Ruy Llera Blanes (2015) O Lider é o Profeta (Anthropologicas)

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Neste texto pretendo refletir sobre a questão da liderança religiosa tal e como é explanada no contexto de movimentos cristãos proféticos angolanos. Refletirei sobre a permanente permutabilidade entre os conceitos político e religioso de liderança, utilizando o conceito de carisma como elemento desestabilizador dessa relação,através da sua participação no processo de definição da categoria de profetismo. Argumentarei, finalmente, que o carisma é um mecanismo de regeneração a partir de continuidades sócio-políticas, e não tanto um iconoclasmo no seu estado puro, como defendia Max Weber. Palavras chave: Profetismo; Carisma; Liderança; Classificação; Angola.

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  • revista AntHropolgicAsAno 18, 25(1):107-127, 2014

    O Lder o Profeta, o Profeta o Lder. Continuidades e descontinuidades da liderana

    carismtica no contexto angolano

    Ruy Llera Blanesa

    Neste texto pretendo refletir sobre a questo da liderana religiosa tal e como explanada no contexto de movimentos cristos pro-fticos angolanos. Refletirei sobre a permanente permutabilidade entre os conceitos poltico e religioso de liderana, utilizando o conceito de carisma como elemento desestabilizador dessa relao, atravs da sua participao no processo de definio da categoria de profetismo. Argumentarei, finalmente, que o carisma um me-canismo de regenerao a partir de continuidades scio-polticas, e no tanto um iconoclasmo no seu estado puro, como defendia Max Weber.

    Profetismo; Carisma; Liderana; Classificao; Angola.

    Tanto no campo da antropologia como da filosofia poltica, v-rios autores tm argumentado acerca da forma como o problema da liderana poltica , frequentemente, informado por noes religio-sas ou sacralizantes (Vries 2006). Concomitantemente, o inverso foi igualmente explorado: a forma como a liderana religiosa se encontra irremediavelmente investida de um carcter poltico (Balandier 1955).

    a Investigador Ps-Doutoral, University of Bergen. Investigador Principal, Instituto de Cincias Sociais da Universidade de Lisboa. Department of Social Anthropology, Fosswinceklsgate 6, Floor 8, 5007 Bergen, Norway. E-mail: [email protected].

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    Tratar-se-, como na linha das sugestes recentes de Agamben, de uma teologia poltica ou de uma poltica teolgica, atravs das quais de-tectamos os fundamentos mtuos pelo menos no que ao contexto europeu diz respeito (Agamben 2011).

    Talvez o campo conceptual onde essa permutabilidade se revelou mais profcua tenha sido o da noo de carisma, inaugurado como problema sociolgico atravs da indagao da sua contribuio para organizao econmica da vida social e poltica por Max Weber (1947). Resumindo, para Weber, o carisma explicava o processo de instituio de liderana e autoridade em distintas sociedades, onde se verificava um processo colectivo de atribuio de um carcter extraordinrio a um lder, no qual eram imbudos processos de legitimao e institu-cionalizao que eram por sua vez formas de organizao social. No entanto, como tambm sabemos, o carisma tambm um tropo com uma carga semntica e experiencial enorme para lderes e seguidores religiosos, invocando questes de poder, discurso mediao, manifes-tao, etc. Alis, a prpria histria etimolgica do conceito emergi-do no grego antigo e com expresso na tradio crist romana nos recorda que a sua configurao essencialmente religiosa, remetendo para a ideia de dom divino que extravasa de Deus para os seres hu-manos por obra do Esprito Santo. Hoje, uma parte significativa da experincia crist assenta na crena no poder carismtico, seja por in-termediao de um especialista por processos histricos de dispen-sao ou por acesso direto ao Esprito Santo (Campos & Mauricio Jnior 2013).

    Neste texto, pretendo argumentar que a polivalncia semntica do carisma o indicador central que permite entender a dupla compo-sio poltica e religiosa do fenmeno da liderana, mas tambm desconstrui-la, detectando as respectivas continuidades e descontinui-dades, descortinando a possibilidade de anlise das lideranas religio-sas para alm do seu contedo espiritual. Noutras palavras, o carisma permite-nos entender lideranas atravs das suas fronteiras e limita-es, e admitir que a liderana religiosa no se encapsula no domnio

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    do espiritual; pelo contrrio, o carisma revela as componentes esttica, temporal, psicolgica e poltica da liderana religiosa, permitindo-nos sair do encapsulamento espiritual com que emerge, frequentemente, na literatura da antropologia da religio (Blanes 2013). Argumentarei, finalmente, que independentemente do invlucro espiritual com que construda, a liderana religiosa formada em continuidade com os campos: poltico, esttico e econmico.

