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OS DESAFIOS DA ESCOLA NA CONTEMPORANEIDADE: CONVERSAÇÕES...
Joana Cecília Biss Silva (FURB)
Diana Sueli Vasselai Simão (FURB)
Orientadora: Gicele Maria Cervi (FURB)
INTRODUÇÃO
A existência da escola, embora pareça tão natural e óbvia, nem sempre existiu. Essa
instituição de ensino foi inventada, pensada e construída para atender a um conjunto de
demandas específicas de uma época, de um projeto histórico. Essa instituição de confinamento
era compatível com os corpos e subjetividades da sociedade industrial, os sujeitos eram
treinados para que funcionassem com eficiência.
Na contemporaneidade exigem-se outras habilidades e competências para tornar cada
um de nós mais produtivo e eficaz. A sociedade requer corpos compatíveis com o modo de ser
e de estar no mundo contemporâneo, e a escola se vê interpelada por essas transformações. As
mudanças impostas pela sociedade com o crescente uso das tecnologias digitais desafiam a
forma de se fazer educação na escola regular e consequentemente causam perplexidade,
insegurança e inquietação aos professores.
A chamada escola ou (pedagogia) tradicional se fez presente no contexto escolar, de
modo hegemônico, até o fim do século XIX. Neste âmbito é enfatizada a exposição dos
conteúdos de forma verbal pelo professor, que é autoridade máxima, bem como a memorização
por meio da repetição. O estudante deve se empenhar para atingir êxito pelo próprio esforço.
Prevalece a transmissão de conhecimento, sendo a escola centrada em uma formação moral e
intelectual. É hierarquizada com normas de disciplina (SAVIANI, 2007).
A partir do fim do século XIX, na busca pela superação da concepção tradicional
surgiram iniciativas visando à implantação de novas formas de ensino. Surge, então, a Escola
Nova com uma proposta na qual o aluno passa a ser o centro do processo. O professor se torna
facilitador da aprendizagem, priorizando o desenvolvimento psicológico e a autorrealização do
educando, agora agente ativo, criativo e participativo no ensino-aprendizagem. Os conteúdos
ganham significação, são expostos por meio de atividades variadas como trabalhos em grupo,
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pesquisas, jogos, experiências, entre outros. Sua principal característica é “aprender a
aprender”.
De acordo com Teixeira (1971) o próprio ato de aprender, durante muito tempo
significou simples memorização; depois seu sentido passou a incluir a compreensão e a
expressão do que fora ensinado; por último, envolveu algo mais: ganhar um modo de agir. Só
se aprende quando se assimila uma coisa de tal forma que, chegado o momento oportuno, sabe-
se agir de acordo com o aprendido.
A Escola Nova no Brasil surgiu vinculada à necessidade de expandir o ensino elementar,
de superar a escola tradicional diante das exigências do mundo moderno e teve por base uma
nova filosofia da educação derivada do novo tipo de vida, de uma nova concepção das suas
funções sociais. “A escola é o retrato da sociedade a que serve” (TEIXEIRA, 1971).
Os intelectuais que se intitularam renovadores propõem um novo olhar sobre a função
da escola, sobre a criança e sua inserção na sociedade, por entender que a educação oferecida
não poderia estar alheia aos problemas sociais nem ao indivíduo partícipe do processo. Para
isso, Freire (1980), que a partir da década de oitenta, surge com a Tendência Progressista
Libertadora, utilizou-se do método dialógico e interdisciplinar. O professor é apresentado como
animador da discussão em grupo, inserindo o contexto sociopolítico do aprendiz na prática
didática, fazendo uma análise crítica da realidade, gerando conhecimento a partir da leitura do
contexto social no qual o aluno está inserido. Conforme Freire (1987, p. 30): “A educação é um
ato político, ideológico e emancipatório (ou doutrinador), que cria vínculos e compromissos
com o futuro, de maneira a contribuir como seres humanos, que vivem e realizam suas
atividades em sociedade”.
O presente artigo pretende discutir os desafios da escola na contemporaneidade
avaliando a prática da “concepção bancária”, tão duramente criticada por Paulo Freire como
metodologia de ensino, e avaliar, em diálogo aberto com os alunos do 9º ano A da E.B.M.
