância do dentro do sistema. É
ele que mantém os meios aquecidos, neste contexto, definiram-se esquemas
de direcionamento de informações: Emissor (veiculo)-----Receptor (público)
e/ou Empresa----Produto (patrocinadores)----Público. Entende-se como público
11
pessoas que tem comportamentos hegemônicos, a partir de critérios
específicos, como: interesses por mesmos assuntos, identificação ideológica
ou política.
Os executivos da TV e do rádio, perceberam que estes veículos
exerciam grande influência, tanto ideológica como comportamental no público,
atraindo assim financiadores para o veiculo. Esses financiadores eram grandes
corporações públicas ou privadas que pretendiam “vender” seus produtos ou
idéias. Eles perceberam que a televisão assim como rádio, são capazes de
moldar a opinião pública e induzir as massas a aceitarem quase todo ponto de
vista desejado pelo comunicador.
O financiador ou patrocinador é aquele que financia a produção de
entretenimento visando aumentar sua participação no mercado de negócios.
Quando o mercado de negócios entra no jogo, é de vital importância para as
corporações que seus produtos ou suas ideologias sejam bem difundidos.
Ao longo dos anos toda comunicação era feita em apenas do
comunicador para o receptor. Não existia a resposta ou demanda deste
receptor. Porem com o aumento da concorrência, as empresas passaram a
investir em pesquisas de opinião, imagem e impacto nos mercados.
1.2 – A propaganda e a publicidade no mercado de consumo
"De forma neutra, propaganda é definida como forma propositada e sistemática de persuasão que visa influenciar com fins ideológicos, políticos ou comerciais, as emoções, atitudes, opiniões e acções de públicos-alvo através da transmissão controlada de informação parcial (que pode ou não ser factual) através de canais directos e de mídia." (Richard Alan Nelson, A Chronology and Glossary of Propaganda in the United States, 1996 <http://pt.wikipedia.org/wiki/Propaganda>
12
Propaganda – anúncios que divulgam idéias políticas, religiosas e
sociais, como campanhas educativas, informativas e políticas. Publicidade -
anúncios de divulgação, de lançamento e venda de produtos. A diferença entre
esses dois termos é muito sutil. Alguns autores apontam quem não existe esta
diferença e que toda propagação de idéias, venda de produtos e valores, é
propaganda. E publicidade é um conjunto de estratégias de Marketing, utilizada
com objetivos comercias.
No mercado cada vez mais globalizado, a propaganda é o fator de
grande importância para a divulgação de uma empresa, marca ou produto. A
publicidade, lança mão de três discursos: o da sedução, da persuasão e da
ordem. Sistematicamente esses discursos devem chamar a atenção do
consumido, estimular o desejo, criar a convicção e transformar este desejo em
compra.
A publicidade, que inicialmente, era utilizada somente para informar aos
consumidores sobre as características de produtos, possibilitando que os
mesmos pudessem analisar entre eles e optar pelo que mais o agradava. Hoje
é uma ferramenta de persuasão a propaganda.
“A idéia fundamental de persuasão tem raízes antigas. Muito antes da Era da comunicação de Massa, o termo Retórica era empregado com referência à arte de utilizar a linguagem para influenciar os julgamentos e a conduta dos outros.” (DeFleur, Ball-Rokeach, 1993, p. 290).
Não é de hoje, que profissionais da área, buscaram ajuda à psicologia
para entender como funciona a mente humana e assim criar campanhas que
atinjam o maior número de consumidores. Estudando características biológicas
e sociais, concentrando-se nos fatores cognitivos, para criarem mensagens que
melhor atinjam os consumidores e fazendo com que ajam de maneira
inconsciente. Para atingir melhor o público, a propaganda passou segmentar o
público através de estudos que determinavam o direcionamento das
mensagens. Esta segmentação pode ser regional, com um direcionamento
13
mais amplo e com direcionamento mais específico, pode ser por sexo, idade,
profissão, classes e tantos outros grupos distintos.