    Weber j definira, no seu estudo inovador, a autoridade carismti-ca como um tipo de liderana subversiva e revolucionria, na medida em que se desligava da ordem tradicional e burocrtica existente e, atravs de uma noo de vocao espiritual (calling, na verso ingle-sa), inaugurava novas modalidades de organizao scio-poltica (We-ber 1947:360-2). No entanto, tal como proponho aqui, o que estar, frequentemente, em causa ser mais um processo de translao, no sentido lvi-straussiano, de significados e indexicalidades que recon-figuram, sem necessariamente rejeitar, iconoclasticamente, as ordens sociais estabelecidas.

    Este argumento surge no mbito das reflexes que tenho vindo a desenvolver nos ltimos anos, relativamente, a movimentos cristos de carcter proftico na frica, mais especificamente, a histria e si-tuao contempornea de uma igreja angolana denominada de Igreja Tokoista, cujo nome advm do seguimento do seu profeta fundador Simo Gonalves Toko (1918-1984). Nessa pesquisa, conclu que o problema da liderana religiosa se encontrava determinado, frequen-temente, por um problema de identificao e classificao (quem era, realmente, o lder fundador?), mediada por processos de complexificao temporal e transformao territorial (Blanes 2014). No mbito desta discusso, a noo de profeta ou profetismo aparecia como proble-ma fundamental e de difcil resoluo, tanto em termos de definio sociolgica1 como de categoria mica de identificao e atribuio. Ainda hoje, volvidos trinta anos aps o falecimento de Simo Toko em Luanda, observo e participo em discusses sobre a figura e o lega-do do lder, inseridas no mbito de disputas polticas entre distintos

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    sectores do seguimento de Simo Toko e as respectivas reivindicaes de legitimidade e autenticidade no que diz respeito recordao e manuteno da memria do fundador (Blanes 2011, 2014).

    Antes de desenvolver esse raciocnio aqui, proponho uma peque-na reflexo sobre a complexa relao entre carisma e liderana, de forma a poder definir o campo de reflexo relativo aos profetismos em frica e Angola em particular. Concluirei defendendo que o esforo, mico e tico, de produo de uma continuidade conceptual em torno da liderana religiosa, em si mesmo a causa da profuso semntica e descontinuidade que detectamos na anlise de movimentos profticos como a Igreja Tokoista.

    Carismas polticos e teolgicos

    Depois de vrias dcadas de prevalncia do esquema weberiano, que o enquadrou no mbito de processos de organizao scio-polti-ca e de autoridade, o problema do carisma foi objeto de reviso e com-plexificao, sem no entanto, abdicar da relevncia interpretativa do pensador alemo. Um exemplo foi o trabalho desenvolvido por Char-les Lindholm, que procurou introduzir uma analtica psicolgica na antropologia da religio, recordando que o carisma uma construo coletiva, que depende tanto da liderana como do prprio seguimen-to (Lindholm 1990, 2003). Neste contexto, refere-se linha durkhei-miana do carisma, apontando-se o seu carter coletivo e socializado. Como sugeriram Shills (1965) e Eisenstadt (2003), o carisma encon-tra-se, mais do que no mbito da teologia, no mbito da sociedade.

    Efetivamente, na cincia poltica exploraram-se vrias vezes as dimenses no religiosas do carisma, focalizando, precisamente, na parte do esquema weberiano da liderana e carter extraordinrio da mesma no que diz respeito a processos de instaurao e redefinio de autoridade poltica. Um caso paradigmtico obviamente o de Hitler e o nazismo, profusamente estudado sob este prisma (Pinto, Eatwell & Larsen 2007). Mas, como nos recordou tambm Stephan

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    Feuchtwang (2008) no seu exerccio de aplicao do conceito de ca-risma ao contexto poltico chins, preciso atentar tanto ao contex-to como ao contedo do carisma enquanto fonte de autoridade, e enquadrar a possibilidade de haver no um carisma, mas sim, vrios carismas. neste sentido que ele distingue entre bom e mau ca-risma, alertando para as dimenses morais e ticas do bem-estar ao problema da accountability que afetam o processo de legitimao coletiva (Feuchtwang 2008). Implcita nesta ideia encontra-se tambm outra dimenso explorada por Feuchtwang junto com Wang Ming-ming: a arregimentao esttica implicada no processo de legitimao, que configura as fontes do carisma (Feuchtwang & Mingming 2001: 19) e as transforma em tradio e, simultaneamente, potencialidade (Feuchtwang & Mingming 2001). Noutras palavras, a autoridade e legitimao carismtica pode assentar tanto e simultaneamente em percepes e reconhecimentos de lgicas histricas, como no poten-cial explosivo (Feuchtwang & Mingming 2001) de inovao, transfor-mao ideia que, espero, fique mais evidente no exemplo emprico que abordo em baixo. Em qualquer caso, esta distino, a meu ver, fundamental para trabalhar o conceito de carisma enquanto elemen-to desestabilizador, e no redutor ou redefinidor da problemtica da liderana religiosa.

