11
GRAVEL ISSN 1678-5975 Novembro - 2010 V. 8 – nº 1 21-31 Porto Alegre O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório e Tramandaí - RS Fracalossi, F.G. 2 ; Barboza E.G. 1,2,3 ; Rosa M.L.C.C. 1,2,4 & Silva, A.B. 1,2 1 Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica – CECO/IG/UFRGS ([email protected]); 2 Programa de Pós-Graduação em Geociências – PPGGEO/IG/UFRGS; 3 Departamento de Paleontologia e Estratigrafia – DPE/IG/UFRGS; 4 Departamento de Geodésia – DGEO/IG/UFRGS. RESUMO O presente estudo tem como objetivo analisar os resultados do imageamento em subsuperfície da Barreira III na região norte da Planície Costeira do Rio Grande do Sul. Essa Barreira desenvolveu-se no Pleistoceno superior há aproximadamente 125 ka, e é constituída por fácies arenosas que correspondem a antigos sistemas praiais e marinho raso, recobertas por depósitos eólicos. A Barreira III apresenta a ocorrência de tubos de ophiomorpha (Callichirus sp.) que marcam paleoníveis do mar. Para este estudo os métodos empregados foram a Geofísica, com a utilização de um Georadar para a aquisição de seções em subsuperfície, e levantamentos altimétricos através de um Sistema de Posicionamento Global Diferencial (DGPS). A aplicação do Georadar permitiu imagear e analisar os depósitos presentes em subsuperfície, possibilitando interpretar as radarfácies correspondentes aos ambientes de foreshore e de shoreface superior, médio e inferior, bem como as suas superfícies limítrofes. ABSTRACT The present study has as objective the analysis of subsurface imagery of Barrier III in the north portion of Rio Grande do Sul Coastal Plain. This Barrier evolved during the Upper Pleistocene at around 125 ka ago and is constituted by sandy facies which corresponds to coastal dunes overlying beach and shallow marine sediments. The Barrier III has Ophiomorpha burrows (Callichirus sp.) which indicate palaeo sea level positions. This study applied a geophysical method through the acquisition of subsurface profiles with Ground Penetrating Radar (GPR) and altimetry measurements through a Differential Global Positioning System (DGPS). The analysis of GPR profiles allowed interpreting foreshore, upper, middle and lower shoreface radarfacies, as well as their limiting surfaces. Palavras chave: Georadar, radarfácies, Pleistoceno.

O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

GRAVEL ISSN 1678-5975 Novembro - 2010 V. 8 – nº 1 21-31 Porto Alegre

O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório e Tramandaí - RS Fracalossi, F.G.2; Barboza E.G.1,2,3; Rosa M.L.C.C.1,2,4 & Silva, A.B.1,2 1 Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica – CECO/IG/UFRGS ([email protected]); 2 Programa de Pós-Graduação em Geociências – PPGGEO/IG/UFRGS; 3 Departamento de Paleontologia e Estratigrafia – DPE/IG/UFRGS; 4 Departamento de Geodésia – DGEO/IG/UFRGS.

RESUMO O presente estudo tem como objetivo analisar os resultados do

imageamento em subsuperfície da Barreira III na região norte da Planície Costeira do Rio Grande do Sul. Essa Barreira desenvolveu-se no Pleistoceno superior há aproximadamente 125 ka, e é constituída por fácies arenosas que correspondem a antigos sistemas praiais e marinho raso, recobertas por depósitos eólicos. A Barreira III apresenta a ocorrência de tubos de ophiomorpha (Callichirus sp.) que marcam paleoníveis do mar. Para este estudo os métodos empregados foram a Geofísica, com a utilização de um Georadar para a aquisição de seções em subsuperfície, e levantamentos altimétricos através de um Sistema de Posicionamento Global Diferencial (DGPS). A aplicação do Georadar permitiu imagear e analisar os depósitos presentes em subsuperfície, possibilitando interpretar as radarfácies correspondentes aos ambientes de foreshore e de shoreface superior, médio e inferior, bem como as suas superfícies limítrofes.