Professora Zulma Souza da Silva se na sala de aula os alunos percebem, na didática do
professor, elementos dessa postura libertadora defendida por Freire. Ao contextualizar a
concepção bancária e demonstrar algumas tentativas de reconceituação da escola, como a
implantação da escola em ciclos de formação e consequentemente o ensino por meio de
projetos, faz-se uma reflexão em relação aos desafios que a escola vem enfrentando na
contemporaneidade.
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Para orientar esse processo de discussão, os alunos escolhidos para participar do projeto
responderam com suas opiniões alguns direcionamentos capazes de esclarecer como eles
entendem o processo de ensino aprendizagem em sua rotina e de que forma eles conseguem
absorver melhor o conteúdo trazido pelo professor avaliando dois contextos distintos: o diálogo
e as mídias. Esclarecem também, ainda que indiretamente, algumas posturas e resquícios das
metodologias de ensino usadas no cotidiano da escola que apontam para a compreensão da
metodologia de aprendizagem vigente.
Não é pretensão desse artigo apresentar ou julgar métodos e posturas dos profissionais
que atuam na escola pesquisada, somente esclarecer, com o devido cuidado e sensibilidade
como o aprendiz entende e percebe o seu universo e como melhor compreende o processo de
aquisição do conhecimento.
É nesse sentido, que se estabelece o problema de pesquisa desse estudo: Os estudantes
do 9ºano A da escola pesquisada percebem na sala de aula e na didática dos professores
elementos da postura libertadora defendida por Paulo Freire?
A “Concepção Bancária” criticada por Paulo Freire e a Escola Libertadora
Freire (1987) define que no modelo tradicional de educação, os professores são os
agentes ativos na troca pedagógica, os únicos detentores de conhecimento legítimo, e depositam
esse saber na cabeça dos estudantes, considerados “depositários”, passivos da informação
externa, e que mais tarde recitarão ou escreverão mecanicamente os saberes recebidos. Na
chamada concepção bancária de educação, de acordo com Freire (2006, p. 69): “O educador é
aquele que age; os alunos, aqueles que têm a impressão de agir, através da ação do educador; o
educador escolhe o conteúdo do programa; os alunos, nunca são consultados sobre essa escolha
[...]”.
Além disso, se na educação bancária o docente é aquele que conhece e o aluno aquele
que não conhece nada, a tarefa do primeiro consistirá em trazer conhecimentos para o segundo,
e esses conhecimentos, segundo Freire, não serão aqueles da “experiência vivida”, mas os da
experiência narrada ou transmitida (FREIRE, 2006).
Contra o método tradicional, Freire (2006) propõe uma abordagem dialógica que faça
dos estudantes co-participantes do seu próprio crescimento intelectual, que procura envolver os
estudantes no processo de aprendizagem e levá-los a assumir a sua cultura e a sua experiência
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pessoal como pontos de referência; despertando-os para a consciência das forças sociopolíticas
que dão forma a essa realidade.
Freire (1987) salienta ainda, que essa realidade pode ser transformada por meio do
diálogo crítico, libertador que leva à reflexão crítica e à ação prática, dando às pessoas poder
sobre sua própria vida. Educar é um ato essencialmente político no qual os mais fracos
aprendem a obter o poder, pois a força encontra-se na coletividade. Freire (1987, p. 29) diz:
“Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho, os homens se libertam em comunhão”.
Com a redemocratização do país na década de 1980 que encerrava um período de
autoritarismo; com as significativas mudanças políticas, econômicas e sociais que refletiram no
contexto geral do país; e diante da visão educativa de Freire, na qual se inscrevia em uma
perspectiva dialógica concebendo a educação como prática de liberdade, o Sistema Municipal
de Ensino de Blumenau propôs a implantação da Escola Sem Fronteiras.
Paulo Freire e a Escola Sem Fronteiras
Para escapar à alienação da educação bancária, a Escola Sem Fronteiras propôs a
reorganização temporal da escola em ciclos de formação, de acordo com a política de inclusão,
que acolhe a todos a partir de seus processos históricos, culturais em uma tentativa dialógica. E
diante desses processos avançam na aprendizagem de cada um e, por conseguinte, no pleno
desenvolvimento integral do ser humano. A proposta da Escola Sem Fronteiras atendeu ao que
preconiza a LDB em seu artigo 2º ao dizer que a educação “tem por finalidade o pleno
desenvolvimento do educando”.
