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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________ _______________Jorge Serrano/2005_______________ 1 INTRODUÇÃO O presente trabalho integra-se epistemologicamente, no âmbito da educação especial, em geral e, em termos mais restritos no domínio da escola inclusiva. Consubstancia, na sua essência, a identificação e descrição de um conjunto de princípios e de procedimentos a serem implementados numa determinada escola, para que a mesma se aproxime, em termos organizacionais e pedagógicos, de um dado modelo de escola inclusiva, entretanto concebido com base na pesquisa bibliográfica. A preocupação com a educação inclusiva é, actualmente, um facto premente no seio das sociedades e dos sistemas educativos da generalidade dos países, mormente após a realização, em Salamanca, da Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, no ano de 1994. Com este ideal, intensamente difundido, questionado e debatido, no último decénio do século XX, pretende-se, fundamentalmente, que nos estabelecimentos de ensino e nas salas de aula - enquanto espaços educativos - sejam criados, gerados e geridos, recursos, condições e estratégias susceptíveis de dar uma resposta apropriada a todos os alunos, com ênfase particular nos alunos com necessidades educativas especiais. Esta preocupação com o ideal da inclusão faz, actualmente, todo o sentido na medida em que continua a verificar-se, um pouco por todo o lado, a exclusão social de muitas pessoas, por diferentes razões, nomeadamente, económicas, linguísticas, culturais ou raciais. Paralelamente, existem, também, muitas crianças que, ingressando no sistema educativo, recebem, neste, uma educação não totalmente de acordo com as suas necessidades, situação que irá contribuir para que a realização dos seus projectos de vida, aconteça a um nível inferior ao que provavelmente aconteceria com um tipo de atendimento pedagógico mais

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 1

INTRODUÇÃO

O presente trabalho integra-se epistemologicamente, no âmbito da

educação especial, em geral e, em termos mais restritos no domínio da escola

inclusiva. Consubstancia, na sua essência, a identificação e descrição de um

conjunto de princípios e de procedimentos a serem implementados numa

determinada escola, para que a mesma se aproxime, em termos organizacionais e

pedagógicos, de um dado modelo de escola inclusiva, entretanto concebido com

base na pesquisa bibliográfica.

A preocupação com a educação inclusiva é, actualmente, um facto

premente no seio das sociedades e dos sistemas educativos da generalidade dos

países, mormente após a realização, em Salamanca, da Conferência Mundial

sobre Necessidades Educativas Especiais, no ano de 1994. Com este ideal,

intensamente difundido, questionado e debatido, no último decénio do século XX,

pretende-se, fundamentalmente, que nos estabelecimentos de ensino e nas salas

de aula - enquanto espaços educativos - sejam criados, gerados e geridos,

recursos, condições e estratégias susceptíveis de dar uma resposta apropriada a

todos os alunos, com ênfase particular nos alunos com necessidades educativas

especiais.

Esta preocupação com o ideal da inclusão faz, actualmente, todo o sentido

na medida em que continua a verificar-se, um pouco por todo o lado, a exclusão

social de muitas pessoas, por diferentes razões, nomeadamente, económicas,

linguísticas, culturais ou raciais. Paralelamente, existem, também, muitas crianças

que, ingressando no sistema educativo, recebem, neste, uma educação não

totalmente de acordo com as suas necessidades, situação que irá contribuir para

que a realização dos seus projectos de vida, aconteça a um nível inferior ao que

provavelmente aconteceria com um tipo de atendimento pedagógico mais

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adequado. Assim, entendeu-se ser de acutilante oportunidade e de relevante

pertinência abordar, de modo teórico e empírico, a problemática em questão, sob

a forma de um projecto de investigação-acção.

Sendo, então, a exclusão social uma realidade incontornável, compreende-

se, por isso, que uma das mais momentosas prioridades da UNESCO consista,

precisamente, em promover e induzir dinâmicas de transformação nos sistemas

educativos do maior número possível de países, de modo a poderem garantir uma

maior equidade e uma mais efectiva igualdade de oportunidades às crianças e

jovens em idade escolar. A realização da referida Conferência de Salamanca - a

qual contou com a presença de mais de uma centena de países - é, exactamente,

um testemunho desse esforço da UNESCO.

Mediante este processo, tenta-se converter as escolas, gradualmente, em

verdadeiros instrumentos de inclusão sócio-educativa que preparem as novas

gerações para uma vivência de plena participação social e subordinada aos

princípios da solidariedade mútua e do respeito pela diferença. Tal, porém, só será

possível quando a escola conseguir disponibilizar uma educação de qualidade

para todos e não, apenas, para alguns. E neste aspecto, o atendimento das

crianças com necessidades educativas especiais terá de merecer uma atenção

muito particular. Os conceitos de igualdade e de qualidade subjacentes à ideia de

resposta à diversidade traduzem, pois, a essência da educação inclusiva, pelo que

terão de presidir, numa perspectiva de simultaneidade, a qualquer tentativa de

concretização da escola inclusiva.

Por conseguinte, criar escolas inclusivas é um imperativo ético de

transcendente alcance. Contudo, a sua materialização não é, seguramente,

empresa fácil. Para que este propósito comece a adquirir expressão real, torna-se

necessário, antes de mais, delinear, com contornos nítidos, uma concepção de

escola inclusiva que consagre, em termos filosóficos e práticos, os referidos ideais

de igualdade e de qualidade. Depois, será, também, imprescindível, encontrar

fundamentos credíveis para estruturar - ainda no plano conceptual - um possível

modelo de escola inclusiva, tanto no que respeita ao aspecto da cultura

organizacional como no que toca ao campo do funcionamento pedagógico.

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Neste quadro de inventariação dos requisitos necessários à caminhada

para a construção de escolas inclusivas, emerge, ainda, a necessidade de se

determinar, com rigor, o ponto em que cada estabelecimento de ensino concreto

se encontra neste possível itinerário. E, finalmente, será, também, preciso

desenvolver um conjunto metódico e orientado de mudanças que permitam que

cada escola percorra, de modo securizante e efectivo, o trajecto situado entre o

que é e o que deve ser, tendo, este último ponto, por referência, precisamente o

referido e desejado ideal de escola inclusiva.

Reside, precisamente, no conjunto dos propósitos enunciados, o cerne da

finalidade do presente trabalho. Finalidade essa que se pode traduzir por uma

tentativa sistematizada e rigorosa de encontrar os percursos e práticas

conducentes à implementação da escola inclusiva, a partir da identificação

metódica e aprofundada de uma situação concreta, no caso, uma escola do 1.º

ciclo do Ensino Básico.

Como já foi antes indiciado, a relevância contemporânea da temática da

educação inclusiva parece justificar, portanto, a sua abordagem num trabalho

desta natureza. As dificuldades subjacentes, quer ao identificar o ponto de

situação em que se encontra uma escola concreta, quer ao desenhar, para a

mesma, um plano de transformação numa escola inclusiva - bem como o

determinar quais os procedimentos a activar para essa transformação - traduzem,

neste projecto, a sua situação problemática. Ousar levar à prática tudo isto, sem

que haja, entre nós, nenhum caso já experimentado - pelo menos de natureza

sistémica - representa o desafio deste projecto, evidenciando, ao mesmo tempo, a

sua originalidade.

A concretização de uma escola de qualidade para todos os seus alunos - e,

neste contexto, garantir um atendimento adequado aos alunos com NEE -

configura uma tarefa de enorme dimensão. Efectivamente são muitos e diversos

os elementos que concorrem para a sua construção. Inventariar todos esses

elementos e categorizá-los sob a forma lógica de uma organização escolar,

constituiu a primeira e decisiva etapa deste trabalho. Para tal houve que recorrer a

um longo e meticuloso esforço de consulta bibliográfica. Foram, sem dúvida,

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muitos os autores e obras pesquisados. Cada um dos contributos obtidos

preenchia uma determinada lacuna, ao mesmo tempo que abria outra. E isto

porque praticamente não existem obras que em si próprias se debrucem sobre a

totalidade dos múltiplos aspectos que estão implicados na organização e

funcionamento das escolas. Consequentemente, em nenhuma altura se

considerou esgotado o recurso aos testemunhos da literatura. Este processo

manteve-se activo e em aberto até ao último momento, procurando-se, desta

forma assegurar uma profunda e constantemente actualizada compreensão

conceptual do que se foi percepcionando no contacto com a escola em estudo.

Deste modo, a pesquisa bibliográfica não se confinou a um mero enquadramento

teórico. Foi muito mais do que isso. Configurou, mesmo, um verdadeiro processo

de recolha de informação que se tornou imprescindível para responder com

fundamento, não só a algumas perguntas de partida relativas ao projecto de

investigação, como também - e nomeadamente - às inúmeras questões que o

desenvolvimento do trabalho, junto da comunidade escolar, ia fazendo emergir

Para além da identificação da multiplicidade de factores que concorrem

para a edificação de uma escola de qualidade para todos e para cada um - e, em

particular, para os alunos com NEE - constatou-se também, na consulta da

literatura concernente, a existência de perspectivas contraditórias. Logo, impunha-

se recolher e seleccionar os dados que se mantivessem coerentes entre si, a fim

de que o resultado final apresentasse uma estrutura conceptual logicamente

coesa. O mencionado aspecto de dispersão e de diversificação de ideias,

pressupostos e perspectivas - conquanto tivesse exigido procedimentos de

selecção de informação extremamente meticulosos - haveria, contudo, de aportar

uma das consequências mais interessantes da realização do trabalho, uma vez

que pôs em relevo uma acentuada divergência de pontos de vista entre os autores

que se dedicam à temática da inclusão e da qual não havia antes, consciência

perfeita, em termos pessoais.

Como consequência da necessidade de recolher informação que

contemplasse, de forma adequada, a generalidade dos aspectos subjacentes à

construção de uma escola capaz de responder, com eficiência, à diversidade,

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resultou a compilação de um volume considerável de contributos, como se pode

confirmar no capítulo do enquadramento teórico do trabalho. Esta situação indicia,

aliás, um certo desequilíbrio entre o capítulo em causa e os restantes. Porém, tal

afigura-se justificado dado que a complexidade subjacente ao funcionamento de

uma escola - com uma dimensão significativa como a que apresenta a escola

estudada - é, de facto, profunda, exigindo, portanto, que fossem tidos em

consideração todos os aspectos em que assenta a sua organização e

funcionamento quotidianos. Esta preocupação provocou, portanto, a pesquisa e a

apresentação de um acervo de informação, reconhecidamente extensíssimo,

apesar de previamente sujeito a um aturado esforço de selecção.

Neste contexto, importa, ainda salientar o facto de - com fundamento na

literatura consultada - se ter considerado, praticamente como sinónimas, as

expressões escola inclusiva com escola de qualidade para todos, assumindo-se,

em ambas, um lugar-chave para os alunos com NEE. Em consequência, optou-se

por pesquisar informação bibliográfica que proporcionasse sugestões e estratégias

consideradas adequadas à consecução de uma organização escolar susceptível

de responder, de modo eficiente, às necessidades individuais de qualquer aluno,

ou seja, à implementação da referida educação de qualidade para todos. Neste

contexto, foi entendido que a eficácia de uma escola se infere pela capacidade de

responder, efectivamente, aos modos de aprender (estilos de aprendizagem) de

cada um dos seus alunos, com natural ênfase - tendo-se em conta a temática

central da investigação - nos que apresentam um quadro de necessidades

educativas especiais. Assim, a pesquisa literária foi orientada de forma a produzir

dados que facilitassem a compreensão, tanto dos estilos de aprendizagem

patentes nos alunos reais da escola estudada, como das estratégias educativas a

mobilizar para responder com qualidade pedagógica aos estilos em questão.

Sob esta perspectiva, a sala de aula e a natureza dos processos ali

desenvolvidos consubstanciam um espaço e uma dinâmica de irrecusável impacto

estratégico. Por isso, aquela realidade mereceu, neste trabalho, uma abordagem

significativamente alongada, visando-se, assim, apresentar um conjunto

pormenorizado de procedimentos metodológicos susceptíveis de configurar

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práticas pedagógicas e didácticas conducentes à optimização das aprendizagens

da generalidade dos alunos e em particular dos alunos com NEE.

Na altura em que era desenvolvido o labor de investigação bibliográfica, o

Ministério da Educação introduziu, a nível do Ensino Básico, uma profunda

reorganização curricular através da publicação do Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18

de Janeiro. As consequências de tal facto viriam a traduzir-se por alterações

sensíveis nas formas habituais de gestão curricular em curso nas escolas em

geral e, naturalmente, na escola em estudo. Por arrastamento, a comunidade

escolar local sentiu, então, a necessidade de dar cumprimento integral às

disposições contidas naquela legislação. Havia, pois, que tentar enquadrar, de

modo coerente, aquelas inovações curriculares na organização e funcionamento

escolares no pretendido projecto de construção de escola inclusiva.

Surgiu, portanto, por imperativos formais, um dado novo na situação

problemática. Este foi devidamente equacionado e alvo de reflectida integração no

desenvolvimento do trabalho de investigação. Tratou-se de um desafio

extremamente aliciante e cujo desfecho terá contribuído, de modo decisivo, para

uma adaptação pertinente e apoiada da comunidade escolar envolvida, às

exigências do referido diploma legal. Pensa-se, paralelamente, que este facto

acarretou, também, uma mais valia no que diz respeito à originalidade deste

trabalho, pois que representa, certamente, algo de pioneiro, no enquadramento do

conteúdo da legislação em causa, num projecto de implementação da escola

inclusiva.

Trata-se, por conseguinte, neste trabalho - até pelo facto de enquadrar

elementos provenientes daquela recente peça legislativa - de lidar com um modelo

de escola inclusiva que não coincide, exactamente, com qualquer outro aportado

pela literatura. Mais um factor que concorre, pois, para o já mencionado cunho de

originalidade que - pensa-se - lhe está subjacente. Refira-se, no entanto - e a

propósito - que, para além dos mencionados aspectos conjunturais, de índole

curricular, o modelo aqui adoptado se norteia, de modo muito aproximado, pelo

modelo concebido e proposto, no âmbito da construção da escola inclusiva, por

Correia (1997, 2001, 2003a e 2003b).

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Definido o modelo, estava, portanto, encontrado o elemento crucial para

suportar o futuro desenvolvimento prático do projecto de investigação.

Desenvolvimento esse que tinha por base a hipótese de trabalho previamente

colocada e que consistia, na sua essência, em inventariar os percursos e práticas

a implementar para que a escola em estudo se pudesse transformar num exemplo

concreto do modelo proposto.

Entretanto, o significativo conhecimento pessoal, anterior e informal que o

autor deste trabalho detinha, já, daquela comunidade escolar, indiciava que, a

mesma, se encontrava seguramente, num determinado ponto do trajecto que

podia conduzir ao objectivo proposto. O passo seguinte visou, então, descrever,

com precisão, qual era esse ponto. Com esse intuito, recolheu-se informação de

outras fontes - a fim de clarificar e objectivar o referido conhecimento pessoal - de

forma a que, mediante a sua análise metódica, fosse possível localizar, de um

modo mais rigoroso, a situação em que já se encontrava a escola, na caminhada

para a concretização do ideal da educação inclusiva, bem como os passos que,

nela, haviam sido dados para aí se chegar.

Identificado, assim, o ponto em que se encontrava a escola, no percurso em

questão, uma nova etapa emergia, a qual se traduzia pela necessidade de se

elaborar o plano das mudanças a operar para que o estabelecimento de ensino

em questão se transformasse, a si próprio e gradualmente, numa escola

intrinsecamente inclusiva. Neste processo, o ponto em que a organização escolar

se encontrava, por um lado e, por outro, os contributos da literatura -

nomeadamente os já especificados - bem como os pressupostos curriculares

veiculados pelo Decreto-Lei n.º 6/2001, configuraram as referências primaciais a

considerar para que o caminho futuro - numa perspectiva de dar continuidade ao

trajecto já realizado pela escola - pudesse, então, ser percepcionado e

formalmente definido. Tal configurou, no entanto, mais um momento de

extraordinária dificuldade, pois a informação com que se lidava, quer de campo,

quer teórica, era imensa. Contudo, a consciência da invulgar dimensão do trabalho

não foi, nunca, impeditiva de através dela se percepcionar uma sensação

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sumamente gratificante, uma vez que os conhecimentos que, de tal resultaram,

são, de facto, de uma riqueza incomensurável.

Encontrado o caminho importava, então ... caminhar. Estava, pois,

configurada uma jornada extremamente longa no tempo. Jornada essa que levará

anos a percorrer até ao seu último passo. Mas pelo que já se caminhou e pelo

conhecimento que se possui do restante trajecto, julga-se que com o referido

último passo se atingirá, precisamente, a meta pretendida.

Está, assim, descrito nas suas linhas gerais, o objecto do presente

relatório. Ou seja, visa-se, no presente documento descrever o trajecto já

percorrido pela escola na sua caminhada em direcção à concretização do modelo

de escola inclusiva delineado. Tal corresponde a um primeiro - e mais significativo

- ciclo do projecto de investigação-acção encetado. É este, precisamente, o

conteúdo da presente dissertação, a qual, portanto não comporta a totalidade do

projecto de investigação-acção em causa, por este ser, tanto consideravelmente

dilatado no tempo futuro como sujeito a determinadas e inevitáveis reformulações,

uma vez que as mudanças de uma organização escolar são extremamente

complexas, imprevisíveis, morosas e nada lineares (Tomlinson & Allan, 2002).

Assim, o trabalho junto da comunidade escolar estudada ainda não

terminou. A sua continuidade assenta agora - e por força de um compromisso

assumido com os docentes locais - numa estratégia de intervenção que visa a

implementação do restante plano delineado e que se crê vir a culminar com a

construção total da escola inclusiva pretendida. Este processo de continuidade

prefigura - como se disse antes - um novo ciclo do projecto e cuja duração prevista

é, no mínimo, de três anos escolares, devido à extensão do plano elaborado, pelo

que só deverá terminar, na melhor das hipóteses, no final do ano de 2006/2007.

Portanto, motivos de restrição e de oportunidade temporais implicam que o

presente relatório seja elaborado nesta altura e exclusivamente para o fim a que

se destina: teor da dissertação a apresentar para a obtenção do grau de

doutoramento. Consequentemente, pelas razões apontadas - as quais se prendem

essencialmente com factores de ordem temporal - este relatório centra-se,

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essencialmente, no primeiro ciclo do projecto de investigação-acção, o qual se

iniciou em Setembro de 1999 e foi dado como terminado em Dezembro de 2003.

Realce-se, entretanto que durante este primeiro ciclo de trabalho foi

percepcionada, localmente, a necessidade de uma espécie de intervenção

prioritária em determinadas áreas do funcionamento escolar. Devido a esse

carácter de priorização, aquela intervenção foi, de imediato desenvolvida,

incluindo-se, desta forma, neste primeiro ciclo da investigação-acção. Por esta

razão, os processos e os resultados daquela intervenção prioritária são, ainda,

alvo de referência neste relatório. Sobre esta questão adiante-se, desde já, que os

aspectos em que se centrou aquela intervenção são, de forma fundamentada,

considerados como fulcrais na edificação do modelo aqui preconizado. Por outras

palavras, tal significa que o trabalho de mudança já desenvolvido permitiu conduzir

a comunidades escolar em estudo, a um patamar de nítida aproximação à

estruturação final do modelo desejado. Consequentemente, considera-se assim,

consumado o fluxo nevrálgico deste projecto de investigação-acção

O corpo propriamente dito do presente trabalho é composto por quatro

capítulos que, no seu todo, descrevem, de modo mais ou menos sequencial, a

actividade de investigação desenvolvida. Assim, no primeiro capítulo é

apresentada uma vastíssima gama de informação recolhida na literatura e que se

considerou indispensável para fundamentar e nortear a enunciação e consecução

dos objectivos do trabalho.

A referida pesquisa bibliográfica subordinou-se, em termos nucleares, ao

princípio da recolha de elementos que configurassem, de modo fundamentado um

determinado modelo organizacional e funcional de escola inclusiva. Nesta lógica, o

tratamento da informação deste modo obtida, obedeceu ao tipo de organização

lógico-científica, proposto por Bruner (1996). Assim - e de acordo com este autor -

é usada a categorização conceptual, acompanhada da descrição das operações

através das quais aquelas categorias se formulam, apresentam, idealizam e se

relacionam entre si, a fim de se constituírem num sistema compreensivamente

lógico, no seu todo.

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No segundo capítulo descrevem-se todos os procedimentos metodológicos

a que se recorreu, para se recolher a informação de campo necessária, não só

para se poder confrontar e complementar, de modo objectivo, o conhecimento

pessoal detido sobre a escola, como, também definir, em consequência, o ponto

em que a mesma se encontrava no que concerne a um possível itinerário em

direcção ao modelo de escola inclusiva adoptado. Para além da descrição

daqueles procedimentos, aquele capítulo integra ainda, entre outros aspectos,

informação relativa à formulação do problema da investigação, as consequentes

perguntas de partida e, também, a explicitação clara e precisa dos objectivos

norteadores do desenvolvimento do trabalho.

No terceiro capítulo é feita, primeiramente, a apresentação sistematizada

dos dados de campo recolhidos e, num segundo momento, a consequente análise

e interpretação. Assim se descreve, de forma estruturada, a situação encontrada

na escola estudada, em cada uma das dimensões, ou categorias, que foram,

entretanto, adoptadas para a estruturação do modelo de escola inclusiva de

referência.

O capítulo quarto é, essencialmente, dedicado à explanação pormenorizada

dos processos de mudança a serem implementados, localmente, para que a

escola em questão - a partir do ponto em que se encontrava - se vá

transformando, progressivamente, num testemunho concreto de uma escola

inclusiva, segundo o modelo proposto. Em termos complementares inclui-se,

também, no capítulo em apreço, o relato dos processos e dos resultados de

algumas mudanças já operadas e que dado o grau de premência com que eram

percepcionadas pela comunidade escolar, se convencionou designar por

intervenção prioritária. Neste contexto é, também, apresentada a avaliação

daquela intervenção e salientada a importância estratégica que os seus resultados

representam nos percursos e práticas a desenvolver pela comunidade educativa

em direcção ao modelo de escola inclusiva. Este capítulo fecha com uma

referência ao modo - e ao conteúdo - como será desenvolvido o ciclo seguinte do

projecto de investigação-acção. Tal tem por finalidade dar a conhecer a

programação do ciclo de trabalho previsto para assegurar a continuidade operativa

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dos processos já desenvolvidos e aqui descritos. Os dois ciclos de trabalho, após

a sua concretização, darão, assim, cumprimento a todo o trabalho planeado.

Como já se esclareceu - e justificou - o primeiro daqueles ciclos já foi cumprido e é

objecto de relato no presente documento. Seguir-se-á, naturalmente, o ciclo

complementar, o qual pela sua morosidade, abrangerá, como já se adiantou, um

período temporal de três anos escolares.

Finalmente - e numa lógica conclusiva - serão, ainda, tecidas algumas

considerações de jaez reflexiva. Desse modo se procurará então, explicitar, de

forma naturalmente sumária, o testemunho das ilacções mais relevantes que,

deste trabalho, se considerou pertinente extrair.

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CAPÍTULO I

ENQUADRAMENTO TEÓRICO

O presente capítulo tem, por finalidade, apresentar a informação obtida

através da consulta da literatura de incidência e que se considerou relevante, não

só para elaborar o enquadramento teórico e compreensivo da problemática em

estudo, mas também para fornecer dados capazes de dar resposta científica a

alguns dos aspectos relacionados com as próprias perguntas de partida. Neste

caso, nomeadamente com os que seprendiam com a definição do modelo de

escola inclusiva a adoptar e com as perspectivas a seguir para implementar, na

escola-alvo, uma organização e um funcionamento propícios a uma educação de

qualidade para todos os alunos e, em particular, para os alunos com NEE.

Como linha orientadora dessa busca de informação, optou-se por se

perfilhar o princípio defendido por Sampieri, Colado e Lucio (1996).

Concretamente estes autores preconizam que o enquadramento teórico de um

trabalho desta natureza, deverá consubstanciar o acervo de teorias, enfoques

conceptuais, pesquisas e antecedentes em geral que se enquadrem,

fundamentem e clarifiquem epistemologicamente a problemática investigada.

1 Perspectiva Histórica

A análise da literatura relativa à emergência da escola inclusiva evidencia

que tal evento erradica num processo evolutivo, o qual mergulha as suas raízes

nos primórdios dos tempos históricos e que durante largo tempo assentava em

práticas puras de exclusão. Julgando-se, então, que a situação actual só será

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objecto de uma compreensão fundamentada, se assente na recuperação - ainda

que em traços largos - de algumas das partes mais significativas daquele

processo de evolução, optou-se, assim, por se iniciar a revisão da literatura com

um resumido relato do processo em causa.

1.1 Do Infanticídio à Segregação

O fenómeno da exclusão, ainda hoje muito patente em determinadas

atitudes e práticas sociais, mergulha profundamente as suas raízes na história da

humanidade a tal ponto, que se situam nos tempos mais remotos, as notícias

sobre procedimentos de exclusão de seres humanos do seio social. Estas acções

eram concretizadas sob o pretexto de que, aqueles, por apresentarem

determinadas características físicas, ou mentais, não eram considerados

merecedores de uma convivência com os que eram, aparentemente, mais

perfeitos.

Porém, se a exclusão é, porventura tão antiga como a própria humanidade,

será de ter em conta que a forma como os indivíduos deficientes têm sido

retratados e tratados, não se manteve inalterável, antes evoluiu à medida que a

própria humanidade ia, também, evoluindo. A situação actual, no contexto em

apreço, terá, assim, que ser entendida como um ponto de chegada, ou seja, como

a consecução progressiva do resultado das várias visões e das várias práticas de

que têm sido alvo as pessoas deficientes, ao longo dos tempos.

Nesta perspectiva, para se compreender, de modo seguro, o que,

actualmente, constitui a situação do atendimento social aos indivíduos com

deficiência, entende-se ser necessário recuperar, retrospectivamente, ainda que

de modo naturalmente sumário, o percurso histórico desse processo, associando-

o, por razões decorrentes da natureza do presente trabalho, à própria história da

Educação Especial. Julgando-se, entretanto, que a expressão Educação Especial

é susceptível de ser interpretada de formas diferenciadas - sobretudo no presente

contexto em que se pretende abordar, a mesma, sob uma lógica de perspectiva

histórica - afigura-se ter cabimento adoptar-se uma explicitação conceptual

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daquela expressão que facilite a compreensão do conteúdo a seguir apresentado.

Nesta perspectiva - de evolução histórica, frise-se - parece, então, adequado

encarar a Educação Especial como “um tipo de educação diferente da praticada

no ensino regular e que se desenrolaria paralelamente a esta, sendo a criança a

quem era diagnosticada uma deficiência, incapacidade ou diminuição, segregada

para uma unidade ou centro específico” (Jiménez, (1997, p. 9).

A propósito precisamente do desenvolvimento da Educação Especial, o

autor antes citado considera a existência de três fases distintas no processo de

evolução temporal da história do atendimento educacional das pessoas com

deficiência. Assim, para Jiménez, essas fases são as seguintes:

Uma primeira, que poderemos considerar como a pré-história da Educação

Especial; uma segunda, aquela em que surge a educação especial entendida

como o cuidado com a assistência e, por vezes também, com a educação,

prestada a um certo tipo de pessoas e caracterizada por decorrer em situações e

ambientes separados da educação regular; uma última etapa muito recente em

que nos encontramos actualmente, com tendências que nos levam a supor uma

nova abordagem do conceito e da prática da Educação Especial. (1997, pp. 21-22)

Na obra em análise, Jiménez situa a emergência da Educação Especial,

nos finais do século XVIII, inferindo-se, por conseguinte, que os tempos anteriores

a esta data, integram o período da sua pré-história. Ora como a história só poderá

ser compreendida se devidamente conectada com a pré-história, julga-se

pertinente serem de recuperar - ainda que de forma necessariamente resumida -

os factos mais significativos que ocorreram nesse período, a fim de que seja

possível interpretar e compreender melhor o sentido da evolução das atitudes e

dos procedimentos, então adoptados, relativamente às pessoas com deficiência.

Com base, ainda, no testemunho de Jiménez, afigura-se, ser de concluir

que, até ao século XIX, foram diminutas as intenções e práticas de assegurar

processos de educação, dirigidos às crianças deficientes. Tal facto parece, pois,

colocar em evidência a visão cultural que as sociedades detinham, até então, dos

indivíduos portadores de deficiência, incluindo-se, nestes, as próprias crianças.

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Retornando, entretanto, ao período da pré-história da Educação Especial,

será de referenciar que, nas sociedades antigas, a condenação à morte das

crianças deficientes era uma prática normal, traduzida, como refere Correia

(1997), em Esparta, na Antiga Grécia, pelo abandono de crianças com

anormalidades físicas, nas montanhas, enquanto que, na então contemporânea

Roma, as crianças com problemas semelhantes, eram, pura e simplesmente

lançadas aos rios. Ainda, segundo este autor - e na mesma obra - já em plena

Idade Média, muitos indivíduos com deficiências físicas, ou mentais, foram alvo de

julgamentos, perseguições e execuções, uma vez que aquelas deficiências, eram,

então, associadas ao imaginário satânico e a actos de bruxaria.

Entretanto, ainda nos tempos medievais, conforme assinala Jiménez, na

obra em análise (1997), a Igreja não apoiava qualquer tipo de infanticídio, antes o

condenava. Contudo, acabaria por contribuir para o crescente hábito das práticas

de perseguição - já explicitadas - por veicular a ideia de que as anormalidades de

que as pessoas eram portadoras, derivavam de causas sobrenaturais, por um

lado, e, por outro, eram sinais terrenos de influências demoníacas.

Jiménez, relata, também, que durante os séculos XVII e XVIII, os

deficientes mentais eram acolhidos, em regime de internato, em manicómios,

orfanatos, prisões e noutros tipos de instituições mais ou menos similares. Estes

indivíduos ali iam permanecendo, na maioria dos casos, juntamente - e de forma

puramente indiscriminada - com delinquentes, velhos e mendigos.

Paralelamente, todavia, iam aparecendo aqui e acolá, algumas iniciativas

que denotavam o despertar de uma nova consciência em relação às pessoas

possuidoras de determinadas limitações físicas, ou mentais. Neste âmbito,

Jiménez cita, por exemplo, o facto de o frade Pedro Ponce de León (1509-1584)

ter criado, de forma bem sucedida, um processo de educação dirigido a 12

crianças surdas, por volta dos meados do século XVI, no Mosteiro de Oña. Este

religioso, para além das acções, preocupou-se, também, com o estudo daquela

problemática educacional, como o prova o facto de ter escrito a obra Doctrina para

os surdos-mudos.

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Naqueles factos, Jiménez encontra razões e fundamentos para considerar

Ponce de León como o pioneiro da educação de crianças surdas, concretamente,

através do método oral. Embora não cabendo aqui aprofundar as razões de tal

acontecimento, não deixa, porém, de ser curioso assinalar o facto de as pessoas

com deficiências auditivas terem sido, de alguma maneira, alvo de uma atenção

precoce - historicamente falando - se comparadas com aquelas que, igualmente,

se debatiam com outros tipos de problemas. Esta observação resulta,

precisamente, da análise da investigação aportada por Jiménez, ao referenciar o

aparecimento de um outro estudo - coevo do produzido pelo frade Pedro Ponce de

Léon - e centrado, igualmente, no ensino dos indivíduos com deficiência auditiva.

A obra em questão foi publicada por Juan Pablo Bonet, no ano de 1620, sob o

título de Reducción de la letras y arte de enseñar a hablar a los mudos.

Ainda, na linha do reforço da ideia em análise, refira-se, também, a criação

da primeira escola pública para surdos no ano de 1755 e que Jiménez atribui ao

abade Charles Michel de l‘Épée. Esta escola viria, algum tempo mais tarde, a dar

origem ao Instituto Nacional de Surdos-Mudos, o que confirma, mais uma vez e de

de modo inequívoco, a atenção especial que a população deficiente auditiva vinha

a merecer, já naqueles tempos.

Porém - refira-se em abono da verdade - que nem só a deficiência auditiva

era alvo de cuidados específicos. Assim, na sua investigação sobre este assunto,

Jiménez, inventaria, igualmente, o aparecimento no ano de 1784, em Paris, de um

instituto para crianças cegas. Tal deveu-se a Valentin Haüy, o qual viria a ter,

como aluno, Louis Braille (1806-1852). Este acontecimento acabaria por ter uma

importância crucial na própria história do atendimento educativo da população

cega, a nível mundial, uma vez que proporcionou, exactamente por parte de Louis

Braille, a invenção de um sistema convencional de leitura e de escrita, assente em

processos de percepção táctil. Este processo instrumental de acesso à literacia

acabaria por chegar com acutilante actualidade, aos tempos de hoje, com a

importância que se lhe reconhece, no quotidiano da escolaridade dos alunos

cegos.

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Com outras iniciativas semelhantes às anteriormente descritas emerge o

tempo das instituições de apoio educacional a indivíduos deficientes. Por essa

razão, Jiménez localiza, nesses tempos, o período de transição da época da pré-

história para a época da história da educação especial (finais do século XVIII,

princípios do século XIX).

Jiménez identifica, então, por aquelas alturas, determinados indícios que

marcam o advento de uma nova atitude social e cultural face à pessoa com

deficiência. O surgimento dessa nova atitude tem, como efeito prático, a tomada

de consciência da necessidade de serem generalizadas as formas e estruturas de

atendimento aos indivíduos deficientes. Mas a razão que, então, estava por detrás

dessas múltiplas iniciativas parecia não primar pelo altruísmo. Efectivamente -

segundo, ainda, Jiménez - aquela tomada de consciência erradicava a sua origem

na ideia de que era imperioso criar condições que assegurassem a protecção à

pessoa normal, em relação à pessoa deficiente, considerando-se, portanto, esta,

como um perigo real para a sociedade. Refira-se, no entanto que, nalguns casos,

as razões fundavam-se em imperativos de natureza inversa, ou seja, de que se

tornava, também, necessário, proteger determinado tipo de indivíduos deficientes,

dessa mesma sociedade.

A verdade é que, graças à coexistência de uma influência dinâmica e

interactiva entre aquelas duas concepções, se verificou o aumento intensivo das

práticas de separação do deficiente do seio da sociedade. Assim, sob o efeito

conjugado de ambas as perspectivas, começam a surgir, a um ritmo elevado,

instituições vocacionadas para o atendimento educacional das pessoas com

deficiência, localizadas, por norma, em zonas situadas fora dos aglomerados

populacionais.

Certamente para amenizar os efeitos menos éticos das práticas em

questão, ia, sendo, paralelamente, cultivada a ideia de que o campo era o local

indicado, por excelência, para garantir, aos indivíduos com deficiência, uma

vivência mais saudável e feliz. Face a esta situação, a consciência social - refere,

ainda, Jiménez - ganha, paulatinamente, uma tranquilidade reconfortante, dado

que os deficientes estavam a ser alvo de práticas de cuidados e de assistência

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em ambientes ecologicamente recomendáveis ao mesmo tempo que a sociedade

se ia livrando do seu contacto.

Gradualmente, os cuidados assegurados aos deficientes passaram a ser

objecto consistente de preocupação social, sendo, para tal, criadas diversas

instituições asilares, ou, inclusivé, hospitalares. Porém, umas e outras eram,

invariavelmente, segregadas. Entretanto e como prova daquela preocupação

efectiva, assinale-se o facto de que os cuidados eram, até, prestados nos

domicílios dos destinatários, nos casos em que as instituições especificamente

vocacionadas para tal, não os podiam assegurar nas suas instalações, por serem

em número insuficiente face à dimensão da procura.

Ao longo daquele período da história da Educação Especial - caracterizado,

como se descreveu, primeiro, pela criação de instituições especiais para surdos e

cegos e, depois, nos finais do século XIX, para deficientes mentais - aparecem,

entretanto, determinadas figuras, as quais, pela sua visão e obra, se tornaram

determinantes no desenvolvimento do processo histórico da educação especial.

Seguidamente será feita referência a tais percursores.

Recorrendo-se, ainda, a Jiménez, este autor salienta, neste âmbito, os

trabalhos de Philippe Pinel (1745-1826), considerando-o como pioneiro na

tentativa de pesquisa de métodos de tratamento - concretamente, formas de

cuidados médicos - junto de indivíduos com atraso mental. Ao mesmo tempo que

desenvolvia o seu trabalho de investigação, Philippe Pinel ia registando, por

escrito, os consequentes resultados. Deste modo nasceram os primeiros tratados

sobre aquela matéria.

Paralelamente, são, também, citados Esquirol (1722-1840), por ter

estabelecido a diferença entre idiotismo e demência no seu Dictionnaire des

sciences médicales e Itard (1674-1836), por se ter dedicado, ao longo de seis

anos, ao conhecido caso do selvagem de Aveyron (Víctor), tentando - ainda que

de forma infrutífera - assegurar-lhe, um processo educativo sistematizado, se bem

que sob a perspectiva da cura. Assinale-se, a propósito, que Correia (1997),

salienta o facto de Itard ser considerado o “pai da Educação Especial” remetendo,

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desta forma, para a ideia de que, residirá na acção daquele investigador, o

verdadeiro nascimento da Educação Especial.

Para além das figuras já referidas, Jiménez referencia outras, como é o

caso de Voisin, que ganhou notoriedade devido à publicação, em 1830, da obra

Aplication de la phisiologie du cerveau á l‘étude des enfants qui necessitent une

éducation spéciale, na qual apresentou os resultados de um estudo sobre crianças

com atraso mental. Referindo-se, ainda a Seguin, Jiménez releva o facto de, este

se ter dedicado à elaboração de um método para o ensino de crianças idiotas, a

que deu o nome de método fisiológico.

De realçar, na visão de Seguin, um aspecto inovador que se julga poder

inserir - salvaguardadas as devidas distâncias - no espírito da igualdade de

tratamento, na medida em que, advogando, igualmente, a aplicação do seu

método fisiológico no ensino regular, foi, de alguma maneira, percursor do aludido

princípio, abrindo, provavelmente, espaços atitudinais para a gradual aproximação

das metodologias educativas entre a educação especial e a educação regular.

Efectivamente, na medida em que preconizava a possibilidade de aplicação

daquele método no âmbito do processo educacional das crianças ditas normais,

Seguin anunciava, já, neste contexto, alguns contornos do que se julga ser um

embrião da perspectiva de educação universal, por contraponto à dicotomia entre

a escola regular e a educação especial.

Prosseguindo na sua perspectiva, Seguin publica uma nova obra, desta vez

sob o título de Traitement moral, hygiène et éducation des idiots e, algum tempo

depois, sob a orientação pedagógica da professora Leontine Nicolle, introduz o

método para a educação e ensino de crianças deficientes mentais, criando uma

classe especial para a educação de raparigas com este tipo de problemática.

Pode-se, portanto, localizar neste evento, os primórdios da génese do ensino

especial, entendido, este, como um processo formal de atendimento educativo de

crianças deficientes, com programas, tempos e espaços intencionalmente distintos

dos destinados às crianças normais.

Jiménez aproveita, a propósito, o ensejo para relembrar que Puigdellivol,

em 1986, na sua obra História de Educação Especial, reconhece, nos trabalhos de

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Seguin, o nascimento da Educação Especial, segundo o sentido moderno da

expressão. Para fundamentar tal opinião, Puigdellivol considera que as iniciativas

de Seguin ultrapassaram o âmbito estritamente médico e assistencial que

caracterizava a generalidade das iniciativas lançadas, até à altura, no domínio do

atendimento ao indivíduo deficiente.

Continuando-se a usar como recurso as pesquisas de Jiménez (1997), e,

agora, também de Fontes (1933), verifica-se que prossegue, em várias partes do

mundo, a evolução dos processos de atendimento educacional das crianças

deficientes. Assim, decorria o ano de 1842 quando é criada a primeira escola para

a educação de crianças idiotas, em Berlim. Esta iniciativa é, posteriormente

objecto de réplica na Suíça, nos Estados Unidos e na Inglaterra. Em 1857 é

publicada na vizinha Espanha a Lei Moyano que formaliza e regulamenta a

criação de escolas para crianças surdas.

O movimento vai alastrando e, em consequência, é possível inventariar, no

ano de 1898, um número de 24 escolas especiais que atendiam o total de 8492

anormais em 19 estados da América do Norte. Por essa altura, e através de um

processo idêntico, eram atendidos 3200 alunos retardados em Inglaterra, e, em

França, cerca de 1000. Noutros países a situação era análoga, como no caso da

Suíça onde se contavam 29 instituições oficiais e 19 particulares, da Dinamarca

com um total de 14, da Suécia onde existiam 11, ou, ainda, da Noruega com

quatro instituições.

Como se referiu, o desenvolvimento deste processo de criação de

respostas educacionais às crianças com deficiência, consolida-se e ramifica-se

dando, como resultado, a proliferação de instituições vocacionadas para o efeito.

Estas iniciativas iam, assim, dentro de cada país, originando autênticas redes

regionais de estabelecimentos educativos. Como testemunho desta afirmação,

refira-se, por exemplo, o facto de em 1929, estar em funcionamento um internato

em cada província da Alemanha, a par de 4066 classes especiais, distribuídas

pelas, então, 699 cidades alemãs e frequentadas por um total de 73000 alunos

anormais. O atendimento destes alunos estava a cargo de 4170 professores

especializados. Estes números indiciam, por si só, um ratio professor/aluno que

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atesta, de maneira inequívoca, o investimento que, na altura era já feito um pouco

por todo o lado, de forma sistematizada, neste subsistema educacional.

Entretanto, a situação congénere na América do Norte era caracterizada

pela existência de 47 internatos, concebidos como apêndices às escolas regulares

oficiais e onde eram atendidos 26770 alunos, enquanto que cerca de 70000

anormais educáveis - entre os 7 e os 16 anos - eram, por sua vez, atendidos em

externatos, também situados próximo das escolas oficiais regulares. Pela mesma

altura, o movimento educativo de crianças com problemáticas semelhantes era,

igualmente, significativo, na Rússia, onde cerca de 1200 professores

especializados exerciam a sua actividade profissional, distribuindo-se por 35

internatos, 400 classes anexas às escolas regulares e, ainda, por 200 escolas

livres.

A evolução cultural e humanística ia prosseguindo e, para a sua

disseminação - como, de resto aconteceu, noutras áreas da actividade humana -

muito contribuíram as filosofias de Rousseau e de Diderot cujas ideias chegam,

também, ao campo da educação especial. Como consequência, emergem novos

ângulos de análise desta problemática. Assim - e na sequência dos contributos

daqueles pensadores - a partir do século XVIII, prefigura-se o embrião da ideia de

um ensino para todos, tendo por base o princípio do reconhecimento e da

aceitação das diferenças entre os indivíduos e, por inerência, entre as crianças.

Por seu turno, os progressos científicos e técnicos permitem novos

avanços, na área da Educação Especial, nomeadamente, no campo da avaliação,

como evidencia Correia (1997). Para confirmar tal, este autor refere os trabalhos

desenvolvidos por Galton e orientados para a medição da competência intelectual.

Este processo de avaliação era realizado a partir da observação sistematizada do

desempenho dos indivíduos, em tarefas de natureza sensório-motora. O autor

citado reporta-se, ainda, a Freud, relevando a sua conhecida teoria psicanalista.

Cita, também, as investigações levadas a cabo por Binet e Simon as quais,

centradas nos testes de inteligência, permitiam a identificação de crianças

mentalmente atrasadas.

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Parte dos trabalhos desenvolvidos por Binet e Simon prende-se, mesmo,

com a preocupação formal de serem criados instrumentos científicos que

pudessem predizer, com fiabilidade, quais as crianças que não teriam

capacidades para frequentar a educação regular. Esta afirmação encontra o seu

fundamento no facto de o Ministério Francês de Educação Pública promover a

constituição de uma comissão para elaborar um projecto de educação especial e

da qual fazia parte o próprio Binet (Coll et al., 2000). Na decorrência destes

trabalhos é publicada em 1905 a Escala Métrica de Inteligência de Binet-Simon, a

qual “perdurou até aos nossos dias com revisões e formulações sucessivas e que

continua sendo, 90 anos após o seu aparecimento, um dos instrumentos de

medida da inteligência mais utilizados pelos psicólogos escolares” (idem, p. 28).

As aludidas revisões e reformulações haveriam de dar lugar à criação da tão

propalada expressão Quociente Intelectual, como descrevem, também, Coll e os

seus colaboradores:

O teste de Binet-Simon concebe o desenvolvimento intelectual como a aquisição

progressiva de mecanismos intelectuais básicos, de tal maneira que a criança com

atraso é aquela que não adquiriu os mecanismos intelectuais que correspondem à

sua idade cronológica. Comparando a idade mental com a idade cronológica, a

escala métrica permite quantificar os anos de avanço ou de atraso no

desenvolvimento intelectual. Em 1912, William Stem [sic] enriquece o teste de

Binet-Simon com a introdução do quociente Intelectual (QI), que é o resultado da

divisão da idade mental pela idade real e da multiplicação por 100. (ibidem, p. 28)

Desta forma, ficava cientificamente provado que determinadas crianças não

dispunham da inteligência necessária para poderem frequentar as escolas

regulares. Consequentemente, os resultados dos trabalhos de Binet e de Simon

concorreram de forma muito significativa para o reforço da criação de escolas

especiais, como claramente, aponta Jiménez:

É de recordar que a psicometria e os testes de inteligência nasceram nos começos

do século com a intenção de elaborar um instrumento que servisse para identificar

e, posteriormente separar, os alunos não aptos para o ensino comum na escola.

Até datas bem recentes, à obtenção desta medida de inteligência seguia-se o

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afastar da escola regular das crianças com atrasos, os que obtinham um quociente

intelectual (Q.I.) abaixo de certos limite. (1997, p. 12)

Continuando a senda de desvendar os percursos temporais trilhados pela

educação especial, Jiménez assinala, em dada altura, a entrada em cena de

alguns argutos defensores de uma pedagogia nova. Realçando o alcance inovador

desta corrente, aquele autor personaliza-a em figuras como Montessori, ou

Décroly. Com o advento destes pensadores e pessoas de acção, a centralidade

do apoio de tipo assistencial aos indivíduos deficientes, começa a ser confrontada

com outras perspectivas mais próximas da intervenção de carácter pedagógico,

ainda que de pendor terapêutico. Esta nova corrente (da pedagogia terapêutica)

sofre, entretanto, um novo e significativo impulso, devido ao contributo de Heller,

nos primeiros anos do século XX, como refere Mayor (1989), citado em Jiménez,

(1997).

Nos finais do século XIX - bem como nos primórdios do século XX -

predominava, efectivamente, como, oportunamente se sublinhou, o princípio

assistencial. Reinava, então, a ideia de que as crianças e os jovens deficientes

deveriam ser, essencialmente, protegidos e acolhidos em estruturas

vocacionadas, prioritariamente, para a prestação dos ditos cuidados de natureza

assistencial.

Paralelamente, começa, porém, a emergir uma nova linha de pensadores,

representada por figuras como Froebel, Dewey, Makarenco, Mendel e Freinet, a

par dos já mencionados Montessori e Décroly. Graças ao contributo destas

personalidades, o enfoque educacional passa a ganhar terreno e, praticamente, a

ombrear - e em contraponto - com a perspectiva tradicional da prestação de

serviços de natureza assistencial.

As crianças deficientes começam, então, a ser alvo de um novo olhar. O

seu direito à educação surge como uma ideia defensável e - ainda que de maneira

implícita - a consciência desse direito vai ganhando lugar, progressivamente, no

imaginário cultural das sociedades, sobretudo do mundo dito ocidental.

Em consequência do exposto, emerge a partir dos inícios do século XX, um

incremento intensivo do processo educativo das crianças com deficiência,

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suportado por uma dinâmica de contínuas mudanças. Gradualmente - e por

pressão do já referido processo de mudanças - as instituições destinadas ao

atendimento das crianças deficientes, mantendo, embora, um cariz nitidamente

segregador, vão assumindo, cada vez mais, preocupações de natureza educativa.

Como corolário deste processo, aquelas instituições passam a proporcionar aos

seus utentes, em termos curriculares, aprendizagens de natureza académica -

ainda que naturalmente simples - complementadas por tarefas do tipo manual.

Na primeira metade do século XX, a evolução no processo de apoio

educacional às crianças com problemas específicos foi, de certo modo, lenta já

que, nessa altura imperava uma visão que considerava que a “deficiência,

diminuição ou handicap incluía as características de inatismo e de estabilidade ao

longo do tempo” (Marchesi & Martín, 1995, p.7). A adopção convicta desta

perspectiva não justificava, naturalmente, investimentos significativos na educação

das crianças em questão, pelo que, durante a vigência daquele princípio, pouco se

evoluiu.

De acordo com o relatado - e como salienta Correia (1997) - identificam-se,

assim, ao longo da história e até meados do século XX, dois grandes tipos de

práticas sociais perante as crianças deficientes: “um, mais antigo, suportado e

decorrente de culturas ancestrais de exclusão que, pura e simplesmente elimina

as crianças da sociedade de que devem ser parte integrante” (p. 14), e um outro,

mais recente que, centrado num “procedimento de as colocar com estatuto

desviante, segrega-as” (idem).

O período que se seguiu à Segunda Grande Guerra Mundial caracterizou-

se por um reforço pertinente da via pedagógica. Esta perspectiva reaviva a

corrente que pretende reduzir a discriminação educativa e social de que eram

alvos as crianças e os jovens com deficiência. Mais precisamente, na segunda

metade da década de 50 do século XX, começa a generalizar-se, nalguns países

ocidentais mais desenvolvidos, a participação, nas escolas, de psicólogos da

educação e do ensino os quais, por este processo, ajudam os professores a

melhor compreender as dificuldades escolares de determinados alunos. O plano

de Langevin-Wallon, com a incorporação de psicólogos nas escolas de França,

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constitui um exemplo dessa tendência (Coll et al., 2000). Deste modo, inicia-se

uma “substituição progressiva de um tipo de intervenção clínica, ou médica,

centrada sobretudo no diagnóstico e no tratamento dos transtornos de

desenvolvimento e da conduta, para uma intervenção do tipo mais educativo,

centrada nos problemas e nas dificuldades de aprendizagem dos alunos e no

trabalho escolar” (idem, pp. 62-63).

Esta visão vai gerando a progressiva democratização da escola que, então,

visa organizar-se de molde a facilitar a igualdade de oportunidades de acesso à

educação escolar a todas as crianças. Contudo, se as portas da escola se abriam,

as portas das salas de aula pareciam continuar demasiado fechadas à inevitável

diversidade dos alunos.

1.2 Da Segregação à Integração

A análise do transcurso histórico da Educação Especial põe em evidência,

ao longo do século XX, uma linha de pensamento e de acção que, orientada de

fora para dentro, vai aproximando a educação das crianças com deficiência, dos

espaços e dos tempos em que era educada a generalidade das crianças. Este

trajecto será, aqui, entendido como o caminhar da segregação para a integração,

valendo, para tal, o entendimento que, para este último termo, sugerem Pijl &

Mejer (1991), ao considerá-lo, em termos gerais, como um conjunto de todos os

procedimentos levados a cabo, com a finalidade de evitar um atendimento

segregado e à parte, das crianças que sejam portadoras de deficiências.

Como referência orientadora da pesquisa da informação necessária à

presente secção, serviu, ainda, a definição de integração escolar constante no

Dicionário Enciclopédico de Educación Especial (1985). Trata-se de um conceito

muito próximo do proposto por Pijl e Mejer, conquanto que formulado em termos

mais relativizados à realidade escolar, como se pode comprovar através da sua

reprodução, (tradução pessoal para a língua portuguesa): “a unificação da

educação regular com a educação especial, oferecendo uma série de serviços a

todas as crianças com base nas suas necessidades individuais de aprendizagem”

(p. 1166).

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A fim de ser descrito o trajecto em causa ou seja, descrever a evolução da

educação especial, ao longo do século XX - período em que transcorre, de modo

nítido a fase de transição da segregação para a de inclusão - de forma rigorosa e

sistemática, serão considerados como fontes principais de referência, alguns dos

mesmos autores a que se tem recorrido para sistematizar a presente perspectiva

histórica da evolução da Educação Especial, nomeadamente, tanto, Correia

(1997) como Jiménez (1997). Segundo o primeiro dos dois autores citados, (Correia, 1997) emerge, a

partir dos meados do século XX, um conjunto de movimentos sócio-culturais que

“estão na génese das recentes disposições de igualdade de oportunidades

educativas para crianças com NEE na escola regular” (p. 14). As consequências

dos referidos movimentos vão, sucessivamente, provocando alterações nas

atitudes e práticas subjacentes ao atendimento educacional das crianças,

processo que, o autor em referência, considera como um período de transição,

entre as práticas de segregação e os procedimentos de integração.

Entretanto, para Jiménez, (1997), “o século XX, caracteriza-se pelo início da

obrigatoriedade e expansão da escolarização básica, detectando-se que

numerosos alunos . . . tinham dificuldade em seguir o ritmo normal da classe” (p.

24). Esta assimetria de rendimento leva, então, à necessidade de encontrar

formas diferenciadas de responder a capacidades igualmente diferentes de

aprender, visão que emergiu com um impacto assinalável nas primeiras décadas

daquele século. Marchesi e Martín (1995), por seu turno, caracterizam esta fase

da seguinte maneira:

Esta visão, existente durante estas primeiras décadas, trouxe consigo duas

consequências significativas. A primeira era a necessidade de uma detecção

precisa do distúrbio, que se beneficiou sobremaneira com o enorme

desenvolvimento dos testes de inteligência, cujas mensurações proporcionaram a

delimitação dos diferentes níveis do atraso mental. A segunda aparece vinculada à

conscientização de uma atenção educacional especial, distinta e separada da

organização educacional regular. Surgem, assim, as escolas de educação

especial, que foram se ampliando e consolidando paralelamente ao

desenvolvimento do estado moderno. (p. 9)

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Sob este fundamento surge, então, a educação especial institucionalizada,

fundamentada na diferenciação das capacidades intelectuais e sustentada,

fundamentalmente - como, de resto, já se referiu - pelos procedimentos de

medição do quociente intelectual criados por Binet. Na prática, a aplicação dos

instrumentos de medição do quociente intelectual tinha, como efeito,

precisamente, identificar os alunos que nas escolas regulares não disporiam de

capacidade cognitiva para acompanhar o ritmo dos alunos normais.

Assim, como informa Ainscow, (1988), “em muitos países o atendimento

dependia de um processo de avaliação que levava à categorização da criança, de

acordo com o tipo de deficiência detectada” (p. 13) e cuja resposta, daí

decorrente, viria a consolidar o objecto nuclear da intervenção da educação

especial, concedendo, a este subsistema, uma importância crescente no seio dos

diferentes sistemas educativos oficiais.

Em consequência daquela separação física dos dois tipos de atendimento

educacional, na década de cinquenta do século XX assiste-se, à proliferação das

classes especiais. Este facto, por seu lado, incrementava a intensificação dos

processos de rotulação das crianças, uma vez que estes consubstanciavam os

trâmites necessários à selecção dos candidatos para efeitos da frequência das

ditas classes especiais. A rotulação em causa ia dando origem ao enquadramento

de cada aluno num dos seguintes quadros categoriais:

• Cegos

• Surdos

• Deficientes mentais

• Deficientes motores

Algumas novas perspectivas surgem, entretanto, naqueles anos de 40 e 50

do século XX, como assinalam Marchesi e Martín (1995) ao referirem que:

Continuavam, certamente, tendo total vigência os dados quantitativos

proporcionados pelos testes de inteligência para determinar os níveis de atraso

mental, mas já se levava em conta as influências sociais e culturais que podiam

determinar um funcionamento intelectual mais deficiente. Firmava-se a concepção

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de que a deficiência podia ser motivada pela ausência de estimulação adequada

ou por processos de aprendizagem incorrectos. Ao mesmo tempo, incluíam-se os

conceitos de adaptação social e aprendizagem nas definições sobre atraso

intelectual, reforçando-se as possibilidades de intervenção. (p. 9)

Vislumbrava-se, então, já naquela época, a natureza interactiva dos

problemas de aprendizagem, abrindo-se, desse modo, caminho para a ideia de

que os ambientes sociais e educacionais são - a par com as condições intrínsecas

das crianças - factores determinantes das suas capacidades e limitações.

No início dos anos sessenta, propaga-se, entretanto, por toda a Europa e

também pela América do Norte, o conceito de normalização entendo-se, tal, como

a “possibilidade de o deficiente mental desenvolver um tipo de vida tão normal

quanto possível” (BanK-Mikkelsen, 1969, citado em Jiménez, 1997, p. 24). Esta

ideia de normalização encontra a sua génese na Dinamarca que a havia, já,

incluído na sua legislação, no ano de 1940. Ao mesmo tempo, várias associações

de pais começavam a manifestar, de forma crescente, a sua rejeição pelas

escolas segregadas.

Por outro lado e na mesma altura, outros sinais favoráveis à integração

começam a ganhar forma, como descrevem Marchesi e Martín (1995):

Começou a formar-se em diferentes países um importante movimento de opinião

em favor da integração educacional dos alunos com algum tipo de deficiência. Seu

objectivo era reivindicar condições educacionais satisfatórias para todos estes

meninos e meninas dentro da escola regular e sensibilizar professores, pais e

autoridades civis e educacionais para que assumissem uma atitude positiva em

todo este processo. (p. 14)

Como se pode verificar, então, pelo testemunho destes autores, a abertura

da escola regular ao processo de integração, não parece ter decorrido de um

exercício de reflexão interna sobre a adequação, ou não, dos modelos de

atendimento segregado às crianças deficientes. Antes, se terá devido a uma

pressão de fora para dentro e movida, neste caso, pelos sectores sociais mais

activamente atentos aos valores da igualdade e da dignidade da pessoa humana.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 29

A força dos pais e o impacto social do conceito de normalização, começam,

de modo convergente, a fazer sentir-se no âmbito da escolaridade, mediante

alguns processos de substituição de procedimentos de segregação, por atitudes e

práticas de integração. No seguimento desta perspectiva, surge, no Canadá, um

trabalho pioneiro de clarificação do conceito de normalização, sob uma

perspectiva pragmática, uma vez que lhe estava subjacente o objectivo de nortear

o atendimento educacional a indivíduos portadores de deficiência. Trata-se de

uma obra produzida por Wolf Wolfensberger, dada à estampa em 1972 e que

contribuiu, de forma incisiva, para reforçar o papel do Canadá na história

internacional da evolução do atendimento educacional das crianças com

necessidades educativas especiais.

Correia (1997) situa, entretanto, neste contexto temporal, a conhecida

expressão meio menos restritivo possível, atribuindo-lhe uma proximidade

semântica com os termos normalização e integração. Neste âmbito, aquele autor

considera que “o termo “integração” tem a sua origem no conceito de

“normalização” e que se aproxima consideravelmente do conceito de “meio menos

restritivo possível” que se usa em sentido lato para referir a prática de integrar ”

(p. 19).

Afigura-se, igualmente, interessante, referir, neste âmbito, a opinião de um

autor, já mencionado, (Wolfensberger, 1972), o qual ao avançar com a ideia de

que o termo integração deverá ser entendido como oposto ao de segregação,

acaba, de alguma forma, por indiciar o que, no campo educacional, deve, ou não,

ser feito. Ou seja, Wolfensberger parece querer demonstrar que o caminho a

seguir nos processos de atendimento educacional aos indivíduos portadores de

deficiência é o da integração - como ponte conducente à normalização - e não o

da segregação. Esta perspectiva começa, também, a ser percepcionada noutros

países alimentando e fundamentando, por essa altura, algumas práticas esparsas

e pontuais de atendimento integrado de alunos portadores de determinado tipo de

deficiências.

Durante as décadas de sessenta e de setenta, do século XX, foram,

entretanto, desenvolvidos alguns estudos que procuravam caracterizar as diversas

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 30

modalidades de atendimento educativo de que eram alvo, então, os alunos com

deficiência em função do grau de complexidade dos seus problemas. Um dos mais

exaustivos terá sido o de Reynolds (1962), citado em Monereo (1989). Como

conclusão do seu trabalho Reynolds identificou, na altura oito possíveis modelos

de atendimento educativo das crianças deficientes. Apresentando os resultados da

pesquisa sob a forma de cascata, estruturada, sequencialmente, do mais

integrador para o mais segregador, aquele autor indicava para a primeira posição,

a colocação da criança em classe regular e em último lugar a situação extrema de

internato a tempo inteiro, referindo de modo explícito, os outros níveis intercalares,

como, por exemplo, a frequência da classe, ou da escola especial.

Entretanto, como observa Ainscow (1996), “com o decorrer dos anos, a

educação especial começou a ver-se a si própria e a ser vista pelos outros como

um mundo à parte, provendo às necessidades de uma pequena parte da

população infantil, considerada deficiente” (p. 13). O autor evidencia, deste modo,

a emergência paralela dos dois subsistemas educativos, em que cada um deles

assume metodologias específicas e, por essa razão, diferenciadas e não

articuladas entre si.

A educação especial, reforça, então, as práticas da avaliação

individualizada, centrada na identificação das áreas problemáticas dos alunos

portadores de necessidades educativas especiais. Para alguns autores, ganha,

desta forma, notoriedade significativa o efeito da etiqueta, no imaginário do

professorado que passaria a centrar a sua atenção em classificações e categorias

como critério para a tomada de decisões. Nesta óptica, os alunos são entendidos,

não tanto pelo que necessitam de saber, mas, principalmente, pelos problemas

que tornam mais difícil a sua progressão escolar ( Ainscow & Tweddle, 1988).

Outros, pelo contrário, insistem em chamar a atenção para as peculiaridades

subjacentes às crianças com NEE, as quais só serão devidamente compensadas

em termos educacionais se as mesmas forem alvo de “uma avaliação

compreensiva, feita por uma equipa multidisciplinar” (Correia, 2003b, p. 18).

Nesta incursão histórica, merece, entretanto, especial realce, o relatório

Warnock (1978) pelo impacto significativo que provocou na reorganização

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 31

conceptual dos modelos educativos destinados às crianças com necessidades

educativas especiais. Efectivamente, este relatório que fora “solicitado pelo

Secretário de Educação do Reino Unido a uma comissão de especialistas,

presidida por Mary Warnock, em 1974, e publicado em 1978, teve o grande mérito

de convulsionar os esquemas vigentes e popularizar uma concepção diferente da

educação especial” (Marchesi & Martín, 1995, p. 11).

A perspectiva subjacente ao relatório de Mary Warnock, de uma certa

reconceptualização das necessidades educativas especiais, provocou uma

transferência estratégica da tónica médica para um enfoque mais intrinsecamente

educacional e curricular. Warnock introduz o entendimento de que a expressão

necessidades educativas especiais indicia o que é necessário proporcionar à

criança para que esta possa dar consecução, com sucesso, aos objectivos

escolares. Trata-se, portanto de uma visão que consagra o princípio da

disponibilização de meios de compensação educativa a determinadas crianças e

em função das suas características específicas. Desta forma é, então aberto o

caminho à adopção das adaptações curriculares (Brennam, 1985).

Nesta perspectiva, ao inventariar, concreta e metodologicamente, os tipos

diferenciados das respostas necessárias aos vários tipos de problemas de que as

crianças são portadores, Warnock institucionaliza as chamadas medidas

educativas especiais. Estas traduzem diversas tomadas de decisões que

procuram consubstanciar uma “ajuda educativa adicional ou diferente no que

respeita às adoptadas em geral para as crianças que frequentam as escolas

regulares” conforme diz Hegarty (1986), citado em Jiménez (1997, p. 10).

Neste contexto, Warnock elenca e explicita as seguintes medidas

educativas especiais:

Meios de acesso ao currículo - Dizem respeito a alunos que, para serem

atendidos apenas necessitam de determinados meios, recursos ou ajudas

técnicas, com os quais poderão acompanhar, em grande medida, o currículo

comum, facilitando quer a autonomia do aluno, quer a sua própria aprendizagem.

Estes meios de acesso estão relacionados com factores físicos, ou ambientais, a

utilização de materiais e de equipamentos específicos, ou de material adaptado,

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 32

ou, ainda, a aprendizagem de um código aumentativo, complementar ou

alternativo, à linguagem oral ou escrita.

Adaptações nos diferentes elementos do currículo - São as modificações,

ou ajustamentos que se realizam em relação ao quê, como e quando ensinar e

avaliar, ou seja, relativamente aos objectivos, conteúdos, à sua sequencialização

didáctica, às metodologias e estratégias de ensino e aos critérios e procedimentos

de avaliação.

Modificações no contexto educativo, estrutura social, ou clima afectivo em

que ocorre o acto educativo - Trata-se de operar mudanças na organização do

ensino, ou nas interacções que se desenvolvem na sala de aula, de modo a

ajustar os contextos educacionais às necessidades concretas dos alunos.

Como se pode observar, Warnock reforça claramente a ideia de que

compete à escola prever e disponibilizar respostas diferenciadas, tendo por critério

a natureza dos problemas de que são portadores os alunos. A lógica desta visão

parece, até certo ponto, ter contribuído para reformular a própria noção de escola,

dado que esta começa a ser encarada como uma organização flexível e, por

consequência, capaz de se adaptar às necessidades específicas e reais dos seus

utentes.

Paulatinamente, a assunção, por parte da organização escolar, dos princípios enunciados por Warnock vai influenciando a sua cultura de tal forma

que:

Este novo modelo não afecta apenas os alunos até agora considerados casos

típicos de Educação Especial, mas, também, e isto é importante, todos os outros

alunos com atraso escolar por causas diversas que engrossariam dentro em pouco

essa lista de fracassados escolares e que agora, graças às alterações propostas

para as condições educativas, receberão o apoio adequado para superar as suas

dificuldades. (Jiménez, 1997, p.11)

Esta situação - embora por outras palavras - é, também, reconhecida por

Marchesi e Martín (1995) ao afirmarem que os resultados produzidos por Warnock

e colaboradores lançam:

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 33

Luz sobre inúmeras e variadas dificuldades de aprendizagem que afetam [sic] uma

proporção muito maior de alunos. Pode-se incluir aqui os atrasos na aprendizagem

de diferentes matérias, a lentidão na compreensão da leitura, os problemas de

linguagem, os distúrbios emocionais de conduta, a evasão escolar, o isolamento

social, etc. (p. 12)

Afiguram-se, portanto, de extrema relevância, as mudanças qualitativas que

os contributos de Warnock produziram no contexto das organizações escolares. O

impacto destas mudanças não só se fez sentir no âmbito do atendimento aos

alunos com necessidades educativas especiais, mas, também e progressivamente

no que respeita a outras franjas de alunos, nomeadamente os que, por uma ou

outra razão, caem nas malhas do insucesso escolar. Por este motivo, prefigura-se

justo salientar que as perspectivas de Warnock promoveram um significativo

avanço nas atitudes e práticas escolares, em termos de organização de respostas

dirigidas aos alunos que mais delas necessitavam. Se a influência daquela

investigadora foi, efectivamente, determinante na activação de um processo de

mudanças fulcrais a nível da organização escolar, o seu impacto terá chegado,

também - ainda que de forma menos directa - aos próprios alunos, pois que,

estes, naturalmente, passam a frequentar a escola com outro ânimo. Esta nova

predisposição é decorrente do pressuposto de que eles passam a estar

conscientes de que, sempre que se deparem com constrangimentos para

progredir nas suas aprendizagens, poderão contar, por parte da própria escola,

com uma maior disponibilização de ajudas e de recursos especiais de que

necessitam para minimizar os efeitos dos problemas que os afectam.

São, por conseguinte, consideráveis e notáveis os efeitos que os trabalhos

de Warnock provocaram no campo da educação especial. Os seus contributos

rapidamente serviram de fundamento à legislação britânica, no que concerne à

regulamentação da prestação do apoio, por parte das escolas, aos alunos com

necessidades educativas especiais.

A análise dos resultados subjacentes à pesquisa desenvolvida pela

investigadora em causa, conduz à inferência de que muito da enorme influência

que estes resultados tiveram na organização de respostas às crianças com

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 34

problemáticas específicas se deverá, essencialmente, à forma clara como ela

responsabilizou a escola pela necessidade de se adaptar àquelas crianças e não o

contrário. Neste contexto, a conceptualização da expressão necessidades

educativas assume uma importância estratégica fundamental o que leva, por

exemplo, Jiménez a considerar que “o conceito de necessidade educativa especial

é um conceito-chave” (1997, p. 9).

A perspectiva de Warnock, ao retirar a problemática da deficiência da

priorização no enfoque médico, para a centrar, de forma muito assertiva, no

âmbito pedagógico, permitiu, como resultado crucial, consciencializar a

necessidade pragmática de a escola passar a proporcionar recursos e processos

de apoio adequados à tipologia das dificuldades dos alunos. Com esta estratégia,

passavam a estar criadas condições para que aqueles alunos pudessem,

minimamente, aceder com sucesso aos objectivos gerais de aprendizagem no

meio menos restritivo possível.

Para reforçar a lógica da sua argumentação, Warnock realça determinados

princípios cuja persuasão se afigura praticamente irrecusável. Como exemplos de

tal, referem-se os seguintes:

• Considera a educação especial como um processo de responder às

necessidades dos alunos e não um lugar.

• Remete o desenvolvimento daquele processo para o âmbito da escola

regular, sob o pretexto de que cerca de 20% dos alunos podem, ao longo

do seu percurso escolar, serem - ainda que alguns de forma temporária -

portadores de necessidades educativas específicas, pelo que não faria

sentido prover o atendimento deste número tão significativo de alunos em

contextos especiais.

No seu trabalho, Warnock acaba por relevar, essencialmente, o tipo de

ajudas, ou de recursos a proporcionar, pela organização educativa, a cada aluno,

para que este possa progredir, de modo apoiado e com sucesso, no seu percurso

escolar. Logo, coloca em evidência as implicações educacionais resultantes dos

problemas específicos de cada aluno e não tanto a sua origem, ou localização

fisiológica. Este facto, reforça, de modo inequívoco, a já referenciada

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 35

proeminência do enfoque pedagógico, sustentada pela investigadora, face à

prevalência da óptica médica até então genericamente verificada.

Esta nova visão de equacionar e de responder aos problemas de

aprendizagem, passa, assim, a valorizar mais as tomadas de decisões

fundamentadas na identificação de estratégias e de materiais curriculares para a

superação de dificuldades, do que, propriamente, as técnicas de intervenção

decorrentes e programadas em função do tipo e grau de deficiência de cada

aluno. Como resultado da sua análise ao trabalho de Mary Warnock, Jiménez

retira algumas ilacções de evidente significado educacional, no que concerne à

forma como deverão ser interpretados os problemas de que são portadores os

alunos, como se pode comprovar nos exemplos seguintes:

a) O seu carácter interactivo: as dificuldades de aprendizagem de um aluno têm

uma origem fundamentalmente interactiva, dependendo tanto das condições

pessoais do aluno como das características do contexto em que este se

desenvolve, que é o mesmo que dizer a escola;

b) A sua relatividade: as dificuldades de um aluno não podem conceber-se com

carácter definitivo, nem de forma determinante, e dependerão das

particularidades do aluno num dado momento e num dado contexto escolar.

(1997, p. 10)

O advento do relatório elaborado por Warnock, marca, sem dúvida, com

traços nítidos, uma decisiva viragem conceptual no campo da educação especial,

estabelecendo, em consequência, algumas rupturas flagrantes com a visão

tradicional. Após o contributo de Warnock a educação especial “já não se concebe

como a educação de um tipo de alunos, mas sim como o conjunto de recursos

humanos e materiais postos à disposição do sistema educativo para que este

possa responder adequadamente às necessidades que, de forma transitória ou

permanente, possam apresentar alguns dos alunos” (Jiménez, 1997, pp. 11-12).

Por outro lado, o sentido terminológico dessa evolução foi objecto de uma

pertinente análise por parte de Gallardo Y Gallego (1993), citados em Jiménez

(1997, p. 11). O conjunto das conclusões obtidas a partir da referida análise pode

ser objecto de apreciação no quadro 1 que seguidamente se insere.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 36

Quadro 1

Comparação Semântica da Expressão Educação Especial (EE) no seu Sentido

Tradicional com a Expressão Necessidades Educativas Especiais (N.E.E.)

Educação Especial

Necessidades Educativas Especiais

• Termo restritivo carregado de

múltiplas conotações pejorativas.

• Termo mais amplo, geral e propício

para a integração escolar.

• Costuma ser utilizado como

“etiqueta” de “diagnóstico”.

• Faz-se eco das necessidades

educativas especiais permanentes ou

temporárias dos alunos/as. Não é

nada pejorativo para o aluno/a.

• Afasta-se dos alunos/as

considerados normais.

• As n.e.e. referem-se às

necessidades educativas do aluno/a

e, portanto, englobam o termo E.E.

• Predispõe para ambiguidade e

arbitrariedade, em suma para o

erro.

• Estamos perante um termo cuja

característica fundamental é a sua

relatividade conceptual.

• Pressupõe uma etiologia

estritamente pessoal das

dificuldades de aprendizagem e/ou

desenvolvimento.

• Admite como origem das dificuldades

de aprendizagem, e/ou

desenvolvimento, uma causa

pessoal, escolar ou social.

• Tem implicações educativas de

carácter marginal, segregador.

• As suas implicações educativas têm

um carácter marcadamente positivo.

• Contém, implicitamente referências a

currículos especiais e, por isso, a

Escolas Especiais.

• Refere-se ao currículo normal e

idêntico sistema educativo para todos

os alunos.

• Faz referência aos PEI partindo de

um Esquema Curricular Especial

• Fomenta as adaptações curriculares

e as adaptações curriculares

individualizadas que partem do

Esquema Curricular normal.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 37

Contudo, as escolas especiais continuavam a ocupar um lugar de destaque

no atendimento educacional dos alunos deficientes. A sua existência impedia, de

algum modo, um avanço mais nítido das práticas de integração. Os defensores

destas procuravam, então, argumentos que relevassem as vantagens do modelo

integrado face ao modelo da escola especial. Dada a natureza das duas situações

em causa, importava, portanto, desenvolver investigação que confrontasse, de

modo científico e credível, as vantagens e as desvantagens do modelo de ensino

em escolas especiais face ao modelo de ensino integrado, ou vice-versa.

Consequentemente alguns trabalhos foram, entretanto desenvolvidos, com essa

finalidade, parecendo que as respectivas conclusões - conquanto nalguns

aspectos as escolas especiais revelem componentes positivas - apontam para o

facto de o modelo de ensino integrado configurar um quadro de melhores

resultados no campo da educação de crianças deficientes.

Por conseguinte, parece ser um dado adquirido que a educação especial,

enquanto subsistema ministrado de forma separada em termos físicos e

curriculares, não proporciona resultados pedagógicos tão eficientes como os

obtidos em situação integrada. O resultado do estudo efectuado por Jiménez

parece vir ao encontro desta premissa, pondo em relevo a desvantagem da

educação em escolas especiais, ao afirmar, em termos conclusivos “que a maioria

dos autores actuais vêem mais aspectos negativos do que positivos, neste

modelo, pelo que advogam a favor do ensino integrado” (1997, p. 25).

Correia (1997) comunga, igualmente, daquela opinião e com recurso a

fundamentos de alguma forma semelhantes aos utilizados por Jiménez, refere que

“uma revisão da literatura sugere que os alunos colocados em classes segregadas

sofrem consequências negativas, nomeadamente um autoconceito mais baixo,

como resultado da separação” (p. 20).

Face aos testemunhos dos autores considerados, afigura-se, portanto, ser

de concluir com fundamento, que a educação de crianças com necessidades

educativas especiais, em meios, o menos restritivos possível, começa, a recolher

amplos consensos, sobretudo, a partir da década de oitenta do século XX.

Contudo, o estado actual da organização e funcionamento das escolas regulares,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 38

parece aconselhar alguma prudência neste campo, a fim de se prevenirem

situações que, conquanto decorrentes de opções bem intencionadas, conduzam,

eventualmente, a resultados frustrantes, quer para os profissionais quer - por

motivos, obviamente mais preocupantes - para os alunos envolvidos. Por

conseguinte, julga-se ser de caminhar firmemente no projecto de construção da

escola inclusiva, porém com algumas cautelas, uma vez que, na situação actual

ainda “ não parece possível um ambiente completamente natural para todos”

(Jiménez, 1997, p. 25). Posição similar é, também, adoptada por Correia (1997),

ao advogar o recurso a processos alternativos “quando as necessidades da

criança não possam ser satisfeitas num meio que incluam crianças “normais”,

ainda que com recurso a apoios e serviços suplementares” (p. 19).

Assim, a colocação de uma criança em ambientes integrados de ensino

deve pressupor, antes de mais, uma qualidade de atendimento que,

efectivamente, proporcione uma resposta qualitativa aos seus problemas. Isto é,

muito mais determinante de que a simples colocação das crianças, é a forma

como se organiza e desenvolve o seu processo de ensino-aprendizagem, pois

que, como previne, de modo inequívoco, Correia (1997), “ quando a prática da

integração se concretiza, apenas, na sua colocação na escola, isto é se a

integração física não estiver articulada com a necessária integração social e

académica, tal prática resulta falaciosa e irresponsável” (p. 20). Semelhante

posição cautelar é expressa por Fonseca (1999) quando alerta para o facto de a

escola, à medida que se foi abrindo a um cada vez maior número de crianças ia,

paralelamente, gerando, um cada vez mais significativo número de situações de

inadaptação.

Nesta análise da evolução histórica do atendimento educacional das

crianças com necessidades educativas especiais foi, já, referido como ocorreu o

advento do termo e das práticas de integração. Porém, este último facto não

marca o fim da história. Efectivamente, os anos noventa do século XX anunciam a

emergência de um novo paradigma na caminhada percorrida pela Educação

Especial, ao longo dos tempos: a inclusão. A seu tempo esta nova visão será

objecto de abordagem pormenorizada neste trabalho. Por agora, será altura de se

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atentar o que, entretanto, se passava no contexto português, no que se refere aos

primórdios da educação especial, bem como a evolução da mesma ao longo do

decorrer dos tempos.

1.3 A Realidade Portuguesa

Em Portugal, a história do processo de educação das crianças em análise,

ocorria, de forma mais ou menos similar ao que, neste contexto, se passava nos

outros países, sobretudo, nos situados no chamado mundo ocidental, embora com

um calendário algo mais diferido no tempo. As fontes consultadas para a recolha

de informação sobre este assunto foram, essencialmente, o Parecer n.º 3/99,

emanado do Conselho Nacional de Educação e publicado no Diário da República,

II Série, em 17 de Fevereiro de 1999 e o resultado da pesquisa efectuada por Ana

Maria Bérnard da Costa, publicada pelo Instituto de Inovação Nacional, em 1996.

O contributo de outras fontes será devidamente assinalado.

O primeiro acto significativo registado entre nós, terá sido, em 1822, a

contratação do sueco Aron Borg, por D. João VI. Esta decisão real prendia-se com

a finalidade de ser devidamente organizada a criação de um Instituto de Surdos-

Mudos e Cegos, o qual viria a ser sediado, posteriormente, na Casa Pia.

Em 1871 surge a primeira instituição especificamente vocacionada para o

atendimento de populações especiais não deficientes, no caso, consubstanciada

pela criação de uma casa de correcção para crianças delinquentes, em Lisboa.

Alguns anos mais tarde - mais concretamente em 1890 - é inaugurado o Instituto

de Surdos de Benfica (Lisboa), o qual, independentemente da sua designação

atendia - para além de crianças com deficiência auditiva - débeis mentais e

crianças com perturbações severas de fala, de ambos os sexos. Este Instituto

assegurava o atendimento aos seus utentes, quer em regime de internato, quer

em regime de externato, onde, mediante o recurso a estratégias terapêuticas e

pedagógicas preconizadas por Jacob Rodrigues Pereira, se organiza a Secção

Especial para Crianças e Adultos Atrasados, Fracos de Espírito e Débeis (Fróis,

1997). Esta orientação didáctica apresentava aspectos verdadeiramente

interessantes, do ponto de vista educacional, já que, a partir da observação do

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 40

aluno e da sua história pessoal, é adoptado um sistema de ensino ajustado às

suas necessidades. As práticas educativas subsequentes eram baseadas nas

capacidades de aprendizagem e no reforço da estimulação sensorial

Entretanto, também, em Portugal se assiste ao movimento progressivo de

disseminação territorial de instituições diversas, genericamente vocacionadas para

o atendimento específico a indivíduos deficientes. Deste processo são exemplos,

entre outros, o Asilo de Cegos de Nossa Senhora da Esperança, em Castelo de

Vide, fundado em 1863, o Asilo-Escola António Feliciano de Castilho, em Lisboa,

criado em 1888, por Madame Sigaud, o Instituto de Surdos no Porto, estabelecido

em 1893, ou a Colónia Correccional Agrícola de Elvas, fundada em 1895.

A formação de professores para o atendimento educativo a crianças

deficientes é, igualmente, alvo de preocupação específica e, como consequência

de tal, é organizado o primeiro curso de formação de professores para a educação

de surdos, em 1913. Esta iniciativa deveu-se ao, então, Provedor da Casa Pia,

Aurélio da Costa Ferreira. Alguns anos mais tarde o seu nome viria ser dado a um

Instituto entretanto criado para a observação e ensino dos alunos da Casa Pia,

portadores de deficiência mental. Este Instituto realizava, paralelamente, trabalho

de observação de outras crianças, também com perturbações mentais e de

linguagem, em regime de consulta externa. Esta instituição viria, algum tempo

depois a ser tutelada directamente pela Secretaria-Geral do Ministério da

Instrução. A partir de 1926, este Instituto passou a assumir a tripla função de

seleccionar as crianças anormais, de preparar e orientar o pessoal docente e

técnico e de promover estudos de investigação médico-pedagógica e de

psiquiatria infantil.

Na década de trinta, emergia, entretanto, no país, uma ideia algo ambígua

na sua filosofia, uma vez que se admitia que a sociedade tinha:

O dever de tratar e educar (os anormais) aproveitando o possível rendimento dos

que, por meios médico-pedagógicos especiais, o possam vir a dar. E tem o dever

de assistir com humanidade os improdutivos. Mas tem, igualmente, o direito de se

defender deles, sequestrando-os ao meio social em que a sua irregularidade de

conduta os torne prejudiciais e, ainda, evitando a sua proliferação, a sua

procreação.” (Fontes, 1933, pp. 252-253)

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 41

Efectivamente, parece haver uma certa contradição neste princípio, dado

que, se por um lado, era cometido à sociedade o dever de tratar e educar os

anormais e de assistir os improdutivos, com humanidade, a mesma sociedade,

tinha, por outro, o direito de se defender daqueles, retirando-os do seu seio.

Conciliar, na prática, o sentido de cada uma das premissas enunciadas não

deveria ter sido tarefa fácil, se bem que a criação de instituições específicas para

este tipo de população, de alguma forma dava concretização prática ao princípio

em análise.

Na década de quarenta - e mercê da significativa influência dos trabalhos

de Décroly - o atendimento às crianças portadoras de deficiência é equacionado

sob uma dupla perspectiva. Uma relevava o tratamento físico ao qual se associa

um conjunto de medidas que possam melhorar o estado das funções biológicas do

indivíduo. A segunda preconizava o tratamento mental e a adaptação social dos

pacientes, em ordem a conseguir-se a maximização do seu rendimento, aquando

da futura sua condição de adulto. As linhas de investigação, neste campo,

prosseguiam, entretanto, quer a nível internacional, quer a nível nacional. Na

decorrência desta acção começam, então, a ser divulgados e conhecidos os

contributos de outros médicos e pedagogos como Burt, Claparède, Montessori,

Gesell, Costa Ferreira e João dos Santos.

Conquanto os resultados destes e doutros investigadores não primassem

pela consensualidade, viriam, contudo, a abalar os modelos médico-pedagógicos

vigentes, no país, nos anos quarenta. Assiste-se, assim - e por influência da obra

daqueles investigadores - a um significativo desenvolvimento da psicologia infantil,

da psicopedagogia experimental, da psicopatologia infantil e da pedagogia

experimental. Desta vaga inovadora resultam consequências assinaláveis como,

por exemplo, o aparecimento de novas categorias profissionais, como o caso do

psicólogo técnico - que transporta a herança dos modelos categorial e

psicométrico - e do psicólogo clínico o qual decorre da tradição psiquiátrica

instalada nos anos quarenta. O primeiro daqueles profissionais (psicólogo técnico)

está na origem do actual psicólogo educacional e a sua intervenção vai evoluindo

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 42

de uma estratégia inicialmente centrada em cada criança, para um tipo de trabalho essencialmente orientado para o desenvolvimento de acções de apoio sistemático

aos professores, na elaboração e activação de planos pedagógicos adequados à

população discente em causa. O segundo dos profissionais mencionados

(psicólogo clínico) permanece, ao longo dos tempos, mais fiel ao seu modelo

inicial de intervenção, subordinando o seu papel à tutela médica e intervindo,

normalmente, no sentido da complementaridade da mesma e no âmbito das

manifestações psicopatológicas diagnosticadas em cada criança atendida.

Este quadro de mudança provoca, gradualmente, uma inflexão

metodológica no cenário do atendimento da população deficiente. Assim, devido a

tais processos de mudança, as respostas às crianças problemáticas vai-se

aproximando de modo progressivo, a uma perspectiva marcadamente de natureza

pedagógica, ainda que muito influenciada pela vertente médica.

Paralelamente, vai evoluindo, também, a atitude social face à condição

educacional das crianças com deficiência, ganhando corpo o princípio do direito

daquelas, a uma educação e reabilitação especializadas. Aparecem, então, as

escolas especiais - ao lado dos centros médico-terapêuticos - onde professores ou

técnicos especializados garantem um atendimento especificamente diferenciado

do que era prestado às crianças ditas normais.

Entretanto Georges Mauco estabelecia em Paris, no ano de 1946, uma

nova forma de intervenção com características nitidamente dominadas pelo

modelo psicoterapêutico. Esta forma de intervenção chega ao conhecimento de

João dos Santos que, seduzido pelas suas virtualidades, a introduz em Portugal,

na década de sessenta, sob a designação de higiene mental infantil. É, desta

forma, iniciado um movimento de grande repercussão nacional no campo

educacional das crianças deficientes assente no princípio da valorização dos

cuidados educativos e de saúde e sob a crença de que muito se podia fazer, por

cada criança, através de uma intervenção médico-pedagógica de natureza

individualizada. Começa, então, a predominar o imperativo do diagnóstico clínico

das crianças, com a consequente categorização diferenciada, a qual

fundamentava a sua colocação em diferentes tipos de escolas, ou de classes.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 43

Nestas eram, então, asseguradas experiências educativas consideradas

adequadas ao perfil individual de desenvolvimento das crianças ali atendidas e de

acordo com os dados resultantes da referida observação diagnóstica.

Alguns investigadores alegam que os resultados do diagnóstico

influenciavam as expectativas dos professores que lidavam com estas crianças,

na medida em que tenderiam a relacionar os fracos resultados das crianças com a

natureza do seu problema. Tal é, por exemplo, a posição de Giné, ao salientar

que:

Seguindo o modelo médico, na avaliação fez-se finca-pé no défice e na posterior

etiquetação. Uma consequência inevitável, entre outras, é que a etiqueta com que

sempre era concluído o diagnóstico - aposta inicialmente para descrever uma

disfunção - convertia-se pouco a pouco em explicação e «causa» do

comportamento da pessoa com problemas. (1987, citado em Jiménez, 1997, p. 12)

Entretanto, em meados da década de quarenta, mais concretamente no ano

de 1947, emerge um marco significativo na história da Educação Especial em

Portugal. Trata-se da criação da primeira classe especial para alunos com

dificuldades de aprendizagem, facto que, de algum modo indicia o reforço de uma

perspectiva política que reconhece o direito e a relevância da educação formal das

crianças com problemas específicos. Esta perspectiva está, de resto,

testemunhada, de forma clara, nos conteúdos de alguns textos legislativos

publicados ao longo da década de quarenta, do século XX, nomeadamente, nos

Decretos-Lei n.º 31801, de 26 de Dezembro de 1941, n.º 32607, de 30 de

Dezembro de 1942, n.º 35401, de 27 de Dezembro de 1945 e no n.º 35801, de 13

de Agosto de 1946. Os diferentes documentos legislativos apresentam, entre si,

um curioso discurso de continuidade que haveria de culminar, precisamente, na

regulamentação extremamente pormenorizada da criação das classes especiais,

como se pode constatar no conteúdo do último dos decretos-lei mencionados.

Grande número daquelas unidades educativas funcionavam em localização

anexa às escolas primárias, situação que prefigurava, tanto uma proximidade

física à escolaridade dos alunos normais, como uma segregação curricular, face à

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mesma referência. Esta situação (segregação curricular) era, portanto - como

oportunamente se descreveu - fundamentada por critérios de natureza médico-

pedagógica produzidos sob a orientação técnica do Instituto António Aurélio da

Costa Ferreira, conforme o legalmente estipulado no Decreto-Lei n.º 35401, de 27

de Dezembro de 1945.

Aquela forma de atendimento educativo caracterizou o funcionamento

nuclear da Educação Especial, entre as décadas de cinquenta e de setenta, do

século XX. Entretanto, o poder político da altura revelava uma certa preocupação

em ir actualizando a regulamentação do funcionamento da educação especial, a

qual ia sendo objecto de sucessivas referências legislativas, como o comprovam,

tanto o Decreto-Lei n.º 43752, de 24 de Junho de 1961, como a Lei n.º 45/73, de

12 de Fevereiro. Este último documento legislativo viria, mesmo, a marcar um

momento decisivo neste historial do atendimento a alunos deficientes com NEE ao

formalizar a criação de departamentos especificamente vocacionados para o

desenvolvimento do ensino especial, no âmbito do Ministério de Educação.

A introdução, em Portugal, das primeiras práticas educativas integradoras

ficou a dever-se à então designada Direcção Geral da Assistência, a qual iniciou e

desenvolveu esforços no sentido de serem criadas melhores condições à

integração de crianças e de jovens - sobretudo com problemas de visão - nas

escolas regulares das principais cidades do país. Ensaiava, desta maneira, os

primeiros passos, uma nova cultura de atendimento educacional aos alunos

portadores de deficiência: a frequência escolar, a tempo inteiro, em turmas

regulares. Como suporte a esta dinâmica, a própria Direcção Geral de Assistência,

mediante o seu Centro de Preparação de Pessoal, organizava cursos de

especialização de professores na área do ensino de deficientes auditivos e de

deficientes visuais.

As referidas iniciativas da Direcção Geral da Assistência (Ministério dos

Assuntos Sociais), geraram a dinamização de um conjunto diversificado de acções

que reforçaram a cultura e a rede de atendimento da educação especial. A

dinâmica de alargamento desses recursos, assentou essencialmente, na “ criação

de centros de educação especial e centros de observação e também pela

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 45

realização dos primeiros programas de formação especializada de professores,

fora do âmbito do Ministério da Educação” (Bairrão, 1998, p. 16).

Aquela actividade parece não ter passado despercebida ao próprio

Ministério da Educação que decide, chamar a si, a partir dos anos setenta, a

responsabilidade das respostas escolares aos alunos com deficiência. Nesta linha

de pensamento e de acção, aquele organismo criou a Divisão do Ensino Especial,

através da já referida Lei n.º 45/73, de 12 de Fevereiro. Com esta medida, o

Ministério da Educação assume, finalmente, a tutela do processo educativo das

crianças e dos jovens portadores de deficiência.

A ocorrência da Revolução de 25 de Abril de 1974, vem reforçar o papel

daquele Ministério, no contexto em apreço, através do advento de uma política

renovada no campo da Educação Especial, orientada, fundamentalmente, para o

desenvolvimento das práticas de integração1. Efectivamente:

O modelo da escola integrativa desenvolveu-se rapidamente em Portugal, não

tendo sido estranhas a este rápido desenvolvimento as condições de inovação e

restruturação que se verificaram a seguir à revolução de 25 de Abril de 1974. A

título indicativo, no fim de 1997, 75% de alunos com dificuldades recebiam a sua

educação na escola regular, o que significava 38486 alunos apoiados por cerca de

6200 professores. (Costa & Rodrigues, citados em Rodrigues, 2001, pp. 17-18)

Esta política é concretizada, por um lado, pelo reforço do papel da Divisão

do Ensino Especial e, por outro, com a disponibilização, no ano de 1976, de

recursos especializados, junto dos estabelecimentos de ensino, sob a designação

de Equipas de Ensino Especial Integrado. Estas equipas tinham, como

fundamento da sua criação, o propósito explícito de promover a integração escolar

das crianças e jovens com deficiência. Correia (2003a) vislumbra, neste facto, um

marco histórico no processo do atendimento escolar dos alunos com

necessidades educativas especiais no nosso país, ao contrapor que “antes da

década de 70, mais propriamente antes de 1972, ou até de 1976, altura em que se

1 Adopta-se, aqui, a noção expressa por Rodrigues (2001) ao referir que a escola integrativa é “ a escola em

que se integram alunos com necessidades educativas especiais” (p. 17).

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criaram as equipas de ensino especial Integrado, os alunos com NEE eram

praticamente excluídos do sistema regular de ensino” (p. 7).

Nesta altura, conforme salienta Correia (1997), os destinatários daqueles

serviços de ensino integrado eram os alunos portadores de deficiências sensoriais

e motoras, desde que com possibilidades cognitivas de acompanhamento dos

currículos escolares regulares. Assim, um significativo número de alunos com

necessidades educativas especiais continuava a ser atendido no âmbito das

classes especiais, salvaguardando-se, aqui, que tal situação se aplicava apenas

às crianças que viviam nas zonas urbanas nas quais estava sediada a

esmagadora maioria daquelas unidades educativas. Consequentemente, infere-se

que as crianças que habitavam nas zonas rurais e que necessitassem de apoio

específico, devido às suas necessidades educativas, não teriam, na altura, tal

oportunidade.

Nos últimos anos da década de setenta, a então Direcção Geral dos Ensino

Básico e Secundário criou os Serviços de Apoio às Dificuldades de Aprendizagem,

que se disseminaram por várias regiões do país, sendo mais conhecidas pela

respectiva sigla (SADA). O alvo do atendimento destas unidades de apoio

psicopedagógico, eram, essencialmente, crianças com dificuldades de

aprendizagem. As estratégias de actuação destes serviços apresentavam

aspectos significativamente inovadores, uma vez que eram desenvolvidas,

sobretudo, junto dos professores titulares das turmas e, consequentemente,

relegando para um plano secundário, o apoio directo aos alunos. Estas unidades

de apoio educativo viriam a ser formalmente extintas em 1988, por pretensas

questões de reorganização funcional do sistema e sem que, relativamente às

mesmas, tivesse sido realizada qualquer tipo de avaliação (Bairrão, 1998).

Na década de oitenta, verifica-se o aumento contínuo e muito expressivo,

do número de Equipas de Ensino Especial Integrado. Este facto teve,

naturalmente, como consequência directa, o acréscimo significativo do número de

alunos atendidos, o qual, contudo, se encontrava “muito aquém do número total

existente no sistema educativo” (Correia, 1997, p. 27).

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No decurso do ano de 1986 é publicada a Lei de Bases do Sistema

Educativo, (Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro) gerando, no campo educacional, uma

renovada visão no que concerne ao atendimento educativo das crianças com

necessidades educativas especiais. Este facto encontra-se, patente,

nomeadamente, no disposto no seu artigo 7.º ao prenunciar, explicitamente, que

compete ao sistema educativo “assegurar, às crianças com necessidades

específicas, devidas designadamente, a deficiências físicas e mentais, condições

adequadas ao seu desenvolvimento e pleno aproveitamento das suas

capacidades”.

Como consequência operativa daquele preceituado legal, o Ministério da

Educação intensifica a organização de recursos para o apoio à escolaridade de

crianças com determinado tipo de deficiências, processo do qual resultaria uma

nova multiplicação, em número de unidades e de recursos humanos, das

Equipas de Educação Especial. Esta designação - por força do estabelecido no

Despacho Conjunto n.º 36/SEAM/SERE/88, de 29 de Julho - passou então a

vigorar, substituindo a anterior (Equipas de Ensino Especial Integrado).

Influências de outros países, neste contexto, fazem-se então sentir de modo

significativo em Portugal, promovendo, no interior da educação especial - e não só

- um clima de profunda reflexão e de debate, cujas consequências, no campo

educacional, contribuem para, gradualmente, começar a surgir no quotidiano

profissional dos docentes - com toda a naturalidade - a presença dos alunos com

necessidades educativas especiais. Assim, as crianças com problemáticas

educacionais mais ou menos significativas, passaram a ser, em geral, atendidas

nos mesmos tempos e espaços lectivos dos que eram proporcionados aos seus

pares, sem aquelas características. Neste aspecto, a divulgação da Public Law 94-

142, aprovada, em 1975, pelo Congresso dos Estados Unidos, teve um papel

reconhecidamente preponderante, pelo impacto efectivo que gerou, então, nas

organizações escolares, como salienta Correia (1997), ao afirmar que “ esta lei

federal vai obrigar a que os sistemas educativos de todos os Estados melhorem

substancialmente os seus serviços de educação especial, criando estruturas

sólidas que promovam a igualdade de oportunidades educacionais para todas as

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crianças com necessidades educativas especiais” (p. 21). As práticas mais

tradicionais da educação especial foram, então, alvo de uma reflexão

generalizada, devido, exactamente, aos efeitos naturalmente primeiro nos Estados

Unidos da América e, depois, noutros países ocidentais - incluindo o caso

português - da lei em referência, o que leva Ainscow (1996) a considerá-la como

“a lei mais influente de todas” (p.15).

Entretanto, a influência do relatório WarnocK - consagrando, entre nós o

uso da expressão necessidades educativas especiais - chega, também, a

Portugal, talvez, com certa demora, uma vez que, só treze anos depois da sua

divulgação pública, o sistema educativo português, consagra, legalmente, alguns

dos seus aspectos mais relevantes, através da publicação do Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de Agosto. A promulgação desta peça legislativa marca,

naturalmente, o início de uma nova forma de encarar a resposta escolar aos

alunos com necessidades educativas especiais, mudança essa, operada

gradualmente por força dos pressupostos e das medidas educativas insertos

naquele diploma legal.

O conteúdo da legislação em análise consubstancia uma série de medidas

diversificadas, as quais, no seu todo, procuram garantir, prioritariamente, o acesso

dos alunos aos programas do ensino regular. Deste modo é relegada, para

segundo plano - e admitida apenas em situações de último recurso - a anterior

tendência para a elaboração de programas especiais concebidos a partir do

diagnóstico do tipo e do grau de deficiência de que os alunos eram portadores.

A tónica no acesso ao currículo, adoptada no decreto-lei em apreço, dá

origem então a uma prática generalizada de adaptações curriculares que,

progressivamente, torna a escola mais flexível e adequada à heterogeneidade da

sua população discente. Através deste processo de adequação e de flexibilização

curriculares, vai tendo gradual concretização, no quotidiano educativo nacional, o

ideal da escola para todos e para cada um, considerando-se aqui, em particular, o

caso das crianças e jovens com NEE.

Todo o articulado da legislação em questão advoga o atendimento dos

alunos com necessidades educativas especiais no meio menos restritivo possível,

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procurando-se, paralelamente, assegurar às escolas e às respectivas equipas

educativas, os princípios e (alguns) meios para tal. Logo, começava a ganhar o

estatuto de naturalidade, o facto dos alunos com problemáticas complexas, serem

atendidos em escolas e em turmas regulares, mercê da disponibilização de apoios

adequados ao seu acesso ao currículo comum, ainda que com a introdução de

determinadas adaptações nos conteúdos programáticos.

A elaboração de programas individualizados, assentes na identificação de

objectivos de aprendizagem diferenciados do grupo/turma - currículos escolares

próprios e currículos alternativos, segundo a terminologia do decreto-lei - passa,

então, a ser considerada como um procedimento excepcional. Este procedimento

é, neste contexto, entendido como último recurso, estando estabelecido que a sua

utilização deverá ser sempre devidamente fundamentada, uma vez que fica

patente a sua natureza de inegável situação de não integração curricular.

Contudo, afigura-se ser fundamental ter-se sempre em conta que, antes do mais,

há que atentar devidamente nas condições específicas de cada aluno com NEE,

uma vez que, para alguns deles, a individualização programática e curricular, com

tempos e apoios personalizados, será a melhor solução. Tal princípio é,

expressamente, defendido por Correia (2003b) ao afirmar que “o aluno com NEE

deve manter-se na classe regular, embora sempre que a situação o exija, poder-

se-á considerar um conjunto de opções que levem a um apoio fora da classe

regular” (p. 23).

Voltando-se à análise do Decreto-Lei n.º 319/91, verifica-se que o seu

preâmbulo consubstancia, por si só, uma interessante síntese da evolução da

filosofia e práticas dos processos educativos das crianças portadoras de

deficiência. Assim, são, ali, referenciados princípios e elementos vocabulares que

relevam o conceito pedagógico da expressão alunos com necessidades

educativas especiais, em detrimento das categorias baseadas em decisões do

foro médico, muito utilizadas até então. Porém, neste aspecto específico convém

atentar - na linha do que Correia (2003b), de forma assertiva e pioneira vem

fazendo - que a legislação portuguesa é “contraditória, muitas vezes imprecisa e

outras não regulamentada” (p. 12). Para ilustrar esta opinião, o autor em

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referência serve-se precisamente do conteúdo do Decreto-Lei n.º 319/91 para

lamentar que, preconizando-se nesta legislação, a substituição da categorização

(classificação das NEE em diferentes categorias) pelo conceito de necessidades

educativas especiais, não tenha havido, entretanto, por parte dos responsáveis, o

cuidado de ser formalmente explicitado o significado das diferentes problemáticas

inerentes às NEE. Esta omissão sobre o sentido preciso daquele conceito é,

efectivamente, grave, porque, como acrescenta, ainda, Correia (2003b) “na nossa

óptica, ele é bem preciso quando pretendemos fazer algum tipo de investigação

ou quando temos necessidade de planificar e programar, em termos

individualizados, para um determinado aluno” (p. 12).

Ainda no Decreto-Lei em apreço são, também, valorizadas - e aqui parece

que sem reticências - tanto a crescente responsabilização da escola regular pelos

alunos com necessidades educativas especiais, como a abertura da escola aos

alunos portadores de deficiência. São, portanto, princípios orientados para o

reforço da perspectiva de uma escola para todos. Finalmente, o Decreto-Lei n.º

319/91 preconiza, ainda, a necessidade de um papel mais explícito,

responsabilizado e activo, das famílias na orientação educativa dos seus

educandos.

Enfim, um contributo de natureza legislativa que, pela pertinência de parte

do seu articulado, não deixou de agitar, positivamente, o panorama nacional no

que concerne às perspectivas e práticas do atendimento escolar dos alunos com

necessidades educativas especiais. A publicação da legislação em análise vem,

por consequência, marcar a cultura nacional de atendimento educativo aos alunos

com NEE, sendo particularmente visível a sua influência, ao longo de toda a última

década do século XX.

Entretanto, a inovação das práticas da Educação Especial, a reflexão feita

sobre os seus processos e resultados e os produtos da investigação, preparam e

fundamentam a abertura dos caminhos para uma nova fase na escolarização, em

Portugal, das crianças com necessidades educativas especiais. Estavam,

consequentemente, criadas as condições necessárias para a emergência da

chamada escola inclusiva.

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1.4 O Epílogo da História: a Inclusão

Os tempos actuais são significativamente marcados por uma crescente

apologia da escola inclusiva, cujo propósito nuclear se enuncia por uma rigorosa

salvaguarda de igualdade de oportunidades educativas e - sempre que possível -

em tempos e espaços comuns, para toda e qualquer criança, independentemente

das suas capacidades e limitações. Trata-se de uma finalidade ideológica que

indicia o esforço de tentar responder à diversidade, através de uma educação de

qualidade para todo e qualquer aluno e que vai consolidando, simultaneamente, o

ideal da inclusão.

A consecução deste ideal tem vindo a ser tentada mediante o

desenvolvimento, mais ou menos moroso mas firme, de um processo em que o

atendimento das crianças com NEE tem ocupado, obviamente, um lugar central.

Essa preocupação com estes alunos advinha - entre outros aspectos - do facto de

haver a consciência de que as escolas não estavam preparados para lhes

responder de modo adequado. Havia, pois, que alterar a sua organização e o seu

funcionamento. A pressão que tem vindo a gerar essa transformação das

organizações escolares, parece não ter partido de dentro, como assinala Correia:

Com o decorrer dos anos, e tendo em conta esta realidade, em 1986, os defensores

dos direitos dos alunos com NEE, os pais dos alunos com NEE severas e o

reconhecimento público de que a escola não estava a desempenhar o seu papel ao

não providenciar respostas educativas para todos os alunos forçaram a

reestruturação do sistema educativo, apelando para a criação de condições que

permitissem responder às necessidades educativas dos alunos com NEE nas

escolas regulares das suas residências. (2003b, p.19)

Este movimento, a nível escolar, emerge, de modo significativo, a partir dos

finais da segunda metade da década de oitenta do século XX. Posteriormente é

reforçado ao longo dos anos noventa e permanece presente, com rara acuidade,

nestes primeiros tempos do século XXI.

Porém, a perspectiva de uma educação inclusiva, conquanto seja,

definitivamente reforçada pela pressão dos movimentos de luta pelo

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reconhecimento dos direitos humanos fundamentais - desenvolvidos,

nomeadamente, ao longo dos anos sessenta, do século XX - tem uma origem

mais remota. Assim, como recordam Thomas, Walker e Webb (1998), desde os

primórdios daquele século que caminham, lado a lado, duas perspectivas opostas,

quanto à forma e aos meios escolares de atender as crianças portadoras de

deficiência. Uma que preconizava uma solução essencialmente inclusiva e outra

que defendia uma via mais segregada. Esta segunda perspectiva - como

descrevem os autores mencionados - acabaria, contudo, por ser considerada

como a mais adequada, durante uma largo período temporal do século em causa.

Tal proeminência terá sido devida, em grande parte, à influência do avanço

verificado no âmbito dos estudos psicométricos, especialmente desenvolvidos por

força das necessidades militares decorrentes da Segunda Grande Guerra Mundial,

como oportunamente se referiu.

A influência da perspectiva psicométrica chega, então, ao campo

educacional e gera o sentimento generalizado - no chamado mundo ocidental - de

que a melhor forma de educar as crianças deficientes é enquadrar, as mesmas,

em modelos educativos diferenciados, normalmente desenvolvidos em escolas

especiais. Esta concepção fundamentava-se no princípio da categorização das

crianças, por tipo de deficiência. Paralelamente, esta perspectiva enfatizava a

natureza hereditária da capacidade cognitiva, considerando, em consequência, o

nível da inteligência, como uma capacidade estática, sendo, a partir deste dado,

generalizada a aceitação natural do princípio de que as crianças com deficiência

deveriam ser atendidas em escolas, ou em classes especiais (Thomas, Walker &

Webb, 1998).

Devido a toda aquela argumentação, a visão inclusiva é relegada, então,

para um plano secundário. Consequentemente não apareceram defensores

públicos desta perspectiva, praticamente durante as décadas de trinta, quarenta e

cinquenta do século XX.

Os autores em causa, Thomas, Walker e Webb (1998), afirmam, entretanto,

que só os efeitos da acção dos movimentos de luta pela defesa dos direitos

humanos - portanto, em plena década de sessenta do século XX - criam

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condições para questionar o modelo de educação segregada de que as crianças

deficientes eram alvo. Na decorrência daqueles acontecimentos, emerge, então,

uma nova concepção relativa aos indivíduos portadores de deficiência, a qual

reforça a sua dignidade enquanto pessoas humanas. Sob este novo cenário,

aqueles indivíduos começam, por sua vez, a compreender que passam a existir

condições de maior sensibilização social e cultural para a sua situação e fazem

ouvir a sua voz de revolta contra a discriminação educativa e social de que vinham

a ser alvo. Devido a uma conjugação favorável de factores, a inclusão começa,

então, a configurar um valor de extraordinária relevância no âmbito da própria

interacção humana, embora - haja consciência disso - pareça estar, mesmo nos

tempos actuais, longe de ser uma realidade universal, em termos práticos.

Paralelamente, ganha evidência a ausência de bons resultados gerados

pelo trabalho desenvolvido nas escolas especiais. Fierro (1990) sustenta, por

exemplo, que as escolas especiais surgiram sem que houvesse estudos prévios a

suportar a sua necessidade. Aquele autor refere, até, que os resultados obtidos

pelas instituições educativas em causa, nunca foram significativos e que as

mesmas se orientavam por um princípio de intervenção centrado nuclearmente na

reabilitação das deficiências, logo distanciado dos fins prosseguidos pelas escolas

do ensino regular as quais se preocupavam, nas suas práticas educativas,

essencialmente com o desenvolvimento de saberes culturais, por parte dos

alunos.

A relativa fragilidade dos resultados alcançados pelas escolas de educação

especial começa a ganhar maior realce à medida que eram conhecidos os

generosos recursos humanos e materiais de que a maioria das escolas em causa

dispunha. A dimensão desta contradição, entre a qualidade de meios e a pobreza

dos resultados, tornava-se de tal forma clara que já não podia passar

despercebida. Com base nestes e noutros argumentos, alguns autores começam

a questionar a acção e os resultados das escolas especiais. Estão concretamente

nesta situação - segundo Thomas et al. (1998) - autores como Christophos e Renz

(1969), Galloway e Goodwin (1979), Lipsky e Gartner (1987) e Anderson e Pellicer

(1990).

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Frise-se, contudo que, neste aspecto, as opiniões não são unânimes.

Assim, por exemplo, Kauffman (1995) perfilha a ideia de que, para determinados

alunos com NEE, as escolas especiais continuam a ser a melhor opção, em

termos de resposta educacional. Aliás, esta dicotomia de opiniões mantém-se viva

e merece uma mais aprofundada reflexão, sobretudo no que se refere à

emergência da chamada inclusão total. Por tal razão esta discussão será

retomada mais adiante.

A extensão do ideal da inclusão, do campo social, em geral, ao campo

particular da educação, assenta, antes de mais, no progressivo reconhecimento

do direito inalienável de toda a criança poder experienciar o sentimento de

pertença a um grupo, e, consequentemente, de não ser excluída (Falvey, 1995).

Para a desejada consecução daquela perspectiva, crê-se fundamental serem

repensados determinados procedimentos, ainda em curso, em muitas realidades

educativas contemporâneas, conforme o testemunha a simples constatação

empírica. Tais procedimentos poderão representar constrangimentos sérios à

implementação de atitudes e de práticas inclusivas, pelo que, neste contexto, se

afigura de relevante pertinência, assumir, como fonte de inspiração para a

mudança, os dados obtidos pela investigação realizada nesta área. Neste campo,

os resultados obtidos pelos trabalhos efectuados por Karagiannis (1988), citado

em Vlachou (1999), afiguram-se paradigmáticos.. De facto, a compilação dos

dados obtidos por Karagiannis são particularmente preocupantes, pois que

indiciam, muito claramente, os efeitos psicológicos percepcionados pelos alunos

com necessidades educativas especiais, quando inseridos em ambientes sociais

de aprendizagem cujo clima não é efectivamente inclusivo. Nestes contextos, as

características daqueles alunos são encaradas, pelos outros, como algo de

negativo, reforçando os efeitos da constatação da diferença.

Ora, segundo revelam os estudos de Karagiannis, os alunos não portadores

de necessidades educativas especiais, tendem a construir uma ideia deturpada

dos seus colegas, considerando-os como menos capacitados, menos seguros de

si mesmos, menos atractivos - academicamente falando - e mais problemáticos no

que se refere ao seu comportamento. Em função dos processos de observação

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por si desenvolvidos, aquele autor concluiu, também, que os alunos com

necessidades educativas especiais são menos felizes e mais conformistas,

revelando-se quase sempre inibidos e demonstrando uma expressiva carência de

apoio por parte do outro. Com tais características, estes alunos evidenciam,

consequentemente frágeis capacidades para estabelecer amizades, facto que,

obviamente funciona como processo de restrição a uma interacção inclusiva.

Os efeitos da auto-percepção destes factos, tornam aqueles indivíduos

mais vulneráveis e, por isso, o nível da sua qualidade de vida é, por norma,

afectado. Em consequência, têm uma tendência acentuada para se perceberem, a

si próprios, como seres inúteis para a sociedade. A consciência do estigma

provoca, assim, nas crianças com NEE, uma nítida desvalorização social, facto

que reduz, em muito, as suas expectativas de participar na comunidade e,

consequentemente, as inibe de demonstrar que não são tal e qual como os outros

os julgam.

Karagiannis põe, pois, em evidência o facto de que as dinâmicas inclusivas

pressupõem, não, apenas, a mudança de atitude, por parte dos outros, mas,

também, a existência de uma auto-imagem positiva, por parte de cada criança ou

jovem, portadores de necessidades educativas especiais. Segundo o autor em

referência, só assim a interacção a estabelecer produzirá efeitos eficientes e

positivos no projecto de realização de vida das crianças em causa. Ora, se - como,

claramente, refere o autor em apreço - os estigmas poderão ser um obstáculo ao

desenvolvimento da necessária auto-imagem positiva, parece então resultar, de

modo evidente, ser imperioso prevenir e evitar os factores que facilitem a sua

ocorrência.

A tentativa de organização de esforços para a criação de escolas inclusivas

consubstancia, como já se referiu, uma ideia relativamente recuada no tempo,

mas que, devido a determinados factores, acabou por ser relegada - ao longo das

primeiras seis décadas do século XX - para lugar secundário. Em alternativa, a

prioridade ia sendo dada às escolas especiais. A partir dos anos sessenta daquele

século, o panorama começa a dar sinais evidentes de mudança e o ideal inclusivo

é reanimado de modo irreversível.

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Percorrendo-se os caminhos históricos subjacentes à evolução das formas

de organizar as instituições educativas para a concretização do ideal de

verdadeira escola para todos, constata-se a existência de determinados itinerários

e de terminologias que, pela sua pertinência neste contexto, se julga importante,

também, serem de considerar. Uma das expressões que, neste âmbito, parece

configurar um alcance de rara pertinência é, precisamente, a que é avançada por

S. Stainback e W. Stainback (1999) e que se traduz na expressão inclusão plena.

A referência específica a esta expressão - ainda que, semanticamente, aparente

enfermar de um certo grau de redundância, na medida em que, em num dado

contexto, ou há inclusão, ou não há inclusão - parece justificar-se pelo facto de,

os autores em causa, lhe atribuírem um sentido que, pela sua acutilância, ganha

relevância particular no contexto em análise. Assim, para S. Stainback e W.

Stainback, a expressão inclusão plena é usada para traduzir a conveniência de

assegurar a educação de todos os alunos em classes e escolas próximas do seu

domicílio, outorgando-lhe, deste modo, um sentido de conotação com a área de

residência dos alunos, factor que se reveste de significativo relevo no âmbito do

alcance social da pretendida escola inclusiva. Pela relevância estratégica que se

reconhece na expressão em análise, julga-se conveniente precisar que, a mesma,

se torna crucial no presente trabalho, porque:

a) Se refere à totalidade dos alunos (logo, incluindo os alunos com NEE).

b) Responsabiliza a escola por se reestruturar de modo a poder responder,

educacionalmente, a todos os alunos inseridos na respectiva área de

influência.

c) As duas premissas anteriores não colocam em causa a possibilidade de

determinados alunos com NEE poderem usufruir de espaços, de tempos e

de apoios diferenciados dos dos seus colegas de grupo/turma, se as suas

condições específicas a tal aconselharem.

Perfilha-se, pois, aqui a expressão inclusão plena nos precisos termos em

que antes foi explicitada. Deste modo se pretende, igualmente, clarificar que, a

mesma não é, por conseguinte, sinónima de inclusão total, uma vez que esta

pressupõe o princípio, conforme enfatiza Correia (2003b), de que “todos os alunos

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 57

com necessidades educativas especiais devem ser incluídos em classes

regulares” (p. 10).

Entretanto - e sobretudo nos anos mais recentes - tem vindo a assistir-se a

uma certa intenção de depuração terminológica, no campo da educação inclusiva,

afigurando-se que a preocupação subjacente consiste numa tentativa de

clarificação consensual do sentido semântico com que cada termo - ou expressão

- é utilizado. Julga-se, a propósito, referir que este aspecto de clarificação

conceptual parece revestir-se de acentuada e premente importância, dado que se

prefigura fundamental haver, pelo menos, adentro da mesma comunidade

científico-pedagógica, um entendimento de base sobre a tradução conceptual de

cada um dos termos mais usados no seio da mesma, sob o risco de se estar a

falar das mesmas coisas, com nomes diferentes, ou a serem utilizados os mesmos

nomes, para coisas que não são iguais.

Concretamente no campo da educação, a não consensualização

conceptual dos termos-chave, poderá provocar um clima de confusão semântica

no interior da respectiva comunidade, mormente no seio da classe docente. Esta,

assim confrontada com perspectivas nocionais diferenciadas sobre o mesmo

objecto terminológico, sentirá, provavelmente, fragilizada a sua capacidade de

compreensão e, consequentemente, de intervenção. Neste quadro, poderão,

então, resultar prejuízos mais ou menos gravosos para os percursos escolares

das crianças e jovens, sobretudo dos que são identificados como alunos com

necessidades educativas especiais. Esta situação parece ser, portanto, de evitar,

para o que será necessário um esforço colectivo e autêntico de clarificação e de

consensualização conceptuais dos termos e expressões nucleares e, no caso

vertente, dos mais directamente ligados à problemática da educação inclusiva.

Na história da evolução semântica verificada no campo do atendimento

pedagógico dos alunos com necessidades educativas especiais, ganha,

ultimamente, especial relevância, o confronto conceptual entre o termo integração

e o termo inclusão. Neste âmbito, autores como S. Stainback e W. Stainback

(1999) afirmam que se produziu uma mudança, isto é, uma substituição gradual do

termo integração pelo termo inclusão, substituição essa justificada - segundo os

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 58

autores em referência - por várias razões. Ao elencarem essas razões, os

mesmos autores avançam com a ideia de que o sentido semântico do termo

inclusão, traduz com maior precisão, ou clareza, o que ainda faz falta na

generalidade das escolas, concretamente, o incluir todas as crianças na vida

educativa e social dos estabelecimentos de ensino da sua área de residência e,

não apenas, colocá-las no seio das classes regulares. Pelo exposto, infere-se que

os autores em apreço, concedem, ao termo inclusão, um sentido de envolvimento

interactivo radical das crianças com NEE nos ambientes educativos, sociais e

escolares e que o termo integração terá, em comparação com aquele, um

significado mais estático. Stainback e Stainback afinam, portanto - como, de

resto, é reconhecido - pelo diapasão da integração total. Trata-se de uma

perspectiva e como tal merecedora de respeito. Respeito esse que, todavia, não

anula a hipótese de se discordar da tese defendida por aqueles autores, uma vez

que a sua aplicação integral pode, nalguns casos, não corresponder à situação

educativa mais apropriada.

Em alternativa, pelo alcance que detém e, também, por travejar, de modo

inequívoco a arquitectura filosófica desta investigação, expressa-se, aqui, a

adesão ao conceito de inclusão avançado por Correia (1994), citado em Correia

(2003b), o qual aponta para a “inserção do aluno com NEE na classe regular,

onde sempre que possível deve receber todos os serviços educativos

adequados, contando-se, para esse fim, com um apoio adequado (e.g., de outros

técnicos, pais, etc.) às suas características e necessidades” (p. 16). A assunção

operativa deste conceito implica naturalmente, a já referida reestruturação da

escola a fim de que esta possa disponibilizar os serviços educativos adequados.

Ao mesmo tempo, Correia ao avançar com a expressão sempre que possível,

admite a eventualidade de alguns alunos com NEE poderem ser, pontualmente,

atendidos fora do contexto das classes regulares, devido às suas características

específicas. Afigura-se, por conseguinte, que este posicionamento é mais cautelar

do que o assumido por Stainback e Stainback e, como aponta para a necessidade

de se prevenirem determinadas condições relativamente a alguns alunos, acaba,

por esta razão, por ser um princípio verdadeiramente inclusivo, uma vez que põe

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 59

os interesses dos alunos concretos à frente dos slogans teóricos, por mais

atractivos que estes possam ser.

S. Stainback e W. Stainback (1999), acrescentam, entretanto, que nos

tempos actuais já se assiste a um gradual abandono do termo integração, uma

vez que, ao mesmo, está associada a ideia de colocação, na vida escolar, de

alguém, ou de um grupo de indivíduos, que, até ao momento, dela estavam

excluídos. Sob estes parâmetros de análise, S. Stainback e W. Stainback

expressam a ideia de que a integração traduz o princípio de que os alunos a

integrar terão de ser, previamente, preparados para se adaptarem ao modelo

pedagógico implementado nas classes regulares, o qual estaria, então,

desenhado, para responder, fundamentalmente, aos alunos normais. Em

contrapartida - e continuando-se a adoptar as linhas de pensamento defendidas

pelos autores mencionados - a educação inclusiva centra-se na assunção, por

parte da equipa educativa da escola, da responsabilidade de organizar

estratégias, dinâmicas e serviços pedagógicos susceptíveis de responder às

necessidades reveladas pelo conjunto dos seus alunos. Deste modo, Stainback e

Stainback postulam o princípio de que cada escola se deverá dimensionar para

atender toda e qualquer criança da sua área de residência, opinião que, neste

particular, se afigura adequada e que, em consequência é alvo de adesão neste

trabalho.

Com uma vasta gama de pressupostos, Stainback e Stainback sustentam,

portanto, claramente que uma escola inclusiva deve estar organizada de molde a

não deixar ninguém de fora, tanto do ponto de vista educativo, como social, ou

físico. Está em jogo, assim, uma visão que propugna por um ideal em que todas

as crianças sejam consideradas membros activos e reconhecidos no seu contexto

sócio-cultural de referência e que, no mesmo, todas disponham de igualdade de

oportunidades educacionais e sociais.

Na mesma linha de raciocínio, Correia (2001, 2003a), explicita, também, as

diferenças operativas entre os conceitos de integração e de inclusão. Assim, no

que se refere ao termo integração, este autor esclarece que, o mesmo, pressupõe

o ingresso de alguém na corrente educativa principal admitindo-se até que,

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anteriormente, poderá ter sido excluído. Paralelamente o autor em questão é de

opinião que a inclusão assenta no desenvolvimento de um sentido de comunidade

na qual, em apoio recíproco, se promove o sucesso escolar da generalidade dos

alunos e em particular os alunos com NEE. Por conseguinte, constata-se que,

para Correia, os alunos com NEE devem merecer sempre uma atenção

educacional específica. Neste contexto, prefigura-se que a preocupação

manifestada por este investigador se reveste de extrema importância, sendo

mesmo crucial para a organização de respostas adequadas aos alunos com NEE

e contribuindo de modo estratégico para a sua inclusão.

Em jeito de conclusão, parece, entretanto, relevante que quer o termo de

integração, quer o termo de inclusão sejam usados com propriedade e clareza

conceptuais, a fim de que as práticas decorrentes se estribem em noções claras e

inequívocas. Só nestas condições essas práticas poderão ser objecto de reflexão

e de reformulação metódicas, por parte da generalidade da comunidade docente,

uma vez que aqueles procedimentos de reflexão e de reformulação assentariam

em pressupostos epistemológicos e metodológicos consensualmente definidos e

entendidos.

Esta preocupação de consensualização conceptual parece ter toda a razão

de ser, sobretudo quando surge um determinado termo que passa a ser empregue

com muita frequência, como se julga ter acontecido, nos últimos tempos, com a

palavra inclusão. E isto porque se observa, empiricamente, uma espécie de moda

de utilização sistemática de cada novo termo sem que, por vezes, ocorra uma

conveniente reflexão sobre a natureza profunda da sua concepção e significação.

Só a clarificação debatida e consensualizada dos novos termos pode proporcionar

uma integração atitudinal, compreensiva e procedimental dos mesmos. Tal

desiderato contribuirá, também, para que cada profissional de educação proceda a

uma assimilação significativa dos novos termos ou expressões, na teia conceptual

formada pelo conjunto dos outros termos semanticamente relacionáveis e já pré-

existentes no seu próprio vocabulário cognitivo.

A questão em análise pode levar, no caso vertente, a que o termo

integração e o termo inclusão sejam, inclusivé, empregues como sinónimos., como

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parece, por vezes, acontecer. Daqui, resultará um cenário de todo indesejável, até

pelas percepções ambíguas que pode provocar nos esquemas conceptuais dos

educadores, induzindo, consequentemente, eventuais reflexos negativos tanto nos

processos de planificação e de gestão das suas práticas profissionais quotidianas,

como nos resultados pedagógicos de tal decorrentes, junto dos alunos. Daí que se

afigure ser indispensável desenvolver esforços para se chegar a uma clarificação

conceptual e consensual dos termos mais usados no seio da comunidade

profissional educativa, no campo da educação inclusiva.

O pressuposto de base contido, de forma mais ou menos explícita, nos

princípios expostos, consiste no facto de que os alunos são todos diferentes e

que, consequentemente, abordam as propostas curriculares de acordo com as

respectivas potencialidades e limitações, designadamente, os alunos com NEE.