    Uma narrativa implcita que perpassa estas propostas , precisa-mente, um argumento relativo dinmica e transformao social: tal como Weber detectava a relevncia do carisma enquanto autoridade poltica, promotora de mudana social (1947), os distintos contextos e estudos de caso discutidos pelos distintos autores preocupados com o carisma questionam processos de inovao, transio e transformao. No contexto religioso, esta dinmica torna-se evidente tanto na anli-se de movimentos religiosos enquanto promotores de mudana social nos contextos onde emergem como sofrendo eles prprios processos de transformao institucionalizao, racionalizao, expanso, etc. (Lindholm 2013). No que diz respeito ao cristianismo em particular, como refere Ramon Sarr, o debate que emerge a partir do estudo de

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    verses pentecostais e evanglicas do cristianismo, no caso particular da frica, provocou precisamente uma reflexo acerca do problema da ruptura e/ou continuidade (Sarr 2012) o que, por sua vez, no est desligado das vertentes teolgicas e polticas com que o tropo do carisma circula nestes movimentos (Campos & Mauricio Jnior 2013). Desde este ponto de vista, o dom carismtico, como diria Si-mon Coleman (2004), despoleta e desconstri relaes entre pessoas, e entre elas e o divino, afetando dimenses morais e subjetivas mas tambm econmicas e polticas. Da que frequentemente a figura do lder carismtico se aplique a contextos to dspares como o pastor de igreja, o profeta, a testemunha, o pregador, o gestor, etc., e configure manifestaes e agencialidades diversas naqueles que o experienciam e invocam. O carisma circula, provoca e transmuta, criando e recrian-do processos de organizao e agrupamento social. um mestre da desordem, seguindo as palavras de Bertrand Hell (1999).

    Assim, como diria Feuchtwang, o que est em causa no carisma no tanto a individualidade de quem o incorpora ou veicula, mas o facto de se concentrar, numa pessoa (ou instituio, ou coisa), uma fonte de expectativa para o extraordinrio (Feuchtwang 2008:94). Como propus noutro texto, a propsito do mesmo contexto emprico que descrevo aqui, esse carcter extraordinrio tambm um argu-mento para a transformao social a travs da inaugurao proftica de novas percepes temporais (Blanes 2013), expectativas de revolu-o ou reforma frequentemente involucradas num processo messini-co. o caso dos profetismos bakongo que descrevo na seo que se segue, mas tambm de outros movimentos bem conhecidos na litera-tura antropolgica, como os cultos cargo (Worsley 1957; Lattas 1992; Jebens 2004) ou os messianismos amaznicos (Fernandez & Brown 2001; Negro 2001; Cepec 2009). desde este ponto de vista que o ca-risma se manifesta como uma ideologia com consequncias polticas.

    Este exerccio de desconstruo do carisma permite-nos chegar a duas concluses parciais: o reconhecimento de que o carisma, sendo

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    recorrentemente, uma expresso causa ou consequncia de lide-rana, no se esgota nesse terreno, antes configurando-se como parti-cipante no processo atravs da invocao de mltiplas dinmicas de conexo e reconhecimento; e que, mais do que refletir um processo de sacralizao do poltico, o carisma extravasa e complexifica a relao entre ambos os campos, provocando, frequentemente, mais desconti-nuidades do que continuidades.

    o que acontece, a meu ver, no que diz respeito ligao bastan-te complexa e produtiva entre carisma e profecia, que se verifica em diversos contextos religiosos. Se do ponto de vista teolgico, frequen-temente, a profecia uma manifestao e qualidade do carisma (viso, prescincia), do ponto de vista poltico tambm uma fonte de auto-ridade e simultaneamente um argumento turneriano de communitas e transformao social, atravs duma dinmica de liderana e segui-mento. Historicamente, so incontveis os exemplos de formao de movimentos religiosos a partir de uma profecia, desde o Montanismo ao movimento mrmon de Joseph Smith Jr. Na seco que se segue, procuro exemplificar estes processos, indagando a relao entre caris-ma, profecia e individualidade proftica.