A Escola Sem Fronteiras é o resultado da caminhada dos educadores da Rede Municipal
de Ensino de Blumenau no exercício reflexivo e na busca de práticas que pudessem superar a
lógica excludente e linear da escola convencional. Essa proposta foi organizada a partir do ano
de 1997, tendo como eixos norteadores o acesso, a permanência e sucesso de todos os sujeitos
envolvidos pela escola, a qualidade social da educação e a gestão democrática.
A Escola Sem Fronteira apoia-se nos pressupostos de um projeto de autonomia e
liberdade, defendidos por Freire (1987), e rompe com o processo restrito da escolarização que
reduz a aprendizagem ao que acontece dentro dos muros da escola. Acreditando que a educação
possa ser construída nos mais diversos espaços e tempos históricos, sociais e culturais. A
educação é vista como um processo de oportunização do desenvolvimento pleno das
potencialidades dos humanos. Segundo Arroyo (2000, p. 53): “Não nascemos humanos, nos
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fazemos humanos. Aprendemos a ser. [...] Se preferirmos, toda criança nasce humana, mas isso
não basta! Temos que aprender a sê-lo. Podemos acertar ou fracassar. Nessa aprendizagem
também há sucesso e fracasso”.
A utilização do conhecimento, a reflexão sobre as implicações de seu uso, por um lado,
e, por outro, a compreensão de como se efetua no ser humano a construção do conhecimento e
de como modifica os processos do pensamento e de memória passam a ser, nesta proposta,
elementos fundamentais da ação educativa.
O ciclo de formação é consequência da reconceituação da escola como espaço de
formação, não só de aprendizagem. A constituição do sujeito é a preocupação inicial, e a partir
daí se concebe uma educação em que as aprendizagens serão definidas em função deste objetivo
mais amplo. Não se trata, portanto, de justaposição de aprendizagens das várias áreas, mas do
conhecimento como parte integrante da formação humana, o que inclui certamente, a dimensão
ética do conhecimento. A noção de ciclos está ligada, a um projeto de educação que valoriza a
formação global humana.
De acordo com Miguel Arroyo (2000), ciclo não é um amontoado ou conglomerado de
séries, nem uma simples receita para facilitar o fluxo escolar, acabar com a reprovação e a
retenção, não é uma sequência de ritmos de aprendizagem. É mais do que isso. É uma procura,
nada fácil, de organizar o trabalho, os tempos e espaços, os saberes, as experiências de
socialização da maneira mais respeitosa para com as temporalidades do desenvolvimento
humano. As idades da vida, da formação humana passam a ser o eixo estruturante do pensar,
planejar, intervir e fazer educativos, da organização das atividades, dos conhecimentos, dos
valores, tempos e espaços. Trabalhar em um determinado tempo-ciclo da formação humana
passa a ser o eixo identitário dos profissionais da educação básica e de seu trabalho coletivo e
individual.
Diante desse entendimento, dessa nova maneira de trabalhar, há uma diferente
perspectiva educacional, com mais autonomia com relação aos tempos e espaços, fortalecendo
assim o ensino por projetos. Com eles, as disciplinas deixam de ser trabalhadas isoladamente
para serem entendidas como campos conceituais do conhecimento. Os referenciais curriculares
representam capacidades, domínios, habilidades, apropriações que se pretendem alcançar na
fase de formação. Os conteúdos deixam de ter finalidades em si mesmo e passam a ser vistos
como meios (desenvolvimento contextualizado). Entende-se que o conhecimento é construído
e reconstruído, processual e continuamente. Ele é resultado da história de vida, as experiências
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de cada um e sugere uma intervenção ativa do sujeito. Trabalhar com projetos motiva tal
intervenção.
Os projetos apontam para outra maneira de representar o conhecimento escolar
baseando-se na aprendizagem e intervenção da realidade, orientando o estabelecimento de
relações entre a vida dos alunos e professores e o conhecimento que as disciplinas e outros
saberes não disciplinares vão elaborando. Tudo isso para favorecer o desenvolvimento de
estratégias de indignação, interpretação e apresentação do processo percorrido ao estudar-se um
tema ou um problema que, por sua complexidade, favorece o melhor conhecimento dos alunos
e dos professores a respeito de si mesmos e do mundo em que vivem. No ponto de vista de
Hernandez (1998): “Os projetos de trabalho supõem, um enfoque no ensino que trata de
ressituar, repensar, recriar as concepções e as práticas educacionais na escola e não
simplesmente adaptar uma proposta do passado e atualizá-la”. Buscam uma escola voltada para
o que é mais significativo e significante na construção do ser humano, tendo conhecimentos
que lhe possibilitem construir uma sociedade justa, ética e feliz.
