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Humberto Villalba Carrapateira
Julio Villa
2011
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Capítulo 1
Capital de Mato Grosso do Sul no Brasil, Campo Grande é uma linda cidade com suas ruas largas e avenidas espaçosas bem arborizadas, ela tem duas avenidas principais, a Mato Grosso e a Afonso Pena onde o canteiro central delas tem muita sombra, com ingazeiros e seringueiras; hoje quase centenárias, que foram plantadas pelo exército em parceria com a prefeitura daquela época. Tudo para fazer uma boa sombra no sol quente da região centro-oeste.
A maioria dos turistas que passam pela cidade diz que ali o entardecer é um dos mais bonitos que já se viu, onde o céu fica com uma coloração sem igual, as matizes das cores vermelho alaranjado, azul e cinza se juntam num que, que extasia a vista de quem observa.
Essa cidade tem também como um de seus pontos turísticos a estação ferroviária, e algumas das ruas que servem ao complexo da estação, ainda mantém a pavimentação com calçamento de pedra e a arquitetura dos prédios no modelo inglês da época de 1922.
Imagina-se que todos que passem por ali tenham um momento de nostalgia ou a impressão de estar em outro país, e é nessas imediações que começa o desenrolar da história que vou lhes contar e
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que tive a oportunidade de viver uns pedaços, outros que me contaram e muitos que dizem que inventei, mas isso é intriga de quem não conta história.
Rua Calógeras esquina com a Avenida Mato
Grosso, feriado católico de Corpus Christi, as ruas sem movimento tudo calmo e silencioso, prestando bem atenção, pode-se ouvir ao longe o som do sino do relógio na torre da Igreja São Francisco tocar pontualmente meio dia, começo do mês de junho, época de frio ainda; e a fina cerração toma conta de parte da cidade, nesse instante aparece, um garoto bem desenvolvido, boné azul marinho surrado, calça jeans, no pé tênis chinezinho comprado no Paraguai, camiseta branca, no pulso uma pulseira larga feita de palha de milho trançada, escrito “Villa” com uma pedra verde incrustada em sua trama, jaqueta grossa de camurça e na mochila cinza azulada algumas mudas de roupa, o Notebook dentro, presente de seu tio e padrinho, analista de sistemas Zé Maria que mora em São Paulo, nele estão todos os seus trabalhos e pesquisas, para pronto acesso, mas precavido tem "backup nas nuvens".
História e Biologia são as áreas que Julio gosta, seu avô paterno aposentado é seu exemplo de vida, seu herói, Moreno pai de Vânia sua mãe. O avô é a pessoa que mais acredita e incentiva em seus projetos e sabe de seu dom.
Moreno era respeitado cidadão de Campo Grande, não tinha muitas posses mas foi convidado a
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fazer parte da equipe de pesquisadores da EMBRAPA, autodidata na área biológica, foi um dos desenvolvedores do projeto genoma do milho no brasil colocou boa parte de suas posses nesse projeto e reconhecido internacionalmente, mora hoje no Asilo São João Bosco onde sempre Julio ia visitar em sua bike e passar as tarde de sábado com ele, hoje sua maior posse é um notebook igual ao de Julio, onde escreve suas poesias, artigos e crônicas para alguns jornais locais e internacionais, sempre quando se conecta à Internet, fala com seu segundo filho Zé Maria e com Julio, o computador tem um dispositivo de segurança que assim que é aberto a sua câmara capta e grava quem está em frente ao monitor e envia uma cópia para a “nuvem” e os dos dois computadores a imagem de vídeo.
Em suas pesquisas Julio sempre se interessou pelos remédios de ervas que sua mãe fazia, mas aprendeu a preparar mesmo foi com Maria a maioria, para cada problema tem um jujo (planta) que te ajuda a curar; ele tem em seus arquivos mais de três centenas de remédios preparados de plantas. Tem também mais outras centenas de frutas e suas ações medicinais. O mais gostoso é o que sua mãe preparava pra ele quando criança, o chazinho de Erva Cidreira com Stevia.
Quando começou as suas pesquisas essa planta foi seu primeiro produto de estudo:
Erva Cidreira - Melissa officinalis é o nome clássico que vem do fato de ter flores amarelas em sua
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floração que atraem abelhas por isso melissa, que em grego: abelhas de mel.
Macerando suas folhas elas exalam um odor agradável, parecido ao do limão, contém óleo volátil de média evaporação, formado por citronelol, geraniol, linalol (são álcoois), citral, neral; e ainda ácido fenol carboxílico, ácido citronélico, acetato geranílico cariofileno e taninos.
E o conhecido óleo de melissa se consegue por destilação e por vaporização dessa erva colhida no início de sua floração.
O citral é empregado em perfumaria, indústria de alimentos, e como matéria-prima para síntese de iononas. A beta-ionona é a partida para a síntese da vitamina A sintética, uma das mais importantes vitaminas para nosso organismo, boa pra vista... O seu estudo da Erva Cidreira é bem extenso, vamos deixar essa parte pra depois.
Bem, Julio está decidido a ir para Ponta Porã a procura de Maria, seu amigo Aparecido, 17 anos, fazendo o Terceirão com o Julio, comprou sua passagem no dia anterior e o encontro para a entrega era ali em frente ao Hotel Gaspar, ao lado do orelhão (telefone público), naquela hora e onde tinha acabado de chegar.
