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FEMPAR – FUNDAÇAO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO PARANÁ LUCAS DE CARVALHO KERBER MANDADO DE INJUNÇÃO E A NOVA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL CURITIBA 2009

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FEMPAR – FUNDAÇAO ESCOLA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO P ARANÁ

LUCAS DE CARVALHO KERBER

MANDADO DE INJUNÇÃO E A NOVA JURISPRUDÊNCIA DO SUPR EMO TRIBUNAL FEDERAL

CURITIBA 2009

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LUCAS DE CARVALHO KERBER

MANDADO DE INJUNÇÃO E A NOVA JURISPRUDÊNCIA DO SUPR EMO TRIBUNAL FEDERAL

Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do grau de Especialista em Ministério Público – Estado Democrático de Direito, na área de concentração em Direito Constitucional, Fundação Escola do Ministério Público do Paraná – FEMPAR, Faculdades Integradas do Brasil – UniBrasil.

Orientadora: Profa. Cibele Fernandes Dias Knoerr

CURITIBA 2009

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TERMODE APROVAÇAO

LUCAS DE CARVALHO KERBER

MANDADO DE INJUNÇÃO E A NOVA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção de grau de Especialista

no curso de Pós-Graduação em Ministério Público – Estado Democrático de Direito,

Fundação Escola do Ministério Público do Paraná – FEMPAR, Faculdades

Integradas do Brasil – UniBrasil, examinada pela Professora Orientadora Cibele

Fernandes Dias Knoerr.

_______________________________

Profa. Cibele Fernandes Dias Knoerr

Orientadora

Curitiba/PR, ____/_____/2010.

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Aos meus pais Roberto e Grayce, que sempre me incentivaram a buscar novos desafios e se tornaram exemplos para toda a minha vida de caráter e dedicação.

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SUMÁRIO

RESUMO

1 INTRODUÇÃO.............………………………………………………………………….07

2 BREVE HISTÓRICO…………………………………………………………………….08

3 CONCEITO…………………………………………………………………………….....09

4 NATUREZA JURÍDICA ………………………………………………………………....11

5 MANDADO DE INJUNÇÃO E A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITU CIONALIDADE

POR OMISSÃO………………………………………………………………………….....14

5.1 LEGITIMIDADE………………………………………………………………………...15

5.2 OBJETO………………………………………………………………………………...15

5.3 JULGAMENTO E COMPETÊNCIA………………………………………………..…17

6 DA TRANSITORIEDADE DO MANDADO DE INJUNÇÃO …………………………18

7 CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS …………………………………...…………19

7.1 REQUISITOS…………………………………………………………………………...19

7.1.1 Dos direitos e liberdades tutelados.........................................................…...…19

7.1.2 Ausência de norma regulamentadora…………………………………………….23

7.1.3 Inviabilidade do exercício do direito, liberdade ou prerrogativa……………......28

8 OBJETO…………………………………………………………………………………..28

9 LEGITIMIDADE ATIVA ……………………………………………………………........29

9.1 O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO PÓLO ATIVO………………………………......32

10 LEGITIMIDADE PASSIVA ………………………………………………………….....33

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11 COMPETÊNCIA………………………………………………………………………...36

12 DECISÃO E SEUS EFEITOS………………………………………………………....37

12.1 TEORIA NÃO CONCRETISTA…………………………………………………......40

12.2 TEORIA CONCRETISTA................................................…….…........................40

12.2.1 Teoria concretista geral…………………………………………………...............41

12.2.2 Teoria concretista individual direta…………………………………...................43

12.2.3 Teoria concretista individual intermediária…………………….........................44

13 EVOLUÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO NO SUPREMO TRIBU NAL

FEDERAL…………………………………………………………………………………...45

14 CONCLUSÃO………………………………………………………………………......52

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ………………………………………………….....54

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RESUMO

O Mandado de Injunção surgiu com o advento da Constituição Federal de 1988, que implantou este novo instrumento como meio capaz de suprir as omissões legislativas concernentes a direitos e liberdades de cunho constitucional inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania quando inviabilizado por falta de norma regulamentadora, pressupondo assim um nexo de causalidade entre o direito e a omissão. Assim, o cidadão que se considerar titular de quaisquer direitos, liberdades ou prerrogativas previstas na Constituição e que estiverem inviáveis por falta de norma regulamentadora poderá se valer deste instrumento. Neste estudo a garantia injuncional será abordada em seus múltiplos aspectos. Desde sua origem histórica com influência do direito inglês, passando por suas características, natureza jurídica, legitimados, sua diferença com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, as divergências doutrinárias, o posicionamento do Supremo Tribunal Federal e principalmente a evolução alcançada por este relevante dispositivo trazido na Carta Magna. O Pretório Excelso com a oxigenação de seus membros nos últimos anos fez com que o mandado de injunção alcançasse os efeitos tão esperados pela esmagadora doutrina brasileira. Nesse sentido, após extensa pesquisa doutrinária e jurisprudencial, o presente estudo busca mostrar o atual posicionamento do Supremo Tribunal Federal frente a este remédio constitucional.

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1 INTRODUÇÃO

A Constituição Federal é o texto máximo que compõe o ordenamento político

e social de um país. É nela que estão assegurados os valores mais importantes de

uma Nação. Ao elaborar seu texto, o legislador constituinte elencou quais deveriam

ser aqueles direitos e a forma que os mesmos seriam descritos. Aos de suma

importância, foram atribuídos detalhamentos que tornaram o dispositivo legal com

efetividade de imediata aplicação, outros, o legislador concedeu o direito, mas atribui

competência para que outras autoridades regulamentassem seus aspectos mais

singulares.

Apesar disso, o que se mantém sempre resguardado de uma carta política é

a máxima efetividade de suas normas. É isso que a torna uma Constituição viva, um

texto com plena aplicabilidade.

Para tanto, muito acertada foi a presença do instituto mandado de injunção

na Constituição Federal de 1988. Garantia inédita até aquele momento em nosso

ordenamento jurídico, o remédio constitucional tinha por objetivo a efetivação das

possíveis lacunas constitucionais que porventura viessem a surgir entre o direito

previsto em seu texto e a regulamentação que ora era exigida.

Desde as primeiras decisões, o mandado de injunção foi alvo de uma

análise crítica sobre a sua verdadeira função. Fato que já suscitou discussões e

decisões bem diferentes durante esses mais de vinte anos de promulgação da Carta

Magna.

É por este fato que o propósito deste estudo se iniciou. Buscar uma maior

compreensão desta garantia constitucional e procurar identificar seus contornos

mais importantes e atuais.

Nossa Constituição precisa ser realizável, não pode assim, ser considerada

um texto político que verse sobre as relações de poderes dominantes, mas que ao

mesmo tempo esteja frustrada pela omissão do Poder Público. É neste ponto que

aparece o mandado de injunção. Instrumento anti-degradante do texto legal que

deve conferir vitaliciedade e trabalhar como neutralizador das conseqüências lesivas

resultantes da ausência legislativa dos preceitos constitucionais de eficácia limitada.

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2 BREVE HISTÓRICO

A Constituição Federal de 1988 nasceu em um período turbulento da nossa

história. Com o término da ditadura militar, uma nova voz, por uma constituição mais

justa e igualitária surgia. Assim sendo, a Constituição de 1988 foi a que nos forneceu

mais liberdades e direitos sociais, sendo conhecida como “Constituição Cidadã”.

O legislador constitucional se preocupou em oferecer formas para conferir a

eficácia de seu texto. O Senador Virgílio Távora foi quem encabeçou esta idéia.

Preocupado com o alerta para o não cumprimento do deve Estatal para com a

educação, sugeriu meios para sanar a inconstitucionalidade por omissão.1

Em 22 de abril de 1987, na 3ª Reunião da Subcomissão dos Direitos

Políticos, dos Direitos Coletivos e Garantias, o constituinte Gastone Righi sugere um

meio procedimental pelo qual alguém poderia exercitar seus direitos obstados em

face de uma omissão legislativa.2

No mundo, o mandado de injunção teve sua origem na Inglaterra, no século

XIV, nascendo como Juízo de Equidade. Desta forma, quando há ausência de

norma legal regulando a espécie, e quando a Common Law não guarda aparo

suficiente, o referente remédio era outorgado.

Avaliando o sentido inglês da palavra equidade – equity – seu significado

assenta em uma valoração jurídica dos elementos daquele caso concreto

juntamente com os princípios da justiça material e com os valores sociais para que

com isso, o magistrado profira uma decisão não fundada no justo legal, mas sim no

justo natural.3

O juiz inglês, assim como o brasileiro não possui o arbítrio de criar regras

próprias, se atendo as regras constitucionais vigentes, bem como aos princípios

gerais de direito e os valores jurídicos presentes na sociedade, ou seja, os vetores

do justo natural que permeiam o viver social.

1 SILVEIRA, Mila dos Santos. Abordagem crítica do mandado de injunção. Disponível em

http://www.iesb.br/ModuloOnline/Atena/arquivos_upload/Mila%20dos%20Santos%20Silveira.pdf acesso em, 20 ago. 2009.

2 Idem. 3 Cf. “Injuction”, in Encyclopoedia Britannica, London, Willian Benton Publisher, 1968, v. 12,

pp. 255 e 256.

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Com isso, o mandado de injunção permite um rompimento com a tradicional

aplicação rígida da legislação ao caso concreto para que o requerente obtenha uma

solução satisfatória que concretize o seu direito.

No Direito Português, previam-se instrumentos análogos, com o mesmo

intuito de combater o estado de inércia legislativa. Sua única finalidade era a

advertência do Poder competente omisso.4

A fonte mais próxima do mandado de injunção está no modelo norte-

americano, writ of injuction, instrumento com a finalidade de tutelar os direitos

fundamentais que se encontravam comprometidos diante da falta de norma legal

para concretizá-los.5 Como exemplo temos o caso Brown v. Board Education of

Topeka, de 1954 onde foi julgada favorável uma injuction no sentido de garantir o

direito de estudantes negros à educação e escolas não segregadas.6

Apesar de guardar semelhanças com o mandado do Direito Inglês e Norte-

Americano, em sua raiz não tem similitudes, uma vez que o writ of injuction é uma

garantia extraordinária, que se propõe a resolver tanto problemas de Direito Público,

como na seara privada, possuindo assim uma função mais ampla que o mandado de

injunção brasileiro, tendo em vista que este é um instrumento voltado pra área do

Direito Constitucional.7

3 CONCEITO

O mandado de injunção foi criado em nossa Carta Magna de 1988, sendo o

meio processual constitucional que o indivíduo dispõe para exercer suas

prerrogativas, seus direitos e suas liberdades constitucionais no que tange à

nacionalidade, à soberania e à cidadania quando estiverem impedidas de serem

exercidas por falta de norma regulamentadora: “CF/88, art. 5˚. LXXI – conceder-se-á

mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o

4 BULOS, Uadi Lammêgo.Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008,

p. 598. 5 Idem, Ibidem. 6 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 26. ed. São Paulo:

Malheiros, 2006, p. 448. 7 Cf. H. W. R. Wade. Diritto Amministrativo Inglese, trad. Italiana de Carmelo Geraci, Mião,

Giuffrè, 1969, PP. 150 e ss.; John Clarke Adams, “Breve exposição sobre o Direito Administrativo norte-americano”, RDA 53/56.

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exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à

nacionalidade, à soberania e à cidadania”.

Assim, sua finalidade está pautada em conferir imediata aplicabilidade à

norma constitucional de eficácia limitada, evitando que a mesma se torne “letra

morta”.

Uma outra visão a ser dada ao mandado de injunção foi a de que o

constitucionalista abriu possibilidade para a declaração de inconstitucionalidade sem

a pronúncia de nulidade8, uma vez que deu um particular significado ao controle de

constitucionalidade quanto à omissão do legislador9. Veja os ensinamentos do

Ministro do Supremo Tribunal Federal em sua obra Curso de direito constitucional:

O art. 5˚, LXXI, da Constituição previu, expressamente, a concessão do mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora tornar inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Ao lado deste instrumento destinado, fundamentalmente, à defesa de direitos individuais contra a omissão do ente legiferante, introduziu o constituinte, no art. 103, § 2˚, um sistema de controle abstrato da omissão.10

Assim, a situação de inconstitucionalidade está pautada em duas vertentes.

Pode derivar de um comportamento ativo do Poder Público, quando este faz algo

que o dispositivo constitucional não lhe permite, ou ainda, quando vem a produzir

normas em desacordo, tanto formal quanto material, gerando uma

inconstitucionalidade por ação.

No entanto, se o Estado deixar de cumprir com seu dever de prestação

imposto pela própria Carta Política, incidirá em uma violação negativa do texto

constitucional, ou seja, a inconstitucionalidade por omissão.11

O autor Othon Sidou trata desta garantia em sua obra da seguinte forma:

Quando a Carta de Princípios reconhece ou erige um direito, uma liberdade ou uma prerrogativa, esse direito, essa liberdade, ou essa prerrogativa impõe execução pronta. É da índole da lei ter efeitos imediatos, sem dilação. A lei não nasce do nada, tem, sempre, motivação superior ditada pela consciência coletiva, e do mesmo modo, não nasce para nada, como se fosse um objeto de adorno. A ausência de regulamentação para que direito,

8 Declarada a inconstitucionalidade, ocorre a suspensão de aplicação da lei e dos processos

em curso até que o legislador, dentro do prazo razoável, venha a se manifestar sobre a situação inconstitucional, ou seja, a Suprema Corte restringe os efeitos da declaração de inconstitucionalidade.

9 MENDES, Gilmar Ferreira, et al. Curso de direito constitucional. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 1205.

10 Idem. 11 PAULO, Vicente. Aulas de direito constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004, p.

105-106.

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liberdade ou prerrogativa possa fluir e atingir seu intuito teleológico, pode não configurar ilegalidade, pode não constituir abuso de poder, mas configura agravo de direito decorrente de negligência indesculpável, que ao Direito incumbe curar. É por isso que se ergue a injunção, ou imposição viabilizada pelo poder público.12

4 NATUREZA JURÍDICA

Recai sobre o mandado de injunção uma certa controvérsia doutrinária

quanto à sua natureza jurídica, podendo extrair duas correntes.

A primeira defende que o referido remédio possui natureza constitutiva, uma

vez que viabiliza o direito do indivíduo, oferecendo os meios para a sua prática.

Já a outra corrente trata o mandado de injunção como uma ação

mandamental que declara a omissão em face da mora legislativa ao regulamentar

direito posto pela Carta Magna, fixando ou não um prazo para sanar a lacuna.