Daqui parece, então, emergir o termo diversidade, como aquele que melhor traduz

o sentido profundo da inclusão educativa. Inerente ao termo diversidade subjaz,

por seu turno, uma certa ideia de igualdade, a qual significa que, conquanto

diferentes, todas as crianças têm algo em comum, sendo que, esse algo, é

representado, exactamente, pela necessidade de aprender. Então, incluir seria, do

ponto de vista pedagógico, ensinar, tendo como base da planificação e da

intervenção, o quadro dos estilos de aprendizagem dos alunos e, em particular, os

dos alunos com necessidades educativas especiais. Desta maneira seria

escrupulosamente concretizada a tão justamente propalada igualdade de

oportunidades educativas para todos e para cada um dos alunos, através de um

atendimento escolar rigorosamente assente no respeito das suas formas

específicas de apropriação dos saberes

Precisamente nos anos noventa do século XX, as preocupações em torno

da Escola para Todos, reforçavam e promoviam o ideal subjacente às políticas

implícitas da educação inclusiva, relevando-se, deste modo, o reconhecimento da

diversidade, o direito à especificidade e o respeito pelos ritmos de aprendizagem.

Como corolário de tudo isto realçava-se o princípio da assunção da necessidade

do atendimento educativo diferenciado, a fim de salvaguardar os direitos das

crianças com NEE.

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Aqueles e outros tipos de ideias e de preocupações começam a ser alvo,

então, de políticas mais ou menos concertadas a nível internacional. Daqui

decorre todo um renovado conceito de escola, o qual se não logo de início, sob a

mensagem explícita da escola inclusiva, continha, já, o princípio expresso de uma

escola para todos, integrando-se, nesta expressão, uma clara atenção para os

alunos com necessidades educativas especiais.

Com o objectivo de serem aprofundados os consensos internacionais sobre

a conveniência de ser assegurado o princípio da igualdade de oportunidades

educativas a todas as crianças, bem como a sua consecução real efectiva,

realizou-se, em 1990, na cidade de Jomtien (Tailândia), a Conferência Mundial

sobre a Educação para Todos, na qual, cerca de sessenta países

consensualizaram o pressuposto da necessidade de uma educação básica para

todos, através do estabelecimento de programas de respostas às necessidades

educacionais fundamentais de cada criança. Esta iniciativa projectou, renovadas

esperanças, no contexto dos países ali representados, comprometendo-se, estes,

a levar a cabo, entre outras, determinadas medidas de combate à pobreza, à

ignorância e à marginalização, de molde a recriar um novo ciclo de esperança

para a generalidade das crianças. Ciclo de esperança esse que, assente na

solidariedade moral e intelectual de todo o mundo, foi, tempos atrás, a razão

principal da fundação da própria UNESCO (Frederico Mayor, Director Geral da

UNESCO, 1994).

Não era, contudo, a primeira vez que se realizava uma conferência

internacional importante sobre a problemática da educação. Mas a que ocorreu na

Tailândia terá, também, servido - entre outros aspectos - para denunciar o rotundo

fracasso dos anteriores compromissos internacionais, assumidos no âmbito da

educação, em iniciativas similares, anteriormente realizadas (Bousquet, 1990).

Como um importante marco na caminhada para a futura construção de

escolas inclusivas, releve-se o facto de a Conferência de Jomtien ter produzido a

Declaração Mundial sobre Educação para Todos, a qual integrava princípios de

elevado significado educacional, na medida em que postulava o acesso de todas

as pessoas às oportunidades escolares, a fim de verem satisfeitas as suas

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necessidades básicas de aprendizagem e, consequentemente usufruir de

condições para melhorar a sua qualidade de vida. O concerto das nações

valorizava, assim, a educação, considerando-a como um meio imprescindível para

a concretização de um melhor nível de qualidade de vida para todos os indivíduos.

Uma outra finalidade mais objectiva resultou, também, dos trabalhos da

Conferência em análise e que apontava, concretamente, para que a partir do ano

de 2000, todas as crianças, em qualquer parte do mundo, teriam condições para o

ingresso e conclusão do ensino primário. Para garantir as metas em causa, foi,

até, disponibilizado pelo Banco Mundial, um fundo financeiro específico (Colclough

& Lewin, 1993). O ano de 2000 já lá vai e, mais uma vez, emergem eloquentes

testemunhos de que aquele compromisso não terá atingido os louváveis

propósitos que estiveram na sua origem.

Quatro anos mais tarde, ocorre, desta vez em Salamanca, nova

Conferência Mundial. Continuava implícito o ideal de Uma Escola para Todos, e,

neste quadro, a temática das Necessidades Educativas Especiais ocupava o lugar

de charneira. Neste propalado evento participaram representantes de 92 países

(entre os quais Portugal) e de 25 organizações internacionais. Uns e outros

assinaram uma Declaração de Princípios onde se expressa que “as crianças e

jovens com necessidades educativas especiais devem ter acesso às escolas

regulares que a elas se devem adequar através duma pedagogia centrada na

criança, capaz de ir ao encontro destas necessidades” (UNESCO, 1994, p. viii).

Este último acontecimento consubstancia um marco relevante na história da

educação das crianças com necessidades educativas especiais, não só pela

dimensão mundial de que se revestiu, mas, também - e sobretudo - pelo teor

pertinente da sua orientação inclusiva. Esta orientação ficou particularmente clara

quando, por consenso, os delegados presentes em Salamanca declararam o

princípio de centrar, na escola, a responsabilidade de assegurar a adequação do

processo educacional aos estilos e ritmos de aprendizagem de todos e de cada

um dos seus alunos.

Estas iniciativas levadas a cabo principalmente ao longo da década de

noventa do século XX, parecem denotar a consciência internacional da situação

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preocupante que se vive no mundo actual, no que diz respeito à efectivação do

direito universal à educação, uma vez que a realidade ainda se traduz por um

número enorme de crianças e de adultos que, a nível mundial, não têm acesso

pura e simplesmente aos benefícios básicos que a frequência escolar concede.

Como evidência e ilustração desta realidade, apresentam-se, seguidamente,

alguns dados divulgados no Foro Consultivo da UNESCO (1995) e obtidos como

resultado do balanço feito, por aquele organismo internacional, sobre o estado, em

todo o mundo, do acesso à escolaridade e educação, precisamente na primeira

metade da década de noventa do século XX. Os dados em causa são, de modo

resumido, os seguintes:

• Em 1995 as crianças fora da escolaridade ascendiam a um total de 109

milhões;

• No mesmo ano, as pessoas analfabetas maiores de 15 anos, nos países

em desenvolvimento, atingiam o número de 872 milhões (mais quatro

milhões do que em 1990);

• O número de crianças matriculadas desceu2 em vários países se

comparado com o que ocorria nos finais da década de oitenta (exemplos

de países nesta situação: Angola, Camarões, Guiné Equatorial, Uganda,

Coreia, Tailândia, Equador e Uruguai).

Estes dados enunciam de forma quase que dramática que a inclusão

educativa de toda a população em idade escolar ainda é uma miragem remota

para um número impressionante de crianças. Tal demonstra de modo cabal que a

escola regular ainda não está dimensionada para tal. E quando tudo leva a crer

que parece estar, como se julga ser o caso português, o insucesso escolar é tão

elevado que as preocupações com a inclusão de crianças com NEE, com este

cenário, não deixam de vir à superfície. Alguns dos fundamentados argumentos

dos críticos à inclusão total terão, aqui, as suas raízes …

Entretanto, em Portugal, os ecos da Conferência de Salamanca foram

naturalmente perceptíveis e o sistema educativo procurou, também, alinhar pelos

2 Pode-se, neste aspecto, admitir que este decréscimo é, nalguns países, uma consequência do

abrandamento dos nascimentos, como sucedeu, por exemplo, em Portugal.

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princípios ali consensualizados, através da activação de medidas concretas,

nomeadamente, no campo legislativo. Assim, foi publicado o Despacho Conjunto

n.º 105/97, de 1 de Julho que espelha de forma, mais ou menos explícita, o

quadro de orientações inclusivas emanado do encontro que ocorrera três anos

antes em Salamanca.

O articulado daquela peça legislativa caracteriza-se pelo recurso a novas

fórmulas discursivas que se demarcam, de modo nítido, da linguagem

anteriormente usada, no mesmo contexto, e que se enquadram, de forma geral,

nos conceitos e princípios concernentes ao paradigma da escola inclusiva. Por

exemplo o preâmbulo do Despacho Conjunto n.º 105/97, consubstancia,

exactamente, o testemunho dessa inovação de linguagem, ao considerar a

questão do atendimento aos alunos com necessidades educativas especiais como

uma competência da escola, enquanto organização subordinada aos ideais da

democracia e da qualidade.

Um outro exemplo da referida renovação discursiva reside no facto de o

Despacho Conjunto se apresentar, a si próprio, como um “ conjunto de medidas

que constituam uma resposta articulada e integrada aos problemas e

necessidades sentidas nas e pelas escolas” (preâmbulo, parágrafo 1.º). Ou seja,

este documento legislativo surge como a configuração de um recurso ao serviço

dos problemas da escola e, não, especificamente, como um meio de regulamentar

o atendimento aos alunos apoiados pela educação especial, conquanto, no seu

todo, seja clara uma preocupação direccionada para esta franja da população

discente.

Independentemente de outro tipo de análise, será portanto, de concluir que,

de facto, o Despacho Conjunto n.º 105/97 veicula ideias e concepções as quais,

no campo da educação especial portuguesa, são originais. Paralelamente, pode-

se verificar que várias secções do conteúdo do despacho legislativo em análise

enfatizam, efectivamente, a filosofia da inclusão, entendida esta, como uma

estratégia sócio-educativa de atendimento a todo e qualquer aluno, como, por

exemplo se pode comprovar, com o excerto seguinte: “ assegurar, de modo

articulado e flexível, os apoios indispensáveis ao desenvolvimento de uma escola

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de qualidade para todos.” (preâmbulo, parágrafo 3.º). Este princípio inserto no

preâmbulo do Despacho em análise virá a ser reforçado ao longo do restante

conteúdo, surgindo como critério orientador da acção dos recursos da educação

especial ao clarificar que a prestação dos apoios educativos visa, entre outros fins,

“contribuir para a igualdade de oportunidades de sucesso educativo para todas as

crianças e jovens” (ponto 2, alínea a).

A intenção presente, no despacho em referência é, a de, declaradamente,

introduzir alterações sensíveis no campo do atendimento a crianças com

problemas na aprendizagem. Facto que é, aliás, expresso de modo inequívoco,

em determinado momento do preâmbulo em análise, em que, expressamente, se

estabelece que “o presente despacho visa introduzir uma mudança significativa na

situação actualmente existente no âmbito dos apoios a crianças com

necessidades educativas especiais” (parágrafo 5º). Como finalidade dessas

intencionadas alterações, o despacho refere a melhoria da intervenção educativa,

relacionando-a, por um lado, com uma gestão mais eficaz dos recursos

especializados e, por outro, com a diversificação das práticas pedagógicas. Ao

mencionar, de forma explícita, a diversificação das práticas pedagógicas, o

despacho parece situar, ainda que implicitamente, na gestão curricular geral das

salas de aula, o atendimento dos alunos com necessidades educativas especiais,

deslocando, claramente, a tónica da perspectiva individual, para a perspectiva

curricular, identificando-se, neste contexto, com a linha de pensamento defendida

e preconizada por Ainscow (1998).

Como outro testemunho do conjunto de inovações aportadas por este

despacho, saliente-se a criação de “uma «rectaguarda» técnico-científica

susceptível de se constituir como um espaço de reflexão, de partilha de saberes,

de coordenação de intervenções e de articulação de recursos” (preâmbulo,

parágrafo 6.º). O Despacho formaliza, assim, a instituição das equipas de

coordenação dos apoios educativos, reformulando, de forma substancial, a

organização e funcionamento dos serviços de educação especial, até então

regidos pelo consignado no Despacho Conjunto n.º 36/SEAM/SERE/88, de 29 de

Julho, o qual viria, naturalmente, a ser revogado pelo despacho em análise.

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Conquanto a semântica do Despacho Conjunto n.º 105/97 - como se

evidenciou - se situe nos discursos inerentes à escola inclusiva, não aparece

contudo, na totalidade do seu conteúdo, qualquer termo, ou expressão da mesma

família vocabular, surgindo, apenas, uma expressão aparentemente similar, em

termos semânticos, mas que, devido à evolução conceptual que se verificou no

âmbito da história da educação especial, a expressão em questão, pode

configurar, até, alguma ambiguidade de sentido. Trata-se, neste caso, da

expressão escola integradora (ponto 13, alínea d), a qual - como se pode

depreender da argumentação oportunamente apresentada - carreia uma

semântica que não é, intrinsecamente, de natureza inclusiva.

Aplaudido e defendido por muitos, o Despacho 105/97 traduz,

efectivamente, uma determinada linha de pensamento e de acção no âmbito da

educação inclusiva. Por essa razão, motiva reticências e objecções por parte de

investigadores e de educadores que se posicionam, naturalmente, noutros

quadrantes e que sustentam convicções diferenciadas. De facto uma análise

global ao conteúdo do Despacho em causa indicia uma espécie de diluição,

exactamente da razão maior da sua criação: as condições específicas dos alunos

com NEE. Consequentemente, a noção conceptual do termo inclusão, aparece, no

referido Despacho Conjunto, de modo ambíguo e pouco articulado com o

processo específico de atendimento devido aos alunos com NEE. São estes factos

e outros similares, ocorridos ultimamente entre nós, que levam Correia (2003b) a

afirmar - em relação à confusão conceptual estabelecida em torno do termo

inclusão - que:

A recente retórica à volta do termo, atirando-nos à cara um conjunto de chavões

que invariavelmente vão desembocar em afirmações já feitas clichés (estou a

lembrar-me de “uma escola para todos”, “todos os alunos devem aprender juntos”,

”todos os professores devem ensinar todos os alunos”), afigura-se-nos sem

sentido, confundindo-nos a todos e desviando a atenção do essencial, que é a

criança com NEE, que traz consigo um conjunto de características e de

capacidades, mas também de necessidades, a que importa dar atenção no sentido

de podermos maximizar o seu potencial”. (pp. 15-16)

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Entretanto, como se tem vindo a constatar, o termo inclusão entra, nos

finais do século XX, nos discursos quotidianos dos profissionais de educação,

principalmente dos que mais ligados estão ao atendimento das crianças e jovens

com necessidades educativas especiais. Para bem destes últimos, importa, agora,

que um pouco por todo o lado surjam, também, as práticas e os recursos

necessários para que das palavras se passe aos actos.

Como corolário de tudo isto, parece dever-se acentuar que comparar as

eventuais vantagens educacionais de um modelo de escola, de classe, ou de

apoio individual, especiais, face às de um modelo de escola inclusiva é, pura e

simplesmente, impossível, em termos de rigor absoluto, dado que o mesmo grupo

de alunos não pode, obviamente, ser objecto de observação num e outro modelo

educativo. Logo, o que se prefigura como determinante é a questão do direito de

toda e qualquer criança desenvolver a sua escolaridade, nos seus contextos reais

de referência social, pelo que uma escola especial ao prever a situação dos seus

utentes em situações sociais não naturais, configura algo que parece contrariar,

de modo absurdo, a própria natureza da vida humana. Logo, só em situações

muito fundamentadas - e que as haverá, sem dúvida - se deverá recorrer a tais

instituições.

2 Reflexões em Torno do Ideal de Escola Inclusiva Apresentado o processo de evolução histórica que se desenvolveu ao longo

dos tempos em torno das atitudes e práticas sociais face às crianças portadoras

de problemáticas específicas, passa-se a partir de agora a uma abordagem

pormenorizada da temática que corporiza o enfoque central do presente trabalho:

a escola inclusiva. Para este efeito será em primeiro lugar dilucidada a sua

semântica conceptual e, seguidamente, serão tecidas algumas considerações

relativamente à importância de que se reveste o ideal da inclusão, nos tempos

contemporâneos.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 69

2.1 Uma Abordagem Conceptual

Num mundo em que a realidade social e cultural se centra cada vez mais

na trinomia da globalização, diversidade e comunicação, a dicotomia da inclusão

versus exclusão, ocupa - designadamente após a realização da anteriormente

referida Conferência de Salamanca - um lugar crucial na preocupação das

políticas de governação da generalidade dos países. Esta preocupação encontra,

naturalmente lugar privilegiado a nível dos respectivos sistemas educativos,

visando-se, desse modo preparar as novas gerações para uma futura convivência

pacífica entre os povos, assente no conhecimento, aceitação e valorização das

diferenças.

Num tempo em que as mais diversas gentes se cruzam um pouco por toda

a parte, torna-se imperioso que a educação das crianças e dos jovens de hoje se

subordine aos princípios da interacção e da inclusão, facilitando, assim, por um

lado, o crescimento de uma predisposição para lidar com aquela diversidade e,

por outro, o desenvolvimento experienciado de um saber que, alicerçado em

relações de solidariedade e de cooperação, emerge como um suporte

fundamental e determinante da própria sobrevivência da humanidade, no século

XXI: o saber conviver. Perante estes pressupostos, novos e complexos desafios

se colocam, de forma irreversível, aos sistemas educativos em geral, os quais,

pressionados pela inevitabilidade de educar para e na diversidade, são

confrontados, portanto, com a questão de como tornar as escolas

verdadeiramente inclusivas. Ou seja, de como devem as escolas organizar-se

para serem capazes de lidar, eficientemente, com as diferenças,

independentemente da sua origem, ou natureza.

Nalguns países, a par do conceito de escola inclusiva, vai emergindo o de

escola compreensiva caracterizando-se um e outro por uma “vontade de tornar

possível uma educação comum e individualizada, mediante a oferta de opções

múltiplas e diversas em um mesmo contexto escolar” (Gortázar, 1995, p. 322). A

este propósito, a UNESCO (2000) tece, também, algumas considerações que,

pela sua pertinência, aqui se recuperam, na sua essência:

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 70

• Caminhar para a inclusão não é essencialmente um trabalho de

reestruturação da educação especial, nem sequer da integração. Tem a

ver com todos os alunos e não unicamente com aqueles que têm

necessidades especiais.

• Tão pouco é algo que possa ser considerado como um objectivo em si,

mas, principalmente, uma intenção de melhorar a qualidade de todo o

sistema educativo para que este possa atender adequadamente, todos os

alunos.

• Não é uma questão puramente de recursos, conquanto, estes, sejam

necessários.

• A educação inclusiva reporta-se à capacidade de construir uma escola que

responda à diversidade das necessidades dos alunos.

• A inclusão pressupõe a reorientação dos serviços de apoio e do

conhecimento especializado e não o seu abandono.

• A educação inclusiva é vista como um projecto da comunidade e da

sociedade.

Ressalta, portanto, do conjunto dos aspectos analisados que há muitos

alunos que têm determinadas necessidades educativas, as quais são, por

natureza, próprias, individuais e irrepetíveis e que, em função de tal, aqueles

acedem de modo diferenciado às experiências de aprendizagem proporcionadas

pela actividade escolar. Parece, de resto, situar-se neste aspecto, o princípio da

igualdade de oportunidades, se entendido como uma tentativa de dar, a cada um,

o que necessita em função das suas características e necessidades individuais e,

por consequência, não tratar, de forma igual, todos os indivíduos.

No fundo - e em termos de semântica operativa - visa-se a criação, na

organização escolar, de ambientes de aprendizagem que, na prática, respondam

às diversas necessidades da generalidade dos “alunos sem necessidades

especiais e alunos com necessidades especiais, sendo que por necessidades

especiais se entende o conjunto de alunos em risco educacional, dotados e

sobredotados (talentosos) e com necessidades educativas especiais.” (Correia,

2003a, p. 13).

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 71

Trata-se, sem dúvida de um desiderato que constitui um tremendo desafio

para as equipas educativas de cada estabelecimento de educação e de ensino,

uma vez que é indubitavelmente complexo desenvolver uma educação adaptada

às diferentes formas e possibilidades de aprender dos alunos. E essa

complexidade decorre precisamente do facto de aquelas diferenças percorrerem

um continuum extremamente diversificado que vai desde determinados talentos

cognitivos excepcionais, até certas limitações muito complexas.

Empiricamente - e a realidade demonstra-o de modo, não raro, dramático -

afigura-se sensato equacionar a ideia de que qualquer criança ou jovem, seja ou

não, portador de problemas específicos, está, potencialmente em risco de

exclusão social. Logo, pensar-se em educação inclusiva é, julga-se, pensar-se

essencialmente nos alunos com NEE, mas também em cada um dos restantes

alunos que frequentam a mesma comunidade escolar. Tal parece então significar

que uma escola só será intrinsecamente inclusiva quando desenvolver uma

educação adequada, ou apropriada, à totalidade dos seus alunos.

Aprofunda-se, assim, uma concepção de escola inclusiva, como “uma

escola onde toda a criança é respeitada e encorajada a aprender até ao limite das

suas capacidades” (Correia, 2003a, p. 12), e, portanto, como uma estratégia

organizacional que permita “establecer comunidades que apoyen y atiendam a

todos os alumnos y no sólo a determinadas categorías seleccionadas” (S.

Stainback & W. Stainback (1999, p. 24).

Entendendo-se, entretanto, a escola inclusiva como um espaço onde todos

os alunos se sintam bem, S. Stainback e W. Stainback (idem), valorizam

sobremaneira a componente relacional e atitudinal. Nesta perspectiva, aqueles

autores caracterizam-na como um espaço onde alunos e professores estão

ligados por sentimentos activos de amizade e de atenção mútua, promovendo,

assim, a construção de um clima de interacção humana onde todos os educadores

assumam colectivamente a responsabilidade do atendimento a todos os alunos

em geral e, de modo particular, aos alunos com NEE.

A tentativa, mais ou menos generalizada, de activação de procedimentos

orientados para a criação de escolas inclusivas, consubstancia uma ideia

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 72

relativamente nova. Contudo, conquanto recente, tem vindo a motivar um número

crescente de aderentes, parecendo até, ser reconhecida de forma universal, a

necessidade de se incrementarem esforços para que as comunidades, escolas e

aulas sejam, cada vez mais inclusivas, como atestam Barth (1990), Maeroff

(1990), McLaughlin, Talbert, Kahne e Powell (1990), citados em S. Stainback e W.

Stainback (1999).

De tudo isto emerge, de modo claro, a ideia de que a evolução conceptual

dos termos-chave, mais ou menos ligados à educação especial serve,

precisamente para explicitar o sentido e o significado da escola inclusiva. Assim,

esta, sugere - como se viu - uma organização educativa em que todas as crianças

de uma determinada comunidade aprendem juntas e de modo interactivo,

independentemente das suas condições pessoais, culturais e sociais. Refere-se,

portanto, de modo indiscriminado, a todas as crianças, ao passo que, por

exemplo, o termo integração, parece comportar de forma mais ou menos implícita,

uma conexão semântica com o grupo de crianças portadoras de necessidades

específicas. Consequentemente, a integração pressupõe a adaptação do ensino

em função dessas mesmas necessidades, ao passo que a inclusão implica a

reorganização cultural e funcional da escola para garantir uma aprendizagem de

qualidade a todos os alunos - ocupando, aqui, um lugar central, os alunos com

NEE - estando, assim, a própria gestão curricular, fundamentada e baseada

precisamente na diversidade total da população discente. O que se pretende,

deste modo entrever é que o processo de inclusão das crianças com NEE pode

contribuir para o reforço qualitativo de práticas pedagógicas capazes de tornar a

resposta educativa das escolas mais aberta e adequada a outro tipo de

problemas, nomeadamente os decorrentes de factores de diferenciação cultural ou

racial. Nesta perspectiva, advoga-se o princípio de que a ideia de inclusão,

conquanto referindo-se crucialmente aos alunos com NEE, pode influenciar a

cultura e atitude dos educadores de forma a que, diferenças de outra natureza -

patentes em outros alunos - sejam alvo de maior atenção e de aceitação. Nesta

lógica, o termo inclusão ganha um sentido mais abrangente esbatendo-se - ainda

que sem esquecer - a ideia de estar associado a um grupo específico de crianças

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 73

que devido a determinados factores sejam tidos como especiais (Gartner, 1987).

Ou seja, os estabelecimentos de ensino deverão organizar-se de molde a que

nenhum dos seus alunos se sinta excluído.

Neste contexto, impõe-se o “reconhecimento e a valorização da

heterogeneidade, implicando a necessidade de se não ser indiferente à diferença,

pelo que se deverá proporcionar a cada aluno, a oportunidade de progredir de

acordo com as suas necessidades e características” (Correia & Serrano, J. 2000,

p. 32). Sob esta perspectiva, afigura-se fundamentada a crença de se estar

perante uma escola quase que ideal, até porque “ a filosofia da inclusão só traz

vantagens no que respeita às aprendizagens de todos os alunos” (Correia, 2003a,

p. 14).

A progressiva transformação das comunidades escolares em comunidades

inclusivas irá consolidando o sentimento de pertença a um grupo de referência,

com as consequentes influências positivas a nível da auto-estima dos alunos, bem

como da valorização das diferenças e do respeito mútuo. Paralelamente:

A adopção deste postulado de conceber o conjunto de agentes educativos como

comunidade, tenderá a fazer com que o aluno passe a deixar de ser considerado

como meu e passe a ser entendido como o nosso aluno, mudança essa que

testemunhará, de modo inequívoco, a presença de uma irreversível cultura de

inclusão. (Correia & Serrano, J., 2000, p. 33)

Neste clima de acolhimento generalizado, as pessoas aprendem a

comunicar entre si com sinceridade, sendo, então, as relações recíprocas muito

mais profundas do que aparentam. Deste modo se vai gerando, naturalmente, um

compromisso pleno de significação colectiva que leva à união, tanto na alegria,

como na tristeza, e produzindo hábitos de tornar suas, as situações vivificadas

pelos demais (Flynn, 1989).

Julga-se, entretanto, ser de preservar e de relevar a ideia de que a

educação inclusiva não é um fim em si própria, pelo menos a nível da dimensão

escolar. Efectivamente, afigura-se que a grande finalidade da escola erradica do

acto da aprendizagem, pelo que, este, será o seu grande objectivo, tendo, por

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 74

sujeito, do mesmo, os alunos. Sob esta lógica, a intervenção escolar visa,

fundamentalmente, a formação integral e de qualidade de todo e qualquer dos

seus alunos, sendo, neste quadro, a inclusão, mais um meio, ou uma estratégia,

de excepcional relevância social sim, mas, não, exactamente, um fim e, muito

menos, o fim último da razão de ser da escola.

Resumindo-se, entretanto, o que foi antes detalhadamente enunciado,

perfilha-se, no presente contexto, que o conceito de escola inclusiva num sentido

lato, pressupõe:

• A inserção do aluno com NEE nas classes regulares, exceptuando-se

situações devidamente justificadas e que sejam alvo de processos de

programação educacional individualizada.

• Sentimento de pertença de todo e qualquer aluno à respectiva comunidade

escolar.

• Sentimento de aceitação, por parte da comunidade escolar, de todo e

qualquer aluno.

• Partilha, por parte de todos os alunos de cada turma - e sempre que

possível - dos mesmos espaços, dos mesmos tempos e do mesmo

currículo.

2.2 A Relevância Actual da Educação Inclusiva

As sociedades modernas debatem-se, na sua generalidade, com um

problema de extraordinária importância, relativamente à qualidade de vida actual -

e, muito particularmente, futura - o qual se poderá resumir, em termos metafóricos,

a uma encruzilhada entre dois itinerários: o da inclusão e o da exclusão. Neste

cenário, a não observância por parte da escola, ou da sociedade, dos valores,

atitudes e práticas inclusivas, parece favorecer a emergência de um certo elitismo,

com todas as consequências de injustiça e de desigualdade que o termo carreia.

Mantida essa cultura de elitismo nos tempos escolares, a mesma será,

posteriormente, relançada na vida social, gerando uma assimetria de

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 75

oportunidades e de condições de vida que acentuarão e perpetuarão as

desigualdades, vincando, consequentemente, os sulcos da aludida encruzilhada.

Nos finais do século XX e nos princípios do XXI, o mundo vive um momento

de mudanças desenvolvidas a um ritmo vertiginoso, com consequências visíveis

no panorama educacional, as quais se traduzem por sintomas de crise e de

insatisfação. Para tentar responder a este cenário indesejável, os sistemas

educativos avançam com inúmeras reformas, visando a sua adequação às

exigências daquelas mudanças, reformas essas que tanto partem do centro para a

periferia (reformas do próprio sistema), como se localizam no interior das

instituições escolares (Castells, 1998).

Conquanto os regimes democráticos, maioritariamente vigentes nos

estados modernos, tenham vindo a contribuir para a consolidação da igualdade de

oportunidades e de direitos, permanece a ideia de que, nesse capítulo, nem tudo

está feito. Nesta problemática a escola, pelo seu sentido de organização

formativa, deverá, não só, dar o exemplo de uma comunidade inclusiva, como,

fundamentalmente, formar precisamente as novas gerações na assunção e nas

práticas dos valores subjacentes à inclusão, a fim de proporcionar condições para

que as sociedades do amanhã, sejam mais solidárias, mais pacíficas e

consequentemente... mais felizes.

Parece, nos tempos de hoje, persistir, ainda, uma marcante situação de

desigualdade permanente entre os indivíduos, facto que leva a uma

conflituosidade, mais ou menos oculta, mas nem por isso menos activa, entre os

que vivem desafogadamente e os que experimentam carências, mais ou menos

significativas, no seu dia a dia. As desigualdades, bem como as razões que as

provocam terão, assim, de ser encaradas como um problema que diz respeito a

todos, aceitando-se o princípio de que será possível atenuar os seus efeitos - que

podem ser, até, em qualquer momento, motivo de possíveis confrontos sociais de

alguma gravidade - se, de modo afectivo e efectivo todos se empenharem na sua

resolução.

No seu todo, as sociedades são hoje, bastantes ricas. Ora, se, por exemplo,

são despendidas somas astronómicas na confecção pura de material bélico, por

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que não canalizar, parte desses recursos, para os diferentes sistemas educativos,

a fim de que os mesmos possam garantir uma educação de qualidade e de

igualdade a todas as crianças? Com esta simples alteração estratégica no

investimento financeiro, certamente que seriam minoradas as assimetrias sociais

existentes e tornada a vivência de todos mais apetecida e tranquila.

As escolas representam um espaço social de excelência para se

equacionarem, reflectirem e debaterem os grandes dilemas que se colocam às

sociedades contemporâneas. São, por isso, um óptimo lugar para as novas

gerações iniciaram uma aprendizagem consciente e assumida dos valores e

práticas da inclusão. Uma escola que valorize a diversidade e pratique a inclusão

é uma escola de grande potencialidade formativa para todos quantos nela

trabalhem e estudem e muito especialmente “ para os alunos sem NEE, uma vez

que lhes permite perceber que todos somos diferentes e, por conseguinte, que as

diferenças individuais devem ser respeitadas e aceites” (Correia, 2003a, p. 15).

Murray-Seegert, há uns anos atrás (1989) preconizava, já, que os alunos

sem necessidades educativas especiais recolhiam benefícios para o

desenvolvimento das suas competências sociais, precisamente, devido à sua

interacção - em contextos escolares inclusivos - com os seus pares portadores de

necessidades educativas especiais. Marchesi e Martin (1990) reforçam esta

perspectiva, referindo que os alunos que não são portadores de necessidades

educativas especiais, em contextos educativos inclusivos, dispõem de um ensino

mais individualizado, de mais recursos e desenvolvem valores e atitudes de

solidariedade, de respeito e de colaboração. Apontam, também, para uma espécie

de reciprocidade de benefícios resultante das relações de amizade geradas, no

quotidiano escolar, entre os alunos com e sem necessidades educativas

especiais.

Um estudo de invulgar fôlego, realizado por Meyer, Park, Grenot-Scheyer,

Schwartz e Harry, publicado em 1998, conduziu a resultados que permitem

confirmar as referidas perspectivas de Murray-Segert e de Marchesi e Martin. Ou

seja, os resultados da sua investigação demonstraram, de forma cientificamente

comprovada, que os alunos sem necessidades especiais, colhem benefícios

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 77

concretos, a nível da sua formação geral, como consequência do estabelecimento

de relações com os seus pares portadores de necessidades especiais.

Por outro lado, a percepção empírica da realidade evidencia, na grande

maioria dos casos, que uma educação não inclusiva, gera, nos alunos com

necessidades educativas especiais, uma situação de vida desprovida de uma

interacção social genuína, na qual não existem verdadeiros amigos nem

vislumbram a esperança de uma ocupação gratificante dos seus tempos de lazer,

ou laborais. Quantos projectos de vida são, desta forma, despojados do seu

essencial! A este propósito ganha relevância significativa recuperar os resultados

obtidos por Falvey (1995). Este investigador levou a cabo um estudo em que

inquirindo um número significativo de crianças, jovens e adultos, lhes perguntava o

que haviam sentido em determinadas fases das suas vidas, em situações

concretas em que se sentiram incluídos e noutras em que se sentiram

marginalizados. Como respostas à situação de inclusão, Falvey recolheu

testemunhos que indiciavam que os sujeitos se sentiram orgulhosos, seguros,

especiais, cómodos, reconhecidos, confiantes, felizes, alegres, apreciados,

queridos, normais e importantes. Ao passo que em relação aos sentimentos

percepcionados pelos inquiridos, em relação à situação de exclusão, foram

inventariadas respostas do tipo ferido, confuso, frustrado, diferente, inferior,

envergonhado, não querido, desprovido de valor, ou subnormal. São, pois,

testemunhos eloquentes do que muitos alunos (seres humanos, claro) podem

percepcionar no seu dia a dia. Por tudo isto, urge, pois, reforçar e apoiar o

paradigma da inclusão, traduzido por um abrir, a todos - e em particular aos

alunos com NEE - as portas das escolas e das comunidades locais, de maneira a

garantir, a cada um e com o apoio de todos, condições de uma vida digna e com

qualidade.

A educação inclusiva parece então - insista-se na ideia - dever passar muito

pelo desenvolvimento de atitudes de respeito e de valorização das diferenças e de

práticas da solidariedade. Para tanto, é premente que a escola proporcione, no

seu quotidiano, actividades em que as crianças aprendam a ajudar-se

mutuamente, perante os problemas do seu dia a dia. E se essas posturas se

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impuserem, perdurarem e acabarem por integrar a forma de ser e de agir definitiva

em cada um, vai-se ganhando a reconfortante convicção de que, em cada vizinho,

colega de trabalho, ou companheiro de lazer, enfim em cada outro, está, antes de

mais, garantida a presença sincera de um amigo.

Pedir e dar ajuda ou apoio, não podem, mais, serem entendidos como

comportamentos esporádicos da interacção humana. Antes, deverão ser

concebidos como formas nobres de construção quotidiana de uma vida plena de

significado e que conferem, a cada grupo social, o estatuto de comunidade, com

toda a riqueza humana que o termo sugere. Infere-se, de tudo quanto representa e

significa a escola inclusiva, que o aluno com necessidades educativas especiais -

e não só - encontra, nela, o ambiente ideal para o seu desenvolvimento humano,

na medida em que:

Para além da filosofia da inclusão lhe reconhecer o direito de aprender junto com

os seus pares sem NEE, o que lhe proporciona aprendizagens similares e

interacções sociais adequadas, ela pretende retirar-lhe, também, o estigma da

“deficiência”, preocupando-se com o seu desenvolvimento global dentro de um

espírito de pertença, de participação em todos os aspectos da vida escolar.

(Correia, 2003a, p. 15)

Desta forma, as energias dos elementos de cada comunidade são

investidas para ajudar os que, efectivamente, precisam de apoio, sendo, estas

atitudes e práticas, as que contribuirão, efectivamente, para o crescimento de uns

e outros, aumentando, assim, a qualidade e o sentido de vida de todos. Só desta

maneira a escola consubstanciará um espaço e um tempo ideais para aprender e

aplicar em contexto os mais nobres processos filantrópicos de interacção social,

promovendo a própria realização humana de quem os pratica.

A aceitação das diferenças, isto é, a aceitação do outro tal qual é, parece,

também, pressupor o cultivo de uma atitude de tolerância. Ora, conforme se pode

constatar através da análise do conteúdo das notícias difundidas, no quotidiano,

pelos órgãos de comunicação social, os tempos actuais parecem denotar, nas

relações entre os homens, um indesejável relegar das atitudes de tolerância, para

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 79

os lugares mais recônditos da vivência humana. São, de facto, bastante evidentes

os sinais dessa ausência de tolerância e de aceitação, nas relações entre os

povos, no mundo de hoje. Para alertar para esta realidade, Carneiro (2001) cita

um conjunto de factores que a UNESCO elegeu a propósito da Ano Internacional

da Tolerância os quais, sendo testemunhos inequívocos da referida intolerância,

vigoram, nos tempos que correm, um pouco por todo o mundo. Neste contexto,

aquele ex-Ministro da Educação refere os seguintes factores:

a) Os conflitos étnicos ou nacionais;

b) A discriminação dirigida relativamente a grupos minoritários;

c) Os actos de xenofobia, designadamente os que incidem sobre refugiados, d) Asilados políticos, trabalhadores migrantes, comunidades flutuantes e

imigrados;

e) A proliferação de organizações e de ideologias racistas e os concomitantes;

f) Actos de violência étnica;

g) Os extremismos religiosos;

h) Os actos de intimidação e de violência perpetrados contra escritores,

intelectuais e outras pessoas que se limitam a exercer o seu direito à liberdade

de opinião e de expressão;

i) A intolerância fomentada por movimentos ou ideologias políticas com a

alegação de que os principais males sociais como a criminalidade, o desemprego a degradação da saúde pública e a violência urbana são

imputáveis a grupos sociais particulares;

j) A intolerância que se manifesta pela marginalização e pela exclusão social dos

grupos vulneráveis, ou pela violência e discriminação exercida relativamente

aos seus bairros ou área de concentração. ( p. 76)

O quadro é, pois, deveras preocupante e deve obrigar a uma reflexão

profunda a qual, por um lado permita inventariar as causas e, por outro, facilite a

identificação e a adopção das medidas a tomar para tornar o panorama menos

sombrio. Neste quadro, afigura-se inquestionável que a educação inclusiva

emerge como um poderoso e necessário instrumento de construção de um

presente e, fundamentalmente, de um futuro renovado, a nível de valores e que

seja mais justo, mais tolerante e, verdadeiramente, mais democrático.

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Articula-se, então, o ideal da educação inclusiva com o de um projecto de

reconstrução de um mundo melhor. Nesta perspectiva afigura-se que se torna

premente que essa desejada forma de educar, passe a acontecer, criança a

criança, professor a professor, turma a turma, escola a escola e comunidade a

comunidade, para que, no fundo, o homem e os seus actos sejam cada vez mais

verdadeiramente humanos.

Tudo leva a crer portanto, que se torna inadiável a tarefa de unir esforços

para que as sociedades se transformem, tão rapidamente quanto possível, em

comunidades tolerantes e inclusivas. Para tal, é essencial que as escolas

contribuam de modo efectivo na concretização deste desiderato, uma vez que

consubstanciam, por excelência, o espaço de educação e de aprendizagem das

novas gerações e, por consequência, das novas sociedades. Numa palavra, o

mundo de amanhã será muito o que a escola de hoje para isso fizer.

Adentro de esta lógica importa, por conseguinte - e ainda que de relance -

espreitar para o que ocorre, hoje nas nossas escolas. E a verdade é que os

sinais aí visíveis são, no mínimo preocupantes, como se depreende, por exemplo,

do que relata Veiga (1999):

Num recente estudo, realizado a pedido do Ministério da Educação (IIE), sobre a

violência nas escolas portuguesas (Costa & Vale, 1998), com uma amostra de

4925 alunos do 8.º e 11.º anos repartidos por 142 escolas, verificou-se que 42%

dos alunos já ouviram insultar um professor, 3,5% observaram um professor a ser

agredido, 4,3% viram destruir os materiais dos professores e 1,4% viram um

professor ser ameaçado com uma arma. (p. 15)

Perante estes dados, parece portanto urgente que sejam criadas condições

para que as crianças e os jovens desenvolvam competências éticas de relações

pessoais, decorrentes de valores como de aceitação, de respeito, de confiança

mútua e de cooperação, valores que, como já foi evidenciado, consubstanciam os

alicerces da escola inclusiva. Estes princípios deverão, contudo, ser objecto de

atenção, também por parte da própria sociedade em geral e, em particular, por

parte das famílias, pois que sozinha, a escola não será capaz de levar a bom

termo esta missão.

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Fundamentalmente, como postulam S. Stainback e W. Stainback (1999),

prefigura-se crucial que a escola represente um espaço, um tempo e uma

interacção em que os alunos se sintam bem. Para tal, é indispensável que eles

sintam, ali, um verdadeiro ambiente de construção emocional e cognitiva,

alicerçado em exemplos constantes e múltiplos de entreajuda, de equidade, de

solidariedade, de colaboração e de respeito. Caso contrário, a decepção os levará,

rapidamente, à rejeição e ao abandono do contexto escolar, como se constata

amiúde. Esse abandono tende a ser, primeiro emocional, depois cognitivo e,

finalmente, físico. E enquanto protagonizam essas formas progressivas de

abandono, os alunos vão, paralelamente, buscando - quase que de forma

inconsciente - outras alternativas de vida, as quais, muitas das vezes, são

viagens, sem retorno, em direcção às paragens da marginalidade e da exclusão.

A reorganização das escolas, de molde a que estas funcionem como

contextos educativos inclusivos é, pois, uma questão plena de actualidade, como

acentuam Cullen e Pratt (1999). E tal parece estar a ser percepcionado pelos

sistemas educativos já que - segundo aqueles mesmos autores - existem muitos

trabalhos e até observações de práticas educativas que prenunciam uma

tendência progressiva para a criação de comunidades escolares inclusivas. É um

sinal de esperança. É imperiosa e premente a sua necessidade. E em função

dessa gritante necessidade é indispensável que, para a sua concretização,

concorram, emocional, esclarecida e activamente, todos os agentes educativos:

profissionais, alunos e famílias.

3 Implicações da Educação Inclusiva na Organização Escolar

A ideia de escola inclusiva pressupõe, claramente, a adopção de práticas

pedagógicas que respondam, de modo qualitativo, à generalidade dos alunos e

em particular aos alunos com NEE, no contexto da sala de aula regular, logo, sem

recorrer - tanto quanto possível - à colocação de alunos em ambientes

segregados, práticas que, na sua maioria - e não sendo devidamente

fundamentadas - demonstraram não ser eficazes, como atestam Anderson

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Pellicer (1990), Braddock; e McPartland (1990), Gartener e Lipsky (1987), Wang,

Reynolds e Walberg (1988), Williams, Richmond e Mason (1986), citados em

Wang (1998).

Sendo, já, mais ou menos claros os contornos conceptuais, organizacionais

e pedagógicos, subjacentes à escola inclusiva, não se afigura, porém, ser tarefa

simples, a sua implementação e, muito menos, a sua generalização, devido,

fundamentalmente, à complexidade educativa que a gestão da diversidade - e,

dentro desta, o atendimento aos alunos com NEE - pressupõe. Contudo, para que

este ideal ganhe sinais efectivos de concretização, as escolas deverão assumir

uma postura de inovação, tanto a nível organizacional, como a nível da gestão

pedagógica. Por esta via, certamente que serão disponibilizadas respostas mais

ajustadas e eficientes às múltiplas necessidades de todos os alunos, conforme

prenuncia Hegarty (1990).

A interpretação dos contributos fornecidos pela investigação leva a concluir

que a educação inclusiva assenta numa visão intrinsecamente diferente da visão

mais tradicionalista da educação, na medida em que, esta, privilegia a

homogeneidade, enquanto, aquela, preconiza o primado da heterogeneidade.

Provavelmente erradica neste aspecto a maior dificuldade na concretização da

pedagogia de inclusão, já que a tradição escolar aponta muito para um ensino

dirigido à homogeneidade, não sendo, obviamente, fácil fazer inflectir essas

práticas para outras mais conformes à pedagogia diferenciada, que é um dos

pilares didácticos da inclusão escolar.

Porém, devido à relevância ética e social dos valores inerentes à educação

inclusiva, importa demover as eventuais inércias e lutar pela sua implementação.

A caminhada para a construção da escola inclusiva, implica, desde logo, a nível de

cada contexto local, a edificação de comunidades de aprendizagem, em que todos

os recursos educativos e culturais de uma comunidade geográfica e social, são

articuladamente investidos para a satisfação das necessidades básicas de

aprendizagem dos seus membros (Torres, 1998).

Por outro lado, afigura-se ter todo o fundamento a ideia de que os tempos

da integração ocultaram, durante muito tempo, a influência de alguns elementos

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 83

pedagógicos que as estratégias efectivamente inclusivas deverão desocultar.

Nesta linha de pensamento pretende-se evidenciar que determinados elementos

do processo de ensino-aprendizagem, como sejam, nomeadamente, a

organização e o desenvolvimento curricular, terão acabado por serem fontes reais

de dificuldades para os alunos com necessidades educativas especiais.

Efectivamente, como se explicitou antes, o processo de integração visava, na sua

essência, dotar aqueles alunos dos requisitos necessários para acompanharem o

programa, sendo este, portanto, basicamente dirigido aos alunos normais. Esta

situação não parece ter sido suficientemente debatida e denunciada, nos tempos

da chamada integração escolar, facto que, entre outros terá concorrido para o

número significativo de alunos (com e sem NEE) que jamais se adaptaram a essa

forma de fazer escola. Nesta lógica, prefigura-se absolutamente necessário

repensar, quer a questão da organização, quer a da gestão curricular, a fim de que

a generalidade dos alunos - e muito em particular os alunos com NEE -

percepcione, no seu dia a dia escolar, situações de aprendizagem significativas,

sob pena de um permanente adiar do ideário inclusivo (Monereo, 1991).

A construção de uma instituição educativa promotora dos ideais genuínos

da inclusão - a qual implica a operacionalização de mudanças várias e

convergentes entre si - parece, efectivamente, prenunciar uma tarefa eivada de

grandes dificuldades. Porém, a sua necessidade, nos tempos que decorrem - por

força das razões anteriormente explicitadas - é mais do que premente e, por tal,

afigura-se eticamente urgente lançar os alicerces da inclusão, na generalidade das

escolas.

Pressente-se a necessidade, vislumbram-se vontades. Há pois que

caminhar nos processos de fundação dessas escolas, sabendo-se de antemão

que esse caminhar será duro e que implica mudanças profundas, uma vez que há

a consciência de que:

A caminhada para que elas possam vir a responder às necessidades de todos os

alunos tenha sido, e continue a ser, bastante árdua, uma vez que há a

necessidade de se proceder a reestruturações bastante acentuadas em todos os

quadrantes, desde as atitudes de todos os profissionais de educação e dos pais

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 84

até à reorganização da sala de aula em termos físicos e pedagógicos. (Correia,

2003a, p. 9).

Esta necessidade de mudança começa, gradualmente, a revelar resultados

práticos, integrados num movimento que visa alterar a cultura organizacional das

escolas. Essas alterações decorrem da pressão, mais ou menos consensual da

chamada opinião pública, para que sejam criadas formas de organização escolar

de modo a que alunos de todas as condições pessoais, sociais, intelectuais, ou

raciais, possam desfrutar das mesmas oportunidades de aprender (Banks, 1989).

Muito provavelmente, os níveis de predisposição para a prática de uma

educação inclusiva, variam de escola para escola. Sendo assim, importa encontrar

os motivos que, eventualmente, justifiquem essa disparidade de posturas. Nesta

linha de pesquisa, Giné (1994) procurou identificar as características que

apresentam as escolas onde se verifica um distanciamento efectivo em relação às

práticas da educação inclusiva. Neste contexto, aquele autor aponta factores que

vão desde a escassez de trabalho cooperativo entre os professores, até a um

sistema de ensino em sala de aula pouco flexível e centrado quase em exclusivo,

em conteúdos de natureza conceptual, passando - ainda segundo o autor em

questão - por alguma ausência de responsabilidade de certos professores.

Giné, aprofundando a sua argumentação, avança, inclusivé, com a ideia de

que, naquelas situações, os próprios alunos normais podem não receber a

resposta adequada, caindo muitos consequentemente, nas teias do insucesso

escolar. Esta situação parece, aliás, dever ser inserida numa certa modalidade de

exclusão.

Analisando-se o sentido das conclusões a que chegou Giné, afigura-se,

então, ter fundamento considerar que este autor - a exemplo de muitos outros -

vislumbra, na cooperação, um dos alicerces basilares da construção da escola

inclusiva. Paralelamente, o autor em questão manifesta a convicção de que se

torna igualmente necessário que o ensino seja concebido e desenvolvido sob uma

lógica de flexibilidade curricular e de diferenciação pedagógica. O autor alerta,

também, para a conveniência de diluir a predominância dos conteúdos de

natureza conceptual. Conquanto o não explicite, Giné, deve querer preconizar a

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 85

aprendizagem paralela de conteúdos de outra natureza, designadamente do tipo

atitudinal, bem como do tipo procedimental

A crescente aproximação a um eventual modelo de escola inclusiva parece

implicar a ideia de que, para tal, não será indiferente o tipo de organização

institucional, ou, dito por outras palavras, o modelo em causa pressupõe uma

forma específica de organização, de gestão e de funcionamento escolar. Sob esta

perspectiva, convirá, então, levar em linha de conta, o facto de que as escolas não

se confinam a “edifícios, horários e planos curriculares . . . antes de tudo o mais,

são relações e interacções entre as pessoas” (Ainscow, 1998, p. 37). Logo, todos

os processos de organização escolar - enquanto sistema funcional assente em

dinâmicas de interacção humana - deverão decorrer de uma reflexão prévia

centrada nos princípios e valores a priorizar na sua acção. Desta forma será

minimamente garantido que o conjunto de relações pessoais, desenvolvidas no

quotidiano escolar, se subordinem aos ideais assumidos consensualmente e

concorram, de modo eficiente e convergente, para a sua concretização.

Tais pressupostos serão, naturalmente, válidos para o caso da assunção

dos valores inerentes à inclusão, até porque, “as pessoas agem de acordo com os

seus valores e influenciam o que a organização pode ser” como afirma Skirtc

(1988), citado em Ainscow (1998, p. 37). Depreende-se, então, que à medida que

as escolas aderem ao princípio da inclusão e pretendem implementá-lo no seu

funcionamento quotidiano, se torna imperioso, adaptar e conformar, de modo

sistémico, com aquele princípio, os papéis e funções dos professores, do pessoal

de apoio, das famílias, dos membros da comunidade e dos alunos. É pelo menos

esta a convicção expressa por Correia (2003a, 2003b) e também por York-Barr,

Schultz, Doyle, Kronberg e Crosset (1996), citados em Sands, Kozleski e French

(2000). Se aquelas premissas não se concretizarem, afigura-se serem poucas as

possibilidades de se passar das intenções às práticas, no campo da edificação

das escolas inclusivas.

Entretanto, face à extrema heterogeneidade que, hoje, caracteriza a

população escolar, a resposta educativa a essa diversidade configura,

provavelmente, o desafio mais importante e, simultaneamente, o mais difícil com

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que se enfrentam as escolas e os professores. Sendo, este facto - a extrema

diversificação da população escolar - uma variável relativamente recente, infere-se

que as instituições escolares não possuem, ainda, experiência suficiente para

lidarem de forma eficiente com a mesma.

Por outro lado, sendo, hoje, a diversidade da população discente uma

realidade significativamente diferente da realidade de alguns tempos atrás, há que

concluir que não serão as formas tradicionais de fazer escola, a melhor maneira

de responder adequadamente à situação actual. Consequentemente, é imperioso

a implementação de mudanças, mais ou menos substanciais, nos contextos

escolares, se, efectivamente se pretender que todos os alunos, sem qualquer tipo

de discriminação, consigam o maior desenvolvimento possível das suas

capacidades pessoais, sociais e intelectuais, como alertam Marchesi e Martin

(1998).

Parecendo, assim, inquestionável que a escola de hoje está, de modo

incontornável, confrontada com o facto de ter que lidar com uma população

significativamente diversificada, julga-se, por conseguinte ser inevitável que a sua

organização e funcionamento se baseie, precisamente, nesse pressuposto, isto é,

que a escola seja concebida e gerida sob o princípio de uma educação para a

diversidade. Adicionando-se a esta lógica, a ideia da igualdade de oportunidades

educativas a que toda e qualquer criança tem direito, parece ser de concluir que a

escola pressupõe, fundamentalmente, um processo educativo assente na gestão

de diferenças. Tal situação parece remeter, sem alternativa, para a condição de

escola inclusiva na qual a própria gestão educativa dos alunos com NEE terá de

merecer, obviamente, uma atenção muito profunda, dada a natureza específica de

que se revestem as suas características educacionais.

Nesta óptica, como assinala Ainscow (1998), torna-se, então, inevitável que

as escolas implementem e desenvolvam procedimentos educativos que valorizem

e respeitem as diferenças. Estas passarão a ser encaradas - ainda segundo

aquele autor - como um pretexto para optimizar os níveis de intervenção

profissional e não como um obstáculo ao processo de ensino-aprendizagem.

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A inclusão escolar de alunos com determinado tipo de necessidades

educativas especiais, enquadra-se, naturalmente, nestes conceitos amplos de

diversidade e neles encontra o seu sentido pleno, como preconiza Giné (1998).

Sob esta visão, as escolas e os professores devem passar a centrar a sua

atenção, não só no que de diferente têm aqueles alunos, mas também na

natureza da resposta educativa a que têm direito, ou seja, no tipo de apoio e do

grau de ajuda de que necessitam para obterem sucesso.

Portanto, a transição de uma escola dita tradicional, para uma escola

orientada pelos valores da igualdade e da qualidade - desde logo, orientada para a

gestão inclusiva da diversidade - pressupõe o desenvolvimento de determinados

princípios. Estes princípios têm sido identificados por numerosos estudos,

realizados no campo da eficácia escolar, entre os quais, pela excelência da

síntese, se relevam os encontrados nos trabalhos de Edmonds (1982), os quais,

de modo resumido, se referem de seguida:

• A capacidade de liderança do director e a atenção que dedica à qualidade

do ensino.

• Um enfoque incisivo no ensino, interiorizado por todos os agentes.

• Um ambiente de ordem e segurança propícios ao ensino e à aprendizagem.

• Um tipo de comportamento dos professores, transmitindo a convicção de

que alimentam expectativas de que todos os alunos atinjam, pelo menos,

os objectivos mínimos.

• O uso de processos de medição do desempenho dos alunos, como base

para a reformulação das práticas educativas.

Nesta perspectiva de mudança interessa, particularmente, atentar na

estratégia a desenvolver, nas escolas, pelos profissionais especialistas,

nomeadamente, os ligados à área da educação especial. Esta preocupação

parece fazer todo o sentido na medida em que alguns dos rumos anunciados,

neste aspecto, se afiguram demasiado infundados, pelo que se levados à letra,

poderão vir a ter efeitos negativos, sobretudo junto dos alunos com necessidades

educativas especiais. Como exemplo desta eventual situação, refira-se o que

preconizam Sands et al. (2000). Efectivamente, estes autores advogam a ideia de

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que os profissionais de educação especial deverão transitar das formas

tradicionais de atender determinados grupos de alunos, para a prestação de

serviços mais abrangentes e orientados para a resposta às necessidades

individuais de todos os alunos. Deste modo, aqueles profissionais seriam

estimulados a deixar a condição de técnicos de apoio a certos alunos, para passar

à de profissionais aptos a colaborar na gestão qualitativa da sala de aula e perante

a totalidade dos alunos da turma. Sem ser necessário aprofundar muito esta

questão, julga-se ser claro que a verificar-se - sem os devidos cuidados - a

premonição de Sands e dos seus colaboradores, tal iria redundar numa gestão

difusa dos apoios especializados, sob a qual os alunos com necessidades

educativas especiais veriam os seus direitos a uma atenção e intervenção

individualizadas, seriamente comprometidos.

Ainda a propósito das formas de interacção entre os papéis dos agentes do

ensino regular e dos da educação especial - e na mesma linha dos autores antes

analisados (Sands e colaboradores) - Iano (1990), apresenta, igualmente, algumas

ideias, as quais se julga, por razões de zelo, serem de referir. Assim, aquele autor,

considera ensino educativo, os processo de ensino-aprendizagem orientados para

responder, de modo integrado, às necessidades de todos os alunos e ensino

técnico a modalidade de atendimento que assenta na diferenciação de práticas

entre o ensino regular e a educação especial. A este último dos dois sistemas de

intervenção referidos, Iano atribui, ainda a designação de descontextualização

técnica. Pela linguagem utilizada, Iano parece entender que a intervenção da

educação especial é meramente técnica, não se integrando, portanto, na

dimensão educativa. Trata-se, por conseguinte de uma visão que pode gerar

alguma confusão, dado que se afigura perfeitamente legítimo e fundamentado que

os profissionais de educação especial possam desenvolver uma intervenção

significativamente diferenciada da dos professores do ensino regular, sem que tal

saia da esfera puramente educacional.

Admite-se, sem dúvida, que as práticas tradicionais possam ser alvo de

uma reflexão profunda para que, em seu lugar, surjam, novas formas

organizativas e pedagógicas que facilitem, tanto quanto possível, a aprendizagem

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conjunta e em cooperação dos alunos, em todas as áreas curriculares. Sob o

primado deste pressuposto, passa a ser natural a generalização da expectativa de

todos os alunos possam vir a usufruir, em simultâneo, dos mesmos recursos e das

mesmas oportunidades educativas e, tanto quanto possível, nos mesmos

contextos e nos mesmos tempos (Wang, 1998). Porém, há que ter na devida

conta que tal não deverá ser conseguido à custa de uma menor ou mais diluída

atenção aos alunos com necessidades educativas especiais. Trata-se aqui de

salvaguardar, naturalmente, os direitos destas crianças a terem acesso a um

processo educativo que efectivamente responda às suas necessidades, “até

porque a maioria dos alunos com necessidades educativas especiais

permanentes terá muita dificuldade em atingir os objectivos do chamado “currículo

comum” se esse processo não for considerado” (Correia, 2003b, p.10).

Tais precauções não impedem, obviamente, de se admitir que a turma e a

sala de aula, configuram o contexto primacial da intervenção dos recursos

especializados. Tal intervenção poderá ser concretizada através de interacções

pedagógicas flexíveis, individualizadas, ou em pequenos grupos e planeadas em

articulação com os docentes titulares de turma, como, de resto, indiciam, por

exemplo, Sands et al. (2000). Deste modo, até será operacionalizado o princípio

de que “os apoios dados pelos serviços de educação especial não são

exclusividade dos alunos com NEE” como refere Sailor (1991), citado por Correia

(2003b, p. 20). Porém, tal não poderá ser conseguido sem que, ao mesmo tempo

se atente criteriosamente nas peculiaridades e necessidades dos alunos com

NEE, ou seja, “ há que dar importância a um processo que permita responder com

eficácia a essas necessidades” (Correia, 2003b, p.21).

Em consequência das premissas referenciadas “a educação especial passa

de um lugar a um serviço, sendo reconhecido ao aluno com NEE o direito de

frequentar a classe regular, possibilitando-lhe o acesso ao currículo comum

através de um conjunto de apoios apropriados às suas características e

necessidades.” (Correia, 2003a, p. 9). Fica, portanto claro que a existência dos

serviços de educação especial se justifica em função da necessidade de

responder aos alunos com NEE. Tal, porém, não impedirá que, de modo

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organizado “eles podem ser utilizados para beneficiar todos os alunos e

professores” (idem, p. 10).

Um dos princípios-chave, advogados por alguns autores - nomeadamente,

Coleman e Hoffer, (1987) - na implementação da escola inclusiva, assenta,

precisamente, na construção efectiva de uma comunidade escolar. Assim - e de

acordo com o testemunho dos autores em análise - existem provas de que nas

escolas em que os alunos, os pais e os docentes não procuram estabelecer e

sedimentar relações de empatia, laços de amizade e assunção de compromissos

recíprocos, aumentam os problemas de insucesso e de abandono escolares, bem

como o abuso de drogas e das actividades marginais.

Ora, numa época em que a sociedade se torna cada vez mais urbana,

complexa e despersonalizada, maior se torna, porventura, a necessidade de

emergência do sentido de comunidade, em cada organização escolar, a fim de

minimizar, junto das crianças, os efeitos negativos daqueles factores

característicos da sociedade moderna. Por todos estes motivos, a necessidade de

mudança nas formas de fazer escola, parecer ser, claramente, cada vez mais

premente, sobretudo quando se atenta no facto - já anteriormente sublinhado - de

a actual população escolar se caracterizar por uma alargada e complexa

diversidade, gerando, por conseguinte, um quadro educacional significativamente

diferenciado do que era patente alguns tempos atrás. A este propósito, S.

Stainback e W. Stainback (1990) sublinham a insuficiência educativa das escolas

e das aulas tradicionais, argumentando que, as mesmas, se encontram

genericamente organizadas e estruturadas para satisfazer as necessidades dos

alunos homogéneos e normais, o que implica que seriam os alunos que se teriam

de adaptar àquele modelo. Logo, na perspectiva dos mesmos autores, a

manutenção de tal modelo provoca, necessariamente, situações de exclusão

pedagógica, dado que existe um número cada vez maior de alunos que não

conseguem uma adaptação minimamente satisfatória ao modelo em questão.

Esta questão, traduzida por uma certa inadequação da generalidade das

escolas e dos professores - em responderem, de forma positiva, ao conjunto de

problemas com que se deparam nas respectivas turmas - começa a ser um dado

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adquirido e para a qual os próprios sistemas educativos parecem não estar a

conceber as necessárias respostas. A comprová-lo está o facto de que “ a maioria

dos professores parece mesmo sentir a falta de directivas que prescrevam como

uma sala de aula deve ser (como é que devemos ensinar), particularmente

quando se enuncia a intenção de as escolas deverem responder às necessidades

individuais dos alunos” (Tomlinson & Allan, 2002, p. 12).

Com este tipo de reflexão, pretende-se tornar claro que se perfilha o

propósito de que a educação escolar actual, no seu todo, parece não garantir uma

resposta satisfatória à generalidade dos alunos. O elevado índice de insucesso e

de abandono escolar que se verifica em Portugal é, de tal, um testemunho tão

eloquente quanto preocupante. Julga-se, a propósito, não ser de todo

infundamentado percepcionar que um jovem em situação crónica de insucesso, ou

de abandono escolar, corre sérios riscos de vir a protagonizar um caso de

exclusão social. Portanto, reafirma-se a convicção de que a exclusão não é uma

probabilidade a que estão sujeitos apenas os alunos com NEE, mas que se

estende, potencialmente, a um número muito significativo de outros alunos. Logo,

ao falar-se da construção de escolas inclusivas parece fazer todo o sentido que o

processo de transformação que lhe está subjacente, seja subordinado, antes de

mais ao propósito de assegurar uma resposta digna e adequada aos alunos com

NEE e, que, simultaneamente, proporcione a melhoria da qualidade das

aprendizagens dos alunos em geral.

Ora, para se operar o processo de mudança necessário para que as

escolas se convertam em organizações vocacionadas para um atendimento

inclusivo dos seus utentes, é imperioso que, antes, sejam inventariadas linhas

orientadoras para a gestão de tal processo de inovação. Porém, para que essa

transformação seja alvo de consecução, torna-se imprescindível que as referidas

linhas orientadoras sejam, simultaneamente viáveis e funcionais. Esta

preocupação afigura-se de importância capital pois que, procedimentos

complicados e de eficiência duvidosa geram, por norma, desconfiança e

desmotivação nos eventuais destinatários.

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Sob este princípio de se procurarem linhas orientadoras para a

concretização das dinâmicas de inovação escolar julga-se que a proposta

apresentada por Ainscow se enquadra nos requisitos expostos, visto que

compreende um número reduzido de condições (seis), parecendo ser, cada uma

delas, de compreensão e de implementação, relativamente fáceis. Neste âmbito,

Ainscow (1997) propõe:

• Liderança eficaz, não só por parte do director, mas difundida através da escola

• Envolvimento da equipa de profissionais, alunos e comunidade nas orientações e

decisões da escola

• Um compromisso relativo a uma planificação realizada sob dinâmicas de

colaboração

• Estratégias de coordenação

• Focalização da atenção nos benefícios potenciais da investigação e da reflexão

• Uma política de valorização profissional de toda a equipa educativa. (p. 24)

Depreende-se, então, de tudo o que foi exposto que a edificação da escola

inclusiva, assenta e decorre, fundamentalmente, de uma reorganização

significativa e importante dos modos de estruturação e de funcionamento da

escola tradicional. Essas alterações têm, como objectivo nuclear, criar condições

que permitam um atendimento adequado a todo e qualquer aluno, traduzindo-se,

no fundo por uma “reforma da educação regular de forma a torná-la mais

abrangente” segundo as palavras de Vislie (1994), citado em Aisncow (1997, p.

27).

Continuando-se, contudo, a preconizar-se o princípio de que qualquer uma

destas mudanças deverá subjugar-se à lógica da progressividade - e não da

ruptura - e que nesta acção de mudança deverão ser sempre salvaguardados os

direitos dos alunos com NEE, afigura-se sensato acrescentar às sugestões de

Ainscow, antes citadas, o contributo que, na mesma linha de construção da escola

inclusiva é dado por Sailor (1991) citado por Turnbull, Shank e Leal (1995) e

recuperado por Correia (2003a): 1) Todos os alunos devem ser educados nas escolas das suas residências. A

frequência da escola da zona de residência beneficia a criança com NEE, porque

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promove a sua inclusão social nas actividades da comunidade, permite-lhe

conviver e pertencer a um grupo de estudo e desenvolver amizades.

2) A percentagem de alunos com NEE em cada escola/classe deve ser

representativa da sua prevalência. Desta forma, as responsabilidades são

distribuídas por todos os professores, aumentando a oportunidade de todos os

alunos interagirem entre si.

3) As escolas devem reger-se pelo princípio da “rejeição zero”. Nenhum aluno deve

ser excluído da escola com base na natureza ou severidade da sua problemática.

4) Os alunos com NEE devem ser educados na escola regular, em ambientes

apropriados à sua idade e nível de ensino. Esta componente tem gerado

bastante controvérsia, especialmente porque continua a não existir um consenso

acerca da eliminação do continuum de serviços educativos, acerca da quantidade

de tempo que os alunos com NEE devem passar na classe regular e acerca do

significado dado à expressão “todos os aluno” para fins de colocação na classe

regular.

5) O ensino cooperativo e a tutoria de pares são métodos de ensino preferenciais.

Estes tipos de ensino proporcionam uma grande diversidade de oportunidades de

aprendizagem para todos os alunos, incluindo aqueles que apresentam NEE.

6) Os apoios dados pelos serviços de educação especial não são exclusividade dos alunos com NEE. Podem ser utilizados para beneficiar os

alunos e professores da escola. (pp. 9-10)

Analisando-se os princípios orientadores subjacentes à base conceptual

que Sailor propõe para o advento da escola inclusiva, verifica-se que este autor

perfilha a tese já aqui defendida de que é desejável que os professores assumam

práticas pedagógicas que beneficiem todos os alunos. Neste aspecto específico,

Sailor releva, como exemplos de tais práticas, o ensino cooperativo e a tutoria de

pares. Numa linha de pensamento de algum modo aproximado, o autor em apreço

refere, ainda - aliás como neste trabalho é, por várias vezes, também preconizado

- que os serviços de educação especial podem ser entendidos como um recurso

do qual poderão beneficiar todos os alunos e professores de escola. De algum

modo, Sailor aponta para a ideia de que a inclusão é uma obra de todos para

todos, no interior de cada comunidade escolar.

Entretanto há uma convicção mais ou menos generalizada de que as

escolas são o reflexo da estratificação das desigualdades sociais. Deste modo,

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afigura-se premente a necessidade de serem repensados, de maneira profunda,

os actuais modelos de estruturação e de funcionamento das instituições

educativas a fim de que, progressiva e eficientemente, seja possível alterar o

cenário actual das assimetrias sociais. A este propósito Torres (1993), preconiza a

necessidade de recriação de um novo paradigma educacional, em ordem a ser

possível desenvolver e oferecer uma escolaridade efectivamente dirigida a todas e

cada uma das crianças e em função da desigualdade das suas necessidades. O

resumo das propostas daquele autor consta do Quadro 2, a seguir inserto:

Quadro 2

Princípios para a Inovação das Organizações Educativas numa Perspectiva de

Escola para Todos a Partir dos Contributos de Torres (1993)

Princípios

Estratégias

• Recuperar a unidade dialéctica

entre o ensino e a aprendizagem

• Devolvendo à aprendizagem a sua

centralidade como objectivo

fundamental de todo o processo

educativo

• Atribuir uma significação ampla à

aprendizagem e ao saber

• Integrando conhecimento e acção,

saber e saber fazer (competência)

• Restituir ao aluno o lugar prioritário

dentro do processo pedagógico

• Redefinindo os conceitos de aluno

que subjazem às práticas escolares

actuais

• Reconhecer que todos (crianças,

jovens e adultos) têm necessidades

de aprendizagem por satisfazer

• Privilegiando-se a dimensão

intergeracional da aprendizagem e

dos saberes e abrindo novas vias de

articulação entre educação formal e

informal.

• Recuperar o saber como elemento

chave de todo o processo educativo

• Preconizando-se uma visão ampla

do saber que integre, tanto o saber

comum, como o saber elaborado.

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• Rever o quê e o como do ensino e

da aprendizagem

• Aperfeiçoando os aspectos

pedagógicos e curriculares da teoria e

da prática educativa.

• Revalorizar o sentido da educação

permanente e do aprender a

aprender

• Acentuando a relevância do

aprender que começa com o

nascimento e dura toda a vida.

• Assumir o reconhecimento da

diversidade, da relatividade e do

instável

• Duvidando do homogéneo, do

universal, do estável e das verdades

inquestionáveis.

• Recuperar a dimensão do individual • Respeitando o papel da motivação e

dos interesses pessoais.

• Conceber a educação numa

perspectiva da necessidade e da

procura

• Pondo em causa a predominância

da oferta.

• Vincular explicitamente os

processos educativos aos

processos sociais

• Fomentando a interacção escola e

vida, escola e local, cultura escolar e

cultura social, educação e trabalho,

currículo escolar e realidade

envolvente e teoria e prática.

Como se pode depreender, através de uma análise ainda que sumária do

conteúdo deste quadro, a perspectiva enunciada por Torres reveste-se de extrema

oportunidade pois clama de forma muito adequada para a necessidade de a

escola não se afastar da missão que lhe está cometida, a qual em muitos casos

parece estar algo relegada. Para estas situações aquele autor aponta como que

para a emergência de uma nova ordem nas formas de fazer escola e se, de entre

as propostas elencadas, umas há que certamente já se verificam em muitas

escolas, outras parecem configurar, exactamente, o oposto de algumas das

práticas actuais em diversos estabelecimentos de ensino.

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4 Contributos para um Modelo de Escola Inclusiva

Esta secção representa, naturalmente, uma das partes fundamentais do

presente trabalho, merecendo, por conseguinte, uma atenção especial. Assim,

adianta-se que a revisão da literatura efectuada para a obtenção dos contributos

considerados adequados ao desenvolvimento deste projecto de investigação-

acção obedeceu a determinados princípios, os quais se filiam na perspectiva, que,

sobre esta questão é perfilhada por Martinez (1996). Assim, como preconiza o

autor citado, nas investigações do tipo qualitativo - como é o caso vertente - o

enquadramento teórico tem por finalidade a exposição do que de mais relevante

consta na literatura sobre a temática em estudo. Sob este objectivo deverão ser,

então, expressas não só as opiniões, mas também as interpretações e as

conclusões aportadas pelos autores cujos trabalhos sejam referências

paradigmáticas no contexto da temática trabalhada (neste caso concreto, a escola

inclusiva).

Continuando-se, então, a seguir a linha de raciocínio de Martinez, o papel

essencial do enquadramento teórico, num trabalho de investigação qualitativa será

o de servir de informação e de referência teóricas e não, propriamente de modelo

a que o investigador se terá que sujeitar. O autor em questão alega, como

fundamento da sua posição - a qual é assumida, como se referiu, neste projecto -

que os contributos da literatura servem, na sua essência, como termo científico de

orientação da intervenção e de comparação com os resultados obtidos pelo

investigador e nunca para, à partida, impor uma determinada interpretação da

realidade a pesquisar. Só imbuído deste espírito - como aconselha, ainda o

mesmo autor - o investigador age sob uma atitude verdadeiramente

fenomenológica, criando-se, desta maneira, condições para a emergência

autêntica da novidade, do original e da inovação.

4.1 Princípios Gerais

As mudanças nos princípios organizacionais das escolas requerem

profissionais que assumam o desejo de ajustar os seus métodos de gestão

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curricular à natureza das necessidades dos seu alunos. Assim, os profissionais de

educação deverão alterar, não só o como ensinam, mas, também, o que ensinam

(Sands, et al., 2000). Consequentemente, para estes autores - e na obra em

referência - as escolas devem transformar-se em organizações, nas quais, todos

os alunos - e muito especialmente, os alunos com NEE - sejam da

responsabilidade conjunta de todos os profissionais escolares.

Em Portugal esta problemática está, naturalmente, também, na ordem do

dia, consubstanciando, presentemente uma das mais momentosas preocupações

do próprio sistema educativo como, de resto, o comprova a última - até à data

(2003) - reformulação organizativa dos serviços da Educação Especial. Com esta

alteração, formalizada através de um documento legislativo (o já mencionado

Despacho Conjunto n.º 105/97, de 1 de Julho) pretende-se, precisamente, que

sejam implementadas dinâmicas e estratégias - coordenadas a nível local pelas

Equipas de Coordenação dos Apoios Educativos - susceptíveis de facilitar, por

parte de cada comunidade escolar como um todo, o atendimento inclusivo da

generalidade das crianças portadoras de necessidades educativas especiais

graves,

Se o propósito é, portanto muito claro, isto é, se se verifica, actualmente,

uma nítida e consensual intenção em se criarem condições para a emergência de

escolas inclusivas, já a forma e os meios para a sua consecução concreta e real,

não se afiguram tão perceptíveis e muito menos consensuais. Logo, atentando-se

nos contornos da problemática em análise, afigura-se da maior premência, a

realização de trabalhos de investigação que, centrados em experiências

institucionais e profissionais comprovadamente bem sucedidas - no que concerne

a resultados práticos no campo da inclusão - teorizem e promovam a visibilidade

dessas experiências e práticas, com o objectivo de, por um lado, provar que o

desiderato da inclusão é possível e, por outro, que existem determinados

procedimentos e atitudes que implementados com crença, rigor e sistematicidade

são susceptíveis de produzir resultados concretos e positivos.

Se a intenção pretendida é a de que as escolas sejam, efectivamente para

todos, parece, por conseguinte, inevitável que as mesmas se transformem

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internamente - e cada uma por si - de modo a que, gradualmente, venham a

proporcionar condições estruturais e pedagógicas capazes de garantir uma

resposta satisfatoriamente qualitativa a toda e qualquer criança. Neste contexto

deverá ser rigorosamente respeitado o princípio da verdadeira igualdade de

oportunidades, o qual se afirma pela crença de que qualquer criança merece um

atendimento adequado, independentemente, das suas capacidades, cultura, raça,

ou credo. O ideal da escola inclusiva - pelas razões já expendidas e por outras, de

algum modo implícitas à sua própria natureza - configura uma empresa

irreversivelmente complexa e, consequentemente, de difícil consecução.

Efectivamente, como afirmam Tomlinson e Allan (2002) “ a mudança escolar é

complexa, imprevisível e confusa” (p. 101).

Entre nós, emerge o facto de - pela primeira vez no historial da escolaridade

portuguesa - se assistir, nos últimos anos, à tentativa de implementação de uma

verdadeira escola para todos, pelo menos a nível do ingresso (o que não é,

necessariamente, sinónimo de sucesso). Ou seja, de um modo perfeitamente

seguro, poder-se-á afirmar que a generalidade das nossas crianças tem o acesso

assegurado à escolaridade, dita, obrigatória. Este facto, é, em si próprio, motivo de

satisfação para a sociedade que o assume e o concretiza, como é o caso presente

da sociedade portuguesa.

Parecendo, assim estar garantido o patamar do acesso para todos, importa,

por conseguinte, organizar, agora, as escolas - e com as escolas - a caminhada

de aproximação ao patamar do sucesso para todos, sob pena de se defraudarem

os objectivos mais intrinsecamente profundos do ideal de uma escola para todos.

Nesta caminhada, são, pois, naturais e incontornáveis, as tensões, as

perplexidades, as hesitações e os inúmeros problemas que esta escola de massas

consubstancia, até, porque - repita-se - é a primeira vez que o sistema educativo e

as próprias escolas se confrontam com tal heterogeneidade e diversidade da

população discente.

Esta situação relativamente nova, se, por um lado gera, - e de modo

inevitável - problemas a nível organizacional e a nível pedagógico, implica -

também de modo eticamente inevitável - a (re)criação de uma nova escola, para

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 99

que aquela população sinta razoavelmente satisfeitas, as suas necessidades

educacionais, já que a escola tradicional, naturalmente, não está dimensionada

para uma resposta adequada a esta recente realidade. Ora, essa escola nova, se

se quiser que seja eficientemente responsiva às constatadas heterogeneidade e

diversidade dos seus alunos, só pode orientar-se pelo chamado modelo da escola

inclusiva, entendendo-se, esta, como uma organização educativa vocacionada

para prestar atenção pedagógica à diversidade dos alunos e, neste contexto, às

necessidades especiais dos alunos com NEE.

Esta perspectiva pressupõe, portanto, o saber lidar com grupos

heterogéneos, o conhecer e o compreender as diferenças educacionais entre os

alunos. Diferenças essas que erradicam num continuum de diversidade a qual

consubstancia uma das características mais marcantes da própria natureza do ser

humano. Por outras palavras: o ser humano pressupõe mais a diferença do que a

homogeneidade.

Esta realidade acarreta, logicamente, um posicionamento oposto às

práticas educativas centradas na homogeneidade, facto que, em si próprio, obriga

a mudanças significativas, tanto nos modos de pensar como nos modos de

actuar, instalados nalguns modos de fazer escola. Contudo, importa ter bem

presente que o eclodir dessas mudanças desejáveis não ocorre, por norma, sem o

desenvolvimento paralelo de atitudes e de processos de resistências e de conflitos

(Pastor, 1988 e Correia 2003a). Para que as mudanças em causa sejam operacionalizadas, as escolas

devem percepcionar a necessidade de considerar - diga-se mais uma vez - que

todos os alunos sejam da responsabilidade do conjunto de todos os profissionais

que, ali, exerçam a sua função. Sob esta lógica, a reestruturação seguirá o seu

curso, subordinando-se aos ideais profundos da inclusão, reutilizando, sob este

princípio, os saberes e experiências dos profissionais de educação e dos serviços

de apoio. Estes devem, pois, articular-se, entre si, de uma forma colaborativa e

convergente, a fim de organizar respostas às necessidades de todos os alunos

(MacKinon & Brown, 1994, S. Stainback & W. Stainback, 1996).

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 100

A implementação de uma efectiva e sólida cultura de colaboração entre o

pessoal educativo da mesma escola, representa um dos caminhos mais eficientes

para o desenvolvimento da educação inclusiva, como preconizam Curtis e

Safranski (1991), citados em S. Stainback e W. Stainback (1999). Correia (2003a)

é, neste aspecto, ainda mais incisivo e concreto ao defender expressamente que:

No caso da filosofia inclusiva, o papel do professor titular de turma deve conciliar-

se com o papel do professor de educação especial, com o dos pais, para que

todos eles, em colaboração, possam desenhar estratégias que promovam sucesso

escolar. (p.13)

Assim, na opinião de qualquer dos autores citados, a equipa de docentes

deverá funcionar, intencionalmente, como um grupo colaborativo, por ser este tipo

de intervenção que melhor se adequa à organização escolar, enquanto instituição

orientada para a prática da inclusão. O tipo de acção colaborativa assume, assim,

um papel de nuclear dimensão na edificação da verdadeira escola para todos. Por

essa razão, a cultura de colaboração deve ser entendida, em cada comunidade

escolar, como uma postura atitudinal que:

Encoraja docentes e discentes a provocarem ambientes de entreajuda onde a

confiança e o respeito mútuos são características essenciais que levam ao

encontro de estratégias, tal como o ensino em cooperação e aprendizagem em

cooperação, tão necessárias ao fortalecimento das áreas fortes dos alunos e à

formulação de respostas adequadas às suas necessidades. (Correia, 2003a, p. 25)

Para responder à diversidade e às exigências da sociedade actual, as

escolas deverão, gradualmente, abandonar as suas formas estandardizadas de

organização e assumirem, no seu lugar, renovados modelos de funcionamento.

Por sua vez, estes deverão ser caracterizados pela flexibilização e diferenciação

educativas para, desta forma, poderem corresponder às constantes e novas

exigências do seu envolvimento social (Apple & Beane, 1995, Lipsky & Gartner,

1996, Skrtic, 1995).

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 101

Os alunos, as práticas de ensino e o envolvimento humano, terão de estar

no âmago de todos os esforços da mudança. Estas mudanças requerem que as

necessidades, capacidades, competências e expectativas das crianças estejam na

sua base e orientem as decisões a tomar, tanto na organização como na

condução das comunidades educativas. A mudança deverá, ainda, assentar e

decorrer da análise feita na escola, sobre a forma como as crianças são, estão,

sentem e agem, em todas as suas vivências escolares e, sobretudo, no espaço da

sala de aula. O conhecimento dessas características deverá, então servir para a

promoção do desenvolvimento de estratégias que conduzam e cimentem

procedimentos de cooperação e de colaboração entre os alunos, em vez de

actividades independentes e competitivas ( Villa & Thousand, 1988).

Na óptica do proposto por Schaffner e Busweel (1996), citados em Sands,

et al. (2000), as comunidades escolares inclusivas poderão funcionar, também,

como um contexto facilitador da concepção e criação de sistemas educativos

capazes de responder de modo adequado e integrado aos dilemas com que se

debatem a educação geral e a educação especial. Schaffner e Busweel advogam,

deste modo - e à semelhança do preconizado por Correia (2003a) e já citado -

uma íntima linha de intervenção articulada entre os professores de turma e os

professores da educação especial. Esta estratégia parece, assim, configurar um

marco essencial nos caminhos da implementação prática da educação para a

inclusão.

A ideia de comunidade - enquanto conjunto de indivíduos que trabalham de

modo convergente para a consecução dos mesmos objectivos - atravessa, assim,

permanentemente, o processo global de operacionalização da escola inclusiva,

afigurando-se, em consequência, como um dos procedimentos nucleares da sua

construção. Com a assunção desta atitude, cada comunidade educativa vai

gerando, de maneira quase que natural mas intrinsecamente consciente e

intencional, dinâmicas facilitadoras da inclusão. As dinâmicas em causa poderão,

por exemplo, assentar na criação de círculos de amigos e de outros enfoques de

relação sócio-emocional, orientados para o desenvolvimento profundo de uma

interacção social entre os alunos e docentes e cimentada por procedimentos

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 102

mútuos de amizade, atenção, confiança e respeito (S. Stainback & W. Stainback,

1999).

Juntamente com os profissionais escolares, os técnicos de apoio, as

famílias, os pares e os membros da comunidade são recursos activamente

necessários para a organização de respostas às necessidades e anseios dos

alunos. Paralelamente, deverá ser tido em conta que as comunidades escolares

inclusivas são organizadas e geridas através de estruturas colegiais de tomada de

decisão, substituindo, assim, uma certa rigidez hierárquica que tradicionalmente

se verifica. Paralelamente, os verdadeiros interesses, necessidades e expectativas

dos alunos devem consubstanciar o fundamento, tanto para a tomada de decisões

colaborativas como para a planificação e consecução de processos inovadores de

resolução de problemas (Sands et al., 2000).

Aprofundando-se, por outro lado, as ideias de Skrtic (1995) citado em

Sands et al. (2000), infere-se que as escolas inclusivas terão de adoptar

esquemas organizacionais de funcionamento, no interior dos quais, os seus

membros desenvolverão, de maneira interdependente, interactiva e convergente,

estratégias de colaboração multidisciplinar. Desta forma, os diversos agentes

educativos estarão em melhores condições para, em conjunto, equacionarem e

resolverem os problemas práticos decorrentes das necessidades educativas

especiais de que são portadores determinados alunos.

Na mesma linha de pensamento emergem os contributos de S. Stainback e

W. StainbacK (1990), pois que postulam o princípio de que a estratégia crucial das

escolas consiste em disponibilizar um sistema facilitador da inclusão, isto é,

vocacionado e estruturado de modo colaborativo para satisfazer as necessidades

de todo e qualquer aluno. Desta forma, a preocupação e a acção convergentes de

todos os profissionais centra-se no objectivo primacial de promover o êxito

educativo e escolar de cada um dos alunos atendidos e, por conseguinte, também,

dos alunos com NEE.

A adopção daqueles princípios implica, naturalmente, a apropriação, por

parte dos profissionais de educação, de um determinado conjunto de saberes e de

saberes-fazer, sensivelmente diferentes dos que habitualmente se possuem e que

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 103

são postos em acção nas práticas tradicionais. Em alternativa a tais práticas, as

escolas ao assumirem a implementação de estratégias inclusivas, terão, então, de

contemplar, paralelamente, a necessidade de introduzirem novos papéis e

funções, nas práticas habituais de todos quantos constituem a sua comunidade

educativa: professores, especialistas de apoio, famílias, alunos e outros membros

da comunidade envolvente (Sands et al., 2000).

Em qualquer modelo de educação escolar, a sala de aula consubstancia,

por sua vez, uma unidade de importância crucial, facto que, naturalmente, se

aplicará ao caso da educação inclusiva. Portanto, naqueles espaços e tempos da

sala de aula afigura-se determinante que as turmas sejam organizadas de forma

heterogénea, devendo prevalecer o primado do apoio mútuo entre professores e

alunos e destes entre si, como preconizam S. Stainback e W. Stainback (1990).

Deste modo, a diversidade é valorizada, acreditando-se na força e na riqueza do

conjunto das diferenças presentes, activando-se o potencial dessa diversidade

para proporcionar maiores oportunidades e melhores estratégias de

aprendizagem, como descreve, de forma magistral, Robert Barth (1988), citado

por S. Stainback e W. Stainback (1999), ao proclamar a ideia de que o

importante das pessoas - e das escolas - é o diferente e não o igual, como de

resto tem sido objecto de realce noutros pontos do presente trabalho.

Alcançar os níveis desejados de equidade implica, assim, desenvolver a

transformação da cultura de escola em direcção a uma estrutura pedagógica que

respeite e eduque na diversidade e que esta seja entendida como uma forma de

enriquecimento e, consequentemente, como recurso e fonte de inovação e de

aperfeiçoamento da qualidade educacional. Trata-se, necessariamente, repita-se,

de um tarefa complexa, a qual passa por tentar encontrar um delicado equilíbrio

entre o oferecer uma resposta adequada a todos os alunos, e o respeitar, em

simultâneo, as suas características pessoais, bem como as suas necessidades

individuais de aprendizagem

Uma das expressões mais intrínsecas do conceito de inclusão parece

assentar, significativamente, no sentimento de pertença de qualquer aluno, ao seu

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 104

grupo de referência3, considerando-se, este - a nível da escola - como o

grupo/turma. Nesta perspectiva, afigura-se essencial que as dinâmicas de

interacção educativa privilegiem - e se centrem - nesta realidade microssocial,

visando que a mesma funcione sob a forma de comunidade e não como um mero

somatório de indivíduos. Sob esta concepção, as actividades em turma tenderão

a promover a cooperação e a colaboração entre companheiros, dando, assim,

origem a pequenas comunidades de entreajuda, cujas dinâmicas facilitem a

promoção dos níveis motivacionais. Procedendo-se desta forma intenta-se a

viabilização de ambientes propícios ao ensino, em sala de aula, de alunos com

capacidades distintas e em particular dos alunos com NEE (Slavin 1989, citado em

Wang,1989).

A inclusão educacional implica, então, a emergência de aulas que

promovam redes naturais de apoio entre os próprios alunos, mediante o recurso a

estratégias diferenciadas de interacção e de ajuda mútua, as quais poderão ser

concretizadas, nomeadamente, através de actividades desenvolvidas em parceria

entre colegas. Neste contexto, os círculos de amigos, os processos de

aprendizagem cooperativa, bem como outras técnicas facilitadoras do

estabelecimento de relações naturais, são procedimentos imprescindíveis no seio

de cada turma.

As dinâmicas de cooperação e de colaboração assumem, pois, - insista-se -

um papel fundamental na concepção, organização e desenvolvimento prático das

escolas inclusivas. Reforça-se, deste modo, a ideia de que para além da prática

destas estratégias - por parte dos alunos nas aulas e noutros espaços - sejam,

também, as mesmas, alvo de prática real entre os docentes e os restantes

profissionais de cada escola, entre estes e as famílias e, finalmente, por todos no

interior de cada comunidade local (S. Stainback & W. Stainback, 1990).

Em causa parece estar, inevitavelmente, um processo de significativa e

profunda mudança organizacional. Algo que configura uma empresa

3 Kauffman (1995) revela uma posição não coincidente. Efectivamente, este autor preconiza a ideia de que se,

de facto, se quer preparar as crianças para viver no mundo adulto, então, será melhor proporcionar-lhes a sua

afiliação a diferentes grupos e que aprendam a movimentar-se, adequadamente, de uns para outros.

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efectivamente difícil, uma vez que se trata de mudanças a nível da organização

escolar, para a qual, como afirmam Tomlinson e Allan (2002) “ nunca alguém

apresentou um plano infalível que a implementasse” p. 101).

A investigação, como se poderá constatar ao longo do presente trabalho, é

pródiga na produção de informação sobre a implementação de mudanças em

contexto escolar. Neste âmbito, por exemplo, Tomlinson e Allan (idem)

inventariam nove princípios que são enunciados como estratégias a mobilizar para

que os resultados da mudança de uma organização escolar se aproximem dos

efeitos esperados. Os princípios apontados, pelas autoras referenciadas, são os

seguintes:

- A mudança é imperativa nas turmas de hoje.

- A mudança nas escolas deve ser polarizada nas práticas de intervenção

pedagógica que se desenvolvem na sala de aula.

- Para que as escolas se transformem naquilo que deveriam ser, necessitamos de

uma mudança de natureza sistémica.

- A mudança é difícil, lenta e incerta.

- As mudanças de natureza sistémica passam pelo modo como se lidera e se

administram as escolas.

- Para mudar as escolas temos de mudar a cultura das escolas.

- As obras daqueles que detêm responsabilidades neste campo fala mais alto do

que as suas palavras.

- Os esforços da mudança necessitam de estar relacionados com mudanças mais

amplas.

- Os responsáveis pelas mudanças deverão promover uma orientação baseada

nos resultados. (p. 57)

Tomlinson e Allan enfatizam, portanto, a necessidade da mudança das

escolas, ao mesmo tempo que, neste contexto, indiciam que essas mudanças não

deverão ser parciais e esparsas, mas, sim, sistémicas. Alertam, também, para o

facto de que neste processo de transformação não deverão ser esperadas

facilidades. Finalmente, as autoras em questão, salientam, neste domínio, a

importância do papel das lideranças escolares, bem como a conveniência em

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relacionar a rumo das mudanças com a natureza dos resultados escolares dos

alunos, condição que se julga ser de pertinente relevância.

4.2 A Pertinência da Reorganização Curricular do Ensino Básico

Em 18 de Janeiro de 2001 é publicado o Decreto-Lei n.º 6/2001, cujo

conteúdo integra e pressupõe uma filosofia educativa de raro alcance e que

aparenta o mérito de apontar as linhas gerais de uma reorganização curricular

capaz de enunciar os princípios a introduzir nas práticas organizacionais e

pedagógicas das escolas, para que estas se aproximem das respostas às

necessidades que as exigências sociais, tecnológicas e culturais dos tempos de

hoje, impõem às novas gerações. A peça legislativa em referência carreia,

também, preocupações relativas à questão da inclusão, como, aliás, o próprio

primeiro parágrafo do seu preâmbulo o testemunha, ao referir que “implica

conceder uma particular atenção às situações de exclusão”. Por estas razões

considerou-se oportuno enquadrar no âmbito deste projecto de investigação-

acção, a legislação em causa.

Por outro lado, a publicação do Decreto-Lei n.º 6/2001, tem vindo a

provocar uma generalizada preocupação no meio escolar, uma vez que introduz,

de forma obrigatória, sensíveis alterações a nível de organização e de

desenvolvimento curricular. Esta preocupação é, aliás, perfeitamente justificada

dado que a esmagadora maioria dos professores e dos próprios órgãos de gestão

parecem não dispor da preparação necessária para poderem dar cumprimento, de

maneira satisfatória, ao postulado naquela legislação. Esta situação verificou-se,

naturalmente, na escola implicada no presente estudo, pelo que, também por este

motivo, se optou por enquadrar aquela reforma curricular neste projecto de

investigação-acção, explorando-se, a mesma, numa perspectiva teórica e prática e

subordinada aos ideais da escola inclusiva.

Uma das ideias mais prementes do Decreto-Lei n.º 6/2001, centra-se,

nomeadamente, na necessidade de serem, a curto prazo, desenvolvidos esforços

pelas comunidades educativas do Ensino Básico, no sentido de se conseguir “uma

maior qualidade das aprendizagens” (preâmbulo, parágrafo 2.º). Esta preocupação

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remete, sem dúvida, para uma finalidade que certamente merecerá a unanimidade

de concordância por parte da generalidade dos profissionais de educação. O que

se afigura, no entanto, importante é que esse desejado acréscimo de qualidade

seja perspectivado em relação a todo e qualquer aluno, independentemente das

suas capacidades e limitações, a fim de que o ideal da educação inclusiva se

afirme, também, na implementação desta reorganização curricular.

No seu conteúdo preambular, o decreto-lei em análise esclarece que o seu

próprio aparecimento decorreu de um processo longo e continuado de trabalho

com as escolas, destacando, neste contexto, o projecto de reflexão participada

sobre os currículos do ensino básico. Na mesma secção é, ainda, realçado que “

após o diagnóstico, foram lançadas medidas de combate à exclusão no âmbito do

ensino básico, nomeadamente, os currículos alternativos” (parágrafo 4.º). Este

excerto atesta e reforça a referida intenção inclusiva que subjaz à legislação em

análise, facto que justifica o alimentar da esperança de que o sistema educativo

português esteja sensível a esta problemática e que preconize, em consequência,

a adopção de medidas que combatam a exclusão.

Julga-se, oportuno entretanto, aqui, expressar as dúvidas que se julgam

inerentes à medida mencionada - currículos alternativos - nomeadamente, no que

concerne ao facto de, a mesma, poder ser considerada, ou não, uma resposta

educativa intrinsecamente inclusiva. Efectivamente, se se poderão reconhecer

algumas virtualidades no que se refere à prevenção da exclusão escolar, já o

mesmo não se poderá, eventualmente, afirmar no que respeita à inclusão

curricular, uma vez que a medida em causa assenta, precisamente, no

pressuposto de um currículo alternativo o qual, pela sua natureza, não possui o

atributo da equidade dentro da organização curricular do ensino básico, antes se

caracteriza por ser um itinerário de segunda oportunidade especialmente

concebido para alunos que de um modo, ou de outro, não obtiveram sucesso no

contexto curricular geral. Não sendo, portanto, uma via de diversificação curricular,

integrada - a nível de primeira oportunidade - no currículo, geral e aberta para todo

e qualquer aluno, cujo estilo de aprendizagem aconselhe a sua frequência, os

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actuais currículos alternativos, parecem, pois, configurar uma estratégia curricular

não autenticamente inclusiva.

Preconizando, entretanto, a flexibilidade, como uma das traves nucleares

da reorganização curricular proposta, o decreto-lei estabelece algumas premissas

inovadoras - pelo menos entre nós - as quais poderão ter um impacto qualitativo a

nível das aprendizagens dos alunos. Esses aspectos inovadores são,

designadamente, o projecto curricular de escola - o qual tendo como referência o

currículo nacional, visa, então, adequá-lo ao contexto de cada escola - e o projecto

curricular de turma, o qual deverá ser elaborado e desenvolvido, em função do

contexto de cada turma, ao mesmo tempo que se subordina aos princípios

orientadores estabelecidos no respectivo projecto curricular de escola. Pela

pertinência que se julga terem, no campo da educação inclusiva, aqueles

instrumentos de gestão curricular serão alvo de tratamento específico no presente

trabalho.

As referências aos valores da pedagogia de inclusão são, definitivamente,

uma preocupação constante na lei em análise. Nesta perspectiva, salienta-se,

ainda - pela sua relevância - o conteúdo inserto na alínea i) do seu artigo 3.º, ao

enunciar - como um dos princípios orientadores da reorganização curricular - a “

diversidade de ofertas educativas, tomando em consideração as necessidades

dos alunos, por forma a assegurar que todos possam desenvolver as

competências essenciais”.

Em termos de organização curricular, propriamente dita, o Decreto-Lei n.º

6/2001, no seu artigo 5.º, formaliza a criação de novas áreas curriculares,

concretamente, a Área de Projecto, o Estudo Acompanhado e a Formação Cívica.

Deste modo, é introduzida no Ensino Básico português uma nova visão curricular,

a qual vai ao encontro, de algum modo, das novas concepções de currículo. Estas

privilegiam - conforme resume Smith (1989) - não só a aquisição de

conhecimentos, mas também o aprender a aprender, bem como o aprender a

pensar. Efectivamente, na sua globalidade, a estrutura curricular agora proposta

na legislação em apreço, enquadra-se, de modo claro, na referida concepção

curricular

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Conjugando-se, assim - e de modo sintético - as referências ao combate à

exclusão, com os propósitos subjacentes à implementação das novas áreas

curriculares, julga-se, por conseguinte, ser de entender que o Decreto-Lei n.º

6/2001 favorece a emergência de duas grandes linhas de orientação, distintas

mas interactivas entre si: uma centrada na procura de encontrar processos

qualitativos de gerir a diversidade da actual população escolar e, a outra,

vocacionada para o desenvolvimento da formação integral de cada aluno, numa

perspectiva potenciadora do desenvolvimento da capacidade de aprendizagem

autónoma e permanente ao longo da vida.

Um dos pontos mais frágeis do articulado desta lei, parece ter sido

reservado, precisamente, à componente da educação especial, pelo que se

afigura transparecer da leitura do artigo 10.º, o qual contém exactamente a

matéria que regulamenta a frequência escolar dos alunos com necessidades

educativas especiais. Assim, no ponto 1. do artigo referido, pode ler-se: “ Aos

alunos com necessidades educativas especiais de carácter permanente é

oferecida a modalidade de educação especial”. Ora, ao conferir, portanto, o

estatuto de modalidade à educação especial, a lei parece atribuir uma certa

autonomia a este tipo de resposta. Em consequência, este facto pode, em termos

práticos, induzir as escolas e os professores a conceptualizarem e, por

conseguinte, a operacionalizarem processos de atendimento de tal ordem

específicos, aos alunos com necessidades educativas especiais, que,

eventualmente, poderão recriar e reforçar os efeitos estigmatizantes da

etiquetagem. Paralelamente, este princípio legal, pelo seu significado, pode, de

forma mais ou menos directa, aumentar o recurso ao encaminhamento daqueles

alunos para as instituições especializadas, inibindo, portanto, as suas

possibilidades de inclusão.

Por outro lado, ao restringir o apoio da educação especial aos alunos com

necessidades educativas especiais de carácter permanente, o sistema está,

provavelmente, a descurar um número significativo de alunos que, conquanto não

sejam portadores de problemas de natureza permanente, são, contudo, alunos

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que se debatem com problemáticas específicas e que de alguma forma indiciam

dificuldades de aprendizagem.

Por conseguinte, este modo de colocar a questão, em termos legislativos,

pode, pura e simplesmente, transformar-se num factor facilitador do aumento dos

já elevados índices de insucesso escolar no âmbito da escolaridade obrigatória,

contrariando, por conseguinte e de forma irreversível, os próprios objectivos

fundamentais da reforma curricular em apreço, como vem alertando Miranda

Correia, em encontros de professores e em escritos diversos.

Nesta óptica, a própria intenção inclusiva - que como já se realçou é,

explicitamente, objecto de preocupação da reorganização curricular agora lançada

- parece, assim, estar igualmente comprometida. Este facto traduz, então, a

existência de uma lógica perniciosamente contraditória no conteúdo da legislação

em apreço.

Aprofundando-se, ainda a questão decorrente de o decreto-lei considerar a

educação especial como uma modalidade, tal, pressupõe - como já foi ,

anteriormente, indiciado - algo conotado com modo, ou, maneira, facto que induz,

portanto, a existência de uma forma educacional singular e, por conseguinte, com

uma identidade própria e distinta da educação geral (Correia, 2001). A ser assim,

este decreto-lei faz meia volta na evolução do percurso da história do atendimento

educacional dos alunos com necessidades educativas especiais, situando-se nos

procedimentos inerentes aos primórdios da fase da integração, tempo que, em

Portugal se pode situar nos inícios da década de setenta do século XX. Logo - e

sem recurso a quaisquer figuras de ordem mais ou menos metafórica - pode-se

dizer, consequentemente, que desta maneira se andou, muito e depressa ... para

trás!

Retornando-se, por outro lado, ao facto de aquela legislação clarificar, de

modo explícito, o âmbito dos alunos com necessidades educativas especiais de

carácter permanente, o Decreto-Lei n.º 6/2001 inclui, nesta categoria,

efectivamente, apenas os alunos que são portadores de incapacidades

decorrentes de “deficiências de ordem sensorial, motora ou mental, de

perturbações da fala e da linguagem, de perturbações graves da personalidade ou

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do comportamento ou graves problemas de saúde” ( artigo 10.º, ponto 2.). Desta

forma - e como foi, também, já assinalado - parece não estarem simplesmente

contemplados, os muitos alunos com dificuldades de aprendizagem que são,

actualmente, utentes do sistema como alerta assertivamente Correia (2001). Tal

(preocupante) conclusão infere-se, tendo em conta, por um lado, a identificação

que o próprio Decreto-Lei apresenta, em relação aos alunos com necessidades

educativas especiais e, por outro, o conceito inerente aos alunos portadores de

dificuldades específicas de aprendizagem, proposto na Lei Pública Americana, P.

L. 94-142 e citada por Correia (1997):

Dificuldade de aprendizagem específica significa uma perturbação num ou mais

dos processos psicológicos básicos envolvidos na compreensão ou utilização da

linguagem falada ou escrita que pode manifestar-se por uma aptidão imperfeita de

escutar, pensar, ler, escrever, soletrar ou fazer cálculos matemáticos. O termo

inclui condições como deficiências perceptivas, lesão cerebral, disfunção cerebral

mínima, dislexia e afasia de desenvolvimento. O termo não engloba as crianças

que têm problemas de aprendizagem resultantes principalmente de deficiência

visual, auditiva ou motora, de deficiência mental, de perturbação emocional ou de

desvantagens ambientais, culturais ou económicas. (p. 55)

Confrontando-se, assim, os dados em equação, parece ser, portanto de

concluir que os alunos com dificuldades específicas de aprendizagem não estão

contemplados no universo de alunos a quem é oferecida a modalidade de

educação especial. Excluídos, então, daquele tipo de apoio afigura-se ser muito

provável que esta situação possa vir a ser pura e simplesmente indutora do

aumento do insucesso escolar dos alunos em causa. É, portanto, devido a

princípios desta natureza que a legislação em causa parece prenunciar um

inquietante retrocesso no âmbito da educação especial. Está-se, assim, perante

uma realidade legislativa em que quer o conceito de educação especial quer o

conceito de alunos com NEE parecem estar deficientemente concebidos.

Claro que no Decreto-Lei em análise não deixa de estar presente um

determinado conceito de educação especial, ainda que muito discutível como se

disse. Trata-se, assim, de um conceito que está expressamente conotado com

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 112

modalidade e que, para além disso, aparenta não aplicar-se aos alunos com

dificuldades de aprendizagem.

Perante este cenário, importa, ainda, reflectir nos dados numéricos em jogo,

números que, no caso, não são identidades abstractas, antes se referem a

pessoas concretas: crianças e jovens. Assim, o autor antes citado (Correia, 1997)

indica que, do universo dos alunos com problemas escolares, 48% se integram na

categoria das dificuldades específicas de aprendizagem. Logo - e sem se sair da

realidade pura e crua dos dados matemáticos - há que concluir que praticamente

metade dos alunos que revelam dificuldades no seu percurso escolar, não são

elegíveis, segundo a letra da lei, para serem alvo da disponibilização dos serviços

a prestar pela educação especial.

Face ao exposto, julga-se, então, haver matéria e fundamentos para uma

profunda reflexão sobre a natureza das possíveis implicações práticas do decreto-

lei, sobretudo, no que toca à construção e - se possível - generalização de escolas

inclusivas. Daí o entender-se que, pela natureza do presente trabalho, esta

questão merece, aqui, uma atenção e uma reflexão pormenorizadas. Recuperando-se, entretanto, outras linhas de força cruciais da legislação

em apreço - nomeadamente, no que respeita à gestão qualitativa da diversidade e

à formação integral do aluno - emerge, com evidente clareza, a necessidade de

serem privilegiadas estratégias de ensino-aprendizagem, mormente nas salas de

aula, que possibilitem a consecução efectiva daquelas metas educativas. Caso

contrário, as escolas não corresponderão às expectativas geradas em torno do

decreto-lei e, por conseguinte, não serão satisfeitas as necessidades das crianças

e dos jovens de hoje, em ordem a, por sua vez, serem capazes de uma integração

activa, crítica e responsável, na vida social contemporânea e futura cujas

exigências são cada vez mais profundas.

Em termos gerais, a intenção subjacente à publicação da legislação em

questão, parece configurar um espectro globalmente positivo, já que postula vários

procedimentos que, no seu todo, visam um ajustamento curricular e metodológico

às novas e prementes exigências das condições sócio-culturais em que se

envolvem e desenvolvem as sociedades modernas. Contudo, parece haver

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fundamentos para se considerar esta mudança curricular, como algo que fica a

meio caminho, pois que a própria legislação em apreço remete alguns dos seus

pontos para a organização curricular anteriormente vigente, facto que sugere, uma

visão fragmentada, desarticulada e algo incoerente do próprio currículo nacional.

Fundamenta-se, assim, a crença de ser necessário, em legislação futura,

conceder maior profundidade à reorganização curricular em questão, pois, assim,

como está, aparenta ser - como costuma, nestes casos, referir Rudduck, (1991) -

como que uma inovação desprovida de mudança.

4.3 Uma Proposta de Modelo de Escola Inclusiva

O desenvolvimento operacional do presente trabalho de investigação-acção

pressupõe, necessariamente, a configuração de um modelo de escola inclusiva,

tão exaustivo quanto possível e capaz de funcionar ao longo do mesmo, como um

marco de referência simultaneamente, teórico, metódico e sistémico. Trata-se -

adiante-se, desde já - de uma tarefa complexa e eivada de inevitáveis

dificuldades, sobretudo se se tiver em conta de que não são, até ao momento,

conhecidas, em Portugal, quaisquer experiências institucionais que se possam

considerar como exemplos paradigmáticos e pragmáticos de uma escola

intencionalmente organizada para a consecução prática do modelo de educação

inclusiva. Assim, esta tentativa de proposta de um modelo de escola inclusiva

emerge, naturalmente, como um trabalho de natureza exploratória e cuja

configuração estrutural é produto de uma análise atenta e metódica do relato de

experiências pontuais, da investigação realizada, nesta área, por especialistas

nacionais e estrangeiros e da própria cultura profissional pessoal construída ao

longo de mais de quatro décadas de exercício laboral.

Com base nos critérios antes enunciados, e tendo como inspiração nuclear

os contributos, neste âmbito, concebidos por Correia (2001, 2003a e 2003b), o

desenho do modelo de escola inclusiva adoptado, como referência, para o

presente projecto de investigação-acção, sustenta-se e estrutura-se,

essencialmente, nas dimensões constantes na Figura 1:

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• Cultura organizacional de escola

• Projecto educativo de escola

• Projecto curricular de escola (por adaptação do preconizado no Decreto-

Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro)

• Equipa de planificação inclusiva

• Projectos curriculares de turma (igualmente por adaptação do preconizado

no Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro)

• Equipa de programação educacional individualizada

• Educação especial e apoio educativo

• Acção auxiliar educativa

• Gestão da sala de aula

• Envolvimento parental

Figura 1. Dimensões integrantes do modelo de escola inclusiva adoptado.

Sob esta estrutura pretende-se, então, delinear os traços organizacionais,

funcionais e pedagógicos que, no seu todo, possam consubstanciar um projecto

de escola vocacionado para o desenvolvimento prático da inclusão sócio-

educativa, protagonizando, por conseguinte, o pretendido modelo de escola

inclusiva. Por razões de natureza metodológica, cada um dos aspectos

mencionados será considerado como categoria de análise do modelo de escola

inclusiva assim estruturado.

Neste contexto interessa relevar que as variáveis inventariadas não

deixarão de ter, cada uma por si, influências diferenciadas, as quais, no seu todo,

concorrerão, contudo, para a edificação de uma organização escolar inclusiva.

Consequentemente, as referidas dimensões serão assumidas como elementos

referenciais para a recolha de informação teórica e de campo. Naturalmente que

as ditas dimensões serão, ainda, a referência de base para estruturar a

planificação da futura intervenção no terreno.

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Wang (1997) refere, a este propósito, que num estudo por si realizado, com

a colaboração de Haertel e de Walberg - e concluído em 1993 - procurou,

precisamente, recensear quais as variáveis que revelam um maior grau de

influência na criação de organizações escolares orientadas para a educação

inclusiva, essencialmente, a nível da sala de aula. Tal indica, portanto, que Wang

e os seus colaboradores se preocuparam, essencialmente, com as variáveis que

mais de perto determinam o grau de eficiência e de inclusão do processo de

ensino-aprendizagem. O estudo em análise, demonstrou que as variáveis

chamadas de influências directas são as que, sem dúvida, produzem maior efeito.

Explicitando quais as variáveis que designam por influências directas, Wang e

seus colaboradores referem que neste contexto se incluem: as capacidades

cognitivas, a motivação, o comportamento dos alunos, a organização da sala de

aula, o clima relacional e as interacções entre os alunos e o professor; a

quantidade e a qualidade do ensino e o apoio dos pais, nomeadamente no que

concerne à ajuda na aprendizagem em casa.

Outras variáveis que os autores em questão consideram como variáveis de

influência indirecta, são igualmente elencadas, porém, com a indicação de que o

seu concurso para a educação inclusiva, embora importante, se situa num grau de

menor impacto do que o ocorrido com as chamadas variáveis de influência directa.

Para Wang, as variáveis de influência indirecta, são: a cultura da escola, a tomada

de decisões pelo professor/administrador e as influências comunitárias.

A autora intenciona, assim, evidenciar que as possíveis variáveis que

concorrem para a implementação de uma escola inclusiva, têm, para este efeito,

um grau de influência diferenciada, entre si. Analisando-se os resultados da

investigação aportados por Margaret Wang, julga-se, então, ser de concluir que a

sala de aula e as dinâmicas de ensino-aprendizagem, desenvolvidas naquele

espaço, configuram o núcleo de referência crucial de todo o projecto de uma

escola inclusiva. Ora, por se concordar com aquela opinião, o espaço e as

dinâmicas da sala de aula merecerão, neste trabalho, uma atenção julgada

correspondente à importância que detêm no contexto em estudo.

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Após definidas as categorias de análise (ou seja, as dimensões) de

construção do modelo, aquelas serviram - como já se referiu - de alvo da

referência nuclear a ter em consideração no desenvolvimento de todas as fases

do projecto, desde a revisão da literatura à planificação da intervenção, passando

pela recolha de informação junto da escola estudada. Deste modo pretende-se a

identificação fundamentada das condições científicas e metodológicas inerentes à

organização securizante de uma escola inclusiva. Ao mesmo tempo visa-se a

estruturação de um plano de transformação de uma comunidade escolar concreta

que a torne competente para proporcionar uma dinâmica educativa capaz de

assegurar uma resposta de qualidade a todos e a cada um dos seus alunos reais.

Julga-se, no entanto, ser minimamente necessário ter em conta as cautelas

e reservas que alguns investigadores têm evidenciado, relativamente às condições

e requisitos que a activação das mudanças em causa pressupõem, como, neste

contexto, é referenciado por Correia (1997):

Estamos convictos de que não basta criar um sistema de boas vontades, de bons

relacionamentos e que preveja uma formação adequada. Há também que considerar

que qualquer tipo de mudança deve ser compreendida e desejada, não só por

educadores, professores e gestores escolares, mas também por pais e cidadãos em

geral. (p. 41)

Logo, prefigura-se cautelar ter em consideração a necessidade de se

percepcionar se, muito particularmente, a comunidade envolvente está desperta

para os valores da inclusão e se adere a tal. Como se demonstrará,

oportunamente, a escola que serviu de alvo desta investigação revela uma história

de adesão e de operacionalização de alguns dos princípios essenciais do ideal

inclusivo. Caso contrário, muito possivelmente, todas as intenções de mudança

iriam esbarrar, de modo sistemático, com a indiferença ecológica local, ou até

mesmo, com atitudes e acções de oposição.

Como já foi amplamente referido, a questão do direito à inclusão escolar

está, já, no nosso país, perfeitamente assumida, adoptando-se, sem reservas -

pelo menos formalmente - o princípio da igualdade de oportunidades e, por

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consequência, a consagração do direito de toda e qualquer criança realizar a sua

escolaridade junto dos seus pares de referência. Por isso perfilha-se como

adquirido o pressuposto de que o cidadão em geral conhece e adere aos

princípios da educação inclusiva, salvaguardando-se, deste modo, a preocupação

que, a este nível, é expressa por Correia (1997) e da qual se deu, anteriormente,

testemunho.

Admitindo-se por consequência, que a sociedade actual deseja que a

educação se desenvolva em contextos facilitadores da consecução dos princípios

e dos valores da inclusão, importa, decorrentemente que, cada escola, passe a

integrar, no seu projecto de intervenção educativa, a intenção explícita de dar

implementação concreta àqueles princípios. Assim, a respectiva equipa educativa

deverá elaborar, de modo participado e consensual, o seu ideário, entendendo-se,

aqui, por tal, a identificação - e exposição pública - de um conjunto sintético, mas

preciso, de orientações estratégicas que norteiem a acção pedagógica dos

professores, pessoal auxiliar, alunos e famílias, em direcção à inclusão.

5 As Dimensões de um Projecto de Escola Inclusiva

Prefigurando-se conveniente, do ponto de vista lógico, estruturar-se o

modelo em apreço, a partir de cada um dos parâmetros enunciados, parte-se,

então, para esse processo, indicando-se, sectorialmente, os componentes tidos

como mais adequados ao fim em causa, sem se perder de vista a lógica de

conjunto. Para tal, permanece, em cada momento, a preocupação de que, o

contributo interactivo e complementar de cada um dos componentes

seleccionados, nos diferentes parâmetros, deverá concorrer, de maneira

convergente e objectiva, para a construção gradual e efectiva do modelo de escola

inclusiva, tido como referencial. Nesta linha de pensamento, julgou-se pertinente

recolher e organizar informação a partir, quer do conteúdo das peças legislativas

que consagram o direito à igualdade de oportunidades educativas, quer dos

resultado produzidos pela investigação e constante na literatura de incidência.

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5.1 A Cultura Organizacional de Escola

Parece lógico inferir-se que a construção de uma escola inclusiva

pressupõe a implementação de um adequado tipo de cultura organizacional,

conforme e decorrente de determinados princípios, sob pena - em caso contrário -

de emergirem contradições internas que gerem constrangimentos irreversíveis à

concretização dos ideais da inclusão. Logo, a procura da consolidação de uma

dada cultura organizacional é, pois, um elemento de importância decisiva no

contexto em apreço.

Para uma compreensão operacional da noção de cultura organizacional de

escola, julga-se necessário estabelecer para a mesma, alguns parâmetros

relacionados com a dinâmica organizativa e funcional da instituição escolar, os

quais no seu conjunto, poderão contribuir para a desejada clarificação. Pela sua

pertinência, recorre-se, neste aspecto, aos dados aportados por Antúnez e Gairín

(1990) que consideram a escola como um grupo social cujos elementos funcionam

em vertentes diversas mas com uma finalidade convergente. Como variáveis

essenciais desse funcionamento, os autores mencionados identificam as

seguintes:

• Uma estrutura organizacional, mais, ou menos, formal;

• Um sistema de comunicação e de coordenação;

• Uma interacção recíproca com o meio envolvente;

• Um conjunto de actividades instrumentais desenvolvido em ordem a dar

consecução a determinados objectivos.

A análise dos dados fornecidos por Antúnez e Gairín, parece indiciar a

conotação de uma escola com uma organização de pessoas, localizada num

determinado espaço físico e que actua e interactua no sentido de dar cumprimento

aos objectivos inerentes à sua criação. Sendo que, por norma, os objectivos em

questão não se prendem, apenas, com o processo de ensino-aprendizagem, não

residirá, portanto, na sala de aula a especificidade da cultura organizacional de

cada escola. Esta, antes se identificará, pelo sistema de valores que cada um

daqueles grupos sociais adoptou, explícita ou implicitamente, o qual imprime, ou

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acrescenta, determinadas atitudes e práticas à acção quotidiana dos membros de

cada organização escolar concreta. Desta forma, é a natureza deste conjunto

específico de atitudes e de práticas que permite fundamentar a formulação de

juízos, sobre, por exemplo, o grau de aproximação de uma dada escola aos ideais

da escola inclusiva.

Neste contexto, afigura-se paradigmático o que Wang (1998) afirma ao

referir que responder, de modo adequado às necessidades educativas especiais,

na escola regular, implica muito mais do que abrir as suas portas e admitir todas

as crianças, pois que exige uma disponibilização total e radical do que todas as

escolas têm para oferecer a todos os seus alunos. Ou seja, a resposta adequada

a todo e qualquer aluno em geral, e em especial aos alunos com NEE, pressupõe

um determinado tipo de organização e funcionamento da escola, ou seja, um certo

padrão de cultura organizacional.

Porém, o conceito de cultura parece carrear bastantes dificuldades no que

respeita à sua definição. Importando, contudo, avançar-se com uma ideia que

represente o que se pode entender por cultura organizacional, julga-se adequado,

a adopção do que, sobre o conceito em questão, sugere Schein (1985), citado em

Ainscow (1997). Assim, a cultura organizacional define-se como “um nível mais

profundo de conceitos e de crenças que são partilhados pelos membros da

organização, actuando a nível inconsciente na definição que a organização faz de

si própria e sobre o ambiente em que se situa” (p. 21). Nesta concepção, a cultura

organizacional4 parece, pois, assentar na partilha de determinadas crenças e

conceitos, os quais, de forma não explícita, vão contribuindo para a criação de

uma afiliação de cada um dos membros da organização aos valores inerentes aos

referidos conceitos e crenças, tendendo a que as práticas, ali levadas a cabo,

visem a prossecução concreta dos valores assim assumidos.

4 Rossman, Corbertt e Firestone (1988) remetem a ideia de cultura escolar para a existência de um conjunto

de expectativas construídas e partilhadas pelos elementos de cada escola, em relação tanto ao que esta é,

como ao que deve ser.

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Crenças5, conceitos e práticas, parecem, por conseguinte, configurar alguns

dos elementos nucleares integrantes da cultura organizacional. No caso vertente,

importa, então, que os mesmos se estribem, de maneira convergente, no ideal da

inclusão.

Ora, de acordo com um número significativo de autores (S.Stainback & W.

Stainback, 1996; 1999, Wang, 1998, Vlachou, 1999, Correia, 1997, Nielsen, 1999,

Ainscow, 1995 e Sands et al., 2000) a cooperação profissional no interior da

equipa educativa do estabelecimento de ensino, é um requisito indispensável a

preencher na respectiva cultura organizacional para que esta se subordine aos

valores da inclusão. Tal pressupõe, por conseguinte, que os diversos elementos

de uma escola orientada por e para aqueles valores, conceptualizem as

estratégias cooperativas como uma via fundamental para a sua consecução e,

consequentemente, as integrem assumida e eficientemente no seu quotidiano

profissional

Porém, a componente organizacional só poderá revelar eficácia nos seus

efeitos operativos se, a mesma, decorrer da assunção reflectida e compreendida,

por parte dos profissionais envolvidos, de uma profunda e activa atitude de crença

nos valores intrínsecos da inclusão. Efectivamente, esta questão consubstancia

uma dimensão incontornável nos projectos de edificação de uma comunidade

escolar inclusiva, parecendo, até, bastante fundamentada, a ideia de que o êxito

de toda a intenção inclusiva estará irremediavelmente dependente da existência

prévia e consolidada da atitude em causa.

Julga-se, portanto, que a inclusão está dependente, crucialmente, da

verificação de um determinado pressuposto atitudinal, o qual, neste caso, se

identifica com a crença nos valores que lhe são inerentes. Tal permite, então,

admitir que as mudanças de uma organização escolar serão, certamente, melhor

conseguidas - como refere RudducK (1991) - se assentarem mais na percepção

5 Como corroboram Correia e Serrano, J. (2002) ao afirmarem que “a existência de uma atitude de crença,

por parte de cada comunidade educativa, configura o requisito fundamental para a consecução de uma

verdadeira cultura de inclusão” p. 32.

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dos significados subjacentes aos motivos dessa mudança do que propriamente

nos enfoques técnicos.

A importância que a questão da percepção dos significados parece deter

nos processos de mudança, remete para um ângulo de análise que aproxima a

concepção de inovação organizacional a uma matéria de natureza cultural. Esta

componente cultural, no entender de Eisner (1988), implica, precisamente, por um

lado a assunção de determinados valores e, por outro, a construção de novos

significados6. Com esta perspectiva Eisner considera, então, que é a partir da

percepção compreensiva do conjunto desses novos significados que se

desenvolve, na organização escolar, o contexto ecológico propício e facilitador da

mudança.

Infere-se, por conseguinte, que a natureza da cultura profissional dos

professores representa a chave no processo de mudança educativa. Esta está,

deste modo, dependente da forma como cada um interpreta e implementa essa

mesma mudança. Neste contexto, as atitudes, assunções e crenças do professor

face à inovação, encontram-se condicionadas e influenciadas, precisamente pelo

tipo da sua própria cultura pessoal e profissional, a qual, portanto, determina a

adesão, ou a resistência às mudanças propostas (Hargreaves, Macmillan, &

Wignall, 1992).

Rossman, Corbett e Firestone (1988), sustentam, por seu lado que a

implementação e o desenvolvimento de mudanças, formalmente planificadas,

dependem, não só, da qualidade desta planificação e do apoio que a escola pode

ter, mas também, pelo grau de coerência que as propostas inovadoras tenham,

relativamente, à cultura escolar existente. A propósito desta matéria e como

resultado das suas investigações, aqueles autores estabeleceram um conjunto

sintético de relações entre a cultura escolar e as mudanças educacionais, o qual

dá origem ao quadro seguinte:

6 Staessens (1993), também aborda esta questão da relação entre a cultura escolar e a inovação,

preconizando a ideia de que a natureza da reacção da organização à implementação de mudanças, depende

da cultura existente e que esta consubstancia, mesmo, o factor determinante do êxito, ou do fracasso

daquelas mudanças

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Quadro 3

Relações entre a Cultura Escolar e as Mudanças Educacionais, na Perspectiva de

Rossman, Corbett & Firestone (1988).

Variação da cultura escolar Grau de reacção à mudança

Uma cultura escolar, enquanto

conjunto de expectativas partilhadas

sobre o que é e deve ser, deriva,

conjuntamente, do envolvimento externo

e distante (comum a várias escolas) e do

contexto próximo e imediato.

A resistência à mudança

varia segundo o carácter das

normas a alterar e o grau de

novidade da mudança.

As escolas variam na

uniformidade da sua cultura, ou seja,

segundo o grau da extensão em que as

normas são conhecidas e seguidas.

As mudanças nas práticas

são possíveis mediante uma

comunicação frequente das novas

definições do que é, ou deve ser e

terminam por dar cumprimento a

tais expectativas.

As normas mudam no grau em

que os membros as entendem como

alteráveis.

As mudanças nas práticas

podem ser prévias à mudança

cultural, mas tal, não assegura a

aceitação das novas normas

propostas.

Verifica-se, portanto que cada cultura escolar compreende, tanto normas e

princípios comuns a culturas de outras escolas - realidade provavelmente

verificável a nível nacional - como normas específicas. É, naturalmente, neste

segundo facto que reside a razão pela qual cada escola tem uma cultura de

natureza particular, diferente de todas as outras e, até certo ponto, única e

irrepetível.

Outra consequência relevante dos dados constantes no quadro,

imediatamente antes apresentado, refere-se ao facto de que, em cada escola,

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algumas práticas podem mudar, devido à passagem de informação e de

insistência nesse sentido. Tal não significa, no entanto que se garantam

mudanças a nível cultural. Se tal acontecer, ou seja se a situação cultural da

escola se mantiver inalterada, as mudanças ocorridas apresentarão um carácter

superficial e com o decorrer do tempo, tudo voltará ao cenário inicial. Daqui se

infere, então, que qualquer alteração operada em determinados aspectos do

funcionamento escolar, será sempre efémera se não for acompanhada de uma

mudança na respectiva cultura organizacional.

Schein (1985) adianta, neste contexto, que, por natureza, a cultura escolar

tende a ser conservadora e, consequentemente, factor de resistência à mudança.

Desenvolvendo esta lógica, o autor acrescenta que aquela cultura é um misto

fundido de crenças e de assunções básicas, as quais configuram as respostas

aprendidas pelo grupo de elementos de cada comunidade e que consubstanciam

a sua sobrevivência e coesão internas. Graças a estes motivos as comunidades

escolares tendem a resistir a qualquer pressão externa que seja pressentida como

uma ameaça àquele estado institucional.