Na escola ele tinha o amigo Cido, amigo mais velho e isso não atrapalhava a amizade, Julio desenvolvia sites para Internet o que lhe dava um rendimento financeiro razoável, Cido sempre dava uma
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mãozinha e recebia uma percentagem quando arranjava clientes para Julio.
Passou a gostar ainda mais do amigo, pois ele lhe propôs no dia anterior a sociedade em 50% do valor das manutenções dos sites de seus clientes; isso daria uma boa grana, sempre torrava toda sua mesada no Shopping, isso seria uma ajuda de custos muito boa, ele era um dos melhores da cidade no Guitar Hero; comprar a passagem para o sócio seria um prazer, ele só não entendia uma coisa, como é que um garoto de 13 anos pode ser tão inteligente assim e fazer aqueles sites irados, coisa de programador mesmo, tão profissionais e além do mais, estar no ensino médio se preparando pro vestibular? E tinham dito que fez treinê no ITA e passou, e estava no Tercerão com ele, sentia até um pouco de inveja do garoto mas parecia mesmo, era admiração.
Nos sites que ele criava, Cido podia fazer as mudanças e atualizações com muita facilidade e dar continuidade no trabalho com as páginas.
Julio pegou o celular ia ligar para o Cido, pra saber se já estava vindo...
Na hora e local marcado estava lá, avistou Julio atravessou a avenida e foi ao seu encontro.
- E ai Julio, obrigado pela confiança, aqui está sua passagem marcada para daqui a pouco as 14 horas, não consegui no ônibus direto porque é feriadão, teve que ser no pinga-pinga que chega só de noite em Ponta.
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- Puxa vida cara, essa eu não esperava. - Julio meio chateado.
- Olha! Eu fui cedo e mesmo assim quase não tinha mais passagem, enfrentei o maior filão.
- E com relação ao nosso trato, pode deixar que faço os depósitos na sua conta, os clientes aqui de Campo Grande já me disseram que foram avisados por você, de que eu estaria fazendo as manutenção e recebendo dos que faziam pagamento em dinheiro, valeu mesmo pela confiança cara.
- Cido, você é meu mano cara, agradeço pelo seu esforço em ajudar, com minha idade nem sempre me dou bem em fazer amizade com gente mais velhas, você sabe né?!
E como o combinado, ninguém sabe nada dessa minha viagem, é segredo mesmo cara.
Despediu-se do amigo, viu ele se afastar e antes de ir para a rodoviária não muito longe dali, resolve dar uma ultima olhada na fachada da entrada do prédio da rede ferroviária. Lembrou que daquela estação o trem não saia mais, o apito parecia estar tocando, pegou uma foto de seu avô sua mãe e tio Zé ao lado das charretes que serviam de táxi em épocas passadas estavam ali prontas com seus cavalos para transportar as pessoas e bagagens que chegavam na cidade pela ferrovia, esse detalhe das charretes e dessa nostalgia, foi o seu avô quem contou tantas vezes e com tantos detalhes que parecia até que ele mesmo tinha vivido aqueles momentos daquela época a foto feita por um
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“lambe-lambe” e sua máquina-caixote, que ganhava a vida por ali.
Hoje os trilhos foram tirados do centro da cidade, lembrou que “viajar de trem era muito legal”, as recordações das viagens com seu avô, tinham sido muito divertidas, lembrou-se do estalar das rodas de ferro nas emendas dos trilhos, davam um ritmo inesquecível em sua mente, tec-telec-tec, trec-telec-tlec, esse som que todos que andam de trem guardam na lembrança.
Na rodoviária ninguém percebeu que Julio embarcara sozinho. Apesar de não estar feliz por ter deixado sua casa, depois de ouvir uma das muitas brigas dos pais, seu pai dizendo sempre que ainda não estava convencido de que Julio era filho dele e que ele era muito diferente, Julio sempre tirou notas excelentes na escola e os professores o admiravam muito, mas pelo fato dos pais não terem tempo de convívio, ele tinha algumas atitudes de rebeldia dentro da escola, mas suas notas eram invejadas pelos outro alunos.
Ele, desde pequeno demonstrava uma inteligência acima do comum que ninguém compreendia. Seu pai Jorge acreditava que ele tinha os sintomas da síndrome de Down porque ficava muito tempo parado e calado e balançando quando criancinha, e culpava a esposa Vânia pelo filho ser assim, não sabia ele que esse rítmo era a lembrança das músicas que ouvia com sua mãe ainda quando estava na barriga dela.
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Tinha uma babá de origem indígena que veio do Paraguai e que cuidava dele quando bebê. Vânia incentivava Maria a falar em espanhol com Julio, ela também falava com ele as duas línguas, o português e o espanhol, Maria dizia que o menino era abençoado e uma das razões de acreditar nisso é que ela viu o menino cuidar de um passarinho doente de uma menininha que estava na gaiola e com muito cuidado cura-lo, Maria contou para Julio que seu avô, um grande pajé de sua tribo dizia que pessoas com esses dons tinham uma missão muito importante na passagem pela vida, tinham uma tarefa de ajudar o mundo.
Depois que Julio nasceu Vânia teve uma reviravolta em sua vida, pois era apaixonada e obcecada pelo marido, uma única coisa importante mesmo que ela fez, foi ter dado todo o carinho e dedicação à sua gravidez e muito cuidado até os três anos de idade de Julio, depois disso, passou a ficar muito vaidosa, adotando Maria que tinha mais ou menos 9 anos. Antes, Maria vivia com seus parentes na Praça dos Índios em frente ao Mercadão Municipal, na 26 de agosto, ali eles faziam troca e venda de artesanato indígenas, frutas, mandioca e milho verde. Vânia há muito observava Maria, uma garota que cuidava de seus primos pequeninos com muito afeto, uma menina tão dedicada e cuidadosa poderia lhe servir. Ofereceu à tutora de Maria um salário e dar escola para a menina, depois do estudo cuidaria do seu
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filho Julio, tendo assim mais tempo para dedicar-se ao marido.
