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7/26/2019 O Novo Aluno Do Ensino Superior Em Um Contexto Neoliberal
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PRISCILA PEREIRA SILVA
O NOVO ALUNO DO ENSINO SUPERIOR EM UMCONTEXTO NEOLIBERAL
CAMPINAS2014
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RESUMO
A pesquisa que deu origem ao presente trabalho teve como objetivo identificar o perfil do novo
aluno do Ensino Superior diante de um contexto neoliberal. A investigao foi desenvolvida apartir de uma anlise bibliogrfica, disponibilizada nos captulos iniciais, fundamentando otrabalho de campo, que apresentado no captulo IV. A metodologia utilizada foi a abordagemqualitativa-quantitativa, possibilitando que a anlise fosse realizada a partir de informaesobjetivas e de dados qualitativos. Quanto s informaes objetivas, foram utilizados os elementosdisponveis no banco de dados da mantenedora das instituies pesquisadas e o resultado doquestionrio aplicado, e, sobre os dados qualitativos, foram obtidos atravs da anlise documentale de entrevistas, realizadas a partir da Tcnica de Grupos Focais. Nos captulos I e II do trabalho, apresentada uma reviso da literatura sobre o Ensino Superior, momento em que foicontextualizado o seu desenvolvimento no pas, e o papel assumido pelo Estado nesse processo.Nesse histrico, aborda-se a expanso ocorrida no Ensino Superior desde o perodo colonial at a
primeira dcada dos anos 2000, e enfatiza-se o crescimento que se deu a partir dos anos 90(perodo marcado pelo cenrio neoliberal) e a ocorrncia de sua elitizao no pas, ficandodemonstrado o carter excludente de nossa sociedade. No captulo III, discute-se o processo deelitizao e excluso no acesso ao Ensino Superior, com destaque para as dificuldadesenfrentadas pelos jovens oriundos de famlias que possuem um baixo poder aquisitivo. Nessecontexto neoliberal, buscou-se delinear o perfil desse novo aluno, que diferente dascaractersticas dos estudantes que historicamente frequentam o Ensino Superior. Para o trabalhode campo, cujos resultados esto reunidos no captulo IV, foram escolhidas 03 (trs) unidadeseducacionais de uma das maiores mantenedoras de Instituies de Ensino Superior do pas.Quanto aos estudantes, foram selecionados os alunos matriculados no Curso de Tecnologia emGesto de Recursos Humanos que ingressaram nas instituies atravs de Financiamento
Estudantil (Fies), e/ou do Programa Universidade para Todos (ProUni). Neste captulo, alm deum breve histrico das instituies, apresenta-se e discute-se o resultado que se obteve atravs dobanco de dados da mantenedora, de documentos institucionais, da aplicao dos questionrios erealizao das entrevistas, possibilitando apresentar as caractersticas que compem o perfil donovo aluno do Ensino Superior, situado em um contexto neoliberal, bem como indicar asinstituies e os cursos que frequenta. Nas Consideraes Finais, retoma-se a contextualizao docenrio que dificultou o acesso dos jovens de baixo poder aquisitivo ao Ensino Superior, ecomprova-se que a ampliao desse acesso provocou novas desigualdades entre as diferentesclasses sociais, atravs da adoo de mecanismos que mantm as caractersticas de umasociedade capitalista.
Palavras chaves:Ensino Superior; Neoliberalismo; Elitizao do ensino; Aluno novo.
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ABSTRACT
The research that led to this study aimed to identify the profile of the new student of HigherEducation before a neoliberal context. The research was developed from a literature review ,released in the early chapters , supporting the field work , which is presented in Chapter IV . Themethodology was qualitative - quantitative approach , enabling the analysis was performed basedon objective information and qualitative data . As for objective information elements availablewere used in the database of the sponsor of the institutions surveyed and the results of thequestionnaire , and the qualitative data were obtained through document analysis and interviews,conducted from the Technical Focus Group . Chapters I and II of the study, a literature review onHigher Education , when it was contextualized their development in the country , and the role ofthe State in this process is presented . In this history , discusses the expansion occurred in highereducation from the colonial period until the first decade of the 2000s , and emphasizes the growththat occurred from the '90s ( a period marked by neoliberal scenario) and the occurrence of itselitism in the country, being shown the exclusionary character of our society . Chapter IIIdiscusses the process of elitism and exclusion in access to higher education , highlighting thedifficulties faced by young people from families that have a low income. In this neoliberalcontext, we sought to delineate the profile of this new student , which is different from thecharacteristics of students who attend historically higher education . For field work , whoseresults are shown in Chapter IV , 03 were chosen (three) educational units of one of the largestsponsors of Higher Education Institutions in the country . As students , we selected studentsenrolled in the College of Technology in Human Resource Management in the institutions thatentered through Financial Aid ( FIES ) , and / or the University for All Program ( Prouni ) . In thischapter , including a brief history of institutions , presents and discusses the results to be obtainedthrough the database of the sponsor , institutional documents , the questionnaires and interviews,enabling characteristic that comprise the profile of the new student of higher education , located
in a neoliberal context , as well as state institutions and the courses they attend . Final Thoughtson resumes to contextualize the scenario that hindered the access of young people from lowincome to higher education , and proves that the expansion of such access brought newinequalities between different social classes , by adopting mechanisms that maintains thecharacteristics of a capitalist society .
Keywords:Higher Education, Neoliberalism; Elitism of education; New Student.
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SUMRIO
RESUMO ............................................................................................................................... vii
ABSTRACT .......................................................................................................................... viii
AGRADECIMENTOS .......................................................................................................... xiii
LISTA DE QUADROS E TABELAS .................................................................................... xv
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ............................................................................ xvii
INTRODUO ..................................................................................................................... 1
CAPTULO I ENSINO SUPERIOR NO BRASIL: DA COLNIA TRANSIOAOS GOVERNOS ELEITOS DEMOCRATICAMENTE ....................................................
17
1.1 Incio do Ensino Superior no Brasil .................................................................... 17
1.2 O Ensino Superior nas primeiras dcadas da Repblica ..................................... 19
1.3 O Ensino Superior de 1930 transio aos governos eleitosdemocraticamente ................................................................................................ 221.3.1 A reforma universitria ocorrida no perodo da Ditadura Militar, e a
transio aos governos eleitos democraticamente ............................. 271.4 A elitizao e o perfil dos alunos do Ensino Superior: da Colnia transio
aos governos eleitos democraticamente .............................................................. 32
CAPTULO IIENSINO SUPERIOR NO BRASIL A PARTIR DOS ANOS 1990 ......... 432.1 Estado Neoliberal e o Ensino Superior a partir dos anos 1990 .......................... 43
2.1.1 Ensino Superior nos governos Collor e Itamar Franco .......................... 56
2.1.2 Ensino Superior no governo Fernando Henrique Cardoso ...................... 59
2.1.3 Ensino Superior no governo Luiz Incio Lula da Silva .......................... 65
2.1.3.1 O Sistema Nacional de Avaliao da Educao Superior ....... 68
2.1.3.2 A Lei de Inovao Tecnolgica ............................................... 69
2.1.3.3 A regulamentao das parcerias pblico-privadas ................. 69
2.1.3.4 O Programa de Apoio a Planos de Reestruturao dasUniversidades Federais ........................................................... 70
2.1.3.5 O Programa Universidade para Todos - ProUni................. 72
2.1.3.6 A Educao a Distancia e a Universidade Aberta do Brasil ... 75
2.1.3.7 O Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior- Fies ...................................................................................... 77
2.1.3.8 A Expanso da Rede Federal de Ensino ................................. 79
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2.2 A elitizao do Ensino Superior a partir dos anos 1990 ...................................... 82
2.3 A contribuio dos cursos de Educao Profissional Tecnolgica para ocrescimento do acesso ao Ensino Superior e para o mercado de trabalho .......... 84
CAPTULO IIIENSINO SUPERIOR, NOVAS DESIGUALDADES EDUCACIONAISE O PERFIL DE SEU NOVO ALUNO ................................................................................ 89
3.1 Ampliao do acesso ao Ensino Superior e as novas desigualdadeseducacionais: um balano crtico do perodo histrico ....................................... 89
3.2 O perfil do novo aluno do Ensino Superior: suas instituies e seus cursos .. 93
3.3 Elitizao e excluso no Ensino Superior ........................................................... 98
3.4 A construo permanente da Identidade ............................................................. 105
3.4.1 Identidade e processo de socializao ..................................................... 110
CAPTULO IVO PERFIL DO NOVO ALUNO DO ENSINO SUPERIOR, A PARTIR
DA ANLISE DE TRS IESs PRIVADAS SITUADAS NO INTERIOR DO ESTADODE SO PAULO ................................................................................................................... 117
4.1 Histrico e caracterizao da mantenedora, das IESs pesquisadas e do curso deTecnologia em Gesto de Recursos Humanos .................................................... 1214.1.1 Caracterizao da Mantenedora .............................................................. 121
4.1.2 Caracterizao do curso de Tecnologia em Gesto de RecursosHumanos .................................................................................................. 122
4.1.3 Caracterizao da IES L e de seu curso de Tecnologia em Gesto deRecursos Humanos .................................................................................. 124
4.1.4 Caracterizao da IES P e de seu curso de Tecnologia em Gesto deRecursos Humanos .................................................................................. 125
4.1.5 Caracterizao da IES I e de seu curso de Tecnologia em Gesto deRecursos Humanos .................................................................................. 127
4.2 O perfil do novo aluno do Ensino Superior, a partir da anlise das trs IESspesquisadas .......................................................................................................... 1284.2.1 Trajetria de vida, escolarizao e trabalho ............................................ 129
4.2.2 Condio de vida do novo aluno do Ensino Superior.............................. 135
4.2.2.1 Condio econmica ............................................................... 135
4.2.2.2 Condio profissional ............................................................. 137
4.2.2.3 Condio civil e familiar ......................................................... 139
4.2.2.4 Condio e tempo de estudo .................................................. 1404.2.2.5 Condio cultural .................................................................... 142
4.2.2.6 As condies de vida do novo aluno do Ensino Superior e assuas implicaes em seu desempenho acadmico................... 143
4.2.3 Escolha da instituio e do curso, sob a influncia de programasgovernamentais: estratgias ou adaptao/pragmatismo.......................... 1484.2.3.1 Significado do ProUni e do Fies para o acesso ao Ensino
Superior.................................................................................... 148
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4.2.3.2 Justificativa utilizada para escolha da instituio.................... 151
4.2.3.3 Justificativa utilizada para escolha do curso............................ 156
4.2.3.4 Nvel de satisfao com a instituio e com o curso............... 160
4.2.4 Idealizao/Projeto de Vida ..................................................................... 163
4.3 O novo aluno do Ensino Superior: seu perfil, sua instituio, seus cursos e seuprojeto de vida ..................................................................................................... 169
CONSIDERAES FINAIS ................................................................................................ 173
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS .................................................................................. 181
ANEXO IRoteiro do Questionrio .................................................................................... 193ANEXO IIRoteiro da EntrevistaGrupo Focal................................................................ 197
ANEXO IIITermo de Consentimento Livre Esclarecimento.............................................. 199
ANEXO IVDeclarao de Concordncia da Instituio Co-Participante.......................... 201ANEXO VParecer Consubstanciado ................................................................................. 203
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AGRADECIMENTOS
Agradeo, primeiramente, a Deus pelo dom da vida, por esta e todas as demais oportunidades que
me concedeu.
