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RESENHA: História da Saúde e da Doença/Antônio Emilio Morga (org.). 1 ed. – Itajaí: Casa Aberta Editora, 2012. 198p. ISBN: 978-85-62459-38-2 Mônica Maria Lopes Lage Desde que a Escola dos Analises ampliou o leque de temas e possibilidades históricas, a história da saúde, assim como a da doença, ganharam espaço no palco das discussões, entretanto, poucos foram os historiadores que se debruçaram sobre o tema, e o resultado disso, é que ainda existem inúmeras possibilidades a serem conhecidas e exploradas neste campo de pesquisa. Nessa perspectiva, a coletânea “História da Saúde e da Doença” organizada por Antônio Emilio Morga trás ao leitor fragmentos de pesquisas de autores das regiões norte, nordeste e sul do Brasil, e que trabalham com a temática em períodos distintos. Talvez as explicações para a ausência de trabalhos voltados para esta temática, encontre lugar no fato de não nos ser natural falar daquilo que nos incomoda nos assusta ou nos traz medo - a doença e suas várias faces. Poder-se- ia dizer que o tema doença e morte vêm sendo explorado, nas últimas décadas, timidamente no campo historiográfico e, as poucas pesquisas existentes contemplam o continente europeu. Mônica Maria Lopes Lage. Doutoranda em História/UFMG. E membro do Grupo de Pesquisa Gênero, Sociabilidade, Afetividade e Sexualidade.

RESENHA: História Da Saúde e Da Doença-Antônio Emilio Morga

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A história da saúde, assim como a da doença, ganharam espaço no palco das discussões, entretanto, poucos foram os historiadores que se debruçaram sobre o tema, e o resultado disso, é que ainda existem inúmeras possibilidades a serem conhecidas e exploradas neste campo de pesquisa.

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RESENHA: Histria da Sade e da Doena/Antnio Emilio Morga (org.). 1 ed. Itaja: Casa Aberta Editora, 2012. 198p. ISBN: 978-85-62459-38-2

Mnica Maria Lopes Lage(Desde que a Escola dos Analises ampliou o leque de temas e possibilidades histricas, a histria da sade, assim como a da doena, ganharam espao no palco das discusses, entretanto, poucos foram os historiadores que se debruaram sobre o tema, e o resultado disso, que ainda existem inmeras possibilidades a serem conhecidas e exploradas neste campo de pesquisa. Nessa perspectiva, a coletnea Histria da Sade e da Doena organizada por Antnio Emilio Morga trs ao leitor fragmentos de pesquisas de autores das regies norte, nordeste e sul do Brasil, e que trabalham com a temtica em perodos distintos.

Talvez as explicaes para a ausncia de trabalhos voltados para esta temtica, encontre lugar no fato de no nos ser natural falar daquilo que nos incomoda nos assusta ou nos traz medo - a doena e suas vrias faces. Poder-se-ia dizer que o tema doena e morte vm sendo explorado, nas ltimas dcadas, timidamente no campo historiogrfico e, as poucas pesquisas existentes contemplam o continente europeu.A iniciativa de Morga de reunir pesquisadores que trabalham com a temtica no Brasil, foi relevante na medida em que lanou o desafio inicial de apresentar para o leitor trabalhos de pesquisadores comprometidos com o conhecimento cientifico, e com o rigor histrico, e assim despertar a ateno de ambos, para a necessidade do aprofundamento de pesquisas voltadas para este tema no pas. A coletnea dividida em onze textos, e onze autores. Os textos contemplam as regies do Amazonas, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Bahia, e trazem reflexes desde os tempos em as epidemias e os miasmas assolavam cidades e campos, at discurses contemporneas acerca da questo da sade e da doena no Brasil.Os autores e pesquisadores que se dedicaram a estudar sobre a sade e a doena na regio norte do pais, mas especificamente o Amazonas, Monica Maria Lopes Lage, Arcngelo da Silva Ferreira e Suzete Camura Nobre, se apropriaram de diferentes metodologias: relatos de viajantes, jornais, relatrios de profilaxia sanitria, prosas urdidas por contistas da regio, e documentos do antigo leprosrio Antnio Aleixo.