Todas essas recordações passaram como um relâmpago na cabeça de Julio; tentou esquecer a discussão dos pais e recordar só das coisas boas.
Abriu seu notebook começou a digitar e compor suas mensagens e passado uma hora já havia terminado seus afazeres, em uma parada com acesso wireless faria o upload para o seu servidor as mensagens de e-mail e atualizações dos seus sites.
Agora estava com seu pensamento fixo em encontrar Maria, ele sentia e tinha uma forte ligação com ela.
Pensou que se estivesse viajando de trem o mais gostoso seria ficar no último vagão observando a imensidão do cerrado.
Lembrou-se de uma das últimas viagens que fizera para Ponta Porã. Diferente deste dia, o céu estava com um lindo sol e nuvens brancas feito algodão, o cobrador de passagens que picota os tickts observou o garoto esticado para alcançar a janela de vidro da porta para ver os trilhos no último vagão, lhe dizia:
- Sua passagem garoto, cuidado ai hein? Acho bom você voltar para perto de seus pais, estamos perto de Maracaju. Seu bilhete diz que vai para Ponta Porá e é a última parada da linha, não pode se perder viu.
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- Eu estou com meu avô, logo ali. Obrigado seu moço, pode deixar que já volto tá? É que aqui no último vagão é legal de ver os trilhos sumirem.
O trocador deu um sorriso admirou o garotinho esforçado e sabia que era mesmo verdade, quando era mais novo fazia o mesmo. Deu meia volta e continuou a picotar os bilhetes dos outros passageiros.
Ficou grato à paisagem por mostrar floridas árvores de Ipês Amarelos e roxos que ficam sempre em destaque. Garças voando nos alagados dos campos, as Emas e seus filhotes nas plantações de soja, de vez em quando dois ou três casais de araras e algumas revoadas de Garças Brancas e Periquitos.
Um solavanco brusco do ônibus interrompe seus pensamentos e ele volta aos seus tempo e problemas. Como vai ser sua nova vida daqui para frente, na busca por Maria que estava doente?
O ônibus faz uma frenagem e vai para o acostamento para desviar de outro veículo todo amassado que estava fazendo uma ultrapassarem perigosa, a neblina era muito densa, quase batem de frente.
Esse era só o começo do que viria pela frente. Aquele carro estava fugindo do local de acidente ao qual tinha se envolvido, deixando para trás um outro capotado na estrada, sem prestar socorro, o acidente fez com que o motorista parasse o ônibus e verificasse a gravidade, ligando para a polícia rodoviária e dando as descrições do veículo fugitivo, havia um médico no ônibus que facilitou o atendimento aos acidentados do
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outro carro, todos recuperados do susto e ninguém com perigo de morte, o motorista dá continuidade à viagem.
Preocupado Julio sabia que poderia contar com Pedro, seu amigo em Pedro Juan Caballero, não queria dar pistas de seu paradeiro para parentes de Ponta Porá e assim ser obrigado a ter que voltar para Campo Grande, seria difícil um garoto de doze anos, convencer as pessoas de que ela tinha que encontrar a sua ex-babá doente e que isso era tudo que importava para ele no momento.
Ponta Porã, cidade oeste do estado de Matogrosso do Sul, com fronteira seca, onde é só atravessar a linha internacional e já se está no outro país, Paraguai.
Uma pena saber, mas por ser assim ela é uma das rotas mais conhecidas para o trafico de drogas.
Cidade conhecida na história como a Princesinha dos Ervais, ali era industrializada a erva mate e parte dela consumida no Brasil e outra exportada para a Argentina. Hoje existe na cidade um museu que conta um pouco dessa história.
Já noite na rodoviária de Ponta Porã Julio desembarca preocupado com a hora que estava chegando, e o frio que estava começando a sentir que era típico de Ponta Porã, de trincar os dentes, a cerração muito fechada deixa a visibilidade na estrada muito baixa fazendo com que a imprudência de alguns motoristas, ocasionasse acidentes na rodovia como
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àquelas horas atrás, fato que fez atrasar ainda mais sua chegada ao destino.
Julio percebe que uma pessoa parecia segui-lo com o olhar constantemente desde seu desembarque, mas não deu importância.
No orelhão liga para o amigo Pedro, ninguém atende. Sua estada àquela noite com baixa temperatura era na casa do amigo era estranho ir dormir na casa de uma pessoa que não se conhecia a não ser pela internet. No trabalho de Pedro em Pedro Juan, Paraguai, as normas de atender telefone eram rígidas, quando Julio ligou para dizer de seu novo horário de chegada não conseguiu contata-lo, deixou recado. Tentou contar com a sorte, mas não deu certo, pegou o endereço do amigo que previamente havia copiado e foi para o ponto de táxi, mas o último tinha acabado de sair com outros passageiros e ele não queria aguardar a vinda do próximo. Pegou seu notebook e começou a escrever um e-mail, encontrou uma conexão wi-fi, conecção sem fio em uma loja da rodoviária e fez os envio, Pedro não estava online nem no MSN, Orkut, Facebook, Google+, em nada, deixou um sckrap para Pedro em cada um contando do ocorrido. De acordo com o endereço e mapa do Google, a casa do amigo ficava logo a umas seis quadras de distância da rodoviária, era só atravessar a fronteira seca e...
