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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA NAS CAUSAS DE VALOR
INFERIOR A 60 SALÁRIOS-MÍNIMOS
Por: Claudia Nascimento de Amaral
Orientador
Prof. José Roberto
Rio de Janeiro
2012
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
O DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA NAS CAUSAS DE VALOR
INFERIOR A 60 SALÁRIOS-MÍNIMOS
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Processo Civil.
Por: Claudia Nascimento de Amaral
3
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, irmãos e a Pedro Silva
Santana de Lima a quem este trabalho
fica indissociável pelo incentivo,
inteligência e carinho com que
participaram na sua elaboração.
4
RESUMO
No presente trabalho, pretende-se, através da apreciação da doutrina
brasileira, bem como da jurisprudência, analisar o caráter absoluto da
competência dos Juizados Especiais Federais, especialmente, nas causas que
versem sobre prestações de trato sucessivo, bem como naquelas que tratam
de dano moral – nas quais o magistrado não está vinculado ao valor indicado
pela parte como correspondente ao dano sofrido.
Tendo como base a ratio das regras de competência dos Juizados
Especiais Federais, o presente trabalho analisará as consequências advindas
do declínio de competência, pelo juízo federal, nas causas em que a pretensão
econômica do demandante estiver no limite do valor previsto no artigo 3º, §3º
da Lei nº 10.259/01.
Nesse sentido, será analisado o prejuízo da parte demandante com o
declínio de competência e consequente remessa dos autos ao Juizado
Especial Federal.
A partir disso, far-se-á um estudo sobre a importância do contraditório
no processo civil atual, abordando a necessidade de intimação da parte autora
para que se pronuncie sobre o valor da causa indicado na petição inicial.
5
METODOLOGIA
Os métodos que conduziram à presente monografia consistiram na
leitura de livros de renomados doutrinadores brasileiros no âmbito do Dirito
Processual Civil, bem como a consulta jurisprudencial.
No desenvolvimento do estudo, as matérias tratadas em cada capítulo
foram pesquisadas e introduzidas separadamente, para, ao final da
monografia, se chegar a uma união de todo o trabalho e, por conseguinte, à
conclusão.
Por fim, foi feito um resumo do trabalho.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 07
CAPÍTULO I - A Competência no Processo Civil
13
CAPÍTULO II - O Contraditório no Processo Civil Atual
34
CAPÍTULO III – O Declínio de Competência nas Causas com Valor
Inferior à 60 Salários Mínimos
40
CONCLUSÃO 52
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
54
ÍNDICE 56
FOLHA DE AVALIAÇÃO
58
7
8
INTRODUÇÃO
Inegável é que a sociedade, bem como aqueles que militam na ciência
do Direito sempre buscaram uma tutela jurisdicional efetiva e célere. Conforme
salienta Frigini:
“O espírito que sempre norteou o legislador foi o de que a
composição das pretensões resistidas se desse de forma
mais rápida possível. E isso se percebe no dirito romano,
como bem explica MOREIRA ALVES e até bem antes.
Realmente, narra o Livro do Êxodo (Cap. 18, vers. 13/27)
que o sogro de Moisés, vendo-o, sozinho, a decidir as
querelas do populoso povo que libertara da escravidão do
Egito, admoesta-o no sentido de escolher homens
capazes de resolver pequenas demandas, reservando
para si as mais importantes. Nascia ali, por volta do
século XIII a.C., a semente de como seriam resolvidas as
causas menores.” (RONALDO FRIGINI, 2007, p. 48 e 49)
Porém, a complexidade das normas procedimentais, ou seja, as
formalidades da Justiça implicavam na longa duração dos processo e, por
conseguinte, na frustração da população em obter uma resposta judicial rápida
e adequada.
“Os Juízes cumprem os ritualismos impostos pela lei e,
com essa obediência procedimental, postergam no tempo
a solução judicial substitutiva da vingança privada.
Essa demora, cuja responsabilidade pode ser imputada
em grande parte ao cumprimento de solenidades
processuais, mercê da falta de estrutura do Judiciário,
motivou, no limiar do novo século, a "busca de uma forma
diferenciada de prestação jurisdicional", onde o Juiz
9
pudesse, mediante compreensão procedimental e
cognição sumária, atender a essa "cultura" da celeridade
"que se formou em confronto com o valor 'segurança',
solucionando o conflito em prazo breve, provendo, o
quanto possível, 'bem e depressa". (LUIZ FUX, 1997, P.
204-214).
Interessante a visão de Montesquieu sobre o assunto. Segundo o
célebre filósofo, a pesar de necessárias para a liberdade, “se examinarmos as
formalidades da justiça em relação à dificuldade que um cidadão enfrenta para
fazer com que devolvam seus bens ou para obter satisfação por um ultraje,
acharemos sem dúvida que existem formalidades demais.” (MONTESQUIEU,
1993, P. 619).
Visando simplificar as normas de processo, o legislador brasileiro
regulamentou, no Código Processual Civil de 1973, o procedimento sumário,
em que os atos processuais devem ser praticados de forma mais célere.
Além disso, ao longo dos anos foram feitas inúmeras reformas
processuais buscando uma melhor e efetiva prestação jurisdicional, não
apenas quanto à celeridade do processo, mas também quanto a necessidade
de garantir a composição da lide.
No entanto, percebeu-se que, além do excessivo formalismo imposto
pela legislação processual brasileira, o aumento demográfico gerou um
consequente aumento das demandas judiciais.
Isto porque, com o crescimentos das cidades, “o tipo de
relacionamento que se estabelece entre as pessoas, mesmo entre vizinhos, é
muito formal, impessoal e frio”. Tal fato, nas lições de Kazuo Watanabe,
dificulta a solução natural e pacífica dos conflitos de interesse, através da
conciliação entre as partes. (WATANABE, 1985, p. 273-277).
10
Ademais, o avanço tecnológico, e a consequente profusão da
informação, possibilitaram o acesso à justiça pela camada menos favorecida
da população. Esta evolução da consciência jurídica gerou não apenas um
aumento de demandas judiciais, mas também alargou a variedade de conflitos
submetidos ao Poder Judiciário. Com isso, pequenas controvérsias com
profundas repercussões sociais, que antes eram desconhecidas pelos
operadores do Direito, passaram a constar do rol das demandas propostas.
Foi neste cenário de clamor social pela garantia de acesso à Justiça,
bem como por um Poder Judiciário célere e despido de formalidades
excessivas, que em 1984 foi editada a Lei nº 7.244.
Este diploma legislativo, que dispunha sobre a criação e
funcionamento do Juizado Especial de Pequenas Causas, criou novo órgão da
Justiça ordinária, com estrutura e princípios próprios, voltados para um
julgamento rápido e eficaz das demandas a ele submetidas.
Nos termos do art. 3º da Lei nº 7.244/84, a submissão do feito ao
procedimento do Juizado de Pequenas Causas consistia em direito do autor,
não havendo qualquer imposição à propositura da ação nestes órgãos.
Sensível ao fato de que os Juizados Especial de Pequenas Causas
aproximavam a justiça do povo, atendendo ao anseio da população de ter seus
problemas solucionados – de forma pronta, eficaz e sem custos excessivos –
pelo Poder Judiciário, o constituinte, ao elaborar da Constituição Federal de
1988, fez incluir em seu art. 98, inciso I a obrigatoriedade de criação de
Juizados Especiais pelos entes federados.
“Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e
os Estados criarão:
I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou
togados e leigos, competentes para a conciliação, o
11
julgamento e a execução de causas cíveis de menor
complexidade e infrações penais de menor potencial
ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumariíssimo,
permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e
o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro
grau;”
Visando regulamentar este dispositivo constitucional, foi editada em
1995, a Lei nº 9.099, que alargou o campo de atuação dos juizados ao prever
como causas de menor complexidade aquelas cujo valor não exceda a 40
salários mínimos (na Lei nº 7.244/84 o valor era de 20 salários mínimos).
Além disso, o legislador acrescentou outras demandas ao rol de
competências dos Juizados Especiais, ao incluir nas causas de menor
complexidade demandas específicas, como por exemplo a ação de despejo
para uso próprio.
Ao dispor sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis no âmbito
da Justiça Federal, através da Lei nº 10.259/2001, o legislador optou por
restringir a competência deste órgão somente às causas cujo valor discutido
não ultrapasse aquele referente à 60 salários mínimos. Conforme salienta
Frigini:
“...devendo-se considerar a demanda em sua totalidade,
isto é, se forem feitos pedidos cumulados, será a soma de
todos eles; se mais de um for o autor, em litisconsórcio
ativo facultativo, englobam-se os pedidos de cada qual,
não sendo possível tomar-se individualmente a pretensão
para efeito do critério valorativo.” (RONALDO FRIGINI,
2007, p. 61).
12
Todavia, mister ressaltar que, uma das principais inovações trazida
pela Lei nº 10.259/01, refere-se ao caráter absoluto da competência dos
Juizados Especiais Federais nos locais onde instaladas varas deste órgão.
Os Juizados Especiais, conforme demonstrado, tem por objetivo
propiciar a obtenção de uma tutela jurisdicional célere e efetiva, inserindo-se
os referidos órgãos no contexto da acessibilidade à justiça.
A principal questão do presente estudo versa sobre o possível
equívoco da decisão declinatória da competência, pelos juízes federais a um
dos juizados especiais federais nas causas nas causas cujo valor é próximo
daquele previsto na Lei nº 10.259/2001.
Isto porque, ao declinar de sua competência a um dos Juizados
Especiais Federais, o Juízo imporia ao autor da demanda a renúncia dos
valores que este poderia auferir acima do limite de sessenta salários mínimos,
ferindo o objetivo de uma tutela jurisdicional efetiva, ensejador da criação dos
Juizados.
Esta Monografia se restringirá a analisar o caráter absoluto da
competência dos Juizados Especiais Federais, especialmente, nas causas que
versem sobre prestações de trato sucessivo, bem como naquelas que versem
sobre dano moral (nas quais o magistrado não está vinculado ao valor indicado
pela parte como correspondente ao dano sofrido).
No primeiro capítulo será feita uma análise da competência no
processo civil e da competência dos Juizados Especiais Federais.