Pelo momento, ficamos com o entendimento do Supremo Tribunal Federal,

que afirma que o mandado de injunção tem natureza constitutiva e possui

procedimento específico, visando combater a síndrome de inefetividade das

constituições.13

O constitucionalista Alexandre de Moraes apresentou o seguinte conceito:

O mandado de injunção consiste em uma ação constitucional de caráter civil e de procedimento especial, que visa suprimir uma omissão do Poder Público, no intuito de viabilizar o exercício de um direito, uma liberdade ou uma prerrogativa prevista na Constituição Federal. Juntamente com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão, visa o combate da síndrome de inefetividade das normas constitucionais.14

O autor Pinto Ferreira entende o mandado de injunção como um instrumento

de determinar o caráter compulsório da norma, uma vez que “muitas normas

constitucionais são puramente programáticas, apenas com eficácia paralisante de

legislação contrária.15

Com a promulgação da Carta Magna em 1988, surgiram apontamentos

divergentes em muitos aspectos do Mandado de Injunção, tendo em vista que seu

dispositivo constitucional foi lacônico.

12 SIDOU, J. M. Othon. Habeas corpus, Mandado de Segurança, Mandado de Injunção, Habeas data, Ação popular. 5ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000.

13 Com a adoção da posição concretista, o STF deixou de conferir o caráter essencialmente mandamental da ação injuncional para uma sentença de natureza constitutiva.

14 DE MORAES, Alexandre. Direito constitucional. São Paulo: Atlas, 2002 15 FERREIRA, Pinto. Curso de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 1996.

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Uma das matérias levantadas foi quanto ao alcance do mesmo. Uma

primeira corrente, defendida por Manoel Gonçalves Ferreira Filho, afirma que o texto

possui aplicabilidade restrita, não sendo aplicável a todas as normas constitucionais

omissas, vejamos: “(...) não é qualquer direito que enseja o mandado de injunção. O

texto constitucional o restringe à nacionalidade, direitos e liberdades constitucionais,

ou seja, aos direitos fundamentais reconhecidos no capítulo II da Constituição e às

prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e a cidadania”.16

Já a segunda corrente, traz com requisitos apenas a necessidade da norma

estar prevista na Constituição e que a mesma não esteja viabilizada por ausência de

norma regulamentadora para que seja passível do writ.

Francisco Antonio de Oliveira acompanha esta corrente em sua lição:

(...) o mandado de injunção foi criado para implementar o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e o exercício das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e a cidadania. Direitos e liberdades constitucionais são aqueles direitos e aquelas garantias fundamentais e bem assim os direitos sociais. Dentro dessa ótica, não estariam limitados àqueles expressamente previstos no art. 5º (Direitos Fundamentais) e nos art. 6º a 11 (direitos sociais). Mas se incluem os demais direitos que a Constituição tenha assegurado de maneira expressa.17

Por derradeiro, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o assunto, entendeu

que se trata de um rol exemplificativo e não taxativo, ou seja, o mandado de

injunção poderia ser proposto em face de qualquer norma constitucional. Este é o

escólio do Ministro Moreira Alves no julgamento do MI 107-3/DF:

(…) não vê razão suficiente para restringir os termos literais do inciso LXXI do art. 5° da Constituição – ‘direitos e liberdades constitucionais’ –, certo como é que a mesma razão que justifica a concessão do mandado de injunção aos direitos e garantias previstos neste art. 5° existe em relação aos demais direitos e garantias constitucionais (inclusive os sociais), cujo exercício seja inviabilizado pela falta de norma regulamentadora.18

Essa discussão será mais especificada em seguida onde constataremos a

figura de mais uma outra corrente, esta de entendimento intermediário.

16 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 31. ed. São

Paulo: Saraiva, 2004. 17 OLIVEIRA, Francisco Antônio. Mandado de Injunção: da inconstitucionalidade por

omissão, enfoques trabalhistas, jurisprudências. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. 18 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. MI 107-3 DF. Relator Ministro Moreira Alves. Diário

da Justiça da União, 21 set. 1990.

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Outra divergência se baseia quanto à auto-aplicabilidade do criado instituto.

Alguns doutrinadores entendiam que deveria haver lei específica regulamentando o

procedimento do mandado de injunção, mas a doutrina majoritária se posicionou no

sentido da previsão do §1˚ do art. 5˚ da Constituição Federal que prevê aplicação

imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais.

Um aspecto curioso sobre esta divergência é que, no entendimento da não

auto-aplicabilidade do referido instituto, teríamos uma ação constitucional contra a

inércia de lei que não poderia ser aplicada diante da ausência de regulamentação.

Veja o comentário do Professor José Joaquim Gomes Canotilho:

A norma regulamentadora do mandado de injunção não é, ela própria uma simples norma programática, no sentido de que seu objecto, conteúdo, extensão e limites dependem da eventual lei reguladora. A entender-se assim, chegar-se-ia a resultados paradoxais: uma ação constitucional dirigida à inação normativa ficaria inerte em virtude da falta de lei regulamentadora!19

No mesmo sentindo e defendendo a auto-aplicabilidade do mandado de

injunção, José Afonso da Silva trouxe o seguinte entendimento:

Finalmente, cumpre esclarecer que o disposto no art. 5˚, LXXI, não depende de regulamentação para ser aplicado. O texto possui todos os elementos suficientes à sua imediata aplicação, reforçada essa aplicabilidade direta com o disposto no §1˚ do mesmo artigo, o que “significa que os juízes não poderão deixar de atender a toda e qualquer demanda que lhe for dirigida”, e não poderão deixar de decidir também, dado o monopólio jurisdicional (non liquet).20

O Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou a divergência com decisão

unânime proferida no mandado de injunção (MI) 107-321: “[…] a infuction é auto-

aplicável, independentemente de norma jurídica que a regule, inclusive quanto ao

procedimento. Relativamente a este, aplicar-se-á, no que couber, e analogicamente,

o do mandado de segurança”.

Assim com a promulgação da nossa Carta Magna em 1988, o

constitucionalista José Afonso da Silva, já defendia sua aplicabilidade imediata:

19 Apud MACHADO, C. A. A. Mandado de injunção: um instrumento de efetividade da Constituição. 2. ed. São Paulo: Atlas 2002, p. 63.

20 SILVA, J. A. Curso de direito constitucional positivo. 22. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 451.

21 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. MI 107-3 DF. Relator Ministro Moreira Alves. Diário da Justiça da União, 21 set. 1990.

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Não se pode deixar de conhecer de uma ação, que é direito público subjetivo, sob o argumento de que não foi estabelecido um procedimento especial para ela. Os tribunais brasileiros nunca deixaram de conhecer institutos novos sob o argumento de ausência de normas processuais específicas. Ao contrário, sempre souberam construir, com grandeza, em tais casos.22

Com o parágrafo único do artigo 24 da Lei n. 8038/90 esta discussão perdeu

sua relevância uma vez que o dispositivo determinou: “no mandado de injunção e no

habeas data, serão observados, no que couber, as normas do mandado de

segurança, enquanto não editada legislação específica.”

O Superior Tribunal de Justiça, acompanhando determinação da Corte

Maior, trouxe em seu regimento interno o artigo 216: “No mandado de injunção e no

habeas data, serão observadas as normas da legislação de regência. Enquanto

estas não forem promulgadas, observar-se-ão, no que couber, o Código de

Processo Civil e a Lei 1.533, de 1951”.23

A professora Flávia Piovesan reforça o entendimento da auto-aplicabilidade

desta garantia constitucional:

Admitir o contrário resultaria no curioso paradoxo de a ação constitucional dirigida contra a inação normativa permanecer inerte em virtude de norma regulamentadora. Assim, enquanto não for instituído um procedimento específico, aplicar-se-á ao mandado de injunção o procedimento do mandado de segurança previsto pela Lei 1.533/51, como determinou o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do MI 107-3, determinação seguida pelo Superior Tribunal de Justiça, nos termos do art. 216 do Regimento Interno deste Tribunal.24

5 MANDADO DE INJUNÇÃO E A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITU CIONALIDADE

POR OMISSÃO

Tanto o mandado de injunção como a ação direta de inconstitucionalidade

por omissão foram instrumentos trazidos pela Constituição Federal de 1988 voltados

para a sua realização material.

22 SILVA, J. A. da. Mandado de injunção, remédio do cidadão. Jornal do Brasil, Rio de

Janeiro, 26 set 1988. p. 9. 23 Vale salientar que no ano de 2009 foi publicada a nova lei do mandado de segurança, Lei

n. 12016/09. 24 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 143.

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Fica claro o paralelismo que existe entre o mandado de injunção e a ação

direta de inconstitucionalidade por omissão (ADIn por omissão), esta prescrita no

artigo 103, §2˚, da Constituição Federal (CF/88).

Como salienta Aricê Moacyr Amaral dos Santos, tanto o mandado de

injunção quanto a ação direta de inconstitucionalidade por omissão “cuidam de um

assunto comum: inércia de norma constitucional, decorrente de omissão normativa”,

concluindo mais adiante que “a questão da inércia constitucional não constitui

fenômeno caboclo, pois atinge fronteiras as mais distantes”. 25

Por mais que ambas visem suprir a omissão do legislador, em face da

necessidade de regulamentação do texto constitucional, elas guardam aspectos

peculiares, sendo institutos distintos.

Suas principais diferenças se fundam basicamente na legitimidade, objeto,

julgamento e competência.

5.1 LEGITIMIDADE

No que tange à legitimidade ativa, o mandado de injunção pode ser

intentado por qualquer pessoa, física ou jurídica, que se encontre em situação de

impossibilidade de exercer um determinado direito previsto na constituição por

ausência de regulamentação normativa. Já a ADIn por omissão traz legitimados

específicos, restrição que está prevista no artigo 103, incisos I ao IX, CF/88

(numerus clausus).

A legitimidade passiva do mandado de injunção vai ser idêntica a da ADIN

por omissão. Dessa forma, vai recair sobre o sujeito ou órgão inibidor do exercício

do direito, aquele que for o responsável para a edição do ato normativo.

5.2 OBJETO

O mandado de injunção tem como objeto a solução de um caso concreto,

algo individualmente considerado frente a um direito subjetivo que está impedido de

25 SANTOS, Aricê Moacyr Amaral. Mandado de Injunção. São Paulo: Revista dos Tribunais,

p. 31.

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ser gozado pela inércia do legislador, tanto que a Constituição faz menção à

ausência de norma regulamentadora.

No caso da ADIn por omissão, o controle é realizado de forma abstrata, em

tese. Não necessita de uma violação concreta a um direito individual e por isso pode

ser intentada de forma genérica, como forma de obtenção da declaração de

inconstitucionalidade da omissão do órgão. Seu artigo se refere à falta de medida a

tornar efetiva norma constitucional, ou seja, é um instituto que abrange os atos

gerais e abstratos.

Neste sentido, Flávia Piovesan:

Em uma só palavra: no mandando de injunção há fiscalização concreta da inconstitucionalidade por omissão, enquanto na ação direta há fiscalização abstrata da inconstitucionalidade. […] Destaque-se: no mandado de injunção objetiva-se tornar viável o exercício de um direito fundamental no caso concreto, já a inconstitucionalidade por omissão visa conferir efetividade à norma constitucional, atacando a inconstitucionalidade em tese. Isto é, se na ação direta de inconstitucionalidade por omissão importa sanear a ordem jurídica lacunosa, no sentido de conferir eficácia plena aos dispositivos constitucionais, no mandado de injunção a finalidade é tornar viável um direito subjetivo lesado. Assim, o mandado de injunção objetiva socorrer todo e qualquer direito constitucional violado pela ausência de norma regulamentadora, enquanto que a ação direta de inconstitucionalidade por omissão objetiva lograr uma decisão que estimule a produção de medida para tornar efetiva a norma constitucional.26

Assim, enquanto a ação direta de inconstitucionalidade por omissão busca

proteger justamente o direito objetivo, o mandado de injunção tutela direitos

subjetivos.

Confira a posição de Willis Santiago Guerra Filho:

Este instituto não foi concebido para o controle abstrato de normas em defesa da ordem jurídica objetiva, pelo exercício de uma forma de jurisdição mais voluntária que contenciosa – ou, propriamente, ‘jurisdicional’ – como anota CAPPELLETTI (1976, n. 38, p. 116 s). Trata-se, a nosso ver, de ação para a tutela de situações jurídicas subjetivas decorrentes de normas consagradoras de direitos fundamentais, cujo exercício encontra-se inviabilizado por omissão inconstitucional de poderes públicos (ou de terceiros). Enfileirar-se-iam, portanto, de um lado, os mandados de segurança, individual e coletivo, e o mandado de injunção, com a função de propiciar ao cidadão a defesa de sua esfera de direitos ou ordem jurídica subjetiva, enquanto em outro pólo, oposto, mas complementar, situar-se-iam as ações civis públicas em geral e as ações diretas de inconstitucionalidade, por ação e omissão, em especial, com a função de tutela da ordem jurídica objetiva.27

26 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 179-180.

27 GUERRA FILHO, W. S. Processo constitucional e direitos fundamentais. 3. ed. São Paulo: Celso Bastos, 2003, p. 100-101.

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No mesmo sentido para distinguir os institutos, Clèmerson Merlin Clève

alega:

Enquanto a ação de inconstitucionalidade por omissão configura instrumento do controle abstrato da constitucionalidade, voltando a defesa (da “integralidade”) da Lei Fundamental, o mandado de injunção apresenta-se como remédio constitucional definido e dependente de norma regulamentadora. Porém, o mandado de injunção não é apenas o instrumento concreto que, ao lado do abstrato, estaria a complementar o modelo brasileiro de fiscalização da inércia constitucional. Ele, como será analisado, guarda certa especificidade. […] O mandado de injunção exprime, sim, mecanismo de fiscalização concreta da omissão inconstitucional, mas, simultaneamente, caracteriza-se por proteger os direitos constitucionais, também contra as meras lacunas técnica (lacunas da legislação). É verdade que, com o passar dos anos, as lacunas técnicas vão se deslocando para o eixo da omissão inconstitucional até o momento em que a distinção perde sentido. De qualquer modo deve ficar o registro, nem sempre percebido pela doutrina, da especificidade do mandado de injunção.28

5.3 JULGAMENTO E COMPETÊNCIA

A ADin por omissão, como sendo um modelo da fiscalização abstrata do

controle de constitucionalidade, tem competência exclusiva para ser julga no

Supremo Tribunal Federal (meio concentrado), conforme o artigo 102, I, “a”, CF/88 e

sua decisão possui efeitos erga omnes. Como bem exprime Regina Maria Macedo

Nery Ferrari: “Sendo a declaração feita em tese, seus efeitos são erga omnes, isto é,

aproveita a todos e reveste-se da autoridade de coisa julgada, implicando a

impossibilidade de sua modificação ulterior pelo próprio Supremo Tribunal Federal”.