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Na volta de sua visita a uma doente que precisava da extrema unção, o padre, andando apresado e se enrolando ao máximo no seu sobre tudo por culpa do frio e neblina, logo a sua frente em uma rua com pouca iluminação nas imediações da Igreja, passado das nove horas da noite, deu de cara com duas pessoas atacando outra, tentou gritar mas desistiu porque um deles estava com um taco de baseball e o outro com uma faca, mas sua presença afugentou os agressores e quase tropeçou na pessoa caída no chão, estava escuro, mas deu pra perceber que era um garoto desacordado. Carlos tentou ajudar, ele estava muito gelado possivelmente com hipotermia, o menino estava muito mal, tinha um ferimento na cabeça, perdera muito sangue, resolveu leva-lo para a igreja para tratar.
Levaram de Julio todos os seus pertences e deixaram uma pancada na cabeça.
Assim o tempo parou para Julio. Mas isso não tinha importância agora, pois ele
estava sem memória, sendo medicado e cuidado pelos padres do mosteiro, o padre Carlos acreditava que ele fosse um garoto paraguaio porque respondia meio desacordado os questionamentos básicos em espanhol, por ser fronteira com o Brasil poderia ser uma criança brasileira, mas sendo assim ficou menos preocupado, anunciando às autoridades locais que um garoto (mitaí) paraguaio tinha sido encontrado e que estava sendo medicado e mantido por ele na igreja,
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mas ninguém tinha reclamado de nenhuma pessoa desaparecida ou fugida.
O médico deu o diagnóstico de que esse tipo de trauma pode fazer com que a memória da pessoa demore a voltar ao normal, depende de como as conexões de lembranças se misturem e o ajudem a fazer uma ligação com o seu passado.
Na cabeça de Julio lapsos de memória apareciam como relâmpago...
- ...corre, corre ele ainda deve estar vivo, será que o Julio consegue ajudar ele? - diz Luci.
- Só vendo, ele já sarou o meu gatinho uma vez. Mas ele disse pra não contar pra ninguém, posso ficar encrencado com ele, mas como é por uma boa causa e seu passarinho pode ficar bom também. - Fala Deco.
- Julio, Julio cê tá em casa? - Batem na porta da casa de Julio os dois desesperados com um passarinho na gaiola.
Maria atende a porta e vê as duas crianças que desesperadas entram sem deixa-la dizer nada, foram direto pro quarto de Julio que estava no computador.
- Julio você vai ter que ajudar o passarinho da Luci, ele amanheceu...
- Me deixa falar Deco, ele estava deitado na gaiola dele hoje de manhã, ele tá vivo mas tá sem levantar e não faz nada, parece que de vez em quando dá uma mexida e volta a ficar parado, será que você pode ajudar ele, em Julio, ajuda vai, o Deco falou que você ajudou ele com o felpudo que estava doente... -
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quase chorando -... Ajuda ele vai!?!? Ele é tudo que eu tenho...
- Espera ai, fecha a porta, vou ver se posso ajudar, às vezes dá certo e às vezes não, depende do bichinho e vocês tem que prometer que não contam pra ninguém viu, se perguntarem pra mim sobre isso, vou dizer que é mentira hein.
- Tá bom, tá bom, eu prometo, mas ajuda ele, por favor?!
Julio pegou o passarinho da gaiola colocou na mão da menina e depois com uma das mãos passou sobre a cabeça do passarinho e pegando a outra mão da menina colocou sobre o passarinho que passado uns minutos começou a ficar bom.
- Você conseguiu, ele está ficando bom... muito obrigado.
Julio diz: - Olha, você é quem ajudou ele a ficar bom viu?
Tenha mais cuidado com ele, ele é um passarinho silvestre, você devia soltar o pobrezinho, ele ficaria bem mais feliz se você o soltasse. É capaz de ele ficar doente de novo se você não soltar...
... - Puxa vida passei... Fala em pensamento o
garoto depois de passar o dedo pela lista de aprovados no vestibular de engenharia do ITA e dar um soco no ar. O local estava abarrotado de gente querendo conferir o resultado do Vestibular. E foi saindo dali com um sorriso de orelha a orelha, ...mais uma vitória pensou consigo.
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Outro candidato acompanhado de outros amigos faz o mesmo. Tinha observado o Julio desde que chegou e estava logo atrás na espera para ver se seu nome estava na lista também e depois olhou com desdém a comemoração do garoto que deu um soco no ar.
- Deve ter alguma coisa errada aqui, meu nome saiu em terceiro lugar na lista.
- Hei, garoto fala ai seu nome. - Fala o rapaz. - Julio, por quê? - Julio. - Seu irmão chama Julio também? - Rapaz. - Não, não tenho irmão. - Julio
- Seu Nome é Julio Villa? – Rapaz adimirado. - Sim, por quê? - Julio
- Sê tá de brincadeira, como é que um bebezinho como você está em primeiro nesta lista? quantos anos você tem? Volta aqui garoto...
Julio dá as costas para o rapaz e sai correndo, deixando falando sozinho...
... - Essa menina não pode ficar mais aqui, ela só
dá despesa, além do dinheiro que você tem que pagar praquela índia tia dela todo mês, ela tá com a gente faz cinco anos e nossa situação financeira não dá pra pagar mais ela não, já faz mais de dois meses que falo isso pra você. Diz Jorge para Vania.