Ao meu orientador e professor, Dr. Jos Roberto Montes Heloani, pelos ensinamentos,
compreenso, dedicao, incentivo nas orientaes e pela oportunidade de mais uma conquista.
Aos professores Dr. Eduardo Pinto e Silva e Dr. Evaldo Piolli, presentes em minha banca de
mestrado (qualificao e defesa), pelas sugestes imprescindveis para o desenvolvimento destadissertao. Aos professores Dr. Zacarias Pereira Borges e Dr. Aparecida Antunes Mitsuko, por
aceitarem compor a suplncia na composio da banca.
A todos os professores da Faculdade de Educao da Unicamp que tive a oportunidade de
conhecer e que contriburam, direta ou indiretamente, com a minha pesquisa (nas disciplinas
cursadas e nas APPs), professores doutores Jos Roberto Montes Heloani, Evaldo Piolli, Luiz
Henrique Aguilar, Liliana Segnini, Jos Roberto Rus Perez, Elosa Hofling e Vicente Rodriguez.
Aos sujeitos desta pesquisa (alunos do curso de Tecnologia em Recursos Humanos das trs IESspesquisadas) que aceitaram discutir o tema proposto, sem os quais no seria possvel concluir este
trabalho.
Aos diretores e coordenadores do curso de Tecnologia em Recursos Humanos das trs IESs
pesquisadas, por autorizarem a realizao desta pesquisa e pela cesso de alguns documentos
institucionais.
s minhas amigas de ps-graduao, Rosely e Rafaela, pela oportunidade de compartilhar
conhecimentos, incertezas e alegrias. E em seguida foram chegando novos amigos: a Mrcia, a
Soraya, a Giseley, a Mnica, o Guilherme e a Andria.
Aos meus amigos de trabalho, pela compreenso nos momentos em que precisei me ausentar para
o desenvolvimento da pesquisa.
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Ao apoio de toda a minha famlia: meus pais (Joo e Marlene); meus irmos (Juliano e Jonathas);
minhas cunhadas (Tatiane e Caroline); a pequena e bela sobrinha (Isadora); minha sogra (Neusa)
e ao Nilson, por tudo que compartilhamos em nossas vidas.
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LISTA DE QUADROS E TABELAS
Quadro 1 - Categorias de Anlise...................................................................................... 13
Tabela 1 - Crescimento ocorrido em instituies de Ensino Superior pblicas e
privadas, no perodo de 1991 a 2010................................................................................. 82
Tabela 2 - Nmero de matrculas, por grau acadmico, modalidade de ensino e
categoria administrativa2001-2010................................................................................ 87
Tabela 3 - Nmero de matrculasingressos por processo seletivo por perodo e por
categoria administrativa2001-2010................................................................................ 88Tabela 4 - Percentual de Pessoas de 18 a 24 anos que frequentam ou j concluram o
Ensino Superior de Graduao1997-2011..................................................................... 91
Tabela 5 - Nmero de alunos matriculados na IES L, no ano de 2012 (alunos
ingressantes e veteranos)................................................................................................... 125
Tabela 6 - Nmero de alunos matriculados na IES P, no ano de 2012 (alunos
ingressantes e veteranos)................................................................................................... 126
Tabela 7 - Nmero de alunos matriculados na IES I, no ano de 2012 (alunos
ingressantes e veteranos)................................................................................................... 128
Tabela 8 - Escolaridade dos pais dos alunos com Fies e/ou com bolsa do ProUni............ 132
Tabela 9 - Renda familiar per capta dos alunos com Fies e/ou com bolsa ProUni...... 135
Tabela 10 - Atuao profissional dos alunos...................................................................... 137
Tabela 11 - Tempo semanal dedicado aos estudos............................................................. 140
Tabela 12 - Local utilizado pelos alunos para os estudos ................................................. 142
Tabela 13 - Atividades culturais frequentadas pelos alunos ............................................. 143
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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
ADS- Associaes de Docentes
ANDES- Associao Nacional dos Docentes das Instituies de Ensino Superior
ANDIFES- Associao Nacional dos Dirigentes das Instituies Federais de Ensino Superior
ATPS- Atividade Prtica Supervisionada
BIRD- Banco Internacional para Reconstruo e Desenvolvimento
CAPES- Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior
CCQ- Crculos de Controle de Qualidade
CEBRAP- Centro Brasileiro de Anlise e Planejamento
CEP- Comit de tica em PesquisaCFE- Conselho Federal de Educao
CFT- Certificados Financeiros do Tesouro
CNE- Conselho Nacional de Educao
CNI- Confederao Nacional da Indstria
CONAES- Comisso Nacional de Avaliao do Ensino Superior
DOU -Dirio Oficial da Unio
EaD- Educao a Distncia
FATEC- Faculdade de Tecnologia
FHC- Fernando Henrique Cardoso
FIES- Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior
FMI- Fundo Monetrio Internacional
FNDE- Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao
FUVEST- Fundao Universitria para o Vestibular
GERES- Grupo Executivo para a Reforma do Ensino Superior
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
ICSID- Centro Internacional para Resoluo de Disputas sobre Investimentos
IDA- Associao Internacional de Desenvolvimento
IES- Instituio de Ensino Superior
IFC- Corporao Financeira Internacional
IFET- Institutos Federais de Educao, Cincia e Tecnologia
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IFES- Instituto Federal de Ensino Superior
INED- Instituto Nacional Francs para Estudos Demogrficos
INEP- Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira
INSS- Instituto Nacional do Seguro SocialLDB- Lei de Diretrizes e Bases
MEC- Ministrio da Educao
MIGA- Agncia de Garantia de Investimentos Multilaterais
ONG- Organizao No Governamental
PCE/CREDUC- Programa de Crdito Educativo/Crdito Educativo
PIB- Produto Interno Bruto
PPC- Projeto Pedaggico de Curso
PRODEM- Programa de Desenvolvimento do Ensino Mdio e Superior de Curta Durao
PROUNI- Programa Universidade para Todos
PUC- Pontifcia Universidade Catlica
REUNIPrograma de Apoio a Planos de Reestruturao e Expanso das Universidades Federais
SELIC- Sistema Especial de Liquidao e Custdia
SESU - Secretaria de Educao Superior
SETEC- Secretaria de Educao Profissional e Tecnolgica
SINAES- Sistema Nacional de Avaliao da Educao Superior
SM- Salrio Mnimo
TCU- Tribunal de Contas da Unio
UAB- Universidade Aberta do Brasil
UNESP- Universidade Estadual Paulista Jliode Mesquita Filho
UNICAMP- Universidade Estadual de Campinas
UNIMEP- Universidade Metodista de Piracicaba
USP- Universidade de So Paulo
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INTRODUO
A histria da educao brasileira demonstra que, por muito tempo, cursar o Ensino
Superior era privilgio dos integrantes das elites sociais e econmicas, sendo dificultado e
inviabilizado o acesso de jovens de baixo poder aquisitivo, o que revela a existncia de um
quadro de elitizao nesse nvel de ensino no pas.No perodo estabelecido entre o sculo XVI ao incio do sculo XIX, a seleo para o
acesso ao Ensino Superior ficava restrita a um pequeno grupo de estudantes que cursava os
colgios brasileiros, ou seja, havia uma triagem instituda e restrita a um grupo de jovens que j
eram selecionados. Entre o incio do sculo XIX at meados do sculo XX, possvel observar
um pequeno aumento no nmero de jovens que ingressavam no Ensino Superior, ocorrendo a
entrada de estudantes oriundos das camadas da populao que possuam mdio poder aquisitivo.
Porm, o perfil do aluno que frequentava o Ensino Superior continuava elitizado, ou seja, a
maioria dos alunos pertencia s camadas da populao com alto poder aquisitivo. A partir do ano
de 1950, possvel observar um expressivo aumento na demanda pelo acesso ao Ensino Superior,
em decorrncia de medidas de incentivo escolarizao primria e secundria, instituda para que
o pas pudesse atender ao crescimento de sua populao no perodo ps-guerra, bem como ao
crescimento da indstria e da urbanizao.
Ao se considerar, nesse perodo, o total de jovens que concluam o segundo grau (e no o
total de jovens oriundos de famlias de baixa renda), possvel verificar que a instituio de
Ensino Superior acolhia um nmero significativo de jovens de baixo poder aquisitivo. Noentanto, o ingresso desses jovens ocorria em cursos noturnos de cincias humanas, para que
pudessem conciliar os seus estudos com o emprego. J os jovens oriundos das famlias da elite
econmica ingressavam em carreiras que apresentavam um maior nmero de candidatos por vaga
(SANTOS, 1998.).