Entretanto no dizer de González (1994) a escola pode ser concebida como

cultura e, por consequência, qualquer tentativa de mudança implica a

transformação da própria identidade da instituição. Segundo, ainda, este autor, a

gestão do processo de mudança deve estimular, apoiar e integrar em paralelo, a

emergência, socialmente construída da assunção de outras crenças e de outros

valores, os quais passarão a figurar como os conteúdos essenciais a contemplar

na nova identidade.

Portanto, deduz-se que, se as organizações são culturas, então as

mudanças são sempre lentas e complexas. Como tal, a mudança institucional será

real se a respectiva comunidade pressentir que, com as alterações em causa, não

está a perder identidade7. Contudo, esta situação só será possível, se a

desconstrução da primeira identidade for acompanhada, em simultâneo, pela

reconstrução de uma segunda identidade que integre os significados subjacentes

7 Entendendo-se identidade como o conjunto de crenças e de valores gerados, interactivamente, pelo

colectivo da organização (González, 1994)

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à mudança pretendida. Logo, parece que qualquer esforço de mudança estará

condenado ao insucesso se não se implicar, naquele processo, a organização na

sua globalidade.

A mudança parece, assim, assentar num processo de sustentação feita

com base em crenças no próprio objecto que se quer assumir através da

inovação. Isto significa, por outros termos, que, só acreditando no alvo da

mudança é que os destinatários da mudança, serão, exactamente, os

protagonistas e intérpretes dessa mudança, alterando, de forma consistente e

consciente, os seus próprios procedimentos, estruturas e funções.

Como expõe González (1992), a instituição afirma-se como uma entidade

capaz de aprender. Consequentemente, os processos que mobiliza para provocar

as mudanças, são, em si próprios, dinâmicas e resultados dessa aprendizagem,

traduzidos por um saber fazer as coisas de outro modo e como parte integrante

da vida diária da escola.

Outros autores relevam, da mesma maneira, o papel desempenhado pela

cultura de escola nos seus processos de mudança. Assim, por exemplo, Hopkins e

Ainscow (1993), ao longo dos seus trabalhos - centrados no objectivo de melhorar

a qualidade de educação para todos os alunos - desenvolvidos junto de algumas

escolas, chegaram a determinadas conclusões que, a par de outros contributos

importantes, confirmam, de modo incisivo, a função crucial da cultura escolar nos

aludidos processo de mudança. Resumidamente as conclusões a que chegaram

aqueles autores, são as seguintes:

1. A melhoria da escola deve repercutir-se no aumento dos resultados dos

alunos e dos professores8.

2. A cultura escolar é uma dimensão vital no processo de melhoria. A

cultura é uma amálgama de valores, normas e crenças que caracteriza

o modo pelo qual um grupo de pessoas interage dentro de um contexto

organizativo específico Os tipos de cultura que mais favorecem a

8 Resultados que, no entender dos autores, se referem ao incremento do pensamento crítico, capacidade de

aprendizagem e auto-estima, nos alunos e, no que diz respeito aos professores, reforço da atitude de

cooperação e de responsabilização e, ainda, do desenvolvimento profissional.

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inovação, são os que se baseiam na colaboração, revelam altas

expectativas, tanto em relação aos alunos, como aos professores, exibe

um consenso real sobre determinados valores, fomenta o apoio da

comunidade local e encoraja a desconcentração das funções de

liderança.

3. A organização escolar deve ser entendida como entidade cultural. Muitas

vezes os esforços da melhoria escolar são dirigidos, directamente, aos

factores organizativos, esquecendo que essa estrutura organizacional,

assenta, também, em valores que configuram a sua estrutura.

4. A mudança é mais eficaz quando é identificado um alvo claro e prático.

As prioridades da escola decorrem de processos internos de reflexão,

pelo que o objecto da mudança se deverá centrar nessas prioridades.

Assim, o objecto da mudança não deverá ser imposto, antes deve ser

induzido pela comunidade escolar e, deste modo, representar algo de

significativo e relevante para todos. Este processo de priorização de

necessidades é, por norma, moroso, pelo que poderá ser apoiado por

agentes externos.

5. Os procedimentos de mudança deverão ocorrer em simultânea

interacção com o desenvolvimento curricular e com outras necessidades

que a escola tenha determinado por si própria.

6. É essencial desenvolver a estratégia de mudança de forma a articular as

prioridades da escola com os procedimentos de inovação.

Fica, desta forma, sobejamente evidenciado o decisivo papel da cultura

escolar nos processos de mudança. Igualmente ficou demonstrada a necessidade

de aquela mudança ser, previamente compreendida, interiorizada e sentida pela

comunidade escolar, dando, assim, origem a que seja esta o motor daquela. Outro

dado a reter é de que o apoio externo pode ser benéfico, se, o mesmo, se

enquadrar e respeitar os princípios referidos, como de resto, defendem,

expressamente, os autores em referência.

Como foi referido, Hopkins e Ainscow, consideram a melhoria dos

resultados dos alunos, como um dos indicadores válidos para se concluir da

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natureza positiva das mudanças escolares. Julga-se da maior pertinência este

contributo, até, pela razão simples de que todo o desenvolvimento escolar deve

estar, de alguma maneira, relacionado com a procura do sucesso educativo dos

alunos. Esta perspectiva parece querer outorgar uma dimensão de proeminência à

gestão curricular em sala de aula, o que se afigura, francamente crucial, num

contexto em que, precisamente se procura uma educação de qualidade. Este

aspecto merece, efectivamente, um realce especial até porque, como observa

Hargreaves (1993), os movimentos actuais de reorganização da cultura escolar

tem desvalorizado a real importância que, neste contexto, têm os efeitos que a

gestão curricular provoca nos alunos.

Da análise de todos os dados analisados emerge a convicção de que a

melhor fórmula para a realização de mudanças efectivas e eficientes a nível de

cada organização escolar é corporizada pelo princípio de que, aquelas, deverão

ser geradas e desenvolvidas a partir do interior da própria instituição, após a

assunção e construção dos novos significados subjacentes às mudanças em

causa. Considerar, portanto, a cultura escolar como núcleo e motor da mudança,

significará priorizar os valores, as maneiras de trabalho e as expectativas

construídos e partilhados pelos actores locais no fluxo da acção diária. Por

conseguinte, o objecto da mudança deve recair sobre este conjunto de

significados e de significações e não sobre a estrutura formal e burocrática da

instituição (Bolívar, 1993).

As mudanças culturais pressupõem, como se comprovou, a emergência de

situações problemáticas, o que representa um aspecto positivo promissor, na

opinião de Fullan (1993). De facto, este autor, com base nos seus trabalhos sobre,

precisamente, os modos de entender os processos de mudanças das

organizações escolares - desenvolvidos ao longo das décadas de oitenta e de

noventa do século XX - entende que os problemas são inevitáveis em tais

processos, indo, até, ao ponto de admitir que a ausência de problemas, neste

âmbito, será sintoma de que as mudanças reais não estão presentes e que, em

seu lugar, surgem mudanças superficiais e, como tal, efémeras.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 127

Neste contexto de identificação de traços culturais de uma comunidade

escolar importa, especialmente, ter em conta o impacto que provoca nas crianças,

a atitude dos adultos que com elas lidam amiúde. Este aspecto é, por demais

importante para que não seja, devidamente equacionado de forma a prevenir,

tanto quanto possível, os efeitos que a postura atitudinal dos educadores e do

pessoal parapedagógico produz na representação que cada criança projecta de si

própria, nomeadamente a nível da auto-imagem e da auto-estima. Este facto

reflecte um factor essencial na qualidade do processo educacional e, por isso,

importa ser levado em conta no âmbito dos valores a contemplar na cultura de

cada escola, como alertam Coll et al. (2000):

De maneira efectiva o professor não tem só uma percepção ou uma representação

dos seus alunos, mas também uma representação ou percepção do que ele crê

que os seus alunos esperam dele como professor; e, reciprocamente, o aluno não

tem só uma percepção ou representação do seu professor, mas também uma

percepção ou representação que acredita que o seu professor espera dele como

aluno. As relações interpessoais que por fim são estabelecidas entre professor e

alunos - relações que constituem, por um lado, o núcleo das actividades de ensino

e de aprendizagem - encontram-se bastante condicionadas e mediatizadas por

esse jogo de representações mútuas” (p. 154)

Logo, o desenvolvimento de atitudes favoráveis à aceitação das crianças

como elas são de facto, significa respeitar as próprias diferenças e, em última

análise, a assunção da própria inclusão. Esta postura dos agentes educativos

impõe-se como um imperativo estrategicamente determinante da consecução dos

objectivos mais relevantes de qualquer projecto de criação de escolas inclusivas.

Importa, pois, atentar, muito profundamente, nesta problemática, uma vez que a

natureza dos comportamentos profissionais das pessoas implicadas, directa, ou

indirectamente, no processo de ensino de crianças com necessidades educativas

especiais, estará, seguramente, em consonância, com a natureza das suas

atitudes, como, muito assertivamente, refere Vlachou (1999).

O ideal da inclusão esbarra, nos tempos de hoje, com outros tipos de

referências, muito difundidos e praticados, como, por exemplo, a competição

pessoal e o individualismo, os quais, de algum modo, geram, no comum das

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 128

pessoas, preocupações e atitudes imediatas as quais, na maioria dos casos, não

são facilitadoras dos princípios inclusivos, favorecendo, ao invés, situações de

marginalização e de exclusão sociais. Logo, surge como requisito inevitável a

identificação de valores e de referências efectivamente conformes ao ideal da

inclusão e que, de algum modo inibam o desenvolvimento daqueles. Alguns

autores ao referirem-se, particularmente, aos valores subjacentes a uma

comunidade de aprendizagem sob a forma de escola inclusiva - como por

exemplo, Pearpoint e Forest (1992) - enunciam os de aceitação, sentimento de

pertença, relações pessoais, a interdependência - em vez da independência - e,

em termos de estratégia, à articulação entre as famílias e os professores, agindo,

uns e outros, sob a lógica de uma comunidade de aprendizagem. Numa

organização onde o exemplo dos adultos deve ser eticamente positivo é, pois,

indispensável que a relação interpessoal se paute por condutas irrepreensíveis9 e

desenvolvidas sob os valores inerentes às condutas inclusivas.

A referida ideia de uma comunidade de aprendizagem pressupõe a

mobilização de todos os recursos de uma determinada unidade social e

geográfica, em ordem, a que, de modo articulado e convergente, possam

satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem dos seus membros (Torres,

1999). Logo, a política de organização de uma cultura escolar vocacionada para o

desenvolvimento da educação inclusiva, terá de assentar nos traços mais nítidos

da semântica do agir colectivo para incluir e que passa, quer pelo ser parte de

algo, quer pelo fazer parte do todo. A escola inclusiva torna-se, assim, num lugar a

que todos pertencem, onde todos são aceites e apoiados reciprocamente.

Prevalece, nesta linha de pensamento, o forte sentido de coesão que a

comunidade escolar deverá assumir e praticar, assegurando, de forma consciente

- e sob a ideia de compromisso - a aceitação das diferenças e a resposta às

necessidades individuais. Por conseguinte, torna-se, de facto, crucial o debate

dialéctico destas questões, no interior da sociedade em geral e, muito

particularmente, no seio das comunidades escolares, já que professores e alunos,

9 Para Barth (1988), as relações entre os adultos, numa escola, influenciam mais o clima, a qualidade da

mesma e o próprio progresso educativo dos alunos do que nenhum outro factor.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 129

estão mais expostos a políticas e discursos relacionados com a produtividade,

consumo, competitividade e outros valores similares, do que propriamente, com

questões ligadas à justiça social, à igualdade de oportunidades, à cooperação e à

solidariedade.

Uma análise, ainda que estritamente sumária, à realidade social

contemporânea, indicia, claramente, que os ideais da inclusão parecem não ser

efectivamente priorizados. Por esta razão julga-se ser premente que os que

acreditam e trabalham para a concretização de tais ideais, contribuam para a

reflexão e disseminação de atitudes efectivamente conducentes à progressiva

criação e consolidação de ambientes sócio-educativos inclusivos, pois que, como

já foi repetidamente acentuado, as atitudes são, neste contexto, um factor

intrinsecamente determinante.

Um outro olhar, desta vez lançado para os resultados dos valores

predominantemente adoptados pelas sociedades actuais (competição e

individualismo, entre outros) facilmente enxerga um número impressionante de

crianças, jovens e adultos, objectivamente marginalizados. São seres que, sendo

protagonistas dramáticos de projectos de vida totalmente despojados de quaisquer

atributos de dignidade humana, procuram, no seu dia a dia, formas de vida

completamente circulares, onde o desânimo da esperança se converteu num

penoso sentimento de resignação.

São muitos, por conseguinte, os motivos para lutar por uma nova forma de

fazer escola. Por uma escola que contribua, de modo consciente e eficiente, para

renovadas formas de ser e de estar, entre as novas gerações, para que estas

possam fruir de uma vida com qualidade verdadeira, assente em valores plenos

de significado humano, como são, os da cooperação, da entreajuda, da

solidariedade, enfim os autênticos princípios da sociedade inclusiva. E, para tal, o

reforço das atitudes de convicta crença naqueles valores são o primeiro dos

muitos passos a dar na caminhada a percorrer para ali se chegar.

Entretanto, a forte heterogeneidade da população discente é, hoje -

provavelmente, mais do que em nenhum outro tempo do passado, como já se

acentuou - uma premente realidade, nas escolas, mormente, a nível do ensino

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 130

básico, pelo que urge que as equipas escolares considerem aquela diversidade,

como um factor positivo. Logo, a atenção à diversidade é um pressuposto nuclear

da escola inclusiva e, portanto, consubstancia uma forte razão para o

desenvolvimento de processos interactivos de reflexão que redundem na procura

de estratégias de intervenção susceptíveis de responder a todos e a cada um dos

alunos, na sua escola de referência. Para que tal se concretize é forçoso que este

princípio seja assumido por todos os profissionais que asseguram a organização e

o funcionamento de cada escola (Arnaiz, 1996). Pretende-se, assim, demonstrar

que manter as escolas sob modelos de organização tradicionais significa,

provavelmente o adiar da vigência das práticas inclusivas, dado que estas exigem

“ a reestruturação da escola e do currículo no sentido de permitir a todos os

alunos, com as mais diversas capacidades e interesses, características e

necessidades, uma aprendizagem em conjunto” (Correia 2003a, p. 13).

Nesta perspectiva, um dos percursos mais nítidos da reorganização da

cultura escolar para um modelo de inclusão, parece situar-se, não tanto, em

mudanças de natureza quantitativa, mas, sim e fundamentalmente, em alterações

do foro qualitativo. E dentro deste último âmbito, impõe-se tanto a renovação da

própria concepção de educação, como o repensar da gestão do currículo,

passando pela forma de organizar as actividades de aprendizagem em sala de

aula (Pérez Gómez, 1992).

A propósito refira-se que Ainscow e Muncey (1989) realizaram uma série de

estudos com a finalidade de identificar quais eram os factores principais que

caracterizam as escolas regulares consideradas eficazes no atendimento a alunos

com necessidades educativas especiais. Analisando-se os resultados obtidos pela

pesquisa referida, constata-se que os procedimentos em causa se centram

fundamentalmente nos seguintes processos:

• Ampla gama de experiências curriculares de forma a satisfazer as

necessidades de todos os alunos;

• Formas organizadas de apoio aos professores de turma;

• Registo e avaliação dinâmica dos progressos dos alunos.

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Qualquer um dos aspectos aportados pela pesquisa levada a cabo por

Ainscow e Muncey aparentam ser de implementação relativamente fácil nos

contextos escolares, desde que as respectivas equipas compreendam a sua razão

de ser. Ainda assim a sua concretização pressupõe a efectivação de algumas

mudanças organizativas na generalidade das nossas escolas, dado que a

constatação empírica aponta para a existência de práticas não conformes aos

procedimentos em causa. Ora se os dados referidos consubstanciam formas

organizacionais e pedagógicas que têm produzido bons resultados no que

concerne ao rendimento dos alunos e uma vez que não implicam dificuldades

significativas na sua implementação, infere-se, portanto, que se deverá diligenciar

no sentido de que as escolas passem a assumir, no seu funcionamento

quotidiano, as estratégias em questão.

No fundo o que está por demais evidente é a necessidade de mudar as

formas relativamente cristalizadas da organização escolar. Contudo, importa ter

em atenção que, tais mudanças implicam uma dinâmica de inovação que deverá

ser protagonizada, não, por grupos específicos de professores, mas, sim, por

todos os elementos da comunidade educativa (Reynolds & Ramasut, 1993).

Atendendo-se a que se trata de um conjunto de alterações, em que os

indivíduos terão de modificar alguns aspectos, tanto do seu pensamento, como do

seu comportamento, é necessário que seja dado tempo aos agentes envolvidos.

Precisamente, o tempo que permita a emergência de um entendimento profundo

do processo, a fim de que de tal resulte numa atitude de aceitação activa e

colectiva do mesmo (Fullan, 1982).

Por seu lado, Rosenholtz (1989), realça, a este propósito - e com base num

estudo realizado junto de setenta e oito escolas - que se torna mais fácil,

estabelecer, numa escola, procedimentos e práticas inovadores, quando os

professores assumem e partem de um consenso generalizado. Mais um

testemunho, por conseguinte, a relevar a importância de uma adesão colectiva,

quando se trata de reformular a instituição escolar. Também aqui o sentido de

comunidade se faz sentir, enquanto entendida como um conjunto coeso de

indivíduos que comungam dos mesmos valores e dos mesmos objectivos.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 132

Como se evidenciou, a activação prática de um conjunto de mudanças

assumidas pelo colectivo de uma escola dá origem à emergência de uma cultura

autónoma de desenvolvimento institucional que se traduzirá por uma melhoria

genérica da sua resposta educacional. Daqui resultará a implementação de

autênticas culturas de colaboração, condição básica para que os docentes se

sintam seguros e sejam capazes de se adequar à diversidade dos alunos e, ao

mesmo tempo, valorizar e fortalecer a sua individualidade (Escudero & González,

1994).

A tónica posta na necessidade e conveniência de as mudanças serem fruto

do envolvimento de toda a comunidade de profissionais de cada escola, exige o

instituir, nas mesmas, de uma atitude mobilizadora de acções cooperativas entre

os professores. Todo este processo de reformulação institucional deve subordinar-

se à ideia de que o conjunto de profissionais deve ter como objectivo procurar -

através da reflexão centrada na sua própria acção - cada vez mais e melhores

respostas à diversidade das necessidades dos alunos (Zabalza, 1996).

Emerge, então, de forma muito clara, a ideia de comunidade como um dos

alicerces essenciais de construção e de sustentabilidade da escola inclusiva. Esta

ideia pressupõe - a nível da cultura organizacional das instituições escolares - a

implementação quotidiana de procedimentos diversificados de colaboração,

entendendo-se, esta, como “um processo interactivo, através do qual

intervenientes, com diferentes experiências, encontram soluções criativas para

problemas mútuos” segundo a versão de Idol, Paolucci-Whitcomb e Nevi (1986),

citados em Correia (2003a, p. 26).

A colaboração, assenta, assim, em processos de relação e de acção

recíprocas entre indivíduos, situação que remete para uma concepção particular e

dinâmica de equipa. Neste contexto, julga-se, então, adequado considerar a

comunidade escolar como um conjunto de pessoas que interagem entre si, de

forma a que cada uma influencia e, por sua vez, é influenciada, por cada uma das

restantes (Shaw, 1981). Complementarmente, poderá, aqui, ser acrescida a ideia

de que as pessoas estão unidas por um objectivo comum o que, de algum modo,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 133

consubstancia o sentimento de pertença activa, afectiva e efectiva à comunidade

onde se integram.

Pretende-se, assim, que as equipas em causa se organizem e identifiquem

como grupos colaborativos, estimulando, no seu interior, a participação de cada

um dos seus elementos, na tomada de decisões, segundo a sua visão,

competências, expectativas e interesses. Sob esta lógica de funcionamento, todos

os membros do grupo se sentirão, simetricamente responsáveis pela qualidade do

seu trabalho.

Nos grupos em que a interacção pessoal e profissional se caracteriza por

processos habituais de colaboração, são progressivamente reforçados os laços de

amizade e de cooperação. Paralelamente aumentam, também, a motivação

individual e a própria produtividade, ao mesmo tempo que são inibidos tanto as

frustrações pessoais como os níveis de conflituosidade interpessoal (Parrilla,

1996).

A consolidação de uma cultura de colaboração, no seio da comunidade

escolar, irá produzir, uma visão colectiva e consensual das modificações

necessárias a introduzir na organização e funcionamento do estabelecimento de

ensino. Consequentemente, criam-se condições internas para que aquele possa

responder com qualidade à diversidade de todos os seus alunos, uma vez que

está garantida, para tal, a mobilização geral dos elementos da comunidade

escolar. O trabalho colaborativo surge, sob esta lógica, como o eixo e charneira do

desenvolvimento da escola inclusiva. Numa comunidade escolar assim organizada

dificilmente será possível identificar os aspectos preocupantes que Tomlinson e

Allan (2002) apontam:

O ensino é, muitas vezes, uma profissão solitária. Um professor pode fazer algo

maravilhoso na sua turma sem que o colega da sala vizinha faça a mínima ideia do

que aconteceu. É possível que quatro professores no mesmo edifício criem

materiais sobre um determinado tópico e nunca fiquem a saber que houve uma

duplicação de esforços entre si. (p. 111)

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A partilha de informação e de experiências deve pois, ser alimentada e

reforçada nesta cultura de colaboração. Esta interacção não deve, porém,

confinar-se à dimensão docente, mas, sim, ser alargada a outros tipos de

profissionais pelo que “os professores devem relacionar-se e colaborar, sempre

que possível, com outros profissionais, como, por exemplo, com um psicólogo, um

médico, um técnico de serviço social ou um terapeuta.” (Correia, 2003a, pp. 25-

26).

A compatibilidade e a complementaridade instalam-se, então, gradualmente

e desta maneira, no seio das interacções entre os diversos membros da

comunidade escolar inclusiva. A articulação funcional entre aquelas estratégias vai

contribuindo para a assunção geral do princípio de que a prestação de atenção à

diversidade, não se refere, apenas aos alunos com necessidades educativas

especiais, mas a todos os alunos, já que todos são diferentes e, ao mesmo tempo,

iguais no direito de oportunidades.

Paralelamente, reforça-se a consciência de que os professores de apoio,

não são os únicos responsáveis pelo atendimento educativo aos alunos com

problemáticas educacionais mais complexas. Antes, são reconhecidos como

membros da comunidade escolar, aportando, à mesma, os seus saberes e

experiências, como qualquer outro elemento, contribuindo, assim, para o reforço

da resposta educativa ali em curso (Parrilla, 1995).

Uma organização escolar que intente nortear-se pelos princípios da gestão

qualitativa da diversidade, tenderá, portanto, a trilhar os itinerários que conduzem

à colaboração. Sob esta estratégia, o espaço escolar consubstanciará, por

conseguinte, uma rede de relações humana em que a acção de cada professor é

objecto de contínuo aperfeiçoamento, devido à influência da actividade de cada

um dos seus colegas, sob o reconhecimento e valorização recíprocos (Jonhson &

Jonhson, 1994).

Paralelamente, o entendimento conceptual de escola inclusiva pressupõe a

ideia de que, todos e cada um dos alunos, deverão ser alvo de uma atenção

especial, a fim de que se sintam aceites de modo securizante pela comunidade

educativa. Simultaneamente os mesmos alunos deverão percepcionar a convicção

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de que se verifica um esforço, por parte daquela comunidade no sentido de

responder, com empenho e qualidade às suas necessidades, quer no plano

pedagógico, quer no plano afectivo, ou social. Deste modo, os alunos aprenderão

a respeitar e a confiar na organização escolar, experienciando um sentimento de

satisfação e de autêntica pertença à comunidade em que se inserem. Sob este

clima, os próprios actores educativos receberão, por sua vez, os sinais de

satisfação expressos pelas crianças por si atendidas, confirmando-se, desta

maneira o sentido profundo do conceito de comunidade, traduzido pelo sentimento

colectivo de que cada um dos seus elementos tem sempre algo para dar e para

receber (S. Stainback & W. Stainback, 1999).

Por outro lado - como preconizam os mesmos autores - a escola inclusiva

implica o envolvimento activo e convergente de pais, professores e alunos no seu

funcionamento quotidiano e nas decisões ali a tomar. Para que tal seja uma

realidade torna-se necessário capacitar, conceder responsabilidades e voz a cada

elemento da comunidade para que saibam participar, de modo eficiente, na

construção de uma interacção pessoal pautada pelos valores da inclusão.

As preocupações iniciais, subjacentes ao ideal de escola inclusiva,

centravam-se, nuclearmente, em processos orientados para atender e apoiar os

alunos com necessidades educativas especiais, nas classes regulares, facto que

se revela, sem dúvida, de extrema pertinência na construção efectiva de uma

verdadeira escola para todos. Porém, actualmente, configura-se a necessidade de

se potenciar apoio e atenção à totalidade dos alunos, dado que - como é

empiricamente confirmado pelo senso comum - os riscos sociais de

marginalização são múltiplos e presentes em todos os lugares, pelo que,

efectivamente, toda a criança, ou jovem, está, de facto, em potencial situação de

risco, ainda que não seja portador de qualquer disfunção, ou problema de

desenvolvimento. Sendo assim, julga-se conveniente - sobretudo, se se privilegiar

a estratégia da prevenção - conceber a escola inclusiva como uma forma de

organização institucional que esteja atenta à situação educacional e social de

todos os alunos que a frequentem, como referem, S. Stainback e W. Stainback

(1999).

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As comunidades escolares inclusivas enquadram-se, segundo, também S.

Stainback e W. Stainback (1996), no princípio estratégico de que todas as

crianças, em princípio, podem desenvolver o seu processo educacional no interior

curricular do seu grupo de referência, independentemente do seu grau de

capacidades e de limitações. Deste modo garante-se, tanto quanto possível -

como preconiza Correia (1997) - que o percurso educativo de qualquer criança

seja, por norma, assegurado e desenvolvido na escola da respectiva área de

residência.

Entretanto, para Sands et al. (2000) a ideia de escolas inclusivas pressupõe

a observância dos seguintes princípios:

• Direitos da criança

• Responsabilidades partilhadas

• Mudanças estruturais nas escolas

• Inovação das funções e práticas escolares

A análise semântica dos aspectos enunciados parece indiciar, o princípio

de que são as características das crianças concretas que devem determinar e

fundamentar, tanto as estratégias organizativas das equipas escolares, como dos

processos de ensino-aprendizagem e não o contrário. Desta forma, parece ser de

assumir que as necessidades individuais e colectivas, bem como as expectativas

dos alunos, devem ser os factores a ter em consideração, quer na tomada das

decisões quer no desenvolvimento das acções diárias a cargo dos profissionais

escolares. Estes serão, então, responsáveis no seu todo, por participarem na

busca activa e colectiva das respostas educativas tidas, consensualmente, como

as mais adequadas às necessidades apresentadas pela totalidade dos alunos da

escola, como recomendam Sands et al. (2000).

Explorando-se, aqui a ideia de Skrtic (1995), citado em Sands et al.,

(2000), preconiza-se, a perspectiva de que as escolas deixem de ser

organizações burocráticas e tendam a ser organizações “resolucráticas” pautando,

deste modo a sua acção, por processos decorrentes de uma inspiração inovadora,

orientada para o diagnóstico e resolução de problemas concretos e práticos. Este

pressuposto configura um dado de relevante e pertinente impacto no caso

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português, dado que neste existe ainda, uma forte tendência para o cultivo da

burocracia, nomeadamente na área da organização e gestão educacional.

Continuando-se, ainda, a abordar autores que se debruçaram, entretanto,

sobre a problemática da mudança da organização escolar, refere-se, também, a

perspectiva de Shein (1985), a qual pressupõe que o desenvolvimento

organizacional da escola deve passar, essencialmente, por novas formas de

pensar, de aprender e de trabalhar. Estas novas formas de proceder deverão

assentar - prossegue o mesmo autor - em dinâmicas de colaboração convergente

entre todos os profissionais escolares e, destes, com os eventuais recursos

comunitários e de apoio técnico.

Entretanto - e como é genericamente assumido - a escolaridade visa, por

norma, a consecução de um determinado conjunto de objectivos curriculares

comuns para todos os alunos, o qual se espera seja, minimamente, dominado por

cada um. Nesta perspectiva, afigura-se criticamente importante atentar no efeito

que os referidos objectivos possam ter como contributo para a chamada qualidade

de vida dos alunos, tanto a nível dos seus tempos presentes como a nível do seu

futuro. Por tal razão, importa que os objectivos e conteúdos educacionais sejam

efectivamente relevantes, dado que parece inquestionável que todo o processo

educativo desenvolvido e a desenvolver, junto de cada aluno, terá, como meta

nuclear, facilitar-lhe, precisamente, a fruição de uma vida com o maior nível de

qualidade possível. Nesta lógica, passa a ser crucial o facto de se assegurar que

cada criança seja alvo de um processo eficiente de ajuda pedagógica de molde a

permitir-lhe a consecução das aprendizagens indispensáveis para a realização do

seu projecto de vida, de acordo com as suas limitações e capacidades

específicas. Assim, importa ter presente - a nível da concepção e gestão da

escola inclusiva - que, esta, não deve ser considerada como um fim em si própria,

o qual uma vez conseguido daria a impressão do dever cumprido, pois, tudo

estaria alcançado. Pelo contrário, julga-se ser imprescindível considerar a escola

inclusiva, como uma estratégia de fazer escola de modo a que, mais e melhor, se

respeite a igualdade de oportunidades e de direitos de todas as crianças.

Entendida deste modo, a escola inclusiva representaria o meio mais pertinente

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para que cada aluno, possa apropriar-se dos saberes, experiências e

competências verdadeiramente facilitadores da consecução de uma qualidade de

vida positiva, desiderato que parece representar o fim último da intervenção

escolar.

Definir, entretanto, qualidade de vida não é, seguramente, tarefa fácil.

Porém, recorrendo-se, em jeito de síntese, ao contributo de vários autores, como,

Blatt (1987), Karen, Lambour, e Greenspan (1990), Stark e Golsbury (1990),

citados em Sands et al. (2000), parece ter fundamento entender, tal, como a

capacidade de um indivíduo adoptar um estilo de viver, através do qual vá

conseguindo, de modo satisfatório, dar resposta às expectativas e necessidades

pessoais ao mesmo tempo que vai percepcionando uma sensação paralela de

satisfação, de felicidade e de sucesso.

Desenvolvendo-se então, numa perspectiva semântica interactiva, os

princípios antes expostos, afigura-se, fundamentado, aliar o conceito de escola

inclusiva à ideia de uma educação de qualidade e de igualdade para todo e

qualquer aluno. Entendida a educação inclusiva da forma como foi apresentada

parece, então, que, a mesma, pode ser considerada como o objectivo fundamental

de todo e qualquer estabelecimento de ensino, na medida em que está,

claramente expressa a preocupação de propiciar a todo o aluno uma resposta

educativa adequadamente ajustada às suas necessidades, parecendo, assim,

residir, aqui, efectivamente, o objectivo primacial da própria instituição escolar.

Aprofundando-se, ainda mais, o sentido intrínseco do termo inclusão,

prefigura-se ser, também, legítimo atribuir, ao mesmo, um sentido que ultrapassa

a ideia de um método, de uma filosofia, ou, simplesmente de um tema a

desenvolver num projecto de investigação. Julga-se assim, que o termo em

questão, significa algo mais do que tudo isso, remetendo para o ideal do viver

juntos, da ideia de aceitação do outro, sendo, no fundo, uma autêntica forma de

viver. Forma de viver que implica, por isso, uma mudança de valores no interior da

sociedade actual, como sugerem Jack Pearpoint e Marsha Forest, no prólogo à

obra de S. Stainback e W. Stainback (1999). Nesta perspectiva - e com base no

conteúdo proposto por aqueles autores - emergem três estratégias de acção que,

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no seu todo, se julga poder serem consideradas como o eixo nuclear das

estratégias a mobilizar para a construção da escola inclusiva e que de alguma

forma acentuam e resumem muito do que a este propósito tem sido descrito. As

estratégias em questão são as seguintes:

• Planificação cooperativa

• Intervenção colaborativa

• Dinamização para o envolvimento de parceiros.

5.1.1 Papéis Cometidos ao Órgão de Gestão.

Os contributos da investigação revelam que a acção dos elementos do

órgão de gestão configura um dos aspectos fundamentais na promoção e

consolidação das experiências inclusivas, a nível da respectiva organização

escolar. Assim, para Kyle (1985) citado em Wang (1998), assenta na atitude do

órgão de gestão, o carácter de continuidade, ou não, de uma mudança já iniciada

e assumida pela escola, dado que essa continuidade depende, precisamente, da

criação e gestão de um clima organizacional que estimule e viabilize a inovação

pedagógica. Sob esta lógica, cada elemento do órgão de gestão deverá funcionar,

prioritariamente, como um líder educacional e, não tanto como um líder

administrativo, como referem Fullan (1985), Montgomery e Leithwood (1983) e

Sergiovanni (1990), citados em Wang (1998).

Na implementação e manutenção de processos educacionais inclusivos, o

órgão de gestão deverá, por consequência, assumir um conjunto de papéis10 que,

no seu todo, assegurem de modo irreversível, a operacionalização dos objectivos

inerentes àquele modelo educativo. Nesta perspectiva, o órgão de gestão “

desempenha um papel crucial quanto ao envolvimento e partilha de

responsabilidades com todo o corpo educacional da escola no que concerne à

planificação e à consecução dos objectivos que levam ao sucesso escolar de

todos e cada um dos alunos” (Correia, 2003a, p. 23). Em relação ao referido

10 Papéis, aqui entendidos como as expectativas de comportamento associadas à posição que um indivíduo

ocupa em determinado âmbito (Hargreaves, 1977)

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conjunto de procedimentos, Wang (1998) propõe uma síntese dos mesmos, a qual

se pode resumir nos seguintes aspectos:

• Promover a prática de uma diversidade de estratégias diversificadas de

ensino.

• Procurar, activamente, soluções para os problemas identificados em cada

turma.

• Proporcionar e participar em actividades formativas de aperfeiçoamento dos

docentes.

• Orientar programas de formação - formal e informal - do professorado.

• Observar a acção pedagógica dos professores e restituir informação sobre

a mesma.

• Trabalhar com os professores para identificar as finalidades educativas

principais, bem como os meios para assegurar o sucessos dos alunos.

Como se infere do exposto, a acção do órgão de gestão torna-se um

elemento cujo impacto é fundamental nos processos de construção da escola

inclusiva. Esta importância estratégica do papel da lideranças é, também, de suma

importância na criação de dinâmicas internas de sustentação à educação

inclusiva, como refere Correia (2003a) ao afirmar que:

Também, numa escola inclusiva, o órgão directivo deve saber compartilhar a

liderança, permitindo aos outros agentes educativos participar activamente na

identificação e resolução de problemas. Um dos processos a considerar pela

liderança será a proposta de criação de equipas cuja missão seja a de implementar

na escola os princípios da inclusão e a de elaborar planificações, tantas vezes

individualizadas, para alunos com NEE. Haverá pelo menos dois tipos de equipas a

considerar: as equipas de planificação inclusiva e as equipas de colaboração,

também conhecidas por equipas de resolução ou equipas de apoio educativo. (p.

24)

O autor em referência atribui, desta maneira, aos responsáveis pela gestão

da escola, não apenas o dever de partilhar a liderança com os restantes agentes

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 141

educativos11, mas, também, a tomada de iniciativa no que respeita à criação

interna de núcleos específicos de profissionais (no caso, equipas de planificação

inclusiva e de colaboração) para, através de dinâmicas sistematizadas, garantirem

a eficácia do modelo inclusivo.

O contributo destes autores concorre, por conseguinte, de modo muito

expressivo, para esclarecer o papel decisivo que o órgão directivo desempenha no

projecto de construção de uma escola eficientemente inclusiva. Há pois que se

levar na devida consideração a necessidade de se envolver os elementos da

gestão escolar em cada passo conducente ao desenho de qualquer modelo de

reorganização institucional, mormente quando o que se pretende se traduz por um

modelo de escola inclusiva.

A questão da definição explícita de uma política educativa de escola parece

configurar, por conseguinte, um aspecto crucial para o desenvolvimento e

implementação de um determinado conjunto de atitudes e de práticas geradoras

da educação inclusiva. Neste contexto, está devidamente comprovado que tanto a

visão como a acção da liderança da organização escolar, se tornam

verdadeiramente cruciais. Efectivamente, só com estas condições será possível a

criação e consolidação de um clima institucional intrinsecamente comprometido

com uma dinâmica de procura activa dos meios operativos capazes de assegurar

uma resposta educativa de qualidade, às necessidades específicas quer da

generalidade dos alunos sem problemas de aprendizagem, quer dos alunos com

NEE.

Sob esta perspectiva, afigura-se, portanto, ser de toda a conveniência,

elencar um conjunto de princípios e de indicadores que, no seu todo, configurem

um quadro pertinente de critérios orientadores de uma política educativa de escola

preocupada com os ideais da inclusão. Julga-se, aqui - pelos motivos que têm

vindo a ser explanados - que a acção do órgão de gestão deverá ser exemplar na

elaboração do corpo doutrinário que fixem os princípios a observar pela

11 A qual passa, segundo Carvalho et al. (1993) pela “institucionalização de condições de diálogo e, portanto,

de comunicação que, por seu turno, assegurarão a distribuição e a partilha do poder, sobretudo, ao nível dos

processos de tomada de decisão e de desenvolvimento das práticas daí emergentes” (p. 26).

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 142

comunidade escolar para que as suas práticas sejam eficientes e eficazes, do

ponto de vista educativo. Para além de servirem de guia à acção de toda a

comunidade escolar, os referidos princípios - se cumpridos - garantirão,

minimamente, o desenvolvimento de uma cultura organizacional e funcional

subordinada à lógica e aos fins dos ideais em causa, neste caso, aos ideais da

qualidade e da inclusão.

Procurando-se na literatura de incidência fundamentos para a identificação

daquele conjunto de princípios orientadores, verifica-se, por exemplo que Ainscow

(1997), valoriza, o facto de a qualidade de ensino estar intimamente ligada à

forma como a respectiva equipa docente interage, entre si, formal e

informalmente. Esta forma de interacção interna no seio da equipa profissional

acaba por configurar, assim - segundo o mesmo autor - a cultura do local de

trabalho, a qual por sua vez, condiciona a forma como os professores assumem o

seu exercício laboral, bem como a forma como vêem os alunos.

No âmbito destas ideias, surge, também, a necessidade de ser

implementada uma articulação metodicamente planeada e muito convergente

entre os professores titulares de turma e os técnicos de apoio, como, também,

sustenta Wang (1998). Pormenorizando este aspecto, a autora sugere que os

professores especialistas (por exemplo, os de educação especial) e os técnicos de

outros serviços, devem trabalhar de forma bem coordenada com os professores

responsáveis pela leccionação das turmas.

É, pois, sob esta lógica de pensamento que se afigura positivo - para os

resultados educativos dos alunos - que cada escola disponha do seu próprio

ideário, traduzido por um conjunto de normas consensualmente negociadas e

assumidas. Serão, pois, essas referências norteadoras devidamente formalizadas

que, de algum modo, contribuirão para que os membros de uma dada instituição

escolar possam socializar - como preconiza Hargreaves (1996) - a consciência de

si próprios, das acções a desenvolver, bem como a ideia de qual o clima relacional

que melhor permita a operacionalização dos próprios princípios constantes no

ideário da escola.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 143

A identificação concreta daqueles princípios e indicadores consubstanciará,

assim, o quadro sincrético de referência da acção da comunidade escolar em

geral, para a concretização de uma educação inclusiva, cabendo, naturalmente,

neste âmbito, um papel de extrema relevância, aos responsáveis pela gestão

global da comunidade em causa. Neste campo, entende-se como fulcral, adoptar,

como orientação de base - para a partir da qual se fundamente a elencagem dos

princípios orientadores de uma política de escola para a inclusão - o excerto

inserto na Declaração de Salamanca o qual preconiza uma ideia sob a qual as

escolas são consideradas como locais educativos em “que os alunos devem

aprender todos juntos, independentemente das dificuldades e das diferenças que

apresentem” (p. 11).

Numa óptica cautelar refira-se, neste ponto, que o facto de se estar de

acordo, em princípio com esta ideia, tal não significa porém, que se defenda de

modo intransigente que os alunos aprendam sempre juntos, nomeadamente, no

contexto da classe regular. Pelo contrário, admite-se o pressuposto de que há

alunos cujas características e necessidades poderão determinar que parte do seu

atendimento educacional seja assegurado noutros espaços. Esta determinação

deverá estar devidamente contemplada no respectivo PEI e consequentemente, à

mesma, deverá ser dado cumprimento integral.

Assumida, então, nas suas linhas gerais, a ideia recolhida na Declaração de

Salamanca, como elemento de referência orientadora para a pesquisa de

informação na literatura de incidência de dados que possam servir de base ao

ideário pretendido, seleccionou-se, entretanto, um outro contributo - com recurso

a determinados autores - cujo conteúdo se afigura igualmente adequado para, em

termos complementares aos princípios de Salamanca figurar como uma segunda

linha norteadora da pesquisa em apreço. O conteúdo em questão representa uma

síntese das propostas sobre os processos de construção da escola inclusiva, as

quais foram apresentadas, por Ainscow, Faro, Vilageliu e Porter, nas V Jornadas

Técnicas de Educação de Barcelona, realizadas no ano de 2000. A tal se reporta a

figura 2, a seguir inserta.

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• Partir da experiência e dos conhecimentos locais, dos seus êxitos e dos

seus problemas

• Assunção de uma concepção inclusiva da educação como condição prévia à

implementação de um projecto de escola para todos

• Fazer do trabalho colaborativo e cooperativo, o instrumento metodológico de

base para gerar conhecimentos que, de modo eficaz, respondam às

diferentes necessidades dos alunos

• Considerar a diversidade como fundamento da flexibilização e diferenciação

do processo de ensino-aprendizagem

• Dotar a escola de uma estrutura flexível de forma a adaptar-se às

características e necessidades dos alunos e dos professores

• Estabelecer formas de organização internas que estimulem práticas de

colaboração no seio da equipa educativa, tanto a nível da planificação das

actividades gerais como a nível do trabalho na sala de aula

• Valorizar a auto-estima dos alunos e dos adultos

• Desenhar e promover planos de formação dos agentes educativos, assentes

em procedimentos de reflexão sobre os efeitos da sua acção educativa

• Fundamentar os processos de mudança nos resultados da avaliação interna

Figura 2. Factores essenciais para a construção da Escola Inclusiva com base nos

contributos de Ainscow (2000), Faro e Vilageliu (2000) e Porter (2000).

Nos princípios aqui apresentados, ganha relevância - como, de resto, já

fora, anteriormente, referido - a contribuição trazida à luz do dia, por

investigadores educacionais que se dedicaram à produção de saberes sobre a

organização cultural e funcional das organizações escolares, no campo da

educação para a inclusão. Dada a importância que tais princípios consubstanciam,

num quadro de construção da escola inclusiva, afigura-se pertinente aprofundar a

reflexão em torno do sentido dos mesmos, recorrendo-se para tal, ao contributo de

outros investigadores, com papel igualmente relevante no âmbito em causa.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 145

Assim, recorrendo-se a Sergiovanni (1992), constata-se que as escolas em

que se observa um movimento no sentido de se caminhar para uma cultura

organizacional favorável à inclusão, evidenciam uma mudança no respectivo

processo de liderança, privilegiando-se, nesta mudança, a opção pelas estratégias

de transformação, em detrimento das de transacção. O que caracteriza cada uma

daquelas estratégias de liderança - segundo o autor em referência - é o facto de a

primeira ( de transformação) se orientar por abordagens centradas na distribuição

do poder, enquanto a segunda (de transacção) se filia em modelos de

manutenção dos conceitos tradicionais de respeito pela hierarquia e pelos

processos de controle. Tal significa, então, que a liderança no verdadeiro sentido

do termo é prioritariamente concebida como uma função exercida por vários

elementos da equipa educativa da escola e não como um conjunto de

responsabilidades concentradas num reduzido número de pessoas.

Como se pode, igualmente, constatar, os princípios enunciados

contemplam a preocupação de envolver, activa e convergentemente, no processo

educativo, os diferentes elementos integrantes da comunidade escolar e não só, e

apenas, os professores. Visa-se, desta forma, consagrar, aqui, o modelo

incorporativo, proposto por Reynolds (1991) o qual - segundo este autor - implica

todo e qualquer membro da comunidade escolar e que transparece com muita

nitidez, nas organizações escolares conhecidas pelos seus resultados positivos.

O envolvimento parental é, especificamente, neste contexto, considerado

como um factor de primordial importância, uma vez que a família “ permanece

como o elemento-chave na vida e desenvolvimento da criança “ (Correia, 1997, p.

145 ). Trata-se, por conseguinte de mais um aspecto a que o órgão de gestão

deverá conceder uma atenção particular, pois que “a escola deverá sempre

considerar a família nas decisões mais importantes respeitantes à criança, quer

sejam crianças normais, quer sejam crianças com NEE” (idem, p. 145).

No fundo, o órgão de gestão deverá estar envolvido em todos os aspectos

que dizem respeito à organização e funcionamento da escola por que é

responsável, tarefa que, para além de intensa, implica um teor enorme de

responsabilização. A fim de que uma e outra incumbências sejam asseguradas

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 146

com sucesso, torna-se necessário ter em conta determinadas premissas. A

primeira é a de que - parafraseando Giangreco (1999) - os educadores sentem, de

uma forma quase que desesperada, a necessidade de líderes que avancem com

orientações inclusivas e que facilitem a sua implementação. A segunda - agora de

acordo com Villa e Thousand (1990), citados em Giangreco (1999) - decorre do

facto de que se a responsabilidade da liderança for entendida como função

exclusiva da equipa directiva, então não se adequa a uma escola com orientação

inclusiva. A terceira é a que considera que ser líder é alguém que possua

capacidades, conhecimentos, perspicácia, visão e carisma inatos, como sugerem

D. Johnson e F. Johnson (1987), citados em Giangreco, (idem). Finalmente, a

quarta remete para o facto de que aquelas e outras qualidades que caracterizam

os líderes, podem ser encontradas não só na equipa directiva, mas também, nos

professores, no pessoal de apoio, nas famílias e nos alunos, como, ainda, afirma o

próprio Giangreco.

Nesta perspectiva, a função cometida às lideranças não terá, já, a

dimensão de algo impossível de ser concretizado, devido aos múltiplos aspectos

que comporta. Para tal é fundamental que a gestão escolar seja concebida como

uma acção a ser partilhada pelos diferentes membros da comunidade escolar e

não como um papel a desempenhar, apenas, por uma pessoa, ou por uma equipa

restrita, formalmente detentoras de autoridade.

5.2 O Projecto Educativo de Escola

O conceito de projecto educativo de escola não é consensual - à

semelhança de muitos outros aqui abordados - variando, por conseguinte, de

autor para autor. Assim, para Barberá (1989), o projecto educativo de escola

consubstancia um documento que estabelece o ideário e o estilo de educação que

se pretendem seguir no estabelecimento de ensino a que respeita. Diz o mesmo

autor que esses ideário e estilo de educação devem aparecer como resultado de

uma reflexão colectiva e determinam os valores e os interesses de uma

comunidade, ao mesmo tempo que fixam e unificam os critérios de actuação a

seguir na instituição. Neste enunciado fica, portanto demonstrado que o projecto

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 147

educativo, por um lado consubstancia a política educativa seguida pela escola e,

por outro, que a sua elaboração deve decorrer de processos colectivos de

participação, de reflexão e de consensualização. Só assim se garantirá que essa

mesma política seja representativa dos ideais e dos significados efectivamente

percepcionados pela comunidade escolar a que diz respeito. Finalmente -

acrescenta o mesmo autor - o projecto educativo de escola deve, também, ser o

repositório dos critérios globais da acção a desenvolver, de forma intencional e

convergente, por todos quanto ali trabalham. Deste modo aquele projecto

representa uma “referência e um dispositivo para a construção contínua da

mudança, para a organização da escola (no presente e no futuro), para a

clarificação das intencionalidades educativas e para a articulação das

participações dos diversos protagonistas” (Leite, Gomes, & Fernandes, 2001,

p.12).

No prosseguimento das linhas orientadoras que já se adiantaram, aquando

da análise da cultura organizacional de escola, julga-se, por imperativos de

coerência, que o projecto educativo de escola deve ser uma realização do tipo

democrático. Nesta perspectiva é considerado “tipicamente um projecto de grupo

pois este tem um peso capital em todos os níveis de decisão” (Carvalho, Almeida,

Afonso & Araújo, 1993, p. 20). Consequentemente “todos são, de acordo com os

sectores (ou grupos) a que se encontram ligados, actores dos processos

educativos na medida em que, a partir daí, são responsáveis pelos objectivos

traçados bem como pela sua execução” (idem).

Sob esta concepção de projecto educativo de escola importa, portanto,

assegurar que ali estejam contidos determinados princípios de política educativa

que deverão nortear os estabelecimentos de ensino que desejem enquadrar-se

nos ideais da educação inclusiva. Dentro desta linha será, então, imprescindível

que, naquele documento, esteja contemplado de forma explícita, um objectivo

crucial o qual consiste, precisamente, na intenção assumida de a escola se

dimensionar de forma a responder a toda e qualquer criança da sua área de

influência, independentemente das suas capacidades e limitações.

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Por outro lado, no documento em apreço devem igualmente figurar outros

princípios que mobilizem a comunidade escolar para práticas pedagógicas de

qualidade, optimizando, por conseguinte, o potencial de aprendizagem dos seus

alunos. Nesta perspectiva, crê-se até, que a utilidade da existência das escolas

poderia, hipoteticamente, ser medida, em grande parte, pelo nível e qualidade das

aprendizagens que cada uma proporciona aos seus alunos.

Em conformidade com esta linha de pensamento parece legítimo admitir-se

que as aprendizagens dos alunos configuram a verdadeira razão de ser das

escolas. Talvez, por este motivo, a literatura produzida em torno da temática da

educação de qualidade e da igualdade (logo muito associado à semântica da

educação inclusiva) aponte a quantidade de tempo efectivamente dedicado à

aprendizagem,12 como uma das estratégias que mais eficientemente têm

contribuído para aquele tipo de educação.

Para comprovar a importância que aquele enfoque parece deter no âmbito

da intervenção escolar, refira-se, a título de exemplo, a atenção que na

Conferência de Jomtien (em 1990), lhe foi concedida, ao dedicar-lhe, na

consequente Declaração, um artigo intitulado precisamente Concentrar a Atenção

na Aprendizagem. No artigo em apreço, recomenda-se que o primado da

educação básica se deve centrar, exactamente, nas práticas e efeitos reais da

aprendizagem e, não tanto, nos aspectos colaterais, como por exemplo, a

matrícula, a concentração nos programas ou a discussão dos requisitos formais

necessários à obtenção de certificados. No artigo em questão - e na continuação

da defesa da centração da acção escolar na aprendizagem - é, ainda,

recomendado, tanto a necessidade de serem definidos níveis mínimos de

aprendizagem para todos os alunos, dentro dos programas educativos comuns,

como a conveniência em serem melhorados os sistemas de avaliação inerentes

àquelas aprendizagens.

12 Por exemplo Creemers (1994), na sua proposta de modelo de eficácia escolar, salienta que o tempo

efectivamente dedicado à aprendizagem é um dos factores que caracterizam as escolas consideradas

eficazes, a nível de resultados junto dos alunos.

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No que se refere, especificamente, à avaliação do rendimento escolar dos

alunos, julga-se, no entanto, ser necessário ter em conta determinada precaução.

E isto porque existem tendências que advogam a prática de dar divulgação e

conhecimento públicos desses resultados, sob o pretexto de que, tal

procedimento, gerará, por si, uma dinâmica de competitividade entre os

estabelecimentos de ensino cujas consequências terão reflexos positivos na

eficácia escolar. Não se trata, aqui, de encarar a questão dos resultados das

aprendizagens, sob esse prisma. Antes, se preconiza, o princípio defendido por

Wolf (1998), de que os resultados decorrentes da avaliação das aprendizagens,

devem ser objecto de reflexão e de interpretação internas, a fim de que as

consequentes conclusões clarifiquem e induzam o quadro das alterações a

introduzir na organização e funcionamento escolares para que sejam

progressivamente optimizados os efeitos das práticas de ensino.

Extraindo-se, na essência, as consequências dos dados expostos, infere-

se, por conseguinte, ser de sensibilizar as comunidades escolares para a

relevância que, efectivamente, parece estar associada ao princípio de privilegiar,

antes do mais, a aprendizagem, de forma a que esta consubstancie o âmago de

toda a acção escolar. Logo, prefigura-se perfeitamente justificado que esta

premissa relativa ao primado da aprendizagem seja devidamente contemplada no

ideário de cada escola, isto é, que seja alvo de atenção explícita no respectivo

projecto educativo. Desta forma, ganhará contornos de evidência, a ideia de que a

aprendizagem, entendida num sentido amplo, representa o objectivo fulcral da

actividade desenvolvida em cada escola, tanto por professores, como por alunos.

Em função ainda desta ideia, as próprias famílias entenderão, de modo mais claro

que é, igualmente, nesse facto (centração na aprendizagem) que deverá

concentrar-se a sua preocupação, no que diz respeito à sua função de

acompanhar o processo educativo dos seus educandos.

Para além do enfoque primacial na questão da aprendizagem, outros

aspectos relevantes deverão igualmente figurar no projecto educativo para que,

este, seja, na realidade uma espécie de carta de princípios da escola e que,

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assim, espelhe a sua identidade. Esta identidade assenta, então, no quadro de

valores referenciais expressos no respectivo projecto educativo.

A este propósito, Townsend (1997) alude a uma série de factores que, no

seu entender, facilitam a consecução dos objectivos educacionais da escola e

que, por consequência devem merecer uma atenção especial no projecto

educativo de cada estabelecimento de ensino. Consequentemente, segundo

Townsend, os factores em apreço são os seguintes:

• Liderança profissional

• Visão e objectivos partilhados

• Ambiente de aprendizagem

• Ensino-aprendizagem como centro da actividade escolar

• Ensino intencional e com um propósito definido

• Expectativas elevadas

• Reforço positivo

• Seguimento do progresso

• Direitos e deveres dos alunos

• Colaboração entre a escola e a comunidade

• Concepção de escola como organização para a aprendizagem.

Como se pode observar - e a exemplo de outros investigadores, já,

igualmente referenciados - Townsend também salienta a necessidade de a

aprendizagem ocupar um lugar de centralidade estratégica na política organizativa

e funcional da instituição escolar. Por outro lado, também a partilha de objectivos

merece, por parte deste autor, uma menção específica. Entendendo-se que a ideia

de partilha pressupõe, naturalmente, formas de trabalho colaborativo entre os

diferentes membros da comunidade escolar, constata-se, mais uma vez, que as

estratégias de cooperação e de colaboração merecem um amplo e significativo

consenso, no âmbito da literatura de incidência na eficácia escolar e,

nomeadamente, por parte dos autores que abordam a problemática da inclusão13.

13 Como, por exemplo, Ainscow (1997), Correia (1997, 2001 e 2003), Wang, (1998) e S. Stainback e W.

Stainback (1999).

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5.3 O Projecto Curricular de Escola

O Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro - legislação central do processo

de reorganização curricular do ensino básico, como já foi dito - vem introduzir,

como também já se acentuou, a formalização de determinados procedimentos

inovadores, entre os quais figura, precisamente, o projecto curricular de escola.

Sendo um instrumento cuja finalidade é fixar a política curricular de cada

estabelecimento de ensino, julga-se que o mesmo detém uma importância similar

ao do projecto educativo de escola, pelo que se optou por, também, se lhe

dedicar, neste contexto, uma abordagem específica.

Ora, segundo o decreto-lei, em apreço, “as estratégias de desenvolvimento

do currículo nacional, visando adequá-lo ao contexto de cada escola, deverão ser

objecto de um projecto curricular de escola” (preâmbulo, parágrafo 11.º). Logo,

este instrumento parece deter uma importância muito relevante no que concerne à

explicitação dos princípios que devem regular o desenvolvimento do currículo, em

cada estabelecimento de ensino. Consequentemente, se uma escola intenciona

levar à prática estratégias de desenvolvimento curricular facilitadoras de uma

educação inclusiva, tal deve merecer uma referência explícita no conteúdo do seu

projecto curricular.

Pelo seu âmbito - e, também, pelo entendimento que, no citado decreto-lei

é feito - afigura-se defensável que o Projecto Curricular de Escola seja um

elemento em tudo coerente com o estabelecido no Projecto Educativo de Escola.

Assim, um e outro, serão testemunhos coesos e visíveis quer da política educativa

adoptada pelo estabelecimento de ensino, quer das estratégias ali assumidas para

a gestão do currículo junto dos alunos.

Coll (1989) remete, claramente, para o Projecto Curricular de Escola a

função de ilustrar e de exemplificar as formas de levar à prática o Currículo

Nacional. Para tal - preconiza aquele autor - deverão ser levados em linha de

conta diversos pressupostos, entre os quais, a estrutura organizativa da escola, a

disponibilidade dos seus recursos e as características dos seus alunos.

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Por sua vez, Del Carmen e Zabalza (1987) pressupõem a ideia de Projecto

Curricular de Escola, essencialmente, como um conjunto diversificado de

decisões, mas articuladas, entre si, para assegurar a adequação do Currículo

Nacional ao contexto específico em que se situa cada escola. Conquanto não se

sobreponham entre si, tanto as ideias expressas por Coll, como por Del Carmen e

Zabalza convergem, no entanto, num ponto: o princípio da adequação do

Currículo Nacional à especificidade das características concretas e singulares da

população escolar de cada estabelecimento de ensino.

Por outro lado, entendendo-se, genericamente, o currículo como um

conjunto de experiências educativas, afigura-se lógico prenunciar o Projecto

Curricular de Escola como o conjunto de experiências educativas intencionalmente

a desenvolver pela instituição, no sentido de ser dada consecução prática aos

objectivos e conteúdos estabelecidos no Currículo Nacional. Paralelamente,

devem constar no Projecto Curricular de Escola os princípios a adoptar na gestão

curricular para que seja significativamente respeitada a realidade sócio-cultural em

que se envolve e desenvolve a respectiva população escolar. É, precisamente,

este o sentido que Roldão (1999) citada em Leite et al. (2001), atribui ao projecto

curricular de escola ao considerá-lo como:

A forma particular como em cada contexto, se reconstrói e se apropria um currículo

face a uma situação real, definindo opções e intencionalidades próprias, e

construindo modos específicos de organização e gestão curricular, adequados à

consecução das aprendizagens que integram o currículo para os alunos concretos

daquele contexto. (p. 16)

Julga-se então, pertinente que no caso de uma escola que prossiga

intencional e activamente os valores da inclusão, o seu Projecto Curricular deverá

explicitar de modo inequívoco esse propósito, bem como a indicação de quais as

estratégias de desenvolvimento curricular a privilegiar, concretamente, para que

aquela preocupação seja alvo de expressão autêntica no quotidiano pedagógico.

Como se depreende e constata, trata-se de um procedimento não habitual

nas práticas das escolas portuguesas, pelo que, logicamente, ainda, nada se pode

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afirmar sobre o impacto do Projecto Curricular de Escola nas políticas de

organização e desenvolvimento curricular das mesmas. Contudo, julga-se

defensável que o instrumento de gestão curricular em causa, venha a merecer a

atenção que o seu significado estratégico sugere, nomeadamente, no âmbito dos

processos de edificação da escola inclusiva.

Desta forma, o acolhimento e o atendimento da diversidade dos alunos

clamam pela construção de um projecto curricular que contemple e atente nas

diferenças individuais. Devem, assim, estar expressos no Projecto Curricular de

Escola os princípios a que as programações pedagógico-didácticas deverão

obedecer, para que os procedimentos, em sala de aula, consubstanciem

estratégias e práticas conformes à educação inclusiva. Neste contexto parece ser

importante que essas orientações contemplem a diversificação e a flexibilização

curriculares e, bem assim, a diferenciação pedagógica, como é , taxativamente,

preconizado no próprio Decreto-Lei n.º 6/2001.

O primado de uma escola para todos pressupõe a subordinação ao

princípio de um currículo básico destinado à generalidade dos alunos, dando,

desta forma, corpo à ideia de uma escola compreensiva. Esta ideia implica, por

sua vez, o tomar em consideração os diversos tipos de necessidades presentes

nos alunos - e por razões óbvias, nos alunos com NEE - a fim de se evitar que,

essas necessidades não se convertam em fonte de discriminação daqueles, mas

sim que figurem como referências orientadoras das formas de apoio necessárias

ao atendimento de todos (Giné, 1998).

Neste contexto, S. Stainback e W. Stainback (1999), defendem que os

processo de mudança que tornam possível a emergência de uma escola inclusiva,

se estruturam em torno do currículo, concebido - sob uma perspectiva ampla -

como uma referência a partir da qual, ganham sentido as distintas actividades,

bem como o conjunto das adaptações curriculares adoptadas em função das

necessidades dos alunos. Nesta linha de pensamento, Giné (1998), por seu lado,

previne que a inclusão não pode resumir-se a uma mera questão de natureza

curricular, organizativa ou metodológica. Efectivamente, para este autor, a

inclusão é mais do que tudo isso, apresentando-a, na sua essência, como uma

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maneira especial de conceber a educação, ou, até, como modelo para a própria

vida humana, pela profunda semântica de interacção social que o termo sugere e

comporta.

Neste âmbito, interessa, agora aprofundar e clarificar o que se entende por

currículo. E, neste aspecto em particular há que reconhecer que o termo currículo

não é de fácil conceituação, sendo, mesmo, um “conceito polissémico, carregado

de ambiguidade” como afirma Pacheco (2001, p. 15). O mesmo autor, numa

tentativa de precisar mais a semântica do vocábulo em análise, adianta que se

pode adoptar “um conceito de currículo definido em termos de projecto,

incorporado em programas/planos de intenções que se justificam por experiências

educativas, em geral, e por experiências de aprendizagem, em particular” (idem, p.

16). Já para Coll (1985) a semântica do termo currículo, pressupõe, uma

associação entre o indivíduo e a sociedade, a tal ponto que - como sugere o autor

- os processos psicológicos que estruturam o crescimento da pessoa acabam, em

grande medida, por resultar de uma interacção permanente, entre aquela e o seu

meio, culturalmente organizado.

Em termos complementares, Coll (idem) sugere que o desenvolvimento

curricular assenta, nuclearmente, na resposta a quatro questões:

1. O que ensinar? Como resposta, Coll, aponta, por um lado, para os

conteúdos (conceitos, procedimentos, normas, valores, etc.) e, por

outro, para os objectivos, ou seja para os processos de crescimento

pessoal que se desejam favorecer mediante o ensino.

2. Quando ensinar? Questão que diz respeito à ordem e sequência da

abordagem dos conteúdos e dos objectivos.

3. Como ensinar? Referindo-se, esta questão, à forma como devem ser

estruturadas as actividades de ensino-aprendizagem, com a finalidade

de alcançar os objectivos propostos, em articulação com os conteúdos

estabelecidos.

4. O quê, como e quando avaliar? Devendo-se, neste âmbito, considerar a

avaliação como um meio imprescindível para garantir a adequação das

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acções pedagógicas, ou, quando tal não acontece, como fundamento

para a introdução de correcções pertinentes.

Da conjugação do contributo dos autores mencionados - Pacheco (2001)

por um lado e Coll (1985), por outro - parece, pois, ser de entender o currículo

como um processo de construção interactiva entre as experiências vivenciadas,

por cada indivíduo e um determinado conjunto de saberes culturais produzidos

pela sociedade envolvente. Paralelamente, releva-se a ideia de que o ensino

formal do currículo implica a implementação de um processo estruturado com

base em certos procedimentos metodológicos, devidamente sequencializados.

Nesta perspectiva, parece tornar-se, não só inevitável, mas também como um

factor de significativo alcance, que cada professor leve a cabo um trabalho prévio

de planificação antes da execução do processo de ensino-aprendizagem,

propriamente dito.

O Projecto Curricular de Escola configura, assim, uma forma de assegurar

uma articulação muito estreita entre a actividade escolar e a realidade social e

cultural envolvente. Com a introdução deste novo instrumento de concepção e de

regulação do plano curricular de cada escola, emerge uma possibilidade soberana

de se evitar a continuidade de determinadas práticas muito vulgarizadas no

quotidiano escolar, as quais centrando-se quase que exclusivamente no currículo

nacional acabam por entravar uma desejável e significativa ligação educacional à

comunidade envolvente. De tais práticas resultam determinados factores que

tornam o ensino escolar num processo algo artificial, ou seja, desligado da

vivência quotidiana das pessoas. Resumindo o que Resnick (1987) pensa a este

respeito, o cumprimento descontextualizado do currículo nacional provoca o

seguinte:

• Maior ênfase no trabalho individual do que acontece na vida real.

• Predominância do trabalho mental na escola, enquanto que no quotidiano

se privilegia o uso de instrumentos materiais.

• Recurso, na escola, ao raciocínio abstracto, ao passo que, na vida

quotidiana se utiliza, mais, o raciocínio prático.

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Portanto, se uma das funções subjacentes à acção escolar é preparar para

a vida, afigura-se ter toda a lógica que essa preparação - para que se torne,

efectivamente eficiente - seja construída em permanente consonância com os

elementos básicos da cultura presente no seio social envolvente de cada escola.

Ora, é precisamente neste processo de articulação da vida escolar com a vida real

que se prefigura determinante o papel a desempenhar pelo Projecto Curricular de

Escola.

Se, quando se abordou a problemática do projecto educativo de escola se

propugnou, entre outros aspectos, pelo primado da aprendizagem, afigura-se,

agora coerente, subordinar, então, a organização e o desenvolvimento curricular

da escola à figura e pessoa do aluno. Aliás, a própria concentração na

aprendizagem, parece pressupor, exactamente, a priorização do papel do aluno,

se se entender, por contraponto - como se julga legítimo - que a concentração no

ensino releva, sobretudo, a primazia do papel do professor. Neste contexto,

afigura-se pertinente realçar a ideia de que, dar prioridade ao ponto de vista das

necessidades e expectativas do aluno - logo, sob o ângulo da procura - implica, de

algum modo, contrariar uma certa tradição educacional, historicamente assente na

priorização do programa, ou seja, da oferta.

Como consequência do exposto, parece resultar - de resto, na mesma linha

de raciocínio, já abordado noutros locais deste trabalho - que o currículo deve ser

entendido e implementado como um meio pedagógico colocado ao serviço da

formação integral do aluno, ocupando este, por conseguinte, o lugar centrípeto de

todo o processo. Logo, o projecto curricular deverá espelhar, de modo explícito,

estes princípios, estabelecendo, assim, uma desejável associação pedagógica e

semântica com os conteúdos do projecto educativo de escola.

5.4 A Equipa de Planificação Inclusiva

Como, oportunamente, se deu conta, Correia (2003) preconiza a criação de

estruturas informais a nível interno da organização escolar, para garantir a

optimização operacional dos processos inerentes à educação inclusiva. Segundo

aquele autor, a iniciativa da criação daquelas estruturas deve partir do órgão de

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gestão, devendo, de tal, resultar, como uma das estruturas em causa, a equipa de

planificação inclusiva.

O autor em análise (Correia, 2003) aponta, como objectivo principal

daquela equipa “planear, dinamizar e avaliar o projecto de escola conducente à

inclusão” (p. 24). Para este autor, portanto, esta equipa detém um papel

estratégico em todos os níveis do processo de construção da escola inclusiva,

dado que lhe está cometida a responsabilidade do planeamento e da avaliação

desse mesmo processo, bem como, ainda, a função de dinamizar o seu

desenvolvimento prático. O mesmo autor insere, ainda, no âmbito da esfera de

acção da equipa de planificação inclusiva, entre outros, os seguintes aspectos:

• Implementação de uma cultura de escola e de sala de aula facilitadora das

dinâmicas de inclusão;

• Sensibilização da comunidade educativa para o processo de inclusão;

• Disponibilização do atendimento escolar para toda e qualquer criança

residente na sua área de influência;

• Diagnóstico dos constrangimentos e problemas inibidores da inclusão;

• Estímulo à emergência de um clima relacional securizante e de entreajuda

a nível da comunidade escolar;

• Promoção da resolução de problemas educacionais de alunos com

problemáticas complexas mediante a intervenção de equipas de

colaboração.

A Equipa de Planificação Inclusiva consubstancia, pois, um recurso crucial

no processo de construção da escola que aqui se defende. Paralelamente,

configura, um estratégico meio auxiliar do órgão de gestão, nos processos de

concepção e implementação dos planos gerais da acção educativa a

operacionalizar, pela comunidade, em cada ano escolar.

Nesta perspectiva afigura-se que a equipa em questão detém um papel

fundamental na elaboração do ideário da escola - a nível, portanto, do seu projecto

educativo - bem como na identificação clara das estratégias de gestão curricular

os quais deverão, por sua vez, consubstanciar os princípios orientadores do

projecto curricular de escola. Ideário e estratégias de gestão curricular que serão,

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obviamente, determinantes enquanto referências norteadoras da acção educativa

do conjunto dos profissionais escolares.

Ora, se se deseja, numa determinada escola, que aquela acção educativa

seja de tendência inclusiva, então parece tornar-se imprescindível que tal esteja

muito explicitamente expresso, tanto no ideário como nas estratégias de gestão

curricular adoptadas. Daqui se infere, pois, a relevância do papel e da acção

cometidos à Equipa de Planificação Inclusiva.

5.5 Os Projectos Curriculares de Turma

Num ambiente de ensino e de aprendizagem inclusivos, o professor deverá,

antes de mais, funcionar como modelo perante os seus alunos, aceitando cada um

como é e estimulando o desenvolvimento de uma rede permanente de interacções

de ajuda e de apoio recíprocos, na sala de aula, ou seja, no seio da turma. Deste

modo, o êxito do processo de ensino-aprendizagem parece estar muito

dependente do grau de conhecimento que os docentes possuam das turmas com

que trabalham e, por conseguinte, do modo como inventariarem as estratégias

pedagógicas a partir, precisamente, daquele conhecimento. Estes parecem ser os

caminhos para uma pedagogia de qualidade através de uma gestão cuidada das

turmas. Para tal importa que “os alunos sejam conhecidos, os seus interesses

particulares reconhecidos e valorizados e os professores proponham um trabalho

relacionado com esses mesmos interesses” (Tomlinson & Allan, 2002, p. 47).

Como é, sobejamente, reconhecido, os alunos são diferentes em

expectativas, interesses, níveis motivacionais e graus de conhecimentos. Essa

diferenciação provoca inevitáveis implicações nos processos de aprendizagem,

nomeadamente, na quantidade de tempo que cada aluno necessita para a

integração dos saberes escolares. É, por consequência, essa a razão, pela qual

se releva a necessidade de serem levados a cabo procedimentos metódicos de

caracterização de cada turma, sob a convicção de que os resultados assim

obtidos, ditarão a conveniência de disponibilizar, precisamente para cada turma,

diferentes graus de apoio educativo.

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É, nesta linha de pensamento, que se posiciona Wang (1998), ao alertar, os

professores, para a necessidade de reflectirem, continuamente, nos modos de

aprender dos alunos, bem como nos efeitos que as práticas docentes provocam

naqueles. Só agindo deste modo - adianta Wang - os docentes terão possibilidade

de adaptarem - com base nos resultados dessa reflexão - o ensino àquelas

características, para, desta forma, obterem resultados significativamente eficazes.

O conhecimento profundo dos perfis educacionais dos alunos da turma14,

emerge, então, como um requisito capital para a implementação e

desenvolvimento de uma intervenção educativa capaz de proporcionar uma

aprendizagem de qualidade para a generalidade dos mesmos alunos. No

seguimento operacional desta perspectiva, torna-se, consequentemente,

determinante, identificar referências que permitam estabelecer um quadro

sistemático, significativo e, ao mesmo tempo funcional, de recolha de informação

conducente à elaboração de cada perfil de turma15.

Dada a importância de que se reveste, entende-se, por consequência, ser

essencial - num projecto de construção de escola inclusiva - o recurso

sistematizado à caracterização rigorosa dos comportamentos e dos desempenhos

educacionais de todos os alunos - e de um modo muito particular dos alunos com

NEE - sob a forma de registos estruturados que, aqui, serão designados -

julgando-se que de modo apropriado - por perfis de turma.

Aceitando-se o pressuposto de que a competência na resolução dos

problemas inerentes aos alunos com necessidades educativas especiais, concorre

para o aprofundamento do conjunto dos saberes profissionais dos professores - e,

por consequência, para a melhoria das respostas a todos os alunos - afigura-se,

defensável, centrar a procura das dimensões a eleger para a caracterização das

turmas, nos trabalhos produzidos por investigadores experientes e especialistas

em processos de diagnose, planificação, intervenção e avaliação, no âmbito das

necessidades especiais de aprendizagem. 14 Apelidados de perfis de aprendizagem por Tomlinson e Allan (2002), sob o conceito de “modo como

aprendemos enquanto indivíduos” (p. 39). 15 Esta expressão é inspirada - conquanto com uma certa adaptação semântica e pedagógica - na que é

utilizada por Ribeiro e Ribeiro (1990).

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Sob a lógica, antes, enunciada, afigura-se, então, que os contributos de

Arândiga (1993 e 1996) configuram um acervo de material pedagógico

perfeitamente adequado ao propósito em causa, uma vez que este autor tem

vindo a produzir um trabalho de considerável dimensão, precisamente no âmbito

da intervenção junto de alunos com NEE. Consequentemente, serão, a seguir,

referenciadas algumas das áreas, ou dimensões de desenvolvimento e de

aprendizagem, abordadas por aquele autor, as quais prefiguram a organização de

um processo funcional e rigoroso de recolha da informação necessária à

elaboração dos pretendidos perfis de turma. Ao longo da exploração dos

contributos do autor referido, serão, entretanto, acrescentados, de forma

intercalada e complementar, dados aportados por outros autores, sobre áreas

afins, visando-se, com tal procedimento, aprofundar e enriquecer o quadro de

organização da grelha de observação e de registo do perfil de turma.

Iniciando-se, então, a abordagem das possíveis áreas relevantes para a

identificação do estilo de aprendizagem de cada aluno, refere-se, em primeiro

lugar, a área das competências sociais a qual merece, por parte de Arândiga um

realce significativo, na medida em que lhe atribui um papel fulcral, na formação

dos alunos como pessoas, nomeadamente, no que respeita ao saber respeitar e

conviver com os outros. Ainda que de modo implícito, Arândiga enquadra,

portanto, no âmbito deste tipo de competências, tanto o respeito pelas regras,

como as formas de relação interpessoal dos alunos. Esta área parece, assim,

conter, virtualidades imensas do ponto de vista formativo, dado que pode ser

considerada como uma aprendizagem e preparação das crianças para a sua

futura integração interactiva na sociedade.16

Numa outra ordem de ideias, Arândiga refere-se, em abordagens

diferenciadas, à atenção17, à memória e ao raciocínio, relacionando-as, no seu

16 No Diccionário Enciclopédico de Educación Especial este conceito é definido como um fenómeno “... que

se produce como consecuencia de la adaptación de las respuestas de los individuos a los reqerimientos del

medio y a la vez, el producto o resultado de dicho processo (1986, p. 1171). 17 Elósegui, J. (1992) descreve a atenção como a disposição que cada indivíduo tem, ou adopta, em

situações em que ouve, vê ou actua.

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todo interactivo, com o funcionamento cognitivo dos alunos, ou seja, com o

processo pelo qual, os mesmos, percepcionam, armazenam, evocam e aplicam a

informação.

Pela aproximação - e até clarificação - à proposta de Arândiga, afigura-se

interessante, recorrer, na área da cognição, a outros autores, neste caso a Araújo

e Chadwick (1988), os quais, com base nos trabalhos de Gagné, descrevem as

fases em que assenta o processo de aprendizagem - na óptica da teoria do

processamento da informação - de um modo que pode ser organizado conforme

consta no Quadro 4, a seguir apresentado.

Quadro 4

Fases do Processo de Aprendizagem Organizadas por Araújo e Chadwick (1998),

com Base na Teoria de Gagné

Fases da Aprendizagem

Processos

1ª fase – Motivação Expectativas do sujeito face à tarefa a realizar

2ª fase - Apreensão Recepção sensorial dos estímulos relevantes

(relevância segundo o critério da atenção selectiva)

3ª fase – Aquisição Codificação da informação recebida

4ª fase – Retenção Armazenamento da informação na memória de longo

prazo

5ª fase – Evocação Recuperação da informação memorizada, para a

acção

6ª fase - Generalização Evocação da informação em novos e diferentes

contextos

7ª fase - Desempenho Emissão de uma resposta que traduz a apropriação

da aprendizagem

8ª fase – Retroalimentação

Percepção do grau de adequação da resposta

A proposta dos autores em causa aponta, assim, para uma sequência de

procedimentos cognitivos que parecem tornar muito claro o processo seguido por

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cada aluno para aprender, pelo que se afigura extremamente adequado a sua

recuperação neste trabalho.

Assentando - como se confirma empiricamente, no quotidiano escolar - o

processo de ensino-aprendizagem, na linguagem oral e escrita, o saber escutar e

o saber ver, configuram, neste âmbito, procedimentos de crucial importância e que

dependem, consequentemente, de um bom uso da atenção, por parte de cada

aluno. Conjugando-se os trabalhos que, neste âmbito, foram produzidos, quer por

Elósegui (1992), quer por Lemaitre e Maquére (1987), importa ter em conta que a

funcionalidade daqueles processos perceptivo-sensoriais, por parte dos alunos,

dependem, por sua vez, da influência de dois factores fundamentais. Tais factores

são:

1) A intenção com que o sujeito mobiliza, quer o saber escutar, quer o saber

ver, a qual é decorrente de uma decisão pessoal, face à percepção do

resultado, ou do proveito que, da acção, em causa, se pode obter;

2) A motivação18 que impulsiona o indivíduo a escutar e a ver, a qual,

depende, tanto do desejo pessoal, como do grau de satisfação que se

espera obter, da situação envolvente.

Encontram-se, também, elementos nos trabalhos daqueles autores que

relevam o facto de que a percepção do fracasso tem implicações inibitórias no

funcionamento da atenção. Assim, se o aluno pressente uma hipótese forte de

insucesso nas tarefas que lhe são propostas, os consequentes impulsos

motivacionais levam-no a uma atitude espontânea de rejeição, tanto do ver, como

do escutar, mesmo que se esforce, internamente, por estar atento. Muito

frequentemente este comportamento provoca uma incontida irritação nos

docentes, como observa Élósegui (1992).

Ainda segundo os autores em análise, a distracção consubstancia o grande

inimigo da atenção, como, de resto, é do senso comum. Mas o que se julga ser

de realçar, neste aspecto, é a possibilidade de serem identificados - com base na 18 Por seu turno Dweck (1989) frisa o facto de haver alunos, cuja motivação está subordinada à

aprendizagem, enquanto que a de outros se subordina aos resultados. Como consequência desta

diferenciação aquele autor, refere que os primeiros assumem a escola como um desafio, enquanto que os

segundos estão, essencialmente, mais preocupados em não cometer erros do que em aprender.

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análise das obras em apreço - alguns factores que, assentes numa dinâmica de

causa/efeito, facilitam, com frequência em determinados alunos, a emergência dos

indesejáveis quadros de distracção. Como exemplos desses factores, podem ser

especificados os seguintes:

• Fragilidades no domínio dos saberes básicos (existências de falhas

significativas em áreas como a linguagem, ou a matemática, tornando

muito difícil, a sua recuperação, se não for implementada uma adequada

orientação).

• Domínio precário das técnicas de estudo (um número muito significativo

de alunos não sabe estudar e só o aprenderão se as técnicas em questão

forem objecto de ensino intencional e da consequente prática).

• Problemas familiares (há alunos que são alvo de uma incipiente aceitação

familiar; outros - ou os mesmos - vivenciam, por norma, ambientes

relacionais conflituosos entre os pais e outros há ainda, que não usufruem

de qualquer enquadramento educacional, nos tempos extra-escolares).

• Hábitos de pouca persistência nos trabalhos (há crianças habituadas à

expressão e realização imediata dos seus desejos sem qualquer

contrapartida da sua parte, o que elimina a possibilidade da percepção

profunda da satisfação advinda da obtenção de algo que é conseguido

graças à vontade e ao esforço pessoais).

No que se refere, entretanto, à memória, julga-se ser legítimo inferir que

esta capacidade cognitiva consubstancia um elemento fundamental no processo

de aprendizagem. A sua importância, neste contexto, verifica-se sobretudo, a nível

da retenção da informação, bem como a nível do fornecimento de matéria para a

evocação e para o consequente desempenho (aplicação em contexto), por parte

do sujeito.

A memória representa, portanto, a faculdade humana de armazenar todos

os conhecimentos adquiridos. Face à relevância desta capacidade, afigura-se

fundamentado, aprofundar, seguidamente, esta questão, para o que se recorreu à

interacção lógica e articulada dos trabalhos desenvolvidos por Carrasco (1995),

Lemaitre e Maquére (1987) e Espinar, (1993).

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Segundo os autores em análise importa ter em conta, por um lado, a

memorização mecânica e, por outro, a memorização significativa, processos que

traduzem a fase da integração da informação, isto é, o armazenamento dos

saberes. A eficácia dos posteriores processos de recuperação e de aplicação da

informação memorizada, não é, em absoluto, independente da natureza

(mecânica, ou significativa) do anterior processo de integração. Pelo contrário, se

a memorização se concretizar de modo significativo, tanto a respectiva evocação,

como a inerente aplicação serão mais eficientes do que seriam, se o processo de

armazenamento tivesse sido assegurado pelo recurso à memorização mecânica.

Logo, afigura-se crucial que a retenção da informação seja, tanto quanto possível,

assegurada mediante estratégias indutoras da atribuição de significado pessoal

àquela informação.

Para que seja, então, garantida uma natureza significativa aos processos

de memorização, torna-se fundamental estabelecer, de forma explícita, relações

quer lógicas quer do tipo causa/efeito, entre os conhecimentos prévios detidos

pelos alunos e os conteúdos propostos pela primeira vez. Serão os resultados

desta interacção semântica que promovem, por parte do aluno, uma apropriação

da informação mais intrinsecamente integrada no respectivo património cognitivo

e, consequentemente, uma mais eficiente utilização futura da informação, assim

retida.

Por oposição à memória significativa, figura, portanto, a memória mecânica

que assenta, essencialmente, na repetição sucessiva do material a fixar. Este tipo

de memorização, ainda assim, terá que ser mobilizado, especialmente, quando a

informação a reter é do tipo factual, como por exemplo, determinados eventos,

datas, acontecimentos e listagens de conceitos, ou de nomes. Neste caso,

deverão ser mobilizados recursos mnemotécnicos, entendidos como processos de

ajuda, em situações de memorização mecânica, já que sem estes auxílios, os

alunos teriam, neste processo, maiores dificuldades.

Como princípio pedagógico é, ainda, importante conceber a memória não

como uma faculdade cognitiva estática, mas sim como uma capacidade dinâmica

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e como tal susceptível de ser desenvolvida mediante a activação de

procedimentos adequados a tal.

Como exemplos dos referidos procedimentos podem ser elencados os

seguintes:

• Concentração funcional (utilização multissensorial - em especial da

audição e da visão - profundamente orientada);

• Repetição (a acção de repetir aumenta a possibilidade de memorização);

• Associação (a consecução da aprendizagem torna-se mais efectiva

quando se relaciona a informação com o maior número possível de redes

semânticas, figurativas ou emocionais);

• Realização de pausas (o esforço alongado de fixação, fatiga a memória,

pelo que é conveniente proporcionar alguns tempos de descanso, por

norma, quando se varia o estudo de uma área de aprendizagem para

outra).

Por seu turno, a atenção desempenha uma função nevrálgica no que

concerne ao bom uso da memória. Logo, a sua influência no modo como

condiciona a predisposição do funcionamento da memória é determinante do

sucesso, ou insucesso da retenção dos saberes abordados na sala de aula, uma

vez que a memória só pode ter acesso à informação que a atenção anteriormente

seleccione e trabalhe.

Está, portanto, aqui em jogo a dependência do processo de memorização,

face ao da concentração. Então, para que a concentração e a subjacente

optimização da acuidade sensorial, funcionem de modo a proporcionar processos

eficientes de aprendizagem, é conveniente assegurar, por parte do aluno, a

assunção activa de determinados procedimentos. De entre estes destacam-se os

seguintes:

a) Uma atitude: positiva face ao professor e às tarefas de aprendizagem;

b) Uma forte motivação (vontade e interesse pelo trabalho escolar);

c) Autonomia no uso de meios auxiliares da compreensão (enciclopédias,

dicionários, gráficos, ou esquemas);

d) Uma compreensão satisfatória do material trabalhado;

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e) Esforço persistente na realização das tarefas.

Dado que uma grande parte da informação escolar é de natureza factual e

que a sua aprendizagem implica o uso da memorização mecânica - como antes se

avançou - importa, agora, aflorar contributos da literatura que, de alguma forma,

configurem estratégias facilitadoras deste tipo de memorização. Ganha, assim,

cabimento o desenvolvimento de algumas ideias sobre a utilização de recursos

mnemónicos, para o que, na parte seguinte, se expõe, de modo muito sumário, o

que, por um lado Carrasco (1995), e, por outro, Jiménez (1994), produziram sobre

o assunto.

De acordo com os dois autores mencionados, os chamados meios

mnemotécnicos - como já foi anteriormente referido - são recursos que tornam

mais fácil a memorização e aprendizagem de conteúdos de natureza factual.

Como exemplo destes conteúdos podem ser indicados, um conjunto de datas

importantes, uma listagem de conceitos, ou de números, ou, ainda, um

determinado grupo de nomes. Insiste-se, entretanto que, em nenhum caso, se

deve recorrer à memorização mecânica, em situações de aprendizagem cujos

conteúdos permitam o emprego de estratégias significativas.

De entre uma relativamente alargada gama de recursos mnemotécnicos,

especificam-se - com base nos trabalhos dos autores em análise - os seguintes:

• Frase coerente, ou uma pequena história (elaborada com base na análise

da natureza dos dados a memorizar);

• Frase construída a partir das sílabas, ou letras iniciais (para, por exemplo,

o caso de listas de palavras);

• Feitura de versos ( com os dados que é necessário memorizar)19;

• Associação do material a determinado recurso figurativo (associação do

objecto de estudo a uma imagem de algo muito conhecido).

Retomando-se, entretanto, as dimensões que, pela sua pertinência

educacional, podem contribuir para a identificação da estrutura do perfil de turma,

julga-se, também, ter lugar, neste contexto, a área da comunicação oral, como se

19 Um exemplo muito conhecido: Trinta dias tem Novembro, Abril, Junho e Setembro. De vinte e oito, ou vinte

e nove, só há um, os outros todos têm trinta e um.

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depreende da importância que Arândiga (1996), lhe confere no âmbito do

processo escolar, como se pode confirmar pela citação das suas próprias

palavras:

Una de las actividades más usuales del aula es hablar. Y hablar correctamente y

de forma adecuada a cada situación de intercambio comunicativo no es nada

sencillo. Son muchos los alumnos y alumnas que experimentan dificultades de

expresión oral, lo cual les impide comunicarse de una manera eficaz. (p. 239)

O citado testemunho de Arândiga, ao colocar a ênfase no elevado nível de

uso que, nas aulas, se faz da linguagem oral, parece, entretanto, implicar a

conveniência de se levarem em conta, dois aspectos essenciais:

a) A necessidade de um domínio satisfatório da comunicação oral, por parte

dos alunos;

b) A prevenção dos efeitos decorrentes dos problemas de comunicação de

alguns alunos, nos níveis de aceitação por parte dos seus pares.

Ainda, na citação em causa, é possível descortinar que Arândiga sobreleva

a capacidade de uma organização correcta do discurso oral, centrando, por

conseguinte, a sua atenção na estruturação morfossintáctica da linguagem. Ao

tornar explícitos os processos de intercâmbio comunicativo, o autor põe, também,

em relevo, por um lado, o aspecto expressivo da comunicação e, por outro, o

aspecto receptivo e compreensivo da mesma.

A leitura, ocupa também - como seria de esperar - um lugar de realce nos

trabalhos de Arândiga, o qual desdobra, a referida área, em dois processos: o

perceptivo e o cognitivo. Assim, na obra publicada em 1993, o autor privilegia uma

abordagem ao processo perceptivo, pressupondo-o como a capacidade de

estabelecer uma correspondência correcta entre os grafemas e os fonemas.

Na sua obra de 1996, prioriza a abordagem cognitiva20 da leitura,

explicitando-a como “habilidades para leer eficazmente a través de la utilización

20 Outros autores designam a leitura cognitiva como leitura compreensiva, como, por exemplo, Carrasco

(1995) e Lasterra (1989).

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de unas estrategias mentales que pretenden manipular el texto, para extraer de él

la máxima información significativa y almacenaria en su memoria” (p. 73).

Dada a importância capital que a leitura detém, não só no processo escolar,

mas no próprio contexto de uma sociedade do conhecimento e da informação,

como é o caso da sociedade actual, julga-se, conveniente, aprofundar a análise

desta área. Tal, será objecto de exposição seguinte, recorrendo-se, para o efeito,

aos trabalhos que, neste domínio, foram desenvolvidos por Carrasco (1995) e por

Lasterra (1989).

A leitura compreensiva, entendida como capacidade de extracção do

sentido das ideias expressas nos textos pelo respectivo autor, implica, também, o

saber extrair dos documentos escritos, os seus dados mais relevantes e

significativos. O processo de compreender é, pois, aqui, fundamental, facto que,

nem sempre, merece a atenção adequada, já que muitos alunos tentam estudar

para memorizar, sem, portanto, tentarem, primeiro, compreender a informação em

causa.

Aquela situação para além de impedir a atribuição de significação pessoal

ao material apreendido, torna a retenção da informação num processo de grande

fragilidade e, consequentemente, muito fácil de ser votada ao esquecimento.

Logo, é crucial que os alunos aprendam a ler de forma compreensiva e a atribuir

significação pessoal ao material que, com base nessa leitura venham a

memorizar.

Por outro lado, o domínio da leitura compreensiva, por parte dos alunos,

consubstancia a posse de uma estratégia de aprendizagem instrumental de

notável alcance. Como prova desta afirmação apresentam-se os argumentos que

neste âmbito são avançados por Lasterra (1989):

a) É uma condição prévia e um requisito fundamental para a realização de um

estudo eficaz;

b) É uma ferramenta de insubstituível préstimo na elaboração de esquemas,

ou de resumos, dos textos lidos;

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c) A falta de compreensão dos textos torna muito difícil, tanto a apreensão do

seu sentido, como a posterior aplicação do seu conteúdo, em situações

onde, tal, venha a ser necessário.

Paralelamente - como sustenta, ainda o autor antes citado - a

aprendizagem do saber ler de maneira compreensiva, pressupõe o domínio

autónomo, por parte do aluno, de determinadas estratégias, entre as quais se

nomeiam, concretamente, as seguintes:

a) Realização de uma primeira leitura rápida e global do texto a fim de se

perceber o assunto e estrutura gerais;

b) Pesquisa da significação (no dicionário) das palavras novas e cujo sentido

não se depreende da análise contextual da frase onde estão inseridas;

c) Registo, em caderno próprio, quer dos novos termos, quer do significado

concernente;

d) Extracção da ideia principal de cada parágrafo;

e) Apreensão da(s) ideia(s) secundárias de cada parágrafo;

f) Observação das gravuras, quadros, ou esquemas para inferir informação

que ajude a compreender a ideia essencial do texto;

g) Análise específica de palavras, ou expressões, em itálico, a negro, ou em

maiúsculas para, das mesmas, retirar informação crucial e facilitadora do

entendimento global do texto;

h) Expressão da ideia fundamental do texto;

i) Associação do conteúdo de textos novos com o de outros anteriormente

trabalhados, analisando semelhanças, diferenças e eventuais dados

comuns.

Quanto a determinados hábitos indesejáveis adquiridos na aprendizagem

da leitura- que são muito frequentes nos alunos, obviamente, nos primeiros anos

de escolaridade - Jiménez (1994), identifica alguns dos que considera mais

significativos, ao mesmo tempo que apresenta, para cada um deles, quer uma

noção conceptual, quer as correspondentes sugestões de remediação.

Sob a forma de síntese, apresenta-se a informação, em questão, no quadro

seguinte.

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Quadro 5

Maus Hábitos na Aprendizagem da Leitura e Respectivas Estratégias de

Remediação com Base nos Contributos de Jiménez (1994)

Maus Hábitos

Explicitação

Estratégias

Vocalizar

- Ler, indevidamente, em voz

alta, ou mover os lábios sem

emitir sons

- Ler ideias e não palavras

Subvocalizar - Pronunciar, mentalmente,

palavra a palavra

- Atentar no conteúdo das

frases, ou dos parágrafos

Regressões - Voltar atrás para ler o que

já foi lido

- Desenvolver hábitos de

auto-correcção simultânea à

leitura

Mover a cabeça

- Movimentação da cabeça

para acompanhar o fluxo da

leitura

- Auto-controle da postura

correcta e aquisição

adequada dos movimentos

oculares

Guiar com o

dedo

- Acompanhar o fluxo da

leitura com o dedo, sob as

linha do texto

- Semelhantes à estratégia

anterior

Como se poderá deduzir através da apreciação reflexiva da informação

exposta, esta afigura-se de grande pertinência funcional, para todos os alunos em

geral e, em particular - e são muitos, a nível do 1.º ciclo do ensino básico - para os

que apresentam dificuldades específicas na aprendizagem da leitura.

A escrita é, por seu turno, tratada, pelos autores consultados, de um modo

muito articulado com a leitura, estratégia que se prefigura, de certo modo ajustada,

na medida em que indicia ser uma área (a escrita) a componente expressiva, de

forma gráfica, da outra (leitura), funcionando, então, esta, como a componente

receptiva da primeira. Com esta orientação, Arândiga salienta, na construção da

escrita, o paralelo com os correspondentes processos de construção da leitura,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 171

mantendo, como aspecto comum, a estruturação morfossintáctica e respeitando,

obviamente, a natureza expressiva de uma e a receptiva da outra.

Consequentemente, para a escrita, o autor considera também, ainda que de modo

implícito, o princípio da correspondência entre os fonemas e os grafemas.

O cálculo é outra área que merece um tratamento específico nos trabalhos

em análise, mormente, através de uma perspectiva de abordagem centrada nas

inerentes dificuldades de aprendizagem (discalculias). Neste âmbito, Arândiga

relaciona a competência matemática, por um lado, com a capacidade de

manipulação mental de símbolos aritméticos - o que parece prefigurar, aqui, a

noção de conceitos - e, por outro, com o saber realizar cálculos matemáticos, o

que, por sua vez, parece ser sinónimo de efectuar operações.

A motivação é, igualmente, objecto de uma aturada análise nas obras em

referência, sendo, por Arândiga, definida como um “proceso que lleva a los

escolares a dedicarse activamente a las tareas de estudio”21 (1996, p. 297). Ao

situar, nesta dimensão, o impulso interior que estimula o envolvimento voluntarista

dos alunos nas tarefas escolares, o autor realça, desta forma, a importância que,

esta dimensão, consubstancia como factor gerador de uma predisposição

favorável a uma eficiente consecução das aprendizagens propostas nas salas de

aula.22

Finalmente, a motricidade configura outra área a que Arândiga atribui,

também, uma importância significativa, no âmbito das aprendizagens escolares.

Com a intenção de conceder, àquela dimensão, o relevo que acha adequado, o

autor afirma, expressamente que “existe un estrecho paralelismo psicoevolutivo

entre el desarrollo motriz en el niño y el desarrollo de los procesos psicológicos

básicos” (1993, p. 237). Arândiga refere que as acções motoras intencionais são

os elementos básicos desta área, indiciando, deste modo que a postura corporal

activa, bem como os movimentos mais finos (funcionalidade) - realizados por

21 Espinar (1993) prefere encarar a motivação numa outra perspectiva, considerando-a, essencialmente, como

um conjunto de processos que, estimulam, orientam e conferem persistência à acção do indivíduo. 22 Tomlinson e Allan (2002) relacionam a motivação com o interesse, afirmando, neste contexto, que “ligado à

motivação, o interesse do aluno pode ser um factor estimulador da aprendizagem, porque o interesse torna as

tarefas atraentes, satisfatórias e pessoalmente estimulantes.” (p. 38)

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 172

qualquer parte do corpo - são resultantes de um prévio comando psíquico

(intencionalidade).

Enquadrando-se, então, a área da motricidade na teoria do processamento

da informação, julga-se adequado associar, fundamentalmente, o funcionamento

psicomotor à fase do output. Estão assim em causa os procedimentos de

desempenho, os quais no âmbito da escolaridade, passam, nuclearmente, pelo

uso do aparelho fonador (exteriorização da linguagem oral) e pela acção da praxia

manual (produção motora do acto da escrita).

Neste processo de pesquisa de fundamentos para a identificação das

variáveis susceptíveis de configurar o desenho da estrutura de uma grelha para a

elaboração do perfil de turma, importa, dentro dos parâmetros de uma perspectiva

inclusiva, enquadrar os casos em que “ um aluno não tem capacidade de aceder

ao currículo regular, mesmo que adaptado, elaborado de modo a responder às

suas necessidades especiais de educação (. . .) devendo, sempre ser procurado o

desenvolvimento de competências que lhe permitam a máxima autonomia”

(Ministério da Educação, 1992, pp. 20-21). Assim, a área da autonomia emerge,

também, como uma das variáveis possíveis no contexto em questão,

nomeadamente, no que concerne aos alunos com problemas significativos, a nível

intelectual, parecendo que a área em causa deverá abranger, paralelamente, a

autonomia pessoal e a autonomia no meio.

Sendo, a diversidade dos alunos uma realidade inevitável e omnipresente

no quotidiano escolar, as equipas educativas de cada estabelecimento de ensino,

ao planearem e desenvolverem o seu projecto de intervenção pedagógica,

deverão equacionar devidamente, aquele factor. De facto quando se fala em

diversidade “estamos a falar em adequação pedagógica e, se quisermos, em

adequação curricular, que nos permita planificar tendo em conta as características

e necessidades dos alunos e dos ambientes onde eles interagem” (Correia, 2003,

p. 13).

Assim, as actividades em sala de aula deverão ser mobilizadas, tendo em

conta, portanto, as características específicas do grupo de alunos em presença,

situação que pressupõe a activação de hábitos de reflexividade, por parte de cada

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 173

professor, visando explorar o currículo (comum e nas variantes de planos

educativos individualizados) como um elemento capital da resposta educativa a

todos os alunos da turma (Hargreaves, 1996). Nesta ideia parece estarem

resumidos, de forma muito pertinente, o conceito e a utilidade educativa do

Projecto Curricular de Turma, enquanto instrumento de gestão curricular que visa

a adequação do processo de ensino-aprendizagem a cada turma concreta.

Contudo, para que tal se desenrole num quadro de pedagogia inclusiva, importa

que não sejam, nunca, descurados - antes pelo contrário - os procedimentos

específicos que, neste âmbito deverão ser desenvolvidos em ordem a responder,

de modo adequado aos alunos com NEE, assegurando-lhes, consequentemente,

o seu direito inquestionável a “ uma educação apropriada” (Correia, 2003, p. 25).

O Projecto Curricular de Turma implica, por conseguinte, uma relação muito

estreita e dinâmica entre a acção do professor, a gestão do currículo e os

diferentes processos de aprendizagem patentes no grupo de alunos. São, pois, de

grosso modo, estes os elementos fulcrais em presença na sala de aula.

Tomlinson e Allan (2002) identificam um conjunto de crenças inerentes ao

acto educativo que, pela sua pertinência, parecem configurar uma referência a ter

em conta, na planificação dos procedimentos de gestão das variáveis, ou

dimensões, atrás apresentadas como os elementos a consagrar na elaboração da

grelha de identificação do perfil de turma. Pelo seu grau de oportunidade, neste

contexto, transcrevem-se, na íntegra, as crenças em causa: - Os seres humanos partilham sentimentos e necessidades comuns e as escolas

devem ajudar-nos a compreender e a respeitar esses aspectos comuns.

- Os indivíduos também diferem significativamente como alunos; estas diferenças

têm um peso importante na turma pelo que as escolas devem ajudar-nos a

compreender e a respeitar as diferenças.

- A inteligência é dinâmica e não estática, plural e não singular.

- A capacidade humana é maleável e a arte de ensino é a arte de maximizar a

capacidade humana; um dos objectivos centrais das escolas devia ser a

maximização da capacidade de cada aluno.

- Provavelmente subestimamos a capacidade de cada criança enquanto aluno.

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- Os estudantes devem estar no centro do processo de aprendizagem, activamente

envolvidos em dar sentido ao mundo em seu redor, através dessas lentes a que

chamamos “disciplinas”.

- Todos os alunos necessitam de um trabalho escolar que os respeite, os afecte e os

atraia para que, desenvolvendo as suas capacidade individuais, se tornem

membros realizados e produtivos da sociedade.

- Uma das principais abordagens relativamente ao desenvolvimento do alunos

defende que este resulta da competição consigo mesmo, a qual favorece o seu

crescimento e o seu progresso.

- Os professores e outros adultos precisam de ajudar os alunos a aceitar a

responsabilidade pelo seu próprio crescimento e progresso.

- Os indivíduos e a sociedade beneficiam quando as escolas e turmas são

comunidades genuínas de respeito e aprendizagem.

- As turmas eficazmente heterogéneas são essenciais para construir uma

comunidade nas nossas escolas.

- As turmas eficazmente heterogéneas são contextos influentes, porque a maioria

dos alunos passa aí grande parte do seu tempo.

- Todas as turmas eficazmente heterogéneas reconhecem as similaridades e

diferenças entre os alunos, dedicando-lhes uma especial e genuína atenção.

- As turmas onde ocorre um processo excelente de diferenciação pedagógica são,

em primeiro lugar, excelentes e, depois, espaços onde se diferenciam os

processos de ensino e de aprendizagem. (pp. 34-35)

Nestes excertos, verifica-se que a heterogeneidade é considerada como a

característica nuclear das turmas, sendo, ainda, evidenciado, de modo particular,

a existência paralela de aspectos comuns e de aspectos diferentes no seio de

cada turma. A partir deste facto as autoras em referência aproveitam, também,

para fundamentar a ideia de comunidade que está subjacente ao conceito de

turma.

A estratégia de diferenciação surge, naquele conjunto de crenças, como um

claro enfoque pedagógico transversal. A estratégia em causa consubstancia,

portanto, o processo mais adequado para uma gestão eficaz dos diversos perfis

de aprendizagem, inevitavelmente presentes em cada grupo concreto de alunos

(turmas).

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 175

Para que não ocorram contradições indesejáveis entre as intenções e os

factos, é indispensável que cada professor desenvolva hábitos de autonomia

reflexiva na forma de lidar com o currículo, a fim de que este seja, efectivamente,

um instrumento ao serviço da formação dos alunos. Procedendo desta maneira,

cada professor - em interacção estreita com outros intervenientes, nomeadamente

com os agentes da educação especial - transforma o currículo numa ferramenta

educativa perfeitamente ajustada ao painel das potencialidades e necessidades

dos alunos por quem é responsável, em termos profissionais. Nesta situação os

professores devem ser intérpretes interventivos do processo de gestão curricular,

funcionando como figuras centrais do seu planeamento, desenvolvimento e

aperfeiçoamento contextualizado, rejeitando, portanto, a mera condição de

executores (Brenann, 1985).

O Projecto Curricular de Turma tem, naturalmente, como elemento de base,

o currículo, o qual deverá ser, simultaneamente, equilibrado, relevante e

diferenciado. Respeitando-se estes princípios o currículo é organizado de maneira

a facilitar a diversificação metodológica na sala de aula e de garantir e

salvaguardar a resposta à diversidade ali presente, em todas as dimensões do

indivíduo.

Nesta lógica, o currículo não pressupõe, apenas, os conhecimentos

académicos. Efectivamente são, além destes, tidos em consideração outros, os

quais sendo embora de natureza diferente - atitudinal e procedimental - concorrem

igualmente para a formação e preparação dos alunos, tendo em vista as

exigências com que terão de se confrontar na sua posterior condição de cidadão

na vida adulta, (Melero, 1995).

Numa perspectiva efectivamente inclusiva, deve, aqui, prevalecer a lógica

do currículo único, gerido de forma a que todos os alunos se envolvam, e

desenvolvam no mesmo, o mais possível. Neste aspecto particular - e de crucial

importância para a edificação da escola inclusiva - admite-se que os alunos com

necessidades educativas especiais possam, perfeitamente, participar, como

qualquer outro, em determinadas actividades curriculares. Noutras, será,

naturalmente, necessário operar determinadas alterações para que o

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 176

envolvimento daqueles alunos seja satisfatório e possível de proporcionar níveis

desejados de sucesso.

Nalguns casos será mesmo imperioso o recurso à intervenção de outros

profissionais que não o professor titular de turma. São disso exemplo as situações

em que se torna aconselhável “um ensino altamente individualizado, intensivo e

baseado em planificações consistentes” como assinalam Hallahan e Kauffman

(1997), citados em Correia (2003, p. 14).

A ideia de se preconizar a existência de um currículo único filia-se, portanto,

na lógica de obediência e de respeito aos princípios conducentes às práticas de

uma educação autenticamente inclusiva. Tal, não implica necessariamente, que a

gestão das actividades de aprendizagem, por parte dos docentes se centre,

fulcralmente, no currículo único. Antes se postula a premissa de que o sucesso de

uma pedagogia para a inclusão passa por uma lógica de interacção entre o estilo

de aprendizagem de cada aluno e a natureza de cada unidade de aprendizagem

proposta, em que esta pode sofrer alterações de modo a que se ajuste àquele.

Nesta perspectiva, afigura-se como estratégia fundamental, a mobilização

da intervenção mediadora do professor. Esta acção deverá estar, portanto,

subordinada a processos devidamente contextualizados de adequação mútua

entre o perfil de aprendizagem dos alunos23 e cada conteúdo de ensino.

Sob a lógica daquela adequação emerge, portanto com todo o fundamento,

a necessidade de se proceder a adaptações do currículo. Cada uma dessas

adaptações curriculares deverá, por conseguinte, responder à dimensão da

individualidade e procurar, nesta, a sua legitimidade.

As alterações referidas não deverão, por conseguinte, legitimar uma

separação curricular, sob o argumento decorrente de qualquer processo de

etiquetagem, antes, deverão consubstanciar indicações claras de como proceder

para assegurar a participação dos alunos com NEE, no currículo geral da turma,

sempre que possível.

23 Como elementos concernentes ao perfil de aprendizagem, Tomlinson e Allan (2002) apontam “o talento dos

estudantes, ou o seu tipo de inteligência”. ( p. 26)

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A turma, enquanto unidade sócio-educativa nuclear do processo de ensino-

aprendizagem, ocupa, portanto, um lugar de capital importância, na organização e

gestão da actividade docente e discente. Logo, a natureza da interacção gerada

no seio de cada turma prefigura uma influência decisiva no processo de inclusão

dos alunos, quer do ponto de vista social quer do ponto de vista educacional.

A relevância pedagógica da turma acaba, precisamente, por ser

reconhecida de modo muito pertinente, pelo sistema educativo português. Tal foi

formalizado através do lançamento do já referido modelo de gestão curricular, no

Ensino Básico, ao estabelecer que o currículo nacional “deverá ser desenvolvido,

em função do contexto de cada turma, num projecto curricular de turma ” (Decreto-

Lei n.º 6/2001, preâmbulo, parágrafo 11.º).

Tendo-se, assim, em conta, por um lado, o lugar estratégico que a turma

ocupa no espectro organizativo e funcional da educação escolar e, por outro, o

mencionado facto de a legislação recente lhe ter concedido um destaque

significativo, entendeu-se ter todo o fundamento integrar o projecto curricular de

turma na estrutura básica de construção da escola inclusiva. É, pois, sob esta

perspectiva que aquele instrumento de gestão curricular de cada turma foi, neste

trabalho, considerado como um factor de extrema relevância e, como tal, dever

figurar como uma das dimensões nucleares do modelo de escola inclusiva aqui

adoptado.

No que respeita, ainda, à organização dos projectos curriculares de turma,

afigura-se ser de capital importância que, os mesmos, contemplem o princípio de

que as adaptações curriculares individuais, sejam concebidas e desenvolvidas no

contexto da programação global das aulas, inibindo, desta forma - e tanto quanto

possível - a existência de dois currículos paralelos. Por seu turno, como já foi

devidamente realçado, a programação das aulas deve assentar e partir do

conhecimento que o professor tenha dos alunos. Para tal a avaliação metódica e

profunda dos estilos de aprendizagem, bem como a respectiva interpretação

pedagógica, ocupam, neste contexto, um lugar estratégico e de indiscutível

pertinência (Wang, 1998). Daí - frise-se mais uma vez - a importância pedagógica

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que decorre da elaboração, no início do ano escolar, do perfil educacional das

diferentes turmas..

Entretanto, a organização do plano curricular de turma (entendido como o

conjunto dos conteúdos programáticos a desenvolver no processo de ensino-

aprendizagem ao longo do ano escolar) para ser intrinsecamente adequada à

realidade de cada turma, deverá seguir alguns princípios estratégicos que lhe

confiram, por um lado autenticidade e, por outro, a necessária natureza de

funcionalidade. Para salvaguardar estes requisitos, Coll e Rochera (1990)

sugerem, o cumprimento de determinados procedimentos, de entre os quais se

relevam os seguintes:

• Identificação prévia dos blocos de conteúdos considerados particularmente

relevantes;

• Selecção dos conteúdos a abordar, em função da situação dos alunos no

ano e ciclo de escolaridade;

• Análise de cada unidade de conteúdos em ordem a serem formulados os

consequentes objectivos educacionais, bem como para estabelecer a

sequência do respectivo processo de ensino-aprendizagem.

A fim de serem, ainda, asseguradas as melhores condições para o sucesso

educacional dos alunos, configura-se imprescindível a identificação de estratégias

que, servindo de suporte basilar ao desenvolvimento curricular do projecto de

turma, conduzam à consecução, de uma autêntica pedagogia de qualidade. Tal

consiste naturalmente num processo de intervenção pedagógica que vise

responder às características de todos os alunos e de uma forma muito rigorosa

aos alunos com NEE.

Sob esta preocupação, haverá, então que seleccionar determinadas formas

de agir, em sala de aula, que facilitem a concretização daquele desiderato. Novak

e Gowin (1988) relevam, neste contexto, a necessidade de se analisarem as

matérias de ensino, a fim de, as mesmas, serem estruturadas de acordo com as

leis e princípios que regem a organização psicológica do conhecimento e,

consequentemente, serem apresentadas, em ordem a possibilitar uma abordagem

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 179

bem sucedida, por parte da generalidade dos alunos. Para aqueles autores, as

estratégias mais relevantes, para o efeito em apreço, são:

a) A apresentação de novos conteúdos deve relacionar-se com as

experiências e conhecimentos prévios dos alunos;

b) Os conteúdos devem ser apresentados numa ordem que vá dos mais

gerais e inclusivos aos mais específicos;

c) A abordagem de novos conteúdos deverá ser precedida da explicitação das

relações que mantêm com os já existentes na estrutura cognitiva dos

alunos;

d) A apresentação de novos conteúdos gerais deverá apoiar-se em exemplos

empíricos que os ilustrem e os tornem significativos.

NovaK e Gowin concedem, como se pode constatar, um realce muito

especial à articulação entre os conhecimentos prévios e os novos saberes,

visando desta forma que sejam desenvolvidos procedimentos didácticos que

proporcionem, aos alunos, uma integração sucessivamente significativa das novas

aprendizagens. De algum modo, os autores em questão sugerem que os saberes

já dominados pelos alunos passem a funcionar como pré-requisitos das futuras

aprendizagens. Tal estratégia parece deter uma importância muito especial no

âmbito da intervenção pedagógica, mormente junto dos alunos mais novos, como

é o caso, naturalmente, dos que frequentam o primeiro ciclo da escolaridade

básica. Agindo-se desta maneira as crianças aprenderão com mais segurança

dado que a apreensão dos novos saberes será mediada através de uma

ancoragem significativa nos conhecimentos que já possuem. Está, aqui, pois,

muito claramente formulada a lei pedagógica que subjaz, de modo estrutural, à tão

proclamada aprendizagem significativa.

5.6 A Equipa de Programação Educacional Individualizada

Como noutro local já se salientou Correia (2001, 2003a), nos seus trabalhos

de investigação sobre as formas de construção da escola inclusiva refere, neste

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contexto, a necessidade de criação de uma equipa de colaboração24

essencialmente vocacionada para “tomar decisões iniciais acerca de como

responder às necessidades educativas de um aluno” (Correia, 2003a, p. 24). Esta

equipa de colaboração é designada pelo mesmo autor como equipa de

programação educacional individualizada (EPEI), sobretudo quando se

responsabiliza por processos mais específicos de planificação individualizada

junto de um aluno com NEE. Tal programação individualizada será sequencial a

uma primeira planificação/intervenção desenvolvida, já no âmbito da equipa de

colaboração mas cujos resultados não foram considerados satisfatórios. Por se

afigurar que aquela designação - equipa de programação educacional

individualizada - é bastante adequada à função da equipa em análise, perfilha-se,

aqui, a mesma.

Como já foi suficientemente dilucidado, a construção da escola inclusiva

pressupõe o desenvolvimento progressivo e autêntico de uma vivência educativa

sob a forma de comunidade, a qual se “prende com um sentido de pertença, onde

toda a criança é aceite e apoiada pelos seus pares e pelos adultos que a rodeiam”

(Correia, 2003a, p.23). Contudo, tal sentido parece não estar ainda generalizado,

dado que “na maioria dos casos, as escolas são lugares onde os professores

trabalham sozinhos, de costas voltadas para os seus colegas e demais

profissionais de educação” (idem).

Caminhar para uma educação inclusiva é, pois, entre outros aspectos,

encetar um conjunto de mudanças, devidamente orientadas e subordinadas ao

ideal da entreajuda. Assim - e por exemplo - “em vez de se esperar que o

professor possua todo o conhecimento e saberes necessários para o atendimento

a todos os alunos da classe, deve ser disponibilizado um sistema de apoio que o

assista e o torne capaz de resolver problemas, de forma cooperativa e

colaborativa” como aconselham Lipsky e Gartner (1996), citados em Correia

24 Assumindo-se, aqui, o sentido que é dado ao termo colaboração por Idol, Paolucci-Whitcomb e Nevin

(1986, citado em Correia, 2003, p. 26): “ a colaboração é um processo interactivo, através do qual

intervenientes, com diferentes experiências, encontram soluções criativas para problemas mútuos”.

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(2003a, p. 25). São dispositivos de apoio desta natureza que se torna premente

criar no interior das escolas votadas à inclusão, pois que:

Os alunos com necessidades educativas especiais precisam, muitas vezes, de

usufruir de um conjunto de serviços especializados pelo que os professores devem

relacionar-se e colaborar, sempre que possível, com outros profissionais de

educação como, por exemplo, com um psicólogo, um médico, um técnico de

serviço social ou um terapeuta. (Correia, 2003a, pp. 25-26) São, portanto, estes os fundamentos - e eventualmente outros de cariz

similar - que justificam a criação da EPEI, a qual conjuntamente com a já

explicitada equipa de planificação inclusiva - configura a disponibilização de

núcleos internos de apoio sistematizado, cuja acção articulada, especialmente

com os professores titulares de turma, se afigura como um poderoso meio de

responder eficazmente às necessidades educativas especiais dos alunos de uma

dada escola. Uma e outra equipas mencionadas concorrem, por conseguinte, de

modo diversificado mas convergente, para a emergência de condições escolares e

de ambientes de aprendizagem eficientemente inclusivos.

Quanto à composição desta equipa, Correia (2003a) sugere que a mesma

pode ser formada pelos seguintes elementos:

Um representante do órgão directivo, ou o próprio director, um educador ou um

professor de turma (consoante se trate de um jardim-de-infância, do 1.º ciclo ou de

professores de disciplinas específicas, no caso do 2.º e 3.º ciclos e do ensino

secundário), um educador ou um professor de educação especial, um auxiliar de

educação e os pais. (pp. 24-25)

Dada a importância que estas equipas detêm num quadro de

operacionalização dos princípios da inclusão, entende-se que deve ser

devidamente pormenorizado o processo a mobilizar para a recolha da informação

relativa aos alunos em questão e necessária para a elaboração das ditas

planificações. Para tal, entende-se como essencial a proposta que, sobre esta

matéria, é apresentada pelo autor em referência (Correia 2003a), onde são

indicados os procedimentos a activar numa primeira fase de trabalho com os

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alunos com NEE e na qual a equipa pode ser ainda considerada como simples

equipa de colaboração. A proposta em apreço assenta num processo de recolha

de informação sobre cada um dos tópicos constantes na figura 3.

1) Passado do aluno (geralmente a informação é dada pela família)

2) Expectativas para o aluno (da família, dos professores, de outros elementos

do grupo)

3) Receios (da família, dos professores, de outros elementos do grupo)

4) Quem é o aluno? (discussão sobre a personalidade, interesses, e

passatempos)

5) Áreas fortes do aluno

6) Necessidades do aluno

7) Decisão sobre o tipo de planificação a elaborar (tendo em conta as variáveis

mais adequadas à concretização dos objectivos delineados).

Figura 3. Conjunto sequencializado dos tópicos a observar pela Equipa de Programação

Educacional Individualizada, segundo Correia (2003a, p. 25).

Adianta, ainda, o autor em referência, que a planificação elaborada visa

orientar uma intervenção com o propósito de responder positivamente às

dificuldades do aluno. Porém, se o problema do aluno subsistir - como alerta

Correia - será necessário “conhecê-lo melhor, bem como aos seus ambientes de

aprendizagem “ (2003a, p. 24). A partir de então, o papel dos elementos da equipa

ganha uma nova dimensão, passando “a ter responsabilidades claramente

definidas, com o objectivo de vir a facultar ao aluno com NEE uma educação

apropriada” (idem). Com base na especificidade deste último processo, Correia

(2003a) propõe que a equipa, enquanto responsável pelo mesmo, passe, então, a

ser considerada - como já se disse - equipa de programação educacional

individualizada (EPEI).

O êxito do atendimento escolar dos alunos com NEE - e desde logo da

própria escola inclusiva - depende muito do grau de qualidade e de rigor com que

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seja desenvolvido o processo de trabalho junto de cada um. Consequentemente,

impõe-se dedicar a esta questão a atenção que, de modo evidente, lhe está

subjacente. Nesta perspectiva - e visando-se, com tal, outorgar a devida qualidade

e o desejável rigor ao processo em questão - entende-se que o desenvolvimento

de todo o plano de apoio aos alunos com NEE, deve prever - como sugere, ainda,

Correia (2003a) na estruturação do seu modelo de atendimento à diversidade - a

ocorrência de quatro fases:

Uma que diz respeito ao conhecimento; outra que se refere a uma planificação

apropriada, com base nesse conhecimento; uma outra que se relaciona com uma

intervenção adequada que se apoia nas características e necessidades do aluno

e dos ambientes onde ele interage (conhecimento) e numa listagem coerente de

objectivos curriculares (planificação); e ainda uma outra que diz respeito à

reavaliação, ou seja, a um conjunto de decisões que se referem à adequação da

programação delineada para o aluno.” (pp. 18-19)

Com esta excelente síntese, Correia define, de modo muito rigoroso e

preciso, o caminho a seguir para que os alunos com NEE disponham, por parte da

organização escolar, de uma resposta adequada às suas dificuldades. Importa,

então, que o processo de atendimento àqueles alunos siga este caminho que, de

modo tão explícito está, assim, assinalado.

Clarificando, em termos complementares, a função de uma EPEI, Correia

(2003a) prescreve que, a mesma:

Deve preocupar-se também com questões que se relacionem com a permanência

do aluno com NEE na sala de aula, com a prestação de serviços (por exemplo,

terapia da fala) dentro ou fora da classe regular, com o tipo de serviços de

educação especial que devem ser prestados e em que media e, até, com a troca

de informações e o encontrar de soluções sobre quaisquer problemas que os

alunos sem NEE possam apresentar. (p. 25)

Do exposto, há a reter que o autor em análise contempla a possibilidade de

a EPEI constituir um recurso de apoio não só aos alunos com NEE - a sua função

nuclear, obviamente - mas também aos alunos sem NEE. Julga-se, efectivamente,

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 184

que esta sugestão assume um valor bastante relevante na implementação e

consolidação da escola inclusiva. Por outro lado, Correia, expressa de maneira

inequívoca a eventualidade de os alunos com NEE serem alvo da prestação de

serviços fora da classe regular, se a decisão da EPEI se afirmar nesse sentido.

Emerge, aqui, uma questão crucial no que toca à concepção profunda do termo

inclusão, a qual, pela sua relevância, merece mais algum espaço de debate e de

reflexão.

Há, de facto, conhecidos autores que advogam a inclusão total, como, por

exemplo, Gordon Porter, Margaret Wang, Susan Stainback e William Stainback.

São, portanto, investigadores que defendem o atendimento educacional dos

alunos com NEE nas classes regulares, praticamente a tempo inteiro. Outros há

que sustentam uma “posição mais moderada, admitindo que a classe regular não

será a modalidade de atendimento ideal para alguns alunos, pelo menos a tempo

inteiro” como é o caso de Lieberman (1996), Correia (1997), e Kauffman (2002),

citados em Correia (2003b, p.15).

Dada a delicadeza de que se reveste a educação das crianças com NEE,

afigura-se, sem dúvida ser imperioso, colocar acima de tudo os interesses

daquelas e não procurar, de modo mais ou menos irresponsável, dar cumprimento

a determinados slogans cujos efeitos poderão ser contraproducentes para alguns

alunos. Assim, parecem estar nesta situação os que defendem, antes de mais, a

inclusão total já que, como referem Fuchs e Fuchs (1995), vários estudos têm

evidenciado que determinados alunos com NEE alcançam melhores resultados,

do ponto de vista académico, quando colocados em classes de educação especial

do que os seus colegas com problemas similares que foram colocados em classes

inclusivas.

Rief e Heimburge expressam, igualmente, reservas quanto ao atendimento

de alunos com NEE, em tempo integral na sala de aula regular. Nesta linha de

raciocínio aquelas autoras esclarecem que:

Não é nossa intenção deixar implicado que todas as crianças - incluindo as que

apresentam deficiências mais severas – podem ser ensinadas eficazmente na sala

de aula regular. Acreditamos num leque alargado de serviços e de opções de

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 185

colocação para alunos com necessidades educativas especiais. Nem todos os

alunos são capazes de funcionar numa sala de aula regular, mesmo com o

màximo de apoio por parte da educação especial. (2000, p. 15)

A discussão aprofundada deste assunto - tendo-se em conta a abundância

de argumentos aduzidos pelos defensores de cada tendência - tornar-se-ia

alongada e por conseguinte descabida no contexto do presente trabalho.

Consequentemente, opta-se, basicamente, por clarificar a opção acolhida na

presente investigação por parecer que, na essência, é isso que, aqui, importa.

Como anteriormente já se deixou entrever, entende-se, por várias razões

que os argumentos apresentados pelo autores que se perfilam nesta linha que a

posição moderada se afigura mais sensata do que a inclusão total, pelo menos no

estado em que se encontram as nossas escolas, quer a nível organizacional, quer

a nível funcional. Por consequência, não se assume, de maneira inflexível, o

primado do atendimento a tempo inteiro na classe regular para todos os alunos

com NEE. Antes se perfilha o princípio de que será cada EPEI (ou outro recurso

similar) que deverá, de forma fundamentada, decidir o como e onde cada aluno

deverá será alvo da prestação dos apoios constantes na respectiva programação

individualizada.

Não esquecendo que este projecto se centra numa realidade concreta (uma

escola do 1.º ciclo do Ensino Básico) a qual transporta já consigo, uma certa

história pró-inclusiva, com a qual se prefigurou aconselhável não romper, pensa-

se, que com base na observação empírica daquela realidade se deverá, aqui,

precisar, em termos conceptuais o sentido da mencionada história pró-inclusiva.

Nesta linha de reflexão, verifica-se que a tendência da escola estudada se move

para um objectivo de atender todos alunos da área de residência cometida à sua

responsabilidade, incluindo os alunos com NEE, por mais complexa que seja a

sua problemática. Paralelamente, coexiste, ali, a ideia do não cumprimento cego

do ideal da inclusão total, uma vez que, há determinados alunos para os quais,

devido à severidade da sua problemática, são programados tempos e espaços

diferentes dos ocorridos na classe regular, ainda que todos esses alunos estejam

vinculados a uma turma de referência.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 186

Procurando-se, agora - e com base, também, na análise do teor da história

pró-inclusiva da escola-alvo desta investigação - clarificar qual o termo mais

adequado para a situação em causa, julga-se - como de resto, noutra secção já foi

indiciado - que, na escola, se propugna, por uma espécie de escola de inclusão

plena. Ora o que se entende, então, por isto? Pois bem, por escola de inclusão

plena, entende-se, aqui, uma escola que abre as suas portas a todos os alunos

com NEE da sua área de residência, os quais são atendidos ou não, a tempo

inteiro nas classes regulares, conforme a conjugação dos recursos existentes com

a natureza dos seus problemas, assim o determine.