- Tudo bem meu amor, amanhã mesmo vou levar ela de volta pra tia dela, e o Julio já tá grande, não precisa mais de babá.
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Julio que observava pela fresta da porta, olha pra Maria sabendo que ela teria que ir.
- Eu queria que não fosse. Você é minha melhor amiga.... Ele sabe que a situação era inevitável, sua mãe vai obedecer ao seu pai e devolve-la para a tia de Maria.
- Maria eu vou te procurar onde você estiver e vou ficar com você, é uma promessa! ...
... - Olha menino, faz tempo que mandei ela de
volta, ela já estava mesmo meio doente e eu não poderia cuidar dela aqui mesmo, assim, eu mandei ela pro avô dela, João, aquele curandeiro lá no Paraguai em Pedro Juan, aqui ela não podia mais ficar, mesmo se tivesse bem de saúde, menina bonita onde tem muito homem é perigoso, não é? - Diz a tia de Maria.
...
“Oi Aparecido. Este e-mail é automático para você, pelo fato de
eu não estar podendo me comunicar pessoalmente a mais de 2 dias através de nenhum meio telefônico ou eletrônico. Tenho tempo especificado em contrato com os meus outros clientes para fazer a manutenção em seus sites, caso você não queira, passarei estes clientes para a Amarilis Websites, pois é uma empresa a altura para não prejudicar esses clientes tão especiais.
Caso queira administrar toda minha carteira de clientes é só enviar o arquivo em anexo por e-mail para
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a lista de descarregar e com senhas deles, para o retorno de suas possíveis mudanças de conteúdo dos clientes em seus sites.
Acredito que 50% de sociedade por mais estes novos clientes pode te interessar.
A maneira de administrar estes outros sites, a senha para liberar os arquivos, será habilitada com os mesmos comandos que você já administra os outros.
A resposta de que você aceitou ser meu sócio será quando você clicar em Responder em seu brouser de e-mail com somente a palavra “sim”. Meu servidor vai responder automaticamente te enviando as senhas se a resposta for essa.
Obrigado desde já por qualquer resposta sua.
Obs.: Se não entrei em contato antes é porque deve ter havido problemas mas dentro de mais 24 horas será enviado mais informações automáticas para você. O segredo de minha viagem ainda é importante.
Julio Villa”.
Depois de ter lido o e-mail, Cido passa perto da
casa do Julio, pois fica no caminho de volta para sua.
No poste de luz, vê um cartaz com a foto de seu amigo
estampada com a frase (Desaparecido Julio Villa -
POR FAVOR - qualquer informação ligar para 9999-
0000).
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Capítulo 2
Passado lembrado
Há um bom tempo atrás quando as Américas
estavam sendo povoadas pelos brancos, na região da
Bacia da Prata num riacho que desagua no rio Iguaçu
afluente do rio Paraná numa pequena cachoeira em
uma pedra plana rodeada por uma flora exuberante,
orquídeas multicores, uma índia dava a luz a um bebê,
o pai ajuda a mãe, cortando o cordão umbilical, seu
choro deixa em silêncio por um breve instante a mata
ao seu redor, com todo carinho sua mãe o amamenta
pela primeira vez, nesse momento o tempo parece ter
parado, nascia Tarobá, esse éra o nome que sua mãe
sempre quis para seu filho, um bebê forte, e que
transmitia a todos os que o viam muita alegria e
felicidade, seu pai, guerreiro da tribo Kaigangue
conhecido nos dias de hoje também como Coroados,
quando recebeu o menino em suas mãos levantou-o
aos céus e agradeceu a Tupã o deus trovão Tupi-
guarani pela dádiva que era seu filho, prometendo ser
um bom pai para a criança.
Sua mãe quis dar o nome do mesmo índio da
lenda que ela ouvira do pai quando pequena, sua
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aldeia ficava a quilômetros rio acima das Cataratas do
Iguaçu, a lenda do Iguaçu (água grande).
Seu pai contava que os índios Kaigangue,
acreditavam que o mundo era governado por M’Boy,
um deus que tinha a forma de serpente e filho de Tupã.
O cacique dessa tribo chamado Igobi, tinha uma filha e
ela era tão bonita que as águas do rio paravam quando
a jovem no seu reflexo se olhava, seu nome era Naipi.
Devido à sua beleza, ela foi consagrada ao deus
M’Boy, tendo a triste função de ser destinada pelo pai a
viver somente para o seu culto.
Mas seu coração já tinha um dono, havia, entre
os Kaigangues, um jovem guerreiro chamado Tarobá
que a havia conhecido e os dois estavam apaixonados.
No dia da consagração da bela índia ao deus,
quando a festa estava bem movimentada, enquanto o
cacique e o pajé bebiam cauim (bebida feita de milho
fermentado) e os guerreiros dançavam, Tarobá
aproveitou e fugiu com a linda Naipi numa canoa rio
abaixo, ajudados pela correnteza conseguindo se
afastar com rapidez. O deus M’Boy descobriu que sua
prometida estava fugindo com Tarobá, ficou furioso.
Se fez a forma de uma serpente gigantesca e
com tamanha força penetrou nas entranhas da terra e,
retorcendo o seu corpo, foi produzindo um enorme
buraco abaixo do leito do rio onde a canoa do casal
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estava passando, fazendo desmoronar a terra e a água
do rio formando uma gigantesca cratera que se
transformou nas Cataratas do Iguaçu.
