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FACULDADE DE ECONOMIA UNIVERSIDADE COIMBRA A Reabilitação dos Centros Históricos José Afonso Biscaia Coimbra, 2008

José Afonso Biscaia Coimbra, 2008 - fe.uc.pt · 2.3.5. – Nova Carta de Atenas (2003).....13 2.3.6. – Legislação Portuguesa para a Conservação e Reabilitação de Centros

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FACULDADE DE ECONOMIA UNIVERSIDADE COIMBRA

A Reabilitação dos Centros Históricos

José Afonso Biscaia

Coimbra, 2008

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FACULDADE DE ECONOMIA UNIVERSIDADE COIMBRA

A Reabilitação dos Centros Históricos

Trabalho de Avaliação Contínua realizado no âmbito da unidade curricular de Fontes de Informação Sociológica, sob orientação do

Professor Doutor Paulo Peixoto

José Afonso Biscaia Aluno nº20040239

Coimbra, 2008

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ÍNDICE 1. – Introdução ......................................................................................................................... 1

1.1. – Ponto Prévio .............................................................................................................. 1 1.2. Objectivos e Metodologia de Trabalho....................................................................... 3

2. – Estado das Artes ............................................................................................................... 4 2.1. A Cidade e o Centro Histórico .................................................................................... 4

2.1.1. – O Centro Histórico............................................................................................. 6 2.2. – Problemas com que se deparam os centros históricos............................................ 8 2.3. – Soluções apresentadas para os problemas dos centros históricos........................ 10

2.3.1. – A Carta de Atenas de 1933 ............................................................................. 10 2.3.2. – A Carta de Veneza de 1964............................................................................. 11 2.3.3. – Recomendação Relativa à Salvaguarda dos Conjuntos Históricos e sua Função na Vida Contemporânea (1976)...................................................................... 12 2.3.4. – Carta Internacional para a Salvaguarda das Cidades Históricas (1986)....... 13 2.3.5. – Nova Carta de Atenas (2003).......................................................................... 13 2.3.6. – Legislação Portuguesa para a Conservação e Reabilitação de Centros Históricos....................................................................................................................... 14 2.3.6.1. – Ponto Prévio.................................................................................................. 14 2.3.6.2. – Menções ao tema no Programa do XVII Governo Constitucional............ 14 2.3.6.3. – Sociedades de Reabilitação Urbana – Decreto-Lei 104-2004 ................... 15 2.3.6.3. – Projectos Polis .............................................................................................. 15

3. – Descrição detalhada da pesquisa................................................................................... 17 4.- Avaliação de uma Página Web ....................................................................................... 18 5. – Ficha de Leitura.............................................................................................................. 20 6. Conclusão........................................................................................................................... 24 7. Referências Bibliográficas............................................................................................... 26

7.1 – Material Impresso .................................................................................................... 26 7.2 – Material On-line ....................................................................................................... 27

Anexo A Página da Internet avaliada Anexo B Texto de suporte da ficha de leitura

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Fontes de Informação Sociológica – Reabilitação de Centros Históricos

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1. – Introdução

1.1. – Ponto Prévio Este trabalho académico, realizado no contexto da unidade curricular de Fontes de

Informação Sociológica, referente ao 1º ano do curso de Licenciatura em Sociologia

na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra tem como tema a

Reabilitação de Centros Históricos. A escolha deste assunto sobre os outros postos

à consideração dos alunos para a realização deste trabalho prende-se,

fundamentalmente, com dois aspectos: o primeiro, o meu interesse por esta

temática, que provavelmente terá a ver com o facto de ter nascido e passado os

meus anos formativos numa cidade como Leiria, dotada de um Centro Histórico

interessante e pitoresco, na encosta do seu conhecido Castelo (que é, ele próprio,

um reflexo de concepções ultrapassadas sobre a reabilitação de monumentos

históricos, dado ter sido reconstruído sem respeito pela sua traça original, no

dealbar do século XX, por projecto do arquitecto Ernesto Korrodi), mas

desaproveitado e negligenciado durante muitos anos pelas autoridades

competentes, o que ajudou à sua degradação e desertificação. Se nesta cidade este

fenómeno começou recentemente a ser combatido, com a intenção de reabilitar e

revalorizar este importante recurso, a verdade é que o mesmo não se passa ainda

em muitas cidades do país, talvez por desconhecimento das potencialidades destes

espaços na formação da identidade dos habitantes das cidades, bem como para a

indústria do turismo, cujos lucros continuam a ser fundamentais para Portugal. É

então necessária uma abordagem a este tema, mesmo que com um escopo

modesto, como é o deste trabalho, para despertar as consciências e talvez, de

algum modo, contribuir para ajudar a “salvar” os Centros Históricos das cidades

portuguesas da ruína. O segundo aspecto, mais prosaico, que me levou a escolher

este tema prende-se com uma maior facilidade em aceder a algumas fontes de

informação, nomeadamente sobre a natureza das cidades e sobre urbanismo,

derivada do envolvimento pessoal de alguns membros do meu agregado familiar no

esforço para melhorar as condições do Centro Histórico de Leiria, através de

associações para o desenvolvimento e da participação no poder autárquico do

município. Contudo, apesar da ligação a esta cidade, não é sobre o seu Centro

Histórico que este trabalho se debruça, mas antes sobre os centros históricos em

geral, em Portugal e em países que enfrentam problemas semelhantes a este nível,

como a França.

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Obviamente, a concretização deste trabalho não passou sem algumas dificuldades,

nomeadamente relacionadas com a falta de experiência em pesquisa, e com as

dificuldades em descobrir fontes adequadas e com informações relevantes para o

tema em causa. Contudo, a maior parte das dificuldades encontradas foram

ultrapassadas, mediante algum esforço, e contribuíram para alargar a minha

experiência neste campo, bem como a flexibilidade na procura de fontes.

Este trabalho permitiu-me ainda chegar a algumas conclusões sobre assuntos que,

porventura, não tinha ainda estruturado convenientemente do ponto de vista

conceptual, sobretudo sobre a forma como os centros históricos são e devem ser

encarados, tanto pelas populações como pelas entidades competentes na sua

conservação, e pelo princípios que devem reger a sua actividade, no seu “ataque” a

um dos importantes desafios urbanos do século XXI: conseguir revitalizar e

reutilizar espaços que se encontram, normalmente, bem no centro da malha urbana

(que, regra geral, se expandiu a partir desses pontos), de forma prática e acessível

a todos, mas praticando um respeito reverencial pelo passado que representam,

fazendo todos os possíveis para permitir uma fruição plena dos espaços, sem

“arrancar” as suas raízes.