Sob aquela filosofia é, portanto, assegurada, no espaço escolar - que não

só, portanto, nas classes regulares - uma resposta a um quadro geralmente

complexo, de necessidades educativas especiais de que são portadores alguns

alunos. Emerge, deste modo - e de forma fundamentada - a necessidade de se

recorrer às adaptações curriculares individualizadas, as quais deverão merecer,

por todos os motivos já aflorados o máximo de cuidado, tanto a nível da

elaboração como da concretização.

Seguindo-se, por exemplo, o que Ruiz (1988) propõe, considera-se que as

adaptações curriculares individualizadas consubstanciam processos de tomada de

decisões sobre os elementos do currículo para dar respostas educativas às

necessidades particulares dos alunos com NEE. Os elementos a adaptar podem

ser de acesso, ou elementos curriculares básicos como são os objectivos,

conteúdos, metodologias, estratégias de aprendizagem e avaliação. O primeiro

tipo de adaptações (ou seja, de acesso) é, normalmente designado por

adaptações não significativas e o segundo (isto é adaptação de elementos

curriculares básicos) por significativas, sobretudo se estas implicarem a

eliminação ou substituição de conteúdos essenciais consagrados no currículo da

turma.

A opção por adaptar este ou aquele elemento deve ser feita de modo

fundamentado e em função da natureza das necessidades apresentadas pelos

alunos. Logo, neste âmbito, a observação/avaliação do perfil educacional dos

alunos assume um lugar de suma importância e confere, a todo o processo, uma

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 187

responsabilidade decisiva. Assim, como recomenda Correia (2003a), tal

observação/avaliação do aluno e dos seus ambientes de aprendizagem deverá

servir para “identificar as suas competências, de forma a aumentar-lhe a

possibilidade de sucesso no decorrer das aprendizagens, nunca com o fim de o

rotular para o segregar “ (p. 19).

Ainda segundo Ruiz (idem), as chamadas adaptações de acesso podem

abranger:

a) Adaptação da função dos recursos humanos às necessidades dos alunos

b) Adequação dos espaços e dos aspectos físicos

c) Adaptação ou aquisição de recursos materiais e de equipamentos

d) Adequação dos tempos

Quanto às adaptações relativas aos elementos básicos do currículo, Ruiz

propõe as seguintes:

a) Adaptações metodológicas

b) Adaptações nas actividades e tarefas

c) Adaptações na avaliação

d) Adaptações nos conteúdos

No que diz respeito aos procedimentos a seguir para a concretização das

adaptações curriculares significativas, o mesmo autor indica a seguinte sequência:

a) Detecção das necessidades que fundamentem a adaptação

b) Avaliação inicial ou diagnóstica

c) Análise e tratamento dos dados

d) Tomada de decisões quantos aos elementos a adaptar

e) Desenho curricular decorrente das decisões tomadas

f) Desenvolvimento curricular

g) Registo e seguimento

h) Avaliação dos resultados

Afigura-se, entretanto, ser fundamental, em todo este processo, que

persista uma sólida consistência e coerência, entre os pressupostos conceptuais e

as consequentes práticas. Deste modo serão, provavelmente, evitadas

incongruências que, certamente fragilizariam e retirariam credibilidade ao

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 188

processo. Concretamente, há que ter em consideração que a sala de aula detém

um lugar decisivo no modo como os alunos com NEE, ali, realizam as sua

aprendizagens, nos tempos em que tal esteja devidamente previsto, na sua

programação individualizada. De facto, serão raras as situações onde já se fez

tudo o que haveria a fazer para se assegurar um atendimento optimizado

daqueles alunos. Logo, impõe-se a adopção de uma cultura de aperfeiçoamento

contínuo das práticas ali desenvolvidas. A literatura de incidência comprova essa

necessidade, como testemunha a informação de Gortázar (1995) ao asseverar

que “em muitos países, os esforços estão centrados atualmente [sic] em

mudanças sistemáticas do ambiente da aula como a melhor forma de ajudar estes

alunos” (p. 324).

Nunca será de mais repetir-se, entretanto que o recurso a planos

educativos individualizados deve merecer o maior cuidado. Como já foi

repetidamente dito, perfilha-se a concepção de um currículo que remete para um

instrumento susceptível de potenciar o desenvolvimento integral de todo e

qualquer aluno e, não, como um fim em si mesmo. Neste sentido, o currículo é

entendido como um conjunto de conteúdos que a generalidade dos alunos deve

dominar. Então, importa ter em conta a necessidade de introduzir, na gestão

didáctica do currículo “medidas que o convertam num instrumento

verdadeiramente útil para responder à inevitável diversidade que apresentam os

alunos quanto aos seus interesses, ritmos de aprendizagem, experiências

anteriores, etc.” (Manjón, Gil & Garrido, 1997, p. 61).

Sob este quadro, afigura-se defensável que a acção da EPEI esteja atenta

à necessidade de inventariar e de aconselhar estratégias educativas que facilitem

a interacção bem sucedida, entre o perfil de aprendizagem dos alunos com NEE e

a gestão do currículo. Com o levar à pratica tais procedimentos estaria, portanto

respeitado o princípio de que “devem ser as características e necessidades dos

alunos a determinar o currículo a considerar” (Correia, 2003a, p. 27). Só quando

estiverem esgotadas estas estratégias e, apesar disso as melhorias do perfil

educacional do aluno não evidenciarem nível aceitável é que se deverá, então,

recorrer à programação educacional individualizada.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 189

No campo em análise, há que admitir que, para que determinados alunos

vejam consagrado o seu direito a uma educação apropriada - segundo a

pertinente expressão usada por Correia, nas suas obras - certas situações

específicas exijam procedimentos significativamente diferenciados dos praticados

com a generalidade dos alunos, dando, assim, lugar à activação de adaptações

curriculares individualizadas. Porém, em obediência à referida necessidade de ser

salvaguardada a coerência entre os princípios e as práticas, prefigura-se

determinante frisar-se, novamente, que as adaptações curriculares em questão,

só sejam operacionalizadas quando todas as restantes estratégias de adequação

curricular se revelem “incapazes de responder efectivamente às necessidades

específicas da criança” (Manjón, Gil & Garrido, 1997, p. 61).

A experiência tem, efectivamente, mostrado - e na escola em estudo tal

pode ser observado na sua acção quotidiana - que a melhor resposta para este ou

para aquele aluno não passa pela sua permanência total nos mesmos espaços e

nos mesmos tempos lectivos dos seus pares de turma. Esquecer tal pressuposto

poderia ter consequências desastrosas para os percursos educacionais daqueles

alunos e será, no mínimo, um acto de significativa irresponsabilidade para os

profissionais de educação que o praticarem. Logo, o que nestas circunstâncias se

afigura defensável é que o projecto curricular de turma seja concebido como um

instrumento de gestão curricular do processo de ensino-aprendizagem de todos -

e, portanto, de qualquer - alunos da turma, respeitando, rigorosamente, a

especificidade das condições de atendimento educacional prescritas pela EPEI

para os alunos com NEE. Desta forma será garantido o direito destes alunos

figurarem - conquanto à medida das suas necessidades - como qualquer dos seus

pares no todo curricular da turma em que, por direito próprio, estão incluídos. O

que se torna, neste contexto, importante é por um lado, entender-se que este todo

abrange, não só, o currículo geral da turma, como, também, os programas

individualizados elaborados face às necessidades e características de alguns

alunos com NEE e, por outro, reforçar a ideia de que os alunos com NEE são

alunos a que é devido, também, o sentimento de pertença à sua turma e, por

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 190

conseguinte têm o direito de verem contemplada a sua condição curricular

específica no respectivo projecto curricular de turma.

Em termos tão metafóricos, quanto assertivos, pode-se, portanto, dizer que

a programação educacional individualizada dos alunos com NEE deve ser

encarada como - independentemente das condições específicas em que é

desenvolvida - uma fatia autêntica do todo curricular do Projecto de Turma e como

tal deve ser considerada para todos os efeitos. Caso contrário, aquele todo não é

um todo e, consequentemente, nunca será ... inclusivo.

Compilando-se os pressupostos apresentados infere-se, em resumo que a

equipa de colaboração/programação educacional individualizada pode

desenvolver um trabalho assente em níveis diferenciados. Assim, em primeira

linha, deve assegurar a prestação de actividades de consultoria aos professores

titulares de turma. Depois, já num outro nível de intervenção, poderá recolher

informação àcerca do perfil educacional de determinados alunos, com

problemáticas complexas e assinalados pelos professores de turma. Da posse

desses dados a equipa elabora e activa um plano de acção com o objectivo de

“tentar minimizar ou até suprimir o problema do aluno” (Correia, 2003a, p. 25).

Finalmente - e para o caso de o problema persistir - haverá, então, que conhecer o

aluno de um modo mais profundo, bem como os respectivos ambientes educativos

e organizar - em função desse conhecimento pormenorizado - uma programação

educacional individualizada.

O que aqui se defende é que a informação produzida sobre os alunos com

NEE, bem como as actividades de apoio a desenvolver, conforme o prescrito na

programação individualizada, sejam consideradas parte integrante dos projectos

curriculares da turma a que pertençam os alunos envolvidos. Deste modo,

entende-se que é possível conciliar o direito inquestionável dos alunos com NEE a

uma educação apropriada, com um outro inquestionável direito (dos mesmos) à

inclusão plena no projecto curricular da turma a que estão vinculados. Destas

ideias se infere, portanto, que o projecto curricular de turma não se esgota na sala

de aula regular. Antes se estende até onde se estenderem os espaços e os

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 191

tempos especificamente atribuídos a determinados alunos com NEE cujas

necessidades tal justifiquem.

5.7 A Acção da Educação Especial e dos Apoios Educativos No âmbito do desenvolvimento de uma pedagogia orientada para a

consecução dos princípios de inclusão, deverá ser dedicada especial atenção às

diferenças individuais patentes nos modos com que cada aluno aborda as

aprendizagens, mormente, em relação aos alunos com NEE. Assumindo-se, no

ideal de construção da escola inclusiva, que esta deve atender, de modo

adequado, toda e qualquer criança residente na sua área de influência, imperioso

se torna, consequentemente, que cada comunidade educativa se organize de

forma a poder assegurar, tanto quanto possível, uma resposta qualitativa à

totalidade das crianças. Neste aspecto há, ainda que ter em conta o facto de que

em cada população escolar concreta existirá, certamente, um número, mais ou

menos significativo, de casos complexos em termos de perfil educacional, os quais

necessitarão de determinados procedimentos específicos a fim de que lhes seja

garantida uma resposta adequada.

A natureza da diversidade dos estilos de aprendizagem dos alunos de cada

escola constitui, provavelmente, o maior desafio à implementação de projectos de

educação inclusiva, uma vez que é do domínio comum - especialmente, no seio

da classe docente - a real dificuldade que está subjacente à gestão pedagógica

das diferenças, em sala de aula, sobretudo, quando, ali, estão presentes alunos

com necessidades educativas especiais. A acção de cada professor, afigura-se,

neste aspecto, ser crucial tornando-se indispensável que a sua atitude pedagógica

atribua à planificação dos processos de ensino-aprendizagem a importância

estratégica que, a mesma, detém, na prossecução dos propósitos inclusivos,

como propõe Wang (1998).

Infere-se, assim, que as práticas de diferenciação pedagógica e didáctica,

são um recurso essencial para um atendimento eficaz de todo e qualquer aluno na

sala de aula. Havendo, contudo, a consciência da extrema dificuldade de que se

reveste a sua implementação, parece aconselhável que a organização e

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 192

funcionamento escolares contemplem formas, meios e dinâmicas de apoiar, de

maneira eficaz, cada professor titular de turma. Esses mecanismos de ajuda

deverão incidir, tanto nos procedimentos de avaliação e de observação dos

alunos, como na programação e execução das práticas educativas em sala de

aula, sobretudo quando tal esteja contemplado nos programas educacionais

individualizados dos alunos com NEE. È, pois, neste contexto que parece dever

ser enquadrada, em parte, a educação especial, enquanto:

Conjunto de serviços de apoio especializados destinados a responder às

necessidades especiais do aluno com base nas suas características e com o fim

de maximizar o se potencial. Tais serviços devem efectuar-se, sempre que

possível, na classe regular e devem ter por fim a prevenção, redução ou supressão

da problemática do aluno, seja ela do foro mental, físico ou emocional e/ou a

modificação dos ambientes de aprendizagem por forma a que ele possa receber

uma educação apropriada às suas capacidades e necessidades. (Correia, 1997,

citado em Correia, 2003a, p. 14)

Recuperando-se, a propósito, a questão da reconceptualização de algumas

expressões usualmente utilizadas no âmbito do atendimento educativo dos alunos

com necessidades educativas especiais, afigura-se ser de capital relevância,

desenvolver alguma reflexão, quer sobre o significado da expressão educação

especial, quer relativamente ao sentido da expressão professor de educação

especial, uma e outra analisadas à luz dos princípios filosóficos subjacentes ao

ideário da educação inclusiva. Nesta perspectiva, julga-se, de estratégica

pertinência, atentar no modo como Carvalho (1998), descreve, conceptualmente, a

expressão educação especial. Sobre esta questão, a autora afirma de modo muito

pertinente que “há, pois um novo conceito de escola e de educação especial,

neste último, o especial da educação traduz-se por meios para atender à

diversidade, como, por exemplo, propostas curriculares adaptadas, a partir das

que são adotadas [sic] pela educação comum” (p. 59). A ideia expressa pela

autora parece, portanto, conseguir um objectivo duplo. Por um lado, manter uma

expressão que se refere a uma área de trabalho que ao longo da história do

atendimento educacional das crianças e jovens com necessidades educativas

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 193

especiais, muito tem contribuído quer para a organização de respostas àqueles,

quer para a própria evolução dos conceitos e procedimentos subjacentes. Por

outro, parece configurar um conceito funcional susceptível de conciliar a

continuidade da expressão, em causa (educação especial), com as perspectivas e

práticas inerentes ao desenvolvimento da escola inclusiva.

Agir de modo coordenado, em procedimentos de interacção e de

colaboração, configura, em termos de síntese, o papel estratégico a desenvolver

pelos professores de educação especial e do apoio educativo, no âmbito de uma

escola inclusiva (Wang, 1988). Esta linha de orientação parece deter uma

importância capital, no contexto da educação inclusiva, na justa medida em que a

mesma, não estará, assim, sujeita a pressões personalizadas de um ou outro

professor de apoio, que decorrentes de atitudes e de práticas alicerçadas, por

vezes, em perspectivas não intrinsecamente inclusivas, poderiam, de alguma

maneira produzirem constrangimentos inibidores nos procedimentos

autenticamente inclusivos.

Actualmente a função dos profissionais que prestam apoio aos professores

titulares de turma, é crucial, como preconiza Correia (2003a) ao referir que “ numa

escola inclusiva o papel dos apoios educativos é fundamental uma vez que irá

permitir que o objecto das planificações individualizadas seja alcançado” (p. 29).

Fica, assim, realçado o contributo que, entre outros profissionais, está cometido

aos professores de apoio educativo, nomeadamente, na tarefa de colaborar para a

criação e desenvolvimento de respostas às necessidades específicas e individuais

dos alunos com NEE.

No contexto em análise - e tendo em conta a actual realidade que, neste

campo, caracteriza a situação portuguesa - afigura-se, importante, numa

perspectiva funcional, diferenciar o papel do professor de apoio, do papel do

professor de educação especial. Para estabelecer esta diferenciação, recorre-se,

em concreto, ao contributo aportado por Correia (2003a), por se afigurar que está

expresso de forma adequada à realidade antes referida. Assim, no que concerne

ao professor de apoio, o autor, em causa, refere o seguinte:

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Este deve possuir habilitação própria, cujas funções devem ser paralelas às suas

áreas fortes de docência, ou seja, se por exemplo, a área forte do professor, for a

língua portuguesa, então ele será determinante na consecução dos objectivos

globais e específicos referentes à leitura e à escrita, contidos nas programações

individualizadas elaboradas para os alunos com NEE”. ( p. 29)

Esta concepção de professor de apoio parece permitir entrever que, no

caso do primeiro ciclo, este profissional poderá intervir em qualquer área curricular

uma vez que a sua formação de base é dirigida, precisamente, para a globalidade

do programa do ciclo em questão. Em relação à figura e acção do professor de

educação especial, o mesmo autor - partindo de uma chamada de atenção prévia

para a conveniência de se não confundir o papel deste com o do professor de

apoio - esclarece que se trata de um “técnico especializado, cujas funções são

cada vez mais de consultoria e menos de apoio directo, que se enquadra na

componente educacional dos serviços de educação especial” (idem).

Tanto no caso do professor de educação especial como no caso do

professor de apoio parece ser de prevenir que certas práticas mais ou menos

tradicionais funcionem como constrangimento ao desenvolvimento da pedagogia

para a inclusão. Por isso, julga-se, cautelar, diligenciar para que nos contextos

escolares, os professores de educação especial “não sejam considerados como

especialistas a quem compete solucionar todas as dificuldades experimentadas

pelos professores de ensino regular” (Porter, 1997, p. 41). A este propósito - e a

fim de melhor precisar o sentido operativo que deve presidir à acção dos técnicos

em apreço - afigura-se de oportuna relevância recuperar o que sobre a matéria em

análise aconselham S. Stainback e W. StainbacK (1999). Assim, estes autores

consideram que as atitudes e os procedimentos dos profissionais de educação

especial e do apoio educativo se podem classificar de formas de apoio ou de

formas de não apoio. Em relação às primeiras - ou seja formas de apoio - estes

autores referem as seguintes:

• Ajudar os alunos e as suas famílias a tornarem real a sua própria ideia de

uma vida digna;

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 195

• Atender as necessidades de apoio identificadas pelos alunos, pelas

famílias e por outros membros da equipa educativa e intervir em função

de tal;

• Disponibilizar e modificar recursos de modo a que seja possível incluir os

alunos na vida escolar quotidiana e de forma a que as equipas possam

trabalhar e aprender juntas;

• Recordar que os alunos são os actores principais e que os membros da

equipa educativa são os actores secundários,

• Valorizar os esforços dos colegas;

• Desenhar métodos curriculares e docentes que ajudem os alunos a

desenvolver uma aprendizagem activa,

• Desenhar métodos curriculares e docentes que ajudem o professor a

incluir de maneira eficaz o aluno;

• Desenhar métodos curriculares e docentes que promovam a

interdependência positiva entre os alunos da classe;

• Facilitar informação construtiva sobre os efeitos das acções dos demais

elementos da equipa que se traduzam em interacções mais eficazes entre

os agentes educativos e, em última análise, na melhoria das

aprendizagens do aluno;

• Facilitar a informação necessária, mas não excessiva e estar à disposição

para o que for necessário, mas não em excesso.

No que concerne a acções tidas como não de apoio apresentam-se,

seguidamente algumas das que S. Stainback e W. Stainback elencaram, as quais,

pelo seu teor se consideram oportunas, tendo-se em conta algumas práticas

vigentes entre nós:

• Levar a cabo uma observação na turma e, de seguida, redigir uma notas,

deixá-las na mesa do professor de turma, sem dar oportunidade a um

diálogo sobre a acção futura;

• Expressar opiniões, conselhos e recomendações e ir-se embora sem

dialogar sobre os mesmos;

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• Solicitar uma reunião com o professor de turma, durante as horas lectivas,

sem prévia negociação;

• Apresentar ao professor de turma uma lista de actividades para serem

incluídas nas aulas do mesmo dia;

• Impor ao professor de turma e à família o que têm de fazer;

• Disponibilizar um ficheiro de recursos quando é solicitada colaboração

para a resolução de um problema;

• Sugerir actividades que contrariem as planificações da turma;

• Proporcionar mais apoio do que o necessário.

Da análise desta perspectiva sobressai a ideia de que, provavelmente,

haverá razões concretas para se pensar que um número significativo das práticas

habituais, no contexto do apoio a alunos com necessidades educativas, deverá ser

alvo de profunda reflexão. Efectivamente - e por aquilo que empiricamente se

conhece - algumas das práticas em questão parecem incorrer, de modo cabal, no

tipo das que S. Stainback e W. Stainback caracterizam, precisamente, como

procedimentos de não apoio.

Face à importância fulcral que a matéria detém no contexto da educação

inclusiva entende-se relevante aprofundar a natureza das estratégias de

intervenção cometidas quer ao professor de apoio quer ao professor de educação

especial bem como à forma como estes se articulam, funcionalmente, com os

professores titulares de turma. Neste contexto - e antes de mais - julga-se ser de

considerar um e outros como recursos fundamentais na construção dos caminhos

da escola inclusiva. Contudo - e com idêntica convicção - se deverá assumir que

aquela ideia só é, naturalmente verdadeira, se as referidas estratégias de

intervenção se pautarem pelos princípios inerentes à implementação de ambientes

de aprendizagem genuinamente inclusivos. Este aspecto, merece - repita-se - uma

atenção especial, dado que, por vezes, aqueles profissionais se transformam

numa autêntica barreira humana à inclusão, quando assumem, por exemplo, a

condição de um primeiro professor - quando não o único - dos alunos com

necessidades educativas especiais, ainda que, trabalhando no contexto da turma

(Wang, 1998).

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 197

Efectivamente, o modo como aqueles professores de apoio complementar

percepcionam e agem - ainda que no interior da sala de aula - é determinante da

natureza dos processos de inclusão, ou, em alternativa, dos processos de

marginalização. De facto, se a sua atenção e acção se centram exclusivamente

nos alunos com necessidades educativas especiais, estes sentem-se alvo de um

tratamento diferenciado do que é proporcionado ao resto da turma, inibindo, tanto

a sua disponibilidade para aprender, como as suas oportunidades para uma

interacção inclusiva. Se, ao invés, o trabalho desses professores se dirigir

estrategicamente ao envolvimento simultâneo de outros alunos, os seus efeitos

traduzem-se pelo aumento da auto-estima dos alunos com necessidades

educativas especiais e pelo reforço da sua predisposição para a apropriação dos

saberes (León, 1994).

Nos últimos tempos, tem vindo a assistir-se ao aparecimento de uma

proliferação de designações para o professor de educação especial, a qual, de

alguma maneira se afigura descabida, na medida em que muito mais do que a

designação, o que se configura como essencial é o tipo de atitude e de

intervenção que o profissional, em causa, protagonize. Assim, por exemplo e no

seu conjunto, Porter e Richler (1991), S. Stainbck, W. Stainback e Moravec, J.

(1992) e Villa e Thousand (1992), usam, neste contexto, terminologias

diferenciadas, tais como facilitadores de apoio, professores colaboradores, ou

professores de métodos e recursos. Provavelmente, a intenção será a de inibir o

uso da expressão educação especial, sob o pressuposto de que, esta, remete

para um certo sentido de alunos especiais e, desde logo, alvo de expectativas

eventualmente diferenciadas, relativamente ao que se espera dos seus pares não

portadores de necessidades educativas especiais.

Preventivamente, portanto, os autores em causa evitam o termo especial,

sob o pretexto de que o mesmo, pelas razões atrás expressas, poderia fragilizar o

sentido intrínseco da expressão escola inclusiva. Tal perspectiva, afigura-se

bastante perniciosa face aos direitos dos alunos com NEE, até pelo simples facto

de que estes existem e que as suas necessidades específicas são efectivamente

reais. Como tal, estes alunos necessitam - e têm direito - de ter acesso a serviços

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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efectivos de educação especial “destinados a responder às necessidades

especiais do aluno com base nas suas características, capacidades e

necessidades e com o fim de maximizar o seu potencial” (Correia, 2003b, p. 18)

Recuperando-se, entretanto, a ideia de que o modo de acção é mais

determinante no contexto em questão, do que propriamente a designação,

importa, por conseguinte consensualizar os tipos de procedimentos a desenvolver

pelos professor de apoio e pelo professor de educação especial no âmbito da

escola inclusiva. Porém, importa ter sempre em conta que uma educação de

qualidade para todos e, em particular para os alunos portadores de necessidades

específicas, é um desiderato que apenas se tornará possível com a assunção do

mesmo por parte da totalidade dos elementos de cada comunidade escolar e não

deste ou daquele grupo de profissionais.

De facto, como releva Hegarty (2001):

Proporcionar uma educação satisfatória para alunos com necessidades educativas

especiais em escolas regulares implica esforços coordenados de toda a escola. É

por isso que falamos em reforma global da escola. As mudanças a fazer não são

simples cosméticas à escola. A necessidade que existe é a de uma reforma global

e abrangente que proporcione a emergência de novas escolas que incluirão e que

educarão bem não só os alunos que frequentam a escola regular e nela recebem

uma educação de má qualidade. (p. 82)

Sob esta óptica, emerge - como, de resto, tem sido já salientado - a

necessidade de que os docentes de apoio trabalhem, substancialmente, em

estratégias de colaboração, com os restantes profissionais da comunidade

escolar. Assim, agindo, todos, de modo articulado e convergente, através de

dinâmicas de entreajuda recíproca, diligenciarão a satisfação das necessidades

especiais de alguns alunos e, de algum forma, trabalharão para a elevação da

qualidade das aprendizagens individuais dos restantes.

É, certamente, perceptível a dificuldade que subsiste a uma intenção de

atribuir um perfil de intervenção mais ou menos pré-determinado, quer ao

professor de apoio, quer ao professor de educação especial, até porque tal

depende - e muito - da cultura organizacional e pedagógica de cada

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 199

estabelecimento de ensino. Todavia essa dificuldade não deve servir em situação

alguma de escusa a uma tentativa de se enunciar um conjunto de funções que, no

seu todo, poderão servir de orientação à acção conjugada dos professores

tutelares de turma, dos professores de apoio e dos professores de educação

especial.

Independentemente do ponto de vista em vigor em cada escola, em relação

ao tipo de funções a desenvolver pelos profissionais de apoio, afigura-se ser

crucial que essas funções sejam alvo de coesa articulação entre os docentes de

ensino e os docentes de apoio. Admite-se, por conseguinte, que essa coesão é,

efectivamente desejável por motivos que se afiguram mais ou menos óbvios.

Paralelamente, porém, há que ter em atenção que esse tipo de coesão não

representa uma tarefa que se afigure fácil de operacionalizar, como reconhecem

Rief e Heimburge ao afirmarem que “ a experiência de vida diz-nos que a relação

entre duas ou mais pessoas que resulta numa boa parceria é de facto algo raro”

(2000, p. 242).

Conquanto, portanto, trabalhar em equipa não seja uma empresa isenta de

constrangimentos julga-se, contudo, ser de porfiar no sentido de que tal se torne

viável no interior da organização escolar. Neste campo, também, Rief e

Heimburge (idem) sugerem determinados factores que se forem minimamente

respeitados poderão contribuir para viabilizar o trabalho em questão.

Os factores em causa são:

• um ambiente marcado pelo apoio e pela partilha, sendo as ideias e os estilos de ensino respeitados e apreciados;

• membros que têm a capacidade de ouvir atentamente as necessidades e os desejos uns dos outros, capazes de fazer críticas construtivas e de elogiar;

• professores cujos interesses, talentos e personalidades se completam; • objectivos comuns, no que diz respeito a alunos e professores; • idêntica perspectiva dos alunos; • padrões e expectativas razoáveis relativamente aos alunos e aos membros da

equipa. (2000, p. 243)

No que respeita à definição do quadro de funções a desempenhar pelo

conjunto dos mencionados profissionais, recorreu-se, por outro lado, às propostas

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 200

elencadas, neste contexto, por Ana Gortázar, com base nas quais se organizou a

Figura 4 a seguir inserta.

Professores de apoio/educação especial e equipa de programação educacional individualizada

Tomada de decisões Informação

Nível

de Escola

- Participação na elaboração do projecto educativo - Detecção de necessidades de formação

- Coordenação de acções de formação - Articulação com outros técnicos especializados

Funções

Tomada de decisões Informação

Nível

de Aula

- Elaboração conjunta do projecto curricular de turma - Elaboração conjunta de adaptações curriculares

- Disponibilização de materiais didácticos

Funções

Tomada de decisões Informação

Nível do

Aluno

- Identificação de necessidades educativas especiais - Prestação integrada de apoio - Observação dos progresso

- Avaliação dos efeitos das adaptações curriculares - Articulação com a família

Funções

Figura 4. Funções e processo de tomada de decisões por parte dos professores de

educação especial/apoio e da equipa de programação educacional individualizada

(Adaptado de Gortázar, 1995, p. 331).

Na sua versão original, Gortázar não se refere, naturalmente a

determinados elementos que constam nesta versão adaptada. Como exemplo

desta situação, menciona-se o caso do projecto curricular de turma, o qual

substitui a programação da aula proposta por Gortázar. Conquanto se entenda

que continua a haver uma acentuada convergência semântica entre as duas

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expressões, optou-se por se usar a de projecto curricular de turma para manter a

coerência com o conteúdo anteriormente exposto, neste trabalho, nomeadamente,

com o que decorre da análise do Decreto-Lei n.º 6/2001. Uma outra referência que

se introduziu na figura apresentada e que não tem correspondência nos trabalhos

de Gortázar é a de equipa de programação educacional individualizada. Esta

equipa, como se viu é proposta por Miranda Correia, nos seus trabalhos de

investigação e não tem qualquer proposta equivalente nas obras de Gortázar.

Entendeu-se, contudo, incluí-la na figura porque essa opção carreia uma maior

conotação com o modelo de escola inclusiva apresentado e defendido na presente

investigação.

Finalmente, entende-se que após toda a informação antes apresentada, se

considera essencial reafirmar a necessidade de valorizar a intervenção dos

serviços de educação especial a fim de que o ideal da inclusão e, neste, os

direitos dos alunos com NEE sejam, de facto, respeitados. Neste contexto,

interessa, então, atentar no que Correia (2003a) preconiza como sendo a essência

das competências concretas do professor de educação especial, tanto a nível da

sua participação em equipas multidisciplinares, como em trabalho a realizar junto

de docentes, outros profissionais e alunos:

• modificar (adequar) o currículo comum para facilitar a aprendizagem da criança

com NEE;

• propor ajuda suplementar e serviços de que o aluno necessite para ter sucesso na

sala de aula e fora dela;

• alterar as avaliações para que o aluno possa vir a mostrar o que aprendeu;

• estar ao corrente de outros aspectos do ensino, designadamente do ensino

individualizado, que possam responder às necessidades do aluno;

• colaborar com o professor de turma (ensino em cooperação);

• efectuar trabalho de consultoria (a professores, pais, outros profissionais de

educação);

• efectuar planificações em conjunto com professores de turma);

• trabalhar directamente com o aluno com NEE ( na sala de aula ou sala de apoio a

tempo parcial, se determinado no PEI do aluno). (p. 29)

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Como se pode directamente constatar o conjunto de papéis a desenvolver

pelos professores de educação especial propostos por Correia, consagra, aqueles

profissionais como autênticas figuras-chave na implementação da escola inclusiva,

uma vez que a sua função se torna determinante para assegurar o atendimento

qualitativo dos alunos com NEE. Paralelamente entrevê-se que se as funções em

causa forem objecto de concretização efectiva no quadro do funcionamento

quotidiano das escolas, estas darão, na prática, cumprimento objectivo aos

princípios essenciais do ideal da educação inclusiva.

5.8 A Gestão da Sala de Aula numa Lógica Inclusiva

Se praticamente toda a organização escolar terá de ser repensada, quando

se intenciona construir um projecto inclusivo, a gestão da sala de aula deverá,

então, requerer, neste contexto, uma atenção muito particular. Tal impõe-se na

medida em que o que ocorre, naquele espaço, vai influenciar, de modo incisivo, a

qualidade do percurso escolar de cada aluno, como é do conhecimento e da

experiência comuns.

5.8.1 Princípios Orientadores

Face, por conseguinte, à importância capital que a gestão da sala detém,

na construção do processo de ensino-aprendizagem, em geral e, em particular, no

âmbito da consecução de uma educação de qualidade e de igualdade, prefigura-

se momentoso, estabelecer-se, aqui, uma proposta de clarificação conceptual que,

de algum modo, concorra para delimitar e precisar o sentido com que a expressão

gestão da sala de aula é empregue. Para tal, recorre-se ao contributo dado por

Genovard e Gotzens (1990), o qual indicia que a sala de aula configura o contexto

onde se realiza um processo de ensino cometido a professores concretos, cujo

objecto se consubstancia em determinados conteúdos específicos, os quais, por

sua vez, traduzem o currículo. Estes conteúdos deverão então ser objecto de

aprendizagem, por parte de sujeitos, também concretos, ou seja, pelos alunos. Do

exposto, resulta, consequentemente, que a gestão da sala de aula, pressupõe a

referência simultânea, aos seguintes aspectos:

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• contexto25

• currículo

• professores

• alunos

Nesta perspectiva, julga-se extremamente pertinente salvaguardar o

princípio de que, uma escola inclusiva não se concebe, apenas, como uma

intenção de assegurar a educação a todas as crianças que residam na sua área

geográfica de influência, mas, sim e também, que esse processo educativo

procure as melhores formas de optimizar o potencial de desenvolvimento e de

aprendizagem de cada uma daquelas crianças. E é, precisamente, neste ponto,

que a intervenção em sala de aula ocupa um lugar estrategicamente crucial, por

ser fundamentalmente ali que se procura concretizar o processo de ensino-

aprendizagem e onde acaba por acontecer a consecução última do currículo, com

a finalidade de dar a resposta mais adequada à diversidade dos discentes ali

presentes (Arnaiz & Gil, 1997).

Por tudo isto, S. Stainback e W. Stainback (1999) consideram que, nas

escolas inclusivas, a aula consubstancia a unidade básica do enfoque pedagógico,

ideia que confere àquele espaço o sentido de um local estratégico de intervenção.

Dada a sua proeminência, no contexto da implementação da educação inclusiva,

ali, devem, portanto ser criadas condições reais para que “.todos os alunos

aprendam juntos, respeitando a sua diversidade” (Correia, 2003, p. 13).

Assim, a gestão da sala de aula configura, certamente, um dos aspectos

centrais da resposta escolar numa perspectiva inclusiva. Ao mesmo tempo, parece

remeter, de forma mais ou menos clara, para a ideia de que muito da qualidade

das aprendizagens dos alunos, está directamente relacionada - ou mesmo

dependente - da qualidade da intervenção dos professores no contexto da sala de

aula.

A importância deste facto emerge, assim, como um dos vectores

fundamentais a considerar em projectos de escola inclusiva, pelo que se afigura

de todo imprescindível que as práticas da sala de aula se insiram, nas

25 A expressão ambiente de aprendizagem será usada, também, como sinónimo de contexto em sala de aula.

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concepções e nos procedimentos didácticos que a investigação considera como

bem sucedidos, nos projectos de construção de comunidades educativas

inclusivas. Sob esta lógica, surge a necessidade de que os alunos com diferenças

mais nítidas - e, em particular, os portadores de necessidades educativas

especiais - sejam encarados de um modo positivo, ou até, mesmo, como

pertinentes agentes inspiradores de recursos educativos estratégicos

consubstanciando, assim, “ fontes de recolha de informação sobre as condições

de sala de aula existentes, fornecendo pistas sobre a forma como essas

condições podem ser melhoradas” (Ainscow, 1996, p. 31).

A adopção de uma postura de crença nos valores da inclusão implica a

consciência profunda de que a sala de aula protagoniza, no âmbito da escola

inclusiva, um factor praticamente decisivo. Importa contudo, ter sempre presente

que a sala de aula pode não ser o modo mais apropriado para responder às

necessidades de determinadas crianças, pelo menos a tempo inteiro.

Salvaguardadas as indispensáveis cautelas, a sala de aula representa, em

suma, um espaço de acção determinante para definir o grau de concretização dos

ideais inclusivos em cada escola. Daqui se poderá deduzir de forma securizante

que as melhores práticas de educação inclusiva terão, como resultado possível, a

própria melhoria do rendimento escolar da generalidade dos alunos da turma,

como, de resto, têm sublinhado diversos autores como aqui já se deu conta..

Como defendem Rief e Heimburge (2000) “se conhecermos os estilos de

aprendizagem dos nossos alunos, podemos organizar as salas de aula segundo

as suas necessidades individuais” (p. 19). Assim sendo, o conhecimento dos

estilos de aprendizagem parece, então, merecer um lugar de insubstituível

relevância, no interior de uma pedagogia que se deseje, ao mesmo tempo, de

equidade e de qualidade, ou seja, genuinamente inclusiva.

Nesta lógica, o aluno - e a pessoa concreta que comporta - emerge como o

centro nevrálgico da acção pedagógica e didáctica. Ele representa um centro

activo que o torna, a si próprio, o protagonista, o actor, o produtor e o consumidor

dos seus saberes, ou seja, das suas próprias competências curriculares.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 205

Todos aqueles aspectos parecem apontar, então, para a necessidade de os

professores de turma serem ajudados a aprofundar a sua competência de

avaliação/observação dos modos de ser e de aprender dos seus alunos. Tal

concorrerá para uma melhor fundamentação da planificação e da gestão da aula,

aumentando-se, assim, aluno a aluno, as respectivas probabilidades de êxito

(Carter & Doyle, 1987).

Desenham-se, desta forma, os traços nítidos e estruturantes de uma

pedagogia que “ terá de se afastar de modelos de ensino-aprendizagem centrados

no currículo, passando a dar relevância a modelos centrados no aluno em que a

construção do ensino tenha por base as suas necessidades singulares” (Correia,

2003a, p. 13). Promove-se, por conseguinte, uma maneira de fazer educação em

conformidade com os ditames e exigências da cultura contemporânea, uma vez

que “ recentrar as estratégias educativas e de aprendizagem no primado da

pessoa será indubitavelmente o primeiro dos desafios humanos e sociais no

primeiro quartel do século XXI” (Carneiro, 2001, p. 31).

Esta preocupação de considerar o aluno como referência central da

planificação e da acção educativas não é um facto recente, pois que já nos

primórdios da década de setenta, do século XX, Edouard Claparède (1972), citado

em Coll et al. (2000) proclamava que:

A pedagogia deve basear-se no conhecimento da criança da mesma maneira que

a afirmação de que horticultura tem sua base no conhecimento das plantas é uma

verdade aparentemente elementar. Porém é totalmente desconhecida por parte da

maioria dos pedagogos e por parte de quase todas as autoridades escolares ( . . .).

Duvido que, nas escolas de horticultura, não haja no programa algumas horas

dedicadas à botânica e ao conhecimento das plantas. (p. 22)

Claparède acentuava, assim, - com uma fina ironia, acrescente-se - a

necessidade de toda a actividade pedagógica partir e assentar no conhecimento

prévio das crianças. A fim de que fosse efectivamente garantido tal processo,

aquele pedagogo considerava - como se pode verificar pela análise do excerto -

que os procedimentos inerentes ao conhecimento diagnóstico dos alunos deviam

figurar, expressamente, nos conteúdos da planificação da acção dos docentes.

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Deste modo seria consagrado o carácter de subordinação que o autor em análise

deseja atribuir - ainda que de modo implícito - ao currículo face aos alunos.

Representando, portanto, a sala de aula, um elemento de determinante

influência no quadro da acção escolar, julga-se ter todo o fundamento relacionar

intimamente aquele espaço com o processo de ensino-aprendizagem

propriamente dito e que este deverá fundamentar-se na sensibilidade, na

capacidade e na acção dos alunos. Neste âmbito, há que partir de um princípio

básico: a aprendizagem é possível, em qualquer criança. Ou dito de um modo

mais peremptório, “não há criança nenhuma que não queira aprender” (Correia,

2003a, p. 7).

Sendo, portanto, a criança um ser geneticamente equipado para a

aquisição de saberes, a função da escola e do professor acabam por ter uma

legitimidade quase que natural, na medida em que consubstanciam o modelo

encontrado pelas sociedades humanas para satisfazer aquela potencialidade

inata. Logo se a aprendizagem é um processo inerente à natureza humana, o

problema daí decorrente parece residir no quê e no como ensinar, factores que,

certamente, representam os grandes desafios que se colocam, tanto às escolas,

enquanto organizações centradas na aprendizagem, como aos professores,

enquanto agentes fulcrais deste processo.

Para além de estarem predispostas a aprender, as crianças evidenciam

preferências por determinados tipos de aprendizagem e, provavelmente, alguma

resistência quer à aprendizagem de outros conteúdos, quer à forma como os

mesmos são ensinados.

Carey e Gelman (1991) provaram, por exemplo, que os saberes

relacionados com o mundo físico e com o mundo biológico - portanto, as coisas e

os seres - despertam um interesse significativo nas crianças, motivando-as,

intrinsecamente para essas aprendizagens. Igualmente - segundo, também,

aqueles autores - os conhecimentos relacionados com a causalidade - logo, o

porquê - geram apetência espontânea de aprendizagem. Neste contexto, a

numeração e a própria linguagem emergem, igualmente, como áreas que

merecem interesse por parte da generalidade das crianças.

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Afigura-se, por conseguinte, que aquela informação contém elementos de

notória relevância pedagógica, pois fornece indicadores concretos para os

professores planearem e gerirem, de modo significativo, as actividades de ensino-

aprendizagem, ligando-as aos interesses naturais dos alunos. Por outro lado o

conhecimento de tais preferências permite induzir a possibilidade de serem

estabelecidas pontes entre as suas temáticas preferenciais e os saberes para os

quais os alunos não revelam tendência natural, mas que as exigências sociais e

culturais impõem que saibam.

À medida que a sua maturação se vai desenvolvendo, as crianças vão

intuindo auto-percepções, ainda que difusas, sobre o que é aprender e como é

que se aprende, construções mentais que dependem, inevitavelmente, das

experiências de vida e do seu conteúdo. Tal consubstancia a génese das teorias

da mente, na linguagem utilizada por Bereiter e Scardamalia (1989).

As trocas decorrentes do tipo de interacção entre a criança e o meio

circundante vão, progressivamente, moldando e estruturando o seu estilo

cognitivo. Consequentemente, os estilos cognitivos configuram conjuntos de

padrões diferenciais de indivíduo para indivíduo e que representam a forma

pessoal de cada um reagir à estimulação recebida do meio. Como fruto dessa

interacção, são igualmente estruturados os modos singulares como cada pessoa

realiza o processamento intelectual da informação recebida do exterior (Fierro,

1990).

Os contributos da investigação parecem consequentemente confirmar o

facto de que cada criança chega à escola, quer com um património único de

saberes, quer com estratégias de aprendizagem igualmente irrepetíveis. Estes

parâmetros teóricos configuram elementos cruciais a ter em conta, pelos

professores, mormente, quando se preconiza uma linha de actuação pedagógica e

didáctica centrada no aluno. Ora, para que a acção pedagógica se centre efectiva

e eficientemente nos alunos, torna-se, naturalmente imprescindível que o

professor observe o comportamento, em aprendizagem, de cada um dos seus

alunos, a fim de que, com um mínimo de rigor, identifique, tanto os saberes de que

são portadores, como qual o tipo de estratégias que utilizam para aprender.

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Neste contexto, ganha especial evidência, o facto de o tipo de experiências

desenvolvidas -. sobretudo em termos de interacções sociais - condicionar,

positiva, ou negativamente, o futuro potencial de aprendizagem de cada criança.

Consequentemente, a natureza destas interacções vai moldando os esquemas

mentais das crianças, tornando-os mais ou menos aptos à apropriação e aplicação

da informação escolar, conforme a qualidade da estimulação cultural envolvente é

maior ou menor. Desta forma, quer para optimizar os efeitos de uma ambiência

cultural rica, quer para obviar os inconvenientes de ambientes sociais carenciados,

é necessário que sejam estabelecidas conexões compreensivas entre a cultura

escolar e a cultura prévias dos alunos, algo que, nem sempre, é devidamente

respeitado pelos professores (Duckworth, 1987).

Centrar, portanto, a pedagogia no aluno, parecer ser muito mais do que um

lugar comum, já que pressupõe, por um lado uma estratégia muito particular de

entender as formas e os conteúdos da sabedoria presente em cada aluno e, por

outro, implica a opção e a activação de procedimentos que, na prática, não

contrariem - antes valorizem - os fundamentos da sua cultura de origem. Sobre

esta momentosa matéria, Loewenberg e Coher (1998), aconselham os

professores a: (a) elaborarem mentalmente uma compreensão do que ensinam,

de uma forma substancialmente diferente da que tinham enquanto alunos; (b)

envidar esforços sistematizados no sentido de conhecerem rigorosa e

profundamente, cada um dos alunos com que lidam.

Como pistas para melhor conhecer e responder aos alunos, Loewenberg e

Coher sugerem, ainda, que os professores devem:

• saber escutar e interpretar as ideias dos alunos sobre as questões

relacionadas com os diferentes campos do conhecimento;

• alargar o âmbito da interpretação que fazem sobre as formas de ser e de

aprender dos seus alunos, de modo a proporcionarem um leque tão

variado de tarefas que satisfaçam os seus diferentes tipos de interesses;

• começar a entender os alunos mais como seres capazes de pensar e de

reflectir e menos como receptáculos vazios de saberes.

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Os autores em referência advogam, pois, o princípio de que conhecer cada

aluno é uma condição essencial a um desempenho profissional qualitativo,

sublinhando, contudo, que aquele conhecimento deve ser devidamente

enquadrado na turma, enquanto grupo social concreto. Para tal, Loewenberg e

Coher, estipulam que é necessário:

a) Considerar, na turma, as diferenças culturais, as quais se poderão verificar

a nível da língua, do estrato social e da cultura de origem;

b) Identificar aspectos comuns à generalidade dos elementos da classe, sob

a perspectiva de que todos podem aprender, evitando a emergência de

expectativas negativas permanentes em relação a este ou àquele;

c) Informar o grupo sobre o que significa o aprender e como tal se torna

possível;

d) Interpretar o pensamento dos alunos sobre o que fazem e sobre o que

tentam aprender;

e) Ser competente, do ponto de vista pedagógico, a fim de ser assegurada

uma mediação adequada e eficiente entre as formas de aprender dos

alunos e o que estes têm que aprender.

Como se torna claro, pela análise do que a investigação aporta, a estratégia

de centrar a acção pedagógica nos alunos, pressupõe conhecimentos e

competências que não se compadecem com o encarar da função docente como

algo rotineiro e estático. Pelo contrário, o ensino-aprendizagem configura um

processo intrinsecamente dinâmico, em que a reflexão sistemática sobre o

mesmo, carreia permanentemente novas informações que, reinvestidas de forma

adequada no fluxo da intervenção educativa, dão lugar a um processo de melhoria

constante dos seus resultados. Daqui provirá um dado de extrema valia: não só

os alunos aprendem, como aprende, também, quem os vai ensinando.

5.8.2 Atenção à Diversidade.

Num contexto de ensino onde se procure concretizar o ideal inclusivo, a

gestão bem conseguida da diversidade ocupa, naturalmente, um lugar de

extraordinária relevância. Dito por outras palavras, tal significa que um dado

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ambiente de aprendizagem só será efectivamente inclusivo se as diferenças na

sala de aula forem objecto de atenção profunda e de um atendimento adequado.

Assim, uma cultura inclusiva deverá assentar em pressupostos claramente

definidos e assumidos e que traduzam, inequivocamente, uma opção por uma

educação na e pela diversidade e que, por conseguinte, não exclua ninguém.

Trata-se, pois, de uma forma eticamente nobre de fazer escola, o que significará,

provavelmente, seguir um trilho marcadamente oposto ao de uma tradicional

educação elitista e discriminatória. Por conseguinte, a crença na perspectiva

inclusiva, aceita e valoriza a diversidade, entendendo-a não só, como um facto

inevitável, mas, também - e sobretudo - como um recurso precioso para o

enriquecimento da profissionalidade docente assente e decorrente das próprias

actividades de ensino-aprendizagem.

Sendo a aprendizagem um processo de interacção entre o aprendiz e o

currículo - mediado pelo professor e condicionada pelo ambiente em que se

desenvolve - julga-se determinante - como já se explicitou - que a gestão curricular

atente e respeite, de forma metódica, a diversidade discente. Torna-se, por

conseguinte, importante que a actividade docente se paute - como postulam

Marchesi e Martin (1998) - por uma concepção de dinâmica curricular que

assegure uma verdadeira igualdade de oportunidades educativas entre todos os

alunos. Para que tal se verifique é fundamental - insista-se - que sejam

escrupulosamente respeitadas as características próprias de cada um.

A gestão da diversidade parece pressupor, então, um esforço de adaptação

da comunidade educativa às necessidades diferenciadas da população ali

atendida. A disponibilização de processos de gestão curricular capazes de

responder, de forma individual, àquelas necessidades e segundo o estilo de

aprendizagem de cada aluno é, pois, indispensável.

Como consequência da aplicação dos princípios em discussão, os alunos

disporão de respostas diversificadas, flexíveis e abrangentes, percepcionando a

crença de que a escola procura ajustar-se às suas características pessoais. Neste

aspecto, as atitudes dos agentes educativos são cruciais, como assinalam Muñoz

e Maruny (1993), ao opinarem que o principal problema subjacente ao

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 211

desenvolvimento de uma pedagogia para a diversidade, não se confina aos

instrumentos didácticos, mas, antes se alarga, de modo determinante às

convicções sociais, culturais e pedagógicas do professorado. Na gestão educativa

da diversidade - salientam os mesmos autores - é importante que aquelas atitudes

confluam num aspecto fundamental: a intenção de conhecer e de respeitar os

estilos de aprendizagem dos alunos.

Tomlinson e Allan (2002), baseando-se nos trabalhos de Dunn (1996),

sugerem a existência de quatro categorias relativas aos estilos de aprendizagem,

sendo, as mesmas, de natureza ambiental, emocional, sociológica e física. No

desenvolvimento da sua linha de raciocínio, aquelas autoras referem ainda, que:

A preferência individual por determinados factores, como um ambiente silencioso

ou ruidoso, muita ou pouca luz, postura sentada formal ou informal, concentração

sustentada ou curtos períodos de concentração, modo perceptivo (auditivo, visual,

cinestésico), hora do dia em que ocorre a aprendizagem, grau de

responsabilidade, relações com os seus pares e grau de mobilidade, pode

influenciar o êxito do aluno e a sua atitude a propósito da aprendizagem. (pp. 39-

40)

Tomlinson e Allan põem em evidência, determinados aspectos

protagonizados pelos alunos no quotidiano das actividades realizadas na sala de

aula. Tais aspectos são indicadores naturais das suas diferentes formas de ser e

de aprender. Consequentemente, aqueles sinais deverão ser interpretados como

dados observáveis e configuradores dos estilos de aprendizagem dos alunos e

não - como não raro acontece - como efeitos de mau comportamento.

Importando, aqui, elucidar, de modo pedagógico, o que se entende por

estilos de aprendizagem, opta-se por se adoptar o que sobre este conceito

estabelecem Dunn, Beuadry, e Klavas (1989), citados em Rief e Heimburge

(2000). Assim para aqueles autores “o estilo de aprendizagem traduz-se num

conjunto de características pessoais, biologicamente estabelecidas, que leva a

que um mesmo método de ensino seja eficaz para uns e ineficaz para outros” (p.

19).

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Analisando-se em profundidade as consequências pedagógicas

decorrentes do conceito de estilos de aprendizagem antes enunciado, julga-se

haver fundamento para se inferir que, no dia a dia das escolas, muitos alunos

estarão sujeitos a processos didácticos ineficazes, uma vez que, por norma, os

professores usam, basicamente, um método de ensino que, conquanto seja

eficiente para alguns alunos serão - como afirmam os autores citados -

inadequados para outros. Este facto configura, pela sua pertinência, uma situação

merecedora de aturada reflexão, por parte da generalidade das equipas

educativas.

Reconheça-se, entretanto, que a investigação tem produzido resultados que

ajudam a equacionar formas de trabalho nas salas de aula capazes de

proporcionarem ambientes e meios de aprendizagem genuinamente inclusivos, ou

seja, capazes de responder à generalidade dos alunos e às necessidades

especiais dos alunos com NEE. Há, pois, matéria para alimentar a esperança de

que é possível gerir, de modo satisfatório, a diversidade, ainda que tal não

represente uma tarefa fácil, como alertam Tomlinson e Allan (2002) “ na verdade,

o desafio de lidar com a diversidade académica nas complexas salas de aula da

actualidade é um importante e difícil desafio com o qual nos confrontamos.” (p 13).

A este propósito, afigura-se interessante recuperar, de forma associada, os

trabalhos desenvolvidos tanto por Cronbach (1967) como por Glaser (1977). Estes

autores estudaram, cada um por si, os modelos com que sucessivamente, ao

longo dos tempos, os sistemas educativos procuraram responder à diversidade

dos alunos. Conjugando-se os resultados obtidos pelos investigadores

referenciados é possível concluir que, naquele âmbito, já foram postos em prática,

até ao presente, cinco modelos. Os modelos em causa são os seguintes:

1) Estratégias selectivas

2) Estratégias de adequação de objectivos

3) Estratégias de flexibilização temporal

4) Estratégias de compensação pedagógica

5) Estratégias de ajustamento metodológico

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Resumidamente - e seguindo-se a explicitação dada pelos autores em

análise - as estratégias selectivas perfilham a lógica de que o aluno deve progredir

na escolaridade até ao patamar onde as suas capacidades o permitam. Quando o

ensino atingir níveis de exigência a que o aluno não consiga responder este

deverá abandonar o sistema.

O modelo das estratégias de adequação dos objectivos parte do mesmo

pressuposto do modelo anterior, isto é, nem todos os alunos são capazes de

responder, com êxito, às exigências do sistema. Então, neste modelo é

preconizada a ideia de que se torna necessário criar diversas vias curriculares, as

quais seriam frequentadas pelos alunos em função das respectivas capacidades,

ou interesses.

As estratégias de flexibilização temporal pressupõem um entendimento

algo diferenciado da visão anterior. Assim, estas estratégias erradicam do

princípio da assunção das diferenças no interior do sistema educativo, ao mesmo

tempo que contemplam o direito de todos os alunos acederem, com sucesso, aos

objectivos comuns da escolaridade. Como critério de base para o seu

desenvolvimento, as estratégias de flexibilização temporal assentam no princípio

de que a generalidade dos alunos tem capacidade para aprender os saberes

nucleares que todo o elemento de uma dada sociedade deve adquirir. A questão

está no facto de que nem todos o fazem ao mesmo tempo. Em termos de

compensação o sistema deverá organizar-se, então, no sentido de proporcionar o

tempo necessário que cada aluno necessita para a realização daquelas

aprendizagens.

Por outro lado, as estratégias de compensação pedagógica baseiam a sua

fundamentação no facto de existirem determinados grupos de alunos que, devido

aos seus contextos sócio-culturais de origem, se encontram desfavorecidos

perante a cultura escolar, vendo, assim, diminuídas as suas possibilidades de

sucesso nas aprendizagens. Nesse sentido, aquelas estratégias teriam,

precisamente, como finalidade, disponibilizar um atendimento educativo

específico, aos alunos em causa, a fim de obviar a referida desigualdade de

partida.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 214

Finalmente, as estratégias de ajustamento metodológico, consideram

fundamental que todos os alunos acedam com sucesso às aprendizagens comuns

e relevantes propostas pelo sistema. Para que tal seja possível, este deve

privilegiar o uso de metodologias diferenciadas e flexíveis que, ajustando-se às

características individuais dos alunos, permitam que estes tenham sucesso na

escolaridade. Estes procedimentos preconizam uma concepção interaccionista do

processo educativo, em que, sob esta lógica, os procedimentos pedagógicos e

didácticos são planeados e desenvolvidos com base no conhecimento das

características diferenciais dos alunos a que se destinam. Estes princípios

afiguram-se, consequentemente, de extraordinária importância no campo da

elaboração das planificações individualizadas destinadas aos alunos com NEE.

Confrontando-se entre si, o leque de estratégias apresentado, afigura-se

que as estratégias de ajustamento metodológico são as que melhor potencialidade

indiciam para responder com eficiência e eficácia à diversidade da população

escolar. Por consequência afirmam-se como as que mais incisivamente poderão

contribuir para a edificação da escola inclusiva.

Outros autores revelam posições semelhantes em relação às vantagens do

uso de tipo de estratégias interactivas e orientadas para o ajustamento das

metodologias. Entre estes, situa-se, nomeadamente, Correia (2003a), ao

preconizar que “o conceito de inclusão dá ainda relevância a uma educação

apropriada (. . .) devendo esta não só respeitar as características e necessidades

dos alunos, como também ter em conta as características e necessidades dos

ambientes onde eles interagem” 2003, p. 12).

Ainda, neste âmbito afiguram-se, particularmente relevantes as conclusões

obtidas por S. Stainback e W. Stainback (1992), ao procurarem identificar

algumas estratégias que facilitem, de modo efectivo, a criação de contextos

educacionais inclusivos. Nesta linha de pensamento aqueles autores

inventariaram algumas características que são próprias das aulas inclusivas e que

organizaram em determinadas dimensões. Tais dimensões são: a filosofia da aula,

as regras na sala de aula, uma gestão do currículo de acordo com as

características do aluno e as formas de apoio na sala de aula.

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No que concerne à dimensão da filosofia da aula, S. Stainback e W.

Stainback preconizam que deve ser estabelecido o princípio de que todas as

crianças pertencem a um determinado grupo de aprendizagem. Em consequência,

todas podem trabalhar em tarefas semelhantes na sala de aula - sempre que

possível, salvaguarde-se - e que ali deve ser valorizada e respeitada a

diversidade. Acrescentam, ainda, a ideia de que a diversidade é um factor de

fortalecimento da turma e capaz de oferecer, a todos os seus membros,

oportunidades mais alargadas de aprendizagem.

Quanto às regras na aula, os autores em questão defendem a necessidade

de serem implementados procedimentos que realcem os direitos à diferença e a

um tratamento justo e igualitário, para todos. Estes princípios deverão ser

acompanhados pelo desenvolvimento de atitudes e de procedimentos

generalizados de respeito mútuo entre os alunos.

S. Stainback e W. Stainback postulam, ainda - e por outro lado - que as

aulas inclusivas devem comportar práticas quotidianas de apoio aos alunos, em

ordem a que estes tenham possibilidades de consecução dos objectivos

curriculares. Os apoios em causa deverão ser alvo de particular atenção nos

casos em que verifique a necessidade de se proceder a adaptações curriculares

adequadas a determinados estilos de aprendizagem26. Neste aspecto, salientam,

ainda que o currículo deverá ser suficientemente flexível, de modo a que seja

possível satisfazer as diferentes necessidades dos alunos concretos.

Para Coll (1986), a flexibilidade curricular pressupõe a adopção da

modalidade de currículo aberto, entendida como uma forma de concepção

curricular que favorece a adequação do ensino às características dos alunos,

opondo-se, consequentemente, ao conceito de currículo fechado em que:

Os diferentes componentes curriculares – objectivos, conteúdos, actividades de

ensino e de aprendizagem, actividades de avaliação, critérios de avaliação, etc. –

estejam completamente fixados e predeterminados com independência dos alunos

26 Esta expressão parece remeter para a ideia de diferenciação. Conceito que, por sua vez, é entendido por

Tomlinson e Allan como “ uma forma de resposta proactiva do professor face às necessidades de cada aluno”

(2002, p. 14).

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e o seu processo concreto de aprendizagem dificilmente poderá, de facto, dar uma

resposta educativa adequada à diversidade. (Coll et al., 2000, p. 121)

Para a dimensão das formas de apoio na sala de aula, S. Stainback e W.

Stainback relevam claramente, o princípio de que as intervenções pedagógicas

específicas, ou os apoios especializados, deverão ser - tanto quanto possível,

acrescente-se - administrados na sala de aula. Sob esta lógica, aqueles autores

referem, explicitamente, a ideia de que os sistemas de apoio, ou de adaptações

curriculares, deverão ser geridos de forma a não só beneficiar o aluno carenciado,

mas, também, os restantes alunos.

De acordo com esta lógica, a aula emerge, então, como um conjunto

objectivamente heterogéneo de alunos, ou seja, um conjunto diversificado de

indivíduos com necessidades diferenciadas aos quais, obviamente, não se poderá

oferecer uma resposta única (Puigdellivol, 1993). Ou mais concretamente haverá

que garantir “em muitas situações as adequações curriculares pertinentes às

características dos alunos” (Correia, 2003a, p. 13).

Muito do que tem sido, aqui, exposto, refere-se à dimensão cognitiva, ou

intelectual dos alunos. Tal consubstancia, obviamente, um aspecto de

transcendente relevância no contexto em apreço. Porém, convém não esquecer,

nunca, que a variável emocional detém, igualmente, um papel determinante no

modo como as crianças reagem ao processo escolar. Se é verdade que os

aspectos relacionados com o intelecto são fulcrais para os resultados melhores ou

piores no que se refere à aprendizagem, não é menos verdade que a faceta

afectiva, por ser de natureza atitudinal, tem uma influência decisiva no que toca à

disponibilidade e eficiência daqueles processos cognitivos. Há, pois, que ter em

atenção que:

O meio educativo tem um enorme impacto, tanto nos alunos com NEE como em

todos os outros. No decorrer do processo de inclusão de alunos com NEE nas

classes regulares, o professor não só lhes deve transmitir sentimentos positivos

como deve também revelar-lhes afecto. As atitudes do professor são rapidamente

detectadas e adoptadas pelos restantes alunos. A criação de um ambiente positivo

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e confortável é essencial para que a experiência educativa tenha sucesso e seja

gratificante para todos os alunos. (Nielsen, 1999, p. 23)

Pela pertinência de que se reveste, também, em termos pedagógicos e

didácticos, afigura-se de extrema relevância o que, sobre a atenção à diversidade

em sala de aula, sugere Zabala (1998). Devido à invulgar importância que se

vislumbra no conteúdo da obra deste autor, no contexto da educação de

qualidade, aquela será, seguidamente, alvo de análise pormenorizada, nos seus

aspectos mais significativos.

No articulado em questão, Zabala começa por referir - aliás numa

linguagem eivada de rara informalidade - que “ a aprendizagem é uma construção

pessoal que cada menino e cada menina realizam graças à ajuda que recebem de

outras pessoas” (p. 63). Sob este entendimento do que é a aprendizagem, o autor

em questão, integra, por um lado, o pressuposto de que a acção é um processo

inerente a quem aprende e, por outro, a ideia de que o acto de aprender implica a

participação de outro alguém.

Nesta concepção do processo de ensino-aprendizagem em que este é,

também, considerado como uma dinâmica de interacção pedagógica, Zabala

realça que, na construção de saberes, quem aprende mobiliza em paralelo e de

forma activa, um conjunto único de traços pessoais, traduzidos pelos seus

interesses, conhecimentos prévios e experiências passadas, ao passo que quem

ensina age no sentido de que o aluno se sinta capaz e com vontade de aprender,

apresentando o novo conteúdo como um desafio viável e interessante.

Desta forma, o autor em apreço, preconiza, tanto o processo de

autonomização das aprendizagens como a preocupação de que, as mesmas,

apresentem um grau de desejada significatividade para os alunos. Na linguagem

do autor, este procedimento interactivo, entre quem aprende e quem ensina “

contribui para que o aluno aprenda certos conteúdos mas também faz com que

aprenda a aprender e que aprenda que pode aprender” (p. 63). Preconizando a

prática desta forma de mediação, nos processos de ensino-aprendizagem, Zabala

valoriza, não só o aspecto académico - mais ligado ao conhecimento - mas,

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também, o que o aluno faz e sente que é capaz de fazer, influenciando, por

conseguinte de modo positivo, a imagem que tem de si mesmo.

Transportando a sua linha de pensamento para as práticas desenvolvidas

no interior da sala de aula, o investigador em referência, postula uma série de

requisitos a que deve obedecer a acção educativa, naquele contexto, para que

seja respeitada a diversidade dos diferentes estilos de aprendizagem. Designando

o conjunto de procedimentos subjacentes ao processo de ensino, por sequência

didáctica, Zabala identifica um rol de pressupostos que na sala de aula devem ser

contemplados - numa perspectiva de atenção à diversidade - para que aquela

configure um ambiente de aprendizagem verdadeiramente inclusivo.

Assim - como sugere o autor - as actividades preliminares à aprendizagem

de novos conteúdos, devem facilitar e provocar a recuperação dos conhecimentos

prévios27, detidos pelos alunos sobre aquelas novas temáticas. Seguidamente, é

preconizado que as aprendizagens sejam propostas de modo a que os alunos

pressintam, tanto a sua funcionalidade, como a sua utilidade, tornando-se, assim,

significativas28.

Um outro aspecto referido neste âmbito, por Zabala, prende-se com a

necessidade estratégica de os conteúdos apresentarem um grau de complexidade

adequado ao nível de desenvolvimento dos alunos, respeitando, dessa forma, as

suas competências do momento29, isto é, que se situem na sua zona de

desenvolvimento proximal. Ao chegar a esta situação, as actividades de

aprendizagem deverão, de seguida, estimular nos alunos, a percepção de um

conflito dialéctico entre o que cada aluno já sabe e o que é convidado a aprender,

conflito esse que deverá ser orientado para a emergência da sua actividade

27 Moll e Whitmore (1993) chamam a atenção para o facto de os conhecimentos prévios integrarem, também,

determinados conhecimentos apreendidos no seio da especificidade cultural, racial ou étnica, das crianças e

que constitui um factor a ter, na devida conta, pelos professores, pois que, alguns daqueles saberes, podem

estar, até, em oposição à cultura escolar, sendo, por isso, causa de rejeição da criança a esta última cultura. 28 Coll (1989) partilha de uma convicção similar, frisando que um elevado grau de significatividade da

aprendizagem, promove, nesta, um grau idêntico de funcionalidade. 29 Araújo e Chadwick (1988), integrando-se na linha piagetiana, referem-se a esta questão afirmando que uma

das condições especiais a que deverão subordinar-se as actividades de aprendizagem reside na necessidade

de, as mesmas, permitirem que o aluno se desenvolva a partir do seu próprio nível de entrada.

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mental , na procura do encontrar relações lógicas entre os novos conteúdos e os

saberes prévios. Neste processo - adianta o autor - importa que se tenha sempre

bem presente o princípio de que as propostas de aprendizagem de novos

conteúdos devem ser percepcionadas pelos alunos como algo susceptível de ser,

por si, apropriado, ainda que com ajuda. Caso contrário, emergirá, por parte

daqueles, a sensação de impotência, a desmotivação e o insucesso. Numa

pedagogia que se deseje como meio facilitador da educação inclusiva, este

aspecto deverá merecer uma atenção muito especial, facto que nem sempre se

verifica, conforme refere Rodrigues (2001):

Muito ensino falha na forma de apresentar a situação de aprendizagem a alunos

com dificuldades, de forma adequada, para que eles possam efectivamente

aprender. Frequentemente encontramos intervenções que são demasiado

elementares (apelando à repetição) ou demasiado complexas (originando

frustração) para as possibilidades dos aluno. (p.26)

A fim de que seja salvaguardada, então, a proposta mais ajustada, o

mesmo autor (Rodrigues, 2001) sugere uma prática pedagógica subordinada ao

pressuposto da Área Sensível de Aprendizagem, considerando esta como o

“conjunto de aquisições que um dado indivíduo consegue efectuar num

determinado contexto” (p.26). Considera, ainda o autor em referência que se os

docentes actuarem de acordo com este princípio, adquirirão procedimentos

didácticos que os ajudarão a “pesquisar qual é a proposta de aprendizagem mais

adequada, quer no seu objectivo quer nos seus meios e estratégias” (idem).

Retornando a Zabala - conquanto, não se refira, de modo explícito à

questão - julga-se, pelo antes exposto, que o mesmo intenciona, também,

equacionar o princípio da hierarquização das aprendizagens, o qual, pressupõe -

como é do domínio comum, entre os docentes - que os conteúdos simples

deverão preceder as aprendizagens complexas e que entre uns e outras sejam

percepcionados elementos comuns. A prática desta hierarquização, bem como, a

de relacionar de modo integrado, os novos com os velhos conhecimentos, torna,

mais fácil, a apropriação de saberes, como, de resto, já apontavam, há um século,

Thorndike e Woodworth (1901) e, apenas alguns anos depois, Judd (1908).

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Entretanto, ao longo da obra em análise, Zabala não esquece o papel

crucial que advém do grau motivacional gerado na relação entre os alunos e as

tarefas escolares, pelo que acrescenta a necessidade de promover, naqueles,

uma atitude favorável30 face à aprendizagem. M. Csikszentmihalyi e I.

Csikszentmihalyi (1988), citados em Tomlinson e Allan, (2002), situam, neste

âmbito, aquilo que apelidam de teoria do fluxo entendendo-a como “ um estado de

total absorção resultante do facto de se estar imerso numa actividade tão

satisfatória que o participante perde a noção do tempo, cansaço e tudo o resto,

excepto a própria actividade” (pp. 38-39).

Depreende-se, então, do anteriormente referido, que se forem seguidos na

rotina didáctica da sala de aula, os passos, antes descritos, os alunos ganham,

gradualmente, uma sensação pessoal de auto-confiança nas suas próprias

capacidades de aprendizagem. Esta percepção decorrerá da certeza antecipada

de que disporão, por sistema, da ajuda pedagogicamente necessária para

percorrerem, com sucesso, a distância que os separa em cada unidade de

aprendizagem, daquilo que sabem daquilo que devem saber.

A activação sequencializada, em cada unidade de aprendizagem, das

actividades e estratégias apresentadas, vai gerando, na generalidade dos alunos -

segundo Zabala - o desenvolvimento securizante de atitudes motivadoras, as

quais terão uma influência estrategicamente decisiva nos níveis de auto-estima e

de auto-conceito de cada aluno31. Tal ocorre à medida em que vão, de forma

fundamentada, tendo a consciência de que o seu esforço para aprender produz

resultados concretos.

Na mesma linha de raciocínio, Wang (1998) salienta, também, a

importância do factor motivacional, informando que existe uma variedade de 30 Volta, neste aspecto, a ganhar importância capital a necessidade de as aprendizagens se tornarem

significativas para os alunos, pois, como declara Klausmeier (1985), os alunos deparam-se no seu dia a dia na

escola, com aprendizagens que, por não terem sentido ou lógica aparente para eles, dificultam a emergência

dos níveis desejados de motivação. 31 Avançando com uma proposta de clarificação conceptual de ambas as expressões, Mestres e Goñi (2000),

referem que a maioria dos autores, actualmente, distinguem auto-conceito e auto-estima. Deste modo

remetem o auto-conceito para o conhecimento que o indivíduo tem sobre si próprio, ao passo que a auto-

estima traduz a avaliação afectiva que cada pessoa faz do seu eu.

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técnicas vocacionadas para o desenvolvimento e manutenção de elevados níveis

de motivação. De acordo com aquela autora, a prática continuada de tais técnicas

induzem o aluno a assumir, de modo autónomo, um grau sucessivamente

crescente de responsabilidade no que respeita ao controle, tanto da sua

aprendizagem como do seu comportamento. Como exemplo de algumas daquelas

técnicas, Wang aponta as seguintes:

• comunicação clara aos alunos, de forma verbal e não verbal, o que deles se

espera;

• estimulação do desenvolvimento de uma atitude de auto-disciplina;

• sensibilização para a criação de hábitos de autonomia e de cooperação.

Regressando aos contributos de Zabala, este defende que a

implementação da sequência didáctica32, tal como foi descrita, favorece de

maneira progressiva, o desenvolvimento das estratégias cognitivas de cada aluno,

em função das suas capacidades e saberes, optimizando, por conseguinte, as

habilidades mentais subjacentes aos processos de aprender a aprender.

Apoiando-se, como se constata, nos trabalhos de Lev Vygotsky, Zabala estruturou

um modelo de sequencialização didáctica de rara acuidade, no que concerne à

diferenciação pedagógica e que, pela sua potencialidade e viabilidade de

operacionalização parece, efectivamente, configurar uma estratégia susceptível de

consubstanciar uma significativa mais valia, nos caminhos para a inclusão,

mormente nas salas de aula.

Analisando-se então os contributos de Vygotsky, (1979), julga-se que os

mesmos corporizam, também, uma relevante via pedagógica e didáctica capaz de

contribuir - se bem interpretada pelos professores - para a materialização de um

atendimento genuinamente inclusivo, nas salas de aula. E isto porque pressupõe

uma acção do professor centrada, precisamente, no conjunto quer de estratégias

32 Basil e Coll (1990) apresentam, sobre a mesma questão (sequência didáctica) uma proposta sensivelmente

mais resumida:

a) Partir de objectivos claramente formulados;

b) Estabelecer uma sequência ordenada no ensino a fim de potenciar a consecução dos objectivos;

c) Proporcionar condições, na aprendizagem, que se ajustem à natureza dos objectivos propostos e às

características do aluno.

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cognitivas quer de conhecimentos prévios, presentes, em cada momento, no aluno

concreto. Trata-se, assim, do exercício de uma mediação diferenciada33, a qual,

facilitando o envolvimento de todos os elementos da turma nas tarefas de

aprendizagem, respeita, entretanto - e ao mesmo tempo - o quadro das limitações

e capacidades inerentes a cada um.

As práticas educativas de mediação entre a zona de desenvolvimento

actual do aluno e a sua possível zona de desenvolvimento proximal, enquadram-

se na perspectiva da modificabilidade cognitiva, transformando-se, por

conseguinte, num requisito pedagógico crucial para uma desejável consecução

de práticas de ensino eficientemente facilitadoras do envolvimento activo de todo e

qualquer aluno. São estas virtualidades que Fonseca (2001) realça, de forma

pertinente, ao explicitar que “a educação cognitiva leva em consideração os

conhecimentos prévios do educando ou formando e tem como pressuposto

fundamental o respeito pelo seu perfil cognitivo ” (p. 9). Este autor, ainda na senda

de uma atitude determinada de valorização da educação cognitiva, preconiza, até,

que esta “deveria constituir-se como o núcleo preferencial de formação para os

professores de apoio pedagógico acrescido” (idem). Fica, assim, claramente

evidenciada, a potencialidade que aquela estratégia educativa prenuncia, no

âmbito dos processos de ensino-aprendizagem.

A implementação real de uma pedagogia de inclusão implica, portanto - e

necessariamente - a adopção de estratégias de gestão curricular que estimulem,

em cada aluno, a percepção do êxito na generalidade das tarefas de

aprendizagem. Dito de outra maneira, a educação inclusiva significa a

operacionalização do princípio da atenção pedagógica à diversidade e cujas

consequências práticas se devem traduzir por procedimentos didácticos que se

33 Vygotsky (1979), distingue a mediação instrumental (uso de instrumentos psicológicos, por parte do sujeito,

para se adaptar à realidade e para a transformar) da mediação social (actividade interactiva em que outros

proporcionam, ao sujeito, os instrumentos que emprega na sua relação com os objectos).

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revelem eficazes no que respeita ao responder às necessidades diferenciadas da

generalidade dos alunos34.

Nesta perspectiva - como já fora anteriormente indiciado - as adaptações

curriculares individualizadas, devem ser concretizadas sob o referente curricular

comum abordado na sala de aula. Consequentemente, e em termos práticos, ao

conhecer-se o resultado da avaliação dos alunos com necessidades educativas

especiais e confrontando-se, o mesmo, como o currículo previsto, deverá ser

tomada a decisão de serem, ou não, introduzidas alterações em determinados

elementos do currículo. Desta forma tenta-se assegurar que a gestão do processo

de ensino-aprendizagem seja adequada à diversidade de cada turma concreta,

sem pôr em causa o sentimento de pertença ao grupo que cada um dos alunos

deverá percepcionar. Por conseguinte, as referidas adaptações curriculares

individuais, deverão ser devidamente incorporadas na preparação das aulas a

desenvolver na turma e serem, depois, concretizadas, de modo integrado, nessas

mesmas aulas. Isto, claro, no caso concreto das actividades que no PEI estejam

consignadas para serem desenvolvidas naquele espaço.

A elaboração e a gestão das adaptações curriculares estarão, assim,

subordinadas, a um continuum cujos extremos podem ir desde uma simples

modificação do tempo previsto para a consecução de um objectivo comum, até à

eliminação pura, ou acréscimo de determinados objectivos. Neste continuum

podem, ainda caber tanto a adaptação da própria avaliação, como a priorização de

certos objectivos, ou conteúdos curriculares, face a outros (Martin, 1988).

Perante aqueles dados, infere-se que adaptar o currículo nas aulas,

pressupõe a realização de uma série de ajustes, ou de alterações, nos elementos

que constituem a proposta curricular de cada turma e que facilitem, aluno a aluno,

a consecução dos objectivos previstos, dentro de uma dinâmica colectiva de

envolvimento educativo. Ao agirem deste modo os professores criam, então,

condições para que todos os alunos participem de modo optimizado e segundo as

34 Em relação a esta questão Tomlinson e Allan (2002) referem que o papel do professor é “empurrar a

criança para a sua zona de desenvolvimento próximo, supervisionar o sucesso através de tarefas cada vez

mais complexas que a criança não consegue fazer sozinha e, assim, alargar a sua área de autonomia” ( p.37).

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possibilidades de cada um. Esta situação implica, naturalmente, tanto a

identificação dos saberes prévios presentes nos alunos, como as suas estratégias

preferenciais de processamento da informação. O conhecimento destes dados

servirá de fundamento não só ao estabelecimento de objectivos flexíveis de

aprendizagem, bem como ao desenvolvimento de actividades com níveis múltiplos

de complexidade e, ainda, de técnicas de aprendizagem cooperativa (S. Stainback

& W. Stainback, 1991).

A flexibilidade dos objectivos de aprendizagem traduz uma importante

estratégia no que concerne ao atendimento da diversidade dos alunos, em sala de

aula, uma vez que potencia a elaboração de objectivos específicos, numa

perspectiva individual. Desta forma será assegurada a adequação curricular às

necessidades, destrezas, interesses e habilidades únicas dos alunos destinatários

(Vila & Thousand, 1992).

Neste processo de integração curricular surge, a propósito, como um factor

de relevante importância, o trabalho de colaboração entre os docentes de apoio e

os professores titulares de turma. Nesta lógica, exige-se a uns e outros, uma total

consonância na aceitação destes princípios, uma rigorosa fidelidade na sua

aplicação e, sobretudo, uma reflexiva e perfeita articulação nas respectivas

práticas, quer de planificação quer de intervenção.

Por outro lado, não pode ser deixada ao acaso a interacção entre os

alunos. Esta deve ser pautada por princípios de tolerância, de respeito e de

entreajuda. É imprescindível, portanto, assegurar ambientes educacionais em que

interagindo uns com os outros, os alunos aprendam a aprender e a conviver, em

clima de perfeita segurança afectiva e cognitiva.

Trata-se, sem dúvida, de tarefas de difícil execução prática, dada a

multiplicidade de pontos de partida, apresentada pelo conjunto de alunos de uma

turma, tanto a nível emocional, como a nível académico, quer ainda pela

diversidade de necessidades e de interesses de que os mesmos são portadores

(Gimeno & Pérez, 1992). Dificuldade essa que é acrescida devido à ausência

generalizada daquelas práticas, uma vez que a pedagogia tradicional assenta num

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 225

ensino desenvolvido sob o primado da homogeneidade curricular e com

actividades e materiais genericamente similares para todos os alunos.

A diversidade é, portanto, a mais vincada das características de uma turma

de alunos. Responder com qualidade a essa diversidade pressupõe diferenciar.

Diferenciar afectos e estratégias pedagógicas de modo a garantir a “prestação de

atenção às necessidades de aprendizagem de um aluno em particular ”

(Tomlinson & Allan, 2002, p. 14).

No âmbito de uma educação inclusiva, importa, pois, reter que não devem

ser os alunos com necessidades educativas especiais a adaptar-se a um

processo de ensino habitualmente programado para satisfazer as necessidades

comuns da maioria dos alunos. Mas, pelo contrário, deverá, ser, antes, a gestão

curricular a corresponder aos modos e formas como cada um dos alunos progride

nas aprendizagens, em função das suas capacidades e sem que seja, portanto,

valorizado o facto de as suas necessidades serem especiais, ou não, (Arnaiz,

1995). Conquanto se concorde com o que postula Arnaiz em termos puros de um

processo de gestão da diversidade, já o mesmo não acontece no que concerne à

aplicação daquele postulado aos alunos com NEE, uma vez que se entende que a

compreensão da natureza das necessidades especiais destes alunos se afigura

de importância capital para a sua inclusão.

As características dos alunos com NEE são, pois, os principais

fundamentos para a adaptação ou adequação curricular de modo a que os

processos de ensino respondam às suas características. Por exemplo, para Martin

(1988), as adaptações curriculares, consubstanciam, mesmo, a estratégia principal

para o atendimento educativo dos alunos com necessidades educativas especiais.

A gestão da estrutura organizativa e funcional das aulas, mormente na sua

componente de desenvolvimento curricular, deve, pois, ser concebida de molde a

facilitar um trabalho coordenado entre os objectivos comuns a todos os alunos e

outros mais direccionados para um número mais restrito, ou mesmo, para este, ou

aquele, aluno em especial. O que se torna, então, decisivo, no interior das práticas

de adaptação curricular é que seja, tanto quanto possível, de evitar uma

assimetria expressiva entre a resposta adequada à turma, no seu conjunto e a

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 226

dirigida a outros dentro da mesma (Landivar, 1993). Quando tal não se afigurar

possível devido à problemática de determinados alunos devem ser encaradas

outras alternativas, incluindo-se, nestas, a possibildade da prestação de apoio fora

do contexto da sala de aula regular.

Concebendo-se, a turma, como uma pequena comunidade social, infere-se

- como já se frisou - que as interacções ocorridas no seu seio, consubstanciam um

aspecto de relevante importância no campo da percepção de sentimentos de

aceitação e de pertença de cada um dos seus elementos, em relação ao conjunto

dos restantes. Joga-se, por conseguinte, nesta dimensão interactiva, muito do

êxito, ou do fracasso das intenções inclusivas. Ultimamente, a investigação tem

vindo a relevar o significado pedagógico deste processo interactivo35, entre iguais,

sendo, mesmo, considerado, como um dos aspectos mais relevantes que se

abordaram, em matéria de ensino, nas duas últimas décadas (Coll & Colomina,

1991).

Resumidamente, pode-se dizer que a interacção discente cooperativa se

fundamenta no facto dos alunos se relacionarem entre si, de modo mais ou menos

estruturado na sala de aula, durante a aprendizagem, visando-se uma partilha e

um acréscimo de saberes. Convém, neste campo atentar-se no facto de que a

relação entre os alunos pode consistir em mais do que um modo, pois que os

alunos podem trabalhar numa dimensão competitiva - até para se saber quem é o

melhor - podem, numa outra ordem de ideias, trabalhar de modo individualista e,

finalmente, podem, também, organizar-se em torno de uma atitude de interesse

activo pelo êxito de todos e de cada um dos elementos da turma e, como

consequência, agir cooperativamente.

São, por conseguinte, hipóteses diferentes de agrupar, pedagogicamente,

os alunos na sala de aula. Contudo há que ter em linha de conta que a

aprendizagem competitiva colide com os princípios subjacentes à construção da

35 De notar, também, nesta matéria, a opinião de Araújo e Chadwick (1988) que, inspirados, ainda, na teoria

piagetiana, sustentam o princípio de que a própria aprendizagem deve ser estruturada de modo a privilegiar a

cooperação e a colaboração entre os alunos

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comunidade, a qual é o esteio social da escola inclusiva pelo que, neste contexto,

não deverá ser estimulada (D. Jonhson & R. Jonhson, 1994).

É, pois, neste campo que se prefiguram de profundo alcance, as noções de

igualdade e de mutualidade, aportadas por Damon e Phelps (1989). Assim, à

expressão igualdade, os autores em análise, atribuem a ideia de simetria, em

relação aos papéis assumidos e desempenhados por cada aluno, em situações de

aprendizagem grupal, reservando, para o termo mutualidade, os níveis de

assimetria da conexão, profundidade e direccionalidade das interacções

comunicativas verificadas entre os alunos. Ou seja, enquanto que a igualdade

apresenta uma semântica relativa às semelhanças, a mutualidade exprime um

sentido conotado com as diferenças, pelo que os autores referidos argumentam

ser a mutualidade a melhor estratégia para se poder atingir a verdadeira

igualdade.

Foot, Shute, Morgan e Barron, (1990) exemplificam e clarificam esta

questão recorrendo ao exemplo da tutoria entre iguais. Assim, os autores em

questão identificam, neste caso, a predominância da mutualidade, face à da

igualdade, dado que o tutor, em princípio, detém saberes que o tutorando não

possui. Então, através deste processo de interacção, o tutor tentará que o

tutorando venha, também, a dominar os saberes em jogo, atingindo-se, então, o

nível da igualdade mediante o desenvolvimento prévio de um processo de

mutualidade.

Adentro, ainda, da problemática das interacções entre os alunos, na sala de

aula, Gauvain e Rogoff, (1989), descrevem, por seu lado, a relação de

colaboração entre iguais, na qual, identificam uma interacção de valor simétrico

entre os alunos. Assim, uma relação de colaboração entre iguais caracteriza-se

por uma situação em que um grupo de alunos, com saberes e competências

próximos, trabalham juntos numa tarefa, visando a sua resolução. Trata-se, por

conseguinte, de uma situação em que os graus de mutualidade e de igualdade

são semelhantes. Gauvain e Rogoff atribuem a esta modalidade de interacção

entre alunos a designação de aprendizagem colaborativa.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 228

Finalmente, refira-se que, também, Coll e Colomina (1991), sublinham, a

relevância pedagógica das situações de aprendizagem cooperativa. Para a

concretização desta estratégia aqueles autores preconizam uma organização dos

grupos de trabalho, de maneira a que os alunos apresentem, entre si, uma

heterogeneidade média. Sob este tipo de agrupamento, as interacções são

caracterizadas por uma igualdade aproximada e uma certa dispersão no que

concerne à variável da mutualidade. Para Coll e Colomina esta forma de

agrupamento de alunos configura uma estratégia de significativa eficácia na

aprendizagem.

As situações de aprendizagem cooperativa, em que interagem, em

pequenos grupos, alunos com heterogeneidade não extremada, representam

procedimentos educativos em que todos os alunos têm oportunidades de aprender

de acordo com as respectivas limitações e capacidades. Neste tipo de actividade

os conhecimentos do aluno mais competente, asseguram o andaime em que se

apoiam os alunos portadores de menos saberes e que, deste modo dispõem de

uma plataforma securizante para construir os seus níveis sequenciais de

conhecimentos. Entretanto, estes últimos alunos ao progredirem, vão

questionando os seus pares detentores de maiores níveis de conhecimento.

Estes, ao sentirem a necessidade de dar respostas àquelas questões, acabam,

por sua vez, por levar a cabo uma reorganização dos seus saberes, ou seja,

acabam por aprofundar tanto os seus saberes como as suas estratégias de

aprender (Bruner, 1986).

Para além de clarificar o processo de interacção que emerge no âmbito das

estratégias de aprendizagem cooperativa, Bruner, esclarece, portanto, que

nenhum aluno é verdadeiramente prejudicado no desenrolar dos procedimentos

em questão. Deste modo, infere-se, que em situação cooperativa, cada elemento

de um grupo, acaba por retirar vantagens do trabalho realizado pelos demais

elementos, parecendo, então, que a única preocupação a contemplar, na gestão

destas actividades é que todos os alunos, efectivamente, trabalhem.

Mais uma vez emerge, então, a necessidade de que a articulação funcional

entre os professores titulares de turma e os professores de apoio, seja

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concretizada de modo muito rigoroso. Efectivamente, para que a referida

articulação se converta numa componente facilitadora da educação inclusiva,

aquela deverá ser orientada, para a progressiva construção e consolidação de

verdadeiros laços de cooperação e de colaboração entre aqueles profissionais,

entre estes e os alunos e, nestes, entre uns e outros.

A interacção cooperativa parece configurar, tanto no espaço escolar em

geral, como no espaço da aula em particular, uma via capital para o

desenvolvimento de autênticos laços de amizade. Estes, por sua vez,

consubstanciam uma condição imprescindível para que os alunos se motivem

para o desenvolvimento de atitudes e de práticas de respeito e de apoio mútuo.

Tais processos vão gerando, no interior da sua interacção interpessoal, um clima

caracterizado por sentimentos recíprocos de aceitação e de pertença, os quais

corporizam o requisito fundamental de um relacionamento social conducente às

práticas inclusivas (S. Stainback & W. Stainback, 1990).

Parecendo, então, fundamentada a crença de que a inclusão se afirma e

confirma, numa interacção de apoio e de entreajuda, entre iguais, na sala de aula,

importa, a propósito, sublinhar que a investigação - sobretudo, a partir dos anos

setenta do século XX - tem demonstrado, também, o contributo daquela

estratégia, para a emergência de determinadas melhorias, no próprio crescimento

integral dos alunos. Assim, o desenvolvimento sistematizado de relações de

trabalho entre os alunos, na sala de aula, tem efeitos positivos, por exemplo, a

nível da aquisição de competências sociais nomeadamente através do

desenvolvimento, naqueles, de hábitos do controle dos impulsos agressivos

(Hartup, 1976, 1978, Lacy, 1978, Lemare & Rubin, 1987, Schmuck, 1978, 1985).

Estes pressupostos foram, igualmente, comprovados por investigações realizadas

por S. Stainback, W. Stainback e Moravec (1991), os quais, ao observarem um

determinado número de aulas frequentadas por alunos com necessidades

educativas especiais, concluíram que, estes, alcançam melhores resultados

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gerais36, quando experimentam sentimentos de segurança, de aceitação e de

amizade com os seus professores e companheiros.

A potencialidade educativa do confronto sócio-cognitivo, assente na

interacção argumentativa de pontos de vista diferentes é, igualmente realçada

como uma mais valia da aprendizagem cooperativa, pelos resultados que produz,

a nível, tanto da compreensão como da apropriação de conteúdos conceptuais

(Alexander & Campbell, 1964, Gottman, Gonso & Rasmusen, 1975). Dados

semelhantes advêm, também, dos trabalhos de investigação realizados por D.

Johnson, Maruyama, R. Johnson, Nelson e Skon, (1981), os quais testemunham

que, numa perspectiva puramente cognitiva, as interacções entre pares,

promovem sensíveis melhorias nos processos de aprendizagem. Segundo os

autores citados, estes ganhos são particularmente sensíveis no âmbito das

aprendizagens académicas 37.

A opção por uma orientação inclusiva, no decurso das actividades de

ensino-aprendizagem, implica, pois, por um lado privilegiar determinadas

estratégias de relações interpessoais e, consequentemente por outro, inibir as que

poderão produzir efeitos contrários. Nesta linha de pensamento, torna-se

necessário atentar, de forma reflectida nos efeitos, que neste contexto decorrem

das estruturas das classes onde imperam atitudes competitivas. Efectivamente,

nas turmas onde se desenvolvem climas de competição, as diferenças entre os

alunos são mais perceptíveis, situação que favorece a emergência de quadros de

rejeição face a alguns alunos, nomeadamente, os pertencentes às minorias

étnicas (Kagan, 1985). Aliás, os inconvenientes das posturas competitivas não se

restringem ao aspecto puramente social, como o comprovaram Gotlieb e Leyser

(1981) ao concluírem que, sob aquele tipo de relação, os alunos menos capazes,

36 Coll e Colomina (1990) afirmam, também, que as situações cooperativas garantem melhores resultado do

que as competitivas e individualistas. Neste contexto, expressam, ainda, a convicção de que a cooperação

intragrupal, combinada com a competição intergrupal gera maior rendimento académico do que a competição

interpessoal. 37 Perret-Clermont (1984), coloca, explicitamente, a hipótese de que a existência de pontos de vista

moderadamente diferenciados entre os alunos que, interactivamente, realizam uma tarefa, dá lugar a um

conflito sócio-cognitivo que activa reestruturações cognitivas facilitadoras do progresso intelectual.

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do ponto de vista académico, tendem a ser menos aceites pelos seus pares de

rendimento elevado, ou até mesmo, pelos de rendimento médio.

Evidenciados que foram os efeitos dos processos competitivos, nos

contextos da intervenção educativa, prefigura-se, por conseguinte, ser imperioso

tentar evitar a ocorrência de tais situações, sob pena de se gerarem relações

sociais, precisamente opostas às que caracterizam e promovem a pedagogia da

inclusão. Em alternativa, ganha, então, cabimento, a implementação de estruturas

sociais de sala de aula que se baseiem em interacções do tipo colaborativo e

cooperativo38. Parece, até, não haver grandes entraves à adopção generalizada

deste tipo de interacções, nas práticas quotidianas das escolas, uma vez que, as

mesmas, consubstanciam estratégias metodológicas de ensino-aprendizagem

susceptíveis de serem aplicadas em qualquer nível de ensino e no interior da

maioria das disciplinas dos currículos escolares (Sharan & Hertz-Lazarowitz,

1980, Slavin, 1983).

Na dimensão em análise, D. Johnson e R. Johnson (1991), consideram, por

sua vez, que a aprendizagem cooperativa constitui uma óptima estratégia, no

âmbito da atenção à diversidade. Para os autores em apreço, aquela estratégia é

significativamente motivadora para o trabalho escolar quando este é desenvolvido

por grupos heterogéneos de alunos39. Ainda segundo a mesma fonte a

aprendizagem cooperativa permite estruturar actividades de níveis múltiplos e,

para além disso, estimula a emergência de hábitos de colaboração entre a

totalidade dos elementos da turma, ao mesmo tempo que estimula cada aluno a

tentar dar o melhor de si próprio, tanto para aprender mais, como para ajudar os

seus pares a melhor progredir.

As actividades de níveis múltiplos a que D. Johnson e R. Johnson fazem

referência, filiam-se na estratégia pedagógico-didáctica a que, de forma pioneira

38 Coll (1990) formula, mesmo, a convicção de que a interacção entre iguais é o motor do desenvolvimento e

que, consequentemente, se justificaria a transferência da mediação da relação professor-aluno, para a relação

entre os alunos. 39 Tomlinson e Allan (2002) sugerem, também, a possibilidade de agrupamentos por paridade de níveis de

aprendizagem, ao admitirem que “ por vezes, os alunos trabalham em grupos homogéneos quanto a

capacidades” (p. 19).

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Schultz e Turnbull (1984), citados em Porter (1997), apelidaram de ensino com

níveis diversificados. Trata-se de uma forma de trabalho escolar de acentuado

impacto em aulas do tipo inclusivo, dado que “possibilita ao professor preparar

uma aula com base em variações que possam responder às necessidades

especiais dos alunos” como explica Collicott (1991) citado em Porter (1997, p.45).

Efectivamente, através da activação do ensino com níveis diversificados

parece ser possível, por um lado, envolver a generalidade dos alunos e, por outro,

assegurar que este envolvimento respeite a zona de desenvolvimento proximal de

cada aluno, facto que - como oportunamente se salientou - torna o ensino e a

aprendizagem em processos marcadamente significativos. Paralelamente

aparenta tratar-se de um procedimento relativamente fácil de operacionalizar,

como se pode inferir pela descrição que Gordon Porter apresenta:

O ensino com níveis diversificados implica: identificação dos principais conceitos

que têm de ser ensinados numa lição; determinação duma variedade de formas

através das quais os alunos possam exprimir a sua compreensão e

desenvolvimentos de meios de avaliação que correspondam aos diferentes níveis

de desempenho. (1977, p. 45)

Ainda, no âmbito das interacções na sala de aula, julga-se pertinente aludir

aos trabalhos de S. Stainback e W. Stainback (1992), em que utilizam a

expressão rede de apoio natural para caracterizar a relevância deste tipo de

relações entre os alunos. Os autores em causa atribuem, de facto, uma

importância decisiva à interacções entre alunos, no contexto da criação de

ambientes escolares inclusivos. Como elementos estruturantes daquela rede de

apoio natural, os autores mencionados identificam, nomeadamente os seguintes:

• os sistemas de tutoria

• os círculos de amigos40

• as estratégias de aprendizagem cooperativa

40 Trata-se de um processo gerido entre pares e que tem por objectivo sensibilizar os alunos de uma dada

turma, para as necessidades de amizade percepcionadas por um colega recém-chegado, conforme o conceito

avançado por Snow e Forest (1987).

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Pelo número de autores que denotam uma opinião favorável ao contributo

que as interacções cooperativas entre os alunos dão para a construção de

ambientes de aprendizagem inclusivos, bem como pelo elevado grau de

consenso que as mesmas suscitam, conclui-se que a edificação de um clima de

interacção inclusiva passa muito por aí. Por conseguinte, afigura-se crucial

considerar, então, as estratégias de cooperação discente - a par com a

colaboração docente - como um dos pilares nucleares da escola inclusiva,

justificando-se, por essa razão a insistência com que é, neste trabalho, abordada.

Praticando-se, por rotina, as estratégias de aprendizagem cooperativa no

contexto escolar, as salas de aula, funcionarão, como uma espécie de projecção

activa da desejada sociedade futura, facilitando desde logo, o desenvolvimento de

atitudes de valorização das diferenças e da gradual aceitação das mesmas. O

sucessivo e natural encontro com outros que, inicialmente, são percepcionados

como diferentes - e, não raro, considerados como incapazes de aprender e de

interagir - vai, naturalmente, inibindo os efeitos daqueles preconceitos, e fazendo

emergir, em seu lugar, sentimentos de aceitação, de valorização, e de

cooperação. Colocam-se, deste modo, as primeiras pedras na construção de uma

sociedade, mais tolerante, mais solidária e (por que não?) mais feliz.

Numa outra óptica de análise, um dos factores que é considerado como dos

mais importantes no que concerne a uma aprendizagem bem sucedida é o factor

tempo, entendendo-se, este, como o período temporal de que efectivamente os

alunos precisam para a apreensão dos diferentes saberes escolares. Também

neste âmbito as diferenças entre os alunos são particularmente significativas.

Sobre esta questão o testemunho de Wang (1997) é extremamente claro e

expressivo, como se pode constatar, quando, por exemplo, a autora afirma que

“para aprender bem, os alunos têm de passar tempo a, activamente, procurar a

aprender. Isto significa que os pais e os professores devem, de qualquer forma,

estimular as crianças a investir tempo a aprender” (p. 61).

A questão do tempo escolar apresenta, assim, duas dimensões: uma diz

respeito à diferença de tempos de aprendizagem existentes entre os alunos a qual

terá de ser, pedagogicamente respeitada e equacionada; a outra refere-se à

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quantidade de tempo que a escola deve dedicar à aprendizagem, admitindo-se,

aqui, o pressuposto de que quanto mais tempo efectivo for dedicado às tarefas de

aprendizagens - em detrimento de outro tipo de actividades, como festas,

convívios, exposições - maior será o rendimento obtido pela generalidade dos

alunos. Logo, prefigura-se a optimização do tempo como princípio fundamental a

consagrar na sala de aula, quer no seu aspecto qualitativo quer na sua vertente

quantitativa, aliás de acordo com o que sobre esta matéria foi já dito,

anteriormente. A observância metódica deste factor será, certamente, uma mais

valia considerável nos resultados da aprendizagem dos alunos em geral e, em

particular, nos processos de inclusão dos alunos com NEE.

5.8.3 A Formação Integral dos Alunos

Todo o espaço social - e, de modo muito especial, o espaço escolar -

deve, obviamente, constituir uma oportunidade educativa para o desenvolvimento

global do aluno. Contudo, no âmbito restrito da escola, a sala de aula, parece

configurar, ainda, no imaginário da generalidade dos alunos, das famílias e de um

número apreciável de professores, um espaço vocacionado, essencialmente para

a aprendizagem de conteúdos académicos. Ora parece ser altura de se

equacionar a possibilidade de alterar essa convicção mormente, agora, que o

Decreto-Lei n.º 6/2001 releva o primado da formação integral do aluno, como

princípio a observar, também, nas actividades a desenvolver na sala de aula.

Aliás, este princípio está já há algum tempo consagrado nos planos curriculares de

muitos países, como, por exemplo, acontece com a vizinha Espanha, como se

pode confirmar mediante a consulta da legislação equivalente à nossa Lei de

Bases do Sistema Educativo.

No caso concreto das estratégias pedagógicas facilitadoras da emergência

de contextos inclusivos, a formação integral dos alunos parece consubstanciar um

manancial de potencialidades tão relevantes que se torna premente reflectir sobre

esta questão e, fundamentalmente, apoiar a consecução dos seus efeitos

educativos nas salas de aula. Assim, prefigura-se ser do domínio comum que a

prática da inclusão pressupõe, antes de mais, o desenvolvimento de atitudes de

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crença nos valores que enformam aquelas práticas, dependendo, até, a eficácia

destas, do grau de adesão afectiva aos referidos valores. Logo, a implementação

de pequenas comunidades inclusivas, nas escolas - e dentro destas, em cada

turma - implica, não só, a interacção cognitiva entre os alunos, mas, também - e,

provavelmente, sobretudo - a interacção emocional. Logo, são estas duas

dimensões (a emocional e a cognitiva) que travejam a estrutura da formação

integral do indivíduo, pelo que, este aspecto, deverá merecer a atenção

permanente e profunda de todo e qualquer docente.

Com a publicação do Decreto-Lei n.º 6/2001 é, assim, recuperada, de

maneira muito incisiva, o ideal da formação integral do aluno-pessoa. Desta forma

ganha corpo a esperança de que se, por conseguinte, as escolas e os professores

se envolverem já, na prossecução quotidiana daquele objectivo, a vida das

sociedades futuras, será, por essa via, seguramente, cada vez mais tolerante,

mais solidária, mais justa e, numa palavra, mais inclusiva.

Para além do saber ser, a formação integral do aluno pressupõe, ao mesmo

tempo, o saber aprender, o aprender conhecimentos e, também, o saber fazer.

Através do desenvolvimento deste conjunto integrado de saberes, o aluno terá

possibilidades reais de crescer, ética e harmoniosamente, nas dimensões do

sentir, do pensar e do agir, as quais, de modo holístico e sumário, definem a

pessoa humana.

Ora, se as crianças de hoje aprenderem a sentir, a pensar e a agir em

cooperação e em solidariedade recíprocas, infere-se que o seu amanhã será mais

pacífico do que os tempos actuais e, sobretudo, será, certamente - insista-se

nesta ideia - mais ... feliz. Enfim, razões de sobra para que as escolas se

empenhem, firmemente, no desenvolvimento da formação integral dos seus

alunos, numa perspectiva subordinada aos ideais da inclusão.

Admitindo-se, como pressuposto, que a formação integral deverá ser

entendida como uma finalidade transversal, deduz-se que, a mesma, deverá ser

objecto de desenvolvimento educativo em todos os tempos curriculares, de modo

contextualizado e oportuno. Porém, a tradição no sistema educativo português, da

persistência de uma estrutura programática que, basicamente, tem assentado em

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conteúdos de natureza conceptual, tem gerado um processo de ensino-

aprendizagem norteado, maioritariamente, pela prioridade concedida à formação

académica dos alunos. Tal posicionamento provoca, naturalmente, nítidas

assimetrias no que concerne ao desenvolvimento das diferentes dimensões

integrantes do todo da pessoa humana, facto a que não serão estranhas as

constantes provas de ausência de civismo que ocorrem no nosso quotidiano

social.

Como consequência da situação, antes exposta, professores e alunos têm,

sobretudo, trabalhado o saber conhecimentos, relegando, para instâncias

secundárias, o saber fazer e, provavelmente, mais ainda, o saber ser. E é

precisamente neste contexto que terá de ser entendido o sentido semântico do

termo competência, termo que atravessa e estrutura, nuclearmente, toda a

proposta legislativa da recente reorganização curricular do ensino básico.

Os contornos conceptuais do termo competência parecem erradicar, de

algum modo, da própria integridade do indivíduo, prenunciando, por conseguinte,

que o exercício concreto de competências - enquanto capacidade de activação

contextualizada de saberes - implicará a mobilização interactiva das dimensões de

base daquela integridade: o sentir, o pensar e o agir. Resta apenas que tais

propósitos passem a ser assumidos e postos em prática no desenvolvimento

curricular nas escolas e muito em particular nas salas de aula.

Genericamente, portanto, o desenvolvimento de competências está

conectado, semanticamente com o conceito de acção, integrando este, tanto o

sentir, como o pensar, pelo que o novo modelo de gestão curricular dá relevância,

no seu espírito e na sua letra, à formação integral do indivíduo. Emerge, aqui, por

consequência, a noção fulcral do currículo como meio estrategicamente facilitador

da formação integral do desenvolvimento humano.

A concretização daqueles propósitos passará, certamente, pela crescente

capacidade das escolas e dos professores, de saber desenvolver a formação

integral dos seus alunos, essencialmente, nos espaços e nos tempos curriculares.

Neste contexto emerge - mais uma vez e ainda - a necessidade de mudança da

cultura pedagógica actual, dado que, como já foi indiciado antes, a escola

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portuguesa tem vindo a preocupar-se essencialmente com os conhecimentos e

não tanto com as atitudes e capacidades.

Provavelmente o desafio em análise será, como outros, de concretização

morosa, uma vez que, de alguma maneira, pressupõe a introdução de novas

formas de, não só de conceber, como de fazer escola. Porém esta morosidade

não poderá funcionar como factor impeditivo da introdução gradual de uma

pedagogia orientada para a formação global das novas gerações, até pelo

transcendente alcance que lhe está subjacente.

Não se deseja, é claro, colocar aqui em causa a importância inerente à

aquisição dos saberes conceptuais. Pelo contrário, estes representam um

contributo de extrema valia para a preconizada formação integral do aluno. A este

propósito, Alemany, Majós e Giménez (2000) não deixam quaisquer dúvidas sobre

tal ao expressarem que a “aprendizagem de fatos [sic], de conceitos e de

princípios é importante para a formação dos alunos, porque ajuda a desenvolver,

em último caso, a capacidade de tornar-se uma pessoa conhecedora do mundo”

(p.304). Através, então, da aprendizagem dos conteúdos de natureza conceptual

(factos, conceitos e princípios) os alunos estarão preparados para:

- Representar o mundo, levando em conta as entidades significativas na cultura.

- Identificar aspectos relevantes da realidade, nominá-los e manifestar-se sobre o

que quer que seja.

- Ter um visão coerente, estruturada e organizada da realidade.

- Reduzir a complexidade e a variabilidade dos acontecimentos a uma estrutura de

identidades que possibilite tanto conhecê-la como intervir pessoalmente.

- Atuar [sic] de maneira reflexiva, sem valer-se de condições de imediatismo ou

deixar-se levar pelas aparências.

- Predizer acontecimentos de maneira que não seja necessário fazer novas

aprendizagens continuamente e garantir a funcionalidade das já realizadas.

- Compreender e explicar com maior profundidade progressivamente tudo o que

nos envolve e estabelecer relações cada vez mais complexas. (idem)

Paralelamente, a aprendizagem dos conteúdos procedimentais - como

referem os mesmos autores - é “importante para a formação dos alunos, para que

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 238

ajudem a desenvolver, em último caso, a capacidade de uma pessoa de tornar-se

ativa [sic] e hábil” (idem). Deste modo se prepararão os alunos para:

- Planejar e controlar a própria atividade [sic] de atenção, de percepção e de

cognição, em geral, de maneira ajustada às condições das tarefas realizadas,

para que garantam os processos de aprender e de continuar aprendendo.

- Habilitar-se a obter, a selecionar [sic] e a tratar a informação, utilizando as

técnicas mais apropriadas de acordo com a natureza das fontes em que se

apresenta.

- Dominar a automatização, os procedimentos, as técnicas, as operações, as

estratégias, as rotinas básicas que permitam comunicar-se e expressar-se de

maneira adequada por meio de diversas linguagens.

- Observar, explorar e realizar processos de pesquisa com a precisão requerida

para obter informações suficientes sobre o meio, para interpretá-lo e nele atuar

[sic].

- Representar e resolver, mediante procedimentos eficazes, determinados

problemas e situações referidas na vida cotidiana [sic] e em diversos campos

do conhecimento.

- Colocar em prática habilidades para a comunicação, para a discussão, para o

debate e, em geral, para a interação [sic] proveitosa com as outras pessoas.

- Garantir a aquisição e a prática autônoma [sic] de hábitos relacionados com a

saúde e o bem-estar pessoal: a higiene e o cuidado do corpo e o exercício

físico; o cultivo da auto-imagem positiva; o estabelecimento de boas relações

com os outros; a resolução de conflitos, a participação em atividades [sic]

colectivas, etc. (idem, pp. 304-305)

Alemany, Majós e Giménez afirmam, ainda, que a “aprendizagem de

atitudes, de valores e de normas é importante para a formação dos alunos, pois

esses factores ajudam a desenvolver, em último caso, a capacidade de tornar-se

uma pessoa responsável” (idem, p. 305). Com a aprendizagem deste tipo de

conteúdos - prosseguem os mesmos autores - os alunos ficarão aptos a:

- Orientar e regular o próprio comportamento nas atuações [sic] que têm como

um determinante o trabalho e o estudo pessoal, o intercâmbio com os outros

e a elaboração coletiva [sic] de resultados.

- Aceitar-se e valorizar-se tanto quanto possível e mostrar compreensão e

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 239

respeito, igualmente, em relação aos outros.

- Demonstrar formas consistentes – e compromissadas [sic], - da atuação [sic],

no cumprimento da convivência e da participação social.

- Contribuir ativamente [sic] para a defesa, para a conservação e para a

melhoria do meio ambiental.

- Assumir uma postura ativa [sic], pessoal e coletivamente [sic], diante do

mundo e dos numerosos problemas apresentados atualmente [sic] na

sociedade e adotar [sic] atitudes que demonstrem a interiorização de valores

fundamentais. (idem, p. 305)

Desenha-se, desta forma, um processo gradual de inovação, suportado por

sucessivas mudanças organizativas e pedagógicas do processo de ensino-

aprendizagem. Trata-se de princípios de inegável alcance pedagógico e que

poderão conduzir, efectivamente, a uma educação de grande qualidade para a

generalidade dos alunos e, provavelmente mais facilitadora da assunção dos

valores sociais inerentes aos ideais inclusivos.

Face aos pressupostos inventariados, surge, como inevitável, a

interrogação de se considerar a actual lógica disciplinar como a mais adequada a

uma educação orientada para a formação integral do indivíduo. Ou, até, se seria

necessário - como está determinado no Decreto-Lei n.º 6/2001 - a introdução de

áreas não disciplinares com essa finalidade específica, uma vez que a formação

integral da pessoa é de natureza intrinsecamente transversal e,

consequentemente, deveria ser alvo de atenção oportuna em qualquer tempo

disciplinar.

Sem relegar a pertinência e oportunidade das questões levantadas, julga-

se, todavia, ser possível, de momento, conciliar o estado actual da cultura

pedagógica das escolas e dos professores, com o advento do conteúdo das

propostas de reorganização curricular formalmente, apresentadas no Decreto-Lei

n.º 6/2001. Assim, parece que o importante será a emergência de atitudes de

crença nos pressupostos de tal reorganização e, em consequência, desenvolver

caminhos que, sujeitos a procedimentos de progressiva reflexão, proporcionem os

rumos conducentes à optimização futura das práticas de organização e

desenvolvimento curricular das escolas. Só deste modo serão viabilizadas

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 240

estratégias educativas simultaneamente capazes de responder, com qualidade,

tanto à diversidade como à formação integral de todos os alunos.

Sob esta perspectiva, julga-se fundamentado admitir que, na fase actual de

implementação da proposta de reorganização curricular, se torna necessário,

antes de mais, reforçar a ideia de que a formação integral dos alunos, passa, em

grande medida, por um processo de aprendizagem de um conjunto determinado

de competências. Seguidamente, importa assumir-se que não existem

competências sem conhecimentos. Finalmente será necessário ter-se em conta

que os saberes integrantes de cada competência são de natureza diversificada,

concretamente, de natureza atitudinal, conceptual e procedimental, e que cada

uma destas naturezas implica a mobilização de estratégias de ensino-

aprendizagem, igualmente diferenciadas (Zabala, 1998).

Como informação preliminar, neste contexto, Zabala começa por enunciar a

definição dos conteúdos factuais, entendendo-os como “o conhecimento de factos,

acontecimentos, situações, dados e fenómenos concretos e singulares” (1998 p.

41). Em relação à aprendizagem de conteúdos de natureza factual, o autor

recomenda que aquela deverá ser assegurada através da compreensão segura

dos conceitos associados. Deste modo - segundo o mesmo autor - a

aprendizagem torna-se num acto significativo suportado, precisamente, pelo facto

de o aluno ser capaz de atribuir um significado pessoal àquela informação.

Após ter compreendido os conceitos relacionados com os factos em estudo,

o aluno deverá passar à repetição oral ou escrita, da informação em causa. Logo,

para Zabala, a estratégia crucial da aprendizagem dos conteúdos factuais,

assenta na repetição, antecedida de um trabalho de compreensão dos conceitos

relacionados com os factos em questão.

No que concerne à aprendizagem dos conceitos e princípios - os quais

juntamente com os factos, integram, como se referiu, a dimensão dos conteúdos

conceptuais - Zabala, entende, que deve ser, antes de mais, facultada, aos

alunos, a explicitação semântica daqueles termos, considerando que “os conceitos

se referem ao conjunto de factos, objectos, ou símbolos que têm características

comuns, e os princípios se referem às mudanças que se produzem num facto,

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 241

objecto ou situação em relação a outros factos, objectos ou situações” (1998, p.

42). O autor esclarece, a este propósito, que as mudanças que consubstanciam os

princípios, descrevem, normalmente, relações de causa-efeito. A fim de melhor

clarificar o sentido com que usa o termo princípios o autor aponta, como exemplos

do mesmo, o princípio de Arquimedes ou a regra seguida por uma determinada

corrente literária.

Passando concretamente aos processos de ensino-aprendizagem, tanto

dos conceitos, como dos princípios, Zabala frisa que uns e outros implicam a

necessidade efectiva de serem objecto, por parte dos alunos, de um trabalho

mental que facilite a sua compreensão, condição básica para a sua aprendizagem,

dado que “ não podemos dizer que se aprendeu um conceito ou um princípio se

não se entendeu o significado” (idem, p. 43). Este trabalho mental traduz, para o

autor em referência, um autêntico processo de elaboração e de construção

cognitivas sendo, por conseguinte, reflexo do processo básico e geral de

aprendizagem usado pelo ser humano quando envolvido em tarefas de

apropriação de saberes.

Finalmente, no que respeita à aprendizagem das competências

procedimentais, Zabala, começa, também, por clarificar o seu entendimento

conceptual deste tipo de saberes, referindo que se trata de “um conjunto de

acções ordenadas e com um fim, quer dizer, dirigidas para a realização de um

objectivo” (p. 43). Como exemplos de conteúdos procedimentais, o autor cita,

entre outros, o ler, o desenhar e o traduzir. Para que este tipo de aprendizagem

ocorra Zabala sugere, por parte de cada aluno, a realização concreta das acções

que integram cada uma das competências procedimentais programadas. O autor

coloca assim em evidência o princípio de que os procedimentos se aprendem

fazendo, a partir da observação reflexiva de modelos competentes. Zabala alerta,

ainda, que a modalidade de aprendizagem dos conteúdos procedimentais não é

conciliável com estratégias de ensino expositivas, relegando, assim, estas para

um lugar secundário em favor da mobilização das chamadas metodologias

activas.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 242

Analisados, assim, os tipos básicos do conteúdo curricular orientado para a

formação integral dos alunos, resta, por fim, focar os processos cognitivos que,

precisamente, tornam possível a sua apropriação, por parte do sujeito, processos,

esses que vários autores designam por estratégias de aprendizagem. Para Mayor

(1993) as estratégias de aprendizagem assentam numa determinada sequência

de procedimentos que, o indivíduo terá de mobilizar para aprender. Para além

desta ideia, Weinstein, Zimmerman e Palmer (1988), identificam - naqueles

processos de apropriação de saberes - atributos que lhes permitem, não só a

aprendizagem (como já foi referido, mediante, o recurso a Mayor), mas também o

desenvolvimento da capacidade de exercer o controle e regulação dessa mesma

aprendizagem.

Ainda sob esta questão, afigura-se, igualmente relevante, especificar que,

um outro autor, desta vez Mayer (1988) acrescenta uma concepção de estratégias

de aprendizagem algo diferenciada das perspectivas já enunciadas. Assim, para

este autor, aquelas estratégias consubstanciam, tanto condutas, como actividades

mentais que o sujeito, ao aprender, mobiliza para optimizar o seu próprio

mecanismo de processamento de informação.

Expostas algumas ideias relativas à concepção e gestão de estratégias de

aprendizagem, importa agora resumir as mesmas. Assim - e com base nos

resultados dos investigadores, antes referenciados - pode-se, portanto inferir que,

as estratégias de aprendizagem, são, por um lado, os processos mentais que

traduzem a possibilidade de aprender e, por outro, procedimentos metacognitivos

que permitem gerir - orientando e aperfeiçoando - a sequência das condutas

intelectuais que o sujeito activa durante a realização das aprendizagens41.

Entretanto começa a ser necessário ter-se em conta que a escola não

consegue ensinar tudo o que os alunos necessitam para responder, de forma

simultaneamente adequada e crítica, às exigências da sociedade actual e futura.

Logo, a aprendizagem ao longo da vida torna-se uma necessidade premente para

41 Bernard (1993), apresenta, também, uma noção de estratégias de aprendizagem que, em síntese, remete

para a ideia do conjunto de procedimentos que o sujeito necessita de mobilizar para atingir, com sucesso, um

determinado objectivo de aprendizagem.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 243

quem não deseje ficar de fora do seu tempo. Por consequência afigura-se,

extremamente, importante que, durante a escolaridade, os alunos aprendam a

aprender a fim de que possam, com eficácia, continuar o seu inevitável processo

de actualização de saberes, após a saída da escola.

Aquela situação de aprender a aprender põe em relevo, por parte do aluno,

justamente, tanto o papel das estratégias de aprendizagem - enquanto sujeito da

aprendizagem - como a necessidade de que, elas próprias, sejam, também,

entendidas como conteúdo, ou seja, objecto da aprendizagem. No que diz

respeito, concretamente, ao ensino de estratégias de aprendizagem, Selmes

(1988) sugere um conjunto de procedimentos pedagógico-didácticos que se

podem resumir do seguinte modo:

• dinamizar tarefas que estimulem a análise do aluno sobre as suas próprias

estratégias de aprendizagem;

• desenvolver hábitos de observar e debater os modos utilizados pelos

colegas, para aprender;

• relevar as estratégias que melhor resultem em cada actividade de

aprendizagem;

• proporcionar o desenvolvimento de atitudes de análise dos processos de

aprendizagem envolvidos nas tarefas da vida diária;

• apoiar a aplicação de novas estratégias de aprendizagem à medida que se

vai progredindo na abordagem dos diversos conteúdo escolares.

A importância do aprender a aprender - em que são proporcionadas,

portanto, oportunidades de os alunos desenvolverem e gerirem os seus próprios

processos de aquisição de saberes - parece ser demasiado grande, face às

necessidades das novas gerações, para que não se dê, à mesma, o realce que

deve merecer, no contexto das aprendizagens a abordar na sala de aula. Porém,

para que essa importância seja, devidamente, percepcionada pelos alunos,

necessário se torna que, estes, disponham de tempos escolares específicos, para

reflectirem e debaterem o alcance actual e futuro, do domínio das estratégias em

questão (Beltrán, 1993). Resulta, então, da aludida perspectiva de Beltrán, que as

escolas e os docentes deverão criar e desenvolver ambientes e acções de

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 244

aprendizagem subordinados ao modelo da pedagogia construtivista. Nesta - e

privilegiando-se o primado da mediação - os alunos encontrarão os ingredientes

imprescindíveis ao crescimento e reforço da sua autonomia, condição fundamental

para que possam vir a desempenhar, com sucesso, um papel integrado,

autónomo, activo e crítico nas sociedades contemporâneas, na qualidade de

cidadão e, por conseguinte, já fora da escola.

Decorre, portanto, da análise destes contributos que, aos professores, está

cometida a função de serem, por sua vez, competentes no trabalho de mediação

didáctica diferenciada. Essa diferenciação é ditada, como se viu, pela

tipologia/natureza de cada conteúdo de aprendizagem. Dito de outra maneira, tal

significa que os conceitos são ensinados de uma forma, as atitudes de outra e os

procedimentos de acordo com uma terceira.

Atendendo às exigências metodológicas em causa, afigura-se ter todo o

cabimento colocar, aqui, a seguinte questão: será que as escolas e os professores

detêm a preparação necessária e suficiente para a implementação, com

qualidade, dos pressupostos educativos subjacentes ao decreto-lei n.º 6/2001?

Afigura-se ser relativamente previsível o sentido da consequente resposta .... A

verdade é que ganha contornos de pressionante premência a necessidade de que

a generalidade dos alunos se aproprie dos diferentes saberes necessários ao

desenvolvimento das competências referidas, dado que estas se afiguram

grandemente relevantes para a realização dos seus projectos de vida, nos tempos

e sociedades actuais e futuros.

Está, pois, aqui, presente e de que maneira, a dicotomia da inclusão e da

exclusão. È que parece não haver dúvidas significativas sobre o caminho que irão

seguir todos aqueles - e não serão poucos - que não vierem a desenvolver

competências que os tornem capazes, simultaneamente, de saber ser, de saber

saberes e de saber fazer. Efectivamente, afigura-se que para estes se tornará

muito difícil escapar aos trilhos da exclusão social.

Neste contexto, qual a situação em que deverão ser considerados os

alunos com NEE? Julga-se, precisamente, que nos mesmos termos em que

deverá ser enquadrada a generalidade dos alunos. Ou seja, partindo-se e

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respeitando-se as suas características e necessidades, os alunos com NEE têm,

igualmente, direito ao acesso a oportunidades educativas que tanto quanto

possível lhes optimizem a sua formação integral.

Surge, então a necessidade da dinamização, nas escolas, de processo

metódicos de reflexão das práticas em curso. Tal é imprescindível para a

identificação criteriosa das práticas necessárias à gestão da diversidade e da

formação integral, as quais deverão, então, ser introduzidas no quotidiano da

acção escolar, a fim de que, gradualmente, se dilua a distância entre o que é e o

que deve ser a gestão curricular.

5.8.4 A Adequação dos Procedimentos de Avaliação

Antes propriamente de se entrar em considerações relativas aos processos

de avaliação em sala de aula, entende-se ser, aqui, oportuno referir que em

qualquer processo de mudança - e sobretudo se este se revestir de natureza

sistémica - o papel da avaliação é fundamental. Efectivamente, desde o início de

qualquer processo de inovação se torna indispensável o recurso a um plano de

avaliação que permita a percepção fundamentada do que está a correr de acordo

com o desejado e do que não está.

A organização de um plano de avaliação que sirva de elemento regulador à

realização de um projecto de desenvolvimento institucional, deverá ganhar forma a

partir da formulação de questões que se afigurem determinantes para a

consecução dos objectivos propostos. Questões estratégicas, portanto, como, por

exemplo, as que sugerem Tomlinson e Allan (2002):

Para onde queremos ir? Quais os passos a seguir para lá chegar? Quando

avaliamos cuidadosamente o nosso progresso? Como conseguir auxílio para

realizar as avaliações significativas e úteis do nosso processo de crescimento? O

que é que fazemos com aquilo que aprendemos nas avaliações? (pp. 99-100)

Se a nível do desenvolvimento institucional a avaliação ganha estatuto de

factor crucial, situação semelhante, naturalmente, ocorre no âmbito do processo

educativo propriamente dito. Neste, a avaliação torna-se num elemento

indispensável tanto para fornecer dados que permitam o controle e correcção dos

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processos de ensino-aprendizagem, como para aferir do grau de consecução dos

objectivos educacionais estabelecidos.

Para tal, é imprescindível que, pela prática da avaliação, se descrevam e

expliquem os progressos que o aluno realiza, no que respeita a atitudes,

capacidades, destrezas e recuperação de dificuldades, bem como no que se

refere aos seus níveis de desenvolvimento de esforços. Neste aspecto, a

condição específica dos alunos com NEE terá de merecer uma atenção

particularmente criteriosa, a fim de que o respectivo percurso escolar seja, tanto

quanto possível, optimizado.

Em suma há que actuar de modo a que se obtenha informação que

contenha os elementos fundamentais à tomada de decisão sobre a adopção de

medidas adequadas de apoio e de orientação a cada aluno, principalmente - diga-

se mais uma vez - aos alunos com NEE. Esta preocupação deverá ser assumida,

tanto por parte dos professores e dos pais como por parte dos alunos em relação

a si próprios, logo através de procedimentos de auto-avaliação (Coll, 1987).

Neste quadro, Thomas et al. (1998) advogam o princípio da avaliação

criterial, em detrimento da avaliação comparativa, salientando a ideia de que,

mediante o recurso a procedimentos de diferenciação, os alunos serão ajudados a

ter sucesso nas aprendizagens esperadas para cada um e em função das suas

capacidades. Sob esta estratégia diferenciada de ensino-aprendizagem a

avaliação criterial - se desenvolvida numa perspectiva de integração curricular, por

um lado, e numa óptica inclusiva, por outro - visará, sobretudo, identificar e

registar os progressos atingidos por cada aluno, sem, portanto, denotar qualquer

preocupação de os comparar com os resultados obtidos por qualquer outro seu

companheiro. Este princípio é sumamente importante para o caso dos alunos com

NEE, tanto nas actividades desenvolvidas em contexto de sala de aula como,

eventualmente, fora deste espaço. O que se afigura, aqui, de extrema relevância é

que os critérios e metodologias de avaliação das aprendizagens destes alunos

estejam perfeita e adequadamente prescritos nos seus planos educativos

individualizados. Considera-se, entretanto, que uma prescrição adequada de

critérios e de metodologias de avaliação das aprendizagens dos alunos com NEE

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deverá ter em conta a respectiva problemática e consequentemente abrir a

possibilidade de serem accionados procedimentos diferenciados de avaliação. É o

que aconselham Correia, Martins, Santos e Ferreira (2003a) ao dizerem que:

Criar várias opções de avaliação é considerado uma prática desejável,

consentânea com os princípios da inclusão que relevam para primeiro plano as

diferenças que existem entre os alunos, contrariando uma certa tendência de

muitos professores em uniformizar a avaliação, elaborando fichas de avaliação

muito semelhantes. (p. 52)

Os ditames de uma educação inclusiva pressupõem por conseguinte, todos

os cuidados com os percursos de aprendizagem dos alunos com NEE, incluindo-

se, aqui, naturalmente, a eventualidade de se recorrer a processos alternativos de

avaliação. Porém - e em nome desses mesmos cuidados - há que analisar

devidamente o conjunto de características e necessidades de cada uma daquelas

crianças uma vez que se torna prudente “salientar que as alterações à avaliação

só devem ser efectuadas quando forem realmente necessárias, devendo o grau

de alteração ser directamente proporcional aos problemas do aluno” (Correia et al.