Enquanto isso, ao writ foi atribuída uma competência entre a concentrada e

a difusa, fala-se em competência intermediária, conferida aos órgãos colegiados do

Poder Judiciário.29

No tocante às decisões do mandado de injunção, o mesmo possui efeitos

inter partes como regra, contudo, no MI 712 a decisão ganhou contornos erga

omnes quando disciplinou o exercício do direito de greve pelos servidores públicos

civis, como veremos de forma detalhada mais a diante.

Além da competência do Supremo Tribunal Federal de acordo com o artigo

102, I, “q”, CF/88, também possui competência para julgamento o Superior Tribunal

28 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008,

p. 598. 29 Sobre a competência do mandado de injunção, conferir capítulo 11 que trata

especificamente da matéria.

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de Justiça, artigo 105, I, “h”, CF/88 e ainda o Tribunal Superior Eleitoral, com base

no artigo 121, §4˚, V, CF/88.

Rodrigo Reis Mazzei trata de forma interessante a característica transitória

dos efeitos da decisão do mandado de injunção: “Aceitar que a decisão do mandado

de injunção é transitória, não formando coisa julgada imutável, sendo absorvida

completamente após a edição da norma faltante, é fundamental, haja vista que

demonstra o real alcance da figura no ordenamento jurídico nacional”.30

6 DA TRANSITORIEDADE DO MANDADO DE INJUNÇÃO

Uma característica peculiar desta garantia constitucional é o seu aspecto

transitório. Com o preenchimento das omissões legislativas, o mandado de injunção

vai perdendo sua razão de existir, subsistindo apenas para as emendas

constitucionais. Portanto, assim que extinguir integralmente aquele texto

constitucional pendente de normatização, não haverá mais justificativa para a

impetração deste remédio.

Este é o escólio de Rodrigo Reis Mazzei:

(…) o mandado de injunção é uma figura de natureza transitória. Surgiu na Carta Magna de 1988 como instrumento para que se superassem as omissões legislativas que impedissem o exercício de direitos e liberdades constitucionais, assim como a efetividade de prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. O mandado de injunção só terá espaço no ordenamento enquanto forem mantidas omissões, uma vez que, na medida que as regulamentações – que permitem o gozo da norma – sejam editadas, proporcionalmente estarão se limitando as hipóteses de impetração, reduzindo-se a zero quando o sistema legal tiver eliminado o vácuo de que trata o inciso LXXI do artigo 5˚ da Constituição Federal de 1988.31

Desta forma, é um instrumento de característica transitória, cuja presença se

faz necessária enquanto o Poder Legislativo não se ocupar das omissões que deve

sanar. A tendência é que quando todas as normas da Constituição forem

regulamentadas, não haverá mais objeto para a proposição deste remédio

constitucional.

30 MAZZEI, Rodrigo Reis. Mandado de Injunção. In: DIDIER JR., F. (Org). Ações

constitucionais. 3. ed. rev. ampl. atual. Salvador: Jus Podivm, 2008, p. 258-261 31 Idem.

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7 CARACTERÍSTICAS FUNDAMENTAIS

Neste capítulo, vamos aprofundar os estudos das características e dos

elementos do mandado de injunção que já foram anteriormente pronunciados.

7.1 REQUISITOS

Primeiramente, faz-se necessário analisar quais os requisitos necessários

para se intentar o mandado de injunção. Basicamente temos três:

- Direitos e liberdades constitucionais previstos em normas de eficácia

limitada;

- Ausência de norma regulamentadora para efetivar esses direitos,

liberdades ou prerrogativas ligadas à nacionalidade, à soberania e à cidadania

(Omissão do Poder Público);

- Inviabilidade do exercício do direito, liberdade ou prerrogativa em virtude da

falta de normatividade.

O mandado de injunção pressupõe a presença do nexo de causalidade entre

a omissão legislativa e a inviabilidade do exercício de um direito.32

7.1.1 Dos direitos e liberdades tutelados

O aspecto da amplitude de incidência do mandado de injunção é talvez o

que mais causa divergência pela nossa doutrina.

De início, cumpre salientar que não são todas as normas do texto Maior com

aplicabilidade limitada que estão passíveis da injunção. O instrumento em discussão

só pode ser aplicado naquelas normas que dependem de regulamentação mas que

se refiram a um direito subjetivo plenamente configurado.33

A professora Regina Maria Macedo Nery Ferrari esclarece:

Quando os meios jurídicos postos à disposição do indivíduo para a realização de um interesse permitem uma exigência direta, plena e específica, surge a figura do direito subjetivo, diretamente relacionada com a intensidade do interesse protegido, pois, a grosso

32 STF – RT 659/213 33 Cf. SOUZA, L. M. de. Normas constitucionais não-regulamentadas: instrumentos

processuais. São Paulo: RT, 2004, p. 88.

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modo, o direito subjetivo nada mais é do que “o reflexo material do dever jurídico de outro”. Várias são as formas de conceituar o direito subjetivo, bem como a operacionalidade de tais conceitos, porém, aqui, por direito subjetivo deve-se entender o poder de ação que, com base no direito objetivo, destina-se à satisfação de um interesse. […] mas quando isso acontece [a norma constitucional se apresente, desde logo, apta a produzir direitos subjetivos] surgem para os beneficiários situações jurídicas imediatamente desfrutáveis, que serão efetivadas por prestações, positivas ou negativas exigíveis do Estado, e quando não realizadas voluntariamente, fazem nascer para o titular do direito, uma pretensão que deverá ser veiculada pelo direito de ação, isto é, do direito de exigir perante o judiciário a sua prestação coativa, pois ao lado da possibilidade de exigir, existe o dever jurídico de cumprir, e quando esta exigibilidade de conduta acontece do particular em face do Estado, diz-se existir um direito subjetivo público.34

No que se refere a quais direitos, liberdades e prerrogativas protegidas pelo

mandado de injunção, temos três posicionamentos a serem discutidos.

A primeira corrente, denominada de restritiva, é encabeçada pelo já citado

Manoel Gonçalves Ferreira Filho e defende que os direitos e garantias

constitucionais protegidos são unicamente aqueles que se referem à nacionalidade,

soberania e cidadania:

A meu ver, o mandado de injunção tem um campo restrito. Cabe quanto “a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. Disto resulta que, como é óbvio, não alcança outros direitos, por exemplo, os inscritos entre os direitos sociais. Realmente, a parte final – “inerentes a nacionalidade, à soberania e à cidadania” – restringe o alcance desse mandado. Ele serve para garantir os direitos, liberdades e prerrogativas diretamente vinculados ao status de nacional (os do artigo 5˚, cujo caput reconhece aos brasileiros determinados direitos fundamentais, ou que possam ser deduzidos pelo Cap. III do Tít. II, capítulo este relativo à nacionalidade), ao de cidadão, quer dizer, o nacional politicamente ativo que, como integrante do povo, o soberano na democracia, tem a participação no governo, como o direito de voto, e a elegibilidade (são os direitos, liberdades e prerrogativas que podem ser deduzidos do Cap. IV do Tít. II – capítulo sobre os “Direitos Políticos”). A omissão de norma regulamentadora referente a outros campos, bem como a norma necessária para que uma expectativa de direito passe a direito subjetivo, reclama não o mandado de injunção, mas a ação direta de inconstitucionalidade por omissão.35

O autor Luis Roberto Barroso critica abertamente este posicionamento de

Manoel Gonçalves Ferreira Filho, vejamos:

Tendo em vista o complemento “inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”, autor ilustre defendeu a restrição do alcance do mandado de injunção aos direitos individuais elencados no art. 5.˚, e aos direitos políticos dos art. 12 a 16, não podendo ser utilizado para tutela de direitos sociais. Com a vênia devida, tal interpretação se afigura antes ideológica que científica, e não corresponde nem à história, nem à teleologia do

34 FERRARI, R. M. M. N. Normas constitucionais programáticas: normatividade,

operatividade e efetividade. São Paulo: RT, 2001, p. 227-230. 35 FERREIRA FILHO, M. G. Curso de direito constitucional. 24. ed. rev. São Paulo: Saraiva,

1997, p. 315.

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remédio jurídico introduzido. Como não há cláusula restritiva, estão abrangidos todos os direitos constitucionais, sejam individuais coletivos, difusos, políticos ou sociais.36

Outro entendimento doutrinário – segunda corrente – amplia um pouco o

alcance dos direitos protegidos pelo writ, contudo ainda de forma tímida, mantendo

uma visão a reduzir o alcance do mandado de injunção.

Defendida por Celso Ribeiro Bastos, ela estende a tutelada da referida

garantia para os direitos contidos no Título II da Carta Política, ou seja, aqueles

direitos referentes à liberdade, tributários da abstenção estatal:

Importante consignar que o propósito da garantia não é colher todo e qualquer direito da Constituição. O mandado de injunção só tem cabimento quando a falta de norma regulamentadora impede o exercício dos “direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. A expressão “direitos e liberdades constitucionais” aponta para as clássicas declarações de direitos individuais. No Texto Constitucional, o tratamento desta matéria é feito de forma moderna, a consagrar não só os direitos e deveres individuais, mas para incluir debaixo do mesmo título “Dos direitos e garantias fundamentais”, os coletivos e os sociais. Destarte, é de se entender que a tutela do mandato de injunção alcança os direitos subsumidos debaixo do Título II da Constituição, aí incluídos obviamente os direitos de nacionalidade, os políticos e também os relativos à soberania nacional, embora com relação a esta última seja um tanto difícil saber em que consiste um direito individual dela extraível.37

Por fim, a terceira corrente busca uma interpretação com foco na máxima

efetivação das garantias constitucionais, assim entende que todos os direitos

(constitucionais) que estejam inviabilizados por ausência de norma regulamentadora

podem ser passíveis de mandado de injunção.

Veja a lição de Carlos Augusto Alcântara Machado:

Analisando o dispositivo constitucional que consagrou o Mandado de Injunção, verifica-se, até por interpretação gramatical, que a conclusão relacionada ao objeto de incidência do remédio constitucional, jamais poderá ser na linha de raciocínio daqueles que defendem o seu reduzido campo de atuação. Estabelece o preceito em tela que será concedido Mandado de Injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Ora, percebe-se que o legislador constituinte, ao utilizar as expressões "nacionalidade", "soberania" e "cidadania", assim o fez, ligando-as tão somente ao termo "prerrogativas". A conjunção aditiva "e" (ressaltada no parágrafo anterior) separa de um lado "DIREITOS E LIBERDADES" e de outro "PRERROGATIVAS". Foi um reforço de abrangência. O seu objetivo, portanto, é assegurar, como visto, o exercício de qualquer direito ou liberdade constitucional. Esta a voluntas legislatoris e a real mens legis.38

36 BARROSO, L. R. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 6. ed. atual. Rio

de Janeiro: Renovar, 2002, p. 249-250. 37 BASTOS, C. B. Curso de direito constitucional. São Paulo: Celso Bastos, 2002, p. 411. 38 MACHADO, C. A. A. op. cit., p. 73.

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Volney Zamenhof de Oliveira Silva acompanha este posicionamento:

Após esta tarefa, conclui-se que, inobstante o fato do writ ter sido inserido em um dos incisos do art. 5.˚, da Carta Magna, percebe-se que o legislador não quis restringir-se apenas àquele dispositivo, pois, “os direitos e liberdades constitucionais” e as “prerrogativas inerentes a nacionalidade, à soberania e à cidadania” estão dispostos na Lei Maior de forma esparsa, fato que amplia o seu campo de aplicação.39

José Afonso da Silva explica detalhadamente cada um dos elementos

trazidos no inciso LXXI do artigo 5˚ da nossa Constituição:

Daí seu objeto: assegurar o exercício (a) de qualquer direito constitucional (individual, coletivo, político ou social) não regulamentado; (b) de liberdade constitucional, não regulamentada, sendo de notar que as liberdades são previstas em normas constitucionais geralmente de aplicabilidade imediata, independentemente de regulamentação; vale dizer, incidem diretamente; de modo que raramente ocorrerá oportunidade de mandado de injunção nessa matéria, mas há situações como a do art. 5o, VI, em que a liberdade de cultos religiosos ficou dependente, em certo aspecto, de lei regulamentadora, quando diz: «garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias»; (c) das prerrogativas inerentes á nacionalidade, á soberania e á cidadania, também quando não regulamentadas; soberania é a soberania popular, segundo dispõe o art. 14, não a soberania estatal; aqui igualmente não ocorrerão muitas hipóteses de ocorrência do mandado de injunção; é que as questões de nacionalidade praticamente se esgotam nas prescrições constitucionais que já a definem de modo eficaz no art. 12; apenas a naturalização depende de lei, mas esta, como vimos, já existe, portanto é matéria regulamentada, que, por isso mesmo, não dá azo ao mandado de injunção; as prerrogativas da soberania popular e da cidadania se desdobram mediante lei, mas estas já existem […].40

No que se refere à parte final do mesmo artigo – prerrogativas – alguns

autores adotam uma posição mais ampla ainda. Veja os ensinamentos do Willis

Santiago Guerra Filho:

Examinando agora o dispositivo que consagra o mandado de injunção, no texto constitucional de 1988, esbarra-se desde logo na dificuldade em entender o porquê da distinção entre os “direitos e liberdades constitucionais” por um lado, e, de outro, as “prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”, enquanto possíveis objetos da tutela por ele fornecida, na medida em que estas últimas “prerrogativas” terminariam em redundar em “liberdades” (nota-se a sinonímia) e/ou “direitos constitucionais”. O problema é contornado por BARBOSA MOREIRA, conforme opinião manifestada em palestras proferidas em diversos locais e oportunidades (Ceará, Rio de Janeiro, etc.). A efetividade a ser conferida por meio da injunção se estenderia também, por esse artifício legislativo, aos que se vissem prejudicados em sua condição de brasileiro elegível (“cidadania”) por normas que não aquelas encerradas na Constituição, ou seja, norma infraconstitucional, a reclamar regulamentação. Daí a distinção feita, frisando que se trata de meio jurisdicional para defender direitos e liberdades constitucionais – i.e.,

39 SILVA, V. Z. de O. Lineamentos do mandado de injunção São Paulo: RT, 1993, p. 55. 40 SILVA, J. A. Curso de direito constitucional positivo. 22. ed. rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2003, p. 447.