ABSTRACT

The present study has as objective the analysis of subsurface imagery

of Barrier III in the north portion of Rio Grande do Sul Coastal Plain. This Barrier evolved during the Upper Pleistocene at around 125 ka ago and is constituted by sandy facies which corresponds to coastal dunes overlying beach and shallow marine sediments. The Barrier III has Ophiomorpha burrows (Callichirus sp.) which indicate palaeo sea level positions. This study applied a geophysical method through the acquisition of subsurface profiles with Ground Penetrating Radar (GPR) and altimetry measurements through a Differential Global Positioning System (DGPS). The analysis of GPR profiles allowed interpreting foreshore, upper, middle and lower shoreface radarfacies, as well as their limiting surfaces.

Palavras chave: Georadar, radarfácies, Pleistoceno.

Page 2: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório e Tramandaí - RS

GRAVEL

22

INTRODUÇÃO

A maioria dos trabalhos sobre a Planície Costeira do Rio Grande do Sul (PCRS) realizados até hoje utilizaram dados de subsuperfície através de testemunhos de sondagem. Dados de subsuperfície contínuos na forma de uma seção são escassos, e, portanto estudos com a aquisição de dados geofísicos podem trazer grandes contribuições.

Esse trabalho apresenta um estudo relativo à Barreira Pleistocênica III, desenvolvida durante a penúltima grande transgressão marinha, com idade aproximada de 120 ka. Essa barreira é composta por fácies arenosas, definidas por Tomazelli & Dillenburg (2007), desenvolvidas nos ambientes de antepraia, praia e pós-praia. As fácies de antepraia superior e praia possuem tubos de Ophiomorpha (Callichirus sp.), o topo da exposição desses tubos marcam um antigo nível médio do mar, aproximadamente 7 m acima do nível do mar atual.

Para a aquisição de dados de subsuperfície foi utilizado um radar de penetração de solo (GPR). Sabendo-se que os alvos possuem propriedades eletromagnéticas contrastantes, definiram-se as radarfácies correspondentes aos

diferentes ambientes deposicionais presentes na área.

A barreira possui um empilhamento estratigráfico progradacional, conforme observado em campo e definido por outros autores como Tomazelli & Dillenburg (2007). O estudo ainda testou a hipótese da existência do registro retrogradacional abaixo do progradacional, o qual estaria relacionado com a transgressão da linha de costa. Localização da área de estudo

A área de estudo está localizada no litoral norte do Rio Grande do Sul, na região dos municípios de Osório e Tramandaí (Fig. 1) e situa-se a aproximadamente 120 km de Porto Alegre. Corresponde as cartas topográficas de Osório (FOLHA SH.22-X-C-V-3 e MI-2972/3) e Tramandaí (FOLHA SH.22-X-C-V-4 e MI-2972/4), na escala 1:50.000.

O acesso se dá pelas rodovias BR 290 (Estrada General Osório - FreeWay), BR 101, RST 101, RS 030 e RS 389 (Estrada do Mar). Faz divisa com Imbé, Cidreira, Capivari do Sul, Santo Antônio da Patrulha, Caraá, Maquiné, Xangri-lá.

Figura 1. Mapa de localização da área de estudo, com os principais acessos (Datum Córrego Alegre,

Coordenadas UTM zona 22S).

Page 3: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

Fracalossi et al.

GRAVEL

23

CONTEXTO GEOLÓGICO REGIONAL A área de estudo encontra-se na porção norte

da Planície Costeira do Rio Grande do Sul, correspondente a parte emersa da Bacia de Pelotas. O embasamento nesta região é constituído por rochas da Bacia do Paraná.

A Bacia de Pelotas constitui-se de uma ampla bacia preenchida por sedimentos terciários e quaternários, sendo composta em superfície por: lagunas, praias, canais, dunas, entre outros. É uma bacia marginal aberta, do tipo costeira estável (Weeks, 1952 apud Villwock & Tomazelli, 1995) ou do tipo V, intermediária, costeira estável ou de rompimento (Klemme, 1971 apud Villwock & Tomazelli,

1995). Corresponde à porção da margem continental brasileira ao sul do Alto de Florianópolis. A sua origem está relacionada com a abertura do Oceano Atlântico Sul (Villwock & Tomazelli, 1995). CONTEXTO GEOLÓGICO LOCAL

A área de estudo está localizada no litoral norte da Planície Costeira do Rio Grande do Sul (Fig. 2). A PCRS é constituída por depósitos Terciários e Quaternários, que correspondem a um sistema de leques aluviais e quatro distintos sistemas deposicionais transgressivos-regressivos do tipo Laguna-Barreira (Villwock et al., 1986).