    Definindo profetas no Congo e Angola

    A regio do Baixo Congo e norte de Angola conhecida por uma longa tradio de movimentos religiosos autctones de base crist que foram sendo conhecidos por profetismos Kongo (MacGaffey 1986) ou messianismos Bakongo (Balandier 1955). De tal forma que se pode estabelecer uma historiografia linhageira entre movimentos his-tricos como o de Dona Beatriz Kimpa Vita (1684-1706) e outros movimentos que emergiram no perodo tardo-colonial, como o do Kimbanguismo, o Mpadismo e o Tokoismo (Balandier 1955; MacGa-ffey 1983; Sarr & Blanes 2009). Esta historiografia emerge tanto no campo mico, produzida e reproduzida pelos lderes e seguidores dos

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    movimentos acima mencionados, como no campo tico, identificada pelos distintos acadmicos que escreveram sobre os mesmos2.

    Georges Balandier (1955) e Wyatt MacGaffey (1983), que estuda-ram o mesmo movimento (Kimbanguismo) em distintos momentos histricos entre o perodo tardo-colonial e o ps-colonial, puderam no s contribuir com etnografias com um valor histrico importante, mas tambm aprofundar um tropo, que posteriormente, viria a ser componente da teologia poltica contempornea: o reconhecimento do carcter eminentemente poltico da liderana religiosa, em parti-cular no caso proftico, onde o discurso, inerentemente, escatolgico (messinico) prenuncia, inevitavelmente, uma mudana na ordem das coisas. No caso do Congo, tratava-se, portanto, de um discurso an-ti-sistema, revolucionrio que preconizava o fim do sistema colonial. Mais recentemente, Ramon Sarr, que elaborara um estudo sobre liderana, gerao e memria na Guin-Conakry (2008), pesquisou as continuidades e evolues da nomenclatura da liderana estabe-lecidas no campo do seguimento de Simon Kimbangu, em parceria com Anne Mlice (Sarr & Mlice 2010). No seu caso, concluiu que existe na historiografia relativa a Kimbangu uma constante composi-o e recomposio do carcter proftico da sua vida e obra, atravs do desenvolvimento de uma linhagem proftica, transmitida de modo consanguneo de pai para filho e neto (Sarr, Blanes & Viegas 2008).

    No meu caso, atravs do estudo de uma igreja nascida na mesma matriz tnica e territorial que a Kimbanguista, mas cuja histria se desenvolve posteriormente em Angola, fui elaborando, num processo anlogo com a construo narrativa que os prprios seguidores de Toko desenvolvem, uma etnografia histrica do movimento atravs da reconstruo biogrfica do fundador Simo Toko (1918-1984), fi-gura incontornvel do movimento, e do seu legado nos dias de hoje tendo em conta que a Igreja Tokoista uma das principais insti-tuies crists em Angola, com acima de um milho de seguidores. Antigo aluno e professor nas misses baptistas do norte de Angola (regio onde nascera), Simo Toko encontrava-se em 1949 no Congo

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    Belga em Leopoldville (hoje Kinshasa) quando teve uma experincia carismtica a descida do Esprito Santo sobre ele e um grupo de seguidores seus, que lhe atribuiu uma misso de reforma espiritual na frica e no mundo e indicou que deveria fundar um movimento au-tnomo de reforma espiritual. Essa iniciativa, ocorrida no momento de gnese dos movimentos polticos de libertao poltica congoleses e angolanos, levantou suspeitas das autoridades belgas, a ponto de expulsarem Toko e centenas de seus seguidores todos de nacionali-dade angolana para a colnia portuguesa. A, viriam a conhecer su-cessivos episdios de perseguio: priso, exlio e trabalho forado o que por sua vez no impediu o movimento de prosseguir e aumentar a sua base de apoio, graas lealdade dos seguidores, que resistiam violncia e, simultaneamente, tornavam-se agentes proselitistas nas reas onde se encontravam exilados. No perodo ps-independncia, viriam a conhecer um novo perodo de perseguio, motivado pelo enquadramento poltico do novo pas, caracterizado por uma poltica anti-religiosa e pela perseguio da oposio poltica ao regime (Blanes & Paxe 2015). A situao duraria at dcada de 1980 quando, aps o falecimento de Toko, o prprio governo do MPLA viria, progres-sivamente, a alterar a sua abordagem ao fenmeno do religioso. A histria do movimento tokoista portanto, tambm, uma histria de sofrimento (Blanes 2011) caracterizada pelo fato extraordinrio da liderana de Toko ter sido uma ausncia involuntria, forada pelas perseguies impostas pelos regimes colonial (portugus) e ps-colo-nial (angolano). Essa ausncia no s no implicou o desaparecimento do seguimento, mas pelo contrrio coincidiu com a sua multiplicao demogrfica. Isto explica, em parte, a complexidade e heterogeneida-de semntica que a figura de Simo Toko inspira nos seus seguidores nos dias de hoje (Blanes 20143).