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fundamentais, previstos por todo o corpo da Lei Maior, e não apenas no art. 5˚, como se insinuou já em interpretação restritiva absurda – , como também de prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, não importando que sejam elas oriundas ou não de norma constitucional, como importa para os direitos e liberdades referidos em separado.41

Logo após o mandado de injunção n. 107, no tema que se refere à omissão,

o Supremo Tribunal Federal realizou alterações significativas nesta garantia e

passou a conferir uma conformação mais ampla do que vinha sendo dado até

aquele momento.42

7.1.2 Ausência de norma regulamentadora

O texto constitucional pode ou não trazer de forma clara a necessidade de

uma norma para regulamentar aquele dispositivo. Se for tratada de forma explícita

fica fácil constatar o tipo de norma regulamentadora (p. ex. lei ordinária ou lei

complementar), contudo na sua ausência, exige-se mais atenção.

Para o doutrinador José Afonso da Silva, norma regulamentadora: “[…] é,

assim, toda ‘medida para tornar efetiva norma constitucional’, bem como diz o artigo

103, §2˚.” 43

O jurista paranaense Clèmerson Merlin Clève também trata de forma ampla

a expressão “norma regulamentadora”:

Assim como na ação de inconstitucionalidade por omissão, a norma faltante pode ser de qualquer natureza: legislativa, regulamentar, ou de escalão hierárquico menor. Importa que a sua falta inviabilize o exercício de um direito (portanto, em sentido amplo) constitucional. A norma faltante pode ser de natureza material ou processual. É necessário, porém, que esteja impedido a fruição de um direito constitucionalmente assegurado.44

Neste sentido, a professora Flávia Piovesan assim leciona:

Ora, a definição de “norma regulamentadora”, a que faz menção o dispositivo constitucional pertinente ao mandado de injunção, deve ser extraída a partir de interpretação sistemática

41 GUERRA FILHO, W. S. Processo constitucional e direitos fundamentais. 3. ed. São

Paulo: Celso Bastos, 2003, p. 105-106. 42 MENDES, Gilmar, et al. Curso de direito constitucional. 2. ed. rev. e atual. São Paulo:

Saraiva, 2008, p. 1209. 43 SILVA, J. A. Curso de direito constitucional positivo. 22. ed. rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2003, p.448. 44 CLÈVE, C. M. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2. ed.

rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2000, p. 368-369.

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da Constituição, levando-se em consideração o princípio interpretativo de que às garantias constitucionais deve ser conferida a mais ampla eficácia possível. Se a Constituição é um sistema e unidade, é deste sistema e desta unidade que se deve inferir o conceito de norma regulamentadora. […] Assim, é possível sustentar que a “falta de norma regulamentadora” invocada pelo artigo 5˚, LXXI, seja, pois, definida como “omissão de medida para tornar efetiva a norma constitucional”. […] Compreender a “norma regulamentadora”como toda e qualquer “medida para tornar efetiva norma constitucional” é incluir no conceito de norma regulamentadora não apenas a edição de normas, mas a produção de ato administrativo e ato material. Nesse sentido, aliás, as lições de Clèmerson Merlin Clève, ao apontar que: “é evidente que a omissão de ato normativo corresponde a um horizonte conceitual muito mais amplo do que a omissão de ato legislativo. No Brasil, portanto, o conceito de inércia inconstitucional engloba também a omissão de medidas normativas de cunho administrativo (regulamentos, instruções).45

Acompanhando o entendimento esposados pelos citados doutrinadores Luis

Roberto Barroso ensina: “No que diz respeito à norma regulamentadora, pode ser

ela de qualquer hierarquia – lei complementar, ordinária, regulamento, resolução,

portaria, decisões administrativas normativas – desde que sua ausência inviabilize

um direito constitucional. Norma regulamentadora é, assim, toda “medida para tornar

efetiva norma constitucional”, como bem diz o art. 103, §2˚. da Constituição.”46

Com posicionamento divergente, Roque Antonio Carrazza e Luciane Moessa

de Souza entendem não ser cabível a garantia do mandado de injunção quando se

tratar de omissões administrativas:47

Logo, não é a falta de atuação administrativa que possibilita a impetração do mandado de injunção, mas a falta de norma regulamentadora de normas constitucionais de eficácia limitada (normas constitucionais de eficácia limitada justamente porque não reúnem condições para, sozinhas, produzirem efeitos que a Constituição quer). Noutro giro verbal, não cabe mandado de injunção contra omissões de órgãos administrativos. Só contra omissões do Poder Legislativo.48

Vale reforçar que este é um entendimento de minoria da doutrina, uma vez

que o próprio artigo 105, I, h, do texto constitucional abre a possibilidade de emissão

45 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 135-136.

46 BARROSO, L. R. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 6. ed. atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 252-253.

47 Cf. SOUZA, L. M. de. Normas constitucionais não-regulamentadas: instrumentos processuais. São Paulo: RT, 2004, p. 82.

48 CARRAZZA, R. A. Curso de direito constitucional tributário. 22. ed. rev. ampl. E atual. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 400.

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de norma regulamentadora por “órgão, entidade ou autoridade federal, da

administração direta ou indireta”.49

Carlos Augusto Alcântara Machado faz uma importante observação: “Exige-

se é que a norma reclamada tenha caráter de “norma geral” (Kelsen) e que encontre

seu fundamento de validade material direta ou indiretamente na Constituição

Federal, mas sempre com caráter de abstração e generalidade”.50 Aduz ainda que,

se tratando de atos administrativos concretos, estaríamos diante de causa para

impetração de mandado de segurança, com base na Súmula 429 do STF.51

O já citado constitucionalista paranaense defende esta posição com base no

Mestre e Doutor Carlos Ari Sundfeld:

O conceito de norma regulamentadora não compreende, reitere-se, os atos administrativos concretos. O ensinamento de Carlos Ari Sundfeld, a propósito, é absolutamente pertinente. Adverte o jovem jurista: “há direitos, derivados de normas constitucionais de eficácia plena, cuja fruição requer previa providencia material de outrem (o sujeito passivo do direito), normalmente o Poder Público. Ex: o direito de acesso à escola (art. 208, §1˚.) e o direito de acesso às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde (art. 196) dependem da existência de escolas e hospitais, de professores e médicos de material didático e medicamentos. Se alguém não obtém vaga em hospital ou escola, não é por falta de norma regulamentando tais serviços, mas por falta de providencias materiais necessárias ao seu oferecimento (destinação de verbas, licitação, contratação, concurso público). Essa falta de providências materiais não é suprível por mandado de injunção, que se destina a suprir ausência de norma regulamentadora do direito, não de atos administrativos concretos (que são regulamentadores). Contudo, tais direitos (acesso à escola e à saúde) são exigíveis, porque as normas que os definem tem aplicação imediata (art. 5.˚, parágrafo único [na verdade §1.˚]). Então, por meio de ações comuns pode-se obter a condenação do Estado à prática de atos necessários ao oferecimento de tais serviços (obrigação de fazer) ou ao ressarcimento (para pagar a utilização de serviços privados, na falta dos públicos)”.52

No que se refere norma incompleta ou insuficiente, a doutrina equipara esta

lacuna à ausência de regulamentação. Por se tratar de ofensa ao principio da

isonomia, a regulamentação incompleta deve ser entendida como objeto passível do

mandado de injunção.

Quanto a este parcial silêncio legislativo, Roque Antônio Carrazza

compartilha do mesmo entendimento:

49 Cf. CHIMENTI, R. C. et. Al, Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 412: “Por norma regulamentadora entende-se toda e qualquer medida necessária a tornar um direito ou uma garantia, protegidos via mandado de injunção, plenamente exercitáveis, medida que pode ser uma lei ou simples portaria.”

50 MACHADO. C. A. A. Mandado de Injunção: um instrumento de efetividade da Constituição. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.75.

51 PIOVESAN, F. op. cit., p. 136: entende em sentido contrário, considerando que a expressão “ausência de norma regulamentadora” abranja também atos matérias.

52 CLÈVE. C. M. op. cit., p. 369-370.

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O mandado de injunção é admissível, também, quando, apesar de editada a norma regulamentadora, esta, por ser incompleta ou insuficiente, não tem condições reais de viabilizar o exercício de tais direitos, liberdades e prerrogativas. Outro entendimento, além de ser irrazoável, levaria ao seguinte absurdo jurídico: a pessoa jurídica poderia cortar o acesso à injunção (direito constitucional inafastável, até mesmo por meio de lei), editando um simulacro de norma regulamentadora, por isso mesmo incapaz de dar operatividade ao comando constitucional.53

Canotilho em sua obra Direito Constitucional e teoria da Constituição nos

ensina:

A doutrina alude, por vezes, à distinção entre omissão em sentido formal e omissão em sentido material e à distinção entre omissões absolutas e omissões relativas. Independentemente dos vários problemas suscitados por estas distinções, o conceito jurídico-constitucional de omissão é compatível com omissões legislativas parciais, isto é, omissões derivadas de os actos legislativos concretizadores de imposições legiferantes favorecerem certos grupos ou situações, esquecendo outros grupos e outras situações que preenchem os mesmos pressupostos de facto. Esta concretização incompleta tanto pode resultar de uma intenção deliberada do legislador em conceder vantagens só a certos grupos ou contemplar certas situações, violando o princípio da igualdade e cometendo uma «inconstitucionalidade por acção», como derivar apenas de uma incompleta apreciação das situações de facto, mas sem que haja o propósito de arbitrária e unilateralmente se favorecerem só certos grupos ou situações.54

No parecer de Willis Santiago Guerra Filho:

Entendemos, por exemplo, que caberia recorrer ao mandado de injunção não só quando houvesse falta completa de norma para regular caso concreto, mas também quando se verificar a chamada “omissão parcial”, em havendo norma que regule de forma insuficiente certo direito ou prerrogativa constitucional, que não estariam regulamentados com efetividade, por não se atender plenamente ao estabelecido na nova Constituição. Também, por essa via interpretativa, seria possível lançar mão do instituto futuramente, para retirar a eficácia de normas que, com o passar do tempo, entram em desintonia com o entendimento a que se chegou da disposição constitucional que elas regulamentam. Ao que parece, se não nos pusermos a imaginar empregos desse tipo para o mandado de injunção, ele terminará um dia por cair em desuso, quando toas as normas regulamentadas já estiverem editadas.55

Já o doutrinado J. M. Othon Sidou levanta um alerta no sentido para a não

banalização do mandado de injunção, uma vez que o mesmo não será procedente

53 CARRAZZA, R. A. Curso de direito constitucional tributário. 22. ed. rev. ampl. e atual. São

Paulo: Malheiros, 2006, p. 401. 54 CANOTILHO, J. J. G. Direito constitucional e teoria da Constituição. 2. ed. Coimbra:

Almedina, 1998, p. 919. 55 GUERRA FILHO, W. S. Processo constitucional e direitos fundamentais. 3. ed. São

Paulo: Celso Bastos, 2003, p. 110-111.

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quando, mesmo que constada a ausência do instrumento disciplinador, o exercício

deste direito não se encontrar obstado.56

No que se refere à interpretação ou alteração de lei infraconstitucional, a

doutrina e a jurisprudência é unânime ao entender que se trata de controle de

constitucionalidade, e não caso do mandado de injunção.

Não caberá, portanto, mandado de injunção para, sob a alegação de reclamar a edição de norma regulamentadora de dispositivo constitucional, pretender-se a alteração de lei ou ato normativo já existente, supostamente incompatível com a Constituição ou para exigir-se uma certa interpretação à aplicação de legislação infraconstitucional, ou ainda para pleitear uma aplicação mais justa da lei existente.57

Por fim, ao se tratar de norma regulamentadora, relevante trazer a

classificação utilizada por José Afonso da Silva e reconhecida pela doutrina, que

entende ser cabível o mandado de injunção como um instrumento da efetivação

daquelas normas constitucionais de eficácia limitada e ao mesmo tempo critica sua

interpretação:

Este é o instrumento que, correlacionado com o citado § 1˚ do art. 5˚. da Constituição, torna todas as normas constitucionais potencialmente aplicáveis diretamente. […] Sua função seria fazer valer, no interesse do impetrante, um direito ou prerrogativa previsto em norma constitucional cujo exercício em geral é inviabilizado pela falta de regulamentação. Mas a interpretação do Supremo Tribunal Federal tolheu essa função que lhe dava razão de existir, para considerá-lo mero meio de obtenção de declaração da inconstitucionalidade por omissão.58

Com efeito, as normas de eficácia plena, ou ainda as de eficácia contida,

que embora ensejem regulamentação, são normas auto-executáveis e não poderão

ser objetos do writ.

56 SIDOU, J. M. Othon. “Habeas corpus”, mandado de segurança, mandado de injunção,

“habeas data”, ação popular: as garantias ativas dos direitos coletivos. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.272.

57 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19. ed. atual. São Paulo: Atlas, 2006, p. 155.

58 SILVA, J. A. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 165-166.

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7.1.3 Inviabilidade do exercício do direito, liberd ade ou prerrogativa

Como já pronunciado anteriormente, o mandado de injunção pressupõe uma

ligação (nexo de causalidade) entre a ausência de regulamentação e a

impossibilidade de ser realizar um direito59. Assim, só vai ser cabível quando o

direito subjetivo estiver obstado face à omissão.

Sobre esta resistência ao cumprimento do preceito constitucional pelo

destinatário passivo da norma, Roque Antonio Carrazza nos ensina:

Noutros termos, o mandado de injunção só é cabível quando a inexistência de norma regulamentadora torna impossível ou inviável o exercício de direitos constitucionais. […] Por igual modo, não cabe mandado de injunção diante de normas constitucionais eficácia plena, que, por terem aplicabilidade direta, imediata e integral […], prescindem de normas regulamentadoras para produzirem todos os efeitos no mundo do Direito. O mesmo podemos dizer das normas constitucionais de eficácia contida, que também tem aplicabilidade direta, imediata, mas possivelmente não integral […] e, por isso mesmo, não demandam a edição de normas de eficácia limitada (ou reduzida) – quer as declaratórias de princípios institutivos ou organizativos, quer as declaratórias de princípios programáticos […] – abrem espaço ao mandado de injunção.60

Conclui-se neste sentido que, presente a satisfação espontânea do direito

previsto na Carta Magna, não haverá o interesse de agir para se propor o mandado

de injunção, funcionando como umas das condições da ação.