“A essência da estratégia psicodinâmica é que uma mensagem eficaz ter propriedades capazes de alterar os funcionamentos psicológicos de indivíduos de maneira tal que reajam ostensivamente (à informação que o objeto da persuasão) com estilos de comportamento desejados ou sugeridos pelo comunicador.” (DeFleur, Ball-Rokeach, 1993, p. 296).
A tecnologia é a arma mais poderosa para a disseminação das idéias.
Com a globalização todas as informações circulam pelo mundo. Quase
nenhum lugar do mundo é isolado e a maioria das pessoas querem algo que já
viram, ouviram ou experimentaram. Porém ficou caro para as corporações
atenderem a demandas individuais.
“A verdade implacável de toda produção moderna – de produtos tangíveis ou intangíveis – é que o produto mais padronizado custa mais barato do que o menos padronizado.” (Levitt, 1985 – p.410).
Seguindo o conceito de que quanto mais o concorrente se expõe, mais
as marcas e produtos devem ser divulgados. Segundo as agências de
publicidade, nos anos 90, as corporações deveriam investir em propaganda e
terem a certeza que estão se destacando mais que as concorrentes. Novas
técnicas de vendas vêm sendo implementadas e estão cada vez mais
invasivas. Uma empresa líder de brinquedos no mundo, já pintou uma rua em
uma cidade da Inglaterra de rosa, incluindo casas, postes, cachorros. Para
comemorar o mês cor de rosa da Barbie.
Hoje, com o mercado virtual expansão, os publicitários criam material
para Ipods, celulares e computadores. Essas novas mídias estão inovando o
mercado publicitário e requerendo mais sofisticação e precisão nas
14
campanhas. Porém a televisão é a mídia que mais influencia o
comportamento do consumidor, somente no Brasil ela esta presente em mais
de 40 milhões de lares, em mais de 4.386 municípios, fazendo dela uma arma
a serviço da propaganda que está presente em toda programação das
emissoras de TV.
Os programas de TV são frutos da indústria cultural que associam
consumo e felicidade em seus conteúdos (novelas, filmes, propaganda). Os
personagens geralmente são bem sucedidos, bonitos, felizes e realizados a
medida que vão adquirindo bens ou conquistando algo ( um bom emprego,
compra de bons carros, produtos de tecnologia avançada). A realização desses
sonhos ilude o consumidor e fazendo ele acreditar que assim alcançaram a
felicidade.
1.3 – Criando a subjetividade
Segundo Mance (1998) biologicamente os seres humanos possuem
matérias e funções semelhantes e culturalmente as subjetividades são
modeladas sob regimes de signos muito diversos. Os grupos de convivência
são fortes padrões de modelagem do indivíduo. É comum ver pessoas
utilizando algumas técnicas já experimentadas para resolver algo que já foi
observado ou filhos seguirem comportamentos dos pais, etc. A subjetividade
está ligada diretamente a tudo que serve de modelo.
Para compreender a criação da subjetividade é preciso entender que
sua construção está ligada nas funções orgânicas de uma sociedade. Divide-se
a sociedade em órgãos e aparelhos com funções determinadas e que articulam
entre si. Os órgãos são comparados ao indivíduo e os aparelhos são os meios
pelo qual o individuo recebe informações. Os aparelhos criam signos – formas
de linguagem e expressão, para exprimir suas idéias. De seu lado os órgãos
decifram esses códigos que podem ser compreendidos de várias maneiras por
receptores distintos. Cada um tem sua interpretação própria sobre determinada
informação.
15
Assim, a subjetividade é determinada pelos agentes formadores da
sociedade (igreja, escola e demais agentes sociais) e é objeto de
apoderamento das mídias de massa que criam padrões éticos, estéticos,
políticos e sociais.