Figura 2. Mapa geológico da área de estudo. Estão presentes na área os quatro Sistemas Laguna-Barreira, bem

como o Sistema de Leques alimentados pela Barreira I (modificado de Tomazelli et al., 1984).

Page 4: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório e Tramandaí - RS

GRAVEL

24

MATERIAIS E MÉTODOS

O equipamento utilizado na aquisição dos dados foi o GPR da empresa GSSI (Geophysical Survey Systems Inc.), modelo SIR-3000 com antenas nas frequências centrais de 200 e de 400 MHz. O arranjo utilizado foi o Common Off Set e a constante dielétrica para areia seca igual a 6. A profundidade máxima do dado adquirido foi em torno de 22 m, isto devido à frequência utilizada e as diferenças de condutividades dos depósitos em subsuperfície.

O sistema de GPR foi conectado a um GPS diferencial (DGPS) permitindo o georeferenciamento das seções com melhor precisão da topografia. No processamento e interpretação das seções de GPR foi utilizado o programa computacional Radan™ (Radar Data Analyser). O objetivo fundamental de processamento de dados de GPR é tentar superar as limitações do levantamento de dados, de modo que a obter informações de subsuperfície mais realista, permitindo assim a interpretação mais confiável em termos de significado geológico ou sedimentológicos (Neal, 2004). Para melhorar a relação sinal - ruído o processamento utilizado neste trabalho seguiu as seguintes etapas: FIR – Background Removal; IIR – Passa Banda; Range Gain e por último a Correção Topográfica.

O Background Removal teve como finalidade remover linhas retas, que não são parte do registro de radar, como por exemplo, a onda direta. Para este procedimento foram removidas linhas que se repetiam iguais por 400 Scans.

O filtro de passa banda é utilizado para definir o intervalo superior e inferior de frequência do sinal. Para cada antena é usado um parâmetro. Neste trabalho os parâmetros utilizados foram: para antena de 200 MHz passa alta 100 e passa baixa 300; para a antena de 400 MHz passa alta 300 e passa baixa 500. O Ganho Exponencial foi utilizado para aumentar o contraste da seção.

Por fim, foi feita a correção topográfica através do Surface Normalization. Tabelas contendo as coordenadas geográficas, altitudes e data da aquisição foram geradas para este procedimento.

INTERPRETAÇÕES E RESULTADOS

Para a interpretação das seções de radar foram utilizados princípios da Estratigrafia de Radar, que é baseado na Sismoestratigrafia (Mitchum et al., 1977). Os primeiros a utilizar o termo Estratigrafia de Radar foram Jol & Smith (1991), embora Gawthorpe et al. (1993) tenham sido os primeiros a definir plenamente o conceito e sua relação com a Estratigrafia Sísmica (Neal, 2004).

Conforme Neal (2004) as superfícies de radar, os pacotes de radar e as radarfácies são definidos da mesma forma como os termos equivalentes em Sismoestratigrafia, são os blocos de construção da estratigrafia de radar para um perfil de reflexões de GPR.

Foram coletados dados em quatro mineradoras da região (Fig. 3). A mineradora 1 (Moro) localiza-se a SE da Lagoa do Peixoto. A mineradora 2 (Gomes) localiza-se na RS-389 (Estrada do Mar). As mineradoras 3 e 4 (Pingo) localizam-se na Estrada Municipal Bom Retiro, próximo ao Aterro Sanitário.

Foram adquiridas 88 seções de GPR, sendo 49 com a antena de 400 MHz e 39 com antena de 200 MHz. As seções foram adquiridas na área onde ocorre mineração de areia diretamente sobre a Barreira III, o que possibilitou um melhor resultado nas seções. Nas seções adquiridas com a antena de frequência central 200 MHz foram identificados duas superfícies de radar e três padrões de radarfácies.

