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1 JOSIANE SCHWEITZER CRIAÇÃO E AÇÃO DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO EM SANTA CATARINA NO PERÍODO DE 1935 A 1942: a educação no período Vargas FLORIANÓPOLIS, 2008

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JOSIANE SCHWEITZER

CRIAÇÃO E AÇÃO DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO EM SANTA CATARINA

NO PERÍODO DE 1935 A 1942: a educação no período Vargas

FLORIANÓPOLIS, 2008

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JOSIANE SCHWEITZER

CRIAÇÃO E AÇÃO DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO EM SANTA CATARINA

NO PERÍODO DE 1935 A 1942: a educação no período Vargas

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Educação, sob a orientação da Professora Doutora Marli Auras.

FLORIANÓPOLIS, 2008

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Dedico este trabalho aos meus pais José Antônio e Nilza, pelo amor incomparável e por serem meu maior alicerce.

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AGRADECIMENTOS Meu agradecimento especial à Professora Marli Auras, que se tornou em minha vida

uma referência de mulher e de educadora. Pelo seu fundamental estímulo, encorajando-me

na busca pelo conhecimento. Sua competência intelectual e o rigor de suas análises me

proporcionaram a segurança necessária para concluir este trabalho. A ela, muito obrigada

pela disponibilidade, compreensão, amizade e orientação.

Aos meus irmãos Maria Cristina, Elaine e Jessé Alberto e aos sobrinhos Beatriz e

Pedro, que dividem comigo a alegria de pertencer a esta família.

Aos cunhados Carlos Eduardo e Maurício e à cunhada Marina pelos momentos de

amizade e descontração em família, que foram muito importantes para esta caminhada.

Ao professor Carlos Eduardo dos Reis e a professora Gladys Mary Ghizoni Teive

pelas importantes considerações apresentadas em minha qualificação.

Aos amigos que fizeram parte deste momento tão importante para mim, através de

sua amizade, conselhos e companheirismo, possibilitando-me superar as dificuldades e

dividindo comigo as alegrias. São eles, Íris L. de Siqueira, Dinara Castilhos, Thaís

Pinheiro, Rosa H. Gaio, Laudemir de Campos. A eles quero expressar um profundo

carinho, pelo que significam em minha vida. E a Danilo Almeida por todo o incentivo e

torcida para meu progresso acadêmico.

Aos colegas de curso, em especial às amigas Inês Oliveira e Jucilaine Zucco, pela

troca de experiências e amizade compartilhada, indispensáveis em todas as horas,

principalmente naquelas de ansiedade e preocupação.

A todos os amigos e colegas, que através de gestos e palavras me estimularam à

buscar essa conquista.

Às funcionárias do PPGE, especialmente à Sônia, por sua colaboração e amizade.

Aos funcionários do Arquivo Público do Estado de Santa Catarina; da Biblioteca

Central da UFSC; da Biblioteca Pública do Estado de Santa Catarina; da Assembléia

Legislativa do Estado de Santa Catarina e do Instituto Histórico e Geográfico do Estado de

Santa Catarina.

Ao CNPq, entidade financiadora desta pesquisa.

A todos aqueles que de alguma forma contribuíram para a concretização deste

trabalho. Obrigada

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO 1. Considerações Iniciais 03 2. Antecedentes desta pesquisa: a educação no Brasil monárquico 09 3. O tempo desta pesquisa: a educação no Brasil republicano 14 4. O trabalho com as fontes 21 CAPÍTULO I: OS ANOS 1930 E 1940: elementos contextuais e educacionais brasileiros e catarinenses 1. Considerações Iniciais 24 2. O contexto educacional brasileiro 27 3. O contexto educacional catarinense 34 CAPÍTULO II: INSTITUCIONALIZAÇÃO DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO 1. Considerações iniciais 46 2. O Decreto 713: a Reforma Trindade 49 3. A formação de professores 59 4 . A obrigatoriedade do ensino 70 4. 1. Breve trajetória da obrigatoriedade escolar no Brasil e em Santa Catarina 71 4.2. A obrigatoriedade na pauta da legislação dos nos de 1930 78 4. 3. A obrigatoriedade no processo de expansão escolar 87 CONSIDERAÇÕES FINAIS 94 ANEXOS 99 GLOSSÁRIO DAS FONTES 103 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 105

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RESUMO

O presente estudo situa-se no campo de investigação da História da Educação e se

propõe a apresentar o processo de criação e atuação do Departamento de Educação no

Estado de Santa Catarina, no período de 1935 a 1942. Pretende-se, a partir da análise dos

dados coligidos em fontes primárias, analisar os principais mecanismos institucionais

utilizados para conduzir a educação catarinense, identificando os interesses econômico-

sociais e políticos que se evidenciaram na legislação e na administração das questões

educacionais. Busca-se compreender como a constituição do Departamento de Educação

fez parte de um processo de complexificação administrativo empreendido pelo governo do

Estado, na pretensão de responder à demanda de modernização da sociedade desencadeada

pelo Estado Nacional. Destaca-se a propalada importância da formação de professores e

da obrigatoriedade do ensino, podendo-se observar o quanto o Estado anunciava estes

aspectos educacionais como elementos necessários para o alcance da propugnada

modernização, sem, no entanto, encaminhar de maneira efetiva investimentos decisivos

capazes de garantir a oferta de educação para as crianças em idade escolar.

Palavras-chave: História da Educação, Obrigatoriedade Escolar, Formação de Professores,

Legislação educacional e Instrução Pública.

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INTRODUÇÃO

1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Esta pesquisa situa-se no campo da História da Educação e aborda a trajetória do

Departamento de Educação no Estado de Santa Catarina, desde sua criação em 1935, vinculado

inicialmente à Secretaria dos Negócios do Interior e Justiça, até o ano de 1942, quando se

tornou subordinado à Secretaria de Justiça, Educação e Saúde.

A proposta deste estudo é tentar compreender o processo de criação do Departamento

de Educação no território catarinense, ocorrido no ano de 1935, no contexto de reestruturação

nacional que então acontecia no sistema de ensino. O novo órgão constituiu-se a partir da

antiga Diretoria da Instrução Pública do Estado, que, pelo decreto nº 713, do ano de 1935,

passou a denominar-se Departamento de Educação do Estado de Santa Catarina. Busca-se,

portanto, estabelecer a relação entre a criação e atuação do Departamento de Educação com a

conjuntura política e econômico-social do período, procurando identificar na legislação

educacional catarinense os principais mecanismos institucionais utilizados para conduzir a

educação na esfera estadual, bem como situar quais os interesses sociais e políticos que

permeavam essas normas legais.

Ao observar-se a História da Educação Brasileira, é possível perceber o quanto a

educação escolar é um forte elemento legitimador das políticas de manutenção da ordem social

vigente. Ela integra o movimento dinâmico da teia de relações sociais como atividade

mediadora entre as tensões e as concessões que são estabelecidas na busca de legitimação da

estrutura social. Ao compreendê-la como campo de disputa hegemônica, percebe-se a

educação como mediação no âmbito da (des)constituição da sociedade. Desde o século XIX,

verifica-se nos projetos políticos para esta área como o Estado brasileiro conduziu as questões

educacionais de acordo com os interesses hegemônicos, para atender, sobretudo, ao segmento

social dominante.

Apesar de a História da Educação Brasileira, durante o período imperial, não ter ainda

alcançado a devida relevância por parte da historiografia, pode-se afirmar que o tema educação

esteve sempre em pauta no cenário político do país. No desafio de formação do Estado-Nação,

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a educação se apresentou como campo de disputa no âmbito da constituição do projeto da

sociedade brasileira. O ideário relativo à nação partia da necessidade da divulgação e aceitação

da idéia de pertencimento a um conjunto maior, a pátria, e para constituir e integrar este

espaço, fazia-se mister civilizar, educar o povo brasileiro nos moldes da modernidade.

A educação foi se estabelecendo, ao longo do período imperial, como elemento

constituidor/desconstituidor dos setores sociais, durante todo o século XIX, na construção do

projeto de formação da sociedade brasileira, estruturado pela elite dominante, interessada em

manter seus privilégios, identificados, nesse momento, principalmente com a reprodução da

escravatura. Apesar de não ser esta elite um bloco monolítico, pois liberais e conservadores

divergiam, por exemplo, na formulação dos ideais políticos de centralização e descentralização,

a escravatura era um tema pertinente a ambos os grupos. A propalada necessidade de inserção

do país nos moldes liberais de nação chocava-se com a manutenção da exploração do trabalho

cativo. A partir do momento em que a formação do Estado Nacional foi sendo articulada com

a necessidade de civilizar o indivíduo a fim de colocar o país no horizonte do liberalismo, a

importação das idéias liberais, pautadas nos princípios de liberdade individual e de igualdade

de todos, entendidos como “direitos universais”, precisou ser adaptada às demandas dessa

sociedade escravocrata, cujo direito à propriedade legitimava tal sistema escravista. O

ajustamento do liberalismo no Brasil foi promovido pela elite nacional, que “não estava

preparada para abolir a escravidão e tampouco percebia contradição alguma entre liberalismo e

escravidão” (COSTA, p.137).

Através da educação, se definiram determinados discursos políticos que a entendiam

como pertinente ao processo de constituição de uma nação civilizada. Havia, desta maneira,

uma preocupação em se determinar o tipo de educação que se pretendia para os brasileiros. A

instrução escolar deveria estar vinculada ao cuidado de ensinar para o acatamento da ordem,

então entendida como condição inarredável para se atingir o progresso da nação. Assim,

assumir a responsabilidade política de estabelecer a transição da sociedade escravocrata para a

sociedade livre, no fim do século XIX, apresentava-se como estratégia disciplinadora que a

elite dominante do país tomou para si.

A passagem do século XIX para o século XX marcou a formação da República e a

continuidade do projeto liberal, que no Brasil, se configurou através da valorização da

propriedade em detrimento dos ideais de liberdade e igualdade. O novo regime de governo

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remodelou os quadros políticos e econômicos do país, sem alterar, no entanto, as estruturas de

dominação. No período do primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945), a questão

educacional foi alçada ao nível de um dos principais interesses políticos do Estado Nacional. A

partir da redefinição política, estabelecida através do movimento de 1930, diversas medidas

relacionadas à educação foram traçadas, na pretensão de se formular um sistema educativo

normatizado pela União, tendo como ponto inicial deste processo a criação do Ministério da

Educação e Saúde.

O período varguista constituiu-se no momento em que as antigas oligarquias rurais,

ligadas à produção cafeeira, foram perdendo sua hegemonia política nos postos administrativos

do poder. Getúlio Vargas, após comandar a deposição do presidente Washington Luis,

assumiu o maior posto de comando do país, em 1930, permanecendo no cargo até o ano de

1945. Sob o propósito de reconstruir a nação, edificando o ideário do “homem novo”, Vargas

implantou uma política centralizadora e autoritária, na perspectiva da construção de um Estado

forte e austero. Tal tentativa de reestruturação da sociedade passava por um ideário que

buscava homogeneizar e disciplinar comportamentos, com vistas ao alcance da modernidade.

A partir destas prerrogativas, pôde-se registrar então que uma das áreas que mais sofreu

intervenção da administração central foi, exatamente, a educação, que era entendida como um

importante instrumento na condução do processo de reconstrução social.

Em Santa Catarina, o projeto de reestruturação da sociedade também se encontrava

configurado, sobretudo, na educação, especialmente a partir de medidas reformistas que já

eram estabelecidas desde as primeiras décadas do século XX. O governo catarinense, pós-

1930, imprimiu considerável importância a questão educacional. Constatou-se que, “educar o

catarinense, para constituí-lo como cidadão disciplinado, foi preocupação central do projeto

político que firmou-se em 30 e consolidou-se no Estado Novo” (CAMPOS, 1999. p.150). A

defesa da escolarização aparece registrada em muitos discursos da época, que divulgavam a

necessidade de estender a escolarização a todas as crianças. Entendia-se que conduzir as

crianças à escola seria uma eficiente maneira de formar indivíduos patrióticos e ordeiros,

comprometidos com os princípios nacionalistas do período.

O desenvolvimento desta pesquisa pretendeu compreender, no caminho percorrido

pelo Departamento de Educação em Santa Catarina, a partir de sua criação em 1935 até o ano

de 1942, os principais mecanismos institucionais utilizados para conduzir a educação no

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âmbito do Estado. Para se alcançar tal intento, partiu-se da compreensão de que a educação é

um aspecto determinante e, ao mesmo tempo, determinado no contexto em que está

estabelecida. Sendo integrante fundamental do processo histórico, se constitui e é constituída

a partir das determinações vigentes em um dado momento. Segundo Auras, “A partir da

compreensão de que o presente é trabalho pretérito, ao realizarmos o inventário deste presente,

vamos perceber, no modo ‘naturalizado’ pelo qual costumeiramente nos relacionamos com

nossa herança histórica marcada pela desigualdade, o quanto somos conformistas de algum

conformismo” (2004, p.136).

A necessidade de investigar o passado se evidencia na medida em que entendemos

que as contradições do presente não ocorrem de maneira historicamente desarticulada, de modo

aleatório, nada tendo a ver com o que passou. No inventário das relações estabelecidas no

passado, encontramos mecanismos formadores da atual conjuntura. A compreensão de

determinado aspecto das relações sociais, através de uma perspectiva histórico-dialética,

permite expressar, no contexto da totalidade, o conjunto de evidências históricas que têm a ver

com as características do particular. Pode-se perceber que é nas contradições destas relações,

conflitantes e em constante movimento, que ocorrem a elaboração e a mudança dos fatos.

Segundo Karel KosiK, “a totalidade sem contradições é vazia e inerte, as contradições fora da

totalidade são formais e arbitrárias” (p.60). A evidência de determinada perspectiva histórica

numa pesquisa científica está ligada a uma dada concepção de mundo. O processo de

desenvolvimento do conhecimento se dá a partir da própria consciência da realidade à qual

pertencemos, pois

“ o início da elaboração crítica é a consciência daquilo que somos realmente, isto é, um conhece-te a ti mesmo como um produto histórico até hoje desenvolvido, que deixou em ti uma infinidade de traços recebidos em seu benefício no inventário. Deve-se fazer, inicialmente, esse inventário” (Gramsci, 1989, p. 12).

Fazer reflexões sobre determinados acontecimentos históricos não significa, no

entanto, procurar respostas no passado para o presente, mas buscar compreender nas

relações sociais que se estabeleceram em determinado momento passado o movimento

dialético de (des)continuidade histórica, que se evidencia no momento presente. A

perspectiva histórica possibilita compreender o presente mais fundamente.

O conjunto de práticas políticas não se desenvolve sem que alguns tenham clareza

do papel que querem uns para os outros. Para entender o que determinada parte da

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sociedade estabelecia, através da legislação vigente, para a maioria da população e para si

mesma em termos de educação, faz-se necessário conhecer em que medida as

determinações legais para a educação estavam comprometidas com o projeto político

centralizador da época. Isto porque “os fatos só são conhecimento da realidade se são

compreendidos como fatos de um todo dialético – isto é, se não são átomos imutáveis,

indivisíveis e indemonstráveis, de cuja reunião a realidade saia constituída – se são

entendidos como partes estruturais de um todo” (Kosik, p.44.)

Assim, analisar de que maneira o Departamento de Educação firmava as diretrizes

para a educação catarinense, possibilita compreender os interesses políticos e sociais que

então se estabeleceram na definição das propostas e medidas educacionais no Estado de

Santa Catarina e no Brasil. O entendimento de como se estabeleceram as relações entre

Estado e Educação implica observar uma dinâmica complexa, embasada na percepção de

avanços e retornos, onde o movimento é incessante e a influência de um sobre o outro é

elemento fundamental para compreensão das relações sociais, já que “o conhecimento da

realidade histórica é um processo de apropriação teórica - isto é, de crítica, interpretação e

avaliação dos fatos – processo em que a atividade do homem, do cientista é condição

necessária ao conhecimento objetivo dos fatos” (Kosik, 63). No intento de identificar a

teia de relações existentes entre o âmbito nacional e o estadual, a investigação se efetivou

no sentido de entender “o conteúdo da relação parte-todo, isto é, de buscar avançar na

percepção de que a especificidade do regional é, necessariamente, construída na relação

com o nacional” (AURAS. p. 130).

Como já foi visto, entende-se que a educação integra a dinâmica histórica da

sociedade como mediadora das práticas sociais. Evidencia-se em qualquer momento, ainda

que disto, ou seja, de sua presença, não se tenha claro conhecimento. Configura-se como

lugar de tensões, imposições e resistências, sendo fundamental, para seu esclarecimento,

observar-se as relações que se estabeleceram/estabelecem entre a sociedade e o Estado, pois

como detentora de um espaço definido a educação foi e é fortemente legitimadora da

estrutura social vigente.

A concepção de educação como prática mediadora evidencia o quanto é detentora

das contraditórias possibilidades de transformação e/ou reprodução social. Segundo

Dermeval Saviani, “está sempre referida a uma sociedade concreta, historicamente situada

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(...). Como atividade mediadora, a educação se situa em face das demais manifestações

sociais em termos de ação recíproca” (1996, p.132).

A análise do processo de adensamento do sistema educacional catarinense, como

um movimento onde se consubstanciavam as relações entre os interesses locais e os

ditames nacionais, parte da necessidade de se perceber a mediação entre o todo e as

partes. Segundo Kosik,

“ esta recíproca conexão e mediação da parte e do todo significa a um só tempo: os fatos isolados são abstrações, são momentos artificiosamente separados do todo, os quais só quando inseridos no todo correspondente adquirem verdade e concreticidade.”

(p. 56). Desvelar os aspectos conjunturais de uma época implica então o entendimento da

dinâmica social como um todo, que expressa o universo mais amplo das relações humanas

e o quanto estas, ao mesmo tempo, produzem e transformam singularmente o movimento

do real1.

A interrogação dos fatos pressupõe que eles não revelam nada por si só e de

maneira espontânea, pois é o historiador que lhes confere visibilidade ao trabalhar para dar

voz às fontes, “mesmo que aquilo que podem dizer e parte de seu vocabulário seja

determinado pelas perguntas feitas pelo historiador. Os fatos não podem falar enquanto não

tiverem sido interrogados” (Thompson, 1981, p. 40). A tarefa do pesquisador, ao interrogar

as fontes, deve ser a de trazer à tona as evidências apresentadas. Deve estar atento às

entrelinhas dos documentos e à relação entre o material pesquisado e o contexto social em

que foi produzido. Ainda, segundo Thompson, “a evidência histórica existe, em sua forma

primária, não para revelar seu próprio significado, mas para ser interrogada por mentes

numa disciplina de desconfiança atenta” (p.38).

Ao buscar historicizar um determinado objeto, neste caso o Departamento de

Educação, pretendeu-se compreender sua institucionalização como resultado de um

conjunto de determinações e tendências históricas, onde o aparelho estatal evidenciou seu

___________________________________

1 - Este conceito é de Kosik (2002, p 51), ao afirmar que “no pensamento dialético o real é entendido e representado como um todo que não é apenas um conjunto de relações, fatos e processos, mas também a sua criação, estrutura e gênese”.

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interesse em utilizar a educação, sobretudo, como instrumento de controle social. A

hipótese norteadora deste trabalho é a de que a extinção da Diretoria de Instrução Pública e

a criação de um novo órgão administrativo para reger as diretrizes educacionais no Estado

foi parte de um processo que pretendia dar vazão à necessidade de complexificação da

burocracia estatal, mas com a firme intenção de continuar a determinar quem deveria

dirigir tais mudanças. A partir dessa premissa, buscou-se identificar em que medida o

governo formulou estratégias para conduzir, sob seu controle, as ações na área educacional.

Para esta pesquisa, alguns objetivos foram propostos, entre eles, sobretudo:

* Identificar, no contexto social, tanto nacional como estadual, que fatores

evidenciaram a necessidade da criação do Departamento de Educação;

* Rastrear e compreender o campo de atuação do Departamento de Educação e

como este conduziu questões básicas referentes à instrução escolar em Santa Catarina;

2 – Antecedentes da pesquisa: a educação no Império Brasileiro

Esta investigação está inserida num conjunto de estudos que vem se realizando no

Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Santa Catarina, sobre

aspectos da trajetória da instrução pública no Estado de Santa Catarina, desde o século

XIX2. As abordagens realizadas até então evidenciam o quanto a escola tem sido

mediadora na (de)formação da sociedade brasileira.

Na esteira desses estudos, pode-se observar a relevância que a educação atingiu no

século XIX, na percepção, pelos governantes, de que era necessária para a formação de um

contingente populacional que pudesse ser considerado morigerado e que acatasse a

sociedade liberal como única produtora de progresso. Desta maneira seria evidenciado que

_____________________________

2 - É oportuno indicar as diversas pesquisas desenvolvidas sobre o período, através dos trabalhos realizados sob a orientação da professora Marli Auras. Uma referência sobre elas encontra-se no anexo 1 deste trabalho.

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o país assim ‘civilizado’ estaria apto a inserir-se no contexto capitalista de desenvolvimento

econômico. Ao pretender estabelecer-se como participante da concepção liberal de

sociedade, que apontava a liberdade individual e a concepção de igualdade jurídica como

princípios inalienáveis e universais, o Brasil expressava, através de sua legislação, a

concordância (retórica) com esse modelo de sociedade. A participação neste novo cenário

mundial era vista como condição necessária para alcançar seu reconhecimento como nação

independente e autônoma. Entretanto, tratava-se muito mais de um discurso elaborado no

intuito de demonstrar concordância com esses ideais, do que uma prática efetivamente

desenvolvida na estrutura social então vigente. Manteve-se a contradição entre liberalismo

e escravidão, numa sociedade “que desprezava o trabalho manual, cultivava o ócio e a

ostentação, favorecia os laços de família, afirmava a dependência, promovia o indivíduo em

razão de seus laços de parentesco e amizade em vez de seus méritos e talentos como rezava

a Constituição, instituía o arbítrio, fazia da exceção a regra e negava os direitos do homem

e do cidadão à maioria da população” (COSTA, p.166).

O que se observa na trajetória da educação durante o período imperial no país, é

que o processo de condução da formação do Estado pela elite dirigente identificava-se, de

modo geral, com os ideais de civilidade propagados ao longo do século XIX. Afirma

Norbert Elias, em sua obra O Processo Civilizador3 , que, através do disciplinamento e da

repressão das atitudes individuais, a manutenção e o desenvolvimento do estado de

civilidade sofreu mudanças no decorrer do tempo. Segundo ele, o indivíduo alcançou a

condição de autocontrole devido à necessidade de reprimir suas próprias vontades, ou seja,

de controlar suas tendências naturais, para, assim, poder alcançar a legitimidade social de

seu comportamento.

A educação escolar, no período imperial, foi engendrada por inúmeros interesses

constituintes de um projeto mais amplo que visava a construção de uma identidade

nacional, na medida em que a nova nação se delineava no contexto mundial de

desenvolvimento do capitalismo e precisava afirmar-se como integrante desse cenário.

_____________________________

3 – ELIAS, Norbert. O Processo Civilizador – Volume II: Formação do Estado e Civilização. Parte II: do Controle Social ao Autocontrole. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1994

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O conceito de civilização alcançou grande repercussão no século XIX, quando as

Ciências Humanas, especialmente no Ocidente, pretenderam construir um arcabouço de

significados voltados para a compreensão de que havia um modelo ocidentalizado de

comportamento e que este deveria servir de padrão para todos aqueles lugares que ainda

não haviam alcançado tal estágio. O século XIX está inserido no contexto das idéias

liberais que tinham a ver com o Iluminismo, então difundido como exemplo do novo

modelo de sociedade a ser formado no conjunto das nações pertencentes ao sistema

capitalista. Para que o projeto de construção de uma identidade nacional ocorresse, foi

necessário, entretanto, criar mecanismos que levassem o país a trilhar o caminho dos

preceitos liberais de liberdade e igualdade, mas aqui seria respeitado antes de tais preceitos

o direito a propriedade. Desta forma, foi necessário organizar um aparato educacional

compatível com os ideais civilizatórios determinados então, para que o país pudesse se

apresentar em sintonia com tal modelo de sociedade.

A necessidade de disciplinamento, ou seja, da presença dessa demonstração

considerada como de civilidade da população, atravessa todo o processo de construção da

nacionalidade brasileira e é na esteira da afirmação desta pretensão que a educação entra

em pauta nas discussões políticas dos liberais. Isto porque a elite burguesa sabia levar em

conta exatamente o que lhe interessava e entendia que o liberalismo, pautado na liberdade

política e econômica, precisava se constituir no país, sem, no entanto, correr o risco de

perder sua condição de classe dominante. A idéia de liberdade defendida pelos liberais era

evidenciada no que entendiam como sendo seu direito à propriedade, tanto de terras como

de escravos. Para que isto fosse garantido era necessário que a própria elite formasse o

aparelho administrativo do Estado.

Quando se discutia a educação durante o século XIX, o conteúdo da ação

pedagógica era basicamente o de servir para acatar a ordem vigente, excluindo-se a

necessidade de se debater com seriedade sobre o efetivo acesso às primeiras letras para as

populações subalternas. A falta de um projeto nacional para a educação popular, no país,

era, contraditoriamente, a expressão da existência de um projeto que visava deixá-la sem

escolas, à mercê do Estado (des)educador, de acordo com os interesses dos grupos

políticos dominantes da época, pois quem produzia a riqueza nacional era a mão-de-obra

cativa, e esta aprendia a trabalhar, trabalhando.

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Educar para o acatamento da ordem era uma estratégia de manutenção da

sociedade elitista, através do estabelecimento de meios tanto coercitivos como consensuais.

Ao buscar fazer da educação um instrumento de moldagem dos indivíduos como condição

necessária para a presença da nação no mundo civilizado, postulava-se a prudência e a

moderação para o povo como condição indispensável para a manutenção do ordenamento

social em que a elite estabelecia sua dominação sobre as camadas subalternas. O paradoxo

entre o discurso e a prática da educação no século XIX deixa claro o caráter conservador

de uma elite que se pretendia liberal, sim, mas sem jamais perder, no entanto, sua condição

dominante no cenário político e econômico da sociedade brasileira. “Pode-se dizer que

havia consenso quanto à desejabilidade de buscar o ideal de civilização, mas começavam as

divergências logo que se passava a discutir os meios de o fazer” (Carvalho, p. 336). Neste

sentido, a questão educacional manifesta o direcionamento apontado por um determinado

grupo social que define legalmente os caminhos e parâmetros para a educação,

evidenciando seus interesses efetivos e, assim, atrelando a estrutura estatal em formação ao

conjunto de seus interesses.

No final do período imperial houve a necessidade de se vislumbrar mudanças para

os projetos educacionais até então estabelecidos, pois se configurava as ascensão do

republicanismo, que era entendido como detentor do propósito de, enfim, realizar as

mudanças necessárias para a inserção do país no cenário mundial considerado civilizado. O

projeto republicano, construído no bojo das transformações industriais do final do século

XIX, pretendia para o país a “construção de uma sociedade civilizada, onde os homens

fossem moldados para o trabalho e para o exercício da política” (SALLES. p. 17). Nesta

perspectiva, uma das principais questões que acompanharam os debates em torno da

proclamação da República, foi a necessidade de se tratar da abolição da escravatura, na

medida em que a doutrina liberal não compactuava com este regime de exploração do

trabalho. Segundo Salles, “ o projeto político republicano tinha como meta a reelaboração

das relações de dominação e a redefinição do papel do Estado face às mudanças da

sociedade, desencadeadas pela emergência do trabalho livre” (1986, p. 24).

Na Província de Santa Catarina, os debates em torno da causa republicana

acompanharam as discussões nacionais, sem, contudo demonstrar o fervor que se

evidenciava na Capital Federal. Segundo Jali Meirinho, “as notícias da Corte que diziam

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respeito à fundação do Partido Republicano e outras manifestações contra a Monarquia

influenciaram a uns poucos, que não deixaram vestígios para que se possa aquilatar até

onde a nova idéia os empolgava” (1997, p. 28). Neste processo de mudança política, o

Estado de Santa Catarina vivenciava o encaminhamento de sua urbanização, juntamente

com o imigrante que se destacava no agro-comércio. Esboçavam-se os primeiros traços de

industrialização. É notável, então, um certo distanciamento entre o pronunciamento

nacional e os discursos elaborados em terras catarinenses, onde os setores sociais

envolvidos possuíam diferentes interesses, mas não, necessariamente, centrados na questão

abolicionista.

No processo de elaboração do republicanismo, o país e seus dirigentes se vêem às

voltas com o problema da abolição, trazendo à tona a necessidade de a elite pensar o que

fazer com toda esta gente que se tornaria liberta. A disciplinarização continuaria a ser o

instrumento que buscaria conduzir os ex-escravos para o acatamento da ordem, para se

constituírem como elementos obedientes num país que se definia, retoricamente, como

liberal, mas apresentava uma estrutura social extremamente conservadora. Portanto, a

formação de uma nova sociedade, engendrada nos moldes modernizadores, se efetivaria

com o advento da República, mas o objetivo da ação pedagógica era, sobretudo, disciplinar

e não fornecer o acesso ao conteúdo, à instrução. Ao assumir a responsabilidade de

realizar a transição da sociedade escravocrata para a livre, a elite pretendia projetar o papel

que desejava para si e para os ex-cativos, apontando a disciplinarização como maneira de

controlar o novo contigente de indivíduos livres, diante da possibilidade de esgarçamento

da oposição vigente, manifestada através de revoltas.