Em uma sntese geral das contribuies deixadas pelos autores, podemos dizer que a histria dos moradores do Amazonas sempre esteve ligada a seguinte trade doena, sofrimento e f. Desde os tempos remotos de formao dos seringais, quando os fatores que ameaam a populao eram muitos, devidos as ms condies da floresta: terrenos alagadios, calor intenso, m alimentao e falta de hbitos saudveis, os amazonenses tiveram que lidar com constantes doenas, sendo a mais temida, a malria. A falta de respostas por parte da medicina oficial, levou os amazonenses a recorressem alternativas baseadas em rituais mgicos, na crena e na busca por respostas de ordens msticas. Este costume de recorrer ao sobrenatural fez parte da cultura nortista, e mesmo quando algumas prticas foram proibidas no Brasil, como a feitiaria por exemplo, proibida por lei no perodo colonial, o povo seguiu acreditando em seus costumes e hbitos, de forma que torna-se impossvel pesquisar sobre sade e doena no Amazonas sem esbarramos na questo da f. O estudo sobre os hbitos e costumes do povo amazonenses mediante a doena, relevante, pois oferece saberes diversos para a histria da busca da cura.Maria Tereza Santos Cunha, Antnio Emilio Morga e Jose Bento Rosa da Silva, contribuem com a coletnea Histria da Sade e da Doena oferecendo fragmentos de suas pesquisas dedicadas ao sul do pais, mas especificamente, Santa Catarina. Regio porturia onde transitavam pessoas de diferentes localidades, hbitos e costumes, entretanto, sujeitos as doenas. O sculo XIX foi um perodo de grande difuso dos discursos mdicos higienistas que buscavam exterminar das cidades os miasmas e tudo que pudesse ser ameaa a sade pblica. Santa Catarina viveu esse perodo com muita intensidade, mais no sem conflitos, se de um lado tratava-se de dar um novo aspecto cidade, urbanstico e social, de outro havia a resistncia dos sujeitos s mudanas, desta forma, duelavam-se aqueles que buscavam civilizar, educar, normatizar, moldar os tratos e promover a sade e a civilizao, com aqueles que insistiam em velhos hbitos e costumes. Antonio Emilio Morga tratou com brilhantismo sobre o tema, quando adentrou no cotidiano da sociedade Desterrense, mostrando os conflitos entre imprensa, mdicos e policiais.Maria Teresa Santos Cunha apresentou os manuais de civilidade e etiqueta que percorreram Santa Catarina no ano de 1950, e mostrou como estes manuais foram incorporados pela sociedade. Em forma de livros que acompanhavam o material didtico dos jovens, nestes manuais continham orientaes, aconselhamentos, normas, condutas e valores, e o objetivo destas publicaes era civilizar apontando prescries para a sade fsica e moral dos habitantes da ilha. Jose Bento Rosa da Silva apresentou os resultados de sua pesquisa em um perodo posterior ao sculo XIX, seu recorte compreende o sculo XX, mais especificamente ao perodo em que a gripe espanhola atingiu Itaja, por volta de 1918. Neste trabalho, o autor mostrou que a passagem da espanhola por Itaja, trouxe consigo o caos alterando o cotidiano da cidade e dos moradores. Segundo o autor a gripe espanhola acometeu indistintamente a populao. Mdicos, soldados, homens, mulheres, crianas e velhos. Todos foram vitimados pela epidemia, e que um ar fnebre pairou sobre a cidade durante semanas e meses. A pesquisa de Jose Bento revela que a gripe espanhola alcanou Itaja, num perodo em que o governo buscava solues para os problemas de ordem sanitria no discurso da cincia da higiene, entretanto a presena inesperada da epidemia colocou em xeque as polticas pblicas implementadas.Jacimara Souza Santana e Denize de Almeida Ribeiro apresentaram aspectos da histria da sade e a doena no Brasil, tomando como ponto de partida a regio do nordeste, tendo como recorte a Bahia. Jacimara apresentou os resultados de um trabalho de campo, baseado em oficinas implantadas em quilombos das regies de Maragogipe e Malhada. Sua pesquisa objetivou mostrar as condies de vida e de sade em que vivem os habitantes dos quilombos da regio, ressaltando a necessidade urgente de medidas que visam uma melhor qualidade de vida, porm sem interferir nos hbitos culturais desse grupo tnico. A visita aos quilombos tinha como objetivo construir um mapeamento das condies de vida nas comunidades quilombolas. Segundo a autora, os resultados apontaram para uma total falta de assistncia governamental estas comunidades, e defende que as medidas mais urgentes a serem tomadas passam pela formao tcnica e profissional para parteiras, polticas sanitrias, como tratamento e recolhimento de lixo, distribuio de gua potvel e construo de fossas. Denize Ribeiro trabalhou com a questo da fome nos terreiros, e com os processos de excluso e incluso desenvolvidos pelos negros atravs da religiosidade, nos candombls da Bahia. A autora fez uso de um conceito que chamou de crise de converso onde constatou que muitos membros dos candombls, por passarem por extremas situaes de dificuldades, incluindo a fome, recorreram a religio como o lugar das respostas. Denize mostrou tambm que a fome entre os negros nos candombls, no se resume apenas a fome de alimento, a fome nestes espaos pode ser interpretada como um desejo no saciado, uma carncia que no suprida, talvez isso se explice, pela histria de excluso de muitos negros que frequentam estes espaos. As autoras Lidiany de Lima Cavalcante e Viviane Trindade Borges contribuem com a coletnea Histria da Sade e da doena, com pesquisas voltadas para o tema do louco e da loucura. Lidiany discorre sobre o tema mostrando como a loucura se constituiu historicamente e exorta-nos para a necessidade de estabelecer a quebra de paradigmas no que se refere ao doente mental. Viviane Borges apresenta-nos o Museu da Loucura, criado nas dependncias do antigo Hospital da Colnia em Barbacena/ MG, mostrando que a criao desta instituio permite pensar como o sofrimento vem sendo Patrimonializado como forma de resistncia ao trauma. A autora ressalta que o acervo do Museu da Loucura composto por documentos textuais, fotografias, e objetos museolgicos, e que este espao adquiriu importncia ao longo da histria pelo peso da realidade que carrega.Por fim, e por ltimo apresentamos os resultados da pesquisa de ria Maria carvalho e sua contribuio para a coletnea Histria da Sade e da Doena. A autora discorre sobre a histria das polticas pblicas voltadas para a questo da sade no Brasil, e num breve percurso, a autora expe os processos histricos que originaram na criao das Santas Casas de Misericrdia e do Sistema nico de Sade (SUS) e, aponta que entre avanos e retrocessos a histria da sade no Brasil ainda no permite a acomodaes, que as decises ainda continuam nas mos daqueles que no vivem a realidade cotidiana dos hospitais e postos de atendimentos.A coletnea Histria da Sade e da Doena rene trabalhos de pesquisadores comprometidos com os processos histricos que envolvem a temtica, o objetivo principal desta coletnea foi o de contribuir com pesquisas na rea, suscitando interesse pelo tema, e desta forma, proporcionar o crescimento das discusses sobre a temtica no pas.