A Escola na Contemporaneidade
A escola que temos hoje não corresponde á mesma instituição que marcou a primeira
metade do século XX. Durante esse século fomos conhecendo escolas. A instituição escolar
sofreu mutações que podemos sintetizar em uma fórmula breve: a escola passou de um contexto
de certezas, para um contexto de promessas, inserindo-se, atualmente, em um contexto de
incertezas (CANÁRIO, 2006).
Segundo Canário (2006), a escola de certezas correspondeu à primeira metade do século
XX e funcionava como “fábrica de cidadãos”. A escola de promessas marcou a passagem de
uma escola elitista para uma escola de massas e a escola de incertezas marca um contexto de
acréscimo de qualificações, de desigualdades, desemprego e dos diplomas escolares.
Com a modernidade, as transformações físicas, sociais e culturais influenciam as escolas
e essas mudanças estão influenciando os corpos e as subjetividades, porém em pleno século
XXI a escola continua com a mesma estrutura e organização pedagógica. Muros altos, salas
fechadas, carteiras enfileiradas, quadro, mesa do professor à frente, continua com os mesmos
tempos e os mesmos espaços, fragmentação dos conteúdos e engavetamento das disciplinas.
Tais características permanecem presentes hoje em dia e servem como forma de
disciplinamento dos corpos. “A ordenação por fileiras no século XVIII começa a definir a
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grande forma de repartição dos indivíduos na ordem escolar: filas de alunos na sala; [...]
alinhamento das classes de idade umas depois das outras; sucessão dos assuntos ensinados [...]”
(FOUCAULT, 2012, p. 141).
De acordo com o autor supracitado, o corpo que pode ser submetido, utilizado,
transformado e/ou aperfeiçoado é dócil. E é esta uma das características da escola: “docilizar”
o aluno, torná-lo utilizável para a sociedade. Tanto seus componentes quanto seus modos de
funcionamento não estão em sintonia com os jovens do século XXI e de acordo com Sibília
(2012, p. 11):
[...] Ainda assim e apesar de tudo, insiste em acontecer todos os dias durante longas
horas, em quase todos os cantos do planeta -, as peças não se encaixam bem:
descobrem-se ressaltos imprevistos em suas engrenagens e os circuitos se obstruem
com frequência, ocasionando toda sorte de atritos, ruídos, transbordamentos e até
enormes desastres.
A estrutura continua a mesma, os tempos e espaço também, mas os sujeitos são outros.
Para Sibília (2012) por um lado há a escola, com todo o classicismo que ela carrega nas costas;
por outro, a presença cada vez mais incontestável desses “modos de ser” tipicamente
contemporâneos.
E isso, vivencia-se diariamente na escola, a criança não quer mais permanecer sentada
ouvindo um professor durante quatro horas. Antigamente o conhecimento era obtido por meio
da escola. Hoje o aluno é midiático. De acordo com Sibília (2012, p. 87), a velocidade do fluxo
de informação atual, bem como sua intensidade, conspira contra a coagulação dos significados.
O estudante atual, portanto, não seria mais um receptor, mas, sim, um usuário que “surfa
ininterruptamente no caos das informações”, reconstituindo e ordenando esse caos com
velocidades bem diferentes dos ritmos e tempos escolares.
Dessa forma, o professor que foi educado, formado, informado, concebido,
profissionalizado... como fruto de diferentes concepções (bancária, tradicionalista, libertadora,
sem fronteiras...) precisa atuar junto a um aluno contemporâneo totalmente digital, com pleno
acesso à informação, com meios mais atraentes, rápidos e conectados a diferentes universos de
ação. Por conseguinte, o docente precisa focar seu planejamento a formas diferenciadas de
chamar a atenção desse aluno aos contextos que são importantes para a sua formação. E, como
conseqüência, precisa estar em constante formação, para poder atingir de forma eficiente e
eficaz os resultados almejados. No entanto, é preciso perceber como os alunos avaliam esse
processo / espaço de ensino e aprendizagem.
