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8/18/2019 Tese Padua http://slidepdf.com/reader/full/tese-padua 1/295 Antonio de Pádua de Souza e Silva A POESIA DA MENSAGEM ANGOLANA E A MENSA POESIA AFRO-BRASILEIRA Tese de Doutoraento e Literatura de L!n"ua Portu"uesa# Investi"a$%o e Pro(essor Doutor )os* Lu!s Pires Laran+eira& a'resentada , Fauldade de L /oi0ra 1234 U NIVERSIDADE DE C OIMBRA

Tese Padua

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Antonio de Pádua de Souza e Silva

A POESIA DAMENSAGEM ANGOLANA E A MENSAPOESIA AFRO-BRASILEIRA

Tese de Doutora ento e Literatura de L!n"ua Portu"uesa# Investi"a$%o ePro(essor Doutor )os* Lu!s Pires Laran+eira& a'resentada , Fa uldade de L/oi 0ra

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U N I V E R S I D A D E D E C O I M B R A

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Fa-uldade de Letras

Antonio de Pádua de Souza e Silva

A POESIA DAMENSAGEM ANGOLANA E A MENSA

POESIA AFRO-BRASILEIRA

Tese de Doutora ento e Literatura de L!n"ua Portu"uesa# Investi"a$%o ePro(essor Doutor )os* Lu!s Pires Laran+eira& a'resentada , Fa uldade de L/oi 0ra

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U N I V E R S I D A D E D E C O I M B R A

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Fa-uldade de Letras

A POESIA DAMENSAGEM ANGOLANA E A MENSA

POESIA AFRO-BRASILEIRA

Fi-5a T*- i-a#

Ti'o de tra0al5oT!tulo

AutorOrientadorIdenti(i a$%o do /urso

6rea /ient!(i aEs'e ialidade

Data

Tese de Doutora entoA 'oesia daMensa"e an"olana e a ensa"eda 'oesia a(ro-0rasileira

Antonio de Pádua de Souza e SilvaPro(essor Doutor )os* Lu!s Pires Laran+eira78 /i lo e Literatura de L!n"ua Portu"uesa#Investi"a$%o e EnsinoLiteraturaLiteraturas A(ri anas de L!n"ua Portu"uesa1234

U N I V E R S I D A D E D E C O I M B R A

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a meus pais: Esmeraldo ( in memoriam) e Nitinha e aos meus 13

irmãos; parentes e amigos, também. meus amores, !"rcia, !ima, lba #$gia e licenanda.

os con%rades e &s con%reiras da cademia 'arreirense de #etras. os po os

marginali ados de todo o *laneta.

os deuses +ue me ensinaram a er melhor a lu da poesia e ao pro%essor *ires

#aran eira, +ue me apresentou a outros deuses de +uem s- tinha uma t nue lembran/a: os

poetas a%ricanos de l$ngua portuguesa, notadamente gostinho Neto, nt-nio 0acinto eiriato da 2ru .

os pro%essores *aulo il a *ereira, 4s aldo il estre, 0osé 2arlos eabra *ereira,

2ristina !ello e 0osé ugusto 'ernardes, +ue ampliaram o meu conhecimento. o pessoal

dos er i/os cadémicos e da 'iblioteca da 5#62.

o e78reitor da 6neb, pro%essor #ouris aldo alentim, e sua e+uipe de gabinete e &

pro%essora driana !"rmore, ines+ueci elmente. os companheiros da 6neb9'arreiras e &

nossa diretora pro%essora !arilde uedes. <eitora do =%bahia, *ro%essora urina. diretora

do =%bahia9'arreiras, Dic$ola 'a+ueiro. os companheiros do =%ba8'arreiras.

os amigos de *ortugal, todos, principalmente aos do 2a%é <ainha anta, da aleria ta.

2lara, do 'e tast>, da *astelaria 'riosa, da ?a erna de is, do alão 'rasil, 0uliana do

2iberEspa/o, le7andre *into e olange de ngola, tão recepti os.

nossa malta conimbricense: na <ocha, nt-nia Domingos, <a+uel il a, !arlene,

ara, 2ristina e Drau.

os %ilhos de 5red ou a 2astro e a ele pr-prio, como grande homem de seu tempo,

%alecido h" pouco. os %amiliares do poeta olano ?rindade.

o +uerido amigo9irmão <icardo ?upini+uim. o *oeta <ui !arinho, +uem primeiro

me apresentou a gostinho Neto nos anos de 1@AB.

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EPÍGRAFE

Os olhos dos nossos mortos(para o poeta gostinho Neto)

4s olhos dos nossos mortos*enetram nos meus sonhos2omo se meu sono5osse uma anela aberta.

into8os lendo minha menteDe noite,E espantando as princesinhas,

4s %aunos, anCes, mistériosue brigam por po oarminhas %antasias ocidentais.

Eles ati/am meu -dio<eacendem meu %ogo,!e acordam a cren/a

ão pro%undos seus olhos.

ão tantos os olhos dos nossos mortos,ue não os conto,ão +uantos

!ortos de ão 2arlos,!ortos de oFeto,!ortos da !angueira,

lagados, 2uru u,!o/ambi+ue, ngola.

ão tantos os nossos mortos

ue suas lembran/as!e sacodem do medo,!e mostram +ue não de o,Não posso,Não tenho se+uer o direito,de calar agora(0osé 2arlos #imeirain D6 <?E, GB11, pp. HB8H1)

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RESUMO

Este estudo de doutoramento representa uma re%le7ão sobre as obras de gostinho

Neto, nt-nio 0acinto e iriato da 2ru , poetas %undadores da no a poesia angolana,

representantes da re ista Mensagem e do Movimento dos Novos Intelectuais de Angola, +ue

tinham como pala ra de ordem I amos descobrir ngolaJK. Estudaremos também a poesia

a%ro8brasileira de olano ?rindade, considerado o primeiro poeta da negritude brasileira, e a

de 5red ou a 2astro, +ue, embora não se a negro em sua epiderme, escre eu, nos anos

1@LB, um li ro chamadoSamba de roda , +ue trata da e7plora/ão da gente do massap do

<ecMnca o 'aiano, predominantemente negra, e7plorada nas planta/Ces de cana de a/ car e

dada & preser a/ão da cultura a%ro8brasileira, muito %orte na região. 4 ob eti o maior deste

estudo é analisar a poesia de gostinho Neto como o de um po o em busca de sua

independ ncia e como %onte de den ncia da e7plora/ão e aliena/ão desse po o. Num outro

momento, analisamos os outros +uatro poetas, nessa mesma ertente, buscando

estabelecer uma analogia com a poética de Neto, para saber até onde essas concep/Ces se

con ergem e onde se distanciam, tendo sempre o I*oeta *residenteK como espelho, como

ponto central das discussCes, tendo em conta tratar8se de cinco poetas de te socialista,todos inculados &s ideias de !ar7 e Engels.

Palavras-chave : a Mensagem angolana; . Neto, . 0acinto e . da 2ru ; . ?rindade e 5red .

2astro; negritude; enga amento; poesia a%ro8brasileira.

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A STRACT

?his doctoral stud> is a re%lection on the ForOs o% gostinho Neto, nt-nio 0acinto

and iriato da 2ru , %ounders o% the neF ngolan poetr>, representati es o% !ensagem

maga ine and the NeF =ntellectual !o ement o% ngola, Fhich had the slogan P#etQs

disco er ngolaP. Re also stud> the a%ro8'ra ilian poetr> o% olano ?rindade, considered the

%irst 'ra ilian poet o% negritude, and o% 5red ou a 2astro, Fho, as not blacO on his epidermis,

Frote, in 1@LB, amba de roda, Fhich deals Fith e7ploitation o% people o% the <econca o

'aiano, predominantl> blacO, e7ploited in plantations o% sugar cane and gi en to the

preser ation o% a%ro8'ra ilian culture, er> strong in the region. ?he ma or ob ecti e o% this

stud> is to anal> e the poetr> o% gostinho Neto as the oice o% a people in search o%

independence and as a source o% complaint %rom the e7ploitation and alienation o% these

people. =n another, Fe anal> e the other %our poets in this same ein, tr>ing to establish an

analog> Fith NetoSs poetic, to OnoF hoF %ar these concepts con erge and Fhere are distant,

alFa>s ha ing the P*oet *residentP as a mirror, as a central point discussions, taOing into

account that the> Fere %i e poets belonged to socialist comple7ion, all linOed to the ideas o%

!ar7 and Engels.

!e"#ords : ngolaSs !essage maga ine. gostinho Neto. nt-nio 0acinto. iriato da 2ru .

olano ?rindade. 5red ou a 2astro. 'lacOness. Engagement. %ro8'ra ilian poetr>.

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SUM$RIO

=N?<4D6TU4..............................................................................................................................@

* <?E = V *4E = D !EN E! N 4# N .....................................................................1W

1.1. poesia angolana dentro do conte7to das literaturas a%ricanas de l$ngua portuguesa. . .1W

1.G. gostinho Neto (1@GG81@W@): não apenas o poeta da imposs$ el ren ncia da NegritudeGB

1.G.1. *er%il biobibliogr"%ico e liter"rio.................................................................................GB

1.G.G. gostinho Neto: o poeta e sua poesia.......................................................................3B

a) *oemas negro8pol$tico8sociais.....................................................................................3G

b) *oemas da prisão........................................................................................................HX

c) *oemas de amor..........................................................................................................LW

d) *oemas pan8a%ricanistas e uni ersais: a ren ncia imposs$ el.....................................L@

e) Neto e sua consci ncia cr$tico8estética.......................................................................WB

1.3. nt-nio 0acinto: do l dico reminiscente ao neorrealismo a%ricano (ou o poeta do

?arra%al).....................................................................................................................................WW

1.3.1. *er%il biobibliogr"%ico e liter"rio.................................................................................WW

1.3.G. nt-nio 0acinto: o poeta e sua poesia........................................................................A11.3.3. s can/Ces de Iminha genteK.....................................................................................A3

1.3.H. nt-nio 0acinto: poeta sobre i ente do ?arra%al.......................................................@H

1.3.H.1. Em redor do ?arra%al...........................................................................................@H

1.3.H.G. No interior de ?arra%al........................................................................................@W

1.3.H.3. ?arra%al l$rico.....................................................................................................1B1

1.3.H.H. lgumas considera/Ces do poeta sobre o seu trabalho poético......................1BG

1.H. iriato da 2ru : um poeta com bilinguismo.....................................................................1BL

1.H.1. *er%il biobibliogr"%ico e liter"rio...............................................................................1BL

1.H.G. iriato da 2ru : o poeta e sua poesia.......................................................................1B@

* <?E == V *4E = 5<48'< =#E=< ...................................................................................1GW

G.1. *<E ENT D4 NE <4 N #=?E< ?6< '< =#E=< .....................................................1GW

G.G. 4 2 4 DE 4# N4 ?<=ND DE E 5<ED 46Y 2 ?<4..............................................1HL

G.G.1. olano ?rindade e o mo imento da negritude no 'rasil..........................................1HL

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G.G.1.1. *er%il biobibliogr"%ico e liter"rio.......................................................................1HL

G.G.1.G. olano ?rindade e a negritude no 'rasil...........................................................1LB

a) 4 cantor de sua gente................................................................................................1LX

b) 4 poeta entre Deus e os 4ri7"s.................................................................................1X3c) 4 poeta e seus amores..............................................................................................1X@

d) olano ?rindade e o mo imento da negritude a%ro8brasileira..................................1WG

G.G.G. 5red ou a 2astro e a poesia das terras do massapé do recMnca o baiano........ ....1AW

G.G.G.1. *er%il biobibliogr"%ico e liter"rio.......................................................................1AW

G.G.G.G. poesia e o amba de roda.............................................................................1@X

G.G.G.3. amba de roda: %onte de alegrias e triste as da gente do massap ................GB@

=) 2anto tel rico.............................................................................................................G1B==) *erspecti a................................................................................................................G1G

===) ?ema V Desen ol imento.........................................................................................G1H

a) terra e o po o.........................................................................................................G1H

b) amba de roda...........................................................................................................G1W

= ) isão da no a idade.................................................................................................G1@

24N2#6 U4............................................................................................................................GG3

<E5E<ZN2= '='#=4 <[5=2 ...............................................................................................GGW

NE\4 ...................................................................................................................................GH3

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I%TRODU&'O

Embora tenha i ido uma prolongada guerra, ngola o%ereceum repert-rio pr-digo no campo da literatura. Desde os anosHB, os angolanos reconheciam a import]ncia da ida liter"riacomo contraponto ao +uadro opressi o em +ue i iam. 4papel dos escritores no mo imento +ue le aria &independ ncia %oi tão signi%icati o +ue nos primeiros anos opa$s era identi%icado como a <ep blica dos *oetas. 4 pr-priopresidente gostinho Neto era conhecido como escritor, assimcomo nt-nio 0acinto, iriato da 2ru e !"rio de ndrade,nomes +ue estão na origem do !o imento *opular de#iberta/ão de ngola. (<ita 2ha es e ?]nia !acedo in'iblioteca Entre #i ros, no embro de GBBW)

2ome/amos este trabalho re isitando um te7to de l%redo 'osi, cr$tico e historiador

liter"rio brasileiro, no +ual os ltimos par"gra%os são dedicados a aston 'achelard e suas

re%le7Ces sobre poesia. 4 cr$tico brasileiro %a a seguinte cita/ão do pensador %ranc s: I^

necess"ria a união de uma ati idade sonhadora e de uma ati idade ideati a para produ ir

uma obra poética. arte é nature a en7ertadaK. *ara 'osi:

'achelard insiste na met"%ora: o enxerto se %a por+ue o poema participa

tanto da nature a, terra8"gua8ar8%ogo, suporte das imagens, +uanto da

cultura, +ue é a%inal a pr-pria nature a +ue mil nios de opera/Ces

simb-licas trabalharam e a%ei/oaram.

Essa dupla participa/ão, +ue se reconhece na matéria signata da pala ra,

abre ao nosso olhar, duas portas.

6ma porta comunica com os labirintos do inconsciente onde se gestam as

metamor%oses do dese o. *orta do sonho.

outra porta d" para os tesouros da mem-ria %ormados por mais de tr s

mil anos de tradi/ão letrada. *orta da cultura. (p.HH)

*ara o cr$tico brasileiro, h" intérpretes do poema +ue se contentam por abrir apenas@

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uma das portas, %echando8se no método, sem permitir +ue outros elementos itais &

compreensão do todo do arte%ato poético possam imprimir sua dose de contribui/ão ao

sabor art$stico das pala ras +ue ir" compor o poema:

*or amor & coer ncia de método h" intérpretes do poema +ue se creem

obrigados a abrir somente uma porta. Dei7am entrar assim uma corrente

homog nea de dados e rela/Ces, mas pagam caro o pre/o dessa

uni%ormidade de istas, pois terão em mãos s- um elo da cadeia. e abro

apenas a porta +ue d" para a g nese sens$ el das %iguras do poema, arrisco8

me a perder tudo +uanto neste se de e ao estilo de época, ao gosto

liter"rio, & poética em +ue se %ormou o autor, &s con en/Ces de g nero e demetro a +ue o te7to obedece, & t-pica do ocabul"rio +ue tradicionalmente

se associaram ao tema, & ideologia +ue ordenou o seu ponto de ista;

en%im, dei7arei de er as dimensCes sociais a +ue nenhum poema amais se

subtraiu. e, porém, eu abrir s- esta outra porta, %echando a primeira, a

minha interpreta/ão acabar" despro ida de todo entendimento das

opera/Ces +ue con erteram o pathos em imagem (nesta imagem nica, e

não em +ual+uer outra tirada de um repert-rio) e nada saberei das

moti a/Ces e7istenciais +ue %or aram a sua e7pressão neste ritmo, e não em

+ual+uer dos metros +ue a hist-ria do erso o%erece ao poeta culto. (pp. HH8

HL)

egundo ele, I'achelard nos ensinaK +ue um tema como carpe diem, muito caro aos

cl"ssicos gregos, ad+uire ao longo das eras uma especi%icidade pr-pria, sem perder sua

ess ncia. largar$amos essa tese e ousariamos di er +ue +ual+uer tema, +ue %i+ue preso aum s- dos elementos a +ue se re%ere 'achelard, tende a es a iar8se, não atingindo assim a

sua plenitude poética. E 'osi %inali a:

4 encontro da imagem com o pensamento, do corpo com a cultura, d"8se

no instante poético, a+uele momento de plenitude +ue %a da poesia uma

meta%$sica instant]nea.

1B

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'ela é a %iloso%ia +ue não teme a di%eren/a nem a contradi/ão; antes, as

con oca e as agasalha & sua sombra. !as, para tanto, de er" também

acolher cora osamente o momento não raro ingrato da identidade. (p.HW)

^ preciso salientar +ue essas impressCes de 'osi são retiradas de seu ensaio Sobre

alguns modos de ler poesia: memórias e reflexões , contido no li roLeitura de poesia, sob sua

organi a/ão. Nele o autor tece uma re%le7ão das leituras %eitas ao longo de sua %orma/ão

como estudante de #etras da 6 * a respeito das correntes da cr$tica liter"ria em oga na

Europa desde o ad ento do <omantismo até os nossos dias.

Essas pala ras de 'osi, recheadas com as re%le7Ces de 'achelard, chamaram8nos aaten/ão, ou melhor, inspiraram8nos a pensar como e por +ue escre er sobre a poesia dos

angolanos gostinho Neto, iriato da 2ru e nt-nio 0acinto, todos oriundos da re ista

Mensagem e da re ista ultura II, +ue circularam em ngola e *ortugal nas décadas de LB e

XB do séc. \\. ?ambém esta am ligados ao Movimento dos Novos Intelectuais de Angola,

cu o lema era!amos "escobrir Angola# , +ue posteriormente %ormaria as bases do !*# 8

!o imento *opular de #iberta/ão de ngola. lém desses poetas, cogitou8nos re erenciar

também dois poetas brasileiros: olano ?rindade, algumas e es citado como re%er ncia pelacr$tica a%ricana de l$ngua portuguesa, e 5red ou a 2astro, poeta baiano pouco publicado e

ainda sem uma cr$tica liter"ria de rele ]ncia.

4 +ue nos le ou a essa escolha %oram dois %atores determinantes dos nossos estudos

ao longo de nossa ida acad mica: a pre%er ncia por escritores pouco conhecidos no 'rasil e

+uase inéditos e a sua +uase e7clusão dos estudos cient$%icos das academias, o +ue preconi a

a condi/ão de maus poetas, de marginais e de subliteratos, como é o caso do Movimento$oetas na $ra%a, de al ador9'ahia, tema de nossa disserta/ão de mestrado, de%endida em

GBBA, na *629 *.

uando propusemos abordar a poética de gostinho Neto, nt-nio 0acinto, iriato da

2ru , olano ?rindade e 5red ou a 2astro, ob iamente +ue não nos passou pela mem-ria

nenhum interesse de chamar a aten/ão do cr$tico norte8americano _arold 'loom e de sua

pl iade a %im de +ue dessem a esses poetas um assento na galeria canMnica da literatura

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ocidental, +ue ele por conta pr-pria elegeu, e a+ui não ai nenhuma cr$tica inconse+uente,

pelo contr"rio, acreditamos +ue o cr$tico norte8americano est" coberto de ra ão. *ensando

na ep$gra%e +ue abre esta introdu/ão, na erdade a nossa preocupa/ão é acicatar o interesse

da academia e dos leitores de l$ngua portuguesa pela obra desses poetas e de outrospr-ceres da re ista Mensagem e da re ista ultura &II', no caso de ngola; di emos pr-ceres,

sim, por+ue eles t m uma signi%ica/ão e uma dimensão liter"ria estética +ue marcam um

di isor de "guas entre o +ue se %e , em termos de literatura, antes deles, e o +ue se %ar"

posteriormente a eles. 4 mesmo acontecendo em outros pa$ses de [%rica de l$ngua

portuguesa; como a nossa abordagem est" restrita ao %enMmeno em ngola, %icamos por

a+ui.

^ certo +ue ha eremos, em alguns momentos de nossa escritura, de %a er algumas

recorr ncias a outras literaturas a%ins. 4 principal ob eti o deste trabalho, porém, é %a er

uma leitura, uma interpreta/ão, uma an"lise cr$tica de nosso corpus, no intuito de tra er &

tona o seu real alor e coloc"8lo (ou destitu$8lo de) em seu de ido lugar dentro do uni erso

liter"rio da l$ngua portuguesa, por+ue é ela o material utili ado por seus autores.

ntes de mais nada, de emos olhar para esses poetas como homens de cultura,

como $cones de homens +ue ti eram toda uma %orma/ão escol"stica e i encial em [%rica e,

posteriormente, na Europa, muitos deles, e s- retornando depois para, atra és da poesia e

da luta armada, %a er a independ ncia de seu pa$s. ^ nosso intuito, também, não combater,

mas con encer, dissuadir a+ueles +ue ainda ho e os desconsideram, principalmente a

gostinho Neto, como poeta, ha endo8lhe de outorgar não apenas os t$tulos de médico,

pol$tico e re olucion"rio, o +ue em erdade o %oi, mas, também, o de poeta.

4s poemas de gostinho Neto, nt-nio 0acinto e iriato da 2ru t m +ualidades, o+ue ha eremos de pro ar ao longo de nossa tese, +ue nada dei7am a merecer em rela/ão a

outros escritores de l$ngua portuguesa e +ui/" de toda a literatura ocidental. Não é nossa

inten/ão, como " %oi a entado, analisar essa poética pelo iés e7clusi o de literatura de

combate, embora a reconhe/amos também assim e dele não possamos nos distanciar. 2omo

" disse #eonel 2osme, e tantos outros, nas escrituras de gostinho Neto (e eu acrescento

nas de iriato da 2ru e nt-nio 0acinto, companheiros de Neto) ida e obra se con ugam,

imbricam8se de tal %orma +ue uma parece condu ir a outra, mais em Neto, é bem erdade,1G

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do +ue nos outros dois.

4utros cr$ticos mais embasados " se deti eram na an"lise dessa poética, a saber:

2arlos Er edosa, <ussel _amilton, erald !oser, al ato ?rigo, *ires #aran eira, Nelson

2er+ueira, ?ania !ac do, !anuel 5erreira, l%redo !argarido, =noc ncia !ata, dentre

outros, por isso, en%ati amos, amo8nos deter em uma leitura estética da poesia +ue compCe

este corpus.

'uscaremos na nossa an"lise a de%esa da autenticidade poética desses artistas da

pala ra, sem dispensar, ob iamente, os conselhos e conhecimentos obtidos ao longo deste

trabalho nas obras dos pes+uisadores elencados nas re%er ncias bibliogr"%icas, sendo eles a

lu e o %anal de nossa escrita. ^ deles +ue em a nossa coragem para a%irmar serem essespoetas pioneiros de uma no a ordem poética da [%rica de l$ngua portuguesa, sem

desmerecer, é claro, as sementes plantadas pelas gera/Ces anteriores. creditamos,

portanto, serem eles os construtores do c]none liter"rio angolano +ue s- agora se esbo/a.

*ela parte brasileira, escolhemos olano ?rindade, por ser negro e contempor]neo

dos angolanos, também ati ista das causas da negritude no 'rasil, sendo um dos pioneiros

na luta contra o racismo e o preconceito, na de%esa dos direitos das pessoas negras e pardas,direitos esses s-, relati amente, alcan/ados no século atual atra és da inger ncia de cotas e

de leis +ue tentam inibir as distor/Ces sociais e punir as posturas preconceituosas contra

a+ueles +ue também contribuem para a constru/ão do desen ol imento do 'rasil e são

muitas e es relegados aos e7erc$cios de ati idades de bai7o prest$gio social.

^ 5red ou a 2astro, também, um poeta contempor]neo dos demais, nascido em

1@31, o mais mo/o embora, tendo publicado seu primeiro li ro no ano de 1@LW, auge da

atua/ão liter"ria dos poetas angolanos. 2astro é um homem do recMnca o baiano, nascido

em ão on/alo dos 2ampos e criado em anto maro da *uri%ica/ão, terra ho e conhecida

por ser o ber/o de 2aetano eloso e !aria 'et]nia. anto maro tem uma representa/ão

muito %orte dentro do cen"rio hist-rico da 'ahia e do 'rasil, principalmente pelo grande

n mero de negros +ue abrigou desde a coloni a/ão do No o !undo, pelo culti o da cana8

de8a/ car e pelas %iguras ilustres ali nascidas e pelo re%erencial nacionalista +ue demonstrou

nas lutas pela independ ncia do 'rasil. Não aleatoriamente, o primeiro li ro de 2astro

13

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chama8se Samba de roda , seguindo8se os inéditos Massap( de sesmarias e anto canavi) ,

a+ui re%erenciados.

ntes de come/ar a an"lise indi idual de cada poeta, de emos ter em conta +ue uma

especi%icidade os une: o mar7ismo; todos eles %oram %iliados ou aderentes de *artidos

2omunistas e9ou ti eram como b$blia os ensinamentos de !ar7 e Engels. Então propomos a

seguinte metodologia: primeiro, analisaremos os poemas de gostinho Neto como ponto

%ulcral do trabalho; segundo, %aremos como +ue uma espécie de comparatismo, uma

analogia das outras poéticas com a do Ipoeta *residenteK, para er o +ue une e o +ue

distancia esses poetas de %orma/ão mar7ista. egundo bdala 0unior:

No 'rasil e em *ortugal encontramos, na perspecti a popular, intelectuais

ideologicamente identi%icados com um resgate cultural +ue não se

con%orma ao mero %olclorismo; ao contr"rio, assumem a posi/ão de

anguarda art$stica. Nos pa$ses a%ricanos de l$ngua portuguesa, a

intelectualidade rompeu de %orma mais radical com a classe dominante

colonial e procura promo er uma consci ncia cr$tica nacional, democr"tica

e popular. 4s escritores mais signi%icati os dessa anguarda ideol-gica

procuram uma a%ina/ão para serem igualmente uma anguarda art$stica, e

promo erem a moderni a/ão desses pa$ses. (GBBW, p.1LG)

^ dentro dessa perspecti a de bdala 0unior +ue se dar" a nossa analogia,

obser ando, criteriosamente, o momento hist-rico em +ue essas poéticas se reali am,

embora contempor]neos os seus e7ecutores. nalisando as poéticas de 0orge de #ima e de

iriato da 2ru , bdala 0unior assinala (em +ue o primeiro homenageia o poeta norte8

americano Rhitman e o segundo, o poeta haitiano 0ac+ues <oumain), +ue essas poéticas

tendem a um congra/amento ou um estreitamento de comunica/ão, atra és da Idialética

particular9uni ersalK. Di o cr$tico:

4s Inegros de todo o mundoK, em sua di"spora, t m o prolet"ria, de suas

condi/Ces prolet"rias. Essa o est" em cada pa$s e nos outros. Ela tem sua1H

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%or/a na considera/ão do espec$%ico nacional e do particular racial de cada

pa$s, com produ/Ces +ue le am a intera/Ces dialéticas uni ersali antes. 4

sistema de re%er ncias deslocou seu centro nacional para outros, onde se

mani%esta a a condi/ão social do negro. apropria/ão nacional %a 8se em

torno dessa identi%ica/ão com um campo ideol-gico8cultural +ue ultrapassa

as %ronteiras nacionais, mas tem sua usti%icati a e articula/ão art$stica

dentro da consci ncia Iposs$ elS da con%igura/ão nacional. (GBBW, pp. 1AW8

1AA)

ssim sendo, o +ue se busca, não é uma total identi%ica/ão, +ue sabemos imposs$ el,

desses poetas, é a o +ue %ala, como %ala, para +uem se %ala e com +ue intuito se %ala, deonde se %ala e sua amplitude no seio de sua pro e/ão e alhures.

1L

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1X

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PARTE I ( A POESIA DAMENSAGEM A%GO)A%A

*+*+ A ,oes a an.olana dentro do conte/to das l terat0ras a1r canas de l2n.0a

,ort0.0esa

Na es%era da a/ão, a unidade a%ricana %oi também reconhecidapela a%irma/ão da Negritude e do *an8a%ricanismo. Negritude, posi/ão intelectual, e o *an8a%ricanismo, posi/ãopol$tica, ambos con ergem ao a%irmarem, a primeira, +uetodos os a%ricanos tinham uma ci ili a/ão em comum, osegundo, +ue todos os a%ricanos de iam lutar em con unto.

=ntui/ão global de ida concreta a%ricana, an"lise das obras,das institui/Ces, das ideias, isCes do mundo, rei indica/ão daNegritude, *an8a%ricanismo con ergem para o mesmo %ato: a[%rica ao sul do aara é culturalmente uma. Essa comunidadecultural é a a%ricanidade, ou se a, a con%igura/ão pr-pria &[%rica de di ersos tra/os +ue podemos encontrarseparadamente alhures. ?odos os rostos humanos sãoconstitu$dos dos mesmos componentes: nari , olhos, l"bios,boca, etc., tal ou tal desses componentes pode8se encontrarid ntico em di ersos rostos; mas a combina/ão desses tra/osid nticos é +ue %orma o rosto nico. a%ricanidade é esserosto cultural nico +ue a [%rica o%erece ao mundo.(`abengele !unanga in 'iblioteca Entre #i ros, no embro deGBBW)

Nos tr s olumes deNo reino de aliban, considerada a primeira obra antol-gica mais

completa da poesia a%ricana de l$ngua portuguesa +uando da sua publica/ão em 1@WL (antes

ha iam sido publicadas as seguintes antologias: Antologia dos novos poetas de Angola,

#uanda, 1@LB;$oesia em Mo%ambi*ue, #isboa, 1@L1; Anthologie de la nouvelle poésie noire

et malgache de langue fran%aise, *aris, 1@HA, compilada por enghor e pre%aciada por 0ean8

*aul artre; $oesia negra de express+o portuguesa , de 5. 0osé ?enreiro e !"rio de ndrade,

1@L3), no longo e documentado estudo introdut-rio, !anuel 5erreira chama a aten/ão para

os mo imentos +ue surgiram nas méricas, na Europa e em [%rica com o ob eti o de di ulgar

a presen/a do negro na cultura uni ersal, notadamente no campo da literatura. ão eles:

1W

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a) , renascimento negro nos E6 : 2ountee 2ullen, 2laude !cOa>, #angston _ughes,

Dubois, este %undador do pan-africanismo, dentre outros;

b) Indigenismo no _aiti, com desta+ue para 0ac+ues <oumain;

c) Negrismo em 2uba, com desta+ue para le o 2arpentier e Nicolas uillén;d) 4 da re ista Lucioles (1@GW), na !artinica, com ilbert ratiant, <ené !énil e a

re ista Légitime "éfense , com ^tiene #ero; e

e) Negritude.

Este ltimo é isto com certa ressal a pelo autor, em irtude de como o termo, depois

de sua primeira descoberta por imé 2ésaire, ganha contornos di%erentes, chegando ao

ponto de banali ar8se; são citados ainda os nomes de enghor e #éon Damas como te-ricosdo assunto. E cabe ao primeiro a melhor de%ini/ão do termo Negritude: I2on unto dos

alores culturais da [%rica NegraK; ou: I4 patrim-nio cultural, os alores e, sobretudo, o

esp$rito da ci ili a/ão negro8a%ricanaSK. Embora 5erreira pre%ira esta de%ini/ão: I re ela/ão

do patrim-nio cultural, dos alores e sobretudo o esp$rito da ci ili a/ão negro8a%ricana,

inculada a uma atitude re%letida e cr$tica, e orientada para o protesto ou para a recusa:

protesto contra o coloni ador e recusa da inger ncia dos dados culturais europeusK

(5E<<E=< , 1@WL, ol. =).

Esses mo imentos e, principalmente o ligado . $résence Africaine , em *aris, tinham

como princ$pio de%ender os direitos dos a%ricanos, notadamente no campo intelectual, a %im

de mostrar ao europeu +ue a cultura a%ricana era tão boa e tão rica +uanto a dita cultura

ocidental.

Negritude, sustent"culo cultural de um mo imento com preocupa/Ces sociais, tem

como meta a recon+uista e a reabilita/ão dos alores perdidos, personali a/ão ,

readapta/ão ao ambiente, a%irma/ão de presen/a no mundo e e7pressão concreta das

realidades negras . =mediati a8se a assun/ão da concretude, do testemunho, da

re alori a/ão do homem negro, na busca de uma identidade social, por todo o mundo onde

negros hou esse: méricas, Europa, [%rica. !"rio de ndrade, gostinho Neto, 4rlando de

lbu+uer+ue concebem a literatura negra como uma entidade uni ersal, da mesma %orma,

lda E. anto a concebe como sendo a americana e a%ricana, +ue se a produto da ra/a negra,1A

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do orgulho da ra/a . *ara eles, a literatura negra inha suprir uma lacuna %ormati a e

in%ormati a, não ambicionando mais do +ue ser til, con%orme *ires #aran eira.

No olume = de sua antologia, 5erreira %a uma introdu/ão sobre a hist-ria da

literatura a%ricana de l$ngua portuguesa, com o t$tulo I6ma a entura desconhecidaK, com

uma sele/ão de 3@ poetas de 2abo erde e apenas um de uiné8'issau, nt-nio 'aticã

5erreira; no olume ==, encontraremos H@ poetas de ngola e sete de ão ?omé e *r$ncipe; "

no olume ===, destinado a !o/ambi+ue, %oram selecionados HH poetas. 2ada parte tra uma

introdu/ão sobre a literatura de cada pa$s. ^ uma obra de grande rele ]ncia para os estudos

da poesia a%ricana de l$ngua portuguesa, embora, por ra Ces e7postas em seu pre%"cio,

alguns outros poetas tenham %icado de %ora da antologia.

No olume ==, 3 . *arte, sobre ngola, 5erreira credita a %unda/ão da poesia angolana

a 0osé da il a !aia 5erreira e seu /spontaneidades de minha alma (1AH@), embora, ho e,

saibamos +ue te7tos esparsos de outros autores tenham sido publicados anteriormente; ele

se re%ere, também, ao Almanach de Lembran%as, +ue circulou entre 1AL1 a 1@3G, como

marco %undador, onde muitos residentes nas colMnias publicaram suas e7peri ncias poéticas.

alienta o organi ador +ue a segunda metade do século \=\ caracteri a8se pelacrescente onda de conscienti a/ão regional , atra és dos ornais, da cultura popular: contos e

ad"gios, da organi a/ão de gram"ticas e dicion"rios. inda segundo ele, embora sens$ el aos

problemas da terra, essa poesia ganhar" contornos europeus, dada a situa/ão de ngola

como colMnia portuguesa & época. 6m tema, no entanto, sobressai: Ia mulherK; ser", porém,

com os grupos de Mensagem e ultura, re istas +ue circularão a partir da década de 1@LB,

+ue a poesia de rai angolana h" de se a%irmar com uma no a isão.

Em seu manual Literaturas africanas de express+o portuguesa , editado pela

6ni ersidade berta, em 1@@L, *ires #aran eira %a um painel dessas literaturas, com

%undamentos epistemol-gicos, desde os seus prim-rdios até & data da publica/ão do

manual, destinado aos estudantes da 6ni ersidade berta espalhados pelo mundo e

interessados em conhecer as literaturas a%ricanas de l$ngua portuguesa. ssim escre e o

autor:

1@

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?rata8se, pois, de um !anual de isão panor]mica, nos cap$tulos

introdut-rios a cada pa$s, de tipo cronol-gico, did"ctico; de apresenta/ão

de aspectos gerais e particulares (hist-ria liter"ria, escritores, obras, temas),

nos cap$tulos +ue não analisam uma obra de leitura completa e

obrigat-riaff; de an"lise de aspectos mais particulari ados, precisamente

sobre um autor e, em especial, um te7to ou um con unto dos seus te7tos

(romance, li ro de poemas, li ro de contos), nos cap$tulos sobre te7tos de

leitura integral (# < N0E=< , 1@@L, p.1W).

?rata8se, portanto, de uma obra com %im epistemol-gico determinado, tal e o

primeiro trabalho dessa nature a sobre o assunto em +uestão. Esse manual contou com acolabora/ão das pro%essoras =noc ncia !ata e Elsa <odrigues dos antos.

ale ressaltar, também, +ue no as obras, atualmente, t m sido publicadas com uma

certa const]ncia, tanto obras liter"rias propriamente ditas, de no os e de antigos escritores,

+uanto obras te-ricas e de hist-ria das literaturas a%ricanas de l$ngua portuguesa, de "rios

autores. *odemos citar nomes como os de: 2osta ndrade, 2arlos Er edosa, <ussel

_amilton, erald !oser, #eonel 2osme, !"rio nt-nio, l%redo !argarido, al ato ?rigo,

?ania !ac do, Nelson 2er+ueira, " citados anteriormente, entre outros, con%orme indica/ão

bibliogr"%ica.

*+3+ A.ost nho %eto 4*533-*56578 n9o a,enas o ,oeta da m,oss2vel ren:nc a

da %e.r t0de

*+3+*+ Per1 l ; o; ;l o.r<1 co e l ter<r o

*ara o escritor angolano, a interpreta/ão da e7ist ncia nãodei7a de estar submetida a esta regra e para o %a er, não pode,e identemente, desconhecer a realidade, sobretudo osaspectos dram"ticos dessa realidade, +ue constituem a suacontradi/ão.

(...)

GB

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?odos n-s, creio, concordamos em +ue o escritor se de asituar na sua época. E e7ercer a %un/ão de %ormador deconsci ncias, +ue se a agente acti o de um aper%ei/oamentoda humanidade.

(...)

literatura, na ngola independente e caminhando para uma%orma superior de organi a/ão V o socialismo V tem de,necessariamente, re%lectir esta no a situa/ão.

(...)

No passado, a nossa literatura mergulhou pro%undamente nacultura europeia V era mesmo uma parte da literatura daEuropa, cu as correntes %oram seguidas e uma das suas l$nguasutili ada como nico meio de e7pressão.

(...)

Neste momento, " não é aceit" el a ideia de %a er entrar nacategoria de escritores, apenas a+ueles +ue mane am comper%ei/ão a l$ngua portuguesa. interpreta/ão ou a descri/ãoda ida t m de ser actos de artistas, mas a %orma +ue assumenão se subordina ao dom$nio mais ou menos per%eito da l$ngua+ue utili amos. ( gostinho Neto: discurso perante a 6E , em1@WW)

poesia de gostinho Neto nem sempre tem sido a aliada consoante a sua alidade

no conte7to da literatura angolana, +ue é a primeira inst]ncia de onde emanam os u$ os

sobre as obras produ idas pelos escritores do pa$s. ?em ha ido sérias ob ec/Ces & sua

+ualidade como poeta. e olharmos para a recep/ão end-gena e também para o longo

historial da sua leitura %ora de ngola, encontraremos uma aprecia/ão positi a e, mais do

+ue isso, consagrando8o como o poeta angolano por e7cel ncia.

egundo #u$s `and imbo, em gostinho Neto, I+ualidades pessoais como aud"cia,

orgulho e autoestima en+uanto a%ricano, a assun/ão do compromisso pol$tico e as%ormula/Ces te-ricas sobre a liberta/ão e o nacionalismo tradu em o culminar de um longo

processo de %orma/ãoK, +ue come/a com a publica/ão de dois te7tos em , /standarte , ornal

da =gre a !etodista: A nova ordem come%a em nossa casa0 A pa1 *ue *ueremos e Instru%+o

do nativo, publicados em 1@HH8HL e com2ma causa psicológica: a marcha para o exterior e

2ma necessidade , publicados no ornal, 3arolim , em 1@HX, +uando o poeta conta a com GG

e GH anos. *ara `and imbo, nesses escritos " se percebe um discurso nacionalista, embora

G1

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ei ado de marcas nati istas das duas primeiras décadas do século \\. No ano em +ue Neto

nasceu, 1@GG, eclodiu a4evolta Nativista amponesa , então apoiada pelo seu pai, o

re erendo gostinho *edro Neto. Nas décadas de 3B e HB, gostinho Neto %re+uenta, em

#uanda, a escola da =gre a !etodista e o ornal , /standarte . 4 seu processo de %orma/ão énarrado no re%erido ornal, atra és de not$cias a respeito dos seus 7itos escolares e outros

%atos como a doen/a e a morte do pai, entre 1@3H e 1@HX, con%orme `and imbo. Nesse

per$odo, gostinho Neto publica alguns poemas e artigos de inspira/ão religiosa no ornal ,

/standarte . Neste mesmo ornal ponti%ica a seu pai.

De 1@HH a 1@L@, escre e e publica artigos marcantes no ]mbito da hist-ria intelectual

angolana, a saber: A nova ,rdem ome%a em asa (1@HH); A $a1 *ue /speramos (1@HL);

Instru%+o ao Nativo (, /standarte , 1@HL);2ma ausa $sicológica: a Marcba para o /xterior

(1@HX);2ma Necessidade (1@HX); e"a !ida /spiritual em Angola (1@H@, !eridiano);, 4umo

da literatura Negra ( entro de /studos Africanos . 1@L1); A propósito de 5eita 3odeba

( Angola6 4evista da liga Africana. 1@L3);Introdu%+o ao oló*uio sobre $oesia Angolana

(1@L@)(`and imbo, p.1B).

re ista Latitudes: ahiers Lusophones, no seu n mero H18HG, de aneiro de GB1G,

ano das comemora/Ces do @B ani ers"rio de nascimento de gostinho Neto, dedica +uase

1BB p"ginas ao Ipoeta *residenteK e é dela +ue nos utili amos para %a er uma pe+uena

biobibliogra%ia de Neto, le ando em considera/ão a rele ]ncia de seus subscritores no

uni erso da cultura e da pes+uisa liter"ria dos pa$ses a%ricanos de l$ngua portuguesa.

No ano leti o 1@HW8HA, o poeta est" matriculado no curso de !edicina da 62; em

1@L1, ao lado de m$lcar 2abral, !"rio *into de ndrade, Noémia de ousa, lda do Esp$rito

anto e outros, %unda o 2entro de Estudos %ricanos, sob in%lu ncia de 2ountee 2ullen,#angston _ughes, <ichard Rright, imé 2ésaire, Nicol"s uillén, <ené !aran e `eita 5odéba.

^ nessa época +ue come/a a nascer a ideia de cria/ão de um grupo pol$tico.

Em 1@LH, a uda a criar o 2lube !ar$timo %ricano, " residente em #isboa. eu

prest$gio intelectual aumenta progressi amente, bem como as persegui/Ces policiais +ue

culminarão numa série de prisCes até & sua %uga para o e7$lio, de onde comandar" o !*# . E

conclui and imbo:

GG

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6ma leitura global da obra de gostinho Neto, compreendendo a poesia e

os te7tos de car"cter ensa$stico sobre os +uais discorremos rapidamente e

+ue ainda se encontram dispersos por "rias publica/Ces, h"8de propiciar a

oportunidade de perscrutar os arcanos da personalidade de um homem de

letras e de um intelectual. 4 homem de letras é o poeta da P agrada

Esperan/aP e da P<en ncia =mposs$ elP. 4 intelectual é o su eito +ue

enuncia o discurso +ue o coloca ao lado dos pobres, dos %racos, dos

humilhados de todo o mundo, uni ersali ando a tr"gica condi/ão do

_omem %ricano durante séculos. (GB1G, p.13)

2om rela/ão & poesia de Neto: a sua aparente simplicidade prosaica e o seu %orte

enga amento pol$tico, assim se re%erem os ensa$stas *ires #aran eira e na ?. <ocha:

2onhecedor de +ue a poesia era insu%iciente para atingir os seus %ins, para

se manter perto do seu po o. Neto poeti ou da %orma mais ade+uada ao

conte7to, recusando, conscientemente e não por incapacidade, lirismos e

seus ornamentos +ue, por belos e so%isticados +ue %ossem, não trariam a

con%ian/a nem a coragem +ue se pede a um po o num conte7to de luta pela

liberta/ão, assim como não re elariam ao resto do mundo a realidade i ida

pelos negros, no tempo da coloni a/ão branca em [%rica. E, muitas e es, as

literaturas, em [%rica, supriram as lacunas da mera in%orma/ão %actual e

tornaram8se e$culo consciente de doutrina/ão. 4 poeta turco Na im

_iOmet, +ue Neto re%ere em P +ui no c"rcereP, mar7ista como ele,

abandonou o culti o do cl"ssico ritmo dos ruba>at, por +ue se empenharana u entude, para escre er leg$ el e aud$ el tendo como destinat"rio o

po o, mesmo +ue anal%abeto, como e7plicou 0o ce #ussu. ustamente +uem

tradu iu os dois para italiano: PNon era un letterato: il letterato si %orma

com lo studio dei predecessori, com lSaccumula ione libresca: a _iOmet

+uesto non interessa a. #a sua %onte dSispira ione non erano gli altri

scrittori. ma la coscien a storica e la lotta politica; e non si ri olge a a critici

e scrittori, ma al popolo dei suo paese e di tutti i paesi, anche agli

G3

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anal%abetiP (_iOmet, GBBL: W). mbos os poetas tinham ob iamente as suas

leituras, mas essa recusa da tradi/ão so%isticada e snob de uma poesia para

circuitos %echados %oi assumida por Neto com a usta consci ncia do

trabalho lingu$stico e da busca da melhor e7pressão estética para os seus

intentos, parecendo +ue o resultado %inal é mais pobre do +ue de outros

poetas (os detractores comparam8no sempre a iriato da 2ru autor de

somente uma d ia de poemas, os +ue se conhecem), por+ue a carga

pol$tica e social tende a submergir a cuidadosa ar+uitectura do discurso.

(GB1G, p.1X)

E identemente, não estão os ensa$stas, de %orma alguma, a menospre ar o alorestético de iriato da 2ru , mas tão8somente a e idenciar +ue ambos se encontram no

mesmo patamar de despre o. Decerto +ue o lirismo puro, sentimentalista, en%adonho, por

e es, centrado no eu, não caberia neste tipo de poesia +ue estamos a estudar. ^

inconceb$ el Io conceito de arte pela arteK aplicado & poética de Neto, embora ele tenha

praticado também os chamados Ipoemas de amorK, mas, mesmo nesses poemas,

encontramos marcas pol$ticas em seu interior, isto +ue pelo menos tr s deles %oram escritos

na prisão.

Neto assumiu a missão de todo um po o. inda com rela/ão & sua obra, é rele ante a

primeira edi/ão, mais completa, publicada em =t"lia, on occhi asciutti (1@X3), numa cole/ão

+ue re ne escritores do +uilate de NaboOo , ide, 2endrars, 0o>ce, !ann, 'utor, 'orges,

*irandello e 5orster.

4utrossim destacamos +ue as poesias de Neto eram declamadas entre os re oltosos

e muitas %oram musicadas e cantadas, o +ue %acilitou a sua dissemina/ão entre as pessoas de

pouca ou nenhuma leitura. Estaria, pois, Neto ligado & linha de poetas como Na im _iOmet,

*aul ^luard, uille ic, ercors, nt-nio !achado, _ernande , etc.. 4s ensa$stas *ires

#aran eira e na ?. <ocha ainda elegem alguns poemas de Neto como de a%inado apuro

técnico8estético: I2aminho do matoK, I*ara além da poesiaK, I ombrasK, I spira/ãoK,

I!ussunda amigoK, I4 caminho das estrelasK, I2riarK, I5ogo e ritmoK, I2ampos erdesK e

I_a emos de oltarK, bem como os Iempenhadamente s-cio8pol$ticos e ideol-gicos, sem

GH

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perda de +ualidades estéticasK: I deus & hora da largadaK, I uitandeiraK, I recon+uistaK,

I angrantes e germinantesK, INa pele do tamborK, I*oemaK, I4 erde das palmeiras da

minha mocidadeK, I4 choro de [%ricaK, I o igualK e I ren ncia imposs$ elK.

pes+uisadora =noc ncia !ata, em seu ensaio 4eler os 7 l)ssicos8: a $oesia de

Agostinho Neto e os herdeiros do nacionalismo liter)rio , chama8nos a aten/ão para a gera/ão

+ue ela denomina de poetas8pol$ticos, composta por: 2ochat 4s-rio (1@1W8GBBG), !aur$cio

omes (1@GB8século \\=), nt-nio gostinho Neto (1@GG81@W@), ires de lmeida antos

(1@GG81@@G), Ernesto #ara 5ilho (1@GG81@WW), nt-nio 0acinto (1@GH81@@1), iriato da

(1@GA81@W3), !"rio *into de ndrade (1@GA81@@B), !"rio nt-nio (1@3H81@A@), _enri+ue

branches (1@3G8GBBX), !anuel dos antos #ima (1@3L), #uandino ieira (1@3L). egundo

ela, a literatura era a %orma, na+uela Ialtura em +ue esta am cerceadas outras possibilidades

de mani%esta/ão pol$ticaK, de mobili a/ão, era Ipor isso, uma ret-rica de inten/ão e

intencionalidade pol$ticas, buscando partilhar mem-rias imaginariamente hist-ricas e sociais

e colecti i ar ang stias e aspira/CesK, a %im de atingir um Icorpo uno e coeso, dentro dos

prop-sitos do nacionalismoK. *ara ela, além da épica, outros recursos são utili ados, como os

elementos Iretirados da nature a e da socioculturaK +ue eram trans%ormados em Is$mbolosK

de encantamento para se criar um elo Ia%ecti o8sentimentalK entre os literatos8pol$ticos e apopula/ão. Não h" d idas para =noc ncia !ata de +ue I nt-nio gostinho Neto é,

untamente com (...) nt-nio 0acinto, ires de lmeida antos, !aur$cio de lmeida e iriato

da 2ru , dos mais portentosos poetas da gera/ão da Mensagem e do nacionalismo liter"rioK.

p-s a independ ncia, ap-s, portanto, o boom da poesia s-cio8pol$tico8nacionalista,

come/a a surgir em ngola e em toda a [%rica de l$ngua portuguesa, como era de se esperar

e como se d" em toda sociedade +ue passa por trans%orma/Ces radicais, uma no a ordem

poética e uma no a concep/ão de poesia passa a operar8se, assim os discursos dos escritores

subse+uentes aos da gera/ão da Mensagem transcorrerão por no as tra et-rias, &s e es

recuando & gera/ão anterior, &s e es dela se distanciando, o +ue s- se pode e7plicar tendo

em ista o discorrer dos no os %atos hist-ricos, da no a ordem cultural e social +ue h" de se

estabelecer, algo absolutamente normal e aceit" el, até prenunciante de um

amadurecimento intelectual salutar ao pro eto de e olu/ão liter"ria do no o pa$s, completa

!ata:GL

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Não obstante essa nostalgia, por e es regressi a (por+ue crepuscular), o

+ue a poesia contempor]nea, a%inal, intenta não é a nega/ão da %ei/ão

celebrati a da terra e suas gentes, a sua %ei/ão hist-rica e a do poético. e

ho e as preocupa/Ces dos poetas se iram para as rela/Ces internas de

poder, para a reparti/ão ra o" el das ri+ue as, para o processo de

digni%ica/ão do indi $duo, para o respeito pela hist-ria particular e

segmental dos grupamentos, para o respeito pelos direitos c$ icos e para o

e+uil$brio nas rela/Ces sociais, mais não %a em +ue reelaborar, criticamente,

a corrente de solidariedade e cumplicidade +ue, prosopopeicamente, se

constr-i no poema P*artida para o contratoP, de gostinho Neto. (GB1G,

p.HW)

Nesse particular, concordamos plenamente com a ensa$sta e cr$tica na "rea dos

estudos a%ricanos de l$ngua portuguesa.

Em 1@L1, Neto so%re a sua primeira prisão pela *=DE, pol$cia do %ascismo sala arista,

+ue amais es+uecer" o nome de gostinho Neto. Ele so%rer" in meras persegui/Ces e outras

prisCes, até %ugir de #isboa em 1@X3, a udado pelo *artido 2omunista *ortugu s, com sua

mulher !aria Eugénia Neto e os %ilhos, !"rio 0orge e =rene le7andra, chegando a

#éopold ille ( inshasa), onde o !*# tinha a sua sede no e7terior, mantendo8se na

clandestinidade, mas sempre atuante na luta pela liberta/ão de ngola, até 1@WL, +uando do

seu regresso, ap-s a +ueda do %ascismo portugu s em 1@WH, a GL de bril, e a declara/ão da

independ ncia das antigas colMnias.

inda em 1@X1, inicia8se uma campanha internacional em prol da liberta/ão degostinho Neto: a re ista $résence Africaine dedica um n mero especial a ngola e condena

se eramente as autoridades %ascistas portuguesas, 9he 9imes publica mani%esta/Ces de

protesto contra a prisão de gostinho Neto, assinadas por %iguras do mais ele ado conceito

intelectual, como o historiador 'asil Da idson, os romancistas Da> #eFis, Doris #essing, =ris

!urdoch, ngus Rilson, lan ilitoe, o poeta 0onh Rain, o cr$tico de teatro ingl s `ermeth

?>nan, os dramaturgos 0onh 4sborne e rnold ResOer. $eguin oo;s edita o li ro

GX

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$ersecution 1@X1, de autoria de *eter 'enenson, denunciando a situa/ão de no e

prisioneiros pol$ticos, entre eles gostinho Neto. Nesse mesmo ano, é eleito presidente do

!*# durante a 2on%er ncia Nacional do !o imento. 4utros nomes, como os de 0ean *aul8

artre e Nicol"s uillén, também se le antam contra a sua prisão. 1B de etembro de 1@W@,gostinho Neto %alece em !osco o.

4 percurso poético de Neto come/a, portanto, mais ou menos em 1@HL e termina em

1@X1, +uando o poeta, cMnscio de sua missão como ate, passa a empreender o caminho do

pol$tico, do re olucion"rio +ue " anunciara em alguns de seus poemas mais & %rente

analisados, com o intuito de descobrir se gostinho Neto é de %ato um poeta, ou se seus

poemas são apenas uma %orma prosaica de desaba%o, de e7primir em ersos as suas m"goas,

as suas dores, os seus dese os e suas in+uietudes.

?endo Neto parado de escre er em 1@X1, como atesta a maioria de seus

pes+uisadores e cr$ticos, então seus escritos não passam de eleidades da u entude E se

seus te7tos causarem no leitor o +ue os I%ormalistas russosK chamaram de estranhamento,

então são "lidos como %ormas poéticas uni ersais

2om e%eito, a poética de Neto, no +ue tange &s trans%orma/Ces sociais e hist-ricas,tende a seguir a concep/ão continu$sta da hist-ria, estabelecida por *aul <icouer ( apud

? D#E< 24 ? , p.XH), para +uem Ia sub ersão total é impens" el e toda a trans%orma/ão

conser a um pé no passado, na medida em +ue a possibilidade de a an/ar parece ser

proporcional & capacidade de dar ida & tradi/ãoK. 4u a poética de Neto representa uma

ruptura com o passado e prega tão somente a separa/ão entre a colMnia e a metr-pole

ão essas interroga/Ces +ue tentaremos esclarecer ao longo deste trabalho.

o>tisolo e arc$a salientam +ue a antologia espanhola é resultado da edi/ão italiana

on occhi asciutti , depois publicada com o t$tulo em portugu s Sagrada esperan%a, segundo

eles:

Entre estas dos ediciones de todos sus poemas, es decir, la primera > la

ltima, se sucedieron otras muchas traducciones: en ugosla ia, la 6< ,

GW

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5rancia, 2hina, =nglaterra... u prestigio como poeta era >a tal +ue en 1@WB,

> sin haberse presentado > ni tan si+uiera saberlo hasta mucho m"s tarde,

recibi- el *remio =nternacional #otus, +ue por unanimidad le otorg- la

2uarta 2on%erencia de Escritores %ro8 si"ticos.

#os poemas de Neto e7presan su isi-n del presente > %uturo de ngola a

tra és de temas cotidianos, de personas, de situaciones determinadas, pero

con la irtud de hacerlos o con ertidos en s$mbolos de toda una naci-n, >

de todo un continente también. No es un escritor pan%let"rio, sino un poeta

+ue hace > escribe la re oluci-n, +ue encarna muchas ]nsias de libertad.

(...)

6na tercera constante en Neto es su total aus ncia de sentimentalismo,

incluso al tratar del dolor, del su%rimiento, de la angustia, de la ajoran a o

de la muerte. u propio dolor o las desgracias de su pueblo k+ue en

ocasiones se con%undenk no son am"s ob eto de conmiseraci-n o

lamento. Es un pudor propio solo de los poetas %or ados en la desolaci-n o

en la cat"stro%e desde su nije . Este pudor, esta autoe7igencia, +ue propone

también para su pueblo, de sobrelle ar el in%ort nio con estoicismo o

impa ide , es el +ue le lle a a repetir una > otra e la %rase: con los o os

secos; a%rontar la ad ersidad sin l"grimas. (1@AB, pp.1H81L)

pesar de grande, essa cita/ão nos interessa por+ue ela " esclarece alguns dos

+uestionamentos e7postos acima sobre a poesia de Neto e sua postura como poeta,

esclarecimentos +ue serão mais alargados & lu de outros cr$ticos re%erenciados no

desen ol imento desta escritura. *ercebemos, por e7emplo, +ue, em Neto, um homempro%undamente angolano e i encialmente a%ricano, surge constantemente em sua poesia

uma ontade uni ersal. uando escre e I amos com toda a humanidade 9 con+uistar nosso

mundo e a nossa pa K, %ala por todos os homens e mulheres do mundo, sem e7ortar

+ual+uer re anchismo ou ingan/a: Icom nossas mãos 9 abertas & %raternidade do mundoK.

egundo os cr$ticos espanh-is: I<ealmente, Neto no ca>- en ninguno de los dos t-picos

habituales en el ?ercer !undo: ni copi- un modelo de cultura heredado de su tribu, ni se

cij- a la tradici-n de la antigua metr-poli. 6n caso ins-litoK.GA

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Em Sagrada /speran%a, os 1X primeiros poemas, +ue ão de I deus & hora da

largadaK a I2ontratadosK, de 1@HL a 1@HA, combinam neorrealismo e negritudinismo.

segunda le a de poemas, escritos entre 1@H@ e 1@LL, +ue ai de I2on%ian/aK a I4 erde das

palmeiras de minha mocidadeK, com G1 poemas, +ue, & e7ce/ão de +uatro, INão me pe/assorrisoK, I`ina7i7iK, I6m ani ers"rioK e I!assacre de . ?oméK, são mani%estamente da

negritude, do negro genérico, uni ersal, mas também a%ricano e angolano, sem demasiados

pormenores regionais. terceira, %ormada por 1H poemas, de 1@LL a 1@XB, IDe um bou+uet

de rosas para tiK a I o igualK, são poemas +ue temati am as prisCes por onde o poeta

passou, com e7ce/ão de I2horo de [%ricaK, e se re%erem genericamente & liberta/ão nacional

e & independ ncia. inda podemos apontar 1X poemas ine+ui ocamente de negritude:

I spira/ãoK, I auda/ãoK, I2onscienciali a/ãoK, I*ausaK, I4 caminho das estrelasK, Irecon+uistaK, I angrantes e germinantesK, INa pele do tamborK, I s terras sentidasK,

I'amaOoK, I2riarK, I5ogo e ritmoK, I!ãos esculturaisK, I*oemaK, I4 erde das palmeiras de

minha mocidadeK e I4 choro de [%ricaK, podendo8se incluir ainda INoiteK, I ombrasK,

I2on%ian/aK, I elho negroK e I*ara além da poesiaK, todos deSagrada esperan%a, mais

I<en ncia imposs$ el V nega/ãoK, I o do sangueK, I ntigamente eraK e I tua mão poetaK,

teremos GL poemas netianos de negritude (c%. #aran eira, A negritude africana , 1@@L).

Nosso ob eti o, " mencionado acima, é %a er uma leitura pr-pria, como condi a todo

trabalho de doutoramento, mas sem perder de ista as orienta/Ces +ue re%erendam o nosso

discurso. %inal, a pol mica gerada por estas pala ras do escritor 0osé Eduardo gualusa,

também angolano, e eiculadas pelo peri-dico Angolense (Iuma pessoa +ue ache +ue o

gostinho Neto, por e7emplo, %oi um e7traordin"rio poeta é por+ue não conhece

rigorosamente nada de poesia. gostinho Neto %oi um poeta med$ocre. 4 mesmo se pode

di er de nt-nio 2ardoso ou de nt-nio 0acintoK), nos incomodou bastante, por nãoconcordarmos com elas e por não sermos tão leigos em poesia como imagina gualusa. 4

+ue nos soa é tratar8se de uma certa di erg ncia pol$tico8ideol-gica, dada a puerilidade das

e7pressCes.

G@

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*+3+3+ A.ost nho %eto8 o ,oeta e s0a ,oes a

#eiam 5anon: saberão +ue, no tempo da sua impot ncia, aloucura assassina é o inconsciente coleti o dos coloni ados.

(...)

ssim, o obcecado %oge da sua e7ig ncia pro%unda in%ligindo8se manias +ue o solicitam a cada instante. Dan/am; na dan/amo em os m sculos dolorosamente contra$dos e a dan/amimeti a, em segredo, muitas e es sem +ue eles saibam, oNão +ue eles não podem di er, os assassinatos +ue não podemcometer. Em certas regiCes, usam um ltimo recurso: apossessão. 4 +ue era outrora %ato religioso em suasimplicidade, uma certa comunica/ão do %iel com o sagrado, é

trans%ormado em arma contra o desespero e a humilha/ão: osdem-nios, os ori7"s, os santos da anteria descem sobre eles,go ernam a sua iol ncia e a desperdi/am em transes até oesgotamento. o mesmo tempo, esses altos personagens osprotegem: isso +uer di er +ue os coloni ados se de%endem daaliena/ão colonial, re%or/ando a aliena/ão religiosa.

(...)

Dois mundos, duas possessCes: dan/a8se a noite inteira;+uando amanhece, corre8se ara a igre a para ou ir missa; acada dia, a %issura aumenta. Nosso inimigo trai os seus irmãose se %a nosso c mplice; seus irmãos %a em o mesmo. 4indigenato é uma neurose introdu ida e alimentada pelocolono nos coloni ados com o consentimento destes. (0ean8*aul artre)

amos tomar como base os poemas publicados na trilogia poética da edi/ão da 6nião

dos Escritores de ngola, GBB@, reunindo poemas deSagrada /speran%a0 4en<ncia

Imposs=vel e Amanhecer , com pre%"cios de 0osé arai a de 2ar alho, eneral e combatente

da luta de liberta/ão, e de *ires #aran eira, +ue representam a mais completa edi/ão da obra

deste $cone da literatura, da pol$tica e da cultura geral de ngola. ^ bom esclarecer +ue

ti emos acesso a outras edi/Ces da obra poética do autor, mas pre%erimos eleger a edi/ão de

GBB@ como %onte de re%er ncia, em irtude de ser a primeira edi/ão realmente completa de

Neto.