O processo educacional no período imperial mostrava-se claramente como

expressão do projeto da elite de manter seus interesses de dominação preservados, negando

desta maneira a possibilidade de expansão da rede escolar, de construção de um projeto

educacional (que nunca se constituiu efetivamente, não obstante a existência de discursos a

ele favoráveis). Era preciso um “povo civilizado”, entendido como ordeiro e subalterno,

para que a estrutura vigente não sofresse alterações e, mais que isto, para que a própria

condição de subordinação deste povo garantisse a manutenção e a reprodução do poder nas

mãos de poucos. Pode-se observar que o não encaminhamento da melhoria das condições

educacionais no Brasil Império significava exatamente um direcionamento com este

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propósito. Portanto, não resolver era uma das maneiras de conduzir as questões relativas à

educação. Não se tratava de fornecer a educação básica para a maioria da população, mas

sim de conduzir o processo educativo de maneira a apresentá-lo como existente, sem

contudo significar o efetivo acesso da população às primeiras letras, como tão bem

evidenciam as investigações realizadas e apontadas no anexo 1 já mencionado.

3 – O tempo da pesquisa: a educação no Brasil Republicano

Como vimos, esta pesquisa buscou identificar, na ação do Departamento de Educação,

como este tratou de conduzir questões do campo educacional catarinense, mais

especificamente as relativas à obrigatoriedade do ensino, à expansão da rede e a formação

de professores, e que interesses principais perpassaram a trajetória deste órgão. A

pretensão foi compreender que contradições foram fundamentais para a defesa, ou não, do

ensino público e como se estabeleceram, em linhas gerais, as relações entre a sociedade

catarinense e a escolarização na formulação da política do Estado. Faz-se pertinente, ainda,

destacar uma importante questão em pauta na época, a nacionalização do ensino, também

expressa na maioria dos discursos e debates educacionais. Vários estudos já realizados

apresentam aspectos do processo de nacionalização instituído no final do século XIX e nas

primeiras décadas do século XX em Santa Catarina, a partir do ideário de valorização do

projeto de construção do Estado Nacional4. Ao identificar, na política de nacionalização

do ensino, a intervenção estatal no processo educativo, essas pesquisas apontam como

foram estabelecidos mecanismos que pretendiam homogeneizar a educação das populações

de origem estrangeira no Estado de Santa Catarina. Esse processo, no entanto, se

estabeleceu de cima para baixo, a partir dos interesses da elite dominante em dirigir a

subordinação dos subalternos, num claro processo de construção da hegemonia através da

escola. A nacionalização deveria contribuir para que se desenvolvesse um sentimento de

__________________________

4 -Dentre diversos trabalhos sobre o tema, apontam-se, aqui, a dissertação de mestrado de Paulo de Nóbrega, intitulada “Ensino Público, nacionalidade e controle social: política oligárquica em Santa Catarina na Primeira República 1900-1922”, o estudo de Jaecyr Monteiro, sob o título: “Nacionalização do ensino: uma contribuição à história da educação” , a dissertação de mestrado de Nilton José Cristofolini com o título “Nacionalização do ensino: estratégia para a construção da nacionalidade e sua contextualização em Joinville”, e ainda, o trabalho de Vera Regina Bacha Pereira, intitulado “ Nacionalização – Autoritarismo e Educação – Inspetores nas escolas catarinenses – 1930-1940”.

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pertencimento da população aos ideais do Estado Nacional, constituídos na vertente do

conservadorismo. Os valores nacionalistas deveriam ser exaltados, especialmente no

ambiente escolar, na busca de constituir-se o consenso social pretendido pelas práticas

políticas de dominação. Através da escola e dos mecanismos fiscalizadores de inspeção,

propagavam-se valores ufanistas, moralizadores e disciplinadores, na justificativa de serem

condições imprescindíveis para o alcance do progresso. Por tal investimento ideológico

empregado na reformulação da educação, enfatizava-se a regeneração moral da sociedade

como o meio pelo qual o país chegaria aos patamares progressistas almejados pelo discurso

republicano.

A Proclamação da República trouxe a necessidade de se reformular projetos

políticos, sem, contudo, alterar-se as estruturas dominantes. Em tal contexto, a educação

assumiu dado papel mediador no desenvolvimento das relações sociais, sendo chamada a

efetivar as propostas de modernização social. Com o advento da República

“os republicanos, reatualizando a plataforma de um regime político

que se desejava sólido e progressista, anunciaram nos tempos em devir a

concretização de um projeto de escola pública, obrigatória, gratuita, democrática

e laica, consolidando a política social da burguesia, enquanto levantavam as

flâmulas de uma educação que, sob o signo da democracia, teria em si o potencial

de corrigir as desigualdades sociais” ( SAVIANI, 1996 p. 02)

As permanências históricas podem ser reveladas nas opções que foram então

encaminhadas para a definição de um ideal liberal republicano, que entendia a escola como

“redentora” da sociedade brasileira, onde ‘as almas’ seriam formadas, modelando-se a

população considerada inculta, segundo os ideais de progresso e a partir da imperiosa

necessidade de acatamento da disciplina. Nos primeiros anos do Brasil republicano, a

educação continuou tendo um papel fundamental na busca de morigeração do povo.

Contudo, esta idéia assumia novos contornos, na medida em que o país era encaminhado

pelos discursos liberais republicanos de modernização. Se no século XIX era necessário

civilizar a população considerada culturalmente atrasada, o século XX trazia o imperativo

da reconstrução da nação, por meio da regeneração do povo. E para que este ideário fosse

alcançado, os discursos reformadores indicavam que “a instrução pública deveria superar

limites estreitos de padrões cívico-nacionalistas e tornar-se estratégia de reconstrução social

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e regeneração social e moral” (MONARCHA, 1989, p.15). Através da escola, pretendia-

se efetivar a regeneração da população brasileira, no afã de concretizar-se a nacionalidade

do país, através do disciplinamento dos corpos que teriam que ser saudáveis e produtivos,

condição considerada necessária para o engrandecimento da nação, a ser engendrada nas

teias do capitalismo industrial, determinador das relações sociais, políticas e econômicas

daquele momento.

A economia e a política do início do século XX vivenciaram um intenso esforço

na direção da modernização nacional, que pretendia colocar o país na esteira das grandes

nações através de um desenvolvimento industrial eficaz e progressista. A República que

estava se organizando necessitava do aval das outras nações para ser vista como inserida no

ideal liberal difundido pelos republicanos daquela época. A instauração da nova ordem

social republicana necessitava de instrumentos que efetivassem o projeto progressista e é na

escola que são vislumbrados os mecanismos responsáveis pela imensa tarefa de civilizar

uma população de milhões de analfabetos. A escola passa a ser vista como a peça

fundamental do ideário nacionalista, que buscava a construção da ordem e do progresso.

Ela teria que ordenar essa massa populacional considerada ignara, que compunha a

sociedade brasileira e que tinha que ser, necessariamente, adequada ao modelo de

civilização difundido.

Para que a educação alcançasse os objetivos pretendidos, todo um aparato de ações

precisaria ser pensado e executado. A partir disto, como, ainda que de modo alargado,

havia ocorrido no século XIX, continuava-se a pensar não somente na estrutura funcional

alfabetizadora das primeiras letras, mas também nos aspectos pedagógicos mais avançados,

que passam a fazer parte da pauta de todas as discussões sobre educação, evidenciando uma

maior preocupação com “o que” e com “o como” seria o ensino nas escolas.

Assim, entendida como signo do progresso, a educação é “concebida nos marcos

positivistas que propunham esse processo de formação como percurso de aprendizagem

que deveria reproduzir todas as etapas da evolução humana” (CARVALHO, 1989 p.143).

Durante as primeiras décadas do século XX, no Brasil, a aposta dos republicanos é na

formação de cidadãos ordeiros e imbuídos dos moldes cívicos, que estavam evidenciados

no cerne das expectativas de progresso para a nação.

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Nas décadas de 1910 e 1920, o país viveu momentos de intensas conturbações

sociais, políticas e econômicas, graças ao crescimento do operariado urbano, a

desestruturação da política coronelista das oligarquias, e ainda, a crise que atingiu a

cafeicultura desestabilizando a economia nacional balizada na produção de café. A massa

de trabalhadores operários, que desenvolvia suas atividades nas fábricas, evidenciará a

presença de um novo elemento social, desvinculado do campo e na sua maioria formado

por imigrantes europeus, que trazem, do velho continente, muitas das idéias anarquistas e

socialistas debatidas na época.

Enquanto no século XIX a mão-de-obra imigrante era apontada como fonte

regeneradora da raça e da moralidade, com teses que embasavam práticas de exclusão da

participação dos recém libertos no processo produtivo, nas décadas de 10 e 20, do século

XX, essas teorias seriam reformuladas exatamente quando esses imigrantes passaram a

fomentar a maioria das movimentações operárias revoltosas e grevistas em ocorrência no

país. Segundo Marta Carvalho “ caem, então, por terra os mitos sobre a operosidade natural

da raça branca e sobre os efeitos regeneradores da imigração em larga escala” (2003, p.

146). Neste contexto, a elite brasileira tentou dar conta de normatizar a ação da classe

operária e, para ela, era na escola que a “regeneração” dessa população seria efetivada. A

educação começou a aparecer como a redentora de todos os problemas sociais vigentes e,

assim, foi imbuída da nobre tarefa de formar a nacionalidade brasileira. Deste modo,

“regenerar as populações brasileiras, núcleo da nacionalidade, tornando-as saudáveis,

disciplinadas e produtivas, eis o que se esperava da educação, erigida em causa cívica de

redenção nacional” (Carvalho, 2003, p.157). Cabe salientar que tais populações

correspondiam à massa de subalternos explorada pelas forças capitalistas, ou seja, mão-de-

obra barata, destituída das mínimas condições de vida dignas. Segundo Olinda Evangelista,

“o projeto das elites, como dos intelectuais reconstrutores, implicava intervenção de

natureza cultural, espiritual. Moldar as mentes das classes perigosas constituiria sua

personalidade, adequando-a ao novo país e ao trabalho racional” (p. 24).

O analfabetismo passou a ser visto como o indicador do atraso do país, sendo

apontado a partir daí como a base de todos os nossos problemas sociais. Era mais que

urgente, então, a ocorrência de iniciativas de alfabetização, para que o progresso pudesse

ocorrer no Brasil. A educação nos anos de 1920 ganhou cada vez mais importância,

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sendo elevada à condição de nosso principal problema social. Para ela se voltaram os

principais debates políticos e sociais daquele momento, e foi desta maneira que se

consolidou “entre intelectuais que se aplicavam a pensar o Brasil, a crença de que na

educação residia a solução dos problemas” ( Carvalho, 2003, p.156). É o período em que

se passa a discutir novas maneiras para se educar o indivíduo, todas permeadas pelas

concepções do escolanovismo, que formulou “a crença na possibilidade de reformar a

sociedade pela reforma do homem, para o que a escolarização tem um papel insubstituível,

pois é interpretada como o mais decisivo instrumento de aceleração histórica” (Nagle, 1976

p.100).

A ênfase técnico-pedagógica dos recém-chegados ao debate, os especialistas da

educação, permeou os discursos que defendiam uma nova escola, mais ativa, contrapondo-

a à chamada escola tradicional, que apenas ensinava a ler, escrever e contar. Segundo Marta

Carvalho,

“opor à escola que ensina só a ler, escrever e contar a escola que

cultiva a inteligência, o coração e as mãos passa a ser obra de

clarevidência de governos cujo mérito político é reiteradamente

alardeado pelos ‘técnicos’ chamados a reformar os sistemas

públicos de ensino” ( 1989, p. 150).

Foi através de diversas reformas de ensino, ocorridas Brasil afora, que se

sedimentou, portanto, a crença na educação como a solução dos problemas nacionais e que

deveria concretizar, enfim, a pretendida regeneração da população, tornando-a saudável,

produtiva e disciplinada, para poder constituir o ideal de nacionalidade pleiteado pelos

liberais desde os tempos do Império. Faz-se necessário enfatizar que os ideais entusiastas

propalados pelos realizadores de tais reformulações provinham das concepções da Escola

Nova. Esta concepção de educação tinha seus pressupostos calcados na idéia de uma

escola ativa, que se contrapunha às práticas da escola tradicional que até então conduziam

os processos de ensino no país.

O momento escolhido para esta pesquisa encontra relevância na medida em que, na

década de 1930, ocorreram mudanças significativas nos quadros políticos do país e mais

especificamente nos rumos educacionais. O início dos anos de 1930 compõe um tempo

que é carregado de inúmeras mudanças no cenário político, econômico e social, usando-se

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como patamar a chamada “revolução de 30”. O ideal revolucionário estava centrado na

necessidade de se processar o reajustamento dos setores sociais, no momento em que o

tradicional segmento agrário-exportador não comportava mais os anseios de

desenvolvimento econômico vislumbrados pela burguesia urbano-industrial, então em

ascendência.

Apesar das inúmeras controvérsias que a historiografia tem fomentado em torno da

questão de denominar o movimento como revolucionário ou não, é indiscutível que as

mudanças políticas de 1930 caracterizaram-se como uma ruptura no processo histórico

brasileiro. Rompia-se, naquele momento, com o quadro sócio-político da dominação até

então hegemônica da oligarquia cafeeira, num processo de reestruturação política e social

que, através da ação de intelectuais e movimentos de massa (compostos em sua maioria

pelo operariado urbano), pretendia encontrar soluções para a necessidade de modernização

do país, considerado, até então, atrasado em relação a outras nações assinaladas como

desenvolvidas.

Os novos rumos políticos e econômicos alcançavam maior importância na medida

em que o Brasil intensificava seu processo de industrialização, que acabou por determinar

o aumento significativo da massa operária e que passou a ocupar os centros urbanos, em

detrimento do universo agrário até então dominante na sociedade brasileira. Além disto, a

consolidação de uma burguesia industrial, aliada à camada média urbana, significou a

presença de uma nova estruturação social, que colocou em evidência a multiplicidade de

grupos e interesses, principalmente nos primeiros anos do primeiro governo de Getúlio

Vargas.

Os anos de 1930 evidenciaram a complexificação da estrutura social brasileira, num

movimento onde a modernização pretendida para a nação precisava ser, então,

acompanhada por uma política eficaz e urgente de controle social, pois o progresso do país

apresentava-se sempre ligado à égide da afirmação da necessidade do disciplinamento da

população. Este discurso era inspirado no ideário positivista, que propagava a ordem como

condicionante do desenvolvimento da nação e apontava que, para a sociedade brasileira, era

necessária a formulação de novos padrões de comportamento para inseri-la no caminho da

modernidade. Isso só se concretizaria a partir da construção de um novo homem,

caracterizado através da figura do bom trabalhador. No período de maior centralização

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política este propósito ficaria mais evidente, já que “nas representações do Estado Novo, a

ênfase no novo era constante: o novo regime prometia criar o homem novo, a sociedade

nova e o país novo” (CAPELATO, p.123).

Ao se observar a ênfase que a educação atingiu no programa revolucionário pós-30,

verifica-se que a manutenção da ordem no país estava intimamente relacionada à

preocupação de resolução dos problemas nacionais, através de um conjunto de

normatizações que teriam na educação moral e cívica a resposta tida como adequada para

tal. Entendia-se que as raízes da maioria dos flagelos nacionais tinham a ver com a

ineficiência do sistema escolar e, por isso, deveria haver neste segmento político uma maior

intervenção do Estado. Foi a partir dessa premissa que o governo de Vargas tomou a

educação como um instrumento de organização social, tentando modelar o indivíduo a uma

nova realidade que então se configurava no cenário nacional.

Em Santa Catarina, a década de 1930 apresentou um quadro político caracterizado

pela continuidade da dominação de oligarquias condutoras do poder, mais especificamente

pela família Ramos, proveniente do planalto catarinense, que se beneficiou deste

movimento para ascender ainda de forma mais incisiva nos postos de mando da estrutura

governamental catarinense. Seguindo a tendência da maioria dos Estados brasileiros,

observou-se aqui o encaminhamento das propostas educacionais em consonância com os

ideais difundidos pelo governo varguista. Segundo Cynthia Campos, “quando Nereu

Ramos priorizou saúde e educação como núcleos de intervenção estratégica, não estava

fazendo nada mais que a tentativa de viabilizar em Santa Catarina o programa da Aliança

Nacional5 que levou Vargas ao poder” (p. 151).

4 – O trabalho com as fontes

Isto posto, através do estudo sobre a definição dos rumos educacionais no Estado de

Santa Catarina nas décadas de 1930 e 1940, a partir da análise das ações do Departamento

de Educação, evidenciaram-se os aspectos que apontam para a complexificação do aparelho

administrativo educacional e como isto determinou, aqui, a elaboração de normas

específicas relativas à educação. Ao partir da perspectiva de que o campo de constituição

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da história da educação de Santa Catarina encontra-se em afirmação, pretendeu-se, através

deste trabalho com inúmeras fontes, colaborar com os estudos já realizados e, assim, fazer

avançar nosso conhecimento acerca da formação da escola catarinense.

Para esta pesquisa, foi realizado o levantamento de diferentes fontes primárias, entre

elas, leis, decretos, relatórios, além de mensagem e falas do governador do Estado. Tais

fontes se encontram disponíveis no Arquivo Público do Estado de Santa Catarina e em

outros acervos, como o dos arquivos da Assembléia Legislativa, da Biblioteca Pública, do

Palácio Cruz e Souza e da seção de obras raras da Biblioteca Central da UFSC.

Uma das leis deste conjunto de fontes levantadas é o Decreto nº 713 de 1935,

baixado pela Secretaria de Estado dos Negócios do Interior e Justiça, determinando a

criação do Departamento de Educação, que substituiu a antiga Diretoria da Instrução

Pública até então o principal órgão condutor das questões educacionais no Estado,

constituindo-se, portanto, como o ponto de partida para esta dissertação. Com sua

institucionalização, o novo órgão administrativo continuou elaborando relatórios, como já

havia ocorrido com a antiga Inspetoria de Instrução Pública, que apresentavam as

realizações e movimentações relativas à educação no Estado, bem como a descrição dos

números referentes a matrículas, freqüência, aprovações, desistências e reprovações. O

primeiro relatório do Departamento de Educação foi apresentado em 10 de junho de 1936,

referente ao trabalho deste órgão no período de janeiro de 1935 a maio de 1936, “relatando

o que mais importante se efetuou, quanto ao movimento educacional no Estado” (Relatório

1935). Nos anos seguintes, foram apresentados os seguintes relatórios: em junho de

1937, relativo ao ano de 1936; em 1938 relativo a 1937, em 1939 do ano de 1938, em 1940

sobre o exercício de 1939, em 1941 sobre o movimento de 1940, em 1942 sobre ano de

1941 e em 1943 relativo a 1942, quando o Departamento passou a ser vinculado

diretamente à nova Secretaria de Saúde e Educação. Todos são encontrados, para

possíveis consultas, no Arquivo Público do Estado de Santa Catarina.

Outra documentação aqui analisada corresponde às leis, decretos e decretos–lei,

sancionados no período sobre questões educacionais. Este conjunto de fontes permite a

____________________________

5 – Ao Reunir políticos descontentes, liderados por Getúlio Vargas, do Rio Grande Sul, a Aliança Liberal não aceitou o resultado do processo eleitoral do pleito de 1930 e efetivou a tomada de poder na chamada “Revolução de 30”.

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compreensão dos aspectos que se apresentavam mais relevantes para a administração

pública, no tocante a educação catarinense. A quantidade de documentos é significativa,

demonstrando, a princípio, um intenso esforço para a normatização da área educacional no

Estado. Este conjunto pode ser localizado no Arquivo Público de Santa Catarina e no

Arquivo da Assembléia Legislativa do Estado. O conjunto de mensagens e falas do

governo do Estado à Assembléia Legislativa e os relatórios apresentados ao Presidente da

República, complementam o material desta pesquisa.

Através da catalogação e levantamento dos diferentes documentos, foi possível

delinear aqueles que fornecem informações mais específicas sobre o tema abordado. Nas

mensagens anuais apresentadas pelo governo do Estado à Assembléia Legislativa, arrolam-

se as ações administrativas governamentais, entre elas as referentes à educação, com

detalhamento das propostas e realizações estipuladas para o serviço público. Os relatórios

anuais do Departamento de Educação enviados à Secretaria do Interior e Justiça detalham a

movimentação dos trabalhos deste sobre a educação catarinense, narrando suas ações no

processo de institucionalização da escolarização no Estado de Santa Catarina.

Os documentos investigados constituem um conjunto diversificado de fontes do

período analisado. Por isso, um dos primeiros cuidados foi identificar aqueles onde o

Departamento de Educação era abordado e quais foram elaborados pelo próprio

Departamento, fornecendo assim a matéria-prima básica para o procedimento de análise

Além da utilização das fontes primárias, estabeleceu-se a interloculação com

fontes secundárias que permitiram o embasamento necessário para as reflexões aqui

expostas. Através da análise dos documentos, é que foi possível perceber os discursos

presentes nestas fontes, nas linhas e nas entrelinhas, revelando os agentes e segmentos da

sociedade que constituíram essas falas, estabelecendo relações entre os projetos

educacionais da época e as propostas apresentadas pelo Estado. A riqueza de informações,

que as fontes possibilitaram fornecer, se transforma em saber histórico, em conhecimento

do passado. Não se descuidou do fato de que as fontes não podem evidenciar, sozinhas, o

que registram, já que precisam ser interpretadas e devidamente analisadas. Ao tentar

compreender aquilo que permeia esses discursos, “qualquer historiador sério sabe que os

fatos (...) arrastam suas próprias cargas ideológicas, que as perguntas aparentemente sem

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dissimulações e inocentes podem ser uma máscara para ocultar as atribuições externas”

(Thompson, p.55).

É necessário que o pesquisador esteja sempre atento à maneira como fará a análise

de documentos de épocas distintas, para manter o diálogo disciplinado com as fontes

documentais, tentando perceber o que está na evidência ou permanece oculto e quem são os

interlocutores que as produziram. Nesse cuidado do trabalho com as fontes, uma

importante reflexão de Gramsci serve de alerta:

“não é suficiente conhecer o conjunto das relações

enquanto existem em um dado momento como um dado

sistema, mas importa conhecê-los geneticamente, em seu

movimento de formação, já que todo indivíduo é não

somente a síntese das relações existentes, mas também da

história destas relações, isto é, o resumo de todo passado”

(1989, p. 40).

A estrutura desta pesquisa se configurou em 2 capítulos, que estabeleceram, de

maneira sistemática, os aspectos pertinentes ao tema estudado. No primeiro capítulo,

intitulado: OS ANOS 1930 E 1940: elementos contextuais e educacionais brasileiros e

catarineneses, buscou-se apresentar como a educação se constituiu numa das principais

preocupações do governo, enquanto elemento necessário para a efetivação da pretendida

modernização do Estado Nacional. Através de diretrizes políticas que encaminhavam as

questões educacionais, o governo definia as estratégias para adotar as mudanças necessárias

a manutenção da ordem social vigente.

No segundo capítulo, Institucionalização do Departamento de Educação,

procurou-se entender o processo de constituição do Departamento de Educação, a partir de

sua criação e sua ação durante os anos investigados, compreendendo como este órgão

administrativo instituiu a legislação de ensino e de que maneira foram conduzidas as ações

apontadas nos discursos propalados, analisando em que medida, as propostas definidas pelo

governo foram ou não, efetivadas.

As considerações finais apresentam uma síntese das análises desenvolvidas,

retomando as discussões acerca dos avanços e retornos, das continuidades descontínuas,

que se apresentaram no momento histórico pesquisado.

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CAPÍTULO I

OS ANOS 1930 E 1940: elementos contextuais e educacionais brasileiros e

catarinenses

A questão educacional configura-se ao longo da história de nosso país como uma

das principais temáticas a permear os projetos políticos. Alcança significativa relevância

por encontrar-se inserida na teia de relações sociais, como lugar de embates, que se

configura tanto como espaço de imposição de valores como de transmissão do

conhecimento acumulado. Apesar de evidenciar-se como uma importante preocupação do

Estado, a educação no Brasil é atravessada pela grande dicotomia entre o que é proclamado

e a realidade efetiva da escola. Compreender a correlação dialética entre o Estado, a

sociedade e a educação pressupõe observação atenta dos avanços e retornos, das

continuidades descontínuas, nas quais o movimento incessante dessa dinâmica integra o

contexto social. A investigação dos caminhos percorridos pelo processo educativo

constitui-se em aspecto marcante para o entendimento da escola, na busca de explicações

mais substantivas para dilemas que continuam, ainda hoje, pautando o acesso de nossas

crianças à educação básica, “tendo em vista a necessidade de se perceber o presente como

trabalho pretérito, de se perguntar pela historicidade de nossa educação escolar” (AURAS,

2004, p.134).

1. Considerações iniciais

A trajetória da educação em nosso país foi permeada, nos dois últimos séculos, por

diferentes momentos que evidenciam ora um desinteresse pela constituição de uma

estrutura educacional para a instrução pública, ora uma grande concentração de esforços na

direção desta temática considerada fundamental para a idéia de formação de um povo, que

deveria caminhar na direção do ideal de civilização defendido pelas aspirações capitalistas

de progresso. Enquanto nos tempos imperiais a educação era entendida “como espaço de

conformação de condutas, ou seja, como lugar irradiador daquilo que se entendia como

expressão de comportamento tido como civilizado” (AURAS, p. 139), pode-se observar nos

ideais republicanos elementos que a entendiam como “salvadora” e “redentora” da nação,

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através da pretendida regeneração do trabalhador. Segundo Jorge Nagle, “a percepção

‘romântica’ dos problemas da sociedade brasileira e de suas soluções resulta numa

superestimação do processo educacional: regenerador do homem, ele é, conseqüentemente,

o regenerador de toda sociedade” (1978, p.263)

A nova conjuntura política que se delineava com o advento da República colocou

em evidência a necessidade de se modificar a antiga estrutura estabelecida durante o

escravismo, na perspectiva de um novo padrão econômico e social, pautado pelos ideais

liberais de liberdade individual e política difundidos no século XIX e apresentados como

referência para a formação do republicanismo. Neste intento, a mão-de-obra imigrante

passa a ser indicada como alternativa para a economia agrário-exportadora; um vasto

contingente estrangeiro chegou ao Brasil a fim de trabalhar na agricultura como mão-de-

obra e/ou no intuito de tornar-se proprietário, poder enriquecer.

O advento do regime republicano, ao substituir a ordem imperial, fez emergir outra

forma de governo, acenando ao povo com a possibilidade de institucionalização de um

“novo” país. Construir este “novo”, no entanto, imprescindia no reordenamento jurídico

do Brasil. Por isto, a elaboração de uma nova Constituição apresentava-se como premente

necessidade política. Mas, consolidar o ideário de ‘nação’ implicava na concepção de

pertencimento, isto é, de cidadania, que deveria espraiar-se pelo tecido social como

horizonte possível, na configuração histórica de um estado unitário que se auto-definia

como “democrático”. Nesse contexto, pode-se observar em que medida as questões

educacionais entraram na pauta dos legisladores e perceber que, apesar de indicadora de

algumas modificações institucionais, a Carta Constitucional de 1891, ainda que não tenha

se eximido deste tema, pontuou uma firme defesa em relação ao individualismo e ao

federalismo, fazendo “com que a educação compartilhasse, junto com outros temas de

direitos sociais, os efeitos de um liberalismo excludente e pouco democrático” (CURY

1996, p.80).

Os anos iniciais da República no Brasil não demonstraram transformações

substanciais no conjunto da sociedade brasileira, que permaneceu atrelada aos moldes

liberais capitalistas ainda segundo o modelo agrário para exportação. Apesar disto, as

primeiras reivindicações trabalhistas apareceram como possibilidades de mudança, na luta

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contra a ordem vigente de profunda exclusão social, evidenciando a existência no cenário

político de grupos sociais ligados, então, ao início do processo de industrialização do país.

Nesse contexto, a educação movimentou-se em torno de determinações

governamentais que se preocupavam com a escola como instrumento de moldagem dos

indivíduos e, por isso, merecedora de atenções e intervenções, mas, ao mesmo tempo,

entendendo o processo de instrução como objeto de interesse individual, eximindo, assim, o

Estado, da responsabilidade de garantir o acesso de todos à escolarização. A partir da

Constituição de 1891, com o fim do voto censitário1, acenou-se para a possibilidade de

participação política a um maior número de homens, mas esta ampliação dos direitos

políticos estaria vinculada a exigência do saber ler e escrever, pois desta maneira

“pressupunha-se que as primeira letras seriam uma espécie de motor atrativo a fim de que o

indivíduo se esforçasse por conquistar a sua individualidade” (Idem,ibidem, p.75).