8 OBJETO

O objeto do mandado de injunção vai estar relacionado à existência de uma

lacuna constitucional61 e vai assegurar o exercício de um direito, liberdade ou

prerrogativa constitucional não regulamentada.62

É com base nessa proteção que o mandado de injunção exerce sobre o

texto legal que o professor paulista Hely Lopes Meireles nos ensina: “O objeto,

portanto, desse mandado é a proteção de quaisquer direitos, liberdades

constitucionais, individuais ou coletivos, de pessoa física ou jurídica, e de franquias

59 Cf. MORAES, A. Op.cit., p. 155: “[…] o mandado de injunção pressupõe a existência de nexo de causalidade entre a omissão normativa do Poder Público e a inviabilidade do exercício do direito, liberdade ou prerrogativa.”

60 CARRAZZA, R. A. Curso de direito constitucional tributário. 22. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 400.

61 BULOS, U. L., op. cit., p. 599. 62 SILVA, J. A. op. cit., p. 448.

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relativas à nacionalidade, à soberania popular e à cidadania, que torne possível sua

fruição por iniciativa do Poder Público em expedir normas regulamentadoras

pertinentes.” 63

Com base nessa premissa, o objeto do writ será sempre a criação pelo juiz

de uma norma jurídica que regulamente o direito do impetrante com a finalidade de

satisfação do pedido. Aqui, a expressão criação pelo juiz de uma norma deve ser

interpretada como qualquer meio que possibilite o gozo do direito que se encontra

incompelido pela omissão regulamentadora.

9 LEGITIMIDADE ATIVA

Quando se trata sobre a legitimidade para se impetrar o mandado de

injunção, não encontramos dificuldades para se obter um consenso quanto as partes

envolvidas.

Possuirá legitimidade ativa qualquer pessoa que esteja impedida de exercer

seu direito, liberdade ou prerrogativa diante da ausência de regulamentação de uma

norma prevista na Constituição, ou seja, a própria Carta Magna vai atribuir

legitimidade quando outorga um direito subjetivo a alguém.

A casuística do Supremo Tribunal Federal já decidiu quanto à legitimidade

ad causam:

Esta Corte, recentemente, ao julgar o Mandado de Injunção 188, decidiu por unanimidade que só tem "legitimatio ad causam",em se tratando de mandado de injunção, quem pertença a categoria a que a Constituição Federal haja outorgado abstratamente um direito, cujo exercício esteja obstado por omissão com mora na regulamentação daquele. Em se tratando, como se trata, de servidores públicos militares, não lhes concedeu a Constituição Federal direito a estabilidade, cujo exercício dependa de regulamentação desse direito, mas, ao contrario, determinou que a lei disponha sobre a estabilidade dos servidores públicos militares, estabelecendo quais os requisitos que estes devem preencher para que adquiram tal direito.64 Neste sentido, como entendeu o Pretório Excelso, o impetrante é o

beneficiário imediato desta garantia constitucional.65

63 MEIRELLES, H. L. Mandado de segurança. 27. ed. atual e comp. São Paulo: Malheiros,

2004, p.259. 64 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 107, Rel. Min. Moreira

Alves, Diário da Justiça da União, 02 ago. 1991. 65 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 595 – Agravo Regimental,

Rel. Min. Carlos Velloso, Diário da Justiça da União, 23 abr. 1999.

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No escólio de Carlos Augusto Alcântara Machado:

Em sede de mandado de injunção, está legitimado para sua impetração o titular do direito da liberdade constitucional ou da prerrogativa inerente à nacionalidade, à cidadania ou à soberania. Vale dizer: dispõe de legitimidade ativa ad causam aquele a quem houver sido atribuída in abstrato, pela própria Constituição, tal titularidade, cujo exercício esteja sendo obstado por uma situação de vacuum juris imputável ao Estado (Poder Público) e objetivamente configurada pela ausência de norma regulamentadora.66

Importante ser abordado também sobre a possibilidade de impetração de

mandado de injunção coletivo. Apesar da forma não estar prevista expressamente

no texto maior, nossa doutrina e o Supremo Tribunal Federal vem admitindo este

ajuizamento coletivo.

Para os defensores desta espécie de legitimidade, o writ coletivo encontra

respaldo na Constituição Federal no artigo 5˚, LXXI e no artigo 8˚, III, que fixa a

legitimidade dos sindicatos para defender os interesses coletivos da categoria nas

questões judiciais e administrativas.

Como perfil seguido pela Corte Suprema, entende-se uma aplicação

analógica do artigo 5˚. LXX da Constituição Federal que trata dos legitimados do

mandado de segurança coletivo. Assim, é possível ajuizar o writ coletivo em regime

de substituição processual v.g. os partidos políticos representados no Congresso,

sindicatos, associações e entidades de classe:67 “A jurisprudência do Supremo

Tribunal Federal admite legitimidade ativa ad causam aos sindicatos para a

instauração, em favor de seus membros ou associados, do mandado de injunção

coletivo”. 68

Veja o posicionamento expresso do Supremo Tribunal Federal quanto ao

mandado de injunção coletivo: “Mandado de injunção coletivo: admissibilidade, por

aplicação analógica do art. 5˚, LXX, da Constituição: legitimidade, no caso, de

entidade sindical de pequenas e médias empresas, as quais, notoriamente

66 MACHADO. C. A. A. Mandado de Injunção: um instrumento de efetividade da

Constituição. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2004, p.96. 67 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 361, Rel. Min. Sepúlveda

Pertence, Diário da Justiça da União, 15 jun. 1994. 68 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 102, Rel. Min. Carlos

Velloso, Diário da Justiça da União, 25 out. 2002.

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dependentes do crédito bancário, têm interesse comum na eficácia do art. 192, §3˚,

da Constituição, que fixou os limites aos juros reais”. 69

Com isso, o Pretório Excelso equipara sua legitimação ativa com a do

mandado de segurança coletivo, o que os faz exigir o preenchimento das mesmas

circunstâncias constitucionais do artigo 5˚, LXX: a) partido político com

representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe

ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelos menos um ano,

em defesa de seus membros e associados.

Contudo, certos requisitos foram dispensados para a garantia injuncional. O

Superior Tribunal de Justiça já decidiu a respeito de mandado de injunção impetrado

por sindicato que: “para requerer mandado de injunção não é preciso que a pessoa

jurídica tenha sido constituída há pelo menos um ano, pois o artigo 5˚, inciso LXX, b,

da Constituição refere-se ao mandado de segurança coletivo e não ao mandado de

injunção”.70

Por este aspecto, nota-se uma interpretação no sentido de ampliar as

possibilidades de ajuizamento (legitimidade ativa) do mandado de injunção em

relação ao mandado de segurança.

Nesta linha de pensamento é o escólio da professora Luciane Moessa de

Souza sobre a legitimidade ativa coletiva:

Entendemos que, em razão da finalidade e pressupostos do mandado de injunção, que, a nosso ver, abarca todos os direitos constitucionais, inclusive os de natureza coletiva, em razão do princípio da indivisibilidade dos direitos fundamentais, tanto motivos de economia processual quanto ao disposto nos arts. 5˚, XXI – que prevê a legitimidade das entidades associativas, quando expressamente autorizadas, para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente – e 8˚,III – que concede legitimidade aos sindicatos para defender os direitos e interesses coletivos da categoria, inclusive em juízo – levam a concluir pela admissibilidade do mandado de injunção coletivo, tanto na defesa de direitos coletivos stricto sensu quanto na defesa de direitos difusos e individuais homogêneos.71

De forma mais isolada a professora Flávia Piovesan defende ser incabível o

mandado de injunção em tutelas de direitos difusos:

69 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n. 361-RJ, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Diário de Justiça da União, 17 jun. 1994.

70 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Mandado de injunção n. 19-DF, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, Diário de Justiça da União, 11 jun. 1990.

71 SOUZA, L. M. de. Normas constitucionais não-regulamentadas: instrumentos processuais. São Paulo: RT, 2004, p. 127-128.

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Defende-se aqui a possibilidade de cabimento do mandado de injunção para a tutela de direito coletivo, mas não difuso. Caso se admitisse a tutela também de direito difuso, o instrumento do mandado de injunção estaria, até certo ponto, a se confundir com o instrumento da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Isto é, caberia, em julgamento de mandado de injunção, a elaboração da norma regulamentadora geral e abstrata. O mandado de injunção deixaria de constituir instrumento de defesa de direito subjetivo, voltado a viabilizar o exercício de direitos e liberdades constitucionais, para se transformar em instrumento de tutela de direito objetivo, permitindo a eliminação de lacunas do sistema jurídico-constitucional.72

9.1 O MINISTÉRIO PÚBLICO COMO PÓLO ATIVO

Fato já reconhecido é a possibilidade do Ministério Público promover o

mandado de injunção. Devido a sua previsão legal para tutelar interesses difusos e

coletivos poderá o membro do parquet impetrar o referido writ.73

Como dever imposto pela Carta Magna, o Ministério Público tem como uma

de suas premissas, a de defender a ordem jurídica, o regime democrático e os

interesses sociais e individuais indisponíveis (artigo 127). Devido a sua importância

Constitucional, deve-se analisar as funções do Ministério Público sempre com uma

interpretação à ampliar seu campo de atuação, entendendo que o mesmo deve

buscar dar efetividade a todos os direitos subjetivos públicos assegurados pela

Constituição.74

Ainda no resguardo constitucional a presente legitimidade se ampara no

artigo 129: “Art. 129 – São funções essenciais do Ministério Público: (…) II – zelar

pelo efetivo respeito dos poderes e dos serviços de relevância pública aos direitos

assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua

garantia” (grifei).

Luís Roberto Barroso esclarece em sua obra O direito constitucional e a

efetividade de suas normas: “Sendo difusos ou coletivos os interesses a serem

protegidos, poderá o Ministério Público promover o mandado de injunção (Lei

72 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 144.

73 Como exemplo, temos o MI 858/PR impetrado pelo Ministério Público do Estado do Paraná.

74 GUASQUE. L. F. A base constitucional de atuação do Ministério Público. Livro de teses do 13˚ Congresso Nacional do Ministério Público, Curitiba, vol. 3, p. 33-38, 1999.

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Complementar 75/93, art. 6˚, VIII)75. Esta legitimação do Ministério Público,

consoante disposição expressa, não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses

(CF, art. 129, §1˚), tais como as já referidas entidades ou associações de classes”.76

No mesmo artigo 6˚. da Lei Complementar 75/93 encontramos previsão

expressa para sua legitimidade: “Promover outras ações, nela incluindo o mandado

de injunção, sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício

dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à

nacionalidade, à soberania e à cidadania, quando difusos os interesses a serem

protegidos.”

Assim sendo, com o respaldo institucional e constitucional, não paira

quaisquer dúvidas a respeito da possibilidade de legitimação do Mandado de

Injunção Coletivo pelo Ministério Público.

10 LEGITIMIDADE PASSIVA

Ao se estudar a legitimidade passiva para o mandado de injunção, constata-

se a presença de uma divergência que pode ser dividida basicamente em três

correntes.

A primeira corrente, reconhecida pela maioria da doutrina e aceita no

Supremo Tribunal Federal entende que o mandado de injunção só pode ser

impetrado em face do Poder, órgão ou autoridade omissa quanto ao dever de

legislar.77

Pode ser extraído disso que somente a pessoa estatal vai ser sujeito passivo

de uma ação injuncional, nunca um particular, uma vez que não recai para este

qualquer dever de regulamentação da Constituição Federal, função que é típica do

Poder Público, em regra ao Poder Legislativo.78

Confira a posição adotada pelo mestre Uadi Lammêgo Bulos em sua obra

Curso de Direito Constitucional: “Realmente, só as pessoas estatais é que podem

75 Este dispositivo se refere ao Ministério Público da União, contudo, está competência é estendida aos Ministérios Públicos Estaduais por força da Lei Orgânica do Ministério Público da União que aplica-se subsidiariamente a estes.

76 BARROSO, L. R. op. cit. p. 256. 77 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 369-DF, voto do Min.

Moreira Alves, Rel. Min. Néri da Silveira, Revista Trimestral de Jurisprudência, 114:405. 78 Como precendete do Supremo Tribunal Federal: Mandado de Injunção n. 288-6/DF, Rel.

Min. Celso de Mello, Diário da Justiça da União, 03 mai. 1995.

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figurar no pólo passivo da relação processual instaurada em sede de mandado de

injunção. É aos entes públicos – e não aos particulares – que se imputa o dever

jurídico de elaborar provimentos normativos para regulamentar a norma

constitucional”.79

O professor Clèmerson Merlin Clève acompanha este entendimento em sua

obra A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro:

Consentiu, entretanto, o Supremo Tribunal Federal, e esta igualmente é a posição do Superior Tribunal de Justiça, que o mandado de injunção deve ser impetrado contra o órgão público ou autoridade que, responsável pela regulamentação do direito constitucional plasmado em norma inexeqüível por si mesma, deixou de adimplir a obrigação. Inexistente lei dispondo sobre o assunto, este entendimento parece ser o mais acertado. No pólo passivo da relação processual residirá, sempre, uma pessoa, órgão ou entidade de natureza pública. Jamais um particular, a menos que exercite, em virtude de lei ou de ato ou contrato administrativos, parcela de autoridade pública.80

Com isso, fica prejudicada a formação do fenômeno do litisconsórcio

passivo, tanto o necessário como o facultativo, seja entre particulares ou entre

pessoas estatais. Veja a decisão do Pretório Excelso no mandado de injunção 323-

8:

Em face da natureza mandamental do mandado de injunção […], ele se dirige às autoridades ou órgãos públicos que se pretendam omissos quanto à regulamentação que viabilize o exercício dos direitos e liberdades constitucionais […], não se configurando, assim, hipótese de cabimento de litisconsórcio passivo entre as autoridades e órgãos públicos que deverão, se for o caso, elaborar a regulamentação necessária, e particulares que, em favor do impetrante do mandado de injunção, vierem a ser obrigados ao cumprimento da norma regulamentadora, quando vier esta, em decorrência dê sua elaboração, a entrar em vigor.81

Com este mesmo posicionamento o STF já havia decido no MI 300-9-DF

que a legitimidade passiva para se discutir o writ que buscava a implementação do

artigo 192, §3˚ da Constituição (tocante aos 12% de juros reais) seria do Congresso

Nacional, e não da instituição financeira que estava praticando os juros abusivos.82

79 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008,

p. 603. 80 CLÈVE, C. M. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2. ed.

rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2000, p. 373-374. 81 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 323-8-DF. Rel. Min. Moreira

Alves. Diário de Justiça da União, 21 out. 1991. 82 BARROSO, L. R. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 7. ed. atual. Rio

de Janeiro: Renovar, 2003, p. 258.