2003a, p. 52).

Pensa-se, também no que respeita à avaliação, que os procedimentos

tradicionais deverão ser objecto de reflexão e, muito provavelmente, de alteração.

Neste âmbito, S. Stainback e W. Stainback (1999) preconizam que o objectivo da

avaliação terá de ultrapassar o conceito arreigamente instituído de o aluno mostrar

se sabe, e caminhar processos frequentes de avaliação formativa, através dos

quais o aluno é ajudado a tornar visível, para si, para os pares e para os

professores, a sua forma de ser e de aprender. Nesta lógica, a avaliação

transforma-se essencialmente num meio de conhecimento, de regulação e de

optimização dos próprios mecanismos de aprendizagem, sendo, no fundo, mais

uma estratégia de aprendizagem do que, propriamente, um meio de medição.

Os contributos da literatura colocam, pois, a ênfase na concepção da

avaliação como um processo de proporcionar oportunidades aos alunos de a

utilizarem para regular o seu pensamento e acção, enquanto trabalham em cada

unidade ou tarefa de aprendizagem. Sob estes procedimentos, os alunos são

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estimulados a desenvolver, progressivamente, hábitos de reflexão integrados e

decorrentes das práticas, ao mesmo tempo que se tornam competentes no

controle intencional e activo das suas próprias experiências de trabalho e de

aprendizagem.

Numa perspectiva pedagógica em que o aluno configure o centro e o núcleo

de toda a actividade educativa, julga-se que a avaliação diagnóstica deverá

desempenhar um papel de estratégica importância, nomeadamente no âmbito das

necessidades educativas especiais, ao funcionar como um processo vocacionado

para o “determinar da actuação educativa ou das ajudas que seja necessário

proporcionar aos alunos com essas necessidades” (Jiménez, 1997, p. 12).

Conquanto seja um procedimento indispensável e de reconhecido alcance

educacional, a avaliação diagnóstica deve ser usada, no entanto com

indispensáveis cautelas, como recomendam Marchesi e Martín, (1995):

A detecção e avaliação das necessidades educacionais especiais constitui uma

etapa primordial. O objectivo não é conseguir encontrar os traços que permitam

situar determinados alunos dentro de uma das categorias em que se distribuem as

deficiências. Ele é muito mais abrangente, com mais nuances e mais ligado às

possibilidades educacionais. Trata-se, sem dúvida, de conhecer os perfis

evolutivos da criança, suas limitações e atrasos, determinando se existe uma

etiologia orgânica ou ambiental. No entanto, a finalidade primordial é analisar suas

potencialidades de desenvolvimento e de aprendizagem, avaliando ao mesmo

tempo quais são os recursos educacionais que necessita. (pp. 12-13)

Com esta perspectiva, Marchesi e Martín pretendem vincar a ideia de que a

avaliação não deve ser um instrumento usado, essencialmente, para categorizar

os alunos, segundo a sua deficiência, mas, sim, para identificar com o maior rigor

possível o seu estilo, ou perfil de aprendizagem. Todavia, há que ter-se algum

cuidado na adopção prática desta premissa de molde a que tal não conduza a

situações difusas sobre a natureza dos verdadeiros problemas dos alunos com

NEE. Se tal acontecer, só por acaso a consequente planificação/programação

redundará em resultados positivos. Preventivamente, neste aspecto, prefigura-se,

antes, aconselhável estar atento ao sentido educacional da questão levantada por

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Correia (2003b): “Será que (parafraseando Kauffman) podemos falar de diferenças

e necessidades especiais sem palavras (categorização)?” (p.10).

No sentido em que, neste trabalho, é entendido a expressão escola

inclusiva resulta claro que todos os alunos são considerados de igual forma,

respeitando-se o seu perfil de aprendizagem. Consequentemente, a avaliação

deverá integrar-se nesta lógica servindo como meio estratégico de recolha de

informação que assegure, na intervenção pedagógica, a disponibilização de “unos

parámetros que garanticen la calidad de la educación para todos los alumnos”

(Cullen & Pratt, 1999, p. 195). Por outras palavras, julga-se ser difícil, para não

dizer impossível, praticar-se uma educação de qualidade sem que ao seu serviço

esteja um processo de avaliação, igualmente, de qualidade. Cullen e Pratt relevam

ainda - na mesma obra - a necessidade de a avaliação passar a ser realizada com

estratégias mais humanas, com mais eficácia e com mais eficiência do que tem

acontecido até ao momento, em que se tem verificado a predominância do uso de

instrumentação puramente técnica. Por tal razão - acrescentam os mesmos

investigadores - tais práticas não podem continuar a resumir-se à simples e

rotineira administração de testes, mas sim passar a valorizar a interpretação do

significado pedagógico profundo de toda a informação recolhida mediante o

recurso a procedimentos e instrumentos diversificados.

Nestes termos - e ainda para os autores em apreço - a avaliação deve:

a) Determinar se os objectivos foram alcançados;

b) Contribuir par o desenvolvimento e execução de um plano educativo que

satisfaça as necessidades do aluno;

c) Ajudar o professor a determinar a direcção que deve seguir;

d) Proporcionar informação sobre a qualidade do ambiente de aprendizagem;

e) Fornecer indicadores sobre a eficácia da metodologia utilizada pelo

professor;

f) Fundamentar a prestação de apoios extras, quando necessário.

Cullen e Pratt estabelecem, assim, uma estreita articulação entre os

objectivos educativos e os processos de avaliação . Paralelamente preconizam o

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envolvimento interactivo - nestes procedimentos - tanto do aluno como do

professor.

No aprofundamento da sua perspectiva, aqueles autores evidenciam, ainda,

a conveniência de serem implementadas práticas de auto-avaliação, em que um -

professor - analisa os efeitos das suas metodologias enquanto o outro - aluno -

reflecte sobre os processos e resultados inerentes às suas aprendizagens. Cullen

e Pratt concedem, assim, um valor estratégico à auto-avaliação nas dinâmicas do

ensino-aprendizagem, conforme se pode observar na Figura 5.

Objectivos e Actividades de Aprendizagem

Auto-avaliação

Do Aluno Do Professor

Processos e Resultados Eficácia dos Métodos de das Aprendizagens Ensino

Figura 5. O enquadramento da auto-avaliação no processo de ensino-aprendizagem a

partir da perspectiva de Cullen e Pratt (1999).

Da análise da Figura 5 depreende-se, fundamentalmente que:

a) A avaliação é um elemento integrado e regulador das práticas de ensino e

de aprendizagem;

b) A auto-avaliação responsabiliza, em simultâneo, o professor pela qualidade

do ensino e o aluno pelos processos e resultados das sua aprendizagens.

Em resumo, o que está em realce neste contexto é a questão do

desenvolvimento da autonomia do aluno, condição indispensável para a realização

plena do seu projecto de vida. Igualmente está em causa a própria autonomia

pedagógica dos docentes. Assim, o professor através da reflexão sobre os efeitos

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da sua acção, recolhe informação que lhe permite introduzir, em cada momento,

as alterações que considere mais necessárias à prossecução de uma pedagogia

de qualidade. Trata-se de um processo que concorre, de modo sistemático, para o

desenvolvimento da sua autonomia profissional. Ao mesmo tempo, o aluno deverá

ser encorajado a apreciar de modo igualmente crítico, o seu envolvimento nas

tarefas de aprendizagem. Por este meio, torna-se gradualmente responsável, de

forma autónoma, pelo controle tanto dos seus progressos, como pela procura dos

melhores caminhos para a sua progressão nas aprendizagens.

Os tipos de procedimentos, antes enunciados, colidirão, provavelmente,

com um conjunto de práticas tradicionalmente em uso, as quais se subordinam,

por norma, ao primado da avaliação dos chamados objectivos programáticos. Esta

perspectiva levará a que praticamente todas as actividades de aprendizagem

sejam concretizadas e avaliadas, tendo por referência essencial, aqueles

objectivos. Vinculados a estas estratégias de sujeição ao programa, quer os

professores, quer os alunos verão, sistematicamente inibidas as suas

possibilidades de desenvolvimento da autonomia. Tais práticas parecem ser

especialmente gravosas para os alunos, como salienta Abrecht (1994):

Já por várias vezes nos pareceu que a boa vontade posta, sobretudo pelos

seguidores da pedagogia por objectivos, em conduzir o aluno, por um caminho

rigorosamente demarcado é, no fundo, um pouco inoportuna; e que, sobretudo, é

contrária a uma evidência que é preciso nunca perder de vista: que o papel do

professor é, em grande parte, levar o aluno a governar-se sem ele. (p. 15)

Abrecht considera, portanto, nocivo para os alunos, os procedimentos

didácticos que demonstram um acentuado seguidismo da chamada pedagogia por

objectivos, sob o pretexto de que tais práticas constrangem, precisamente, o

desenvolvimento da autonomia. Julga-se, aqui, ser de notar que a opinião do autor

pode ser considerada aceitável em termos gerais, mas que a sua aplicabilidade

terá que ser objecto de aplicação filtrada, sobretudo em função do escalão etário

dos alunos. Por exemplo, no caso do 1º ciclo certamente que o papel do professor

será - pelo menos nos dois primeiros anos de escolaridade - mais orientado para o

objectivo de governar os alunos do que tentar que sejam estes a governarem-se a

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 252

si próprios. Tal premissa parece ser também de generalizar em relação ao caso

concreto dos alunos com NEE.

Avaliar numa lógica de favorecer o desenvolvimento da autonomia dos

alunos é um princípio pedagógico crucial na educação contemporânea que está,

de forma inevitável, marcada pela veemente afirmação da sociedade do

conhecimento e da informação. Logo, o saber lidar com os conhecimentos e com

a informação representa uma necessidade vital para que cada indivíduo possa ter

oportunidade de participação real nesta sociedade. Porém, dada a vertiginosa

velocidade com que aqueles conhecimentos e aquela informação vão evoluindo,

os saberes aprendidos em idade escolar rapidamente se transformarão em algo

obsoleto e de reduzida utilidade. Consequentemente a escola não pode limitar-se

a transmitir conhecimentos. Terá também que desenvolver nos alunos de hoje

uma acentuada apetência pelo aprender ao longo da vida - como já se acentuou -

bem como apetrechá-los com as ferramentas intelectuais e procedimentais

necessárias para tal. É, pois, mais uma vez a autonomia que está em questão e

para que cada aluno a atinja de um modo satisfatório, a escola deverá privilegiar

as modalidades de avaliação que mais e melhor o permitam.

Em toda esta questão certamente que a avaliação criterial, a avaliação

formativa e a auto-avaliação se situarão entre as eleitas. Para além destes

princípios gerais, os quais se afiguram facilitadores de uma educação inclusiva, há

que não esquecer que os alunos com NEE, neste enquadramento, deverão ser

alvo de metódicos processos de avaliação/observação individualizada. Só assim,

não será posta em causa a sua inclusão educacional.

5.8.5 A Exploração das Novas Tecnologias de Informação

Como é do domínio comum os tempos actuais recomendam - aliás quase

que impõem - o desenvolvimento de competências no uso das novas tecnologias

de informação e comunicação. Um simples relance pela realidade actual

aconselha, de maneira evidente, que os alunos deverão estar preparados

minimamente para lidar com as mesmas, uma vez que na sua condição futura de

cidadão activo, a referida competência será um meio fundamental para a

realização do seu projecto de vida pessoal e, fundamentalmente, profissional.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 253

Por outro lado, a utilização das tecnologias de informação e comunicação

pode ser, também, encarada como um meio facilitador da concretização curricular,

visando-se, com a mesma, a consecução de dois objectivos nucleares, como

sugere Howell (1996), citado em Correia (2003a):

a) aumentar a eficiência dos alunos no desempenho de tarefas académicas, ou do

dia-a-dia;

b) desenvolver capacidades para aceder e controlar tecnologias com determinado

nível de realização. (p. 43)

Empiricamente, pode ser observado, entretanto, que o computador é, por

um lado, um poderoso instrumento didáctico para a transformação da própria

forma de fazer escola e, por outro, um reconhecido meio de motivação para a

aprendizagem. Este último factor é observável num número de alunos cada vez

maior, incluindo-se, aqui, o caso de muitos com NEE.

Se há tempos atrás - e não muito recuados - os equipamentos informáticos

eram, nas salas de aula, testemunhos da presença de determinados alunos que

deles necessitavam para poderem aceder e participar no processo de ensino-

aprendizagem, hoje, tendem a ser recursos didácticos usuais naqueles contextos.

Actualmente, estão, assim, criadas todas as condições para que as novas

tecnologias de informação possam ser utilizadas numa vertente de trabalho

inclusivo, em paralelo, portanto, com os restantes materiais educativos,

igualmente utilizados nas actividades de aprendizagem.

O recurso aos equipamentos informáticos configura, assim, um importante

auxiliar das escolas e dos professores para melhor responder à complexa

diversidade dos seus utentes. São, sem dúvida, instrumentos cruciais para

reganhar as novas gerações para a escolaridade, desde que explorados com

algumas cautelas. Assim, cada vez se torna mais necessário que “num presente

dominado pela realidade virtual e pela comunicação electrónica que o educador ou

o professor saibam dar a devida atenção à potencialidade das TIC, não

esquecendo, no entanto, que elas por mais poderosas que sejam não os

substituem” (Correia et al. 2003a, p. 44). Como se verifica pelo excerto citado,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 254

Correia alerta para a imprescindibilidade da relação humana, no campo do ensino-

aprendizagem. Tal alerta tem inteiro cabimento num tempo em que o computador

cada vez mais parece ser considerado como um inevitável substituto da acção

humana, nos mais diversos contextos.

Efectivamente, algumas correntes educacionais têm vindo a considerar o

uso do computador como um processo de mediação pedagógica, retirando, assim,

a exclusividade deste procedimento à acção do professor. O futuro dirá como vai

decorrer este frente a frente entre a mediação humana e a mediação tecnológica

nas salas de aula. Para já o que não parece deixar dúvidas é que esse confronto

parece inevitável, ainda que não seja num prazo muito imediato que o papel do

docente seja relegado pelo computador “dado que na prática quotidiana só uma

pequena parcela das suas possibilidades são utilizadas” (Rodrigues, 2001, p. 28).

Independentemente de toda a querela que tal possa suscitar, a verdade é

que o uso do computador consubstancia, já, nesta altura, um indiscutível

manancial de poderosos recursos pedagógicos e didácticos, na educação em

geral e, naturalmente, no campo particular da escola inclusiva. Perante estes

factos, torna-se premente a sua exploração generalizada nas salas de aula, mas

sem colocar em causa o papel crucial que é devido ao professor na gestão das

actividades de aprendizagem como avisa Correia na citação atrás inserta.

Saliente-se, entretanto, que o sistema educativo português revela uma

postura que se afigura ajustada no que toca à importância que o domínio

instrumental das novas tecnologias de informação e de comunicação, por parte

dos alunos, tem para a sua futura realização, enquanto cidadão activo. Como

prova desta percepção refere-se que o Decreto-Lei n.º 6/2001 frisa

expressamente, no seu conteúdo preambular que “o diploma consagra (. . . .) a

utilização das tecnologias de informação e comunicação (. . . ) tomando em

consideração as necessidades dos alunos”.

Persistindo na valorização daquela instrumentação tecnológica, o mesmo

decreto-lei refere, também, que “constitui ainda formação transdisciplinar de

carácter instrumental a utilização das tecnologias de informação e comunicação, a

qual deverá conduzir, no âmbito da escolaridade obrigatória, a uma certificação da

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 255

aquisição das competências básicas neste domínio” ( ponto 2 do Artigo 6.º). Fica,

deste modo, patente, a relevância que é dada a esta aprendizagem, a qual,

precisamente pela importância estratégica que detém - como condição facilitadora

da futura entrada no mercado de trabalho - deverá ser objecto de certificação

específica. Julga-se, assim, ser indispensável que os alunos, professores e

famílias estejam devidamente despertos para este acto de certificação das

competências alcançadas no domínio das novas tecnologias. Este aspecto

consagra, efectivamente um factor de inegável importância, uma vez que aponta

claramente para o arranque - ainda que, obviamente, embrionário - do curriculum

vitae dos alunos.

5.8.6 O Papel Estratégico do Professor Titular de Turma

Ao procurar atender pedagogicamente a diversidade de um modo inclusivo

na sala de aula, o professor titular de turma assume a responsabilidade nuclear da

gestão e da coordenação do processo de ensino-aprendizagem. Nesse sentido,

desenvolve dinâmicas de trabalho com os alunos, em grupos grandes, em grupos

pequenos, ou em tarefas individualizadas., visando garantir oportunidades e

apoios pedagógicos e didácticos, em ordem a proporcionar a consecução das

aprendizagens possíveis, em cada aluno, face aos objectivos comuns (Wang,

1998).

Conquanto se afigure importante que a tónica nas aprendizagens deva ser

uma preocupação permanente, no âmbito de uma pedagogia eficiente -

nomeadamente através da disponibilização de procedimentos didácticos

diferenciados - considera-se, porém que a criação de um ambiente agradável,

facilitador de interacções positivas e pleno de oportunidades diversificadas de

aprendizagem,42 representa, também, uma das funções capitais, por parte do

professor de turma. Sob esta questão, Correia (2003a) lembra que :

42 Repare-se, a propósito, na sugestiva imagem que, referindo-se aos ambientes de aprendizagem, apresenta

Jensen (1998), citado em Tomlinson & Allan, (2002) ao dizer que “o melhor ambiente de aprendizagem é

como uma boa cafetaria. Não só garante os produtos essenciais como também oferece uma grande variedade

de escolhas para satisfazer os gostos individuais” (p. 47).

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O professor desempenha um papel importante na criação de ambientes

educacionais positivos e enriquecedores. As suas atitudes influenciam imenso a

inserção harmoniosa dos alunos com NEE na classe regular, dado que se elas não

forem adequadas, os alunos com NEE rapidamente ficam menos receptivos à

aceitação dos colegas com NEE. As expectativas devem ser igualmente altas em

relação aos alunos com NEE e os seus conhecimentos devem permitir-lhe

responder às suas necessidades individuais (educação apropriada), reconhecendo

que a atenção à diversidade exige um conjunto de estratégias de ensino

diferenciadas. (p. 31)

Promovendo o desenvolvimento de projectos curriculares de turma

direccionados para a atenção à diversidade, o professor terá de recolher

elementos que lhe permitam usufruir de um conhecimento sucessivamente

actualizado das necessidades e dos modos de aprendizagem de cada um dos

seus alunos. Com base nesses procedimentos de avaliação diagnóstica, o

professor dispõe, então, dos fundamentos imprescindíveis a uma gestão do

ensino-aprendizagem capaz de, através de tarefas adequadas, corresponder de

forma efectiva à natureza daquelas necessidades e daqueles estilos de

aprendizagem (Wang, 1988).

A este propósito Rief e Heimburge (2000) recordam que o professor se

deve conhecer a si próprio muito bem, de modo a estar consciente de que o seu

estilo de ensino - como já se disse antes - poderá beneficiar certos alunos e, em

contrapartida, ser praticamente ineficaz para outros que aprendam de maneira

diferente. Por isso, aqueles autores salientam que:

Estabelecer qual é o seu próprio estilo de aprendizagem e quais são as suas

preferências é o primeiro passo que cada professor deve dar de forma a aumentar

a eficácia do trabalho que desenvolve com populações discentes que se

caracterizam pela diversidade. (p. 18)

Rief e Heimburge (2000) referem ainda no que concerne aos estilos de

aprendizagem, que “ a maior parte das pessoas apresenta determinados pontos

fortes e denota preferência por aprender e por processar informação segundo

modalidades ou meios (ouvir, ver, tocar e fazer)” (p. 19). No seguimento desta

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 257

lógica, os autores em apreço esclarecem que nos alunos se notam preferências

por determinadas modalidades de percepção e de processamento da informação,

nomeadamente:

• a modalidade auditiva

• a modalidade visual

• a modalidade táctil-quinestésica

Em relação às estratégias de ensino mais adequadas a cada uma das

modalidades referenciadas, Rief e Heimburge (2000) aconselham que para a

modalidade auditiva deverão explorar-se as seguintes:

• instruções verbais

• leituras (feitas pelo próprio aluno ou por outros)

• debates

• brainstormings

• apresentações orais

• programas de televisão e de rádio

• música

• jogos verbais

• paráfrases

• repetições

• concurso à base de soletração de palavras

• cassetes áudio

• gravações sonoras de textos

• dramatizações criativas

• abordagens fonéticas

• dramatizações de diálogos

• poesias

Em relação à modalidade visual, os mesmos autores recomendam a prática

das seguintes estratégias:

• estimulação do ver, olhar e observar

• reconhecimento dos padrões visuais das palavras

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 258

• tarefas por associação de palavras da mesma família

• actividades com palavras que mantenham o mesmo núcleo de grafemas,

mudando, apenas, o grafema inicial

• recurso a códigos de cores (como, por exemplo, sublinhar as ideias

principais de um texto com uma cor e as secundárias com outra)

• enquadramento da informação relevante em caixas com limites bem

definidos

• recurso a desenhos e imagens

• apresentações orais com apoio em desenhos, palavras-chave ou ideias-

chave

• uso do retroprojector com conteúdos coloridos

• exploração de organizadores gráficos (mapas, gráficos, tabelas, esquemas,

sublinhados, esquematizações de textos e diagramas)

• textos com imagens

Quanto aos alunos que revelam preferência pela modalidade táctil-

cinestésica, Rief e Heimburge aconselham a activação das seguintes estratégias

didácticas:

• actividades que impliquem fazer e tocar

• envolvimento físico em projectos e tarefas

• exploração manual de objectos

• interiorização das aprendizagens através da psicomotricidade

• jogos didácticos

• experiências de laboratório

• representações

• trabalhos manuais

• expressão plástica

• uso de computadores e outras tecnologias

• explicações com base em exemplos concretos

• aprendizagem da leitura por batimentos para cada som

• associação da aprendizagem ao movimento

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 259

A fim de que as salas de aulas disponham de condições e de materiais

ajustados a uma gestão adequada dos diversos estilos de aprendizagem, os

autores em referência recomendam, complementarmente, o seguinte:

• áreas diferentemente iluminadas

• cantos com material áudio, auscultadores, livros e música

• áreas com tapetes

• disposições para trabalho individual, em pares, em grupo e colectivo

• grande número da materiais didácticos manipuláveis

• áreas para trabalho com movimento

• áreas para trabalho em sossego

• diversificação de métodos e de estratégias de apresentação da informação

• áreas e equipamentos para actividades experimentais

Rief e Heimburge relevam, portanto, com bastante propriedade, a

necessidade de os professores atentarem nos diversos estilos de aprendizagem

presentes inevitavelmente em cada turma. Ao mesmo tempo sugerem

metodologias, materiais e formas de organização do espaço capazes de

minimamente garantirem uma gestão adequada e motivadora dos processos de

ensino. Este aspecto apresenta uma extraordinária importância no que diz respeito

ao atendimento qualitativo de todos os alunos, prefigurando um inestimável

contributo para a criação de aulas verdadeiramente inclusivas, como de resto o

prova o próprio título da sua obra: Como Ensinar Todos os Alunos na Sala de Aula

Inclusiva.

O conhecimento empírico dos modos como as salas estão, normalmente

equipadas, bem como dos métodos e dos materiais genericamente usados pela

maioria dos docentes, alerta para a necessidade de uma reestruturação

significativa de todos aqueles aspectos a fim de que, por conseguinte, cada aluno

ali disponha das condições mínimas de aprender de acordo com as suas formas

peculiares. Para tanto, ganha particular incidência a ideia de que “o ensino deveria

prestar mais atenção ao tipo de inteligência preferencial dos indivíduos”

(Tomlinson & Allan, 2002, p. 40).

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 260

Trata-se, sem dúvida, de um enorme desafio que os professores titulares

de turma terão que assumir para tentar responder de forma eficaz, competente e

inclusiva, aos alunos em geral e às necessidades diferenciadas dos seus alunos

com NEE, segundo o consignado no respectivo PEI.

Nesta lógica afigura-se que compete, portanto, ao professor titular de turma

chamar, a si, o papel principal na gestão de todo o processo de ensino-

aprendizagem da respectiva turma Porém, no atendimento aos alunos com NEE,

devido à especificidade e não raro, à complexidade das suas problemáticas, é

imperioso que conte com a colaboração de outros recursos, nomeadamente com a

ajuda de professores de apoio educativo e de educação especial.

Para que a sua actividade seja conforme aos princípios básicos de uma

educação inclusiva, o professor titular de turma deverá pugnar, de modo

persistente e coerente, para que todos os processos de apoio educativo a prestar

a este, ou àquele aluno, sejam sempre que possível desenvolvidos na sala de aula

e enquadrados quer na planificação, quer na execução do processo de ensino-

aprendizagem da turma. Porém, ao defender esta postura, como princípio geral

da sua visão inclusiva não poderá, nunca deixar de ter em conta que “ sempre que

a situação o exija, se possa considerar um conjunto de opções que levem a um

apoio fora da classe regular” (Correia, 2003a, p. 17).

Como se vem propugnando, em temos de orientação genérica, “o modelo

inclusivo, parte, por conseguinte, do pressuposto de que o aluno com NEE deve

manter-se na classe regular "(idem). Desta maneira, o aluno não perderá qualquer

das experiências sócio-educativas ocorridas naquele contexto, o que contribuirá

para que os alunos com necessidades educativas especiais, obtenham maior

rendimento, experimentem mudanças positivas de atitudes e alcancem um

número apreciável de resultados esperados, como salientam Wang e Zollers

(1990). Claro que estes princípios de priorização do atendimneto educacional dos

alunos com NEE, no seio da classe regular, valem desde que as prescrições

constantes na sua planificação individualizada não determine nada em contrário.

A fim de, por um lado, ser possível responder aos diversos estilos de

aprendizagem existentes na turma, e por outro, serem assegurados os princípios

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 261

da inclusão, torna-se indispensável que o professor use a gestão curricular de

acordo com uma e outra destas duas premissas. Tal implica que essa gestão do

currículo seja previamente concebida e planeada, tendo por base, precisamente, o

painel de diferenças patente na turma, bem como a necessidade de envolver a

generalidade dos alunos, de maneira activa e compreensiva em cada unidade de

aprendizagem.

Deverá também, o professor titular de turma, ter em atenção os conteúdos

da planificação e da programação individualizada dos alunos com NEE. Ao

proceder desta forma, o professor pode administrar o desenvolvimento curricular

sob a lógica da interacção43 entre as áreas fortes destes alunos - como um todo -

e os conteúdos programáticos, visando, deste modo o seu desenvolvimento

global, com a consequente melhoria das áreas fracas.

Sujeitos a dinâmicas desta natureza, cada aluno com NEE experimenta

uma percepção de segurança e de expectativa de sucesso, mantendo, por

consequência, elevados quer os seus níveis motivacionais, quer o seu grau de

auto-estima. Consequências opostas teriam a adopção de estratégias assentes

em dinâmicas de apoio individual centradas, basicamente, nas áreas fracas dos

alunos, pelo que, em ambientes de aprendizagem inclusivos, tais estratégias terão

que ser evitadas (Jurado & Laborda, 1996).

Refira-se, entretanto - e mais uma vez - que a responsabilidade dos

procedimentos de avaliação, de planificação e de intervenção, no âmbito do

processo de atendimento a alunos com NEE, deverá ser atribuída a uma equipa

multidisciplinar e “nunca somente ao educador ou professor” (Correia, 2003a, p.

20).

Afigurando-se, em princípio, crucial a atitude e o papel do professor titular

de turma na procura do encontrar ambientes e práticas de aprendizagem

inclusivos, ressalta, em consequência, a ideia de que aquele profissional terá de

interiorizar e de operacionalizar, alguns conceitos e estratégias, verdadeiramente

conducentes à efectivação daqueles ambientes. Tal situação irá implicar,

43 Para Bruner (citado em Palácios, 1988), a educação configura uma espécie de diálogo em que o aluno

aprende a realizar a construção conceptual do mundo, com a ajuda – andaimaria – do professor.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 262

provavelmente em muitos, a desconstrução de algumas ideias e práticas que

desenvolvem no seu dia a dia.

Antes de mais, por conseguinte, o professor de turma deverá assumir,

intrinsecamente, a responsabilidade, rigorosamente simétrica, pela progressão

optimizada do processo educativo de todo e qualquer aluno, contando, para tal,

com o apoio de recursos especializados - sob formas de orientação, colaboração e

de cooperação - no caso dos alunos com NEE. Assumido esse princípio, o

professor só terá que agir pedagógica e didacticamente em conformidade com o

mesmo.

Devido, porém, à natureza das práticas educativas tradicionais - pouco

consentâneas com as estratégias referidas - provavelmente, em muitos casos,

aquele processo de actuação terá que passar pela inovação, tanto do património

de conhecimentos, como do conjunto das próprias práticas de articulação entre os

diferentes profissionais. A este propósito - e pelas consequências perversas que

daí possam advir para o atendimento escolar dos alunos com NEE - denunciam-

se, neste contexto, os princípios aportados por alguns investigadores, como, por

exemplo, Porter. Repare-se então no que propõe este autor:

Quadro 6

Comparação Estabelecida por Porter (1997) entre a Abordagem Tradicional e a

Abordagem Inclusiva

Abordagem tradicional

Abordagem Inclusiva

- Focalização no aluno

-Avaliação do aluno por

especialistas

- Dados diagnósticos/prescritivos

- Programa para o aluno

-Colocação em programa

apropriado

- Enfoque na turma

-Análise dos factores do ensino-

aprendizagem

- Resolução cooperativa de problemas

- Estratégias para os docentes

- Adaptação e apoio na classe regular

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 263

A análise das propostas de Porter indicia explicitamente que este autor

perfilha a hipótese de que a sala de aula é o local apropriado para o atendimento

educacional de todo e qualquer aluno. Além do mais cultiva o pressuposto de que

os especialistas, a observação, a avaliação, a planificação e a intervenção

individualizadas são dispensáveis nos processos de atendimento aos alunos com

NEE. Parece, efectivamente, uma postura que levada à prática pode, colocar em

causa de forma significativa, os direitos dos alunos com NEE, pois na perspectiva

apresentada por Porter, não se compreende o modo como os mesmos podem ser

alvo da atenção educacional específica que as suas características e

necessidades tão objectivamente pressupõem.

São, por conseguinte, ideias desta natureza que, veiculadas sob o desígnio

da inclusão, podem minar, de modo irreversível, o que de mais genuíno contém

este ideal: o atendimento de qualidade dos alunos com NEE. Não é, pois, esse o

ponto de vista que se defende neste trabalho como já foi oportunamente

esclarecido, não se assumindo, consequentemente, a perspectiva de inclusão total

que a visão de Poster prefigura..

Numa outra ordem de ideias salienta-se que a predisposição favorável para

a aprendizagem, ou seja, a assunção, por parte dos alunos, de níveis

motivacionais satisfatórios, parece consubstanciar uma condição fundamental

para o seu sucesso educativo. Admite-se, desta forma, que o tipo de actuação e

de atitude postas pelo professor, na organização e desenvolvimento das

actividades de ensino-aprendizagem, exerce uma influência decisiva na natureza

da referida predisposição, a qual se não for positiva, terá, certamente,

consequências muito gravosas na qualidade do processo de apropriação dos

saberes por parte dos alunos. Consequências, do mesmo sinal (negativo) serão,

muito provavelmente, sentidas no próprio clima relacional da sala de aula, com

todos os indesejáveis efeitos que tal produz igualmente nas aprendizagens.

Por tudo isto, aquelas questões devem merecer a melhor atenção por parte

dos professores, devendo, estes esforçarem-se por criar e manter climas de

trabalho que exerçam influência favorável nos níveis motivacionais dos alunos e

em particular nos alunos com NEE. Ao conseguirem tal desiderato os professores

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 264

provam que estão movidos pela intenção efectiva de assegurarem processos

educativos de qualidade e de igualdade de oportunidades para a totalidade dos

seus alunos.

No que concerne, então, à construção de contextos motivadores através da

gestão da sala de aula, Alonso Tapia (1991), na sua investigação, sobre esta

temática, elencou cinco factores que considera cruciais para o desenvolvimento e

manutenção dos desejados níveis de motivação dos alunos. Os factores propostos

pelo autor são os seguintes:

• apresentação bem estruturada das tarefas

• organização de actividades extensivas a todos os alunos

• mensagens positivas dirigidas aos alunos

• modelação das formas de enfrentar as tarefas

• práticas de avaliação com sentido formativo

Para cada um dos factores por si enunciados, o autor sugere um

determinado número de procedimentos que servem de base à operacionalização

daqueles. Assim, para o factor apresentação bem estruturada das tarefas, Tapia

faz corresponder os seguintes procedimentos:

a) Activar a curiosidade e o interesse do aluno para o conteúdo da tarefa a

realizar;

b) Evidenciar a relevância, para o aluno, do conteúdo da tarefa.

Em relação ao factor organização de actividades extensivas a todos os alunos,

Tapia sugere:

a) Organizar grupos cooperativos, fazendo depender a avaliação de cada

aluno dos resultados globais do grupo;

b) Oferecer o máximo possível de opções para a realização das tarefas a fim

de facilitar a percepção, por parte de cada aluno, da possibilidade de

execução das mesmas com sucesso.

No que diz respeito às mensagens positivas dirigidas aos alunos são

propostos, pelo mesmo autor, os seguintes procedimentos:

a) Orientar a atenção dos alunos, antes, durante e após as tarefas.

b) Diligenciar, de modo explícito, que os alunos entendam que:

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 265

- a inteligência é modificável

- devem atribuir os resultados das tarefas a causas pessoais,

modificáveis e controláveis

- deverão tomar consciência dos factores que os fazem sentir menos

motivados.

Entretanto para que seja assegurada a modelação das formas de enfrentar

as tarefas, Alonso Tapia aconselha a demonstração prática dos procedimentos a

desenvolver para a realização bem sucedida de cada uma delas. E, finalmente,

para o desenvolvimento dos procedimentos de avaliação com sentido formativo e

motivador ao longo do processo de ensino-aprendizagem, o autor em análise

propõe que aqueles sejam administrados de forma a que:

1. Os alunos os considerem como mais uma oportunidade de aprendizagem.

2. Sejam evitadas comparações de uns alunos com os outros e, pelo

contrário, se privilegie a comparação de cada aluno, consigo próprio.

Um outro investigador, Robles (1995), aporta, também, importantes

contributos no âmbito da matéria em análise, realçando a conveniência de serem

implementados, em sala de aula, procedimentos que promovam hábitos de auto-

motivação, por parte de todos os alunos. Como pretexto para advogar este

posicionamento, o autor em causa expressa a ideia de que se torna indispensável

a existência de uma motivação positiva, por parte dos alunos, como requisito

fundamental à consecução dos resultados necessários e desejados. Robles,

preconiza, mesmo, o princípio de que a motivação positiva é indispensável para a

ocorrência da aprendizagem, parecendo, portanto, expressar a crença de que, os

alunos desmotivados não estão disponíveis para a aprendizagem. Parecendo

inquestionável o papel que os níveis motivacionais desempenham, no âmbito da

actividade escolar, mormente no que concerne à eficácia das aprendizagens,

julga-se, por consequência, imperiosa a necessidade de se atentar neste aspecto

com toda a profundidade que a sua importância impõe, fundamentalmente junto

dos alunos com NEE, sob pena de se colocarem em causa, todos os propósitos

de desenvolvimento de uma escola inclusiva.

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Retornando a Robles e ao modo como este valoriza a questão da

motivação, verifica-se que o mesmo lhe concede o estatuto de via fundamental

para que se consiga que os alunos abordem as tarefas escolares, com atitudes

positivas, favoráveis e facilitadoras do sucesso. Na obra em análise, o autor

emprega, por diversas vezes, uma linguagem muito direccionada aos próprios

alunos, estimulando-os, sempre, primeiro a terem consciência e a identificarem os

seus interesses e capacidades para, depois, se esforçarem e lutarem pela

realização dos objectivos daí decorrentes. Robles, valoriza, deste modo, o

desenvolvimento, em cada aluno, de atitudes de autonomização e de

responsabilização, tanto no planeamento como na consecução dos respectivos

projectos de vida.

Entretanto, no seu dia a dia profissional, o professor desenvolve uma

interacção constante entre as matérias de aprendizagem e os alunos. Reforça-se,

neste aspecto, a convicção de que aquelas são um meio ao serviço destes

últimos. Reafirmando-se o princípio - que se julga inquestionável - de que os

alunos configuram a variável mais importante do processo educativo, estes

deverão, por conseguinte, ser considerados em qualquer circunstância, como o

centro nevrálgico de todo o processo escolar. Nesta ordem de ideias infere-se

então que as restantes variáveis gravitam à sua volta, emergindo, assim e com

contornos bem definidos, a necessidade de se desenvolver a chamada pedagogia

centrada no aluno. Esta premissa parece implicar que o professor atente e

considere os significados que cada aluno comporta e que foram construídos pelas

experiências desenvolvidas ao longo da sua própria história de vida.

Ora, como aponta Duckworth (1987), centrar a acção educativa no aluno,

significa que o professor terá de estabelecer pontes pertinentes entre o que aquele

é, sabe e gosta e as propostas de novas aprendizagens a fim de que estas se

tornem particularmente significativas. Respeitando, portanto, as experiências

prévias dos alunos, o professor assegura os fundamentos necessários para que

estes realizem com eficiência, cada ciclo de compreensão que toda a nova

aprendizagem requer. Agindo, pois, em conformidade com estes pressupostos o

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 267

docente vai, paulatinamente criando as condições elementares para a

optimização da capacidade de aprender de cada um dos seus discentes.

5.8.7 Em Busca de uma Síntese para a Eficiência do Ensino

Reflectindo-se sobre os dados recolhidos e expostos sobre as possíveis

formas de gerir o processo de ensino-aprendizagem na sala de aula, ressalta a

evidência de que são múltiplas as teorias que se centram nesta questão, tornando

extraordinariamente difícil a elaboração de uma perspectiva integrada que unifique

de modo lógico e coeso todos os contributos em causa. Contudo, havendo a

consciência de que a eficácia dos efeitos da informação obtida - aquando da sua

análise junto dos docentes da escola em estudo - poderá ser prejudicada devido à

natureza da sua dispersão, julga-se que se torna premente a necessidade de se

procurarem linhas de pensamento que conduzam, tanto quanto possível, a um

entendimento integrado e holístico de todos os dados já referidos e que se

centram nos modos de concretização do ensino de qualidade na sala de aula.

Após o desenvolvimento de um plano exaustivo e moroso de consulta de

variadíssimos autores com a mira de se encontrarem fundamentos para a

consecução da síntese pretendida, concluiu-se, depois de uma análise comparada

entre todos os investigadores consultados que o contributo que melhor servia o

propósito em causa era o aportado por César Coll (2000). Assim, o conteúdo

desta secção tem por base o resultado do trabalho desenvolvido pelo autor

mencionado.

Coll, neste contexto, avança com um pressuposto não muito optimista, mas

que com certeza retrata o estado actual da investigação. Diz este autor que, nos

tempos actuais “não existe uma teoria que dê conta, por si só, dos processos

escolares de ensino e de aprendizagem, e que tenha, ao mesmo tempo, uma

sólida fundamentação empírica e uma ampla aceitação entre os especialistas” (p.

393). Apesar desta constatação, Coll expressa, no entanto, a sua convicção de

que é possível identificar, neste âmbito, uma nítida linha de acentuada

convergência complementar, a partir da análise comparada das diversas teorias.

Fundamentando esta opinião o autor declara que “ essa convergência e essa

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 268

complementaridade é o consenso crescente experimentado no decorrer das

últimas décadas em torno da visão construtivista da mente” (idem). Logo, o

construtivismo é considerado como o paradigma susceptível de contribuir para

uma explicação integrada da relação entre a actividade mental dos alunos e a

consequente apropriação dos saberes escolares, ou seja - usando-se os próprios

termos de César Coll - “ a finalidade da concepção construtivista ( . . . ) consiste

em configurar um esquema de conjunto orientado para analisar, explicar e

compreender a educação escolar” (idem, p. 394).

Continuando com a sua argumentação, Coll refere–se à actividade mental

dos alunos “como um elemento mediador do ensino e da sua incidência sobre a

aprendizagem” (idem, p. 395). Paralelamente o autor em questão alerta para o

facto de que o objecto daquela actividade dos alunos - os conteúdos escolares -

já se encontram perfeitamente elaborados no momento em que os mesmos alunos

os abordam. Coll, localiza neste facto, a causa da tensão que preside ao processo

de aprender na escola, uma vez que, por um lado, “os alunos somente podem

aprender os conteúdos escolares na medida em que desenvolvem diante desses

uma atividade [sic] mental construtiva de significados e de sentido” (idem, p. 395)

e, que por outro:

O desencadeamento dessa atividade [sic] mental construtiva não é suficiente para

que a educação escolar alcance os objectivos aos quais se propõe: que o sentido e

os significados que os alunos e as alunas constróem estejam de acordo e sejam

compatíveis com aquilo que os conteúdos escolares significam e representam

como saberes culturais já elaborados. (idem)

Para o autor, portanto, a tensão maior que emerge no processo de ensino-

aprendizagem decorre do facto de os alunos terem não só que realizar as

aprendizagens, mas também - e sobretudo - que os significados que das mesmas

vão elaborando se aproximem do sentido real que os conteúdos escolares

veiculam. Fica, aqui, patente, por conseguinte, as dificuldades que são sentidas

pelas crianças cuja cultura esteja significativamente distanciada da chamada

cultura dominante - que é aquela em que a escola se move - e pelas crianças

portadoras de NEE, sobretudo do foro mental.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 269

Prosseguindo-se na análise do pensamento do investigador em apreço,

este chama, ainda a atenção para o facto de se “aceitar igualmente, com todas as

suas consequências, que a construção do conhecimento na escola não é um

processo solitário do aluno, mas um processo de construção conjunta de

professores e alunos sobre os conteúdos escolares” (idem, p. 396). Fica, deste

modo, posto em evidência o facto, praticamente inevitável, de a actividade do

aluno estar associada e, até, dependente da acção de outros.

Precisando, entretanto a função do professor, Coll assume que esta

“consiste em assegurar um encadeamento adequado entre a atividade [sic] mental

construtivista dos alunos e os significados sociais e culturais que os conteúdos

escolares refletem [sic]” (idem). Realçado, fica, desta forma o papel de mediação

entre a acção cognitiva dos alunos e a semântica sócio-cultural que os

professores dão aos saberes escolares.

Buscando as fontes e os fundamentos teóricos da concepção construtivista

do ensino e da aprendizagem, Coll localiza, tal, na teoria genética elaborada por

Piaget e os seus colaboradores. Neste aspecto, o autor consultado encontra, nos

trabalhos de Piaget, três princípios fundamentais para a explicação do

funcionamento psicológico dos alunos. A saber:

Em primeiro lugar, a relação existente entre, por um lado, a capacidade de

aprendizagem que o aluno manifesta em um determinado momento do seu

desenvolvimento e, por outro, o seu nível de competência cognitiva nesse mesmo

momento. Em segundo lugar, a importância da atividade [sic] mental construtiva do

aluno ( . . . ). Em terceiro lugar, a explicação do progresso cognitivo em termos de

um processo de equilibração dos esquemas e das estruturas a partir dos quais e

graças aos quais os alunos interpretam e assimilam as experiências educativas.

(idem, pp. 397-398)

Como se viu, Coll reporta-se aos estudos de Piaget para elaborar uma

explicação dos processos psicológicos desenvolvidos pelos alunos na sua

actividade de aprendizagem. Valorizando desta maneira o contributo da escola de

Genebra, Coll, no entanto, vislumbra na teoria genética, algumas limitações

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 270

quando a mesma é transposta para o seio da educação escolar. Clarificando as

insuficiências em causa, Coll considera que:

a. a descrição da competência cognitiva em termos de esquemas de acção e

de estruturas operatórias é pouco adequada ao contexto em que ocorrem a

aprendizagem dos conteúdos escolares;

b. a aprendizagem escolar é um processo de construção que envolve sempre

outros (colegas e professores), contrariamente ao que está implícito na

teoria de Piaget;

c. a ideia de que a reequilibração é reconstruída a um nível superior não é, no

caso das aprendizagens escolares, nem natural nem espontânea, dado que

exige uma intervenção educativa sistemática e planeada.

Assinalando as limitações que encontrou na teoria de Piaget, Coll não optou

por uma postura de inacção. Antes, empreendeu um processo de pesquisa de

molde a encontrar outros dados que preenchendo as lacunas em causa,

permitissem alimentar o carácter de convergência que havia vislumbrado no

paradigma construtivista. Na senda deste procedimento, o autor admite que o

“conceito de esquemas de conhecimento, cuja origem reside nas teorias do

processamento humano da informação - outra das fontes teóricas das quais a

concepção construtivista se nutre - permite superar uma das limitações indicadas”

(idem, p. 298). Justificando a sua perspectiva, Coll está convicto de que esta teoria

“faz referência a uma caracterização da competência cognitiva que está mais de

acordo com a natureza das aprendizagens escolares” (idem).

Para clarificar a sua versão, o investigador avança com uma definição de

esquemas de conhecimento, considerando os mesmos - lógica da teoria do

processamento da informação - como “estruturas simbólicas que nos servem para

armazenar e conservar os conhecimentos gerais que temos sobre determinados

objectos, situações ou acontecimentos em um determinado momento da nossa

existência” (idem).

Resolvida, assim, a questão da limitação encontrada na proposta de Piaget,

no que concerne à noção de esquemas de acção e de estruturas de acção, Coll

enfrentou de seguida, a problemática da necessidade de atribuição de significado

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 271

sócio-cultural convencional, aos conteúdos escolares. Para tal socorreu-se, desta

vez, dos resultados dos trabalhos desenvolvidos por David Ausubel e respeitantes,

precisamente, à sua teoria da aprendizagem verbal significativa, ao mesmo tempo

que não se esquece de frisar que esta teoria é “outra das fontes teóricas

fundamentais da concepção construtivista” (idem).

Integrando o contributo de Ausubel nas suas diligências, Coll, estabelece

uma articulação conceptual muito lógica, entre aquele e a natureza do processo

de ensino-aprendizagem escolar, afirmando que aprender “consiste, em essência,

na construção de significados e na atribuição de sentido àquilo que se aprende”

(ibidem).

Encontrando, sucessivamente, soluções para os problemas diagnosticados,

Coll, entretanto, identificava novo constrangimento, o qual se traduzia pela

necessidade de se saber:

Como e mediante quais mecanismos se consegue incidir sobre o processo de

construção de significados e de atribuição de sentido que os alunos efetuam [sic];

e, sobretudo, como e mediante quais mecanismos se consegue orientar esse

processo para que os significados finalmente construídos estejam de acordo com

os significados científicos e culturais que os conteúdos possuem. (Idem, pp. 398-

399)

Coll questiona desta forma os tipos de estratégias didácticas a mobilizar

para o ensino-aprendizagem significativo dos saberes escolares, pressupondo que

tal processo não é conseguido pelo aluno, enquanto agente solitário, mas sim, em

interacção educativa com outros agentes, nomeadamente, os professores e os

colegas. Também para esta questão o autor encontra uma saída, recorrendo, para

tal, às proposições de Vigotsky ao elaborar a sua teoria sócio-cultural do

desenvolvimento e da aprendizagem.

Em defesa da sua perspectiva de conceber uma visão integrada sobre a

aprendizagem escolar, Coll refere que:

A partir dos trabalhos e das pesquisas de inspiração vigotskiana, a concepção

construtivista postula a existência de três tipos de mecanismos de influência

educativa que operam em três níveis diferentes: o da interação [sic] que se

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estabelece entre o professor e os alunos no decorrer das actividades de ensino e

de aprendizagem, o das interações entre alunos e o da organização e

funcionamento da instituição escolar. (idem, p. 399)

Fechando, desta maneira, o seu ciclo de recursos conceptuais para

optimizar a aprendizagem escolar, Coll releva, neste contexto, o contributo da

teoria sócio-cultural para que, também, na óptica construtivista, a educação

escolar “deve ser vista, antes de mais nada, como uma prática social complexa

que tem, entre outras, uma função claramente socializadora” (ibidem). Para

acentuar este contexto de socialização que está subjacente à actividade em sala

de aula, Coll, acrescenta, ainda que “os conteúdos escolares são saberes

construídos socialmente que existem antes do ato [sic] de ensinar e de aprender”

(idem).

Graças ao pertinente labor de César Coll julga-se, assim, conseguida uma

visão integrada de toda a informação exposta e relativa à gestão das actividades

de aprendizagem a desenvolver na sala de aula. Persiste, também, a convicção

de que as ideias daquele autor configuram um quadro de elevada sincronia

semântica com o corpo geral das ideias anteriores aqui já expostas, conferindo-

lhe, portanto, um significativo grau de coerência, desiderato sempre desejável em

trabalhos desta natureza.

Finalmente emerge a sensação de que presentemente - e provavelmente,

ainda de uma forma mais consistente e sólida num futuro próximo - a perspectiva

construtivista oferece possibilidades reais de consubstanciar um modelo

simultaneamente explicativo e orientador das práticas pedagógicas em sala de

aula, perfilando-se como um poderoso recurso na construção dos caminhos

conducentes a um verdadeira educação de qualidade para todos os alunos. Pelo

menos parece haver fundamentos para, neste contexto, alimentar uma efectiva

esperança, como se julga poder depreender de mais uma achega de Coll ao

prenunciar que:

Em resumo, a concepção construtivista, no seu estado atual [sic] de elaboração,

mostra-se como um instrumento bastante preciso e potente para guiar a análise, a

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 273

reflexão e a acção no que se refere à educação escolar e aos processos de ensino

e de aprendizagem que ocorrem na escola. (idem, p. 399)

5.8.8 Sistematização do Processo de Gestão Pedagógica da Diversidade

Assumindo-se, como aspecto deveras importante, o conjunto dos processos

de atendimento educativo a desenvolver no espaço da sala de aula, e tendo-se

em conta os contributos dados pela literatura de incidência já expostos, julga-se

fundamental estabelecer, agora, um quadro de sistematização daqueles

processos. Para tal recorreu-se a uma determinada lógica organizativa de modo a

possibilitar que o quadro de sistematização em análise possa servir como uma

espécie de roteiro securizante da acção das equipas educativas no que toca à

gestão da diversidade e, dentro desta, ao atendimento dos alunos com NEE.

Como referência de base para a arquitectura do pretendido quadro de

sistematização optou-se pela proposta avançada por Correia (2003a, 2003b) no

âmbito do atendimento à diversidade - e de alguma forma já abordada em secções

anteriores deste trabalho - por se afigurar que a mesma apresenta uma lógica

estrutural susceptível de, por um lado abranger os elementos cruciais aportados

pela investigação anteriormente abordados e, por outro, por assentar num claro

princípio de interacção dinâmica entre as suas diferentes fases, facto que lhe

confere uma natureza significativamente sistémica. Note-se que a proposta do

autor em referência indicia de modo claro o continuum de todo o processo,

facilitando, consequentemente, a sua compreensão, ao mesmo tempo que induz,

de maneira muito clara, à acção.

Segundo o autor em análise, trata-se de uma proposta “ cujo objectivo é o

de tentar dar resposta à diversidade; um modelo que poderemos designar de

modelo de atendimento à diversidade” (2003a, p.18). Em relação às formas de

concepção e de desenho da proposta, o autor esclarece que:

Este modelo tem por base quatro componentes essenciais: uma que diz respeito

ao conhecimento do aluno e dos seus ambientes de aprendizagem; outra que se

refere a uma planificação apropriada, com base nesse conhecimento; uma outra

que se relaciona com uma intervenção adequada que se apoie nas características

e necessidades do aluno e dos ambientes onde ele interage (conhecimento) e

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numa listagem coerente de objectivos curriculares e ainda uma outra que diz

respeito à reavaliação, ou seja, a um conjunto de decisões que digam respeito à

adequação da programação delineada para os alunos. (pp. 18-19)

Em consequência, intenta-se, de seguida, estruturar um quadro organizado

com os possíveis procedimentos a desenvolver para um atendimento

sistematizado à diversidade. Para tal, perfilhou-se uma estratégia de integração

lógica, na já referida proposta de Correia, quer de contributos de outros autores -

anteriormente explanados - quer de aportações pertinentes trazidas à colação pelo

Decreto-Lei n.º 6/2001 e que foram, igualmente objecto de análise em local

oportuno deste trabalho. O resultado deste procedimento figura como o conteúdo

do Quadro 7. Quadro 7

Sistematização dos Modos de Atendimento à Diversidade a Partir da Proposta de

Correia (2003a)

Fases Estratégias/Actividades

Conhecimento

Avaliação preliminar: Identificação dos estilos de

aprendizagem (caracterização da turma)

Análise dos ambientes educativos

Articulação com a equipa de programação

educacional individualizada

Planificação

Elaboração contextualizada do projecto curricular de

turma

Desenvolvimento aprofundado de avaliações

individualizadas (avaliação compreensiva)

Elaboração de planos educativos individuais

destinados aos alunos com NEE

Activação dos conhecimentos prévios dos alunos

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 275

Intervenção

Mediação entre os conhecimentos prévios e a

consecução dos novos objectivos

Atribuição de significado às novas aprendizagens

Promoção da formação integral do aluno (saberes

atitudinais, conceptuais e procedimentais)

Desenvolvimento do ensino por níveis diversificados

(ajustamento das actividades aos diferentes estilos

de aprendizagem)

Exploração curricular das tecnologias de informação

e comunicação

Apoio educativo em parceria

Estratégias de aprendizagem cooperativa e

colaborativa

Uso de estratégias motivacionais

Apoio aos processos de autonomização das

aprendizagens

Desenvolvimento das programações individualizadas

junto dos alunos com NEE segundo o prescrito nos

respectivos planos individualizados

Auto e hetero avaliação dos progressos dos alunos

Reavaliação

Balanço dos processos e resultados do Projecto

Curricular de Turma

Avaliação metódica dos resultados decorrentes dos

planos educativos individuais

Elaboração de relatórios analíticos

Tomada de decisões para o ano escolar seguinte

Propostas de programas transicionais

Como se pode constatar, o quadro de sistematização em referência dá

lugar a plano de desenvolvimento operacional de todo o processos de ensino-

aprendizagem a levar a efeito em cada turma. O processo em questão decorre,

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 276

então, do conjunto das quatro fases propostas por Correia (o conhecimento, a

planificação, a intervenção e a reavaliação) no modelo que concebeu para a

gestão da diversidade. Aquelas fases foram, entretanto, devidamente analisadas

na secção deste trabalho dedicada à Equipa de Programação Educacional

Individualizada (página 181 e seguintes).

5.9 A Intervenção dos Auxiliares da Acção Educativa

Numa escola sob orientação inclusiva, torna-se imperioso que todo e

qualquer membro da comunidade escolar, assuma e active uma atitude coerente

com aquela orientação e seja, mesmo, um protagonista interventivo e convergente

na prossecução dos ideais em causa. Para que este facto seja uma desejada

realidade é necessário que os responsáveis pela gestão escolar estejam

particularmente atento a esta problemática de modo a “fazer com que todo o

pessoal escolar - educadores, professores, outros agentes educativos e alunos -

os pais e quaisquer outros membros da comunidade se sintam parte de um

projecto educacional que tenha por base os princípios da inclusão” (Correia,

2003a, p. 24 ).

Nesta perspectiva, o pessoal auxiliar da acção educativa, pela natureza da

sua intervenção - com professores, com alunos e com as famílias - posicionam-se,

por tal, como elementos potencialmente estratégicos no desenvolvimento dos

processos de inclusão. Consequentemente torna-se necessário diligenciar para

que a sua atitude e acção sejam efectivamente contributos efectivos e positivos

naquele contexto.

Assim, a intervenção daquele pessoal, no âmbito de uma escola a caminho

da inclusão, deve enquadrar-se e subordinar-se a determinados parâmetros de

orientação específica, de entre os quais se prefigura fundamentado nomear os

seguintes:

• disponibilidade para um apoio informado nas salas de aula

• prestação de eventuais ajudas a alunos carenciados, em todo o espaço

escolar, mormente, nos tempos não lectivos

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 277

• desenvolvimento de relações positivas com as famílias e indutoras de

mudanças positivas quanto à problemática da inclusão.

As funções deste sector profissional deverão, portanto, revestir-se de um

carácter genuinamente educacional - a par de outras, de natureza mais

administrativa que lhe estejam cometidas - sobretudo num quadro de construção

de uma escola inclusiva, onde, portanto, a acção de todo e qualquer elemento da

comunidade escolar assume um posicionamento estratégico. Sob este aspecto - e

não só - Correia (2003a) esclarece que:

Por assistente de acção educativa consideramos um indivíduo cujas habilitações

académicas devem estar ao nível do 12.º ano e cujas funções não só se prendam

com a organização de tarefas rotineiras, como o são o registo da assiduidade, a

vigilância nos recreios e nos autocarros, a supervisão das refeições, mas também

com a execução de tarefas instrucionais, tal como, levar a cabo actividades

programadas pelos educadores ou professores, prestar assistência ao educador

ou professor da turma, apoiar os alunos de acordo com os critérios estabelecidos

nas programações individualizadas e participar em reuniões de grupo/equipa. (p.

48)

Por vezes, a relação dos profissionais da acção auxiliar educativa - a que

Correia, como se viu, designa por assistentes de acção educativa - como se pode

comprovar no quotidiano dos contextos escolares, caracteriza-se, por um excesso

de zelo proteccionista no que toca às crianças com necessidades educativas

especiais e por uma ligação do tipo piedosa relativamente às respectivas famílias.

Trata-se, obviamente, de atitudes bem intencionadas. Contudo, parece não

corresponder ao tipo de actuação mais correcto. Assim, há que, no interior da

comunidade escolar, desenvolver estratégias de sensibilização e de informação

para que estas atitudes se pautem por sentimentos de apoio e de solidariedade,

sim, mas despidas de preconceitos que fragilizem, ainda mais, a já, por vezes

bastante debilitada auto-estima das crianças e das famílias em questão.

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5.10 O Envolvimento Parental

O papel das famílias prefigura um factor de crucial importância na forma

como se desenvolve o processo escolar dos respectivos educandos. Se aquelas

estiverem vocacionadas para desenvolver, junto da escola, uma participação

activa e esclarecida, então prestarão um apoio insubstituível para a optimização

do percurso educativo dos alunos, se bem que, nem sempre devidamente

explorado, por parte da escola (Wang, 1998).

Numerosos resultados aportados pela investigação, neste aspecto

particular, relevam, de maneira muito evidente, a importância do envolvimento

familiar na escolaridade dos respectivos educandos. Tais estudos têm salientado o

facto de que os programas de intervenção educativa em que as famílias

protagonizam uma colaboração efectiva, são, significativamente mais eficazes dos

que os programas que se centram apenas nos alunos, como informam, por

exemplo, Brofenbrenner (1986), Epstein (1986), Walberg (1984), citados em Wang

(1998).

Porém, a relação da escola com os pais das crianças com necessidades

educativas especiais deverá ser devidamente ponderada. E isto porque se “alguns

pais são capazes de ser bem sucedidos ao proceder à necessária adaptação,

revelando-se consideravelmente realistas, outros encontram-se menos preparados

para aceitar o desafio que uma criança deficiente representa para a família”

(Nielsen, 1999, p. 29). A verdade é que o diálogo entre os professores e as

famílias destas crianças configura, por norma, um processo eivado de contornos

delicados e complexos. Esta realidade é mais nítida - como frisa aquela autora -

nos casos em que os pais, se recusam a admitir que o seu filho é portador de uma

determinada problemática.

No caso concreto do envolvimento parental em termos de

acompanhamento do processo educativo dos alunos com necessidades

educativas especiais, a situação portuguesa parece, ainda, distante dos níveis de

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 279

implicação que seriam desejáveis44, situação que prenuncia um factor

preocupante tanto mais que os pais “constituem elementos cruciais na

planificação, execução e avaliação dos programas de intervenção dos seus filhos”

(Correia & A. Serrano, 2003a, p. 61).

Este panorama, não decorre, porém da falta de estímulo legal para a

participação dos pais nos processos de atendimento escolar dos seus educandos,

como se pode inferir pela análise pormenorizada do que, neste contexto, postula o

Decreto-Lei n.º 319/91. Efectivamente, como é descrito em documentação do

próprio Ministério da Educação (1992), aquele diploma legal, outorga, aos pais,

uma extensa série de oportunidades de participação, nomeadamente:

• Ser ouvidos, dando informações acerca do seu filho;

• Ver consideradas as sua opiniões e decisões sobre a educação dos seus

filhos;

• Ser esclarecidos sobre normas e regras que regem o funcionamento da

escola e que dizem respeito aos alunos, muito especialmente no que

respeita ao D. L. 319/91, de 23 de Agosto;

• Dialogar com os intervenientes no processo educativo no sentido de criar

uma relação de entendimento mútuo sobre a situação escolar dos seus

filhos;

• Autorizar, por escrito que se proceda à avaliação para possível aplicação

de medidas do Regime Educativo Especial;

• Manifestar as suas opiniões e o seu sentir em relação à avaliação;

• Exigir que se proceda à avaliação antes de ser tomada qualquer medida

do Regime Educativo Especial;

• Colaborar na elaboração do Programa Educativo e do Plano Educativo

Individual;

44 Como comprovam Correia e Serrano, A. M. ao expressarem que “a nossa experiência relata-nos que a

relação pais-professores ainda não é a melhor” 2002, p. 73

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• Recorrer à Direcção Regional de Educação se não estiverem de acordo

com as decisões do OGAE no que diz respeito ao Plano e/ou ao

Programa Educativo elaborados para o seu filho;

• Conhecer, dar opinião e autorizar a(s) proposta(s) da alteração do

Programa e do Plano Educativo Individual;

• Serem participantes activos na execução das actividades;

• Ver tomadas em consideração as suas diferenças culturais, na

interpretação e gestão do resultado da avaliação e na elaboração do

Programa e Plano Educativo Individual;

• Ver, usada na avaliação, a sua língua materna;

• Ver reavaliado o Plano Educativo Individual, num período máximo de três

anos e o Programa Educativo, anualmente, ou antes, se requerido;

• Consultar todos os elementos que constituem o processo dos seus filhos

e obter cópia dos mesmos;

• Ter assegurada a confidencialidade de informações a respeito dos seus

filhos.

Um relance pela listagem dos direitos conferidos aos pais, nesta matéria,

releva, efectivamente, o elevado nível de preocupação evidenciado pelo sistema.

Todavia, teme-se que as consequentes práticas de usufruto daqueles direitos

estejam bastante distante do que é recomendado formalmente.

Dentro desta linha de actuação, o Ministério de Educação, para além de

fixar os direitos referenciados, explicita, no mesmo documento (Os Intervenientes

na Aplicação do Decreto-Lei 319/91, 1992), algumas recomendações para serem

operacionalizadas pelas escolas, a fim de aumentar os níveis de implicação dos

pais, no envolvimento da escolaridade dos filhos. Pela importância de que se

revestem tais sugestões, no contexto de uma colaboração entre a escola e os pais

para a edificação e travejamento de uma educação inclusiva, aqui, se dá conta

das mesmas:

• Reuniões realizadas na escola destinadas a diversos fins: avaliação,

planeamento ou programação, informação, intercâmbio entre pais,

demonstração de actividades escolares, etc.;

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• Partilha pelos pais dos acontecimentos relevantes da escola ou mesmo

da aula: participação em festas, exposições, debates, etc.;

• Pedido de colaboração nas actividades da escola: recreios, visitas de

estudo, ocupação de tempos livres (fins de semana, férias, etc.);

• Utilização de um caderno (sempre que possível a caderneta escolar do

aluno) que sirva de transmissão de informações entre a casa e a escola;

• Elaboração de textos elucidativos sobre os direitos dos alunos com

deficiência e dos direitos dos pais em participar na sua orientação

educativa;

• Elaboração ou distribuição de cadernos informativos sobre os recursos

existentes a nível local, regional ou nacional no âmbito do atendimento à

população deficiente;

• Informação sobre as perspectivas de apoio que se abrem à população

com deficiência em fase de transição para a vida activa e na vida adulta.

Como se pode verificar, os organismos oficiais parecem não terem

descurado - pelo menos a nível teórico - a tarefa de estabelecer normas

pertinentes, quanto à desejada dinâmica de mobilizar os pais para uma

participação contínua no processo escolar dos seus educandos, especialmente

para os que são portadores de necessidades educativas especiais. Resta saber

até que ponto vai - como já se indiciou - o nível de consecução real de tais

propostas...

É, pois, fundamental que os professores estejam sensibilizados para os

problemas dos pais e que, sob esta atitude, os ajudem a estabelecer objectivos e

expectativas adequadas às limitações e capacidades dos seus filhos. Desta forma,

os pais sentirão que não estão sozinhos, vendo, consequentemente, na figura do

professor, alguém que “se preocupa, que <está do lado deles> e que quer que a

criança desenvolva todo o seu potencial individual” (Nielsen, 1999, p. 29).

Correia (1997) preconiza que a interacção entre a escola e a família se

deve pautar por uma estratégia que privilegie uma abordagem de natureza

sistémica. Desta forma - segundo, ainda, aquele autor - a atenção dos professores

não se deve centrar apenas na criança e na sua problemática, mas também no

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seu contexto familiar e ambiental. Este modo de intervenção “permite auxiliar os

pais a identificar áreas problemáticas no sistema familiar e assim melhorar o

processo de mudança, criando um equilíbrio nas interacções familiares” (idem, p.

146).

A concepção do relacionamento entre os profissionais da educação e as

famílias tem vindo a evoluir ao longo dos tempos, sendo que, actualmente, a

tendência se traduz por uma abordagem centrada na totalidade da família45. O

alvo da acção dos professores, neste âmbito, passa, desta maneira, a ser a família

inteira e não apenas os pais, pelo que, por exemplo, as sugestões de um irmão de

uma criança com necessidades educativas especiais na planificação e

desenvolvimento de um plano educativo individual, pode ser tão pertinente como

as de um fisioterapeuta (Sands, et al., 2000).

A partilha convergente e interactiva de responsabilidades educativas, em pé

de igualdade, entre a escola e as famílias tende a consubstanciar uma estratégia

de inegável alcance no desenvolvimento do processo escolar das crianças em

geral e, em particular, das que são portadoras de problemas específicos. Trata-se,

portanto de uma articulação que deve ser reciprocamente construída e estimulada.

Dinâmica que, na opinião de Sands et al., (idem) confere aos pais uma

responsabilidade activa na defesa dos direitos dos seus filhos, tão importante

como o desenvolvimento de competências por parte dos docentes na promoção

do envolvimento parental no acompanhamento da escolaridade dos seus

educandos.

Conquanto esta articulação entre a escola e as famílias deva revestir-se de

uma natureza abrangente e, por conseguinte, vincular-se à generalidade das

actividades escolares, prefigura-se de significativa relevância a necessidade de

um acompanhamento activo das famílias do que ocorre na sala de aula. Para se

assegurar esta finalidade com a máxima eficiência e impacto nos percursos

escolares dos alunos, julga-se que aquele acompanhamento deverá ser

45 Percepcionada como um sistema interaccional em que “acontecimentos que afectem qualquer um dos

membros da família podem ter impacto em todos os seus membros” (Carter & McGoldrick, 1980, citado em

Correia, 1997, pp. 145-146).

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 283

particularmente desenvolvido em estreita interacção com o processo de

concretização dos projectos curriculares de turma, ao longo do ano escolar. Este

acompanhamento ganha, por força de maior razão, níveis de profunda acuidade

no que se refere aos alunos com NEE.

O que está mais uma vez em causa é, portanto, criar as melhores

condições para o advento prático de uma autêntica educação de qualidade para

todos. Este objectivo ganhará tanto mais probabilidades de concretização, quanto

mais práticas de colaboração ocorrerem entre a escola e os pais, pois que a

“investigação já realizada aponta claramente para o facto de os alunos terem mais

sucesso na escola quando os pais se envolvem e assumem um papel positivo na

sua educação” (Rief & Heimburge, 2000, p. 124).

Finalmente e em jeito de resumo, registam-se, sobre toda esta questão, as

ideias de Nielsen:

O envolvimento parental no processo educativo e a assistência especial dada ao

aluno com NEE contribuirão para o seu sucesso escolar. Sempre que tal se revele

pertinente, o professor pode disponibilizar o seu apoio aos pais, no que diz

respeito a formas de ajudar o seu educando. Nunca esquecendo que a sua

abordagem deve ser cuidadosa, o professor pode, por exemplo, encorajar os pais

a manifestar claramente a sua afectividade e o seu apoio, quando a criança inicia

uma nova experiência ou atinge um novo objectivo. As necessidades básicas de

um aluno com NEE são as mesmas que as de um aluno regular. Enfatizar as

similitudes é essencial para promover interacções positivas entre todos os alunos.

(1999, pp. 25-26)

6 Experiências Anteriores em Portugal

Paralelamente ao trabalho de pesquisa de informação relevante na

literatura de incidência, procurou-se apurar, dentro do possível, até que ponto

estão, em curso experiências concretas de desenvolvimento de escolas inclusivas,

no nosso País. Ressalvando-se o facto de ter sido, obviamente, impossível

contactar a generalidade das escolas, a informação empírica e informalmente

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 284

recolhida permitiu, no entanto, inferir que em nenhum estabelecimento de ensino

português se levou a cabo, até ao momento (ano de 2004), qualquer projecto de

reorganização global do mesmo, com intuitos de criação, ou desenvolvimento, de

uma comunidade escolar inclusiva.

Conquanto, portanto, não se tenha tido conhecimento de nenhum projecto

sistémico de implementação de uma escola inclusiva, há no entanto notícia de que

foram, já, entretanto desenvolvidas algumas acções, mais ou menos formais, no

sentido de sensibilizar e de preparar, em Portugal, alguns estabelecimentos de

ensino para a assunção de culturas e práticas da educação inclusiva.

Seguidamente se dará conta de algumas dessas acções.

6.1 Projecto Escolas Inclusivas

No âmbito em análise julga-se, nomeadamente, ser digno de uma

referência especial o papel desempenhado, recentemente, pelo próprio Ministério

de Educação. Efectivamente, aquele organismo estatal, através do ex-Instituto de

Inovação Educacional (IIE), dinamizou uma série de iniciativas - sobretudo ao

longo da segunda metade da década de noventa, do século XX - que muito terão

contribuído para relevar a importância da educação inclusiva, junto da comunidade

educativa nacional.

O trabalho desenvolvido pelo ex-IIE, foi, por sua vez, decorrente e

impulsionado por um projecto internacional concebido pela UNESCO,

fundamentalmente orientado “para encorajar os estados-membros a desenvolver

estratégias de resposta às necessidades especiais das crianças nas escolas

regulares” (Ainscow, 1998, p. 5). Este autor (Mel Ainscow - Professor Catedrático

da Universidade de Manchester - foi precisamente, designado, pela UNESCO,

como primeiro responsável pelo referido projecto, tendo, nesta qualidade,

dinamizado o lançamento do mesmo em Portugal, no âmbito da actividade do ex-

IIE, como já foi mencionado.

Neste contexto. o ex-Instituto de Inovação Educacional lançou, nos inícios

de 1996, a versão portuguesa do projecto em questão sob a designação de

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 285

Escolas Inclusivas, o qual teve como momento de especial significado, a

realização, em Maio daquele ano, de um curso de formação de formadores com a

finalidade de capacitar os participantes para a aplicação do Conjunto de Materiais

para a Formação de Professores - Necessidades Especiais na Sala de Aula. Este

dispositivo de formação teve lugar no Estoril, tendo sido orientado pelo próprio Mel

Ainscow, e foi frequentado por 35 técnicos e professores nacionais, entre os quais

o autor deste trabalho (Anexo I).

No seguimento daquele curso de capacitação, o ex-IIE, em articulação com

outros serviços centrais e regionais do Ministério da Educação, desenvolveu um

conjunto de acções que tinham, como objectivo nuclear, problematizar e divulgar,

a nível nacional, o conteúdo e os materiais abordados por Mel Ainscow, na acção

de formação, antes referida46. Ao mesmo tempo, procurava-se sensibilizar,

localmente, escolas e professores para a implementação prática, em sala de aula,

das estratégias trabalhadas.

Seguiu-se, depois, uma nova fase do projecto Escola Inclusivas, a qual

tinha como propósito fundamental apoiar determinadas escolas, em diferentes

regiões do País, na experimentação das estratégias e dos materiais integrados no

projecto da UNESCO. Nesta fase, o IIE estabeleceu protocolos com algumas

Escolas Superiores de Educação, as quais concediam acompanhamento

informativo e formativo aos estabelecimentos de ensino sediados na respectiva

zona geográfica e que se encontravam envolvidos na aplicação experimental do

projecto. Este trabalho era acompanhado e complementado por uma equipa de

técnicos sediada no IIE, constituída por técnicos seus e por colaboradores

externos47.

Conquanto não se perspectivasse a criação, no seu todo institucional, de

comunidades escolares inclusivas, estas experiências - que ainda hoje (2004) se

mantêm, nalguns locais - consubstanciaram, sem dúvida, importantes marcos no

desbravar dos caminhos para a inclusão escolar. De facto, aquelas acções, 46 O autor do presente trabalho participou, igualmente, nesta fase do projecto, na qualidade de representante

da Direcção Regional de Educação de Lisboa, onde, à altura, exercia as suas funções profissionais. 47 O autor deste trabalho participou, ainda, nesta fase do projecto em análise, a convite do IIE e, portanto, na

qualidade de colaborador externo.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 286

desempenharam um papel relevante, não só, no âmbito da sensibilização da

generalidade dos profissionais mais vinculados à área da educação especial, mas

também no campo particular da aplicação prática de estratégias inclusivas, na sala

de aula, por parte das escolas e dos professores implicados directamente nos

referidos projectos experimentais.

6.2 Projecto O Nosso Mundo a Nossa Escola: Colaborar para Incluir

Este projecto (Anexo II) foi desenvolvido sob a coordenação da Equipa de

Coordenação dos Apoios Educativos do concelho de Vila Franca de Xira, entre

1998 e 2002 e foi concebido e supervisionado cientificamente pelo Professor

Doutor Luís de Miranda Correia, da Universidade do Minho. Esta iniciativa contou

também com o apoio formal da Direcção Regional de Educação de Lisboa

(DREL).

Nas sua linhas gerais, este projecto, de natureza experimental, tinha como

objectivo desenvolver um conjunto de acções em ordem a melhorar o

desempenho de alunos com Dificuldades de Aprendizagem (DA), nas áreas da

Leitura da Escrita e da Matemática, visando-se, assim, reforçar a capacidade de

inclusão das escolas locais. Neste contexto, foram envolvidas oito escolas do

concelho de Vila Franca de Xira, englobadas em dois grupos:

a) Grupo de Controle

b) Grupo Experimental

Em termos procedimentais o projecto, assentava primeiro, na avaliação

psicológica dos alunos com DA das escolas de um e do outro dos grupos

mencionados. Seguidamente era feita uma intervenção de carácter formativo junto

dos professores dos alunos com DA e apenas a nível das escolas do grupo

experimental. Esta acção destinava-se a promover competências que visavam

optimizar os resultados académicos dos alunos com DA, daquelas escolas.

Finalmente, após este período de intervenção, procedia-se a uma reavaliação

tanto dos alunos das escolas do grupo de controle como das escolas do grupo

experimental.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 287

Com este processo de reavaliação pretendia-se comparar os resultados

obtidos e verficar até que ponto a variável manipulada - formação específica dos

professores das escolas do grupo experimental - tivera influência na melhoria dos

alunos com DA atendidos por aqueles professores. Na sua fase inicial o projecto

integrou uma ciclo de seminários orientados precisamente pelo Professor Doutor

Miranda Correia. Tais seminários tiveram como destinatários todos os professores

de cada uma das escolas do grupo experimental, sendo os seus conteúdos

orientados para o desenvolvimento prático de procedimentos de colaboração e

cooperação sistematizados, em ordem a facilitar o atendimento inclusivo dos

alunos com NEE. A par daqueles conteúdos, outros foram igualmente

contemplados nos seminários em questão, nomeadamente, a abordagem de

estratégias adequadas ao ensino dos alunos com DA.

Não caberá aqui, naturalmente, abordar os resultados obtidos junto dos

alunos com a realização deste projecto, adiantando-se, apenas que os mesmos

evidenciaram apreciável grau de positividade. No entanto, adentro do contexto em

que este assunto está a ser objecto de análise, julga-se fundamentado realçar que

os efeitos dos seminários orientados pelo Professor Doutor Miranda Correia se

fizeram sentir, de modo efectivo, junto das equipas das escolas envolvidas,

consubstanciando um factor determinante para o incremento do ideal da inclusão

a nível do concelho de Vila Franca de Xira.

Resta, aqui, acrescer que a escola-alvo do presente trabalho de

investigação fazia parte das escolas do grupo experimental do projecto O Nosso

Mundo a Nossa Escola: Colaborar para Incluir tendo, sido, por consequência

também beneficiada a sua cultura inclusiva, como mais em pormenor se verá a

seu tempo.

7 O Suporte Crucial da Mudança: a Formação

Como, já foi devidamente salientado, a sala de aula ocupa um lugar

estrategicamente decisivo no plano de concretização prática da educação

inclusiva. Efectivamente, muito do êxito ou do fracasso desta forma de fazer

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 288

escola, parece estar muito dependente do que, na realidade, vai acontecendo, no

contexto das relações pessoais, pedagógica e didácticas ocorridas, no quotidiano

da sala de aula, entre o professor e os alunos e destes entre si.

Assim, julga-se indispensável, nesta perspectiva, que todo o professor

titular de turma - tendo-se, aqui, como referência, o modelo genérico de

funcionamento do 1º ciclo - assuma um posicionamento de crença activa e

profunda nos valores da inclusão. Paralelamente, é necessário, ainda, que revele

uma postura pessoal de empenho, na procura da formação necessária a um

exercício satisfatório das estratégias pedagógicas e didácticas facilitadoras da

mesma inclusão.

A procura de formação, aliás, parece inevitável se se admitirem extensivos

a Portugal, os resultados da investigação realizada por S. Stainback e Stainback

(1990). Assim, estes investigadores apontam para o facto de que na maioria dos

programas de preparação inicial dos professores, estes não só, não recebem

informação e formação sobre as formas de praticar a inclusão educacional como,

em muitos casos, porventura, lhes são indiciados procedimentos de recusa, nas

escolas regulares, de determinados alunos.

Da situação exposta, parece, pois, resultar claramente, por um lado, a

necessidade de desenvolver processos sistematizados de reflexão que contribuam

para a assunção, por parte dos professores, de uma atitude activa de aceitação

de toda e qualquer criança que resida na área de responsabilidade da escola e,

por outro, a urgência de serem disponibilizados dispositivos de formação que

proporcionem os saberes necessários à concretização de aulas verdadeiramente

inclusivas. Tal pressupõe a “implementação de um modelo de formação contínua,

consistente, planificado e seleccionado de acordo com a filosofia comum definida

pela e para a escola” conforme refere Hunter (1999), citado em Correia (2003a, p.

28).

Neste âmbito, importa conseguir o que S. Stainback e W. Stainback (1990)

apelidam de compromisso do professor com a inclusão plena, o que pressupõe -

segundo os mesmos investigadores - que, aquele, aceite, em princípio, todos os

alunos como membros imprescindíveis e de pleno direito, na turma. Na hipótese

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contrária, ou seja, quando os professores não desejam determinados alunos na

sua classe, emergem dificuldades significativas no que respeita à concretização

da inclusão.

Assim, segundo os autores e obra em referência, afigura-se essencial que,

aos professores, sejam disponibilizadas, regularmente, oportunidades de

actualização dos conhecimentos e das competências necessárias às práticas

inclusivas, nomeadamente através do visionamento de filmes com conteúdo de

incidência na temática em questão, em paralelo com a participação em seminários

e cursos. Estes meios de formação deverão, ainda, serem complementados com o

recurso a diálogos informais com profissionais conhecedores, quer das formas de

conceber quer dos modos de levar à pratica a educação inclusiva, como

acrescentam, também, S. Stainback e W. Stainback (1999)

Devido à já referida ausência, na formação inicial de professores, de

tempos curriculares centrados na problemática da inclusão, um grande número de

professores sente-se naturalmente inseguro, no momento de aceitar e de lidar,

pedagogicamente, com os alunos portadores de necessidades educativas

especiais. Consequentemente, os professores em questão sentem grandes

dificuldades de natureza metodológica, sobretudo nas tentativas de adaptação da

gestão curricular aos estilos e ritmos particulares de aprendizagem daqueles

alunos, ainda que com o indispensável apoio de recursos especializados.

Por tudo isto, a formação tanto a nível das atitudes, como a nível dos

saberes e dos saberes-fazer, ganha uma acuidade crucial, parecendo ser,

portanto, a via fundamental para predispor, de modo securizante, os professores a

aceitarem e a trabalharem de forma positiva com a generalidade dos alunos.

Ajudar os professores a saberem lidar melhor com a diversidade é algo que,

obviamente não é de fácil concretização. Está em causa um processo

naturalmente moroso e nem sempre linear e que, exige, inicialmente, um esforço

mais ou menos acentuado, como também referem concretamente, os autores

antes mencionados.

Se a formação orientada para as práticas inclusivas é, portanto, um recurso

imprescindível, a atitude é, porém, determinante do êxito de todo o processo. De

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facto, como salientam ainda Stainback e Stainback (1990), de pouco valerá a

formação, ou a participação em cursos e seminários sobre métodos e técnicas de

inclusão, se o professor não desejar este ou aquele aluno na sua turma, devido à

natureza especial da sua problemática.

Uma análise ponderada sobre o conjunto sistémico de mudanças que a

criação de escolas inclusivas pressupõe, parece fundamentar a ideia de que tal

não será viável sem a activação de dispositivos internos e contextualizados de

formação. Deve pois ser concebido e concretizado um plano de formação que, por

um lado proporcione aos elementos da comunidade escolar a apropriação das

competências indispensáveis e, por outro, garanta o desenvolvimento do processo

de reorganização institucional segundo os princípios e valores nucleares da

educação inclusiva.

Assim, afigura-se fundamental a necessidade de equacionar o processo de

mudança de modo a que, o mesmo, seja operacionalizado sob o apoio constante

e orientador de mecanismos adequados de formação. Naturalmente que, no caso

vertente, o enfoque se centra, não na formação inicial, mas sim na chamada

formação contínua, tal como aconselha - como se viu - Hunter (1999).

Entretanto, Ribeiro (1993), considera que a formação contínua representa:

O conjunto de actividades formativas de professores que vêm, na sequência da

sua habilitação profissional inicial e do período de indução profissional (quando

existe), e que visa o aperfeiçoamento dos seus conhecimentos, aptidões e atitudes

profissionais em ordem à melhoria da qualidade da educação a proporcionar aos

educandos”. (p. 10)

Sendo que o conceito de formação contínua parece apresentar, entre os

autores da especialidade, concepções diversas, para o presente contexto afigura-

se ajustado adoptar, de entre aqueles, a conjugação complementar das ideias

sobre tal adiantadas por Chantraine-Demailly (1992): a formação contínua como

instrumento de mudança e como instrumento facilitador de resolução de

problemas. No primeiro caso, Chantraine-Demailly perspectiva a formação

contínua como um processo de negociação e de colaboração no seio da

comunidade escolar a fim de activar dispositivos de formação que permitam a

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 291

reorientação dos saberes e das competências dos professores. É o tipo de

formação que assegura a inovação e a mudança, acrescenta Chantraine-Demailly.

Para o segundo caso (formação contínua como instrumento de resolução de

problemas) é referido, na mesma fonte, que a escola e a sala de aula são espaços

onde surgem, periodicamente, novos problemas cujo diagnóstico e consequente

resolução devem ser da responsabilidade directa dos profissionais ali envolvidos

para o que, normalmente, necessitam da ajuda de dispositivos de formação

contextualizada.

Um relance sobre os requisitos organizacionais e pedagógicos que a

literatura de incidência aponta como inerentes a uma escola inclusiva, parece

indiciar a inevitável necessidade de os agentes educativos serem portadores de

saberes novos. Este facto, por sua vez, pressupõe que a formação a disponibilizar

não poderá ser do tipo mais do mesmo, ou seja, deverá integrar conteúdos e

recursos que, em grande parte, são novidade para os destinatários, uma vez que

não terão sido objecto de abordagem na sua formação inicial e - muito

provavelmente - o mesmo ocorrerá no âmbito da formação contínua que

ultimamente tem sido disponibilizada.

Admitida a imprescindibilidade da formação, bem como da sua natureza

inovadora, julga-se defensável que, a mesma, seja pensada e concretizada com o

máximo de rigor, a fim de que os objectivos em causa possam ser

satisfatoriamente alcançados. Face a este quadro, afigura-se, então, que a forma

mais apropriada de levar a cabo a formação em questão, deverá assentar no

pressuposto de que os professores agirão como investigadores, como sugerem

Carr e Kemmis (1998). Nesta perspectiva - e de acordo com os mesmos autores -

a investigação emerge como um processo integrado no trabalho institucional e

pedagógico, gerando uma comunidade educativa cada vez mais informada e

formada. Sob este quadro, afigura-se adequado pressupor, então, que a

indagação reflexiva orientada para a compreensão da realidade contextual -

assente em procedimentos colectivos de colaboração - a par da procura

intencional e experiencial das novas competências configuram os traços mais

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nítidos da estratégia formativa a implementar para a consecução da mudança

pretendida.

Como assinalam, ainda, Carr e Kemmis, os contextos de trabalho - neste

caso, a escola - consubstanciam um ambiente pertinente de formação individual e

colectiva. Desta forma, os processos envolvidos nas práticas profissionais são

entendidos como acções que formam e transformam os seus actores, desenhando

e materializando, progressivamente, os caminhos a que a comunidade se propôs.

Segundo o cenário antes descrito como ambiente privilegiado de

desenvolvimento dos processos de formação, os professores assumem - como se

referiu - o papel de investigadores reflexivos e activos no âmbito das suas próprias

acções profissionais. Sob esta lógica interessa, então, compreender de modo mais

aprofundado, a concepção de professor enquanto investigador. A este respeito

Buitrago (1999), identifica, no professor-investigador, determinadas características

que o definem, sumariamente, como:

a) O docente que ensina a partir da dúvida, do que não se sabe, ou seja a

partir das incertezas dos seus alunos.

b) O docente que revela uma atitude hermenêutica, entendida como uma

intenção de clarificar aquilo que lhe parece confuso.

c) O docente que cultiva uma atitude dialéctica com os seus alunos através da

procura e de mudanças metódicas de perspectiva que permitam a

superação constante de todo o ponto de vista parcial.

A perspectiva desta autora cruza-se, assim, com a de Elliot (1990) o qual

considera ser a prática pedagógica uma forma de evidenciar e de compreender o

saber dos professores. Ainda, neste contexto, Elliot concebe o ensino como uma

espécie de ciência prática, na qual o professor é um investigador da sua própria

actividade, a partir de processos de compreensão contextual e de interpretação

reflexiva de situações concretas.

Perfilha-se, portanto, neste trabalho, uma perspectiva de análise em que os

docentes são considerados como profissionais vocacionados para investigar os

efeitos das suas próprias práticas. Para que tal seja conseguido, torna-se

necessário que os mesmos assumam uma atitude sistemática de reflexão

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hermenêutica que lhes permita recolher os dados imprescindíveis para tornar

evidentes os aspectos que necessitam de ser melhorados.

No que respeita aos professores de educação especial e a outros técnicos

especialistas, parte-se do princípio de que os mesmos possuem já a formação

necessária para, em termos de orientação, colaboração e cooperação,

assegurarem a gestão, em modos adequados do processo de atendimento aos

alunos com NEE. Estes recursos especializados corporizam, como é evidente, um

papel-chave na construção de uma escola inclusiva e poderão, com os seus

saberes e experiências, consubstanciarem um meio a explorar nos próprios

dispositivos de formação orientados para as práticas de inclusão, nos locais onde

exercem a sua função específica.

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CAPÍTULO II

METODOLOGIA

Concluída a parte do trabalho onde foi apresentada a informação

considerada relevante para o enquadramento teórico da presente investigação -

sobretudo como fundamento da estruturação do modelo de escola inclusiva,

adoptado como referência - inicia-se, aqui, um novo capítulo, cuja finalidade

consiste, sumariamente em:

1. Delimitar e definir o problema da investigação

2. Identificar os objectivos do trabalho

3. Caracterizar o modo de investigação utilizado

4. Fundamentar e explicitar o processo de recolha de informação sobre a

escola estudada.

1 A Formulação do Problema

O facto de, pessoalmente, trabalhar, em tempo parcial, no concelho de Vila

Franca de Xira, desde 1987 até à presente data (2004), forneceu um

conhecimento mais ou menos apurado da realidade educativa local e, muito em

particular, da Escola do 1º ciclo do Forte da Casa - objecto de estudo desta

investigação - nomeadamente no que concerne ao tipo de atitudes e de práticas

pedagógicas que, naquela, se iam desenvolvendo. Ao longo do tempo referido,

muitos foram os contactos formais e informais com diversos agentes educativos

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da escola, nomeadamente, com o seu, director48, professores titulares de turma,

docentes de apoio educativo e pessoal auxiliar da acção educativa.

Alguns dos contactos em questão revestiram-se de formas de acções de

sensibilização e de formação, orientadas pelo autor do presente trabalho, facto

que gerou, por um lado, uma ligação estreita com a comunidade educativa da

escola em causa - e uma relação muito próxima com o respectivo órgão de gestão

- e, por outro, um processo activo de envolvimento, ainda que modesto, na

construção da cultura inclusiva, ali emergente. Por conseguinte, a aludida

participação pessoal no desenvolvimento das perspectivas inclusivas na escola,

foi iniciada, muito tempo antes do começo formal deste projecto de investigação.

Tal significa que a implicação pessoal desenvolvida, como colaborador informal na

concretização dos ideais da escola, estava - e está - assegurada,

independentemente da formalização, para efeitos académicos, do presente

trabalho.

Sob aquela perspectiva, portanto, este projecto de investigação representa

mais um meio do que propriamente um fim. O que no fundo este trabalho

representa em relação à colaboração desenvolvida junto daquela escola é,

fundamentalmente, um contributo de natureza metodológica e científica, para

apoiar com maior qualidade e profundidade o continuum de mudanças que ali

ocorre.

Foi, portanto, no seio de um trabalho já em curso, que emergiu a ideia de, o

mesmo, ser enquadrado num projecto de investigação orientado para a obtenção

de um grau académico, neste caso concreto, de doutoramento. Claro que este

facto não deixou de ter determinadas consequências na forma como o trabalho de

colaboração vinha a ser desenvolvido, uma vez que a morosidade que lhe está

subjacente implicava, pontualmente, um maior distanciamento pessoal da escola,

sobretudo nos últimos tempos. Contudo, o princípio de base - de que a obtenção

do grau académico era um meio e não um fim - manteve-se inalterável. Deste

48 Era esta a designação formal do responsável pelo órgão de gestão da escola, antes desta entrar no regime

de autonomia estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio, após o que a designação em causa,

passou a ser a de Presidente do Conselho Executivo.

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modo, as consequências advindas da realização formal deste projecto de

investigação, dada a sua natureza informativa e formativa, acabarão por ser -

julga-se - na sua maioria, como que mais valias, para a comunidade escolar, as

quais se podem, de forma sumária, assim, explicitar:

• maior rigor na caracterização diagnóstica da situação escolar;

• melhor conhecimento da natureza da diversidade dos alunos;

• intensificação das modalidades de envolvimento parental;

• optimização do apoio aos alunos com necessidades educativas especiais;

• introdução de vários aspectos, não só organizacionais como pedagógicos,

intrinsecamente inovadores;

• aprofundamento e disponibilização de um maior leque de respostas para os

problemas decorrentes do quotidiano pedagógico.

Paralelamente, procurou-se, em rigor, que a realização do projecto de

investigação, academicamente falando, não redundasse numa sobrecarga

adicional de trabalho para os elementos da comunidade escolar. Este

compromisso foi integralmente respeitado, através da utilização de uma estratégia

que assente e integrada no trabalho de colaboração que já vinha sendo

desenvolvido, permitisse a efectivação das tarefas da investigação sem interferir,

de forma significativa, com o labor de rotina da escola e dos seus profissionais.

Quanto a eventuais desvantagens para a escola - e que tenham a sua

origem ligada ao desenvolvimento deste trabalho académico - reconhece-se, com

toda a sinceridade, que têm sido insignificantes, devido - repita-se - à preocupação

do cumprimento escrupuloso dos princípios negociados e antes descritos. Porém,

o facto de serem considerados insignificantes, não representa a negação da sua

existência. Efectivamente alguns existirão e de entre eles é justo reconhecer -

como aqui já se disse - que, a partir de determinada altura, não foi possível evitar

um certo espaçamento nas deslocações e contactos com a escola, o que na

prática, traduz um maior distanciamento. A razão para este facto localiza-se,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 297

precisamente, na necessidade de redigir o presente relatório49 da investigação, o

qual, dada a natural exigência de rigor e de formalidade que lhe estão inerentes,

tem vindo a consumir tempos consideráveis. Mas, há a intenção sincera de, num

futuro imediato, compensar a comunidade escolar dos efeitos deste contratempo.

De facto, a finalização do relatório não é sinónimo do fim do projecto de

implementação do modelo de escola inclusiva, até porque este é um projecto

aberto, flexível, recorrente e, consequentemente, em processo de permanente

reformulação. Por outro lado, esta investigação produziu um acervo de informação

e de materiais de tal dimensão que se acredita que a próxima abordagem

reflexiva e crítica no seio da comunidade escolar - como foi negociado e assumido

- produzirá efeitos de significativo alcance na melhoria da prestação profissional

da equipa educativa e, por reflexo, nos índices do sucesso educativo dos alunos.

Logo, a investigação formal vai terminar, mas o projecto local - agora mais

aliciante do que nunca - vai continuar e numa vertente essencialmente centrada

na intervenção. Assim, se intenciona compensar, a escola, os docentes, as

famílias e - principalmente - as crianças, da quebra de colaboração, no terreno, a

que tem obrigado a redacção deste relatório.

Entretanto, a aproximação progressivamente feita à escola, forneceu

indicadores de acentuada importância quanto ao caminho a seguir. Desta forma

foi possível percepcionar, por exemplo, o sentido dos caminhos que a comunidade

escolar desejava trilhar. Caminhos esses que assentam numa crença firme nos

valores e ideais subjacentes à inclusão e que têm gerado a vontade de

disponibilizar a resposta do estabelecimento de ensino a toda e qualquer criança

da sua zona de influência, independentemente das suas capacidades ou

limitações, nomeadamente, às crianças com necessidades educativas especiais.

Crença essa que amadureceu por força do querer fazer e da constatação

gratificante de que esse querer fazer ia provocando resultados positivos junto das

49 Aquí, considerado como “documento escrito en el que el investigador relata cuidadosamente todos os

pasos seguidos en la investigación, los resultados obtenidos y sus conclusiones con respecto al problema

estudiado” (León & Montero, 1995, p. 22)..

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crianças em causa. Pressentia-se, por conseguinte, a direcção que a escola

desejava, convicta e activamente, tomar.

Por todas as razões enunciadas, ganhava cada vez maior nitidez a

problemática a estudar no seio deste projecto de investigação. Efectivamente, a

história recente da escola, bem como a sua abertura para atender crianças com

problemáticas complexas, apontavam claramente para o facto de ser a educação

inclusiva a temática a explorar neste projecto de investigação ou, de um modo

ainda mais preciso e restrito, o campo específico da escola inclusiva.

Em termos de enquadramento, no âmbito conceptual da investigação julga-

se, portanto, legítimo considerar a dimensão da escola inclusiva como a sua área

temática. Área temática que, embora contendo-o, não traduzia, obviamente, o

problema50 concreto a investigar. Este será alvo, oportunamente, de uma

explicitação mais pormenorizada.

Se bem que em termos pessoais era inegável uma intencionalidade afectiva

e racional para orientar o processo investigativo51 no sentido da construção da

educação inclusiva, coexistia, paralelamente, um imperativo ético de, tanto quanto

possível, evitar a proeminência das opções pessoais face às legítimas

expectativas, interesses e ritmos de inovação patenteados pela comunidade

escolar. Estes teriam que ser respeitados em absoluto a fim de que o projecto

pudesse ser desenvolvido em clima de estável e de recíproca confiança.

Assumida a área temática a investigar, constatava-se, pela história e pelo

conhecimento pessoal da acção educativa da comunidade escolar que, nesse

âmbito, algo estava feito mas que muito estava - e está - ainda, por fazer.

“Queremos fazer e ter uma escola inclusiva!” era, no fundo, a expressão que, de

forma mais precisa, traduzia - nas conversas informais - o anseio e o desejo dos

profissionais locais.

Aliás, aquela predisposição da equipa educativa local para trilhar os

caminhos conducentes à concretização da escola inclusiva já estava formalmente 50 Segundo Sampieri, Collado e Lucio (1996), a formulação do problema, em investigação, consiste,

fundamentalmente, em estruturar, de modo formal, a ideia central do processo de pesquisa. 51 Aquí, considerado como “... estudiar una situación para diagnosticar necesidades y problemas a efectos de

aplicar los conocimientos con fines prácticos (investigación aplicada)" (Ander-Egg, 1987, p. 59).

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assumida ao ter optado por participar no Projecto O Nosso Mundo, a Nossa

Escola: Colaborar para Incluir que vinha a ser alvo de desenvolvimento no

concelho de Vila Franca de Xira, desde o ano de 1998, como se clarificou em local

próprio. O autor deste trabalho integrou, entretanto, a equipa de intervenção local

do aludido projecto. Como a escola do 1.º ciclo do Forte Casa era um dos

estabelecimentos de ensino envolvidos naquela experiência científica, é óbvio que

os contactos pessoais foram ali intensificados e, em consequência de tal resultou

o aprofundamento do conhecimento sobre os processos de gestão e de

funcionamento pedagógico da escola em apreço.

Com todas estas dinâmicas a escola traduzia, efectivamente, uma

organização educativa que trilhava de forma intencional, percursos claramente

subjacentes ao ideal inclusivo. Faltava-lhe, porém, a percepção reflexiva e a

consequente compreensão conceptual de um modelo holístico e exaustivo de

escola inclusiva que servisse de referência orientadora e securizante à sua

caminhada. Consequentemente, algumas dúvidas existiam no seio da comunidade

escolar. Assim: “Em que ponto estamos?”, “O que é, em rigor, uma escola

inclusiva?“ e “O que fazer para lá chegar, a partir do ponto onde nos

encontramos?” eram, então, algumas das interrogações lógicas, espontâneas,

informais e naturais que, de certa forma representavam o estado de

questionamento interno da equipa educativa em causa, na altura em que se

decidiu iniciar o projecto de investigação propriamente dito.

A partir do momento em que se consciencializou que aquelas questões

traduziam de uma maneira muito real a situação de partida, igualmente se

considerou que havia matéria e motivos pertinentes para a realização de um

projecto de investigação. Claramente começava a ficar, então, subjacente a esta

possibilidade o objectivo de se poder contribuir para encontrar respostas concretas

àquelas questões. Emergia, em face de tudo isto um profundo sentido motivador,

tanto para o investigador como para a comunidade escolar envolvida.

Como resultado do diálogo puramente informal - e, por isso,

intrinsecamente autêntico - mantido, ao longo de muito tempo, com os

profissionais locais, ganhava cada vez mais clareza a ideia de que o trabalho de

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 300

investigação teria efectivamente de dar resposta às questões emergentes, as

quais se prendiam com a necessidade de a comunidade educativa ser esclarecida

sobre três aspectos fundamentais:

1. Conhecimento de um modelo holístico e exaustivo de escola inclusiva

(adequado à cultura organizacional e pedagógica local).

2. Clarificação do ponto em que se encontrava face ao modelo em questão.

3. Qual o conteúdo de um processo de inovação que permitisse a

aproximação da escola aos requisitos fulcrais do modelo a adoptar.

A análise dos aspectos referidos prenunciava, de modo muito assertivo que

os mesmos consubstanciavam as genuínas perguntas de partida que,

classicamente, qualquer projecto de investigação deverá apresentar. Neste

contexto, havia ainda um factor que se tornava importante levar em conta: as

perguntas de partida, como se descreveu, eram feitas, de modo empírico e

espontâneo, pela comunidade escolar em estudo e não pelo investigador. Este

facto parecia - parece - não ser muito ortodoxo à luz dos princípios teóricos que

fundamentam a praxis da investigação e, por essa razão, denotava riscos

evidentes, sobretudo a nível dos procedimentos metodológicos. Neste cenário

seria muito mais cómodo e formal ser o investigador a formular as perguntas em

causa e, consequentemente, elaborar um percurso metodológico de recolha e de

tratamento de informação em perfeita conformidade com os manuais da teoria

investigativa. Só que esta opção - sem dúvida muito segura do ponto de vista

metodológico - acabaria por revestir-se de características algo artificiais na medida

em que iria sacrificar, a autenticidade da situação encontrada, só por imperativos

de obediência aos formalismos teóricos.

Reside, precisamente, neste aspecto o maior dos dilemas que emergiram

ao longo da realização do presente trabalho. Dilema que se definia por um lado

pelas exigências do rigor metodológico que aconselhavam a enveredar por um

caminho mais conforme à teoria clássica da investigação e por outro, pelo desafio

muito mais aliciante de que a investigação a desenvolver procurasse,

essencialmente, responder às dúvidas e questões protagonizadas

espontaneamente pelo conjunto dos profissionais locais. Estavam em confronto,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 301

pois, a racionalidade técnica e a autenticidade empírica. A forma de ser e de

pensar pessoais penderam, claramente, para a segunda hipótese e, em

consequência, foi esta a eleita.

Optando-se, por conseguinte, por uma perspectiva de trabalho em que o

investigador assumiu as questões colocadas pela comunidade como o problema a

investigar, houve de imediato a consciência de que, de algum modo, quem

questionava eram os investigados e quem respondia era o investigador,

resultando daqui uma espécie de inversão da lógica tradicional da investigação.

Claro que esta opção implicava riscos sérios no campo dos procedimentos

metodológicos. Houve consciência clara de tal e a opção tomada assumia,

portanto, os riscos subjacentes.

Numa outra ordem de ideias percepcionava-se, entretanto, que o profundo

conhecimento empírico detido a nível pessoal da realidade local, comprovava que

os elementos da organização escolar desenvolviam esforçadamente o que podiam

e sabiam para responder às necessidades de todas as crianças ali atendidas.

Neste aspecto, os alunos portadores de necessidades educativas especiais

mereciam, inclusivamente, uma atenção muito particular. Por conseguinte, as

atitudes e os procedimentos pedagógicos ali em curso denotavam já um vínculo

muito significativo à ideia da escola inclusiva. Porém, os elementos da equipa

educativa não detinham, como já foi exposto, um conhecimento profundo, quer

das formas metodologicamente necessárias à estruturação completa de uma organização funcional e pedagógica conforme a um determinado modelo exaustivo de escola inclusiva, quer obviamente, das estratégias a mobilizar para lhe dar consecução prática. O ponto em que se situavam entre uma coisa e a outra também não estava perfeitamente identificado.

Assim, aquele desconhecimento relativo - por parte da equipa educativa da

escola - de uma estrutura organizacional representativa de um modelo holístico de

escola inclusiva, bem como, obviamente, da totalidade dos meios para o

conseguir, e, ainda, da localização do ponto exacto onde se situava, nesse

processo, passou a consubstanciar - por força da opção antes explicitada - não só

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o elemento nuclear do problema de partida deste projecto como, por decorrência,

também a identificação e materialização dos próprios aspectos a investigar.

Neste contexto, seguiu-se a sugestão de Sampieri, Collado e Lucio (1996),

ao opinarem que a formulação do problema deve assentar na indução de

determinadas questões, as quais funcionarão como perguntas de partida para a

investigação. Os mesmos autores, numa lógica de raciocínio sequencial àquelas

ideias, apontam então que os resultados da dita investigação deverão

consubstanciar, tanto quanto possível, a resposta às referidas perguntas, as

quais, como se evidenciou, traduziam as dúvidas sentidas pela comunidade

educativa da escola envolvida neste trabalho de investigação. Desde logo se

pressentiu que a consulta bibliográfica e os seus resultados seriam a matéria nuclear a ter em conta para a configuração das respostas a tais perguntas.

Por outro lado, dada a abrangência e dimensão afectas a cada pergunta, intuiu-se

também logo de início que teria de ser bastante volumosa a informação a obter no

campo bibliográfico para que as respostas em causa pudessem ter validade e

credibilidade científicas. Daí a considerável fatia que tal matéria corporiza no

presente relatório.

Pela importância nevrálgica que a natureza da situação-problema detém no

presente projecto de investigação-acção - conquanto se possa incorrer num

cenário de repetição - julga-se, então, necessário recuperar aqui, os seus

contornos sob a forma definitiva das perguntas de partida subjacentes à realização

do projecto de investigação:

a) O que é, em rigor e profundidade, uma comunidade escolar inclusiva?

b) Em que ponto está a comunidade escolar em estudo face a um determinado modelo de escola inclusiva?

c) O que deve ser implementado localmente para que seja conseguida a aproximação, do estado encontrado, à situação de escola inclusiva, segundo o modelo adoptado?

O órgão de gestão e o corpo docente tinham, portanto, - como nos diálogos

informais do quotidiano era possível testemunhar - uma noção implícita e

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assumida dos contornos do problema. Só que, o mesmo, não estava clarificado

formalmente. Aliás, tal não consubstanciava, naturalmente, uma necessidade

muito sentida pelos actores da escola. Eles iam desenvolvendo a sua acção

profissional dentro de uma linha de acentuada atenção para com os alunos mais

problemáticos e, logicamente, as suas preocupações ficavam-se muito por aí o

que - diga-se de passagem - já não era pouco.

Assim, a definição clara e precisa do problema passava a ser uma questão

a resolver pelo investigador e não propriamente pelos profissionais locais.

Contudo, percepcionava-se, também a ideia de que, de alguma maneira aqueles

sentiam uma certa curiosidade - e, até mesmo, necessidade - de ver clarificada

aquela questão. Essa necessidade advinha precisamente da crença de que se a

situação-problema fosse explicitamente clarificada tal iria, certamente, contribuir

para o desenvolvimento e aprofundamento apoiado das respostas que seriam

naturalmente identificadas como adequadas à resolução daquele problema,

melhorando, assim, o atendimento educacional à generalidade dos alunos,

propósito que - isso sim - todos sentiam como algo de muito desejável

Começava então a ganhar corpo, a ideia de que uma definição precisa de

um modelo exaustivo de escola inclusiva e a sua consequente implementação

global poderia, efectivamente, ser um meio efectivo de reforçar qualitativamente

as formas de responder a todos os alunos. Esta perspectiva de melhoria

correspondia - como se comprovava pelo conhecimento pessoal que se tinha do

pensamento e das práticas dos docentes da escola - às mais profundas

preocupações da comunidade educativa e, por conseguinte, passava a

consubstanciar a verdadeira mola impulsionadora da transformação pretendida.

Ao mesmo tempo entendia-se que a investigação proposta poderia contribuir de

modo pertinente para a consecução real daquela desejada transformação.

O aprofundamento empírico e informal da explicitação e da análise do

problema, junto - e com - a comunidade escolar, dava aso, entretanto, à

dilucidação de algumas evidências significativas, tais como:

a) Percepção de que a situação do momento representava, já, um

determinado percurso na caminhada para a construção da escola inclusiva;

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b) Consciência da necessidade de colaboração externa na tarefa de

identificação de um modelo de escola inclusiva, adequado à cultura e

práticas internas;

c) Vontade do órgão de gestão, dos docentes, do pessoal auxiliar e dos

representantes dos pais de, a partir da situação do momento, tentar uma

aproximação real ao modelo de escola inclusiva, a configurar;

d) Entendimento da conveniência da continuidade da colaboração externa

para a consecução do processo de transformação indiciado.

Como resultado destas evidências - e dando-se continuidade mais intensiva

aos processos de colaboração anteriormente desenvolvidos - foi iniciado o

processo de investigação propriamente dito. Paralelamente era dado

conhecimento aos profissionais locais - mediante a continuidade dos diálogos

espontâneos e informais - do andamento da pesquisa.

Aprofundaram-se, a partir de então, neste clima, dinâmicas de cooperação

e de comunhão entre o investigador e a comunidade educativa local. Tais

procedimentos visavam dar continuidade às atitudes e acção locais com o fim de

se alcançar uma resposta efectiva às questões e anseios expressos pela

comunidade escolar do 1º ciclo do Forte da Casa, os quais passavam, em síntese,

por uma cada vez maior aproximação efectiva aos ideais e práticas conformes à

escola inclusiva.

2 Objectivos do Estudo

O conhecimento directamente vivenciado e progressivo da realidade

organizacional e pedagógica da escola envolvida, incluindo-se - no objecto deste

conhecimento - as expectativas e os anseios da respectiva equipa de

profissionais, forneceu dados, que facilitavam de modo seguro, ensaiar a

delimitação e a explicitação, quer da área temática da investigação

(educação/escola inclusiva), quer do problema de partida. Nesta perspectiva - e de

alguma maneira como já se indicou, anteriormente - os eixos da referida situação

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problemática giravam em torno da necessidade de concretização dos aspectos

seguintes:

a) Determinação de um modelo holístico de escola inclusiva ajustado à cultura

e práticas escolares;

b) Identificação precisa do ponto de situação da organização e do

funcionamento pedagógico da escola, num trajecto conducente ao referido

modelo de escola inclusiva;

c) Elaboração de um plano de intervenção que possibilitasse o

desenvolvimento de um processo de transição do estado actual ao estado

desejado.

A explicitação clara e inequívoca dos factores integrantes da situação

problemática foi, então explorada no sentido de, naturalmente, fundamentar a

formulação dos objectivos inerentes ao desenvolvimento prático deste projecto de

investigação-acção e dos quais se dará conhecimento explícito um pouco mais à

frente.

Consultando-se, a propósito deste assunto, ainda Sampieri, Collado e Lucio

(1996), estes investigadores referem que deverá haver uma nítida e lógica

congruência entre as perguntas inerentes ao problema e os objectivos propostos

para a consequente investigação. Acrescentam - os mesmos autores - que uns e

outros devem ir na mesma direcção e que, finalmente - como, de resto, já

anteriormente se referiu - as perguntas devem orientar o trabalho de investigação

propriamente dito, de modo a que este venha a produzir respostas satisfatórias

àquelas. Procurou-se, assim, que o trabalho a desenvolver traduzisse um fluxo de

sólida coerência entre todas as suas fases. Consequentemente, foram vários os

momentos em que se ia procedendo a uma reflexão intensa sobre os processos e

conteúdos gradualmente produzidos para verificar se os referidos níveis de

coerência interna eram satisfatórios. Caso se constatasse o contrário - e nalguns

momentos tal acontecia - tornava-se necessários reformular alguns passos para

se recuperar, então, a desejada coerência.

Tendo-se, pois, em consideração a opinião de Sampieri, Collado e Lucio,

julgou-se então pertinente organizar entre si e de forma tão sistematizada quanto

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 306

lógica, os dados em causa: perguntas de partida, objectivos e respostas a

encontrar. O resultado daquele procedimento está patente no quadro que a seguir

se apresenta.

Quadro 8

Relação de Congruência entre as Perguntas, Objectivos e Respostas do Projecto

de Investigação

Perguntas Objectivos Respostas

O que é, em rigor, uma escola inclusiva?

Definir um modelo de escola inclusiva para

enquadramento e desenvolvimento da

situação

Configuração conceptual de um modelo de escola

inclusiva (recurso à bibliografia de

incidência) Em que ponto está a comunidade escolar, face a um determinado modelo de escola inclusiva?

Identificar o ponto de

situação da comunidade escolar, no que concerne à cultura organizacional e

práticas pedagógicas inclusivas

Caracterização do ponto de situação da cultura organizacional

de escola, face ao modelo configurado (mediante a recolha local de informação

relevante)

O que deve ser implementado para

aproximar a situação actual (o que é) da situação

desejada ( o que deve ser)?

Elaborar um plano de intervenção susceptível

de concretizar a aproximação da situação de partida à situação de

chegada (modelo proposto).

Planificação sistematizada das

acções a desenvolver com base nas

diferenças existentes entre a cultura

organizacional e pedagógica da escola e

os correspondentes níveis prescritos no modelo proposto.

Para uma melhor e mais precisa orientação do desenvolvimento prático do

projecto de investigação - bem como da sua regulação dinâmica - tornava-se,

contudo, conveniente desenvolver a elaboração de objectivos menos abrangentes.

Assim e a partir do desdobramento lógico dos objectivos gerais, antes

mencionados, foram, por sua vez, formulados os seguintes objectivos específicos:

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1. Pesquisar, na literatura de incidência, informação respeitante à

problemática da escola inclusiva;

2. Sistematizar a informação pertinente relativa à história organizacional e

pedagógica da escola-alvo;

3. Analisar, criticamente a informação coligida;

4. Caracterizar os níveis de cultura e de práticas inclusivas já atingidas pela

comunidade escolar;

5. Estruturar, com base nos contributos da literatura, uma proposta de modelo

exaustivo de escola inclusiva ajustado aos percursos já concretizados pela

escola em estudo;

6. Elaborar um plano de acção que clarificasse e estabelecesse os percursos

organizacionais e pedagógicos a desenvolver pela escola, para a

concretização prática dos elementos estruturais do modelo proposto,

(tendo-se em consideração a situação encontrada);

7. Desenvolver, numa primeira fase, os procedimentos necessários à

implementação das mudanças consideradas localmente prioritárias.

8. Continuar e concluir, numa segunda fase, o restante plano de acção.

Estes foram, portanto, os objectivos propostos para o desenvolvimento do

presente projecto de investigação-acção. Até ao momento foram levados a cabo

os sete primeiros dos oito objectivos elencados. É, pois, o resultado decorrente da

consecução destes sete objectivos que integra o conteúdo deste relatório. Após a

conclusão deste (relatório) será dada continuidade ao projecto de investigação-

acção, sendo que essa nova fase terá, portanto, como referência nuclear a

seguinte meta:

- Levar à prática, junto - e com - a comunidade escolar, o restante plano de

intervenção delineado, a fim de aproximar a situação real do modelo de

escola inclusiva adoptado.

Definidos, assim, os objectivos norteadores do desenvolvimento prático do

trabalho, ficava deste modo clarificado e traçado o caminho a percorrer. A ordem

com que os objectivos foram previa e teoricamente estabelecidos não significava

que a mesma fosse objecto de sequencialização isomórfica na concretização dos

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mesmos. Essa ordem ficava, assim, dependente das especificidades e das

circunstâncias inerentes, emergente e decorrentes do próprio desenvolvimento do

trabalho, como de resto aponta o sentido semântico do termo projecto.

Ponderando-se todos os dados em presença importava, pois, assumir uma

linha de abertura e de flexibilidade ao longo do desenvolvimento do trabalho. Esta

precaução seria, de resto, respeitada escrupulosamente no design do projecto de

modo a que este permitisse adaptar o seu figurino “à medida que o conhecimento

se aprofunda e/ou as situações se alteram” (Tuckman, 2002, p.510). Só assim

seria possível diminuir as possibilidades de a investigação “ficar encerrada em

designs rígidos que eliminam o seu carácter de resposta” (idem).

3 A Legitimação da Investigação

O acesso e os contactos pessoais, até então tidos com a escola e os seus

profissionais, foram desenvolvidos - como já foi antedito - paulatinamente, ao

longo de vários anos no âmbito de um trabalho de abrangência concelhia. Tal tem

vindo a ocorrer por inerência à função de director técnico que o autor deste

trabalho tem vindo a desempenhar numa instituição particular de solidariedade

social, localizada precisamente na sede do concelho, ou seja, na cidade de Vila

Franca de Xira.

Importa, entretanto, esclarecer - por se afigurar, neste contexto importante -

que aquela instituição tem, por vocação, desenvolver projectos, programas e

acções de apoio à inclusão escolar, comunitária e social, de crianças e jovens com

necessidades educativas especiais. Foi, portanto, naquele contexto que os

referidos contactos se iniciaram e desenvolveram em várias escolas do concelho,

incluindo, nestas, a escola-alvo deste estudo.

As acções da mencionada instituição foram, numa primeira fase,

desenvolvidas numa perspectiva unilateral, passando, com o tempo, a privilegiar o

regime de parcerias com serviços ou entidades que prosseguem objectivos afins.

E foi graças precisamente a esta segunda fase - nomeadamente, devido à

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parceria com a Equipa de Coordenação dos Apoios Educativos de Vila Franca de

Xira - que as relações pessoais com a escola do 1º ciclo do Forte da Casa se

intensificaram. Para tal, concorreu, de forma decisiva o facto de a responsável por

aquela Equipa de Coordenação, deter um conhecimento muito profundo da

organização e funcionamento da escola, bem como da maioria das pessoas que

ali trabalham. Esse conhecimento resultou do facto de, a docente em causa, ter

desempenhado, na escola em estudo, funções de professora de apoio educativo

durante um período sequencial e ininterrupto de três anos lectivos.

De tudo isto resultava que a intervenção formativa realizada pelo autor

deste trabalho, junto da comunidade escolar em referência, se centrava bastante

nos aspectos lacunares ali identificados pela referida Coordenadora. Como

consequência desta actividade emergia, logicamente, o aprofundamento do

conhecimento pessoal da vida e da acção da escola em questão, facto que se viria

a revestir de importância crucial em todo o desenvolvimento prático do presente

trabalho de investigação. Este aspecto acabaria, ainda por ser reforçado pelo facto

de o investigador ter, também, tido a oportunidade de participar, junto da mesma

escola, no projecto A Nossa Escola o Nosso Mundo: Colaborar para Incluir,

concebido - como se diss antes - pelo Professor Doutor Miranda Correia.

Estabeleceu-se, assim e gradualmente, um processo intenso de relação de

trabalho e de cooperação com a comunidade educativa em apreço. Deste facto

nasceu um conjunto de circunstâncias que vieram, naturalmente, facilitar a

emergência das condições mínimas necessárias ao desenvolvimento da vertente

académica deste projecto. Para tal, concorreu, também, a explanação preliminar

junto da comunidades escolar, de que o objectivo nuclear do trabalho se centrava

no desenvolvimento de um processo de colaboração destinado a ajudar a escola a

tornar-se numa organização verdadeiramente inclusiva, ou seja, inventariar e

introduzir as mudanças estruturais e pedagógicas que viessem a ser consideradas

necessárias para continuar a assegurar a melhoria das respostas educativas, para

a generalidade das crianças ali atendidas e, de modo específico para os alunos

com NEE.

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Com este tipo de postura ia-se, entretanto, definindo, de maneira

transparente, que a finalidade académica do trabalho se inseria integralmente num

processo de maximizar a acção pedagógica da escola. Paralelamente,

socializava-se, a nível local, a ideia que de tal trabalho certamente iriam

benefeciar em particular os alunos com perfis educacionais mais complexos.

Dentro desta linha de pensamento e de acção, ficou então consensualizado e

estabelecido que a prioridade era o desenvolvimento local de uma escola

integralmente inclusiva. Neste cenário, o projecto de investigação - sobretudo no

seu figurino académico - passou a ser entendido fundamentalmente como um

meio, enquanto que a mencionada prioridade configurava o verdadeiro fim a

alcançar.

Durante este processo de clarificação de procedimentos foi, ainda,

assegurado aos elementos da gestão da escola - bem como ao conjunto de

professores - que a concretização do projecto de investigação não lhes iria

implicar sobrecargas significativas de trabalho. Esta precaução adveio do facto de,

uns e outros, terem, informalmente, feito sentir - aliás, com visível fundamento -

que o seu dia a dia profissional já era, por si próprio, bastante exigente - devido à

heterogeneidade e complexidade dos estilos de aprendizagem dos alunos - pelo

que seria pouca a sua disponibilidade para corresponder a eventuais pedidos de

trabalho-extra subjacentes à realização do trabalho académico em questão.

Entretanto, em Março do ano de 2000 teve lugar na escola, numa das suas

salas de aula, uma reunião dinamizada pelo autor deste trabalho com o objectivo

de clarificar os objectivos e as linhas gerais do projecto. Nessa reunião estiveram

presentes: o Presidente do Conselho Executivo, quatro representantes dos

professores (um por ano de escolaridade), um representante do pessoal da acção

auxiliar educativa e a presidente da Comissão de Pais. No fundo pretendeu-se,

com esta reunião, clarificar que:

a) Estava subjacente ao desenvolvimento do projecto o objectivo de obtenção

de um grau académico, concretamente, o doutoramento;

b) O trabalho a desenvolver se inseria no âmbito temático do projecto de nível

concelhio proposto, anteriormente, pelo Professor Doutor Miranda Correia e

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em que a escola já estava envolvida e comprometida, pelo que não iria

implicar nem sobrecargas de tarefas nem dispersão de temas.

Expostos os esclarecimentos subjacentes à integração do trabalho

académico no projecto de construção de uma escola inclusiva, verificou-se que

todos os presentes na reunião em causa se pronunciaram favoravelmente à

pretensão apresentada. Socializada e clarificada a forma precisa como iria

decorrer o trabalho académico - bem como o seu enquadramento no fluir da

reorganização funcional e pedagógica da escola - estavam, por conseguinte,

estabelecidas consensualmente as condições necessárias para o seu

desenvolvimento operacional.

Em função dos esclarecimentos prestados em torno da investigação e do

seu contributo para a realização das mudanças percepcionadas como

necessárias, constatou-se, portanto que a comunidade escolar não levantou

quaisquer entraves ao desenvolvimento do trabalho proposto. Antes, pelo

contrário, pois que se posicionou numa perspectiva de entendimento de que do

projecto de investigação poderiam resultar benefícios para as aprendizagens dos

alunos, nomeadamente dos alunos com NEE. Perante tais factos considerou-se

que a legitimação da vertente académica do trabalho ficou, assim, perfeitamente

conseguida.

4 Modo de Investigação

Em termos gerais, procurou-se que a planificação e o desenvolvimento

prático do presente trabalho decorressem, tanto quanto possível, em rigorosa

conformidade com os parâmetros estabelecidos pela literatura, no que concerne à

metodologia científica52 subjacente aos trabalhos de investigação. Aliás - como

opina Cáceres (1996) - o recurso à metodologia científica pressupõe,

paralelamente, a aquisição de conhecimento. Consequentemente, à realização do 52 Segue-se, neste âmbito, a concepção de metodologia expressa por Herman, 1983 (citado em Lessard-

Hébert et al., 1994, p. 15) o qual a define como “um conjunto de directrizes que orientam a investigação

científica”.

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presente trabalho esteve sempre subjacente a preocupação de se aprofundar e de

se alargar o pecúlio dos saberes pessoais, quer no âmbito educacional em geral,

quer muito particularmente no da concepção e operacionalização da educação

inclusiva.

A fim de se garantir um processo sistematizado e científico na condução do

projecto de investigação seguiu-se, em particular o que, neste campo, Judith Bell

(1997) preconiza. Assim - segundo a autora mencionada - para levar à prática um

projecto de investigação:

Será preciso seleccionar um tópico, identificar os objectivos do trabalho, planear e

delinear a metodologia adequada, escolher os instrumentos de pesquisa, negociar

o acesso a instituições, material e indivíduos; será também necessário recolher,

analisar, apresentar, a informação e, finalmente, produzir um relatório ou

dissertação bem redigidos. (1997, p. 13)

Efectivamente, a organização e a implementação do trabalho foram

desenvolvidas em conformidade plena com tais princípios orientadores, visando-

se assegurar, desse modo, a sua natureza sistemática, metódica e ordenada, ou

por outras palavras, a sua cientificidade. Neste contexto, era também crucial

seleccionar o tipo de abordagem a privilegiar, isto é, se seria uma abordagem do

tipo quantitativa, ou, pelo contrário, se uma abordagem do tipo qualitativa.

Ora como se referenciou, antes, o objectivo de um projecto de investigação

passa, entre outros aspectos, pela produção de conhecimentos, sendo, para tal,

fundamental a eleição do método adequado para a compreensão e descrição da

realidade a estudar. Mais uma vez - e para fundamentar a opção - se recorreu à

bibliografia da especialidade e, no caso vertente, ainda aos contributos de Judith

Bell. Através dessa consulta colheram-se fundamentos que permitiram, então

concluir que “a abordagem adoptada e os métodos de recolha de informação

seleccionados dependerão da natureza do estudo e do tipo de informação que se

pretenda obter” (1997, p.20).