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1.2. Objectivos e Metodologia de Trabalho

De forma a evitar perdas de tempo desnecessárias, uma das primeiras tarefas a

que me dediquei na realização deste trabalho foi a delimitar o seu campo. Assim,

decidi abordar em primeiro lugar a noção de cidade, sem a qual não é possível

apreender o significado e importância dos Centros Históricos, passando em seguida

a apresentar, criticamente, diversas visões, passadas e actuais, sobre a sua

natureza, problemas que estes enfrentaram e enfrentam, e possíveis soluções para

estes, que foram sendo apresentadas, nomeadamente pelos governos e

organizações internacionais dedicadas à matéria.

Para conseguir este intento, pesquisei em diversos mananciais de informações, dos

quais destaco, por se terem revelado mais profícuos e, por conseguinte, mais úteis,

a Biblioteca da Faculdade de Economia e alguns arquivos pessoais de familiares.

Nestes locais, procurei encontrar informação actualizada sobre o assunto,

socorrendo-me de livros e revistas, científicas e de imprensa, bem como de

documentos considerados de “literatura cinzenta”, como legislação portuguesa e

recomendações da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

Cultura (UNESCO), que complementei com informação disponível em formato

electrónico na Internet. Faltava ainda uma filtragem e cruzamento de todas estas

fontes, de forma a que as pudesse articular apropriadamente, o que não se revelou

mais fácil, dada a quantidade de informação inicialmente conseguida, mas cujos

resultados se espelharão ao longo deste trabalho, até dado o relativo

desconhecimento, para lá daquele que faz parte do senso comum, que tinha sobre

a matéria.

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2. – Estado das Artes

2.1. A Cidade e o Centro Histórico É impossível avançar para um entendimento da Reabilitação do Centro Histórico

sem antes o entender, com as suas características. Da mesma forma, sendo este,

normalmente, um bairro ou um conjunto de bairros dentro de uma cidade, não é

possível entendê-lo sem antes fazer, pelo menos uma abordagem ao que é,

actualmente, a cidade e à forma como ela é interpretada.

Começando esta abordagem, com a “vista a olho nu” do que é a cidade, podemos

afirmar, com Lacaze (1999: 13) que a cidade é “um sítio natural no espaço

geográfico”. Com efeito, atentando na história do Homem, constatamos que a partir

do momento em que este se tornou sedentário, sobretudo por causa do advento da

agricultura, procurou estabelecer-se em locais que fossem favoráveis à sua

actividade, sobrevivência e defesa; se é óbvio que estas primeiras povoações não

podiam, de forma alguma ser classificadas como cidades, a verdade é que

demonstravam já o princípio de uma tendência, que alguns milhares de anos mais

tarde era em pleno confirmada com o aparecimento das grandes cidades da

Antiguidade, junto a cursos de água, ao mar, a rotas de comércio de determinados

produtos, a jazidas de recursos no subsolo ou em locais de fácil defesa, como as

encostas das montanhas. Basta pensar nas grandes cidades do Egipto, junto ao

Nilo, em Roma, na confluência dos rios Tibre e Aniene, ou em Atenas, próxima do

porto de Pireu. Porém, mesmo nessa altura, não era à localização que se resumia a

cidade: ela sempre foi o que se constrói nessa localização, a forma como o Homem

altera esse local, ruas, praças, casas, a actividade humana que aí decorre, e as

muralhas, que separavam sem margem para dúvidas, o que era “dentro” e o que

era “fora” da cidade. Estas últimas foram progressivamente desaparecendo, à

medida que a sua população foi aumentando, bem como as necessidades que

manifestava e a complexidade da sociedade que aí habitava.

Na Idade Média, onde jaz a raiz de boa parte das cidades modernas, as cidades

cresceram e foram aglomerando um número cada vez maior de pessoas, dentro e

fora das muralhas, que muitas vezes foram mudadas de lugar para acolher novos

“anéis” urbanos, até deixarem de ser necessárias pela relativa pacificação da

Europa. Contudo, a relação entre o Homem e a cidade nunca foi unívoca: ao

mesmo tempo que aquele constrói a cidade, ela também o define. A cidade é um

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sítio de criatividade, de dinamismo, é, como se constata pela etimologia, o berço da

Democracia e da cidadania, o sítio por excelência para o relacionamento humano,

para a criação de riqueza através do comércio, do artesanato e da indústria, para

os serviços administrativos que relacionam cada cidadão com a sociedade, e que se

instalam nos locais mais populosos. Pode-se quase dizer que a cidade é o habitat

natural do ser humano, sobretudo a partir das revoluções industriais começadas no

séc. XVIII e que aumentaram em muito a densidade populacional, sobretudo nos

bairros operários e pobres. Nesta altura, as cidades começaram a espalhar-se mais

para os seus arrabaldes, até porque a nova indústria necessitava de espaço para se

estabelecer, o que já não existia no centro das cidades em quantidade suficiente.

Assim começou, lentamente, um fenómeno de suburbanização, que se prolonga até

aos dias de hoje, em que, segundo Jean-Paul Lacaze:

(…)um novo modelo espacial começa a surgir, a que poderíamos chamar o modelo da ‘circular’. O crescimento do tráfico automóvel levou ao reforço das redes de estradas da maior parte das cidades através de novas estradas penetrantes ligadas entre si por uma estrada periférica. Inicialmente previstas para desviar o tráfego, estas circulares produziram efeitos cumulativos que tendem a modificar a repartição das funções outrora concentradas no centro das cidades(…) (1999: 113)

Terá sido o deslocamento dos serviços e centros de comércio, juntamente com a

saturação e consequente aumento do preço das habitações de qualidade nos

centros das cidades, ao mesmo tempo que os outros edifícios, por diversos motivos

se foram degradando, uma das principais causas para o aparecimento do que se

convencionou chamar de “efeito donut”, isto é, a densificação do povoamento das

zonas suburbanas, contrastando com a desertificação do centro urbano, onde se

situa o Centro Histórico, e onde muitas vezes as condições de vida se foram

também deteriorando, com o aumento da insegurança, e com o envelhecimento

das populações que aí habitam. A cidade cresceu, durante o séc. XX, desligada do

seu centro, abandonando-o à sua sorte, enquanto privilegiava outras zonas, onde a

construção e o lucro eram mais fáceis e rápidos, mas também apoiada em certas

visões de urbanismo, veiculadas, por exemplo na Carta de Atenas de 1933, de

certa forma ainda na esteira do higienismo de Haussmann (séc. XIX), e inspirada

nas tendências modernistas e funcionalistas na arquitectura de então, e que

advogava a extinção de muitos desses bairros, considerados sujos, insalubres e

promotores da miséria e da promiscuidade, bem como as vantagens de um estilo

de vida periurbano.

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2.1.1. – O Centro Histórico

O abandono é a pior das mudanças, porque o grande motor da ruína da Cidade e da Arquitectura reside na perca [sic] de uso. É o drama de grande parte dos nossos centros históricos (Byrne apud Rodrigues da Silva, 2007)

Reconhece-se, hoje a carga simbólica e a importância que o Centro Histórico

reveste para a formação da identidade da cidade, tanto para os habitantes como

para os visitantes, o que criou consenso sobre a imperatividade de os salvaguardar

(Rio Fernandes, 2006: 1; Lacaze, 1999: 15). Passeando-se pelos bairros históricos

portugueses percebe-se isto mesmo, retendo os olhos no seu colorido próprio, nas

ruas estreitas que contêm a memória do passado vivido em comum.