Neto escre eu seu ltimo poema, de cunho erdadeiramente re olucion"rio, ou

assim presume8se, em 1@X1, ano em +ue se inicia de %ato a guerra pela independ ncia. ?rata8

3B

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se, portanto, de um %ato e7emplar: gostinho Neto desiste de seu pro eto como poeta, para

se dedicar a um pro eto mais leg$timo, mais importante, o da re olu/ão, da luta pela

autodetermina/ão de ngola 4u, na erdade, sentia8se o aedo com sua missão cumprida

como disc$pulo de 4r%eu, assim como o o em <imbaud, e punha8se agora a trilhar um no ocaminho e a construir uma outra edi/ão de sua biogra%ia, e identemente oposta & do g nio

%ranc s

creditamos na segunda hip-tese: ha endo Neto cumprido sua missão como poeta,

compondo um discurso poético do +ual se utili aria, ele e seus companheiros, como or"culo

dos seus patr$cios e %onte did"tico8pedag-gica ao longo dos 1H anos +ue ha eria de perdurar

a luta. 2umprido assim esse périplo, punha8se em no a marcha. 2abe8nos, entanto, a aliar o

seu esp-lio poético, e tão somente este, a saber se merece o poeta, ho e, o t$tulo de

Icl"ssicoK da literatura angolana, como bem e7pressa a edi/ão em causa.

Essa edi/ão é composta dos L1 poemas de Sagrada esperan%a, nem todos datados,

mas seguindo uma ordem, a nos parecer, cronol-gica, sendo o ltimo de 1@XB, mais o #i ro ==

V4en<ncia Imposs=vel , nem sempre datados os poemas, mas +ue correspondem ao per$odo

de 1@HW a 1@LB, com 1W poesias. 5echa a trilogia o #i ro === V Amanhecer , com sete poemas,

curiosamente tra endo um poema datado de 1@WG, o ltimo.

Desta trilogia, como se abai7o, %i emos uma sele/ão dos te7tos a serem analisados,

em irtude da impossibilidade de utili armos um processo poema a poema, o +ue tornaria o

trabalho demasiadamente lento e, +ui/", cansati o. sele/ão obedeceu ao seguinte critério:

a) poemas negro8pol$tico8sociais; b) poemas da prisão; c) poemas de amor; d) poemas pan8

a%ricanistas e uni ersais; num outro item, analisaremos e) Neto e sua consci ncia cr$tico8

estética, sempre buscando esclarecer as +uestCes le antadas acima, notadamente as +ue sere%erem & poeticidade ou não dos te7tos de Neto, a %im de coloc"8lo em seu de ido lugar,

para depois buscarmos a analogia com a poesia do restante de nosso corpus, nt-nio

0acinto, iriato da 2ru , olano ?rindade e 5red ou a 2astro.

31

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a7 Poemas ne.ro-,ol2t co-soc a s

%ilia/ão mar7ista da an"lise e desta classi%ica/ão da Isérie

liter"ria angolanaK, por #eonel 2osme, não est" apenasimplicada na terminologia +ue utili a e +ue procurei a+ui pMrsinteticamente em desta+ue. Ela é e7pl$cita eprogramaticamente erbali ada no seu te7to como a/ão eescrita orientadas, como declara, pelo Icompromissoideol-gico com a dialética mar7istaK (Eneida #eal 2unha)

4 +ue emos nos tr s primeiros poemas da antologia: I deus & hora da largadaK,

I*artida para o contratoK e I "bado nos musse+uesK é um eu poético a pre enir I!inha

mãeK, não apenas a sua progenitora, ha a ista o aposto entre par nteses, e7plicando ae7pressão antecedente, +ue e olui da condi/ão particular para a coleti a e mais

especi%icamente para a condi/ão de InegrasK, a cor da pele. Nascido negro, numa %am$lia

negra e religiosa, como é sabido, o poeta apresenta8se & ImãeK9leitor " como um

transgressor, como bem e7plicam os ersos: I!as a ida9matou em mim essa m$stica

esperan/aK, pregada pelas religiCes, no entanto, em um tom pro%ético esse mesmo eu

declara IEu " não espero9sou a+uele por +uem se esperaK, da$ alguns dos cr$ticos e

historiadores de Neto +uererem8no messi]nico, no sentido b$blico da pala ra, o +ue na nossa

-tica corresponde, e7atamente ao contr"rio, a assumir8se l$der e desmisti%icador de seu

po o, mar7ista +ue era. enão, ou/amos o pr-prio poeta: a I%éK é a+uela I+ue alimenta a

idaK e a Iesperan/a somos n-s9os teus %ilhosK.

egundo *ires #aran eira (com +uem concordamos), no pre%"cio +ue %a ao li ro +ue

tomamos como corpus:

poesia de Neto, e7pondo esteticamente as ]nsias e rai as do po o dos

musse+ues (bairros populares pobres), analisando socialmente a situa/ão

hist-rica, re%erindo as aspira/Ces, o dese o de mudan/a e a esperan/a desse

po o, pressupCe a e7ist ncia de condi/Ces ob ecti as para a %orma/ão de

um mo imento popular de liberta/ão nacional, en+uanto organi a/ão

superior de luta, constituindo esse discurso estético um testemunho social e

hist-rico de +ue come/ou, nele pr-prio (e noutros discursos) e na pr"tica3G

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social e pol$tica, a ser %or ado, portanto, antes de 1@LX e surgiu, de %acto,

nesse ano, en+uanto !*# , e não mais tarde, como algumas teorias

re isionistas +uerem %a er crer.

4 erso %ulcral do poema +ue abre o li roSagrada esperan%a VPsou a+uelepor +uem se esperaP V %oi escrito por Neto e é premonit-rio. nt-nio

0acinto ou iriato da 2ru não puderam escre er tal erso, nem tinham

condi/Ces para escre er poesia como a de Neto, também por não serem

negros. Não tinham condi/Ces i enciais, ideol-gicas, doutrin"rias e

culturais. Não podiam %a er essa poesia épica, +ue mostrasse as condi/Ces

de so%rimento, de ansiedade e de potencialidade re olucion"ria do po o.

2omo nota de esclarecimento, acrescemos o testemunho do ensa$sta Edmundo

<ocha, a respeito da %unda/ão do !*# :

De resto, a 2on%er ncia *an8 %ricana s- admitia mo imentos pol$ticos

nacionais e, se +uisessem ser aceites o%icialmente, tinham mesmo +ue se

apresentar como dirigentes de mo imentos nacionais. 5oi assim +ue iriato

apresentou a proposta do t$tulo do no o mo imento angolano, repescado

do ! N=5E ?4 de 1@LX: I mplo !o imento *opular de #iberta/ão de

ngolaK. !as, para os imperati os t"cticos %ace & 6* , era necess"rio dar a

no/ão de anterioridade, e assim se cria o mito de 1@LX, ano em +ue, ele,

iriato, lan/ara em #uanda o *#6 e o ! N=5E ?4. E esse arti%$cio

impunha a e7ist ncia desse !o imento (!*# ) no interior de ngola. Esses

dois argumentos V anterioridade e interioridade V eram absolutamente

necess"rios na estratégia para contrapor presen/a bem real da 6* no

terreno, em ngola, a +ual " era aceite o%icialmente pelos l$deres a%ricanos

desde a = 2on%er ncia *an8 %ricana de ccra, reali ada dois anos antes.

%unda/ão do !*# , em ?unes, em 0aneiro de 1@XB e a in erdade hist-rica

V a cria/ão do !*# Iem 1@LXK V nascem nessa 2on%er ncia, pelas mãos de

iriato da 2ru e de # cio #ara.

(...)33

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?endo sido lan/ada a in erdade hist-rica da cria/ão do !*# em 1@LX e da

sua e7ist ncia em ngola, era necess"rio agora tentar, a todo o custo, %a er

passar a mentira por uma erdade hist-rica e estruturar o mo imento no

interior e no e7terior. 5oi a essa gigantesca tare%a +ue os no os militantes do

!*# passaram a dedicar8se em 2onaOr>. (<42_ et al . pp.1H@81LB)

<e%letindo sobre as duas posi/Ces em rela/ão & data de 5unda/ão do !*# , cremos

não ser esse %ato muito rele ante para a an"lise +ue estamos imprimindo aos te7tos poéticos

de nossos ates.

Então o eu poético, +ue não se distancia do eu autor, isto tratar8se de uma poiesis de

pr"7is, passa a enumerar o +ue I_o e9somosK: as crian/as nuas das sen alas do mato, os

garotos sem escola, os contratados a +ueimar idas nos ca%e ais, os homens negros a

respeitarem os homens brancos, os homens b bados a ca$rem, com %ome, com sede, com

ergonha de identi%icar8se como negro, re eitando, portanto, sua pr-pria origem.

partir dessas constata/Ces o ate, e não o deus, também ainda não o l$der, +ue s-

se concreti ar" em 1@XG, ao perceber os rumos +ue o !*# , melhor di endo, alguns de seus

membros procura am tomar, pre o I manhãK (Ientoaremos hinos & liberdadeK), por+ue

Iem busca de lu K, e7pressão poética, logo tradu ida para o +ue se realmente busca: a ida.

Estamos diante de um poema negritudinista, no di er de 5anon, assim como I*artida

para o contratoK e I "bado nos musse+uesK. *ara 5anon:

Na [%rica, a literatura coloni ada dos inte ltimos anos não é uma

literatura nacional, mas uma literatura de negros. 4 conceito de negritude,

por e7emplo, era a ant$tese a%eti a, senão l-gica, desse insulto +ue o

homem branco %a ia & humanidade. Essa negritude lan/ada contra o

despre o do branco se re elou, em certos setores, como nico %ator capa

de derrubar interdi/Ces e maldi/Ces. *or+ue os intelectuais guineenses ou

+uenianos en%renta am, antes de tudo, o ostracismo global, o despre o

sincrético do dominador, sua rea/ão %oi admirar8se e cantar8se. a%irma/ão

incondicional da cultura europeia sucedeu a a%irma/ão incondicional da3H

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não é o batu+ue do tambor, é estranha or+uestra/ão, pala ra por si s- amb$gua; é o homem

%ardado +ue se regala por espancar outro homem ou se di erte nas emboscadas; são

mulheres a%litas & espera de seus homens, todo um con unto de pr"ticas inaceit" eis:

inter alos

is de dor

#ancinam ou idos

5erem cora/Ces t$midos

E a%astam8se passos

Em correria angustiante

E depois dos risos da matulaDesen%reada

- sil ncio mistério l"grimas e -dio

E carnes laceradas

*elas %i elas dos cinturCes

_" ainda a procura do pra er %"cil, e7plora/ão se7ual das inde%esas crian/as,

contendas de taberna, intrigas %amiliares, par+ues luminosos ao custo de dois mil e

+uinhentos, uma +uantia não acess$ el ao po o pobre e h", também, a ansiedade:

Nos batu+ues saudosos

Dos Oiocos contratados

5ormando l" do acampamento

4 %undo de todo o ru$do

#unda sem %ronteiras

debruar o sussurro

Da ]nsia tumultuante

Destacamos essas estro%es por insinuarem um islumbre, um pren ncio, uma e +ue

o batu+ue, na cultura a%ricana, representa uma %orma de comunica/ão. Então essa ansiedade3X

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se prolonga e se repete, ora saudosa, ora re oltante, pelos b bados ca$dos, pelos %ilhos

desaparecidos, pelas mulheres embriagadas, pelo homem +ue procura o Oimbanda para

recuperar o emprego. Essa entrega ao %eiticeiro ou adi inho (&s Inossas senhorasK), pro oca

no eu poético uma erdadeira repulsa, por saber, ele pr-prio, as causas da miséria de seupo o, en%im é a I nsiedade9Nos +ue descobrem multidCes passi as9Esperando a horaK.

4bser emos +ue h" uma retomada do primeiro poema, mas demos o ao poeta:

Nos homens

%er e o dese o de %a er o es%or/o supremo

para +ue o _omem

renas/a em cada homem

e a esperan/a

não mais se torne

em lamentos da multidão

pr-pria ida

%a desabrochar mais ontades

nos olhares ansiosos dos +ue passam

4 s"bado misturou a noite

nos musse+ues

com m$stica ansiedade

e implaca elmente

ai des%raldando her-icas bandeiras

nas almas escra i adas.

^ essa certe a +ue colorir" toda a poética de Neto e em momento algum ele se

mostrar" abatido, por mais pungente +ue lhe se am a dor e as causas de abatimento de seus

irmãos, com eles se irmana, por isso a necessidade de não claudicar. 4 poema %a 8nos

remeter ao IDia da 2ria/ãoK, de inicius de !oraes, poeta brasileiro do segundo momento

modernista, com um porém: o poema de inicius in este na dialética da contesta/ão, se3W

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de ia o enhor ter ou não descansado no se7to e no sétimo dias, uma e +ue para ele tudo

aconteceu da %orma +ue %oi Ipor+ue o enhor cismou em não descansar9no e7to Dia e sim

no étimo9E para não %icar com as astas mãos abanando9<esol eu %a er o homem & sua

imagem e semelhan/aK, arrematando com uma %ina ironia: I*ossi elmente, isto é, muitopro a elmente9*or+ue era s"badoK. *re%ere, porém, o poeta angolano aticinar:

pr-pria ida

%a desabrochar mais ontades

nos olhares ansiosos dos +ue passam

4 s"bado misturou a noite

nos musse+ues

com m$stica ansiedade

e implaca elmente

ai des%raldando her-icas bandeiras

nas almas escra i adas.

*ara ele o dia da cria/ão é o da conscienti a/ão de seus compatriotas, de sua gente

oprimida, de construir um mundo no o e, por +ue não, de %a er a re olu/ão, como insinua o

pr-prio inicius em outro poema, I4 4per"rio em constru/ãoK, um dos seus momentos mais

sublimes, em +ue o poeta brasileiro constr-i, desconstr-i e reconstr-i a e7pressão8t$tulo do

poema:

De %ato, como podia

6m oper"rio em constru/ão

2ompreender por +ue um ti olo

alia mais do +ue um pão

(...)

!as ele desconhecia

Esse %ato e7traordin"rio:3A

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ue o oper"rio %a a coisa

E a coisa %a o oper"rio.

(...)

4lhou em torno: gamela

'anco, en7erga, caldeirão

idro, parede, anela

2asa, cidade, na/ãoJ

?udo, tudo o +ue e7istia

Era ele +uem o %a ia

Ele, um humilde oper"rio

6m oper"rio +ue sabia

E7ercer a pro%issão.(...)

E o oper"rio ou iu a o

De todos os seus irmãos

4s seus irmãos +ue morreram

*or outros +ue i erão.

6ma esperan/a sincera

2resceu no seu cora/ãoE dentro da tarde mansa

gigantou8se a ra ão

De um homem pobre e es+uecido

<a ão porém +ue %i era

Em oper"rio constru$do

4 oper"rio em constru/ão.

E é dentro dessa dimensão poético8re olucion"ria +ue ser" constru$da toda a obra de

gostinho Neto, mesmo as ditas amorosas, como eremos. ntes de Neto e de inicius, Ralt

Rhitman " aticina a: I6rge and urge and urge,9 lFa>s the procreant urge o% the ForldK

(I]nsia, a ]nsia, a ]nsia9 empre a ]nsia procriadora do mundoK, trad. de ndré 2ardoso, p.@).

Em um de seus te7tos em prosa, di Neto: I liberta/ão, +ue é um %actor da <e olu/ão, não

pode de modo algum, ser e%ecti a, se não se inclui decidida e de%initi a, num processo

cont$nuo de e olu/ão socialK.3@

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5a endo parte desta tem"tica ainda, temos I2rueldadeK, I2omboio a%ricanoK, +ue, na

mesma linha de den ncia da e7plora/ão, da mais8 alia, pois o +ue poderia ser sinMnimo de

progresso torna8se lugar comum do capital: en+uanto uns poucos ganham muito, outros

muitos ganham pouco, ou +uase nada, idas +ue Ise esmagam sob o peso da m"+uina9e nobarulho da terceira classeK, pois I+uem es%or/ou não perdeu9mas ainda não ganhouK. Na

poesia nada é em ão, e o ad érbio temporal IaindaK indica, senão a certe a, ao menos a

cren/a na possibilidade do ganho, negado pelo opressor, representante leg$timo do

progresso, ou %also progresso, por isso é I#ento caricato e cruel9o comboio a%ricano...K.

*oder$amos comparar esse poema ao I?rem de %erroK, de !anuel 'andeira (de toda a gente

conhecido) como corroboram alguns pes+uisadores brasileiros da obra de Neto.

Emblem"tico é o poema I uitandeiraK, mar7ista até & sua rai . 6m te7to +ue tradu

sintomaticamente a lei da mais alia, como escre em !ar7 e Engels, em seu Manifesto

omunista: I burguesia não pode e7istir sem re olucionar permanentemente os

instrumentos de produ/ão; portanto, as rela/Ces de produ/ão; e assim, o con unto das

rela/Ces sociais. o contr"rio, a manuten/ão inalterada do antigo modo de produ/ão %oi a

condi/ão prec$pua de e7ist ncia de todas as classes industriais do passado. 4

re olucionamento permanente da produ/ão, o abalo cont$nuo de todas as categorias sociais,a inseguran/a e a agita/ão sempiternas distinguem a época burguesa de todas as

precedentes. ?odas as rela/Ces imut" eis e esclerosadas, com seu corte o de representa/Ces

e de concep/Ces etustas e ener" eis dissol em8se; as recém8constitu$das rompem8se antes

de tomarem consist ncia. ?udo o +ue era est" el e s-lido desmancha no ar; tudo o +ue era

sagrado é pro%anado, e os homens são obrigados a encarar com olhos iludidos seu lugar no

mundo e suas rela/Ces rec$procasK (! <\ EN E# , pp. GA8G@). ^ e7atamente isso +ue se

desnuda nesse poema, é até redundante cham"8lo de mar7ista, isto +ue toda a obra deNeto, inclusi e seus discursos pol$ticos, não dispensam os ensinamentos do pai do

socialismo. Nota8se +ue o poeta utili a8se das situa/Ces cotidianas de miséria do seu po o

(sem cair em sentimentalismos e7acerbados em l"grimas) de %orma se eramente contida,

como compro a a leitura do poema, detentor de um belo ogo de imagens, o +ue o torna um

dos mais, esteticamente, bem escritos. Nele, no entanto, percebemos claramente o

contraste entre a endedora de laran as e a cidade em Iseu +uente ogo de claros e escurosK,

onde a I ida brinca em cora/Ces a%litos o ogo da cabra8cegaK. 4 humano termina porHB

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coisi%icar8se, I ende8seK, pois o +ue lhe resta são Io amargo desta tortura da ida sem idaK,

a in%]ncia Ibotão de rosa +ue não abriuK, o riso, o choro, as esperan/as, Io sangue dos meus

%ilhosK, a$ sentencia o eu poético:

2omo o es%or/o %oi o%erecido

& seguran/a das m"+uinas

& bele a das ruas as%altadas

de prédios de "rios andares

& comodidade de senhores ricos

a alegria dispersa por cidades

e eume %ui con%undindo

com os pr-prios problemas da e7ist ncia.

$ ão as laran as

como eu me o%ereci ao "lcool

para me anestesiar

e me entreguei &s religiCes

para me insensibili ar

e me atordoei para i er.

?udo tenho dado.

té mesmo a minha dor

e a poesia dos meus seios nus

entreguei8as aos poetas.

ão, pois, os poetas, respons" eis por essa d"di a e dela %arão o +ue bem

entenderem: cantar por cantar, ou %a er dela %anal +ue guie todos em busca das

trans%orma/Ces. Diante desse +uadro, a escolha do poeta pode ante er o seu %uturo no

+uadro canMnico da literatura +ue se esbo/a nos "rduos campos das discrep]ncias sociais.

Esse poema também se apro7ima de outro poema de 'andeira: I!eninos car oeirosK,

bastando compararmos estes ersos:

H1

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4s meninos car oeiros

*assam a caminho da cidade.

k Eh, car oeroJ

E ão tocando os animais com um relho enorme.

(...)

(*ela boca da noite em uma elhinha +ue os recolhe, dobrando8se com um

gemido.)

kEh, car oeroJ

2ompar"8los com estes de I uitandeiraK:

k#aran a, minha senhora

laran inha boaJ

(...)

+uitandeira

+ue ende %ruta

ende8se(...)

gora endo8me eu pr-pria.

( )

?al e endendo8me

eu me possua.

2ompra laran aJ

Não apenas a apro7ima/ão tem"tica, de cunho social, mas a lingu$stica também, a

linguagem sendo semelhante, tanto em um +uanto no outro poema. =sso é magn$%icoJ Então

s- 'andeira é bom poeta e Neto não o é Essa inusitada imputa/ão aos poetas da

responsabilidade s-cio8hist-rica se repete no poema seguinte, I elho NegroK, ao ate, ao

detentor do poder da pala ra m"gica (como di ia acima inicius, Ia dimensão da poesiaK),

compete instruir e moti ar o homem negro, $tima das e7plora/Ces capitalistas e dogm"ticas:

HG

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e transportado nas galeras

ergastado pelos homens

linchado nas grandes cidades

esbulhado até ao ltimo tostão

humilhado até ao p-

sempre sempre encido

^ %or/ado a obedecer

a Deus e aos homens

perdeu8se

(...)

o passar de tanga

com o esp$rito bem escondido

no sil ncio das %rases cMnca as

murmuram eles:

*obre negroJ

E os poetas di em +ue são seus irmãos.

Não chamem de irmão a+uele +ue so%re e por ele s- se tem compai7ão, pois Neto é

isceralmente contra a comisera/ão.

diante eremos I!eia8noite na +uitandaK e I*ara além da poesiaK, ambos, a meu

er, dentro das mesmas caracter$sticas dos anteriores, com suas particularidades, é claro.

Destacamos no primeiro a bela prosopopeia da segunda estro%e: I4 sol9entrega " Domingas

& lua9nas +uitandas dos musse+uesK, por+ue a%inal ela tem de trabalhar para pagar oimpag" el imposto +ue é cobrado de seu %ilho. 4 outro é um poema %otogr"%ico, %otogra%ia

panor]mica de [%rica, e7pondo a bela paisagem, em contraste com a dure a da lida e os

dese os do po o a%ricano, os m$nimos dese os; porém, se engana +uem pensa estar o eu

preocupado apenas com os e%eitos estéticos das imagens. 4 t$tulo em si " é pro%undamente

sugesti o e as duas ltimas estro%es sugerem muito mais +ue o e%eito estético na duplicidade

de sentido +ue encerram suas met"%oras e prosopopeias, denotando a er e poética do

H3

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primeiro grande cantor de ngola e de sua gente.

INoiteK e I2i ili a/ão ocidentalK também pertencem a este ei7o tem"tico. No

segundo, os ersos caracteri am o trabalho mec]nico e bruto do negro para %a er o con%orto

da Ici ili a/ão ocidentalK, en+uanto ele pr-prio ergue sua morada de I#atas pregadas em

paus9%i7adas na terra9%a em a casaK, por isso Ia elhice em cedoK e Iuma esteira nas noites

escuras9basta para ele morrer9grato9e de %omeK. 4bser emos +ue o uso das bilabiais 9p9 e

9b9 en%ati am o trabalho duro, desumano, associado & repeti/ão das pala ras IbritarK,

IpedraK, IacarretarK, ser i/o e7ecutado Iao solK ou I& chu aK. Não nos es+ue/amos +ue

%oram as in asCes europeias +ue destru$ram a sociedade a%ricana, ou tentaram, e7istente na

época, a partir do es%acelamento %amiliar e do incenti o indecente da di"spora.

igni%icati as são as pala ras de artre no pre%"cio +ue %a ao li ro de 5rant 5anon,

,s condenados da terra . %inal, a postura do europeu concorre para o digladiar entre os

pr-prios a%ricanos e para uma %uga desesperadora para o "lcool, os mitos ancestrais e as

religiCes europeias in%iltradas no seio de [%rica. ^ contra essa dissimula/ão +ue se rebela o

eu poético negritudinista. *ara *ires #aran eira: I4 mo imento estético da Negritude assenta

ideologicamente na consci ncia da ra/a, da classe e do territ-rio. 2oincidem a apologia da

ra/a e a conscienciali a/ão social e o amor & terra, primeiro esbo/o do sentimento

patri-ticoK (1@@L: p.1HG). inda nesse poema, pode8se obser ar, mais uma e , o poder de

sinteti a/ão de Neto, assim como o %e o poeta brasileiro 0oão 2abral de !elo Neto sobre a

labuta do homem nordestino, em oposi/ão &+ueles +ue i em nos centros pr-speros do

pa$s, o ul, embora por l" encontremos também muita miséria.

ssim o são K2ontratadosK, I2on%ian/aK e I in%oniaK, este muito se assemelhando a

I2i ili a/ão ocidentalK pela conten/ão ocabular e pela e7pressi idade +ue emerge de seudi er lac-nico V Icor9estertor9ang stiaK, Isorrisos9dor9ang stiaK V, ang stia +ue h" de cessar

com Ia luta gloriosa do po oK: esta I m sica9+ue a minha alma senteK. 4 eu est" sempre

en olto em otimismo, pois a Isin%oniaK +ue ele espera " se prenuncia no canto dos

IcontratadosK, pois eles I hJ9eles cantamK ( " dissemos +ue o canto é uma %orma de

comunica/ão, o canto e a dan/a, entre os a%ricanos, mesmo entre a+ueles +ue se

dispersaram pelo mundo a%ora), mas o eu poético é ta7ati o: I s minhas mãos colocaram

pedras9nos alicerces do mundo9mere/o o meu peda/o de pãoK, e esse merecer não é umHH

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pedido de esmola, é uma e7ig ncia %actual.

I2on%ian/aK é a o de [%rica contabili ando as contas na constru/ão do mundo

ocidental, respons" el pela sua di"spora: INa minha hist-ria9e7iste o parado7o do homem

dispersoK. 5oram os negros +ue constru$ram a tal ci ili a/ão ocidental, por isso esse mundo

também lhes pertence: Imere/o o meu peda/o de pãoK; não h" a+ui como não %a er um

paralelo com I o es dS[%ricaK, de 2astro l es (1AHW81AW1), poeta rom]ntico baiano +ue

i eu apenas GH anos, mas +ue te e grande parte de sua poesia dedicada & alori a/ão do

negro escra o como ser humano e & condena/ão do escra agismo.

2ompletam este bloco os seguintes poemas: K auda/ãoK, I ina7i7iK,

I2onscienciali a/ãoK, I*ausaK, I!ussunda amigoK, I4 caminho das estrelasK, I recon+uistaK,I angrantes e germinantesK, INa pele do tamborK, poema este +ue re%lete a integra/ão do

ser humano com os instrumentos musicais, a m sica e a dan/a, ambos imbricados numa

causa nica, c mplices de suas dores e alegrias, como bem e7empli%icam os ersos: Ie a pele

curtida solta8me tam8tans gritantesK; Iesmago8me na pele batida do tambor a%ricanoK; Iao

lado dos ritmos de dedos congestionados9sobre a pele en elhecida do tambor9dentro do

+ual i o e ibro e clamo:9 N?EJK. 4 poema I!assacre de ão ?oméK, dedicado & amiga

lda ra/a (o massacre ocorrido em B3 de %e ereiro de 1@L3, ano em +ue %oi escrito o

poema); I s terras sentidasK, I'amaOoK, I2riarK, em +ue o termo criar compCe a an"%ora +ue

se dilui pelo corpo do poema a en%ati ar a necessidade da poiesis, da cria/ão sob os e%eitos

torturantes da opressão, termo poliss mico +ue, a um s- tempo, signi%ica escre er ou cantar

os poemas e construir a pa , a liberdade, o amor Icom os olhos secosK, e7pressão +ue se

tornou uma marca da poética de Neto, principalmente depois da antologia publicada na

=t"lia com esse nome, em italiano on occhi asciutti . I!ãos esculturaisK, I5ogo e ritmoK

(outro poema emblem"tico de Neto, +ue dar" t$tulo a uma antologia publicada pela editora

Nossomos, +ue também tem a sua origem num outro poema, I!ussunda amigoK). Em I5ogo

e ritmoK, celebra8se, mais uma e , a imbrica/ão corpo9ser, instrumento9m sica e

dan/a9ritmo, (e7aspera/ão demon$aca e7pressa por esses sememas), pela utili a/ão

ana%-rica de um termo, agora IritmoK, a indu ir o leitor a entrar no pr-prio te7to, %a endo

dele parte, complemento, um dos raros momentos em +ue o autor termina uma composi/ão

com e7clama/ão de dor: I o es dolorosas de [%ricaJK, ao +ue as pala ras de artre emHL

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cadeia de l ube9#isboa, em agosto de 1@XB; IDepressaK, escrito na cadeia de l ube9#isboa,

em agosto de 1@XB; I#utaK, escrito na cadeia do l ube9#isboa, em setembro de 1@XB;

I2ampos erdesK, cadeia do l ube9#isboa, em setembro de 1@XB; I_a emos de oltarK,

escrito na cadeia de l ube9#isboa, em outubro de 1@XB; IDesterroK, escrito no r+uipélagode 2abo erde9*onta do ol, em de embro de 1@XB; e I o igualK, escrito no r+uipélago

de 2abo erde9*onta do ol, em de embro de 1@XB.

Estando o poeta na prisão a er os p"ssaros chilreando Isobre as tr s "r oresK da sua

I nica paisagemK, apetece8lhe %a er um IpoemaK, +ue seria um poema I%echado dentro de

siK, a ser compreendido por +uem , eis a +uestão. 6m poema +ue %ale das paisagens, da ida

e das suas contradi/Ces, Ilongo e impercept$ elK, não ser e ao pro eto do eu l$rico, +ue não é

tão l$rico assim, embebido +ue est" de ironia destacada a partir do erso WW, num IsimK +ue

em erdade representa um não, pois a%inal o seu canto est" comprometido com outra causa.

Escrito um dia depois do poema anterior, I4 erde das palmeiras de minha

mocidadeK, ei ado de imagens re%le7i as +uanto & ingenuidade do eu em ra ão das pr"ticas

de seu po o, +ue, em e de libert"8lo, mais o aliena a (não nos es+ue/amos dos

ensinamentos de 5anon e !ar7 e Engels), o poema constitui8se numa nega/ão dessas

pr"ticas: I4ra a:9?ata ietu uala Ou diulu95uOamenuJ9#engenuJ94 itu7iJ 4 it u7i9 parado7o

dos pecadosJK. s imagens +ue perpassam por sua cela de prisão ão se des elando ao

espocar da mem-ria. Em alguns momentos, parece o eu +uerer omi iar8se no e7-tico, no

passado:

Eu %ugia

orridente e tristeorridente e a io

em terra, nem l$ngua, nem p"tria

'rincando com a a entura

?remendo ao oscilar das canoas %r"geis

Esperan/osas

*ara uma meta%$sica mesti/a de con untura

2om o estMmago a io

HW

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E o esp$rito

Esmagado entre os malcheirosos dentes.

!as esse aparente e asionismo, em erdade, %unciona como restabelecimento de%or/as nos ancestrais, na nature a, nutrindo8se da dan/a, da m sica, do canto, das dores, da

ang stia de I4 erde negro das palmeirasK (+ue Item bele aJK), ha endo uma necessidade

desse retorno aos prim-rdios da humanidade, como esclarecem os ersos: IE nos gritos

embrion"rios dos elhos mundos9?udo re i e9Estada dram"tica mocidade de

reencontro9?udo re i e em peitos largos de ansiedade94%egantes & %or/a da

erdade9 licer/ados no imperec$ elK, notando8se assim a+ui um pro%undo dese o de

liberdade e de harmonia entre os po os, o +ue se constata com nitide .

4s dois poemas seguintes, classi%icados como de amor, colocamos a+ui por terem

sido escritos na prisão, o primeiro no dia do ani ers"rio de sua esposa !aria Eugénia, com

+uem mante e, até & sua morte, uma rela/ão a%eti a e carinhosa de respeito m tuo; o outro

%oi escrito dois anos depois de estar na prisão, como e idencia o t$tulo. No primeiro, ao in és

do +ue %aria o ser amoroso, apartado de seu amor, Iderramar8se em l"grimasK, apresenta8se

um ser cMnscio de sua situa/ão a e7plorar, atra és de ant$teses, as dicotomias da pr-priae7ist ncia humana:

4 sabor amargo da prima era iminente

em gr" ido de %or/a

em cheio de desesperos

E de %rustra/Ces

E nenhuma derrota poss$ el

^ capa de destronar a %or/a tra ida

No sabor amargo da prima era iminente

E em cada um dos teus dias

s pala ras tomam um no o sentido, assim: I5or/a e certe a9no bou+uet de

rosas9para o teu diaK ganham uma conota/ão pol$tica, sem perder sua %un/ão amorosa;HA

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a%inal são as Isaudades %uga esK e o in erno IcurtoK. ^ +ue, para o eu l$rico, como se percebe

em IDois anos de dist]nciaK, acima da pr-pria reali a/ão pessoal, indi idual, est" a coleti a,

de um ser +ue não se desprende de seus ob eti os pol$tico8humano8re olucion"rios:

Entre o sonho e o dese o

uando nos eremos

?arde ou cedo

Di 8me amorJ

2resce com mais usti/a ainda

]nsia de sermos

2om os nossos po os_o e sempre e cada e mais

#i res li res li res

4 poema I4 i/ar da bandeiraK, escrito em 1@XB, dedicado aos her-is do po o

angolano, é uma espécie de poema8mani%esto e resposta a I hora da largadaK, é o retorno

de +uem se espera a: o ate, +ue en ia uma mensagem %utura, a recordar um presente +ue

ele " sente passado, mas +ue s- ir" 1L anos mais tarde e%eti amente, assim também o

sendo IDepressaK (se me permitem, %anMnico em seu sentido literal), +ue con oca toda a

gente & luta armada, & re olu/ão, poema enga ado, sem ser pan%let"rio. *or outro lado, é

também césairiano, na sua erup/ão de brandir contra os opressores, entendendo +ue não

h", de per si , um antagonismo entre os escritores martinicanos, con%orme di o poeta:

Não esperemos os her-is

e amos n-s os her-is

6nindo as nossas o es e os nossos bra/os

2ada um no seu de er

E de%endamos palmo a palmo a nossa terra

Escorracemos o inimigo

E cantemos numa luta i a e her-ica

Desde "H@

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independ ncia real de nossa p"tria

5echando este bloco temos I2ampos erdesK e I o igualK. 4 primeiro é um soneto,

embora moderno, com sua métrica irregular, predominando os ersos ale7andrinos e as

rimas alternadas, e7ceto a do décimo, +ue rima com a do 13 , o +ue rati%ica o conhecimento,

pelo menos em parte, de Neto pelas técnicas da ersi%ica/ão, embora não se a essa %orma,

acreditamos, a ade+uada nem a escolhida para disseminar a sua mensagem, uma e +ue se

o I!ussunda amigoK, e ocado tantas e es em sua obra, não compreende os ersos mais

simples, menos compreenderia os compostos em %ormas mais r$gidas com, por e7emplo, as

do soneto.

I o igualK re+uer8nos um pouco mais de aten/ão e cuidado, por isso nos

demoraremos um pouco mais nele. ^ constitu$do de 1X1 ersos, distribu$dos em 1X estro%es

irregulares, de ersos li res e brancos como a +uase totalidade da obra do poeta, o terceiro

em e7tensão, %icando atr"s apenas de I "bados nos !usse+uesK e I ren ncia imposs$ elK,

+ue analisaremos oportunamente. I o igualK %oi escrito em de embro de 1@XB, +uando o

poeta esta a cumprindo uma das suas prisCes decretadas pela *=DE no ar+uipélago de 2abo

erde, em *onta do ol.

4 poema inicia8se, também, pro%ético (INeste amanhecer italK e Icaminhamos "

itoriososK) e a luta armada nem ha ia sido decretada contra o regime %ascista de *ortugal.

note8se: I6m amanhecer italK ( ) Isobre o solo p"trioK. 4bser e8se +ue o termo

sublinhado, segundo o "icion)rio >ouaiss , signi%ica um pa$s ou territ-rio en+uanto realidade

a%eti a a +ue grupos e indi $duos estão ligados (ao pa$s em +ue se nasce e ao +ual se

pertence como cidadão; terra, torrão natal; terra natal ). _" no conceito impl$cito deIp"triaK, nesse poema, também, logicamente, uma %orte conota/ão pol$tica.

Na terceira estro%e, o eu poético aticina a concreti a/ão de seus ob eti os, dei7ando

bem clara a sua posi/ão socialista e humana do +ue seria (ou ser") o seu Estado, com letra

mai scula, representando a entidade respons" el pela organi a/ão da Ip"triaK e de seus

habitantes. +ueles homens IeleitosK ao no o I%estim da no a idaK serão:

LB

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4s homens

cu a o descansou sob a condi/ão e sob o -dio

e constru$ram os impérios do 4cidente

as ri+ue as e as oportunidades da elha Europa

mantendo os seus pilares sobre a ang stia puls"til dos bra/os

sobre a indignidade e a morte dos seus %ilhos

os homens sacri%icados nos tra/os paralelos das ias %érreas

cu o sangue se encontra nas argamassas

lan/ado com pontes e estradas

também prenderam as "guas nas barragens

com as suas mãos %ormid" eis e com os seus mortos

deram ao brilho das metr-poles ouro e diamantese das entranhas da terra mungiram -leos e %arturas

para os sorrisos ingratos

e na sua bondade na sua ision"ria esperan/a

pediram &s estrelas

apenas o complemento espiritual do dia escra o

*o o genial heroicamente i o

onde outros pereceramde italidade inultrapassada na _ist-ria

alimentou continentes e deu ritmos & mérica

deuses e agilidade nos est"dios

centelhas luminosas na ci ncia e na arte

*o o negro

homens an-nimos no esp$rito da triste aidade branca

agora construindo a nossa p"tria

a nossa [%rica

e no tra/o luminoso dos dias magn$%icos de ho e

de%inem a [%rica solid"ria e es%or/ada

contra os des arios duma nature a incongruente

na independ ncia

num mundo no o com a o igual

L1

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4bser emos +ue o erso Ios homens sacri%icados nos tra=os ,aralelos das ias

%érreasK re ela uma %ina ironia: os homens tra/am ias %érreas IparalelasK e por elas são

sacri%icados, o termo em negrito, pois, perdendo o seu sentido de igualdade, de mesma

dire/ão, recebendo em troca de tudo +ue %e pelos continentes Europeu e mericano apenasIsorrisos ingratosK, um po o +ue s- pedia Ina sua bondade, na sua ision"ria esperan/aK,

Iapenas o complemento espiritual do dia escra oK. Não nos es+ue/amos, no entanto, +ue

I ision"riaK tem ao menos duas dimensCes: a do alienado e a da+uele +ue longe, além,

islumbra o amanhã, termo " rei indicado por #ima 'arreto, escritor negro brasileiro das

primeiras décadas do século \\, em seu li ro 9riste fim de $olicarpo ?uaresma , ho e um

cl"ssico das literaturas de l$ngua portuguesa. Em 'arreto, é o caricato personagem de

5loriano *ei7oto, então presidente do 'rasil no momento do enunciado, +ue insinua:I*olicarpo, oc é um ision"rioK, termo a+ui também carregado de ironia e de ambiguidade.

segunda estro%e da cita/ão é, ao mesmo tempo, en%"tica e esclarecedora: I*o o

negro9 agora construindo a nossa p"tria9a nossa [%ricaK, na %irme a do possessi o InossoK, o

eu ai dando %or/a ao coleti o, pois ele en7erga onde os outros não podem, então Ia [%rica

solid"ria e es%or/ada9contra os des arios duma nature a incongruente9na

independ ncia9num mundo no o com a o igualK é ho e. ?odo o poema se constr-i nessaperspecti a de presente, uma corrente na obra de Neto. Esse Imundo no oK, porém, s- é

poss$ el atra és da Ire olu/ãoK +ue Ipul eri a a submissão do homemK e estreita os la/os de

ami ade catali adores da união +ue promo er" um no o retorno aos ancestrais atra és do

canto das IraparigasK e dos IpoetasK.

I2hegados & horaK é um erso +ue abre as portas do rego i o da reconstru/ão da

Ip"triaK, mas uma Ip"triaK li re e Isem +ue o germe da e7plora/ão lhe penetreK, é a p"tria

socialista, %undada nos princ$pios mar7istas8leninistas, a p"tria de todos. Esse erso também

condu o po o ao reencontro Inas melodias e nos cheiros ancestraisK, +ue " não %uncionam

como %ontes de aliena/ão, uma e +ue, regenerados Ino milagroso pacto entre o homem e

o cosmosK, é um reencontrar8se mesmo Ina sociali a/ãoK, partilhado Ina entrea uda

gloriosaK, tanto Idas cat"stro%esK, +uanto das IalegriasK, na Iess ncia para a no a ida de

[%ricaK. ?emos um eu +ue promulga a ressurrei/ão do homem a%ricano, pois para ele o +ue

mais importa é:LG

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<essuscitar o homem

nas e7plosCes humanas do dia a dia

na marimba no chingu%o no +uissange no tambor

no mo imento dos bra/os e corpos

nos sonhos melodiosos da m sica

na e7pressão do olhar

e no acasalamento sublime da noite com o luar

da sombra com o %ogo do calor com a lu

a alegria dos +ue i em com o sacri%$cio gingado dos dias

=magens da mais pura poesia, carregadas de hipérboles, ap-stro%es e met"%oras, +ue

nos en iam de retorno a 2astro l es (1AHW81AW1), chamado pelos brasileiros de I*oeta dos

Escra osK, lembram e7atamente as do ate baiano, carregadas de humanidade: Ie7plosCes

humanasK, ad indas da ImarimbaK, do ItamborK, do Imo imento dos bra/os e corpos9nos

sonhos melodiosos da m sicaK, do Iacasalamento sublime da noite com o luar9da sombra

com o %ogo do calor com a lu K, sendo a procura da harmonia dos contr"rios base de

constitui/ão do ser humano e de toda sociedade, por+ue a%inal somos duais, por isso nãotemer nem o reencontro Inos sagrados re% gios das horas de ang stiaK, +uer se a Inos

labirintos alco-licosK ou nos Idias de %arraK ou Inos dias de rusgaK, posto +ue Iimpre is$ elK e

Iindispens" elK ao e7erc$cio pleno da pr-pria condi/ão humana %eita de Ira ão e loucuraK,

assim aticinando, mais uma e , o ate:

Do caos para o rein$cio do mundo

para o come/o progressi o da ida

e entrar no concerto harmonioso do uni ersal

digno e li re

po o independente com o igual

a partir deste amanhecer ital sobre a nossa esperan/a.

e não concebemos esse te7to como uma das mais belas p"ginas da poéticaL3

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uni ersal, des%a/a8se toda a hist-ria e cr$tica da arte liter"ria +ue se concebe desde *latão

aos nossos dias. Não é ob eti o deste trabalho %a er de nenhum dos poetas a+ui analisados

g nio, mas tão somente estender8lhe o manto da bene ol ncia -r%ica +ue lhes é de ido e

não os dei7ar a%undar ainda mais no po/o de certo ostracismo em +ue se encontram, por%alhas de recep/ão. Nem dei7ar para %a er depois umamea-culpa, como a +ue %e 0aOobson

em rela/ão aos poetas da <e olu/ão de 1W:

4 r$gido credo liter"rio dos %ormalistas condu ia ine ita elmente a poesia

dos %uturistas russos & ant$tese do %ormalismo V ao Igrito bruto do cora/ãoK,

& sinceridade despudorada. 4 %ormalismo coloca a o mon-logo l$rico entre

aspas, ma+uia a o IeuK poético sob um pseudMnimo. 4 horror toma

propor/Ces imensas +uando subitamente a %antasmagoria do pseudMnimo

se re ela, e, derrubando as %ronteiras, os %antasmas da arte emigram para a

ida. (GBBX, p.HG)

2omo " o dissemos em outro momento, essas pala ras do linguista russo corroboram

a ideia de +ue a poesia não suporta regras absolutas, ainda mais a poesia de poetas

comprometidos com o seu tempo. Esclare/amos, é importante, +ue o poeta russo era

%uturista e, de certa %orma, renega a o cotidiano a %a or do %uturo; essa atitude, porém, não

de e ser entendida como nega/ão do presente. Ele o repudia a, por+ue o %uturo +ue o poeta

perseguia, +uando se erguia no presente (e a$ entram as contradi/Ces p-s8<e olu/ão de 1W),

não era o %uturo +ue ele sonhou, +ue ele a udou a criar. egundo 0aOobson, não se pode

redu ir !aiaO- sOi apenas ao plano da propaganda, nem tampouco interpretar

unilateralmente as causas da morte do poeta. 4 drama de 0aOobson reside e7tamente naindi%eren/a dispensada a alguns poetas da <e olu/ão de 1W. Di ele: IDesculpe8nos por n-s

mesmos e pelos outros, +ue um dia ainda iremos matar... 4 Estado não se responsabili a

pela morte de ninguém; na época de 2risto, esse Estado não entendia o aramaico nem

+ual+uer l$ngua humana. 4s soldados romanos +ue per%uraram as mãos de 2risto não %oram

mais culpados do +ue os pregos +ue a atra essaram, embora reste sempre muita dor aos

sacri%icadosK (GBBX, p.1G). 4 +ue percebemos nessas pala ras é um sentimento de pro%unda

dor diante da brutalidade +ue caracteri ou essa indi%eren/a pela poesia de !aiaO- sOi e deLH

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outros. Esperamos, pois, +ue não aconte/a o mesmo com estes poetas +ue se doaram & ida

e & poesia como %orma de liberta/ão e podem redu ir8se ao ostracismo, caso não

inter enhamos em sentido contr"rio.

0orge mado, escritor brasileiro tradu ido para mais de 3B l$nguas e "rias e es

indicado ao Nobel de #iteratura, embora nunca tenha sido contemplado (também ele,

portanto, não reconhecido como tal e de eria ter sido, por essa inst]ncia de certa

legitima/ão internacional), assim se re%ere a gostinho Neto, no pre%"cio +ue %a & pe+uena

antologia editada pela 2odecri em 1@WX:

N #6? pela independ ncia de ngola, a poesia %oi arma poderosamane ada por gostinho Neto. Na sel a, tanto +uanto a metralhadora, o

%u il, o %acão, a poesia sustentou o ]nimo e alimentou a esperan/a dos

guerrilheiros.

Durante cerca de +uin e anos, a guerrilha cresceu na sel a angolana

trans%ormando8se por %im em e7ército de liberta/ão, sob o comando do

poeta gostinho Neto. Derrotando não apenas as tropas coloniais

portuguesas, em realidade derrubando o regime sala arista na então

metr-pole.

(...)

4 primeiro desses guerrilheiros, o principal, chama8se gostinho Neto,

poeta da mais alta +ualidade liter"ria, dos maiores a escre er em l$ngua

portuguesa, ho e presidente da <ep blica, de uma <ep blica em ésperas

de trans%ormar8se num no o ietname de e es mais tr"gico +ue oanterior.

Em todos os momentos, mado trata Neto de poeta, +uando não de grande poeta,

corroborando com nossas a%irma/Ces. E conclui o autor de conhecid$ssimas obras como

9erras do sem fim e apit+es da areia :

LL

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?omei da m"+uina de escre er para tra/ar algumas considera/Ces liter"rias,

pe+ueno pre%"cio & edi/ão brasileira de uma colet]nea de poemas de

gostinho Neto e acabei por não %alar de poesia e, sim, de independ ncia,

luta, it-ria e amea/as. !as os poemas a$ estão belos, pro%undos, a%ricanos,

poemas de guerra escritos por um homem +ue ama a pa . udaram o po o

na batalha da guerrilha, no amente serão canto de 1uta, de it-ria na no a

batalha " come/ada. ?ambém a publica/ão desses poemas no 'rasil é uma

%orma de contribuir para ngola independente, democr"tica e socialista.

(...)

rande homem do nosso tempo.

*oderão os inad ertidos e os maliciosos di er tratar8se de um companheiro de

comuna e +ue %ala mais com o cora/ão do +ue com o senso cr$tico, tudo bem, é poss$ el até

+ue assim se a, mas não in alida as +ualidades poéticas de Neto.

e amos então o +ue di um dos mais renomados e combati os (e também

combatidos) cr$ticos da atualidade, _arold 'loom, em entre ista publicada na Ler: livros @

leitor , de unho de GB1G:

4h, não sei %a er nada +ue não se a pessoal. 0" era assim +uando comecei a

publicar em 1@LW. *or isso é +ue muita gente não gosta do +ue %a/o. Não

e o para +ue ser e %a er cr$tica liter"ria ou edi/ão cr$tica de literatura se

não %or tão pessoal como a poesia ou algumas ariantes do romance, da

hist-ria ou do drama. cr$tica liter"ria ou %a parte da literatura ou nemde ia e7istir. Eu ensino, penso, leio e escre o de %orma pessoal. lguma e

podia ser de outra maneira %inal andamos todos a+ui para +u

ob eti idade é uma %arsa. ^ um mito. ^ super%icial. sub eti idade pro%unda

não é %"cil V é muito di%$cil V, é a+uilo +ue +ueremos culti ar nas pessoas.

E conclui 'loom +ue, I+uando não se aprecia uma coisa, é melhor não escre ermos

acerca delaK. 5oi e7atamente o apre/o +ue %e 0orge mado escre er sobre gostinho Neto eLX

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é isso +ue me %a debru/ar sobre a sua poética, apre/o +ue nasceu ao ler pela primeira e

em li ro seus poemas, na mesma edi/ão da 2odecri.

c7 Poemas de amor

Neste bloco tem"tico estão os poemas +ue, & primeira lida, são considerados de amor

e não estão relacionados nos blocos anteriores. ão: I2aminho do matoK, I*ara en%eitar os

teus cabelosK, este escrito em BA de mar/o de 1@LW; I`alumbaK, I2ircunst]nciaK, escrito em

BH de maio de 1@LG; INas curtas horasK e IDocementeK, escrito em BH de setembro de 1@L1.

N-s colocamos I2aminho do matoK entre os poemas de amor, embora nos soe como

uma den ncia da e7plora/ão se7ual +ue s- os leitores mais atentos percebem, os incautos,

dei7ando8se enganar pela le e a e musicalidade +ue ele apresenta, o eem como uma sua e

cantiga de amor; ali"s esse poema é uma das modinhas mais cantadas em ngola, musicada

+ue %oi por 5ilipe !uOenga. Da mesma %orma, enganam8se a+ueles +ue eem tão somente

um enleio amoroso em I2arta de um contratadoK, de nt-nio 0acinto e INamoroK, de iriato

da 2ru , +ue serão analisados mais adiante.

4 poema é composto de apenas 1A ersos di ididos em seis estro%es e um estribilho

+ue não aparece no %inal do te7to. ?odo o poema gira em torno da pala ra IcaminhoK +ue

pode ser Ido matoK, Ida genteK cansada em busca de repouso ou de mudan/as; Ido sobaK,

+ue tanto pode ser um l$der tribal, +uanto um representante das %or/as repressoras

coloniais; Ide #embaK, com letra mai scula, +ue pode representar uma di indade ou uma

mulher %ormosa mesmo; Icaminho do amorK, ou Ide lembaK, ou Ido sobaK, nunca é Idagente cansadaK, é preciso oltar a aten/ão para esse detalhe. *or outro lado, I2aminho do

matoK parece destoar um pouco da tem"tica dos poemas até agora analisados, dando8nos

uma ilusão de enleio amoroso, mas é tão s- uma cr$tica a +uem pode des%rutar desse pra er:

o IsobaK, o che%e, é um poema +ue tem um ritmo musical, constru$do & base de poliss$labos

e um re%rão, em estro%es de +uatro ersos, contando o estribilho, ao %eitio das can/Ces, nele

sobressai a %igura de I#embaK: di indade +ue preside a procria/ão, segundo _ouaiss; nele

LW

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h", ao mesmo tempo, lamento e dese o do eu l$rico.

I*ara en%eitar os teus cabelosK, dedicado & esposa do poeta no dia de seu ani ers"rio,

em A de mar/o, dia =nternacional da !ulher, nele o poeta lamenta a dist]ncia +ue os separa,

mas nem assim o eu cai em desespero sentimental, pelo contr"rio, trans%orma o seu sentir

$ntimo em um sentir coleti o: Ié dentro de n-s9+ue mergulham as ra$ es9pelas +uais os

homens9se alimentamK, saindo, portanto, do plano amoroso para o pol$tico: Io nosso

caminho é nico98o amorK: dos amantes ou da humanidade Eis a +uestão. egundo *ires

#aran eira, mesmo nos poemas amorosos, Neto assume uma postura pol$tica. ^ o +ue

também pensamos.

I`lumbaK retrata a migra/ão da Ilinda %ilha do sobaK, +ue sai Ido matoK para acidade, perdendo8se e %a endo perderem8se os homens pelos encantos de seus olhos, na

cidade ela ai se tornando uma espécie de maldi/ão, não caracteri ando erdadeiramente

um poema de amor, mas de cho+ue cultural.

Em I2ircunst]nciaK, a %ome das crian/as negras é comparada com a aus ncia do ser

amado Isua e e dolorosa9distinta e m ltiplaK, mais uma e o eu trans%orma o +ue seria uma

crise sentimental em e7istencial.

4s dois ltimos, INas curtas horasK e IDocementeK, mant m a mesma oscila/ão

a%eti o8amorosa ersus pol$tico9e7istencial, a indi idual ersus a coleti a. No primeiro, o eu

tende a re%letir sobre a aus ncia do ser amoroso e o +ue essa aus ncia lhe pro oca, nas duas

estro%es %inais, no entanto, as pala ras ganham uma ambiguidade terr$ el, saindo do plano

pessoal para o coleti o, assinalados pelas e7pressCes I%eraK, ImedoK, Isemente portentosa

da chegadaK, Ia ornada insana das lutas itoriosas9o grito no caminho %irme para a idaK,

para depois recair no amente sobre o pessoal Io meu grito na tua o K e Io meu dese o nos

teus olhosK, é como se o grito do eu representasse a con+uista da liberdade dele e do po o,

+ue é também do ser amado.

4 segundo é o nico poema de Neto, tal e , +ue tem uma conota/ão amorosa mais

purista, mesmo assim sem descer aos arrebatamentos das pulsa/Ces sentimental-ides, ha a

ista a cumplicidade +ue e7altam as duas ltimas estro%es a %a or de uma amplia/ão do

sentimento amoroso ao I6ni ersoK e ao ImundoK.LA

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d7 Poemas ,an-a1r can stas e 0n versa s8 a ren:nc a m,oss2vel

4 mo imento liter"rio dos negros norte8americanos, +ue nosanos 3B muito se discutiu na Europa, antecedeu o despertardos a%ricanos para a conscienciali a/ão dos seus pr-prios

alores. 2oube & elite negra dos Estados 6nidos o tomar dasrédeas das rei indica/Ces dos po os negros. Era para eles +ue,parado7almente, se dirigiam as esperan/as dos negros de[%rica. itua/ão tanto mais aberrante +uanto a acti idade dosnegros da mérica, se proclama a a liberdade e a usti/a paratodos os homens, inseria8se num conte7to nitidamenteamericano: era o problema particular dos Estados 6nidos +ueesta a em ogo e s- indirectamente o renascimento cultural de[%rica. De +ual+uer %orma, %oi a arrancada da elite negrada+uele pa$s +ue antecedeu o mo imento negro +ue, ap-s a

ltima guerra, ganhou corpo em *aris e #ondres.

(...)

4 mo imento da negritude era pan8a%ricanista, sem d ida...mas, de rai cultural no seu in$cio. e no campo da culturatodos os seus adeptos se uniam, na descida ao dom$nio dasIcoisasK pol$ticas as di erg ncias podiam ser pro%undasK(Mensagem , ano 7 , unho X3, n G, p.@)

Neste bloco estão os poemas pan8a%ricanistas em sua ess ncia e a+ueles +ue t m

uma %ei/ão mais uni ersal, sem uma associa/ão direta, com e7pressCes e7pl$citas ao

negritudinismo particulari ado. ão eles: IDes%ile de sombrasK, escrito em 1@HA; I ombrasK,

I spira/ãoK, escrito em 1@H@; INão me pe/as sorrisosK, escrito em 1@H@; I6m ni ers"rioK,

escrito em setembro de 1@L1; IEu8!istérioK, escrito em 1@HW; I nestesiaK, I o do sangueK,

escrito em 1@HA; I*assei a idaK, escrito em 1@HA; I into na minha o K, escrito em 1@H@;INo o rumoK, escrito em 1@LB; I*oema para todosK, I ntigamente eraK, INoite escuraK,

I manhecerK, I*aredes elhasK, I'oogie8RoogieK, I'ailaricoK, I_omenagem a 0oa+uim 5orte

5ariaK, escrito em maio de 1@LB, +uando o autor era +uartanista de 2i ncia, em 2oimbra;

I obre o sangue ainda +uente do meu irmãoK e o %ant"stico I ren ncia imposs$ elK.

4 pan8a%ricanismo é um mo imento, surgido nos E6 , +ue tem como ob eti o a união

de todos os po os de [%rica como %orma de potenciali ar a o do continente no conte7to

L@

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internacional. 4 pan8a%ricanismo tem sido mais de%endido %ora de [%rica, entre os

descendentes dos escra os a%ricanos +ue %oram le ados para as méricas até ao século \=\ e

dos emigrantes mais recentes. Ele propCe a unidade pol$tica de toda a [%rica e o

reagrupamento das di%erentes etnias, $timas da di"spora imposta pelos coloni adores.alori a a reali a/ão de cultos aos ancestrais e de%ende a amplia/ão do uso das l$nguas

a%ricanas.

_" +uem de%ina o *an8a%ricanismo como um mo imento pol$tico, %ilos-%ico e social

+ue promo eu a de%esa dos direitos do po o a%ricano e da unidade do continente a%ricano no

]mbito de um nico Estado soberano, para todos os a%ricanos, tanto na [%rica como em sua

di"spora. 5oi desen ol ido, a partir de meados do século \\, por Rilliam EdFard 'urghardt

Du 'ois e !arcus !osiah ar e>, entre outros, e posteriormente le ado para a arena pol$tica

por a%ricanos como `Fame NOrumah. No 'rasil %oi di ulgado amplamente por bdias do

Nascimento. *ara `abengele !unanga, podemos considerar o Dr. Rilliam EdFard 'urghardt

Du 'ois como o pai do *an8 %ricanismo e #angston _ughes o maior representante do

<enascimento Negro.

^ um mo imento social, com "rias ertentes, mas também liter"rio e pol$tico, +ue

tem seu in$cio ainda no século \=\. 4 *an8 %ricanismo tem in%luenciado a [%rica, pro ocando

pro%undas altera/Ces em seu +uadro pol$tico, tendo sido mesmo decisi o para a

independ ncia dos pa$ses a%ricanos. 4 pan8a%ricanismo também in%luenciar" o mo imento da

Negritude na Europa e, particularmente, na [%rica de l$ngua portuguesa, e identemente, e

tanto Du 'ois +uanto _ughes serão sempre lembrados como %omentadores dos mo imentos

negritudinistas posteriores e igualmente prestigiados pelos no os intelectuais da Europa e de

[%rica.

oltando & poesia de Neto, os dois primeiros poemas se complementam e o poeta se

comporta como uma espécie de condutor dessas sombras: passadas, presentes e %uturas,

condenadas & iol ncia das incerte as, e7postas &s intempéries da pr-pria ida,

meta%ori adas na %igura da IpraiaK a receber o %lu7o e re%lu7o das IondasK, bem como Ia

brutalidade das +uilhas dos na iosK e a Irecolher a ang stia e os ltimos suspiros dos

n"u%ragosK.

XB

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*ro%ético, como em I hora da largadaK, é IEu sou a+uele por +uem se esperaK, com

esse eu +ue anuncia a liberta/ão dos +ue hão de ir, recebendo uma [%rica no a,

con+uistada ao sacri%$cio das IsombrasK +ue se doaram para +ue os indouros %ossem

portadores de uma no a ordem social, de uma no a I idaK inspirada nos princ$pios daigualdade, da usti/a e da %raternidade, tr$ade constante nos discursos pol$tico e poético de

gostinho Neto.

*artindo do local para o uni ersal, o eu, mais uma e , (con)%unde8se no tu, %ormando

o n-s: Ide tiK Ide mimK, em busca de todas as "%ricas do mundo, I"%ricaK com letra

min scula, para simular a sinédo+ue, e não a meton$mia, +ue representa.

4 belo poema INão me pe/as sorrisosK, n-s o classi%icamos como uni ersal por+ue,lido %ora de sua conte7tuali a/ão hist-rica, ganha outra dimensão, representa a sua crise

e7istencial, pois o eu se incapa do IrisoK e da Igl-riaK em irtude da opressão em +ue se

encontram ele e seu po o, tanto podendo ser um eu, oc ou +ual+uer outra gente $tima

das mesmas imposi/Ces imperialistas. ssim se comportam outros poemas de Neto, como,

por e7emplo, I6m ani ers"rioK, +ue é, pois, autobiogr"%ico, ressaltando, porém, mais a

indi%eren/a pelo passar de seus anos, do +ue seu bilo, como s-i acontecer. En+uanto

perdurarem as distor/Ces sociais, não s- em [%rica, esse dia ser" sempre in til, até +ue sur a

I6m dia9mas duma inutilidade necess"riaK, por ora não h" nada a comemorar, com +ue

re ubilar8se: nem pela passagem dos anos, nem pelo %ato de estar cursando !edicina, o eu

est" sempre & busca da paridade.

4bser emos a le e a destes ersos: I liberdade nos olhos9o som nos ou idos9das

mãos " idas sobre a pele do tambor9num acelerado e claro ritmo9de Yaires 2ala"ris

montanhas lu K, contrariando as agita/Ces %eéricas de outros momentos, sem o seua "%ama... Em I4 caminho das estrelasK amos encontrar uma descri/ão sua e do continente

a%ricano atra és do Ipesco/o da ga elaK como a unir o corpo de [%rica ao resto do mundo e a

estender sua mão & da humanidade num gesto ine+u$ oco de pa , não de subser i ncia, de

amor, de harmonia, incessante re%erencial na poética netiana.

Não poder$amos, em erdade, dei7ar de destacar, dentro da obra de gostinho Neto,

a+uele +ue é uma das mais belas p"ginas " escritas das literaturas de l$ngua portuguesa: I A

X1

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ren:nc a m,oss2velK, compar" el aSong of m self , de Rhitman, ,de triunfal , de *essoa,

ahier dBun retour au pa s natal , de 2ésaire e $oema suCo, de ullar. poesia de Neto tem

um signi%icado para os angolanos compar" el & de 2amCes para os portugueses.

= celebrate m>sel%, and sing m>sel%,

nd Fhat = assume >ou shall assume,

5or e er> atom belonging to me as good belongs to >ou.