A pequena canoa foi envolvida e tragada pelas
águas desaparecendo para sempre. M'boy amaldiçoou
os dois enamorados, transformou Naipi em uma das
rochas que fica no meio das cataratas, sempre
salpicada pelas águas da cachoeira e fustigada pelas
águas revoltas. O destino que o deus traído reservou
para Tarobá não foi pior que o de sua amada, foi
convertido em uma palmeira situada à beira do abismo
que se formara, inclinada sobre a garganta do rio a
observar sua amada, e logo abaixo dessa palmeira
está situada a entrada da gruta com o nome de
Garganta do Diabo onde o monstro vingativo vigia
eternamente as duas vítimas.
Uma história de amor de um fim triste que a mãe
de Tarobá agora quer desfazer, prestigiando o índio do
casal enamorado que demonstrara tanta coragem não
temendo enfrentar M'boy mesmo ele sendo um deus.
(Nhanderu, Tupãberaba - relâmpago o deus da
luz)
Tarobá cresce e com o tempo aprende todas as
artes que um bom índio deve aprender, aprendeu e se
tornou um grande pescador, foi reconhecido como o
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melhor feitor de arco e flecha de todas as tribos da
região seguindo os ensinamentos e detalhes de seu
pai, com sua mãe aprendeu também tudo o que se
sabe sobre a mandioca e milho e o que era necessário
para não passar necessidade, com seu avô, grande
pajé aprendeu as artes da utilização das ervas, e
manipulação dos elementos da natureza, aprendeu a
fazer paricá, pó alucinógeno que, inalado, desperta os
poderes de pajé, entrando assim em transe, para fazer
contato com os espíritos da natureza e antepassados,
e assim ajudar seus irmãos quando precisassem. E ele
quanto mais aprendia mais queria saber das coisas
como elas são, assim sendo tornou-se um líder entre
os seu, e respeitado pelas outras tribos, pois tinha um
bom coração e muita determinação.
Ele já tinha feito o ritual de passagem da fase de
criança para a adulta.
Havia dias que sua mãe e outras mulheres
tinham ido visitar alguns parentes na tribo vizinha rio
abaixo e os novatos do ritual de passagem tinham que
ir buscar as pessoas que desciam o rio, pois a subida
da correnteza necessitava de braços fortes para ser
vencida no trajeto de volta.
Na descida do rio com seus companheiros de
caça avistaram um grupo de homens estranhos com
vestimentas diferentes em embarcação que nunca
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tinhas visto, eram os brancos espanhóis, o que esses
homens queriam?
Esconderam-se e descobriram que eles haviam
feito prisioneiros e morto um punhado de índios da
aldeia, sua mãe e avó tinham conseguido escapar, mas
o sentimento de raiva e de vingança dentro de seu
coração naquele momento foi maior e de seu grupo
também, como estavam armados de arco e flecha
mesmo em menor numero que os invasores,
conseguiram derrota-los, mas dois de seus
companheiros morreram quando o pau que cospe fogo
os atingiu.
Na fuga sua mãe é atacada e ferida por um dos
invasores, mas consegue se defende e matar o
agressor, o ferimento que ela teve não foi maior que o
vírus com que o invasor a contaminou, uma simples
gripe. Taroba cuida dela é a leva para a aldeia rio
acima, os guerreiros se dividem em mais canoas para
levar os feridos do ataque dos brancos rio acima.
Na aldeia, sua mãe e um punhado de pessoas
que cuidavam dela começam a ficar doentes devido ao
vírus da gripe.
Com a ajuda de Tarobá o pajé seu avô que
através de conversa com os espíritos da floresta
preparam um remédio para curar o mau que não se
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conseguia ver, a doença começa a se alastrar e se
inicia uma possível epidemia.
Seu pai e outros índios que estava de volta de
uma caçada lamentaram não estarem presentes para
poder ter ajudado mais.
O pai e o Pajé também sabia que outros brancos
viriam para saberem do ocorrido.
É feita então uma cerimonia espacial para o
ocorrido e no transe em conversa com os espíritos o
Pajé visualiza uma tribo distante perto do começo do
antigo mar de Xaraés, lá existe uma tribo de índios
onde o Pajé Terena é muito culto e ele detêm o
conhecimento de um remédio que tudo cura, nessa
visão também observa que em seu cocar tem uma
pena quebrada, pena essa quebrada pela sua filha
quando pequenina é revelado também o Tape-aviru
que deve ser seguido para se poder chegar
rapidamente até lá.
Sem esperar por mais detalhes Tarobá
preocupado com sua mãe e irmãos da tribo segue a
estrada Tape-aviru o caminho que liga as nações
indígenas com mais três guerreiros todos com um
adereço feito de pequenas penas brancas pelo pajé,
esse adereço era uma espécie de amuleto e
passaporte de viagem, indicando que eles estavam em
jornada importante em busca de remédio, prepara
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também um alforje de couro com uma comida especial
para cada um, uma receita de amendoim, mel, farinha
de mandioca e de milho. Pede a proteção e ajuda dos
espíritos da natureza para que sua empreitada seja
rápida e acertada, pois sua jornada seria difícil e com
muitos perigos.
No primeiro dia de viagem eles passam por uma
ilha no meio do rio Paraná, essa ilha tem o nome de
Pedra que Canta, que nesse local, viria a ser erguida
pelos brancos, no futuro próximo uma obra colossal
sendo uma das sete maravilhas do mundo moderno.