Contudo, antes de nos perdermos em lirismo, há ainda que esclarecer uma coisa:

qual é, actualmente, o entendimento dado ao conceito de Centro Histórico?

Geralmente, é um espaço compacto, com elevada densidade de construção, muitas

vezes separado do resto da cidade pelo circuito da muralha medieval, e que

raramente é espelho de uma história ou morfologia homogénea (Rio Fernandes,

2006: 1), mas antes uma conjunto que foi sendo construído ao longo dos séculos,

com várias intervenções a sobreporem-se, criando uma amálgama de estilos e

testemunhos de épocas díspares. Ainda com Rio Fernandes (2006: 1), notamos a

heterogeneidade dos usos que lhe são dados, embora actualmente o principal seja

a habitação, com um decréscimo prolongado das actividades comerciais, artesanais

ou industriais, embora se assista a uma inversão desta tendência, em centros

históricos em que a reabilitação se encontra mais avançada, e embora a função

habitacional esteja ainda, em muitos sítios, ameaçada pelo envelhecimento da

população e pela falta de condições dos edifícios mais antigos que ainda não foram

restaurados.

Este entendimento dos nossos dias difere radicalmente daquele que vigorou

durante boa parte do século passado, e que quase levou grande parte dos centros

históricos à ruína. Com efeito, durante esse período, verificou-se uma repulsão

relativamente a estas partes das cidades que levou a que aqueles que tinham

capacidade para isso fugissem a morar dentro das suas ruas estreitas e dos seus

prédios velhos, que ainda não eram abrangidos por planos de salvaguarda eficazes,

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que os poderes públicos deixavam ao critério dos particulares, que muitas vezes

nada faziam, como aliás ainda continua a acontecer frequentemente.

Porém, mais do que como reserva de memória das cidades, os centros históricos,

apesar dos seus numerosos problemas, são preciosos recursos territoriais

começando pelo potencial para o mercado imobiliário (Cabral Teles, et al., s/d),:

tratam-se de zonas centrais nas cidades e onde, apesar de a circulação automóvel

ser muitas vezes limitada (por vezes até com um certo fundamentalismo que acaba

por prejudicar tanto os habitantes como as actividades empresariais que aí possam

decorrer), há normalmente a possibilidade de criar soluções de estacionamento

práticas, que ajudem a fixação da população. Há, contudo, que criar condições para

que os centros históricos possam voltar a ser locais de habitação por excelência,

para além de locais a ser vividos. Por outro lado, mas pela mesma razão, os

centros históricos têm também potencialidade para atrair o comércio e os serviços,

que também necessitam de infra-estruturas para que as suas actividades decorram

frutuosamente.

É então necessário “tratar bem” os centros históricos, dar-lhes as condições de que

precisam para viver e respirar saudavelmente, e como estes, tal como qualquer

parte da cidade não vivem sem gente, atrair a si mais pessoas para lá viver, ou

simplesmente para passear e aspirar a ambiência da parte da cidade com maior

dose de autenticidade. Não é, porém inteligente nem praticável começar a

construção de um edifício pelo seu telhado: convém antes disso lançar as suas

fundações, que neste caso, se traduzem num diagnóstico dos problemas de que

sofre o Centro Histórico de forma a que se possa encontrar a sua solução.

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2.2. – Problemas com que se deparam os centros históricos Apesar das tentativas que vão começando a ser empreendidas por diversos

organismos públicos, bem como por algumas associações privadas de promoção da

conservação do património desenvolvido, e que canalizam verbas, por vezes

avultadas, para o desiderato de “salvar” os centros históricos, a verdade é que

estes ainda sofrem de problemas graves, cuja identificação, apesar de nem sempre

ser fácil, é necessário fazer.

O primeiro dos problemas de que sofrem os centros históricos é o esvaziamento da

sua função habitacional. Esta fuga para fora do centro histórico ajuda à degradação

dos edifícios, e consequentemente baixa o seu valor de mercado. Contudo, muitas

vezes se constata, que apesar do seu baixo valor os proprietários não estão

dispostos a vender a sua propriedade, bloqueando-a a investimentos que a

pudessem beneficiar.

Outro problema é a obsolência das actividades profissionais que aí decorrem. A

decadência do sector artesanal, a falta de atractividade do comércio tradicional,

suplantado pelos grandes centros comerciais, a pouca frequência de cafés dirigidos

aos residentes, funciona também como motor da desertificação, deixando as ruas

desertas mesmo durante o dia, e criando a impressão de se passar numa cidade

fantasma.

Outro ainda é o do empobrecimento dos residentes nos centros históricos,

associado ao envelhecimento da população, e também à falência de actividades.

Assim, mesmo que os proprietários estivessem de facto interessados em beneficiar

os seus lotes, não têm possibilidades materiais para o fazer, a menos que sejam

ajudados pelas autoridades públicas.

Associado a estes problemas surge o da insegurança, fomentada pelo aumento da

criminalidade, que não só sublinha o abandono das zonas como dissuade pessoas

que pudessem estar interessadas em passar a morar no centro histórico.

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Há assim uma densa malha de problemas a ensombrar os centros históricos. As

tentativas para os resolver são numerosas, e algumas delas são até antigas.

Contudo, só recentemente se começaram a ver resultados práticos, traduzidos em

melhorias nas condições de vida nesses bairros.

Para comprovar a existência destes problemas, bastar-nos-á atentar, por exemplo,

num estudo sócio-demográfico efectuado no início da presente década pela Câmara

Municipal de Leiria (Cabral Teles, et al., s/d), que através de questionários

colocados à população residente no Centro Histórico daquela cidade, concluiu que

em 6 hectares de espaço habitavam apenas 275 habitantes, divididos em 140

agregados, sendo que a 50% destes eram constituídos por apenas uma pessoa,

normalmente idosos, estudantes ou recém-licenciados. Destes agregados, 79,3%

vivem em casas sujeitas ao regime de arrendamento, tendo grande parte (45,6%)

destes contratos sido celebrados antes de 1979, ou seja, contratos muito antigos

que indiciam uma certa negligência dos proprietários relativamente aos edifícios

que possuem, deixando-os degradar-se, o que aliás salta à vista passeando pela

zona menos recuperada do Centro Histórico leiriense. Verifica-se ainda, neste

espaço, uma carência ao nível das infra-estruturas de cariz social e cultural, com

inexistência, por exemplo, de um lar de terceira idade ou de um centro de dia, que

poderiam apoiar a população envelhecida dessa zona. Contudo, apesar das

dificuldades que viver neste Centro Histórico ainda levanta, 91,4% dos inquiridos

afirmam pretender continuar a viver nessa zona, o que provavelmente terá a ver

com a composição da população residente: se os mais velhos não sentirão já

energia para abandonar o bairro onde vivem há já muito tempo (relembre-se a

quantidade de contratos de arrendamento celebrados antes de 1979 e ainda em

vigor), os mais novos, estudantes e recém-licenciados, encontram nos edifícios

recuperados um bom sítio para começar a sua vida, dotado de grande centralidade

em relação à cidade.