Posteriormente, no segundo capítulo, será abordada, de modo sucinto,
a importância do contraditório no processo civil atual.
13
Finalmente, o terceiro e último capítulo irá tratar do tema específico da
monografia, onde serão feitas considerações acerca da competência cível dos
juizados especiais federais e da necessidade de intimação da parte para se
que pronuncia sobre o valor da causa antes da decisão declinatória de
competência.
A partir dos estudos realizados, bem como da análise da jurisprudência
que será feita a cada capítulo, poderemos concluir se a decisão declinatória de
competência nas causas cuja pretensão econômica estiver no limite do valor
previsto no artigo 3º, §3º da Lei nº 10259/2001 é ou não equivocada.
14
CAPÍTULO I
A COMPETÊNCIA NO PROCESSO CIVIL
1.1 – Considerações Gerais
A jurisdição, segundo Didier1, é a função atribuída a terceiro imparcial
para, mediante um processo, realizar o Direito de modo imperativo e criativo,
tutelando situações jurídicas concretamente deduzidas, em decisão
insuscetível de controle externo e com aptidão para tornar-se indiscutível pela
coisa julgada material.
Como expressão do poder estatal, a jurisdição, não obstante ser una e
indivisível, precisa de limites, dentro dos quais, o juiz pode exercer,
legitimamente, a atividade jurisdicional.
Essa limitação da função jurisdicional, que é feita de acordo com as
atribuições dos órgãos jurisdicionais, dá-se por questão de conveniência, com
a finalidade de assegurar uma distribuição da justiça mais ágil e de melhor
qualidade.
A competência define estes limites à atividade jurisdicional (divisão de
trabalho), sendo estabelecida em diversas fontes, como por exemplo, na
Constituição Federal, lei complementar, lei ordinária e regimento interno dos
tribunais.
A competência2 é exatamente a medida de jurisdição de cada órgão
que compõe o Poder Judiciário. É ela que delimita em quais casos e em
relação a quais controvérsias, o órgão jurisdicional tem o poder de emitir
1 DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil Vol. 01, 12ª Edição. Bahia: Ed. Jus Podium, 2010, página 83. 2 Importante ressaltar que a doutrina pátria, liderada por Fredie Didier Jr., entende que a competência é instituto da teoria geral do direito, não sendo, portanto, exclusivo do processo.
15
provimentos, delimitando, por conseguinte, o grupo de controvérsias que lhe
são atribuídas.
“A competência é exatamente o resultado de critérios
para distribuir entre vários órgãos as atribuições relativas
ao desempenho da jurisdição. A competência é o poder
de exercer a jurisdição nos limites estabelecidos por lei. É
o âmbito dentro do qual o juiz pode exercer a jurisdição. É
a medida da jurisdição. (DIDIER JR., Fredie. 2010 página
121)
Forçoso concluir, portanto, que a competência representa os limites
legais impostos ao exercício válido e regular do poder jurisdicional pelos
órgãos jurisdicionais. É a competência que torna legítima a atuação do órgão
jurisdicional em um processo concretamente considerado.
“A jurisdição está presente em todos os órgãos do Poder
Judiciário, tendo em vista que o juiz, com a investidura no
cargo, dotado está do poder de dizer o direito, ou seja, da
função judicante. Na medida em que a prestação
jurisdicional é um serviço público e, como tal, deve ser
realizado a contento, não obstante todas as carências, há
uma necessidade prática de divisão do trabalho e das
tarefas, a fim de otimizar ou, quando menos, viabilizar o
exercício da função como um todo. Essa razão de ordem
prática norteia, em geral, a fixação da competência dos
órgãos judiciais. Sob o prisma teórico, a jurisdição pode
ser entendida como o poder, enquanto a competência é o
exercício delimitado daquele. Tecnicamente, portanto, a
jurisdição estará sempre presente para o juiz, podendo
faltar-lhe, entretanto, a competência.” (ALUISIO
GONÇALVES DE CASTRO MENDES, 2009, p. 35).
16
1.2 – Princípios da Competência
Há dois princípios que regem a competência, seja ela jurisdicional ou
não: princípio da tipicidade da competência e princípio da indisponibilidade da
competência.
Segundo Canotilho, citado por Fredie Didier Jr., esses princípios “
compõem o conteúdo do princípio do juiz natural. O desrespeito a tais
princípios implica, consequentemente, o desrespeito ao princípio do juiz
natural.” (DIDIER JR., Fredie, 2010, página 122)
1.2.1 – Princípio da Tipicidade da Competência
Segundo este princípio, a competência precisa estar prevista
expressamente em um diploma legal.
Conforme ensina Fredie Didier, no ordenamento jurídico brasileiro, a
“distribuição da competência faz-se por meio de normas constitucionais, de leis
processuais e de organização judiciária.” Acrescenta o renomado jurista, que
há, ainda, a distribuição interna da competência feita pelos próprios tribunais
através de seus regimentos internos3.
No entanto, o STF há muito vem admitindo a existência de
competências implícitas (implied power). A título ilustrativo, transcrevo trecho
do voto proferido pelo Ministro Luiz Gallotti, quando do julgamento do Pedido
de Intervenção nº 14 – Distrito Federal, in verbis:
“Embora a competência do Supremo Tribunal seja de
ordem constitucional, porque fixada na Constituição e
inampliavel por lei ordinária, todavia, além dos casos
expressos, há alguns de competência implícita, ou por
3 DIDIER JR., Fredie. Op. Cit, página 122
17
força de compreensão, que sempre foram admitidos, pelo
método construtivo, quer no Brasil, quer nos Estados
Unidos.
Entre nós, muitas vezes reconheceu o Supremo Tribunal
essa competência implícita, em face da Carta de 1891,
quer no tocante as suas atribuições originárias, quer
relativamente às da Justiça Federal.
Quanto a estas, é de lembrar o que ocorreu com relação
ao processo e julgamento dos crimes que interessam à
administração federal (peculato, moeda falsa,
contrabando, etc.). A Constituição de 1891 não cogitara
da competência da Justiça Federal para processá-los e
julgá-los. Apesar disso, o Supremo Tribunal considerou
implícita essa competência, como decorrente da índole
do nosso sistema federativo M
E, no tocante à competência originária do Supremo
Tribunal, este a reconheceu em mais de uma hipótese
não prevista expressamente pela Constituição de 1891.”
(STF, IF nº 14, Tribunal Pleno, Julgamento 20/01/1950,
DJ de 26/01/1950, página 880, in www.stf.jus.br em
15/03/2012 às 11:02)
Segundo a Corte Suprema, nosso ordenamento jurídico não admite o
vácuo de competência, ou seja, não pode haver situação em que não haja
órgão competente para processar e decidir determinado caso concreto.
Frise-se que a competência implícita admitida pelo STF não se
confunde com a competência residual da Justiça Estadual. Isto porque, o texto
constitucional expressamente prevê que a competência da justiça estadual
será fixada na lei de organização judiciária do respectivo tribunal.
18
“No entanto, o STF admite que se reconheça a existência
de competências implícitas (implied power): quando não
houver regra expressa, algum órgão jurisdicional haverá
de ter competência para apreciar a questão. Veja o caso
dos embargos de declaração: não há regra constitucional
que preveja como competência do STF ou do STJ o
julgamento de embargos de declaração interpostos contra
as suas decisões, embora seja inegável que a atribuição
de competência para julgar determinadas causas embute,
implicitamente, a competência para julgar esse recurso.
É fundamental perceber que não há vácuo de
competência: sempre haverá um juízo competente para
processar e julgar determinada demanda. A existência de
competências implícitas é, portanto, indispensável para
garantir a completude do ordenamento jurídico.” (DIDIER
JR., Fredie, 2010, página 123)
1.2.2 – Princípio da Indisponibilidade da Competência
As regras de competência fixadas na norma legal não podem ser
transferidas para órgãos diferentes daqueles a quem a lei as atribui. Logo, é
vedado ao órgão jurisdicional alterar suas próprias regras de competência, seja
através da abdicação de sua competência, seja através da avocação de
competência atribuída a órgão jurisdicional diverso.
As regras de competência são fixadas por lei formal, estes limites da
jurisdição, portanto, somente podem ser alterados pelo próprio legislador.
Dessa forma, a indisponibilidade refere-se ao órgão jurisdicional e não ao
órgão legislativo a quem compete a fixação das regras de competência.
19
1.3 – Kompetenz Kompetenz
Princípio de origem alemã que ganha relevo, no ordenamento jurídico
pátrio, com a divisão constitucional da competência da justiça estadual e da
justiça federal.
Isto porque, ao prever taxativamente a competência da justiça federal, a
Constituição Federal impôs ao magistrado o ônus de somente conhecer a lide
após o reconhecimento de sua competência.
O princípio do Kompetenz-Kompetenz estabelece, justamente, que todo
juiz tem a competência para examinar a sua própria competência, ou seja, por
mais incompetente que o órgão jurisdicional seja, a ele sempre restará uma
competência: a de dizer se é ou não competente para o processo e julgamento
do caso concreto.
Conforme salienta Marinoni4, a competência para apreciar sua própria
competência para examinar determinada causa decorre da cláusula que
outorga ao magistrado o poder de verificar a satisfação dos pressupostos
processuais.
Tendo em vista que a competência é um dos pressupostos processuais,
é natural que o juízo ao qual distribuída a demanda tenha, ao menos, o poder
de decidir sobre sua competência para conhecer a ação.
Dessa forma, sempre que arguida a incompetência de determinado
órgão jurisdicional, prima facie, a análise da matéria será feita pelo próprio
juízo tido por incompetente.
4 MARINONI, Luiz Guilherme. Manual do Processo de Conhecimento. 3ª Edição. São Paulo? RT, 2004, página 51.
20
Nas palavras de Fredie Didier Jr. “para todo órgão jurisdicional há
sempre uma competência mínima (atômica): a competência para o controle da
própria competência.” (DIDIER JR., Fredie, 2010, página 123).