As superfícies de radar são s1-sl e s2-sl. A superfície s1-sl é lateralmente pouco continua, com relevo ondulado e concordante. Já s2-sl continua e ondulada, com terminações em downlap.

A radarfácies f1-ma possui refletores com forma ondulada, horizontais, subparalelos e descontínuos. Esta radarfácies foi encontrada apenas na mineradora 1 abaixo da cota -3,7 m.

Na radarfácies f2-ma observa-se refletores com forma paralela, horizontais, relação entre refletores também paralela e alta continuidade. Ocorre entre as cotas 0,2 e -3,7 m na mineradora 1, na mineradora 2 entre as cotas -3,5 e -7 m.

Na radarfácies f3-ma os refletores tem forma sinuosa, horizontais, subparalelos e moderadamente contínuos. Esta foi identificada em todas as mineradoras, próxima à superfície do terreno.

Page 5: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

Fracalossi et al.

GRAVEL

25

Na Figura 4 observa-se uma seção obtida na mineradora 1, com orientação SW-NE, aproximadamente paralela a linha de costa. A seção atingiu 12,5 m de profundidade, tendo

perda de sinal a partir dos 9,5 m. Nesta seção foram identificadas as duas superfícies de radar e as três radarfácies encontradas na área.

Figura 3. Carta imagem com a localização das mineradoras estudadas. Acima e á esquerda observa-se que foi

elaborado um perfil ortogonal a linha de costa, o qual amostrou a Barreira III.

Na radarfácies f1-ma, a partir aproximadamente de 8 m, ocorre uma perda de sinal, esta pode estar relacionada com a presença de material fino (silte e argila) na unidade. Na unidade superior a esta, f2-ma, observa-se partes onde a os refletores estão transparentes, resultado de mudanças de energia do ambiente. Na unidade superior da seção, observam-se terminações em downlap para sentidos variados.

Outra seção obtida com antena de 200 MHz está na Figura 5. A orientação da seção é SSE-NNW e foi coletada na mineradora 2. A profundidade alcançada foi 20 m, mas a partir dos 12 m ocorre perda de sinal. Como na seção apresentada anteriormente, a unidade correspondente a radarfácies f2-ma tem espessura média de 3,5 m. A unidade acima também possui terminações em downlap em direções distintas.

Page 6: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório e Tramandaí - RS

GRAVEL

26

Figura 4. Radargrama de 200 MHz, obtido na mineradora 1. São observadas as radarfácies e as superfícies.

Figura 5. Radargrama de 200 MHz obtido na mineradora 2. São observadas as radarfácies e as superfícies.

Page 7: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

Fracalossi et al.

GRAVEL

27

Nas seções adquiridas com antena de 400 MHz foram definidas duas superfícies de radar e três padrões de radarfácies. As superfícies de radar foram nomeadas por s’2-sl e s’3-sl. A superfície s’2-sl é lateralmente continua, ondulada, com terminações em downlap. E a superfície s’3-sl é caracterizada por toplap e downlap.

A radarfácies f’2-ma possui refletores ondulados, subhorizontais, subparalelos e moderadamente contínuos. Esta radarfácies ocorre na mineradora 1, abaixo da cota -0,5 m e na mineradora 2 cota 0,2 m, não estando presente nas seções das mineradoras 3 e 4.

Os refletores da radarfácies f’3-ma são curvados, subhorizontais. A relação entre os refletores é subparalela. Descontínuos. Esta radarfácies foi identificada em todas as

mineradoras. O limite superior da mesma só é registrado na mineradora 3, onde corresponde a 5,4 m, equivalendo ao topo do nível contendo tubos de Ophiomorpha. Nas outras mineradoras, as seções foram adquiridas abaixo deste limite.

E por último, a radarfácies f’4-pr é caracterizada por refletores curvados, mergulhando levemente para SE, subparalelos e contínuos. Esta radarfácies ocorre apenas na mineradora 3.

Na Figura 6 observa-se uma seção adquirida com a antena de 400 MHz na mineradora 1. Observa-se a superfície s’2-sl limitando as radarfácies na f’2-ma e f’3-ma. Na unidade inferior observam-se porções onde os refletores ficam transparentes. A unidade superior desta mostra o mesmo padrão de terminações em downlap mergulhando para diferentes direções.