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2.3. – Soluções apresentadas para os problemas dos centros históricos À medida que os entendimentos sobre a natureza e importância dos centros

históricos se foram alterando, ao sabor das correntes de pensamento dominantes,

também as propostas apresentadas para a resolução dos seus problemas foram

mudando. Apresentar-se-á nesta parte do trabalho uma visão cronológica sumária

de algumas propostas com maior relevância e dos princípios que as informavam.

2.3.1. – A Carta de Atenas de 1933

Fruto do 4º Congresso Internacional de Arquitectura Moderna (CIAM) e fortemente

influenciada pela visão funcionalista de cidade defendida, entre outros, por Le

Corbusier, pela ideologia modernista que era ainda forte, e que se associou ao

advento dos regimes totalitários, e ainda herdeira do higienismo de Haussmann, a

que juntava determinas preocupações sociais (Rio Fernandes, 2006: 1), a Carta de

Atenas de 1933 deixa perceber o fascínio que a sociedade de então sentia com o

movimento, com a “velocidade mecânica”, várias vezes referenciada ao longo do

documento, um entendimento de que a vetustez e a morte atingem tanto as obras

como os seres, de que a cidade condiciona a formação dos seus habitantes, “assim

como o clima, a região, a raça e o costume” (CIAM, 1933: 3), e de que a saúde dos

indivíduos dependia, em muito, das condições naturais, a começar pela exposição

solar que impedia a tuberculose, na altura ainda bastante comum em populações

desfavorecidas.

No espírito descrito, o 4º CIAM concluía que a distribuição de áreas residenciais

pela área das cidades era contrária às imposições da higiene, desfavorecendo em

termos de saúde, limpeza e promiscuidade aqueles que eram, à partida,

desfavorecidos economicamente. Para contrariar esta tendência, defendia-se o

zoneamento das cidades. Este seria, segundo a definição oferecida pela própria

Carta, “a operação feita sobre um plano de cidade com o objectivo de atribuir a

cada função e a cada indivíduo o seu justo lugar” (CIAM, 1933: 5), e que requeria

mecanismos legais para ser posto em prática da forma desejada, isto é, separando

por completo as zonas destinadas à habitação, à indústria e mesmo à circulação de

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veículos, dadas as diferenças entre a “velocidade mecânica” e a dos peões, bem

como os incómodos causados pela poluição criada pelos veículos. Bem assim,

defendia que os planeadores de cidades deviam ter em conta tempos razoáveis

para as deslocações entre as diversas zonas da cidade, que não deveriam mais

crescer em anéis, mas de forma linear, com as indústrias e os meios de

comunicação de um lado da cidade, a zona habitacional noutra, separada da

primeira por uma parte arborizada, e o artesanato concentrado nos pontos mais

intensos da cidade (CIAM, 1933: 13).

Na parte da carta dedicada ao urbanismo, o 4º CIAM deixava bem claro que este

não se deveria deixar prender pelo estetismo, dado considerar que este devia ser

primordialmente funcional, subordinada à prossecução de três funções centrais:

habitar, trabalhar e recrear-se. Considerava ainda que o estado das cidades nessa

altura, não favorecia estas funções, pelo que o espaço urbano devia ser repensado,

ou mesmo reconstruído segundo estas directrizes.

A aplicação dos preceitos defendidos na Carta de Atenas de 1933 ajudou a criar um

certo “desprezo” pelos centros históricos das cidades, que pela estreiteza das suas

ruas e antiguidade dos seus edifícios, eram definidos como focos de doença,

pobreza e promiscuidade que deviam, para o bem da cidade e dos seus habitantes,

ser erradicados o quanto antes. De certa forma, um bom exemplo disto é a

construção, em Coimbra, da Biblioteca Geral da Universidade e das Faculdades de

Letras e de Medicina, numa zona histórica da cidade, para a criação de um conjunto

monumental ao gosto do regime totalitário vigente à época. Actualmente, embora

ainda sobre grande parte da zona histórica coimbrã, a verdade é que só podemos

imaginar os danos irreparáveis que esta construção teve para a unidade do Centro

Histórico de Coimbra, hoje em dia mais identificado com a zona da Almedina.

2.3.2. – A Carta de Veneza de 1964

Entendida como expansão da Carta de Atenas de 1933, e resultante do 2º

Congresso Internacional de Arquitectos e de Técnicos de Monumentos Históricos

(CIATMH), tem como principal contribuição a ideia, plasmada logo no seu 1º artigo

de que

A noção de monumento histórico engloba a criação arquitectónica isolada, bem como o sítio urbano ou rural que são o testemunho de uma

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civilização particular, de uma evolução significativa ou de um acontecimento histórico. Esta noção estende-se não somente às grandes criações mas também às obras modestas que adquiriram com o tempo um significado cultural. (CIATMH, 1964: 1)

Esta ideia ajuda, sem dúvida, à definição do próprio conceito de Centro Histórico

como hoje o entendemos, e que na Carta de Atenas de 1933 era ainda algo difusa,

e passível de confusão com as noções de bairro pobre ou de bairro crítico.

Estendeu-se também a noção de monumento, que passou agora a englobar não só

o elemento em si, como também o que o circunda, o enquadramento que

condiciona a sua visão global.

2.3.3. – Recomendação Relativa à Salvaguarda dos Conjuntos Históricos e sua Função na Vida Contemporânea (1976)

Assinada em Nairobi, em 1976, durante a 19ª sessão da UNESCO, e reflectindo o

espírito da altura em que foi redigida, alertava para os perigos da uniformização e

da despersonalização (UNESCO,1976: 1) e considerava o legado histórico das

cidades como fulcral para os combater. Avança uma definição de conjunto histórico

ou tradicional que abrangia todas as construções e espaços que constituíssem um

assentamento humano com coesão e valor reconhecidos, a que junta duas

importantes noções: a de ambiência, ou seja, o enquadramento desses conjuntos,

e o de salvaguarda, isto é, a identificação, protecção, conservação, restauração,

reabilitação, manutenção e revitalização dos mesmos, que regulava amplamente,

apelando a que os países membros criassem políticas específicas para aplicação nos

seus territórios, apoiadas em conceitos científicos retirados de estudos

multidisciplinares.