“O nome Teoria da Modelagem é valioso para descrever a aplicação da teoria social geral de aprendizagem, a aquisição de comportamento novo através de descrições da mídia. Eles proporcionam modelos simbólicos de quase toda forma concebível de comportamento. tanto crianças quanto adultos adquirem atitudes, repostas emocionais e novos estilos de conduta por intermédio da mídia.” (Comfield, 1958, apud De Fleur e Ball-Rokeach, 1993, p. 234).
Sob uma perspectiva menos ampla, a comunicação de massa através
dos signos, modela as utopias, atua no inconsciente e move os desejos das
pessoas. Criando assim, modelos que se formam no imaginário pessoal e que
dão vida às ilusões e fantasias, através de um projeto de vida ideal. Os mitos
são criados: poder, luxo, beleza, riqueza e fama. E fazem parte de um mundo
idealizado não pelo indivíduo, mas sim por uma indústria (comunicação) que
ditam as regras das corporações (financiadores).
1.3.1 – A Indústria Cultural e a Sociedade do Espetáculo
A indústria cultural, segundo os Teóricos Críticos*, é o processo pelo
qual são criados produtos em larga escala para que sejam consumidos pelas
massas. Eles diziam que a indústria cultural transforma a cultura em produto de
consumo e que o homem é o objeto desta indústria; manipulando o
comportamento do homem; transformando a cultura em mercadoria e o homem
em um consumidor voraz. Na sociedade pós-revolução industrial os produtos
culturais são criados para ser consumidos e não apreciados.
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Entende-se por Indústria Cultural, o conjunto de meios de
comunicação capaz de gerar lucro e com grande poder de penetração nas
massas.
“... a arte não se democratizou, massificou-se para consumo rápido no mercado da moda e nos meios de comunicação de massa, transformando-se em propaganda e publicidade, sinal de status social, prestígio político e controle cultural”. (Chauí, 1995, p. 329/333).
Uma das idéias da Indústria Cultural é massificar todo e qualquer tipo de
produto, dando a idéia que isso é uma forma de democratizar o acesso aos
mesmos. Porém, esse ideal é falso, desde o momento em que a indústria cria
valores diferentes para tais produtos. Por exemplo: uma obra de arte pode
custar milhões e só poder ser consumida por um grupo seleto de pessoas.
Com essa valorização, criam-se classes distintas. Aqueles que podem comprar
o que querem e aqueles que compram o que a Indústria permite. Outro aspecto
é a falsa idéia de acesso aos mesmos bens. Numa sociedade de
superprodução industrial, existem infinitas mercadorias de diversas marcas que
dão a sensação de certa “liberdade de escolha”.
“O valor de uso é absorvido pelo valor de troca em vez de prazer estético, o que se busca é conquistar prestígio e não propriamente ter uma experiência do objeto”. (Costa, 2003, P 03).
A sociedade do espetáculo na sua totalidade pode ser compreendida
como o resultado de um modo de produção existente. Onde as informações
são ditadas através da propaganda ou publicidade e do mercado do
entretenimento (TV, rádio, cinema, internet). Essas informações são oriundas
das classes sociais dominantes, onde está calcado o modelo ideal de
sociedade. Segundo o filósofo francês, Guy Debord, na Sociedade do
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Espetáculo, o consumo é alienado, fazendo com que o homem aceite os
valores pré-estabelecidos do capitalismo.
“toda a vida nas quais reinam as condições modernas de produção se anuncia como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era diretamente vivido se afastou numa representação.” (Guy Debord 1967, Sociedade do Espetáculo, p. 167 apud De Fleur e Ball-Rokeach, 1993, p. 234).
18
CAPÍTULO II
POR DENTRO DO FILME
“quando mais pessoa descobrirem os segredos das grifes da teia logo mundial, a revolta estimulará o próximo grande movimento político, uma grande onde de oposição dirigida contra corporações”
Naomi Klein
O filme 1,99 – Um supermercado que vende palavras começa com a
imagem de uma embalagem branca numa prateleira com a seguinte frase: o
mundo está ficando cada vez mais complicado. O filme já começa dizendo o
que as complicações existem, mas as soluções estão ali, nas prateleiras.