Figura 6. Radargrama de 400 MHz obtido na mineradora 1. São observadas as radarfácies e a superfície.

Na Figura 7 identificam-se a superfície de

radar s’3-sl e a radarfácies r’4-pr as quais foram observadas em algumas seções da mineradora 3. A seção atingiu a profundidade de 8 m tem SE-NW, perpendicular a linha de costa atual.

Foi possível realizar uma comparação das radarfácies com as litofácies que afloram na área (Fig. 8). Devido à diferença de resolução entre as antenas de 200 e 400 MHz, as radarfácies

equivalentes mostram pequenas diferenças. A radarfácies f3-ma e f’3-ma corresponde à areia fina esbranquiçada, bem selecionada, com estratificação cruzada acanalada e tabular mergulhando em sentidos contrários, presença de tubos de Ophiomorpha (Callichirus sp.). E f’4-ma corresponde a areias finas esbranquiçadas, bem selecionadas com estratificação subhorizontal.

Page 8: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório e Tramandaí - RS

GRAVEL

28

Figura 7. Radargrama de 400 MHz obtido na mineradora 3. São observadas as radarfácies e a superfície.

Figura 8. Correlação entre as radarfácies das antenas de 200 e 400 MHz e suas correspondentes litológicas em

afloramento na mineradora 4.

A partir da análise das seções de GPR, integradas com outros dados observados em campo é proposto o ambiente deposicional correspondente as mesmas (Fig. 9). A unidade inferior, onde ocorre lama, com características

marinhas, foi depositada em ambiente de shoreface inferior.

As formas paralelas dos refletores da radarfácies f2-ma e f’2-ma, indicam ambiente de baixa energia, interrompido por momentos de

Page 9: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

Fracalossi et al.

GRAVEL

29

alta energia, que geram as descontinuidades nos mesmos, pode ser resultado de um ambiente marinho raso, com perturbações de energia devido a tempestades ou pela proximidade com o embasamento na área. Esta unidade foi depositada no shoreface médio.

O padrão da radarfácies f3-ma e f’3-ma caracteriza um ambiente de energia alta, as terminações em downlap migrando para diversas

direções provavelmente estão relacionado com a migração de bancos e pequenos canais. A descrição da litofácies correspondente também auxilia na interpretação do ambiente deposicional. Esta unidade foi interpretada como gerada no ambiente shoreface superior. O radarfácies f’4-pr, também aflorante na área foi gerada em ambiente praial subaéreo, no foreshore.

Figura 9. Relação entre as radarfácies e os ambientes deposicionais nas quais foram geradas (modificado de

Walker, 1992). CONCLUSÕES

Foram definidas quatro unidades através das seções de GPR. Os ambientes deposicionais destas unidades foram possíveis determinar através da integração dos resultados integrados dos métodos utilizados no trabalho.

A unidade basal foi definida através dos dados de GPR como radarfácies f1-ma. Fracalossi (2009) analisou nesta unidade uma amostra sedimentar quanto aos parâmetros granulométricos e morfoscópicos, e também através da difração de raios-X. As análises nessa amostra demonstraram a presença de Glauconita, mineral autigênico de origem marinha. Outros relatos deste mineral na PCRS foram feito por Dillenburg et al. (2000) e Tomazelli & Dillenburg (2007). Ambos os autores correlacionaram este mineral com depósitos de shoreface.

A radarfácies f2-ma e f’2-ma foi caracterizada através do GPR, e não foi possível observar a mesma por não estar aflorante na área. O ambiente de deposição foi interpretado como shoreface médio, no trabalho de

Tomazelli & Dillenburg (2007) esta foi interpretada juntamente com a unidade abaixo. As reflexões de radar possibilitaram diferenciar ambas.