Nas décadas de 1930 e 1940, durante a vigência do governo de Getúlio Vargas, cuja

culminância ocorreu no período do Estado Novo, a educação configurou-se como um dos

principais interesses do Estado. Através do estabelecimento de diretrizes políticas que

foram determinadas a partir das mudanças desencadeadas nos anos decorrentes da

Revolução de 1930, o governo definiu estratégias de manutenção da ordem vigente. A

tomada do poder realizada graças à liderança de Vargas, encerrava o predomínio dos

grandes produtores de café, estabelecendo a presença de outros grupos na condução política

do país, reordenando as estruturas econômicas, políticas e sociais na busca da construção

do consenso, a fim de se evitar mudanças na estrutura social. A preocupação com a

educação pautou-se no entendimento de que era necessário implementar esforços

governamentais específicos, direcionados, sobretudo, à classe trabalhadora, já que se fazia

imperativo consolidar o processo de modernização nacional, no “reconhecimento de que a

civilização e o progresso do país eram um produto do trabalho e da educação” (GOMES,

2003, p.446). A escolarização se constituiria a partir do ditame da manutenção do

ordenamento jurídico do país, garantindo, assim, uma condução pacífica para a

implementação do regime que se instalava no poder. Urgia basicamente formar para o

trabalho, segundo a ideologia de reconstrução social, pela educação e, por isso, a escola

________________________________

1 – Este modelo de voto foi incluído na Constituição brasileira de 1824, definindo que o eleitor deveria possuir uma renda líquida anual superior a 100 mil réis.

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apresentava-se como meio indispensável para este fim, pois, sem ela, entendia-se que “seria

difícil formar o cidadão e torná-lo força produtiva eficaz” (CURY, 1988, p.19).

1 - O contexto Brasileiro

O início da década de 30, do século XX, caracterizou um tempo atravessado por

inúmeras mudanças no cenário político, econômico e social do país, tendo como base o

movimento de 1930 encabeçado pela Aliança Liberal liderada por Getúlio Vargas, que se

constituiu na oposição ao domínio das oligarquias cafeeiras, até então mandatárias dos

rumos políticos da nação. A decadência deste segmento social já se esboçava a partir da

década de 1920, em decorrência das crises geradas na economia mundial, que culminaram

na quebra da bolsa de valores de Nova Iorque no ano de 1929. Com o declínio da

estrutura agro-exportadora do país, outras forças sociais se estabeleceram como promotoras

de uma nova ordem econômica, caracterizada pela idéia de desenvolvimento como

condição necessária para a superação de nosso atraso em relação a outras nações

consideradas desenvolvidas, já que “nos anos 30, o Brasil não seguiu rumos muito

distintos dos que estavam sendo trilhados pelos países europeus e que eram objeto da

atenção dos brasileiros ilustrados” (OLIVEIRA, VELOSO E GOMES, p.07).

Na elaboração dessas mudanças, então idealizadas pela classe média e pela nova

burguesia industrial, implementou-se, a partir do estabelecimento de Vargas no poder, um

processo de centralização política que se definiu no início do governo provisório e

posteriormente, radicalizou-se com a implantação do Estado Novo em 1937. A ascensão

de Getúlio Vargas ao poder deslocou do centro das decisões governamentais a antiga

oligarquia do café, evidenciando, assim, uma transformação nas relações de dominação.

Percebe-se que o pós-30, apesar de apresentar um quadro que demonstrava a saída do poder

dos antigos barões do café, foi muito mais um reajuste interno entre os setores dominantes

da época, evidenciados pela nova burguesia industrial e pela antiga elite agro-exportadora,

pois “do ponto de vista político observa-se uma acomodação entre os dois setores da

burguesia. O novo governo é o resultado de uma aliança no próprio interior da classe

dominante” (SILVA, p. 18).

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Na medida em que o país intensificava seu processo de industrialização, que se

daria a partir da importação de novas tecnologias e de capitais externos e tendo como

principal gestor o próprio Estado, as idéias nacionalistas encontraram importante

relevância. O aumento significativo da massa de trabalhadores operários passou a ocupar

os espaços urbanos, transferindo assim, aos poucos, a concentração de mão-de-obra do

universo agrário-exportador, dominante até então, para as cidades. A noção de brasilidade

deveria ser suficientemente forte a ponto de incutir nos brasileiros a necessidade de

exaltação dos heróis, de reconhecimento dos valores nacionais, além, é claro, do culto às

autoridades, evidenciando desta maneira a idéia de pertencimento a uma nação,

anunciadora de um futuro promissor.

A necessidade do desenvolvimento econômico do país, explicitada no discurso

modernizador desse período, estava calcada no entendimento expresso pelo governo de que

seria a partir do crescimento da economia nacional que se consolidaria a garantia de

unidade e ordenamento da sociedade. Tal desenvolvimento deveria integrar as diversas

regiões brasileiras em prol de um ideal comum, além de fortalecer a imagem de nosso

potencial frente aos outros países. Isto era visto como indispensável, pois “dada a ênfase

em que se encontrava o capitalismo, em termos internacionais, marcado pela presença

hegemônica do capital monopólico, o Brasil não poderia fugir a esses ditames” (BRITO,

p.10).

Com uma característica política marcadamente centralizadora, o governo de Vargas

estabeleceu desde o início várias medidas para obter uma base de apoio ao seu movimento

revolucionário, de modo a poder garantir a manutenção da ordem nacional. Isso, através

de atos e decretos que fortaleciam a concentração do poder no Executivo, como, por

exemplo, a dissolução do Congresso Nacional e a nomeação de interventores para os

governos dos diversos estados da federação. Segundo Maria Celina D’Araújo, “Um

Estado-Nação forte era o caminho vislumbrado como a saída para o século XX. Isso pode

ser resumidamente traduzido como autoritarismo político e ideologia nacionalista

extremada” (2000, p.13)

Foi na esteira dos interesses de Estado, então propalados pelo governo Vargas, que a

educação apareceu como um dos grandes problemas nacionais a serem resolvidos e que

mereceu, de fato, significativa importância no período. Através da criação de todo um

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aparato administrativo, o governo passou a tratar o setor educacional como um dos

principais pilares para a organização e ordenamento da sociedade. Uma das primeiras

medidas indicadoras deste aspecto é a criação, ainda em 1930, do Ministério da Educação e

Saúde Pública, que passou a estabelecer especificamente para esta área parâmetros

decisivos para a afirmação da política educacional brasileira. O novo Ministério tinha como

responsável o mineiro Francisco Campos, que permaneceu no cargo até 1934, instituindo

um conjunto de medidas que seguiam o movimento de reformas educacionais,

protagonizado durante as primeiras década do século XX por alguns estados do país, entre

eles Santa Catarina.

A questão educacional, na década de 1930, pode ser avaliada pela forte percepção

de que era indispensável a formação de indivíduo disciplinado para o acatamento das

determinações do Estado Nacional, entendido como único produtor e defensor do potencial

de progresso da nação. Desta maneira, seria evidenciado que o país, então ‘civilizado’,

estaria apto a inserir-se no contexto do mundo moderno industrial. Segundo Marta

Carvalho, “obra de moldagem, a educação era o instrumento com que contavam as ‘elites’

para unificar, disciplinar, moralizar, homogeneizar e hierarquizar as populações brasileiras,

com vistas à efetivação de um particular projeto de sociedade” (1999, p.21). A busca destes

propósitos encontrava-se balizada na necessidade que a elite tinha de amalgamar a

população das classes subalternas na perspectiva do sentimento de pertença à nação, para

que fossem evitadas convulsões sociais, especialmente entre os trabalhadores. Portanto,

apesar de ter-se passado mais de um século de independência política e autonomia

institucional, a educação ainda continuava a ser propagada na intenção de conduzir a

população para o acatamento da ordem, com vistas a eliminar comportamentos que

ameaçassem a estrutura social vigente.

Na consolidação desse ideário, um significativo passo foi dado quando da

elaboração e promulgação da Constituição de 1934, que apresentou pela primeira vez em

nossa história um capítulo específico para a Educação, formalizando, deste modo, no

âmbito federal, a possibilidade de criação de uma política educativa abrangente e

articulada. Assim, caberia à União a competência de

“traçar as diretrizes da educação nacional” e “fixar

o Plano Nacional de Educação”, sendo que este “deveria ser entendido como o desenvolvimento lógico de alguns

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pontos previstos na própria Constituição, como o ensino primário integral, gratuito, de frequência obrigatória, a liberdade de ensino, a fiscalização, a obrigatoriedade da língua pátria, o reconhecimento de estabelecimentos particulares” (HORTA, 1996. p. 143).

A preocupação com o ordenamento da população vinha atravessando todo o

processo de construção do Estado brasileiro, desde a Independência. No fortalecimento da

idéia de modernização nacional a educação entrou vigorosamente em pauta nas discussões

políticas e sociais das primeiras décadas do século XX. Diferentes setores sociais passaram

a tomar para si a tarefa de pensar uma educação para o povo brasileiro, embora cada um

deles faria sua defesa em favor de seus próprios interesses. Nesta perspectiva,

“havia os que preferiam a educação humanística sobre a técnica; os que defendiam o ensino universal contra os que preferiam escolas distintas para cada setor da sociedade; os que se preocupavam com o conteúdo ético e ideológico do ensino contra os que favoreciam o ensino agnóstico. Havia os defensores da escola pública e os guardiães da iniciativa privada; os que propunham toda ênfase na formação das elites e os que davam prioridade à educação popular” (Schwartzman, p.69).

Não obstante uma idéia centralista em âmbito federal, o texto constitucional

permitia aos Estados a elaboração de leis que pudessem complementar as possíveis lacunas

da legislação central. As diretrizes gerais a serem seguidas, no entanto, seriam as

expressas na Carta Constitucional e à elas as normatizações estaduais deveriam estar

subordinadas. Apesar da curta duração da vigência da Constituição de 1934, a nova Carta,

outorgada em !937, em função do golpe que instituiu o Estado Novo, não diferiu muito seu

texto em relação à educação, mas entre outras medidas “retirou a vinculação de impostos

para o financiamento da educação, restringiu a liberdade de pensamento, colocou o Estado

como subsidiário da família e do segmento privado na oferta da educação escolar” (CURY,

2005. P.25).

O que fica evidente é que muitos foram os projetos educacionais para a época e

distintos eram os seus componentes que passaram a exercer uma influência cada vez mais

forte no cenário político nacional. A questão educacional passou a ser foco central de

discussões para a qual se voltaram as atenções tanto dos diferentes setores sociais quanto do

próprio poder estatal. Esse período ficou marcado pelo forte protagonismo que o poder

federal estabeleceu para regular as diretrizes do ensino para todo o país. As correntes de

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pensamento naquele período polarizavam-se entre os renovadores do chamado Movimento

da Escola Nova e o grupo ligado à Igreja, que se entendia como Movimento de Renovação

Católica. Ainda que formassem grupos com idéias distintas, fica evidente que o que cada

um deles pretendia era a preponderância de seus interesses na condução do processo

histórico de formação de um sistema educacional no país, tendo como horizonte a

necessidade de manutenção da estrutura social vigente.

No movimento de renovação da religião católica no Brasil, que se operou na década

de 30, identificado principalmente pela atuação do Centro D. Vital, pelo Movimento de

Ação Católica e, também, pela revista do próprio movimento intitulada A Ordem, o

propósito era o de redefinir a influência do catolicismo sobre a sociedade em geral. Ainda

que num primeiro instante os católicos tenham se posicionado contra o movimento

‘revolucionário’, que era visto pela Igreja como tradutor de idéias perigosas e

corporificadas na articulação com os poderes da ciência e da técnica, poucos anos depois

ocorreu uma aproximação substancial entre Igreja e Estado, através do trabalho de

Francisco Campos, que buscava evidenciar e conciliar interesses similares entre as duas

instituições. A religião católica passou a engajar-se no novo governo a ponto de

identificar, agora, a ‘revolução’ como a maneira pela qual poderia alcançar sua devida

supremacia. Diante do avanço cientificista, foi necessária uma revisão no interior da

própria Igreja, propondo-se, então, uma sociologia cristã, que deveria primar pela busca da

razão para a fé. Desta maneira, caberia a ela “a tarefa de reespiritualizar a cultura,

acabando de uma vez por todas com a incompatibilidade entre a religião e a ciência”

(Schwartzman, p.74).

Do outro lado deste debate, como vimos, encontravam-se os renovadores do

Movimento da Escola Nova que definiam um projeto balizado na escola pública, gratuita,

universal e laica. Para esses renovadores, cabia ao poder público a tarefa de proporcionar a

educação para todos, criando, assim, um nível básico de igualdade de oportunidades, já que,

segundo entendiam, as diferenças seriam demonstradas pelas capacidades individuais. A

finalidade deste ensino leigo seria a de “formar o cidadão livre e consciente que pudesse

incorporar-se, sem a tutela de corporações de ofícios ou organizações sectárias de qualquer

tipo, ao grande Estado Nacional em que o Brasil estava se formando” (Idem, p.70).

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A movimentação dos escolanovistas teve como documento norteador o Manifesto

dos Pioneiros da Educação Nova, elaborado por Fernando de Azevedo, mas tendo recebido

a assinatura de diversos intelectuais da época, entre eles Anísio Teixeira, Lourenço Filho e

Francisco Campos, que foram responsáveis pelas principais reformas de ensino em seus

estados e no Distrito Federal. O Manifesto, apesar de não ter sido encabeçado por um

grupo homogêneo, representava um poderoso recurso de afirmação de seus signatários, pois

“ concebido como instrumento de legitimação do grupo e de seu projeto modernizador, o

Manifesto ganha estatuto de marco inaugural da renovação educacional no Brasil”

(XAVIER, p. 9), em contraponto aos católicos que foram os principais condutores, até

aquele momento, da educação brasileira ao longo de sua história.

Os reformadores se apresentavam como interlocutores de um projeto que visava a

melhoria da educação como principal instrumento de regeneração da sociedade, chamando

para si a responsabilidade desta pretensão, já que “se organizavam e se autopropunham

como heróis modernizadores” (EVANGELISTA, p.18). Segundo suas propostas, era

necessária a formação de uma cultura que sustentasse a racionalização do trabalho através

da técnica e da ciência. Para eles, a consolidação de políticas de homogeneização da

sociedade e a necessidade de expandir o mercado projetaria o país internacionalmente,

visando a inserção decisiva deste no cenário mundial capitalista. A organização do campo

educacional era parte integrante desta estratégia. O predomínio dos ideais renovadores,

como referência sobre os aspectos educacionais, de acordo com Miriam Warde, “resulta

terem eles construído, de uma vez para sempre, toda História e toda Teoria, porque

construíram o nosso ideário e nossa memória”. (1990, p.09).

A grande mudança do cenário educacional brasileiro começou a acontecer quando o

novo governo assumiu a educação como fundamental, elegendo-a como ponto central de

apoio para seus projetos modernizadores. Passa, então, a tomar para si os

encaminhamentos deste setor, através da criação de estruturas administrativas que

concedem à educação o patamar de destaque necessário, enfatizando-a como o principal

fator gerador de progresso.

O século XIX foi atravessado por um ideal de civilização que deveria ser

concretizado para o progresso do país nas décadas de 30 e 40 do século XX e a construção

da nacionalidade se constituiu como um dos pilares do projeto modernizador que o Estado

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pretendia alcançar. A partir do poder estatal, a nacionalização do ensino encontraria um

momento importante para a sua objetivação: o período estadonovista. A concentração de

esforços neste sentido estava imbuída da necessidade de reduzir-se a influência dos

imigrantes que, através de suas tradições e idiomas, exaltavam a importância de suas

origens em detrimento do ideal nacionalista da época.

Ainda que os debates fossem muitos e que a educação ocupasse o centro das

atenções, nada foi mais eficaz, na condução das questões educacionais da década de 30, do

que a ingerência do próprio Estado. Era do poder estatal que emanavam as decisões sobre

os rumos a serem seguidos. Ao estruturar desde o início de seu mandato um aparato

administrativo educacional, Vargas teve nele um dos principais pilares de sustentação da

ordem vigente, tanto no período de 1930 até 1937 (quando assumiu provisoriamente e

depois constitucionalmente em 34), quanto no momento do período estadadonovista,

correspondente aos anos mais centralizadores de seu governo.

O período do Estado Novo é identificado, portanto, através da supremacia do

Executivo sobre os demais poderes, agindo de maneira autônoma, fazendo “do Estado a

entidade suprema, identificado com a própria nação” (GOULART, p.15). Este pensamento

e prática política acabam por ser difundidos para a sociedade, a partir de uma ideologia que

apresenta o governo como o único capaz de oferecer e realizar as ações necessárias para o

projeto de construção de uma nação forte, pois “o Estado Novo, é preciso ressaltar, teve

uma preocupação nítida em fazer produzir, ou aproveitar para seu uso, um conjunto de

princípios e idéias, pelas quais se auto-interpretava e justificava seu papel na sociedade e na

história brasileiras” (OLIVEIRA, VELLOSO E GOMES, p.09).

No ano de 1934, ainda antes do golpe de 1937, o mineiro Gustavo Capanema

tornou-se Ministro da Educação e Saúde Pública, dando seqüência ao processo de reformas

educacionais iniciadas, ainda, na década de 1920. Capanema também interferiu no âmbito

da legislação através de uma atuação caracterizada por uma série de propostas, leis e

decretos específicos para a educação. Nos hoje chamados “tempos de Capanema”, o que

ocorreu na educação foi expressão dos caminhos políticos trilhados pelo país, pois a grande

centralização das questões educacionais nas mãos do Estado ocorreu quando o governo

federal passou a normatizar a vida escolar através de leis que estabeleciam desde os

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conteúdos a serem ministrados até a cobrança de mensalidades, fixando ainda modelos a

serem seguidos, como o do Colégio Pedro II.

Faz-se interessante notar que todas as medidas tomadas nas décadas de 30 e 40 não

foram estabelecidas de maneira aleatória e arbitrária, pois neste período houve a elaboração

e a institucionalização de duas constituições, uma promulgada em 1934, quando Capanema

assumiu o Ministério, e outra em 1937, outorgada pelo recém declarado Estado Novo.

Nas diretrizes de 34, o governo federal atribuía aos Estados a responsabilidade de manter

seus sistemas educacionais em consonância com os traçados pela União. Nesta Carta,

aparece pela primeira vez a vinculação de uma parte dos recursos federais para

investimentos na área educacional. O mesmo ocorre em 37, quando o governo continua

mantendo seus parâmetros para fixar as diretrizes educacionais nos Estados. Ou seja,

durante o período Vargas a educação era considerada matéria de primeira instância pelo

Estado Nacional e os estados federados deveriam estar de acordo com as decisões

emanadas da União. Segundo Horta, “a concepção da educação como problema nacional

servirá para justificar uma intervenção cada vez mais intensa do Governo Federal nos

diferentes níveis de ensino e uma crescente centralização do aparelho educativo” (1994,

p.02).

2 – O Contexto Catarinense

Após a proclamação da República no país, os Estados brasileiros estabeleceram

algumas mudanças em suas administrações em decorrência da nova estrutura política que se

definia e influenciados, sobretudo, pelo novo regime consagrado em âmbito nacional. Pelo

texto constitucional de 1891, as antigas províncias passaram a ser Estados Federados,

contando com autonomia pelo artigo 65 e estando deste modo autorizados, ainda que de

maneira subentendida, a realizar diversas atribuições, uma vez que se concedia aos Estados

todos os “poderes e direitos que não lhes fossem negados por dispositivos do texto

constitucional” (2006, p.249).

Na esteira desta tendência de reformulações, o governo catarinense também

elaborou medidas perspectivadas nas idéias republicanistas. Uma dessas medidas foi no

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campo da educação, já que no início desse período observava-se que “o panorama geral da

instrução pública catarinense apresentava-se desolador” (FIORI, p.77). Pode-se constatar

esta situação, no entanto, desde os tempos imperiais, através das diversas dissertações aqui

mencionadas e que perfilaram a precária trajetória de diversos aspectos relativos ao ensino

público no Estado de Santa Catarina.

A educação era um instrumento de ordenamento dos indivíduos na busca da

efetivação de um projeto político da elite, que pretendia inserir o país no contexto de

modernização da época, oferecendo, sim, alguns meios de escolarização, mas tendo

bastante claro o tipo de instrução que deveria ser disseminado. Assim, para a população

pobre, “bastava fornecer elementos que reforçassem a obediência e a passividade, ou seja, a

condição de submissos às ordens e às leis em processo de constituição” (SCHMIDT, p.64).

A escola era anunciada como necessária, mas prevalecia o entendimento de que o

aprendizado das camadas subalternas deveria ser para o trabalho e isto se efetivaria na

prática, ou seja, aprendia-se a trabalhar, trabalhando. O que se pode perceber era o temor

da elite em relação à possibilidade de generalizar-se uma educação emancipadora, pois

“espalhar escolas de primeiras letras, possibilitando a alfabetização, poderia implicar a

desarticulação da ordem vigente” (AURAS, 2004 p.140).

Apesar de se poder constatar que o número de escolas primárias, bem como o de

matrícula e de freqüência, tenha aumentado no período inicial da República, o estado

catarinense apresentava situação desabonadora quanto às condições adequadas para o

aprendizado de seus alunos, tanto no que tangia à precária situação dos estabelecimentos de

ensino, como também ao nível de formação do professorado, que em sua maioria era

nomeado interinamente, sem passar por concursos, eliminando desta maneira a necessidade

de demonstrar seus conhecimentos em provas públicas. No entanto, algumas iniciativas

de reestruturação do ensino público aconteceram neste período através de ações como a

reforma do governo de Manoel Machado, que reorganizou a instrução pública pela lei nº

155 de 1892, quando “o Instituto Literário e Normal se transforma no Ginásio

Catharinense, tendo como anexo uma escola normal destinada ao professorado público”

(DAROS, p.13).

Ainda outras modificações chegaram a ser planejadas nos governos de Hercílio Luz

e de Gustavo Richard, na pretensão de que fossem reformuladas algumas questões relativas

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à instrução pública, “mas, somente em 1911, iria ocorrer uma das mais decisivas reformas

do ensino público de Santa Catarina” (FIORI, p.79), que aconteceu no mandato de Vidal

Ramos (1910/1914), quando este chamou o educador paulista Orestes Guimarães para

incumbi-lo de efetuar uma reforma de ensino que colocasse o Estado catarinense em

harmonia com a reforma educacional que havia se estabelecido em São Paulo, que se

transformou numa referência, num modelo a ser seguido. Segundo Fiori, “a reforma de

ensino do ano de 1911 reorganizou administrativa e pedagogicamente as escolas públicas

catarinenses” (1991, p. 87).

Observa-se que a reforma iniciada em 1911, pela iniciativa do governo estadual,

pretendia uma considerável mudança nos aspectos educacionais catarinenses a partir da

reorganização das diretrizes básicas da educação pública. Esta iniciativa é considerada um

marco na história da educação catarinense, por ter sido criada a Escola Normal para a

formação de professores e, também, ocorrido a criação dos Grupos Escolares, então

considerados símbolos de modernidade, na medida em que foram organizados a partir de

uma visão que englobava a estruturação do método, a administração escolar, os programas

ministrados e os espaços de aprendizagem. Ao indicar a necessidade de formalizar a

educação catarinense, esta reforma pretendeu uniformizar o ensino na perspectiva da

afirmação de uma rede de escolas públicas.

Apesar de indicar para uma reestruturação ampla no sistema educacional

catarinense, o principal aspecto apontado como imprescindível para a elaboração de uma

nova estrutura educacional era o relacionado às novas técnicas pedagógicas, que deveriam

ser empregadas como métodos de ensino. Para os educadores da época, era preciso mudar

a maneira de ensinar para se poder instaurar um novo modo de aprendizado, e esta nova

pedagogia se desenvolveria através do chamado ‘método de ensino intuitivo’, que segundo

a ótica dos discursos republicanos, “vinha transformando o destino das sociedades em toda

parte” (TEIVE, p.32). O reformador Orestes Guimarães, designado para a pretendida

reestruturação educacional, entendia que a escola era o principal meio onde se realizariam

mudanças, e por isso era preciso convertê-la “em instância civilizadora e inculcadora dos

novos valores e normas de comportamento” (Idem, ibidem p.29), e o caminho para se

alcançar isto “era organizá-la e regê-la sob os pressupostos do método de ensino intuitivo

ou lição de coisas” (Idem, ibdem, p.29). Esta nova prática pedagógica se caracterizava

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pela concepção de ensino através do contato direto do educando com os objetos, ou seja, a

educação se desenvolve pelas coisas, antes de ser pela palavra. Segundo Gladys Teive,

“para além da memorização e da repetição de palavras e de textos, o novo método de

ensino propunha o contato direto da mente com as coisas, com o objeto, com a natureza:

intueri, intuitus” (p.34).

No afã de conduzir os rumos educacionais do Estado catarinense na direção do

pretendido progresso, reestruturar a prática pedagógica se acenava como necessário na

medida em que a instrução seria o meio de desenvolver, na criança, “o caráter, a disciplina

e as qualidades morais, isto é, dirigir os seus sentimentos e regular a sua conduta” (Idem,

ibidem, p.250). Portanto, reformular significava organizar de modo a que os antigos

valores sociais permanecessem inalterados. Através do controle do comportamento e da

normatização do cotidiano escolar se processaria a manutenção da velha ordem liberal

excludente.

Convém registrar (por ser largamente expressivo da política de continuidade da

marginalização social das maiorias) que o momento dessa reforma é o mesmo em que

ocorreu em Santa Catarina o maior conflito social de nossa história: a Guerra do

Contestado. Neste episódio, caboclos que viviam na região fronteiriça entre Santa Catarina

e Paraná foram expulsos das terras que ocupavam, evidenciando uma determinante ação de

controle social por parte do poder republicano. Segundo Auras, “ os caboclos da área

contestada entre Santa Catarina e Paraná, analfabetos, isolados do restante do país, no

interior de uma estrutura de poder coronelista, vivendo apenas da obtenção dos ‘mínimos

vitais’, ergueram várias cidade santas e nelas fundaram a irmandade, como seu modo

concretamente possível de dizer ‘não’ ao avanço da ordem capitalista” (2001, p.17).

Assim, no momento em que o governo de Vidal Ramos enunciava importante

reestruturação na educação da população catarinense, contraditoriamente, porém, tratou de

implementar uma severa política de ordenamento social, que demonstrava, a ferro e fogo, o

quanto a ordem oligárquica vigente deveria ser mantida no interior desta mesma sociedade.

A reforma educacional de 1911 configurou-se como diretriz de ação no âmbito

escolar catarinense até meados da década de 1920, sendo que após o movimento de 1930

outras reformas seriam idealizadas, na esteira dos pressupostos nacionais de defesa da

reestruturação da educação.

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Nos anos 30, o Estado de Santa Catarina também passou a vivenciar os efeitos da

política nacional autoritária do governo Vargas, principalmente através da presença direta

de interventores enviados para gerir o governo estadual. Inicialmente, assumiu como

interventor o General Assis Brasil, que permaneceu no cargo até 1932, quando o Major

Rui Zobaram vem substituí-lo. Como a presença de interventores de outros estados

incomodava muito os políticos catarinenses, principalmente aqueles ligados às oligarquias,

Getúlio Vargas resolveu então nomear o lageano Aristiliano Ramos para o cargo de

governador. Mas tal indicação não significou consenso entre os políticos da época, que

contavam com o Partido Liberal Catarinense, cuja liderança estava nas mãos da família

Ramos, e os partidos de oposição a esta legenda, como o Partido Republicano, liderado por

Adolpho Konder e a Legião Republicana Catarinense, encabeçada por Henrique Rupp

Junior, além de outros partidos de menor expressão.

Após a Constituição de 1934, os Estados realizaram eleições indiretas através das

Assembléias Legislativas para os respectivos governos estaduais. A disputa em Santa

Catarina se concentrou no nome de dois primos, ambos rivais políticos: Aristiliano Ramos

e Nereu Ramos. Isto gerou um rompimento dentro do próprio Partido Liberal e uma

ferrenha oposição do derrotado Aristiliano ao governo do eleito Nereu. Naturais do Estado,

integravam a oligarquia política dominante em Santa Catarina. Mesmo após o golpe

desencadeado em 1937, Nereu Ramos permaneceu à frente do governo catarinense como

interventor, pois compartilhava dos ideais getulistas de uma política autoritária e

centralizadora. Sua administração imprimiu grande importância à área educacional, ao

balizar-se em “duas temáticas principais: a educação primária e a saúde pública”

(PIAZZA, p.144). Político de grande prestígio em seu território natal, Nereu Ramos, à

frente da administração estadual, “imprimiu sua marca contribuindo para levar o pequeno

Estado sulino à linha de frente no processo de modernização do país” (CAMARGO, p.

123).