Entendendo-se, entretanto, que não será relevante discutir, aqui, as

vantagens ou as desvantagens da investigação qualitativa, face às da

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investigação quantitativa, ou vice-versa, opta-se, ao invés, por se referir que se

optou por uma investigação do tipo qualitativa. Tal opção deveu-se, em primeiro

lugar, ao facto de que, tendo-se em conta a natureza do contexto da investigação,

bem como dos seus objectivos, a investigação qualitativa se perfilava como uma

hipótese perfeitamente adequada e em segundo lugar por merecer maior adesão

em termos pessoais. Em traços breves se apresentarão, de seguida, alguns

argumentos que, cientificamente, servem de fundamento à opção em análise.

Por exemplo, Bogdan e Biklen (1994) provam que o método de investigação

qualitativa conta, já, com uma consolidada tradição no campo educacional. Assim

- como referem explicitamente os autores em questão - a partir da década de

setenta do século XX, “a investigação qualitativa explodiu em educação” (p. 40).

Outra razão advém do facto desta metodologia assentar em fundamentos

humanistas, sob os quais se procura um envolvimento dialógico com a realidade a

investigar, com o fim de melhor a conhecer, como vinha a acontecer no caso

vertente. Realidade que é, ela própria, fruto da interacção humana e, por

conseguinte, inscrevendo-se no pressuposto idealista de que o mundo não é

dado, mas sim criado pelas pessoas que nele vivem (Cook & Reichardt, 1986).

A natureza do objecto de estudo parecia, portanto, compatível com uma

investigação do tipo qualitativa. Não para se procurar e garantir a produção de

resultados objectivos e generalizáveis, mas, sim, para se compreender

profundamente a realidade em causa, através da descoberta e da interpretação

dos seus significados, sendo estes, objecto de construção e de reconstrução por

parte das pessoas envolvidas, com base na suas experiências e acções em

contextos particulares (Ibañez, 1994).

Portanto, “os investigadores que adoptam uma perspectiva qualitativa estão

mais interessados em compreender as percepções individuais do mundo,

procuram compreensão, em vez de análise estatística” (Bell, 1997, p. 20). Esta

visão contraria, a priori, a perspectiva positivista, uma vez que esta anseia por

processos que produzam resultados que espelhem, fielmente, a realidade social,

enquanto que, por seu turno o enfoque qualitativo pretende aceder aos

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 314

significados que as pessoas atribuem às suas experiências, no mundo social onde

as desenvolvem (Miller & Glassner, 1997).

A subjectividade que está, de forma mais ou menos inerente à investigação

qualitativa pode, de algum modo, fragilizar a sua própria validade e fiabilidade no

que respeita às conclusões, sobretudo se se tiver como termo de comparação a

natureza dos dados normalmente fornecidos pela investigação quantitativa.

Efectivamente, estes, detêm, por norma, maior sentido de objectividade. Contudo,

há autores cuja opinião parece poder introduzir, neste aspecto, alguma

tranquilidade de consciência. Neste caso está por exemplo Bazerman (1988),

dado que a sua opinião vai no sentido de concluir que se torna inútil uma

discussão exaustiva sobre as virtualidades da investigação quantitativa, ou da

investigação qualitativa, uma vez que, no seu entender, não existe qualquer forma

ou modelo de investigação que desvende, com total rigor, a verdade absoluta.

Paralelamente, procurou-se, também, que o projecto de investigação se

enquadrasse, com o maior nível de compromisso possível, nos cânones

subjacentes ao rigor do método científico53. Para tal, foram considerados como

referência - e devidamente tidos em conta no trabalho prático - os princípios

estabelecidos pelos principais especialistas na matéria, nomeadamente, Ander-

Egg (1987). Este autor postula que para que um determinado método se enquadre

no domínio científico terá de ser respeitada a observância dos seguintes

requisitos:

a) Ser factual, no sentido em que os factos são a sua fonte de informação e de

resposta;

b) Transcender os factos: se bem que o método científico parta do

conhecimento dos factos particulares, não se detém neles, transcende-os

através de um salto do nível observacional para o nível teórico;

c) Respeitar certas regras metodológicas, devidamente formalizadas

(operações e procedimentos estabelecidos previamente) sem deixar de

lado a imaginação e a intuição;

53 Que León e Montero definem de um modo muito singelo: “conjunto de pasos reglados que utiliza la Ciencia

para la ampliación de sus conocimientos” (1995, p. 22)

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 315

d) Recorrer à verificação empírica para formular respostas aos problemas

formulados e para apoiar as suas próprias afirmações;

e) Confrontar, permanentemente, os procedimentos metodológicos com os

processos de verificação empírica, assegurando-se, desta forma, a auto-

correcção do método, bem como a sua progressão. Assim, as conclusões

estarão em conformidade com novos dados, não sendo, nem umas nem

outros, finais;

f) Divulgar e generalizar as suas formulações: o facto em particular interessa

enquanto se é membro de uma classe;

g) Ser objectivo enquanto se procura alcançar a verdade factual,

independentemente dos valores e crenças na ciência.

Relativamente a este conjunto de princípios preconizados por Ander-Egg,

impõe-se referenciar que, pela sua relevância, um deles merece uma análise

diferenciada. No caso, está em causa a crença expressa pelo autor de que as

formulações decorrentes da investigação poderão ser generalizadas. Julga-se,

contudo que no que concerne aos resultados produzidos por esta investigação

concreta, tal não deverá ser tomado à letra. Ou seja, afigura-se provável que os

procedimentos genericamente propostos possam ser generalizáveis a outras

realidades similares, porém, já a mesma perspectiva não parece ser, de todo,

aplicável aos resultados, por se afigurar que estes dependem, em larga medida,

da especificidade cultural, organizacional e profissional de cada contexto em

particular.

A realização de um trabalho desta natureza implicou um permanente estado

de preocupação reflexiva com o sentido de se tentar que, por um lado o processo

caminhasse no sentido de serem concretizados os propósitos que lhe estavam

subjacentes e, por outro, que a comunidade escolar envolvida percepcionasse,

tanto quanto possível, como seu, o projecto em causa. Dissecando-se, agora o

que até ao momento decorreu acha-se que aqueles princípios foram, sempre

respeitados, conquanto se tenha a consciência de que se tornou inevitável

conferir, em determinados momentos, uma certa direccionalidade pessoal no que

respeita aos rumos e conteúdos do trabalho desenvolvido, quer em termos de

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 316

pesquisa da literatura, quer em termos das opções metodológicas tomadas para o

desenvolvimento das várias fases do projecto.

Neste contexto, parece ser de referir que - como, de resto já foi acentuado -

a aceitação e o envolvimento dos actores locais, neste projecto, têm sido reais e

voluntaristas. Contudo, não é menos verdade que, em certa medida - como de

forma perspicaz sustenta Nast (1994) - o investigador - como é o caso - ao não

ser um elemento de pertença formal à comunidade que consubstancia o objecto

de estudo, acaba por não estar fora nem estar dentro, em termos absolutos, facto

que o torna, na maioria das situações, mais num interlocutor do que propriamente

num actor.

Neste tipo de prática investigativa, a dimensão do subjectivo é admitida

como algo natural, ainda que - como se procurou que acontecesse no

desenvolvimento prático do projecto - se deva privilegiar, tanto quanto possível, a

objectividade. Sob esta condição, procurou-se que o trabalho de recolha de

informação fosse concretizado de forma a que os resultados decorrentes viessem

a evidenciar, sobretudo, contornos nítidos de credibilidade. Para tal houve, sempre

o cuidado de se ir verificando criticamente, até que ponto aquela informação

correspondia, de forma coerente com a percepção do que se ia vivenciando e

conhecendo espontaneamente em contexto.

Como requisitos essenciais a levar em conta neste tipo de investigação,

adoptaram-se, em termos gerais, os elencados por Bogdan e Bicklen (1994). Os

requisitos em apreço são os seguintes:

a) A investigação qualitativa é descritiva;

b) Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que

simplesmente pelos resultados ou produtos;

c) Os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma

indutiva;

d) O significado é de importância vital na abordagem qualitativa.

De notar, também, que no contexto em análise, Kendall e Michael (1997)

salientam que os tempos actuais se caracterizam por uma verdadeira proliferação

de diversas modalidades de conceber e de compreender a realidade. Então -

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deduzem aqueles autores - qualquer uma dessas modalidades será legítima

desde que lute pelo objectivo de tornar o mundo cada vez melhor. Ora, como o

presente projecto parece, precisamente, posicionar-se numa linha de melhorar as

práticas educativas de uma comunidade escolar concreta - que consubstancia, de

alguma maneira, uma porção do mundo, a qual, embora minúscula, é tão

importante para os seus protagonistas como qualquer outra - julga-se, por

conseguinte que, também, por esta perspectiva, a metodologia adoptada se pode

considerar legitimada.

Entretanto, Sherman e Webb (1988) aludem, por sua vez, ao facto de a

investigação qualitativa se centrar em trabalhos inerentes a contextos que são

naturais e que, consequentemente deverão ser estudados no estado em que se

encontram. Perspectiva essa que acabou por presidir, de maneira praticamente

literal, ao desenvolvimento global do presente projecto.

Em suma, este tipo de investigação, privilegiou uma tónica eminentemente

naturalista54, parecendo, no caso presente, ser este, um atributo mais adequado

até, do que o termo qualitativo. E isto tendo em conta que os investigadores, sob o

paradigma naturalista, não estão preocupados em quantificar, medir ou contar os

dados obtidos, mas sim em apreender os seus sentidos sociais mais significativos

(LeCompte & Preissle, 1993).

Assim, o desenvolvimento do presente projecto de investigação subordinou-

se fundamentalmente, aos princípios da análise e da compreensão de uma

determinada realidade social55 com o fim de, a mesma, ser posteriormente

transformada de modo intencional, pelos seus próprios protagonistas. Sob este

ângulo de análise o modo de investigação aproxima-se da tipologia metodológica

do estudo de caso, sobretudo se entendido, como um trabalho de descrição 54 Na medida em que “o investigador frequenta os locais em que naturalmente se verificam os fenómenos em

que está interessado, incidindo os dados recolhidos nos comportamentos naturais das pessoas: conversar,

visitar, observar, comer, etc. (Guba, 1987, Wolf, 1979, citados em Bogdan & Bicklen, 1994, p.17) 55 Pelo que parece aproximar-se, também, da modalidade de investigação social, no sentido que lhe é dado

por Ander-Egg (1987) ao considerá-la como um “proceso que, utilizando el método científico, permite obtener

nuevos conocimientos en el campo de la realidad social (investigación pura) o bien estudiar una situación para

diagnosticar necesidades y problemas a efectos de aplicar los conocimientos con fines prácticos

(investigación aplicada) (p. 59).

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minuciosa “sobre uma organização específica, ao longo de um período

determinado de tempo”, como referem Bogdan e Biklen (1994, p. 90). Neste

enquadramento, esta investigação pode, ainda, ser encarada sob a lógica de uma

perspectiva de teoria local dado que “a sua aplicação está limitada a um dado

meio” como assinalam Schibeci e Grundy (1987), citados em Léssart-Hérbert et al.

(1994).

Em resumo, as propriedades do alvo de qualquer investigação, situam-se

ao longo de um determinado continuum que vão desde uma natureza nitidamente

real, aberta e não controlada até a uma natureza artificial, fechada e controlada.

Logo os modos de investigação tenderão a ser empregues segundo o tipo da

natureza do assunto, ou problema a investigar, sendo que quando este se

configura como algo de real, aberto e não controlado se aconselha a metodologia

qualitativa do estudo de caso, ao passo que para um objecto de estudo de

natureza fechada, artificial e controlada se deverá privilegiar a metodologia

quantitativa sob a lógica da simulação. Para situações intermédias tendem a ser

utilizadas metodologias qualitativas ou quantitativas, sob a lógica da comparação

ou da experimentação. A Figura 6 dá, desta matéria, uma visão bastante

elucidativa.

Estudo de caso

Comparação

(amostra)

Experimentação

(terreno/laboratório)

Simulação

Real Artificial Aberto Fechado Incontrolado Controlado

Figura 6. Continuum dos modos de investigação, segundo De Bruyne, P., Herman, J. e

De Schoutheete, M. (1975), reproduzido em Lessart-Hérbert et al. (1994, p. 168)

Para além de se haver optado pelo paradigma qualitativo, perfilhou-se,

dentro deste, a adopção de uma perspectiva crítica no sentido que lhe é dado por

Habermas (1978). Este autor pressupõe que tal sucede - como é o caso - quando

a investigação consubstancia uma acção orientada para o conhecimento reflexivo

e compreensivo da realidade, a partir da análise das praxis ali existentes e com a

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finalidade de as transformar. Deste modo, o envolvimento interactivo entre o

investigador e os actores dessas praxis, gera uma dinâmica contínua de

conhecimento e de transformação em que um e outros são, simultaneamente,

sujeitos e objectos. Trata-se, em suma, de uma investigação com um sentido

pragmático, logo subordinada a um critério de transformação da realidade

pedagógica, uma vez que:

A investigação que tenha por único objectivo o aperfeiçoamento do discurso

teórico sem a confirmação de uma transferência possível para as aplicações profissionais torna-se cada vez mais desacreditada. (. . . ) A investigação deverá

ter, acima de tudo, uma pertinência socioprofissional, ela deverá aderir à prática

mais do que à estética da argumentação formal. (Van der Maren, s.d., citado em

Lessard-Hébert et al., 1994, p. 87)

A vinculação dos processos de investigação, aos parâmetros de um

questionamento crítico, permite orientar aqueles para uma estratégia operativa de

compreender e de transformar a organização e o funcionamento escolares, em

função dos objectivos finais que os seus protagonistas assumiram, de forma activa

e consensualizada. Agindo deste modo, os actores do processo chamam a si, a

tarefa de redimensionar as suas práticas, a partir - como referem Carr e Kemmis

(1986) - de um olhar para dentro. Vista desta maneira, a investigação qualitativa

proporciona e facilita a emergência de um clima de aprendizagem recíproca que,

protagonizada e desenvolvida convergentemente pelo conjunto dos seu

protagonistas - investigador e alvos da investigação - acaba por beneficiar cada

um deles (Kendall & Michael, 1997).

Assim, a investigação educacional posicionada numa perspectiva

simultaneamente social e crítica, visa, antes de mais, conhecer e compreender as

acções reais, através do desenvolvimento regulado de processos de comunicação

reflexiva e dialógica entre os seus actores. Nesta lógica, o diálogo deverá estar

intrinsecamente comprometido e orientado para a necessidade de colocar em

prática os procedimentos necessários ao processo de transformação pretendido.

Uma vez que esta investigação admite como pressuposto de base a

ocorrência de futuros processos de mudança, pretendeu-se que os profissionais

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da escola envolvida, fossem previamente informados de quais os procedimentos a

desenvolver para a identificação rigorosa e metódica dos rumos dessa mudança.

Com esta preocupação pretendeu-se operacionalizar o princípio de que os

agentes educativos locais deveriam acompanhar de modo participativo,

esclarecido e crítico, todos os passos a dar no desenvolvimento de um projecto no

qual, ao fim e ao cabo, detêm o lugar de protagonistas principais

Sob esta lógica, a comunidade escolar em causa, ia percepcionando e

confirmando a necessidade de mudar e, ao mesmo tempo, compreendendo que,

para tal, seria necessário tomar consciência profunda dos caminhos e dos

conteúdos subjacentes a essa mudança. Paralelamente, gerava-se a consciência

de que estava em curso um trabalho capaz de contribuir para o aperfeiçoamento

dos conhecimentos dos agentes educativos envolvidos, bem como dos seus

saberes-fazer e dos seus modos de actuar colectivamente.

Com a observância prática daqueles princípios, os elementos da

comunidade da escola acabaram também por percepcionar a consciência de que

iriam ter uma oportunidade local e interna de ver reforçados os seus níveis

teóricos e práticos de autonomia profissional. Ao mesmo tempo iam, igualmente

assumindo que a compreensão e transformação da realidade pressupõe uma

abordagem dos factos sob uma visão e uma acção de natureza investigativa.

Em todo o desenvolvimento prático deste ciclo de trabalho tem estado,

assim, presente um processo contínuo e continuado de uma permanente

interacção comunicativa, entre o investigador e a comunidade escolar . Sob esta

estratégia visava-se - de maneira dialéctica e intrinsecamente informal - a

discussão e a consensualização, quer de cada ponto de situação do processo,

quer da identificação dos itinerários a trilhar futuramente para que venham a ser

atingidos os objectivos finais.

O desenvolvimento da pesquisa e da recolha de informação teórica e de

campo, bem como do delineamento do plano de intervenção, seguiu, portanto, um

curso muito suportado por procedimentos regulares de contacto com a realidade

funcional da escola. Esta linha de actuação permitiu um conhecimento tão

vivenciado, quanto significativo daquela realidade ao mesmo tempo que ia

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orientando e fundamentando a própria revisão da literatura. Tal haveria de ter

como efeito real o facto de que a informação sucessivamente recolhida permitisse

iluminar intensamente a situação em estudo, facilitando, desta forma, a percepção

e a compreensão profundas dos seus significados.

A conjugação Interactiva de todos os factores em jogo - informação

recolhida e a multiplicidade prolongada de contactos com a escola - deu, ao

investigador, um conhecimento privilegiado sobre a organização escolar em

estudo. Tal era, de resto, reconhecido pelos docentes locais, pois que os mesmos

frisavam nas conversas do seu quotidiano que o autor deste trabalho era uma das

pessoas que mais e melhor estavam por dentro da realidade da escola.

De algum modo, por conseguinte, se poderá justificar que a construção

teórica deste projecto, se tenha efectuado de forma paralela a uma permanente

leitura do real ou, por outras palavras, que se procurou consistentemente que a

sua componente teórica apresentasse uma significativa conexão lógica com o

campo concreto a que se reporta. Desta maneira se diligenciou, também,

assegurar que a configuração do plano de mudanças a apresentar, se encaixasse

o mais ajustadamente possível no contexto em causa e lhe conferisse, portanto,

uma continuidade intrinsecamente natural, na concretização das metas

perspectivadas. Paralelamente procurou-se evitar sempre, que a relação bastante

informal detida com a comunidade escola em estudo, configurasse quaisquer

constrangimentos à prossecução de um rigoroso carácter científico em todo o

processo de inovação escolar.

Como sequência desta atitude de recorrência interactiva entre a evolução

da investigação e a intensificação progressiva do conhecimento da realidade,

emergia a convicção de que o projecto mantinha um acentuado cunho de

contextualização, ou seja de que os resultados provenientes da pesquisa teórica

detinham um elevado grau de adequação à realidade em estudo. Deste modo iam

ficando cada vez mais claros, por um lado, os percursos trilhados pela

comunidade escolar e, por outro, os caminhos que deveriam ser percorridos para

que a mesma se abeirasse do modelo de escola inclusiva desejado.

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Com os sucessivos processos de comparação empírica entre os resultados

do trabalho de investigação teórica e os provenientes do conhecimento e da leitura

pessoais da realidade local, eram construídos, progressivamente, renovados

enfoques de entendimento conceptual daquela realidade. Daqui ia decorrendo

uma cada vez maior experiência de análise informal da situação escolar a qual

permitia, por sua vez - através do recurso ao contributo da literatura - um contínuo

e valioso aprofundamento da compreensão dos significados inerentes à acção

educativa dos actores locais. Mas se, por este processo, muitos dos significados

iam sendo entendidos, outros aspectos emergiam, entretanto cuja significação não

se afigurava tão nítida. Face a este quadro importava, então, intensificar, de novo,

a procura na literatura, a fim de encontrar informação que permitisse enquadrar e

clarificar aqueles dados emergentes.

Como resultado de toda esta dinâmica, ganhava corpo a sensação de que,

em momento algum, se considerou encerrado qualquer ciclo deste trabalho. Pelo

contrário, cada vez - e foram muitas - que surgiam dados cuja compreensão não

era clara, encetava-se de imediato um renovado processo de consulta de

informação teórico-científica até que fossem recolhidos elementos que facilitassem

a integração, daqueles dados, no património da informação que já tinha sido

objecto de conceptualização compreensiva. Trata-se, pois, de um processo que se

tem mantido - e se manterá, certamente - permanentemente em aberto.

A contínua azáfama de actualização, antes referida, ia provocando,

obviamente, uma incessante clarificação dos caminhos a seguir. Daí que quando o

presente relatório estiver formalmente terminado é muito provável que a pretensa

realidade que o mesmo pretende retratar, esteja já, num outro patamar de

desenvolvimento, o qual, por sua vez, não será , ainda definitivo, se é que alguma

vez o virá a ser.

São, pois, estes - e eventualmente outros ainda não totalmente

identificados - os riscos advindos de um projecto cujo alvo de estudo é a acção

humana. Esta é, por definição, geradora permanente de novos significados que,

dia a dia, vão modificando, de forma irreversível, a realidade do dia anterior. Essa

modificação conquanto imparável, pouco tem de linear. Umas vezes parece que

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tudo vai bem. Outras há em que tudo parece que vai descambar. Ao longo deste

trabalho tudo isto tem acontecido. E, assim, se tem a certeza de que se vai no

caminho certo, já que se está envolvido num campo de pura intervenção humana

e que esta se tem caracterizado, sempre, pelo seu elevado grau de

imprevisibilidade. Quando tal deixar de acontecer ... muito provavelmente também

deixará de acontecer a própria vida humana.

A notória carga de informalidade com que o trabalho tem sido desenvolvido

localmente não tem, todavia, impedido que fossem identificadas e concretizadas

determinadas directrizes com a intenção, sobretudo de garantir quer a sua

intencionalidade metodológica, quer a sua regulação dinâmica. Sob esta lógica,

foram então definidas as seguintes estratégias de actuação:

• desenvolver a acção investigativa a partir da história real da comunidade

escolar;

• partilhar, periodicamente, os resultados dessa investigação, com o

colectivo de profissionais da escola;

• considerar a organização escolar e as práticas pedagógicas como

procedimentos hermenêuticos e objectos de reflexão crítica;

• induzir a futura necessidade de integração dos contributos teóricos nas

culturas e práticas existentes, de forma reflexiva, compreensiva e

contextualizada;

• sensibilizar os docentes para se considerarem, a si próprios, como agentes

de mudança;

• promover o entendimento da sala de aula como um espaço de

investigação;

• considerar os efeitos das práticas pedagógicas como objecto de reflexão e,

em consequência, de inovação;

• construir, a partir dos percursos efectuados pela comunidade escolar - e

com base nos dados da investigação - o modelo referencial de escola

inclusiva;

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• assegurar o compromisso de, ao longo do ciclo seguinte de trabalho,

apoiar, interactivamente, a introdução das restantes mudanças

conducentes à implementação do modelo referenciado de escola inclusiva.

Como princípio indutor das estratégias elencadas, elegeu-se a ideia de que

se estava perante um grupo de docentes eivados de uma intenção autónoma para

a investigação e reflexão centradas na sua realidade quotidiana. Desse modo,

aqueles iam intensificando a compreensão da realidade que edificaram e em que

se movem para, a partir dos resultados desse processo de análise, poderem, de

maneira esclarecida, reconstruir, pela acção, a realidade em causa, fazendo com

que esta se aproximasse das metas propostas.

Sendo - como empiricamente se pode comprovar - a prática pedagógica,

uma acção de natureza instrumental, parece, pois, fazer todo o sentido que os

seus autores e actores se responsabilizem pelo seu contínuo aperfeiçoamento,

mediante o recurso a formas colectivas e sistemáticas de análise reflexiva, de

investigação e de reformulação. Redescobrindo, ciclicamente, no interior das suas

práticas, novos sentidos para os percursos de uma continuada melhoria, cada

docente projectará na estrutura organizacional da respectiva comunidade escolar,

elementos que, conquanto parciais, vão consolidando uma dinâmica convergente

de inovação capaz de garantir, a cada momento, uma resposta, tão optimizada

quanto possível, ao painel de necessidades que os alunos configuram. Desta

forma, a comunidade escolar converte-se num colectivo de actores que,

reinterpretando, continuamente, os elementos advindos de processos de análise e

de reflexão centrados nas suas próprias práticas, evidenciam uma capacidade

convicta mas flexível de ajustar a sua oferta às expectativas e necessidades da

procura.

Face à argumentação apresentada importava, então, que fossem criadas

condições que permitissem aos professores participantes agir como

investigadores das suas próprias práticas. Como o núcleo crucial destas práticas

incide no desenvolvimento do currículo em sala de aula, tornava-se evidente que o

processo de mudança teria que passar, quer por uma auto-análise crítica da acção

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curricular ali em curso, quer por uma intenção prospectiva de adequar aquelas

práticas aos propósitos da educação inclusiva.

No fundo, visa-se, fundamentalmente, uma verdadeira inovação das formas

de gestão curricular, na sala de aula. Este propósito tem a sua razão de ser no

facto de se ter constatado in loco que se centrava precisamente na gestão da sala

de aula um dos aspectos cujo estado indiciava maior distanciamento em relação

ao que, na mesma dimensão, recomendam os teóricos e os investigadores.

Neste campo, Ângulo (1990) considera ser de enorme transcendência o

facto de os docentes adquirirem competências sólidas no campo da investigação

activa e crítica, para que mediante o recurso sistematizado e intencional a tais

saberes empreendam alterações fundamentadas a nível de gestão do próprio

currículo. Assim - ainda segundo aquele autor - ao reflectirem, por exemplo, sobre

os princípios e conteúdos curriculares formal e oficialmente propostos, os

professores poderão percepcionar nos mesmos, ideologias, valores e concepções

que considerem menos éticos, mas que de alguma maneira continuam

subjacentes aos modelos sociais vigentes. Discordando, assim, daqueles

componentes curriculares, os docentes devem ser encorajados a alterá-los,

dando-lhes um sentido mais próximo dos valores e das crenças que entendam ser

mais correctos.

Agindo daquela maneira, os professores podem tornar-se, por conseguinte,

sujeitos de uma acção susceptível de contribuir para a transformação futura da

própria sociedade, melhorando-a. Neste caso concreto, os ideais da inclusão

prefiguram valores que, se implementados nas novas gerações, contribuirão, sem

lugar para dúvidas, para o advento seguro de uma futura sociedade melhor.

Trata-se, pois, de um agir. Um agir que decorre dos resultados de um

reflectir, isto é, de um pensar. Julga-se, no entanto, que estes agir e pensar só

terão significado se, por sua vez, se plasmarem no campo do sentir. Por

consequência, acha-se crucial que, neste âmbito, os protagonistas desenvolvam,

antes de tudo, uma adesão afectiva e intencional aos propósitos da mudança em

emergência.

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Sentindo - emocionalmente falando - a importância e o alcance da mudança

em questão, os docentes saberão, então, encontrar motivos profundos para lhes

dar efectividade prática e paralelamente desenvolver sinergias internas que

alimentarão a persistência e os esforços necessários. Provavelmente, esta será a

fórmula para não desistirem enquanto não sentirem que foi alcançado o seu

desiderato. Por isso, ao longo de todo o trabalho institucional desenvolvido sob o

objectivo de construção de uma escola inclusiva, se tem procurado que os

membros da comunidade local se envolvam neste projecto, de modo literalmente

integral, ou seja agindo de modo interactivo com o que vão pensando e sentindo.

Qualquer comunidade escolar, enquanto cenário de interacção e de

comunicação sociais, pressupõe, inevitavelmente, a ocorrência de determinados

conflitos. Logo, há que encarar este facto como algo que se torna imperativo

equacionar, analisar e resolver com proveitos para a própria intenção de melhorar

a acção educativa. Nesta perspectiva, o conflito, enquanto manifestação

transparente e explícita de opiniões diferenciadas, terá de ser, igualmente,

entendido como objecto de investigação reflexiva, cujos resultados, após

devidamente debatidos e consensualizados, deverão ser reinvestidos nos

processos e dinâmicas - assumidos institucionalmente - de procura do encontrar

novas formas de melhor responder às necessidades dos alunos.

Perfilha-se, portanto, a tese de que o docente é entendido como um

profissional capaz de investigar, na - e pela - acção, de partilhar e de discutir

perspectivas diferenciadas. Paralelamente e, através de sucessivos processos de

procurar consensos, deverá ser capaz de contribuir para a sistematização de um

corpo teórico que ilustre, legitime e dê sentido às suas práticas pedagógicas.

Nesta perspectiva, o aluno deverá ser considerado como um sujeito

activamente implicado na procura de saberes que possibilitem a construção da

sua autonomia e propiciem o seu adequado desenvolvimento humano. Nesta

lógica, o processo de investigação enquadra-se numa óptica epistemológica de

natureza construtivista, a qual pressupõe - como insistentemente se proclamou

anteriormente - que o conhecimento é produzido pelos sujeitos da acção, a partir

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 327

de processos reflexivos centrados nas suas práticas e sob dinâmicas de

comunicação colectiva.

A orientação construtivista imprimida a este trabalho, no sentido em que os

participantes são actores determinantes dos processos e dos resultados, ia

implicando, entretanto, a adopção de estratégias metodológicas coerentes com

aquele pressuposto.. Consequentemente, privilegiou-se a adopção de uma atitude

eminentemente crítica para a interpretação e compreensão da realidade em

estudo. Pretendeu-se então que essa atitude figurasse, por sua vez, como um

comportamento indutor de atitudes semelhantes por parte dos intérpretes locais,

nomeadamente de auto-crítica, a fim de ser assegurada uma implicação reflexiva,

consciente e autónoma da comunidade escolar em todas as fases do projecto de

mudança.

Tratando-se de uma mudança com sentido, o projecto em causa ganhava,

por esta razão, estatuto de inovação, sendo esse sentido representado por um

modelo de escola inclusiva, delineado a partir do cruzamento do conhecimento e

interpretação da realidade, com os conteúdos insertos na literatura de incidência.

Sob esta orientação visou-se garantir -repita-se - que o modelo em causa fosse,

entretanto, percepcionado como pertinentemente ajustado à cultura da

comunidade local e, em função desse facto, assumido como a referência

prospectiva e desejada por todos quantos estão, implicada e activamente

envolvidos, neste projecto de mudança.

Em todos os passos e momentos da investigação tem estado presente,

portanto, o princípio ético de implicar o colectivo de agentes da comunidade

escolar, de forma reflexiva e activa, na compreensão e implementação do

projecto. Deste modo o processo investigativo proporcionava, ao longo do seu

curso, a partilha do pensamento e de acção, entre todos os seus protagonistas,

inscrevendo-se, por conseguinte - e de acordo com a perspectiva apresentada por

Carr e Kemmis (1986) - num quadro de racionalidade emancipatória.

As estratégias de desenvolvimento deste projecto de mudança, operadas,

sob intuitos de promover a articulação convergente entre a acção individual e o

labor colectivo, iam gerando tanto a consolidação do sentido comunitário, no seio

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 328

da organização escolar, como o reforço da autonomia dos processos de repensar

e de refazer escola. Para que estes procedimentos fossem concretizados de forma

voluntariosa e assumida, tornava-se naturalmente necessário encontrar, debater e

consensualizar os respectivos fundamentos. Esta estratégia de implicar

esclarecidamente os actores locais em todas as fases da mudança

consubstanciou, portanto, uma preocupação que se tem mantido como uma

orientação nuclear - e permanente - ao longo da concretização de todo o trabalho.

Neste contexto, a modalidade de investigação-acção por consistir “na

recolha de informações sistemáticas com o objectivo de promover mudanças

sociais”56 como explicam Bogdan e Biklen (1994, p. 292), parece, assim configurar

o recurso metodológico que, por excelência, melhor se ajusta e serve os princípios

norteadores do projecto. Seguindo-se os passos estratégicos desta modalidade de

investigação - e ainda de acordo com aqueles autores - operacionalizaram-se,

sucessivamente, ao longo do trabalho, os seguintes tipos de análise:

1. compreensiva e rigorosa da realidade a investigar (logo, atenta aos

pormenores);

2. sistemática, ou seja, mediante o desenvolvimento de um processo intenso

e alongado no tempo orientado para o conhecimento da realidade que era

objecto de investigação;

3. crítica, portanto, sujeita a apreciação reflexiva, em cada passo dado;

4. cíclica, isto é, através de um trabalho desenvolvido em sucessivas fases de

investigação, de reflexão e de acção.

A operacionalização prática daqueles processos - e segundo os princípios

metodológicos referidos - ia criando condições e matéria para a construção do

plano de intervenção necessário ao aperfeiçoamento da organização escolar.

Pretendia-se, com aqueles procedimentos, a identificação fundamentada e segura

dos passos a dar para a construção efectiva de uma escola inclusiva.

56 Alguns autores utilizam a expressão investigação aplicada com um sentido muito similar, como por

exemplo, Ander-Egg (1987) que considera ser, aquela, uma investigação que procura conhecer para fazer e

para actuar.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 329

Entretanto - e como acontece noutros campos da investigação educativa - a

não consensualização conceptual também se faz sentir no âmbito da investigação-

acção, facto do qual resulta, naturalmente, a existência de mais do que uma

definição desta expressão. Assim, para além da proposta nocional de Bogdan e

Biklen, antes mencionada, outras sugestões coexistem.

Neste contexto refere-se, como outro exemplo, a apresentada por Elliot

(1990) que considera ser a investigação-acção um meio de pesquisa vocacionado

para facilitar a interpretação do que acontece, a partir do ponto de vista dos que

actuam e interactuam no contexto de uma determinada situação-problema. Assim,

Elliot valoriza, essencialmente, o pensamento dos actores e não tanto os

contributos da pesquisa literária.

Já para Martinez (1996) a investigação-acção é uma metodologia de

trabalho que procura, não apenas recolher informação para descrever um

problema, mas também propiciar o desenvolvimento de um ciclo de acções

recorrentes para o solucionar. Estão, pois, presentes de forma muito clara, na

opinião conceptual deste autor, as componentes quer da investigação, quer da

acção.

Em jeito de síntese das opiniões apresentadas julga-se, então, apropriado o

entendimento de que a metodologia de investigação-acção pressupõe a

articulação interactiva e cíclica entre quatro actos: conhecer, planear, intervir e

avaliar. Resta, então, aqui, acrescentar que o presente projecto de trabalho se

enquadrou, rigorosamente, na lógica de tais princípios.

Através da investigação-acção o contacto informal emerge, também, como

algo natural entre os distintos actores envolvidos, facilitando, desta maneira, a

compreensão da realidade e a natureza da sua representação, por parte dos

agentes que a materializam. Possibilita, também, a emergência de processos de

questionamento reflexivo, por parte daqueles protagonistas, àcerca das práticas

em curso a nível da instituição escolar (compreensão da realidade) a fim de as

melhorar (transformação da realidade) sob a ideia de um compromisso grupal.

Neste quadro, parece resultar claro que a compreensão e a posterior

transformação da realidade institucional pressupõem a mobilização sequencial,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 330

primeiro de uma postura crítica face ao que é no momento e, depois, de uma

acção intencional de mudança susceptível de a conduzir, no futuro, ao que deve

ser.

No desenvolvimento operacional das actividades a que o presente relatório

se refere, procurou-se, no quadro dos processos nucleares integrantes do modelo

da investigação-acção, o cumprimento do seguinte:

a) Investigação e reflexão – Conhecimento rigoroso, crítico e sistemático da

realidade do momento e pesquisa de informação teórica na literatura de

incidência;

b) Planificação – Elaboração de um modelo de escola inclusiva adequado à

realidade estudada e estruturação de um plano de intervenção tendente a

transformar a situação actual na situação desejada.

c) Intervenção – Activação metódica de procedimentos orientados para a

resolução dos problemas considerados como mais prementes mediante a

análise da situação encontrada e em contraponto com a situação almejada.

d) Avaliação – Realização ponderada de um balanço de toda a acção já

desenvolvida de modo a serem usados os resultados decorrentes, como

elementos seguros e fiáveis para determinar com precisão o novo ciclo de

actividades.

Logo, o termo ciclo é aqui interpretado como “um conjunto ordenado de

fases que, uma vez completadas, podem ser retomadas para servirem de

estrutura à planificação, à realização e à avaliação de um segundo projecto e

assim sucessivamente” (Lessard-Hébert, 1996, p.15). Assumiu-se, assim, no

desenvolvimento deste trabalho, uma perspectiva metodológica traduzida, por

conseguinte, num procedimento sistematizado de investigação-acção. Nesta

perspectiva as metodologias concretizam-se sob o modelo de um ciclo em espiral

em que este “ não é um ciclo vicioso, porque cada novo ciclo é enriquecido pelo

ciclo anterior, de que é a continuação; não se trata portanto de repetir, de andar

em círculo” (idem).

Presentemente (altura em que é redigido este relatório) considera-se então

concretizado, praticamente, o primeiro ciclo desta investigação-acção. Sem dúvida

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aquele que contém os elementos fundamentais para viabilizar a concretização de

todo o projecto. Ao mesmo tempo fica, também, perfeitamente delineado o trajecto

a ser trilhado ao longo da realização da etapa seguinte. Esta, por seu turno, terá

lugar - conforme o compromisso localmente assumido - imediatamente após a

ultimação da presente dissertação.

Torna-se, ainda, neste quadro relevante referir que no âmbito de um

processo de investigação-acção cientificamente inspirado, ao conceito de

realidade está subjacente o sentido de uma articulação estreita entre teoria e

prática e vice-versa, condição indispensável para que, quer o conhecimento dessa

realidade, quer o processo da sua transformação, se reportem a um corpo

doutrinário que lhes confira inteligibilidade e legitimação. Localizam-se, desta

forma, nesta interacção dialéctica entre a teoria e a prática, os fundamentos

científicos que permitem orientar, metodologicamente falando, a acção a

desenvolver por uma comunidade escolar que deseja inovar a sua cultura

organizacional, como é o caso vertente.

Surge, então aqui, de modo que se julga perfeitamente justificado, a

perspectiva da metodologia de investigação-acção preconizada, já, na década de

cinquenta do século XX (mais precisamente em 1953) por Stephen Corey, o qual,

na sua qualidade de professor do Teacher’s College da Universidade de

Columbia, publicou uma obra sobre esta matéria em que aquela metodologia era,

já, considerada como um método adequado para melhorar as práticas escolares.

Corey preconizava, assim, a ideia de que fundamentalmente, a investigação-

acção consistia no desenvolvimento de processos investigativos, centrados nas

organizações escolares concretas e que ajudavam os professores implicados, a

analisarem, a compreenderem e a melhorarem as suas práticas educativas. Sob

este princípio houve, pois que ter em conta - como já se frisou, antes - o primado

de se considerarem os actores locais como os verdadeiros protagonistas da

mudança, ajudando-os a identificar os problemas decorrentes das suas práticas

de modo a que fossem estes o alvo da investigação e não os problemas teóricos

antecipadamente concebidos ou definidos pelo investigador (Elliot, 1990). Esta

visão tem pontos de contacto com a perspectiva entretanto defendida por Donald

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Schon (1981) uma vez que este teórico concebe o professor como um profissional

reflexivo e, por consequência, como alguém que analisa, de modo sistemático, a

sua prática docente com o fim de a melhorar, transformando-a.

Como já foi dito, à medida que o projecto se ia desenrolando avançava,

igualmente, um contínuo processo de transformação da própria forma pessoal de

pensar. Este facto revelou-se de extraordinário interesse, já que colocava, em

permanente situação de dúvida, muitas das certezas, anteriormente

percepcionadas como tal. Efectivamente, a ordem metodológica que as

circunstâncias iam ditando, depressa relegou para um plano secundário, a

sequência racional que fora previamente estabelecida.

Como também já se referenciou, os contínuos contactos com a realidade

implicavam novas consultas bibliográficas, ou a reorientação de pesquisa nas

obras já consultadas e cujos resultados, não raro, sugeriam um questionamento

da mesma situação, sob um diferente ângulo de análise. Daí que os processos da

pesquisa literária, do conhecimento da realidade e do gizar do plano para a sua

transformação, não tenham sido desenvolvidos em espaços de tempo específicos,

linearmente sequencializados e diferenciados, antes pelo contrário.

O que realmente tem vindo a suceder é que, ao longo do desenvolvimento

do trabalho se tem verificado o desenrolar de um processo em que o

conhecimento da realidade, a pesquisa bibliográfica e a planificação da acção de

transformação avançam paralelamente. Consequentemente, influenciam-se

mutuamente, gerando uma constante dinâmica de reformulação.

Todos estes factos provocam sem dúvida - há, disso, perfeita consciência -

alguma perplexidade metodológica. Porém, tal parece susceptível de alguma

desculpabilização na medida em que, a tudo isto, tem estado sempre subjacente a

intenção primordial de se procurarem formas de se obterem os melhores

resultados possíveis, para a comunidade envolvida e, nomeadamente, para o seus

alunos, sobretudo para os alunos com NEE. Por outras palavras: a linearidade

metodológica esteve sempre subordinada aos processos de melhoria das

respostas da comunidade escolar estudada e não o contrário.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 333

5 Fontes e Técnicas de Recolha de Informação Nesta secção parece ser de recolocar previamente uma questão

anteriormente aflorada a qual ganha agora renovada acuidade. Efectivamente já

foi explicitado que os procedimentos metodológicos inerentes ao desenvolvimento

prático deste trabalho não seguem os parâmetros clássicos. Tal deve-se,

sobretudo, ao facto de o seu autor deter um conhecimento deveras significativo da

organização e funcionamento da escola-alvo do trabalho em questão. Daqui

resultou, por exemplo, que o grande investimento a ser feito em termos de recolha

de informação não se centrasse no campo do objecto em observação - este era,

pois, já bastante conhecido - mas, sim, na obtenção de dados científicos que

permitissem conceptualizar com credibilidade e em pormenor, um modelo de

escola inclusiva que abarcasse toda aquela orgânica institucional e,

simultaneamente, se adequasse à sua cultura. Logo, o processo mais relevante de

recolha de informação centrou-se no âmbito da pesquisa literária, dado que seria

neste contexto que se poderiam obter dados fidedignos para encontrar as rotas

mais adequadas às respostas para duas das perguntas de partida, oportunamente

formuladas: a) O que é, em rigor e profundidade, uma comunidade escolar inclusiva? b) O que deve ser implementado localmente para que seja conseguida a

aproximação, do estado encontrado, à situação de escola inclusiva, segundo o modelo adoptado? Sendo, portanto, crucial, a informação recolhida na literatura científica para

a obtenção das respostas àquelas questões, entende-se estar perfeitamente

justificada a dimensão que a mesma ganhou neste projecto de investigação,

sobretudo quando comparada com a chamada informação de campo. A propósito

convém desde já adiantar que esta última (informação de campo) visou responder,

consequentemente, à restante pergunta de partida:

Em que ponto está a comunidade escolar em estudo, face a um determinado modelo de escola inclusiva?

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 334

Após a definição, tanto da situação problemática, como dos processos e

princípios norteadores da investigação propriamente dita, configurou-se, então, um

plano de recolha de informação em ordem a coligir dados susceptíveis de

configurar respostas às questões formuladas. Como se explicou atrás, a recolha

de informação literária forneceu matéria para responder às questões relacionadas,

tanto com o modelo de escola inclusiva adoptado, como o conteúdo necessário à

planificação da transformação da escola para ali chegar. Paralelamente, com a

recolha de informação de campo pretendeu-se a obtenção de dados que

permitisse, por um lado, aprofundar a caracterização - nos seus aspectos mais

significativos - da estrutura escolar, bem como do seu meio envolvente e, por

outro, conhecer, de maneira mais entranhada, a história da organização e da

cultura escolares, principalmente nos aspectos mais relacionados com a

problemática do atendimento a alunos com NEE. Através da informação de

campo tentou-se, pois, compreender, de modo objectivo, a natureza matricial da

cultura de origem dos alunos da escola e, paralelamente, chegar-se a um nível

mais aprofundado e aferido da compreensão dos percursos e das práticas,

entretanto já concretizados pela comunidade escolar, na sua caminhada em

direcção ao ideal de uma escola inclusiva.

Nesta etapa do projecto, pretendia-se, então, clarificar de forma

compreensiva, uma das facetas cruciais da situação-problema, neste caso

concreto, determinar, com a maior precisão possível, o ponto em que se situava a

comunidade em estudo no seu projecto de construção da escola inclusiva. Este

aspecto revestia-se, naturalmente de importância quase que transcendente, já

que, do grau de rigor com que, o mesmo, fosse determinado, dependeria, em

grande parte, o nível de precisão e de pertinência das fases seguintes e do próprio

projecto de investigação.

A consciência daqueles factos levou a que, preliminarmente, fosse feito um

exercício aturado de auto-reflexão sobre o conhecimento tanto informal como

intrínseco, até então, detido, em termos pessoais, sobre a organização e o

funcionamento da escola. Tal procedimento visou não só fundamentar a escolha

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 335

das eventuais fontes a recorrer para a recolha da informação complementar, mas,

também, para identificar as melhores formas de questionar as fontes em causa.

Havia, portanto, a consciência de que esta etapa da investigação

consubstanciava um marco significativamente nevrálgico no desenvolvimento de

todo o projecto de trabalho, pelo que à mesma se dedicou uma atenção muito

profunda, sobretudo no que respeitou à recolha da informação acrescida sobre o

conhecimento das atitudes e das práticas inclusivas da escola. Tratava-se, aqui,

de se recuperar e de confirmar - ou até de se acrescentar - informação susceptível

de identificar com rigor e nitidez, os contornos do próprio objecto de investigação,

os quais, por seu turno, seriam decisivos para iluminar com fiabilidade, os

caminhos a trilhar nas fases seguintes.

Jogavam-se, neste aspecto particular, muitos dos factores que poderiam vir

a inibir, ou a facilitar a qualidade e a pertinência de todo o trabalho. Conhecia-se

relativamente bem o terreno e os actores que eram objecto de análise. Porém,

achou-se imperioso, por razões de natureza científica que seria imprescindível

desocultar essa informação e torná-la em matéria clara e operacionalizável. O

termo desocultar, remete, então, para o terreno das metodologias, na medida em

que estas se referem, precisamente, por um lado às formas como os problemas

são equacionados e fundamentados e, por outro, aos modos como se buscam as

respectivas soluções (Taylor & Bogdan, 1986).

Procurou-se, então, que as consolidadas percepções pessoais já

interiorizadas, sobre a realidade em estudo, ajudassem a equacionar a definição

das fontes informativas e dos meios de as questionar, mas que, ao mesmo tempo,

não influenciassem, ou condicionassem, o rumo e muito menos os conteúdos dos

acontecimentos. Com este tipo de preocupações pretendia-se que a

representação pessoal sobre o conhecimento da comunidade escolar interferisse

o menos possível na recolha metódica de outro tipo de informação sobre a

mesma, prevenindo-se assim, tanto quanto possível, a introdução de elementos

subjectivos, quer nas opções relativas aos modos de proceder à sua recolha, quer

aos consequentes processos de a interpretar. Antes se intentou que aquele - sem

dúvida profundo - conhecimento pessoal da realidade em estudo servisse,

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essencialmente, para direccionar a recolha de informação para as rotas que mais

e melhor pudessem contribuir para o refinar daquele conhecimento, a fim de se

alcançar uma compreensão exaustivamente profunda e significativa da

problemática em causa.

Por tudo isto, a partir de determinada altura as visitas e contactos com a

escola foram orientados no sentido de se colherem indícios que fundamentassem,

com credibilidade, a eleição das fontes a usar para a recolha da informação

complementar. Com estes procedimentos visava-se, fundamentalmente, alcançar

um domínio exaustivo, objectivo e adequado da cultura e das práticas

educacionais da comunidade escolar, condição estritamente necessária para

garantir a cientificidade de todo o projecto.

Em consequência daquela preocupação passou a haver uma ainda maior

imbricação pessoal com o espaço social em estudo. A realidade presenciada era

o ponto de chegada de uma certa história na qual a intervenção educativa dos

seus sucessivos protagonistas era, simultaneamente, produtora e produto. Essa

história havia sido, naturalmente, gerada a partir de um continuum de acções e de

interacções institucionais e que, de algum modo, configuravam a problemática da

própria pesquisa. Importava, então, procurar meios que, de forma credível e fiável

confirmassem, ou infirmassem, o pecúlio de representações pessoais que, sobre a

mesma, o desenrolar dos últimos anos havia permitido acumular.

A recuperação compreensiva da história recente da escola era, a nível

desta investigação, considerada como o meio de coligir dados para responder,

com segurança à questão “em que ponto estamos no itinerário que leva à

concretização de uma escola inclusiva?” Esta questão pela frequência com que

era expressa, nos contactos informais, era uma preocupação real e permanente

dos agentes educativos locais, pelo que todos os processos a activar para lhe dar

resposta teriam que ser devida, cuidadosa e metodicamente equacionados.

Havia, pois, que confrontar a informação pessoal com a de outras fontes e,

a partir de tal, devolver o relato da história efectiva aos seus autênticos autores a

fim de que os mesmos dispusessem de elementos susceptíveis de os ajudar a

identificar, com clareza, os percursos já percorridos num eventual itinerário

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conducente a uma escola inclusiva. Ao mesmo tempo, tornava-se indispensável

determinar o ponto exacto em que, então, se situavam na caminhada em causa.

O conhecimento da comunidade escolar comprovava, efectivamente, que

se estava perante uma comunidade educativa com uma forte tendência histórica

para a concretização da educação inclusiva. Importava, pois, precisar, os

caminhos já andados para que estes pudessem servir de ancoradouro à

planificação dos sobrantes.

Neste contexto optou-se por recolher informação que se tornasse

efectivamente relevante para o desenvolvimento optimizado do trabalho

pretendido. Como também foi já objecto de referência, a informação em apreço

deveria reportar-se, essencialmente, a três aspectos:

a) caracterização do contexto sócio-cultural local;

b) clarificação compreensiva das atitudes e práticas inclusivas desenvolvidas

pela organização escolar até ao momento;

c) aspectos mais frágeis do ponto de vista organizacional e funcional tendo

por referência os ditames da educação inclusiva;

d) localização do ponto em que a comunidade escolar se encontrava face a

um certo modelo de escola inclusiva.

Em relação ao primeiro daqueles aspectos constatou-se, por análise

directa, que o projecto educativo da escola continha os elementos essenciais para

se chegar ao conhecimento da realidade social do aglomerado populacional

envolvente. Portanto, aquele documento configurava uma fonte capaz de fornecer

os dados imprescindíveis para a configuração do quadro cultural de origem dos

alunos.

Neste aspecto, recorreu-se, então, à técnica de análise documental já que

esta tem - como postulam Lessard et al. (1994) - “com frequência, uma função de

complementaridade na investigação qualitativa” (p. 144). Deste procedimento

resultou a informação que, em local próprio deste relatório, se apresenta para

efeitos de caracterizar o contexto social e cultural em que se situa o objecto desta

investigação. Em conformidade com esta opção o projecto educativo de escola

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passou a ser considerado como uma fonte de recolha de informação pertinente

para a contextualização da situação problemática.

Quanto às fontes de informação a recorrer para a consecução

complementar dos restantes aspectos, ou seja, para se chegar a uma

compreensão mais rigorosa dos percursos e das práticas inclusivas da escola,

bem como da sua localização no caminho para uma escola inclusiva, o processo a

seguir tornava-se menos linear. A constatação deste facto levou a que este

aspecto tivesse sido merecedor de uma estratégia significativamente, mais

ponderada. Neste âmbito emergiam duas dimensões que, pela sua relevância na

temática em estudo, convinha serem alvo de uma explicação pormenorizada. Uma

remetia para a necessidade de se refinar o conhecimento sobre a génese do

desenvolvimento da crença e dos procedimentos de cariz inclusivo já existentes

na comunidade escolar. Pela sua natureza, este aspecto resvestia-se de uma

dimensão global a qual se prendia com uma visão e acção holísticas da escola,

no seu todo. A outra dimensão dizia respeito a um projecto de trabalho em curso

na escola, o qual consiste num processo de atendimento educacional a um grupo

de alunos multideficientes - com um quadro de problemática muito complexa - que

pela sua especificidade configura uma situação invulgar em contextos de escolas

regulares, sendo, pela sua forma e pelo seu conteúdo, um testemunho eloquente

da cultura inclusiva local. Rever e pormenorizar informação relevante sobre uma e

outra dimensões da cultura organizacional e funcional da escola consubstanciava,

portanto, um objectivo crucial da investigação, pelo que se intentou identificar,

criteriosamente, os meios de o conseguir.

Como já foi aclarado, o conhecimento que o autor deste trabalho detinha

sobe o alvo da investigação, resultava, essencialmente, do acompanhamento feito

à escola ao longo de uma década e que passava por sessões de informação e de

formação aos docentes e pessoal auxiliar e por muitas conversas informais com

os mesmos, com os elementos do órgão de gestão e com pais. Neste quadro de

actividade, outros procedimentos tiveram igualmente lugar, tais como a presença

nas salas de aula e avaliação pedagógica de alunos.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 339

Este conhecimento da realidade local tornou-se ainda mais metódico e

completo com a participação pessoal no projecto de apoio educativo a alunos com

dificuldades de aprendizagem, concebido e lançado pelo Professor Doutor

Miranda Correia, como já foi devidamente salientado. Tudo isto ia contribuindo

para que o investigador se tornasse numa das pessoas que mais e melhor

conhecia a escola como diziam o seu director e alguns docentes. No fundo era

verdade. Só que esse conhecimento tinha sido construído ao longo de vários anos

de forma puramente informal e não assente em registos estruturados até porque,

na altura não existia, ainda, a ideia de uma investigação gerida sob o intuito de

obtenção de um grau académico. De qualquer forma o conhecimento profundo da

realidade era uma certeza e, como tal, não poderia ser escamoteado, pelo que se

tornava inevitável tê-lo em consideração no contexto do desenvolvimento do

projecto de investigação. Porém, usar apenas essa informação para caracterizar a

situação encontrada na comunidade escolar não se afigurava ser uma hipótese

totalmente recomendável pelo que se tornava indispensável recorrer a outros

elementos que pudessem igualmente servir de fontes e cuja informação fosse,

simultaneamente, credível e susceptível de funcionar como contraponto da

informação detida pelo investigador.

Assim, no que respeita ao estudo compreensivo da razão de ser e dos

contornos funcionais do referido projecto de atendimento aos alunos com

multideficiência, a questão resolveu-se de forma definitiva, na medida em que

existia na escola um documento escrito relativo a esse projecto. Analisado o seu

conteúdo concluiu-se que o mesmo se poderia considerar satisfatório para o efeito

desejado.

Continuava, contudo, em aberto, o problema da recolha de informação

complementar relativa à história passada e actual das atitudes e práticas

tendencialmente inclusivas existentes na escola. Naturalmente que para o efeito

se pensou serem os elementos do órgão de gestão da escola, as pessoas

adequadas para fornecerem a informação pretendida, pelo que se dialogou com

aqueles no sentido de, mediante uma entrevista, se recolher tal informação.

Assim, foi-lhes explicado que havia a necessidade imperiosa de se obterem dados

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sistematizados, credíveis e teoricamente consistentes sobre a génese, o

crescimento e a consolidação das tendências inclusivas existentes na escola, a

fim de ser aferida com a informação possuída pelo investigador. Confrontado com

esta situação e analisando reflexivamente os critérios que deveriam estar

subjacentes à informação solicitada, o Presidente do Conselho Executivo informou

que, no seu entender, havia uma outra pessoa que estava em melhores condições

para fornecer a informação em causa. Instado, então, a indicar a personalidade

de quem se tratava, o Presidente do Conselho Executivo esclareceu que essa

pessoa era a Coordenadora da Equipa dos Apoios Educativos de Vila Franca de

Xira. Fundamentando, de imediato, aquela sugestão, o interlocutor argumentou

que a pessoa em questão, para além de ser especializada em educação especial,

era, também, conhecida pela suas crenças e práticas em prol da educação

inclusiva. Continuando a desenvolver a seu ponto de vista, o responsável pela

gestão do estabelecimento de ensino acrescentou que aquela Coordenadora era,

ainda, detentora de um conhecimento profundo, tanto da história como do

funcionamento recentes da escola, uma vez que ali tinha exercido funções de

professora de educação especial, ao longo de três anos lectivos ininterruptos,

mais precisamente, nos anos de 1994/95, 1995/96 e 1996/97, trabalhando sempre

no contexto das salas de aula. Finalmente, foi ainda dito que aquela professora

tinha sido a principal dinamizadora do já mencionado projecto de apoio aos alunos

multideficientes e que, embora sendo, actualmente, Coordenadora da Equipa dos

Apoios Educativos do concelho, continuava a disponibilizar um acompanhamento

muito próximo à escola, visitando-a com uma frequência muito intensa e regular.

Acresce, a propósito, referir que alguns dos aspectos frisados pelo órgão de

gestão e atribuídos à Coordenadora dos Apoios Educativos, tinham efectivamente

fundamento, como, por exemplo, os contactos usuais com a comunidade escolar,

como o autor deste projecto tinha, por diversas vezes, presenciado.

Analisada a hipótese sugerida pelo órgão de gestão - e com base nos

fundamentos aduzidos - entendeu-se então que a Coordenadora da Equipa dos

Apoios Educativos consubstanciava a fonte que, de modo mais cabal e holístico,

poderia preencher as condições exigíveis para fornecer a informação

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complementar relativa à explicitação histórica da génese e desenvolvimento dos

princípios e das práticas inclusivas presentes na escola e, eventualmente, prestar

esclarecimentos complementares sobre o projecto de apoio a alunos

multideficientes. Consequentemente a pessoa sugerida emergia como um recurso

fiável para ajudar a esclarecer, a nível da escola, “que modificações se operaram

ao longo do tempo e como se encontra actualmente” (Bogdan & Biklen, 1994, p.

90). Estava, pois, em questão, o modo de aprofundar o conhecimento sobre a

história recente da comunidade escolar, mormente no que a mesma comportava

relativamente à cultura pró-inclusiva. Os mesmos autores davam a resposta, ao

afirmarem que a recolha daquela informação se deverá basear em “entrevistas a

pessoas que tenham estado relacionadas com a organização” (idem). O problema

da fonte em análise ficou posteriormente resolvido com o anuir formal da referida

Coordenadora em disponibilizar-se para fornecer a informação pretendida.

Estava, assim, em marcha, mais uma componente de um tão complexo,

quanto atraente desafio. Prolongava-se, por conseguinte, o desenvolvimento de

um intenso processo de trabalho que, em espiral, procurava dar cumprimento

prático, a todos e a cada um dos componentes básicos da investigação-acção:

pesquisa, diagnóstico, reflexão, planificação, acção e transformação.

Em resumo, para se obter informação acrescida à detida pessoalmente e

conducente - uma e outra - à avaliação diagnóstica precisa e fundamentada da

situação em estudo, foram, então, utilizados:

• como fontes documentais - e no dizer, ainda de Bogdan & Biklen, (1994) -

“os registos escritos existentes” (p. 90), ou seja, o projecto educativo de

escola e o projecto de apoio a crianças multideficientes;

• como técnica, a entrevista em profundidade57realizada com a

Coordenadora da Equipa dos Apoios Educativos de Vila Franca de Xira.

Estava, igualmente assumido que toda esta informação seria alvo de

confronto crítico com o considerável manancial de informação de que se era,

detentor em termos pessoais. Este procedimento justificava-se pela necessidade

57 Ou longa, conforme a apelidam Bogdan & Biklen (1994).

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 342

de se garantir que a situação encontrada na escola fosse efectivamente objecto de

uma caracterização explicitada com elevado grau de rigor e precisão.

Seguidamente então serão apresentados e descritos, em termos formais,

cada um dos meios utilizados como instrumentação no processo de recolha de

informação relativa ao objecto de estudo, os quais são, como se descreveu:

1. O Projecto Educativo de Escola

2. O Projecto de Apoio a Crianças Multideficientes

3. A Entrevista em Profundidade à Coordenadora da Equipa de Apoios

Educativos de Vila de Franca de Xira.

5.1 O Projecto Educativo de Escola

Trata-se de um documento composto por um corpo principal de texto, com

catorze páginas, complementado por uma outra secção que integra um conjunto

de 3 anexos. Encontra-se arquivado no gabinete do órgão de gestão do

estabelecimento de ensino.

O projecto educativo de escola contém informação sobre a caracterização

do meio e do próprio estabelecimento de ensino. Explicita, ainda - e numa outra

ordem de ideias - o objectivo geral a que a comunidade escolar se propõe dar

consecução, através da sua acção educativa. Refere, também, o conjunto de

objectivos específicos a que a comunidade educativa se compromete dar

cumprimento e que são decorrentes daquele objectivo geral. Finalmente,

esclarece a forma genérica quer da organização dos intervenientes da acção

educativa, quer dos processos de avaliação dessa mesma acção.

5.2 O Projecto de Apoio a Crianças Multideficientes

Como já se mencionou noutro local deste trabalho, a escola mantém em

funcionamento um projecto de atendimento educativo a crianças multideficientes58,

58 Cujas características se conformam, em traços gerais, com a definição dada por Correia, ou seja, “conjunto

de deficiências numa mesma criança, tal como deficiência mental-cegueira, paralisia cerebral-deficiência

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 343

sendo estas portadoras de uma problemática bastante complexa. Sendo este um

facto de relevante significado, para a temática em estudo, entendeu-se ser de toda

a relevância, procurar-se uma compreensão aprofundada da génese desta

experiência, tanto a nível do conhecimento das razões que levaram à sua criação

como do modo como foi planeada a forma da sua implementação prática.

Como já se sabia que havia um documento escrito sobre aquela matéria,

foi, por conseguinte, solicitada autorização ao órgão de gestão para a consulta do

documento em causa. A resposta foi afirmativa tendo, em consequência, sido

disponibilizada aquela documentação para os efeitos pretendidos.

Trata-se de um documento de 11 páginas, com o título de Projecto de

Apoio a Crianças Multideficientes, elaborado em 1996, conjuntamente pelo então

director da escola e pela professora de educação especial que, na altura, ali

exercia funções (actualmente - ano escolar de 2003/2004 - é Coordenadora da

Equipa Concelhia dos Apoios Educativos). O documento em apreço encontra-se

arquivado na escola, mais precisamente no gabinete do Presidente do Conselho

Executivo, onde foi analisado.

Com base na informação de que a Coordenadora da ECAE participara na

elaboração e organização prática do projecto em apreço, logo se anteviu a

possibilidade de, igualmente, se recorrer àquela profissional para a obtenção de

dados complementares sobre o mesmo, aquando da realização da entrevista com

aquela professora.

5.3 A Entrevista

A entrevista59 consubstancia, na sua essência, uma técnica de recolha de

dados de opinião que se transformam em elementos úteis para a compreensão do

alvo do estudo. Por esse meio se recolhe, portanto, informação relevante através

mental, etc., causadoras de problemas educacionais severos que requerem intervenções específicas de

acordo com a concomitância da problemática (1997, p. 58). 59 A que Bogdan & Biklen (1994) atribuem, neste contexto, um papel fundamental – a par com a observação

participante – ao referirem que “as estratégias mais representativas da investigação qualitativa . . . são a

observação participante e a entrevista em profundidade” (p. 16).

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 344

de indivíduos que conhecem tanto a realidade estudada, como os intervenientes

na mesma, como refere Estrela (1994). É uma técnica que se traduz por “uma

conversa entre um entrevistador e um entrevistado que tem o objectivo de extrair

determinada informação do entrevistado”. Conforme acrescentam Moser e Kalton

(1971) citados em Bell (1997, p. 118).

Mediante o recurso à entrevista, o investigador “pode aprofundar motivos e

sentimentos, coisa que o inquérito nunca poderá fazer, a forma como determinada

resposta é dada (o tom de voz, a expressão facial, a hesitação, etc.) pode fornecer

informações que uma resposta escrita nunca revelaria.” (Bell, !997, p.118).

Por todas as razões antes apresentadas e, ainda, porque proporciona a

recolha de “descrições detalhadas de acontecimentos passados.” (Peretz, 2000,

p.23), optou-se, pois, pela entrevista, no caso, - como lhe chamam Lessard et al.

(1994), - de “profundidade” (p. 145). Foi, portanto, esta a técnica seleccionada

para figurar como o meio fundamental para a angariação dos contributos

necessários, essencialmente, à identificação e caracterização do ponto em que se

situava a escola na sua caminhada para a cultura e prática da educação inclusiva,

bem como dos respectivos antecedentes.

A opção pela entrevista filiou-se, também, numa outra ordem de motivos.

Tais motivos traduzem-se pela possibilidade que aquela técnica oferece de

clarificar, aprofundar, desenvolver e orientar o diálogo, no sentido de se obter,

tanto quanto possível, a informação pretendida.

Devido, por conseguinte, a toda a flexibilidade metodológica que esta

técnica de recolha de informação possibilita, existe sempre a possibilidade de se

poder conferir aos processos de indagação o rumo necessário a uma completa

recolha dos dados imprescindíveis, bem como à clarificação de outra informação

que inicialmente haja sido alvo de uma eventual interpretação ambígua. Por todas

estas razões, aquela técnica parece representar um precioso instrumento nos

processos de investigação qualitativa, sobretudo, no caso em que se lida com

acções e significados subjacentes à interacção humana.

Contudo, se as virtualidades descritas concorreram para a referida tomada

de decisão, havia que - por ordem a não fragilizar a credibilidade do presente

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 345

trabalho - não esquecer, os inconvenientes que a aplicação da entrevista

pressupõe. Bell (1997) inventaria alguns deles:

• o consumo significativo de tempo;

• elevada carga de subjectividade;

• dificuldade de interpretação de algumas respostas;

• possibilidade de as perguntas induzirem e influenciarem as respostas.

Havia, por consequência, a consciência do dilema da escolha do meio de

recolha da informação, bem como das sua eventuais limitações. Dilema, esse que,

aliás, por razões análogas, se colocaria, perante qualquer outro tipo de técnica

que não a entrevista, até pela natureza do objecto de pesquisa. Ora sendo, este,

de natureza social, é do conhecimento comum que se trata de uma realidade

muito fluida e que, por consequência, se torna muito difícil de ser apreendida,

independentemente do tipo de instrumento a utilizar.

Claro que na decisão tomada pesou de maneira muito significativa o facto

de se ter a consciência de que a pessoa a entrevistar possuía um conhecimento

ímpar - uma vez que participou no processo, de modo determinante - sobre a

génese e desenvolvimento das atitudes e práticas pró-inclusivas patenteadas pela

escola.

A realização da entrevista com a Coordenadora da Equipa dos Apoios

Educativos de Vila Franca de Xira preenchia, também, um requisito que a

literatura de incidência contempla e valoriza. Tal relaciona-se com o facto de a

profissional em causa ser, já, pessoalmente conhecida, situação que é prevista

nos trabalhos de Bogdan e Biklen (1994) ao referirem concretamente que “em

estudos que envolvem entrevistas longas com um ou poucos sujeitos, é frequente

os investigadores conhecerem o sujeito antes da investigação começar” (p. 135).

Dessa maneira não se tornava necessário “quebrar o gelo inicial, o que, nalguns

casos, demora o seu tempo” (idem). Por outro lado esse conhecimento pessoal

colocava o entrevistado numa posição de disponibilidade para um diálogo aberto e

franco, situação que não ocorre quando os interlocutores não se conhecem

antecipadamente. Neste último caso, por norma, o entrevistado fica apreensivo,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 346

chegando mesmo a negar a “existência de alguma coisa importante para dizer”

(idem).

Reafirma-se, entretanto, que a entrevista visou, sobretudo, recolher

informação que incidisse sobre os aspectos mais salientes dos percursos e das

práticas desenvolvidos pela escola, na caminhada para a inclusão.

Simultaneamente intencionava-se que a informação disponibilizada pela

entrevistada servisse de contraponto aos dados detidos, informalmente, pelo

investigador sobre os mesmos aspectos da realidade em estudo.

Recorda-se finalmente - e em jeito de síntese - que a escolha da pessoa

entrevistada - sendo sugerida, para tal, pelo órgão de gestão da escola - foi, no

entanto, decidida com base em três aspectos nucleares:

1. Ter desempenhado, na escola, funções de docente de apoio educativo,

durante três anos escolares ininterruptos, sequenciais e há relativamente

pouco tempo (1994/95 a 1996/97);

2. Ter estado ligada a processos concretos de abertura da escola à frequência

de crianças com problemáticas de notória complexidade;

3. Continuar a assegurar um acompanhamento muito sistematizado e

próximo, à escola, na qualidade de responsável concelhia pela

coordenação dos apoios educativos.

Como salientam Bogdan e Biklen “as entrevistas qualitativas variam quanto

ao seu grau de estruturação” (1994, p. 135). No caso desta investigação,

perfilhou-se a utilização de uma entrevista relativamente aberta, centrada em

determinados tópicos e questões previamente identificados a fim de planear com o

máximo de precisão possível a recolha da totalidade da informação desejada,

como sugerem Merton e Kendall (1946).

Procurou-se, assim, que a entrevista viesse a centrar-se num ciclo de

questões antecipadamente pensadas, assegurando-se, desta forma que as

declarações da entrevistado se enquadrassem na temática e nos tópicos

desejados. Ao mesmo tempo subjazia a intenção de o diálogo ocorrer em jeito de

conversação tão natural quanto possível, a fim de não se influenciar, ou inibir

qualquer opinião do interlocutor.

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A opção, neste trabalho, por um tipo de entrevista semi-aberta, parece,

entretanto, perfeitamente legitimada pois, como referem diversos autores (entre

eles, Estrela, 1994, Lessard-Hébert, Goyette & Boutin, 1994 e Bodgan & Biklen,

1994), a chamada entrevista semi-directiva (ou relativamente aberta) é a

modalidade mais frequentemente utilizada no âmbito da pesquisa de natureza

educacional.

A estrutura propriamente dita da entrevista em análise, foi configurada

segundo o quadro de elementos que se apresenta seguidamente.

1. Tema - Cultura organizacional e funcionamento pedagógico da escola

2. Objectivos gerais:

a) Recolher a representação da entrevistada sobre as formas actuais de

organização e de funcionamento pedagógico da instituição escolar;

b) Solicitar a identificação das atitudes e práticas indiciadoras de educação

inclusiva, em curso na escola, bem como os seus antecedentes;

c) Pedir a opinião sobre a forma como estava a decorrer o projecto de apoio a

alunos multideficientes;

d) Inventariar aspectos prioritários a melhorar para aproximar o estado actual

da comunidade escolar ao modelo de escola inclusiva.

3. Entrevistado - Coordenadora da Equipa dos Apoios Educativos do

concelho de Vila Franca de Xira e ex-professora de educação especial

na escola em estudo.

4. Blocos temáticos:

a) Preliminar – Legitimação da entrevista e Perfil da entrevistada

b) Indicadores temáticos propriamente ditos60 – Cultura de Organização e de

Gestão da Escola, Projecto Educativo de Escola, Equipa de Planificação

Inclusiva, Gestão da Sala de Aula, Equipa de Planificação Educacional

Individualizada, Projecto de Apoio a Crianças Multideficientes, Educação

Especial e Apoios Educativos, Acção Auxiliar Educativa, Envolvimento

Parental e Propostas de Intervenção Prioritárias.

60 Seguiu-se, aqui, como se pode constatar, o elenco das dimensões entretanto adoptadas para a estruturação do modelo de escola inclusiva adoptado.

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5. Objectivos específicos:

a. Caracterizar o perfil profissional da entrevistada

b. Obter informação precisa sobre aspectos significativos da organização e

gestão da escola.

c. Recolher opinião sobre as formas de elaboração do projecto educativo de

escola, bem como dos seus conteúdos relevantes.

d. Conhecer a perspectiva de análise sobre a organização e funcionamento da

equipa de planificação inclusiva.

e. Recolher informação pormenorizada sobre a forma como é percepcionada

a gestão pedagógica das salas de aula.

f. Aprofundar o conhecimento sobre a génese e evolução do projecto local de

atendimento educativo a crianças multideficientes e de outras práticas

inclusivas.

g. Obter dados relativos ao grau de percepção sobre o funcionamento da

Equipa de Planificação Educacional Individualizada.

h. Conhecer o modo de entendimento sobre o funcionamento da educação

especial e dos apoios educativos no contexto escolar local.

i. Recolher informação àcerca do que pensa a entrevistada sobre a

actividade e funções do pessoal auxiliar da acção educativa.

j. Compreender como são entendidos os níveis e as formas de interacção

entre a escola e as famílias.

k. Recolher a opinião sobre quais as áreas e conteúdos a priorizar a fim de

serem optimizadas as atitudes e práticas inclusivas da comunidade escolar.

Relativamente, ainda, à recolha de informação concernente à situação

concreta da organização e funcionamento pedagógico da escola, vários autores

(nomeadamente, Lessard-Hébert, 1996, Meron & Kendall, 1946, Bell, 1997, e

Bogdan & Biklen, 1994) preconizam - nos estudos de natureza qualitativa - que

para além da entrevista se deve recorrer ao uso da observação directa. Ora a

observação directa tinha sido - como já se referenciou - a estratégia mais

naturalmente utilizada ao longo dos últimos anos para conhecer e apoiar a escola.

Só que os resultados dessa observação foram alvo de uma interiorização

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 349

puramente empírica e desarmada não tendo sido, portanto, objecto intencional de

qualquer registo escrito, uma vez que, na altura, não lhe estava subjacente

qualquer intenção de um trabalho de investigação formal. Tal não pode contudo

negar a sua existência, bem como a natural influência da mesma na planificação

e desenvolvimento de todo este trabalho. Logo, achou-se, não haver necessidade

de se recorrer a tais processos - repetição da obervação para se materializarem

os correspondentes registos escritos - por se haver considerado que para além de

apenas servirem para efeitos formais nada mais adiantariam em relação ao

conhecimento da situação estudada. Em consequência, não foi levado à prática

qualquer procedimento formal de observação para efeitos desta investigação, até

por ser difícil de justificar perante a comunidade escolar, uma vez que, como já

repetidamente se antedisse, aquela considerava o investigador como uma das

pessoas que mais profundamente conhecia a organização e funcionamento da

escola.. Daí que se tivesse optado pela realização de uma entrevista longa, de

certa forma indirecta e semi-aberta, a qual permitia, assim, recolher, junto da

entrevistada - igualmente detentora de informação holística e estratégica - todo o

tipo de dados relevantes e necessários para clarificar, confirmar ou completar o

conhecimento até então adquirido e detido pelo investigador.

O que ocorria nas salas de aula configurava, por outro lado, um elemento

de transcendente importância para a compreensão profunda e real das práticas

pedagógicas inclusivas desenvolvidas na escola. A prática pessoal de entrar nas

mesmas e de observar a acção pedagógica ali desenvolvida permitiu, ao longo de

anos consecutivos, a emergência de uma opinião mais ou menos segura do que

ali se passava. Porém - dado o lugar crucial que tal contexto ocupa na construção

das práticas subjacentes à educação inclusiva - entendia-se que se tornava

imprescindível confrontar essa opinião com outras igualmente conhecedoras

dessa realidade. Este assunto mereceu, por essa razão, um cuidado

especificamente meticuloso e intencional na entrevista com a Coordenadora da

Equipa dos Apoios Educativos, uma vez que era um elemento bastante

conhecedor daquela realidade, precisamente porque:

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• sempre trabalhara, no contexto da sala de aula, nos três anos escolares em

que exerceu funções de professora de educação especial na escola em

causa;

• continuava a entrar com frequência em diversas salas de aula onde era

aceite com toda a naturalidade.

Paralelamente, procurou-se também, recolher, através da realização da

entrevista, informação relativa tanto ao projecto educativo de escola, como ao

projecto de apoio a crianças multideficientes. Tal justificava-se uma vez que as

respectivas fontes documentais, quando analisadas, afiguraram-se relativamente

omissas em relação a determinados dados que se consideravam importantes.

Face a essa circunstância, entendeu-se, então, que a entrevista consubstanciava

uma oportunidade a explorar como uma forma de complementar, idoneamente, a

informação em falta.

5.4 Procedimentos

Seleccionados, justificados e descritos os meios de recolha de informação,

passa-se, de seguida à explicitação dos modos61 como se procedeu à obtenção

dos dados, quer a partir das fontes documentais utilizadas para o efeito, quer

através da entrevista. Todo este processo de recolha de informação foi

desenvolvido ao longo do ano escolar de 2001/2002.

Análise documental do projecto educativo de escola - Com a consciência de

que o projecto educativo de escola poderia representar um “retrato brilhante e

realista de como funciona a organização” (Bogdan & Biklen, 1994, p. 180), houve

o cuidado de se proceder a uma análise de conteúdo que fornecesse indicadores

precisos sobre aspectos muito concretos, ali constantes e seleccionados segundo

critérios extraídos da informação bibliográfica. Assim, a recolha dos dados, a partir

61 Os quais em termos metodológicos são entendidos como uma espécie de plano de actuação desenvolvido

pelo investigador, no momento de recolher os dados e em que são identificados os detalhes relativos aos

instrumentos utilizados, bem como os passos seguidos para a sua operacionalização (Léon, & Montero,

1995).

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da consulta do projecto educativo da escola, foi realizada tendo, como referência

orientadora, as categorias de análise sugeridas por Barberá (1988), as quais são,

concretamente:

• aspectos do ideário (princípios orientadores);

• estilo de educação preconizado;

• critérios gerais de actuação.

A consulta do documento em causa foi realizada no gabinete do Presidente

do Conselho Executivo - onde se encontra arquivado - e sob a sua autorização.

Este procedimento consistiu numa leitura reflexiva do texto, acompanhada de

tomada de apontamentos os quais foram, posteriormente classificados e

integrados - segundo o respectivo sentido - numa das categorias de análise antes

referidas. Dos resultados desta recolha de informação será dado conta no capítulo

que trata da apresentação e análise dos dados.

Consulta do projecto de apoio a crianças multideficientes - Teve,

igualmente lugar no gabinete do Presidente do Conselho Executivo, onde,

também, se encontra arquivado. Procedeu-se à sua análise com vista,

fundamentalmente, a conhecerem-se:

• as razões que motivaram a sua criação;

• as características educativas das crianças destinatárias;

• estratégias de intervenção implementadas.

Realização da entrevista à Coordenadora da Equipa dos Apoios Educativos

- Atendendo-se à finalidade e alcance subjacentes à realização da entrevista, esta

foi objecto de meticulosa preparação e de análise em todas as suas fases. O

primeiro passo formal deste procedimento consistiu na feitura do respectivo guião

(Anexo III - A). Neste, constam os temas estabelecidos, os objectivos, a referência

aos tópicos a abordar (para que a informação recolhida correspondesse ao

previsto em cada um dos objectivos propostos) e ainda um conjunto de princípios

orientadores do desenvolvimento da entrevista inseridos ao longo do guião sob a

designação de observações.

A entrevista ocorreu, em Dezembro de 2001, nas instalações da escola,

mais precisamente na sala de reuniões contígua ao gabinete do Presidente do

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Conselho Executivo, tendo sido objecto de gravação sonora, após autorização

para tal, por parte da entrevistada. A conversação decorreu num clima pleno de

confiança e de abertura recíprocas, dado que se havia previamente percepcionado

que “as boas entrevistas caracterizam-se pelo facto de os sujeitos estarem à

vontade e falarem livremente sobre os seus pontos de vista” (Bodgan & Biklen,

1994, p. 136).

Após a realização da entrevista, passou-se à elaboração do seu protocolo

(Anexo III - B), permitindo, assim, transformar o seu conteúdo em texto susceptível

de ser analisado. Este protocolo foi objecto de várias leituras para se aprofundar a

apreensão do conteúdo e para se conceber a melhor forma de estruturar a

consequente análise.

A operacionalização do processo de análise centrou-se em procedimentos

de identificação individualizada das afirmações, declarações e ideias produzidas

pela entrevistada, ou seja, dos indicadores. Para este procedimento foi utilizada a

técnica de assinalar por meio de um círculo as passagens significativas que

contivessem unidade de sentido. Em cada círculo era inserido um determinado

código que correspondia a uma das diferentes categorias de opinião deduzidas a

partir da análise da estrutura do guião, nomeadamente, da parte designada por

blocos. Os diferentes indicadores que mantinham afinidade semântica entre si,

eram, naturalmente, classificados sob o mesmo código e, por consequência

integrados na mesma categoria.

Na operacionalização deste processo de codificação dos dados obtidos

pela entrevista, foram tidas em consideração as recomendações produzidas pelos

especialistas nesta matéria. Assim, seguiu-se, em particular, as sugestões

apresentadas por Van der Maren (1987), as quais são:

1. A necessidade de um léxico, de uma documentação precisa das convenções e

das regras utilizadas na codificação ou, seja, no momento da transposição das

respostas dos entrevistados para um sistema de códigos utilizado para os reduzir a

um conjunto manipulável.

2. O respeito por uma consistência de base e por uma coerência na aplicação das

regras de transposição (de codificação).

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3. A manutenção da correspondência, da orientação dos planos, antes e após a

codificação, isto é, a manutenção das características dos dados,

independentemente da redução e do sistema de códigos utilizados para o fazer.

4. A circunscrição aos formatos originais: não adicionar nem atribuir, aos códigos dos

valores, sentidos que não se encontram presentes nos dados. (Citado em Lessard-

Hébert, 1994, p. 111)

A partir do resultado daquelas operações de tratamento de conteúdo,

iniciou-se um processo de organização de quadros, por categorias, sob o princípio

de que estas deveriam ser coesas, homogéneas, exaustivas e reciprocamente

exclusivas. A cada categoria foi dada uma designação, ao mesmo tempo que se

registava a frequência dos respectivos indicadores.

O aprofundamento do tratamento de dados punha em evidência a

emergência de possíveis subdivisões de determinadas categorias. Este facto

levou, por conseguinte, ao estabelecimento de subcategorias. O resultado último

deste procedimento deu, por fim, origem ao quadro de categorização dos dados

da entrevista (Anexo III - C).

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CAPÍTULO III

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Para Erikson (1986) só se pode, com propriedade falar em dados da

investigação a partir da altura em que a mente começa a trabalhar o material

recolhido. Para este efeito, ou seja para tratar, apresentar e interpretar os dados

obtidos, na informação de campo, seguiu-se, a tríade de processos que Miles e

Huberman (1984, citados em Lessart-Hérbert et al. 1994) sugerem. Os referidos

procedimentos são: a redução da informação, a sua apresentação e, finalmente, a

sua interpretação.

Pretende-se, então, nesta componente do trabalho, realizar um processo de

extracção do sentido dos dados recolhidos em relação à comunidade escolar, a

fim de se obter um conjunto de informações que permita elaborar conclusões

credíveis sobre o alvo do estudo e, em consequência, tomar decisões. Os dados

recolhidos e devidamente tratados - e que seguidamente se apresentam -

prefiguram, pois, os contornos da situação encontrada à partida no objecto de

estudo da presente investigação, configurando, ao mesmo tempo, a sua

localização no percurso conducente à concretização do modelo de escola

inclusiva proposto, isto é, da situação desejada.

1 Análise Contextual

Nesta secção serão apresentados, num primeiro momento, elementos de

natureza ecológica com a finalidade de fornecer informação susceptível de

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contribuir para a compreensão da realidade social, cultural e económica em que

se situa a escola estudada. Num segundo momento será descrita a própria

estrutura escolar, sob critérios de análise de ordem física e humana. A fim de se

evitar a acumulação de informação irrelevante para o presente trabalho procurou-

se coligir apenas os dados efectivamente significativos.

Como foi anteriormente clarificado, a informação constante nesta secção foi

obtida mediante a análise documental do projecto educativo de escola.

1.1 Caracterização Sumária do Meio

A Escola do 1.º Ciclo do Ensino Básico - a qual configura o alvo deste

projecto de investigação - situa-se na freguesia do Forte da Casa, no concelho de

Vila Franca de Xira, distando, sensivelmente, oito quilómetros (a norte) de Lisboa.

Localiza-se, portanto, na chamada zona suburbana da capital.

É referido no projecto educativo de escola - aliás, como se pode constatar

com a simples observação empírica do local - o facto de as habitações

circundantes da escola serem predominantemente dispostas em prédios de vários

andares, alojando, portanto, um grande número de pessoas em espaços

relativamente reduzidos. A esmagadora maioria destas construções são recentes,

facto que significa que grande parte da população residente é oriunda de outras

paragens quer, do país, quer do estrangeiro, e - neste último caso -

nomeadamente dos países africanos de expressão portuguesa, bem como de

Timor. Verifica-se igualmente, a presença de um ou outro núcleo de indivíduos de

etnia cigana. Ultimamente tem-se registado a fixação de alguns grupos de

emigrantes vindos dos países do leste europeu.

Face àqueles dados infere-se, por conseguinte, que a população local não

dispõe de uma identidade cultural definida, antes se caracterizando por um

cruzamento híbrido de diversificadas formas de ser e de viver, situação que, por

vezes, desencadeia desavenças e conflitos entre determinados estratos sociais. O

desenraizamento cultural da generalidade dos habitantes parece ser um

constrangimento à criação de entidades associativas. Estas existem

efectivamente, mas em número muito restrito

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O concelho de Vila de Franca de Xira apresenta uma configuração

geográfica mais ou menos rectangular, distendendo-se mais no sentido norte-sul

do que no sentido este-oeste. Ora é precisamente também neste sentido, que, ali,

passam duas das maiores vias de circulação de pessoas e de mercadorias

existentes no país: a auto-estrada e a linha de caminho de ferro que ligam, uma e

outra, as cidades de Lisboa e do Porto.

Ainda neste contexto há que acrescentar que no concelho está também

localizado um terminal de tráfego rodoviário internacional (Terminal TIR de

Alverca). Aqui chegam - e partem - diariamente, dezenas de camiões de

transporte das mais diversas mercadorias.

Muito provavelmente, a conjugação local de todos estes itinerários não

deixará de contribuir, em alguma medida, para a preocupante situação que, a nível

do consumo de estupefacientes, ali se tem verificado ultimamente.

Em termos muito genéricos - como é referenciado no projecto educativo de

escola - a população apresenta um estatuto social, económico e cultural com

índices pouco elevados, registando-se a existência de um número significativo de

famílias com carências económicas. Segundo a versão informal dos responsáveis

pela gestão da escola, esta situação tem vindo a agravar-se nos últimos tempos.

Em termos de actividades económicas verifica-se que, localmente, apenas

a construção civil tem tido algum impacto e expressão, proporcionando ocupação

laboral a um determinado número de residentes, sobretudo a nível de mão-de-

obra não qualificada. Para além desta actividade apenas há a registar a existência

de uma rede esparsa de pequenas unidades comerciais, na sua maioria ligadas à

restauração e à venda de produtos alimentares ou de vestuário. Pela sua reduzida

dimensão, por norma, cada uma daquelas unidades comerciais garante a

ocupação laboral apenas a uma ou duas pessoas. Consequentemente, a maioria

das pessoas exerce a sua profissão em locais distantes da sua residência, saindo

de casa bastante cedo e regressando bastante tarde. Estão, portanto, nesta

situação, muitos dos pais dos alunos da escola estudada. Por consequência

muitos dos alunos da escola-alvo ficam, nos seus tempos extra-escolares, sob o

cuidado de outros familiares, amas, ou, até, entregues a si próprios. Não sendo

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uma situação rara no panorama nacional, o certo é que este factor provoca,

naturalmente, um inevitável distanciamento entre os pais e o percurso escolar dos

filhos.

1. 2 Descrição da Escola

A escola está sediada num único edifício, remontando a sua construção ao

ano de 1974. É composta por vários pavilhões de um só piso, edificados em três

níveis diferenciados do solo.

Este estabelecimneto de ensino entrou em funcionamento de modo gradual,

no ano de 1977. Dois anos depois já funcionava em pleno e, mesmo assim, não

conseguia assegurar uma oferta completa à dimensão da procura. Para obviar

este facto foi necessário acrescentar à estrutura de base, no ano escolar de

1985/86, um pavilhão pré-fabricado, no qual viriam a ser atendidas mais quatro

turmas de alunos. Naquela altura, a escola era frequentada por um total de 901

alunos.

Trata-se, portanto de uma escola de grande dimensão, ainda que o número

de alunos - desde aquela data - tenha vindo a diminuir, quedando-se, actualmente

(ano escolar de 2003/04) pelos 450 alunos. Ou seja, ao longo dos últimos quinze

anos verificou-se uma diminuição de cerca de 50% da população escolar. Esta

situação tem vindo, de resto, a acontecer noutras zonas do País, mormente a nível

do Ensino Básico.

Os espaços livres são basicamente constituídos por uma superfície

empedrada, descoberta e com o piso ligeiramente inclinado. Existe, ainda, nestes

espaços, um amplo campo de jogos com piso asfaltado.

Em termos gerais, a escola dispõe das seguintes estruturas:

• gabinete de direcção

• secretaria

• sala de reuniões

• sala de professores

• sala de auxiliares de acção educativa

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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• treze sala de aulas

• Centro de Recursos “Sala 16”

• Biblioteca e Núcleo de Audiovisuais

• ginásio

• cantina

• instalações sanitárias independentes para pessoal docente, auxiliares e

alunos

Analisando-se o conjunto de equipamentos descrito e confrontando-o com a

sua utilização e funcionalidade reais, pode-se afirmar que o mesmo representa,

em termos globais, um recurso muito satisfatório em relação às necessidades dos

alunos, dos docentes e do pessoal auxiliar. Acrescente-se, a propósito, que este

nível de satisfação traduz o resultado das diligências que os responsáveis da

gestão da escola têm, ao longo dos tempos, desenvolvido, junto de vários

serviços, nomeadamente, órgãos autárquicos e Direcção Regional de Educação

de Lisboa, para a obtenção, manutenção e acréscimo daqueles recursos.

A Associação de Pais dispõe, também, de um pequeno espaço nas

instalações da escola. Esta Associação é ainda responsável pela criação de um

atelier para ocupação dos tempos livres dos alunos, em horário pós-lectivo . Este

atelier oferece um conjunto diversificado de actividades e funciona numa das salas

de aula.

No presente ano escolar de 2003/2004 a escola é frequentada - como já foi

referido - por 450 alunos agrupados em 21 turmas. Estas turmas funcionam em

horários diferenciados. Assim, cinco funcionam em regime normal, oito só de

manhã e as restantes oito só de tarde.

O corpo docente é composto por 31 professores. Destes, 21 são

professores titulares de turma, enquanto os restantes desenvolvem funções de

gestão (três) e de apoio educativo (7).

O pessoal auxiliar de acção educativa é, por seu turno, composto por oito

elementos. A sua acção é complementada por duas tarefeiras.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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A escola encontra-se em regime de autonomia pedagógica e financeira. Por

esta razão conta com uma Secretaria cujo funcionamento é assegurado por uma

chefe de serviços administrativos e por uma tesoureira.

2 A Política Educativa da Escola

Na sua introdução, o projecto educativo de escola considera a Liberdade, a

Solidariedade e a Democracia como os valores fundamentais que norteiam a

acção da comunidade escolar. Conquanto estes valores não estejam, no

documento em análise, conotados expressamente com o ideal da inclusão,

constituem, contudo, referências morais facilitadoras da sua implementação, como

se confirmou no enquadramento teórico. Como objectivo nuclear é, proposto neste

projecto - ainda na sua parte introdutória - o preparar “os jovens para um mundo

em constante mutação” (p.2).

Na sua segunda parte, o projecto educativo de escola dá informação sobre

o meio envolvente, informação essa a que se fez referência, anteriormente,

aquando da análise contextual da situação sócio-cultural da comunidade local.

Seguidamente descreve a própria escola, em termos estruturais, organizacionais e

funcionais. De tal, também já se deu conhecimento, neste relatório.

Na secção intitulada Justificação do Projecto são identificados alguns

problemas existentes a nível escolar. Entre estes, realça-se “a necessidade de

maior cooperação entre todos os docentes” (p. 5). Trata-se, sem dúvida da

explicitação de uma lacuna relevante - mormente a nível de funcionamento de

uma organização escolar que se pretende inclusiva - que é, daquele modo,

reconhecida e fixada por escrito. A consciencialização da necessidade de

melhorar os índices de cooperação entre os agentes educativos terá sido

consequência do trabalho desenvolvido no âmbito do projecto orientado pelo

Professor Doutor Miranda Correia, uma vez que este investigador preconiza a

estratégia em questão como uma das traves mestras da edificação da escola

inclusiva.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 360

Um outro problema de que há igualmente registo por escrito, no documento

em questão, refere-se ao relacionamento interpessoal entre os alunos, o qual

atinge índices de agressividade que “continuam a situar-se além dos limites

considerados aceitáveis” (p. 6). Este aspecto assume, obviamente, uma relevância

central na problemática aqui estudada e que por esse motivo merece uma análise

mais aprofundada. Assim, a primeira sensação que emergiu perante a leitura

daquela informação foi a de que, a mesma, não parecia ter total correspondência

no plano real, uma vez que tal não era, efectivamente perceptível no dia a dia. Daí

que, informalmente, se questionasse o presidente do conselho executivo sobre

esta questão. A resposta apontou, de facto, para que a situação no momento era

bastante melhor do que há tempos atrás e que se constava, daquela forma, no

projecto educativo era porque a mesma transitava, nos exactos termos em que

estava escrito no projecto anterior e que se convencionou manter, no actual, por

razões preventivas. Clarificada, então, aquela questão, inferia-se, em

consequência, que o relacionamento interpessoal entre os alunos havia

melhorado, mas que não se considerava, ainda, nos níveis desejáveis.

Como princípio orientador, o projecto educativo remete para o conteúdo do

Decreto-Lei n.º 115-A/98, de 4 de Maio62, nomeadamente, “. . . concretizar na vida

da escola a democratização, a igualdade de oportunidades e a qualidade do

serviço público de educação”. Mais uma vez se confirma a sensibilidade da

comunidade escolar para a adopção de valores de algum modo associáveis ao

ideal inclusivo, sem que este seja, contudo, alvo de qualquer referência explícita

no seu projecto educativo.

O objectivo geral, constante no projecto educativo, afigura-se algo

abrangente e, simultaneamente, difuso uma vez que se traduz pela defesa e

promoção de uma “cultura de participação e de co-responsabilização, por forma a

criar um sentido de escola em que se dilua o individual e prevaleça o colectivo” (p.

7). Apesar dessa natureza difusa, parece legítimo deduzir-se que continua patente

a preocupação de reforçar a implementação de uma atitude global de cooperação

e que, em consequência, é percepcionada a necessidade de que a organização

62 Esta legislação regulamenta o processo de autonomia dos estabelecimentos de educação e de ensino.

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escolar caminhe decididamente para a sua gradual transformação em verdadeira

comunidade.

Como objectivos específicos estão presentes - no documento que é objecto

desta análise - os seguintes:

• lutar pela melhoria das condições do espaço físico da escola, interior e

exterior.

• criar estratégias e actividades que estimulem o envolvimento e participação

de toda a comunidade escolar, na convicção de que o conhecimento é de

todos e para todos.

• promover um maior envolvimento das famílias na escola, pela criação de

um ambiente acolhedor para todos.

• investir na formação contínua do corpo docente, não docente e, se

possível, das famílias, desenvolvendo a existência de mentes abertas,

predispostas à actualização de conhecimentos e saberes e à aprendizagem

contínua ao longo da vida.

• proporcionar às crianças vivências e experiências motivadoras através de

estratégias diferenciadas, respeitando a individualidade de todos e de cada

um.

• contribuir para a formação integral da personalidade das crianças,

formando cidadãos críticos, livres e responsáveis.

Como se pode constatar, os objectivos propostos no projecto educativo,

configuram um conjunto de propósitos semanticamente associados a um esforço

incisivo de procurar aproximar a resposta escolar de uma autêntica educação de

qualidade. Logo, existe uma forte consciência local do que se deve fazer para se

aperfeiçoar a oferta educacional. Todavia o seu impacto, ficará provavelmente

fragilizado devido ao facto de não existir, ainda, uma cultura sistematizada de

levar à prática efectiva parte das intenções contidas nos sucessivos projectos

educativos. Daí que alguns objectivos vão transitando de uns projecto educativos

para outros.

Ainda no que se prende com a pertinência dos objectivos em análise,

parece ser de referir, em especial, a natureza da preocupação que está inerente a

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um deles. Assim, no objectivo em questão, há uma referência expressa à

necessidade de serem desenvolvidas estratégias diferenciadas a fim de que seja

respeitada a individualidade de todos e de cada um. Como se pode facilmente

subentender, está aqui implícita a cultura da inclusão. Só que, como já se

acentuou anteriormente, este vocábulo, ainda não faz parte do código de

comunicação formal, usado na escola.

Também se infere, entretanto, através da análise dos objectivos em

questão, a existência de uma certa incoerência entre alguns dos problemas

diagnosticados e o projecto de acção. Ou seja, há problemas que são identificados

e integrados no conteúdo do projecto educativo de escola, mas, depois, acabam

por não ser objecto de preocupação activa a nível de resolução. Esta incoerência

não é, porém, total, uma vez que há determinados problemas que são alvo

efectivo de resolução. Está, por exemplo, nesta última situação, a necessidade

percepcionada de se actuar para melhorar a estrutura física da escola. Ora,

efectivamente este aspecto tem sido devidamente tido em conta na acção real e,

como efeito de tal, o edifício escolar tem sofrido significativos melhoramentos, nos

últimos tempos. Os resultados desta acção traduzem-se, por exemplo, numa nítida

ampliação e melhoria das condições físicas de atendimento da população escolar.

Logo, este aspecto é, efectivamente, alvo de atenção, tanto a nível dos objectivos

como a nível dos processos reais de intervenção.

Entretanto, para ilustrar, agora, a aludida incoerência entre as intenções e

os actos, refere-se, a título de exemplo, o facto de - como se referiu,

oportunamente - ter sido constatada a necessidade de serem promovidas

melhorias relativamente quer ao relacionamento interpessoal entre os alunos quer

à colaboração entre os adultos. Logo, estes dois aspectos foram identificados

como factores problemáticos no contexto da organização e do funcionamento da

escola. Consequentemente, julga-se que os mesmos deveriam ser,

expressamente, alvo de um conjunto de acções a desenvolver para que os

problemas em causa fossem resolvidos. Contudo, nem um nem outro dos factores

mencionados são objecto de referência no conjunto dos objectivos elencados no

projecto educativo de escola. Embora sabendo-se que o primeiro aspecto já não é,

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actualmente, muito preocupante, o certo é que se afigura adequado que algumas

medidas deveriam ser salvaguardadas com o intuito de prevenir eventuais

regressões no comportamento presente das crianças. Quanto ao segundo -

colaboração entre os adultos - representa um aspecto de referência crucial, no

que concerne à construção de ambientes relacionais inclusivos. Por conseguinte a

questão em apreço parece merecedora de uma atenção muito especial e, como

tal, deverá ser repensada pertinentemente no seio da comunidade escolar e ser

contemplada, sob uma lógica de resolução, no seu projecto educativo.

De salientar, ainda - pela sua relevância estratégica como factor de

mudança das práticas de organização curricular - o facto de estar contemplado, no

plano de acção a desenvolver, a construção dos projectos curriculares para cada

uma das turmas existentes. Entende-se residir neste aspecto uma das mais

relevantes virtualidades do conteúdo do projecto educativo de escola, a qual

parece traduzir um firme propósito interno de significativa inovação pedagógica,

procurando-se, por esta via, enquadrar a cultura curricular de escola, nos

pressupostos subjacentes à recente reorganização curricular do Ensino Básico.

De realçar, também, a menção específica às crianças atendidas no âmbito

do projecto de apoio à multideficiência, menção essa que, pela sua pertinência se

transcreve: “ realização de actividades conjuntas com o Centro de Recursos/Sala

1663, a contemplar nos respectivos Projectos Curriculares de Turma, de forma a

promover em todos os alunos os valores da solidariedade e respeito pela

diferença” (p. 11). Este excerto é, por si só elucidativo da preocupação existente

em relação às crianças com necessidades educativas especiais e constitui um

inegável testemunho da vontade inclusiva que caracteriza a equipa educativa.

Porém - e como sempre - não se verifica a utilização de termos integrantes da

família vocabular de inclusão.

Finalmente, na secção respeitante à avaliação do projecto, é estabelecido

que esta incidirá sobre as actividades desenvolvidas, em concreto, pelos diversos

agentes educativos, individualmente, ou em equipas de trabalho. Como se poderá

depreender, o que se intenciona avaliar é o conjunto de actividades que

63 Espaço que funciona como a sede física do projecto.

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espontaneamente os elementos da escola desenvolvam, a título individual, ou em

equipa. Consequentemente, a avaliação não incide sobre os resultados

eventualmente a alcançar a nível de consecução de cada um dos objectivos de

intervenção expressos no projecto educativo de escola. Este facto parece mais

uma vez vir a confirmar - ainda que sob um outro ângulo de análise - a já

suficientemente referida incoerência entre as intenções e as acções. Ao mesmo

tempo este facto parece concorrer para justificar a frequência com que alguns dos

referidos objectivos vão transitando de um projecto educativo para outro.

3 A Origem e Funcionamento do Projecto de Apoio à Multideficiência

A informação relativa ao projecto de atendimento a crianças com

multideficiência, em curso na escola, foi recolhida por meio da análise de um

documento ali arquivado e elaborado em 1996 para servir de base escrita à

planificação do projecto em causa. Complementarmente serão, também, aqui

acrescidos dados recolhidos na entrevista realizada com a Coordenadora da

Equipa de Apoios Educativos, recordando-se aqui que foi durante o seu exercício

como professora de apoio na escola, que este projecto foi concebido e

implementado

Segundo a informação analisada, a Escola do Forte da Casa foi

confrontada, na parte terminal do ano escolar de 1995/96, com a eminência da

entrada, no ano escolar seguinte, de três crianças com problemáticas

educacionais extremamente complexas. Esta situação emerge como fruto da

vontade expressa por parte dos pais, os quais conscientes dos seus direitos, se

dirigiram à escola para efectuar a matrícula dos respectivos filhos.

Tratava-se, portanto, de um pequeno grupo de crianças cujas

características educacionais configuravam, na sua essência, um quadro de

multideficiência. Sumariamente as crianças em causa apresentavam o seguinte

perfil:

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a) Um aluno, com paralisia cerebral que, por essa razão, havia frequentado o

Centro de Paralisia Cerebral e que, após esse período, permaneceu em

casa, por falta de respostas educativas na sua área de residência;

b) Um outro com Síndroma de Down e epilepsia que recebia apoio

domiciliário, prestado por uma educadora e que havia frequentado,

paralelamente, um jardim de infância;

c) Ainda uma aluna com deficiências em várias áreas de desenvolvimento e

cujo diagnóstico, ainda hoje, não se encontra totalmente esclarecido. Esta

criança frequentou, também, um jardim de infância da sua área de

residência.

Na altura, aquelas crianças tinham idades compreendidas entre os sete e

os nove anos de idade, logo em plena idade de frequência da escolaridade

obrigatória. Este facto foi decisivo para a decisão dos pais em desejarem a

matrícula dos seus filhos na escola local. Perante a constatação daquele quadro

de necessidades educativas especiais, a equipa docente da escola, entendeu que

não dispunha de condições para assegurar o atendimento daquelas crianças pelo

que diligenciou no sentido de se inventariarem outras alternativas. Foi neste

sentido que se contactaram então, as instituições de ensino especial existentes no

concelho de Vila Franca de Xira. Porém, estes esforços revelaram-se infrutíferos

dado que nenhuma das instituições contactadas tinha vagas para aquelas

crianças.

A professora de apoio educativo de então - e actualmente Coordenadora da

Equipa dos Apoios Educativos de Vila Franca de Xira - manifestara, entretanto, a

opinião de que, estando as crianças dentro da idade da escolaridade obrigatória,

deveria ser o estabelecimento de ensino a garantir a efectividade do direito das

crianças à escolaridade. Dentro deste espírito sugeriu mesmo ao Director da

Escola que agendasse e propusesse a discussão da situação no respectivo

Conselho Escolar. Perante esta posição a questão acabaria por ser analisada pelo

conjunto dos professores da escola (conselho escolar). Nesta reunião a maioria

dos docentes pronunciou-se favoravelmente à entrada e frequência das crianças

na sua escola.

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Esta decisão iria abrir caminho, no seio da comunidade escolar a um

pertinente desafio pedagógico. A partir daquele momento a inclusão ganhou, ali,

um novo e factual sentido. Este evento representa, mesmo, um marco histórico na

vida da escola na medida em que, a partir de tal - e pela primeira vez na sua

existência - a comunidade educativa passava a lidar, no seu quotidiano, com

crianças portadoras de severas necessidades educativas especiais.

Dada a consciência da insuficiência de meios, o órgão de gestão da escola

diligenciou no sentido de ser elaborado, por escrito, um projecto educacional

relativo ao atendimento das crianças em questão e no qual constavam os meios

minimamente necessários para o efeito. O início do trabalho de atendimento

educacional das crianças em causa fora programado para o ano escolar seguinte

(1996/97).

Da versão escrita do projecto foi dado, de imediato, conhecimento aos

competentes serviços oficiais a fim de serem solicitados os recursos

indispensáveis à sua implementação prática. Neste contexto, foram contactados,

nomeadamente, o Departamento de Educação Básica e a Direcção Regional de

Educação de Lisboa. Paralelamente, informava-se, também, o Centro de Paralisia

Cerebral da Fundação Gulbenkian de Lisboa, da intenção da escola em assegurar

o atendimento educativo àquelas crianças.

O Departamento de Educação Básica demonstrou, de imediato, um

interesse profundo por aquele projecto, devido, quer à sua natureza inovadora,

quer à própria complexidade de que se revestia, na medida em que apontava para

uma intenção de atender crianças com uma problemática educacional

flagrantemente complexa. Dando consecução concreta e prática a este interesse,

aquele Departamento viria, rapidamente, a disponibilizar alguns recursos materiais

- nomeadamente equipamento didáctico e mobiliário - contribuindo, deste modo,

para a criação efectiva de condições que viabilizassem o desenvolvimento das

actividades.

Por sua vez, a Direcção Regional de Educação de Lisboa, protagonizou

idêntica postura de interesse e de apoio, disponibilizando a colocação de uma

educadora de infância e de uma auxiliar de acção educativa, para assegurar um

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atendimento individualizado das crianças. Paralelamente, aquele organismo

custeou, ainda, a realização das obras necessárias às adaptações físicas dos

espaços pedagógicos requeridos para a efectivação do projecto.

Finalmente, o Centro de Paralisia Cerebral da Fundação Gulbenkian - em

estreita colaboração com o Departamento de Educação Básica - aderiu também a

este processo de colaboração em parceria, comprometendo-se a proporcionar,

gracisamente, um dispositivo de formação junto dos agentes educativos

vinculados ao projecto. Aquela entidade acabaria, não só por assegurar a dita

formação como também o desenvolvimento de um plano posterior de supervisão e

de acompanhamento local aos referidos profissionais.

Como testemunho do envolvimento da comunidade envolvente, nesta

experiência educacional, saliente-se a colaboração da própria Junta de Freguesia

que, entretanto, planeou e efectuou trabalhos de reforço da segurança das

instalações. Esta diligência justificava-se perfeitamente, uma vez que o projecto

acabou por fazer com que diverso e valioso material didáctico chegasse à escola,

a qual temeu, em consequência, a possibilidade de vandalismo e de assaltos. O

mesmo organismo autárquico concedeu, ainda, determinados equipamentos e

recursos didácticos imprescindíveis ao processo de ensino-aprendizagem das

crianças.

Face aos factos relatados - e atendendo-se à relevância do que estava em

jogo - pensa-se ser justo, realçar, tanto a iniciativa da escola, quanto a

receptividade activa dos diversos serviços e entidades que se disponibilizaram, de

imediato, para um envolvimento solidário e participativo no desenvolvimento do

projecto de apoio educacional às crianças destinatárias do mesmo. São atitudes

desta jaez que demonstram que as escolas não estão sozinhas quando apostam

em levar por diante e com voluntarismo, projectos específicos de apoio a crianças

nitidamente carenciadas de tal.

Preconizando uma filosofia orientada, efectivamente, pelos princípios da

escola para todos - e em especial para as crianças com NEE - os mentores e os

Serviços implicados no projecto, imprimiram, convergentemente, uma dinâmica

pedagógica coerente com aqueles princípios. Em consequência destes propósitos

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os alunos em questão, foram, progressivamente, integrados nos processos

pedagógicos e didácticos das turmas a que, formalmente, pertenciam,

compartilhando, paralelamente, uma sala de apoio (conhecida internamente pela

sala 16). Este último espaço físico fora, entretanto disponibilizado para esse efeito,

mediante a realização das adaptações e obras, antes referenciadas.

As crianças em causa participam, assim, com regularidade, em

determinadas actividades desenvolvidas no seio da sua turma. As restantes

tarefas são realizadas, ou na sala 16, ou noutros espaços escolares e extra-

escolares. Estas actividades são objecto de programação individualizada e

integram-se, sob essa perspectiva, no plano curricular da turma. As crianças

multideficientes, quando em trabalho na classe regular, são para ali levadas e

acompanhadas por uma das educadoras vinculadas ao projecto. Inversamente, os

colegas da turma de referência deslocam-se de vez em quando, à sala 16, para aí

desenvolveram conjuntamente com os seus pares multideficientes, determinadas

actividades. Estas seriam de difícil execução nas salas das turmas de referência

devido à ausência de determinados equipamentos, os quais estão presentes na

sala usualmente utilizada como o espaço-sede do projecto (a referida sala 16) .

O tempo decorria e, com ele, o projecto ia consolidando as suas raízes

operativas, convertendo-se, deste modo, numa prática natural no interior das

rotinas pedagógicas da escola. O estímulo e o apoio dos serviços envolvidos

continuaram a fazer-se sentir junto da comunidade escolar.

Toda esta dinâmica de colaboração acabaria por conferir ao projecto, uma

visibilidade pertinente. Assim, este trabalho passou a ser objecto e pretexto para o

desenvolvimento de acções formativas, inclusivamente no contexto de parcerias

europeias. Genericamente estes dispositivos de formação enquadram-se na

temática do atendimento de alunos com necessidades educativas especiais nas

escolas regulares de ensino.

Conquanto o número actual de crianças tenha, entretanto, mais do que

duplicado em relação ao grupo inicial, mantém-se em todas, a característica da

multideficiência. Esta é, em termos gerais, traduzida por graves problemas de

cognição associados a disfunções, igualmente severas, de origem motora. São

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portanto, casos que suscitam situações reconhecidamente muito complexas a

nível da sua gestão educativa.

A escola foi ganhando, paulatinamente, experiência e saberes que eram

inusuais até então. A lidação diária, ao longo dos últimos anos, com estas

crianças, trouxe, efectivamente, aos docentes locais, uma nova concepção de

aluno e mesmo de escola uma vez que, até então, os objectivos estavam

basicamente centrados no aprender a ler e a escrever. Com a chegada daquelas

crianças esses objectivos passaram a ser considerados apenas alguns no meio de

tantos outros igualmente relevantes.

A cultura inclusiva ganhava, assim, um novo e decisivo impulso no

imaginário e na acção daquela comunidade educativa, se bem que estes aspectos

não tenham, ainda sido, alvo de uma conceptualização profunda por parte da

equipa educativa

A experiência consolidou-se, sem dúvida. Presentemente, o grupo de

alunos subiu para um total de sete. Todos estas crianças são - como se referiu já -

portadoras de multideficiência complexa.

Na escola, este projecto é considerado fundamentalmente como um

trabalho de atendimento educacional a alunos multideficientes. É algo que é

considerado como uma resposta a que estes alunos têm direito. A sua conotação

com os conceitos inerentes à inclusão não está, ainda devidamente reflectida e

clarificada. Nota-se, informalmente, uma certa confusão entre duas hipóteses: se o

projecto é um testemunho de integração, ou se, pelo contrário, se trata de uma

trabalho de inclusão.

A manutenção de um elevado nível de qualidade no desenvolvimento do

projecto é um objectivo central na preocupação do órgão de gestão. Contudo, a

sua concretização não tem sido tarefa fácil porque o pessoal envolvido varia de

ano para ano quase na sua totalidade, devido à já referida mobilidade docente. Há

anos em que as coisas correm melhor do que noutros. Para isto concorre a maior

ou menor sensibilidade e preparação do diferente pessoal que ali é colocado. O

órgão de gestão é incansável na sua missão de em todos os anos explicitar a

natureza e os objectivos que norteiam o projecto. O apoio, por parte dos serviços

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mantém-se mas a formação que foi dada inicialmente de um modo muito intenso

foi, com o passar dos tempos, esmorecendo. Actualmente é quase inexistente. Os

seminários orientados pelo Professor Doutor Miranda Correia, no âmbito do

projecto A Nossa Escola o Nosso Mundo: Colaborar para Incluir deram um novo

alento e imprimiram uma nova dinâmica à escola a qual teve reflexos muito

positivos na eficiência do trabalho com os alunos multideficientes. Porém, os

docentes (vinculados ao projecto) que participaram nos seminários em questão

saíram, entretanto, da escola. Os que vieram depois tentam fazer os possíveis

para que os alunos recebam uma resposta adequada mas as suas dúvidas são,

por vezes, muito difíceis de ultrapassar o que provoca, pontualmente, uma menor

curva de rendimento na eficácia nos resultados do projecto.

Independentemente das dificuldades que, pontualmente ocorrem como se

mencionou atrás, o projecto lá vai caminhando. Os profissionais locais

consideram-no como necessário e entendem que o mesmo contribui para tornar a

escola para uns mais inclusiva, para outros mais integradora. Os serviços oficiais

parecem, por seu turno, utilizar, também, esta dupla linguagem quando a ele se

referem. Tal, em si, não se afigura negativo de forma transcendente. Todavia

afigura-se conveniente clarificar a situação de hibridismo conceptual que se

verifica em redor do projecto e isto por força de três motivos:

a) Em defesa do rigor de terminologia que deve estar presente num trabalho

desta natureza;

b) O facto de se considerar que a comunidade escolar atingiu um patamar de

acção e de maturidade organizacional que justificam o direito a um

processo de teorização conceptual da sua história educativa recente;

c) A necessidade de ser introduzida uma noção de inclusão que, de algum

modo preserve o seu sentido intrínseco “uma vez que parece existir uma

grande controvérsia à sua volta, não só pelo facto de ao conceito em si

serem dadas diversas interpretações, mas também pela forma mais ou

menos abrangente como é visto” (Correia, 2003b, p. 15).

Tendo-se, então, em vista clarificar conceptualmente a questão, decidiu-se

aprofundar a pesquisa na literatura a fim de se recolher informação que, neste

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contexto, permitisse caracterizar, com um mínimo de rigor conceptual, a

experiência em causa. Há - refira-se - a consciência de que nesta secção do

trabalho o conteúdo deve ser mais ligado à realidade empírica do que

propriamente à especulação teórica, mas julga-se justificado recorrer-se aqui aos

contributos da investigação pela importância que o assunto detém no âmbito deste

trabalho de investigação. Para esse efeito são, aqui, considerados e analisados

vários pontos de vista de outros tantos autores.

Assim, Thomas, Walker e Webb (1998) sintetizam, de forma muito simples,

o sentido escolar do termo integração, relacionando-o com dois tópicos-chave :

1. Alunos com necessidades educativas especiais

2. Intervenção especializada junto daqueles alunos com vista à sua inserção

nas classes regulares de ensino.

Deste modo, a concepção do termo integração pressupõe, por um lado, o

enfoque em um determinado grupo de alunos (alunos com necessidades

educativas especiais) e por outro, o atendimento educativo daqueles nas salas de

ensino regular após todo um trabalho de prestação de serviços que os prepare

para tal.

Por sua vez, Sebba e Ainscow (1996), consideram o termo inclusão como

um processo através do qual a escola procura dar resposta a todos os alunos,

consubstanciando-se esse processo, sobretudo nos procedimentos relativos à

organização curricular e ao apoio educativo. Através desta perspectiva, os autores

em causa, consideram que a escola vai construindo, gradualmente, a sua

capacidade para aceitar todos os alunos da comunidade que ali devam ingressar e

que, ao proceder assim, torna real a possibilidade de incluir todos os alunos,

independentemente das suas potencialidades ou fragilidades. Sob este último

entendimento a inclusão - conforme a opinião em análise - comporta, então, duas

premissas nucleares:

a) A referência à totalidade dos alunos (sem, portanto, especificar qualquer

grupo em particular);

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 372

b) A deslocação, para a organização escolar, da responsabilidade de

assegurar a resposta pedagógica, simultânea, em tempo e em espaço, a

cada grupo/turma natural de alunos.

Já para Correia (2003b) a inclusão traduz-se - como aliás já foi mencionado

anteriormente - pela “inserção do aluno com NEE na classe regular, onde, sempre que possível, deve receber todos os serviços educativos adequados, contando-

se, para esse fim, com um apoio adequado...” (p. 16). Clarificando ainda mais a

sua concepção o mesmo autor acrescenta que “o conceito de inclusão não deve

ser tido como um conceito inflexível, mas deve permitir que um conjunto de

opções seja considerado sempre que a situação assim o exija...” (idem).

De permeio, Correia (2003a) esclarece que a integração precede a

inclusão. Assim, para este autor, a integração começa - a partir da década de 70

do século XX - a fazer-se sentir nas escolas regulares, primeiramente com a

integração física dos alunos com NEE, seguindo-se a integração social e,

finalmente, a integração académica. Nesta última fase verificava-se “o acesso

cognitivo à classe regular por parte dos alunos com problemáticas ligeiras” (idem,

p. 9).

Correia, na mesma obra (2003a), destrinça, também, o papel cometido à

educação especial numa e noutra das fases em análise. Assim, para este autor a

educação especial assume a função de lugar, na fase da integração, ao passo que

na fase da inclusão o seu papel é o de serviço. Interessante, sem dúvida o

significado que esta analogia de funções da educação especial induz na

compreensão de ambas as fases.

De acordo, entretanto, com a proposta de Correia, a noção conceptual de

inclusão assenta na verificação dos seguintes pressupostos:

a) Atenção específica aos alunos com NEE;

b) Inserção, sempre que possível, daqueles alunos na classe regular;

c) Disponibilização, aos alunos em causa, dos serviços educativos

adequados.

Clarificada, então - e muito sumariamente, até porque no capítulo da

revisão da literatura, tal já havia sido objecto de análise meticulosa - a

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 373

diferenciação conceptual existente entre o termo integração e o termo inclusão,

importa, agora, elencar as características fundamentais inerentes à experiência

educacional em curso na escola em estudo. Tais características podem ser

sintetizadas conforme consta na Figura 7, a seguir inserta.

• Primeira matrícula escolar de alguns dos alunos com idade superior à

legalmente prevista

• Primeira matrícula de alguns alunos na idade legalmente prevista

• Maior tempo de apoio em sala específica

• Pessoal educativo exclusivamente vinculado a este grupo de alunos

• Referência explícita à multideficiência

• Elaboração de um projecto de apoio específico

• Recurso à medida de ensino especial currículos alternativos (assente em

planificação/programação individualizada)

• Frequência ocasional da turma de referência por parte de cada aluno.

Figura 7. Características essenciais do Projecto de Apoio a Crianças Multideficientes

Reportando-se, agora, aos conceitos de integração e de inclusão antes

explicitados - e confrontando-se os mesmos com o conteúdo da figura 6 - julga-se

fundamentado concluir que:

a) As crianças em causa são portadoras de necessidades educativas

especiais;

b) Constata-se uma intencionalidade activa de inserir, temporariamente,

aqueles alunos em turmas regulares;

c) Simultaneamente, os alunos são alvo de uma programação educacional

individualizada, cujas actividades são desenvolvidas dentro e fora da

classe regular.

Assim e pela interpretação interactiva dos dados atrás apresentados, a

experiência educativa em análise parece não dever enquadrar-se, de modo claro,

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 374

no âmbito conceptual exclusivo de integração (expresso por Thomas, Walker e

Webb, ou por Correia), e muito menos no de inclusão defendido por Sebba e

Ainscow). Assim, o processo de atendimento dos alunos em questão parece

aproximar-se simultaneamente do modelo de integração, em relação aos alunos

cuja primeira matrícula foi efectuada significativamente para além da idade legal -

génese do projecto - e do conceito de inclusão para aqueles cuja matrícula foi

feita em idade apropriada. Em relação aos primeiros aconteceu que “ parte da sua

instrução processava-se na sala de apoio e parte na classe regular” (Correia,

2003a, p. 9). Então, a educação especial era mais um lugar do que um serviço.

Em relação aos segundos verificou-se que com o andar dos tempos a comunidade

escolar se foi aproximando do princípio organizacional inerente à inclusão, o qual

passa por uma dinâmica orientada para que fossem “criadas condições que

permitissem responder às necessidades educativas dos alunos com NEE nas

escolas regulares das suas residências” (idem, p. 9).

Decorrente deste espírito, os professores assumiram, então, o princípio de

abrirem as suas turmas, logo no início do ano, a alunos com problemáticas

complexas (crianças multideficientes) e, com maior ou menor dificuldade, vão

respondendo às suas necessidades, contando para tal, com a colaboração dos

docentes de apoio. Este atendimento é garantido sob procedimentos de

programação individualizada, cuja intervenção é realizada tanto na classe regular

como na sala de apoio (sala 16). Com esta gradual reorganização da cultura

escolar, a educação especial foi progressivamente passando de um lugar a um

serviço.

De grosso modo, por conseguinte, as práticas actuais da escola ganham

similitude com as ideias preconizadas por Correia, sobretudo se se atentar no

atributo de flexibilidade que este autor aconselha ter-se em consideração quando

se define o conceito de inclusão. Consequentemente, o projecto de apoio aos

alunos com multideficiência, ali matriculados pela primeira vez com a idade para

tal prevista, pode ser considerado como uma experiência de inclusão (na sua

acepção de moderada, ou progressiva e nunca total).

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 375

Esta questão parece, pois, merecer especial atenção, pelo que implica a

nível de percepção conceptual. Como se mencionou, antes, a experiência descrita

é considerada no seio da comunidade escolar em que se desenvolve, ora como

um testemunho claro e inequívoco de integração, ou como uma prática pura de

inclusão. No fundo é isso que acontece: um pouco de ambas as coisas. Só que a

percepção de onde acaba uma e começa a outra é que não parece minimamente

adquirida.

Neste contexto, aproveita-se a oportunidade para se reforçar a filosofia do

modelo de inclusão, definido e defendido no presente trabalho. Assim, como em

local próprio foi assumido, adopta-se, em termos nucleares, a perspectiva

defendida por Correia (1997, 2003a, 2003b), essencialmente orientada para a

inserção dos alunos com NEE, sempre que possível e sob a garantia de uma

educação apropriada (prestação individualizada de serviços especializados,

previamente planeados).

Contudo, em termos complementares, reafirma-se a preocupação de não

deixar de parte, num modelo inclusivo, as restantes crianças, dado que,

potencialmente, qualquer delas, em qualquer altura, - e por razões várias - pode

tornar-se num protagonista da exclusão escolar ou social. Neste pressuposto, uma

eficiente gestão pedagógica do projecto curricular de turma, desenvolvida em

cooperação estreita entre o professor titular de turma e o pessoal de apoio parece

consubstanciar uma resposta preventiva aos mencionados riscos de exclusão. É

sobretudo por esta razão que os projectos curriculares de turma e a acção da

equipa de programação educacional individualizada protagonizam os papéis-

chave no presente trabalho.

Ganha, pois, sentido, realçar a convicção de que a implementação

sistematizada de processos qualitativos de apoio educacional aos alunos com

NEE, pode ligar-se simultaneamente ao objectivo de melhorar a resposta

educativa da escola à generalidade dos alunos, desiderato que a tornará

efectivamente mais inclusiva. Pugna-se, aqui, por consequência, por princípios

que, uma vez operacionalizados, tornem a organização e funcionamento da escola

em meios estruturalmente dimensionados para disponibilizar um atendimento de

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 376

qualidade a toda e qualquer criança residente na sua área de influência,

independentemente da natureza do seu estilo de aprendizagem.

Reafirma-se, finalmente, que a concepção de inclusão preconizada,

pressupõe uma preocupação real e efectiva com a totalidade dos alunos - ainda

que muito específica, naturalmente, em relação aos alunos com NEE - de forma a

que cada um - independentemente da sua forma pessoal de aprender -

experimente e vivencie um autêntico sentimento de pertença à respectiva

comunidade escolar e que esta pratique, em relação àqueles, uma efectiva e

activa relação de aceitação.

O facto de se deixar bem frisado que os sentimentos de pertença e de

aceitação, em relação a todos os alunos, são cruciais na construção e

desenvolvimento da escola inclusiva, não significa que se não deva levar em linha

de conta, o elevado nível de rigor de processos e de procedimentos que devem

estar subjacentes ao atendimento qualitativo a que as crianças com NEE têm

direito. Pelo contrário, pois entende-se, igualmente de modo convicto, que se tal

não for equacionado numa dada escola esta estará completamente alheia aos

mais nobres ideais da inclusão.

Concretamente, visa-se, aqui, lutar e defender uma causa: a causa da

inclusão. Porém, torna-se relevante salientar - novamente - que não se defende

uma inclusão a qualquer preço, dado que tal perspectiva pode acarretar custos

elevados para determinadas crianças. Assim, preconiza-se que a análise

meticulosa das capacidades e limitações de cada criança com NEE deve ser

devidamente equacionada. Processo esse que deverá fundamentar e conduzir a

uma efectiva planificação e programação individualizadas, sempre que tal se

justifique. Neste contexto importa, pois, atentar muito reflexivamente, no facto de

que:

Se uma sequência de aptidões for ensinada automaticamente ou um conjunto de

estratégias educacionais usado indiscriminadamente, sem atendermos às

características singulares de um aluno e às suas capacidades de aprendizagem, o

resultado pode muito bem ser uma perda de tempo ou, até, um acto prejudicial ao

aluno, lesivo dos seus direitos. (Correia. 2003b, p. 12)

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 377

4 Dados Obtidos pela Entrevista: A Situação Escolar à Partida

Um dado crucial para o desenvolvimento do projecto de investigação

remetia, naturalmente, para a necessidade de se confirmar - em confronto com

outras fontes - o conhecimento pessoalmente detido sobre a história escolar local,

sobretudo sobre os aspectos que na sua organização funcional e pedagógica

indiciassem percursos e práticas na direcção de uma escola inclusiva. Como foi

entretanto referido, o conhecimento pessoal em causa foi sendo obtido em

resultado de múltiplos contactos e visitas efectuados à escola, ao longo dos

últimos anos. Porém, assumiu-se - dada a natureza da exigência científica e

metodológica deste trabalho - ser necessário que essa informação e esse

conhecimento fossem objecto de comparação e de confrontação críticas com

outras opiniões provenientes de pessoas que detivessem, igualmente, um

conhecimento seguro e pormenorizado da realidade organizacional e funcional da

escola em estudo. Para tal - como se explicitou e justificou em momento oportuno

- recorreu-se à realização de uma entrevista em profundidade à Coordenadora da

Equipa de Coordenação dos Apoios Educativos do concelho de Vila Franca de

Xira.