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Apesar de uma pequena parte dos jovens que no integrava a elite econmica e social do
pas comear a frequentar o Ensino Superior, esse acesso ocorreu em cursos que apresentavam
um menor nmero de candidatos por vaga, sendo instituda, dessa forma, uma seletividade no
interior da universidade, ou seja, quando as camadas de menor poder aquisitivo conseguiram oacesso ao Ensino Superior, ele se deu atravs dos cursos de menor prestgio, que levavam a
menor remunerao e baixo reconhecimento social.
Almeida (2006a) reconhece que, a partir de determinado perodo histrico, no
somente a elite econmica que passa a ter acesso ao Ensino Superior, e enfatiza que a
universidade no est disponvel s camadas excludas, havendo limites na democratizao do
acesso ao Ensino Superior, sendo perceptvel a existncia de novos processos de diferenciao,
que produziram novas desigualdades educacionais, as quais passam a ocorrer, a partir desse
momento, no interior das prprias instituies.
Na expanso ocorrida no Ensino Superior a partir dos anos de 1990, houve uma forte
contribuio das instituies privadas para o atendimento do novo pblico que passa a frequentar
o Ensino Superioros jovens oriundos de famlias de baixo poder aquisitivo, cujo acesso sempre
foi dificultado. Nesse perodo, incio do governo Collor, a doutrina neoliberal passou a direcionar
a poltica do Brasil, sendo acentuada no governo FHC atravs de uma srie de reformas, que teve
como um de seus eixos centrais a privatizao (CHAVES; LIMA; MEDEIROS, 2008).
O Banco Mundial assumiu um dos principais papis no processo de reformas ocorridas
para a insero do pas na lgica neoliberal, contribuindo para a adoo de medidas que buscaram
organizar a economia e a sociedade em um Estado Mnimo (SILVA JUNIOR; SGUISSARDI,
1999). Com a finalidade de garantir a estabilidade econmica nos pases em desenvolvimento, e
declarando que o seu principal objetivo era o ataque pobreza (ALTMANN, 2002), atravs de
seus documentos, o Banco difundiu (...) uma nova orientao para a articulao entre educao e
produo do conhecimento, por meio do binmio privatizao e mercantilizao da educao
(DOURADO, 2002, p. 239). Dourado, ao analisar as orientaes gerais do Banco Mundial,conclui que a instituio, ao prescrever as polticas educacionais, induz (...) as reformas
concernentes ao iderio neoliberal, cuja tica de racionalizao do campo educativo deveria
acompanhar a lgica do campo econmico, sobretudo a partir de programas de ajuste estrutural
(2002, p. 239-240), se constituindo em um interlocutor, de importncia relevante, da poltica
macroeconmica, atuando em sintonia com o FMI - Fundo Monetrio Internacional. Dessa
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forma, observa-se que a expanso ocorrida no Ensino Superior, via instituies privadas, foi se
configurando de acordo com as propostas do Banco Mundial.
Britto (2008), ao vincular o crescimento do nmero de instituies e de estudantes do
Ensino Superior com a demanda do setor produtivo, identifica a existncia de uma subdiviso naEducao Superior, onde se tem, de um lado, as instituies pblicas, responsveis pela produo
e circulao do conhecimento acadmico e intelectual, e, de outro lado, as instituies privadas,
que passam a atender um novo aluno, advindo de uma camada social sem acesso ao Ensino
Superior. Para o autor, esse novo aluno (...) normalmente, dispe de condies de estudo
limitadas e pouca convivncia com objetos intelectuais e artsticos da cultura hegemnica
(BRITTO, 2008, p. 778). Para o autor, o Ensino Superior assume uma nova funo a partir do
ingresso desse novo pblico, estando plenamente articulada com as demandas do mercado de
trabalho, (...) englobando tanto a oferta de emprego/trabalho, como a organizao mesma do
sistema produtivo (p. 780)
Dias Sobrinho (2010) tambm analisa o crescimento ocorrido nas ltimas dcadas no
Ensino Superior, fazendo referncia existncia de instituies diferenciadas. Para o autor, as
instituies referncia em ensino e pesquisa, de forma geral, atendem os jovens provenientes de
famlias com maior renda financeira, enquanto as instituies escassas em atividades de pesquisa,
e que priorizam o preparo para o mercado de trabalho, atendem a nova populao do ensino
superior, constituda pelos jovens provenientes de famlias de baixa renda, que cursaram a
educao bsica em instituies pblicas que oferecem precrio itinerrio escolar.
Dessa forma, a significativa expanso ocorrida nos ltimos anos possibilitou que pessoas
com mdio e baixo poder aquisitivo tivessem acesso ao Ensino Superior, o que no significa a
existncia de oportunidades a todos os interessados nesse nvel de ensino, e muito menos que as
diferentes camadas da populao frequentem as mesmas instituies de ensino e os mesmos
cursos, e que desfrutem das mesmas condies para o estudo.
O acesso desse novo pblico ao Ensino Superior, que ocorreu principalmente eminstituies de ensino privadas, e que foi alavancado por programas institudos pelo poder
pblico, tais como o ProUni e o Fies, atende s novas demandas de formao dos trabalhadores,
requeridas pelo processo capitalista de produo.
Ao se considerar a existncia de alunos que ingressaram no Ensino Superior, atravs de
programas que supriram a carncia de recursos financeiros de determinada camada da populao,
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pode-se facilmente concluir que se tem, hoje, um aluno com um perfil diverso daquele que
sempre frequentou esse nvel de ensino. Esse novo aluno, que at recentemente no tinha acesso
ao Ensino Superior, pertence a um segmento social que historicamente foi tambm excludo da
convivncia com a produo cientfica, tecnolgica e cultural/artstica de nossa sociedade, o quecontribui, significativamente, para que tenha condies de estudo diferentes daquelas que so
vividas pelos alunos que integram as elites econmica e social do pas.
Essas caractersticas que integram o perfil desse aluno, interesse deste trabalho, que tem
como tema O novo aluno do Ensino Superior em um contexto neoliberal, conhecer esse
estudante para comprovao de sua origem social e conhecimento de sua condio financeira, de
suas expectativas, de seu projeto para o futuro, das dificuldades que encontra para cursar o
Ensino Superior e de suas realizaes, aps o acesso ao local que sempre foi negado a ele.
Para conhecimento do novo aluno do Ensino Superior, foram escolhidas 03 (trs) unidades
educacionais de uma das maiores mantenedoras de Instituies de Ensino Superior do pas, que
atende, em sua maioria, alunos de baixa renda, integrando, de acordo com essa caracterstica, esse
novo pblico que chegou ao Ensino Superior atravs de Financiamento Estudantil (Fies) e/ou
do Programa Universidade para Todos (Prouni).
As unidades educacionais escolhidas, situadas em uma regio do Estado de So Paulo,
foram selecionadas pelo fato de ofertarem o curso de Tecnlogo em Recursos Humanos, e por
estarem localizadas em municpios que possuem um mercado de trabalho que valoriza e requer,
em maior nmero, profissionais qualificados. A escolha do curso de Recursos Humanos se deu
pelo fato de representar um dos cursos mais procurados nos processos seletivos da instituio, e
por integrar a categoria do curso de Tecnlogos, que obteve o maior ndice de crescimento dos
ltimos anos, contribuindo efetivamente para a expanso do Ensino Superior. Outro critrio para
a escolha das IESs foi o fato de integrarem o grupo de unidades orgnicas da mantenedora. A
mantenedora divide as suas unidades em dois grupos: unidades orgnicas e unidades adquiridas.
So consideradas unidades orgnicas as que foram criadas pela prpria organizao, e unidadesadquiridas as que foram integradas em pleno funcionamento, a partir da aquisio dessas
instituies de outra mantenedora.
O conhecimento do novo aluno do Ensino Superior, objeto desta pesquisa, ocorreu a partir
dos seguintes questionamentos:
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- Quais as caractersticas do atual aluno do Ensino Superior privado (origem social,
condies financeiras, etc.)?
- Qual a importncia do Ensino Superior a esse novo aluno, e que fatores o motiva a
procurar um curso de graduao?- O que significa ao aluno e aos seus familiares o acesso ao Ensino Superior?
- Quais critrios so utilizados pelos alunos para a escolha da instituio onde cursaro o
Ensino Superior? A instituio privada foi a sua primeira opo para o ingresso no Ensino
Superior? As expectativas dos alunos com a instituio esto sendo atendidas?
- Quais critrios foram utilizados pelos alunos para a escolha do curso em que esto
matriculados? Esto satisfeitos com o curso escolhido?
- Quais as principais dificuldades encontradas pelo novo aluno do Ensino Superior para se
manter e concluir o curso de graduao?
- Qual a avaliao do aluno sobre os programas (ProUni e Fies) que possibilitaram o seu
ingresso no Ensino Superior? O que significa a esse aluno estudar com bolsa do ProUni ou com o
Financiamento Estudantil? Esse estudante j sofreu alguma discriminao na faculdade (amigos
ou instituio) por ser bolsista ProUni ou por ter aderido ao Fies?
- Quais os sonhos desse novo pblico, ou seja, qual o projeto dos novos alunos aps a
concluso da faculdade?
- Quais so as expectativas desses alunos em relao instituio em que esto
matriculados, e quais as suas principais realizaes aps o ingresso no Ensino Superior?
Como Objetivo Geral do trabalho, ficou estabelecida a inteno de se identificar o perfil
do novo aluno do Ensino Superior diante de um contexto neoliberal, bem como indicar as
instituies e os cursos que frequenta.
Quanto aos objetivos especficos, foram definidos os seguintes:- Contextualizar a Educao Superior no Brasil, bem como a elitizao/excluso do
acesso a esse nvel de ensino.
- Avaliar as polticas pblicas de ampliao do acesso ao Ensino Superior, em um
contexto capitalista/neoliberal.
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- Analisar o processo de incluso/excluso do acesso de estudantes do pas ao Ensino
Superior.
- Descrever o perfil do novo aluno do Ensino Superior, a partir de suas caractersticas,
expectativas, projetos, dificuldades encontradas, realizaes e possvel ascenso social.