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DISCUSSÕES
Com a pretensão de não julgar e sem o propósito de criticar posturas ou metodologias
adotadas pelos professores, em diálogo com um grupo de alunos que compõem o 9º ano de uma
escola da Rede Municipal de Ensino de Blumenau (E.B.M. Profª. Zulma Souza da Silva),
questionou-se, após explicar como historicamente foram compreendidas as concepções de
aprendizagem no Brasil, como eles viam e entendiam o processo de ensino e aprendizagem de
suas práticas escolares atuais.
Cabe ressaltar, que os indivíduos que compõem essa sala são questionadores e avessos
a obedecer a regras ou imposições sem muito discutir e por assim dizer, criar regras próprias
para burlar ou antepor-se ao que lhes é imposto. A criticidade do grupo os torna difíceis como
contexto de trabalho desfiando professores, gestores e coordenadores a assumir posturas
diferenciadas para lidar com os ensinamentos previstos ao grupo. Isso desafiou os profissionais
que atendem a esse grupo a traçar um planejamento diferenciado, e justamente por esse motivo,
chamou a atenção da pesquisadora, que se propôs a dirigir esse estudo a esse contexto
específico. Importou-se em apresentar como eles entendem os métodos usados no processo de
ensino / aprendizagem e como melhor compreendem o processo de aquisição do conhecimento
na atualidade e considerando-se a realidade de suas vivências no ‘chão da escola’. Por
conseguinte, foi feita uma avaliação de dois aspectos: a importância do diálogo entre professor
e estudante para a aquisição do conhecimento e a contribuição das mídias (sobretudo a internet)
na construção desse processo de ensino e aprendizagem, como apresenta o item a seguir.
Os Estudantes e a Relação Dialógica
Os estudantes foram questionados quanto à importância do diálogo, de se discutir, trocar
ideias, construir conceitos sobre os assuntos abordados em sala. Admitem que nem todos os
docentes utilizam esse método, mas, que aprendem mais quando podem se valer desses aspectos
de interatividade com os assuntos. Ao observar o depoimento de alguns estudantes percebe-se
claramente essa valorização:
Quanto mais conversamos com o professor, mais aprendemos. [...] Além de aprender
a aula fica mais interessante, diferente. [...] Há mais interação entre professor e aluno.
9
[...] Relaciona a prática ao conteúdo. [...] Quando se discute, o assunto fica mais
detalhado (ESTUDANTES 9º ANO, 2014).
Os conteúdos apresentados pelo professor, a partir do planejamento coletivo escolar,
devem refletir as experiências vividas pelo estudante, servindo de ponto de partida para
conhecimentos mais elaborados dentro de cada disciplina. Devem-se considerar as diferenças
individuais, as necessidades e interesses dos alunos, a faixa etária e cultural do aprendiz. Por
isso, o papel do professor adquire grande importância não só na escolha da atividade
[interessante, adequada à idade, com objetivos e regras claras etc.], mas, sobretudo, ao exercer
seu papel de mediador do conhecimento (SORDI; LUDKE, 2009).
Para os discentes consultados, a aprendizagem se dá, sobretudo, pela forma com que o
professor interage e mostra a relação do que é estudado com a prática desse contexto nas suas
vidas. Questionados sobre a eficácia de aulas em que o professor expõe o conteúdo como
detentor do conhecimento, cobra exercícios e aplica provas sem discutir o contexto, algumas
abordagens foram apontadas pelos estudantes, como expressa o Gráfico 1.
Gráfico 1 – Avaliação dos alunos sobre a aula não dialogada e expositiva
Fonte: Dados da pesquisa.
Evidencia-se que a cópia de conteúdos não é significativa para a aprendizagem dos
estudantes quando não acompanhada por discussões. Na prática de sala de aula o professor
precisa ter um planejamento sequencial e organizado, coerente com os objetivos abordados pelo
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Projeto Político Pedagógico (PPP) e os objetivos estipulados para o ano letivo como norteadores
do processo de aprendizagem ao estudante, e constituintes do ato avaliativo, pois, como afirma
Luckesi (2013, p. 2): “Não há como praticar avaliação da aprendizagem, sem que essa
aprendizagem esteja configurada previamente (planejamento). Afinal, o que se deseja com a
ação de ensinar? [...] A avaliação, de modo subsidiário, servirá a esse desejo”. Dessa forma, o
contexto escolar, e seus diversos atores, são responsáveis por uma ação de qualidade, e,
portanto, um bom planejamento, construído coletivamente.