1.4 – Classificação da Competência
1.4.1 – Competência Originária e Competência
Derivada/Recursal
Originária é a competência para conhecer e julgar a causa pela primeira
vez, ou seja, é a competência para fazer o primeiro exame da causa. Ela pode
ser atribuída tanto ao juízo monocrático, que é a regra, quanto ao tribunal,
como nas hipóteses de ação rescisória.
A competência derivada é aquela atribuída ao órgão jurisdicional que
revisará decisão anteriormente proferida. Excepcionalmente, esta competência
será conferida aos juízos de primeira instância5, como por exemplo nos
embargos infringentes de alçada (art. 34 da Lei nº 6.830/80).
1.4.2 – Competência Absoluta e Competência Relativa
A competência absoluta é a regra criada para atender ao interesse
público (correto exercício da jurisdição e o bom funcionamento do Poder
Judiciário) tendo natureza cogente, ou seja, não admite qualquer flexibilização,
seja por vontade das partes, seja pela própria lei (conexão ou continência).
5 Importante ressaltar que a competência derivada nos juizados especiais é atribuída ás turmas recurais, órgãos distintos do juízo. Não é porque estas turmas são formadas por juízes que esta hipótese se amolda a exceção. A competência recursal é da turma e, portanto, adequa-se à regra geral.
21
A incompetência absoluta pode ser alegada por qualquer das partes, ou
reconhecida de ofício pelo magistrado, enquanto o processo estiver pendente6.
Além disso, esta incompetência pode alegar a incompetência absoluta por
qualquer forma, uma vez que a lei não exige uma forma preestabelecida.
A incompetência absoluta gera uma nulidade absoluta. Após o trânsito
em julgado, toma-se um vício de rescindibilidade, significando que mesmo
após esse momento processual poderá ser alegada por meio de ação
rescisória (art. 485, II, CPC).
Já a competência relativa visa atender ao interesse de uma das partes
e, por conta disso, só pode ser alegada pelo réu78 e no primeiro momento que
lhe couber falar nos autos, sob pena de preclusão. Nesta hipótese, haverá a
prorrogação da competência, ou seja, o juiz que inicialmente era incompetente
tornar-se competente.
Ademais, a norma processual exige que o réu alegue a incompetência
relativa por meio de peça processual autônoma9, trata-se de petição escrita
formal, diversa da contestação, que gera um incidente processual. Trata-se,
pois, segundo Fredie Didier Jr., de requisito processual de admissibilidade do
incidente de exceção de incompetência.
6 Nos tesmos do artigo 113, §1º do CPC, a parte que deixar de alegar a incompetência absoluta na primeira oportunidade em que lhe cabe falar nos autos arcará com as custas do retardamento. 7 Nos termos da súmula 33 do STJ, a “incompetência relativa não pode ser declarada de ofício.” 8 Segundo entendimento assente no STJ, o Ministério Público tem legitimidade para arguir a incompetência relativa em benefício de réu incapaz. “PROCESSO CIVIL. MINISTÉRIO PUBLICO. CUSTOS LEGIS. INVENTÁRIO. QUALIDADE DE PARTE. INCAPAZ. COMPETÊNCIA RELATIVA. LEGITIMIDADE DO MP PARA ARGÜIR EXCEÇÃO DE INCOMPETÊNCIA. - O Ministério Público, quando atua no processo como custos legis, o que acontece em inventário no qual haja menor interessado, tem legitimidade para argüir a incompetência relativa do juízo. Para tanto, deve demonstrar prejuízo para o incapaz. Não demonstrado o prejuízo tal legitimidade não se manifesta.” (STJ, REsp 630968, Processo nº 200400200124, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª Turma, DJ 14/05/2007, página 280 – grifos nossos) in www.stj.jus.br em 15/03/2012 às 11:10 9 Vide artigos 112, 299 e 304, todos do Código de Processo Civil.
22
No entanto, a jurisprudência do STJ é firme no sentido de que é possível
alegar incompetência relativa no bojo da contestação, desde que não cause
prejuízo ao autor10.
Além disso, as regras de competência relativa têm natureza dispositiva,
podendo ser alteradas por conexão ou continência, bem como pela vontade
das partes. Esta modificação pode ocorrer de maneira tácita (por exemplo: não
oposição da exceção de incompetência) ou expressa (por exemplo: foro de
eleição ou cláusula de escolha de foro ou foro contratual11).
Frise-se que a incompetência, qualquer que seja ela, absoluta ou
relativa, não gera extinção do processo. O reconhecimento da incompetência
leva à remessa dos autos ao juízo competente, nos termos do art. 113, §2º do
CPC.
“...Melhor, portanto, compreender a competência como
pressuposto para a apreciação do mérito pelo juiz, não
gerando, entretanto, a sua falta a extinção do processo,
mas, sim, a decisão interlocutória de remeter os autos ao
órgão competente.” (ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO
MENDES, 2009, p. 36).
10 “PROCESSO CIVIL. INCOMPETÊNCIA RELATIVA. ARGÜIÇÃO EM PRELIMINAR NA CONTESTAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO. I - Não obstante seja a exceção, oposta por meio de peça processual autônoma, o meio correto de se argüir a incompetência relativa, constitui mera irregularidade a sua alegação como preliminar da contestação, devendo ser observado o princípio da instrumentalidade do processo, se a finalidade essencial do ato foi atingida e não houve prejuízo à defesa da parte contrária. II - O artigo 100, I, do Código de Processo Civil, cuja inconstitucionalidade é argüida, não foi a norma aplicada na definição da competência, mas sim a regra disposta no caput do artigo 94 do mesmo Código. Recurso não conhecido, com ressalvas quanto à terminologia.” (STJ, REsp 169176, Processo nº 299800225846, Rel. Min. Castro Filho, 2ª Seção, DJ 12/08/2003, página 185 – grifos nossos) in www.stj.jus.br em 15/03/2012 às 11:22 11 Ao celebrar um negócio jurídico, as partes podem escolher onde as causas relacionadas àquele negócio terão de tramitar (foro). Nos termos do art. 112, parágrafo único do CPC, em qualquer contrato de adesão pode o juiz, de ofício, anular a cláusula de eleição de foro e remeter o processo de ofício ao domicílio do réu. Contudo, este declínio deve ocorrer no primeiro em que lhe couber falar nos autos, sob pena de preclusão, nos termos do art. 114 do diploma processual civil.
23
Porém, na hipótese de incompetência absoluta, seu reconhecimento
gerará, ainda, a anulação dos atos decisório praticados pelo juízo
incompetente.
1.5 – Distribuição da Competência
A primeira grande distribuição da competência no ordenamento jurídico
brasileiro é feita pelo texto constitucional.
A Constituição Federal de 1988 criou cinco grandes organizações de
órgãos jurisdicionais: Justiça Federal, Justiça dos Estados, Justiça do
Trabalho, Justiça Militar, e Justiça Eleitoral
O constituinte estabeleceu taxativamente a competência da justiça
federal, da justiça do trabalho, da justiça militar e da justiça eleitoral, sendo a
competência da justiça estadual residual, ou seja, tudo aquilo que não estiver
previsto no texto constitucional como competência de qualquer daqueles
órgãos jurisdicionais será da competência da justiça estadual.
Importante salientar que, não obstante sejam administradas pela União,
a justiça do trabalho, a justiça militar e a justiça eleitoral não compõe a Justiça
Federal, sendo consideradas justiças especializadas.
A justiça estadual e a justiça federal são consideras justiças comuns,
uma vez que a ela compete o processo e julgamento de uma generalidade de
causas.
Feita a distribuição pela Constituição, há uma nova etapa da distribuição
da competência, ora por lei federal, ora por lei estadual, cuidando, obviamente,
da justiça dos estados. Há, ainda, as Constituições estaduais, que organizam
as jurisdições em cada Estado, portanto, distribuem competência também.
24
Frise-se que os regimentos internos dos tribunais, não obstante não
criar competência para o tribunal, distribuem a competência já atribuída ao
tribunal pelo ordenamento jurídico e a distribui internamente, entre os órgãos
do tribunal12.
Distribuída a competência pela legislação saberemos qual os juízos que
teoricamente podem julgar a causa, mas para saber o juízo competente para o
processo e julgamento de um caso concreto é necessário concretizar a
competência.
Logo, somente através dos critérios de determinação da competência
será possível saber qual, dentre todos os juízos prima facie competentes, tem
efetivamente competência para processar e julga o feito.
1.6 – Critérios para Determinação da Competência
Estes critérios tem por objetivo identificar o juízo competente para
conhecer, processar e julgar o caso concreto. São este critério que deverão ser
observados no momento da concretização da jurisdição.
“Chiovenda estabeleceu os critérios de determinação da
competência em três grupos: a)objetivo, englobando o
valor da causa, sua natureza (competência por matéria) e
a qualidade das pessoas litigantes; b) funcional, em
consideração às funções que se chama o magistrado a
exercer no processo; c) territorial, relacionado com a área
geográfica atribuída a cada órgão judicial.” (ALUISIO
GONÇALVES DE CASTRO MENDES, 2009, p. 37)
12 Importante observação deve ser feita acerca do regimento interno do STF. O texto constitucional de 1969 dava ao STF competência para legislar sobre os processos que nele seriam processados e julgados. Neste cenário foi editado o Regimento Interno de 1980, que segundo entendimento à época era lei. Com o advento da atual Carta Magna, a regra prevista na de 1969 deixou de existir, mas os ministros do STF continuam entendendo que o seu Regimento Interno tem natureza de lei.
25
1.6.1 – Critérios Objetivos
Levam em consideração os elementos da demanda (partes, pedido e
causa de pedir) posto em juízo como dado relevante para a determinação da
competência.
1.6.1.1 – Em Razão da Pessoa
Regra de competência absoluta que leva em consideração a qualidade
da pessoa para fixação da competência. É o que acontece com boa parte das
regras de competência da Justiça Federal. Presente um ente federal em juízo,
a justiça federal é competente.