Para o alcance dos objetivos propostos, foi adotado o mtodo dialtico pelo fato de
possibilitar ao pesquisador a apreenso das dimenses poltica, filosfica e material/concreta que
envolvem o seu objeto de estudo, e por lev-lo a considerar, na pesquisa, a contradio e o
conflito, o movimento histrico, o devir, a totalidade e, ao mesmo tempo, a unidade dos
contrrios (LIMA; MIOTO, 2007). Dessa forma, para a utilizao deste mtodo foi requerida
uma ampla abordagem histrica, que resultasse em uma contextualizao da temtica discutida,
possibilitando, juntamente com os dados coletados no campo emprico da pesquisa, uma anlise
que considerasse os fatores que contriburam com a construo da realidade atual do objeto
estudado.
A escolha da abordagem qualitativa-quantitativa se deu pelo fato de possibilitar a
utilizao de instrumentos das duas concepes. Santos Filho (2000) considera que a abordagem
qualitativa e a abordagem quantitativa no so incompatveis entre si, podendo ser utilizadas
pelos pesquisadores, sem que se caia na contradio epistemolgica. Para o autor, possvel se
defender que no atual estgio de desenvolvimento do conhecimento humano, e de modo especial
na rea das cincias humanas e da educao, se admita e adote a articulao e complementaridade
dos paradigmas a fim de fazer avanar o conhecimento humano (p. 54). H uma clara distino
entre os enfoques qualitativo e quantitativo, no entanto, no seria correto dizer que eles guardam
uma relao de oposio (NEVES, 1996, p. 2). Ao se adotar uma abordagem qualitativa, no se
deve (...) menosprezar a importncia dos bancos de dados, do corpo de informaes objetivas,
das estatsticas, dos estudos quantitativos (DIAS SOBRINHO, 1995, p. 67). Neves (1996, p. 2)
considera que combinar (...) tcnicas quantitativas e qualitativas torna uma pesquisa mais forte ereduz os problemas de adoo exclusiva (...) de procedimentos de uma abordagem
metodolgica.
Assim, a adoo dessa abordagemao possibilitar uma anlise dos dados obtidos atravs
de informaes objetivas (banco de dados/estatsticas e questionrio) e de informaes
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qualitativas (resultado da anlise documental e entrevista) permitiu uma complementao das
informaes, para uma melhor compreenso do fenmeno estudado.
Em relao ao banco de dados/estatsticas, foram utilizadas as informaes relativas ao
Ensino Superior, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) e do Instituto Nacionalde Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira (INEP). Tambm foi utilizado o banco de
dados disponibilizado pela mantenedora das 03 instituies adotadas como campo de pesquisa,
relativo s informaes de suas unidades e de seus alunos, gentilmente disponibilizado pela
Diretoria de Avaliao Institucional da mantenedora da instituio.
Em relao ao questionrio, foi elaborado e aplicado com o objetivo de se obter mais
informaes sobre as caractersticas dos alunos do Curso de Tecnologia em Gesto de Recursos
Humanos das trs IESs pesquisadas. A aplicao do questionrio ocorreu na prpria sala de aula
de cada uma das instituies, aps uma explicao sobre os objetivos da pesquisa e
esclarecimentos sobre o teor de cada uma das questes. Os questionrios foram respondidos por
44 alunos da instituio L (23 alunos que declararam possuir o Fies e 21 alunos que declararam
possuir bolsa de estudos do Prouni), 32 alunos da instituio P (26 alunos que declararam
possuir o Fies e 6 alunos que declararam possuir bolsa de estudos do Prouni) e 12 alunos da
instituio I (4 alunos que declararam possuir o Fies e 8 alunos que declararam possuir bolsa de
estudos do Prouni).
Quanto anlise documental, foram objetos de estudos o Regimento e o Projeto
Pedaggico do Curso de Tecnologia em Gesto de Recursos Humanos das unidades envolvidas.
No que se refere entrevista1, considerada por Minayo (2009, p. 65) como a estratgia
mais utilizada no trabalho de campo. Para citar a utilizao da entrevista em algumas
modalidades de pesquisa, a autora afirma que por meio de entrevistas que realizamos
pesquisas baseadas em narrativas de vida, igualmente denominadas histrias de vida, histrias
biogrficas, etnografias ou etno-histrias. Heloani e Capito (2007, p. 29-30) consideram
que a histria de vida constitui-se em uma estratgia com eficcia para se estudar a (...)identidade individual de uma pessoa em sua totalidade concreta, em suas mltiplas
determinaes, considerando-se suas relaes sociais, seu processo de desenvolvimento, atrelado
s condies histricas e em que vive, seus grupos de pertencimento.
1Para Heloani e Capito (2007, p. 27), (...) a entrevista pode ser um instrumento extremamente til, seja na formalivre, semi-estruturada, ou mesmo dirigida.
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A entrevista tambm utilizada em Estudo de Caso2, referido por Heloani e Capito
(2007, p. 33) como (...) uma experincia singular, escrito por um pesquisador para registrar seu
encontro com uma pessoa e demonstrar certos arranjos tericos. Os autores consideram que o
Estudo de Caso pode ser o relato de uma nica entrevista, ou do desenvolvimento de todo umprocesso de acompanhamento longitudinal (...) (HELOANI; CAPITO, 2007, p. 33, grifos
nossos).
Alm dessas modalidades, Minayo (2009) apresenta os grupos focais como uma
modalidade de entrevista que ocorre em grupo, que possibilita o confronto das falas de uns com
os outros. Dessa forma, alm da entrevista individual, uma tcnica cada vez mais usada no
trabalho de campo qualitativo a dos grupos focais... (MINAYO, 2009, p. 68), modalidade
adotada nesta pesquisa.
A principal diferena entre uma entrevista individual e a entrevista obtida mediante o
Grupo Focal que a segunda tem como base a interao que ocorre entre as pessoas do grupo,
para que se obtenham as informaes requeridas pela pesquisa. Trad (2009), baseando-se em
Morgan (1992), afirma que uma das vantagens do grupo a menor possibilidade de que se
forneam respostas prontas pelos informantes, ao contrrio do que ocorre com as entrevistas
individuais. Em um grupo, pode-se considerar que os participantes se sentem livres para revelar
a natureza e as origens de suas opinies sobre determinado assunto, permitindo que
pesquisadores entendam as questes de forma mais ampla (BARBOUR, 2009, KITZINGER,
1999 e TEMPLETON, 1994, apud TRAD, 2009, p. 790).
Caplan (1990) considera como grupos focais pequenos grupos de pessoas que so
reunidos para avaliao de conceitos ou identificao de problemas. Kitzinger (2000), citado por
Trad (2009), define grupo focal como uma modalidade de entrevistas com grupos de pessoas, que
tem como base a comunicao e a interao, e, como objetivo principal, agrupar informaes
minuciosas sobre um tema especfico a partir de um grupo de pessoas selecionadas. O
pesquisador, moderador ou coordenador do grupo procura coletar as informaes do temasugerido, de forma que possa compreender as percepes, as atitudes e as crenas dos
participantes, em relao ao que est sendo discutido.
2Heloani e Capito consideram (...) que toda histria de vida pode ser identificada como uma categoria particularde estudo de caso; entretanto, nem todo o estudo de caso deve ser considerado uma histria de vida (2007, p. 30).
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tambm valorizado na utilizao do grupo focal o seu formato flexvel, o que possibilita
a explorao de questes no previstas, o incentivo para que todos participem, o baixo custo e a
rapidez com que os resultados so obtidos. No entanto, o trabalho com Grupos Focais tambm
apresenta dificuldades, sendo destacadas as seguintes: complexidade para se garantir anonimatodas discusses ocorridas; interferncia do moderador, de forma que o seu juzo de valor tenha
preponderncia; desvio do tema que motiva as discusses; domnio das discusses por poucas
pessoas, podendo interferir nos resultados; risco da imposio da opinio de uns, podendo
influenciar a conscincia e o comportamento de outros (TRAD, 2009).
Para a formao do grupo, o pesquisador deve estabelecer critrios consoantes aos
objetivos da pesquisa, sendo tambm necessria a criao de um ambiente que seja favorvel
discusso que pretende desenvolver, de forma que os integrantes do grupo possam manifestar os
seus pontos de vistas e as suas percepes sobre o assunto discutido (MINAYO, 2000). Atravs
dos Grupos Focais, torna-se possvel a ocorrncia de um debate franco e acessvel sobre o tema
que de interesse dos participantes, fundamentado em uma discusso racional, onde as diferenas
de posies entre pessoas so deixadas de lado (GASKELL, 2002, apudTRAD, 2009).
A utilizao dessa tcnica requer a adoo de alguns procedimentos, sendo os principais
deles a escolha dos recursos necessrios ao trabalho; a definio do nmero de pessoas que
participaro da atividade; o perfil das pessoas que integraro o grupo; a seleo dos elementos do
grupo e, ainda, o tempo de durao dos trabalhos (TRAD, 2009).
Quanto aos recursos para o desenvolvimento dos trabalhos, recomendado um local de
fcil acesso aos participantes, que possibilite a acomodao confortvel das pessoas e que esteja
protegido de interrupes externas e de rudos. desejvel que os participantes sejam
distribudos de forma circular, e que se tenha, para o desenvolvimento dos trabalhos, gravadores
de boa qualidade, podendo, ainda, o pesquisador fazer uso de cmeras, microfones e notebooks
(TRAD, 2009).
O nmero de participantes do grupo pode variar entre seis e quinze, sendo ideal acomposio que permita a participao adequada dos integrantes ao tema discutido (TRAD,
2009).
Para a definio do perfil das pessoas que integraro o grupo, fundamental que tenham
certas caractersticas comuns em relao ao tema objeto da pesquisa, sendo recomendado, ainda,
conforme Barbour (2009) e Kitzinger (1999), citados por Trad (2009), que sejam selecionadas
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pessoas que tenham convivncia com o tema que ser discutido, e que, ainda, conheam os
fatores que interferem nas informaes consideradas mais pertinentes. O conhecimento comum
do tema no significa que os integrantes do grupo devam se conhecer, sendo apenas necessrio
que tenham convivncia com o tema de interesse do pesquisador.Definido o perfil dos integrantes do grupo, chegado o momento da seleo intencional
dos participantes, que dever estar consoante aos objetivos da pesquisa (PIZZOL, 2004).