A utilização do conhecimento, a reflexão sobre as implicações de seu uso, por um lado,
e, por outro, a compreensão de como se efetua no ser humano a construção do conhecimento e
de como modifica os processos do pensamento e de memória passam a ser, nesta proposta,
elementos fundamentais da ação educativa.
Porém, ao observar, no entanto, a realidade de uma sala de aula, constata-se situações
em que a atividade escolar é de mera reprodução, tanto no que diz respeito ao estudante quanto
ao professor. A ação pedagógica acontece não por meio de uma relação interativa, mas
autoritária, diretiva, em que a ideia de construção do conhecimento está atrelada ao processo de
depositá-lo nos educandos, na reprodução do saber, como na concepção bancária. E isso foi
perceptível no depoimento dos estudantes. Alguns professores ainda entram em sala sem o
propósito de interagir, falando de cima de um pedestal que já ruiu quanto à aquisição do
conhecimento, evidenciando a reprodução de um discurso e uma metodologia que não abraçam
as concepções dirimidas por Paulo Freire (1980). No entanto, segundo os discentes, a maioria
dos professores já possui, pelo menos em uma parcela bem significativa de suas aulas, essa
interação com os alunos.
Isso oportuniza inferir que a metodologia vigente no contexto da escola pesquisada em
relação às práticas discentes possui resquícios (muitos) da concepção bancária, mas também
possui (muitos) aspectos inovadores e libertários, com claros métodos que apontam a
compreensão do entendimento educacional defendido por Paulo Freire. O pensamento de Freire
(1980, 1987, 2006) é contemporâneo e inspira a teoria e a prática da educação. Em suas
reflexões, evidencia cuidados, propondo a humanização das relações e libertação dos homens.
Uma pedagogia solidária, reflexiva e fundamentada na práxis, inserida em uma política de
esperança, de luta revolucionária, de amor e fé no ser humano. O diálogo é o elemento chave
possibilitador do processo de conscientização, e professor e aluno são sujeitos atuantes.
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Assim, responde-se ao problema de pesquisa desse estudo, apontando que os estudantes
do 9ºano A da escola pesquisada percebem na sala de aula e na didática dos professores
elementos da postura libertadora defendida por Paulo Freire. Salienta-se, no entanto, que há
muito a ser conquistado para a completa compreensão e prática das abordagens Freirianas.
O segundo aspecto avaliado pelos estudantes foi a presença das mídias no processo de
aprendizagem, como mostra o item a seguir.
As Mídias na Aprendizagem
Para avaliar, qual é, na concepção do estudante, a importância das mídias no processo
ensino / aprendizagem, considerando-se que a informação está acessível e na “palma da mão”
da maioria dos alunos (pois quase todos possuem celular com acesso à internet e o utilizam na
escola); questionou-se a importância do uso dessas mídias (sobretudo a internet) como
contribuinte do processo ensino / aprendizagem. Entre as respostas, obtiveram-se dados
conforme apresenta o Gráfico 2.
Gráfico 2 – Importância das mídias no processo ensino / aprendizagem
Fonte: Dados da pesquisa.
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Observa-se que os estudantes não citam o uso das mídias em sala de aula como um
processo contributivo na aquisição da aprendizagem. A informação das mídias é considerada
importante como complemento de estudo e conhecimento, sobretudo por sua praticidade.
Conforme diz uma aluna do 9º Ano pesquisado (2014): “Tudo que tem lá, [na internet], tem em
livros, lá é só um meio mais rápido de achar a informação”. Os estudantes também percebem
os riscos decorrentes do uso inconsequente da internet como fonte de consulta de dados, que é
mencionado associado à necessidade de seleção das informações. Reconhecem ainda que
embora seja um motivo de incentivo para a aprendizagem, também serve como distração
(tentação) para desviar a atenção da aula. Um dos estudantes escreveu (ESTUDANTE DO 9º
ANO, 2014): “Na maioria das vezes a internet não tem importância. Pode ajudar ou atrapalhar,
as músicas muitas vezes ajudam o aluno a fazer as atividades com calma, mas também
atrapalham pelo fato de ser um motivo de distração”.