    Desde este ponto de vista, um dos problemas identificados nesta persistncia e complexidade, tanto por Sarr como por mim, foi a questo da temporalidade, isto , a forma como a percepo da li-derana proftica foi mediada por questes de presena e memria,

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    cujos componentes vo variando conforme a gerao e o lugar de produo. Frequentemente, invoca-se o problema da presena (Sarr 2010) como conceito definidor e delimitador. Argumentamos, tanto em conjunto (Sarr & Blanes 2009) como individualmente, que estas dinmicas eram motivadas por um processo poltico caracterstico da histria das religies: o problema da sucesso geracional e da dispen-sao carismtica do profeta. Quando um movimento religioso surge em torno de uma figura proftica e carismtica, o que acontece quan-do essa mesma figura desaparece? Neste processo, despoletam-se v-rios questionamentos: que processos de legitimao poltica permitem a continuao do movimento para alm do fundador? Quais os meca-nismos de estabelecimento de ortodoxia e heterodoxia? Que regimes de recordao entram em ao? O argumento aqui, portanto, que esses questionamentos engajam num processo classificatrio: quem foi realmente Simon Kimbangu? A resposta variar conforme o posi-cionamento histrico, geogrfico, tico e poltico do interlocutor. No que diz respeito a Toko, ele foi, e , visto ora como um profeta, pa-racleto, redentor, messias, Jesus Cristo africano, reformista, poltico, dirigente, lder, sbio, etc. Esta multiplicidade classificatria resultou de uma composio de fatores, que incluem o fato de o movimento de seguimento, inicialmente ocorrido numa circunscrio tnica especfi-ca um grupo bakongo oriundo do Uge emigrado em Leopoldville , ter transcendido essa circunscrio e transformado, paulatinamente, num movimento multitnico angolano e posteriormente transnacio-nal e diasprico. Mas, tambm, o fato de como referi acima, a lideran-a de Toko ter sido condicionada pelo seu constante exlio e ausncia de contato direto com os seus seguidores o que por sua vez contrasta com a lealdade que lhe prestavam. E finalmente, pelo fator geracional, ele prprio motivador de dinmicas de inovao e/ou conservao no que diz respeito ao seu legado. O conflito que despoletou na igreja aps o seu falecimento em 1984, e que provocou uma desestruturao institucional que separou vrios grupos e lideranas intermedirias en-tre si, um reflexo destas distintas dinmicas, assim como na incapaci-

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    dade de desenvolver um mecanismo de transio poltica consensual. O conflito interno continua at aos dias de hoje, regenerando, cons-tantemente, os debates sobre a figura e memria do lder fundador e o seu respetivo legado.

    Portanto, tal como se depreende do uso mltiplo de descritores referentes a este tipo de liderana, nesta reflexo a categoria de profeta particularmente complexa, na medida em que encapsula distintos nveis de significao e agncia, mas onde em qualquer caso o carisma parece assumir um papel central. Numa obra seminal, David Ander-son e Douglas Johnson intitulada Revealing Prophets (1995), discutem esta complexidade revisitando a tradio classificatria acadmica eu-ropeia relativa especializao religiosa na frica Oriental a partir da clssica introduo da categoria de profeta, por parte de Evans-Prit-chard, para descrever a religio entre os Nuer. Uma das concluses da sua reflexo que no possvel desligar a classificao e categoria de liderana da sua localidade e genealogia. Recordam igualmente que, tendo isto em conta, a profecia e o profeta so, iminentemente, p-blicos, inseridos num idioma e tradio especficos ao qual reportam. Requerem uma plateia, por assim dizer (Johnson & Anderson 1995: 20). Essa tradio, no entanto, no , necessariamente, localizada geo-graficamente, mas sim ideologicamente. Neste sentido, a tradio pode ser tanto uma histria local de prticas de adivinhao como a prpria Bblia, ou a noo de transmisso linhageira, por exemplo. O que estar em causa, ento, sero as dinmicas de conexo, como diria Sarr (2013): as ligaes atravs das quais se identifica e constri uma tradio. neste sentido que Johnson e Anderson falam de pro-fetismo revelador, na medida em que torna explcitas as conexes, as legitimaes e contestaes, tanto no mbito espiritual como no prosaico, quotidiano.

    O que ressalta desta anlise , portanto, a necessidade de destrin-ar a noo de profeta enquanto categoria bblica e enquanto catego-ria extrnseca a uma tradio conceptual e teolgica particular. Como

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    consequncia, deparamo-nos com os limites da prpria categoria do religioso, por relao profecia e carisma.