Quanto ao tempo de durao dos trabalhos, comum uma variao entre 90 a 110
minutos, sendo fator determinante ao tempo de durao o nmero de pessoas que participaram
dos trabalhos (TRAD, 2009).
O papel do moderador em um grupo focal de fundamental importncia para o sucesso
dos trabalhos, sendo requerido que ele tenha domnio do assunto que ser discutido e que tenha
habilidade para assegurar um clima agradvel, favorvel s trocas de impresses e experincias,
muitas vezes pessoais, para que indesejadas discusses entre os integrantes do grupo no
resultem em prejuzo aos trabalhos. importante que o moderador, no exerccio de um papel
menos diretivo e mais voltado discusso, conduza os trabalhos do grupo de forma que o foco
sobre o interesse da pesquisa seja mantido e, ao mesmo tempo, no seja negado aos participantes
que se expressem de forma espontnea (TRAD, 2009). Minayo (2000) enfatiza que o condutor
das discusses deve ter o cuidado de no induzir o grupo ao seu ponto de vista. No incio dos
trabalhos, o moderador dever esclarecer aos participantes as principais questes que nortearo as
atividades, e especificar as regras bsicas de funcionamento do grupo3, bem como o seu papel na
conduo dos trabalhos.
Scrimshaw e Hurtado (1987), referidos por Trad (2009), consideram que o moderador tem
as seguintes atribuies: 1) introduzir a discusso de interesse, e mant-la acesa; 2) deixar claro
ao grupo a inexistncia de respostas certas ou respostas erradas; 3) observar a participao dos
integrantes do grupo, encorajando para que todos se manifestem; 4) identificar as deixas que
surgem da discusso; 5) obter um bom relacionamento com os participantes do grupo, de formaque possa aprofundar, de forma individual, o comentrio que considera relevante para o trabalho;
3Gondim (2002) apresenta as seguintes regras para o funcionamento adequado de um grupo focal: 1) somente umapessoa deve falar de cada vez; 2) discusses paralelas devem ser evitadas, de forma que todos possam participarcoletivamente; 3) as pessoas devem, livremente, dizer o que pensam sobre o assunto; 4) deve ser evitado o domnioda discusso por um dos integrantes do grupo; 5) deve ser mantido o discurso e a ateno sobre o assunto discutido.
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6) ficar atento s comunicaes no verbais e ao ritmo dos participantes, controlando o tempo
previsto para os trabalhos.
A ordem das questes que sero apresentadas pelo moderador e o tempo dedicado a cada
uma delas pode variar, sendo relevante nessa definio o ritmo de discusso do grupo e o nmerode pessoas que o compe (TRAD, 2009).
Para o desenvolvimento do trabalho, imprescindvel que o pesquisador elabore um
roteiro das questes de interesse da pesquisa, no entanto, recomendado que esse tenha poucos
itens, permitindo flexibilidade na conduo dos trabalhos, e o registro de temas que, apesar de
no previstos, sejam relevantes. Para que os integrantes do grupo sejam incentivados a participar
de imediato, recomendado que as questes consideradas mais gerais, mais fceis de responder,
sejam as primeiras e, de forma gradativa, sejam introduzidas as questes mais especficas e/ou
mais polmicas (TRAD, 2009).
Para a anlise das respostas obtidas atravs dos grupos focais, orientado que:
O processo [...] [deva] contemplar dois momentos complementares: anliseespecfica de cada grupo e anlise cumulativa e comparativa do conjunto degrupos realizados. Em sntese, o objetivo deste processo identificartendncias e padres de respostas associadas com o tema de estudo(MORGAN, 1997; WHO, 1992; GASKELL, 2002, apudTRAD, 2009, p. 789).
A organizao dos trs grupos desta pesquisa um de cada instituio, a conduo dostrabalhos e a anlise dos dados atendeu s recomendaes dos autores, o que permitiu um
resultado satisfatrio da tcnica utilizada.
O grupo 1, da instituio do municpio L, foi composto por 11 integrantes; o grupo 2, da
IES P, por 8 integrantes e o grupo 3, da faculdade I, foi composto por 10 participantes,
proporcionando as condies para que todos pudessem participar do trabalho. Para integrar os
grupos, ficou estabelecido que o aluno estivesse matriculado no 2 ou 3 semestre do curso de
Tecnlogo em Gesto de Recursos Humanos, e, ainda, fosse bolsista do Prouni ou contemplado
com o Fies. Definidos os critrios, todos os alunos que atendiam ao perfil estabelecido foram
convidados para participar da pesquisa, sendo escolhidos aqueles que, de forma espontnea, se
prontificaram a colaborar com o trabalho. Caso houvesse um nmero maior de alunos
interessados em participar do trabalho, seria formado mais de um grupo por instituio de ensino
no entanto, isso no ocorreu.
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A entrevista coletiva foi realizada em uma sala privativa de cada uma das instituies,
livre de rudos excessivos e de interrupes externas, sendo as carteiras do local disponibilizadas
em crculo. Para a gravao dos trabalhos, foi utilizado um gravador digital.
No incio das atividades, foi realizada a apresentao da pesquisadora, momento em quehouve a coleta de assinaturas do termo de concordncia em participar da pesquisa e os
esclarecimentos relativos aos objetivos da pesquisa e s regras para o funcionamento adequado
do grupo. Aps, foi solicitada a apresentao de cada um dos alunos, ocasio em que os
estudantes falaram os seus nomes e o semestre do curso em que estavam matriculados.
Aps essa etapa inicial dos trabalhos, foram apresentadas as questes que seriam
discutidas pelos grupos, comeando pelas questes mais gerais, sendo que, aos poucos, foram
introduzidas as questes mais especficas, que provocavam uma maior interao entre os
participantes. No decorrer dos trabalhos, buscou-se a interao dos membros do grupo, de forma
que as informaes fossem complementadas e direcionadas aos objetivos do trabalho. Os alunos
demonstraram total liberdade para discutir sobre cada uma das questes, inclusive quando o
assunto era relacionado ao curso e instituio que frequentavam. Os trabalhos tiveram, em
mdia, a durao de 100 minutos, sendo possvel observar que os alunos se mantiveram
motivados durante todo o tempo da entrevista, no demonstrando cansao ao final das atividades.
Aps a realizao de todas as entrevistas coletivas, que ocorreu no perodo de setembro de
2012 ao ms de maro de 2013, foi efetuada a transcrio do material coletado. Para a anlise de
todas as informaes, houve a necessidade de se construir algumas categorias de anlise, o que
permitiu uma explorao aprofundada do material coletado, conforme postula Bardin (1979).
Para o autor, a anlise de contedo atravs do mtodo qualitativo funciona atravs do
desmembramento do texto em categorias, segundo reagrupamentos analticos. Entre as
diferentes possibilidades de categorizao, a investigao dos temas, ou anlise temtica, rpida
e eficaz na condio de se aplicar a discursos diretos (significaes manifestas) e simples
(BARDIN, 1979, p. 153).Para a construo das categorias, foi fundamental retomar o objetivo geral da pesquisa:
identificar o perfil do novo aluno do Ensino Superior, diante de um contexto neoliberal, bem
como indicar as instituies e os cursos que frequenta. Ao ser considerado o objetivo geral da
pesquisa, foram, ento, construdas categorias que contribussem para a identificao do perfil do
novo aluno do Ensino Superior, sendo realizadas inmeras leituras de todo o material, que
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permitiram a classificao dos dados coletados. Ludke e Andr (1986), ao tratarem da anlise
aps a coleta de dados, ressaltam a necessidade de construo de categorias, recomendando
leituras sucessivas do material, para que seja possvel a sua diviso de acordo com os elementos
que o compem. Nessa etapa importante que seja apreendido o contedo manifesto e ocontedo latente. Argumentam as autoras quanto necessidade de que a (...) anlise no se
restrinja ao que est explcito no material, mas procure ir mais a fundo, desvelando mensagens
implcitas, dimenses contraditrias e temas sistematicamente silenciados (p. 48).
Aps essa etapa foram, ento, estabelecidas as seguintes categorias:
1. Trajetria de vida, escolarizao e trabalho;
2. Condies de vida;
3. Escolha do curso e da instituio: estratgia ou adaptao/pragmatismo;
4. Idealizao/Projeto de Vida.
Essas categorias, que representam a classificao dos dados coletados (dados referentes
ao novo aluno do Ensino Superior), possibilitaram a anlise das informaes dispostas no quadro
seguinte:
Quadro 1 - Categorias de Anlise
Categoria de Anlise Informao Coletada
Trajetria de vida, escolarizao e trabalho. - Trajetria de vida e trabalho.
- Trajetria escolar.- Significado dos estudos.Condies de vida. - Caractersticas dos alunos (condio econmica,
condio profissional, condio civil e familiar,condio e tempo de estudo, condio cultural).- Condies de vida do novo aluno do ensinosuperior e as suas implicaes em seu desempenhoacadmico.
Escolha do curso e da instituio: estratgia ouadaptao/pragmatismo.
- Significado do ProUni e do Fies para o acesso aoEnsino Superior.- Justificativa utilizada para escolha do curso e dainstituio.
- A busca de outros cursos e/ou de outrasinstituies.- Nvel de satisfao com o curso e com a instituioescolhida.
Idealizao/Projeto de Vida. - Significado do Ensino Superior para o aluno e suafamlia.- Expectativas aps a concluso da faculdade(objetivos, sonhos e projetos).
Fonte:Quadro elaborado pela autora, a partir das sugestes da Banca de Qualificao.
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As informaes coletadas atravs do questionrio e da tcnica de Grupos Focais foram
divididas de acordo com cada uma das categorias elencadas, possibilitando uma anlise
minuciosa, que contribuiu com o conhecimento das caractersticas que integram o perfil do novoaluno do Ensino Superior, conforme j referido.
Esclarecida a metodologia da pesquisa, ser apontado, de forma breve, o contedo de
cada captulo deste trabalho, e uma sntese dos resultados obtidos.
