Uma teoria do pensamento Livro Bion - da teoria à prática - Zimerman

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  • 7/29/2019 Uma teoria do pensamento Livro Bion - da teoria prtica - Zimerman

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    Instituto de Estudos Psicanalticos de Ribeiro Preto (IEP-RP)

    Introduo obra de Wilfred Bion (quarta-feira, 13-3-2013)

    Luiz Henrique Sampaio Junior

    Uma teoria do pensamento

    As experincias grupais fizeram com que Bion se interessasse em se aprofundar no estudo daspsicoses, por meio da linguagem e da funo dos pensamentos. Sua obra, principalmente no que concerne ao

    estudo do pensamento, demonstra ter sido ele um leitor direto das obras de Freud. Utilizou fontes como:Dois princpios do suceder psquico; Neurose e psicose; Ego e id, etc.Alm disso, utilizou-se de textos de Klein, como: O desenvolvimento da criana, que trata do

    impulso epistemoflico da criana, na luta entre o conhecimento da verdade versus o sentimento deonipotncia (ZIMERMAN, 1995, p. 88).

    Bion parte da conceituao freudiana de processo primrio e processo secundrio, compreendendo queos indivduos necessitam representar as situaes vividas para poderem, posteriormente, modific-las. Paraele, pensamento, emoes e conhecimento esto imbricados.

    Como ocorre com Freud, Bion postula que a teoria do pensamento tem como ponto de partida afrustrao das necessidades bsicas que so impostas ao lactante (ZIMERMAN, 1995, p. 89). No entanto,compreende que cada indivduo possui uma capacidade diferente de tolerar frustraes.

    Existe, na teoria bioniana, diferena entre pensamento (substantivo ou adjetivo) e funo de pensar(verbo). Para tanto, ele estabeleceu uma distino entre elementos do pensamento (elementos , ,preconcepes, onricos, etc...) e os pensamentos propriamente ditos (ZIMERMAN, 1995, p. 89).

    Desse modo, surgiram expresses que incomodavam alguns leitores, como o Pensamento sempensador [...] que se trata de um pensamento errante em busca de algum pensador para se alojar nele(BION apudZIMERMAN, 1995, p. 89). Com relao ideia de pensamento vazio [podemos sintetiz-locomo uma] pr-concepo que est a espera de uma realizao (ZIMERMAN, 1995, p. 90).

    Bion trata das realizaes, as quais consistem em experincias emocionais resultantes de frustraesda onipotncia do lactante (ZIMERMAN, 1995, p. 90). Essas podem ser positivas (quando o seio sustmsuas necessidades) ou negativas (quando o seio no o conforta, tornando-se um objeto mal). Para o autor, aprivao sempre motivo de sofrimento.

    Se o beb possui suficiente resistncia inata frustrao, a ausncia do seio torna-se umprotopensamento, desenvolvendo, ento um aparelho psquico capaz de pens-lo. Em termos freudianos: opensar est intimamente ligado ao princpio da realidade. Se ocorrer o oposto, ou seja, se a capacidade desuportar frustraes for insuficiente, o seio mau dever ser expulso, gerando uma hipertrofia da onipotnciae um excesso de identificaes projetivas, o que nos remete gnese das psicoses.

    Assim, compreendemos que as experincias negativas so inerentes e indispensveis a qualquer serhumano. [S]e o dio resultante da frustrao no for excessivo capacidade do ego do lactante em suport-lo, o resultado ser a formao do pensamento por meio de elementos . J no caso contrrio, ocorrer aformao dos elementos . Esses ltimos so muito primitivos e precisam ser descarregados seja na formade agitao motora, dos bebs, seja nos actings dos pacientes adultos.

    Bion afirma que para lidar com o excesso de identificaes projetivas deve haver uma capacidade deconteno, por parte da me, a qual ele denominou rverie [palavra francesa relacionada a devaneio,divagao, fantasia, etc.]. Na verdade, ele fala de um modelo em que continente e contido so indissociveis,em outros termos, alm da capacidade inata, necessria a interveno real da me para o desenvolvimentosaudvel da criana. Ele utiliza a sigla para representar a ideia de continente-contido.

    Bion recorre conceituao kleiniana, da passagem da posio esquizo-paranide depressiva, a qualele representa pela frmula: PS D. Menciona que a essncia da formao dos pensamentos teis dependeno s da capacidade de tolerncia s frustraes, como tambm da capacidade em suportar as depresses.