    Desde este ponto de vista, o caso de Simo Toko particular-mente relevante. Como referi acima, o movimento tokoista surgiu em 1949 a partir de uma experincia carismtica ocorrida em Leopold-ville. No entanto, essa experincia no redundou necessariamente na atribuio colectiva de um dom carismtico a um lder individual. Por um lado, iniciou uma tradio proftica no seio da igreja, o vaticnio, atravs do qual determinados membros os chamados corpos vates obtm a capacidade de realizar trabalho espiritual com dons graas possesso espiritual por parte de profetas bblicos (Daniel, Jeremias, etc.) e profetas modernos (Simon Kimbangu, por exemplo). Esse tra-balho espiritual carismtico, na medida em que mediado por dons de origem divina. Por outro lado, o trabalho proftico-carismtico desligado do trabalho de liderana poltica, na medida em que os cor-pos vates so figuras discretas no universo tokoista, desenvolvendo os seus trabalhos no mbito dos chamados tabernculos espaos de recluso e trabalho espiritual da igreja4. Simo Toko, apesar de in-corporar carismas e partilhar a sua viso atravs de profecias, nunca se afirmou como um profeta ou um corpo vate. Pessoalmente, ele prefe-ria ressaltar a sua condio de dirigente, ocupando-se administrativa-mente de um movimento de reforma crist, mas nunca colocando-se num patamar espiritualmente superior ao dos seus seguidores. No en-tanto, os seus seguidores nunca cessaram de lhe atribuir um carisma particular, individual, por forma a justificar a sua lealdade para com o seu projeto. A questo fulcral estaria em que as distintas sensibili-dades e tendncias dentro do universo tokoista lhe atribuam e atri-buem ainda hoje distintos modos carismticos, isto , ressaltavam carismas diferentes: um carisma psicolgico, individual, exemplificado na recordao de Toko como uma pessoa atrativa com qualidades rela-cionais excepcionais; um carisma espiritual, reconhecendo o carcter proftico da sua mensagem e o milagre da sua sobrevivncia a ml-tiplas tentativas de assassinato perpetradas pelos regimes colonial e

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    ps-colonial; um carisma poltico, justificado pelo reconhecimento da sua capacidade de influncia no espao pblico angolano; um carisma organizacional, justificado pela sua capacidade de estruturar um movi-mento institucional com as caractersticas e extenso da Igreja Tokois-ta num contexto particular de perseguio e clandestinidade; etc. As crises institucionais e polticas verificadas aps o falecimento de Toko em 1984 so vistas pelos vrios intervenientes como um falhano na capacidade de reproduzir esses carismas5.

    Liderana, esprito e tradio

    Tanto no caso de Toko como no do prprio Kimbangu, o debate persiste at aos dias de hoje: Qual a influncia da tradio na instau-rao de um regime de autoridade em redor dos respectivos lderes? E, tendo em conta o seu carter messinico e libertrio, at que ponto os movimentos em causa supuseram roturas das mesmas tradies? O argumento que prevalece na historiografia sobre estes movimentos a sua proposta de ruptura com o sistema colonialista (Marcum 1969; Plissier 1978). Esta argumentao, reproduzida igualmente pelos prprios agentes do sistema colonial, focaliza a ateno para a ver-tente revolucionria destes movimentos, acabando por ressaltar a sua qualidade moderna na medida em que se tratariam de propostas orientadas para um estado futuro a partir de um processo de contes-tao poltica que seria simultaneamente de inovao espiritual. No entanto, movimentos como o tokoista incorporam tanto uma dimen-so milenar e messinica como uma mensagem reformista e conser-vadora, apelando a uma lgica de tempo original prvio ao processo de corrupo espiritual e poltica provocado pela europeizao do cristianismo e posterior insero no projeto imperial europeu. Esta lgica refere tanto dimenso religiosa, crist, como social e poltica.

    Nesta linha, como identificou Jean-Pierre Dozon (1974, 2006), existe neste tipo de fenmeno uma constante apropriao e reapro-priao de conceitos de tradio e modernidade que faz com que ideia

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    recorrente poca de apresent-los como meros sincretismos se apresente insuficiente. Dozon notava que o sincretismo implicava no-es de autoctonia, emprstimo e alteridade (Dozon 1974:83), ou seja, a possibilidade de que um movimento local (por exemplo, a tradio espiritual bakongo) incorporasse um elemento forneo (por exemplo, o cristianismo) e produzisse um movimento social moderno. Esse movimento, ento, tornar-se-ia em algo novo (uma igreja) ou ento um neo-tradicionalismo (Dozon 1974:87). Wyatt MacGaffey (1977) engajaria num exerccio semelhante quando indagava sobre as razes culturais do profetismo bakongo, embora recordando que:

    o processo sincrtico governado por poderosos fatores ideolgicos e sociais de origem indgena que transformaram parcialmente no s a doutrina crist, mas tambm os missionrios que a trouxeram, sem o seu conhecimento (MacGaffey 1977:192 traduo minha).