Os dados assim obtidos servem, pois, de base à informação apresentada

na presente secção, traduzindo, portanto, a representação, o conhecimento e a

compreensão da situação escolar, manifestados pela entrevistada. Os dados em

causa passam a ser apresentados de modo estruturado, ou seja, distribuídos, de

acordo com a sua natureza, pelas diferentes categorias que enformam o modelo

de escola inclusiva adoptado.

Para este efeito seguiu-se, de perto, a estrutura resultante do processo de

categorização dos dados da entrevista, procedimento fundamentado

cientificamente, já que os dados obtidos por “uma entrevista por perguntas

directas podem ser tratados por assunto ou por título” (Lessard-Hébert, 1996, p.

130). Nesta lógica, admite-se o pressuposto de que “ o termo assunto não é

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 378

utilizado aqui no sentido de sujeito novo ou de uma pessoa, mas no sentido de

uma categoria, de uma parte de um objecto de estudo, de um conceito ou de um

tema” (idem).

Antes da informação relativa à situação escolar propriamente dita, será

apresentado um conjunto de dados, os quais de forma resumida, retratam o perfil

profissional da entrevistada. Tais dados, de forma sistematizada, serão

seguidamente objecto de apresentação.

4.1 O Perfil da Entrevistada

Aquando da entrevista, a Coordenadora da Equipa de Coordenação dos

Apoios Educativos de Vila Franca de Xira foi convidada a resumir os seus dados

pessoais, tanto a nível das suas habilitações literárias como a nível da sua carreira

profissional. Com base na informação recolhida procede-se, de seguida à

descrição de uma e de outra situações.

A professora em apreço fez o Curso do Magistério Primário em Coimbra, no

ano de 1975. Iniciou a sua função profissional, como docente do 1.º ciclo, no

concelho de Castanheira de Pera. Seguidamente, exerceu essa função no

concelho de Loures.

Em 1979 entrou para a equipa educativa de uma instituição de ensino

especial, concretamente para a Cercitejo, em Alverca, já, por conseguinte, no

concelho de Vila Franca de Xira. Permaneceu nesta instituição durante dez anos,

os últimos quatro dos quais como sua Coordenadora Pedagógica.

Em 1989 deixa a Cercitejo e passa a desempenhar funções de professora

de apoio, também no concelho de Vila Franca de Xira. Este tipo de funções durou

até 1997. De 1994/1995 a 1996/1997 esteve a exercer funções como professora

de apoio na escola do 1.º ciclo do Forte da Casa (escola em estudo neste projecto

de investigação).

Deixou, em 1 de Setembro de 1997 as funções de professora de apoio para

assumir a Coordenação da Equipa de Apoios Educativos de Vila Franca de Xira,

onde se mantém actualmente (ano de 2003/2004).

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 379

Para além do Curso do Magistério Primário, a entrevistada possui o grau de

licenciatura em Ensino na Variante de Matemática e de Ciências. Tem, ainda, o

Diploma de Estudos Superiores Especializados em Educação Especial, na área de

Problemas Graves de Cognição.

Esta informação foi, assim, obtida directamente através da entrevistada, na

parte preliminar da entrevista, constando, portanto, do respectivo protocolo. Como

se optou por incluir estes dados no corpo principal do trabalho, os mesmos não

foram considerados no quadro de categorização elaborado para o tratamento da

informação resultante da entrevista.

4.2 A Cultura Organizacional de Escola

A análise de conteúdo da entrevista em questão oferece um acervo de

informação que possibilitou aquilatar, com apreciável nitidez, a representação da

entrevistada sobre os contornos da cultura organizacional de escola existente

aquando do início deste projecto de investigação. A parte que se segue dá conta

dos referidos contornos, a qual está organizada de forma a abordar cada um dos

tópicos que, neste contexto, se consideram relevantes.

Hábitos de reflexão colectiva - A comunidade escolar revela uma certa

ausência de hábitos de reflexão colectiva. A sua preocupação fundamental assenta

mais no fazer o seu trabalho rotineiro de atendimento dos alunos do que

propriamente procurar a conceptualização e fundamentação de tais práticas.

Concepção e práticas de inclusão - A ideia de inclusão é, basicamente

entendida como sinónimo de abrir a escola aos alunos com necessidades

educativas especiais, por um lado e, por outro, apostar no apoio aos mesmos,

tanto no interior da sala de aula, como noutros espaços. A partir de determinada

altura a escola passou a admitir todo e qualquer aluno da sua zona de influência,

independentemente da respectiva problemática. Igualmente a partir de então

nunca mais se verificou qualquer encaminhamento de alunos para instituições de

ensino especial. Em termos gerais, todos os agentes educativos locais aceitam e

concordam com estes princípios.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 380

O papel da liderança - O órgão de gestão dedica uma atenção especial ao

modo como decorre o atendimento educativo dos alunos com necessidades

educativas especiais, nomeadamente em relação aos que são abrangidos pelo

projecto de apoio às crianças multideficientes. Por norma, o presidente do

conselho executivo da escola passa, pelo menos uma vez por dia, no espaço onde

aqueles alunos são apoiados, quando não estão integrados na sua turma de

referência. A gestão da escola revela uma sensibilidade, uma consciência e um

respeito especiais pela dificuldade que aquele tipo de trabalho implica, pelo que,

por sistema, os profissionais que de mais perto lidam com aquelas crianças são,

amiúde, alvo de palavras de apoio e de estímulo, por parte dos responsáveis pela

gestão.

O presidente do conselho executivo demonstra uma crença activa e muito

determinada nos valores e nas práticas da inclusão em relação a todos os alunos

com NEE. Consequentemente, esta forma de ser e de estar incute na restante

comunidade escolar, uma predisposição genuína e voluntária para aquela aceitar e

trabalhar com crianças portadoras de problemáticas complexas.

Percepção de um modelo de escola inclusiva - A cultura de funcionamento

dos profissionais da escola está muito direccionada e centrada nos processos de

intervenção em sala de aula. Não existe uma ideia solidamente consensualizada

de como estruturar a organização global e sistematizada do estabelecimento de

ensino, sob o formato de um possível modelo de escola inclusiva. Há a noção clara

da necessidade de serem asseguradas determinadas dinâmicas como, por

exemplo, o funcionamento e contributo das equipas de planificação inclusiva e de

programação educacional individualizada (por influência do Projecto A Nossa

Escola o Nosso Mundo: Colaborar para Incluir). Contudo falta, por vezes, a

compreensão segura de como tal pode ser inserido numa estrutura e cultura que

envolva toda a organização da escola.

Há, também, como que uma espécie de crença, mais ou menos enraizada

de que pensar e falar em coisas que não se centrem nas actividades da sala de

aula é uma maneira de perder tempo. Há a prevalência nítida da cultura do fazer

face à da cultura do compreender os porquês.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 381

Angariação de recursos - Há a consciência de que o abrir das portas a toda

e qualquer criança implica dotar a escola de um mínimo de condições humanas e

materiais que possibilitem, àquelas, uma resposta suficientemente digna. Contudo,

o entendimento é de que a disponibilização dos recursos, por parte dos serviços,

passa por processos extremamente burocráticos e morosos. Ainda assim o órgão

de gestão nunca desanimou e porfia persistentemente em diligências diversas para

a sua obtenção. Os serviços de tutela, conhecendo a postura e o trabalho

desenvolvido pela escola acabam por colaborar, cedendo, por norma, os recursos

indispensáveis.

Atitudes e práticas de colaboração - Os modos de colaboração são, muitas

vezes, algo desgarrados e alvo de comportamentos assimétricos por parte dos

diversos profissionais. Uns (quase sempre os mesmo) colaboram mais, outros

menos. Estes processos de colaboração são mais evidentes nas alturas em que

ocorrem determinados eventos e que quase obrigam a tal. Entre estes contam-se

nomeadamente festas, exposições ou visitas de estudo. Parece haver a ideia de

que uma prática sistematizada de colaboração pode contribuir para a eficiência do

atendimento educativo dos alunos em geral e, em particular, dos que são

portadores de necessidades educativas especiais. Todavia a prática diária de tal,

ainda está distante de se poder considerar como minimamente satisfatória.

4.3 O Projecto Educativo da Escola

Grau de valorização do papel do Projecto Educativo de Escola - O projecto

educativo de escola não era, até há pouco tempo, alvo de uma atenção relevante.

O projecto existia mais como resultado da necessidade de dar cumprimento ao

que sobre a matéria estava legislado do que propriamente para consensualizar e

fixar a política educativa da comunidades escolar. Contudo, nos últimos tempos

tem vindo a ser dada maior atenção à sua elaboração, procurando-se que toda a

comunidade participe, quer na identificação, quer na resolução dos problemas

existentes a nível da estrutura escolar. Verifica-se, porém, uma certa discrepância

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entre o que está formalmente contemplado no projecto educativo e aquilo que

efectivamente se leva à prática.

Processo de elaboração e conteúdo - O projecto educativo de escola vigora

durante um período de três anos escolares. A sua redacção é, tradicionalmente,

da responsabilidade de um pequeno grupo constituído para o efeito. O conselho

de docentes pronuncia-se sobre os problemas mais significativos com que, no seu

entender, se debate a comunidade escolar. Esses problemas são objecto de

referência no projecto educativo, propondo-se, seguidamente, a sua resolução no

período de vigência do mesmo. Os problemas referentes à estrutura física e ao

espaço escolar são, por norma, resolvidos naquele período temporal. Já as

lacunas constatadas a nível atitudinal, ou a nível de mudanças pedagógicas, são

de resolução muito mais lenta, transitando, assim, de um projecto para outro.

O conteúdo do projecto educativo de escola era, há tempos atrás, muito

simples e não continha qualquer referência explícita ao ideal da inclusão.

Actualmente, o seu conteúdo é mais elaborado, procurando-se que o mesmo se

afirme como uma referência, quer para o conhecimento da situação presente, quer

para dar e indicar um sentido para a acção futura. Integra, algumas ideias

importantes relativas à forma como todos alunos devem ser atendidos. Continua,

no entanto, sem fazer qualquer referência concreta ao termo inclusão.

4.4 A Equipa de Planificação Inclusiva

Processo de criação e de funcionamento – Foi criada há alguns anos atrás

(1999) por efeitos da participação da escola no projecto “A Nossa Escola o Nosso

Mundo: Colaborar para Incluir”. Inicialmente a sua acção foi muito frutuosa na

consolidação da cultura e das práticas inclusivas. Porém, a sucessiva mudança

dos seus elementos - devido à conhecida mobilidade do pessoal docente - tem

retirado alguma coesão e eficiência à sua acção. Igualmente a tendência recente

de a grande maioria dos docentes se centrar quase que exclusivamente no

trabalho em sala de aula tem fragilizado o impacto da acção desta equipa.

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Situação actual - Na altura da entrevista a equipa parecia estar com

algumas falhas a nível da sua coesão funcional. A sucessiva mobilidade dos

professores, desfez, praticamente o grupo inicial. Ao mesmo tempo, a maioria dos

professores centra-se - como já se salientou - na sua sala de aula demonstrando,

de modo geral, pouco interesse por qualquer outro tipo de trabalho. A importância

desta equipa continua presente nos elementos da gestão que, em cada ano, tenta

assegurar a sua reorganização, principalmente junto dos elementos que a

integram pela primeira vez.

4.5 A Equipa de Programação Educacional Individualizada

Criação e funcionamento – Esta equipa foi, também, criada no âmbito do

projecto “A Nossa Escola o Nosso Mundo: Colaborar para Incluir”. O seu

funcionamento inicial teve grande impacto no fortalecimento das atitudes e

práticas inerentes ao atendimento dos alunos com NEE.

Situação actual – A mudança sucessiva de professores, no arranque de

cada ano escolar esbateu, de certo modo, a dinâmica inicial. A maioria dos seus

elementos actuais não participou nas sessões de formação desenvolvidas no

âmbito do projecto “A Nossa Escola o Nosso Mundo: Colaborar para Incluir”, pelo

que não lhes tem sido fácil a apropriação das atitudes e procedimentos ali

abordados. As práticas de planificação e de programação individualizadas

apresentam, pelas razões apontadas, aspectos que necessitam de ser

melhorados.

4.6 A Educação Especial e os Apoios Educativos

Estratégias de intervenção - Está bastante consolidada a prática de

desenvolver o apoio no espaço da sala de aula. Só os alunos multideficientes são

alvo de prestação de serviços educativos, tanto na sala de aula como no Centro

de Recursos/Sala 16. Os professores de apoio são considerados como recurso

exclusivo dos alunos com NEE. As adaptações curriculares têm vindo a ser

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 384

elaboradas, mais ou menos de acordo com o previsto no Decreto-Lei n.º 319/91,

de 23 de Agosto, sob uma responsabilização muito directa dos professores de

apoio.

Caracterização e mobilidade dos recursos - Os serviços de tutela têm

ultimamente disponibilizado um número de professores de apoio que corresponde

ao mínimo necessário. A mobilidade docente, neste sector, tem sido muito intensa.

A escola contava, na altura, (2001/2002) com três educadoras de infância e quatro

professores do 1.º ciclo do ensino básico. A quantidade tem sido mais ou menos

satisfatória, a qualidade é que nem tanto dado que só um dos docentes de apoio

era - na altura da entrevista - especializado.

Articulação com os professores titulares de turma - Os professores titulares

de turma têm vindo a aceitar com toda naturalidade, o apoio dos colegas dentro da

sua sala de aula. Os professores de apoio observam, inicialmente como os

professores titulares de turma trabalham e, depois, desenvolvem a sua acção de

apoio de modo ajustado ao que observaram. A maioria dos professores titulares

de turma não tem experiência na elaboração das adaptações curriculares que se

tornam necessárias para alguns dos seus alunos. Assim, tal tarefa é transferida

praticamente de forma exclusiva para os professores de apoio.

A escola conta também com o apoio, em tempo parcial, de uma psicóloga

clínica. O trabalho desta é desenvolvido, preferencialmente, em contexto de sala

de aula.

4.7 Os Modos de Gestão da Sala de Aula

A diversidade dos alunos - Em algumas turmas existem alunos

considerados bastante complexos. Os professores têm consciência de que

aqueles são muito diferentes entre si, mas conhecem-nos sobretudo pelas

dificuldades e problemas que apresentam. Este conhecimento assenta

fundamentalmente numa base perfeitamente empírica dado que a generalidade

dos professores não recorre nem a práticas nem a instrumentos sistematizados de

avaliação diagnóstica. As turmas são entendidas mais como um somatório de

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 385

crianças distintas umas das outras do que uma realidade sócio-educativa com

uma identidade única e concreta.

Estratégias de intervenção - Em termos gerais os docentes tendem a usar

estratégias mais ou menos semelhantes para todos os alunos. Verifica-se uma

atenção aluno a aluno quando estes apresentam nítidas dificuldades na

aprendizagem. Este aspecto é mais evidente no que toca aos alunos com NEE,

enquadrados em regime de PEI. Neste contexto verifica-se que, de um modo

geral, os professores recém-chegados à escola denotam bastantes dificuldades

em lidar com tais alunos. Há poucas dinâmicas de trabalho grupal nas salas de

aula. As actividades escolares apoiam-se bastante no modelo expositivo. Os

professores dão repetida e minuciosamente instruções sobre cada tarefa que os

alunos devem realizar. Por esta razão, os alunos estão sempre à espera que o

professor vá dizendo o que fazer e como fazer. As actividades são muito

parecidas para todos os alunos. O professor, normalmente é o centro de toda a

actividade na sala de aula. As práticas de avaliação são essencialmente centradas

na apreciação dos produtos

Necessidade de inovação das práticas - De um modo geral, as formas de

trabalho mantêm-se muito tradicionais. A maioria dos professores ensina como se

ensinava há anos atrás. A intervenção pedagógica é realizada um pouco como se

os alunos fossem todos iguais, exceptuando-se o caso dos docentes mais antigos,

no seu trabalho com os alunos com NEE. Não existem estratégias

verdadeiramente inovadoras, embora aqui e ali se registe uma ou outra actividade

menos rotineira. No fundo, a maioria dos docentes trabalha como lhes foi ensinado

aquando da sua formação inicial.

4.8 O Pessoal Auxiliar da Acção Educativa

Caracterização genérica - São considerados em número insuficiente para as

necessidades da escola. A maioria tem uma idade relativamente avançada, facto

que inibe, de certo modo, os processos de mudança. As suas habilitações

literárias são de nível baixo.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 386

Funções - A maior parte do pessoal auxiliar da acção educativa não

participa em actividades pedagógicas de forma sistematizada. Todos os

elementos aceitam bem a presença dos alunos com necessidades educativas

especiais, no espaço escolar. O objecto principal da sua actividade é a limpeza

das salas, bem como dos restantes espaços das escola. Constata-se, em geral,

uma diferenciação muito nítida entre as funções dos professores e as deste

pessoal. Neste sector, apenas o pessoal vinculado ao projecto de apoio educativo

às crianças multideficientes desenvolve, de modo sistemático, funções de

natureza educativa.

4.9 O Envolvimento Parental

Relação escola-família - Os contactos entre a escola e a família são muito

frequentes. Há professores que sabem lidar bem com os encarregados de

educação e há outros que revelam como que uma espécie de receio. As

estratégias de envolvimento das famílias, no acompanhamento do percurso

escolar dos educandos são as que trivialmente se praticam, ou seja, assentam na

realização de reuniões gerais nos finais de cada período lectivo para comunicar os

resultados da avaliação e em práticas de atendimento individualizado de

encarregados de educação, em horas previamente estipuladas para o efeito. Por

vezes é chamado à escola, este ou aquele encarregado de educação para serem

analisadas determinadas situações pontuais, mais ou menos urgentes e relativas

aos respectivos educandos.

Postura dos pais - A Comissão de Pais demonstra um interesse activo no

acompanhamento do funcionamento escolar, colaborando voluntariamente, em

grande parte dos projectos em curso na escola. A maioria dos pais evidencia um

sentido de responsabilidade real em relação ao processo educativo dos filhos.

Contudo, existe, também um número - ainda que restrito - de pais que não

dedicam uma atenção suficiente ao acompanhamento do percurso escolar das

suas crianças.

Page 387: Tese de Doutoramento.pdf

________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 387

4.10 As Mudanças Prioritárias

Gestão pedagógica das turmas - Uma vez que de um modo geral, o

trabalho dos docentes assenta em bases tradicionais, é percepcionada a

necessidade de que as turmas sejam entendidas, por parte dos respectivos

professores, de forma diferente, nomeadamente como unidades sócio-educativas

concretas e diferenciadas. Seguidamente, torna-se necessário que os professores

as saibam gerir, pedagogicamente, como tal.

Afigura-se igualmente premente que os alunos passem a ser alvo de uma

metodologia de intervenção mais adequada às suas capacidades e interesses a

fim de serem reforçados os níveis de inclusão na sala de aula. De uma forma

geral, os professores entendem que os projectos curriculares de turma são meios

capazes de melhorar a resposta educativa a todos os alunos. Contudo, a grande

maioria ainda não sabe bem como organizar e gerir tais projectos.

Para que a mudança seja efectiva torna-se indispensável que neste

processo de inovação sejam activa e simultaneamente envolvidos os professores

de apoio e a psicóloga. Os professores que nos últimos anos têm chegado à

escola evidenciam atitudes e saberes pouco adequados à inclusão dos alunos com

NEE pelo que urge ajudá-los a superar tais limitações.

Práticas de colaboração – Impõe-se inverter a tendência generalizada de os

professores locais se preocuparem quase que em exclusivo com o que passa na

sua sala de aula. Consequentemente, importa, em alternativa, que aqueles sejam,

reflexivamente sensibilizados para a conveniência da assunção fundamentada de

práticas conducentes a uma maior cultura de colaboração e de cooperação entre

todos. Este aspecto nem parece difícil de conseguir dado que há a consciência

teórica - e nalguns casos até de práticas pontuais - de que tais procedimentos são

facilitadores da inclusão.

Equipa de Programação Educacional Individualizada - Torna-se imperioso e

urgente desenvolver procedimentos que promovam o reganhar da coesão e de

segurança desta equipa. A acção desta equipa é de uma importância crucial para o

atendimento adequado dos alunos com NEE. Por essa razão corporiza um dos

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 388

eixos essenciais na construção de uma escola inclusiva. É premente, por

conseguinte desenvolver um trabalho que conduza à optimização da sua

funcionalidade no âmbito da comunidade escolar. Para tal, julga-se que seria

conveniente proporcionar aos seus elementos, um contacto sistematizado e

aprofundado com a essência dos conteúdos abordados, nesta matéria, pelo

Professor Doutor Luís de Miranda Correia, no âmbito do projecto “A Nossa Escola

o Nosso Mundo: Colaborar para Incluir”.

5 Resumo e Interpretação da Informação Relevante Apresentada de modo sistematizado a informação recolhida, importa agora

proceder à análise da que se considera mais relevante, em função dos objectivos

do trabalho. Assim, com base na análise da informação apresentada - quer

recolhida por análise documental, quer por meio da entrevista - será feito, de

seguida, um balanço dos seus aspectos mais significativos, designadamente

quanto ao nível das atitudes e práticas inclusivas em curso na escola, tanto a nível

dos processos organizacionais, como a nível dos procedimentos pedagógicos em

sala de aula. Pela sua importância estratégica neste contexto, o projecto de apoio

à multideficiência será, também, aqui, objecto de algumas considerações

específicas.

5.1 Atitudes e Práticas Inclusivas em Termos Organizacionais

Desenvolvendo-se uma apreciação analítica da informação recolhida, julga-

se haver fundamento para se inferir, de modo genérico, que a comunidade escolar

em estudo revela muito mais pendor para a acção do que para a reflexão. No que

toca a esta inferência importa, no entanto, realçar que esta característica

manifestada pela equipa educativa em causa, nada terá de negativo, antes pelo

contrário. Contudo, julga-se que esse facto estará na origem de algumas

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 389

fragilidades conceptuais, atitudinais e procedimentais constatadas - no âmbito da

educação inclusiva - a partir da análise dos dados obtidos.

Assim, nota-se uma certa despreocupação no que respeita à clarificação e

consensualização conceptuais de alguns termos, nomeadamente, em relação ao

termo inclusão e à expressão escola inclusiva. Claro que neste contexto será

muito mais relevante o fazer do que, propriamente, definir e explicar o que se está

a fazer. Todavia, haverá que ter em conta a possibilidade de se incorrer em

determinados equívocos quando se avança de modo incisivo para certas práticas

sem haver um processo mínimo e prévio de compreensão conceptual do que está

- ou poderá estar - subjacente a tais práticas. No fundo é o que parece que

acontece um pouco com a equipa de profissionais desta escola.

Refira-se, entretanto, que a acção ali encontrada não se afigura muito

preocupante sob o ponto de vista pedagógico em particular e da inclusão, em

geral. Apenas pecará, talvez, por ausência de uma consciência profunda da

relação causal entre as práticas e os seus fundamentos teóricos.

Em termos gerais os procedimentos locais relativos aos alunos com NEE

podem sintetizar-se do seguinte modo:

a) Abertura da escola a toda e qualquer criança da sua área de influência;

b) Assegurar o apoio aos alunos com necessidades educativas especiais

dentro da respectiva sala de aula, sempre que possível;

c) Promover o atendimento educacional a estes alunos sob o regime de

programação individualizada.

A ocorrência real destes três aspectos é, só por si, de pertinente significado,

tanto mais que os mesmos estão, provavelmente, longe de ser tão assertivamente

assegurados na generalidade das escolas como o são nesta. Constituem,

portanto, passos de extraordinário relevo numa organização educativa que aceita

e valoriza os ideais básicos de uma escola para todos. É, pois, graças a este

posicionamento dos profissionais em questão, que um grupo concreto de crianças,

portadoras de graves problemas educacionais, é atendido junto e em interacção

com os seus amigos e vizinhos. Conquanto, portanto, se pressinta alguma

fragilidade conceptual no imaginário dos educadores locais, a verdade é que as

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 390

sua práticas indiciam um elevado teor de inclusão, pelo que se afigura desejável

proporcionar-lhes a respectiva teorização. Tal não se afigura difícil. Bastará, até,

que os docentes locais interpretem - de forma reflexiva e à luz dos princípios da

inclusão - o sentido do que, neste âmbito, já vão fazendo.

Realce-se, a propósito, o facto de a comunidade escolar em apreço denotar,

genericamente - como se constatou - alguma ausência de hábitos de reflexão

conjunta, situação que se julga estar na base da não consolidação conceptual de

algumas das ideias-chave inerentes à educação inclusiva. Esta questão afigura-se

significativa, não como um dado de conotação crítica àquele conjunto de

profissionais, mas sim como um factor que devidamente equacionado e

problematizado internamente, poderá, em resultado de tal, contribuir para uma

mais profunda clarificação dos caminhos a trilhar e, consequentemente, abrir

novos percursos conducentes à melhoria dos resultados educativos da

generalidade dos alunos e dos próprios alunos com NEE..

Nesta perspectiva prefigura-se então determinante partir daquilo que a

comunidade é e faz, para que possa vir a ser e a fazer um trabalho intrínseco de

educação inclusiva e em que esta filosofia seja assumida como:

a) Uma forma de atender todo e qualquer aluno da sua área de influência

(desiderato já assumido).

b) Um meio pedagógico de optimizar a potencialidade de aprendizagem de

todos e de cada aluno e de acordo com as respectivas capacidades e

limitações (o princípio da atenção à diversidade).

c) Um processo de maximizar o atendimento dos alunos com NEE,

aproximando-o assim daquilo a que Correia (2003a, 2003b) designa por

adequação apropriada.

Constata-se, então, com clareza que muitos e importantes passos foram já

dados. Verifica-se, porém, que há que continuar a caminhada pois que muitos

passos ainda estarão por dar. Por exemplo, concluiu-se que a cultura da escola

faz coincidir a ideia de inclusão com o atendimento educativo de um determinado

grupo de alunos (alunos com necessidades educativas especiais). Está perfeito.

Porém, crendo-se que, actualmente, todo e qualquer aluno, quer seja portador, ou

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 391

não, de necessidades educativas especiais, está, potencialmente, sujeito à

exclusão (quantos e quantos destes últimos não estão nesta situação por esse

país fora!), preconiza-se o princípio de que as escolas deverão igualmente atentar

nesse risco potencial de exclusão e, consequentemente, preveni-lo, através de

estratégias para tal orientadas. Ao preconizar-se esta premissa pensa-se que se

está, ainda, a batalhar pelos ideais da inclusão pelo que se afigura ajustado que

esta preocupação se integre num trabalho desta natureza.

Logo, a inclusão será, aqui, concebida como uma verdadeira educação de

qualidade para todos os alunos de uma escola, ainda que à medida de cada um. E

é - acredita-se - sob este princípio que poderá ser salvaguardada, não só a

legítima igualdade de oportunidades como, também, a consecução de uma escola

genuinamente democrática. De resto a própria comunidade escolar local tem

desta perspectiva uma noção muito precisa, pelo que a intenção de fundo deste

trabalho - entender a escola inclusiva como uma educação de qualidade para

todos os alunos - preserva e reforça o ideário da equipa educativa da escola do 1.º

ciclo do Forte da Casa. A confirmação de tal encontra-se, até, patente no seu

projecto educativo onde se pode constatar - como em local próprio se referiu - que

“proporcionar às crianças vivências e experiências motivadoras através de

estratégias diferenciadas, respeitando a individualidade de todos e de cada um”

corporiza, precisamente, um dos seus objectivos específicos.

Passar da noção já consensualizada de atendimento a todos os alunos com

necessidades educativas especiais (preocupação centrada com alguns) à

necessidade de prestar atenção à diversidade (prestação de atenção específica a

todos, ainda que modo particular aos alunos com NEE) parece pois, ser um passo

crucial a dar pela cultura organizacional da escola, para que esta se torne

irrepreensivelmente inclusiva. Repete-se, portanto que é esta a concepção de

escola inclusiva que se perfilha na elaboração e no desenvolvimento prático deste

projecto de investigação. Provou-se também, que a concepção em causa se

coaduna com um ideal já expresso - pelo menos em termos formais - pela

comunidade escolar observada. Daí que se afigure ter fundamento a convicção de

que aquela comunidade aparenta encontrar-se em estado de maturação

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 392

adequado para adoptar e activar, a nível de operacionalidade real, a dita

concepção.

Deduz-se, ainda, pela análise dos dados recolhidos, que se nota uma certa

incipiência interna nos procedimentos de colaboração e de cooperação entre os

diversos profissionais desta comunidade escolar. Efectivamente parece que um

grande número de professores se centra essencialmente no seu próprio trabalho,

tendo, pois, como epicentro, a sala de aula e como alvo preferencial os alunos

mais problemáticos. Entrevê-se, neste facto, uma coerência - ainda que parcial -

com a concepção de educação inclusiva, a qual, como já se frisou, visa, tanto

quanto possível, o atendimento, em cada sala de aula, dos alunos com

necessidades educativas especiais. Contudo, se a perspectiva tender a ser a de

inclusão de todo e qualquer aluno - em que para além da inevitável preocupação

específica com os meus alunos com necessidades educativas especiais, se passa

para uma política educativa centrada em processos de se prestar atenção à

diversidade, isto é, às necessidades individuais de todo e de qualquer dos nossos

alunos - então a presente postura de cada um trabalhar por si entrará, certamente

em ruptura, uma vez que a percepção da crescente necessidade de dinâmicas de

colaboração e de cooperação será inevitável. Aliás, como a maioria dos autores

proclama a própria qualidade do atendimento aos alunos com NEE, numa

determinada escola é proporcional aos índices de colaboração e de cooperação ali

praticados. Consequentemente, vão num único sentido, as razões elencadas para

a necessidade de serem promovidos, na escola em estudo, graus mais elevados

de interacção colaborativa. Assim - e em conformidade com o que a literatura de referência tem

apontado - parece ganhar foros de grande evidência, o princípio de que os

caminhos para uma escola genuinamente inclusiva - centrada, por conseguinte, na

perspectiva da atenção à diversidade - impõe o desenvolvimento de uma sólida

cultura de colaboração e de cooperação entre todos os elementos da comunidade

escolar. Tal premissa parece, então, significar que enquanto aquela cultura não

estiver minimamente conseguida, também o não estará a consecução do ideal

inclusivo.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 393

Localmente é já percepcionada a necessidade de reformular algumas

rotinas através da introdução de novas formas de organização e de funcionamento

da escola. Para corroborar esta afirmação, relembra-se, por exemplo, que no

projecto educativo de escola consta, expressamente, a necessidade de maior

cooperação entre os docentes. Por tudo quanto já se referiu quanto à importância

daquele aspecto, forçoso é de admitir que no seio da comunidade escolar começa,

já a emergir, uma certa tendência, não só para a reflexão - ainda que seja, na

maioria dos casos, por motivos meramente formais (necessidade de elaboração

do projecto educativo de escola) - como, também - e em consequência desta nova

atitude - para a inventariação dos procedimentos a introduzir para que a resposta

educativa se torne cada vez mais adequada às necessidades individuais de todos

os alunos, como já se demonstrou.

Retornando-se à sugestão apresentada por Barberá (1988), a qual aponta

para que o projecto educativo de escola deve ser analisado segundo três

vertentes, concretamente, aspectos do ideário, estilo de educação e critérios

gerais de actuação, julga-se, haver fundamento para - em relação a cada um dos

factores mencionados - se deduzir, na escola-alvo, a existência dos seguintes

factores:

a) Aspectos do ideário - Respeito pelo princípio da igualdade de

oportunidades e da individualidade.

b) Estilo de educação - Subordinação ao objectivo da formação integral dos

alunos, a desenvolver de modo sistematizado através da gestão de

projectos curriculares de turma.

c) Critérios gerais de actuação - Trabalho algo individualizado, muito centrado

em cada sala de aula, conquanto seja já perceptível uma certa tendência

futura para o reforço das atitudes de colaboração e de cooperação.

Em resumo pode-se, então, considerar que a escola não configura uma

organização estática. Antes consubstancia uma entidade viva que, de algum

modo, se vai apercebendo de que algumas mudanças se tornam inevitáveis para

que a sua acção seja optimizada. Conforme prenuncia Eisner (1988), a inovação

organizacional começa quando os seus actores percepcionam o sentido e os

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 394

significados subjacentes à mudança. E é esta a situação que parece ocorrer com

a comunidade escolar em estudo, facto que, portanto, alimenta toda a convicta

esperança de que o projecto de consecução de uma escola inclusiva é, no caso

vertente, uma meta, desafiante sim, mas também estimulante na medida em os

dados recolhidos indiciam que poderá tornar-se em algo de tangível.

5.2 Atitudes e Práticas Inclusivas em Termos Pedagógicos

Como se pode comprovar através do recurso a variadíssimos autores, a

sala de aula consubstancia um factor de influência determinante na consecução

da educação inclusiva. Ora entendendo-se esta como o desenvolvimento de um

processo de ensino-aprendizagem que visa responder de modo adequado a todo

e qualquer aluno, infere-se que, neste aspecto, será necessário que os docentes

locais, de um modo geral, introduzam mudanças mais ou menos significativas nas

suas práticas pedagógicas tradicionais. Com esta mudança será, talvez, de

esperar que todos os alunos - e, logo, cada um - passem a usufruir de um

atendimento maximizado em termos de qualidade.

Pela informação obtida verifica-se que a generalidade dos professores

gerem a sua intervenção educativa em sala de aula de um modo essencialmente

empírico, ou seja, desenvolvem a sua prática educativa sem o recurso a

instrumentos sistematizados de observação e de registo de comportamentos e de

desempenhos. Muito provavelmente esta será uma prática muito usual nas

escolas portuguesas, nomeadamente a nível do primeiro ciclo do ensino básico e,

portanto, os docentes em estudo nem sequer pressentirão razões para alterar

aquela postura, uma vez que fazem o que sabem ser uma prática mais ou menos

generalizada, um pouco por todo o lado.

Procurando-se, entretanto, vislumbrar eventuais consequências da ausência

de registos estruturados de observação e de registo dos modos de trabalhar e de

aprender dos alunos, julga-se haver motivos para, neste contexto, identificar as

seguintes:

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 395

a) Conhecimento pouco aprofundado dos estilos de aprendizagem de cada

aluno;

b) Tendência para os professores trabalharem sempre da mesma maneira as

diferentes turmas por que vão passando, dado que não dispõem de

elementos rigorosos que evidenciem as reais diferenças entre aquelas;

c) Prevalência da pedagogia do ensino face à pedagogia da aprendizagem.

Ou seja, como a actividade pedagógica é decorrente da forma como os

professores normalmente trabalham, acaba por ser a lógica destes a gerir

toda o processo de ensino-aprendizagem (pedagogia do ensino), uma vez

que não se parte do conhecimento metódico dos estilos de aprendizagem

dos alunos para fundamentar a planificação da actividade lectiva adequada

àqueles estilos (pedagogia da aprendizagem);

d) Impasse perante situações apresentadas pelos alunos portadores de

problemáticas educacionais mais complexas. Efectivamente a falta de

hábitos sistematizados de análise dos diferentes estilos de aprendizagem e

das consequentes e fundamentadas tomadas de decisão educativas

apropriadas, leva a que persista, nas salas de aula, um certo estilo de

ensino mais ou menos padronizado e dirigido, essencialmente, ao leque de

alunos, normais. Ora quando, nas turmas, aparece um ou outro aluno com

necessidades educativas muito específicas, os professores rapidamente

dão conta de que a sua capacidade habitual de resposta não é adequada

àqueles alunos, pelo que estes são, por esta razão e muito naturalmente,

assinalados para o apoio. Torna-se, portanto, aconselhável aprofundar o

rigor dos processos de avaliação, de planificação, de programação e de

intervenção individualizadas juntos daqueles alunos, bem como melhorar a

articulação dos intervenientes neste âmbito.

Outras implicações seriam, igualmente, possíveis de elencar, neste quadro

da intervenção educativa na sala de aula. Porém, afigura-se que as anteriormente

expostas fornecem uma leitura suficientemente clara para se compreender a

realidade ali presente. Acentue-se, contudo - e mais uma vez - que, neste

contexto, muito de positivo já ali ocorre, como seja o facto de todos os professores

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 396

aceitarem, de modo natural, qualquer aluno na sua turma e, também, ser

igualmente verdade que a prestação do apoio, por parte dos docentes da

educação especial e dos apoios educativos, é, sempre que possível, assegurada

no interior da sala de aula e durante os tempos lectivos normais da turma. Trata-

se, por conseguinte - e sem qualquer espécie de dúvida - de factores de grande e

decisiva relevância no que respeita a práticas docentes indiciadoras de atitudes

inclusivas.

Adequar as práticas em sala de aula, mormente através de estratégias de

flexibilização e de diferenciação pedagógica, converte-se, em suma, numa

prioridade cimeira no capítulo das mudanças a operar junto da comunidade

educativa local. Para que estas mudanças surtam efeito é imperioso que sejam

também intensificados os procedimentos de avaliação diagnóstica dos estilos de

aprendizagem presentes em cada grupo de alunos. Será, pois, com base neste

conhecimento das formas de aprender dos alunos que os professores poderão ver

fundamentadas as aludidas estratégias de diferenciação educativa.

Em síntese há que prever com rigor quais as mudanças requeridas para

que a escola passe a ser capaz de, em termos práticos, reforçar qualitativamente,

o ideal da inclusão para todos os alunos, tendo-se no entanto sempre em conta

que aquele, entre outros, “nasce com um fim, o de inserir as crianças com NEE

severas nas escolas regulares das suas residências (Correia, 2003b), p. 16).

Trata-se de uma oportunidade crucial a proporcionar àquelas crianças. Tal implica

“também salvaguardar os seus direitos, respeitando as suas características

individuais, as suas capacidades e as suas necessidades específicas” (idem). É

este o sinal de alerta que pode e deve ser sempre respeitado, respeito esse que

nalguns casos poderá levar mesmo à concretização de modalidades de

programação e de atendimento indiviualizados que não se esgotem na sala de

aula.

No final de contas, todas estas questões são preocupações que de alguma

maneira estão já presentes no espírito da generalidade dos docentes locais. Os

princípios activamente defendidos pelos próprios elementos do órgão de gestão

são, de tal, um frutuoso exemplo.

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5.3 O Sentido do Projecto de Apoio à Multideficiência

Este projecto representa um marco muito significativo na história recente da

escola, nomeadamente no que concerne ao início das práticas, ali em curso, de

atendimento sistematizado a crianças com problemáticas educativas muito

complexas. Será de notar, neste contexto, que a génese do processo se deveu à

iniciativa dos pais das crianças em questão, os quais conscientes dos seus

direitos se dirigiram à escola de referência para que a mesma matriculasse e

respondesse, em termos educacionais, aos seus filhos. A escola aceitou

convictamente o desafio e a partir daquele momento diligenciou no sentido de

serem criadas condições humanas e materiais para que a resposta solicitada

fosse garantida.

O projecto foi sendo consolidado e aberto a outras crianças igualmente

portadoras de multideficiência. A sua forma de funcionamento parece

minimamente ajustada quer às condições da escola quer ao perfil educacional dos

alunos, conquanto se registem, pontualmente, algumas flutuações no que

concerne à qualidade da resposta. Concretamente, a emergência de um novo tipo

de necessidades apresentadas por alguns dos alunos sugere que se torne

desejável a activação de determinados ajustamentos estratégicos no

funcionamento do projecto. Um dos fundamentos para essa reformulação decorre

do facto de que as crianças vão, naturalmente, atingir em breve, idades que não

são as normais para a frequência do ciclo de ensino em que se encontram

actualmente. Paralelamente, vai evoluindo também a natureza das suas

características educacionais. A convergência de ambas as circunstâncias implica,

portanto a necessidade de serem equacionadas novas respostas, as quais

deverão passar pela exploração de outras experiências de aprendizagem,

nomeadamente aquelas que só serão possíveis em contacto com a vivência

pedagógica, orientada e sistematizada, no seio da comunidade envolvente. Tais

experiências deverão, então, ser norteadas pelo objectivo de optimizar a

autonomia pessoal e social de cada uma das crianças em causa.

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Finalmente, julga-se ser de clarificar o entendimento conceptual que,

localmente - e não só - é feito em torno deste projecto. Como se realçou, na

secção devida, esta experiência educativa é considerada, ora como uma prática

de integração, ora como uma prática de inclusão sem que pareçam estar

percebidas as razões de uma ou outra opção. Como também se constatou, os

teóricos da problemática da inclusão apontam para a necessidade de se

verificarem determinados requisitos para que as prática educativas possam ser

consideradas inclusivas. Entende-se - e já se explicitou o porquê - que esses

requisitos não estão, na sua totalidade, operacionalmente presentes no projecto

em apreço, nomeadamente a nível dos procedimentos inerentes ao processo de

uma autêntica educação apropriada, segundo o sentido que lhe é dado por

Miranda Correia em várias das suas obras. Consequentemente, entende-se ser

pertinente clarificar e melhorar este aspecto, a fim de que a comunidade escolar

consciencialize, de forma conceptualmente correcta, a noção profunda quer de

integração, quer de educação inclusiva.

5.4 O Impacto Estratégico da Intervenção Prioritária

Conforme se descreveu anteriormente a preocupação com a intervenção

prioritária centrava-se fundamentalmente em dois grandes vectores:

a) A gestão pedagógica das turmas em sala de aula;

b) A intensificação das práticas de colaboração no âmbito das respostas aos

alunos com NEE, mormente através do reforço da coesão funcional da

equipa de programação educacional individualizada.

O primeiro dos factores mencionados aponta para o propósito de se

melhorar a resposta à generalidade dos alunos - pensando-se também aqui,

logicamente, nos alunos com NEE - assentando num pressuposto que se traduz

pela necessidade de os docentes aprofundarem as suas competências de

diagnóstico do estilo de aprendizagem de cada um dos seus alunos. Tal

pressuposto decorre da premissa de que só sabendo como os alunos aprendem é

que os professores os poderão ensinar de forma apropriada. Tudo isto parece dar

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corpo, portanto, ao verdadeiro fundamento da educação de qualidade para todos

os alunos.

Desenvolvendo metodologias de intervenção que se coadunem com os

processos e ritmos de aprendizagem protagonizados por cada aluno, estes sentir-

se-ão motivados e certamente que os seus níveis de aproveitamento se

ressentirão, positivamente, de tal. Diminuirá, desta forma, a tendência para o

abandono escolar, cuja génese ocorre, em grande número de casos, na própria

sala de aula. Consequentemente, a escola torna-se mais inclusiva e serão

menores as situações de potencial marginalidade, risco a que - repita-se - nenhum

aluno está imune. Ora, levando-se a cabo uma intervenção prioritária que incida

nestes aspectos, afigura-se que tal será conseguido mediante um trabalho

centrado precisamente na organização e gestão dos projectos curriculares de

turma. Será, pois, esta temática que será objecto de abordagem específica no

primeiro ciclo de intervenção. Com ela - espera-se, pelas razões antes expostas -

subirão os níveis de qualidade da resposta educativa da escola e, com eles, o

grau da sua capacidade de inclusão face à generalidade dos alunos.

O segundo dos vectores elencados para ser tratado no domínio da

intervenção prioritária, remete para a optimização dos níveis de colaboração e de

cooperação entre os diversos agentes profissionais, sobretudo no que concerne à

organização e gestão dos processos de atendimento aos alunos com NEE. Esta

acção terá como fulcro de enfoque - como se explicitou antes - a equipa de

programação educacional individualizada (EPEI).

Efectivamente - como sugerem vários autores - as características e

necessidades dos alunos com NEE impõem o reforço das práticas de colaboração

e de uma cultura sistemática de elaboração de itinerários educativos rigorosa e

adequadamente individualizados. Estão, aqui em jogo, por conseguinte, os

processos de trabalho que se consideram imprescindíveis para garantir o direito à

inclusão dos alunos com NEE. Razão mais do que ponderosa para que a

optimização da coesão EPEI seja, ela, também, alvo de abordagem específica no

primeiro ciclo de intervenção (intervenção prioritária) no seio do presente projecto

de investigação-acção.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 400

Reflectindo-se, finalmente, sobre o impacto associado dos conteúdos

previstos para a intervenção prioritária, entende-se ter fundamento a convicção de

que, da mesma, resultará um conjunto reforçado de saberes-fazer, os quais

consolidarão e intensificarão de maneira muito significativa a cultura e a prática

inclusivas da escola em estudo. Afigura-se, até, que o núcleo duro de uma escola

inclusiva, como aqui é considerada - uma educação de qualidade para todo e

qualquer aluno em geral e em particular para os alunos com NEE - ficará

praticamente edificado, pedra a pedra, com a implementação metódica, por um

lado, dos processos de criação e desenvolvimento dos projectos curriculares de

turma e, por outro com o funcionamento optimizado da equipa de programação

educacional individualizada. São pois, estes os motivos que levam a configurar a

crença de que o objecto da intervenção prioritária materializa estrategicamente os

pilares em que assenta a construção de uma escola genuinamente inclusiva.

6 Inferências Relativas à Metodologia Adoptada

Como se demonstrou, a recolha de informação de campo centrou-se,

essencialmente, em fontes documentais e na realização de uma entrevista.

Também, oportunamente, se fundamentou esta opção. Sendo, porém, claro, que

outras alternativas, neste âmbito, poderiam ter sido utilizadas, importa, assim,

reflectir sobre o grau de adequação daquela opção. Neste contexto, torna-se,

então, crucial ter em conta os objectivos que presidiram, precisamente, à recolha

da informação em causa, sendo que estes, resumidamente, são os seguintes:

a) Evidenciar a história dos percursos e das práticas desenvolvidas pela

comunidade escolar.

b) Situar a escola no ponto - tão exacto quanto possível - em que mesma se

encontra no trajecto conducente ao modelo de escola inclusiva adoptado.

Ora, analisando-se a pertinência e a natureza dos dados obtidos e

confrontando-os com os objectivos pretendidos, afigura-se ter cabal cabimento

deduzir-se que as opções metodológicas adoptadas para a recolha da informação

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 401

se revelaram perfeitamente eficientes. Efectivamente, após tratados e analisados

os dados em questão, ficou-se com uma ideia muito clara e precisa não só dos

trilhos já precorridos pela comunidade escolar, mas também do ponto em que a

mesma se encontrava na rota para a consecução de um modelo exaustivo de

escola inclusiva. Logo, a metodologia por que se optou revelou-se cabalmente

adequada aos fins que lhe estavam subjacentes.

Conhecida em profundidade a história pró-inclusiva da escola e identificado

o ponto em que se a mesma se situava no itinerário do modelo adoptado, estavam

pois, conseguidos os requisitos imprescindíveis para se passar à configuração do

conjunto dos percursos e das práticas a implementar, localmente, para que a

escola se transformasse num testemunho real do modelo em questão. Dar a

conhecer tais percursos e práticas é, por conseguinte, o propósito do capítulo que

se segue.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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CAPÍTULO IV

OS CAMINHOS PARA A SITUAÇÃO DESEJADA

Esta componente do trabalho será essencialmente dedicada à

apresentação dos conteúdos e dos processos a desenvolver para que a

organização escolar em estudo prossiga a seu itinerário para a consecução

concreta do modelo de escola inclusiva adoptado. Conforme foi, já, frisado, a

planificação do itinerário em causa respeita, em absoluto, tanto o percurso, já

concretizado pela escola, neste contexto, como o estilo e o ritmo de

funcionamento característicos dos actores locais.

1 Os Fundamentos da Planificação

Os contributos fornecidos pela revisão da literatura, por um lado, bem como

a informação recolhida localmente, por outro, configuram os elementos

significativos e essenciais para delinear, tanto o plano global de acção necessário

para que a escola continue a sua caminhada para o modelo sistémico de inclusão,

como o quadro dos conteúdos de cada dimensão daquele plano. Entretanto, uma

reflexão mais atenta neste aspecto específico conduz à percepção de que o

modelo de escola inclusiva daí resultante - e que se pretende concretizar - não

coincide, totalmente, com nenhuma das propostas similares contidas na literatura

consultada. Contudo, prefigura-se ser de justiça realçar que, o mesmo, se estriba

nuclearmente, nas ideias que neste âmbito são avançadas por Correia (1997,

2003a, 2003b) .

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 403

Para o mencionado facto de se não haver verificado uma coincidência

absoluta com nenhum modelo anteriormente teorizado, concorreu, em primeiro

lugar a preocupação de se procurar conciliar o conjunto dos circunstancialismos

locais, com os formatos sugeridos pelos investigadores e vice-versa. Sob este

prisma, procurou-se, então, assegurar um equilíbrio que, sem adulterar qualquer

das referências em jogo, permitisse a consecução científica, metódica e

contextualizada dos objectivos perseguidos. Em segundo lugar - pelos motivos

que foram oportunamente explicitados - figurou a intenção de integrar no modelo

adoptado as determinações formais entretanto estabelecidas pelo sistema

educativo e veiculadas pelo Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro,

nomeadamente no que respeita aos projectos curriculares de escola e, também,

de turma.

Apesar, portanto, de o modelo em si próprio não se sobrepor a nenhum

outro afigura-se, no entanto, dever referir-se que os fundamentos e a matéria para

a planificação da estratégia de intervenção decorrem - e muito - da informação,

perspectivas e sugestões obtidas através de toda a consulta bibliográfica levada a

cabo, bem como da legislação antes referida. Simultaneamente - como se fez

prova - a informação recolhida localmente, forneceu os elementos necessários,

não só para descrever a história mais recente da organização escolar, mas

também para precisar o ponto onde a mesma se encontrava, à data do início

desta investigação. Complementarmente, a mesma informação serviu, ainda de

base para contextualizar toda a edificação teórica subjacente ao modelo de escola

inclusiva tido como referência. Contudo, tanto um como os outros tipos de

informação mencionados acabaram, de algum modo, por serem formatados e

modulados, também, pelo conjunto de significados subjectivamente elaborados

pelo autor do trabalho, através da vivência de interacção social entretanto

desenvolvida no interior da instituição, em contacto assíduo com os profissionais

que ali exercem a sua função.

A ausência, no país, de modelos holísticos - ou, se os há não foram, até ao

momento, objecto de divulgação formal - de implementação prática de escolas

inclusivas provocou, entretanto, uma espécie de vazio no que concerne à

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 404

idealização dos procedimentos metodológicos a activar, junto da comunidade

escolar, para facilitar a evolução, desde o ponto em que a mesma se encontrava,

até ao patamar desenhado para cada um dos diversos componentes sistémicos

do modelo concebido.

Para resolver - ou, pelo menos, para minimizar - o problema referido,

procurou-se sempre explorar, tanto quanto possível, as sugestões encontradas na

bibliografia. Quando, após esgotada essa exploração, se verificava que algo

faltava, ainda, para a respectiva planificação, recorria-se à criatividade pessoal -

alicerçada, naturalmente, na experiência profissional obtida ao longo de quase

quatro décadas de trabalho - a fim de dar continuidade, lógica e metodológica a

cada passo, até que os resultados obtidos fossem considerados aproximados do

perfil que se julgou adequado, com base no seu confronto com os dados retirados

da literatura. Toda esta estratégia desembocaria na materialização de um acervo

importante de materiais e de contributos organizacionais e pedagógicos. A forma

como esses contributos foram tratados e organizados de molde a dar lugar ao

modelo adoptado, é em grande parte, uma espécie de engenharia conceptual

delineada pelo investigador. Daí que o resultado global se afigure - acredita-se –

como algo de inédito na realidade portuguesa. Consequentemente, pressente-se

neste aspecto - e pelas razões antes expostas - uma das maiores virtualidades do

presente trabalho.

2 A Planificação da Acção

Sistematizada a informação recolhida, sob a lógica de categorias de análise

estruturantes do modelo de escola inclusiva adoptado, importava, em termos de

continuidade de desenvolvimento do projecto, equacionar as hipóteses de

trabalho, consideradas adequadas para a consecução dos propósitos previamente

delineados. Para a construção de tais hipóteses recorreu-se a um processo de

confrontação entre os dados constantes em cada categoria - os quais traduzem,

como se verificou, a situação existente - com a informação de idêntica natureza

obtida mediante a pesquisa literária.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 405

Ao confrontaram-se as premissas enunciadas verificou-se que se

confirmava, genericamente, o pressuposto de partida. Ou seja, confirmou-se que a

escola evidenciava efectivamente aspectos que indiciavam, já, uma certa cultura

de princípios e de práticas inclusivas, mas cuja dimensão não configurava uma

proximidade metódica a qualquer modelo de escola inclusiva.

Em consequência, a lógica seguida para a identificação das hipóteses de

trabalho a concretizar no âmbito da intervenção, assentava, precisamente, no

estudo das lacunas apresentadas em cada categoria. O resultado deste estudo

clarificava, simultaneamente, o percurso já realizado pela escola e o caminho a

percorrer, dentro de cada categoria de análise, para se atingir, para cada uma

destas, os níveis preconizados pelos investigadores consultados e que constam

no enquadramento teórico deste trabalho.

Neste quadro importava, portanto, mobilizar duas estratégias fundamentais:

a) Valorizar, manter e reforçar os aspectos organizacionais e pedagógicos em

curso localmente e que apresentavam conformidade substantiva com os

princípios da escola inclusiva;

b) Incrementar, internamente, o desenvolvimento da organização escolar em

direcção aos objectivos traçados, de modo contextualizado e integrado, a

fim de que os mesmos fossem alcançados sem ser desrespeitada a

identidade cultural da comunidade escolar.

Os resultados dos procedimentos antes explicitados forneceram os

elementos necessários à elaboração da planificação global da acção a

desenvolver para que se possa vir a atingir a situação desejada. Visa-se, desta

forma prudente, metodológica e fundamentada, concretizar, portanto, a

aproximação da instituição em estudo, ao modelo de escola inclusiva prefigurado.

Para tal tentou-se, tanto quanto possível, especificar em pormenor os

conteúdos a abordar e a trabalhar na - e pela - escola, de modo a permitir uma

antecipação significativamente fiel do modo como virão a ser desenvolvidas as

acções tidas como adequadas para materializar a caminhada pretendida, desde o

ponto em que aquela se encontra. Trata-se, por conseguinte, já, de uma

planificação de nível operacional, em que cada uma das suas componentes traduz

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uma espécie de roteiro das sucessivas acções a levar a cabo junto da comunidade

local para diluir a distância entre a situação actual e a situação desejada.

2.1 A Especificação Operacional da Planificação

Conforme foi explicitado oportunamente, a estrutura do modelo de escola

inclusiva adoptado, figura como a matriz de referência orientadora da organização

lógica de todo este trabalho de investigação. Nesta perspectiva, segue-se idêntico

princípio relativamente ao processo de planificação do quadro de acções

concretas a desenvolver no seio da escola para que esta caminhe da situação

actual para uma situação futura, tanto quanto possível coincidente com o modelo

em causa. De permeio emerge, entretanto, a necessidade de, a partir daquela

referência matricial (isto é do conjunto de categorias integrantes do modelo de

escola inclusiva), se definirem os roteiros de desenvolvimento das acções

necessárias à consecução do fim pretendido. Tal é, então, o objectivo nuclear

desta secção. Nesta lógica, serão, então apresentados cada um dos sucessivos

roteiros de objectivos e de conteúdos a trabalhar, em cada uma das várias

categorias do modelo, com a comunidade escolar em estudo, para se alcançarem

as metas pretendidas.

Cada um dos roteiros em questão conterá, também, a indicação dos

autores cujos contributos foram tidos em consideração para a definição dos

conteúdos nucleares de cada categoria do modelo. Como se depreenderá, a

totalidade dos roteiros em questão corresponderá ao trajecto global a percorrer

pela escola, desde o seu ponto actual até à sua transformação metódica e

rigorosa num estabelecimento de ensino inclusivo, segundo o modelo e

perspectivas aqui expostos e defendidos.

Segue-se, então, um pouco mais à frente, a apresentação do conjunto de

quadros (roteiros de acção) que correspondem, no seu todo, à planificação

sistematizada das mudanças a implementar a nível da organização e

funcionamento da comunidade escolar. Para uma antecipada e compreensiva

visão global desta planificação, adianta-se a sua descrição sumária no seguinte

quadro sinóptico:

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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Quadro 9

Quadro Sinóptico dos Roteiros das Acções a Desenvolver para a Consecução da

Situação Desejada

Roteiros

Dimensões do Modelo de Escola Inclusiva

Roteiro 1 Cultura Organizacional de Escola

Roteiro 2 Projecto Educativo de Escola

Roteiro 3 Projecto Curricular de Escola

Roteiro 4 Equipa de Planificação Inclusiva

Roteiro 5 A Projectos Curriculares de Turma (conceito, relevância

pedagógica e guião-base)

Roteiro 5 B Projectos Curriculares de Turma (organização e

desenvolvimento)

Roteiro 6 Equipa de Programação Educacional Individualizada

Roteiro 7 Educação Especial e Apoios Educativos

Roteiro 8 A Gestão da Sala de Aula: Princípios Orientadores

Roteiro 8 B Gestão da Sala de Aula: Atenção à Diversidade

Roteiro 8 C Gestão da Sala de Aula: Formação Integral dos Alunos

Roteiro 8 D Gestão da Sala de Aula: Procedimentos de Avaliação

Roteiro 8 E Gestão da Sala de Aula: As Novas Tecnologias de

Informação

Roteiro 8 F Gestão da Sala de Aula: O Papel Estratégico do

Professor Titular de Turma

Roteiro 8 G Gestão da Sala de Aula: Sistematização do Atendimento

à Diversidade

Roteiro 9 Auxiliares da Acção Educativa

Roteiro 10 Envolvimento Parental Seguidamente, serão apresentados, um a um, os quadros de especificação

dos sucessivos roteiros. O conteúdo dos quadros em apreço traduz, portanto, os

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caminhos a percorrer - com base na situação encontrada - para que a escola

venha a configurar, de forma substantiva, o modelo idealizado.

Quadro 10

Roteiro 1 – Planificação da Acção Relativa à Cultura Organizacional de Escola

1. Objectivos

1.1 – Proporcionar a apropriação dos conceitos de cultura organizacional e de inclusão 1.2 – Identificar as variáveis nucleares do funcionamento escolar 1.3 – Analisar o modelo de escola inclusiva adoptado 1.4 – Sensibilizar para a necessidade de reforçar as dinâmicas de reflexão e de colaboração 1.5 – Promover atitudes de inovação 1.6 – Reforçar práticas de resolução colectiva de problemas 1.7 – Estimular a responsabilização colectiva pela totalidade dos alunos 1.8 – Valorizar a percepção dos resultados dos alunos como indicadores da qualidade educativa 1.9 – Identificar estratégias de liderança indutoras da escola inclusiva

2. Conteúdos

2.1 – Explicitação conceptual de cultura organizacional e de inclusão 2.2 – As variáveis essenciais da organização escolar 2.3 – Proposta e debate de um modelo de escola inclusiva 2.4 – A relevância das práticas de reflexão, de colaboração e de resolução colectivas de problemas 2.5 – Os fundamentos da necessidade de inovação educativa 2.6 – O princípio da co-responsabilização colectiva pela totalidade dos alunos 2.7 – Os resultados escolares dos alunos como indicadores da qualidade da acção escolar 2.8 – A liderança no quadro de uma escola inclusiva

3. Referências bibliográficas - Antúnes & Gairín (1990). Formación de Equipos Directivos. Madrid: MEC. - Correia, L. M. (1997). Alunos com Necessidades Educativas Especiais nas Classes Regulares de

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 409

Ensino. Porto: Porto Editora. - Faro, B. & Vilageliu, M. (2000). The next step for Special Education. 5es. Jornades Tècniques d’

Eduación Especial. Barcelona: APPS. - Hopkins, D. & Ainscow, M. (1993). Making sense of school improvement an interim account of the

“Improving the Quality for All Project”. Cambridge Journal of Education, 23 (3), 287-304. - Rossman, G., Corbett, H. & Firestone, W. (1998). Change and Effectiveness in Schools: a cultural

perspective. Albany, NY: State University of New York Press. Sailor, W. (1991). Special education in the restructured school. Remedial Special Education, 12

(6), 8-22. - Schein, E. (1991). Organizational culture and leadership. San Francisco: Jossey-Bass. (citado em

Ainscow, M. (1997). Educação para todos: Torná-la realidade. Caminhos para as escolas

inclusivas. Desenvolvimento curricular na Educação Básica, 6, 11-31. Lisboa: IIE/Ministério da Educação.

- Stainback, S. & Stainback, W. (1996). Inclusion: A guide for educators. Baltimore: Paul Brookes.

- Wang, M. (1998). Atención a la diversidad del alumnado. Madrid: Narcea.

Quadro 11

Roteiro 2 – Planificação da Acção Relativa ao Projecto Educativo de Escola

1. Objectivos

1.1 - Reconceptualizar a ideia de projecto educativo de escola 1.2 - Vincular a necessidade de inovar as formas processuais de elaboração do projecto educativo

de escola 1.3 - Reflectir sobre o tipo dos conteúdos essenciais do projecto educativo de escola, bem como da

necessidade de uma articulação efectiva entre as intenções ali expressas e as práticas 1.4 – Estimular a consagração do princípio de ser dedicada à aprendizagem do currículo a maior

quantidade de tempo possível 1.4 - Identificar o projecto educativo de escola como o ideário da cultura organizacional e funcional

da comunidade escolar

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1.5 – Sensibilizar para a importância da participação alargada da comunidade educativa na construção, execução e avaliação do projecto educativo de escola

1.6 – Contemplar, de forma explícita no projecto educativo de escola, o primado da colaboração/cooperação entre todos os profissionais ali em exercício

1.7 – Fomentar a definição dos princípios orientadores da política de inclusão a integrar no projecto educativo de escola

2. Conteúdos

2.1 – A concepção de projecto educativo de escola 2.2 – Os requisitos actuais para a elaboração do projecto educativo de escola 2.3 – Identificação dos conteúdos nucleares do projecto educativo de escola 2.4 – A articulação coerente entre os diversos conteúdos do projecto educativo 2.5 – O guião-base dos princípios para uma educação inclusiva: um ideário para a inclusão 2.6 – As práticas de colaboração/cooperação como meio facilitador da educação inclusiva 2.6 – O envolvimento da comunidade educativa na elaboração, execução e avaliação do projecto

educativo de escola 3. Referências bibliográficas - Barberá, V. (1989). Proeycto Educativo. Plan Anual del Centro. Programación docente Y

Memoria. Madrid: Escuela Española. - Carvalho, A. (Org.). Almeida, L., Afonso, M. & Araújo, E. (1993). A construção do Projecto de

Escola. Porto: Porto Editora. - Creemers, B. (1994). The effective classroom. London: Cassell. - Leite, C., Gomes, L. & Fernandes, P. (2001). Projectos Curriculares de Escola e Turma. Conceber

Gerir e Avaliar . Porto: Asa Editores. - Townsend, T. (1997). What makes schools effective?. A comparison between school

communities in Australia and the USA. School Effectiveness and School Improvement, 8 (3), 311-326.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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Quadro 12

Roteiro 3 – Planificação da Acção Relativa ao Projecto Curricular de Escola 1. Objectivos 1.1 – Analisar o conteúdo das referências ao projecto curricular de escola patentes no Decreto-Lei

n.º 6/2001, de 18 de Janeiro 1.2 – Situar o projecto curricular de escola face ao projecto educativo 1.3 – Conceptualizar o projecto curricular de escola 1.4 – Discutir o significado pedagógico da contextualização curricular 1.5 – Estabelecer um guião-base para a elaboração do projecto curricular de escola 1.6 – Identificar as prioridades curriculares face ao contexto sócio-cultural da comunidade escolar 1.7 – Fixar as estratégias curriculares a privilegiar numa gestão pedagógica subordinada aos

princípios da inclusão 2. Conteúdos

2.1 – A semântica curricular do Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro 2.2 – A interdependência do projecto curricular de escola face ao projecto educativo 2.3 – O conceito e os objectivos do projecto curricular de escola 2.4 – A pertinência da contextualização curricular 2.5 – Proposta para a estruturação do projecto curricular de escola 2.6 – Prioridades curriculares locais e sua fundamentação 2.7 – Estratégias curriculares para uma educação inclusiva 3. Referências bibliográficas

- Coll, C. (1985 b). Psicología y Currículum: una aproximación psicopedagógica a la elaboración del currículum escolar. Barcelona: Laia

- Correia, L. M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais: um guia para educadores

e professores. Porto: Porto Editora. - Coll, C. (1989). Aprendizage Escolar y Construcción del Conocimiento. Buenos Aires: Paidos.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 412

- Del Carmen, A. & Zabala, M. (1987). Orientación y criterios para la elaboración de proyectos

curriculares. Barcelona: Departamento de Psicología Evolutiva y de la Educación de la Universidad Complutense.

- Giné, C. (1998). Hacia dónde va la integración? Cuadernos de Pedagpgía, 269, 40-45. - Leite, C., Gomes, L. & Fernandes, P. (2001). Projectos Curriculares de Escola e de Turma –

Conceber, Gerir e Avaliar. Porto: Edições ASA. - Resnick, L. (1987). Educational and learning to think. Washington, DC: National Academy Press.

4. Legislação de suporte

- Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro

Quadro 13

Roteiro 4 – Planificação da Acção Relativa à Equipa de Planificação Inclusiva

1. Objectivos

1.1 – Sensibilizar os novos professores para a importância da acção da equipa 1.2 – Reforçar a coesão funcional da equipa 1.3 – Instituir o princípio da formalização do plano anual de actividades da equipa e da respectiva

avaliação.

2. Conteúdos 2.1 – Problematização do papel da equipa de planificação inclusiva 2.2 – Recuperação dos objectivos e estratégias de intervenção 2.3 – Propostas para a formalização interna do regime de organização e de funcionamento 3. Referências bibliográficas - Correia, L.M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora

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Quadro 14

Roteiro 5 A – Planificação da Acção Relativa aos Projectos Curriculares de Turma:

Conceito, Relevância Pedagógica e Guião-Base

1. Objectivos 1.1 – Dilucidar o conceito de projecto curricular de turma 1.2 – Identificar a natureza da relação dos projectos curriculares de turma com o projecto

curricular de escola 1.3 – Analisar os objectivos decorrentes do projecto curricular de turma 1.4 – Explorar as virtualidades do projecto no âmbito de uma pedagogia para a inclusão 1.5 – Consensualizar formas colaborativas de gestão dos projectos curriculares de turma 1.6 – Estabelecer um guião-base para a estrutura dos projectos curriculares de turma

2. Conteúdos 2.1 – A semântica curricular do projecto de turma 2.2 – O enquadramento dos projectos de turma no projecto curricular de escola 2.3 – Os resultados esperados do desenvolvimento dos projectos curriculares 2.4 – O projecto curricular de turma como estratégia facilitadora da educação inclusiva 2.5 – A pertinência das práticas colaborativas no desenvolvimento dos projectos de turma 2.6 – Elaboração e explicitação de uma proposta de guião-base para a estrutura organizacional dos projectos curriculares de turma (segundo o estabelecido no Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro e no Despacho Normativo n.º 30/2001, de 19 de Julho):

a) Introdução b) Objectivos c) Caracterização da turma d) Priorização de problemas e) Plano curricular f) Estratégias pedagógicas g) Estratégias de gestão curricular h) Dinâmicas de acompanhamento i) Avaliação

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3. Referências bibliográficas - Melero, M. L. (1995). Diversidad y cultura: en busca de los paradigmas perdidos. In P. Arnaiz &

De Haro, R. (Eds.), 10 años de integración en España. Murcia: Servicio de Publicaciones de la Universidad.

- Tomlinson, C. & Allan, S. (2002). Liderar projectos de diferenciação pedagógica. Porto: Edições ASA..

- Leite, C., Gomes, L. & Fernandes, P. (2001). Projectos Curriculares de Escola e de Turma – Conceber, Gerir e Avaliar. Porto: Edições ASA.

- Wang, M. C. (1998). Atención a la diversidad del alumnado. Madrid: Narcea.

4. Fontes legislativas - Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro - Despacho Normativo n.º 30/2001, de 19 de Julho

Quadro 15

Roteiro 5 B – Planificação da Acção Relativa à Organização e Desenvolvimento

dos Projectos Curriculares de Turma: Organização e Desenvolvimento 1. Objectivo - Desenvolver competências de operacionalização dos projectos curriculares de turma a partir do guião-base consensualizado

2. Conteúdos

2.1 – Análise específica de cada dimensão integrante do guião-base dos projectos curriculares de turma:

• Introdução

• Objectivos

• Caracterização de turma

• Priorização de problemas

• Plano curricular

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• Metodologias e estratégias

• Envolvimento dos encarregados de educação

• Avaliação 2.2 – Elementos a incluir em cada dimensão dos projectos curriculares de turma

3. Referências bibliográficas

- Arândiga, A. V. (1993). Dificultades de aprendizaje y actividaddes de refuerzo educativo.

Valência: Promolibro. - Arândiga, A. V. (1996). Guia de actividades de recuperación y apoio educativo: dificultades de

aprendizaje. Madrid: Editorial Escuela Española. - Araújo, J. B. & Chadwick, C. B. (1988). Tecnologia educacional: teorías de instrucción.

Barcelona: Paidós. - Carrasco, J. B. (1995). Cómo Aprender Mejor: Estrategias de Aprendizaje. Madrid: Rialp. - Jiménez, J. (1994). Método práctico de técnicas de estudio. Madrid: Visor - Lemaitre, P. & Maquère, F. (1987). Técnicas para saber aprender. Bilbao : Deusto. - NovaK, J. & Gowin, D. (1988). Aprendiendo a aprender. Barcelona: Martinez Roca.

Quadro 16

Roteiro 6 – Planificação da Acção Relativa à Equipa de Programação

Educacional Individualizada

1. Objectivos 1.1 – Revalorizar a utilidade subjacente ao funcionamento da Equipa 1.2 – Estimular a adopção de mecanismos formais, a nível interno, para a optimização da

actividade da equipa 1.3 – Analisar as implicações subjacentes aos conceitos de inclusão total e de inclusão moderada 1.4 – Consolidar o quadro de funções da equipa à luz da inclusão moderada 1.5 – Estimular o aprofundamento das práticas colaborativas de resolução de problemas 1.6 – Reforçar os saberes e experiências inerentes à planificação educacional individualizada

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2. Conteúdos 2.1 – Sensibilização para a importância estratégica do trabalho de equipa à luz da escola inclusiva 2.2 – Reafirmação dos critérios de constituição da equipa 2.3 – Consolidação do quadro de funções cometido à equipa 2.4 – Formalização das metodologias de trabalho a desenvolver pela equipa 2.5 – O confronto das perspectivas subjacentes à inclusão total e à inclusão moderada 2.6 – Compreensão das práticas à luz daquelas perspectivas 2.7 – A optimização dos contributos multidisciplinares 2.8 – Revisão dos princípios a adoptar na planificação educacional individualizada 2.9 – Análise dos critérios usados na elaboração das adaptações curriculares 2.10 – Proposta de instrumentos de observação e de registo da competência curricular dos alunos 2.11 – O primado da acção: estratégias colaborativas na resolução de problemas

3. Referências bibliográficas - Correia, L.M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora - Correia, L.M. (2003b). Prefácio (pp. 9-10). Em L. M. Correia (org.). Educação Especial e Inclusão

– Quem disser que uma sobrevive sem a outra não está no seu perfeito juízo. Porto: Porto Editora.

- Correia, L.M. (2003b). O Sistema Educativo Português e as Necessidades Educativas Especiais ou Quando Inclusão Quer Dizer Exclusão. (pp. 11-38). Em L. M. Correia (org.). Educação

Especial e Inclusão – Quem disser que uma sobrevive sem a outra não está no seu perfeito

juízo. Porto: Porto Editora. - Fuchs, D. & Fuchs, L. S. (1995). Special education ineffective? Immoral? Exceptional Children,

61, 303-305. - Gortázar, A. (1995). O Professor de Apoio na Escola Regular. Em C. Coll, J. Palácios, & A.

Marchesi (Org.). Desenvolvimento Psicológico e Educação: Necessidades Educativas

Especiais e Aprendizagem Escolar - Vol. 3. Porto Alegre: Artes Médicas. -Kauffman, J. M. (1995). Why we must celebrate a diversity of restrictive environments. Learning

Disabilities. Research and Practice. Vol. 10, (4), 225-238. - Kauffman, J. M., & Hallahan, D.P. (1995). The illusion of Full Inclusion: a Comprehensive Critique

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 417

of a Current Special Education Band-Wagon. Austin: Pro-Ed. - Manjón, D., Gil, J., & Garrido A. (1997). Adaptações Curriculares. In R. Bautista (Coord.).

Necessidades Educativas Especiais. Lisboa: Dinalivro. - Reynolds, M. C. (1988). A reaction to the JLD special series on the Regular Education Initiative.

Journal of Learning Disabilities, 21, 6, 352-356. - Ruiz, R. (1988). Técnicas de individualización didáctica: adecuaciones curriculares

individualizadas para alumnos con necesidades educativas especiales. Madrid: Cincel-Kapelusz.

4. Fonte legislativa - Decreto-Lei n.º 319/91 de 23 de Agosto

Quadro 17

Roteiro 7 – Planificação da Acção Relativa à Educação Especial e aos Apoios

Educativos

1. Objectivos 1.1 – Problematizar os modos de intervenção no contexto da escola inclusiva 1.2 – Reflectir sobre as funções específicas dos professores de educação especial face aos

professores de apoio educativo 1.3 – Inventariar as práticas de apoio mais conformes à implementação da educação inclusiva em

sala de aula 1.4 – Enquadrar a intervenção dos docentes de apoio no contexto da gestão curricular do projecto

de turma 1.5 – Definir critérios de articulação operacional dos docentes de apoio com os professores

titulares de turma e com a equipa de planificação educacional individualizada 1.6 - Princípios a adoptar no desenvolvimento do processo conducente às programações

individualizadas dos alunos com NEE 1.7 – Identificar linhas de actuação junto das famílias

2. Conteúdos 2.1 – Princípios orientadores da intervenção num contexto de aulas inclusivas

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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2.2 – As funções dos professores de educação especial 2.3 – O perfil da intervenção dos professores de apoio 2.4 – A articulação entre o currículo comum e a programação individualizada 2.5 – A coordenação das actividades entre os docentes de apoio e o professor titular de turma 2.6 – A colaboração operacional com a equipa de planificação educacional individualizada 2.7 – Critérios e procedimentos orientadores do processo conducente às programações

individualizadas 2.8 – As metodologias de trabalho com as famílias 3. Referências bibliográficas

- Correia, L.M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora - Gortázar, A. (1995). O Professor de Apoio na Escola Regular. Em C. Coll, J. Palácios, & A.

Marchesi (Org.). Desenvolvimento Psicológico e Educação: Necessidades Educativas

Especiais e Aprendizagem Escolar - Vol. 3. Porto Alegre: Artes Médicas. - León, M. . (1994). El profesor tutor ante la integración. Granada: Alambra Ediciones. - Porter; G. (1997). Organização das escolas: Conseguir o acesso e a qualidade através da

inclusão. Caminhos para as escolas inclusivas. Desenvolvimento Curricular na Educação

Básica, 6, 33-48. Lisboa: IIE/Ministério da Educação. - Rief, S. & Heimburge, J. (2000). Como Ensinar Todos os Alunos na Sala de Aula Inclusiva. Porto:

Porto Editora - Stainback, W., Stainback, S. & Moravec, J. (1992). Using Curriculum to Build Inclusive

Classrooms. In Stainback, W. & Stainback, S. Curriculum considerations in Inclusive

Classrooms. Baltimore: Paul Brookes. - Stainback, S. & Stainback, W. (1999). Aulas Inclusivas. Madrid: Narcea, S. A. de Ediciones.

- Vila, R., Thousand, J., Stainback, W. & Stainback, S. (1992). Reestructuring for Caring &

Effective Education. Baltimore: Paul Brookes. - Wang, M. C. (1998). Atención a la diversidad del alumnado. Madrid: Narcea. 4. Fonte legislativa - Decreto-Lei n.º 319/91 de 23 de Agosto

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 419

Quadro 18

Roteiro 8 A - Planificação da Acção Relativa à Gestão da Sala de Aula numa

Perspectiva Inclusiva: Princípios Orientadores 1. Objectivos 1.1 – Consciencializar a importância crucial da sala de aula para a consecução dos ideais da

inclusão 1.2 – Considerar os eventuais limites do espaço da sala de aula face às características de

determinados alunos com NEE 1.3 – Reflectir sobre as implicações pedagógicas de um dado conjunto de princípios orientadores 2. Conteúdos 2.1 - A centralidade da sala de aula no âmbito da construção de uma escola inclusiva 2.2 – A necessidade de um conhecimento e de um cumprimento profundos da informação

prescrita nos planos educacionais individualizados 2.3 – Análise dos princípios orientadores:

• A gestão integrada do contexto, do currículo, da acção do professor e da acção dos alunos

• A optimização do potencial de aprendizagem de cada aluno

• O local certo para que todos aprendam juntos sempre que possível

• A necessidade de expectativas positivas em relação à totalidade dos alunos

• A compreensão profunda do estilo de aprendizagem de cada aluno

• A centração da acção pedagógica no aluno

• O respeito pelos saberes, interesses, vivências e raízes culturais dos alunos

• A sala de aula como o habitat de uma comunidade de aprendizagem concreta

• O respeito pelas diferenças e a sua valorização

• Partir do interesse que as crianças demonstram pelo porquê dos seres e das coisas

• A relevância de uma planificação fundamentada nos modos como os alunos aprendem

• A necessidade de uma mediação didáctica adequada às formas de aprender dos alunos

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 420

3. Referências bibliográficas - Ainscow, M. (1998). Necessidades Especiais na Sala de Aula – um guia para a formação de

professores. Lisboa: IIE, Edições UNESCO. - Arnaiz, P. & Gil, C. (1997). Las adaptaciones curriculares en la educación secundária. Em N. I.

Romeu & ª G. Martinez (Coords). La diversidad y la diferencia en la educación secundaria:

retos educativos para el siglo XXI.Málaga: Aljibe. - Carey, S. & Gelman, R. (1991). The Epigenesis of Mind: Essays on Biology and Cognition.

Hilldsdale, NJ: Erlabaum. - Carter, K. & Doyle, W. (1987). Teacher‘s knowledge structure and comprehension processes. In

J. Calderheart, (Ed.). Exploring Teacher Thinking. London: Cassell. - Correia, L.M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora - Duckworth, E. (1987). The Having of Wonderfull Ideas and Other Essays on Teaching and

Learning. New York Teachers College Press. - Genovard, C. & Gotzens, C. (1990). Psicología de la Instrucción. Madrid: Narcea. - Loewenberg, D. & Coher, D. (1998). Developing Practice Developing Practitioners: Toward a

Practice-Based Theory of Professional Education. In L. Darling-Hammond, and G. Skyes (Eds.). Teaching as the Learning Profession: Handbook of Policy and Practice. San Francisco: Jossey-Bass Publishers

Quadro 19

Roteiro 8 B - Planificação da Acção Relativa à Gestão da Sala de Aula numa

Perspectiva Inclusiva: Atenção à Diversidade

1. Objectivos 1.1 – Problematizar o conceito de diversidade 1.2 – Proporcionar uma concepção de currículo como meio de assegurar uma igualdade de

oportunidades para todos os alunos 1.3 – Sensibilizar para a necessidade do conhecimento das categorias que diferenciam os estilos

de aprendizagem 1.4 – Abordar, numa perspectiva histórica os modelos sucessivamente usados pelos sistemas

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 421

educativos para responder à diversidade das populações escolares 1.5 – Analisar os requisitos pedagógicos e didácticos necessários à criação de ambientes

inclusivos nas salas de aula 1.6 – Promover processos de reflexão sobre a proposta de sequencialização didáctica das

unidades de aprendizagem elaborada por Zabala 1.7 – Estudar processos e técnicas de desenvolvimento da motivação nos alunos 1.8 – Definir os princípios de gestão coordenada das programações individualizadas dos alunos

com NEE, dentro e fora da sala de aula. 1.9 – Abordar activamente estratégias de aprendizagem cooperativa 1.10 - Aprofundar o conhecimento de processos pedagógicos inerentes ao princípio da educação

apropriada 1.11 - Preparar os docentes para as práticas de ensino por níveis diversificados de conteúdos

(diferenciação pedagógica)

2. Conteúdos 2.1 – O conceito de diversidade 2.2 – A gestão curricular numa lógica da igualdade de oportunidades 2.3 – As categorias estruturantes dos estilos de aprendizagem: ambientais, sociais, emocionais,

cognitivas e físicas 2.4 – Os modelos de gestão da diversidade:

• Selectivos

• Por adequação de objectivos

• De flexibilização temporal

• Por compensação pedagógica

• Por ajustamento metodológico 2.5 – A criação de ambientes inclusivos em sala de aula:

• A filosofia da aula

• As regras

• O currículo aberto

• As formas de apoio 2.6 – Os procedimentos de sequencialização das unidades de aprendizagem

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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• Recuperação de conhecimentos prévios

• A demonstração da funcionalidade, utilidade e significatividade das aprendizagens

• Adequação da complexidade da informação ao nível do desenvolvimento dos alunos

• Conflito dialéctico entre os saberes prévios e os novos saberes

• Promoção de atitudes favoráveis à aprendizagem

• Apoio personalizado à obtenção de sucesso 2.7 – Técnicas de motivação dos alunos

• Comunicação clara do que se pretende dos alunos

• Desenvolvimento da auto-disciplina

• Promoção de hábitos de autonomia e de cooperação

• Reforço positivo 2.8 – A gestão articulada das programações individualizadas dos alunos com NEE, sob a lógica

de uma educação apropriada 2.9 – Estratégias de diferenciação pedagógica

3. Referências bibliográficas - Coll, C. (1986). Marc curricular per a l´ensenyament obligatori. Barcelona: Departament

d´Ensenyament, Generalitat de Catalunya. - Coll, C. & Colomina, R. (1991). Interacción entre alumnos y aprendizaje escolar. In C. Coll; J.

Palacios & A. Marchesi (Eds.), Desarrolo psicológico y educación III: Psicología de la

Educación. Madrid: Alianza. - Correia, L.M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora - Cronbach, L. (1967). “How can instruction be adapted to individual differences?” Remedial

Special Education, 2 (1), 11-17 - Gagné (Ed.). Learning and individual differences. Columbs, Ohio: Merrill. - Damon, W. & Phelps, E. (1989). Critical distinctions among three approaches to peer education.

International Journal of Education Research, 13, 9-19. - Gauvain, M. & Rogoff, B. (1989). Collaborative problem-solving and children´s planning skills.

Developmental Psychology, 25, 139-151. - Glaser, R. (1977). Adaptative education: individual diversity and learning. Nova YorK: Holt,

Rinchart & Winston.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 423

- Johnson, D. W. & Johnson, R. T. (1994). Cooperation and competition: Theory and research.

Edina, MN: Interaction BooK Co. - Marchesi, A., & Martín, E. (1998). Calidad de la enseñanza en tiempos de cambio. Madrid:

Alianza Editorial. - Stainback, W., Stainback, S. & Moravec, J. (1992). Using Curriculum to Build Inclusive

Classrooms. In Stainback, W. & Stainback, S. Curriculum considerations in Inclusive

Classrooms. Baltimore: Paul Brookes. - Schulz, J. B. & Turnbull, A. P. (1984). Mainstreaming handicapped students. Newron, MA: Allyn

& Bacon Inc. - Tomlinson, C. & Allan, S. (2002). Liderar projectos de diferenciação pedagógica. Porto: Edições

ASA.. - Wang, M. C. (1998). Atención a la diversidad del alumnado. Madrid: Narcea. - Zabala, A. (1998). A Prática Educativa: como ensinar. Porto Alegre: ARTMED.

Quadro 20

Roteiro 8 C - Planificação da Acção Relativa à Gestão da Sala de Aula numa

Perspectiva Inclusiva: Formação Integral dos Alunos 1. Objectivos 1.1 – Relevar as dimensões do ser, do conhecer e do fazer da pessoa humana 1.2 – Salientar o enfoque dado à formação integral do aluno pelo novo modelo de gestão

curricular 1.3 – Reflectir sobre os aspectos mais relevantes do impacto formativo dos conteúdos atitudinais,

conceptuais e procedimentais numa sociedade que se pretende inclusiva 1.4 – Analisar as didácticas diferenciadas subjacentes ao ensinar os saberes conceptuais,

atitudinais e procedimentais 1.5 – Abordar estratégias de ensinar a aprender 2. Conteúdos

2.1 – A compreensão crítica da formação integral do aluno-pessoa 2.2 – A formação integral dos alunos no âmbito da reorganização curricular do ensino básico

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2.3 – As exigências do mundo actual e a sua implicação na educação das novas gerações 2.4 – A formação holística do aluno-pessoa e os seus efeitos positivos no contexto da inclusão

escolar e social 2.5 – Procedimentos didácticos específicos para o ensino de:

• saberes atitudinais

• saberes conceptuais

• saberes procedimentais

• estratégias de aprendizagem 3. Referências bibliográficas

- Alemany, I. , Majós, T. & Giménez, E. (2000). A aprendizagem dos conteúdos escolares. Em C. Col, Alemany, I., Martí, E., Majós, T. Mestres, M., Goñi, J. Gallart, I. & Giménez, E. (Eds.). Psicologia do Ensino. Porto Alegre: Artes Médicas Sul.

- Zabala, A. (1998). A Prática Educativa: como ensinar. Porto Alegre: ARTMED. - Selmes, I. (1988). La mejora de las habilidades para el estudio. Madrid: Paidós/MEC.

- Beltrán, J. (1993). Procesos, estrategias y técnicas de aprendizaje. Madrid: Eudema. 4. Fonte legislativa - Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro

Quadro 21

Roteiro 8 D - Planificação da Acção Relativa à Gestão da Sala de Aula numa

Perspectiva Inclusiva: Procedimentos de Avaliação

1. Objectivos 1.1 – Valorizar o papel da avaliação 1.2 – Analisar o Despacho Normativo n.º 30/2001, de 19 de Julho e as respectivas implicações na

acção educativa 1.3 – Ensaiar instrumentos de recolha metódica de informação de natureza diagnóstica da

competência curricular dos alunos

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1.4 – Desenvolver competências para práticas integradas da avaliação formativa 1.5 – Evidenciar a pertinência da avaliação criterial no âmbito de uma pedagogia para a inclusão 1.6 – Promover hábitos de elaborar e de aplicar instrumentos de avaliação e de registo dos

progressos dos alunos 1.7 – Salientar a necessidade de os alunos desenvolverem práticas sistematizadas de auto-

avaliação 1.8 – Consolidar a concepção da avaliação como um processo de fundamentar a tomada de

decisões curriculares 1.9 – Sensibilizar para a necessidade de ser dado cumprimento rigoroso às metodologias e

critérios estabelecidos nas programações individualizadas dos alunos com NEE 1.10 – Reforçar as práticas conducentes à utilização da avaliação como o processo crucial de

regulação do ensino-aprendizagem 1.11 – Realçar a função da auto-avaliação como estratégia facilitadora da autonomização das

aprendizagens 2. Conteúdos 2.1 – O conceito pedagógico da avaliação 2.2 – As modalidades e procedimentos de avaliação à luz do Despacho Normativo n.º 30/2001, de

19 de Julho 2.3 – Aplicação experimental de instrumentos de avaliação diagnóstica dos alunos 2.4 –Modos de aplicação da avaliação formativa 2.5 – Concepção e formas de operacionalização da avaliação criterial 2.6 – A relevância da avaliação criterial numa perspectiva inclusiva 2.7 – Elaboração de instrumentos de registo do progresso dos alunos (Anexo XI) 2.8 – Os fundamentos pedagógicos da auto-avaliação dos alunos 2.9 – A avaliação como base para a tomada de decisões curriculares 2.10 – O respeito pelos critérios de avaliação prescritos nos PEI dos alunos com NEE. 2.11 – A prática integrada da avaliação como processo de regulação das actividades de ensino-

aprendizagem 2.12 – A avaliação como dinâmica facilitadora da autonomização das aprendizagens

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 426

3. Referências bibliográficas - Abrecht, R. (1994). A Avaliação Formativa. Porto: Edições ASA - Coll, C. (1987). Psicología y curriculum. Uma aproximación psicopedagógica a la elaboración del

curriculum escolar. Barcelona: Laia. - Correia, L. M., Martins, A. P., Santos, A. C., & Ferreira, R. M. (2003a). Algumas Estratégias a

Utilizar em Salas de Aula Inclusivas. Em L. M. Correia, Inclusão e Necessidades Educativas

Especiais. Porto: Porto Editora. - Cullen, B. & Pratt, T. (1999). Medir e informar sobre el progreso de cada alumno. Em S. Stainback

& W. Stainback (Eds.), Aulas Inclusivas. Madrid: Narcea. - Marchesi, A. & Martín, E. (1995). Da Terminología do Distúrbio às Necessidades Educacionais

Especiais. In Desenvolvimento Psicológico e Educação: (Vol.3) Necessidades Educativas

Especiais e Aprendizagem Escolar. Em A. Marchesi, C. Coll & J. Palácios (Orgs.). Porto Alegre: Artes Médicas.

- Stainback, S. & Stainback, W. (1999). Aulas Inclusivas. Madrid: Narcea, S. A. de Ediciones. - Thomas, G., Walker, D. & Webb, J. (1998). The Making of the Inclusive School. London and New

York: Routledge. - Tomlinson, C. & Allan, S. (2002). Liderar projectos de diferenciação pedagógica. Porto: Edições

ASA.

4. Fonte legislativa - Despacho Normativo n.º 30/2001, de 19 de Julho

Quadro 22

Roteiro 8 E - Planificação da Acção Relativa à Gestão da Sala de Aula numa

Perspectiva Inclusiva: As Novas Tecnologias de Informação

1. Objectivos

1.1 – Reflectir sobre a importância estratégica das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação

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1.2 – Sensibilizar para o acréscimo do uso do computador na sala de aula 1.3 – Valorizar o impacto que o recurso ao computador produz nos níveis motivacionais da

generalidade dos alunos 1.4 – Abordar formas de uso do computador como um recurso educativo facilitador da interacção

inclusiva em sala de aula 2. Conteúdos

2.1 – As potencialidades educativas das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação 2.2 – A exploração didáctica do computador em sala de aula 2.3 – O uso do computador e a motivação dos alunos 2.4 – Estratégias de utilização do computador numa perspectiva inclusiva 3. Referências bibliográficas

- Correia, L. M., Martins, A. P., Santos, A. C., & Ferreira, R. M. (2003a). Algumas Estratégias a Utilizar em Salas de Aula Inclusivas em L. M. Correia, Inclusão e Necessidades Educativas

Especiais. Porto: Porto Editora. 4. Fonte legislativa - Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro Quadro 23

Roteiro 8 F - Planificação da Acção Relativa à Gestão da Sala de Aula numa

Perspectiva Inclusiva: O Papel Estratégico do Professor Titular de Turma

1. Objectivos 1.1 – Alertar para o papel crucial que o professor titular de turma detém na concretização dos

ideais da educação inclusiva 1.2 – Salientar a importância do tipo de ambiente relacional da sala de aula para a efectivação da

pedagogia de inclusão 1.3 – Evidenciar a necessidade de um conhecimento permanente do evoluir das necessidades dos

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alunos 1.4 – Abordar formas de coordenação dos apoios aos alunos com necessidades educativas

especiais 1.5 – Analisar estratégias de integração no projecto curricular de turma dos apoios a prestar aos

alunos com necessidades educativas especiais 1.6 – Problematizar processos didácticos de envolver a generalidade dos alunos na mesma tarefa

educativa 1.7 – Evidenciar o confronto entre determinadas práticas tradicionais e as práticas facilitadoras da

inclusão 1.8 – Alertar para o perigo das ideias veiculadas pelos adeptos da inclusão total 1.9 – Inventariar procedimentos capazes de gerarem contextos motivadores no quotidiano da sala

de aula 1.10 – Analisar propostas pedagógicas orientadas para o desenvolvimento de atitudes de

responsabilização dos alunos pela própria aprendizagem 1.11 – Explicar a aprendizagem sob o ponto de vista construtivista 1.12 – Frisar a necessidade de promover aprendizagens significativas 1.13 - Salientar a importância da mediação social no processo de proporcionar a apropriação de

saberes de forma adequada a cada aluno 1.14 – Proporcionar informação relativa aos estilos de aprendizagem 1.15 – Abordar estratégias de gestão pedagógica dos estilos de aprendizagem em geral e em

especial dos alunos com NEE (respeitando o prescrito nos PEI) 2. Conteúdos 2.1 - O clima de sala de aula 2.2 – Procedimentos para o registo e análise da evolução educativa dos alunos 2.3 – A coordenação dos intervenientes no projecto curricular de turma 2.4 – Estratégias didácticas inclusivas: a inovação das práticas tradicionais 2.5 – Reanálise comparada das perspectivas inerentes à inclusão moderada e à inclusão total 2.5 – A motivação dos alunos: estratégias facilitadoras

2.6 – A auto-avaliação como processo conducente à responsabilização dos alunos pela própria aprendizagem

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2.7 – A perspectiva construtivista e a educação inclusiva: análise conceptual 2.8 – A prática pedagógica interactiva da perspectiva construtivista e da aprendizagem

significativa 2.9 – A gestão da mediação social numa lógica inclusiva 2.10 – Os estilos de aprendizagem (diversidade): conceito, variáveis e estratégias de gestão 2.11 – O desenvolvimento dos PEI em articulação com os técnicos de apoio 3. Referências bibliográficas - Coll, C. (2000). A construção do conhecimento na escola: para a colaboração de um marco

teórico global de referência à educação escolar. Em C. Coll, I. Alemany, E. Martí, T. Majós, M. Mestres, J. Goñi, I. Gallart, & H., Giménez, (Eds). Psicologia do Ensino. Porto Alegre: Artes Médicas do Sul.

- Correia, L.M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora. - Duckworth, E. (1987). The Having of Wonderfull Ideas and Other Essays on Teaching and

Learning. New York Teachers College Press. - Jurado, P. & Laborda, C. (1996). Algunas consideraciones sobre el modelo colaborativo y la

actuación docente en Educación Especial. In F. Salvador; M. J. & A. Miñan, Integración

escolar. Desarrollo curricular, organizativo y profesional. Granada: ICE y Universidad de Granada.

- Porter; G. (1997). Organização das escolas: Conseguir o acesso e a qualidade através da inclusão. Caminhos para as escolas inclusivas. Desenvolvimento Curricular na Educação

Básica, 6, 33-48. Lisboa: IIE/Ministério da Educação. - Robles, J. (1995). Tú puedes: manual de automotivación y estrategias de aprendizaje. Alcalá de

Gudaira: MAD. - Tapia, J. A. (1991). Motivación y aprendizaje en el aula. Madrid: Santillana. - Wang, M. (1988). The wedding of instructionand assessment in the classroom. In Freeman, E.F.

(Eds.). Assessment in the service of learning: Proceedings of the 1987 ETS invitational

conference.Educational Testing Service. Princeton: NJ. - Wang, M. & Zollers, N. (1990). Adaptative instruction : an alternative service delivery approach.

Em Remedial and Special Education, 11 (1), 7-21.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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Quadro 24

Roteiro 8 G - Planificação da Acção Relativa à Gestão da Sala de Aula numa

Perspectiva Inclusiva: Sistematização do Atendimento à Diversidade

1. Objectivos

1.1 – Consolidar o conhecimento de estratégias de gestão educativa da diversidade 1.2 – Analisar as componente essenciais da proposta de sistematização proposta por Correia

(2003a) 1.3 – Valorizar o sentido sistémico da proposta 1.4 – Enquadrar todo a sequência do processo de ensino-aprendizagem no quadro de

sistematização proposto 2. Conteúdos

2.1 – Análise das componentes da proposta de sistematização:

• Conhecimento dos alunos

• Planificação

• Intervenção

• Reavaliação 2.2 – Modos de integrar a totalidade do processo de ensino-aprendizagem nas sucessivas

componentes da proposta 3. Referência bibliográfica - Correia, L.M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora. 4. Fontes legislativas - Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro - Despacho Normativo n.º 30/2001, de 19 de Julho

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Quadro 25

Roteiro 9 - Planificação da Acção Relativa à Intervenção dos Auxiliares da Acção

Educativa

1. Objectivos

1.1 – Sensibilizar para a importância da função do pessoal auxiliar da acção educativa 1.2 – Esclarecer os tipos de intervenção do pessoal auxiliar da acção educativa no contexto da

escola inclusiva 1.3 – Abordar informação relativa às necessidades educativas especiais 1.4 – Reflectir sobre as formas adequadas de lidar com as crianças com necessidades educativas

especiais e respectivas famílias 1.5 – Preparar para a assunção de práticas educativas em complementaridade com o pessoal

docente 2. Conteúdos

2.1 – O conceito de escola inclusiva 2.2 - O papel dos auxiliares da acção educativa num quadro de escola inclusiva 2.3 – A noção de necessidades educativas especiais 2.4 – Caracterização sumária das crianças com necessidades educativas especiais presentes na

escola 2.5 – A relação pedagógica com as crianças portadoras de necessidades educativas especiais e

com as suas famílias 2.6 – A intervenção complementar dos auxiliares da acção educativa no âmbito do projecto

curricular de turma 3. Referências bibliográficas

- Correia, L.M. (2003a). Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora.

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Quadro 26

Roteiro 10 - Planificação da Acção Relativa às Estratégias de Envolvimento

Parental

1. Objectivos 1.1 – Relevar o papel das famílias no processo educativo 1.2 – Inventariar possíveis constrangimentos locais na relação escola-família 1.3 – Identificar dinâmicas de acompanhamento dos projectos curriculares de turma, por parte

dos encarregados de educação 1.4 – Analisar as propostas do Ministério da Educação sobre as formas de envolvimento dos pais

no acompanhamento escolar dos alunos com necessidades educativas especiais 1.5 – Incrementar hábitos de realização, no espaço escolar, de eventos informais de convívio

social para uma maior aproximação dos pais. 2. Conteúdos 2.1 – Os pais como parceiros nucleares na construção da escola inclusiva

2.2 – Análise dos problemas actuais na relação escola-família e estudo das formas da sua resolução

2.3 – Responsabilização dos encarregados de educação no acompanhamento dos projectos curriculares de turma dos seus educandos.

2. 4 – A relevância dada pelo Ministério da Educação ao papel dos pais no processo educativo das crianças com necessidades educativas especiais.

2.5 – Procedimentos para implicar activamente os pais na planificação e execução de programações individualizadas dos alunos com necessidades educativas especiais.

2.6 – A pertinência das jornadas de convívio informal organizadas conjuntamente pela escola e pelos pais.

3. Referências bibliográficas - Correia, L. M. (1997). Alunos com Necessidades Educativas Especiais nas Classes Regulares

de Ensino. Porto: Porto Editora. - Correia, L. M. & Serrano, A. M.(2003a). Parcerias Pais-Professores na Educação da Criança

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 433

com NEE, em L. M. Correia, Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto: Porto Editora.

- Ministério da Educação (1992). Educação Especial: Guia de Leitura do Decreto-Lei 319/91, O

Planeamento e a Programação Educativa, p. 20-21. Lisboa: DGEBS. - Nielsen, L. (1999). Necessidades Educativas Especiais na Sala de Aula: Um guia para

professores. Porto: Porto Editora. - Rief & Hamburge (2000). Como Ensinar Todos os Alunos na Sala de Aula Inclusiva. Porto: Porto

Editora. - Sands, D., Kozleski, E. & French, N. (2000). Inclusive Education for the 21st Century: A New

Introduction to Special Education. Wadsworth: United States of America. - Wang, M. C. (1998). Atención a la diversidad del alumnado. Madrid: Narcea.

4. Fonte legislativa - Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de Agosto

2.2 Reformulação do Projecto de Apoio à Multideficiência

Como já fora oportunamente indiciado, a actual situação das crianças

atendidas no âmbito do projecto de apoio à multideficiência parece justificar a

alteração de alguns aspectos do funcionamento do projecto em questão. Um dos

factores que levam a tal percepção, prende-se com o facto de alguns dos utentes

desta modalidade de atendimento educativo terem atingido um escalão etário

(mais de treze anos) que ultrapassa, de modo notório, a média de idades própria

dos alunos do primeiro ciclo do ensino básico.

Um outro aspecto - de alguma forma decorrente do primeiro (a idade das

crianças) - tem a ver com a evolução do tipo de necessidades dos alunos, as

quais começam a apresentar uma natureza pronunciadamente diferente das que

os mesmos apresentavam há algum tempo atrás. Assim, à medida que o tempo

tem passado, começa a fazer sentido que sejam proporcionadas, aos alunos em

causa, oportunidades educativas orientadas para a sua autonomia diária em

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contexto comunitário, situação que não tem sido muito praticada no actual modelo

de funcionamento.

Face à argumentação exposta, julga-se, portanto, fundamentado que seja

elaborado um renovado leque de objectivos de intervenção e introduzir o mesmo

no projecto de apoio à multideficiência com vista a garantir uma melhor adequação

das respostas à evolução das necessidades dos seus utentes. Por conseguinte - e

atentando-se nos argumentos antes apresentados - sugere-se que a intervenção

em análise vise atingir os seguintes objectivos:

a) Assegurar a transição apoiada de alguns dos alunos para a escola do 2.º

ciclo da sua área de residência;

b) Reforçar os tempos e modos de interacção de cada um dos alunos

restantes com a sua turma de referência, no contexto do respectivo projecto

curricular, respeitando-se, contudo, as estratégias e conteúdos constantes

nos respectivos PEI (os quais deverão ser objecto de reformulação);

c) Intensificar, junto dos alunos mais velhos, as oportunidades de

desenvolvimento da respectiva autonomia pessoal e social, no seio da

comunidade, através da elaboração e da implementação prática de

programas individualizados de aprendizagem sócio-ocupacional (em

parceria com recursos comunitários adequados).

Crê-se, então, que desta forma a comunidade educativa conseguirá

disponibilizar uma resposta educacional mais conforme com as actuais

necessidades pedagógicas manifestadas pelo grupo de crianças multideficientes

ali atendidas. Por outro lado, a inovação de programas e de estratégias acabará

por alargar o âmbito da capacidade de resposta dos professores e dos técnicos

envolvidos, aos alunos com NEE.

3 O Desenvolvimento da Intervenção Prioritária

A intervenção, no contexto deste trabalho, significa em termos gerais, o

conjunto de processos a desenvolver operacionalmente, em ordem a transformar

a situação encontrada na situação desejada (implementação do modelo de escola

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 435

inclusiva). Esta acção será concretizada, em grande parte, no ciclo seguinte do

projecto de investigação-acção, não constando, naturalmente, do presente

relatório o qual dá, apenas conta do primeiro ciclo de trabalho, conforme foi,

oportunamente referido e fundamentado.

Contudo - conforme se expressou, também, em local oportuno - na

informação recolhida na realização da entrevista, constatou-se que se tornava

necessário avançar tão urgentemente quanto possível para a fase da intervenção

em determinadas áreas. Nesta perspectiva foram, então, nomeadamente focados

a implementação dos projectos curriculares de turma e o reforço das dinâmicas de

colaboração a desenvolver, fundamentalmente, no âmbito das respostas aos

alunos com necessidades educativas especiais.

Confrontado com aqueles dados, o órgão de gestão manifestou o seu total

acordo com as prioridades elencadas, sobretudo com o que dizia respeito aos

projectos curriculares de turma, uma vez que com a publicação do Decreto-Lei n.º

6/2001, os mesmos passavam a deter carácter de (urgente) obrigatoriedade. Esta

preocupação estava, de resto, contemplada no próprio projecto educativo de

escola, facto que - até de um modo formal - concorria para justificar, igualmente, a

identificação desta prioridade, em termos de intervenção.

Como, paralelamente, se afigurava importante reforçar o trabalho de

colaboração no sentido de se responder de modo mais eficiente às necessidades

das crianças com problemáticas mais complexas, concluiu-se que tal poderia ser

assegurado mediante o reforço optimizado da coesão funcional da equipa de

programação educacional individualizada, segundo os pressupostos concebidos,

nesta matéria, pelo Professor Doutor Miranda Correia.

Nesta perspectiva ficou, também assente que devia ser esta a acção a

implementar tão urgentemente quanto possível, para, a curto prazo serem

aumentadas as dinâmicas locais de colaboração, tidas, até ao momento como

algo não totalmente assumido no interior da comunidade escolar. Esta priorização

teve como fundamento a convicção local de que a consecução de um trabalho

colaborativo mais intenso, no seio da equipa dos profissionais escolares teria,

certamente, efeitos mais positivos na organização e desenvolvimento prático das

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 436

respostas pedagógicas aos alunos, nomeadamente aos portadores de

necessidades educativas especiais.

Perante a concordância significativamente expressa pelos responsáveis da

escola entendeu-se, então, que os aspectos em questão deveriam ser alvo de um

tratamento prioritário em matéria de intervenção. Em consequência o

desenvolvimento operacional de todo o plano de intervenção ficou definido, em

termos cronológicos, do seguinte modo:

a) Seria iniciado este processo prioritário de intervenção, no 3.º período lectivo

do ano escolar de 2001/2002 centrado, por esta ordem, na implementação

dos projectos curriculares de turma e no reforço sistematizado da acção da

equipa de programação educacional individualizada. Tal processo visava

preparar a comunidade escolar para a assunção prática e sistematizada

daquelas mudanças no ano escolar seguinte(2002/2003).

b) Logo que terminada a redacção do presente relatório seria dada

continuidade ao restante processo de intervenção de acordo com a

planificação proposta, em ordem a fazer com que a escola se aproximasse

da organização e funcionamento previstos no modelo de escola inclusiva

adoptado.

A fim de as acções necessárias à intervenção serem integradas, o mais

naturalmente possível, na organização e funcionamento normais da escola,

estipulou-se que as mesmas seriam, por princípio, concretizadas no espaço de

tempo consagrado às reuniões do conselho de docentes, as quais se realizam, por

regra, com uma periodicidade mensal e com a duração de duas horas.

Especificamente, neste aspecto, presidia, sempre, uma especial atenção à

necessidade de ser preservada, aprofundada e consolidada, a identidade da

comunidade escolar, facto que visava assegurar a transformação da mesma sem

a descaracterizar. Simultaneamente, esta preocupação visava garantir, no seio da

comunidade escolar, que o processo de mudança e de inovação em questão

viesse, assim, a decorrer num clima interno de perfeita e de serena confiança

recíproca entre o investigador e os profissionais da escola.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 437

Neste contexto, optou-se por se respeitar o princípio de que os

procedimentos subjacentes à intervenção obedeceriam, com rigor, ao previsto na

planificação previamente estabelecida e conforme consta nos quadros para tal

elaborados e já apresentados. Deste modo salvaguarda-se a pureza do modelo

idealizado, uma vez que a planificação tem por base, precisamente, os contributos

da investigação consultada, os quais, por sua vez serviram de esteio à

configuração daquele modelo. Este procedimento cautelar visa, exactamente,

evitar, que os resultados da intervenção conduzam a uma eventual adulteração do

modelo proposto.

Dado o considerável volume de informação subjacente ao trabalho de

intervenção admitiu-se, que muito dificilmente a cultura organizacional e funcional

de escola atingiria os níveis desejados após uma única realização do conjunto de

acções programadas para o efeito. Por esse facto consensualizou-se, com os

profissionais locais, que seria desenvolvido, primeiramente, um trabalho de

abordagem sequencial de todas as sessões programadas e necessárias à

compreensão operativa da totalidade do modelo de escola inclusiva proposto.

Posteriormente seria, então, implementado um novo ciclo de trabalho, assente

num plano de acompanhamento do desenvolvimento prático das mudanças a

operar, tendo, por finalidade essencial, assegurar a revisão esclarecedora e

reguladora dos aspectos eventualmente menos conseguidos. Paralelamente,

seriam considerados como consolidados aqueles aspectos cuja avaliação

denotasse uma prática autónoma e eficiente por parte dos agentes escolares.

As sessões de trabalho com a equipa educativa da escola, destinadas à

aquisição dos saberes necessários à concretização do conteúdo da planificação,

passariam a ser realizadas sob um formato a que se convencionou, localmente,

designar por oficinas pedagógicas. Em termos gerais, as oficinas em questão

visavam abordar, junto dos profissionais envolvidos, as diversas dimensões

integrantes do modelo de escola inclusiva assumido. Tais actividades passariam a

ser geridas de molde a possibilitar, por parte dos destinatários, a apropriação

activa dos saberes e dos saberes-fazer integrantes de cada roteiro de trabalho.

Ficou, entretanto estabelecido que a realização daquelas oficinas pedagógicas

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 438

passaria a ter lugar, essencialmente, como já se disse, nos tempos reservados às

reuniões do conselho de docentes da escola, a fim de não interferir com os

tempos dedicados ao processo de ensino-aprendizagem.

Os roteiros insertos na anterior secção da planificação passavam, então, a

transformar-se nos roteiros de oficina, servindo, portanto, de guião orientador do

seu desenvolvimento prático. Por norma, o plano de desenvolvimento destas

oficinas assenta nos seguintes passos:

1. Apresentação da temática e dos objectivos

2. Organização de pequenos grupos para análise activa dos conteúdos do

roteiro

3. Distribuição, pelos grupos, de materiais de apoio e de consulta

(nomeadamente, excertos relevantes da informação recolhida na literatura,

e referida, para esse efeito, em cada roteiro)

4. Trabalho de apropriação activa dos conteúdos, em cada grupo

5. Socialização dos produtos do trabalho de grupo

6. Debate e clarificação de dúvidas

7. Assunção, por consenso, das alterações a operacionalizar na organização

e funcionamento escolares, decorrentes do trabalho desenvolvido na

oficina.

3.1 Organização e Gestão dos Projectos Curriculares de Turma

Em função do significativo grau de importância que os projectos curriculares

de turma podem configurar na construção e desenvolvimento prático da educação

inclusiva, a sua abordagem, no contexto deste processo de mudança, tem sido,

naturalmente, alvo de aturada preocupação. Assim - e no cumprimento do previsto

aquando da planificação desta intervenção - esta temática foi objecto de

abordagem, não em uma, mas sim em duas oficinas pedagógicas. Na primeira,

foram tratados, por um lado o conceito de projecto curricular de turma e, por outro,

a sua relevância pedagógica enquanto instrumento fundamental nos processos de

gestão do currículo de uma escola inclusiva. Foi, ainda - neste primeira oficina -

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 439

apresentada e analisada uma proposta sistematizada de guião-base da estrutura a

seguir para a elaboração dos referidos projectos curriculares.

Na oficina pedagógica seguinte deu-se continuidade à problemática dos

projectos curriculares de turma, sendo, então, alvo de trabalho específico, as

formas concretas de organização prática daquele instrumento de gestão curricular.

Para tal foi usado, como referência estruturante, o guião-base apresentado na

oficina inicial.

Na primeira das oficinas em questão (Abril de 2002) foi feita, em termos

preliminares, uma interpretação genérica do Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de

Janeiro64. Esta análise focou com especial incidência os conteúdos em que era

explicitamente referenciado o projecto curricular de turma.

Para uma melhor consecução do objectivo de dar a conhecer o que sobre

os projectos curriculares de turma era preconizado na lei, foram coligidos e

distribuídos excertos daquela legislação (Anexo IV). Os excertos em questão

reproduziam, exactamente, a informação relativa ao projecto curricular de turma,

contida no decreto-lei n.º 6/2001. Com este procedimento procurou-se, portanto

tornar mais funcional, objectiva e significativa, a análise pretendida.

Fundamentada - com recurso à própria legislação - a obrigatoriedade legal

inerente ao projecto curricular de turma, foi, seguidamente, apresentada, aos

docentes, a já mencionada proposta de guião-base (Anexo V) para servir de

referência à estruturação daquele instrumento de gestão curricular. O conteúdo

deste guião-base é formado pelas componentes obrigatoriamente a constar nos

projectos curriculares de turma (nomeadamente, a caracterização da turma, a

priorização de problemas, o plano curricular, as estratégias de gestão curricular e

a avaliação) e por outros indicadores que se consideraram adequados em termos

complementares. Deste modo se chegou à constituição do índice-guião em causa,

o qual é constituído pelas seguintes nove dimensões:

• Introdução

64 Na realidade esta actividade foi antecedida pela apresentação e explicitação, ao colectivo de docentes, do

plano geral da intervenção a desenvolver internamente, para aproximar, a instituição, do modelo de escola

inclusiva adoptado.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 440

• Objectivos

• Caracterização da turma

• Priorização de problemas

• Plano curricular

• Estratégias pedagógicas

• Estratégias de gestão curricular

• Dinâmicas de acompanhamento

• Avaliação.

Cada dimensão do guião-base foi objecto de análise específica, com vista à

clarificação do seu significado e conteúdo, segundo os parâmetros que, de

seguida, se descrevem sumariamente.

Introdução – Secção inicial para referir a fundamentação legal do projecto

curricular de turma, o seu objectivo geral (promover a apropriação dos saberes

essenciais, por parte de todos os alunos), os seus modos de construção e a sua

estrutura.

Objectivos – Secção destinada à explicitação dos propósitos específicos a

dar consecução com a organização e desenvolvimento do projecto curricular de

turma. Como exemplos de possíveis objectivos - tendo-se em conta o objectivo

geral proposto - foram sugeridos os seguintes:

• Identificar os estilos de aprendizagem dos alunos

• Priorizar os problemas educacionais da turma

• Estabelecer o conjunto ordenado dos conteúdos curriculares a leccionar no

ano escolar a que respeita

• Programar as actividades de enriquecimento curricular

• Fundamentar as estratégias pedagógicas

• Definir as estratégias de gestão curricular a priorizar

• Fixar os mecanismos de acompanhamento do desenvolvimento do projecto

• Estabelecer os critérios e procedimentos de avaliação dos resultados dos

alunos e do próprio projecto.

Caracterização da turma – a realizar com recurso a dois instrumentos de

registo:

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 441

a) Lista nominal dos alunos com a indicação, para cada um, da idade, da

situação escolar (se está pela primeira vez no ano escolar que frequenta,

ou se foi retido) e interesses específicos.

b) Grelha grupal de registo dos comportamentos e dos desempenhos de cada

aluno ( perfil de turma, a descrever, em pormenor, mais adiante).

Priorização de problemas – Para serem identificadas as áreas consideradas

mais frágeis, com base na interpretação pedagógica da grelha grupal de

comportamentos e de desempenhos.

Plano curricular – A preencher com o conjunto ordenado de conteúdos

específicos das diferentes áreas disciplinares, com as competências transversais

consideradas adequadas à turma, as competências específicas das áreas

curriculares não disciplinares (Formação Cívica, Estudo Acompanhado e Área de

Projecto) e, ainda, as actividades de enriquecimento curricular (visitas de estudo,

torneios desportivos, ciclos de acções culturais, comemoração de efemérides e

outras). Nesta componente seriam também incluídas as planificações

educacionais individualizadas dos alunos com NEE.

Estratégias pedagógicas – Explicitação das estratégias a privilegiar ao

longo do ano escolar, sendo, as mesmas, fundamentadas com base na

interpretação pedagógica da caracterização da turma. Merecem neste contexto

especial atenção as estratégias específicas a desenvolver com os alunos com

NEE.

Estratégias de gestão curricular – Clarificação dos enfoques de

desenvolvimento curricular a adoptar, com vista à optimização das aprendizagens

(exemplos: interdisciplinaridade, trabalho de projecto, temas de integração

curricular, situações-problema, abordagem directa de conteúdos e atenção

individualizada aos alunos com NEE).

Dinâmicas de acompanhamento – Estabelecimento dos mecanismos a

activar ao longo do ano escolar para uma implicação activa e responsabilizada de

todos os intervenientes e parceiros, na promoção do sucesso escolar de todos os

alunos da turma, através do acompanhamento e seguimento da execução do

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 442

projecto curricular de turma (exemplos: assembleias de turmas, reuniões de

docentes e técnicos de apoio especializado e assembleias de pais).

Avaliação – Desenvolvimento de procedimentos de avaliação contínua com

feed-back e regulação de processos (avaliação dinâmica), dos resultados obtidos

(avaliação retrospectiva) e de sugestões futuras (avaliação prospectiva).

Abordados conceptualmente, o projecto curricular de turma, a sua

relevância como instrumento facilitador da educação inclusiva, bem como o guião-

base para a sua estruturação, importava, de seguida passar à análise dos

princípios e das formas de organização e de operacionalização dos projectos

curriculares de turma.

A pressão sentida pelos docentes em passar à prática aquele instrumento

de gestão curricular, aliada ao facto de a própria legislação o colocar no centro da

planificação e desenvolvimento de toda a função lectiva, - bem como a inegável

relevância educacional subjacente à natureza e princípios do projecto curricular de

turma - contribuíram, de modo convergente, decisivo e fundamentado, para que

este aspecto ocupasse um lugar da maior importância estratégica no

funcionamento educativo da escola. A conjugação de todos estes factores

determinaram, logicamente, que a organização e gestão dos projectos curriculares

de turma viesse a merecer um lugar de proeminente destaque no próprio

desenvolvimento deste projecto, por se considerar que aqueles podem servir de

instrumentos de acção poderosos na concretização dos princípios subjacentes à

educação inclusiva.

Em termos de continuação do trabalho desenvolvido sobre a temática do

projecto curricular de turma, teve lugar, no mês seguinte (Maio de 2002), uma

segunda oficina pedagógica cujo objectivo fundamental se centrou no reforço das

competências necessárias para a elaboração e gestão daquele instrumento

curricular. Após uma sumária recuperação da informação trabalhada na oficina

anterior, passou-se à abordagem reflexiva dos procedimentos a activar, por parte

dos professores, para a concretização, de modo securizante, do respectivo

projecto curricular de turma

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 443

Neste contexto, foi particularmente sentido que a caracterização da turma configurava uma dimensão crucial em todo o processo sendo, a mesma,

considerada como uma condição essencial para o desenvolvimento qualitativo dos

projectos curriculares de turma e, nestes, para a obtenção do sucesso escolar por

parte da generalidade dos alunos, incluindo-se, aqui, naturalmente, os alunos com

necessidades educativas especiais. Em consequência, aquela dimensão foi alvo

de uma profunda e pormenorizada abordagem.

Assim, foi objecto de análise particularmente meticulosa, a grelha grupal

(Anexo VII) destinada a ser usada para a observação e registo dos

comportamentos e dos desempenhos de cada um dos alunos da turma e já,

anteriormente mencionada. Esta grelha foi elaborada a partir dos contributos

aportados por vários autores e em conformidade, portanto, com a informação

constante no enquadramento teórico deste trabalho, mais precisamente na secção

relativa aos projectos curriculares de turma. Por uma questão de simplificação da

comunicação interna esta grelha passou a ser designada, informalmente, por perfil

de turma.

Concretamente, os autores consultados para o efeito foram: Arândiga (1993,

1996), Araújo e Chadwick (1988), Carrasco (1995), Coll e Rochera (1990),

Elósegui (1992), Espinar (1993), Jiménez (1994), Lasterra (1989), Lemaitre e

Maquère (1987), NovaK e Gowin (1988) e Tomlinson e Allan (2002). A referida

grelha é, por conseguinte, resultante do tratamento dos contributos dos autores

mencionados, sendo constituída por um conjunto de categorias de análise de

determinados comportamentos e de desempenhos protagonizados por cada um

dos alunos. As referidas categorias de análise foram seleccionadas segundo

critérios que se subordinaram aos seguintes princípios:

a) Serem estritamente necessárias;

b) Serem educacionalmente suficientes;

c) Serem compreensíveis;

d) Serem de aplicação fácil;

e) Serem relevantes para a explicação do estilo de aprendizagem de cada

aluno;

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 444

f) Terem fundamento científico.

Segundo os critérios referidos foram, então identificadas as nove categorias

que estruturam o conteúdo da grelha em análise. As categorias de comportamento

e de desempenho adoptadas são, então, as seguintes:

1. Competências Sociais

2. Funcionamento Cognitivo

3. Comunicação Oral

4. Leitura

5. Escrita

6. Matemática

7. Assiduidade

8. Organização Pessoal

9. Motivação

Todas estas dimensões foram - como se explicitou - inspiradas nos

conteúdos recolhidos através da consulta dos autores antes mencionados, com

excepção da dimensão da assiduidade. Esta categoria foi acrescentada, portanto

por inicitiva do autor do trabalho, por se ter considerado que se trata de uma

variável igualmente relevante para a caracterização do perfil educacional dos

alunos, ainda que nenhuma das fontes bibliográficas, a que se recorreu, se refira à

mesma. Paralelamente, foi também elaborada, apresentada e analisada uma

outra grelha, (Anexo VI) sendo que esta se destina a uma aplicação aluno a aluno.

É, por conseguinte uma grelha de registo individualizado. A função desta consiste,

precisamente, em facilitar o registo dos dados observados em cada aluno, nas

diferentes categorias de análise para, posteriormente, serem - aqueles dados -

então transferidos para a já referida grelha grupal, a fim de ser, então, configurado

o perfil de turma. Os dados obtidos em relação a cada aluno representam, assim,

o seu perfil informal de aprendizagem. Esta grelha de aplicação individualizada

está organizada de forma a contemplar três níveis possíveis de comportamentos

ou de desempenhos, para cada uma das nove áreas consideradas. No quadro 27

- que se pode consultar de seguida - está apresentada, de modo sistematizado,

esta matéria.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 445

Quadro 27

Explicitação dos Níveis de Comportamento e de Desempenho de cada Aluno

Áreas

Variáveis

Competências Sociais

a) Respeita as regras e relaciona-se bem com os colegas b) Respeita regularmente as regras e revela alguma

inibição no contacto com os outros c) Não respeita as regras e tem uma relação difícil com os

outros

Funcionamento Cognitivo

a) Integra, retém e aplica a informação sem dificuldades b) Revela ligeiras dificuldades na integração, retenção e

aplicação da informação c) Apresenta grandes dificuldades no processamento da

informação

Comunicação Oral

a) Possui uma comunicação expressiva/receptiva normal b) Expressa-se com ligeiras imprecisões morfossintácticas

e entende a comunicação dos outros c) Expressa-se muito mal e tem dificuldades em entender

os outros

Leitura a) Domina a leitura perceptiva e cognitiva b) Apresenta ligeiras dificuldades na leitura perceptiva e

cognitiva c) Revela grandes dificuldades no domínio da leitura

Escrita

a) Escreve com correcção morfossintáctica e ortográfica b) Escreve com ligeiras incorrecções morfossintácticas

e/ou ortográficas c) Revela grandes dificuldades no domínio da escrita

Matemática

a) Aprende os conceitos e resolve operações lógico-matemáticas

b) Revela algumas dificuldades no domínio dos conceitos e das operações

c) Revela grandes dificuldades no domínio da matemática

Assiduidade a) Tem assiduidade mensal total, ou total menos uma falta b) Tem uma média mensal de duas faltas c) Tem uma média mensal superior a duas faltas

Organização Pessoal

a) Por norma trabalha e é cuidadoso com os materiais b) Trabalha se estimulado e é quase sempre cuidadoso

com os materiais c) Revela uma quase ausência de métodos de trabalho e é

pouco cuidadoso com os materiais

Motivação

a) Envolve-se espontaneamente na generalidade das actividades escolares

b) Precisa de algum estímulo directo para se envolver nas actividades escolares

c) Raramente se envolve nas actividades escolares

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Como se constata de modo óbvio, tanto o conteúdo da grelha - após a sua

aplicação aos alunos - bem como a sua interpretação pedagógica, vale,

sobretudo para os seus utilizadores directos, daí o seu carácter eminentemente

empírico. Neste contexto, não se poderá sequer colocar, por conseguinte, o

problema da sua eventual validação científica65, dado que nem os critérios de

elaboração, nem os de aplicação estão subordinados a tal âmbito. Trata-se, de

uma grelha de registo de dados obtidos a título de observação pedagógica

experimental, sendo, portanto um instrumento de trabalho puramente informal,

pretendendo-se, contudo, o seu aperfeiçoamento futuro.

Independentemente daquelas características, tanto a grelha individual como

a grelha grupal funcionam como um poderoso meio de comunicação interna sobre

as formas de ser e de aprender dos alunos, consubstanciando, assim, uma

pertinente forma de produção de uma cultura comum de recolher e de trocar

informação sobre o perfil educacional dos alunos. Paralelamente, funciona como

um meio de sinalização preliminar dos alunos com eventuais NEE.

Em termos de aplicação foi, então, assumido que em função do que se

observa em cada aluno, o respectivo professor - sozinho ou em colaboração com

outro profissional - assinala, na grelha individual, a variável que melhor

corresponde a cada comportamento/desempenho em causa. Finalmente, após ter

registado o tipo de comportamento, ou de desempenho de todos os alunos, em

todas as categorias de análise previstas, o professor responsável de turma

preenche, com aqueles dados, a grelha grupal, dando, deste modo, origem ao

perfil de turma.