A Carta de Nairobi, especialmente pela definição dos conceitos de ambiência e

salvaguarda, foi extremamente importante, oferecendo léxico e espírito às

operações a fazer em bairros e monumentos históricos. Foi também a primeira vez

que se mencionou a importância da constituição de equipas multidisciplinares, com

arquitectos, urbanistas, historiadores, arqueólogos, sociólogos, especialistas em

saúde pública, etc., como importante para se atingir uma compreensão adequada

dos centros históricos, indispensável para a sua preservação, nos seus elementos

mais importantes e característicos, sem recorrer a mudanças demasiado radicais

nos seus contextos.

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2.3.4. – Carta Internacional para a Salvaguarda das Cidades Históricas (1986)

Assinada no ano de 1986, em Washington, pelo Conselho Internacional de

Monumentos e Sítios e entendida como complemento à Carta de Veneza de 1964,

alarga mais um pouco o conceito do que é considerado como histórico,

reconhecendo que todas as cidades do mundo, independentemente da data da sua

fundação, são o espelho da história e dos valores das sociedades que as habitaram.

Ao contrário da Carta de Veneza de 1933, defende veementemente a preservação

do carácter histórico e dos elementos materiais e espirituais que formam a cidade,

nomeadamente, como o traçado das ruas, as relações entre os diversos espaços

citadinos, a forma e aspecto dos edifícios e as relações da cidade com o que a

rodeia. Pela primeira vez se defende a criação de planos de educação para a

cidadania, no intento de sensibilizar, desde tenra idade, os cidadãos para a

preservação do carácter histórico da cidade.

Esta Carta constituiu mais um avanço significativo no entendimento do carácter

singular dos centros históricos e da sua importância, que devia inclusivamente ser

ensinada, para inculcar por eles um respeito especial. Cinquenta e três anos depois

da Carta de Atenas, percebia-se já um carinho completamente diferente pelas

zonas históricas, que influenciou o tratamento que lhes era concedido, e que ao

longo dos anos 90 foi continuamente melhorando.

2.3.5. – Nova Carta de Atenas (2003)

Assinada em Lisboa, no ano de 2003, pelo Conselho Europeu de Planeadores de

Cidades (European Council of Town Planners), tinha como objectivo explícito a

renovação da Carta de Atenas assinada 70 anos antes, já sob o espírito do início do

séc. XXI. Defendeu-se aqui a criação de uma rede europeia de cidades que

mantivessem a sua riqueza e diversidade cultural, integrando os elementos

construídos e naturais do ambiente. A par dos novos fenómenos de imigração,

defende também a riqueza multicultural das novas cidades, considerando que a

miscigenação cultural deve ser encorajada, representando uma das riquezas das

cidades.

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É então uma visão moderna de cidade, entendida como centro criativo e dinâmico

da vida em sociedade que caracteriza a Nova Carta de Atenas, mas cujas

repercussões estão ainda para ser entendidas.

2.3.6. – Legislação Portuguesa para a Conservação e Reabilitação de Centros Históricos

2.3.6.1. – Ponto Prévio

A legislação recente sobre a conservação e reabilitação dos centros históricos em

Portugal tem-se centrado na criação de programas generalizados de recuperação

urbana. Estes, como observa Matos Fernandes (2002: 70), podem-se dividir

segundo uma tipologia bipartida, de acordo com o financiamento (nacional ou

comunitário), ou de acordo com a promoção (por parte dos organismos de

“desenvolvimento” ou dos de “ordenamento do território ou do ambiente”). Dentro

do primeiro tipo, a diferença prende-se sobretudo com o superior financiamento

consignado àqueles que são financiados pela Comunidade Europeia, não se

podendo apontar substanciais diferenças no que toca às exigências de aprovação.

Dentro do segundo tipo, porém, as diferenças são mais acentuadas, estando

aqueles que são promovidos por organismos de “ordenamento do território ou do

ambiente” mais presos a questões meramente materiais, enquanto que os outros,

promovidos por organismos de “desenvolvimento”, tomam mais atenção à vertente

imaterial, nomeadamente no que toca às questões sociais e de criação de

actividade.

Para que um projecto de reabilitação possa ser verdadeiramente integrado, terá de

significar, para a área a que é aplicado, mais do que a mera realização de obras.

2.3.6.2. – Menções ao tema no Programa do XVII Governo Constitucional

O Programa de Governo do executivo em funções no final de 2008 mencionava, de

forma sumária, a política de Reabilitação como estando em articulação com a sua

política de Habitação. As medidas previstas prendiam-se com um “pacto para a

modernização do património habitacional” que concentraria o conjunto de apoios à

reabilitação de edifícios, com a dinamização das Sociedades de Reabilitação Urbana

(SRU) e com o enquadramento de uma penalização fiscal ou administrativa dos

proprietários de imóveis ou fracções devolutas (Portal do Governo, 2005: 101).

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2.3.6.3. – Sociedades de Reabilitação Urbana – Decreto-Lei 104-2004

O texto introdutório ao Decreto-Lei 104-2004 (Conselho de Ministros, 2004: 1)

reconhece a imperatividade de intervir em áreas do país com degradadas condições

de habitabilidade, salubridade, estética e segurança, em particular nas zonas

urbanas históricas, e define os princípios porque se deve reger a sua reabilitação.

Destes, os mais importantes são os da responsabilidade dos municípios pela

reabilitação do seu território, que lhes dá legitimidade para criarem SRUs, a que

são atribuídos poderes de expropriação [que, para Paulo Trindade, tem uma função

sobretudo dissuasora (Filipe, 2006: 10)] e de licenciamento, da concessão de meios

efectivos de intervenção aos poderes públicos, nomeadamente através das mesmas

SRU, o da ponderação de direitos e obrigações dos proprietários e protecção dos

direitos dos arrendatários, cujos direitos são reforçados em caso de expropriação,

prevendo o direito de suspensão do contrato e de reocupação do imóvel.

As SRU são, então, de acordo com a parte normativa do Decreto em questão,

empresas de capitais públicos e/ou privados, cujo objecto social é a promoção da

reabilitação urbana das respectivas zonas de intervenção, que devem também ser

identificadas no seu acto de constituição. A sua capacidade de tomar posse

administrativa dos bens imóveis e de os colocar à venda a preço de mercado

permite-lhes serem ressarcidas dos investimentos efectuados, garantindo a sua

sustentabilidade financeira. De grande importância é também a estreita

colaboração que ajudam a criar entre o município e os privados. Neste momento,

existem já SRU em diversas cidades portuguesas, incluindo Coimbra, Évora, Viseu,

Lisboa e Porto.