    O sincretismo, portanto, no mais um processo unvoco. A questo, como viria a notar o prprio Dozon mais tarde (2006), que se trata de um processo mais ambivalente e complexo, frequentemente, me-diado por ideologias competidoras sobre o significado de tradio e modernidade. Certamente, prosseguindo a lgica inicial, corre-ramos o risco de entrar num processo interminvel de circularidade classificatria. Este tipo de reconhecimento devolve-nos ao debate es-tabelecido por Wyatt MacGaffey (1970) relativamente s comisses religiosas dos Bakongo, atravs das quais inseria Simon Kimbangu dentro de uma tipologia de liderana local onde circulavam noes flutuantes de chefe (mfumu), mago (nganga) e profeta (ngunza), cada qual revelando a dificuldade de destrinar to facilmente tanto o lo-cal do forneo como o religioso do poltico. Neste sentido por exemplo, Simon Kimbangu era, no tempo do seu ministrio, profeta, mas tambm, curador (healer) e professor.

    Por outro lado, se frequente encontrar nos estudos sobre estes movimentos uma anlise da sua contribuio ou impacto no cristia-nismo, muitas vezes, se ignora o impacto que ambos tiveram sobre a

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    tradio local. No caso concreto de Toko, notei frequentemente a du-plicidade imagtica criada em redor da sua figura, apresentada tanto atravs de uma condio religiosa como de uma condio culturalis-ta, invocando, alternadamente, elementos espirituais como polticos. Mas, tambm, pude perceber o impacto que o ministrio de Toko teve no sistema scio-poltico local bakongo do norte de Angola, quebran-do algumas normatividades pr-estabelecidas como seja a gerontologia e a especializao ritual. O novo regime de associao e liderana pro-movido por Toko, embora inspirado na tradio coletivista e mutualis-ta bakongo (Blanes no prelo), provocou novas solidariedades e estatutos que confrontavam o mundo dos velhos (Margarido 1966) e os usos e costumes (Gonalves 1967), em particular no que dizia respeito a componentes rituais, (por exemplo, a rejeio da dana e do fetichis-mo) e a hbitos comportamentais (vestimenta, etc.). No entanto, nas minhas conversas em Luanda com tokoistas bakongo, notei que no se trataria tanto de uma mera rejeio de tradio por parte de Toko, mas antes um processo de crescimento no seu seio6, posteriormente transcendida pelo fato de o tokoismo se transformar numa instituio trans-tnica e multinacional.

    Atravs destes debates apercebemo-nos do peso histrico e epis-temolgico que a noo de tradio desfruta no contexto bakongo, onde a prpria noo de normatividade que ela invoca se sobrepe das prprias necessidades de classificao com que especulamos aqui. Neste caso especfico, a ideia de tradio bakongo (Van Wing 1959; Bortolami 2012), frequentemente, associada a uma ideia de coletivis-mo linhageiro (kanda) usualmente ligado a uma territorialidade con-creta, atravs do qual a questo da liderana surge patrimonializada e hierarquizada no seio de um processo de identificao mais abrangen-te (Pereira 2004). Essa tradio, apesar de se investir frequentemente com uma capa de imobilismo e estabilidade, sujeitou-se, nos momen-tos colonial e ps-colonial aos quais se pode somar a questo da urbanizao e da guerra que assolou Angola ao longo de trs dcadas, entre outras coisas , a processos de reestruturao relevantes. A con-

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    tinuidade e emergncia de movimentos cristos como o tokoismo fa-zem parte deste histrico de recomposio permanente da tradio, participando no processo de auto-constituio atravs da sua contesta-o e/ou continuao.

    A sugesto que pretendo deixar neste ponto que o carisma pode se revelar um instrumento til para pensar as comisses bakongo, ajudando a compreender o processo social de constituio de hierar-quias de liderana e, simultaneamente, a sua contestao. No caso do tokoismo, apreciamos como a prpria construo de Toko como um lder carismtico absorveu e reconfigurou noes plurais de tradio, passando ele prprio a participar no complexo.