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A segunda corrente aceita como sujeito passivo do mandado de injunção a

pessoa física ou jurídica que caberá a implementação do direito constitucional

garantido, podendo ser pública ou privada. A professora Flávia Piovesan assim

defende: “De fato, se o mandado de injunção visa a tutela de uma pretensão, deverá

ser impetrado, repise-se, contra a pessoa pública ou privada, a qual compete tornar-

se viável a pretensão. Não faria sentido chamar-se ao processo a autoridade cuja

inércia se imputa a omissão, de modo a excluir a parte contra qual a pretensão é

dedutível”. 83

O ministro Carlos Velloso se enquadra nesta segunda corrente, contudo

admite o litisconsórcio com quem deveria produzir a regulamentação. Veja seu

posicionamento no voto vista no MI 176-6/PE: “O mandado de injunção deve ser

requerido contra a pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que deve suportar os

efeitos da sentença, que atuará em litisconsórcio com a autoridade ou entidade

incumbida da elaboração da norma regulamentadora, fixando esta a competência do

órgão julgador”.84

Por fim, a terceira corrente admite que o mandado de injunção cabe tanto

para relações de natureza pública como para as de natureza privada e traz como

legitimado passivo aquele que deveria implementar o direito disciplinado na

sentença, ou seja, aquele que deva atuar a fim de viabilizar o exercício do direito

constitucional assegurado, com a diferença que deve haver uma notificação da

autoridade competente para a edição da norma regulamentadora.

Segundo Luis Roberto Barroso, esta notificação ajuda inclusive na

fundamentação da decisão: “Todavia, mesmo que não figure como parte, parece de

83 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 146-147.

84 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 176-6/PE. Voto vista Min. Carlos Velloso. Diário de Justiça da União, 09 abr. 1992. Nesse sentido, muitos estudiosos e alguns juízes entendem que o sujeito passivo do mandado de injunção é a pessoa física ou jurídica, pública ou privada. Doutrina: Hely Lopes Meirelles, Mandado de segurança, ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, “habeas data”, p. 140; Sérgio Bermudes, O mandado de injunção, Revista dos Tribunais, 642:24; Carlos Augusto Alcântara Machado, Mandado de Injunção: um instrumento de efetividade da Constituição, p. 99. Jurisprudência: Rio de Janeiro, Tribunal de Justiça. Mandado de injunção n. 6/90. Rel. Des. José Carlos Barbosa Moreira, decisão de 22-2-1991 apud BULOS, U. L. op. cit., p. 603.

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todo conveniente que se dê ciência ao responsável pela omissão, que poderá, trazer

elementos e informações relevantes para a decisão”.85

Em jurisprudência semelhante, o Ministro Marco Aurélio, no mandado de

injunção n. 305-5/DF onde se discutia a cobrança de juros extorsivos, ampliou o pólo

passivo do writ ao adicionar, além do Congresso Nacional, os bancos.86

11 COMPETÊNCIA

Não recai muitas dúvidas sobre a competência para processar e julgar o

mandado de injunção, uma vez que nossa Constituição foi clara ao determinar a

mesma. Como característica primordial, temos que referida competência fora

atribuída pelo legislado constitucional aos órgãos colegiados do Poder Judiciário

sendo distribuída da seguinte forma:

Ao Supremo Tribunal Federal compete processar e julgar a garantia

injuncional quando a elaboração de norma regulamentadora for atribuição do

Presidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do

Senado Federal, das Mesas de uma dessas Casas Legislativas, do Tribunal de

Contas da União, de um dos Tribunais Superiores, ou do próprio Supremo Tribunal

Federal. (art. 102, I, q, CF/88). Persiste ainda a competência da Corte Suprema para

os casos de recurso ordinário de mandado de injunção que foram denegados pelos

Tribunais Superiores, conforme artigo 102, II, da nossa Constituição.

Para o Superior Tribunal de Justiça, a Carta Marga (art. 105, I, h) atribui

competência para o mandado de injunção em face de inércia regulamentar do órgão,

entidade o autoridade federal, da administração direta ou indireta, excetuados os

casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça Militar,

da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal.

Ao Tribunal Superior Eleitoral compete, em grau de recurso, processar e

julgar esta garantia quando a mesma for denegada pelo Tribunal Regional Eleitoral

(art. 121, §4˚, V).

85 BARROSO, L. R. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 6. ed. atual. Rio

de Janeiro: Renovar, 2002, p. 277. 86 Esta foi uma posição isolada e não condiz com a postura que prevalece na Corte Excelsa,

que em sua maioria adota a primeira corrente.

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Para os Tribunais de Justiça, fica a cargo das Constituições Estaduais de

cada Estado ditar as regras para a competência do mandado de injunção, conforme

artigo 125, §1˚ da Carta Maior.

Esta competência concentrada nos tribunais tinha como escopo uniformizar

critérios para acabar com as lacunas e evitar decisões diversas em mandado de

injunção. O doutrinador Uadi Lammêgo Bulos ao tratar dessa competência afirma

que seria uma temeridade dispensar o poder decisório, outorgando-o à unanimidade

dos membros do Poder Judiciário.87

Apesar de ser assunto que não exige maiores discussões, vale salientar o

posicionamento do Supremo Tribunal Federal para a estipulação dessas

competências. A Corte Suprema acompanha o entendimento encabeçado pelo Min.

Moreira Alves que define esta como sendo uma competência em razão da pessoa.

Para ele:

“[…] na falta de regulamentação a que se refere o artigo 5˚, LXXI, a competência para o processamento e julgamento originários do mandado de injunção é fixada ratione personae, ou seja, em razão das condições dos Poderes, órgãos, entidades ou autoridades a que seja imputada a omissão regulamentadora, o que, segundo a técnica processual, se dá quando essas pessoas estão em causa, participando, portanto, da relação jurídica processual, na defesa do interesse jurídico”88

De qualquer maneira, as normas para competência serão sempre ditadas

em função do órgão ou autoridade responsáveis pela produção do dispositivo

regulamentador. 89

12 DECISÃO E SEUS EFEITOS

A decisão do mandado de injunção é com certeza o assunto mais discutido e

mais atual dessa garantia constitucional. Antes de analisar os seus efeitos, temos

87 BULOS, op. cit., p. 605. 88 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de Injunção n. 107. (Questão de ordem),

Rel. Min. Moreira Alves, RTJ, 133:11, 1990. Com posicionamento contrário, Jorge Hage in Omissões Legislativas, p. 137: a competência para processar e julgar mandado de injunção não é em razão da pessoa (ratione personae), mas em razão da matéria (ratione materiae). Segundo ele, “é a importância e a natureza da matéria em jogo, que por isso mesmo deveria ser regulamentada por órgãos de alta estatura político-administrativa (Presidente da República, Congresso, etc.) que faz com que se defina o STF (e não outro) como sendo o órgão do Judiciário apto a suprir-lhe a falta, concedendo a ordem (mandado) para o exercício do correspondente direito, no caso concreto”.

89 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n. 176-6-PE, Rel. Min. Marco Aurélio, RT 688/215.

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que ter em mente que a decisão do mandado de injunção não é ato legislativo, mas

sim judicial, tanto que o Poder Judiciário poderá revê-la, inclusive em sede de ação

rescisória, desde que atendidos os prazos e condições legais.

Para se compreender qual posição adotar ao julgar o mandado de injunção,

temos que adentrar nas teses que abraçam os efeitos da decisão deste remédio

constitucional.

O professor paulista Alexandre de Moraes fez uma importante classificação

didática das teorias existentes na nossa doutrina e jurisprudência, vejamos:

- Geral

- Concretistas - Direta

- Individual

- Intermediária

Posições

- Não Concretista

Dessa forma, é possível classificar as diversas teses em dois grandes

grupos: concretista e não concretistas.

I - Concretista: o Poder Judiciário, por meio de uma decisão constitutiva, vai

viabilizar o exercício do direito que se encontra inexequível ante a ausência de

regulamentação. Essa teoria é subdividida em:

� Concretista Geral: além de implementar o exercício do direito

inviabilizado, sua decisão possuirá efeitos erga omnes.

� Concretista individual: diversamente da corrente anterior, a

decisão terá seu alcance restringido às partes. Essa decisão com efeito inter

partes é dividida em: a) direta: quando o provimento judicial vai ser

imediatamente viabilizado o direito; b) intermediária: a decisão, reconhecendo a

lacuna legislativa, abre prazo para que o legitimado inerte se manifeste para a

elaboração da norma regulamentadora, em não o fazendo, o Poder Judiciário

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poderá implementar as condições necessárias para que o titular da demanda

possa usufruir de seu direito.

II – Não concretista: neste caso, o Poder Judiciário, ao declarar a

inconstitucionalidade da omissão, vai tão somente comunicar ao órgão competente

para que adote as medidas necessárias à regulamentação que ora é exigida pelo

texto constitucional.

Com o passar dos anos e os novos entendimentos surgidos Supremo

Tribunal Federal com as alterações de seus membros, o writ injuncional já teve

efeitos diversos do que se pode concluir dos dias atuais. O Ministro aposentado Néri

da Silveira, em um pronunciamento em 1995, resumiu com clareza as posições

existentes naquela Corte à época:

Há, como sabemos, na Corte, no julgamento dos mandados de injunção, três correntes: a majoritária, que se formou a partir do Mandado de Injunção nº. 107, que entende deva o Supremo Tribunal Federal, em reconhecendo a existência da mora do Congresso Nacional, comunicar a existência dessa omissão, para que o Poder Legislativo elabore a lei. Outra corrente, minoritária, reconhecendo também a mora do Congresso Nacional, decide, desde logo o pedido do requerente do mandado de injunção e provê sobre o exercício constitucionalmente previsto. Por último, registro minha posição, que é isolada: partilho do entendimento de que o Congresso Nacional é que deve elaborar a lei, mas também tenho presente que a Constituição, por via do mandado de injunção, quer assegurar aos cidadãos o exercício de direitos e liberdades, contemplados na Carta Política, mas dependentes de regulamentação. Adoto posição que considero intermediária. Entendo que se deva, também, em primeiro lugar, comunicar ao Congresso Nacional a omissão inconstitucional, para que ele, exercitando sua competência, faça a lei indispensável ao exercício do direito constitucionalmente assegurado aos cidadãos. Compreendo, entretanto, que, se o Congresso Nacional não fizer a lei, em certo prazo que se estabeleceria na decisão, o Supremo Tribunal Federal, pode tomar conhecimento de reclamação da parte, quanto ao prosseguimento da omissão, e, a seguir, dispor a respeito do direito in concreto. É por isso mesmo, uma posição que me parece concilia a prerrogativa do Poder Legislativo de fazer a lei, como o órgão competente para a criação da norma, e a possibilidade de o Poder Judiciário garantir aos cidadãos, assim como quer a Constituição, o efetivo exercício de direito na Constituição assegurado, mesmo se não houver a elaboração da lei. Esse tem sido o sentido o sentido de meus votos, em tal matéria. De qualquer maneira, porque voto isolado e vencido, não poderia representar uma ordem ao Congresso Nacional, eis que ineficaz. De outra parte, em se cuidando de voto, no julgamento de processo judicial, é o exercício, precisamente, da competência e independência que cada membro do Supremo Tribunal Federal tem, e necessariamente, há de ter, decorrente da Constituição, de interpretar o sistema da Lei Maior e decidir os pleitos que lhe sejam submetidos, nos limites da autoridade conferida à Corte Suprema pela Constituição.90

90 Pronunciamento do Ministro Néri da Silveira. Ata da 7ª (sétima) sessão extraordinária do

Supremo Tribunal Federal, realizada em 16 de março de 1995 e publicada no Diário da Justiça, 04 abr. 1995, Seção I, p. 8.265 apud MORAES, A. de. Direito Constitucional. 17. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

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Como o tema exige uma análise mais minuciosa, cumpre analisar de forma

isolada cada teoria e qual se aplica melhor ao nosso ordenamento jurídico.

12.1 TEORIA NÃO CONCRETISTA

Por esta teoria, o Judiciário vai procurar incitar o Poder competente para

regular a omissão. Ele não tem competência para compelir ou obrigar o Poder

Legislativo a legislar, pode tão somente apontar a mora na elaboração da norma e

recomendar sua edição.

Caso o poder judiciário criasse a norma que obsta a fruição do direito,

estaria afrontando princípios basilares do direito constitucional, como a separação

dos poderes e a reserva legal. Tal conduta não é aceita por esta tese e também não

é compartilhada pelas demais teorias.

Para defender esta tese que é bem criticada, encontramos os dizeres de

Manoel Gonçalves Ferreira Filho, o principal partidário da teoria não concretista:

O alcance do mandado de injunção é análogo ao da inconstitucionalidade por omissão. Sua concessão leva o Judiciário a dar ciência ao Poder competente da falta de norma sem a qual é inviável o exercício de direito fundamental. Não importa no estabelecimento pelo próprio órgão jurisdicional da norma regulamentadora necessária à viabilização do direito. Aliás, tal alcance está fora da sistemática constitucional brasileira, que consagra a "separação dos poderes", não apenas pela referência contida no art. 2º, incluída entre os "princípios fundamentais" da República, mas também por ter sido ela incluída no cerne imutável da Constituição. […] Concluímos, pois, que não se pode dar ao mandado de injunção um alcance que não tem a inconstitucionalidade por omissão. Esta, que é reservada a autoridade e a entes de alta representatividade, que apenas corre perante o mais alto Tribunal do País, tem, repita-se, como consequência levar uma comunicação ao Poder competente para legislar, ou à fixação de prazo para órgão administrativo, se for o caso. O mesmo, no máximo, será o alcance do mandado de injunção.91

12.2 TEORIA CONCRETISTA

Esta posição confere ao impetrante a satisfação do que ora requer, ou seja,

oferta o direito constitucionalmente assegurado que antes lhe era restringido. Está é,

sem dúvida, a posição apoiada pela doutrina em massa e que após certa

resistência, passou a ser adotada pelo Supremo Tribunal Federal.