Prontas para serem alcançadas, ou melhor, consumidas. Nas embalagens
estão escritas palavras e frases de incentivos como: amor, desejo, sexo, mais
por você, seja você, você precisa correr. O cenário é bem amplo, dando a idéia
de um universo ideal, onde as pessoas são arrumadas e limpas. Não há
diálogos e tão pouco, atuações elaboradas. Enquanto a câmera percorre os
corredores do supermercado, vais focalizando personagens apáticos diante
das “ofertas”. Homens, mulheres, crianças buscam ali, a solução para suas
complicações.
Opondo-se ao mundo “perfeito” do supermercado, existe outro cenário
que remete a certa exclusão. Este ambiente é composto por diversos pneus
dando a idéia de bagunça e as pessoas que fazem parte desse mundo não tem
características ideais para estar no supermercado.
“Devido às grandes mudanças sociais acima referidas, as sociedades urbano-industriais, e particularmente as do hemisfério ocidental, criaram estruturas sociais grandemente diferenciadas. Em linguagem corrente. “diferenciação social” quer dizer complexidade societária. As pessoas em sociedade
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assim compõem numerosas categorias sociais diferentes...” (DeFleur, Ball-Rokeach, 1993, p. 202).
Em alguns momentos surgem conflitos entre os personagens, como o de
dois homens quem brigam diante de uma platéia apática, por uma embalagem
que diz: “porque nós somos mamíferos”, fazendo alusão às disputas dos
grandes predadores, que só termina quando um deles fica desacordado. Outro
conflito, agora psicológico, surge quando duas mulheres, uma gorda e por volta
de seus quarenta anos e outra mais jovem e magra, experimentam uma calça
com os dizeres: “eu quero você”, dando idéia de exclusividade. Assim que elas
se viram para o espelho, acabam se deparam com suas “imagens tão
controversas”. Por alguns segundos elas se entreolham e percebem que
aquela calça, não é um objeto tão personalizado por mais que a mensagem
diga o contrário.
“Uma estratégia e conseguir espaço ou tempo na mídia e apresentar anúncios, comerciais e apelos na base uma mensagem basta para tudo... e torça para dar certo.” (DeFleur, Ball-Rokeach, 1993, p 212).
O filme 1,99 não é um filme de estrutura convencional e permite ao
expectador várias interpretações. Nele estão várias descobertas, uma delas é
que os personagens principais são os objetos e suas frases de efeito. Onde
são trabalhados todos os conceitos que a publicidade pode oferecer alienação,
passividade, consumismo, fetiche. A comunicação direta entre os personagens
é irrelevante e se dá através de representações e sempre com o intuito de
satisfação. Um exemplo é quando uma relação sexual é simulada entre um
personagem que precisa tirar dinheiro do caixa eletrônico. E neste aparece a
imagem de uma mulher como o objeto que irá satisfazer o desejo do homem. O
ato se consome, quando o homem passa várias vezes o cartão de banco na
leitora magnética. Neste momento a música do filme se torna mais forte e os
movimentos do personagem, mais intensos. O prazer se estampa na cara dele
e da imagem da mulher “caixa eletrônico”. O ápice se dá quando finalmente a
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máquina libera o dinheiro, como se fosse o gozo. Neste momento o desejo
do homem é realizado. Ao longo do filme são apresentadas várias situações do
cotidiano das grandes cidades e como todas as pessoas lidar com situações
diferentes.