Esse é o ensinamento trazido por Aluisio Mendes, que ao explicar a
competência em razão da pessoa, assim estabelece:
“No concernente ao critério objetivo, Chiovenda destacou
a competência em razão M da qualidade das pessoas
litigantes... levando em conta a realidade italiana da
época, afirmou que 'já teve grande importância na
formação de jurisdições especiais (privilegiadas); mas
hoje, por si só, não influe mais na competência do juiz,
salvo em casos excepcionalíssimos'. Por sua vez, no
Brasil, a competência ratione personae é de grande
importância, sendo o principal e tradicional critério para a
fixação da competência da Justiça Federal, além de se
fazer também sentir na Justiça dos Estados, diante das
Varas de Fazenda Pública. Certo é, no entanto, que o
Código de Processo Civil de 1973 deixou de elencar, no
26
seu bojo, a competência em razão da pessoa. Entretanto,
a falta não é relevante para a exclusão do critério...”
(ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES, 2009, p.
38)
Conforme salientado pelo eminente jurista, o principal exemplo desta
competência é a criação de varas especializadas, por norma de organização
judiciária, para julgar demandas envolvendo a Fazenda Pública. Nesta
hipótese, todavia, somente a fixação da competência do foro é que será
relevante, não sendo influenciada pela existência de vara especializada para o
processo e julgamento das demandas contra a Fazenda Pública.
“ Súmula 206 – A existência de vara privativa, instituída
por lei estadual, não altera a competência territorial
resultante das leis de processo.” (in www.stj.jus.br em
15/03/2012 às 16:54)
1.6.1.2 – Em Razão da Matéria
Regra de competência absoluta determinada em virtude da natureza da
relação jurídica de direito material posta em Juízo.
“Assim, é a causa de pedir, que contém a afirmação do
direito discutido, o dado a ser levado em consideração
para a identificação do juízo competente. É com base
neste critério que as varas de família, cível, penal etc. são
criadas.” (FREDIE DIDIER JR., 2010, página 139)
As normas de competência em razão da matéria estão previstas não
apenas nas normas de organização judiciária, como faz previsão o art. 91 do
CPC, mas também na Constituição da República e nas leis estaduais.
27
Quando prevista no Código de Organização Judiciária, determinarão a
competência do juízo, com a criação, por exemplo, de varas especializadas13,
com o escopo de especializar o trabalho do Juiz e serventuário da Justiça para
melhor prestação jurisdicional.
1.6.1.3 – Em Razão do Valor da Causa
O valor da causa é definido a partir do valor do pedido. Ante o disposto
no art. 111 do CPC, estre critério de definição da competência é regra relativa
que, portanto, admite modificação.
Este critério de definição da competência tem como um dos seus
exemplos mais relevantes a fixação da competência dos juizados especiais
cíveis. No entanto, segundo salienta Fredie Didier Jr. a questão gera
controvérsias.
“O art. 111 do CPC permite a modificação da competência
em razão do valor da causa. Seria portanto, um exemplo
de competência relativa. É por isso que o sujeito pode
optar por demandar ou não perante o Juizado Especial
Cível, no caso de uma demanda cujo valor é inferior ao do
teto dos Juizados Especiais.
No entanto, a questão não é tão simples.
A competência dos Juizados Especiais Federais, onde
houver, é absoluta (art. 3º, § 3º da Lei Federal n.
10.259/2001). O mesmo ocorre com os Juizados
Especiais Estaduais da Fazenda Pública (art. 2º, § 4º da
13 A guisa de esclarecimento, a vara especializada não modifica a regra de competência de foro.
28
Çeo n. 12.153/2009). Cria-se, pois, uma regra de
competência em razão do valor da causa que é absoluta.
Do mesmo modo, quando há competência em razão do
valor da causa, o juízo é absolutamente incompetente
para conhecer das causas que extrapolem o limite
estabelecido.” (FREDIE DIDIER JR., 2010, página 139)
1.6.2 – Critério Funcional
Segundo Didier, a competência funcional “relaciona-se com a
distribuição das funções que devem ser exercidas em um mesmo processo.”
Esta regra leva em consideração os atos endoprocessuais, ou seja, aspectos
relacionados às atribuições exercidas pelo juiz ao longo da marcha processual.
Dessa forma, para se determinar o juízo competente para a prática de
determinado ato, basta analisar função já exercida no processo por
determinado órgão.
“Explicando o que seria o critério funcional, Chiovenda
afirmou que 'extrai-se da natureza especial e das
exigências especiais das funções que se chama o
magistrado a exercer num processo. Tais funções podem
repartir-se entre diversos órgãos na mesma causa (assim,
há juízes de primeiro gráu e segundo gráu, juízes da
cognição, juízes da execução), ou devem confiar-se ao
juiz de dado território, em vista, exatamente, de suas
exigências, abrindo lugar a uma competência em que o
elemento funcional concorre com o territorial.” (ALUISIO
GONÇALVES DE CASTRO MENDES, 2009, p. 39)
29
A competência funcional é absoluta e costuma ser dividida pela doutrina
clássica em competência funcional vertical e competência funcional
horizontal14. Na competência funcional vertical a divisão de competência se dá
entre duas instâncias diferentes. É o que acontece, por exemplo, com a
competência originária e derivada. Já na competência funcional horizontal o
legislador redistribui as funções, sem que haja mudança de instância. O
exemplo mais claro desta divisão de funções se dá no processo penal. Na
hipótese de competência do tribunal do júri, cabe ao juiz pronunciar e ao júri
condenar. Se o júri condena, volta para o juiz dosar a pena.
No entanto, segundo o entendimento majoritário da doutrina a
competência funcional é classificada da seguinte forma15:
1.6.2.1 – Quanto às Fases do Procedimento
Consiste na fixação da competência para a prática de atos que se
sucedem ao longo do mesmo processo, quando o procedimento mediante o
qual se desenvolve é distribuído em fases significativamente distintas.
Dessa forma, se no curso do processo a prática de determinado ato em
comarca diversa for necessária, não terá o juízo para o qual distribuído o
processo competência para determinar a realização daquele ato, devendo o
mesmo determinar o deslocamento dos autos ou a expedição, por exemplo, de
carta precatória.
Assim, pode acontecer de numa mesma fase do procedimento haver
mais de um juiz competente, mas não para a prática do mesmo ato.
14 Vide art. 93 do Código de Processo Civil 15 “Vicente Greco Filho sistematizou muito bem a competência funcional, que pode ser: a) por graus de jurisdição (originária ou recursal); b) por fases do processo (cognição e execução, p.ex); c) por objeto do juízo: uniformização de jurisprudência (art. 476 do CPC, declaração de inconstitucionalidade em tribunal (art. 480 do CPC) etc.” (FREDIE DIDIER JR., 2010, página 140/141)
30
1.6.2.2 – Por Grau de Jurisdição
Divide-se em Competência Funcional Recursal e Competência
Funcional Originária. Nesta, a lei escolhe determinados órgãos jurisdicionais
para conhecer e julgar a demanda originariamente, podendo ser tanto o juízo
singular quanto os Tribunais. Naquela, há uma competência hierárquica,
existindo um órgão revisor da decisão prolatada pelo órgão originário.
1.6.2.3 – Pelo Objeto do Juízo
Ocorre quando participam para a elaboração de uma mesma decisão
dois diferentes órgãos jurisdicionais. (p.ex: Incidente de uniformização de
jurisprudência e declaração incidental de inconstitucionalidade).
1.6.3 – Critério Territorial
Regra que determina em que unidade territorial a demanda deve ser
processada e julgada, ou seja, trata-se de critério distribuidor da competência
em razão do lugar.
A fixação deste critério pela legislação pátria é ampla e específica.
Entretanto, o presente trabalho não tem por escopo a análise da competência
territorial dos juizados especiais federais, razão pela qual apenas lançamos o
conceito geral da competência territorial, afim de não escapar do foco central
de estudo.
1.7 – Concretização da Jurisdição
É o “caminho” a ser percorrido para determinar o juízo competente.
Diante de um caso concreto e na busca do órgão jurisdicional competente para
31
o julgamento da demanda, o operador de direito deve buscar a fixação de
competência.
“O princípio do juiz natural estabelece que a demanda
seja formulada sempre perante um julgador cuja
competência foi abstratamente fixada, em geral por regra
legal prévia.” (ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO
MENDES, 2009, p. 41)
Primeiramente, deve-se identificar se o juízo brasileiro é competente
para o processo e julgamento da causa. Tratando-se de competência interna,
cabe indagar se a causa se enquadra em uma das hipóteses de competência
originária dos Tribunais de Superposição, nos termos dos artigos 102 e 105,
ambos da Constituição Federal de 1988.
Não sendo hipótese de competência originária do STJ ou do STF, o
operador do Direito deve analisar se o processo é da competência da justiça
especial (Justiça do Trabalho, Justiça Militar ou Justiça Eleitoral) ou da justiça
comum (Justiça Estadual e Justiça Federal).
Em sendo competente a justiça comum, devem ser observadas as
disposições dos artigos 108 e 109 da Carta Magna, que fixam a competência
da justiça federal. Isto porque, conforme anteriormente salientado, a
competência da justiça estadual é residual, ou seja, somente será competente
a justiça estadual quando a hipótese não se amoldar aos dispositivos legais
supracitados.
Descoberta a justiça competente, deve-se verificar se o processo é de
competência originária do Tribunal respectivo (Tribunal Regional Federal ou
Tribunal de Justiça) ou do primeiro grau de jurisdição.
32
Sendo de competência do primeiro grau de jurisdição, faz-se
necessário determinar a competência do foro.
Foro é o local onde o juiz exerce as suas funções; é a unidade territorial
sobre a qual se exerce o poder jurisdicional (lembre-se que o Estado é
soberania de um povo sobre dado território). Na Justiça Estadual cada
comarca representa um foro, enquanto na Justiça Federal cada seção
judiciária representa um foro. Determinado o foro competente, a tarefa do
operador poderá ter chegado ao final.
Haverá hipóteses, entretanto, em que no mesmo local, conforme as leis
de organização judiciária podem funcionar vários juízes com atribuições iguais
ou diversas. Dessa forma, ainda deverá ser definido juízo competente (que é a
vara, o cartório, a unidade administrativa).