    Aps a superao da posio depressiva, os pensamentos vo sofrendo sucessivas modificaesprogressivas, passando pelas onricas, as pr-concepes, o conceito, o sistema dedutivo cientfico, atatingir o alto grau do clculo algbrico (ZIMERMAN, 1995, p. 91). Se houver xito nesse processo,

    desenvolve-se a capacidade de generalizao, abstrao e criatividade.Bion utiliza o termo funo, extrado da matemtica, como uma tentativa de explicar os fenmenospsquicos. A ideia de funo consiste basicamente na dissecao de pensamentos em diversos fatoresdeterminantes, sendo que uma funo pode interferir em outra. Assim, por exemplo, pode-se dizer que uma

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    personalidade funciona psicoticamente, devido conjugao de fatores, como os de uma inveja destrutiva,de identificaes projetivas excessivas, etc. (ZIMERMAN, 1995, p. 92).

    Durante as primeiras experincias do beb, predomina a funo . Se elas forem bem sucedidas,ocorrer a transformao das impresses sensoriais e experincias emocionais em elementos . Casocontrrio, constituiro os chamados elementos , que precisam ser evacuados e se expressam na forma decomunicaes primitivas.

    [No compreendi a passagem: Os elementos , por sua vez, sendo processados pela funo , vofuncionar para as seguintes finalidades: pensamentos onricos, pensamentos inconscientes da viglia,

    produo de sonhos, memria e funes intelectivas (ZIMERMAN, 1995, p. 92) grifos meus].Bion utiliza o termo barreira de contato, que j havia sido utilizado por Freud em Projeto de umapsicologia cientfica para designar a dinmica dos elementos . Haveria essa barreira capaz de separar oconsciente do inconsciente, o mundo externo do interno. Essa ideia se relaciona com o conceito freudiano deque o ato do sonho serve como guardio do sono. importante frisar que o termo utilizado por Freud noProjeto possui uma acepo um tanto diferente da empregada por Bion.

    Contrariamente barreira de contato, Bion prope o conceito pantalha (ou tela) , que consiste naincapacidade de realizar a separao supramencionada, devido desintegrao promovida pelos elementos .Isso se expressa, clinicamente, por meio de confuses mentais do paciente, como a no discriminao entrerealidade e fantasia, viglia e sono, consciente e inconsciente.

    Nos pacientes psicticos predomina a formao da pantalha . So incapazes de generalizar,

    conceituar, abstrair e discriminar. Em vez de snteses, realizam as denominadas sncreses, ou seja, opensamento adquire ares de onipotncia, alm de carter mgico. Predomina o chamado pensamentovazio, expresso por meio de muita angstia, sendo o seu extremo o terror sem nome, gerandocomportamentos como a salada de palavras, que consiste num excesso de palavras sem sentido ousignificao.

    Se a funo j tiver tido incio, porm, ocorrer algum tipo de ruptura nesse processo, poderacontecer o que Bion denominou reverso da funo . Nesse caso, suceder a produo de elementos (relacionados ao conceito de objetos bizarros, por se diferenciarem dos elementos originais). A expressomaior desse processo consiste na apario de distrbios psicossomticos.

    Bion postulou, contra a opinio da maioria, que o pensar que produz o pensamento (ZIMERMAN,1995, p. 94). Assim, apr-concepo, aps uma realizao positiva, forma uma concepo. Se essa mesma

    pr-concepo passa por uma realizao negativa, forma-se um pensamento. Concepes e pensamentosevoluem, numa dinmica em que ambos esto estreitamente ligados, promovendo o advento dos conceitos,da capacidade dejulgare de raciocinar.

    Bion props o modelo conhecido como Grade, que consiste em projetar, num plano cartesiano,notaes que ajudariam os psicanalistas a lidar com os pensamentos de seus pacientes. A essncia dessapreocupao relaciona-se com a necessidade da transformao da experincia emocional intolervel emalgo tolervel (ZIMERMAN, 1995, p. 95).

    A relao entre pensador e pensamento pode adquirir trs formas: a parasitria; a comensal; e asimbitica. A formaparasitria consiste na desvitalizao do pensamento novo, algo destrutivo, que se nutrede mentiras; a comensal relaciona-se vivncia do pensador sem grandes atritos com seus pensamentos, oque no impede a evoluo, porm no possibilita grandes avanos; por fim, a simbitica, representa pelaharmonia e pelo benefcio mtuo entre pensador e pensamento.

    Vale destacar que uma das funes do psicanalista consiste em ensinar o paciente a pensar comelementos (ZIMERMAN, 1995, p. 96). Essa noo de que o psicanalista, entre outras coisas, deve ensinarseus pacientes gerou um certo rebulio nas sociedades psicanalticas. No entanto, atualmente, ascontribuies de Bion so bastante aceitas, considerando-se que ele conseguiu promover inmeros avanoscom relao Psicanlise, tal como Einstein, com relao Fsica newtoniana.

    REFERNCIA:

    ZIMERMAN, D. E. Uma teoria do pensamento. In: ZIMERMAN, D. E. Bion: da teoria prtica. Porto

    Alegre: Artes Mdicas, 1995. pp. 88-98.