O filme é uma reflexão sobre como a sociedade se relaciona com o
mercado de consumo, seja ele de produtos ou idéias. A sociedade é regida
pelo desejo, cada personagem representa a sociedade em seus diferentes
aspectos e cada um cumpre o seu papel, mas com uma coisa em comum, o
consumo. Esse consumo dá a sensação de aventura, felicidade, realização e
vitórias permanentes. E tais sensações são geradas através de certo fetichismo
de mercadorias, que manipulam os indivíduos que consomem passivamente
tudo que lhes parece necessário, através de uma alienação ditada pelo
processo da industrialização cultural.
Duramente criticado no filme, o consumo é colocado em cheque, quando
em uma cena aparece uma caixa com dois ratos de laboratório e os seguintes
dizeres: fetiche ou necessidade. Deixando a pergunta no ar, o que consumismo
é por necessidade ou por fetiche? E de onde vem essa vontade de consumir?
No final do filme, os personagens estão em uma sala observando cenas
em que o supermercado é invadido por várias pessoas vestidas com roupas e
armas de Paint Ball. Essas pessoas travam uma batalha, mas não umas contra
as outras. O que elas fazem lá é a destruição dos paradigmas existentes no
supermercado. Todos os produtos, caixas, frascos são destruídos. Os
espectadores assistem as cenas com certa repressão, desconfianças e
incomodo. A idéia é que estão em uma sessão de hipnose, onde uma voz dita
o comportamento que eles devem ter em relação a tudo o que assistem. Essa
voz diz palavras de conforto e incentivo, dando a idéia de que tudo o que foi
destruído fazia mal aquelas pessoas e que no final elas estavam livres desses
tormento.
21
Essa sessão na verdade é uma metáfora usada pelo diretor para dizer
que o supermercado é na verdade uma ilusão e que todos aqueles produtos,
são ilusões criadas e que podem ser desfeitas com a vontade de cada um.
2.1 - Necessidade e Fetiche
Como citado acima, a indústria criou padrões sociais, éticos e estéticos
através da subjetividade. Sutilmente incutiram no indivíduo o desejo de
satisfação. As pessoas buscam satisfação em tudo que fazem, percebendo
isso a publicidade criou mecanismos para atrair os consumidores. As pessoas
querem consumir coisas tangíveis ou não. O consumidor atribui aos carros,
roupas, status, bem estar, entre outros a capacidade de terem seus problemas
resolvidos e esse valor está no benefício que ele quer ou recebe.
Alguns autores entendem como necessidade tudo aquilo que é
empregado para manter biologicamente o homem. Basicamente o uso do que é
realmente é necessário para a sua sobrevivência. Claro que cada indivíduo tem
necessidades distintas e conseqüentemente precisam de produtos diferentes.
Porém a indústria da comunicação, visando ampliar o consumo transforma
necessidade em fetiche (feitiço), como exigência para sobrevivência de cada
indivíduo, criando desejos e oferecendo produtos capazes de satisfazê-los.
Em o O Capital, Karl Marx denominou em fetichismo de mercadoria, que
as mercadorias têm vontades independentes dos seus produtores. Ele define
que essas mercadorias em sua natureza, satisfazem as necessidades
humanas. Essas necessidades são físicas, biológicas e espirituais. Marx
entende como necessidade uma coisa que seja útil e essas utilidades têm o
valor determindade pelo uso que se faz dela. Já o fetichismo de mercadoria
está atrelado ao valor que o capitalismo dá as mercadorias, através da
alienação e sedução. Porém este valor não está ligado aos investimentos
utilizados na produção das mercadorias. E sim aos valores subjetivos, onde
apenas o desejo de obter tal mercadoria é o suficiente para adiquiri-la.
22
Comer é necessário, mas comer no MacDonald´s supre a
necessidade biológica ou simplesmente torna o homem parte de uma
comunidade? Para se locomover as grandes distâncias é importante ter um
carro, porém ter um carro popular não supre essa necessidade ou é preciso ter
uma Mercedes? Tantos outros exemplos podem ser dados.