Nestes casos, a definição da competência observará no mais das
vezes as Leis de Organização Judiciária (responsáveis pela criação de varas
especializadas em razão da matéria e da pessoa); o Código de Processo Civil
(definição de qual juízo é competente quando duas ações são conexas e
tramitam no mesmo foro - art. 106, CPC); ou, ainda, os critérios de distribuição
abstratamente fixados, nos termos do art. 251 e 252 CPC16.
Concretizada a jurisdição, com a propositura da ação17, ocorrerá a
Perpetuatio Jurisdicionis (art. 87 do CPC). Assim, posteriores modificações no
estado de fato ou de direito da causa pendente não alterarão a competência
(Súmula 58 do STJ).
16 Onde houver mais de um juiz ou escrivão abstratamente competentes, os processos deverão ser sorteados entre todos, de forma alternada e de acordo com o princípio da igualdade. Com isso, conforme salienta Fredie Didier Jr. “fixa-se a competência concreta do juízo, transformando a 'competência cumulativa de todos em competência exclusiva de só um dentre todos.' (DIDIER JR., Fredie, 2010, página 126)
33
Todavia, conforme o ensinamento de Fredie Didier Jr., há exceções à
regra da perpetuação da jurisdiição.
“Excepcionam-se os seguintes casos: a) Supressão do
órgão judiciário – por exemplo, a extinção de uma vara
cível; b) Alteração superveniente da competência em
razão da matéria ou da hierarquia – porque são espécies
de competência absoluta, fixadas em função do interesse
público, motivo pelo qual outras modalidades de
competência absoluta devem estar aí abrangidas
(máxime, a territorial absoluta do art. 95 do CPC).
Frise-se que a interpretação da segunda das ressalvas
previstas em lei (parte final do art. 87) deve ser
sistemática e extensiva, pois a todas as luzes, o
legislador, ao restringir as exceções à 'competência em
razão da matéria ou hierarquia', quis referir-se, em
verdade, a todas as modalidades de competência
absoluta, cometendo a mesma gafe dos arts. 102 e 111
do CPC.” (DIDIER JR., Fredie, 2010, página 124)
1.8 – Conflito de Competência
Consiste em um incidente processual de competência originária de um
tribunal que tem por objeto um conflito entre dois ou mais juízos18 sobre a
competência para julgar determinada causa.
17 Nas comarcas de juízo único, considera-se proposta a ação quando a petição for despachada pelo juiz. Havendo mais de uma vara competente, a propositura da ação dá-se com a distribuição (art. 263 CPC). 18 Note que o conflito pode se dar entre juízes, ou seja, juiz contra juiz; entre juiz e tribunal a que não esteja vinculado; e entre tribunais, desde que não haja relacionamento hierárquico entre eles. Frise-se que o STF nunca é sujeito de um conflito porque o que ele disser prevalece sobre a manifestação dos demais órgão do Poder Judiciário.
34
Dessa forma, somente haverá conflito de competência enquanto o
processo estiver pendente de julgamento. Nesse sentido o enunciado da
Súmula 59, do STJ: “Não há conflito de competência se já existe sentença com
trânsito em julgado proferido por um dos juízos conflitantes”.
O conflito de competência pode ser positivo – quando ambos os juízos
se considerarem competentes para processo e julgamento do feito – ou
negativo – aquele em que ambos se afirmam incompetentes para julgar o
processo.
O conflito de competência pode ser suscitado por qualquer dos juízos
conflitantes, pelas partes19 e também pelo Ministério Público. Importante
ressaltar que se o Parquet não suscitar o conflito, será obrigatória sua
intervenção no processo na qualidade de custos legis.
19 “A parte que ofereceu exceção de incompetência não pode suscitar o conflito, pois já teve a oportunidade de manifestar-se sobre a competência e optou por argüir a exceção (art. 117 do CPC). O objetivo da lei, segundo Athos Gusmão Carneiro, foi impedir que a parte utilizasse, simultaneamente, ambos os meios de controle da competência. Entende o autor que é possível o uso sucessivo desses mecanismos de controle da competência. É possível, por exemplo, que, após a exceção de incompetência, surja o conflito: o juízo que recebeu a causa em razão da declinação pode negar a sua competência, não a aceitando.” (FREDIE DIDIER JR., 2010, página 169)
35
CAPÍTULO II
O CONTADITÓRIO NO PROCESSO CIVIL ATUAL
2.1 – Princípio do Contraditório
Há uma tendência muito clara de que a atividade estatal que afete o
interesse de alguém – seja administrativa ou jurisdicional – tem que se realizar
através do contraditório.
Esta tendência fez com que a Constituição Federal de 1988, elevasse
o princípio do contraditório à direito fundamental, garantindo “aos litigantes, em
processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral ... o contraditório
e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” 20.
O princípio do contraditório tem duas dimensões: formal e substancial.
Em sua dimensão formal, o princípio do contraditório é aquele que garante a
todos o direito de participar do processo que lhe diga respeito, que possa
afetar o seu interesse. Ou seja, o Estado não pode agir contra alguém sem lhe
dar o direito de participar do processo.
No entanto, não é qualquer contraditório que é garantido. Segundo a
dimensão substancial do contraditório, a participação da parte no processo
deve ser apta a influenciar o conteúdo da decisão. A dimensão substancial do
contraditório é o poder de intervir, de influenciar no convencimento do juiz.
A participação no processo, que é garantida pelo aspecto formal, tem
que ser uma participação apta, ao menos teoricamente, a influenciar naquilo
que o juiz vai dizer.
20 Vide art. 5º, LV da Constituição Federal de 1988.
36
Logo, é preciso que se dê ao sujeito os instrumentos para que possa
exercer amplamente a sua defesa, que é reforço de poder processual para
poder convencer o juiz das suas afirmações.
Possível afirmar, portanto, que o direito de produzir provas em juízo,
bem como o direito a ampla defesa, nada mais são do que consequências da
dimensão substancial do contraditório porque de nada adiantaria um
contraditório meramente formal, sem dar à parte o poder de interferir na
decisão.
Conclui-se, dessa forma, que o contraditório tem que ser formalmente
devido (de participar) e substancialmente devido (dar à parte a oportunidade
de influenciar).
2.2 – Princípio da Boa-Fé Processual
“O princípio do devido processo legal, que lastreia todo o
leque de garantias constitucionais voltadas para a
efetividade dos processos jurisdicionais e administrativos,
assegura que todo julgamento seja realizado com a
observância das regras procedimentais previamente
estabelecidas, e, além disso, representa uma exigência
de fair trial, no sentido de garantir a participação
equânime, justa, leal, enfim, sempre imbuída pela boa-fé
e pela ética dos sujeitos processuais.
A máxima do fair trial é uma das faces do princípio do
devido processo legal positivado na Constituição de 1988,
a qual assegura um modelo garantista de jurisdição,
voltado para a proteção efetiva dos direitos individuais e
coletivos, e que depende, para seu pleno funcionamento
da boa-fé e lealdade dos sujeitos que dele participam,
condição indispensável para a correção e legitimidade do
37
conjunto de atos, relações e processos jurisdicionais e
administrativos.” (Trecho do Voto do Min. Gilmar Mendes
no Julgamento do AI 529733. STJ, AI 529733/RS, Rel.
Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, DJ 01/12/2006, página 97)
O diálogo processual, garantido pelo contraditório é iluminado pelo
princípio da boa-fé processual, que impõe o comportamento ético das partes.
A boa-fé aparece nos livros, ora como princípio, ora como norma que
impõe condutas, criando direitos e deveres (boa-fé objetiva), ora como fato,
como elemento psíquico (boa-fé subjetiva).
Quando a doutrina se refere à boa-fé como princípio fala-se na
chamada boa-fé objetiva, ou seja, como norma que impõe condutas leais à
todos aqueles que de qualquer forma participam do processo.
O princípio da boa-fé impõe que o comportamento seja ético, que ele
esteja em conformidade com a boa-fé e não a vontade de quem pratica o ato.
Dessa forma, ainda que a parte esteja bem intencionada, caso se comporte
contra a boa-fé objetiva, o comportamento será ilícito e, portanto, deve ser
reprimido.
“Não se pode confundir o princípio (norma) da boa-fé com
a exigência de boa-fé (elemento subjetivo) para a
configuração de alguns atos ilícitos processuais, como o
manifesto propósito protelatório, apto a permitir a
antecipação dos efeitos da tutela prevista no inciso II do
art. 273 do CPC. A boa-fé objetiva subjetiva é elemento
do suporte fático de alguns fatos jurídicos; é fato,
portanto. A boa-fé objetiva é norma de conduta: impõe e
proíbe condutas, além de criar situações jurídicas ativas e
passivas. Não existe princípio da boa-fé subjetiva. O
38
inciso II do art. 14 do CPC brasileiro não está relacionado
à boa-fé subjetiva, à intenção do sujeito do processo:
trata-se de norma que impõe condutas em conformidade
com a boa-fé objetivamente considerada,
independentemente da existência de boas ou más
intenções.” (DIDIER JR., Fredie, 2010, página 62)
Conforme salienta Fredie Didier Jr, uma das consequências da
aplicação do princípio da boa-fé no processo é a vedação do abuso do direito.
O exercício abusivo caracteriza-se pelo uso anormal ou anti-funcional do
direito, independentemente do interesse de prejudicar alguém. Em outras
palavras, no abuso de direito não há desafio à legalidade estrita de uma regra,
porém à sua própria legitimidade, posto vulnerado o princípio que fundamenta
e lhe concede sustentação sistemática. A ilicitude consiste na violação da
norma pela conduta humana, inferida por um juízo de valor.
Ademais, o princípio da boa-fé veda o comportamento contraditório
(venire contra factum proprium). Esta vedação obsta que alguém possa
contradizer o seu próprio comportamento, após ter produzido, em outra
pessoa, uma determinada expectativa. É, pois, a proibição da inesperada
mudança de comportamento (vedação da incoerência), contradizendo uma
conduta anterior adotada pela mesma pessoa, frustrando as expectativas de
terceiros.
Outro fator de preservação da confiança alheia advindo da boa-fé
objetiva, é a supressio (verwirkung). A supressio é o fenômeno da perda de
determinada faculdade jurídica pelo decurso do tempo, que não se submete a
prazos rígidos. Na supressio as expectativas são projetadas pela injustificada
inércia do titular, somada a existência de indícios objetivos de que o direito não
mais seria exercido.