O governo catarinense buscava apresentar consonância de suas ações com as dos

projetos políticos dos grupos dominantes. Observou-se também na área econômica

algumas intervenções do poder público, no sentido de integrar o território catarinense ao

projeto de modernização. Tendo em seus primórdios uma base econômica calcada

essencialmente na produção de subsistência, passou o Estado catarinense, ao longo do

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século XIX, sem grandes alterações na estrutura de sua economia. Ao se delinearem as

primeiras décadas do século XX, ocorreram mudanças que se configuraram como

significativas, verificadas principalmente no padrão de crescimento da economia que estava

baseada “na pequena propriedade e nas atividades tradicionais” (FILHO, 2207, p.71). A

estruturação na pequena propriedade configurou-se hegemonicamente como padrão de

crescimento da maioria das atividades econômicas em Santa Catarina, até praticamente os

anos de 1940. Segundo Alcides Goularti Filho, os anos de 1880 a 1945 seriam o

“momento em que se constitui e cresce o capital industrial, predominando um padrão de

crescimento baseado na pequena produção e no capital mercantil” (2007, p.33) e é o

período em que se criam e se desenvolvem as atividades ligadas às “industrias madeireira,

alimentar, carbonífera e têxtil” (Idem, ibidem p.72).

A desejada modernização que se vislumbrava no início do século XX chegou ao

Estado a partir do investimento na rede de transporte, com a construção de estradas de ferro

e portos, além da Ponte Hercílio Luz (que fez a ligação do porto da capital às demais

localidades estaduais), assim como o estabelecimento da ligação entre o sul e o sudeste do

país atravessando o território de Santa Catarina pela ferrovia São Paulo-Rio Grande. Esta

estrada de ferro possibilitou uma maior viabilidade de deslocamento das exportações dos

produtos fabricados no Estado. O investimento nas vias de transporte possibilitou o

desenvolvimento da economia catarinense ao estabelecer não só a integração das diversas

regiões do Estado entre si como também a ligação do território às outras unidades da

federação.

Nas décadas de 1930 e 1940 contava-se com algumas ferrovias, que estavam

localizadas em regiões estratégicas para o comércio. Uma delas encontrava-se na região do

vale do Itajaí ligando Blumenau a Ibirama, utilizada para o transporte de pessoas, alimentos

e madeira. Para o escoamento da produção de carvão, foi construída a Estrada de Ferro

Teresa Cristina no sul do Estado e para a região do planalto norte construiu-se a ferrovia

Dona Francisca para o transporte da erva-mate. No oeste verificou-se o escoamento de

uma diversificada produção manufatureira e comercial através da ferrovia São Paulo-Rio

Grande. Nesta região predominava um regime de produção estruturado na pequena

propriedade que tratava de comercializar o excedente, fato que determinou “uma

acumulação lenta e pulverizada e ao mesmo tempo possibilitou o surgimento de uma

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diferenciação social” (Idem,ibidem, p.78). Tal diferenciação foi observada quando

pequenos proprietários passaram da condição de colonos para a condição de “grandes

madeireiros ou proprietários de frigoríficos” (Idem, ibidem, p.78). Portanto, essas ligações

intra-estadual e inter-estaduais foram de fundamental importância para “desenvolver o

mercado local e integrar a região ao mercado nacional” (FILHO, p.74).

Apesar de Santa Catarina firmar-se a partir de uma estrutura preponderantemente

agrário-mercantil, nos anos de 1930, algumas regiões destacaram-se na industrialização,

como o Vale do Itajaí e a região de Joinville. No sul se desenvolveu a indústria de

extração do carvão e no planalto a exploração da indústria madeireira, enquanto na capital

consolidava-se a estrutura político-administrativa. Mas a economia dos anos de 1930

enfrentou problemas, principalmente devido ao cancelamento dos acordos comerciais

estabelecidos com a Alemanha, em virtude da campanha nacionalista determinada pelas

diretrizes do governo varguista. De maneira geral, pode-se afirmar que na década de 1930

e início da de 1940, do ponto de vista econômico, havia a predominância das atividades

tradicionais, especialmente as das indústrias têxtil, madeireira e alimentícia, fato

determinado principalmente “devido à baixa capacidade de acumulação (excluindo os

têxteis), à desintegração econômica e à falta de aporte financeiro” (Idem, ibidem, p.133).

Com relação à educação, em Santa Catarina, os anos de 1930 e 1940 apresentaram

algumas modificações no processo pedagógico e institucional na tentativa de reorganizar o

ensino catarinense, que continuava a ser indicado como um dos grandes problemas a serem

equacionados no âmbito do processo de modernização da sociedade. Eram apontadas

como necessidades prioritárias, a formação de professores, a nacionalização do ensino e a

uniformização dos métodos pedagógicos. As mudanças pretendidas foram definidas na

reforma educacional que então se processou, quando foi criado o Departamento de

Educação, subordinado à Secretaria de Interior e Justiça, extinguindo-se a antiga Diretoria

de Instrução Pública, órgão que foi responsável pela gênese da institucionalização do

ensino no Estado desde meados do século XIX.

Com vistas a estabelecer uma reformulação no ensino catarinense, o Departamento

de Educação, sob a orientação do Diretor Luiz Sanchez Bezerra da Trindade, formulou

diretrizes educacionais que ficaram conhecidas como “Reforma Trindade”, segundo Neide

Fiori ( p. 121). Além de Trindade, dois outros nomes foram importantes nesse processo de

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reformas, que seria o do Subdiretor Técnico Elpídio Barbosa e o do Inspetor Federal de

Nacionalização do Ensino, João dos Santos Areão, ambos inspetores escolares. Apesar de

respeitados por muitos, a oscilação de poder de mando referente às questões educacionais

em Santa Catarina entre esses três professores - que inclusive chegaram a ser conhecidos

como a “Santíssima Trindade da Educação” (FIORI, 124) - durante as décadas de 1930 e

1940, não agradava a alguns que consideravam serem detentores de excessiva força nas

decisões relativas às questões do ensino catarinense. Ao proporem um discurso que

anunciava novas técnicas de ensino, inspiradas principalmente nos pressupostos

escolanovistas de educação ativa, essa trinca de professores, entretanto, formava uma

diminuta elite intelectual, monopolizadora das diretrizes que deveriam conduzir os

caminhos da educação em Santa Catarina. Tratava-se, portanto, de intelectuais incumbidos

da responsabilidade de constituir um sistema de ensino mais consonante com os ideais de

modernização, que, neste afã, acabaram imputando em grande medida para si mesmos, esta

tarefa. Na condição de componentes do aparelho estatal, esses profissionais formaram um

bloco fortalecido, já que o “trânsito livre pelo campo político lhes conferiu poder de mando

suficiente para se tornarem relativamente autônomos na administração do Estado”

(BOMBASSARO, p.38).

A dimensão de auto-suficiência, expressa pelo campo educacional, principalmente

pela atuação desses educadores, acabou por evidenciar uma significativa independência do

setor em relação à burocracia governamental, o que parecia desagradar ao governo

intervencionista estabelecido. Por este motivo, no ano de 1938, o interventor Nereu

Ramos resolveu criar a Superintendência Geral de Ensino da Secretaria do Interior e

Justiça, subordinando, deste modo, o Departamento de Educação a este novo órgão, “num

hábil estratagema – sem exonerações que poderiam provocar antipatias públicas” (FIORI,

p.124), na tentativa de minimizar a concentração de poder nas mãos do Professor Luiz

Trindade, evitando, assim, possíveis desavenças com prováveis demissões ou afastamentos.

Para o cargo de Superintendente Geral, o governador Nereu Ramos nomeou o educador

paulista Sebastião de Oliveira Rocha, que era o diretor da Escola Normal de São Carlos.

Sua vinda para Santa Catarina ocorreu por solicitação do governo catarinense, seguindo

uma tendência da época que era, em vários Estados do país, a de se chamar educadores do

Estado de São Paulo para que conduzissem reformas educacionais. A colaboração de

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Sebastião Rocha, entretanto, foi rápida e trouxe poucas mudanças à educação catarinense,

pois sua atuação “não se caracterizava por preocupar-se marcantemente com a qualidade

de ensino. Sua grande preocupação era que as escolas públicas apresentassem elevados

índices de aprovação de alunos” (Idem, p. 125).

Não tendo alcançado êxito com a presença do professor paulista, o governador

Nereu Ramos nomeou então em 1940, para Superintendente Geral, o professor Elpídio

Barbosa, que assumiu o cargo até 1942 quando ocorreu a extinção deste órgão e a criação

da Secretaria da Justiça, Educação e Saúde. Neste momento, o Departamento de

Educação, relegado até então a segundo plano, volta a ganhar a importância que lhe fora

atribuída quando de sua criação, no que concerne à condução das decisões sobre o ensino

público em Santa Catarina. Fiori aponta que “ o Departamento de Educação readquiriu sua

posição de mando no ensino público estadual, para uma fase de grandes realizações” (p.

125).

O Departamento de Educação do Estado de Santa Catarina, criado em 1935, por

ordem do governador Aristiliano Ramos, teria como principal função a de adotar e conduzir

“as novas normas para regerem os Institutos destinados à formação do professorado, para

aplicação de novos métodos de ensino” (Decreto 713, 1935). A necessidade de um

aparelhamento educacional mais atuante foi um dos pilares a justificar a criação deste órgão

administrativo. O Estado possuía um aparato educacional em funcionamento, mas era

necessário, naquele momento, determinar mais claramente de que maneira se faria a

condução das questões educacionais, principalmente no que dizia respeito àquelas relativas

às práticas pedagógicas, que estavam em pauta em função das eminentes idéias da chamada

Escola Nova. Esse modelo de educação pautava seus pressupostos numa escolarização

mais cientificista, amparando-se para isto em todas as técnicas possíveis para impulsionar

mais fortemente a formação da conduta pedagógica.

Os dois primeiros anos de atuação do Departamento de Educação tiveram como

condutor das mudanças, o Diretor Luiz Sanches Bezerra da Trindade. Nascido em

Florianópolis no ano de 1892, tornou-se professor de curso primário e depois alcançou

diversos cargos em instituições estatais, chegando na década de 1920 ao cargo de Inspetor

Escolar. Além das atividades educacionais, desempenhou outras funções, como a vereança

em Florianópolis no ano de 1936. À frente do Departamento, o professor Trindade

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conduziu uma série de reformulações no sistema de ensino catarinense, criando o

Departamento de Educação e reestruturando o processo de formação de professores, ao

transformar as Escolas Normais em Institutos de Educação, a fim de serem implantados

novos métodos de ensino, tendo estas medidas sofrido “forte influência do sistema de

ensino do Distrito Federal, remodelado por Fernando de Azevedo” (FIORI, p. 121).

Seguindo parâmetros que norteavam a conjuntura política marcada pelo

crescimento econômico, novas diretrizes precisavam se efetivar na educação e uma das

balizas ideológicas utilizadas foi o movimento de renovação educacional, apresentado pelo

Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova. A partir de indicativos norteadores dos novos

rumos pretendidos para a educação, os intelectuais que assinaram o manifesto apontavam

para a premissa de empreender a reconstrução nacional por meio da educação,

considerando que seria “impossível desenvolver as forças econômicas ou de produção, sem

o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento das aptidões à invenção, que

são os fatores fundamentais do crescimento de riqueza de uma sociedade” (Manifesto,

1984, p.407). Na visão dos renovadores, modernizar o ensino significava reagir de forma

sistemática aos antigos parâmetros da escola tradicional verbalista, que segundo suas

convicções, serviria a determinados interesses de classe, desconsiderando desta maneira o

potencial individual de cada educando. Segundo Saviani, “se a escola tradicional mantinha

o indivíduo na sua autonomia isolada e estéril, a nova educação, embora pragmaticamente

voltada para os indivíduos e não para as classes [formava para a] cooperação e

solidariedade entre os homens” (2007, p.244). A partir destes pressupostos, é possível

perceber algumas referências quanto a essas idéias de modernização nos documentos que

discutiam e mostravam aspectos e normas para a condução da instrução pública em Santa

Catarina.

Além do aspecto relativo à modernização da educação a partir de novos métodos de

ensino, outros itens também se configuraram como relevantes nas fontes primárias

consultadas, como a nacionalização do ensino e a ênfase ao necessário avanço da expansão

escolar. Um exemplo disto está na Mensagem apresentada pelo governador à Assembléia

Legislativa em 1937, quando indicou o aumento do número de escolas no Estado ao relatar

que, do ano de 1935 para 1936, “as escolas isoladas estaduais foram aumentadas em 48, as

municipais de 47, as particulares e subvencionadas de 26, os grupos de 6 e as escolas

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normais primárias de 5. As unidades escolares tiveram portanto, o aumento de 132 e a

matrícula de 11.776” (Relatório 1937, p.12). Ainda, segundo as palavras de Nereu Ramos,

“esses algarismos nos colocam entre os Estados que mais e melhor cuidam do problema

educacional” (Idem, p.12).

Entretanto, apesar de um discurso indicando compromissos com princípios

democratizantes, na medida em que apontava para uma educação única, laica, gratuita,

obrigatória e para a ampliação dos serviços escolares à maioria da população, faz-se

interessante notar que um aspecto de elementar importância para o processo de

democratização do ensino - que é a questão da obrigatoriedade escolar - era apresentado de

maneira pouco aprofundada ou até mesmo era desconsiderado em determinados momentos

do período em estudo. Ainda que se verifique a presença da lei de nº 301, do ano de 1939,

específica para esta finalidade, pouco pode ser observado de efetivo em Santa Catarina para

a concretização de uma escola para todas as crianças em idade escolar. Outro aspecto e

também de maior relevância era o da formação de professores, que norteou os parâmetros

do Decreto 713. Tal legislação foi criada considerando-se que havia a “necessidade da

adoção de novas normas para regerem os Institutos destinados à formação do professorado

para a aplicação de novos métodos de ensino” (Decreto 713, 1935). Segundo Daros,

“dentre as preocupações e estratégias políticas que faziam parte da pauta do governo dos

Ramos estava a política educacional, com destaque para a formação docente compreendida

como veículo de ordenação e modernização do ensino” (2005, p.24).

A chamada “Reforma Trindade” pretendia inserir na educação catarinense os

princípios educacionais que eram discutidos pelo Estado Nacional, buscando desta maneira

processar o ensino catarinense em consonância com as diretrizes gerais e centralizadoras do

governo de Getúlio Vargas. Como vimos, os debates pedagógicos que se faziam presentes

pelas várias correntes ideológicas, como a da Igreja, a dos militares e a dos renovadores,

respaldavam as discussões sobre a reformulação do ensino. Também presentes em Santa

Catarina, os ideais de reestruturação do ensino e da necessidade do emprego de novas

metodologias educacionais eram debatidos por aqueles que integravam os quadros

administrativos do Estado, especialmente os relacionados diretamente à área educacional,

como o do cargo de Diretor do Departamento de Educação, que conferia ao responsável por

este a condução geral dos rumos que deveriam ser trilhados pela escola catarinense.

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Ao enfatizar a necessidade de superar os tradicionais e arcaicos métodos de ensino e

implantar uma escola mais moderna e renovada para a formação dos educadores e dos

educandos, os discursos dos administradores ressaltavam a importância de se apresentar

novas diretrizes para a educação. Ao ocupar o primeiro posto de Diretor do recém criado

Departamento de Educação, o professor Luiz Bezerra da Trindade “tornou-se o principal

profeta dos novos métodos de ensino no Estado. Em suas falas, reafirmava que a

modernização pedagógica constituía a resolução dos problemas educacionais”

(BOMBASSARO, p. 16).

Era pela educação que se vislumbrava a possibilidade de concretização do ideal de

modernização do país, pois ela era vista como o ‘instrumento de reconstrução nacional e

estabilidade política” (MONARCHA, p.13), fundamental para a construção do futuro do

país. Em Santa Catarina, foi principalmente através do Departamento de Educação, com a

atuação inicial do professor Trindade, que os ditames propalados em âmbito nacional foram

ganhando força na condução do processo de reforma educacional. Era constante, em seus

discursos, a afirmação da necessidade de uma renovação pedagógica como horizonte para a

resolução dos nossos problemas educacionais. Entretanto, apesar dos elevados propósitos

constantemente apresentados em suas falas, a questão acerca de novos métodos de ensino

pouco era evidenciada nos documentos relativos ao ensino em Santa Catarina.

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CAPÍTULO II: A INSTITUCIONALIZAÇÃO DO DEPARTAMENTO

DE EDUCAÇÃO

1 – Considerações iniciais

Desde os tempos do Império e durante os primeiros anos da República, no país e

também nos estados, a instrução foi constantemente alvo de inúmeros debates, reformas e

revisões. A estrutura da organização educacional passou em diversos momentos por

novas formulações e reformulações. Através de dispositivos como leis, decretos-leis,

revisões constitucionais e outros mecanismos legais, o Estado procurou estabelecer suas

diretrizes na condução das questões educacionais. Estas se encontravam, explicitamente

ou não, interligadas ao contexto econômico e político no interior do qual eram elaboradas.

Vários documentos nos embasam na compreensão da pesquisa aqui desenvolvida,

ao fornecerem o material básico necessário para as análises que constituem o fundamento

deste trabalho. São essas fontes que permitem compreender as questões que permeiam o

processo em que o aparelho governamental foi se complexificando e, desta maneira, foi

estruturando os vários segmentos da área educacional catarinense no período em foco. As

falas presentes nos relatórios, decretos e leis, permitem compreender o delineamento

pretendido pelo governo para encaminhar os projetos relacionados à questão educacional.

É possível perceber um discurso que revela a necessidade de iniciativas ordenadoras

capazes de garantir a modernização pretendida pelo avanço das relações capitalistas, ao

mesmo tempo em que a educação, especificamente, constituía-se, cada vez mais, como

importante questão a ser equacionada pelo poder governamental, ainda que estas estivessem

“submetidas às relações, às vezes contraditórias e às vezes complementares, entre as

práticas tradicionais e as demandas de modernização exigidas por transformações de ordem

estrutural por que passava o país” (NOBREGA, p.114).

Dentre os materiais analisados, uma significativa fonte primária compõe a

estruturação básica do estudo aqui desenvolvido: o Decreto 713, do ano de 1935. Nele

determina-se um conjunto de normatizações para a reestruturação do ensino catarinense, ao

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apontar principalmente para a necessidade de uma melhor formação de professores no

Estado de Santa Catarina. Ao abordar diversos itens fundamentais, esta fonte é relevante

para se observar o que a legislação específica para a educação pretendia determinar no que

tange aos rumos da escola. O interesse do governo estadual inclinava-se, portanto, para a

implantação de uma administração da educação cada vez mais burocrática, num esforço

para incluir a escolarização catarinense na dinâmica do projeto político nacional,

centralizador e autoritário.

Outra fonte é representada pelos relatórios enviados pelo Departamento de

Educação ao governador do Estado sobre as questões relativas ao ensino catarinense, pois

neles há descrições anuais sobre os vários aspectos relativos a esta área da administração

estadual. Entre os itens do sumário que recorrentemente eram abordados no período de

1935 a 1939 estavam: educação popular; enumeração das unidades escolares; quadros de

matrículas; situação das escolas municipais, isoladas, particulares, normais e secundárias;

professorado, fiscalização do ensino; nacionalização do ensino; ensino religioso, caixas

escolares e obrigatoriedade do ensino. A partir do ano de 1939, esses relatórios passam a

abordar com maior detalhamento as informações apresentadas pelo Departamento de

Educação encaminhados agora diretamente ao presidente da República, fato que demonstra

a consonância com as determinações fortemente centralizadoras do Estado Novo. Nesses

relatórios, por vezes minuciosos em números, apresentava-se a movimentação do ano letivo

desenvolvida pelo Departamento relativa às unidades escolares e às questões referentes à

educação catarinense em geral.

Pode-se verificar, no estudo dessas fontes, que determinados aspectos foram

constantemente enfatizados, como é o caso da preocupação com a formação de professores

e o da intenção de generalizar a instrução através da obrigatoriedade do ensino. Estes

temas foram recorrentes na maioria dos documentos sobre a educação no período aqui

observado e por isso constituem a principal abordagem deste trabalho. Como já citado

anteriormente, também se configurou como tema relevante o da nacionalização do ensino.

Neste estudo, este aspecto não será contemplado, por já ter sido objeto de diversas outras

pesquisas da área, fornecendo através delas estudos consistentes para o entendimento da

questão. Os projetos de nacionalização do ensino, embasados no ideário nacionalista,

alcançaram considerável ênfase em Santa Catarina, especialmente por este território

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concentrar um grande número de imigrantes e escolas estrangeiras. Ao apontar para a

evidência de que era necessário se constituir um processo de assimilação cultural, através

da propagação de mecanismos ufanistas, enfatizava-se na escola a possibilidade de se

buscar a pretendida regeneração moral da sociedade, sendo este o meio pelo qual a nação

poderia chegar ao progresso propalado nos discursos republicanos.

O que parece revelar-se a partir desses documentos é o quanto a educação aparecia

inserida num projeto político que se apresentava ambíguo, na medida em que divulgava

ideais de modernização para a sociedade brasileira, em um momento de maior inserção do

capitalismo no processo de industrialização, mas que se estruturava num reformismo

conservador, determinado pelos setores sociais dominantes, na pretensão de conservar seus

privilégios de classe. No ensino,

‘dir-se-ia que a ‘modernização conservadora’, conceito com que

a historiografia tende a classificar a orientação política que

prevaleceu após a Revolução de 1930, poderia facultar a seguinte

leitura: enquanto conservadora, essa orientação buscava atrair a

Igreja para respaldar seu projeto de poder; enquanto modernização, a

força de atração dirigia-se aos adeptos da Escola Nova” (SAVIANI,

2007, p.270).

No momento em que era necessário modernizar o país e, assim, inseri-lo no

contexto de desenvolvimento econômico do cenário mundial, essas transformações não

poderiam ser estabelecidas aleatoriamente, entendendo o Estado, então, que deveria partir

dele a condução das tão propaladas mudanças. Nesse processo de consolidação das

relações capitalistas no Brasil, o encaminhamento das propostas econômicas e sociais foi

estabelecido a partir da compreensão de que era necessário centralizar o poder, para

assegurar uma reestruturação sem transformação, já que se tratava de uma troca de elites no

poder e não de uma ruptura de dominação. Ou seja, a manutenção da ordem social vigente

na estrutura formadora das relações sociais no país precisava de um governo

burocraticamente autoritário, para que não houvesse cisões ou rupturas drásticas dentro

desta sociedade de classes, justificando-se que “em um país desarticulado como o Brasil,

cabia ao Estado organizar a nação para promover dentro da ordem o desenvolvimento

econômico e o bem-estar geral” (FAUSTO, 2006, p.357).

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O Estado Getulista promoveu a centralização do poder inspirado em idéias que se

desenhavam em países da Europa, notadamente na Itália fascista de Mussolini, buscando

consolidar seu domínio em um delicado momento de sérios problemas na economia

mundial decorrentes da crise de 1929, para conduzir o país a um desenvolvimento

controlado de cima para baixo, na perspectiva de que o liberalismo não havia conseguido

assegurar o fortalecimento das economias mundiais. Por decorrência do temor da elite,

diante da possibilidade da sublevação das massas populares, em crescimento graças ao

processo de industrialização que se configurava no país, se estabeleceu a convicção da

necessidade de se concentrar o poder e de se delinear um regime autoritário que garantisse

a manutenção da ordem e do caminho para o progresso, inspirando-se, portanto, em idéias

antiliberais propagadas a partir dos modelos de Berlim e Roma, “o fascismo parecia

história de sucesso da década” (HOBSBAWN, 1995, p.137). Ao ser adotado por líderes

mundiais que pretendiam tornar seus respectivos países grandes potências, apresentou-se

como “um modelo no mundo a ser imitado por políticos promissores de um continente que

sempre recebera inspiração das regiões culturalmente hegemônicas” (Idem, ibidem, p.137).

Na área educacional brasileira, o governo do pós-30 também demonstrou desde seu

início a propensão para adotar medidas autoritárias e centralistas, no intuito de estabelecer

as decisões “do centro para a periferia. Em resumo, a educação entrou no compasso da

visão geral centralizadora (...) ou seja, o Estado tratou de organizar a educação de cima para

baixo” (FAUSTO, 2006, p. 337).

2 - O Decreto 713: A Reforma Trindade

Um dos documentos básicos analisados nesta pesquisa, como já dito, é o Decreto

713 de 08 de janeiro de 1935 do Estado de Santa Catarina, elaborado durante o governo do

Interventor Coronel Aristiliano Ramos, com o objetivo de realizar uma nova reforma no

ensino público - sendo que a última tinha sido a de 1911, de Orestes Guimarães - que

pretendeu, entre outros aspectos, conferir destaque à formação de professores para que

pudessem trabalhar e difundir novos métodos educacionais, o que é apontado na introdução

do Decreto quando trata de esclarecer que havia a “necessidade da adoção de novas normas

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para regerem os Institutos destinados à formação do professorado, para aplicação de novos

métodos de ensino”. Havia, portanto, o reconhecimento formal de que era necessário

formular uma nova estratégia para um antigo problema educacional, registrado desde os

tempos do Império, que era o da formação de professores.

O que se observa no documento em foco é a pretensão de reformular a estrutura

organizativa do campo educacional, demonstrando a ocorrência de um adensamento do

sistema de ensino no Estado com a criação de um Departamento, que deveria continuar

fazendo a regulação e a inspeção do processo educacional, como aliás, já ocorria com a

extinta Diretoria de Instrução Pública. Tal fato aponta para “um período caracterizado por

grande centralização e formalismo legal em matéria de ensino’ (FIORI, p.130). Através da

ação dos Institutos e Sub-diretorias, além das Circunscrições, também denominadas de

Inspetorias Escolares, o Departamento coordenaria as ações relativas à instrução escolar.

Esta reestruturação seguia traços do que então se delineava em âmbito nacional, na medida

em que o governo Vargas, desde seu início, elaborava medidas de complexificação do

aparelho estatal, na busca da consolidação de sua política centralizadora. Constata-se que

“o processo de centralização autoritária e a redefinição dos canais de acesso e influência

para a expressão dos interesses econômicos regionais junto ao poder central, ancoraram-se

na constituição de um aparato burocrático, que contribuiu de modo particular com o sistema

vigente” (GOULART, p.31). Entre algumas dessas medidas relativas ao setor educacional

está a criação, já em 1930, do Ministério da Educação e Saúde, tendo como responsável

Francisco Campos, que permaneceu no cargo até 1934, e ainda a formação do Conselho

Nacional de Educação, medidas que, juntas, “cuidariam de todos os aspectos ligados à

questão” (SILVA, p. 19). Assim que assumiu o Ministério, Campos organizou um

conjunto de ações que constituíram a chamada “Reforma Campos”, reestruturando a

educação nacional, articulando e organizando os ensinos primário, secundário e superior.

Em Santa Catarina, também se operacionalizaram algumas modificações, entre elas

a criação do Departamento de Educação, que, na pretensão de reformular o ensino,

indicava seguir os parâmetros nacionais. A criação deste Departamento, portanto,

demonstrava a consonância da administração catarinense com as medidas burocráticas do

poder federal quando da centralização levada a efeito pelo aparelho estatal, que

transformou a educação numa “atividade estritamente controlada por leis e regulamentos, e

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o Ministério da Educação e as Secretarias de Educação em órgãos de registro, fiscalização e

controle formal do cumprimento desses dispositivos de lei” (FIORI, p.130). Ao entender

que havia uma demanda imperativa pela adoção de novos métodos de ensino em Santa

Catarina, o Decreto 713 procurou apontar as principais modificações que deveriam reger

os rumos da educação a partir daquele momento. Apesar de assinalar com ênfase as novas

metodologias educacionais, especialmente embasadas na pauta dos renovadores da Escola

Nova - que defendiam o ensino ativo, público e laico, - a operacionalização dessas

exigências ainda aparecia fortemente vinculada a antigos formalismos, evidenciados pela

presença de mecanismos fiscalizadores, como a manutenção da prática de inspeção escolar

no controle das ações educativas. Expressava-se, desta maneira, o quanto o Estado ainda

necessitava vigiar a prática dos educadores e o cotidiano escolar.