Embora muitos docentes façam uso de diferentes mídias como recurso pedagógico na
escola pesquisada, e os próprios alunos reconheçam isso, o foco das aprendizagens não está
centrado no uso dessas alternativas. São instrumentos facilitadores, uma metodologia de
abordagem dos conteúdos. Ressalta-se, por exemplo, o uso da internet em traduções e pesquisas
orientadas, tanto na escola como em exercícios extraclasse em complementos de conteúdos.
No entanto, ainda é comum encontrar em pleno século XXI, na sociedade da
comunicação, um ambiente escolar em que os alunos assistem passivamente a aulas expositivas
como espectadores, protagonistas de um processo que não lhes permite agir como sujeitos. O
conteúdo estudado, muitas vezes, encontra-se desvinculado da realidade, sem nenhum elo com
as diferentes linguagens em circulação no mundo moderno. De acordo com Sibília (2012, p.
197): “Há uma divergência de época: um desajuste coletivo entre os colégios e seus alunos na
contemporaneidade”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Socialmente a escola, como instituição formal de educação, deve propor uma educação
voltada para o desenvolvimento integral do educando e do educador, fazê-los crescer no sentido
mental, social, emocional, e espiritual, capaz de modificar o comportamento do indivíduo de
forma global, por meio de uma ação significativa e consciente de todos os envolvidos no
processo ensino-aprendizagem.
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A escola pesquisada tem resquícios da formação conteudista e comportamentalista, mas,
já se vislumbra resultados da preocupação com o estabelecimento dos objetivos em termos de
aprendizagem dialógica. Segundo Perrenoud (2004, p. 52), é justamente esse o desafio: “fazer
emergir o novo em meio a um aparato escolar que tem grande poder de regulação [...], já que o
tempo de mudar no papel é muito diferente do tempo de transformar corações e mentes, e
daquele requerido para moldar a nova face da escola”.
Para Sibília (2012), um dos maiores desafios da educação moderna é fazer com que a
escola volte a ter consistência em sua finalidade social, política, ética e estética, que passe a ser
um espaço de diálogo, de encontro, que instigue a criança a produzir seus próprios pensamentos.
Não se deve considerar esse percurso como um processo que tenha fim. É um desafio
para continuar pensando o sentido da escola, do conhecimento, das relações com o saber
acumulado e em constante transformação das sociedades. É uma porta aberta para repensar a
função da escola no século XXI, o que constitui o desafio de mudar permanentemente e...
continuar aprendendo.
REFERÊNCIAS
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Gerais: Educação & Sociedade, 2000.
CANÁRIO, R. A Escola Tem Futuro? Das Promessas às Incertezas. Porto Alegre: Artmed,
2006.
FREIRE, P. Conscientização: teoria e prática da libertação. Uma introdução ao pensamento
de Paulo Freire. 3ª ed. São Paulo: Moraes, 1980.
______. Pedagogia do oprimido. 27ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987.
______. Educação como Prática da Liberdade. 29ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. Org., intr., rev. de Roberto Machado. 25ª ed. São
Paulo: Graal, 2012.
HERNANDEZ, F. Os projetos de Trabalho e a Necessidade de Transformar a Escola (II).
Presença Pedagógica, 1998.
LUCKESI, Cipriano Carlos. As distorções epistemológicas nas práticas com as notas
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Acesso em: 01 out. 2013.
14
PERRENOUD, P. Os ciclos de aprendizagem. Um caminho para combater o fracasso
escolar. Porto Alegre: Artmed Editora, 2004.
SAVIANI, D. História das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas, SP: Autores Associados,
2007.
SIBILIA, P. Redes ou Paredes: A Escola em Tempo de Dispersão. Rio de Janeiro, 2012.
SORDI, Mara Regina Lemes; LUDKE, Menga. Da avaliação da aprendizagem à avaliação
institucional: aprendizagens necessárias. Campinas; Sorocaba, SP, v.14, nº 2, p. 313-336,
jul. 2009.
TEIXEIRA, A. Pequena Introdução à Filosofia da Educação: A Escola Progressiva ou a
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