“Há duas maneira pelas quais a mídia modifica toda gama de nossas atividades de comunicação. Uma através de sua influencia em nossos padrões de fala. A outra é uma linguagem de forma mais genérica, através da modificação e aplicação do vocabulário. A o fazê-lo a mídia serve como uma espécie de feira livre de forma concorrentes para influenciar nossa comunicação. DeFleur, Ball-Rokeach, 1993, p 286).
A partir das mudanças culturais promovidas pela indústria de consumo,
necessidade e fetiche determinam basicamente o que ou como se consome. O
problema é avaliar o quanto isso é negativo ou positivo, já que cada produto
tem valores diferentes para cada indivíduo.
23
CAPÍTULO III
ANÁLISE DA SOCIEDADE NO FILME 1,99
Quando Marcelo Masagão concebe o filme, ele já espetaculariza a obra.
As idéias e questionamentos apresentados no filme fazem parte da cultura de
apresentação dessas propostas. O próprio filme em sua natureza se apropria
do conceito da sociedade do espetáculo, onde todas as relações sociais são
mediadas através de imagens. O cinema assim como a TV discute a sociedade
e seus costumes através de filmes e programas.
A mídia se põe como uma mediadora de assuntos entre o mercado e o
espectador (consumidor). A critica sobre a sociedade é que ela deixou de viver
uma realidade concreta para viver das representações, nas quais nem sempre
traduzem a verdade sobre esta sociedade e sim uma fantasia criada pelo
mercado de consumo.
“Os signos publicitários nos falam dos objetos, mas sem explicá-los em vista de uma práxis (ou muito pouco): de fato, remetem aos objetos reais como a um mundo ausente. São literalmente “legenda”, ou seja, põem-se aí para que sejam lidos. Se não remetem ao mundo real, tampouco o substituem exatamente...”. (Lima, p 291).
Masagão utiliza metáforas para identificar no filme características da
sociedade de espetáculo. O próprio supermercado é o grande mercado de
consumo, todas as angústias, sofrimentos, desejos e compulsões são
“tratados”, através da aquisição de produtos. Cada frasco, caixa ou pacote,
contém segundo o diretor, a solução para os males citados anteriormente.
Desde a criação dos meios de comunicação e seus aperfeiçoamentos, o
sistema capitalista busca formas para se manter por meio do lucro. Ao passar
dos anos a Indústria Cultural interferiu na sociedade criando diversos meios
para aumentar o consumo de mercadorias e idéias; criou divisão de classes,
24
como vemos no filme, onde as pessoas são reconhecidas por determinado
grupo social através de seu poder de compra; são aceitas porque mantém o
mesmo padrão e comportamento e consumo. A propaganda é a alma dessa
ditadura consumista, ela aliena a vontade do consumidor à determinação do
mercado. E essas formas podem ser muito sutis, como vemos no filme quando
um grupo de dançarinos invade o cenário com o intuito de combater o tédio.
Mas por trás deste discurso existe um sistema de comunicação que é mostrado
ao longo da apresentação, como mensagens subliminares.
Na sociedade do espetáculo todas as ações partem da comunicação
simbolizada como entretenimento. Os produtores transformam a realidade dura
em um mundo em aparências, onde quase tudo é perfeito e sempre existe um
final feliz. Durante anos a sociedade é bombardeada com esses discursos que
já não se percebe a diferença da realidade e da ficção.
“Em muitos casos, as revistas usam a informação do leitor para planejar peças publicitárias estreitamente orientadas para seus clientes. a revista Details, por exemplo, projetou uma história em quadrinhos cômica/publicitária de 24 páginas em outubro de 1997, com produtos como colônia Hugo Boss e Jeans Lee entrelaçados em uma história sobre as aventuras diárias de uma patinador profissional. Na página seguinte cada trecho da história, a verdadeira propaganda da empresa aparecia.” (Klein, Naomi. 2004, p. 85).