Assim, compondo o quadro dos órgãos que auxiliariam na organização do sistema

de ensino, estavam as já existentes Inspetorias Escolares, que no ano de 1935 somavam 12

circunscrições, sendo que estas deveriam estabelecer uma melhoria na atuação da inspeção,

principalmente nas áreas rurais. De acordo com o Relatório de 1936 do D.E., as

Inspetorias estavam distribuídas da seguinte maneira:

Circunscrições Unidades Escolares 1ª Circunscrição Florianópolis (Séde), São José e Palhoça

199

2ª Circunscrição Blumenau (Séde), Indaial e Timbó

161

3ª Circunscrição Pôrto União (Séde), Mafra, Canoinhas e Itaiópolis

171

4ª Circunscrição Laguna, Imaruí, Tubarão, (Séde e Orleans)

198

5ª Circunscrição Lages (Séde), São Joaquim, Curitibanos e Bom Retiro

170

6ª Circunscrição Joinville (Séde), Parati e São Francisco

135

7ª Circunscrição Cruzeiro (Séde), Chapecó, Campos Novos, Caçador e Concórdia

219

8ª Circunscrição

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Rio do Sul (Séde) e Hamônia

126

9ª Circunscrição Jaraguá do Sul (Séde), São Bento do Sul e Campo Alegre

86

10ª Circunscrição Itajaí (Séde), Gaspar e Brusque

148

11ª Circunscrição Araranguá, Cresciúma (Séde), Urussanga e Jaguaruna

156

12ª Circunscrição Biguassú, Tijucas (Séde), Pôrto Belo, Camboriú e Nova Trento

140

Fonte: Informações extraídas do Relatório anual do Departamento de Educação de Santa Catarina (1936), apontadas na página 30 deste documento Em 1935 o número de municípios catarinenses era de 43, sendo então que cada um

pertencia a uma dada circunscrição escolar, como evidenciado na tabela anterior. Para cada

uma dessas inspetorias havia um inspetor escolar responsável pela fiscalização de todas as

unidades escolares integrantes da sua área de atuação. O trabalho de inspeção abrangia a

visita aos estabelecimentos de ensino para que se processasse o levantamento do número de

matriculados, a freqüência média dos alunos, o aproveitamento do curso contabilizado pela

aprovação, além da observação das condições físicas e higiênicas dos ambientes escolares,

bem como da organização pertinente a escrituração dessas unidades escolares.

De acordo com o Relatório do D.E. de 1936, o trabalho de inspeção escolar

encontrava sérias dificuldades para ser realizado porque o número de estabelecimentos de

ensino a ser visitado pelo responsável era superior ao tempo disponível para tal

empreendimento. Era indicado para a realização das visitas às escolas aproximadamente

195 dias por ano letivo, para um número variável entre 86 e 219 estabelecimentos de

ensino que integravam cada uma das circunscrições catarinenses. Entretanto, um aspecto

importante a se considerar entre os obstáculos encontrados pelos inspetores em sua tarefa

de fiscalização seria o deslocamento até as unidades a serem visitadas. Neste período, o

Estado de Santa Catarina apresentava uma interligação muito deficitária entre suas regiões,

com vias rodoviárias que eram, segundo dados do Departamento Estadual de Estatística,

em sua maioria, de “terra não melhorada” (Relatório D.E.E., 1940, p.18) tendo como

principal meio de transporte “veículos de tração animal” (Idem, p.18), o que marcava as

visitas dos inspetores com grandes dificuldades de deslocamento e consideráveis gastos de

tempo entre o trabalho de inspeção de cada unidade escolar.

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As intenções de intensa fiscalização evidenciadas na fala do Diretor do

Departamento de Educação, ao apontar que “sem fiscalização constante, inteligente e

criteriosa, não se pode imprimir orientação pedagógica, nem formar tão pouco o hábito do

trabalho” (Relatório D.E. 1936, p. 28), eram limitadas pelas dificuldades encontradas pelos

inspetores, que não conseguiam fazer cumprir sua função de modo a chegar aos resultados

desejados. Tal fiscalização era considerada “improfícua, falhando completamente seu

objetivo, pois é axioma hodiernamente que a inspeção é a alma de todo aparelho

educacional” (Relatório D.E. 1936, p. 28). Observa-se, não obstante os problemas, que a

presença do inspetor nas unidades escolares era vista como um importante meio de

intervenção estatal na escola, na medida em que era através desta inspeção que se

verificaria o cumprimento ou não das determinações legais.

É possível perceber, na indicação do relatório em pauta, que havia uma

preocupação governamental em instrumentalizar com eficiência o controle sobre a escola,

buscando uma maior uniformização do ensino. Pretendia-se, desta maneira, harmonizar as

medidas administrativas catarinenses com as estratégias centralizadoras do governo federal.

O trabalho de inspeção constituía-se numa estratégica medida de supervisão que objetivava

estabelecer a presença constante da burocracia estatal na condução do setor escolar, já que

os inspetores “se constituíram muito mais em agentes de uma complexa e minuciosa

burocracia, do que em garantidores de uma melhoria na qualidade de ensino. De qualquer

forma, o que se buscava era a maior uniformização do ensino, mobilizando-se, para tanto,

mecanismos de controle centralizado” (GOMES, p. 453). A ação fiscalizadora era

entendida como um mecanismo estatal necessário com vistas ao controle e supervisão sobre

o aparelho educacional, pois sendo a escola um importante meio de instrução constituia-se

em significativo elemento afirmador da ordem social vigente. Assim, “a inspeção passou

a ser, neste contexto, a forma de controle de ‘qualidade’ então pretendida na formação que

se esperava” (FERREIRA E FORTUNATO, p.06), indicando, portanto, a expressão de

uma determinada concepção política, que na época se evidenciava através do autoritarismo.

Considerando-se que os projetos educacionais envolvidos no contexto da época

foram apresentados por setores elitistas, componentes, muitas vezes, da própria burocracia

estatal, percebe-se que a intervenção do Estado na normatização e regulação dos aspectos

educacionais indicava para a permanência dos interesses da elite dominante, que pretendia

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uma educação para o trabalho e para a formação de um indivíduo patriótico, ordeiro e

cumpridor dos deveres. Tendo em vista que o governo de Getúlio Vargas buscou trilhar o

caminho da industrialização, o encaminhamento da educação formal para o trabalho

caracterizou-se como uma das principais diretrizes do ensino primário deste período.

No Relatório do Departamento de Educação apresentado em 1938 indica-se o

aumento do número de inspetorias, que passaram a ser de 15 circunscrições, na tentativa de

ampliar o alcance da fiscalização sobre a escola, já que as visitas de inspeção, que deveriam

abranger todas as unidades escolares de maneira regular, se apresentavam deficitárias e

com falhas em seus objetivos. A nova divisão das circunscrições aparece assim

distribuída:

Unidades Escolares

1ª Circunscrição Florianópolis

106

2ª Circunscrição Blumenau (Séde) e Gaspar

122

3ª Circunscrição Pôrto União (Séde), Mafra, Canoinhas e Itaiópolis

187

4ª Circunscrição Tubarão,(sede), Laguna Imarui E Orleans

227

5ª Circunscrição Lages (Séde), São Joaquim, e Bom Retiro

173

6ª Circunscrição Joinville (Séde), Parati e São Francisco

151

7ª Circunscrição Cruzeiro (Séde), Chapecó e Concórdia

180

8ª Circunscrição Rio do Sul (Séde) e Indaial

134

9ª Circunscrição Jaraguá do Sul (Séde), São Bento do Sul e Campo Alegre

100

10ª Circunscrição Itajaí (Séde), E Brusque

147

11ª Circunscrição Araranguá, Cresciúma (Séde), Urussanga e Jaguaruna

168

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12ª Circunscrição Biguassú, Tijucas (Séde), Pôrto Belo, Camboriú e Nova Trento

157

13ª Circusncrição Hamonia (sede), Timbó e Rodeio

136

14ª Circunscrição Palhoça(sede) e São José

113

15ª Circunscrição Caçador(sede), Campos Novo e Curitbanos

147

Fonte: Informações extraídas do Relatório do Departamento de Educação, apresentado à Secretaria do Interior e Justiça de 1938

As modificações podem ser identificadas nos seguintes aspectos: a 1ª circunscrição

passou a ser composta apenas do município de Florianópolis, sendo que Palhoça e São José

formaram uma nova circunscrição (14ª). Na 2ª, a cidade de Indaial foi transferida para a 8ª

e a de Timbó para a nova 13ª; no entanto, Gaspar foi integrada à 2ª, quando desmembrada

da 10ª. Outra mudança ocorreu na 5ª, que teve a transferência do município de Curitibanos

para a nova 15ª circunscrição, juntamente com as cidades de Campos Novos e Caçador que

antes estavam na 7ª. Por fim, houve a inserção na 13ª circunscrição do recém-criado

município de Rodeio. A partir dessas modificações, pode-se observar que a 1ª

circunscrição teve a diminuição de municípios e de unidades escolares. Isto parece

apontar para uma tentativa de estabelecer na Capital uma fiscalização mais intensa,

especialmente pela existência do maior número de Grupos Escolares, que eram cinco:

Lauro Muller, Silveira de Souza, Arquidiocesano São José, Padre Anchieta e Dias Velho.

Os Grupos Escolares representavam um projeto que pretendia evidenciar, publicamente, a

idéia de modernização da sociedade e do ensino em particular, pois “haviam se tornado a

modalidade de escola primária predominante no país, acompanhando o processo de

urbanização e democratização do ensino público” (SOUZA, p.117). Essas unidades

escolares eram entendidas pelas autoridades como espaços privilegiados para a

escolarização catarinense e por isso precisavam ter a presença constante da inspeção, pois

“serviam como símbolos importantes que demarcavam força política, registravam ação

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governamental e disseminavam um ideal de escola que prometia o alcance do progresso, a

modernidade, a redenção” (SILVA, p. 345).

A maioria das outras circunscrições revela, entretanto, um aumento no número de

estabelecimentos de ensino a serem fiscalizados; daí a criação de mais circunscrições para

atender essa nova demanda. Isto demonstra que o governo estadual pretendia estabelecer

sua ingerência através da ação inspetora e tal preocupação em ampliar a fiscalização

provinha da própria ideologia centralizadora do poder federal, que se entendia como o

promotor da transformação da sociedade, procurando fazer da “educação instrumento de

adaptação do homem à nova realidade político-social” (GOULART, p.16).

A necessidade de homogeneização do aparelho escolar era entendida como uma

das formas para se desenvolver o projeto de modernização. Através da escola, o Estado

pretendia intervir sobre a formação letrada dos indivíduos e desta maneira, disseminar seus

ideais centralizadores e autoritários, incluindo progressivamente “elementos de

racionalidade, modernidade e eficiência” (SCHWARTZMAN, p.32), na tentativa de

consolidar o projeto de modernização conservadora. Assim, estabelecer formas de

controle através principalmente do trabalho de inspeção sobre a escolarização, se

configurou num dos importantes mecanismos para estabelecer padrões uniformes de

instrução na formação dos indivíduos.

Na estruturação do Departamento de Educação também se observa uma dinâmica

crescentemente complexa de organização, através de um significativo número de

diretorias, com diferentes ramos de atividades ligadas à administração geral da escola. A

organização administrativa se ampliava na medida em que novos aspectos modernizantes

se configuravam no cenário estadual, que gradativamente adquiria novas configurações no

espaço urbano, principalmente a partir da economia industrial fabril que ganhava impulso

naquele momento aqui no Estado. Isto demonstra que Santa Catarina parecia querer

incorporar a maioria das concepções que eram determinadas pelo âmbito nacional,

embasadas na idéia de centralização, evidenciadas no entendimento de que “o pensamento

político dos anos 30 foi permeado por muitas das grandes questões articulados pelo

pensamento conservador, tais como os ideais de ordem e hierarquia” (GOULART, p.16).

O afã de estabelecer um direcionamento político em consonância com as diretrizes

gerais difundidas pelo poder central indicava a necessidade que o poder estadual

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demonstrava de parecer colaborar com as determinações federais, já que “quando Nereu

Ramos priorizou saúde e educação como núcleos de sua intervenção estratégica, não estava

fazendo nada mais do que a tentativa de viabilizar, em Santa Catarina, o programa da

Aliança Liberal, que levou Vargas ao poder” (CAMPOS, p.151).

De acordo com o organograma abaixo, que consta do relatório do Departamento de

Educação do ano de 1936, elaborado a partir da indicação do Art 3º do Decreto 713, a

estrutura administrativa deste órgão deveria ser assim constituída:

Fonte: Extraído do Relatório de Departamento de Educação de 1936, página 04

Ao apontar esta divisão administrativa, o Decreto 713 indicava que caberia aos

Institutos de Educação formar os professores e os técnicos educacionais. A

regulamentação de um Instituto para conduzir os cursos que formariam os professores

constituía uma das principais preocupações que o Decreto nº 713 apontou na reformulação

do ensino e ganhou destaque na pauta da política educacional do Governo de Nereu Ramos,

por ser a “formação docente compreendida como veículo de ordenação e modernização do

ensino” (SILVA, DANIEL E DAROS, p. 24). Os trabalhos referentes à contabilidade,

recursos humanos e arquivamento de material, seriam incumbência da Sub-diretoria

Administrativa e na Sub-diretoria Técnica estariam concentrados os relacionados ao

DEPARTAMENTO DE

EDUCAÇÃO

Instituto de Educação

Sub-diretoria de

Saúde e Higiene

Escolar

Sub-diretoria de Educação Musical e

Artística

Sub-diretoria Técnica

Sub-diretoria Administrativa

Sub-diretoria de Biblioteca, Museu e Rádio Difusão

Sub-diretoria de Educação Física,

Recreação e Jogos

Sub-diretoria de Cultura e

Divulgação (estatística)

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processo de ensino-aprendizagem, como a elaboração de métodos, programas e planos de

ensino além da função de inspeção escolar. A valorização da técnica e de novos

procedimentos pedagógicos exigia um espaço organizacional definido, que se constituiria

numa sub-diretoria própria na medida em que “havia uma demanda, sob a ótica daquela

geração, pela formação técnica do professor” (EVANGELISTA, 2002, p. 29). A

elaboração de dados estatísticos, com os números relativos à matrícula e freqüência dos

alunos, seria desenvolvida pela Sub-diretoria de Cultura e Divulgação. Este ramo da

administração pública alcançou considerável importância por caracterizar-se como

mecanismo de difusão da ideologia que se pretendia instituir, calcada no fortalecimento do

Estado. E ainda quanto à assistência médico-dentária, estaria encarregada desse serviço a

Sub-diretoria de Saúde e Higiene, segmento do Departamento que se encarregaria dos

aspectos vinculados às práticas médicas e sanitárias, imbuídas pelo discurso de

medicalização do social, “que propunham orientar e educar a fim de constituir cidadãos

(pre)ocupados com a saúde e a higiene” (STEPHANOU, p.142).

O Decreto indica ainda que tais sub-diretorias funcionariam a partir daquele ano, ou

seja, 1935, com exceção das sub-diretorias de Educação-Física, Recreação e Jogos, de

Educação Musical e Artística e de Bibliotecas, Museus e Rádio Difusão, que só seriam

organizadas na medida em que fossem reivindicadas ao longo do processo de reforma

pretendido, sendo que os serviços referentes a estas atividades ficariam até então sob o

encargo da Sub-diretoria Técnica.

Ao observar-se todo este aparato administrativo, elaborado com especificações para

cada divisão do Departamento de Educação, pode-se identificar um processo que foi ao

encontro da idéia de centralização que o governo federal desenvolvia na edificação das

pretensões unificadoras do esquema político-administrativo. A acentuada hierarquização

dos órgãos governamentais seguia o processo de redefinição do poder central, “ancorando-

se na constituição de um aparato burocrático que contribuiu de modo particular com o

sistema vigente” (GOULART, 1990. p.31). Essa complexificação dos serviços vinculados

a área educacional através da criação de diversas sub-diretorias, com o registro de suas

respectivas funções, evidencia a necessidade de se estabelecer uma ingerência cada vez

mais abrangente sobre a educação, emanada diretamente do centro da burocracia estatal.

Em cada setor era preciso regular as ações e direcionar as práticas na condução do processo

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de ensino, que deveria chegar até às escolas a partir da pressuposta necessidade de se

garantir a uniformidade. Sistematizar e regular as atividades escolares aparecia como uma

constante preocupação dos discursos dos educadores e políticos da época, pois, segundo

Cynthia M. Campos, “a escola foi a instituição onde pareceu ser possível, naquele

momento, atingir amplos segmentos da população no sentido de normatizar, homogeneizar,

disciplinar, ordenar e higienizar hábitos e comportamentos” (p. 151).

Um dos temas que alcançou grande repercussão nesse contexto estava centrado nas

questões da disciplinarização dos corpos e mentes através de inúmeros mecanismos de

difusão de valores, que vinculavam o progresso da nação à idéia de indivíduos saudáveis e

de comportamentos obedientes. Estes discursos, que assinalavam para a necessidade de

homogeneização da sociedade, indicavam os elementos fundamentais para a formação do

esperado cidadão trabalhador, fundamental para o processo modernizante pretendido pelo

Estado Nacional, uma vez que, segundo Silvana Goulart, “o discurso da nova democracia

tomava como alvo o ser humano e elegia o trabalho como meio de valorização do homem”

(p. 18).

Ao se observar o relatório de 1936 do Departamento de Educação, que evidenciava

a preocupação em se organizar as Sub-diretorias de Saúde e Higiene Escolar e a de

Educação Física, consideradas de grande importância na medida em que eram apresentadas

como solucionadoras dos males educacionais, registra o Diretor, “pondo em funcionamento

essas duas sub-diretorias teríamos dado um grande passo à solução dos problemas

educacionais do nosso Estado” (p. 15). A questão que vincula a normatização dos corpos

e mentes ao ideal de progresso constituiu-se numa das principais temáticas afirmadas desde

os primeiros anos da República e particularmente na formação do Estado centralizado do

período Vargas. Segundo Marta Carvalho, “a inegável gravidade da questão sanitária no

país reforçava o poder persuasivo da propaganda educacional” (1998, p.145).

3 – A formação de professores

Um importante ponto a ser considerado no Decreto 713 é a preocupação em

transformar as Escolas Complementares em Escolas Normais para a capacitação de

professores, na medida em que também em âmbito nacional um “aspecto relevante que

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emergiu na década de 1930 foi a questão da formação de professores” (SAVIANI, 2004

p.36). Segundo o Decreto, tal preparo docente seria desenvolvido com o “atual programa

do primeiro ano das Escolas Complementares; no segundo e terceiro serão adotados os

programas da primeira e segunda séries do Colégio Pedro II”(art. 6º). Esta preocupação já

era expressada em Santa Catarina desde o período imperial, quando já se assinalava a

necessidade de melhorar a capacitação dos professores como condição para impulsionar o

projeto civilizador do Estado/Nação. Segundo Leonete Schmidt, “desde meados da década

de 1830 fazia parte das preocupações dos Presidentes da Província o problema de um

magistério sem o mínimo de formação profissional” (p. 86). Destaque-se, ainda, a

observação de Elaine Marcílio que registra também para os momentos finais do Império o

reconhecimento da necessidade de “criação de uma Escola Normal, que pudesse

proporcionar a preparação dos docentes para a instrução dos alunos, a fim de difundir os

padrões culturais e morais indispensáveis para a consolidação do Estado Nacional” (p.170).

No que concerne à necessidade da preparação de professores para a escola

catarinense, fica evidente a longa continuidade da proclamação governamental acerca desta

preocupação, fato que avança até o início da República. Efetivamente, pode-se perceber

alguns avanços em direção a esta preocupação na medida em que a regulamentação acerca

da Escola Normal foi se estabelecendo e definindo os programas a serem ministrados para

este fim. No entanto, é possível apontar que “a ausência de uma regulamentação federal

para a formação docente até 1946, fez com que se ampliasse muito o número de escolas

normais, no Brasil, nem sempre com a qualidade adequada para a formação de professores”

(DAROS, p.15).

Na reforma aqui analisada, Liéte Accácio aponta que “a relevância do tema Escola

Normal e do Instituto de Educação passa pela política educacional, especialmente a

conduzida pelos reformadores da educação brasileira nos anos 20 e 30 do século XX”

(2008, p. 01). As mudanças que se processavam nessas décadas nos cursos de formação

de professores “eram baseadas no que acontecia em São Paulo e Rio de Janeiro, sob a

influência das idéias dos chamados intelectuais-educadores, como Fernando de Azevedo e

Lourenço Filho” (DAROS, SILVA E DANIEL, P. 27), que pautavam seus discursos nos

pressupostos do escolanovismo, defendendo o ensino laico, público, gratuito e universal,

com o fim de fornecer aos professores aptidões embasadas no cientificismo, então

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entendido como meio capaz de propiciar a eles um manancial de conhecimentos mais

aprimorado para a sua atuação educativa dentro da realidade social. O projeto desses

educadores, atravessado pelo afã de reestruturação da sociedade por meio da educação,

possuía como balisa ideológica “ a crença no poder da ciência e a ambição de estabelecer

uma administração científica da esfera pública” (XAVIER, 1999. p.27), que implicou

numa extensa mobilização configurada através das reformas de ensino empreendidas

diretamente por eles nos Estados em que possuíram cargos administrativos ligados ao

ensino.

Especificamente em Santa Catarina, esses ideais alcançaram visibilidade também

através de reformas, que, no contexto dos anos 30, podem se expressas sobretudo através da

denominada Reforma Trindade. A partir desta iniciativa, a formação de professores passa

então a ser realizada pelos Institutos de Educação, nova designação dada às antigas Escolas

Normais, que passaram a integrar a estrutura deles organizadas em Escola Normal Primária,

Escola Normal Secundária e Escola Normal Vocacional. Esses cursos foram estruturados

com a intenção de fornecer aos futuros docentes “o aperfeiçoamento do professorado,

elevando-lhe o nível de cultura e desenvolvendo-lhe as aptidões pedagógicas” (Mensagem.

1936, p.24), aí compreendendo a incorporação de novos pressupostos metodológicos.

Observa-se uma significativa preocupação dos quadros dirigentes em estabelecer uma

reestruturação do ensino a partir da ingerência do Estado, que naquele momento

demonstrava a tendência de abandonar as formulações liberais, enfatizando acentuadamente

a influência dos ideais autoritários de governo. Essa reformulação apresentava-se

impregnada da propensão em atender aos esforços que estavam sendo empreendidos para a

racionalização burocrática do aparelho administrativo estatal e especificamente para a

regulamentação do espaço educacional a partir de leis e decretos normatizadores, que

acabaram por expressar o quanto o poder governamental mobilizou-se nesta tarefa.

A reorganização das Escolas Normais, transformadas nos Institutos de Educação,

estabeleceu-se com programas apresentados no Decreto 713, que indicam a seguinte

divisão de matérias:

REFORMA TRINDADE ESTRUTURA DOS INSTITUTOS DE EDUCAÇÃO

ESCOLA NORMAL PRIMÁRIA ESCOLA NORMAL SECUNDÁRIA ESCOLA NORMAL VOCACIONAL

1º ANO: Aulas Semanais

1º ANO: Aulas Semanais

1º ANO Aulas Semanais

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Português 04

Aritmética 03

Geografia do Estado 03

História do Brasil 03

Desenho 03

Música 03

Trabalhos 03

Educação Física 03

2º ANO (1ª Ano do Colégio Pedro II)

Português 04

Francês 03

Geometria 01

Algebra 02

Aritmética 03

Geografia 04

História da Civilização 02

Desenho 03

Música 02

Trabalhos 02

Educação Física 02

3º ANO ( 2º Ano do Colégio Pedro II)

Português 04

Francês 03

Alemão (Inglês) 02

Geometria 02

Aritmética e Álgebra 03

Geografia 02

História da Civilização 02

Ciências Físicas e Naturais 03

Agricultura 02

Noções de Pedagogia e

Psicologia 02

Desenho 01

Música 01

Trabalhos 01

Educação Física 01

Português 04

Francês 03

Alemão (Inglês) 03

Geometria 03

Aritmética e Álgebra 04

Geografia 02

História da Civilização 03

Física 02

Química 02

História Natural 03

Desenho 02

Música 02

Trabalhos Manuais 01

Educação Física 02

2º ANO

Português 04

Francês 01

Latim 03

Alemão (Inglês) 02

Geometria 01

Aritmética e Algebra 03

História da Civilização 03

Física 02

Química 02

História natural 03

Geografia 03

Desenho 02

Música 02

Trabalhos 02

Educação Física 02

3º ANO

Português Literatura 06

Latim 02

Física 02

Química 02

Geografia 02

Cosmografia 03

História da Civilização 02

História do Brasil e do Estado 02

Filosofia 03

Matemática 06

Música 01

Desenho 01

Trabalhos 01

Educação Física 01

História e Filosofia 03

Literatura 04

Higiene e Puericultura 04

Psicologia Geral e Infantil 05

Sociologia 03

Metodologia Geral Especial 03

Legislação Escolar 02

Desenho 02

Trabalhos 02

Música 02

Educação Física 02

2º ANO

Psicologia Aplicada a Educação 05

Pedagogia 05

Sociologia Educacional 03

Didática 03

Trabalhos 02

Música 02

Desenho 02

Educação Física (didática) 02

Prática Pedagógica Horário Especial

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Fonte: Informações extraídas do Decreto nº 713 de 1935 – Artigos 11º, 23º e 25º.

No conjunto das cadeiras disponibilizadas nos três cursos do Instituto de Educação,

apontam-se algumas alterações em relação ao currículo anterior da Escola Normal

Catarinense, que estava em vigor desde 1928 (Decreto nº 2218). A Reforma Trindade de

1935, a partir do Decreto 713, buscava remodelar a estrutura do processo de formação de

professores através da inserção de matérias indicadoras de uma atuação no contexto

analisado, como referenciais pedagógicos para a reestruturação educacional que se

pretendia implantar. No entanto, verifica-se que ocorreu o oferecimento de apenas uma

disciplina, a de Noções de Pedagogia e Psicologia, no último ano da Escola Normal

Primária, indicando desta maneira pouca preocupação em fornecer fundamentos

pedagógicos básicos no primeiro nível de formação do professorado destinado a preparar

docentes para a zona rural, segundo o artigo 5º do Decreto 713.

Ainda que se observe este indicativo para alguma competência pedagógica na

Escola Primária, o mesmo não acontece no segundo nível de formação, que seria a Escola

Normal Secundária, também estruturada em 3 anos, onde não há qualquer disciplina

específica para a preparação docente, abrangendo um quadro de matérias direcionadas a

uma formação mais intelectual e de caráter enciclopédico. Mesmo indicando que era “sua

finalidade fornecer sólido preparo aos que pretendam dedicar-se ao magistério” (Decreto

713, artº 16), as Escolas Normais Secundárias pareceram apresentar-se mais voltadas a um

ensino cientificista do que propriamente aos pressupostos pedagógicos tão divulgados nos

discursos educacionais daquele momento, alicerçados especialmente nas idéias da Escola

Nova, que defendia “a escola pública, universal e gratuita (...) como sua grande bandeira”

(SCHWARTZMAN, BOMENY E COSTA, p.70), difundindo a idéia de uma escolarização

que deveria ser baseada em “princípios pedagógicos que se afastavam da transmissão

autoritária e repetitiva de conhecimentos e ensinamentos e procurava se aproximar dos

processos mais criativos e menos rígidos de aprendizagem” (Idem,ibidem, p.71).

Registre-se que a elaboração desses programas atendia a interesses estrategicamente

definidos via preceitos liberais, que enalteciam as possibilidades que a educação poderia

oferecer através do esforço individual. Tratava-se de encaminhar a educação para as

necessidades de uma sociedade dividida em classes sociais definidas pela profunda

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desigualdade e que deveria continuar desta maneira, de acordo com a concepção de mundo

da elite dominante. Evidencia-se a pretensão de educar a elite para um ensino acadêmico,

necessário para a organização de quadros burocráticos, para atender as demandas da

racionalização administrativa da conjuntura política dos anos 30 e 40, no país e nos estados.

Algo recorrente desde os tempos imperiais, quando, “com a emergência do Estado

Nacional, suscitou-se o delicado problema da autonomização cultural da sociedade

brasileira, além da necessidade de formar quadros para o aparelho estatal” (ADORNO,

p.81). Outro destaque nesses dois graus de escolarização é a inserção da disciplina de

Educação Física, que passou a fazer parte da grade curricular em todos os anos do

programa de formação de professores. Esta presença justificava-se via idéias higienistas1 ,

que se configuravam nos discursos médicos de modernização da sociedade através do

controle do corpo, no “projeto de (re)ordenação social desencadeado pelo capitalismo, o

que necessariamente passava pelas propostas de higienização social, incluída aí a de

educação” (PAIVA, P.05). Os pressupostos que defendiam a saúde e a educação como

meios para solucionar os males sociais encontravam ressonância nos ideais de regeneração

e construção do ‘homem novo’, estabelecidos no contexto do discurso de modernização da

sociedade brasileira, pois “vinculava-se a prática da higiene escolar como a garantia da

consciência sanitária, que por sua vez asseguraria a ascensão do país ao status de nação

culta e desenvolvida” (STEPHANOU, p. 150).

Na Escola Normal Superior Vocacional, que abrangia um período de apenas dois

anos, concentraram-se as disciplinas pedagógicas tidas como necessárias para uma

preparação mais qualificada do professorado catarinense. É neste nível de ensino que

disciplinas consideradas como base para a formação em educação, vinculadas à Psicologia,

à Sociologia e à Biologia, foram incorporadas como indispensáveis ao processo formativo

docente. Pode-se então perceber a dualidade que se evidenciou nesse empreendimento de

escolarização, que, por um lado, ia oferecer, no ensino primário, as noções básicas de

pedagogia para um aprendizado prático e utilitário, configurado através de um programa

__________________________

1 – O higienismo consistiu-se de uma movimentação de médicos e sanitaristas, que no final do século XIX organizaram-se no sentido de implantação de novos hábitos de higiene e saúde, sob influência de idéias positivistas, que pregavam a regeneração do homem como condição necessária ao processo civilizatório.