A terceira unidade identificada, radarfácies f3-ma e f’3-ma, foi possível caracterizar nas seções de GPR e correlacionar com a as litofácies observadas em campo. Foi interpretada como shoreface superior. Os icnofósseis Ophiomorpha abundantes na unidade são bons marcadores de paleoambientes, indicado a zona compreendida entre o nível médio do mar e as marés baixas normais ou excepcionais (Barreto et al., 2002). A estratificação mergulhando para lados contrários presentes nesta, lembra a estratificação espinha de peixe, atribuída a áreas com regime de macromarés. Considerando-se que o regime de marés da época era semelhante ao atual (micro marés, com amplitude de 0,50 m (Tomazelli & Dillenburg, 2007)), é provável que esta estratificação não seja resultado das marés, e sim de migração de formas de leito como barras.

A unidade superior, radarfácies f’4-pr, só está em poucas seções obtidas com antena de

Page 10: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório e Tramandaí - RS

GRAVEL

30

400 MHz na mineradora 3. Não pode ser observada em outras mineradoras devido à extração de areia. Esta unidade foi interpretada como gerada no foreshore.

Os valores medidos do topo do nível contendo tubos de Ophiomorpha ajudam a estimar o nível médio do mar na época. O maior valor medido foi 7,281 m, na mineradora 2, e o menor 2,545 m, na mineradora 1. Este valor provavelmente não corresponde ao topo do nível, apesar de ser a exposição mais alta encontrada nesta mineradora. Rodrigues & Shimizu (1997) descrevem a morfologia das galerias formadas por estes, o que possibilitou uma comparação com o nível medido, concluído que o mesmo não é a parte superior da galeria.

Assumindo-se que o regime de marés da época era semelhante ao atual (0,5 m), o nível máximo alcançado na região de estudo foi em torno de 7,7 m acima do nível atual. Estes dados correspondem a valores encontrados por outros autores ao longo da costa brasileira: 6 a 8 m (Bittencourt et al.,1979); 7±1 m (Martin et al., 1982); 8±2 m (Suguio et al., 2005); aproximadamente 7 m (Tomazelli & Dillenburg, 2007).

A sucessão vertical das fácies depositada durante o Pleistoceno superior, idade de 120 ka, mostra um padrão de empilhamento progradacional, caracterizando uma barreira regressiva. Tomazelli & Dillenburg (2007) descreveram o mesmo comportamento da barreira, considerando dados sedimentológicos e paleontológicos.

A caracterização dos padrões de radarfácies das unidades utilizadas na exploração de areia na região é importante para auxiliar as mineradoras. Os níveis explorados atualmente correspondem as radarfácies f2-ma/f’2-ma e f3-ma/f’3-ma. Estas foram caracterizadas através das seções obtidas com as antenas de 200 e 400 MHz. As seções obtidas para este estudo foram coletadas diretamente sobre os sedimentos da Barreira III, sem cobertura de solos. A composição dos solos pode afetar na propagação do sinal da onda eletromagnética, causando assim um resultado diferente para o mesmo material. AGRADECIMENTOS

Os autores expressam seus agradecimentos

ao CNPq (processos no 472380/2007-9 e

300699/2007-7) pelo apoio financeiro deste estudo através do Projeto de Pesquisa e Bolsa de Produtividade em Pesquisa. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARRETO, A.M.F.; BEZERRA, F.H.R.;

SUGUIO, K.; TATUMI, S.H.; YEE, M.; PAIVA, R.P. & MUNITA, C.S. 2002. Late Pleistocene marine terrace deposits in Northeastern Brazil: sea-level changes and tectonic implications. Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology 179, p. 57–69.

BITTENCOURT, A.C.S.P.; MARTIN, L.; VILAS BOAS, G.S. & FLEXOR, J.M. 1979. Quaternary marine formations of the coast of the State of Bahia (Brazil). Proceedings of the International Symposium on Coastal Evolution in the Quaternary. São Paulo, Brazil, p. 232–253.

DILLENBURG, S.R.; LAYBAUER, L.; MEXIAS, A.S.; DANI, N.; BARBOZA, E.G. & LUMMERTZ, C.N. 2000. Significado estratigráfico de minerais glauconíticos da Planície Costeira do RS, região da Laguna de Tramandaí. Revista Brasileira de Geociências. 30, p. 649–654.

FRACALOSSI, F.G. 2009. Análise estratigráfica da Barreira Pleistocênica III entre Osório e Tramandaí - RS. Trabalho de conclusão (Graduação) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Instituto de Geociências, Porto Alegre, BR-RS, 54p.