2.3.6.3. – Projectos Polis

Os Projectos Polis, também a decorrer em várias cidades do país têm como

objectivos a realização de grandes operações integradas de requalificação, e de

acções que contribuam para a requalificação e revitalização de centros urbanos,

promovendo a sua multifuncionalidade, bem como o apoio a outras acções de

requalificação que permitam melhorar a qualidade do ambiente urbano, valorizar a

presença de elementos ambientais como frentes de rio ou de costa e a iniciativas

que visem aumentar zonas verdes, promover áreas pedonais e condicionar o

trânsito automóvel em centros urbanos (Matos Fernandes, 2002: 71)

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As principais diferenças do Polis relativamente a outros programas desenvolvidos

anteriormente, para além da noção de escala conferida às “grandes operações

integradas”, prendem-se com a intervenção mais directa do Estado Central em

matérias locais, com a vontade de concentrar investimento num número

significativo de cidades, cuidadosamente escolhidas, com a obrigação de criar

Planos de Pormenor, que serão importantes para o futuro das cidades escolhidas.

(Matos Fernandes, 2002: 73)

Este projecto foi, de imediato, acolhido com entusiasmo por muitas autarquias

portuguesas, que se candidataram a participar nele, havendo já resultados visíveis

em muitas das cidades em que houve intervenções, casos por exemplo de Leiria e

Castelo Branco. Este projecto, porém, não era somente destinado à requalificação

de centros históricos, o que levou a que em certas cidades, essas áreas não fossem

sujeitas à intervenção que mereciam, e que a quantidade de verbas disponibilizadas

no contexto dos Programas Polis pareciam possibilitar.

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3. – Descrição detalhada da pesquisa No interesse de poupar algum tempo precioso, mesmo antes de começar a

pesquisa procurei delimitar, a partir dos conhecimentos que dispunha, o campo do

trabalho que pretendia realizar. Naturalmente, com o progredir do trabalho e

crescimento do meu entendimento sobre a matéria, este não se manteve

inalterado, tendo-lhe sido acrescentadas importantes partes, como a análise dos

documentos emanados de organizações internacionais.

Com o intuito de procurar as fontes de informação necessárias à concretização

deste trabalho, comecei por recorrer ao manancial mais próximo de mim, a

Biblioteca da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra onde, através da

pesquisa no seu catálogo on-line consegui identificar algum material de interesse.

Seguidamente, e sabendo da já referida participação de alguns familiares em

projectos de reabilitação urbana de Leiria, procurei ainda mais material nos seus

arquivos, tendo encontrado material repetido, ao mesmo tempo que encontrava

alguns dados relativos àquela cidade, cujo acesso não seria tão fácil de outra

forma. Outro local em que procurei, mas sem tanto êxito, foi na Biblioteca

Municipal Afonso Lopes Vieira, em Leiria, que está destinada a um público mais

geral, não contendo as informações actualizadas de que precisava.

Actualmente, uma das formas mais fáceis de aceder a fontes de informação é a

Internet, pelo que também aí pesquisei, tanto na Biblioteca do Conhecimento On-

Line (B-on), como através de diversas pesquisas no motor “Google”, aquele que

actualmente consegue devolver mais resultados, fruto das potencialidades do seu

logaritmo de pesquisa. Comecei esta tarefa com uma pesquisa relativa à frase

completa “reabilitação de centros históricos”, que devolveu 466 resultados, dos

quais procurei extrair alguma informação. Utilizando as ferramentas de pesquisa

avançada para obter apenas resultados em formato .pdf, consegui restringir os

resultados a 117, incluindo alguns trabalhos de alunos desta unidade curricular de

anos anteriores, que filtrei. Repetindo a pesquisa no motor “Yahoo” obtive 362

resultados, muitos deles repetidos, pelo que decidi abandonar a experiência.

Reunidos os dados, estava na altura de os começar a cruzar, para chegar a uma

perspectiva mais abrangente.

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4.- Avaliação de uma Página Web

O sítio web escolhido para fazer a avaliação requerida no contexto deste trabalho

foi a página da Coimbra Viva - Sociedade de Reabilitação Urbana, pela sua estreita

conexão com o tema escolhido. É precisamente esse o nome do site, que pode ser

encontrado em http://www.coimbravivasru.pt/, cuja intenção é a de informar um

público generalizado da estrutura, planos e unidades de intervenção da SRU

coimbrã, bem como fornecer diversas hiperligações a legislação sobre o tema. A

língua original da página é a portuguesa, não havendo possibilidade de a consultar

em outras línguas. A página foi consultada no dia 22 de Dezembro de 2008.

O webdesigner responsável pela concepção da página foi João Ferrand, e o

responsável pelo web development foi João Melo, pela Coimbra Viva – Sociedade de

Reabilitação Urbana, que é uma empresa pública com capitais maioritariamente

privados, que se exprime em nome institucional. Estão disponíveis os e-mails dos

dois responsáveis pela página, com hiperligações bem visíveis.

O endereço URL da página não podia ser mais intuitivo, dado não conter mais que o

nome da empresa e o domínio .pt, relativo a Portugal. A navegação pelos

conteúdos é simples e intuitiva, graças a um design apelativo mas eficaz, apesar de

não dispor de uma ferramenta de pesquisa. Não existe qualquer publicidade no

site, e também não existem “cold links” que prejudiquem a navegação. As ligações

disponíveis são, em regra, úteis ao utilizador, sendo sobretudo para legislação a

propósito do tema. Na página inicial encontramos informações gerais, alguns

excertos de notícias relativas ao tema, com ligações para o seu desenvolvimento,

para além de ligações a 4 diferentes partes do site, relativas à estrutura da SRU, às

suas áreas de intervenção, a perguntas frequentes e a outras informações.

Quanto aos seus conteúdos e alcance, o site da Coimbra Viva – SRU, disponibiliza

sobretudo informação destinada a um público não muito especializado na matéria,

pelo que se adequa à consulta pela maior parte da população, mesmo que

desprovida de grandes conhecimentos sobre urbanismo ou arquitectura, sendo esta

informação apresentada de forma organizada e relativamente metódica, claramente

redigida. A disponibilização de mapas ajuda à consulta do site, à percepção dos

planos de reabilitação ligados à Sociedade, e à confirmação de dados fornecidos por

outras fontes consultadas durante a realização do trabalho, como a revista

Arquitecturas de Fevereiro de 2006. A data da última actualização da página não

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está disponível, e através de pesquisa no motor “Google”, não encontrei outras

páginas que a esta ligassem.

Quanto ao grafismo que, como se disse, é atractivo e simples, pode-se acrescentar

que o texto disponível é facilmente legível, com um formato adequado, sem

grandes peculiaridades de design, e a maior parte das imagens, como os mapas

são úteis e interessantes. Recorrendo à ferramenta de pré-visualização de

impressão do Mozilla Firefox, parece que a versão do site para impressão está bem

formatada, de forma a permitir uma percepção clara da página, em formato papel.