39
“Além dessas concretizações, o princípio da boa-fé impõe
deveres de cooperação entre os sujeitos do processo. A
importância desses deveres é, atualmente, tão grande,
que convém separar o seu estudo, dando-lhe um item
próprio adiante.” (DIDIER JR., Fredie, 2010, página 65)
2.3 – Princípio da Cooperação
A boa-fé que ilumina o contraditório gerou o chamado dever de
cooperação. As partes e o juiz têm de cooperar entre si, como se fosse uma
comunidade de trabalho, para que o processo chegue ao resultado mais justo
possível.
Nas palavras de Fredie Didier Jr, o “princípio da cooperação define o
modo como o processo civil deve estruturar-se no direito brasileiro.” É este
princípio que torna devido os comportamentos necessários à obtenção de um
processo justo e leal.
O princípio da cooperação gera para o juiz três deveres: de
esclarecimento, de consulta e de proteção/ prevenção.
Quanto ao dever de esclarecimento, o juiz tem a obrigação de
esclarecer os seus posicionamentos às partes e de pedir esclarecimento a elas
quanto às suas manifestações.
Além disso, tem o juiz o dever de consultar as partes sobre ponto de
fato ou de direito sobre o qual elas ainda não puderam se manifestar. Esse
dever tem a ver com o princípio do contraditório porque se o juiz se manifesta
sobre uma questão sobre a qual não se pronunciaram as partes, ele não teve a
oportunidade de ser influenciado em sentido contrário, de ser convencido de
que estava errado, de que a solução não era aquela.
40
Segundo Fredie Didier Jr., mesmo em relação às questões que o juiz
pode conhecer de ofício, deve ser assegurada à parte a possibilidade de
influenciar na decisão do magistrado.
Isto porque, a matéria cognocível ex officio pelo juiz é aquela que pode
ele dela conhecer sem consultar as partes. No entanto, ressalta o eminente
jurista, conhecer de ofício é conhecer do tema sem que ninguém o provoque, o
que não significa dizer que a decisão deve ser proferida sem prévia
manifestação das partes sobre o assunto.
Por fim, o juiz tem o dever de, constatada alguma irregularidade
processual, apontar o defeito processual e dizer como ele pode ser corrigido.
Assim o juiz – ao perceber que o processo tem algum defeito,
irregularidade – tem o dever, inerente à cooperação, de apontar onde está o
defeito e dizer como o defeito será corrigido. Se o juiz é o condutor do
processo e percebe que tem um defeito que vai comprometer a validade do
processo, ele tem que indicá-lo. Trata-se, segundo a nomenclatura de Fredie
Didier Jr, do chamado dever de prevenção, variante do dever de proteção.
“ No direito brasileiro, esse dever de prevenção está
concretizado, por exemplo, no art. 284 do CPC, que
garante ao demandante o direito de emendar a petição
inicial, se o magistrado considerar que lhe falta algum
requisito; não é permitido o indeferimento da petição
inicial sem que se dê a oportunidade de correção do
defeito. Não cumprindo o autor a diligência que lhe fora
ordenada, a petição inicial será indeferida (art. 295, VI,
CPC” (DIDIER JR., Fredie, 2010, página 82)
41
CAPÍTULO III
O DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA NAS CAUSAS COM
VALOR INFERIOR À 60 SALÁRIOS MÍNIMOS
3.1 – Competência Cível do Juizado Especial Federal
Nos termos do art. 98, I da Constituição Federal de 1988, os juizados
especiais são “competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de
causas cíveis de menor complexidade”.
“As leis 9.099 é 10.259 consumaram a previsão
constitucional, adotando critérios objetivos, como o valor é
a natureza da causa ou do procedimento, é subjetivos,
como a qualidade das partes, firmando uma concepção,
mesclada de pequena causa é menor complexidade, para
a criação de uma nova justiça é de um novo procedimento
sumaríssimo, informados pela simplicidade, oralidade,
economia processual, informalidade é celeridade, na
busca da ampliação do acesso a justiça é da efetividade
do direito processual.” (ALUISIO GONÇALVES DE
CASTRO MENDES, 2009, p. 196)
Os Juizados Especiais no âmbito da Justiça Federal, objeto de estudo
do presente trabalho, foram instituídos pela Lei nº 10.259/2001. Ao contrário
da diretriz adotada pela Lei nº 9.099/95 – que dispõe sobre os juizados
especiais no âmbito da justiça estadual – a lei dos juizados especiais federais
estabeleceu o caráter absoluto da competência destes órgãos judiciais21.
21 Vide art. 3º, § 3º da Lei 10.259/01, in verbis: “§ 3o No foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta.” Importante ressaltar que o acesso ao juizado especial será facultativo, no entanto, nos locais em que ainda não tiver sido instalado referido órgão judicial.
42
Conforme salienta Aluisio Gonçalves, a Lei nº 10.259/2001
estabeleceu a combinação de três parâmetros para a fixação da competência
dos juizados especiais federais: o valor da causa (art. 3º, caput); a matéria ou
procedimento (art. 3º, § 1o); e, a qualidade da parte (art. 6º).
“Art. 3o Compete ao Juizado Especial Federal Cível
processar, conciliar e julgar causas de competência da
Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos,
bem como executar as suas sentenças.
§ 1o Não se incluem na competência do Juizado Especial
Cível as causas:
I - referidas no art. 109, incisos II, III e XI, da Constituição
Federal, as ações de mandado de segurança, de
desapropriação, de divisão e demarcação, populares,
execuções fiscais e por improbidade administrativa e as
demandas sobre direitos ou interesses difusos, coletivos
ou individuais homogêneos;
II - sobre bens imóveis da União, autarquias e fundações
públicas federais;
III - para a anulação ou cancelamento de ato
administrativo federal, salvo o de natureza previdenciária
e o de lançamento fiscal;
IV - que tenham como objeto a impugnação da pena de
demissão imposta a servidores públicos civis ou de
sanções disciplinares aplicadas a militares.”
“Art. 6o Podem ser partes no Juizado Especial Federal
Cível:
I – como autores, as pessoas físicas e as microempresas
e empresas de pequeno porte, assim definidas na Lei no
9.317, de 5 de dezembro de 1996;
II – como rés, a União, autarquias, fundações e empresas
públicas federais.”
43
Observa-se, portanto, que excluídas as hipóteses arroladas no art. 3º,
§1º da lei dos juizados especiais federais22 e figurando como sujeito
processual qualquer das partes previstas no art. 6º da referida lei2324, será da
competência do referido juizado as causas – da competência da justiça
federal25 – com valor de até 60 salários mínimos26.
Importante ressaltar que, nas palavras de Ronaldo Frigini, “o valor do
bem da vida é o norte absoluto para o estabelecimento da competência”27. Isto
porque, não há demandas especificas que, independentemente do seu valor,
devam ser propostas necessariamente perante o juizado especial federal.
O valor da causa deve corresponder ou, ao menos aproximar-se, do
real proveito econômico pretendido pela parte autora, razão pela qual deve o
demandante atentar para os exatos termos de seu pedido.
A fixação do valor da causa ocorre no momento da propositura da
demanda, correspondendo, nos termos do art. 259 do Código de Processo
Civil, a soma do principal, da pena e dos juros vencidos até a propositura da
ação, na ação de cobrança de dívida; a quantia correspondente à soma dos
valores dos pedidos formulados, na hipótese de cumulação de pedidos; ao
22 De acordo com o Enunciado 09 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais: “Além das exceções constantes do § 1º do artigo 3º da Lei n. 10.259, não se incluem na competência dos Juizados Especiais Federais, os procedimentos especiais previstos no Código de Processo Civil, salvo quando possível a adequação ao rito da Lei n. 10.259/2001.” in www.ajufe.org.br em 18/03/2012 as 13:55. 23 De acordo com o Enunciado 09 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais: “O incapaz pode ser parte autora nos Juizados Especiais Federais, dando-se-lhe curador especial, se ele não tiver representante constituído.” in www.ajufe.org.br em 18/03/2012 as 13:57. 24 CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DECLARATÓRIA. POLO ATIVO. ESPÓLIO. LEI Nº 10.259/2001. ROL EXEMPLIFICATIVO. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL. … II - Em que pese ao fato de o espólio não figurar na lista prevista pelo art. 6º, inciso I, da Lei nº 10.259/2001, tal rol não é exaustivo, devendo a competência dos Juizados Especiais Federais basear-se na expressão econômica do feito, a teor do art. 3º, caput, da citada norma. Precedente: CC nº 92.740/SC, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI , DJe de 22/09/08. ...(STJ CC – 97522, Processo nº 2008.01.64497-8, Rel: Min. Francisco Falcão, 1ª Seção, DJE 25/05/2009) 25 Os critérios de sua fixação são absolutos, estado previstos taxativamente na Constituição Federal (arts. 108 e 109 da CF/88). Logo, eles não podem ser alterados por lei de hierarquia inferior. 26 De acordo com o Enunciado 15 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais: “Na aferição do valor da causa, deve-se levar em conta o valor do salário mínimo em vigor na data da propositura da ação.” in www.ajufe.org.br em 18/03/2012 as 14:00.
44
pedido de maior valor, quando alternativos os pedidos; o valor do pedido
principal, em havendo pedido subsidiário; o valor do contrato, quando o litígio
tiver por objeto a existência, validade, cumprimento, modificação ou rescisão
de negócio jurídico; a soma de 12 prestações mensais, na ação de alimentos;
a estimativa oficial para lançamento do imposto, na ação de divisão, de
demarcação ou de reivindicação.
Todavia, quando a pretensão versar sobre prestações vincendas,
deve-se considerar, além do disposto no art. 260 da legislação processual civil,
os parâmetros fixados pelo art. 3º, §2º da Lei nº 10.259/200128. Nestas
hipóteses, tomar-se-á em consideração o valor das prestações vencidas,
acrescido da soma do valor de 12 prestações vincendas.
Determinado o valor da causa e sendo este, de acordo com a
legislação processual civil29, inferior a sessenta salários mínimos deverá a
demanda ser submetida necessariamente ao juizado especial federal. Porém,
em sendo superior a 60 salários mínimos, a competência será da vara federal.