    Concluso: continuidades e descontinuidades

    Os antroplogos que trabalhamos em contextos religiosos tende-mos a empregar uma definio mais ou menos aberta da prpria cate-goria de religio, uma que nos permita produzir um campo de con-tinuidade e comparabilidade conceptual inteligvel. Frequentemente, no entanto, essa procura de continuidade implica, precisamente, o ignorar das descontinuidades e fraturas com que, frequentemente, nos deparamos no nosso trabalho emprico. No caso concreto da reli-gio, esse esforo, frequentemente, se traduz em exerccios de delimi-tao institucional, ritual, discursiva, etc. Desde este ponto de vista, frequentemente, deparamo-nos com um campo de anlise onde ob-servamos uma continuidade entre o religioso e o poltico, que apesar de manifestar potencialidades epistemolgicas no permite escapar da circularidade da narrativa de: o poltico religioso, o religioso pol-tico. Tendo isto em conta, considero til a utilizao de uma catego-ria desestabilizadora como a de carisma, na medida em que permite detectar as permutaes e limitaes da referida continuidade polti-ca-religiosa. Na qualidade de argumento de pluralidade, heterogenei-dade e transformao social, o carisma assume um carcter revelador

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    que, por sua vez, torna explcitos os distintos processos classificatrios envolvidos no processo.

    No caso da Igreja Tokoista, uma das primeiras concluses que retirei foi o reconhecimento de um processo colectivo de retrato compsito da figura de Simo Toko, retrato motivado pelas distintas operaes de memria envolvidas na sua recordao, por sua vez in-vocadas por complexos processos de mobilidade, transio geracional e contestao poltica. Esse retrato compsito alimentava-se, simulta-neamente, de elementos religiosos e no religiosos, apelando tanto a uma ou vrias tradies epistemolgicas teolgicas como a distintas noes de tradio.

    Neste contexto, observa-se, no sentido oposto ao de Weber, um processo de atribuio de autoridade carismtica que, mais do que ad-vogar um iconoclasmo scio-poltico, absorve, reconfigura e translada elementos de tradio e inovao para o seu seio. Desde este ponto de vista, o carisma no forneo, no repudia o envolvimento no quotidiano (Weber 1947:446); pelo contrrio, ele emerge da vontade regeneradora do quotidiano, tanto da parte do lder carismtico como dos seus seguidores.

    Notas

    1 O meu colega e amigo Ramon Sarr, que desenvolve a sua pesquisa sobre um movimento limtrofe oriundo da RD Congo, o Kimbanguismo (Sarr 2009; Sarr & Blanes 2009; Sarr & Mlice 2010), partilhou vrios momentos de trabalho de terreno comigo em Lisboa e Angola. Atento a esta problemtica definicional, mais do que uma vez ele me perguntou: porqu, e em que medida, que a Igreja Tokoista proftica? Este texto surge tambm no mbito das respostas e discusses que emergiram a partir da.

    2 Na minha pesquisa, inseri o Tokoismo na mesma tradio, embora com ressalvas importantes e notando a ambiguidade da construo narrativa em causa (Blanes 2014).

    3 A capa da edio inglesa do livro (Blanes 2014) precisamente um retrato do pro-feta, elaborado a partir de uma fotografia de Simo Toko de autoria desconhecida. A foto foi tirada no Vale do Loge, uma pequena aldeia no distrito do Uge, onde Toko

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    e seus seguidores viveram na dcada de 1950 aps a sua expulso de Leopoldville para Angola, tendo sido submetidos a trabalho forado (Blanes 2013b).

    4 Como explico noutro lugar (Blanes 2014), isto no significa, no entanto, que o seu trabalho espiritual no tenha implicaes polticas.

    5 Desde o ano 2000, uma das faes maioritrias do universo tokoista hoje con-siderada hegemnica liderada pelo Bispo Afonso Nunes, que reivindica o facto de ter sido revestido pelo esprito de Simo Toko, procedendo-se assim a um me-canismo de prolongamento biogrfico de forma a legitimar a sua liderana atual (Blanes 2011).

    6 Um exemplo foi o fato de Simo Toko ter empregado, na organizao institucio-nal do movimento, a categoria de tribo como entidade aglutinadora de tokoistas do mesmo background cultural no seio da igreja (Blanes 2014). Essa categoria repor-tava tanto a uma noo de tradio local como de tradio bblica, por relao s tribos de Israel.

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    Abstract: In this text I propose to debate the problem of religious leadership as it is played out within Angolan Christian prophetic movements. I will discuss the permanent permutability between the political and religious concepts of leadership, using the concept of charisma as a destabilizing element of that relationship, through its participation in the process of definition of the category of prophetism. I argue that charisma is a mecha-nism of regeneration from socio-political continuities, and not so much an iconoclasm in its pure state, as Max Weber famously argued.

    Keywords: Prophetism; Charisma; Leadership; Classification; Angola

    Recebido em setembro de 2014.Aprovado em novembro de 2014.