No próprio filme, cada personagem é o retrato da sociedade, onde há
escolhas e escolhidos; bem sucedidos e fracassados; feios e bonitos, fortes e
fracos e assim por diante. Neste ponto a comunicação de massa cria produtos
que pretendem influenciar e criar novos critérios para a sociedade, muitas
vezes camuflando sérios distúrbios sociais. Um exemplo claro no filma 1,99
quando um grupo de supostos turistas nipônicos, vão até uma favela e tiram
várias fotos de um barraco e de seu morador. Terminada a sessão de fotos, os
turistas vão embora e nada muda no barraco. É como se ele tivesse que ser
daquele jeito e estar naquela situação, porque existe uma indústria que se
25
“alimenta” daquela circunstância. Estas cenas são umas das poucas que não
foram gravadas cenário principal (supermercado). Os personagens saem do
supermercado, mas a atitude passiva diante da realidade continua.
“A sociedade era composta de indivíduos carentes de laços sociais expressivos com outros, e por isso, acionados pelo lado não racional de sua natureza humana...” (DeFleur, Ball-Rokeach, 1993, p 203).
Nas cenas finais quando os personagens são confrontados com a
destruição do mundo imaginário perfeito, percebe-se a reprovação e angústia
das pessoas. Porém, novamente a “voz” do narrador, que é mesma das
propagandas, aparece para resolver todos os problemas. Dizendo que tudo vai
acabar bem, que eles podem ficar tranqüilos e relaxados. O diretor lança mão
de mais uma criação da indústria cultural, o aconselhamento, sobre forma de
um especialista que ensina como viver bem.
3.1 – O consumidor pela ótica da propaganda
As crianças são vulneráveis à publicidade por não serem maduros o
suficiente para entenderem o que as mensagens publicitárias querem dizer.
Desde pequenas, muitas delas já querem comprar, vestir ou ter determinados
produtos veiculados nas mídias de massa. Quando atingem a idade de dez
anos já são consumidores formados e ávidos por novidades. Essas crianças
são os consumidores do futuro e para conquistar e manter esse público, a
propaganda aprimora suas estratégias de vendas de produtos infantis. Antes,
as campanhas usavam o discurso da alegria em obter um brinquedo e fazer
dele um companheiro para as brincadeiras com os amigos. Hoje a propaganda
tornou-se mais agressiva e estimula a competição, a superioridade e até
mesmo a sexualidade. Além disso, ela também influencia nos hábitos
26
alimentares das crianças, com o bombardeio de anúncios de refrigerantes e
fast-foods.
Psicologicamente o adolescente se sente mais seguro quando faz
parte de um grupo, então propaganda dirigida a esse público pretende criar
uma identidade e um estilo de vida para atingir este grupo. Neste contexto, o
que a propaganda vende é a marca de uma empresa e não propriamente um
produto específico. O trabalho dirigido aos jovens é o de provocar o consumo
das marcas usadas pelos ícones da juventude. Se aquele jogador de futebol ou
a cantora da moda usa determinada marca, para o jovem, isso significa que a
mesma é de qualidade independente do preço, mesmo que isso não seja a
verdade. Ávido por novidades, o público jovem trata os novos produtos como
conquistas a serem exibidas nos seus grupos. Diferentes das crianças, os
jovens não criam vínculos afetivos com suas aquisições e assim que adquirem
novos produtos, logo perdem o interesse pelo produto e já querem um novo. Ao
perceber essa fragilidade, os publicitários programam o lançamento de um
novo produto, marca, atividade, música e até ídolos, todos os dias.
Com o público adulto, a ação a publicidade é direcionada aos sexos.
Homens e mulheres recebem mensagens distintas e nesse nicho predomina a
condição social de cada um deles. Principalmente a mulher é quem recebe o
maior número de anúncios, já que na sociedade é o agente que faz as compras
para a família. Os anúncios costumam ser mais sentimentais, mais delicados e
voltado para a realização da mulher como mãe, esposa e profissional bem
sucedida. Para os homens as mensagens têm o discurso mais agressivo, de
competição e de vitoria. Além de posicioná-lo como um grande conquistador.