Como se referiu, este site revestiu alguma importância para parte do trabalho

realizado, embora cubra apenas um dos pontos de que trata, precisamente o

trabalho das Sociedades de Reabilitação Urbana e, particularmente, da de Coimbra

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5. – Ficha de Leitura

O livro escolhido para a elaboração da Ficha de Leitura requerida neste trabalho

tem por título “A Cidade e o Urbanismo”, da autoria de Jean-Paul Lacaze e

traduzido por Magda Bigotte de Figueiredo. Encontra-se disponível na Biblioteca da

Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, com a cota 711.4 LAC. A

edição portuguesa é do Instituto Piaget e tem o depósito legal nº 130 908/99. Foi

editado na cidade de Lisboa, no ano de 1999, e tem 141 páginas.

Jean-Paul Lacaze é engenheiro de pontes e professor de Urbanismo na Escola

Superior de Ciências Económicas e Comerciais, em França.

O capítulo escolhido para a elaboração desta ficha de leitura é o primeiro do livro,

tem como título “As Cidades” e tem 13 páginas. As palavras e expressões que

considero como sendo chaves para a compreensão deste capítulo são: cidade,

função, organização social, urbanismo, bairro, centro, rede viária, espaço

económico, mutação, localização, renda de situação, costume social, liberdade,

inovação, escolha, apropriação do espaço, e descentralização.

Apesar de não focar directamente a questão dos centros históricos, Jean-Paul

Lacaze começa por chamar a atenção para a oposição histórica entre cidade e

campo, que tradicionalmente era marcada pela existência de uma muralha, após o

que enumera aqueles que considera terem sido os três papéis fundamentais e

complementares entre si da cidade na Idade Média: em primeiro lugar, o comércio

que estabelecia a ligação entre a cidade e o campo, com o constante fluxo de

camponeses que aí se deslocavam para trocar produtos artigos por outros que

eram mais fáceis de encontrar num contexto urbano e que é uma função que a

cidade como a entendemos hoje ainda desempenha; em segundo, sublinha a

importância que o estabelecimento de cidades teve no transcender das primitivas

formas de organização do trabalho, pela necessidade de construir determinados

edifícios, como silos para guardar cereais e de protecção contra grupos rivais,

importante desde a revolução neolítica praticamente até à modernidade. A terceira

função fulcral destacada pelo autor é a potenciação da inventividade humana, que

permitiu que este de alguma forma se libertasse das leis da natureza e modificasse

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as relações que estabelece com o seu semelhante. Esta última alteração foi

também crucial para a evolução da organização dos poderes públicos, desde o

Estado personificado com um rei cujo poder era absoluto e derivado da vontade de

Deus, até ao Estado de direito, e que na Idade Média e no Renascimento fazia com

que as cidades contrastassem mais ainda com o meio rural.

Depois desta introdução, Lacaze passa a caracterizar a cidade como um objecto

polissémico. Com efeito, a cidade surge, primordialmente, como sítio natural no

espaço geográfico, mas também como complemento do espaço rural e como

aproveitamento humano de determinadas oportunidades, como a existência de

jazidas.

Outro aspecto a levar em linha de conta é o facto de o local construído “tomar

posse” do local natural, pelas modificações que lhe faz. A cidade tem como

“ossatura” as suas redes viárias, e está normalmente organizada em bairros

especializados, tendo o seu centro normalmente numa convergência desses

caminhos. É aí que se situam os locais de poder, os monumentos, as lojas mais

raras e caras e as actividades mais especializadas. É também aí o espaço

privilegiado de reunião dos citadinos, por ocasião de festas ou outros grandes

acontecimentos: é o centro o espaço por natureza da multidão. O centro

desempenha ainda um duplo papel simbólico, sendo fulcral na construção da

identidade dos seus habitantes relativamente à sua cidade, mas é também a

imagem que os turistas levam consigo quando a visitam, é a súmula da cidade, o

seu postal.

Para além do sítio para viver, a cidade é também porventura o mais importante

ponto do espaço económico. Com efeito, é lá que se concentram as actividades

produtivas, de troca, de consumo, industriais e de serviços. Estas duas últimas

actividades mencionadas têm, aliás, uma importância crucial para a cidade. A

primeira destas foi responsável por um aumento rápido das cidades aquando da

Revolução industrial, dando origem a uma dispersão pouco planeada da cidade,

com o aparecimento de pobres bairros operários, enquanto que a segunda se

encontrava mais ligada à organização tradicional da cidade, procurando as

profissões liberais e as outras actividades que necessitam de escritórios para se

desenrolar o seu lugar no centro da cidade, mesmo que pagando rendas altas.

Contudo, mais recentemente, o seu crescimento deu origem a uma necessidade de

novos espaços, criados especificamente para esse propósito, dando origem a uma

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nova dispersão. Daqui, Lacaze retira o papel determinante das mutações

económicas para a cidade, estabelecendo uma relação de proporcionalidade directa

entre a vitalidade económica de determinado lugar e o valor do seu solo, já que as

empresas estarão sempre dispostas a pagar avultadas rendas de situação, dada a

utilidade que esses locais revestem para elas, traduzida sobretudo na facilidade de

contacto.

Para além disto, a cidade é, indubitavelmente, um espaço social privilegiado, onde

a sociedade é mais tolerante, onde há, por conseguinte maior liberdade, que se

traduz na possibilidade de anonimato que permite a fuga ao controlo social, o que

ainda se tornou mais importante nos dias de individualismo que vivemos. Ao

mesmo tempo, a cidade é também um lugar privilegiado de reprodução dos

costumes sociais, tendo cada um o espaço de que necessita para aprender a

desempenhar o papel que deseja, permitindo uma mais eficaz mobilidade social.

Fundamental ainda na cidade é o aumento da capacidade de escolha que os

citadinos têm em relação aos habitantes de meios rurais. Esta pode ser vista na

forma como as modas “pegam” melhor e mais depressa nas cidade que noutros

meios, mas têm uma consequência mais profunda quando toca às questões de

urbanismo ou de arquitectura. Com efeito, mais nas cidades que nos campos, o

utilizador é a medida do sucesso de qualquer intervenção dessa natureza, o que

torna o processo de apropriação do espaço mais decisiva ainda. Este processo de

apropriação refere-se ao estabelecimento de relações afectivas com os lugares, que

faz com que as pessoas não sintam vontade de os abandonar, e é um processo

muito lento, o que implica que quando se trata de urbanismo residencial, por

exemplo, a maneira de proceder é, muitas vezes, mais importante que a própria

intervenção. Diferente é a lógica que deve presidir às obras ditas de grande

urbanismo, dadas as suas referências serem, de todo, diferentes.

O último assunto abordado por Lacaze neste primeiro capítulo é o da virtude que

representa a complexidade da sociedade urbana ao nível da exigência

relativamente aos modos de regulamentação administrativa e política, que se lhe

devem adaptar. Dá o exemplo do Reino Unido, onde os municípios urbanos dispõem

de poderes diferentes dos rurais, e onde o poder é mais descentralizado do que,

por exemplo, na sua França natal.