Para uma mais clara visualização do tipo de perfil que cada turma

apresenta, optou-se por atribuir uma determinada cor a cada uma das variáveis

observadas. Desta forma ao nível de Bom corresponde a cor verde, ao nível de

Suficiente a cor azul e, finalmente, ao nível de Insuficiente foi atribuída a cor

amarela. Ficou, neste âmbito, consensualizado também que os professores de 65 Todos os instrumentos utilizados foram expressamente elaborados para este projecto, sob os critérios de,

por um lado, compatibilidade lógica com as categorias de análise de suporte ao modelo de escola inclusiva adoptado e, por outro, serem de fácil compreensão e operacionalização por parte dos docentes locais. Assim,

a validação dos instrumentos em causa não fazia parte dos objectivos deste trabalho.

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apoio, ou de educação especial, deveriam colaborar activa e convergentemente,

com o professor titular de turma, no desenvolvimento de todos os procedimentos

conducentes à identificação do perfil de turma. Esta recomendação, para além do

seu significado específico, visava, também, estimular o incremento dos processos

de colaboração e de cooperação, os quais, como se constatou, detinham um nível

baixo nas dinâmicas internas da instuitição escolar.

Concluída a parte respeitante à caracterização da turma, continuou-se a

apreciação pontual de cada uma das restantes dimensões do guião-base do

projecto curricular de turma. A sua compreensão, por parte dos docentes da

escola afigurou-se fluída, não se tendo verificado dúvidas significativas quanto ao

modo da sua operacionalização.

Foi, entretanto, repetidamente salientado que o perfil de turma seria um

elemento-charneira para o desenvolvimento prático dos restantes componentes do

projecto curricular de turma. Este instrumento foi, ainda considerado como o meio

essencial para permitir “reanalisar o projecto curricular de turma, com vista à

introdução de eventuais reajustamentos” (Despacho Normativo n.º 30/2001, de 19

de Julho, ponto 25).

Terminada a abordagem ao projecto curricular de turma, bem como aos

consequentes modos de operacionalização, o colectivo de docentes expressou a

sua concordância e apreço pelos conteúdos das oficinas, assumindo, em paralelo,

o compromisso unânime de implementar o dito instrumento de gestão curricular,

nos moldes apresentados, no início do ano escolar de 2002/2003, junto das

respectivas turmas.

3.2 O Reforço da Coesão da EPEI

Com o intuito de serem reforçadas o mais rapidamente possível, as práticas

de colaboração internas, a fim de que através dessa dinâmica fossem melhoradas

as respostas às necessidades dos alunos em geral e, em particular, aos alunos

com necessidades educativas especiais, programou-se, adentro do plano de

intervenção prioritária, mais uma oficina pedagógica, desta vez com o objectivo

exclusivo de ser analisado o modo como na altura se desenvolvia o funcionamento

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da Equipa de Programação Educacional Individualizada.Relembra-se, a propósito

que a Equipa em análise surgiu como resultado do envolvimento da escola, a

partir do ano de 1998, no projecto “A Nossa Escola o Nosso Mundo: Colaborar

para Incluir”.

Ao longo da sua existência a EPEI configurou um precioso auxiliar para a

consolidação dos ideais e das práticas inclusivas locais. Contudo, como também

já se referiu, a coesão e a eficiência da equipa tinham vindo a ser prejudicadas

gradualmente, devido à constante mobilidade do pessoal docente. Esta mobilidade

foi a causa directa da saída da totalidade dos elementos que estiveram na

composição inicial da equipa. Consequentemente havia a sensação local de que

os elementos actuais não detinham a segurança patenteada pelos seus

antecessores. Perante estes factos e tendo-se em conta a importância estratégica

que esta equipa pode ter na implementação e manutenção das respostas

inclusivas às crianças com NEE, entendeu-se ser prioritário desenvolver um

processo de intervenção que ajudasse a recolocar o seu funcionamento em níveis

semelhantes aos iniciais.

Esta componente da chamada intervenção prioritária, para além do mais,

configurava um factor de extrema pertinência na caminhada para a consecução do

modelo de escola inclusiva, dada a importância estratégica que neste plano detèm

a acção da equipa de programação educacional individualizada. Por essa razão,

este processo foi planeado e levado à prática com o máximo de ponderação e de

rigor.

Na altura da realização desta oficina pedagógica (no conselho escolar de

Junho de 2002) a equipa de programação educacional individualizada encontrava-

se constituída e activa. Porém os seus elementos denotavam como que uma certa

dificuldade em identificar com segurança, qual a sua função pelo que a eficácia da

sua acção parecia, efectivamente, algo aquém daquilo que na realidade poderia

ser.

Havia portanto fundamentação concreta para uma intervenção urgente a

este nível. A intenção subjacente a este trabalho centrava-se - frise-se - na

convicção de que a optimização da acção da equipa de programação educacional

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 449

individualizada conduziria a uma melhoria sensível no campo das respostas em

curso - e no futuro - aos alunos com NEE.

Os trabalhos subjacentes à oficina pedagógica em causa iniciaram-se com

uma breve narrativa histórica - recuperada pelo investigador em diálogo com os

professores mais antigos da escola - destinada a reavivar os procedimentos

activados em 1998, através da acção subjacente ao projecto O Nosso Mundo, A

Nossa Escola: Colaborar para Incluir. Entre outros aspectos, aproveitou-se a

oportunidade para se referenciar também, a equipa de planificação inclusiva e da

vantagem advinda da articulação operacional entre esta e a equipa de

programação educacional individualizada.

Seguidamente desenvolveu-se um processo de análise da utilidade

pragmática da equipa em discussão, sobretudo pelo contributo que poderia dar, a

cada docente, na organização das respostas individualizadas aos seus alunos

com perfis educacionais mais complexos. Neste contexto, foi devidamente

salientada a relevância subjacente às dinâmicas de colaboração e de cooperação

profissionais, pelas mais valias que poderiam trazer à cultura e práticas inclusivas

já presentes na escola. Paralelamente evidenciaram-se os benefícios mais ou

menos óbvios que, de tais dinâmicas, poderiam advir para os professores e para

os alunos.

Passou-se, de seguida, à revisão crítica da constituição da equipa em

análise. Posta esta questão aos professores presentes - e após um pequeno

período de discussão e de debate - aqueles ractificaram a equipa existente, a qual

era formada pelos seguintes elementos:

a) O presidente do conselho executivo

b) O professor de educação especial (o único com formação especializada)

c) A psicóloga

d) Uma educadora de apoio

Definiu-se então que este seria o núcleo de recursos permanentes, sendo

estabelecido também que a equipa agregaria, pontualmente, o professor titular de

turma do, ou dos alunos que viessem a ser alvo da intervenção formal da equipa.

Caso estes alunos dispusessem de um professor de apoio, este viria, ainda, a

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 450

integrar a equipa, durante o processo de estudo e de intervenção junto daqueles

alunos. A equipa passava, assim, a ter um conjunto de profissionais fixos, aos

quais seriam acrescidos, pontualmente, os docentes implicados no atendimento

dos alunos que viessem a ser objecto da intervenção da equipa em questão.

Foi pedido, de seguida, que os elementos da equipa de programação

educacional individualizada, inventariassem, entre si, os papéis que na sua

opinião lhe estavam cometidos. Igual pedido foi feito aos restantes docentes

presentes. Para o efeito, estes organizaram-se em pequenos grupos. Após algum

tempo deu-se lugar à socialização dos resultados produzidos em cada pequeno

grupo. Conquanto se tenha registado alguma dispersão no respeitante ao que as

pessoas entendiam ser as funções básicas da EPEI, verificou-se que as mesmas,

no essencial, estavam contempladas.

Como referência sistematizada da matéria em análise foi, finalmente,

apresentado pelo investigador, um acetato que resumia - com base na literatura

consultada sobre esta questão - os procedimentos cometidos à equipa de

programação educacional individualizada, os quais concretamente são:

a) Constituir um sistema de apoio de rectaguarda a todas as turmas da escola.

b) Mobilizar procedimentos cooperativos e colaborativos de resolução de

problemas educacionais.

c) Desenvolver acções de formação e de informação de carácter preventivo

junto da comunidade educativa.

d) Proporcionar assistência de consultoria aos professores titulares de turma.

e) Programar, em cooperação com os docentes de turma, acções de reforço

pedagógico dirigidas a alunos com necessidades educativas especiais.

f) Elaborar programações educacionais individualizadas para alunos com

necessidades educativas complexas, bem como apoiar e acompanhar o

seu desenvolvimento integrado nos projectos curriculares de turma, dentro

ou fora da sala de aula, conforme o que fosse achado mais conveniente

face às características e necessidades de cada aluno.

Os objectivos elencados foram, pelos presentes, considerados adequados

tendo-se em conta a natureza e o papel da equipa. Aliás, parte significativa dos

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 451

mesmos estavam a ser objecto de cumprimento por parte da equipa, ainda que de

forma um pouco irregular.

Ainda em termos de organização e de funcionamento desta equipa ficou,

também, estabelecido, que a mesma passaria a reunir quinzenalmente e não

mensalmente como até então acontecia. Esta periodicidade foi adoptada por se

haver entendido que seria a mais adequada para se poder dar cumprimento aos

objectivos propostos.

Nesta oficina pedagógica mereceu especial interesse a problemática da

articulação do trabalho da equipa de programação educacional individualizada

com os processos pedagógicos e didácticos inerentes ao desenvolvimento dos

projectos curriculares de turma. A intensidade daquele interesse derivava,

também, do facto de entretanto, terem começado a aparecer, na escola, os

primeiros ensaios de perfis de turma, como resultado prático do trabalho

desenvolvido nas duas primeiras oficinas pedagógicas integrantes deste plano de

intervenção prioritária.

Nos referidos perfis emergia com nítida clareza a situação educacional dos

alunos com NEE. Por esse motivo tornava-se óbvia a conveniência de uma

articulação estreita entre a equipa de programação educacional individualizada e

os professores titulares de turma, mediada, precisamente, pelos referidos perfis de

turma.

Constatava-se, assim, que as acções de mudança estavam a produzir

efeitos concretos e que novas formas de agir ganhavam corpo no seio da

comunidade escolar. Importava portanto, estrategicamente, valorizar o facto e

enquadrar o mesmo no conteúdo desta última oficina pedagógica.

Assim, a questão da articulação da intervenção da equipa de programação

educacional individualizada com as práticas educativas em curso nas sala de aula

- segundo a planificação delineada nos diferentes projectos curriculares de turma -

ocupou um lugar primacial nesta terceira oficina pedagógica. Ou seja, procurava-

se assegurar, fundamentalmente que as adaptações curriculares individualizadas,

nas componentes previstas para serem levadas a cabo no espaço da sala de aula

fossem concebidas sob uma lógica inclusiva. Tal pressupunha, naturalmente, que,

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 452

naquele processo, fossem tidos em linha de conta, quer o perfil educativo dos

alunos, quer as decorrentes estratégias de gestão curricular desenvolvidas pelo

respectivo docente.

Sob aquela preocupação foi, então, recuperado e consensualizado o

conjunto ordenado de procedimentos a serem activados no âmbito da organização

de respostas aos alunos com necessidades educativas especiais, do qual se dá

conta de seguida:

1. Os alunos são, em primeira instância, identificados pelo professor titular de

turma.

2. O professor reúne informação relevante sobre o aluno (a partir deste

procedimento - e em todo o restante percurso - o professor titular de turma

conta com a colaboração em parceria do respectivo professor de apoio, se

este existir).

3. Realiza-se uma avaliação diagnóstica do perfil educacional do aluno.

4. Diligencia-se o envolvimento activo e convergente da família.

5. Planifica-se uma acção de reforço pedagógico com vista a minorar os

problemas diagnosticados.

6. Dá-se cumprimento prático, no contexto do projecto curricular de turma, ao

plano desenhado.

7. Procede-se a uma avaliação dinâmica da execução do plano.

8. Analisam-se os resultados decorrentes da avaliação dinâmica. Se estes

forem considerados satisfatórios, a execução do plano continua.

9. Se, pelo contrário, a resposta não for considerada positiva, solicita-se a

intervenção da equipa de programação educacional individualizada.

A fim de consolidar a cultura de operacionalização da actividade da equipa

nos casos em que esta viesse a ser chamada a intervir, ficou então reafirmado

que, a mesma, desenvolveria, por norma e sequencialmente, o seguinte conjunto

de passos: a) Reunir com os docentes envolvidos no processo educativo do aluno - e se

possível com o encarregado de educação - para a discussão do caso;

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 453

b) Levar a cabo uma avaliação diagnóstica aprofundada do aluno,

evidenciando as suas necessidades, áreas fortes, interesses específicos e

nível de competência curricular. Para identificar este nível com precisão, a

equipa de programação educacional individualizada recorrerá a uma tabela

de especificação das competências essenciais a desenvolver pelos alunos

do 1.º ciclo de Ensino Básico (Anexo VIII) elaborada, pelo autor da

investigação, para esse efeito;

c) Interpretar, pedagogicamente, o perfil da turma frequentado pelo aluno,

bem como as estratégias de gestão curricular ali em curso;

d) Formular as orientações metodológicas a desenvolver com fundamento nos

resultados da análise referida no ponto anterior;

e) Formalizar a adaptação curricular individualizada segundo as normas e os

formulários estabelecidos pelos serviços oficiais de tutela;

f) Respeitar, na elaboração desta programação educacional individualizada,

as características e necessidades dos alunos, conforme os princípios

subjacentes à inclusão moderada;

g) Apoiar, acompanhar e participar na intervenção e avaliação da

programação individualizada segundo o prescrito no competente formulário.

O documento referido na alínea b) - tabela de especificação das

competências essenciais do 1.º Ciclo - foi concebido com o objectivo de facilitar o

acesso, por parte dos docentes, ao conjunto das competências essenciais a

desenvolver, pelos alunos, ao longo dos quatro primeiros anos de escolaridade do

Ensino Básico. Assim, a elaboração do documento teve, por base, o programa

oficial do 1.º ciclo do Ensino Básico (Ministério da Educação - Departamento da

Educação Básica, 1998) e, complementarmente, os conteúdos dos trabalhos

produzidos por Arândiga (1993 e 1996).

Genericamente, a estrutura daquele documento assenta em duas

componentes relacionadas entre si: a primeira enuncia as áreas programáticas a

desenvolver, a segunda contém as aprendizagens a adquirir, sequencialmente,

pelos alunos, dentro de cada uma daquelas áreas. Deste modo, esta tabela de

especificação de competências proporciona, aos professores:

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 454

a) Situar os alunos no ponto exacto em que se encontram no domínio das

aprendizagens dentro de cada área;

b) Identificar, de imediato, as propostas seguintes de aprendizagem a

trabalhar com cada aluno, no interior das diferentes áreas de

aprendizagem.

As áreas integrantes da tabela em análise são as seguintes (conforme se

pode observar no Anexo VIII):

• Funcionamento Cognitivo

• Motricidade

• Estruturação Espacial

• Estruturação Temporal

• Competências Sociais

• Autonomia Pessoal

• Autonomia no Meio

• Comunicação Oral Expressiva

• Comunicação Oral Compreensiva

• Leitura

• Escrita

• Matemática

• Organização Pessoal

• Motivação

• Assiduidade

Na organização da estrutura desta tabela de especificação de

competências, procurou-se salvaguardar, tanto quanto possível, uma estreita

correspondência com os outros instrumentos anteriormente elaborados e já em

uso na escola. Por essa razão, ainda que com um formato mais exaustivo, a

tabela em questão apresenta uma nítida afinidade estrutural com o quadro das

categorias de análise integrantes da grelha de identificação do perfil educacional

das turma.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 455

Procurou-se, seguidamente, que todos estes processos fossem

formalmente assumidos a nível interno. Para tal ficou determinado que os

elementos da EPEI passariam a elaborar um plano anual de actividades, cujo

conteúdo respeitaria rigorosamente as funções que lhe estavam cometidas e que

acabavam de ser ractificadas.

Regressando ao modo como foi desenvolvida a oficina de formação relativa

à equipa de programação educacional individualizada, salienta-se que se

aproveitou, neste contexto, o facto de existirem, já, na altura, os mencionados

ensaios experimentais de perfis de turma66. Assim, recorreu-se a um deles para

através da sua projecção em acetato se exemplificarem possíveis modos de

interpretação pedagógica do perfil educacional das turmas. Para tal, sugeriram-se

os seguintes critérios de análise:

1. Caracterização de cada uma das nove dimensões do perfil, segundo o

princípio das áreas fortes e das áreas fracas (análise vertical).

2. Identificação dos alunos com perfil para desenvolverem funções de tutoria

colaborativa em sala de aula (análise horizontal).

3. Análise específica da categoria Funcionamento Cognitivo da turma, uma

vez que esta é entendida como a dimensão crucial para fundamentar o tipo

de mediação pedagógica67 a privilegiar (análise vertical desta dimensão).

4. Identificação de alunos considerados como casos especiais devido à

problemática complexa do seu estilo de aprendizagem (análise horizontal

para estudo preliminar do estilo de aprendizagem de alunos com

necessidades educativas especiais).

Com esta actividade procurou-se assegurar, fundamentalmente, que os

docentes locais aprofundassem a sua cultura de lidação com instrumentos e

processos facilitadores do conhecimento educacional de cada aluno. Ao mesmo

tempo, a caracterização das turmas, elaborada com base nos documentos

apresentados, foi explorada como um meio sistematizado de identificar as áreas, 66 Para uma compreensão mais imediata desta questão, optou-se por incluir no corpo do trabalho a

reprodução do acetato então utilizado, a qual consta na Figura 7. 67 Neste contexto, esta expressão é utilizada como sinónimo de estratégias de ensino-aprendizagem e na

linha das propostas de Vigotsky (conforme o exposto no enquadramento teórico do trabalho).

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 456

ou dimensões educacionais mais bem conseguidas - bem como, as menos

conseguidas - não só a nível de cada turma, mas, também, a nível da própria

escola.

Refira-se, entretanto que o trabalho de interpretação pedagógica dos perfis

de turma parece configurar um dado de extraordinário alcance a nível, por

exemplo, da gradual implementação de uma gestão da acção educativa da escola

por objectivos. Com este processo visa-se precisamente a possibilidade de

orientar, com dados fundamentados, a actividade da equipa educativa para a

resolução dos problemas mais prementes da escola, identificados a partir da

análise global de todos os perfis de turma. Assim, a identificação e o

conhecimento do nível atingido, globalmente, pela totalidade dos alunos da escola,

passaria a fundamentar o enfoque, em cada ano escolar, nas áreas tidas como as

mais críticas. Para que a questão se afigurasse mais clara para os docentes

recorreu-se a exemplos do tipo “se a análise dos perfis de turma no final de um

ano escolar evidenciasse que a escrita era uma área problemática, seria esta a

área que iria merecer uma atenção especial no ano seguinte”.

Desta forma, estabeleceu-se que a escola enveredaria por um processo de

elaboração de projectos curriculares de turma centrados numa lógica de resolução

dos problemas educacionais efectivamente ali constatados. Consequentemente

entendeu-se ser igualmente desejável que tais problemas passassem a ser até, o

critério preferencial para a selecção dos conteúdos a integrar nos próprios

programas de formação contínua dos docentes locais.

Um outro aspecto que foi, também, devidamente realçado prendeu-se com

as possíveis estratégias de inovação da forma de participação dos pais no

acompanhamento esclarecido do projecto curricular de turma. A referência aos

pais tornava-se uma necessidade estratégica, já que, como se comprovou através

da informação recolhida na literatura, o seu envolvimento implicado e esclarecido

no acompanhamento do percurso escolar dos seus filhos materializa um forte

contributo para o sucesso educativo dos mesmos. Por outro lado, pretendia-se

vincular a ideia de que a colaboração da família deveria ser um aspecto a ser

sempre contemplado no âmbito da acção cometida à equipa de programação

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 457

educacional individualizada. Em todo este contexto foi, então, adiantado - fala-se

em adiantado com toda a propriedade uma vez que o envolvimento parental será,

mais tarde, abordado em oficina especificamente a desenvolver para tal - que os

pais poderiam, trimestralmente, ter conhecimento dos progressos realizados pelo

seu educando mediante a análise do respectivo perfil de turma, utilizando-se para

o efeito a sua projecção em acetato. Foi aqui sugerido que, neste trabalho

deveriam participar elementos da EPEI a fim de melhor elucidar os pais dos

alunos com NEE, sobre a natureza da problemática dos seus filhos e sobre a

melhor forma de com eles lidarem educacionalmente. Motivados pelo desafio e

virtualidades pedagógicas que este facto poderia vir a despoletar, alguns dos

professores manifestaram, de imediato, a sua determinação em trabalhar o perfil

das suas turmas, em reuniões com os pais, de modo voluntarista e experimental,

já ao longo do ano escolar imediato. Perante esta atitude reveladora de um

elevado sentido de inovação educativa, o autor deste trabalho disponibilizou-se,

logo, para poder vir a colaborar com tais processos, em tudo quanto os docentes

entendessem que tal ajuda podia revestir-se de utilidade.

Este contexto de diálogo e de partilha de ideias foi, entretanto,

estrategicamente explorado para se frisar o papel a desempenhar pelo perfil de

turma no desenvolvimento efectivo de uma autêntica educação de qualidade para

todos e com todos, ou por outros termos, a consecução genuína de uma escola

inclusiva. Neste cenário a abordagem da problemática dos aluno com NEE era

sempre estrategicamente explorada, remetendo-se sempre esta questão para o

contexto do funcionamento da EPEI. Esta oficina de formação teve uma duração

bastante maior do que aquela que lhe estava formalmente destinada. Tal deveu-se

ao facto de os docentes terem aproveitado a mesma para questionar diversos

aspectos relacionados com a gestão do projecto curricular de turma. Apesar de

nem todos os aspectos em causa se prenderem com a EPEI, todos eles foram

alvo de discussão, satisfazendo-se, assim, os interesses e expectativas presentes.

Entretanto para uma melhor compreensão de tudo quanto antes foi

exposto, reproduz-se na Figura 8 - página seguinte - um dos perfis de turma em

causa.

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P E R F I L D E T U R M A

Áreas Alunos CS

(1) FC (2)

CO (3)

LTR (4)

ESC (5)

MTM (6)

ASS (7)

OP (8)

MTV (9)

Observações

PEI – C.E.P.*

Figura 8. Reprodução do perfil de uma das turmas da escola

Ano Lectivo de 2001/2002 Turma S 4.º Ano

a) Legenda (Áreas) : 1 – Competências Sociais 2 – Funcionamento Cognitivo 3 – Comunicação Oral 4 – Leitura 5 – Escrita

6 – Matemática 7 – Assiduidade 8 – Organização Pessoal 9 – Motivação

b) Código (Níveis/Cores) : Verde – Bom Azul – Suficiente Amarelo - Insuficiente * Currículo Escolar Próprio

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 459

Convencionou-se, ainda, que as estratégias de gestão curricular, usadas

pelo professor titular de turma, passariam a ser objecto de apreciação conjunta,

entre este e os elementos da equipa de programação educacional individualizada,

à luz dos resultados da interpretação pedagógica dos perfis de turma. Tal trabalho

em cooperação serviria, para além de outros efeitos, para se inferir da

necessidade, ou não, da introdução de reajustamentos nas referidas estratégias.

Finalmente, ficou, também, assumido que as conclusões resultantes destes

procedimentos passavam a ser o fundamento da concepção das orientações

metodológicas a ter em conta na aplicação das adaptações curriculares

individualizadas, mormente nas componentes que eram remetidas, pelo PEI, para

o contexto da classe regular. Deste modo se garantia que o atendimento educativo

dos alunos que eram alvo de programação individualizada fosse integrado nas

dinâmicas de desenvolvimento do respectivo projecto curricular de turma.

3.3 Balanço dos Efeitos da Intervenção Prioritária

A análise dos efeitos da intervenção prioritária configura um dado essencial

na perspectiva de se prefigurar até que ponto será bem sucedida a intenção de

transformação da cultura de escola encontrada à partida, numa cultura de escola

conforme ao modelo de uma escola inclusiva. Por isso se entendeu crucial

proceder-se a uma breve descrição do impacto que a chamada intervenção

prioritária provocou no funcionamento da escola, nomeadamente, no que diz

respeito à organização e desenvolvimento dos projectos curriculares de turma e

ao funcionamento da equipa de programação educacional individualizada.

A presente descrição tem por base a situação real constatada na escola, a

apartir dos finais do mês de Outubro de 2002, ou seja, no início do ano escolar de

2002/2003 e, portanto, cerca de três/quatro meses após a realização das oficinas

de formação integrantes do processo da intervenção prioritária. Não se trata -

adiante-se - de uma avaliação metódica, até por se haver entendido que não havia

nem tempo nem matéria para tal. Por isso, a informação aqui contida decorre,

apenas, do que foi percepcionado e observado empiricamente no início do ano

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lectivo imediatamente posterior à realização da intervenção prioritária e que de

algum modo se relacionasse com o desenvolvimento dos projectos curriculares de

turma e com o funcionamento da EPEI.

3.3.1 A Implementação dos Projectos Curriculares de Turma

Na sequência dos primeiros ensaios de construção dos perfis de turma - a

que já, anteriormente se fez referência - a generalidade dos professores aderiu,

com empenho, à elaboração dos projectos curriculares de turma. Assim, no início

do ano escolar de 2002/2003 todas as turmas passaram a ser trabalhadas sob

aquele instrumento de gestão curricular, seguindo, para tal, a estrutura do guião-

base apresentado na oficina de formação que teve lugar no mês de Abril de 2002.

Aquele instrumento de gestão curricular -.o projecto curricular de turma - está

organizado sob a forma de um dossier e pode ser encontrado na sala de aula

onde cada turma é alvo de atendimento.

Saliente-se, a propósito, que o órgão de gestão assumiu com muita

determinação esta matéria. Consequentemente tem vindo a diligenciar no sentido

de que fosse prestado todo o apoio necessário, no processo de organização dos

projectos curriculares de turma, aos professores que, pela primeira vez, passavam

a trabalhar na escola.

Face a esta realidade considera-se, por conseguinte, um dado

efectivamente adquirido a existência material dos projectos curriculares de turma.

E diz-se existência material porque, naturalmente, será precoce avançar com

qualquer outro tipo de consideração, nomeadamente a nível procedimental, uma

vez que só com um maior tempo de experimentação geral daquele instrumento de

gestão curricular, será possível recolher informação susceptível de caracterizar

com fundamento, os processos e resultados daquela inovação. De qualquer modo,

a situação ocorrida parece constituir um testemunho de que a comunidade escolar

evidencia predisposição operativa para concretizar as mudanças propostas,

indiciando, assim, que pode vir a ser uma realidade tangível a sua progressiva

evolução para uma situação efectiva de escola inclusiva.

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3.3.2 Reanálise do Funcionamento da EPEI

Como foi atrás relatado a oficina pedagógica destinada a reforçar a coesão

funcional da equipa de programação educacional individualizada, teve lugar em

Junho, portanto nos finais do ano lectivo de 2001/2002. No início do ano escolar

seguinte verificou-se - mais uma vez - que a mobilidade docente alterou a

composição da equipa docente. Efectivamente a educadora de infância havia

mudado de escola e houve, pois, que substituí-la por uma outra docente de

idêntica categoria.

De acordo com o que estava estipulado a equipa reunia quinzenalmente. O

investigador participou na segunda reunião do mês de Setembro para conhecer o

novo elemento e para dinamizar um processo de reavivar e de acentuar o conjunto

de funções a desempenhar pela equipa no contexto da comunidade escolar,

sobretudo no âmbito da elaboração de respostas específicas aos alunos com

NEE.

Em finais de Outubro, os projectos curriculares de turma estavam, na

generalidade ultimados. Um dos elementos do projecto curricular de turma,

concretamente, o perfil de turma facilitava o conhecimento mais ou menos seguro

do quadro de características e de necessidades de cada aluno. Emergiam deste

modo alguns alunos cujas problemáticas se afiguravam mais complexas. Em

consequência desta sinalização os professores titulares de turma e os respectivos

professores de apoio começavam, então, a solicitar a intervenção da EPEI com o

objectivo de esta colaborar na acção de atendimento àqueles alunos.

Nos casos em que se justificava, a EPEI organizava-se no sentido de - em

estreita colaboração com o professor titular de turma e professores de apoio -

elaborar uma planificação individualizada, cuja intervenção se subordinava ao

princípio genérico de ser desenvolvida, sempre que possível, na classe regular.

Casos houve, porém, em que determinados apoios específicos eram propostos

para serem prestados em espaços distintos dos da sala de aula. Em relação aos

alunos multideficientes tal prática era, por norma, seguida.

Por sugestão do presidente do conselho executivo a prioridade de

intervenção da EPEI centrava-se nos alunos dos dois primeiros anos de

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escolaridade e em alunos com NEE provenientes de outras escolas. Este princípio

sustentava-se num fundamento que aparentava ser efectivamente válido, o qual

decorria do facto de os alunos do 3.º e 4.º anos de escolaridade terem já uma

história anterior de acompanhamento por parte da EPEI e, consequentemente, o

tipo de intervenção estava mais ou menos estipulado, requerendo, normalmente,

apenas alterações pontuais.

Como se esclareceu em local oportuno o número de alunos da escola

rondava as quatro centenas e meia. È, de facto, um número considerável. Com

uma população tão numerosa, os alunos com NEE eram, também, em número

significativo. Foi, por isso, estimulado o reforço das práticas de colaboração e da

circulação da informação. O órgão de gestão dava um importante exemplo nesta

matéria. A azáfama da EPEI foi de grande intensidade ao longo de todo o primeiro

período. Os professores de turma, os docentes de apoio e as próprias famílias (em

geral) cooperavam com a EPEI, dando mostras de evidente compreensão, tanto

do volume de trabalho que lhe estava cometida, como do impacto do mesmo para

a melhoria das respostas aos alunos com NEE.

Por alturas do Natal de 2002, as programações individualizadas destes

alunos estavam, praticamente na totalidade, devidamente elaboradas. Na parte

restante do ano escolar a prioridade seria dada à intervenção e ao seguimento

crítico do seu resultado.

Constatou-se, pelo acompanhamento contínuo da acção da EPEI no

primeiro período do ano escolar de 2002/2003, que esta respondia - ainda que

com alguma dificuldade devido ao alto número de alunos com NEE - aos

objectivos que Correia (2003a) propôs para a sua criação. Com a sua acção eram,

fundamentalmente beneficiados os alunos com problemáticas educacionais mais

complexas.

3.4 A Aproximação Significativa ao Modelo de Escola Inclusiva

Analisando-se, então e em conjunto os efeitos da chamada intervenção

prioritária, tanto a nível dos projectos curriculares de turma, como a nível do

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 463

funcionamento da equipa de programação educacional individualizada, forçoso

será de inferir que se notou, na comunidade escolar do Forte da Casa uma forte

vontade em responder cada vez mais e melhor às carências educacionais dos

seus alunos e nomeadamente aos alunos com NEE. Tal constatação gerava no

autor deste trabalho a crescente convicção de que os percursos e práticas para

uma escola inclusiva prosseguiam a rota certa.

Dotar a escola de capacidade para oferecer a todos os seus alunos uma

educação de qualidade e, neste âmbito garantir, igualmente, um atendimento

adequado aos alunos com NEE, corporizavam os grandes objectivos da

intervenção a desenvolver junto da - e com - a comunidade escolar. Objectivos

esses que de grosso modo correspondem à acção de uma escola inclusiva. Face

à intervenção prioritária concretizada e tendo-se em conta os resultados com tal

alcançados, julga-se ser legítimo concluir-se que, até ao momento foram, já,

dados os passos fundamentais para que a escola local possa, na prática,

desenvolver, de modo seguro, as estratégias básicas para assegurar uma

educação de qualidade para a generalidade dos alunos (com a organização e

gestão dos projectos curriculares de turma) e uma resposta apropriada aos alunos

com NEE (através do reforço da coesão funcional da equipa de programação

educacional individualizada).

Trata-se, pois, da consolidação de traves-mestras na edificação da

pretendida escola inclusiva. São caminhos que parecem irreversíveis no trajecto

delineado. Graças, portanto, à intervenção prioritária, estrategicamente

identificada, planeada e executada, a escola materializou um importante progresso

nos seus percursos e práticas, os quais traduzem um extraordinário avanço nos

caminhos de aproximação ao modelo de escola inclusiva.

4 Dinâmicas de Continuidade

Concluído o processo que conduziu à clarificação, quer do ponto de

situação em que a escola-alvo se encontrava, quer dos percursos a percorrer para

a sua progressiva transformação numa autêntica escola inclusiva, terminava,

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 464

paralelamente, o primeiro dos ciclos deste projecto de investigação-acção. O

mesmo contemplou, ainda, um conjunto de acções levado a efeito para dar

consecução prática às mudanças identificadas como prioritárias. O ciclo que agora

findou traduz, efectivamente, a componente crucial de todo o trabalho e por isso

constitui o núcleo básico da presente dissertação. Contudo, o projecto, no seu

todo, não pára por aqui. Vai continuar de acordo com as actividades programadas

e, por conseguinte, num plano temporal que se prevê vir a ter a duração de três

anos escolares, assim preenchidos:

a) Imediatamente após a conclusão do presente relatório: primeira fase do

segundo ciclo do projecto de investigação-acção a desenvolver com a

realização das oficinas de formação (uma por mês) correspondentes aos

roteiros compreendidos entre os números 1 (Cultura Organizacional de

Escola) e o número 7 (Educação Especial e Apoios Educativos). De

permeio ficarão os roteiros números 5 A, 5 B e 6, respeitantes aos

Projectos Curriculares de Turma (os dois primeiros) e à Equipa de

Programação Educacional Individualizada (o último), os quais por terem

sido já objecto de tratamento na intervenção prioritária, serão - neste

seguinte ciclo de acção - alvo, tanto de reflexão sobre os modos de

funcionamento, como de tomadas de decisão sobre eventuais processos de

reformulação.

b) Ano escolar de 2005/2006 - segunda fase do segundo ciclo do projecto de

investigação-acção a preencher com o desenvolvimento prático dos

restantes roteiros.

c) Ano escolar de 2006/2007 - terceira fase do projecto de investigação-acção

destinada a um processo de regulação global das mudanças operadas com

a finalidade de serem introduzidas as reformulações que vierem a ser

consideradas necessárias.

São pois, estas as dinâmicas de continuidade que no momento se perfilam

face ao estado actual do projecto. Mas como o próprio termo projecto enuncia, na

sua componente semântica, o que está, de momento planeado pode vir a ser

alterado em função de determinados factores, dos quais alguns não serão de todo

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 465

previsíveis. Entre os que se afiguram previsíveis, contam-se, nomeadamente, os

contributos dos possíveis avanços da investigação científica, uma vez que a

consulta bibliográfica continuará, naturalmente a ser uma preocupação

permanente. Logo, se os hipotéticos contributos indiciarem algo de relevante no

âmbito da escola inclusiva e se a sua integração neste projecto implicar alguma

alteração no que já está planeado, tal virá, naturalmente a acontecer.

Outra situação igualmente previsível consiste nos prováveis efeitos da

análise dos dados a recolher no futuro e resultantes das mudanças entretanto

operadas. Assim se a referida análise fornecer indicações que aconselhem a

reformulação de algo já delineado, tal será, obviamente levado em linha de conta

e essa reformulação será efectuada.

Trata-se, pois, de um projecto sensivelmente dilatado no tempo. Julga-se,

contudo que só desta forma será minimamente viável levar-se a cabo, de modo

consolidado, as transformações programadas. Estas são, de facto, muito

complexas e como mexem com aspectos estruturais do funcionamento escolar

são, por essa razão, morosas na sua implementação. Por outro lado o que está

em causa - um projecto de educação de qualidade para todos os alunos e, no seio

destes, para os alunos com NEE - é demasiado importante para que se ceda a

eventuais tentações de encurtar tempo, as quais não se afiguram de todo

compatíveis com a natureza do que se pretende.

Além do mais, o compromisso assumido com a comunidade escolar visada,

no âmbito deste projecto é, por um lado, de o concretizar na sua totalidade e por

outro, fazê-lo sem provocar rupturas significativas com o seu funcionamento

quotidiano. O respeito integral por uma e outra das premissas enunciadas

determinou, em grande medida, a calendarização adoptada e, antes, exposta. A

morosidade - que se julga de todo justificada - inerente ao desenvolvimento de

todas as diferentes fases deste extensíssimo projecto não se compadece,

contudo, com os prazos académicos e daí esta dissertação surgir antes da

conclusão total do processo em que se baseia.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 466

CONCLUSÃO

Antes de serem referidas as conclusões propriamente ditas entende-se ser

conveniente, em termos preliminares, frisar a natureza e as consequências dos

compromissos assumidos para com a comunidade escolar implicada. Assim - e

neste contexto - ficou, previamente consensualizado, junto daquela, que a

investigação seria um meio e não um fim. Tal, na prática, significava que a

prioridade consistia no trabalho de diagnosticar a situação escolar à partida,

identificar um modelo de escola inclusiva adequado àquela realidade e, por fim,

cooperar, em termos pessoais, na implementação das mudanças para caminhar

da situação diagnosticada à situação desejada, ou seja, à construção da escola

inclusiva, com base no modelo pré-estabelecido. Neste contexto, a presente

dissertação deverá, então, ser entendida mais como um produto parcial do que

propriamente como um resultado final de todo o trabalho desenvolvido e a

desenvolver, como, de resto, é prenunciado em várias partes deste relatório.

Face àquele quadro, emerge, portanto, uma situação - também ela com o

seu quê de original - em que o projecto de investigação-acção na sua globalidade,

está subordinado a determinados objectivos, enquanto que o trabalho que serviu

de base à presente dissertação se regeu por um conjunto de propósitos que, se

bem que completamente integrantes na totalidade dos objectivos do projecto de

investigação-acção em curso, são, no entanto, mais restritos. Logicamente, por

conseguinte, só estes últimos poderão, aqui, ser alvo de apreciação, querendo-se

com isto relembrar que este tipo de conclusões são, de algum modo, parciais face

à totalidade do projecto.

Ora, neste primeiro ciclo de trabalho o que estava fundamentalmente em

causa era, por um lado, a edificação conceptual de um modelo de escola inclusiva

que de algum modo configurasse uma plataforma compatível com a realidade da

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 467

escola estudada e, por outro, o desenho de um plano que indicasse, com clareza,

o caminho futuro a seguir pela escola. Neste cenário era ainda imperioso

determinar com metódica segurança, o ponto, tão exacto quanto possível, em que

se encontrava a comunidade escolar entre uma e outra daquelas duas referências

cruciais. Entretanto e por motivo de não se deixarem sem resposta imediata

algumas necessidades prementes, constatadas localmente, assumiu-se que ainda

antes da redacção deste relatório seriam levadas a cabo algumas sessões de

trabalho, orientadas pelo investigador, com o objectivo de ajudar a escola a

organizar-se em termos estruturais e funcionais de modo a obviar as causas das

referidas necessidades. Dada a importância capital de que se revestiam tais

aspectos para a equipa educativa da escola, a resposta aos mesmos foi

considerada como muito urgente pelo que se decidiu conceder uma atenção

imediata àquela questão. Esta acção - como se declarou no corpo do trabalho – foi

considerada como intervenção prioritária e em consequência do período em que

ocorreu é, ainda, objecto de descrição e de análise nesta dissertação.

Atentando-se, então, nos objectivos propostos previamente para o

desenvolvimento deste projecto académico - e tendo-se em consideração os

processos e resultados decorrentes do trabalho desenvolvido e aqui relatados -

entende-se, de forma muito convicta, que os mesmos foram alvo de uma

consecução praticamente plena. Efectivamente, foi construída uma configuração

de modelo de escola inclusiva que, no seu todo, se afigura tão pertinentemente

sistémico quanto viável, conquanto bastante exaustivo. Paralelamente, foi

desenhado um plano de mudanças que, se sujeito a uma análise metódica e

rigorosa se afigura como um meio susceptível de dar corpo a uma espécie de

ponte que a partir do percurso já percorrido pela escola parece representar, com

relativa nitidez e lógica o trajecto a percorrer, por aquela, para atingir a meta

desejada.

Também se assume que os percursos entretanto já calcorreados pela

escola, num possível itinerário conducente a uma escola inclusiva, foram

igualmente identificados com uma apreciável clareza. Finalmente, acrescente-se a

ideia de que a intervenção prioritária entretanto já concretizada, produziu efeitos

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 468

cruciais no que concerne à consolidação e reforço dos ideais inclusivos assumidos

pela comunidade educativa em exercício na escola do Forte da Casa. Daí que se

considere este facto como um dos resultados mais salientes de todo este projecto,

sobretudo se forem levados na devida conta os objectivos previamente traçados.

Acentue-se, agora, que a crença antes expressa, se apoia,

fundamentalmente, no facto de se haver procurado fundamentação teórica e

científica, praticamente ao nível de pormenor, a fim de se assegurar um suporte

credível para cada um dos incontáveis passos que foram dados ao longo de toda

esta actividade investigativa. Tal processo verificou-se, tanto para a concepção do

modelo de escola inclusiva, como para a identificação dos percursos de mudança

a mobilizar pela comunidade escolar. Idênticos cuidados foram tidos no que se

refere às metodologias de recolha e de análise da informação recolhida sobre a

escola. Tratou-se de um trabalho extremamente minucioso e extensíssimo mas

cujos resultados - pelo menos do ponto de vista pessoal - acabam por serem

compensadores na medida em parecem traduzir, de modo visível, uma real

materialização dos objectivos fundamentais do projecto.

A apreciação profunda do modelo de escola inclusiva aportado, prova por si

mesmo que todos os aspectos essenciais da organização e funcionamento

escolares foram contemplados. Neste contexto, nota-se que a gestão da sala de

aula mereceu um tratamento mais intenso. Tratou-se de uma opção intencional. A

razão de tal decorre, precisamente, do facto de se considerar que é efectivamente

naquele espaço que acontece muito do que é determinante no desempenho

educativo de toda uma escola e consequentemente nas práticas inerentes à

educação inclusiva.

Evoca-se, entretanto que com o próprio processo de concepção do modelo

de escola inclusiva se procurava responder a uma das perguntas nevrálgicas que

a comunidade escolar colocava à partida: O que é, no seu todo, uma escola

inclusiva? Como se depreende pela sua natureza e significado, esta questão

prefigurava a questão-chave de toda a situação-problema. Encontrar uma

resposta cabal a esta questão consubstanciava, provavelmente, o objectivo mais

proeminente de todo o trabalho. Havia a consciência de que do modo como fosse

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conseguida a resposta a tal questão dependeria igualmente a resposta a outra das

perguntas de partida: Que percursos e práticas a desenvolver para a

concretização de um modelo de escola inclusiva? Consequentemente, a

arquitectura do modelo em apreço corporizou uma preocupação tão central quanto

permanente no desenvolvimento do projecto de investigação. Efectivamente, a

consulta bibliográfica coexistiu, desde o primeiro momento, com o desenrolar das

restantes actividades. Aliás, ainda hoje se mantém em aberto e assim continuará a

ser até à consecução derradeira de toda a intervenção planeada. Nesta altura

julga-se, não sem fundamento, que se encontrou, com base em inúmeras fontes,

um modelo coerente, coeso e completo do que se pode considerar uma

comunidade escolar inclusiva orientada para a disponibilização de uma educação

de qualidade para todos os alunos e em particular para os alunos com NEE. Como

se disse, esta meta prefigurava a resposta dorsal à situação-problema encontrada.

Daí o volume de informação e o destaque de que se reveste este aspecto no

presente relatório.

A importância da informação recolhida para a elaboração do modelo de

escola inclusiva aqui perfilhado, revelou-se, também, de utilidade estratégica, a

nível do desenho da própria planificação da intervenção. Efectivamente como se

pode observar nos roteiros para tal construídos, o seu conteúdo assenta,

precisamente, nos contributos dos diversos autores consultados. Claro que a este

procedimento foi, dedicada - como já se indiciou - uma atenção muito rigorosa,

pretendendo-se, desta forma que as mudanças a operar localmente, tivessem um

suporte científico sólido e que os seus resultados finais conduzam, com uma

proximidade tangível, ao modelo proposto.

A identificação do ponto em que se situava a escola, na caminhada em

questão parece, de igual modo, ter sido conseguida com muita propriedade e

precisão. Bem, diga-se em abono da verdade que esta questão configura,

naturalmente, um aspecto cuja natureza é extremamente difícil de objectivar e que

são múltiplas as alternativas para a recolha de informação no terreno. Porém,

afigura-se legítimo deixar aqui expressa a percepção de que a leitura subjectiva e

informal que se ia fazendo da realidade local, fornecia indícios de que a

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informação formalmente recolhida na entrevista, bem como em fontes

documentais, retratava com muita propriedade, os aspectos e os contornos mais

significativos daquela mesma realidade. Esta percepção ficou definitivamente

comprovada quando se verificou, por parte da comunidade local, uma clara

concordância ao ser confrontada com os dados, assim recolhidos e que

reproduziam, fundamentalmente, a situação-diagnóstica da organização e

funcionamento da escola. Logo, também neste âmbito, emergem testemunhos e

indícios que permitem inferir que o que se pretendia terá sido muito

satisfatoriamente alcançado.

Foi, entretanto, intensamente referido que o projecto continua no terreno da

sua implementação prática. Este facto carreia consigo a sensação de que, nesta

altura, algo está inacabado. E está. Aliás tudo o que seja acção social em

momento algum estará encerrado, uma vez que cada dia traz algo de diferente ao

verificado no dia anterior. Mas no que respeita, concretamente, ao presente

trabalho, resulta claro que o que aqui se reporta se relaciona apenas com uma das

componentes da totalidade do projecto em curso. Há a consciência plena de tal.

No entanto, também há a convicção de que o essencial do projecto está

conseguido, ou seja, estão lançados e fortificados os alicerces de base em que se

julga assentar a construção de uma escola inclusiva. Por conseguinte, a parte

restante irá acontecendo, pedra a pedra, sim, mas sobre uma estrutura já

perfeitamente construída. Sendo assim os percursos e práticas seguintes serão

percorridos, certamente, com uma confortável margem de segurança. Acrescente-

se, a propósito, que as mudanças ensaiadas, nomeadamente, aquelas que a

realidade de então reclamava como prioritárias foram implementadas com

assinalável êxito. Estão já, satisfatoriamente assimiladas pelas rotinas funcionais

da escola, sendo que os seus efeitos organizacionais configuram um patamar de

apreciável estabilidade no que toca à implementação das transformações em falta.

Logo, também neste aspecto particular, os resultados foram francamente

animadores. Facto que parece dar lugar a um prenúncio claro de que a

continuidade do desenvolvimento do plano proposto produzirá um produto final

bastante aproximado do projectado.

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Normalmente, defende-se que os resultados da investigação do tipo

qualitativa não são generalizáveis. Naturalmente que esta premissa também se

aplicará ao caso vertente. Porém, persiste um certo sentimento pessoal de que

muito do que resultou deste trabalho poderá ser passível de aplicação

relativamente similar noutros contextos. Como reforço desta opinião, salienta-se,

por exemplo, o facto de o modelo de escola inclusiva encontrado parecer, na sua

globalidade, corporizar um tipo de organização perfeitamente adequado à

generalidade das escolas portuguesas68. Logo, o mesmo comporta - como se

testemunha no presente relatório - matéria capaz de fundamentar, com rigor, a

estratégia da planificação a desenhar, caso a caso, junto de outras comunidades

escolares que, eventualmente desejem, activamente, trilhar os caminhos da

escola inclusiva. O que parece mais específico para cada uma das eventuais

situações é, precisamente o processo de identificação dos percursos já

concretizados naquele contexto, uma vez que aqueles serão por natureza

singulares e, consequentemente, diferentes de caso para caso.

Assim, considera-se que a identificação do ponto em que se situa cada

escola configura, naturalmente, um dado de suma importância. Merecerá que, ao

mesmo, seja dada uma atenção muito metódica a fim de evitar que se parta de

uma posição que não corresponda minimamente à situação real, conduzindo

inevitavelmente a resultados finais desalentadores. Daí ser extremamente

imperioso que se seleccionem meios de recolha dessa informação diagnóstica

com o máximo de precaução.

Pelo que se pode deduzir da experiência resultante deste trabalho pensa-se

que para a consecução de projectos similares se deve privilegiar a estratégia da

investigação participada. Tal opinião fundamenta-se no pressuposto de que se

torna determinante o facto de que a comunidade estudada sinta que está perante

alguém que quer cooperar por dentro para ajudar a mesma a conseguir mais e

melhores resultados para os alunos com NEE, ali atendidos.

68 Refira-se, a propósito, que por convite e proposta da ECAE de Vila Franca de Xira, este modelo de

intervenção será, num futuro próximo alargado a todas as escolas do 1.º ciclo do Ensino Básico daquele

concelho, facto que poderá, naturalmente servir de teste à sua potencialidade de generalização.

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Confrontando-se alguns aspectos da escola estudada com os dados

coligidos empírica e pessoalmente ao longo da actividade profissional, exercida ao

longo de quatro décadas, julga-se ser pertinente afirmar que, no geral, existe uma

certo figurino-padrão de funcionamento nas escolas portuguesas do 1.º ciclo do

ensino básico. Como exemplos de descritores da tipologia de funcionamento

desse figurino, referem-se, nomeadamente, os seguintes:

a) A cultura organizacional de escola

b) A gestão da sala de aula

c) A intervenção da educação especial e dos apoios educativos

d) O envolvimento parental

e) Mobilidade anual de pessoal docente

Estabelecendo-se, agora, um paralelismo com o modo de funcionamento das

nossas escolas, naquelas dimensões, com o modo como deveriam funcionar -

segundo os princípios norteadores da escola inclusiva - julga-se ser de inferir que

a realidade portuguesa está, ainda, bastante distanciada dos pressupostos

atitudinais, conceptuais e procedimentais característicos das organizações

escolares com orientação inclusiva. Para fundamentar esta afirmação refira-se

concretamente que, no contexto português, são, por exemplo, praticamente

inexistentes os núcleos informais de apoio à inclusão dos alunos com NEE,

nomeadamente os preconizados por Correia (2003a): a equipa de planificação

inclusiva e a equipa de programação educacional individualizada.

Consequentemente, o conhecimento da função estratégica que estas equipas

podem desempenhar na criação de dinâmicas escolares facilitadoras da

organização de respostas inclusivas aos alunos com NEE - como se demonstrou

no corpo principal deste trabalho - leva a formular a ideia de que, no nosso país, a

generalidade daqueles alunos estarão a ser alvo de uma resposta, no mínimo,

pouco sistematizada.

Entendendo-se, entretanto, que a realidade social actual clama, de modo

evidente por uma clima geral de maior e mais genuína solidariedade e igualdade

entre as pessoas (valores supremos do ideal da inclusão) urge que as escolas se

estruturem e organizem para a consecução gradual e eficiente das práticas

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efectivas de uma educação inclusiva. Nesta perspectiva - e em termos

inevitavelmente sumários - advoga-se que:

1. Se reforce a cultura de cooperação e de colaboração no seio de cada

comunidade escolar de modo a que se deixe de falar dos meus alunos e se

passe a considerar os nossos alunos.

2. Se passe a governar a sala de aula sob uma lógica didáctica assente no

princípio construtivista e cooperativo da pedagogia da aprendizagem,

gerindo-se a turma segundo o seu perfil educacional.

3. Se enquadre o funcionamento da educação especial e dos apoios

educativos nas práticas de uma interacção convergente que envolva, de

modo esclarecido, docentes e auxiliares da acção educativa na procura do

encontrar das respostas apropriadas a cada aluno com NEE.

4. Se desenvolvam estratégias conducentes à crescente implicação

responsabilizada das famílias, no acompanhamento activo de todo o

percurso escolar dos respectivos educandos.

5. Se criem em cada escola, - ainda que de modo informal - equipas de

planificação inclusiva e equipas de programação educacional

individualizada com o fim de reforçar as crenças e os valores da inclusão,

bem como o desenvolvimento de competências nos processos de

planificação e de intervenção individualizadas junto dos alunos com NEE.

6. Se tomem medidas formais que permitam a estabilização temporal do

pessoal docente, condição crucial para se gerar e gerir, de modo

consolidado, projectos de inovação, culturalmente assumidos por cada

comunidade escolar.

Num trabalho desta natureza será naturalmente de esperar que algo surja, em

termos de originalidade, ou de inovação. Sob este ângulo entende-se que o

projecto, em si próprio e na sua globalidade, parece prefigurar um processo

praticamente inédito, na realidade portuguesa, não só pela sua dimensão

sistémica (abranger o todo organizacional e funcional de uma escola), mas,

também - e sobretudo - pelo seu alcance conceptual, dado que, na prática,

associa o conceito de escola inclusiva ao de escola de qualidade para todos e

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 474

com todos, contemplando naturalmente, - como ficou patente - a situação

específica dos alunos com NEE. Porém, o seu aspecto mais genuinamente inédito

residirá no modo como foi integrado, no paradigma da escola inclusiva, o conteúdo

do Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro, facto que, naturalmente, não tem

precedentes na história educativa portuguesa. Neste contexto, pelo relevo

operacional que detém já na escola estudada, salienta-se, em especial, o trabalho

desenvolvido no âmbito da organização e gestão dos projectos curriculares de

turma e, nestes, o enquadramento que é assegurado, turma a turma, aos alunos

com NEE o qual abrange, não só o apoio prestado na classe regular, como

noutros espaços, consoante o prescrito nos respectivos PEI.

A educação inclusiva configura, sem quaisquer dúvidas um instrumento social

de extraordinária relevância no mundo actual. Dos seus resultados poderão advir

mais valias consideráveis no que toca à qualidade (por que não felicidade?) de

vida das novas gerações. Neste contexto, as escolas inclusivas terão, obviamente,

um papel determinante. É, pois, um imperativo crucial diligenciar-se para que a

generalidade dos estabelecimentos de educação e de ensino se tornem, sob o

ponto de vista organizacional e funcional, mais inclusivos.

Nesta perspectiva, o presente trabalho parece, então, consubstanciar um

modesto mas securizante roteiro das acções a empreender pelas comunidades

escolares para activarem projectos de inclusão. Pelo menos é esta a convicção

pessoal cuja base de sustentação decorre, não só do conteúdo teórico produzido

mas também das respectivas implicações práticas já accionadas na escola

estudada.

Reflectindo-se, então, no valor intrinsecamente humano de tudo o que está

em jogo e no contexto da temática que é objecto deste trabalho, emerge no mais

íntimo recôndito da sensibilidade pessoal, uma pujante sensação de que valeu a

pena todo este esforço. Intimamente acredita-se que a inclusão traduz, a

verdadeira essência do que deve presidir à vivência quotidiana entre os homens.

Provavelmente nada haverá de mais gratificante do que cada um de nós usufruir,

em pleno, um sentimento simultâneo e interactivo de pertença e de aceitação em

relação a cada grupo social em que desenvolvemos, no dia a dia, a nossa

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interacção pessoal, social ou laboral. O contrário, ou seja, a rejeição, provocará,

obviamente, uma sensação de indiscritível frustração que se assemelhará a uma

percepção extrema de vida vazia, despida, obviamente do sentido de felicidade

que é, em suma, aquilo que cada ser humano mais almeja e procura ao longo da

sua vivência.

A tudo isto estão igualmente sujeitos os alunos com NEE. Como seres

sensíveis eles percepcionam profundamente os efeitos, em si próprios da

aceitação e de pertença, ou em alternativa, os da exclusão. Está, pois em jogo, a

sua própria condição de felicidade. Por essa razão, a eles é dedicado, em primeira

linha, todo o intenso e extenso esforço subjacente à realização do presente

trabalho. Consequentemente, espera-se e deseja-se que, de tal, resulte algo que

contribua - ainda que modestamente - para a consecução de um dos direitos

fundamentais daquelas crianças e jovens: uma educação de qualidade em

ambientes inclusivos e a decorrente sensação de se sentirem... felizes.

Há pois que lutar, em todas as frentes pela inclusão dos alunos com NEE.

Não é, seguramente, uma luta fácil e com a vitória garantida. Os sinais visíveis no

nosso país, nesta matéria, são, nalguns sectores, no mínimo, preocupantes.

Mesmo, até por parte daqueles a quem competiria estar na linha da vanguarda

dos que participam nesta batalha pela inclusão dos alunos com NEE. Mas

parecem não estar, como é o caso do próprio serviço de tutela “porque pretende

publicar muito brevemente legislação que poderá vir a colocar o aluno com NEE

numa posição muito próxima da segregação/exclusão, atirando-o de novo para a

institucionalização” (Correia, 2003b, p. 13). Há, portanto, que estar vigilante e

promover convictamente acções que, no campo educacional, salvaguardem e

materializem os direitos de todos os alunos com NEE.

Enfim, motivos bem profundamente fortes para que as comunidades

educativas trilhem, tão urgentemente quanto possível, os caminhos seguidos pela

escola do Forte da Casa...

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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Decreto-Lei n.º 35401, de 27 de Dezembro de 1945

Decreto-Lei n.º 35801, de 13 de Agosto de 1946

Decreto-Lei n.º 43752, de 24 de Junho de 1961

Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de Agosto

Decreto-Lei n.º 115/98, de 4 de Maio

Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro

Lei n.º 45/73, de 12 de Fevereiro

Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro (LBSE)

Despacho Conjunto n.º 36/SEAM/SERE/88, de 29 de Julho

Despacho Conjunto n.º 105/97, de 1 de Julho

Parecer n.º 3/99, do Conselho Nacional de Educação – Diário da República, II

Série, 17 de Fevereiro de 1999

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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A N E X O S

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 502

A N E X O I

Certificado de Participação na Acção de Formação sobre Escolas Inclusivas

Orientada por Mel Ainscow

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 503

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 504

A N E X O I I

Quadro-resumo do Projecto

A Nossa Escola o Nosso Mundo: Colaborar para Incluir

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 505

ECAE de Vila Franca de Xira

Projecto O Nosso Mundo, A Nossa Escola: Colaborar para Incluir

1. Objectivo geral: Melhorar as respostas educativas aos alunos com

dificuldades de aprendizagem, numa perspectiva inclusiva

2. Plano de Acções: a. Selecção das escolas a envolver e sua distribuição em grupo

de controle e grupo experimental

b. Desenvolvimento de Seminários centrados na organização e

gestão da escola inclusiva e em estratégias de atendimento

educativo a alunos com DA

c. Dinamização nas escolas do Grupo Experimental de dinâmicas

sistematizadas de colaboração e de cooperação orientadas

para a promoção de práticas inclusivas

d. Avaliação individual dos alunos das escolas de ambos os

grupos (pré-intervenção)

e. Desenvolvimento de um programa de formação específica para

os professores dos alunos do grupo experimental

f. Desenho e implementação de um plano de intervenção junto

dos alunos do grupo experimental (pós-intervenção)

g. Reavaliação dos alunos dos grupos experimental e de controle

e confronto de resultados

Apoio: Direcção Regional de Educação de Lisboa Supervisão Científica:

Professor Doutor Luís de Miranda Correia (Professor da Universidade do Minho)

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 506

A N E X O I I I

A - Guião da Entrevista

B - Protocolo da Entrevista

C- Quadro de Categorização dos Dados da Entrevista

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 507

A - Guião de Entrevista

Tema: Cultura organizacional e pedagógica da escola Objectivos Gerais:

a) Conhecer as formas actuais de organização e de funcionamento pedagógico da escola

b) Identificar atitudes e práticas indiciadoras de educação inclusiva, em curso na escola, bem como os seus antecedentes

Entrevistado: Coordenadora da Equipa de Coordenação dos Apoios Educativos do concelho de Vila Franca de Xira e ex-professora de apoio na escola em estudo Designação dos

blocos Objectivos específicos Tópicos

A

Legitimação da entrevista

a) Explicitar os fundamentos e objectivos da entrevista b) Garantir a confidencialidade

Razões da entrevista Objectivos Garantia de confidencialidade

B

Perfil da entrevistada

Caracterizar o perfil profissional da entrevistada, relativamente a: a) Formação b) Tempo de serviço c) Funções profissionais d) Locais de trabalho e) Conhecimento da realidade em estudo e

seu fundamento

Formação Trajecto profissional Nível e razões do conhecimento da escola

C

Cultura de

organização e gestão da escola

Obter informação precisa sobre: a) Conceito de inclusão assumido pela

comunidade escolar b) Atitude da liderança face à educação

inclusiva c) História do atendimento escolar a alunos

com necessidades educativas especiais d) Formas de envolvimento parental e) Relação com a comunidade e serviços

exteriores

Conceito de inclusão Atitudes da liderança Práticas anteriores de

atendimento a alunos com NEE

Envolvimento parental Relação com o exterior

C Projecto

Educativo de Escola

Conhecer as formas de elaboração e os conteúdos do Projecto Educativo de Escola

Estratégias de elaboração Procedimentos Conteúdos

D Equipa de

Planificação Inclusiva

Recolher informação relativa a: a) Criação b) Objectivos e funções

Antecedentes Situação actual

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 508

E

Gestão da sala de aula

Recolher informação pormenorizada sobre: a) Estratégias e metodologias gerais b) Práticas inclusivas c) Gestão do grupo/turma d) Técnicas de elaboração e de

desenvolvimento de adaptações curriculares

e) Formas de interacção com outros profissionais

Metodologias Estratégias inclusivas Gestão da turma Individualização curricular Trabalho em parceria

F

Equipa de Programação Educacional

Individualizada

Obter dados sobre a Equipa de Programação Educacional Individualizada, relativos a: a) Criação b) Funções c) Formas de trabalho com os professores

titulares de turma

Antecedentes Actividades desenvolvidas Modos de articulação

G Projecto de

Apoio a Crianças

Multideficientes

Obter dados relativos a: a)Razões do aparecimento b) Caracterização dos utentes c) Modo de funcionamento

Informação histórica Tipo de crianças Organização funcional

H

Educação Especial e Apoio

Educativo

Conhecer: a) Número de elementos e tipo de

formação b) Formas de trabalho c) Mobilidade anual

Dados numéricos Formação profissional Actividades desenvolvidas Continuidade plurianual

I

Acção Auxiliar Educativa

Recolher informação sobre: a) Atitudes face à inclusão b) Nível de conhecimentos sobre

necessidades educativas especiais c) Formas de cooperação no trabalho

pedagógico da escola

Atitudes face à inclusão Informação/formação so- bre crianças com NEE Envolvimento nas activi-

dades educativas

J Envolvimento

parental

Conhecer os níveis e as formas de interacção entre a escola e as famílias

Grau de envolvimento Formas de interacção

L Propostas de intervenção prioritária

Inventariar quais as áreas e conteúdos prioritários a trabalhar para reforçar as atitudes e práticas inclusivas da comunidade escolar

Áreas problemáticas Concretização de propos- tas

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 509

B - Protocolo da Entrevista

Contextualização da situação

A Coordenadora da Equipa dos Apoios Educativos de Vila Franca de Xira

exerce estas funções desde 1 de Setembro de 1997 e detém um conhecimento

profundo da escola estudada. Esse conhecimento advém do facto de ali haver

desenvolvido funções, como professora de apoio, durante três anos escolares

(1994/95, 1995/96 e 1996/97), e por continuar, no exercício das actuais funções, a

disponibilizar um acompanhamento sistematizado à mesma escola.

Objectivo geral da entrevista

Recolher informação susceptível de contribuir para o conhecimento dos

percursos já realizados pela escola no âmbito do desenvolvimento da sua cultura

inclusiva

Entrevistado: Coordenadora da Equipa dos Apoios Educativos de Vila

Franca de Xira

Apresenta-se, de seguida, o conteúdo transcrito da entrevista realizada,

então, pelo autor do trabalho (E - Entrevistador) à Coordenadora da Equipa dos

Apoios Educativos (C).

E – A presente conversa tem, como finalidade, conhecer a realidade

recente e actual desta escola, sobretudo nos aspectos que se relacionam com a

sua história de atendimento de alunos com necessidades educativas especiais e

que tu conheces muito bem ...

C – Bem, ... tenho acompanhado muito de perto esta escola nos últimos

cinco anos e foi, precisamente, durante este tempo que a escola abriu as suas

portas a crianças que são verdadeiramente problemáticas, como já viste. Como já

te disse estive aqui como professora de apoio durante três anos escolares. Acho

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 510

que conheço bem as ideias e ... as práticas destas pessoas. Portanto, vou tentar

recordar o que tem vindo a acontecer e, portanto, tentar corresponder ao teu

pedido. Até porque sei que desta conversa pode sair informação muito importante

para ajudar a escola a melhorar a resposta, não só àqueles alunos mas a todos.

E – Obrigado pela tua disponibilidade. Como sabes, para além do meu

compromisso de desenvolver trabalho de formação com os professores locais,

estou, também, a desenvolver um projecto de investigação no âmbito do meu

doutoramento e esta entrevista vai ser um elemento fundamental neste contexto.

C – Claro que estou consciente desse facto e é com satisfação que

procurarei ajudar-te nessas duas situações.

E – Mais uma vez o meu obrigado. Ainda nesta parte inicial da conversa

queria esclarecer que o conteúdo da mesma será considerado confidencial pelo

que agradecia que falasses com um perfeito à vontade. E, continuando, começa

por falar de ti. Da tua formação, das funções profissionais que tens

desempenhado, do tempo de serviço. Enfim de tudo o que achares importante

dentro do teu perfil profissional...

C – Bom ... fiz o Curso do Magistério Primário em Coimbra, no ano de 1975.

Trabalhei depois, como docente do 1.º ciclo, nos concelhos de Castanheira de

Pera e no de Loures até ao ano de 1979. Seguidamente trabalhei numa instituição

de ensino especial, concretamente na CerciTejo, em Alverca, onde permaneci 10

anos, quatro dos quais como Coordenadora Pedagógica da instituição.

Em 1989 comecei a trabalhar como professora de apoio neste concelho de

Vila Franca, até 31 de Agosto de 1997. Nos últimos três anos desta fase estive

como professora de apoio na Escola do 1.º Ciclo do Forte da Casa. Desde

Setembro de 1997 exerço, como sabes, funções na ECAE de Vila Franca, da qual

tenho sido responsável.

E – Mas para além do Magistério tens outras habilitações, não é?

C – Sim, sim. Tenho a Licenciatura em Ensino na variante de Matemática e

de Ciências e o Diploma de Estudos Superiores Especializados em Educação

Especial, na Área de Problemas Graves de Cognição.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 511

E – Muito bem e obrigado pela informação. Voltando agora à escola, o que

é achas que as pessoas pensam sobre o que é a inclusão?

C – ... Olha, esta gente não é muito dada a pensar sobre o que é isto, ou

aquilo. Acho que ... está mais preocupada em fazer, ... em resolver problemas, do

que propriamente em pensar o que é isto, ou aquilo.

E – Certo! Mas vamos combinar uma coisa. Vais tentar esforçar-te por

responder concretamente às questões que te colocar, baseando-te, sempre, claro

no conhecimento que tens desta realidade.

C – Combinado. Então olha, pelo ... por aquilo que conheço das pessoas,

eu julgo que a inclusão, para elas é, essencialmente, a escola estar aberta e

trabalhar com alunos com necessidades educativas especiais e sempre que

possível em turma, como já viste.

E – Em turma? Explica melhor o que queres dizer com isso do em turma...

C – Bem .. . é isso mesmo. As pessoas já não aceitam a ideia de que haja

apoio fora da sala de aula, portanto, toda a actividade de aprendizagem é

desenvolvida, por norma, por todos os alunos, em contexto de turma. Bom há um

caso ... uma situação de excepção...

E – Estás a pensar nas crianças do projecto da multideficiência...?

C – Claro. Mas esse é um caso mesmo excepcional. Trata-se de crianças

com problemas cognitivos muito graves associados a outros de outra natureza,

nomeadamente motora. São extremamente dependentes. Essas crianças têm

uma turma de referência e vão lá de forma previamente combinada para

participarem em actividades em que elas tenham possibilidade de uma

participação real...

E – E que tipos de actividades são essas?

C – É assim: O professor titular de turma tem um conhecimento muito

profundo da criança multideficiente que pertence à sua turma: Semanalmente

organiza actividades que são possíveis de integrar essa criança, em horário mais

ou menos fixo. E então, nesse horário, uma das educadoras que acompanham as

crianças na sala 16 dirige-se com a criança à sua turma, onde ela vai participar

com os seus colegas na actividade preparada para tal.

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 512

E – São tempos e trabalhos pensados para esse efeito , não é?

C – Sim ... mas... a própria turma beneficia também, isto é, essas

actividades são adequadas ao trabalho da turma, não é portanto uma actividade

só para a criança multideficiente. É um trabalho que faz parte do programa da

turma, mas que permite, também a participação activa daquela criança.

E – Estou a perceber. Mas, então, a maior parte das actividades não

permitem essa integração...?

C – Acho que não. Foi na altura em que eu era, aqui, professora de

educação especial que esta forma de trabalhar foi decidida e na qual eu participei.

A minha vontade era que não houvesse nenhuma sala 16 e que cada criança

multideficiente estivesse a tempo inteiro na sua turma de referência. Mas não me

parecia possível. São casos muito complicados. Algumas destas crianças cansam-

se com muita frequência. Têm um ritmo muito próprio e parecia-me que colocá-las

a tempo inteiro na sua turma era uma perfeita violentação. Por isso acabámos por

pensar nesta forma de participação em turma que ainda hoje se mantém.

E – Mas as turmas também vão à sala 16, não é verdade?

C – Sim, sim. Desde o início do projecto. A sala 16 está equipada com

recursos e materiais que as outras salas não têm, sobretudo a nível das áreas de

expressão. Desta forma, de vez em quando são grupos de alunos das turmas a

que pertencem as crianças multideficientes que de forma programada passam

pela sala 16 e aí trabalham aquelas áreas conjuntamente com aquelas crianças.

E – E todos os professores aceitam bem esta forma de atendimento?

C – Aceitam mais ou menos... Bom é um trabalho nada fácil, mas ao

mesmo tempo é uma grande aposta da escola. O órgão de gestão dedica uma

atenção particular a este projecto. Praticamente o Presidente do Conselho

Executivo todos os dias passa pela sala 16 para se inteirar de como vão as coisas

e dar uma palavra de estímulo às educadoras que ali trabalham. A ida às turmas é

uma tarefa exigente para estas educadoras. Para que tudo funcione de modo

satisfatório é preciso haver um grande trabalho de avaliação, de planificação e de

coordenação de tudo isto.

E – E as outras crianças como lidam com esta situação?

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 513

C – Hoje lidam perfeitamente bem. Aceitam os seus colegas com

naturalidade e procuram ajudá-los nas tarefas da sala de aula.

E – E os pais?

C – Os pais também aceitam muito bem esta realidade. A Comissão de

Pais da escola sempre concordou com esta experiência e tem apoiado

activamente a escola neste projecto. Como sabes, eu valorizo imenso o trabalho

com as famílias. Julgo que as famílias são um aspecto fundamental no processo

educativo das crianças. Quando estava aqui na escola como professora de apoio

implicava muito as famílias no acompanhamento dos seus filhos. Ia com muita

frequência a casa dos alunos para conhecer o seu meio e para falar com os pais.

Especialmente aos Sábados que era o dia em que eles estavam em casa. Esta

ideia foi também agarrada pela escola. Há, como já disse, uma Comissão de Pais

muito interessada e os contactos entre a escola e a família são muito frequentes.

E – Bem já que demos um salto para fora da escola... e as relações com os

serviços exteriores, como são?

C – Olha, não são muito pacíficas, com alguns, mas vão funcionando, aliás

como tens visto, uma vez que assistes a muitas conversas entre mim e o director,

ou presidente, como agora se diz.

E – Sim mas dizes que não são muito pacíficas, porquê?

C – Mas é no bom sentido. Esta escola não acredita no encaminhamento

das crianças para escolas especiais e, por isso, recebe os alunos todos e, como

sabes, alguns são, de facto, casos muito complexos. Para responder a estes

casos é preciso ter um mínimo de condições, quer materiais quer humanas. A ...

disponibilização dos recursos é um processo muito burocrático e demorado. Por

isso o Presidente do Executivo passa a vida a chatear os serviços, a câmara e

outras entidades para pedir os tais recursos. E como sabes, pedir não é uma

palavra muito agradável e é por isso que eu digo que a relação não é pacífica e

digo que não o é no bom sentido, porque os serviços conhecem o que se vai

fazendo nesta escola e, de um modo geral, até têm colaborado.

E – Por falar em colaborar. As pessoas dentro da escola colaboram umas

com as outras?

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 514

C – Umas colaboram mais, outras menos. Mas de qualquer maneira é uma

forma de colaborar algo desgarrada e pontual. Não é muito sistematizada. Só

funciona em determinadas alturas em que há determinados acontecimentos que

não são de rotina, como festas, exposições e outras coisas do género.

E – Sim, mas a colaboração é um factor muito importante na construção da

escola inclusiva, não concordas?

C – Plenamente. Mas como te disse logo no início, as pessoas não têm

grandes hábitos de pensar e de pensar juntas ainda menos, por isso acho que não

estão ainda muito conscientes de nenhum princípio de funcionamento colectivo

para a inclusão.

E – Então não se segue nenhum modelo de escola inclusiva, aqui?

C – Sinceramente, a nível da escola no seu todo, acho que não.

Experiência de práticas inclusivas, sim, como é do teu conhecimento. Mas

conhecimento consciente de um modelo completo de escola inclusiva acho que

não há, sobretudo por parte de muitos dos professores. Há que continuar a

trabalhar nesse campo. É preciso, ainda, muita ajuda do exterior.

E – Quando dizes que muitos dos professores não têm consciência de um

modelo completo de escola inclusiva, queres dizer que alguns já têm mais ou

menos uma ideia aproximada de tal, não é?

C – Sim, é verdade, sobretudo por parte dos elementos do órgão de gestão.

E não só. Há outros professores, sobretudo os que cá estão há mais tempo que

têm, também, alguma informação sobre essa questão. Tal deve-se, como sabes, à

participação da escola no projecto “A Nossa Escola. O Nosso Mundo: Colaborar

para Incluir”. Ora os professores que estão mais informados sobre as questões da

escola inclusiva são precisamente os que participaram nos seminários do projecto,

orientados pelo Professor Doutor Miranda Correia. É verdade que toda a escola

participou na altura. Mas muitos dos docentes que cá estavam então, já cá não

estão e a informação já não está tão sólida como estava naquele tempo, apesar

dos esforços do órgão de gestão no sentido contrário. Se bem que o presidente do

conselho executivo, devido a algumas situações muito urgentes que apareceram

na altura, não teve disponibilidade para participar em todas as sessões o que

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 515

também provoca algumas lacunas na passagem de informação. E depois os

professores concentraram-se sobretudo na informação relativa aos alunos e à sala

de aula, pois é esta realidade que os mais preocupa. Nós próprios - eu e tu – que

fazemos parte do projecto, temos andado ultimamente pelas diversas escolas que

estão envolvidas no projecto, a avaliar os alunos com dificuldades de

aprendizagem e consequentemente também não temos tido tempo para trabalhar

mais de perto com esta escola. Quando puderes terás que ajudar a escola a voltar

ao nível de informação que tinha na altura em que o Professor Miranda Correia

orientava os seminários em Alverca.

E – Prometo que vou tentar. O que vou notando é que as pessoas aqui se

centram ultimamente, muito em si próprias e pouco na organização global da

escola, não achas?

C - É isso. Há a crença generalizada de que falar ou pensar em coisas que

não a sala de aula é praticamente considerado como ...perder tempo. Assim, os

princípios de um modelo a nível de toda a escola não foram, ainda, objecto de

uma apropriação segura e daí a sua reduzida operacionalização.

E – E quanto à Equipa de Planificação Inclusiva prevista no projecto “A

Nossa Escola. O Nosso Mundo: Colaborar para Incluir” o que é que entendes que,

agora se passa?

C – Olha, na altura foi constituída de acordo com o previsto. Chegou a

funcionar muito activamente durante algum tempo e com entusiasmo. Chegou,

mesmo, a reforçar na prática as ideias já existentes sobre a inclusão. Mas agora

está menos activa. É sempre a mudança de professores que está na origem desta

quebra de acção. Por outro lado, como já vimos, a tendência para as pessoas se

centrarem cada uma por si na sua sala de aula também pesa muito e esse facto

tem vindo a fazer com que o grupo de planificação inclusiva sinta dificuldade em

fazer passar a sua mensagem. Alterar aquela atitude não parece ser fácil. Há que

respeitar o ritmo das pessoas mas tenho esperança de que a semente lançada há-

de voltar a melhorar a qualidade dos seus frutos, que, ainda assim, não é má. O

certo é que, embora, lentamente algumas coisas vão mudando e os alunos com

NEE até estão a ter uma resposta muito aceitável..

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 516

E – Certo. Mas achas que essa postura de cada professor se centrar,

basicamente, na sua sala de aula é, agora, uma característica, dominante desta

escola?

C – Sem dúvida. Penso que a maioria dos docentes continua muito

centrada na sua sala e pouco interessada noutros aspectos. Mas se calhar alguns

aspectos positivos têm também sido provocados por esse facto. Talvez por isso

tenha já havido algumas mudanças nas actividades em sala de aula,

nomeadamente o ser uma prática comum o trabalho de apoio ser desenvolvido no

seio da sala e da turma e só em casos muito excepcionais é que é prestado fora

daquele espaço.

E – Para além dessas mudanças achas que há outras na sala de aula?

C – Olha é assim. Como sabes eu conheço bem as práticas em sala de

aula de grande parte das pessoas e acho que as pessoas aceitam com

naturalidade o apoio dos colegas dentro da sala. Mas acho que as formas de

trabalhar se mantêm muito tradicionais, ou seja, muito dirigidas ao grupo ao

mesmo tempo e da mesma maneira, funcionando o professor de apoio como um

recurso junto dos alunos que devido às suas problemáticas aprendem mais

devagar.

E – Mas de um modo geral pode-se entender que os professores desta

escola acreditam na inclusão... ou não?

C – Bom, uns acreditam mais na inclusão, outros menos, sobretudo os que

chegaram à escola há menos tempo. Mas, em termos gerais há uma aceitação

convicta da ideia. Por exemplo, como é do teu conhecimento, o Presidente do

Conselho Executivo não tem dúvidas sobre esta questão e a sua determinação

tem levado toda a gente a aceitar a inclusão e a trabalhar nesta linha.

E – È verdade. Agora mudando um bocadinho de assunto e já voltamos à

sala de aula. Em relação ao Projecto Educativo de Escola, tens a noção da forma

como é elaborado e do seu conteúdo?

C – Olha se queres que te diga, acho que nunca tinha falado sobre isso

aqui na escola até há bem pouco tempo, e, ao longo destes anos todos acho que

também nunca ninguém me tinha falado directamente em tal.

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_______________Jorge Serrano/2005_______________ 517

E – E o que queres dizer com isso?

C – Bem, quero dizer que, aqui, as pessoas não ligam muito a isso. Como

já disse as pessoas querem fazer e fazem coisas concretas. Pensar em

determinadas coisas e escrever sobre elas é que não lhes diz muito. Como já

noutra altura me falaste no projecto educativo de escola eu procurei-o, acabei por

o ler e por falar com o director da escola sobre o projecto educativo. Os projectos

educativos sempre foram feitos mas sem especial preocupação porque as coisas

vão se fazendo com ou sem o papel. Eram feitos por um número reduzido de

pessoas e fundamentalmente para dar cumprimento a essa exigência legal. O

último, por acaso, já teve uma história algo diferente. Pretendeu-se, já, que todos

os professores através do conselho de docentes tivessem uma maior participação,

tanto a nível da identificação como a nível da solução de problemas. Acho que o

que está no projecto não é, na totalidade, posto em prática no período de três

anos em que vigora. Os problemas relativos à parte material da escola são mais

depressa resolvidos do que os problemas relativos ao funcionamento das

pessoas. Este último projecto já contém alguns princípios orientadores da acção

presente e futura da escola e até da forma como, em geral, os alunos devem ser

atendidos. Depois desta conversa até podemos ir ver o actual projecto educativo

de escola. Verás que de facto é um documento pequeno e, embora apresente

uma melhoria em relação aos anteriores, nada, ainda, consta em relação ao termo

inclusão. Facto que me leva a reforçar a ideia de que as pessoas ainda não

valorizam muito o conteúdo do projecto educativo de escola.

E – Está bem, lá iremos ver o projecto educativo. Desejaria, agora, voltar

ao que se passa nas salas de aula. Podes dizer-me o que os professores fazem,

em termos pedagógicos na sala de aula?

C – Bem, não posso dizer exactamente o que cada um faz, embora saiba

que há diferenças na forma de trabalhar. Mas em termos gerais, tenho verificado

que a generalidade dos professores trabalha muito nas suas salas. Contudo acho

que podiam trabalhar melhor.

E – Como, concretamente?

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C – Bem, também não sei muito bem. Mas julgo que as actividades são

muito parecidas para todos os alunos. As aulas são muito faladas. Os professores

explicam muitas vezes as tarefas que pretendem e os alunos estão sempre à

espera que o professor vá dizendo o que fazer e como devem fazer. Não existem

estratégias inovadoras. Sei lá ... dá a impressão que os professores ensinam

como aprenderam. Acho que há que mudar e muito esta forma muito rotineira de

trabalhar. O professor é o centro de toda actividade e no fundo julgo que a maioria

ensina hoje como ensinava há anos atrás. Penso que o trabalho é feito, pelo

menos nalguns casos, como se fosse destinado a alunos todos iguais se bem que

os professores tenham muita consciência de que são muito diferentes entre si.

Mas esforçam-se muito e se não fazem diferente é porque a sua formação inicial

os não preparou para isso.

E – Confirmas que, por exemplo, não há um trabalho de avaliação

diagnóstica dos perfis de aprendizagem dos alunos de cada turma?

C – Não. Não há tais práticas. Claro que os professores conhecem os seus

alunos, mas sobretudo pelas dificuldades que eles têm nas aprendizagens. A

turma é entendida mais como um somatório de crianças e não como uma

realidade ...

E – ... pedagógica concreta

C – Isso mesmo. Há uma espécie de trabalho igual para todos e uma

preocupação aluno a aluno, com os que não aprendem bem. Esta atenção é mais

notada em relação aos alunos com NEE que têm uma planificação individualizada.

Tenho notado também que os professores mais novos revelam, em geral, algumas

dificuldades em lidar com estes alunos. Há, por exemplo, poucas dinâmicas de

trabalho grupal, por sistema.

E – E como é que os professores de educação especial e de apoio se

integram nesse trabalho?

C – Sem grandes problemas. De início tentam perceber como é que os

professores de turma trabalham, depois é só ajustarem-se a esse tipo de trabalho

e apoiarem os alunos mais problemáticos no desenvolvimento das suas tarefas.

Muito do apoio aos alunos com NEE é desenvolvido na sala de aula, segundo a

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planificação individualizada. Como o professor de turma e os professores de apoio

trabalham bastante, os alunos com NEE, de uma maneira geral, lá vão andando.

Diga-se, entretanto, que nesta escola há bastantes casos com problemas de

aprendizagem.

E – Como sabes, na escola e por efeito do Projecto A Nossa Escola, o

Nosso Mundo: Colaborar para Incluir” orientado pelo Professor Miranda Correia

está constituída a equipa de programação educacional individualizada. Qual é a

tua opinião sobre o seu funcionamento?

C – Sim, também, foi criada no âmbito do Projecto A Nossa Escola, o

Nosso Mundo: Colaborar para Incluir”. Chegou, também, a funcionar com um nível

muito elevado e com grandes efeitos na melhoria do atendimento dos alunos com

NEE. Só que mais uma vez a mobilidade dos professores fez com que os

elementos actuais sejam docentes que não participaram nas acções de formação

dadas pelo Professor. Por outro lado a própria organização do 1.º ciclo não facilita

a reunião entre os professores regulares e o pessoal de apoio. O funcionamento

da equipa, nesta altura, está, assim, mais frágil. As pessoas do grupo mudam

todos os anos. É isso, as do grupo inicial já cá não estão, praticamente, e a união

e os saberes do grupo diluíram-se um pouco. Acho que cada pessoa está a

trabalhar mais por si e não propriamente como uma equipa. Temos de

rapidamente dar a esta equipa o nível que já teve na altura da sua criação. Julgo

que nesta altura não há, pois, uma verdadeira concertação de esforços na

tentativa de resolver os problemas apresentados por alguns alunos e pelos

respectivos professores. As programações individualizadas, a meu ver, precisam

de ser aperfeiçoadas.

E – E o que achas das práticas de organização e desenvolvimento de

adaptações curriculares?

C – Bom essas práticas, como sabes, existem, sobretudo, a nível do

cumprimento do previsto no Decreto- Lei n.º 319/91. Só que as adaptações

curriculares são feitas essencialmente pelo professor de apoio sem grande

participação dos professores titulares de turma porque a maioria destes não tem

prática neste tipo de tarefas, sobretudo os mais novos.

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E – A escola conta, também, com o apoio de uma psicóloga. Que tipo de

trabalho é que achas que ela desenvolve?

C – Fundamentalmente, quanto a mim, tenta colaborar com o professor

titular de turma e com os professores de apoio na organização de respostas aos

alunos mais problemáticos. O seu trabalho incide, também, na realidade da sala

de aula.

E – Achas que o número dos docentes de apoio é suficiente?

C – Bem suficiente nunca será, mas os serviços têm, de algum modo,

colocado os recursos humanos considerados minimamente necessários à gestão

educativa desta população escolar. Nesta altura há sete docentes de apoio: quatro

professores do 1.º ciclo e três educadoras de infância.

E – Lembras-te de qual é a sua formação?

C – Em todos os anos há uns que são especializados e outros que não.

Este ano só há um especializado. Para além dos professores do 1.º ciclo, a escola

pede também, educadoras de infância para um atendimento mais direccionado

àquele grupo de crianças multideficientes.

E – E estes professores de apoio e de educação especial raramente

permanecem por cá, mais do que um ano ...

C – Exacto e esse é um dos graves problemas com que esta escola se

defronta. A mobilidade dos professores de apoio tem sido enorme. As educadoras

do grupo de crianças multideficientes mudam praticamente todos os anos. Acho

que não é necessário estar a referir os pesados inconvenientes que tal facto traz

para tais crianças.

E – E no que respeita ao pessoal da acção auxiliar educativa. Como

entendes a sua função?

C – Acho que são poucos para a dimensão desta escola. A maior parte não

participa em actividades educativas de forma sistematizada, ainda que

praticamente todos aceitem bem a presença dos alunos com necessidades

educativas complexas. Continua a haver uma separação muito nítida entre a

função dos professores e a deste pessoal, exceptuando as auxiliares que

trabalham com o grupo das crianças multideficientes. Acho que estão a precisar

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de terem alguns conhecimentos sobre estes problemas e sobre a forma de como

podem ajudar nas suas respostas.

E – Finalmente no que se refere às famílias, como é que achas que elas

são implicadas no acompanhamento dos seus educandos?

C – Bom, como deves concordar o contacto escola-família é bom. Os pais

estão habituados a serem responsabilizados pelo acompanhamento dos seus

filhos. O presidente tem uma relação muito estreita com a Comissão de Pais e

esta colabora muito com as actividades e projectos da escola. Como em todo o

lado há pais muito interessados, e há outros que ligam muito pouco ... à educação

escolar dos filhos. Por outro lado, há professores que lidam bem com as famílias e

há outros que demonstram uma espécie de receio.

E– Entendes que as estratégias em curso na escola para o envolvimento

das famílias são adequadas?

C – Sim, quero dizer ... as estratégias são as do costume. Há as reuniões

para comunicar a avaliação e há horas em que os pais podem vir por sua iniciativa

inteirar-se da situação escolar dos seus filhos. Paralelamente, há o costume de

chamar este ou aquele encarregado de educação para serem analisadas algumas

situações pontuais relativas à escolaridade do seu educando.

E – Muito bem. Há aqui já muita informação importante para me ajudar

compreender, ainda melhor a realidade desta escola. E já agora, para terminar,

não te importas de focar alguns aspectos que na tua opinião sejam prioritários em

termos de mudança?

C – Sobre isso tenho algumas ideias: Explicá-las é que é um pouco mais

difícil. Acho, por exemplo que era fundamental ajudar os professores a terem outra

ideia de turma, para terem um funcionamento diferente em relação a essa

realidade e que essas mudanças envolvessem, ao mesmo tempo, os professores

de apoio e até a psicóloga. Era preciso que os alunos trabalhassem no dia a dia

de acordo com as suas capacidade e os seus interesses. Não sei bem como, mas

acho que tal seria fundamental para que as dinâmicas em turma passassem a ser

ainda mais inclusivas.

E – E parece-te que há mais alguma coisa para mudar mais urgentemente?

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C – ... A... Bom, talvez a necessidade de passar a haver uma maior

colaboração entre todos para a melhoria geral da resposta aos alunos... É preciso

inverter esta tendência dos professores para o trabalho individual centrado na sala

de aula. Bom... eu acho que não é só aqui. Acho que o trabalhar só na sua sala de

aula é um problema geral. É necessário que as pessoas se convençam de que o

trabalho em colaboração é muito mais seguro para todos. Por outro lado, como

disse há pouco, torna-se muito urgente recuperar a coesão da equipa de

programação educacional individualizada, a fim de se garantir uma cada vez

melhor resposta aos alunos com NEE. É, portanto, necessário que a resposta da

EPEI se volte a aproximar, com mais regularidade, dos elevados níveis com que

os seus elementos iniciais desenvolviam a sua função, após a frequência dos

seminários do Professor Miranda Correia.

E – Certo. Vamos pensar nisso e ver o que se poderá fazer nesse sentido.

Pronto, acho que tenho os dados de que necessitava. Sinceramente, muito

obrigado pela tua óptima colaboração.

C – De nada. E continuarei ao dispor para tudo o que puder contribuir para

ajudar as crianças e os professores desta escola, de que tanto gosto e que

continuo a viver de um modo muito, mas mesmo muito, especial.

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C – Quadro de Categorização dos Dados Frequência dos Indicadores

Categorias

Sub-Categorias

Indicadores Sub-Categorias Categorias I

Envolvimento da entrevistada na

organização escolar

1 Experiência

profissional e conhecimento

da escola

2 Ideias sobre a

inclusão

3 Influência na

cultura da Escola

“Tenho acompanhado de muito perto esta escola nos últimos cinco anos” “Estive aqui, como professora de apoio durante três anos escolares” “Quando estava aqui na escola como professora de apoio” “Acho que conheço bem as ideias e as práticas das pessoas” “ Vou tentar recordar o que tem vindo a acontecer” “Conheço bem as práticas em sala de aula de grande parte das pessoas” “ “Se calhar alguns aspectos positivos têm também sido provocados por esse aspecto (centração dos professores no que se passa na sua sala de aula)” “Foi na altura em que era aqui professora de educação especial que esta forma de trabalhar (projecto da multideficiência) foi decidida e na qual participei” “Sei que desta conversa pode sair informação muito importante para ajudar a escola a melhorar a resposta não só àqueles alunos mas a todos” “A minha vontade era que não houvesse nenhuma sala 16” “Que cada criança multideficiente estivesse a tempo inteiro na sua turma de referência, mas não me parecia possível”_____________________________ “Acabámos por pensar nessa forma de participação em turma que ainda hoje se mantém” “Foi precisamente durante esse tempo que a escola abriu as suas portas a crianças verdadeiramente problemáticas” “Valorizo imenso o trabalho com as famílias” “As famílias são um aspecto fundamental no processo educativo das crianças” “Implicava muito as famílias no acompanhamento dos seus filhos” “Ia com muita frequência a casa dos alunos para conhecer o meio e para falar com os pais” “Especialmente ao Sábado que era o dia em que eles estavam em casa

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II

Cultura organizacional

da escola

1

Hábitos de reflexão colectiva

_____________

2 Concepção e práticas de

inclusão

_____________

3 O papel da liderança

“Esta gente não é muito dada a pensar sobre o que é isto ou aquilo” “ Acho que está (esta gente) mais preocupada em fazer, em resolver, do que propriamente em pensar o que é isto, ou aquilo” “As pessoas não têm grande hábito de pensar” “De pensar juntas, ainda menos” “Estão preocupadas em fazer coisas concretas” “As pessoas querem fazer e fazem coisas concretas” “Penso que a maioria dos docentes continua muito centrada na sua sala e pouco interessados noutros aspectos” “ Se calhar alguns aspectos positivos têm também sido provocados por esse aspecto (centração dos professores no que se passa na sua sala de aula)”__ “A inclusão é a escola estar aberta e trabalhar com alunos com necessidades educativas especiais e sempre que possível em turma” “Toda a actividade de aprendizagem é desenvolvida, por norma, por todos os alunos, em contexto de turma” “É uma grande aposta da escola” “As pessoas já não aceitam a ideia de que haja apoio fora da sala de aula” “Esta escola não acredita no encaminhamento de crianças para as escolas especiais” “Recebe os alunos todos” “Experiência de práticas inclusivas, sim” “(Todos os professores) aceitam mais ou menos bem (o funcionamento do projecto da multideficiência)” “Uns acreditam mais na inclusão, outros menos, sobretudo os que chegaram à escola há menos tempo” “Em termos gerais há uma aceitação convicta da ideia”_______________________________________ “O órgão de gestão dedica uma atenção particular a este projecto (da multideficiência)” “O Presidente do Conselho Executivo todos os dias passa pela sala16 para se inteirar de como vão as coisas” “Dar uma palavra de estímulo às educadoras que aí trabalham” “O Presidente do Conselho Executivo não tem

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II Cultura

Organizacional de Escola

(continuação)

4 Percepção de um modelo de

escola inclusiva

dúvidas sobre esta questão (o ideal da inclusão)” “ A sua determinação tem levado toda a gente a aceitar a inclusão e a trabalhar nesta linha” “ Acho que não (se segue nenhum modelo de escola inclusiva) a nível da escola no seu todo “Conhecimento consciente de um modelo completo de escola inclusiva acho que não há, sobretudo por parte de muitos dos professores” “Há que continuar a trabalhar nesse campo” “É preciso, ainda, muita ajuda do exterior” “A grande preocupação de cada professor é a sua sala de aula” “Há a crença generalizada de que falar ou pensar em coisas que não a sala de aula é praticamente considerado como perder tempo” “Não estão ainda muito conscientes de nenhum princípio de funcionamento colectivo para a inclusão” “ Por parte dos elementos do órgão de gestão (há uma ideia aproximada de um modelo completo de escola inclusiva)” “Há outros professores, sobretudo os que cá estão há mais tempo que têm também, alguma informação sobre essa questão” “Tal deve-se à participação da escola no projecto “A Nossa Escola o Nosso Mundo: Colaborar para Incluir” “ Os professores que estão mais informados sobre as questões da escola inclusiva são precisamente os que participaram nos seminários do projecto, orientados pelo Professor Doutor Miranda Correia” “ É verdade que toda a escola participou na altura” “Muitos dos professores que cá estavam então, já cá não estão” “A informação já não está tão sólida como estava naquele tempo” “Apesar dos esforços do órgão de gestão em sentido contrário” “Se bem que o Presidente do Conselho executivo devido a algumas situações muito urgentes que apareceram na altura não teve disponibilidade para participar em todas as sessões” “O que também provoca algumas lacunas na passagem da sua informação” “Os professores concentraram-se sobretudo na informação relativa aos alunos e à sala de aula, pois é esta a realidade que os preocupa” “Nós próprios – eu e tu – que fazemos parte do projecto temos andado ultimamente pelas diversas

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II Cultura

Organizacional de Escola

(continuação)

________________

III Projecto

educativo de escola

4

Percepção de um modelo de

escola inclusiva

(continuação) _____________

5 Angariação de

recursos

_____________

6 Atitudes e práticas de

colaboração

____________

1 Valorização do

papel do Projecto

Educativo de Escola

______________

2 Processo de elaboração e

conteúdo

escolas que estão envolvidas no projecto, a avaliar os alunos com dificuldades de aprendizagem” “Também não temos tido tempo para trabalhar mais de perto com esta escola” “Assim, os princípios de um modelo a nível de toda a escola, não foram, ainda, objecto de uma apropriação segura e daí a sua reduzida operacionalização” ___________________________________________ “A disponibilização de recursos é um processo muito burocrático e muito demorado” “Para responder a estes caos é preciso ter um mínimo de condições quer materiais quer humanas” “O Presidente do Conselho executivo passa a vida a chatear os serviços, a câmara e outras entidades para pedir os tais recursos” “Os serviços conhecem o que se vai fazendo e de modo geral até têm colaborado”_________________ “ Umas pessoas colaboram mais, outras menos” “É uma forma de colaborar algo pontual e desgarrada” “Não é muito sistematizada” “Só funciona em determinadas alturas em que há determinados acontecimentos que não são de rotina, como festas, exposições e outras coisas do género”

“Acho que nunca tinha falado sobre isso aqui na escola até há bem pouco tempo)” “Ao longo destes anos todos acho que também nunca ninguém me tinha falado directamente em tal” “As pessoas não ligam muito a isso” “Fundamentalmente para dar cumprimento a essa exigência legal” “Acabei por o ler e por falar com o director da escola sobre o projecto educativo” ___________________________________________

“Os projectos sempre foram feitos mas sem grande preocupação” “ Porque as coisas vão se fazendo com ou sem o papel” “Eram feitos por um número restrito de pessoas” “O último já teve uma história diferente” “ Pretendeu-se já que todos os professores, a nível do conselho de docentes, tivessem uma maior participação, tanto a nível da identificação como a nível da solução de problemas” “Acho que o que está no projecto, não é, na

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III Projecto

educativo de escola

(continuação)

_______________

IV Equipa de

Planificação Inclusiva

______________

2 Processo de elaboração e

conteúdo

(continuação)

_____________

1

Processo de criação e de

funcionamento _____________

2 Situação actual

______________

1 Estratégias de

intervenção

totalidade, posto em prática no período de três anos em que vigora” “Os problemas relativos à parte material da escola são mais depressa resolvidos do que os problemas relativos ao funcionamento das pessoas” “Este último projecto já contém alguns princípios orientadores da acção presente e futura da escola” “E até da forma como, em geral, os alunos devem ser atendidos” “Verás que de facto é um documento pequeno” “ E embora apresente uma melhoria em relação aos anteriores” “Nada ainda consta em relação ao termo inclusão” “Facto que me leva a reforçar a ideia de que as pessoas ainda não valorizam muito o conteúdo do projecto educativo da escola” ___________________________________________ “Na altura foi constituída de acordo com o previsto” “Chegou a funcionar muito activamente durante algum tempo e com entusiamo” “Chegou a reforçar na prática as ideias já existentes sobre a inclusão” ___________________________________________ ”Mas agora está menos activa” “ É sempre a mudança de professores que está na origem desta quebra de acção” “A tendência para as pessoas se centrarem cada uma por si na sua sala de aula também pesa muito” “Esse facto tem vindo a fazer com que o grupo de planificação inclusiva sinta dificuldade em fazer passar a sua mensagem” “Alterar aquela atitude não parece ser fácil” “Há que respeitar o ritmo das pessoas” “Mas tenho esperança de que a semente lançada há-de voltar a melhorar a qualidade dos seus frutos que, ainda assim, não é má” “Embora lentamente as coisas vão mudando” “Os alunos com NEE até estão a ter uma resposta muito aceitável” “A maioria dos professores está apenas centrada na sua sala de aula e pouco interessada noutros aspectos ___________________________________________ “O ser uma prática comum o trabalho de apoio ser desenvolvido no seio da sala e da turma” “Funcionando o professor de apoio como um recurso junto dos alunos que devido às sua problemáticas

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V Funcionamento

da Educação Especial e dos

Apoios Educativos

______________

2 Caracterização e mobilidade dos recursos

______________

3 Articulação com

o professor titular de turma

aprendem mais devagar” “Existem práticas de organização e de desenvolvimento de adaptações curriculares, a nível do cumprimento do previsto no decreto-lei n.º 319/91” “(A psicóloga) quanto a mim tenta colaborar com o professor titular de turma e com os professores de apoio na organização de respostas aos alunos mais problemáticos” “O seu trabalho (da psicóloga) incide também na realidade da sala de aula” ___________________________________________ “Suficiente (o número dos docentes de apoio) nunca será” “Os serviços têm, de algum modo, colocado os recursos humanos minimamente necessários à gestão educativa desta população escolar” “Há sete docentes de apoio: três educadoras e quatro professores do 1.º ciclo” “Há um professor que é especializado” “A mobilidade dos professores de educação especial e dos apoios tem sido enorme” “É um dos graves problemas com que a escola se defronta” “As educadoras do grupo de crianças multideficientes muda todos os anos” “Não é necessário estar a referir os pesados inconvenientes que tal facto traz para tais crianças”__ “Nomeadamente o ser uma prática comum o trabalho de apoio ser desenvolvido no seio da sala e da turma” “Só em casos muito excepcionais é que é prestado fora daquele espaço” “As pessoas aceitam com naturalidade o apoio dos colegas dentro da sala” “De início tentam perceber como é que os professores de turma trabalham” “Depois é só ajustarem-se a esse tipo de trabalho” “(Os professores de educação especial e dos apoios) integram-se nesse trabalho sem grandes problemas” “Muito do apoio aos alunos com NEE é desenvolvido na sala de aula, segundo a planificação individualizada” “Como o professor da turma e os professores de apoio trabalham bastante os alunos com NEE lá vão andando” “As adaptações curriculares são feitas essencialmente pelos professores de apoio sem grande participação do professor titular de turma. A

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VI Equipa de

Programação Educacional

Individualizada

________________

VII Projecto de

Apoio a Crianças

Multideficientes

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1

Criação e funcionamento

______________

2 Situação actual

______________

1 Caracterização

genérica do projecto e dos destinatários

maioria destes não tem prática neste tipo de tarefa” “A psicóloga tenta colaborar com o professor titular de turma” ___________________________________________ “Foi criada no âmbito do projecto A nossa Escola, O Nosso Mundo: Colaborar para Incluir, orientado pelo Professor Miranda Correia” “Chegou, também, a funcionar com um nível muito elevado” “Com grandes efeitos na melhoria do atendimento dos alunos com NEE”_____________________________ “Só que mais uma vez a mobilidade dos professores fez com que os elementos actuais não participaram nas acções de formação dadas pelo Professor” “Por outro lado a organização do 1.º ciclo não facilita a reunião entre os professores e o pessoal de apoio” “O funcionamento da equipa nesta altura está mais frágil” “As pessoas do grupo mudam todos os anos” “É isso as do grupo inicial já cá não estão, praticamente” “A união e os saberes do grupo diluíram-se um pouco” “A organização do 1.º ciclo não facilita as reuniões entre os professores” “Cada pessoa está a trabalhar mais por si, não propriamente como uma equipa” “Julgo que nesta altura não há, pois, uma verdadeira concertação de esforços na tentativa de resolver os problemas apresentados por alguns alunos e pelos respectivos professores” ___________________________________________ “ Há um caso, uma situação de excepção” “É um caso mesmo excepcional” “Trata-se de crianças com problemas cognitivos muito graves” “ Associados a outros de outra natureza nomeadamente motora” “São extremamente de pendentes” “São casos muito complicados” “Algumas dessa crianças cansam-se com muita frequência” “Têm um ritmo muito próprio” “Colocá-las a tempo inteiro na sua turma era uma perfeita violentação” “ A sala 16 está equipada com recursos e materiais

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VII Projecto de

Apoio a Crianças

Multideficientes

(continuação)

______________

2 Modo de

Funcionamento

______________

3 Reacção das

outras crianças

que as outras não têm, sobretudo a nível de expressões” “É um trabalho nada fácil” “A ida às turmas é uma tarefa exigente para estas educadoras” “Para que tudo funcione satisfatoriamente é preciso haver um grande trabalho de avaliação, de planificação e de coordenação___________________ “As educadoras de infância asseguram o atendimento daquele grupo de crianças multideficientes” “Essas crianças têm uma turma de referência” “Vão lá de forma previamente combinada” “Para participarem em actividades em que tenham possibilidade de participação real” “O professor titular de turma tem um conhecimento muito profundo da criança multideficiente que pertence à sua turma” “Semanalmente organiza actividades possíveis de integrar essa criança, em horário mais ou menos fixo” “ Nesse horário uma das educadoras que acompanham as crianças na sala 16 dirige-se com a criança à sua turma” “Onde ela vai participar com os seus colegas na actividade preparada para tal” “Sim (são tempos e trabalhos preparados para esse efeito)” “A própria turma beneficia também” “Essas actividades são adequadas ao trabalho da turma” “Não é, portanto, uma actividade só para a criança multideficiente” “É um trabalho que faz parte do programa da turma” “Permite também a participação activa daquela criança” “ Acho que (a maior parte das actividade) não (permitem a integração)” “(As turmas também vão à sala 16) desde o início do projecto” “ De vez em quando são grupos de alunos das turmas a que pertencem as crianças multideficientes que de forma programada passam pela sala 16” “Aí trabalham aquelas áreas juntamente com aquelas crianças”____________________________________ “(As outras crianças) hoje lidam perfeitamente bem” “Aceitam os seus colegas com naturalidade” “Procuram ajudá-los nas tarefas da sala de aula” “Os pais também aceitam muito bem esta realidade”

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VIII A gestão da sala

de aula

e dos pais

______________

1 A diversidade

______________

2 Estratégias de

intervenção

“A Comissão de Pais sempre concordou com esta experiência” “(A Comissão de Pais) tem apoiado activamente a escola neste projecto” ___________________________________________ “Alguns são de facto muito complexos” “Se bem que os professores tenham muita consciência de que os alunos são muito diferentes entre si” “Não há tais práticas (de avaliação diagnóstica do perfil dos alunos de cada turma)” “Os professores conhecem bem os seus alunos, mas sobretudo pelas dificuldades que eles têm nas aprendizagens” “Há uma espécie de trabalho igual para todos” “A turma é entendida mais como um somatório de crianças do que como uma realidade pedagógica concreta” “Há uma preocupação aluno a aluno com os que não aprendem bem” “Esta atenção é mais notada em relação aos alunos com NEE que têm uma planificação individualizada” “Tenho notado que os professores mais novos, revelam, em geral, algumas dificuldades em lidar com estes alunos” “Há poucas dinâmicas de trabalho grupal, por sistema” “Há bastantes casos com problemas de aprendizagem” ___________________________________________ “Não posso dizer exactamente o que cada um faz, embora saiba que há diferenças na forma de trabalhar” “A generalidade dos professores trabalha muito na sala de aula” “As actividades são muito parecidas para todos os alunos” “Esforçam-se muito” “As aulas são muito faladas” “Os professores explicam muitas vezes as tarefas que pretendem” “Os alunos estão sempre à espera que o professor vá dizendo o que fazer e como fazer” “Avaliam o que os alunos sabem ou não sabem e não a razão de uma coisa ou outra” “As actividades são muito parecidas para todos os

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VIII A gestão da sala

de aula

(continuação)

________________

IX O pessoal da acção auxiliar

educativa

________________

X

Envolvimento Parental

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3 Necessidade de

inovação das práticas

______________

1 Caracterização

genérica

______________

2 Funções

_____________

1 Relação escola-

família

alunos” “Peno que o trabalho é feito, pelo menos nalguns casos como se os alunos fossem todos iguais” “Muito dirigidas ao grupo ao mesmo tempo e da mesma maneira” “O professor é o centro de toda actividade” “Podiam trabalhar melhor” _________________________________________________________ “Acho que as formas de trabalhar se mantêm muito tradicionais” “Não existem estratégias inovadoras” “Julgo que a maioria ensina hoje como ensinava há anos atrás” “Dá a impressão que os professores ensinam como aprenderam” “Tenha já havido algumas mudanças nas actividades nas sala de aula” “Se não fazem diferente é porque a sua formação inicial não os preparou para isso” ___________________________________________ “Acho que são poucos para a dimensão desta escola” “A maioria tem uma idade avançada o que não ajuda à mudança” “A grande parte têm habilitações muito baixas” “Acho que estão a precisar de terem alguns conhecimentos sobre este problema e sobre a forma como podem melhorar as suas respostas”_________ “A maior parte não participa em actividades educativas de forma sistematizada” “Ainda que praticamente todas aceitem bem a presença dos alunos com necessidades educativas especiais” “Fundamentalmente ocupam-se da limpeza da escola” “Continua haver uma separação muito nítida entre a função dos professores e a deste pessoal” “Exceptuando as auxiliares que têm trabalhado com o grupo das crianças multideficientes ___________________________________________ “ Esta ideia (de que as famílias são muito importantes no processo educativo das crianças) foi também agarrada pela escola” “Os contactos entre a escola e a família são muito frequentes” “O contacto escola-família é bom” “Há professores que lidam bem com a família”

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X Envolvimento

Parental

(continuação)

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XI Mudanças prioritárias

______________

2

Postura dos pais

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1 Gestão

pedagógica das turmas

______________

2 Práticas de colaboração

“Há outros que demonstram um certo receio” “As estratégias de envolvimento dos pais são as do costume” “Há as reuniões para comunicar a avaliação” “Há horas para que os pais possam vir por sua iniciativa inteirar-se da situação escolar dos seus filhos” “Há o costume de chamar este ou aquele encarregado de educação para serem analisadas situações pontuais” ___________________________________________ “Há uma Comissão de Pais muito interessada” “Os pais estão habituados a serem responsabilizados pelo acompanhamento dos seus filhos” “Esta Comissão de Pais colabora muito com as actividades e os projectos da escola” “Há pais muito interessados” “Há outros que ligam muito pouco à educação escolar dos filhos”___________________________________ “Acho que há que mudar e muito esta forma rotineira de trabalhar” “Era fundamental ajudar os professores a terem outra ideia de turma para terem um funcionamento diferente em relação a essa realidade” “Que essas mudanças envolvessem os professores de apoio e até a psicóloga”” “Era preciso que os alunos trabalhassem no dia a dia de acordo com a sua capacidade e interesses” “Acho que tal seria fundamental para que as dinâmicas de turma passassem a ser ainda mais inclusivas” “As programações individualizadas, a meu ver, precisam de ser aperfeiçoadas”__________________ “Quando puderes terás que ajudar a escola a voltar ao nível de informação que tinha na altura em que o Professor Miranda Correia orientava os seminários em Alverca” “Talvez a necessidade de uma maior colaboração entre todos para a melhoria geral da resposta aos alunos” “É preciso inverter esta tendência para o trabalho individual centrado na sala de aula” “É necessário que as pessoas se convençam de que o trabalho em colaboração é muito mais seguro para todos” “Eu acho que não é só aqui. Acho que o trabalhar só na sua sala de aula é um problema geral”

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XI Mudanças prioritárias

(continuação)

2

Práticas de colaboração

(continuação)

“Torna-se muito urgente recuperar a coesão da equipa de programação educacional individualizada” “A fim de se garantir uma cada vez melhor resposta aos alunos com NEE” “È necessário que a resposta da EPEI se volte a aproximar com mais regularidade, dos elevados níveis com que os seus elementos iniciais desenvolviam a sua função, após a frequência dos seminários do Professor Miranda Correia” “Temos que dar a esta equipa (EPEI) o nível que já teve na altura da sua criação”

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A N E X O IV

Excerto dos Fundamentos Legais do Projecto Curricular de Turma

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Fundamentação formal do Projecto Curricular de Turma

1. “No quadro do desenvolvimento da autonomia das escolas, estabelece-se que as estratégias de desenvolvimento do currículo nacional, visando adequá-lo ao contexto de cada escola, deverão ser objecto de um projecto curricular de escola, concebido, aprovado e avaliado pelos respectivos órgãos de administração e gestão, o qual deverá ser desenvolvido, em função do contexto de cada turma, num projecto curricular de turma, concebido, aprovado e avaliado pelo professor titular de turma, ou pelo conselho de turma consoante os ciclos.”

Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro - Preâmbulo

2. “As estratégias de concretização e de desenvolvimento do currículo nacional e do projecto curricular de escola, visando adequá-los ao contexto de cada turma, são objecto de um projecto curricular de turma, concebido, aprovado e avaliado pelo professor titular de turma, em articulação com o conselho de docentes, ou pelo conselho de turma, consoante os ciclos.”

Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro – Artigo 2.º, ponto 4.

3. “Em situações de não realização das aprendizagens definidas no projecto curricular de turma para um ano não terminal de ciclo que, fundamentadamente comprometam o desenvolvimento das competências definidas para um ciclo de escolaridade o professor titular de turma ... ou o conselho de turma ... poderá determinar a retenção do aluno no mesmo ano de escolaridade...”

Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro – Artigo 14.º, ponto 2

4. “Em situações de retenção, compete ao professor titular de turma, no 1.º ciclo e ao conselho de turma nos 2.º e 3.º ciclos, identificar as aprendizagens não realizadas pelo aluno, as quais devem ser tomadas em consideração na elaboração do projecto curricular de turma em que o referido aluno venha a ser integrado no ano escolar subsequente.”

Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro – Artigo 14.º, ponto 3.

5. Áreas curriculares não disciplinares: “Estas áreas devem ser desenvolvidas em articulação entre si e com as áreas disciplinares, incluindo uma componente de trabalho dos alunos com as tecnologias de informação e de comunicação e constar explicitamente do projecto curricular de turma.”

Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro – Anexo I, nota a) do rodapé.

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A N E X O V

Quadro de Explicitação do Guião-base do Projecto Curricular de Turma

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Do Currículo Nacional à contextualização curricular em turma

Explicitação do guião-base do Projecto Curricular de Turma

Dimensões

Conteúdos

Introdução Fundamentação legal, objectivo geral, modos de construção e estrutura

Objectivos

Identificar os estilos de aprendizagem dos alunos. Priorizar os problemas educacionais da turma. Estabelecer o programa do ano lectivo (em interdependência com o estabelecido no PCE). Programar as actividades de enriquecimento curricular. Fundamentar as estratégias pedagógicas e de gestão curricular mais adequadas ao grupo de alunos. Fixar os mecanismos de acompanhamento do desenvolvimento do projecto. Promover a apropriação dos saberes essenciais por parte de todos os alunos. Definir os critérios e procedimentos de avaliação.

Caracterização da turma

1.Ficha de identificação nominal, idade, situação escolar e interesses específicos dos alunos. 2. Perfil Educacional da Turma

Priorização de problemas

Identificação das áreas mais problemáticas à luz do perfil de turma (a rever no final de cada período lectivo)

Plano curricular

Conjunto estruturado de saberes de referência e transversais por áreas disciplinares. Saberes específicos e transversais por áreas curriculares não disciplinares. Competências no domínio das TIC. Actividades de enriquecimento curricular (visitas de estudo, torneios desportivos, ciclos de teatro, dança, cantares, efemérides, jornadas de desenvolvimento cultural, etc.)

Estratégias pedagógicas

Explicitação das estratégias educativas a privilegiar tendo em conta o perfil e os problemas educacionais da turma (aprendizagem significativa por recepção directa ou por descoberta mediada; agrupamentos cooperativos, de tutoria, ou colaborativos, reforço positivo; comunicação didáctica audio-gráfica-visual, etc.)

Estratégias de gestão curricular

Clarificação dos enfoques de desenvolvimento curricular (interdisciplinaridade, trabalho de projecto, temas de integração curricular, abordagem directa de conteúdos, etc.)

Dinâmicas de Acompanhamento

Estabelecimento dos mecanismos a activar para o acompanhamento implicado do projecto, por parte dos intervenientes e parceiros (conselho de turma, assembleias de turma e conselho de pais)

Avaliação

Desenvolvimento de procedimentos de avaliação dinâmica, retrospectiva e prospectiva, centrados nos processos e nos resultados (dos alunos e do próprio projecto)

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A N E X O V I

Grelha de Registo do Perfil Informal de Aprendizagem

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PERFIL INFORMAL DE APRENDIZAGEM

Ficha de Registo - A

Nome do Aluno ____________________________________

AREAS

COMPORTAMENTOS/DESEMPENHOS

C (1)

a) Respeita as regras e relaciona-se bem com os outros b) Respeita regularmente as regras e revela alguma inibição no contacto com os outros

Competências

Sociais c) Não respeita as regras e tem uma relação difícil com os outros

a) Integra, retém e aplica a informação, sem dificuldades b) Revela ligeiras dificuldades na integração, retenção e aplicação da informação

Funcionamento

Cognitivo c) Apresenta grandes dificuldades no processamento da informação

a) Possui uma comunicação expressiva/receptiva normal b) Expressa-se com ligeiras imprecisões morfossintácticas e entende a comunicação dos outros

Comunicação

Oral c) Expressa-se muito mal e tem dificuldades em entender os outros

a) Domina a leitura perceptiva e cognitiva b) Apresenta ligeiras dificuldades na leitura perceptiva e cognitiva

Leitura

c) Revela grandes dificuldades no domínio da leitura

a) Escreve com correcção morfossintáctica e ortográfica b) Escreve com ligeiras incorrecções morfossintácticas e/ou ortográficas

Escrita

c) Revela grandes dificuldades no domínio da escrita

a) Aprende os conceitos e resolve operações lógico-matemáticas b) Demonstra algumas dificuldades nos conceitos e nas operações

Matemática

c) Revela grandes dificuldades na domínio da Matemática

a) Tem assiduidade mensal total, ou total menos uma falta b) Tem uma média mensal de duas faltas

Assiduidade

c) Tem uma média mensal superior a duas faltas

a) Por norma, trabalha e é cuidadoso com os materiais b) Trabalha, se estimulado e é, quase sempre, cuidadoso com os materiais

Organização

Pessoal c) Revela uma quase ausência de hábitos de trabalho e é pouco cuidadoso com os materiais

a) Envolve-se, espontaneamente, na generalidade das actividades escolares b) Precisa de algum estímulo directo para se envolver nas actividades escolares

Motivação

c) Raramente se envolve nas actividades escolares

(1) Indicar: a), b) ou c) consoante o comportamento/desempenho observado no aluno

Características deste instrumento de observação pedagógica:

a) Natureza empírica e informal b) Referência genérica ao esperado que os alunos desenvolvam no ano escolar frequentado.

Turma ______ Ano ______

JS/2001

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A N E X O VII

Grelha de Registo do Perfil de Turma

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P E R F I L D E T U R M A

Ficha de Registo - B

Ano Lectivo de 2001/2002 Turma _____ Ano ____ ____ Período

Áreas Alunos CS

(1) FC (2)

CO (3)

LTR (4)

ESC (5)

MTM (6)

ASS (7)

OP (8)

MTV (9)

Observações

a) Legenda (Áreas): 1 – Competências Sociais 2 – Funcionamento Cognitivo 3 – Comunicação Oral 4 – Leitura 5 – Escrita 6 – Matemática 7 – Assiduidade 8 – Organização Pessoal 9 – Motivação

b) Código (Níveis/Cores) Verde – Bom Azul – Suficiente Amarelo – Insuficiente

JS/2001

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A N E X O VIII

Tabela de Especificação das Competências Essenciais a Desenvolver no Ensino Básico

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Competências Essenciais (1.º Ciclo do Ensino Básico)

Área

Comportamento/Desempenho

Faz pares com objectos semelhante Assinala o objecto nomeado Reconhece-se numa fotografia Agrupa objectos pelo critério da cor Discrimina quatro cores Recorda objectos vistos numa gravura Enuncia o que falta num desenho Reflecte sobre o que está a fazer Compreende a informação apresentada

Funcionamento Cognitivo

Aplica, de forma adequada, os conhecimentos Caminha com autonomia Anda entre duas linhas paralelas separadas com 15 cms, entre si Corre com autonomia Caminha sobre uma linha traçada no chão Muda de direcção a correr Sobe e desce escadas alternando os pés Salta com ambos os pés no mesmo sítio Segura um lápis entre os dedos Atira uma bola a um par a 1,5 metros Flexiona os braços ao receber uma bola atirada a 1,5 metros Lança uma bola com ambas as mãos Lança uma bola só com uma mão Mantém os pés juntos, um à frente do outro

Motricidade

Mantém objectos planos sobre a cabeça Em cima/ em baixo Perto/Longe Juntos/separados Ao lado de Entre Fora de Esquerda/direita

Estruturação Espacial (explica por palavras ou gestos, o

significado de cada situação)

Em fila Explica o sentido de rápido /lento Identifica manhã/tarde/noite Discrimina o significado de antes/depois Explica o sentido de sempre/nunca Conhece os dias da semana Sabe o dia/mês do aniversário

Estruturação Temporal

Nomeia as estações do ano Brinca com os pares Relaciona-se adequadamente com os colegas Tem amigos

Competências Sociais Relaciona-se adequadamente com os adultos

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Integra-se no grupo/turma Assume responsabilidades Interage com auto-confiança Diferencia objectos por forma, cor e tamanho Selecciona a roupa de modo adequado Veste-se, despe-se sem ajuda É autónomo na higiene pessoal

Autonomia Pessoal

Alimenta-se sem ajuda Desloca-se de forma autónoma Orienta-se nas deslocações Cumpre instruções/recados adequados à idade Pede ajuda se necessário

Autonomia no Meio

Relaciona-se adequadamente com os vizinhos Expressa-se em frases com pelo menos, sujeito e verbo Expressa-se em frases com sujeito, verbo e algum complemento Narra um facto passado de modo compreensível Mantém um diálogo lógico Expressa as suas necessidades de modo claro Articula correctamente os diversos fonemas

Comunicação Oral Expressiva

Fala com a correcção esperada para a idade Escuta com atenção quando está em diálogo Nomeia objectos ausentes face à descrição das sua função Explica acções presentes numa gravura Explica relações de causa-efeito Escuta contos/histórias e reproduz o essencial

Comunicação Oral Compreensiva

Cumpre instruções dadas oralmente Faz a correspondência grafema/fonema Descodifica, oralmente, pequenas palavras escritas (nível perceptivo) Identifica o sentido das palavras descodificadas (nível cognitivo) Lê frases simples, soletrando Lê frases simples sem soletrar Lê pequenos textos ainda com omissões, substituições ou inversões Responde a questões sobre os textos lidos Lê textos com uma entoação adequada

Leitura

Reproduz, por palavras suas, pequenos textos lidos em voz baixa Tem uma postura corporal adequada Pega correctamente no lápis (ou equivalente) A escrita segue uma linha, mais ou menos, recta da esquerda para a direita As letras têm um desenho/ tamanho adequado e uniforme Copia palavras de forma completa Copia 2/3 linhas de modo fiel Separa, correctamente, as palavras, em ditados de duas frases Escreve pequenos ditados com aceitável correcção ortográfica Escreve um frase com 4/5 palavras a partir de uma palavra dada Escreve duas frases sobre um facto Realiza uma composição de 4, ou mais frases, narrando um facto Resume, por escrito, um texto simples

Escrita

Reconta, por escrito, uma história/notícia, oralmente transmitida

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

_______________Jorge Serrano/2005_______________ 546

Organiza séries de objectos do maior ao menor e vice-versa Conta até três Conta os dedos de uma mão Conta os dedos das duas mãos Conta até 20 objectos Reproduz a grafia dos números de 1 a 5 Reproduz a grafia dos números de 1 a 10 Reproduz a grafia dos números de 1 a 20 Soma de 1 a 5 com objectos Subtrai de 1 a 5 com objectos Reconhece o primeiro, o médio e o último Reconhece o primeiro, segundo, terceiro e quarto Conta até 50 Conta até 100 Lê quantidades compreendidas entre 0 e 10 Lê quantidades compreendidas entre 10 e 20 Lê quantidades compreendidas entre 20 e 100 Escreve, por ditado, quantidades compreendidas entre 0 e 10 Escreve, por ditado, quantidades compreendidas entre 10 e 20 Escreve, por ditado, quantidades compreendidas entre 20 e 100 Adquiriu o conceito de unidade Adquiriu o conceito de dezena Adquiriu o conceito de centena Expressa, oralmente, os ordinais até ao décimo Reconhece os símbolos de > de < e de = Utiliza correctamente os símbolos >, < e = Lê quantidades entre 100 e 500 Lê quantidades entre 100 e 1000 Escreve, por ditado, quantidades entre 100 e 1000 Escreve, por ditado, quantidades superiores a 1000 Decompõe números em unidades e dezenas Decompõe números em unidades, dezenas, centenas e milhares Realiza somas sem transporte Realiza somas com transporte Realiza subtracções sem transporte Realiza subtracções com transporte Multiplica por um número Multiplica por dois números Multiplica por mais de dois números Multiplica pela dezena, centena e milhar Divide por um número Divide por dois, ou mais, números Divide pela dezena, centena, milhar Conhece as moedas e notas em circulação Resolve problemas relacionados com o dinheiro Reconhece as medidas de tempo Realiza problemas simples com medidas de tempo Compreende os números decimais

Matemática

Identifica o triângulo

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________________Percursos e práticas para uma escola inclusiva_______________

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Identifica o círculo Identifica losango Conhece as medidas de comprimento, capacidade e peso Resolve problemas com as operações matemáticas elementares Resolve problemas com as operações matemáticas elementares Resolve problemas com as unidades de medida

Matemática (continuação)

Resolve problemas relativos às figuras geométricas abordadas Pede esclarecimentos quando tem dúvidas É limpo e ordenado Envolve-se espontaneamente nos trabalhos Termina as tarefas sem ser alertado para tal È cuidadoso com o material

Organização Pessoal

Faz os trabalhos de casa Revela interesse pelas actividades escolares Esforça-se por melhorar os níveis dos seus saberes Aproveita bem o tempo (procura não estar desocupado)

Motivação Tenta corrigir o que errou Praticamente nunca falta

Assiduidade È pontual na entrada na sala de aula