91 FERREIRA FILHO, M. G. Curso de direito constitucional. 24. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 315-316.

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12.2.1 Teoria concretista geral

Para esta teoria, se presente os requisitos constitucionais do mandado de

injunção, o Judiciário está autorizado a declarar a existência da omissão e

implementar o direito que era inexequível até aquele momento, dando efeito erga

omnes. Um regra de normativa geral é expedida até que a omissão seja suprida pela

autoridade competente.

Como se trata de posição que chega a exigir interpretação além dos limites

constitucionais92, poucos são os doutrinadores que a adotam. Adepto a este

entendimento, o professor Vicente Greco Filho possuía a seguinte interpretação

após a promulgação do diploma constitucional: “Restam, pois, as duas outras

hipóteses: o Supremo Tribunal Federal faz a norma ou limita-se a mandar que o

poder competente a faça. […] A solução adequada, portanto, parece a primeira,

admitida alternativa de, antes, ser dada a oportunidade para que o poder

competente elabore a norma. Se este não a fizer o Judiciário a fará para que possa

ser exercido o direito constitucional”.93

No escólio de Luciana Moessa de Souza, a posição ora discutida não chega

a romper com os limites de independência de poder protegidos pela Carta Magna.

Na sua interpretação, a regulamentação feita pelo Poder Judiciário no mandado de

injunção tem aspecto provisório, onde o magistrado atua de forma subsidiária e

autorizado pela Constituição, vejamos:

Poderíamos enumerar aqui muitas outras exceções, mas o que importa salientar, em suma, é que a concepção defendida pela terceira corrente para o mandado de injunção, ao contrário de algumas outras exceções consagradas no texto constitucional, não viola de forma alguma nenhum dos três aspectos apontados pela doutrina como essenciais a independência entre os poderes. Ademais, é preciso sublinhar que não há que falar em legislação propriamente dita ao proceder o Judiciário à regulamentação provisória de direitos constitucionais, eis que a fonte deles é a própria Constituição. […] A regulamentação provisória pelo Poder Judiciário no mandado de injunção bem se insere nesse contexto, eis que desfruta de caráter meramente subsidiário, entrando em cena somente quando deixa o Poder Legislativo de cumprir sua missão constitucional.94

92 Muitos doutrinadores entendem que a Teoria Concretista Geral afrontar a separação dos

poderes e o princípio da reserva legal. 93 GRECO FILHO, V. Tutela constitucional das liberdades. São Paulo: Saraiva, 1989, p.

183-184. 94 Cf. SOUZA, L. M. de. Normas constitucionais não-regulamentadas: instrumentos

processuais. São Paulo: RT, 2004, p. 117-118.

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Contudo, para o Min. Moreira Alves, esta posição não pode prevalecer. Ao

apresentar um dispositivo com aspectos gerais (erga omnes), o Supremo estaria

interferindo na função do Poder Legislativo, afrontando o princípio constitucional da

separação dos poderes.

Ao discorrer sobre a posição concretista geral, o paranaense Clèmerson

Merlin Clève não admite como possível a tutela com efeitos erga omnes. Afirma que

o Judiciário não possui liberdade para uma produção legislativa, sob pena de se

romper com o sistema constitucional brasileiro de organização funcional do poder:

Três foram, afinal, as soluções pensadas na doutrina. Uma primeira conferiu ao Judiciário competência para, ele próprio, em virtude da impetração e em caráter substitutivo, editar a norma faltante. […] A tese, afinal, não conseguiu sustentar-se. Com efeito, é difícil imaginar que um órgão como o Judiciário, cujos agentes não dispõem de representatividade popular, pudesse exercer a liberdade de conformação típica do Legislativo e excepcionalmente do Executivo. Aceita essa tese, decorreria como consequência a negação do sistema constitucional brasileiro de organização funcional do poder, que atribui o exercício da política, enquanto atividade de determinação do sentido para o qual se orienta a ação estatal, ao Executivo e ao Legislativo. Não se quer, com isso, afirmar que o Judiciário seja “apolitizado” ou que não faça política. É que a política do Judiciário está jurisdicionalizada, não sendo, portanto, capaz de realizar o tipo de atividade prospectiva intimamente vinculada à dinâmica do livre jogo das forças políticas. A “política” eventualmente exercida pelo Judiciário não tem, portanto, o condão de fixar o vetor que determina o sentido da ação particular ou global do Estado.95

A constitucionalista Flavia Piovesan também rechaça a posição concretista

geral:

Ao pretender que no mandado de injunção seja elaborada a norma regulamentadora faltante de modo a suprir a omissão do legislador, a primeira corrente não pode ser admitida. Caso contrário, importaria em converter o mandado de injunção, de instrumento de tutela de direito subjetivo em instrumento de tutela de direito objetivo. Já se disse que, ante a Carta de 1988, em caso de omissão inconstitucional, constitui a ação direta de inconstitucionalidade por omissão instrumento de defesa de direito objetivo. Isto é, enquanto esta ação apresenta por objeto a ordem jurídica lacunosa propriamente dita, o mandado de injunção tem por objeto o direito subjetivo, que se encontra violado no caso concreto, posto que inviabilizado por falta de regulamentação. Se assim o é, não seria razoável que o Poder Judiciário elaborasse norma geral e abstrata, quando da apreciação de um caso concreto cujo pedido é a restauração de direito subjetivo violado. Não condiz com a finalidade de um instrumento de tutela de direito subjetivo, o intuito de sanear vícios da ordem jurídica, ou seja, do direito objetivo.96

95 CLÈVE, C. M. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. 2. ed.

rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2000, p. 375-376. 96 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 148-149.

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Mesmo com este conflito doutrinário, o Pretório Excelso, ao discutir o direito

de greve dos servidores públicos civis, conferiu efeito erga omnes aos mandados de

injunção que tratavam do tema. Mais adiante analisaremos cada um.

12.2.2 Teoria Concretista Individual Direta

Esta teoria pode ser considera uma das mais defendidas pela nossa

doutrina. Seguindo sua proposta, ao julga procedente o mandado de injunção, o

Supremo implementa a eficácia da norma constitucional ao autor, sendo que os

efeitos do seu veredito vão se limitar as partes do processo, não trazendo uma

solução de continuidade para o restante da sociedade.97

Para os seus defensores, o impetrante do writ não visa edição de uma

norma, mas sim uma decisão que traga a solução para o seu caso concreto.

Trata-se de uma decisão de natureza constitutiva com seus efeitos

vinculados apenas às partes, ou seja, vale apenas para aquele caso concreto. Nas

sábias palavras de Luis Roberto Barroso encontramos amparo para esse

entendimento:

Coerente com a posição doutrinária aqui sustentada, afigura-se melhor a orientação que identifica no provimento judicial na espécie uma natureza constitutiva, devendo o juiz criar a norma regulamentadora para o caso concreto, com eficácia inter partes, e aplicá-la, atendendo, quando seja o caso, à pretensão veiculada. Este caráter constitutivo, porém, só se verifica no plano de criação da normatividade ausente, pois o mandado de injunção tem nítido caráter instrumental.98

O professor mineiro Marcelo Cattoni aborda de forma cristalina o alcance da

decisão:

Com tais afirmações, podemos dizer, então, que a atividade realizada pelo Poder Judiciário, em sede de Mandado de Injunção, não deve ser compreendida, como foi por parte da doutrina, como sendo legislativa, mas de regulamentação, e regulamentação para o caso concreto. Tal atividade não deve ser, portanto, compreendida como sendo de justificação, mas de aplicação do Direito. Diante disso, garantir processualmente através do Mandado de Injunção, o exercício de direitos constitucionais, cujo exercício esta inviabilizado por falta de

97 BULOS, Uadi Lammêgo.Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008,

p. 606. 98 BARROSO, L. R. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 6. ed. atual. Rio

de Janeiro: Renovar, 2002, p. 259-260.

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norma regulamentadora, consiste em aplicar diretamente a norma constitucional definidora de um direito a um caso concreto, estabelecendo como esse direito deverá ser exercido.99

No escólio de Flávia Piovesan:

Neste enfoque interpretativo, o mandado de injunção é instrumento apto a viabilizar, no caso concreto, o exercício de direitos, liberdades ou prerrogativas constitucionais, que se encontrem inviabilizados por faltar norma regulamentadora. Isto é, em face de um direito subjetivo constitucional, cujo exercício se ache tolhido pela ausência de norma regulamentadora, caberá ao titular deste direito, pela via do mandado de injunção, postular ao Poder Judiciário a edição de decisão saneadora da omissão, para que se concretize o exercício do direito subjetivo constitucional.100

Com isso, comprometido com o sistema jurídico, o Poder Judiciário tem a

oportunidade ímpar de poder exercitar uma interpretação inovadora, antecipada e

criativa de um dispositivo constitucional e garantir a satisfação do impetrante para

concretizar seu direito antes inviabilizado.

12.2.3 Teoria Concretista Individual Intermediária

Pela posição concretista individual intermediária, o Judiciário, ao julgar

procedente o mandado de injunção, abre prazo para que o órgão legislativo inerte se

manifeste no sentido de elaborar a norma faltante dentro de um prazo determinado.

Se ainda assim não o fizer, fica o impetrante assegurado da plenitude do exercício

do seu direito.

O mestre constitucionalista Uadi Lammêgo Bulos assim interpreta: […] Esse é o melhor entendimento da matéria. Ao mesmo tempo que mantém intacto o princípio da separação dos Poderes (CF, art. 2˚), confere utilidade ao mandado de injunção (CF, art. 5˚, LXXI), assegurando, ainda, a inafastabilidade do controle judicial na resolução de conflitos (CF, art. 5˚, XXXV). Ademais, permite que os cidadãos exerçam a plenitude dos seus direitos constitucionais, obstaculizados pela inércia inconstitucional do Poder Público.101

No Supremo Tribunal Federal, o ex-Ministro Neri da Silvéria foi quem

encabeçou esta posição. Desta feita, entendeu que a viabilização do direito

99 CATTONI, M. Direito processual constitucional. Belo Horizonte: Mandamentos, 2001, p.

275. 100 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 157.

101 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 606.

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constitucional só poderia ocorrer após o descumprimento do prazo pré-estipulado

para o saneamento da lacuna legislativa.

Acompanhe seu voto no MI-369/DF:

[…] O mandado de injunção é, assim, procedente, quanto ao Congresso Nacional, pela omissão verificada na elaboração da lei. Julgo, no particular, procedente o mandado de injunção, assinando ao Congresso Nacional o prazo de seis meses para que a lei se elabore. Vencido esse prazo, sem que o Congresso Nacional haja criado a disciplina regulamentadora do art. 7˚, XXI, da Constituição, asseguro, desde logo, ao requerente pedir, no Juízo trabalhista competente, o que entender como devido, a título de aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, integrada, então, a relação processual pela ex-empregadora, Companhia Brasileira de Trens Urbanos, cabendo à Justiça do Trabalho fixar o “quantum”, como julgar de direito, diante do disposto na regra maior aludida aos fatos.102

Esse posicionamento prevaleceu em alguns julgados do Supremo Tribunal

Federal como no MI-232/RJ: sob pena de, vencido esse prazo, sem que essa

obrigação se cumpra, passar o requerente a gozar da imunidade requerida; e no MI-

283/DF: se ultrapassado o prazo acima (60 dias), sem que esteja promulgada a lei,

reconhecer ao impetrante a faculdade de obter, contra a União, pela via processual

adequada, sentença líquida de condenação à reparação constitucional devida, pelas

perdas e danos que se arbitrem.

13 EVOLUÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO NO SUPREMO TRIBU NAL

FEDERAL

O primeiro writ injuncional que o STF teve a oportunidade de apreciar foi em

novembro de 1989 (MI 107). O impetrado, um Oficial do Exército buscava

regulamentação sobre a duração dos serviços temporários, matéria que de acordo

com a Carta Magna, deveria ter sido encaminhada pelo Presidente da República ao

Congresso Nacional para apreciação. Naquela época, a Suprema Corte restringiu

sua jurisprudência no sentido de que deveria limitar-se a constatar a

inconstitucionalidade da omissão e dar ciência ao legislador para que o mesmo

102

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n.369-6/DF, Rel. Min. Francisco Rezek. Diário de Justiça da União, 26 fev. 1993.

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empreendesse as medidas requeridas,103 típica característica da teoria não

concretista.

O ex-Ministro Moreira Alves também coadunou com essa teoria quando foi

relator do MI-107-DF:

O mandado de injunção é ação outorgada a titular de direito, garantia ou prerrogativa dos quais o exercício está inviabilizado pela falta de norma regulamentadora; é ação que visa obter do Poder Judiciário a declaração de inconstitucionalidade desta omissão se estiver caracterizada a mora em regulamentar por parte do Poder, órgão, entidade ou autoridade de que ela dependa, com a finalidade de que se lhe dê ciência dessa declaração, para que adote as providências necessárias, à semelhança do que ocorre com a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, §2.˚, da Carta Magna)104.

Por conseqüência desta decisão, muitas criticas surgiram pelo fato do

mandado de injunção ter seus efeitos equivalentes ao da ação direta de

inconstitucionalidade por omissão, o que acabava por não dar sentido a sua

existência.

Na esteira do conhecimento de José Afonso do Silva extraímos:

[O mandado de injunção] Não visa obter a regulamentação prevista na norma constitucional. Não é função do mandado de injunção pedir a expedição da norma regulamentadora, pois ele não é sucedânio da ação de inconstitucionalidade por omissão (art. 103, §2˚). É equivocada, portanto, data vênia, a tese daqueles que acham que o julgamento do mandado de injunção visa à expedição de norma regulamentadora do dispositivo constitucional dependente de regulamentação, dando a esse remédio o mesmo objeto da ação de inconstitucionalidade por omissão. Isso quer apenas dizer que o mandado de injunção não passaria de ação de inconstitucionalidade por omissão subsidiária, a dizer: como os titulares dessa ação (art. 103) se omitiram no seu exercício, então fica deferido a qualquer interessado o direito de utilizar o procedimento injuncional para obter aquilo que primeiramente ocorria àqueles titulares buscar. A tese errônea e absurda, porque: (1) não tem sentido a existência de dois institutos com o mesmo objetivo e, no caso, de efeito duvidoso, porque o legislador não fica obrigado a legislar; (2) o constituinte, em várias oportunidades na elaboração constitucional, negou ao cidadão legitimidade para a ação de inconstitucionalidade; por que teria ele que fazê-lo por vias transversas; (3) absurda mormente porque o impetrante de mandado de injunção, para satisfazer seu direito (que o moveu a recorrer ao Judiciário), precisaria percorrer duas vias: uma, a do mandado de injunção, para obter a regulamentação que poderia não vir; especialmente se ela dependesse de lei, pois o legislativo não pode ser constrangido a legislar; admitindo que obtenha a regulamentação, que será genérica, impessoal, abstrata, vale dizer, por si, não satisfatória de direito concreto; a segunda via é que, obtida a regulamentação, teria ainda que reivindicar sua aplicação em seu favor, que, em sendo negada, o levaria outra vez ao

103 MENDES, Gilmar Ferreira, et al. Curso de direito constitucional. 2. ed. rev. e atual. São

Paulo: Saraiva, 2008, p. 1.208-1.209. 104 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n. 107-7-DF. Relator Min.