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69

que não priorizava um aperfeiçoamento específico voltado para a área pedagógica. Por

outro lado, a mais aprimorada formação dos profissionais da educação era encontrada nos

últimos anos de escolaridade, com matérias pedagógicas específicas, sendo que os egressos

do curso atuariam diretamente na formulação e condução das questões sobre educação no

Estado, ocupando postos de relevo na burocracia governamental.

Isso caracterizava a formação de um processo educativo com diferentes interesses,

uma vez que a educação da elite se faria por um ensino mais acadêmico e classicista,

enquanto os segmentos subalternos seriam atendidos por uma escolarização voltada para a

profissionalização, já que constituiriam a força de trabalho indispensável para a produção

da riqueza nacional. Verifica-se, então, a existência de “duas redes de ensino: aquela que

atenderia a formação das ‘elites’ e a que atenderia a formação da força de trabalho”

(CURY,1988 p.19). Constata-se, portanto, que, apesar dos anúncios propalados de novos

tempos e ‘novas’ pedagogias, a estrutura de dominação continuava atuante desde os

‘velhos’ tempos imperiais de formação do Estado Nacional, quando o ensino secundário

“era destinado aos filhos das famílias mais abastadas que, após concluírem o ensino

primário, continuavam seus estudos com a intenção de freqüentar cursos superiores no

Brasil ou fora do país, para depois poder voltar à Província e assumir cargos

administrativos” (TEIXEIRA, 2005, p.173).

O processo de escolarização dos anos de 1930 trilhou o caminho da seletividade e

do elitismo, encaminhando os diferentes setores da sociedade para um determinado tipo de

instrução, firmando-se na estruturação de uma educação formal da elite, num veio para a

organização dos quadros dirigentes do Estado e particularmente da área educacional,

enquanto que as camadas menos favorecidas eram instruídas com vistas a uma educação

voltada para o mercado de trabalho. Segundo Jane Almeida, “consolidou-se assim nesse

período um novo dualismo social e educacional: de um lado as elites nas escolas de elevado

padrão educativo, de outro as classes populares sendo preparadas para o trabalho pelo

ensino profissionalizante” (p.86). O projeto de formação acadêmica e aristocrática

continuava como baluarte na estruturação do processo educativo, demonstrando a

permanência dos interesses da elite em detrimento de uma educação democrática, extensiva

e popular.

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Apesar de se encontrar nos discursos muitas intenções de melhoria da qualificação

do professorado, pouco houve de mudança efetiva nesse processo de formação. Ainda que

se tenha buscado constituir um caráter mais cientifico nos programas de ensino, destinados

ao preparo mais qualificado do professorado, “o aumento exagerado do número de escolas

normais contribuiu para sua deteriorização, já que, neste caso, o aumento na quantidade de

escolas influenciou diretamente a qualidade do ensino e suas condições estruturais”

(DAROS, SILVA E DANIEL, p. 26). As falas do governo indicam a presença de esforços

no sentido de fornecer subsídios ao professorado acerca das novas concepções de educação

defendidas pelos renovadores. Nereu Ramos, em sua mensagem de 1936 à Assembléia

Legislativa, registra que tinha “o Departamento de Educação, promovido nas circunscrições

escolares, diversas concentrações de professores” (p. 23). Entretanto, nada há que aponte

na direção do processo formal de formação docente um substancial investimento

pedagógico, anunciado nas linhas do Decreto 713 de 1935. Pode-se constatar que a

tentativa de melhoria pretendida para a formação docente parece ter se estabelecido mais

por vias indiretas, ou seja, através da prática da concentração de professores, com palestras

e com a realização de Semanas Educacionais2,do que pela via da educação formal e

pública.

De acordo com o relatório do Departamento de Educação apresentado em 1938 à

Secretaria dos Negócios do Interior e Justiça, a reunião de professores nas Semanas

Educacionais tinha como “finalidade a uniformização dos processos de ensino e fazer

conhecida a nossa legislação escolar, além de serem de grande alcance para o serviço de

estatística” (Relatório D.E. 1938, p.153). Os temas proferidos nas palestras desses

encontros variavam entre “assuntos de cunho exclusivamente ruralista/nacionalizador para

as questões de ordem metodológica e filosófica da educação” (BOMBASSARO, p. 55) e

apesar da diversidade que poderia ser operacionalizada na pauta dos encontros, destacava-

se a preocupação em difundir os métodos pedagógicos do escolanovismo e o processo de

nacionalização do ensino. Eram responsáveis por essas reuniões os professores Luiz

Sanchez Bezerra da Trindade, Elpídio Barbosa e João dos Santos Areão, que realizavam,

________________________

1 – As Semanas Educacionais eram reuniões coordenadas pelo Departamento de Educação, para divulgarem os novos pressupostos metodológicos da Escola Nova. Segundo dados levantados por Ticiane Bombassaro, ocorreram nove destes eventos entre os anos de 1936 e 1945, sendo que sete concentraram-se no ano de 1936, uma em 1937 e a última teria somente ocorrido em 1945.

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além das palestras, aulas que deveriam servir de modelo à prática docente nas escolas de

Santa Catarina. Indicadas como momentos sedutores de capacitação do professorado, por

serem realizadas com pompa e circunstância, as semanas dedicadas à educação

constituíram-se mais pela propagação da idéia estusiasta de renovação dos métodos do que

propriamente como transformação do processo de formação de professores. Investir na

formação docente pela via do informalismo pareceu mais viável do que estabelecer um

investimento franco e incisivo em cursos regulares destinados a tal fim.

É interessante notar as indicações que o Decreto 713 apresenta para ‘despertar o

interesse dos alunos’, sugerindo excursões escolares e constituição de bibliotecas, que estão

apresentadas nos artigo 49, “a fim de despertar o interesse do aluno pela boa leitura e servir

de complemento as atividades escolares, terão os Institutos de Educação, além da biblioteca

dos professores, uma biblioteca para os alunos” e no artigo 50 indica-se que “com o

objetivo de facilitar aos alunos o conhecimento por observação direta, serão instituídas as

excursões escolares”. Percebe-se uma determinada inclinação ao uso de diferentes

metodologias, pensadas principalmente a partir dos pressupostos que tanto eram propalados

de uma ‘nova escola’.

O Decreto 713 elaborou um significativo conjunto de normatizações referentes ao

Instituto de Educação, organizados em organograma assim elaborado:

Os Institutos de Educação foram estabelecidos a partir das Escolas Normais

Secundárias que existiam em Santa Catarina, localizadas uma em Florianópolis e a outra

em Lages. Segundo dados do relatório do Departamento de Educação de 1936, além dos

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

Jardim de Infância

Curso Fundamental (Grupo Escolar) Escola Isolada Anexa

Escola Normal Primária

Escola Normal Secundária

Escola Normal Superior Vocacional

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dois Institutos, mais quatro escolas particulares foram equiparadas a eles, sendo uma em

Florianópolis, no Colégio Coração de Jesus; uma em Porto União, no Colégio Santos

Anjos; outra em Caçador, no Colégio Aurora, e por fim, em Canoinhas, no Colégio

Coração de Jesus. Destaca-se, ainda, a partir de vários artigos do Decreto em pauta, a

preocupação em estabelecer a responsabilidade dos diretores dos Institutos de Educação e

dos respectivos cursos a eles subordinados. No artigo 28º, define-se que este cargo será

ocupado por um dos professores da Escola Secundária ou Superior Vocacional ou ainda por

um dos Inspetores de Ensino, sendo a escolha do diretor do Instituto determinada

diretamente pelo governador do Estado. Para cada uma das escolas pertencentes aos

Institutos de Educação, a escolha dos diretores se daria da mesma forma que a do Diretor

Geral. Competiam, aos diretores, segundo o artigo 30º, as seguintes atribuições:

1º - Orientar e fiscalizar a execução dos planos que lhes corresponderem;

2 º- Promover a eficiência e extensão das atividades escolares correspondentes;

3º- Assistir tecnicamente os professores, na solução dos problemas de métodos e

fins, recorrendo ao Diretor do Instituto quando, porém, essa solução escapar de

sua alçada;

4º- Estimular e desenvolver a freqüência nos cursos que dirigem;

5º -Remeter à Secretaria do Instituto, até o 3º dia útil de cada mês, a folha de movi-

mento mensal;

6º- Organizar as folhas de pagamento apresentando-as ao Diretor do Instituto para

o respectivo visto;

7º- Prestar ao Diretor do Instituto as informações julgadas necessárias e, bem assim,

atender as solicitações emanadas do mesmo;

8º - Admoestar, repreender e suspender até oito dias os alunos, por faltas que come-

terem, solicitando a aprovação do Diretor do Instituto.

Pode-se observar que a função indicada em cada um desses itens aponta para um

sentido que oscila entre a repressão e a persuasão na condução das responsabilidades dos

diretores, já que, ao mesmo tempo em que se afirma que devem ‘promover’, ‘orientar’,

‘assistir’ e ‘estimular’, contrapõem-se funções de controle e repreensão, como ‘fiscalizar’,

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‘organizar’, ‘admoestar’, ‘repreender’ e ‘suspender’, numa evidente estratégia

disciplinadora, autoritária. Percebe-se que a maior parte das propostas tendiam à repressão.

Para o cargo de Diretor Geral do Instituto de Educação, as determinações foram

indicadas no artigo 31º e estavam assim definidas:

1º - Promover a eficiência, progresso e ampliação do ensino, dentro dos planos

elaborados pelo Departamento de Educação;

2º - Fiscalizar o cumprimento das obrigações funcionais do pessoal docente e

demais funcionários;

3º - Comunicar ao Diretor do Departamento de Educação as ocorrências de

relevância que possam interessar a marcha dos trabalhos escolares;

4º - Recorrer ao Diretor do Departamento de Educação quando não possa ou não

deva resolver por si os problemas que se apresentarem na execução do plano geral

de ensino;

5º - Remeter ao Departamento até o quinto dia útil de cada mês as folhas do

movimento dos diversos cursos;

6º - Remeter ao Departamento de Educação, devidamente visadas, as folhas de

pagamento para que sejam enviadas ao tesouro;

7º - Cumprir, aplicar e fazer aplicar leis, regulamentos e instruções de serviços;

8º - Prestar ao Departamento de Educação todas as informações e dados que lhe

forem solicitados;

9º - Receber e encaminhar, por intermédio da Secretaria, todos os papéis e

requerimentos dos funcionários do Instituto;

10º - Conferir diplomas aos alunos que completarem os cursos do Instituto;

11º - Aplicar aos diretores, docentes e funcionários as penalidades regulamentares

12º - Aplicar aos alunos dos diversos cursos as penalidades regulamentares quando

fora da alçada dos Diretores dos respectivos cursos.

As funções apontadas para o cargo de Diretor do Instituto de Educação,

hierarquicamente de maior relevância sobre os outros diretores, apontam para uma gama

mais ampla de compromissos, que reforçam o mesmo processo disciplinador verificado

com relação ao cargo dos diretores das escolas normais. A oscilação de proposições se faz

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presente no mesmo sentido, o de convencer, ao mesmo tempo que o de repreender. Quando

se recorre à idéia de ‘marcha’ dos trabalhos escolares, percebe-se a clara tendência

militarizante de imprimir aos desígnios educacionais os fundamentos cívico-militares tão

em voga no período.

O conjunto regulador das responsabilidades dos diretores demonstra a forte

preocupação governamental em concentrar no encargo destes postos as principais tarefas

relativas ao cumprimento das regras estabelecidas em âmbitos superiores, com vistas ao

regular funcionamento dos cursos a eles incumbidos. Percebe-se, pela recorrente menção

aos atributos destes cargos, que ocupavam papel relevante na condução e efetivação dos

pressupostos pretendidos. Ao ter uma ligação direta com o diretor do Departamento de

Educação, o diretor geral de cada um dos Institutos era a instância mais próxima, o elo de

ligação entre a burocracia administrativa do Estado e os cursos de formação do

professorado em Santa Catarina. A criação dos Institutos de Educação “objetivava

impulsionar a melhoria da qualidade da escola com base na crença de que um maior

cuidado na formação dos mestres primários vai estabelecer melhores condições ao ensino”

(ACCÁCIO, p.22). A atenção que era dada aos Institutos de Educação justificava-se pela

idéia de serem espaços privilegiados para a formação do professorado e, por isto,

precisavam ser firmemente conduzidos e de acordo com os discursos da época, que

identificavam na melhoria da educação a solução para os problemas gerais da sociedade.

Institucionalizar a formação docente indicava que “a formação técnica e profissional do

professor ganhou então nova coloração, pois não se tratava apenas de saber o que ensinar,

mas de saber como ensinar” (EVANGELISTA, p.30).

4. - A obrigatoriedade de Ensino

A educação escolar consiste num dos principais direitos históricos alcançados pela

humanidade, mas continua a ser questão que envolve embates consideráveis pela sua

efetivação, especialmente em países como o Brasil, que ainda não resolveu a maioria de

seus problemas sociais, questão evidenciada pela presença de uma grande concentração de

renda e de uma acentuada desigualdade social. Apesar de se constatar que, no concernente

à legislação educacional, o país apresentou significativos avanços no século XX, ainda se

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pode verificar a existência de milhares de crianças fora do ambiente escolar ou nele

presentes, mas com idade inapropriada. Essa realidade demonstra que a escola, apesar de

ser constantemente apontada como uma das principais instituições necessárias para o

desenvolvimento do projeto de um Estado/Nação, apresenta-se muito mais valorizada no

âmbito do discurso do que na prática, uma vez que, “no caso brasileiro, este momento de

plenitude de declaração face ao direito de instrução é dado desde a Constituição de 1934,

mas a realidade é ainda bastante negadora da efetivação do mesmo” (CURY, HORTA E

FÁVERO, p.30).

4. 1. Breve trajetória da obrigatoriedade escolar no Brasil e em Santa Catarina

O direito à educação é uma prerrogativa declarada em lei a partir do final do século

XIX, tendo a França e a Inglaterra entre os primeiros países a reconhecê-lo, configurando-

se num “produto dos processos sociais levados adiante pelos segmentos de trabalhadores

que viram nele um meio de participação na vida econômica, social e política” (CURY,

2003. p.569). No caso do Brasil, a proclamação deste direito remonta aos tempos

imperiais, quando se pode apontar o anúncio em algumas províncias do princípio da

obrigatoriedade escolar, assim como na “Constituição Imperial de 1824, que continha um

artigo sobre educação escolar gratuita” (Idem, p.570), mas que não trazia especificações

oficiais do porte de uma clara diretriz nacional para a educação. Segundo Antônio

Chizzoti, “a gratuidade universal à educação primária, genericamente proclamada e

candidamente outorgada na Constituição, não derivou de interesses articulados e reclamos

sociais organizados, inserindo-se no texto mais como um reconhecimento formal de um

direito subjetivo dos cidadãos que numa obrigação efetiva do Estado” (p. 53).

Com o advento da República, este direito, embora até então apenas anunciado,

sofreu silenciamento ao ser desconsiderado na Carta Constitucional de 1891, fortemente

influenciada pelos princípios liberais norteados pela perspectiva dos direitos individuais.

Entendia-se que o próprio indivíduo buscaria a escola no afã de se alfabetizar para então

poder formalizar o direito de votar, por isso considerava-se que “o exercício do voto se

convertia em direito para os alfabetizados e em atração para a escolarização primária”

(CURY, p.573). A União repassou para as unidades federadas a ‘faculdade’ de estabelecer

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suas legislações sobre a educação, configurando desta maneira uma forte autonomia

relativa aos estados, que puderam elaborar suas leis conforme seus próprios interesses e

projetos políticos. Com isto, “após 1891, muitos estados assumiram a gratuidade, mas boa

parte deles repassou essa incumbência aos municípios, pobres em arrecadação de impostos”

(Idem, p.573), demonstrando, na prática, um descompromisso dos poderes governamentais

para com o desenrolar histórico desta questão social.

Com o avançar das primeiras décadas do século XX, o quadro político brasileiro

sofreu alterações e a emergência do estado getulista nos anos de 1930 ocasionou

modificações constitucionais, implicando, conseqüentemente, reformulações na legislação

das unidades federadas. Elaborada a partir do princípio de uma ingerência mais acentuada

do Estado sobre o social, a Constituição de 1934 apresenta-se como um dos momentos mais

significativos, no que diz respeito à cidadania, como direito que afeta a todos. No tocante

à legislação educacional, “é a única constituição, antes de 1988, que reconhece ao adulto o

acesso à escolarização como direito” (Idem, ibidem, p.574). A partir do texto

constitucional federal, “o ensino gratuito e obrigatório será recebido pelas constituições

estaduais, as quais poderiam alargar seu campo de aplicabilidade” (Idem, p.574) e elaborar,

desta maneira, legislações que associassem, pela primeira vez em nossa história, gratuidade

e obrigatoriedade concernentes ao ensino.

O ensino obrigatório, como aspecto pertinente ao sistema educacional, apresenta-se

como questão de peso nas discussões referentes ao desenvolvimento da educação e dos

ideais de progresso, indicando a necessidade de se encarar de fato o ensino como um dos

instrumentos para viabilizar o processo de civilizar a nação, sendo considerado elemento

fundamental na formação do indivíduo. Pode-se afirmar que o direito à educação constitui-

se como decorrente da condição fundante da cidadania; para o estabelecimento efetivo da

participação de todos nos processos políticos e sociais. Por este motivo, torna-se

imprescindível sua afirmação na legislação. Segundo Carlos Jamil Cury, é “no

reconhecimento da educação como direito, que a cidadania como capacidade de alargar o

horizonte de participação de todos nos destinos nacionais, ganha espaço na cena social”

(2005, p.21). A questão da obrigatoriedade do ensino incorpora amplas discussões sobre o

papel do Estado brasileiro na garantia desse direito social básico e atravessa nossos tempos

como proposta ainda não resolvida plenamente no interior do processo de democratização

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do ensino. Importa registrar que o reconhecimento de direitos implica na possibilidade de

institucionalização de normas que conduzam a ações efetivas, porque “ a figura do direito

tem como correlato a figura da obrigação” (BOBBIO, 1992, p.80).

A obrigatoriedade de ensino como prerrogativa constitucional assume na sociedade

brasileira a condição de ser uma afirmação que, ao longo da história do país, configurou-se

na legislação de vários períodos políticos, mas que efetivamente não foi consolidada, não se

fez prática. Uma sociedade excludente e atravessada pelo autoritarismo inclusive

burocrático, a proclama, mas não trata de criar as condições objetivas necessárias para sua

efetivação. Apesar de se constatar que o direito à educação no Brasil sempre foi muito

restrito, não se pode ignorar os avanços estabelecidos ao longo do século XX, uma vez que

o número de alfabetizados e de escolas cresceu de maneira constante

No Estado de Santa Catarina, desde os tempos do Império, a obrigatoriedade de

ensino, segundo Elaine Marcilio, “era considerado o único meio capaz de generalizar o

ensino, tornando-o frutífero diante dos investimentos realizados pelas províncias” (p. 117).

Segundo esta autora, a partir de vários dispositivos, a obrigatoriedade escolar era indicada

para atender a pretensão de direcionar-se o projeto de constituição do Estado/Nação.

Entendia-se que a educação era um dos meios capazes de modificar o comportamento dos

indivíduos, na busca de normas de condutas consideradas mais civilizadas. Nesse processo,

era importante que fosse constituída uma identidade entre os membros da sociedade

brasileira e isto poderia ocorrer, segundo o suposto na época, pela via da instrução. Para

tal, no entanto, era necessária a formulação de mecanismos que conduzissem de maneira

impositiva as crianças para a escola.

Faz-se necessário considerar que, no período imperial, apesar de o Estado apontar

com alguns dispositivos legais em direção ao ensino obrigatório, a educação como um

direito, a partir dos ideais liberais de sociedade, encontrava inúmeros limites na medida em

que a maioria da população não possuía nenhuma condição de acesso a ela (até mesmo

porque a escola era, praticamente, inexistente). Portanto, a educação, no Império, era

restrita a determinada parte da sociedade e quando proclamada como necessária à

população em geral, partia da preocupação de “sujeitar esses indivíduos a um tipo de

disciplina tida como salutar, formando-lhes o coração e o espírito por meio de instruções

consideradas úteis” (Idem, p. 39).

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Desta maneira, percebe-se o quanto a educação foi estabelecida de modo ambíguo,

na medida em que era reconhecida como imprescindível para o alcance de uma sociedade

civilizada e por isso deveria estender-se a todos, ao mesmo tempo em que deveria

representar uma forma de controle social, pois pretendia-se através da escolarização moldar

os sujeitos deste processo através da normatização de sua conduta.

Esta questão atravessa o século e continua sendo observada no processo de

constituição da República, quando a escola é apontada como o caminho para formar os

cidadãos republicanos e integrá-los ao projeto de modernidade como indivíduos produtivos.

Segundo Gladys Teive, “a instituição escolar passou, então, a constituir-se numa exigência

à modernização social pretendida” (2008, p.33), entendida como espaço no qual ocorreria a

socialização de novos modelos comportamentais, a escola “deveria civilizar e moralizar as

crianças, disciplinando seus corpos e mentes para a modernidade” (Idem, p.33), na

perspectiva de formar cidadãos impregnados pelos ideais republicanos comprometidos pela

ordem na busca do progresso.

Apesar da idéia amplamente propagada de que a escolarização era o espaço

formador dos novos cidadãos da República, na Carta Constitucional de 1891, “mantiveram-

se os pontos de vista assentados nos dispositivos constitucionais do Império” (NAGLE,

1976. p.280), uma vez que não havia ocorrido nenhuma alteração estrutural significativa da

ordem social vigente. A Carta Constitucional de 1891 apresentou um texto essencialmente

liberal, com o federalismo determinando juridicamente a relação da União com os Estados

e, não obstante ter ampliado alguns direitos políticos com a supressão do voto censitário, os

direitos sociais nela não apareceram explicitados. Desta maneira, “o perfil do liberalismo e

do ‘Estado mínimo’ passa a ser lei, mas dentro de um pragmatismo elitista e excludente

dos grupos oligárquicos no poder” (CURY, 1996, p. 79). A questão da “gratuidade foi

retirada da Constituição e deixada a cargo dos Estados bem como o estatuto da

obrigatoriedade” (Idem, ibidem, 2005, p.24), desobrigando o Estado Nacional desta

responsabilidade, na esteira do entendimento de que “deixava a demanda por educação

escolar ao indivíduo que, atraído pelo exercício do voto, seria motivado a buscar os bancos

escolares” (Idem, p. 24). Ainda que a discussão sobre o aspecto da obrigatoriedade de

ensino tenha sido desenvolvida no processo constituinte, a “obrigatoriedade não passou,

seja por causa do federalismo, seja e sobretudo pela impregnação do princípio liberal de

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que a individualidade é uma conquista progressiva do indivíduo que desenvolve

progressiva e esforçadamente a sua virtus” (Idem, ibidem, 1996, p.78).

Permaneciam, portanto, antigos entraves a uma escolarização básica obrigatória,

uma vez que o governo central continuava a eximir-se da tarefa de organizar e garantir um

sistema educacional nacional, não assumindo a responsabilidade pela instrução pública

primária. Segundo Saviani, “do ponto de vista da administração do ensino público, o

advento da República marcou uma continuidade em relação ao Império, ao manter as

escolas primárias, portanto, o ensino popular, sob a égide das províncias, transformadas em

estados federados” (2004, p. 31).

Esta visão demonstra a forte presença do ideal liberal de maximização da liberdade

individual, que perfilava os principais discursos ideológicos do início do período

republicano no país, o que se fez notar também nas discussões sobre as questões

educacionais, especialmente no Congresso Constituinte de 1890, quando “em sua maioria,

os constituintes defendiam as posições próprias do liberalismo” (Idem, 1996, p.73), em

especial os concernentes aos direitos individuais e civis e à propriedade privada,

congregados em uma bancada de engenheiros, militares, médicos e advogados a compor “a

maioria parlamentar sob a bandeira dos Partidos Republicanos” (Idem, ibdem, p.73).

Ainda segundo Saviani, não ocorreu organicidade na discussão sobre os aspectos mais

elementares a respeito da educação. Em virtude disto, ao omitir-se diante do compromisso

de explicitar direitos sociais, o Congresso retirou do processo educacional a possibilidade

de ampliar aos indivíduos o acesso a escola, evidenciando-se, desta forma, a formulação de

um projeto político excludente, a partir da perspectiva de que “não haverá educação

obrigatória exatamente porque a oportunidade educacional será vista como demanda

individual” (Idem, p.79).

No Estado de Santa Catarina, os primórdios da tomada de regulação governamental

sobre a obrigatoriedade de ensino encontram-se esboçados no ano de 1854, quando houve a

determinação de se multar aqueles pais que retirassem os filhos da escola. Esta

regulamentação, no entanto, incidia somente sobre a freqüência dos alunos, por ser uma

penalização dirigida apenas aos que tivessem efetuado matrícula, ou seja, “não tratava-se,

no caso, de obrigar os pais a matricularem seus filhos na escola, mas de exigir que os já

matriculados efetivamente a freqüentassem” (TEIXEIRA, p.130).

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Apesar de ser uma questão que estava presente em países europeus e ser adotada na

Corte do país desde 1854, na Província catarinense este tema marcava apenas a pauta de

discussões sobre educação. A normatização da obrigatoriedade do ensino só se tornou lei

em 1874, quando a matrícula passava também a ser uma obrigação dos pais, que deveriam

matricular os filhos com idade entre 7 e 14 anos e as filhas entre 7 e 10 anos de idade, a

partir da Lei nº 699, que indicava como obrigatória e gratuita na educação primária e livre

nos outros graus de ensino, isentando somente os pais ou responsáveis daqueles que

apresentassem impossibilidade física ou moral.

Não obstante esta legislação apresentar uma preocupação que apontava na direção

da obrigatoriedade de ensino como uma necessidade, parece ter alcançado pouco êxito, uma

vez que “isso não foi suficiente para fazer com que um número significativo de crianças

viesse pelo menos a cursar as primeiras letras”(MARCÍLIO, p. 188). Alguns fatores

foram apontados como justificativa para que este dispositivo legal não fosse alcançado,

entre eles a irresponsabilidade dos pais em não enviar seus filhos à escola, sendo tais

indivíduos “considerados pelos governantes como entraves para o progresso, por não

atribuírem à instrução a importância merecida” (Idem, p.166) e, ainda, a falta de habilitação

do professorado, apontada pelo poder público como responsável pela estruturação do

processo de ensino-aprendizagem, mas que não vinha cumprindo com seu papel, “ora pela

falta de capacitação, ora pela sua má vontade em desempenhar sua missão” (Idem, ibidem.

p.170). É necessário ressaltar, no entanto, que a falta de escolas na Província era o fator

gerador da ineficiência da obrigatoriedade, “fato que tornava inviável a imposição da

obrigatoriedade do ensino, constituindo-se então numa regra praticamente impossível de ser

estabelecida” (Idem, p.135).

Diante das evidências de não observância da lei estabelecida em 1874, o governo

catarinense tratou novamente desta matéria no ano de 1886, com a lei nº 1144, que

estabelecia mais uma vez a obrigatoriedade do ensino primário abrangendo toda as regiões

da Província ou onde existissem escolas públicas. Essa obrigatoriedade incidia sobre as

crianças que morassem em um raio de até três quilômetros da unidade escolar, para

meninos de 7 a 15 anos e meninas de 7 a 13 anos. Por essa legislação, comparativamente a

lei de 1874, aumentava-se em um ano a idade escolar dos rapazes e em três anos a das

meninas. No entanto, segundo Neide Fiori, o cumprimento dessa obrigatoriedade dar-se-ia

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“seja pela freqüência a estabelecimento de ensino público ou particular reconhecido, seja

pelo aproveitamento demonstrado pelo discípulo, mediante ensino ministrado por professor

particular, na residência do aluno” (p.64), assinalando que a obrigatoriedade recaía sobre os

matriculados e não sobre todas as crianças em idade escolar.

Ainda no que concerne à obrigatoriedade, o Regulamento da Instrução Pública do

Estado de Santa Catarina do ano de 1911, no artigo 128, afirma que o ensino seria

“obrigatório para ambos os sexos, até aos 14 annos, começando aos 7” (p.31). Aparece

pela primeira vez a equiparação dos sexos quanto à idade-base para a escolarização. Isto,

no entanto, não significava garantia da presença efetiva de todas as crianças em idade

escolar nas instituições de ensino primário, uma vez que o artigo seguinte, nº 129, indicava

como obrigação a frequência de alunos entre 07 e 10 anos, desobrigando da matrícula os

que tivessem mais de 11 anos. Pode-se observar aqui um recuo no que diz respeito a

normatização da obrigatoriedade, uma vez que a lei de 1874, indicava que a

obrigatoriedade recaía sobre a matrícula e a freqüência das crianças em idade escolar,

dispositivo não reiterado neste momento. Portanto, apesar da ênfase que os discursos

davam à importância do processo educativo e das tentativas de reformas do ensino, como a

Reforma Orestes Guimarães aqui citada, que indicava a necessidade de “instaurar um novo

sistema de pensamento” (TEIVE, p.32), a estrutura do ensino permanecia atrelada a

entraves que dificultavam sua consolidação.