“...as mensagens publicitárias, as quais enredam os consumidores de todas as idades em circuitos emotivos e irracionais criados para vender produtos no mercado”.(IDEC, 2002.p, 09).
27
Perfumes caros, viagens inesquecíveis, carros potentes, bebidas,
independência, corpo perfeito, filhos saudáveis, mulher sedutora, jogos de
última geração, bolsa da moda, tênis esportivos, bonecas que falam e tantas
outras idéias de sucesso e perfeição são vendidas como ideal de vida.
Gerando expectativas nesses grupos, sem que haja a preocupação com o
resultado dessas conquistas ou a não aquisição de determinados produtos ou
assimilação de idéias. De uma forma abrangente publicidade lida com seus
públicos de forma bem parecida, mesmo tendo perfis diferentes, a propaganda
que lhes é destinada, é forma impactante, massificadora, instigante e
excessivamente manipuladora.
“somos fetichistas e muito susceptíveis à própria propaganda e aos seus slogans. Nesse supermercado não há cor, não há marcas, só frases com a apelo usado para que comprem seus produtos, ou seja, vendem-se palavras, vendem-se slogans, em última análise, vende-se fetiches.” .” (Cerqueira, Nereide. ConsumismoApático.URL:http://www.labjor.unicamp.br/comciencia/img/consumo/entrevista/vaca.jpg data de acesso:15/02/10).
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CONCLUSÃO
Após a análise do filme conclui-se que propaganda com suas estratégias de persuasão não só influencia o comportamento da sociedade mas maneira geral também constrói e derruba valores individuais. Como foi falado anteriormente, o homem é um objeto da indústria cultural e responde aos apelos do mercado. O mercado promete igualar os homens pelo que eles têm e não pelo que são, causando uma confusão no indivíduo e na sociedade. A propaganda promete realizações que nem sempre atingem a todos, criando abismos sociais e pessoais e gerando conflitos entre os bem sucedidos e os derrotados. Esses conflitos nem sempre são entre indivíduos, eles são observados também no comportamento do homem. Confiando nas promessas da propaganda, o homem acredita que consumindo tal produto, agindo de tal forma ou tendo algo especial, ele será plenamente saciado nas suas necessidades. Mas esquece que nem sempre essas necessidades são reais, elas podem ser fruto da ilusão criada para incentivar o consumo. O filme 1,99 – Um supermercado que vende palavras, nada mais é que uma reprodução do comportamento da sociedade em pequena escala, mas com todos os conflitos, incômodos, fórmulas, comportamentos, atitudes, gestos, satisfação, sucesso, desejo, ou seja, palavras que norteiam o universo do indivíduo, que lhes são atribuídas de acordo com o interesse do mercado.
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Bibliografia
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www.labjor.unicamp.br/comciencia/img/consumo/entrevista/vaca.jpg. CERQUEIRA, Nereide. Consumismo Apático , data de acesso:15/02/10).
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ÍNDICE
INTRODUÇÃO 8
CAPITULO I 9
A EVOLUÇÃO DA COMUNICÇÃO HUMANA 9
1.1 – A Era da Comunicação de Massa 10 1.2 – A propaganda e a publicidade no mercado de consumo 11 1.3 – Criando a subjetividade 14 1.3.1 – A indústria cultural e a sociedade do espetáculo 15
CAPITULO II 18
POR DENTRO DO FILME 21
2.1 – Necessidade ou Fetiche
CAPÍTULO III 23
ANÁLISE DA SOCIEDADE DO ESPETÁCULO NO FILME 1,99 23 3.1- O consumidor pela ótica da propaganda 25
CONCLUSÃO 28
BIBLIOGRAFIA 29
ÍNDICE 30