Moreira Alves. Diário de Justiça da União, 21 set. 1990.

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Judiciário para concretizar seu interesse, agora por outra ação porque mandado de injunção não caberia.105

Em sua obra A aplicação imediata dos direitos e garantias individuais, João

Pedro Gebran Neto nos coloca diante dos ensinamentos da professora Regina

Ferrari:

Criticando a escolha do Tribunal Excelso, assinala Regina Maria Macedo Nery Ferrari que o fato de dar ciência ao Poder competente para a edição da norma é ato de reduzida valia jurídica, porque não cria nenhum tipo de vínculo obrigacional, mas apenas um efeito moral e político.106

Pode-se concluir então que este não era o efeito desejado pelo legislador

constitucional quando criou a garantia injuncional. Obviamente, não iria desenvolver

dois institutos para o mesmo objetivo. Neste sentido, Flávia Piovesan:

Inconcebível é admitir que, no julgamento do mandado de injunção, o Poder Judiciário declare inconstitucional a omissão e dê ciência ao órgão competente para a adoção das providências necessárias à realização da norma constitucional. Caso contrário, estar-se-ia a atribuir ao mandado de injunção idêntica finalidade à da ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Inexistiria a distinção entre a finalidade do mandado de injunção e a finalidade da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, nos moldes em que é prevista pelo art. 103, §2˚, do texto constitucional. Ora, faltaria qualquer razoabilidade ao constituinte se criasse dois instrumentos jurídicos com idêntica finalidade. A duplicidade de instrumentos jurídicos afastaria a logicidade e coerência do sistema constitucional, mesmo porque não haveria sentido em centrar a legitimidade ativa no caso de ação direta de inconstitucionalidade por omissão nos entes elencados pelos incs. I a IX do art. 103 e, ao mesmo tempo, admitir a ampla legitimidade do mandado de injunção, que pode ser impetrado por qualquer pessoa, se ambos instrumentos apresentassem idênticos efeitos.107

Sob este mesmo prisma, Luís Roberto Barroso despeja sua critica ao

julgado da época: “Assim, de acordo com a interpretação da Suprema Corte, há dois

remédios constitucionais para que seja dada ciência ao órgão omisso do Poder

Público, e nenhum para que se componha, em via judicial, a violação do direito

constitucional pleiteado”.108

105 SILVA, J. A. da. Curso de direito constitucional positivo. 22. ed. rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2003, p. 448-449. 106 GEBRAN NETO, J. P. A aplicação imediata dos direitos e garantias individuais: a busca

de uma exegese emancipatória. São Paulo: RT, 2002, p. 169. 107 PIOVESAN, Flávia. Proteção judicial contra omissões legislativas: ação direta de

inconstitucionalidade por omissão e mandado de injunção. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2003, p. 150-151.

108 BARROSO, op cit. p. 262.

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Diante das fortes críticas sobre a inefetividade do instituto injuncional, o

Supremo Tribunal Federal passou a rever suas decisões e dar novos efeitos a esta

tutela constitucional das liberdades. Sem assumir um compromisso com a típica

atividade legislativa, aquela Corte afastou sua orientação inicial para buscar mais

efetividade das decisões proferidas em mandado de injunção.

Como exemplo de transição, podemos citar o MI-283 de relatoria do Min.

Sepúlveda Pertence, que, pela primeira vez, estipulou prazo para sanar a lacuna

regulamentar sob pena de garantir a satisfação do direito ora inexequível ao

prejudicado: “Mandado de Injunção: mora legislativa na edição da lei necessária ao

gozo do direito à reparação econômica contra a União, outorgado pelo art. 8˚, §3˚,

ADCT; deferimento parcial, com estabelecimento de prazo para purgação da mora e,

caso subsista a lacuna, facultando ao titular do direito obstado a obter, em juízo,

contra a União, sentença líquida de indenização por perdas e danos”.109

Logo após, veio o MI-232 de relatoria do Min. Moreira Alves. Seguindo a

mesma linha, a Corte reconheceu que, passados seis meses da inércia do Poder

Legislativo para edição da lei referida no art. 195, §7˚, CF/88, o impetrante passaria

a gozar a imunidade requerida:

Mandado de injunção. - Legitimidade ativa da requerente para impetrar mandado de injunção por falta de regulamentação do disposto no par. 7. do artigo 195 da Constituição Federal. Ocorrência, no caso, em face do disposto no artigo 59 do ADCT, de mora, por parte do Congresso, na regulamentação daquele preceito constitucional. Mandado de injunção conhecido, em parte, e, nessa parte, deferido para declarar-se o estado de mora em que se encontra o Congresso Nacional, a fim de que, no prazo de seis meses, adote ele as providencias legislativas que se impõem para o cumprimento da obrigação de legislar decorrente do artigo 195, par. 7., da Constituição, sob pena de, vencido esse prazo sem que essa obrigação se cumpra, passar o requerente a gozar da imunidade requerida.110

O Ministro Relator Marco Aurélio, no MI-284, sabiamente reconheceu que a

mora legislativa extrapolava os limites aceitáveis para produção do ato normativo e

conferiu direito à reparação econômica aos impetrantes:

O novo "writ" constitucional, consagrado pelo art. 5., LXXI, da Carta Federal, não se destina a constituir direito novo, nem a ensejar ao Poder Judiciário o anômalo desempenho de funções normativas que lhe são institucionalmente estranhas. O mandado de injunção não e

109 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n. 283/DF. Rel. Min.

Sepúlveda Pertence. Diário de Justiça da União, 14 nov. 1991. 110 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n. 232/RJ. Rel. Min. Moreira

Alves. Diário de Justiça da União, 27 mar. 1992.

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o sucedâneo constitucional das funções político-jurídicas atribuídas aos órgãos estatais inadimplentes. A própria excepcionalidade desse novo instrumento jurídico "impõe" ao Judiciário o dever de estrita observância do princípio constitucional da divisão funcional do poder. Reconhecido o estado de mora inconstitucional do Congresso Nacional - único destinatário do comando para satisfazer, no caso, a prestação legislativa reclamada - e considerando que, embora previamente cientificado no Mandado de Injunção n. 283, rel. Min. Sepúlveda Pertence, absteve-se de adimplir a obrigação que lhe foi constitucionalmente imposta, torna-se "prescindível nova comunicação a instituição parlamentar, assegurando-se aos impetrantes, "desde logo", a possibilidade de ajuizarem, "imediatamente", nos termos do direito comum ou ordinário, a ação de reparação de natureza econômica instituída em seu favor pelo preceito transitório.111

Com essas decisões, o Supremo Tribunal Federal começou a dar sinais de

uma nova interpretação ao instituto do mandado de injunção. Conferia-se aos

impetrantes uma reparação concreta, sem adotar uma postura legislativa.

Preservava-se a separação dos poderes e, ao mesmo tempo, consagrava a

efetividade das normas constitucionais.

De conteúdo mais recente e polêmico, o Pretório Excelso julgou o MI-670/ES

(Rel. para o acórdão Min. Gilmar Mendes), MI-708 (Rel. Min. Gilmar Mendes) e o MI-

712/PA (Rel. Min. Eros Grau). Dispondo sobre o mesmo assunto, foram propostas

as mesmas soluções para os referidos writs injuncionais que buscavam uma solução

para a omissão inconstitucional do direito de greve dos servidores públicos civis.

Assim, no dia 25 de outubro de 2007, o Supremo Tribunal Federal concedeu

efeito concretista geral (erga omnes) para regulamentar aos servidores públicos civis

o direito de greve com base na legislação de greve da iniciativa privada (Lei n.

7.783/89). Veja parte da ementa do MI-670/ES:

Mandado de injunção. Garantia fundamental (CF, art. 5º, inciso LXXI). Direito de greve dos servidores públicos civis (CF, art. 37, inciso VII). Evolução do tema na jurisprudência do supremo tribunal federal (STF). Definição dos parâmetros de competência constitucional para apreciação no âmbito da justiça federal e da justiça estadual até a edição da legislação específica pertinente, nos termos do art. 37, VII, da CF. Em observância aos ditames da segurança jurídica e à evolução jurisprudencial na interpretação da omissão legislativa sobre o direito de greve dos servidores públicos civis, fixação do prazo de 60 (sessenta) dias para que o congresso nacional legisle sobre a matéria. mandado de injunção deferido para determinar a aplicação das leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989. […] Mandado de injunção conhecido e, no mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis.112

111 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n. 284/DF. Rel. Min. Marco

Aurélio. Diário de Justiça da União, 26 jun. 1992. 112 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n. 670/ES. Rel. Min. Gilmar

Mendes. Diário de Justiça Eletrônico-206, 31 out. 2008.

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Uma das ultimas matérias a respeito do mandado de injunção abordada pelo

Supremo Tribunal Federal (até a presente data de conclusão deste trabalho) foi

sobre o direito de aposentadoria especial pelos servidores públicos pertencentes ao

Regime Jurídico Único (Lei nº. 8.112/90).

Conforme decisão proferida no MI-880 do Ministro Eros Grau, foi acolhido o

referido writ que declarou a inércia legislativa para regulamentar o direito à

aposentadoria especial e conversão do tempo de serviço em condições insalubres,

perigosas e penosas após a edição da Lei nº. 8.112/90 para diversas confederações

sindicais de servidores públicos.113

Com isso, fica autorizada a aplicação da Lei nº 8.213/1997 – que se refere

aos direitos dos trabalhadores do setor privado, adstritos ao Regime Geral de

Previdência Social (INSS) - até que lei específica dos servidores federais seja

editada. Acompanhe parte da decisão monocrática do Min. Eros Grau:

No mandado de injunção o Poder Judiciário não define norma de decisão, mas enuncia a norma regulamentadora que faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito da impetrante, servidora pública, à aposentadoria especial. Na Sessão do dia 15 de abril passado, seguindo a nova orientação jurisprudencial, o Tribunal julgou procedente pedido formulado no MI n. 795, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, reconhecendo a mora legislativa. Decidiu-se no sentido de suprir a falta da norma regulamentadora disposta no artigo 40, § 4º, da Constituição do Brasil, aplicando-se à hipótese, no que couber, disposto no artigo 57 da Lei n. 8.213/91, atendidos os requisitos legais.114

Com essas ultimas decisões, pode-se avaliar que o mandado de injunção

obteve uma grande evolução. A maturidade alcançada após muitos anos de conflitos

jurisprudenciais e doutrinários pode ser atribuída à oxigenação dos membros da

Corte Maior de Justiça, aliada a uma inércia que paira nebulosamente sobre as

autoridades e estas não quisesse enxergar certas omissões que são de sua

competência. Nas palavras do Ministro Gilmar Mendes, a não atuação do Tribunal

até aquele momento estava se transformando em uma omissão judicial. Fato esse

113 Precedente: MI-721/DF. Relator o Min. Marco Aurélio. Diário de Justiça da União 30 nov.

2007. Assegurou idêntica garantia a uma servidora da área de saúde que teve a aposentadoria negada por falta de regulamentação do dispositivo constitucional que permite a aposentadoria especial no caso de trabalho insalubre e de atividades de risco.

114 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de injunção n. 880/DF. Min. Eros Grau. Decisão transitada em julgado em 11 set. 2009, ainda não publicada. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2634230. Acesso em 10 abr. 2010.

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que ensejou um acertado posicionamento mais firme dos magistrados

constitucionalistas.

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14 CONCLUSÃO

Após toda essa explanação acerca do mandado de injunção, algumas

considerações finais podem ser extraídas.

A finalidade do mandado de injunção é suprir a omissão do legislador

infraconstitucional na edição de suas normas de eficácia limitada. Com essa idéia,

será cabível sempre que a falta de norma regulamentadora inviabilize um direito que

esteja assegurado por qualquer dispositivo da Constituição.

Seu campo material, contudo, é limitado. A omissão deve ser de tal forma

que torne inexequível o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das

prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Assim, não se

trata de atacar qualquer omissão, mas aquelas que importem nessas

consequências.

Deve ser impetrado sempre pelo interessado, sendo acatado pelo Supremo

Tribunal Federal a representatividade pelo Ministério Público ou de impetração por

sindicato, caso que constitui o mandado de injunção coletivo. Essa legitimação é

aceita pelo Pretório Excelso em analogia ao mandado de segurança coletivo.

Ainda se baseando nessa analogia, o Supremo entende que o mandado de

injunção é auto-aplicável e, para o rito procedimental, no que couber, é utilizada lei

do mandado de segurança . Aqui deve ser feita uma observação no tocante a

publicação da nova lei do mandado de segurança (Lei n. 12.016/09), até o momento

nenhum questionamento foi levantado quanto a não aplicabilidade dessa nova

legislação ao mandado de injunção, fato este que enseja a permanência da

analogia.

Quanto ao pólo passivo da demanda, ficou estabelecida a impossibilidade de

configuração do litisconsórcio ao se referir à pessoa privada. A restrição ganha

sentido uma vez que a tarefa de elaboração da norma regulamentadora só pode ser

realizada pelas pessoas que possuem competência para tanto.

No que se refere a sua decisão, pode-se aduzir que nossa mais alta Corte

alterou os efeitos dado a este remédio constitucional.

Após o momento inicial de rejeição do novo dispositivo trazido na Carta

Maior, o Supremo Tribunal Federal, com sua nova composição, quedou-se à crítica

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dos doutrinadores e a discordância que assolava os Tribunais Inferiores e passou a

dar força constitutiva em suas decisões, agora adotando a posição concretista.

Essa evolução jurisprudencial é de grande valia para o nosso ordenamento

jurídico, uma vez que atribuiu ao mandado de injunção a sua verdadeira vocação, o

de dar efetividade as normas constitucionais para a construção de um ordenamento

legal mais justo e democrático.

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