Quando se avança aos anos de 1920, a legislação federal sofre a revisão

constitucional em 1926, que, entre outros aspectos, encaminhou discussões específicas

sobre a educação. Apesar de terem sido apresentadas diversas emendas constitucionais,

muitas delas acabaram sendo retiradas, o que deixou o texto final com poucas alterações

significativas. No âmbito educacional, ainda que tenha sido definido que os diferentes

níveis da administração pública (o nacional, o estadual e o municipal) deveriam distribuir

entre si a responsabilidade sobre a educação escolar básica (ensino fundamental), não ficou

explícito de quem era efetivamente esta competência. Desta maneira, “dada a tradição de

estar este nível da educação escolar afeito aos estados desde, pelo menos, o Ato Adicional

de 1834” (CURY, p.84), deduz-se que esta responsabilidade ficaria aos encargos das

unidades estaduais da federação.

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Assim, a tarefa de possibilitar a instrução pública primária nacional continuava

pautada na idéia de descentralização. Com a instituição do sistema federativo de governo,

os Estados passaram a legislar sobre suas próprias leis, estruturando todas as questões

relativas a administração pública, definindo-se, desta forma, uma estrutura governamental

relativamente autônoma nas unidades federadas, bem como a continuidade da ausência de

diretrizes nacionais advindas da União para a organização do campo educacional.

Entretanto, faz-se necessário destacar que, “se o ensino básico é assumido por todos os

estados da Federação, bastando para isso ler os parágrafos relativos à educação nos corpos

das Constituições Estaduais, a obrigatoriedade não está ali presente” (Idem, p.84).

Tratava-se, portanto, de deixar ao encargo das unidades federadas a responsabilidade de

efetivar ou não a escola básica para o conjunto dos brasileiros.

4. 2. A obrigatoriedade na pauta da legislação dos anos de 1930

Na década de 1930, o ensino obrigatório continuava a integrar a pauta de

“prioridades educacionais” presentes na legislação, na medida em que permanecia e como

um dos problemas históricos desta área a ser enfrentado pelos poderes públicos. Percebe-

se como o Estado ainda continua a proclamar a importância da educação, mas passa a

requerer a participação da família, como elemento fundamental para a garantia deste

processo. Ao buscar somar com os pais a responsabilidade acerca do oferecimento da

educação, o Estado pretendia, diante deste direito social básico, efetivar uma divisão de

tarefas, eximindo-se, assim, do compromisso republicano de criar e garantir as condições

indispensáveis para se efetivar a instrução pública primária obrigatória.

Na Constituição de 1934, ao se observar o princípio da obrigatoriedade, permanece

a fragilidade delineada desde os tempos imperais, conferindo a obrigação apenas sobre a

freqüência escolar, já que o Artº 150, letra “a” do Parágrafo Único, definia o “ensino

primário integral e gratuito e de freqüência obrigatória”, restrito, desta maneira, aos que

tivessem efetuado o ato da matrícula. Ou seja, o direito à educação ocorreria através da

presença dos matriculados nos estabelecimentos de ensino, demonstrando novamente a

indicação de obrigatoriedade apenas sobre aqueles que já estivessem na escola,

desobrigando uma alocação de recursos mais incisiva do Estado para garantir o acesso mais

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amplo ao ensino básico, na medida em que, por este dispositivo, o direito à educação “sai

suficientemente mutilado para que nada obrigue o Estado a um investimento maciço em

educação pública” (ROCHA, p.126). Foram definidos percentuais orçamentários que

deveriam ser destinados para a educação pela União, Estados e Municípios, além de criar-

se um sistema de bolsas para subsídios a alunos carentes. No entanto, estes dispositivos

não se faziam suficientes para a efetiva consolidação do ensino público, uma vez que a

destinação de verbas era indicada para os serviços de educação em geral e não

especificamente ao sistema público de ensino.

Posteriormente, a Constituição de 1937 estabelecida no Estado Novo, no Art.º 130

definia que “o ensino primário é obrigatório e gratuito”. No entanto, registra-se o

imediato complemento textual de que a questão da gratuidade “não exclui o dever de

solidariedade dos menos para com os mais necessitados”, identificando-se esta situação no

ato de matrícula, ocasião em que seria exigido dos considerados mais favorecidos “uma

contribuição módica e mensal para a caixa escolar”. Continuava, portanto, a histórica

política de desobrigar o Estado com relação ao oferecimento da escola pública, ainda que se

declarasse reiteradamente no discurso governamental a necessidade de democratizar a

educação como uma das exigências do processo de modernização pelo qual o país passava.

Ainda assim, trata-se do período em que o Estado centralizou de maneira mais acentuada as

decisões sobre os diversos ramos da administração pública, designando-se a si próprio

como propulsor das mudanças sociais. Isto porque, “o reforçamento da autoridade do

Estado passa certamente por estas duas demandas: modernização a curto prazo e controle

do ritmo das demandas sociais no processo de transformação da sociedade brasileira”

(OLIVEIRA, VELLOSO E GOMES, p. 28). Tratava-se, portanto, de estabelecer uma

política em que o Estado, na área educacional, decidia e buscava controlar todos os

aspectos relacionados a ela, ao mesmo tempo em que estabelecia mecanismos de isenção ou

desobrigação quando se tratava de ações efetivas de mudança na educação.

Nas duas constituições do período analisado, havia uma política governamental de

mitigação de responsabilidade quanto ao dever do Estado de proporcionar à população o

acesso à instrução primária, obrigatória e pública. Não obstante os impostos arrecadados

pelo conjunto da sociedade, o Estado queria contar com a contribuição da família para a

realização da obrigatoriedade escolar. Ainda que a educação básica tivesse sido declarada

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como obrigação e reconhecida como direito, o Estado ainda tentava recorrer à mediação da

instituição familiar para implementá-la, na medida que “o mesmo artigo que declara a

educação como obrigação do Estado, simultaneamente a impõe como tal sob a

responsabilidade da família” (CURY, HORTA e FÁVERO, p.25).

Em Santa Catarina, a legislação que regulava, a obrigatoriedade de ensino no início

dos anos de 1930 seguia os padrões estabelecidos pela Carta Constitucional, que definia a

obrigação da freqüência das crianças entre 7 e 10 anos de idade. Ao se observar a

reformulação do ensino processada pela Reforma Trindade de 1935, verifica-se que pouco

se define sobre a escolarização obrigatória, tendo apenas o Artº 1º apontado que se

“manterá um ensino público gratuito” (Decreto nº 713), que abrangeria os níveis de ensino

primário, fundamental, supletivo, secundário e vocacional. Esse documento tinha um

propósito declarado de tratar mais especificamente do processo de formação de professores,

consubstanciado em algumas das idéias escolanovistas difundidas no país por intelectuais

que tomaram para si a tarefa de renovar a educação, contando-se com “a dedicação de toda

essa geração à causa da formação de professores” (EVANGELISTA, p.18).

O princípio da obrigatoriedade permaneceu assim, oculto, ainda definido por

orientações antigas e sem revisões orgânicas, embora se tratasse de uma reforma na

estrutura educacional do Estado de Santa Catarina. Determinar a obrigatoriedade faria ser

necessária uma preocupação maior com a demanda por mais escolas, mais professores,

mais materiais didáticos, enfim, mais verbas para a necessária ampliação da rede de ensino.

Tratava-se, portanto, de apresentar a pretensão de organizar a educação catarinense nos

moldes do que então se propagava pelo país, num ideário atravessado pelo que os novos

métodos de ensino requeriam, sem, no entanto, tratar de garantir o acesso efetivo das

crianças à instrução básica. Não obstante o anúncio constante de reconhecimento da

educação como uma necessidade para a modernização do Brasil, na prática era,

contraditoriamente, uma necessidade desnecessária que tinha a ver com o avançar da

modernização conservadora em nosso país.

No relatório do governador Nereu Ramos, apresentado ao Presidente da República,

no ano de 1937, percebe-se alguma referência ao dispositivo da obrigatoriedade em um

item específico ao “ensino obrigatório”, apontando-o como questão imprescindível. Mas

as falas oficiais da época entendiam que o Estado ainda não apresentava condições capazes

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de solucionar os problemas que freavam a aplicação de tal dispositivo legal. Embora a

obrigatoriedade escolar estivesse presente na legislação de Santa Catarina, “esta nem

sempre pode ser observada a rigor, porque vários são os fatores que a tornam impraticável”

(Relatório D.E., 1936, p.94). Entre esses fatores, apontava-se a dificuldade financeira do

Estado em criar escolas e a “carência de recursos materiais e a miséria” (p.94) da

população, que impediam o avançar do processo de escolarização. Constatou-se, assim, a

continuidade de uma antiga evasiva dos governos que indicavam o aumento das despesas

dos cofres públicos como justificativa para a impossibilidade de efetivação da expansão da

escolarização, demonstrando, deste modo, seu descaso para com a educação, “na medida

em que era vista mais pelos gastos que implicava e não por ser um investimento construtor

do futuro” (MARCÌLIO, p.38), embora este último aspecto, invariavelmente, compusesse

os discursos governamentais. Desvela-se o quanto o formalismo do discurso oficial

destoava da prática.

Entretanto, no ano de 1939, o Decreto-lei nº 301 dispunha especificamente sobre a

obrigatoriedade escolar do ensino primário destinado às crianças de oito a quatorze anos.

Este Decreto foi integralmente reproduzido no relatório apresentado ao Presidente da

República, onde o governador Nereu Ramos salientou a necessidade de observância da

Carta de 1934, “considerando que a Constituição da República estabelece a

obrigatoriedade do ensino (...), que a orientação do Estado Novo, no tocante à educação é

intensamente nacional (...), que, sendo a educação da infância e da juventude problema que

interessa à construção moral da nação (...), decreta: Art. 1º - São obrigadas à frequência

escolar, em estabelecimento primário oficial ou registrado no Departamento de Educação,

todas as crianças de oito a quatorze anos” (Idem, p.130). As indicações apontadas no

documento demonstram a preocupação governamental em conduzir a educação como

instrumento de moldagem dos indivíduos, na pretensão de formar homens ordeiros e

obedientes para servirem à pátria, na medida em que a escola era entendida como lugar de

conformação social. Anunciando a educação como bem público, buscava conduzir o

indivíduo a se ver como parte integrante do processo de construção do Estado Nacional,

evitando o desencadear de revoltas e de transgressões à ordem vigente.

Segundo o Superintendente Geral do Ensino, Sebastião de Oliveira Rocha, em seu

relatório do Departamento de Educação apresentado em maio de 1939, “o Decreto-lei nº

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301 de 24 de fevereiro de 1930, resolveu simples e praticamente, o modo de obter-se u’a

matrícula e freqüência compensadoras” (Relatório Departamento de Educação. 1939, p.

360). Registra-se então o entendimento de que, através da força de uma lei, as crianças

catarinenses em idade escolar iriam para a escola, pois tal determinação, pela ausência de

medidas práticas, era tida como suficiente para encaminhá-las aos estabelecimentos de

ensino. Desta maneira, o Estado buscava apresentar como resolvido o problema do acesso

das crianças à escola, eximindo-se da responsabilidade sobre quaisquer outros aspectos

pertinentes ao processo de escolarização, absolutamente necessária para a efetivação de tal

intento.

O Decreto-Lei 301 de 1939 determinava de forma detalhada os pressupostos vistos

como necessários para que a obrigatoriedade do ensino se efetivasse de maneira eficaz. O

interventor federal de Santa Catarina considerava que a obrigatoriedade do ensino primário

era necessária para encaminhar a “infância e a juventude no cumprimento de seus deveres

para com a economia e a defesa da nação, (...) e para que o espírito da criança seja

impressionado e guiado por ensinamentos que, além de úteis à cooperação social, lhe

estimulem o amor, o culto e a compreensão às tradições e às instituições brasileiras”

(Decreto-Lei º 301, 1939, p.58). Através da escola, o indivíduo seria preparado para o

trabalho, no âmbito do processo de modernização da sociedade que ocorria sobretudo pelo

aumento da industrialização verificada no país. Seria a escola a instituição que promoveria

a integração dos indivíduos ao processo capitalista de produção, fornecendo-lhe o

conhecimento prático necessário para o desempenho de sua função social. O discurso da

legitimação do trabalho estava fortemente ligado à percepção de que era necessário

homogeneizar as condutas em geral para construir-se uma nação forte e promissora.

O ideal de propagação da escola em Santa Catarina ocorria num contexto social e

econômico marcado pelo crescimento do comércio e pelo desenvolvimento de indústrias

que se estabeleciam tanto para o mercado catarinense como para o fornecimento de

produtos para diferentes regiões do país. Nesse contexto, a educação da criança e do jovem

apresentava-se como “problema que interessa a construção moral da nação e ao seu

equilíbrio político” (Idem, p.59), o que indicava que a escola era tida como o lugar onde se

conduziria à estabilidade social através das idéias de cooperação, de submissão às

instituições, de moralização dos indivíduos, uma vez que “o projeto das elites, como dos

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intelectuais reconstrutores, implicava em intervenção de natureza cultural, espiritual.

Moldar as mentes das classes perigosas constituiria sua personalidade, adequando-a ao

novo país e ao trabalho racional” (EVANGELISTA p.24).

A regulamentação da lei nº 301 de 1939, estabelecida após a deflagração do Estado

Novo, trazia em seu contexto os indicativos que perfilavam os ideais estadonovistas de

ampliação do controle do Estado sobre os diferentes setores da sociedade, já que esta

“concepção da educação como problema nacional servirá para justificar uma intervenção

cada vez mais intensa do Governo Federal nos diferentes níveis de ensino e uma crescente

centralização do aparelho educativo” (HORTA 1996, p.02). A maneira pela qual o Estado

definiu o caminho para se alcançar os intentos de propagação da educação foi a de contar

com a colaboração da família, já que entendia que a obrigação pela escolaridade das

crianças era também de seus responsáveis legais. De acordo com o Art. 4º da Lei 301, “os

pais ou outros representantes legais são obrigados a promover a matrícula e a freqüência

das crianças em idade escolar” (Decreto-Lei nº 301, 1039,p.60). Por este artigo, tem-se a

indicação de que a obrigação era da frequência e também da matrícula, o que pode ser

considerado um avanço em relação às legislações anteriores, que recaíam no dispositivo

sobre a frequência dos que estivessem efetivamente matriculados, desconsiderando-se os

que ainda não tinham sido registrados no processo escolar. Mas, não obstante a legislação

demonstrar cada vez mais a educação como um direito declarado e reconhecido como tal,

esta conquista não vinha respaldada por mecanismos que vissem também o Estado como

infrator no âmbito desta responsabilidade, uma vez que os instrumentos que possibilitavam

uma ação judicial recaíam unicamente sobre os pais ou responsáveis. Ao penalizar os pais

como os infratores de tal norma, o Estado pretendia assegurar esta proteção jurídica pela

incriminação da instituição familiar, descartando desta forma a possibilidade de se cobrar

do próprio Estado a garantia da efetivação deste direito.

Ao observar-se o artº 2 da lei em questão, constata-se que o ensino era obrigatório

de acordo com uma ‘zona de influência’, sendo esta área fixada em um círculo com o raio

de apenas três quilômetros, desobrigando da norma aqueles que não estivessem neste

espaço geográfico delimitado. É importante ressaltar que esta era a mesma distância já

estabelecida no século XIX, encontrada na Coleção de Leis e Decretos do Estado

Catarinense no ano de 1886, especificamente na lei catarinense nº 1144, de 30 de setembro

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daquele ano (MARCÍLIO, p.84). Portanto, apesar do longo tempo e do crescimento da

população, a normatização sobre a área de abrangência da lei continuava a mesma. Além

desta condição básica, outros requisitos apontavam para a isenção da obrigação escolar,

indicados no artº 3º, como é o caso dos portadores de moléstias consideradas repugnantes

ou contagiosas, dos que não tivessem residência ou não fossem nascidos no Brasil, dos

tidos como portadores de “motivos legítimos” (sem, no entanto, especificar-se sobre o que

seriam esses motivos) e ainda dos que tivessem qualquer fato julgado relevante pelo

Secretário do Interior e Justiça. Verifica-se, então, que diversas circunstâncias justificavam

a não obrigatoriedade de se matricular crianças em idade escolar, o que demonstra a

continuidade de uma forte isenção que o Estado pretendia atribuir-se diante da proposição

de se efetivar a educação popular.

Considerando-se a trajetória do ensino primário no Brasil e em Santa Catarina, essa

regra de obrigatoriedade sobre a matrícula representou um relevante avanço em termos de

direito à educação. Ainda que muitos condicionantes fossem necessários para a efetiva

consolidação da ampliação do processo de escolarização, alcançava-se a implicação maior

de estar registrada, na forma da lei, a obrigatoriedade de ensino, o que apontava para uma

possível alocação maior de recursos do Estado para com a educação ao longo do tempo.

É necessário, no entanto, entender que esse processo estava ligado a interesses de

conciliação que os dirigentes pretendiam fortalecer e/ou estabelecer entre os membros da

elite e a maioria da população, de modo que a ordem vigente não fosse desarticulada.

Alargar a oferta de educação escolar seria um meio de disciplinar o trabalhador, tornando-o

obediente às leis e aos princípios de moderação e acatamento da ordem. Ainda que o

ideal de democratização da escola fosse apontado pelo discurso oficial como prerrogativa

do processo de modernização, isto não poderia se dar de maneira ampla, mas de forma

conservadora, na medida em que não deveria alterar a situação social de exclusão

historicamente estabelecida.

De acordo com o Art. 5º, várias situações eram apontadas como passíveis de

receberem penalidades caso houvesse infrações quanto ao dispositivo legal, dentre elas, a

falta de matrícula, a não justificação de faltas e a cessação de freqüência. A partir desses

indicativos, as penalidades para os ‘infratores’ seriam estabelecidas através de multas

aplicadas pelo poder público. Quando os pais ou responsáveis não realizassem a matrícula

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na época indicada, seriam multados em 20$000 réis, podendo se chegar ao valor de

200$000 réis no caso de reincidência. Na incidência de faltas por mais de três dias sem

justificação, as multas iam de 10$000 réis a 30$000 réis, e ainda para o caso de cessação de

freqüência estipulavam-se valores que variavam entre 50$000 e 300$000 réis. Por meio de

instrumentos coercitivos, o governo pretendia regular as ações dos indivíduos,

uniformizando o processo educativo com vista a consolidar o ideal de uma nação unitária.

Impunha-se à família a responsabilidade pela educação, ainda que proclamada em lei

também como obrigação do Estado.

Quanto ao dispositivo de aplicação das multas, definia-se no art. 6º que elas

incidiriam quando ocorressem quaisquer infrações a esta lei. Essas multas implicavam no

pagamento de determinadas quantias em dinheiro, e o valor seria aplicado gradualmente, de

acordo com “as posses dos infratores, o seu grau de instrução, as condições do meio em que

vivem, a facilidade de comunicações e o motivo determinante da infração” (Idem, p. 61).

Para que as normas estabelecidas fossem cumpridas, se fazia necessário o uso de

mecanismos de controle e fiscalização, definidos no art.º 12 como competência dos

inspetores escolares, dos diretores e dos professores, além dos promotores públicos. Tais

pessoas deveriam enviar mensalmente o nome dos pais ou responsáveis para o

Departamento de Educação, a fim de intimar-se à realização da matrícula ou verificação da

freqüência para a aplicação de multa à infração identificada. Após a intimação do

infrator, este deveria pagá-la no prazo máximo de cinco dias, ou “no mesmo prazo recorrer

para o Superintendente de Ensino, mediante prévio depósito da respectiva importância”

(art. 13, § 1º, lei nº 301, 1939). Por meio de punições, o Estado apresentava a educação

como uma obrigação individual e, desta maneira, deveria ser entendida pela população.

Outra indicação da lei nº 301 de 1939 determinava que o depósito da importância a

ser paga deveria ocorrer na Coletoria Estadual ou, em caso de negativa de recurso, na

fazenda do Estado, que repassaria o valor recolhido para o Departamento de Educação que

encaminharia para “à Caixa Escolar da circunscrição a que pertencer o infrator” (Idem,

p.64). Ainda que as multas fossem indicadas no próprio documento como educativas (art.

6º, letra e, lei nº 301, 1939), constituíam-se mais como mecanismo de coerção do que de

conscientização, na medida em que caracterizavam o ato de omissão dos pais ou

responsáveis como delito. Mas também atuavam como instrumento de persuasão, ao

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declararem que era um dever “cooperar para a efetivação da obrigatoriedade do ensino

primário, assim os responsáveis pelas crianças, em idade escolar, como todas as autoridades

públicas e todos os cidadãos brasileiros” (Decreto-Lei 301 de 1939, p.59) para “à

construção moral da Nação” e “como meio de educar a infância e a juventude no

cumprimento de seus deveres para com a economia brasileira e a defesa da Nação”

(Idem,ibidem, p.58). Evidencia-se então que o Estado estabelecia mecanismos de controle

e imposições de normas de conduta através de penalidades que buscavam obrigar os pais ou

tutores a serem grandemente responsáveis pelo processo de efetivação da educação popular.

Ao apontar a escola como necessária para o crescimento da economia, como instância

formadora do trabalhador, fazia-se mister elaborar dispositivos legais que obrigassem os

indivíduos a cumprirem seus deveres. Previa-se até a suspensão do pátrio-poder aos pais

que descumprissem com o dever que lhes era incumbido. Pode-se perceber que a própria

intervenção na instituição familiar compunha-se como uma das principais estratégias de

normatização das condutas sociais.

Um relevante mecanismo de coerção, elaborado como forma de garantir a

observância da norma por parte da população em geral, foi a instituição da denominada

‘quitação escolar’, apontada no art. 20º da lei 301 de 1939. De acordo com este

dispositivo, que se constituiria de um atestado emitido pelo diretor ou professor do

estabelecimento de ensino da ‘zona de influência’ a qual estivesse subordinado o indivíduo,

ninguém poderia ser admitido ou promovido em serviço público do Estado ou do

Município, sem apresentá-lo. Do mesmo modo, não poderia receber dinheiro ou

remuneração de cargo público, seria impossibilitado de adquirir estampilhas de vendas e

consignações e ainda não poderia extrair certidões negativas em repartições públicas. A

formulação deste dispositivo legal, a quitação escolar, apontava na direção da preocupação

em se encontrar mecanismos para consolidar a afirmação da escola como importante fator

de progresso. Esse entendimento encontrava-se respaldado no ideal republicano de

redenção da nação através da educação, consubstanciado nas idéias do renovadores que

indicavam a “educação para um programa de reconstrução social e regeneração moral”

(MONARCHA, p.18).

Pode-se apontar nesta prerrogativa a equiparação da educação ao serviço militar,

uma vez que, apresentada como condição obrigatória, revelava-se como um documento

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comprobatório de idoneidade moral, que era tido como condicionante para a obtenção ou

realização de importantes atos civis. Em entrevista ao jornal “Correio da Manhã”,

transcrita no relatório do governador Nereu Ramos para o presidente Getúlio Vargas do

ano de 1940, o jornalista Costa Rego afirma que a quitação escolar “forma, em outras

palavras, uma espécie de rede coletora dos indiferentes e rebelados, e possue, na

simplicidade de seu processo, a sabedoria de não agir por coerção, pois age antes por

eliminação natural” (p. 492). O entendimento de educar a população para o acatamento

da ordem parecia ser o meio pelo qual o governo do estado atingiria a homogeneização da

sociedade catarinense, disciplinando e normatizando os integrantes desse território. Não

se tratava de garantir a presença das crianças na escola, mas, antes, de garantir pela lei que

os indivíduos pertencentes ao Estado Nacional em construção, cumprissem seus deveres,

tidos como necessários para o engrandecimento da pátria.

4..3. A obrigatoriedade no processo de expansão escolar:

No primeiro relatório do Departamento de Educação de Santa Catarina, apresentado

à Secretaria do Interior e Justiça, em junho de 1936, referente aos trabalhos realizados por

este órgão no período de 01 de janeiro de 1935 a 31 de maio de 1936, os dados apontam

que o número de matrículas havia aumentado consideravelmente nos últimos anos,

“acompanhando o ritmo de intensificação e melhoramento do nosso aparelho educacional”

(p. 46) , pois segundo este relatório, o número de crianças matriculadas “em 1932 atingia a

80.3939, em 1933, 100.861, em 1934, 104.977, alcançando 108.843 em 1935” (p.46).

Outro documento que irá enaltecer e demonstrar a satisfação das autoridades com o número

de matrículas, é a Mensagem do Governo do Estado à Assembléia Legislativa, apresentada

em 1936 por Nereu Ramos, quando registrava que o percentual de freqüência entre as

crianças de 7 a 14 anos, no ano de 1935, era de aproximadamente 62%, contabilizando uma

população de 132.000 crianças em idade escolar para uma frequência de 83.459 e uma

matrícula de 108.811 alunos, que segundo a fala oficial, indicava “a animadora

percentagem de 82,4% de matrícula escolar” (p. 15). Estes algarismos eram

correspondentes ao número de 2082 estabelecimentos de ensino, dos quais 1472 eram

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escolas públicas e 610 eram escolas particulares e subvencionadas. Por outro lado, o

mesmo documento menciona a não correspondência desses números aos relativos à

freqüência, o que tornava necessária a tomada de “providências que ponham termo a êsse

mal” (p. 23). Apontava o governo que, para solução desse problema, se fazia mister

fiscalizar de maneira mais rígida e com punições severas aos pais que não cumpriam seus

deveres de encaminhar os filhos à escola. Apesar de se estar falando de um contexto de

quase meio século de República, permaneciam as velhas tentativas dos tempos imperiais de

se culpar os pais pelo não encaminhamento dos filhos à escola e mantinha-se a necessidade

de punição àqueles que não colaborassem com o Estado no cumprimento de deveres

imputados aos indivíduos.

Não se vincula a precariedade da escolarização à falta de escolas ou à quantidade de

professores provisórios, que, no período pesquisado, compreendia uma parcela considerável

do professorado catarinense. Segundo dados constantes dos Relatórios do Departamento de

Educação, em 1935 eram 577 provisórios para 763 Normalistas e Complementaristas e em

1936, apontavam-se 604 provisórios para 830 Normalistas e Complementaristas. Nos anos

seguintes, não há apontamentos definidos sobre estes dados. Ainda que houvesse no

discurso a intenção explicitada de melhorar a qualidade de capacitação dos professores,

evidenciada principalmente no texto do Decreto 713, elaborado para este fim, o número de

professores sem formação profissional ainda era um problema a ser resolvido. Percebe-se

que, apesar de se reconhecer como necessária a profissionalização do educador, através de

discursos que elencavam como um grande problema educacional sua má formação, a

elaboração de normatização específica se caracterizava mais como um caminho a ser

trilhado pelos próprios professores do que necessariamente como possibilidade de melhoria

da política de formação docente. Ao Entender ser o professor um elemento importante no

desenvolvimento do processo educativo, uma vez que era ele o principal responsável pela

difusão do conhecimento, o Estado tratava então de legislar sobre tal propósito, a fim de ser

o definidor daquilo que deveria ser repassado como ensinamento.

No ano de 1943, o governo do Estado, em seu relatório anual apresentado ao

presidente da República, apontava os seguintes dados referentes aos “principais resultados

do ensino primário geral -1935/42” (p.57):

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ANOS POPULAÇÃO MATRÍCULA EFETIVA

FREQUÊNCIA MÉDIA

APROVEITAMENTO EM GERAL

1935 1.026.976 98.695 83.459 51.034 1936 1.056.743 104.921 89.470 54.815 1937 1.087.424 117.470 95.844 56.701 1938 1.118.971 107.270 86.254 50.902 1939 1.151.434 111.104 95.117 54.628 1940 1.184.838 117.728 103.953 68.738 1941 1.211.832 120.593 105.617 70.038 1942 1.242.641 126.732 111.199 75.877

Fonte: Informações retirados do Relatório do Governador Nereu Ramos ao Presidente da República, Getúlio Vargas, em outubro de 1943

Observa-se que os números relativos à mensagem de 1936 e os desta de 1943, em

relação ao número de matrículas, não coincidem, já que em 1935, pelo relatório de 1936,

teriam sido matriculadas 108.811 e nos números apontados em 1943 seriam 98.695. Isto

demonstra que as informações oficiais suscitam dúvidas, que justificam a utilização desses

números como indicadores relativos e ainda porque a comparação se estabelecia entre a

população em geral e não de crianças em idade escolar. Mesmo assim, pode-se perceber

que houve um aumento na porcentagem de aproveitamento e freqüência, entre os anos de

1935 e 1942, pois, por estes números, o índice, em 1935, entre o aproveitamento geral e a

matrícula efetiva, era de 51,7% e em 1942, teria sido de 59,8%, e na freqüência média

houve o aumento de 84,5% em 1935 para 87,7 em 1942.