No captulo I, Ensino Superior no Brasil da Colnia transio aos governos
eleitos democraticamente, apresentada uma reviso da literatura sobre o Ensino Superior,
momento em que foi contextualizado o seu desenvolvimento no perodo histrico referido e o
processo de elitizao desse nvel de ensino.
No perodo pr-colonial e colonial houve desinteresse de Portugal para o desenvolvimento
do Ensino Superior no Brasil. Aps a Proclamao da Repblica ocorreram tentativas de criao
de universidades no Brasil, motivadas pelas condies criadas a partir da implantao de cursos
de Ensino Superior em diversas instituies. No entanto, somente no ano de 1920 foi criada a
primeira universidade brasileira: a Universidade do Rio de Janeiro. Sob o impacto do populismo,
o Ensino Superior passou por um processo de expanso nas dcadas de 1950 a 1960. Enquanto a
taxa anual de crescimento do Ensino Superior, no perodo de 1932 a 1945, foi de 2,4%, no
perodo de 1945 a 1964, essa taxa foi de 12,5%, sendo essa ampliao creditada ascenso social
das camadas mdias da populao, ao crescimento do Ensino Mdio Pblico e ao alargamento
do ingresso na universidade decorrente do processo de equivalncia dos cursos tcnicos ao curso
secundrio, que se iniciou nos anos 50 e culminou com a Lei de Diretrizes e Bases de 1961
(MENDONA, 2000, p. 142).
No perodo da Ditadura Militar ocorreu a Reforma Universitria, desencadeada pelos
seguintes fatores: a tomada de conscincia, por parte de vrios setores da sociedade, daprecariedade em que se encontravam as universidades brasileiras; o ritmo acelerado do
desenvolvimento do pas, em decorrncia da industrializao e do crescimento econmico, que
demandavam um nmero crescente de mo de obra qualificada; as transformaes, tanto no
campo sociocultural quanto no campo econmico; a discusso ocorrida durante o processo de
tramitao do Projeto de Lei da LDB, que envolvia calorosos debates sobre escola pblica versus
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escola privada; a instituio da Universidade de Braslia atravs da Lei n. 3.998, de 15 de
dezembro de 1961, considerada um divisor de guas na histria das universidades, que se
constituiu na primeira universidade que no foi criada mediante a aglutinao de outras
faculdades que j existiama universidade possua uma estrutura considerada flexvel, modernae integrada, onde os departamentos substituram as tradicionais ctedras; a participao ativa do
movimento estudantil, combatendo o carter arcaico e elitista das universidades (OLIVEN, 2002;
FVERO 2004; FVERO, 2006).
Com o esgotamento do regime militar, e das medidas pedaggico-administrativas que
foram propostas pela Reforma de 1968, foi retomado o debate sobre os rumos da Universidade,
sendo tambm recuperada a discusso sobre o papel da universidade brasileira, no contexto da
democratizao do pas.
Aps a reviso bibliogrfica sobre o percurso histrico das instituies de Ensino
Superior, iniciada no mesmo captulo uma discusso sobre o processo de elitizao e excluso
no acesso ao ensino superior, com destaque para as dificuldades enfrentadas pelos jovens
oriundos de famlias que possuam um baixo poder aquisitivo.
No captulo II, Ensino Superior no Brasil a partir dos anos 1990, h continuidade da
reviso literria sobre o percurso do Ensino Superior, e analisado o papel assumido pelo Estado
nesse processo.
A discusso sobre as reformas ocorridas no Ensino Superior a partir dos anos de 1990
comprovou que as polticas educacionais desse perodo estavam alinhadas proposta neoliberal,
tendo o Estado, na condio de Estado Mnimo, atuado de forma contida e pontual, com o
objetivo de que a lgica do mercado fosse garantida. O conjunto de medidas, sobretudo
normativas, adotadas pelos governos Collor, Sarney, FHC e Lula (principalmente os dois ltimos
governos) provocaram uma forte expanso do Ensino Superior, sob a lgica da diversificao e
da privatizao, conforme as orientaes emanadas do Banco Mundial para a Amrica Latina
(CHAVES; LIMA; MEDEIROS, 2008). Das medidas elencadas, destacam-se, neste trabalho, oProUni e o Fies, pela contribuio dada ao crescimento da educao superior no pas, ou, no dizer
de Leher (2010, p. 388-389), pelo processo de (...) massificao da educao superior, e, por
isso, legitimam o sucateamento planejado e sistemtico da educao superior.
Ainda no segundo captulo, foi empreendida uma breve anlise com foco para o pblico
atendido pelas instituies nesse perodo histrico, ficando demonstrada a continuidade do
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carter elitista do Ensino Superior, e, depois de uma discusso sobre o crescimento do ensino
superior nas ltimas dcadas, foram identificadas novas desigualdades educacionais entre os
estudantes da elite econmica e social, e os estudantes de baixo poder aquisitivo.
No captulo III, Ensino superior, novas desigualdades educacionais e o perfil de seunovo aluno, observado que o quadro scio/poltico/educacional descrito no captulo II, situado
no contexto de um Estado Mnimo que passa a ser efetivado no pas a partir dos anos 90, ratifica
uma educao minimalista para os trabalhadores, denominados de pobres ou excludos, que so
atendidos principalmente em instituies privadas, que se expandem de forma extraordinria, em
relao ao crescimento ocorrido em instituies pblicas. Nesse contexto neoliberal, buscou-se
delinear o perfil desse novo aluno das instituies privadas, que apresenta caractersticas diversas
daquelas observadas entre os alunos que historicamente frequentam o Ensino Superior. Nessa
anlise, foi fundamental a busca da concepo terica do conceito de identidade, que possibilitou
uma anlise fundamentada de todo o trabalho de campo, que apresentado no captulo IV desta
dissertao.
Nesse captulo IV, aps a caracterizao das trs instituies e de sua mantenedora,
apresentado o resultado da pesquisa de campo, a partir das informaes que integraram as
categorias estabelecidas. A pesquisa indicou que o acesso ao Ensino Superior representa, ao novo
aluno, que possui renda familiarper capitade at dois (02) salrios mnimos, um meio para que
ele tenha uma melhor condio profissional. Ou seja, o novo aluno tem a expectativa de que o
Ensino Superior possibilitar o exerccio de uma atividade profissional que trar uma elevao ao
seu salrio, um maior reconhecimento social, e exigir menor investimento de tempo e reduzido
desgaste fsico. A partir da mudana de sua condio profissional, ele mantm a esperana de
conseguir uma melhoria em toda a sua condio de vida, bem como na de seus familiares.
Nas Consideraes Finais, de forma resumida e comentada, retoma-se o cenrio que
dificultou o acesso dos jovens de baixo poder aquisitivo ao Ensino Superior, sendo esclarecido
que o ingresso de uma determinada camada social provocou a ocorrncia de novos mecanismosnas instituies sociais, de forma que as desigualdades entre as diferentes classes sociais fossem
mantidas. No entanto, mesmo com as dificuldades enfrentadas para conciliar os seus estudos com
as caractersticas que compem o seu perfil, a esperana do jovem de baixo poder aquisitivo foi
renovada com o seu ingresso no Ensino Superior.
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CAPTULO I - ENSINO SUPERIOR NO BRASIL: DA COLNIA TRANSIO AOS GOVERNOS ELEITOSDEMOCRATICAMENTE
1.1 Incio do Ensino Superior no Brasil
O perodo pr-colonial e colonial (1500-1815) do Brasil marcado pelo desinteresse
de Portugal no desenvolvimento do Ensino Superior no pas, como reflexo de sua poltica decolonizao, bem como do desinteresse dos prprios brasileiros, que no viam justificativa para a
criao de uma instituio com essa finalidade na colnia (OLIVEN, 2002; MOACYR, 1937;
FVERO, 2006).
Durante o perodo colonial, os jesutas, responsveis pela educao no Brasil,
dedicaram-se desde cristianizao dos ndios at a formao do clero, alm de promoverem a
educao nos colgios reais. Os filhos da classe dominante recebiam uma educao que os
preparavam para que frequentassem a Universidade de Coimbra, em Portugal, que tinha como
uma de suas diversas misses a de unificao cultural do imprio Portugus (OLIVEN, 2002).
Ansio Teixeira (apud OLIVEN, 2002, p. 24) considerou a Universidade de Coimbra como a
primeira universidade dos brasileiros, sendo que, nessa instituio, nos trs primeiros sculos se
graduaram 2.500 jovens nascidos no Brasil, em diversos cursos: Teologia, Direito Cannico,
Direito Civil, Medicina e Filosofia (OLIVEN, 2002).
Fvero (2000), ao debater sobre o tema, afirma que todos os esforos de criao de
universidades, nos perodos colonial e monrquico, foram malogrados, o que denota uma poltica
de controle, por parte da Metrpole, de qualquer iniciativa que vislumbrasse sinais deindependncia cultural e poltica da Colnia (FAVERO, 2000, apud FAVERO, 2006, p. 18-19).
Somente durante o perodo de 1808 a 1889 foram apresentados 24 projetos de universidades,
conforme identificao de Ansio Teixeira, e no foram criadas novas faculdades em quase meio
sculo de reinado do segundo imperador do Brasil (CUNHA, 1980; FVERO, 2006).
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Na chegada da famlia real ao Brasil, D. Joo VI recebeu comerciantes da Bahia que
solicitaram a criao de uma universidade no pas, se comprometendo a colaborar
financeiramente com esse projeto. Apesar da solicitao e da disponibilidade dos comerciantes
em colaborar com o projeto, no foi instalada a universidade, no entanto, Salvador passou a ser asede do curso de Cirurgia, Anatomia e Obstetrcia, que entrou em funcionamento atravs de
decreto datado de 18 de fevereiro de 1808.
Cunha (1980) afirma que a partir da chegada da famlia real ao Brasil, foram,
principalmente, criados cursos e academias para a formao de profissionais para o Estado, bem
como para a formao de especialistas em produo de bens simblicos 4. Aps a transferncia da
Corte para o Rio de Janeiro, constata-se que foram criadas no local as Academias Militares em
1808 e 18105, sendo instituda a Academia Real Militar, onde foi implantado o ncleo que deu
incio Escola de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
No mesmo ano foi tambm constituda uma Escola de Cirurgia, com cursos de anatomia e
cirurgia, que formava cirurgies militares. Com a criao do Curso de Medicina em 1809, foi,
ento, instalada em 1813 a Academia de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro.