(R_=?! N, GBBB)

<ememorando8se (como negro) nesse important$ssimo poema I ren ncia

imposs$ elK, ele assume a plenitude hist-rica do Eu8mistério +ue constitui oponto de partida da sua acti idade de poeta e homem de ac/ão.

(...)

^, singularmente, dois nicos poemas, dos cerca de sessenta publicados,

bastariam para mostrar o processo dialéctico de toda a obra produ ida V I

ren ncia imposs$ elK V , a +ual assenta sempre sobre os termos antitéticos.

D4< V #E <=

E 2< =DU4 V #='E<? TU4

E *E< NT V 2E<?EY

_6!=#_ TU4 V # <=

*ara a%irmar a s$ntese;

4*<E U4 V 24N 2=ZN2= V #='E<D DE

unidade estético8ideol-gica +ue en%orma todo o processo poético, de

gostinho Neto est" tão consubstanciada na+ueles dois poemas, +ue se

deu o caso V olunt"rio ou não V de um dos ersos %inais do primeiro,

escrito em 1@H@, entrosar per%eitamente na parte %inal do segundo, escrito

em 1@XB, para produ ir a necess"ria unidade dos contr"rios V e completar,

assim, o mo imento dialéctico, como se o poeta desse por conclu$da a

pr-pria cria/ão uni ersalJ

(24 !E, s9d)

*or isso +uando comparamos a poesia de Neto com a épica de 2amCes, é pela suaXG

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import]ncia hist-rica, lingu$stica, c$ ica e moral para o po o a%ricano de l$ngua portuguesa,

sem perder seu car"ter particular de angolanidade. e 4s #us$adas de 2amCes é a grande

obra8prima dos lusitanos, I ren ncia imposs$ elK de Neto h" de ser a obra8prima dos

angolanos, sem sombra de d idas, e h" de ser ensinado, encenado e lido nas escolas, nosteatros e nas ruas de ngola, pois o seu uni ersalismo e a sua alori a/ão de em partir de

sua IaldeiaK.

2omparamos com Song of m self por sua %or/a transgressora nos campos estrutural e

lingu$stico, por sua doa/ão & ida e & humanidade, por sua multiplica/ão de IeusK na busca

da coleti idade, do In-sK, por sua doa/ão incontest" el ao outro:

= am satis%ied V = see, dance, laugh, sing;

s the hugging and lo ing bed8%elloF sleeps at m> side through

the night, and FithdraFs at the peep o% the da> Fith

stealth> tread,

#ea ing me basOets co erSd Fith Fhite toFels sFelling the house

Fith their plent>,

hall = postpone m> acceptation and reali ation and scream at m>

e>es,

?hat the> turn %rom ga ing a%ter and doFn the road,

nd %orthFith cipher and shoF me to a cent,

E7actl> the alue o% one and e7actl> the alue o% tFo, and Fhich is

ahead

(IEstou satis%eito V e o, dan/o, rio, canto;9 uando o companheiro amoroso

dorme abrac/ado a mim durante a noite e depois9 ai embora ao raiar do

dia com passos silenciosos,9Dei7ando para mim cestas cobertas com toalhas

brancas enchendo a casa com sua %artura,9De o adiar minha aceita/ão e

compreensão, e gritar a meus olhos,9*ara +ue dei7em de %itar a estrada,9E

imediatamente calculem e mostrem até o menor centa o,94 alor e7ato de

um e o alor e7ato de dois, e +ual ai na %rente K)

(trad. de ndré 2ardoso, in R_=?! N, p.1L)

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pelo amor I roFing among blacO %olOs as among Fhite,9`anucO, ?ucOahoe, 2ongressman,

2u%%, = gi e them the same,=9 recei e them the sameK, pela sabedoria pro%ética com +ue

prega em seus ersos ou %rases poéticas a %raternidade uni ersal:

E er> Oind %or itsel% and its oFn, %or me mine male and %emale,

5or me those that ha e been bo>s and that lo e Fomen,

5or me the man that is proud and %eels hoF it stings to be slighted,

5or me the sFeet8heart and the old maid, %or me mothers and the

mothers o% mother t

5or me lips that ha e smiled, e>es that ha e shed tears,

5or me children and the begetters o% children.(I2ada tipo para si mesmo e para o +ue é seu, para mim o +ue é meu,

macho e % mea,9*ara mim a+ueles +ue %oram meninos e +ue amam as

mulheres.9*ara mim o homem orgulhoso +ue sabe como d-i ser

desrespeitado,9*ara mim a namorada e a elha solteirona, para mim as

mães e as mães das mães,9*ara mim l"bios +ue " sorriram, olhos +ue "

erteram l"grimas,9*ara mim as crian/as e a+ueles +ue geram as crian/asK,

trad. de ndré 2ardoso, in R_=?! N, p.1W)

2omparamos ao de *essoa por sua transgressão, por seu igor -dico, +ue em Neto,

ganhar" outra dimensão, não como:

Em %ebre e olhando os motores como a uma Nature a tropical V

randes tr-picos humanos de %erro e %ogo e %or/a V

2anto, e canto o presente, e também o passado e o %uturo,

*or+ue o presente é todo o passado e todo o %uturo

Em Neto h" essa I%ebreK, mas não da (impro " el) humani a/ão da m"+uina como

+ueria 2ampos, um heter-nimo pessoano %uturista, e, portanto, empolgado com o

mo imento e a industriali a/ão:

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h, poder e7primir8me todo como um motor se e7primeJ

er completo como uma m"+uinaJ

*oder ir na ida triun%ante como um autom- el ltimo8modeloJ

*oder ao menos penetrar8me %isicamente de tudo isto,

<asgar8me todo, abrir8me completamente, tornar8me passento

todos os per%umes de -leos e calores e car Ces

Desta %lora estupenda, negra, arti%icial e insaci" elJ

4 poeta angolano, mar7ista +ue era, busca a humani a/ão do ser perdido e7atamente

nessa para%ern"lia chamada progresso +ue desumani a e separa os indi $duos por classe,nesse ponto os dois poetas di ergindo %rontalmente, embora, num determinado momento, o

lado %uturista do poeta portugu s +ueira negar o seu lado marinettiano:

h, e a gente ordin"ria e su a, +ue parece sempre a mesma,

ue emprega pala rCes como pala ras usuais,

2u os %ilhos roubam &s portas das mercearias

E cu as %ilhas aos oito anos V e eu acho isto belo e amo8oJ V

!asturbam homens de aspecto decente nos ãos de escada.

gentalha +ue anda pelos andaimes e +ue ai para casa

*or ielas +uase irreais de estreite a e podridão.

!ara ilhosa gente humana +ue i e como os cães,

ue est" abai7o de todos os sistemas morais,

*ara +uem nenhuma religião %oi %eita,

Nenhuma arte criada,Nenhuma pol$tica destinada para elesJ

2omo eu os amo a todos, por+ue sois assim,

Nem imorais de tão bai7os +ue sois, nem bons nem maus,

=nating$ eis por todos os progressos,

5auna mara ilhosa do %undo do mar da idaJ

XL

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Neto repudia essa e asão (embora sua poética se a constru$da na base dos

contr"rios), se a atra és do "lcool ou de +ual+uer outra %onte de alucina/ão, o +ue se

con%irma no %inal de I ren ncia imposs$ elK, penitenciando8se, com ironia in ulgar:

I*erdoem8me os cinco minutos de loucura9+ue i iK.

2omparamos ao do poeta antilhano imé 2ésaire, por sua corrosi a repulsa +ue %a &

miséria e & e7clusão do negro, sempre ilipendiado pelo branco empedernido na sua cultura:

Et ni lSinstituteur dans sa classe, ni le pr tre au catéchisme ne pourront tirer

un mot de ce négrillon somnolent, malgré leur maniere si énergi+ue & tous

deu7 de tambouriner son cr]ne tondu, car cSest dans les marais de la %aim+ue sSest enlisée sa oi7 dSinanition (un8mot8un8seul8mot et e8 ous8en8

tiens8+uitte8de8la8reine8'lanche8de82astille, un8mot8un8seul8mot, o>e 8

ous8ce8petit8sau age8+ui8ne8sait8pas8un8seul8des8di78commandements8de8

Dieu)

2ar sa oi7 sSoublie dans les marais de la %aim,

et il nS> a rien, rien & tirer raiment de ce petit aurien,

+uSune %aim +ui ne sait plus grimper au7 agr s de sa oi7

une %aim lourde et eule,

une %aim ense elie au plus pro%ond de la 5aim de ce morne %améli+ue

(IE nem o mestre na escola, nem o padre no catecismo poderão arrancar

uma pala ra desse negrinho sonolento, apesar da sua sua maneira tão

enérgica de tamborilar sobre seu cr]nio raspado, pois %oi nos p]ntanos da

%ome +ue se a%undou sua o de inani/ão (uma8pala ra8uma8pala ra8uma8s-8pala ra e eu8me8dou8por8sati%eito8com8a8rainha8'ranca8de82astela, uma8

pala ra8uma8s-8pala ra, e am8esse8burguesinho8+ue8não8sabe8um8s-8dos8

dos8de 8mandamentos8de8Deus)

pois sua o se es+uece nos p]ntanos da %ome,

e não h" nada a tirar, erdadeiramente nada desse pe+ueno e adio,

e7ceto uma %ome +ue " não sabe mais subir nas escalas da sua o

XX

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uma %ome pesada e co arde,

uma %ome sepulta no mais %undo da 5ome desse triste %amélicoK trad. #ilian

*estre de lmeida in. 2^ =<E, p.1H)

2omparamos ao de 5erreira ullar por ser o poeta brasileiro igualmente mar7ista e

militante na luta contra as distor/Ces sociais, sendo o seu poema uma das obras8primas da

literatura brasileira, não sem antes ter sido e7ecrado como %onte de pala rCes, escrito +ue

%ora na época da ditadura militar brasileira e no e7$lio.

4 poema de Neto possui 31A ersos, brancos e li res, distribu$dos por XB estro%es

irregulares e est" di idido em duas partes: nega/ão e a%irma/ão, numa clara alusão &dialética de !ar7 e Engels, uma e +ue os princ$pios mar7istas é +ue são o seu etor.

4 eu poético, do erso 1 ao GA, opera uma constru/ão destituti a do ser negro como

pro oca/ão do homem branco, de %orma niilista, a +ue este reconstrua a hist-ria sem o

elemento negro escra i ado ao longo dos séculos. uando atinge o est"dio I eroK, +ue a+ui

tem uma +ualidade de IascensãoK e não de descensão, o eu parece assumir um posto

espectador, atra és do +ual apreciar" o no o de ir dos tempos, não sem antes IgritarK ao

mundo: IV 5ui eu +uem renunciou & idaJ9*odeis continuar a ocupar o meu lugar9 -s os +ue

mo roubastesK, a ren ncia é, pois, uma escolha, é olunt"ria, mas também uma ingan/a, a

anula/ão total do passado e do presente representa a indi%eren/a e a e7pectati a de como a

burguesia, para usar um termo mar7ista, se sair" sem o su eito da e7plora/ão, é a total

desobedi ncia ci il, muito clara nos ersos LL a WA. INão contem comigo9<enuncio8me.9Eu

atingi o eroK: " +ue nada alho, não sir o para ser ir8lhes. té o IapartheidK " não é mais

necess"rio, por isso:

*odeis agora +ueimar

os letreiros medrosos

+ue &s portas de bares, hotéis e recintos p blicos

gritam o osso ego$smo

nas %rases: I * < '< N24 K ou I4N# ?4 24#46<ED !ENK

Negros a+ui. 'rancos acol".XW

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total ren ncia do eu se trans%orma na da ra/a negra e aos poucos e olui para uma

ironia m-rbida:

*odeis trans%ormar em toureiros

ou em magare%es

os membros da `u8`lu78`lan

para +ue matem a sua %ome sanguin"ria

nas %eridas dos touros +ue descem & arena.

Não h" negros para lincharJ

^ a er e irMnica de um eu indignado +ue trans%orma o seu suic$dio de maso+uista em

Is"dicoK, o +ue autentica a %or/a irMnica do discurso, nitidamente di%erenciado do discurso

dominante:

?oda a ri+ue a representa agora o suor do rosto

e o suor do rosto é a poesia da ida.

(...)" de encher os salCes

de Debuss>, trauss, `orsaOo%%.

0" não h" sel agens na terra

i a a ci ili a/ão dos homens superiores

em manchas negr-ides

a perturbar8lhe a estéticaJ

_" um consciente deboche contra a arte ocidental e a sua hist-ria: é a cor da pele

+ue promo e a dimensão estética. nega/ão é a con%irma/ão irMnica dos eu%emismos

utili ados pela ci ili a/ão ocidental para mitigar sua conduta ine7plica elmente desumana e

hip-crita, atitudes alimentadas pela =gre a como institui/ão dos brancos e religião, -pio, do

po o, é como di !ar7 e Engels em seu mani%esto: IDa mesma %orma +ue os padres sempre

caminharam de mãos dadas com os senhores %eudais, o socialismo clerical caminha, lado a

XA

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lado, com o socialismo %eudalK.

^, então, a indi%eren/a a arma com +ue o eu poético se inga, pois tem consci ncia de

sua import]ncia na constru/ão do mundo ocidental, " denunciada em outros poemas antes

analisados.

Do erso GG1 ao G3B, o eu imprime um tom de re olta (Iraios os partamK), para

depois di er I=de para o diaboJK, retomando, porém, em seguida seu discurso de nega/ão,

agora dirigido diretamente ao negro9irmão, como se nos ersos GLX a GXX. 4 nada a +ue

chegam os Ipretos submissos, humildes ou t$midosK é sinMnimo de grande a: I abei +ue

subistes todos de alorK, pois Isal astes o _omemK, assim com letra mai scula. al ou, não

s- o homem, mas o mundo, ironicamente, com a total anula/ão do negro, sem ser suadesapari/ão. ^ importante notar +ue em toda essa parte o eu poético dirige8se a um

interlocutor de segunda pessoa do plural, um -s, geralmente utili ado para tratamento

solene, +uando nos dirigimos a um ser eminente, superior. segunda parte, a a%irma/ão,

come/a com um pedido de lucide I5a/a8se lu no meu esp$ritoK, o erso lembra a e7pressão

latina fiat lux , +ue signi%ica, dentre outras coisas, o no o, o in$cio e, na b$blia, o contr"rio de

escuro, da noite, como se pode constatar no nesis. No poema, é o islumbre do no o e a

nega/ão da nega/ão, por isso a%irma/ão, assim o eu poético d" um no o testemunho: o +ue

no caso do poema ganha uma outra conota/ão em irtude da linguagem irMnica +ue

predomina ao longo dos ersos:

Eu8todos nunca me negarei

Nunca coincidirei com o nada

não me deitarei nunca debai7o dos comboios(...)

uem %alou não %ui eu

5oi a minha loucura.

4 meu lugar est" marcado

no campo da luta

para con+uista da ida perdida

X@

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Essa retomada de consci ncia e olui para a declara/ão da IlutaK a ser tra ada em

busca Ida ida perdidaK. gora IEu sou. E7istoK, a%irma8se, repete8se, rati%ica8se, mais uma

e o +ue %oi dito no poema I2on%ian/aK, alidado na senten/a: I s minhas mãos colocaram

pedras9nos alicerces do mundo9?enho direito ao meu peda/o de pãoK, rati%ica8se, portanto, aparticipa/ão da ci ili a/ão a%ricana no erguimento da ci ili a/ão ocidental.

4 eu retoma a consci ncia de seu I alor positi oK, da +ual amais se a%astou, de sua

parte da humanidade, e sentencia: I eguirei com os homens li res9o meu caminho9para a

liberdade e para a idaK, para %echar, mais uma e , ironi ando a+ueles +ue por entura

acreditaram na possibilidade de sua ren ncia: I*erdoem8me os cinco minutos de

loucura9+ue i iK.

e7 %eto e s0a consc >nc a cr2t co-est?t ca

p-s a an"lise da obra de Neto, restam8nos algumas considera/Ces a respeito de sua

consci ncia cr$tico8estética do %a er poético; para tal, nos baseamos em seus pr-prios

poemas e nos seus discursos em prosa reali ados em di ersas circunst]ncias e também na

opinião de alguns especialistas de sua obra.

ntes de mais nada, gostar$amos de apresentar uma pe+uena lista de poemas de

Neto +ue %oram musicados: I'ou+uet de rosas para tiK, INoite na +uitandaK, I elho negroK,

I2on%ian/aK, I*ara en%eitar os teus cabelosK, I_a emos de oltarK (musicado e interpretado

por *ablo !ilanés, cantor e compositor cubano, reconhecido internacionalmente), I deus &

hora da largadaK e I +uitandeiraK, por <ui !ingas.

5oi lan/ado, em setembro de GB1G, o li ro Agostinho Neto e a Luta de Liberta%+o de

Angola0 DEFE-DEGF, a obra, constitu$da por cinco olumes, com mais de H.BBB p"ginas,

elaboradas a partir de mais de X.BBB documentos e7istentes na ?orre do ?ombo, em #isboa,

ilustrando Po muito trabalhoP +ue o %undador do !o imento *opular de #iberta/ão de

ngola (!*# ) deu & pol$cia pol$tica portuguesa *=DE9D . I ren ncia imposs$ elK %oi

interpretada por GB atores, durante LL minutos, em #uanda, pelo grupo de teatro da 6.!. .WB

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lém do poema matricial de ngola, mais de 1X poemas de Neto %oram interpretados na

$ntegra. pe/a le a o nome de INeto, *ai, migo e 2amaradaK. Em abril de GB1H, %oi lan/ado

o li ro A no%+o do ser , sob coordena/ão do pro%essor, cr$tico e historiador das literaturas e

culturas a%ricanas de l$ngua portuguesa *ires #aran eira e na ?. <ocha, mestra em literaturasa%ricanas de l$ngua portuguesa e doutoranda da orbonne Nou elle 8 3. 2ada e mais, são

sintomas da import]ncia da sua obra.

Em gostinho Neto, por mais +ue notemos as in%lu ncias pol$ticas de imé 2ésaire,

#angston _ughes, Nicol"s uillén, as estéticas do heterMnimo [l aro de 2ampos, de Ralt

Rhitman, no amente uillén e imé 2ésaire, percebe8se claramente uma aut ntica

concep/ão poética na constru/ão origin"ria da literatura angolana. Da id !estre, poeta e

membro da ssocia/ão =nternacional dos 2r$ticos #iter"rios, em seu li ro Nem tudo é poesia ,

assim se re%ere a Neto:

!as, antes da celebridade a +ue o le aria a sua ida pol$tica marcada pelo

tra/o %orte das con ic/Ces pro%undas, gostinho Neto %oi o nome +ue

subscre eu com a sua assinatura de caligra%ia caprichosa, a maioria dos

primeiros te7tos +ue para sempre %i7aram a impossibilidade de ane7a/ão daliteratura angolana pela literatura portuguesa, na sua l$ngua. Desconhecida

internacionalmente, a poesia angolana encontra8o entre a primeira soma de

poesia negra de e7pressão portuguesa (#isboa, 1@L3) apresentada ao

!undo. partir de então, as principais re istas de di ulga/ão e debate dos

alores a%ricanos em l$ngua %rancesa e inglesa, tradu em os seus ersos e

propCem8nos & opinião p blica +ue imediatamente se apercebe da

import]ncia hist-rica, social e pol$tica +ue a sua linguagem poética

transporta.

(...)

2om e%eito %oi gostinho Neto um de%ensor intransigente do mais alargado

debate de ideias, do mais amplo mo imento de in estiga/ão, dinami a/ão e

apresenta/ão p blica de todas as %ormas culturais e7istentes em ngola,

sem +uais+uer preconceitos de car"cter art$stico ou lingu$stico, o +ue

iabili ou a ri+ue a de e7peri ncias na di ersidade +ue é ho e a literaturaW1

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angolana. ^ neste esp$rito +ue disponibili a os escritores para a escolha dos

meios e7pressi os +ue melhor lhes aprou er, sem comple7os de

subalternidade em rela/ão ao chamado realismo socialista.

ão depoimentos como esses +ue alidam a nossa a%irma/ão de +ue, ao %alarmos de

Neto, estamos, indubita elmente, diante do grande poeta da literatura angolana, cMnscio de

sua estética e de seus ob eti os liter"rios. e amos o pr-prio ate atra és de alguns trechos

seus sobre literatura:

?odos n-s, creio, +ue concordamos em +ue o escritor se de e situar na sua

época e e7ercer a sua %un/ão de %ormador de consci ncia, +ue se a agente

acti o de um aper%ei/oamento da humanidade.

(...)

*or+ue não se pode es+uecer o no o %actor hist-rico introdu ido na

realidade angolana e constitu$do pela independ ncia e pela liberdade.

(...)

Durante as lutas de liberta/ão nacional, hou e tentati as sérias de seguir o

no o caminho. !as sem resultados signi%icati os. *or+uanto, a recon ersão

cultural não pode ser %eita pelas nossas condi/Ces, em uma s- gera/ão. 4

es%or/o, eu estou seguro disso, ser" %eito. !as os seus e%eitos s- se %arão

sentir muito mais tarde, +uando as condi/Ces materiais %orem

su%icientemente determinantes de uma no a consci ncia.

(...)

igni%ica i er a ida do po o e, para os +ue t m preocupa/Ces liter"rias,

saber retirar dos sentimentos, das aspira/Ces e dos momentos, da _ist-ria,

os elementos necess"rios para a sua tare%a art$stica (NE?4).

WG

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^ importante percebermos como gostinho Neto, ao modo de 4sFald de ndrade,

constr-i um pensamento antropo%"gico sobre a cultura angolana, sem chau inismos, uma

%orma alargada e consciente de er as coisas, de compreender as trans%orma/Ces. Em seu

discurso reali ado +uando da tomada de posse dos membros da 6nião dos Escritoresngolanos, reali ada em BA de aneiro de 1@W@, declara: IE identemente, a cultura não pode

inscre er8se no chau inismo, nem pretender e itar o dinamismo da idaK. Esse olhar

antropo%"gico não diminui a sua no/ão de angolanidade, apenas o distancia das incursCes

estereotipadas do Irealismo socialistaK:

e os estimados camaradas e colegas me permitem, direi +ue não podemos

cair em es+uemas ou estere-tipos como os te-ricos do realismo socialista.

par de nossa capacidade nacionalista, teremos de inter ir de modo a

inscre er8nos no mundo. medida +ue %ormos assumindo a realidade

nacional.

(...)

cultura angolana é a%ricana, é sobretudo angolana, e por isso sempre

consideraremos ultra ante a maneira como o nosso po o %oi tratado por

intelectuais portugueses.

(...)

!as, no meu entender, ser" necess"rio apro%undar as +uestCes +ue

deri am da cultura das "rias na/Ces angolanas, ho e %undidas numa, dos

e%eitos da acultura/ão dado o contacto com a cultura europeia e a

necessidade de nos pormos de acordo sobre o apro eitamento dos agentespopulares da cultura e %a ermos em ngola uma s- corrente compreensi a

da mesma.

!ais adiante, o ensa$sta Neto propCe a democrati a/ão dos debates acerca das ideias

culturais pro indas do no ostatus *uo de ngola: I*enso +ue é necess"rio o mais alargado

poss$ el debate de ideias, o mais amplo poss$ el mo imento de in estiga/ão, dinami a/ão eW3

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apresenta/ão * blica de todas as %ormas culturais e7istentes no *a$s, sem +uais+uer

preconceitos de car"cter art$stico ou lingu$sticoK.

!uitos dos a%orismas dos mani%estos *au 'rasil (1@GH) e ntrop-%ago (1@GA), de

4sFald de ndrade, amos encontrar em toda a poesia de ngola do per$odo da Mensagem,

notadamente em gostinho Neto, nt-nio 0acinto e iriato da 2ru .

obre a literatura produ ida no per$odo em +uestão, assim se e7pressa !"rio de

ndrade, no pre%"cio +ue %a & Antologia tem)tica de poesia africana: canto armado :

poesia continua a ser o dom$nio pri ilegiado e o mais imediato da

e7pressão liter"ria de liberta/ão nacional.

(...)

?omando a %orma de lamento l$rico, de elegia ou de epopeia, essa poesia

constitui a re%er ncia primordial da tradi/ão liter"ria da resist ncia a%ricana.

(...)

Esses poetas cantam uma realidade +ue em bre e ser" ultrapassada pela

pr-pria e olu/ão do combate pol$tico.

(...)

^ assim +ue, por olta de 1@XB, a poesia a%ricana de combate se caracteri a

por uma tem"tica pan8a%ricana.

(...)

Noutros termos: rali a8se a coincid ncia entre o enga amento pol$tico, a

presen/a %$sica no pr-prio terreno da luta e a e7pressão militante na poesia.

E, para ilustrar, %a cita/Ces de ersos de gostinho Neto: I iol ncia9 o es de a/o ao

sol9=ncendeiam a paisagem " +uenteK, pois é da materiali a/ão do compromisso com a luta

armada +ue Ielabora8se também uma no a tem"tica da e7pressão liter"riaK, no di er deWH

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ndrade. E a+ui de emos ressal ar Ios no os actores sociais na cena da hist-ria: o po o e, no

seu seio, os guerrilheiros. 2onstituindo a luta armada um %acto cultural por e7cel ncia, ela

introdu , acima de tudo, as condi/Ces %$sicas, materiais e intelectuais da liberdade de

cria/ãoK. Nas regiCes libertadas, ao contr"rio, a caracter$stica essencial da poesia ad ém dasua linguagem clara e direta.

^ preciso salientar, diante dessas cita/Ces, +ue a poesia de combate não dispensa o

e7erc$cio técnico da poesia. 2ontinua o cr$tico, IEntretanto, a %or/a de inspira/ão e o talento

poético indi iduais superam muitas e es a %alta de i ncia no terreno da lutaK. ( ND< DE,

1@W@)

e pegarmos esses %ragmentos e outros do mesmo ensaio, teremos um mani%esto dapoesia a%ricana de l$ngua portuguesa numa ertente similar aos de 4sFald de ndrade,

embora as circunst]ncias hist-ricas %ossem bem di%erentes umas das outras.

obre a presen/a da m sica e da dan/a na obra de gostinho Neto assim se reporta

\osé #ois arc$a:

Só as vo1es0 sen ningun instrument nen dan1a0 elevan este himno monódico

polo futuro0 pola pa1 e o amor dunha Africa unida0 Agostinho Neto insiste0

tanto na ancestralidade como no universo tel<rico da realidade de Africa6 H

un dos poetas africanos con maior insistencia sobre a importancia da

7Negritude8 e da africanidade *ue a expressa con todo sentimento *ue fluie

do seu ser africano e *ue se manifesta na dan1a e nos canticos *ue0 mais

*ue estar ao servicio dun ritual0 est)n manifestando a emanación dun

pensamento e dunha pauta social e espiritual de conducta6 /staafricanidade0 en todos os seus compoentes0 lexitiman esa unción continental

*ue revela o poeta nos seguintes versos:

imJ

& interroga/ão m"gica de ?alamungongo

do 2unene ou do !aiombe,

ao sonoro c]ntico de ritmo subterr]neo

WL

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e dos chamamentos tel ricos;

aos tambores

apelando para o %io da ancestralidade

esbatida a+ui e além;

ao ponto interrogati o de !adag"scar.

*ara arc$a, como para n-s também, a dan/a e a m sica %uncionam como

sustenta/ão poética na obra de gostinho Neto. No entender do ensa$sta galego, os tam8tans

e os batu+ues são linguagem i a e certeira de todos os grupos sociais de [%rica, não apenas

nos cerimoniais, mas também para emitir mensagens de guerra ou de pa . Essas

mani%esta/Ces, tanto na dan/a como na m sica, estão inculadas & grande mensagem dapoesia a%ricana, em particular, & de gostinho Neto, impregnada de boa dose musical. E, para

ilustrar, cita alguns ersos do poema I "bado nos musse+uesK; são eles: I nsiedade9no som

da iola9acompanhando uma o 9+ue canta sambas inde%inidos9deliciosamente

pregui/osos9pe ando o ar9do dese o de romper em prantoK. ão muitos os e7emplos dessas

imagens na poesia de Neto, pelo +ue completemos com mais um e7emplo citado por arc$a:

I5ogueiras9Dan/a9?am8tam9<itmo9<itmo na lu 9ritmo na cor9ritmo no som9ritmo no

mo imento9ritmo nas gretas sangrentas dos pés descal/os9ritmo nas unhas arrancadas9!as

ritmo9ritmo9 o es dolorosas de [%ricaJK. ?odos esses e7emplos nos %a em lembrar a

poética de uillén, de olano ?rindade e de 5red ou a 2astro.

egundo Eduardo ocha, em artigo publicado na re ista iblioteca /ntre Livros, de

no embro de GBBW, INas l$nguas banto, a pala ra +ue designa dan/aS também é usada para

m sicaS. 4 intérprete não de e apenas produ ir sons; de e mo imentar o corpoK, assim

Idan/aK e Im sica se (con)%undem, representando uma s- %orma de comunica/ão com osancestrais ou entre as comunidades, de con%raterni a/ão, de plenitude, de guerra ou de pa .

WX

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*+@+ Ant n o Bac nto8 do l:d co rem n scente ao neorreal smo a1r cano 4o0 o

,oeta do Tarra1al7

*+@+*+ Per1 l ; o; ;l o.r<1 co e l ter<r o

... a maior parte dos poetas tem sido capa de manter umcontato m$nimo com as popula/Ces do seu meio e identi%icar8se, tradu ir a ida desses homens nos seus poemas. ssim osentimos +uando lemos os belos ersos de iriato da 2ru , de

nt-nio 0acinto ou de 2osta ndrade.( gostinho Neto)

... 4s no os poetas %oram cantando, com o pr-pria, a terraangolana e as suas gentes.

nt-nio 0acinto escre e então alguns dos mais belos poemasdo !o imento, com temas +ue se inscre em tanto no mundourbano como no mundo rural. Deste, d"8nos o escritor, entreoutros poemas, a I2arta de um contratadoK, onde nostransmite a ang stia do homem do campo, saudoso, longe daterra e da sua amada, escolhendo o poeta, com precisão, aspala ras e as imagens, a %orma, em suma, +ue melhor poderiaser ir o tema. (2arlos Er edosa)

nt-nio 0acinto do maral !artins le a a um %ato, cal/a ecasaco, no dia do ulgamento pol$tico em +ue apanhou umapena +ue o le ou a conhecer 2abo erde pelo lado do ?arra%al.4ntem, ao tomar posse de !inistro da Educa/ão e 2ultura,

nt-nio 0acinto en erga a o mesmo %ato. eria o mesmo Nãosei. - sei é +ue o 0acinto +ue esta a dentro do %ato era omesmo do I rande Desa%ioK. (Ernesto #ara 5ilho)

ssim nasceu a literatura angolana moderna, distinguindo8seos primeiros poetas +ue come/aram a deci%rar o real+uotidiano: iriato da 2ru , nt-nio 0acinto, gostinho Neto. gera/ão da Mensagem entoou, com e%eito, o no o canto daangolanidade. (!"rio de ndrade)

nt-nio 0acinto, cu o nome completo é nt-nio 0acinto do maral !artins, é, para

alguns cr$ticos da literatura angolana, um dos poetas mais completos de sua

contemporaneidade l$rica, também cognominado Ium poeta nacional de ngolaK. 0acinto

nasceu no dia GA de setembro de 1@GH, no mesmo ano em +ue morre #enin, e dois anos

depois do nascimento de gostinho Neto. 0" na in%]ncia, come/a a perceber as contradi/Ces

da sociedade de sua época, +uando surgem as primeiras lutas sociais e +ue os dominadoresWW

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apro eitam para mani%estar +ue se trata de um con%lito de luta racial. 0acinto pertence a uma

%am$lia portuguesa +ue se instala em ngola Ie +ue não de e ter tido um papel cha e no

processo colonial. De e ter sido uma dessas %am$lias coloniais +ue não esti eram implicadas

com dinheiros, nem com grandes propriedades e não aderiram & pol$tica sala aristaK,segundo arc$a. sua %am$lia muda8se para o meio rural de 2ambombo, onde não ha ia

escola. nt-nio 0acinto, como ele mesmo %ala na entre ista dada a !ichel #aban, passou a

in%]ncia no interior de ngola, isolado, e s- aos @ anos ai para uma escola prim"ria em local

mais a an/ado, embora o então menino " soubesse ler e escre er. 2hega a #uanda em 1@3W,

com 13 anos de idade, e, embora o mundo se alargue com a chegada & cidade grande, logo

tudo se torna pe+ueno de no o em %ace do resto do mundo: estoura a egunda uerra

!undial. Declara 0acinto: I6ma carta da Europa para #uanda, ou de #uanda para a Europademora a seis meses de barcoJ iesse donde iesse, tinha +ue ir & [%rica do ul, onde era

aberta, era lida, coloca am l" mesmo uma %ita a di er +ue tinha sido aberta, depois é +ue

inha para ngolaK.(# ' N, 1@@1. p.1X1)

eu poema I4 grande desa%ioK e oca os anos 3B i idos entre a segunda ila e

#uanda, +ue %oi escrito, segundo o autor, no ano de 1@L3, untamente com outro poema +ue

se perdeu: INãoK. 5oi a mãe a sua primeira pro%essora, +ue o %e aprender na elha PartilhaMaternal P, do cl"ssico portugu s 0oão de Deus. egundo arc$a:

- aos no e anos %oi para a escola do olungo, po oa/ão rural dedicada &

produ/ão de ca%é. Nessa escola e7perimenta a primeira %ase repressi a +ue

os meninos tinham +ue suportar. Ele di estas pala ras patéticas: PNos tr s

anos seguintes, a to+ue de ara e palmat-ria de um pro%essor, ti e de andar,

e andei...P Este comportamento, origin"rio da =nglaterra e di%undido em*ortugal, olta a ser potenciado pela rea/ão sala arista, para reprimir,

alienar e castrar os esp$ritos +ue terão, mais tarde, eco de liberdade.

( <2 , p.A)

ua mãe lia, para o %uturo poeta e combatente, 0oão de Deus, ?om"s <ibeiro, nt-nio

Nobre e uerra 0un+ueiro, entre outros. 5oi nesse ambiente %amiliar, cercado pelos desenhosWA

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+ue relata am o drama e o combate do po o espanhol, pendurados nas paredes da sua casa,

na erdade, reprodu/Ces dos desenhos do pintor espanhol 5rancisco de o>a (1WHX81AGA),

sobre a in asão espanhola em 1ABA pela 5ran/a de Napoleão. egundo arc$a, essas

reprodu/Ces impressionaram a crian/a pela semelhan/a com as imagens do +uotidianoangolano e o le aram a sentir um grande rep dio pelo dramatismo da+ueles +uadros e,

também, a sentir8se en ol ido num uni erso ergastado pela ocupa/ão de ngola. *ara

arc$a:

Este uni erso i encial ai ser ampliado psicologicamente ao acentuar8se a

descoberta de outros submundos contemplados e não imaginados.

crian/a, nt-nio 0acinto, i e num mundo real, não abstracto. Estes alores

das gentes angolanas %"8lo superar os das leituras iniciadas dos escritores

portugueses +ue a sua mãe lhe tinha ensinado. Depois come/a a

autoestimular8se para narrar com todo o impacto o misterioso mundo das

suas i ncias, dos grandes contrastes +ue o%erecem certas regiCes

angolanas e, no meio de tudo isto, aparece o drama dos negros.

primeira escrita de nt-nio 0acinto tem " um cunho +ue marcar", para

sempre, um compromisso em prol dos marginali ados, %ace &+uela escrita

o%icialista e contra as e7alta/Ces do coloni ador. 2omo ele mesmo di :

PEscre er por o%$cio e por obriga/ão: uma %orma %"cil de combater.

2ombater sempre, escre er sempreP. =sto é a per%ei/ão: escrita para ser

arma de combate contra as contradi/Ces; escre er sobre a problem"tica nas

suas mais di ersas %aces. PEscre er para os outros, escre er pelos outrosP.

No per$odo +ue ai de 1@33 a 1@HX, pouco sabemos da sua ida. ão anos em +ue o

poeta esta a, de %ato, encubando uma no a semente; contribuindo para essa sementeira +ue

%lorir" na terra angolana a partir de 1@HA. *ara ngola, o ano de 1@HA é uma data8cha e para

a dinami a/ão liter"ria de cari pol$tico8social; nesse ano, em a lume o P!o imento dos

No os =ntelectuais de ngolaP, cu o lema era: P amos descobrir ngolaJP, como " dito

acima, e nele nt-nio 0acinto ter" um papel8cha e em sua cria/ão. _", nesse sentido, uma

W@

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%oram escritos e datados no campo do ?arra%al (2. ?. 2hão 'om), com e7ce/ão do ltimo,

dtado de 1H.BW.WL, cinco meses antes da =ndepend ncia Nacional. Em 1@WG, alcan/a a

liberdade, porém é mandado para #isboa, onde passa a i er sob igil]ncia da *=DE. ?rabalha,

durante um ano, como técnico de contabilidade. Em 1@W3, %oge de *ortugal e unta8seno amente ao !*# , onde presta ser i/os no 2entro de =nstru/ão <e olucion"ria.

p-s a independ ncia, gostinho Neto con ida8o a integrar o 2onselho de !inistros,

como !inistro da Educa/ão e 2ultura. Em 1@W@, ganha o pr mio #-tus, outorgado por uma

organi a/ão de [%rica e [sia. 5oi também membro %undador da 6nião dos Escritores de

ngola. 5aleceu em 1@@1.

poesia de nt-nio 0acinto corresponde a uma poética +ue re%lete os problemas deseu tempo, do homem na sua dimensão mais pro%unda, tanto no ponto de ista pol$tico8

social, +uanto no cultural. Dentro desta perspecti a nacionalista, re olucion"ria e cultural,

em seus poemas, encontramos, muitas e es, tra/os de nacionalismo pleno, como bem

e7empli%ica I2arta de um contratadoK, e, com muito re+uinte técnico, não nos enganemos,

boa parte dela.

*+@+3+ Ant n o Bac nto8 o ,oeta e s0a ,oes a

+ui est" um poeta dos mais tradu idos e di ulgados de +uedispCem as "%ricas +ue escre em em portugu s, sendo dosmais representati os com +ue pode a literatura angolanacontar, condi/Ces +ue garantiram a nt-nio 0acinto o carisma

de um lugar de especial rele o no +uadro da nossa poesiacontempor]nea.

(...)

^ a poesia desta op/ão +ue 0acinto propCe de um modo +ue seenri+uece num le+ue de in%orma/Ces +ue criam um clima deidentidade. onomatopeia desempenha entretanto um papelmuito peculiar no reconhecimento dessa identidade, +ue%unciona também pela Inega/ão da nega/ãoS como no caso da

2arta dum 2ontratado . ?odas estas re%er ncias so%rem umaapropria/ão, um +ue%a er sem]ntico, para serem um poemaI+ue " +uer9e " sabe.(Da id !estre)

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obra de nt-nio 0acinto é constitu$da das seguintes publica/Ces: $oemas , 1@X1,

! v artolomeu, 1@W@,$oemas , 1@AG,/m 5ilunCe do Jolungo, 1@AH,Sobreviver em 9arrafal

de Santiago, 1@AL,$rometeu , 1@AW,3)bulas de SanCi , 1@AA. edi/ão +ue tomamos como

%onte de pes+uisa, publicada pela N-ssomos, cu o t$tulo é$oesia &DEKD-DEGK', na parte de

re%er ncias bibliogr"%icas, não %a constar a edi/ão de 1@AG, possi elmente por ser a mesma

de 1@X1.

obra-corpus deste trabalho, editada pela N-ssomos est" di idida em +uatro partes

e re ne os poemas escritos até 1@X1, não datados e os poemas de Sobreviver no 9arrafal de

Santiago, +ue, por sua e , di ide8se em tr s con untos:9arrafal em redor , 9arrafal interior e9arrafal l=rico, cada con unto com sua especi%icidade, como eremos a seguir.

2ompete8nos nesta parte in estigar as semelhan/as e dessemelhan/as +ue h" entre a

poesia de nt-nio 0acinto e de gostinho Neto dentro do bloco maior +ue compCe o

mo imento da Mensagem como teori a/ão para situar a literatura angolana dentro do

conte7to das literaturas de l$ngua portuguesa, analisando sua estrutura, sua linguagem e seu

conte do, a %im de detectar a possibilidade de sua inscri/ão no c]none dessas literaturas ou,ao menos, no de ngola, +ue s- h" pouco se esbo/a. ^ nessa linha, sem +uerer au%erir

medi/Ces de alor entre os poetas e sua obra.

*ara Da id !estre, 0acinto é um I*oeta cu a produ/ão rescende & terra de +ue

nasceu cantor, escritor de obra magra mas %arta de sortilégios patr$cios, h" nos seus ersos o

to+ue de simplicidade e pro%ecia de toda a grande poesia. <eali ada a pro%ecia, eles

permanecem em sua inteira garantia, prontos a ganhar a rua, %alar connosco, %alar8nos de

Qn-s mesmosQK. 2ompanheiro, na ida e nas letras de outro poeta nacional, gostinho Neto, e

de iriato da 2ru também, 0acinto, como eremos, é um poeta +ue se di ide entre sua

gente e seu pr-prio eu: suas ang stias e in+uieta/Ces, ha a ista o longo tempo +ue este e

preso no ?arra%al.

AG

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*+@+@+ As can= es de m nha .ente

*orém, a grande import]ncia deste li ro de poemas dent-nio 0acinto, não ad ém nica e principalmente das

circunst]ncias hist-ricas da sua = edi/ão. 4 alor inestim" eldesta *oesia cresce da sua +ualidade intr$nseca e do seusigni%icado no +uadro global da luta de liberta/ão nacional eainda do papel desempenhado por ela no apelo,conscienciali a/ão e mobili a/ão do po o angolano para o seuinalien" el combate pela pr-pria identidade e dignidadereencontrada.

(...)

era/ão da Mensagem e o seu grito amos descobrirngola , te e em nt-nio 0acinto o mais directo e incisi o dosgrandes poetas +ue lhe deram corpo. os escritospaternalistas dos escribas coloniais, & poesia alienada de unspoucos, 0acinto opunha o igor de uma op/ão angolana. igore altura, +ualidade +ue não so%ria sem rid$culo +ual+uercompara/ão. E por+ue o eco da +ualidade e do igor erasobretudo a erdade das terras sentidas de ngola, o

rande desa%io do po o & condi/ão terr$ el da miséria e dae7plora/ão em +ue i ia, a poesia de nt-nio 0acinto, com ade gostinho Neto e iriato e mesmo a de outros +ue ieram a

trair sem amor tornou8se bandeira preenchendo o sonho.(2osta ndrade)

Na primeira parte, composta de 1H poemas, o te7to +ue a abre le a o t$tulo de

"escobrimento , e é dedicado I& <ua da *edreiraK e representa, numa linguagem +ue lembra

a do poeta brasileiro !anuel 'andeira, a autoanuncia/ão do descobrir8se poeta, o soltar a

o para um no o hori onte +ue se espalhar" pelos poemas seguintes, mais elaborados e

curtos uns, outros mais longos e narrati os. Nos primeiros, predomina a metalinguagem num

transcurso e7istencial e humanista +ue se %ortalecer" nas outras partes da antologia. Nos

mais longos, pre alecem os encantos da terra natal, as suas ma elas, a den ncia da

e7plora/ão do homem pelo homem, as distor/Ces sociais, os desencontros da ida e a

incerte a do %uturo, ou a certe a não dese ada. descoberta é por+uanto uma %orma de

humani ar8se, de ele a/ão, de poder, +ue o distinguir" dos outros poetas.

partir de I2an/ão do entardecerK, cognominada de I2antiga de rodaK, teremos a

A3

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alori a/ão dos cantos populares, +ue e7pressam o sentimento da angolanidade, a

alori a/ão da l$ngua materna e da linguagem popular do portugu s angolano como %ontes

de embele amento do arte%ato poético, como %i eram os modernistas da emana de rte

!oderna de GG no 'rasil. _" também desta+ue para as hist-rias populares como a de ?eresa,de IEra uma e K, muito parecida com a do poema de 0orge de #ima IEssa Negra 5ulMK; é

is$ el a premoni/ão das crian/as sem %uturo como se insinua em INau%r"gioK e em

I*]ntanoK, na representa/ão da %igura %eminina, condenada & prostitui/ão, a e oca/ão dos

primeiros amores em I adiagemK e as lembran/as das coisas simples i idas na meninice,

restando um agora dos destinos dos elhos amigos dispersos na indi%eren/a e7istencial,

como nos %ala I4 grande desa%ioK, todos esses poemas carregados de um lirismo pungente,

na linha dos poetas rom]nticos ou sentimentais como o " citado !anuel 'andeira, por+uea+ui não %alamos de mo imento liter"rio, mas de inter en/ão estética na constru/ão do

te7to.

Dessa primeira parte, podemos destacar os poemas I2astigo pro comboio malandroK,

I2arta dum contratadoK, I!onangambaK e I*oema da aliena/ãoK, este apro7imando8se

muito de outro poeta brasileiro neoconcretista 5erreira ullar. Nesses poemas, amos

encontrar um eu poético mais pr-7imo da poesia de gostinho Neto, mesmo +ue aindatimidamente. s onomatopeias, a linguagem popular e a %ala materna se entrecru am numa

ri+ue a ocabular para %a er a den ncia dos maus8tratos dispensados aos negros, igualados

aos animais em determinados momentos.

inda sobre I2astigo pro comboio malandroK, percebemos nele, além da

apro7ima/ão com poetas brasileiros como !anuel 'andeira em I?rem de %erroK, poema "

citado neste trabalho, ressal adas as de idas propor/Ces, uma e +ue a sua posi/ão pol$tica

é mais acentuada, " a partir da tipi%ica/ão do comboio ImalandroK e da den ncia da

animali a/ão do negro ele ado & condi/ão de IboiK, um ser Isem respeitoK; por isso, não nos

enganemos com a %alsa ingenuidade do eu l$rico, notamos um poema +ue caminha sob a lu

da o netiana, embora sem o seu igor ainda.

e amos o +ue di Da id !estre sobre ele:

AH

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^ do +ue encontramos ind$cios no poema 2astigo pro 2omboio !alandro :

Esse comboio malandro9passa9passa sempre com a %or/a dele V di ,

lan/ando mão de uma linguagem +ue desponta da domestica/ão da l$ngua

portuguesa por uma geogram"tica nacional e +ue assume deste modo logo

uma primeira sintonia com o receptor. No entanto, o poeta oga ainda na

n%ase e recorre & representa/ão onomatopaica: ué ué ué 9hii hii9te8+uem8

tem te8+uem8tem te8+uem8tem.

ssim o poema desdobra8e entre estas duas opera/Ces até encontrar o

des%echo progressi amente sugerido: 2omboio malandro 9 oc ai er s- o

castigo 9 ai dormir mesmo no meio do caminho. _" nesta poesia uma

rela/ão de causa8e%eito de maior enle o +uanto mais conseguida. (pp. G@8

3B)

*or e es, o eu poético assume a o dos contratados +ue se+uer sabem escre er ou

ler e le a seu canto de dor &s suas amadas, como no belo poema I2arta dum contratadoK.

+ui, também, deparamo8nos com uma linguagem simples, carregada de imagens sutis +ue

re%letem, mais uma e , a den ncia da opressão patrocinada pelo go erno %ascistaportugu s. 4 poema torna8se importante por+ue acentua o grau de abandono do colono no

plano educacional e +ue, aos olhos do leitor despre enido, soa ainda mais como IpoéticoK, a$

residindo a ironia de 0acinto, +ue, por e es, engana até conhecedores pr-7imos de sua obra.

e amos o +ue di Da id !estre:

I2arta dum 2ontratadoK, outro dos te7tos %undamentais da obra +uetratamos como do con unto da poética ImensageiraK, organi a8se por sua

e num modelo +ue caldeia a cl"ssica balada com a den ncia e o protesto

social. E7pediente utili ado com e7celentes resultados por brasileiros como

0orge de #ima. ou <aul 'opp, entre outros.

(...) 4 mesmo processo assiste igualmente o *oema da liena/ão ,

!onangamba e 4 rande Desa%io . Em +ual+uer deles se combina o

%luir de uma l$rica depurada e inter%erida pela met"%ora lu7uriante deAL

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s$mbolos locais (caracter$stica dos poetas e contistas empenhados na senha

amos Descobrir ngola) com a demonstra/ão pelo absurdo do drama +ue

a aberra/ão colonial en+uadra. (pp. 3B831)

inda sobre este mesmo poema, temos também o depoimento de Er edosa, para

+uem 0acinto Iescre e alguns dos mais belos poemas do !o imentoK. 4 cr$tico est" a re%erir8

se ao grupo da Mensagem. 2osta ndrade também chama a aten/ão para o alor +ue reside

na ele ada reali a/ão pl"stica +ue os anos de HA iram surgir, notadamente na obra de

0acinto e dos seus companheiros da Mensagem , Ipedrada iolenta e de rotura de%initi a no

bolor da escrita colonialK. nt-nio 0acinto escre e sobre temas +ue se inscre em tanto nomundo urbano como no mundo rural: IDeste, d"8nos o escritor, entre outros poemas, a

I2arta de um contratadoK, onde nos transmite a ang stia do homem do campo, saudoso,

longe da terra e da sua amada, escolhendo o poeta, com precisão, as pala ras e as imagens,

a %orma, em suma, +ue melhor poderia ser ir o tema, con%orme 2arlos Er edosa.

E identemente esses dois poemas nos condu em a uma pro a/ão do processo

enunci"tico do eu l$rico: sua enuncia/ão e o enunciado, per%ilados pelas met"%oras e imagens

carregadas da pseudossimplicidade com +ue !anuel 'andeira coloriu boa parte de sua

poética.

e compararmos, porém, com a poesia de Neto, especi%icamente os tr s primeiros

poemas de Sagrada esperan%a: I deus & hora da largadaK, I*artida para o contratoK,

I "bado nos musse+uesK, mais I2omboio a%ricanoK, eri%icaremos +ue este é mais incisi o na

condu/ão de sua mensagem, mais direto, sendo ambos bons poetas, e os poemas de alta

grande a, pre alece no Ipoeta *residenteK a sedu/ão, ou melhor, a ad ert ncia, a incita/ão,

o con ite & insurrei/ão em busca da liberdade, en+uanto o eu l$rico de 0acinto se anuncia

mais sutil e melanc-lico, não se e7imindo, como " dito, de denunciar, também ele não

%ugindo aos ob eti os dos INo os =ntelectuais de ngolaK e sua m"7ima I amos Descobrir

ngolaJK, onde o IdescobrirK pode ser muito bem substitu$do por libertar. Em Neto, lemos

I#ento caricato e cruel9o comboio a%ricanoK, en+uanto em 0acinto: I2omboio malandro9 oc

ai er s- o castigo9 ai dormir mesmo no meio do caminhoK.

AX

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Em I!onangambaK, musicado por <ui !ingas, %ica mais e7pl$cito o brado do negro

contra a e7plora/ão do branco e a %uga +ue a+uele %a atra és do "lcool. egundo o pr-prio

poeta, em entre ista a #aban, IQ!onangambaQ %oi constru$do na serra/ão de madeiras onde

eu trabalha a. Em %rente da serra/ão passa a a linha de caminho8de8%erro. Eu esta a noescrit-rio, sa$ e im para onde passa a a linha. 4 pessoal esta a a descarregar madeira. Eu a $

%i um recuo para o mato, para o interior, e lembrei8me das lendas dos Oi%umbes, da

con ic/ão de +ue +uem tem barriga grande tem muito dinheiro, +ue o dinheiro é %eito pelos

pretos, etc. #embrei8me do estribilho muito grande do I!onangambéééK e não sei se o

escre i l" mesmo no escrit-rio, ou se o constru$ e, +uando cheguei a casa, o escre i... !as %oi

nessas circunst]ncias, %oi no trabalho mesmo...K(1@@1, p.1XA). +ui estamos diante de um

poema mais pr-7imo da poética netiana:

Na+uela ro/a grande não tem chu a

é o suor do meu rosto +ue rega as planta/Ces;

Na+uela ro/a grande tem ca%é maduro .

E a+uele ermelho8cere a

são gotas do meu sangue %eitas sei a.

4 ca%é ai ser torrado,

*isado, torturado,

ai %icar negro, negro da cor do contratado

ão reclamos mais incisi os, o ImonangambaK é o mesmo Ioper"rio em constru/ãoK

de inicius de !oraes, é o mesmo I!ussunda amigoK, a mesma I+uitandeiraK, o mesmoI elho negroK (a iltados em sua dignidade humana) de Neto. 4 +ue os di%erencia é a %orma

de se re oltar contra o Ibranco opressorK: I!onangambaK pede: I hJ Dei7em8me ao menos

subir &s palmeiras9 Dei7em8me beber maru%o, maru%o9 e es+uecer dilu$do nas minhas

bebedeirasK; o +ue não se re ela nos oprimidos de Neto e inicius. ssim se re%ere #uandino

ieira a esse poema: I2om a a uda do nt-nio 0acinto +ue & dist]ncia e aos domingos de

manhã nos ia subtilmente orientando e en+uadrando ia literatura para a Ioutra coisa

(...) ...poemas como I!onangambaK (...) onde (...) pela primeira e as massas trabalhadorasAW

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aparecem na literatura ... inda sobre o mesmo poema, assim se e7pressa l%redo

!argarido:

(...) e o poema de nt-nio 0acinto !onangamba é o e7ame das ess ncias

do contratado e, também, a soma das aliena/Ces parciais +ue acabam por

lhe de ol er a consci ncia da sua miséria, a consci ncia das suas

necessidades. 4 poema de nt-nio 0acinto pretende, naturalmente,

ultrapassar o plano do descriti o, embora apro%undado, e apresenta8se

como um trabalho de encora amento, de educa/ão, +ue o incita a desa%iar

as leis +ue o redu em a uma ser idão. (! < <=D4, p.GW@)

4s poemas IEra uma e K, INau%r"gioK, I*]ntanoK e I adiagemK compCem um

+uadro de %rustra/Ces amorosas e e7istenciais +ue se misturam & saudade dos bons tempos

de rapa , da u entude tocada a iola, bebidas e namoradas. 4 primeiro nos remete &s

hist-rias populares; no caso, I M M 'artolomeuK, " elho, recorda os tempos IdS mbacaK em

+ue se perde de amores pela Imulata ?eresaK, +ue nos tra & mem-ria a hist-ria da INegra

5ulMK de 0orge de #ima, +ue, depois de acusada pela inh" de tudo de errado +ue acontece

no sobrado, termina por sedu ir o seu senhor:

Essa negrinha 5ulMJ

%icou logo pra mucama

pra igiar a inh",

pra engomar pro inhMJ

( )

4 inhM %oi a/oitar

so inho a negra 5ulM.

negra tirou a saia

e tirou o cabe/ão,

de dentro d le pulou

AA

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nuinha a negra 5ulM.

( )

5ulMJ 5ulMJ

2ad , cad teu inhM

+ue Nosso enhor me mandou

hJ 5oi oc +ue roubou,

%oi oc , negra %ulM

No cancioneiro italiano h" também uma %"bula cantada por 2arlos lberto alustre,?rilusssa, chamada I le ada ?eresaK; na de 0acinto, cu o t$tulo denuncia o car"ter aned-tico,

amos encontrar:

hist-ria da ?eresa mulata...

_um ...

M M 'artolomé elanguescido em carcomida cadeira

dormeceu

4 sol se coando da mulembeira eio brincar com as

moscas nos l"bios resse+uidos +ue sorriem

\iuJ M M t" dormindoJ

... 4 mo/o dS mbaca sonhando...

*ercebe8se no %inal do poema a %usão do Imo/o dS mbacaK no I M M 'artoloméK +ue

são o mesmo, representando, tal e , a decad ncia da antiga burguesia angolana.

4s poemas INau%r"gioK e I*]ntanoK representam a premoni/ão e den ncia das

crian/as pobres angolanas (I5oi & pra/a roubou cola 95oi & praia tomou banho 9*ediu um

doce ao doceiro9e na enda da 'ai7a olhando, olhando, 9uma boneca grande9sonhou com

muito dinheiroK), condenadas a se prostitu$rem: Ih"8de amadurar tristemente cedo9& lu

radiosa do sol +uente...9...&s mãos impuras da rua K ( ) Iho e %a tudo tudo tudo9inda tem

A@

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a alma cheia de dese os9 a pensar ai a imaginar outros bei os K. pr-pria re%er ncia

simb-lica dos termos Inau%r"gioK e Ip]ntanoK " nos remete a uma conota/ão de despre o,

perder8se, a%undar8se, lodo, bai7e a, dentre outras acep/Ces.

5echando esse con unto, temos I*oema de aliena/ãoK, como e7pl$cito no t$tulo, mais

direto, dentro da linha mar7ista, reinterpretado de _egel, signi%icando em linhas gerais a

e7plora/ão do homem pelo homem: o trabalho +ue de eria digni%icar a condi/ão humana,

e7erce a %un/ão contr"ria, desumani a o ser, uma e +ue o trabalhador não se como

produtor de um bem comum & coleti idade e a si pr-prio, bem a +ue pro a elmente não

ter" acesso e +ue não é produ ido por li re arb$trio, mas & base de maus8tratos, e a+ui os

ltimos ersos re elam +uem são esses homens:

!as o meu poema não é %atalista

4 meu poema é um poema +ue " +uer

E " sabe

4 meu poema sou eu8branco

!ontado em mim8preto

ca algar pela ida.

4 poema, +ue percorre todas as inst]ncias espaciais e da ordem social, ainda não se

%e e, diante do +ue constata: o branco a e7plorar o preto, toma consci ncia da realidade

para reabrir no os caminhos, é o +ue implicitamente se insinua. !ais uma e , nos

reportamos a Da id !estre:

Esta poesia socorre8se, no desen ol imento da par"bola, de recursos +ue

emergem do +uotidiano com a %rescura e o igor do seu uso corrente,

e7pressCes repescadas no rol da in%]ncia, nos pregCes e cantigas de gente

humilde iolentamente e7plorada +ue Icorre as ruas 9 com um +uibalo

podre & cabe/a, entra nos ca%és 9 amanhã anda a roda amanhã anda a roda,

em do !usse+ue, ai nas cordas, anda na pra/a trabalha na co inha9 ai &

o%icina9enche a taberna e a cadeiaK. (p. 3B831)

@B

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+ui temos um poema dentro da corrente netiana ou, como diria ?hiago de !elo,

Ipoesia comprometida com a minha e a tua idaK, a peregrinar por onde ha a iola/ão dos

direitos do outro, +uer se a no plano da rela/ão capital9assalariado, +uer se a na entrega do

corpo como sa$da para não morrer de %ome, +uer se a na e7plora/ão do homem pelo homemem +uais+uer circunst]ncias:

4 meu poema é contratado

nda nos ca%e ais a trabalhar

4 contrato é um %ardo

+ue custa a carregar

ImonangambéééK

o meu poema anda descal/o na rua

o meu poema carrega sacos no porto.

4u, como diria 5erreira ullar, em seu I*oema su oK (Escrito muitos anos depois), de

certa %orma antecipado pelo pr-prio 0acinto nos ersos abai7o:

4 meu poema anda na pra/a trabalha na co inha

ai & o%icina

enche a taberna e a cadeia

é pobre roto e su o

i e na noite da ignor]ncia

o meu poema nada sabe de si

nem sabe pedir

o meu poema %oi %eito para se dar

para se entregar

sem nada e7igir

ou, como di Drummond, em sua I2onsidera/ão do poemaP: I2omo %ugir ao m$nimo

ob eto9ou recusar8se ao grande ( ) 0" agora te sigo a toda parte,9e te dese o e te perco,@1

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estou completo,9me destino, me %a/o tão sublime,9tão natural e cheio de segredos,9tão

%irme, tão %iel... ?al uma l]mina,9o po o, meu poema, te atra essa.K.

E oco Neto, !elo, ullar e Drummond s- para dar a dimensão +ue atinge a escritura

de nt-nio 0acinto, o seu poder de sinteti ar as den ncias +ue aparecerão em outros

poemas, esse poema simboli ando todos os aspectos da ida corrompida em [%rica: no

mato, no mar, na cidade ou dentro do pr-prio ser humano. obre ele assim se pronuncia

l%redo !argarido:

con ic/ão %undamental destes poetas é, pois, +ue o homem total, sendo

embora inicialmente o su eito8ob ecto i endo dilacerado, i endo emboradissociado e preso & necessidade e & abstrac/ão, nem por isso dei7ar" de

ser uma rea1idade. ra ão %undamental da aliena/ão, numa sociedade

pluriétnica, como ali"s em +ual+uer sociedade, reside na ordem econMmica

e social, pelo +ue importa +ue cada um dos elementos sociais se %irme

numa e7ig ncia absoluta: a da liberdade total. - deste modo o poeta pode

re estir8se da e7emplaridade +ue dese a, não por mera e7ig ncia de um

ideal transcendente, mas sim por saber necess"ria a cria/ão de "rias onas

de e+uil$brio entre o biol-gico e o humano, o particular e o social, no

]mbito de uma e7ecu/ão progressi a do pessoal no pro ecto social.

cone7ão e a unidade, sempre postas em e id ncia, e7istentes entre os

elementos do conte do, pro ocam a necessidade de alcan/ar uma plena

consci ncia da pr"7is. e7emplaridade do poeta est", pois, primeiramente,

na reali a/ão total, pois esta não s- lhe assegura o acesso ao uni ersal,

como e idencia necessidade V e a possibilidade V de criar um mundo

humano, com a e%ecti a participa/ão de todos os homens.(1@AB, p.GWL)

5inali a esta parte o poema I4 grande desa%ioK, constru$do em duas dimensCes: uma,

+ue representa o passado em constata/Ces do +ue %oi %eito da di"spora %raterno8 u enil de

INa+uele tempoK, em +ue alguns se perdem pelos caminhos da I2asa de <eclusãoK, dos

Icontratados de ão ?oméK, mas h" os +ue se deram IbemK na ida e ignoram, no ho e do

@G

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enunciado, até +uem lhe deu guarida. =sso era o tempo do INunca maisJ Nunca maisJK, +ue

lembra o INe er moreJ Ne er moreJK do poeta norte8americano Edgar lan *oe. ?empo do

Igrande desa%ioK, brincadeira de in%]ncia +ue se perde nas lembran/as das coisas simples

i idas na meninice. 4s desencontros da pr-pria e7ist ncia humana. Dentro, porém, dessaperspecti a uni ersal, o poeta não dei7a de salientar os problemas locais +ue se tornam

agora sim um Igrande desa%ioK a ser %eito:

!as tal e um dia

+uando as bugan $lias alegremente %lorirem

+uando as bimbas entoarem hinos de madrugada nos capin ais

+uando a sombra das mulembeiras %or mais boa

+uando todos os +ue isoladamente padecemos

nos encontrarmos iguais como antigamente

tal e a gente ponha

as dores, as humilha/Ces, os medos .

desesperadamente no chão

no largo V areal batido de caminhos passados

os mesmos trilhos de escra idCes Vonde passa a a enida +ue ao sol ardente alcatroamos

e unidos nas ]nsias, nas a enturas, nas esperan/as

amos então %a er um grande desa%io...