O interesse do Estado em desenvolver a reformulação do ensino também pode ser

verificado em outros dados, como no caso do aumento gradativo do número de

estabelecimentos de ensino, apresentados nos relatórios anuais que o governador do Estado

encaminhava à Assembléia Legislativa e posteriormente ao Presidente da República

durante a vigência do Estado Novo. No documento relativo ao ano de 1936 indica-se que

as escolas municipais teriam saltado de 130, no ano de 1930 para o número de 564 em

1935, dado que pode ser considerado como muito relevante, pois o número de escolas teria

praticamente quintuplicado em apenas cinco anos. Isto era apontado como conseqüência da

obrigação que os municípios tinham de “aplicar nunca menos de 15% da renda tributária na

manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educativos” (Relatório à Assembléia

Legislativa, 1936, p.18).

Os registros do relatório do governo do Estado à Assembléia Legislativa, do ano de

1937, apontavam na direção de que “nosso aparelho escolar continua a ampliar-se, posto

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não ainda na medida das nossas necessidades” (p.12). Os números apresentados

expressavam taxas de aumento, “as escolas isoladas estaduais foram aumentadas em 48, as

municipais de 47, as particulares e subvencionadas de 26, os grupos de 6 e as escolas

normais primárias de 5. As unidades escolares tiveram, portanto, o aumento de 132” (p.

12). A indicação dos números parece corresponder ao que o Estado desejava em termos de

crescimento, quando se observa a seguinte conclusão posta no relatório: “esses números

nos colocam entre os Estados que mais e melhor cuidam do problema educacional” (p. 12).

Outros dados que demonstram a satisfação do governo quanto aos números pode ser

observado no Relatório do Governador Nereu Ramos apresentado ao Presidente Getúlio

Vargas, no ano de 1942, quando ressalta que “Santa Catarina se destaca no país, pelo

desenvolvimento do ensino primário, ao qual vem o governo assegurando desvelada e

sempre crescente assistência” (Relatório apresentado ao Presidente Getulio Vargas, 1942,

p.53).

Apesar de todos os discursos da época estarem voltados à propagação dos ideais de

renovação da escola, os argumentos utilizados para demonstrar algum crescimento eram, na

maioria, de caráter quantitativo. Através dos relatórios do Departamento, as verificações

desenvolvidas pelos inspetores escolares nas circunscrições eram descritas e analisadas,

sobretudo, por tabelas e gráficos referentes tanto ao ensino público como ao particular.

Uma das grandes preocupações era a necessidade constantemente referida de expansão da

rede de ensino, bem como da qualidade desta educação, principalmente no que tangia à

escola primária, pois era esta que formaria os indivíduos de uma pátria em crescimento.

De acordo com os números demonstrados nos documentos oficiais, o Estado

catarinense parecia apresentar alguns resultados considerados satisfatórios, no

desenvolvimento da escolarização da população. No entanto, o esforço governamental se

definia muito mais pela via da fiscalização do que por um empenho maciço em ampliar a

rede escolar e possibilitar o acesso de todos a escola pública e gratuita. A

responsabilização dos pais no envio dos filhos à escola, como condição necessária ao

progresso da educação, aponta no sentido da pretensão do Estado em desobrigar-se do

compromisso que deveria ser dele em fornecer educação pública básica.

Num registro indicador das dificuldades para a observância dessa norma, destaca-se

a falta de escolas para atender à uma população diluída em regiões pastoris, como é o caso

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das terras do ex-contestado e da região serrana, onde havia “a grande dificuldade de se

localizar escolas que abranjam uma população escolar regular, vindo daí a impossibilidade

de o Estado criar unidades escolares para manterem uma freqüência exigida regular, à vista

do numerário exigido para tal manutenção e que a renda estadual não comporta” ( Relatório

D.E. 1936, p. 94).

Segundo alguns dados do Relatório apresentado pelo Interventor Nereu Ramos ao

Presidente da República em 1940, onde são apontados os gastos orçamentários atribuídos

ao item “educação popular”, registraram-se os seguintes números:

ANOS ORÇAMENTO VERBA PERCENTAGEM

1935 18.880:000$000 4.428:304$000 23,5%

1936 21.900:116$100 5.563:352$000 24,03%

1937 25.581:305$100 6.278:810$000 24,5%

1938 31.500:000$000 6.684:492$000 21,2%

1939 38.924:944$000 7.862:732$000 20,2%

1940 40.212:673$300 8.383:140$000 20,8%

Relatório apresentado ao Presidente da República pelo Governo do Estado, 1940. P. 07

Através dos números oficiais apresentados pode-se constatar que as verbas

destinadas à educação pelo governo catarinense demonstravam um decréscimo de

investimentos entre os anos de 1935 e 1940. Ainda assim, pareciam atender ao que estava

determinado como obrigação do Estado, apontada no Artº 156 da Carta Federal de 1934,

onde se definia que “A União e os Municípios aplicarão nunca menos de dez por cento, e os

Estados e o Distrito Federal nunca menos de vinte por cento, da renda resultante dos

impostos na manutenção e no desenvolvimento dos sistemas educativos”, ainda que tenha

ocorrido a retirada deste dispositivo de vinculação entre educação e impostos na

Constituição de 1937. Observa-se também na fala oficial do governador do Estado de

1943, em seu Relatório ao Presidente da República, que até aquele momento “os recursos

do Estado não permitiam, como fora de desejar, que a obrigatoriedade começasse antes” (p.

62). Portanto, apesar de serem apresentados números relevantes relativos ao ensino, isto

não indicava a resolução de um dos principais problemas educacionais, o da efetivação do

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ensino público expandido a toda a população em idade escolar. No discurso oficial, o fator

econômico permanece como uma barreira determinante diante do processo de não

consolidação do acesso da população à escolaridade básica, na medida em que o ato de

assumir a obrigatoriedade de ensino como questão de Estado implicava/implica

investimento mais amplo do poder público em medidas objetivas, tais como a criação de

mais escolas, a aquisição de material didático e o investimento maciço na capacitação dos

docentes.

Outro grande obstáculo apontado para a não efetivação da proposta de

obrigatoriedade escolar era a pobreza generalizada da população, evidenciada pela grande

falta de recursos materiais, o que impedia o Estado de fazer sua parte quanto à

concretização do acesso das crianças à escola, principalmente quando se percebia a

necessidade dos pais de utilizarem a mão-de-obra infantil no trabalho agrícola. Segundo o

relatório do D.E. de 1936, “acontece mui freqüentemente que os pais são forçados a retirar

seus filhos da escola, tão logo estes possam lhes prestar algum auxílio na lavoura, ou em

serviços de outra natureza, a fim de os auxiliar na subsistência” (p. 94). Além dessas

dificuldades, ainda, apontava-se que “outras vezes deixam de frequentar a escola pela falta

absoluta de roupa, material didático, alimentação, etc.” (p. 95).

Apesar de constituir-se, teoricamente, como aspecto fundamental na organização da

estrutura educacional, a proclamação da obrigatoriedade do ensino não garantia a efetiva

presença das crianças em idade escolar nos estabelecimentos de educação, pois, antes era

preciso superar vários entraves indicados como justificativas para o não cumprimento deste

objetivo estipulado nas leis vigentes. Apesar disto, no relatório que o governador Nereu

Ramos enviou à Assembléia Legislativa de Santa Catarina, no ano de 1936, sobre a

movimentação administrativa de 1935, a obrigatoriedade do ensino era apresentada de

maneira mais simplificada, apontando-se como solução para o problema da baixa

freqüência em relação ao número de matrículas uma política de maior rigidez para com os

pais dos alunos, entendendo-se que isso poderia ser resolvido através de uma “fiscalização

mais severa e penalidades efetivas aos pais que não cumprem o dever de mandar os filhos

ás escolas” (Mensagem. p. 23). Evidencia-se o quanto, ainda, antigas questões

sobreviventes, que atravessaram os anos do Império e o início da República, procuravam

responsabilizar os pais pelo fracasso na efetivação da escolarização, eximindo-se o Estado

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das atribuições que lhe eram próprias. Tal prática permanece como expressão de estratégia

política de exclusão escolar, não obstante os anúncios de inclusão.

O Estado colocava-se numa posição de regulador das normas por ele próprio

instituídas, mas tratava de eximir-se da responsabilidade de estabelecer para si as condições

necessárias para o acesso das crianças às unidades escolares. Isto era apontado como dever

dos pais, na condição de indivíduos que deveriam cumprir as regras legalmente postas.

Caberia ao governo a tarefa de fiscalizar os estabelecimentos escolares como meio de

efetivar a obrigatoriedade de ensino. O relatório apresentado à Assembléia Legislativa de

Santa Catarina pelo governador Nereu Ramos, no ano de 1937, indicava, graças ao aumento

do número de inspetorias escolares, uma melhoria da atuação do governo no que concerne à

obrigatoriedade de ensino, ao afirmar que esse acréscimo de unidades fiscalizadoras

“assegurou maior eficiência ao serviço de fiscalização do ensino. Daí não só o aumento da

matrícula, sinão também o da freqüência escolar” (M. G. 1937, p.20). O Estado apontava

para a expansão do serviço de inspeção como a maneira de cumprir sua própria função de

acatar a legislação vigente, no que concerne à obrigação de fornecer ensino público aos

catarinenses em idade escolar.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao finalizar este trabalho, é possível – e necessário - acentuar o quanto nossa

educação é atravessada historicamente por um forte contexto de exclusão social, ao longo

do processo de construção do Estado Nacional. Ainda que, constantemente anunciada

como importante para responder às demandas do processo de modernização econômico-

social, a democratização do ensino se fez presente graças ao ingresso de muitos a escola,

fato que por si só já aponta na direção de um significativo avanço. No entanto, esta

ampliação da escolarização básica não se fez acompanhar de um efetivo investimento

governamental capaz de garantir a qualidade do ensino oferecido.

Na reestruturação da educação, nos anos em análise, percebe-se a ênfase sobre a

normatização das questões educacionais, no entendimento de que era necessário estabelecer

um conjunto maior de regulamentações para se poder alcançar um ensino mais direcionado

pela via das decisões tomadas a partir do governo federal. A importância dada às questões

educacionais no período varguista apontava na direção do quanto o Estado pretendia

definir, de cima para baixo, os caminhos a serem percorridos por esta área. Ao entender-

se que se fazia indispensável a presença de uma sociedade letrada para atender às

exigências da expansão do mercado, estabeleceu-se a realização de reformas educacionais

que, no afã de reestruturar o ensino, evidenciaram um acentuado exercício estatal de busca

de controle sobre a circulação do conhecimento.

A criação do Departamento de Educação do Estado de Santa Catarina integrava um

projeto de complexificação da estrutura administrativa governamental, que pretendia

expressar a concordância das ações políticas catarinenses com as diretrizes definidas pelo

poder central. Entretanto, constata-se que não ocorreram grandes mudanças em relação às

atribuições da antiga Diretoria de Instrução Pública, fundamentalmente vinculadas ao

trabalho de fiscalização e de regulamentação das questões relativas à educação escolar. A

criação do novo órgão administrativo constituiu-se mais em uma reestruturação de caráter

organizacional, burocrático.

A presente pesquisa possibilitou perceber o quanto a afirmação da escola pública

esteve vinculada ao discurso de modernização da sociedade, na perspectiva de se chegar ao

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pretendido engrandecimento da nação, mas sendo conduzida de maneira a conservar a

ordem vigente. O poder governamental anunciava a necessidade de mudanças e estabelecia

as regras para este fim, mas as medidas que se faziam imprescindíveis, tais como o

investimento na formação docente, na ampliação de escolas e em políticas sociais que

visassem a melhoria das condições de vida da população, praticamente permaneceram

apenas no nível do discurso. Ficava evidente, portanto, o quanto o Estado era o

responsável pela precariedade da educação escolar oferecida, na medida em que reconhecia

a necessidade dela, mas não resolvia, de forma decisiva, os problemas que surgiam.

A partir do discurso que anunciava a necessidade de uma ação constante sobre a

educação, o governo formulava reformas no âmbito escolar através de leis que pretendiam

reorganizar o processo de ensino e ampliar o acesso a escola. Mas tais medidas não se

fizeram acompanhar de uma prática decisiva, com mecanismos institucionais capazes de

viabilizar tais pretensões. Assim, a disseminação do ensino público se manifestava mais

fortemente nas falas oficiais do que na prática cotidiana do processo escolar Ao observar a

prerrogativa de matrícula, que passou a ser considerada obrigação, apontava-se a

necessidade de que era preciso um investimento governamental mais acentuado no

oferecimento da educação para atender as crianças em idade escolar. Isto indica alteração

na relação do Estado para com a educação, pois não se tratava apenas de cobrar dos pais e

de aplicar-lhes multas. Seria imprescindível criar mais escolas para atender às crianças em

idade escolar, como responsabilidade do Estado republicano.

Apesar do reconhecimento de que era preciso reformular o ensino, a educação

continuava sendo encaminhada por propósitos que visavam reproduzir interesses da elite,

na perspectiva da manutenção da ordem social estabelecida. Assim, o discurso, tão

anunciado pelo Estado de uma educação tida como necessária, evidenciava-se

contraditório, expressando-se numa prática ainda pouco inclusiva e transformadora.

Através do estabelecimento de uma legislação que visava interferir na ação

pedagógica (a reforma de ensino de 1935 pelo Decreto-lei nº 713, direcionado a formação

de professores, ou a regulamentação da obrigatoriedade de ensino, elaborada no Decreto-lei

nº 301 de 1939), o Estado procurava definir suas diretrizes para a escola pública, mas ao

mesmo tempo tentava eximir-se do compromisso de efetivar os propósitos declarados, na

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medida em que apontava na ação do professor ou na colaboração dos pais a

responsabilidade pela concretização dos intentos anunciados.

Ao ter como um dos principais focos a formação de professores, a reforma de 1935

demonstrava o quanto esta questão continuava se apresentando como problema, já que,

desde os tempos imperiais, anunciava-se a necessidade de maior investimento na

capacitação do professorado. Por meio de medidas que reestruturaram o currículo e o

tempo de escolarização para formação docente, a reforma pretendia fornecer melhores

instrumentos de capacitação profissional. Através das Escolas Normais e da criação dos

Institutos de Educação, apontava-se no sentido de uma maior profissionalização do corpo

docente, na medida em que expressava a necessidade de munir os mestres com uma

formação mais específica para sua profissão. Percebe-se, portanto, que através da

reformulação dos currículos dos cursos destinados a formar professores, havia uma

preocupação em fornecer maior capacitação aos docentes catarinenses. Entretanto, apesar

de serem definidas mudanças na legislação, o processo de formação dos professores ainda

permaneceu mais fortemente estruturado pelo informalismo, graças a um conjunto de

atividades então realizadas para a divulgação dos novos métodos de ensino.

Outro alvo das políticas voltadas para a questão educacional era o interesse do

Estado em persuadir os pais a encaminharem seus filhos para as escolas, relacionado ao

entendimento de que a instrução básica era fundamental para o processo de modernização

do país através do modelamento das condutas individuais. Pretendia-se, pela educação,

fornecer substratos elementares de conhecimento para formar o indivíduo virtuoso e

cumpridor de seus deveres para com a Pátria. Buscava-se, através do discurso

nacionalista de unificar o povo em torno da escola, amalgamar a população através do ideal

de pertencimento à Nação, na pretensão de formar um indivíduo imbuído do sentimento de

coletividade, levando-o a abrir mão de interesses próprios em nome de um ideal maior, da

necessidade de consolidação do Estado nacional.

A idéia de se propagar a educação, formalizada na Constituição Federal através de

dispositivos legais de obrigatoriedade, trazia em seu contexto entraves a este fim, na

medida em que colocava limites tanto no dever do Estado de fornecer uma educação básica

quanto no dever dos pais de matricularem seus filhos, já que se definia a frequência como

obrigatória e não a ampliação de matrícula de todas as crianças em idade escolar. Apesar

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disto, pode-se apontar no período aqui trabalhado avanços significativos no processo de

escolarização. Observa-se aumento no número de escolas, no número de matriculados e

até mesmo um maior percentual de verbas para a educação. Ainda que de modo

fragmentado, o investimento na área educacional se fazia sentir de maneira mais constante

pela complexificação do sistema, pelas reformas que se proclamavam melhorar a educação.

Diante desses discursos, é possível observar o quanto o Estado se preocupava em

legislar satisfatoriamente sobre as questões educacionais, de acordo com as diretrizes

nacionais definidas pelo governo central. Ao estabelecer regras, o governo estadual

apresentava a lei como uma indicação de que as normas determinadas seriam o suficiente

para que se os projetos educacionais do período se efetivassem. Através de mecanismos

legais, instituídos por canais burocráticos, o governo buscava atender os propósitos

difundidos de renovação educacional, que então qualificavam importantes discussões sobre

a educação. As falas oficiais propalando as vantagens dos novos métodos de ensino,

expressos pela Escola Nova, legitimaram a promoção de reformas. A reestruturação da

educação configurava-se, no entanto, em um conjunto de mudanças mais amplo, que

passava pelos ideais de promoção da modernização, numa sociedade que se encaminhava

para a industrialização e para a urbanização. A criação de órgãos administrativos e de

circunscrições se inscrevia no processo de complexificação, delineado no projeto político

centralizador do governo Vargas. Percebe-se o quanto a preocupação em organizar a

educação esteve atravessada por um formalismo burocrático, com vistas a demonstração de

conformidade das autoridades políticas estaduais às determinações nacionais. Em muitos

momentos, este aspecto se sobrepôs ao ideal de uma efetiva reestruturação do ensino

público.

No entanto, ao se observar o conteúdo das reformas que foram implantadas no

Estado, pode-se constatar que houve alguns avanços. Um dos aspectos significativos foi o

aumento do número de escolas primárias, representando um substancial acréscimo da rede

escolar catarinense, o que demonstra que o governo parecia contemplar, as propostas dos

ideais reformadores do ensino concernentes ao aspecto quantitativo, mas “a qualidade da

educação primária ministrada pelo Estado, em harmonia com o contexto da época e com a

herança das concepções educacionais da reforma de Orestes Guimarães, era ainda

acentuadamente intelectualista” (FIORI, p.143).

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Outro aspecto fundamental foi a ampliação do acesso à escola, definido

juridicamente pela obrigatoriedade de matrícula e freqüência. Através deste dispositivo, as

crianças em idade escolar deveriam estar a partir de então incluídas no processo educativo.

Ainda que efetivamente isto não tenha ocorrido, pois o número de crianças fora da escola

era alto, percebe-se na regulamentação da norma um avanço em relação às normatizações

anteriores. Além da obrigação dos pais de matricularem seus filhos, o Estado também teria

que assumir maior compromisso para com a educação, pois, ao anunciar que todas as

crianças deveriam ir para a escola, precisaria oferecer escolas a todos.

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ANEXOS

1. A escolha da presente temática encontra-se, portanto, fundamentada na perspectiva de

estudos que já foram desenvolvidos no intuito de fazer avançar o campo da investigação

histórica da educação catarinense. Várias pesquisas anteriores conseguiram aprofundar o

conhecimento histórico sobre a trajetória da educação no Estado durante o século XIX e

início do XX, com trabalhos realizados por pesquisadoras ligadas ao PPGE da UFSC.

Estes trabalhos são necessariamente o ponto de partida para o intento desta pesquisa.

È o caso da dissertação de Leonete Luzia SCHMIDT(1996), com o título A

constituição da rede pública de ensino elementar em Santa Catarina: 1830 – 1858, que

investigou a criação oficial da rede pública de instrução primária em Santa Catarina, a

partir das primeiras cinco escolas instituídas pelo Imperador D. Pedro I em 1830,

concluindo seu espaço temporal de análise em 1859, quando ocorre a definição do

Regulamento da Instrução Elementar. Com este estudo é possível acompanhar o início do

processo de estabelecimento da rede de ensino elementar no território catarinense,

destacando-se que a criação desta rede, encontrava justificativa na necessidade de

promover a civilidade e o progresso, tão pretendidos pela Estado Nacional em formação.

A autora evidencia os elementos básicos constituidores do processo de institucionalização

da escola, quando ocorre em Santa Catarina a intensificação da urbanização, o incremento

da economia e a emergência de um aparato cultural condizente com os ideais do afã de

‘ilustrar o povo’, compreendendo, desta forma, a relação entre o crescimento da população

e a expansão da rede escolar.

O trabalho de Rosmeri SCHARDONG (1997), intitulado A instrução pública

secundária em Desterro – o Atheneu Provincial (1874 – 1883) , aborda o processo

inicial de formação da instrução pública secundária na cidade de Desterro, antiga

designação de Florianópolis, através da formulação de uma legislação específica, além da

criação de escolas e aulas1 para este nível de ensino. A pesquisa demonstra como o Estado

______________________________

1 – Quando houve a expulsão dos jesuítas em 1759, a reforma do Marquês de Pombal criou as ‘aulas régias’, na tentativa de substituir as lacunas decorrentes da extinção das escolas organizadas pelos padres da Companhia de Jesus. Segundo Schardong, no século XIX, “o sistema de aulas ou cadeiras avulsas era uma realidade nacional”(p. 17).

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constituiu o ensino secundário visando formar jovens, geralmente ligados à elite, para

ocuparem cargos relacionados ao governo da Província, além de buscar encaminhá-los para

escolas superiores que existiam em determinadas capitais do Império. Portanto, o interesse

maior era educar jovens da elite que, ao integrarem os quadros do governo catarinense

reproduziriam os interesses dela. Coube então, ao Atheneu Provincial o papel de formar e

atender a elite dirigente catarinense, a partir dos considerados valores nacionais de

civilidade e progresso, que identificavam na instrução pública a função de constituir uma

juventude embasada nos ideais de moralidade e do respeito às leis.

Rosicler SCHAFASCHEK(1997), por sua vez desenvolveu um estudo a partir de

artigos de jornais, tendo como título Educar para civilizar e instruir para progredir:

análise de artigos divulgados pelos jornais do Desterro na década de 1850.

Neste trabalho, evidencia-se o quanto a educação era tida como um importante instrumento

de luta nas relações de poder, voltada sobretudo para a manutenção da ordem social

estabelecida. A necessidade de se propagar a instrução escolar era norteada pela idéia de

civilidade que se propagava nos países europeus e que se constituía como condição

imprescindível para que a nação fosse formada e alcançasse o progresso esperado pela elite

política dirigente. Entendia-se que, através da educação, a ordem seria mantida, os

segmentos sociais subordinados, seriam pacificados e docilizados. O que se pretendia era

propagar um padrão comportamental embasado na moderação dos hábitos e na expressão

de civilidade e decência dos indivíduos.

O trabalho de Rosemeri Conti GONÇALVES (2000), sob o título Gênese da

Diretoria da Instrução Pública na Província de Santa Catarina: 1830-1858, analisou a

inspeção escolar na província catarinense, no período referido, no processo de criação da

rede pública de ensino. Evidencia-se o reconhecimento da necessidade de que o governo

inspecionasse a escola, com vistas a tentar firmar o controle e norteamento do trabalho do

professor, através de posições policialescas e disciplinadoras, baseadas em atos de correção

e punição aos docentes que não estivessem atuando de modo condizente com as diretrizes

governamentais determinadas para o processo educativo. Não havia o interesse em investir

na formação dos professores, mas em inspecionar seu comportamento, dirigir sua prática

educativa e punir suas faltas, o que não deixa de ser expressão de uma certa pedagogia,

formadora de mestres.

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105

Outro estudo que segue a linha de investigação da história da educação em Santa

Catarina ainda relativo ao século XIX, é o de Aline Ayres MENDES (2001), sob o título

Formação da Província de Santa Catarina: o papel moralizador da Igreja Católica

(1830 – 1881). A pesquisadora discute como se desenvolveu a relação da Igreja Católica

para com a sociedade catarinense, num momento em que o Estado era oficialmente ligado a

esta instituição religiosa pelo estabelecimento do regime de padroado2 , mas que

encontrava na imigração estrangeira a influência crescente de outras religiões, inclusive no

âmbito da educação.

Outra pesquisa que aponta elementos para história da educação catarinense é a de

Glória Maria TEIXEIRA (2005), intitulada Ação da Diretoria da Instrução Pública na

Província de Santa Catarina no período de 1858 a 1874: Inspeção Escolar na

afirmação da educação como força civilizatória. Expressa a complexificação do aparato

governamental na condução da instrução pública catarinense. Indica o interesse em

direcionar e controlar o ensino através da inspeção, agora em caráter oficial, uma vez que a

Diretoria de Instrução Pública foi efetivamente criada como um braço administrativo do

Estado, estava diretamente relacionado ao projeto civilizatório, hegemônico no Estado, que

visava a constituição de uma sociedade moralizada e sobretudo disciplinada, com vistas a

manutenção da ordem social vigente.

Por fim, o trabalho de Elaine Cristina MARCÍLIO, intitulado Ação da Inspetoria

Geral da Instrução Pública na Província de Santa Catarina no período de 1874 a

1888: a precariedade da inspeção escolar como instrumento para a uniformização do

ensino, apresenta a continuação cronológica das pesquisas anteriores, sobretudo a de

Gonçalves e a de Teixeira e expressa como a ação da Inspetoria Geral constituía-se como

efetiva administradora da rede de ensino em Santa Catarina. Ao trabalhar com as

primeiras indicações relativas a obrigatoriedade do ensino, bem como com os momentos

iniciais de uma escola para a formação de professores, identifica como a Inspetoria

conduzia o ensino catarinense, basicamente a partir do controle e da fiscalização que

deveriam nortear as práticas escolares, pautadas em aspectos de civilidade dos indivíduos.

________________________ 2 - O padroado tem a ver com a relação de dependência entre a Igreja Católica e o Estado, quando este a financiava, impondo-a como oficial para a população em geral.

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106

A obrigatoriedade do ensino é um marco para se compreender, no projeto republicano, a

percepção de que o Estado teria que assumir a necessidade de oferecer escolas, como

espaço propagador dos ideais liberais de civilidade.

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107

GLOSSÁRIO DAS FONTES

LEIS E DECRETOS

DECRETO nº 713 de 05 de janeiro de 1935 – Coleção de Leis e Decretos do Estado de

Santa Catarina - Arquivo Público do Estado de Santa Catarina

DECRETO-LEI nº 301 de 24 de fevereiro de 1939 – Coleção de Leis e Decretos do Estado

de Santa Catarina - Arquivo Público do Estado de Santa Catarina

MENSAGENS E RELATÓRIOS DO GOVERNO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

Mensagem apresentada à Assembléia Legislativa de Santa Catarina, em 16 de julho de

1936 pelo Governador Nereu de Oliveira Ramos – Arquivo Público do Estado de Santa

Catarina

Mensagem apresentada à Assembléia Legislativa de Santa Catarina, em 16 de julho de

1937 pelo Governador Nereu Ramos - Arquivo Público do Estado de Santa Catarina

Relatório apresentado em outubro de 1939 ao exmo. Sr. Presidente da República, pelo Dr.

Nereu Ramos, Interventor Federal no Estado de Santa Catarina - Arquivo Público do

Estado de Santa Catarina

Relatório apresentado ao exmo. Sr. Presidente da República, pelo Dr. Nereu Ramos,

Interventor Federal no Estado de Santa Catarina. Setembro de 1940 - Arquivo Público do

Estado de Santa Catarina

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Relatório apresentado ao exmo. Sr. Presidente da República, pelo Dr. Nereu Ramos,

Interventor Federal no Estado de Santa Catarina. Outubro de 1941 - Arquivo Público do

Estado de Santa Catarina

Relatório apresentado ao exmo. Sr. Presidente da República, pelo Dr. Nereu Ramos,

Interventor Federal no Estado de Santa Catarina. Outubro de 1942 - Arquivo Público do

Estado de Santa Catarina

Relatório apresentado ao exmo. Sr. Presidente da República, pelo Dr. Nereu Ramos,

Interventor Federal no Estado de Santa Catarina. Outubro de 1943 - Arquivo Público do

Estado de Santa Catarina

RELATÓRIOS DO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO

Relatório do Departamento de Educação para a Secretaria dos Negócios do Interior e

Justiça – Ano Letivo 1935 ( apresentado em 10 de junho de 1936) - Arquivo Público do

Estado de Santa Catarina

Relatório do Departamento de Educação para a Secretaria dos Negócios do Interior e

Justiça – Ano Letivo 1936 ( apresentado em 10 de junho de 1937) - Arquivo Público do

Estado de Santa Catarina

Relatório do Departamento Estadual de Estatística – Estado de Santa Catarina - Ano de

1940 - Arquivo Público do Estado de Santa Catarina

Relatório do Superintendente Geral de Ensino, Sebastião de Oliveira Rocha ao Secretário

dos Negócios do Interior e Justiça – Ano Letivo de 1937 ( apresentado em outubro de

1938) - Arquivo Público do Estado de Santa Catarina

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Relatório do Superintendente Geral de Ensino, Sebastião de Oliveira Rocha ao Secretário

dos Negócios do Interior e Justiça – Ano Letivo de 1938 ( apresentado em outubro de

1939) - Arquivo Público do Estado de Santa Catarina

Relatório do Diretor Interino do Departamento de Educação, Profº Elpídio Barbosa ao

Secretário dos Negócios do Interior e Justiça – Ano Letivo de 1939 ( apresentado em

outubro de 1940) - Arquivo Público do Estado de Santa Catarina

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