( Mnica Maria Lopes Lage. Doutoranda em Histria/UFMG. E membro do Grupo de Pesquisa Gnero, Sociabilidade, Afetividade e Sexualidade.

Monica Maria Lopes Lage, Arcangelo Da Silva Ferreira, Lidiany de Lima Cavalcante, Suzete Camura Nobre, Antnio Emilio Morga, Maria Teresa Santos Cunha, Viviane Trindade Borges, Jose Bento Rosa da Silva, Jacimara Souza Santana, Denise de Almeida Ribeiro, ria Maria de Carvalho.

Os seringais do Amazonas Seus moradores e suas formas de sobrevivncia.

Representaes sobre a doena e seus rituais de cura.

A profilaxia do isolamento em Manaus: estigma e representaes sociais sobre a lepra

Preceitos para a sade em manuais de civilidade (Dcada de 1950): Apontamentos de um percurso.

A cidade enferma e o diz- que- diz.

A Espanhola em Itaja 1918: Uma visitante indesejvel.

A sade nos quilombos da Bahia: Uma experincia de trabalho nos Municpios de Maragogipe e Malhada.

Candombls: Espaos de superao da excluso, das desigualdades e da fome.

Louco ou doente: reflexes histricas sobre os invisveis sociais.

A nossa sociedade produziu esse tipo de instituio: O museu da loucura e seu acervo.

A Histria das polticas de sade no Brasil: 512 anos vivos na memria.