Para suprir as lacunas do ensino ministrado nas aulas rgias, foi tambm organizado curso
avulso: no ano de 1809, em Pernambuco, curso de Matemtica Superior; no ano de 1817, em Vila
Rica, curso de Desenho e Histria; e em 1821 em Paracatu - Minas Gerais, curso de Retrica e
Filosofia. Em 1816, foi estabelecida a Escola Real de Cincias, Artes e Ofcios, funcionando
como Academia das Artes apenas no ano de 1826 (OLIVEN, 2002; FVERO, 2006;
MENDONA, 2000).
Esses cursos, criados por D. Joo VI aps a vinda da famlia real ao Brasil, deram origem
s escolas e faculdades profissionalizantes, que, praticamente, constituram o conjunto das
instituies de Ensino Superior do Brasil at a Repblica, sendo agregado a esse conjunto alguns
cursos jurdicos no ano de 1827 instalados em 1828 em So Paulo e em Olinda e a
implantao, no ano de 1875, da Escola de Minas Gerais, em Ouro Preto6
(MENDONA, 2000).
4Para Bourdieu (BOURDIEU, 1974), um bem simblico configurado quando atribudo um valor mercantil a umobjeto cultural ou artstico, adquirindo, pelas leis de mercado, o status de mercadoria. formado um grupoconsumidor a esses objetos, assim como produtores de bens simblicos.5 A Academia da Marinha foi criada no Rio de Janeiro no ano de 1808, e a Academia Real Militar foi criada no anode 1810 - ambas com o objetivo de formar oficiais e engenheiros civis e militares (MENDONA, 2000).6 A Escola de Minas Gerais, criada em 1832 e instalada em 1875, teve como origem o projeto elaborado peloengenheiro francs Claude Henri Gorceix, a pedido do prprio Imperador D. Pedro II. Para Cunha, o imperador se
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Em 1889, em sua ltima fala no trono, o Imperador props a criao de duas
universidades (uma no Norte e outra no Sul do Brasil) com a inteno de que se constitussem em
centros da organizao cientfica e literria, mas a proposta no chegou a ser colocada em prtica.
No perodo imperial, apesar das vrias propostas apresentadas, no foi criadauma universidade no Brasil. Isto talvez se deva ao alto conceito da Universidadede Coimbra, o que dificultava a sua substituio por uma instituio do jovempas. Assim sendo, os novos cursos superiores de orientao profissional queforam se estabelecendo no territrio brasileiro eram vistos como substitutos universidade (OLIVEN, 2002, 25-26).
Observa-se que os governos imperiais se limitaram manuteno e regulamentao das
instituies j existentes, tendo ocorrido poucas iniciativas no que se refere ao Ensino Superior.
1.2 O Ensino Superior nas primeiras dcadas da Repblica
Aps a Proclamao da Repblica, ocorreram outras tentativas de criao de universidade
no pas, tendo o Ensino Superior passado por vrias alteraes em sua estrutura e funcionamento,
conforme ser visto na sequncia. Para Cunha (1980, p. 132), o (...) seu incio coincide com a
influncia positivista na poltica educacional, marcada pela atuao de Benjamin Constant, de
1890-1891.
Com a implantao de cursos de Ensino Superior em diversas instituies, foram geradas
condies para o surgimento de universidades, o que resultou na instalao de universidades
como instituies livres, sendo uma delas criada em Manaus, em 1909 (Escola Universitria
Livre de Manaus), outra em So Paulo, em 1911 (Universidade Popular), e uma universidade no
Paran (Universidade do Paran), em 1912 (MICHELOTTO, 2006).
Foi possvel a implantao dessas universidades quando Rivadvia da Cunha Correia
assumiu o Ministrio do Interior, Justia e Instruo Pblica, e garantiu, atravs de decreto, ampla
liberdade para que os estados ou particulares criassem instituies de Ensino Superior, sem a
fiscalizao do governo federal (OLIVEIRA; VOGT; LEFER, 2012). Com essa liberdade, os
empenhou para a instalao da escola buscando acelerar o surto econmico que foi produzido pela Guerra doParaguai (CUNHA, 1980; MENDONA, 2000; OLIVEN, 2002).
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estados e particulares podiam organizar, com total autonomia, seus cursos, o currculo e o corpo
docente da instituio (CUNHA, 1980).
Em 18 de maro de 1915, atravs do Decreto n. 11.530, foi retomado por Carlos
Maximiliano, sucessor de Rivadvia Corra, o controle do ensino pelo governo federal, tendo asreferidas instituies perdido ostatusde universidade, e os seus cursos passaram a ser ofertados
em faculdades livres ou isoladas, sob o rgido controle do governo federal (CUNHA, 1980). Esse
decreto, que promoveu a retomada do controle do Ensino Superior, em seu Art. 6 tambm
estabeleceu que:
O Governo Federal, quando achar oportuno, reunir em universidade as EscolasPolitcnica e de Medicina do Rio de Janeiro, incorporando a elas uma dasFaculdades Livres de Direito, dispensando-a da taxa de fiscalizao e dando-lhegratuitamente edifcio para funcionar.
Aps tantas tentativas para a criao de uma universidade brasileira7, e em cumprimento
ao Art. 6 do Decreto n. 1.530/1915, foi ento instalada a Universidade do Rio de Janeiro 8no
ano de 1920, na gesto do Presidente Epitcio Pessoa, atravs do Decreto n. 14.343, de 7 de
setembro de 1920. Para Mendona, as universidades institudas antes de 1920 (...) tiveram uma
vida efmera e, de fato, a primeira instituio que assumiu, entre ns, de forma duradoura, essa
denominao foi a Universidade do Rio de Janeiro, criada em 1920 (2000, p. 136).
A Universidade reunia as faculdades profissionais que j existiam, sendo voltada mais
para o ensino do que para a pesquisa, era elitista, e mantinha a orientao profissional dos cursos
que oferecia e a autonomia das faculdades que agrupava (OLIVEN, 2002; FVERO, 2006). Para
Fvero, a primeira universidade oficial brasileira foi constituda a partir da (...) justaposio de
trs escolas tradicionais9 sem maior integrao entre elas e cada uma conservando suas
caractersticas (FVERO, 2006, p. 21).
Oliven (2002) relata que havia um comentrio, na poca de instalao da Universidade do
Rio de Janeiro, de que a sua instituio se deu no ensejo da comemorao do Centenrio da
Independncia, ocasio em que havia um interesse poltico em se outorgar o ttulo de Doutor
7Luiz Antnio Cunha critica a ideia de alguns autores de que a universidade seria a forma ideal de organizao doEnsino Superior, sendo essa uma carncia que deveria ser superada (CUNHA, 1980).8Criada em 1920, a Universidade do Rio de Janeiro foi transformada em Universidade do Brasil em 05 de julho de1937 e na Universidade Federal do Rio de Janeiro a partir do ano de 1965.9A Universidade do Rio de Janeiro agregou a Escola Politcnica, a Escola de Medicina e a Faculdade de Direito,resultante da juno de duas escolas livres constitudas anteriormente (MENDONA, 2000).
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Honoris Causa ao Rei da Blgica, que estaria em visita ao Brasil. No havendo instituio
apropriada para o evento, decidiu-se criar a universidade, que seria o palco para a outorga do grau
ao referido rei.
Fvero afirma que outra crtica em relao instalao da Universidade foi feita peloeducador Jos Augusto10, para quem o decreto que instituiu a Universidade do Rio de Janeiro
tratava a matria de forma geral e vaga, no estabelecendo (...) a noo exata e segura da
verdadeira orientao a ser seguida (...) pela universidade (FVERO, 2006, p. 22).
Mendona (2000), ao analisar a juno das instituies que constituiu a Universidade do
Rio de Janeiro, afirma que o funcionamento de cada uma delas continuou a ocorrer de forma
isolada, no havendo qualquer articulao entre as faculdades, nem alterao de seus currculos
ou das prticas desenvolvidas em seu interior. Para o autor, a partir da juno das instituies foi
desencadeada uma disputa pelo poder entre as faculdades.
Apesar das crticas efetuadas, h de se reconhecer que a Universidade do Rio de Janeiro
foi a primeira instituio legalmente instalada pelo governo federal, com o mrito
() de reavivar e intensificar o debate em torno do problema universitrio nopas. Esse debate, nos anos 20 do sculo passado, adquire expresso graas,sobretudo, atuao da Associao Brasileira de Educao (ABE) e daAcademia Brasileira de Cincias (ABC). Entre as questes recorrentes destacam-se: concepo de universidade; funes que devero caber s universidades
brasileiras; autonomia universitria e modelo de universidade a ser adotado noBrasil (FVERO, 2006, p. 22).
Aps a criao dessa primeira universidade, foi fundada a Universidade de Minas Gerais
no ano de 1927, por iniciativa do governo do Estado, que seguiu o mesmo modelo da
universidade do Rio de Janeiro, ou seja, foi constituda a partir do agrupamento de instituies j
existentes (MENDONA, 2000).
Oliven, ao analisar o atraso no estabelecimento de Universidades no Brasil, atribui como
um de seus fatos a influncia do iderio positivista presente no grupo de oficiais que promoveu a
proclamao da Repblica. Para o autor, os lderes polticos da Primeira Repblica1889 a 1930
consideravam a universidade uma instituio anacrnica e ultrapassada, o que no condizia
10A crtica do educador Jos Augusto foi publicada no Jornal do Brasil, na edio de 24 de outubro de 1920, sob ottulo: Regime UniversitrioIII - o estado atual da questo no Brasil (FVERO, 2006).
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com as necessidades do Novo Mundo, sendo (...) francamente favorveis criao de cursos
laicos de orientao tcnica profissionalizante (OLIVEN, 2002, p. 26).