Dúvida poderá surgir quanto a possibilidade de o autor renunciar ao
valor que exceda ao de alçada para se submeter ao rito da Lei nº 10.259/01.
Segundo o Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais - FONAJEF30, é
vedada a fragmentação da demanda, bem como a renúncia de parcelas
vincendas, como meios de acesso ao juizado especial federal.
Interpretação a contrario senso do enunciado 20 do FONAJEF permite
afirmar, por conseguinte, que pode o autor da demanda abrir mão do valor que
27 FRIGINI, Ronaldo. Op. Cit. Pagina 61. 28 “O dispositivo em questão também peca por ser incompleto, principalmente se comparado com o art. 260 do diploma processual pátrio, porque expressa que ‘a soma de 12 (doze) parcelas não poderá exceder o valor referido no art. 3º, caput’, da Lei 10.259/2001, quando, na verdade, o limite deverá ser observado levando-se em conta não apenas as parcelas vincendas, mas, também, as parcelas vencidas é todos os demais aspectos mencionados nos arts. 259 é 260 do CPC.” (ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES, 2009, p. 198) 29 Vide artigos 258 a 261 do Código de Processo Civil. 30 Enunciados 17 e 20 do FONAJEF, respectivamente. in www.ajufe.org.br em 18/03/2012 as 14:05.
45
supere ao de alçada – imposto pelo art. 3º, caput da lei dos juizados especiais
federais – desde que este excesso seja referente a prestações vencidas.
Assim, somente estará afastada a competência do juizado especial
federal, caso o valor das prestações vencidas não ultrapasse o limite legal,
mas haja prestações vincendas que façam com que a demanda atinja valor
superior ao de alçada.
Outra hipótese que gerou discussão na doutrina e na jurisprudência
refere-se a competência dos juizados especiais federais para a execução dos
seus julgados, quando o título executivo ostentar valor superior ao de alçada,
em decorrência de encargos inerentes à condenação.
Conforme anteriormente salientado, o valor da demanda deve ser
aferido na data da propositura da ação, não abarcando os acessórios e
consectários da obrigação reconhecida pelo título executivo judicial. Além
disso, segundo lição de Carreira Alvim, a renúncia do autor quanto ao
excedente do valor de alçada, para que a demanda seja proposta perante o
juizado especial federal “só atinge as prestações vencidas, por não ter
cabimento a renúncia de prestações vincendas, referentes ao credito futuro.” 31
Logo, o fato de a execução ter valor superior ao de alçada não alterará
a competência para a execução dos juizados especiais federais e nem
implicará a renúncia a percepção dos juros, correção monetária e ônus da
sucumbência.
Nesse sentido o voto proferido pela Min. Maria Isabel Gallotti, quando
do julgamento do Recurso em Mandado de Segurança 33.155, cujo voto assim
consignou, in verbis:
31 ALVIM, J.E. Carreira e ALVIM, Luciana Gontijo Carreira. Comentarios a Lei dos Juizados Especiais Federais Civeis, 2006, Curitiba: Ed. Jurua. 2ª Edicao, pagina 39.
46
“Fixado o valor da pretensão do autor quando do
ajuizamento da inicial, renunciando ele, por imposição
legal (art. 3º, § 3º), ao valor que exceder a alçada dos
Juizados, não se põe em dúvida a competência do
Juizado para a execução da sentença, mesmo que
ultrapassado este valor por contingências inerentes ao
decurso do tempo, como correção monetária e juros de
mora, os quais incidem sobre aquela base de cálculo
situada no limite da alçada, além dos honorários de
advogado, encargo este que também encontra
parâmetros definidos em lei (CPC, art. 20).” (STJ, Registro
2010/0189145-8, 4ª Turma, Julgamento 28/06/2011, Dje
29/08/2011, pagina 02 in www.stj.jus.br em 18/03/2012 às
17:00).
No entanto, quando da análise da jurisprudência atual, verifica-se que
nova dúvida, quanto a competência absoluta dos juizados especiais federais,
vem surgindo nas causas que versam sobre prestações de trato sucessivo,
bem como naquelas que versam sobre dano moral, nas quais o magistrado
não está vinculado ao valor indicado pela parte como correspondente ao dano
sofrido.
Observa-se que, nestas hipóteses, as partes têm optado por propor a
demanda perante vara federal, não obstante naquele momento o valor da
causa seja inferior à 60 salários mínimos, a fim de fazer jus ao montante total
da condenação32.
32 Vide: TRF2, AG 184252, Processo nº 2009.02.01.019022-2, Rel. Des. Fed. Carmen Silva Lima de Arruda, 6ª Turma Especializada, E-DJF2R 27/09/2010, página 259/260.
47
No entanto, os magistrados com jurisdição nestas varas, têm
declinado ex officio de sua competência, com fulcro no art. 3º, §3º da Lei nº
10.259/0133.
Este declínio da competência pode causar à parte lesão grave e de
difícil reparação, posto que lhe impõe a renúncia ao montante que excede o
valor de alçada dos juizados.
3.2 – Da Necessidade de Intimação da Parte para Adequar o
Valor da Causa
Não obstante a oportunidade de emenda à inicial somente seja
legalmente obrigatória nas hipóteses de indeferimento da inicial com a
consequente extinção do processo, nos termos do art. 284 do Código de
Processo Civil, nas hipóteses em que a remessa dos autos a outro juízo possa
causar prejuízo à parte, deve lhe ser dada oportunidade para se pronunciar
sobre a matéria.
Neste sentido a lição de Humberto Theodoro Jr., que defende que
verificando o magistrado que a petição inicial apresenta lacunas, imperfeições
ou omissões, ao invés de indeferi-la de plano, deve o juízo determinar que o
autor a emende, ou complete, na forma do art. 284 do Código de Processo
Civil.34
Dessa forma, somente será legítima a retificação de ofício do valor da
causa, com a consequente remessa do feito para o juizado especial federal,
quando o autor não cumprir a determinação judicial para corrigir o valor da
causa ou não justificar a propositura perante a vara federal.
33 Vide: TRF2, CC 10185, Processo nº 2011.02.01.000852-9, Rel. Des. Fed. Liliane Roriz, 2ª Turma Especializada, E-DJF2R 11/03/2011. in www.trf2.jus.br em 20/03/2012 às 11:40. 34 THEODORO JR., Humberto. Curso de Dirito Processual Civil, Vol 01 – 47ª Edição, 2007: Editora Forense, página 400 e seguintes.
48
Conforme previsão expressa da Lei nº 10.259/01, as causas cujo valor,
no momento da propositura da ação, for inferior à 60 salários mínimos, devem
ser processadas e julgadas pelos juizados especiais federais.
“O Código de Processo Civil é claro e conclusivo ao
estabelecer, como regra geral, nos artigos 111 e 102, que
a competência em razão do valor e do território são
derrogáveis (incompetência relativa) e, a contrario sensu,
que as fixadas pelo critério da matéria, da função e da
qualidade das partes são inderrogáveis (incompetência
absoluta). Contudo, a regra geral pode ser excepcionada
diante de norma especial que, naturalmente, prevalecerá.
Nesse passo, o legislador estabeleceu, no §3º do artigo
3º da Lei nº 10.259/2001, a competência absoluta ou
inderrogável dos Juizados Especiais Federais.
No mesmo sentido, o artigo 14 da Resolução nº 30/2001,
da Presidência desta Eg. Corte, prescreve:
'Art. 14. No foro onde estiver instalado Juizado
Especial, sua competência é absoluta'”.(Trecho
do voto proferido pelo JF Conv. Aluisio Gonçalves
de Castro Mendes no julgamento do AG
196508)35
Indubitável é que incumbe à parte autora, quando da propositura da
ação, fixar valor da causa compatível com o conteúdo econômico que deseja
obter, sendo-lhe facultado, conforme anteriormente explicitado, renunciar a
parcela do crédito que eventualmente exceder ao limite previsto na Lei nº
10.259/01, a fim de demandar no juizado especial federal.
35 Vide: TRF2, Ag 196508, Processo nº 2011.02.01.001752-0, Rel. JF Conv. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, 1ª Turma Especializada, E-DJF2R 08/04/2011, página 152/153.
49
Contudo, quando, não obstante o valor da causa – segundo os
critérios dos arts. 258 a 261 do CPC – no momento da propositura esteja
dentro dos limites do valor de alçada, mas pela morosidade processual, seja
possível afirmar que ao final do processo, o valor da pretensão será superior a
60 salários-mínimos e não se possa depreender das razões apresentadas na
petição inicial que é intenção da parte proceder a renúncia, deve o magistrado
intimar a parte para que se manifeste sobre a matéria antes de decidir pela
remessa dos autos ao juizado especial federal.
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
VALOR DA CAUSA. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL.
JUÍZO FEDERAL DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA.
EMENDA DA INICIAL. ADEQUAÇÃO DO VALOR. I. A
competência dos Juizados Especiais Federais Cíveis é
absoluta e fixada em função do valor da causa,
consoante disposto no art. 3º, e seu § 3º, da Lei n.
10.259/2001. II. No entanto, deve-se observar que, não
estando o valor da causa de acordo com os critérios da
lei, o Juiz Federal, ao despachar a inicial, não deve
desde logo declinar da competência para o Juizado
Especial, mas, sim, determinar emenda da petição, sob
pena de indeferimento (art. 267, I, do CPC c/c art. 295,
VI, do CPC). III. No presente caso trazido à colação, o
MM. Juízo de 1º grau, determinou a remessa dos autos
ao Juízo Especial, sem antes intimar o Agravante para
que o mesmo procedesse à emenda à inicial, com a
alteração do valor dado a causa. IV. Agravo de
Instrumento provido, para determinar o retorno dos autos
do processo para a vara de origem, a fim de que seja
procedida à intimação da Parte Autora, a fim de emendar
a petição inicial, atribuindo à causa valor compatível com
a pretensão deduzida em Juízo.” (TRF2, AG 188659,
50
Processo nº 2010.02.01.006662-8, Rel. Des. Fed. Reis
Friede, 7ª Turma Especializada, E-DJF2R 06/09/2010,
página 183 e 184).