4utro aspecto a considerar é a %orma; uma e +ue esses poemas são +uase

narrati os e apro7imam8se muito da prosa, a sua linguagem torna8se mais compreens$ el do

+ue em poemas +ue se prendem mais & elabora/ão da linguagem, dei7ando & margem o

conte do; não +ue nesses poemas ora trabalhados a poeticidade termine por se e7aurir,

mesmo por+ue o ritmo, +ue é uma caracter$stica da poesia a%ricana de um modo geral, ou a

ela %iliada, lhe garante muita musicalidade, o +ue compro a terem sido muitos desses

poemas musicali ados, o +ue permitiu %ossem cantados por toda a gente do pa$s,

notadamente a+uela gente a +uem eram endere/ados: os angolanos +ue se insurgiram

contra a opressão do Estado portugu s e propunham a independ ncia.

@3

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*+@+ + Ant n o Bac nto8 ,oeta so;rev vente do Tarra1al

*+@+ +*+ Em redor do Tarra1al

Estes poemas são meus. ^ minha terraé ainda mais do +ue ela. ^ +ual+uer homemao meio8dia em +ual+uer pra/a. ^ a lanternaem +ual+uer estalagem, se ainda as h". V _" mortos h" mercados h" doen/as^ tudo meu. er e7plosi o, sem %ronteiras,por +ue %alsa mes+uinhe me rasgaria

( )

*oeta do %inito e da matéria,cantor sem piedade, sim, sem %r"geis l"grimas,boca tão seca, mas ardor tão casto.Dar tudo pela presen/a dos long$n+uos,sentir +ue h" ecos, poucos, mas cristal,não rocha apenas, pei7es circulandosob o na io +ue le a esta mensagem,e a es de bico longo con%erindosua derrota, e dois ou tr s %ar-is,

ltimosJ esperan/a do mar negro.(2arlos Drummond de ndrade)

primeira se/ão da segunda parte é constitu$da de G3 poemas mais ou menos curtos

e datados, preocupando8se um pouco mais com a elabora/ão da mensagem em si,

contrariamente aos +ue analisamos anteriormente; e re elam um eu l$rico apartado de seus

entes +ueridos, ora representado pela primeira pessoa do singular, ora pela primeira do

plural, um eu +ue busca atra és da poesia, de Itu *oesiaK (com letra mai scula), um sopro de

liberdade.

gora o poeta, isolado e preso no 2ampo de 2oncentra/ão do ?arra%al, en olto na

ang stia de +uem nada pode %a er, o tempo passar (e como passa lentoJ), por isso busca

re% gio no %a er poético e atra és dele al/a os mais ariados oos para além dotopus em +ue

se encontra enclausurado, e7ilado +ue %ora por sua participa/ão na luta pela independ ncia

de ngola. poesia é o sustent"culo do eu l$rico e, atra és dela, esse eu submete8se ao

sacri%$cio, & subsist ncia Idos ratos de maldi/ãoK, a interrogar8se do de%inhar de si pr-prio e

do es air8se de suas ra$ es, da$ a ang stia de +uem e7perimenta uma realidade brutal, a@H

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insist ncia em germinar a terra, por mais pedra +ue ela se a, tal +ual o catingueiro de 0oão

2abral de !elo Neto. s e es um des]nimo in ade8o, e este parece dei7ar8se esmorecer. _",

porém, no Iar+uipélagoK da ida insular em +ue se encontra, sempre o islumbre de uma

I elaK (chama e9ou embarca/ão) +ue o con ida ao sonho de liberdade. ?omemos comoe7emplo $aisagem Iconcentracion"riaK:

Esta é a %orma imprecisa

%usão do céu e do mar

linha +ue não se di isa

nos limites da paisagem insular

4 *ico do 5ogo é um astro

satélite dos olhos meus

suspenso no ar com lastro

de nu ens:

eno elados algodoais

racioso, !alagueta e montescasas de pedra +ue os trepam

são %ronteiras a limitar

os limites deste sonhar

*oeta V este i er é incerto

sinta8se o homem liberto

- de meditar

No pensar +ue é ida +ue se estua

k a ilha continua

2. ?. 2hão 'om. [email protected]

(0 2=N?4, GB11, p.L1)

^ o ulcão I=onaK +ue, +uedo na paisagem, irrompe dentro do poeta como o %ogo@L

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+ueimando a solidão, pois +ue Io %ogoK é Isaudade i aK e não pode permitir +ue o mar7ista

(INatal na =lhaK) se renda aos +uebrantos da Ino a moradaK e suas %ormas de aliena/ão.

Desta+uemos, agora, os ltimos poemas desta parte: I hJ e pudésseis a+ui er

poesia +ue não h"K, partindo da descri/ão geométrica do espa/o in loco, o eu, dirigindo8se a

um interlocutor +ue chama de I!ãeK, %a um paralelo entre o Ia+ui dentroK e o Il" %oraK.

tra és da nega/ão, estabelece8se a a%irma/ão: a poesia, associada &s coisas boas: &

liberdade, & lu , rare%a , parado7almente, as aus ncias, a morte, a triste a e a Ipoesia +ue

não h"K.

s ant$teses e as hipérboles dão assim uma isão surrealista ao poema +ue se

transmuda no ob eto de dese o, s- alcan/" el atra és da arte poética, mesmo +ue negada:INum ca alo de nu ens brancas94 luar incendeia car$cias9E em, por sobre meu rosto magro

dei7ar teus bei os !ãe, teus bei os !ãe9 hJ e pudésseis a+ui er poesia +ue não h"JK.

4 poema I*aisagemK é uma espécie de del$rio de entrega & IpaisagemK +ue não

muda, & solidão +ue se intensi%ica com a re%ormula/ão ou reconstru/ão do poema de %orma

ainda mais sintética do +ue " o é; parece8nos um e7erc$cio poético como necessidade de

e7pia/ão.

Em I té mimK, encontramos pela primeira e uma re%er ncia e7pl$cita do todo [%rica

como tem"tica e apela/ão de liberdade coleti a. re ela/ão do so%rimento do po o a%ricano

se intensi%ica no poema I=lha do alK, com as ricas imagens, atra és dos neologismos e das

re%er ncias b$blicas, nas %iguras do IsalK e de I0obK: +ue são o I al desta =lhaK e, ao mesmo

tempo, o I al desta idaJ9E o so%rido po o8sol%erido9criamado & imagem de 0ob...9E a

solidão, ano emp-s anoK, +ue corroboram a tragicidade a +ue %oi impelida essa gente.

Dilatemos os neologismos: o Isal desta =lhaK é o mesmo Isal desta idaJK, dito assim com

clamor da pontua/ão; e o Iso%rido po oK é Ipo o8sol%eridoK: %erido a sol e sal, monoss$labos

+ue por si s-s intensi%icam a dor desse po o criado e amado como I0obK, sem,

e identemente, o +ue Deus a este ser b$blico lhe de ol eu.

+ui, para 4 $dio !artins, temos a paisagem e7terior, de %ora, mas +ue se in%iltra no

]mago do poeta de %orma e7tremamente dolorida. 4 eu, no entanto, mostra8se crente, não

como I0obK, nas trans%orma/Ces, por mais +ue claudi+ue em alguns momentos. *odemos@X

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concluir +ue é a primeira con ocat-ria direta ao po o a%ricano, embora " em 1@WL. ^ um

con ite & humani a/ão desse Ihomem8pedraK, desse homem IsalK e IsolK.

o compararmos sua poética com a de Neto, notamos, surpreendentemente, +ue

nt-nio 0acinto tende a uma poesia mais %iloso%ante, mais re%le7i a, %ruto e identemente de

sua condi/ão de prisioneiro, enclausurado +ue esta a no ?arra%al, & espera, como 0ob, da

concreti a/ão do dito por gostinho Neto em seus poemas mais agudos I deus & hora da

largadaK, I2on%iana/aK, I spira/ãoK, I!ussunda amigoK e I2aminho das estrelasK, para

%icarmos apenas nesses cinco. 0" a%irmamos atr"s +ue a poética de 0acinto tem "rios

contornos, con%orme amos esclarecendo, mas sem %ugir em seu todo de sua marca de

nacionalidade.

*+@+ +3+ %o nter or de Tarra1al

Esta parte, 9arrafal interior , compreende uma colet]nea de GH poemas, sendo dois

reescritos, I2ensuraK e I lda #araK, todos ersando sobre o locus +ue se insere entre as

muralhas da prisão do ?arra%al, em antiago, 2abo erde, os temas serão similares aos das

poesias " interpretadas: a censura, acompanhada da permissi idade corrupta, a liberdade,

re elando um eu poético como construtor do mundo, nesse coro, também irmanado com a

coleti idade negra a%ricana tão largamente comerciali ada para todos os continentes como

mão de obra escra a.

*or mais pessoais +ue soem esses cantos, perpassam por eles o ideal de I#iberdadeK

e o combate & opressão. 4 eu l$rico, construtor do mundo, como e7pl$cito em gostinhoNeto, nesse coro também irmanado com a coleti idade negra a%ricana, rei indica I s minhas

mãos colocaram pedras9nos alicerces do mundo9também mere/o o meu peda/o de pãoK, e

0acinto: INas tare%as da constru/ão do mundo9a+ui estou de no o9unido9na procissão das

ontades9ala ancas em aplica/ão comburente9a+ui estou de no o9presenteK. poesia é

sempre ista como arma de combate, Isuma po mia imperec$ el98digo8 os +ue sou perigoso

+uando9na %or/a iril do meu erso9EsperoJK e como construtora da pa uni ersal. Ela, a

@W

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poesia, é de tal %orma signi%icati a para o poeta +ue chega a ganhar uma e7pressi a

conota/ão %ecundante de humanidade.

_" na poesia de 0acinto um perene di"logo com a arte poética e com outros

companheiros do Ilutar com pala rasK, como di Drummond. 6m lidar &s e es e7perimental,

c mplice. poesia personi%icada torna8se con%idente, amiga e conselheira. Dessa entrega &

poesia e aos companheiros e companheiras poetas, ad ém, como em I lda #araK, a

consubstancia/ão da ami ade em %ace das perturba/Ces pr-prias de sua op/ão de ida. 4 eu

não se parece muito crente na concreti a/ão de seus ob eti os, da$ a in+uiri/ão: I uem

des%e nosso sonho K. *or e es, claudica. Estamos diante de poemas l$mpidos, sucintos,

cer idos num portugu s escorreito, no permanente labor do arte%ato, por isso a

reelabora/ão de alguns deles. 4 des]nimo assalta, &s e es, a alma do poeta, e7pondo suas

%ra+ue as:

5i+uei

(mutilado egeto)

resto teimando8me

a io na iniciada estradalarga estrada do destino +ue +uero

mas eis +ue:

^ preciso %rustrar o des]nimoJ

!orri

!as eu os acompanho

(a todo o tamanho)

ue a ida de no o bate & porta

2omo importa:

k recado de ressurrei/ãoJ

esperan/a renasce, então, tal +ual a % ni7, pois tudo não %oi mais +ue uma Inu em

passageiraK. No amente re igorado, o poeta (nem a morte da genitora é capa de amputar@A

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os sonhos de um mundo no o), " +ue o e7erc$cio poético é como o da pr-pria e7ist ncia, %a

da ida um eterno recome/o. ^ importante salientar +ue I!ãeK, na poética de 0acinto, se

inscre e, muitas e es, como a pr-pria genitora, ganhando um car"ter espec$%ico, a aus ncia

do s$mbolo maternal.

De tão sincopados, alguns poemas terminam por atingir um certo hermetismo, t$pico

das escrituras %ilos-%ico8e7istenciais, por e es, como em I onhemos s-isK, onde as

asson]ncias e alitera/Ces dão mais poeticidade aos ersos, dispersos no "cuo da poesia

e7perimental, o +ue não in alida a ino a/ão, nem diminui o alor liter"rio, ao contr"rio,

apenas o distancia dos ob eti os propostos pela gera/ão da Mensagem e o apro7ima da

corrente modernista brasileira de 1@GG e dos concretistas da década de 1@LB. 4bser emos

+ue o poema é datado de 1@X@ e sua concep/ão de poesia come/a a se delinear para o

pr-prio discurso poético como em oga. Nesses poemas, o +ue predomina é o e7erc$cio

metalingu$stico, o e7perimentalismo, por isso, em determinados momentos, como "

e7presso, o te7to en ereda8se pelo hermetismo. *or outro lado, o e7erc$cio poético

transmuda8se no e7erc$cio da pr-pria e7ist ncia do eu: um eterno recome/o. E muitas

e es o eu l$rico oscila entre *latão, #ongino e rist-teles, como bem e7empli%icam os

poemas I#oucuraK e I polo ==K:

E nada

ou noite

mitos e s$mbolos

loucos

e tu poesia

?ua bele a

inho8rubi

l"bios8sangue

sol l" %ora

*oesiaJ

( )

@@

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inda permanecer" na ?erra

E nos Espa/os

6ma no a espécie

*oeta e onhador

?otal e /o

inda

4 _omem...

4 lirismo em desa%io & ci ncia: ser" +ue o mar7ista se rendeu ao poeta rom]ntico

moderno 5undiu8se nele a +uestionar o ine7plic" el, como os simbolistas *erdeu ointeresse pelas coisas ob eti as do mundo, apegando8se ao sobrenatural, ou, ao menos, &

busca do inconsciente, e adindo8se na loucura e pondo8se em de aneios entre a ida e a

morte

^ I#oucuraK, pois, um poema de alto n$ el psicanal$tico, ali"s, como o são "rios dessa

le a, em +ue alguns dos temas mais uni ersais se pCem & pro a: ida e morte. 4 +ue se

percebe é o ego$smo humano perante essas Icausas pétreasK do outro, puro IsadismoK:

cobran/a, rai a, por se sentir lesado em seu direito do outro. Não amos, porém, in%iltrar8nos

nessa seara por agora.

4 eu l$rico, no entanto, continua sua I%a7inaK interior: é a e7peri ncia interte7tual,

para%r"sica, o di"logo entre os seres poéticos +ue se buscam na e7plica/ão do ine7plic" el,

são os de aneios dessa alma embebida de Dion$sio e de polo também.

I4 ritmo do tantãK, s$mbolo da comunica/ão entre a%ricanos e seus deuses, não est"no sangue nem na pele, est" no cora/ão, no +ue pensa e no +ue sente, poema amalgamado

num tom de re olta re ela a autoestima, o orgulho e a autoa%irma/ão das origens do eu

poético, do ser8se a%ricano, independentemente da cor.

^ como se o eu l$rico esti esse a dirigir8se a um interlocutor preconceituoso, +ue

repudia a+uele +ue não tra na pele a marca original da [%rica Negra. ^ um recado de +uem

so%re no seu ser a e7clusão +ue tanto combateu. ^ um reclamo de seus direitos. ?al e a+ui o

1BB

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autor nos chame a aten/ão para um problema inter8relacional do pr-prio po o angolano,

também tratado por *epetela em Ma ombe. 0acinto, no ltimo poema, con ida8nos a re%letir

sobre os mistérios +ue cobrem as linhas lim$tro%es da e7ist ncia humana: ida e morte, para

+ue dessa re%le7ão possamos tirar as conclusCes a n-s mesmos inerentes.

*+@+ +@+ Tarra1al l2r co

Na ltima parte da antologia, composta de 13 poemas, relati amente curtos,

encontramos um eu poético pro%undamente l$rico e amoroso, se é +ue podemos 8lo de

outra %orma +ue não abra/ado & lira. +ui estamos diante, erdadeiramente, de um poeta

re eladamente l$rico e contido em suas re%le7Ces e7istenciais: +uer se am %ilos-%icas, morais,

pol$ticas ou amorosas, trabalhando o poema, amalgamando sua %orma ao conte do, como a

buscar uma harmonia entre os dois: %orma e conte do, onde a pure a e o dese o carnal

e7ercem o imbr-glio poético, e7ercendo a+uela uma certa supremacia sobre este, numa

clara interte7tualidade com as prostitutas e as estrelas do bardo brasileiro, " citado, !anuel

'andeira de I ou8me embora pra *as"rgadaK e IEstrela da ida inteiraK. !esmo emI pontamento para poemaK, +ue tem seu in$cio carregado de lasc$ ia, termina Inum

discreto sorrisoK.

Em IE oca/ão remotaK, mais uma e seguindo a linha do poeta modernista brasileiro

!anuel 'andeira, para +uem a IestrelaK aparece como s$mbolo do ob eto do dese o

amoroso (a estrela e as prostitutas), o eu l$rico recorda os momentos de puro amor IEm casa

de Em$lia abaloK, onde se percebe o contraste entre a %igura de INossa enhoraK e as

ati idades ali praticadas. ?udo isso INa longetempopassada casa9De Em$lia 5ragoso

abalo...K. 4 poeta então olta sua IEntregaK aos de aneios de +uando

Era

e7ist ncia repartida

E o sonho

romas de todas as %lores1B1

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+ue murcham ao sol posto

e i/am prima eras

pela no a manhã

?rata8se, portanto, de um eu nost"lgico, a %alar de um I morK do passado, presente

apenas pela %or/a da mem-ria e da arte poética. Em momentos raros como em IE agora +ue

nos temos9?oda me tremes95remes9(ohJ 0ardim de del$cias e...)9Del$rio de bei os9E tactos9

(... de loucos cansa/osJ)K. 4 eu l$rico se insinua mais lasci o, mas não ousa outros oos. o

lado dos e7erc$cios metalingu$sticos, +ue compCem toda a obra de nt-nio 0acinto,

encontraremos elementos da nature a como a noite, o sol, bem como a m sica e a dan/a,

são esses componentes +ue dão ida ao I morK e arre%ecem a tensão nost"lgica, +ui/"

b]n ica, +ue atormenta o eu l$rico.

*+@+ + + Al.0mas cons dera= es do ,oeta so;re o se0 tra;alho ,o?t co

Em entre ista concedida a !ichel #aban e publicada no olume = da cole/ão Angola:

encontro com escritores , perguntado sobre +uais in%lu ncias so%rera no in$cio de sua carreira

como poeta, nt-nio 0acinto esclarece +ue as primeiras moti a/Ces partiram de sua mãe

+ue, na in%]ncia, lhe narra a os contos in%antis da tradi/ão portuguesa, declama a poemas

de poetas portugueses e canta a também. #embremos +ue os pais do poeta, embora com a

+uarta classe escolar, tinham boa leitura dos escritores portugueses. Ele a%irma, também,

+ue, antes de entrar para o Movimento dos Novos Intelectuais de Angola, os li ros escolares

eram a base de sua leitura, ao depois, mante e contato com a poesia dos mo imentos

laridade e erte1a, de 2abo erde, e com a poesia brasileira.

!ais especi%icamente e " nos anos de 1@HB, declara 0acinto serem os neorrealistas

portugueses, do No o 2ancioneiro e sob o signo do galo, os brasileiros, basicamente os +ue

%i eram o !odernismo, os escritores negros norte8americanos, da I<enascen/a do _arlemK e

os poetas da INegritudeK, nos anos LB, além de 2astro oromenho, le7andre D"sOalos e,

principalmente, Noémia de ousa, suas leituras habituais. Di o poeta:1BG

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Noémia tinha escrito os poemas +ue n-s gostar$amos de " ter escrito V é

esta a sensa/ãoJ Esse caderno circulou. Eu assumi8me como propriet"rio do

caderno, mas era s- para não perder o seu destino. Então, %oi circulando V ia

e inha V e toda a gente leu os poemas da Noémia. desão aos poemas da

Noémia, muito grande... e hou e cr$tica & +uestão %ormal dos poemas, %oi

do !"rio nt-nio. *or+ue o !"rio nt-nio +ue ela acusa a de arti%$cios

emocionais muito grandes na constru/ão dos poemas. 4 !"rio nt-nio é

um homem cerebral, critica a, e critica ainda, em poesia, a %acilidade da

constru/ão declamati a, a grandilo+u ncia sonora de certos poemas

re estindo8os de um alor poético aparente +ue e%ecti amente não

possuem. Era isso +ue aponta a & Noémia. !as n-s todos aceitamos, como

eu lhe digo: sentimo8nos des%raldados. *ens" amos +uer$amos escre er e "

esta a escritoJ (# ' N, 1@@1, p.1XX)

^, portanto, de se er +ue as in%lu ncias giram em torno da+ueles escritores +ue

busca am uma %orma de liberta/ão dos moldes cl"ssicos e uma apro7ima/ão com as classes

populares, uma e +ue se trata a de escritos +ue se re estiam de muita cr$tica social. _a ia,

porém, " na+uela época uma discussão sobre o %a er poético. !ais adiante declara o poeta:

té por+ue, na altura, eu e outros nos consider" amos escritores muito

med$ocres, poetas med$ocres, mesmo, principiantes... 4 +ue era preciso era

dar uma mensagem pol$tica. 4s meios 4 +ue era acess$ el era a poesia:

então, pois, seria poesia. e hou esse outra possibilidade, seria outra...

tra és do conto, da poesia, a preocupa/ão era de ordem pol$tica. (# ' N,

1@@1, p.1H@)

Esse depoimento é importante para esclarecer a di isão +ue %a emos da poesia de

nt-nio 0acinto: a poesia do enga amento pol$tico e a poesia da prisão no ?arra%al, onde o

poeta %icou por mais de de anos. !ais adiante 0acinto esclarece ainda mais a sua isão do

1B3

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%a er poético:

Eu não sei se hou e e olu/ão liter"ria. Eu poderei di er é +ue, praticamente,

depois de XB eu creio +ue não %i ersos com a %re+u ncia com +ue inha

%a endo anteriormente. Eu posso mesmo recuar: creio +ue depois da

intensidade da ida pol$tica, a ida liter"ria cedeu o passo a essa ida

pol$tica. E ersos +ue eu tenha %eito são espor"dicos... =sso a$ são ersos

escritos noutras circunst]ncias V são escritos no ?arra%al, num mundo muito

%echado, também, concentracion"rio, longe das realidades da terra, com

outra realidade, dei7ados in%luir também pelo ambiente cobo8 erdiano (...)

também com muita in%lu ncia das leituras %eitas l"... 4 !anuel 'andeiraestar" a$ presente... 5ernando *essoa também estar" presente, Eugénio de

ndrade estar" presente, 0osé omes 5erreira (...) $ " h" a preocupa/ão de

codi%icar. Eu creio ho e +ue, também, daria outro arran o, ou outra %orma, a

muitos poemas anteriores. uer di er +ue h" uma concep/ão no a da obra

poética...(# ' N, 1@@1, pp. 1WB81W1)

4 +ue se percebe é +ue se trata de um artista +ue tinha consci ncia de sua obra na

altura em +ue escre eu os poemas de combate, inculados & INegritudeK e ao neorrealismo,

bem como ao longo dos anos +ue se seguirão & sua prisão, & independ ncia e & p-s8

independ ncia, um poeta cMnscio da arte em si e de seu trabalho. o longo da entre ista, é

not-ria essa isão alargada da literatura angolana p-s8independ ncia, +uando os escritores

buscarão outros caminhos e outras %ormas de concreti "8la, seguindo, por assim di er, as

pala ras de gostinho Neto, o 2amarada *residente, nas duas inter en/Ces +ue %e na 6niãodos Escritores de ngola sobre a literatura e a cultura angolanas.

1BH

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*+ + r ato da Cr0H8 0m ,oeta com ; l n.0 smo

*+ +*+ Per1 l ; o; ;l o.r<1 co e l ter<r o

( ) a maior parte dos poetas tem sido capa de manter umcontato m$nimo com as popula/Ces do seu meio e identi%icar8se, tradu ir a ida desses homens nos seus poemas. ssim osentimos +uando lemos os belos ersos de iriato da 2ru , de

nt-nio 0acinto ou de 2osta ndrade. ( gostinho Neto)

^ atra és da Mensagem ou em liga/ão a ela +ue surgem asgrandes %iguras de escritores e re olucion"rios de gostinhoNeto, nt-nio 0acinto e iriato da 2ru . ( ntero de breu)

ssim nasceu a literatura angolana moderna, distinguindo8seos primeiros poetas +ue come/aram a deci%rar o real+uotidiano: iriato da 2ru , nt-nio 0acinto, gostinho Neto. gera/ão da Mensagem entoou, com e%eito, o no o canto daangolanidade. (!"rio ndrade)

iriato 5rancisco 2lemente da 2ru nasceu em *orto mboim, ngola, em 1@GA. 5oi o

primeiro teori ador e ati ista do Movimento dos Novos Intelectuais de Angola. Este e ligado

& cria/ão, em 1@LL, do *artido 2omunista ngolano, além de ter sido membro %undador do

!*# e seu primeiro ecret"rio8 eral. 2resceu numa %am$lia em situa/ão econMmica di%$cil,

uma e +ue o seu pai a tinha abandonado. pesar das di%iculdades, %e estudos liceais no

#iceu al ador 2orreia. Nos anos 1@LB, este e em contato com a mo imenta/ão anticolonial

clandestina em #uanda, incluindo o *artido 2omunista ngolano, sendo um dos seus

%undadores. bandonou ngola por olta de 1@LW, para se dirigir a *aris, onde se encontrou

com !"rio *into de ndrade, desen ol endo ati idades pol$ticas e culturais.

5e parte da recém8%ormada 5< =N (5rente <e olucion"ria %ricana pela

=ndepend ncia Nacional dos *o os sob Dom$nio *ortugu s), e, ainda em 1@XB, %e uma

iagem & 2hina para obter apoios.

Em 1@XG, iriato da 2ru abandonou o cargo de secret"rio8geral do !*# , de ido a

di erg ncias com o presidente do mo imento, gostinho Neto, e %oi %ormalmente e7pulso,

em 1@X3. obre o epis-dio assim se e7pressa o pr-prio presidente do !*# :1BL

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4 %raccionismo e7iste desde a %unda/ão do !*# . ?i emos +ue combater

"rios grupos %raccionistas, +ue ho e estão totalmente entregues ao

imperialismo.

Em 1@XG93, iriato da 2ru condu iu uma ala %raccionista, ainda +uando n-s

nos encontr" amos no e7$lio, no I2ongo `inshasaK, iriato da 2ru +uis

%ormar o seu !o imento dentro do !*# e acabou por se entregar & 5nla.

!ais tarde, %oi se entregar & 2hina onde ele perdeu a sa de e eio a %alecer.

uer di er +ue " em 1@XG, n-s ti emos +ue combater as ideias erradas +ue

alguns dos nossos compatriotas de%endiam dentro do !*# e esses

mesmos indi $duos não ti eram outro remédio senão entregar8se aosnossos inimigos. Entregar8se ao imperialismo para lutar contra n-s, para

encontrar armas para lutar contra n-s e acabaram por desaparecerK.(Neto,

p.@)

iriato da 2ru ia a em 1@XX para *e+uim, onde %i7a resid ncia. sua chegada deu8

se, assim, no in$cio da <e olu/ão 2ultural 2hinesa. 6ma das suas primeiras a/Ces %oi a de

a udar a di idir a 4rgani a/ão de Escritores %ro8 si"ticos (4E ), no decorrer da sua

ssembleia eral E7traordin"ria, +ue decorreu em *e+uim, entre os dias GW de 0unho e @ de

0ulho de 1@XX, em duas agremia/Ces distintas: a pr-8so iética, baseada no 2airo, e a pr-8

chinesa, com sede em *e+uim e em 2olombo, no ri #anOa. *or suas con ic/Ces pol$ticas,

entra em con%lito com os ob eti os mao$stas, o +ue lhe acarreta uma espécie de prisão

domiciliar na 2hina.

2om o claro prop-sito de precipitar a e7pulsão do seu marido e %am$lia da 2hina, a

mulher de iriato, !aria Eugénia, derrubou o busto do presidente !ao Yedong. 4 e%eito %oi

precisamente ao contr"rio: as autoridades chinesas desterraram8nos para um campo de

trabalho na região sul da cidade de *e+uim. 4s ltimos anos de ida do poeta %oram

marcados por %alta de alimentos, o +ue acabou por %ragili "8lo. indo a %alecer no dia 13 de

0unho de 1@W3. 5oi sepultado no cemitério para estrangeiros +uase como indigente.

egundo o pro%essor da 6 *, 5ernando !ourão, +ue mante e rela/Ces de ami ade1BX

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com o poeta:

*odemos a%irmar +ue iriato da 2ru , uma personalidade multi%acetada,

a%irmou8se na +ualidade de mulatoS sem comple7os, o +ue nada tem a er

com a sua concep/ão pol$tica de a lideran/a do aparelho partid"rio de er

obrigatoriamente ser condu ida por a%ricanos negrosS.

5i eram8se e ainda se %a em cr$ticas a iriato da 2ru , pondo8se em

e id ncia um certo desalento, com origens "rias, do autor %ace &s

icissitudes dos %atos, atribuindo essa poss$ el maneira de estar a "rias

causas. Na erdade iriato da 2ru mostrou uma enorme capacidade

humana de resist ncia, como +ue sempre disposta a recome/ar, por e es

e+ui ocado.

4 lado humano de iriato da 2ru merece desta+ue, até por+ue é uma

+ualidade rara entre os humanos e ainda pelo %ato, +ue tal e se a uma das

cha es para ultrapassar o so%rimento. Em iriato ha ia duas constantes: por

um lado o humanismo, por outro a busca in%ind" el no campo da teoria

pol$tica, guiada pelo dese o de %a er a an/ar a luta de liberta/ão e ainda de

relacionar o bem estar humano com o +uadro te-rico do mar7ismo, um

mar7ismo, como se di ho e, até certo ponto re isitado em rela/ão aos

te7tos cl"ssicos. (<42_ et al ., p.GA)

!ais adiante, !ourão rati%ica +ue 2ru acabou isolado na 2hina, +ue, na altura da

<e olu/ão 2ultural, proibia a liberdade de e7pressão dos artistas +ue l" i iam: I#i `uchan %oi

perseguido por 0iang uing, a esposa de !ao; #u anshan, o ltimo dos mestres das

paisagens da 2hina do ul, é con%inado numa s- pe/a com a %am$lia; os artistas cal$gra%os são

perseguidosK, o +ue e idencia o drama i ido pelo grande te-rico do Movimento dos Novos

Intelectuais de Angola.

iriato da 2ru colaborou com as seguintes publica/Ces: ultura &I e DD', Mensagem

(#uanda e 2E=), ornal de Angola e "i)rio de Luanda . ^ unanimemente reconhecido como um

dos principais precursores da moderna poesia angolana. !ante e com !"rio *into de1BW

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ndrade, de +uem o poeta era muito amigo, uma correspond ncia, cont$nua, prolongando

assim as con ersas culturais e liter"rias dos anos da u entude. ssim %alou ndrade sobre

2ru : I iriato era um homem de grande capacidade de organi a/ão e a ele se de e a

emerg ncia das %or/as mais progressistas de ngolaK. 4 poeta tem uma nica obra editada:$oemas (1@X1). eu nome, porém, é re%er ncia em todas as antologias nacionais e

estrangeiras de poesia a%ricana. "rios de seus poemas %oram musicados e até ho e ecoam

nos ou idos do po o de ngola e de *ortugal, como são e7emplos P!aOé P e PNamoroP,

musicados por <ui !ingas.

egundo Noémia de ousa, I*or terceiros soube do seu a%astamento do !*# e de

outros epis-dios da sua ida, incluindo a ida para a 2hina, a sua morte, a traslada/ão dos

seus restos mortais e o %uneral, em GW de De embro de 1@@B, para o cemitério do lto das

2ru es, em #uandaK. *ara ela, a imagem de iriato da 2ru +ue %ica é a de um homem magro,

de -culos de aro grosso, grande cra eira intelectual e pol$tica, poeta ino ador, %ino sentido

de humor, apai7onado por uma causa, e +ue não dei7a a ninguém indi%erente. amiga ainda

lembra +ue alguns dos seus contempor]neos, +ue & época do seu a%astamento do !*# se

lhe opuseram, como !"rio, lamentaram mais tarde não se ter %eito o es%or/o necess"rio para

a concilia/ão, reconhecendo8lhe grandes +ualidades organi ati as e de lideran/a. #embraainda +ue outro %undador do partido +ue tem go ernado ngola desde a independ ncia,

_ugo ancourt de !eneses, a%irmou +ue iriato %oi um elemento determinante na cria/ão

do !*# (c%. <42_ et al ., p.GA).

Esse depoimento da poetisa mo/ambicana é importante para termos a clare a do

alor humano, pol$tico e poético +ue compunha a %igura de nosso ilustre pensador a%ricano,

de um modo geral, e, no particular, de ngola e de sua gente. 4utro depoimento +ue

enri+uece o nosso trabalho é o do poeta ?om" 0orge: IEntão, num "pice, o grupo de dois

con+uistou mais dois e mais dois e, em bre e tempo, éramos muitos, na maioria poetas:

iriato, eu, nt-nio 0acinto, 'andeira Duarte, _umberto da il an, #eston !artins, mais tarde

os mais no os como !"rio nt-nio e nt-nio 2ardoso, tendo como escriba o prosador

seguro de nome !"rio lc]ntara !onteiro, +ue colige toda a colabora/ão da re ista

Mensagem sob o slogan amos Descobrir ngola , de autoria incerta, tal e do poeta mais

modesto _umberto da il anK. *ara 0orge, iriato %oi um caudilho, um lutador c$ ico, um1BA

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intelectual maior, sem, no entanto, ter dei7ado obra liter"ria ao n$ el superior do seu talento.

6ma e +ue esta a mais ocupado com a re olu/ão e a doutrina mar7ista8leninista, do +ue

com a poesia, embora %osse poeta de grande a maior, escultor e até pintor. I4 amos

Descobrir ngola é o slogan de moti a/ão, bandeira oral, +ue se pronuncia a com energia eemo/ãoK (<42_ et al ., p.GA). 2om esses depoimentos, %inali amos o +ue de e a+ui ser

considerado o percurso e7istencial, poético e pol$tico de iriato da 2ru , isto não ser nosso

ob eti o lidar com uma biobibliogra%ia completa de nenhum dos autores tomados como

corpus nosso.

*+ +3+ r ato da Cr0H8 o ,oeta e s0a ,oes a

4s poemas +ue escre eu continuam a ser populares emngola, conhecidos e cantados em *ortugal, antologiados por

toda a parte. 4 nome e a obra circulam ho e pela =nternet, emp"ginas lus-%onas, %ranc-%onas e angl-%onas de poesia oucritica. Naq moro , por e7emplo, tornou8se um cl"ssico aomesmo tempo da m sica popular ango1ana e da portuguesa.

em rima, com métrica muito %le7$ el, com o ritmo agitando8seentre o do erso e o da prosa, tanto como entre o do metro eo da marimba, contando um caso tipicamente luandense deenamoramento, %oi %"cil de musicar e mais %"cil ainda %oiconsumi8lo no pa$s colonial, como em outros onde chegou s-por ia escrita.

uais as ra Ces do sucesso num poeta de +ue saiuum.pe+ueno li ro, com escassos poemas e +ue, segundo tudoindica, trocou muito cedo a poesia pela pol$tica li"s, de umhomem onde o pol$tico matou o poeta *or+ue %oi ele tido porIpossi elmente o poeta representati o da poesia angolanaK, Iomelhor reali ado dos poetas angolanosK egundo !"rio

nt-nio, o +ue Iiria %i7ar, para os poemas de iriato, umaposi/ão $mpar na poesia angolanaK, tornando8o no Iprimeiropoeta angolanoK, era Io sentido de descobertaK, +ue %aria com+ue não se soubesse Ionde come/a o poeta e onde come/a asua genteK. (5rancisco oares in pre%"cio de $oemas ,N-ssomos, GB13)

obra de iriato da 2ru resume8se a apenas 1G poemas: 1B publicados na antologia

da N-ssomos, de GB13, e +ue utili amos como re%er ncia de nossocorpus e dois dispersos1B@

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não inclusos na edi/ão (não e7iste, até o momento, nenhuma publica/ão com os 1G poemas

do poeta). pesar da escassa produ/ão, o nome do poeta é re%er ncia em todas as antologias

da moderna poesia angolana produ ida entre as décadas de 1@HB e 1@WB, destacando8se

pela n%ase +ue d" &s ra$ es da poesia popular e da den ncia da e7plora/ão do po o e daterra a%ricana, cognominada de I!ãe ?erraK, no seu sentido mais pro%undo. ?rata8se, pois, de

poemas com rara plasticidade poética, nascidos da intera/ão eu9l$rico8po o8terra8cultura8

e7plora/ão, dando maior en%o+ue &s hist-rias populares, &+uilo +ue compCe o cerne do

%olclore angolano.

2ompete8nos, em primeira linha, %a er uma aprecia/ão das pala ras do eminente

cr$tico e historiador da literatura angolana 5rancisco oares em ep$gra%e, uma e +ue

discordamos, em parte, dela. 0" no seu primeiro par"gra%o, di oares: I*ela in%lu ncia +ue

dei7ou, pela recep/ão +ue te e mas, sobretudo, pelos poemas +ue escre eu, iriato da 2ru

pode ser considerado o grande paradigma da literatura nacional angolana e o seu m"7imo

e7poente poéticoK. Embora concordemos +ue os poemas de iriato da 2ru podem ser ir de

modelo para as gera/Ces seguintes, assim como os de gostinho Neto e de nt-nio 0acinto,

somos obrigados a discordar do peso emocional com +ue oares carregou suas pala ras

%inais: Io seu m"7imo e7poente poéticoK. - podemos admitir +ue o cr$tico tenha sidoacometido por uma carga a%eti a em ra ão das icissitudes +ue acometeram o nosso grande

poeta, pois, para n-s, baseados em pro%$cua pes+uisa acad mica, inclusi e em li ros de

pes+uisadores por ele re%erendados, não pode ser iriato da 2ru ele ado & condi/ão de

arauto m"7imo da poesia nacional de ngola, por "rios moti os, bastando apenas dois para

derrubar a sua tese: iriato escre eu tão somente 1G poemas; embora de alt$ssima

+ualidade alguns, sua obra, ainda, torna8se insu%iciente para e7ercer tal posto, +uer se a pela

+uantidade, +uer se a pela subst]ncia poética +ue caracteri aria a produ/ão da Mensagem,-rgão respons" el por di ulgar o produto poético e cr$tico de seus representantes e

in%luenciadores: uillén, #angston _ughes, imé 2ésaire, 5anon, `eita 5odeba, Da id Diop,

5rancisco 0osé ?enreiro, dentre outros.

creditamos, e a an"lise +ue segue de seus poemas h" de con%irmar, +ue iriato da

2ru tem seu espa/o, indiscuti elmente, dentro do c]none da no a poesia angolana,

estando, porém, longe de ser o Ie7poente m"7imoK, como +uerem alguns e não nos con ém11B

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assegurar essa posi/ão a nenhum deles, embora reconhe/amos em gostinho Neto, por tudo

+ue %oi dito a seu respeito e sua obra, inclusi e pelo pr-prio iriato da 2ru , um poeta mais

completo. Nas circunst]ncias +ue norteiam este trabalho, por uma parte, identi%icamos Neto

como a+uele poeta +ue mais se apro7ima do identit"rio angolano em seu con unto pol$tico,hist-rico, lingu$stico, cultural e re olucion"rio. Essa constata/ão não des+uali%ica, em

nenhum momento, o bom poeta +ue é iriato da 2ru . enão e amos.

4s tr s primeiros poemas IDois poemas & ?erraK, INa encru ilhadaK e I " da

bandeiraK constituem re%erenciais diretamente oltados ao elemento terra, ao locus, ao

espa/o onde i e o eu l$rico e sua gente. 4 primeiro, di idido em duas partes, é introdu ido e

encerrado pela mesma ap-stro%e: I4h ?erra, oh ?erraJ 4h minha !ãe ?erraJJK. ela, o eu

l$rico se dirige como sendo uma série de opostos identit"rios da espécie humana, inclusi e o

p-, a matéria de +ue somos compostos. 4 ser, porém, +ue %ala no poema outorga8se uma

superioridade edipiana em %ace do resto da humanidade. e+uioso, ele tenta e7plicar ao

resto da humanidade, atra és da I!ãe ?erraK, a uni ersalidade dos bens do planeta, tudo

isso acompanhado por um sentimento de perten/a:

!as sou amor, -dio, emo/ão

(...)

ra/as aos meus ner os, &s minhas cames, aos meus olhos,

minha o V a este corpoJ

do barro do teu chão

da "gua das tuas %ontes

- por ti consigo ser

o amor +ue trans%orma para melhor,o -dio libertador +ue atemori a, arrasa e silencia,

a emo/ão +ue dinami a a apatia

e ence os imposs$ eis

(...)

V de onde m, de onde m senão, - ?erra

do seres o ber/o de todos,

o rega/o de todos

111

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!ãe ubérrima li remente dadi osa e igual V de todos ...

4hJ

4h ?erraJ 4h ?erra, oh nossa !ãe ?erra (2<6Y, GB13, pp. G@831)

^ de se notar a trans%orma/ão indi idualista do eu no coleti o, agora Iminha !ãe

?erraK passando a ser Inossa !ãe ?erraK, perdendo a incerte a apresentada na interroga/ão

Ide todos K.

4 segundo poema, dedicado a Du 'ois e a gostinho Neto, INa encru ilhadaK, pelo

t$tulo aponta para tr s caminhos, ou as tr s %aces de _écate: a deusa da magia, se

desdobrarmos o termo Ien9cru 9ilhadaK e buscarmos o seu signi%icado: por onde se cru amdois ou mais caminhos, ou ainda, local onde se praticam rituais e %eiti/os. ^ um te7to +ue

pode le antar alguma suspeita, mas numa leitura mais s-bria e buscando a o do pr-prio

poeta:

*ara além da alegria mult$moda deste par+ue acolhedor

(...)

*ara além do olhar amplo mar manso das crian/as

(...)

*ara além de +uanto me d" esta emo/ão positi a, eu e o

(...)

mão no arado a mão no tear a mão na en7ada,

(...)

a agulha na mão debai7o da mão tachos no %ogo +ue a mão

domou, eu e o2abe/as na escora da mão pensando aumentar da mão o

poder, eu e o,

o li ro na mão o _omem a !ão, eu e o

o trabalho crescendo na *a criadora oh a *a V

o modo humano da e7ist ncia %ecundaJ l-ria

*a

E a -s também - paladinos da ida V

11G

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_umani ais os cora/Ces de pedra do mundo cobrindo8os

2om o manto indom" el da ossa ac/ão de musgo

Nos olhos inceg" eis do osso +uerer de musgo, um par+ue

(...)

E tomaremos nosso alimento com as nossas mãos de semente

2heias de inoc ncia e poder construti o oh

l-riaJ -s campeCes da ida V l-riaJ (2<6Y, GB13, pp. 3G833)

Ele parece8nos +uerer di er +ue os sonhos do po o de [%rica estão nas mãos desses

dois $cones +ue o representam. erão, pois, Dubois e Neto os construtores de um no o

tempo, de uma no a terra ei ada de pa , amor e harmonia dedicat-ria não é em ão, poisiriato " concebia Neto & altura do Dr. Dubois, " o ia como um $cone.

0" o poema I " da 'andeiraK, descriti o +ue é, prende8se & bele a pictural +ue emana

da paisagem natural, ar+uitetMnica e humana da cidade, predominando o to+ue l dico e

l$rico +ue encanta o ser poético.

4 poema I<imance da menina mo/aK, K(segundo o "icion)rio Informal ,nline ,

rimanceiro ou romanceiro, de onde deri a IrimanceK: é um género poético de origem

medie al, +ue corresponde, na pen$nsula =bérica & balada narrati a medie al europeia. (...)

*or seu turno, na segunda metade do século \ =, a barro+ui a/ão crescente do género

alter"8lo8" pro%undamente, perdendo a sua narrati idade e ad+uirindo uma tonalidade

e7tremadamente l$rica. !as, em paralelo com a ersão %i7ada no c-dice manuscrito e no

li ro ou %olheto impresso, o <omanceiro i eu e i e na mem-ria colecti a, transmitido de

gera/ão em gera/ão, da$ as err-neas designa/Ces popular e oral para este género)K, te7to de

2ru , poeta moderno, adota a pluralidade métrica, embora mantenha o erso curto,

notadamente a redondilha menor, como base do desen ol imento, da glosa, e os mais

longos como estribilho ou arremate, ou moti o, sem rimas, porém num ritmo e7tremamente

musical, em +ue se alternam "rias o es: a do eu l$rico9narrador: I menina da ro/a9est" no

terreiro9cosendo a toalhinha9pro seu en7o al...K; a da menina: I ue céu tão lindoJ,9e o

encanto da mataJ9 i, tanta bele a9na ca%e alJ...K; e a dos negros: VIEst" ele a chegar JK, e a

das negras: IV 0" iu a minina ...S9S_em... tem cor amarela9do mburututu...S9V E não come

113

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nem nada...S9V E os olhos de mel9tão8se a%undar9numa lago a ul9+ue %a sonhar...SK. *ara

5rancisco oares, o te7to Iremete para l$ricas e narrati as t$picas de certos per$odos das

literaturas brasileira e portuguesa, do século \=\ e da primeira metade do século \\K. 2r ele

+ue as da literatura brasileira ganham especial desta+ue num t$tulo, , 4omanceiro daInconfid(ncia, de 2ec$lia !eireles, te7to +ue recupera a hist-ria da =ncon%id ncia !ineira e

de personagens como !ar$lia e Dirceu, do rcadismo. Di ele: I titula/ão repete8se na l$rica

da mesma autora, com a %orma IrimanceK, em!aga M<sica , publicada em 1@HG, também no

<io. *ara ele I Qmenina da ro/aQ leria pro a elmente os romances regionalistas brasileiros

em +ue se %ala a nas ro/as e nos seus amores in%eli es. iriato da 2ru contrapunha8lhes as

de ngola e ão ?omé, respondendo a esse tipo de literatura com uma representa/ão

dialéctica. pala ra Iro/aK, ali, remete para estes dois aspectos contradit-rios. 4 primeiro érepresentado pela menina; o segundo é representado pelos coment"rios subtis do poeta,

+ue ou re%erir aindaK (<ochaet al ., pp. @18@G). Eu pre%iro esta outra linha, +ue não é em seu

todo di%erente. 4 tema é t$pico dos poetas rom]nticos +ue antecederam a gera/ão da

Mensagem em ngola e no 'rasil, em +ue a dor da protagonista se mistura aos elementos da

nature a, integrada ao sentimento humano: I!enina da ro/a V "guas do rio9saudades da

%onte... dese os de amarK. Esse tipo de romanceiro é muito recorrente no cancioneiro

popular de "rias culturas; um e7emplo bem conhecido é o tema de I?eresinha de 0esusK:

?eresinha de 0esus

De uma +ueda %oi ao chão

cudiram tr s ca alheiros

?odos tr s chapéu na mão:

4 primeiro %oi seu pai

4 segundo seu irmão

4 terceiro %oi a+uele

ue a ?eresa deu a mão

2hico 'uar+ue de _olanda também recria o tema: I4 primeiro me chegou92omo

+uem em do %lorista9?rou7e um bicho de pel cia,9 (...) 4 segundo me chegou9como +uem

chega do bar (...) 4 terceiro me chegou9como +uem chega do nadaK, o " citado ?rilussa11H

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também o recria em I#a ispa ?eresaK, s- para %icarmos nesses dois. omos, no entanto, a

%a or da seguinte tese apresentada por oares:

4 poema de iriato da 2ru pode ser lido como uma resposta da poesia

nacionalista angolana ao car"cter, originalmente subtil e re+uintado, mas

alienado, +ue a hist-ria do IrimanceK continha no pa$s (por ia da l$rica dos

colonos) e %ora dele (pelas ias citadas). *or tal moti o o caminho +ue

aponta & angolanidade liter"ria é o de uma alegoria comprometida com

uma isão cr$tica da sociedade. 4 aspecto cr$tico est" representado, na

terceira estro%e, pela imagem da menina alongando Ia istaK, & +ual se

segue a resposta Ido a/o de en7adas 9 dos negros na tanga ...K , +ue nega ailusão do carro a ir, o carro +ue traria o seu amado pelas rodas da

ci ili a/ão. (<ochaet al ., pp. @G8@3)

4 poema I erão de meninoK, ou sarau, ou reunião recreati a, no caso, o contar

est-rias para as crian/as & noite, normalmente, nele tr s o es dialogam: a do narrador das

est-rias (INa noite de breu9ao +uente da o 9de suas a -s,9meninos se encantam9de contosbantus...K, a o ancestral IEra uma e uma cor/a9dona de cabra sem macho...K); a dos

meninos, encantados e amedrontados com o balou/ar dos galhos das "r ores, das

ImulembasK (IV Eué9V ^ casumbi...K); e a da Igente grandeK +ue ri do medo das crian/as

(Ibem perto dali9%ei ão descascando para o +uitande V 9a gente grande com gosto ri...92om

gosto de ti, por+ue ela di 9+ue o casumbi males s- %a 9a +uem não tem amor, aos mais9seres

busca, em negra noite,9essa outra o de casumbi9essa outra o V 5elicidade...K). Nesses

trechos, percebe8se a per%eita integra/ão: crian/as, gente grande, est-rias, ancestrais,

costumes e nature a. !esmo a+ui, em +ue se insinua uma ad ert ncia da supremacia do

bem sobre o mal, atra és das alegorias, como met"%ora do coloni ador s. colono, o +ue

sobressai é o %olcl-rico, não nos es+ue/amos, repudiado por 5anon. mise en ab me é uma

técnica muito utili ada por 2ru , como bem esclarece oares:

2omo " %i era em M anto , a+ui iriato não s- transcre e as %alas das11L

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personagens, também introdu uma parcela de outra est-ria, numa

proli%era/ão t$pica de mil e uma noites e de "rios di"logos %ilos-%icos

também V a proli%era/ão estrutural e narrati a a +ue os %ranceses chamam

mise em ab me . Essa estrutura narrati a tem paralelos, portanto, com

discursos de sabedoria eiculados pela tradi/ão escrita e ai tra er uma

mensagem +ue se cola & sabedoria dos elhos. uer di er, não dei7a de se

relacionar simultaneamente com a tradi/ão oral. (<ocha et al ., p.A@)

4 poema I!aOé K, musicado e interpretado por ndré !ingas, uma das obras8

primas do cancioneiro popular angolano, escrito em heptass$labos, caracter$stica dos

cantares populares, re ela8nos mais uma contradi/ão do mundo no o a%ricano, dito

Ici ri adoK e o passado i ido por Ia - \iminhaK e Imano 5elisbertoK, em %ace das

icissitudes ine7or" eis do tempo, apresentadas no di"logo entre as personagens +ue se

negam a admitir o no o, o +ue de certo modo parece ter o a al do eu l$rico. <ico de

poeticidade e sabedoria popular, a%eito, contudo, ainda ao %olclore local, o +ue não

desmerece sua grande a, mas, repetimos, se distancia um pouco dos poemas negritudinistas

e pan8a%ricanistas de Neto. Na estro%e a seguir, +ue usamos como ilustra/ão, é admir" el a

irre er ncia, a ruptura lingu$stica, num apro eitamento genial do %alar do po o, como diria

'andeira (Ia l$ngua errada do po o, a l$ngua certa do po oK):

IE di ainda pro cima,

(_um ... mbundu Oene mu7ima ...)

ui, o nosso bom maOé

^ pra eios como tuK V,

V IEles não sabe o +ue di ...

*ru +ué +ui i i %ili .

E tem cem ano eu e tu K

4 segundo erso, carregado de ironia, de desdém, escrito em Oimbundo, encerra um

chiste do tipo I alei8nos Nossa enhoraK, e e7prime a re olta com a des%eita do alioso

11X

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man ar, respons" el pela longe idade de ambos: IV ^ pru+u nossa rai 9tem %or/a do

maO ...K. ^ preciso, no entanto, argumentar +ue l%redo !argarido, no +ue se re%ere ao

processo poético de 2ru , posiciona8se de maneira um tanto ad ersa:

e iriato da 2ru adapta muitas e es estruturas poéticas portuguesas, é

para as iolentar, ao impor8lhes uma constru/ão angolana. mudan/a não é

somente tem"tica no sentido de +ue ele tenta encontrar uma constru/ão

especi%icamente angolana no interior das estruturas da poética portuguesa.

4 recurso ao +uimbundo, assim como &s de%orma/Ces %onéticas do

portugu s, não são uma tentati a %olcl-rica ou populista mas a busca duma

sem]ntica angolana. (! < <=D4, p.33@)

2ompete8nos esclarecer, em irtude das pala ras do decano dos estudos a%ricanos de

l$ngua portuguesa, +ue a busca das ra$ es, ou mesmo o termo %olclore, a+ui não é, de %orma

alguma, utili ado pe orati amente, mas como engrandecimento da autenticidade de um

po o e, também, por+ue corroboramos com suas pala ras, isto +ue no poeta do I amos

Descobrir ngolaJK a olta &s ra$ es tem um %undamento did"tico8re olucion"rio de

conscienti a/ão, assim como em 0acinto e Neto, embora com graus di%erentes. e amos o

+ue di 5rancisco oares:

4 sentido da IdescobertaK (a do amos Descobrir ngolaJ ) especi%ica8se

nos poemas de iriato da 2ru sistematicamente, sendo Icada um deles ...

um caminho aberto & pes+uisa da %orma e do %undo angolanos de uma

e7pressão liter"ria. Em cada um deles se utili a um meio pr-prio para essa

pes+uisa. 4 seu aspecto prospecti o é o +ue mais se impCeK. <elati amente

a M anto , al ato ?rigo obser a o mesmo, um Imodelo te7tual e

discursi o da moderna literatura angolana, anunciada pelo amos

Descobrir ngolaJ K. pala ra Ipes+uisaK e a pala ra ImodernaK dão sinal

de uma al ncia de rai uni ersal na poesia de iriato da 2ru . (<ochaet al .,

p.W3)

11W

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4 poema I M antoK é um canto irMnico +ue narra a decad ncia da burguesia

angolana da época colonial, representada pela %igura da personagem, caracteri ada entre o

passado e o presente. 4 primeiro re ela um homem de posses, de poder: I'engala na

mão9 rande corrente de ouro, +ue sai da lapela9 o bolso ...K; o segundo introdu um su eitoI+ue não tem um tostãoK, com Icigarro apagado9bengala na mãoK, em +ue o termo

IbengalaK perde a$ o seu ar de superioridade e7presso na primeira cita/ão. opul ncia de

I M antoK, outrora, é uma a%ronta aos mais necessitados, aos subalternos +ue lhe dedicam

uma aten/ão desmedida de in%erioridade e ba ula/ão:

uando sM anto passa

ente e mais gente em & anela:

V I'om dia, padrinho...K

V I4l"...K

V I'e/" cumpadre...K

V I2omo est"J...K

V I'om8om di8ia sM aaanto...K

V I4l", *o oJ...K

( )

I2oma e arrebenta

e o +ue sobrar ai no mar...K

o eu poético, no entanto, inter ém atra és do estribilho: II!uari8ngana anto9dim8

dom...9ual- banda - cala/ala9dim8dom92haluto mu mu umbo9dim8dom...K, como +uem di :

cuidado IsM antoKJ ^ importante %risar +ue a l$ngua de inter en/ão é a materna, o

Oimbundo. morte de IsM antoK, então, é aguardada com muita curiosidade e e7pectati a,

a %im de se descobrir o grande mistério atribu$do nos ltimos ersos: I e ele é o s$mbolo da

ra/a9ou a ingan/a de andu...K, recheados, ali"s, de pro%unda ambiguidade. egundo al ato

?rigo (apud <ocha):

11A

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iriato da 2ru desen ol e a mesma tem"ticaK de !aO e %a do

protagonista o Is$mbolo de uma burguesia nacional angolana $tima dos

tempos no os K. dicotomia %a 8se notar na dis un/ão %inal: se Ié o

s$mbolo da <a/a 9 ou ingan/a de andu ...K. *or um lado, ela constitui a

e7pressão da+uilo +ue irão perguntar a Ngombo atra és de um uimbanda

V é ao mundo InegroK +ue se ai buscar a resposta, ao substrato culturalK

do mundo %ricano, onde Ngombo é a Ientidade espiritual da adi inha/ãoK,

Io esp$rito re elador da erdadeK. tal atitude o poeta adere, ou pelo

menos usa8a para pedir a erdade, para chamar a aten/ão sobre ela, ao

contr"rio do +ue se passou com alguns dos seus colegas. *or outro lado,

essa decisão responde a uma cisão (entre, K elhoK e Ino oK) (<42_ et al .,

pp. A18AG)

Essas pala ras de ?rigo rati%icam então o nosso pensamento, por um lado, e, por

outro, apro%undam as +uestCes da sociedade angolana da época e como eram tratadas pelos

seus poetas: os mais no os e os mais elhos. e con%rontarmos Neto e 2ru , pereceberemos

+uão o primeiro %oi mais aguerrido na de%esa de seu po o, poeticamente %alando, do +ue o

segundo.

4 poema INamoroK, o mais badalado dos poemas de iriato da 2ru , também

musicado, segue a ertente de I<imance da menina da ro/aK, s- +ue alternando as posi/Ces

dos seres amorosos, agora +uem se +uei7a é o ente masculino, mas nesse poema o %inal ser"

%eli . Nele, o ogo amoroso segue o percurso dos contos populares, como é comum nesse

tipo de narra/ão. Escrito em primeira pessoa, o enunciador é, portanto, o pr-prio candidato

ao cora/ão da amada, +ue e7ercer" uma %un/ão de es+ui a, com prop-sitos de%inidos, +uaisse am os de ter a certe a de ser amada e não ser apenas uma a entura do amante.

4 poema inicia8se com o en io de uma IcartaK +ue come/a por dispensar "rios

elogios & amada, +ue responde com um InãoK; ao depois, o amante %a a proposta, o +ue

no amente é recusado, então indo a humilha/ão do amante pelo ob eto do dese o, o apelo

ao sobrenatural, mas nada a demo e de seu InãoK, nem a o%erta de bens materiais; então,

como ltimo recurso, o eu l$rico utili a8se do despre o ao ser amado, agora ignorado pelo11@

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amante, o +ue termina por demo 8la de sua persistente recusa. ^ preciso salientar +ue a

concre/ão do enleio amoroso s- se con%irma depois de "rias pro a/Ces do amante, como

ensina *ropp, o +ue garante o %im da trama, numa %esta popular, animada por uma dan/a,

embora não t$pica, mas muito comum na+uele ambiente do 'airro 4per"rio:

*ara me distrair

le aram8me ao baile do sM 0anu"rio

mas ela l" esta a num canto a rir

contando o meu caso &s mo/as mais lindas do 'airro 4per"rio

?ocaram uma rumba V dancei com elae num passo maluco oamos na sala

+ual uma estrela riscando o céuJ

E a malta gritou: I i, 'en amimK

4lhei8a nos olhos V sorriu para mim

*edi8lhe um bei o V e ela disse +ue sim.

obre o %ato de não ser uma dan/a +ual+uer, mas a rumba, 5rancisco oares tece o

seguinte coment"rio: I rumba designa ao mesmo tempo uma dan/a e o tipo de m sica

dan/ado. sua origem é dupla: hisp]nica e a%ricana, tendo8se desen ol ido em 2uba desde

o século \ =, com a chegada dos primeiros escra os negrosK. *ara ele I escolha da m sica

não é casual e um dos pra eres desta poesia é, precisamente, o de ermos como nela nada

se dei7a ao acaso. Na sua origem a rumba imita a os mo imentos do acto se7ual, dan/ando8

se mais com as ancas do +ue com os pés. 4s passos do homem sugeriam uma atitude

Isensualmente agressi aK e os da mulher uma postura essencialmente de%ensi aK. No amba

de roda, do recMnca o baiano, também amos encontrar essa mesma insinua/ão se7ual, ou

não, na umbigada. *rincipalmente +uando se trata de pessoas de se7os di%erentes a %a erem

a per%ormance. crescenta oares sobre INamoroK, +ue é Icomo se o seu poema %osse a

representa/ão liter"ria da rumba e a actuali a/ão de um +uadro liter"rio local e antigoK.

(<42_ et al ., p.AL)

1GB

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Essas obser a/Ces ser em para corroborar o nosso pensamento em rela/ão a esse

retorno de iriato aos seus antecessores, sem, no entanto, copi"8los, e identemente, muito

pelo contr"rio, reatuali ando o tema, a linguagem e dando8lhes uma no a roupagem. 4 tema

é muito recorrente em uillén, um elho conhecido de 2ru , +ue tem um poema intituladoI<umbaK; ali"s, uillén é um dos grandes recuperadores da dan/a a%ro8cubana atra és da

poesia, notadamente em Sóngoro osongo. e %i ermos uma compara/ão tem"tica entre os

dois poemas (I<umbaK, de uillén, e INamoroK, de 2ru ), eremos +ue eles se

complementam, o de 2ru , mais prosaico, rende8se ao narrar os %atos, a %a er uma espécie

de e7egese do de uillén, +ue se e7prime mais pr-7imo do ritmo da m sica e da dan/a +ue

representa, mas o %oco narrati o é o mesmo, inclusi e o seu %echamento.

4 ltimo poema, também o nico erdadeiramente negritudinista9pan8a%ricanista, é

dedicado ao escritor re olucion"rio haitiano 0ac+ues <oumain (1@BW81@HH), I!amã NegraK,

também subintitulado I2anto de esperan/aK. linha com o pensamento dos No os

=ntelectuais de ngola e segue a esteira dos poemas netianos I deus & hora da largadaK, I

recon+uistaK, I angrantes e germinantesK, IDesterroK, dentre outros.

4 eu poético dirigindo8se a Iminha !ãeK, como representa/ão do continente e da

ra/a, Ipela tua o K, o da+ueles %or/ados a dei7ar sua terra8mãe, constr-i o percurso de

retorno da di"spora de I irg$niaK, de I2arolinasK, do I labamaK, de I2ubaK, do I'rasilK, do

I_arlem _ill District outhK (dessas o es +ue compCem Itoda a méricaK e Itoda a [%ricaK e

são representadas pelos seus grandes poetas I2orrothersK, I#angstonK, uillénK), num

discurso laudat-rio, resgatando as %iguras ilustres dela oriundas, bem como a %or/a i a de

sua cultura disseminada pelo mundo. !as, também, como não poderia dei7ar de ser, esse

mesmo eu l$rico, em tom re oltante, e7pCe as distor/Ces em +ue se estruturam os dois

mundos: a [%rica e7propriada de seus bens mais caros e o resto do mundo bene%iciado por

essa e7propria/ão. ale a pena citar o %inal do poema:

*elo teu rega/o, minha !ãe,

4utras gentes embaladas

& o da ternura ninadas

do teu leite alimentadas1G1

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de bondade e poesia

de m sica ritmo e gra/a...

santos poetas e s"bios...

4utras gentes... não teus %ilhos,

+ue estes nascendo alim"rias

semo entes, coisas "rias,

mais são %ilhos da desgra/a:

a en7ada é o seu brin+uedo

trabalho escra o 8 %olguedo...

*elos teus olhos, minha !ãe e o oceanos de dor

claridades de sol8posto, paisagens

ro7as paisagens

dramas de 2am e 0a%é...

!as e o (4hJ se e oJ...)

mas e o também +ue a lu roubada aos teus

olhos, ora esplende demoniacamente tentadora V como a 2erte a...

cintilantemente %irme V como a Esperan/a...

em n-s outros, teus %ilhos,

gerando, %ormando, anunciando V

o dia da humanidade

4 D= D _6! N=D DEJ...

2omo em Neto, apesar de todas as discrep]ncias, humilha/Ces e indi%eren/as, o

ob eti o %inal do poeta, e não apenas do eu l$rico, é a con+uista de sua dignidade, de usti/a e

igualdade entre os po os. ^ um poema de grande e7pressão human$stica e rara bele a %ormal

e lingu$stica.

egundo !"rio nt-nio, citado por oares, I!amã NegraK Imarca a adesão do poeta

& negritudeK. *ara oares, o poeta haitiano tinha em comum com iriato a Ide%esa da

1GG

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negritudeK e Iuma %orte liga/ão ao mar7ismoK, uma e +ue ambos são %undadores do

*artido 2omunista em seus respecti os pa$ses. #igados a essa posi/ão mar7ista estão ainda

#angston _ughes, Nicol"s uillén, 2laude !acOa> e olano ?rindade, e eu acrescentaria 5red

ou a 2astro, embora este enha a constituir um caso di%erenciado nesse conte7to, comoeremos em tempo. *ara oares, Itodos eles (!acOa>, _ughes, uillén e ?rindade) tinham

tra/os em comum: promo iam a solidariedade entre os po os negrosS, alori a am a

respecti a cultura, propunham a negritude como t-pico e moti o do canto e rei indica am a

igualdade com os brancosS, o +ue passa a pela de%esa da independ nciaK. ssim I!amã

NegraK caracteri a8se por ser um poema negritudinista9pan8a%ricanista, como " o dissemos,

como o são a grande maioria dos poemas de Neto e muitos dos poemas de 0acinto e de

outros não analisados neste trabalho.

2om rela/ão ao ad ento, do ponto de ista cronol-gico, da negritude no seio dos

membros da Mensagem , pouco alor tem para n-s, uma e +ue poemas anteriores a 1@H@

" esta am ei ados de sua tMnica, tomando o termo na acep/ão de *ires #aran eira e +ue

transcre emos abai7o:

Negritude, cau/ão cultural de um mo imento com preocupa/Ces sociais, é

apresentada como recon+uista e reabilita/ão dos alores perdidos,

personali a/ão , readapta/ão ao ambiente, a%irma/ão de presen/a no

mundo e e7pressão concreta das realidades negras . Desde logo, a

assun/ão da concretude, do testemunho, da re alori a/ão do homem negro

e da rede%ini/ão de uma identidade social, por todo o mundo onde negros

hou esse: méricas, Europa,S [%rica. !"rio de ndrade, gostinho Neto ou

4rlando de lbu+uer+ue concebem a literatura negra como umaentidade uni ersal ( lda E. anto de%ine também a poesia negra como

sendo a americana e a%ricana, produto da ra/a negra, do orgulho da

ra/a ), a+uele ltimo indicando mesmo as l$nguas em +ue ela se %or a V

inglesa, espanhola, %rancesa e portuguesa V, abrangendo assim os

Negrismos e todos os mo imentos liter"rios +ue prenunciaram a Negritude.

*ara eles, a literatura negra coloca a8se na posi/ão de suprir uma lacuna

%ormati a e in%ormati a, não ambicionando mais do +ue ser til. (# < N0E=< , 1@@L)

1G3

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e, por outro lado, apro eitarmos as de%ini/Ces de outro cr$tico " citado, `abengele

!unanga, para +uem a negritude é Iposi/ão intelectualK e o pan8a%ricanismo representa

Iposi/ão pol$ticaK, e +ue ambos a%irmam I+ue todos os a%ricanos tinham uma ci ili a/ão em

comumK e I+ue todos os a%ricanos de iam lutar em con untoK, então teremos os poemastodos de iriato da 2ru en+uadrados na primeira %onte, com e7ce/ão de I!amã negraK +ue,

também, representaria o segundo mo imento.

^ nossa con ic/ão de +ue iriato da 2ru , como representante %undador dos No os

=ntelectuais de ngola, empunhou com esmero a bandeira I amos Descobrir ngolaJK, tanto

no campo poético, +uanto no campo pol$tico, mais neste +ue na+uele, o +ue compro a sua

parca produ/ão liter"ria e sua ad ersa postura pol$tica +ue o le ou, como atestam cr$ticos e

contempor]neos do %er oroso de%ensor dos direitos humanos a%ricanistas, & morte

prematura aos HL anos de idade.

4 bilinguismo, podemos assim di er, é uma constante na obra dos poetas angolanos,

notadamente a+uele +ue engloba o portugu s europeu, o portugu s a%ricano e o Oimbundo,

além de outras l$nguas locais. Em iriato da 2ru , esse bilinguismo é mais acentuado e

repetido na maioria de seus poemas. obre o assunto, recorremos ainda a oares:

distribui/ão dos n$ eis de l$ngua %a 8se entre duas l$nguas, pelo menos,

sendo sempre uma delas de origem europeia. Na maior parte dos casos a

outra é banto. - em !amã Negra , hino & di"spora %or/ada pela

escra atura, a componente banto submerge completamente sob o ugo da

portuguesa em l dica disputa com a inglesa (embora esta ocupe muito

pouco espa/o) e com re%er ncias a "rias méricas.

4 aspecto pedag-gico é por sua e caracter$stico de algumas das tradi/Ces

em ogo ali. D"8se bem com as tradi/Ces orais, onde encontramos "rios

g neros reser ados ao treino para a, e & transmissão da, sabedoria dos mais

elhos. E satis%a , ao mesmo tempo, o ideal cl"ssico europeu dodocere, no

seu tempo rentabili ado pela poesia militante, +ue durante o século \\ %oi

sendo escrita e reescrita em +ual+uer dos continentes e em to)do o espa/o

lus-%ono. 5unciona, portanto, como um conector entre as "rias partes, um

1GH

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suporte & tradu/ão poética. (<42_ et al ., pp. 1BH81BL)

2omo se pode obser ar, a %un/ão pedag-gica, como s-i nesse tipo de poesia, e7erce

uma %un/ão primordial no enunciado, con%igurando8se mesmo no seu ]mago, embora num

iés transgressor e atuali ado.

1GL

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1GX

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PARTE II ( A POESIA AFRO- RASI)EIRA

3+*+ A PRESE%&A DO %EGRO %A )ITERATURA RASI)EIRA

?recho do !ani%esto de 1@A1 dos adernos Negros:

4s autores do adernos Negros H k *rosa são a+uicontinuadores da luta e das ideias de um gostinho Neto, deum olano ?rindade, de um <ichard Rrigth, de um #éonDamas. 4 negro ho e %a ponte, liga suas ideias e age.

4ntem %e dois anos +ue gostinho Neto morreu. *oeta epol$tico, não por acaso. E não é por acaso também +ue a

resist ncia ao colonialismo no 2ontinente %ricano %oi, emgrande parte, %eita por poetas, como 0osé 2ra eirinha, m$lcar2abral, `alungano, #uandino ieira, No mia de ousa e tantosoutros. *oeta é a+uele +ue e a isa por meio de ersos.

uando é necess"rio unir o ision"rio ao ati ista, ele e age,como soldado, pol$tico. ?al é o caso de gostinho Neto.

Neste momento angustiante da ida do po o angolano, +ue o seu territ-rio in adido por uma pot ncia racista, nossosentimento de negros é +ue n-s estamos sendo in adidos,por+ue somos unos com o negro do mundo inteiro. Negros,n-s sentimos também +ue a nossa luta est" amea/ada.

=denti%icados com o es%or/o e resist ncia do po o angolano,em sua solidariedade esta <oda se chama: <oda de *oemasgostinho Neto.

ssinam o !ani%esto: belardo <odrigues, 2uti, _enri+ue2unha, 4sFaldo de 2amargo e Mnia 5"tima da 2oncei/ão

^ importante salientar +ue o nosso prop-sito é tão somente o de %a er um pré io

assento da presen/a do negro na literatura brasileira, a %im de +ue possamos situar os dois

poetas +ue escolhemos como contraponto dos poetas angolanos acima analisados. Não se

trata, portanto, de uma pes+uisa do Inegro na literatura brasileiraK, mas de cinco poetas

(tr s angolanos e dois brasileiros) +ue i eram num mesmo tempo, uns mais outros menos,

e constru$ram uma poética sobre a ra/a negra, cada +ual e7perimentando a linguagem, a

cultura e a e7ist ncia desse ser dentro da %orma/ão do po o angolano e do po o brasileiro

no ]mbito particular, como também na %orma/ão de outros po os espalhados pelo mundo

a%ora. lém do mais, estes poetas t m em comum, como " acenado, o %ato de comungarem

1GW

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a cartilha do mar7ismo.

Não nos +ueiram, portanto, e7igir um tratado sobre a presen/a do negro na literatura

brasileira, o +ue seria e7tremamente grati%icante, não %osse o nosso ob eti o outro: o de

analisar os poetas mencionados, construindo entre eles, ou entre suas poéticas, um caminho

para a re%le7ão de suas obras pre iamente selecionadas com a %inalidade de e7trair8lhes

semelhan/as e di%eren/as, con erg ncias e di erg ncias +ue possam saltar aos olhos curiosos

de +uem nelas se debru/a.

2remos necess"rio, para tal, uma s$ntese, um espelho (pelo +ual possamos mirar) da

presen/a da ra/a negra na literatura brasileira. Esse espelho é uma espécie de pano de %undo

para a an"lise dos poetas escolhidos: olano ?rindade, muito pouco trabalhado pelasacademias, embora se possa encontrar um ou outro trabalho a seu respeito, como se er"; e

5red ou a 2astro, praticamente um ilustre desconhecido das academias, embora tenha

e7ercido boa impressão no c$rculo intelectual de al ador desde %ins da década de 1@LB até,

possamos assim di er, aos nossos dias, uma e +ue seu passamento se deu em GB1G.

4 primeiro te-rico a +ue recorremos é 4sFaldo de 2amargo, +ue, em seu li ro ,

negro escrito, %a um esbo/o da passagem do negro pela literatura brasileira. egundo ele,l%onso [l ares %oi o primeiro autor de Iorigem et$opeK a escre er em l$ngua portuguesa e

_enri+ue Dias %oi Io primeiro negro +ue escre eu um te7to no 'rasilK. ?rata8se de uma carta

en iada a IEl <e> de *ortugalK, datada de B1 de agosto de 1XLB. 2amargo, no entanto,

considera !anuel il a l arenga ( ila <ica 1WH@81A1H <io de 0aneiro) o primeiro poeta

mulato brasileiro, I%ilho de um m sico mesti/o e pobreK, autor de Jlaura , tendo seu

contempor]neo Domingos 2aldas 'arbosa (<io de 0aneiro, 1WHB, ou 'ahia, 1W3A V #isboa,

1ABB), também mulato, gran eado mais import]ncia +ue ele.

2amargo ainda cita E aristo da eiga (1W@@81A3W) e 0osé Nati idade aldanha (1W@L8

1A3B), reconhecendo, no entanto, +ue esses intelectuais, de um modo geral, não se

inscre eram na hist-ria como representantes do Inegro escritoK.

ssegura o ensa$sta +ue é a partir do <omantismo +ue o negro passa a ter uma maior

representa/ão dentro de nossa literatura, +uando surgem ?ra ano al ão de 2ar alho

(!aranhão, 1A3B81AXH), branco, +ue escre eu sobre a ida dos escra os, ntonio on/al es1GA

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?ei7eira e ousa (1A1G81AX1), mulato, pioneiro do romance no 'rasil, mas não muito

apreciados pela cr$tica nacional. E mais 0osé 'oni%"cio, o !o/o, e 0oa+uim Nabuco, brancos,

ao lado de negros como #u$s ama e 0osé do *atroc$nio (1AL381@BL), +ue dão continuidade

na manuten/ão do negro como tema liter"rio, e7ce/ão %eita aos mulatos #aurindo <abelo e5rancisco 4ta iano, +ue se mant m ausentes ao tema, até mesmo o mesti/o on/al es Dias,

acrescenta 2amargo, %ilho de escra a, se abstendo de um apro%undamento do tema.

Noutro passo, 2amargo historia o mulato *aula 'rito (1AB@81AX1), primeiro editor

brasileiro, poeta, dramaturgo e contista; 2astro l es (1AHW81AW1), branco, +ue, para o autor

de , negro escrito , I^ a o , a consci ncia, o esp$rito do mo imento abolicionista. Ergueu8se

até os limites do poss$ elK. E resume o ensa$sta a presen/a do negro durante o <omantismo

da seguinte %orma: IEntre os romances, poemas e pe/as de teatro onde, de +ual+uer %orma,

se sublinha a presen/a do negro, antes da I boli/ãoK, podemos citar estes: , omendador

(%olhetim) V 1AL@ V 5rancisco uimrães *inheiros;, "em nio 3amiliar (teatro) V 1AL@ V 0osé

de lencar; M+e (teatro) 1AXG V 0osé de lencar;, ego (teatro) V 0oa+uim !anuel de

!acedo; A /scrava Isaura V 1AWL V 'ernardo uimarães;>istória de uma mo%a rica (teatro)

V 1AX1V *inheiro uimarães; As v=timas algo1es (tr s hist-rias) V 1AX@ V 1AW3 V 0oa+uim

!anuel de !acedo; Mota o*ueiro ou a $ena de Morte V 1AWW V 0osé do *atroc$nio;Mauro0o /scravo (poema) V 1AXH V 5agundes arela;, abeleira V 1AWX,, Matuto V 1AWA e

Louren%o V 1AA1 V 5ranOlin ?" oraK. (2 ! < 4, p.HA)

e se pode notar uma escasse do negro nas letras brasileiras até ao <omantismo, nos

mo imentos seguintes até ao ad ento da emana de rte !oderna, o cen"rio assim ainda

permanece: # cio de !endon/a (1ALH81@B@), com A esta Morta; <aimundo 2orreia, com

an1o; on/al es 2respo (1AHX81AA3), poeta luso8brasileiro, mulato; 'ernardino da 2osta

#opes (1AL@81@1X), também mulato; !achado de ssis (1A3@81@BA), mulato, +ue pouco ou

nada disse por sua ra/a, como ousara denunciar 0osé do *atroc$nio; lu$sio e edo, com,

Mulato e , orti%o; dol%o 2aminho e seu om rioulo; 0 lio <ibeiro em A arne; al ador de

!endon/a, com Marab) ; e =ngl s de ousa, com seus ontos Ama1 nicos. 2amargo ainda

cita icente de 2ar alho e seu poema 3ugindo ao ativeiro e D. il ério omes *imenta, um

ilustre desconhecido, embora muitos dos citados beirem, também, o caminho do ostracismo,

ao menos nos li ros did"ticos escolares.1G@

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5echando esse per$odo, 2amargo destaca 2ru e ousa (1AX181A@A), para muitos o

maior poeta simbolista do 'rasil, negro e %ilho de escra os, recebeu a alcunha de 2isne

Negro; e #ima 'arreto (13 de maio de 1AA18B1 de no embro de 1@GG), também negro,

considerado um dos $cones do romance e do conto brasileiros. obre ele, escre e 2l- is!oura, em cita/ão de 2amargo:

I4s negros +ue %i eram literatura no 'rasil, a %im de não se marginali arem

inte1ectualmente obedeceram (ou ti eram de) aos padrCes estéticos

brancos, & tem"tica branca, situando8se em uma posi/ão de dobradi/as

amortecedoras de uma consci ncia étnica V e de classe V do negro

brasileiro. 6m 2ru e ousa, um _enri+ue 2astriciano, uma uta de ousa,

todos, mais ou menos intensamente, bran+uearam a sua posi/ão, o seu

ide"rio e a sua mensagem. 4s mulatos, por seu turno, contribu$ram menos

ainda. (2 ! < 4, p.W1)

Nota8se, pela cita/ão, +ue h" mais uma presen/a do negro como personagem do +ue

como autor e, +uando autor, muitos tendem a tem"ticas mais uni ersalistas. !ais adiante,2amargo %echa essa +uestão: I2om a morte de #ima 'arreto desaparece o ltimo Igrande

mulatoK da #iteratura brasileira, o ltimo da #iteratura o%icialK. crescenta 2amargo +ue,

ap-s sua morte, em 1@GG, ano de %unda/ão do !odernismo no 'rasil, não er" aparecer",

misturada &s o es de !"rio de ndrade, !enotti del *icchia, 4sFald de ndrade, 0orge de

#ima e, depois, 0orge mado V e tantos outros V a o do negro. - com o aparecimento de

#ino uedes, em 1@GX, o negro olta a %alar: I4 negro cala8se nas primeiras décadas da

<ep blica. *rodu/ão nula. Malungo, contos de er "sio !orais, outro negro, aparece em

de embro de 1@H3. !as não tem alor, não dei7a conse+u ncias. er "sio não aprendeu

nada com #ima 'arreto, bem ao contr"rioK. presen/a, segundo ele, do negro, no palco da

#iteratura brasileira, dar8se8" pelas mãos do escritor branco. IE se o elemento a%ro8brasileiro

se insinua, por e es, apenas como esteio para ariedade na %ic/ão, não h" negar +ue em

"rios romances ele se mo imenta de corpo inteiro, é o personagemK. (2 ! < 4, p.W3)

#amenta o ensa$sta +ue até & segunda metade do século \\ o Inegro escritoK este e13B

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+uase ausente, não %ossem algumas apari/Ces como as de <omeu 2rusoé, #ino uedes,

olano ?rindade, e nos %ornece uma lista de li ros Ionde se sublinha a presen/a do negro na

%ic/ão brasileira de 1AAA a 1@LGK, com desta+ue para #ima 'arreto, 0orge mado e 0osé #ins

do <ego. Essa aus ncia, acrescenta ele, se d" também no teatro.

egundo 2amargo, s- na segunda metade do século passado é +ue se e idencia uma

maior apari/ão do negro na literatura brasileira, momento, inclusi e, em +ue surgem "rios

mo imentos oltados para a +uestão da InegritudeK no 'rasil e "rias o es se le antam no

campo cultural, sociol-gico e liter"rio, notadamente no da poesia. ão elas: 2arlos ssun/ão,

o pr-prio 4sFaldo de 2amargo, 4li eira il eira, dão entura, Eduardo 4li eira e suas

Jestas L=ricas da negritude, !ilton de odo> 2ampos, 4li eira il eira, !adalena de ousa,

*er> do Embu, 2harlain al ão, 'élsi a ('enedito #ouren/o da il a), !arc$lio Nascimento

5ernandes, na " 2aetano, 2osta *into e , negro no 4io de aneiro , belardo <odrigues,

*aulo 2olina e a Axé Antologia contempor nea da poesia negra brasileira, eni !ariano

uimarães, 0osé 2arlos #imeira, ^le emog, !asuo amaOi, 2uti (#u$s il a), rnaldo \a ier,

!iriam l es, !"rcio 'arbosa, 4ubi =na `ibuOo, 0amu !inOa, Esmeralda <ibeiro, 0Mnatas

2oncei/ão, _enri+ue 2unha, ngela #opes al ão, _ugo 5erreira, !"rio 0orge #escano, Mnia

5"tima da 2oncei/ão, _erm-genes lmeida . 5ilho, !arise ?ietra, <amatis 0acino, Dele> decar>, ri 2]ndido 5ernandes, Est ão !a>a8!a>a, Yenaide, `ilamba, <oseli Nascimento,

2élia parecida, <onald ?utuca, 0osé #uanga 'arbosa, b$lio 5erreira, entre outros.

<e%erindo8se a rnaldo \a ier, 2amargo %a o seguinte coment"rio: IEspera8se de

rnaldo +ue se insira, claro e negroS, na corrente de poetas onde " estão instalados olano

?rindade, 2arlos ssun/ão, 4li eira il eira, dão entura, *aulo 2olina, belardo <odrigues,

2uti, ^le emog, por e7emploK. !ais adiante ele cita os adernos Negros0 4eflexões sobre a

Literatura Afro- rasileira (Edi/ão do I2onselho de *articipa/ão e Desen ol imento da

2omunidade Negra do Estado de ão *auloK). edi/ão é de 1@AL, e um trabalho do

uilombho e. ssinam te7tos os poetas e contistas 2uti (#ui il a), Esmeralda <ibeiro, 0,

b$lio 5erreira, 0amu !inOa (0osé 2arlos ndrade), !"rcio 'arbosa, !iriam l es, 4ubi lna

`ibuOo e Mnia 5"tima da 2oncei/ão. E mais ria%+o rioula0 Nu /lefante ranco, de 1@AW,

re ne te7tos cr$ticos elaborados a partir do I /ncontro de $oetas e 3iccionistas Negros

rasileiros, reali ado em ão *aulo V setembro de 1@AL, entre outros (+ue podem ser131

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encontrados em 2 ! < 4, pp. 1BW81BA).

Embora ha a uma e%eti a participa/ão de muitos intelectuais negros, a partir de 1@LB

e mais precisamente a partir de 1@WA, +uando aparecem adernos Negros, a 4evista Li%+o e

o MN2-Movimento Negro 2nificado, é +ue a literatura a%ro8brasileira, ou a%rodescendente,

ganhar" mais desta+ue. 4bser amos, é bem erdade, um grande n mero de escritores, o

seu n$ el, porém, sendo bastante contestado, até mesmo pelo pr-prio 2amargo: I al aram8

se, não h" d ida, alguns +ue por l" andaram e l" permanecem. Não são, porém, da escola

dos adernos, por muito tempo permissi a.(...). 5altou, porém, muitas e es, tinta de

+ualidade no escre er das letras de muitos +ue l" se imprimiram, %altou perspecti a de

_ist-ria #iter"ria. De e8se comemorar. !as se poderiam soltar mais %ogos...K (2 ! < 4,

p.1B@)

Em seu li ro Literatura negro-brasileira , publicado em GB1B pela elo Negro, na

cole/ão 2onsci ncia em Debate, 2uti (#ui il a) chama a aten/ão para o %ato de serem os

estrangeiros, <oger 'astide, <a>mond a>ers e regor> <abassa, a +uestionar a rela/ão do

negro com a literatura brasileira. No cap$tulo 3, o autor tra & discussão a pol mica +ue

en ol e as e7pressCes Ia%roK e InegroK, o +ue muito nos interessa, isto +ue elucidar da

melhor %orma poss$ el a utili a/ão de um dos pre%i7os sem incorrer em preconceito ou

banalidade, buscando a %orma cient$%ica mais ade+uada, é o nosso intuito. *ara 2uti: I

produ/ão liter"ria de negros e brancos, abordando as +uestCes atinentes &s rela/Ces inter8

raciais, tem ieses di%erentes por conta da sub eti idade +ue a sustenta, em outras pala ras,

pelo lugar socioideol-gico de onde esses produ emK. partir do <omantismo, sugere ele, a

literatura brasileira come/a a se %irmar pela ontade coleti a de escritores e cr$ticos, +ue

procuram dar desta+ue aos elementos +ue di%erenciassem a produ/ão local da metr-pole

portuguesa. Di 2uti: INo interior da literatura brasileira, "rias são as ertentes destacadas,

sendo as mais comuns a estil$stica e a regional. ?odas nascem de uma ontade coleti aK. 2uti

ainda esclarece +ue h" uma hegemonia, +uanto & produ/ão liter"ria do segmento negro da

popula/ão, de escritores brancos sobre o tema. entencia o ensa$sta: Ios estudiosos, desde

o come/o do século \\, tentam aplicar nomes ao recorte %eito. ?endo em ista tanto a

tem"tica +uanto a nomina/ão não serem reser as s- de escritores negros, desde 2astro

l es, a +uestão da sub eti idade branca tem dado o tom hegemMnico acerca da13G

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interpreta/ão e da nomina/ão das obras.K (26?=, pp. 3383H). =sso parece in+uiet"8lo

sobremaneira. Da$ a recusa da denomina/ão de Ia%roK & produ/ão liter"ria negro8brasileira

I(dos +ue se assumem como negros em seus te7tos)K, por+ue, para 2uti, isso é pro etar &

origem continental de seus autores, Idei7ando8a & margem da literatura brasileira,atribuindo8lhe, principalmente, uma des+uali%ica/ão com base no iés da hierar+ui a/ão das

culturasK, ou se a, tanto Ia%ro8brasileiroK +uanto Ia%rodescendenteK Isão e7pressCes +ue

indu em a discreto retorno & [%rica, a%astamento silencioso do ]mbito da literatura brasileira

para se %a er de sua ertente negra um mero ap ndice da literatura a%ricanaK. *re alecendo,

segundo ele, apenas a produ/ão de autores brancos como componente da literatura do

'rasil. 2uti ainda outros interesses por tr"s de tais denomina/Ces: I4 a al do Estado

'rasileiro d" & denomina/ão Ia%ro8brasileiraK um car"ter compuls-rio, en+uadrando aprodu/ão liter"ria em seus pressupostos ideol-gicos. 4 interesse de interc]mbio econMmico

com os pa$ses a%ricanos sustenta as iniciati as de interc]mbio culturalK. (26?=, pp. 3L83X)

preocupa/ão e a cr$tica do ensa$sta sobre a +uestão, além de esta ser usta, ser em

para re%erendar a terminologia adotada a+ui neste trabalho. Entendemos, também, +ue h"

uma tend ncia de apresentar os Inegros como detalhes de uma suposta generalidade

brancaK em "rios aspectos da cultura. Esclarece 2uti +ue a%ro8brasileiro ou a%rodescendentenão é a mesma coisa +ue negro8brasileiro, uma e +ue a%ro se re%ere a todos os nascidos em

[%rica. *ara ele: I pala ra InegroK é uma das mais poliss micas do ern"culo. ua

polissemia, +uem sabe, contribuiria para seu despre o na caracteri a/ão de um corpus. %ro8

brasileiro, e7pressão cunhada para a re%le7ão dos estudos relati os aos tra/os culturais de

origem a%ricana, independeria da presen/a do indi $duo de pele escura, e, portanto, da+uele

+ue so%re diretamente as conse+u ncias da discrimina/ãoK (26?=, p.3@). 4 +ue nos dei7a &

ontade para usar a e7pressão poesia a%ro8brasileira no t$tulo de nossa tese e dentro docorpo do te7to as e7pressCes ade+uadas ao momento. 5echemos esta pol mica com mais

uma cita/ão de 2uti:

*ortanto, a pala ra InegroK nos remete & rei indica/ão diante da e7ist ncia

do racismo, ao passo +ue a e7pressão Ia%ro8brasileiroK lan/a8nos, em sua

sem]ntica, ao continente a%ricano, com suas mais de LH na/Ces, dentre as

133

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+uais nem todas são de maioria de pele escura, nem tampouco estão

ligadas & ascend ncia negro8brasileira. <emete8nos, porém, ao continente

pela ia das mani%esta/Ces culturais. 2omo literatura é cultura, então a

pala ra estaria mais apropriada a ser ir como selo. (26?=, p.HB)

alientamos +ue conhecemos e apro amos a e7pressão InegroK como %orma de se

a%irmar de parte da popula/ão brasileira organi ada ou espont]nea, pois, como di o pr-prio

2uti, Io +ue h" de mani%esta/ão rei indicat-ria apoia8se na pala ra QnegroSK. 2om isso ele

rea%irma e autentica a denomina/ão +ue usou para seu instigante li ro Literatura negro-

brasileira, centrado em argumentos plaus$ eis e dignos de um pes+uisador, pro%essor e

escritor InegroK no sentido mais re olucion"rio +ue esse termo carrega dentro de si. *or ora,

ainda adotaremos a e7pressão cunhada no in$cio de nossa pes+uisa Ia%ro8brasileiraK, +ue,

para n-s, mais se coaduna com o nosso prop-sito.

#ui ama, 2ru e ousa e #ima 'arreto, no di er de 2uti, são os precursores de uma

escrita condigna com o termo InegroK, mesmo +ue se am atua/Ces isoladas em todo o

século \=\ e no limiar do século \\. <e%erendado por <a>mond a>ers, ele tra/a um per%il de

como o negro era isto dentro de nossa literatura, desde reg-rio de !attos, +uase sempre

calado, %iel, so%redor ou de despertador de interesses lu7uriosos, assinados pelo I iés de

uma ideologia brancoc ntricaSK, passando por 2astro l es e o seu I4 na io negreiroK, tendo

como Idi isor de "guasK Ios ersos de #ui ama, +ue con%iguram um euS l$rico negroK.

*ara 2uti, I!aria 5irmina dos <eis, #ui ama, 2ru e ousa e #ima 'arreto são

e7emplos do isolamento estético8liter"rio no +uesito sub eti idade negro8brasileira.K

consci ncia de uma coleti idade negro8brasileira s- tomaria corpo na segunda metade doséculo \\. inda na primeira metade desse século, o autor cita #ino uedes como um

identi%icador de sua gente: o negro8brasileiro. *ara ele, o %ato de uma obra conter tra/os de

origem a%ricana não lhe con%ere autoridade para consider"8la Inegro8brasileiraK.

No cap$tuloIdentidade por dentro , 2uti tece uma série de coment"rios a respeito de

escritores mais no os, publicados entre as décadas de WB e a primeira deste século, cu a

literatura é a a%irma/ão do negro como negro, o combate eemente ao racismo declarado13H

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e9ou elado e a legitimidade do te7to por eles escritos como parte indissoci" el da literatura

brasileira, com um car"ter também uni ersal, " +ue muitos cr$ticos tendem segregar a nossa

literatura com o %im nico de estabelecer o +ue para eles é de +ualidade ou não, algo

parecido com o I<egionalismo de 3BK. ão citados nomes como os de: ^le emog, 0osé 2arlos#imeira, 4li eira il eira, 2ristiane obral, #ep 2orreia, era%ina !achado, Elisa #ucinda,

#ande 4naFale, !"rcio 'arbosa, poetas de grande alor estético.

s associa/Ces negras, segundo 2uti, ti eram uma import]ncia %undamental na

%orma/ão de seus associados, principalmente pelo incenti o & leitura e pelo apre/o &

produ/ão escrita: ornais, li ros, teatro, etc. : I4s autores +ue constituem esse grupo são:

bdias do Nascimento, olano ?rindade, 2arlos de ssump/ão, Eduardo de 4li eira, 4sFaldo

de 2amargo e 4li eira il eiraK. 4bser emos +ue esse grupo tra duas re%er ncias essenciais,

sem demérito para os demais, bdias do Nascimento Io criador do ?eatro E7perimental

NegroK e o grande I$cone da milit]ncia negraK, além de ator, diretor, escritor teatral, poeta e

pol$tico. 4 outro é olano ?rindade:

*oeta +ue assumiu a no/ão IpopularK em seus te7tos. 2om a signi%ica/ão de

Ipoliti adaK e de es+uerda, reali ou obra de %orte incandesc ncia erbal e

r$tmica. 2riador do ?eatro *opular 'rasileiro. 5oi um militante de ideias

socialistas, sua poesia atingiu amplo conhecimento não s- pelo trabalho de

seus companheiros de partido pol$tico, mas pelo mérito interno de sua

reali a/ão poética. *ublicou: $oemas de uma vida simples (1@HH);Seis

tempos de poesia (1@LA);antares ao meu povo (1@X191@A1);9em gente

com fome e outros poemas (1@AA);$oeta do povo (1@@@9GBBA);anto

negro (GBBX); e$oemas antológicos (GBBA). 5oi um e7$mio declamador.(26?=, p.11A)

olano ?rindade, como corpus deste trabalho, ser", mais adiante, de idamente

estudado nos "rios aspectos +ue compCem sua tra et-ria poética.

0" o prop-sito de Yil" 'ernd, em seu li ro Negritude e literatura na América Latina ,

13L

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%ruto de sua pes+uisa de doutorado na 6 *, é apontar o identit"rio de uma literatura no

'rasil, algo " preconi ado por alguns pes+uisadores, como os por ela citados: <oger 'astide

e ?hales de e edo, para os +uais seria um erro du idar da e7ist ncia de uma literatura

a%ro8brasileira, ou até mesmo negro8brasileira, como nos assegura 2uti.

*ara 'ernd, no entanto, a +uestão de uma literatura negra estar inculada & cor da

pele %ica %ora de cogita/ão, uma e +ue I*artir da e id ncia te7tual nos parece ser o

caminho +ue assegurar" um maior rigor cient$%ico & an"lise da +uestão. ssim, poderão ser

considerados como literatura negra a+ueles te7tos em +ue hou er um eu enunciador +ue se

+uer negro, +ue rei indica a sua especi%icidade negraK. ('E<ND, p.1X). *arece8nos, também,

+ue o termo InegroK associado ao %a er liter"rio ad+uire um car"ter rei indicat-rio de um

determinado grupo, +ue, pelas circunst]ncias da pr-pria hist-ria da humanidade, te e os

seus direitos tolhidos nas necessidades mais caras ao ser humano: a liberdade, o direito de

ser perante o outro e a sociedade, desde os direitos prim"rios de cidadania até aos mais

comple7os +ue também de eriam ser uni ersais, como o da arte, por e7emplo. ssim se

e7pressa 'ernd:

Esta comunidade de situa/ão +ue ir" determinar uma constru/ão mental

comum é igualmente obser ada no conte7to brasileiro. 2ertos escritores

apresentam8se como autores negros e esta rei indica/ão não se prende a

uma simples +uestão epidérmica, mas a caracter$sticas te7tuais. 4u melhor,

seus te7tos apresentam marcas de enuncia/ão +ue os particulari am, entre

as +uais a presen/a de um su eito de enuncia/ão +ue se +uer negro.

('E<ND, pp. 1X81W)

Não amos a+ui adentrar na pol mica do assunto, mas tão somente elucidar melhor

a utili a/ão dos termos tipo Ia%rodescend nciaK, Ia%ro8brasileiraK e Inegro8brasileiraK, como

dito acima, para não incorrermos em +uesti nculas +ue tergi ersem a missão a +ue nos

propusemos. ?emos consci ncia, " o dissemos, das +uestCes inerentes aos mo imentos

re olucion"rios leg$timos do mundo e do 'rasil +ue sempre souberam rei indicar os seus

direitos em %ace da usurpa/ão das elites ao corrente da hist-ria, no nosso caso, a literatura13X

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desses poetas, &s e es +uestionados por seus pr-prios pares.

No caso espec$%ico desta tese, temos cinco poetas, dois autenticamente negros,

segundo a cor da pele: gostinho Neto e olano ?rindade, um mesti/o, iriato da 2ru e dois

brancos, nt-nio 0acinto, +ue é uma espécie de branco9pardo, dentro das considera/Ces

étnicas brasileiras, e 5red ou a 2astro, de te branca. ?odos, no entanto, %alam do negro,

cada +ual & sua maneira, por isso essas e7pressCes ão sendo utili adas segundo os seus

te-ricos e as necessidades do pr-prio te7to rei indicar.

egundo Dom$cio *roen/a 5ilho: I4 processo liter"rio en ol e basicamente a inter8

rela/ão entre +uem %a o +ue, como o reali a e +uem o usu%rui, ale di er, entre o autor, o

te7to e o leitor. #ogo, em um sentido restrito, ser" negra a literatura %eita por negros oudescendentes de negros re eladora de ideologias +ue se caracteri am por uma certa

especi%icidade. Em um sentido lato, ser" negra a arte liter"ria %eita por +uem +uer +ue se a,

desde +ue re eladora de dimensCes peculiares aos negros ou aos seus descendentesK (in

'E<ND, p.1W). Essa de%ini/ão de *roen/a ser e8nos em determinados pressupostos, mas

sabemos, como +uer ntonio 2andido, +ue toda arte subalterni ada s- se impCe pela

ItransgressãoK, como o %e , por e7emplo, #u$ ama no século \=\.

'ernd orienta +ue de emos atentar para os seguintes elementos: Ia) a e7ist ncia de

uma articula/ão entre te7tos dada por um certo modo negro de er e de sentir o mundo; b) a

utili a/ão de uma linguagem marcada tanto a n$ el do ocabul"rio +uanto dos s$mbolos

usados pelo empenho em resgatar uma mem-ria negra es+uecidaK. ssim sendo, ter$amos

Iuma escritura negra, ale di er, uma literatura +ue se propCe a desconstruir o mundo

nomeado pelo branco e erigir a sua pr-pria cosmogonia. eria, em suma, uma literatura

disposta a romper um contrato de %ala igente e a buscar uma dic/ão no a dentro doconte7to liter"rioK ('E<ND, p.1A). 'ernd ainda elenca "rios nomes sobre a +uestão do negro

na literatura brasileira (do teatro, da poesia, da cr$tica e da m sica popular brasileira), alguns

" citados e outros não, sem muita import]ncia, porém, para o +ue nos propomos a+ui, pelo

simples moti o de não ser o negro na literatura brasileira a ess ncia de nossa pes+uisa, no

sentido de bali ar a sua presen/a entre os "rios autores brasileiros: de reg-rio até aos

nossos dias, embora amais nos es+ui emos desses par]metros. +ui, re%or/amos, %a emos

precipuamente uma iagem pelo mundo poético do corpus escolhido, tendo como ponto13W

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central a poesia de gostinho Neto e como dialogam com a poética de Neto, +uando

dialogam, os outros poetas escolhidos como contraponto, dentro duma an"lise comparatista,

%a endo uma analogia entre ambos, cu o %im maior é mergulhar em suas poéticas em busca

do mundo m"gico de 4r%eu negro e9ou branco de nossos dois atl]nticos, sem nenhumintuito de pri ilégios.

Nossa restri/ão segue a linha de todos a+ueles +ue %a em pes+uisas mundo a%ora: o

interesse particular do pes+uisador, as a%inidades e a necessidade de torn"8los conhecidos

do mundo acad mico, embora alguns " o se am de certa %orma. lém, e identemente, da

impossibilidade de %alar de todos.

INegroK e INegritudeK são dois termos +ue se a%inam, mas, de certa %orma,percorrem caminhos di%erentes, principalmente se comparamos a sua utili a/ão nas +uatro

primeiras décadas na Europa, a partir da década de 1@LB em [%rica, no nosso caso em

ngola e, algum tempo depois, no 'rasil.

*ara tanto, embora " tenhamos esclarecido o termo INegritudeK na primeira parte

deste trabalho, %a emos algumas aprecia/Ces de Yil" 'ernd sobre os termos, e7tremamente

pertinentes. ensa$sta parte das pol micas geradas nos anos de 1@3B: enghor s 2ésaire,artre s 5anon. egundo ela: Inegritude, num sentido amplo, remete & ontade de ser, &

a%irma/ão da alidade uni ersal do negro. Neste sentido (com InK min sculo) ela é

in+uestion" el e permanecer" en+uanto hou er negros na terra, como " sublinhou 2ésaire,

pois é sinMnimo da busca de uma identidade, ou de uma determinada dimensão de

identidadeK. 0" o termo INegritude V al o das mais contundentes cr$ticas V é ustamente

a+uela +ue, trans%ormando8se em ideologia, passou a ser ir aos interesses dos dominadores.

^ a esta Negritude (com INK mai sculo) e, essencialmente, &s trilhas pelas +uais acondu iram enghor e seus seguidores +ue passamos a nos re%erirK. ('E<ND, p.31). *arece8

nos uma tend ncia & e7comunhão de enghor, herege +ue surge dentro do seio do

negritudinismo criado em solo europeu. !ais além, 'ernd, baseada nas contradi/Ces +ue o

termo alcan/ou, inculando8se ao conceito de ra/a em detrimento do de classe, ganhando

assim, no di er da ensa$sta, um car"ter ideol-gico em +ue por e es patrocina atrocidades e

Id" o , por e7emplo, ao escritor en+uanto negro e não en+uanto homemK, perdendo assim

toda sua ess ncia de mo imento re olucion"rio, a%irma ser positi a a negritude +ue se13A

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desenha como a Iop/ão dos escritores terceiro8mundistas +ue é a de e7plorar nossa

circunst]ncia imediata. ^ um de er mais do +ue um direito do escritor do ?erceiro !undo

%or ar uma consci ncia de negridade +ue possa coe7istir com a de americanidade,

antilhanidade, latinidade, brasilidade, mineiridade, etc., e no interior da +ual se e7ercite aconsci ncia de classeK. ('E<ND, p.3L). *ara então islumbrar um sentido +ue se possa

estender ao 'rasil, di ela:

chamos, portanto, +ue se pode %alar, em sentido lato, em uma ertente

brasileira da negritude +ue não é um mo imento estan+ue, mas um

%enMmeno +ue ocorre em di%erentes culturas (E6 , ntilhas, [%rica, mérica

do ul), com di%erentes condi/Ces sociais, e7primindo8se em "rias l$nguas,

portanto essencialmente migrat-rio e não sincrMnico.

?entar er os atuais mo imentos brasileiros, +ue oltam8se sobre si mesmos

para %abricar uma autoimagem, como um sistema de asos comunicantes,

como o canto poli%Mnico da negritude, poder" a udar a entender melhor a

realidade da literatura negra e da pr-pria literatura brasileira. ('E<ND, p.3A)

Nesse sentido, podemos di er +ue a poesia de olano ?rindade se encai7a

per%eitamente dentro desse conceito, como eremos adiante. *ara a ensa$sta, a literatura

negra brasileira, tanto nos planos espacial +uanto temporal, se articula de %orma

rei indicat-ria, na luta Ipelo resgate de uma mem-ria +ue dar" aos negros as pe/as para a

montagem de uma autoimagem positi aK, uma e +ue ela agora Ibusca uma no a dic/ãoK a

%im de a%irmar a identidade negra, +ue ela chama de InegridadeK, em oposi/ão aostatus *uoestabelecido, mas sem negar sua condi/ão de oper"rio, de latino8americano, de mulher,

en%im, de ser oprimido pela classe dominante.

%inal, +ual o mérito da poesia negra brasileira 0" imos atr"s as posi/Ces de 2uti e

2amargo; e amos então o +ue di 'ernd:

ual o mérito desta poesia ?al e , se comparada & " consagrada poesia13@

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europeia, a poesia negra pare/a ing nua e Isem de%esaK. eu alor, contudo,

reside no %ato de ela estar aberta para o homem Ipor inteiroK. ua grande a

emana mais de seu conte do +ue de sua %orma: ela se constituir" no espa/o

em +ue o poeta negro perde Io medo de si pr-prio e assume sua total

nature aK. poesia negra nasce no ponto de intersec/ão entre o eu e o

mundo, dei7ando escorrer Iuma gota de sangueK .

ual a condi/ão primeira do poeta ^ a %idelidade &+uele +ue de e

constituir8se no tema central da poesia: o homem em torno do +ual passa a

gra itar o mundo. Esta %idelidade implica necessariamente humildade em

resistir aos apelos da Ici ncia, da moral e da culturaK para oltar8se para a

descri/ão do negro +uotidiano, +ue de er" ser retratado sem os

estere-tipos do e7-tico ou do grotesco, como %oi representado por toda

uma literatura.

5inalmente, +ual a matéria poética 4 poeta a+ui não ser" apenas o

recriador, mas, necessariamente, o pr-prio criador de um mundo onde, se

possa islumbrar uma no a maneira de ser e de so%rer, de morrer, de

resignar8se, em suma, de carregar uma certa carga de homem...K ('E<ND,

1@AW, pp. LX8LW)

E, citando 2ésaire, ela conclui +ue a poesia negra Ié a erdadeira poesia por+ue não

se restringe & ret-rica dos poetas +ue permanecem na super%$cie de si pr-prios: ela emana

das pro%unde asS do ser +ue toma consci ncia de si mesmo e de sua condi/ãoK, tratando8se,

portanto, de uma poesia rei indicat-ria, social, transgressora e ao mesmo tempo indi idual e

coleti a, não sendo uma poesia apenas de deleite, mas de den ncia em sua grande parte.

*ara 'ernd, a e7pressão Iliteratura negraK parece a mais ade+uada para de%inir esse

%ilão da literatura brasileira +ue em lutando por um espa/o nas institui/Ces de nossa

sociedade, por ser, para ela, mais alargada a sua dimensão, por ir além do nacional e do

lingu$stico e, +ui/", do da cor da pele, atestado por alguns depoimentos colhidos pela

ensa$sta nos pre%"cios lidos em li ros de escritores brasileiros representati os dessa

literatura: Ien+uanto alguns consideram +ue a poesia negra é a+uela +ue é %eita por negros,1HB

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pois s- um negro pode ter a Ie7peri ncia negraK, outros a%irmam +ue o +ue caracteri a a

poesia não é a cor da pele do autor, mas o %ato de retratar o negro en+uanto ra/a possuidora

de determinada cultura e alores.K ('E<ND, 1@AW, p.A1). Dei7ando8nos, mais uma e , &

ontade +uanto ao uso das terminologias Ia%ro8brasileiroK ou Inegro8brasileiroK, " +ue'ernd pensa, assim como 2uti, +ue o primeiro termo Icorresponde a reconhecer uma

literatura empenhada em resgatar uma ancestralidade a%ricanaK e o segundo reconhece I+ue

h" um estilo, um lé7ico, uma tem"tica, etc., +ue particulari am um discurso liter"rio de

%orma marcante e de%initi aK.

<e%erindo8se aos adernos Negros, antologias +ue surgiram no %inal dos anos 1@WB,

criadas por 2uti e 0amu !inOa, 'ernd mostra8se muito cr$tica no +ue concerne &s

publica/Ces dos anos de 1@AB, em irtude da +ualidade poética de alguns de seus

colaboradores, notadamente os mais o ens, chegando ao ponto de comprometer a

+ualidade inicial de%endida por seus %undadores. entencia ela: I4 discurso desintegrador se

rituali a, trans%ormando os poetas em meros ep$gonos, em artesãos +ue nada mais %a em do

+ue repetir modelos petri%icados. =sto determina um e%eito contr"rio ao +ue os poetas

isaram obterK. <econhece 'ernd, como 2amargo, +ue alguns se sal aram e constru$ram

uma poesia +ue caminha, de certa %orma, noutra ertente, mas com um tino poético maisagu/ado, di%erenciando8se da+ueles +ue se mant m presos em Ium discurso homog neo

onde as singularidades tornam8se praticamente impercept$ eisK, dentre os +ue se destacam

estão 0osé 2arlos #imeira e ^le emog, poetas +ue, além da poesia de protesto e do lamento,

cultuam a poética do Iamor, a bele a da mulher negra, o samba e a %é na e7ist ncia,

tornando sua %ala mais %ecunda +ue a dos demais poetas do grupoK. =nteressa ressaltar, a+ui,

+ue muitos dos poetas colaboradores dessas antologias %i eram uma iagem de regresso &s

origens a%ricanas, num ato transgressor de contrariedade ao +ue se iu no tempo daescra idão, em busca de nomes a%ricanos, como uma retomada de sua identidade

ilipendiada pelos senhores de escra os +ue lhes punham nomes cristãos.

'ernd %inali a seu te7to com as seguintes considera/Ces: a) a poesia negra brasileira

situa8se ainda na IsombraK, uma e +ue não h" anu ncia das grandes editoras e seus

autores, na maioria das e es, bancam os seus pr-prios li ros; b) essa literatura é um meio

de os negros Ipleitearem seu reconhecimento como su eitos para poderem impor sua e%eti a1H1

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participa/ão num di"logo de culturasK; c) recupera/ão da cosmogonia a%ricana es%acelada

com o pro eto escabroso da escra idão e dos her-is das lutas pela liberta/ão +ue remontam

a priscas eras, como %onte e moti os poéticos; d) reno a o discurso dominante,

estabelecendo uma no a alora/ão, assim, termos antes com teor negati o passam asimboli ar o positi o, numa atitude transgressi a de seus operadores; e) com isso o negro

recupera sua autoestima, estabelecendo uma rela/ão antitética entre Ieu9elesK, numa

in ersão de alores em +ue o eu representa o Ipositi oK e o eles o Inegati oK.

bordemos um recente con unto de olumes dedicados ao resgate dessa literatura.

Literatura e afrodescend(ncia no rasil: antologia cr$tica, cole/ão organi ada por Eduardo de

ssis Duarte, em +uatro olumes, editada pela 65! , %ruto de pes+uisa %eita em todas as

regiCes do pa$s, en ol endo X1 pes+uisadores, inculados a G1 institui/Ces de ensino

superior e seis estrangeiras, abordando 1BB escritores a%rodescendentes, desde o per$odo

colonial, mais precisamente a partir do século \ ===, com Domingos 2aldas 'arbosa, até aos

nossos dias.

^ de %ato um trabalho de grande amplitude, publicado no ano de GB11, pela

+uantidade de escritores antologi ados e pelas re%er ncias bibliogr"%icas apresentadas.

Nessa cole/ão, em seu pre%"cio, o organi ador tra/a um per%il da literatura negra, +ue ele

pre%ere denominar de a%rodescendente, no mundo, nomeando %iguras " nossas conhecidas:

imé 2ésaire, #éon Damas, #éopold édar enghor, dentre outros. 4 autor %a , também, um

apanhado dos mo imentos negros, também a+ui " re erenciados: Negritude, =ndigenismo

_aitiano, _arlem <enaiscense e o ?eatro E7perimental do Negro, criado no 'rasil por bdias

do Nascimento.

4 autor tece ainda cr$ticas pro%undas ao preconceito declarado de intelectuais doporte de *aulo Duarte, de%ensor do processo de um 'rasil branco, o +ue nos é e7tremamente

inaceit" el. ?ece cr$ticas, também, ao luso8tropicalismo de ilberto 5re>re. Duarte reser a

um espa/o para mencionar a literatura dos pa$ses a%ricanos de l$ngua portuguesa +ue

%i eram da poesia o seu Icanto armadoK. ão citados !"rio *into de ndrade, gostinho

Neto, Noémia de ousa. Ele, também, rati%ica os nomes dos estrangeiros <oger 'astide,

a>ers e <abassa, como pioneiros na pes+uisa da presen/a do negro na nossa literatura.

1HG

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Duarte ensina +ue a partir da década de 1@WB até aos nossos dias surgem no os

trabalhos sobre a Iliteratura a%rodescendenteK, destacando nomes como os de: ?e-%ilo de

ueiro 0 nior (1@WL), 'enedita ou eia Damasceno (1@AA), 0ean !areel 2ar alho 5ran/a

(1@@A), _eloisa ?oller omes, !oema *arente ugel, Dom$cio *roen/a 5ilho, Da id'rooOshaF (1@A3), Yil" 'ernd (1@AW, 1@AA e 1@@G) e mais: 4sFaldo de 2amargo (1@AW), #ui a

#obo (1@@3, GBBW) e #eda !aria !artins (1@@L); as colet]neas cr$ticas organi adas por !aria

Na areth oares 5onseca (GBBB e GBBG), por Ni>i %olabi, !"rcio 'arbosa e Esmeralda <ibeiro

(GBBW) e por Edimilson de lmeida *ereira (GB1B); e os olumes ensa$sticos do pr-prio

Edimilson de lmeida *ereira (GBBW), 5lorentina da il a ou a (GBBL), 0Mnatas 2oncei/ão da

il a (GBBH), !iriam l es (GB1B), 2uti (GBB@; GB1B). Este ltimo, pseudMnimo de #ui il a,

um dos %undadores do uilombho e. Desta+ue8se ainda o olume te-rico e historiogr"%icoorgani ado por 5lorentina ou a e !aria Na aré #ima (GBBX); o ensaio cr$tico de *atr$cia

Reis8'om%im (GBBB), publicado na lemanha; o li ro de Emanuelle 4li eira (GBBA), editado

nos Estados 6nidos; as obras enciclopédicas de Eduardo de 4li eira (1@@A), Nei #opes (GBBH

e GBBW) e #$cia oares de ou a (GBB@); o ensaio biogr"%ico de !aria # cia de 'arros !ott

(1@A@); e os estudos comparados de !aria parecida algueiro (GBBH) e de uel> !eira

#iebig (GBB3 e GB1B). 2umpre destacar ainda a obra A m+o afro-brasileira, organi ada por

Emanoel rau o em 1@AA e reeditada em GB1B. (D6 <?E, GB11, pp. G@83B). *or ser muito

e7tensa a sua cita/ão e por hora não nos interessar diretamente todas essas leituras,

acrescentemos apenas: adernos Negros, publicados entre 1@WA e GB1B, a colet]nea

adernos Negros: os melhores poemas (1@@A), as antologias organi adas por *aulo 2olina

(1@AG), Edu 4mo 4guiam (1@AG), 4sFaldo de 2amargo (1@AX e 1@AW), Yil" 'ernd (1@@G),

0Mnatas 2oncei/ão e #indinal a 'arbosa (1@@@ e GBBB) e, ainda, a recolha %eita por #ui 2arlos

dos antos, !aria alas e 6lisses ?a ares (GBBL). (D6 <?E, GB11, p.31)

5echam a lista os nomes de 5ernanda 5elisberto (GBBH) e o de #ui <u%%ato (GBB@).

Esclarece o autor +ue a antologia pri ilegiou os escritores com publica/Ces indi iduais, &s

+uais os pes+uisadores ti eram acesso, a+ueles +ue se assumiam como a%rodescendentes ou

re elam em seus escritos tal sentimento e os +ue, " mortos, ti eram a anu ncia de seus

herdeiros, sendo a %ic/ão e a poesia os g neros escolhidos. antologia ainda nos presenteia

com uma série de estudos sobre o assunto assinados por rnaldo \a ier, il iano antiago,

4ct" io =anni, o pr-prio Eduardo de ssis Duarte, Yil" 'ernd, dentre outros, +ue serão1H3

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estudados de acordo com a pertin ncia da teoria e do te7to liter"rio lido. 4 primeiro olume

V *recursores V é dedicado aos autores nascidos antes de 1@3B. =nclui escritos da+ueles +ue,

mesmo não assumindo e7plicitamente um pro eto liter"rio a%ro8brasileiro, apresentam tra/os

discursi os +ue os situam, em muitos momentos, numa -rbita de alores socioculturaisdistintos dos abra/ados pelas elites brancas. 4 segundo olume V 2onsolida/ão V contempla

os nascidos nas décadas de 1@3B e 1@HB, marco hist-rico de m ltiplos sentidos para a cultura

do pa$s. 4 terceiro olume V 2ontemporaneidade V compreende autores nascidos na

segunda metade do século \\, com publica/ão a partir das ltimas décadas. _" uma %orte

presen/a de autores re elados nos adernos Negros: 2uti, !iriam l es, Esmeralda <ibeiro,

!"rcio 'arbosa, b$lio 5erreira, #ia ieira, Mnia 5"tima da 2oncei/ão, 5austo ntMnio,

<amatis 0acino, belardo <odrigues. _" também nomes mais conhecidos em seus estados deorigem, +ue mant m presen/a discreta na série, a e7emplo de ^le emog, 0osé 2arlos #imeira

e 0Mnatas 2oncei/ão. E, ainda, autores des inculados do uilombho e, tais como os poetas

Edimilson de lmeida *ereira, algado !aranhão e <onald ugusto, além dos _edonistas

dilson ila/a, *aulo #ins, #u$s 2arlos de antana e na !aria on/al es. Na prosa in%anto8

u enil estão presentes 0 lio Em$lio 'ra , _eloisa *ires e 2idinha da il a. 4 +uarto olume V

_ist-ria, teoria, pol mica V é composto de depoimentos e ensaios de escritores, bem como

de cr$ticos e historiadores da literatura brasileira. eu prop-sito é %ornecer aos estudiosos

não apenas dados historiogr"%icos, mas também subs$dios te-ricos a respeito dessa

discursi idade etnicamente marcada. (...) 4s depoimentos, colhidos em di%erentes

momentos da pes+uisa, cont m re ela/Ces e impressCes de autores como bdias do

Nascimento e 4sFaldo de 2amargo, cu a produ/ão remonta a meados do século \\, bem

como de participantes de gera/Ces posteriores, a e7emplo de 2oncei/ão E aristo, 2uti, l ira

<u%ino, Edimilson de lmeida *ereira, Esmeralda <ibeiro e !"rcio 'arbosa. presentam

ainda os posicionamentos de Yil" 'ernd, uma das precursoras desses estudos na década de

1@AB. (D6 <?E, GB11, pp. 3L83@)

Essa antologia, principalmente em seus te7tos cr$ticos e te-ricos, ser" de grande alia

para os nossos estudos, assim como os li ros anteriormente comentados, uma e +ue neles

nos pautaremos no momento da an"lise dos te7tos +ue %a em parte de nosso corpus.

1HH

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3+3+ OS CASOS DE SO)A%O TRI%DADE E FRED SOU A CASTRO

3+3+*+ Solano Tr ndade e o mov mento da ne.r t0de no ras l

3+3+*+*+ Per1 l ; o; ;l o.r<1 co e l ter<r o

De todos os escritores negros, agora " atuando ligados &coleti idade negra brasileira, o +ue dei7ou presen/a mais %orte%oi olano ?rindade. (2 ! < 4, p.W@)

*ode8se, com seguran/a, a%irmar +ue olano ?rindade é orepresentante brasileiro da linhagem, & +ual se inculam osautores mencionados, caracteri ada pelo enga amento aomar7ismo e por um %orte sentimento de perten/a ao soloamericano. Estes autores pensaram a cultura das tr s

méricas como uma totalidade: ser negro é uma %orma de seramericano; ser negro americano é participar, pelamediati a/ão do discurso poético, da desconstru/ão daimagem negati a +ue a sociedade elaborou sobre ele. ('E<ND,1@AW, pp. AX8AW)

4s dados biogr"%icos +ue a+ui se apresentam %oram colhidos de biogra%ias escritas

pela %ilha do poeta, <a+uel ?rindade, uma das +uais publicada no li roSolano trindade: o

poeta do povo, editado pela Ediouro em GBBA.

olano ?rindade nasceu no dia GH de ulho de 1@BA, no bairro de ão 0osé, em <eci%e,

*ernambuco. ão seus pais: !anuel b$lio, %ilho de negra com branco, e !eren/a

(Emerenciana), %ilha de negro com $ndia. 2resceu ou indo os pregCes dos endedores

ambulantes: I4stra chegada agora9chegada agora, chegada agoraK, I^ doce, é doce o

abaca7i9é doce, é doce e é baratoK, I*itomba, tomba não tomba9chora menino por umintém9pede a papai +ue mamãe não temK, I^ mungus", t" +uentinho9o mungus"9est" bom,

ispici"K, I'anana prata9ma/ã madurinhaK, I apoti, sapot"9manga espada9manga

rosa9 apatinho =tamarac"K, I^ a bolinha de cambar"J9Dois pacotes é um tostãoK. noite,

ha ia serenatas e briga de malandros, en+uanto nas casas pe+ueno8burguesas soa a o piano.

_a ia, também, os tipos populares: I!inha elaK, I6ma e -K, I#agarti7a 'arbadaK,

I0acaré essentaK, I raraK, I!el com [guaK, I'uchechaK, I*eri+uitoK, I arapaK, IYu aK,1HL

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I?obinhaK e I2anela de /oK. 4 homem do carangue o e a %reguesa das bonecas de pano,

personagens +ue po oaram de encantamento a in%]ncia do menino olano.

4 Natal era caracteri ado pelos %andangos, pastoril, bumba8meu8boi, presépios,

lapinhas e mamulengos. No carna al: os %re os assourinhas, *"s Douradas, #enhadores,

?oureiros %a iam a %esta do Imenino de 4uroK, como era apelidado o seu pai, de +uem

olano amais se a%asta a nessa época. ua mãe era anal%abeta, mas para ela o aprendi de

poeta lia no elas e outras hist-rias.

=niciou seus estudos no #iceu de rtes e 4%$cios, onde %e o ho e chamado Ensino

!édio. Em 1@3L, casou8se com !aria !argarida. té 1@HB, %oi di"cono presbiteriano. Nessa

época, seus poemas eram m$sticos e uma re ista do 2olégio 1L de No embro, de aranhuns,publicou suas primeiras poesias +ue %ala am do -lgota, de ?iago e de 0oão E angelista.

Depois tornou8se socialista e eio a %ase da poesia negra.

Em 1@3X, %undou a 5rente Negra *ernambucana e o 2entro de 2ultura %ro8'rasileiro

com o pintor 'arros (4 !ulato), scenso 5erreira e o escritor 0osé icente #ima. 4 2entro

tinha por ob eti o, entre outros, di ulgar os intelectuais e artistas negros. Nele, olano

publicou seus I*oemas NegrosK. Num de seus n meros lia8se o seguinte: INão %aremos lutasde ra/as, porém ensinaremos aos irmãos negros +ue não h" ra/a superior, nem in%erior, e o

+ue %a distinguir uns dos outros é o desen ol imento cultural. ão anseios leg$timos a +ue

ninguém de boa8%é poder" recusar coopera/ãoK.

Depois passou por 'elo _ori onte e *elotas, %undando nesta, com o poeta 'alduino

de 4li eira, o rupo de rte *opular, em 1@HB. Em 1@HG, esta a no <io de 0aneiro, em 2a7ias,

onde se reunia no bar I ermelhinhoK com os amigos, tornando8se logo %igura popular.

2arrega a uma pasta cheia de poemas, de planos sobre mo imentos art$sticos e sonhos,

declama a para seus amigos: INão disciplinarei minhas emo/Ces estéticas; dei7"8las8ei &

ontade, como o meu dese o de i er ...K.

Nessa época, editou o seu li ro $oemas de uma vida simples . eu poema I?em gente

com %omeK %e sucesso nos meios liter"rios. #igou8se & pintora D anira, a 5erreira, 4scar

!eira, 5ernando 5an, !ilton <ibeiro, ldemir !artins, 'arbosa #eite, 'runo iorgi, rande

4telo, *ascoal 2arlos !agno e ntonio 'andeira.1HX

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0" desen ol endo seus dotes de pintor, participou, em 1@HG, de uma coleti a, tendo

endido seus +uadros (pela primeira e ) ao ecret"rio do o erno da ene uela e a ingleses

da [%rica do ul.

Em 1@HL, %undou o 2omit Democr"tico %ro8'rasileiro com <aimundo ou a Dantas

e 2ustodio 2orsino 'rito, depois untou8se a _aroldo 2osta para %ormar o ?eatro 5olcl-rico

'rasileiro. Dai sairia, em 1@H@, a %amosa P'rasilianaK. 2om a entrada do diretor sOanasi,

olano se a%astou por+ue o grupo estili ou8se e perdeu sua autenticidade. Em 1@LB, unto

com sua esposa !argarida ?rindade (core-gra%a e terapeuta ocupacional) e o soci-logo

Edson 2arneiro, trans%ormou um de seus sonhos em realidade, %undando o ?eatro *opular

'rasileiro, cu o lema era: Ipes+uisar na %onte de origem e de ol er ao po o em %orma de

arteK. 4 ?*' %a ia uma aut ntica arte popular e seu elenco era %ormado por domésticas,

oper"rios, estudantes e comerci"rios.

Em sua casa de 2a7ias, %oram apresentados os primeiros espet"culos ('atu+ues,

#undus, 0ongos, amba 2arioca, *astoris, 'umba8!eu8'oi, 2hegan/a, uerreiros de lagoas,

5olia de <eis, 'aião, 2andomblé, Dan/a das 5itas etc.), +ue atra$am para l" embai7adores,

artistas, ornalistas e outros intelectuais. Encontra am8se ntonio 'andeira e 0ean #ouis

'arrault, ladir, ugusto <odrigues e nibal !achado, dentre outros. 4 ?*' reali ou

espet"culos especiais para companhias estrangeiras como P2omedie 5ran/aiseP, P2ia. !arcel

!arceauP, P2ia. !adeleine <enault8 0ean #ouis 'arraultP, P4pera de *e+uimP, P2ia. =taliana

de 2omediaP e para personalidades como Edith *ia%, 0ean ablon etc.

ai a ão *ulo em 1@LH, pela primeira e , para, com o ?eatro *opular 'rasileiro,

participar das comemora/Ces do = 2enten"rio da cidade. Em 1@LL, sempre com o ?*',

olano ia ou para a Europa, onde apresentou espet"culos de canto e dan/a, deu entre istasna tele isão, participou do 2oncurso =nternacional de Dan/as *opulares e ganhou medalha

de ouro. presentou8se em est"dios para plateias de G a L mil espectadores. E7ibiu8se em

oito cidades da *olMnia e tre e cidades da ?checoslo "+uia. Na Europa, %oram %ilmadas as

dan/as para o document"rio rasil "an%as.

De olta ao <io, olano ?rindade, com o seu ?*', se apresentou nos teatros 0oão

2aetano, 2arlos omes, <ep blica, !unicipal do <io, no est"dio de Niter-i, em %aculdades,

1HW

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na tele isão e em clubes (5luminense, 2abiras, ociedade _$pica etc.). *ara il eira ampaio,

em , pais dos adilacs , olano %orneceu o material %olcl-rico, coreogr"%ico e musical. Em"e

$edro a $edro , coube a !argarida ?rindade, uma das %undadoras do ?*', ensinar o 0ongo e

'umba8!eu8'oi.

Em 1@LW, olano esta a no amente em ão *aulo. ua poesia tinha uma aguda

consci ncia de classe, mas sem -dios. *articipou com integrantes do ?*' da pe/a Jimba , de

ian%rancesco uarnieri, no ?eatro !aria Delia 2osta. eparou8se de !argarida e come/ou a

amar Dione. <eali ou espet"culos em ão *aulo para o P'alé EspanholP, P'alé !e7icanoP e

P'alé Negro mericanoP. Em 1@XB, publicou seu li ro de poemasSeis 9empos de $oesia e, no

?eatro lian/a 5rancesa, apresentou o espet"culo Sambalel( t) doente .

Em 1@X1, olano conheceu o escultor ssis, +ue o con idou para ir a Embu das rtes

(além de ssis, " esta am l" aOai, teca e 2assio !Q'oi). companhado do elenco do ?*',

apai7onou8se por Embu, sua terceira cidade. 2ome/ou então um mo imento muito sério. 4

?*' poderia Pmostrar, incenti ar e desen ol er as artes populares tradicionais do po o

brasileiro, a dan/a, a m sica, a escultura, a pintura, a poesia e todas as mani%esta/Ces

%olcl-ricasP (pala ras do pr-prio olano). presentou espet"culos no Embu e come/ou a

atrair multidCes de turistas para a+uela cidade colonial. 4 Embu %oi %icando conhecido no

mundo inteiro, atraiu outros artistas pl"sticos e, com eles, os colecionadores de arte.

Em 1@XG, publicou, pela Editora 5ulgor, o seu li roantares ao meu povo (Ppara %alar

ao po o numa linguagem +ue ele entendiaP). E dei7ou Dione para amar #>cia (a baiana).

Em 1@XL, chateado com os PpicaretasP e a comerciali a/ão +ue come/a a a aparecer

no Embu, olano %oi morar na ila Mnia e depois no 5erreira (bairros da peri%eria de ão

*aulo). oltou dois anos depois a con ite do anti+u"rio !arcos !ariano. ua casa

trans%ormou8se em um erdadeiro n cleo de arte.

Em 1@X@, olano come/a a adoecer, estado +ue se agra ou em 1@WB com a morte de

sua baiana #>cia. Em 1@W1, a arteriosclerose " esta a num estado bem adiantado e olano

era cuidado por sua %ilha, a pintora <a+uel, e pelo escultor icente de *aulo. Em 1@W3,

<a+uel %oi para o <io e pediu a sua mãe, !argarida, +ue o le asse para o <io também, no

+ue %oi prontamente atendida. 4 poeta, no entanto, contraiu uma pneumonia e %oi internado1HA

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por !argarida e sua %ilha odi a em uma cl$nica de anta ?ere a, onde %aleceu, no ano

seguinte, sendo enterrado em 0acarepagu".

té ho e, em Embu das rtes, o ?eatro *opular olano ?rindade, dirigido por <a+uel

?rindade e itor ?rindade, continua a apresentar os espet"culos de dan/a e canto +ue tanto

notabili aram seu grande criador.

"rios intelectuais se pronunciaram a respeito de ?rindade e de sua poesia: IEis um

grande *oeta Negro. ão conhecer alguém, os +ue não conhecem (poucos, de em ser muito

poucos), um leg$timo poeta Negro. %am$lia não é grande. tualmente est" +uase toda na

mérica do Norte, com o es muito altas (entre as +uais a maior k a patente e pro%unda o

de #angston _ughes). No inter alo centro8americano, h" também alguns representantes.Nicolas uillén, o principal. No 'rasil, #ui ama, saldo dos gemidos das sen alas, e o gigante

2astro l es, sem pigmentos na epiderme, mas Negro em "rios poemas e na de%esa da ra/a

escra i adaK. ssim %alou *aulo rmando. 2orsino de 'rito di : Io poeta olano ?rindade é

poesia em ess ncia, a ser i/o de uma causa; trans%ormismo dos na ios negreiros em brados

de sonoridade alti a. olano ?rindade com *ablo Neruda %ormam uma dupla Idi%erenteK na

poesia americana; são os maiores poetas do No o !undo por+ue compreenderam, mais +ue

os outros, a arte como a ersão natural aos na i8%ascismosK. IEntre os raros poetas negros

+ue conhe/o neste 'rasil mesti/o, olano ?rindade é o +ue melhor me satis%a . *or+ue

olano ?rindade não se encerrou na torre de mar%im da arte pura e tampouco escre eu

poesia negra com linguagem de Pnegro8brancoK, desses +ue se en ergonham de abordar o

t$pico das ga%ieiras e das macumbas como legitimas e7pressCes do anseio estético e da

misteriosa espiritualidade negra. Ele é Negro, sente como Negro, e como tal cantou as dores,

as alegrias e as aspira/Ces libert"rias do a%ro8brasileiro. *ara mim olano ?rindade é o brado

da ra/a, o maior poeta Negro do 'rasil contempor]neoK. ssim %alou bdias do Nascimento.

<ecebeu cumprimentos, também, de ergio !illiet, rthur <amos, Nestor de _olanda

e, de 2arlos Drummond de ndrade, essas elegantes pala ras: I leitura de seus ersos deu8

me con%ian/a no poeta +ue é capa de escre er P*oema do _omemP e I4 canto dos

*almaresP. _" nesses ersos uma %or/a natural e uma o indi idual, rica e ardente, +ue se

con%unde com a o coleti aK. (2arlos Drummond de ndrade, <io de 0aneiro, G de de embro

de 1@HH.)1H@

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3+3+*+3+ Solano Tr ndade e a ne.r t0de no ras l

Entre os raros poetas negros +ue conhe/o neste 'rasil mesti/o,olano ?rindade é o +ue melhor me satis%a . *or+ue olano

?rindade não se encerrou na torre de mar%im da arte pura etampouco escre eu poesia negra com linguagem de Pnegro8brancoK, desses +ue se en ergonham de abordar o t$pico dasga%ieiras e das macumbas como legitimas e7pressCes doanseio estético e da misteriosa espiritualidade negra. Ele éNegro, sente como Negro, e como tal cantou as dores, asalegrias e as aspira/Ces libert"rias do a%ro8brasileiro. *ara mim

olano ?rindade é o brado da ra/a, o maior poeta Negro do'rasil contempor]neo. ( bdias do Nascimento9<io de 0aneiro,W de setembro de 1@HHin ?<=ND DE, GBBA, p.GL)

*oeta da no a gera/ão, olano ?rindade é uma das melhorese7pressCes r$tmicas do Nordeste.

*ernambucano e de origem humilde, seus ersos e seusescritos possuem um animado colorido %olcl-rico, alori ado,entretanto, pelo cunho uni ersalista +ue transparece da suapoesia social, com a +ual descre e a ida nos mucambos e as]nsias das classes des%a orecidas +ue padecem da mesma%orma em +ual+uer parte do mundo. (4 2ensitario9<io de0aneiro, 1 de no embro de 1@H3in ?<=ND DE, GBBA, p.GX)

olano trindade escre eu os seguintes li ros: $oemas dBuma vida simples (1@HH);Seis

tempos de poesia (1@LA);antares ao meu povo (1@X1), com G edi/ão aumentada em 1@A1;

além de GB poemas in: !eredas , re ista de letras da 6ni ersidade de ão *aulo, n 1,

setembro de 1@W@;Solano trindade: o poeta do povo , editado pela Ediouro em GBBA;9em

gente com fome (em %ormato in%anto8 u enil), em GBBW; e$oemas antológicos de Solano

9rindade, de GB11, o +ual tomamos como base para an"lise nesta pes+uisa.

^ interessante notar +ue os li ros mais completos da obra de ?rindade são Solano

9rindade: o poeta do povo , editado pela Ediouro em GBBA, com 1A3 poemas di ididos em

+uatro partes intituladas pelos organi adores por cadernos: 1 *oemas sobre o negro, G

*oemas de cunho pol$tico8social, 3 *oemas de amor e H *oemas sobre a ida do poeta.

Essa edi/ão tra ainda algumas %otos do poeta e do ?*', além de "rios depoimentos de

intelectuais brasileiros e estrangeiros sobre a sua obra, nomes como os de <oger 'astide,

rthur <amos, 2arlos Drummond de ndrade, entre outros. E o outro é a antologia da Nova1LB

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Alexandria, de GB11,$oemas antológicos de Solano 9rindade , uma sele/ão e introdu/ão de

Yenir 2ampos <eis. Essa edi/ão também é di idida em cap$tulos: 1 ida, nossa ida; G

Deuses e ra$ es; 3 %lor da pele; e o H <esist ncia e luta. antologia é composta de 1BW

poemas e tem ilustra/Ces da %ilha do autor <a+uel ?rindade.

2omo se , as duas antologias t m o mesmo n mero de di isCes, +ue no %undo se

e+ui alem tematicamente, mesmo +ue assinaladas algumas di erg ncias, tal e por

aprecia/Ces de cunho pessoal por parte dos editores. !esmo nos apoiando nas di isCes

estabelecidas pelas duas edi/Ces, por uma +uestão did"tica da pr-pria pes+uisa, em irtude

do en%o+ue +ue estamos perseguindo desde o seu in$cio, adotaremos a seguinte se+u ncia

para a an"lise dos poemas de olano ?rindade: a) 4 cantor de sua gente; b) 4 poeta entre

Deus e os 4ri7"s; c) 4 poeta e seus amores; e d) olano ?rindade e o mo imento da

negritude a%ro8brasileira.

Em seu li roNegritude: usos e sentidos , `abengele !unanga, nascido na <ep blica

Democr"tica do 2ongo e naturali ado brasileiro, pro%essor da 6 *, estabelece algumas

considera/Ces +ue ulgamos importantes na interpreta/ão da poesia negra %eita no 'rasil,

notadamente a de olano ?rindade, especi%icamente relati as ao termo INegritudeK, criado

por imé 2ésaire e +ue tem gerado uma série de pol micas.

!unanga toma como $cones das no as gera/Ces negras +ue surgirão ao longo do

século \\ os nomes de R. E. '. Du 'ois (n. em 1AX3), doutor em 5iloso%ia e secret"rio do

*rimeiro 2ongresso *an8 %ricano, reali ado em #ondres, em 1@BB, tendo sido, até ho e,

aclamado como o Ipai do pan8a%ricanismo contempor]neoK. egundo o pro%essor da 6 *,

I*or ter de%endido a olta &s origens, Du 'ois merece também o nome de *ai da NegritudeK.

Nascido nos Estados 6nidos da mérica, de%endia a luta dos negros americanos pelos seusdireitos como cidadãos da+uele pa$s e, ao mesmo tempo, instiga a os a%ricanos a se

libertarem dentro de sua pr-pria terra. Di ia Du 'ois: I ou negro e me glori%ico deste nome;

sou orgulhoso do sangue negro +ue corre em minhas eias...K.

4 outro é #angston _ughes, poeta e militante do chamado I<enascimento NegroK,

precursor do mo imento da INegritudeK, em 5ran/a, encabe/ado por 2ésaire e enghor,

%icou bastante conhecido com o seu %amoso poema IEu também sou a méricaK: I?odos os

1L1

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tantãs do mato batem no meu sangue. ?odas as luas sel agens e %er entes do mato brilham

na minha almaK.

Em 1@3G, surgiu a re istaLégitime "éfense , iniciati a de alguns estudantes negros

antilhanos (^tienne #éro, <ené !enil, 0ules !onnero e outros) (c%. !6N N , L1). eguindo

os passos dos criadores do mo imento da <enascen/a negra norte8americana, esses o ens

rebelaram8se contra os anos de escra idão a +ue %ora sub ugado o po o negro e impuseram

uma o de assun/ão de suas origens e das aspira/Ces do po o oprimido.

Em 1@3L, surgiriaLBHtudiant Noir , +ue também se opunha & Ipol$tica de assimila/ão

culturalK, sendo seus criadores: I imé 2ésaire, +ue criou a pala ra negritude, o guianense

#eon Damas e o senegal s #éopold edar enghor, cercados de #eonard ain ille, ristide!augée, 'irago Diop, 4usmane oce e dos irmãos chilleK. egundo !unanga:

4 e7ame da produ/ão discursi a dos escritores da negritude permite

le antar tr s ob eti os principais: buscar o desa%io cultural do mundo negro

(a identidade negra a%ricana). protestar contra a ordem colonial, lutar pela

emancipa/ão de seus po os oprimidos e lan/ar o apelo de uma re isão das

rela/Ces entre os po os para +ue se chegasse a uma ci ili a/ão não

uni ersal como a e7tensão de uma regional imposta pela %or/a V mas uma

ci ili a/ão do uni ersal, encontro de todas as outras, concretas e

particulares. (GB1G, p.LG)

ão ob eti os desses o ens intelectuais negros a busca da identidade a%ricana, a

re ei/ão ao assimilar8se, o re%or/o da pree7ist ncia de uma cultura a%ricana e a sua

e+ui al ncia com a ocidental, da$ 2ésaire rede%inir anegritude em tr s pala ras: identidade,

+ue consubstancia8se no orgulho de ser negro; %idelidade, +ue Irepousa numa liga/ão com a

terra8mãe, cu a heran/a de e, custe o +ue custar, demandar prioridadeK; e solidariedade,

sentimento de união entre todos os po os negros.

<ele adas as pol micas geradas pelas "rias isCes sobre a Negritude, notadamente

as +ue en ol em 2ésaire e enghor, podemos a%irmar, e assim nos assegura !unanga:1LG

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crise desperta no negro um dese o de a%irma/ão cada e maior.

6ltrapassando os limites da literatura, a negritude aspira ao poder, anima a

a/ão pol$tica e a luta pela independ ncia. cria/ão poética torna8se um atopol$tico, uma re olta contra a ordem colonial, o imperialismo e o racismo. 4

mo imento da negritude deu um igoroso impulso &s organi a/Ces pol$ticas

c aos sindicatos a%ricanos, esclarecendo8os na sua caminhada &

independ ncia nacional. 2on+uistadas as soberanias, continuou a ser ir na

causa da unidade a%ricana, ao mesmo tempo +ue o%erecia um +uadro

ideol-gico a partir do +ual seus protagonistas, tornados homens de Estado,

iam pensar o desen ol imento econMmico e social e abordar o sistema derepresenta/ão dos alores culturais de seus respecti os pa$ses. (GB1G, p.LL)

2reio +ue podemos %alar, então, +ue " se passaram +uase AB anos das primeiras

discussCes a respeito da Negritude: seus alores, suas pol micas, seus erros e acertos e sua

rami%ica/ão no resto do mundo, en%ocando, portanto, um pouco o seu desdobramento no

'rasil. *ara !unanga (GB1G, p.LW), citando 'ernard #echerbonnier, Ias di ersas de%ini/Ces danegritude oscilam entre duas interpreta/Ces antinMmicas: uma m$tica e outra ideol-gicaK.

primeira acep/ão, como se pode pre er, estaria oltada para o passado a%ricano, os seus

prim-rdios, no sentido de Ire itali ar a realidade a%ricanaK tão modi%icada pelos ocidentais,

para não di er ilipendiada. outra encontra seu sustent"culo nos ensinamentos mar7istas e

busca a/Ces e%eti as +ue promo am os ensinamentos necess"rios no pensamento do

a%ricano a %im de +ue este estabele/a as mudan/as %ulcrais no seio da sociedade, abrindo

no os hori ontes e apontando com eem ncia para as ma elas dei7adas pela coloni a/ão.

inda segundo !unanga, essas duas concep/Ces não são incoerentes: IEn+uanto

mito, interpreta8se a negritude como realidade oltada ao passado, sonhadora e

contemplati a, eg-latra e autossu%iciente, não de combate, pro etada para o %uturoK, essa

isão %oi insistentemente combatida por 5anon, mas !unanga chama a aten/ão para algo

+ue soa bastante cr$ el e não estaria tão des inculado das teorias do pensador martinicano:

I s linhas8%or/a +ue serão pensadas para a %rente e usti%icadas pela an"lise da situa/ão1L3

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presente pertencem & ideologia (de luta), mas podem ter sucesso +uando apoiadas por uma

ontade coleti a, re%le7o de um passado real ou m$ticoK (GB1G, p.LA).

=nteressa8nos até a$ essa discussão por conta de +ue a poesia a ser analisada, em

seguida, embora boa parte dela ei ada desses conceitos, segue suas particularidades: a

situa/ão social (+uer +ueiramos ou não), o locus, a cultura, a pol$tica, a linguagem, a religião

e os ob eti os. egundo *ires #aran eira, a poesia brasileira +ue %ala da [%rica, inclusi e a de

1@GG, não sugere +uase nada desse continente: I^ eleita (a [%rica) como s$mbolo ou $cone,

uma [%rica ausente (imagin"ria e %antasiosa +uando ultrapassa a mera nomea/ão) e o negro,

por+ue mais pr-7imo, encarna a representa/ão +ue do continente imaginam os +ue nenhum

conhecimento dele t mK (1@@L, p.HB). crescenta ainda o ensa$sta portugu s +ue a [%rica

não passa de um adorno poético ou Iuma pura ilusão li rescaK.

'uscamos, por isso, atra és de 'ernd, construir uma de%ini/ão para a e7pressão

Negritude ou, ao menos, situ"8la dentro do conte7to brasileiro a partir do século \\.

ensa$sta inicia seu discurso sobre o assunto com duas perguntas: I1) ^ poss$ el %alar em

negritude em rela/ão ao conte7to brasileiro G) *oder" este termo recobrir a totalidade das

tend ncias +ue os mo imentos negros apresentam no 'rasil K. *ara respond 8las, 'ernd

parte para %a er a distin/ão entre negritude (com min scula) e Negritude (com mai scula).

em desconhecer os "rios mo imentos de insurrei/ão de negros +ue permearam os anos de

e7ist ncia do 'rasil colMnia ea posteriori , não encontramos, na altura dos mo imentos a +ue

aludimos atr"s (nos E6 , na Europa e na [%rica), mesmo ap-s a cria/ão em 1@3B da 5rente

Negra 'rasileira85N', a Irei indica/ãoK do termo negritude por parte dos intelectuais

brasileiros.

_ou e o surgimento da imprensa negra, em 1@1L, ainda a %unda/ão do ?eatroE7perimental do Negro8?EN, por bdias do Nascimento em 1@HH, o ?eatro *opular 'rasileiro8

?*', criado por olano ?rindade em 1@HA e o !o imento Negro 6ni%icado 2ontra a

Democracia <acial9!N62D<, depois trans%ormado em !N6, simplesmente, em 1@WA, além

de muitos outros, com ob eti os claros de rea%irma/ão da ra/a negra.

egundo 'astide, a negritude no 'rasil não te e um car"ter de I olta & mãe8[%ricaK.

Nem poderia, ha a ista a conte7tuali a/ão ImultirracialK, o +ue %a ia o mo imento inserir8se

1LH

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num prop-sito maior Inacional multirracialK a %a or da melhoria de ida do proletariado

brasileiro em geral, e é nesse conte7to +ue ai se in%iltrar a poesia de olano ?rindade.

#amenta 'astide: IEu gostaria de poder a%irmar +ue a Negritude a+ui %oi a tomada de

consci ncia de um nacionalismo brasileiro por brasileiros de ancestralidade a%ricanaK('E<ND, 1@AW). e amos o +ue di a pr-pria ensa$sta:

chamos, portanto, +ue se pode %alar, em sentido lato, em uma ertente

brasileira da negritude +ue não é um mo imento estan+ue, mas um

%enMmeno +ue ocorre em di%erentes culturas (E6 , ntilhas, U%rica, mérica

do ul), com di%erentes condi/Ces sociais, e7primindo8se em "rias l$nguas,

portanto essencialmente migrat-rio e não sincrMnico.

?entar er os atuais mo imentos brasileiros, +ue oltam8se sobre si mesmos

para %abricar uma autoimagem, com um sistema de asos comunicantes,

como o canto poli%Mnico da negritude, poder" a udar a entender melhor a

realidade da literatura negra e da pr-pria literatura brasileira. (1@AW, p.3A)

s pala ras da estudiosa corroboram com o nosso pensamento e iluminam a nossa

caminhada na an"lise +ue ha emos de %a er sobre os poetas olano ?rindade e 5red ou a

2astro. creditamos, como 'ernd (1@AW), +ue a poesia negra é, em geral, possuidora de uma

ertente e7tremamente particulari ada, & procura de uma identidade pr-pria, sem, porém,

omitir8se dos elementos estéticos +ue tornam um te7to e%eti amente liter"rio. 2remos,

também, +ue a identidade não est" alicer/ada na cor da pele, embora reconhe/amos a sua

import]ncia na e7pressão negritudinista brasileira. *ara 'ernd: I6ma identidade alicer/adana cor da pele, isto é, num dado empiricamente eri%ic" el, é uma identidade de primeira

ordem. 4u a+uela +ue se d" na super%$cie, admitindo uma correla/ão inerente entre

caracter$sticas raciais e produ/ão de cultura, o +ue é, como " a%irmamos, cienti%icamente

%also, tendo originado posi/Ces racistas +ue atribu$ram & ra/a n-rdica pretensa

superioridade.K (1@AW, p.3@).

0ulgamos, por se tratar de um trabalho de doutoramento, importante a %ala de <enato

1LL

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4rti como sustenta/ão de nossas con ic/Ces, uma e +ue o re%erido pro%essor e escritor

go a de asto prest$gio entre a comunidade intelectual brasileira e internacional. 4rti

assinala +ue os mo imentos negros atuais Ibuscam %ormas concretas de e7pressCes culturais

para integr"8las e reinterpret"8las dentro de uma perspecti a mais amplaK. *ara ele, a culturaa%ro8brasileira integra em um todo coerente Ias pe/as %ragmentadas da hist-ria negra V

candomblé, +uilombos, capoeira V os intelectuais (agentes) constroem uma identidade negra

+ue uni%ica os atores +ue se encontra am anteriormente separados. identidade é, neste

sentido, elemento de uni%ica/ão das partes, assim como %undamento para uma a/ão

politica.K (in 'E<ND, 1@AW, p.H1).

ssim, a poesia de +ue nos ocupamos en ereda pelo caminho das descobertas ou

redescobertas da identidade poética de +uem a pratica, com %inalidades pr-prias, pensadas a

partir de um eu para ser repartida entre "rios eus componentes de uma coleti idade +ue

pode não ser apenas &+uela +ue di ou impCe a Iminha perten/aK, sendo esta, embora, uma

%orma de a%irma/ão do eu pr-prio diante do outro. *assemos, então, & an"lise poética a er o

+ue ela nos propCe como %onte de comunica/ão, de deleite, de contesta/ão, de den ncia, de

re olta e de comunhão.

a7 O cantor de s0a .ente

I*inta pinta pintainhoYorra me orra

ue " est" %orraola sapato

<ei rainhaDebai7o da camaDa camarinhaK

2omo parece esta lua com a+uele outro luarue +uando pe+ueno i lua esta a amarela

<odeada de estrelas*ra minha in%]ncia a sorrir

I2ru 2ru 2ru elhinha do nguK

2omo sublime é lembrar1LX

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+uela cena singelaDa mamãe toda cur ada'atendo de mão em mão?" +uente ou t" %ria( olano ?rindade)

0" disseram +ue os poemas simples tendem a perder sua +ualidade estética, e é

poss$ el +ue sim; podem, no entanto, esses poemas tornar8se mais populares, mais lidos,

mais ou idos e, pela sua pr-pria estrutura e linguagem, mais de idamente compreendidos,

cabendo ao poeta a escolha do caminho a trilhar, mas a partir do momento em +ue a

academia passa a er com outros olhos esses poetas, &s e es, aparentemente simples, e a

preocupar8se com sua obra, é sinal de +ue algum e%eito estético a ultou, pro ocando a+uilo

+ue os te-ricos russos chamaram de IestranhamentoK.

^ tal e o +ue este a acontecendo com alguns poetas, de "rias nacionalidades, +ue

s- agora t m sua obra sob olhar cr$tico das uni ersidades, o caso olano ?rindade por

e7emplo, +ue " tem uma meia d ia de teses a seu respeito, todas empenhadas em não

dei7ar o autor a perder8se no ostracismo das belas letras.

<oger 'astide, pes+uisador %ranc s da cultura negra brasileira, assim se re%ere a

alguns poemas de ?rindade +ue lhe %oram en iados pelo pr-prio poeta: I4 senhor %a dos

seus ersos uma arma, um to+ue de clarim, +ue desperta as energias, le anta os cora/Ces,

combate por um mundo melhorK (c%. ne7os). 4 pr-prio cr$tico se di apreciador de I*oemas

+ue reali am uma s$ntese entre o passado e o %uturo, entre as aspira/Ces de reis

proletari ados e as can/Ces do %olclore, entre o amor moderno, a sombra das chaminés de

usina, e o amor m$stico, sob o olhar dos 4ri7"sK. E acrescenta I2reio, de %ato, +ue o progresso

não de e destruir o +ue h" de grande e l$rico na cultura tra ida outrora da [%rica, e +ue de etornar8se uma heran/a comum a todosK. 4bser emos +ue 'astide come/a por chamar o

poeta de IinauguradorK de uma no a concep/ão poética. diante %a , porém, uma

ad ert ncia: I?al e possam lhe repro ar certa limita/ão do ocabul"rio e do ritmoK, por+ue

é e7atamente a simplicidade +ue coroar" a +uase totalidade da obra de ?rindade, e o %a de

%orma consciente, pois é do pr-prio poeta o seguinte depoimento de 1@X1 e apenso ao li ro

Solano 9rindade: o $oeta do $ovo:

1LW

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K pesar de tudo +ue tenho ou ido e lido sobre poesia, resultado das teses e

debates nos congressos de poetas e cr$ticos, não me sinto disposto a mudar

de linha, de sair do caminho popular de minha poética. em +uerer discutir

o alor dos herméticos concretistasS, dada$stasS, etc. (eruditos donos da

cultura ocidental), pre%iro le ar ao meu po o uma mensagem, em

linguagem simples, em e de uma mensagem ci%rada para um grupo de

intelectuais. ?enho pelos homens de cultura uma grande simpatia, se am

modernos ou acad micos; tenho aprendido muito com todos eles, atra és

dos seus li ros e das suas con ersas, porém a minha poesia continuar" com

o estilo do nosso popul"rio, buscando no negro o ritmo, no po o em geral

as rei indica/Ces sociais e pol$ticas, e nas mulheres, em particular, o mor.

gradam8me pro%undamente os t$tulos de poeta negroS, poeta do po oS,

poeta popularS, &s e es ditos de modo depreciati o, mas +ue me dão uma

consci ncia e7ata do meu papel de poeta na de%esa das tradi/Ces culturais

do meu po o, na luta por um mundo melhor. 6nir o 6ni ersal ao <egional,

num poema participante ou amoroso, num erso de protesto ou ternura,

mas em pala ras bem compreens$ eis. V uem me ou ir, ou/aK. olano

?rindade, ão *aulo, ulho de 1@X1.

Essas são pala ras de um homem consciente de seus ob eti os e a par do +ue se

passa no mundo acad mico e das teorias eruditas sobre o %a er poético, mas pre%ere uma

poesia mais le e e comunicati a, menos rica do ponto ista ocabular, mais e7pressi a, no

entanto, do ponto ista lingu$stico. 2omo di 'astide: Io +ue para alguns cr$ticos é um

de%eito, para outros V para os +ue eem na *oesia uma PmensagemP V ser", ao contr"rio,uma +ualidade, tornando poss$ el uma mais r"pida compreensão dos poemas e uma a/ão

mais e%ica K. *articularmente, congratulamo8nos com o escritor %ranc s, +uando escolhemos

a poesia de olano ?rindade para contrapor & dos poetas angolanos gostinho Neto, nt-nio

0acinto e iriato da 2ru , por pura identi%ica/ão com sua poética, o +ue não nos tira o direito

de apreciar um 5ernando *essoa ou um 0oão 2abral de !elo Neto. ?omemos como ponto

inici"tico o poema I d ert nciaK:

1LA

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_" poetas +ue s- %a em ersos de amor

_" poetas herméticos e concretistas

en+uanto se %abricam bombas atMmicas e de hidrog nio

en+uanto se preparam

e7ércitos para guerra

en+uanto a %ome estiola os po os...

Depois

eles %arão ersos de pa or e de remorso

e não escaparão ao castigo

por+ue a guerra e a %ome

também os atingirão

e os poetas cairão no es+uecimento...

(p.1W)

parentemente, simples, diria singelo, numa isão metalingu$stica cortante, o poeta

%a a Iad ert nciaK aos companheiros de escrita, podendo ser inclusi e uma autor8

reprimenda, pois ele pr-prio h" de se deliciar em belos ersos de amor, como se er". Ele, o

poeta, se intitula o cantor de sua gente, por isso a reprimenda geral, mas é +ue, apesar das

guerras e da %ome, a ida também é %eita de coisas boas: na in%]ncia, pode8se des%rutar das

Ihist-rias de ?rancosoK, com Irei e rainhaK, com Ibichos +ue %alamK, suas I*rincesas

encantadasK, como bem e7empli%ica I ben/am papai, +ue bicho é esse K, embora essas

lendas, na o do poeta, tenham sempre uma conota/ão de cr$tica social.

4s poemas I'arca u anaK, I'umba8meu8boiK, I*au de seboK e I*apai NoelK

representam esses cantos, %olguedos, %estas populares, carregados de %iguras e7-ticas, como

I!inha elhaK, I6ma e -K, I#agarti7a 'arbadaK, 0acaré essentaK, I raraK, I!el com

[guaK, I'uchechaK, I*eri+uitoK, I arapaK, IYu aK, I?obinhaK e I2anela de /oK, ou

e7ercedoras de algum o%$cio popular como a parteira ID. !icaelaK. ^ desse mundo +ue nasce

a poesia de ?rindade, como ele pr-prio se re%ere no poema I'umba8meu8boiK:

1L@

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'umba8meu8boi

Da minha in%]ncia

I eu capitãoK

!inha %antasia

I!ateu 'astiãoK

*rimeiro poema

ue o po o me deu.

!inha maldade

Não ha ia nascido

!eus problemas

?a am pra nascer

*assa am mulheres

!elancia eu pedia

ueria era er

gira%a a ema

o 'oi a burrinhaD. 2atirina

eu rreli+uim

*assa am mulheres

Eu +ueria era doce

E mendubim

inha a madrugada

?udo acaba a

*assa am mulheres

Eu ia dormir.

(GB11, p.G3)

*oemas +ue lembram !anuel 'andeira de I=rene no 2éuK, de I!eninos 2ar oeirosK,

e de I*ro%undamenteK, entre outros, carregados de ternura, alegria e de triste a muitas

e es. _a ia, também, muito respeito pela morte, como no poema IDomingo triste na1XB

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'arreiraK, em +ue o eu di : I4 domingo %oi triste9Não hou e ogo9Nem a escola

ensaiou...K(GB11, p.G@). Em ?rindade, a poesia %unciona como alimento espiritual do poeta,

desde +ue atenda, primeiro, as necessidades sociais dos in usti/ados, é bem erdade. 5ala o

poeta: I_o e estou e7uberante9estou poroso de poesia9como o liberto9recém8sa$do dacadeiaK, eu I alori o o homem +ue passaK, pois IEm tudo h" gra/aK, por isso I_o e estou

e7uberanteK e Iporoso de poesiaK (GB11, 33). ^ um certo rego i o por ser um poeta, essa

condi/ão narc$sica, e é, também, uma maneira de autoa%irma/ão.

^ também um poeta oltado para as +uestCes %amiliares, o labor pra eroso do pai:

I ino do ter/o repicando9e meu pai batendo sola9brincando de trabalhar ...K(GB11, p.GA), as

icissitudes nas recorda/Ces do dia de seu nascimento, em I4 poema de mamãeK, carregado

de plasticidade, num ogo meta%-rico dos contrastes +ue caracteri am a e7ist ncia humana,

em +ue I'ach 2hopin 'eetho enK se misturam ao som das I2rian/as brincando de

roda9gente discutindo a re olu/ãoK. o mesmo tempo, dir" o poeta: I!inha %am$lia é

incont" el9eu tenho irmãos em todas as partes do mundo (...) no 4riente e no 4cidenteK,

então Ipor +ue estreitar o mundo a um larK, h" uma necessidade de ampliar o territ-rio

%amiliar: I4hJ *ares, inde para +ue eu baile9e possa conhecer todos os meus9parentesK

(GB11, p.3W), uma e +ue o poeta não se de e render apenas ao particular, pois sua %am$lia éa congrega/ão de todas as pessoas IdignasK. _" sempre um %undo social nos poemas +ue se

reportam ao %olclore, como detectamos nas ant$teses e met"%oras de I*au de seboK:

obser emos o Isobe9desceK, pois a Ia ida é um pau de seboK, no Ipau de sebo da idaK, h"

Iaplausos9 aiaK, bem como Icru eiros9pancadaK(GB11, p.HA), é um eterno IsubirK e bai7ar,

como nos aconselham os percal/os da pr-pria e7ist ncia.

4s poemas I*apai NoelK e I*ara +ue imK rati%icam o car"ter desconstrutor e

reconstrutor da realidade: o I*apai NoelK +ue nos apresentam não nos ser e, é preciso

substitu$8lo por outro, da mesma %orma +ue en+uanto hou er Iamea/a de guerraK, eu não

posso estar a I%a er lindos bu+u sK (GB11, pp. LB8L1), mais uma e o poeta sub ertendo a

ordem de sua poesia.

ida simples %amiliar é retomada e ai ser re%letida na sua Ipoesia duma ida

simplesK, como %ala o pr-prio poeta, mas não nos enganemos +ue essa ida se a realmente

simples, o simples não podendo ser sinMnimo de acomoda/ão, de subser i ncia, de1X1

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subalternidade. 2om essa poesia, o eu continua a saudar Ios +ue amam a liberdade9sem ter

medo de prisCes e %u ilamentosK(GB11, p.LL) (Ele pr-prio te e um %ilho $tima da ditadura

militar de 1@XH), a cometer erros gramaticais, e h" nele a certe a de +ue Is- morrerei

depoisK, como di o eu: I?enho o manhã o mor e a *oesiaK; por isso, Icada dia +uepassa9eu %ico mais o em9os elhos morrem9e eu s- ou morrer9depois do manhã...K.

*restemos bem aten/ão a esta ltima e7pressão Io manhãK, +ue é uma personi%ica/ão de

algo abstrato +ue h" de se concreti ar, poderia estar até em outro bloco, mas o pre%erimos

a+ui. Em olano ?rindade, até um I elho trapoK ira poesia de utilidade.

os LB anos de sua e7ist ncia, o poeta escre e o poema I idaK, uma espécie de

autoa alia/ão dos anos passados, presta/ão de contas, em +ue percebemos o mesmo eu

l$rico: a cantar a ida, suas bele as e agruras, a %alar de si, a cantar as saudades por onde

passou e em +ue i eu: I*elotas9*rincesa do ulK, ou I<io de 0aneiroK, ou I<eci%eK

relembradas em I2an/ão & minha cidadeK, ou I4lindaK e al ador da I'aianinhaK. Nesses

poemas, amos encontrar um eu mais solto, mais le e, mesmo +ue em determinados

momentos imponha uma postura de den ncia e re olta, mas ainda são ersos para o deleite

da alma. Nessa perspecti a, assim se re%ere #eda !aria !artins: INa+uela época, "

amea/ado pela doen/a, solit"rio e triste, es+uecido dos becos, bares e batu+ues, da alegria u enil +ue marcara grande parte de sua ida, olano, em seus ltimos poemas, escre e

como se ditasse um in ent"rio da ida, da sua poesia, de sua arte, de suas utopiasK. E nos d"

como e7emplo os ersos: Io tempo olta numerado92ontando hist-rias9Di endo

erdades9Esti e muitas e es preso9*erdi um %ilho na ca%ua9Na epidemia9Dos

acidentes92om um tiro no cora/ão9(eu " era card$aco)9Nunca endi o meu

pensamento9Nem em prosa nem em erso9?i e um amor em cada %ase da ida9Nunca matei

ninguém95i alguns poemas 9*u7ei loas em grande parte do mundo.K (D6 <?E, GB11, p.3@B).!ais adiante a ensa$sta comenta os ep$tetos dados ao poeta, &s e es utili ados de %orma

carinhosa, outras nem tanto, como %oi o caso, também, de inicius de !oraes, alcunhado de

IpoetinhaK, termo ei ado de ambiguidade. *ara !artins: IDe %ato h" oscila/Ces na produ/ão

poética de olano. !as h" também uma urgente necessidade de re isão de muitos poemas e

de uma edi/ão cr$tica de sua obra, inclusi e para %i7a/ão de poemas +ue, em algumas

publica/Ces, apresentam di%eren/as signi%icati as de ortogra%ia.K(GB11, p.3@A). Essas

Ioscila/CesK apontadas por !artins %oram por n-s detectadas e corroboramos com o seu1XG

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pensamento, sendo preciso um trabalho %ilol-gico sobre sua obra, a %im de corrigir essas

impure as.

;7 O ,oeta entre De0s e os Or /<s

De%orma/ão*rocurei no terreiro4s antos DS[%ricaE não encontrei,

- i santos brancos!e admirei ...

( )

gora47um, eman ", 4gum,^ ão 0orge,

ão 0oãoE Nossa enhora da 2oncei/ão.

'asta NegroJ'asta de de%orma/ãoJ(GB11, p.WG)

4 percurso religioso de ?rindade é bem parecido com o de gostinho Neto, pois

ambos come/am cristãos, depois tornam8se ateus. 4 primeiro chega a ser di"cono, como

imos; Neto, a protestante metodista, pro a elmente in%luenciados pela %am$lia como s-i

acontecer. o +ue nos parece, o contato com o pensamento mar7ista e a ida pr"tica

permeada de in usti/as e iol ncia contra, principalmente, o po o negro desen ol em nesses

homens de pensamento, nesses poetas, uma isão mais clara da sociedade, muitas e es

mascarada pela a/ão religiosa, imprimindo nesses esp$ritos, muitas e es, uma rai a

incontida.

o analisarmos o primeiro bloco dos poemas de ?rindade, é %or/oso esclarecer,

percebemos +ue estão um pouco distantes da te +ue mati a os poetas angolanos

anteriormente trabalhados, notadamente gostinho Neto, mais pr-7imos de um iriato da

2ru , com I elhinha do anguK, o I'um 'um 'umK e I*regCes do <eci%e antigoK, mas não

1X3

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+ueiramos uma unidade absoluta entre esses poetas, é preciso compreender +ue os

conte7tos são bastante d$spares, por+uanto enuncia/ão e enunciado também d$spares, mas

em +ue eles se apro7imam - h" di erg ncias ou h" congru ncias entre eles ^ o +ue

tentaremos responder até ao %inal desta pes+uisa.

Neste bloco, composto de 1H poemas: I0aboatãoK, I'aianinhaK, IDe%orma/ãoK,

I_ist-ria para crian/aK, I!acumbaK, INoite de eman "K, I4lorum EO K, I4lorum hanuK,

I*lagiando o No o ?estamentoK, I\angMK, I0ana$naK, I6ma negra me le ou a DeusK, I4utra

negra me le ou & macumbaK e I'atucadaK, a poem"tica de ?rindade trilhar" uma seara no a:

a dos deuses ori7"s, tema não contemplado pelos poetas da Mensagem, algo %acilmente

e7plic" el, uma e +ue o tema est" ausente de sua mundi id ncia, en+uanto no 'rasil

e7erce um poder de a%irma/ão do negro de capital import]ncia. egundo *ierre erger:

presen/a dessas religiCes a%ricanas no No o !undo é uma conse+u ncia

impre ista do tr"%ico de escra os. Escra os estes +ue %oram tra idos para os

di%erentes pa$ses das méricas c das ntilhas, pro enientes de regiCes da

[%rica escalonadas de maneira descont$nua, ao longo da costa ocidental

entre eneg]mbia e ngola. *ro enientes, também, da costa oriental de!o/ambi+ue e da ilha de ão #ouren/o, nome dado nessa época a

!adagascar.

Disso resultou, no No o !undo, uma multidão de cati os +ue não %ala a a

mesma l$ngua, possuindo h"bitos de ida di%erentes religiCes distintas. Em

comum, não tinham senão a in%elicidade de estar, todos eles, redu idos &

escra idão, longe das suas terras de origem.

Desde muito cedo, ainda no século \ =, constata8se na 'ahia a presen/a de

negros bantu +ue dei7aram a sua in%lu ncia no ocabul"rio brasileiro. Em

seguida, eri%ica8se a chegada de numeroso contingente de a%ricanos,

pro enientes de regiCes habitadas pelos daomeanos (g ges) e pelos iorub"s

(nagMs), cu os rituais de adora/ão aos deuses pareceram ter ser ido de

modelo &s etnias " instaladas na 'ahia.

(...)1XH

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s con ic/Ces religiosas dos escra os eram entretanto colocadas a duras

pro as +uando de sua chegada ao No o !undo, onde eram bati ados

obrigatoriamente Ipara sal a/ão de sua almaK e de iam cur ar8se &s

doutrinas religiosas de seus mestres.(GBBG, pp. GG8G3)

s pala ras do pes+uisador %ranc s, +ue morou muitos anos na 'ahia e conheceu de

perto a [%rica, ser em para re%or/ar o +ue " é sabido sobre as su ei/Ces a +ue %oram

submetidos os negros escra os tra%icados para o 'rasil, tendo sido obrigados, inclusi e, a

aceitar o sincretismo como %orma de burlar a ordem estabelecida e manter as suas tradi/Ces.

2abe a+ui alertar, como %ala erger, +ue hou e uma m tua in%lu ncia entre as di ersas etnias

chegadas ao 'rasil, principalmente no campo religioso, ao +ue nos parece ser o culto dos

ori7"s desconhecido dos negros tra%icados de ngola e s- na mérica ad+uirido a partir do

contato com as outras etnias, particularmente a iorub".

No poema I0aboatãoK, +ue poderia estar no bloco anterior, pre%erimos lig"8lo a este

pelo seu car"ter combati o & religião o%icial, embora sustentemos a postura de um Estado

laico. Em I'aianinhaK, +ue é também um poema de amor, pro a elmente um dos amores do

poeta, mas +ue pre%erimos a+ui, " +ue enri+uecido de re%erentes relacionados ao mundo do

candomblé, pala ra de origem banto, +ue designa na 'ahia as religiCes a%ricanas em geral

(GBBG, p.31). I'aianinhaK tra em si as comidas t$picas como o I atap"K, o Idoce de cocoK,

o a eite de Idend K +ue ser em de o%erenda aos deuses ori7"s, além da dan/a e da m sica e

dos elementos sagrados: Ipatu"K e ItamborK, como um I%eiti/o de =ansãK, simboli ando

assim um ritual do I2andombléK, mas um candomblé particular Ida minha madrugadaK,

possuidor de uma caracter$stica especial: de Ire olu/ão de cubaK e de Iliberta/ão do 2ongoK,

reentr]ncias da negritude pan8a%ricanista, com um sabor bem brasileiro, algo muito comum

na poesia de ?rindade.

4 poema IDe%orma/ãoK é o rep dio ao sincretismo religioso +ue impCe a supremacia

dos deuses brancos, é a re ei/ão da subalternidade, a tão dese ada o de pi aO, solta com

maior eem ncia em I_ist-ria para crian/aK. 4 poema I!acumbaK é uma espécie de

mistura, como outros do poeta, das %iguras dos ori7"s, com a dan/a e com a m sica,

1XL

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marcando a inicia/ão ou insinua/ão amorosa, tal e um %ator di%erenciador das duas

religiCes: cat-lica9candomblé. 4s ersos curtos e seu ritmo musical nos le am a essas %estas

populares, muito comuns na 'ahia, no <io e em *ernambuco. !acumba tanto pode ser o

ritual do candomblé, +uanto um trabalho ou até mesmo um instrumento de percussão, é dese notar, também, a e7pectati a i ida pelo eu, o seu deslumbramento com a %igura

%eminina: I!ulata cai no santo9corpo %ica belo9mulata cai no santo9seus peitos %icam

bonitos9Eu %ico com ontade de amar...K (GB11, p.WW), onde Icai no santoK representa o ser

possu$do pelo ori7". eman " ser" tema em outros dois poemas INoite de eman "K, em

celebra/ão pela passagem de ano, e I0ana$naK.

I4lorum EO K e I4lorum hanuK são dois poemas +ue e ocam o mito da g nese

iorub", " +ue, segundo erger, ,lóOrum ou ,lódPmarQ , ou simplesmente ,lorum ou

,lodumaré , é considerado o Ideus supremoK e não um ori7", é um deus distante, inacess$ el

e indi%erente &s preces e ao destino dos homens. ^ um ser supremo %ora do alcance da

compreensão humana e est" acima de todas as conting ncias de usti/a e de moral.

INenhum culto lhe é destinado. Ele criou os ori7"s para go ernarem e super isionarem o

mundo. ^, pois, a eles +ue os homens de em dirigir suas preces e %a er o%erendas.

,lód<marQ , no entanto, aceita ulgar as desa en/as +ue possam surgir entre os ori7"sK.(GBB1, p.G1)

No primeiro poema, o eu e oca a entidade suprema no sentido de identi%icar8se

como um seu descendente, primeiro como poeta, portanto, também uma di indade: IEu sou

o poeta do po oK e I minha bandeira9^ de cor de sangueK +ue é a cor Ida re olu/ãoK,

tal e uma re%er ncia ao socialismo leninista9mar7ista, depois esclarece: I!eus a -s %oram

escra osK e IEu ainda sou escra oK, porém Ios meus %ilhos não serãoK(GB11, p.AB), sentencia

categoricamente como o %e gostinho Neto em muitos de seus poemas.

4 segundo poema é a o do griot a contar a hist-ria da g nese a%ricana num

bilinguismo +uase +ue did"tico a tornar sua mensagem compreens$ el e compreendida,

dentro de um esp$rito ritual$stico, passo a passo, até +ue IDe noite9^ 47um9 o lado das

estrelas9Embele ando94batal"94lorum hanuK, %inali ando o te7to assim sem nenhum sinal

de pontua/ão, o mesmo acontecendo com o poema anterior, isso nas duas antologias

citadas. ?al e isso não tenha muito alor, mas o %inal de I4lorum hanuK nos passa uma1XX

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ideia de continuidade ou de pausa para a continuidade do processo de cria/ão do mundo

m$tico a%ricano.

4 poema I*lagiando o No o ?estamentoK, di idido em tr s estro%es, possui,

igualmente, tr s dimensCes: a primeira é a ele a/ão do amor carnal ao n$ el di ino, o +ue

para os mais religiosos poderia soar até como uma heresia, o poeta, no entanto, de%endendo

a grandiosidade do ato amoroso, como coisa di ina; a segunda, é a re olta contra a+uele

+ue, desobedecendo os ensinamentos b$blicos, procura sempre ter mais em %ace do pobre

+ue nada tem; e a terceira, reser ada para as %iguras b$blicas de nanias e sua esposa a%ira,

mostra +ue, mesmo dentro da =gre a primiti a, " ha ia a corrup/ão, o descumprimento dos

alicerces de uma sociedade erguida nas bases da igualdade, por isso, para esses +ue tiram do

po o, s- e7iste uma sa$da I*aredãoJ *aredãoJK(GB11, p.A3), sentencia um eu implac" el, é o

+ue sucede ao casal in%iel aos princ$pios de Deus. Na erdade, ?rindade se apropria do te7to

b$blico e %a , não um pl"gio, como indica o t$tulo, mas uma brilhante interte7tualidade,

%ormando uma e7egese do No o ?estamento, de onde tira suas pr-prias conclusCes, num

te7to +ue re+uer uma certa %orma/ão e sapi ncia para não se perder em suas entrelinhas.

Em I\angMK, pre alece o car"ter memorialista, saudosista das hist-rias contadas pelo

griot a respeito de seus deuses, o eu poético ou e o canto I!ariM 9!ariM

"9=eman 9 eman "K, é um canto InagMK, +ue em do I7angM da baianaK, +ue pode muito

bem ser uma casa de candomblé, " +ue 7angM, em *ernambuco, designa, segundo erger, o

con unto de cultos a%ricanos praticados nesse estado (GBBG, p.13@). No poema, o c]ntico,

indo desse terreiro, e oca as saudades de [%rica representada por seus elementos:

I eman ", nagM, "gua a%ricana e 7angMK, o pr-prio clima e oca essa I iagemK m$tica, senão

ou/amos o poeta: I té a lua canta a,9E dan/a a,9Este canto nagM,94 mar suspira a,94 mar

solu/a a,9Era "gua a%ricana9Na praia do *ina9No 7angM da baianaK(GB11, p.@G.)

Em I6ma negra me le ou a DeusK e em I4utra negra me le ou & macumbaK, temos

dois poemas +ue re%letem bem o poder +ue a %igura %eminina e7erce sobre o poeta ao ponto

de condu i8lo ao encontro religioso, é a mulher, como em tantos outros poetas, ele ada a

s$mbolo de sedu/ão, na erdade, é ela a pr-pria personi%ica/ão de IDeusK: I li esta a o

Deus9+ue eu procura aK(GB11, p.1G3); no outro poema, a condu/ão é também a um templo

religioso: I\angM da 'aianaK, (não mais a Iigre aK), onde se cultua a ImacumbaK: ritual1XW

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religioso do po o a%ricano de <eci%e, nessa outra negra o +ue en ol e o eu l$rico é a

oluptuosidade, não mais o recato, atentemos para esses ersos: IDan/a a no corpo9 ue

lindo o andarK, e Itinha um cheiro no corpo9+ue me le ou ao pecado95altei com respeito9ao

seu 4ri7"K, o eu se dei7a possuir, pois I eus seios bonitos9pula am no ritmo9do ataba+ue9edo agogM95ui pra casa da negra95omos os dois pro céu99<ecebi o santo9do corpo da negra9e

%i+uei o maior dos 4gans9e passei a ca alo9de 4batal"...K, essa possessão ele ando o eu a um

del$rio tal +ue ele se Io maior dos 4gansK, o maior dos che%es dentro do ritual do

candomblé, mais: o erdadeiro Deus criador do mundo e dos homens, o pr-prio I4batal"K, o

mesmo +ue 4runmil". Noutra ertente, podemos encontrar 4b&t"l" %ormando a trindade

m"7ima dos Deuses criadores ao lado de s e vr nmil".

4bser emos +ue o eu passa a ser Ica aloK de 4batal", ou se a, elégwn, o +ue recebe

o 4ri7". _", no entanto, algumas ersCes em +ue o Deus supremo não monta o elégwn, na de

*ierre erger por e7emplo, re%erindo8se a 4runmil".

I'atucadaK é o ltimo poema dessa série, mas +ue poderia estar em outra, da

mesma %orma +ue I6ma negra me le ou a DeusK e I4utra negra me le ou & macumbaK

poderiam estar entre os de amor, %uncionando a+ui apenas uma +uestão did"tica. Nesse

poema, o +ue predomina é a den ncia, & época, da persegui/ão &s religiCes a%ricanas:

I'ranco adora o Deus +ue +uer,9 !as o negro não pode não,9?em de adorar Deus de

branco94u sinão ai pra prisão ...K (GB11, p.13B). 2om rela/ão & batucada, o uso de

instrumentos musicais nos rituais das religiCes a%ricanas, em todas elas (e +ue est" presente

na poesia de todos os poetas a+ui retratados, mais especi%icamente em gostinho Neto,

olano ?rindade e também em 5red ou a 2astro), erger salienta o seguinte:

No in$cio da %esta, tr s ataba+ues de tamanhos di%erentes, denominados

rum, rmpi e lé, acompanhados de um sino de percussão, o agogM, tocam

apelos ritmados &s di ersas di indades. Esses ataba+ues apresentam uma

%orma cMnica e são %eitos com uma nica pele, %i7ada e esticada por um

sistema de cra elhos para os nagMs e os g ges, e por cunhas de madeira

para os tambores ngomas, de origem congolesa e angolana

(...)1XA

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No caso de um desses ataba+ues ser derrubado ou cair no chão durante

uma cerimMnia, esta é interrompida por alguns instantes, em sinal de

contri/ão.

(...)

4s ori7"s são recebidos com gritos e lou ores e, em seguida, %a em a

sauda/ão aos ataba+ues, ao pai ou & mãe8de8santo, aos IogãsK do terreiro

sendo, %inalmente, le ados pelas IeOedisK ao Ipe $K do seu deus. (GBBG, pp.

W18W3)

5a/o essa cita/ão para +ue %i+ue clara a import]ncia dos instrumentos musicais e da

dan/a na %orma/ão geral do po o a%ricano, o +ue re%lete pro%undamente em sua arte como

um todo. 0" o dissemos antes, mas nunca é muito reiterarmos essa rela/ão +ue t m esses

elementos na %orma/ão do po o a%ro8brasileiro.

c7 O ,oeta e se0s amores

Eu gosto de ler gostando,go ando a poesia,como se ela %osseuma boa camarada,dessas +ue bei am a gentegostando de ser bei ada.

Eu gosto de ler gostando

go ando assim o poema,como se ele %osseboca de mulher purasimples boa libertadaboca de mulher +ue pensa...dessas +ue a gente gostagostando de ser gostada.( olano ?rindade)

poesia amorosa de ?rindade é m ltipla e contrastante, e nessa multiplicidade

aparece como elemento central: o ser humano, como ser uni ersal, espiritual, mas a mulher,1X@

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no +ue di respeito ao amor %$sico, é a %igura central, a$ se re ela um eu, no di er de Yenir

2ampos <eis, Im"sculoK, uma rela/ão literal Imacho8% meaK, mas também Io

companheirismo, comunhão de corpo e sentimento, b ssola da e7ist ncia, a+ui tradu ido na

terminologia musical: IcantoK, Im sicaK, IritmoK.

E, ao lermos o poema em ep$gra%e IEu gosto de ler gostandoK, em & mem-ria <oland

'arthes em seu , pra1er do texto , por+ue em ?rindade, principalmente nesta parte, é tudo o

+ue 'arthes +uis di er em seu li ro com rela/ão ao ler com sabor, o %ruir das pala ras, o go o

como coisa carnal, tal como nos poemas I cabocla +ue eu +ueriaK, I mensagem do poetaK,

I mar é uma constante em mimK, I mor, amor, sempre amorK, I ida me deu uma negraK,

I musa e a poesiaK, I rosa ermelhaK, I s amadas de minha ternuraK, I'alada molenga a

uma negra dengosaK, I2a%unésK, I2anto & amadaK, I2anto & musa ceroulaK, I2irandinha da

idaK, I2rian/aK, IEu gosto de ler gostandoK, I0ana$naK, I#inda negraK, ImandingaK, I!eu

canto ao marK, I!eu grande amorK, I!inha missãoK, I!ule+ueK, I!ulher em preto e

brancoK, INegra bonita de a ul e brancoK, I4 mar também é casadoK, I mulata pastorinhaK,

I4 tempo ogou prata na minha cabe/aK, I*oeticamente pol$gamoK e I*rimeira loa do

amanhecerK.

2omo dissemos, a mulher é, na maioria desses poemas, a %igura central, mais ainda, a

mulher negra, mulata ou cabocla, sempre enaltecida e lembrada a partir do cancioneiro

popular, ha a ista muitos desses poemas serem pass$ eis de musicali a/ão; para ?rindade I4

poeta é um mensageiro da idaK ( ) IE no homem9Est" a maior mensagem da ida...K, mas

também I mensagem do poeta95ala do corpo da mulherK, isso I*or+ue a mensagem do

poeta9 em do entre da mulherK(GB11, p.@L), a%irmando ele: I4 ser humano é a minha

bandeira9Esta é a minha arteK. 4 amor, então, aparece como %im absoluto da ida, e, como

disse Drummond, I4 tempo é minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a

ida presenteK, a matéria de ?rindade é o I mor, amor, sempre amorK e I?odo amor é de

agora...9Não e7iste amor %uturoK.

_" "rios poemas para celebrar tão somente o amor, poemas descontra$dos, +ue

re elam um eu poético pol$gamo: I^ necess"rio criar muitas musas9para +ue a poesia não

pareK(GB11, p.1BB), ele pr-prio a%irmando: IEu sou poeticamente pol$gamo9 mo

inumer" eis musas9e elas não são iguais...K. Declara8se o eu, mas o +ue era apenas1WB

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IpoeticamenteK, se re ela de repente: Ih" grande aria/ão9entre as amadas9e nos seus

olhares9encontro inspira/Ces di ersas9e nos seus corpos9di%erentes per%umesK(GB11, p.1GL),

pois a%inal o amor também é se7o, além, é claro, de pure a, sensibilidade e consci ncia,

assim como di o eu: Ino corpo9le arei o sol do meu se7o9nas mãos9a pure a dascrian/as9nos pés a sensibilidade dos bailarinos9na cabe/a a consci ncia do séculoK(GB11,

p.1B1). Noutro momento, a guerra, a %ome, a dor e a miséria entram em concorr ncia

+uando o eu l$rico +uer %alar de amor: I ou desdobrar8me em ternura9 " +ue não tenho

%or/as9para e7terminar as guerras9a dor9 a miséria, a %ome...K, a$ retoma o eu: I ou

abra/ar9as minhas amadas9 ou bei "8las ternamente9sentir seus olhos, seus

seios9es+uecendo +ue h" uma guerra no ietnã9in usta guerra contra um po o %aminto9+ue

luta por liberdadeJK (GB11, p.1BG), +uando não, ele se dei7a le ar pelo canto ma ioso de4r%eu entre IdengosK e Ica%unésK, a%inal: I ou !olengo9!olengo92heio de dengoK (GB11,

p.1BH).

Neste bloco, gostaria ainda de destacar os poemas I0ana$naK, I!eu canto ao marK, I4

mar também é casadoK, +ue nos condu em ao cancioneiro popular mar$timo, tema tão caro

a 0orge mado e Dori al 2a>mmi e +ue tanto %re+uentou a poética de nt-nio 0acinto, 4

*oeta do ?arra%al. e amos alguns trechos desses poemas: I4hJ Eu não sou marinheiro94hJNão sou homem do mar9mas 0ana$na me persegue9pras aguas +uer me le ar9Não me le es

prSas "guas90ana$na dona do marK. 4u IEu tanto %alei ao mar,9+ue o mar me

atendeu,9!andou a minha amada,9'em pra unto de mim,9*ra +ue ela me conte,9_ist-ria

da ida simples,9Do bairro dos meus amores,9En%eitado de co+ueiros,9Da ida dos

pescadoresK, ou I uero bei ar minha amada,9 uero os seus l"bios bei ar9 uero +ue a

amada me bei e92omo a areia bei a o marK. ão poemas compostos em ersos +ue ariam

entre cinco e sete s$labas, o +ue lhes d" uma tend ncia para a musicalidade, como ocancioneiro medie al ou como as can/Ces de 2a>mmi: I^ doce morrer no mar9nas ondas

erdes do marK.

1W1

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d7 Solano Tr ndade e o mov mento da ne.r t0de a1ro-;ras le ra

!eu canto de guerra

Eu canto na guerra,2omo cantei na pa ,*ois o meu poema^ uni ersal.^ o homem +ue so%re,4 homem +ue geme,^ o lamentoDo po o oprimido,Da gente sem pão ...^ o gemidoDe todas as ra/as,

De todos os homens^ o poemaDa multidãoJ( olano ?rindade)

Neste bloco, englobamos os poemas +ue, para n-s, de uma %orma ou de outra, são

representati os de uma poss$ el INegritudeK brasileira +ue, como imos, tem em olano

?rindade o seu primeiro cantor. <eunimos a+ui: I ben/am Dindinha #uaK, I manhã ser"

melhorK, I'olinhas de gudeK, I2hamadaK, I2ontrastesK, I2on oca/ãoK, IEsperemosK, I5. da*.K, I ra ata coloridaK, I#amentoK, I!eu canto de guerraK, I!ulher barrigudaK, INicolas

uillénK, I4 canto da liberdadeK, I4 drama do circoK, I*oema autobiogr"%icoK, I?em gente

com %omeK, I?em gente morrendo, naK, I elho ataba+ueK, I<eencarna/ãoK, I?ristes

maracatusK, I?o+ue de reunirK, I<ainhas e escra asK, I2anto dos *almaresK, I2i ili a/ão

brancaK, I2ongoK, I2on ersa com #uciK, IEu +uero maracatucarK (musicado por $tor

?rindade), I!aracatu da boneca de ceraK, INa io negreiroK, INegrosK, I*regCes do <eci%e

antigoK, I uem t" gemendo K, I<eminisc ncias soltasK, I ou negroK, IYumbiK (musicado por$tor ?rindade) e I i a a rapa iada da canela su aK, num total de 3W poemas, sempre nos

detendo na+ueles mais substanciais &s +uestCes da INegritudeK.