Fvero, estendendo a sua anlise at a dcada de 1960, considera ingnuo o pensamento
de que apenas as instituies universitrias e o universo educacional enfrentaram crises e/ouimpasses. O autor afirma que:
a crise da universidade pode ter relao ntima com o colapso de instituiesexistentes na sociedade brasileira, que no satisfazem ou no atendem aosinteresses da velha ordem e, ao mesmo tempo, ainda no tinham assumido umpapel atento a responder s necessidades emergentes (FVERO, 2006, p. 19).
Para ilustrar a sua afirmao, o autor cita as funes assumidas pela universidade, que foi
pensada para oferecer um bem cultural a uma minoria, no se constituindo como um espao de
investigao cientfica, e, consequentemente, de produo de conhecimento.
1.3 O Ensino Superiorde 1930 transio aos governos eleitos democraticamente
Aps a constituio do Ministrio de Educao e Sade em 14/11/1930, pelo ento
presidente Getlio Vargas11, que teve Francisco Campos como o seu primeiro Ministro, foram
institudas reformas no ensino, que ficaram marcadas pela centralizao, que tambm estava
presente nos mais diversos setores da sociedade.
As reformas institudas buscavam adequar o ensino modernizao do pas, priorizando a
formao da elite e a capacitao para o trabalho. O projeto universitrio elaborado pelo Governo
Federal tinha como objetivo a articulao de medidas que abrangiam desde a instituio do
Estatuto das Universidades Brasileiras, objeto do Decreto-lei n. 19.851, de 1931, at a
organizao da Universidade do Rio de Janeiro, atravs do Decreto-Lei n. 19.852/31, e a criao
do Conselho Nacional de Educao, objeto do Decreto-Lei n 19.850, tambm do ano de 1931.O Ministro Francisco Campos considerava que a universidade no poderia ter a sua finalidade
11 Getlio Dorneles Vargas governou o Brasil no perodo de 1930 a 1945, marcando o final da Primeira Repblica.
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reduzida a uma funo meramente didtica, mas que deveria tambm se preocupar com a pura
cincia e com a cultura desinteressada12.
No que se refere nova organizao da Universidade do Rio de Janeiro, Fvero (2006)
conclui que o Decreto 19.852/31 minucioso sobre a instituio, no entanto, ele no chegou a sercolocado em prtica imediatamente e no atribuiu Universidade o carter integrador das
diferentes instituies de Ensino Superior que agrupava.
Ao analisar o Estatuto das Universidades Brasileiras, objeto do Decreto-lei n. 19.851, de
1931, Fvero pondera que, pelo documento, as escolas e faculdades da nova estrutura
universitria se apresentavam como verdadeiras ilhas, que dependiam da administrao superior.
Outro ponto discutido pelo autor, em relao ao documento, se refere ideia de ctedra 13presente
no documentodefinida como uma unidade operativa de ensino e, tambm, de pesquisa docente
que era entregue a determinado professor que ganhou fora a partir das Constituies de 1934 e
de 1946, permanecendo at o ano de 1968. Outro aspecto importante da Reforma Campos est
relacionado concesso da autonomia plena s universidades, ao se considerar que havia uma
tendncia de centralizao da poltica adotada pelo Governo.
Oliven (2002), ao discutir sobre as polticas adotadas pelo Ministro Francisco Campos,
afirma que algumas de suas aes, tais como a criao da Faculdade de Educao nas
Universidades, respondiam muito mais aos planos do prprio Ministro do que s reivindicaes
dos educadores, que se preocupavam com a constituio de uma universidade voltada s
pesquisas. O autor ainda afirma que os principais pontos de discrdia entre o projeto do Ministro
Francisco Campos e os anseios dos educadores estavam ligados ao papel do governo federal,
como normatizador do Ensino Superior, e atuao da Igreja Catlica, como instituio que
formava o carter humanista da elite do pas.
Fvero (2006) aponta que a instituio da Universidade de So Paulo, em 1934, e da
Universidade do Distrito Federal, em 1935, contrastam com a poltica autoritria do governo
12Gramsci escreve, do crcere, uma carta para sua mulher Jlia, onde discute a noo de cultura desinteressada. Parao autor, (...) desinteressado se contrape a oportunista, imediatista, utilitarista; profissionalizao precoce,reducionista, minimalista; a politiqueiro, taticista e eleitoreiro, como tantos projetos educacionais que bemconhecemos: Os cientistas, em sua atividade, so desinteressados (GRAMSCI, 1965, p. 598, apud NOSELLA,2005, p. 232).
13 Fvero (2006, p. 24) afirma que, no Brasil, os privilgios do professor catedrtico adquiriram uma feiohistrica, apresentando-se o regime de ctedra como ncleo ou alma mater das instituies de ensino superior.
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federal, ao se ponderar, por exemplo, que USP atribuda as seguintes finalidades (Art. 2 do
Decreto n. 6.283/34):
a) promover, pela pesquisa, o progresso da cincia;b) transmitir, pelo ensino, conhecimentos que enriqueam ou desenvolvam oesprito ou que sejam teis vida;c) formar especialistas em todos os ramos da cultura, bem como tcnicos eprofissionais em todas as profisses de base cientfica ou artstica;d) realizar a obra social de vulgarizao das cincias, das letras e artes por meiode cursos sintticos, conferncias e palestras, difuso pelo rdio, filmescientficos e congneres. (FVERO, 2006, p. 23-25).
Oliven (2002) avalia que o Estado de So Paulo implantou a sua Universidade no
contexto de um projeto poltico, com um alto padro acadmico-cientfico, e livre do controle
direto do governo federal14. Considera o autor que a USP representou um divisor na histria do
sistema de educao superior do Brasil, e o estado, para concretizar o seu plano poltico, agrupou
as faculdades independentes e tradicionais, constituindo a Faculdade de Filosofia, Cincias e
Letras da USP, que tinha em seu quadro docente professores pesquisadores de outros pases,
principalmente da Europa. O autor avalia que o ideal dos fundadores da USP foi concretizado,
tendo a Universidade se tornado o maior centro de pesquisa do pas.
A Universidade do Distrito Federal, fundada em 1935, por iniciativa de Ansio Teixeira,
Diretor de Instruo do Distrito Federal no governo do Prefeito Pedro Ernesto, deu prioridade
renovao e ampliao da cultura desinteressada e ao desenvolvimento de uma atividadecientfica livre, incentivando as atividades de pesquisa, contando com o apoio dos professores.
No entanto, a Universidade, que no era simptica ao Ministrio da Educao, foi extinta em
1939 por decreto presidencial, devido ao autoritarismo presente no Brasil15, ficando tipificada
uma ingerncia direta do governo federal nos assuntos do Distrito Federal (OLIVEN, 2002;
FVERO, 2006; ALMEIDA, 2006a).
14
Fernando Azevedo liderou um movimento para a criao da Universidade, sendo incentivado pelo jornal O Estadode So Paulo e apoiado pelo prprio governo estadual. A criao de uma universidade livre do controle direto dogoverno federal se constitua em uma tentativa para a reconquista da hegemonia poltica que o Estado gozara no
perodo anterior Revoluo de 1930 (OLIVEN, 2002).15 A partir da promulgao da segunda Constituio Republicana, o que ocorreu em 1934, e (...) da eleio do
presidente Getlio Vargas pelo Congresso, havia a expectativa de que a democracia liberal fosse instituda no pas.Mas, logo a seguir, as tendncias centralizadoras e autoritrias recuperam a hegemonia. A abertura, proporcionada
pela Revoluo de 1930, passou a ser vista como um erro a ser corrigido. A partir de 1935, ampliam-se tendnciascentralizadoras e autoritrias, assegurando um clima propcio implantao do Estado Novo. (FVERO, 2006, p.25).
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Mendona afirma que as universidades (Universidade de So Paulo e Universidade do
Distrito Federal) tinham como competncia promover o estudo cientfico dos grandes problemas
da nao, buscando gerar um estado de nimo em todo o pas, que fosse capaz de dar fora,
coerncia e eficcia s aes dos homens, independentemente das divergncias e diversidades devista que tivessem. Para o autor, nesse tipo de instituio:
(...) seriam formadas as elites de pensadores, sbios, cientistas, tcnicos e oseducadores a entendidos os professores para todos os graus de ensino. Emlinhas gerais, essa foi a concepo que informou as duas experinciasuniversitrias desenvolvidas ao longo desses anos por iniciativa de educadoresvinculados ao grupo dos renovadores, a saber, a Universidade de So Paulo(USP), criada em 1934, pelo grupo de intelectuais que se articulava em torno dojornal O Estado de S. Paulo, entre os quais Fernando de Azevedo, e aUniversidade do Distrito Federal (UDF), criada por Ansio Teixeira em 1935, nobojo da reforma de ensino por ele empreendida, como secretrio de Educao,
no Rio de Janeiro. Para Cardoso (1982), a criao da USP teve como objetivoexplcito a reconquista da hegemonia paulista na vida poltica do pas, o que sefaria pela cincia em vez das armas, conforme as prprias palavras de Jlio deMesquita Filho, presidente da Comisso Organizadora da Universidade, nosendo, portanto, uma simples expresso do surto inspirador produzido peloManifesto de 32. Para a autora, mesmo que nesse projeto Azevedo estivesse como grupo do Estado, mantinha uma relativa autonomia desse grupo, o que iria,inclusive, condicionar alguns conflitos de ordem interna. [...] Ambas asuniversidades possuem uma base comum, como expresses mesmo quediferenciadas do iderio do Movimento da Escola Nova, consubstanciado noManifesto de 32 (MENDONA, 2000, p. 39).
Gustavo Capanema, ministro da Educao e da Sade durante o perodo de 1937 a 1945,
ao expor os motivos da extino da Universidade, justifica que tal fato seria necessrio para que
fosse reestabelecida a disciplina e a ordem (FVERO, 2006). Aps a extino da Universidade,
seus cursos foram transferidos para a Universidade do Brasil, instalada atravs da Lei n. 452/37.
Oliven considera que Gustavo Capanema aproveitou-se do autoritarismo do Estado Novo
para implantar o seu projeto universitrio, que se constitua na criao de uma universidade que
se tornaria em um modelo nico de Ensino Superior para todo o territrio nacional. O autor