Com dois dias de viagem com apenas quatro horas de
sono para descanso, um dos guerreiros muito cansado
pede para que eles sigam em frente sem ele, pois
estaria atrasando a jornada, Tarobá vendo esse
momento como um sinal, resolve seguir sua intuição e
fazer uma parada e seguir quando estivessem
recobradas as energias. Com mais quatro dias de
marcha rápida sem descanso, depois de passarem por
rios e grande extensão de mata observando os sinais
que seu avô lhe havia indicado para não errar o
caminho, o tempo de viagem de acordo com seus
cálculos deveria ser de mais uma semana em marcha
rápida para chegar até lá. Assim quase perto do
destino eles passam pelo território dos kadiwéu e
depois pelo dos Guaikurus, chegam à região dos índios
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Kinikinao e dos Terena, que tem o mesmo tronco da
língua Jê dos Kaigangue. Sempre quando eram vistos
pelos outros povos, os indios dessas tribos viam os
amuletos, logo reconheciam e davam passagem e eles
eram tratados com respeito ou recebiam guarida
(ajuda).
Descansados Tarobá e seus companheiros
agradeciam a estada e seguiam para mais horas de
jornada, até a tribo indicada pelos espíritos, do pajé
Pena Quebrada.
Passado vários dias de viagem, os quatro
componentes já exaustos chegam ao alto de uma
colina verdejante e avistam a aldeia dos Terenas, a
descrição é exatamente como seu avô havia falado em
sua visão.
Logo abaixo, então são bem recebidos e Tarobá
saúda dizendo “Anauê” e entrega uma pequena cabaça
ao Chefe, contendo componentes e ervas importantes
que somente quem é sábio sabe seu valor, e diz que foi
enviado pelo seu avô para ser entregue ao Pajé Pena
Quebrada e conta o porque de sua viagem.
O Pena Quebrada percebe que os viajantes
estão muito cansados e pede para que sejam bem
tratados, agradece o presente tão valioso que o
guerreiro havia trazido e comovido com tamanha força
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de vontade do jovem e da doença da tribo Kaigangue,
se prontifica em ajudar.
Mas o remédio que a tribo tinha estava
acabando, era pouca a quantidade para ser levado e
era necessário fazer mais. O remédio era feito somente
em uma semana específica do ano, deveria ser
preparado num período do dia e por magia do destino
era essa a semana do sol.
Tarobá fica desesperado, pois pretendia voltar o
mais rápido possível para sua aldeia levando o remédio
tendo que se conformar.
Naquele dia as tribos estavam se reunindo para
a dança dos mortos, parecida com a que era feita pelos
índios do alto Xingu a dança do Kuarup essa dança nos
dias atuais não faz mais parte da cultura Terena.
Depois de fazer a cura de uma criança da tribo
Chamacocos o pajé teve uma visão que mostrava que
o rapaz deveria retornar rapidamente e que deveria
aprender como era feito a poção do remédio que tudo
cura.
Todos vão dormir cuidados pela luminosidade da
maravilhosa lua cheia e na manhã seguinte ainda
escuro quando ainda o sol não havia aparecido uma
índia entra para acordar os Kaiagangues na parte da
grande Óca reservada aos visitante. Tarobá e Inaí se
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olham e nesse momento nasce um sentimento entre os
dois, o pajé entra também e os apressa e diz que Inaí é
sua filha.
Sem querer Taroba diz:
Há, então foi você quem quebrou a pena do
cocar de seu pai?
Pai e filha se olham admirados pela revelação
que só os dois sabiam e Inai fica corada.
Tarobá segue a equipe de curandeiros e pajés
de outras tribos rumo a um local sagrado nas entranhas
de um morro protegido por uma flora exuberante e
muito densa, depois da subida o grupo começa a
descer e nesse instante Tarobá vislumbra um enorme
portal arredondado incrustrado no morro, um buraco na
terra, sem saber direito e onde estava sendo levado
seguiu sem temer o grupo na estreita trilha.
Depois de uma hora de terem saído da aldeia
eles estavam dentro de uma enorme gruta que aos
poucos começou a revelar uma beleza extraordinária, o
sol estava nascendo e quando mais o sol se levantava,
mais luz penetrava em seu interior, revelando seu
esplendor, as tochas foram apagadas e suas paredes
refletiam as lindas nuances da cor azul do lago ao
fundo que hoje tem esse nome, o final de dezembro e
começo de janeiro é o melhor período de incidência de
luz na Gruta do Lago Azul, suas estalactites e
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estalagmites que foram construídas através de
milhares de anos, muito tempo, gotinha por gotinha
depositando minúsculos sedimentos de calcário para a
formação das colunas enormes com formato que
pareciam terem sido feitas por crianças quando
brincam com terra molhada na beira do rio.
Lá ele estava com o grupo de pajés, na
pequenina praia de seixos e pedra calcaria do lago da
gruta.
Pena Quebrada começa um cântico gutural
sendo imitado pelos outros dando início à cerimonia,
dois deles entram e mergulham dentro do lago de
águas cristalinas e transparentes de azulado anil e as
vezes turquesa com nuances diferentes que de acordo
com a incidência e intensidade da luz deixando mais
lindo o quadro que se via.
Pena Quebrada mostra e ensina os
componentes que estavam sendo colocados na mistura
a Tarobá que guarda cada informação com muita honra
e responsabilidade.