Em todas as pes+uisas +ue %i emos, parece ha er uma unanimidade em apontar

olano ?rindade como o primeiro poeta negro da moderna poesia brasileira, negro na cor e

na assun/ão do ser8se negro de corpo e alma, bem como na poesia e na arte +ue %e e

de%endeu até os ltimos dias em +ue i eu, como bem atesta o poema I ou negroK:1WG

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46 NE <4

ou Negro

meus a -s %oram +ueimados

pelo sol da [%rica

minhxalma recebeu o batismo dos tambores

ataba+ues, gongu s e agogMs.

2ontaram8me +ue meus a -s

ieram de #oanda

como mercadoria de bai7o pre/o

plantaram cana pro senhor do engenho no o

e %undaram o primeiro !aracatu.

Depois meu a M brigou como um danado

nas terras de Yumbi

Era alente como +u

Na capoeira ou na %aca

escre eu não leu

o pau comeuNão %oi um pai 0oão

humilde e manso

!esmo o - não %oi de brincadeira

Na guerra dos !al s

ela se destacou

Na minhyalma %icou

o samba

o batu+ue

o bamboleio

e o dese o de liberta/ão

(GB11, pp. 1XG81X3)

*oema emblem"tico da Negritude brasileira, inteiramente ligado aos ideais propostos1W3

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pelo grupo da Mensagem angolana. ?rata8se, no entanto, não de um a%ricano, mas de um

negro brasileiro +ue se reconhece um pr-7imo dos irmãos poetas angolanos: I2ontaram8me

+ue meus a -s ieram de #oandaK. _" no eu poético toda uma heran/a de [%rica:

Iminhxalma recebeu o batismo dos tambores9ataba+ues, gongu s e agogMsK e isso é moti ode orgulho, mesmo +ue seus a -s tenham seguido para o 'rasil Icomo mercadoria de bai7o

pre/oK, como escra os, pois %oi a$ +ue eles I%undaram o primeiro !aracatuK. ão moti os de

orgulho, também, a participa/ão de seu a M nas lutas empreendidas pelo destemido l$der

Yumbi e a de sua a - INa guerra dos !alésK, contrastando assim com a %igura do Ipai

0oão9humilde e mansoK, tão di ulgada na literatura brasileira; é, portanto, esta heran/a +ue

eio de [%rica +ue %ormar" a personalidade do poeta: INa minhyalma %icou9o samba9o

batu+ue9o bamboleio9e o dese o de liberta/ão...K. !arcas +ue também amos encontrar nospoemas dos poetas da Mensagem angolana.

4 poema IYumbiK, da mesma %orma +ue a <ainha in a para os a%ricanos natos, ser"

o grande her-i da resist ncia negra no 'rasil, e *almares, a [%rica americana, s$mbolos de

liberdade, muitas e es e ocados por tantos outros poetas brasileiros de "rias épocas.

*almares ser" tema do grande poema de ?rindade +ue analisaremos mais & %rente. 2omo

anuncia o poema em ep$gra%e, a poesia negritudinista de ?rindade se rami%ica em pan8a%ricanista, da negritude, do proletariado e dos in usti/ados e miser" eis de um mundo

desa ustado, independentemente da cor, como imos também em Neto. Estamos diante de

poetas +ue seguem uma linha mar7ista, cu o ob eti o é a de%esa do direito das classes

oprimidas. Notemos, pois, +ue é uma poesia uni ersal, podendo ser cantada Ina guerraK ou

Ina pa K, mas oltada para I4 homem +ue gemeK e I+ue so%reK, pois I^ o lamento9Do po o

oprimido9Da gente sem pão...9^ o gemido9De todas as ra/as,9De todos os homens9^ o

poema9da multidãoK.

ssim, também, eremos, em I ben/am Didinha #uaK, o car"ter socialista da di isão

dos bens, em +ue o eu, de %orma carinhosa, se dirige & I#uaK pedindo o m$nimo Ipão com

%arinhaK para ameni ar a %ome Ida humanidadeK, e I!uita muita liberdadeK, pois o

trabalhador est" I empre a trabalharK, nos IcamposK, nas I%"bricasK, também INos

hospitaisK e Inas cadeiasK, então o poeta se +uestiona: I uais as esperan/as9Do

trabalhador K(GB11, pp. 1A81@), tal e as de I0orginhoK do poema I'olinhas de gudeK. Não1WH

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nos parece, no entanto, esse o pensamento do poeta. Em determinados momentos, a %im de

combater as ini+uidades e e itar a %orma/ão de outros I0orginhoK, o eu se pCe em

con ocat-ria, como em I2hamadaK, em +ue o poeta é intimado a participar da constru/ão

do no o mundo; a%inal ele (o poeta em si) é +uem conhece Io segredo da idaK, o +ue see7ige dele não é a comisera/ão, por isso em I2on oca/ãoK(GB11, p.GX), poema mar7ista em

linha direta, congruente com a linha netiana, o eu se assume I2ontra o %ascismo,K e con oca:

I!archemos, camaradas,9 #iberdade nos chama,9*ara o dia de amanhãK. I#iberdadeK

est" gra%ada com letra mai scula, instando a +ue não se comportem, parece clamar o eu,

como a+uele +ue dorme até I s de K, en+uanto ou e Io pisar %orte dos trabalhadores9sobre

o barro mole da estrada.9 ão pegar o trem das +uatroK(GB11, p.GL), repetindo o eu:

I!archemos, camaradas,9?eremos a nossa parte9Na sal a/ão do mundoK, +uando Neto dir"com mais n%ase: I s minhas mãos colocaram pedras9nos alicerces do mundo9mere/o o meu

peda/o de pãoK(1@AW, p.W@), e esse merecer não é um pedido de esmola, é uma e7ig ncia

%actual, como " dito mais acima.

imos atr"s +ue, em determinados momentos, ?rindade, ao in és de %alar de amor,

%a o in erso, %ala de outra coisa, como acontece com o poema IEsperemosK(GB11, p.3B), o

+ue seria um poema de amor sub ertendo8se num de den ncia da crueldade dos homens,das in usti/as, pois essa concep/ão poética est" em primeiro lugar, o poema para a amada

pode esperar, o de den ncias, não. 4 poeta +ue se comporta de %orma contr"ria é um I5. Da

*.K (GB11, p.3B), é a total o eri a & poética de gabinete. Na mesma linha, temos I ra ata

coloridaK: a poesia como pr"7is social, isto +ue a%inal o poeta tem o poder de escutar o

Ilamento do homemK, enha de onde ier, pois, como di a ep$gra%e, I!eu canto de guerraK

também é de pa . ^ sempre bom %risar +ue, embora cante o drama particular do negro, o

poeta estende sua pala ra a todos os oprimidos, é de Itodas as ra/asK, é Ida multidãoK,re%orcemos.

2omo em Neto, o mundo e ocado é sempre o da pa , o eu est" sempre preocupado

com a+ueles +ue hão de ir (I!ulher barrigudaK), ha a ista a imprecisão do mundo %uturo, a

incerte a +ue cerca o destino +ue ai ter a no a gera/ão, por isso I4 canto da liberdadeK se

opera como or"culo dos no os tempos, é um Icanto +ue %a ibrarK e I+ue est"

penetrando9em todos os ou idos...K, esse canto é, também, uni ersal. 2omo imos atr"s,1WL

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os poetas angolanos dialogam com o poeta do INegrismoK cubano Nicolas uillén, ao ponto

de di ulgar seus poemas em suas re istas e antologias ao lado de um #angston _ughes.

?ambém ?rindade h" de %a er esse di"logo no poema8di"logo INicolas uillénK. 2abe, antes,

a+ui ressaltar +ue o poeta cubano este e por +uatro e es no 'rasil, numa delas %oi saudado,na '#, pelo poeta !anuel 'andeira: I grande no idade dessa poesia é +ue nela o negro

não entra mais apenas como curiosidade %olcl-rica, como elemento de pitoresco, e sim como

realidade racial. ocial e *ol$tica, como %ator essencial no processo da ida cubana, como

irmão degradado e escra i ado +ue urge redimirK. (*ronunciada na cademia 'rasileira de

#etras) (1@AX, pp. 1X81A). Essa cita/ão ser e para +ue tenhamos uma dimensão real do

signi%icado de uillén e de sua poesia para o campo intelectual brasileiro da época. Essas

pala ras de 'andeira %oram pronunciadas na cademia 'rasileira de #etras no ano de 1@HW,+uando o poeta cubano, em passagem pelo 'rasil, %icou hospedado na casa de 2]ndido

*ortinari e come/ou a escre er a IElegia a 0es s !enende K, tendo sido saudado por outros

escritores brasileiros como 2arlos Drummond de ndrade. %ala de 'andeira %oi publicada

no li ro S ngoro osongo e outros poemas, tradu/ão de ?hiago de !ello, pela editora

*hilobiblion, na +ual consta parte de uma entre ista concedida por uillén (1@BG81@AW) a

0aime arusO>, amuel 5ei -o, 5rancisco ar -n 2espedes, 2iro 'ianchi e Nanc> !ore -n e

+ue consta em nossas indica/Ces bibliogr"%icas.

?rindade, como sabemos, nasceu em 1@BA, no <eci%e e morreu no <io em 1@WH,

sendo, portanto, contempor]neo de uillén e também %a sua sauda/ão, como o %a em

nossos irmãos de [%rica acima estudados. No poema espec$%ico do poeta brasileiro,

diretamente nomini%icado INicolas uillénK, o eu l$rico apro7ima8se de uillén, como se

apro7imam os poetas a%ricanos em geral, incluindo os da di"spora, em som, ritmo e dan/a,

como a +uerer repeti8lo em sua cad ncia %Mnica, para irmanarem8se em suas ang stias easpira/Ces, acompanhados implicitamente pelos instrumentos de percussão meta%ori ados

no ritmo do poema: INicolas9Nicolas uillénK e INicolas9Nicolas uillénK, e INicolas

uillén9Nicolas uillén9NicolasK, entre um som e outro, +ue podem caracteri ar um coro de

o es e a o denunciadora do poeta a sussurrar ao ou ido do Iirmão de 2ubaK as ma elas

+ue a%etam o 'rasil e os brasileiros, e +ue são similares &s +ue a%etam 2uba e os cubanos,

esse encontro de o es sendo capitaneado pelos elementos +ue unem os tr s po os V

I'atu+ue macumba sambaK(GB11, p.H1) V, podendo até arriscar8se di er +ue o poema é um1WX

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erdadeiro aporte do I%onetisno cubanoK. ^ claro +ue esta, digamos assim, soni%ica/ão

poética, caracter$stica de toda poesia, é uma especi%icidade da+uela origin"ria do continente

a%ricano, ao menos com mais eem ncia, como di o pr-prio uillén em t$tulo de um de seus

li ros: antos para soldados sones para turistas , em +ue o canto representa o ato dacomunica/ão, o tornar comum entre poeta9mensageiro e o soldado9interlocutor da

mensagem, não apenas sons perdidos no "cuo. Eles representam, como nos in%ormam, em

"rios de seus poemas, os nossos poetas a+ui trabalhados, inclusi e ?rindade, I4 canto de

liberdadeK, como di o poeta: I4u/o um no o canto9+ue sai da boca9de todas as ra/as9com

in%inidade de ritmos...K, em erdade, repetimos I^ o canto da liberdadeK (GB11, p.H3).

No poema I4 drama do circoK, o poeta desconstr-i a m"7ima grega de Ipão e circoK

muito utili ada pelos pol$ticos para enganar o po o. 4 eu se declara a %a or da tomada de

consci ncia das massas, nica %orma de alcan/ar a tão sonhada liberdade, como reitera em

outro poema autobiogr"%ico: IEu sou um trabalhador94u i o ritmo das caldeiras ...94bedeci

ao chamado das sirenes ...9!orei num mocambo do Q'odeQ9e ho e moro num barraco na

a de ...9Não mudei nada ...K(GB11, p.LG). poesia de olano é um di"logo, como " dito,

com outras poéticas, e assim o são todas as artes, por isso mesmo e7igindo +ue nos

detenhamos mais especi%icamente num ou noutro poema em an"lises interte7tuais, como éo caso de I?em gente com %omeK, poema +ue te e grande repercussão & época de sua

primeira publica/ão e mereceu uma edi/ão especial, com ilustra/Ces de !urilo e 2intia, para

as crian/as.

I?em gente com %omeK, em correspond ncia direta com o I?rem de %erroK, de

'andeira, " a+ui aludido, I2omboio a%ricanoK, de Neto, e I2astigo pro 2omboio malandroK,

de 0acinto, ai, mais uma e , sub erter a leitura do de 'andeira e apro7imar8se dos de Neto

e de 0acinto, senão e amos: 4 trem de ?rindade é o I?rem su o da #eopoldinaK (GB11, p.LA),

assim como o de Neto é I#ento caricato e cruelK (1@AW, p.XB) e o de 0acinto é ImalandroK. 4

de 'andeira, um hino honomatopaico, tra Ica%é com pãoK e d" até I ontade de cantarK,

e oca, portanto, coisas alegres, en+uanto o do poeta do maracatu re ela +ue I?em gente

com %omeK, no mesmo diapasão honomatopaico do de seu conterr]neo. mbos, parece8nos,

encontram8se no <io de 0aneiro, s- +ue um, mais rom]ntico, delicia8se com as reminisc ncias

de seu Itrem de %erroK, ?rindade, mar7ista +ue era, en7erga o trem de seu momento1WW

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presente, +ue corta todas as esta/Ces dos sub rbios do <io, le ando a gente, assim como o

dos angolanos le a os IcontratadosK para o trabalho Iescra oK, o Itrem su o da #eopoldinaK

le a a gente pobre dos sub rbios (I?antas caras tristes9 uerendo chegar9Em algum

destino9Em algum lugarK) e, +uando nas esta/Ces, " +uase parando Icome/a a di er:9 e temgente com %ome9Dai de comer...9 e tem gente com %ome9Dai de comer...9K, é estupidamente

interrompido pela ordem +ue I4 %reio de ar,9?odo autorit"rio,9!anda o trem

calar:9*siuuuuuu...K, +uebrando assim, abruptamente o ritmo encantat-rio do poema,

por+ue não h" gra/a alguma, não h" deleite, não cabem a+ui, com todo respeito ao grande

poeta !anuel 'andeira, suas can/Ces %olcl-ricas tão saudosamente tra idas & mem-ria

poética: I uando me prendero9No cana i"92ada pé de cana9Era um o%ici"94M...9!enona

bonita9Do estido erde9!e d" tua boca9*ra matar minha sede94M...9 ou mimbora oumimbora9Não gosto da+ui9Nasci no sertão9 ou de 4uricuri94M...K. %inal I2a%é com pão é

muito bomK, como di o trem de 'andeira. obre este poema e amos o +ue di #eda !aria

!artins:

4 poema de olano parodia os ersos de I2a%é com pãoK, de !anuel

'andeira. E sub erte a alegria +uase in%antil dos rumores do trem +ue, em

'andeira, alude, pela onomatopeia, ao ca%é8com8pão de uma gorda,

let"rgica e pregui/osa maria8%uma/a. Este cede lugar, no poema de olano, a

um trem cansado, de uma cinesia ner osa, ironicamente habitado pela

%ome. paisagem buc-lica e rural de 'andeira, amaciada pelas alitera/Ces

sua es e gostosas do gingado pregui/oso, é in adida pelo mais pobre

h"bitat suburbano, da ona norte carioca, na +ual os nomes das esta/Ces do

trem metonimicamente e ocam a %ome, a miséria, a su eira e a triste a dos

lugares e dos su eitos. (...)

4 ritmo elo e magro é marcado pelas s$ncopes e pela predominancia das

tMnicas, +ue re%or/am o reordenamento e7igido na ltima estro%e (I se tem

gente com %ome9d" de comerK ), imediatamente silenciado pela estrid ncia

da repressão marcada pelas sibilantes sonoras da ltima estro%e: (GB11,

p.HBH)

1WA

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*arecidos na %orma, re elam8se completamente opostos +uanto ao conte do. !esmo

na %orma, nem o poema de ?rindade tem o car"ter l dico9r$tmico do de 'andeira, nem

poderia ser di%erente; o +ue Neto, 0acinto e ?rindade pretendem é incursionar o leitor numa

no a ordem poética, imaginando +ue todos eles " ti essem conhecimento do te7to9matri ,publicado em 1@3X, na IEstrela da manhãK, o +ue nos parece absolutamente pro " el. No

mesmo ritmo de I?em gente com %omeK, amos encontrar I?em gente morrendo, naK,

dedicado a na !ontenegro (grande ati ista do I!o imento 5emininoK, %iliada ao *2' e,

como o poeta, enga ada nos mo imentos contra o racismo e as in usti/as sociais), este

poema re elando a perple7idade de um eu diante da banalidade da morte, um eu sem

alternati as, sem %or/as para mudar o curso dessa hist-ria, isso é o +ue, implicitamente, nos

inspira o ritmo alucinante de suas redondilhas menores repetidas 1@ e es nas +uatroestro%es +ue compCem o poema, (metade do n mero total dos ersos).

0" %alamos a+ui da import]ncia dos instrumentos musicais para a cultura a%ro8

brasileira, não nos custa muito, s- para rati%icar, estabelecer um paralelo entre dois poemas,

um de ?rindade e outro de Neto, respecti amente: I elho ataba+ueK e INa pele do tamborK.

Em ambos os poemas o pr-prio instrumento se identi%ica com a %igura do eu poético, sendo

+ue em I elho ataba+ueK o eu se dirige ao instrumento agradecendo8lhe pelo aprendi adoad+uirido ao longo dos anos: I+uantas coisas oc %alou para mim9+uantos poemas oc

anunciou9 uantas poesias oc me inspirou9&s e es cheio de ban o9&s e es com

alegria9diamba r$tmica9cacha/a mel-dica9repeti/ão tel rica9maracatu triste9mas gostoso

como mulherK, sendo um eu agradecido, cMnscio de sua d$ ida para com o seu mestre,

atra és de +uem ai buscar em Iloanda distante do corpo9e pertinho da alma9negras sem

desodorante9com cheiro gostoso9de mulher a%ricana9 abumba batucando9na alma de eu...K,

é um ser em total entrega, em magia de (e)terno retorno, mas também Imadeira de leiK,+uando Imãos negras lhe batem9e o seu choro é m sica9e com sua m sica9dan/am os

homens9inspirados de lu7 ria9e procria/ãoK, isto é, o I elho ataba+ueK, um Igerador de

humanidadeK (GB11, pp. XH8XL). Em Neto, também h" uma doa/ão do eu, um

reconhecimento de um no outro como seres insepar" eis. Em INa pele do tamborK, amos

nos deparar, igualmente, com I s mãos iolentasK +ue Iinsidiosamente batem9no tambor

a%ricanoK, mas a+ui h" um porém: +ue mãos são essas +ue %a em o eu assumir uma postura

de sacri%icado IEsmago8me na pele batida do tambor a%ricano9 ibro em sanguinolentas1W@

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deturpa/Ces de mim mesmo9& ontade das percussCes alco-licas sobre9a pele esticada do

meu cérebroK, ao ponto de ele se interrogar: I4nde estou eu uem sou euK, a dilacera/ão

do eu ad ém, entanto, do uso inde ido do instrumento, +ue desaba%a: I ibro no couro

pelado do tambor %esti o9em europas sorridentes de %arturas e turismos9sobre a %ertili a/ãodo suor negro9nas "%ricas en elhecidas pela ergonha de serem "%ricasK, são ibra/Ces +ue o

pCem em estado de possessão, pois são Isons %esti os e con%usosK +ue o eu não consegue

distinguir, ele se indaga, no amente: I(+ue l$nguas pronunciais em mim irmãos9+ue não os

entendo neste ritmo )K, de repente ele se redescobre nessa mesma [%rica, pois +ue INuncaK

se pensara Itão per ertidoK da Iimpure a criminosa dos séculos coloniaisK. 4bser emos +ue

em Neto h" uma per ersão, " em ?rindade, uma olta e%usi a, a per ersão tem de ser

carpida, pois +ue Inem tão per ertidoK se encontra o eu +ue não possa in erter essasI ibra/Ces9da pele do meu cérebro9esticada no tambor das minhas mãos9pela [%rica

humanaK e I+ue nasce9%ora dos abismos escurecidos da nega/ão9ao lado de ritmos de

.dedos congestionados9sobre a pele en elhecida do tambor9dentro do +ual i o e ibro e

clamo: N?EJK (1@AW, pp. 1BB81B1). 2omo tratado anteriormente, e seguindo as li/Ces de

erger, a m sica e a dan/a simboli am, na per%ormance do Iataba+ue8tamborK9eu, a

potenciali a/ão do ser8se negro na constru/ão de uma [%rica no a, humana, liberta para

sempre da imposi/ão e e7plora/ão ocidentais.

2onstantemente, o poeta olano ?rindade est" rea%irmando o seu lado m"sculo (IE

anunciou o meu se7o9_omemJK) e a sua condi/ão de negro, mesmo sendo uma mistura das

tr s ra/as: negra, $ndia e branca: I!eu pai era preto9!inha mãe era preta9?odos em casa

são pretosK(GB11, p.AH) e, numa linguagem muitas e es debochada, escarnece da religião

dos brancos: I'ranco esp$rita é espiritualistaK. 0" o negro I!acumbeiro é um esp$rita pretoK,

mas o branco Inão +uer a/ãoK, s- I uer reencarnarK e escarnece também do intelectual +ueIse acomoda sem reencarnarK. ?rindade, bem ao gosto dos repentistas do Nordeste, ele

mesmo pernambucano, por isso, e em +uando, in ade8o um certo ban o dos Itristes

maracatusK (GB11, p.AA), outrora Imaracatus alegres9+ue se ão distantes9Em ritmo calmo

de congo9Em acelerado !o/ambi+ue9Em to+ue de ` to9De 0e e de ngola9!aracatus

meus...K. _" sempre um sentimento de perten/a. Essa religiosidade a%ricana em muitos

momentos uni ersali a8se a %a or do bem da *"tria (I inde irmãos

macumbeiros9Esp$ritas92at-licos9 teusK), incluindo também os homens de todas as classes1AB

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sociais, ItrapeiroK, IpedreiroK, Iirmãos sambistasK, IpoetasK, IpintoresK, IengenheirosK,

InegociantesK, por ser necess"ria a participa/ão de todos para Icombater o %ascismo9+ue

mata a nossa na/ãoK (GB11, pp. @B8@1), essa sendo a Imissão de poetaK, +ue ?rindade

carrega, não lhe cabendo a aidade de Ium poema9+ue me imortali eK. 2omo a tantoscompatriotas poetas, o seu lugar é ao lado do Ipo o9na sua can/ão9e assim cumprirei9a

minha missão de poetaK, esse é o seu compromisso primordial, em sua acep/ão m$tica

mesmo, mas re olucion"ria também, como em I<ainhas e escra asK (GB11, p.1GW).

poesia de ?rindade, " %alamos, o%erece8se, como em iriato da 2ru , a imortali ar a

gente pobre e sem identidade social +ue %a a alegria de outras gentes e mo imenta o

comércio local das %eiras li res e esse comportamento é bem acentuado nos poemas

I2an/ão & minha cidadeK, INatal na minha terraK e, principalmente, o espetacular I*regCes

do <eci%e antigoK. *ara %echarmos a an"lise dos poemas de ?rindade, %alemos um pouco mais

de IYumbiK, INegrosK, I uem t" gemendo K, INa io negreiroK, I2ongoK, I2i ili a/ão brancaK

e seu I2anto dos *almaresK. 4 primeiro, escrito para a pe/a Malungos e musicado, em 1@@X,

por seu neto $tor ?rindade, é uma ode, um hino ao her-i de *almares, +uilombo constru$do

para receber e proteger os negros %ugidos e logo trans%ormado numa sociedade a%ricana

dentro do 'rasil com mais de GB mil habitantes, s$mbolo da resist ncia contra a escra atura,locali ado na erra da 'arriga, região ho e pertencente a 6nião dos *almares, estado de

lagoas. eu apogeu %oi durante o século \ == e seu %im se deu praticamente ap-s a morte de

seu l$der, a GB de no embro de 1X@L, dia em +ue ho e se comemora a consci ncia negra,

cognominado de Dia Nacional da 2onsci ncia Negra, momento em +ue se %a em "rias

re%le7Ces sobre a situa/ão do po o a%ro8brasileiro em todo o pa$s.

No poema, Yumbi é ele ado & condi/ão de her-i e seu corpo metonimicamente é

identi%icado aos +uatro elementos da nature a: I eus bra/os são troncos de "r ores9 ua %ala

é ento, é chu a,9^ tro ão, é rio, é marK, como con ém a todo her-i ou deus. 4 poema

INa io negreiroK, como não poderia dei7ar de ser, é uma alusão direta ao %amoso poema do

poeta baiano 2astro l es, alcunhado de I*oeta dos Escra osK, mas dele di%erindo na %orma e

no conte do, embora o tema se a o mesmo. En+uanto o te7to de l es é constitu$do de seis

partes e de ersos de di ersas medidas, o de ?rindade redu 8se a +uatro estro%es de +uatro

ersos, em redondilha maior. uanto ao conte do, ?rindade limita8se a con idar o leitor a1A1

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direcionar sua aten/ão ao INa io negreiroK +ue em I?ra endo carga humanaK, +ue est"

I2heio de melancoliaK, mas também est" I2heinho de poesiaK, pois tra uma Icarga de

resist nciaK, e o bo o, I2heinho de intelig nciaK. Num ponto os dois poemas se cru am: a

humani a/ão do negro escra o; apenas l es tra/a um painel épico adornado de hipérboles,ap-stro%es, meton$mias e met"%oras do tr"%ico escra o de [%rica para o 'rasil, en+uanto, de

%orma simpli%icada, ?rindade nos con ida a olhar para o na io como algo al issareiro, sem a

elo+u ncia castroal ina. *roen/a 5ilho assim se re%ere ao poeta da INegritude brasileiraK:

4utro combatente da elha guarda é olano ?rindade (1@BA81@W3),

legitimado pela tradi/ão liter"ria brasileira, mas não pela matéria negra de

seu te7to e sim pelo posicionamento pol$tico8social; o seu poema presente

na colet]nea !iol+o de rua (1@XG), antologia representati a de uma das

tentati as de reno a/ão poética p-s8modernista, %ala +ue Ptem gente com

%omeP. !as também são dele te7tos como, por e7emplo, PNa io negreiroP,

onde se leem, entre outros, os ersos: I#" em o na io negreiro9 2heio de

melancolia9 #" em o na io negreiro92heinho de poesia...9#" em o na io

negreiro9 2om carga de resist ncia9 #" em o na io negreiro92heinho de

intelig ncia.K (GBBH, p.1A).

inda sobre o mesmo poema, comenta Elio 5erreira de ou a: Io erso inicial I#" em

o na io negreiroK simboli a o coro das o es a%rodescendentes, entremeado nos 1X ersos,

imprimindo uma atmos%era sonora e musical & narra/ão. olano negrali a o pregão poético

na e oca/ão dos %ragmentos da mem-ria hist-rica de milhCes de a%ricanos, +ue

atra essaram a I*orta do Não <etornoK na dire/ão da di"spora brasileiraK (GBBX, p.AB). 4

chamado de ?rindade, carregado de emo/ão, tende a reorientar o olhar do leitor para o

homem de cor, o a%ricano e7patriado pelo europeu e, muitas e es, pelos pr-prios a%ricanos,

por isso, no poema INegrosK, ?rindade e7tra asa seu -dio, sua repulsa &+ueles INegrosK +ue

endem seus irmãos, desses di endo ta7ati amente o eu +ue INão são meus irmãosK, nem

a+ueles +ue i em I ser i/o do capitalK, por+ue para ele I - os negros

oprimidos9escra i ados9em luta pela liberdade9são meus irmãosK, para estes ele tem Ium

1AG

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poema9grande como o NiloK(GB11, p.1L3), rio a%ricano, como sabemos.

4utro poema onomatopaico e e7tremamente musical +ue re%lete o estado b]n ico do

eu em di"logo com o Ipingo de chu aK +ue lhe tra & mem-ria a can/ão do Ipreto cansadoK

a e ocar as terras de [%rica é I2ongoK; assim como em I uem t" gemendo K, onde o gemido

do carro de boi se (con)%unde com o do negro, acentuando esse ban o +ue I eme na

minhSalma,9 alma do 2ongo,9Do N$ger da uiné,9De toda [%rica en%im...K, mas, como

sempre acontece com ?rindade, esse estado de melancolia tende a espalhar8se a outras

terras e a outras gentes, caracteri ando, tal e , seu pan8a%ricanismo, +ue também é de Neto:

I alma da mérica...9 alma 6ni ersal...K(GB11, p.1LA). obre o poema I2ongoK é oportuna

a %ala de ou a: I olano tenta re%a er o caminho de olta & [%rica pela I*orta do Não

<etornoK. busca da mem-ria perdida tem algo de particular e coleti o para esse griot da

di"spora, +ue procura guardar na sua mente a imagem8lembran/a do lugar de origem dos

ancestrais, ainda i a nas can/Ces do elho a%ricano, embora o car"ter %ragmentado da

narra/ão não o%ere/a +uase nada de concreto sobre o passado dos a%ricanos antes da

tra essiaK. (GBBX, p.AW). 4 I2ongoK representa o Ilugar do imposs$ el retorno, o espa/o

geogr"%ico e a mem-ria ancestral borrada pelo abismo do entre8marK. *or isso Ios pingos

%rios da chu a re i em, no cora/ão do eu8l$rico de olano, a lembran/a de uma can/ão triste,+ue um elho a%ricano, de o cansada, cantou para ele, relembrando o 2ongo distante, +ue

se des%i era numa miragemK. ^ a busca, melanc-lica, de suas origens, da +ual muito se

orgulha. 4s pingos %uncionam como re%or/o b]n ico desse sentimento de perten/a, tão

%alado ao longo deste trabalho. I4 2ongo é o lugar da lembran/a e do sonho ancestral,

rein entado no corpo do poema e do poeta negroK, con%orme ou a (GBBX, pp. AW8AA). Essas

pala ras ser em para autenticar o +ue estamos a di er sobre ?rindade: um poeta constru$do

dentro da comple7a simplicidade natural do po o pernambucano, notadamente a+ueledescendente da di"spora a%ricana, assim tal +ual o poeta. 4 o7imoro é para +ue não nos

iludamos +ue o simples é o %"cil, o sem rele ]ncia estética, sem pes+uisa, sem %rui/ão

poética.

4 poema I2i ili a/ão brancaK, tal +ual a I2i ili a/ão ocidentalK de gostinho Neto,

encontra8se permeado de ironia; " a partir mesmo do termo Ici ili a/ãoK, +ue nos passa a

ideia de e olu/ão de progresso da humanidade, nos dois poemas, também, aparece com1A3

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sentido contr"rio: em Neto, a Ici ili a/ãoK obriga o InegroK a morar em habita/Ces da pré8

hist-ria, a e7ercer I1G horas de trabalho escra oK, tanto Iao solK, +uanto I& chu aK e

ganhando como recompensa, ironicamente, I6ma esteira nas noites escurasK, o +ue Ibasta

para ele morrer9grato9de %omeK; " em ?rindade, de %orma mais direta, sempre de %ormadireta, essa mesma Ici ili a/ãoK comete o crime de linchar um homem, por este encontrar8

se IEntre os arranha8céusK e ser de pele negra. +ui se desprende a luta de classes tão bem

anunciada por !ar7, & propor/ão +ue a sociedade ai se estrati%icando e as di%eren/as ão

ganhando contornos insustent" eis. E não estar$amos cometendo nenhum e7agero se

utili "ssemos as pala ras de Eneida #eal 2unha sobre a leitura +ue %a do li ro de #eonel

2osme ultura e 4evolu%+o: I %ilia/ão mar7ista da an"lise e desta classi%ica/ão da Isérie

liter"ria angolanaK, por #eonel 2osme, não est" apenas implicada na terminologia +ue utili ae +ue procura a+ui pMr sinteticamente em desta+ue. Ela é e7pl$cita e programaticamente

erbali ada no seu te7to como a/ão e escrita orientadas, como declara, pelo Icompromisso

ideol-gico com a dialética mar7istaK (GB11). creditamos, pois, +ue a ideologia mar7ista

permeia +uase toda a obra de olano ?rindade, +ue, em momento algum, se descuida em

apontar a di%eren/a de classes, a discrep]ncia social +ue sempre coroou o 'rasil, ou melhor,

o mundo capitalista. ^ bem erdade +ue, na obra de Neto, esse iés tem um car"ter mais

acentuado pela pr-pria conting ncia +ue en ol ia o seu pa$s, sob a implac" el ditadura

sala arista, persistentemente criticada por #eonel 2osme em seus escritos.

*assemos, então ao ltimo poema de ?rindade, o mais longo: cerca de 1@G ersos

brancos e li res, como em toda sua obra, distribu$dos em G@ estro%es irregulares, também o

mais épico de seus te7tos e, +ui/", o mais negritudinista, no +ual %a uma sauda/ão ao

uilombo dos *almares, I2anto dos *almaresK, +ue come/a com um desa%io aos épicos

cl"ssicos da literatura ocidental (Isem in e a de irg$lio de _omero9e de 2amCesK), não noses+uecendo +ue este ltimo, na terceira estro%e de seu ,s Lus=adas também lan/a um

desa%io: I2essem do s"bio rego e do ?roiano9 s na ega/Ces grandes +ue %i eram;9 2ale8se

de le7andro e de ?ra ano9 %ama das it-rias +ue ti eram;9 ue eu canto o peito ilustre

#usitanoK. ssim também ?rindade d" alti e a seu canto, Ipor+ue o meu canto9é o grito de

uma ra/a9em plena luta pela liberdadeK e se a+ui retomarmos Neto, eremos +ue toda a sua

poética, e não apenas um poema, é um canto & liberdade da ra/a negra e de todas as ra/as

oprimidas do planeta, ha endo uma congru ncia literal entre o angolano e o brasileiro de1AH

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<eci%e92a7ias9Embu. ?anto em um +uanto no outro, I_" batidos %ortes9de bombos e

ataba+uesK, também I_" gemidosK, também Ih" gritos nas sel as9in adidas pelos %ugiti osK

e os I%ugiti osK são a ra/a negra perseguida pelos her-is do bardo lusitano, por isso o eu

canta Iaos *almaresK, sem omitir o seu -dio: I4diando opressores9de todos os po os9detodas as ra/as9de mão %echada9contra todas as tiraniasK. ^ como se esti éssemos a ou ir

Neto, em sua Sagrada esperan%a, na luta a %a or do po o angolano.

^ uma luta %errenha entre oprimido e opressor, este impedindo a+uele de %alar: Imas

dei7am abertos meus olhosK, se Imaltratam meu corpo9minha consci ncia se puri%icaK e Ieu

%u o das mãos9do maldito senhorJK. !as não é uma %uga da linha de combate, uma e +ue

Imeu poema libertador9é cantado por todos9até pelo rioK. ssim, en+uanto morrem uns,

nascem outros e se Io opressor con oca no as %or/asK, Ino a luta recome/aK e não importa

se Imatam meus irmãos9matam as minhas amadas9de astam os meus campos9roubam as

nossas reser asK. 4bser emos a+ui a %usão do IeuK no In-sK a estabelecer o canto da

coleti idade +ue tem seu territ-rio de astado Ipara sal ar9a ci ili a/ão9e a %éK dos

coloni adores, tal +ual %oi %eito em ngola, !o/ambi+ue, uiné8'issau e outros.

4 eu9n-s tem o seu Isono tran+uiloK, en+uanto Io opressor não dormeK, a onisci ncia

dos %atos é %ruto dessa consci ncia das in usti/as praticadas pelo europeu e da %é na

resist ncia do po o negro +ue s- alme a uma ida de pa e pre : INossas planta/Ces9Estão

%loridas9Nossas crian/as9'rincam & lu da lua9Nossos homens9'atem tambores,92an/Ces

pac$%icas,9E as mulheres dan/am9Essa m sicaK (GB11, p.13@). En+uanto isso, o Iopressor

prepara outra in estida9con%abula com ricos e senhoresK, então o eu l$rico reage: Imas eu os

%a/o correrK por+ue Iainda sou poetaK e Imeu poema9le anta os meus irmãosK. 2on%orme se

in%ere, a poesia é uma arma de combate e de comunica/ão, assim como Ios tamboresK, Ia

m sicaK e Ia dan/aK; irmanam8se, pois, os dois poetas nessa concep/ão de uma no a poesia:

um a cantar as lutas do uilombo dos *almares, o outro a cantar as lutas pela independ ncia

de ngola. obre o poema, assim se e7pressa #eda !aria !artins: I!etamor%oseando8se em

irg$lio, _omero e 2amCes, como o narrador épico de seu po o, o eu poético +ue se %a ia

porta8 o da ra/a, em um mo imento de trans%orma/ão cinético e din]micoK, sem dei7ar de

re%erenciar a ra/a negra, torna o seu enunciado uni ersal, +ue integrando Itodas as %aces do

humano no combate &s tiranias: QEu canto aos *almares9odiando opressores9de todos os1AL

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po os9de todas as ra/as9de mão %echada9contra todas as tiraniasQ. =deali ado, *almares é

tanto a rep blica de Yumbi, her-i épico da saga negra no 'rasil, +uanto uma alegoria de uma

ut-pica ona %ranca pan8americana, onde Qaté as palmeiras t m amor & liberdade.QK (GB11, p.

HBB8HB1).

4 poema oscila entre a pa alme ada, a in asão e a luta, num ir e ir constante, com

um eu sempre a e7plicar as di%eren/as de ob eti o em +ue as pala ras I%éK e Ici ili a/ãoK são

antitéticas para ambos: para o oprimido, signi%icam ambas I#iberdadeK; para o in asor, a

sal a/ão da ordem estabelecida pela dita Ici ili a/ão ocidental9brancaK. *ode ter sucumbido

o territ-rio dos *almares, mas o seu e7emplo de resist ncia para as pr-7imas gera/Ces

permanece ine7aur$ el e ine7or" el, mesmo por+ue imortali ado na o do poeta:

!as não mataram

!eu poema.

!ais %orte

+ue todas as %or/as

é a liberdade;;;

4 opressor não pMde %echar minha boca,Nem maltratar meu corpo,

!eu poema

^ cantado atra és dos séculos,

!inha musa

Esclarece as consci ncias,

Yumbi %oi redimido

(GB11, p.1H3)

ssim se re%ere 'ernd sobre esse poema: INeste ogo de contr"rios, +ue con%igura a

antiépica, +uem é o her-i ão a+ueles +ue a Qhist-ria es+ueceQ, são os Qcon+uistadores da

noite nuaQ, são os Qher-is das sombrasQ. 4 poeta se ale de um o7$moro, Q%amosos e

es+uecidosQ, para melhor caracteri ar tais her-is, cu a a/ão é a resist nciaK. 'ernd termina

por igualar ?rindade a 2ésaire e lissant. *ara ela: I a/ão do con+uistador não é tão

completa a ponto de ani+uilar tudo: resta o mito +ue precisa ser recuperado. Da$ a1AX

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import]ncia do poeta +ue resgata a mem-ria destes %eitos es+uecidos e, com as suas Qarmas

miraculosasQ V as pala ras V, os transmuta em elementos de recomposi/ão da

autorrepresenta/ão positi a dos po os negrosK (1@AW, p.@L). ^ uma isão pro%ética, o poeta é

um ate +ue anuncia, não a liberta/ão do outrora uilombo dos *almares, mas de todos os*almares espalhados pelo mundo a%ora, met"%ora do oprimido, do subalterno, dos sempre

sub ugados ao preconceito, &s in usti/as sociais e ao imperialismo capitalista +ue sempre

norteou os princ$pios das grandes pot ncias.

3+3+3+ Fred So0Ha Castro e a ,oes a das terras do massa,? do recJncavo

;a ano

3+3+3+*+ Per1 l ; o; ;l o.r<1 co e l ter<r o

PEu tenho mania de escre er poemas.9Eu gosto da poesia emais nada.9Eu sou a+uele menino matinal, +ue ama apassarinhos sem gaiola, +ueria +ue o mundo %osse, agora,igual a antes, e agora igualP. 5red ou a 2astro

5rederico 0osé de ou a 2astro nasceu no dia 1 de abril de 1@31, na cidade de ão

on/alo dos 2ampos, %ilho de ntMnio 'enedicto de ou a 2astro e de !aria de #ourdes

alles de 2astro, ele era o primog nito de uma %am$lia de 11 %ilhos e nasceu em ão on/alo

por mera casualidade, pois a sua %am$lia era tipicamente santanarense. Na erdade, seus pais

esta am em isita ao primo, *e. 'r"ulio ou a 2astro, +ue e7ercia a ati idade religiosa em

ão on/alo. Na+uela ocasião, sua mãe te e as dores do parto na+uela localidade e

5rederico nasceu ali, tendo o %amoso *e. 'raulinho como padrinho. crescentamos, ainda,

+ue o primeiro ou a 2astro a chegar a anto maro, bisa M de 5red, %oi o portugu s,

origin"rio de 2ascais, ntMnio Diogo de ou a 2astro. egundo as est-rias dos antigos, ele

era cristão no o e membro da ociedade !$stica <osa82ru . 2hamado de *ai Diogo,

estabeleceu8se como comerciante e casou8se com uma nati a, muito mais o em, chamada

!aria ?om"sia k 5red chegou a conhec 8la na in%]ncia, " bastante idosa, +uando todos a

1AW

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chama am de =ai" elha. 4 primog nito do casal, ntMnio 'enedicto de ou a 2astro %oi

magistrado pelos sertCes da 'ahia, indo a ser o a M de 5red. 2asado com D. na 'arros de

ou a 2astro, o casal te e tr s %ilhos: o bacharel ntMnio 'enedicto de ou a 2astro 5ilho k

conhecido na %am$lia por ?otonho k, a *ro%a. Dulce entil de ou a 2astro e Esther de ou a2astro.

Embora nascido em ão on/alo, 5red, como era carinhosamente chamado por

parentes e aderentes, como ele mesmo costuma a ironi ar, i eu toda sua in%]ncia na cidade

de anto maro da *uri%ica/ão, +ue recebeu os primeiros in asores por olta de 1LLW,

segundo a historiadora Yilda *aim (1@@H, p.13), alguns parentes, por a%inidade, do %amoso

Diogo [l ares 2orreia, 2aramuru. li também montou engenho em 1L@G o então go ernador

do 'rasil !em de ".

base da economia, %a orecida pelo solo de massap , era a cana de a/ car, o %umo, a

mandioca e o arro , moti o pelo +ual %oram surgindo os engenhos de moer cana, as casas de

%arinha e os pe+uenos %abricos de %umo (1@@H, p.1H). Em 1XBB, as terras %oram repartidas em

sesmarias, a %im de %a orecer a coloni a/ão do local. Di *aim:

Em toda a e7tensão plana e ele ada, outra cousa não se senão I2 N E

!6=? 2 N K, e uma ati idade acelerada com um mecanismo prim"rio e

grosseiro, e o bra/o %orte do negro escra o, a +uem se de e as grandes

%ortunas dos enhores de Engenho, dando8lhes t$tulos de nobre a, ao

tempo +ue contribu$am para o engrandecimento da !etr-pole. (1@@H,

p.1L)

2om o passar dos tempos, os engenhos %oram dando lugar &s usinas, ainda na

primeira década do século \=\. Di 8se +ue anto maro i eu uma erdadeira época de

opul ncia, em +ue o lu7o e a ri+ue a eram agressi amente ostentados pelas %am$lias

abastadas. Di ia *aim: I!esmo antes de ser a po oa/ão ele ada a ila " ostenta a o lu7o de

i er, as cadeirinhas de sane%as de seda %orradas de eludo ermelho, e cobertas de

damasco. Nas estradas a %olgan/a do seu po o. Nos solares a prataria e as bai7elas de prata,

1AA

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candelabros de bron e, era a s$ntese da prosperidade e abastan/aK. anto maro era então

chamada de 2apital do <ecMnca o e e7erceu in%lu ncia na hist-ria econMmica e pol$tica da

'ahia (c%. *aim, 1@@H, pp. GG8G3). Em 1WGW, %oi ele ada & condi/ão de ila e, em 1A3W, &

categoria de cidade. sua base étnica é, como a de todo o Nordeste brasileiro, a mistura dobranco europeu, a do negro a%ricano e a do nati o, ainda segundo *aim:

4 sel agem %a 8se cidadão. 4 clima é também %ator importante, não é o

nico respons" el pela pluralidade das ra/as e pelas migra/Ces, e cada ra/a

deu8nos a temperatura de sua terra natal, os costumes, a sua religião e a

sua l$nguaK. _erdamos do portugu s o esp$rito con+uistador, a entureiro,

comerciante; do a%ricano, a nostalgia e o esp$rito de sacri%$cio; do ind$gena,

a insubmissão e a teimosia.

Duas %oram as ra/as negras +ue ieram para anto maro, os _auss"s e os

!alés. 4s hauss"s habita am o udão 2entral, ao norte do <io Niger e

'inue. 5orma am a na/ão mais =mportante de todas as negriticas ou

sudanesas. ^ um grupo da ra/a 'antu8negra, misturada com elementos

ham$ticos. sua l$ngua era chamada Ihauss"sK e segundo Nina <odrigues

dei7ou oc"bulos até ho e usados.

4s !alés eram a%ricanos =slami ados, possuidores de mediana cultura, e

portadores de o%$cios de pedreiro e carpinteiro, -timos agricultores,

e7ercendo in%lu ncia sobre os escra os das di ersas proced ncias. 4s malés

%oram instigadores das di ersas rebeliCes. Eram conhecidos na 'ahia como

hereges e e7comungados Imouros a%ricanosK. 5oram considerados inimigos

da nossa religião. (1@@H, pp. GH8GL)

?al e tenha sido anto maro a terra +ue mais escra os recebeu na 'ahia. lém das

etnias citadas, por ali passaram g ges e nagMs. ?erra de nomes ilustres da hist-ria do 'rasil

com participa/ão decisi a na uerra da =ndepend ncia, bem como na uerra do *araguai.

anto maro também %oi palco de "rias rebeliCes escra as, pelo menos até 1A3L (1@@H,

p.X3), tal e por isso e, contrariando a bra ura de seu po o, %oi palco de repressão ao1A@

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abolicionismo. 5oi, porém, um santo8amarense o primeiro, na 'ahia, Ia estabelecer o

trabalho li re na la oura do estadoK, e ali se %undou a ociedade G de 0ulho anto8amarense,

tendo como um de seus %ins a liberta/ão de escra os. 5oi palco, também, de uma isita, em

1AL@, de ua !a estade D. *edro ==, acompanhado da 5am$lia <eal e de distinta comiti a. Elechegou & cidade de anto maro &s X horas e 3B minutos do dia 11 de no embro de 1AL@.

egundo *aim, %oi uma recep/ão brilhante, com todas as classes sociais a acolherem o ilustre

isitante. comiti a partiu em 13 de no embro. *or l" este e também o 2onde DSEu em

1AAA.

ão %ilhos ilustres de anto maro, entre outros, !anuel <aimundo uerino, um

intelectual a%rodescendente, aluno %undador do #iceu de rtes e 4%$cios da 'ahia e da Escola

de 'elas rtes, pintor, escritor, l$der abolicionista e pioneiro nos registros antropol-gicos da

cultura a%ricana na 'ahia; o pintor Emanuel ra o, o !édico, pro%essor e cientista, 0osé

il eira, os compositores e m sicos ssis alente, <oberto !endes, Edite do *rato e os mais

%amosos 2aetano eloso e sua irmã !aria 'et]nia.

egundo 0orge 2almon, anto maro dos barCes e iscondes, opulenta e rica, era

di idida apenas em duas classes: a dos ricos propriet"rios rurais e grandes comerciantes e a

dos escra os Ide +ue raramente saem, para integrar o segmento in%erior da escassa classe

média, os ser os contemplados pela al%orria.K (GBBH, p.1L)

^ uma cidade do interior da 'ahia com muitas igre as cat-licas, destacando8se a de

4li eira dos 2ampinhos, sobre a +ual e7iste a lenda de +ue o Diabo deu um coice e entortou

a torre por conta do não cumprimento do pacto %eito entre ele (o Diabo) e 0oão <omão

ramacho 5alcão, lenda esta documentada em $deo por 5red ou a 2astro.

cidade conta ho e, segundo o =' E, com LW.ABB habitantes e " não i e a mesma

grande a dos primeiros séculos; segundo 2almon, sua decad ncia come/ou mesmo ainda no

século \=\, agra ando8se no seguinte.

4 %olclore santo8amarense é muito rico e i o até ho e, em algumas modalidades,

%a em parte de seu relic"rio, como di *aim: !aculel , 2apoeira, amba de <oda, #indro8

mM, 'urrinha de 4uro, 4 N go 5ugido, <eisados, 'ailes *astoris, 'aile do ndio, 'aile das

5lores, 'embé do !ercado, 'umba8meu8'oi, ueima das *alhinhas, 5esta de G de 5e ereiro,1@B

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4 Entrudo, 4 2arna al, %o7é, 5ilannMnicas ou 'andas de ! sica, antos, G de 0ulho,

'otada, *resépios, 'andeiras, 4s <anchos, 2hulas, s erenatas, 2antigas, 2antigas de

2ana ial, boio, !odinha, di inha/Ces, *egas *arlendas, _umorismo 2ompara/Ces,

nedotas, *ro érbios, De%ini/Ces *opulares, *oesia *opular uadrinhos, *regCes, 2ontos Est-rias, pelidos, Nome de 'ecos, ?ipos *opulares, ?ipos de <ua, <e as, 2h"s,

upersti/Ces e 2rendices, Ditos *opulares, #endas, 'riga de alo, !oda de 2omer 'em,

Nomes *itorescos e 'rincadeiras. *ara *aim, I5olclore é o retrato i o dos costumes de um

po o, re elado atra és da m sica, da dan/a, da pintura, das cren/as e dos %olguedosK (1@@@,

p.1L). *ode8se di er +ue se trata de uma historiadora emp$rica, como ela pr-pria di na

introdu/ão ao seu 4elic)rio $opular : I s pes+uisas +ue a+ui transmito, %oram obtidas

erbalmente de aut nticos populares. Numa pe/a %olcl-rica, o obser ador de e ter em miraos personagens como elemento da composi/ão; ele realmente compCe a pe/aK (1@@@, p.1L).

Ela pr-pria é %ilha de anto maro, Ida terra dos cana iais, constru$da pelo bra/o %orte do

negro, esta ra/a tit]nica e %orte, deste ser indom" el, so%rido, maltratado e despre ado, +ue

tudo deu sem nada receberK a%irma ela (1@@@, p.1L). E é a esse po o +ue 5red ai dedicar

boa parte de sua poesia e de sua pes+uisa como poeta, intelectual, homem de tele isão e de

cinema +ue o %oi durante toda sua e7ist ncia.

sua literatura é composta dos seguintes li ros: Samba de roda (poesia), al ador:

Edi/Ces !acuna$ma, 1@LW, obra9corpus desta nossa in estiga/ão; onto para Jriselda

(conto) 2ata8milho, 1@X@;Meu sal e meus espelhos (poesia) anto maro: Edi/Ces 2ata8

milho, 1@WA, antologia composta de poemas intimistas e memorialistas, caracter$sticas gerais

da obra de 2astro, nesse li ro, podemos destacar as seguintes dedicat-rias do autor: I ntes

de mais nada +uero dedicar este li ro a anto maro, lugar onde aprendi a erse ar, ou ir

est-rias e I i er i endoK o dia a dia de um po o +ue, tendo ra$ es num passado de muitari+ue a, ainda não encontrou a ri+ue a de seu presenteK. 2omo imos atr"s, anto maro

i eu muitos anos de opul ncia, como compro a o seu brasão, " na época do poeta, no

entanto, ou um pouco antes, em %ins do século \=\, a cidade ai i er um per$odo de

decad ncia, e da$, tal e , a mem-ria triste do poeta, o seu desencanto, principalmente com a

gente pobre +ue %e a ri+ue a de outros poucos.

2ontinuando as dedicat-rias: I*ara os ou a 2astro, todos eles V negros, mulatos,1@1

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brancos V i os ou mortosK; I*ara os elloso e os alles, todos eles V negros, brancos ou

mulatos V i os ou mortosK. ^ importante salientar +ue esse li ro saiu em 1@WW e re ne

poemas de 1@L1, +uando 2astro conta a apenas GB anos de idade até & data de sua

publica/ão. uase todos os poemas le am uma dedicat-ria: parentes, amigos e %igurasilustres do meio art$stico como <u> Espinheira 5ilho, 0uare *ara$so, 0amison *edra, 0eho "

de 2ar alho e 2arlos n$sio !elhor. ssim se de%ine o poeta:

Não sei pedir nem esperar %a ores

e amais tra aria de mendigo;

aos pr$ncipes não sei tecer lou ores

e as %alsas dores, todas, abomino

estou & margem

e gosto de di 8lo

para não enganar os %alsos elos

de +uantos +ueiram me

incluir em es+uemas

sou, a meu modo, li re

(por escolha)

e a %olha

de papel em +ue me inscre o

é outra +ue não eu,q

+ue sou eu mesmo

guardado no meu corpo

e, a mim,

%ie=.

1@LX

(1@WA, p.GX)

Mam+e macho (contos) V al ador. poio: 0ornal I ?ardeK, 1@AX, A gotinha dR)gua1@G

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(in%antil) *etr-polis: o es, 1@AW e$ortulanos (conto) 'D , 1@@X, e os inéditos: anto

canavi) e Massap( de sesmarias +ue compCem unto comSamba de roda a trilogia santo8

amarense e +ue %ala de sua gente e de sua cultura como bem nos re elam os poemas I s

%erramentas do ersoK e I2alend"rio da saudadeK, escre eu maisLivro de Javeta , !ersossac nicos e A loucura adiada. 5e ainda o pre%"cio para o li ro do poeta, ornalista, ad ogado

e ogan (%ilho de santo) 0eho " de 2ar alho, de +uem era muito amigo,4einven%+o do reino

dos !oduns . 2om o poema I lbalunK, 5red con+uistou o pr mio do oncurso Liter)rio da

3unda%+o Jivré9 rgentina, em 1@AX, e %oi agraciado, também, nooncurso de v=deo do

Algarve9*ortugal.

Em GBBA, recebeu homenagem da ienal do 4ec ncavo V 2achoeira8 'ahia pelo

con unto de sua obra em $deo, +ue re ne, entre tantos trabalhos %eitos com seus pr-prios

recursos: , $elourinho é uma festa0 2mbu1eiro0 3arinhada0 9rifestan%a Cunial0 "as )guas0

$resente para IemanC)0 $ar*ue dos ,rix)s0 G IbeCi0 4om+o e 4om+o1inho0 ,lhar eletr nico0

Matan%a0 3eira do verbo0 angaceiros de carnaval0 DTT anos de "ona an, %ilmando ainda a

-pera A empregada *uer ser patroa , no ?2 , e a pe/a "end( e dengo , no =2' . ssina, ainda,

o argumento do %ilme , m)gico e o delegado , embora apare/a na %icha técnica como

colaborador. anhou o pr mio da ecretaria do Estado da 'ahia, em 1@XA, com o %ilme uliana e "6 orge, participou da _ora da 2rian/a, programa dirigido por droaldo <ibeiro

2osta, trabalhou ainda na ? =tapoan, ? ratu e ? Educati a.

5oi homenageado na colet]nea Salvador FKT anos, organi ada por <oberto #eal,

GBBA, reunindo os poetas ntMnio antana, 5"tima ?rinchão, 5rancisco de ou a 0 nior,

#et$cia ndrade, <oberto #eal, <udi al <odrigues, aldecO lmeida e inicius 2ardoso (em

+ue cada poeta tra como ep$gra%e um te7to de algum poeta baiano conhecido: de reg-rio

de !attos, considerado por muitos como o primeiro grande poeta brasileiro, a Yeca de

!agalhães, um poeta da pra/a, da década de @B), o poeta <udi al <odrigues usa como

ep$gra%e os poemas I atosK e I >JK, de nosso poeta.

5oi companheiro de lauber <ocha, nos idos da era/ão !apa, de +uem %inanciou o

primeiro %ilme, con%orme declara/Ces do pr-prio lauber e de sua mãe # cia <ocha.

0untamente com o %amoso cineasta e outros intelectuais baianos %undaram a eman "

5ilmes. 2omo curiosidade: para %inanciar o primeiro %ilme de lauber,, p)tio . 5red endeu1@3

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uma cole/ão de !achado de ssis +ue lhe pertencia. 4utras curiosidades: em carta ao amigo

dalmir, datada de ulho de 1@LW, lauber <ocha %a a seguinte recomenda/ão: IEspere um

e7emplar Samba de roda , li ro de estreia do poeta 5rederico ou a 2astroK (p.@3). !ais

adiante:

*or %alar em reitorismo, o !agn$%icoS nos con%eriu de mil cru eiros por

trinta e7emplares de amba de roda, o +ue sal ou o pre u$ o mas não deu

para subornar, como ele pretendeu; embora nossos alores se am escassos,

lutamos %irmemente, apesar da campanha p blica +ue so%remos (é p blica

mesmo, por+ue até %olheto impresso " hou e), apesar de sermos

trans iadosS, eadosS, 2omunistasS, nticat-licosS e outras besteiras maisdas +uais oc bem sabe, no sentido de uma honestidade e autointegra/ão

( ) 6m abra/o e en ie +uatro ias de cada recorte seus artigos, ou de

outros, sobre !apa, 0ogralesca e amba de rodaK (pp. @L8@X).

Em outro li ro sobre lauber: Jlauber 4ocha: uma revolu%+o baiana , aparece mais

uma e a con%irma/ão de 5red ao lado do g nio do 2inema No o:

1@LX V lauber. 2alasans Neto, ante calda%erri, #uis *aulino, Yé ?elles,

5ernando da <ocha *eres, 5red 2astro entre outros, %undam a 2ooperati a

2inematogr"%ica eman ". 2omo pala ra de ordem, picham nos muros da

cidade: oc acredita em 2inema na 'ahia

No <io, tenta %inanciamento para uma série de %ilmes da ociedade2ooperati a de 2ultura 2inematogr"%ica eman ", da +ual participam

lauber, #ui *aulino dos antos, *aulo il oares, 5ernando da <ocha

*eres, 0osé ?eles, lberico !otta, 5red ou a 2astro, 0aime 2ardoso ?arc$sio

ra o, NeFton <ocha, 0osé ula>. Entre os pro etos, o curtaSenhor dos

Navegantes . isita as %ilmagens de <io, Yona Norte, de Nelson *ereira dos

antos e conhece le7 ian>. Em ão *aulo inteira8se do mo imento

concretista. (<42_ , p.WBL)

1@H

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chamada riselda e com a e78atri !aria 2aldas, ho e soci-loga, com +uem tem dois %ilhos:

rabela e usta o. 6ltimamente i ia com a pro%essora e escritora !aria ntonia.

4 corpo do poeta %oi cremado e suas cin as, a pedido dele, %oram ogadas num

cana ial santo8amarense numa linda tarde de sol, contando com a presen/a de alguns

poucos %amiliares e também a do autor desta tese.

3+3+3+3+ A ,oes a e o Sam;a de roda

5E<< !EN? D4 E< 4

uero escre er meu poemacon%orme com minha terra:

com os bra/os, com a cabe/a,

com as pernas,

assim como +uem entrou no samba8de8rodapra dar umbigada no tempo;assim como +uem entrou na capoeirapra dar pernada no tempo,

pra dar rasteira no tempo.(...)!eia8lua de compassono rel-gio da saudade

ou cair na negati a pra tr"s

M l 8l" Dona

nas terras do Nunca8!ais.(5red ou a 2astro9=nédito9Massap( de sesmarias )

poesia de 5red ou a 2astro, por mais +ue desagrade a algumas autoridades

acad micas, caracteri a8se, ao menos a +ue compCe o nosso corpus, por ser um canto de sua

gente, um canto de sua terra, como +uer e insinua o pr-prio bardo. 2omo " isto, nascido

em ão on/alo e criado em anto maro da *uri%ica/ão, terra +ue abrigou muitos negros e

se desen ol eu gra/as ao culti o, principalmente, da cana de a/ car, notabili ada ho e pela

%or/a de sua cultura a%ricana: dan/a, m sica, religião, capoeira e outras mani%esta/Ces; terra

1@X

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de !aria 'et]nia, 2aetano, e !abel eloso, primos seus, a +uem o poeta alimentou de li ros

o in$cio de sua %orma/ão intelectual, dito pelo pr-prio 2aetano, 2astro re estir" +uase a

totalidade de sua poética desses bens imateriais aprendidos e apreendidos na in%]ncia e na

adolesc ncia ali i idas.

^ uma poesia carregada da %ala e da %or/a dessa gente, +ue lhe deu a poesia +ue o

alimentou durante os A1 anos de sua e7ist ncia e para onde retornou em cin as a seu

pr-prio pedido, ho e espalhadas pelo cana ial +ue tanto o encantou e o indignou também,

como eremos. 2astro, mesmo radicado em al ador, capital da 'ahia, mesmo na elhice, ia

ao menos uma e ao m s a anto maro I isitar os seus %antasmasK, como costuma a di er,

e os +ue ainda insistiam em i er, sem dei7ar de sor er uma saborosa mani/oba. ssim di o

poeta: I!inha terra, não palmeiras9 ou cantar no berimbau9no eco de uma caba/aK, e I ou

dei7ar o meu recadoK, +ue é IV mensagem de minha gente VI nascida Inas rodas das

capoeirasK, ou IEu canto cana i"K (...) Ium rebanho de Mndias crarasK, assim mesmo na

l$ngua errada do po o, l$ngua certa do po o, como nos ensina 'andeira, e se desmancha em

met"%oras bel$ssimas: I%olha de cana é na alha9de cort" +ue nem saudadeK.

rande parte de sua poesia re ela a ginga de seu po o, nascido e crescido nos

conselhos do berimbau, regado a capoeiras, samba de roda e candomblé. 4 sincretismo

religioso e7ercia um %asc$nio enorme sobre o homem, +ue se di ia ateu, e o poeta, a ponto

de o le ar & risca a %rase tão propalada no 2inema No o, &s e es atribu$da ao amigo lauber

<ocha: I6ma c]mera na mão e uma ideia na cabe/aK, +ue ele tradu iu para I6ma c]mera na

mão e se a o +ue deus +uiserK. De sua terra registrou:, Lindro Amor0 4om+o U 4om+o1inho0

Matan%a0 Lu1ia um- um (+ue se outorga a o t$tulo de pro%essora de iolão de !aria

'et]nia, ao +ue sup nhamos uma %antasia dessa mulher do po o, maris+ueira, +ue sabia

cantar, dan/ar e tocar iolão): I# 8l 9meu gener"...K. 5ilmou as %estas uninas: anto nt-nio,

ão 0oão e ão *edro, montando mesmo um %ilme, com artistas amadores locais, por ele

pr-prio editado, imortali ou o deus dos sertane os, num trabalho de pes+uisa e de campo

e7austi o, assim como o %e com a %arinhada (%abrico de %arinha da mandioca de %orma

artesanal) e tudo a suas e7pensas.