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Este texto reveste uma natureza fundamentalmente explicativa, quase de manual,

mas a sua clareza é cristalina, o que permite uma mais fácil apreensão de conceitos

fundamentais sobre a cidade e sobre o urbanismo, que se revelam de extrema

importância e utilidade quando queremos perceber o Centro Histórico. Funciona,

então, como um óptimo texto introdutório ao tema, até por ser escrito por alguém

que vem de um background mais técnico, de certa forma afastado do horizonte das

Ciências Sociais, o que permite também comparar algumas pontos de vista

diferentes sobre a questão, o que é sempre pertinente.

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6. Conclusão

Mesmo que a cidade tivesse poucos edifícios que fossem património histórico para o país, essas edificações representam e são importantes para a cidade. Às vezes uma velha fábrica como referência é tão importante como é um edifício de grande valor para a cidade. A cidade é como uma fotografia de família. Você vê o retrato de família e pode não gostar de um tio ou de uma tia, mas não o rasga porque esse retrato é você mesmo (Lerner apud Barreiras Duarte, 2003)

Aquilo a que hoje chamamos Centro Histórico não é mais do que a parte da cidade

que existe há mais tempo. Se, inicialmente, era o coração da cidade, a parte mais

viva, onde morava a maior fatia da população, com o alargamento do espaço

ocupado e com o decorrer do tempo, que vai exercendo uma paulatina erosão nas

pessoas mas também nas coisas, ele foi quase esquecido, abandonado por grande

parte dos seus residentes, pelas actividades que aí eram exercidas e pelas políticas

aplicadas por aqueles que para isso tinham autoridade. Por pouco, a maioria destes

centros históricos não se transformou em cidades fantasmas, apenas visitadas por

turistas e apenas em ocasiões especiais pelos habitantes da cidade. Este

esquecimento foi causado não só pelos factores espontâneos que levam a que as

pessoas morram, ou mudem de casa, ou que a própria casa se torne inabitável,

mas também por visões que vigoraram durante grande parte do século XX e que

menorizavam a importância simbólica dos centros históricos, considerando-os

pouco mais que pobres bairros cuja única solução seria o bulldozer que os

destruísse, para dar lugar aos bairros de um “progresso” pouco mais que utópico.

Contudo, com o evoluir da história do século passado e do início deste, houve

importantes contributos para uma melhor compreensão do Centro Histórico com

todo o significado e autenticidade que encerra. Porém, face ao avançado estado de

degradação em que a maioria deles se encontravam, e ainda infelizmente se

encontram, torna-se necessário um demorado e complexo processo de reabilitação,

que se percebe que só será possível uma vez diagnosticados todos os problemas de

que padecem. Para isto, é necessária a constituição de equipas multidisciplinares

especializadas, que para além de identificar problemas, os apresentem juntamente

com propostas de resolução às autoridades competentes. Depois, é ainda preciso

que estas autoridades, tantas vezes forças de bloqueio, percebam da importância

do recurso que têm em mãos e se mobilizem nesse sentido com estratégia e, como

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diz Jaime Lerner, um dos mais importantes urbanistas brasileiros, responsável pela

requalificação da área urbana de Curitiba, com sensibilidade, porque

A cidade exige sensibilidade, não é um somatório de “espertezas”, mas de gente que a sente segundo a sua própria formação, de maneira diferente, mas cada um com a sua contribuição.(…) tem que existir, antes de mais, uma concepção de cidade simples(…) até agora não se inventou nada melhor que a rua tradicional, que é a síntese de uma cidade onde todas as funções estão juntas: moradia, trabalho e lazer. (Lerner apud Barreiras Duarte, 2003)

A cidade define-nos, e somos tão parte dela como ela é parte de nós. Estar a

descurar uma parte dela, ainda por cima uma parte tão importante é, no mínimo

irresponsável. Só nos resta, então, pôr mãos à obra!

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7. Referências Bibliográficas

7.1 – Material Impresso

Barreiras Duarte, Rui (2003), “Entrevista a Jaime Lerner”, Revista Arquitectura e Vida nº39, Junho 2003 Cabral Teles, Manuel; Dias, Miguel; Baena Mendes, Vitória (orgs) (s/d) “Reabilitar e Requalificar o Centro Histórico de Leiria”. Leiria: Câmara Municipal de Leiria CIAM - Assembleia do Congresso Internacional de Arquitectura Moderna (1933), Carta de Atenas de 1933. Atenas: Congresso Internacional de Arquitectura Moderna CIATMH - 2º Congresso Internacional de Arquitectos e de Técnicos de Monumentos Históricos (1964) Carta de Veneza. Veneza: Congresso Internacional de Arquitectura Moderna Conselho Europeu de Planeadores de Cidades (European Council of Town Planners) (2003) A Visão dos Planeadores de Cidades para as Cidades do séc. XXI – Nova Carta de Atenas. Lisboa: Conselho Europeu de Planeadores de Cidades Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (1986) Carta Internacional para a Salvaguarda de Cidades Históricas. Washington: Conselho Internacional de Monumentos e Sítios Conselho de Ministros de 17 de Janeiro (2004), Decreto-Lei 104-2004. Lisboa: Diário da República Filipe, Joana (2006) “Quem paga a conta da reabilitação?”. Revista Arquitecturas nº9, Fevereiro 2006 Lacaze, Jean-Paul (1999), A Cidade e o Urbanismo. Lisboa: Instituto Piaget Matos Fernandes, João Pedro (2002) “Reabilitação Urbana – Experiências recentes do Programa Polis”. Revista Cidades nº5, Dezembro 2002 pp.69-79 Rodrigues da Silva (2007) “Entrevista a Gonçalo Byrne”, Jornal de Letras, edição de 17-30 Janeiro 2007, pp 6-9 UNESCO – 19ª Sessão da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (1976), Recomendação Relativa à Salvaguarda dos Conjuntos Históricos e sua Função na Vida Contemporânea. Nairobi: UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

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Fontes de Informação Sociológica – Reabilitação de Centros Históricos

Faculdade de Economia – Universidade de Coimbra 27

7.2 – Material On-line

Portal do Governo (2005) “Programa do XVII Governo Constitucional”. Página consultada a 26 de Dezembro de 2008 <http://www.portugal.gov.pt/NR/rdonlyres/ 631A5B3F-5470-4AD7-AE0F-D8324A3AF401/0/ProgramaGovernoXVII.pdf> Rio Fernandes, José Alberto (2006) “Reabilitação de Centros Históricos e Reutilização da Cidade: O Caso de Porto-Gaia - 1º Ciclo de Cinema e Urbanismo”. Página consultada a 27 de Dezembro de 2008 <http://www.porto.taf.net/dp/files/ 20061114-portogaia.pdf>

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ANEXO A Página da Internet avaliada

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ANEXO B Texto de Suporte da ficha de leitura

O Capítulo seleccionado foi o 1º, “As Cidades”, do livro “A Cidade e o Urbanismo”,

da autoria de Jean-Paul Lacaze