Sem parar com o cântico os pajés, iniciaram a
mistura dos componentes dentro de uma cabaça
grande com o socador de madeira macerando os
componentes. Assim que os dois mergulhadores
vieram a tona, colocaram o que tinham colhido nas
profundezas do lago pequenas folhinhas de musgo
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para receber um pouco mais o feixe da luz solar e logo
apos no misturador, terminada a maceração,
acrescentou-se a água.
Cessou o cântico e um silêncio profundo
aconteceu.
Somente o canto dos pássaros vindo da grande
boca da gruta era ouvido, em uma cabaça menor cada
um dos pajés componentes do grupo passou a recolher
um pouco do conteúdo da poção para si, o pajé
entregou uma cabaça para Tarobá, que com muita
gratidão entendeu o que acabara de acontecer e
participar tinha aprendido tudo sobre o preparo da
poção, as ervas e componentes minerais.
Ele teve o privilégio de ter aprendido com o pajé
que tinha em seu cocar, uma pena que por descuido
sua filha havia quebrado quando ainda criança e que
agora tinha também encantado seu coração.
Descobriu inclusive que existe uma pequenina
planta com formato de musgo que nasce dentro da
lagoa e que ela muda de cor com a incidência do sol,
nesse momento a planta libera um componente
químico específico dessa planta e isso acontece
somente naqueles dias do ano, sendo esse um dos
principais ingredientes do remédio que tudo cura.
O sol já não fazia mais o efeito maravilhoso
naquele templo criado pela natureza, reservava apenas
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algumas horas para mostrar sua beleza e também para
fazer com que os elementos da mistura tivessem seu
efeito. Mesmo assim ainda se via seu esplendor.
A subida íngreme do fundo da gruta foi
exaustiva, e somente depois de chegar ao cume na
saída da caverna ele voltou a perceber e admirar
aquela câmara tão enorme que a natureza havia
esculpido em suas entranhas, logo na saída Inaí estava
esperando por ele, sabendo assim que o sentimento
era recíproco mesmo. Na aldeia pode descansar e logo
em seguida agradecer e pedir para partir com o
remédio para a cura de sua mãe e de sua tribo doente.
Inaí e Tarobá se prometeram e o pajé consentiu
o namoro dos dois e a promessa dele voltar e levar Inaí
para sua aldeia.
Pena Quebrada fala que a tribo Kadiwéus enviou
de presente a Tarobá duas parelhas de animais, para
que ele pudesse voltar mais rápido à sua tribo, nem
Tarobá e seus irmãos de jornada tinham visto na vida
tais animais, pareciam com antas, mas esses eram
mais dóceis e esguios com cabelos compridos em cima
de seu pescoço, disse o pajé que eles emprestavam
seu dorso para que se pudesse montar, esse era o
cavalo, animal fugidio das mãos dos brancos que havia
vindo em tempos passados, eles se fixaram naquelas
paragens, demonstrando serem dóceis aceitarem
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brincadeiras com as crianças da tribo, aceitavam sua
montaria, foi assim incorporado à cultura dos índios
kadiwéus sendo eles depois de muito tempo
conhecidos como os mais exímios cavaleiros-
guerreiros que se encontrara na região do pantanal sul-
mato-grossense.
Depois de testar e se acostumarem uns com os
outros, cavalos e cavaleiros seguem viagem de volta a
sua tribo tão necessitada daquele remédio milagroso e
oportuno, Tarobá seguia com o remédio antecipando
os parceiros.
Quando chegou em sua aldeia estava toda
contaminada pela gripe seu pai já havia sucumbido e
sua mãe quase morrendo. Ele pede ao avô que separe
os mais doentes dos bons e que fosse trazida água da
fonte para fazer a mistura do remédio a ser distribuído
aos doentes.
Depois de uma semana de cuidado a doença era
vencida, mas com um custo muito grande, a mãe de
Tarobá e mais algumas mulheres e crianças não
consegue suportar ao vírus. Antes de morrer ela coloca
o colar de três pedras verde que havia ganho de seu
pai quando se conheceram, no pescoço de Tarobá e
em seguida perde a vida, com muito pesar de toda a
tribo.
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O Pajé e Tarobá com sabedoria levam a tribo
para uma região mais longe dali e incrustada da
floresta para que se distanciassem dos brancos que
com certeza iriam querer se vingar dos que foram
mortos e também das doenças que eles carregavam.
Quando saiu a procura de um lugar mais seguro
para sua tribo, perceberam o quanto teriam que deixar
para traz, lembranças de um lugar tão formoso que
tinha sido a casa de todos, o riacho com cachoeira
pequena onde todos tomavam banho, afluente do rio
caudaloso que lhes dava uma pesca abundante, os
animais, as árvores frutíferas que subiam e brincavam
fazendo macaquices e das pessoas queridas que
morreram na trágica epidemia e não poderiam cultuar
pois estariam longe. O pajé avô de Tarobá não
precisou do consentimento de todos para coloca-lo no
cargo de novo cacique da tribo, pois todos já o
consideravam como verdadeiro.
Depois de uma longa jornada de mais ou menos
200 kilómetros de viagem, com todas as medidas
tomadas para o assentamento de sua tribo, sabendo
que a distância de sua antiga morada era segura para
que os brancos não viessem a encontra-los, pediu
licença para seu avô e partiu novamente para trazer
sua amada Inaí que havia deixado na aldeia Terena.
Fim de 2º capítulo.
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(o restante da história será acrescentado para
quem quiser acompanhar a saga e para os escritores
que quiserem coo escrever o restante da história).
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