4 poema8ep$gra%e, tirado do li ro inéditoMassap( de sesmarias , e7prime com clare a

os moti os poéticos de 2astro: I uero escre er meu poema9con%orme com minha terraK. 1@W

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%or/a da ancestralidade, como ponto de retorno, como elo primordial, a erdadeira busca das

origens, é %ato indissoci" el de sua poética (I6m gosto de ra$ aes9V os ancestrais V9 m

indoK), e também encontraremos as %iguras populares como Dom Domingos e 0oão 5lautim,

as duras leis do candomblé como em I*enit ncia do negro 'onitinhoS por %or/a de eb- ein e aK, os di%erentes caminhos do homem e da mulher negros %orros, mas também ai

denunciar a elha pol$tica do pão e circo em +ue se trans%ormam as %estas populares como o

carna al:

mingorra, mingorra

a nega t" %orra:

na roda8de8samba

V ela ai %arri"

nas orta da %ome

V ela ai emprenhar

na barriga de sete

V ela ai perpetuar

a %ome,

o home,

o %arri"...

+ui nesta terra tudo é 2arna " J

E, como 0oão 2abral de !elo Neto, constr-i essa poética de den ncia cont$nua, pois

parece não ha er %im para a escra idão dos menos %a orecidos, na sua grande maioria

negros e negras, mas ha endo brancos e brancas também. e7plora/ão, +ue come/ou com

os coloni adores portugueses e a di isão das terras por sesmarias, estendeu8se aos nossos

tempos com o capitalismo sel agem impetrado pelas grandes pot ncias, notadamente pelos

1@A

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E6 :

=, E ! <= J

Na maré bai7a

o po o tira seu sangue

e paga uros na 2ai7a

do mangue;

soma um a mais na conta

+ue sempre aumenta

e o rendeiro descontano oito ou oitenta;

+ue eio em naus

seu so%rimento

em doa/Ces aos

donos do momento;

ai, sesmarias J

Em muitos poemas de 5red, eclode um remoer de saudades de tempos pretéritos,

pr-7imos ou não, s- acalentado atra és da m sica a%ro8brasileira e seus instrumentos

musicais e sua dan/a, esse tipo de consolo, com certe a, não se %a endo dentro de uma

corrente %anoniana, nem netiana, estaria mais pr-7ima de um iriato da 2ru , con%orme o

poema I2alend"rio da saudadeK, +ue, embora não %a/a parte de nossa an"lise, tra emosapenso aos ane7os. 0" nesse li ro inédito de 2astro, aparece a %igura do her-i popular

I'esouroK, +ue também ser" in ocado em Samba de roda , pertencente ao nosso corpus:

4 _4!E! =<[

?empos <eais

ai, tempos <eais J

1@@

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( esmarias abertas

para cana iais) .

?empos iguais,

dias atuais J

(Nossas eias abertas

pelas multinacionais) .

i, 'esouro,

ai, 'esouro !angang":

o _omem ir"

(ai, o home ir" J) pra %a rebuli/o

no cana i".

'esouro !angang" tornou8se uma lenda no recMnca o baiano e em al ador, por sua

alentia, %or/a e uso da capoeira nas embrulhadas em +ue se metia, um t$pico her-i popular,

uma espécie mesmo de Yumbi, com sua hist-ria recentemente trans%ormada em %ilme e

e ocado na poesia de 5red como esse her-i Ipra %a rebuli/o9no cana i"K, para %a er a

re olu/ão, como eremos adiante. 'esouro se insurge, não como mal%eitor, mas como

contestador, de%ensor dos oprimidos como ele, +ue le am uma ida Icomprada a

retalho9roubada no peso9da balan/a do labutarK.

E, como em ngola, esse po o resiste e persiste, mesmo tendo sua ida roubada ao

pre/o das in usti/as e do trabalho %or/ado, atra és da dan/a e da m sica, pois s- atra és

delas são capa es de suportar as intempéries. 4 eu poético, &s e es, chega ao "pice do

altru$smo, sacri%icando8se a %a or do po o:

Eu +ue sem eira nem beira

i i o tanto +ue pude

s- pe/o a Deus +ue me a ude

a i er a ida inteiraGBB

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sem eb- e sem me inha

sempre go ando sa de

e de Deus sempre nas gra/a

comendo a minha %arinha

bebendo a minha cacha/a.

E sendo merecedor

da pro id ncia Di ina

pe/o a Deus outro %a or:

pra minha gente outra sina

+ue não essa de i ente

i endo do pr-prio sanguemorando em riba do mangue

se escorando no perigo

comendo o pão do castigo

irando sobra de gente.

4 outro li ro, também inédito, aparece numa antologia %eita pelo poeta em ida e

entregue ao escritor destas p"ginas com o t$tulo de ,s sem terra , como parte de Massap(s

de sesmarias , salientando8se +ue +uase todos os poemas dos li ros a+ui abordados de em

sair numa edi/ão da ecretaria de 2ultura do Estado da 'ahia, com erba " liberada para

este ano de GB1H, com o t$tulo5itanda do bem di1er Mangang) .

Em ,s sem terra , 2astro retoma a %igura de 'esouro como her-i do po o santo8

amarense. ?rata8se de um poema narrati o, cu a enuncia/ão é %eita em duas l$nguas: a

portuguesa e a espanhola, a primeira, suponho, para contar a in asão do 'rasil e a segunda,

a do restante da mérica latina. Nesse poema, o narrador parte de um poss$ el IcausoK para

contar a domina/ão, passada e presente, da mérica, considerada pobre pelo elho mundo

e, também, pelo no o, donde destaca8se a %igura dos E6 :

3LAS> A 5 K

2u"ntos dioses no han tumbadoGB1

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por la imposici-n de un Dios

ué sonidos no han plantado

en los latinos o$dos

las herramientas de muerte

mandadas en carabelas

(carabelas cala eras)

2inco siglos de hogueras

> cruces de cristiandad

cual salamandra de %uego

alrededor de su lecho:

(2arabelas de 2ol-n > armadas de 6ncle am).

!as o eu não se limita a narrar os %atos, como todo bom ate +ue é cada poeta, ele

também %a seu ulgamento e tira suas conclusCes, sempre pro%ético, e anuncia um no o

amanhecer como bem encerra o seu poema:

*<E!4N=TU4

i, o _omem ir".

2om mil caras, mil rostos,

o _omem ir".

4 _omem ir"pra %a er rebuli/o

no cana i".

cabou sesmaria...

l 8l

acabou sesmari".

GBG

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também de 2arurus de 2osme, de ido & iguaria da culin"ria a%ro8brasileira, o caruru, +ue é

ser ida na ocasiãoK (GBBX, p.1@). E mais:

4 samba de roda também é parte %undamental do culto aos caboclos,

entidades espirituais cultuadas no conte7to a%ro8brasileiro, mas com %orte

re%er ncia ao uni erso amer$ndio. credita8se +ue os caboclos gostem de

samba, e em particular das modalidades +ue incluem iola.

(...)

4 samba também acontece depois de %estas de candomblés de rito nagM ou

angola, em alguns casos, " como tradi/ão institucionali ada e, em outroscasos, como algo espont]neo +ue pode acontecer ou não a depender do

]nimo das pessoas. Na ilha de =taparica é comum, ainda, o samba acontecer

de manhã, depois de uma noite inteira de %esta para os eguns, entidades

espirituais relacionadas aos ancestrais.

4utra importante %esta religiosa onde o samba de roda representa papel de

coad u ante proeminente e indispens" el é a de Nossa enhora da 'oa

!orte, em agosto, na cidade de 2achoeira (!ar+ues. GBB3) (GBBX, p.1@).

Esses são apenas alguns e7emplos, em se tratando do recMnca o baiano, não h" hora

nem dia para +ue ele aconte/a, bastando apenas moti o e disposi/ão. uase todas as %estas

citadas por *aim, em seu li ro 4elic)rio popular , terminam sempre com um samba de roda.

egundo ?iago de 4li eira *into, citado pelos pes+uisadores do =phan:

No <ecMnca o, o samba sem d ida tem uma posi/ão especial. ^

signi%icante a liga/ão +ue o samba consegue entre todas as %ai7as et"rias e

entre os se7os, como também o %alo de +ue %ormas de samba são ligadas,

de uma ou outra maneira, a +uase todas as espécies culturais importantes,

e +ue t m um papel importante nas demais datas %esti as, se am elas

religiosas, rituais ou de outra nature a. (GBBX, p.G1)

GBH

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_o e de emos olhar para o samba de roda como uma mani%esta/ão musical,

coreogr"%ica, poética e %esti a. 2omo o pr-prio nome insinua, a sua disposi/ão é em %orma

de c$rculo, muitas e es acompanhado de instrumentos musicais, tais como: pandeiro, prato8

e8%aca, iola, +ue são acompanhados por palmas pelos demais presentes e por cantosIestr-%icos e sil"bicos em l$ngua portuguesa, de car"ter responsorial e repetiti oK. inda

segundo os pes+uisadores do =phan:

estro%e principal, em certos casos, chamada de chula, pode ser cantada

por um ou dois cantores com certo grau de especiali a/ão, en+uanto a

resposta ou relati o V trata8se de termos locais V pode ser cantada por

todos os presentes ou, &s e es, por dois cantores também especiali ados,

di%erentes dos dois primeiros, com ou sem re%or/o das mulheres

presentes. . s estro%es são relati amente curtas, podendo ser de um nico

erso, e raramente indo além de oito ersos. _" ocorr ncia e entual de

impro isa/ão erbal. E7iste um repert-rio de estro%es conhecidas pelos

participantes, +ue no caso de canto indi idual, e e entualmente em dupla,

podem ser acionadas ad libitum. (GBBX, p.G3)

?odos acompanham a m sica atra és de coreogra%ias, m ltiplas, a depender do grau

de pro%issionali a/ão do grupo, se " se é poss$ el %alar disso, isso %eito da cintura para bai7o.

^ importante salientar +ue, durante a reali a/ão da dan/a, uma pessoa entra na roda

mostrando sua per%ormance e em seguida tira outra pessoa para substitu$8la. egundo

2arneiro e ?inhorão, citados pelos pes+uisadores do =phan: I4 princ$pio da altern]ncia

relaciona8se também com um dos gestos coreogr"%icos mais t$picos do samba de roda, a

%amosa umbigada, ou cho+ue de umbigos: tra/o cultural de origem banto, a umbigada é um

sinal por meio do +ual a pessoa +ue est" sambando designa +uem ir" substitu$8la na rodaK

(GBBX, p.GH).

Não podemos omitir +ue o samba de roda tem a %inalidade de congra/amento,

podendo, portanto, todos +ue ali estão dele participar; o samba não tem lugar espec$%ico

para acontecer, +ual+uer espa/o é "lido e seu to+ue contagiante. ão tradi/Ces transmitidasGBL

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por a%ricanos escra i ados no Estado da 'ahia, ao depois se misturam com outras tradi/Ces,

inclusi e a portuguesa. Esclarecem os pes+uisadores do =phan: I?al mescla, assim como

outras mais recentes, não e7clui o %ato de +ue o samba de roda %oi e é essencialmente uma

%orma de e7pressão de brasileiros a%rodescendentes, +ue se reconhecem como taisK (GBBX,p.GH).

2omo imos na parte biobibliogr"%ica de 2astro, o <ecMnca o baiano i eu uma época

de opul ncia com as culturas da cana8de8a/ car e do %umo. 2om a decad ncia da produ/ão

desses produtos e o empobrecimento regional +ue se seguiu, %icaram ainda mais redu idas e

prec"rias as oportunidades de sobre i ncia. ssim, te e lugar uma outra %orma de

e7pansão do <ecMnca o: a migra/ão, segundo in%ormam os pes+uisadores do =phan. *ara

eles, no entanto, essa migra/ão não %oi de toda ruim para a manuten/ão do samba de roda,

pois Ios trabalhadores, em sua esmagadora maioria negros, +ue abandonaram as elhas

cidades de anto maro, 2achoeira, ão 5éli7 e ão 5rancisco do 2onde para se

estabelecerem em po oados e ilas menores, em busca de melhores condi/Ces de idaK,

permaneceram na região. =sso +uer di er +ue Io <ecMnca o %oi e7pandido para dentro de si

mesmo. ^ muito corri+ueiro encontrar na região %am$lias espalhadas por di ersas cidades: o

resultado de in meras tentati as de se i er melhorK. 5oi gra/as a esse processo migrat-rio+ue ho e é poss$ el perceber certa unidade cultural na região. ssinalam os pes+uisadores:

despeito da disritmia intra8regional, a presen/a a%ricana e

a%rodescendente %oi, e continua a ser, uma marca da cultura do lugar. Eram

negros os homens, mulheres e crian/as +ue cuida am dos cana iais, %a iam

os engenhos %uncionarem, mantinham toda a in%ra8estrutura necess"ria

para o bem i er de seus senhores ... e ainda promo iam magn$%icosbatu+ues. 2omo ho e também o são os trabalhadores ocupados com a cata

de mariscos, com a pe+uena la oura ou com o re%ino de petr-leo, e com o

samba de roda. ?amanha predomin]ncia negra %a com +ue o <ecMnca o

resguarde pr"ticas cu1turais +ue são, a um s- tempo, uma s$ntese das

e7peri ncias das popula/Ces a%ricanas no 'rasil, e a e id ncia da enorme

criati idade dos seus descendentes.(GBBX, pp. GW8GA)

GBX

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2reio +ue essa +uestão salientada pelos pes+uisadores %ica e idente no poema

Samba de roda , de 5red ou a 2astro, com uma pe+uena di%eren/a, o poeta não se atém

apenas ao aspecto %esti o do %enMmeno, mas também & sua %un/ão cat"rtica de retorno aos

ancestrais, bem como o de den ncia da e7plora/ão do po o e seu apego at" ico ao solo do

massap , " tido como sua pr-pria terra, em +ue o migrar8se representa a uma segunda

di"spora, um segundo so%rer, por isso o atic$nio do retorno de I'esouroK, uma espécie de

ingador, m"rtir e libertador de sua gente.

ntes de darmos in$cio & an"lise propriamente dita dos poemas, %a/amos alguns

esclarecimentos sobre o termo IsambaK. egundo #u$s da 2]mara 2ascudo, samba est"relacionado com baile popular, dan/a de roda, batu+ue, pro indo de semba, umbigada, em

#uanda, segundo o pes+uisador brasileiro: I'atu+ue é denomina/ão genérica para o baile

a%ricano e o rei D. !anuel proibia sua %un/ão nas primeiras décadas do séc. \ =. 2om a

designa/ão de amba não conhe/o dan/a a%ricana nem registro algum de ia ante, durante o

séc. \=\K. 2onclui 2ascudo:

Na [%rica a dan/a, no registro portugu s de cinco séculos, di 8se batu+ue.

dan/a é &s e es o instrumental. 5rei !iguel do acramento #opes ama,

no arapuceiro (n X, <eci%e, 38G81A3A), esbra e a indignado contra o samba

dSalmocre es, e no n XH, de 1G8\=81AHG, registra:

I +ui pelo nono mato,

uSesta a então mui tatamba,

Não se sabia out?a zous.a .

enão a Dan/a do ambaK.

4 nome, entretanto, te e ulgari a/ão lenta e apenas em 1@1X apareceu a

primeira m sica impressa em +ue ele se menciona a I*elo tele%oneK, de

Ernesto ousa, Donga, <io de 0aneiro. 4 samba possui atualmente grande

ariedade de tipos e de %ormas, nos +uadros rurais e urbanos, e, no <io de

0aneiro, a ariedade, +ue é uma das elocidades iniciais, é o samba doGBW

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morro (2 26D4, X@B)

inda segundo 2ascudo, a dan/a era combatida pelos clérigos por considerarem8na

indecente. egundo os pes+uisadores do =phan, a primeira e +ue o termo %oi registrado no

'rasil data de 1A3A, em um ornal de *ernambuco. Na 'ahia, ele surge em 1AHH, mas, ao +ue

parece, sem liga/Ces com as %ormas de di ertimentos dos negros, chamadas de batu+ue.

egundo eles, sempre %undamentados nos historiadores 0oão 0osé <eis e 0océlio ?eles dos

antos:

^ s- na segunda metade do século +ue se passa a encontrar, sobretudo na

imprensa e em registros policiais, re%er ncias em pro%usão ao samba na

'ahia, e " agora com muitas das caracter$sticas ho e presentes no

<ecMnca o. primeira delas data de 1AXH V de =HB anos atr"s, portanto, e

GB anos depois do carcereiro antos ieira: INos becos da <ua da

2astanheda por e7emplo, ha ia, segundo o ornal o labama de X9=91AXH ,

sambas, todas as noites, acompanhados de pratos e pandeirosK (GBBX, p.3B)

No boletim Mensagem, no \ =, 0ulho de 1@XH, n 1 (#isboa), escre e ?om"s 0orge,

no conto poético I=n%]nciaK: I*assa a também a banda do amba9?oda a gente

acompanha a o ambo9 ambo m sico e curandeiro milagroso.K (p.3G). Esses

esclarecimentos ser em tão somente para rati%icar algumas de nossas conclusCes tomadas

ao longo da an"lise do te7to poético de 2astro, parte do corpus de nossa tese, o +ue não é,

porém, de somenos.

Em GG e G3 de agosto de GBBX, a grande sambista brasileira 'eth 2ar alho reali ou

um shoF intitulado I'eth 2ar alho canta o samba da 'ahiaK e dedica o espet"culo ao grande

sambista baiano Dori al 2a>mmi, o +ue mostra a rele ]ncia dessa mani%esta/ão, ho e,

art$stica, +ue come/ou com a gente so%rida do massap , ou melhor, com seus ancestrais

indos de [%rica. Do shoF participam grandes e7poentes da m sica baiana ao lado da

sambista carioca, %amosos e não; citemos alguns dos compositores: 'atatinha, <iachão, EdilGBA

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*acheco, <oberto !endes, ?ião !otorista, ordurinha, Yé *retinho da 'ahia, ilberto il,

ssis alente, Nelson <u%ino, 2aetano eloso e o pr-prio 2a>mmi, entre outros. *assemos,

agora & an"lise do poema de 2astro.

3+3+3+@+ Sam;a de roda8 1onte de ale.r as e tr steHas da .ente do

massa,>

I amba de <odaK, en%im, ilustrado pelas belas gra uras de2alasans Neto, apresentando %ei/ão gr"%ica moderna e

elegante, lan/a um poeta, +ue, por o em, nada de e. I ambade <odaK, sem d ida, representa, magni%icamente, ano $ssima poesia bahiana. ( lbérico !otta, s9d)

2onheci 5red ou a 2astro no in$cio dos anos XB. (...) primeira e +ue i 5red ou a 2astro, cu o nome de poetarespeitado " me era %amiliar, %oi no bar 'aiana; +ue %ica a unto ao ?esouro, nas pro7imidades de dois outros bares%amosos: o <io erde e o \angM. (...) 2omo diria Drummond,nunca me es+uecerei desse acontecimento na ida das minhasretinas tão %atigadas... 4 mais espantoso %oi +ue terminei%a endo ami ade com o admir" el poeta. (...) *oeta e%iccionista, %abuloso contador de causos cr$ eis ou incr$ eis,tudo embebe num lirismo +ue amais cessa...(<u> Espinheira5ilho, A 9arde ultural , GBB1)

4 +ue apresenta 5red ou a 2astro, como sempre, é o +ue elecostuma nos apresentar: uma literatura de alta +ualidade.

(<u> Espinheira 5ilho, #auro de 5reitas, aneiro de 1@@X)

Samba de roda , pois, é o primeiro li ro publicado por 5red ou a 2astro, com

7ilogra uras de 2alasans Neto, no ano de 1@LW, momento em +ue nasce na 'ahia, em

al ador, mais precisamente, uma gera/ão de o ens intelectuais, uns mais elhos, outros

mais no os, " sob a lideran/a do ainda candidato a g nio lauber <ocha, então com 1A anos,

mais 5ernando da <ocha *eres, 0oão 2arlos ?ei7eira omes, 5ernando <ocha, 2arlos n$sio

!elhor, 2alasans Neto, il a Dutra, 5loris aldo !atos, lbérico !otta e 5red ou a 2astro,

este " com GX anos. Esses o ens se reuniram a outros e %ormaram a %amosa era/ão !apa,

de onde surgiram a re ista, com o mesmo nome, de curta dura/ão, as ogralescas, as Edi/Ces

GB@

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!acuna$ma e a eman " 5ilmes. uase todos eles ainda secundaristas do 2olégio da 'ahia,

ho e 2olégio 2entral.

4 li ro, & época, recebeu um coment"rio cr$tico de um dos participantes da era/ão,

lbérico !otta, e %oi recomendado por lauber a amigos do ul do pa$s, a +uem pedia

aprecia/ão, o +ue pode ser compro ado atra és das re%er ncias bibliogr"%icas e dos ane7os.

?rata8se de um poema narrati o, embora o eu poético nele se %a/a presente, por isso

poder$amos di 8lo épico, mas a carga de lirismo empreendida é tão grande +ue podemos

considerar Samba de roda como um poema épico em suas inten/Ces

enunciat as9construti as e, ao mesmo tempo, l$rico na sua linguagem e acep/ão poéticas,

sendo estas a sua ess ncia.

4 poema est" di idido em +uatro partes: =) 2anto tel rico; ==) *erspecti a; ===) ?ema V

Desen ol imento, +ue, por sua e , di ide8se em a) terra e o po o, e b) amba de roda; e

= ) isão de no a idade. er assim tecnicamente distribu$do, parece8nos tratar8se de um

poema épico ou um ensaio sociol-gico como em ,s sertões de Euclides da 2unha, +ue possui

a seguinte estrutura: terra, 4 homem e luta.

EmSamba de roda também teremos os tr s segmentos, mas, como se trata de %ic/ão,

a luta permanece no ide"rio poético do socialista, +ue era o seu autor. 6topia a ser

alcan/ada ainda, mesmo depois de passados LW anos de sua publica/ão, mas +ue não cremos

imposs$ el.

I7 Canto tel:r co

Na primeira parte I2anto ?el ricoK, o poeta ou e a in oca/ãodo massap . ão ersos calmos e precisos.

(...)

4 massap %ascina o poeta: o massap +ue alimenta oshomens +ue Itra em no corpo as mesmas manchas dos gomosda canaK o massap , +ue prende e castiga, ciumento e terr$ el,os homens rebeldes +ue pensam em %ugir...

G1B

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?odo o drama do cana ial é sentido pelo poeta, em toda suagrandiosidade humana. terra e o homem, a luta eterna entreos dois, a condi/ão l$rica resultante, constituem o tema deI amba de <odaK.

( lbérico !otta, ne7os 5red)

primeira parte inicia8se com uma das mais belas met"%oras de nossa literatura: I6m

bisturi de lu parte ou a neblina;9e do entre leitoso do I%ogK de anto maro9nasceu a

cabeleira erde do %ilho do massap K: assim o enunciador pro eta o nascimento do

I2ana ialJK, cu o choro é um I agidoK +ue se mistura & Itirana do negro suadoK ao lidar com

a Iterra comburidaK, +ueimada, e ao Irangir dos %erros da usinaK. 4s tr s primeiros

elementos aparecem amalgamados, indissol eis e9ou indissoci" eis.

_" um di"logo tra ado entre o eu poético e o I2ana ialK: este I%ilho e pai ao mesmo

tempoK, como numa rela/ão edipiana, pois +ue Iteus %ilhos, os homens tostados do

massap ,9tra em no corpo as mesmas manchas dos gomos da canaK e I*or+ue a lama do

massap 9mais o p- de espinhos das tuas %olhas9amalgamados os marcam na labutaK e, como

^dipo, I*ara onde %ugir K, então o homem I%ilho do massap K, tal +ual o I2ana ialK, não

pode des encilhar8se de seu destino e resigna8se ao dom$nio at" ico a +ue est" preso, pois,se ele %oge:

+ual+uer destes dias

ai ou ir a tirana cantada no trabalho...

ai ou ir a+uele samba de roda...

E lembrar %olhas erdes ao longe lhe acenando.:.

brindo8lhe os bra/os

num abra/o na sua saudade...

Então, é oltar.

enão a triste a toma conta

e nunca mais alegria ...

Nunca maisJ

G11

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4s ersos, assim nessa distribui/ão, ão como +ue desenhando um +uadro diante de

+uem os l , numa isão impl$cita de uma %otogra%ia posta & nossa %rente. té a$, emos um

eu a construir esse +uadro melanc-lico do homem e de sua terra, adiante, porém, o +ue é

dor e saudade e7plode nas mãos " idas de um sonho +ue I em de longe, no tempo e noespa/oK, em Isons ritmados de o es, iolas e pandeirosK e esse homem é possu$do por

Iestranha alegriaK e Iderrama pelo massap toda a alegria +ue encerra9no canto de amor e

de saudade do escra o da terraK. Essa passagem nos remete diretamente ao mito de ^dipo,

+uando este, " cego, entrega8se ao I entreK da terra, completando, assim, o ciclo da sua

e7ist ncia. - +ue em 2astro se d" uma outra perspecti a como eremos a seguir. 2ompete8

nos esclarecer, mais uma e , +ue a m sica %unciona como um chamamento at" ico,

lit rgico, de penates: o antigo escra o dos homens torna8se agora escra o também da terra &+ual se apegara como seio materno. Esse mesmo moti o amos encontrar em olano

?rindade e em Neto.

II7 Pers,ect va

Na segunda parte, I*erspecti aK, a esperan/a e o amor dopoeta se %undem, indissolu elmente, nestes ersos serenos eseguros:

6m dia ...6m raio de entendimento

ai rasgar a neblina dos olhos da gente do massap J . .( lbérico !otta)

Não é sem ra ão +ue esta parte denomina8se e7atamente Iperspecti aK. ?rata8se deuma pro%ecia, de um atic$nio, " +ue todo poeta é um ate. Essa pro%ecia marca uma

ad ert ncia pregada pelo ate, da mesma %orma +ue amos encontrar em Neto, sem a

mesma intensidade tal e . Em Neto, o eu poético é Ia+uele por +uem se esperaK; em 2astro,

o esperado é o her-i popular, é I'esouroK, +ue não aparece e7pl$cito em Samba de roda ,

mas ai aparecer com toda sua %or/a em 5itanda do bem di1er Mangang) , em ersos

também da década de LB:

G1G

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i, 'esouro,

ai, 'esouro !angang":

o _omem ir"

(ai, o home ir" J)

pra %a rebuli/o

no cana i".

$mbolo da resist ncia e da re olta do homem e7plorado, outrora como escra o, ho e

pelo imperialismo capitalista, representado pelos senhores de engenho e, mais & %rente,

pelos empres"rios do a/ car e do %umo:

?empos <eais

ai, tempos <eais J

( esmarias abertas

para cana iais) .

?empos iguais,

dias atuais J

(Nossas eias abertas

pelas multinacionais)

+ui h" uma sub ersão do mito de ^dipo uma e +ue a imagem dos ersos (I6m

dia 9 6m raio de entendimento 9 ai rasgar a neblina dos olhos da gente do massap J . . K)nos pCe em outra dimensão: en+uanto ^dipo %ura os pr-prios olhos, o Iraio de

entendimentoK rasgar", no sentido de abrir, os olhos da gente do massap +ue se

encontra am encobertos pela neblina.

G13

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III7 Tema ( Desenvolv mento

a7 A terra e o ,ovo

Esse despotismo é tanto mais mes+uinho, mais odioso, maise7asperante, +uanto mais abertamente proclama +ue seu %im

ltimo é o lucro. (...) mas toda luta de classes é uma lutapol$ticaP.(! <\ EN E# )

terceira parte do poema é o tema, propriamente dito, da obra. +ui 5rederico 0osé

de ou a 2astro estuda, com acentuado igor poético, as duas %or/as em luta: a terra, o

cana ial erde e dominador, de um lado, e o homem, simples e bom, do outro. Dessecho+ue, somente os donos do massap conseguem sair ilesos. +ui, o massap ganha duas

dimensCes: a primeira é sua rela/ão edipiana com o homem +ue nela trabalha; a outra, é a

%onte de ri+ue a da+ueles poucos +ue se+uer pCem os pés l".

_" dois tipos de ser em rela/ão & terra: a gente +ue com ela se identi%ica e por +uem

o poeta se doa em carinho e cuidados e Ios donos do massap 9+ue ninguém K(...) Imas

desses a gente não %alaK, estes são de somenos, então o eu se trans%orma em Ia genteK comodi o homem do massap +ue é o n-s, o coleti o.

marca sil"bica tMnica o7itonal e a repeti/ão Imassap K, também %inal, dão a ideia de

uma ida +ue se ergue & base do trabalho repetiti o, sem absolutamente nenhuma

no idade, trata8se de um trabalho mec]nico e desumano, como em I2i ili a/ão ocidentalK,

de Neto:

'ritar pedraq

acarretar pedra

britar pedra

acarretar pedra

ao sol

& chu a

britar pedraG1H

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acarretar pedra

(1@AW, p.X@)

Em 2astro teremos:

ESa terra =nteira assim:

#ama e torrão9con%orme se a in erno ou erão...

4 'rasil de l" é s- massap .

E gente do massapé.

%ora os donos do massap

+ue ninguém .

(*or+ue não gostam do massap ).

(...)

*lantar a cana,

2ortar a cana,

+ueimar o terreno,

limpar o terreno,

*lantar outra e ... ente d- eito,

doente do peito,

tomando me inha,

morrendo so inha

num canto de massap .

(1@LW, p.1H)

E Neto complementa:

elhice em cedo

6ma esteira nas noites escuras

basta para ele morrer

G1L

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grato

e de %ome.

(1@AW, p.X@)

Em 2astro parece, mas s- parece, um certo con%ormismo da Igente do massap K:

!as essa indignidade

+ue %re a mim e a oc

não %ere a gente do massap ;

por+ue o mundo da gente do massap

s- massap : #ama e torrão

con%orme se a in erno ou erão

(1@LW, p.1H)

inércia, a resigna/ão da Igente do massap K est" centrada na sua %alta de estudo,

de conscienti a/ão, por isso a bebida, o "lcool, é +ue %a a %elicidade dessa gente, assimcomo nos musse+ues dos poetas angolanos. 4 alerta do eu poético é bem claro: trata8se de

uma I5elicidade b badaJK, não de uma %elicidade consciente, por isso é +ue nesses

momentos h" uma espécie de retorno aos antepassados, " +ue possu$dos pela sem8ra ão

desta mistura:

t" ico etilismo, tosse, %umo, e dan/a

distila, instila, %er e, %ede. ( uor e "lcool)

E en+uanto corpos negros %otogra%am

a lu an mica do candeeiro

di em b"rbaros sons ataba+ues possu$dos

por e7portadas mãos despachadas

acondicionadas no porão de um cargueiro.

G1X

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;7 Sam;a de roda

Dessa luta entre o massap e o po o, +ue, apenas, Iplanta

dinheiroK, para os donos, surgem a dor e o dese o de %ugir.!as, imposs$ el escapar. 4 cana ial guarda os seus %ilhosciumento. 4 eito é cantar:

^ o samba8de8roda;de negros, mulatos,brancos também,se rebolando no chão batidochão rubro de massapéJ( lbérico !otta)

Nesta parte, %undem8se o poeta e o pes+uisador, a+ui se narra o e ento, o samba de

roda, +ue é tocado, batido, cantado e dan/ado (e comentado por +uem l" não %oi ou não

pMde estar) pela gente do massap , de "rias paragens, a ele tudo pertencendo: negras e

negros e brancas e brancos também, libidinagens, cacha/a e Icon%usãoK. 4 enunciado

alterna8se com a enuncia/ão: são in ocadas as o es do passado, Ilamentos das sen alasK:

*ercutem tambores,repicam iolas,

chocalham pandeiros,

e tudo reunido:

tambores, iolas,

as o es, pandeiros,

o cheiro +ue sobe dos corpos suados,

melodia, cad ncia,

tra em reminisc ncia de noites do 2ongo,

de negros suados

cantando cantigas em l$ngua nagM.

INão %ui eu morena

+uem %e arenga a teu pai ...

não %ui eu morena

+uem %e arenga a teu pai ...

apatina bem %eitaG1W

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sapateiro é +uem %a ...K

?udo bem calculado, bem di idido: enuncia/ão e enunciado, na predomin]ncia das

redondilhas, dos ersos curtos, consoante pede o ritmo. egundo lbérico !otta, tal e o

nico a tecer um coment"rio sobre Samba de roda :

+ui 5rederico 0osé de ou a 2astro nos %ornece uma preciosa

documenta/ão %olcl-rica, transcre endo os gostosos sambas de roda, +ue,

com a aguardente ali iam a alma e o peito do homem do massap :

IEu topei seis cabras machos,

e essa %oi pe+uenininha,

um %acão de sete arrobas,

%ora o arco e a bainha,

%ora o a/o +ue ele tinha.

6ma cesta de o os,

etecentas galinhas

o trem corre

por cima da linha...

ssegura8nos !otta +ue se o poeta não alesse, pela seguran/a e sua técnica e pelo

igor de sua mensagem, o pes+uisador %olcl-rico tornaria Samba de 4oda um li ro til a

+ual+uer estante brasileira. !as ale o poeta e ale o pes+uisador. 2astro, como grandeconhecedor +ue o é da cultura de anto maro, onde i eu a maior parte de sua ida, pMde

sentir, nas pr-prias %ontes originais, a hist-ria do homem do cana ial, +ue ele bem soube

captar:

ES assim no massap .

Entre um samba e outro

morre alguém,G1A

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nasce alguém,

alguém dei7a o massap

e ninguém mais o .

2om um olhar cinematogr"%ico, heran/a de sua i ncia com a ? e o cinema, o poeta

ai pro etando no papel em branco, com sua 1oom poética, a cena da disputa entre as

personagens. E como um elho griot , ai tecendo o acontecido atra és das personagens por

ele, como poeta, criados ou relembrados de IcausosK ou idos +uando crian/a ou in entados,

con%orme di"logo entre o elho pai, +ue não pMde ir ao samba, e o %ilho +ue l" este e.

tra és de Samba de roda , 2astro %a 8nos acreditar +ue a e7plora/ão do homem pelohomem acontece em todos os lugares: tanto em anto maro, +uanto em ão *aulo, a

di%eren/a é +ue a %uga praticada pelo homem do massap (por uma ida melhor) termina

por causar8lhe mais triste a em irtude da pr"tica de uma no a di"spora: a do sertane o

nordestino (colocando num plano mais alargado) para as cidades grandes, notadamente a

capital paulista, %onte ilus-ria de ri+ue a, muito cantada por *atati a do ssaré e outros

poetas e cantores nordestinos, bem como pelos ilustres escritores chamados de regionalistas

da gera/ão de 1@3B.

I 7 s9o da nova dade

$ +ue de um golpe a mérica do Nortele anta uma ta/a de negro metal:

a negra ta/a do iolento hidrog niocom +ue brinda o ?io am.# brico macaco de pe+ueno cr]niochia em sua mesa: $ela morte vai#2repuscular responde um coro m ltiplo:!ai pela morte0 pela morte vai#(Nicol"s uillén)

I isão de no a idadeK nada mais é do +ue a proclama/ão da re olta da Igente do

massap K, tal +ual a re olu/ão russa de 1@1W e, +ui/", tal +ual a de 2uba em 1@LA e tal +ual a

G1@

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de ngola, +ue s- iria acontecer a partir de 1@X1. <epresenta a tomada do poder pelos

e7plorados, +ue, numa atitude e7emplar, aspiram a aplicar o dinheiro, apreendido dos

e7ploradores, em escolas, hospitais e moradias decentes:

6m dia oc

+ue sabe somente

(o +ue é bastante)

+ue a+uela gente

planta dinheiro

no seu massap ,

+uando acordar, cansado ainda dos ban+uetes da éspera

e procurar.

nas cai7as8%ortes dos bancos.

s moedas +ue brotaram dos gomos da cana ro7a,

Eles mostrar8lhe8ão a Escola

E o _ospital

!aternidade

E as casas no as

2onstru$das no lugar das choupanas.

(1@LW, p.GX)

^ a mesma isão tida pelo Ioper"rio em constru/ãoK de inicius de !oraes, a mesma

conscienti a/ão buscada por Neto entre os negros e as negras dos musse+ues de ngola, é a

pura isão socialista apregoada por !ar7 e Engels em seu Manifesto omunista , é are olu/ão oper"ria ad inda pela %or/a da poesia, do samba de roda, +ue ilumina e encora a o

po o a tomar do patrão o +ue, por direito de humanidade, lhe pertence; não nos enganemos

pensando di%erente, essa Igente do massap K, embora indi iduali ada, representa toda a

gente estiolada pelo império capitalista +ue se alastrou ao longo dos séculos mundo a%ora,

bene%iciando uma classe de m$nimas pessoas a%ogadas no dese o desen%reado do lucro, sem

dar nenhuma import]ncia &s classes trabalhadoras: das %"bricas, das ind strias, do comércio,

GGB

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dos cana iais, das usinas e da ona rural, como um todo.

pro%ecia, pre ista na segunda parte, esperamos, h" de se concreti ar um dia, pois o

poder dos ates é ine7or" el. ssim %alou Drummond em sua IElegia 1@3AK:

2ora/ão orgulhoso, tens pressa de con%essar tua derrota

e adiar para outro século a %elicidade coleti a.

ceitas a chu a, a guerra, o desemprego e a in usta distribui/ão

por+ue não podes, so inho, dinamitar a ilha de !anhattan

4 +ue nos %a lembrar os acontecimentos de setembro de GBB1 nos E6 , não +ue o

poeta de =tabira dese asse a morte de tantos inocentes, mas ser" +ue estaria se

concreti ando o +ue ele aticinara em 1@3A segundo, ainda, as pala ras de lbérico !otta,

representante da era/ão !apa, escritas nos idos de 1@LW:

Na ltima parte de I amba de <odaK, 5rederico 0osé de ou a 2astro

cristali a o seu sentimento de amor e de esperan/a, +ue desde +ue n-sterminamos a leitura do poema, passa a ser também nosso: I6m raio de

entendimento ai rasgar a neblina dos olhos da gente do massap K.

I amba de <odaK, en%im, ilustrado pelas belas gra uras de 2alasans Neto,

apresentando %ei/ão gr"%ica moderna e elegante, lan/a um poeta, +ue, por

o em, nada de e. I amba de <odaK, sem d ida, representa,

magni%icamente, a no $ssima poesia bahiana. ( lbérico !otta).

<ecorremos, então, mais uma e a ramsci, +uando di +ue a Ipossibilidade não é a

realidade, mas é, também ela, uma realidadeK e +ue Ipossibilidade +uer di er liberdadeSK;

por isso:

4 homem, neste sentido, é ontade concreta: isto é, aplica/ão e%eti a do

+uerer abstrato ou do impulso ital aos meios concretos +ue reali am esta

GG1

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ontade. 2ria8se a pr-pria personalidade: l) dando uma dire/ão

determinada e concreta (IracionalK) ao pr-prio impulso ital ou ontade; G)

identi%icando os meios +ue tornam esta ontade concreta e determinada e

não arbitr"ria; 3) contribuindo para modi%icar o con unto das condi/Ces

concretas +ue reali am esta ontade, na medida de suas pr-prias %or/as e

da maneira mais %rut$%era. 4 homem de e ser concebido como um bloco

hist-rico de elementos puramente sub eti os e indi iduais e de elementos

de massa V ob eti os ou materiais V com os +uais o indi $duo est" em

rela/ão ati a. ?rans%ormar o mundo e7terior, as rela/Ces gerais, signi%ica

%ortalecer a si mesmo, desen ol er a si mesmo.(1@XX, p.HW)

Então o mito de ^dipo dei7a de cumprir8se, a %a or de uma no a utopia: a concre/ão

do Estado ocialista.

GGG

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CO%C)US'O

2omo arremate desta tese, con ocamos para uma re%le7ão +ue se %a necess"ria:"rios escritores %oram recha/ados pela cr$tica o%icial e +ue, por um ou outro moti o, %icaram

& margem da o%icialidade acad mica. ?emos como e7emplo na literatura ocidental, como um

todo, 5ran/ois <abelais (1H@H81LL3), poeta %ranc s do século \ =, ho e um cl"ssico

consagrado, +ue %oi por séculos dei7ado no ostracismo, e7atamente por tornar a %ala e as

%estas populares de seu tempo em moti os poéticos e te e seus li ros con%iscados pela

orbonne & época; dentro da pr-pria literatura de l$ngua portuguesa, h" "rios casos, como

reg-rio de !attos e uerra (1X3X81X@X), poeta brasileiro +ue o +uiseram copista, plagiador

e até ine7istente, tornando8o uma espécie de "rios poetas, destitu$do de identidade

pr-pria.

2omo se sabe, o 'rasil %oi colMnia de *ortugal durante mais de tr s séculos, tornando8

se independente em 1AGG, e s- 1BB anos depois é +ue se %a uma re isão hist-rico8liter"ria

de pro%undas rupturas estéticas, sem nunca, porém, despre ar os seus escritores do passado,

por mais +ue alguns tenham sido espe inhados pelos e7ecutores da emana de rte!oderna, como são os casos de 'ernardo uimarães e 4la o 'ilac.

e pegarmos os patronos das cadeiras da cademia 'rasileira de #etras e até mesmo

alguns acad micos, +uando da sua %unda/ão em 1A@W, por !achado de ssis e seus

disc$pulos, encontraremos nomes até ho e desconhecidos, inclusi e de muitos intelectuais

brasileiros.

o nosso er, o +ue os intelectuais de ngola t m a %a er é elaborar o seu pr-prio

c]none, dei7ando de lado alguns aspectos de ordem re anchista ou até mesmo

preconceituosa, resgatando a+ueles escritores +ue mant m uma identidade s-cio8cultural e

liter"ria desde o tempo de sua %unda/ão, com 2adornega, ou antes, com sua literatura oral,

preser ada até aos dias de ho e.

Não se pode e7purgar uma obra +ue mantém la/os identit"rios com a terra e o seu

po o s- por+ue o seu autor nasceu em outras plagas; se assim %osse, ?om"s ntMnioGG3

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on aga, nascido no *orto, tendo morrido em !o/ambi+ue, não seria um poeta brasileiro.

Esperamos, da+ui a 3B ou HB anos, ou ir do po o angolano +ue esses poetas

compCem sua tr$ade canMnica, e +ue gostinho Neto é, não o seu 2amCes +ue cantou as

in asCes portuguesas, inclusi e a de ngola, mas o poeta +ue pre iu e promo eu a e7pulsão

desses in asores de sua terra8mãe. !esmo +ue tur as se am as "guas lusas.

Da pes+uisa %eita, o +ue %ica é +ue esses tr s poetas " come/am a ocupar o lugar +ue

lhes é de ido atra és de alguns trabalhos cr$ticos e9ou acad micos, dentro dum poss$ el

c]none da literatura angolana, ambos inculados ao mo imento I amos Descobrir ngolaJK,

a%inados, em determinados poemas, com a den ncia da e7plora/ão da terra e do po o de

[%rica, condenados por "rios séculos ao a iltamento pelo branco europeu, com aconscienti a/ão de sua gente oprimida e com a con oca/ão da luta em busca de sua

liberta/ão total. 4u/amos, mais uma e , l%redo !argarido:

4 +ue se %i7a, pois, nos ersos dos poetas angolanos, é a di%eren/a essencial

+ue e7iste nas rela/Ces sociais tra adas entre as "rias etnias postas em

presen/a no mesmo espa/o geogr"%ico. <econhece esta poesia, em primeiro

lugar, +ue o homem negro se encontra numa posi/ão peculiar, e +ue por

isso a sua ac/ão não possui um ob ecti o +ue possa ser classi%icado como

um interesse particular. 2om e%eito, para além dos seus interesses gerais ou

particulares, a sua situa/ão peculiar obriga8o a de%ender a sua ida

(! < <=D4, p.GWX)

2om rela/ão aos poetas brasileiros, sentimo8nos com a missão cumprida, ap-s ter

proporcionado a eles um con%ronto salutar dessa en ergadura, posicionando cada um em

sua dimensão estética, sem lhes tirar ou acrescentar nada +ue não se a %ruto de uma

pes+uisa deste trabalho.

gora é esperar +ue as academias pertencentes aos pa$ses +ue t m a l$ngua

portuguesa como o%icial possam apreci"8los com mais cuidado, cabendo8lhes a certe a de

+ue não estão %a endo nenhum %a or, muito pelo contr"rio, apenas cumprindo o seu de er.GGH

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ale acrescentar +ue, partindo da obra de gostinho Neto, poeta +ue reputamos,

dentre os trabalhados, como o de maior agude a no trato das +uestCes do homem oprimido,

especi%icamente do negro a%ricano de ngola e, por outro lado, os oprimidos de todo o

mundo, encheu8nos de orgulho o trabalhar sobre os seus poemas ei ados da dor, da alma edo dese o de liberta/ão do homem angolano, sem claudicar em nenhum momento entre os

seus ob eti os poéticos e pol$ticos, tra/ando, como +ue calculadamente, cada percurso de

sua ida ao tempo correto de sua e7ist ncia, ob eti os esses bem de%inidos em seu discurso

tanto em prosa, +uanto em erso.

ua poesia é a o de seu po o e, como uillén, também a dos a%ricanos em sua

di"spora e a de todos os po os oprimidos, sendo uma poética de combate e estando

comprometida com as circunst]ncias em +ue %oi escrita; mesmo assim, nunca dei7ou de ser

bela e e7pressi a, não se des iou de seus ob eti os, nem padeceu da estética pela estética,

podendo %a er parte de +ual+uer antologia poética, independentemente de sua tem"tica,

pois o seu compromisso pol$tico " %oi alcan/ado, %altando apenas o social e o acad mico.

2om rela/ão aos outros poetas, e7ternamos, igualmente, a salutar con i ncia com

suas poéticas, e7altando de nt-nio 0acinto, companheiro de Neto e grande poeta, a+ueles

poemas, tão ricos, +ue %alam de sua gente com tamanho sentimento de perten/a, a%inando

em muitos momentos com a poética de Neto e, +uando dela se distanciou, %oi para dar uma

no a roupagem & sua pr-pria poesia, alcan/ando n$ eis de alta grande a, de pro%unda

re%le7ão e7istencial, mas +ue bem soube cantar também a dor de sua gente.

*odemos a%irmar, com toda seguran/a, +ue, se iriato da 2ru ti esse se dedicado &

poesia como o %e & pol$tica, seria outro poeta soberbo de ngola. Não ti esse %icado ele com

os poucos poemas +ue escre eu (e, como dissemos, dignos das maiores e melhoresantologias, ele também poeta %undador), teria al/ado oos mais long$n+uos, como os dados

por Neto e 0acinto. 4 +ue %e , no entanto, " é digno de um bom poeta.

5alando da poesia a%ro8brasileira, tendo como representantes um negro militante e

promotor de cultura popular, pre%erir$amos di er apenas cultura, e um branco, mas também

militante da cultura popular, embora em outra ordem, sentimo8nos igualmente agraciado,

pois se trata de dois grandes poetas: olano ?rindade e 5red ou a 2astro. 4 primeiro,

GGL

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E< E<, *ierre 5atumbi.,rix)s deuses iorub)s na Wfrica e no Novo Mundo . ?radu/ão !aria

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*aulo: 7is !undi Editora #tda, GBBG.

RE##E`, <en e R <<EN, ustin. 9eoria da literatura . H Edi/ão. ?radu/ão de 0osé *alla e

2armo. !ira. intra8!em !artins9*?: *ublica/Ces Europa8 mérica, s9d.

R_=?! N, Ralt. Song of m self . (?rad. de ndré 2ardoso). <io de 0aneiro, =mago9 lumni,

GBBB.

GHB

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D DLS

2 < #_4, 'eth. 'eth canta o samba da 'ahia. al ador: GBBBX gra ado ao i o no ?2 .

* 24 , 0orge. , samba de roda na palma da m+o . D D9Document"rio. al ador: s9d.

GH1

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GHG

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A%E OS

GH3

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GHH

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PENUE%A A%TO)OGIA DE E SO RE FRED SOU A CASTRO

GHL

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GHX

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GH@

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GW1

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CA)E%D$RIO DA SAUDADE

!andei carta sem destino

(o ento %oi mensageiro)espero desde menino

resposta do amor primeiro.

No +uintal de minha espera

plantei um grão de esperan/a:

eu sendo sempre crian/a,

oc sempre *rima era.

2i%rei seu nome no erso

sendo oc a primeira

e sendo tão erdadeira

de minha ida o re erso

eu canto, grito e con erso

princ$pio e %im do uni erso

desta minha brincadeira

+ue a brisa mensageira

me trar" em prosa e erso

de eras o amor edado

+ue po oa a solidão

de um poeta acorrentado

aos elos deste re%rão:

diga de olta ao lugar,

ire a pala ra no meio,

na letra do b 8a8b"

mande uma carta no seio,

don"...GWG

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+uero lhe descascar

como a cana crioula;

+uero lhe descascar como a cana a criou

l 8l"8l".

amos na beira do mar,

pega no seu pé8de8 ento,

bote a ela pra oar,

oa mais +ue o pensamento,don"...

me abre a gaiola

+ue eu +uero a o".

?ibiri8Da85olha rossa,

Yé Do , 'ilusca, é:

nome de gente e de barco

nas "guas do ubaé...

^

de madrugada

ou pro 2alolé:

o samba pu7a cacha/a,

cacha/a pu7a ca%é

com %aro%a:

I%arinha %ina é de mesa,

é de mesa, é de mesa, é de mes";

%arinha %ina é de mesa...K

#" em inh" !adalenaGW3

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na Estrada de 0eric-:

soldado %oi pra no ena,

Delegado %icou s-,

4h J !e abre a cai7inha

+ue eu +uero o meu p-.

2ai7inha de bom parecer

guarda l" dentro um segredo

mas a cha e desse enredo

não h" carapina +ue saiba %a ,M don", M don ,

me mande a mucama

cat" ca%uné.

?re e dias tem meu anto,

ela de sete tostCes,

o não de todos os senCes

%ica escornado num canto,

canto:

Isub$, precioso incenso

até o trono do lt$ssimo;

incensai o glorioso ntMnio

com per%ume sua $ssimo...K

ente na pra/a, barulho,

*re%eitura na anela:

mocidade in ade unho

toda erde e amarela,

don"...

me bote uma %itaGWH

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na minha lapela.

gosto na encru ilhada

(na alha de ento %rio)sobre as "guas do meu

rio b-ia uma lua boiada...

I /o %rio de um punhal

%oi teu adeus pra mim...K

etembro e7plodiu em cores

nos tons de ardim8pomar;+ue con uga o erbo amar

da ida s- colhe %lores.

I *rima era é uma esta/ão %lorida...K

4utubro e no embro eu passo

nos preparos do Natal;

em de embro V menos mal V

de tudo +ue +uero %a/o...

I se oc tem

a %elicidade

pra oc me dar...K

0aneiro prepara a entrada

das %estas de %e ereiro;

com dinheiro ou sem dinheiro

ou er minha namorada:

...K élia, por oc me apai7onei

De mar/o o m s não tem gra/a:

é %eito de despedidas,

de promessas es+uecidasGWL

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nos bancos de minha *ra/a...

I deus, meu anto maro,

+ue desta terra ou me ausentar...K

GWX

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A) A)U%

Em lbalun V o planeta

sete luas, sete s-is%a em %esta noite e dia

(se dia pode chamar8se &+uelas noites de

prata

ou pode chamar8se noite ao ouro da+ueles

dias)

Em lbalun V o planeta

não h" maridos ni maridas

por isso não e7istem m"goas

em lbalun V o planeta

(a ida corre per%eita

com noites de sete luas

com dias de sete s-is)

Em lbalun V o planeta

h" campos de girassois

+ue são outros s-is girando

dia e noite no planeta

(e campos de giraluas

V uma %lor especial+ue s- medra em lbalun)

Dias desses trago uma

para matar tua %ome

dia desses trago uma

para matar tua sede

Dia desses te carrego

4n lbalun V the planet

se en moons, se en suns%east night and da>

(i% da> those sil er nights can be called

or the gold o% those da>s called night)

4n lbalun V the planet

there are no husbands, no Fi es

so there are no hurts

on lbalun V the planet

(li%e goes on per%ectl>

Fith nights o% se en moons

Fith da>s o% se en suns)

V

4n lbalun V the planet

%ields o% sun%loFers

are other suns turning

da> and night on the planet

(and %ields o% moon%loFers

V a singular %loFerFhich thri es on lbalun alone)

4ne o% these da>s =Qll bring one

to sate >our hunger

one o% these da>s =Qll bring one

to slaOe >our thirst

4ne o% these da>s =Qll carr> >ou aFa>GWW

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te le o para lbalun

o planeta das ertigens

das incr$ eis paisagens

do tempo dentro do ?empodas marés de sete luas

das corridas de hipocampos

dos dias de sete s-is

clepsidras e ampulhetas

madrugadas de cristal

e borboletas de prata

e gatos de %ino eludoe cães albinos

e um tudo

+ue ninguém nunca iu

Dia desses te carrego

e le o para lbalun

para te dar sete luas

para te dar sete s-is

Dia desses te carrego

e le o para lbalun

Não te chamar"s marida

nem marido te chamar"s

E nos seremos 6m

na plenitude do tempo

na eternidade da %esta

com noites de sete luas

com dias de sete s-is

=Qll taOe >ou to lbalun

the planet o% ertigos

o% Fondrous landscapes

o% time Fithin ?imeo% the tides o% se en moons

o% seahorse races

o% the da>s o% se en suns

o% FaterclocOs and hourglasses

cr>stal Fee hours

and sil er butter%lies

and cats o% the %inest el etand albino dogs

and an e er>thing

that no one ne er saF

4ne o% these da>s =Qll carr> >ou aFa>

and taOe >ou to lbalun

to gi e >ou se en moons

to gi e >ou se en suns

4ne o% these da>s =Qll carr> >ou aFa>

and taOe >ou to lbalun

=t Fill not call >ou Fi%e

nor husband Fill it call >ou

nd Fe tFo Fill be 4ne

in the plent> o% time

in the eternit> o% the %east

Fith nights o% se en moons

Fith da>s o% se en suns

GWA

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E nos dois seremos 6m

seremos apenas 6m

na unidade do "rio

do planeta de lbalun

E se acaso não e7istisse

tal lugar no 6ni erso

assim com est"s em mim

%ica lbalun no meu erso

como o princ$pio e o %im

de tudo a+uilo +ue disse

5ica8te ai, lbalun,

na gal"7ia do poeta

%ica8te a$ lbalun

(meu pobre8rico planeta)

5red ou a 2astro, 1@A@

nd Fe tFo Fill be 4ne

FeQll be ust 4ne

in the oneness o% the plent>

o% the planet o% lbalun

nd i% b> chance there did not e7ist

such a place in the 6ni erse

as >ou are in me

sta> lbalun in m> erse

as the beginning and the end

o% all this = ha e said

ta> >ou there, lbalun,

in the gala7> o% the poet

sta> there >ou lbalun

(m> poor rich planet)

?ransl. b> <alph 2ole Radde>, 1@@1)

GW@

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)ITERATURA

amba de <oda, por lbérico !otta

s IEdi/Ces !acnua$maK nos apresentam o poema I amba de <odaK, de 5rederico

0osé de ou a. 2astro, como in$cio de suas ati idades, +ue, ulgando pela estreia, trarão

sens$ el enri+uecimento ao mo imento cultural bahiano.

I amba de <odaK de 5rederico 0osé de ou a 2astro, é o poema do massap , do

cana ial de anto maro, da terra e da gente, de seus amores e de suas esperan/as.

4 poema di ide8se em H partes.

Na primeira parte I2anto ?el ricoK, o poeta ou e a in oca/ão do massap . ão ersos

calmos e precisos:

6m bisturi de lu parte ou a neblina;

e do entre leitoso do I%ogK de anto maro

nasceu a cabeleira erde do %ilho do massap .

2ana ialJ

tua gesta/ão +uadri8centen"ria

repete8se todo dia

no parto da neblinaJ

E eu escuto o teu agido

na tirana do negro suado,

no estertorar da terra comburida,

no rangir de %erros da usinaJ

E o poeta responde ao apelo da terra:

e derrama pelo massap toda a alegria +ue encerra,

no canto de amor e de saudade do escra o da terra.

4 massap %ascina o poeta: o massap +ue alimenta os homens +ue Itra em noGAB

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corpo as mesmas manchas dos gomos da canaK o massap , +ue prende e castiga, ciumento e

terr$ el, os homens rebeldes +ue pensam em %ugir...

?odo o drama do cana ial é sentido pelo poeta, em toda sua grandiosidade humana.

terra e o homem, a luta eterna entre os dois, a condi/ão l$rica resultante, constituem o

tema de I amba de <odaK.

Na segunda parte, I*erspecti aK, a esperan/a e o amor do poeta se %undem,

indissolu elmente, nestes ersos serenos e seguros:

6m dia ...

6m raio de entendimento

ai rasgar a neblina dos olhos da gente do massap J . . .

terceira parte do poema é o tema, propriamente dito, da obra. +ui 5rederico 0osé

de ou a 2astro estuda, com acentuado igor poético, as duas %or/as em luta: a terra, o

cana ial erde e dominador, de um lado, e o homem, simples e bom, do outro. Desse

cho+ue, somente os donos do massap conseguem sair ilesos.

!as desses a gente não %ala

por+ue não conhecem samba8de8roda

nem nunca iram negras, mulatas,

brancas também se rebolando no chão batido.

4 poeta descre e então o plantio da cana e todo o drama humano +ue essas tr s

pala ras encerram:

*lantar a cana,

cortar a cana,

+ueimar o terreno,

limpar o terreno,GA1

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plantar outra e ...

Dessa luta entre o massap e o po o, +ue, apenas, Iplanta dinheiroK, para os donos,

surgem a dor e o dese o de %ugir. !as, imposs$ el escapar. 4 cana ial guarda os seus %ilhos

ciumento. 4 eito é cantar:

^ o samba8de8roda;

de negros, mulatos,

brancos também,

se rebolando no chão batido

chão rubro de massapéJ

+ui 5rederico 0osé de ou a 2astro nos %ornece uma preciosa documenta/ão

%olcl-rica, transcre endo os gostosos sambas de roda, +ue, com a aguardente ali iam a alma

e o peito do homem do massap :

IEu topei seis cabras machos,

e essa %oi pe+uenininha,

um %acão de sete arrobas,

%ora o arco e a bainha,

%ora o a/o +ue ele tinha.

6ma cesta de o os,

etecentas galinhaso trem corre

por cima da linha...

e o poeta não alesse, pela seguran/a e sua técnica e pelo igor de sua mensagem, o

pes+uisador %olcl-rico tornaria I amba de <odaK um li ro til a +ual+uer estante brasileira.

!as, ale o poeta e ale o pes+uisador.

GAG

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5ilho adoti o de anto maro, onde i eu a maior parte de sua ida, 5rederico 0osé de ou a

2astro pMde sentir, nas pr-prias %onstes originais, a hist-ria do homem do cana ial, +ue ele

bem soube captar

ES assim no massap .

Entre um samba e outro

morre alguém,

nasce alguém,

alguém dei7a o massap

e ninguém mais o .

Na ltima parte de I amba de <odaK, 5rederico 0osé de ou a 2astro cristali a o seu

sentimento de amor e de esperan/a, +ue desde +ue b-s terminamos a leitura do poema,

passa a ser também nosso: I6m raio de entendimento ai rasgar a neblina dos olhos da

gente do massap K.

I amba de <odaK, en%im, ilustrado pelas belas gra uras de 2alasans Neto,

apresentando %ei/ão gr"%ica moderna e elegante, lan/a um poeta, +ue, por o em, nada

de e. I amba de <odaK, sem d ida, representa, magni%icamente, a no $ssima poesia

bahiana.

GA3

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GAH

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GAL

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GAX

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GAW

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GAA

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A%E OS SO RE SO)A%O TRI%DADE

De <oger 'astide para olano trindade2aro enbor:

De ol o8lhe, depois de os ter lido, os *oemas +ue o senhor te e a bondade de me

en iar manuscritos. 5i+uei, creia8me, muito sensibili ado com essa marca de estima, e é

sempre com pra er +ue leio os seus ersos. Não sei se o senhor sabe +ue um grupo de

o ens estudantes brasileiros e %ranceses criou em ão *aulo uma re ista, *aralelos. 6ma

parte do terceiro n mero, em elabora/ão, ser" uma homenagem & literatura a%ricana e a%ro8

americana. ei +ue um dos seus poemas até ser" publicado. 4 senhor +ue sua obra é

conhecida e apreciada por a+ueles +ue serão amanhã o %uturo deste pa$s.

!as, se o senhor me en iou seus ersos, %oi, sem d ida, por+ue dese a conhecer

minhas impressCes. Esses no os *oemas continuam a tradi/ão dos seus antigos, prolonga

uma rota +ue o senhor inaugurou no 'rasil. ?al e possam lhe repro ar certa limita/ão do

ocabul"rio e do ritmo, mas, o +ue para alguns cr$ticos é um de%eito, para outros V para os+ue eem na *oesia uma PmensagemP V ser", ao contr"rio, uma +ualidade, tornando

poss$ el uma mais r"pida compreensão dos *oemas e uma a/ão mais e%ica . 4 senhor %a dos

seus ersos uma arma, um to+ue de clarim, +ue desperta as energias, le anta os cora/Ces,

combate por um mundo melhor. uanto a mim, aprecio esses *oemas +ue reali am uma

s$ntese entre o passado e o %uturo, entre as aspira/Ces de reis proletari ados e as can/Ces do

%olclore, entre o amor moderno, a sombra das chaminés de usina, e o amor m$stico, sob o

olhar dos 4ri7"s. 2reio, de %ato, +ue o progresso não de e destruir o +ue h" de grande e l$rico

na cultura tra ida outrora da [%rica, e +ue de e tornar8se uma heran/a comum a todos.

2reia8me, sinceramente, seu amigo,

2arta de H de outubro de 1@HX.

GA@

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