GAWTHORPE, R.L.; LL COLLIER, R.E.; ALEXANDER, J.; BRIDGES, J.S. & LEEDER, M.R. 1993. Ground penetrating radar: application to sandbody geometry and heterogeneity studies. In: NORTH, C.P. & PROSSER, D.J. (Eds.). Characterization of Fluvial and Aeolian Reservoirs. Geological Society Special Publication No. 73, The Geological Society, London, pp. 421-432.

JOL, H.M. & SMITH, D.G. 1991. Ground penetrating radar of northern lacustrine deltas. Can. J. Earth Science 28, p. 1939– 1947.

KLEMME, H.D. 1971. The Giants and the Supergiants. Part 2. To find the Right Basin. Oil e Gas Journal. p. 103-110.

MARTIN, L.; BITTENCOURT, A.C.S.P. & VILAS BOAS, G.S. 1982. Primeira ocorrência de corais pleistocênicos na costa

Page 11: O Registro em Subsuperfície da Barreira Pleistocênica entre Osório

Fracalossi et al.

GRAVEL

31

brasileira: datação do máximo da penúltima transgressão. Revista Ciências da Terra 1, p. 16–17.

MITCHUM, R.M.; VAIL, P.R. & SANGREE, J.B. 1977. Stratigraphic interpretation of seismic reflection patterns in depositional sequences. In: PAYTON, C.E. (Ed.). Seismic Stratigraphy - Applications to Hydrocarbon Exploration. AAPG Memoir 16, p. 117– 123.

NEAL, A. 2004. Ground-penetrating radar and its use in sedimentology: principles, problems and progress. Earth-Science Reviews 66, p. 261–330.

RODRIGUES, S.A. & SHIMIZU, R.M. 1997. Autoecologia de Callichirus major (Say, 1818), p. 155-170. In: R. ABSALÃO & A.M. ESTEVES (Eds.). Ecologia de praias arenosas do litoral brasileiro. Rio de Janeiro, PPGE-UFRJ, Série Oecologia Brasiliensis, vol. 3, 270p.

SUGUIO, K.; ANGULO, R.J.; CARVALHO, A.M.; CORRÊA, I.C.S.; TOMAZELLI, L.J.; VILLWOCK, J.A. & VITAL, H. 2005. Paleoníveis do mar e paleolinhas de costa. In: SOUZA, C.R.G., SUGUIO, K., OLIVEIRA, A.M.S., OLIVEIRA, P.E. (Eds.). Quaternário do Brasil. Holos Editora, Ribeirão Preto, São Paulo, pp. 114–129.

TOMAZELLI, L.J. & DILLENBURG, S.R. 2007. Sedimentary facies and stratigraphy of a last interglacial coastal barrier in south Brazil. Marine Geology 244, p. 33-45.

TOMAZELLI, L.J.; HORN F°, N.O.; VILWOCK, J.A.; DEHNHARDT, E.A.; LOSS, E.L. & KOPPE, J.C. 1984. Mapa Geológico das Folhas de Osório e Tramandaí. Escala 1:100.000. CECO/IGEO/UFRGS.

WALKER, R.G. & JAMES, N. 1992. Facies models: response to sea level change. Newfoudland, Canadá: Geological Association of Canada. 454p.

WEEKS, L.G. 1952. Factors of Sedimentary Basin Development that control oil occurrence. American Association Petroleum Geologists Bulletin. n. 36. p. 2071-2124.

VILLWOCK, J.A. & TOMAZELLI, L.J. 1995. Geologia costeira do Rio Grande do Sul. Notas Técnicas, CECO, UFRGS. Porto Alegre, n.8, 45p.

VILLWOCK, J.A.; TOMAZELLI, L.J.; LOSS, E.L.; DEHNHARDT, E.A.; HORN Fº, N.O; BACHI, F.A. & DEHNHARDT, B.A. 1986. Geology of the Rio Grande do Sul Coastal Province. In: Rabassa J. (Ed.). Quaternary of South America and Antarctic Peninsula. Rotterdam, A.A. Balkema. v.4, p.79-97.