Isto porque, permitir que o magistrado, de ofício, reduza o valor
atribuído à causa obrigará a autora a renunciar os valores excedentes ao limite
da competência dos Juizados Especiais Federais, impedindo que o
demandante usufrua em sua totalidade das repercussões financeiras do
julgado.
O mesmo procedimento deve ser observado quando a pretensão não
puder ser valorada com exatidão no momento do ajuizamento da ação, como
por exemplo nas ações indenizatórias por dano moral.
Nestas, a parte autora ao formular sua demanda aponta legitimamente
a reparação pecuniária que entenda devida por todo o constrangimento e
sofrimento experimentados em razão da alegada conduta ilegal da ré.
Assim é que ao alterar o valor da causa na hipótese vertente, o juízo
da vara federal estará procedendo à verdadeira antecipação de seu
entendimento sob o mérito da lide sem, contudo, empreender qualquer
instrução probatória e garantir o efetivo contraditório. Logo, a decisão
declinatória de competência nestas hipóteses acaba por assinalar de pronto o
eventual valor indenizatório devido ao demandante.
Neste sentido o voto proferido pelo Des. Fed. Poul Erik Dyrlund
quando do julgamento do Conflito de Competência nº 2003.02.01.0006433, in
verbis:
“PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA.
VARA FEDERAL E JUIZADO ESPECIAL FEDERAL.
VALOR DA CAUSA. INFERIOR A 60 SALÁRIOS
MÍNIMOS. LEI Nº 10.259/01. PRINCÍPIO DA
51
INAFASTABILIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL. 1. O
artigo 3º da Lei nº 10.259/01 determina que: “Art. 3º.
Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar,
conciliar e julgar causas de competência da Justiça
Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem
como executar as suas sentenças”. 2. Noutro giro, o
artigo 17, parágrafo 4o , norma de caráter heterotópico
(TRF 4a Região, 5a Turma, AI nº 2002.04.01.031578-
8/SC, julg. 13/02/03, ITRF 4a R/nº 145), estabelece:“§4o
Se o valor da execução ultrapassar o estabelecido no
§1o, o pagamento far-se-á, sempre, por meio do
precatório, sendo facultado à parte exeqüente a renúncia
ao crédito do valor excedente, para que possa optar pelo
pagamento do saldo sem o precatório, da forma lá
prevista.”. 3. Da conjugação destes preceptivos legais,
infere-se, a uma, que, eventual renúncia deve ser
expressa, e não tácita, por se tratar de tema
envolvendo disponibilidade patrimonial, o que não se
presume; a duas, que a competência absoluta (§3º,
art. 3º Lei 10.259/01) foi instituída em favor do
interessado, e não como forma de prejudicar os seus
direitos, pelo que cabe a este optar pelo Juízo mais
conveniente, sendo interditado à parte ré, este o sentido
da norma, obstar a referida opção, possuindo aquele o
caráter concorrente, nestes termos, e não excludente; e,
por derradeiro, que exegêse diversa da exposta,
implicaria em vulnerar o princípio da inafastabilidade
da tutela jurisdicional, bem como o acesso efetivo à
mesma, o que conduz ao reconhecimento da
competência do Juízo Federal da 16a Vara da Seção
Judiciária do Rio de Janeiro.”(TRF2, CC
52
200302010006433, Rel. Des. Federal Poul Erik Dyrlund,
8ª Turma Especializada, DJ 13.04.2005, p. 185 – grifos
nossos)
Dessa forma, a intimação da parte para se manifestar sobre o valor da
causa é medida recomendada.
53
CONCLUSÃO
Os juizados especiais foram criados com a finalidade de assegurar à
população uma tutela jurisdicional efetiva e célere, tendo suas regras de
competência sido instituídas em favor do interessado e não como forma de
prejudicar os seus direitos.
Dessa forma, sempre que o processo e julgamento pelo rito dos
juizados especiais federais ensejar qualquer prejuízo à parte, deve ela ser
intimada a se manifestar nos autos do processo.
A obrigatoriedade de intimação da partes é reforçada pelos princípios
norteadores do Processo Civil atual, especialmente, o princípio do
contraditório, da boa-fé processual e da cooperação.
Pelo princípio da cooperação, o juiz não pode decidir com base em
questão a respeito da qual as partes não puderam se manifestar e, por
conseguinte, não tiveram a oportunidade de influenciar na decisão proferida,
apresentando argumentos em sentido contraditório, que demonstrariam o
equívoco da solução adotada.
Além disso, a atuação do magistrado deve ser no sentido de garantir a
participação equânime, justa e leal das partes no processo, a fim de assegurar
seja alcançado o melhor resultado possível.
Logo, não basta que o processo esteja em conformidade com as
normas legais, é preciso que o próprio processo seja adequado a tutelar os
direitos das partes.
A definição do valor da causa, nas causa de competência da justiça
federal, tem nuances de extrema importância pois, além de corresponder - ou
54
ao menos aproximar-se – do real proveito econômico pretendido pela parte
autora, é critério fixador da competência do juízo.
Quando a pretensão econômica estiver no limite da norma legal, cabe
à parte optar pelo juízo mais conveniente entre aquele em que receberá o valor
integral – tendo, contudo, que se submeter a rito com maiores formalidade e,
por conseguinte, mais demorado – ou aquele em que receberá apenas o limite,
renunciando expressamente ao excedente, porém com celeridade.
Além disso, eventual renúncia a valores que excedem os 60 salários-
mínimos previstos no art. 3º da Lei nº 10.259/01, por se tratar de direito
patrimonial disponível, deve ser expresso e não tácito, razão pela qual
impossível presumir que a parte renunciou a tais valores.
Dessa forma, inexistindo a demonstração de violação a critério legal ou
incongruência fática no valor indicado na petição inicial para a causa, deve
prevalecer o valor atribuído pelo autor, sendo defeso ao magistrado declinar de
ofício de sua competência para o juizado especial federal.
A prolação de decisão declinatória da competência, nas causas cuja
pretensão econômica estiver no limite do valor previsto no artigo 3º, §3º da Lei
nº 10259/2001, é medida equivocada.
55
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
1 - ALVIM, JOSÉ EDUARDO CARREIRA; CABRAL, LUCIANA G. CARREIRA
ALVIM. Comentários à lei dos juizados especiais federais cíveis: (Lei 10.259/01
adaptada à Lei 9.099/95). 2ª Edição, rev. e atual. Curitiba: Juruá, 2006.
2 - DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 13ª Edição, cidade:
Ed. Jus Podium. 2011.
3 - Enunciados do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais/
FONAJEF, disponível em <www.ajufe.org.br>
4 - FRIGINI, Ronaldo. Comentários à lei dos juizados especiais cíveis. 3ª
Edição Leme, SP: J. H. Mizuno, 2007.
5 - FUX, Luiz. A ideologia dos juizados especiais. Revista de processo, vol. 22,
n. 86, p. 204-214, abr./jun. 1997.
6 – Jurisprudência. Disponível em: <http://www.jf.jus.br/juris/unificada>.
7 - MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 5ª Edição, cidade:
Revista dos Tribunais. 2011.
8 - MENDES, Aluisio Gonçalves de Castro. Competência cível da justiça
federal. 2ª Edição, rev., atual. e ampl. São Paulo, SP: Revista dos Tribunais,
2006.
9 - MONTESQUIEU, Charles de. O espírito das leis (tradução de Cristina
Murachco), 1ª Edição, São Paulo: Martins Fontes,1993.
10 - THEODORO JR., Humberto. Curso de Dirito Processual Civil, Vol 01 – 47ª
Edição, Editora Forense: 2007.
56
11 - WATANABE, Kazuo. Juizado especial de pequenas causas: filosofia e
características básicas. In: Revista dos Tribunais, v. 600, pp. 273-277, out.
1985.
57
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02
DEDICATÓRIA 03
RESUMO 04
METODOLOGIA 05
SUMÁRIO 06
INTRODUÇÃO 07
CAPÍTULO I - A COMPETÊNCIA NO PROCESSO CIVIL
13
1.1 – Considerações Gerais 13
1.2 – Princípios da Competência 15
1.2.1 – Princípio da Tipicidade da Competência 15
1.2.2 – Princípio da Indisponibilidade da Competência 17
1.3 – Kompetnz Kompetenz 18
1.4 – Classificação da Competência 19
1.4.1 – Competência Originária e Competência Derivada/ Recursal 19
1.4.2 – Competência Absoluta e Competência Relativa 19
1.5 – Distribuição da Competência 21
1.6 – Critérios para Determinação da Competência 23
1.6.1 – Critérios Objetivos 23
1.6.1.1 – Em Razão da Pessoa 24
1.6.1.2 – Em Razão da Matéria 25
1.6.1.3 – Em Razão do Valor da Causa 26
1.6.2 – Critério Funcional 27
1.6.2.1 – Quanto às Fases do Procedimento 28
1.6.2.2 – Por Grau de Jurisdição 28
1.6.2.3 – Pelo Objeto do Juízo 29
1.6.3 – Critério Territorial 29
1.7 – Concretização da Jurisdição 29
1.8 – Conflito de Competência 32
58
CAPÍTULO II - O CONTRADITÓRIO NO PROCESSO CIVIL ATUAL
34
2.1 – Princípio do Contraditório 34
2.2 – Princípio da Boa-Fé Processual 35
2.3 – Princípio da Cooperação 38
CAPÍTULO III – O DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA NAS CAUSAS COM
VALOR INFERIOR À 60 SALÁRIOS MÍNIMOS
40
3.1 – Competência Cível do Juizado Especial Federal 40
3.2 – Necessidade de Intimação da Parte para Adequar o Valor da Causa 46
CONCLUSÃO 52
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
54
ÍNDICE 56
FOLHA DE AVALIAÇÃO
58
59
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes
Título da Monografia: O DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA NAS CAUSAS DE
VALOR INFERIOR A 60 SALÁRIOS-MÍNIMOS
Autora: Claudia Nascimento de Amaral
Data da entrega: 22/03/2012
Avaliada por: José Roberto Conceito: